mídia e educação: novos olhares para a aprendizagem sem

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  • Raul Incio BusarelloPatricia Bieging

    Vania Ribas Ulbrichtorganizadores

    Mdia e Educao: novos olhares para a aprendizagem sem fronteiras

    So Paulo, 2013

  • Copyright Pimenta Cultural, alguns direitos reservados.

    Raul Incio Busarello, MSc.Capa e Projeto Grfico

    Patricia Bieging, MSc.Editorao Eletrnica

    Prof Dra. Marlia Matos GonalvesComit Editorial

    Prof Dra. Vania Ribas Ulbricht

    Patricia Bieging, MSc.

    Raul Incio Busarello, MSc

    Autores e OrganizadoresReviso

    Raul Incio Busarello, MScOrganizadores

    Patricia Bieging, MSc

    Prof Dra. Vania Ribas Ulbricht

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Esta obra licenciada por uma Licena Creative Commons: Atribuio Uso No Comercial No a Obras Derivadas (by-nc-nd). Os termos desta licena esto disponveis em: . Direitos para esta edio cedidos Pimenta Cultural pelos autores, conforme as normas do edital da chamada pblica de trabalhos realizada em 2012 para esta obra. Qualquer parte ou a totalidade do contedo desta publicao pode ser reproduzida ou compartilhada. O contedo dos artigos publicados de inteira responsabilidade de seus autores, no representando a posio oficial da Pimenta Cultural.

    PIMENTA COMUNICAO E PROJETOS CULTURAIS LTDA MESo Paulo SP Fone: (11) 96766-2200 (11) 96777-4132www.pimentacultural.comE-mail: [email protected]

    2013

    M629 Mdia e Educao: novos olhares para a aprendizagem sem fronteiras / Raul Incio Busarello, Patricia Bieging e Vania Ribas Ulbricht, organizadores. - So Paulo: Pimenta Cultural, 2013. 172 p..

    Inclui bibliografia ISBN: 978-85-66832-01-3 (ePub) 978-85-66832-02-0 (PDF)

    1. Aprendizagem. 2. Mdia. 3. Tecnologia de Informao e Comunicao. 4. Mdia-Educao. 5. Alfabetizao. 6. Incluso Digital. 7. Acessibilidade. 8. Ambiente Virtual. I. Busarello, Raul Incio. II. Bieging, Patricia. III. Ulbricht, Vania Ribas. IV. Ttulo.

    CDU: 37.01/.09 CDD: 370

    http://www.pimentacultural.comhttp://www.pimentacultural.com%0Dmailto:livro%40pimentacultural.com?subject=

  • Sumrio

    Prefcio ............................................................................................................................ 05

    Captulo I

    Pesquisa em Mdia-educao no contexto escolar: do cruzamento de olhares o encontro de pistas ............................................. 08Lenice Cauduro

    Captulo II

    A televiso: uma possibilidade frente ao processo de alfabetizao e letramento de jovens e adultos assentados da reforma agrria, militantes do movimento dos trabalhadores rurais sem terra de Santa Catarina ........................................................................ 26Leyli Abdala Pires Boemer e Maria Salete de Miranda

    Captulo III

    Entretenimento, informao e aprendizagem: um estudo de recepo de TV com crianas ..................................................... 45Patricia Bieging

    Captulo IV

    A arte e a mdia na cultura da convergncia: o cinema na escola ..................................................................................................... 59Alessandra Collao da Silva

  • Captulo V

    Comunidades de Prtica em Ambientes Virtuais de Ensino Aprendizagem Acessveis ........................................................................... 72Vania Ribas Ulbricht e Tarcsio Vanzin

    Captulo VI

    Design de hipermdia: proposta metodolgica ............................................... 90Marlia Matos Gonalves e Claudia Regina Batista

    Captulo VII

    Redes sociais temticas apoiando AVEA-I .......................................................... 118Vania Ribas Ulbricht, Luiz Antnio Moro Palazzo, Tarcsio Vanzin,Angela R.B. Flores e Luis Henrique Lindner

    Captulo VIII

    A Compreenso Espacial dos Cegos ..................................................................... 131Angela R. B. Flores, Ana Lucia Alexandre de Oliveira Zandomeneghi, Vilma Villarouco e Cludia Mara Scudelari de Macedo

    Captulo IX

    Aprendendo por quadrinhos hipermdia: o discurso de alunos surdos sobre essa proposta de aprendizagem ............................ 148Raul Incio Busarello e Vania Ribas Ulbricht

    Sobre os Autores ......................................................................................................... 165

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    PrefcioA educao deve ser pensada de forma ampla. O aprendizado d-se no somente no mbito dos muros da escola, mas tambm com a tecnologia, com a famlia, com os amigos e com o convvio em sociedade e, ainda, com, para e atravs dos meios de comunicao. Vive-se em meio s Tecnologias da Informao e Comunicao e faz-se necessrio entend-las e inseri-las no cotidiano, seja na educao formal ou informal, tanto como fonte de conhecimento ou como ferramenta para a gerao de novos contedos.

    O uso das mdias e das tecnologias tem exigido cada vez mais espao nas prticas cotidianas, transformando no somente as relaes interpessoais, mas tambm o processo de ensino-aprendizagem. As possibilidades trazidas pelas novas tecnologias tm propiciado, alm disso, um novo olhar para a educao, fazendo com que pesquisadores desenvolvam trabalhos especialmente focados na acessibilidade dos contedos. A incluso, neste contexto, vem ganhando alternativas e ferramentas cada vez mais modernas, ampliando e facilitando a formao dos sujeitos. Percebe-se, a partir das pesquisas aqui apresentadas, que as novas tecnologias e as ferramentas miditicas esto se tornando muito mais do que somente um espao de socializao, mas, principalmente, o ponto chave para o desenvolvimento de estratgias de aprendizagem e transformao social.

    O uso do computador, da internet, da televiso, da fico seriada, das histrias em quadrinhos, do cinema, dos ambientes virtuais e hipermdia, das redes sociais temticas e de tantos outros meios e formatos apresentam-se alm de simples produtos ou tecnologias. Todas estas alternativas, e tambm os usos destas mdias, chegam para mudar a concepo da aprendizagem formal e da necessidade exclusiva de um espao institucionalizado para o ensino. As tecnologias e todas as ramificaes derivadas esto a todo o tempo ressignificando os papis dos atores envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. O aprimoramento e a criao de novos formatos tm se mostrado urgente e emergente frente aos desafios que esto surgindo em detrimento do acelerado desenvolvimento tecnolgico e, especialmente, das novas prticas de consumo das mdias pelos sujeitos.

    Diante deste contexto, os primeiros quatro captulos deste livro apresentam pesquisas com foco nas relaes e no processo de aprendizagem pelos sujeitos, sejam eles crianas, jovens ou adultos, e tambm nas prticas e nos usos das mdias. Do quinto ao ltimo captulos questes relativas acessibilidade, s

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    ferramentas de ensino-aprendizagem e ao desenvolvimento de ambientes hipermdia so abordadas a partir de diferentes e inovadoras vertentes.

    No primeiro captulo, Pesquisa em Mdia-educao no contexto escolar: do cruzamento de olhares o encontro de pistas, o foco de anlise est centrado no uso das mdias pelos professores na perspectiva da Mdia-Educao. O objetivo est em analisar as representaes e os usos das mdias pelos docentes tanto na esfera pessoal quanto no espao da escola.

    Na sequncia, A televiso: uma possibilidade frente ao processo de alfabetizao e letramento de jovens e adultos assentados da reforma agrria, militantes do movimento dos trabalhadores rurais sem terra de Santa Catarina, apresenta o uso da televiso como suporte terico metodolgico para o desenvolvimento de aulas de alfabetizao e letramento de jovens e adultos do campo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

    Entretenimento, informao e aprendizagem: um estudo de recepo de TV com crianas, no captulo trs, apresenta um estudo de recepo de televiso com crianas a partir de um seriado e de um desenho animado. O objetivo centra-se no que as crianas dizem e pensam sobre os contedos trazidos por estes dois audiovisuais, fazendo com que estes sejam tambm espaos de aprendizagem.

    O captulo quatro, A arte e a mdia na cultura da convergncia: o cinema na escola, traz uma reflexo pelo vis da Mdia-Educao, acerca da arte e da mdia na cultura da convergncia, apontando o cinema como um eficaz instrumento no processo de aprendizagem.

    Comunidades de Prtica em Ambientes Virtuais de Ensino Aprendizagem Acessveis, discute a validade do enfoque proposto pela Teoria da Cognio Situada, que suporta as Comunidades de Prtica, nos ambientes virtuais de aprendizagem acessveis para pessoas surdas. Faz tambm uma apreciao do papel desempenhado pelas Tecnologias de Informao e Comunicao existentes nessa mediao.

    O desenvolvimento dos ambientes hipermdia abordado no captulo Design de Hipermdia: Proposta Metodolgica. O trabalho tem foco nas diferentes etapas que demandam o conhecimento dos membros da equipe de produo,

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    na construo de ambientes hipermdia e tambm na carncia de metodologias que se moldem a diferentes situaes e demandas.

