metodologia ebook sesi gomes,chris.2005

93
Christianne Luce Gomes Maria Teresa Marques Amaral Brasília, 2005 Metodologia da pesquisa aplicada ao lazer Estudos Avançados do Lazer Estudos Avançados do Lazer Metodologia da Pesquisa Aplicada ao lazer Aplicada ao lazer Metodologia da Pesquisa

Upload: andrechacacapi

Post on 12-Aug-2015

97 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

Christianne Luce GomesMaria Teresa Marques Amaral

Brasília, 2005

Metodologia da pesquisa aplicada ao lazer

�����������

����������

EstudosAvançadosdo Lazer

EstudosAvançadosdo Lazer

Metodologia da PesquisaAplicada ao lazerAplicada ao lazerMetodologia da Pesquisa

Page 2: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005
Page 3: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

Metodologiada Pesquisa Aplicada ao Lazer

Page 4: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia

Ocupacional

Pablo Juan GrecoDiretor

Luciano Sales PradoChefe do Departamento de Educação Física

Christianne Luce GomesCoordenadora Pedagógica do CELAR

Hélder Ferreira IsayamaCoordenador Administrativo do CELAR

Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa

José Nagib Cotrim ÁrabeDiretor Executivo

Confederação Nacional da Indústria - CNI

Armando de Queiroz Monteiro NetoPresidente

Serviço Social da Indústria - SESI

Jair MeneguelliPresidente do Conselho Nacional

SESI - Departamento Nacional

Armando de Queiroz Monteiro NetoDiretor

Rui Lima do NascimentoDiretor-Superintendente

Mariana RaposoDiretora de Operações

Universidade Federal de Minas Gerais

(UFMG)

Ana Lúcia Almeida GazzolaReitora

Marcos Borato VianaVice-Reitor

Jaime Arturo RamirezPró-Reitor de Pós Graduação

Edison José CorrêaPró-Reitor de Extensão

Page 5: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

Christianne Luce GomesMaria Teresa Marques Amaral

Brasília, 2005

Estudos Avançados do Lazer

Metodologia da Pesquisa Aplicada ao Lazer

Page 6: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

© 2005. SESI – Departamento Nacional

Nota sobre o Módulo

Este livro didático integra o Programa de Educação Continuada em Lazer e foi elaborado para subsidiar o desenvolvimento da

Monografia de Conclusão do Curso de Especialização em Estudos Avançados do Lazer.

Nota sobre as autoras

Christianne Luce Gomes, docente e pesquisadora da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG, é

coordenadora pedagógica do Centro de Estudos de Lazer e Recreação (Celar) e líder do grupo de pesquisa Lazer e Sociedade

(Plataforma Lattes – CNPq). É especialista em lazer e doutora em educação pela UFMG. Editora da Revista Licere e autora de seis

livros, dentre os quais o Dicionário crítico do lazer (Autêntica Editora, 2004).

Maria Teresa Marques Amaral, docente e pesquisadora da Faculdade de Educação da UFMG, licenciada em filosofia pela UFMG,

mestre em educação, doutoranda do Programme PhD Fondements en l’Éducation _ Faculté des Études Supérieures Université

de Montréal, Quebec, Canadá. Coordenadora da Cátedra de Educação a Distância da Unesco na FAE/UFMG; coordenadora

do Projeto Seiva: Sistema de Educação Interativa para a Formação de Tutores. Autora do módulo Metodologia da Pesquisa para o

Projeto Unirede, artigos e capítulos sobre história da ciência e epistemologia.

SESIServiço Social da Indústria-Departamento NacionalUniversidade Corporativa do SESI/UniSESISetor Bancário Norte Quadra 1 – Bloco CEdifício Roberto Simonsen70040-903 – Brasília – DFTel. (61) 3317-9480Fax. (61) 3317-9429E-mail: [email protected]://www.unisesi.org.br

G633m

Gomes, Christianne Luce. Metodologia da pesquisa aplicada ao lazer / Christianne Luce Gomes, Maria Teresa Marques Amaral – Brasília: SESI/DN, 2005. 89 p. : il. ; 21 cm.

ISBN 85-88199-96-3

1. Metodologia Cientifica 2. Ciências Sociais I. Título II. Amaral, Maria Teresa Marques

CDU 001.8

Page 7: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

Apresentação

Unidade 1 – O processo de pesquisa: dimensão compreensiva, 13

1.1 Do senso comum à atitude científica, 171.2 O problema como ponto de partida, 221.3 O projeto de pesquisa e a monografia, 261.4 Relação entre o tema e o problema de pesquisa, 281.5 Os objetivos, 301.6 As hipóteses, 321.7 Base teórico-conceitual da pesquisa, 34

Unidade 2 – O processo de pesquisa: dimensão metodológica, 39

2.1 Abordagens de pesquisa: a questão da intercomplementariedade, 42 2.1.1 A abordagem quantitativa e seus limites, 48 2.1.2 A abordagem qualitativa e seus dilemas, 52 2.1.3 A questão dos critérios na pesquisa qualitativa, 562.2 As regras do jogo, 60

S U M Á R I O

Page 8: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2.3 Tipos de pesquisa, 632.4 A coleta de dados, 732.5 A análise e a interpretação dos dados, 782.6 O ponto de chegada: conclusão da pesquisa, 80

Referências, 85

6

Page 9: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

C ara aluna, caro aluno,

Gostaríamos de começar essa conversa lembrando o poema “O guardador de rebanhos”, de Alberto Caeiro, um dos heterônimos do poeta Fernando Pessoa:1

O meu olhar é nítido como um girassol.

Tenho o costume de andar pelas estradas

Olhando para a direita e para a esquerda,

E de vez em quando olhando para trás…

E o que vejo a cada momento

É aquilo que nunca antes eu tinha visto,

E eu sei dar por isso muito bem…

Sei ter o pasmo essencial

Que tem uma criança se, ao nascer,

Reparasse que nascera deveras…

Sinto-me nascido a cada momento

Para a eterna novidade do Mundo.

A P R E S E N TA Ç Ã O

1 PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986.

Page 10: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

A expressão “eterna novidade do mundo” pode ter várias interpretações. No âmbito da metodologia da pesquisa, seria interessante vê-la como uma atitude de estranhamento, mas também de deslumbramento pelo fato novo, que o autor denomina “pasmo essencial”. Estes serão também nossos desafios: olhar, investigar e transformar nosso olhar. Para isso, precisamos fazer escolhas e decidir caminhos, especialmente quando nos engajamos no processo de construção de conhecimentos sobre o lazer, essência deste livro didático.

Neste curso de especialização, você tem a oportunidade de aprofundar conhecimentos sobre o lazer e levantar questionamentos, sendo desafiado a rever conceitos, superar dificuldades e desvelar possibilidades nessa área de estudos e de intervenções profissionais. Esses são alguns dos elementos que poderão contribuir com sua pesquisa monográfica, cujo desenvolvimento requer um tratamento rigoroso e sistemático. Denominamos esse processo de investigação científica.

A investigação científica é uma atividade que busca, em princípio, colocar em dúvida, criticar e analisar teorias e as maneiras de pensar preconizadas pela maioria. Ela pode também contestar um conjunto de verdades até então consideradas incontestáveis. Ao duvidar, é-nos permitido transgredir buscando estratégias renovadoras, produzindo saberes que fogem aos padrões costumeiros. Portanto, a investigação sistematizada, sobretudo quando coloca em foco práticas profissionais cotidianas, como o lazer, devem transgredir os conhecimentos patenteados e puramente especulativos e ir além, buscando novas idéias, propondo novas hipóteses a fim de tentar novas soluções, firmes e coerentes do ponto de vista epistemológico. Para isso, é necessário assumir o papel de “pesquisador”.

No entendimento de Bunge (1983), o “pesquisador” é um profissional que reflete sobre sua prática e produz novos conhecimentos. O autor dá-nos algumas dicas para isso:

Comece por abordar problemas modestos, mas aponte para problemas ambiciosos. A modéstia inicial é necessária em razão da escassez de conhecimentos (sic), mas não se passa a vida no jardim de infância. Modéstia não é o mesmo que incapacidade. Comece abordando um assunto bem circunscrito, talvez até distante, com o objetivo final de

Page 11: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

ampliá-lo ou de abordar eventualmente problemas inéditos. Comece averiguando o que pensa um grande teórico X sobre o problema Y e trate de pensar com sua própria cabeça sobre o problema Y.2

Em vez de sermos meros reprodutores, Bunge (1983) instiga-nos a assumir o papel de produtores de conhecimento. Esse encaminhamento é fundamental para promovermos o avanço do campo de estudos sobre o lazer no país, conforme apontado por Gomes e Melo (2003). Ao discutir trajetórias de estudos e possibilidades de pesquisa para o lazer no Brasil, os autores citam alguns desafios, dentre os quais selecionamos aqueles que têm uma relação com o processo de pesquisa:

(a) Dar continuidade ao processo de qualificação da produção teórica na área do lazer, carente de análises criteriosas e de argumentos consistentes. Um passo para isso poderia ser dado mediante questionamentos sobre a preponderância de determinados entendimentos reproduzidos como soluções definitivas, o que nos indica que o processo de construção de conhecimento é dinâmico e sempre inacabado.

(b) Promover experiências refletidas com qualidade, que possam estar articuladas com o cotidiano e auxiliem o redimensionamento das compreensões teóricas adotadas. Esse pressuposto evidencia que podemos pesquisar a prática cotidiana, sendo imprescindível observar os parâmetros científicos para não nos restringirmos ao “senso comum”.

(c) Ampliar as redes de troca de experiências entre estudiosos, profissionais e pesquisadores nacionais e internacionais, estabelecendo diálogos com quem estuda o lazer a partir de diversos enfoques e olhares. Essa necessidade mostra-nos que é essencial explorar os conhecimentos sobre o lazer, o que implica estar sempre atualizado, acompanhando os estudos, as pesquisas, os projetos e as publicações na área.3

2 BUNGE, M. Epistermologia: curso de atualização. São Paulo: Edusp, 1980.3 GOMES, Christianne Luce; MELO, Victor A. Lazer no Brasil: trajetória de estudos, possibilidades de pesquisa. Rev. Movimento, Porto Alegre, v. 9, n.1, p.23-44, jan./abr. 2003.

Page 12: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

Certamente, essas metas podem ser conquistadas a partir de várias frentes, e, em especial, pela realização de pesquisas na área do lazer. Ao ingressar no curso de especialização, você estabeleceu o compromisso de desenvolver um trabalho monográfico, que é um pré-requisito para a conclusão do curso. Portanto, ao realizar uma monografia bem fundamentada e cientificamente consistente, você poderá colaborar com o alcance desses objetivos.

Como sugerem os quadrinhos a seguir, esse é um exercício muito “arriscado”:4

Obviamente, o diálogo anterior apresenta uma visão distorcida de cultura (entendida como sinônimo de conhecimento acumulado). Contudo, como afirmava Francis Bacon, “conhecimento é poder”, evidenciando a importância e os “perigos” decorrentes do investimento na construção do saber. Afinal, ao ampliarmos nosso conhecimento sobre um determinado assunto, passamos a duvidar mais, a questionar, a criticar e a rever princípios, conceitos e teorias já cristalizados, o que aumenta nossa responsabilidade perante a sociedade em que vivemos.

Esta obra foi preparada com o intuito de auxiliar você a superar mais esse desafio. Por essa razão, nosso interesse pela metodologia da pesquisa aplicada ao lazer não se

4 QUINO. Toda Mafalda, da primeira à última tira. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p.16.

Page 13: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

resume às questões conceituais, tendo também uma preocupação instrumental: os debates são, antes de tudo, estratégicos, no sentido de colaborar com a realização de sua monografia. Dessa maneira, você verá que a produção do conhecimento científico abrange duas dimensões inseparáveis: a compreensiva (de conteúdo) e a metodológica (operacional). De certa maneira, esses serão os assuntos tratados, respectivamente, nas duas unidades que compõem este livro.

Bom trabalho!

Page 14: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005
Page 15: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

O processo de pesquisa: dimensão compreensiva

Unidade

Page 16: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

15

Page 17: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

15

Como afirmam os especialistas, pesquisar aprende-se mediante o próprio fazer e nada poderia substituir essa prática, mesmo porque muitas situações inusitadas esperam pelo pesquisador no decorrer dos variados momentos de seu trabalho, e os possíveis encaminhamentos a serem seguidos não estão previamente decodificados (e nem poderiam estar) em algum manual.

Algumas interrogações sobre o processo da pesquisa vêm, ao longo da sua história, ocupando diversos profissionais das áreas das ciências humanas e sociais e coloca algumas questões: é uma simples técnica que todos podem utilizar, ou chega a constituir um conhecimento de forma específica? Como hoje concebemos a pesquisa? Quais são os pré-requisitos para a produção do conhecimento denominado científico?

Estamos trabalhando preferencialmente para obter informações consistentes e rigorosas sobre um tema que nos ajudem a construir um campo específico de forma independente com objeto e método próprios e com exigências particulares, também marcadas pelo operacional.

A pesquisa, em suas várias possibilidades, coloca-se em um palco complexo, marcado por desafios entre o observado e o registro, entre as situações vividas pelo indivíduo e as vividas coletivamente, entre a narração do depoente e a interpretação do pesquisador, entre a objetividade e a subjetividade de quem faz a pesquisa.

U N I DA D E 1 - O P R O C E S S O D E P E S Q U I S A : D I M E N S Ã O C O M P R E E N S I VA

Page 18: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

1616 17

O campo do lazer convive com muitas contradições, evidenciando a necessidade de ponderarmos sobre elas, especialmente sobre a relação objetivo/subjetivo. Quando as ciências humanas e sociais começaram a produzir conhecimentos, estes foram questionados pelos cientistas, que tradicionalmente desenvolviam pesquisas experimentais, alegando que era impossível produzir conhecimento científico em campos tão pouco controláveis. Afinal, como confiar na fidedignidade dos dados?

Em geral, não há um consenso entre os autores no que se refere à classificação das ciências. No Brasil, uma referência é a tabela de classificação das áreas de conhecimento adotada pelo CNPq (www.cnpq.br/areas/tabconhecimento/index/htm), que também vem sendo repensada. Consulte este site e procure identificar em quais áreas você acredita que as pesquisas sobre o lazer poderiam ser desenvolvidas.

Um dos grandes feitos da história, a partir de então, foi produzir formas de lidar com as peculiaridades dos objetos a serem trabalhados. Isso aparece de modo mais ou menos enfático nas pesquisas realizadas nas ciências humanas e sociais, denunciando direta ou indiretamente o conhecimento comprometido com os poderes instituídos. Essa crítica foi relevante e contribuiu para a renovação das pesquisas em seu conjunto. Graças a essa postura, a pesquisa em ciências humanas e sociais foi definindo seu duplo compromisso político: com a democratização do saber e com o direito ao saber, que garantiu o registro de opiniões diferentes sobre temas diversos e até marginais dentro do quadro clássico de produção científica. Esse novo horizonte descortinou algumas possibilidades para o desenvolvimento de estudos científicos sobre o lazer, notadamente a partir da segunda metade do século XX.

Não vamos recontar toda essa história, apenas apontar as possibilidades de realização dessas pesquisas, que passaram a contemplar novos objetos. O que se viabiliza com essa nova postura é que vários caminhos se abrem para os estudos sobre o lazer, que precisam ser abordados de forma rigorosa e sistemática, superando o senso comum e caminhando em direção à atitude científica.

Page 19: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

1616 17

1.1 Do senso comum à atitude científica

Historicamente, vários pensadores se preocuparam com a questão do “senso comum”, ou “conhecimento popular”. Desde a Grécia antiga, a distinção entre mito e razão foi objeto de preocupação de filósofos. A pergunta é simples na formulação, porém complexa na resposta: até onde estamos mergulhados pura e simplesmente no mundo da vida, e até onde conseguimos problematizar esse cotidiano e dele nos afastarmos de forma suficiente para ter uma visão mais nítida da realidade e, com isso, produzir conhecimento?

Enquanto o senso comum está baseado no conhecimento imediato, a atitude científica tem por base a problematização. Poderíamos ficar nesse debate por um longo tempo, mas consideramos importante desvendar essa questão da forma mais simples possível, distinguindo esses dois tipos de conhecimento. Para isso, vamos recorrer a Chauí, especialmente em seu livro Convite à filosofia.

Este livro está totalmente disponível na internet. Caso você queira conhecê-lo e aprofundar seu conhecimento, acesse o site: http://pfilosofia.fateback.com/03_filosofia/filosofia.htm.

No capítulo sobre a ciência, a autora inicia o debate indagando:

O Sol é menor do que a Terra. Quem duvidará disso se, diariamente, vemos um pequeno círculo avermelhado percorrer o céu, indo de leste para oeste? O Sol se move em torno da Terra, que permanece imóvel. Quem duvidará disso, se diariamente vemos o Sol nascer, percorrer o céu e se pôr? A aurora não é o seu começo e o crepúsculo, seu fim? As cores existem em si mesmas. Quem duvidará disso, se passamos a vida vendo rosas vermelhas, amarelas e brancas, o azul do céu, o verde das árvores, o alaranjado da laranja e da tangerina?

