me - capítulo 3 - teoria dos sc

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 37 CAPÍTULO 3: INTRODUÇÃO À TEORIA DOS SEMICONDUTORES 3.1) INTRODUÇÃO Eletrônica é a ciência e tecnologia do movimento de cargas elétricas num gás, vácuo ou semicondutor. Sua história divide-se basicamente em dois períodos: o primeiro definido como a era dos tubos a vácuo (conhecidas como válvulas), que consistem basicamente no aproveitamento do fenômeno da emissão termoiônica e que, porisso, tem o inconveniente de consumir muita energia, e o segundo como a era dos transistores, que são componentes construídos a base de certos materiais sólidos chamados semicondutores. Por isso, para diferenciar este último da tecnologia dos tubos a vácuo, a teoria dos semicondutores é conhecida como Física do Estado Sólido. Hoje todo o âmbito da eletrônica é dominado pelos dispositivos semicondutores, exceto em algumas aplicações de grande potência e alta tensão. Assim, a teoria dos tubos a vácuo é praticamente omitida de todas as ementas de engenharia eletrotécnica. Os dispositivos semicondutores são os componentes básicos para processar sinais elétricos nos sistemas de comutação, comunicação, computação e controle. Assim, o estudo dos semicondutores vem se tornando cada vez mais importante, em razão de seu uso em larga escala no campo da eletro-eletrônica. Componentes como transistores  bipolares de junção (TBJ´s), d iodos, termistores, fotocondutores, varistores, tiristores (SCR, Diac e Triac), tran sistores de efeito de campo (FET's) e circuitos integrados baseiam-se em princípios estudados na teoria do estado sólido. 3.2) MATERIAIS SEMICONDUTORES Como visto no Capítulo 1, a propriedade condutividade elétrica dos materiais é proporcional à concentração n de portadores de carga (elétrons livres), isto é, σ  = n e μ n . Como também mencionado no Capítulo 1, para um bom condutor, n é muito grande (~10 23  elétrons livres/cm 3 ) e, para um isolante, n é muito pequena (~10 7  elétrons livres/cm 3 ), havendo para este último, portanto, poucos portadores de carga disponíveis para a condução de corrente. Os materiais com concentrações de portadores de carga livres entre a dos condutores e a dos isolantes podem ser denominados de semicondutores, caracterizados, então, por possuir uma semicondutância. Condutores e isolantes  possuem apenas elétrons livres como portadores de carga porque possuem apenas um caminho para a corrente. Nos semicondutores, no entanto, o deslocamento de carga livre ocorre em dois caminhos, isto é, os semicondutores comportam-se como se tivessem dois tipos de portadores de carga livre, que serão vistos posteriormente: elétrons livres e lacunas. Desse modo, o valor numérico desta condutância intermediária é um critério insuficiente, pois de modo algum define totalmente o comportamento funcional dos materiais e ligas pertencentes a esse grupo, pois pode- se obter misturas de materiais que atendem a essa classificação mas que não tem comportamento semicondutor. Com relação ao comportamento da condutividade com a temperatura, medido pelo parâmetro coeficiente de temperatura da resistividade α  (visto no Capítulo 1), os semicondutores ditos puros apresentam, em geral, α  negativo dentro de uma determinada faixa de valores, isto é, ao contrário dos metais (ou semelhante aos materiais isolantes), sua condutividade aumenta com a temperatura e a concentração de portadores de carga não é constante, variando em razão exponencial, o que poderá ser observado na Eq. 3.3.2. Os materiais semicondutores mais conhecidos e usados são o germânio (Ge), o silício (Si) e o arsenieto de gálio (GaAs). Devido a limitações de temperatura e capacidade de tensão e corrente do germânio, atualmente há um amplo  predomínio dos dispositivos de silício, razão pela qual a discussão mais geral neste capítulo limitar-se-á a este material. Outros materiais: selênio (Se), gálio (Ga), sulfeto de cádmio, fosfeto de índio e nitreto de gálio. Um átomo de germânio ou silício isolado possui quatro elétrons na sua órbita de valência. Sabe-se porém que, para ser quimicamente estável, um átomo necessita de oito elétrons na camada de valência. Os átomos destes elementos podem, então,  posicionarem-se entre outros quatro átomos, compartilhando um elétron com cada vizinho (ligação chamada covalente, presente também nos plásticos, no diamante, em cerâmicas e nos polímeros), obtendo, assim, um total de oito elétrons na órbita de valência (Fig. 3.2.1). Esta disposição se constitui num sólido onde os átomos se arranjam na configuração chamada cristal (rede cristalina). Carbono, silício, germânio e estanho pertencem à configuração eletrônica do grupo IV-A da tabela periódica, ou seja, possuem quatro elétrons na camada de valência. Apesar desta semelhança, o carbono na forma cristalina (diamante) é um isolante, silício e germânio no estado sólido são semicondutores e o estanho é um condutor. A razão para a diferença nos comportamentos elétricos está na estrutura de  bandas de energia: a energia do gap entre as bandas de valência (BV) e de condução (BC), denominada  E G , é muito elevada no diamante (  E G ≈  6 eV ), tem valores  pequenos no germânio (  E G  = 0,785 eV ) e no silício (  E G  = 1,21 eV ) e inexistência de gap no estanho (  E G  = 0 eV ). +4 +4 +4 +4 +4 ligação covalente elétrons de valência íons de silício Fig. 3.2.1: Estrutura  bidimensional de um cristal semicondutor (silício).

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    CAPTULO 3: INTRODUO TEORIA DOS SEMICONDUTORES

    3.1) INTRODUO

    Eletrnica a cincia e tecnologia do movimento de cargas eltricas num gs, vcuo ou semicondutor. Sua histria divide-se basicamente em dois perodos: o primeiro definido como a era dos tubos a vcuo (conhecidas como vlvulas), que consistem basicamente no aproveitamento do fenmeno da emisso termoinica e que, porisso, tem o inconveniente de consumir muita energia, e o segundo como a era dos transistores, que so componentes construdos a base de certos materiais slidos chamados semicondutores. Por isso, para diferenciar este ltimo da tecnologia dos tubos a vcuo, a teoria dos semicondutores conhecida como Fsica do Estado Slido. Hoje todo o mbito da eletrnica dominado pelos dispositivos semicondutores, exceto em algumas aplicaes de grande potncia e alta tenso. Assim, a teoria dos tubos a vcuo praticamente omitida de todas as ementas de engenharia eletrotcnica.

    Os dispositivos semicondutores so os componentes bsicos para processar sinais eltricos nos sistemas de comutao, comunicao, computao e controle. Assim, o estudo dos semicondutores vem se tornando cada vez mais importante, em razo de seu uso em larga escala no campo da eletro-eletrnica. Componentes como transistores bipolares de juno (TBJs), diodos, termistores, fotocondutores, varistores, tiristores (SCR, Diac e Triac), transistores de efeito de campo (FET's) e circuitos integrados baseiam-se em princpios estudados na teoria do estado slido.

    3.2) MATERIAIS SEMICONDUTORES Como visto no Captulo 1, a propriedade condutividade eltrica dos materiais proporcional concentrao n

    de portadores de carga (eltrons livres), isto , = n e n. Como tambm mencionado no Captulo 1, para um bom condutor, n muito grande (~1023 eltrons livres/cm3) e, para um isolante, n muito pequena (~107 eltrons livres/cm3), havendo para este ltimo, portanto, poucos portadores de carga disponveis para a conduo de corrente.

    Os materiais com concentraes de portadores de carga livres entre a dos condutores e a dos isolantes podem ser denominados de semicondutores, caracterizados, ento, por possuir uma semicondutncia. Condutores e isolantes possuem apenas eltrons livres como portadores de carga porque possuem apenas um caminho para a corrente. Nos semicondutores, no entanto, o deslocamento de carga livre ocorre em dois caminhos, isto , os semicondutores comportam-se como se tivessem dois tipos de portadores de carga livre, que sero vistos posteriormente: eltrons livres e lacunas. Desse modo, o valor numrico desta condutncia intermediria um critrio insuficiente, pois de modo algum define totalmente o comportamento funcional dos materiais e ligas pertencentes a esse grupo, pois pode-se obter misturas de materiais que atendem a essa classificao mas que no tem comportamento semicondutor.

    Com relao ao comportamento da condutividade com a temperatura, medido pelo parmetro coeficiente de temperatura da resistividade (visto no Captulo 1), os semicondutores ditos puros apresentam, em geral, negativo dentro de uma determinada faixa de valores, isto , ao contrrio dos metais (ou semelhante aos materiais isolantes), sua condutividade aumenta com a temperatura e a concentrao de portadores de carga no constante, variando em razo exponencial, o que poder ser observado na Eq. 3.3.2.

