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  • CADERNOS DE AULA: O MTODO DA ABELHINHA NAS LINHAS E ENTRELINHAS DA HISTRIA DA ALFABETIZAO EM PELOTAS/RS

    LAPUENTE, Janana Soares Martins - UFPeL - [email protected] EIXO: Histria da Educao / n.12 Agncia financiadora: Sem financiamento

    Resumo

    O artigo apresenta uma contribuio para a pesquisa no campo da Histria da Educao e mais especificamente para a Histria da Alfabetizao na cidade de Pelotas/RS, buscando compreender a utilizao do Mtodo da Abelhinha no cotidiano escolar de uma turma de alfabetizao na dcada de 90. Neste trabalho analisei os cadernos de uma aluna que foi alfabetizada pelo Mtodo da Abelhinha relacionando os dados com as orientaes dos Guias do Mestre e de Aplicao do referido mtodo. O entrecruzamento dessas diferentes fontes de pesquisa possibilitou a anlise das etapas do Mtodo da Abelhinha, confrontando a proposta de ensino ao dia-a-dia da sala de aula, atravs da sistematizao dos registros realizados pela aluna e principalmente pela especificao dos cem dias letivos desenvolvidos no ano de 1991.

    Introduo

    O artigo apresenta uma contribuio para a pesquisa no campo da Histria da Educao, em geral e para a Histria da Alfabetizao, em especial medida que busca compreender a utilizao do Mtodo da Abelhinha em Pelotas/RS atravs da anlise dos cadernos da aluna Suzana da Conceio de Barros que foi alfabetizada pelo referido mtodo na dcada de 90.

    A determinao do recorte temporal do trabalho considerou a dcada de 60, perodo de criao do Mtodo da Abelhinha at meados de 90, em funo da localizao de professoras que alfabetizaram com o mtodo na sua verso original, ou seja, seguindo as etapas e materiais indicados pelas autoras no Guia do Mestre e no Guia de Aplicao.

    Tendo em vista a base terica e metodolgica do Mtodo da Abelhinha, apresento a sua utilizao no cotidiano de uma sala de aula atravs do cruzamento das fontes escritas, entre elas destaco o acervo escolar das irms Suzana da Conceio de Barros e Renata da Conceio de Barros e as orientaes contidas no Guias do Mestre e de Aplicao.

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    O acervo disponibilizado para pesquisa foi guardado por mais de uma dcada e organizado pela famlia das alunas/irms em duas caixas contendo em cada uma, cadernos de aula, folhas de atividades, avaliaes, uma cartilha artesanal1 do Mtodo da Abelhinha produzida pela professora e alunos e outra cartilha impressa que faz parte do Plano Nacional do Livro Didtico (PNLD). As alunas Suzana Barros e Renata Barros2 estudaram em uma Escola Municipal na cidade de Pelotas/RS em anos diferentes 1991 e 1993, mas ambas foram alfabetizadas pelo Mtodo da Abelhinha. Para fins desse artigo, analisei somente os cadernos de aula, as folhas de atividades e a cartilha impressa da aluna Suzana, relacionando as orientaes dos Guias do Mestre e de Aplicao.

    A famlia das alunas ao reunir essas fontes escritas conservou papis que guardam histrias individuais e familiares que trazem marcas da escolarizao e permitem pensar diferentes interpretaes da escola e da educao (MIGNOT e CUNHA, 2006). De acordo com Mignot e Cunha (2006, p.41) guardar diferente de esconder. Guardar consiste em proteger um bem da corroso temporal para melhor partilhar; preservar e tornar vivo o que, pela passagem do tempo, deveria ser consumido, esquecido, destrudo, tornado lixo.

    O estudo de Silvia Gvirtz (1999) destaca a relevncia do uso do caderno como fonte privilegiada do registro do ensino e aprendizagem. De acordo com a autora o caderno no um mero suporte fsico, pelo contrrio, um dispositivo cuja articulao gera efeitos na dinmica da sala de aula, atravs da interao dos alunos e professores na realizao da tarefa escolar, alm de um instrumento fortemente normatizado e ritualizado que contempla em sua estrutura o ensinado, o conhecimento do aluno e a sua avaliao.

    Nesse sentido, podemos destacar a importncia do caderno de aula como fonte de pesquisa, ampliada e problematizada atravs do entrecruzamento com outras fontes escritas, que para esse trabalho ajudam a compreender o cotidiano escolar de uma turma de alfabetizao atravs sistematizao e utilizao do mtodo em estudo.

