medida cautelar inominada
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EXMO. SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
Tutela de urgência incidental à apelação cível interposta no
processo 161.01.2012.011909 da Vara da Fazenda Pública de
Diadema
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por meio dos seus órgãos de execução
signatários, vem, à presença de Vossa Excelência,
com o devido acatamento e respeito, incidentalmente
à apelação cível interposta no processo
161.01.2012.011909 da Vara da Fazenda Pública da
Comarca de Diadema, propor a presente, com espeque
no art. 798 do CPC e art. 1º, III e art. 5º, XXXV
da Constituição Federal
AÇÃO CAUTELAR INOMINADA COLETIVAcom pedido de liminar
em face do MUNICÍPIO DE DIADEMA, ente da
Federação, pessoa jurídica de direito público
interno, que deve ser citado, conforme preceitua o
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artigo 12, inciso II, Código de Processo Civil, na
pessoa do seu Chefe do Executivo, sito Rua
Almirante Barroso, n° 111, Vila Santa Dirce,
Diadema/SP, CEP 09912-170, diante dos seguintes
fatos e fundamentos.
I – DA SÍNTESE FÁTICA
Foi interposto pela Defensoria Pública do
estado de São Paulo, no dia 11 de maio de 2012,
mandado de segurança coletivo, objetivando a tutela dos direitos coletivos de reunião e de expressão,
especificamente para cassar proibição e obrigar o
Município de Diadema a permitir, tolerar e
colaborar, nos limites legais, com a realização de
evento cívico conhecido como Marcha da maconha, em
Diadema, no dia 26 de maio de 2012 .
É preciso demonstrar o processo fático
que culminou naquela impetração.
Assim, há nos autos farta documentação,
apta a demonstrar que, em 25 de janeiro de 2012, o
Coletivo Marcha da Maconha expediu ofício para a
Prefeitura de Diadema , para o Comandante da Polícia
Militar e para a Companhia de Engenharia de Tráfego
do Município (documento em anexo), ocasião em que
solicitava “apoio para a realização de evento
público”.
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Neste primeiro documento, foi externado o
objetivo do encontro, sua data e local. Assim,
informou-se , desde o primeiro momento , que o evento Marcha da Maconha, concretização do direito de
reunião, em Diadema, ocorrerá no dia 26 de maio de
2012, a partir das 13h, na Praça da Moça, cujo objetivo seria “a manifestação pública por mudanças na Lei 11343/2006 a fim de regulamentar o uso,
comércio e produção da planta cannabis sativa L.”.
Mais ainda, acrescentou-se que “o evento tem
caráter pacífico e democrático”1.
Em resposta ao ofício expedido pelo
coletivo, a Prefeitura de Diadema respondeu. E
respondeu, pasme, Excelência, positivamente. Assim,
consoante documentação em anexo, no ofício OF – GP
nº50/12, consta o seguinte:
“Em resposta ao ofício 01/12, solicitando a
cessão de uso da Praça da Moça para a
realização do evento “Marcha da Maconha –
2012”, no dia 26/05 à partir das 13h,
comunicamos que a solicitação será atendida” – grifos do original.
Com o aceite por parte do Poder Público
Municipal, foi realizada reunião no 24º Batalhão da
Polícia Militar , com participação do Capitão da PM,
Sr. Roberto Laguna Ornellas, do 1º Tenente da PM,
1 Ofício, com protocolo da Prefeitura, em anexo.
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Sr. Robinson Luiz Carota, e dos senhores Bruno
Logan Azevedo e Ícaro Monteiro Rizzo, ambos
representantes do movimento, com o intuito de
organizar o evento 2.
Contudo, de maneira contraditória, o
Município passou a adotar postura refratária ao
movimento cívico da Marcha da Maconha.
Em 22 de março de 2012, o Sr. Osvaldo
Misso, Chefe de gabinete do Prefeito de Diadema,
expediu ofício para o coletivo Marca da Maconha
ABC, pedindo “aos idealizadores do evento em
referência para que (...) busquem espaços adequados
para discutir as mudanças pretendidas da lei
Federal nº11343/2006” 3.
