metodologia do trabalho academico-6 - versão final

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  • Ani Carla Marchesan Atilio Butturi Junior

    Campo Grande, MS - 2011

    METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

  • PRESIDENTE DA REPBLICA Dilma Rousseff

    MINISTRO DA EDUCAO Fernando Haddad

    SECRETRIO DE EDUCAO A DISTNCIA Carlos Eduardo Bielschowsky

    UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL

    REITORA Clia Maria Silva Correa Oliveira

    VICE-REITOR Joo Ricardo Filgueiras Tognini

    COORDENADORA DE EDUCAO ABERTA E A DISTNCIA - UFMSCOORDENADORA DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL - UFMS

    Angela Maria Zanon

    COORDENADOR ADJUNTO DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL - UFMS Rodrigo Juliano Oliveira

    COORDENADORA DO CURSO DE LETRAS: PORTUGUS E ESPANHOL (MODALIDADE A DISTNCIA)Patrcia Graciela da Rocha

    CMARA EDITORIAL

    SRIE

    Angela Maria ZanonDario de Oliveira Lima Filho

    Carina Elisabeth MacielPatrcia Graciela da Rocha

    Sonia Maria Monteiro da Silva BurigatoVera de Mattos Machado

    Obra aprovada pelo Conselho Editorial da UFMS - Resoluo n 12/2011

    CONSELHO EDITORIAL UFMS

    Dercir Pedro de Oliveira (Presidente)Celina Aparecida Garcia de Souza Nascimento

    Claudete Cameschi de SouzaEdgar Aparecido da Costa.

    Edgar Czar NolascoElcia Esnarriaga de Arruda

    Gilberto MaiaJos Francisco FerrariMaria Rita Marques

    Maria Tereza Ferreira Duenhas MonrealRosana Cristina Zanelatto Santos

    Sonia Regina JuradoYnes da Silva Felix

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Coordenadoria de Biblioteca Central UFMS, Campo Grande, MS, Brasil)

  • APRESENTAO

    Caro(a) Aluno(a),Iniciar um curso de graduao no apenas dar os pas-

    sos iniciais na carreira profissional, mas enfrentar os desafios inerentes vida acadmica. Na Universidade, o sujeito se de-para com um universo de conhecimento especializado e com novos gneros textuais, tpicos dos ambientes ligados Cin-cia, Filosofia e s Artes. Isso demanda algumas adaptaes e um entendimento dos caminhos do Ensino Superior.

    Quando pensamos em caminhos, a importncia da Metodologia vem tona. Primeiramente, porque j na eti-mologia (a filiao histrica de cada palavra) a palavra me-todologia traz significados derivados do latim como percur-so, caminho. A implicao direta dessa filiao imaginar que o conhecimento cientfico e filosfico da Universidade exige que se percorram caminhos determinados, j traados pela tradio de pesquisa e que permitam um entendimento universal dos temas abordados.

    Imagine um quadro simples: diferentes Universida-des do mundo fazem pesquisa sobre uma espcie ainda sem nome, sem etiqueta. Algumas dessas Universidades optam por abordar esse novo ser pela biologia evolutiva do sculo XIX, enquanto outras Universidades baseiam seus estudos na Gentica contempornea. Alm disso, cada uma das Univer-

  • sidades apresenta seus resultados de forma diferente: algu-mas optam por utilizar grficos, outras desenvolvem teses de doutoramento, e ainda h aquelas que produzem narrativas (histrias) para dizer aquilo que observam a nossa es-pcie nova.

    O leitor h de convir que alguma confuso provavelmen-te seria instituda nessa discusso:

    Como os pesquisadores poderiam se entender com cdigos to diferentes?

    Como os resultados poderiam ser comparados a partir de teorias to diferentes?

    Como os saberes sobre a nova espcie poderiam re-dundar em conhecimento, visto a disparidade (prov-vel) na divulgao dos resultados?

    Uma confuso parecida com essa narrada j na Bblia, no mito da Torre de Babel: os homens construram a torre para chegar aos cus e quando essa caiu todos passaram a falar lnguas diferentes e nunca mais se entenderam. Diferen-temente da Bblia, o papel da Metodologia justamente con-sertar o mito: construir torres cada vez mais altas e permitir o entendimento cada vez mais geral entre os sujeitos.

    Certamente, os mtodos cientficos nem sempre alcan-am sucesso em sua tentativa de dizer tudo e faz-lo de ma-neira objetiva. Atualmente, inclusive, h um grande debate sobre os limites da objetividade e sobre essa capacidade de entendimento. Muitos cientistas e epistemlogos (os filsofos preocupados com questes cientficas) tm se perguntado so-bre as funes dos mtodos e negado a capacidade de qual-quer metodologia para criar um entendimento geral. Mais do que isso, hoje se pensa na cincia e na vida acadmica como experincias ligadas ao poltico, social, cultural e afins.

    Este livro, a partir da necessidade de mostrar os percur-sos e da importncia de considerar os limites desses percur-sos, oferece uma introduo metodologia do trabalho aca-dmico. Ser uma espcie de manual, passando brevemente sobre os conceitos mais clebres de cincia e mtodo e partin-do para as prticas de textualizao exigidas na graduao, a fim de que o leitor possa dispor das ferramentas necessrias para refletir sobre o fazer cientfico na Universidade e para produzir seus estudos e textualiz-los da forma mais adequa-da s esferas ligadas formao no Ensino Superior.

    Para isso, nosso livro est assim organizado: no primeiro captulo, Mas afinal, o que metodologia?, oferecemos um pa-norama geral dos conceitos de Cincia e Mtodo; no segundo

  • captulo, A vida universitria, descrevemos os principais me-canismos institucionais de pesquisa e refletimos sobre o co-tidiano do Ensino na Graduao; no terceiro captulo, Leitura e documentao, fazemos uma breve discusso sobre a impor-tncia da leitura, bem como indicamos a importncia das fon-tes legitimadas de pesquisa e descrevemos os mtodos mais utilizados de documentao, a saber, o Resumo e o Fichamen-to; no quarto captulo, Trabalho Acadmico, apresentamos os principais gneros que circulam na Universidade, a Resenha e o Artigo Cientfico, sua funo sociocomunicativa e sua confi-gurao textual.

    A tarefa , sobretudo, permanente: dominar as metodo-logias acadmicas requer uma prtica constante, que envolve um processo que nunca acaba entre pesquisa e produo de textos, de acordo com parmetros bastante rgidos de acei-tao que circulam nas mais diferentes reas. Caber ao aca-dmico, fundamentalmente, alcanar a proficincia a partir dos contedos sugeridos nesse livro.

    Os autores.

  • Sobre os autores

    ATILIO BUTTURI JUNIORGraduado em Lngua Portuguesa e respectivas Literaturas pela Universidade Estadual

    de Ponta Grossa UEPG (2004); mestre em Lingustica Terica pela Universidade Federal de Santa Catarina UFSC (2008). Atualmente doutorando em Lingustica tambm pela Universidade Federal de Santa Catarina e professor assistente da Universidade Federal da

    Fronteira Sul UFFS, Campus Erechim - RS. E-mail para contato: [email protected]

    Currculo lattes:

    ANI CARLA MARCHESANGraduada em Lngua Portuguesa e Inglesa com respectivas Literaturas pela Universidade Federal

    de Santa Maria UFSM (2005); mestre em Lingustica Terica pela Universidade Federal de Santa Catarina UFSC (2008). Atualmente doutoranda em Lingustica tambm pela

    Universidade Federal de Santa Catarina e professora da Universidade Federal da Fronteira Sul UFFS, Campus Erechim - RS.

    E-mail para contato: [email protected] lattes:

    LUIZ LEANDRO GOMES DE LIMA professor colaborador de Lingustica e Lngua Portuguesa no curso de Letras da EaD-UFMS.

    Possui graduao em Letras - Portugus e Ingls pela UFMS. Suas reas de interesse so Lingustica Geral e Portuguesa e Ensino de Lngua Portuguesa

    E-mail para contato: [email protected] Currculo Lattes:

    PEDRO PAULO VEZON FILHOCriador da imagem da capa deste livro. Graduado em Design de Produto pelo

    Instituto Federal Tecnolgica de Santa Catarina IFSC (2010). Atualmente responsvel pelo Estdio Longe.E-mail para contato: [email protected]

    Currculo lattes: < http://lattes.cnpq.br/6721966783989780>

  • SUMRIO

    UNIDADE I

    Mas afinal, o que Metodologia?

    1.1 As hipteses e teorias 151.2 O objeto 171.3 O mtodo 18

    UNIDADE II

    A vida universitria

    2.1 Universo acadmico e a construo de conhecimentos 252.2 O Ensino da Universidade:

    encontros presenciais e estudo individual 302.3 Interao distncia e ambientes virtuais 34

    UNIDADE III

    Leitura e documentao

    3.1 Fontes de pesquisa: a biblioteca e a Internet 393.1.1. As bibliotecas 413.1.2. A internet 433.2 A leitura e a documentao na vida acadmica 503.2.1 Os resumos 523.2.2 O Resumo Informativo 543.2.3 O fichamento 66

    UNIDADE IV

    Trabalho acadmico

    4.1 Normas gerais da redao tcnico cientfica 754.2 Partes que compem um trabalho acadmico 774.2.1 Elementos pr-textuais 794.2.2 Elementos textuais 874.2.3 Elementos ps-textuais 884.3 Referncias 894.4 Regras gerais de apresentao 934.5 Gneros acadmicos 994.5.1 Resenha acadmica 994.5.2 Artigo cientfico 1124.5.3 Resumo indicativo 146

    Concluso 149

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Processos de Abstrao 17Figura 2: Mtodo Cientfico 20Figura 3: Site da Capes 28Figura 4: Site Lattes 29Figura 5: Site Lattes 30Figura 6: Estudo em Casa 33Figura 7: Site do MEC 34Figura 8: Site da Biblioteca da UFSC 42Figura 9: Site Google Books 43Figura 10: Lista de sites que oferecem livros digitais gratuitos 45Figura 11: Site Peridicos Capes 46Figura 12: Site Scielo 47Figura 13: Site da Biblioteca brasileira de Teses e Dissertaes 48Figura 14: Reportagem sobre um caso de plgio na USP 60Figura 15: Estrutura de trabalhos acadmicos 78Figura 16: Elementos que compem os Trabalhos Acadmicos 79Figura 17: Modelo de Capa 80Figura 18: Modelo de Lombada 81Figura 19: Modelo de Folha de Rosto 81Figura 20: Modelo de Ficha Catalogrfica 82Figura 21: Modelo de Errata 83Figura 22: Modelo de folha de Aprovao 84Figura 23: Modelo de Dedicatria 84Figura 24: Modelo de Agradecimento 84Figura 25: Modelo de Epgrafe 84Figura 26: Modelo de Resumo 85Figura 27: Modelo de Resumo 85Figura 28: Modelo de Lista de Ilustraes 86Figura 29: Modelo de Lista de Tabelas 86Figura 30: Modelo de Lista de Abreviaturas e Siglas 86Figura 31: Modelo de Lista de Smbolos 86Figura 32: Modelo de Sumrio 87Figura 33: Modelo de Apndice 88Figura 34: Modelo de Anexo 88Figura 35: Margens do Texto 94Figura 36: Modelo Sumrio 96Figura 37: Modelo Lista de Figuras 96Figura 38: Modelo de Referncias 96Figura 39: Regras de Apresentao do Trabalho Acadmico 97Figura 40: Figuras e Tabelas 99Figura 41: O Artigo Cientfico 117Figura 42: A Reviso de Literatura 131

  • Unidade I

    MAS AFINAL, O QUE METODOLOGIA?

    METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

  • EaD UFMS 11 Mas afinal, o que Metodologia?

    Unidade I

    MAS AFINAL, O QUE METODOLOGIA?

    Vamos iniciar nosso percurso pelo mundo da Metodologia com a leitura de um pequeno texto de Rubem Alves (1999), um educador brasileiro que tem se dedicado a refletir sobre o papel do mtodo na construo do saber acadmico e cientfico. Nosso incio busca uma compreenso bsica do que seja a Cincia.

    O que cientfico?(II)

    No h dvidas de que a memria o estmago da mente. Da mesma forma como o alimento trazido boca pela rumina-o, assim as coisas so trazidas da memria pela lembrana. Santo Agostinho, autor dessa afirmao (captulo 14 do livro 10 das Confisses), percebeu com clareza as relaes de analogia existentes entre o ato de pensar e o ato de comer. Nietzsche se deu conta da mesma analogia e afirmou que a mente um est-mago. Quem entende como funciona o estmago entende como funciona a cabea.

    Analogia um dos mais importantes artifcios do pensa-mento. Octvio Paz, no seu livro Los hijos del limo, afirma que a analogia torna o mundo habitvel. Ela o reino da palavra como, essa ponte verbal que, sem suprimi-las, reconcilia as diferenas e oposies. A analogia nos permite caminhar do conhecido para o desconhecido. assim: eu conheo A mas nada sei sobre B. Sei, entretanto, que B anlogo a A. Assim, posso concluir, logica-mente, que B deve parecido com A.

    A analogia entre o estmago e a mente nos permite saltar daquilo que sabemos sobre o estmago para o que no sabemos acerca da mente. Em grande medida graas s analogias que o conhecimento avana e que o ensino acontece. Quando a cincia usa as palavras onda e partcula ela est se valendo de analo-gias tiradas do mundo visvel para dizer o universo naquilo que ele tem de invisvel. Um bom professor tem de ser um mestre de analogias. Uma boa analogia um flash de luz.

    O estmago rgo processador de alimentos. Os alimentos so objetos exteriores, estranhos ao corpo. Ele os transforma em objetos interiores, semelhantes ao corpo. isso que torna possvel a assimilao. Assimilar significa, precisamente, tornar seme-lhante (de assimilare, ad + similis). A mente um processador de informaes. Informaes so objetos exteriores, estranhos

  • EaD UFMS12 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    mente. A mente os transforma em objetos interiores, isto , pens-veis. Pelo pensamento as informaes so assimiladas, tornam-se da mesma substncia da mente. O pensamento estranho se torna pensamento compreendido.

    Entre todos os estmagos, os humanos so os mais extra-ordinrios, dada a sua versatilidade. Eles tm uma capacidade inigualvel para digerir os mais diferentes tipos de comida: leite, caf, po, manteiga, nabo, cenoura, jil, mandioca, alface, repolho, ovo, trigo, milho, banana, cco [sic], pequi, azeite, carne, pimenta, vinho, whisky, coca-cola, etc.

    Por vezes essa versatilidade do estmago submetida a res-tries. Alguns, por doena, deixam de comer torresmo e comidas gordurosas. Outros, por pobreza, acostumam-se a uma dieta de batatas, como na famosa tela de Van Gogh. Outros, ainda, por religio, adotam um cardpio vegetariano.

    H estmagos que s conseguem digerir um tipo de comida. o caso dos tigres. Seus estmagos s digerem carne. Eles s reconhecem carne como alimento. Se, num zoolgico, o tratador dos tigres, vegetariano convicto, tentar converter os tigres s suas convices alimentares, submetendo-os a uma dieta de nabos e cenouras, certo que os tigres morrero. Diante dos legumes os tigres diro: Isso no comida!

    Os estmagos das vacas s digerem capim, com resultados magnficos para os seres humanos. difcil pensar a vida humana sem a presena dos produtos que resultam dos processamentos digestivos dos estmagos das vacas sobre o capim. Sem as vacas no teramos leite, caf com leite, mingau, queijos (quantos!), fil parmegiana, morango com leite condensado, sorvetes de variados tipos, cremes, pudins, sabonetes. Os estmagos das vacas, com sua modesta dieta de capim, so dignos dos maiores elogios.

    A mente um estmago. H muitos tipos de mente-estmago. Alguns se parecem com os estmagos humanos e processam os mais variados tipos de informaes. Leonardo da Vinci um exemplo extraordinrio desse estmago onvoro, capaz de dige-rir poesia, msica, arquitetura, urbanismo, pintura, engenharia, cincia, criptografia, filosofia. Outros estmagos se especializaram e s so capazes de digerir um tipo de alimento.

    O que vou dizer agora, digo-o com o maior respeito, sem nenhuma inteno irnica. Estou apenas me valendo de uma analogia: assim que o meu pensamento funciona. As possveis queixas, que sejam feitas a Deus Todo Poderoso, pois foi ele, ou fora anloga, que me deu o processador de pensamentos que tenho. A cincia um dos nossos estmagos possveis. No o

  • EaD UFMS 13 Mas afinal, o que Metodologia?

    nosso estmago original. um estmago produzido historica-mente, por meio de uma disciplina alimentar nica. E eu sugiro que o estmago da cincia anlogo ao estmago das vacas. Os estmagos das vacas s reconhecem capim como alimento. Se eu oferecer a uma vaca um bife suculento, ela me olhar indiferente. Seu olhar bovino me estar dizendo Isso no comida. Para o estmago das vacas comida s capim.

    A cincia, semelhana das vacas, tem um estmago es-pecializado que s capaz de digerir um tipo de comida. Se eu oferecer cincia uma comida no apropriada ela a recusar e dir: No comida.. Ou, na linguagem que lhe prpria: Isso no cientfico. Que a mesma coisa. Quando se diz : Isso no cientfico est se dizendo que aquela comida no pode ser digerida pelo estmago da cincia.

    Quando a vaca, diante do suculento bife, declara de forma definitiva que aquilo no comida, ela est em erro. Falta, sua afirmao, senso crtico. Sua resposta, para ser verdadeira, deve-ria ser: Isso no comida para o meu estmago. Sim, porque para muitos outros estmagos aquilo comida. Assim, quando a cincia diz isso no cientfico, preciso ter em mente que, para muitos outros estmagos, aquilo comida, comida boa, gostosa, que d vida, que d sabedoria. Acontece que existe uma inclinao natural da mente em acreditar que s real aquilo que real para ela ( o que , cientificamente, uma estupidez) - de modo que, quando normalmente se diz isso no cientfico est se afirmando, implicitamente, que aquilo no comida para estmago algum.

    Vo me perguntar sobre as razes por que escolhi o estmago da vaca e no do tigre como anlogo ao da cincia. O tigre parece ser mais nobre, mais inteligente. A ESSO escolheu o tigre como seu smbolo; jamais escolheria a vaca. Ao que me consta, existe uma nica instituio de saber superior cujo nome est ligado vaca: a universidade de Oxford. Ox, como bem sabido, a palavra inglesa para vaca. Eu teria sido mais prudente escolhendo a analogia do tigre ao invs da vaca, posto que ambos os estma-gos conhecem apenas um tipo de comida. Mas h uma diferena. No h nada que faamos com os produtos dos estmagos dos tigres. Mas daquilo que o estmago da vaca produz os homens fazem uma srie maravilhosa de produtos que contribuem para a vida e a cultura. J imaginaram o que seria da culinria se no houvesse as vacas? Assim o estmago da cincia, com seus pro-dutos infinitos, incontveis, maravilhosos - se no fosse por eles eu j estaria morto - mais se assemelha ao estmago das vacas que ao dos tigres.

  • EaD UFMS14 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    Resta-nos revelar a comida que o estmago da cincia capaz de digerir. Vou logo adiantando: se no for dito em linguagem matemtica a cincia diz logo: No cientfico... Concluo que isso que estou ouvindo agora, a Rhapsody in Blue, de Gershwin, que me d tanto prazer, que me torna mais leve, que espanta a tristeza, coisa real pelos seus efeitos sobre meu corpo e minha alma, isso no coisa que o estmago da cincia seja capaz de processar. No cientfico. O CD player, o estmago da cincia digere fcil. Mas a msica a faz vomitar.

    Como voc pode perceber, a crnica de Alves adota uma postura bastante crtica, concluindo uma analogia entre a Cincia e os estma-gos: diante dos objetos do mundo, a Cincia s capaz de digerir alguns, enquanto os demais no servem de alimento. Alves est par-tindo de uma proposio cara aos tericos contemporneos: a de que a Cincia um empreendimento de recorte daquilo que existe, ou seja, a Cincia define seus caminhos (leis e mtodos, como veremos a seguir) e a partir deles separa aquilo que um objeto cientfico e o restante, os chamados saberes leigos.

    Assim, comum encontrar em textos de metodologia uma diferenciao explcita entre o senso comum e a Cincia. O primeiro seria um conhecimento cheio de crenas, f, subjetividade. J o segundo nasceria de um corte em relao ao senso comum. Essa ideia de corte foi formulada nos incios do sculo XX, por um filsofo chamado Gaston Bachelard. Para ele, em O novo esp-rito cientfico, h um corte epistemolgico quando se passa de uma compreenso pr-cientfica a uma compreenso cientfica dos objetos. Essa verdade cientfica est alm das evidncias do nosso cotidiano e estabelecida como um discurso baseado em mtodos especficos de objetividade.

    O que Bachelard (1968, p.18) afirma em seu texto , de forma mais simples, que a Cincia opera alm dos sujeitos e das convenes sociais, e fundada num projeto: [...] demonstra-se o real, no se mostra o mesmo. Isso deve ser pensado no como um preconcei-to em relao s outras formas de conhecimento1, mas que guarda especificidades que dizem respeito sua constituio.

    Certamente, o fazer cientfico muitas vezes pode ser redutor. Quando, por exemplo, o pesquisador precisa recortar o objeto e suas variveis, seu cuidado ser em minorar os estragos. Muitas vezes, as bases das Cincias precisam ser revistas, de modo a incluir elementos antes excludos. Nesse caso, a crtica realizada por Rubem Alves sugere que se amplie a capacidade da Cincia de digerir ou-tros objetos, de se valer de outros conhecimentos para no se tornar to restritiva.

    1 Os saberes ditos leigos tm recebido cada vez mais ateno na pesquisa acad-mica. Muitas reas do co-nhecimento apontam para a importncia de repensar o papel das narrativas, da subjetividade e dos movi-mentos microestruturais na formao e transformao dos objetos cientficos. Para se ter uma noo dos de-senvolvimentos desse pen-samento e sua influncia na prpria concepo de Cin-cia na contemporaneidade, remetemos o leitor ao livro A condio ps-moderna, do francs Jean Franois Lyotard.

  • EaD UFMS 15 Mas afinal, o que Metodologia?