    Na prxima seo apresento uma breve anlise histrica e metodolgica sobre o Mtodo da Abelhinha, fornecendo subsdios para a compreenso dessa proposta de ensino na sala de aula.

    1 A cartilha foi produzida de forma artesanal, atravs de folhas mimeografadas e manuscritas, coladas em

    um caderno pequeno e utilizadas para atividades de leitura oral e silenciosa. 2 As alunas autorizaram a divulgao dos seus nomes e dos materiais manuscritos e impressos para fins de

    pesquisa.

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    O Mtodo da Abelhinha origem e proposta de ensino

    Os estudos sobre a Histria da Alfabetizao no Brasil enfocam os mtodos de ensino da leitura e escrita e as cartilhas escolares, intimamente relacionados com as caractersticas dos acervos e fontes de pesquisa. Nesse sentido, considero os trabalhos de Barbosa (1994), Rizzo (1986), Braslavsky (1971), Mortatti, (2000), Corra (2003) e Soares (2003), pois abordam os principais perodos da histria da leitura e da escrita relacionados ao movimento histrico em torno da questo dos mtodos de alfabetizao.

    Segundo Corra (2003), at meados do sculo XVIII, os alfabetizadores utilizavam-se do mtodo sinttico de alfabetizao. Nessa metodologia, partia-se dos elementos no-significativos da lngua, o fonema e a slaba, por meio dos quais o aluno aprendia a palavra, a frase e o texto. A partir do sculo XVIII at o incio do sculo XX, o mtodo global prope uma oposio ao mtodo sinttico. Em um movimento inverso, essa abordagem analtica parte dos elementos significativos da lngua: a palavra, a frase e o texto.

    Na abordagem sinttica podemos salientar os mtodos alfabtico, fnico e silbico. O mtodo fnico passou a ser adotado no lugar do alfabtico na tentativa de superar a dificuldade existente entre o nome e o som da letra. Primeiro so ensinados os sons das vogais e de forma simultnea o ensino da forma da letra e a maneira de pronunci-la. Depois as consoantes so introduzidas numa determinada ordem e combinadas com as vogais, formando slabas e posteriormente palavras e frases. A aprendizagem dificultada atravs da decifrao som por som, interferindo na habilidade de apreender a idia contida nas palavras, ou seja, o seu significado. O Mtodo da Abelhinha caracterizado como fnico e, portanto, baseado nesses procedimentos didticos.

    Segundo Carvalho (2005), o Mtodo da Abelhinha de autoria de Alzira Sampaio Brasil da Silva, Lcia Marques Pinheiro e Risoleta Ferreira Cardoso, educadoras com ampla experincia de ensino e pesquisa que, criaram o mtodo que foi experimentado na Escola Guatemala, na cidade do Rio de Janeiro, em 1965. Essa escola criada por Ansio Teixeira, era um centro de referncia para inovaes pedaggicas e recebia apoio do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (INEP).

    Em 1968 e 1969 o mtodo ainda foi experimentado nas seguintes unidades federadas: Esprito Santo, Braslia, Guanabara e Rio Grande do Sul (SILVA et al, s/d,

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    p,19). Na dcada de 70, o mtodo j era largamente empregado em escolas pblicas do Rio de Janeiro com resultados muito satisfatrios: 80 e 95% de alunos aprovados em escolas de populao desfavorecida e taxas mais elevadas em escolas de classe mdia (SILVA et al., s/d, p.9).

    A evidncia na memorizao dos sons e a preocupao com a leitura so caractersticas fundamentais do Mtodo Misto de Ensino da Leitura e da Escrita3, mais conhecido como Mtodo da Abelhinha, devido referncia Histria da Abelhinha que acompanha os Guias do Mestre e de Aplicao. De acordo com Carvalho (2005, p.25) nos anos 80 e 90, o referido mtodo continuava a ser aplicado, embora por um menor nmero de professoras.

    Na utilizao do mtodo em estudo so usados prioritariamente recursos fnicos e visuais, tendo como atividade principal Histria da Abelhinha, organizada de forma continuada e dividida em sete captulos, cujos personagens so associados a sons e letras, criando um universo de imaginao e fantasia. Segundo Carvalho (2005, p.26), os personagens so desenhados para sugerir o todo ou partes das formas estilizadas das letras. H, portanto, uma associao de trs elementos: personagem forma da letra som da letra (fonema).