Em resposta, foi publicada carta aberta
(que também foi encaminhada ao Prefeito de Diadema)
com o objeto de reafirmar os valores que norteavam
a Marcha da Maconha, bem como a intenção de
prosseguir no intento, especialmente porque
respaldados pela Corte Suprema do Brasil.
Ao final deste processo acima narrado,
veio, em verdadeira síntese arbitrária, a
derradeira e irrestrita proibição do evento no
território de Diadema.
2 Ata da reunião em anexo.3 Documento anexado.
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Deveras, em 18 de abril de 2012, as
autoridades apontadas como coatoras na impetração
originária, senhores Arquimedes Andrade e José
Tadeu, notoriamente cumprindo orientação do Sr.
Prefeito, Mario Reali, encaminharam ao coletivo
Marcha da Maconha o OF.SDS nº81/212, que segue em
anexo. Segue, no que interessa, transcrição do
texto, in omissis:
“Prezado Senhor,
Venho informar a vossa senhoria que a
Prefeitura Municipal de Diadema não autoriza
o uso da Praça da Moça para a realização da
‘Marcha da Maconha Diadema’, no dia 26 de
maio, 13h, na Praça da Moça. (...)
O município, como ente federado tem autonomia política para deliberar sobre o uso de seu espaço urbano. Neste sentido e considerando todo o exposto, e o interesse público maior, não autoriza o uso do espaço público para realização da Marcha da Maconha no território de Diadema ” – grifos nossos.
O Município, a par de tentar justificar,
longamente, sua posição, ao final, pura e
simplesmente, destaca a intolerância, a indiferença
para com grupos minoritários, a falta de diálogo e,
em última instância, o completo desrespeito ao
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livre pensamento, à liberdade de reunião e às
decisões do Supremo Tribunal Federal.
Ora, fosse garantida a liberdade de
expressão e de reunião apenas para a defesa de
ideias majoritárias e encampadas pelo Poder
Público, estaríamos defronte a um direito sem
qualquer utilidade prática. É justamente no caso de
grupos minoritários, de ideias que conflitem com a
massa hegemônica, que os direitos que se pretende
tutelar ganham corpo e importância.
De toda essa trama fática, extrai-se, a
um só tempo: (i) a completa proibição da Marcha da
Maconha em qualquer espaço público de Diadema; (ii)
a fundamentação em pura discricionariedade
administrativas, eis que “a marcha da maconha
conflita, colide, com as políticas públicas
desenvolvidas pela Prefeitura”.
Daí porque tornou-se necessária a
impetração de mandado de segurança coletivo, perante a Vara da Fazenda Pública de Diadema,
procurando tutelar o direito coletivo de todos os potenciais participantes do encontro , resguardando-se o direito de reunião e a liberdade de expressão
de incontáveis cidadãos .
Sucede que o juízo da Vara da Fazenda
Pública de Diadema, ex abrupto, indeferiu
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liminarmente a petição inicial, sob o fundamento de
carência de ação, notadamente ausência de interesse
processual (interesse-adequação). Alegou, em
síntese, que, no caso, a medida cabível seria apenas a reclamação constitucional , haja vista a
eficácia erga omnes e o efeito vinculante das
decisões proferidas pelo Excelso Pretório na
arguição de descumprimento de preceito fundamental nº187 e na ação direta de inconstitucionalidade 4274. O juízo a quo, aliás, chegou a consignar na
sentença que extinguiu o processo que “é induvidoso o direito material deduzido pela impetrante ”.4
Contra esta decisão já foi interposto recurso de apelação , no bojo do qual foi
apresentado pedido, dirigido ao relator, de
concessão de tutela antecipada recursal 5.
Sucede que, diante da urgência que marcou a impetração (urgência que ainda persiste ), é
absolutamente inviável que se aguarde a subida dos
autos para que, apenas no âmbito da apelação, seja
analisado o pedido, sob pena de perecimento do
direito e, mais do que isso, provável ocorrência de
desnecessários confrontos entre manifestantes e
agentes do Estado no dia 26 de maio de 2012, na
Praça da Moça, em Diadema.
