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Faculdade de Engenharia – NuGeo/Núcleo de Geotecnia Prof. M. Marangon Mecânica dos Solos II RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO DOS SOLOS 124 5.5 – Ensaio de compressão triaxial Esses ensaios são os mais utilizados na atualidade, por sua condição de aparelhagem, mais refinadas, capazes de garantir uma impermeabilização total da amostra, controle absoluto da drenagem e medida do valor da pressão neutra. O Professor Carlos de Souza Pinto (PINTO, 2000) descreve muito bem o procedimento básico do ensaio triaxial, a saber: O ensaio de compressão triaxial convencional consiste na aplicação de um estado hidrostático de tensões e de um carregamento axial sobre um corpo de prova cilíndrico do solo. Para isto, o corpo de prova é colocado dentro de uma câmara de ensaio, cujo esquema é mostrado na figura 5. 15, e envolto por uma membrana de borracha. A câmara é cheia de água, à qual se aplica uma pressão, que é chamada pressão confinante ou pressão de confinamento do ensaio. A pressão confinante atua em todas as direções, inclusive na direção vertical. O corpo de prova fica sob um estado hidrostático de tensões. Figura 5. 15 - Corpo de prova dentro de uma câmara de ensaio, submetido às tensões de confinamento e axial Como não existem tensões de cisalhamento nas bases e nas geratrizes do corpo de prova, os planos horizontais e verticais são os planos principais. Se o ensaio é de carregamento, o plano horizontal é o plano principal maior. No plano vertical, o plano principal menor, atua a pressão confinante. A tensão devida ao carregamento axial é denominada acréscimo de tensão axial ( σ1- σ3) ou tensão desviadora. Durante o carregamento, medem-se, a diversos intervalos de tempo, o acréscimo de tensão axial que está atuando e a deformação vertical do corpo de prova. Esta deformação vertical é dividida pela altura inicial do corpo de prova, dando origem à deformação vertical específica, em função da qual se expressam as tensões desviadoras (figura 5. 16), bem como podem ser plotadas com as variações de volume ou de pressão neutra. O carregamento axial é feito por meio da aplicação de forças no pistão que penetra na câmara, caso em que o ensaio é chamado de ensaio de deformação controlada. A carga é medida por meio de um anel dinamométrico externo, ou por uma célula de carga intercalada no pistão. Este procedimento tem a vantagem de medir a carga efetivamente aplicada ao corpo de prova, eliminando o efeito do atrito do pistão na passagem para a câmara.

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5.5 – Ensaio de compressão triaxial

Esses ensaios são os mais utilizados na atualidade, por sua condição de aparelhagem, mais refinadas, capazes de garantir uma impermeabilização total da amostra, controle absoluto da drenagem e medida do valor da pressão neutra.

O Professor Carlos de Souza Pinto (PINTO, 2000) descreve muito bem o

procedimento básico do ensaio triaxial, a saber: O ensaio de compressão triaxial convencional consiste na aplicação de um estado

hidrostático de tensões e de um carregamento axial sobre um corpo de prova cilíndrico do solo. Para isto, o corpo de prova é colocado dentro de uma câmara de ensaio, cujo esquema é mostrado na figura 5. 15, e envolto por uma membrana de borracha. A câmara é cheia de água, à qual se aplica uma pressão, que é chamada pressão confinante ou pressão de confinamento do ensaio.

A pressão confinante atua em todas as direções, inclusive na direção vertical. O corpo de prova fica sob um estado hidrostático de tensões.

Figura 5. 15 - Corpo de prova dentro de uma câmara de ensaio, submetido às tensões de confinamento e axial

Como não existem tensões de cisalhamento nas bases e nas geratrizes do corpo de

prova, os planos horizontais e verticais são os planos principais. Se o ensaio é de carregamento, o plano horizontal é o plano principal maior. No plano vertical, o plano principal menor, atua a pressão confinante. A tensão devida ao carregamento axial é denominada acréscimo de tensão axial ( σ1- σ3) ou tensão desviadora.

Durante o carregamento, medem-se, a diversos intervalos de tempo, o acréscimo de tensão axial que está atuando e a deformação vertical do corpo de prova. Esta deformação vertical é dividida pela altura inicial do corpo de prova, dando origem à deformação vertical específica, em função da qual se expressam as tensões desviadoras (figura 5. 16), bem como podem ser plotadas com as variações de volume ou de pressão neutra.

O carregamento axial é feito por meio da aplicação de forças no pistão que penetra na câmara, caso em que o ensaio é chamado de ensaio de deformação controlada. A carga é medida por meio de um anel dinamométrico externo, ou por uma célula de carga intercalada no pistão. Este procedimento tem a vantagem de medir a carga efetivamente aplicada ao corpo de prova, eliminando o efeito do atrito do pistão na passagem para a câmara.

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As tensões desviadoras (acréscimos verticais) durante o carregamento axial

permitem o traçado dos círculos de Mohr correspondentes, como é mostrado para um dos ensaios representados na figura 5. 17, o de número 2 – círculos traçejados.

A tensão desviadora representada em função da deformação específica, indica o valor máximo, que corresponde à ruptura, a partir do qual fica definido o círculo de Mohr, correspondente à situação de ruptura. Círculos de Mohr de ensaios feitos em outros corpos de prova permitem a determinação da envoltória de resistência conforme o critério de Mohr, como na Figura 5. 17, ou ainda pode-se obter a envoltória de Mohr-Coulomb.

Figura 5. 17 - Traçado dos círculos de Mohr correspondentes a realização de 3 ensaios triaxiais. Na figura é mostrada a envoltória de Mohr (curva).

Figura 5. 16 - Exemplo de curvas “ tensão desviadora x deformação axial”, para uma amostra de argila (identificada como CU6) coletada em poço à 4,00 m de profundidade, em Igrejinha, Juiz de Fora/MG. Para os 3 corpos de prova ensaiados foram utilizadas as tensões de confinamento de 100, 200 e 600 kPa.

Foto – Conjunto de equipamentos para a realização do ensaio de compressão triaxial, do LaEsp – Laboratório de Ensaios Especiais em Mecânica dos Solos / UFJF. Consta basicamente de: . Prensa de compressão; . Unidade de controle de pressões; . Compressor; . Reservatório de água desgazificada; . Microcomputador (monitoramento e aquisição de dados automática)

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Estes ensaios nos dão condição de reproduzir em laboratório, com relativa precisão, as condições que os solos estarão sujeitos no projeto e serão solicitados nas obras.

Considerações sobre o ensaio

Nesta unidade são abordados em linhas gerais, os conceitos relacionados a realização do ensaio triaxial (foto), sendo deixados os detalhamentos para as aulas práticas.

Foto 1

Foto 2

Foto 3

Foto 4

Foto 1 – Moldagem de um CP de areia sobre a própria base interna da câmara; Foto 2 – Montagem na câmara triaxial, após a montagem do CP na base, fora da

prensa de compressão; Foto 3 – Aspecto da câmara montada na prensa, preenchida com água sob pressão,

durante a realização do ensaio; Foto 4 – Registro de um corpo de prova rompido, em que se observa o plano de

cisalhamento do material ensaiado – no caso um solo argiloso compactado. Como pode ser visto na figura 5. 18 (esquema do ensaio), na base do corpo de

prova e no cabeçote superior são colocadas pedras porosas, permitindo-se a drenagem através destas peças, que são permeáveis. A drenagem pode ser impedida por meio de registros apropriados (torneiras), como se vê na foto ao lado, sendo controladas as suas posições (aberto/fechado) pelo operador.