Poderíamos denominar esse saber de conhecimento espontâneo. Mas por que o designamos “senso comum”? Porque consideramos o fato de ele trazer, em sua

Page 20: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

1818 19

essência, características globais daquilo que chamamos conhecimento comum dos homens, geralmente construído de modo imediato, a partir da observação, das experiências, das vivências, das atividades humanas. Essa imediatidade é dada, sobretudo, pelo fato de a realidade vivida não ser transparente à percepção humana, isto é, pelo fato de as ações humanas e de os fenômenos em geral se apresentarem aos homens como dados acabados, como resultado e não como um processo de relações complexas e contraditórias. Daí a apreensão empírica das coisas, a aparência de estático, de imutável das relações. Além disso, há o fato de o senso comum apreender apenas o “aparente”, a “sombra”, aquilo que lhe parece “óbvio” como sendo o real.

Empirismo: Conhecimento pelos sentidos, pela experiência sensível. Fala-se em pesquisa empírica quando ela se apóia no exame sistemático do real ou o submete à experiência (Laville e Dionne, 1999).

Porém, o senso comum não é algo desprezível e não deve ser confundido com ignorância, pois trata-se do saber cotidiano disponível, com o qual organizamos o nosso dia-a-dia. É um saber acumulado que orienta as nossas ações, mas, obviamente, esse saber reveste-se de tradições, valores, preconceitos, tabus e crendices. Será que a atitude científica é o contrário de tudo isso? Em que medida a atitude científica se distingue do senso comum?

Você pode recorrer à obra de Chauí para aprimorar a distinção entre senso comum e ciência.

De acordo com Chauí, a ciência distingue-se do senso comum porque enquanto este representa uma opinião baseada em hábitos, preconceitos e tradições cristalizadas

Page 21: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

1818 19

a primeira baseia-se em pesquisas, investigações metódicas e sistemáticas. Ademais, a ciência pauta-se na exigência de que as teorias sejam internamente coerentes e digam a verdade sobre a realidade. Assim, ciência é conhecimento que resulta de um trabalho sistemático, analítico e racional.

A crítica ao senso comum é, pois, um caminho para o conhecimento científico e tem a finalidade de romper com as idéias dominantes arbitrariamente inculcadas e disseminadas entre os indivíduos. Apesar de tudo, não nos podemos esquecer de que todos estamos, irremediavelmente, imersos no mundo da vida. Nossa experiência é toda ela experiência do mundo. Analisando e comparando as duas atitudes, podemos percebê-las totalmente diferenciadas, mas não podemos eliminar o senso comum e tomar uma decisão de pensar de forma totalmente racional.

Segundo Gramsci, na obra Concepção dialética da história, não existe diferença de qualidade entre senso comum, filosofia e ciência, como se os dois últimos fossem melhores que o primeiro. A diferença é de sistematização, de ordenamento lógico. Entretanto, todos esses conhecimentos têm a mesma natureza, isto é, são representações da realidade.

Podemos afirmar, com isso, que os fatos ou objetos científicos não são dados empíricos espontâneos de nossa experiência cotidiana: eles são formulados, ou seja, construídos pelo trabalho de investigação científica. A construção é uma operação contínua em busca da “verdade”, nunca considerada acabada. A partir do momento em que se conseguiu desprender o objeto da situação problemática na qual se encontrava, ele não tarda a suscitar, por seu próprio funcionamento, novas questões e objetos de pesquisa.

Em geral, que objetos de estudo você acredita que um pesquisador deve investigar?

Essa indagação desafia profundamente o campo do lazer, geralmente considerado objeto irrelevante no meio acadêmico. Magnani (2000) relatou as dificuldades que enfrentou por eleger o lazer como objeto de estudo no seu doutoramento. Ordinariamente, acredita-se que existem questões mais nobres e importantes a serem investigadas, o que revela um grande preconceito acerca do lazer.

Page 22: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2020 21

Apesar da permanente necessidade de justificação como objeto relevante de pesquisa, felizmente esse quadro começou a se alterar na sociedade contemporânea, como evidencia o crescimento dos grupos de estudos e das pesquisas sobre o lazer, dos trabalhos apresentados em congressos científicos, simpósios e seminários, bem como sua inserção em programas e currículos de vários cursos, em diversos âmbitos e níveis. Essas e outras iniciativas facilitaram uma aproximação do lazer aos parâmetros científicos legitimados em nosso meio.

No diretório de grupos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq – www.cnpq.br) existem cadastrados, atualmente, 84 grupos de pesquisa sobre o lazer, número bastante expressivo. Esses grupos contam com a participação de pesquisadores de diversas áreas do conhecimento: educação física, turismo, administração, educação, antropologia, etc.

A questão do que seja ou não “científico” é muito controversa e instiga calorosos debates. Tal constatação evidencia que a dúvida constitui o cerne da ciência, e a curiosidade, seu principal foco. Descartes, no livro Discurso sobre o método, explica a dúvida como necessidade radical. A dúvida metódica é uma regra da pesquisa científica muito difícil de ser vivida no cotidiano, mas essencial ao progresso do conhecimento. Mesmo as proposições mais brilhantes são relativas às condições de possibilidade de suas aplicação e, justamente por essa razão, estão sujeitas a revisões periódicas.

Demo (1994), baseado em Habermas, também destaca que é impossível fazer ciência sem duvidar e estabelecer polêmica, e, mesmo com as controvérsias que a rondam, existem acordos que, tradicionalmente, permanecem. Como exemplo, podemos citar alguns pressupostos da pesquisa científica: o questionamento, a sistematização, a lógica, a argumentação, a análise e o rigor.

A pesquisa sobre qualquer tema, dentre os quais o lazer, precisa assentar-se sobre esses pilares. A não-observância desses princípios compromete a legitimidade científica do trabalho, ficando este à mercê do senso comum ou da ideologia. Do

Page 23: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2020 21

primeiro, quando se reveste de ingenuidade, uma vez que aceita sem discutir, não aplica ao conhecimento nele implicado suficiente sistematização questionadora. Da segunda (ideologia), quando enfatiza o compromisso político de defesa de posições, que lança mão de todos os recursos possíveis para justificar condições que se deseja preservar, conformar, reduzir, ampliar, impor, distorcer ou ocultar. Sua relação básica é estabelecida com o exercício do poder. Contudo, assim como a ciência, a ideologia também pode ser questionadora, mas para justificar seus interesses. Por isso é preciso ter bastante cuidado ao definir o tema e o objeto de estudo (Demo, 1994).

A título de ilustração, podemos citar alguns trabalhos que pretendem pesquisar a importância do lazer na vida do trabalhador (ou do cidadão em geral), mas limitam-se a ressaltar os benefícios que algumas práticas recreativas podem promover: na recuperação da força de trabalho, na redução do número de acidentes e dos níveis de absenteísmo, no aumento da produtividade, na manutenção da ordem e na promoção de valores morais, educativos e sociais. Será que esses “benefícios” indicam realmente a importância do lazer na vida do grupo investigado, ou refletem interesses externos a ele?

Vejamos mais um exemplo: quando as investigações assumem o caráter de “pesquisas de opinião”, ficam limitadas ao senso comum, e, por essa razão, não podem ser reconhecidas como científicas. É o caso, por exemplo, de estudos que pretendem verificar a concepção de lazer das pessoas em geral. Encaminhamento muito complicado, porque, se a pesquisa ficar restrita à opinião, não irá além do senso comum – conseqüentemente, não irá promover avanço no conhecimento.

Dessa forma, podemos observar que o questionamento característico do senso comum ou da ideologia é bem diferente da atitude científica, por ser esta analítica, sistemática, metódica e rigorosa.

Assim, fazer ciência é

[...] questionar com rigor, na acepção precisa de atitude sistemática cotidiana, não de resultado esporádico, estereotipado, especial. Ademais, a ciência não se basta com formalidades consideradas exemplares, como o uso da lógica. [...] Até mesmo o senso comum usa de lógica, tal qual a ideologia sagaz, que sempre busca emergir como necessidade lógica (Demo, 1994, p.17).

Page 24: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2222 23

Como postulou Habermas (1987), no livro Conhecimento e interesse, somente pode ser científico o que for discutível, o que implica ir além de meras reproduções do conhecimento já acumulado e construído. O avanço e a capacidade de inovação não advêm da repetição, e sim da discussão. Mas não basta que a ciência seja crítica, ela também precisa ser criativa – preenchendo lacunas, descortinando novas possibilidades, apontando outros aportes, caminhos e interpretações num infindável processo de busca e pesquisa, de construção e reconstrução.

Sendo um processo de busca, a discordância crítica pode ser bem-vinda, desde que não seja apenas para sustentar posições contrárias ou se manter cegamente fiel a uma determinada teoria ou corrente de pensamento. Todavia, para divergir é necessário, primeiramente, deter conhecimento profundo sobre o ponto questionado. Vale lembrar que uma resposta divergente, por mais consistente e aprimorada que seja, não encerra a discussão: apenas a recoloca, acrescentando novos elementos ao debate. Qualidade formal e autocrítica sistemática são, portanto, condições básicas para formar uma atitude científica.

A marca distintiva da atitude científica é o questionamento sistemático, que valoriza principalmente os processos de elaboração argumentativa e de reconstrução metódica (consistente e coerente), sistemática, crítica e criativa do conhecimento.

1.2 O problema como ponto de partida

Neste momento, daremos continuidade à discussão tratando do ponto de partida para qualquer pesquisa: o problema.

Entretanto, como você poderá verificar, o “problema” não é privilégio das pesquisas, estando presente em nossa prática cotidiana. Valendo-se da linguagem humorística, os quadrinhos a seguir revelam-nos a presença e a dimensão do(s) problema(s) em nosso dia-a-dia (Quino, 1997, p. 404).

Page 25: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2222 23

Além disso, Rizzini, Castro e Santos (1999, p. 26) advertem-nos que:

[...] Problema é um termo que pode ser usado com uma grande variedade de sentidos no linguajar cotidiano. Em todos esses usos, no entanto, problema é um dado imediato: ou identificamos um problema, ou alguém causa problemas, ou algo é problema, enfim, não precisamos de grandes esforços para chegar ao problema e ele nos parece sempre evidente.

Considerando sua pluralidade de sentidos, podemos recorrer ao trabalho de Teixeira (2003) para diferenciar o problema da prática do problema de pesquisa. A autora destaca que o “problema da prática” refere-se, em geral, às dificuldades, aos desconfortos e/ou complicações presentes em nosso dia-a-dia, nos lugares, nas situações e nos contextos em que nos encontramos. Em geral, são os fatos que nos incomodam, os empecilhos, os desafios que temos a enfrentar e uma infinidade de coisas difíceis que aparecem em nosso trabalho, questões que precisam ser resolvidas, superadas ou solucionadas.

Embora o “problema da prática” seja freqüentemente a origem do “problema de pesquisa”, eles são diferentes (Teixeira, 2003). Como visto, o “problema de pesquisa” é formulado pelo pesquisador, além de apresentar-se e expressar-se de modo diferente do “problema da prática”: enquanto nós o vemos e o sentimos, o

“problema de pesquisa” é construído, é pensado pelo pesquisador.

Page 26: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2424 25

Para aprofundar um pouco mais sobre a questão do problema de pesquisa, imaginemos que um profissional do lazer esteja fazendo um projeto para um trabalho de intervenção. Até aqui, o profissional não tem um problema de pesquisa: tem, antes, o desafio de desenvolver bem o seu trabalho. Contudo, se ele acrescentar a este trabalho uma questão analítica para estudo, formulando um problema de pesquisa, seu projeto de trabalho no cotidiano profissional poderá impulsionar a realização de uma pesquisa.

Como assinala Bachelard (1996, p.18):

Em primeiro lugar, é preciso saber formular problemas. E, digam o que disserem, na vida científica os problemas não se formulam de modo espontâneo. [...] Todo conhecimento é resposta a uma pergunta. Se não há pergunta, não pode haver conhecimento científico.

A definição do problema de pesquisa, que podemos chamar, também, de questão analítica, diferentemente do problema da prática, supõe a formulação de boas perguntas que podem nos dar bases e elementos para pensarmos, entendermos e, posteriormente, atuarmos tentando solucionar o problema da prática ou propor novas soluções para os desafios da realidade cotidiana. De acordo com Teixeira (2003), um profissional terá melhores condições para enfrentar seu problema da prática em relação ao seu ambiente de trabalho à medida que, por meio de suas interrogações, conseguir entender como e por que acontecem.

O problema de pesquisa procura entender, desvelar, compreender ou destrinchar o que se passa na realidade, em relação a um problema da prática ou a um desafio a ela relacionado. Teixeira (2003) aponta que o problema de pesquisa é uma questão analítica, que tenta estabelecer relações entre fatos, que analisa os processos que constituem os fatos e os fenômenos, tentando compreender suas configurações, suas determinações e processualidades, tentando entender seus significados e/ou as formas como se processam.

De acordo com Laville e Dionne (1999), a construção de um bom “problema de pesquisa” supõe a formulação de boas perguntas, de perguntas significativas e relevantes para a análise e a compreensão dos fatos e dos fenômenos estudados.

Page 27: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2424 25

Algumas perguntas podem auxiliar esse exercício: Qual a origem de uma dada situação ou problema? Quais as possíveis causas de um determinado problema, dificuldade ou situação? A quem tal dificuldade atinge e de que modo? Essa situação relaciona-se com quais outras ou com que fatos ou circunstâncias? Como essa situação ou dificuldade se constitui? Que processos os produzem? Quais são os aspectos, as dimensões e os fatores que interferem na pesquisa?

Em suma, as boas perguntas começam a formar o esboço do problema de pesquisa, que pode conter uma única questão analítica ou um conjunto de questões, de aspectos, de dimensões ou de facetas do problema da prática ou da situação considerada.

Muitas vezes, a elaboração de boas perguntas pode exigir uma análise prévia da situação e até mesmo uma espécie de pesquisa ou estudo anterior. Isso quer dizer que a construção, a definição ou a formulação do problema de pesquisa podem gerar a necessidade de explorar preliminar e informalmente a situação, para possibilitar a formulação de um conjunto completo de boas perguntas de estudo, ou seja, de uma problematização fecunda e adequada.

Para atender ao objetivo da investigação, Laville e Dionne (1999) sugerem uma série de reflexões que ajudariam a construir o problema que pode se tornar seu objeto de pesquisa.

Para formular seu problema de pesquisa, procure refletir sobre as seguintes questões:

• Por que este problema merece ser pesquisado?

• Que benefícios podem ser obtidos com a pesquisa em relação à situação original?

• Já se pode vislumbrar o que seria desejável obter como explicação, compreensão e informações após se ter estudado o problema? Em outras palavras, você já tem em vista uma hipótese para ser explorada?

Page 28: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2626 27

Um problema bem definido e bem construído pode gerar uma boa pesquisa, enquanto um problema mal delimitado pode dificultar e prejudicar a qualidade da investigação. Construir um problema de pesquisa é tarefa do pesquisador, e os problemas não estão prontos para ser investigados. De acordo com Laville e Dionne (1999), eles são criados pelo pesquisador para serem pesquisados, embora sempre partam de situações ou de problemas existentes no mundo da natureza ou da cultura, da sociedade, da vida social.

Essa primeira etapa do planejamento de uma investigação é tão importante que será retomada. Antes, contudo, consideramos essencial esclarecer alguns aspectos relacionados ao projeto de pesquisa e à monografia que você deverá desenvolver neste curso de especialização.

1.3 O projeto de pesquisa e a monografia

No tópico 1.1, você teve a oportunidade de refletir sobre o senso comum, compreendendo as razões que o diferenciam do conhecimento científico.

Daremos continuidade ao processo apontando, inicialmente, as características de um projeto de pesquisa, que é a primeira etapa para obter um conhecimento sistematizado acerca da realidade. Ou seja, o projeto é a “espinha dorsal” que irá orientar o desenvolvimento de seu trabalho monográfico. Assim, o projeto de pesquisa consiste em um documento que explicita as ações que serão realizadas ao longo do estudo.

O projeto deve possuir uma seqüência lógica, e todas as fases da pesquisa precisam estar entrelaçadas e direcionadas para o mesmo objetivo. Assim, o projeto de pesquisa precisa responder às seguintes perguntas:

1. O que fazer? (tema e problema)

2. Por que fazer? (justificativa)

3. Para que fazer? (objetivo)

Page 29: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2626 27

4. Onde fazer? (campo da pesquisa)

5. Como fazer? (metodologia)

6. Com o que fazer? (recursos)

7. Quando fazer? (cronograma, especificando quando é que cada ação será desenvolvida)

Apesar de os itens anteriores não destacarem a questão da fundamentação teórica, é essencial que se tenha em mente que não existe pesquisa sem teoria. Portanto, será necessário lançar mão do conhecimento produzido na área do lazer para fundamentar seu projeto e a pesquisa como um todo.

Que tal discutirmos essa questão de modo mais detalhado? Nossa proposta é tecer considerações que envolvam a produção do trabalho monográfico como um todo, e não contemplar apenas a estrutura de um projeto de pesquisa. Mas partimos do pressuposto de que você já sabe que uma monografia só será bem desenvolvida a partir do momento em que você conseguir planejar as ações, e por essa razão a composição de um projeto de pesquisa torna-se essencial.

Segundo Teixeira (2003), em geral, o processo de elaboração de uma pesquisa envolve três etapas distintas, porém indissociáveis, quais sejam: (1) o planejamento da investigação, no qual é construído o processo de pesquisa; (2) a realização da pesquisa planejada; (3) a redação do relatório final do estudo, isto é, o texto da monografia propriamente dita. Cada uma dessas etapas envolve um conjunto de atividades específicas. Chamamos de estrutura básica de pesquisa – e, portanto, de monografia – a organização dos elementos que orientam a reflexão e a prática do pesquisador na construção e no estudo do problema investigado.