    Apesar dessas discusses e da necessidade imperativa de se per-ceber que o conhecimento acadmico no se encerra na Cincia h, por exemplo, a Filosofia, as Artes, os saberes leigos ela que surge como referncia quando se pensa no "Conhecimento Acadmico" que circula pelas Universidades. O leitor mais atento, ento, j se perguntaria: "Afinal, o que seria a Cincia? Qual sua especificidade diante dos demais conhecimentos?"

    Vamos tentar conceitu-la de modo mais formal. Para isso, uti-lizaremos uma problematizao do conceito de Cincia retirada do livro Introduo filosofia da cincia, de Ins Lacerda Arajo:

    Na conceituao de Cincia, deve-se levar em conta trs fatores: a) toda Cincia se compe de um conjunto de hipteses e teorias resolvidas e a desenvolver; b) possui um objeto prprio de investigao que determinado setor da realidade recortado para fins de descrio e explicao; c) possui um mtodo, sem o qual as tarefas acima seriam impraticveis.

    (ARAJO, 1998, p. 15)

    O texto de Arajo sugere que um bom caminho para o enten-dimento da Cincia seria inferi-la como o conjunto dos discursos que guarda as propriedades (a), (b) e (c). Esses trs elementos so recorrentes na definio de cientfico. Nossa tarefa torn-los mais claros, o que faremos a seguir.

    1.1 As hipteses e teorias

    Antnio Joaquim Severino, em seu livro Metodologia do Trabalho Cientfico, ensina que a primeira atividade realizada por um cientista a observao dos fatos. Se seguirmos nossas observaes anteriores, essa observao e esses fatos nunca aparecem neutros para o cientista, pois esse j se encontra dentro de um campo de conhecimento, ou seja, seu olhar j antecedido por um mtodo.

    Severino (2007) considera ento que, diante dos fatos observados segundo alguma perspectiva metodolgica, o discurso da Cincia se caracteriza por formular hipteses que levem em conta a relao de causa e efeito. De maneira simples, imagine que voc um cientista e observa a vida das abelhas africanas em sua cidade. Voc percebe que a posio de uma abelha alterada e depois disso a colmeia passa a se distribuir de maneira X. Levando em conta Severino (2007), voc teria um fato observado: a influncia do movimento de uma abelha em relao s demais.

    A partir desse fato, sua tarefa de cientista seria entender quais as causas dessa movimentao, que voc concluiria como sendo o

  • EaD UFMS16 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    efeito. Sua tentativa, alm disso, seria dar uma explicao genrica, que no ficasse restrita quela colmeia, mas que pudesse ser aplicada a todas as colmeias de abelhas africanas.

    Ao buscar essa relao de causa e efeito e generaliz-la, a opera-o que voc realizaria era a de levantar uma hiptese, assim definida por Severino (2007, p.103):

    hiptese: proposio explicativa provisria de relaes entre fen-menos, a ser comprovada pela experimentao. E se confirmada, transforma-se na lei.

    da hiptese que surgiro dois elementos muito conhecidos da Cincia: as leis e as teorias, tambm definidas por Severino (2007, p.103):

    Lei cientfica: enunciado de uma relao causal constante entre fenmenos ou elementos de um fenmeno. Relaes necessrias, naturais e invariveis. Frmula geral que sintetiza um conjunto de fatos naturais, expressando uma relao funcional constante entre as variveis.

    Para entendermos o conceito de Lei, voltemos colmeia. Imaginemos que a nossa hiptese para o movimento da abelha, A1, a identificao de um alimento. Assim, da hiptese ns passaramos verificao experimental via observao. Podera-mos inclusive observar outras 500 colmeias em diferentes regies. Se fossemos capazes de identificar uma relao entre alimento, movimento de A1 e o movimento da colmeia em todos os casos observados, nossa hiptese elevaria seu status, tornando-se uma Lei: Toda vez que A1 identifica alimento, movimenta-se para a direita e faz com que toda a colmeia se movimente para a es-querda.

    Continuemos nossa pesquisa sobre as abelhas. Digamos, ento, que criamos uma srie de outras hipteses sobre a sua vida e organi-zao, tendo verificado cada uma delas e formulado leis devidamente comprovadas por experimentos. Teramos, pois, um conjunto de explicaes lgicas e organizadas sobre as tais abelhas africanas. Severino (2007, p. 104) categoriza esse conjunto como Teoria:

    Teoria: conjunto de concepes, sistematicamente organizadas, sntese geral que se prope a explicar um conjunto de fatos cujos subconjuntos foram explicados pelas leis.

  • EaD UFMS 17 Mas afinal, o que Metodologia?

    Em seu livro Fundamentos de Metodologia Cientfica, Marina de Andrade Marconi e Eva Maria Lakatos (LAKATOS; MARCONI, 2010, p.108) apresentam um quadro, retirado da obra de Jos Carlos Kche, demonstrando a correlao entre fenmenos, leis e teorias:

    Como voc j deve ter observado, a Teoria sempre complexa e pretende dar explicaes mais gerais e completas. Muitas dessas teorias j devem ter sido estudadas por voc em outras fases da vida estudantil: a Teoria da Relatividade, a Teoria dos Conjun-tos, a Teoria da Evoluo. Cada uma delas ganhou notoriedade justamente pelo rigor de suas leis e pela capacidade explicativa que carregavam.

    1.2 O objeto

    Ainda de acordo com Arajo (1998), o discurso cientfico tambm se caracteriza por ter objetos. Objetos, no caso da Cincia, seriam uma espcie de recorte dentro de um campo de conhecimento para fins de investigao.

    Aqui, uma distino importante: quando pensamos em ob-jetos, a compreenso inicial de que sejam objetos do mundo, as coisas ou os conceitos que nos so familiares. No entanto, na tradio dos estudos do texto e do discurso, uma distino realizada entre objetos do mundo e objetos do discurso. Assim, segundo Koch (2009), cada vez que nos voltamos para os objetos do mundo e falamos a seu respeito, estamos de algum modo interferindo nesses objetos, criando categorias.

    No caso da Cincia, que pretende explicar os fatos de maneira cada vez mais geral e que possui mtodos especializados, a escolha dos objetos acaba por transform-los em objetos do discurso

    Figura 1 - Processos de abstraoFonte: Lakatos e Marconi (2010, p. 108)

  • EaD UFMS18 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    cientfico. Dito de outra forma, possvel pensar que h um discurso cientfico sobre, por exemplo, o aquecimento global. Esse discurso escolheu uma frao do real as mudanas climticas para entabular suas discusses. somente no interior desse discurso cientfico que existe o "objeto aquecimento global".

    Um terico que se preocupou com a construo dos objetos da Cincia foi Thomas Kuhn, cujas reflexes podem ser encontradas no livro A estrutura das revolues cientficas. Para Kuhn (2007), a Cincia operaria por paradigmas, que seriam modelos legitimados e utili-zados por uma comunidade cientfica. Esses paradigmas seriam res-ponsveis por definir o que real e merecedor do ttulo de objeto da cincia e aquilo que no cientfico.

    A ideia de que a Cincia elege seus objetos e d a eles reali-dade, defendida por Kuhn (2007), exige, portanto, a lembrana de que tambm o discurso cientfico interventor e justamente por isso constri seus objetos. por isso que a Metodologia tem um papel to relevante nas pesquisas acadmicas.

    1.3 O mtodo

    Finalmente, o outro elemento que Arajo (1997) apresenta como constitutivo da Cincia o mtodo. Como j afirmamos, um mtodo um caminho para se investigar um objeto, para se construir uma pesquisa sobre as coisas que existem. Cabe agora apresentarmos algumas definies de mtodo:

    [...] o mtodo o conjunto de atividades sistemticas e racio-nais que, com maior segurana e economia, permite alcanar o objetivo - conhecimentos vlidos e verdadeiros - traando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decises do cientista.

    (LAKATOS; MARCONI, 2010, p. 64)

    Um mtodo um procedimento regular, explcito e passvel de ser repetido para conseguir-se alguma coisa, seja material ou conceitual.

    (BUNGE, 1987, p.20)

    Trata-se de um conjunto de procedimentos lgicos e de tcnicas operacionais que permitem o acesso s relaes causais constantes entre os elementos.

    (SEVERINO, 2007, p.102)

  • EaD UFMS 19 Mas afinal, o que Metodologia?

    Entre as trs definies, o que temos em comum a exigncia de rigor lgico e de procedimentos constantes e ordenados, com o intuito de estabelecer verdades acerca dos objetos. Seguindo o que j dissemos sobre as teorias e os objetos, possvel concluir que h certa interdependncia entre os elementos responsveis por engendrar o discurso cientfico: um mtodo uma espcie de luneta com que o pesquisador observa os fatos, criando hipteses sobre os objetos. Assim como as lunetas2 podem ver coisas diferentes de acordo com suas variaes (alcance, foco, lentes), os mtodos tambm podem oferecer vises diferentes sobre os objetos.

    Esse debate sobre os limites dos mtodos profcuo, mas infe-lizmente no cabe aqui. Entretanto, importante que se apresente ao menos alguns dos mtodos ditos clssicos na pesquisa acadmica, aqueles que balizam a maior parte da(s) Cincia(s).

    Inicialmente, vamos trazer tona dois tipos de raciocnio fun-damentais para a construo do conhecimento: o indutivo e o dedu-tivo. Isso porque, segundo Severino (2007), um mtodo cientfico composto de um momento experimental e indutivo e um momento matemtico e dedutivo. Dessa perspectiva, elucidaremos brevemente os dois tipos de raciocnio.

    O raciocnio indutivo aquele em se passa de observaes de particulares para se chegar a generalizaes universais. Lembremos da nossa colmeia: da observao de um fato particular (o movimen-to de A1), passou-se busca de generalizao para todos os fatos semelhantes. Esse raciocnio historicamente baseado na chamada Filosofia Empirista do sculo XVII, defendida por pensadores como Locke e Hume. Para estes, a experincia (empiria) a base de todo o conhecimento.

    O raciocnio dedutivo opera de modo inverso. Ele parte de expli-caes gerais para aplic-las aos particulares. O exemplo cannico de raciocnio dedutivo aristotlico, na forma de silogismo, um racioc-nio considerado perfeito e formado de trs proposies:

    Todos os homens so mortais.Scrates homem.

    Logo, Scrates mortal.

    Como voc capaz de notar, as sentenas um e dois premis-sas tm como concluso necessria a sentena trs. Perceba ainda que a primeira sentena mais geral e diz respeito a um predicado, enquanto a sentena dois diz respeito a um sujeito (Scrates). De-dutivamente, temos ento uma generalizao anterior aplicada ao particular, com um produto logicamente estabelecido a sentena trs.

    2 A metfora de luneta foi utilizada por um filsofo muito importante, Gottlob Frege. Frege imaginou que teramos as coisas do mun-do, que chamou de refe-rncia, e as nomeaes dessas coisas, que chamou de sentidos. Para ele, en-to, os sentidos seriam como as lunetas, recortando os referentes de acordo com sua capacidade de viso (FREGE, 1978).

  • EaD UFMS20 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    Essa espcie de raciocnio forjou um mtodo tambm muito c-lebre, o "Racionalismo", cujo expoente principal Descartes, filsofo francs do sculo XVI. Basicamente, trata-se de uma metodologia dedutiva que ensina que somente a Razo maiscula, para marcar sua base Iluminista pode levar ao conhecimento e que a experin-cia deve ser suplantada por uma cadeia de raciocnios matemticos e necessrios.

