matérias hsm

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uas repórteres de HSM Manage- ment foram a Emeryville, na Califórnia, visitar a sede do estúdio Pixar e nos con- taram, entre outras coisas, que o prédio principal, erguido em 2000, foi inspirado no cérebro humano. Assim como nosso hemisfério direito é o criativo e o esquer- do, o lógico e racional, os escritórios da ala direita abrigam designers e artistas, e os da esquerda, animadores e técnicos. No centro, ficam áreas destinadas a fo- mentar a colaboração espontânea entre os dois grupos, como café, sala de jogos, televisores e loja de presentes. Isso me levou diretamente a um tre- cho da entrevista exclusiva que o neu- rocientista Miguel Nicolelis concedeu a nossa editora-executiva, Adriana Salles Gomes, em que ele diz suspeitar que nosso comportamento social em grupo reflete, de algum modo, a maneira como os neurônios funcionam, como se o mo- delo cerebral fosse escalado para uma unidade maior. No fundo, o que a Pixar fez foi escalar o cérebro literalmente. O CEO do estúdio de Toy Story, Ed Catmull, nos revelou mais um de seus segredos: ir atrás de pessoas talen- tosas e lhes pedir ideias, em vez de ir atrás de ideias, como faz a maioria em Hollywood. Talentos são o mais impor- tante de tudo para Catmull, que prati- ca a sério a meritocracia, como a que Nicolelis diz ser necessária para que a inovação brasileira decole. Segundo o professor da Duke University, aqui, “quando surge um pool de recursos, eles são pulverizados para contentar todo mundo, em vez de concentrados em uma pesquisa que tenha mérito e possa realmente fazer diferença”. O Dossiê que apelidamos de “Neuro- business” nesta edição está interessan- tíssimo ao tratar a neurociência tanto como a segunda chance das empresas (de se humanizarem) quanto como a segunda chance do Brasil (de passar de seguidor mundial a um país que inova e dita regras, por meio da educa- ção científica e de um cluster de neu- rotecnologia). Encho-me de esperança quando vejo um brasileiro com a ambi- ção de um Nicolelis, embora reconheça que, como nossa editora me chamou a atenção, uma nuvem de palavras da conversa com ele destacaria três ter- mos: “dificuldade”, “começo” e “Brasil”. Nicolelis se queixa, por exemplo, do empreendedorismo em nossas terras, muito primitivo comparado ao que en- contra nos Estados Unidos e na Europa, porém ele mesmo vê sinais de avanços. E esses sinais também se espalham por esta revista, desde a reveladora entrevis- ta com Jayme Garfinkel, da Porto Seguro Seguros, até as reportagens sobre nossas startups, nossos pós-empreendedores e a Amil no minidossiê do projeto Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo. Lições adicionais e valiosas de em- preendedorismo vêm de Eric Ries e sua lean startup, dos cases Evernote e Recyclebank, e de Peter Guber, o exe- cutivo por trás da gravadora da banda de rock Kiss e do estúdio de cinema de O Exterminador do Futuro, entre mui- tos sucessos de bilheteria. No raciocínio de Guber, tanto empreender como lide- rar requerem que se seja um talentoso contador de histórias e o primeiro passo para isso, segundo ele, onde a maioria dos homens e mulheres de negócios tro- peça, está em ser um ótimo ouvinte. Há esperança. Marcos Braga PS: Minha nuvem de palavras está no título. Nascida no Brasil em 1987 com o propósito de oferecer conteúdos de excelência na gestão de empresas, a HSM é hoje referência em educação executiva. EXPEDIENTE EDITORIAL DIRETOR-PRESIDENTE Marcos L. de Almeida Braga DIRETOR-EDITORIAL José Salibi Neto CONSELHO EDITORIAL Carlos Alberto Júlio, Philip Kotler, Richard Whiteley DIRETOR DE MARKETING E OPERAÇÕES Flávio Cordeiro COORDENADOR DE PRODUTOS DE MÍDIA Paulo Sérgio Silva DIRETOR COMERCIAL Wilson Lelis PRODUÇÃO EDITORIAL Alexandre Braga EDIÇÃO AF Comunicações EDITORA-EXECUTIVA Adriana Salles Gomes ARTE E EDITORAÇÃO ELETRÔNICA UVXZ REDAÇÃO/TRADUÇÃO Alexandra Delfino de Souza, Elizabeth da Penha Cardoso, Fernando Moreira Leal, Lizandra Magon de Almeida REVISÃO Marcia T. Courtouké Menin LOGÍSTICA Walney Santos PUBLICIDADE Rosana Silva Tel. (11) 4689 6630 ASSINATURAS Grande São Paulo: (11) 4689 6699 Outras Cidades: 0800 551029 Fax: (11) 4689 6698 – www.hsm.com.br Al. Mamoré, 989 – 13º andar – Alphaville CEP 06454-040 Barueri/SP SERVIÇO AO CLIENTE Alexandre Oliveira Assinaturas: [email protected] Renovações: [email protected] ASSINATURAS CORPORATIVAS Alexandre Oliveira [email protected] ALIANÇAS E PARCERIAS Vera Costa [email protected] Distribuição nacional em bancas pela DINAP S/A. Distribuidora Nacional de Publicações. HSM Management é uma publicação bimestral da HSM do Brasil. ISSN 1415-8868 O CONTEÚDO DOS ARTIGOS É DE RESPONSABILIDADE DOS AUTORES. Como assinante desta publicação, você poderá receber malas diretas e comunicações online da HSM ou de empresas parceiras, com ofertas de produtos e serviços adequados a seu perfil. Caso prefira não recebê-las, solicitamos a gentileza de entrar em contato pelo telefone (11) 4689 6699 ou pelo e-mail [email protected]. S i g a - n o s n o t w i t t e r . c o m / h sm m a n a g e m e n t D cérebro ambição talento empreendedorismo esperança HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br 6

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Seleção de matérias da revista HSM

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Page 1: Matérias HSM

uas repórteres de HSM Manage-ment foram a Emeryville, na Califórnia, visitar a sede do estúdio Pixar e nos con-taram, entre outras coisas, que o prédio principal, erguido em 2000, foi inspirado no cérebro humano. Assim como nosso hemisfério direito é o criativo e o esquer-do, o lógico e racional, os escritórios da ala direita abrigam designers e artistas, e os da esquerda, animadores e técnicos. No centro, ficam áreas destinadas a fo-mentar a colaboração espontânea entre os dois grupos, como café, sala de jogos, televisores e loja de presentes.

Isso me levou diretamente a um tre-cho da entrevista exclusiva que o neu-rocientista Miguel Nicolelis concedeu a nossa editora-executiva, Adriana Salles Gomes, em que ele diz suspeitar que nosso comportamento social em grupo reflete, de algum modo, a maneira como os neurônios funcionam, como se o mo-delo cerebral fosse escalado para uma unidade maior. No fundo, o que a Pixar fez foi escalar o cérebro literalmente.

O CEO do estúdio de Toy Story, Ed Catmull, nos revelou mais um de seus segredos: ir atrás de pessoas talen-tosas e lhes pedir ideias, em vez de ir atrás de ideias, como faz a maioria em Hollywood. Talentos são o mais impor-tante de tudo para Catmull, que prati-ca a sério a meritocracia, como a que Nicolelis diz ser necessária para que a inovação brasileira decole. Segundo o professor da Duke University, aqui, “quando surge um pool de recursos, eles são pulverizados para contentar todo mundo, em vez de concentrados em uma pesquisa que tenha mérito e possa realmente fazer diferença”.

O Dossiê que apelidamos de “Neuro-business” nesta edição está interessan-tíssimo ao tratar a neurociência tanto

como a segunda chance das empresas (de se humanizarem) quanto como a segunda chance do Brasil (de passar de seguidor mundial a um país que inova e dita regras, por meio da educa-ção científica e de um cluster de neu-rotecnologia). Encho-me de esperança quando vejo um brasileiro com a ambi-ção de um Nicolelis, embora reconheça que, como nossa editora me chamou a atenção, uma nuvem de palavras da conversa com ele destacaria três ter-mos: “dificuldade”, “começo” e “Brasil”.

Nicolelis se queixa, por exemplo, do empreendedorismo em nossas terras, muito primitivo comparado ao que en-contra nos Estados Unidos e na Europa, porém ele mesmo vê sinais de avanços. E esses sinais também se espalham por esta revista, desde a reveladora entrevis-ta com Jayme Garfinkel, da Porto Seguro Seguros, até as reportagens sobre nossas startups, nossos pós-empreendedores e a Amil no minidossiê do projeto Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo.

Lições adicionais e valiosas de em-preendedorismo vêm de Eric Ries e sua lean startup, dos cases Evernote e Recyclebank, e de Peter Guber, o exe-cutivo por trás da gravadora da banda de rock Kiss e do estúdio de cinema de O Exterminador do Futuro, entre mui-tos sucessos de bilheteria. No raciocínio de Guber, tanto empreender como lide-rar requerem que se seja um talentoso contador de histórias e o primeiro passo para isso, segundo ele, onde a maioria dos homens e mulheres de negócios tro-peça, está em ser um ótimo ouvinte.

Há esperança.

Marcos Braga

PS: Minha nuvem de palavras está no título.

Nascida no Brasil em 1987 com o propósito de oferecer conteúdos de excelência na gestão de empresas, a HSM é hoje referência em educação executiva.

expedienteeditorial

diretor-presidenteMarcos L. de Almeida Braga

diretor-editorialJosé Salibi Neto

Conselho editorialCarlos Alberto Júlio, Philip Kotler, Richard Whiteley

diretor de marketing e operaÇÕesFlávio Cordeiro

Coordenador de prodUtos de mÍdiaPaulo Sérgio Silva

diretor ComerCialWilson Lelis

prodUÇÃo editorialAlexandre Braga

ediÇÃoAF Comunicações

editora-exeCUtivaAdriana Salles Gomes

arte e editoraÇÃo eletrôniCaUVXZ

redaÇÃo/tradUÇÃoAlexandra Delfino de Souza, Elizabeth da Penha Cardoso, Fernando Moreira Leal, Lizandra Magonde Almeida

revisÃoMarcia T. Courtouké Menin

logÍstiCaWalney Santos

pUbliCidadeRosana SilvaTel. (11) 4689 6630

assinatUrasGrande São Paulo: (11) 4689 6699Outras Cidades: 0800 551029Fax: (11) 4689 6698 – www.hsm.com.brAl. Mamoré, 989 – 13º andar – AlphavilleCEP 06454-040 Barueri/SP

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HSM Management é uma publicação bimestral da HSM do Brasil. ISSN 1415-8868

o Conteúdo dos artigos é de responsabilidade dos aUtores.

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Page 2: Matérias HSM

A Zynga é conhecida por estudar a maneira como as pessoas jogam. Você pode explicar esse estudo?Estamos interessados na experiência do jogador. Para aprimorar nossos aplicativos, estudamos fa-

tores como: quando, como e por que as pessoas jogam, que tipo de jogo lhes interessa mais, até que níveis chegam, os problemas que enfrentam. Encaramos os jogos mais como um serviço do que como um produto, e é por essa razão que usamos toda a informação possível para melhorá-los. Utili-zamos as lições aprendidas para aperfeiçoar a experiência do usuário e manter os clientes.

Como se melhora esse serviço?Há vários modos de fazê-lo, mas o segredo é pres-tar muita atenção ao que os jogadores querem. Por exemplo, alguns dos objetos escondidos no jogo Hidden Chronicles [Crônicas Ocultas] são mais fá-

ceis de encontrar do que outros. Nós observamos. Se percebe-mos que os usuários acham muito difícil encontrá-los em uma cena em particular e que isso faz com que ele deixe o jogo, pas-sa a não ser mais divertido. Então, modificamos as cenas, para que os jogadores possam superá-las e ir para a etapa seguinte.

Qual a diferença entre os games de hoje e os do passado?Os jogos mudaram em muitos aspectos, mas algu-mas coisas permanecem iguais. Ao jogar, procura--se experimentar prazer e surpresa; as pessoas

querem se divertir, competir, desafiar amigos.Isso não mudou. O que mudou é que os jogos de hoje

oferecem uma nova maneira de competir, compartilhar e se conectar com os outros. Não há necessidade de sen-

tar à mesma mesa. Eu jogo Hidden Chronicles com mi-nha mãe, que mora em outra cidade. Nós compartilhamos esses momentos todos os dias, e essa interação é bem importante para nós.

Também acredito que a concepção dos jogos mudou. Antes estavam mais relacionados com o ócio; hoje fazem parte da vida diária, algo que serve para conectar as pessoas com seus ami-gos e familiares.

Em sua opinião, qual será o próximo pas-so na indústria de games? Os celulares?Acho que as pessoas estão se conectando cada vez mais por meio desses aplicativos, porque podem jogar a qualquer hora, em qualquer lugar, e é nis-

so em que nos concentramos. Os telefones celulares são um bom exemplo. As pessoas esperam que o jogo faça parte de seu dia a dia, e a Zynga deseja disponibilizá-lo para elas o tem-po todo e em qualquer lugar.

O que faz um jogo ser demais?Um bom jogo tem muitos componentes. Deve-se pen-sar no jogo como o presente perfeito para um jogador. É preciso definir claramente o público que vai jogar e criar a melhor experiência possível para essas pes-

soas. Acredito firmemente que é fundamental surpreender e deleitar os usuários. O jogo tem de ser divertido, algo que as pessoas queiram compartilhar com outras, seja para competir ou não. Essas são as coisas que fazem um grande jogo e que levam alguém a querer jogar todos os dias.

(Entrevista de Viviana Alonso)

tEndênCiAs

Contagem regressiva Com Cara ElyDESDE O ANO 2000, ElA ESTá ENVOlVIDA NO DESENVOlVImENTO DE jOgOS CASUAIS, fáCEIS E ráPIDOS DE APrENDEr. INDICADA COmO UmA DAS CEm ESPECIAlISTAS Em TECNOlOgIA mAIS bEm-SUCEDIDAS DE SEATTlE PElA PUblICAçãO ONlINE TECHflASH, CArA Ely É, DESDE 2011, DIrETOrA DE CrIAçãO DA ZyNgA, COmPANHIA qUE mONITOrA OS USUárIOS DE SEUS APlICATIVOS PArA CrIAr A mElHOr ExPErIêNCIA lúDICA POSSíVEl. ANTES, fOI DIrETOrA DE CrIAçãO DA I-PlAy gAmES, ONDE DESENVOlVEU A SÉrIE DrEAm DAy, APlICATIVO COm mAIS DE 60 mIlHõES DE DOwNlOADS, E TrAbAlHOU NA EmPrESA DE jOgOS SIErrA ONlINE, ADqUIrIDA PElA VIVENDI, ONDE CrIOU mAIS DE 25 jOgOS CASUAIS. A SEgUIr, ElA fAlA SObrE O SETOr COm ExClUSIVIDADE A HSM ManageMent

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pOntODireto ao

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A entrada de Cara Ely, em junho de 2011, significou uma guinada para a Zynga, importante desenvolvedora de jogos sociais online. Pela primeira vez, a empre-sa criadora de alguns dos aplicativos mais usados no facebook —mais de 220 milhões de usuários jogam CityVille, Poker Zynga, farmVille e Empires & Allies, entre outros sucessos— tentou a sorte em uma área que está causando furor na web há algum tempo: a dos jogos de objetos escondidos. O melhor exemplo desse conceito foi Onde Está wally?, uma série de livros lan-çados há mais de duas décadas.

Com mais de 12 anos de experiência no desenvolvi-mento de jogos de computador, Ely é especialista nes-se gênero e a diretora de criação do novo hit da em-presa: Hidden Chronicles, uma história de mistério em que os jogadores devem encontrar objetos escondidos e desvendar pequenos segredos. Eles também podem desafiar amigos e compartilhar recomendações.

Desde seu lançamento, em janeiro de 2012, Hidden Chronicles se tornou o jogo de melhor desempenho da Zynga e um dos 25 aplicativos mais utilizados no face-book, com um recorde de 33,4 milhões de usuários até abril deste ano.

O conceito de jogos de objetos escondidos se encai-xa na classificação de jogos casuais (casual games), voltados para o grande público, com regras simples, que não requerem habilidades especiais dos usuários.

“queremos que as pessoas se conectem entre si e por meio dos jogos”, afirma Ely. “Sinto que podemos voltar ao tempo em que compartilhar isso unia a famí-lia e os amigos.”

Como diretora de criação de Hidden Chronicles, Ely é responsável por todo o processo de desenvolvimento de aplicativos, desde a concepção da experiência do jo-gador até a idealização da maneira como ele convidará os amigos a competir. “Eu tenho essa visão geral do jogo e, como tal, estou encarregada de transmiti-la à equipe e também ao público, a fim de gerar expectativa e motivação”, explica.

No entanto, Ely acrescenta: “Na Zynga, trabalha-mos de modo colaborativo. Estamos todos envolvidos no esforço de criação. O escritório é uma grande área aberta, as ideias fluem de todas as direções. Isso cria um ambiente cheio de energia, em que qualquer pes-soa pode dar sua contribuição. É uma ótima maneira de melhorar os jogos e conectar as pessoas. Em úl-tima análise, esse jeito de trabalhar também tem um impacto positivo nos resultados da empresa”. (V.a.)

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Page 4: Matérias HSM

É amplamente disseminada a ideia de que, em muitos mercados de tecnologia, as empresas dominantes possuem gran-de vantagem e a ampliam ao longo do tempo. Não é necessariamente verdade.

Na última década, sites de relaciona-mento como o Friendster, o MySpace e o Bebo conquistaram um grande núme-ro de usuários de início, mas perderam terreno para novos concorrentes e aca-baram em segundo plano. Padrões se-melhantes de surgimento, crescimento, domínio e declínio do valor da marca já afetaram organizações como a Microsoft e a AOL. Como algumas companhias vão da força de mercado à vulnerabilidade?

Embora as pesquisas mostrem que inovação tecnológica, mudanças na es-trutura de mercado, curtos ciclos de vida dos produtos, força do capital e grandes jogadas promocionais influenciam a ca-pacidade de uma empresa de manter a liderança de mercado, um fator crucial é ignorado com frequência: as forças psi-cológicas que impulsionam as decisões dos consumidores e, especificamente, o grau em que estes sentem que possuem, ou perdem, poder de escolha.

É verdade. As pessoas relutam em mudar para produtos dos concorrentes quando se acostumam a um produto tecnológico líder, como o sistema opera-cional Windows e os softwares do pacote Office. Mas podem ter a percepção de que sua liberdade de escolha está sendo restringida e partir para o que se chama de “reatância” psicológica (termo origi-nado da eletrônica, referente a uma força que motiva a agir contra uma limitação).

Como funciona e o que fazerA reatância psicológica funciona da se-guinte maneira:

Em um primeiro momento, à medida que aprendem a usar determinada in-terface eletrônica —associada à busca de informações ou compras online, por exemplo—, as pessoas acabam se sen-tindo presas a essa ferramenta e desen-volvem altos níveis de lealdade mesmo quando ferramentas equivalentes de concorrentes estão disponíveis. O custo de trocar de interface supera os benefí-cios de utilizar outro produto.

De repente, como mostram nossas pesquisas, os clientes sentem que sua liberdade de escolha é tolhida e sua lealdade se reduz. Quando as pessoas sofrem com essa percepção de limita-ção, reagem virando as costas para o lí-der de mercado e aceitam arcar com os custos associados à troca de interface.

Assim, organizações que parecem deter o poder de monopólio se tornam surpreendentemente vulneráveis a de-serções de clientes. Isso explica por que, mesmo sem haver diferenças qualitati-vas objetivas entre o produto da empresa dominante e o da desafiante, a participa-ção no mercado do navegador Internet Explorer, da Microsoft, caiu de 67% em setembro de 2008 para 39% em setem-

bro do ano passado e, no mesmo período, a fatia do Chrome, do Google, passou de 1% para 22%.

O que fazer? Depende de seu papel no mercado. Se você é dominante, tome cuidado para não passar a impressão de estar fazendo sucesso demais. Ironica-mente, pode ser bom para você apoiar e até mesmo cultivar a concorrência.

Se você é desafiante, mantenha a imagem de negócio pequeno —além de evitar a reatância, os consumidores ten-dem a enxergar a interface de usuário feita por uma companhia pequena como mais fácil e atraente do que a de uma grande líder de mercado.

Um exemplo de empresa que conse-gue reduzir sua percepção de dominan-te é a Apple: ela detém fatia dominante do mercado de tablets, mas é quase uma desafiante nos de computadores de mesa e laptops.

© MIT Sloan Management Review

Todos os direitos reservados.

Reproduzido com autorização.

Distribuído por Tribune Media Services International.

estratÉgia

quando se sentem limitados em sua possibilidade de escolha, os consumidores tendem a se afastar da empresa líder de mercado, segundo as pesquisas dos especialistas Kyle b. murray e gerald häubl,da university of alberta, do canadá

a reatância psicológica

HsM Management

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Page 5: Matérias HSM

Abrir o capital é considerado um fator positivo para a gestão de uma empresa, desde que os acionistas se comprometam com o negócio e pressionem os gestores por resultados sempre melhores. Na prá-tica, contudo, isso acontece?

Na década de 1980, quando o Japão vivia seu apogeu econômico, muitos analistas de mercado acreditavam que o sistema adotado no país, caracterizado pela baixa liquidez, contribuía para isso. Ao dificultar a compra e a venda, o mer-cado de capitais japonês incentivaria o compromisso de longo prazo, levando os acionistas a estimular o desempenho dos gestores das empresas.

De acordo com essa visão, os sis-temas de alta liquidez, como o norte--americano, com sua extrema facilidade para a saída de acionistas descontentes, incentivavam a adoção de uma aborda-gem de curto prazo pelo acionista.

No entanto, a “década perdida” da economia japonesa, nos anos 1990, pôs em xeque o modelo de baixa liquidez, ao mesmo tempo que, nos Estados Unidos, as empresas e seus acionistas pareciam bem. Então, veio a crise financeira de 2008 e as dúvidas permanecem. Três professores de finanças, Alex Edmans

(Wharton School), Vivian W. Fang (Rut-gers University) e Emanuel Zur (Baruch College), investigaram o assunto e con-cluíram: uma liquidez mais alta estimula os acionistas a pressionar os gestores a melhorar a gestão e a rentabilidade.

Como? Por exemplo, os pesquisadores descobriram algo muito curioso sobre os fundos de hedge, que tendem mais a adquirir grandes conjuntos de ações de empresas de alta liquidez: quanto maior a liquidez de uma empresa, maior a probabilidade de que o fundo de hedge opte por uma propriedade “passiva”, e não “ativa”. (O estudo se concentrou nos fundos de hedge porque estes têm mais liberdade do que fundos mútuos, que po-dem ser diversificados demais para usar estratégias incisivas.)

Ruim? Não. Os fundos não pressio-nam ativamente os gestores a melhorar a rentabilidade, mas recorrem à ameaça implícita de vender as ações (o que leva-ria à derrubada da cotação do papel) e tal ameaça se torna uma forma indireta de melhorar a governança.

Estranho, mas isso representa de fato um novo olhar sobre o que significa um investidor institucional, como um fun-do de hedge, adquirir participação em

determinada companhia. Na visão tra-dicional, acreditava-se que os investido-res só tentavam influenciar a governan-ça corporativa em questões específicas —por exemplo, mudanças na gestão ou em casos de aquisição ou alienação— e pouco se preocupavam com a gover-nança corporativa em si: ao sair do jogo, eles deixavam a empresa sem promover melhoria alguma.

O que Edmans e seus colegas susten-tam é diferente: segundo eles, a possi-bilidade de uma grande venda de ações ou da saída do investidor funciona como meio de pressão sobre os gestores da empresa. E esse raciocínio permanece válido mesmo quando o investidor não expressa demandas específicas em re-lação à gestão.

“O executivo da empresa acaba pen-sando duas vezes antes de agir de ma-neira inadequada. A ameaça de vender as ações quando as coisas dão errado pode, de fato, ajudar a melhorar a ges-tão”, afirma o professor da Wharton.

© Knowledge@Wharton. Reproduzido com autorização.

Todos os direitos reservados.

AlEx EDmANS, DA WhARTON SChOOl, ViViAN W. FANg, DA RUTgERS UNiVERSiTy, E EmANUEl ZUR, DO BARUCh COllEgE, DEFENDEm qUE A AlTA liqUiDEZ DA AçãO DA EmPRESA NA BOlSA DE VAlORES mElhORA SUA gESTãO

Ao contrário do que se pensava

HSM Management

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Direto aoponto

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Page 6: Matérias HSM

Crescer na América Latina, especial-mente no Brasil. Essa é uma das maio-res prioridades do novo CEO da Marriott International, Arne M. Sorenson, que as-sumiu em 31 de março último o comando da rede hoteleira e já fez questão de visi-tar o País. Em 85 anos, Sorenson é o pri-meiro CEO da Marriott que não pertence à família controladora —era executivo--chefe de operações e vinha, nos últimos dois anos e meio, preparando-se para assumir o comando.

Presente em 72 países e estudo de caso frequente dos especialistas em gestão, a Marriott enxerga dois desafios nesse crescimento. “O primeiro é encontrar lí-deres e parceiros locais; o segundo, re-definir nossas marcas, para que sejam relevantes para os consumidores dessas regiões”, ressaltou Sorenson, em entre-vista a HSM Management durante visita a São Paulo.

A seu favor, a Marriott acredita ter dois trunfos: foco no longo prazo e cuidado com os associados, como eles chamam

seus funcionários —e cuidado significa, nesse caso, desenvolvimento de talentos. A lógica é simples, explicou Sorenson: “Se cuidarmos bem deles, certamente eles cuidarão bem dos hóspedes”.

FUTURO E CUIDADOO plano de longo prazo é claro: se hoje a Marriott tem cinco hotéis no Brasil, traba-lhará para ter 50 nos próximos dez anos e ainda mais unidades nas décadas seguin-tes. Embora não faça projeção de novos empregos no País, Sorenson adianta que, na América Latina toda, a Marriott quer chegar ao contingente de 27 mil funcioná-rios em cinco anos, ante os atuais 13 mil.

Como desenvolverá os talentos locais? Em primeiro lugar, deve lhes dar pers-pectiva de avanço na carreira. “Em uma reunião recente em Los Angeles (EUA), en-contrei cerca de mil gerentes-gerais e to-dos haviam começado em funções básicas como garçom, segurança ou recepcionista e avançado em dez anos de empresa ou mais”, contou. “Talentos internos são prio-rizados nas promoções e fazemos com que as pessoas se sintam donas do negócio.”

Em segundo lugar, vem o treinamento —a empresa tem um acervo extenso de treinamentos, que podem ser presenciais, e-learning e internacionais. Segundo So-renson, o Brasil já tem uma cultura de receber bem, o que é um ponto muito po-sitivo, e isso apenas tem de ser aprimora-do com treinamento intensivo e constante, tanto técnico como comportamental e de idiomas. “É um movimento natural: con-forme um país cresce, também cresce a necessidade de pessoas mais preparadas, que falem outras línguas e estejam aber-tas para o mundo”, reforçou.

“O treinamento é a melhor forma de reter, motivar e qualificar profissionais, assim como a oferta de oportunidades de desenvolvimento igualitárias para todos”, afirmou. No sistema de comunicação interna da Marriott, que mantém todos informados das ações e iniciativas glo-bais dos hotéis da rede e funciona como gestão do conhecimento, são anunciadas vagas no mundo inteiro, dando a qual-quer funcionário a possibilidade de fazer carreira internacional.

REDEFINIÇÃO DE MARCASSe hoje a Marriott é associada, no Brasil, principalmente a hotéis de luxo, por conta do Renaissance, em São Paulo, e do JW Marriott, no Rio de Janeiro [na foto], isso deve mudar com a implantação da marca econômica Fairfield. “A previsão é termos um hotel desses aqui entre o final de 2013 e meados de 2014. Garanto que será, de longe, o melhor hotel do segmento, com o maior número de quartos, serviço e am-biente adequados”, disse Sorenson, sem revelar a localização das unidades.

A priorização do Brasil não é fortuita. O CEO e toda a Marriott têm grandes ex-pectativas em relação a nosso mercado, tanto por conta do número crescente de brasileiros que viajam ao exterior —eles precisam conhecer mais as marcas da Mar riott já aqui e a rede tem de conhe-cê-los mais para hospedá-los melhor no mundo todo— como pelos eventos esportivos mundiais que o País sediará em 2014 e 2016.

(Entrevista de Andréa Maia)

EMpRESAS

EM ENTREvISTA ExCLUSIvA, O NOvO CEO dA MARRIOTT, ARNE M. SORENSON, AFIRMA qUE A EMPRESA CRESCERá AqUI E qUER INvESTIR NA CLASSE C

E a Marriott prioriza o Brasil

HSM Management

Direto aopONTO

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Page 7: Matérias HSM

* Estimativa

Da web para a loja

A pesquisa online influencia as decisões de compra no mundo real.

Gasto do consumidor em lojas físicas vinculado a consultas na internet:

* Estimativa

2011 US$ 917 bilhões

2014 US$ 1,4 bilhão*

Nova experiência de compra

O consumidor é protagonista. Ele decide como, quando e onde interage com a marca.

O mundo online invade a loja física. Os novos estabelecimentos oferecem acesso móvela vários pontos de venda, aplicativos sociais e a possibilidade de pagar por telefone.

Pontos-chaveda mudança

“Antes, as lojas eram ‘donas’ dos consumidores, até que eles foram

embora. Hoje, a internet e os aparelhos móveis abriram

as portas dos estabelecimentospara seus concorrentes.”

“O setor varejista evoluiu muito. Nunca vi tanta inovação como nos últimos dez anos. As pessoas não

desejam apenas adquirir um produto; querem também uma experiência recompensadora.”

“Os consumidores precisam de tempo. Muita gente prefere

ficar em casa e comprar pela internet.”

Nirmalya Kumar,professor de marketing da

London Business School,Londres, Inglaterra

Russell Buckley, especialista emtecnologias móveis

Terry Leahy,ex-CEO da Tesco

Pesquisar produtosonline

Receber ofertassegundo a

localizaçãogeográfica

Acumular pontosde programasde fidelidade

FORMAS DEPAGAMENTO:Entrega na

residência

CompararLer as opiniões

Chat nas redes sociais

Criar listas de compras

1 3 4 5 8 7 0

A Tesco, a terceira rede de supermercados mais importante do mundo, montou uma filialvirtual no metrô de Seul, Coreia do Sul. Os produtos disponíveis estão expostos em fotos

penduradas nas paredes e com códigos de barras. Os clientes escaneiam com seus smartphones o que querem comprar. A mercadoria é entregue na residência.

✓ Online✓ Número detelefone

✓ Aparelho móvelmediante leitorde códigos de barrasou cartão de crédito

1. Amazon 2. Square 3. Patagonia

4. Kiva Systems

5. UPS 6. OpenSky 7. Fast Retailing

8. RelayRides

9. Shopify 10. Warby Parker

Os 10 varejistas maisinovadores de 2012segundo a FastCompany

Os grandesperdedores que

não souberamse atualizar

MARKETING

Direto aopoNTo

HSM Management

sim, a internet transformou o setor varejista, mas como? os hábitos De compra, antes DitaDos por marcas traDicionais, agora cabem aos clientes

o INfoGRáfIco TEM coMo bASE uM docuMENTáRIo dA SéRIE buSINESS MATTERS E, coMo foNTES AdIcIoNAIS, A NATIoNAl RETAIl fEdERATIoN (EuA), vERIzoN, foRRESTER E Idc.

O BOOM DO VAREJO ONLINE

Arte de Guido Dellmea. Texto de Francisca Pouiller,

colaboradora de HSM MANAGEMENT.

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Inovação

Vijay Govindarajan afirma que organizações precisam reaprender a inovar para imaginar o futuro e desen-volver hipóteses com base nos sinais do mercado.

SuStentabIlIdade

Pesquisa faz raio X da atuação e remuneração dos profissionais do setor e mapeia a maturidade de grandes empresas brasilei-ras em relação ao tema.

leItura

MovIMento braSIl

Descubra como foi a estratégia da Riachuelo de Flávio Rocha nos últimos seis anos, quando dobrou o número de lojas, acessando www.hsm.com.br/brasil.

recurSoS huManoS 1

As entrevistas de emprego merecem mais atenção. O consultor Mark Murphy mostra como fazer as per-guntas certas para escolher os melhores candidatos.

recurSoS huManoS 2

A reitora da Pixar Uni-versity, Elyse Klaidman, afirma que o aprendizado com emoção garante que os funcionários do famoso estúdio não se entediem.

Videocasting:Mônica Herrero

Podcasting: alexandre Caldini

Em pauta, o projeto de inovação da Stefanini, uma das dez empre-sas mais inovadoras do Brasil, segundo a Fast Company.

O CEO do Valor Econômico fala sobre como “espiritualizar” a gestão do ambiente organizacional —e as vantagens disso.

Entre outros posts, Abraham Shapiro mostra como ganhar com o período de experiência de funcionários, Bruno Mello analisa por que o IPO do Facebook representa uma vitória para o bom marketing, Gil Giardelli fala sobre a antropologia das redes sociais e Francisco Albuquerque discorre sobre modelos de negócio.

Fórum hSM novas Fronteiras da Gestão 2012Em 21 e 22 de agosto, em São Paulo, especialistas explicam como reverter o rápido avanço tecnológico a favor dos negócios.

Seminário hSM William ury – Fortaleza 2012Em 28 de setembro, William Ury apresentará os conceitos, habilidades, influência e poder para alcançar o sucesso no processo de negociação.

EVENTOS

Veja o que os empresários Jorge Paulo Lemann e Abilio Diniz dizem sobre Vencedo-ras por Opção, o polêmico livro de Jim Collins que rela-tiviza o poder da inovação.