    Os materiais semicondutores mais conhecidos e usados so o germnio (Ge), o silcio (Si) e o arsenieto de glio (GaAs). Devido a limitaes de temperatura e capacidade de tenso e corrente do germnio, atualmente h um amplo predomnio dos dispositivos de silcio, razo pela qual a discusso mais geral neste captulo limitar-se- a este material. Outros materiais: selnio (Se), glio (Ga), sulfeto de cdmio, fosfeto de ndio e nitreto de glio.

    Um tomo de germnio ou silcio isolado possui quatro eltrons na sua rbita de valncia. Sabe-se porm que, para ser quimicamente estvel, um tomo necessita de oito eltrons na camada de valncia. Os tomos destes elementos podem, ento, posicionarem-se entre outros quatro tomos, compartilhando um eltron com cada vizinho (ligao chamada covalente, presente tambm nos plsticos, no diamante, em cermicas e nos polmeros), obtendo, assim, um total de oito eltrons na rbita de valncia (Fig. 3.2.1). Esta disposio se constitui num slido onde os tomos se arranjam na configurao chamada cristal (rede cristalina).

    Carbono, silcio, germnio e estanho pertencem configurao eletrnica do grupo IV-A da tabela peridica, ou seja, possuem quatro eltrons na camada de valncia. Apesar desta semelhana, o carbono na forma cristalina (diamante) um isolante, silcio e germnio no estado slido so semicondutores e o estanho um condutor. A razo para a diferena nos comportamentos eltricos est na estrutura de bandas de energia: a energia do gap entre as bandas de valncia (BV) e de conduo (BC), denominada EG , muito elevada no diamante (EG 6 eV), tem valores pequenos no germnio (EG = 0,785 eV) e no silcio (EG = 1,21 eV) e inexistncia de gap no estanho (EG = 0 eV).

    +4 +4

    +4

    +4

    +4 ligao covalente

    eltrons de valncia

    ons desilcio

    Fig. 3.2.1: Estrutura bidimensional de um cristal semicondutor (silcio).

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

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    3.3) FENMENOS DE TRANSPORTE EM SEMICONDUTORES

    A discusso que se segue limita-se ao silcio devido s razes discutidas anteriormente e por discutir. Como visto no Captulo 1, um cristal condutor (metais), quando submetido a uma ddp, capaz de conduzir

    correntes elevadas porque em sua estrutura atmica h eltrons submetidos a uma fraca atrao do ncleo dos tomos do material, os chamados eltrons livres, pois percorrem nveis de energia elevados.

    Para um cristal de silcio, ento, este tambm depende da existncia de eltrons que possam se deslocar dentro do cristal. Contudo, em temperaturas muito baixas ( 0 K), seus eltrons no conseguem se mover (no podem se comportar como carga livres) e o silcio comporta-se como isolante (Fig. 3.3.1-a). Isto porque todos os eltrons de valncia esto fortemente presos aos seus tomos, pois fazem parte das ligaes covalentes do material (Fig. 3.3.1-b) e, desse modo, no podem se deslocar pelo mesmo em resposta a um campo eltrico aplicado, pois no h rbitas disponveis na banda de valncia. Porm, para uma temperatura mais elevada (por exemplo, ambiente), a energia trmica recebida pelo cristal quebra ligaes covalentes e eltrons se deslocam para a banda de conduo, deixando

    vacncias na banda de valncia (Fig. 3.3.2-b e c) e possibilitando o silcio conduzir corrente (Fig. 3.3.2-a). Estas vacncias, que se constituem em ligaes covalente incompletas, so chamadas de lacunas ou buracos. A importncia do conceito de lacuna que esta se comporta como um portador de carga comparvel ao eltron livre.

    Como cada eltron que se desloca para a banda de conduo cria uma lacuna na banda de valncia, o par criado chamado par eltron-lacuna. Logo, o aumento de temperatura de um semicondutor provoca um aumento da densidade de pares eltron-lacuna. Assim, devido temperatura, pode-se conseguir um nmero limitado de portadores de carga livres em um semicondutor.

    Enquanto a energia trmica produzir novos pares eltron-lacuna, outros pares desaparecem como resultado de

    recombinaes, isto , eltrons livres voltam BV para ocupar uma rbita disponvel (lacuna). Logo, em um semicondutor dito intrnseco, como o caso do dito puro, o nmero de lacunas igual ao de eltrons livres. Sendo n (eltrons livres/cm3) a concentrao de eltrons livres e p (lacunas/cm3) a concentrao de lacunas, tem-se ento que:

    inpn == (3.3.1) onde ni a chamada concentrao intrnseca (concentrao de pares eltron-lacuna num semicondutor intrnseco). Assim, um aumento de temperatura em um semicondutor provoca um aumento em sua concentrao intrnseca. Como a condutividade eltrica , como visto no Captulo 1, proporcional concentrao de eltrons livres (Eq. 1.3.6), a condutividade do semicondutor puro aumenta com o aumento da temperatura (como j dito, seu coeficiente de temperatura da resistividade negativo), devido ao aumento na sua concentrao intrnseca. Tal comportamento expresso pela seguinte equao:

    TKE

    oiB

    GO

    eTAn= 32 (3.3.2)

    onde Ao (cm-6 K-3) uma constante do material independente da temperatura, EGO (eV) a largura da banda proibida a 0 K (ou a energia necessria para desfazer a ligao covalente) e KB (eV/K) a constante de Boltzmann.

    Na temperatura ambiente, um cristal de silcio puro praticamente no tem portadores livres se comparado ao de germnio. Esta a razo principal que fez o silcio tornar-se superior ao germnio na fabricao de componentes semicondutores, pois significa que o silcio tem menor dependncia da temperatura em relao ao germnio.

    Fig. 3.3.1: Conduo no silcio puro a 0 K: (a) circuito; (b) bandas de energia.

    energia

    BV

    BC

    1o B

    2o B

    bandas totalmente preenchidas

    silcio puro a T = 0 K

    metal

    I = 0

    (a) (b) VS

    Fig. 3.3.2: Silcio puro temperatura ambiente: (a) fluxo de eltrons; (b) bandas de energia; (c) cristal de silcio com ligao covalente desfeita.

    +4 +4

    +4

    +4

    +4 ligao covalente desfeita

    eltron livre

    lacuna

    silcio puro a T > 0 K

    movimento dos eltrons

    (a) (b) (c)

    1o B

    par eltron-lacuna

    eltron livre

    lacuna

    energia

    2o B

    BV

    BC

    VS

    I 0

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

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    As lacunas em um semicondutor tambm produzem corrente. Seja um bloco de silcio temperatura ambiente submetido a uma ddp, que gera um campo eltrico em seu interior. Atravs dos eltrons livres originados por quebra das ligaes covalentes pela energia trmica, haver uma conduo de corrente na banda de conduo que se assemelha conduo nos metais. As lacunas tambm se locomovem devido a esta ddp, porm em sentido contrrio.

    Seja uma lacuna criada por energia trmica, representada na Fig. 3.3.3-a com a letra A. Quando uma ligao

    est incompleta de modo a existir uma lacuna, apenas uma pequena variao de energia fornecida por um campo eltrico pode fazer um eltron de um tomo de valncia vizinho (representado em B) deslocar-se para esta lacuna e deixar sua ligao covalente incompleta em B, gerando uma lacuna. Logo, o mesmo pode acontecer ao eltron em C que, ao preencher a lacuna em B, cria uma lacuna em C e assim sucessivamente. Desse modo, as lacunas se movem no sentido contrrio aos dos eltrons da BV (Figs. 3.3.3-b e c). Portanto, as lacunas, no lugar dos eltrons da BV, podem ser tratadas como partculas clssicas de carga positiva e, assim como os eltrons da BC, tambm consideradas portadores de carga livres. Tal comportamento das lacunas pode ser verificado pelo Efeito Hall, visto mais adiante.

    Assim, pelo fato de haver lacunas nas rbitas de valncia, h dois percursos ao longo do qual os eltrons podem se deslocar dentro do cristal: bandas de valncia e conduo (Figs. 3.3.3-a e b), com as lacunas no sentido contrrio (Fig. 3.3.3-c). Portanto, entende-se que o semicondutor possui dois tipos de portadores de carga e oferece dois trajetos de corrente para os mesmos: um atravs da banda de conduo, formado pelos eltrons livres, e outro atravs da banda de valncia, formado pelas lacunas. Este o principal motivo dos semicondutores serem diferentes dos metais.

