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ALFREDO ARAÚJO D'ALMEIDA CAMPOS

DYPSOMAMá DISSERTAÇÃO INAUGURAL

APRESENTADA A

ESCOLA MEDICO-CIRURGICA DO PORTO

PORTO I M P R E N S A PORTUGUEZA

181, Bomjardira, 181

Q^lç £Mt

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ESCOLA I Q l - i l O DIRl'Xl'OR O I L L . m o E EX".»»o SU.

V I S C O N D E D E O L I V E I R A SECRETARIO O ILL .mo £ EX.mo SR.

R I C A R D O D ' A L M E I D A J O R G E

- ^ ^ p g - c o —

C O R P O C A T H E D R A T I C O

LENTES HATHEDItATICOfe

OS ILL.mos E KX.mos SUS.

(.« Cadeira —Anatomia descriptiva e geral João Pereira Dias Lebre.

2." Cadeira — Physiologia Vicente Urbino de Freitas. 3.» Cadeira — Historia natural dos

medicamentos e materia medica Dr. José Carlos Lopes. 4.» Cadeira— Pathologia externa e

therapeutica externa Antonio J. de Moraes Caldas. 5.» Cadeira — Medicina operatória . Pedro Augusto Dias. 6.» Cadeira — Partos, doenças das

mulheres de parto e dos recem-nascidos Dr. Agostinho A. do Souto.

7-a Cadeira — Pathologia interna e therapeutica interna Antonio d'Oliveira Monteiro.

8.» Cadeira — Clinica medica . . . . Antonio dAzevedo Maia. q.» Cadeira — Clinica cirúrgica. . . Eduardo Pereira Pimenta,

to.» Cadeira — Anatomia pathologica Augusto H. Almeida Brandão. 11.» Cadeira — Medicina legal, hygie­

ne privada e publica e toxicolo­gia Manoel Rodrigues Silva Pinto.

13.» Cadeira — Pathologia geral, se-meiologia e historia medica. . . Illidio Ayres Pereira do Valle.

Pharmacia Vago.

LENTES JUBILADOS

Secção medica José dAndrade Gramaxo.

Secção cirúrgica Visconde de Oliveira.

LENTES SUBSTITUTOS

,. ,. ( Antonio Placido da Costa. Seccao medica . . ' . . , - ;

' Maximiano A. Lemos. ,, í Ricardo dAlmeida Jorge. Seccao cirúrgica ' ° ' Cândido Augusto C. de Pinho.

LENTE DEMONSTRADOR

Secção cirúrgica Roberto R. do Rosário Frias.

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A Jiscola não responde pelas doutrinas expendidas na disser­tação e enunciadas nas proposições.

(Regulamento da Escola de 23 d'abri! de 1840, art,» i55.°J

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Á MEMORIA

MEU PAE E DE MINHA MÃE

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A ' M E M O R I A

DE MEUS TIOS

Antonio José d'Araujo e Silva Joaquim José d'Araujo e Silva Manoel d'Almeida Querido

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A3 M E M O R I A

DE MEUS PRIMOS

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A MINHA AVÓ

E A MEU T I O

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^4 MEU TIO

jpnoel José it îvaujo t mfm

A sua esposa e a seus filhos

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AOS MEUS AMIGOS

Th. Adolpho d'Artayett \Awtonio Augusto da Rocha Peixoto Cbristovão Teixeira Machado Eduardo Alfredo de Sousa Lm\ de Freitas Viegas T)r. Manoel Jorge Forbes Bessa 'Rjiul Larose Rocha Thiago Augusto d'Almeida

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lAOSlLL.™' E EX:ms SRS.

.=J)i>/. Q/ate t/c/ifata c/o<f 6/anfoJ a$>c<-*

^JJ^. Qfode r^CJoMtna,aeJ <t (y/e-ueua Oriente?

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-AO ILLUSTRE ALIENISTA

J r . jptaplftãeís Jíemoá

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*

^iO MEU 'PRESIDENTE

O ILL.""0 F. F.X."" SR.

DR. JOSÉ CARLOS LOPES

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Degenerados em geral

A questão da hereditariedade, tantas vezes trotada ern alienação mental a propósito da sua influencia sobre a génese das doenças, não é hoje posta mais em duvida, como não o era des­de que Darwin demonstrou que a ascendência imprimia os seus caracteres normaes e pró­prios á descendência. Hoje, a doença não é con­siderada um estado de cousas creado d'uma só vez; a predisposição hereditaria é o fundamento das condições vitaes em que qualquer organismo tem o seu equilíbrio orgânico. Esto predisposi­ção encontra-se sempre a propósito de todas as doenças e podemos para muitas encontrar-lhes a filiação os pontos de contacto, o seu ar de fami-lia. E' assim na alienação mental e principal-mente na degenerescência psychica. Ninguém acredito, diz Maudsley, que o ovo humano possa ser origem d'um quadrúpede, como a ninguém passa pela cabeça que do ovo d'um quadrúpede provenha um homem ; é bem certo que a natu­reza do primeiro deve á hereditariedade alguma

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coisa, por que em condições requeridas se des­envolve a forma humana, e que o outro herdou também alguma coisa por que se desenvolve em condições convenientes a forma d'uni qua-drnpede. Não só o ovo humano acha na sua natureza este destino especifico, mas em cada ovo em particular a hereditariedade individual prepara o destino próprio do individuo. Os ho­mens parecem-se uns com os outros a ponto de os distinguirmos sem demora dos seres d'ou-tra espécie; mas cada individuo diffère sempre de todos os outros que existem e que existiram, ainda que seja por bem pouco. D'onde provêem estas differenças entre individuos da mesma es­pécie? Tem-se attribuido a causa d'esté phe-nomeno ás circumstancias exteriores aos indi­viduos, cá educação no sentido lato da palavra, isto é a todas as circumstancias que lhes sol-licitam a actividade sob todas as formas, in­tellectual, moral, voluntária, orgânica etc., e tem-se esquecido a natureza do individuo sobre quem actuam as sollicitações externas. A expe­riência confirma a já agora verdade banal de que a hereditariedade é a poderosa determi­nante dos actos do individuo, dos seus senti­mentos e das suas ideias. Colloquem-se, diz ainda Maudsley, desde o seu nascimento duas pessoas em idênticas condições, submettam-nas a mesma educação e a final o seu espirito não se fará do mesmo molde, ellas não serão da mesma capacidade como não terão as mesmas feições. Cada uma d'estas pessoas está sob o

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Mi

império da lei de evolução; sob o império dos antecedentes de que cada uma é o consequente. Coda uma se desenvolverá a seu modo, ainda que este consistisse no caso considerado em singelas nuances, as quaes pelo effeito de se­lecção natural iriam ter a variedades de caracter distinctes. E' assim que o homem tem o seu destino feito pelos seus antepassados, e que por mais que faça elle não pode escapar á fatalidade da sua organisaçâo. A educação pode somente determinar o que está previamente determinado na organisaçâo do systema nervoso e no me­canismo do corpo em relação com este systema ou por outros palavras, ella só actua quer res­peitando as condições impostas pela espécie, quer segundo estas condições. Mas também ella não pode senão tornar effectivas as virtua­lidades da natureza humana ou como quem diz actuar nas condições impostas pela organisaçâo individual. Assim a educação não fará que o homem vôe como a ave, veja como a águia, viva na agua como o peixe, como ella não será capaz de tazer de quem quer que seja Socrates ou Homero.

A transmissão de caracteres mórbidos faz-se tão seguramente como a dos normaes, quer di­rectamente, quer por atavismo. A loucura é como a maior parte das doenças um estodo mórbido herdado. Está no systema nervoso o ser louco, como n'um vicio de nutrição para que em nada se concorreu está o ser gottoso. Mas se a loucura é uma doença herdada, para

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que foliar de loucura hereditaria? Toda a lou­cura é hereditaria, mas ha mais ou menos he­reditariedade. Tem-se notado que os filhos de nevropathas fornecem sempre o contingente ao grupo dos alienados; que a loucura apparece n'elles umas vezes á menor das causas, outras vezes depois de elles terem reagido sobre todas as influencias mórbidas; que nem sempre é á mesma forma d'alienaçào que as neATopathias dos pães conduzem os filhos; por ultimo que muitos filhos de nevropathas parecem escapar á loucura, manifestando apenas esquisitices de caracter, particularidades d'intelligencia que fa­zem d'elles homens de génio ou imbecis.