CONhEçA ALGUNS DESTAqUES DE NOSSO CONTEúDO ONLiNE,qUE REúNE O MELhOR DO PENSAMENTO E DA PRáTiCA DA GESTãO MUNDiAL

eMPreSa 2.0

A revolução da web 2.0 está em

plena marcha. Com ela, as empresas podem construir uma nova cultura organizacional, de

colaboração horizontal, e tirar pro-veito da inteligência coletiva visando ganhos de produtividade, inovação e geração de valor. Veja o que diz

Soumitra Dutta, professor do insead, a esse respeito.

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Às vésperas de deixar a presidência executiva, Jayme Garfinkel repassa os 40 anos em que moldou a maior e mais inovadora seGuradora de carros do país e revela como seu pensamento foi moldado, em entrevista exclusiva

O soldado daPoRTo SeguRo

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engenheiro mecânico Jayme Brasil Garfinkel, presidente da seguradora Porto Seguro, aprendeu muito com seu pai e conselheiro, Abrahão Garfinkel, nascido na Ucrânia. Os conselhos mais importantes, porém, não vieram de manuais teóricos de administração, mas de um clássico do pensamento político, O Príncipe, de Nicolau Ma-quiavel. “Ganhei o livro de meu pai pouco tempo antes de ele morrer, e ele me disse que aquela era a obra mais importante já escrita sobre administra-ção.” Logo depois, a morte de Abrahão levou Jayme ao comando da empresa. “O livro me preparou.”

Não foi a máxima “maquiavélica” sobre os fins justificarem os meios que ajudou o empresário, no entanto. “O que norteou minha atuação foi o conselho de que o príncipe —o líder— tem de estar sintonizado com o povo e dar o exemplo em tudo o que faz”, diz.

Ressalte-se que Garfinkel não ga-nhou uma edição qualquer da obra clássica. Sua versão continha comen-tários de um leitor muito conhecido, Napoleão Bonaparte, que reforçou ser essencial ouvir os pares e os parceiros. “Isso foi fundamental na minha atua-ção na Porto Seguro”, afirma.

Funcionário de uma grande segura-dora carioca, a Boa Vista, Abrahão Gar-finkel começou de baixo e fez carreira na empresa, até chefiar sua sucursal paulista, a maior do grupo, um proces-so testemunhado pelo filho Jayme. Nos bons tempos de menos trânsito, ele al-moçava e jantava em casa todos os dias e falava bastante sobre o trabalho. Os filhos acompanhavam o cotidiano de um executivo em ascensão. “Era a nos-sa novela”, lembra Jayme.

O sonho de Abrahão era chegar à presidência, mas esse processo foi in-terrompido por um evento externo. A Boa Vista fundiu-se com outra segura-dora carioca, a Atlântica, e o gestor, que se preparava para assumir o comando, percebeu que não haveria mais espaço

para crescimento profissional. A úni-ca saída seria seguir carreira solo. Em 1972, Abrahão decidiu comprar uma unidade da Boa Vista para presidir.

Poucos imaginariam que nascia ali um competidor tão peso-pesado do mercado segurador, que hoje lidera o segmento de seguros de automóveis, com mais de 30% de participação —reu-nidas, as marcas do grupo, Porto Segu-ro, Itaú e Azul, atendem 4,2 milhões de segurados—, e é um de seus maiores inovadores. A morte do pai, em 1978, obrigou o jovem Jayme, com 30 e poucos anos, a assumir a presidência executiva, que ele deixará no início de setembro, embora se mantenha como presidente do conselho. E é aqui que começa esta entrevista exclusiva, ex-cepcionalmente editada no formato storytelling, contando a essência dos 40 anos em que Garfinkel construiu esse império de R$ 10,1 bilhões.

ERA UMA VEZ UMA CULTURANo início, tudo era complicado. “Foi quando me dei conta de quanto nossos

resultados dependiam dos corretores e dos funcionários e que, por isso, era fundamental conquistar a confiança deles”, diz Garfinkel, confirmando o que Maquiavel e Napoleão haviam aprendido com séculos de antecedên-cia. “Trabalhamos realmente muito nesse sentido e acabou virando uma cultura dentro da companhia.”

Nesses primeiros tempos, outro aprendizado se deu em uma visita de Jayme ao banco Bradesco, que cha-mou sua atenção para uma nova ten-dência dentro das empresas: o fim das salas, especialmente as de diretoria. “Todo mundo trabalhava no mesmo ambiente e as coisas fluíam mais de-pressa. Gostei tanto da novidade que a adotei imediatamente na Porto.”

Mais uma medida incorporada nes-sa etapa foram as reuniões de dire-toria diárias, iniciadas pontualmente às 8 horas. Ao mesmo tempo que es-tabelecia um horário para os execu-tivos começarem sua jornada, servia como exemplo de cima para todos os funcionários, exatamente como pre-

SinoPSe

• Inspiradopelaideiamaquiavélicadequeolíderdevesintonizar-secomseusseguidoresedarexemploemtudooquefaz,JaymeBrasilGarfinkelconstruiu,aolongode40anos,umimpériochamadoPortoSeguro,quecompreende4,2milhõesdesegurados,13milfuncionáriosdiretosereceitadeR$10,1bilhões(em2011).

• PrestesapassarobastãodeCEOaosucessor,Garfinkelrepassaoquemoldouseupensamentoeaculturadesuaempresa:olivroOPríncipe,dadopelopai,o“insight”sobreconquistaraconfiançadefuncionáriosecorretores,asreuniõesiniciadaspontualmenteàs8horasdamanhã,olayoutabertonasaladadiretoria.Tudoissoresultouemmaiorautonomiaparaosfuncionárioseemumahierarquialimitadaaomínimo.

• Anecessidadedediferenciar-sedosbancostambémexplicaosrumostomadospelaPortoSeguro:Garfinkelcompreendeuqueeraprecisoaproveitarasvulnerabilidadesdessesconcorrentesnaofertadeserviçosenaeficiência.Nãoàtoa,hojeaempresaélíderemsegurosdeautomóveis.

a entrevista é de anna lucia França, colaboradora de HSM ManageMenT.

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pensamento

nacional

gou Maquiavel. “Como nossa melhor vendedora de consórcios diz, só o líder envolvido com o trabalho pode cobrar desempenho dos subordinados.”

Assim, dar o exemplo, seja ao co-meçar o expediente às 8 horas, seja em uma série de iniciativas cotidia-nas, tornou-se um hábito dos líderes da Porto Seguro. Ainda hoje, quando tem dúvidas sobre como proceder, Jayme faz um exercício mental de pensar como um soldado a serviço da empresa. “Se for útil dar esta entre-vista para falar sobre a Porto Seguro, eu vou dá-la. O líder tem de se com-portar como um soldado disponível para qualquer tarefa.”

Foram essas três medidas estendidas que, ao longo do tempo, criaram a cul-tura da seguradora, muito antes de as ferramentas “missão, visão e valores” frequentarem as listas de recomenda-ções de “gurus” e consultores.

ESTRATÉGIA: O FOCO EM SERVIR E A EFICIÊNCIA “Em 1998, começamos a fazer reu niões da alta gestão regularmente para pen-sar em mudanças e na estratégia; que-ríamos criar ali uma rotina de traba-lho permanentemente agradável pa ra os funcionários do grupo e aquilo tam-bém vinha facilitar a tomada de deci-sões”, explica o empresário.

O que significa “estratégia”, no voca-bulário da Porto Seguro? É abraçar o método [na concepção de Vicente Fal-coni, o caminho da verdade, baseado em informações reais] e somar-lhe tra-balho, o que, segundo Garfinkel, é es-sencial para desenvolver a imaginação e a criatividade. “Ninguém gosta de se-gunda-feira, mas criamos mecanismos de muita conversa para que as facili-dades que criamos para os líderes da companhia estejam disponíveis para todos, não só para os líderes”, afirma.

Nessas reuniões, identificou-se uma das fraquezas estratégicas da segura-dora em seus primeiros tempos: ter de concorrer com os bancos que também ofereciam seguros e que, como vanta-gens competitivas, contavam com uma rede de distribuição extensa por meio de suas agências e com uma força fi-nanceira muito superior. Como contor-nar isso? Garfinkel mirou a maior vul-nerabilidade do setor bancário: a baixa capacidade de oferecer bons serviços. Prestar um serviço memorável para o consumidor em um momento de es-tresse (como um acidente ou o roubo do carro) passou a ser o diferencial.

Essa opção acabou sendo o grande ponto de diferenciação —e de inova-ção— da empresa no mercado. Tudo começou com os guinchos, que passa-ram a levar a marca Porto Seguro. Em

seguida, vieram os escritórios regio-nais, para estar mais perto de clientes e de corretores, e, mais tarde, uma me-dida tão simples quanto entregar um lanche rápido ao segurado junto com a prestação do socorro. Pequenos deta-lhes, que, no entanto, foram garantindo a distinção da concorrência e facilitan-do a renovação da apólice.

Algumas vezes, os detalhes nem fo-ram tão pequenos assim, como quan-do a Porto Seguro criou, em 2000, os serviços de assistência mecânica para revisão de automóveis aos segurados, não apenas reduzindo a possibilidade de sinistro, como gerando uma receita extra. “Essa foi uma saída estratégica importante; vimos uma oportunidade e a aproveitamos com competência.” (Hoje, serviços de conveniência são vendidos também a não segurados.) São famosos os serviços de assistência à residência, a computador e a animais de estimação que a empresa presta a quem tem apólice de automóvel e paga uma taxa extra, o que gera nova receita e aumenta a atratividade dos produtos.

Garfinkel explica que o melhor de tudo foi perceber que “a gente gosta-va muito de fazer essas coisas”. Surgia na Porto um círculo virtuoso de fazer o que diferencia o negócio estrategica-mente e dá prazer —e orgulho— aos fun-cionários, a tal ponto que, como conta o líder sem medo de demagogia, se há um problema operacional na empresa e, ao mesmo tempo, um problema com um segurado, todos vão atender o se-gurado em primeiro lugar. As pessoas não agem assim por serem boazinhas ou ingênuas, garante ele. “Sabemos que o resultado disso vem, embora no longo prazo. Ele pode demorar um pouco, mas aparece nos números.”

Também há o orgulho de sentir-se parte de um império. “A Atlântica Boa Vista pode ainda ser a maior segurado-ra do País, mas nós somos a maior em automóveis em uma companhia que fundamos. Somos um império e temos de mantê-lo.” Não à toa, quando o pró-prio Garfinkel promove um colabora-dor, gosta de presenteá-lo com uma cópia de Gladiador, do diretor Ridley

“queríamos criar uma rotina De trabalho permanentemente agraDável para os Funcionários Do grupo”

Entresucursaiseregionais,aPortoSegurotem130unidadesnoBrasil

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Scott, Oscar de melhor filme no ano 2000, passando a mensagem de que o promovido, assim como o personagem principal, tem de defender o império independentemente de qualquer coisa.

Porém não bastava, como diferen-cial, a excelência em serviço que dá prazer e orgulho. O empresário e seus gestores entenderam também que a empresa precisava ser mais eficiente do que os bancos e, no idioma do setor de seguros, eficiência é sinônimo de redução de sinistros.

“O preço do seguro, especialmente o de automóvel, é praticamente fixo e, se não posso mexer no preço, tenho de enxugar custos”, justifica Garfinkel. Assim, a Porto passou a investir na redução de sinistros popularizando iniciativas como as chamadas vacinas —identificações dos automóveis para evitar o risco de furto e desmanche— e a instalação de rastreadores que dimi-nuem os preços das apólices.

AS PESSOAS E A AUTONOMIACom cerca de 20 diretores, a Porto Se-guro busca restringir a hierarquia or-ganizacional ao mínimo. Seus líderes

estão convencidos de que isso é obriga-tório para conceder autonomia às pes-soas e, assim, evitar lentidão na hora de decidir. “Quanto mais níveis, mais len-ta fica a empresa para tomar decisões. E não podemos ser vagarosos, porque não fazemos uma linha de produção com todos os produtos iguais. No nosso caso, cada sinistro é uma história dife-rente e requer decisões específicas —e rápidas”, diz o executivo.

Para que seus funcionários saibam resolver logo o problema do segurado que sofre um sinistro, a Porto criou uma receita que considera imbatível: muito treinamento somado à valori-zação sincera da vida pessoal de cada um. “Não adianta apenas treinar. Nós precisamos que cada funcionário te-nha uma visão maior do mundo e das outras pessoas e, para isso, é essencial que seja feliz. É evidente que o cliente só vai ser feliz se o funcionário traba-lhar com alegria”, afirma Garfinkel.

O empresário percebeu depressa o que muitos gestores, tanto do setor privado como do público, parecem de-morar uma eternidade para aprender: controle é igual a custo. Querer con-

trolar tudo eleva custos enormemente, além de provocar lentidão nas ações, o que leva à perda de agilidade para com-petir no mercado. “Nosso raciocínio é o seguinte: ao descentralizarmos as deci-sões, a perda é uma possibilidade, mas, ao centralizarmos, ela é certa. Por isso, vale correr o risco de descentralizar; o funcionário pode fazer certo.”

É fácil desprender-se? Não. Contudo, Garfinkel aprendeu a delegar traba-lhos ao longo dos anos, para poder ir atrás de outras questões, e não tem dú-vida: “É fundamental dar autonomia na ponta”. Só que sua autonomia segue sua visão maquiavélica: é autono mia com proximidade. “Napoleão passava com seu cavalo perto dos soldados, para animar a tropa, e os soldados ga-nhavam outro ânimo só por ver o líder de perto. Além disso, com a proximida-de, as informações chegam mais rápido até o soldado que está na ponta”, afir-ma. Em outras palavras, mesmo que a empresa tenha um contingente de 13 mil funcionários, Garfinkel obriga--se a ficar próximo deles.

Poucos degraus hierárquicos, po-rém, costumam dificultar a promoção

saiba mais sobre gaRFinkel e a PoRTo SeguRo

Graduado em engenharia civil pela escola politécnica da universidade de são Paulo e pós-graduado em ad-ministração de empresas pela fundação Getulio vargas, Jayme brasil Garfinkel é o chairman da porto seguro e também seu maior acionista —estima-se que tenha 40% da empresa, com 30% pertencentes ao Itaú-unibanco e outros 30% distribuídos pelo mercado. assim como seu pai fez com ele, Garfinkel logo levou o filho para trabalhar lá: hoje Bruno responde pela área de sinistros. jayme é membro ativo de entidades setoriais, como a federação Nacional de seguros gerais, que preside.

a Porto seguro é a quarta maior seguradora do Brasil e a líder quando se fala em seguros de automóveis (que eram 65,4% de sua carteira no início de 2012) e de residên-cias. Com faturamento de R$ 10,1 bilhões em 2011 e lucro líquido de R$ 580 milhões, congrega hoje 13 mil funcioná-

rios diretos, 11 mil prestadores de serviços e 23,5 mil cor-retores. organiza-se em 18 empresas: oito no segmento de seguros (incluindo Itaú e azul) e mais Portoseg (finan-ciamento) e sua distribuidora Crediporto, Portoserv (novos negócios para corretoras de seguro), Portopar (distribui-dora de valores), Portoserviços (serviços em condomínios empresariais e residenciais) e as cinco que levam o nome porto seguro e atuam em consórcios de carros e imóveis, proteção de residências e transporte, serviços médicos, telemarketing e telecom.

os anos 2004 e 2009 foram marcantes para a Porto seguro: em um, abriu o capital; em outro, associou-se com o Itaú. E 2012 também promete sê-lo: depois de 40 anos construindo a empresa, seu líder garfinkel dei-xará o posto de ceo em setembro; deve passar o bastão para o VP executivo, Fabio luchetti.

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e a retenção de funcionários. Como a Porto lida com isso? Dada a formação feita por ela, é natural que seus pro-fissionais sejam alvo da concorrência em uma guerra por talentos como a atual. Garfinkel admite: não ter um plano de carreira definido, para evitar as tentações da burocracia, faz com que a ascensão dependa mais dos líde-res e de seu senso de justiça na avalia-ção. A companhia ainda não achou a fórmula ideal para reter seus talentos, diz ele. “Como seres humanos, alguns líderes podem ter funcionários preferi-dos, sim. O que estamos tentando fazer, no entanto, é desenvolver mecanismos para oxigenar a liderança, como os treinamentos; estamos evoluindo.”

UMA NOVA CULTURA?A associação da seguradora com o Itaú-Unibanco em 2009 trouxe mais 4,5 mil pontos de venda para a Porto (as agências) em todo o País. Foi Gar-finkel pessoalmente que costurou a operação, e, embora tenha iniciado as negociações com outro banco, fechou com o Itaú-Unibanco em tempo recor-de (nove dias!), porque lhe foi garanti-do que o comando continuaria com a Porto Seguro —e, consequentemente, a cultura não mudaria substancialmen-te. Como descrever, em poucas pala-vras, a cultura sintetizada em tantos

anos? Para o dirigente, tem a ver com um estilo “bom de conversa” vindo do modo de pensar judaico: não aceitar nada sem discussão e análise. Uma anedota contada por Garfinkel ilustra que dois rabinos discutiam um ponto da religião e um deles operou um mi-lagre. O outro respondeu: “Tudo bem com o milagre, mas você não provou sua tese”. A tendência ao questiona-mento é o jeito Porto de gerenciar.

SUSTENTABILIDADE E PROJETOSMuito antes de o termo “sustentabili-dade” entrar na moda, a Porto Seguro percebeu que precisava pensar em seu impacto sobre a sociedade. Por isso, com a mudança da sede para a Aveni-da Rio Branco, no centro de São Paulo, em 1973, a empresa passou a atuar em seu entorno. “O lugar era horrível e plantamos árvores. Queríamos ter um local bonito”, explica o empresário.

Com o avanço da companhia, come-çou também a crescer em Garfinkel um incômodo com a miséria ao redor e ele criou a fundação Casa Campos Elíseos Melhor, que oferece cursos de profissionalização para a comunidade e uma escola de ensino médio em Pa-raisópolis, bairro de população carente na zona sul de São Paulo. A verba para isso está atrelada ao resultado da em-presa —1% do lucro previsto para o ano.

“A realidade mostra que as empresas têm de fazer mais do que gerar empre-go, pagar impostos e dar lucro.”

A cada ampliação da Porto, Garfinkel se lembra de um diálogo recorrente com sua mãe. Ela dizia: “Isso vai pro-vocar inveja”, e ele respondia: “Se não crescer, fico para trás”. Hoje, contudo, o empresário acha que todos precisam mesmo rever o custo do crescimento. “O comunismo não funcionou, mas o capitalismo também está sendo colo-cado em xeque, provocando a exaus-tão do planeta. Talvez seja melhor as empresas diminuírem a velocidade do crescimento”, pondera. E contribuírem para a sociedade e o planeta. Além da Casa Campos Elíseos Melhor, a Porto contribui com campanhas educativas como a do “Trânsito Mais Gentil”, lan-çada em 2009, que, de quebra, também favorece seu negócio.

Despertando inveja ou não, a com-panhia continua criando empresas, contudo, de uma prestadora de servi-ços a condomínios a uma telecom.

O FUTURO DE FINAL FELIZO que tem feito brilhar os olhos do empresário? O potencial aumento do percentual da frota brasileira com seguro: os 28% de hoje podem subir para pelo menos 40% com a classe média emergente (a capilaridade do parceiro bancário ajudará muito nis-so). Ele mantém o foco em seu ponto forte e no mercado doméstico —em-bora já tenha ensaiado a internacio-nalização, implantando, com sucesso, uma unidade no Uruguai.

E quanto à sucessão, que se comple-ta em setembro? “Sei que não adianta querer controlar o futuro, mas creio que a companhia sempre precisará saber ouvir.” Ou seja, a cultura da boa conversa tende a resistir.

Aos 65 anos, Garfinkel, como qual-quer outro soldado, mostra brilho nos olhos também com a possibili-dade de folga —para poder sentar no alpendre de seu quintal e ler.

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pensamento

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pensamento

nacionalacadÊMico

segundo Carmen migueles, professora da fundação getulio vargas e Consultora da symballein, afastar-se da HierarQuia não signifiCa abraçar a organiZação em rede. a transformação ideal é em direção a um modelo Híbrido, tema de seu novo livro, Que ela anteCipa aQui Com exClusividade

A metamorfose organizacional

(e a fÁBULa da Barata na Lata)

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magine que um operário de uma fábrica de alimentos cujo nome seja sinônimo de confiabilidade enxerga uma barata no meio de sua linha de produção. Ele precisa tomar uma decisão: interrompe o trabalho e ma ta a barata ou mantém o ritmo e ignora o inseto?

Guarde esse suspense na memória; vou desenvolvê-lo em breve. Antes, preciso falar da imensa pressão que as empresas vêm sofrendo para eliminar suas estruturas hierárquicas e substi-tuí-las por um modelo organizacional em rede, em nome da maior capacida-de de inovação, de adaptação e de mais um sem-número de motivos. Nesse cenário, a pergunta que vale 1 milhão é: que configuração é realmente a ideal para uma empresa?

Sem que essa questão seja formula-da e receba uma resposta adequada, a metamorfose corporativa pode ser mais dolorosa, e mais fatal, do que a de Gregor Samsa, o protagonista da obra A Metamorfose, de Franz Kafka.

Sem dúvida, estamos todos fasci-nados com o potencial das redes —a velocidade da integração, o acesso às informações e as novas possibilidades de cooperação que elas geraram trou-xeram possibilidades inimagináveis há pouco mais de 20 anos. Porém existem virtudes na hierarquia que não podem ser ignoradas, principalmente a capaci-dade de coordenar sistemas complexos, e qualquer outro modelo, para substituí--la, precisa realizar melhor essa difícil tarefa [veja quadro na próxima página].

Em outras palavras, para as organi-zações, a hierarquia ainda é, em larga medida, insubstituível. Como, diante disso, construir um novo modelo or-ganizacional eficiente? Uma resposta é certa: não é possível caminhar nes-sa direção sem repensar a empresa de maneira muito mais profunda.

CONSENSO SOBRE O QUE FAZERO que essa nova organização almejada vem transformar no modelo hierárqui-co é, sobretudo, a clássica separação que ele faz entre concepção e execução: de um lado, comando e controle e, do

outro, o cumprimento de tarefas frag-mentadas. Ambas precisam se misturar para que haja ganhos de flexibilidade e inteligência de que a nova organização necessita. Isso em si nem é novidade —os adeptos dos modelos gerenciais japone-ses da década de 1980 e da reen genharia dos anos 1990 já haviam chegado à con-clusão de que o aumento da autonomia do executante é fundamental.

O desafio agora é como fazer isso. Estou convencida de que a solução está na capacidade de agir sobre passivos intangíveis que todas as culturas na-cionais ou étnicas colocam e, a partir daí, criar maneiras de ver e pensar o trabalho por meio das culturas organi-zacionais, buscando construir sistemas de coordenação informais e flexíveis capazes de organizar a cooperação.

Essa virada representa uma impor-tante mudança do foco de uma empre-sa: sai a concentração na técnica e na engenharia e entra a priorização do fator humano no trabalho. Na prática, isso representa um afastamento das habilidades mais duras, mensuráveis

por critérios ligados à produtividade fí-sica do ser humano no trabalho, e uma aproximação das habilidades ligadas aos ativos intangíveis. Focar essas ha-bilidades muda muita coisa:

• Aqualidadedosvínculosdecadain-divíduo com a empresa, com o supe-rior e com a equipe é o que passa a fazer a grande diferença.

• Areputaçãodaorganizaçãoeova-lor percebido pelo cliente tornam--se os responsáveis pela maior par-te das margens.

• Asustentabilidadepassaadependerda gestão de um conjunto de relacio-namentos que boa parte dos gestores aprendeu a ignorar.

Nesse novo modelo, valor percebi-do, reputação, valor da marca, cultura organizacional, gestão do capital inte-lectual e inovação são fatores estreita-mente inter-relacionados. E é com a gestão dessas relações que aumenta a capacidade da organização de atu-ar em rede e se beneficiar dela. Entra

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SinoPSE

•Está em discussão a transformação das organizações hierárquicas em modelos em rede, assentados sobre o conhecimento. O objetivo seria aumentar a cooperação para a gestão do conhecimento e, consequentemente, para a inovação.

•O melhor, no entanto, é buscar um modelo híbrido, que busque o reequilíbrio entre hierarquia e rede em uma nova governança. Esta deve ser capaz de regular a organização por indicadores de qualidade da gestão, redistribuindo poder e autoridade, dando mais voz aos detentores de conhecimento e com novas formas de disciplina organizacional. Tal combinação só é possível com o desenvolvimento da cultura corporativa.

•Isso pede que se construa a hierarquia do conhecimento, em detrimento da hierarquia industrial, selecionando alguns aspectos tradicionais da hierarquia e excluindo outros, e que se estimule a cooperação das redes nesse cenário. A hierarquia do conhecimento neutralizará as características indesejáveis da organização em rede, como caos, falta de coordenação e de foco, excesso de informação e de participação.

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em cena, definitivamente, a gestão dos ativos intangíveis.

Porém sem abolir 100% a hierarquia. São grandes os desafios para a forma-ção de redes colaborativas que sejam verdadeiramente produtivas —a redu-ção das quase infinitas probabilidades de interação, a manutenção da memó-ria do que é gerado, a aplicabilidade das soluções— e nenhum se resolve sem alguma hierarquização.

DIFICULDADES DE FAZERNa hora de as empresas gerenciarem intangíveis, têm de vencer, logo de cara, uma primeira grande dificulda-de: a maneira de pensá-los. Em re-cente revisão que realizei, com outros pesquisadores, nas principais revistas e jornais acadêmicos mais bem ava-liados do mundo, encontramos uma tendência marcada: a de olhar para os intangíveis pela mesma lógica de raciocínio empregada para pensar os tangíveis. Há uma tendência clara a “coisificar” os intangíveis. Coisas têm preço e valor em si; um ativo intan-gível, não. Seu valor depende de um conjunto de relações e não é demais afirmar que gestão integrada de ativos intangíveis é gestão das relações que lhes dão sustentação. Traduzindo: ati-vo intangível não é coisa; é relação. E, sendo relação, a segunda grande difi-

culdade fica evidente: será difícil sus-tentar uma ou mais boas relações onde não houver um jogo ganha-ganha para todos os stakeholders, onde for grande a distância entre o discurso e a prática, onde faltar transparência no processo decisório sobre recursos, onde predo-minar a desconfiança. Organizações autoritárias terão problemas.

Ressalte-se que as culturas latinas, a brasileira entre elas, sofrem espe-cialmente desse mal. Nesses países, redistribuir poder e autoridade é um desafio maior do que nos mais iguali-tários. Mas eis uma boa notícia: várias organizações superaram os obstáculos descritos e já conseguem fazer a gestão de ativos intangíveis que constrói esse novo modelo organizacional, entre a hierarquia e a rede.

ENTÃO, COMO FAZER? Nessa moda de parafrasear certo po-lítico norte-americano, eu diria: “É a cultura, estúpido!”. A cultura de uma organização constitui “o” fator de coor-denação flexível que permite a gestão integrada dos ativos intangíveis e, as-sim, dá unidade e coerência ao todo e estrutura o processo decisório. Mas esqueça a definição messiânica de cul-tura como valores e crenças compar-tilhados, que líderes convertidos incu-tem nas pessoas. A cultura não é uma

questão de escolha de indivíduos livres e sua gestão pressupõe:

• processosbemdefinidos;• métricasdeexcelênciadasentregas

do core business; • investimentosemáreascríticaspara

as entregas de valor da organização; • sistemas de consequências éticos e

justos; e • esforçosdealinhamentodacomuni-

cação interna e dos sistemas de in-formação, bem como de transparên-cia nas formas de alocar recursos.

Sim! E, ao propor um novo modelo organizacional, estou falando automa-ticamente de uma nova cultura, capaz de conciliar as virtudes da hierarquia (organização, planejamento e foco) com as virtudes da rede (liberdade, flexibilidade e participação) e de com-bater as principais fraquezas da hierar-quia (fragmentação, burocratização e desempoderamento das pessoas) e as principais fraquezas da rede (caos, fal-ta de coordenação e de foco, excesso de informação e de participação).

E, para isso acontecer, há que repen-sar a coordenação, o poder e os víncu-los dos indivíduos com a organização.

coordenação, poder e vínculosLembra-se da história inicial deste arti-go? Do operário em uma fábrica de ali-mentos que vê uma barata e não sabe o que faz? Voltemos a ela: se esse funcio-nário conhece a estratégia e o posicio-namento da marca, e se compreende a importância e os desafios de criar con-fiabilidade nos processos produtivos, ele não hesita: para a máquina, mata a barata e reporta a contaminação.

Rapidamente, esse funcionário de chão de fábrica consegue calcular o risco para a marca e para a imagem perante o consumidor de ter uma bara-ta morta em uma lata do produto. Sabe que a confiabilidade dos equipamentos nunca é perfeita e que é necessário um esforço constante de aprimoramen-to. Entende a relevância de seu papel nesse cenário e parte para a ação. Após o relato aos encarregados, ainda faz o

pensamento

nacional

exemplos HíbridoSHospitais e universidades eram considerados organizações anárquicas, cujo resultado dependia mais da excelência de seus indivíduos (médicos, profes-sores e pesquisadores) do que da divisão de tarefas e da hierarquia. Hoje, contudo, aumentam sua efetividade pela seleção de linhas de pesquisa que congregam esforços e pela construção de processos, procedimentos e pro-tocolos que permitam, pelo aprimoramento contínuo, alcançar resultados cada vez melhores. São exemplos de modelo híbrido.

É importante ter consciência de que a administração científica e sua hie-rarquia foram capazes, como nenhum outro modelo, de transformar com-plexidade e especialização em desempenho. Tratou-se da inovação que causou a maior diferença na vida do maior número de pessoas em toda a história, pois o gigantesco aumento da produtividade do trabalho que gerou permitiu à humanidade passar da era da escassez para a era da abundância.

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acompanhamento do caso e coloca o problema para toda sua equipe: “Como podemos evitar que isso aconteça no futuro?”. E, com uma pergunta simples e focada como essa, a equipe, por sua vez, pode cooperar para a busca de so-lução, criando uma inovação no pro-cesso produtivo que reduza as chances de esse episódio acontecer no futuro.

Percebe-se aí um tipo de coordena-ção, uma distribuição de poder e vín-culos típicos de uma cultura organiza-cional fortemente alinhada a esse valor de entrega para o cliente, que não deixa o funcionário em dúvida sobre parar a produção —mesmo que isso reduza o volume desta— e resolver o problema. Nessa cultura, seu superior imediato vai avaliá-lo mais positivamente se ele interromper tudo, pois terá forte ade-são à cultura da empresa.

Agora imagine que esse indivíduo está em uma organização em que tal foco não está claro. Seu supervisor imediato é pressionado por metas de produção e o gerente de qualidade, por metas de confiabilidade. Ele deve tomar uma decisão. “Quem está olhan-do? O gerente de qualidade ou o super-visor? Se for o supervisor, paro e mato a barata ou não paro?” O operário pre-cisa acertar com um conjunto maior de variáveis em mente: é como se tivesse de jogar um dado e tirar 5 de qualquer maneira; há uma possibilidade em seis de isso acontecer. Ou suponha que a empresa passou por uma fusão e o comprador quer aumentar o volume de vendas e reduzir os preços, e para isso quer trabalhar com 100% da capa-cidade do equipamento. Há tamanha falta de clareza nas informações e tan-to risco que o funcionário parece ter de tirar 9 jogando dois dados. Sua chance de acertar é reduzida para 1/36.

O DESAFIO DE FAZER NA PRÁTICAComo chegar a esse modelo híbrido, que combina rede e hierarquia, repen-sando coordenação, poder e vínculos?

Filtrar a hierarquiaDeve-se usar a hierarquia para planejar os investimentos e criar

grandes projetos, garantindo maior racionalidade no emprego dos re-cursos e na divisão de tarefas e pa-péis. Ela reduz tremendamente os riscos de médio e longo prazos para os investidores e para os profissio-nais do conhecimento.

É o planejamento dos investimentos, por sua vez, que permite financiar o trabalho dos profissionais do conhe-cimento, cobrir os gastos da curva de aprendizado dentro das equipes de alto desempenho e o tempo de maturação das pesquisas e dos esforços de inova-ção. Não poderia ser mais falsa a ideia de que a hierarquia é barreira à gestão do conhecimento. Trata-se do contrá-rio. Deve-se, isto sim, eliminar suas características inadequadas:

• separaçãoconcepção-execução;• prevalência da ética dos acionistas

em detrimento da ética dos stakehol-ders (com destaque especial para a assimetria de poder entre os execu-tivos que representam os acionistas e os profissionais do conhecimento);

• redução dos vínculos entre indiví-duos e organização a uma relação

contratual de natureza exclusiva-mente jurídica e econômica (em que as atividades não têm sentido);

• relaçãotrabalhistapensadacomore-lação entre patrão e empregado;

• foco no comando e controle (comregras, padrões e procedimentos en-quadrando o trabalho, quando isso deveria só servir à boa execução);

• foconastarefasenãonosatributosdas entregas; e

• busca por planos de cargos e salá-rios que reduzem desproporcional e excessivamente os seres humanos a métricas genéricas.

Estimular a cooperaçãoA predisposição dos funcionários para a cooperação depende da confiança e da qualidade de seu vínculo com a em-presa (que cabe aos gestores estabele-cer). As tarefas-chave para isso são:

• Envolver todosnaorganizaçãoenamelhoria dos resultados alinhados às promessas da marca.

• Definirtãobemosprocessosdeapri-moramento que todos enxerguem claramente como contribuir.

saiba mais sobre carMEn MiGUElESCarmen Migueles é professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) no Rio de Janeiro. Doutora em sociolo-gia das organizações, mestre em antropologia pela Universidade de Sophia (Tóquio, Japão) e historia-dora pela Pontifícia Universidade Católica gaúcha, escreveu três livros, entre os quais Criando o Há-bito da Excelência (ed. Qualitymark) e Antropologia do Consumo (ed. FGV), e está finalizando Cultura e Gestão Integrada de Ativos Intangíveis (título provi-sório), com o tema desenvolvido neste artigo, para lançar em 2013. Migueles também é consultora de empresas e, por meio da firma de consultoria Symballein, que fundou e dirige, trabalha com o diagnóstico de intangíveis. Ela e o sócio Marco Túlio Zanini deram uma detalhada entrevista a HSM Ma-nagement a esse respeito [edição nº 85, página 30].

pensamento

nacional

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ção

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• Direcionar métricas e acompanha-mentos para favorecer os esforços de quem está voltado para o aprimora-mento das entregas.