    Como visto no Captulo 1, a densidade de corrente de conduo J em um material condutor proporcional ao campo eltrico E aplicado ao mesmo, isto , J = E, onde a condutividade do material. Como tanto os eltrons como as lacunas contribuem para o processo da conduo em um semicondutor, a expresso da condutividade para estes materiais a uma temperatura acima de 0 K ampliada de modo a contemplar ambos os portadores, ou seja:

    )/()( mSpneepen pnpn +=+= (3.3.3) onde o sinal de soma dos produtos das concentraes de eltrons livres (n) e lacunas (p) com as mobilidades dos eltrons livres (n) e lacunas (p) devido ao fato que os portadores movem-se em sentidos contrrios mas possuem cargas opostas. A expresso da densidade de corrente de conduo agora expressa por:

    )/()( 2mAEpneJEJ pn +== (3.3.4) mas, como nos semicondutores intrnsecos, n = p = ni (Eq. 3.3.1), tm-se ento que:

    )/() () ( 2ii mAEneJne pnpn +=+= (3.3.5) A Tab. 3.3.1 a seguir mostra algumas propriedades do silcio puro. PROPRIEDADE VALOR PROPRIEDADE VALORnmero atmico 14 concentrao de tomos do cristal (cm-3) 5 x 1022

    massa especfica (g/cm3) 2,33 constante de difuso de eltrons livres Dn a 300 K (cm2/s) 34 constante Ao (cm-6 K-3) 5,23 x 1035 constante de difuso de lacunas Dp a 300 K (cm2/s) 13 EGO (EG a 0 K) em eV 1,21 mobilidade das lacunas - p a 300 K (cm2/V s) 500 EG a 300 K em eV 1,12 mobilidade dos eltrons - n a 300 K (cm2/V s) 1300 constante dieltrica 11,9 concentrao intrnseca ni a 300 K (cm-3) 1,5 x 1010

    Tab. 3.3.1: Algumas propriedades do silcio puro Observa-se pela Tab. 3.3.1 que a densidade (concentrao) de tomos por cm3 no silcio da ordem de 1022,

    mas temperatura ambiente (300 K) a concentrao intrnseca de portadores ni da ordem de 1010 portadores livres por cm3. Isto significa dizer que apenas um tomo de silcio em cada 1012 tomos do material contribui com um eltron livre (e, conseqentemente, uma lacuna). Desse modo, esta concentrao intrnseca de portadores mais prxima da que se verifica num isolante. Tal fato pode ser verificado pela grande resistividade do silcio puro na temperatura ambiente, calculada a seguir:

    Fig. 3.3.3: (a) diagrama de energia da corrente de lacunas; (b) e (c) dois trajetos para a corrente.

    A B C D

    BV

    BC

    energia

    - - - - - - - - - - - - - -

    eltrons da BV

    eltrons da BC

    - - - - - - - + + + + +

    lacunas na BV

    eltrons da BC

    (a) (b) (c) VS VS

    E

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    40

    mm

    mScmS

    ne

    KK

    K

    KpKnKK

    =====

    +=+=

    230023141032,4

    11:Logo

    /1032,4/1032,4

    )5001300(105,1106,1)(:Da

    4300

    300

    46300

    1019300300300i300

    3.3.5Eq.

    Por estes clculos verifica-se, ento, que a resistividade do silcio puro na temperatura ambiente (300K) bem elevada. Este problema exemplificado de outra maneira no exerccio a seguir. EXERCCIO 3.3.1: Seja uma barra de silcio puro de comprimento 5 mm e 0,01 mm2 de seo transversal. Determine a ddp entre as suas extremidades quando no mesmo se mede uma corrente de 1A a 300 K.

    SOLUO Seja Rb,300 K a resistncia CC da barra de silcio a 300 K. Do Captulo 1, sabe-se que: Rb,300 K = 300K l/A, onde,

    do clculo acima, 300K = 2300 m e, do problema, que l = 5 mm = 5 x 10-3 m e A = 0,01 mm2 = 10-8 m2. Seja Vb a ddp nos terminais da barra e I = 10-6 A sua corrente. Aplicando a Lei de Ohm na barra, tem-se ento:

    VVb 1150====

    683

    300300, 10101052300I

    AlVIRV KbKbb

    O resultado obtido neste exemplo indica que ser necessria uma tenso extremamente elevada (1150 V) para

    produzir uma pequena corrente (1 A) no silcio. Assim, para a maioria das aplicaes, em um semicondutor intrnseco no h portadores de carga livres nem causas suficientes para produzir uma corrente utilizvel. A soluo consiste, ento, em elevar a condutividade do semicondutor intrnseco, introduzindo-se no mesmo, tomos de certas impurezas para aumentar a quantidade de um dos tipos de portadores livres. Tal assunto visto a seguir.

    3.4) O SEMICONDUTOR EXTRNSECO Quando em um cristal semicondutor puro so introduzidas impurezas tal que produza um predomnio de um

    portador de carga, este passa a ser denominado semicondutor extrnseco. Este expediente, chamado dopagem, tem a funo de aumentar a condutividade do material semicondutor puro e diminuir sua dependncia com a temperatura. A dopagem consiste na introduo, por processo tecnolgico delicado e sofisticado, de tomos de impurezas com teor cuidadosamente controlado para produzir a perfeita difuso destas impurezas no semicondutor.

    As impurezas so tomos trivalentes ou pentavalentes que, quando introduzidas, estabelecem um semicondutor com predomnio de uma espcie de portador de carga, eltron livre ou lacuna. Para o silcio, o nvel usual de dopagem da ordem de 1 tomo de impureza por 106 a 108 tomos de silcio. Assim, a maioria das propriedades fsicas e qumicas so essencialmente as do silcio e apenas suas propriedades eltricas mudam acentuadamente.

    De acordo com as impurezas dopadas no semicondutor intrnseco, obtm-se os semicondutores extrnsecos denominados tipo P (predomnio de lacunas) e tipo N (predomnio de eltrons livres), vistos a seguir.

    3.4.1) SEMICONDUTOR TIPO N

    Dopando-se tomos pentavalentes (tomos com 5 eltrons na banda de valncia) em um cristal de silcio

    intrnseco, pode-se aumentar o nmero de eltrons na banda de conduo deste material. Isto acontece porque o tomo de impureza pentavalente forma quatro ligaes covalentes com quatro tomos de silcio vizinhos, atingindo oito eltrons na sua banda de valncia e se tornando estvel. Como a banda de valncia est totalmente ocupada, o quinto eltron do tomo pentavalente pode, ento, percorrer uma rbita disponvel na banda de conduo (Fig. 3.4.1-a).

    Os tomos pentavalentes so chamados freqentemente de impurezas doadoras ou tipo N porque eles produzem eltrons na banda de conduo. Exemplo de impurezas doadoras so o arsnio (As), o antimnio (Sb) e o fsforo (P).

    Quando impurezas doadoras so adicionadas a um semicondutor intrnseco, nveis de energia permitidos so introduzidos bem prximos da banda de conduo (Fig. 3.4.1-b). O quinto eltron do tomo pentavalente pode, ento, ocupar este nvel. Como a energia necessria para retir-lo do tomo, da ordem de 0,05 eV no silcio, bem menor que a requerida para desfazer a ligao covalente ( 1,1 eV), o mesmo pode facilmente ser ionizado.

    O silcio dopado com doadores , dessa forma, conhecido como semicondutor tipo N. As impurezas tipo N no s aumentam o nmero de eltrons livres como faz decrescer a quantidade de lacunas que havia no semicondutor intrnseco, porque h uma maior taxa de recombinao devido maior presena de eltrons livres. Devido a este fato, em semicondutores tipo N chama-se os eltrons livres de portadores majoritrios e as lacunas de portadores minoritrios. A Fig. 3.4.1-c mostra as bandas de energia de um cristal dopado com impureza doadora. Nota-se, ento, um grande nmero de eltrons na banda de conduo, produzido principalmente pela dopagem, e um nmero comparativamente bem menor de lacunas na banda de valncia, criadas pela energia trmica.

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    41

    3.4.2) SEMICONDUTOR TIPO P Dopando-se tomos trivalentes (tomos com trs eltrons na BV) em um cristal de silcio intrnseco, pode-se

    aumentar o nmero de lacunas na BV deste material. Isto porque o tomo de impureza trivalente forma trs ligaes covalentes com trs tomos de silcio vizinhos, atingindo sete eltrons na BV. Logo, resta uma ligao covalente incompleta, ou seja, h a ausncia de um eltron (Fig. 3.4.2-a), o que se constitui numa lacuna.