Por aqui se vé, e a leitura de todas as obser­vações unanimemente o confirma, como as doenças nervosas têm estreito parentesco umas com outras. Sabendo-se que as predisposições mórbidas n'alguns casos se sommam até á es­terilidade, isto é como conduzem ao desgaste da espécie, é preciso admittir que este traba­lho de successivos estragos não se faz d'uma só vez, mas por graus successivos, o que é tão verdadeiro da loucura como d'outras doenças. Desde a suspensão de desenvolvimento conhe­cida pelo nome de idiotia até delicado fetichis-mo amoroso da mão feminina, ha lugar para graus infinitos de anormalidade. Esta quanti­dade de hereditariedade é variável com a im­portância das nevropathias ancestraes e com

las modificações experimentadas por estas por meio da selecção sexual. Assim pode-se her-

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dar a névrose paterna só, on esta e a materna; corn paes appareil temente sãos a loucura exis­tente nos collateraes pôde apparecer no todo ou em parte ; assim a loucura pode ser unila­teral, bilateral, convergente ou divergente; umas vezes as névroses casam-se, a epilepsia, a hys­teria, o alcoolismo, e a herança éaccumulada; outras vezes, porém, esta attenua-se pelo effeito d'uma alliança com um procreador são.

O individuo á mercê dos estímulos externos, senhor de se mover no sentido das suas deter­minações proprias, poderá apenas reagir quanto comporte a saúde de todas as partes integran­tes do seu organismo.

D'aqui uns que manifestam a sua doença á menor causa, ou mesmo sem que causa al­guma se possa invocar, e outros susceptíveis de serem toda a vida sãos a menos que a pre­disposição latente se não transforme em doença. É entre os primeiros que se encontram todos os que Morei chamou loucos hereditários, pela sua facilidade em delirar, denominação que Ma-gnan completou chamando-lhes hereditários de­generados.

Que logar occupam os hereditários degene­rados no quadro das doenças mentaes?

Até Morei ninguém se tinha entendido so­bre o verdadeiro valor a dar a um grande nu­mero de signaes de loucura que hoje com Ma-gnan se chamam syndromas episódicos dos de­generados. O que nada admira visto como ainda hoje se deixam de fora do grupo d'esles aliena-

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dos muitos que ahi deviam estar, taes como os exhibicionistas, etc.

O que os alienistas tiveram em attenção foi a forma do accesso. Durante muito tempo, a doutrina da monomania sob os auspícios de Esquirol tinha sido unanimemente acceite, para o que não concorreram pouco os seus discí­pulos. Esta doutrina divulgou-se graças á ideia que se formava acerca da independência das faculdades do espirito e sobretudo a obser­vações clinicas incompletas. Depois approxi-mando-se os factos notou-se que as conce­pções delirantes por parciaes que pareçam, ger­minam e se desenvolvem n'um fundo mórbido commum. Porém não estava dito tudo. Existe uma cathegoria de alienados, cuja loucura em logar de se traduzir pela perturbação das ideias, tem sobretudo por caracteres a aberração do sentimento, a desordem dos actos. Estes indi­víduos gosam na apparencia das suas faculda­des intellectuaes, elles podem mesmo ter cons­ciência do seu estado e procurar reprimir as tendências que os sollicitam. Não deliram, no sentido restricto da palavra, mas acções mais ou menos graves de forma impulsiva, por ve­zes somente um pensamento fixo, excêntrico ou preverso vêem affirmar a anomalia. Pinei foi.o primeiro a crear uma mania sem delirio, (folie raisonnante). Esquirol, com a maior parte dos casos d'esté observador cria a mania rai­sonnante. Depois cada auctor dá uma denomi­nação nova ao que vae observando: mono-

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mania instinctiva, moral insanity, loucura lú­cida, pseudo-monomania. A confusão, porém, não é só de nomes; entre todos os estados mórbidos observados, tão dissimelhantes na apparencia, ninguém apercebeu a sua estreita relação, até que Morel expozesse a sua depen­dência reciproca, e a sua origem commum: a degenerescência. Mas Magnan é que desen­volveu em todos os seus termos a theoria da degenerescência, estudando progressivamente as enfermidades congeuitaes do cérebro, para o que partiu das lesões geraes e manifestas do idiota profundo até chegar successivamente ás lesões locaes, parciaes e dissimuladas dos irre­gulares.

Eis, segundo Magnan, a classificação cli­nica das doenças mentaes:

Estados mentaes dependentes da pathologia e da psychiatria

Parulysia geral Demência senil (atheroma cere­

bral) í Amollecimento

Lesões cerebraes circumscriptns] Hemorragia ' Tumores, etc.

Hysteria Epilepsia

Absintho Morphina e ópio Cocaina Cravagem do centeio

Alcoolismo e intoxicações

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Psychoses — loucuras propriamente ditas

elementos simples

/ Simples ) Circular 1 Dupla forma ' Allemã

Loucura dos degenerados com os syndromas episódicos e os delírios primários

Idiotas imbecis, débeis desequilibrados

I

A n o m a l i n s c e r c b r a e s

Na serie das degenerescências, a idiotia re­presenta o modelo mais completo da degra­dação physica intellectual e moral. Também no idiota a lesão cerebral desenvolve-se o mais completa possível. A inferioridade do cérebro dos idiotas resulta d'um trabalho inflammato-rio primitivo ou secundário: o amollecimento, a hemorrhagia, a sclerose, a meningo-encepha-lite parcial ou disseminada, kystos, etc., taes são as alterações mais commummente obser­vadas. Exteriormente o craneo, a face, o tronco e os membros, marcam-se dos defeitos internos. Assim a cabeça umas vezes pequena (microcephalia) outras vezes enorme (macro-

Mania Melancholia Delirio chronico

Loucuras intermittentes

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cephalia) constantemente irregular, offerece em certos Jogares um achatamento anormal, quan­do não se faz notar pela exageração das saliên­cias ordinárias. Outras vezes é o desenvolvi­mento em altura, produzindo a desformidade conhecida pelo nome de acrocephalia; ou o adelgaçamento ou espessamento das paredes craneanas, e a ossificação prematura das sutu­ras. Os idiotas em geral são brachicephalos; segundo Masselli e Tamhurini a idiotia exage­raria sempre a brachycephalia quando ella é normal na raça ou bem tornaria brachycephalo o craneo normalmente distincto pela dolichoce-phalia. A circumferencia do craneo marca mi­crocephalia: a proporção das circumferencias craneanas inferiores a 530 sendo, nos indiví­duos sãos, apenas de 3 por cento, é nos idiotas de 60 por cento. Os auctores teem notado cor­relativamente a atrophia da massa encephalica e em particular das partes frontaes.

Todo o corpo apresenta além d'isto anoma­lias tanto na estructura como nas funcções, as quaes se reconhecem pela pequenez do angulo facial, pela proeminência dos maxilares (progna-thismo simples ou duplo) opposta á direcção fugidia da fronte que pôde mesmo faltar. A asymetria é de regra n'estes seres. O strabis-mo torna o olhar vago e incerto. As orelhas são mal implantadas, afastadas do craneo ou muito adhérentes ou pelo menos desiguaes quanto á forma e ao tamanho. O nariz achatado na raiz, largo na base é algumas vezes munido d'iim

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lóbulo supplemental-. Pela abertura de lábios espessos d'onde escorre continuamente saliva, vèem-se dentes mal collocados e atacados de carie. Emfim, a mesquinhez da estatura, o es­tado rudimentar dos órgãos genitaes, a obtu-são notável dos sentidos, a imperfeição da lin­guagem, completam a physionomia typica d'esté desherdado. Esta decadência physica na sua expressão mais pronunciada vae ter á surdo-mudez e a enfermidades de toda a espécie: hernias, paralysias parciaes, contractures dos membros e finalmente á esterilidade.

0 abaixamento intellectual tão notável como a tara physica, explica-se igualmente pelo facto de extensão da lesão cerebral. Esta pôde es-tender-se até aos máximos limites, attingindo os centros corticaes na sua totalidade, deixando intacto apenas o bolbo e a medulla, de modo que o enfermo fique reduzido á vida vegetativa.

Mais lenta e menos diffusa que no caso precedente, a invasão do encephalo cede um lo-gar á sensação e ao instincto : o cérebro em toda a parte situada atraz da circumvolução parietal ascendente, fica mais ou menos in­demne. A educação pôde mesmo pegar n'este dominio restricto e desenvolver n'estes seres degradados alguns vestígios de manifestação semi-consciente. A ausência do lóbulo anterior, isto é do centro de formação das ideias, não lhes permitte senão trabalhos d'imitaçâo. Incapa­zes de determinação pensada, as suas tendên­cias são automáticas. Privados do poder de

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moderação são dominados pelo acto impulsivo que não raras vezes é perigoso, attento o seu poder d'imitaçao. Tal é o caso d'esse idiota que depois de haver assistido á matança d'uni porco pegou d'uma faca e a dirigiu contra um homem. Outros praticam a tendência imitativa pegando fogo ao que encontravam.