• Estabelecer real transparência nasdecisões (deve estar claro por que a organização está patrocinando esfor-ços em uma direção e não em outra).

• Garantir a maior descentralizaçãoda decisão sobre as funções que pre-cisam ser exercidas, para que haja maior foco na utilização dos recursos e no valor a ser gerado —em primeiro lugar, para o cliente final e, depois, para o conjunto dos stakeholders.

Especificamente, o líder deve tomar estas iniciativas de gestão de equipes:

• Tratar das verdadeiras causas dosproblemas (especialmente os de cul-tura nacional e organizacional, por onde a racionalidade e a capacidade de coordenação se perdem de ma-neira mais perversa).

• Encararasdificuldades(senecessá-rio, reduzindo as distâncias de poder e partilhando informações).

• Aumentaracapacidadedeestabe-lecer conversas difíceis (por exem-plo, cobrar responsabilidade por resultados e negociar com o supe-rior melhores condições de traba-lho para um subordinado).

O líder não pode evitar questões como:

• Alguémnãosabeoquedevefazer?• Faltaram investimento, processo e

procedimento?• Porquenãosefazoquedeveefetiva-

mente ser feito? • Quaissãoosespaçosdeliberdade?• Porqueomissãoé“pecado”?• Oqueéliderançabaseadaemvalo-

res nesse sentido?• Qualéopapeldecadaumdenós?

Por fim, a organização tem de criar sistemas de apoio e incentivo para:

• Comunicar-se com as pessoas eapoiá-las a não ceder às justificativas e ao fatalismo do “é assim mesmo”.

• Construir esforços de governançaalinhados com a promoção de ações ganha-ganha. Antes de cada esforço, vale consultar a matriz acima.

• Apoiar o desenvolvimento de resi-liência nos indivíduos. Assim, eles persistirão na busca de soluções ne-cessárias e viáveis e convencerão os outros a se esforçar para isso.

Os desafios, muitos, são exequíveis se a questão cultural for privilegiada, com um equilíbrio entre a hierarquia e as redes. O importante é não adiar seu en-frentamento para que não se encontre uma barata enlatada por aí e para que a organização não se torne uma barata, como Gregor Samsa. A metamorfose pode e deve acontecer —para melhor.

HSM Management

pensamento

nacionalDesenho de normas e regras para orientar o comportamento humano promovendo jogos cooperativos (ganha-ganha)

BAIxALUCRATIvIDADE

ALTALUCRATIvIDADE

ALTA ACEITAçÃO

B) COMPATIBILIDADEPOSITIvA

D) CONFLITOMORAL

A) CONFLITOECONôMICO

C) COMPATIBILIDADENEgATIvA

BAIxA ACEITAçÃOSEGUInDo o QUADRAnTE B, TRABAlHE, PoR ExEMPlo:

• Acompreensãodoqueévalorparaocliente.• Oentendimentodecomoaorganizaçãopodeproduzir,entregar,aprimorarerenovarsuaofertadevalor.• Adecisãodecomoinvestireemqueinvestirparasercapazdeobteromáximoretornoporessasentregas.• Umdesenhoorganizacionaladequadoparaqueaempresasempreserenove.• Aformulaçãodepolíticasdegestãodepessoasqueestimulemacooperaçãoparaessefim.• Odesenhodemétricaseacompanhamentosderesultadosquealinhemosesforçoscomosobjetivos.

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Memória de elefante

EmprEsas

RepoRtagem hsm management apResenta a eveRnote, empResa noRte-ameRicana que vive seu momento de glóRia gRaças a seu aplicativo homônimo; este pRomete mudaR a foRma como nos lembRamos das coisas

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uanta informação somos capazes de acumular na memória ao longo de nossa vida? Nomes de pessoas que co-nhecemos, lugares que visitamos, fil-mes a que assistimos, datas importan-tes... A lista é interminável. Só que, por mais poderoso que seja, nosso cérebro não tem capacidade para armazenar tudo o que gostaríamos de recordar.

Foi justamente com o objetivo de superar essa limitação humana que Phil Libin, cofundador e CEO da Evernote, teve a ideia, com seus par-ceiros, de criar uma ferramenta que ajudasse as pessoas a se lembrar ba-sicamente de tudo.

Eleita empresa do ano em 2011 pela revista Inc., a Evernote desenvol-veu um aplicativo para dispositivos móveis que permite ao usuário fazer anotações e tirar fotos de qualquer coi-sa que interessá-lo e guardá-las utili-zando o sistema de computação em nuvem. Mais tarde, ele pode acessar essa memória virtual por meio de um sistema de busca que pretende ser tão poderoso como o Google.

“Nosso cérebro tem uma capaci-dade de memória muito limitada e

a reportagem é de mariana Lima, cola-boradora de Hsm maNaGEmENT.

Q

sINOpsE

• “Lembre-se de tudo.” Esse é o slogan que se encontra no site da Evernote, em que se pode baixar o aplicativo homônimo, que, instalado em dispositivos móveis ou computadores, registra e armazena tudo o que o usuário vê e pensa, como uma memória virtual adicional.

• Por conta dessa inovação, a desenvolvedora do aplicativo, com quatro anos de existência, cerca de cem funcionários e mais de 25 milhões de clientes, foi eleita empresa do ano em 2011 pela revista Inc.

• Qual o modelo de negócio? O usuário baixa o aplicativo gratuitamente no site e abre uma conta, também gratuita, para armazenar os arquivos produzidos com ele, até o limite de 16 MB por mês. No entanto, cerca de 1 milhão de pessoas já pagam US$ 45 ao ano pela conta premium, que armazena até 1 GB por mês.

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Phil Libin,cofundador e CEOda Evernote

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EmprEsas

isso se agrava em uma época, como a presente, em que somos bombar-deados por uma infinidade de infor-mações e não temos certeza de que essas coisas serão úteis no futuro”, explica Libin. “Ninguém está satis-feito com seu cérebro”, segundo ele, que, por isso, tem perseguido o ob-jetivo de fazer com que as pessoas, com a ajuda da tecnologia, se tor-nem mais inteligentes.

A proposta é ambiciosa e, até agora, os números mostram que a empre-sa tem ganhado muitos adeptos. Com quatro anos de existência, a Everno-te já conta 25 milhões de usuários e seis escritórios no mundo. Com sede em Mountain View, no coração do Vale do Silício, ocupa um edifício mo-derno, alegre e sem divisórias, onde trabalham quase cem pessoas, que se autointitulam “nerds genuínos” da tec-nologia, como seu líder.

POR DENTRO DO SOFTWARE“O Evernote é nosso cérebro externo.” É essa a resposta de Libin quando questionado sobre como o aplicativo funciona. Mas o que isso significa?

“Trata-se de um sistema que ajuda a pessoa a se lembrar de tudo o que é importante e manter um banco de da-dos com todas as informações de que precisa, seja para a vida profissional ou pessoal”, explica ele.

O software oferece isso por meio de uma plataforma central que permite ao usuário fazer anotações, tirar fotos,

gravar voz e salvar páginas de sites. Todo o conteúdo é gerado e mantido à disposição para pesquisas futuras.

Há, também, acessórios que incre-mentam o serviço principal, com fun-ções mais específicas, como o Evernote Hello, que ajuda a se lembrar de pes- soas com base em determinados da-dos, e o Evernote Food, para guardar experiências gastronômicas. Aplica-tivos adicionais são muitas vezes de-senvolvidos em parceria com terceiros. “Temos cerca de 10 mil sócios, e entre eles está o que desenvolveu a platafor-

Números da Evernote

4

5 30 40

6anos deexistência

escritórios pelo mundo (califórnia,

texas, moscou, tóquio,

Zurique e pequim)

percentual da receita

proveniente do pagamento pela versão premium:

número de usuários que

pagam pela versão premium:

milhão1 95número de

usuários no mundo:

milhões

número aproximado de funcionários:

custo mensal do serviço premium: us$

idade média dos usuários:

anos

percentual de usuários que

acessam o evernote de um computador no

escritório: 25100

o aplicativo EvERNotE fuNcioNa como sE fossE o céREbRo ExtERNo dE uma pEssoa, ofEREcENdo um baNco dE dados muito fácil dE alimENtaR E dE coNsultaR

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ma Expensify, que serve para controlar as finanças pessoais com base em ima-gens das faturas”, diz Libin.

De acordo com o CEO da compa-nhia, as possibilidades são tão amplas quanto as situações cotidianas. “Se uma pessoa, em um restaurante, não quer esquecer a marca do vinho que está bebendo, pode tirar uma foto; se acabou de conhecer alguém, pode fa-zer uma imagem de seu cartão de vi-sita; se está dirigindo, pode gravar para ela mesma um lembrete de voz”, afir-ma. Todo esse material é armazenado em servidores da empresa, inteligen-temente classificado pelo sistema e sincronizado com todos os dispositivos pelo qual o usuário acessa o serviço.

O aplicativo funciona tanto para os desorganizados como para os mais prolixos. “Há muitas possibilidades de criação de pastas, categorias, tags etc. E você também pode jogar tudo em um só lugar e usar o sistema de busca para encontrar o que quer”, diz Libin.

Para lembrar, por exemplo, o nome de alguém que conheceu em uma via-gem a Paris em agosto de 2007, basta pesquisar por data ou local para en-contrar informações sobre esse acon-tecimento, ainda que a informação não tenha sido identificada com uma tag.

Parece mágica, mas é tecnologia pura. Toda informação leva rótulos de hora e data; um sistema de geolocali-zação informa o local relativo a cada marcação, e outro reconhece e identi-fica qualquer texto, mesmo quando as letras são parte de uma imagem.

POR DENTRO DO MODElO DE NEgóciOA ideia dos desenvolvedores é que os adeptos do uso do aplicativo o utilizem por toda a vida. Para isso, garantem que a informação sempre estará dis-

ponível e que a Evernote não vai usá-la para qualquer outra finalidade. O limite mensal de dados que podem ser envia-dos para o servidor é de 16 MB para os que usam a versão gratuita e de 1 GB para os que pagam US$ 5 por mês ou US$ 45 por ano pela versão premium.

Quais são as vantagens de pagar pelo serviço? A maior capacidade de arma-zenamento e o acesso a algumas fun-ções extras que facilitam compartilhar e editar arquivos em grupo.

As vantagens não parecem muito significativas, e por isso é difícil enten-der por que cerca de 1 milhão de usuá- rios estão pagando por um serviço que é oferecido gratuitamente. “Nossa es-tratégia não é forçar ninguém a com-prar a versão premium. É óbvio que ela tem funções geniais, mas o que quere-mos é que todos entendam que pode-rão usar o aplicativo a vida inteira, sem custo algum”, garante Libin.

Então, qual é o modelo de negócio de um serviço que nem sequer incentiva as pessoas a pagar para usá-lo? Segun-do o CEO, o mundo online possui um código muito particular sobre quando é aceitável cobrar por algo. “Nosso objeti-vo é que as pessoas se apaixonem pelo produto, porque descobrimos que elas odeiam pagar por qualquer coisa na in-ternet, mas não se importam em pagar por algo pelo qual estão apaixonadas. E, quanto mais usam o Evernote, mais estão dispostas a pagar”, afirma.

De fato, as estatísticas confirmam que a quantidade de pessoas que op-tam por remunerar o serviço é pro-porcional ao tempo de uso que tiveram oportunidade de usufruir. A lógica é simples: os usuários querem retribuir à empresa a prestação de um serviço útil, em parte porque eles se sentem gratos, mas também porque não que-rem que o produto deixe de existir.

O que cada função fazEvernote Helloprojetado para ajudar a se lembrar de pessoas com base nos seguintes dados: fisionomia, data e contexto. Quando o usuário encontra alguém, pode adicionar informações sobre o evento e tirar uma foto. o perfil de cada pessoa no diretório mostra a foto dela, o lugar onde o usuário a conheceu, quem os acompanhava naquela hora e que expe riências foram compartilhadas. todas essas variáveis também são úteis para fazer uma busca.

Evernote FoodElaborado para registrar experiências gastronômicas. a ideia é tirar fotos de pratos que foram importantes por algum motivo e adicionar as sensações visuais e os fatores contextuais: com quem o usuário estava, onde e como se sentiu. é útil quando se está pensando em algo diferente para cozinhar ou se quer recordar os bons restaurantes visitados durante uma viagem.

Evernote Clearlydesenvolvido como acessório para uso em sites: limpa o excesso de informação visual e registra mensagens para torná-las mais legíveis. além de separar o conteúdo que lhe interessa, o usuário pode alterar sua aparência, escolher fontes e cores. depois que o site é personalizado, o Evernote dá a opção de salvá-lo para ser lido mais tarde, sem necessidade de conexão com a internet.

as Estatísticas mostRam QuE a QuaNtidadE dE pEssoas QuE optam poR REmuNERaR o sERviço é pRopoRcioNal ao tEmpo dE uso; Elas sE sENtEm gRatas E QuEREm REtRibuiR à EmpREsa

EmprEsas

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Hsm management

Assim, 95% do faturamento da com-panhia vem das receitas com o serviço premium e o restante, de licenças para uso da tecnologia. Há também uma ra-zão para o fato de haver muito pouca publicidade: não dispersar a atenção do usuário. “Nosso modelo de negó-cio não se baseia em transformar em dinheiro informações do usuário, nem em publicidade. Nosso plano é que 1 bilhão de pessoas se apaixonem pelo produto, a ponto de 5% delas decidirem pagar US$ 5 por mês”, explica Libin.

Isso representaria uma cifra de cerca de US$ 3 bilhões por ano gerada so-mente por usuários, o que parece mui-to factível quando se leva em conta o público-alvo da empresa: profissionais, ao redor de 30 anos de idade, com ensi-no superior e de alta renda.

O cOMEçOAs primeiras tecnologias que tornaram possível a criação do Evernote datam de 2005 e foram desenvolvidas por uma equipe de empresários russos e norte-americanos liderada por Stepan Pachikov, que havia duas décadas tra-balhava em um projeto para expandir a memória (dos homens e das máqui-nas) e reconhecer imagens. Enquanto o grupo de Pachikov programava na Califórnia, Libin buscava, com alguns empreendedores, uma nova ideia de negócio em Boston.

“Tínhamos vendido a última empre-sa que havíamos criado e queríamos desenvolver um produto relacionado à memória”, conta ele. “Elaboramos um plano de negócios com uma ideia semelhante à da equipe de Pachikov. Em 2007, nos encontramos com ele e decidimos unir forças. O Evernote foi lançado no ano seguinte.”

Embora a ideia parecesse genial para Libin e seus colegas, não era tão fácil convencer os investidores. “Nosso plano é desenvolver um software que permi-tirá que as pessoas anotem coisas para mais tarde lembrar, e isso será oferecido gratuitamente. Por favor, nos ajude com dinheiro para lançar esse produto.” Esse era o discurso com que Libin se dirigia a potenciais investidores, sem sucesso.

Como a maioria das empresas ini-ciantes, os primeiros tempos da Ever-note só foram possíveis graças a recur-sos dos próprios empreendedores e ao aporte de amigos e familiares. Em ou-tubro de 2008, quando estavam prestes a fechar um grande acordo de investi-mentos, o mercado entrou em colapso —literalmente. “O colapso do Lehman Brothers teve um efeito de contágio, e nosso investidor desistiu do negócio no dia acordado para assinatura do con-trato”, lembra Libin.

A situação financeira da empresa era crítica. Não havia dinheiro sufi-ciente no banco para sobreviver nem mesmo um mês. Naquele dia, Libin foi para a cama pensando que, na manhã seguinte, teria de comunicar a seus 30 funcionários que era hora de fechar as portas. O que ele não sa-bia era que do outro lado do mundo, mais precisamente na Suécia, havia um fã do Evernote, que escolheu o momento certo para comunicar seu entusiasmo em um e-mail que mu-dou o destino da companhia.

Às 3 horas da manhã, Libin leu: “Oi, amo o Evernote. Eu o uso há al-guns meses e ele mudou minha vida. Estou muito satisfeito com o serviço e queria saber se eles estão buscando

algum tipo de investimento”. Duas se-manas depois, a empresa recebia um empréstimo de meio milhão de dólares no banco, que lhes deu tempo suficien-te para melhorar os processos, até que, em 2009, apareceu o primeiro grande capitalista do Vale do Silício.

Longe da situação difícil da origem, a Evernote conta atualmente com in-vestidores como Sequoia Capital, Mor-genthaler Ventures, Docomo Capital e Troika Dialog. Embora a empresa este-ja desfrutando seu momento de glória, tanto com os usuários como com os investidores, o sucesso não parece ter afetado de maneira alguma o espírito empreendedor do CEO.

“É muito difícil começar um negócio, demanda muito trabalho intensivo”, diz Libin. “Mas vale a pena. Para mim, tem um significado muito maior dedi-car 120 horas por semana a algo que eu amo, especialmente em compara-ção com trabalhar para alguém que me diz o que fazer. E o mais difícil é atrair pessoas com a mesma atitude, porque o que eu quero são 300 empreendedores trabalhando na Evernote. O único risco real na vida é perder tempo.”

95% do fatuRamENto da compaNhia vEm do sERviço pREmium E o REstaNtE, dE licENças paRa uso da tEcNologia. a publicidadE é pouca paRa Não distRaiR o usuáRio

EmprEsas

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Page 24: Matérias HSM

A leAn

EMPREENDEDORES

stArtupHSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br42

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HSM

ric Ries estava satisfeito como pro-gramador de software, até perceber que alguma coisa errada se repetia em seu trabalho: costumava atuar com equipes tecnicamente excelen-tes, mas sem sucesso no mercado.

A ideia de iniciar a IMVU, rede so-cial voltada para jogos e avatares, sur-giu como possibilidade de solucionar o problema. “Em vez de manter o foco em desenvolver tecnologias melhores e produtos mais sofisticados, optamos por ser mais interativos. Lançamos produtos com velocidade bem acima da média, envolvendo os clientes no processo de desenvolvimento desde o início. Isso nos permitiu testá-los mais e ter mais precisão na verifica-ção de nossas hipóteses. Como resul-tado de tais iniciativas, surgiu uma forma diferente de trabalhar”, explica Ries, um dos fundadores da IMVU.

A outra providência foi criar um blog para relatar suas experiências, o Start up Lessons Learned (lições aprendidas com uma empresa star-tup). A iniciativa originou o método conhecido, mesmo no Brasil, por seu nome em inglês —a lean startup— e o livro A startup enxuta. No blog Ries define empreendedorismo como uma disciplina de gestão com foco nas si-tuações de grande incerteza e, em sua opinião, qualquer um que esteja desenvolvendo um novo produto, en-trando em um novo mercado ou fa-zendo algo que ninguém tenha feito antes é um empreendedor.

Nesta entrevista concedida com ex-clusividade a HSM Management, Ries detalha como o conceito de fa-bricação enxuta, sem desperdícios,

de empresas como a japonesa Toyota chegou ao empreendedorismo e am-pliou a própria ideia de empreender [vale a pena ler a reportagem sobre startups do minidossiê Brasil, na pági-na 110]. Ele se mostra convencido de que é necessário deixar de encarar a atividade empreen dedora como algo que acontece de repente, de maneira aleatória, como um golpe de sorte, e passar a entendê-la como um proces-so passível de aprimoramento.

Alguns creem que o nome é só marke­ting. Qual é a diferença entre uma lean startup e uma startup convencional? Usamos a palavra “lean” por analogia com lean manufacturing [fabricação enxuta], que é uma filosofia de fabri-cação originada no Japão e tem a ver com identificar o desperdício e elimi-ná-lo. Implica olhar a empresa com os olhos dos clientes, para entender o que realmente importa. Esse processo fun-cionou muito bem no setor de manu-fatura e, quando adotado no desenvol-vimento de software, foi chamado de desenvolvimento ágil, porque tornava o processo livre de desperdício.

Na lean startup, podemos usar mui-tas dessas técnicas —lotes pequenos, interação rápida, redução de desvios na linha de produção—, mas devemos ajustar o que entendemos por criação de valor, pois na fabricação enxuta o valor é definido como a capacidade de entregar ao cliente um produto de alta qualidade; todo o resto é desperdício.

A entrevista é de Viviana Alonso, cola­boradora de HSM MANAGEMENT.

EM ENtREVIstaEXClusIVa, ERIC RIEs,

EsPECIalIsta No EMPREENDEDoRIsMo

Da EMPREsa INICIaNtE ENXuta, aBoRDa os PRINCIPaIs PoNtos

DEssE NoVo MoDElo, DE QuE tRataEM sEu lIVRo

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EMPREENDEDORES

Como em um novo empreendimen-to frequentemente não conhecemos o cliente nem se ele vai querer o que ven-demos, então, aprender é nossa base para evoluir. Nesse sentido, é funda-mental saber rapidamente se estamos no caminho certo para construir um negócio viável.

Quero destacar que “enxuto” não significa barato nem implica economi-zar dinheiro. Poupa-se dinheiro como efeito colateral de não perder tempo em coisas sem importância.

No começo de uma lean startup, quanto se sabe sobre o cliente? O problema surge quando aceita-mos como verdadeiras as suposi-ções e hipóteses sobre o comporta-mento dos clientes que figuram em nosso plano de negócios. Em vez de incorporar ao plano tudo o que nos propusemos fazer, deveríamos veri-ficar com rapidez e simplicidade as suposições-chave.

No lugar de dedicar vários meses ao plano de negócios e ao estudo do mercado, e o dobro ou triplo desse tempo ao desenvolvimento de um protótipo que lançaremos com grande estrondo, mesmo que não saibamos qual porcentagem de clientes aceitará testá-lo, nossa proposta é colocar em circulação o produto minimamen-te viável [minimum viable produto, MVP], a mínima unidade de produto absolutamente necessária para iniciar o processo de aprendizado.

Em muitos casos, o MVP pode ser tão simples quanto uma página na internet que ofereça a possibilidade de adquirir o produto antes de seu lançamento. Se nesse momento não houver clientes interessados, devemos abandonar a tentativa de ter 1 milhão de clientes e passar a focar outros aspectos, como a taxa de conversão e o que chamamos de actionable matrix [em português, algo como “matriz sobre a qual é possí-vel agir”], que, em microescala, nos faz entender se o negócio funciona.

Você mencionou o tema do desper­dício que existe quando se inicia um

empreen dimento. A que você se re­fere concretamente?Nos empreendimentos tradicionais, mais da metade do trabalho feito é des-perdício. Por exemplo, desenvolver um primeiro produto com uma quantidade de funções pensadas para vários seg-mentos de clientes é puro desperdício, porque, se a companhia for obrigada a mudar de direção visando um mer-cado diferente, com clientes que darão outros usos ao produto, muitas dessas primeiras funções serão herdadas e di-ficultarão a mudança.

Devemos manter o foco na agilidade, na adaptabilidade e no aprendizado. A causa mais frequente de morte de um empreendimento é seu lançamento prematuro por causa da impaciência para crescer. É um desperdício gigan-tesco de tempo. Se mil clientes não gostam de seu produto, qual valor de aprendizado virá com o cliente mil e um? Zero. Devemos nos propor con-quistar a quantidade mínima necessá-ria de clientes para saber se estamos no caminho certo.

O que você argumenta sobre modifi­car o produto se aplica principalmen­te ao mundo digital ou vale para todo tipo de companhia? Creio que se aplica a todo tipo de com-panhia. Pense em uma simples matriz de dois eixos, na qual o eixo “x” indica a velocidade do ciclo de desenvolvimen-to de novos produtos em um setor e o “y”, o nível de incerteza do mercado.

Se trabalharmos com uma indústria como a automobilística, na qual sabe-mos o que os clientes querem, o risco é primordialmente técnico e a incerteza baixa. No outro extremo, porém, estão, por exemplo, os produtos de consumo e os estruturados na web. Imaginemos todos os setores alinhados em um nível de incerteza, em sentido crescente, da esquerda para a direita. No quadrante superior direito estaria o ponto ótimo para a lean startup: alta incerteza asso-ciada com um ciclo de desenvolvimen-to rápido de novos produtos.

Agora, se observarmos os dois eixos, em qual direção o mundo se move?

Autor de A Startup Enxuta (ed. Lua de Papel), Eric Ries é criador da metodologia da lean startup (em­presa iniciante enxuta), sistema que ele explica e promove em seu blog Startup Lessons Learned, e um dos fundadores e diretor de tecnologia da companhia de jogos sociais e avatares online IMVU.

Enquanto estudava na Yale University, Estados Unidos, fundou a Catalyst Recruiting, uma das inúmeras vítimas do crash das pontocom. Em 2007, foi considerado um dos jovens empreendedores de tecnologia com mais destaque pela BusinessWeek e, em 2009, recebeu uma distinção do prêmio TechFellow na categoria “liderança em enge­nharia”. Hoje é conselheiro de vários empreendimentos tecnológicos e desde 2010 é empreendedor resi­dente da Harvard Business School.

O que o levou a escrever um livro? Ele explica: “Considero o empreen­dedorismo um processo que pode ser aprendido e, portanto, ensinado. As pessoas não deveriam trabalhar durante anos em projetos destinados ao fracasso. Isso é algo que podemos prevenir, e, se mudarmos o paradig­ma de gerenciamento, obteremos um resultado melhor”.

Um livro se presta a organizar bem esse aprendizado. Como diz Ries, “a metodologia abordada no livro trata desse novo tipo de gestão empreen­dedora que incorpora os clientes, mais cedo que o normal, ao processo de desenvolvimento de um novo pro­duto. Seu objetivo é lançar produtos com mais frequência, interação e mudança, identificando com exatidão o que funciona e o que não. E, se for comprovado que a estratégia não está dando resultado, o livro ensina a pivotar, ou seja, mudar o mais rápido possível para uma nova abordagem que funcione melhor”.

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ERic RiES

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Vamos notar que em todos os setores as mesmas forças estão atuando para aumentar a incerteza e tornar o ciclo de desenvolvimento mais rápido. Ou seja, mesmo que hoje o negócio não esteja no ponto ótimo para uma lean startup, logo estará.

E, quando isso acontece, o que se deve fazer? Você sabe?Um empreendimento é algo pratica-mente imprevisível. Precisamos de uma base que nos auxilie a avaliar as sugestões que recebemos e decidir quais delas podem ajudar. Existe um ciclo de feedback [feedback loop] com-posto por três etapas principais que de-finem o tempo do processo: construir, medir e aprender.

Um novo empreendimento transfor-ma ideias em produtos, ele constrói; trata-se da função mais importante. A interação do cliente com nossos pro-dutos gera vários dados e podemos mensurá-los. Essa informação, sobre o que os clientes fazem e deixam de fa-zer, chamamos de aprendizado.

Nosso objetivo é que a cada processo e decisão o ciclo de feedback seja mais eficiente e que seu tempo total seja mi-nimizado [veja gráfico acima].

Você poderia citar alguma empresa que tenha colocado em prática essa meto­

dologia efetivamente? imagino que, co­mo consultor, você tenha casos... Como consultor, seria muito ten-tador dizer que a Apple e o Google seguiram meu modelo, mas prefiro documentar casos de startups que desenvolveram técnicas específicas com esse kit de ferramentas.

Por exemplo, no tema da intera-ção rápida, menciono, em meu livro, a implantação contínua. Na IMVU, a empresa de jogos sociais online que, em 2004, fundei com Will Harvey, che-gamos a lançar software 50 vezes por dia, de modo que eliminamos o ciclo de lançamento mensal ou semanal. En-tre desenvolver o software e colocá-lo para rodar, levamos 20 minutos. Mui-tos programadores consideram isso rápido e arriscado demais, mas a im-plantação contínua é uma metodologia com rigor suficiente para possibilitar o trabalho em alta velocidade.

Também temos o que chamamos de sistema imune. Ele detecta e corri-ge automaticamente os problemas e nos permite produzir confiantes, sem necessidade de verificação constante. Muitos pensam que ele funciona ape-nas para empresas de tecnologia da informação, porém um dos estudos de caso que cito no livro é o da Wealth-front, que oferece serviços de fundos de investimentos e está sujeita a regu-

lamentações governamentais, e mes-mo nesse ambiente é capaz de fazer a implantação contínua. Seus diretores dizem que no caso de uma aplicação crítica, confiar a verificação a seres hu-manos é uma loucura, porque a por-centagem de erros é enorme.

Você coloca ênfase no processo, mas e as pessoas? Em meu livro, uso o diagrama de uma pirâmide, cuja base é a responsabili-dade, seguida do processo, da cultura e, finalmente, das pessoas —ou seja, as pessoas estão no topo. Toda a metodo-logia foi desenhada para apoiá-las e permitir que sejam criativas, empreen-dedoras e bem-sucedidas.

A maioria das empresas, especial-mente as grandes, acha que seus fun-cionários não são empreendedores nem criativos, quando na verdade eles estão engessados em uma cultura pau-tada por processos preestabelecidos que eliminam a tomada de riscos, cas-tigam as falhas e impedem qualquer um de tentar algo novo.

O que devemos fazer é escalar a pi-râmide até onde as pessoas estão e desenhar processos que conduzam a uma cultura mais criativa e saudável, na qual os funcionários tenham liber-dade de agir.

Gosto da história de um produto recente e inovador, o SnapTax, apli-cativo que permite fazer a declaração de imposto de renda pelo smartpho-ne. Muito impressionante. Ele não foi criado por uma equipe de gênios em uma garagem, e sim por funcionários de uma companhia norte-americana chamada Intuit, uma das maiores pro-gramadoras de software para geren-ciamento empresarial e financeiro, e a última atitude que se esperaria dela é a criação de um produto inovador como esse, que compete com sua linha prin-cipal de negócios.

O que a Intuit fez? Ela não contra-tou superestrelas, apenas criou am-biente para que seus colaboradores se organizassem em equipes e crias-sem processos com base em uma nova cultura.

Minimizar o tempo total

do ciclo

Ideias

CONSTRUIR

ProdutosDados

APRENDER

ciclo de feedback

MEDIR

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O que você recomendaria a alguém in­teressado em empreender?O mais importante é ter visão. É preciso ter uma ideia clara de aonde quer che-gar. Mesmo contando com o auxílio dos dados e das inúmeras informações sobre o mercado e sobre a realidade de modo geral, não podemos deixar de lado nossa visão, nossa perspecti-va sobre o negócio. É a mesma coisa quando entro no carro e ligo o GPS. Eu pergunto a ele aonde quero ir? Claro que não, pois ele não sabe; afinal, é um robô, está ali para me ensinar como ir. Portanto, a visão deve estar claramente articulada; só assim é possível definir uma estratégia que a concretize e leve em consideração, entre outros fatores, o comportamento que pretendemos gerar em nossos clientes, os sócios que nos interessam e os preços pelos quais ofereceremos nossos produtos.

Depois é preciso testar rapidamen-te se cada um dos elementos da es-

tratégia funciona como o esperado. Caso contrário, teremos de “pivotar” [o termo vem de “pivot” (pivô), con-ceito criado por Ries que significa mudar de abordagem o mais rápido possível] em direção a uma nova es-tratégia, sem que isso implique uma mudança de visão. É comum ter de dar algumas voltas, porém na verda-de elas significam aprendizado e nos aproximam do destino final.

Mas deve ser difícil modificar a estraté­gia e manter a visão...Claro que é. Meu exemplo favorito é o Groupon, site de compras coletivas. Trata-se da companhia que chegou mais rápido a US$ 1 bilhão de fatu-ramento. Originalmente chamava-se The Point, um espaço de ativismo online no qual as pessoas cobravam as autoridades. A ideia era que 100 pessoas concordassem em participar de uma manifestação; se apenas 50

confirmassem presença, o protesto era cancelado. Em um ano, chega-ram a gastar US$ 1 milhão tentando organizar a empresa, mas a proposta não era atrativa.

Então decidiram tentar algo diferen-te. Com a mesma dinâmica, substituí-ram a política pelo comércio. Criaram um blog gratuito usando o WordPress chamado The Groupon, em que ofere-ceram o “leve dois, pague um” de uma pizzaria em Chicago, Estados Unidos, e tiveram muito sucesso. Essa é a defini-ção de pivotar. Os investidores os consi-deraram pessoas responsáveis porque tinham compromisso com os clientes.

O Groupon implantou um processo que permitiu criar o produto minima-mente viável e replicá-lo com rapidez, e isso ajudou no desenvolvimento de uma cultura de inovação.

Princípios da lean startup

543Empreendedorismo é gerenciamento. Uma startup é mais que um produto, é uma instituição. Portanto, precisa de gerenciamento, especificamente orientado para seu contexto.

21

EMPREENDEDORES

HSM Management

construir, medir e aprender. A atividade fundamental de uma startup é transformar ideias em produtos, medir como os clientes reagem e, depois, aprender, decidindo se é necessário pivotar ou perseverar. Todos os processos de uma startup devem ser voltados para acelerar esse ciclo de feedback.

inovação responsável. Para melhorar os resultados e não perder de vista o objetivo, é necessário focar os seguintes pontos: como medir os avanços, como estabelecer metas, como priorizar tarefas. Isso exige um gerenciamento específico para startups.

Aprendizado validado. As startups não nascem para fazer coisas, ganhar dinheiro ou servir clientes, mas para aprender a construir um negócio sustentável. Esse aprendizado pode ser validado mediante experimentos que permitam colocar à prova todos os elementos da visão do empreendedor.

Empreendedores existem em todos os lugares. Não é necessário trabalhar em uma garagem para iniciar uma empresa.