    Os tomos trivalentes so chamados freqentemente de impurezas aceitadoras ou tipo P, porque produzem lacunas na banda de valncia. Exemplo de impurezas aceitadoras so o alumnio (Al), o boro (B) e o glio (Ga).

    Quando impurezas aceitadoras so adicionadas ao semicondutor intrnseco, nveis de energia so introduzidos bem prximos da banda de valncia (Fig. 3.4.2-b). Visto que pequena quantidade de energia necessria para um eltron deixar a BV e ocupar este nvel aceitador (0,05 eV para o silcio), segue-se que as lacunas gerada na BV por esses eltrons constituem o maior nmero de portadores no material semicondutor.

    O silcio dopado com aceitadores , dessa forma, conhecido como semicondutor tipo P. As impurezas tipo P tambm no s aumentam o nmero de lacunas como faz decrescer a quantidade de eltrons livres existentes no semicondutor intrnseco, pois h tambm uma maior taxa de recombinao devido maior presena de lacunas. Logo, em semicondutores tipo P chama-se os eltrons livres de portadores minoritrios e as lacunas de portadores majoritrios. A Fig. 3.4.2-c mostra as bandas de energia de um cristal dopado com impureza aceitadora. Nota-se, ento, um grande nmero de lacunas na banda de valncia, produzido principalmente pela dopagem, e um nmero comparativamente bem menor de eltrons livres na banda de conduo, criadas pela energia trmica. 3.4.3) RESISTNCIA DE CORPO

    A resistncia de um semicondutor chamada resistncia de corpo. Ela obedece a Lei de Ohm, isto , a tenso

    aplicada mesma proporcional corrente eltrica que a percorre, atravs de uma constante dependente da temperatura, que sua resistncia. Como, quanto maior a dopagem, mais portadores livres so criados, ento tem-se que a resistncia de corpo do semicondutor extrnseco diminui com a dopagem.

    Fig. 3.4.2: Cristal tipo P de silcio: (a) criao de lacunas na rede cristalina do silcio; (b) bandas de energia; (c) predominncia de lacunas em relao aos eltrons livres gerados por efeito trmico.

    +3 +4

    +4

    +4

    +4 on trivalente energia

    BV

    BC

    EG 0,05 eV

    nvel de energia aceitador

    energia

    BV

    BC

    eltron livre

    lacuna (a) (b) (c)

    lacuna ligao covalente no completada

    Fig. 3.4.1: Cristal tipo N de silcio: (a) criao de eltrons livres na rede cristalina do silcio; (b) bandas de energia; (c) predominncia de eltrons livres em relao s lacunas geradas por efeito trmico.

    +5 +4

    +4

    +4

    +4 eltron livre

    on pentavalente

    energia

    BV

    BC

    EG

    0,05 eV

    nvel de energia doador

    energia

    BV

    BC

    eltron livre lacuna

    (a) (b) (c)

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    42

    3.4.4) LEI DA AO DE MASSAS Pelo exposto anteriormente nota-se que, adicionando-se impurezas tipo N, esta decresce o nmero de lacunas e,

    de maneira anloga, adicionando-se impurezas tipo P, esta diminui o nmero de eltrons livres abaixo da existente em um semicondutor puro. Porm, em condies de equilbrio trmico, isto , de criao de pares eltron-lacuna constante, verifica-se por anlise terica que, qualquer que seja a dopagem, o produto das concentraes de cargas livres (eltrons n e lacunas p) sempre igual ao produto das concentraes de cargas livres do semicondutor puro, isto , igual ao quadrado da concentrao intrnseca ni (pois, como visto, n = p = ni para o semicondutor intrnseco). Logo, o produto das concentraes de cargas livres uma constante independente da quantidade da dopagem de impurezas doadoras ou aceitadoras. Esta relao chamada Lei da Ao de Massas, sendo definida, ento, por:

    2inpn = (3.4.1)

    onde a concentrao intrnseca ni , como visto, funo da temperatura (Eq. 3.3.2). Esta sentena vlida, portanto, tambm para qualquer semicondutor intrnseco (por exemplo, o puro), pois n = p = ni para este semicondutor.

    Logo, nos semicondutores extrnsecos tem-se que n p, pois h predominncia de um dos tipos de portadores de carga (eltrons livres nos semicondutores tipo N e lacunas nos tipo P), mas o produto das concentraes obedece a Lei da Ao de Massas. Contudo, como ser visto a seguir com a definio das concentraes de portadores em um semicondutor extrnseco atravs da Lei da Neutralidade de Carga, a predominncia de um tipo de portador far com que a dopagem de um semicondutor extrnseco aumente bastante sua condutividade, pois passa a ter concentrao de portadores mais prxima dos condutores, mesmo obedecendo a Lei da Ao de Massas.

    3.4.5) CONCENTRAO DE PORTADORES EM SEMICONDUTORES EXTRNSECOS

    Seja um cristal semicondutor isolado e uniformemente dopado com ND tomos doadores e NA tomos aceitadores. Logo, tem-se que ND (tomos/cm3) a concentrao de tomos doadores e NA (tomos/cm3) a concentrao de tomos aceitadores do semicondutor. Aps um tomo doador ceder um eltron, este se torna um on positivo, assim como, aps um tomo aceitador receber um eltron, este se torna um on negativo. Para temperaturas normais de uso (em torno de 300 K) estas impurezas esto praticamente ionizadas, e produzem, ento, uma densidade ND de ons positivos e uma densidade NA de ons negativos. Porm, um cristal isolado deve manter sua neutralidade eltrica e, assim, deve-se ter que a concentrao de cargas positivas totais (lacunas + ons positivos) deve igualar-se concentrao de cargas negativas totais (eltrons livres + ons negativos), ou seja:

    )( 3+=+ cmnNpN AD (3.4.2) Como em um semicondutor extrnseco, n p, adicionar-se- os ndices N e P para caracterizar o tipo de

    material. Logo, a Eq. 3.4.2 reescrita para cada tipo de semicondutor extrnseco: )( 3+=+ cmnNpN NAND (3.4.3)

    para o semicondutor tipo N. Para o semicondutor tipo P ser: )( 3+=+ cmnNpN PAPD (3.4.4)

    Considere-se agora um material tipo N. Como nesse tipo de semicondutor no h impurezas aceitadoras (NA = 0) e o nmero de eltrons livres muito maior que a quantidade de lacunas (nN >> pN ), a Eq. 3.4.3 reduz-se a:

    DN Nn (3.4.5) isto , num material tipo N, a concentrao de eltrons livres aproximadamente igual concentrao de tomos doadores. A concentrao de lacunas no material tipo N pode, ento, ser obtida pela Lei da Ao de Massas, ou seja:

    DN

    NNNN N

    np

    nn

    pnpnnpn2i

    2i2

    i2i ou ==== (3.4.6)

    Logo, como nN >> pN , tem-se que as expresses da condutividade eltrica (Eq. 3.3.3) e da densidade de corrente de conduo (Eq. 3.3.4) para o material tipo N passam a contemplar apenas os eltrons livres, isto :

    EneJne nNnnNn == e (3.4.7) onde n a condutividade eltrica do material tipo N e Jn a densidade de corrente de conduo de eltrons livres.

    Analogamente, para um semicondutor tipo P, onde ND = 0 e pP >> nP , tem-se, da Eq. 3.4.4, que: AP Np (3.4.8)

    e desse modo, pela Lei da Ao de Massas, a concentrao de eltrons livres no material tipo P ser:

    AP

    PP N

    nn

    pn

    n2i

    2i ou == (3.4.9)

    Como pP >> nP, tem-se neste caso que as expresses da condutividade eltrica (Eq. 3.3.3) e da densidade de corrente de conduo (Eq. 3.3.4) para o material tipo P passam a contemplar apenas as lacunas, isto :

    EpeJpe pPppPp == e (3.4.10)

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    43

    onde p a condutividade eltrica do material tipo P e Jp a densidade de corrente de conduo de lacunas. O exemplo a seguir mostra a eficcia dos semicondutores extrnsecos nos dispositivos eletrnicos. Neste

    exemplo ser considerada uma amostra tipo N com iguais dimenses e mesma corrente eltrica que se considerou no silcio puro mostrado no exerccio 3.3.1.