4 Sentença proferida pelo juízo da Vara da Fazenda Pública de Diadema, que segue
em anexo, em cópia integral.5 Em anexo, cópia protocolizada da apelação interposta.
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II – DA PERTINÊNCIA EXCEPCIONAL DESTA AÇÃO.
Este Egrégio Tribunal de Justiça de São
Paulo, diante de situações de manifesta urgência,
como forma de concretizar uma prestação
jurisdicional útil, tempestiva e efetiva, entende
que há interesse processual no ajuizamento de ação
incidental com o fito de concessão de tutela
antecipada, já no âmbito recursal, seja em apelação
cível, seja em agravo.
Foi o que decidiu a Colenda 5 a Câmara de
Direito Público deste Egrégio Tribunal na medida cautelar incidental nº 994.09.235755-8, em que foi deferida liminar para o fim de antecipar,
diretamente no Tribunal, os efeitos da tutela
pretendida, diante de insucesso processual em
primeiro grau de jurisdição. Vale a transcrição da
ementa:
OBRIGAÇÃO DE FAZER FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTO POSSIBILIDADE. Em atendimento a
preceito constitucional (artigos 5º e 196 CF)
é direito do paciente hipossuficiente e com
doença crônica obter o fornecimento de
tratamento prescrito pelo médico, mesmo que
não se encontre padronizado pela rede pública
de saúde Paciente hipossuficiente Observância
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do Estatuto do Idoso (artigos 9º e 15, § 2º)
Obrigação dos órgãos públicos de garantir
atendimento salutar à saúde dos idosos
Sentença reformada Cautelar incidental à apelação Tutela antecipada recursal deferida para o fornecimento de medicamentos Ratificação da liminar Ações procedentes
Sucumbência Honorários Não cabimento Súmula
nº 421 do STJ Ação cautelar procedente e
recurso de apelação provido.
Este precedente paradigmático, na
verdade, concretiza tradicional magistério
doutrinário.
"Depois da sentença. Recurso interposto.
Proferida a sentença, em tese não haveria
mais interesse processual na obtenção da
medida antecipatória da tutela de mérito,
porque apreciada definitivamente a pretensão.
Pode ser, entretanto, que o autor tenha
sentença a seu favor, mas haja necessidade de
obter o cumprimento ou a execução dos efeitos
da mesma sentença. Neste caso, é possível
requerer a própria tutela concedida na
sentença, ou seus efeitos, com força de
verdadeira execução provisória (CPC 475-0 e
587). Se já foi interposto recurso, recebido no efeito suspensivo, a competência para a concessão da tutela será sempre do tribunal,
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pois a matéria impugnada restou devolvida ao conhecimento do tribunal, saindo da esfera de competência do juiz. Incide, por extensão, o CPC 800 par. ún., na redação dada pela L 8952/94. A tutela antecipada, portanto, deve ser concedida em grau de recurso”6 – grifei.
A pertinência (excepcional) do
ajuizamento de ação incidental pretendendo a
concessão, urgente, de tutela antecipada no âmbito
recursal também conta com o respaldo dos Tribunais
Superiores:
PROCESSO CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. LIMINAR.
TERATOLOGIA. CARÁTER ABUSIVO. LIMINAR
CONCEDIDA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. I - Na
linha da jurisprudência desta Corte, é
cabível a medida cautelar, antes de
interposto o recurso especial, em caráter
absolutamente excepcional, para coibir abuso
manifesto e teratologia. II - O uso adequado
e correto da tutela antecipada não prescinde
da postura sensata do juiz defronte do caso
concreto sob sua apreciação. III - Na esfera
da tutela antecipada, o contrapeso de ampliar
os poderes do juiz na direção da causa, como
a conferir-lhe a possibilidade de deferir
liminares em procedimentos nos quais a lei
6 é a lição dos ilustres Professores Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade
Nery, em sua obra Código de Processo Civil Comentado, 10a ed., Ed. RT, pág. 528, item 29
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expressamente não as contemple, para evitar
danos de impossível ou de difícil reparação e
coibir o abuso de defesa, reside na prudência
e cautela na aplicação desse poder, sob pena
de transverter esse instituto tão importante
para a efetividade do processo em prejuízo
para as partes e, afinal, para a prestação
jurisdicional. IV - Revela-se desarrazoada,
em sede de tutela antecipada, a determinação
de publicar-se a íntegra da petição inicial
de quarenta e uma laudas de ação
indenizatória, dada a desproporção da medida
em relação à matéria publicada, que tomou o
espaço de uma página da revista, e em face do
direito fundamental "de resposta,
proporcional ao agravo" (art. 5º, V, da
Constituição). (AgRg na MC 6417/DF, Min.