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... aumenta um ponto no mundo dos negócios, onde pontos equivalem a sucesso. o Homem do cinema peter

guber afirma, nesta entrevista, que, Hoje, a Habilidade de contar Histórias é mais importante do que nunca para

gestores e empresas

Quem conta um

conto...

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omo produtor de cinema, Peter Gu-ber é responsável por levar às telas muitas das histórias mais queridas pelo público: Rain Man, A Cor Púrpu-ra, O Exterminador do Futuro, Feitiço do Tempo... Aos 69 anos, é uma figura proeminente no mundo do entreteni-mento, com uma trajetória que inclui muitos dos filmes e programas de TV mais populares dos últimos anos.

Como ele coloca, porém, nos pri-meiros 37 anos de sua carreira, não entendia por que o que fazia, em apre-sentações, discursos e conversas, fun-cionava. “Precisei de todo esse tempo para descobrir o que eu era”, diz. “E então me dei conta: ‘Meu Deus, sou um contador de histórias!’. Não reconhecia isso em mim.”

O resultado dessa revelação é Tell to Win: Connect, Persuade, and Triumph with the Hidden Power of Story (ed. Crown Business) [em tradução lite-ral: “Narrar para vencer: conecte--se, convença e triunfe com o poder oculto das histórias”], um livro que reúne uma incrível gama de relatos que demonstram que o segredo de vencer nos negócios e na vida é sa-ber contar uma história.

Pelo telefone, a argumentação de Guber se torna ainda mais forte, em alto volume e com torrentes de pa-lavras que levam a um crescendo de entusiasmo. E confirma várias de suas lições, entre elas a de que um bom con-tador de histórias é um ótimo ouvinte.

Vamos falar de histórias e eu começo: quando eu era garoto, adorava o disco love Gun, do Kiss, que saiu pelo seu selo, o casablanca records. Um amigo e eu até nos fantasiamos no Halloween em homenagem a ele. Mas não pude deixar de notar que há poucas histórias da gravadora em seu livro. Por quê? Eu não escrevi minhas memórias. Foquei as possibilidades da narrativa para os gestores. E pode ser qualquer história: a própria experiência, algo que se observou, notícias, guerra, li-vros, TV, metáforas, analogias. Uma história carrega os valores míticos e a ética de um sistema.

O sr. argumenta que “o coração é sem-pre o primeiro alvo ao contar uma his-tória”, muito mais do que a cabeça ou o bolso. isso é verdade em uma época em que todo mundo só pensa no bolso?Totalmente. Não quis dizer que con-siderações econômicas não são im-portantes; sempre são. Mas, se você visa o bolso das pessoas, nunca vai acender sua paixão, não vai encon-trar uma forma de se conectar com elas emocionalmente e, assim, não construirá um relacionamento.

como o sr. mesmo menciona, “os con-tadores de histórias de negócios não têm o benefício de uma sala de cinema escura ou de uma trilha sonora para interromper o padrão de pensamento da plateia”. então, como eles atraem a atenção das pessoas?Com uma técnica-chave, que funcio-na ao vivo, por telefone ou online: não tente ser interessante; seja interessa-do. Claro que tenho mais chance de saber pelo que você se interessa se eu estiver em seu escritório, olhando seus porta-retratos, vendo onde você mora e qual é a natureza de seus negócios. Mas, se formos falar ao telefone, como estamos falando, posso ter pesquisado sobre você antes ou conversado com pessoas que o conhecem.

O sr. escreveu que a maioria dos gesto-res “falha em ouvir ativamente e son-dar com inteligência, porque não ficam calados o suficiente”. É isso? Sim, um bom contador de histórias é um ótimo ouvinte, e essa escuta deve ser ativa, enfática. Ele precisa ter uma sensibilidade aguda para ob-ter pistas sobre a plateia, para saber como as pessoas estão respondendo, interagindo. Ele quer que elas sejam participantes e não só ouvintes. Se acha que contar uma história com uma finalidade é um evento de uma pessoa só, tudo se complica.

e é mais vantagem comunicar-se oral-mente do que por escrito? Sem dúvida, porque é assim que es-tamos conectados. Não fomos conec-

tados como seres digitais ou criatu-ras escritas, e sim como narradores orais. Temos voz, ritmo e presença, além das palavras, que são apenas 25% da comunicação.

com a ênfase atual em métricas e me-tas financeiras de curto prazo, a nar-rativa não é menos eficaz do que foi? Ao contrário, hoje o recurso “história” é ainda mais eficaz. As pessoas erram ao querer fazer apresentações menos emocionais: “Passe-me os dados, dei-xe-me falar com meu diretor-financei-ro e lhe dou retorno”. Eu, como CEO, nunca assinaria um contrato com uma pessoa se não pudesse sentir sua calma e sinceridade. Nas decisões, deve haver a base de fatos e a base de emoção.

em seu livro, o sr. descreve como cons-truir uma história que capte a atenção, dê uma experiência emocional e esti-mule uma resposta. A tarefa é difícil...Ao contar uma história, você precisa ter um objetivo. Se não tiver, não será

A entrevista é de Matthew Budman, editor da conference Board review.

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“Hoje, o recurso ‘História’ é ainda mais eficaz. nas decisões, deve Haver a base de fatos e a de emoção”

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bem-sucedido. “Vote em meu candida-to político”; “Junte-se a minha igreja”; “Dê-me um aumento”; “Promova-me”. Contar —e ouvir— histórias com uma intenção está em todos nós. É assim que funciona. Contávamos histórias em volta de fogueiras há 30 mil anos, para que os mais novos soubessem quais as regras, crenças e valores da tribo. Isso criava os laços.

Você acha que o LinkedIn criou coe-são social? Coesão social é o que acon-teceu 30 mil anos atrás, quando tive-mos de ir do final da cadeia alimentar para o topo. Lá criamos histórias a fim de nos mantermos unidos, incorporan-

do e transmitindo assim as lições que precisavam ser lembradas.

Quando alguém diz que o Facebook e o Linked In criaram as tribos e a rede de comunicação social, eu lhe digo que vá para a Nova Guiné, para a Etiópia. Eu fui. Povos que foram excluídos da linguagem escrita e da tecnologia contam histórias! Para fazer com que as pessoas se sin-tam conectadas e ajam em conjunto para derrotar oponentes mais fortes. Contar histórias lhes dá propósito, padrões de julgamento de valor e ferramentas de comportamento.

O sr. fala que histórias com intenção “sabiamente contêm as lições que o contador quer inserir no coração e na mente do ouvinte”. Mas muitos ouvin-tes não reviram os olhos quando ouvem uma história com moral? Se a moral é a história toda e a chama-da para a ação não é incorporada à his-tória, então é claro que será algo pre-tensioso ou, pior, ineficaz —os ouvintes simplesmente não ouvirão.

O segredo está na própria história e na forma de narrá-la. Você inclui a li-ção numa boa história para que tam-bém a lição seja emocionante e memo-rável. Não fui eu que inventei isso; só jogo a luz sobre o assunto. E não preci-sa ser um poeta como um Robert Frost para fazê-lo.

Peter Guber tem um dos currículos mais expressivos do mundo do entretenimento. Como chefe de gravadora, produziu grandes nomes da música, como Kiss, Donna Summer e The Village People, e também muitas trilhas sonoras de sucesso, entre elas a do filme Flashdance, que vendeu mais de 14 milhões de cópias. Como che-fe de estúdio, bateu recordes de bilheteria com filmes que tiveram dezenas de indicações ao Oscar, entre eles Batman, As Bruxas de Eastwick e Desaparecido.

Primeiro, Guber fundou a Casablanca Records, que foi adquirida pela Polygram em 1979, e, então, montou a divisão de filmes de cinema e TV da Polygram, da qual

foi CEO e chairman. Depois, em 1983, lançou o próprio estúdio, Guber-Peters Company, que, no final dos anos 1980, vendeu para a Sony. Esta transformou-se na Sony Pictures Entertainment e empossou Guber como seu CEO e chairman, para que ele, entre outras coisas, introduzisse os conceitos de cinema IMAX e de complexo multiplex.

Isso se seguiu até 1995, quando Guber deixou a Sony e criou a Mandalay Entertainment, produtora e distribuidora de conteúdo para entretenimento, que também acumula grandes êxitos, como Sete Anos no Tibet, de Jean-Jac-ques Annaud, e A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, de Tim Burton, entre muitos outros filmes e programas de TV.

saiba mais sobre Peter GUBer

“criamos Histórias a fim de nos mantermos unidos, transmitindo as lições”

AltA GerênciA

Da esquerda para a direita, Batman e cena do filme O Exterminador do Futuro, duas das histórias de Guber

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Ah, mas talento de poeta ajuda...Não, essa linguagem está em todos nós, é o que somos. Por isso amamos fo-gueiras, televisão, entretenimento e es-portes —são histórias. Os fatos e infor-mações estão incluídos na experiência.

Trata-se de uma ideia tão simples que o fato de não ser ensinada em es-colas de negócios, direito, cinema e medicina é insano! As pessoas aban-donaram uma de nossas ferramentas comunicativas mais importantes, por-que decidiram que é coisa de criança. Só que, quando os negócios estão ruins, é isso que importa.

Pergunte a qualquer um sobre quando teve medo, dor, alegria ou desejo, ou quando falhou ou foi bem-sucedido. O que ele faz? Con-ta uma história. Pergunte a alguém por que acredita em um produto. Ele não vai listar os benefícios do produto; descreverá uma experiên-cia que teve com ele. E a propagan-da? É história! Toda vez que alguém conta uma história, você inclusive, tem um objetivo.

Mas, em empresas, não é manipulação? Basta não esconder o objetivo. Se o fi-zer, as pessoas vão perceber e perder a confiança. Você precisa deixar cla-ras suas intenções antes de entrar na sala. Depois se pergunte: “Com quem estou falando?”. Você tem de enxergar os outros como plateia. Dê-lhes uma experiência. Então inclua a análise e os dados. E não esconda o objetivo!

Seu livro é cheio de histórias que o sr. ouviu de pessoas bem-sucedidas, mas deve ter escutado muitas histórias de erros. O sr. vê muitos contadores de his-tórias subestimando seu público ou con-tando histórias ineficazes? Muitos, o tempo todo! Eu fiz isso vá-rias vezes, pois pensava: “Ah, eu tenho todos os números e fatos; eles falam por si”. Você já viu algum número fa-lar por si? Eles precisam ser explica-dos, narrados: têm de contar o benefí-cio e o fardo daquilo para as pessoas, o que significa para a vida delas, para o negócio, para a carreira. É isso que

move seu coração e sua emoção e, de-pois, seus pés e seu bolso.

Qual é o erro mais comum nessa área?O erro mais comum é não reconhecer que se está em uma sala, metafórica ou realmente, com alguém que quer ser um participante, não um espectador. O que é importante não é se alguém vai tentar se comunicar comigo por meio de uma história, mas como, quando, em que contexto e com qual história.

Quando você usa uma história de maneira pouco articulada ou incorre-ta, erra o alvo. Nem todas as histórias são boas; você sempre tem de escolher a história certa, na hora certa e contá-la do jeito certo.

O processo é imperfeito, mas há pis-tas do que não fazer: se você sabe que alguém tem medo de autoridade e en-tra com um uniforme do Exército, es-traga tudo. A pessoa só vai se lembrar disso. Preparação é muito importante.

E depois largue o roteiro, ninguém quer ouvir um roteiro. As pessoas querem falas espontâneas, com to-das as palavras saindo fluentemente. Querem alguém autêntico, vivo, no mesmo barco.

não existem pessoas que simplesmen-te não sabem contar bem uma história? nem todos tiveram uma experiência de vida como a sua, naturalmente rica em histórias. Você teve encontros com pes-soas como Michael Jackson, Muham-mad Ali, Fidel castro, nelson Mandela, Frank Sinatra...Qualquer um pode se dar mal cinco, sete, doze vezes e, então, dar-se bem nisso. Todos vão ao banheiro, fazem sexo, têm pessoas a quem amar e odiar. Todo mundo já caiu e se levan-tou. Todos que estão respirando tive-ram as mesmas experiências —ape-nas vêm de lugares diferentes. E todo mundo no planeta observou essas experiências, então sabe todas essas histórias. Toda pessoa tem o dicioná-rio completo de experiências em seu coração e mente, mesmo que não se torne um John Grisham [autor de best-sellers como A Firma, Dossiê Pelicano e O Cliente].

© The Conference Board Review

Reproduzido com autorização.

Todos os direitos reservados.

HSM Management

“o erro mais comum é não reconHecer que alguém quer ser participante, não espectador de uma História”

Da esquerda para a direita, Guber aparece com os líderes Bill Clinton (EUA) e Nelson Mandela (África do Sul)

Quem conta um

conto...

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Essas imagens do grafite paulistano são do vídeo Non Ducor, Duco, de Duda Hernandez, diretor de criação da WMcCann, que integrou a quarta turma da escola, entre 2009 e 2010. Sua master thesis, escolhida a melhor do ano pela Berlin School, abordou a Lei Cidade Limpa, que estimulou a arte de rua de São Paulo

FORMAÇÃO

magine que você é o diretor de cria-ção de uma agência de publicidade. Ou um repórter especial premiado por, digamos, coberturas de guerra. Ou o diretor artístico de uma gravadora que descobriu a banda pop do momento. Aí você é promovido a CEO. E seu mun-do acaba, porque você não faz ideia de como gerenciar pessoas e nunca aprendeu nada sobre finanças.

Foi pensando em resolver proble-mas assim que Michael Conrad topou

o desafio de criar a Berlin School of Creative Leadership, logo depois de se aposentar de uma longa carreira como publicitário e deixar o cargo de vice-presidente e diretor de criação da Leo Burnett internacional.

Assim que se aposentou, em 2003, foi procurado pelo presidente do Art Directors Club da Alemanha, Sebas-tian Turner, que pediu sua ajuda para desenvolver um programa de educa-ção para a instituição. De início, Con-rad não se sentiu muito motivado. Porém, após várias conversas, os dois identificaram a baixa qualidade do que chamaram de “liderança criativa”

como principal motivo para os pa-drões de desempenho questionáveis da indústria criativa, e então veio a ideia de criar uma escola de negócios voltada para esse público.

A escola começou a funcionar em 2006 e o primeiro aluno matricula-do foi um brasileiro, Luiz Sanches, hoje diretor de criação da Almap- BBDO no Brasil, então indicado por Marcelo Serpa, sócio e presidente da agência atualmente. A Berlin School tinha se constituído como uma orga-nização sem fins lucrativos, a partir de uma rede de pessoas da indústria criativa que apostaram na ideia, entre

Não sou liderado, lideroSE oS gEStorES quErEm SEr maiS criativoS, também oS criativoS buScam SEr mElhorES gEStorES, para não ficar À mErcê dE “ExEcutivoS profiSSionaiS”. a fim dE comandar bEm oS próprioS nEgócioS, ElES têm ido para a bErlin School, diz michaEl conrad, Em EntrEviSta ExcluSiva

I

Fotos: Arquivo pessoal/Duda Hernandez

A entrevista é de Lizandra M. Almeida, colaboradora de HSM MANAGEMENT.

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elas Serpa. Hoje há alunos de 50 paí-ses, e o Brasil é o maior participante, seguido da Romênia. “O que consegui perceber é que os dois países são mui-to em preendedores. Os alunos não re-clamam, são os que conseguem cons-truir algo do nada”, afirmou Conrad, que conversou com exclusividade com HSM Management no “First Executi-ve Seminar: Creative Leadership”, pro-movido em maio, em São Paulo, pela Escola Superior de Propaganda e Mar-keting (ESPM) e pela Berlin School [a parceria entre as instituições pode se tornar regular, o que não estava defini-do até o fechamento desta edição].

Entre os alunos estão não só publi-citários, mas executivos de gravadoras, jornalistas, desenvolvedores de games e profissionais das áreas de entrete-nimento e marketing de empresas diversas. Além de Serpa, também pas-saram por lá Washington Olivetto, da WMcCann, João Daniel Tikhomiroff,

da produtora Mixer, e outros “gurus” da publicidade e do entretenimento, como Seymour Stein, cofundador e presidente da Sire Records, a grava-dora que descobriu Ramones, Talking Heads e Madonna, Keith Reinhearth, presidente emérito da DDB internacio-nal, e o brasileiro André Midani, CEO da Warner Music International e pro-dutor musical que esteve na linha de frente da bossa nova.

O currículo entremeia discussões acadêmicas com apresentações de profissionais de diversas áreas. “A co-municação é chave nos negócios hoje em dia, e é muito importante que o profissional saiba o que ela pode agre-gar para criar uma cultura. A Apple não seria o que é se tudo se resumisse à funcionalidade”, disse Conrad.

Segundo ele, pessoas criativas ge-ralmente são inseguras, precisam de aprovação externa e, na Berlin School, a maior competência que adquirem é

justamente a confiança. “Para nós, o importante é que a pessoa seja since-ra consigo, que se conheça e saiba de suas limitações. Nosso foco está prin-cipalmente no desenvolvimento da liderança; por isso, discutimos como lidar com a complexidade, como de-senvolver estratégias alternativas, a tomada de decisão, o alinhamento”, explicou. A intenção: que cada um descubra onde pode fazer diferença.

O principal programa da escola é um MBA executivo de cinco módulos de duas semanas, divididos em aulas em Berlim, Ásia (Xangai ou Tóquio) e Estados Unidos (Nova York ou Los Angeles), em uma estrutura flexível que permite o desenvolvimento do curso em até dois anos. Depois de cada módulo, todos retornam a seus lugares de origem com uma missão e têm até cinco meses para desenvolvê--la ou implementá-la. Na volta à esco-la, discutem os resultados obtidos nos locais de trabalho.

As novas tecnologias de comunica-ção são um ponto central do curso. Além de muitos diretores de tecnolo-gia de empresas como Google Apps e Dentsu, a escola também recebeu Pablos Holman, um hacker “legal”, que trabalha para empresas de comu-nicação e acredita que o trabalho do hacker consiste em reorganizar peças e partes, para transformá-las em no-vos produtos. “Procuramos fazer todo tipo de exercícios para estimular as pessoas a pensar disruptivamente e abraçar a tecnologia”, disse Conrad.

Para ele, o futuro da escola está nos alunos, que voltam para ensinar. É a partir dessa rede de pessoas criativas que a escola pretende concretizar sua missão: ter um CEO criativo em cada empresa da área criativa. Eles que-rem fazer valer o lema do trabalho de um aluno brasileiro premiado lá, Duda Hernandez, diretor de criação da WMcCann: “Non ducor, duco” (o lema de São Paulo, que, em latim, sig-nifica “Não sou liderado, lidero”).

Ao ensinar profissionais de criação a se tornar líderes, a escola se propõe fazer com que cada indivíduo seja o melhor líder que puder. “Não podemos ensinar ninguém a se tornar Mandela, mas ensinamos cada um a ser ele mesmo” é uma de suas máximas. Nesse contexto, o curso procura derrubar seis mitos de liderança:

1. Liderança é um talento individual? Não, é muito mais do que isso, e o líder tem sempre de estar focado no interesse da empresa. A ideia é que a organização vá muito bem, obrigado, com ele e —principalmente— sem ele.

2. Ser um bom líder é ter seguidores? Não, se as pessoas querem seguir o líder, ótimo, mas carisma não é tudo na vida.

3. Liderar bem é manter a calma nas crises? Não, frieza também não é tudo. Um exemplo é o do ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, que se manteve no controle no desenrolar do ataque às Torres Gêmeas, mas se revelou altamente autocrático ao longo de sua carreira.

4. Bons líderes se baseiam em instinto e inspiração? Não somente, eles também recor-rem muito a desenvolvimento pessoal, autoconhecimento e conhecimentos profundos do negócio e de gestão. Boas ideias sozinhas não são suficientes.

5. Bons líderes turbinam o preço das ações? Não basta isso; a empresa precisa ser sólida.6. O líder é uma figura distante, no topo da pirâmide? De preferência, não. Líder é

aquele que inspira e tem empatia pelos outros. Valem mais suas ações no dia a dia do que atos grandiosos.

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•Senãoéfácildefiniroqueéumapessoa“aberta”,muitomenosumaempresa.Noentanto,oadjetivo,cadavezmais,fazpartedovocabuláriodomundodosnegócios.

•Trêsdimensõesconstituemessaaberturaepodemajudarasorganizaçõesnocaminhoatéosucesso:transparência,expansãodasfronteirasecriaçãointelectualcompartilhada.

•Paraasociedade,trata-sedeumanovaera,commaispossibilidadesdedesenvolvimentoparatodos.Paraasempresas,abrem-senovoshorizontesdemaximizaroconhecimento—eosganhos.

EStratégIa

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Aberturaem 3-D

termo “aberta” é rico em signi-ficados e conotações positivas. En-tre outros aspectos, é associado a ter ações negociadas em bolsa de valo-res, sinceridade, flexibilidade, envol-vimento e diálogo. Em países que já viveram regimes ditatoriais, tem uma conotação especial de liberdade. Não é, porém, um adjetivo tradicionalmente utilizado para descrever empresas. Pa-lavras como “isoladas”, “burocráticas”, “hierárquicas” e “fechadas” em geral combinam mais com elas.

As companhias mais inteligentes andam, contudo, flertando com a ideia de ser abertas. Em que dimensões? Em três, que realmente fazem dife-rença nos negócios: transparência, expansão das fronteiras e criação in-telectual compartilhada.

DIMENSãO Nº 1: traNSParêNcIaPara a maioria das companhias, faz cada vez mais sentido optar pela trans-parência. A globalização, a comuni-cação instantânea e a organização da sociedade civil mudaram as regras do jogo. As empresas precisam lidar com um conjunto de padrões comple-xo e em constante transformação, pu-xados por incansáveis representantes dos mais diversos stakeholders, que

são rápidos em passar adiante seus julgamentos. Cada passo, e cada pas-so em falso, é alvo do escrutínio pú-blico e todas as organizações que têm uma marca ou reputação a proteger estão vulneráveis.

Minha pesquisa indica que, na maior parte dos setores de atividade, as em-presas que adotam a transparência apresentam melhor desempenho. Elas mesmas o reconhecem: essa atitude, assumida de maneira proativa, au-menta as chances de sucesso e consti-tui uma fonte cada vez mais importan-te de diferenciação.

Olhando para trás, as organizações eram fechadas em parte porque po-diam ser; guardavam informações im- portantes para si mesmas, especial-mente no que dizia respeito a falhas, erros e fraquezas, e tendiam a ter como padrão o segredo.

Agora, em um mundo condicionado pela expectativa de transparência ex-

O

Don tapscott é professor da rotman School, do canadá, e autor de livros de referência como a Empresa transpa-rente (ed. M.Books), a Hora da geração Digital (ed. agir) e MacroWikinomics (ed. campus/Elsevier). Virá ao Brasil para a HSM ExpoManagement 2012.

Como mostra o espeCialista em era digital don tapsCott, da rotman sChool, empresas de vanguarda estão abraçando o ConCeito de abertura para responder de maneira efiCaz às demandas da soCiedade Com três deCisões muito Claras

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a transparência tem de envolver a divulgação de informações que podem ajudar os stakeholders ou impedir que eles sejam prejudicados

SEr aBErtO SIgNIFIca:

Possibilidades“Aberto para os negócios”Honestidade, transparência“Livro aberto”Padrões“Sistemas abertos”Redes“Política de portas abertas”Inovação“Encontrar uma abertura”Compartilhar“Open source”Escutar“Ouvidos abertos”Flexibilidade e agilidade“Aberto a sugestões”Acesso“Open bar”Liberdade“Sociedade aberta”Expansividade“Abertura”Reabastecimento“Open stock”Complexidade“Final aberto”Sinceridade“De coração aberto”Primórdios“Abridor”Ausência de restrições“Loja aberta”, “temporada aberta”Oportunidade“Mercado aberto”

trema, muitas companhias estão des-cobrindo que maior transparência não apenas reduz os custos de transação, como também favorece a confiança e a boa vontade alheia, o que permite que elas realizem inovações com um grupo de parceiros mais amplo. Os funcioná-rios de uma empresa aberta confiam mais uns nos outros e no próprio em-pregador, o que também resulta em custos mais baixos, melhor qualidade e maior grau de inovação e de fidelidade.

No entanto, há algumas questões a responder: que áreas corporativas precisam estar envolvidas na gestão da transparência? Quais devem ser abertas e quais devem ser fechadas? Quais stakeholders podem ter acesso às informações e com que frequência? Quais mídias sociais têm de ser moni-toradas e como serão engajadas?

Várias empresas já começaram a enfrentar tais questões. A varejista de eletrônicos Best Buy adotou o princípio segundo o qual os clientes devem saber tudo o que a companhia sabe, até mes-mo dados sobre níveis de defeito dos produtos. Seu CEO, Brian Dunn, diz que não se trata apenas de construir a confiança; segundo ele, “os consumi-dores têm direito a essas informações”.

As organizações precisam manter alguns segredos, que são legítimos, e os funcionários nunca devem violar os acordos de confidencialidade ou a lei. A transparência tem de envolver a di-vulgação de informações pertinentes,

definidas como aquelas que “podem ajudar as partes interessadas ou impe-dir que sejam prejudicadas”.

DIMENSãO Nº 2: ExPaNSãO DaS FrONtEIraSRelacionada com a arquitetura cor-porativa e suas fronteiras, ela desa-fia a empresa tradicional, integrada verticalmente, como uma espécie de monstro paradoxal. Titãs do capitalis-mo, como Henry Ford, defendiam as virtudes das regras de mercado, mas suas companhias eram a antítese des-tas, pois funcionavam como organiza-ções de economia planificada. Se assim triunfaram muito tempo sobre a con-corrência, isso não acontece mais.

A empresa monolítica e verticalmen-te integrada começou a perder força diante de concorrentes ágeis, com pa-redes mais porosas ao mundo externo (que utilizam a internet para promover a abertura e obter algum controle de conhecimentos, recursos e capacida-des fora de suas fronteiras).

Tais competidores inteligentes criam um ambiente que favorece a inovação e convidam clientes, parceiros e outros terceiros a criar conjuntamente produ-tos e serviços. Na maioria dos casos, têm conseguido inovar mais e ter me-lhor desempenho com suas redes.

Vale retomar o trabalho do econo-mista Ronald Coase, vencedor do Prê-mio Nobel, para compreender o que está acontecendo. Em 1937, Coase fez

EStratégIa Aberturaem 3-D

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Page 38: Matérias HSM

EStratégIa

a pergunta necessária “Por que as em-presas existem?”. Afinal, se o mercado é o melhor mecanismo para alocar recursos, por que não são as pessoas, agindo individualmente, que compram e vendem no mercado, em vez de em-presas? A resposta ele encontrou nos custos de transações tais como buscar no mercado o produto certo e nego-ciar sua compra. Acabava sendo mais eficiente do ponto de vista dos custos operar com o maior número possível de funções dentro de casa.

Passaram-se 75 anos, contudo, e as tecnologias digitais, que não existiam então, arrasaram os custos de transa-ção e colaboração. O resultado é que as empresas verticalmente integradas têm sido desdobradas em empresas mais focadas, que trabalham juntas. O mantra “Concentre-se no que você faz melhor e feche parcerias para fazer o restante” está servindo para todos.

Além da eficiência de custos, outro aspecto a ser considerado em relação às fronteiras é o do capital humano. A sa-bedoria convencional diz que esse capi-tal tem de estar dentro da empresa, que é estimulada a “contratar os melhores profissionais”, motivá-los, desenvolvê--los e retê-los, mas hoje ela consegue fazer isso de fato? Muitos dos melhores profissionais têm preferido ficar fora das fronteiras corporativas —tanto que, atualmente, é comum a inovação come-çar nas beiradas da empresa.

Além disso, os consumidores estão cada vez mais se organizando para desenvolver bens e serviços, criar co-nhecimento ou simplesmente produzir experiências dinâmicas que possam ser compartilhadas. Surge, assim, a economia da colaboração, global e in-terdependente, em que bilhões de pro-dutores autônomos agem, conectam--se e criam valor juntos.

Nesse contexto, o modelo tradicional de recrutar, gerenciar e reter funcioná-rios está claramente ultrapassado.

DIMENSãO Nº 3: crIaçãO INtElEctual cOMPartIlHaDaComo se sabe, na economia do passa-do, os trabalhadores contribuíam com

os braços, mas não com o cérebro. Hoje, as empresas querem contribui-ções cerebrais de seu pessoal, pois os únicos ativos que fazem diferença são os do conhecimento, e a única forma significativa de capital é o intelectual.

A sabedoria convencional continua a dizer que é preciso controlar e prote-ger a propriedade intelectual, por meio de patentes, copyrights e marcas, mas milhões de jovens de todo o mundo, plenamente alfabetizados em tecnolo-gia, usam a internet para criar e com-partilhar livremente músicas em MP3, além de ferramentas para trabalhar com elas. Em vez de reconhecer isso e adotar novos modelos de negócio, a indústria tem preferido ficar na defen-siva, com respostas judiciais ao novo modelo. Ela está certa?

Creio que não. Inegavelmente, a digitalização introduz novos proble-mas, do ponto de vista da apropria-ção, para os criadores de conteúdo. Se sua criação pode ser reproduzida sem nenhum custo, por que alguém pagaria por ela? E, se ninguém paga, como você recupera seu investimen-to em custos fixos?

Porém Hollywood já encontrou uma solução: novas tecnologias de gestão de direitos digitais fazem com que o conhe-cimento e os conteúdos sejam mais “ex-clusivos” —a quantidade de informação pode ser medida, o comportamento dos consumidores pode ser monitorado e os detentores da propriedade intelectual podem cobrar taxas por acesso.

Os territórios murados em que se encontravam os conteúdos —os ban-

cos de dados e os softwares fechados — prometiam retornos saudáveis para seus criadores. Ao mesmo tempo, no entanto, restringiam o acesso às fer-ramentas essenciais da economia do conhecimento. Pior: acabavam com as reais oportunidades de inovações im-pulsionadas pelos consumidores, que poderiam dar origem a novos modelos de negócio e até mesmo a setores de atividade inéditos.

Empresas de setores como os de ele-trônica e biotecnologia, entre outros, têm descoberto que manter e defender a propriedade intelectual frequente-mente castra sua capacidade de criar valor. As companhias de vanguarda es-tão tratando a propriedade intelectual como um fundo mútuo, em que podem gerenciar um portfólio equilibrado de ativos desse tipo, alguns protegidos e outros disponíveis para todos.

tEMPOS INtErESSaNtESPara os indivíduos, para as pequenas empresas e para a sociedade, esta é uma nova e excitante era, em que po-derão participar da produção e agregar valor a sistemas de larga escala eco-nômica, de formas antes impossíveis. Para as grandes organizações, tam-bém: seus recursos e talentos podem contribuir para elas e para todos.

© rotman magazine

reproduzido com autorização da rotman school

of management, da university of toronto.

todos os direitos reservados.

algumas empresas, como as de eletrônica, descobriram que manter e defender a propriedade intelectual castra sua capacidade de criar valor

HSM Management

Aberturaem 3-D

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Dossiê

Talvez mais do que o código genético, o cérebro diz o que cada um de nós realmente é, mostrando o que temos em comum e nossas diferenças. Esses cir-cuitos de neurônios e sua dinâmica explicam por que escrevemos, como nos lembramos das coisas, o que sentimos, as tristezas, os medos e os amores.

Quem oferece essa explicação é o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, um pioneiro nas pes-quisas sobre o cérebro e sobre a interface cérebro- -má quina, que está, com suas equipes nos Estados Unidos, na Suíça, na Alemanha e no Brasil, fazendo uma série de descobertas importantíssimas en-volvendo desde a possibilidade de um tetraplégico voltar a andar com o auxílio de um terno robótico

comandado por seu cérebro até a terapia eficaz de uma doença degenerativa como Parkinson.

Não há dúvida: a neurociência, que estuda o cére-bro, tende a dar uma segunda chance a diferentes segmentos da sociedade. O mais óbvio é o grupo das pessoas que sofrem dos males pesquisados. Menos óbvios, porém, e bastante relevantes, são os segmentos tratados neste Dossiê: as empre-sas, que podem enfim humanizar sua gestão cons-cientes do que leva os seres humanos a agir desse ou daquele modo, e o Brasil, que pode tornar-se referência em uma inovação de ponta —a indústria neurotecnológica— e também fazer uma revolu-ção empreendedora pela educação científica.

A FISIOLOGIA DO GERENCIAMENTO Reportagem HSM Management

62

SE O CÉREBRO FALASSEEntrevista com David Rock 68

O BRASIL E A ERA DO CÉREBROEntrevista com Miguel Nicolelis

76

CASOS REAISPor Jeffrey Schwartz, Pablo Gaito e Doug Lennick

72

NEUROBUSINESS

NOSSA SEGUNDA ChANCE

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DossiêNEUROBUSINESS

62 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

as descobertas da neurociência estão, cada vez mais, chegando às empresas. reportagem hsm management mostra como esse novo conhecimento tende a modificar, e a humanizar, a gestão, que por muitos anos pautou-se pela visão mecanicista desenvolvida na era industrial

falta de reconhecimento no trabalho dói tanto quanto uma pancada na cabeça: o cérebro sente a exclusão e emite um impulso neural intenso que termina por prejudicá-lo.

“Posso lhe dar um conselho?” não é uma pergunta simpá-tica: para quem ouve é o equivalente à angústia de escutar passos desconhecidos durante a noite. O cérebro entende que quem pergunta está impondo sua superioridade, fica na defensiva e envia a ordem para que as glândulas produzam hormônios do estresse.

Um aperto de mãos ou uma troca de olhares sobre algo engraçado dilui a sensação de perigo que muitos líderes causam em seus subordinados, que, com medo deles, sen-tem como se sua vida estivesse ameaçada. É que o cérebro libera o hormônio do amor diante de gestos simpáticos, esti-mulando confiança, empatia e generosidade.