Se a drenagem for permitida e o corpo de prova estiver saturado ou com elevado grau de saturação, a variação de volume de água que sai ou entra no corpo de prova. Para

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isto, as saídas de água são acopladas a buretas graduadas. No caso de solos secos, a medida de variação de volume só é possível com a colocação de sensores no corpo de prova, internamente à câmara. Sensores internos, em qualquer caso, são mais precisos, mas não são empregados em ensaios de rotina.

Se a drenagem não for permitida, em qualquer fase do ensaio, a água ficará sob pressão. As pressões neutras induzidas pelo carregamento podem ser medidas por meio de transdutores conectados aos tubos de drenagem.

Figura 5. 18 – Esquema do ensaio de compressão triaxial, com destaque para o sistema de drenagem da amostra. A foto ao lado vê-se o operador controlando as posições (aberto/fechado) das torneiras e conseqüentemente da drenagem do CP.

Estado de tensões efetivas

Em função da possibilidade de se controlar a drenagem dos CPs, o estado de tensões que atua no solo pode ser determinado tanto em termos de tensões totais (TTT) como em tensões de tensões efetivas (TTE). Da mesma forma pode-se obter as envoltórias de resistência considerando-se as tensões principais σσσσ1 e σσσσ3 e a pressão neutra, u, num solo, plotando os dois círculos indicados na figura 5. 19. Dois pontos fundamentais, ilustrados por esta figura são: 1) O círculo de tensões efetivas se situa deslocado para a esquerda, em relação ao círculo

de tensões totais, de um valor igual à pressão neutra. 2) As tensões de cisalhamento em qualquer plano são independentes da pressão neutra,

pois a água não transmite esforços de cisalhamento. As tensões de cisalhamento são devidas somente à diferença entre as tensões principais e esta diferença é a mesma, tanto em tensões totais, como em tensões efetivas.

Figura 5. 19 – Efeito da pressão neutra no estado de tensões em um elemento de solo.

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5.5.1 – Ensaios Triaxiais Convencionais

No que se refere às condições de drenagem, tem-se três tipos básicos de ensaio: a) Ensaio lento (com consolidação e com drenagem) A característica fundamental desse ensaio, que também é conhecido como ensaio

tipo CD – consolidad drained ou tipo S – slow (lento), é que as tensões aplicadas na amostra são efetivas (tensões atuam no arcabouço estrutural dos solos). São ensaios em que há permanente drenagem do corpo de prova. Aplica-se a pressão confinante e espera-se que o corpo de prova adense, ou seja, que a pressão neutra se dissipe. A seguir, a tensão axial é aumentada lentamente, para que a água sob pressão possa sair. Desta forma, a pressão neutra durante todo o carregamento é praticamente nula, e as tensões totais aplicadas indicam as tensões efetivas que estavam ocorrendo, sendo portanto os parâmetros determinados em termos de tensões efetivas (TTE ).

A referencia “lento” não se refere à velocidade de carregamento, mas sim à condição de ser tão lento quanto necessário para a dissipação das pressões neutras; se o solo for muito permeável, o ensaio pode ser realizado em poucos minutos, mas, para argilas, o carregamento axial requer 20 dias ou mais.

b) Ensaio adensado rápido (com consolidaçào e sem drenagem) Nesse tipo de ensaio, também conhecido como ensaio tipo CU – consolidad

undrained ou tipo R – rapid (rápido) ou ainda rápido pré-adensado, a amostra se consolida primeiramente sob a pressão hidrostática σ3, como no ensaio lento. Em seguida, após aplicação lenta de σ3, a amostra é levada a rutura por uma rápida aplicação da carga axial σ1 de maneira que não se permita a variação de volume, na fase de aplicação de σ1, sem a saída de água (ensaio lento para σ3 e ensaio rápido para σ3).

A condição essencial desse ensaio é não permitir nenhum adensamento adicional na amostra durante a fase de aplicação da carga axial até a rutura (σ1). Logo, após aplicar σσσσ3, fecha-se as válvulas de saída de água pelas pedras porosas dando garantia da condição pré-estabelecida, independente da velocidade em que essa carga axial seja aplicada.

Na segunda etapa do ensaio, aplicação de σ1, pode-se pensar que a água dos vazios é que irá receber toda a carga de pressão em forma de pressão neutra, mas, no real isso não se dá, pois, parte dessa pressão axial é recebida pela fase sólida do solo, pois a amostra não está totalmente confinada lateralmente (como no caso do ensaio de adensamento). Como no triaxial a amostra só está envolvida por uma delgada membrana de latex, há, portanto, condição da estrutura granular absorver esforços cortantes desde o início do ensaio. No ensaio a pressão neutra age-ocorre em seu valor absoluto, podendo ser medida.

Este ensaio indica a resistência não drenada em função da tensão de adensamento. Se as pressões neutras forem medidas, a resistência em termos de tensões efetivas também é determinada, razão pela qual ele é muito empregado, pois permite determinar a envoltória de resistência em termos de tensão efetiva (TTE ) num prazo muito menor do que o ensaio CD ou ainda em termos de tensões totais (TTT ).

c) Ensaio rápido (sem consolidação e sem drenagem) Neste ensaio, também denominado ensaio tipo UU – unconsolid undrained ou tipo

Q – quick (imediato), não se permite em nenhuma etapa adensamento (consolidação) da

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amostra. As válvulas de comunicação entre as pedras porosas e os buretos de medição serão fechadas impedindo a drenagem da mesma durante as aplicações das tensões.

No ensaio, aplica-se a pressão hidrostática σ3 e, de imediato, se rompe o corpo de prova com a aplicação da pressão axial σ1, em velocidades padronizadas.

Não se conhecem as pressões efetivas em nenhuma das fase de execução do ensaio nem tão pouco sua distribuição. O ensaio é geralmente interpretado em termos de tensões totais (TTT ). Fases do Ensaio

Em resumo, tem-se 2 fases distintas no ensaio triaxial: 1a FASE: Saturação do CP e Adensamento (consolidação) Saturação De uma forma geral, o ensaio é iniciado com a saturação do CP. Faz-se geralmente

o uso do próprio sistema de pressão do equipamento para aplicar uma pressão interna no CP (contra-pressão), aumentando o valor na câmara, de forma a se obter pressão σ3 (de confinamento). A obtenção da condição de saturação é verificada calculando-se o coeficiente B de Skempton, também conhecido como coeficiente de pressão neutra.

Por exemplo, quando se aplica uma conta-pressão de 300kPa e na câmara do

triaxial uma pressão de 400 kPa corresponde em solicitar a amostra com uma tensão σ3 de confinamento de 100 kPa.

“Coeficientes A e B” da pressão neutra A teoria dos “coeficientes A e B” da pressão neutra (pore pressure coefficients),

apresentada por Skempton, em 1954, propõe-se a determinar a variação da pressão neutra em uma amostra de argila, quando variam as tensões principais σ1 e σ3.