    De acordo com Severino (2007, p.101), a Cincia passa tanto por raciocnios indutivos quanto por dedutivos, conforme o quadro a seguir:

    No universo da Cincia ou das Cincias, todavia, no somente a linguagens lgico-dedutiva e quantitativa que tm espao. Como voc j deve saber, existem outros universos de conhecimento menos matematizveis, que dizem respeito s chamadas qualidades, a aspectos subjetivos que exigem um grau maior de interpretao do pesquisador.

    De modo geral, as Cincias podem, segundo essa diviso3, per-tencer a dois grandes campos de estudo: o campo das Cincias Exa-tas e o Campo das Cincias Humanas. Assim, enquanto as Cincias Exatas comungariam de paradigmas lgico-matemticos, as Cincias Humanas disporiam de diversos paradigmas concorrentes.

    Dentre esses paradigmas, seria importante destacarmos trs daqueles que tm exercido grande influncia na contemporaneidade:

    A) Mtodo Dialtico: fundamentado na dialtica de Friedrich Hegel, um filsofo alemo do sculo XIX. Est baseado na concepo de alteridade e contradio. Para Hegel, o pensamento trabalha com a ideia de teses e antteses, que possibilitam incessantemente novas

    Figura 2 - Mtodo cientfico

    Fonte: Severino (2007, p. 101)

    3 Essa diviso no estan-que e pode variar conforme o entendimento das episte-mologias ou das metodo-logias.

  • EaD UFMS 21 Mas afinal, o que Metodologia?

    snteses. Cada sntese, novamente, faz surgir nova anttese. Esse pen-samento dinmico tem influenciado diversas correntes da Filosofia e da Sociologia, com destaque para as discusses estabelecidas por Karl Marx (LAKATOS; MARCONI, 2010).

    B) Mtodo Fenomenolgico: a Fenomenologia um campo da Filosofia que foi inaugurada por Edmundo Husserl, filsofo alemo do incio do sculo XX. Para Husserl, haveria uma intencionalidade da conscincia subjetiva sobre todo o objeto. De acordo com Penha (1989, p. 29), essa intencionalidade seria a caracterstica principal da conscincia, que estabeleceria, em termos de conhecimento, [...] uma nova relao entre o sujeito e o objeto, o homem e o mundo, o pensamento e o ser, ambos inseparavelmente ligados.

    Como voc deve imaginar, o papel preponderante da intenciona-lidade nessa forma de filosofar ter como resultado metodolgico uma complexizao das descries dos objetos, exigindo sempre que se leve em conta o vrtice sujeito e objeto, nunca pensados de forma isolada.

    C) Mtodo Estruturalista: o chamado Estruturalismo tem como marco a publicao, em 1916, do Curso de Lingustica Geral, obra pstu-ma de Ferdinand de Saussure. Para o genebrino Saussure, as lnguas seriam sistemas de elementos interdependentes. Tais elementos s ganhariam seu significado no interior dessas lnguas e no teriam fora de transform-la.

    Alm de ter estabelecido os critrios para uma Cincia da Lngua, o pensamento saussuriano ganhou notoriedade a partir da dcada de cinquenta do sculo XX, quando o antroplogo Claude Lvi-Strauss transps seu modelo para a anlise da cultura, em seu livro As estru-turas elementares do parentesco. Strauss se valeu do modelo fonolgico estruturalista para construir um sistema cultural binrio, feito de oposies e em que os elementos guardavam dependncia entre si.

    Conforme Dosse (1993), o Estruturalismo conseguiu se tornar uma vedete nas Cincias Humanas desde ento: da psicanlise ao marxismo, passando pela prpria lingustica, ele teria oferecido um mtodo rigoroso para a explicao dos objetos das Humanidades. Ainda hoje, sua influncia pode ser vista nas correntes chamadas de ps-estruturalistas, que rediscutiram seus limites e propuseram modificaes.

    Em suma, podemos agora traar as linhas gerais do que estuda a Metodologia. Sabemos que os mtodos dizem respeito busca pelo conhecimento, principalmente nas reas cientficas. Alm dis-so, pudemos perceber que a Cincia no a nica responsvel pela produo de conhecimento h, por exemplo, a Filosofia e que h uma variedade de modelos cientficos, que podem ser agregados nas categorias de Cincias Exatas e Cincias Humanas. Fundamen-

  • EaD UFMS22 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    talmente, o desafio perceber a importncia da metodologia como mediadora de todo empreendimento de pesquisa, tanto por seu rigor lgico quanto pelas "vises" que ela oferece.

    Finalmente, resta dizer que o tema amplo e que h opinies controversas quando se pretende definir Cincia ou Mtodo. No en-tanto, imprescindvel saber que, na Universidade, o rigor, a ordem e a tentativa de ser objetivo que pautar tanto a pesquisa quanto a apresentao de seus resultados para os pares, na forma de textos.

    dessa vida acadmica e dos mecanismos de adequao s nor-mas e metodologias que trataro os captulos seguintes, cuja nfase estar na pesquisa como fonte de conhecimento cientfico, artstico, filosfico, etc.

  • Unidade II

    A VIDA UNIVERSITRIA

    METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

  • EaD UFMS24 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

  • EaD UFMS 25 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 25A vida universiria

    Unidade II

    A VIDA UNIVERSITRIA

    Ao ingressar num curso superior, voc perceber uma grande nfase dada Pesquisa, justamente porque essa desenvolvida, atu-almente, sobretudo nas Universidades. nelas que o conhecimento ganha legitimidade e se formaliza, tendo seus meios especficos e restritos de circulao e valorizao. Inicialmente, podemos ento partir do pressuposto de que a pesquisa requer grande grau de for-malizao, da execuo at a socializao em textos.

    Um pensador francs chamado Michel Foucault nos ajudar a entender essa formalizao. Em seu livro A ordem do discurso, Foucault sugere que as sociedades ocidentais esto divididas entre uma espcie de amor pelo conhecimento irrestrito, que ele chama de logofilia, e um temor diante desse conhecimento, capaz de desfa-zer a ordem poltica, social e cultural em que vivemos. A esse temor Foucault chama logofobia (FOUCAULT, 2003).

    A formalizao, a partir de Foucault, poderia ser vista como a srie de procedimentos que tm como funo garantir que a comu-nidade cientfica possa separar o verdadeiro do falso, o que tem valor do que desvalorizado. Um dos critrios mais relevantes para essa definio de verdade o da objetividade: o mundo da pesquisa necessita formular suas teorias da maneira mais neutra possvel, estabelecendo leis cada vez mais capazes de dizer como se d o fun-cionamento dos objetos do mundo.

    Esse conhecimento formal produzido nas Universidades neces-sariamente constitudo de amarras e certos mandamentos. Desde os modelos de produo de textos - resumo, resenha, artigo, tese, etc. - at os modelos (paradigmas) de pesquisa, o Ensino Superior um universo complexo e com leis muito particulares, o que tentaremos deixar claro nesse captulo.

    2.1 Universo acadmico e a construo de conhecimentos

    Leiamos o que nos diz Severino (2007, p. 22) sobre os objetivos histricos do Ensino Superior no Ocidente:

    O primeiro objetivo o da formao de profissionais das diferentes reas aplicadas, mediante o ensino/aprendizagem de habilidades e competncias tcnicas; o segundo objetivo o da formao do cientista mediante a disponibilizao dos mtodos e contedos de

  • EaD UFMS26 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS26 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    conhecimento das diversas especialidades do conhecimento; e o terceiro objetivo aquele referente formao do cidado, pelo estmulo de uma tomada de conscincia, por parte do estudante, do sentido de sua existncia histrica, pessoal e social.

    (SEVERINO, 2007, p. 22)

    Vejamos ento: para que a Universidade seja capaz de formar tecnicamente, fomentar pesquisa e assegurar uma formao cidad, trs pilares necessariamente interligados so apontados como fundan-tes; o primeiro deles, o Ensino, oferecido atualmente em diversas modalidades; o segundo, a Pesquisa, responsvel por garantir a vanguarda no conhecimento de cada rea; e, finalmente, o terceiro pilar, a Extenso, responsvel por estabelecer uma aproximao entre os saberes acadmicos e a sociedade de forma ampla.

    No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educao (a LDB, lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996), responsvel por traar as normati-zaes sobre todos os nveis de ensino no pas, d nfase justamente a esses trs pilares, quando afirma que a Educao Superior tem por finalidade:

    I. estimular a criao cultural e o desenvolvimento do esprito cientfico e do pensamento reflexivo;

    II. formar diplomados, nas diferentes reas do conhecimento, ap-tos para a insero em setores profissionais e para a participao no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formao contnua;

    III. incentivar o trabalho de pesquisa e investigao cientfica, vi-sando ao desenvolvimento da cincia e da tecnologia e, ainda, da criao e difuso da cultura e, desse modo, desenvolver o enten-dimento do homem e do meio em que vive;

    IV. promover a divulgao de conhecimentos culturais, cientficos e tcnicos que constituem patrimnio da humanidade e comunicar o saber atravs do ensino, de publicaes ou de outras formas de comunicao;

    V. suscitar o desejo permanente de aperfeioamento cultural e pro-fissional e possibilitar a correspondente concretizao, integrando os conhecimentos que vo sendo adquiridos numa estrutura inte-lectual sistematizadora do conhecimento de cada gerao;

    VI. estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar servios especiali-

  • EaD UFMS 27 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 27A vida universiria

    zados comunidade e estabelecer com esta uma relao de reci-procidade;

    VII. promover a extenso, aberta participao da populao, visando difuso das conquistas e benefcios da criao cultural e da pesquisa cientfica e tecnolgica geradas na instituio.

    O leitor pode notar que a nfase da LDB est na educao e na pesquisa como um compromisso de desenvolvimento nacional, crian-do possibilidades de ampliar o bem-estar da populao e inserir o pas nos debates mais importantes do conhecimento universal. Na busca de fomentar essa qualificao constante da Educao Superior, tanto o Governo (Federal ou Estadual) quanto a iniciativa privada oferecem importantes contribuies financeiras para o Ensino, a Pesquisa e a Extenso, por meio da abertura constante de editais de apoio.

    No caso da iniciativa privada, um dos exemplos mais famosos a Fundao Ford. Segundo Severino (2007), essa organizao privada foi fundada na dcada de trinta nos Estados Unidos e a partir da d-cada de cinquenta passou a financiar a pesquisa e o desenvolvimento humano em todo o mundo.

    J na esfera pblica, os rgos de financiamento da pesquisa universitria podem ser Nacionais ou Estaduais. Essas entidades so conhecidas como FAPS, Fundaes de Amparo Pesquisa, como a Fapemat, do Mato Grosso, a FAPESP, de So Paulo, e Fundao Araucria, do Paran. No Mato Grosso do Sul temos a FUNDECT, Fundao de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Cincia e Tec-nologia do Estado de Mato Grosso do Sul, que distribui bolsas de pesquisa para alunos de ps-graduao do estado.

    H, tambm, as agncias que atuam em mbito nacional. As principais so a CAPES e o CNPq, de que falaremos a seguir.