II

Um grau acima na escala das degeneres­cências apparece um novo typo melhor confor­mado que o antecedentemente descripto. E o imbecil. Ordinariamente elle apresenta defeitos similares, posto que attenuados, no craneo, na face e na constituição geral. Irregularidades so­bretudo, assymetria e o prognatismo, alterações de forma da abobada palatina, dedos supra­numerários, estrabismo, affecções do fundo de olho, taes são as anomalias mais ordinárias. A região psychica entra aqui em acção. O im­becil, possuindo além dos centros perceptores uma porção limitada da região frontal, pôde dar provas d'uma tal ou qual expressão intellectual; mas como o foco das operações do entendimento está longe de ser intacto não se deve esperar d'esté incompleto concepções muito largas. A sua fraqueza far-se-ha sentir notavelmente na associação das ideias; não vendo cousa além da imagem material, a abstracção é letra morta

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para o imbecil. Se elle conseguir por educação 1er, escrever e contar, as suas acquisições nun­ca o elevarão ao papel de creador.

Se o idiota está a mercê dos seus instinctos, o imbecil tem já um poder de determinação propria, mas em limites restrjctos, o trabalho de elaboração do pensamento sendo por força deficiente. As suas faculdades intellectuaes são desprovidas d'esté dom que cria a personalida­de, e os seus sentimentos privados dos attri­butes do individuo dotado de entendimento. Portanto, n'elle como no idiota, o acto tem a marca da impulsividade; não pode discutir os seus instinctos senão n'uma medida restricta; o seu moral incompleto mostra-se impotente para encaminhar as suas tendências.

Ao lado de certas naturezas ternos e disci­plinadas, encontram-se imbecis cruéis e perver­sos, praticando as peores acções a que a sua actividade cerebral os conduz de preferencia á repressão de más tendências.

É sobre este estado intellectual e moral de que a perversão e a impulsão formam a nota do­minante, que se gera uma grande aptidão para o delírio, cujos caracteres se constatam em to­dos os graus de degenerescência; installa-se de subito quasi sem preparação, sob as formas as mais diversas; concepções ambiciosas, mysti-cas e hypochondriacas misturam-se, emmara-nham-se sem tendências á systematisoção, po­dendo desapparecer tão promptamente como oppareceram.

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III

Além do idiota cuia funccão intellectual é annulada, além do imbecil que a executa mui imperfeita e limitadamente, um outro typo se pode definir anatómica e clinicamente. E o de­generado superior.

Considerado no triplo ponto de vista phy-sico, intellectual e moral, n'elle se encontram posto que menos accusadas, as anomalias dos desvios extremos. De mais pela sua aptidão impulsiva e delirante elle reproduz por com­pleto estas anomalias.

Physicamente os degenerados superiores são em geral bem constituídos.

No emtanto, se, na maior parte, nada no as­pecto exterior revela o vicio hereditário, é raro que uma exploração mais directa não descubra uma inferioridade. Este signal por si só e to­mado isoladamente, não é um signal de certeza de degenerescência; tão pouco a sua ausenci-a garante a immunidade; approximado porém das disposições moraes e intellectuaes do individuo adquire um valor relativo, pois que constitue um laço palpável entre os diversos graus de degenerescência. Uma estatística do dr. Kuecht permittiu-lhe chegar a este respeito ás conclu­sões seguintes: 1." 0 que se designa pelo nome de signaes exteriores de degenerescência cons­titue a expressão mais frequente da predisposi­ção nevropathica ; 2.° Os portadores d'estes de-

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feitos possuem urna tendência três a quatro ve­zes maior a contrahir psychoses e névroses de que os individuos normalmente conformados; 3." A falta de signaes somáticos em individuos tocados d'uma maneira latente pela hereditarie­dade não é garantia d'immunidade para doen­ças mentaes ou nervosas.

O estygma, quando existe, vem caracterisado desde os primeiros annos da vida: a depaupe­ração orgânica, persistindo após doenças ou a congenita ; suspensão de desenvolvimento do corpo ou deformações variadas; bossas, saliên­cias no craneo; assymetria do rosto, as formas das orelhas, dos olhos, da bocca e dos dentes; disposição irregular de différentes apparelhos, ás vezes de estructura viciosa, a que corres­ponde irregularidade e imperfeição de funccio-namento; enfermidades parciaes, movimentos choreicos, tics convulsivos, uma extrema sen­sibilidade ás impressões ambientes, favorecen­do a appariçâo de enxaquecas e de diversas ne­vralgias.

Em summa, um quadro muito semelhante ao da idiotia e da imbecilidade.

Na puberdade, epocha em que as crianças se transformam, a organisação soffre perturba­ções diversas: suspensão de crescimento, atro­phia de certos órgãos, anomalias nas funcções genitaes; apparecem accidentes nervosos, cho­reicos, hysteriformes, phenomenos d'incoorde-naçâo motriz, d'anesthesia e de hyperesthesia.

No ponto de vista moral observa-se a mesma

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m incoordenação. A natureza do degenerado é na sua infância indisciplinada e perversa ou indo­lente e apathica. Cóleras violentas, impossíveis de dirigir, obliteração dos sentimentos revelada por aggressões injustificadas e sem fim, prati­cadas bruscamente, a mentira, a vadiação, o roubo e o assassinio, eis o que os primeiros mostram de sua actividade cerebral, emquanto que os segundos sempre indecisos da sua na-turesa, vão tornar-se muitas vezes mais peri­gosos que os primeiros.

A intelligencia n'elles é explorada com notá­vel proveito, averiguando-se então anomalias que umas vezes são o génio, outras vezes são a mais completa incapacidade de comprehen-são, de memoria, uma lesão em summa parcial ou total de toda ou d'uma parte de qualquer das suas operações. Uns degenerados ficam com a sua actividade intellectual em tal estado que não lhes é possível ir além d'uni certo grau de instrucção, esquecendo mesmo o que adqui­riram com muita dificuldade, pois a preguiça é o seu defeito; outros mostram-se incapazes de fazer que as suas faculdades trabalhem de harmonia nas obras que querem executar. O que mais põe em evidencia a degenerescên­cia do individuo é incontestavelmente a desor­dem dos actos. No estado normal não ha acto algum a que não corresponda um estimulo pró­prio; no estado pathologico ou este estimulo não pôde seguir as vias apropriadas á sua traduc-ção peripherica ou ha estímulos que dão em

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resultado toda uma série d'actos que desde a febre até á epilepsia psychica em nada concor­rem para o bem do individuo, o qual seria a universal aspiração de todos os esforços celhi-lares.

Resumindo pois este esboço dos degenera­dos, vè-se que elles são anatomicamente irre­gulares, quer no pezo quer nas proporções dos órgãos, que estes ou faltam ás vezes, ou são exagerados. Que, physiologicamente, não ha desarranjo que mereça assignalar-se, menos pelo que diz respeito ao seu estado mental que ao diante estudaremos.

Pathologicamente, os degenerados são um terreno admirável para n'elles se desenvolverem todas as doenças, sendo elles sempre portado­res d'alguma que segundo Morei se pôde filiar em variadas doenças nervosas.

Não ha uma degenerescência, mas forma de degenerescência. A idiotia é o modelo com­pleto da forma mais acabada de degenerescên­cia. O imbecil representa já uma forma menos devastada. Segue-se a estes uma série de de­generados superiores que successivamente se vão avisinhando do homem normal.

Nos degenerados, as lesões que se encon­tram além das já mencionadas, são principal­mente do lado do système nervoso. Ha-as que não permittem aos seus portadores senão o funccionamento medullar, n'este caso o indivi­duo fica reduzido a vegetar. As lesões porém se poupam toda a parte situada atraz da cir-

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cumvolução parietal ascendente, deixam ainda ao individuo substractum para a sensação e o instincto. Ás vezes a lesão exerce-se principal­mente na região psychica, o individuo ficando então com um poder de determinação propria, mas em limites restrictos; mais limitada do que a antecedente, a intelligencia só é affe-ctada em parte.

A lesão funccional, fundamental nos de­generados, está sobretudo no exercício do seu systema nervoso. É na desordem da intelligen­cia, da sensibilidade e da vontade, marcados com a etiqueta que Magnan chama o syndroma episódico, que se pôde reconhecer um louco enri­que a hereditariedade surge em todas as conse­quências que se vêem produzindo desde ante­passados em que o primeiro facto d'esta derro­cada passou desapercebido como uma excentri­cidade, um vicio, uma ideia genial, um senti­mento de execravel bondade.