Monografia é uma dissertação ou estudo minucioso que se propõe a desenvolver determinado problema relativamente restrito. Em outros termos, a monografia é um tipo de trabalho científico sobre um único problema, composta por três partes: introdução (que contempla a problematização, justificativa do estudo, hipótese e objetivo), desenvolvimento (composta pela fundamentação teórica e metodológica,

Page 30: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2828 29

que permite planejar e desenvolver o estudo por meio da coleta/análise dos dados) e conclusão (que abarca, além da resposta ao problema de pesquisa, perspectivas de avanço no campo de estudo), seguida das referências bibliográficas citadas no trabalho, conforme as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas

– ABNT (França e Vasconcellos, 2004). Em suma, a monografia é a sistematização escrita de uma pesquisa realizada dentro dos padrões de cientificidade, que trata de desenvolver ou estudar um problema delimitado e construído pelo próprio pesquisador.

Assim, a monografia insere-se no campo da produção dos conhecimentos científicos. Sua elaboração representa os primeiros passos de iniciação nos caminhos da construção da ciência, tornando-o autor de novos saberes. No entanto, a monografia não é um trabalho simples; ao elaborá-la, os estudantes devem ter a colaboração de professores orientadores.

Você poderá estar se perguntando: que assuntos ou temas devem ser estudados, ou ainda que tipos de problemas podem dar origem às monografias do curso de Especialização em Estudos Avançados em Lazer?

Pelo que foi exposto, já devem ter ficado claras, para você, algumas das razões pelas quais a monografia é um tipo de pesquisa científica que envolve o estudo de um problema. Toda pesquisa científica – e, portanto, toda monografia – deve delimitar um objeto de estudo, um problema, por meio de um processo de problematização. Não há pesquisa sem problema, e, dependendo do tipo de questão a ser investigada, dos propósitos e do contexto da investigação, teremos uma ou outra modalidade de pesquisa monográfica, como você verá a seguir.

1.4 Relação entre o tema e o problema de pesquisa

Um problema de pesquisa localiza-se em um campo temático, isto é, encontra-se dentro de um assunto mais amplo. Assim, não devemos confundir o tema da investigação com o problema. A pesquisa não estuda temas, mas sim problemas específicos. Assim sendo, um mesmo tema pode gerar vários problemas de pesquisa,

Page 31: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

2828 29

cada um deles investigado em uma pesquisa específica. Por isso é fundamental a delimitação do problema de pesquisa.

Na linguagem corrente, confunde-se, por vezes, erroneamente, os termos problema e problemática. Você sabe qual é a diferença entre essas palavras? Problemática, na realidade, é o quadro no qual se situa o problema. Não se pode dizer “tenho uma problemática”. Por outro lado, pode-se dizer “essa situação é problemática”, utilizando então a palavra problemática como adjetivo

– especificando eventualmente seu problema e, portanto, estabelecendo uma problemática (Laville e Dionne, 1999).

Para elaborar um “problema de pesquisa”, o passo inicial é fazer um recorte, definir precisamente os aspectos que serão estudados. O que pesquisamos, portanto, são partes de um tema ou um recorte de um assunto. E ao delimitarmos o problema de pesquisa estaremos, também, estabelecendo as fronteiras da investigação (selecionando o que entrará ou não na pesquisa) e orientando os critérios de inclusão–exclusão para a seleção das informações relevantes para a pesquisa.

O problema de pesquisa precisa ser formulado de forma interrogativa, ser claro, preciso e passível de solução.

Essas opções precisam ser justificadas, preferencialmente ressaltando sua relevância. Dessa forma, é importante destacar as motivações que levaram à escolha do tema, situando-o num quadro teórico referencial; especificar o nível de abrangência da pesquisa, salientar elementos inovadores que serão trabalhados pelo pesquisador, bem como a necessidade de realização da pesquisa.

Page 32: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3030 31

De acordo com Denker (2003), a justificativa do estudo poderá conter:

• os motivos que levaram à escolha do tema;

• especificação do nível de abrangência da pesquisa;

• definição clara do que vai ser abordado, bem como dos aspectos a serem considerados;

• referência aos aspectos originais da pesquisa;

• destaque dos elementos inovadores que serão trabalhados pelo pesquisador;

• vínculo do tema com um quadro teórico referencial;

• explanação sobre a viabilidade de execução da proposta;

• relevância, utilidade e necessidade de realização da pesquisa.

No processo de escolha e definição do seu objeto de estudo, é também importante ressaltar a questão da pertinência ao campo do lazer. Ou seja, tanto o tema como o problema da pesquisa precisam ter relação direta com uma determinada área de conhecimento ou campo de estudos. É necessário, desse modo, que você justifique a importância de seu estudo para a área do lazer, destacando as possíveis contribuições que ele irá gerar para o processo de produção de saberes neste campo.

1.5 Os objetivos

Ao tratar do problema de pesquisa, inevitavelmente nós estaremos nos referindo aos objetivos da investigação. Por serem aquilo que se pretende conhecer com a pesquisa, seus objetivos articulam-se estreitamente com as questões de estudo ou com o problema a ser investigado. Em geral, só variam as formas de escrever um e outro: geralmente, o problema é apresentado na forma de indagações, e o(s)

Page 33: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3030 31

objetivo(s), em ações concretas com caráter afirmativo, sendo o verbo comumente colocado no modo infinitivo. Dito de outra maneira, o objetivo e o problema da pesquisa possuem relações estreitas e, em muitos casos, repetem-se.

A seguir você encontrará, como exemplo, algumas informações sobre a problematização e os objetivos da pesquisa de Gomes (2003). Observe como há uma correspondência entre as questões norteadoras do estudo e os objetivos.

O Problema

Gomes (2003) destacou que a obra Lazer operário, de Ferreira (1959), é considerada o primeiro livro brasileiro sobre o lazer, mas esse reconhecimento precisava ser repensado. Na introdução, o próprio Ferreira esclarecia: “Trabalho pioneiro, pois não encontrei outro com o enfoque [sociológico e urbanístico] em que o situamos” (p.10). Citou, em nota de rodapé alguns trabalhos nacionais “sobre o lazer e suas atividades”: “Exceção dos trabalhos de Inezil Marinho, Arnaldo Sussekind, Ethel Bauzer Medeiros e de mais alguns poucos estudiosos, nada conseguimos encontrar sobre o assunto” (Ferreira, 1959, p.13).

Possivelmente, publicações da primeira metade do século XX que tratavam da recreação (livros, matérias publicadas em jornais, revistas e periódicos especializados) poderiam ter desenvolvido reflexões sobre o lazer. Em face dessa constatação, questionamentos foram elaborados: Que matrizes de pensamento permearam a construção dos significados de recreação e de lazer no contexto da primeira metade do século XX? Quando, como e por que o lazer foi analisado, nessa época, pelos autores brasileiros envolvidos com a produção de conhecimentos sobre a recreação?

Levantamentos preliminares indicavam que muitos dos autores que realizaram estudos sobre a recreação eram profissionais que estavam liderando políticas públicas. Como recreação e lazer são palavras que, freqüentemente, se mesclam em muitos empreendimentos desenvolvidos no país, a pesquisadora indagou: Que trajetórias foram percorridas pela recreação e pelo lazer no contexto brasileiro nas primeiras décadas do século XX? O que as experiências institucionais, desenvolvidas no âmbito das políticas públicas, revelam sobre as semelhanças e as singularidades da recreação e do lazer?

Page 34: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3232 33

Os Objetivos

Objetivo geral: Analisar as trajetórias percorridas pela recreação e pelo lazer no Brasil, focalizando os significados incorporados por ambos, neste contexto, a partir da produção de conhecimentos sobre o assunto.

Objetivos específicos:

a) Compreender as matrizes de pensamento que influenciaram a construção dos significados de recreação e de lazer no âmbito das políticas públicas, por meio do estudo de experiências institucionais desenvolvidas nas primeiras décadas do século XX.

b) Analisar os autores, e seus discursos, envolvidos com a produção de conhecimentos sobre a recreação até a década de 1960, procurando compreender os significados de lazer neste contexto, bem como relações constituídas com a recreação (Gomes, 2003).

Ao definir os objetivos do estudo, o pesquisador estabelece o que espera conseguir com sua investigação e onde pretende chegar com a proposta. Os objetivos devem ser explicitados de maneira clara, correlacionada com o problema proposto. Caso necessário, os objetivos podem ser divididos em gerais e específicos, e estes últimos dizem respeito a aspectos mais particulares do estudo.

Vale destacar que os objetivos podem ser reformulados, descartados ou acrescidos de outros no decorrer da pesquisa. Mas essa flexibilidade não exclui a necessidade de formulação dos objetivos desde o início do projeto.

1.6 As hipóteses

Da mesma maneira que os objetivos estão diretamente relacionados ao problema de pesquisa, as hipóteses também são parte da problematização do tema. Contudo, uma pesquisa pode conter ou não uma hipótese, isto é, pode haver pesquisa sem hipótese (por exemplo, os chamados estudos exploratórios, como você verá mais adiante na Unidade 2).

Page 35: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3232 33

A hipótese é uma suposição acerca do problema, ou questão analítica, que está sendo investigado. É uma conjectura, uma possível resposta para o que está sendo perguntado na pesquisa. A hipótese ainda não é uma verdade, uma certeza, mas sim uma possibilidade a ser averiguada, podendo ser confirmada ou negada no decorrer da pesquisa. Por esse motivo, a hipótese é uma afirmação provisória a respeito de determinado fenômeno em estudo – devendo, portanto, ser apurada.

A formulação de hipóteses é complexa, pois exige sólido conhecimento prévio acerca do problema. Além disso, demanda maior sofisticação metodológica e maior experiência em pesquisa, seja para formular uma ou mais hipóteses adequadas ao problema, seja para desenvolvê-la(s) na pesquisa.

A hipótese é uma suposição, uma resposta provável que se faz na tentativa de responder ao problema.

A hipótese não é uma opinião ou idéia isolada do pesquisador, mas sim uma afirmação a partir de bases sólidas, fundamentadas nas teorias existentes.

Ainda tomando como exemplo a pesquisa de Gomes (2003), mesmo que a hipótese não tenha sido explicitada, nas entrelinhas do texto é possível observar que a autora acreditava que a obra Lazer operário, de Acácio Ferreira, não representava a primeira publicação a tratar especificamente sobre o lazer no Brasil. Na conclusão do seu estudo, a autora afirma justamente isso.

Vale destacar que a natureza ou o tipo de “problema de pesquisa” irá orientar nossas escolhas quanto aos procedimentos metodológicos a serem utilizados na investigação: quem será investigado, por meio de que recursos os dados serão coletados, dentre outras decisões a serem tomadas. Essas questões, no entanto, serão tratadas posteriormente. Antes de explorarmos os aspectos metodológicos, consideramos essencial discutir a base teórico-conceitual que fundamentará a pesquisa.

Page 36: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3434 35

1.7 Base teórico-conceitual da pesquisa

A construção da base teórico-conceitual para uma pesquisa faz-se por meio do estudo de teorias e pesquisas já realizadas acerca do problema e da temática que está sendo pesquisada. Ao fazermos uma pesquisa, deveremos buscar os estudos e as teorias já existentes sobre o assunto investigado.

Essa base trata-se de um conjunto de idéias, conceitos e categorias de análise presentes nas teorias que fundamentam o objeto estudado. É um conjunto de explicações científicas que nos ajudam a analisar, compreender e desvelar o problema que estamos pesquisando com o rigor, a profundidade e a validade exigidos nos trabalhos científicos e acadêmicos.

Nessa fase de fundamentação da pesquisa – muitas vezes organizada em uma seção específica, denominada “marco teórico” – busca-se adquirir conhecimentos a partir de uma revisão da literatura existente sobre o lazer. Procuram-se pesquisas similares sobre o tema estudado, conceitos, explicações e modelos teóricos existentes com o objetivo de situar a pesquisa no contexto geral do conhecimento. Essa revisão de literatura deve ser sintética e crítica, indicando lacunas nos estudos anteriores, bem como os conceitos e as teorias considerados “clássicos” no campo pesquisado (Denker, 2003).

Mas o que é uma teoria?

Segundo Minayo (1996, p. 91-92), teoria é “um conjunto inter-relacionado de princípios e definições que servem para dar organização lógica a aspectos selecionados da realidade empírica”. Ainda segundo esta autora, “uma teoria reúne um conjunto de pressupostos e axiomas, proposições logicamente inter-relacionadas e empiricamente verificáveis”. A essência de uma teoria consiste na sua potencialidade de explicar uma gama de fenômenos por meio de um esquema conceitual que seja, simultaneamente, sintético e abrangente.

Dessa maneira, podemos afirmar que a pesquisa precisa conter um conjunto sistemático de conceitos que formem a teoria geral dos fenômenos estudados, que controlem e guiem seu andamento – além de ampliá-la com novas investigações – e permitam a previsão de fatos novos a partir dos já conhecidos.

Page 37: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3434 35

As teorias têm seus conceitos, mas o mesmo conceito pode relacionar-se a mais de uma teoria, caso em que adquire significados parcial ou totalmente diversos em cada teoria. O conceito de lazer, por exemplo, pode ter diferentes significações, dependendo do autor referenciado e da teoria considerada. O importante é manter a coerência e a consistência teórica dos conceitos e dos pressupostos desenvolvidos no estudo.

Minayo (1996) observa que os conceitos são as vigas mestras de uma construção teórica, isto é, são as unidades de significação que definem a forma e o conteúdo de uma teoria. Podemos considerá-los como operações mentais que refletem certo ponto de vista a respeito da realidade, pois focalizam determinados aspectos dos fenômenos, hierarquizando-os. Dessa forma, eles se tornam um caminho de ordenação da realidade, de olhar os fatos e as relações e, ao mesmo tempo, um caminho de criação.

Ainda sobre as teorias e seus conceitos, devemos lembrar que eles não são válidos para sempre. Podem e devem ser questionados, problematizados e reformulados pelas pesquisas que os tomam como referencial. Nesse sentido, é pertinente a seguinte afirmação:

É fundamental que se tenha em mente que não existe pesquisa sem teoria. A teoria é a base sobre a qual desenvolvemos o modelo de explicação que testamos com a pesquisa. É a partir da teoria que definimos nosso objeto, formulamos nossas hipóteses e escolhemos os modelos e os métodos apropriados de análise (Denker, 2003, p.69).

O referencial teórico é um pré-requisito para qualquer tipo de pesquisa, pois servirá como base para uma futura explanação a respeito do tema proposto. Sem esta, não é possível realizar um trabalho satisfatório, uma vez que não será possível organizar um texto coeso e de argumentação consistente.

Em síntese, na pesquisa, lançamos mão de teorias e conceitos para entender e analisar em profundidade o problema que pretendemos investigar. Toda pesquisa

Page 38: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3636 37

deverá ter, desse modo, uma base teórico-conceitual para dar sustentação ao estudo. Caso contrário, ficará limitada aos conhecimentos da experiência, do senso comum ou das nossas pré-noções, que não têm cientificidade, não têm rigor nem a profundidade exigida de um conhecimento científico. Em contrapartida, vale lembrar que toda pesquisa busca discutir, confirmar, ampliar ou refutar, total ou parcialmente, as teorias e os conceitos que constituem seu referencial.

Para viabilizar a construção da base teórico-conceitual e analítica de uma pesquisa, um meio insubstituível é a revisão da produção científica existente sobre o problema a ser investigado – revisão de literatura, revisão bibliográfica, ou ainda o chamado

“estado da arte”. Essa revisão consiste no levantamento e no estudo de teorias, autores e/ou pesquisas que já abordaram o problema que pretendemos investigar, de modo que possamos tomar conhecimento do que existe a respeito desse campo de estudo.

Revisão de literatura

Esta é a primeira etapa de qualquer processo de pesquisa. Consiste em realizar um estudo a respeito de um tema referente ao problema de pesquisa escolhido. Essa busca deve contemplar um referencial teórico e a análise de outras pesquisas que seguiram a mesma linha proposta pelo pesquisador. A revisão da literatura é essencial para qualquer tipo de pesquisa realizada, pois ela permite uma reflexão a respeito dos objetivos propostos para a concretização do trabalho. O objetivo de analisar as pesquisas que já foram concluídas não é o de “reproduzir” o que foi feito, e sim o de gerar um senso crítico a respeito do assunto. Isso contribui para que o pesquisador seja capaz de avaliar o próprio trabalho que está desenvolvendo. Além disso, análises de experiências já realizadas podem evitar que a pesquisa trate de questões já investigadas em outros estudos.

Além de ajudar-nos a não perder tempo, estudando o que foi pesquisado, a revisão da literatura auxilia-nos a construir a base teórico-conceitual de que necessitamos

Page 39: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

3636 37

para dar suporte à análise do problema que iremos investigar. Essa atividade é fundamental para que possamos reelaborar e especificar melhor o problema de pesquisa e situá-lo no tempo e no espaço, se for o caso.

A revisão da literatura não deve ser confundida com pesquisa bibliográfica, pois ela tem como finalidade um domínio dos termos utilizados para o tema proposto. Em uma pesquisa bibliográfica, a literatura referente ao tema possui conotação diferenciada, uma vez que constitui o próprio objeto de estudo. Essa questão será retomada na Unidade 2.