A fórmula proposta por Skempton, é a seguinte:

∆u = B[∆σ3 + A (∆σ1 - ∆σ3)]

onde A e B são coeficientes determinados experimentalmente. O coeficiente A depende principalmente do tipo de solo e do estado de solicitação a que já esteve submetido; o coeficiente B, é predominantemente influenciado pelo grau de saturação. Para solos saturados B = 1 e para solos parcialmente saturados B < 1. Valores de A, medidos no instante de ruptura da amostra, situam-se aproximadamente entre –0,5 para argilas pré-adensadas e +1,5 para argilas de alta sensibilidade. A figura 5. 20 esclarece os significados de “B” e “A”:

Figura 5. 20 - Significado dos coeficientes “A” e “B” da pressão neutra.

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Adensamento Obtida a saturação do CP aplica-se uma tensão de confinamento na câmara do

equipamento triaxial no sentido de levar o material ao adensamento. As deformações são então lidas até a constância de valor, quando se considera o fim desta fase.

2a FASE: Ruptura ou cisalhamento do CP Esta fase corresponde a do cisalhamento da amostra propriamente dita e também

deverá ser executada de acordo com as condições de drenagem anteriormente escolhida, ou seja, se será permitida a geração de pressão neutra “u” durante o ensaio ou não.

No caso de ser executada sem drenagem o valor de u deve ser medito durante o ensaio para nos possibilitar a determinação do estado de tensões efetivas do CP durante o ensaio, por exemplo. A planilha abaixo apresenta um exemplo de parte de uma planilha de ensaio triaxial do tipo CU ou R (fase de cisalhamento). Observa-se que o valor do excesso da pressão neutra durante a execução do ensaio está sendo anotado na 6a coluna (∆u). Tem-se p =(σ1 + σ3)/2, se q =(σ1 - σ3)/2 e p` = (σ`1 + σ`3)/2, como será visto adiante.

São transcritos a seguir alguns dos principais pontos de entendimento do

comportamento de solos – quanto à resistência ao cisalhamento (de predominância arenosa – areias e predominância argilosa – argilas). É utilizada a publicação de PINTO (2000), do eminente Professor de Mecânica dos Solos da USP, Carlos de Souza Pinto, que recomendamos aos alunos adquirem para uma melhor consulta e aproveitamento do seu curso, sendo hoje a melhor referencia do assunto, no nível de graduação, publicada no Brasil.

5.5.2 – Resistência das areias (Pinto, 2000) Areias fofas:

Analise-se inicialmente, o comportamento das areias fofas. Ao ser feito o carregamento axial, o corpo de prova apresenta uma tensão desviadora que cresce lentamente com a deformação, atingindo um valor máximo só para deformações relativamente altas, da ordem de 6 a 8%. Aspectos típicos de curvas tensão-deformação estão apresentados na figura 5. 21(a) que mostra também que ensaios realizados com tensões confinantes diferentes apresentam curvas com aproximadamente o mesmo aspecto, podendo-se admitir, numa primeira aproximação, que as tensões sejam proporcionais a tensão confinante do ensaio. Ao se traçar os círculos de Mohr, correspondentes às máximas tensões desviadora (que correspondem à ruptura) obtém-se círculos cuja envoltória é uma reta passando pela origem (sem coesão), pois as tensões de ruptura foram admitidas proporcionais as tensões confinantes. A resistência da areia fica definida pelo angulo de atrito interno efetivo, como

Planilha de Resultados Folha: 01 de 06

∆∆∆∆h εεεεa Ac Faxial σσσσd ∆∆∆∆u p q p' A(mm) (%) (cm²) (kgf) (kPa) (kPa) (kPa) (kPa) (kPa)0,000 0,00 11,210 0,0 0,0 0,0 300,0 0,0 100,0 -0,056 0,08 11,219 2,2 18,9 1,8 309,5 9,5 107,6 0,100,094 0,13 11,225 3,9 33,8 3,0 316,9 16,9 113,9 0,090,129 0,18 11,231 5,4 47,4 4,2 323,7 23,7 119,5 0,090,166 0,24 11,237 6,7 58,6 5,2 329,3 29,3 124,1 0,09

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se mostra na Figura 5. 21(c). A areia é então definida assim, em muito casos, pela impossibilidade de se moldar um corpo de prova de areia seca ou saturada. As medidas de variação de volume durante o carregamento axial indicam uma redução de volume, como apresenta a figura 5. 21(b), sendo que, para pressões confinantes maiores, as diminuições de volume são um pouco maiores.

Figura 5. 21 - Aspectos típicos de curvas tensão-deformação, deformações verticais e traçado das envoltórias de resistência - ϕf (máximas tensões desviadora - ruptura) para areias fofas (“a”, “b” e “c”) e compactas, ϕc, além de relacionar com ϕr e ϕf – residual e fofa (“d”, “e” e “f”). Areias compactas:

Resultados típicos de ensaios drenados de compressão triaxial de areias compactas estão apresentados na figura 5. 21 (d), (e), (f). A tensão desviadora cresce muito mais rapidamente com as deformações até atingir um valor máximo, sendo este valor considerado como a resistência máxima ou resistência de pico. Nota-se por outro lado, que atingida esta resistência máxima, ao continuar a deformação do corpo de prova, a tensão desviadora decresce lentamente até se estabilizar em torno de um valor que é definido como a resistência residual. Os círculos representativos do estado de tensões máximas definem a envoltória de resistência. Como, em primeira aproximação, as resistências de pico são proporcionais as tensões de confinamento dos ensaios, a envoltória a estes círculos é uma reta que passa

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pela origem, e a resistência de pico das areias compactas se expressa pelo angulo de atrito interno correspondente. Por outro lado, pode-se representar também, os círculos correspondentes ao estado de tensões na condição residual. Estes círculos, novamente, definem uma envoltória retilínea passando pela origem. O angulo de atrito correspondente, chamado angulo de atrito residual, é muito semelhante ao ângulo de atrito desta mesma areia no estado fofo, pois as resistências residuais são da ordem de grandeza das resistências máximas da mesma areia no estado fofo. Com relação à variação de volume, observa-se que os corpos de prova apresentam, inicialmente, uma redução de volume, mas, ainda antes de ser atingida a resistência máxima, o volume do corpo de prova começa a crescer, sendo que, na ruptura, o corpo de prova apresenta maior volume do que no início do carregamento.

Valores típicos de ângulos de atrito interno de areias. Compacidade

Areias bem graduadas fofo a compacto • De grãos angulares 37º a 47º • De grãos arredondados 30º a 40º

Areias mal graduadas • De grãos angulares 35º a 43º • De grãos arredondados 28º a 35º

5.5.3 – Resistência das argilas (Pinto, 2000)

Introdução: As argilas se diferenciam das areias, por um lado, pela sua baixa permeabilidade,

razão pela qual adquire importância o conhecimento de sua resistência tanto em termos de carregamento drenado como de carregamento não drenado. Por outro lado, o comportamento de tensão-deformação das argilas quando submetidas a um carregamento hidrostático ou a um carregamento típico de adensamento oedométrico, é bem distinto do comportamento das areias. Estas apresentam curvas tensão-deformação independentes para cada índice de vazios em que estejam originalmente. O índice de vazios de uma areia é conseqüente das condições de sua deposição na natureza. Carregamentos posteriores, que não criem tensões desviadoras elevadas, não produzem grandes reduções de índices de vazios. Uma areia fofa permanece fofa ainda que submetida à elevada carga. Para que esteja compacta, ela deve se formar compacta, ou ser levada a esta situação pelo efeito de vibrações que provocam escorregamento das partículas.