SÁLVIO DE FIGUEIREDO, DJ 25/08/2003 p. 308).
Ainda neste tópico, é preciso demonstrar,
por fim, que a matéria será apresentada, na ação principal, em sede da apelação já interposta, a este Egrégio Tribunal, tratando-se a presente medida apenas de uma estrita antecipação em razão da urgência manifesta . Mais do que isso, arrisca-se dizer que, para além de ser admissível a apelação,
será ela julgada procedente, dada a incorreção,
s.m.j, do juízo de 1 a instância.
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Deveras, estão presentes os requisitos de
admissibilidade daquela apelação. Diante de uma
sentença que extingue o processo, o recurso a ser
interposto é a apelação, donde se revela o
cabimento . A interposição, ademais, foi tempestiva ,
eis que apresentada apenas 2 (dois) dias após a
intimação. O interesse é manifesto, eis que não foi
acolhido o pedido.
Enfim, a apelação já foi interposta e não
há dúvidas de que é ela admissível.
III – DO FUMUS BONI IURIS.
A plausibilidade e verossimilhança da
questão jurígena agitada traduzem-se na firmeza dos
precedentes do Supremo Tribunal Federal e, por
incrível que possa parecer, na própria sentença
hostilizada. Deveras, como dito, o próprio juízo da Vara da Fazenda Pública, apesar de indeferir a petição inicial, consignou que “é induvidoso o direito material pleiteado pela impetrante ”. Uma
pena, contudo, que tenha levantando óbices
processuais indevidos para obstaculizar a tutela do
direito “induvidoso”.
A indubiedade realmente está presente. Os
direitos que se pretende tutelar possuem extração
constitucional e contam com pronunciamento
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definitivo do Supremo Tribunal Federal. Trata-se de
tutelar o direito de reunião 7 e a liberdade de
expressão 8, consistentes, concretamente, na hipótese
dos autos, na realização da “Marcha da Maconha ABC”, no dia 26 de maio de 2012, a partir das 13h, na Praça da Moça e adjacências, em Diadema, São Paulo.
Assim, é preciso que se demonstre, no
presente caso, que estão presentes os elementos de
configuração e validade da liberdade de reunião, o
que demonstrará o fumus boni iuris e,
consequentemente, a procedência do pedido.
Com espeque no magistério doutrinário de
Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco, é possível identificar 5 (cinco) elementos de configuração do direito de
reunião.
Tem-se, assim, um elemento subjetivo, consistente em “um agrupamento de pessoas”. É
preciso, ainda, que haja “um mínimo de
coordenação”, de forma que “a aglomeração deve ser
o resultado de uma convocação prévia à coincidência 7 Artigo 5o, CF, XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais
abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião
anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade
competente.8 Artigo 5o, CF, IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato.
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de pessoas num mesmo lugar”. Este seria, por sua
vez, o elemento formal. Exige-se, ainda, um
elemento teleológico, haja vista que “as pessoas
devem estar reunidas com vistas à consecução de
determinado objetivo”.
Acrescenta a doutrina citada que “o
agrupamento de pessoas, no direito de reunião, é
necessariamente transitório, passageiro”, no que se
designa por elemento temporal. Por fim, exige-se
que a reunião deve ser pacífica e sem armas,
denominado, pelos autores, de elemento objetivo.
A leitura atenta da síntese fática supra
mencionada permite constatar, com clareza, a
presença de todos esses elementos, de resto sequer
contestados pelo Município.