Graças à neurociência, conjunto de disciplinas científi-cas que estudam o cérebro para estabelecer a base orgâ-nica do comportamento, hoje se sabe que a dor “social” descrita nas três situações acima é um impulso primá-rio. Isso significa que, contrariando a crença comum, o sofrimento por motivos emocionais acontece em regiões do cérebro similares às que processam a dor física e não deve ser desconsiderado. O cérebro humano é um órgão social e sua luta para atenuar o sofrimento emocional é uma batalha pela sobrevivência.

A reportagem é de Florencia Lafuente, colaboradora de HSM MANAGEMENT.

GERENCIAMENTO

A FISIOLOGIA DO

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63HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

CÉREBRO SOCIALEm menos de uma década, avanços tec-nológicos como a ressonância magné-tica tiraram a neu-

rociência dos limites do laboratório. As re-

centes descobertas sobre a flexibilidade do cérebro,

sua capacidade de criar no-vas conexões neurais em qualquer idade, sua receptivi-dade ao treinamento cogniti-vo e a confirmação de que a conduta humana tem origem fisiológica são revelações for-midáveis para o mundo dos negócios e, sobretudo, para a área de gestão.

Sabemos que o trabalho é uma transação econômica —horas de dedicação em troca de salário—, mas para o cérebro o ambiente profis-

sional é um sistema social. Da mesma forma que os pre-dadores estão programados para reagir diante da caça, o cérebro humano está conectado de modo a responder às ameaças sociais como se sua existência dependesse disso. Basicamente, para o cérebro não há diferença entre ser condenado ao ostracismo e ter fome.

As pessoas não podem ser criativas, trabalhar em harmo-nia com sua equipe ou tomar decisões acertadas quando seu sistema de defesa está em alerta. Consideremos o seguinte exemplo: para lidar com o estresse, o cérebro consome oxi-gênio e glicose destinados à função da memória recente, que processa novas informações e ideias. Tal procedimento re-sulta em deterioração do pensamento analítico, diminuição da capacidade de resolver problemas e queda de criatividade.

“Qualquer mudança, por menor que seja, em como perce-bemos uma situação ou realizamos uma tarefa tem efeitos drásticos em nosso desempenho e bem-estar pessoal”, afir-ma Susan Greenfield, especialista em fisiologia do cérebro e professora de farmacologia sináptica da Oxford University [veja quadro na página 65].

David Rock, cofundador e CEO do NeuroLeadership Ins-titute, iniciativa global que busca criar uma ciência para o desenvolvimento de novos líderes, vai além: “No futuro, a capacidade de colocar o cérebro social a serviço do desem-penho será um diferencial dos gestores”. [Veja entrevista com David Rock na página 68.]

“Estudos do cérebro têm demonstrado que a crítica melhora o fluxo

de ideias”Jonah Lehrer

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64 HSMManagement 92 • maio-junho 2012 hsmmanagement.com.br

NEUROMANAGEMENT Com o desenvolvimento da neurociência, os modelos e as fórmulas de gerenciamento construídos com base em teo-rias têm perdido espaço para os novos conhecimentos sur-gidos de experiências científicas empíricas. Essas pesquisas são interdisciplinares e envolvem psicologia, sociologia, eco-nomia, psiquiatria, bioquímica e filosofia.

Tais saberes formam a base do neuromanagement —e suas subdivisões, como a neuroliderança, o neuromarke-ting e o neurocoaching [veja quadro acima]. Seu objetivo é explorar os mecanismos intelectuais e emocionais vin-culados à tomada de decisão e ao gerenciamento organi-zacional para desenhar metodologias e ferramentas que, por meio do desenvolvimento das capacidades cerebrais, melhorem a eficiência dos líderes e potencializem o de-sempenho das pessoas.

O neuromanagement se popularizou nos últimos cinco anos graças à redução dos custos das tecnologias de aná-lises de imagens. O uso desses recursos permite a observa-ção direta da atividade cerebral e o entendimento completo sobre como funciona o cérebro e qual é a participação das emoções no sucesso ou no fracasso dos indivíduos. E, dife-rentemente das tradicionais pesquisas de ciências sociais, a neurociência traz o rigor das ciências biológicas e exatas, o que possibilita criar metodologias efetivas para a mudança.

OUTRO OLHARAs descobertas científicas sobre o funcionamento do cérebro estão jogando por terra muitas das ideias de gerenciamento concebidas nas últimas décadas. Um exemplo: os escritó-rios divididos em baias, sem espaço privativo, favorecem a criatividade, certo? Não exatamente, segundo as pesquisas de especialistas. Hélio Schwartsman, filósofo brasileiro e co-lunista do jornal Folha de S.Paulo, escreve em seu artigo “A mitologia das ideias” que a privacidade e o silêncio tornam as pessoas mais produtivas.

Schwartsman apoia-se no estudo Coding War Games, li-derado pelos consultores Tom DeMarco e Timothy Lister, que compararam o trabalho de mais de 600 programado-res de computadores, de 92 companhias. A pesquisa des-cobriu que a enorme diferença no desempenho entre as melhores e as piores organizações não tinha relação com a experiência ou o salário de seus funcionários, e sim com a privacidade que estes desfrutavam e a quantidade de vezes em que eram interrompidos.

Entre os programadores de melhor desempenho, 62% afirmaram que seu espaço de trabalho era suficientemente privado para se concentrar e criar com tranquilidade e ape-nas 38% disseram ser interrompidos com frequência.

De outro lado, entre os programadores menos produ-tivos, só 19% garantiram ter a privacidade necessária e

GLOSSÁRIO

Neurocoaching sua proposta é melhorar e ampliar as estratégias de desenvolvimento. indica quais as ferramentas e

técnicas necessárias para dominar e equilibrar as emoções e estabelecer

novas conexões neurais que impulsionam pensamentos,

crenças e sentimentos.

interdisciplinar, a neurociência engloba, além da biologia, química, ciência da computação, engenharia, linguística, matemática, medicina, filosofia, física e psicologia. muitas vezes, o termo é usado no plural, porque há as neurociências molecular, celular, sistêmica, comportamental e cognitiva.

Neuroeconomia combina economia, biologia

e psicologia, entre outras disciplinas. está centrada no estudo do comporta-

mento, na confiança nas re-lações, na tomada de riscos irracionais, na avaliação re-lativa de custos e benefícios de curto e longo prazos e na

conduta altruísta.

NeuroliderançaÉ um campo interdisciplinar

da ciência que estuda a base neural da liderança e das práticas de gerencia-mento. explora os proces-sos do cérebro por trás das decisões, os comportamen-tos e as interações sociais

no trabalho e fora dele. seu objetivo é melhorar a

eficiência dos líderes.

Neuromarketing estuda como o cérebro res-ponde aos anúncios publi-

citários e à comunicação de marcas por intermédio da

pesquisa da atividade cere-bral e corporal. visa desco-brir os desejos secretos do consumidor para antecipar

seu comportamento.

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65HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

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76% declararam ser interrompidos com frequência. As dis-trações no trabalho reduzem a energia,

diminuem a atenção, prejudicam a tomada

de decisões e impedem a formação da memória.

Segundo estudos de 2009 reunidos por David Rock, uma pessoa perde 546 horas de traba-lho por ano devido a interrupções no escritório e demora 25 minutos para recuperar a atenção depois de uma dispersão.

A convivência criativa acontece de maneiras mais sutis que for-çando os funcionários a conviver em espaços onde as únicas portas conduzem aos banheiros ou à rua.

Um exemplo célebre é o Building 20, um prédio do campus do Massachusetts Institute of Technology (MIT) construído durante a Segunda Guerra Mundial e destinado à incubação de projetos inovadores.

Sua edificação básica e incoerente —tinha sido pen-sado como algo temporário— formava um labirinto de pequenas salas, corredores, escadas e áreas de descan-so nas quais se encontravam cientistas de todo tipo. Em seus 55 anos de existência, nele surgiram avanços tão fundamentais como o radar, as micro-ondas, os primei-ros videogames e a linguística chomskiana. Batizado na-quele tempo de “santuário da ciência”, hoje é possível explicar cientificamente a origem de tanta capacidade criativa: privacidade.

Outro exemplo de uma teoria obsoleta? A que sustenta que o brainstorming é um processo criativo por excelên-cia. Inventado na década de 1940 por Alex Osborn, um dos fundadores da agência de publicidade BBDO, o método é conhecido: um grupo se reúne e começa a propor ideias; nenhuma proposta pode ser criticada, e sim aproveitada como base para outras.

“sabemos que o cérebro humano vai mudar, a pergunta é se para o bem ou para o mal”, diz a reconhecida cientista britânica susan greenfield, especializa-da em fisiologia do cérebro e professora de farmacologia sináptica da oxford uni-versity, do reino unido. “as novas gera-ções estão se afastando da interação hu-mana, dos abraços, dos cheiros, e isso é um exemplo do que será a vida no século 21. a cultura da tela de computador está gerando uma mudança mental equipa-rável à mudança climática.”

a pesquisadora acha que as conse-quências da cultura da tela serão senti-das em três aspectos principais:

1. Informação versus conhecimento. as pessoas detectarão padrões e processa-rão informação com rapidez. no entanto, informação não é conhecimento. enten-der conceitos e estabelecer relações,

comparar e colocar os dados em pers-pectiva são habilidades que se aprendem interagindo com outros, lendo livros. o cérebro humano adapta-se ao ambiente; se o ambiente indica que deve falar com um computador, ele fará isso.

2. Assumir e gerenciar riscos. a cultu-ra da tela ensina que os atos não têm consequências —tudo pode ser apa-gado ou revertido— e que recomeçar é algo natural. no mundo real, porém, as ações causam efeitos. uma empre-sa quer que seus funcionários se arris-quem, mas com consciência.

3. Identidade, empatia e socialização. como a identidade das pessoas será afetada pelo fato de a principal atividade de socialização acontecer nas redes so-ciais? vejamos o caso do twitter —e não há aqui uma crítica à tecnologia, e sim a seu uso—, onde as pessoas escrevem coisas como: “olá, eu me levantei, comi

cereais, calcei minhas meias”. quem se importa? parecem as crianças quando dizem: “olha, mamãe, olha o que eu consigo fazer”. se a mamãe não olha, elas não existem. hoje, o sentido da identidade está dado pelo outro. muito facebook e pouca interação.

O PRÓXIMO PASSO

Gregory Berns

“Os melhores programas

organizacionais podem ser uma ameaça se não

considerarem as reações do cérebro”

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66 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

No entanto, estudos do cérebro comprovaram que os indivíduos, quando estão em grupo, tendem a deixar que outros façam seu trabalho. Instintivamente “imitam” as opiniões dos demais e perdem de vista as suas. Sucum-bem à pressão dos colegas.

Em um artigo publicado na The New Yorker, Jonah Lehrer, especialista em neurociência e autor de O Momen-to Decisivo (ed. Best Business) e Proust Era um Neurocien-tista (ed. Lua de Papel), relata que estudos do cérebro têm demonstrado que a crítica melhora o fluxo de ideias. Ele cita uma experiência: formaram-se dois grupos de brains-torming; cada um recebeu uma recomendação: um podia criticar, o outro não. Terminada a sessão, o primeiro grupo teve 20% mais ideias e continuou inspirado muito depois de a reunião ter acabado.

John Medina, biólogo molecular e autor de Aumente o Poder do Seu Cérebro (ed. Sextante), desbanca um mito so-bre o desempenho: o multitasking. “O cérebro não pode focar mais de uma tarefa ao mesmo tempo, simplesmente

porque é um processador se-quencial. Só pode passar de

uma tarefa à outra com mais ou menos rapidez.

Os multitaskers pare-cem eficientes, mas a verdade é que chegam a demo-rar 50% mais para completar um tra-balho e cometem quatro vezes mais

erros que as pessoas que realizam uma tare-

fa por vez.”

DOR DE CABEÇAO cérebro humano é complexo. A linha entre o que o estimula e o que o maltrata é muito tênue. Gregory Berns, professor de psiquiatria, economia e negó-cios e diretor do departamento de neuroeconomia da Emory University, explica que até os melhores programas organiza-cionais podem se tornar uma ameaça se não levarem em con-ta as reações do cérebro diante de determinadas situações.

As análises de desempenho são um exemplo. As pessoas que estão sendo examinadas costu-mam sentir que só por partici-par dessa atividade seu status

dentro da compa-nhia é afetado. Vivenciam a experiência como uma ameaça. Tal postura difi-culta o retor-no esperado: a mudança positiva do comportamento.

Todas as situações re-lacionadas com a “dor so-cial” experimentada pelo cérebro diante da sensa-ção de exclusão acabam afetando a capacidade cognitiva. “Quando al-guém adota uma postura diferente, uma pequena parte do cérebro associa-da ao medo da rejeição é ativada. Portanto, inicia--se uma reação emocio-nal que reduz os recur-sos disponíveis para o ‘cérebro pensante’, no córtex pré-frontal, o que, por sua vez, diminui o desempenho e a capaci-dade de criar e de tomar decisões”, explica Berns. Sendo assim, acrescenta ele, os líderes devem entender a importância de promover ambientes de aceitação e autonomia para oferecer seguran-ça para sua equipe.

Paul Zak, professor de economia da Claremont Graduate University e fundador e diretor do Center for Neuroecono-mic Studies, acredita que a neuroeconomia tem o potencial de substituir o enfoque mecanicista do gerenciamento por outro mais humanista. “A ciência tem contribuído muito para a economia”, afirma. “Os cientistas contam com gran-des técnicas de observação e enten dem o funcionamento do cérebro, mas nem sempre formulam as perguntas adequa-das. Os economistas questionam-se sobre como as decisões são tomadas ou o que motiva determinados comportamen-tos, porém, quando vão interpretar as possíveis razões, sur-ge um grande enigma. Na verdade, eles assumem alguns pontos como certos —por exemplo, acreditam que o indiví-duo toma decisões com base em informações. O cérebro, no entanto, não está programado dessa maneira.”

Grande parte das decisões que tomamos, aponta Zak, não é fruto do estudo das alternativas possíveis, e sim de motivações inconscientes, ou seja, incentivada por intui-

John Medina

“O cérebro não pode focar mais de uma tarefa ao mesmo tempo, porque é um processador

sequencial”

“Incentivada por intuições ou

sentimentos, nossa mente chega a

conclusões rápidas ”Paul Zak

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67HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

ções ou sentimentos, nossa mente chega a conclusões rá-pidas. O hemisfério esquerdo do cérebro tenta dar sentido ao mundo e, em busca de significado, atribui um enorme peso às evidências que apoiam nossas teses e ignora as que não interessam. O renomado psicólogo experimental e linguista Steven Pinker diz que “há um mundo de dife-rença entre crer que se sabe a verdade e saber de fato que algo é verdade”.

Um estudo realizado no California Institute of Technolo-gy analisou de que modo os preços de um produto influen-ciam as preferências de gosto. Os participantes provaram dois vinhos: um de US$ 10 e outro de US$ 90. Na verdade, os vinhos eram o mesmo, mas as pessoas não sabiam dis-so. A bebida mais cara foi qualificada como a mais sabo-rosa. Contudo, segundo o estudo das imagens, as regiões

do cérebro associadas ao gosto não sofreram alteração,

enquanto as relaciona-das com o prazer da

experiência foram modificadas.

Pesquisadores em neuroecono-mia da Univer-sity of Pennsyl-vania, liderados pelo professor de

psicologia Joseph Kable, identificaram

uma parte específica do cérebro —o córtex

frontal ventromedial— co- mo a responsável por tomar decisões sobre o valor. Esse estudo procura determinar as configurações de produtos e preços que os consumido-res percebem como justas.

De acordo com o neuro-marketing, a maioria das de-cisões de consumo responde às emoções e não à razão. Martin Lindstrom, um dos especialistas mais reconheci-dos na área, diz que no futuro próximo o papel do especia-lista em marketing ficará ob-soleto para dar lugar à prática de psicólogos e cientistas.

Dan Ariely, professor de psi-cologia e economia do compor-tamento da Duke Uni versity, acha que o uso da ressonância magnética em marketing será

cada vez mais popular, por sua eficiência e porque os custos de aplicação con-tinuarão baixan-do. “Ao revelar dados sobre as preferências de compra que o pró-prio usuário é incapaz de verbalizar, as companhias poderão intervir na fase de de-senvolvimento de seus produ-tos, testar conceitos com rapi-dez e eliminar os que não são promissores.”

TREINAMENTO PARA A POSITIVIDADEO neurocoaching oferece fer-ramentas para intervir de ma-neira consciente em processos cerebrais automáticos. A ado-ção e prática de novas condu-tas criam circuitos neurais e os reforçam.

Uma pesquisa de 2009 de-nominada Neuroleadership and the Productive Brain concluiu que quatro horas de treinamento cerebral on-line durante 30 dias melho-ram de modo significativo a produtividade e a capacida-de dos funcionários de au-torregularem suas emoções, um fator-chave no controle cognitivo, uma vez que as emoções negativas absorvem a energia neural e disper-sam a atenção.

Mudar é um desafio. Dos 60 mil pensamentos diários de uma pessoa, 80% são negativos. Segundo os especialistas, para manter o estado de bem-estar, são necessários três pensamentos positivos para cada pensamento negativo.

É possível reverter a inclinação natural do ser huma-no ao pessimismo? Sim; tornando-se consciente da ten-dência mental para libertar a negatividade. Se alguém se apega aos pensamentos e sentimentos negativos, con-tinua revisando-os e persistindo em compreendê-los e termina conseguindo o que deveria evitar: reforça o pes-simismo. Ao desviar a energia e a atenção das conexões neurais negativas, estas se debilitam e desaparecem.

Steven Pinker

“Há um mundo de diferença entre crer

que se sabe a verdade e saber de fato a

verdade”

“A ressonância magnética revela

preferências de compra que o próprio usuário é incapaz de verbalizar”

HSM Management

Dan Ariely

Page 46: Matérias HSM

68 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

David Rock é um dos fundadores do NeuroLeadership Institute, iniciativa global que reúne neurocientistas e es­

pecialistas em liderança com o objeti­vo de construir uma nova ciência para o desenvolvimento dos gestores. Também é fundador e CEO da empresa de con­

sultoria NeuroLeadership Group. Entre os clientes que têm utilizado seus treinamen­

tos estão a Nasa (agência espacial dos Esta­dos Unidos), outros departamentos do gover­

no norte­americano, bancos de atuação global e empresas listadas entre as 500 maiores dos

Estados Unidos pela revista Fortune.Um dos editores do NeuroLeadership Journal, é autor

de quatro livros, entre eles o best­seller Your Brain at Work: Strategies for Overcoming Distraction, Regaining Focus, and

Working Smarter All Day Long (ed. HarperBusiness) e Coaching with the Brain in Mind: Foundations for

Practice (ed. Wiley), nenhum lançado no Bra­sil ainda. David Rock é Ph.D. em neuro­

ciência da liderança pela Middle­sex University, de Londres,

Reino Unido.

Saiba mais sobre David Rock

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s líderes bem-sucedidos do futuro se caracterizarão pela capacidade de adaptação, uma habilidade que vai exigir muita flexibilidade cognitiva. A boa notícia, porém, é que o cérebro é um órgão com plasticidade e aprende.” A afirmação é de David Rock, criador do conceito de neu-roliderança e diretor do NeuroLeadership Institute, rede de especialistas e organizações que fazem pesquisas no campo da neurociência.

Há muitos anos, Rock explora as consequências dos resultados científicos que derivam de estudos na área de gestão e vida organizacional. Desde 2007, compartilha suas descobertas com o público no NeuroLeadership Summit, evento que a cada ano acontece em uma cidade diferente dos Estados Unidos e tem por objetivo explorar novos para-digmas para o desenvolvimento dos líderes de amanhã. O próximo ocorrerá entre 15 e 17 de outubro em Nova York.

Nesta entrevista exclusiva a HSM Management, Rock conta por que acredita que a chave para o desenvolvimento dos melhores gestores está definitivamente na ciência.

O sr. poderia definir o que é neuroliderança?Neuroliderança é a ciência que estuda a arte de liderar. Não tentamos responder à pergunta “o que é liderança” porque achamos que depende muito do contexto: ser lí-der nas Forças Armadas é muito diferente de ser líder em uma pequena organização criativa ou o líder de um país. Agora, tentar definir o que é liderança é perigoso. Já fo-ram escritos muitos livros sobre o tema e seus autores coincidiram em poucas coisas.

Quais são os campos de estudo da neuroliderança?Em primeiro lugar, queremos entender a base lógica das ta-refas comuns a todo líder —por exemplo, tomar decisões e solucionar problemas. Então, observamos quais são os pro-cessos que interferem em cada trabalho e como funcionam os níveis do consciente e do inconsciente em relação a isso.

Nosso segundo campo de estudo é o da autorregulação, ou seja, da capacidade das pessoas de regular as próprias emo-ções. Acreditamos que todo líder deve controlar emoções, an-siedade, atenção; em outras palavras, ele tem de controlar a si mesmo, a ponto de poder executar tarefas difíceis, como con-duzir um exército, pensar nos outros, gerenciar a incerteza.

Nosso terceiro domínio é o da colaboração. Os líderes pre-cisam se conectar com os outros e ajudá-los a se conectar, assegurar-se de que a informação é compartilhada e incen-tivar o trabalho em equipe.

Finalmente, os líderes devem facilitar a mudança: influen-ciar os outros, inspirar.

O que fazemos na neuroliderança é estudar a base lógica de cada um desses quatro domínios.

O que são os fundamentos biológicos da neuroliderança? É muito difícil explicar brevemente! É como contar a história do mundo em cinco minutos. Entretanto, na essência, o que fazemos é observar o cérebro de uma perspectiva sistêmica.

O cérebro é muito diferente em cada pessoa. Isso é sur-preendente, e também um grande desafio. Os circuitos através dos quais a informação flui são distintos em cada um e mudam constantemente. Um dia a informação pode fluir em uma direção e no dia seguinte em outra. O que tentamos fazer é compreender o funcionamento desses cir-cuitos, detectar os processos mentais que podem ser vistos e identificar a linguagem mais precisa para descrevê-los.

EM ENTREvISTA ExCLUSIvA, DAvID ROCk, UM DOS FUNDADORES DO NEUROLEADERSHIP INSTITUTE, FALA SOBRE A NEUROLIDERANçA, qUE PRETENDE FORNECER UM qUADRO CIENTíFICO PARA COMPREENDER DE ONDE vEM A MAESTRIA DOS GRANDES LíDERES, POR qUE ELES ERRAM, COMO MUDAM E COMO INFLUENCIAM OS OUTROS

A entrevista é de Francisca Pouiller, colaboradora de HSM MANAGEMENT.

Se o cérebrofalasse

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A neuroliderança serve para aumentar a cons-ciência de si mesmo e a consciência da so-ciedade, para enten-der como pensamos e como pensam os outros, como faze-mos as coisas e como colaboramos. Depen-dendo de qual for seu tra-balho, talvez seja muito útil saber que costuma tomar decisões ruins sem se dar conta. Ao conhecer os processos envolvidos na tomada de deci-sões, você pode evitar que isso aconteça. Por essa razão, é importante criar uma linguagem científi-ca; eleva a consciência.

É possível dizer quais funções cerebrais um líder deve priorizar desenvolver? O cálice sagrado para um líder é o sistema de freios que existe no cérebro, uma rede que inibe funções. É utilizado para controlar a ansiedade, impedir que se grite com um colega, evitar que se fale demais em uma reunião. Cada vez que você contém determinado comportamento, está usando esse sistema. Um líder deve ter a capacidade de se adaptar a ambientes e pessoas que mudam, a circunstâncias que se modificam. Precisa ser capaz de transformar seus com-portamentos. Às vezes, você tem de inspirar; em outras, ser duro ou contido; e, em outras, estar muito focado em algo.

Há ocasiões em que você não deve se importar com o que os outros dizem, mas apenas se concentrar em suas metas. É um trabalho que exige muita flexibilidade cognitiva, e isso se consegue freando comportamentos errados para desenvolver comportamentos novos e mais seguros.

A boa notícia é que temos um sistema de freios cerebrais, e a má é que está

alojado na parte do cérebro que se sobrecarrega mais facilmente: o córtex pré-frontal. É difícil usá-lo e não pode ser usado em exces-so, pois deixa de funcionar.

O sr. menciona a importância do cérebro social de um líder. Fale sobre isso, por favor.

No cérebro há uma rede social que não tem a ver com o Facebook

nem com o Twitter, embora o êxito das redes sociais realce a importância de

partes semelhantes do cérebro. Quando uma pessoa se concentra em

objetivos, a rede social do cérebro se desconecta. Essa “rede de modo predeterminado” é fundamental. Os seres humanos são impulsionados pelas necessida-

des sociais. Por exemplo, se alguém nos insulta, nos senti-mos ofendidos, porém, se nos insulta na frente de três pes-soas, o efeito é mais ameaçador. E o oposto também vale: as recompensas sociais são mais importantes do que as não so-ciais. Isso significa que nos sentimos mais motivados —para o bem ou para o mal— por temas sociais do que não sociais. O problema é que os líderes, por natureza, tendem a focar demais os objetivos; então o circuito social se desconecta e perde-se a oportunidade de desenvolvê-lo. Por isso, também se perde contato com as necessidades dos demais.

Por que o autoconhecimento é tão crucial para um líder?O autoconhecimento é crítico em certos tipos de liderança, não em todos. Se você é o líder de um país subdesenvolvido e está conduzindo seu povo pela força, talvez não necessite se conhecer. No entanto, se dirige uma empresa com pes-

“A boa notícia é que temosum sistema de freios cerebrais,

e a má é que está alojado naparte do cérebro que se

sobrecarrega mais facilmente. É difícil usá-la e não pode

ser usada em excesso”

O modelo ScarfEm sua edição nº 79 (página 60), HSM Management pu­blicou um artigo de David Rock sobre neuroliderança em que ele descrevia o modelo Scarf como eventual substitu­to da pirâmide de necessidades de Abraham Maslow para os gestores que querem aumentar a motivação da equipe. Durante esta entrevista, ele voltou a explicar a ideia:

“As ameaças e recompensas sociais são tão importantes quanto as ameaças e recompensas primárias, porque ati­vam o mesmo centro cerebral: a área dos impulsos primá­rios. Essas são as motivações intrínsecas e as resumi na

sigla Scarf, que corresponde a status, certainty [segurança ou certeza], autonomy [autonomia], relatedness [relaciona­mentos ou conexões] e fairness [justiça].

“O ser humano tende a minimizar o perigo e a maximi­zar a recompensa, nessa ordem. E, por mais que existam diferenças individuais —para algumas pessoas, ter status é mais importante do que sentir segurança, por exemplo—, o desejo de querer mudar algo gera respostas ameaçadoras a algum dos cinco domínios que mencionei.

“quando vários domínios reagem a uma suposta ameaça, o perigo se torna irresistível e bloqueia completamente o pensamento racional. O Scarf é uma ferramenta para ler o ambiente social, predizer o efeito de possíveis ações e es­tar mais sintonizado com as necessidades alheias.”

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soas que escolheram trabalhar para você e são da área do conhecimento ou fazem um trabalho criativo, seu nível de autoconhecimento deve ser muito alto.

O autoconhecimento é, simplesmente, a capacidade de ver a si mesmo como os demais não veem, conhecer-se. Isso é importante porque o líder é alguém que atrai a atenção, seu comportamento e emoções são copiados de modo automá-tico. Se quer que as pessoas que trabalham para você sejam criativas, tenham bom desempenho ou sejam disciplinadas, tem de encontrar essas qualidades primeiro em si mesmo. Quando somos capazes de nos enxergar e pensar sobre nos-so próprio pensamento, conseguimos nos adaptar melhor.

O sr. fala de dois tipos de padrões mentais: um fixo e outro de crescimento. É possível mudar um padrão mental?Sim, há um trabalho de Carol Dweck [professora de psicolo-gia da Stanford University, dos EUA], apresentado no último NeuroLeadership Summit, de novembro de 2011, que mos-tra ser possível mudar. Porém, ainda mais importante, ela demonstrou que o padrão mental de uma pessoa tem um grande impacto sobre sua capacidade de aprender.

Os indivíduos que pensam que tudo é fixo e inabalável tendem a evitar o feedback. Os que acreditam que suas ha-bilidades e inteligência mudam lidam muito melhor com o feedback e aprendem. As pessoas que pensam que não po-dem mudar tendem a enganar, a ter uma ética diferente e a apresentar pior desempenho, se comparadas com aquelas que acreditam que podem se transformar e crescer.

Organizações também possuem padrão mental? As organizações “desenvolvem” as pessoas nesses padrões —é assim que falamos em neuroliderança. Mesmo sem sa-ber, as empresas desenvolvem as pessoas em um desses dois padrões: as que usam o padrão fixo separam as pessoas entre as que têm talento e as que não o têm; as que operam no padrão de crescimento favorecem quem pode crescer.

Até a maneira como ocorre o feedback é importante para isso. Se o líder oferece feedback sobre o desempenho, ten-de a desenvolver seus funcionários em um padrão fixo; ao fazê-lo pelo esforço realizado, permite que encontrem um padrão de crescimento, flexível.

Normalmente somos educados em um padrão mental fixo. Foi o sistema educacional de muitos países que nos fez crer que a inteligência é imutável, o que não está certo. Isso explica o que os estudos concluem: os líderes costumam ser bons na obtenção de resultados, o que tem a ver com o padrão fixo, mas não no pensamento estratégico, ligado ao padrão de crescimento e a desenvolver o talento das pessoas.

Um líder não deveria ser menos racional e mais emotivo para poder comprometer-se com sua equipe? Reconheço que o líder precisa tomar consciência dos temas humanos e sociais, mas eu não diria que tem de ser mais emotivo. Ao contrário: ele deve aprender a controlar suas emoções, porque a liderança é muito ameaçadora e estres-sante. Controlar as emoções —que é sinônimo de controlar o estresse— é importante.

Talvez o certo seja dizer que há momentos em que o líder deve ser emocional, como quando tem de mostrar sentimen-tos positivos para inspirar os outros. Voltamos à capacidade de adaptação! Trata-se de entender quais são as necessida-des dos demais e de poder modificar comportamentos para adaptar-se a elas instantaneamente.

O impacto das diferenças culturais é significativo?Obviamente, a cultura muda de um lugar para outro e isso influencia nosso modo de pensar e interagir com os demais, embora os seres humanos tenham muito em comum, de onde quer que sejam. Há culturas para as quais a autonomia é chave, por exemplo, enquanto, em outras, as pessoas pre-ferem ser dirigidas e ter certezas maiores.

Existem diferenças, e há todo um campo de investigação, chamado “neurociência cultural”, que analisa as desigual-dades biológicas e genéticas das culturas.

Como o sr. descreveria o líder do novo século?Como uma pessoa capaz de se adaptar, de mudar seu foco e seu comportamento para modificar o de outras pes soas ou da cultura em que trabalha. Acredito que os líderes bem-sucedidos não somente terão alta capacidade de adaptação, mas também ajudarão suas organizações a fazê-la com êxito.

A neurociência da liderança ainda evoluirá muito?Sim, estamos apenas começando a compreendê-la! Ainda há muito que fazer. Uma centena de pessoas pesquisa esse campo atualmente e haverá muitas novidades ainda.

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Casos reais

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assim que fazemos as coisas aqui.” Proferida no con-texto empresarial, a frase é muito mais do que uma expli-cação. Em geral, incorpora crenças que se fortaleceram ao longo dos anos pela repetição de rotinas e de centenas de conversas sobre o que (não) deve ser feito.

Essas crenças constituem práticas complexas e sutis tão enraizadas na cultura corporativa que acabam moldando sua identidade. De fato, não são ruins em si; constituem muitas vezes a razão pela qual a empresa vai bem. Porém, quando as circunstâncias se transformam ou a companhia se torna disfuncional, “o que fazemos aqui” precisa mudar.

Modificar um hábito é difícil; nas empresas, a com-plexidade da conduta coletiva faz com que o desafio seja ainda maior. Nos últimos anos, as pesquisas no campo da neurociência abriram espaço para trilhar caminhos radicais. A chave é implementar novos comportamen-tos que substituam essas atitudes fixas, quase gravadas nos circuitos neurais.

Duas empresas que fizeram issoA Cargill, gigante dos setores agroindustrial e alimentí-cio, e a Ameriprise Financial, empresa de assessoria fi-nanceira, utilizaram as descobertas sobre o cérebro para dar início a mudanças internas profundas.

Em 1999, a Cargill se propôs ser uma organização mais ágil. Em 2006, a direção decidiu renovar seu com-promisso e elevar a aposta de colaboração e inovação em todas as unidades de negócios. Para isso, teve de modi-ficar alguns aspectos de sua cultura que a impediam de construir um ambiente verdadeiramente livre, no qual os funcionários tivessem o poder de agir de maneira de-cisiva e assumir responsabilidades diante dos clientes.

A companhia é composta por mais de 70 unidades dis-tribuídas em 66 países; o desafio era complexo, porém a Cargill o abordou com base na definição de mudanças estruturais e comportamentais —uma grande transfor-mação na “maneira como fazemos as coisas aqui”.

A Ameriprise Financial entrou em ação em 2007. Os resultados de um estudo sobre o desempenho dos in-vestidores fizeram com que os líderes da empresa deci-dissem submeter a exame seus hábitos organizacionais. O estudo, realizado pela empresa de pesquisas Dalbar, mostrou que havia uma lacuna entre o êxito individual dos investidores e o do mercado como um todo.

A origem do problema era orgânica: o instinto de so-brevivência levava os profissionais a evitar algumas das receitas características de um mercado volátil. Por exemplo, quando as ações caem subitamente, um inves-tidor que pensa de modo racional deveria se afastar da situação e esperar um sinal do que está por vir. No en-tanto, muitos se apressam em vender por temerem uma queda maior. Isso aumenta as perdas: frequentemente as ações logo voltam a subir. Tentando se garantir, os inves-tidores comprometem as próprias carteiras.