As argilas sedimentares, ao contrário, se formam sempre com elevados índices de vazios. Quando elas se apresentam com índices de vazios baixos, estes são conseqüentes de um pré-adensamento. Em virtude disso, diversos corpos de prova de uma argila, representativos de diferentes índices de vazios iniciais apresentarão curvas tensão-deformação que apos atingir a pressão de pré-adensamento correspondente, fundem-se numa única reta virgem (figura 5. 22).

A resistência de uma argila depende do índice de vazios em que ela se encontra, que é fruto das tensões atuais e passadas, e da estrutura da argila.

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Análise em termos de tensões efetivas (TTE) e tensões totais (TTT): O comportamento dos solos é determinado pelas tensões efetivas a que estiverem

submetidos. As tensões efetivas refletem as forças que se transmitem de grão a grão, das quais resultam as deformações do solo e a mobilização de sua resistência. Esta resulta, principalmente, do atrito entre as partículas e do seu rolamento e re-acomodação, conseqüentes das forças transmitidas de partícula a partícula.

Na análise de um problema de estabilidade do solo, conseqüentemente, devem-se considerar as tensões efetivas atuantes no solo. As tensões totais aplicadas sempre são conhecidas. Para o conhecimento das tensões efetivas, é necessário o conhecimento das pressões neutras, não só as devidas ao nível d’água e a redes de percolação, como também as resultantes do próprio carregamento. Quando as pressões neutras podem ser conhecidas com razoável precisão, como, por exemplo, pela observação do comportamento de obra semelhante, a análise por tensões efetivas (TTE) é sempre previsível. Entretanto, como a estimativa das pressões neutras pode ser muito difícil, realizam-se, com freqüência, análises de estabilidade em termos das tensões totais atuantes.

Para análise em termos de tensões totais (TTT), realizam-se ensaios não drenados e analisam-se os resultados em termos das tensões aplicadas. Admite-se, implicitamente, que as pressões neutras que surgem nestes ensaios são semelhantes às pressões neutras que surgiriam no carregamento real no campo. Se esta hipótese for verdadeira, a análise pelas tensões totais será semelhante à análise pelas tensões efetivas. Se a hipótese não for verdadeira, a análise será somente aproximada, empregam-se as soluções por tensões totais, que são mais fáceis.

Dentre os diversos procedimentos de carregamento na realização de ensaios de laboratório, o mais comum consiste no ensaio em que a pressão confinante é mantida constante, enquanto a pressão axial é aumentada até a ruptura. Este ensaio, evidentemente aplica-se a problemas de carregamento.

5.5.3.1 Resistência de argilas em ensaio CD:

Considerando que o estudo da resistência deve se iniciar pela análise de seu

comportamento em ensaios drenados, são apresentados a seguir, resultados típicos de argilas quando submetidas a ensaios triaxiais drenados, do tipo CD.

a – Resistência acima das tensões de pré-adensamento (normalmente adensada - NA).

Consideremos uma argila hipotética, cuja relação índice de vazios em função da pressão hidrostática de adensamento seja indicada na figura 5. 23(a). Esta argila terá sido adensada, no passado, segundo a curva tracejada na figura, até uma tensão efetiva igual a 3

Figura 5. 22 – Variação do índice de vazios em carregamento em argila.

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– entre 2 e 4 (as tensões estão indicadas por valores absolutos, independentes do sistema de unidades; 3 poderia ser 300 kPa, por exemplo). Esta argila apresenta, atualmente, a curva de índice de vazios em função da tensão confinante indicada pela linha contínua.

Consideremos a realização de dois ensaios, com tensões confinantes de 4 a 8. Quando aplicadas estas tensões, os corpos de prova adensam sob os seus efeitos, e estarão normalmente adensados em relação a estes valores. Ao se fazer o carregamento axial, nestes ensaios, com estes valores, serão obtidas curvas com aspecto indicado na parte (b) da figura 5. 23. As tensões desviadoras, a que os corpos de prova são submetidos, crescem lentamente com as deformações verticais, sendo que a máxima tensão desviadora ocorre para deformações específicas da ordem de 15 a 20 %. Como conseqüência da proporcionalidade das tensões desviadoras máximas com a tensão confinante, os círculos de Mohr representativos do estado de tensões na ruptura são círculos que definem uma envoltória reta, cujo prolongamento passa pela origem como indicado na figura 5. 23 (h).

Figura 5. 23 - Aspectos típicos de curvas tensão-deformação, deformações verticais (“b” e “c” – NA e “d” e “e” – PA) e traçado das envoltórias de resistência a partir do ensaio do tipo CD em argila saturada sem estrutura (PINTO, 2000).

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Por outro lado, observa-se que durante o carregamento axial, o corpo de prova apresenta redução de volume, da mesma ordem de grandeza, sendo só ligeiramente maior para confinantes maiores. Este resultado está indicado nas figura 5. 23(c).

b – Resistência abaixo das tensões de pré-adensamento (pré-adensada - PA).

Considere-se agora, que da amostra referida como exemplo no item anterior, e que tem uma tensão de pré-adensamento igual a 3, moldem-se 3 corpos de prova para o ensaio triaxial drenado, com tensões confinantes iguais a 0,5 e a 2; portanto, abaixo da tensão de pré-adensamento.

Considere-se inicialmente, que este solo não tivesse sido pré-adensado sob a tensão de 3, mas sim sob uma tensão menor que 0,5 e ao se fazerem os ensaios citados, os corpos de prova estariam, após adensamento sob a tensão confinante, nas posições indicadas pelos símbolos 0,5’e 2’ na figura 5. 23(a). Neste caso, estes corpos de prova estariam normalmente adensados e os seus resultados seriam semelhantes aos dos corpos de prova ensaiados nas condições indicadas pelas tensões confinantes 4 e 8, já estudados.

Entretanto, o pré-adensamento sob pressão 3 fez com que estes corpos de prova ficassem nas condições de 0,5e 2 na parte (a) da figura 5. 23, ou seja, com índice de vazios menores do que os correspondentes aos corpos de prova nas condições de 0,5’ e 2’. Menor índice de vazios significa maior proximidade entre as partículas, donde um comportamento diferente que se manifesta pelos resultados indicados na figura 14.2 (d) e (e). A envoltória de resistência é uma curva até a tensão de pré-adensamento.

c – Envoltória de resistência das argilas. Como conclusão temos que uma argila, no estado natural, sempre apresenta uma

tensão de pré-adensamento. Portanto ao ser submetida a ensaios de compressão triaxial, alguns ensaios poderão ser feitos com tensões confinantes abaixo e outros com tensões confinantes acima da tensão de pré-adensamento. O resultado final é aquele indicado na figura 5. 23(h). A envoltória de resistência é uma curva até a tensão de pré-adensamento, e uma reta, cujo prolongamento passa pela origem, acima desta tensão.

Não sendo prático se trabalhar com envoltórias curvas, costumasse substituir o trecho curvo da envoltória por uma reta que melhor a represente.

Há, naturalmente, várias retas possíveis, devendo-se procurar a reta que melhor se ajuste a envoltória, no nível das tensões do problema prático que se estiver estudando.