    EXERCCIO 3.4.1: Uma amostra de silcio tipo N a 300 K, de comprimento 5 mm e 0,01 mm2 de seo transversal, percorrida por uma corrente eltrica de 1 A. A dopagem feita nesta amostra de 1 tomo de impureza doadora por 108 tomos de silcio. Determine a ddp na amostra.

    SOLUO Da Tab. 3.3.1 tem-se que a concentrao de tomos do cristal de silcio de 5 x 1022 tomos/cm3. Como a dopagem

    feita no material consiste em 1 tomo de impureza por 108 tomos de silcio, ento a concentrao de tomos doadores ser de 5 x 1014 tomos/cm3, isto : ND = 5 x 1014 tomos/cm3. Logo: - Da Eq. 3.4.5: nN = 5 x 1014 eltrons livres/cm3

    - Da Eq. 3.4.6: ( )

    35

    14

    2102i 105,4

    105105,1

    cmlacunas

    nn

    pN

    N ===

    onde ni a 300 K 1,5 x 1010 portadores/cm3 (Tab. 3.3.1). Observando-se que nN >> pN, pode-se entender que a condutividade depender apenas da concentrao de eltrons

    livres. Considerando constante o valor da mobilidade dos eltrons (n) a 300 K, dado na Tab. 3.3.1, tem-se:

    mmScmS

    ne

    KnKn

    KnNKn

    =====

    09615,0/4,10/104,0

    1300105106,1:.4.73Eq.Da-

    300,300,

    1419300,300,

    Pode-se observar que a condutividade desta amostra consideravelmente maior que a do silcio puro calculado anteriormente (4,32 x 10 -4 S/m). A razo entre ambos de:

    240001032,44,10

    )intrnsecaamostra()extrnsecaamostra(

    4300

    300, = n

    Utilizando-se a Lei de Ohm para o clculo da ddp na amostra de silcio tipo N, tem-se: VmVb 48,1====

    6

    8

    3

    300,300, 1010

    10509615,0IAlVIRV KnbKbb

    Este resultado muito menor que o obtido para a amostra pura, pois, como as dimenses da mesma e condio de corrente so iguais s do Exerccio 3.3.1, tem-se que a razo entre os mesmos de:

    240000481,0

    1150)extrnsecaamostra()intrnsecaamostra( =

    ddpddp

    A comparao deste resultado com o obtido no Exerccio 3.3.1 mostra que, para se gerar uma pequena corrente

    de 1 A deve-se aplicar 1150 V amostra pura, enquanto que a amostra extrnseca tipo N requer apenas 48,1 mV. Alm disso, como demonstrada no exemplo, esta reduo de tenso, num fator de 24000, iguala exatamente ao acrscimo na condutividade. Logo, o enorme aumento da quantidade de eltrons livres, n = ni = 1,5 x 1010 cm-3 do semicondutor intrnseco a 300 K (Tab. 3.3.1) para nN = 5 x 1014 cm-3 obtido neste exemplo, acontece quando apenas 1 tomo de silcio em 108 tomos substitudo por um tomo de impureza. Comentrio: Se em um cristal tipo P, com concentrao NA de tomos aceitadores, for acrescentada ND impurezas doadoras, tal que ND > NA , o cristal passa de tipo P para tipo N e vice-versa. Se ambas as dopagens forem iguais, o semicondutor permanece intrnseco (porm no mais puro) porque eltrons livres e lacunas gerados pela dopagem se combinam, no originando portadores adicionais. Logo, sobre uma amostra de determinado tipo, pode-se criar ilhas do outro tipo e assim sucessivamente. Este fato amplamente aproveitado na construo dos circuitos integrados. 3.4.6) VARIAES DE PROPRIEDADES COM A TEMPERATURA DEVIDO DOPAGEM

    Como visto, a condutividade de um semicondutor depende da concentrao e da mobilidade dos eltrons e

    lacunas. Logo, o estudo das variaes destes parmetros com a temperatura em semicondutores extrnsecos importante porque os dispositivos semicondutores sujeitam-se a uma vasta gama de temperaturas de operao: 1) Concentrao intrnseca ni : atravs da equao da concentrao intrnseca (Eq. 3.3.2), nota-se que o aumento de

    ni2 com a temperatura tambm exerce efeito sobre as densidades de carga nos semicondutores extrnsecos por causa da Lei da Ao de Massas (Eq. 3.4.1). Por exemplo, considere-se uma amostra tipo N com uma concentrao de doadores ND. Neste semicondutor, quase todos os portadores de carga so eltrons livres (portadores majoritrios) porque as impurezas tipo N contribuem aproximadamente com todos os portadores de carga (eltrons livres). Quando esta amostra submetida a um aumento de temperatura, a energia trmica cria

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    44

    pares eltron-lacuna, o que ocasiona um aumento substancial no nmero de lacunas (portadores minoritrios), mas no de eltrons livres. Como a concentrao intrnseca ni depende deste aumento de temperatura, o aumento em ni devido aos portadores minoritrios (lacunas - pN) pois o nmero de eltrons livres (nN) permanece praticamente constante (nN ND), obedecendo a Lei da Ao de Massas. Analogamente, nos semicondutores tipo P, pequenas subidas de temperatura elevam nP e verifica-se que pP NA permanece constante.

    2) Mobilidade dos portadores de carga (n e p): a elevao da temperatura (aumento da energia trmica) cria novos portadores e aumenta a agitao trmica, o que origina um maior nmero de colises, com conseqente diminuio das mobilidades dos portadores de carga. Tipicamente, para uma variao da temperatura entre 100 e 400 K, a variao das mobilidades dos eltrons livres (n) proporcional a T -2,5 e, das lacunas (p), T -2,7.

    3) Condutividade (): a condutividade de um semicondutor puro cresce com o aumento da temperatura porque o incremento de pares eltron-lacuna maior que a diminuio das mobilidades. Nos semicondutores extrnsecos, porm, na faixa de temperaturas entre 100 e 600 K, a quantidade de portadores majoritrios , como visto, praticamente constante devido dopagem, mas a reduo da mobilidade origina um decrscimo da condutividade com a temperatura. A dopagem, portanto, faz o semicondutor extrnseco adquirir caractersticas de temperatura mais prxima dos materiais condutores, pois, como visto no Captulo 1, a condutividade aumenta para materiais isolantes e diminui para materiais condutores.

    3.4.7) O EFEITO HALL

    Chama-se Efeito Hall o fenmeno do aparecimento de um campo eltrico induzido E quando um metal ou semicondutor, conduzindo uma corrente eltrica I, imerso em um campo magntico de induo B uniforme e transversal corrente I. Esse campo eltrico surge perpendicularmente ao plano B-I e tem como finalidade restabelecer o estado de equilbrio que foi alterado pela ao das linhas de induo sobre o fluxo de portadores. O surgimento deste campo eltrico discutido a seguir:

    Da Eletrodinmica sabe-se que, quando uma carga q em movimento com velocidade v atravessa um campo

    magntico uniforme de induo B transversal a v, surge uma fora magntica Fmag na carga proporcional ao produto vetorial entre v e B e perpendicular ao plano v-B. Seja, ento, uma amostra de material condutor percorrida, no sentido convencional, por uma corrente I na direo positiva do eixo x e mergulhada em um campo magntico de induo B na direo positiva do eixo y (Fig. 3.4.3-a). Desse modo, os portadores de carga do condutor estaro sujeitos a uma fora magntica Fmag . Como em condutores a corrente formada por eltrons livres, cujo sentido contrrio ao convencional, e, sendo q = carga do eltron = - e, o sentido da fora magntica Fmag nos portadores de carga o mostrado na Fig. 3.4.3-a (sentido positivo do eixo z). A fora magntica provoca, ento o deslocamento dos eltrons para a face 2 da amostra, deixando a face 1 carregada positivamente. Esta separao de cargas opostas origina uma diferena de potencial VH , como resultado de um campo eltrico E que surge entre as cargas (Fig. 3.4.3-a). O surgimento do campo eltrico chamado Efeito Hall, sendo a ddp VH conhecida como tenso ou fem de Hall.