0 exercício cerebral faz-se nos degenerados diurna maneira imperfeita umas vezes, irregu­lar a maior parte das vezes. As operações do entendimento ou se não levam a cabo porque lhes falta estimulo capaz de os provocar ou são imperfeitas quando o individuo é privado de exercer alguma das que são indispensáveis ao trabalho harmónico da intelligencia. Assim cer­tos loucos hereditários só com immensa diffi-culdade adquirem os conhecimentos ordinários e communs nas pessoas do seu meio ; outros

...jparam na carreira intellectual que seguiam com

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êxito, para nada mais dar ou regressar á im­becilidade; outros pelo contrario distinguem-se por faculdades especiaes; por vezes uma sim­ples lacuna separa a intelligencia dos degene­rados da d'um homem são.

A loucura d'estes doentes consiste em mui­tos casos mais no delírio dos sentimentos do que n'uma alteração profunda da intelligencia ; a sua rasão não está apparentemente tocada de loucura., elles podem occupar devidamente o seu logar, quer na família quer em sociedade, ha na sua vida intima uma simples obsessão que os atormenta e que basta a marcar-lhes o logar ao lado dos degenerados. A maior parte d'estes alienados teem a noção exacta dos phe-nomenos que os atormentam, a sua existência ordinária em nada manifesta o desarranjo que lhes vae no espirito, empregam-se mesmo em defender-se das obsessões que os importunam, obrigando a intelligencia ao contrôle dos seus actos e dos sentimentos sem que por isso deixe de ter logar a impulsão que surgirá criticamente em occasião propria.

A sensibilidade, quer physica quer moral, é a anomalia mais importante d'estes indivíduos. Desde novos que elles manifestam a mais de­cidida incompatibilidade com os seus compa­nheiros.

Umas vezes entram em aberta hostilidade a respeito de todos, outras vezes elles conser-vam-se aparte, evitando o convivio. O egoísmo é a base da sua moralidade. A proceder d'um

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senso moral defeituoso elles entregam-se a actos de selvageria sobre animaes, sobre as pessoas que com elles vivem; a desgraça do semelhante em nada os affecta, a generosidade é sentimento que nem comprehendem ; a justiça é sentimento que sempre os revolta. Lacenaire, ouvindo pro­ferir a sua sentença de morte, depois dos cri­mes que praticou lamentava que se matasse um homem por tão pouca cousa.

A desordem a mais apparente é sempre a dos actos. Na cathegoria de loucos que estuda­mos, elles teem o caracter de impulsividade. As acções d'estes alienados são umas vezes deli-ctuosas, outras vezes benignas.

Além do importante caracter d'impulsivi-dade, ellas.são sempre múltiplas n'este sentido de que o degenerado é em períodos successivos da vida um delirante em que surgem syndro-mas variados. A loucura dos actos manifesta-se por exemplo por tendências automáticos e es­túpidas, para n'iim accesso seguinte tomar o caracter de odientas e reflectidas, para ainda n'ira terceiro acesso ser o medo do tacto etc. Geralmente toda a tendência viciosa e contra natureza quando não possa ser explicada por algum funesto habito adquirido n'um meio so­cial ou familiar corrompido é um indicio certo de degenerescência; o vicio e o crime do indi­viduo bem constituído não são os mesmos que os dos degenerados.

«A impulsão, diz Magnan, constitue um mo­do d'actividade cerebral que impelle a actos que

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a vontade é por vezes impotente para impedir. Esta perturbação elementar mostra-se nas for­mas mentaes mais diversas, revestida de cara­cteres próprios á affecção em que se encontra: a impulsão do epiléptico é différente da do al­coólico, da do melancholico, da do paralytico ge­ral, da do delirante chronico. No caso dos doen­tes que estudamos, a impulsão não tem mais valor do que o d'um symptoma, pelo que deve desapparecer do quadro da nosographia como espécie pathologica. Os actos, d'estes delirantes não são todo o desarranjo mental, a impulsão não constitue só de per si toda a doença; ella caracterisa-a ; o acto impulsivo torna-se patho-gnomonico pois que elle adquire a sua maneira de ser îi'um terreno especial. Não ha forma ve-sanica, em que a perturbação dos actos seja mais imperiosa que na alienação hereditaria. O louco ordinário obedece a uma concepção deli­rante, a uma illusão, a uma allucinação; o de­generado é impulsivo, os seus actos são auto­máticos e irresistíveis. A lucta que elles sus­tentam a maior parte das vezes contra a ten­dência que os sollicita não se encontra em ne­nhuma outra psychose.

Os hereditários degenerados podem ser di­vididos em quatro grandes grupos segundo o grau de desenvolvimento das faculdades intel-lectuaes: os idiotas nos quaes a vida cerebral é quasi nulla ; os imbecis susceptíveis d'uma certa educação mas incapazes de se dirigir, pois que a intelligencia fica rudimentar; os débeis com fa-

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culdades intellectuaes insuficientes, mas capa­zes em condições determinadas d'uni certo des­envolvimento; emfim os desiquilibrados, os de­generados superiores, sempre mal ponderados, nos quaes ao lado de faculdades por vezes bri­lhantes existem lacunas intellectuaes e moraes; as perturbações do seu desenvolvimento cere­bral muito attenuadas se se compararem com as dos idiotas offerecem comtudo caracteres ge-raes, communs. Não obstante as notáveis dif-ferenças que mostram os doentes collocados nos extremos da escala, elles são da mesma familia. Types intermédios conduzem d'uns a outros por graduação insensível. O próprio d'es-tes indivíduos é o desiquilibrio mental. A maior parte é physicamente defeituosa sendo de notar principalmente a asymetria e atrophia orgânica.

As obsessões e as impulsões irresistíveis, taes como a depsomania, a onomatomania, a kleptomania, as anomalias sexuaes e muitos outros estados análogos, mostram o desequilí­brio dos diversos centros cerebraes e espinhaes. Todos estes phenomenos, classificados outr'ora sob o nome de monomanias, são por Magnan reunidos n'uni mesmo grupo e designados, pelo nome de syndromas episódicos de hereditários. São um episodio na historia dos degenerados e comquanto variáveis de formas conservam sem­pre os mesmos caracteres ; irresistibilidade, an­gustia concomitante, consciência completa do estado e a satisfação consecutiva ao acto cum­prido. São os estigmas psychicos.

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As suos anomalias cerebraes dão conta do apparecimento das obsessões e das impulsões, e explicam a facilidade com que elles deliram.

As perturbações dos degenerados ou podem limitar-se á espliera intellectual e não passam então de ideias fúteis, bizarras ou perigosas, os sentimentos pervertidos são outras vezes o ponto de partida d'uma serie d'actos que podem ser tudo o que ha de mais criminoso como de mais excêntrico; os actos, aboutissant de todo o processo de psychismo mórbido, podem redu-zir-se a quatro typos principaes relativamente ao seu mechanismo:

1." O acto tem todos os caracteres d'util phe-iiomeno puramente reflexo que se produz fatal­mente sem connivencia de vontade. A impulsão é súbita, inconsciente, seguida d'uma execução immediata, sem que o entendimento tenha tido tempo de tomar conhecimento d'ella, e de pen­sar se deve ou não obedecer. Mechanismo este análogo áquelle pelo qual um individuo subita­mente acordado commette actos de violência e especialmente assassinatos. Assim uma senti-nella despertada por um officiai de serviço ca-biu sobre este de sabre em punho e tel-o-hia morto, se pessoas presentes na occasião não se tivessem interposto. Resultou do exame me-dico-legal a que se procedeu depois que esta acção era involuntária e a consequência da vio­lenta confusão mental produzida pelo despertar subito depois d'um somno profundo.

2.° A tendência ao acto, sendo espontânea ç

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involuntária, pôde ser perfeitamente percebida e tornar-se o objecto d'um trabalho intellectual consciente. N'este caso o resultado da delibera­ção consiste umas vezes em afastar a impulsão involuntária, outras vezes em acceital-a.

3.° Alteração de tendências. Necessidades instinctivamente viciosas exercem-se d'unis ma­neira contínua e impellem aos que as sentem a praticar actos depravados ou criminosos, to­das as vezes que possam encontrar occasião para isso.

4." Os actos delirantes não se mostram senão em certos períodos sob a forma deaccessos mais ou menos regulares, sendo normal o comporta­mento do doente, nos intervallos dos accessos.

Mechanismo dos syíidromas episódicos dos hereditários

E8PINHÀES

Reflexa sim­ples medullar, t a n t o m a i s v i v a q u a n t o mais e s t á li­berta da in­fluencia cere­bral.

A c t o auto­mático.

ESPINHAES

POSTERIORES

Reflexo cor­tical posterior.

Da sensação, mas não mo­vei reflectido.