* Condição acima da pressão de pré-adensamento (ângulo de atrito interno efetivo)

Índice de Plasticidade Ângulo de atrito interno efetivo (0) Geral São Paulo

10 30 a 38 30 a 35 20 26 a 34 27 a 32 40 20 a 29 20 a 25 60 18 a 25 15 a 17

* Condição abaixo da pressão de pré-adensamento

Depende da tensão de pré-adensamento e do nível de tensões de interesse Valores usuais de “c”: 5 < c < 50 kPa

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5.5.3.2 Resistência em ensaio CU:

No ensaio adensado rápido, representado pelos símbolos CU ou R, o corpo de prova é inicialmente submetido à pressão confinante e sob ela adensado. Isto pode requerer um, dois ou mais dias, dependendo da permeabilidade da argila. Ao final deste procedimento a tensão efetiva de confinamento é igual à pressão confinante aplicada; a pressão neutra é nula. A seguir, o sistema de drenagem é fechado e o carregamento axial aplicado. Em argilas saturadas, este ensaio pode ser considerado como ensaio sem variação de volume ou ensaio a volume constante.

Consideremos, como foi feito para o estudo da resistência das argilas em ensaio drenado, uma argila saturada cuja relação do índice de vazios em função da pressão hidrostática de adensamento seja a indicada na figura 5. 23(a).

Os resultados do estudo do comportamento em ensaios CU pode ser representado

de uma forma simplificada como na figura 5. 24.

(a) e (b)

(c) e (d)

(e)

Figura 5. 24 - Aspectos típicos de curvas tensão-deformação, pressão neutra (“a” e “b” – NA e “c” e “d” – PA) e traçado das envoltórias de resistência a partir do ensaio do tipo CU, em TTE e em TTT, em argila saturada sem estrutura (PINTO, 2000).

A interpretação correta deste ensaio é a caracterização da resistência não drenada

em função da tensão de adensamento, que é a pressão confinante do ensaio. Neste caso, pode-se dizer que, acima da tensão de pré-adensamento, a resistência não drenada é proporcional à tensão de adensamento. Entretanto, tem sido comum interpretar os resultados dos ensaios CU em termos de círculos de Mohr, representativos do estado das tensões totais. A envoltória de resistência destes ensaios não tem muita aplicação prática, mas serve para o desenvolvimento de estudos de comportamento dos solos.

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Quando o ensaio é feito com medida das pressões neutras, ficam conhecidas as tensões efetivas na ruptura. Representando-se os círculos de Mohr em termos das tensões efetivas (que são círculos de diâmetro igual aos das tensões totais deslocados para a esquerda do valor da tensão neutra), pode-se determinar a envoltória de resistência em termos de tensões efetivas, como se mostra na figura 5. 24(e). Esta envoltória de resistência é, aproximadamente, igual à envoltória obtida nos ensaios CD.

Uma avaliação comparativa do comportamento obtido nos ensaios CU e CD é

apresentada na figura 5. 25 para corpos de prova sob a mesma tensão confinante, (a) – estando o solo normalmente adensado e (b) estando o solo pré-adensado.

(a) (b) Figura 5. 25 - Avaliação comparativa do comportamento obtido nos ensaios CU e

CD é apresentada para corpos de prova de solo normalmente adensado e pré-adensado. 5.5.3.3 Resistência em ensaio UU:

Os ensaios de compressão triaxial do tipo CD e CU mostram como varia a resistência dos solos argilosos, em função da tensão efetiva. Eles fornecem as chamadas envoltórias de resistência, que na realidade, são equações que indicam como a tensão cisalhante de ruptura (ou a resistência) varia com a tensão efetiva (ensaio CD) ou como a resistência não drenada varia com a tensão efetiva de adensamento (ensaio CU). Estas equações de resistência são empregadas nas análises de estabilidade por equilíbrio limite, em projetos de engenharia, onde a tensão efetiva no solo varia de ponto para ponto.

Existem situações, entretanto, em que se deseja conhecer a resistência do solo (a tensão cisalhante de ruptura) no estado em que o solo se encontra.

É o caso, por exemplo, da análise da estabilidade de um aterro construído sobre uma argila mole. Como se mostra na figura 5. 26, o problema é verificar se a resistência do solo ao longo de uma superfície hipotética de ruptura é suficiente para resistir à tendência de escorregamento provocada pelo peso do aterro. Uma eventual ruptura ocorreria antes

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de ocorrer qualquer drenagem. Portanto, a resistência que interessa é aquela que existe em cada ponto do aterro, da maneira como ele se encontra. É a resistência não drenada do solo.

A argila no estado natural se encontra sob uma tensão vertical efetiva que depende de sua profundidade, da posição do nível d’água e do peso específico dos materiais que estão acima dela. Seu índice de vazios depende da tensão vertical efetiva e das tensões efetivas que já atuaram sobre ela.

Para se conhecer a resistência não drenada do solo, pode-se empregar três procedimentos: (a) por meio de ensaios de laboratório; (b) por meio de ensaio de campo (ensaio Vane Shear Test ou de palheta); e (c) por meio de correlações.

Figura 5. 26 - Análise da estabilidade de um aterro construído sobre argila mole. Em Laboratório: Quando uma amostra é retirada do terreno, as tensões totais caem a zero. Convém lembrar que, quando se aplicam acréscimos de tensão isotrópicos (de igual

valor nas três direções principais) num corpo de prova de solo saturado, sendo impedida a drenagem, surge uma pressão neutra de igual valor, em virtude da baixa compressibilidade da água perante a compressibilidade do solo, sendo este um dos pontos básicos do estudo do adensamento. Da mesma forma, quando se reduzem tensões externas, ocorre uma redução de pressão neutra de igual valor.

Por ocasião da amostragem, a pressão externa deixa de atuar, e não há possibilidade de drenagem. Logo, na amostra ocorre uma redução da pressão neutra, que passa a ser negativa. Num terreno genérico, as três tensões principais não são iguais. Admite-se que o efeito da amostragem seja igual ao da redução de uma tensão isotrópica igual à média das três tensões principais, que é a tensão octaédrica, σ’oct, o que é bastante aceitável, considerando-se que, nesta situação, o comportamento é próximo do comportamento elástico.

Figura 5. 27 – Exemplo de tensões atuantes no terreno e na amostra

Considere o exemplo da figura 5. 27, ilustrado por PINTO (2000), sendo conceitualmente, σ’oct = σv + σh(x) + σh(y) / 3. Por exemplo, sendo σv= 80, σh= 62 e u= 30, temos: σ’ v= 50, σ’h= 32 ⇒ a média das 3 tensões = 38 (admite-se que 38kPa corresponde ao valor reduzido na tensão isotrópica quando extraída a amostra)

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Na amostra coletada u= -38, logo atua nos eixos esta magnitude de tensão: σ’ v= 38, σ’h= 38 Isto implica no fato de que qualquer que seja a pressão confinante de ensaio, o corpo de prova ficará com a mesma tensão confinante efetiva, veja:

σ3= 100 u= -38 +100 = 62 σ’3= 100 –62 = 38 kPa σ3= 150 u= -38 +150 = 112 σ’3= 150 –112 = 38 kPa ... .... ...

Conclui-se, portanto, que em ensaios de compressão triaxial do tipo UU, com amostras saturadas, a tensão confinante efetiva após a aplicação da pressão confinante será sempre a mesma e igual à pressão confinante efetiva que existia na amostra, que é igual, em valor absoluto, à pressão neutra negativa da amostra, que é igual, ainda, à média das tensões principais efetivas que existia no terreno na posição que a amostra foi retirada.