Como você pode perceber, o processo de pesquisa não é linear: precisamos ter algumas referências de um campo de estudo para escolher um tema de pesquisa e nele recortar um problema relacionado com a nossa prática ou com os nossos interesses. Precisamos ter um problema para selecionar a bibliografia pertinente, mas temos de estudar essa bibliografia para aprofundar conhecimentos, chegar a uma formulação mais precisa do problema e, se for o caso, formular hipóteses que orientarão o estudo.

À medida que esses aspectos forem definidos, você poderá estruturar o arcabouço teórico-metodológico de sua pesquisa. Esse será o assunto tratado na Unidade 2.

Reveja o pré-projeto que você desenvolveu para se inscrever no curso de especialização e tente responder estas questões:

De onde surgiu o interesse em estudar este tema? Por que você pretende desenvolver essa pesquisa e qual será sua contribuição para o campo de estudos do lazer? Qual o problema da pesquisa? Você tem alguma hipótese a respeito do problema? Que objetivos pretende alcançar? Que autores e teorias podem auxiliar a contextualizar o objeto e a constituir a base teórico-conceitual do estudo?

Page 40: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005
Page 41: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

O processo de pesquisa: dimensão metodológica

Unidade2

Page 42: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4040 41

Page 43: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4040 41

A dimensão metodológica da pesquisa constitui mais uma viga sobre a qual ela se sustenta, podendo ser discutida a partir de diferentes perspectivas, como indicam os diversos livros dedicados ao assunto. Quando falamos de metodologia de pesquisa estamos tratando de um conjunto de procedimentos que inclui vários aspectos, que se referem a “como” fazer sua pesquisa monográfica.

Outros livros de metodologia de pesquisa podem ser consultados para que você aprofunde conhecimentos sobre a questão. Seguem algumas sugestões: Kipnis, (2003); Laville e Dionne (1996); Alves-Mazzotti (1998); Bogdan e Biklen (1994).

Neste texto, ao nos referirmos à dimensão metodológica do processo de pesquisa, trataremos basicamente das abordagens, dos métodos de procedimento, dos tipos e técnicas operacionais para a realização da pesquisa, de modo que explicite claramente onde, quando, com quem e de que forma será realizada a investigação. Nosso intuito é auxiliar você a construir as bases metodológicas para o planejamento de sua pesquisa (projeto) e seu posterior desenvolvimento (monografia).

U N I DA D E 2 - O P R O C E S S O D E P E S Q U I S A : D I M E N S Ã O M E T O D O L Ó G I C A

Page 44: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4242 43

A princípio, devemos salientar que diferentes tipos de problema requerem diferentes modalidades de pesquisa, que, por sua vez, exigem distintos encaminhamentos metodológicos. É também necessário ter claro e saber justificar por que serão usados esses ou aqueles procedimentos e que tipo de informação a técnica ou o instrumento escolhido poderá oferecer.

Devemos lembrar, ainda, que os procedimentos metodológicos da pesquisa não representam um “pacote” pronto e acabado, podendo ser criados, recriados e combinados pelos pesquisadores. A criatividade e a experiência do pesquisador são tão necessárias em uma pesquisa quanto a teoria e as técnicas de coleta e análise de dados.

Na discussão sobre a dimensão metodológica da investigação, consideramos necessário iniciar tratando da intercomplementariedade entre as abordagens de pesquisa.

2.1 Abordagens de pesquisa: a questão da intercomplementariedade

Adotando-se uma classificação bastante abrangente, podemos dizer que há duas grandes abordagens (ou paradigmas) de pesquisa: a abordagem quantitativa e a abordagem qualitativa. Elas se diferenciam não apenas pela sistemática peculiar a cada uma delas, mas, sobretudo, pela maneira de formular e de tratar o problema. Normalmente, é a natureza do problema ou seu nível de profundidade que definirá a escolha da abordagem, isto é, se o problema deverá ser tratado pela vertente qualitativa, pela quantitativa ou por ambas.

O conceito de paradigma foi proposto por Thomas Kuhn no livro A estrutura das revoluções científicas (1982).

Page 45: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4242 43

Podemos analisar essas abordagens utilizando o critério de distinção relacionado à matriz epistemológica que lhes dá sustentação. Dessa forma, tem-se, assim, de um lado a tendência positivista qualificada de padrão para as ciências naturais, que se apóia em algumas proposições: a) considerar a realidade como formada por partes isoladas (variáveis); b) somente aceitar a realidade dos fatos que podem ser observados, buscando a relação entre estes (excluindo sentimentos, percepções, interpretações, valores culturais); c) considerar verdadeiro aquilo que é verificável, não se preocupando em saber para que ou para quem aquele conhecimento irá servir (crença na neutralidade da ciência); d) acreditar que tanto os fenômenos da natureza quanto aqueles sociais são regidos por leis invariáveis, que podem ser conhecidas pelo pesquisador; e) pretender a generalização dos resultados, por meio de tratamento estatístico e controle de variáveis.

O termo positivismo foi elaborado a partir de Auguste Comte, que considerava a ciência da natureza como o paradigma de todo o conhecimento. É uma posição teórica que defende a possibilidade de um conhecimento “objetivo” do mundo, no sentido de um conhecimento verdadeiro, quer se trate do mundo social ou do mundo físico, num processo de transferência dos métodos das ciências da natureza para as ciências humanas. Para o positivismo, somente o modelo fisíco-matemático seria válido, porque estabelece as regras de verificação a partir de uma base empírica sólida, construindo dessa forma o conhecimento científico, garantindo a objetividade da ciência.

De outro lado, situam-se as ciências humanas e sociais, que não se “enquadram” nesse modelo por considerá-lo reducionista, uma vez que o positivismo enxerga a realidade apenas por meio dos fatos observáveis e quantificáveis. Resgatando a dimensão interpretativa dos fatos observados, essa outra tendência foi denominada qualitativa. Respaldada pela fenomenologia, essa linha de trabalho defende que a pesquisa não deve desprezar a intencionalidade, a consciência e a paixão e o desejo que move o sujeito. Portanto, a realidade não poderia estar separada da subjetividade, nem dos sujeitos pesquisados, nem do próprio pesquisador.

Page 46: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4444 45

Fenomenologia é o estudo dos fenômenos ou de um conjunto de fenômenos na sua essencialidade. Trabalha com aquilo que faz sentido para o sujeito, com o que se apresenta como significativo ou relevante no contexto no qual a percepção e a manifestação ocorrem.

Esses dois grupos de abordagem podem ser considerados paradigmáticos, no sentido de que correspondem a pontos de partida e a programas de pesquisa distintos. Isso não quer dizer que não existe a possibilidade de trabalhar com a complementariedade das duas abordagens. Contudo, por ser uma proposta mais arrojada, de maior complexidade, traz maiores desafios aos pesquisadores.

Apesar desse desafio, vamos inverter a lógica da oposição entre as abordagens examinando o tema da intercomplementariedade entre quantitativa e qualitativa. Dito de outra forma: quais seriam as possibilidades de tratarmos um tema de pesquisa utilizando a metodologia quantitativa, que observa, compara e mede, e a metodologia qualitativa, que observa, interpreta e compreende?

Não podemos abordar esse desafio sem pensar nas trajetórias da pesquisa contemporânea, que se têm caracterizado por uma multiplicidade de correntes científicas e filosóficas. Essa característica, expressão do esgotamento do modelo lógico-formal de fazer ciência, torna difícil, senão impossível, enquadrar o pensamento contemporâneo em um modelo de conhecimento. Num primeiro momento, isto é o que se denomina crise dos paradigmas. Essa crise, que ainda tem como referência a noção de modelo, manifesta-se na pergunta: Qual o modelo, o paradigma científico, mais adequado para se conhecer a realidade? Kuhn (1982) defendia a idéia de que um modelo ou paradigma se refere a um conjunto de crenças e argumentos defendidos por um grupo de cientistas, não sendo a “verdade” absoluta ou o sinônimo de “ciência”.

Page 47: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4444 45

Alguns teóricos já realizam um trabalho bastante consistente na linha transdisciplinar. Seria interessante conhecê-los. Seguem-se dois exemplos:

MORIN, Edgard, A religação dos saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.

SANTOS, Boaventura de Souza (Org.). Conhecimento prudente para uma vida decente: “Um discurso da ciência” revisitado. São Paulo: Cortez, 2004.

Uma das dificuldades dos pesquisadores é abordar essa crise em seus aspectos epistemológicos e fazer escolhas coerentes (Amaral, 2001). E quando se trata da escolha de metodologia de pesquisa, é necessário examinar as posições dos pesquisadores diante do tipo de relação que pode existir entre as metodologias qualitativas e as quantitativas, verificando a possibilidade de compatibilizá-las ou não. A maior parte dos autores considera essa acomodação insustentável

– afirmam que existe uma descontinuidade e um conflito entre os dois “tipos” de abordagem, persistindo a rivalidade de paradigmas, e um não é jamais convocado a substituir o outro.

Alves-Mazzoti (1998) trata desse tema de forma muito interessante.

Entretanto, existe um bom número de teóricos que sustentam essa compatibilidade. Por exemplo, André (2002) insiste sobre as convergências que existem entre as diferentes abordagens de observação. A autora aceita a possibilidade de combinar essas abordagens numa mesma proposta. Goldenberg (2001) também aborda a questão da possibilidade de integração entre as abordagens e aponta Max Weber, que acreditava que se podia tirar proveito da quantificação na sociologia, desde que

Page 48: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4646 47

esse método se mostrasse fértil para a compreensão de um determinado problema. Como nenhum pesquisador tem condições para produzir um conhecimento completo da realidade, diferentes abordagens de pesquisa poderiam projetar luz sobre diferentes questões. Assim, são as formas diferenciadas de coletar e analisar os dados (qualitativa e quantitativamente) que permitem uma idéia ampla e inteligível da complexidade de um problema.

Em contrapartida, Milles e Huberman (1991) advertem-nos sobre a distância que existe entre o nível do discurso, no qual a abordagem qualitativa pode ser julgada irreconciliável com a abordagem quantitativa, e o nível da prática da pesquisa, no qual muitas vezes os pesquisadores combinam as duas perspectivas. De fato, embora vários pesquisadores considerem não fundadas as pretensões de complementariedade entre as abordagens quantitativa e qualitativa, julgando equivocados os resultados de pesquisa obtidos pela mistura dos dois tipos de abordagem, uma análise das pesquisas produzidas por pesquisadores reivindicando uma ou outra das perspectivas epistemológicas permite constatar que, na prática da pesquisa, a maioria dos pesquisadores recorre à combinação das duas perspectivas. Por um lado, os estudos quantitativos utilizam as abordagens fenomenológicas para complementar as entrevistas e os questionários estruturados; por outro lado, um número crescente de pesquisas etnográficas serve-se de quadros conceituais preestabelecidos.

Dessa forma, a integração entre as pesquisas quantitativa e qualitativa permite que o pesquisador faça um cruzamento de suas conclusões no intuito de ter maior confiança de que seus dados não são produto de um procedimento específico ou de alguma situação particular. Ele não se limita ao que pode ser coletado em uma entrevista: pode entrevistar repetidamente, pode aplicar questionário, pode investigar diferentes questões em diferentes ocasiões, pode utilizar fontes documentais e, até mesmo, dados estatísticos.

Page 49: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4646 47

Embora vários pesquisadores considerem não fundadas as pretensões de complementariedade entre as abordagens quantitativa e qualitativa e julguem equivocados os resultados de pesquisa obtidos pela mistura dos dois tipos de abordagem, uma análise das pesquisas produzidas reivindicando uma ou outra das perspectivas epistemológicas permite constatar que na prática a maioria dos pesquisadores recorre à combinação das duas perspectivas.

Em resumo, a tese de uma distinção entre qualitativo e quantitativo está cada vez mais difícil de ser sustentada, pois tanto a abordagem de base positivista como a abordagem interpretativa de base fenomenológica não são necessariamente excludentes. Existem possibilidades de uso qualitativo da pesquisa quantitativa e vice-versa. Se for preciso conhecer o panorama da situação atual de um determinado segmento da população, posso buscar respostas quantitativas, ou seja, uma amostra representativa dessa população, com controle de variáveis interpretando os dados. Por exemplo, sobre o lazer na terceira idade, posso obter dados concretos sobre essa população e fazer posteriormente uma leitura qualitativa.

Desse modo, em um primeiro momento, a investigação quantitativa pode dar um panorama da situação. Em um segundo momento, a investigação qualitativa pode auxiliar a detectar a rede de vivências, de práticas e de significados que envolve o cotidiano de uma determinada população, associando vários aspectos.

Basicamente, portanto, deve-se buscar desafiar preconceitos com relação a qualquer metodologia de pesquisa, sejam quantitativas ou qualitativas. Enquanto a pesquisa quantitativa apresenta vantagens no que diz respeito, principalmente, à possibilidade de generalizar resultados, perde no que diz respeito ao conhecimento da realidade em suas nuanças em seus aspectos não observáveis e quantificáveis. Por outro lado, as metodologias qualitativas, embora não possam permitir generalizações estatísticas de seus resultados, podem, no entanto, oferecer um quadro descritivo e aprofundado dos significados e das percepções que movem os sujeitos da pesquisa, permitindo o que se denomina de “generalizações naturalísticas”. Isso se refere

Page 50: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4848 49

à possibilidade de uma pesquisa qualitativa permitir que os leitores em outras realidades identifiquem pontos em comum com a experiência relatada, o que é conseguido quando a pesquisa qualitativa insere suas preocupações no contexto maior em que está colocada. Mas convém ter clareza de que o cruzamento de diferentes abordagens requer um pesquisador com mais experiência e com aguçado senso de análise. Cautela e bom-senso são fundamentais.

Enfim, como diz a Mafalda, a complexidade é muito maior (Quino, 1997, p.104):

Vimos a possibilidade de tratar, de forma intercomplementar, as abordagens qualitativa e quantitativa de pesquisa. Não precisamos contar com uma forma única de pesquisar e de produzir conhecimento. Os diferentes paradigmas abrem uma série de possibilidades para buscar compreender e solucionar problemas. Nossos objetivos são diversos, mas dentro de cada um desses paradigmas podemos estar interessados em diferentes metodologias. Por essa razão, é fundamental conhecermos um pouco mais essas abordagens, bem como seus respectivos limites.

2.1.1 A abordagem quantitativa e seus limites

Nosso objetivo é propor uma passagem pelas marcas da pesquisa quantitativa e verificar sua influência nas ciências humanas e sociais. A história da ciência tem como marco o século XVII, a Era das Revoluções, de acordo com Hobsbawm

Page 51: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

4848 49

(1986). Na história da ciência, esse momento rompeu com o conhecimento apenas especulativo que contemplava o mundo, iniciando um novo paradigma que experimentasse a realidade e fosse capaz de dominar a natureza compreendendo suas leis e construindo teorias explicativas. No entanto, em sua evolução histórica, o triunfo dessa forma de produzir conhecimento deu-se no século XIX: foi quando a ciência ganhou corpo no domínio da natureza (Amaral, 2001). Dessa maneira, o ritmo e o número das descobertas saíram dos laboratórios para ter aplicação prática: ciência e tecnologia estabeleceram seus vínculos. O triunfo maior esteve ligado a essa forma objetiva, empírica, experimental com alta capacidade de previsibilidade. Esse foi o paradigma dominante (Santos, 1991), que teve como centro a noção de lei, de modelo simples, eficaz, mas irrefutável.

Sua ênfase maior está ligada ao positivismo, que, como ressaltado anteriormente, se caracteriza como uma teoria do conhecimento de inspiração empirista que limita o conhecimento à observação dos fatos e das relações estabelecidas entre eles, admitindo unicamente a certeza do tipo experimental, por ser esta capaz de produzir leis. Esses princípios orientaram a origem da pesquisa em vários segmentos e, inevitavelmente, no campo das ciências humanas e sociais.

Os pesquisadores partidários do paradigma positivista afirmam:

• O fenomenismo, que significa que somente o mundo dos fatos pode ser analisado cientificamente.

• O objetivismo, que considera como verdadeiro o conhecimento que capta com precisão os objetos externos sem interferência da subjetividade.

• O empirismo, tendo o observador externo e o teste empírico objetivo como os únicos guias das teorias cientificas.

• A noção da lei geral como centro do programa positivista.

• A previsibilidade como a marca de um conhecimento verdadeiro.

O resultado dessa proposição é postular a uniformidade da vida social por meio dos comportamentos e de suas significações. Enfim, a pesquisa marcadamente positivista

Page 52: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5050 51

visa à descoberta e à verificação de leis gerais – o particular é julgado sem interesse e não significativo em si mesmo.

Se o método quantitativo tem como ênfase o positivismo, isso significa que ele é um processo formal, objetivo e sistemático, segundo o qual os dados numéricos são utilizados para obter informações acerca do mundo. Esse método de pesquisa é usado para descrever, testar relações e determinar causas.

Algumas pesquisas realizadas no campo do lazer seguem esse paradigma. Silva (1999), por exemplo, realizou uma pesquisa quantitativa com alunos do 2o segmento do ensino fundamental do Colégio Pedro II do Rio de Janeiro com o objetivo de estabelecer correlações entre a prática da educação física escolar e as formas de lazer jovem, fora do tempo escolar. Como instrumento de coleta de dados, foi aplicado um questionário estruturado composto de 37 questões, que envolveu 969 respondentes. O autor constatou que enquanto na 5a série 43,6% dos entrevistados se diziam estimulados pelo lazer esportivo em função da educação física escolar, 46,9% responderam que nunca tiveram seu interesse aumentado em função dessa atividade. Como conclusão, a pesquisa destaca a adesão do jovem ao lazer esportivo em razão de elementos culturais próprios, e não do papel desempenhado pela educação física na escola.

