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Mercado das Artes Visuais Objeto artístico: gostos e preferências

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  • 1. Objeto artstico: gostos e preferncias

2. RESUMO: O presente estudo divide as galerias de arte de Curitiba em trs grupos: vanguarda, intermediria e comercial. Na maioria das galerias analisadas em 2004, os artistas so pintores de gneros e so esses que conseguem viver profissionalmente da arte, ou seja, escolhem e se aperfeioam sempre no mesmo tema. Podemos dizer que, na produo de vanguarda, a linguagem plstica se dissociou do social, mas esse avano no foi acompanhado pelo grande pblico; se isso verdade para a produo, o mesmo no acontece com o/a profissional, que no dissociou do social, isso porque o/a artista depende das relaes sociais para produzir a sua obra tanto materialmente quanto simbolicamente, isto , esses profissionais, alm de serem artistas plsticos, atuam em outras reas. Considerando esse aspecto profissional, independentemente da formao, precisam desenvolver outras atividades que possibilitem uma remunerao. 3. Nosculo XVII, os mecenas eram ao mesmo tempo o patrocinador e o consumidor da arte. Na arte barroca, a segurana para o artista era trabalhar para os mecenas que, nesse perodo, desempenhavam a funo que os crticos de arte exercem na atualidade. 4. Somenteno sculo XVIII que iria ser ressuscitado o culto do gnio (HASKELL, 1997, p.17-19). A genialidade desse perodo e o isolamento do artista em seu ateli, de acordo Nestor Canclini (1986, p.99), impem ao artista um novo tipo de dependncia: o mercado de pintura, e, segundo Pierre Bourdieu (2002, p.278), do origem ao campo artstico. 5. A constituio do campo artstico retira o poder que no sculo XVIII era conferido Academia de Belas Artes, que atuava como detentora do monoplio artstico criando suas prprias regras e condutas, legitimando o mercado de bens simblicos: na oposio entre arte e dinheiro. A partir do Impressionismo e do advento da fotografia o campo da arte e os diversos agentes que legitimam essas novas regras estabelecem princpios de classificao para os bens simblicos que, como conseqncia, depende da relao que o artista estabelece com o mercado de pintura. 6. Na contemporaneidade da arte temos dois mercados: o comercial e o simblico. No mercado simblico, hoje, os crticos ou os curadores representam os mecenas do sculo XVII, que diferente dos mecenas no garantem proteo financeira em curto prazo, como diria Bourdieu (1996, p.135). E, no mercado de galerias de arte, representa o marchand, que dependendo da posio da galeria poder trazer retorno financeiro e/ou simblico. As relaes de poder entre os diversos agentes que atuam no campo da arte e a luta por melhores posies o que mantm o campo em funcionamento. 7. Diferentedas publicaes editadas pelo campo erudito da arte, o Dicionrio e Catlogo Julio Louzada, bem como o Manual do Mercado da Arte, livro tambm editado pela Julio Louzada Publicaes, so referncias que tratam diretamente do mercado de arte e, portanto, no so consideradas boas leituras pelos crticos e tericos que tratam sobre a arte 8. De acordo com as publicaes editadas por Julio Louzada, o artista para ter sucesso no mercado de arte deve: primeiro, ter domnio do desenho realista e exercer uma profisso paralela, fato que se comprova pela anlise dos currculos dos artistas das diferentes geraes, mas que no mencionado pelo grupo de vanguarda; segundo, o artista no deve perder a comunicao com o grande pblico; sendo assim, deve escolher um nome artstico adequado que o pblico alie pintura, o que significa ter um estilo prprio. 9. Porm, algumas regras do grupo de vanguarda servem para o grupo comercial: participar dos canais de legitimao oferecidos pelo sistema da arte, o que proporciona a circulao e valorizao da sua obra; consultar os servios de um marchand e no comercializar a obra diretamente no seu ateli; a idia que se perpetua em ambos os grupos de que o talento do artista congnito e que a formao em artes no primordial embora para o campo erudito esse fato no seja revelado abertamente como para o mercado de arte 10. Porltimo, a idia que mercado e a arte so coisas distantes e antagnicas: arte criao; o novo; uma projeo para o futuro; movimento; dinmica. J mercado de arte a anlise do que foi criado, mesmo que h pouco tempo; o velho; um mergulho no passado; esttico (SANTOS, 1999, p.73). 