    O captulo Redes sociais temticas apoiando AVEA-I prope a utilizao da web como meio educacional de maneira inclusiva, permitindo incrementar os nveis pessoais de autonomia e compartilhamento de conhecimento. Para tanto, o trabalho apresenta o prottipo da rede social temtica, criado para servir de apoio as Comunidades de Prtica de um Ambiente Virtual de Ensino Aprendizagem Inclusivo (AVEA-I).

    A compreenso espacial dos cegos, no captulo oito, discute como um cego interpreta a geometria plana e tridimensional. Sabe-se que a maior dificuldade de aprendizagem do deficiente visual reside na compreenso de seu entorno. Desta forma, o objetivo est em identificar junto aos sujeitos participantes da pesquisa os aspectos da necessidade do conhecimento, do interesse no aprendizado e dos conhecimentos sobre a geometria plana.

    O ltimo captulo, Aprendendo por quadrinhos hipermdia: o discurso de alunos surdos sobre essa proposta de aprendizagem, apresenta discursos sobre as percepes de voluntrios surdos, quanto utilizao de um prottipo de objeto de aprendizagem construdo como histrias em quadrinhos hipermdia. Evidencia-se a eficincia do objeto criado enquanto ferramenta de aprendizado.

    Diante desta pesquisas, torna-se essencial que pesquisadores, professores, educadores e toda a sociedade envolvam-se nesta crescente jornada na busca por melhores condies de ensino e, principalmente, no homogneo compartilhamento do conhecimento e das informaes de forma alargada e acessvel a todos. Em pleno sculo XXI, e diante de to avanadas tecnologias, inaceitvel que ainda tenhamos formas desiguais no acesso aos contedos e, sobretudo, um grande abismo no que diz respeito acessibilidade das informaes e da educao plena. Este livro traz pesquisas relevantes no somente para o espao escolar, mas para o desenvolvimento de novas formas de aprendizagem considerando as diferenas entre os sujeitos e o respeito diversidade.

    Raul Incio Busarello, Patricia Bieging e Vania Ribas Ulbricht

  • Lenice Cauduro

    PeSquiSa em mdia-educao no contexto eScolar:

    do cruzamento de olhares o encontro de pistas

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    A Mdia-educao ou educao para os meios"1" vem se construindo como um campo de saber situado na interface da comunicao e da educao, em uma perspectiva crtica, instrumental e produtiva, voltado reflexo, pesquisa e interveno no sentido da apropriao crtica e criativa das mdias e da construo da cidadania. A interface entre os dois campos representa um importante espao na formao dos sujeitos e constitui-se como um lugar de ressignificaes de sentidos sociais, de mediao, que ajuda a conformar a percepo da realidade; uma agncia que, atuando juntamente com a escola e outras agncias de socializao, tem influncia decisiva nos rumos da Histria, segundo Baccega (2008). Assim sendo, a mdia-educao constitui um espao de reflexo terica sobre as prticas culturais e tambm se configura num fazer educativo e que pode ser uma possibilidade frente aos desafios de reaproximar cultura, educao e cidadania (FANTIN, 2006, p.37).

  • Pesquisa em mdia-educao no contexto escolar: do cruzamento de olhares o encontro de Pistas

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    Mdia-educao e a escola

    Cabe Mdia-educao ou educao para as mdias realizar o estudo sobre os modos como a instituio escolar e os professores se apropriam das tecnologias da informao e comunicao (TIC) e o uso educativo que se faz delas. No caso deste texto, o interesse reside em verificar como a Mdia-educao tem se efetivado no contexto escolar: em que medida consiste em uma educao com o uso dos meios (que meios e como so utilizados), para o uso dos meios ou atravs dos meios"2". Ressaltamos a importncia de entender as mdias como fonte de conhecimento, objeto de estudo e forma de expresso para qualificar a educao, a partir de uma perspectiva crtica, criativa e responsvel.

    Considerando as atuais discusses sobre Mdia-educao, sobretudo na questo da integrao das mdias e tecnologias na escola, algumas proposies j so at consideradas senso comum entre estudiosos da rea, dentre elas: a importncia da utilizao das mdias na escola, a constatao da falta de recursos fsicos, da falta de formao dos professores, a falta de polticas pblicas, etc. No entanto, na escola a questo ainda no est devidamente problematizada: as prticas e as queixas se reproduzem sem que se sejam vislumbradas perspectivas de transformao.

    A discusso terica continua se desenvolvendo e j envolve o que alguns tericos denominam de nova Mdia-educao ou New Media Education conforme Rivoltella (2006), frente ao advento das mdias digitais e as mudanas provocadas no consumo definidas pela mobilidade, portabilidade e personalizao dos meios, o que influencia determinantemente a Sociedade da Informao e do Conhecimento (DRUETTA, 2011). Enquanto isso, na escola, ainda nem se consegue promover uma integrao adequada das mdias e tecnologias ao processo de ensino e aprendizagem e muito menos consolidar a perspectiva inicial da Mdia-educao.

  • Pesquisa em mdia-educao no contexto escolar: do cruzamento de olhares o encontro de Pistas

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    As pesquisas e o percurso metodolgico

    nesta perspectiva que este texto vem trabalhar, apontando o resultado de vrias pesquisas que tiveram esta inteno, as quais sero apontadas ao longo do texto, tendo como referncia a pesquisa "Uso dos Meios e Consumos Culturais dos Professores de Ensino Fundamental" (FANTIN; RIVOLTELLA, 2010). Com base neste trabalho foi desenvolvida tambm a pesquisa "Representaes e usos das mdias na escola: de ferramentas para aumentar a motivao possibilidade de produo crtica e criativa em Mdia-educao" (CAUDURO, 2011). Ambas utilizaram metodologia semelhante para identificar a problemtica especfica de cada contexto pesquisado, em relao s representaes, prticas pedaggicas e os usos dos meios nos diferentes espaos da escola.

    O processo de construo dos elementos de anlise contou com estudo terico, a reviso das pesquisas j realizadas sobre formao em Mdia-educao e o levantamento dos dados obtidos nas pesquisas empricas.

    A pesquisa "Uso dos meios e consumos culturais dos professores" (FANTIN; RIVOLTELLA, 2010) realizada por Monica Fantin, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com professores da rede pblica municipal de Florianpolis, e Pier Cesare Rivoltella da Universit Cattolica del Sacro Cuore (UCSC), de Milo/Itlia com professores de Milo, com cerca de 50 professores em cada contexto, fez um mapeamento sobre os usos dos meios e consumos culturais de professores do Ensino Fundamental, com vistas a pensar uma formao mais sintonizada com os desafios da educao contempornea (FANTIN, 2009, p. 5). A pesquisa utilizou questionrio online com uma base digital na UCSC de Milo, entrevistas e grupos focais com o objetivo de identificar dificuldades encontradas e boas prticas desenvolvidas pelos professores alm da organizao de um grupo de estudos e formao com professores, pesquisadores e representantes do Ncleo de Tecnologias Educacionais (NTE) que atua com formao continuada.

    A pesquisa "Representaes e usos das mdias na escola: de ferramentas para aumentar a motivao possibilidade de produo crtica e criativa em Mdia-

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    educao" (CAUDURO, 2011), foi realizada com 70 professores de ensino fundamental da rede pblica municipal de So Jos, SC, mais especificamente do Colgio Municipal Maria Luiza de Melo, a maior escola pblica municipal do estado. Este trabalho buscou identificar as representaes que os professores possuem sobre as mdias e TIC em sala de aula; observar os usos dos espaos nas prticas educativas dos professores em relao ao uso das mdias e TIC e sua integrao no cotidiano escolar; analisar as dificuldades e boas prticas dos professores buscando elementos para entender a insero ou a ausncia das TIC na escola; refletir sobre a formao de professores frente s demandas educativas do uso dos meios na perspectiva de ser um mdia-educador; identificar elementos para elaborao de pistas para superar as limitaes encontradas e utilizar as mdias na perspectiva da Mdia-Educao.

    Alm dessas, as pesquisas apontadas a seguir tambm exerceram um papel importante na construo dos elementos de anlise porque tambm dizem respeito aos usos e consumos das mdias na educao e sua insero nas prticas pedaggicas tendo em vista a perspectiva da Mdia-Educao e foram apontadas por Cauduro (2011).

    A pesquisa "Mdia-educao no Contexto Escolar: Mapeamento crtico dos trabalhos realizados nas escolas de Ensino Fundamental em Florianpolis" (PEREIRA, 2008) do Mestrado em Educao da UFSC, mapeou atividades de Mdia-Educao em escolas de Ensino Fundamental de Florianpolis envolvendo inicialmente 83 escolas das redes estadual, municipal e particular e depois trs escolas onde foi aprofundada a observao a respeito dos usos, dificuldades e solues relacionados s atividades com, sobre e/ou atravs das mdias no ambiente escolar.