    Como nos semicondutores tipos P e N os portadores majoritrios (lacunas e eltrons livres, respectivamente) tm sinais contrrios, o Efeito Hall pode ser empregado na determinao do tipo de semicondutor . Seja, ento, uma amostra de material semicondutor de tipo desconhecido, atravessada por uma corrente I no sentido positivo de x e colocada em um campo magntico de induo B no sentido positivo de y. Assim, analisando-se as Figs. 3.4.3 -b e c observa-se que seus portadores de carga estaro sujeitos a uma fora magntica no sentido positivo de z, independentemente da amostra ser tipo N ou P, isto , independente do tipo de portador de carga que compe a corrente no semicondutor. Logo, atravs da ddp de Hall entre as faces 1 e 2 nas amostras se conclui que: Se a polaridade da tenso de Hall VH positiva na face 1 em relao face 2, ento os portadores de carga so

    eltrons livres, o que identifica a amostra de material semicondutor como sendo do tipo N (Fig. 3.4.3-b). Nota-se que este caso similar ao que ocorre em um condutor (Fig. 3.4.3-a).

    Fig. 3.4.3: Efeito Hall em: (a) condutores; (b) amostra tipo N; (c) amostra tipo P.

    (a) (b) (c)

    Fmag = -e (- vr

    ) x Br

    = e vr x Br

    z

    x

    y

    VH

    face 1

    face 2

    SC Tipo N I

    B E

    v

    Fmag = e vr

    x Br

    z

    x

    y

    VH

    face 1

    face 2

    SC Tipo P I

    B E

    v

    lacunaFmag = -e (- vr

    ) x Br

    = e vr x Br

    z

    x

    y

    VH face 1

    face 2

    I

    BE

    v d

    w

    (corrente formada majoritariamente por eltrons livres)

    Condutor

    (corrente formada majoritariamente por lacunas)

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    45

    Se a polaridade de VH positiva na face 2 ento os portadores de carga so lacunas, o que identifica a amostra como sendo do tipo P (Fig. 3.4.3-c) e confirma ainda o fato indicado no item 3.3 de que a lacuna se comporta como um clssico portador de carga livre positivo.

    O mdulo do campo eltrico E criado devido ao Efeito Hall pode ser dado por: E = VH /d. Para o equilbrio das cargas nas faces opostas, este campo eltrico deve submeter estas cargas a uma fora eltrica Fel para contrabalanar a fora magntica Fmag, tal que: Fel = Fmag e E = e v B v = E/B = VH /(d B). Atravs da definio da densidade de corrente J, vista no Captulo 1 (J = n e v = I/A, onde A = w d para este caso), e, com base na Fig. 3.4.3-b, tem-se que:

    H

    H

    VweIBn

    dwI

    BdV

    endw

    IvenJ ==== Sabendo-se o valor de w e medindo-se os parmetros I, B e VH , pode-se, ento, calcular o valor da concentrao da carga n na amostra. Se a condutividade do material da amostra tambm for determinada, atravs do simples emprego da relao = l/(R A), onde R a resistncia da amostra, l seu comprimento e A = w d a rea da seo transversal corrente, pode-se determinar tambm a mobilidade n das cargas pela relao: n = / (n e). 3.5) DISPOSITIVOS SEMICONDUTORES PUROS

    Como visto anteriormente, a condutividade de um semicondutor proporcional concentrao de portadores livres (Eq. 3.3.3) e, ainda, que a mesma pode ser aumentada pelo acrscimo destes portadores. No entanto, devido excessiva sensibilidade temperatura do semicondutor puro (por exemplo, a condutividade do silcio puro aumenta aproximadamente 8% por grau de temperatura), acrescido ao fato da mobilidade dos eltrons livres ser maior que a de lacunas (vide Tab. 3.3.1 para o silcio), no indica o material puro como um bom elemento para o emprego direto nos circuitos eletrnicos. Isto porque necessita-se de ter o maior controle possvel sobre a corrente que flui nos circuitos de modo a no haver mudanas na sua performance esperada, problema que pode se potencializar se a condutividade dos materiais componentes de um circuito se alterar demasiadamente com a temperatura.

    Porm, uma exceo feita em circuitos de controle, onde se deseja utilizar componentes sensores constitudos de materiais em que alguma de suas propriedades fsicas alterada por ao de alguma varivel fsica externa. Como para se alterar o nmero de pares eltron-lacuna em um semicondutor pode-se utilizar a variao da temperatura (energia trmica) e mesmo a iluminao sobre o mesmo (energia luminosa), os semicondutores puros so, ento, explorados em certos dispositivos tipo transdutores. Estes dispositivos so chamados de termistores (sensveis ao da temperatura) e fotocondutores (sensveis ao da luz), sendo estes ltimos tambm chamados de fotorresistores. Dessa forma, as propriedades dos semicondutores puros se constituem numa vantagem nestas aplicaes.

    Tanto o germnio, quanto o silcio no so utilizados na tecnologia destes componentes porque ambos possuem impurezas naturais de difcil extrao, sendo bastante dispendiosa sua purificao a um nvel satisfatrio, e porque h outros semicondutores com maior sensibilidade e capacidade de corrente. 3.5.1) TERMISTORES

    Termistores semicondutores (smbolo esquemtico na Fig. 3.5.1-a) so componentes que se comportam como resistores variveis com a temperatura. So normalmente do tipo NTC, com variao da resistncia da ordem de 3% por oC, sendo muito maiores que os dos metais. So, por isso, usados como sensores trmicos ou para compensar variaes de temperatura em circuitos. So considerados transdutores do tipo que converte energia trmica em eltrica. Termistores so obtidos de xidos metlicos tais como de nquel, mangans, cobre, zinco, etc, que fornecem produtos com condutividades que crescem rapidamente com a temperatura.

    Um exemplo do emprego dos termistores na estabilizao do ponto de operao de um circuito submetido a grandes variaes de temperatura ambiente, tais como circuitos eletrnicos que empregam componentes semicondutores, estes bastante sensveis a variaes de temperatura. So empregados em srie com estes circuitos (Fig. 3.5.1-b) para se obter uma ao compensadora que neutralize os efeitos da variao trmica ambiente. Se necessrio, utiliza-se ainda um resistor em paralelo com o termistor (Fig. 3.5.1-b), para ajustar o coeficiente de temperatura do termistor de acordo com o do circuito a ser compensado. A Fig. 3.5.1-c mostra a ao do ajuste de um paralelo termistor-resistncia.

    Os termistores so utilizados tambm como sensores de temperatura em termometria. Duas aplicaes so:

    Fig. 3.5.1: (a) smbolo esquemtico do termistor; (b) compensao trmica de um circuito; (c) exemplo de caracterstica resistncia versus temperatura de um paralelo termistor-resistncia.

    T

    -10 10 30 50 T(oC)

    200 100

    curva do termistor isolado

    curva do paralelo

    termistor- resistncia

    R ()

    (a) (b) (c)

    T Rparal.

    calor

    circuito eltrico

    a ser compensado

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    46

    Em rels de proteo de motores. O aquecimento de motores tem correlao com a corrente admissvel, atravs do Efeito Joule. Desse modo, em caso de sobrecorrente no motor, o sobreaquecimento resultante permite ao termistor interpretar esta condio adversa e, se necessrio, comandar um circuito eltrico capaz de desligar o motor.

    Para medio e controle automtico de temperatura em fornos, motores a exploso e outros casos. 3.5.2) FOTORRESISTORES

    Fotorresistores ou fotocondutores so componentes semicondutores que diminuem sua resistividade quando incide-se sobre o mesmo uma radiao luminosa. A radiao quebra ligaes covalentes, gerando pares eltron-lacuna em excesso queles gerados termicamente pela temperatura ambiente. Tipicamente, um aumento de iluminamento de alguns lux em um fotocondutor comercial diminui sua resistncia consideravelmente. O fotocondutor consiste, ento, em um transdutor do tipo que converte energia luminosa na forma eltrica. Exemplo de fotocondutor o LDR (light dependent resistor), cujo smbolo esquemtico dado na Fig. 3.5.2.

    Da teoria da Fsica Quntica sabe-se que a relao entre o comprimento de onda (m ou ) e a freqncia f (Hz) de uma onda de radiao eletromagntica dada por:

    cf = (3.5.1) onde c = 299,79 x 106 m/s 3 x 108 m/s a velocidade da onda eletromagntica no vcuo. Sabe-se tambm que, para um fton de energia Ef (eV), seu comprimento de onda () pode ser expresso por:

    fE12400= (3.5.2)

    e que a energia mnima de um fton, necessria para a excitao de um eltron da banda de valncia de certo material, a energia do gap EG do material. Logo, o comprimento de onda limite C para excitar um eltron da banda de valncia de certo material ser dada por: C = 12400/EG . Assim, se o comprimento de onda da radiao excede C ento a energia do fton menor que EG e tal fton no desloca um eltron de valncia para a banda de conduo, pois, como Ef = 12400/, se > C, ento Ef < EG . Por este motivo, C chamado comprimento de onda crtico, de corte ou limiar superior do material. Por exemplo, para o silcio, EG = 1,12 eV a 300 K (Tab. 3.3.1) e, portanto, C 11071 (faixa do infravermelho, Tab. 3.5.1). Portanto, pode se dizer que um fotocondutor um dispositivo seletivo de freqncia, ou seja, deve existir uma energia mnima da radiao incidente, e por conseguinte do comprimento de onda, que consiga superar o gap EG do material.