    A personagem Abelhinha, que d nome ao mtodo, tem uma grande importncia no enredo da histria, pois atravs das situaes que so criadas pelas autoras a partir da perda de uma de suas asinhas, os demais personagens so apresentados, criando um clima de magia e envolvimento atravs do enredo da narrao.

    O Mtodo da Abelhinha apresenta trs etapas seguidas de objetivos, durao, recomendaes e sugestes de atividades. De acordo com o Guia do Mestre e do Guia de Aplicao elaborado pelas autoras do mtodo, as etapas so as seguintes: Perodo Preparatrio ou Integrao da Criana, Histria ou Incio da Alfabetizao e Completando a Alfabetizao.

    Durante a primeira etapa a criana integrada ao ambiente da escola, atravs de atividades que desenvolvem as habilidades fundamentais para a aprendizagem da leitura e da escrita e a socializao entre os colegas e o professor. Na etapa seguinte, a criana une os sons das consoantes as vogais atravs da Histria da Abelhinha e na etapa

    3 Os mtodos mistos tambm so chamados de mtodos analtico-sintticos, que tentam combinar

    aspectos de ambas as abordagens tericas, ou seja, enfatizar a compreenso do texto desde a alfabetizao inicial, como prprio dos mtodos analticos ou globais, e paralelamente identificar os fonemas e explicitar sistematicamente as relaes entre letras e sons, como ocorre nos mtodos fnicos (CARVALHO, 2005, p.18).

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    posterior os alunos separam sons nas palavras e unem sons e letras em atividades de leitura e escrita de forma gradual.

    A facilidade na aplicao do mtodo e o reduzido nmero de reprovao e evaso escolar so destacados entre as vantagens na sua utilizao. Conforme as autoras, a inteno era fazer um mtodo simples, eficiente, de baixo custo e que no necessitasse de cartilha, pois as prprias crianas deveriam preparar parte do seu material didtico.

    Na prxima seo apresento os materiais localizados para a pesquisa e as relaes estabelecidas atravs do cruzamento de diferentes fontes de pesquisa: os cadernos de aula, o Guia do Mestre e o Guia de Aplicao.

    O cotidiano escolar do Mtodo da Abelhinha atravs dos cadernos de aula

    Os cadernos de aula e os demais materiais impressos e manuscritos localizados no acervo escolar da aluna Suzana Barros compreendem um vasto e riqussimo material de estudo, possibilitando uma aproximao com o cotidiano escolar da turma em que foi alfabetizada atravs do acesso aos contedos, s atividades e aos pressupostos terico-metodolgicos utilizados pela professora-alfabetizadora.

    A explorao dos cadernos de aula da aluna Suzana foi realizada paralelamente as fontes escritas apresentadas anteriormente, incluindo uma anlise geral dos cadernos, o agrupamento dos dados coletados e a comparao das atividades desenvolvidas com a proposta do Mtodo da Abelhinha.

    No primeiro caderno de aula do ano letivo de 1991, consta o registro de vinte e oito aulas que iniciou no dia oito de maro e terminou no dia doze de junho. No segundo caderno foi possvel observar o registro de vinte e uma aulas, distribudas no perodo dezessete de junho a dezoito de agosto, no terceiro caderno de aula vinte e seis aulas registradas, que compreendem o perodo do dia vinte e sete de agosto ao dia quinze de outubro e no quarto caderno de aula vinte e cinco aulas distribudas no perodo de dezessete de outubro a onze de dezembro. Reunindo as informaes dos quatro cadernos de aula encontramos cem dias letivos registrados.

    Na inteno de compreender a utilizao do Mtodo da Abelhinha no cotidiano escolar, relacionamos as etapas do mtodo indicadas pelas autoras no Guia do Mestre e de Aplicao com as atividades desenvolvidas pela aluna no caderno de aula. De acordo com as autoras do mtodo, o professor

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    ao iniciar cada etapa, deve rel-la, para fixar bem os objetivos visados e as recomendaes importantes e, ainda, para selecionar, aps ler todas, as atividades que ir desenvolver de preferncia com seus alunos (...).Sempre que tiver alguma dvida, voc voltar a consultar o Guia. Isso importante para que seus alunos sejam beneficiados (SILVA et al., 1973, p.39).