Acto instin-ctivo e irresis­tível.

CEREBRAES

Reflexo cor­tical anterior.

Obsessões e i m p u l s õ e s c o n s c i r e n t e s mas instincti­ves. Apoz deli­beração men­tal o acto pôde ou não produ-zir-se.

CEREBRAES

Reflexo pu­ramente psy-chica.

O b s e s s õ e s , ideias fixas in-stinctivas mas não se trans­formando em actos.

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• O delírio dos degenerados

O delírio dos degenerados consiste, como já dissemos, n'uma desordem dos actos e dos sentimentos, a intelligencia ficando, a maior parte das vezes, lúcida. Em rasão da sua dis­posição dominante, basta a maior parte das ve­zes a causa mais benigna para que a pertur­bação psychica appareça em graus que estão em relação com a quantidade de influencias hereditárias que se calculam no doente. E não é preciso que o predisposto chegue á idade adulta; tão pouco devemos esperar que o delí­rio seja espectaculoso, para considerar as per­turbações mentaes como signaes de degeneres­cência. No serviço de Magnan havia um doente de quatro annos já atacado de melancholia com ideias de suicídio. Tem-se descripto sob o nome de loucura de dois uma variedade de delirio em que um alienado communica e faz adoptar a outro as suas ideias. Se é certo que n'estes casos se podem invocar como causa do delirio as condições de meio, a imitação, é certo que

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este caso se pôde sem difficuldade eollocar no quadro das degenerescências, como ahi tem logar o bêbedo que se embriaga por imitar um outro, o idiota de que já fallei, que por vêr matar um porco tomou da faca e a dirigiu contra uma pessoa visinha.

O delirio do degenerado em nada diffère do do louco ordinário se se observa de momento. Com effeito, nos dois casos pensamento e acção estão alterados; o doente soffre allucinações variadas, illusões e perturbações da sensibili­dade geral; depois de um período de excitação sobrevem o delirio agudo, ou então apôs pro-dromos de depressão chega o stupor.

Mas a considerar a marcha de toda a phase delirante, a degenerescência impõe-se ao dia­gnostico e em taes caracteres, que, segundo Magnan, por elles se pôde reconhecer o dege­nerado, mesmo na ausência de anamnesticos. N'este fundo mórbido tudo é irregularidade. O debute do accesso é brusco, sem período pro-dromico. As ideias múltiplas, confusas, tristes ou alegres, succedem-se ou combinam-se sem a menor regra, outras vezes fixam-se sobre um único ponto, tenaz e persistentemente. Não ha forma alguma de vesânia, em que a ma­neira de ser do paciente se manifeste de modos mais variados, em que a successão dos phe-nomenos seja mais rápida : o doente pôde pas­sar sem transição da mais violenta agitação á mais profunda depressão.

As impulsões e os actos violentos mais na

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dependência do instincto do que na da alluci-nação, são promptos e automáticos.

A terminação d'estes accidentes é tão im­prevista como a sua marcha; se elles sobre­vem mui rapidamente, elles affrouxam depressa e desapparecem quando menos se pensa.

As recidivas são frequentíssimas n'estes alienados ; as alternativas de melhora e de doen­ça são muitas vezes de desesperar; a cura instável só permitte ao doente deixal-o na ameaça de um novo accesso mórbido. A demência, um dos terminus d'esta enfermidade herdada, não sobrevem senão apoz a repetição mui próxima d'estes accessos doentios.

O delirio que se installa de improviso é pro-teiforme (ambicioso, mystico, hypochondriaco, de perseguição) sem tendência a evolucionar sistematicamente. Predomina n'elle o lado im­pulsivo, e alterna com intervallos de apparente saúde, e não marcha com regularidade. Qual­quer, pois, que seja a maneira de delirar d'um alienado, é sempre possivel diagnosticar a de­generescência pelos signaes supra menciona­dos, mesmo que se apresente uma forma de alienação mui parecida com a que estudamos.

E senão veja-se. O delirio ambicioso tanto pôde ser a expres­

são mórbida d'um degenerado como a d'um de­lirante chronico. Mas o delirio d'esté annun-cia-se por um periodo de incubação mais ou menos longo, constante sempre; mais tarde, á interpretação falsa, á illusão, succede-se a allu-

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cinação, o delirio começa a lixar-se e revela um perseguido. A este période em que o doente não é poupado a soffrimento algum, siiccede-se um outro em que vão surgindo gradualmente ideias ambiciosos, segundo os quaes o doente se crê investido das mais altas funcções sociaes. Tudoé previsto na marcha do delirio, a systemati-sação, sendo completa : a passagem d'um période» a outro faz-se de uma maneiro quasi insensí­vel, em annos suecessivos; é por lenta gradua­ção que a systematisoção do delirio vem reve­lar com a apparição sobretudo das ideias ambi­ciosas, um estado chronico irremediável. No degenerado, pelo contrario, a expressão das ideias delirantes não segue nenhuma ordem distincta, podem apparecer as manifestações mais diversas, combinor-se, alternar sem evo­lução precisa. Longe de indicar a systematiso­ção e a tendência a tornar-se chronico, o delirio ambicioso_ não tem caracter e pôde desappore-cer d'um dia para •-© outro. Esta maneira de ser basta só por si para distinguir os alienados d'esta cathegoria do perseguido clássico.

Os aspectos múltiplos que reveste o delirio nos degenerados, podem em certos casos tor­nar o diagnostico differencial assaz difficil. As­sim, muitas vezes se tem confundido a degene­rescência com a paralysia geral no seu inicio. Quando, pois, o doente apresenta uma activi­dade exagerada, concepções ambiciosas dema­siado absurdas, convém notar os phenomenos somáticos e examinar com attenção o nivel ce-

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rebral. A mudança ou perversão de caracter e a transformação nos hábitos da vida como pri­meiros symptomas que se observam ; depois as perturbações da palavra, desde a hesitação até ao mutismo, passando pela sua ataxia e em­pastamento devidos a movimentos convulsivos dos lábios e a um tremulo vermicular da lingua muito apreciável, quando se faz repousar este órgão sobre a arcada dentaria inferior, as per­turbações da escripta, guardando rigoroso pa­rallelism© com as da palavra; a paresia mus­cular, ao principio limitada e depois general i-sada, a inconsciência da actividade muscular, a desigual dilatação das pupillas, phenomenon de insensibilidade cutanea e mucosa, paralysia muscular desde os músculos pharingios até ao constrictor anal, as perturbações nutritivas, consistindo n'um appetite exagerado e emma-grecimento rápido, são phenomenos somáticos que muito esclarecem o diagnostico da paraly­sia geral no período de estádio. Do lado psy-chico, enfraquecimento geral da intelligencia e perda de memoria. Se sobrevem delirio, este pôde ser expansivo, depressivo ou circular. 'A primeira forma delirante é incohérente e pueril, além de que o paralytico geral se contradiz a cada passo como na seguinte observação colli-gida no manual de doenças mentaes do dr. Ju­lio de Mattos:

S . . . 35 annos, diz-se general, presidente de todas as republicas, reformador do exercito

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e organisador das finanças; ao mesmo tempo declara-se tintureiro, e denuncia com exactidão o misero salário que percebia na fabrica.

A segunda forma delirante manifesta-se por. uma tristeza constante com prostração e pre-occupações de natureza hypochondriaca ; o delí­rio indo ás vezes até ao ponto do doente se julgar morto e em estado de putrefacção.

A terceira forma apparece umas vezes com regularidade como no delirio vesanico generali-sado, outras vezes n'uma transição inesperada e rápida d'uma phase a outra, da alegria á tris­teza, das ideias de grandeza a preoccupações hypochondriacas, do riso ás lagrimas.

O enfraquecimento da intelligencia progride até ao esgotamento das faculdades, e a amnesia torna-se absoluta, a palavra inintelligivel e a paresia muscular completa. Então o doente succumbe a uma congestão cerebral, se inci­dente algum não cortar a evolução da paralysia geral.

Acabamos de fazer o esboço da paralysia geral. Pois estes phenomenos succedem pro­gressiva e regularmente. No periodo em que as perturbações somáticas sejam bem visiveis, ellas guiam no diagnostico da enfermidade; mas quando não existam ainda bem pronun­ciadas, quando o doente ainda está no periodo que Legrand du Saulle chama o periodo medi-co-legal da paralysia geral, o diagnostico é dif-ficil, sobretudo se se ignorar a lenta desordem

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das faculdades, e se não se tornar bem appa­rente o defeito de coordenação das operações intellectuaes.