A Ameriprise viu a oportunidade de melhorar suas práticas e evitar continuar caindo nessa armadilha. Im-plementou um programa de capacitação para todos os seus assessores destinado a aumentar a consciência so-bre o processo de tomada de decisões.

princípios Da muDançaOs focos da mudança organizacional são baseados nas des-cobertas que a neurociência considera em diversos fatores relacionados ao funcionamento do cérebro, tais como:

Hábitos são difíceis de mudar. Muitos padrões conven-cionais de pensamento nunca chegam à atenção cons-ciente. Isso acontece com a informação processada por órgãos como os gânglios basais —também chamados de “centro dos hábitos”—, que normalmente controlam ati-vidades semiautomáticas (dirigir e andar, por exemplo), a amígdala, que dá origem às emoções fortes (medo, irri-tação etc.), e o hipotálamo, que lida com instintos (fome, sede e desejo sexual, entre outros).

Toda vez que os padrões neurais dos gânglios basais são convocados, criam mais raízes. Quando uma prática organizacional ativa um órgão, torna-se extremamen-te difícil removê-la. Por isso, é necessário desenvolver novas condutas, que devem ser geradas nos gânglios basais. Aprender novos comportamentos costuma ser difícil e doloroso porque implica superar de maneira consciente um circuito neural profundamente cômodo.

A CArgill e A AmeripriSe FinAnCiAl provAm que é poSSível modiFiCAr hábitoS de modo mAiS eFiCAz e durAdouro Com A AjudA dA neuroCiênCiA, em SeiS pASSoS, Como eSCreve o pSiquiAtrA jeFFrey SChwArtz, em pArCeriA Com oS exeCutivoS que implAntArAm Seu método

O psiquiatra Jeffrey Schwartz, professor e pesquisador da faculdade de medicina da University of California em Los Angeles (UCLA), escreveu este artigo com Pablo Gaito, vice-presidente da Cargill Learning and Development, e Doug Lennick, assessor da Ameriprise Financial e de outras empresas.

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Também envolve utilizar partes do cérebro que exigem mais esforço e energia, como o córtex pré-frontal, asso-ciado a funções executivas como o planejamento.

No trabalho, tentar algo novo pode gerar medo e irrita-ção (o que se denomina “sequestro da amígdala”), desejo de fugir ou cansaço desproporcional em relação à ação real que o provocou. Diante do surgimento dessas emo-ções, as pessoas resistem à mudança e a capacidade de pensamento racional e criativo diminui.

As conexões neurais são plásticas e até os pensamen-tos mais enraizados podem ser modificados. O tipo de atenção que faz essa mudança combina a metacognição (pensar sobre o que se está pensando) e a metaconscien-tização (dar-se conta momento a momento daquilo a que se presta atenção). O filósofo Adam Smith chamou esse método de “espectador imparcial”.

Estudos neurocientíficos confirmaram o poder do espectador imparcial. Se uma pes-soa observa o próprio processo de pensar enquanto reflete sobre determinada crença (como a de que precisa lavar as mãos o tem-po todo), pode fazer com que o pensamen-to se desloque para regiões do cérebro mais conscientes, como o córtex pré-frontal, que permite atuar sobre sua compulsão.

Prestar atenção a novas formas de pensa-mento, não importa quão incômodas pareçam a princípio, pode gerar novos circuitos nos há-bitos mentais. Esse fenômeno é denominado “densidade de atenção”. Quando uma pessoa presta atenção consciente aos pensamentos desejados e às metas relacionadas a isso, o processamento dessa informação se estabili-za e os padrões neurais se solidificam.

Ao focar a atenção, não se deve reforçar o ne-gativo, mas o que se faz de bom. A maioria das atividades cerebrais não distingue a dife-rença entre realizar uma atividade e evitá-la. Quando alguém pensa repetidamente “Não devo violar esta regra”, está ativando e refor-çando padrões relacionados a violar a regra. Portanto, para engendrar uma mudança em uma empresa, é importante focar a atenção no estado final desejado, não em evitar os problemas. Esse reforço positivo orientado para a meta deve ocorrer repetidas vezes.

A capacidade do “veto cognitivo” permite con-siderar rapidamente provocações externas e escolher deter os impulsos disfuncionais antes que entrem em ação. Muitas pessoas

acreditam que o controle de seus impulsos é limitado, especialmente em vista de emoções fortes como a irrita-ção, a frustração, o entusiasmo ou a pena, porém a neu-rociência tem demonstrado que um indivíduo sempre pode limitar ou impedir (escolher não fazer) determi-nado impulso. Tudo é questão de praticar. Mesmo uma simples ação, como contar até dez, abre possibilidades de resposta mais funcionais.

A capacidade de focar a atenção deve ser constantemente cultivada. Poucas empresas têm conseguido isso. Suge-rimos um método para fazê-lo: composto de seis passos, é uma síntese de nosso trabalho em diversas áreas da neurociência [veja quadro acima].

• Passo 1: Reconhecer a necessidade de mudança. A chave consiste em se dar conta de quando uma pessoa está imer-

O círculo virtuoso dos valores focados

esse círculo mostra seis passos para produzir uma mudança profunda (círculo externo) e os novos valores organizacionais que produzem (cír-culo interno). o círculo virtuoso começa quando o primeiro passo ativa o foco deliberado na “maneira como fazemos as coisas aqui”. Conforme as etapas progridem, os participantes ganham um senso mais forte de significado compartilhado, levando a práticas específicas e, por fim, a contribuições mais tangíveis e a um desempenho melhor.

Fontes: Gaito (círculo interno); Schwartz e Lennick (passos).

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IBUIÇÃO FOCO

PRÁTICA SIGNIF

ICAD

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1Reconhecer a

necessidade de mudança

2Renomear as reações

3Refletir sobre expectativas e

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Reorientar a conduta

5Responder

com repetição

6Revalorizar as escolhas em tempo

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75HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

sa em uma rotina. Para evitar tal imersão, é fundamental aumentar a consciência sobre os pensamentos, emoções e ações e sua conexão com os resultados na vida real. De-pois de um episódio difícil, por exemplo, você pode se dis-tanciar e perguntar: “Em que eu estava pensando? Como me sinto agora? Meu comporta-mento estava alinhado com meu objetivo e com o quadro mais amplo que tenho?”.

Coletivamente, a eta-pa do reconhecimento significa falar sobre as possibilidades de mudança com a pre-missa de que a ma-neira como fazemos as coisas não pode continuar. A prática des-sa etapa pode trazer grande carga emocional, porque significa recusar ou abandonar ações cômo-das, porém contraproducentes.

Jim Cracchiolo, presidente-executivo da Ameriprise, por exemplo, reconheceu a necessi-dade de transformação no setor de assessoria finan-ceira e isso influenciou sua rejeição ao programa de apoio do governo dos Estados Unidos, após a crise de 2008. Segundo ele, o financiamento do governo impediria a empresa de atingir todo o seu potencial. Essa explicação ressoou fortemente nos funcionários.

• Passo 2: Renomear as reações. Essa etapa foi inspirada na terapia de transtorno obsessivo-compulsivo, o conhe-cido TOC. Se uma pessoa com TOC dá um novo nome a um comportamento inadaptado, ela pode superar pen-samentos disfuncionais (“Tenho de lavar as mãos para me assegurar de que estão limpas”) e aprender que são simplesmente pensamentos (“Sinto que a urgência volta, mas é somente um pensamento que me é produzido pela síndrome do TOC”). O ato mental de renomear melhora a capacidade de distinguir e, portanto, diminui o apego pessoal ao que se está pensando.

• Passo 3: Refletir sobre expectativas e valores. Nessa etapa, as expectativas antigas são suplantadas por uma nova imagem do estado que se deseja alcançar. Tanto a Cargill como a Ameriprise mantêm seções internas de treinamento para fomentar a capacidade de reflexão co-letiva. Os participantes falam sobre o tipo de empresa que estão tentando criar, sobre a liderança que será ge-rada e sobre as necessidades e valores de seus clientes.

Nessa reflexão, a companhia emprega as expectativas de condições melhores como ferramenta para reforçar padrões neurais produtivos. Experimentos neurocientí-

ficos sugerem que dizer, por exemplo, “As coisas serão melhores se mudarmos” acalma as reações como um placebo alivia a dor.

• Passo 4: Reorientar a conduta. Aqui é necessário ali-nhar hábitos e metas. As práticas a adotar

são identificadas e colocadas em prática. Nas empresas que navegam por águas

turbulentas (como em uma crise econômica), reorientar-se talvez

signifique perseguir práticas de-liberadas para ativar o especta-dor imparcial. Um líder pode começar falando abertamente sobre como se sente, pedir a sua equipe que faça o mesmo e então ajudá-la a encontrar uma perspectiva mais ampla. “Ainda estão bem, têm traba-

lho, suas famílias não sofre-ram.” Logo trata de gerar um es-

tado emocional mais calmo, levando as pessoas a um pensamento preme-

ditado. Essa é a etapa crucial da sequên-cia, por causa de seu poder de impacto no

córtex pré-frontal, onde se processam novas condutas que, ao se repetirem, constroem circuitos nos gânglios

basais e se convertem em um conjunto de novos hábitos.

• Passo 5: Responder com repetição. Significa ser responsá-vel e tornar os demais responsáveis pondo em prática con-dutas apropriadas para a mudança de modo constante. A disciplina é necessária para criar novos hábitos. A Cargill, por exemplo, usa indicadores para estabelecer prioridades de liderança e avaliar o comportamento dos gestores.

• Passo 6: Revalorizar as escolhas em tempo real. Essa etapa é a da atenção plena. É possível reconhecer os próprios pensamentos no momento em que acontecem, resistir ao sequestro da amígdala e controlar a crise. Nas empresas, em vez de reverter automaticamente a ideia da “maneira como fazemos as coisas aqui”, as pessoas pensam na “maneira como fazíamos as coisas, pois agora fazemos melhor”. Quando as respostas auto-máticas mudam em um grande grupo de pessoas, surge uma nova ética organizacional. A transformação deixa de ser imposta e passa a ser escolhida, instalando-se como um novo hábito.

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A etapa do reconhecimento

significa falar sobre as possibilidades de

mudança com a premissa de que a maneira como fazemos as coisas não

pode continuar

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76 HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br

m assunto de suma importância quando um novo macaco chega ao laboratório é descobrir qual seu suco de fruta favorito”, ensinou o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis durante esta entrevista, mostrando que mesmo as grandes inovações têm detalhes prosaicos. A macaca Rhesus Aurora, por exemplo, adorava suco de laranja, e foi para be-ber litros dele que, entre 2002 e 2003, aprendeu a controlar um braço robótico, localizado em outra sala, apenas com a força do pensamento —como se fosse um terceiro braço seu.

Em seu laboratório na Duke University, na Carolina do Norte, Estados Unidos, Aurora aprendeu primeiro a con-trolar mentalmente o joystick de um videogame —os mi-croeletrodos implantados em seu cérebro transmitiam seus impulsos neurais e estes eram convertidos em comandos matemáticos que podiam ser interpretados pelo computa-dor. Sem se mexer, Aurora acertava com o cursor os alvos que apareciam na tela do computador, fazendo a melhor e mais rápida trajetória possível.

Quando o joystick foi trocado por um braço mecânico, num intervalo curto, Aurora continuou a fazer a mesma coi-sa. Detalhe: ela acertava 98% das jogadas. Então, Nicolelis e sua equipe entenderam: assim como a raquete se torna, para o cérebro do tenista, uma extensão de seu braço ou o violão passa a ser uma extensão dos dedos do violonista, aquele braço robótico virou uma extensão do corpo da macaca —só que controlado apenas por sua vontade, sem exigir nenhum trabalho muscular. Uma descoberta impressionante é que os comandos motores para o braço mecânico não vinham só dos neurônios normalmente ativados para mover os bra-ços, mas também de outras áreas do cérebro, comprovando uma incrível capacidade cerebral de adaptação.

Os estudos de Nicolelis nessa fronteira, batizada por ele e seus colegas de “interface cérebro-máquina”, vêm se desen-volvendo velozmente desde então e os impactos potenciais são imensos. O menor deles é que um brasileiro finalmente ganhe um Prêmio Nobel e eleve a autoestima nacional. Ou-tros, sem a pretensão de esgotar a lista, incluem a terapia de doenças como epilepsia e Parkinson, a possibilidade de um tetraplégico voltar a andar, a revolução da educação brasileira, a criação de uma plataforma de inovação im-portantíssima para o País —a indústria da neurotecnologia, já iniciada, de certa maneira, no Rio Grande do Norte—, a recuperação da vocação científico-tecnológica, que o Brasil perdeu de Alberto Santos Dumont para cá, e, filosoficamen-te, a libertação do cérebro em relação ao corpo, o que repre-senta “a” mudança de paradigma mundial.

Assim, no limiar da substituição da “era do corpo” pela “era do cérebro”, como define Nicolelis, com desdobra-mentos imprevistos, HSM Management foi discutir to-das essas questões com um de seus maiores protagonistas, professor de neurobiologia e engenharia biomédica, codi-retor do Center for Neuroengineering, da Duke University, e responsável pelo Instituto Internacional de Neurociên-cias de Natal Edmond e Lily Safra (IINN-ELS), para citar algumas de suas credenciais. Nesta entrevista exclusiva à editora-executiva Adriana Salles Gomes, ele mostra oti-mismo em relação ao empresariado brasileiro —“estão mais preocupados com o assunto do que imaginamos”—, pede-lhe mais ambição e, ao mesmo tempo, externa seu temor de que se feche a janela de oportunidade que temos, calculada em mais dois anos.

Nossas empresas se dizem ansiosas por inovar. Elas devem perseguir uma vocação científica brasileira? Isso existe?Tem de existir. Acho que precisamos ser capazes de expor-tar conhecimento tropical, fruto do que eu posso chamar de

A entrevista é de Adriana Salles Gomes, editora-executiva de HSM MANAGEMENT.

O Brasil e a era do cérebroAlém de revolucionAr o mundo, o neurocientistAmiguel nicolelis contA, em entrevistA exclusivA, comopode AjudAr A revolucionAr o pAís com suA especiAlidAde

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ciência tropical. Exemplo disso é o que está acontecendo lá no Fundão, no Rio de Janeiro, em que estão criando prova-velmente o maior parque tecnológico industrial da indús-tria do petróleo e do gás em todo o mundo. Outras frentes? Bio logia marinha, doenças tropicais, fontes alternativas de energia, farmacologia, botânica e, claro, neurociência.

Já fazemos pesquisas de ponta no Instituto Internacio-nal de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra, no Rio Grande do Norte, relativas a doenças degenerativas, à inter-face cérebro-máquina e a uma educação revolucionária de

crianças, coisas que o mundo inteiro está observando. Por exemplo, estamos avançando rapidamente no desenvolvi-mento de uma nova terapia da doença de Parkinson, já em teste com primatas. Temos outras pesquisas que vão ser pu-blicadas este ano também, completamente diferentes do que fizemos até agora: são na área da interface cérebro-máquina e descobertas sobre mecanismos fisiológicos de funciona-mento do cérebro, que não têm aplicação prática imediata, mas terão no futuro. Só que, seguindo o protocolo científico, ainda não posso falar sobre elas, que estão sendo revisadas.

“o neurocientista é um astrônomo descobrindo um novo universo: o cérebro.” essa é a poética definição que miguel Ângelo laporta nicolelis, de 51 anos de idade, dá a sua profissão e que reposi-cionou o cérebro imediatamente em meu imaginário, muito mais do que suas tão impressionantes credenciais: foi o primeiro bra-sileiro a ter artigo de capa da revista science; integra a lista dos 20 maiores cientistas do mundo da década de 2000 no ranking da scientific American; tem um índice H (métrica de quantas vezes o trabalho de um cientista é citado por outros na literatura mundial) de 57, o que é elevadíssimo; já orientou 20 teses de doutorado e 45 de pós-doutorado em 29 anos de carreira, 18 dos quais na duke university. mais que tudo, porém, a hábil analogia levou-me a que-rer enxergá-lo, e descrevê-lo, da perspectiva de seu cérebro.

A neurociência comprovou que a multidisciplinaridade é chave para o cérebro desenvolver-se, e esse médico formado pela uni-versidade de são paulo também é múltiplo: seguiu carreira aca-dêmica (doutorado em fisiologia no instituto de ciências Biológicas da usp, professor de medicina da mesma universidade, pós-dou-torado na Filadélfia, professor e pesquisador da duke university, de durham, carolina do norte), mas, ao mesmo tempo, foi em-preendendo (como no instituto internacional de neurociências de natal edmond e lily safra, iinn-els), participando de comissões governamentais (preside a comissão do Futuro, do ministério de ciência e tecnologia), escrevendo ficção, sendo pintor autodidata, torcendo fanaticamente por futebol (Brasil e palmeiras) e, quando o twitter apareceu, participando ativamente desse microblog.

se “ensinar para aprender” é a lógica cerebral, nicolelis ensi-na às mais distintas plateias, seja de um programa de tv popular como o dominical Fantástico ou um talk show cool como o de jon stewart nos euA, seja no livro infantil que trabalha com a mãe es-critora, giselda laporta nicolelis —uma versão de muito Além do nosso eu (ed. companhia das letras)—, ou num evento para ges-tores como o Fórum novas Fronteiras da gestão, organizado pela Hsm do Brasil, que ocorrerá em agosto próximo em são paulo.

Apesar de hoje dividir seu tempo igualmente entre Brasil, estados uni-dos e suíça, nicolelis é impregnado de suas memórias de infância, aquelas que moldam o cérebro. seu conheci-do radicalismo pode ser atribuído em grande parte ao convívio estreito com a avó anarquista lygia laporta. esse neurocientista quer não apenas curar doenças consideradas incuráveis, co- mo também ajudar a elaborar uma es-tratégia para um país sem estratégia e cooperar para criar uma cultura cientí-fica em um povo que não a tem, pondo o Brasil no mapa da inovação e da rele-vância mundial. o radicalismo não o faz de fácil convívio: ele não perdoa quem colaborou com o regime militar, recusa-se a pedir recursos a empresas que ganham dinheiro com produtos nocivos à saúde, como cigarros ou bebidas alcoólicas —“deveriam, no mínimo, financiar pesquisas sobre a cura dos males que causam”—, não poupa de críticas os que chama de “pseudocientistas” e “terro-ristas”, que atemorizam as pessoas com as ciências. e provo-cou a ira de um grupo de neurocientistas ligados à universidade Federal do rio grande do norte, que foi à mídia contra ele [leia mais sobre isso no quadro da página 80].

no entanto, suas memórias tão profundamente brasileiras explicam a paixão pelo país. As saudades que declara sentir de pão de queijo, sanduíche bauru, esfiha paulistana, bombom sonho de valsa, chocolate diamante negro, goiabada com quei-jo de minas fortalecem seu comprometimento com o Brasil.

tudo me faz crer que o cérebro de miguel nicolelis é bas-tante complexo. como a história mostra, contudo, não são cé-rebros simples que mudam os países —ou o mundo.

Saiba mais sobre o cérebro de Miguel Nicolelis por Adriana Salles Gomes

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Queremos ampliar o instituto transformando-o no Cam-pus do Cérebro. Seria um parque neurotecnológico, que ins-talaria no Brasil uma cadeia produtiva de neurotecnologia, e futuramente isso se converteria na Cidade do Cérebro —um modelo a replicar em outras regiões do País.

O que vocês estão fazendo para que isso aconteça?Para dar visibilidade a nosso objetivo, estamos buscando patrocínio para fazer uma demonstração do nosso projeto Walk Again na abertura da Copa do Mundo de Futebol que será sediada pelo Brasil em 2014. Nosso sonho é que uma criança tetraplégica volte a andar utilizan-do um terno robótico comandado por seu cérebro e dê o chute inicial no jogo inaugural.

Isso, aliás, teria um efeito ex-tremamente benéfico para a marca Brasil, ao tirar o es-tigma de que aqui só tem futebol e música, conferin-do-nos uma imagem cien-tífica que ajuda a construir a cultura de ciência e inova-ção de que tanto precisamos.

O projeto Walk Again continuaria lá fora ou seria transferido para cá?Ele é financiado por um consórcio interna-cional e continuaria entre Estados Unidos, Suíça e Alemanha, mas a gente quer trazer toda essa tecnologia para Natal —e eventualmente para São Paulo— para servir também como alavanca do parque neurotecnológico.

E como anda o processo de viabilização, tanto do pontapé ini-cial como desse cluster de neurotecnologia no Brasil?O patrocínio ao chute inicial temos dois meses para viabili-zar e estamos conversando com muitas empresas —o apoio do governo já possuímos, mas é preciso mais do que isso. Por exemplo, em São Paulo, procuramos um hospital par-ceiro, para fazer toda a parte clínica, algo bem difícil.

Sobre a viabilização do cluster, creio que temos uma jane-la de oportunidade de dois anos, não mais; outros países têm se dedicado ao assunto também.

O governo faz a figura de um planejador central na iniciativa? Não no projeto do chute inicial, mas o governo é o planeja-dor de um modelo de ciência para o Brasil. Não sei se os lei-tores da sua revista conhecem a Comissão do Futuro. É uma comissão de cientistas voluntários e independentes, da qual faço parte, que foi convidada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia para criar esse modelo. Nos próximos dois a três meses devemos terminar um primeiro relatório que trará à tona, creio eu, a gravidade da situação do País em relação a seus competidores.

Como não estamos atrelados a ninguém, podemos dizer a verdade, e ela é chocante. O único remédio é: precisamos formar gente. E nós estamos tratando essa questão com uma dolorosa superficialidade.

Uma parte do empresariado brasileiro parece que já se con-formou com o gap que o Brasil tem em relação aos países mais inovadores em termos de ciência e tecnologia e desistiu de tentar diminuí-lo. Outra parte, menor, quer avidamente ser “tech”. Se isso fosse um jogo, que time venceria?A diferença entre o Brasil e os Estados Unidos nas condi-

ções para fazer ciência é realmente grande, a começar pelo fato de que lá a ciência

faz parte do dia a dia das pessoas e aqui não. Mas é preciso entender

que essa situação é produto de um pensamento conformista

como o desses empresários do time número um, que dominou nossa vida du-rante 400 anos. De acordo com essa lógica atrasada, devemos continuar sendo uma colônia —não mais de Portugal, mas de outros

países que desenvolvem ciência e tecnologia.

Esse conformismo é quase aético, porque nos condena a ser

subservientes, seguidores eternos, obedecendo às normas científicas

ditadas por outra sociedade. Ciência, neste século, é uma questão de soberania nacional.

Por quê?Se um país não investir em áreas estratégicas, científicas e tecnológicas, ele fica completamente à mercê de quem de-tém o conhecimento. Hoje, se os fornecedores de micropro-cessadores decidirem boicotar o Brasil, o País para. Se os satélites internacionais não aceitarem fazer o serviço de que o Brasil precisa, já era. Não tenho muita dúvida de que, se quiserem desligar a internet do Brasil fora daqui, desligam.

Por exemplo, eu me orgulho muitíssimo da Embraer, mas ela não faz turbina nem avionics no Brasil; compra fora e, se o fornecimento parar, não terá a quem pedir socorro.

Em cenários de guerra ou catástrofes, o fornecimento pode cessar, de fato. Mas parece impossível reduzir a diferença...Outros países a estão reduzindo, por que não o Brasil? Hoje os Estados Unidos enfrentam uma crise tremenda em seu financiamento científico e no grau de educação científica, e outras nações, que há décadas ninguém imaginaria compe-titivas na área, aparecem com força, como a Coreia do Sul ou a Finlândia, com o melhor ensino de ciência do mundo.

“De acordo com essa lógica atrasada [de parte do

empresariado], devemos continuar sendo uma

colônia, não de Portugal,mas dos países que

desenvolvem ciência”

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O que é essa crise científica dos Estados Unidos?Essas universidades maravilhosas dos Estados Unidos só existem porque receberam subsídios gigantescos do governo federal. Harvard, para citar um exemplo, recebe centenas de milhões de dólares por ano em verba para pesquisa, e é isso que faz com que possa funcionar. Na hora em que o dinheiro estatal for removido, elas vão de-saparecer; estão se dando conta de que esse é um modelo absolutamente não sustentável.

A sociedade norte-americana, mais do que qualquer ou-tra, reconhecia a necessidade do desenvolvimento tecnoló-gico e científico como parte essencial do desenvolvimento econômico do país. Agora não há mais esse pacto social.

Esse pacto nunca houve no Brasil...Nunca. Ciência e tecnologia aqui sempre foram feitas para uma minoria, de maneira artesanal; você precisava ser fi-lho de família rica para entrar na USP [Universidade de São Paulo], fazer doutorado e virar cientista. Nos Estados Uni-dos, você sempre pôde ter origem humilde e conseguir uma bolsa de estudos para se dedicar à pesquisa; há estímulo à carreira científica e reconhecimento pela sociedade.

Talvez o ponto de partida do Brasil seja uma cultura de ciência e um desafio que galvanize o país inteiro, como o da Copa. Pense em quando os americanos decidiram ir para

a Lua; não tinham a menor ideia de como chegar lá, mas o desafio que eles se impuseram como nação galvanizou a população inteira, e eles encontraram uma forma de ir.

Como podemos construir uma cultura da ciência no dia a dia?Como nos Estados Unidos, onde você leva seu filho ao Air Space Museum, em Washington, e mostra a conquista do es-paço. A criançada vai lá já aos 4 anos de idade e se emocio-na. Temos de contar histórias da ciência do mundo inteiro e do Brasil, como a de meu orientador, que conto em meu livro, dr. César Timo-Iaria —foi uma pessoa fenomenal.

Há um pouco de culpa das nossas universidades na história?Sim, as universidades brasileiras têm um modelo de fun-cionamento muito arcaico e corporativista, ainda não che-garam ao século 21. Impõem dificuldades imensas a seus pesquisadores: eles têm de fazer múltiplas coisas ao mesmo tempo além de pesquisar, como dar aulas, cuidar das ques-tões administrativas e agora ser empreendedores. Com tan-tas atribuições, é difícil fazer bem alguma.

Mas o sr. teve de ser empreendedor nos Estados Unidos...Sim, mas lá tenho equipe e fui treinado para isso. Reproduzi esse aprendizado aqui, no Instituto de Neurociências de Na-tal. Conseguimos o terreno, em Macaíba, como doação da

miguel nicolelis levantou o equivalente a us$ 50 milhões para implementar a primeira fase de sua sonhada cidade do cére-bro no rio grande do norte: o instituto internacional de neu-rociências edmond e lily safra (iinn-els). ele abarca o tripé escola-hospital-centro de pesquisas:

• A escola Alfredo j. monteverde, com unidades em natal e em macaíba, a 20 quilômetros da capital, atende mil alunos que cursam do 6º ao 9º ano do ciclo básico em horários alternati-vos, em nove oficinas (ciência e tecnologia; robótica; história; química; biologia; física; ciência e arte; ciência e identidade; e ciência e movimento). os objetivos: (1) dar educação científica a alunos e segundo os preceitos da neurociência, (2) formar cientistas e empreendedores futuros e (3) contribuir para a formação de profissionais de educação científica.

•o centro de saúde Anita garibaldi oferece assistência pré--natal, de caráter multidisciplinar, a mulheres grávidas, especialmente em casos de alto risco, incluindo desnutri-ção. são feitos 12 mil atendimentos por ano.

•dois centros de pesquisa, o de natal e o de macaíba, in-cluem laboratórios de neurobiologia celular e molecular,

de comportamento ani-mal e de eletrofisiologia, além do criadouro cientí-fico de primatas de últi-ma geração.

em 2011, começou a fase 2 do projeto, o campus do cérebro, que inclui mais es-colas, centros de pesquisas e a produção de tecnologias. porém, em julho, dez pesquisadores romperam com nicolelis, acusando-o de autocrático, reclamando de seu comportamento imprevisível e alegando que os recursos eram encaminhados mais aos alunos das escolas do que a eles, pós-doutorandos, que teriam maior chance de ser cientistas do futuro. A aparen-te priorização de cientistas estrangeiros em vez de brasileiros também pode ter sido um motivador do conflito: no ano passa-do, dos 31 profissionais novos no iinn-els, 28 eram estrangei-ros. o grupo dissidente criou, em natal, o instituto do cérebro e tentou puxar para si parte da verba de nicolelis, mas sem êxito.

Saiba mais sobre o Campus do Cérebro

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte; o governo es-tadual cuidou de água, luz e estrada; o governo federal con-tribuiu com os recursos para a construção; e a sra. Lily Safra nos ajudou a equipá-lo e sustentá-lo, fazendo, creio, a maior doação privada para a ciência em toda a história do Brasil.

O que precisaria mudar na universidade brasileira?Criar a carreira de pesquisador e treiná-lo para estruturar um negócio são bons começos. Outro ponto de virada se-ria não ter tanto receio de reconhecer e privilegiar o que tem mérito. Como há muita dificuldade em dizer “não” no Brasil, quando surge um pool de recursos, eles são pulveri-zados para contentar todo mundo, em vez de concentrados em uma pesquisa que tenha mérito e possa realmente fazer diferença, que é como se faz mundo afora.

Além disso, em ciência existe uma premência de apoiar os jovens, que estão iniciando a carreira —a ciência vive des-sa renovação contínua. Só que, no Brasil, acontece o oposto: a gente concentra todo nosso apoio financeiro, estratégico e político em quem está no final da carreira. Essa casta do CNPq [Centro Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] não existe em nenhum lugar do mundo.

E foi assim que o Brasil exportou Miguel Nicolelis?Não, quando fui embora fazer meu doutorado, no começo de 1989, eu era muito jovem, nem sabia dessas coisas. Por ou-tro lado, quando terminei o doutorado, logo vi que não teria a menor chance de fazer aqui o que eu queria. Só comecei a voltar, ainda parcialmente, em 2003.

Houve um esforço do governo para repatriar cientistas, não foi? Bem, um modelo de ciência que atraia as empresas deve conter uma promessa de lucro. Como garantir isso?No parque neurotecnológico, por exemplo, há essa promes-sa. Uma fração dessa atividade econômica tem de gerar os recursos para manter e ampliar as ações sociais que inicia-mos e o restante fica para o investidor. Se nosso empreen-dedorismo não fosse tão primitivo em geral, essa promessa de lucro seria enxergada. Não dá para querer ter o máximo possível de lucro daqui a 10 milissegundos.

É hora de as empresas brasileiras verem que o resto do mundo está fazendo coisas inovadoras e de longo prazo, aceitando o desafio do complexo, e nós não. Eu acredito no futuro do capitalismo brasileiro como ganha-ganha.

Só que o sr. fala em não registrar patente e doar tudo para a humanidade, à la Santos Dumont... Isso provoca arrepios.Na Duke University, também sofro uma pressão muito gran-de para patentear tudo o que eu faço. Em alguns casos, não tive alternativa e patenteei de fato.

Veja: eu entendo essa discussão da propriedade intelec-tual, só que, como muitas coisas, ela é usada de maneira indevida. Em algumas situações, as patentes são aceitáveis; em outras, não. Por exemplo, precisávamos desenvolver, no

miguel nicolelis, com o cientista john chapin, ajudou a mudar o enfoque dos estudos da fisiologia do cérebro. eles foram estudar como se comportava o cérebro de animais como ratos quando estes faziam atividades inte-ressantes: “em vez de olhar uma célula de cada vez, ana-lisamos grandes grupos que nos permitem chegar mais perto da dinâmica de funcionamento dessa estrutura em termos operacionais, o como funciona”. em 1995, eles começaram a medir os impulsos cerebrais (sinais elétri-cos) de 50 neurônios ao mesmo tempo, ouvindo o som do cérebro em tempo real. já estão conseguindo fazê-lo com mil neurônios ao mesmo tempo e, em cinco a dez anos, pretendem fazê-lo com até 100 mil. A partir desse feito, vieram várias descobertas, entre elas:

• O cérebro funciona como uma demo-cracia neural, não como a ditadura de um neurônio específico. cada função é exercida por vários neurônios e cada neurônio tem potencial para exercer várias funções.

• Os sinais elétricos emitidos pelos neu-rônios são caóticos —e devem sê-lo, pois, se ficam muito sincrônicos e disciplinados, ocorre a crise de epilepsia. desorganizar esses sinais somando-lhes sinais elétricos artificiais no nervo da face faz cessar a crise.

•ComomaldeParkinson,océrebrosecomporta como numa crise epiléptica de baixa frequência. então, desorganizar os sinais com estímulos na medula espinhal, por exemplo, melhora sensivelmente os sintomas da doença, que, contudo, não

tem cura. um rato com parkinson avançado, que já não se movia, conseguiu ir beber água e uma macaca no mesmo estágio da doença escalou a jaula para pegar uma banana.

•Eseossinaiselétricosartificiais foremcomandados pelo cérebro? talvez os te-traplégicos possam voltar a andar, com a ajuda de uma interface cérebro-máquina, o terno robótico do projeto Walk Again. o experimento da macaca Aurora no videoga-

me, descrito no início deste texto, provou isso e somou-se a ele outro, igualmente bem-sucedido, em que a macaca idoya comandou, com o pensamento, um robô no japão.

Entenda o trabalho de Nicolelis

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Brasil, vacinas para malária e dengue. Elas não teriam mui-ta utilidade no hemisfério norte, mas seriam cruciais aqui, na África e na Ásia, e, num caso desses, é uma patente que não mereceria existir. Assim como foi com os remédios do coquetel da aids, cujas patentes o Brasil ignorou e assim se transformaram num modelo mundial. Se há milhões de pes-soas correndo risco de vida, patentes não se aplicam.

O modelo da indústria farmacêutica atual está fadado a desaparecer. Não há como conseguir crescer 8% ao ano, que é o que se tenta fazer, para dar o retorno a seus acionistas, quando se gastam bilhões de dólares para gerar uma única droga. E os pipelines não são tão ricos quanto eram há al-

gumas décadas. Em todas as reuniões científicas a que vou, fala-se que há muito poucas drogas sendo desenvolvidas com chance de virar algo comercialmente importante. Por outro lado, as pesquisas para tratar certas doenças são enga-vetadas por não terem interesse comercial. É uma situação dramática para o setor.