    As primeiras atividades realizadas pela aluna durante a primeira srie do ano letivo de 1991 referem-se ao Perodo Preparatrio, entre estas destacamos exerccios para desenvolver a coordenao motora e a discriminao perceptivo-visual. Durante os trs primeiros meses de aula a professora comeou o trabalho de alfabetizao atravs do mtodo silbico4, no entanto neste perodo a famlia de Suzana Barros morava na cidade de Rio Grande/RS e na escola em que estudava no era utilizado o Mtodo da Abelhinha, conforme informaes da prpria aluna e anlise do caderno de aula e das folhas de atividades como mostram as figuras ao lado. Com a vinda da famlia para Pelotas/RS a aluna foi transferida para uma Escola Municipal, na qual a professora utilizava o mtodo em estudo, portanto realizei a anlise dos cadernos de aula a partir do dia seis de junho, data que localizei a primeira aula com o Mtodo da Abelhinha.

    No dia seis de junho de 1991, observei algumas atividades de fixao das vogais e unio aos sons correspondentes, que fazem parte da segunda etapa do Mtodo da Abelhinha, intitulada pelas autoras de Histria ou Incio da Alfabetizao. Essa etapa

    4 De acordo com Gilda Rizzo (1986) no mtodo silbico a slaba a unidade estabelecida como ponto de

    partida para o ensino. Primeiramente as vogais so apresentadas sozinhas e depois todas as consoantes so em sua ordem alfabtica. Logo inciam-se os agrupamentos, utilizando-se da ilustrao para apoiar a slaba destacada. A nfase dada nas slabas isoladas (Ex: ba, be, bi, bo, bu) atravs de um ensino repetitivo.

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    dividida em sete captulos (ver tabela 1) e os personagens apresentados so interligados a Histria da Abelhinha como podemos acompanhar no trecho abaixo:

    J estava ficando noite. - Bem falou a abelhinha. Acho que hoje vou dormir aqui mesmo. Posso? E, sem esperar resposta, deitou-se no meio dos pelos da escova encantada. E logo tirou um soninho. De repente a abelhinha acordou e comeou a gritar: - Socorro! Socorro! Socorro! Por favor, me acudam! - Que que aconteceu com voc? Perguntou o ursinho. A abelhinha respondeu com voz de choro: - A escova mgica est pegando fogo! A escova, dando uma risada, explicou: - No fogo no, abelhinha! um bichinho! Ele ficou preso nos meus pelos. (...) A escova encantada sacudiu os pelos. O bichinho saiu voando. - Como o seu nome? Quis saber a abelhinha. O bichinho, muito afobado, s conseguiu fazer um barulhinho assim: v... A escova mgica explicou: - Este bichinho um vaga-lume, minha gente! Ele no pode falar direito, porque levou um susto muito grande. Agora ele precisa descansar um pouco. Tudo vai acabar bem, vocs vo ver (SILVA et al., 1973, p.108-109).

    Tabela 1 As orientaes do Mtodo da Abelhinha Etapas do Mtodo da Abelhinha

    Os personagens da Histria da Abelhinha

    Guia do Mestre e Guia de Aplicao

    2 Etapa Histria ou Incio da Alfabetizao

    Captulo I Vogais a, e, i, o, u

    Captulo II Consoantes v, d, l, m.

    Captulo III Consoantes p, g, r, t.

    Captulo IV Consoantes b, s, j, n.

    Captulo V Consoantes f, c, z, x.

    Captulo VI Apresentao do h e dos dgrafos ch, nh, lh.

    Captulo VII Apresentao da abelhinha com as novas asas.

    abelha, escova, ndio, culos, urso

    vaga-lume, dlia, lobo, minhoca

    pipa, gato, rato, torre

    bule, sapo, jacar, nenm

    faca, caracol, zebra, Xaveco

    harpa

    Introduo dos sons: Ah! Oh!

    Objetivos: apresentar, fixar e unir as vogais. Apresentar as consoantes e unir consoantes e vogais.

    Durao: 5 dias em mdia.

    Durao: 2 a 3 dias.

    Durao: 3 a 4 dias.

    Durao: 3 dias.

    Durao: 2 dias.

    Durao: 3 dias.

    Durao: 1 ms.

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    No desenvolvimento da segunda etapa do mtodo Histria ou Incio da Alfabetizao percebi que a professora medida que vai introduzindo as consoantes na seqncia da Histria da Abelhinha realiza atividades de fixao daquelas que j foram trabalhadas, como foi possvel analisar no caderno de aula atravs dos seguintes registros: no dia vinte e cinco de junho a professora apresenta os sons p, g, r, t (captulo II) e no dia primeiro de julho observei uma atividade de fixao das consoantes v, d, l, m (captulo I) colada no caderno de aula e logo em seguida o desenho dos respectivos personagens pela aluna Suzana.