Após o confinamento, os corpos de prova são submetidos a carregamento axial, sem drenagem. Ora, independentemente das pressões confinantes de ensaio, todos os corpos de prova estão sob a mesma tensão confinante efetiva, todos apresentarão o mesmo desempenho, e, conseqüentemente, a mesma resistência. Os círculos de Mohr em tesões totais terão os mesmos diâmetros, e a envoltória será uma reta horizontal, como se mostra na figura 5. 28. A ordenada desta reta é a resistência não drenada da argila, Que é constante, também chamada de coesão da argila, usualmente referida como Su.

O comportamento das argilas em ensaios não drenados justifica a denominação de solos coesivos tradicionalmente empregado para designar as argilas em contraposição às areias, chamadas de solos não coesivos. Como foi visto anteriormente, a resistência das argilas, no íntimo, é resultante de um fenômeno de atrito entre as partículas. A resistência que elas apresentam quando não confinadas é fruto da tensão confinante efetiva que existe. A impressão que se tem, entretanto, é a de um material que apresenta resistência mesmo que não submetido a qualquer confinamento, e, portanto, de um material coesivo, ao contrário das areias. A denominação de solos coesivos é anterior ao conceito de pressões efetivas formulado por Terzaghi.

Figura 5. 28 – Envoltória de resistência de argilas saturadas em ensaio UU

Observa-se que para uma amostra de solo em condições de tensões diferentes da situação colocada (reprodução das condições de campo), por exemplo, uma amostra de solo compactada em que o grau de saturação naturalmente não é 100%, a obtenção da sua envoltória de resistência leva ao traçado “clássico”, em que se determina a sua coesão e ângulo de atrito para o material. Um exemplo de ensaio UU em amostra compactada é apresentado no final desta Unidade.

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5. 5. 4 - Trajetória de tensões

Quando se pretende representar o estado de tensões num solo em diversas fases de carregamento, num ensaio ou num problema prático, os diversos círculos de Morh podem ser desenhados, como se observa na figura 5. 29. Num caso simples como o desta figura, em que a tensão confinante se mantém constante enquanto a tensão axial aumenta, os círculos representam bem a evolução das tensões.

(a) círculos de Mohr (b) pela trajetória das tensões

Figura 5. 29 – Representação da evolução do estado de tensões Quando as duas tensões principais variam simultaneamente, entretanto, esta

representação gráfica pode se tornar confusa. Diante disto, criou-se a sistemática de representar as diversas fases de carregamento pela representação exclusiva dos pontos de maior ordenada de cada círculo, como os pontos 1,2 e 3 na figura 5. 29, ligando-os por uma curva que recebe o nome de trajetória de tensões.

Sendo p e q as coordenadas dos pontos da trajetória, pela sua definição, tem-se: p= (σσσσ1 + σσσσ3) / 2 e q= (σσσσ1 - σσσσ3) / 2

Nota-se que p é a média das tensões principais e q é a semi diferença das tensões

principais, ou ainda, p e q são, respectivamente, a tensão normal e tensão cisalhante no plano de máxima tensão cisalhante.

Na figura 5. 30 estão representadas as trajetórias de tensões para os seguintes carregamentos:

Traçadas as trajetórias de tensões de uma série de ensaios, é possível determinar a

envoltória a estas trajetórias. No caso da figura 5. 31, esta trajetória é a reta EDI, que pode ser expressa pela equação: q = d + p . tgββββ

** Os coeficientes desta reta, d e ββββ, podem ser correlacionados com os

coeficientes da envoltória de resistência, c e ϕ, como se demonstra geometricamente através da figura 5.31.

Curva I : confinante constante e axial crescente. Curva II : Confinante decrescente e axial constante. Curva III : Confinante decrescente e axial crescente com iguais valores absolutos. Curva IV : Confinante e axial crescentes numa razão constante. Curva V: Confinante e axial variáveis em razões diversas.

Figura 5. 30

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Figura 5. 31 – Correlação entre a envoltória dos círculos de Mohr e a envoltória às

trajetórias de tensão

As retas FDI e GCH se encontram no ponto A, sobre o eixo das abcissas. Então do triângulo ABD tem-se BD = AB . tgβ. Do triângulo ABC tem-se BC = AB . senϕ. Sendo BC = BD, resulta: sen ϕϕϕϕ = tan ββββ

Por outro lado, o intercepto c = EG = AE tgϕ e o intercepto d = EF = AE tgβ.

Dividindo-se estas duas expressões, tem-se: (c/d) = (tgϕϕϕϕ/tgββββ) Lembrando que tgβ = senϕ, resulta: c = d/cosϕϕϕϕ Estas expressões são muito úteis, por exemplo, para se determinar à envoltória de

resistência mais provável de um número muito grande de resultados. A representação de todos os círculos de Mohr faria o gráfico ficar muito confuso. A representação só dos pontos finais das trajetórias de tensões permite a determinação da envoltória média mais provável, e, dela, a envoltória de resistência.

Trajetória de tensões efetivas As trajetórias de tensões têm seu maior campo de aplicação nas solicitações não

drenadas de laboratório ou de campo. Nestes casos, as tensões efetivas é que são geralmente representadas e permitem representar claramente o desenvolvimento das pressões neutras em função do carregamento, pois, na representação tradicional dos resultados dos ensaios, as pressões neutras são indicadas em função da deformação.

Consideremos um ensaio com manutenção da tensão confinante e acréscimo de tensão axial, representado na figura 5. 32. A trajetória de tensões totais é uma linha reta, formando 45 graus com a horizontal. Consideremos que com o acréscimo de tensão axial representado na figura tenha ocorrido uma pressão neutra igual a u. O círculo de tensões efetivas se apresenta deslocado para a esquerda deste valor, assim como o ponto representativo do estado de tensões efetivas na respectiva trajetória.

Portanto, a diferença de abscissa de um ponto da trajetória de tensões efetivas ao correspondente ponto da trajetória de tensões totais indica a tensão neutra existente. Se a trajetória de tensões efetivas estiver para a esquerda, tensão neutra é positiva; se para a direita, a tensão neutra é negativa. A trajetória de tensões totais geralmente não é representada, para maior clareza do gráfico. Sua direção é conhecida pelas condições do carregamento.

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Figura 5. 32 – Trajetória de tensões efetivas obtidas a partir da trajetória de tensões totais e pressão neutra. Observe que a trajetória de tensões efetivas corresponde à linha tracejada, indicada na figura pela letra “p”, com uma barra em cima, e não por p’ ( sem ’ que é mais usual para a representação de tensões efetivas). Esta notação se equivale. 5.5.5 – Valores de parâmetros de resistência ao cisalhamento e correlações com SPT

São apresentados na tabela abaixo valores de parâmetros de resistência ao cisalhamento e de capacidade de carga (como será visto na Unidade 07 deste curso) para alguns solos compactados.

Tabela - Parâmetros de resistência e capacidade de carga para alguns solos compactados.