Hoje o mundo se encaminha para um reequilíbrio com a cooperação. Todos têm de ser remunerados, mas numa me-dida razoável. O capitalismo “extrativista” não se sustenta.

Por que o Brasil não tem inovações como uma vacina contra a malária ou outra coisa de alto impacto, como foi o avião?É por pouca ambição, um problema cultural. Não é só do setor privado; é do setor público também. As pessoas nem querem criar um negócio e, quando querem, é para ficar ri-cas, não para mudar sua cidade, seu país, o planeta. Quero ver ganhar dinheiro com algo que realmente seja bom para as pessoas e faça diferença para o mundo. Sempre falo para meus alunos: “A gente atira para as estrelas; se acertar a Lua, já valeu a pena”. Temos de querer fazer alguma coisa que ninguém fez.

Como seus alunos brasileiros lá fora respondem a isso?A maioria deles tem optado por voltar para o Brasil e fazer essa ambição transformar-se em realidade aqui.

Como o sr. sensibilizou o governo? Tinha contatos? Que nada! Começamos nosso projeto-piloto com o centro de saúde e, quando o presidente Lula visitou o projeto, ficou emocionado. Em 2007, vieram os apoios do Ministério da Educação, depois do Ministério da Ciência e Tecnologia e mais tarde do Ministério da Saúde.

Nós trabalhamos com esse conceito básico, derivado da neurociência, de que a educação de uma pessoa começa com o pré-natal de sua mãe, uma vez que seu cérebro está sendo formado no útero e deve ser capaz de usar o máximo de seu potencial. Muitas dessas crianças que estão nascendo vão ser nossos alunos e, mais tarde, neurocientistas.

É possível perceber se essas crianças são mais inteligentes?Nossos resultados são explosivos. Um dos mais importan-tes, por exemplo, é que, enquanto no Brasil o índice de eva-são entre o ensino fundamental e o médio é de mais de 50% −milhões de crianças desaparecem do sistema educacional todos os anos−, em nosso sistema a evasão fica por volta de 1%. Nós mantemos 99% de nossos alunos interessados em aprender, sabe o que é isso? E a explicação é que eles sabem que são os protagonistas de seu ensino. Aprendem o que têm de aprender em ciência fazendo ciência.

Nós mesmos estamos começando a contratar nossos ex--alunos, não só para funções técnicas, mas para trabalhar nos laboratórios como assistentes científicos. E já percebe-mos que alguns deles, na faixa dos 13 anos, começam a em-preender cientificamente. Um, por exemplo, resolveu medir

“eu não acredito em fórmulas. dou asas à imaginação e penso completamente à vontade. não acredito em reu-niões também. eu me encontro com meus alunos, in-dividualmente ou com um grupo, e vamos caminhando pelo campus de maneira relaxada e trocando ideias. ou conversamos pela internet.

“inovação para mim é pensar sem se ater ao que os ou-tros falam. Quando fui para os estados unidos, existiam —e ainda existem— vários dogmas da neurociência, que eram como cânones da igreja. e eu, por minha formação intelectual brasileira, não tinha aquilo como algo sagrado. eu precisava conseguir reproduzir para acreditar. então, tentei reproduzir alguns dos cânones e nenhum deles funcionou. os resultados tinham sido obtidos em animais anestesiados e eu estava registrando animais despertos.

“dei muita sorte com meu orientador de pós-graduação —sorte em encontrar um bom mentor é algo que ajuda a inovar—, porque ele me deu muita liberdade. ele brinca-va: ‘nunca vamos conseguir publicar isso, porque estamos indo contra tudo e todos, mas, se é assim que você vê, va-mos em frente’. e trabalhava comigo. Até que começou a ver que eu tinha razão.

“inovar também implica uma briga de foice, já que se desafiam cânones. por outro lado, uma das mais agradáveis recompensas da carreira de um cientista é, quando a coisa funciona, o reconhecimento daquele que combatia sua ideia.

“eu nunca me dei bem com autoridades que se im-põem pela força, até porque cresci nos anos da dita-dura brasileira, e reconheço isso em vários cientistas, mesmo os que não viveram sob ditadura. talvez isso seja importante para a inovação.”

Uma “fórmula” pessoal para inovar por Miguel Nicolelis

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o conteúdo de gordura de uma semente do semiárido nor-destino como possível fonte de biodiesel e já está pensando na possibilidade de abrir um negócio de certificação de óleo vegetal do semiárido, algo que não existe.

Ou seja, mesmo que essas crianças não se tornem cientistas, elas se tornam empreendedores...Sim, à medida que pegam o gosto por inovar. Esse é o cami-nho: inovação se faz com gente que pensa diferente e que quer mudar o mundo. E, se essas crianças, apesar de se-rem de lugares tão periféricos que quase ninguém sabe que existem, hoje têm certeza de que podem mudar o mundo, há futuro para o Brasil, principal-mente se conseguirmos multiplicar essa experiência.

Eu desconfio que Peter Drucker, que é a maior len-da do pensamento de ges-tão e gostava particular-mente do Brasil, vibraria com essa perspectiva. Em sua última entrevista em vida, que foi concedida a HSM Management, ele disse que nos-so real entrave era essa desigualdade Norte-Sul...Sem dúvida. Nós precisamos de escala —um conceito que qualquer empresário entende— para ter os grandes talentos necessários à inovação no Brasil; não pode haver escala só com o Sul e o Sudeste, ex-cluindo todo o resto.

Como podemos extrair um Neymar da ciência se concen-tramos todo o esforço de recrutamento de cientistas em dois ou três estados do País? Eu sou de São Paulo e adoro isso aqui, mas não tem nenhum cabimento você concentrar 70% da produção científica em São Paulo. Do ponto de vista hu-mano, ciência é que nem futebol ou arte: precisa de talentos, onde quer que estejam.

Dá para incutir mentalidade científica nas escolas públicas?Sim! Neste instante, minha ambição é criar um currículo que possa ser espalhado por toda a rede federal e estamos conversando com o governo a esse respeito. E também es-tamos falando com empresas para que criem as próprias escolas baseadas nos princípios da neurociência. Assim, contribuirão duplamente: para o Brasil, porque ajudarão a fazer essa revolução educacional de que tanto precisamos; para si, porque vão garantir seu futuro estrategicamente com mão de obra qualificada —as crianças vão ser tão gra-tas e tão vinculadas a sua filosofia que serão seus melhores e mais leais executivos, engenheiros e técnicos. Seus CEOs sairão dessas escolas. É um novo tipo de cadeia produtiva que inclui a educação.

E que, ao fazê-lo, inclui a inovação e o empreendedorismo. Com que empresas o sr. está conversando? Foram várias nos últimos meses e estou animado; tem mais gente preocupada com esse tipo de coisa do que imagina-mos. Esse diálogo da ciência com as empresas certamente ainda é mais fácil fora do Brasil, mas começa a melhorar aqui também. Ainda não posso anunciar nada oficialmen-te, porém tenho a impressão de que nos próximos meses vamos fazer alguns anúncios que chocarão o empresariado brasileiro que ainda não embarcou nessa filosofia.

Esses princípios da neurociência para a edu-cação são bem similares às ideias de

educadores como Paulo Freire e Ru-bem Alves, não?

Eu gosto de dizer que nosso cur-rículo é produto de um matri-

mônio de Paulo Freire com Santos Dumont. Porque é importante ter conteúdo também e não apenas ins-tigar a pensar. Sabe o que é impressionante? A autoes-tima dos nossos alunos é elevadíssima. Pode entrar

a Lady Gaga lá, ou qualquer outra celebridade, eles não se

abalam. Continuam focados.

Posso fazer uma provocação? Paulo Freire não era exatamente um fã da

ciência... E o sr. não acha que a sociedade atual tenta transformar a ciência num novo deus?

Paulo Freire tinha um pré-conceito em relação à ciência porque não a praticou, apenas a viu de fora. Mas fez um trabalho neurocientífico sem saber. Agora, não po-demos transformar ciência em religião. Ela tem limites metodológicos, interpretações, e a gente tem sempre de saber que toda descoberta precisa ser reproduzida antes de ser considerada um fato. E devemos tomar muito cui-dado com a pseudociência.

Qual o limite dessa popularização da neurociência? Por exemplo, no caso dos negócios, ela tem levado as empresas a repensar suas práticas, humanizando-as, o que é bom...Estou entre os que defendem o entendimento de que tudo o que fazemos depende do tipo de cérebro que temos. Mas a manipulação com argumentos neurocientíficos é grave.

Há terrorismo em relação a essa capacidade que a ciência teria de nos manipular ou nos dominar? Ou é tudo verdade?A ficção científica, hoje em dia, é dominada pelos cená-rios aterradores de que a ciência vai nos conduzir ao fim da raça humana e isso cria uma imagem, no inconsciente

“Esse diálogo da ciência com as empresas

certamente ainda é mais fácil fora do Brasil, mas

começa a melhorar aqui também”

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coletivo, de que cientistas são agentes do mal e da destruição. Ocorre que a vasta maioria dos cientistas está preocu-pada em fazer coisas que, se derem certo, podem mudar nossa vida para muito melhor. Uma das motivações que tive para escrever meu livro, Muito Além do Nosso Eu, foi tentar mostrar uma vi-são muito mais otimista do que pode acon-tecer em decorrência de todas essas pesquisas atuais.

E seu perfil no Twitter também tem esse objetivo?Sim. Os cientistas podem ajudar tanto a mostrar essa vi-são positiva como a aumentar nossa cultura científica. A cobertura de ciências no Brasil, com raríssimas exceções, é muito pobre e amadora; ela só copia o que sai lá fora.

Com os computadores cada vez mais inteligentes, a máquina não vai substituir o homem mesmo?Nunca! O cérebro não pode ser reduzido a um algoritmo. Boa parte do que fazemos em nossa rotina diária até é pas-sível de um tratamento computacional, como escrever um texto, entrar na internet, postar uma fotografia, mas escrever um soneto de Shakespeare nenhum computador escreve. E isso vai ser sempre necessário.

O computador não imitará o cérebro a ponto de substituí-lo, que bom! Mas a sociedade imita o cérebro?Essa é uma das questões em que tenho pensado muito nos últimos anos: será que o modo de funcionamento do cére-bro ganha escala, tanto para baixo quanto para cima? Tra-duzindo: será que influencia tanto uma unidade “menor”, como o gene, quanto uma unidade “maior”, como o grupo social? Será que nossos padrões de comportamento social em grupos refletem a maneira como a população de neurô-nios do cérebro funciona?

Mais e mais a biologia tem mostrado que o processamen-to distribuído por populações pode, sim, vir a ser o algoritmo da biologia para tudo: para gene, para proteína, para como uma membrana das células funciona, para como as células funcionam em cooperação etc. Então, as evidências dessa escalada para baixo têm aumentado muito. Agora, para cima, eu tenho a suspeita, sem nenhuma prova científica, de que existe uma relação entre as coisas de fato. E é uma linha de pesquisa em que gostaria de embarcar: a neurociência social. Descobrir algo assim seria uma revolução.

Quanto o cérebro reproduz o passado e cria o futuro?O passado está totalmente registrado em nosso cérebro e determina em grande parte como vamos reagir a um evento

futuro. Além disso, o cérebro é um sugador de estatísticas, de informações e de padrões do mundo. Quando você vai ao cinema e vê uma atriz que acha fenomenal fazendo um gesto, tende a incorporar aquilo também.

Agora, pode-se dizer que ele também cria o futuro, na me-dida em que os neurônios se movimentam 200 milésimos de segundo antes de o corpo executar o comando corres-pondente. E ainda não há consenso, mas são fortes as supo-sições de que, durante o sonho, o cérebro faz simulações de cenários futuros, como se estivesse planejando coisas com grande antecedência.

Para terminar: o sr. vai trazer o primeiro Prêmio Nobel para o Brasil, de medicina ou fisiologia? O Prêmio Nobel é importante para a autoestima de um país como o Brasil. Seria uma afirmação da ciência brasileira, que o merece porque tem muita gente talentosa —e algum brasileiro vai acabar ganhando uma hora dessas. Mas eu pessoalmente não posso pautar minha carreira científica por esse tipo de recompensa, porque quem faz isso tende a se frustrar e porque, comparativamente, não tem tanta graça: se a gente conseguir fazer 20 milhões de pessoas no mundo voltarem a andar, que diferença faz um prêmio?

Por outro lado, admito que o fato de eu ter sido o primeiro brasileiro a ir a um Simpósio Nobel fez valer meus quase 30 anos de trabalho duro. Acho que os suecos sentiram o ba-que do projeto Walk Again. Agora, permita-me compartilhar uma lição valiosa que aprendi com os americanos: você tem de “talk the talk” e “walk the walk”. Falar é necessário, mas não basta; precisa correr atrás e fazer.

HSM Management

“O Prêmio Nobel é importante para a autoestima

de um país como o Brasil, mas, se a gente fizer

20 milhões de pessoas no mundo voltarem a andar,

que diferença faz um prêmio?”

DossiêNEUROBUSINESS

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a prática, a maioria opta pela pri-meira alternativa, sobretudo em em-presas familiares, nas quais os líderes mais velhos tendem a se “aposentar no trabalho”. No entanto, meu conse-lho é escolher a segunda: a sucessão deve ser efetivada quando o sucessor estiver pronto, independentemente do líder atual.

Talvez alguns receiem que isso seja visto como um sinal de derrota do líder substituí do ou de inferioridade sua em relação a seu substituto e, por isso, evi-tam a trilha. Mas, nos casos exemplares de transições bem-sucedidas, o líder sênior ainda é bastante capaz de lide-rar —mais que o substituto—, e mesmo assim o substituto preparado toma pos-se. A explicação para isso está em uma palavra quase mágica: “momentum”.

Usamos muito o termo latino na lín-gua inglesa, sobretudo no jargão dos negócios, porque ele traduz, com força, o contexto que é tão favorável a dada iniciativa que ela receberá impulso se acontecer ali.

MoMentuM nos negóciosEle é fácil de detectar. É quando cada um na empresa, incluindo a lideran-ça, tem uma noção clara de direção, energia e confiança. Já o antimomen-tum, em que o negócio começa a ficar para trás, é bem mais difícil de perce-ber. Nesse caso, as pessoas parecem nervosas e geralmente paralisam, es-perando o pior.

O aspecto ao qual as companhias precisam mais prestar atenção é o momentum, porque, quando há perda

dele, todos olham para dentro, com a confiança e o entusiasmo abalados, e ninguém se lembra do ambiente exter-no, criando um ciclo perverso do qual é difícil sair.

Companhias com momentum con-seguem suportar baixa demanda, pre-ços maleáveis e outras pressões sobre os resultados por algum tempo, por-que sentem que ainda estão inovando, adaptando-se e melhorando.

Qual a relação entre momentum e liderança? Bem, o comprometimen-

AltA GerênciA

John Davis, fundador e diretor da fir-ma de consultoria cambridge Advisors to Family enterprise e professor da Harvard Business School, é colunista fixo de HSM MAnAGeMent.

n

O especialista em empresas familiares JOhn Davis Discute a

impOrtância De preparar a sucessãO entre líDeres

levanDO em cOnta O mOmentum Da empresa

Foco no líder que

entraQuando se deve fazer a sucessão de comando em uma empresa? ( ) Quando o líder que sai está pronto para deixar o cargo.( ) Quando seu sucessor está pronto para liderar.

eMpreSAS FAMiliAreSJOHn DAViS

& ASSOciADOSJOHn DAViS

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Um líder em ascensão é impaciente por natureza e isso é bom: eu quero sempre que o sucessor deseje o papel de liderança e que esteja ansioso para assumi-lo. Mas ele também não deve superestimar--se nem ter expectativas irrealistas sobre o momento da transição. Costumo dar aos substitutos as seguintes orientações:

• Faça agora seus planos para comandar a empresa. Não se pode esperar até estar sentado atrás da mesa de CEO para se perguntar: “O que eu quero fazer agora?”. Isso é um erro clássico e deve ser evitado.

• Vá colocando seus planos em prática pouco a pouco, mesmo antes de tomar o “trono”, ainda enquanto assume mais responsabili-dades na empresa. Nesse caso, só é preciso estar de acordo com a estratégia do líder atual. Você será bem-sucedido quando seus planos e os do líder atual se encaixarem; mantenha-os alinhados.

• Saiba que haverá mudanças importantes que somente poderão ser feitas dois ou três anos depois de você assumir o cargo. Conforme-se com isso e prepare-se.

• respeite a delicadeza emocional de uma transição de líde-res. Haverá graves consequências se o líder atual se sentir ameaçado, acreditando que está sendo jogado para escanteio —e você deve evitar esse sentimento a todo custo. Ele precisa saber que sua memória será respeitada, que receberá crédito por suas realizações. Se você não respeitar as estratégias do líder atual, certamente ele ficará com um pé atrás e partirá para uma ação defensiva. Essa perturbação pode se tornar uma longa batalha pela estabilidade, que não vale a pena. Evite o conflito para se beneficiar dos conselhos e do apoio do líder que está saindo.

• Sempre comece seu discurso com o que terá continuidade, para só depois falar em mudança. Inicie suas conversas com frases como as seguintes: “Vamos conservar esses valores culturais que trabalhamos tão duramente para construir”, “Nossa lealdade aos principais investidores con-tinua”, “Nossa persistência por alta qualidade se mantém”. Só depois de garantir o que permanece fale sobre as coisas que terão de mudar.

Conselhos para quem chega

HSM Management

to, a motivação e a capacidade de construir um negócio bem-sucedido e ascendente podem criar ou destruir o momentum entre as pessoas que fa-zem parte de uma empresa. Tudo isso depende da liderança, e é por essa razão que a escolha do líder e seu desenvolvimento são tão cruciais e que o timing da transição de lideran-ça, com o qual iniciei este texto, tem tanta importância. E não são apenas os funcionários que precisam sentir o momentum; os aspirantes a líder também. Se não sentirem, é como se lhes negassem oportunidades de crescimento e eles sairão de cena, be-neficiando os concorrentes.

Membros de uma família empresá-ria geralmente não prestam atenção ao momentum na transição de seus líde-res. Costumeiramente, os mais velhos se perpetuam no comando, enviando à geração jovem a mensagem de que não precisa se preparar para liderar a empresa (e transformá-la), porque es-perará muito de qualquer maneira.

Não foram poucas as vezes em que vi isso acontecer, e, quando o líder finalmente estava pronto para se aposentar, seus sucessores tinham perdido o entusiasmo, a motivação ou a capacitação.

o ciclo de vida da liderançaNormalmente, a capacidade de uma pessoa de liderar uma organização (ou seja, de ser seu CEO) segue um ciclo de vida: aumenta, chega ao pico e decai ao longo do tempo.

Costumo fazer a seguinte pergunta a meus alunos, independentemente da idade: “Se você tivesse de conside-rar única e exclusivamente os próprios interesses, preferiria se aposentar do cargo de CEO: a) antes de chegar ao auge do ciclo de vida da liderança; b) no auge; c) depois do auge?”.

A maioria deles diz que gostaria de se aposentar no pico ou depois de atingi-lo, e apenas cerca de 25%, antes. Quando questiono motivações, os que querem ficar mais tempo apresentam um dos seguintes argumentos:

• “Gostaria de ficar até realizar todomeu potencial, demonstrando a mim e aos outros toda minha capacidade.”

• “É muito difícil saber quando vocêchegou ao pico, mas é fácil ver quan-do suas contribuições como líder es-tão em declínio. Se eu esperar minhas contribuições caírem por um tempo, terei certeza de que ultrapassei meu auge e estarei pronto para sair.”

Alerto-os de que alguns líderes acham que seus declínios são tem-porários e que logo vão começar a contribuir novamente, porém de nada adianta. Há uma resistência conside-rável a passar o bastão a um sucessor.

conselhos para queM saiCabe a quem sai reconhecer a hora certa de sair, pelo momentum. Eis al-gumas recomendações:

• Não espere muito para dar aos jo-vens gestores responsabilidades e autoridades significativas. Do con-trário, eles ficarão desmotivados e será tarde demais.

• Insista para que conversas e planosde transição aconteçam, oferecendo aos futuros líderes experiências desa-fiadoras que testem suas capacidades.

• Ajudeaorganizaçãoa seprepararpara a transição da liderança, defi-nindo data e avisando o sucessor: “Esteja pronto”.

Não espere até o dia de sua morte para que a sucessão seja feita. O mo-mentum terá morrido também.

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INOVAÇÃO

IBM, a nº 1EM PaTEnTES

Bernard Meyerson,vice-presidente de inovaçãoda IBM

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e houvesse uma olimpíada de ino-vação, a IBM seria a campeã mundial recorrente. Assim como os países cole-cionadores do maior número de meda-lhas olímpicas fazem com seus atletas, essa empresa, com sede em Nova York, investe muito em seus pesqui-sadores. O resultado ficou evidente em 2011: ela superou a notável marca de 6 mil patentes registradas em um ano. Nem Microsoft, Sony, Xerox e Apple so-madas alcançam tal número.

A área de pesquisa e desenvolvi-mento (P&D) foi priorizada há duas décadas e hoje conta com mais de 8 mil pesquisadores, entre cientistas e técnicos, em 36 países, e um orça-mento que ultrapassou os US$ 6 bi-lhões no ano passado. Ela sabe que sua inovação constante é a razão de seu valor de mercado ter superado, em abril de 2012, os US$ 230 bilhões.

Há oito anos a International Busi-ness Machines não faz computadores pessoais, nem está entre seus objeti-vos criar o substituto para o iPhone ou para o iPad. A visão da companhia tem a ver com o que a maioria cha-ma de “inteligência artificial”, mas que o pessoal ali prefere denominar “cognição automática”. Trata-se de automatizar o processo de adquirir ou gerar conhecimento.

PERFIL DO LÍDERUm dos principais responsáveis pelo sucesso da divisão de P&D da empresa

é Bernard Meyerson, vice-presidente de inovação, chefe do departamen-to de relacionamento com universi-dades internacionais e líder da IBM Academy of Technology (organização autogerida composta por executivos e técnicos seniores da empresa), além de membro da equipe de integração e valores com outros altos executivos de diferentes departamentos.

Com 32 anos de IBM, Meyerson assina a criação de mais de 40 paten-tes. Graduado e doutorado em física pela New York University, dos Esta-dos Unidos, entrou na IBM Research para cuidar do desenvolvimento de uma tecnologia de semicondutores que usavam uma mistura inovadora de silício e germânio e outras tecno-logias de alto desempenho. Em 1992, foi designado “fellow” da IBM, a mais alta honra técnica da companhia, e, nove anos mais tarde, nomeado chefe do grupo de tecnologia.

No final da década de 1990, foi re-conhecido como “inventor eminen-te” pela American Intellectual Pro-perty Law Association (Aipla). Em 2003, assumiu a responsabilidade operacional pelos esforços globais de pesquisa e desenvolvimento de semicondutores. Nessa posição, lide-rou o maior consórcio do mundo em desenvolvimento de semicondutores, integrado por IBM, Sony, Toshiba, AMD, Samsung, Chartered Semi-conductor Manufacturing e Infineon.

HÁ 19 ANOS, A IBM É A EMPRESA QUE MAIS GERA PATENTES NO MUNDO. DURANTE 2011, SEU EXÉRCITO DE CIENTISTAS E PESQUISADORES REGISTROU NADA MENOS QUE 6.180 INOVAÇÕES. ESTA REPORTAGEM DETALHA COMO TAL CONQUISTAFOI POSSÍVEL

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IBM

SINOPSE

•A percepção é a de que é a Apple a mais inovadora das companhias? Mas foi a IBM que registrou mais de 6 mil patentes em 2011, nove vezes acima do número da empresa da maçã. Para tanto, investiu mais de US$ 6 bilhões em pesquisa e desenvolvimento.

•A maioria dessas patentes está relacionada com métodos e modelos, não com engenhos eletrônicos —uma realidade diferente da do Brasil, onde não é o capital intelectual o alvo do patenteamento.

•Bernard Meyerson, VP de inovação da IBM, credita parte do êxito aos gestores da empresa que não dizem como fazer, mas desafiam suas equipes, colocando-as à prova e confiando nelas.

A reportagem é de Guillermo Martínez, colaborador de HSM MANAGEMENT.

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INOVAÇÃOINOVACÃO

O QUE É SER INOVADORMeyerson sorri quando alguém lhe pede que defina inovação. Apaixonado pelo tema, a simplicidade de sua res-posta comprova o domínio que tem sobre o assunto: “Penso que inovação é a oportunidade que temos para criar um mundo melhor ao tornar tangíveis as ideias que passam por nossa mente”.

Líder de projetos destinados a em-presas, cidades e universidades, tam-bém é responsável pelo Watson, o supercomputador que é a joia tecno-lógica da IBM, cotado para se tornar o propulsor da nova era da inteligência artificial, ou da cognição automática.

O lema da divisão de P&D é: “Além de inventar, inovamos”. Meyerson en-tende que a inovação é essencial e cita um provérbio árabe: “Há quatro coisas irrecuperáveis: o disparo efetuado, a palavra pronunciada, o tempo passado e a oportunidade desperdiçada”.

A IBM se caracteriza por não desper-diçar oportunidades de tomar decisões.

Em 2004, quando o mercado de micro-computadores estava mais aquecido, ela vendeu sua divisão de computa-dores pessoais para a chinesa Lenovo, que lhe pagou cerca de US$ 650 mi-lhões em dinheiro e US$ 600 milhões em ações (a IBM ficou com aproxima-damente 20% da Lenovo).

Hoje, com o auge dos smartphones —no final de 2010 pela primeira vez foram vendidos mais smartphones que computadores—, fica evidente que a organização conhecida como “Big Blue” (por causa do uniforme de seus funcionários) vendeu grande parte de seu negócio no melhor momento.

A IBM, então, se transformou e op-tou por não ficar limitada à produção de hardware ou de software, passando a trabalhar na busca de soluções tecno-lógicas. Meyerson, melhor testemunha desse processo, garante que a filosofia da companhia motiva a inovação o tempo todo. “Para ter sucesso nos ne-gócios, é necessário olhar adiante dos

concorrentes, atuar com mais ousadia, e não apenas se aproximar ou se ade-quar às tendências do mercado, e criar novas tendências, o que certamente demora mais, porém, em longo prazo, traz benefícios maiores.”

VARIEDADEA atividade de seus centros de pesqui-sa, localizados nos cinco continentes, pode ser compreendida por meio de alguns de seus projetos: • Nos EUA, estão desenvolvendo um

sistema de apoio para a tomada de decisões em cardiologia (Vale do Silí-cio, Califórnia); microprocessadores de alta velocidade (Austin, Texas); dispositivos ultrarrápidos e intera-tivos (Nova York e Massachusetts). Além disso, com a National Geogra-phic Society, atuam no Projeto Geno-gráfico, que tem como finalidade re-gistrar novos dados sobre a história migratória da raça humana.

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Posição Patentes Empresa País

1 6.180 IBM Estados Unidos 2 4.894 Samsung Electronics Coreia do Sul 3 2.821 Canon Japão 4 2.559 Panasonic Japão 5 2.483 Toshiba Japão 6 2.311 Microsoft Estados Unidos 7 2.286 Sony Japão 8 1.533 Seiko Epson Japão 9 1.514 Hon Hai Precision Industry Taiwan 10 1.465 Hitachi Japão

Fonte: Patent Intelligence and Technology Report 2011/IFI Claims.

AS 10EmPRESAS

QUE ObtIVERAmmAIS PAtENtES

Em 2011

PAtENtES ObtIDAS PELA Ibm NOS

úLtImOS cINcO ANOS

Segundo a IBM, uma nova geração de aplicativos ajudará as pessoas a conseguir umavida mais saudável

2011 6.1802010 5.8962009 4.9142008 4.1862007 3.125

Fonte: Research & Development Reports, IBM.

Page 68: Matérias HSM

• Na Austrália, em Melbourne, há projetos vinculados às ciências da vida e ao planeta inteligente.

• No Brasil, o foco é sustentabilidade.• Na China, priorizam a computa-

ção em nuvem. • Em Israel, criam ferramentas analí-

ticas e de verificação. • Na Irlanda, têm um centro de tecno-

logia para cidades inteligentes. • Na Índia, desenvolvem aplicativos

de comunicação móvel e tecnolo-gias de linguagem humana.

• No Japão, concentram-se nos cam-pos dos microdispositivos e da inte-ração homem-máquina.

• Na Suíça, pesquisam nanotecnologia.

“Podemos inovar de muitas formas”, diz Meyerson, “e com muitos parceiros.” Ele cita uma pesquisa que combina a capacidade de processamento de dados do Wat son, o supercomputador da IBM, com o vasto arquivo de conhecimen-tos e históricos médicos do Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, para criar um sistema de tomada de decisões diagnósticas e indicação de tratamentos —piloto previsto para o final de 2013.

Outra parceria importante foi estabe-lecida no Brasil, com o Grupo EBX (na figura da Six Automação), para de-sen volver programas de pesquisa e propriedade intelectual com foco em recursos naturais, sustentabilidade e in fraestrutura. A parceria inclui, entre outras coisas, a criação de um centro de soluções para que clientes realizem testes e provas de conceito e customi-zem tecnologias [leia entrevista do cien-tista-chefe da IBM Brasil, Fábio Gan-dour, na HSM Management nº 88].

As invenções da IBM também foram úteis para o Facebook, que adquiriu mais de 750 patentes da empresa nova--iorquina. Poucos sabem que os códi-gos de barras saíram de seus centros de pesquisa ou que a cirurgia a laser para a correção de miopia nasceu lá.

“Deve-se conseguir que os consumi-dores não comprem apenas produtos, mas também conceitos úteis e insubs-tituíveis”, define Meyerson.

PESQUISADORES E GEStORESO VP da IBM tem uma forma peculiar de se referir aos cientistas responsá-veis pela criação de um número tão

elevado de patentes. Diz que se trata de “especialistas inovadores com o gene da invenção hiperdesenvolvido”. São profissionais assim que procura atrair. Muitos deles são pesquisadores independentes que atuam em outras instituições e, ao serem incorporados à IBM, recebem apoio para potencia-lizar ao máximo seus conhecimentos. No entanto, a empresa também forma seus futuros inovadores. “Já testemu-nhei casos de jovens recém-formados que ao cabo de seis anos se tornaram inovadores ‘hardcore’, pessoas que ge-ram grande valor para a organização.”

Em 2011, a Fortune elegeu a IBM a melhor companhia do mundo em de-senvolvimento de líderes, pelo segundo ano consecutivo. Um de seus polos de talentos é a Academy of Technology, formada por mil cientistas de primeiro nível e mais de 7 mil técnicos e pesqui-sadores promissores, de várias áreas da companhia. Ao todo, são 44 grupos téc-nicos ou regionais. Segundo Meyerson, desenvolver talentos em equipes de pes-quisa requer compreender a complexa personalidade de seus membros, e o melhor gestor para isso “não diz como fazer o projeto, mas desafia sua equipe, pondo-a à prova e confiando nela”.

A nova geração de cientistas não se limita às tarefas tradicionais. Também elabora planos de negócios, participa de reuniões executivas e realiza apre-sentações para diretores e clientes. “Os novos cientistas aprenderam a colabo-rar. Hoje temos uma espécie de rede social com a participação de especialis-tas da IBM e de fora. Todos contribuem com o maior conhecimento possível em seus campos”, explica Meyerson.

O FUtUROApesar dos esforços e do sucesso des-sa gigante, Meyerson acredita que, cada vez mais, os pequenos empreen-dimentos determinarão o rumo da sociedade, provando que, para ino-var, não são necessários grandes or-çamentos, e sim grandes ideias.

HSM Management

IBM, a nº 1EM PaTEnTES

HSMManagement 93 • julho-agosto 2012 hsmmanagement.com.br 91

2011 6,2582010 6,0262009 5,8202008 6,3372007 6,153 Fonte: Relatórios anuais da IBM.

INVEStImENtO DA Ibm Em P&D NOS úLtImOS

cINcO ANOS (EM US$ BILHÕES)

O supercomputador Watson atrai a atenção de estudantes de todo

o mundo; aqui, dois deles com o professor

R.P. Raghupathi (centro), ganhador do Smarter Planet

Faculty Award da IBM

Page 69: Matérias HSM

empresas

sINOpse

•SteveJobspagouUS$10milhõespelaPixarem1986,investiuUS$50milhõesparaqueproduzissehardwareesoftwaredecomputaçãográficae,comoissonãodecolou,demitiuumterçodopessoal;sobrouadivisãodeanimação.

•Sóque,desdeacriaçãodoOscardemelhoranimação,em2001,aPixarganhouseisestatuetas,semmencionarosprêmiosconquistadosporseusdiretoresetécnicos,eseus12filmeslongas-metragensjáarrecadarammaisdeUS$6bilhões(o13º,Valente,acabadeserlançado).ADisneyacomprouem2006porUS$7,4bilhões.

•Asrazõesdosucesso?Noinício,ossócioscomplementares.Emgeral,ainovaçãoconstanteesobmedida(queincluioscurtas-metragensdetreino),aintegraçãodaequipeenãotemerfracassar.Doissegredos:iratrásdepessoas,nãodeideias;visaraexcelênciasempre,semrevezarcomomedíocre.

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EdCatmull,CEOdaPixar

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Era uma vez uma lâmpada

uma noite estrelada. Em um barco, no meio do mar, estão um menino, seu pai e seu avô. De repente, a lua ilumina a cena. Assim começa o mais recente curta-metragem da Pixar, que deve ser lançado em julho na América Latina e que HSM Management teve o privilé-gio de ver em primeira mão na sede da empresa. “O menino acompanha o pai e o avô para trabalhar e descobre que estão envolvidos em algo fantástico, relacionado com a lua”, conta Enrico Casarosa, o diretor, com cuidado para não revelar a trama. “Tentei capturar um pouco da atmosfera italiana. Cres-ci em Gênova, uma cidade portuária, e sempre tive o mar diante de mim”, diz.

