memoria viva quincas leao

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Quincas Leão, o ho- mem mais rico de Cachoeiro........ em amizades. Q uincas Leão, meu avô por parte de pai foi uma das figuras mais estimadas desta cidade. Certa vez um amigo o apresentou em uma roda em Vitória como: este é o Quincas, o sujeito mais rico de Cachoeiro. Diante o espanto de vovô, ele acrescentou: Rico em amizades. Firmou-se assim a mais pura verdade. O velho e desbocado Quincas Leão era um mestre na arte de fazer amigos, as vezes através das mais insólitas molecagens, outras de sua mesa farta e sempre aberta aos amigos. Ele costumava ficar sentado na varanda esperando a hora do almoço. Se não tivesse nenhum convidado ele convocava o primeiro que passasse. Fazia questão de estar sempre a mesa acompanhado por algum amigo. A habilidade de vovó Maria na cozinha era um de seus maiores orgulhos. Ela contava sem mágoa que certa vez ele chegou de supetão as 11 horas da manhã pra avisar que uma hora depois o governador do estado e seus secretários, estariam em casa para almoçar. O governador na época era Chiquinho Lacerda de Aguiar, seu amigo de longa data, correlegionário na UDN. Dito e feito, Dona Maria correu para o fogão e em prazo curtíssimo preparou um banquete para todo o "staff" do partido, que se deliciou, entre outros quitutes, com seu macarrão caseiro e seu famoso bife de músculo - súper macio - um segrêdo que ela levou para o túmulo e ninguém nunca mais conseguiu fazer igual. Além do frango assado e diversas sobremesas. Quincas era filho do Major Quintino, um tropeiro mineiro que se estabeleceu em Alegre e foi um de seus primeiros prefeitos. O major era uma figura sizuda que deixou para os tres filhos- homens- uma fortuna em bens e imóveis. Eles, que não tinham nada de sizudos, não perderam tempo, torraram tudo e caíram no mundo. Tio João virou dono de pensão na Lapa, Tio Benedito foi assassinado por um ciumento motorista de caminhão, cuja mulher ele andou dando umas beliscadas "in- voluntárias", e Vovô depois de ser dono de cinema, hoteleiro e delegado "do Alegre", virou viajante. Contava entre gargalhadas que na época das vacas gordas ele tinha dois guarda-roupas: um "no" Alegre, outro no Rio de Janeiro, onde só andava como na foto ao lado: terno sob medida, cartola e polainas. As histórias de Quincas Leão são folclóricas. Amigo de todos os delegados, juízes e desembargadores - que o chamavam de coronel - um de seus maiores prazeres era pedir favores para os amigos, independente do credo ou preferência política. Ele contava seus casos com a maior desfaçatez, depois morria de rir. Uma das que mais gosto foi quando um "fulano" foi pedir para que ele intercedesse junto ao seu grande amigo, o desembargador C. A. para que apressasse uma ação de despejo contra um "Turco" que era seu inquilino. Causa chata, o proprietário era o maior miserável, mas o outro estava abusando. Não pagava e empurrava a causa há anos. Vovô foi a Vitória e fez o pedido. Dias depois Dr. C.A respondeu a solicitação. Olha Quincas, não vai dar pra te atender porque voce já pediu anteriormente a favor do "Turco" e ele ganhou a causa. Época boa em que imperava a inocência de um causídico amador que penalizado por situações antagônicas, advogava gratuitamente para os dois lados. E só dava empate. por Gilson Leão QUINCAS LEÃO Quincas Leão em companhia de um amigo na Av Rio Branco, no Rio de Janeiro. Esta foto foi gentilmente retocada por Geraldo Sobrosa

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Page 1: MEMORIA VIVA QUINCAS LEAO

Quincas Leão, o ho-mem mais rico de Cachoeiro........em

amizades.

Quincas Leão, meu avô por parte de pai foi uma das figuras mais estimadas desta cidade. Certa vez um amigo o apresentou em uma roda em Vitória como: este é o Quincas, o sujeito mais rico de Cachoeiro. Diante o espanto de vovô,

ele acrescentou: Rico em amizades. Firmou-se assim a mais pura verdade. O velho e desbocado Quincas Leão era um mestre na arte de fazer amigos, as vezes através das mais insólitas molecagens, outras de sua mesa farta e sempre aberta aos amigos. Ele costumava ficar sentado na varanda esperando a hora do almoço. Se não tivesse nenhum convidado ele convocava o primeiro que passasse. Fazia questão de estar sempre a mesa acompanhado por algum amigo. A habilidade de vovó Maria na cozinha era um de seus maiores orgulhos. Ela contava sem mágoa que certa vez ele chegou de supetão as 11 horas da manhã pra avisar que uma hora depois o governador do estado e seus secretários, estariam em casa para almoçar. O governador na época era Chiquinho Lacerda de Aguiar, seu amigo de longa data, correlegionário na UDN. Dito e feito, Dona Maria correu para o fogão e em prazo curtíssimo preparou um banquete para todo o "staff" do partido, que se deliciou, entre outros quitutes, com seu macarrão caseiro e seu famoso bife de músculo - súper macio - um segrêdo que ela levou para o túmulo e ninguém nunca mais conseguiu fazer igual. Além do frango assado e diversas sobremesas.

Quincas era filho do Major Quintino, um tropeiro mineiro que se estabeleceu em Alegre e foi um de seus primeiros prefeitos. O major era uma figura sizuda que deixou para os tres filhos- homens- uma fortuna em bens e imóveis. Eles, que não tinham nada de sizudos, não perderam tempo, torraram tudo e caíram no mundo. Tio João virou dono de pensão na Lapa, Tio Benedito foi assassinado por um ciumento motorista de caminhão, cuja mulher ele andou dando umas beliscadas "in-voluntárias", e Vovô depois de ser dono de cinema, hoteleiro e delegado "do Alegre", virou viajante. Contava entre gargalhadas que na época das vacas gordas ele tinha dois guarda-roupas: um "no" Alegre, outro no Rio de Janeiro, onde só andava como na foto ao lado: terno sob medida, cartola e polainas.

As histórias de Quincas Leão são folclóricas. Amigo de todos os delegados, juízes e desembargadores - que o chamavam de coronel - um de seus maiores prazeres era pedir favores para os amigos, independente do credo ou preferência política. Ele contava seus casos com a maior desfaçatez, depois morria de rir. Uma das que mais gosto foi quando um "fulano" foi pedir para que ele intercedesse junto ao seu grande amigo, o desembargador C. A. para que apressasse uma ação de despejo contra um "Turco" que era seu inquilino. Causa chata, o proprietário era o maior miserável, mas o outro estava abusando. Não pagava e empurrava a causa há anos. Vovô foi a Vitória e fez o pedido. Dias depois Dr. C.A respondeu a solicitação. Olha Quincas, não vai dar pra te atender porque voce já pediu anteriormente a favor do "Turco" e ele ganhou a causa. Época boa em que imperava a inocência de um causídico amador que penalizado por situações antagônicas, advogava gratuitamente para os dois lados. E só dava empate.

por Gilson Leão

QUINCAS LEÃO

Quincas Leão em companhia de um amigo na Av Rio Branco, no Rio de Janeiro. Esta foto foi gentilmente retocada por Geraldo Sobrosa