Deveras, a Marcha da Maconha possui
verdadeira coordenação, tanto nacional, quanto
local, o que se comprova, como adiantado, pelo
termo de declarações em anexo, pelos diversos
ofícios expedidos pelo coletivo (e juntados nesta
impetração), bem como pela realização tranquila de
Marchas em diversas cidades do Brasil, inclusive
neste último sábado, dia 19 de maio de 2012, na
Avenida Paulista, sem qualquer intercorrência .
Ademais, como decorrência desta
coordenação, tem-se um prévio agendamento e, mais
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que isso, prévia convocação de manifestantes, tanto
pela mídia (diversas reportagens de periódicos
locais noticiaram a marcha, como se constata dos
documentos juntados em anexo), quanto por ampla
divulgação em sítios na web (confira-se, v.g, os
sítios www.marchadamaconha.org e www.growroom.net).
Na sequencia, também está bem demonstrado
que a reunião possui propósito específico, no caso,
promover o debate e a difusão de ideias “sobre
mudanças na lei 11343/2006 a fim de regulamentar o
uso, comércio e produção da planta cannabis sativa
L.”.
Prosseguindo. Presente também está, no
caso, o elemento subjetivo, no caso, o “agrupamento
de pessoas”. Talvez não como no Rio de Janeiro, em
06 de maio de 2012, quando cerca de 10 (dez) mil
pessoas se reuniram neste mesmo evento. Ou ainda em
São Paulo, no dia 19 de maio, quando, segundo
estimativa da Polícia Militar, foram 2 (dois) mil
participantes. Em Diadema, segundo relato da
organização na Reunião Realizada junto ao 24º
Batalhão da Polícia Militar (ata em anexo), prevê-
se o comparecimento de cerca de 200 pessoas,
podendo chegar até 1000 (mil) pessoas, como
noticiado na mídia local.
O elemento temporal, por sua vez, está
bem delineado, eis que está agendado o encontro
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cívico para 26 de maio de 2012, a partir das 13h,
na Praça da Moça, em Diadema. A transitoriedade é
ínsita, eis que, também consoante informações
repassadas ao Município pela organização, o evento
terá apenas algumas horas de duração.
Por fim, também está presente o elemento
objetivo, eis que está bem demonstrado, ao longo de
diversos ofícios, manifestações e termo de
declarações que o evento é pacífico, sem o uso de
armas de qualquer tipo.
Estão presentes, portanto, todos os
elementos que conformam o direito de reunião,
demonstrando-se, no caso, que realmente trata-se da
tutela desta posição subjetiva dos cidadãos que
pretendem fazer parte da situação.
A doutrina e a jurisprudência, por sua
vez, também mencionam um requisito de validade
implícito, que, no caso, seria a licitude da manifestação pública. Aqui, especificamente,
residiu toda a celeuma que marcou a questão da
Marcha da maconha, até o ano de 2011 (na verdade,
como se vê, ainda persitem condutas refretárias,
comprovadas pela simples necessidade de utilização
desta via). É que, no final de 2011, encerrou-se qualquer discussão sobre a licitude funcional da Marcha da Maconha (ou, melhor dizendo, deveria ter se encerrado... ) a partir de decisões proferidas em
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controle concentrado de constitucionalidade pelo
Supremo Tribunal Federal, especificamente na
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL nº187 e na AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE n o 4274.
No âmbito destes processos de controle
abstrato de constitucionalidade, pediu-se que fosse
dada interpretação conforme aos artigos 287 do
Código Penal e 33, parágrafo 2 o da Lei 11343/2006,,
“de forma a excluir qualquer exegese que possa
ensejar a criminalização da defesa da legalização
das drogas, ou de qualquer substância entorpecente
específica”.
Ao final do julgamento, o Pretório
Excelso, por unanimidade, consignou o seguinte:
O Tribunal, por unanimidade, rejeitou as preliminares de não-conhecimento da arguição e a de ampliação do objeto da demanda. No mérito, também por unanimidade, o Tribunal julgou procedente a arguição de descumprimento de preceito fundamental, para dar, ao artigo 287 do Código Penal, com efeito vinculante, interpretação conforme à Constituição, "de forma a excluir qualquer exegese que possa ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas, ou de qualquer substância entorpecente específica,
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inclusive através de manifestações e eventos públicos", tudo nos termos do voto do Relator – ADPF 187.