    A terceira etapa do mtodo recebeu o nome de Completando a Alfabetizao e comeou a ser desenvolvida no dia dois de setembro atravs de uma atividade de leitura e interpretao, em que foram trabalhadas palavras como carro, amarelo, cenoura, circo atravs de desenho. Segundo as autoras do mtodo nesta etapa as crianas devem vencer dificuldades da lngua: uso de cedilha, til, r, e rr, s e ss, qu, etc. e tambm separar os sons nas palavras e unir sons e letras na leitura e escrita de palavras (SILVA et al., s/d, p.35).

    De acordo com o Guia de Aplicao as crianas no tm qualquer dificuldade ao enfrentar slabas invertidas (ar, al, as) e grupos consonantais (br, cr), pois basta que unam os sons conhecidos. O professor no precisa se preocupar com tais casos (SILVA et al., s/d, p.36).

    No Guia do Mestre e de Aplicao as autoras sugerem que nesta etapa os professores

    trabalhem a leitura e a escrita de forma gradual, ou seja, atravs da leitura e escrita de sons, palavras e frases. Nesse sentido, encontramos no caderno de aula, no dia cinco de agosto o primeiro registro de leitura que tambm foi

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    visualizado na Cartilha Aquarela de D Olim Marote (1991, p. 23): Dad, a comida e a cocada registrado pela aluna Suzana Barros. Analisando comparativamente os cadernos de aula e a Cartilha Aquarela observamos outras histrias dessa cartilha: Sueli e o sapo (p.39), Zaz e o boi Zebu (p.45), A arara de Aurora (p.46), A garrafa de suco (p.48), Cenoura para o vov (p.53) que tambm foram utilizadas pela aluna em atividades de cpia, leitura e interpretao.

    A referida cartilha fundamenta-se na concepo sinttica para o ensino da leitura e da escrita, ou seja, comea o processo de alfabetizao pelas unidades menores da lngua, neste caso letras e slabas. A nfase dada na palavra-chave e na famlia silbica correspondente (Ex: bala ba, be, bi, bo, bu), depois aparecem uma lista com palavras

    isoladas, frases e pequenos textos sem sentido. De acordo com Frade e Maciel (2006) em 1996 instaura-se um processo de avaliao das cartilhas pelo governo federal que praticamente inaugura uma poltica de regulao, avaliao e compra de livros para alfabetizar e aqueles baseados em mtodos mais rgidos e problemas com a autenticidade dos textos tiveram pareceres de excluso.

    No decorrer da terceira etapa podemos observar que a professora utilizou a maioria das palavras-chaves da Cartilha Aquarela para trabalhar as dificuldades da lngua e paralelamente seguiu as orientaes do Guia do Mestre e de Aplicao. Como foi possvel analisar nos seguintes registros do caderno de aula para apresentao da consoante q: no dia onze de novembro a alfabetizadora apresentou a palavra mgica da Histria da Abelhinha quadiduvivu e na folha seguinte do desenho do caderno observamos o desenho do aqurio conforme a cartilha (p.76) seguida de uma histria copiada no caderno.

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    De acordo Jean Hbrard (2001) a cpia est no centro da alfabetizao quando esta se prope a ensinar no somente a ler, mas tambm a escrever. O espao de escrita nos cadernos de Suzana Barros predominantemente ocupado por pginas de cpias, intercaladas por atividades de fixao dos sons, ordenao de palavras e frases e ditado de palavras. No decorrer dessa anlise tambm observei o aprendizado de outros saberes, manifestados no uso e cuidado com os cadernos de aula desde a evoluo do traado das palavras at a manuteno do estado de limpeza e organizao.

    O estudo dos cadernos escolares parece mostrar que, por meio do exerccio, passa a acontecer no somente uma tcnica do corpo, mas tambm uma tcnica intelectual especfica do saber de fazer grficos. Fazer exerccios aprender a apresentar. preciso aprender a tomar essa expresso em todos os sentidos. Apresentar, isto , guiado por uma preocupao constante de limpeza, de boa manuteno, de elegncia ingnua ou afetada, fazer do caderno o pequeno teatro do saber escolar (HBRARD, 2001, p.137).

    Segundo Hbrard (2001) o caderno escolar ainda cumpre o importante papel de apresentar o trabalho escolar para a famlia servindo como um objeto de controle que ordena o espao e o tempo do trabalho na escola. Por isso, a anlise dessa fonte de pesquisa exige um trabalho minucioso atravs da constante leitura nas linhas e entrelinhas do seu contedo.