Em síntese, a pesquisa quantitativa caracteriza-se pelo emprego da quantificação, tanto na fase de coleta de dados quanto no tratamento destes, por meio de técnicas ou programas estatísticos. Empenha-se por garantir precisão dos resultados, evitar distorções de análise e interpretação dos dados, possibilitando uma margem de segurança quanto aos resultados. É freqüentemente aplicada nos estudos descritivos, naqueles que procuram descobrir e classificar a relação entre variáveis, bem como nos que investigam a relação de causalidade entre fenômenos.

Consulte um banco de dados (tais como IBGE, Inep, etc.) que desenvolva pesquisas quantitativas que possam ser úteis para a área do lazer. Procure interpretar criticamente essas informações.

Page 53: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5050 51

Mesmo tendo afirmado a possibilidade de utilizar a integração entre as abordagens, é necessário perceber que tanto a abordagem quantitativa como a qualitativa possuem limites. Cada uma delas tem vantagens e desvantagens, a escolha de um a implica muitas vezes renunciar às vantagens da outra. Procurando resolver certos obstáculos metodológicos, cada abordagem provoca outros problemas, que são com certeza seus dilemas. No entanto, não é por essas dificuldades que a pesquisa quantitativa será rejeitada.

Em primeiro lugar, há o reconhecimento de que o positivismo foi de grande valia para a humanidade, permitindo que a ciência avançasse em suas descobertas, com critérios de controle da realidade estudada e de rigor científico que superaram

“mitos” e fantasias em muitas áreas do conhecimento. Em segundo lugar, reconhece-se hoje que o positivismo tinha diferentes adeptos com distintas idéias, não podendo ser reduzido a um “pacote” de noções homogêneas, como fazem seus críticos. Em terceiro lugar, a rejeição a algumas idéias do positivismo, já superadas nas discussões científicas, não pode significar a rejeição às metodologias quantitativas como um todo, nem a qualquer critério de rigor e de objetividade em pesquisa. Embora muitas das críticas ao positivismo sejam pertinentes, essas observações não podem ser desconsideradas.

1. As pesquisas quantitativas são úteis e necessárias, como uma “fotografia” da situação mais ampla do fenômeno estudado, permitindo que se generalizem os resultados para toda a população.

2. Ainda que a compreensão do fenômeno estudado não se esgote na pesquisa quantitativa, ela pode servir de ponto de partida para outros estudos qualitativos que busquem aprofundar certos aspectos apontados e analisar significados atribuídos a esses aspectos no cotidiano dos sujeitos.

3. O fato de uma pesquisa ser qualitativa ou quantitativa não significa, por si só, uma adesão ou uma rejeição aos aspectos do positivismo criticado no pensamento científico.

Page 54: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5252 53

2.1.2 A abordagem qualitativa e seus dilemas

A expressão “metodologias qualitativas” cobre um conjunto de possibilidades que recebem diferentes denominações. No momento que se utiliza a denominação paradigma interpretativo para designar o conjunto das abordagens qualitativas, alguns autores recorrem também à expressão paradigma compreensivo. A tendência é reagrupar sob a categoria chamada de pesquisa qualitativa o conjunto das metodologias: etnografia, estudo de caso, pesquisa participante. Além disso, o paradigma da pesquisa qualitativa/interpretativa tem por base essencialmente os contextos, assim como as significações individuais que as pessoas imprimem às suas experiências (Huberman e Miles,1991; André, 1986, 2001, 2002; Bogdan e Biklen, 1994; Van der Maren, 1996).

Podemos justificar a utilização da categoria “pesquisa interpretativa” principalmente pelo fato de que a “família” das abordagens assim designadas compartilha um interesse central pela significação dada pelos “atores” às ações nas quais eles estão envolvidos.

A ênfase é, desse modo, colocada sobre a necessidade de reconhecer que o sentido primeiro dessas abordagens se situa não sob o plano dos procedimentos e das técnicas, mas sobre o objeto mesmo da pesquisa e dos postulados que se agregam. Van der Maren (1996) defende essa posição afirmando, sobretudo, que uma mesma técnica qualitativa pode ser utilizada em contextos diferentes.

No quadro do paradigma qualitativo, o pesquisador concebe de forma diferente seu objeto de pesquisa. O objeto da pesquisa social qualitativa é a ação e não o comportamento. Diante do objeto ação-significação, o pesquisador busca compreender as formas de comportamento e os significados que os atores lhes atribuem por meio de suas interações sociais.

De um ponto de vista ontológico, o objeto de pesquisa é o mundo humano. Os fatos sociais não são coisas, a sociedade não é um organismo natural, mas, principalmente, um artefato cultural, como foi tratado no primeiro núcleo do curso. É necessário compreender a significação dos símbolos sociais construídos. Estudar o social é compreender (o que só é possível vivendo) que o objeto social não é uma realidade externa, é uma construção subjetivamente vivida.

Page 55: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5252 53

Na mesma ordem de idéias, os grandes temas do paradigma compreensivo são a subjetividade e o mundo social como lugar de produção de sentido e de valorização: é o indivíduo, e não o conceito, que está na fonte das concepções válidas sobre o social (Van der Maren, 1996). A pesquisa será sobre a forma como se desenvolvem e mantêm os sistemas de significações.

O pesquisador pode considerar o contexto social imediato na sua forma espacial e na sua forma temporal. Sobre o plano espacial, as significações variam em função dos grupos particulares de indivíduos que, pelo conjunto de suas interações, partilham certas compreensões e tradições próprias ao seu meio, uma microcultura diferente de um grupo-classe para outro. Sobre o plano temporal, as significações são construídas e reconstruídas sem cessar em tempo real, uma vida renova-se constantemente, mesmo nos acontecimentos cotidianos mais repetitivos.

Busquemos na área do lazer mais um exemplo de pesquisa com este enfoque: a pesquisa de Alves (2000) teve como foco de análise a comunidade indígena Maxakali. Seu objetivo foi buscar a compreensão dos sentidos e dos significados do corpo e do lúdico presentes na comunidade. O método de investigação científica considerado adequado foi o etnográfico, que encontrou na antropologia seus pressupostos teóricos e metodológicos, bem como as categorias de análise. A coleta de dados foi realizada por meio da observação participante, registrada em diário de campo. Outros recursos foram utilizados, como fotografias, desenhos e entrevistas.

Em contextos sociais mais distantes – como sinalizado na pesquisa anterior –, é necessário considerar que as significações têm uma história, isto é, que elas podem ser conectadas, na origem, a uma cultura mais ampla que a de seu ambiente imediato. Essa cultura é definida, em termos cognitivos, como aprendizagem de normas que guiam a percepção, a crença, a ação e a avaliação das ações dos outros. As significações que os sujeitos têm por certo podem também ser influenciadas pelas percepções das vantagens e das restrições ligadas a um contexto mais amplo que aquele das suas relações imediatas com os outros atores do mesmo grupo.

Os pesquisadores que assumem a abordagem qualitativa pensam que problemáticas formuladas a partir de tais centros de interesse permitirão produzir conhecimentos que responderão às seguintes necessidades:

Page 56: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5454 55

• A necessidade de levar em conta a invisibilidade da vida cotidiana. De fato, o cotidiano sempre nos escapa porque é muito familiar ou apresenta contradições que o tornam difícil de ser enfrentado. A pesquisa interpretativa permite um distanciamento que torna estranho aquilo que é familiar, explicita aquilo que é implícito e onde o lugar comum se torna problemático.

• A necessidade de compreender as situações particulares por meio de uma documentação baseada nos detalhes concretos da vida prática.

• A necessidade de considerar as significações que os acontecimentos tomam para as pessoas de um determinado meio. Acontecimentos que parecem idênticos podem ter significações diferentes segundo os ambientes.

• A necessidade de compreender, de forma comparativa, diferentes níveis de uma mesma organização social. A compreensão de uma organização estudada no nível local pode ser ampliada pelo seu relacionamento com os elementos pertencentes a um nível de realidade mais ampla, permitindo assim identificar suas condições “contextuais” de existência. A pesquisa interpretativa é capaz de perceber a organização particular do ambiente, ao mesmo tempo em que percebe a realidade das pressões exteriores exercidas sobre essa organização. Os dois níveis de organização devem interagir teórica e empiricamente.

• A necessidade de compreender uma organização local para além de suas condições particulares de existência, comparando essa organização com outras entidades locais semelhantes.

A definição do termo “qualitativo” assinala o caráter de proximidade entre o pesquisador e os sujeitos da pesquisa centrada sobre a construção de sentido. Essa proximidade manifesta-se tanto sobre o plano físico, isto é, o campo de estudo, lugar de interação com as pessoas, como sobre o plano simbólico, ou seja, a linguagem empregada pelo pesquisador quando se dirige às pessoas do ambiente. Essa proximidade representa a “tradição de pesquisa qualitativa”.

Essa orientação de pesquisa tenta se aproximar o mais possível do mundo interior, das representações e da intencionalidade dos atores humanos engajados nas trocas simbólicas como eles o são nas ciências humanas e sociais.

Page 57: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5454 55

Dois grandes riscos aparecem. Primeiro, a elaboração redutora da complexidade do tema; segundo, o controle sobre a subjetividade do pesquisador. Atualmente, a pesquisa qualitativa é tão reconhecida quanto a pesquisa quantitativa, porém ela sofre uma restrição maior, pois o registro e a análise dos dados exigem uma comunicação muito mais complexa. Na pesquisa qualitativa, a necessidade de comunicar e de fazer compreender a complexidade do fenômeno estudado conduz a:

• reduzir o número de dimensões a serem consideradas;

• atenuar ou mesmo anular as contradições e os hiatos entre as dimensões que farão crer ao leitor que o pesquisador não compreendeu o caso;

• introduzir uma coerência, uma estrutura, pois é na exposição de uma nova organização dos fatos que reside a explicação;

• linearizar, isto é, expor um seguido do outro os acontecimentos que se apresentaram simultaneamente;

• apurar sob forma de um raciocínio simples com um número limitado de movimentos os resultados de uma longa série de compromissos e de cálculos complexos com um grande número de movimentos.

Em conseqüência, assim que a pesquisa é comunicada, a representação elaborada não é mais que uma ficção reduzida ao comunicável, com o risco de ser reduzida a um retrato mal desenhado.

No caso do controle da subjetividade do pesquisador, o desafio é ainda maior, pois ela é reforçada a partir do “reencontro intersubjetivo” que serve tanto de meio quanto de mobilizador da pesquisa qualitativa. Como exemplo dessa questão, citamos a pesquisa realizada por Silva (2002). O autor busca compreender, por meio de uma pesquisa participante, a paixão do torcedor por um time de futebol – que, curiosamente, é seu próprio time “do coração”. O objeto desvela a subjetividade do próprio pesquisador. Contudo, não existe simetria, apenas posições complementares em que a subjetividade do pesquisador ocupa o lugar dominante. O risco que se corre é que a seleção de elementos que o pesquisador efetua na fala do sujeito confirme mais o pesquisador do que o(s) depoente(s).

Page 58: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5656 57

Um dos critérios de rigor metodológico é a fidedignidade aos dados, evitando acrescentar ruídos e informações ao quadro investigado (Quino, 1997, p. 237).

2.1.3 A questão dos critérios na pesquisa qualitativa

Vários autores tratam particularmente da definição de normas a partir das quais podem ser considerados os valores do conhecimento obtido por meio de uma pesquisa cujos postulados e procedimentos sejam qualitativos. A questão dos critérios de cientificidade aplicada às metodologias de pesquisa qualitativa é um campo complexo que sob nenhuma hipótese pode ser negligenciado.

Segundo Miles e Huberman (1984), o importante é:

• a clarificação dos critérios utilizados;

• a operacionalização desses critérios no processo da pesquisa;

• a explicitação da operacionalização dos critérios nos relatórios de pesquisa, isto é, a “documentação” sistemática dos procedimentos utilizados pelo pesquisador.

Assim, é necessário que as sucessivas ações realizadas no decorrer da coleta de dados, da análise e da interpretação sejam explicitadas nos relatórios de pesquisa. Esse cuidado relaciona-se com os critérios de validade, de triangulação, de objetividade,

Page 59: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5656 57

de fidedignidade e com a sua aplicação. Por uma questão didática, esses critérios podem ser apontados separadamente para efeito de análise, porém no processo da pesquisa eles aparecerão como indicadores do rigor metodológico. Você sabe em que consiste cada um desses critérios?

Critério de validade

O cuidado com a validade do estudo é a primeira exigência que se impõe ao pesquisador. A validade destaca o problema de saber se o pesquisador observa verdadeiramente aquilo que ele julga observar. Ou seja, o pesquisador cuida para que seus dados correspondam estreitamente àquilo que eles pretendem representar, de uma maneira adequada e autêntica.

Van der Maren (1996) utiliza a expressão coerência programática para designar a validade interna de uma pesquisa. Essa coerência define-se como uma resposta ao problema da lógica do argumento ou da demonstração, ligando entre elas os diferentes componentes de uma pesquisa, indo da formulação de intenções e de metas da pesquisa, passando pela constituição, pela análise e pelo tratamento dos dados até a interpretação e a verificação dos resultados.

Colocar mal a pergunta é a maior fonte de erros de validade. Para evitá-los, é necessário diversificar as técnicas de coleta de dados utilizadas num processo de pesquisa qualitativa. Isto é o que se denomina triangulação, outro critério metodológico importante.

Critério de triangulação

Denomina-se triangulação o procedimento de uma validação instrumental feita por meio de uma confrontação de dados recolhidos a partir de uma variedade de estratégias. O conceito de triangulação é também estendido à idéia de validação teórica pela confrontação das inferências feitas a propósito de um problema, seja entre vários pesquisadores, seja entre os pesquisadores e os sujeitos pesquisados.

Page 60: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5858 59

Essencialmente, a triangulação supõe confirmar um resultado demonstrando que medidas independentes que realizamos vão na mesma direção, ou, pelo menos, não as contradizem (Huberman e Miles,1991).

Critério de objetividade

A objetividade é um conceito amplo que caracteriza, em geral, o procedimento de racionalização científica que recorre à observação, à experimentação, à medida, de maneira que ultrapasse a sensibilidade subjetiva individual do pesquisador para alcançar um princípio de universalidade. No caso da pesquisa qualitativa, esse critério não terá as mesmas características. No entanto, a objetividade do estudo não poderá ser negligenciada. Segundo Laville e Dionne (1996), objetividade é uma atitude intelectual que visa considerar a realidade do objeto, controlando ao máximo, pela operação nomeada objetivação, as preconcepções do pesquisador. Por sua vez, a objetivação é a operação pela qual o pesquisador torna consciente, para ele e para os outros, as coordenadas de seu problema de pesquisa e a perspectiva na qual o aborda.

Critério de fidedignidade

A fidedignidade repousa, essencialmente, sobre os procedimentos de observação cuja descrição deve ser explicitada no estudo. Ela não se apóia diretamente sobre os dados, mas sobre as técnicas e os instrumentos utilizados. A validade supõe a fidedignidade, mas não o inverso. O critério de fidedignidade refere-se à escala segundo a qual o resultado é independente das circunstâncias acidentais da pesquisa, isto quer dizer que o critério de validade remete à escala segundo a qual o resultado é corretamente interpretado.

O registro que será retido como dado deve ser uma aproximação do real que resulte da comparação, do cruzamento ou da triangulação de vários registros parciais apreendidos de pontos de vista diferentes ou com registradores diferentes.

Por último, resta comentar os critérios que estão na ordem das opções ético-filosóficas do pesquisador, mas que fazem parte do quadro da validade de uma boa pesquisa, como você verá a seguir.

Page 61: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

5858 59

Critérios de ordem social e de pertinência socioprofissional

Nos critérios de ordem social, a relação entre a validade de uma pesquisa qualitativa e o respeito de certos princípios éticos reveste-se de uma grande importância: a responsabilidade ética e a preocupação científica devem andar juntas numa pesquisa de campo. Desde o início, o pesquisador deve explicitar aos sujeitos os propósitos da pesquisa, as atividades que pretende realizar e mesmo as tarefas ou os riscos que podem implicar sua participação na pesquisa.

O pesquisador deve proteger tanto quanto possível os sujeitos pesquisados, particularmente os participantes que considera vulneráveis, contra os riscos psicológicos ou sociais que antevê, o embaraço ou o risco de sanções administrativas. Para ser bem-sucedido, ele deve reunir o máximo de informações sobre o ambiente, a fim de avaliar os riscos que os sujeitos envolvidos podem incorrer. É também prudente preparar uma proteção rigorosa das informações, especialmente nos casos em que o anonimato será preservado.

Existem muitos meios de estabelecer e de manter uma relação de confiança e de colaboração com os sujeitos durante a pesquisa. Os textos de metodologia apontam o seguinte:

• A confiabilidade: enquanto está no campo, o pesquisador não deverá jamais formular comentários perto dos sujeitos que fazem parte de sua amostra em relação ao que observa.

• A implicação: o pesquisador deverá tentar envolver os depoentes diretamente na pesquisa como colaboradores, a fim de formular adequadamente as questões de pesquisa e coleta de dados.