No tocante à ADI 4274, já houve
puvlicação do acórdão, cabendo, portanto, a
transcrição da ementa:
EMENTA: ACÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
PEDIDO DE “INTERPRETAÇÃO CONFORME À
CONSTITUIÇÃO” DO § 2º DO ART. 33 DA LEI Nº
11.343/2006, CRIMINALIZADOR DAS CONDUTAS DE
“INDUZIR, INSTIGAR OU AUXILIAR ALGUÉM AO USO
INDEVIDO DE DROGA”. 1. Cabível o pedido de
“interpretação conforme à Constituição” de
preceito legal portador de mais de um
sentido, dando-se que ao menos um deles é
contrário à Constituição Federal. 2. A
utilização do § 3º do art. 33 da Lei
11.343/2006 como fundamento para a proibição
judicial de eventos públicos de defesa da
legalização ou da descriminalização do uso de
entorpecentes ofende o direito fundamental de
reunião, expressamente outorgado pelo inciso
XVI do art. 5º da Carta Magna. Regular exercício das liberdades constitucionais de manifestação de pensamento e expressão, em sentido lato, além do direito de acesso à informação (incisos IV, IX e XIV do art. 5º da Constituição Republicana,
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respectivamente). 3. Nenhuma lei, seja ela civil ou penal, pode blindar-se contra a discussão do seu próprio conteúdo . Nem mesmo a Constituição está a salvo da ampla, livre e aberta discussão dos seus defeitos e das suas virtudes, desde que sejam obedecidas as
condicionantes ao direito constitucional de
reunião, tal como a prévia comunicação às autoridades competentes . 4. Impossibilidade
de restrição ao direito fundamental de
reunião que não se contenha nas duas
situações excepcionais que a própria
Constituição prevê: o estado de defesa e o
estado de sítio (art. 136, § 1º, inciso I,
alínea “a”, e art. 139, inciso IV). 5. Ação
direta julgada procedente para dar ao § 2º do
art. 33 da Lei 11.343/2006 “interpretação
conforme à Constituição” e dele excluir qualquer significado que enseje a proibição de manifestações e debates públicos acerca da descriminalização ou legalização do uso de drogas ou de qualquer substância que leve o ser humano ao entorpecimento episódico, ou então viciado, das suas faculdades
psicofísicas. ADI 4274 / DF - Relator(a):
Min. AYRES BRITTO Julgamento: 23/11/2011
Órgão Julgador: Tribunal Pleno. ACÓRDÃO
ELETRÔNICO DJe-084 DIVULG 30-04-2012 PUBLIC
02-05-2012.
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Ora, não se pede, obviamente, que o
Município concorde com as ideias que pretendem ser
defendidas pelos potenciais participantes do grupo.
O que se exige, agora com força de decisão
judicial, é que o Município respeite essas ideias,
mesmo se lhe pareçam desagradáveis ou equivocadas,
tolerando a manifestação democrática, cívica e
propositiva que os cidadãos de Diadema pretendem
concretizar em 26 de maio de 2012.
Assim, demonstrados tanto a licitude da
manifestação, quanto a presença concreta de seus
elementos configuradores, bem delineado está o
fumus boni iuris.
IV – PERICULUM IN MORA
Outrossim, há, na hipótese, inconteste
periculum in mora.
Consoante afirmado e comprovado, tem-se,
de um lado, o agendamento do encontro cívico para o
próximo sábado, dia 26 de maio de 2012; de outro, a
pública (e ilícita) proibição por parte do
Município. Acaso não haja manifestação firme do
Poder Judiciário, nesta ação, o resultado pode ser
trágico: um direito constitucional incontroverso
será sepultado e confrontos violentos
desnecesssários podem ocorrer.