    A) A CAPES

    A CAPES (Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior) uma agncia vinculada ao Ministrio da Educao (MEC) e tem como principal atributo desenvolver e consolidar os programas de Ps-Graduao strictu sensu no Brasil. Os programas stricto sensu so os Mestrados e Doutorados, cujo ingresso depende de formao superior prvia.

    Criada em 1951 (CAPES, 2011), sua importncia se deve justa-mente ampliao dos mecanismos de formao de pessoal especia-lizado para a atuao no Ensino Superior, tanto no Ensino quanto na Pesquisa e na Extenso. Suas aes vo desde a concesso de bolsas de estudo e apoio pesquisa e extenso at a avaliao da produo

  • EaD UFMS28 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS28 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    acadmica e dos cursos de Ps-Graduao existentes, com critrios claros e com transparncia mpar na divulgao de resultados.

    Suas aes so dividias em quatro linhas:

    avaliao da ps-graduao stricto sensu; acesso e divulgao da produo cientfica; investimentos na formao de recursos de alto nvel no pas

    e exterior; promoo da cooperao cientfica internacional.

    (CAPES, 2011)

    A fim de que voc tenha um contato inicial com os mecanismos de financiamento e as possibilidades oferecidas a graduandos, o ideal acessar o site da CAPES, . L voc poder encontrar informaes como a classificao dos melhores Mestrados e Doutorados e das publicaes cientficas de sua rea, conforme a figura abaixo:

    Figura 3: Site da CapesFonte:

  • EaD UFMS 29 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 29A vida universiria

    B) O CNPq

    O CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico) define-se assim em seu site:

    O Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgi-co (CNPq) uma agncia do Ministrio da Cincia e Tecnologia (MCT) destinada ao fomento da pesquisa cientfica e tecnolgica e formao de recursos humanos para a pesquisa no pas. Sua histria est diretamente ligada ao desenvolvimento cientfico e tecnolgico do Brasil contemporneo.

    De modo direto, o CNPq oferece regularmente uma srie de editais de apoio e fomento pesquisa, tanto para a Graduao quanto para a Ps-Graduao. Para o acadmico que acaba de iniciar seus es-tudos, o CNPq oferece a oportunidade de bolsas de estudo ao pesqui-sador ou ao extensionista em suas fases iniciais, com seus Programas de Iniciao Cientfica e de Iniciao ao Extensionismo. Segundo o prprio CNPq, esses programas so responsveis por estimular a pesquisa e contribuir para a formao de recursos humanos para o desenvolvimento cultural e cientfico do pas.

    Consulta obrigatria para o acadmico, eis abaixo uma imagem da pgina do Conselho na Internet:

    Figura 4: Site Lattes

    Fonte:

    Na pgina inicial do site do CNPq voc deve ter notado um ttulo chamado Currculo Lattes. Esse currculo, conhecido no mun-

  • EaD UFMS30 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS30 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    do acadmico por Lattes, a plataforma atualmente mais aceita para organizar e divulgar o histrico de cada pesquisador no Brasil. O Lattes permite que se elenque a produo cientfica, de artigos a livros publicados, a experincia em Ensino, Pesquisa e Extenso e ainda permite saber qual a rede de colaborao (quais pesquisadores trabalham em cooperao constante) e a quais Grupos de Pesquisa os cientistas brasileiros esto vinculados.

    Para o acadmico das primeiras fases, importante que se inicie o processo de insero na comunidade cientfica, bem como que se faa a documentao daquilo que se produz. O caminho criar o seu Currculo Lattes, acessando a pgina da plataforma < http://lattes.cnpq.br/> e efetuando seu cadastro.

    Alm de se tornar parte da comunidade, voc pode acessar o Lattes dos pesquisadores de todo o Brasil e saber quais deles desen-volvem pesquisas do seu interesse, o que permitir uma rica troca de informaes e, quem sabe, orientaes para pesquisas futuras.

    Figura 5: Site LattesFonte:

    Depois dessa breve incurso nos meandros institucionais da pes-quisa acadmica, a tarefa esclarecer quais as modalidades de troca de informaes e de circulao de conhecimento que se do na esfera cotidiana do acadmico. Se sabemos que h uma srie de agncias que se preocupam com Pesquisa e a Extenso, passemos a elucidar as formas de obter bons resultados no que diz respeito ao Ensino.

    2. 2 O Ensino da Universidade: encontros presenciais e estudo individual

    Se o papel da Universidade est diretamente relacionado com a transformao social e com a pesquisa, o cotidiano da formao acadmica deve ser iniciado com uma preocupao mpar em relao

  • EaD UFMS 31 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 31A vida universiria

    ao Ensino. Na Graduao, o sujeito ser lanado num mundo novo, o que exigir no apenas dedicao, mas uma organizao especfica da vida escolar, a fim de que os contedos e debates da disciplinas e crditos cursados se traduzam numa boa formao - profissional ou cultural.

    Os autores de metodologia, como Severino (2007), Lakatos e Marconi (2010) e Medeiros (2009) sugerem, diante dessa especificidade do trabalho e da necessidade de uma postura de "autoatividade", que se elaborem pequenos "planos de trabalho", cujo objetivo auxiliar na aproximao entre a prtica presencial (a ida Universidade e a participao nas aulas) e o estudo individual posterior. do vrtice entre o estudo presencial e o individual que trataremos nessa seo.

    Inicialmente, tomemos uma dificuldade em considerao: nossa capacidade de memria seletiva e, por conseguinte, h uma limitao cognitiva em jogo quando pretendemos estudar "algo". Garcez (2004) ensina que nossa memria "seletiva", ou seja, memorizamos aquilo que mais significativo para nossos interesses e aquele material com o qual temos contato mais frequente.

    Quando nos referimos ao "interesse", certamente imaginamos algo como uma "motivao", que no pode ser matematicamente calculada, mas que diz respeito aos aspectos subjetivos do estudante. No entanto, apesar de no mensurvel, essa motivao uma condio para o bom desempenho e, como o trabalho acadmico, precisa ser "trabalhada", pois como aponta Medeiros (2009, p. 6):

    [...] a motivao relaciona-se com interesses internos ao indivduo, independendo de estmulos externos. Se ela existe, a influncia externa positiva pode favorec-la; no entanto, a um indivduo motivado dificilmente influncias externas, ainda que negativas, o demovero a buscar atingir seu objetivo. Cabe ao estudante mo-tivar-se interiormente antes de pr-se a estudar qualquer assunto.

    No pretendemos aqui criar nenhuma expectativa de "autoaju-da" nem um "manual de motivao". Apenas nos referimos ao fato de que, dadas as exigncias (de tempo, assiduidade e concentrao) da vida acadmica, necessrio que cada sujeito desenvolva conti-nuamente seu interesse em relao s reas e s disciplinas, o que pode ser auxiliado por uma boa organizao do trabalho e por uma motivao regular.

    Um dos mtodos sugeridos para isso a criao de um repertrio, ou de diversos repertrios. Reflitamos: se a memria trabalha com as variveis interesse e frequncia, seu estudo deve ser organizado de forma a contemplar a formao de um repertrio, de um conjunto de conhecimentos de base e com caractersticas relacionais afins sua

  • EaD UFMS32 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS32 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    escolha acadmica, que possibilite a manuteno do interesse, para que a frequncia possa ser mantida.

    Essa ideia de repertrio pode ser tomada como etapa chave para um bom aproveitamento dos encontros presenciais, as aulas. O tema bastante simples e partiremos de um exemplo para elucid-lo: imagine que voc cursar a disciplina de Metodologia do Trabalho Acadmico. Como voc ver, os professores universitrios dispo-nibilizam as ementas das disciplinas (os contedos a serem trata-dos) e a bibliografia bsica (os textos mais relevantes utilizados) que ser utilizada - inclusive, trata-se de um direito do acadmico solicitar ementa e bibliografia bsica. Para criar seu repertrio inicial, voc poder escolher, dentre os livros da bibliografia e os contedos da ementa, aqueles que chamam mais sua ateno e os de carter mais geral. Isso permitir que voc, antes de ir aula, j tenha um trabalho sobre o conhecimento daquela disciplina e possa ento, discutir com o professor mais assertivamente.

    Sobre a importncia das leituras introdutrias prvias, Severino (2007, p. 40) bastante claro:

    Eles se fazem necessrios, contudo, nesse momento de iniciao, sobretudo para complementar as exposies dos professores em classe, para servir de base de comparao com algum texto porven-tura utilizado pelos professores, enfim, para fornecer o primeiro instrumental de trabalho nas vrias reas, o vocabulrio bsico, os elementos do cdigo das vrias disciplinas.

    Mas qual seria o objetivo dessas leituras prvias? Justamente, ter um contato com os textos e torn-los mais ntimos, dirimindo dvidas iniciais e criando problematizaes que podem ser resolvi-das com o professor, o responsvel por ampliar o leque de respostas. Lembre-se, ainda, que a memria trabalha de forma associativa, e que quanto mais relaes for capaz de fazer - entre textos, conversas, filmes - mais ser capaz de resistir e se consolidar.

    Esse trabalho sobre o conhecimento na criao de um repertrio diz respeito documentao. Trataremos dela nas sees seguintes quando falaremos de resumos e fichamentos, mas por hora voc pode se valer de uma definio dada por Severino (2007, p. 44): "Documentar registrar os elementos colhidos mediante atividade de estudo ou pes-quisa das diversas fontes". Desse modo, depois que voc efetuou suas leituras prvias, seu repertrio ser documentado e voc passar aos encontros presenciais, um ciclo intermitente durante toda a Graduao.

    No caso dos encontros presencias, as aulas, o processo de docu-mentao poder ser mantido. Dizemos "poder" porque entendemos que os sujeitos possuem idiossincrasias, "jeitos", e tambm nas salas

  • EaD UFMS 33 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 33A vida universiria

    de aula podem (e devem) ter comportamentos diferentes. Contudo, entendendo que h um parmetro mdio prototpico, nossa sugesto que tambm nas aulas a documentao seja efetuada: de algum conceito referido pelo professor, de alguma discusso, de um livro ou artigo importante. O costume de fazer anotaes enriquece o material de estudo e tem se mostrado til para os estudos individuais.

    Cabe ainda uma ressalva: na Universidade, as aulas devem ser acompanhadas como espaos de debate e reflexo e no de uma pers-pectiva vertical, onde o professor ocupa o ponto mais elevado. Isso no quer dizer que os professores no detenham um conhecimento acumulado e nem que seu papel no seja fundamental na orientao dos alunos. Apenas faz notar que o trabalho acadmico eficaz quan-do produto de um comprometimento do acadmico com o mundo do saber, o que requer que sua postura crtica e suas leituras sobre a rea sejam ouvidas, discutidas e respeitadas.

    Isto dito, resta-nos lembrar que a tarefa de estudos na Univer-sidade sempre de retroalimentao e em formato circular, ou seja: estudos individuais prvios so seguidos pela presena em sala e, depois disso, por novas leituras, retomadas, e nova documentao individual. A manuteno constante e disciplinada desse "ciclo" garantir a solidez do conhecimento de cada sujeito. O quadro foi descrito por Severino (2007, p. 47):

    Figura 6: Estudo em casaFonte: Severino (2007, p. 47)

    Um questionamento pode ser levantado: h tcnicas e mtodos especficos e eficazes na documentao da pesquisa? Responderemos de antemo que os trabalhos de metodologia tm se debruado em produzir solues econmicas e produtivas para um bom desempe-nho acadmico, o que ser tema do captulo seguinte.