Ao passo que o delírio de grandezas na pa-ralysia geral é absurdo dissociado e illogico, elle é cohérente e lógico n'um accesso deli­rante d'uni degenerado, cujo espirito offerece apenas lacunas, emquanto que no primeiro caso se trata d'uma lesão diffusa.

O degenerado possue um estado mental par­ticular bem différente do vesanico ordinário, porquanto elle comporta uma origem, uma marcha, uma duração e uma terminação dis-tinctas.

Examinemos a reacção que elle oppõe a ele­mentos occasionaes capazes por si de dar phy-sionomias a formas pathologicas.

O degenerado perde a sua individualidade em presença do alcoolismo, das névroses con­vulsivas, da paralysiã geral.

De modo algum a nova influencia, que lhe surprehende a marcha da doença, affecta-o in­dependentemente, e despertando-lhe o fundo delirante com todos os seus caracteres.

A acção toxica do alcool n'um louco ordi­nário, ou se manifesta produzindo o delírio al­coólico especial ou actua a titulo de excitante n'um terreno preparado, favorecendo d'esté modo o appareeimento de um delírio que não se teria produzido na ausência de um estimulo. Sempre que as allucinações da embriaguez desappare-cem lentamente, o doente fica convencido da

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realidade das suas percepções anormaes, e re­belde a todo o ensaio de tratamento physico e moral. A convalescença da embriaguez do de­generado, mais demorada do que a do alcoólico, pelo habito adquirido e repetido de beber, vae-se tornando cada vez mais difficil de alcançar; as ideias de perseguição, as tendências hypochon-driacas, as desordens intellectuaes surgindo mais amiudadas vezes após accessos ligeiros de bebidas e prolongando-se para deixar após si perturbações melancholicas ou manía­cas nada influenciadas pelo alcool. Se ordi­nariamente pouco alcool é preciso para le­var o degenerado a violências furiosas e actos gravíssimos, é certo que o degenerado re­siste mais que o alcoólico ao effeito da intoxi­cação.

O parentesco que se estabeleceu entre as névroses convulsivas e a degenerescência, não tem, segundo Magnan, explicação senão a de uma forma de hereditariedade que se sommou com outra forma.

As névroses convulsivas podem limitar-se unicamente á esphera motriz, ou podem, por vezes, constituir uma situação vesanica, mas esta é sempre a germinação de um terreno de escolha, a degenerescência. O delírio e a con­vulsão são formas combinadas e não transfor­madas. O alcoolismo pôde entrar em scena em indivíduos que apresentam a forma convulsiva da névrose ou esta e o delírio de degeneres­cência, podendo o mesmo doente encontrar-se

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em très situações mórbidas, cuja expressão é característica para cada uma.

A paralysia geral, se se constitue nos dege­nerados, participa dos symptomas da marcha da loucura hereditaria. Effectivamente o delirio, que não é já de si senão uma complicação da doença, pois que esta em factos de perturba­ções cerebraes se deve limitar ao enfraqueci­mento intellectual, é de bruscas alternativas ; podendo revestir a forma lúcida, o estado im­pulsivo estabelece-se como no delirio hereditá­rio, a evolução da doença não se faz segundo as regras ordinárias, n'uns a doença surgindo de improviso e estabelecendo-se chronicamente, apenas apresentando de quando em quando manifestações sub-agudas sob a influencia de accidentes congestivos ; n'outros, pelo contra­rio, o delirio sendo de dupla forma circular, não fallando por ultimo da demora nas remis­sões.

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Dypsomania

Alguns medicos observaram, ha já muitos annos, que certos indivíduos se embriagavam de tempos a tempos, e que, não obstante a sua embriaguez em nada differir da dos outros, as circumstancias em que elles se entregavam ao alcoolismo differiam tanto das que precedem a embriaguez ordinária, que não tiveram remédio senão admittir a hypothèse de uma doença ca-racterisada pela necessidade da bebida, para explicar o que elles não podiam fazer pelo vicio ou pelo habito.

Foi Hufeland o primeiro alienista que cha­mou a esta doença dypsomania. Do modo de vèr de Hufeland, nada resta hoje; conserva-se, porém, a palavra dypsomania, a qual não serve mais a designar uma entidade mórbida, se não um syndroma de degenerescência muito impor­tante, e análogo de resto a outros syndromas, taes como impulsões para o roubo, homicídio, suicídio, medo do espaço, procura anciosa da palavra, preversões genésicas.

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Etiologia. — Na dypsomania, como nas de­mais manifestações da degenerescência, a he­reditariedade é o primeira causa a invocar. Ha, pôde dizer-se, uma série de causas que repre­sentam no apparecimento da doença um papel indispensável; mas além de não poderem ex­plicar a doença, menos se pôde comprehender como só por si, na sua insignificância, estas possam ser origem de gravíssimas desordens do systema nervoso. Sem fallût" da confusão que alguns auctores fizeram entre causas da doença e seus symptomas, tem-se attribuido tudo a influencia na ecclosão do mal á dyspe­psia, á hysteria, á prostração geral, á menstrua­ção, á menopausa e até a causas meramente moraes.

E preciso vèr-se hoje com Magnan, o que forma o terreno em que se desenvolveu esta impulsão para a ingestão de líquidos, para n'um estudo em globo de todos os factos d'esté grave estado mórbido se notar que acima de todos uma causa está sempre : a hereditarieda­de. Não é louco quem o quizer ser. A heredita­riedade é um factor importante na génese das doenças mentaes, nas quaes a devemos sempre procurar por traz de todas as causas. Aparte o traumatismo, não ha causa capaz de enlou­quecer um cérebro são, a reacção segue de perto ou de longe os effeitos da acção. Assim a uma influencia deprimente, actuando sobre um cérebro são, succédera a tristeza e nunca a melancholia ; a influencias expansivas succe-

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dera a alegria e nunca a mania. Ha doenças que deixam vestígios no systema nervoso, os quaes por não terem sido observados anterior­mente a estas, são inculpados de produzir a loucura. A meningite, o typho, a tuberculose, a intoxicação puerperal, etc. Qualquer d'estas doenças tem symptomas próprios e symptomas que, ajuntando-se a estes, dão um feitio com­plicado á doença.

Importa, porém, saber que, além dos pri­meiros, a doença nem sempre se evidenceia por estes, o que quer dizer que ao primeiro se juntou novo elemento mórbido. Por exemplo, o typho tem, como se sabe, symptomas depen­dentes ou das lesões que no intestino produz o bacillo de Eberth, ou da intoxicação pelas ptomainas ahi produzidas por este bacillo. Se se dá uma infecção que localisa a doença em outra parte, esta pôde, por exemplo, ter logar no pulmão ou revelar-se por symptomas de or­dem nervosa. Em certos casos o doente cahe no sopor e no coma completo, contrariamente a outros em que predominam as excitações psychicas, não se tendo conta de phenomenos elementares e muito geraes, desde a obtusão do sensório até ás perturbações da motilidade. D'onde vem esta localisnção da doença? As al­terações anatómicas que se encontram no sys­tema nervoso, especialmente no encephalo, não estão de modo algum, na grande maioria dos casos, em relação com a gravidade dos pheno­menos observados durante a vida. Se tanto,

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pequenas heinorrhagias nas meningeas, oedema, n'estas, estado húmido da substancia cerebral, eis o que estabelece uma relação mais que du­vidosa com os phenomenos mórbidos. Também nada significam as alterações microscópicas descobertas no cérebro, sendo mais que pro­vável, segundo Strumpell, que nada tenham que vèr com a forma da doença. Liebermeister professava a opinião de que os phenomenos nervosos observados na infecção typhica eram a consequência immediata de hyperthermia fe­bril, mas a falta de proporção entre o grau da febre e a gravidade das desordens nervosas é, em muitos casos, de tão indiscutível evidencia, que não ha remédio senão procurar outra causa que mais nos satisfaça o espirito.

Com eifeito, vèem-se doentes dias successi-vos serem atacados d'uma forte febre continua e sentirem-se bem subjectivamente, não apre­sentando desordem cerebral notável, pelo con­trario outros com pouca febre apresentando desde o começo da doença manifestações ner­vosas seriíssimas. A questão não é de mais ou menos ptomainas, de sua fácil ou difficil elimi­nação; a infecção, acompanhando-se sempre de um augmente de temperatura, esta sendo tanto mais forte quando aquella o é, como ex­plicar ainda pela acção d'estes alcalóides os phenomenos nervosos da doença.

Ha, pois, que pronunciar-nos pela heredita­riedade, pela predisposição para perturbações d'esta ordem. Nas doenças infecciosas os sym-

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ptomos cerebro-espinhaes não apparecem sem­pre ; apparecem n'uns certos indivíduos? e quaes?. N'aquelles em que o systema eerebro-espinlial é o Locus minor is resistentiœ.