    Nomenclatura (m) Nomenclatura () Nomenclatura () energia eltrica 5 x106 infra-vermelho 107 7000 azul 5000 4500

    udio-freqncia 3 x106 1,5 x 104 vermelho 7000 6500 violeta 4500 4000ondas mdias e curtas 600 6 laranja 6500 6000 ultra-violeta 4000 40 FM-TV-VHF-UHF 5 0,5 amarelo 6000 5500 raios X 40 0,1

    microondas 0,5 0,001 verde 5500 5000 raios 0,1 10-3 Tab. 3.5.1: Comprimentos de onda de algumas radiaes eletromagnticas

    A curva de sensibilidade espectral para o silcio plotado na Fig. 3.5.2 (a faixa de comprimento de onda da luz

    visvel indicada pela regio grifada). Observa-se nesta figura que, quando o comprimento de onda diminui ( < C ), a resposta aumenta e atinge um mximo de sensibilidade. Logo, a resposta espectral depende da radiao incidente. Isto significa que uma certa radiao incidente de um determinado comprimento de onda no conseguir gerar o mesmo nmero de portadores de carga livres com uma igual intensidade de luz de outro comprimento de onda.

    Dispositivos fotocondutores comerciais so chamados de clulas fotocondutivas. So utilizados para medir a quantidade de iluminao (como um medidor de luz), para registrar uma modulao de intensidade

    luminosa e ainda como um rel de luz liga-desliga (como em um circuito digital ou de controle). O dispositivo fotocondutor de maior aplicao a clula de sulfeto de cdmio dopada com uma pequena

    quantidade de prata, antimnio ou ndio. As vantagens destes fotocondutores so sua alta capacidade de dissipao (300 mW), excelente sensibilidade no espectro visvel e baixa resistncia quando estimulados pela luz (em escurido, em torno de 2 M e com luz forte, menos de 100 ). Podem, ento, controlar, por exemplo, um circuito de vrios watts operando um rel diretamente, sem circuitos amplificadores intermedirios.

    Outros materiais fotocondutores: sulfeto de chumbo, que apresenta um mximo na curva de sensibilidade em 29000 (sendo, ento, usado para deteco ou medidas de absoro de infravermelho), e selnio, que sensvel em toda faixa do espectro visvel, particularmente perto do azul.

    Fig. 3.5.2: Resposta espectral do silcio.

    Resposta relativa (%)

    4000 8000 11071 ()

    C 0

    25

    50

    75 LDR

    smbolo esquemtico

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    47

    3.6) CORRENTE DE DIFUSO E A JUNO PN

    Como visto no Captulo 1, quando submetidos a uma ddp, os materiais condutores conduzem uma corrente eltrica como resposta ao campo eltrico gerado pela ddp, chamada corrente de conduo. Este tipo de corrente necessita, ento, de um campo eltrico para que possa existir. Nos semicondutores, contudo, o transporte de carga eltrica pode ocorrer por meio de, alm de uma corrente de conduo, tambm atravs de um mecanismo denominado difuso, geralmente no existente nos materiais condutores, e que ocorre devido a uma concentrao no uniforme de portadores de carga livres num material.

    Seja, por exemplo, uma amostra de semicondutor tipo P, onde a concentrao p de lacunas varia com a dimenso x do material (Fig. 3.6.1). Como o vetor gradiente determina o sentido de crescimento de uma funo com a distncia, nesta amostra existe, portanto, um gradiente de concentrao de lacunas dp/dx, que expressa a variao de lacunas ao longo do material, orientado, desse modo, no sentido negativo do eixo x.

    A existncia de um gradiente implica que, numa superfcie imaginria (indicada na Fig. 3.6.1 pela linha tracejada), a densidade de lacunas no material maior imediatamente antes do que imediatamente a seguir desta superfcie. Como portador de carga, as lacunas esto em movimento aleatrio devido a sua energia trmica. Portanto, elas se movimentam de um lado para outro atravs da superfcie. Espera-se ento que, estatisticamente e num intervalo de tempo, haja mais lacunas a atravessar a superfcie do espao de maior concentrao para o de menor concentrao do que em sentido contrrio.

    Devido diferena de concentrao, ocorre, ento, um transporte resultante de lacunas atravs da superfcie no sentido positivo de x, que se constitui na chamada corrente de difuso. Esta corrente no se deve repulso entre cargas de mesmo sinal, mas apenas de um fenmeno estatstico resultado da diferena de concentrao de portadores.

    Seja JDp a densidade de corrente de difuso de lacunas. Esta , ento, proporcional ao gradiente da concentrao dp/dx de lacunas no semicondutor, segundo a relao:

    )/( 2mAdxdpDeJ pDp = (3.6.1)

    onde e a carga do portador (lacuna, e, portanto, positiva) e Dp (m2/s) chamada constante de difuso das lacunas do material. O sinal negativo devido ao fato que o gradiente dp/dx negativo (Fig. 3.6.1), pois tem sentido contrrio direo de x (concentrao p diminui com o aumento de x).

    Analogamente, para uma amostra de semicondutor tipo N onde a concentrao n de eltrons livres varia com a distncia x, a densidade de corrente JDn de difuso dos eltrons livres ser:

    )/( 2mAdxdnDeJ nDn = (3.6.2)

    onde Dn a constante de difuso dos eltrons livres do material, sendo JDn , neste caso, positivo no sentido positivo de x pois a carga e (carga do eltron) e o gradiente de portadores dn/dx so negativos.

    Assim como outras variveis dos semicondutores, as constantes de difuso Dn e Dp dependem da temperatura. Por exemplo, para o silcio a 300 K (Tab. 3.3.1): Dn = 34 x 10-4 m2/s.

    Mobilidade e difuso so fenmenos termodinmicos estatsticos, de modo que as constantes de difuso (Dp e Dn) e as mobilidades das cargas (p e n) no so independentes e esto relacionadas entre si pela Relao de Einstein:

    )(VVDD

    Tn

    n

    p

    p == (3.6.3) onde VT = T/11600 (T = temperatura do material em Kelvins) o chamado potencial termodinmico ou equivalente volt de temperatura do material. Por exemplo, para a temperatura ambiente (300 K), tem-se que VT = 0,0259 V e, desse modo, Dn = 0,0259n e Dp = 0,0259p .

    Como mencionado, os semicondutores podem conduzir dois tipos de corrente: conduo e difuso. Assim, na Eq. 3.6.1 pode-se ainda acrescentar uma parcela referente corrente de conduo, que resultado de um gradiente de potencial no material (o chamado campo eltrico), cuja expresso foi vista na Eq. 3.4.10. Assim, a densidade de corrente total de lacunas Jp em um semicondutor tipo P, orientada na direo positiva do eixo x, agora expressa por:

    )/( 2mAdxdpDeEpeJ ppp = (3.6.4)

    Analogamente, da Eq. 3.4.7 tem-se que a densidade de corrente total de eltrons livres Jn para o tipo N ser:

    )/( 2mAdxdnDeEneJ nnn += (3.6.5)

    Fig. 3.6.1: Representao de uma amostra de tipo P com densidade de lacunas no uniforme.

    0 x

    p (0) p(x)

    JDp densidade de corrente de difuso de lacunas

    dp dx

    x

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    48

    Como visto, a dopagem de lacunas da amostra de semicondutor mostrado na Fig. 3.6.1 a funo da distncia x, isto , a dopagem progressiva (no uniforme), podendo haver, ento, uma corrente de difuso. Logo, pela Lei da Ao de Massas, a densidade de eltrons livres tambm tem de variar com a distncia x.