    A pesquisa "Alm da sala informatizada: a prtica pedaggica com as mdias na escola" (LINO, 2010) do Mestrado em Educao da UFSC, investigou a prtica pedaggica de professores em ambientes diferenciados de trabalho com as mdias na escola, verificando limites e possibilidades desta utilizao.

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    A dissertao "Impresses digitais entre professores e estudantes: um estudo sobre o uso das tic na formao inicial de professores nas universidades pblicas de Santa Catarina" (LARA, 2011), do mestrado em Educao da UDESC, traou um panorama da utilizao social e pedaggica das mdias por professores e alunos, em oito cursos de formao de professores das universidades pblicas de Florianpolis.

    Alm delas, contriburam para a construo da reflexo as produes existentes nos campos da educao e comunicao, sobretudo nos ltimos cinco anos, (para selecionar as discusses mais atuais) sobre Mdia-Educao, formao de professores, uso das mdias e prticas pedaggicas no Brasil, no banco de dissertaes e teses da CAPES, nas reunies da Associao Nacional de Ps Graduao (ANPED), principalmente dos grupos GT16 (Educao e Comunicao) e GT8 (Formao de professores) e nas produes da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicao (INTERCOM), no GP Comunicao Educativa .

    Alguns aspectos destacados nas pesquisas

    O primeiro e indiscutvel aspecto destacado em todas as pesquisas e artigos consultados evidencia a necessidade de formao inicial e continuada dos professores e multiplicadores, para alm do carter instrumental das TIC, fundamental para promover prticas transformadoras. Pereira (2008, p. 13) sugere a necessidade de uma formao terico prtica dos professores, a partir, entre outros elementos, das expectativas e usos que eles mesmos j possuem das mdias.

    Fantin e Rivoltella (2010) e Cauduro (2011) encontraram diversos pontos em comum. Evidenciou-se que os professores em sua maioria possuem acesso a equipamentos eletrnicos, principalmente computador e internet dos quais fazem uso frequente, em sua vida pessoal e menor na profissional. Parte deles no utiliza pedagogicamente os meios porque no teve oportunidade ou tempo de aprender enquanto outros no os utilizam porque no querem. Este grupo

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    o mais difcil de ser atingido devido sua resistncia, que tem mais a ver com suas concepes de ensino-aprendizagem do que com outros aspectos como saber usar, disponibilidade de recursos, etc.

    Tambm constataram que as representaes"3" dos professores em relao s mdias dizem respeito prioritariamente s noes de recursos didticos e ferramentas de comunicao. Ainda foi possvel constatar que o professor ao utilizar as mdias em suas aulas possui uma representao de inovao, pois acredita estar fazendo algo diferente. Entretanto, percebe-se como mudana superficial, de ferramentas, mas no no formato das aulas e na concepo de ensino e aprendizagem. Verificou-se tambm alguns espaos prioritrios de uso das mdias e tecnologias, como as salas informatizadas e salas de vdeo, por exemplo. A exibio frequente de filmes e vdeos para os alunos contrasta com a escassez de propostas de produo audiovisual na escola. Os professores apontaram como principais dificuldades para a utilizao das mdias em suas aulas, a falta de recursos (infraestrutura/condies de acesso e/ou manuteno dos equipamentos), a falta de tempo e a falta de formao em ordem diferente em cada contexto. Em relao aos consumos culturais verificou-se pouca participao em atividades culturais (teatro, cinema, shows, galerias, museus etc), sobretudo por questes econmicas, falta de tempo, cansao e at por no gostarem. Assistir televiso e a leitura so as atividades preferidas no tempo livre. Considerando que a ampliao do repertrio cultural importante para que professores e alunos construam uma bagagem que lhes permita serem produtores criativos, tais dados preocupam.

    Lino (2010) destaca algumas iniciativas, como a de incluso e distribuio de computadores e outros meios nas salas de aula de uma das escolas por ela observadas (o que poderia resultar em boas prticas no uso das mdias na escola), porm as considera isoladas e com pouca articulao entre os pares. E tambm constata: a dificuldade de manuteno dos equipamentos; as iniciativas no continuadas pela rotatividade dos professores contratados temporariamente que compromete a implantao e continuidade de qualquer proposta pedaggica; a pouca discusso promovida pelas escolas sobre o tema e as

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    iniciativas insuficientes de formao pelo Ncleo de Tecnologia Municipal (NTM). Apesar de verificar a presena considervel de tecnologias digitais na escola, a autora considera sua utilizao limitada, sobretudo ao carter de ferramenta e/ou recurso, transferindo velhas prticas para os meios digitais (LINO, 2010, p.117).

    Lara (2011) constatou que, apesar de haver polticas pblicas do MEC para insero das mdias e tecnologias nas escolas de ensino fundamental (sobretudo computadores com acesso internet banda larga), as universidades, responsveis pela formao dos futuros docentes dessas instituies, ainda no desenvolveram polticas para incorporao das tecnologias em sua prpria prtica (LARA, 2011, p. 122). Constatou tambm diferenas entre esses usos pelos professores e estudantes, sobretudo no fato de os estudantes utilizarem mais as TIC no mbito social, enquanto os professores utilizam mais no mbito profissional. No mbito acadmico o uso limitado e predominantemente instrumental nos dois casos. As constataes encontradas na pesquisa foram importantes por oferecerem dados concretos sobre a formao inicial dos professores.

    Dentre os artigos consultados, destacamos Santos (2009) que analisa como a questo da formao dos professores para uso das tecnologias digitais tem sido contemplada nas reunies anuais da Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao, nos Grupos de Trabalho Formao de Professores (GT8) e Educao e Comunicao (GT16), entre 2000 a 2008. Ela encontrou 26 trabalhos: 11 no GT8 e 15 no GT16 e os resultados demonstraram:

    - o crescimento de pesquisas que focalizam essa temtica em diferentes frentes;

    - uma formao continuada descontextualizada, apressada e centrada prioritariamente nas questes tcnicas do computador/internet;

    - como produo cultural, as tecnologias no podem ser excludas da escola, da formao da prtica docente e das pesquisas.

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    Sintetizando os trabalhos consultados na ANPED e INTERCOM, Abranches (2004), Fadel (2005), Rosalen e Mazzill (2005), Cunha (2006), Gonalves e Nunes (2006), Zanchetta (2006), Ruaro (2007), Mafra (2007), Andrade (2007), Silva (2007), Tosta e Santos (2008), Melo (2009), Rodrigues (2009), Santos (2009), Soares (2009), Schnell (2009), Vosgerau (2009) e Lopes, Coutinho e Cavicchioli (2010), encontramos alguns aspectos recorrentes:

    - apesar de diversos esforos das escolas na insero das tecnologias, os docentes ainda encontram dificuldades em utilizar as novas mdias na prtica pedaggica, por no dominarem metodologicamente as linguagens miditicas, o que remete questo da formao;

    - a incluso de novas tecnologias na escola evidencia certa resistncia em substituir determinadas prticas escolares tradicionais;

    - ainda so inmeros os desafios para a construo, por parte dos docentes, de competncias no uso das TIC como interface pedaggica;

    - a importncia da reflexo sobre a prtica docente;

    - a implementao de polticas pblicas que busquem a efetiva insero das tecnologias digitais na escola, aliada programas de formao docente;

    - a discusso acerca da emergncia de mudanas estruturais e curriculares nas instituies escolares com a introduo das tecnologias digitais e dos programas com uso de software livre;

    - ainda h um longo caminho a percorrer para que a escola (como um todo) incorpore a Mdia-Educao e desenvolva prticas afinadas entre a formao de professores e o contexto de mudanas.

    Outros trabalhos tambm analisados, que desenvolveram propostas voltadas para a Mdia-educao, concluram que a formao continuada, com o uso das

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    mdias interativas, contribuiu para que os professores se apropriassem tcnica e pedagogicamente das TIC (LAURENTINO, 2005; SANTOS SILVA, 2006; SANTOS, 2007; MENDES, 2008; BIANCHI, 2009). As aes colaborativas em Mdia-Educao tambm levaram os professores ao desenvolvimento de atitudes mais autnomas e reflexivas em relao ao seu aprendizado e a estabelecer relaes dialgicas com os alunos e agentes da escola.

    O dilogo entre as pesquisas

    De posse dos dados das pesquisas e artigos pesquisados foi possvel estabelecer um dilogo entre eles, encontrar pontos comuns e buscar algumas pistas sobre o panorama da Mdia-Educao no contexto escolar e as possibilidades de articulao.

    Um dos pontos principais diz respeito ao perfil profissional necessrio para que um professor seja um mdia-educador, que usa e pensa sobre os meios, que tem uma leitura crtica em relao a eles e a capacidade de expressar-se criativamente a respeito das mdias. O desenvolvimento de uma identidade educativa (RIVOLTELLA, 2001) e as competncias"4" necessrias a ela. Existem profissionais que tem as mdias integradas e incorporadas ao seu cotidiano, tanto pessoal como profissionalmente. Seu uso vai alm do meramente instrumental, porm a nfase de seu trabalho no est nas mdias em si, mas no processo que desencadeiam. Estes professores propem o uso, a reflexo crtica, a criao e produo com as mdias, porm nas escolas pesquisadas este grupo ainda minoria.