E como falíamos das intoxicações na génese da loucura, não acceitando a theoria que quel­que a pathogenia não vá além do veneno, va­mos abordar a questão das loucuras diathesicas.

Não ha duvida quanto ao facto de que as affecções nervosas existem em maior numero nos indivíduos filhos de rachiticos, escrophu-losos, rheumaticos, tuberculosos e d'uma ma­neira geral em todos aquelles que teem de sof-frer a miséria pathologica que lhe legaram os seus antepassados do que em quaesquer ou­tros geralmente bem constituídos.

Diz-se n'estes casos que a doença constitu­cional se transformou directamente em vesânia. Clouston foi dos primeiros alienistas a assi-gnalar o parentesco exacto entre a tuberculose e a loucura, não hesitando em crear uma forma mental que denominou loucura dos tysicos ; outros se lhe seguiram que descreveram a mais uma loucura rheumatismal, gottosa e syphiliti­ca. Maudsley deu logar, na sua classificação de doenças mentaes, a uma loucura de puberdade, de masturbação, da menopause, etc. Esta ques­tão das loucuras diathesicas perdeu muito do seu valor, e perdel-o-ha á medida que a etiolo­gia das doenças diathesicas se fòr apurando. Toda a doença que não se localisa no systema nervoso não é a loucura.

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Nós acabamos de vèr que as intoxicações Mo dão a loucura se os seus eft'eitos se não, fizerem sentir no systema nervoso, e ainda é preciso que elle tenha recebido u m a modifica­ção que o torne apto para funccionar irregular­mente, para que uma reacção da: sua parte o não salve da permanência da doença. Depois, a mesma causa produz effeitos variados nos indi­víduos, segundo a sua acção se faz sentir par­ticularmente n'uni ou n'outro órgão. Não ha caracteres especiaes ás loucuras diathesicas capazes de lhes fazer crear um logar distincto n'uma classificação.

De que no curso de uma doença diathesica apparece algumas vezes a loucura, concluiu-se que a diathese podia originar a vesânia.

Contrariamente a esta maneira de vèr, a propósito da preponderância das influencias-estranhas á hereditariedade, sustentamos que a aptidão delirante tem a sua rasão de ser na herança nevro-psychopatica, e que tanto esta é mais rica pela accumulação successiva de elementos tanto mais aquella é fácil e prompta.

Todos os auctores, sem excepção, apontam a hereditariedade como documento de loucura.

Segundo Esquirol e Baillarger, a loucura transmittir-se-hia mais vezes aos filhos pela mãe do que pelo pae.

Luys ensina que a hereditariedade é o pri­meiro dos phenomenos da pathologia mental, e que, como n'uma série de indivíduos se vêem dominar as semelhanças physicas e moraes, as-

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sim a hereditariedade domina a seu modo. uma geração de nevropathas. ..-.

Para Griesinger não ha causa mais pode­rosa da loucura que a hereditariedade. Alguns auctores, no emtanto, Legrand du Saule, por exemplo,-parecem notar que a hereditariedade não se verifica sempre. Subsiste sempre o facto geralmente reconhecido; contradições ha-as apenas quando se trate de saber em quantos por cento o facto tem logar.

Diz Morei que nas indicações etiológicas de certas doenças é muitas vezes difficil chegar a conhecer a verdade; e que na da loucura o ó mais do que em outra qualquer affecção.

Effectivãmente a família do doente, não com-prehendendo o interesse scientifieo das indaga­ções do alienista, occulta com todo o cuidado pormenores sobre a ascendência do louco; por outro lado, como diz Saury, a hereditariedade vesanica offerece elementos nada commodos de destrinçar. Que phenomenos devemos compre-hender n'esta palavra loucura?

Segundo Maiidsley, de modo algum é su­pérfluo bem estabelecer o que esta palavra en­cerra, e com razão. Nós não sabemos quaes são os limites da sanidade e da insanidade do espirito:; facilmente affirmaremos ser' louco o individuo que delira no sentido das suas ideias, apresentando-as tumultuosas, incontes­táveis, variadas, sem ligação; mas fazemos as nossas reservas quando seja preciso affirmar, por exemplo, ëe o illustre fundador do methodo

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experimental em sciencia, Bacon, cahindo em syncope durante os eclipses da lua, e não vol­tando á si senão depois do d,esapparecimento de phenomenos astronómicos, era ou não um louco. A mesma incerteza do diagnostico se dá muitas vezes quando os indivíduos sujeitos a exame apresentam particularidades de caracter que os tornam salientes no meio social em que vivem. São estas muitas vezes a necessidade do isolamento, a irresolução, escrúpulos de­masiados, uma falta de espirito de direcção, a impressionabilidade extrema. Outras vezes a originalidade ou a excentricidade, a extrava­gância do comportamento que pôde ir, no dizer do vulgo, até á loucura.'

D'aqui se vê como erradas informações, mal feitas interpretações, limites de phenomenali-dade mal estabelecidos, e sobretudo um incom­pleto conhecimento do objecto se conspiram para a elaboração de estatísticas incompletas. Não admira, pois, que a proporção de casos de loucura hereditaria para os demais casos de alienação seja para uns de 9 por cento e para outros de 40 por cento.

Não ha outra causa a assignalar á dypso-mania que nfio seja a hereditariedade.

S y mp tomas.—A dypsomania tem por cara­cter principal o traduzir-se por accessos essen­cialmente intermittentes eparoxisticos, deixando após a sua desapparição um mal estar cerebral que se atténua pouco e pouco. Os doentes reto­mam os seus hábitos de sobriedade, lamentando

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os abusos aos quaes momentaneamente se en­tregaram.

O aecesso é precedido de prodromos quasi sempre os mesmos: primeiro um sentimento vago de tristeza impossível de se dissipar pelas occupações ou pelas distracções; os doentes, deprimidos e desanimados, renunciam então ao trabalho, no qual lhes é impossível pensar; não os largam ideias negras, tudo em torno d'elles lhes parece mudar, sentem-se como ameaçados de um perigo eminente, o seu cara­cter torna-se azedo; os sentimentos affecti-vos fundamente perturbados, os seres mais queridos são-lhes indifférentes. A estes sym-ptomas de ordem intellectual e moral juntam-se mais tarde outros symptomas physicos. A ano­rexia com anciedade precordial, aperto epigas-trico e por vezes da garganta, depois desgosto pelos alimentos sólidos. Emfim sobrevem per­turbações da sensibilidade geral ; assim os doen­tes queixam-se de ardência no estômago, na garganta, teem uma sede intensa, não uma sede que qualquer bebida possa calmar, mas uma sede particular com desejos, tendência ir­resistível a beber alguma coisa de excitante. D'aqui por diante, nada detém o dypsomaniaco. É-lhes preciso, seja pelo que fòr, um liquido alcoólico; quando lhes falte dinheiro, todos os meios para o arranjarem, o roubo, a prostitui­ção e o crime, lhes parecem bons: o pae de fa­mília, levando para a taverna os últimos recur­sos da casa, ficará surdo ás supplicas da mãe

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que lhes mostra os filhos sem pão; a mãe, es­quecida dos seus deveres e perdendo todo o pudor, por alguns copos de vinho, prostituir-se-ha ou venderá a filha, etc. São estes doentes os primeiros a deplorar a sua funesta tendência para a bebida. Conhecem-lhe as consequências para si e para os seus, envergonbam-se de se­rem assim, mas são inúteis todos os esforços para se conterem. A lucta que muitos d'estes infelizes teem comsigo, antes de ceder á sua horrível impulsão, mostra bem quanta diffe-rença elles fazem dos bêbedos ordinários. Em-quanto que estes procuram todas as occasiões de beber, o dypsomaniaco começa por as evi­tar, censura-se a elle próprio, expõe toda a sé­rie de tormentos por que passará cedendo á necessidade, e sobretudo procurará desgostar-se do liquido alcoólico, misturando-lhe tudo quanto o possa tornar repugnante, chegando ás vezes a deitar-lhe excrementos. A doença sem­pre mais forte que a razão e que o nojo que elles procuram, fal-os succumbir. Então o dy­psomaniaco occulta-se de todos, entra ás es­condidas na taverna, ahi beberá todo o alcool que lhe derem, um primeiro copo para fazer desapparecer o calor que elles sentem na gar­ganta, um outro para se darem forças que lhes faltam; sobrevem um sentimento de bem estar passageiro, de plenitude, qualquer allivio ao seu estado, e então as libações seguem-se até á bebedeira. Antes, porém, de estar bêbedo, o dypsomaniaco era já um alienado. Todas as

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bebidas alcoólicas servem indistinctamente, aos dypsomaniacos. Uns tomam a agua de Coló­nia, outros tinturas diversas, vulneraria, hor­telã, absintho, outros o vinho, e ainda outros o ether. Todavia muitos dypsomaniacos não escolhem liquido e bebem aquelle que lhes cahe á mão.