  • EaD UFMS34 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS34 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    Antes, todavia, apresentaremos uma modalidade de interao entre professor-aluno que tem ganhado destaque no Ensino Superior e parece ser um dos caminhos mais importantes da difuso do saber na contemporaneidade: os ambientes virtuais de aprendizagem e as modalidades de interao distncia, objetos da seo 2.3.

    2.3 Interao distncia e ambientes virtuais

    O Ensino Superior no Brasil est assistindo a uma grande ex-panso da modalidade a distncia, prevista na LDB e atualmente vinculada Secretaria de Educao a Distncia, do MEC:

    Figura 7: Site do MECFonte:

    A Secretaria responsvel pelas mais diversas aes do que se convenciona chamar de e-learning, que aqui podemos entender como o conjunto de mecanismos, tecnologias e discursos que dizem respeito s interaes pedaggicas que ocorrem alm do ambiente face a face, mais precisamente via Internet. As iniciativas vo desde a Universi-dade Aberta do Brasil (UAB) at o Programa um computador por aluno, passando inclusive pelo site Domnio Pblico (MEC, 2011).

    Mais do que apresentarmos dados especficos da chamada EaD (Educao a Distncia), cabe aqui ressaltar o papel do e-learning de modo mais generalizado. Dito de outro modo, o importante enten-der a Internet como ferramenta definitiva em todas as modalidades de Ensino Superior, presencial ou a distncia.

    Voc j entrou em contato com os chamados AVAs, os Ambientes Virtuais de Aprendizagem. Em muitas Universidades, o ambiente

  • EaD UFMS 35 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 35A vida universiria

    Moodle est sendo utilizado como ferramenta principal do e-learning, como plataforma principal desses programas. A vantagem de uma pla-taforma como Moodle , inicialmente, sua gratuidade e acesso - qualquer sujeito pode ir ao site e baix-lo (basta acessar ). Ademais, visto que o programa de livre acesso, sua programao tambm ganha em plasticidade: h grande liberdade de programao, possibilitando modificaes funcionais de acordo com o usurio.

    Em geral, as Universidades utilizam o Moodle como ferramenta de Ensino e comunicao entre docente e discentes. possvel, pela plataforma, ter acesso s aulas e aos contedos trabalhados, s no-tas, frequncia e at mesmo ao perfil dos participantes. Conforme a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC, 2011), o Moodle intenta atender aos trs eixos do processo de ensino-aprendizagem:

    Gerenciamento de contedos: organizao de contedos a serem disponibilizados aos estudantes no contexto de disci-plinas/turmas;

    Interao entre usurios: diversas ferramentas para intera-o com e entre estudantes e professores: frum, bate-papo, mensagem instantnea, etc.

    Acompanhamento e avaliao: definio, recepo e avalia-o de tarefas, questionrios e enquetes, atribuio de notas, clculo de mdias, etc.

    Num artigo que aponta as vantagens e os problemas da Educa-o a Distncia, Santos (2003) sugere que a interatividade a marca diferencial desse processo pedaggico. Quando revela que, no espao virtual, os receptores de textos podem se tornar rapidamente emis-sores de textos, o que a autora afirma uma pluralidade de vozes imbricada nesses ambientes de ensino-aprendizagem.

    Como voc deve ter observado, nos AVAs do Ensino Superior, exatamente essa maior interatividade que se busca. Exemplifique-mos: no incio desse captulo, ns citamos um filsofo francs, Michel Foucault. Num AVA se fosse estabelecido que a aula de amanh seria sobre Foucault, seria possvel no apenas que ns, como professo-res, postssemos textos que comentam o filsofo, como ainda vdeos e at mesmo alguma obra completa do autor. Alm disso, poderia ser criado um chat ou um frum, em que cada aluno fosse solicitado a incluir informaes a partir de uma pergunta inicial. Em 24 horas, voc pode imaginar a quantidade de material e comentrios que es-taria disponvel e como estes poderiam incrementar criticamente a aula presencial ou os debates online.

    Dito isto, passemos a refletir sobre os meandros acadmicos da busca por materiais e leituras de qualidade, tarefa do captulo trs.

  • EaD UFMS36 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS36 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

  • Unidade III

    LEITURA E DOCUMENTAO

    METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

  • EaD UFMS 39 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 39Leitura e documentao

    Unidade III

    LEITURA E DOCUMENTAO

    No captulo anterior, vimos que o cotidiano de estudos acadmi-cos requer algum cuidado no que tange organizao e disciplina. Apontamos tambm que necessrio e mesmo imprescindvel que haja um trabalho sobre o conhecimento, buscando congregar o acompanhamento de disciplinas, as leituras prvias, a participao em ambientes virtuais e o estudo individual constante.

    Voc deve ter percebido, ento, que a leitura tem um papel de destaque na formao acadmica. Sem um aporte quantitativo e um outro qualitativo em suas leituras, dificilmente haver um aprovei-tamento adequado daquilo que oferecido no Ensino Superior. De modo mais objetivo, a leitura est envolvida diretamente no sucesso acadmico, no apenas porque o conhecimento tem um carter docu-mental e textual - preciso ir s discusses anteriores para fundamen-tar as novas - mas porque a produo dos textos acadmicos requer o conhecimento de diversos assuntos e o aprofundamento desses conhecimentos, alm de exigir, uma familiaridade com os gneros textuais tpicos da Universidade.

    Para atingir essa proficincia na leitura e na produo textual acadmica, dois tpicos merecem destaque: as "fontes", ou seja, os locais e modos de se encontrar os textos considerados legtimos em cada rea; e os mtodos de se obter "sucesso" na leitura e na docu-mentao do que foi lido.

    A tarefa desse captulo apresentar e relacionar cada um desses tpicos.

    3.1 Fontes de pesquisa: a biblioteca e a Internet

    Umberto Eco, um pensador italiano que escreveu livros como O Nome da Rosa e Apocalpticos e Integrados tambm deu sua contri-buio ao mundo da Metodologia, com o texto Como se faz uma tese. A obra, no obstante o ttulo voltado tese, tornou-se referncia para aqueles que pretendem desenvolver pesquisas e textualiz-las adequadamente.

    Iniciamos essa seo citando Eco (2007), pois em seu livro que uma boa definio das fontes de pesquisa encontrada. Para o italia-no, quando tomamos um objeto de pesquisa, o instrumento para questionamentos e explicaes sempre o livro, por dois motivos: o primeiro, porque toda pesquisa demanda que se consulte tudo

  • EaD UFMS40 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS40 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    que se escreveu sobre o objeto e, portanto, que se recorra literatura especializada, aos livros. Depois, porque ainda que se trabalhe com acontecimentos histricos (Eco usa esse exemplo) ou com pesquisas em laboratrio e afins, os resultados sempre estaro disponveis em forma de texto, ou seja, artigos, livros, grficos, quadros estatsticos, etc.

    Partamos ento dessa ubiquidade (a presena geral) dos textos na Universidade. Consideremos que todos os campos do saber uti-lizam textos para socializar suas pesquisas, seus resultados e suas problematizaes. Quando voc, ento, for convocado a produzir o conhecimento acadmico, algumas etapas sero delimitadas: a escolha do objeto, a formulao do problema, a definio da metodologia, a construo de hipteses e, o que muito importante agora, a delimi-tao das fontes bibliogrficas da pesquisa.

    As fontes bibliogrficas tm uma funo determinante em seus trabalhos acadmicos: elas indicam que voc conhece as ideias aceitas em seu campo de conhecimento, que pode confront-las e estabelecer relaes entre as teorias mais importantes. Elas garantem, por isso, sua legitimidade como pesquisador. Alm disso, a leitura das fontes enseja um aprofundamento dos temas de sua rea, ou seja, voc aca-bar por conhecer de maneira mais ntima aquilo de que necessita para ser um bom acadmico e pesquisador.

    Uma outra observao proveitosa: as fontes se dividem em primrias ou secundrias. Uma fonte primria aquela cuja origem de um ou mais autores e tem como resultado suas pesquisas: livros, artigos, monografias, ensaios, teses, dissertaes. As fontes secund-rias so as compilaes, as chamadas obras de referncias, como as enciclopdias e os dicionrios (ECO, 2007; MEDEIROS, 2009). O ideal que, no decorrer da vida acadmica, voc faa uso decrescente das fontes secundrias, que so apenas uma etapa inicial e consultiva das pesquisas. Alm disso, at mesmo os manuais e os livros introdut-rios devem ser paulatinamente substitudos por textos mais densos, conforme sua experincia acadmica evolui.

    Certamente, dada a sua importncia, a consulta e a leitura de fontes bibliogrficas exige um filtro inicial, pois o saber acadmico, como vimos, pretende estabelecer um corte em relao ao senso comum. Esse corte faz uma espcie de separao entre o joio, aqui-lo que opinio, preconceito, achismo, e aquilo que passvel de comprovao, que produto de pesquisa e tem carter generalizante. O que estamos apontando que os saberes acadmicos pretendem alcanar a objetividade, dizer como as coisa realmente so. Ainda que muitas vezes isso seja impraticvel, o esforo sempre rigoroso na busca da objetividade1.

    Assim, a consulta s fontes requer alguns cuidados: utilizao de textos de autores consagrados; consulta a bancos de dados institucio-

    1 Iniciamos uma breve dis-cusso sobre os limites dessa objetividade no capitulo um. Cabe ao acadmico interes-sado buscar novas fontes para o debate.

  • EaD UFMS 41 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 41Leitura e documentao

    nais, ligados a Universidades ou Institutos de Pesquisa reconhecidos (o que vale para consultas online); cuidado extra com a utilizao de material online, excluindo textos sem autoria reconhecida ou de gneros textuais mais subjetivos, como blogs pessoais.

    Para facilitar sua introduo s fontes, dividimos o tema em dois subtpicos: As bibliotecas e a Internet. Nosso desejo que voc perceba que pode transitar entre os dois universos e escolher o que cada um oferece de melhor para sua trajetria de estudos e pesquisas.

    3.1.1. As bibliotecas

    Vamos partir de Medeiros (2009, p.44), que elabora uma boa descrio das bibliotecas como fontes de pesquisa. Inicialmente, o autor define o que um acervo bibliogrfico e sua classificao:

    o conjunto de obras que formam o patrimnio de uma bibliote-ca, ou conjunto de documentos abrigados e organizados por uma biblioteca.

    As bibliotecas abrigam milhares de obras, classificadas ou pelo sistema de Melvil Dewey (Classificao de Decimal de Dewey - CDD) ou pelo Sistema de Classificao Decimal Universal (CDU).

    Se voc j fez alguma consulta a bibliotecas, observou que ne-las h sempre uma catalogao em fichas (fsicas ou virtuais), onde constam o ttulo do trabalho e os elementos essenciais da Referncia Bibliogrfica2 e, no canto esquerdo, a numerao correspondente classificao CDD ou CDU. Observe na figura abaixo, extrada de Medeiros (2009, p. 49):

    501.8 Metodologia cientfica Ruiz, Joo lvaro, 1928-

    R884m Metodologia cientfica: guia para eficincia nos estu dos. 5.ed. So Paulo: Atlas, 2002.