• A clareza: se o pesquisador pretende inspirar confiança aos sujeitos implicados, deve ter uma idéia clara das questões principais que guiam a pesquisa, assim como os procedimentos a serem utilizados para recolher os dados relativos às suas dúvidas.

Page 62: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6060 61

Em relação ao critério de pertinência socioprofissional, é possível afirmar que a pesquisa qualitativa deve levar em conta as exigências do objeto de pesquisa, ou seja, das situações profissionais e das pessoas que o vivem –tanto no plano da forma de agir como no da implicação dos resultados da pesquisa.

Muitas vezes, é em nome de certa concepção de validade que as pesquisas produzem um conjunto de conhecimentos sistemáticos, sem relação com as necessidades e as atividades dos atores, dos lugares e dos acontecimentos. A preocupação com a validade deve, portanto, se exercer às vezes em função do contexto científico e social da pesquisa. As questões de validade constroem-se no cotidiano, na práxis.

Todos esses critérios precisam ser observados a partir das regras estabelecidas para a metodologia da pesquisa científica, como veremos no próximo tópico.

2.2 As regras do jogo

Ao construir a pesquisa na área de ciências humanas e sociais, deparamos com algumas interrogações. A primeira é: o que é realmente um método científico?

Todas as ciências caracterizam-se pela utilização de métodos científicos, mas nem todos os ramos de estudo que empregam esses métodos são ciências. A utilização de métodos científicos não é da alçada exclusiva da ciência, mas, como esclarecem Marconi e Lakatos (2000), não há ciência sem o emprego de métodos científicos.

Porém, os modos de funcionamento da pesquisa científica foram modificados ao longo do tempo e à medida que ocorreu a democratização dos saberes. Atualmente, ela é uma codificação das práticas consideradas como válidas para os pesquisadores experientes de um determinado campo de saber. Dito de outra forma, ela é uma estruturação das regras do jogo que os adversários estabelecem respeitar nos seus discursos, bem como as contestações por meio das quais a pesquisa científica irá se desenvolver.

Page 63: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6060 61

De acordo com Marconi e Lakatos (2000, p. 46), existem várias definições e conceitos de método. A partir da análise de vários conceitos, assim o definem:

“O método é o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objetivo – conhecimentos válidos e verdadeiros – traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do cientista”.

Podemos afirmar que um método de pesquisa é um conjunto de operações sistemática e racionalmente organizadas, que tem por fim estabelecer relação lógica ou causal (conexões) de forma consistente. Como já foi explicitado no item 1.3, essas questões determinam:

• a maneira de colocar o problema: o quê?

• a intenção, a meta, o objetivo da pesquisa: para quê?

• as técnicas de constituição do material e sua validação: como?

• as técnicas de tratamento transformando dados em resultados;

• os procedimentos de interpretação dos resultados e suas verificações;

• a justificativa das diferentes escolhas.

Realizado esse percurso, estaremos diante de uma pergunta muito mais embaraçosa: como conseguir trabalhar metodicamente meu objeto de interesse? As produções científicas de maior qualidade são resultado de uma preparação minuciosa de estruturação do objeto de estudo e de planejamento das etapas de demonstração e validação de novos saberes, da validade interna, da consistência programática.

Page 64: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6262 63

Considerando a concepção atual do método, conforme Bunge (citado por Marconi e Lakatos, 2000), entre outros autores, o método científico é escopo teórico-metodológico da investigação, que alcança seus objetivos quando cumpre as seguintes etapas:

• descobrimento do problema ou lacuna no conhecimento;

• colocação (ou recolocação) precisa do problema;

• busca de conhecimentos ou instrumentos relevantes para resolver o problema;

• tentativa de solução com os meios encontrados;

• invenção de novas hipóteses, teorias ou técnicas ou produção de dados empíricos para resolver o problema;

• obtenção de solução exata ou aproximada;

• Investigação das conseqüências da solução obtida;

• confronto dos prognósticos obtidos com a teoria e a informação empírica disponível;

• correção de hipóteses e procedimentos e começo de um novo ciclo de investigação (quando for o caso).

A partir dessas considerações básicas, mais uma questão se impõe: qual o tipo de pesquisa mais adequado para o campo do lazer?

Justamente por falta de modelos estratégicos para a realização de pesquisas sobre este tema é que temos sempre muitas dúvidas sobre qual opção seguir, como coletar os dados, como interpretá-los, de que forma garantir critérios para construir um conhecimento a partir de uma situação em que eu sou parte integrante do processo.

Page 65: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6262 63

A escolha metodológica é complexa, pois cada tipo de pesquisa tem seus limites e toda opção implicará sempre renúncias. As escolhas são limitadas e uma alternativa é sempre uma das possibilidades, um dos olhares, e nunca detentora da validade absoluta, pois são várias as opções de pesquisa.

2.3 Tipos de pesquisa

Para abordar os tipos de pesquisa, existem diferentes parâmetros para classificá-las. Denker (2003) explica que a tipologia da pesquisa pode ser subdividida de acordo com os campos de atividade humana ou setores do conhecimento; segundo a utilização dos resultados; a natureza ou procedência dos dados; a extensão dos campos de estudo; os métodos de análise; o nível de interpretação, etc.

Neste texto não adotaremos nenhuma classificação específica, pois nossa opção é apresentar alguns tipos de pesquisa geralmente desenvolvidos nos estudos realizados no campo do lazer no Brasil para que você conheça algumas possibilidades metodológicas. Como não temos a pretensão de esgotar o assunto, esperamos que você também aprofunde conhecimentos sobre as possibilidades de pesquisa, busque outros exemplos de estudos no campo do lazer e complemente, posteriormente, o levantamento aqui esboçado.

Pesquisa bibliográfica

Essa metodologia consiste em realizar um trabalho de investigação, procurando analisar os resultados de experiências de pesquisa e as teorias que foram desenvolvidas por diferentes autores que possuem proximidade com o tema escolhido. O pesquisador desenvolve o problema de pesquisa a partir dessa exploração minuciosa do tema e procura estabelecer um diálogo entre suas proposições e o conteúdo da literatura utilizada.

A pesquisa abrange toda a bibliografia publicada em relação ao tema de estudo, tais como boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses. Alguns autores consideram que a pesquisa bibliográfica compreende, além dessas obras, informações fornecidas pelos meios de comunicação orais (rádio, gravações em fita

Page 66: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6464 65

magnética) e audiovisuais (filmes e programas de TV). De acordo com Marconi e Lakatos (2002, p. 71), a finalidade da pesquisa bibliográfica é “colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto, inclusive conferências seguidas de debates que tenham sido transcritos de alguma forma, quer publicadas ou gravadas”.

As principais características, os limites e as possibilidades da pesquisa bibliográfica podem ser assim resumidas:

• Desenvolvida a partir de material bibliográfico já elaborado.

• Pode ser parte integrante de qualquer outra pesquisa, sendo utilizada para auxiliar a construção do marco teórico.

• Permite grande amplitude e economia de tempo.

• Sua principal limitação é a possibilidade de reprodução das falhas presentes nas fontes consultadas. Para reduzir a possibilidade de erro, o pesquisador precisa analisar a forma como os dados foram coletados pelo autor, confrontando-os com outras obras.

Os resultados da pesquisa bibliográfica apontam para o conhecimento sobre diferentes abordagens de um tema ao longo do tempo, ou ainda para a identificação das relações e dos vínculos entre processos de construção, resultados e aplicações do conhecimento.

A pesquisa bibliográfica não significa uma simples repetição do que já foi dito ou escrito sobre determinado assunto, pois propicia a análise de um tema a partir de um novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras (Marconi e Lakatos, 2002). Esse tipo de pesquisa é bastante recorrente no campo de estudos do lazer. É recomendável para pesquisadores que estão iniciando suas buscas na área e ainda não têm experiência com a pesquisa científica.

Pesquisa documental

Independentemente dos procedimentos metodológicos desenvolvidos, toda pesquisa implica o levantamento de dados de variadas fontes. Esse levantamento de

Page 67: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6464 65

dados, que é o primeiro passo de qualquer pesquisa científica, geralmente é feito por meio da pesquisa bibliográfica e/ou da pesquisa documental.

A pesquisa documental tem como característica básica o fato de que a fonte de coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se denomina “fonte primária”. Dados secundários (obtidos de livros, revistas, jornais, etc.) não se confundem com documentos, pois já foram trabalhados. O documento é a “matéria-prima” de que o pesquisador dispõe para fazer suas análises e interpretações.

Dessa forma, a pesquisa documental utiliza, como fonte de dados, materiais que ainda não receberam tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados, tais como documentos conservados em arquivos de instituições públicas, privadas ou particulares (atas, leis, ofícios, relatórios, correspondências, diários, programas, registros, etc.) e até mesmo dados estatísticos; objetos, fotografias e documentação por imagem (compreendendo gravuras, estampas, desenhos, pinturas, etc.).

A pesquisa documental geralmente é desenvolvida em combinação com a pesquisa bibliográfica ou outro tipo de pesquisa, como você poderá verificar no exemplo que se segue.

Mendonça Jr. (2004) realizou uma pesquisa bibliográfica e documental: a primeira, efetuada a partir de um levantamento bibliográfico realizado no Sistema de Bibliotecas da Universidade Metodista de Piracicaba; a segunda, utilizando o método de estudo de caso. A instituição escolhida foi o Serviço Social da Indústria (Sesi), e, como procedimento de amostragem, o autor desenvolveu o não-probabilístico, intencional, por acessibilidade, utilizando a técnica de análise de conteúdo para tratamento dos dados. Tendo como objetivo analisar o documento Política e diretrizes de ação do Sesi no campo do lazer, o estudo procurou verificar se há indicativos da superação do conformismo pela participação.

Pesquisa de campo

A pesquisa de campo é utilizada com o objetivo de obter informações e/ou conhecimentos acerca de um problema e descobrir novos fenômenos ou as

Page 68: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6666 67

relações entre eles. Requer um intenso trabalho de pesquisa bibliográfica e não deve ser confundida com uma simples coleta de dados, que corresponde a uma etapa de suas fases específicas. Assim, a pesquisa de campo demanda a busca de informações e dados necessários ao alcance de objetivos preestabelecidos, que discriminam adequadamente o que deverá ser coletado, registrado e analisado (Marconi e Lakatos, 2002).

A pesquisa de campo pode ser desenvolvida a partir de diversas estratégias, como você poderá observar a seguir:

Pesquisa exploratória

Visa proporcionar maior familiaridade com o problema estudado, ou uma nova forma de considerá-lo. Seu planejamento é flexível, por considerar aspectos variados do problema e, geralmente, envolve técnicas como levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tenham experiência com o problema e análise de exemplos que facilitem a compreensão. Pode ser também utilizada nas fases iniciais da pesquisa (formulação do problema, revisão de literatura, levantamento de hipóteses, etc.).

A pesquisa exploratória consiste em buscar elementos que visam a uma compreensão geral das características apresentadas pelo objeto de pesquisa. Esse procedimento é escolhido quando o pesquisador não está muito familiarizado com o objeto estudado, sendo um trabalho de investigação que propicia descobertas. Para alcançar os objetivos citados, o pesquisador deve, em um primeiro momento, efetuar um levantamento criterioso dos estudos anteriores sobre o tema para, em seguida, planejar uma estratégia de estudo que possibilite uma espécie de sondagem a respeito do tema/problema.

Esse tipo de pesquisa também vem sendo desenvolvido na área do lazer. Gomes (2004) realizou uma pesquisa exploratório-descritiva que objetivou identificar e analisar as dissertações e as teses sobre lazer defendidas no Brasil no período de 1970 a 1995. A autora procurou configurar a produção científica desenvolvida no âmbito do lazer a partir de sua caracterização geral, disciplinar e temática; descrever

Page 69: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6666 67

as referências bibliográficas das teses relacionadas ao lazer turístico, identificando as bases documentais que fundamentaram essas pesquisas; mapear o posicionamento teórico dos autores (em termos de conceitos adotados, teorias envolvidas, autores citados, etc.) e reconstituir historicamente a produção literária na área, tanto em âmbito nacional como internacional. Considerando todas as dissertações e as teses brasileiras como universo da pesquisa, a autora selecionou uma amostra intencional, escolhendo dissertações, teses e teses de livre-docência nas quais o lazer constituía o tema principal.

Por possuir um caráter mais descritivo, normalmente quando esta modalidade de pesquisa é utilizada de forma isolada não permite uma elucidação dos motivos e das causas relacionados a determinada característica. Sendo assim, é muito comum que a pesquisa exploratória se constitua no “primeiro passo” para o desenvolvimento de um trabalho que tem um grau maior de aprofundamento, como, por exemplo, um estudo de caso.

Estudo de caso

O estudo de caso é uma pesquisa que apresenta um grau elevado de aprofundamento em relação ao objeto selecionado para análise. Pode ser para estudar uma metodologia empregada por um profissional, o comportamento de usuários em determinado contexto, um acontecimento específico, dentre outros. Por se tratar de um estudo detalhado, muitas vezes é necessária uma combinação de várias técnicas para o recolhimento de dados de forma que possibilite uma análise satisfatória. Isso depende exclusivamente dos objetivos propostos pelo pesquisador. Entre essas técnicas podem ser citadas: entrevista, coleta de depoimentos, grupo focal, observação, acesso a documentos.

O conhecimento teórico do tema, a análise de trabalhos que seguiram a mesma linha proposta e um contato prévio com o objeto de pesquisa facilitam a escolha da(s) técnica(s) mais adequada(s) para efetivação do estudo. Uma limitação desse tipo de pesquisa diz respeito à impossibilidade de generalização dos resultados. Cada

“caso” estudado apresenta suas peculiaridades, que não devem ser ignoradas para a realização de análises comparativas.

Page 70: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6868 69

Fases do estudo de caso:

1) Delimitação da unidade-caso (pessoa, família, comunidade, conjunto de processos, cultura): é uma construção intelectual arbitrária; é difícil determinar a quantidade de informações necessárias; busca-se a seleção de casos variados: típicos, extremos, marginais.

2) Coleta de dados: uso de procedimentos variados.

3) Análise e interpretação dos dados: é importante tentar-se utilizar categorias analíticas derivadas de teorias amplamente aceitas, evitando-se interpretações baseadas em julgamentos implícitos e “pré-conceitos”.

4) Redação do relatório: deve indicar como foram coletados os dados e a vinculação da interpretação a teorias. Deve-se buscar a concisão possível.

Principais características do estudo de caso:

• Estudo profundo e exaustivo de indivíduos, grupos, organizações ou situações, permitindo o conhecimento aprofundado de processos e relações sociais.

• Recomendado para temas pouco estudados, pois permite a construção de hipóteses ou a recolocação de problemas (pesquisa exploratória).

• Flexível, mas não permite generalizações.

• Exige maior experiência do pesquisador.

• Pode envolver observação, entrevista, história de vida, exame de documentos e outras técnicas (que serão discutidas no próximo tópico).

Vejamos um exemplo: Amaral (2003) realizou um estudo de caso no município de Porto Alegre tomando por base o ano 2000. A autora procurou compreender como ocorria a participação da população na formulação das políticas públicas de lazer na

Page 71: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

6868 69

cidade de Porto Alegre, identificando as possibilidades e os limites dessa participação. Os dados foram coletados por meio de observações, questionários, entrevistas e análise de documentos. A autora optou por usar a técnica de triangulação na análise dos dados, procurando promover um diálogo entre teoria e realidade e entre as diferentes fontes de pesquisa.

Muitas vezes, o estudo de caso representa uma etapa específica da pesquisa etnográfica, uma outra interessante possibilidade de pesquisa. Você sabe em que ela consiste?

Pesquisa etnográfica

A etnografia é um esquema de pesquisa desenvolvido pelos antropólogos para estudar a cultura e a sociedade. Etimologicamente, etnografia significa “descrição cultural”. Para os antropólogos, o termo tem dois sentidos: um conjunto de técnicas que eles usam para coletar dados sobre os valores, os hábitos, as crenças, as práticas e os comportamentos de um grupo social; e um relato escrito resultante do emprego dessas técnicas como atesta André (2002).

Se o foco de interesse dos etnógrafos é a descrição da cultura (práticas, hábitos, crenças, valores, linguagens, significados – Magnani, 2002) de um grupo social, a preocupação central dos estudiosos é com o processo. Segundo André (2002), para que isso aconteça é necessária uma longa permanência do pesquisador em campo, o contato com outras culturas e o uso de amplas categorias sociais na análise dos dados. Nem sempre isso é possível, portanto o que se tem feito é uma adaptação da etnografia a outros campos de conhecimento. Nessas adaptações, o foco permanece na escolha de técnicas de pesquisa que tradicionalmente são associadas à etnografia, ou seja, a observação participante, a entrevista intensiva e a análise de documentos.

Existem polêmicas sobre essa adaptação: uma das questões para a qual os etnometodólogos sensibilizaram os investigadores não constitui exclusivamente um empreendimento científico; pode ser mais bem entendido como “uma realização prática” (Bogdan e Biklen, 1997).

Page 72: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7070 71

Etnologia: Ramo da antropologia que estuda a cultura das chamadas sociedades tradicionais. Relaciona-se com a antropologia cultural, dedicada à discussão das características culturais do homem, como costumes, crenças, comportamentos, organização social, etc.