Satisfeita a impulsão, o dypsomaniaco foge desde que lhe faliam de alcool ou de qualquer outro liquido que lhe produz uma repugnância invencível. No intervallo dos seus accessos, ge­ralmente, elle não bebe alcool, até mesmo lí­quidos que o desgostam sempre. Quando a vergonha e o arrependimento os não levam ao sui­cídio, fazem esforços por passar uma vida re­gular, esperando não succumbir a mais algum accesso impulsivo. A convicção a este respeito é sincera; elles manifestam-n'a de muitas ma­neiras. Magnan cita três observações de dypso-maniacas, uma das quaes escrevia com o seu sangue a promessa de não mais beber, outra das quaes se prestava da melhor vontade a to­das as suggestões da família, inclusive a se-questração em casa de um seu parente medico para a auxiliar na sua cura, uma terceira, cria­da de servir, que, surprehendida pelos seus amos, deixava em casa d'estes tudo quanto possuía, preferindo perdel-o a apparecer-lhes.

Por vezes, porém, o dypsomaniaco, além de beber por necessidade indomável, bebe como qualquer fraco da vontade. No intervallo da sua impulsão, o individuo é bêbedo. Mas, diz

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Maguan, é sempre fácil assegurarmo-nos se o alienado bebe por impulsão ou por habito de bêbedo; quando elle bebe por distracção ou por gosto, o alienado comporta-se como o bêbedo ordinário, e leva comsigo para a taverna os seus amigos; quando, pelo contrario, elle bebe impulsionado pela doença, isola-se da. gente das suas relações, esconde-se, leva o vinho para o seu quarto e engole copo sobre copo, depois de tomar todas as precauções para que o não descubram.

Já Trela! insistiu sobre a differença que se­para os dois estados: os bêbedos são indiví­duos que se embriagam sempre que podem; os dypsomaniacos são doentes que se embria­gam, todas as vezes que os acommette um ac-cesso. Nota importante: contrariamente ao que se passa na embriaguez, a impulsão para a be­bida é sempre precedida de uma phase de de­pressão. Toda a differença está em que na em­briaguez a absorpçâo do alcool é uma causa; mas na dypsomania é um symptoma.

Como observa Magnan, os accessos não teem época determinada de apparição. No prin­cipio separa-os de ordinário um período de muitos me/.es; pouco e pouco, porém, vão-se approximando até sobrevirem todas as sema­nas (typo hebdomadario) e mesmo todos os dias (typo quotidiano).

No dypsomaniaco, além do furor de beber, mostram-se outras impulsões e obsessões va­rias.

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Uma das mais frequentes é a impulsão para O suicídio. A pyromania e a kleptomania asso-ciam-se muitas vezes aos accessos dypsoma-niacos.

Estado mental. — O desenvolvimento phy-sico dos dypsomaniacos apresenta a maior parte das vezes, desde a infância, particulari­dades doentias a assignalar: uma apparencia muito precoce, o apparecimento tardio da in-telligencia, certos phenomenos nervosos, con­vulsivos, choreicos ou outros. Nas dypsoma-niacas, em quem este syndroma episódico da degenerescência é mais frequente que no ho­mem, não é raro constatar antes da puberdade manifestações hystericas.

Pode-se dizer dos dypsomaniacos o mesmo que dos demais degenerados, que se elles não deliram continuamente, estão promptos a isso. Se muitos são différentes de si próprio, segun­do são observados no periodo paroxistico ou no periodo de remittencia, a maior, porém, comportam-se como alienados nos seus inter-vallos chamados de lucidez.

O desequilíbrio das faculdades, o caracter bizarro, exaltado ou apathico, superstições e impulsões variadas de forma, mostram suffi-cientemente que o mal não cessa, embora re-appareça uma vez ou outra com mais ou menos força. De resto, temos já dito o bastante sobre o estado mental do degenerado para se saber 0 que pensar a respeito dos dypsomaniacos.

Diagnostico e tratamento. — Não é fácil con-

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fundir-se um accesso de dypsomania com a in­toxicação aguda alcoólica. Já descrevemos o accesso; viu-se que o dypsomaniaco cede á ne­cessidade de beber, mas cede passando por uma phase de desanimo e de prostração ; es-conde-se de todos, e sobretudo o que lhe im­porta é a ingestão de uma bebida forte que o estômago lhe reclama imperiosamente.

Não é assim o alcoólico, que não resiste ao prazer de beber, escolhe líquidos que lhe rega­lam o paladar, associa com outros alcoólicos, cujas tendências são do seu particular agrado, e sobretudo faz étalage dos seus vicios, cujas vantagens e deleites elle não cessa de apre­goar.

O diagnostico da dypsomania completa-se se se teem observado outros syndromas episó­dicos.

Dissemos que este estygma psychico era tributo, principalmente do sexo feminino. Se­gundo Magnan, sempre o appetite depravado das bebidas que as mulheres gravidas teem, é um primeiro accesso de dypsomania. Elle cita uma observação em que se pôde notar as phra­ses delirantes d'uma dypsomaniaca, a primeira das quaes consistia na necessidade apenas de beber uma quantidade muito grande de vinho, a ultima sendo uma impulsão suicida.

Se o doente não está de posse de uma forte herança de miséria nervosa, não só os accessos são espaçados, mas é de crer que beneficie, se o submetterem a elle, de um tratamento me-

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thodico, que o poupe ao menos aos effeitos da intoxicação alcoólica. Se no doente, porém, con­verge toda a série de causas que se apontam n,a producção da degenerescência, os accessos amiudam-se, e a intoxicação revela-se por ca­racteres que tornam incerto o diagnostico se a historia do doente, e sobretudo estygmas phy-sicos, não denunciarem o segredo do mal.

O tratamento da dypsomania consiste ape­nas em combater os effeitos alcoólicos e evitar que o doente beba.

A acção do alcool sobre a economia é tão complexa que mal cabe aqui foliar d'ella, por isso só diremos que é preciso observar as per­turbações somáticas já produzidas e comba-tel-as por um tratamento ad hoc.

Para realisar a segunda indicação, conhe-ce-se um meio efficaz, que é a sequestração, privando o doente de bebidas, aonde quer que as haja, aonde quer que o doente fique impossibilitado de as procurar. Escusado será dizer que todo o tratamento moral, os conse­lhos, as distracções, o medo, as promessas, a sugestão, nenhum resultado dão.

O doente tirará resultado, comtudo, de uma boa hygiene e de uma medicação tónica e re­constituinte.

Se sobrevem excitação e que a insomnia persiste recorra-se aos banhos tépidos, prepa­rados com infusão de plantas antispasmodicas, a tilia, a figueira do enfermo, etc., e ao uso in­terno dos polybrometos.

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Se pelo contrario sobrevier depressão, estão indicados os banhos sulfurosos, ou os banhos de ar quente (therebentinados seguidos de uma immersão em agua fria ou de uma douche em leque fria.

A hydrotherapia methodicamente applicada, particularmente as douches frias sobre todo o corpo, com excepção da cabeça, é de grande proveito.

É de aconselhar o uso de todas as substan­cias que, sendo alimentos de poupança, modi­fiquem favoravelmente a nutrição. Está n'este caso o arsénico.

E n'este tratamento se persistirá até que o clinico incertamente dè o alienado como capaz de sahir do hospicio de reclusão.

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PROPOSIÇÕES

Anatomia — A laryngé é uma porção da tra­chea modificada.

Physiologia—A urina deve ser considerada como um producto excrementicio resultante da acção da dyalise renal sobre a massa plasmá­tica sanguínea.

Materia medica — Na anesthesia local prefiro a cocaína.

Anathomia pathologica— Os tumores são de­vidos a anomalias de desenvolvimento cellular.

Pathologia geral — A febre é um effeito da in­toxicação por matérias orgânicas animaes nor-maes ou pathologicas alteradas ou não.

Pathologia interna — A loucura choreica é a manifestação na occasião da corea da degene­rescência do apparelho psychico.

Pathologia externa — A possibilidade de dis-trophia não contra-indica as resecções.

Operações —O tratamento post-operatorio das resecções deve ser feito por meio de um penso que fique no seu logar ao menos vinte dias.

Partos — Na cura da eclampsia não se deve intervir por meio do aborto.

Medicina legal — Pronuncio-me pela irrespon­sabilidade absoluta dos dypsomaniacos.

Visto, Imprima-se. Dr. Souto,

Dr. José Carlos. director interino.