    As pesquisas no conseguiram encontrar uma resposta clara sobre o que determina esta diferena em relao aos outros. H evidncias que nos fazem acreditar naquilo que Schn (2000) denomina de talento artstico profissional, tipo de competncia demonstrado pelos profissionais em determinadas situaes de sua prtica, que dizem respeito ao conhecimento tcito (aquele que o sujeito tem e s vezes nem consegue descrever). Eles esto constantemente em busca de novas solues, de ampliar seu repertrio, de melhorar suas prticas.

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    E, neste caso, a motivao muito mais pessoal do que determinada por qualquer tipo de formao que se possa promover.

    Outros pontos que se destacaram:

    - a constatao da utilizao das mdias na escola principalmente com o objetivo de aumentar a motivao dos estudantes para a aprendizagem. Este o carter instrumental de uso delas, como ferramentas/recursos e apesar de ser um dos aspectos importantes defendido por autores como Moran (2000), Masetto (2000), Almeida (2005), Kenski (2007), entre outros, limitar-se a ele restringe demasiadamente as possibilidades educativas das mdias;

    - os usos e consumos culturais dos professores parecem ter influncia no seu perfil profissional evidenciadas nas prticas pedaggicas empobrecidas com relao s atividades culturais (teatro, cinema, galerias de arte);

    - a urgncia em se (re)pensar cursos de formao de professores para o uso das mdias na escola na perspectiva da Mdia-Educao para ampliar as possibilidades dessa utilizao. Essa formao deve permitir que os professores reflitam em conjunto sobre as prticas em realizao e encontrem diferentes alternativas para avanar no trabalho de integrao entre mdias e conhecimento. E a implementao de polticas pblicas de formao de professores que promovam a valorizao das pessoas e das instituies educativas, em substituio aos modelos frequentemente oferecidos, que buscam reafirmar o controle sobre eles (avaliaes profissionais e institucionais);

    - a necessidade de se construir competncias adequadas ao perfil do professor mdia-educador;

    - a importncia de o professor modificar suas prticas, com destaque para a disponibilidade, interesse e curiosidade intelectual que possa impulsionar para as mudanas, ou seja, de uma motivao pessoal;

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    - viabilizar alteraes na organizao escolar que envolvam uma melhor distribuio e otimizao dos tempos e espaos de aprendizagem. Na perspectiva ecolgica da mdia-educao, a prtica pedaggica precisa estar articulada aos usos da cultura no sentido da interao com os objetos que alimentam o pensar e o fazer na escola e fora dela, com a cultura produzida: livros, filmes, programas de televiso, peas de teatro, apresentaes musicais, mostras de dana, exposies, etc. (FANTIN, 2008, p. 157);

    - a importncia de se valer da Mdia-Educao na construo da cidadania, no sentido de desenvolver nos estudantes o sentido crtico e criativo para que, alm de consumidores, sejam produtores responsveis de conhecimento. Reconhecer a cultura do uso das mdias e das possibilidades oferecidas pelas TIC, pelas mdias digitais e pela Web 2.0, tanto como fonte de informao quanto para a construo, socializao do conhecimento e ampliao das relaes entre sujeitos e instituies;

    - o reconhecimento por parte dos professores da importncia das mdias no processo educativo, porm a limitao nas possibilidades de uso por desconhecimento, por falta de planejamento e momentos de socializao de experincias;

    - com relao motivao dos alunos pela utilizao das mdias como recurso didtico, as pesquisas demonstraram que quando houve xito, ou seja, aumento na participao e interesse dos alunos foi pela proposta pedaggica desenvolvida e no pelo uso do equipamento e da ferramenta.

    Para alm do uso instrumental

    indiscutvel que a insero das TIC na escola traz novos desafios e dificuldades ao trabalho pedaggico. Por esse motivo preciso compreender a realidade em que atuamos e planejar a construo de novos cenrios, saberes e competncias para lidar com a diversidade de acesso s informaes, s possibilidades de

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    comunicao e interao, s novas formas de aprender, ensinar e produzir conhecimento, para as quais talvez no estejamos suficientemente preparados.

    Logicamente, a Mdia-Educao no a nica varivel possvel que incide sobre as mudanas e no se pode resolver todos os problemas s com a introduo de novas mdias, afirmam Rivoltella e Marazzi (2001). Existem outras condies particulares que atuam no processo, tais como: condies culturais, econmicas e de trabalho, relaes interpessoais, etc.. O desenvolvimento de pesquisas na rea fundamental, sendo importante ouvir os sujeitos pesquisados e estimul-los a pensar sobre estes dilemas, para buscar solues coletivas e compromet-los com a transformao. Percebemos isso nas pesquisas quando, a despeito dos esforos governamentais para equipar as escolas e oferecer formaes, as prticas permanecem defasadas.

    Outro aspecto que dificulta a mudana a configurao escolar. As caractersticas de infraestrutura fsica e organizacional das escolas, o currculo vigente organizado com a compartimentalizao dos saberes, fragmentado em disciplinas, a organizao dos tempos e espaos escolares de forma fragmentada com as aulas divididas em perodos de 45 min., a distribuio dos alunos na classe e o uso flexvel ou rgido dos horrios so fatores que configuram e condicionam o ensino. O espao precisa ser repensado em sua arquitetura, pois a diviso convencional em salas de aula, com tamanho reduzido, onde cabem no mximo 40 carteiras (como se observa na maioria das escolas pblicas), prejudica uma reorganizao do trabalho escolar na perspectiva da presena das TIC em tais espaos. preciso pensar as salas de aula como ambientes de aprendizagem, com tamanho e equipamentos adequados para tal, aliado ao uso de outros espaos.

    As pesquisas apontadas neste texto, sobretudo Fantin e Rivoltella (2010) e Cauduro 2011, apresentaram algumas pistas para a reorganizao escolar, no sentido de ampliar e qualificar as prticas pedaggicas na perspectiva da Mdia-Educao, que envolvem a ampliao do espao da sala de aula para outros espaos de cultura, tanto erudita quanto de massa, como museus, galerias de

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    arte, parques, cinema, etc. na perspectiva de uma formao cultural que envolve o amplo repertrio imagtico, literrio, artstico, musical, miditico, das mais diversas produes humanas disponveis (FANTIN, 2008, p. 154).

    Tambm destacam ser fundamental a oferta de uma formao onde os professores reflitam em conjunto sobre as prticas em realizao e encontrem diferentes alternativas para avanar no trabalho de integrao entre mdias e conhecimento, pois ns profissionais avanamos na medida em que compreendemos e fundamentamos o que fazemos, na medida em que podemos refletir sobre isso e encontrar os motivos de nossa atuao (ZABALLA, 1998, p. 223). Talvez uma possibilidade interessante pudesse ser a mescla da formao, presencial e online, o que podemos denominar de modalidade blended. Afinal, o processo ensino-aprendizagem online, ainda no est devidamente explorado na formao de professores e muito menos na educao escolar. Esse exerccio possibilitaria a familiarizao com a multiplicidade de cdigos lingusticos oferecidos pela tecnologia digital (textos, hipertextos, imagens, sons, animaes) o que pode favorecer estilos singulares de aprendizagem, que muitas vezes no acontece numa situao presencial. Esse processo devidamente mediado oferece vantagens como, por exemplo, flexibilidade, abrangncia, dinamicidade, mediao pela internet, entre outras, o que potencializa a comunicao entre os sujeitos, encurtando tempo e distncia e favorece o acesso ilimitado informao, s trocas instantneas, produo coletiva do conhecimento e, principalmente, pressupe uma lgica no linear e hierarquizada dos saberes.

    E, por fim, mas no esgotando a questo, preciso reconhecer a necessidade de mudana das concepes tericas ou empricas sobre ensino e aprendizagem, que no conseguem deslocar o foco do professor, como aquele que ensina e o aluno aquele que deve aprender com ele. Que o professor assuma o papel de mediador entre os alunos e a cultura mais ampla, promovendo a integrao das diferentes mdias no cotidiano escolar, como fonte de conhecimento, como objeto de estudo e, sobretudo, como forma de expresso, que possibilite interpretar, problematizar e produzir os mais diferentes textos de forma crtica e criativa, utilizando todos os meios, linguagens e tecnologias disponveis (FANTIN, 2008, p. 69).

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    Neste sentido, este texto pretendeu buscar, nas produes tericas acadmicas, algum auxlio para visualizar as mudanas necessrias, colocando o conhecimento j produzido em circulao e em dilogo com as prticas efetivamente realizadas na escola. Longe de esgotar a questo e oferecer receitas pretende desencadear novas reflexes.