Algumas características da pesquisa etnográfica:

• princípio da interação constante entre o pesquisador e o objeto pesquisado, o que define, que o pesquisador é o instrumento principal na coleta e na analise dos dados;

• ênfase no processo, naquilo que está ocorrendo, e não no produto ou nos resultados finais;

• preocupação com o significado, com a maneira própria com que as pessoas vêem a si mesmas, suas experiências e o mundo que as cerca. O pesquisador deve tentar apreender e retratar essa visão pessoal dos participantes;

• envolvimento com o trabalho de campo. O pesquisador aproxima-se de pessoas, situações, locais, eventos, mantendo com eles um contato direto e prolongado;

• descrição e indução de situações, pessoas, ambientes, depoimentos. O pesquisador faz uso de uma grande quantidade de dados descritivos que são por ele reconstruídos em forma de palavras ou transcrições literais;

• formulação de hipóteses, conceitos, abstrações, teorias e não sua testagem. Faz uso de um plano de trabalho aberto e flexível, em que os focos da investigação vão sendo revistos; as técnicas de coleta, reavaliadas; os instrumentos, reformulados; e os fundamentos teóricos, repensados.

O que esse tipo de pesquisa de campo visa é a descoberta de novos conceitos, novas relações, novas formas de entendimento da realidade.

Procurando compreender os “Jogos jogados com bola de gude: a atração e o fascínio que marcam os seus atuais e ex-jogadores”, Fonseca (2004) realizou uma pesquisa

Page 73: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7070 71

qualitativa com abordagem etnográfica interpretativa. As formas de abordagem ao tema foram concretizadas por meio de: observação dos jogos de bola de gude de crianças e adolescentes e de entrevistas por meio da técnica de análise do discurso.

Pesquisa participante e pesquisa-ação

A pesquisa participante é uma modalidade científica relativamente recente que mantém uma postura crítica ante o modelo positivista, concebendo e fazendo ciência a partir de uma perspectiva político-social. De acordo com Brandão (1990), na pesquisa participante, pesquisadores e pesquisados, ainda que tenham situações e tarefas diferentes, são sujeitos de um mesmo trabalho comum. Tem, como meta, propiciar um conhecimento mais profundo da realidade, participar desse conhecimento e dele tomar posse. Assim, observa-se o empenho do pesquisador em produzir conhecimentos a partir da participação e da cooperação de todos os envolvidos na situação pesquisada.

O pesquisador procura fazer parte do contexto e, para isso, estabelece relações comunicativas com as pessoas ou grupos da situação investigada, no intuito de conseguir interagir melhor com o grupo. Assim, o pesquisador busca participar do contexto investigado, identificando-se com valores e comportamentos em busca de aceitação.

Seu objetivo é obter conhecimento mais profundo do grupo, que tem ciência da finalidade, dos objetivos e da identidade do pesquisador. Permite a observação das ações no momento em que ocorrem e oferece uma visão dinâmica dos processos de interação no grupo, devendo-se cuidar para não perder a objetividade, um dos critérios que deve ser almejado.

De maneira semelhante à pesquisa participante, a pesquisa-ação pressupõe a inserção num determinado ambiente que se pretende investigar. De acordo com Thiollent (1986, p.14),

“Pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.”

Page 74: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7272 73

Além disso, devemos considerar que a pesquisa-ação não é apenas uma orientação de ação emancipatória e voltada para grupos sociais das classes populares. É uma estratégia de pesquisa em situação real, na qual os pesquisadores intervêm de forma consciente e intencional e os participantes desempenham um papel ativo no processo.

O planejamento de uma pesquisa-ação é dotado de uma flexibilidade considerável, não seguindo uma série de fases ordenadas de forma rígida, não precisando seguir, necessariamente, a ordem proposta para os passos definidos por Thiollent (1986).

Caso você tenha interesse em conhecer os passos (ou momentos) propostos para a pesquisa-ação, consulte Thiollent (1986) e Kurt Lewin (1990).

Muitas são as criticas dirigidas à pesquisa-ação e, dada a sua complexidade, até o momento não foram identificadas muitas investigações dessa natureza no campo do lazer. Entretanto, citamos como exemplo a pesquisa de Almeida (2003), que teve como objetivo analisar o lazer na reclusão e a possibilidade de intervenção pautada na reflexão crítica. A partir da metodologia da pesquisa-ação, o autor observou as atividades desenvolvidas pelos presidiários da Penitenciária de Campinas-SP e, concomitantemente, realizou intervenções privilegiando o lazer como tema gerador, com o intuito de estimular a realização de ações práticas, proporcionando a reflexão sobre o espaço, a posição como sujeito, o corpo e a possibilidade de transformação.

Poderíamos citar outros tipos de pesquisa, mas, neste momento, apresentamos essas possibilidades como exemplos de estudos na área do lazer. Lembramos que a escolha da estratégia de pesquisa dependerá do problema a ser estudado, bem como dos objetivos e da viabilidade do estudo (em termos de tempo, recursos, etc.). Além disso, diferentes estratégias podem ser utilizadas em uma mesma pesquisa, como evidenciaram muitos dos estudos citados para exemplificar.

Page 75: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7272 73

2.4 A coleta de dados

São diversas as formas e a dinâmica dos objetos e das práticas de pesquisa que dão à metodologia vida e dinamismo, explicitam suas complexidades e suas contradições, mas também sua consistência programática. O ato de pesquisar requer que o pesquisador trabalhe sobre uma situação, sobre um objeto, sobre um saber-fazer repleto de significados vividos, que são carregados de desejos, de sonhos, de sentidos e de símbolos. Assim, a escolha das técnicas utilizadas na fase de coleta de dados está condicionada ao problema da pesquisa. Se vou optar pela entrevista ou pelo questionário, depende do meu objeto.

Mesmo que nos exemplos apontados no tópico anterior você já possa ter identificado algumas estratégias para a coleta de dados, trataremos dessa questão para facilitar sua compreensão e ajudá-lo nas suas escolhas, considerando os tópicos a seguir.

Observação

A observação é um instrumento de coleta de dados muito utilizado para estudar o comportamento de pessoas que se encontram em determinada situação. A partir do tema relacionado ao problema de pesquisa, o observador define as pessoas e escolhe o local onde estas estejam na situação que se pretende analisar.

O estudo sobre o uso de um espaço de lazer pode ser realizado a partir da observação do público que o freqüenta para desenvolver suas experiências de lazer. A partir dessa delimitação, o pesquisador dedica parte de seu tempo dando atenção aos acontecimentos que ocorrem no contexto escolhido. O investigador pode adotar duas posturas diferenciadas: a de observador não participante ou a de observador participante. A escolha de qual postura será adotada deve levar em conta a necessidade de recolher dados, que é o objetivo deste procedimento.

Na observação não participante, o investigador se comporta como um expectador das pessoas, do local e do tema. Ou seja, ele “assiste” às cenas que ocorrem sem qualquer participação. Já na observação participante, o investigador interage de alguma forma com o contexto analisado: as conversas com as pessoas, a participação

Page 76: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7474 75

em brincadeiras e a contribuição para a realização de alguma atividade são exemplos de participações que podem ser exercidas pelo pesquisador.

É importante destacar a necessidade de conduzir de forma sistemática toda a observação sem se deixar levar por receitas prévias. O estudo prévio de observações realizadas por outros pesquisadores pode contribuir para evitar dispersão ou mesmo enganos do investigador iniciante. O registro rotineiro das observações efetuadas deve ser precedido de um roteiro dos itens a serem observados, como também deve contemplar a anotação de situações e/ou acontecimentos inesperados.

No entanto, a observação direta feita pelo pesquisador tem seus limites. O mundo social que ele examina por um determinado período de tempo tem continuidade, seus registros e memórias podem apresentar lacunas e, muitas vezes, seus valores e paradigmas se conformam à interpretação dos registros efetuados. A realização de uma boa observação e a interpretação dos registros efetuados deve observar alguns princípios da pesquisa sociológica, quais sejam: as pessoas não são necessariamente o que elas dizem ou fazem nem fazem ou dizem o que elas necessariamente são; a interpretação dos registros coletados durante uma observação iniciou-se desde o momento da elaboração do roteiro de itens, ou melhor, a partir do referencial teórico do pesquisador. Outra característica de uma boa observação é a apresentação criteriosa de situações ou acontecimentos novos, inesperados ao referencial teórico do pesquisador.

O estudo de Queirós (2000), por exemplo, buscou compreender e interpretar os interesses, os valores e os significados da e na participação dos descendentes de alemães na 11a Oktoberfest, de Marechal Cândido Rondon, PR, por meio de uma análise sociocultural. O estudo compreendeu uma combinação de pesquisa bibliográfica com as pesquisas documental e exploratória, privilegiando, como técnica de coleta de dados, a observação participante e entrevistas estruturadas, além de testemunhos orais de organizadores, trabalhadores, turistas e participantes locais.

Entrevista

Entrevista é uma conversa intencional, que tem como objetivo o recolhimento de informações a respeito de um assunto determinado. O entrevistador conduz a

Page 77: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7474 75

conversa para estimular a(s) pessoa(s) a falarem a respeito do tema de seu interesse. O entrevistado contribui com o relato de suas experiências, opiniões a respeito do assunto proposto ou em relação a algum acontecimento específico.

A necessidade de seguir um roteiro é dependente do objetivo do estudo. A entrevista estruturada exige a elaboração de um roteiro prévio, que tem por finalidade recolher dados a partir de perguntas específicas. Na entrevista não estruturada, o entrevistador introduz determinado assunto e deixa que o(s) entrevistado(s) fale(m) livremente, sem que haja o cumprimento de um roteiro preestabelecido. Uma outra possibilidade é promover a entrevista semi-estruturada, em que o pesquisador estabelece um roteiro prévio, porém flexível. Embora sejam feitas perguntas específicas, o entrevistado possui um espaço para falar livremente, e o pesquisador pode elaborar questões não previstas inicialmente, mas que podem ser importantes para a compreensão de seu problema de pesquisa.

As entrevistas não estruturadas podem contribuir com informações que não haviam sido sequer imaginadas pelo observador, mas pode ocorrer o desvio do assunto proposto, em razão do grau de liberdade desse procedimento. Embora as estruturadas se restrinjam ao que foi proposto, podem ser utilizadas para análises comparativas, pois o roteiro seguido permite a análise de respostas dadas para as mesmas perguntas. Quando é possível realizar mais de uma entrevista com um sujeito, é comum que gradativamente elas passem de não estruturadas a estruturadas. Inicialmente, realiza-se uma sondagem, para depois aprofundar e obter informações mais específicas.

A entrevista não tem um caráter questionador, ou seja, independentemente da opinião do entrevistado, este precisa ser respeitado. É importante que o entrevistado se sinta à vontade para falar o que pensa e esteja seguro de que as informações sejam confidenciais e utilizadas apenas na pesquisa. Ao realizar a pesquisa, é importante preparar, previamente, um Termo de Consentimento, para que o entrevistado autorize a publicação das informações fornecidas pela entrevista. Sua utilização é recomendada quando o número de entrevistas a serem efetuadas é mais reduzido (esse número depende das condições de realização do estudo disponíveis para o pesquisador), ou quando a(s) pessoa(s) entrevistada(s)

Page 78: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7676 77

detêm informações/experiências novas, ou, ainda, quando o(s) entrevistado(s) são portadores de sentidos ou significados diversos sobre o tema de estudo.

Para um pesquisador iniciante, a entrevista com questões abertas contribui para checar seus pressupostos iniciais, elaborados no decorrer da revisão de literatura, confrontar diferentes respostas sobre uma mesma questão e conhecer experiências diversas sobre o objeto da pesquisa. A análise de questões abertas é mais complexa, pois permite uma variedade de respostas, que em algumas situações não correspondem ao que foi solicitado pela pergunta. Após a(s) entrevista(s), o pesquisador deverá elaborar um inventário das respostas, que servirá de base para a análise posterior. Elaborar um roteiro prévio com questões abertas apresenta duas vantagens essenciais: possibilita identificar as práticas, as concepções e os referenciais próprios dos entrevistados sobre o tema e também oferece maiores perspectivas de comparação de informações correlacionadas, além do registro das diferenças de opinião sobre o assunto.

Por outro lado, corre-se o risco maior de as informações recolhidas estarem dispersas ou mesmo serem inúteis para as preocupações da pesquisa. A forma de elaboração das questões e sua ordenação no roteiro são importantes para evitar esse viés. Na atualidade, a gravação da entrevista é preferível à coleta de respostas por escrito. Muitas vezes o(s) entrevistado(s) dispõe(m) de pouco tempo ou baixa motivação para responder por escrito. Nas gravações, o pesquisador deve atentar para inflexões de voz, evasivas ou silêncios ocorridos na entrevista. Essas situações também fazem parte da resposta. A atitude do pesquisador no decorrer da entrevista tem conseqüências importantes, pois ele pode influenciar a qualidade das respostas apresentadas. É necessário explicar claramente ao entrevistado quais os objetivos do conjunto de perguntas a serem formuladas e se ele concorda em respondê-las, tendo em vista que serão gravadas. Em seguida, apresentar pausadamente as questões aguardando, atentamente, que a resposta seja complementada para passar à pergunta seguinte. Evite interromper o entrevistado e, quando necessário, somente para esclarecimento de dúvidas específicas, procurando fazê-lo de forma que se interfira o mínimo possível na elaboração da resposta.

Page 79: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7676 77

Tendo como ponto de partida de análise o muro de escalada do Grupo de Escalada Esportiva da Unicamp, o estudo de Marinho (2001) investigou as relações estabelecidas na escalada esportiva em ambientes artificiais. Privilegiando uma abordagem sociocultural, o estudo foi desenvolvido, complementarmente, entre pesquisa bibliográfica e pesquisa empírica, com a utilização de entrevistas semi-estruturadas e observação participante como recursos para obtenção dos dados.

Questionário

Também abordaremos este tema de forma simples, pois o espaço é relativamente pequeno para o detalhamento dessa questão. A sugestão é que se procure na literatura resposta mais aprofundada, de acordo com a necessidade de cada tema de pesquisa. Segundo Laville e Dionne (1999), para saber a opinião da população sobre uma determinada escolha da sociedade como a da preservação dos programas sociais, é preciso, evidentemente, interrogá-la. Talvez não a população inteira, mas uma amostra suficiente, constituída com os cuidados requeridos para assegurar sua representatividade. Para tal investimento, são necessários instrumentos, compatíveis com as necessidades da investigação, tais como os questionários.

O questionário é considerado uma técnica de observação direta pelo fato de estabelecer um contato efetivo com as pessoas implicadas no problema investigado. No entanto, possui peculiaridades que devem ser observadas para que o pesquisador possa atingir seus objetivos.

Para interrogar indivíduos que compõem uma determinada amostra, é possível definir o tipo de amostragem que será utilizada: a amostragem probabilística (sorteio dos indivíduos dando chance igual para todos), amostragem por quotas (seleção de um número de indivíduos proporcional à importância das categorias que eles representam no conjunto) e a amostragem por aglomerados (seleção aleatória de indivíduos e aplicação do questionário a cada um deles e às pessoas que estão ao seu redor ou que eles indicam). De acordo com Thiollent (1986), no plano do rigor estatístico só a amostragem probabilística garante a representatividade.

Questionários e entrevistas são considerados complementares. Como regra geral, pratica-se a entrevista não diretiva em estudo piloto para determinar a formulação do questionário, isto é, o processo denominado de validação ou pré-teste. Em

Page 80: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7878 79

seguida, se a forma for validada ou tiver de sofrer alterações, o questionário será distribuído por um meio acessível, seja via correios ou outra forma.

A aplicação dos questionários obedece a regras diferentes das regras das entrevistas abertas. Sendo padronizado, tem a vantagem de alcançar um número maior de pessoas, uma vez que responderam sem a necessidade da presença do entrevistador, mas sempre garantindo a representatividade no universo da pesquisa.

Um outro fator fundamental está relacionado à questão da linguagem e à ordem das questões, pois esses cuidados revestem-se de muita importância quando se interrogam pessoas. Geralmente, faz-se um esforço para propor a formulação mais imparcial possível e ordenar as questões no intuito de minimizar os efeitos de umas sobre as outras. Assim como os interrogados colocam a si mesmos as perguntas, deve-se presumir que eles compreendem seu sentido. Dessa maneira, é fundamental que as questões sejam claras, garantindo que os interrogados as interpretem como o pesquisador planejou. Ao trabalhar os dados, é fácil perceber (pelas respostas) se houve entendimento do sentido, mas isso não assegura a uniformidade das interpretações, que podem ser distintas.

Para exemplificar: Riede e Bramante (2003) realizaram um estudo com o objetivo de identificar os fatores críticos de sucesso nos processos de gestão praticados nas Associações Atléticas Banco do Brasil (AABBs). O estudo combinou as pesquisas bibliográfica, documental e exploratória de campo por meio de um trabalho de coleta de dados com a aplicação de questionários. Os sujeitos da pesquisa foram superintendentes e gerentes do Banco do Brasil em 15 cidades com e sem AABBs, conselheiros e presidentes de AABBs, associados e não associados.

Na etapa de tratamento dos dados, o pesquisador terá de construir categorias e analisar as respostas dos sujeitos. Trataremos dessa questão a seguir.

2.5 A análise e a interpretação dos dados

Tanto na literatura quanto na prática da pesquisa, a análise dos dados nem sempre recebeu a atenção necessária. Poderíamos dizer que isso acontece na pesquisa

Page 81: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

7878 79

qualitativa justamente para não se correr o risco de um receituário que possa cercear a liberdade do pesquisador.