    Considerando equilbrio trmico e que no h injeo de corrente a partir de fonte externa (amostra isolada), ento, no pode existir um movimento de carga resultante na amostra, havendo somente o movimento aleatrio devido agitao trmica, isto , a corrente total de lacunas tem de ser nula. Porm, com concentrao no uniforme, h a tendncia de ocorrer uma corrente de difuso de lacunas no nula. Assim, para que a corrente total de lacunas seja zero, dever existir uma corrente de lacunas igual e no sentido contrrio (isto , da regio de menor para a de maior concentrao) para anular a corrente de difuso, que, portanto, no pode ser tambm de difuso. Logo, esta corrente contrria deve necessariamente ser de conduo (Fig. 3.6.2). No entanto, para que possa existir, uma corrente de conduo exige, como visto, um campo eltrico, isto , um gradiente de potencial. Pode-se concluir, ento, que, em uma amostra semicondutora de dopagem no uniforme, cria-se um campo eltrico em seu interior (Fig. 3.6.2) e, conseqentemente, uma ddp (gradiente de potencial) entre dois pontos

    quaisquer da amostra, que impede a difuso de lacunas (portadores majoritrios), isto , a referida ddp funcionar como uma barreira de potencial para os majoritrios. Seja, ento, uma amostra de semicondutor isolado com dopagem no uniforme (Fig. 3.6.3), onde a concentrao de lacunas p(x) diminui com a distncia x. Pretende-se agora determinar o campo eltrico criado devido dopagem no uniforme e a correspondente variao de potencial. Como a amostra est isolada (isto , no h movimento preferencial de carga), conclui-se que a densidade de corrente de lacunas tem que ser nula. Assim, fazendo Jp = 0 na Eq. 3.6.4 e usando-se ainda a relao de Einstein (Eq. 3.6.3), obtm-se:

    dxdp

    pV

    E T= (3.6.6) onde o campo eltrico resultante E pode ser determinado se conhecida a concentrao de dopagem p(x). Como o campo eltrico expressa a variao de potencial eltrico V com a distncia x (E = - dV/dx), obtm-se, da Eq. 3.6.6, uma equao que, integrada desde um ponto qualquer x1 , de concentrao p1 e potencial V1 , at um ponto qualquer x2 de concentrao p2 e potencial V2 (Fig. 3.6.3), estabelece:

    ==== 21

    2

    1

    1ppT

    V

    VTT dp

    pVdV

    pdpVdV

    dxdp

    pV

    dxdVE

    TVV

    T eppppVVVV

    21

    212

    12112 ou,ln =

    == (3.6.7)

    onde nota-se que a diferena de potencial entre os dois pontos x1 e x2 depende apenas da concentrao de lacunas nestes dois pontos e independente da distncia entre os mesmos (x2 - x1).

    Analogamente, fazendo-se Jn = 0 na Eq. 3.6.5 e procedendo-se como anteriormente tem-se:

    TVV

    T ennnnVV

    21

    211

    221 ou,ln

    =

    = (3.6.8)

    A multiplicao das Eqs. 3.6.7 e 3.6.8 resulta: n1 p1 = n2 p2. Assim, desde que se mantenha as condies de equilbrio, o produto n p constante e independente de x e do nvel de dopagem (Lei da Ao de Massas.).

    Considere-se agora o caso particular mostrado na Fig. 3.6.4, chamado cristal PN. A regio esquerda do cristal de semicondutor tipo P (chamado agora de substrato ou regio P), com uma concentrao de tomos aceitadores NA uniforme, e a regio direita do tipo N (substrato ou regio N), com uma concentrao de tomos doadores ND tambm uniforme. Nota-se, ento, que a concentrao de portadores livres varia bruscamente do lado P para o lado N na juno dos dois substratos. Esta fronteira entre os substratos recebe a denominao de juno PN (Fig. 3.6.4) e se constitui na chamada juno abrupta.

    Pode-se notar, ento, que este caso particular constitui-se tambm em uma diferena de concentrao de portadores, pois, entre um ponto qualquer x1 no substrato P e um ponto qualquer x2 no substrato N h uma diferena de concentrao de portadores (Fig. 3.6.4), pois, como visto, eltrons livres so portadores minoritrios no lado P e majoritrios no lado N e lacunas so

    Fig. 3.6.3: Semicondutor com distribuio no uniforme de lacunas.

    p1 p2

    V1

    E x2 x1 x V21 p1 > p2

    V2

    dp/dx

    0

    Fig. 3.6.4: O cristal PN.

    juno PN

    substrato P substrato N

    NA ND

    V1 V2 V21 = Vo

    p1 p2

    x1 x2 x

    dx

    dp

    dx

    dV

    corrente de difuso

    corrente de conduo

    campo eltrico criado (barreira de potencial)

    Fig. 3.6.2: Efeitos da dopagem no uniforme.

  • CAPTULO 3: Introduo Teoria dos semicondutores

    49

    majoritrios no lado P e minoritrios no lado N. Portanto, como visto, a teoria mostra que surge uma ddp (barreira de potencial) entre estes dois pontos, agora chamada de potencial de contato Vo.

    Assim, considerando, por exemplo, na Eq. 3.6.7 que p1 = NA (lacuna majoritrio no lado P - Eq. 3.4.8) e que p2 = ni2/ND (lacuna minoritrio no lado N - Eq. 3.4.6), tem-se que o potencial de contato Vo ser dado por:

    == 2

    io21 ln n

    NNVVV DAT (3.6.9)

    Analogamente, para o caso dos eltrons livres, considera-se na Eq. 3.6.8 que n1 = ni2/NA (lado P - Eq. 3.4.9) e que n2 = ND (lado N - Eq. 3.4.5), tem-se que o potencial de contato Vo ser dado por:

    = 2

    io ln n

    NNVV DAT

    que o mesmo resultado da Eq. 3.6.9, como teria de se esperar. Logo, a diferena de concentraes de portadores em um cristal PN provoca uma diferena de potencial Vo

    entre os substratos, que impede, no cristal PN isolado, a difuso de majoritrios atravs da juno PN, isto , funciona como uma barreira do tipo potencial para os majoritrios. Logo, conclui-se ento que os portadores majoritrios s conseguiro se difundir atravs da juno PN se for aplicado uma ddp que vena a barreira de potencial Vo.

    Assim, como ser novamente discutido no Captulo 4, o efeito desta barreira de potencial permite que o cristal PN conduza bem corrente no sentido P N (sentido convencional), porque a corrente resultante ser constituda por portadores majoritrios, e praticamente no o faa no sentido contrrio, porque a corrente resultante ser constituda por portadores minoritrios, ou seja, dependendo de sua polarizao, o cristal PN funciona em dois modos distintos: conduo-no conduo, o que ser chamado de funo retificadora.

    Com este simples efeito, a juno PN tornou-se a base construtiva de quase todos os dispositivos eletrnicos, pois empregada na construo de inmeros componentes e diversos dispositivos semicondutores, tais como diodos e transistores, assuntos discutidos nos prximos captulos, alm de circuitos integrados, tiristores, etc.

    Assim, a condio de equilbrio, definida pelo anulamento da corrente de lacunas ou eltrons livres resultantes, permite calcular o nvel da barreira de potencial Vo em termos das concentraes de doadores e aceitadores, atravs da Eq. 3.6.9, o que exemplificado a seguir.

    EXERCCIO 3.6.1: Calcule o valor da barreira de potencial Vo numa juno PN a 300 K, considerando ambas as regies P e N de silcio com dopagens iguais de 1 tomo de impureza por 108 tomos de silcio.

    SOLUO Da Tab. 3.3.1 tem-se: concentrao intrnseca ni = 1,5 x 1010 portadores/cm3

    concentrao de tomos no cristal de silcio = 5 x 1022 tomos/cm3 Se a dopagem de 1 tomo de impureza para 108 tomos de silcio, ento a concentrao de tomos doadores (para o substrato N) e aceitadores (substrato P) de 5 x 1014 tomos/cm3, ou seja, ND = NA = 5 x 1014 tomos/cm3. Logo, da Eq. 3.6.9 tem-se:

    ( )VV 0,54o

    =

    =

    =

    210

    1414

    2i

    2i

    o105,1

    105105ln11600

    300ln11600

    lnn

    NNTn

    NNVV DADAT

    que um resultado coerente, pois os valores tpicos da barreira de potencial a 300 K para um cristal PN de silcio esto entre 0,5 e 0,7 V (para um cristal PN de germnio, os valores tpicos situam-se em torno de 0,2 V).

    QUESTES 1) Comente sobre os materiais semicondutores em geral. 2) Explique o conceito de lacuna e como ocorre a conduo em um semicondutor. 3) Qual o propsito da dopagem? 4) Comente sobre os semicondutores tipo N e tipo P. 5) Explique a Lei da Ao de Massas. 6) Explique o Efeito Hall e o que se pode determinar com ele. 7) Comente sobre os termistores e os fotocondutores. 8) Explique o mecanismo da difuso de portadores de carga em um semicondutor. 9) Explique o que se configura uma juno PN.