    Notas1. Media education, em ingls; ducation aux mdias, em francs; educacin en los mdios, em espanhol, educao e media em portugus (BELLONI, 2005, p. 9). (p. 8)

    2. Para ou sobre os meios, refere-se ao estudo e anlise dos contedos presentes nos diferentes meios e suas linguagens. Com os meios, trata-se do uso dos meios e suas linguagens como ferramenta de apoio s atividades didticas. E atravs dos meios, diz respeito a produo de contedos curriculares para e com os meios, em sala de aula e, tambm, a educao a distncia ou virtual, quando o meio se transforma no ambiente em que os processos de ensino-aprendizagem ocorrem. (http://www.revistapontocom.org.br/entrevista/midiaeducacao-em-debate). (p. 09)

    3. Utilizamos o conceito de representaes de Moscovici (2009) para quem as representaes seriam a forma de conhecer, uma espcie de traduo e de verso da realidade feita por determinado grupo, de acordo com sua cultura, suas informaes, crenas, opinies e valores. (p. 13)

    4. Neste trabalho o conceito de competncia entendido como saber de ao (RIVOLTELLA, 2010). Na direo do que props Perrenoud (2000), competncia a capacidade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos (saberes, capacidades, informaes, etc.) para solucionar com pertinncia e eficcia uma srie de situaes. (p. 16)

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  • Leyli Abdala Pires Boemer Maria Salete de Miranda

    a televiSo: uma possibilidade frente ao processo de alfabetizao

    e letramento de jovens e adultos assentados da reforma agrria, militantes do movimento dos

    trabalhadores rurais sem terra de Santa Catarina

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    Embora o MST, ao longo de quase trs dcadas de existncia, tenha acumulado significativa experincia no campo educacional e, por conseguinte, investido paulatinamente e logrado grandes xitos no referido campo, o ndice de analfabetismo em sua base continua expressivo. De acordo com Documento do MST, em uma pesquisa realizada em 2007 a situao educacional nas reas de assentamentos e acampamentos revela que nesses lugares 23% dos adultos so analfabetos (MST, 2007). Segundo a mesma fonte, no que se refere ao meio rural brasileiro:

  • A televiso: umA possibilidAde frente Ao processo de AlfAbetizAo e letrAmento de jovens e AdultosAssentAdos dA reformA AgrriA, militAntes do movimento dos trAbAlhAdores rurAis sem terrA de sAntA cAtArinA

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    O ndice de analfabetismo entre os adultos (acima de 15 anos) de 28,7%, enquanto que na zona urbana o ndice de 10,2%. Num total de 15 milhes de brasileiros adultos que no sabem ler nem escrever (MST, 2007, p.7).

    Conforme depoimento de Vargas (2007), membro do Setor Nacional de Educao do Movimento, numa pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) sobre a educao no campo demonstra que o analfabetismo no meio rural ainda muito expressivo.

    Tal situao demonstra que a garantia do ensino fundamental, obrigatrio e gratuito, inclusive para os que no tiveram acesso na idade prpria conforme fixado no inciso I, artigo 4, da Lei de Diretrizes e Bases da Educao, de 1996 (Cf. Brasil, MEC, 2005) no vem sendo cumprida. E que as maiores taxas de analfabetismo esto nas cidades do norte e nordeste brasileiro (VARGAS, 2007).

    O INEP aponta que esse percentual de analfabetismo, de 28,7%, no meio rural quase trs vezes superior se comparado com o ndice de analfabetismo na rea urbana. Segundo a mesma fonte, os contrastes regionais so acentuados, como por exemplo, no Nordeste onde esse percentual de 40,7%, alcanando 49,2% no Estado do Piau. Segundo o INEP, os menores ndices de analfabetismo esto na Regio Sul, com 11,9% de analfabetos na rea rural (INEP apud MST, 2007). Segundo Lenzi (2010), o Ministrio de Desenvolvimento Agrrio (MDA), em relatrio de 2008, aponta que na faixa etria de 40 anos ou mais onde se concentra um elevado percentual de analfabetos, e que, enquanto na rea urbana o percentual de 7,3% na rea rural de 27,1%.

    Conforme a autora:

    Quanto s diferenas das taxas de analfabetismo entre campo e cidade, na populao da zona rural de 15 anos ou mais se observa que, enquanto, em 1996, era de 31%, em 2006, tem-se 22,2%, enquanto nas reas urbanas era 10,8%, em 2006, de 8% (LENZI, 2010, p.82-83).

  • A televiso: umA possibilidAde frente Ao processo de AlfAbetizAo e letrAmento de jovens e AdultosAssentAdos dA reformA AgrriA, militAntes do movimento dos trAbAlhAdores rurAis sem terrA de sAntA cAtArinA

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    Assim posto, compreende-se que, embora tenha havido uma diminuio nesses percentuais, permanece o cenrio de desigualdades, o qual demanda uma mudana mais significativa e urgente, no que se refere ao fenmeno do analfabetismo no campo, pois ainda, de acordo com Lenzi (2010)

    As mudanas propagadas pelos programas de alfabetizao ou de escolarizao para jovens e adultos no objetivam uma poltica prpria, pois de modo geral tm seus interesses majoritariamente marcados mais pela diminuio dos ndices de analfabetismo do que pelos prprios sujeitos (LENZI, 2010, p.83)

    Boemer (2010), articulando a concepo de sujeito com as questes de alfabetizao e letramento"1", considera que:

    Os limites dos investimentos governamentais e o princpio educativo de uma sociedade baseada no modo de produo capitalista, por meio de suas polticas educacionais, no oportunizam uma educao de qualidade, nem tampouco promovem articulao do letramento com a alfabetizao. (Boemer, 2010, p.32,33)

    Ainda, de acordo com a autora outra dificuldade que se observa na formao dos educandos do campo diz respeito, tambm, s condies difceis de sobrevivncia s quais esto submetidos jovens e adultos, tais como: a falta de tempo para os estudos devido s longas jornadas de trabalho, dificuldades no acesso escola e, escassez de material e recursos didticos disponveis nos programas oficiais.

    De acordo com Lenzi (2010), apesar de ter sido proclamado o direito de todos educao na Constituio Federal de 1988, apenas em 2001 foi elaborada e aprovada a Resoluo CNE/CEB n 1, de 03 de abril de 2002, para a Educao Bsica nas Escolas do Campo (LENZI, 2010, p.83). Deste perodo em diante, embora tenha se avanado de forma significativa, a luta pela garantia deste direito e, por conseguinte, as condies de reavaliao ou prticas sociais marcadas pela linguagem escrita continuam em curso e vm sendo a bandeira

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    de luta de muitos educadores e movimentos sociais engajados nesta problemtica, e, de modo especial, o MST.

    Diante do problema do analfabetismo no campo, especificamente nos assentamentos rurais, no perodo compreendido entre 2006 e 2007, o MST adotou um mtodo de alfabetizao oferecido solidariamente pelo governo cubano. O mtodo chamado Mtodo de Alfabetizao Sim, eu posso, traduzido do ttulo original Yo, s puedo, foi elaborado pelo Instituto Pedaggico Latino-americano e Caribenho de Cuba (IPLAC), sob a responsabilidade e organizao da Professora Leonela Ins Relyz Daz"2". Este mtodo, recm aplicado nas atividades destinadas alfabetizao de jovens e adultos desse Movimento, busca rapidez no processo de alfabetizao dos educandos devido ao alto ndice de analfabetismo no campo.

    Esta pesquisa, resultante de nossa dissertao de mestrado, buscou perceber como se deu esse processo de alfabetizao pela via tecnolgica e, por conseguinte, se o mesmo possibilitou o letramento dos jovens e adultos. O conceito de letramento, neste trabalho, circunscreve-se na perspectiva de uma educao omnilateral (Manacorda 2007): que reconhea os sujeitos na sua totalidade e libertadora (Paulo Freire 2010): educao como princpio de liberdade.

    As questes de pesquisa deste trabalho tiveram por base a formao integral defendida pelo MST e os conhecimentos sobre o Mtodo Yo si puedo (Sim, eu posso), quando tivemos um primeiro contato em seu lanamento oficial durante o Congresso Internacional de Pedagogia, realizado em Havana (Cuba), no ano de 2005, e, em meados de 2006, quando participamos da capacitao sobre o mtodo na cidade de Chapec, Santa Catarina. Ministrada por um professor cubano esta capacitao era destinada s lideranas do movimento, coordenao do setor estadual de educao e monitores"3" que iriam aplicar o mtodo nas turmas de EJA em Santa Catarina. A partir da, surgiram algumas indagaes quanto ao uso do mtodo no que diz respeito preocupao com o letramento dos educandos defendido pelo MST em suas atividades educacionais, quer sejam:

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    Quais as contribuies do Mtodo de Alfabetizao Sim, eu posso para o processo de letramento dos sujeitos educandos em uma turma de EJA do MST.

    O mtodo Sim, eu posso contempla os princpios polticos pedaggicos e filosficos"4" postulados pelo MST?

    Para este trabalho, adotou-se como metodologia a pesquisa qualitativa, valendo-se, no entanto, de dados quantitativos para uma anlise mais detalhada das questes. Compreende-se que a perspectiva qualitativa contribui para uma melhor compreenso da experincia humana, bem como do fenmeno social a ser analisado.