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Deveras, percebe-se pela documentação
juntada que as duas partes (de um lado, cidadãos ,
titulares legítimos do direito de reunião e da
liberdade de expressão; doutro, o Município , ente
federativo autônomo – mas não despótico! ) estão firmes e irretratáveis em seus propósitos : manifestar-se publicamente e proibir , sabe-se lá
como, esta manifestação pública.
A possibilidade de consenso parece
inviável, daí porque é útil e necessária a
intervenção aguda do Judiciário.
Urge anotar que a única alternativa
processual viável é justamente o ajuizamento desta
demanda, de caráter urgente. É que o trâmite para a
subida dos autos principais para análise do recurso
de apelação simplesmente inviabilizaria a adequada
tutela do direito constitucional eis que, por
certo, estaria ultrapassada a data limite de 26 de maio de 2012.
De que adiantaria, ao final do árduo
trâmite processual, ser conferida a tutela
jurisdicional definitiva procedente, se durante o
procedimento consumou-se lesão irreparável a um sem
número de cidadãos, indevidamente cerceados em suas
garantias constitucionais de pensar e manifestar?
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Responde-se: pouco adiantaria, senão o
reconhecimento estéril e formal de um direito já
violado pelo tempo, esvaindo-se a promessa
constitucional em discurso retórico apenas.
Disso emerge o perigo na espera da
proteção jurisdicional definitiva que poderá tornar
ineficaz e inútil caso não seja acautelado o
direito ameaçado concretamente. Os cidadãos do Município de Diadema ficarão marcados como aqueles únicos do Brasil que não puderam, na data aprazada e combinada, pensar , falar , ouvir , criticar , enfim, concretizar as mais belas facetas da cidadania .
O dano a ser neutralizado é iminente, que
na lição de Humberto Teodoro Jr (Curso de Direito
Processual Civil, II, 41ª Ed, p.550) é aquele que
se relaciona com uma lesão que provavelmente deve
ocorrer ainda durante o curso do processo
principal, isto é, antes da solução definitiva ou
do mérito. Justamente esse o panorama fático do
dano anunciado.
Dessa forma, absolutamente delineada e
existente o receio de dano gravo e irreversível que
poderá desnaturalizar eventual provimento do
recurso de apelação já interposto.
Cumpre reavivar, por fim, a noção de que
por detrás de toda e qualquer medida cautelar
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encontra-se, como imenso vigor, o interesse público
na atuação eficaz e tempestiva da jurisdição.
Em ultima ratio, não se protege o
interesse pleiteado, mas sim a dignidade e
integridade da jurisdição e, pois, da soberania
estatal , que ficaria desacreditada e abalada caso
suas ordens fossem estéreis e absolutamente
intempestivas no seio social. Instrumento sem
utilidade, desvinculado de seu telos, é
imprestável.
À talha, por pertinente e validador, o
escólio de José Roberto dos Santos Bedaque, in
Direito e Processo:
O poder de agir em juízo não se limita ao
direito de pedir, mas abrange o direito de
obter uma tutela efetiva. Daí ser também
direito a uma tutela provisória. Andou bem o
legislador constitucional ao prever a tutela
cautelar inominada para garantia do princípio
da efetividade da jurisdição (CF, art. 5º,
XXXV)
V – DO PEDIDO LIMINAR. REQUISITOS E CONFORMAÇÃO.
Imperiosa, portanto, a concessão da
liminar. O fumus boni iuris e o periculum in mora
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supra expostos demonstram não apenas o cabimento da
tutela de urgência, mas de tutela “urgentíssima”, a
ser prestada em sede liminar.
Para a exata compreensão do pedido a ser
formulado (especialmente os efeitos reflexos da
cassação da proibição), é preciso apresentar a
exata conformação, para o Poder Público, do direito
de reunião.
Assim, segundo magistério doutrinário, do
direito de reunião extraem-se dois deveres
correlatos ao poder público. Há um dever de abstenção e um dever de colaboração .
O dever de abstenção indica que se exige
respeito a todo o processo prévio ao evento e de
execução da manifestação. Para os participantes, é
verdadeiro dever negativo, no sentido de respeito à
organização e realização do ato.