Ref. Data Material c

(Kgf/cm2)

ϕ

(º)

q0

(Kgf/cm2)

Svenson 1980 Argila amarela/RJ Argila vermelha/RJ Argila vermelha/MG Argila vermelha/PR

4,0 1,8 1,7 1,2

22 23 27 33

98,65 48,17 63,23 78,25

Cruz

1985 - solo laterítico de basalto não saturado - solo laterítico de arenito não saturado - solo laterítico de gnaisse não saturado -solo laterítico quatzo-xisto não saturado - colúvio arenito basalto não saturado

0,40 a 0,70

0,10 a 0,50

0,20 a 0,50

0,15

0,30 a 0,60

24 a 33

26 a 31

26 a 29

33

27 a 31

11,69 a 45,80 3,53 a 26,89 6,93 a 22,34 10,09

11,28 a 39,30

Marangon 2004 - solo argiloso de comportamento laterítico (latossolo) - solo argiloso de comportamento não laterítico (podzólico)

0,5

1,5

44

34

114,75

90,10

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Trata-se de solos maduros (não saprolíticos) com características semelhantes, de utilização típica na construção de aterros em geral. Os valores mostram serem elevadas às condições de suporte dos solos compactados com estes materiais, assim como altos para os solos compactados brasileiros, em geral, quando este é bem compactado e de material laterizado de boa qualidade.

Outros Resultados de Ensaios Triaxial São apresentados alguns resultados de ensaios triaxiais (do tipo S - CD, R - CU e Q - UU) executados em uma série de solos de obras de barragens construídas no Brasil, conforme apresentado por CRUZ (1996), que podem servir como ordem de grandeza na escolha de parâmetros de cálculo para as fases preliminares de projeto. Amostra Natural / Solo Talhado em Blocos Indeformados Solo Residual Maduro – Solo Laterítico (CRUZ, 1996)

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Amostra Natural / Solo Talhado em Blocos Indeformados Solo Residual Jovem – Solo Saprolítico (CRUZ, 1996)

Observe que foram listados parâmetros de ensaios realizados em solos residuais maduros (ou seja, horizonte B, que corresponde a solos argilosos laterizados – lateríticos típicos utilizados como material de construção para aterros, subleitos, e camadas nobres de obras de terra em geral). Na tabela seguinte foram apresentados resultados de ensaios em solos residuais jovem ou saprolíticos (horizonte C, corresponde a solos menos argilosos ou até mesmo silto-arenosos – inconvenientes para uso como material de construção). Correlação entre os parâmetros de resistência com os valores de SPT obtidos em sondagem à percussão

Nas tabelas a seguir apresentam-se uma visão, mesmo que empírica e grosseira, dos

valores estimados de c e ϕ, co-relacionando esses valores com o SPT. Esses valores devem ser tomados com toda reserva uma vez que os parâmetros

dependem da condição de utilização, portanto, as tabela implicam em sugerir uma faixa de valores.

Para o caso de obras de baixo custo esses valores podem ser orientadores quando o problema não comporta a execução de ensaios especiais e, nesse caso convém procurar enquadrar o valor a ser adotado na condição mais desfavorável possível (a favor da segurança).

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Tabela – Características dos solos sem coesão (arenosos) SPT ϕϕϕϕ Nomenclatura para sondagens < 4 < 25º Muito fofo

4 a 10 25º a 30º Fofo ou pouco compacto 10 a 30 30º a 36º Medianamente compacto 30 a 50 36º a 40º Compacto

> 50 > 40º Muito compacto

Tabela – Características dos solos com coesão (argilosos) SPT C (t/m2) Nomenclatura para sondagens < 2 < 1,2 Muito mole

2 a 4 1,2 a 2,5 Mole 4 a 8 2,5 a 5,0 Média 8 a 15 5,0 a 10,0 Rija 15 a 30 10,0 a 20,0 Muito rija

> 30 > 20 Dura

No caso dos solos com coesão, temos uma fórmula aproximada, a saber: ( ) IP.045,058,0tg −=ϕ

5.5.6 – Aplicações dos ensaios em análise e projetos

A partir dos três ensaios básicos associamos, de acordo com as condições previstas de ocorrência na obra, as condições de ensaio em relação à compressão ou expansão, condição de drenagem, condição de deformação, entre outras.

De acordo com a importância da obra e/ou com as características do solo e dos previstos esforços solicitantes, poderemos criar, em laboratório, condições que sejam condizentes com cada problemas de projeto em questão.

Como citações simples, só como ilustração, temos alguns exemplos de aplicações

dos ensaios padronizados, em situações práticas de projetos e obras de Engenharia:

• No caso de estabilidade de estruturas de solos argilosos a longo tempo com relação a taludes e empuxos, ou de estruturas de solos arenosa recomenda-se o ensaio lento, com predominância tipo CD (S);

• Solos argilosos abaixo de fundações de edifícios, estruturas de terra em cortes provisórios, fundações de aterros em solos moles recomenda-se o ensaio rápido, tipo UU (Q);

• No caso de barragens de terra quando há possibilidade de rápido esvaziamento recomenda-se o ensaio adensado rápido (ou rápido pré-adensado), tipo CU-R.

Observa-se que para a obtenção dos parâmetros de resistência em termos de tensões

totais, é importante considerar a obra a que serão aplicados, dentro do ponto de vista acima apresentado. Um problema de escavação, por exemplo, em que haverá redução das tensões, não pode ser tratado da mesma maneira que um problema de fundações, onde haverá um carregamento. O desenvolvimento das tensões neutras em cada caso será diferente. O ensaio, em termos das tensões totais, deve procurar representar o problema específico.

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5. 5. 7 – Considerações finais sobre a compressão triaxial

a) Em dado instante do ensaio é sempre considerado uniforme o estado de tensões em toda a amostra. Assim, podemos recorrer às soluções gráficas de Mohr.

b) Como vimos, σ2 = σ3, portanto reduzimos ao sistema plano de tensões, com um só círculo. Portanto, o tratamento analítico/gráfico se tornou bem mais simplificado do que o tridimensional (com três círculos).

c) A resistência ao cisalhamento de solos coesivos é variável e dependente de vários fatores circunstanciais, diferentemente dos solos granulares onde os fatores são menos acentuados.

d) Ao tentarmos reproduzir, em laboratório, as condições que a estrutura de solo estará sujeita nas obras, será necessário levantar todos os fatores intervenientes e levar em conta cada um dos mesmos, tratando-se de reproduzi-los às condições reais para cada caso em particular. Não há como se ter um ensaio que reflita todas as possibilidades de ocorrência e de solicitações naturais previstas na obra.

e) Cada situação condicionaria um ensaio especial. É óbvio que esse procedimento não é prático para o funcionamento de um laboratório além do ônus decorrente. O que se faz, então, é reproduzir as circunstâncias mais típicas e influentes em alguns ensaios padronizados, referidos a comportamentos e circunstâncias extremas. Assim seus resultados devem ser adaptados aos casos reais, interpretando-os com critério e tendo sempre em referência a experiência vivida/constatada.

f) O ensaio de compressão triaxial é constituído por duas etapas: • A aplicação na amostra da pressão inicial da câmara (água), para se poder

dar início às aplicações de σ3 e σ1. Essa aplicação inicial pode ser com ou sem drenagem.