    A anlise dos dados deu-se a partir das entrevistas e dos estudos tericos feitos com base no material fornecido pelo governo cubano"5" e, por referencial bibliogrfico alinhado perspectiva terica do materialismo histrico e dialtico. Foram realizados estudos sobre a origem e operacionalizao do mtodo na obra Yo si puedo (Sim eu posso) e sobre os conceitos centrais e seus respectivos autores, tais como: o conceito de letramento de Soares (2003) e o de alfabetizao de Freire (2007).

    Quanto ao campo de pesquisa, trata-se de uma turma de EJA sob a responsabilidade do educador Jos dos Santos"6", localizada no Assentamento So Jos, no Municpio de Campos Novos, no Estado de Santa Catarina, que adotou o referido mtodo de alfabetizao atravs do MST.

    Ressalve-se que esta pesquisa no teve a pretenso de responder qual o melhor mtodo a ser aplicado, tampouco apontar uma frmula mgica para resolver os problemas do analfabetismo dos sujeitos jovens e adultos do campo. Entretanto, luz da reflexo crtica, pretendeu-se estabelecer questionamentos acerca do fenmeno pesquisado, apontando alguns indicativos passveis de contribuir com a Alfabetizao de Jovens e Adultos, em especial junto aos movimentos sociais organizados. Acredita-se, ainda, que esse estudo e as reflexes dele

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    oriundas possam servir de referncia para outros programas e instituies que trabalham com a EJA.

    O MST e a questo da alfabetizao: contexto histrico

    Algumas questes referentes educao do campo no so muito diferentes do que se observa no cenrio da educao, em geral e, por conseguinte, na educao de jovens e adultos no Brasil. Haja vista os ndices referentes ao analfabetismo no referido pas, apresentados na introduo deste trabalho, e acrescentando aos mesmos dados o cenrio poltico, social e econmico nos quais esto inseridos os sujeitos da classe trabalhadora de nosso pas se pode refletir sobre as condies postas e impostas aos mesmos, de modo especial os trabalhadores do campo.

    Independentemente de a educao estar voltada para o campo ou para a cidade, o que se coloca como um dos fenmenos, dentre outros, que se alinha a esses dois espaos o controle e a submisso da classe trabalhadora frente ao sistema capitalista e o pouco investimento do Estado no que concerne s polticas pblicas que contemplem e atendam as necessidades na esfera da educao de Jovens e Adultos, em mbito nacional.

    Embora no se tenha pretendido para esta pesquisa fazer um resgate histrico acerca da dualidade campo e cidade, isso no significa que essa reflexo no seja importante, pois seus desdobramentos sociais, polticos, educacionais e outros, assolam a classe trabalhadora desde longa data. E, ressaltando que essa concepo dicotmica vem sendo propagada ao longo de nossa histria, por vezes, pejorativamente e de modo perverso, fato que no se pode ignorar nem desconsiderar, uma vez que tal concepo ainda persiste nos tempos atuais. Pois, como nos apontam:

    H uma tendncia dominante em nosso pas, marcado por excluses e desigualdades, de considerar a maioria da populao que vive no campo como a parte atrasada e fora de lugar no almejado projeto de modernidade.

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    No modelo de desenvolvimento, que v o Brasil como um mercado emergente, predominantemente urbano, camponeses e indgenas so vistos como espcies em extino (CALDART et all, 2004, p.21).

    Segundo os mesmos autores, ao tomar como princpio as premissas acima citadas, as nicas polticas pblicas voltadas para esses indivduos no seriam outras se no polticas de cunho compensatrio sua prpria condio de inferioridade, e/ou diante de presses sociais (CALDART, 2004, p 21.) Ou seja, para que os povos do campo sejam olhados com respeito, reconhecimento e dignidade h que haver presses principalmente por parte dos movimentos sociais, o que j vem ocorrendo h praticamente trs dcadas.

    Neste sentido, preciso no apenas romper com esta lgica que coloca margem e estigmatiza os sujeitos do campo, como tambm reconhec-los como sujeitos histricos que ao longo de suas vidas vm contribuindo de forma significativa no s para o desenvolvimento econmico do pas, como tambm para a transformao da sociedade brasileira forjada nos princpios da desigualdade, da expropriao e explorao dos trabalhadores.

    Por reconhecer as especificidades dos povos do campo, bem como sua cultura, suas experincias e seus saberes, defende-se uma educao que esteja voltada realidade desses sujeitos histricos em seus respectivos espaos. Portanto, devemos conceber a educao como um direito universal e democrtico, tanto para o campo quanto para a cidade, no perdendo de vista as especificidades prprias de cada realidade.

    A referncia educao do campo sob a tica do direito, o qual vem sendo conquistado paulatinamente por alguns segmentos da sociedade e, principalmente, pelos movimentos sociais, remete ao MST, o qual, desde sua fundao, ocorrida na dcada de 1980, sempre manifestou preocupaes com a questo da educao em seus acampamentos e assentamentos, e, em seu percurso histrico, vem buscando e desenvolvendo propostas pedaggicas com o intuito de educar sua base.

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    Nessa perspectiva h que se considerar a busca de alternativas que possibilitem a incluso destes sujeitos ao processo educativo ao qual foram de certa forma, durante dcadas, alijados deste direito. Sendo assim o uso do mtodo ofertado pelo governo cubano ao que parece teve um carter emergencial e de certa forma experiencial, carecendo, portanto de anlises que possam no mnimo aprofundar o debate sobre a eficincia ou no de seu uso pelo MST. Sabe-se que o Movimento expressa a preocupao com a formao humana tendo como princpio a integralidade dos conhecimentos que se d em suas mltiplas dimenses do pensar e agir dos sujeitos sociais, ao mesmo tempo, que incorpora novos valores e se conscientiza de sua insero numa sociedade contraditria aos princpios de igualdade e solidariedade. Tais preocupaes se expressam num conjunto de princpios poltico-pedaggicos e filosficos presentes em suas deliberaes congressuais, resolues e publicaes, que do sustentao sua prtica. Nesta perspectiva, o MST entende que a escola: no deve ser vista apenas como um lugar de aprender a ler, escrever e contar, mas tambm de formao dos sem-terra, como trabalhadores, militantes, cidados, sujeitos (CALDART, 2000, p.174).

    Vale ressaltar que nas ltimas dcadas, o MST tem expressado significativa preocupao com a educao de seus assentados e acampados. O Movimento vem dedicando especial ateno questo da alfabetizao balizada por Freire (2002), este autor defende uma concepo de alfabetizao conscientizadora, a qual preconiza a leitura da palavra e a leitura do mundo, onde a leitura do mundo precede a leitura da palavra (FREIRE, 2002, p. 11), configurando-se, portanto, numa pedagogia libertadora. Como podemos perceber o MST tem claro seu objetivo, tanto no que diz respeito luta pela terra como a luta pela educao e por escolas que se alinhem cultura do campo, visto pelos movimentos sociais e em especial pelo MST, pois no de qualquer campo que o movimento trata, mas sim o campo onde vivem, trabalham e se constituem sujeitos crticos, criativos, conscientes de seu papel na sociedade, e, portanto sujeitos histricos e revolucionrios.

    Neste contexto, o MST busca atravs do mtodo Yo si puedo alfabetizar os seus

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    integrantes, proporcionando a continuidade dos estudos em outras esferas da escolarizao, uma vez que para esse movimento a educao uma expressiva ferramenta de luta contra as formas de explorao e dominao. No entanto o movimento considera que, o uso do mtodo cuja proposta alfabetizar pela via da televiso deve alinhar-se aos princpios polticos, educacionais e filosficos do MST que propaga e defende uma educao calcada nos princpios da omnilateralidade. Ou seja, uma educao que reconhea os sujeitos em sua totalidade como diz Manacorda (2007, p.89):

    A omnilateralidade , portanto, a chegada histrica do homem a uma totalidade de capacidades produtivas e, ao mesmo tempo, a uma totalidade de capacidades de consumo e prazeres, em que se deve considerar, sobretudo o gozo daqueles bens espirituais, alm dos materiais.

    Entendendo que o MST expressa seus princpios de acordo com o autor acima citado, compreende-se que mesmo que o mtodo de alfabetizao Sim, eu posso, da forma como foi apresentado, no vislumbre os mesmos objetivos, fez-se necessrio pelo referido movimento experiment-lo levando em conta suas necessidades emergenciais frente questo da alfabetizao. Neste sentido, reconhecendo a possibilidade de utilizao do mtodo aliado a uma proposta diferenciada compreende-se relevante apresentar a mensagem proferida por Fidel Castro Ruz"7", durante o V Congresso Nacional do MST realizado entre os dias 11 e 14 de junho de 2007 em Braslia, acerca do mtodo de alfabetizao Yo, si puedo.