11. Em Curitiba, caso a opo do artista seja se manter na posio de vanguarda e no na posio comercial, suas prticas so diferentes, ou seja, outras atividades profissionais tornam-se uma necessidade e uma regra, tanto pela necessidade financeira quanto pelas trocas simblicas estabelecidas dentro do espao social. Dependendo de qual seja a atuao e posio ocupada nas outras reas relacionada s artes, o artista permanece ativo e agrega valor simblico sua produo. Esta passa a ser valorizada no pela obra em si, mas pela posio ocupada dentro do espao social e das relaes extra-artsticas que so estabelecidas. Tais relaes, mesmo quando evidentes so negligenciadas, o que comprova a regra da arte8, mencionada por Bourdieu, j que o artista moderno nega tanto o mercado quanto s relaes sociais. 12. Constatamosque o acesso do artista ao mercado de bens simblicos no depende da formao superior em artes. Ou seja, o artista para ser reconhecido precisa ser aprovado pelas inmeras instncias de legitimao que compem o sistema das artes. Sem participar dessas instncias, o artista considerado marginal pelo sistema e no oficializado pelo mesmo. 13. Portanto, para ser considerado artista, ele deve ser aceito oficialmente, seja pela participao em Sales de arte, seja pela realizao de exposies individuais em espaos oficiais, seja pela participao em Bienais de arte ou pela edio de catlogos e livros que falem sobre a sua produo. Assim, o artista precisa participar do sistema da arte, que independe da sua formao e refora a importncia dos agentes culturais: o que define esse reconhecimento so os espaos nos quais o artista participa ou participou, j que a mudana de posio tambm modifica o valor atribudo obra e ao artista. 14. O mercado de trabalho para o artista plstico que pretende trabalhar com a produo, em Curitiba, se caracteriza pelos profissionais que esto vinculados s galerias comerciais, que at mesmo j ocuparam posies de destaque. Quanto ao pblico, embora o foco da pesquisa tenha partido da produo existente nas galerias e no do pblico consumidor, indiretamente possvel analisar a sua preferncia. A maioria das obras atende ao pblico principiante, como diria Gombrich, ou demanda comercial, como menciona Bourdieu: so obras que seguem os princpios renascentistas de composio, que reproduzem o objeto fiel realidade posio j superada com a difuso da fotografia. 15. No campo da arte, no apenas as escolhas profissionais classificam os grupos, mas a escolha da temtica e da linguagem tambm diferente de um grupo para outro, que por sua vez, est relacionada atividade profissional de cada artista. Na maioria das galerias analisadas, os artistas so pintores de gneros ou pintores de ofcio e so esses que conseguem viver profissionalmente da arte, ou seja, escolhem uma temtica nica e se aperfeioam sempre no mesmo tema. Os temas quase sempre so agradveis de serem apreciados e remete a paisagens cotidianas, como o pinheiro do Paran, os casarios de Curitiba, o mar do litoral paranaense; passagens religiosas, como o pastor com ovelhas ou procisso; natureza morta, com vasos de flores e objetos. 16. Considerandoas regras do mercado de arte e no as regras do campo erudito da arte, o tema determinante na carreira do artista plstico. No Manual do Mercado de Arte, Santos (1999, p.76) menciona que existe uma hierarquia nos temas escolhidos, o que indica maior ou menor possibilidade de venda, ou seja, as paisagens iconogrficas, paisagens diversas, casarios, marinhas, interiores, naturezas-mortas, nus artsticos, figuras na paisagem e retratos, nessa ordem, detem a preferncia do pblico. 