    182 p.

    Alm disso, para que voc possa fazer um bom uso do acervo, preciso entender a arrumao dos livros nas estantes, realizada nas bibliotecas por uma tabela chamada Pha, na qual constam a classificao CDD (em cima), a inicial do sobrenome do autor (em maiscula), o nmero na prpria tabela e a inicial (em minscula) do ttulo da obra.

    2 As Referncias Bibliogrfi-cas sero tratadas no captu-lo seguinte.

  • EaD UFMS42 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS42 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    Veja o exemplo a seguir, produzido a partir do livro de Medeiros (2009), Redao Cientfica. Lembre-se de que a lombada das publicaes traz a etiquetao indicativa com os mesmos elementos:

    808.0665 808.0665 Nmero de Classificao CDDM448r M Inicial do nome do autor (MEDEIROS) 448 Nmero na Tabela Pha r Inicial minscula do ttulo da obra (Redao Cientfica)

    J de posse das informaes de classificao e localizao, bom saber que as Bibliotecas oferecem, alm dos livros gerais (cientfi-cos, didticos e de literatura) e os livros de referncia (dicionrios, enciclopdias e outras fontes secundrias), os peridicos, que so as publicaes cientficas onde constam os artigos acadmicos das diferentes reas (MEDEIROS, 2009). H, inclusive, uma diviso das Bibliotecas cujo acervo, alm dos peridicos cientficos, contm jor-nais e revistas de circulao nacional e internacional. Tal espao denominado hemeroteca, e deve ser includo entre as melhores fontes para sua pesquisa.

    Para finalizar essa seo, destacamos que as melhores bibliotecas tm seu acervo disponvel para consultas online. A consulta virtual oferece grande economia de tempo, j que voc poder acessar os dados bibliogrficos de qualquer computador, saber se as obras esto disponveis, onde podem ser encontradas e at reserv-las. A Universidade Federal de Santa Catarina dispe de uma ferramenta dessa espcie. Observe a figura abaixo:

    Figura 8: Site da biblioteca da UFSCFonte:

  • EaD UFMS 43 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 43Leitura e documentao

    Se o mundo virtual uma boa ferramenta de pesquisa, o ideal tambm elucidarmos algumas de suas caractersticas, tarefa da seo a seguir.

    3.1.2. A internet

    Como j afirmamos, a Internet uma boa fonte de informaes e as Universidades dispem de diversas bases de dados de pesquisa, tanto nacionais como internacionais. No Brasil, so vrias as parcerias que a CAPES tem mantido com variadas instituies de pesquisa internacionais. Exemplo disso dado por Silva e Menezes (2001): desde 1999, a CAPES tem um convnio que garante acesso base de dados WoS - Web of Science - que contm mais de milhares de artigos publicados desde 1974 em todo o mundo.

    Essas bases de dados muitas vezes tm acesso restrito e depen-dem dos acordos que cada instituio pode firmar. Entretanto, h muitas bases de dados pblicas de pesquisa. Um site de busca como o Google j oferece ferramentas como o Google Acadmico, voltado para a pesquisa universitria e o Google Books, com acesso parcial ou total de milhares de livros. O funcionamento do Google Books bastante simples: basta digitar o ttulo do livro ou o nome do autor no local especfico, conforme a figura abaixo.

    Figura 9: Site Google booksFonte:

    No Brasil, o Governo disponibiliza diversos textos, nas mais va-riadas mdias, no site Domnio Pblico (), onde possvel encontrar as obras completas de vrios escritores de lngua portuguesa, de Li-

  • EaD UFMS44 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS44 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    teratura a Cincias Sociais. O ento Ministro da Educao Fernando Haddad (HADDAD, 2005?) define a misso do site:

    O Portal Domnio Pblico, lanado em novembro de 2004 (com um acervo inicial de 500 obras), prope o compartilhamento de conhecimentos de forma equnime, colocando disposio de todos os usurios da rede mundial de computadores - Internet - uma biblioteca virtual que dever se constituir em referncia para professores, alunos, pesquisadores e para a populao em geral.

    Este portal constitui-se em um ambiente virtual que permite a coleta, a integrao, a preservao e o compartilhamento de co-nhecimentos, sendo seu principal objetivo o de promover o amplo acesso s obras literrias, artsticas e cientficas (na forma de textos, sons, imagens e vdeos), j em domnio pblico ou que tenham a sua divulgao devidamente autorizada, que constituem o patrimnio cultural brasileiro e universal.

    Para o acadmico de cursos de Graduao, buscando os primeiros contatos com a pesquisa, primordial que se atente para a procedncia dos dados. preciso recorrer, como j apontamos anteriormente, s fontes mais legtimas do conhecimento acadmico. Nesse sentido, vale pena ler o que apontam Zandomenego e Cerutti-Rizzatti (2008, p. 145) sobre o cuidado em relao s fontes de pesquisa na internet:

    Na internet, um caminho mais seguro parece ser a busca por in-formaes em sites de universidades, grandes bibliotecas, bancos de dados com solidez, organizaes no-governamentais socio-culturalmente reconhecidas, editoras respeitadas (editoras cujos conselhos editoriais endossam publicaes slidas e no necessa-riamente comerciais ou lucrativas), instituies governamentais.

    (ZANDOMENEGO; CERUTTI-RIZZATTI, 2008, p. 145)

    O jornalista Luis Celso Junior, na Gazeta do Povo, deu algumas dicas de boas fontes de consulta (CELSO JUNIOR, 2007), que ofe-recem e-books completos:

  • EaD UFMS 45 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 45Leitura e documentao

    Figura 10: Lista de sites que oferecem livros digitais gratuitos

    Fonte:

    Ainda da perspectiva da excelncia das fontes de pesquisa na vida acadmica e pensando na Graduao como etapa inicial da pesquisa, trs fontes parecem fundamentais: o Portal de Peridicos CAPES, o SciELO e os Bancos de Teses e Dissertaes de Universi-dades.

    A) O Portal de Peridicos da CAPES

    A CAPES apresenta assim seu Portal (CAPES, 2010):

    Professores, pesquisadores, alunos e funcionrios de 268 institui-es de ensino superior e de pesquisa em todo o Pas tm acesso imediato produo cientfica mundial atualizada atravs deste servio oferecido pela CAPES.

    Portal .periodicos. CAPES oferece acesso aos textos completos de artigos selecionados de mais de 15.475 revistas internacionais, nacionais e estrangeiras, e 126 bases de dados com resumos de documentos em todas as reas do conhecimento. Inclui tambm

  • EaD UFMS46 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS46 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    uma seleo de importantes fontes de informao acadmica com acesso gratuito na Internet.

    O uso do Portal livre e gratuito para os usurios das institui-es participantes. O acesso realizado a partir de qualquer terminal ligado Internet localizado nas instituies ou por elas autorizado.

    A navegabilidade no Portal facilita a pesquisa, dividindo as categorias de busca entre Publicaes, reas e Assuntos, conforme a imagem a seguir:

    Figura 11: Site Peridicos CapesFonte:

    Alm do acesso s mais importantes fontes de divulgao cien-tfica, o Portal ainda oferece o servio Qualis Capes (que voc pode acessar em ), no qual h uma avaliao dos peridicos conforme a qualidade da produo intelectual, o que pode garantir variaes de A1 (para os melhores avaliados) at C. A avaliao se d por pares das reas especficas do conhecimento num sistema de coleta de dados peridico e macio.

    B) O SciELO

    De acordo com o site do SciELO, esse pretende [...] implementar uma biblioteca eletrnica que possa proporcionar um amplo acesso a colees de peridicos como um todo, aos fascculos de cada ttulo de peridico, assim como aos textos completos dos artigos (SCIELO, 2010).

    Diferentemente do Portal CAPES, porm, o SciELO uma banco de dados cujos participantes passam por uma seleo prvia. O pro-cesso se d na forma de avaliao por pares e tem como critrios itens como periodicidade, pontualidade e nmero de citaes em outras publicaes. A vantagem de sua utilizao justamente esse crivo tcnico, que assegura a excelncia acadmica dos textos disponveis.

  • EaD UFMS 47 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 47Leitura e documentao

    Aberto ao pblico em geral, o site do SciELO oferece uma ferra-menta de busca que prev o cruzamento de vrios dados atravs de operadores booleanos (que sero explicados a seguir). Observe, abaixo, sua pgina de busca inicial:

    Figura 12: Site ScieloFonte:

    C) Os Bancos de Teses e Dissertaes

    As Universidades, alm do acervo de livros e revistas cien-tficas (os peridicos onde esto publicados os artigos, que se-ro tema do prximo captulo), tambm dispem de um banco de Dissertaes e de Teses. Esses dois trabalhos so resultados, respectivamente, de Mestrados e Doutorados, os cursos de Ps--Graduao stricto sensu que do ao acadmico o ttulo de Mes-tre e Doutor e so responsveis pela parte mais significativa da pesquisa no Brasil.

    Esses bancos de Dissertaes e Teses, em algumas das mais im-portantes Universidades do pas, esto disponveis online, ou seja, voc pode acess-los e inclusive baixar esses textos para leitura e utilizao em seus trabalhos - com o devido cuidado com os direitos autorais e o uso da normas de citao e referncia3.

    3 As normas sero aborda-das, sucintamente, no prxi-mo captulo.

  • EaD UFMS48 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS48 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    Entre os principais bancos de dados dessa natureza disponveis para consulta desenvolvidos pelas Bibliotecas Institucionais, pode-mos destacar:

    da UFMS, disponvel em ;

    da UNICAMP, disponvel em ;

    da UFMG, disponvel em ;

    da UFSC, disponvel em ;

    da USP, disponvel em .

    Observe abaixo a pgina inicial de consulta do Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertaes (), um banco de dados que contm os mais importantes trabalhos de Ps-Gra duao do pas:

    Figura 13: Site da Biblioteca brasileira de Teses e Dissertaes

    Fonte:

    Alm de garantir a seu trabalho uma atualizao regular, visto que as teses e dissertaes se ocupam das discusses de ponta de suas reas, ambas em geral tm alguns captulos de carter didtico, em que se estabelece o campo de conhecimento por meio de um apanhado das referncias fundamentais daquele universo de saber.

    Finalmente, alm da garantia da importncia da credibilidade das fontes de pesquisa a que estamos nos reportando, outro aspecto

  • EaD UFMS 49 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 49Leitura e documentao

    deve ser observado na pesquisa acadmica: a especificidade. Isso significa que a busca mais refinada de informaes muito til quan-do se realiza uma pesquisa. Silva e Menezes (2001) sugerem alguns comandos que facilitam esse refinamento: os sinais grficos e os operadores booleanos. Aqui, faremos uma pequena listagem dos mais recorrentes, segundo as autoras:

    (a) aspas: fazem com que a ferramenta de busca identifique as palavras como frases. Se voc digitar metodologia acadmica, a busca se restringir s ocorrncias exatas dessa frase.

    (b) o sinal de mais (+): faz com que a ferramenta de busca sele-cione todos os itens antecedidas do mais (+), em qualquer ordem. Se voc digitar + metodologia + acadmica, sero selecionadas todas as ocorrncias de ambas.