    A concepo que expomos para a alfabetizao mediante a utilizao dos meios de comunicao de massa vai mais alm da simples aquisio de habilidades e destrezas no manejo das letras e dos nmeros, est voltada, tambm, ao melhoramento das funes que na vida cotidiana os seres humanos realizam (funcional) e ao incremento da tomada de conscincia, de tal forma que se produzam as transformaes necessrias em seus modos de atuao e de vida (conscientizadora). Esta uma concepo com carter integrador, que proporciona o dilogo constante, dialgica; a

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    reflexo oportuna frente a temticas e situaes de carter objetivo e subjetivo, reflexiva e facilitadora do debate e da discusso, problematizadora. (Fidel Castro Ruz, 3 de setembro de 2007. Fonte: http://www.cubadebate.cu/index.php?tpl=design/especiales.tpl.html&newsid_obj_id=9841. Acesso em: 20 set. 2007, traduo nossa, grifos das autoras)

    Segundo Daz (2005), Cuba vem trabalhando desde 1999 na implantao do mtodo de alfabetizao Yo s puedo cuja primeira experincia ocorreu naquele mesmo ano no Haiti por meio de rdio, devido precariedade e/ou dificuldade em contar com o aparelho televisivo. Posteriormente a Venezuela, mais precisamente em 2003, adotou o mtodo, utilizando como recurso audiovisual a televiso, onde mais de um milho de venezuelanos foram alfabetizados. A alfabetizao por meio do rdio, aplicado primeiramente no Haiti, uma modalidade que pode ser considerada como educao distncia, principalmente nos pases pobres com poucos recursos econmicos e tcnicos, a alfabetizao por radio pode converter-se em uma das principais formas de erradicar o analfabetismo (DAZ, 2005, p. 16, traduo nossa).

    Daz explica que Cuba disponibiliza a todos os pases que necessitam e solicitam, o mtodo de alfabetizao, seja por rdio ou televiso, pois, segundo a autora, ficou provado que esta experincia demonstrou que possvel erradicar o analfabetismo, sobre tudo , se encararmos como uma tarefa educativa de toda a sociedade (DAZ, 2005, p. 15, traduo nossa).

    O mtodo de afabetizao Yo, si puedo

    O programa de alfabetizao Yo, s Puedo teve como inspirao e objetivos polticos a campanha de alfabetizao realizada em Cuba em 1961"8" que envolveu toda a sociedade, sendo o primeiro pas da Amrica Latina a solucionar o problema do analfabetismo ao mesmo tempo em que demarcou a revoluo cubana. Referenciando as palavras de Fidel Castro na mensagem acima, observa-se que a proposta de alfabetizao utilizada pelo mtodo Yo si puedo, mesmo fazendo uso de meios de comunicao de massa, alinha-se a uma concepo de

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    educao emancipatria e libertadora, dentro dos princpios de educao do MST.

    Neste sentido, embalado pelas palavras da mensagem de Fidel Castro, o monitor designado para aplicar o mtodo numa turma de alunos jovens e adultos do Assentamento So Jos no municpio de Campos Novos em Santa Catarina, ousou ir alm da proposta apresentada e fez a diferena.

    O monitor, integrante e liderana do movimento, calejado pelas experincias de luta, com um vasto acmulo em educao no campo participou da capacitao e viu a possibilidade de trabalhar com o mtodo numa perspectiva emancipatria.

    De acordo com o monitor em resposta s entrevistas, o mtodo de alfabetizao cubano, em sua gnese propunha-se apenas ao exerccio de codificao e decodificao dos smbolos grficos, ou seja, ensinar a ler e escrever palavras, frases e pequenos textos revelando, portanto, uma proposta de alfabetizao tradicional e restrita.

    Lembrando que tanto o monitor quanto um conjunto de integrantes do setor de educao em nvel nacional e estadual do movimento tinha suas ressalvas frente proposta do mtodo. Ou seja, tinha conscincia que o mesmo era limitado no que tange a uma proposta de educao-alfabetizao omnilateral totalizadora e emancipadora.

    Analisando o material a ser usado, concordamos com o monitor, ao verificar que o mtodo utilizava como ponto de partida a lgica alfanumrica, ou seja, a combinao ou associao entre nmeros e letras, bem como a necessidade rigorosa do uso de uma cartilha que auxiliasse no processo de alfabetizao, utilizando a televiso como via principal. De acordo com Daz (2005):

    Durante a observao se comprovou que os analfabetos principalmente homens, jogavam domin com destreza e calculavam a quantidade obtida pelos ganhadores com facilidade, s vezes muito mais rpido que qualquer

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    letrado. Como as mulheres tinham uma vida muito ativa no mercado, nenhuma se confundia ao cobrar determinada mercadoria [...]. Assim, se compreendeu o grande valor pedaggico da idia de que os nmeros podiam converter-se em um ponto de apoio para a aprendizagem da escrita e da leitura. (DAZ, 2005, p. 41, traduo nossa)

    Ora, no que se refere facilidade em lidar com nmeros, principalmente com dinheiro, sabe-se que este um fenmeno comum a um expressivo nmero de pessoas no alfabetizadas independente do seu pas de origem. Assim como lidar com as contas de cabea" uma capacidade de abstrao que no passa pela aprendizagem escolar, mas engendrada na prtica cotidiana daqueles/as que no so alfabetizados e/ou nunca frequentaram a escola.

    De acordo com o (IPLAC, [2000]), a Cartilha foi elaborada de forma bem simples, apresentando o mesmo formato em todas as pginas, estabelecendo um vnculo entre os nmeros e letras, possibilitando ao analfabeto a compreenso do processo de associao entre o conhecido que so os nmeros e o desconhecido que so as letras. Sendo a utilizao da numerao uma varivel facilitadora frente ao processo de ensino e aprendizagem, uma vez que se atribui um nmero a cada letra.

    Verificou-se tambm que a aplicao do mtodo deve ter a durao de trs meses e segue trs etapas intituladas: adestramento, ensino da leitura e escrita e consolidao. A primeira etapa intitula-se adestramento e se destina a capacitar e treinar, ou seja, preparar os educandos para a aprendizagem da leitura e da escrita. Nesta etapa, faz-se necessrio trabalhar algumas habilidades psicomotoras, devendo desenvolver exerccios de coordenao motora ampla e fina, levando em conta que muitos educandos nunca frequentaram a escola e nem pegaram num lpis, destinando-se tambm ao estmulo e motivao dos mesmos que dever estar presente em todo o processo de ensino-aprendizagem. A segunda etapa compreende o ensino da leitura e escrita, a qual:

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    Dedicam-se quarenta e duas aulas para a aprendizagem da leitura e escrita. Em vinte e trs delas se aprende a cada dia uma nova letra ou fonema e as dezenove restantes vo introduzindo dificuldades, como o caso das combinaes: ce-ci, gue-gui (DAZ, 2005, p. 59, traduo nossa).

    A terceira etapa intitula-se consolidao, que sinteticamente destina-se fixao dos conhecimentos adquiridos pelos educandos, sendo previsto para a mesma 11 aulas as quais so programadas para a consolidao das letras estudadas. As cinco aulas finais so dedicadas ao exerccio dos elementos relativos redao de pargrafos e cartas. Nesta etapa espera-se que os educandos pratiquem exerccios que desenvolvam a escrita e leitura compreensiva, mesmo que seja num nvel elementar ou simples. Os mesmos tambm devem organizar as palavras de forma que as mesmas possam resultar em um enunciado lgico. Esta etapa, por ser a ltima, de suma importncia no processo de alfabetizao, pois como mencionado anteriormente, nela que o alfabetizando vai revelar sua fixao frente ao que aprendeu.

    O papel do monitor no mtodo Yo si puedo

    Partindo desta pequena explanao sobre o mtodo Yo si puedo (Sim eu posso), cabe esclarecer que o monitor Jos dos Santos, atuando como educador (a partir deste momento citamos o monitor como educador) fez uso de todo o material proposto, no entanto todo esse material, inclusive a televiso foi utilizado apenas como suporte. O educador trabalhou por meio de temas geradores, tendo como principal referencial terico os postulados de Paulo Freire encampados tambm pelo MST em outros projetos educativos. Tambm trabalhou no sim, eu posso com questes de cunho poltico, social e econmico, o que para o movimento denominado de anlise de conjuntura, sendo esta imprescindvel em todo o conjunto de suas aes, fato este, que pode ser observado nos princpios pedaggicos do referido movimento. Na fala do educador: no d pra ficar s nos contedos das matrias sem discutir anlise de conjuntura que tambm um contedo, s que no da escola (Jos). Esta fala est referendada no 4 princpio pedaggico conforme j explicitado, sendo que neste princpio os

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    contedos escolares so importantes, mas no determinantes no processo de aquisio dos conhecimentos para os integrantes do Movimento, havendo, portanto a necessidade de conjugar a teoria com a prtica levando em considerao a realidade de cada indivduo.

    No que diz respeito s aulas ministradas pelo educador em questo, foi percebido que o mesmo as planejava, levando em considerao o interesse dos educandos e, por consequncia, a compreenso de conjugar os contedos das aulas com a realidade e necessidade dos mesmos. E para elucidar estas afirmaes pertinente a fala do educador ao apresentar o seguinte exemplo de aula:

    Se eu vou trabalhar matemtica, eu nunca chego l despejando nmeros, eu sempre leio um texto, uso um texto como base para da, partir para os nmeros. Porque da a gente no ta ensinando s os nmeros a gente ta trabalhando aquilo dali puxando pra um assunto que interessa que no so s nmeros ou as contas separadas dum texto. (JOS).