17. Retomando as hipteses do trabalho, podemos dizer que, primeiro, a produo na vanguarda a arte moderna e contempornea a linguagem plstica se dissociou do social. Esse avano no foi acompanhado pelo grande pblico. Se isso verdade para a produo o mesmo no ocorre para o profissional. Ele no se dissociou do social. Isso porque o artista depende das relaes sociais para produzir a sua obra tanto materialmente quanto simbolicamente, ou seja, esses profissionais alm de artistas plsticos atuam em outras reas. 18. Considerandoesse aspecto profissional, os artistas plsticos, independentes da formao, precisam desenvolver outras atividades que lhes possibilitem uma remunerao, seja para produzir obras mais hermtica com pouca possibilidade de comercializao e de difcil entendimento por parte do grande pblico, seja para manter o nome em evidncia, j que as exposies, na maioria das vezes, so realizadas esporadicamente. 19. Segundo, a produo comercial, tanto a obra quanto o artista no se dissociaram do social, pois este artista, com o seu trabalho, quem participa das escolhas e preferncias do grande pblico. E somente assim que a relao entre galeria, artista e consumidor se consolida socialmente. Os artistas que no desenvolvem outras atividades paralelas tm como fontes de renda a produo e a comercializao da obra. Sendo assim, a linguagem plstica precisa ser mais acessvel ao grande pblico. 20. Verificamos tambm a relao entre a formao acadmica em artes e a formao autodidata, na qual conclumos que o diploma no garante o cargo (BOURDIEU, 1998, p. 142), ou melhor, para o mercado de bens simblicos o diploma no garante capital simblico necessrio para que o artista atue na posio de vanguarda. No campo artstico, o uso do termo cargo j se torna um problema quando relacionamos ao artista plstico, cuja prtica no encarada como trabalho, no sentido hierrquico e institucional. O artista produz em seu ateli sendo um profissional autnomo, embora a existncia do mercado o coloque como um trabalhador que produz obras de arte, porm, para o campo erudito da arte, o artista deve criar livremente, sem depender diretamente do campo econmico. 21. O mercado das galerias de arte em Curitiba atende a demanda comercial que oposta conduta instituda no ensino. Evidenciando, assim, a defasagem entre as aspiraes que o sistema de ensino produz e as oportunidades que o mercado de trabalho oferece, soma-se aspirao pessoal a inflao de diplomas (BOURDIEU, 1998, p.161-162). Ento, de um lado, o ensino superior ao incentivar a produo de vanguarda liberta o artista do conhecimento da tcnica: do desenho artstico, reforando as relaes sociais, e por outro, prepara o profissional para outras profisses: por ofertar cursos de licenciatura e tambm por dar subsdios para que o artista produza uma obra comercial. Nesse caso, os diplomas so importantes para preservar a produo de vanguarda e possibilitar as condies de acesso a outros cargos, ou mesmo explicitar as trocas simblicas, caso o diploma no corresponda ao cargo. 22. Os artistas de vanguarda precisam da validao oficial para vincular os seus trabalhos e serem reconhecidos no meio artstico. O caminho continua sendo participar de Sales de arte, etapa anterior realizao de exposies individuais, para formar um currculo artstico e ganhar credibilidade. Os Sales so instncias reguladas pela Secretaria de Estado da Cultura do Paran e representam a poltica cultural adotada pelo Estado, juntamente com os espaos disponibilizados para realizao das exposies oficiais em Curitiba, alm das atividades promovidas pela FCC que tambm est relacionada Prefeitura de Curitiba. 23. Sendo assim, mesmo com toda a autonomia preconizada pelo sistema de ensino e pelo campo da arte constatamos que a produo plstica a ser vinculada e aceita como arte depende em grande parte das decises do campo poltico e econmico que interferem na atuao profissional do artista. Contudo, conclumos que a realidade social para o profissional de artes no permite muitas escolhas e salrios: primeiro, pela desvalorizao dos diplomas na rea de artes (professores de arte); segundo, pelo mercado restrito para os artistas de vanguarda; e, terceiro, pela prtica gerada no ensino superior que repudia os artistas comerciais. 24. ARGAN, G. C. Arte Moderna: do Iluminismo aos movimentos contemporneos. So Paulo: Companhia das Letras, 2002. BOURDIEU, P. A economia das trocas simblicas. 5. ed. So Paulo: Perspectiva, 2001. ______. A procura de uma sociologia da prtica. In: ORTIZ, R. (org.). Pierre Bourdieu: Sociologia. So Paulo: tica, 1994.p.7-37. ______. A produo da crena. 1. ed. 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