    (c) o sinal de menos (-): faz com que a ferramenta de busca ex-clua o item antecedido do menos (-). Se voc digitar - metodologia + acadmica, sero excludas todas as ocorrncias de metodologia.

    Sobre os operadores booleanos, Silva e Menezes (2001, p. 56) en-sinam:

    A relao lgica entre os termos a serem pesquisados, chamada de expresso booleana, estabelecida pelos operadores lgicos tam-bm conhecidos como operadores booleanos. [...] Os operadores booleanos so usados nas buscas para possibilitar a ampliao ou a restrio (refinamento) dos resultados.

    AND: o uso do operador AND traz como resultado da pesquisa p-ginas que possuam obrigatoriamente todas as palavras ligadas por esse operador. Por exemplo, na solicitao: engenharia gentica AND tica. O resultado da pesquisa ser uma lista com todos os documentos com a expresso engenharia gentica que tambm tenham a palavra tica.

    NOT: o uso dos operadores AND NOT traz como resultado da pesquisa pginas que possuam a palavra que precede o operador AND e excluam as palavras que sucedem o operador NOT. Por exemplo, na seguinte solicitao: engenharia gentica AND NOT tica. O resultado da pesquisa incluir todos os documentos que possuam a expresso engenharia gentica, mas que no conte-nham a palavra tica.

    OR: o uso do operador OR traz como resultado da pesquisa docu-mentos que possuam tanto uma palavra como a(s) outra(s) ligada(s) por esse conectivo. Por exemplo, na solicitao: engenharia genti-ca OR tica.O resultado da pesquisa incluir todos os documentos que possuam a expresso engenharia gentica e a palavra tica no necessariamente no mesmo documento.

  • EaD UFMS50 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS50 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    Apresentadas as fontes da pesquisa (biblioteca, Internet), pru-dente ratificarmos a relevncia da escolha dos textos lidos e de sua credibilidade junto comunidade acadmica. Isto posto, cabe ento refletir sobre a leitura desses textos e as maneiras mais eficazes de documentao daquilo que foi lido, tarefa da seo a seguir.

    3.2 A leitura e a documentao na vida acadmica

    Joo Wanderley Geraldi, um importante pesquisador brasileiro da rea de Lingustica, aponta que o processo de leitura e produo de textos no deve separar leitura e produo de maneira estanque (GERALDI, 1999). O que o autor pretende que se pense um processo que vai da leitura escrita e vice-versa. Alm da leitura e da escrita, Geraldi (1999) ainda considera a anlise lingustica nesse processo, que forneceria as bases para a autonomia nos trs mbitos.

    O que afirmamos que, se seguirmos Geraldi (1999), preciso entender que a proficincia em leitura e produo de textos passa no apenas pela constncia e consequente qualidade das leituras re-alizadas e dos textos escritos mas, alm disso, refere-se capacidade que teremos de analisar, de avaliar aquilo que lemos e escrevemos.

    Para desenvolvermos de maneira tima esse processo, passare-mos pelos dois caminhos, o da leitura e o da escrita, imaginando que a partir da o acadmico ter as bases para efetuar suas anlises. No que tange leitura, inicialmente cabe descrever o que se entende por proficincia em leitura. Utilizaremos Koch (2009, p. 48), que revela que so trs grandes sistemas utilizados para processar textos, ou seja, transformar a superfcie escrita em sentido para o leitor:

    O conhecimento lingustico compreende o conhecimento gramati-cal e o lexical, sendo responsvel pela articulao som-sentido [...]

    O conhecimento enciclopdico ou conhecimento de mundo aquele que se encontra armazenado na memria de longo termo, tambm denominada semntica ou social.

    O conhecimento sociointeracional o conhecimento sobre as aes verbais, isto , sobre as formas de inter-ao atravs da linguagem. [...]

    Partimos, pois do entendimento de que ler construir sentidos. Construir sentidos, porm, sempre um trabalho no mundo, consi-derando seus aspectos polticos, sociais e culturais. H, portanto, uma espcie de dicotomia entre uma liberdade total na leitura e algumas regras de sentido, uma limitao daquilo que pode ser entendido. Zandomenego e Cerutti-Rizzatti (2008, p.21) do um panorama dessa problemtica:

  • EaD UFMS 51 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 51Leitura e documentao

    Se entendemos o ato de ler como construo de sentidos, estamos concebendo esse mesmo ato como a participao ativa do sujeito leitor, que empresta o seu conhecimento prvio, agregando-o ao contedo veiculado pelo autor de modo a compreender o que est lendo. [...] Isso sugere que os textos sero lidos de modo particular pelos diferentes leitores, o que, porm, no autoriza a cada leitor conferir ao texto uma interpretao to particularizada a ponto de tangenciar ou deformar o que est escrito no texto, ou tergiversar sobre tal contedo o conhecido equvoco da fuga do assunto.

    Ainda que seja diverso o conhecimento que cada um de ns em-presta ao material textual para a construo dos sentidos (Afinal, somos pessoas diferentes umas das outras.), os textos trazem consi-go, no plano do posto (contedo escrito ou falado), eixos de sentidos que precisam ser depreendidos sob pena de cada leitor entender o texto de um modo to singular que no encontre convergncia na leitura de outros sujeitos. Se o texto o mesmo, os leitores precisam ter pontos minimamente comuns na leitura que fazem dele.

    Na Universidade, voc observar que essa liberdade de inter-pretaes mais restrita, justamente porque se trata de textos can-nicos e ligados tradio de pesquisa de cada rea. Apesar disso, importante que voc exera sua capacidade crtica, dialogando com os textos e no apenas assimilando seus discursos. necessrio que voc entenda a leitura como um ato de dilogo constante, um embate de vozes entre o leitor e o texto.

    Essa a perspectiva que Geraldi (1999) adota, baseado num autor russo chamado Bakhtin: os textos so dialgicos e isso significa que muitas vozes participam desse dilogo. As vozes, no caso dos textos acadmicos, podem ser a do seu professor, a do autor do texto, as dos comentadores do texto, a sua voz de leitor. O ideal no perder o equilbrio entre o que se l, a superfcie do texto, sua voz subjetiva, e as demais vozes que circulam cada vez que lemos um texto num espao e num tempo (social, poltico e cultural) determinados.

    Tendo em vista essa relao sempre tensa entre as vozes textuais, ainda fundamental que voc desenvolva alguns hbitos tcnicos, facilitando a compreenso do material lido. Certamente, se voc acompanha o que ns escrevemos at aqui, impossvel restrin-gir a leitura visualizao da pgina e a decifrao dos caracteres grficos, justamente porque ler um processo mais amplo e exigente, envolvendo sempre estncias exteriores s superfcies textuais.

    Para entender melhor a diferena entre a leitura e a decifrao grfica, Foucambert, um educador francs influente no debate des-se assunto, ensina que a escrita uma organizao grfica para os olhos. Foucambert (1994), ento, diferencia uma leitura eficiente, com

  • EaD UFMS52 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO EaD UFMS52 LETRAS - METODOLOGIA DO TRABALHO ACADMICO

    velocidade entre 20 a 50 mil palavras lidas com os olhos e uma decifrao, que duplica o que se v falando mentalmente. Fou-cambert afirma que h um problema grave na escola, j que muitos so capazes de decifrar lentamente e com grau inferior de enten-dimento e muito poucos - "menos de 30 % dos franceses sabem ler" (FOUCAMBERT, 1994, p. 109) - so capazes de realizar uma leitura com entendimento pleno do texto.

    Dessa perspectiva, voc deve entender seu processo de leitura de modo complexo: primeiramente, porque envolve o "embate de vozes"; depois, porque necessita de elementos exteriores ao texto, como o contexto social e cultural; finalmente, porque exige que no se decifre "palavra por palavra", mas que se compreenda o que leu, globalmente.

    No obstante a centralidade desses aspectos, alguns caminhos "tcnicos" podem ser sugeridos. Considerando o incio da vida aca-dmica e uma eventual ausncia de experincia nas primeiras fases de estudo, relacionamos abaixo seis "dicas" listadas por Medeiros (2009, p. 77-78) para garantir um bom aproveitamento das leituras:

    Determinar um objetivo a alcanar. Esse fato ajuda a selecionar a leitura.

    Fazer uma leitura de contato com a obra. Deve ser realizada sem interrupo.

    Resolver os problemas de decodificao do vocabulrio. Esclarecer dvidas com o dicionrio.

    Apreender as ideias principais. No conveniente assinalar tudo e tampouco marcar termos isolados. [...]

    Esquematizar as ideias principais.

    Elaborar frases-resumo com base no que foi sublinhado.

    Infelizmente, as "dicas" no so infalveis e o trabalho de ler constantemente e atentamente imprescindvel. Dizemos com isso que voc s ter bons rendimentos em leitura - e, por conseguinte, na produo de textos e na anlise autnoma do que leu e escreveu - se seu contato com os textos for ntimo, ou seja, se voc se tornar um "leitor". A partir desses apontamentos, passemos s etapas iniciais da pesquisa e da documentao do material.

    3.2.1 Os resumos

    Um conto muito citado do argentino Jorge Luis Borges narra a histria de uma espcie de confraria de cartgrafos, os mais exmios existentes, que planejam uma revoluo em sua rea:

  • EaD UFMS 53 Mas afinal, o que Metodologia?EaD UFMS 53Leitura e documentao

    Naquele imprio, a Arte da Cartografia alcanou tal Perfeio que o mapa duma Provncia ocupava uma Cidade inteira, e o mapa do Imprio uma Provncia inteira, escreveu ele. Cansados de reduzir o tamanho real das cidades e provncias para que elas coubessem nos mapas, os cartgrafos resolveram construir mapas na escala 1 por 1, de modo que a carta cartogrfica de uma cidade tinha o tamanho da prpria cidade, e assim por diante [...]

    A tarefa de pesquisar deve estar atenta aos problemas levantados na ironia de Borges. Assim, quando lemos um texto e pretendemos documentar o que foi lido, no podemos perder de vista que se trata de um trabalho de seleo e, portanto, de edio. Logicamente, a atividade de leitura constante e o aprofundamento na rea do co-nhecimento que permitir que o acadmico seja capaz de filtrar as informaes mais relevantes dos textos, a fim de resumi-los e no transcrev-los - o erro grandiloquente dos cartgrafos de Borges.

    A tarefa de resumir uma constante em nossas vidas dirias. Em muitas ocasies, narramos de forma sucinta os acontecimentos e as situaes em que nos envolvemos. De maneira parecida, no de-correr da sua vida escolar, em muitas ocasies foi solicitado que voc produzisse resumos, de livros a filmes. Muitas vezes, voc deve ter notado que havia uma variao nas expectativas dos professores em relao a estes textos: alguns exigiam comentrios pessoais, outros se pautavam na objetividade.

    Na Universidade, o acadmico tambm dever produzir resu-mos, com finalidades distintas. Todavia, h um modo acadmico de produzi-los, que inclusive tem uma norma tcnica especfica, a NBR 6028. Essa norma (ASSOCIAO BRASILEIRA DE NORMAS TCNI-CAS, 2003, p. 1) conceitua os resumos e ainda os divide em trs tipos:

    2.2