Mas a análise de dados é o processo de busca e de organização sistemático das transcrições de entrevistas, de notas de campo e de outros materiais que foram sendo acumulados com o objetivo de aumentar sua própria compreensão desses mesmos dados e de lhe permitir apresentar aos outros aquilo que encontrou. Dito de forma mais simples, é a hora de reunir a teoria com os dados coletados por meio das entrevistas, dos questionários ou das observações que você realizou e que precisam ser organizados e compreendidos.

Segundo Bogdan e Biklen (1994), a análise envolve o trabalho com os dados, sua organização, divisão em unidades manipuláveis, síntese, procura de padrões, descoberta dos aspectos importantes e suas decisões.

A tarefa analítica, ou seja, a tarefa de interpretar e tornar compreensíveis os materiais recolhidos, parece ser monumental quando alguém se envolve num primeiro projeto de investigação. Uma boa dica para o pesquisador não se perder na hora de reunir todo esse material e tomar decisões sobre eles é ensaiar a análise logo após realizar cada entrevista ou questionário, fazer as anotações de cada documento, garimpando as principais idéias. Deve-se analisar comparativamente as diferentes respostas, as idéias novas que aparecem, o que confirma e o que rejeita as hipóteses iniciais, o que esses dados levam a pensar de maneira mais ampla. Este momento exige muito tempo de reflexão e dedicação para se tirar o máximo de idéias de cada resposta, de cada leitura.

Existem muitos estilos diferentes de investigação qualitativa e uma variedade de maneiras de trabalhar e analisar os dados. É o ponto em que se percebe com mais nitidez o estilo do pesquisador: seu conhecimento teórico, sua criatividade para analisar cada dado e seu bom-senso para descartar as informações desnecessárias. Garantindo os critérios de rigor, o pesquisador irá retomar suas hipóteses, seu quadro teórico, os conceitos rastreados e explicitar toda a sua criatividade.

Page 82: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8080 81

Busque livros de metodologia de pesquisa e procure complementar esta discussão sobre a análise de dados identificando algumas possibilidades sugeridas pelos autores.

2.6 O ponto de chegada: conclusão da pesquisa

Para que as conclusões de sua pesquisa não sejam banais, você deve refletir para além dos dados obtidos e analisados, deve se arriscar e teorizar, retomar o trabalho de reflexão especulativa, conceitual, e confrontá-lo com os resultados que você encontrou. Dessa forma, garante-se a dimensão de originalidade do trabalho, mesmo que seja numa produção modesta.

O que importa é que o resultado seja aceito como um avanço, que possa servir de meta para uma contestação posterior, que se constituirá em um outro avanço e não somente um retorno ao ponto de partida. Essas regras da pesquisa são as normas que asseguram o rigor metodológico do estudo e, assim como a ética da atividade científica, independe da abordagem adotada (qualitativa ou quantitativa).

Ao concluir seu trabalho, este precisa ser sistematizado a partir da revisão de toda a sua monografia, revendo a lógica do estudo, a coerência e a coesão das idéias trabalhadas. Assim, é necessário explicitar informações sobre a forma de planejamento e execução da pesquisa, análise e interpretação dos dados e principais conclusões e recomendações.

Agora que já percorremos o trajeto proposto para a pesquisa científica, construa o seu projeto de monografia. Siga os seguintes passos:

• Título: procure elaborar uma frase, a mais breve possível, que permita identificar sua área de estudos e/ou problema de investigação. Caso queira,

Page 83: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8080 81

pode complementar o título com uma segunda frase (subtítulo) que delimite mais o que você pretende estudar.

• Questões problematizadoras: enuncie os desafios do estudo, da investigação ou da experiência proposta na forma de perguntas, hipóteses a serem confirmadas ou características particulares que a diferenciam. A escolha depende do conteúdo de seu estudo.

• Objetivo: redigir duas ou três frases apresentando o que você espera conseguir ao final desta atividade. Podem ser objetivos relacionados a novos conhecimentos, ações profissionais ou experiências inovadoras. Lembre-se de que os objetivos propostos indicam quais os resultados esperados de seu trabalho.

• Justificativa/relevância: você deve buscar responder pelo menos duas das questões propostas a seguir, além de outras que você julgue pertinentes a partir da leitura deste livro: Qual a importância desse estudo para sua prática profissional? Que situações-problema o estudo pode contribuir para solucionar? Que modificações e que inovações você considera possíveis a partir de seu estudo?

• Pressupostos teóricos: Como seu tema de estudos e/ou questões são tratados na bibliografia consultada? Como você situa essa discussão na sua prática profissional? O que você considera pertinente para sua maior compreensão do problema abordado?

• Procedimentos metodológicos: apresente, de forma sistematizada, quais as ações necessárias à realização da pesquisa. Informe de modo sucinto quais os procedimentos de coleta/análise dos dados que você pensa em utilizar.

• Cronograma de atividades: a forma mais usual de cronograma especifica quais ações serão realizadas em um determinado período. Verifique quanto tempo você dispõe para concluir seu estudo, que é um pré-requisito para que você obtenha o título de especialista.

• Referências: registre as referências bibliográficas que você utilizar em sua pesquisa, listando-as sempre seguindo as normas da ABNT.

Page 84: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8282 83

Para sintetizar as discussões propostas neste livro, apresentamos o quadro a seguir (Bogdan e Biklen, 1994, p. 72-74), que ilustra muitos pontos do percurso detalhado no texto, complementando o assunto e indicando outros elementos que podem ser aprofundados em livros que tratam de metodologia da pesquisa.

Características das Abordagens Qualitativa e Quantitativa

QualitativaExpressões/frases associadas com a abordagem

Quantitativa Expressões/frases associadas com a abordagem

- etnógrafo- trabalho de campo- dados qualitativos- interação simbólica - perspectiva interior- naturalista- etnometodológico- descritivo

- observação participante- fenomenológico- escola de Chicago- documentário- história de vida- estudo de caso- ecológico- émico

- experimental- dados quantitativos- perspectiva exterior- empírica

- positivista- fatos sociais- estatística- ética

Conceitos-chave associados com a abordagem Conceitos-chave associados com a abordagem

- significado- compreensão de senso comum

- pôr entre parênteses- compreensão- vida quotidiana

- processo- ordem negociada- para todos os propósitos práticos

- construção social- teoria fundamentada

- variável- operacionalização- garantia- hipóteses

- validade- significância estatística

- replicação- predicação

Afiliação teórica Afiliação teórica

- interação simbólica- etnometodologia- fenomenologia

- cultura- idealismo

- funcionalismo cultural- realismo, positivismo- comportamentalismo

- empirismo lógico- teoria dos sistemas

Afiliação acadêmica Afiliação acadêmica

- sociologia- história

- antropologia - psicologia- economia

- sociologia- ciência política

Objetivos Objetivos

- desenvolver conceitos sensíveis

- descrever realidades múltiplicas

- teoria fundamentada- desenvolver a compreensão

- teste de teorias- encontrar fatos- descrição estatística

- encontrar relações entre variáveis

- predição

Page 85: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8282 83

Plano Plano

- progressivo, flexível, geral - intuição relativa ao modo de avançar

- estruturado, predeterminado, formal, específico

- plano detalhado de trabalho

Elaboração das propostas de investigação Elaboração das propostas de investigação

- breves- especulativa- sugere áreas para as quais a investigação possa ser relevante

- normalmente escritas após o recolhimento de alguns dados

- parcas em revisão de literatura

- descrição geral da abordagem

- externas- detalhadas e específicas nos objetivos

- detalhadas e específicas nos procedimentos

- longa revisão de literatura

- escritas antes do recolhimento de dados

- especificação de hipóteses

Dados Dados

- descritivos- documentos pessoais- notas de campo

- fotografias- o discurso dos sujeitos- documentos oficiais e outros

- quantitativos- codificação quantificável- contagens, medidas

- variáveis operacionalizadas

- estatísticas

Amostra Amostra

- pequena- não representativa

- amostragem teórica - ampla- estratificada- grupos de controle- precisa

- seleção aleatória- controle de variáveis extrínsecas

Técnicas ou métodos Técnicas ou métodos

- observação- estudo de documentos vários

- observação participante- entrevista aberta

- experimentos- inquéritos- entrevista estruturada

- quase experimentos

- observação estruturada

- conjuntos de dados

Relação com os sujeitos Relação com os sujeitos

- empatia- ênfase na confiança- igualdade

- contato intenso- o sujeito como amigo- ser natural

- circunscrita- curta duração

- distante- sujeito-investigador

Page 86: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8484 85

Instrumentos Instrumentos

- gravador- transcrição

(freqüentemente a pessoa do investigador é o único instrumento)

- inventários- questionários- índices

- computadores- escalas- resultado de testes

Análise de dados Análise de dados

- contínua- modelos, temas, conceitos- indutivo

- indução analítica- método comparativo constante

- dedutiva- verifica-se após a conclusão dos dados

- estatística

Problemas com o uso da abordagem Problemas com o uso da abordagem

- demorada- difícil a síntese dos dados- garantia

- os procedimentos não são estandardizados

- dificuldade em estudar populações de grandes dimensões

- controle de outras variáveis- reificação

- intrusão- validade

BOGDAN, R.; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação:, uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Editora Porto, 1994, p. 72-74.

Esperamos ter contribuído para o sucesso de seu projeto de monografia. Lembre-se: “mono” vem do grego mónos, que significa só, único, isolado; “grafia” também deriva do grego grapho, gráphein, que quer dizer escrever, descrever, desenhar. Fica o desafio de que você comece, desde já, a escrever sua monografia!

Page 87: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8484 85

Unidade 1

BACHELARD, Gaston. A formação do novo espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Rio de Janeiro: Contraponto,1996.

CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1997.

DEMO, Pedro. Pesquisa e construção de conhecimento. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994.

DENKER, Ada F. M. Métodos e técnicas de pesquisa em turismo. São Paulo: Futura, 2003.

DESCARTES, René. Discurso do método. São Paulo: Abril, 1979. (Col. Os pensadores)

FERREIRA, Acácio. Lazer operário: um estudo de organização social das cidades. Salvador: Progresso, 1959.

FRANÇA, Júnia L.; VASCONCELLOS, Ana Cristina. Manual para normalização de publicações técnico-científicas. 7. ed. Belo Horizonte: UFMG, 2004.

GOMES, Christianne L. Significados de recreação e lazer no Brasil: reflexões a partir da análise de experiências institucionais (1926-1964). 2003. Tese (Doutorado em Educação.) – Faculdade de Educação/UFMG, Belo Horizonte, 2003.

R E F E R Ê N C I A S

Page 88: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8686 87

GRAMSCI, Antonio. Concepção dialética da história. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.

HABERMAS, Jürgen. Conhecimento e interesse. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.

LAVILLE, Christian; DIONNE, Jean. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências sociais. Porto Alegre: Artmed, 1999.

MAGNANI, José Guilherme C. Lazer: um campo multidisciplinar de pesquisa. In: BRUHNS, Heloísa T.; GUTIERREZ, Gustavo L. (Org.). O corpo e o lúdico: ciclo de debates. e Lazer e motricidade. Campinas: Autores Associados, 2000. p.19-33.

__________. De perto e de dentro: notas para uma etnografia urbana. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 17, n. 49, 2002.

MINAYO, Maria Cecília S. et al. (Org). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 1996.

QUINO. Toda Mafalda, da primeira à última tira. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

RIZZINI, I.; CASTRO, Mônica R.: SARTOR, Carla D. Pesquisando: guia de metodologias de pesquisa para programas sociais. Rio de Janeiro: Universidade Santa Úrsula/Ed. Universitária, 1999.

TEIXEIRA, Maria Inês C. A monografia e a redação de trabalhos acadêmico-científicos. Belo Horizonte, 2002. p. 78-200. (Col. Veredas)

Unidade 2

ALMEIDA, Marco Antonio B. Lazer e presídio: a relação que não se busca. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 6, n. 1, p. 71-81, 2003.

ALVES, Vânia F. N. O corpo lúdico Maxakali: desvelando os segredos de um “programa de índio”. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 3, n.1, p.111-112, 2000.

ALVES-MAZZOTI, Alda Judith. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. São Paulo: Pioneira,1998.

Page 89: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8686 87

AMARAL, Maria Teresa M. Curso de formação em educação à distância-Unirede: metodologia da pesquisa e didática de ensino superior. [Curitiba]: MEC/Seed, 2001.

AMARAL, Silvia Cristina F. Políticas públicas de lazer e a participação cidadã: entendendo o caso de Porto Alegre. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 6, n. 2, p. 99-100, 2003.

ANDRÉ, Marli. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus, 2002.

BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto, Portugal: Porto, 1997.

BRANDÃO, Carlos R. Pesquisa participante. 8. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990.

FONSECA, Ingrid F. Jogos jogados com a bola de gude: a atração e o fascínio que marcam os seus atuais e ex-jogadores. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 7, n. 2, p.119, 2004.

GOLDENBERG, Miriam. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em ciências sociais. Rio de Janeiro: Record,1997.

GOMES, Cristina M. Pesquisa científica em lazer no Brasil: bases documentais e teóricas. 2004. Tese – (Mestrado em Ciências da Comunicação.) – Escola de Comunicações e Artes, USP, São Paulo, 2004.

HOBSBAWM. Era das revoluções 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra, 1982.

HUBERMAN, A. M.; ILLES, M. B. Analyse ds données qualitative. Recueil de nouvelles méthodes. Bruxelles: De Boeck-Wesmael, 1991.

KIPNIS, Bernardo. Elementos do processo de pesquisa, EPP Seleção. Brasília: SESI/DN, 2003.

__________. Elementos do processo de pesquisa: projeto. Brasília: SESI/DN, 2003.

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1982.

Page 90: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8888 89

LAVILLE, Christian; DIONNE, Jean. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências sociais. Porto Alegre: Artmed, 1999.

LEWIN. K. In: SERRANO, M. G. P. Investigacion-accion: aplicaciones al campo social y educativo. Madrid: Kykinson,1990.

MARCONI, Marina A.; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia científica. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2000.

__________. Técnicas de pesquisa: planejamento e execução de pesquisa, elaboração, análise e interpretação de dados. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

MARINHO, Alcyane. Da busca pela natureza aos ambientes artificiais: reflexões sobre a escalada esportiva. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 4, n. 1, p.137-138, 2001.

MENDONÇA Jr., Ataliba. O lazer no Sesi: do conformismo à participação. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 7, n. 1, p. 85, 2004.

MORIN, Edgard. A religação dos saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.

QUEIRÓS, Ilse Lorena V. B. G. A; Oktoberfest de Marechal Cândido Rondon. Paraná: um estudo sobre o significado do lazer entre descendentes de alemães. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 3, n. 1, p.107-108, 2000.

RIEDE, Antonio Sérgio; BRAMANTE, Antonio Carlos. Realinhamento dos fatores críticos de sucesso na gestão de clubes social-recreativos baseado no conhecimento dos sistemas internos e externos: o caso das AABBs. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 6, n. 1, p. 29-45, 2003.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Verbete Ciência 23-43. In Carrilho (Org). Dicionário do pensamento contemporâneo. Lisboa: Publicações Dom Quixote,1991.

__________ (org). Conhecimento prudente para uma vida decente, “um discurso da ciência” revisitado. São Paulo: Cortez, 2004.

Page 91: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

8888 89

SILVA, Otávio G.T. Algumas relações entre as formas de lazer jovem e a educação física escolar. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 2, n. 1, p. 132-149, 1999.

SILVA, Silvio Ricardo. Tua imensa torcida é bem feliz... Da relação do torcedor com o clube. Revista Licere, Belo Horizonte, v. 5, n. 1, p. 139-140, 2002.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. 7. ed. São Paulo: Cortez, 1986.

VAN DER MAREN, Jean-Marie. Méthodes de recherche pour l’éducation. 2°. édition. Montréal: Les Presses de l’Université de Montréal; Bruxelles: De Boeck-Wesmael, 2005.

Page 92: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005
Page 93: Metodologia eBook SESI GOMES,Chris.2005

Coordenação Geral do Programa

SESI/DN - UniSESI

Joana D’Arc Machado Cerqueira, Especialista - Universidade de Brasília Coordenadora Geral

Cláudia Martins Ramalho, Especialista - Universidade Federal de Minas Gerais Gerente de Cultura

Rossana Araújo de Melo e Silva, Bacharel – Faculdades Integradas de Patos Responsável TécnicaI

Thiago Endres da Silva Gomes, Bacharel – Universidade Católica de Brasília Responsável Técnico

Coordenação UFMG

Christianne Luce Gomes, Doutora - Universidade Federal de Minas Gerais Coordenadora Geral

Maria Teresa Marques Amaral, Mestre - Universidade Federal de Minas Gerais Coordenadora pedagógica de meios e mídias

Hélder Ferreira Isayama, Doutor - Universidade Federal de Minas GeraisCoordenador de tutoria

Daniel Braga Hübner, Especialista - Universidade Federal de Minas Gerais Coordenador Administrativo

Ana Letícia KlajnbergSecretária Acadêmica

Sistema Confederação Nacional da Indústria

Superintendência de Serviços Compartilhados – SSCÁrea Compartilhada de Informação e Documentação - ACIND

Marmenha RosárioNormalização

Link DesignProjeto Gráfico

TDA Desenho e ArteDesign e Editoração Eletrônica

Stock. xchngFoto capa