    No que diz respeito sua considerao frente ao papel do monitor, o educador Jos, mesmo sabendo que sua funo era controlar o vdeo e ao final da aula auxiliar os educandos em suas possveis dvidas frente aos exerccios e compreenso acerca das temticas enfocadas pelo sim, eu posso, usou de sua autonomia para ir alm da funo que lhe cabia, asseverando sempre que para acompanhar e/ou desenvolver um trabalho como o proposto pelo referido mtodo, preciso contar com a presena, interveno e mediao de um educador.

    Consideraes finais

    Aps o exposto, tendo analisado os documentos, acompanhado as entrevistas com educandos e com o educador e observado algumas aulas, tecemos algumas consideraes que acreditamos, relevantes a ttulo de esclarecimentos ou como reflexo para novos projetos utilizando o mtodo Yo, si puedo (Sim eu posso).

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    Entendendo que a tecnologia pode converter-se em valioso instrumento a servio da humanidade, compreendemos que a mesma em suas mais variadas formas deve ser utilizada com conhecimento tcnico, senso crtico e transformador, sempre se atendo aos cuidados necessrios quando se faz uso das mdias, para no substituir o papel do homem em detrimento da mquina. A mquina fruto da ao e construo humana e, portanto, ela quem deve estar a servio do homem, devendo o mesmo, encar-la como uma ferramenta para facilitar o trabalho e no, substituir a fora de trabalho humano pelo trabalho executado pela mquina.

    Conclumos que o educador Jos atingiu os objetivos propostos para o uso do mtodo, pelo fato do mesmo ter atuado como um Educador Popular e no apenas como monitor que liga e desliga a televiso e segue uma cartilha didtica. Percebemos que o mtodo Sim, eu posso, a partir de certo estgio do processo de alfabetizao, contribuiu de forma eficaz para a apropriao da leitura e escrita dos educandos. No entanto no que diz respeito concepo de letramento a qual defendemos e que vai ao encontro dos constructos tericos de Freire (1980; 2007) e, por conseguinte, que se aproxime de uma proposta de educao marxiana segundo Manacorda (2007), constatamos que este s foi possvel por conta da prtica pedaggica e mediaes efetuadas pelo educador da turma, bem como da vivncia dos educandos num movimento social que politiza e problematiza a realidade. H que se considerar tambm que mesmo que os educandos tivessem tido experincias remotas com a escola, e que pela ausncia do exerccio da leitura e da escrita, tornaram-se analfabetos funcionais em sua trajetria de vida, todos, de certa forma possuam alguns conhecimentos prvios acerca da leitura e escrita, o que para ns, se configurou num elemento facilitador no processo de ensino e aprendizagem com o Sim, eu posso.

    Compreende-se que todo o ato pedaggico tambm um ato poltico, como nos ensinou Paulo Freire (2007). E, no caso dos sujeitos de nossa pesquisa, a ao pedaggica foi conjugada ao poltica, fato observado em suas falas, pois juntamente com as palavras conseguiram ler o mundo de outro ponto de vista, ou seja, sob a luz da criticidade e de um posicionamento questionador frente

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    sua realidade e tambm em relao sociedade.

    Conclui-se esclarecendo que no houve a pretenso de encontrar frmulas mgicas para resolver a questo do analfabetismo e letramento no mbito do MST, mas a partir destas reflexes estabelecer um dilogo acerca desta problemtica, apontando alguns indicativos que possam contribuir com a educao dos jovens e adultos do campo, em especial aqueles vinculados ao MST.

    Notas

    1. Tomamos como referncia a concepo de letramento propagada por Soares (2003) ao afirmar que: Ao exerccio efetivo e competente da tecnologia da escrita denomina-se letramento, que implica habilidades vrias, tais como: capacidade de ler ou escrever pra atingir diferentes objetivos - para informar ou informar-se, para interagir com outros, para imergir no imaginrio, no esttico, para ampliar conhecimentos, para seduzir ou induzir, para divertir-se, para orientar-se, para apoio memria, para catarse...; habilidades de interpretar e produzir diferentes tipos de gneros de textos; habilidades de orientar-se pelos protocolos de leitura que marcam o texto ou de lanar mo desses protocolos, ao escrever; atitudes de insero efetiva no mundo da escrita, tendo interesse e prazer em ler e escrever, sabendo utilizar a escrita para encontrar ou fornecer informaes e conhecimentos, escrevendo ou lendo de forma diferenciada, segundo as circunstncias, os objetivos, o interlocutor [...] (SOARES, 2003, p. 91-92", bem como a de Rojo (2009) ao asseverar que para o sujeito ser letrado no basta conhecer o alfabeto e decodificar as letras em sons da fala. preciso tambm compreender o que se l, isto , acionar o conhecimento de mundo para relacion-lo com os temas do texto, inclusive o conhecimento de outros textos/discursos (interstualizar), prever, hipotetizar, inferir, comparar informaes, generalizar. preciso tambm interpretar, criticar, dialogar com o texto: contrapor a ele seu prprio ponto de vista, detectando o ponto de vista e a ideologia do autor, situando o texto em seu contexto. Reciprocamente, para escrever, no basta codificar e observar as normas da escrita do portugus padro do Brasil; tambm preciso textualizar: estabelecer relaes e progresso de temas e idias, providenciar coerncia e coeso, articular o texto a partir de um ponto de vista levando em conta a situao e o leitor (ROJO, 2009, p.44). e autores como: (SILVA, 2004) (KLEIMAN,1995), entre outros. (p. 28)

    2. Assessora acadmica da Ctedra de Alfabetizao de Jovens e Adultos, do Instituto Pedaggico Latino-americano e Caribenho (IPLAC), organizadora e responsvel pelo Programa de Alfabetizao Yo, si puedo (Sim, eu posso). . (p. 29)

    3. Educador/monitor: Pessoa responsvel para acompanhar os educandos/as durante a aplicao do mtodo Sim, eu posso no tendo o mesmo a necessidade de ser professor ou ter formao acadmica para tal feito, devendo, portanto, apenas ser treinado para conhecer e lidar com o mtodo em questo. (p. 29)

    4. Princpios pedaggicos: Relao entre teoria e prtica; combinao metodolgica entre processos de ensino e capacitao; Realidade como base da produo do conhecimento; Contedos formativos socialmente teis; Educao para o trabalho e pelo trabalho; Vnculo orgnico entre processos educativos e formativos; Vnculo orgnico entre processos educativos e econmicos; Vnculo orgnico entre educao e cultura; Gesto democrtica; Auto-organizao dos/as estudantes; Criao de coletivos pedaggicos e

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    formao permanente dos educadores e das educadoras; Atitude e habilidades de pesquisa; Combinao entre processos pedaggicos coletivos e individuais; Princpios filosficos: Educao para a transformao social: educao de classe massiva organicamente vinculada ao movimento social, aberta ao mundo, para a ao e aberta para o novo; Educao para o trabalho e a cooperao social; Educao voltada para as vrias dimenses da pessoa humana; Educao com/para valores humanistas e socialistas; Educao como um processo permanente de formao/transformao humana (MST apud MANGGINI, 2009, p. 45). (p. 30)

    5. O governo cubano brindou o MST com o mtodo de alfabetizao Sim, eu posso e tambm todos os materiais a serem utilizados na aplicao do mesmo como por exemplo: Cartilha do educando/a, Manual do Monitor, Fita VHS, aparelho de DVD , Televiso. (p. 30)

    6. Jos dos Santos, assentado nas reas da reforma agrria e integrante do MST aproximadamente trs dcadas. Atua como liderana em seu Assentamento denominado So Jos situado no municpio de Campos Novos SC e tambm no setor de educao do MST no estado de SC. Trabalhou como educador em projetos de educao voltados principalmente para a alfabetizao de jovens e adultos desenvolvidos pela Universidade Federal de Santa Catarina- UFSC Instituto de Colonizao e Reforma Agrria - INCRA e Programa Nacional na Reforma Agrria - PRONERA. Em parceria com o MST. O referido educador foi responsvel pela aplicao do mtodo de alfabetizao Yo, si puedo ( Sim, eu posso) em uma turma localizada em seu Assentamento no ano de 2007. Turma esta que serviu de campo para nossa pesquisa. (p. 30)

    7. Fidel Alejandro Castro Ruz: foi presidente de Cuba desde a Revoluo cubana ( 1958-1959), que derrubou o governo pr-americano do general Fulgncio Batista, at fevereiro d 2008. Esta revoluo tinha carter nacionalista e socialista, pois recebeu forte influncia do "companheiro"Ernesto Che Guevara ( conhecido como "Che") e de seu irmo, Raul Castro. Aps a revoluo, Fidel aproxima-se da unio Sovitica, fazendo Cuba uma aliada do socialismo na Amrica. Fato que fez com que os Estados Unidos passasse a tratar a ilha como uma perigosa inimiga. A