    Nesse sentido, os cadernos de aula criam registros de memria e ajudam a compreender o cotidiano escolar de uma turma de alfabetizao em Pelotas/RS, atravs do acompanhamento das etapas do Mtodo da Abelhinha e do registro dos cem dias letivos trabalhados no ano de 1991.

    Consideraes Finais

    Este trabalho procurou compreender a utilizao do Mtodo da Abelhinha em Pelotas/RS atravs do cruzamento de diferentes fontes escritas, entre elas destaco os cadernos da aluna Suzana da Conceio de Barros que possibilitaram uma aproximao com o dia-a-dia de uma sala de aula na dcada de 90 .

    A anlise desses cadernos permitiu o acompanhamento das etapas do mtodo e a aplicao do mesmo pela professora-alfabetizadora, atravs da organizao dos registros

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    e principalmente pela especificao dos cem dias letivos, que foram analisados comparativamente as orientaes dos Guias do Mestre e de Aplicao.

    Considerando que os cadernos de alunos e alunas so fontes ainda pouco exploradas, torna-se necessrio segundo Peres (2006), (re) inventar estratgias de explorao dessa fonte e principalmente trabalhar na criao de uma cultura de valorizao e conseqente preservao desse material, debatendo estratgias efetivas de polticas de acervo.

    Com relao s estratgias (re) inventadas busquei confrontar as fontes escritas buscando entender as rotinas, os tipos de atividades, as formas de sistematizao do conhecimento, as prticas de leitura e escrita pensadas e planejadas para uma determinada turma e com isso, refletir sobre concepes e prticas que somente os depoimentos orais e os Guias no permitiriam. Dessa forma, os cadernos de aula trouxeram a vida e o movimento de uma sala de aula permitindo uma leitura nas linhas e entrelinhas e contribuindo com a Histria da Alfabetizao em Pelotas/RS.

    Referncias

    CARVALHO, Marlene. Alfabetizar e letrar: um dilogo entre a teoria e a prtica. Petrpolis, RJ: Vozes, 2005.

    FRADE, Isabel Cristina Alves da Silva; MACIEL, Francisca Isabel Pereira. Introduo. In: FRADE, Isabel Cristina Alves da Silva; MACIEL, Francisca Isabel Pereira (orgs). Histria da Alfabetizao: produo, difuso e circulao de livros (MG/ RS/ MT Sc. XIX e XX). Belo Horizonte: UFMG/FaE, 2006 (a).

    GVIRTZ, Silvina. El discurso escolar a traves de los cuadernos de clase: Argentina 1930/1990. Buenos Aires: UNBA, 1999.

    HBRARD, Jean. Por uma bibliografia material das escritas ordinrias: o espao grfico do caderno escolar (Frana sculos XIX e XX). In: Revista Brasileira de Histria da Educao. Campinas/SP: editora Autores Associados, n 1, p.115- 141, jan. / jun. 2001.

    MAROTE, D Olim. Cartilha Aquarela. So Paulo: tica, 1991.

    MIGNOT, Ana Chrystina Venncio; CUNHA, Maria Teresa Santos. Razes para guardar: a escrita ordinria em arquivos de professores/as. In: Revista Educao em Questo, Natal, v. 25, n.11, p. 40-61, jan./abr.2006. Disponvel em www.revistaeduquestao.educ.ufrn.br/revista25.htm Acesso em 8 de julho de 2007.

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    PERES, Eliane. A produo e a circulao de cartilhas escolares no Rio Grande do Sul: alguns dados de pesquisa. In: FRADE, Isabel Cristina Alves da Silva; MACIEL, Francisca Izabel Pereira (orgs.). Histria da Alfabetizao: produo, difuso e circulao de livros (MG/ RS/ MT Sc. XIX e XX). Belo Horizonte: UFMG/FaE, 2006.

    RIZZO, Gilda Menezes. Estudo comparativo dos mtodos de ensino da leitura e da escrita. Rio de Janeiro: Papelaria Amrica, 1986.

    SILVA, Almira Sampaio Brasil da; PINHEIRO, Lcia Marques; CARDOSO, Risoleta Ferreira. Mtodo misto de ensino da leitura e da escrita e histria da abelhinha Guia do mestre. 7. ed. So Paulo: Companhia Editora Nacional, 1973.

    SILVA, Almira Sampaio Brasil da; PINHEIRO, Lcia Marques; CARDOSO, Risoleta Ferreira. Mtodo misto de alfabetizao Guia de aplicao. So Paulo: Companhia Editora Nacional, s/d.