Ademais, fala-se em dever de prestação,
no sentido de que “o estado deve proteger os
manifestantes, assegurando os meios necessários
para que o direito à reunião seja fruído
regularmente”9. Esse dever de prestação traduz-se
tanto no dever de segurança dos manifestantes
9 MENDES, Gilmar; COELHO, Inocêncio Mártires Coelho; BRANCO, Paulo Gustavo
Gonet. Curso de direito constitucional. 3ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, página
400.
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(inclusive contra grupos contrários), como na
colaboração da organização, para compatibilizar o
evento com o fluxo de pessoas e de veículos.
Delimitado o exato âmbito atingido pela
proibição e que, por consequência, merece a devida
proteção, a causa de pedir já está madura para o
pedido liminar (e também final).
Pede-se, assim, liminarmente , que seja concedida tutela antecipada recursal, abreviando-se a decisão a ser proferida na apelação cível
interposta no processo 161.01.2012.011909 da Vara
da Fazenda Pública da Comarca de Diadema, com o
intuito de que seja cassada a proibição exarada
pelo Município contra a realização da Marcha da
Maconha em Diadema, no dia 26/05/2012, a partir das
13h, na Praça da Moça, determinando-se ao Município que se abstenha de praticar qualquer ato que interfira em tal direito de reunião e que auxilie, no que for necessário, na realização do evento , bem como oficiando-se ao 24º Batalhão da Polícia Militar do Estado de São Paulo, no intuito de garantir a segurança durante a realização da Marcha.
VI – DOS PEDIDOS
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Diante de tudo o que foi exposto, requer-
se:
(i) A confirmação da medida liminar, para que
seja concedida tutela antecipada recursal, abreviando-se a decisão a ser proferida na apelação cível interposta no
processo 161.01.2012.011909 da Vara da
Fazenda Pública da Comarca de Diadema,
com o intuito de que definitivamente
cassada a proibição exarada pelo
Município contra a realização da Marcha
da Maconha em Diadema, no dia 26/05/2012,
a partir das 13h, na Praça da Moça,
determinando-se ao Município que se abstenha de praticar qualquer ato que interfira em tal direito de reunião e que auxilie, no que for necessário, na realização do evento , oficiando-se ao 24º Batalhão da Polícia Militar do Estado de
São Paulo, no intuito de garantir a
segurança durante a realização da Marcha.(ii) para o cumprimento, por parte do ente
público requerido, das medidas a serem
impostas por este Juízo, inclusive em sede de liminar , fica desde já requerida a adoção das providências que se fizerem
necessárias, especialmente a intimação pessoal do agente público, sob pena de desobediência e fixação de multa única ,
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no valor de R$500.000,00 (quinhentos mil reais), acaso o direito de reunião
protegido seja frustrado por ato/ordem do
Município;
(iii) Que seja citado o Município de Diadema,
na pessoa de seu representante judicial,
no endereço já informado;
(iv) A intimação do Ministério Público, por se
tratar de tutela de urgência com viés
coletivo;
(v) A concessão das prerrogativas da
Defensoria Pública, nos termos da LC
80/94 c/c LCSP 988/06, em especial a
intimação e vista pessoal dos autos do
processo.
Dá-se à causa o valor de R$500.000,00
(quinhentos mil reais).
Provará o alegado por todos os meios em
Direito admitidos, sem prejuízo de qualquer um que
se fizer conveniente, máxime a juntada dos inclusos
documentos e outros no decorrer do iter processual.
Nos termos do artigo 365, III, Código de
Processo Civil, por aplicação analógica, declaram-
se autênticas as cópias que acompanham a presente
impetração, que segue com 1 (uma) contra-fé,
instruídas com todos os documentos, para citação da
Pessoa Jurídica.
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Finalmente, requer-se a dispensa quanto
ao pagamento de custas, emolumentos e outros
encargos, por se tratar a autora da Defensoria
Pública do Estado de São Paulo.
Diadema, 21 de maio de 2012.
CLÁUDIO LÚCIO DE LIMADefensor Público
ILKA SAITO MILLANDefensora Pública
LEANDRO DE CASTRO GOMESDefensor Público
RAFAEL GALATI SÁBIODefensor Público
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