• A aplicação das cargas propriamente dita, seja lateral ou axial. Nessa etapa, também podemos ter drenagem (ensaios drenados) ou não (ensaios não-drenados).

g) Os ensaios de compressão triaxial são dois tipos principais: • Ensaios de compressão, em que a dimensão axial do corpo de prova diminui

e o diâmetro aumenta; • Ensaios de expansão, em que a dimensão axial aumenta durante o ensaio.

h) Para se ter o ensaio de compressão adotamos três procedimentos: • A dimensão axial pode diminuir aumentando o esforço axial e mantendo-se

constante o lateral (quando há pressão de água, também no topo da amostra, tem que ser compensada para manter a pressão axial constante);

• Pode ocorrer, também, mantendo constante o esforço axial e fazendo diminuir o esforço lateral transmitido pela água;

• Conseguimos o mesmo resultado aumentando o esforço axial e diminuindo o lateral simultaneamente. Nesse tipo de ensaio o mais comum é se ter cada incremento de pressão axial no dobro do decréscimo da pressão lateral, de maneira que a média aritmética dos esforços normais principais se mantenha constante.

i) Para o caso do ensaio de expansão teremos, também, três procedimentos: • Aumenta-se a dimensão no sentido do eixo do corpo de prova diminuindo a

pressão axial e mantendo constante a lateral. Na prática a haste da prensa vai exercer uma tração no corpo de prova;

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• Manter a pressão axial constante, aumentando-se a pressão na água; • Fazer diminuir a pressão axial ao mesmo tempo em que se aumenta a

pressão lateral. Nesse caso é muito usual o incremento, isto é, a diminuição da pressão axial, em cada variação de carga aplicada, no dobro do aumento da pressão lateral, buscando, mais uma vez a constância como feito em C;

j) Num ensaio triaxial à compressão, a pressão axial é sempre a tensão principal maior enquanto que num ensaio triaxial à tração ocorre o contrário, ou seja, a pressão axial é a tensão principal menor.

Descrição, como exemplo, da obtenção de parâmetros de resistência ao

cisalhamento, coesão – “c” e ângulo de atrito – “ϕϕϕϕ”, para 2 solos argilosos compactados através do ensaio UU, visando o estudo deste solo como suporte em projetos de pavimentos, conforme abordado por MARANGON, 2004.

Para este estudo foram selecionadas duas amostras de solo, uma de comportamento

laterítico, a amostra ZM10 – bairro Retiro em Juiz de Fora, e uma outra de comportamento não laterítico, a amostra MV08, da BR , próximo à Conselheiro Lafaiete.

Foram utilizados corpos de prova nas dimensões 5 x 10 cm. As amostras de solo

foram preparadas e passadas na peneira de 3/8” (máximo de 1/5 do diâmetro do cilindro) para serem homogeneizadas no teor de umidade ótima, correspondente a energia aproximada do PN, permanecendo 24 horas em câmara úmida.

A moldagem dos corpos de prova de solo compactado, na densidade máxima, correspondente à umidade ótima, foi feita por prensagem de uma quantidade de solo úmido previamente calculado para, após a sua moldagem, apresentar altura aproximadamente em 10cm.

Para a determinação de cada uma das envoltórias de resistência ao cisalhamento foram moldados 4 CPs, tendo sido adotadas as seguintes tensões de confinamento σ3: 20kPa, 50kPa, 70kPa e 150kPa, (0,20 kgf/cm2 a 1,50 kgf/cm2) correspondendo ao intervalo dos níveis de tensões usualmente utilizadas na análise visando o projeto de um pavimento.

Os dados correspondentes aos corpos de prova moldados estão apresentados na tabela abaixo.

O ensaio estático de resistência ao cisalhamento utilizado foi o do tipo UU (não adensado e não drenado) prevendo uma situação mais desfavorável de solicitação do subleito por uma roda de veículo parado sobre o pavimento, imediatamente após a liberação ao tráfego.

Tabela - Dados dos corpos de prova moldados para o ensaio triaxial estático para

obtenção da resistência ao cisalhamento. Amostra

Teor de Umidade

(%)

Massa Específica Aparente Seca

(kN/m3) Ótima Moldagem Máxima

(máx) Moldagem

(CP1) Moldagem

(CP2) Moldagem

(CP3) Moldagem

(CP4) ZM10 26,5 24,48 14,83 14,89 14,90 14,86 14,91 MV08 28,8 26,94 14,65 14,64 14,65 14,63 14,66

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Os ensaios foram executados em uma prensa triaxial, do Laboratório de Geotecnia da COPPE/UFRJ, acoplado a um sistema automático de aquisição de dados, tendo sido seguidos os procedimentos usuais para a realização deste tipo de ensaio. Os dados obtidos foram posteriormente trabalhados em planilhas eletrônicas permitindo a plotagem dos gráficos usuais à interpretação do ensaio.

Os círculos de Mohr foram traçados a lápis em papel milimetrado e as

envoltórias de resistência obtidas. São apresentados, contudo, neste trabalho, as envoltórias de resistência obtidas a partir das trajetórias de tensão, em termos de p` x q, que permite também o cálculo dos parâmetros de resistência “c” e “ϕ”, tendo sido verificado uma boa aproximação entre os parâmetros obtidos pelos dois métodos. A figura 5. 33 mostra a envoltória de resistência para a amostra ZM10 e a figura 5. 34 a envoltória para a amostra MV08.

Os parâmetros de resistência ao cisalhamento obtidos nas envoltórias de resistência

traçadas a partir dos círculos de Mohr e das trajetórias de tensões, assim como os valores máximos alcançados pela tensão desvio na ruptura de cada um dos 4 CPs ensaiados estão apresentados na tabela abaixo, em resumo aos resultados obtidos nos ensaios.

Pode-se observar que os resultados apresentados são coerentes. A amostra MV08 apresenta maior coesão, e conseqüentemente menor ângulo de atrito, que a amostra ZM10.

Estes parâmetros correspondem a níveis de resistência ao cisalhamento, relativamente satisfatórios, em se tratando de solo compactado.

Figura 5. 33 - Envoltória de resistência ao cisalhamento em termos do diagrama p` x q, para a amostra ZM10.

Figura 5. 34 - Envoltória de resistência ao cisalhamento em termos do diagrama p` x q, para a amostra MV08.

Ensaio Triaxial - UUAmostra ZM10

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 550 600 650

p' ( kPa )

q (

kPa

)

Ensaio Triaxial - UUAmostra MV08

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 550 600 650p' ( kPa )

q (

kPa

)

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Tabela - Parâmetros de resistência ao cisalhamento obtidos a partir do traçado dos círculos de Mohr e do traçado das trajetórias de tensão e valores máximos alcançados pela tensão desvio na ruptura, nos ensaios do exemplo ilustrado.

Amostra

Parâmetros de Resistência ao Cisalhamento

c (kPa) ϕ (graus)

Tensão Desvio Máxima (Ruptura)

(kPa) Círculos de

Mohr Trajetória de

tensões

σ3 = 20

σ3 = 50

σ3 = 70

σ3 = 150

ZM10 c = 45,0 c = 44,8 237,3 512,4 797,4 879,0 ϕ = 44,3 ϕ = 44,4

MV08 c = 140,0 c = 147,9 518,3 655,6 768,7 817,1

ϕ = 34,4 ϕ = 33,7

Um bom exercício para a compreensão da obtenção dos parâmetros c e ϕ consiste em traçar a envoltória dos círculos de Mohr e a envoltória das trajetórias de tensão, para os dados do exemplo acima, e verificar a correlação entre os parâmetros obtidos.