Esse é só um exemplo do trabalho da Pixar, marcado por imagens im-pecáveis, música emocionante, re-sultado final hipnótico e sinônimo de inovação. Desde a criação do Oscar de melhor animação, em 2001, o estú-dio ganhou seis estatuetas, sem men-cionar os prêmios conquistados por diretores e técnicos. Seus 12 longas--metragens já arrecadaram mais de US$ 6 bilhões. De onde vem o sucesso? HSM Management visitou a sede da Pixar, em Emeryville, Califórnia, e conversou com animadores, encarre-gados de efeitos especiais, diretores e seu CEO e encontrou três respostas.

É

RepoRtagem HSm management moStRa como a pixaR inauguRou

uma nova fRonteiRa na indúStRia cinematogRáfica e Se tRanSfoRmou

em modelo de inovação

a reportagem é de Viviana alonso, com o auxílio de mariana Lima, ambas, cola-boradoras de Hsm maNaGemeNT.

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INOVAçãOCONStANtEESObmEDIDAPara analistas do setor, o segredo do sucesso da Pixar está na inovação con-tínua, que lhe permitiu ser pioneira no campo da animação por computador e se manter à frente de seus concor-rentes a partir daí. Steve May, diretor de tecnologia do estúdio, confirma: a evolução tecnológica é fragrante de um filme para outro. “Para isso, temos um departamento de pesquisa e desenvol-vimento [P&D], com cem pessoas, que sempre desenvolve novos programas, e grupos de sistemas que gerenciam o hardware, assim como a infraestrutura de computadores e redes. Ao mesmo tempo, em cada filme, há equipes de P&D para a criação de softwares es-pecíficos para os personagens e cenas daquela história.”

Às vezes, conta ele, o novo persona-gem se parece com algum que a Pixar já colocou na telona e é possível rea-proveitar a tecnologia existente. Outras vezes, suas características e os traços obrigam a construir um novo software. Nesses casos, a equipe de desenvolve-dores do filme trabalha ao lado de P&D para criar o personagem.

Embora na tela pareça simples, com movimentos muito naturais, cada per-sonagem tem grande complexidade e envolve diferentes profissionais, res-ponsáveis, de um lado, por criá-lo e, de outro, por animá-lo.

“Os criadores desenham um mo-delo de formato de rosto, de cabelo,

de corpo e de vestimentas; fazem a pele parecer pele, escolhem a cor dos olhos. É como criar uma marionete no computador. Depois, alguém a faz atuar”, ilustra May.

ImPErAtIVODEINtEgrArSe a inovação leva ao sucesso, a cultu-ra impulsiona a inovação. Ed Catmull, CEO e cofundador da Pixar, recorda que após o sucesso do primeiro longa--metragem, Toy Story, lançado em 1995, levantou-se uma questão funda-mental: como se tornar um estúdio que sempre produz bons filmes?

“Muitas vezes, as tentativas seguin-tes ao êxito não são do mesmo nível e isso leva ao fracasso”, afirma ele. “Por isso, dedicamo-nos a nossas questões culturais. São grupos diferentes, mas tentamos não ter uma estrutura hie-rarquizada, como muitos estúdios. Pro-movemos a integração, tanto por meio de nossa arquitetura, que simula o cé-rebro, como pela Pixar University [veja no Portal HSM], misturando pessoas de diferentes áreas e experiências.”

SEmmEDODOfrACASSOEncorajar novas ideias é o terceiro ponto. “Criatividade significa fazer o que nunca foi feito e, para isso, é preci-so ter um ambiente no qual as pessoas não temam o fracasso. Se fazemos algo novo, às vezes cometemos erros, po-rém é melhor corrigi-los que evitá-los.”

A filosofia de Catmull não se aplica apenas aos produtos, mas também à

escolha dos diretores. Como nenhum filme funciona bem em seus estágios iniciais, como decidir se o diretor é o certo e quando trocar se não for? “Nós o trocamos quando a equipe perde a confiança nele e não por causa de er-ros cometidos na produção. Erros, a equipe corrige em conjunto; rachas, não”, explica ele.

A visão de Catmull deu frutos também fora das telas. Em 1995, a estreia da Pixar na bolsa de valores levantou US$ 140 milhões e quebrou o recorde do ano. Em 2006, prestes a lançar Carros, seu sétimo longa--metragem, a Walt Disney a adquiriu por US$ 7,4 bilhões.

EOfUtUrO?Catmull fundou a Pixar com John Las-seter e Steve Jobs [veja quadro ao lado] e 40 funcionários. Catmull se tornou seu CEO (e do estúdio de animação da Disney também), Lasseter, o diretor de criação e a família de Jobs mais do que recuperou seu investimento –seu ca-pital passou de US$ 1 bilhão, o maior acionista individual da Disney. E hoje são 1,2 mil pessoas trabalhando ali.

A Pixar continua crescendo e enfren-ta o difícil desafio de preservar a essên-cia. Mas um bom sinal é que ela nunca abandonou a produção de curtas-me-tragens, como o de Casarosa –bons exercícios para formar pessoas.

empresas

Hsm management

Toy Story

1995

Vida de inseto

1998 Toy Story 2

1999Monstros S.A.

2001Procurando Nemo

2003

OsIncríveis

2004

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Carros

2006

Valente

2012Ratatouille

2007Up

2009

WALL-E

2008

Toy Story3

2010Carros 2

2011

Considerado um dos fundadores do campo da computação gráfica, o CEO Ed Catmull ganhou cinco prêmios da Academia, entre eles o Gordon E. Sawyer de 2008 pelo conjunto da obra e por suas contribuições técnicas na área. Quando Steve Jobs adquiriu a divisão de computação gráfica da Lucasfilm, em 1986, Catmull era o VP e John Lasseter, membro da equipe de animação. O trio, então, fundou a empresa a que chamaram Pixar.Ao lembrar aqueles dias, Catmull conta o papel de cada um:

• Lasseter, hoje executivo-chefe de criação da Pixar, contribuiu com os lados criativo e cinematográfico e com um foco muito preciso na história e nos personagens. “John dizia: ‘Uma boa história é muito bem estruturada e gira em torno de um personagem com quem você se relacionaria’.”

• Steve, por sua vez, usava uma “barra de aço” para medir a qualidade. “Ele tinha uma inaba-lável determinação de alcançar a excelência em tudo. Era quem negociava e nos protegia.”

• Catmull lidava com os assuntos internos. Apesar da formação técnica, concentrava-se em questões “culturais” do negócio: como interagir, o que poderia dar errado e como corrigir.

Eles se complementavam, como os três olhos do monstrinho de Toy Story. “Havia momentos difíceis em que desanimávamos, mas não os três ao mesmo tempo, e, mantendo a união, encontrávamos a solução.”

Os primeiros anos foram os mais difíceis. Jobs pagou US$ 10 milhões pela compra da Pixar, porém teve de investir US$ 50 milhões de seu capital pessoal para mantê-la à tona. Um dos objetivos iniciais era comercializar hardware e software de computação gráfica. Em 1991, como isso não atin-giu as metas de receita, ele demitiu um terço do pessoal e manteve só a

divisão de anima-ção. Outro período crítico

foi em 1996, durante a produção do segundo longa, Vida de Inseto. A Dis-ney, que distribuía e cofinanciava os filmes, pediu uma sequência de Toy Story, para venda em vídeo. Mas Las-seter e a equipe estavam envolvidos em Vida de Inseto e montou-se uma equipe inexperiente. A oito meses do lançamento, o grupo de Lasseter teve de assumir Toy Story 2, e o que levaria 18 meses foi finalizado em tempo re-corde. Diz Catmull: “Tiramos daí duas grandes lições: (1) A diferença não está nas ideias, e sim nas pessoas. Em Hollywood, muitos procuram boas ideias para transformá-las em filmes. Nós fazemos o inverso: buscamos boas pessoas e lhes pedimos ideias —um dos segredos de nosso sucesso. (2) Não se devem fazer alguns filmes medíocres e outros extraordinários; todos precisam ser excelentes.”

Era uma vez uma lâmpada

os segredos deed caTmuLL

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odos os anos, o jornal econômi-co The Wall Street Journal divulga uma lista das empresas de tecnolo-gia limpa financiadas por capital de risco nos Estados Unidos. Em 2011, o Recyclebank ficou em primeiro lu-gar, entre cerca de 150 companhias. Ele se autodefine como uma em-presa de tecnologia limpa apoiada por capital de risco que mantém o foco em incentivar o comportamen-to ecologicamente responsável, em grande escala.

O Recyclebank surgiu por iniciativa de Ron Gonen, durante seu MBA na Columbia University, em Nova York, quando se interessou pela ideia de criar um banco de reciclagem. Sabia que o modelo deveria ser testado em um município e conseguiu emplacar um projeto-piloto na Filadélfia.

Um dos primeiros investidores foi a própria universidade, que possui um fundo de capital de risco para investir em negócios de seus estu-dantes. Com essa contribuição e a de outros dois investidores, chegou-se à segunda rodada de financiamento,

liderada pela Kleiner Perkins, Cau-field & Byers (KPCB), uma das maio-res empresas de capital de risco do Vale do Silício, que vinha investindo em tecnologias limpas e apoiando quem colocasse ênfase no compor-tamento do consumidor. A terceira rodada foi encabeçada pelo Genera-tion Investment Management, fun-dado por Al Gore.

Fundado em 2004, o Recyclebank tem sede em Nova York e está presen-te em mais de 30 estados e 300 comu-nidades norte-americanas. A empresa possui também um escritó rio na Fila-délfia, responsável pelo atendimento ao cliente, e outro em Londres, Ingla-terra, onde desembarcou depois que Boris Johnson assumiu a prefeitura pela primeira vez, em 2008. Trata-se de

A reciclagem compensa

RepoRtagem HSm management moStRa como o pRogRama Recyclebank implantou a eStRatégia de RecompenSaR a boa atitude ambiental e deSencadeou um cíRculo viRtuoSo, dando início a um modelo no qual todoS ganHam

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A reportagem é de Mariana Lima, cola-boradora de HSM MANAGEMENT.

SINOPSE

•ORecyclebank,fundadoporRonGonenem2004,atuanapromoçãodeiniciativaseatitudesecologicamenteresponsáveis.Emparceriacomprefeituras,organizaçõesprivadasecidadãoscomuns,aempresaestabeleceuumprogramadepontuaçãoerecompensaparaqueméecocorreto.Quantomaisapessoareciclaoueconomizaenergia,maispontosganhaparatrocarporvantagensnascompanhiascadastradasno“banco”.

•Comainiciativa,omunicípioeconomiza,osmoradoreslucramcomdescontos,acomunidadesedesenvolvecomatrocadepontosnosnegócioslocaiseomeioambientemelhora.

•HojeoRecyclebankcontacommaisde3milhõesdemembros,que,emmédia,poupam,comoprograma,maisdeUS$130poranocadaum,edeleparticipammaisde3milempresasnorte-americanasdesetoresvariados,entreelasmarcasfamosascomoMacy’s,Nestlé,PurinaeCoca-Cola.

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Ian Yollesdiretor de sustentabilidade

do Recyclebank

FICHATÉCNICADORECYCLEBANK

Anodefundação: 2004CEO: Jonathan HsuInvestidores:Generation Investment Management; Kleiner Perkins, Caufield & Byers; Paul Capital Investments; Physic Ventures; RRe Ventures; sigma Partners; The Westly Group; Waste ManagementFuncionários:215Membros:mais de 3 milhõesComunidadesatendidas: mais de 300Membrosdoprogramadepontos: mais de 3 milPrincipaisprêmiosrecebidos:primeiro lugar entre as empresas de tecnologia limpa (The Wall street Journal, em 2011); excelência na associação público-privada (Conferência de Prefeitos dos estados Unidos, em 2010); pioneira em tecnologia (Fórum econômico Mundial, em 2009); Campeões da Terra (Programa das nações Unidas para o Meio ambiente, em 2009)

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um político entusiasma-do com a ideia de promo-ver incentivo positivo para fazer com que as pessoas tenham atitudes ecologi-camente corretas, em vez de aplicar punições.

MISSÃO O Recyclebank recompensa as pes-soas por reciclar. Para tanto, criou uma plataforma educativa que es-timula o aumento da consciência ambiental. Na área de energia, pre-mia quem reduz o uso doméstico de eletricidade. “Por exemplo, se alguém compra um livro na Barnes & Noble, o recompensamos por isso, e o mesmo acontece com quem de-cide se unir ao green team do eBay. Em outras palavras, o que fazemos é pensar nesses temas da perspectiva do consumidor”, explica Ian Yolles, diretor de sustentabilidade.

A essência do negócio do Recycle-bank é mudar o comportamento e o comprometimento dos consumido-res. Para a empresa, os complexos problemas de nossa época exigem uma política de soluções gradativas e o setor privado deve estar orienta-do para a inovação radical.

A ideia original do Recyclebank foi desviar os resíduos do aterro sa-nitário para reciclagem. Com essa premissa, os clientes óbvios eram as prefeituras, porque as cidades conseguiriam uma economia subs-tancial. Essa foi a proposta de valor feita aos municípios, baseada na ca-pacidade da empresa de rastrear a taxa de reciclagem de cada família, por meio de um pequeno chip colo-cado na lata de lixo das casas. Além disso, pesa-se o saco de lixo quando ele entra no caminhão. Então, toda semana, o morador ganha pontos em sua conta pessoal no Recycle-bank.com, onde pode verificar sua pontuação e consultar um catálogo para decidir como usá-la.

“O principal é o programa de re-compensas e fidelidade: quanto mais se recicla, mais pontos se obtêm, e esses pontos podem ser trocados por descontos na compra de produtos e serviços das empresas que fazem parte do programa. Nossa função não é falar com quem já está com-prometido com o tema, e sim chegar ao público em geral”, destaca Yolles.

MODELO REDONDO O modelo de negócio do Recycle-bank está baseado na relação con-tratual com as prefeituras, porque compartilha com elas a economia que conseguem mediante o incre-mento das taxas de reciclagem e o aumento do número de participan-tes do programa. Em resumo, há um cliente que paga (a prefeitura),

mas a empresa envolve também o público em geral para ter impacto em grande escala.

“À medida que incorporamos membros e comunidades, as grandes marcas de produtos de consumo em massa, como a Unilever, a Johnson & Johnson e a Coca-Cola, se interes-sam em participar. Por isso, também é possível pensar no Recyclebank como uma plataforma que aumenta seus rendimentos com base nas re-lações de marketing com as marcas”, afirma Yolles.

O executivo acredita que, atual-mente, todas as grandes compa-nhias preocupam-se com o tema da sustentabilidade, seja em sua cadeia de fornecimento, seja no de-sign de seus produtos ou na relação com o consumidor.

O Recyclebank recompensa quem adota ações verdes no cotidiano. Sua missão é incentivar os indivíduos e as comunidades a construir um mundo no qual nada seja desperdiçado.

Ao educar e envolver mais de 3 milhões de membros on e off-line, o Recyclebank incrementa as taxas de reciclagem, diminui o consumo de água e de energia, pro-move o transporte inteligente, fortalece as economias locais e ajuda os cidadãos a obter benefícios financeiros ao adotar um modo de vida mais verde. Em média, cada membro poupa mais de US$ 130 por ano com o programa de recompensas.

O “banco” é assessorado por um conselho de especialistas em sustentabilidade, executivos de negócios e representantes de organizações não governamentais. Sua rede é composta por mais de 3 mil empresas locais de alimentos e bebidas, cosmé-ticos e saúde, restaurantes, entretenimento, esporte e lazer, vestuário, automóveis, eletroeletrônicos e outras atividades, além de mais de uma centena de grandes marcas, entre elas a Macy’s, a Nestlé, a Purina e a Coca-Cola.

PORUMFUTUROSUSTENTÁVEL

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O Recyclebank também está tra-balhando, com os responsáveis pelo transporte em Londres, no projeto “Co-Transportation”, que visa pro-mover e recompensar quem optar por fazer a pé ou de bicicleta os tra-jetos tradicionalmente percorridos em transporte público. Um aplicati-vo de GPS para smartphones permi-tirá medir e registrar as viagens.

Quando o Recyclebank assina con-trato com uma cidade, o prefeito anuncia, por meio da imprensa e de uma carta aos cidadãos, a chegada do “banco” e a oportunidade de participar. Depois, a empresa faz um convite es-pecífico para cada morador.

Todos saem ganhando com a ini-ciativa: a prefeitura poupa dinheiro, os moradores geram valor econômi-co com o programa de recompensas, o desenvolvimento é impulsionado com a troca de pontos nas empre-sas e nos comércios locais —e o meio ambiente sai no lucro.

EXEMPLOSAo ver o que está acontecendo no setor privado, Yolles encontra motivos para ser otimista. Ele aponta a Unilever como um “exemplo muito interessan-te”. Sob o comando de seu CEO, Paul Polman, a companhia lançou, em no-vembro de 2010, o “Plano para uma Vida Sustentável”, por meio do qual procura reduzir pela metade a pegada ambiental de seus produtos até 2020.

Outro exemplo global é a General Electric com sua proposta Ecomagi-

nation, uma iniciativa que não se limi-ta ao marketing e à comunicação, mas que também está vinculada à agenda de pesquisa e desenvolvimento (P&D), inovação e crescimento da GE [veja entrevista com Beth Comstock, diretora de marketing da GE, em HSM Mana-gement nº 92, página 18].

Yolles cita, ainda, a Nike, orientada para iniciativas de sustentabilidade há três décadas, e a GoodGuide. Trata--se de uma empresa com sede em San Francisco, fundada pelo professor Dara O’Rourke, da University of Cali-fornia em Berkeley, onde uma equipe de cientistas desenvolveu uma meto-dologia para qualificar os produtos se-gundo seu impacto social e ambiental. Um aplicativo para smartphones per-mite que a pessoa consulte a pontua-ção que a GoodGuide deu ao objeto que deseja comprar.

A mais recente iniciativa do Recycle-bank é a construção de uma platafor-ma digital para otimizar a participação das pessoas. A intenção não é oferecer mais uma experiência vir tual, e sim motivá-las a atuar no mundo real. O diretor exalta as oportunidades da mo-bilização online, porém reconhece a necessidade de outro tipo de relação para que o ciclo se feche. “A meta do Recyclebank é utilizar o espaço digital para começar a construir a conexão e a participação da comunidade, mas é só isso: o começo do processo.”

o Recyclebank aSSina contRato com uma cidade e ganHam todoS: a pReFeituRa poupa veRba, oS moRadoReS têm RecompenSaS, o coméRcio cReSce e o meio ambiente melHoRa

HSM Management

Saiba maiS SobReIANYOLLES

Não é por acaso que Ian Yolles é um dos principais gestores do Recyclebank. “Sempre me interessei por empresas que têm um propó-sito mais nobre que o mero fato de ganhar dinheiro e buscam fazer dife-rença no mundo”, afirma. Ele atuou como diretor de invenções sociais na The Body Shop e como diretor de marketing na Patagonia.

Antes, foi cofundador e vice-pre-sidente de marketing e comunicação da Nau, empresa de vestuário sustentável, consultor sênior da Dialogos, companhia de aprendizado organizacional e liderança coletiva, orientada para promover o capi-talismo responsável, e diretor de marketing da Nike.

No Recyclebank, supervisiona a agenda de sustentabilidade, visando integrá-la a todos os as-pectos fundamentais para a marca, a experiência do consumidor e as parcerias estratégicas.

Como executivo verde, aponta que o desafio ambiental mais relevante é a crise climática, mas chama a atenção para outros temas: a mudança climática, as emissões de gases do efeito estufa, o acesso à energia e às fontes renováveis, a pobreza e a segurança nacional. “São tópicos que estão tão interconectados que é difícil separá-los. Portanto, temos de pensar no sistema e em suas inter-conexões quando tentamos decidir onde intervir”, explica.

Yolles acredita que o maior proble-ma é “a ideia de que um empreendi-mento rentável é contraditório com a proposta de fazer a diferença para o bem” e sustenta que, para conseguir uma mudança significativa, deve-se alterar, mentalmente, essa premissa básica. “Uma história de sustentabi-lidade associada ao produto implica valor agregado e isso pode ser um diferencial”, garante.

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Parceira das múltis brasileiras

ntes dos anos 1960, ninguém ven-dia serviço na área de informática. Quando se comprava um computador, o serviço —que inclui o software— vinha de graça. Então, os fabricantes perce-beram que, se vendessem a máquina “pelada”, poderiam vender serviços. E assim nasceu a indústria de serviços em tecnologia da informação (TI). No final da década, em 1967, fundava-se na França o grupo Capgemini, que ofe-recia outro negócio: a terceirização dos serviços de TI. Dois anos depois, a em-presa já abria seu primeiro escritório em outro país, “globalizando” a ideia.

Nesta entrevista concedida com exclusividade a Marcos Braga, presi-dente da HSM, o CEO e chairman da Capgemini, Paul Hermelin, fala sobre a evolução da terceirização na área de TI —com o multisourcing e a nuvem— e da

própria globalização e afirma que, em-bora suas maiores plataformas estejam na Índia e na Polônia, o Brasil tem van-tagens como economia emergente e a Capgemini quer ser parceira das multi-nacionais brasileiras no mundo.

Você costuma dizer que, para ser um player importante do mercado, é pre-ciso estar entre seus cinco melhores fornecedores. Por quê?Não queremos, necessariamente, ser grandes, mas queremos ser parceiros de clientes exigentes, porque, se conse-guimos, temos acesso ao resto do mer-cado. Quando escolhemos o mercado por local ou setor, temos de rapida-mente ganhar a confiança das pessoas ali para que nos vejam como líderes. A questão-chave nunca é ser grande, e sim ser confiável.

Foi por isso que vocês adquiriram a CPM Braxis no Brasil? Também, mas foi sobretudo por conta de nossa estratégia. Antes da aquisição da CPM Braxis, éramos principalmente um grupo transatlântico entre Estados Unidos e Europa, com uma plataforma indiana. A aquisição foi o primeiro pas-so que nos credenciou a uma ambição global. Hoje ocupamos o quarto lugar no Brasil, atrás de três empresas norte--americanas e seguidos por algumas nacionais e latino-americanas.

Mas desde o início vocês tinham essa visão de expansão para outros países...É que a globalização evoluiu muito!

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A entrevista é de Marcos Braga, CeO da HSM do Brasil.

Há cerca de dois anos, a empresa de consultoria em ti francesa capgemini comprou a cpm Braxis no Brasil. em entrevista exclusiva, seu ceo e cHairman, paul Hermelin, fala soBre os desafios aqui, incluindo o de internacionalizar nossas companHias

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Você já ouviu dizer que o mundo é pla-no? É isso. Graças à rede de comuni-cações, é possível ter colegas indianos, brasileiros e suecos trabalhando cada um durante suas horas de trabalho para que na manhã seguinte você pos-sa atender seu cliente em Atlanta ou Estocolmo. Isso é ser global hoje.

Nosso grupo tem sede na Europa, mas um terço de nossos colaboradores está na Índia. São 40 mil pessoas! Elas são responsáveis principalmente por clientes de lugares como Reino Unido, Escandinávia, Benelux, onde se fala in-glês como língua de trabalho.

Para as Américas, temos estruturas de atendimento no Brasil, onde o custo não é dos menores, Argentina e Gua-temala. Nossas maiores plataformas, porém, são a indiana e a polonesa. Na unidade da Polônia falam 19 línguas!

Parece que agora se dissemina no mun-do essa ideia de que o Brasil é um país caro, infelizmente... Como está sendo o processo de abrasileirar-se?O primeiro desafio é que a economia brasileira é um pouco mais volátil do que as outras —como você deve saber, mas eu não sabia. Aqui as coisas mu-dam mais rápido e são mais instáveis do que na “Europa adormecida”, e a situação competitiva se altera rapida-

mente. Estamos aprendendo que é pre-ciso ser muito vigilante.

O segundo ponto é que os negócios da CPM Braxis não estavam totalmente alinhados com os do grupo; foi neces-sário haver uma adequação. Por exem- plo, a CPM Braxis tem mais negócios na área de infraestrutura, mais de 50%, enquanto no grupo o total desse seg-mento é 25%. Então precisamos acei-tar a diferença e aprender a respeitar uns aos outros.

E o terceiro aspecto é aprender a ser fornecedor de marcas globais no Brasil, mas também escolher marcas brasilei-ras para torná-las globais. Queremos posicionar a CPM Braxis Capgemini para ser parceira da empresa brasileira que pretende globalizar-se —e também para apoiar empresas globais aqui.

Diferenças culturais atrapalham? Eu diria que a bandeira francesa aju-da a lidar com isso. Todos sabem que a França não é um centro de tecnologia, então não é essa a questão; respeitar as diferenças culturais é obrigatório na Europa. E nos damos bem em paí-ses como o Brasil e até mesmo a Índia porque são lugares em que as pessoas gostam de estar juntas. Temos mais respeito pela cultura dos outros do que os ocidentais em geral costumam ter.

Além disso, nossa empresa foi cons- truída sobre valores um pouco inco-muns. Parecem mais valores indivi-duais do que corporativos, pois tenta-mos alcançar a harmonia do grupo respeitando os valores do indivíduo.

Normalmente a lista de valores de uma empresa de serviços inclui ousa-dia e espírito de equipe, enquanto na nossa consta agir com simplicidade. Isso significa que não vamos ser tão ar-rogantes, tão técnicos —a ideia é não se esconder atrás de jargões tecnológicos que ninguém entende. Outro ponto é a honestidade, tanto no aspecto financei-ro como na relação interpessoal.

Para nós, as culturas nas quais é mais difícil trabalhar são aquelas que tentam dominar o mundo, como a nor- te-americana. Agora, de qualquer mo- do, a Capgemini adotou o inglês como língua de trabalho em 1985.

Algumas pessoas dizem que os norte--americanos e os franceses são pareci-dos. Como você vê isso?Não são tão diferentes quanto franceses e alemães, como quando comparamos o culto do improviso na França com o culto da organização e disciplina na Alemanha. Mas somos, sim, diferentes de uma empresa norte-americana —na França, tanto quanto no Brasil, tende-mos a querer combinar a ambição nos negócios com a qualidade de vida pes-soal. Por isso é que digo que o difícil é lidar com culturas que querem ser do-minantes globalmente ou que despre-zam o que é relativo a pessoas.

Chineses são difíceis?Muito! Chineses não falam inglês. Aprendem, mas esquecem, pois não usam. E não usam porque não têm a mente aberta para o mundo. O mesmo vale para os Estados Unidos. Você sa-bia que apenas 40% dos congressistas norte-americanos têm passaporte?

realmente inacreditável. e a cultura brasileira? É fácil trabalhar nela?Eu diria que sim, há o orgulho nacio-nal e algumas características locais, mas é uma cultura aberta aos outros.

AltA gerênCiA

“as culturas nas quais é mais difícil trabalhar são aquelas que tentam dominar o mundo”

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Como você vê o futuro no Brasil? Somos a quarta do setor e nos per-guntamos se podemos nos tornar a terceira. Para isso, teríamos de sair de nossos 3,6% de mercado para chegar a 5%, que é a posição do terceiro colo-cado, o que acho possível. Em relação ao mercado, queremos crescer mais rápido do que ele, progressivamente, tentando galgar essas posições.

Vocês trabalham com planejamento de quantos anos adiante? A cada cinco anos, lançamos um do-cumento chamado “Tecnovision”, no qual tentamos prever para onde vai a tecnologia. Com base nisso, fazemos nosso planejamento estratégico, que geralmente é de quatro a cinco anos. Depois vem o ciclo do orçamento, e a cada 12 meses tudo é revisado.

Vocês foram capazes de prever algum blockbuster nesses documentos?Vimos alguns, outros deixamos passar. Por exemplo, entendemos a importân-cia da internet em 1994, o que foi muito bom, porém não nos demos conta da

explosão da mobilidade. Para mim, a grande questão atualmente é se e como seremos capazes de controlar os dados —e de interpretá-los.

A terceirização atingiu seu limite ou está apenas se transformando?Acho que a terceirização vai crescer mais no mercado não anglo-saxão, porque ainda é muito nova, conside-rando Europa e Brasil. E mudará sua natureza para o cloud service [serviço em nuvem], com outro nível de desen-volvimento. Nos Estados Unidos, estão fazendo multisourcing, ou seja, tercei-rizam para váriios fornecedores. Como um líder deve ser, para você?A primeira coisa é que ele tem de pas-sar tempo suficiente na seleção de gen-te —é incrível a diferença que a pessoa certa no lugar certo faz no desempe-nho. E, para construir relações com os outros, o líder deve ser rígido e ex-tremamente amável ao mesmo tempo. Soa estranho, mas é como busco ser.

Quando falo em pessoas, eu me refi-ro a funcionários, clientes, fornecedo-

res, todos. O difícil é que você tem de conhecer as pessoas para que possa demonstrar alguma empatia.

Quando se administra um negócio de pessoas principalmente, conhecê--las está na descrição de cargo do líder. Elas precisam sentir confiança, ainda que um pouco de sentimento de medo também seja necessário.

estamos enfrentando uma guerra por talentos no Brasil e pergunto: qual é a fórmula de sua empresa para encon-trar os melhores talentos? Eu me envolvo pessoalmente sem-pre que existe alguém que valha a pena. Por exemplo, na Índia, onde selecionamos 15 mil pessoas por ano, temos uns cinco headhunters procurando talentos maiores e eles me ligam quando encontram; todo mês conheço até cinco pessoas —são indicações de todos os tipos, de ta-lentos para todos os setores e níveis e de qualquer idade.

Já CEO da Capgemini, Paul Hermelin também assumiu, em maio de 2012, a presidência do conselho de administração da empre-sa, no lugar do fundador, Serge Kempf, que, aos 77 anos, passou à vice-presidência.

O executivo iniciou a carreira no Ministério das Finanças francês no governo François Miterrand, na gestão de Jacques Delors (1981-1984), que, na época, foi o líder da Comissão Europeia que implantou o euro. Ele também trabalhou no Ministério de Pesquisa e Tecnologia entre 1988 e 1991 e foi chefe de equipe do Ministério da Indústria e Comércio da França de 1991 a 1993. Para Hermelin, essa experiência governamental foi um desafio empolgante, mas difuso. “Em uma empresa, você sabe exatamente seu papel e consegue mensurar seus resultados, o que não acontece em uma equipe de governo.”

Ao sair do setor público, começou a trabalhar na Capgemini. Em 2000, a empresa se uniu à Ernst & Young Consulting e ele se tornou seu diretor de operações. Em 2002, já ocupou o cargo de CEO, que mantém até hoje, além de acumular diversas posições diretivas na matriz e em subsidiárias. Em 2011, a Capgemini faturou 9,7 bilhões de euros globalmente.

HSM Management

saiba mais sobre PAul HerMelin

AltA gerênCiA

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As stArtups estão renovAndo o empreendedorismo no BrAsil. reportAgem mostrA que, em todo o pAís, jovens motivAdos desenvolvem novos produtos e novAs mAneirAs de consumir

m novo tipo de empreendedorismo está chegando ao Brasil —e mais rápido do que muitos têm conseguido enxergar. enquanto alguns nem entendem exatamen-te o termo “startup”, confundindo-o com “spin-off” e

outras palavras de língua inglesa faladas aqui e acolá, outros o in-terpretam ao pé da letra, como referente a uma companhia que acaba de entrar no mundo dos negócios.

no entanto, trata-se de um conceito que se tornou específico: tem a ver principalmente com empresas iniciantes que trabalham com tecnologia e inovação. elas praticam um empreendedorismo gerador de mais empregos e de maior riqueza do que a média, que se convencionou chamar de “empreendedorismo de alto impacto”, por sua grande influência social (ambiciona mudar o mundo ou o modo como o vemos) ou financeira (essas organizações são pensa-das para render muito em pouco tempo).

no segundo caso, uma startup é uma empresa iniciante com a missão de desenvolver, em pouquíssimo tempo (às vezes uma noite de insônia), um modelo de negócio escalável e replicável, ou seja, com o máximo de lucro, no mínimo de tempo, pelo menor custo unitário de produção possível. dessas características deri-vam mais duas: as startups são companhias que atraem capital de risco e, na maioria das vezes, têm em sua base tecnologia inova-dora vinculada à internet.

essa relação entre startup e internet é quase uma regra e vem se difundindo nos estados unidos desde a década de 1990, período da bolha da internet. no Brasil o fenômeno começou a mostrar seu potencial nos primeiros anos do milênio, mas só em 2010 e 2011 ganhou força e tende a se popularizar em 2012.

o cenário propício para esse crescimento em solo brasileiro é constituído de vários fatores. primeiramente, somos 78 milhões de internautas, segundo pesquisa ibope/nielsen. depois, há o fenôme-no da geração Y, pessoas nascidas no final da década de 1980 e nos

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O novo empreendedorismo

A reportagem é de Elizabeth Cardoso, colaboradora de Hsm mAnAgement.

anos 1990, com intimidade com os recursos tecnológicos e inapti-dão para ter chefes, cumprir horários rígidos e lidar com estrutu-ras que as impeçam de ser criativas e inovadoras. soma-se a isso a tendência dos brasileiros ao empreendedorismo de modo geral. pesquisa da global entrepreneurship monitor aponta que em 2009 o empreendedorismo no Brasil cresceu 97% em relação a 2008 e, pelas estimativas do sebrae, de julho de 2009 para cá, o Brasil ganhou mais de 2 milhões de empreendedores formais. A associa-ção de instituições de ensino ao fenômeno, por meio da oferta de cursos, também o tem fortalecido —isso ocorre com universidades que têm incubadoras de viés tecnológico, em geral, e com faculda-des como a Fiap, de são paulo, que vem selando parcerias com a singularity university para isso.

por ser um fenômeno recente e mutável por natureza —as em-presas abrem, fecham, fundem-se e são vendidas em questão de dias ou meses—, não há dados ou estatísticas suficientes sobre esse boom. no entanto, especialistas da área concordam que, em 2011, esses empreendimentos proliferaram pelo país.

“em 2009, recebíamos cerca de cinco projetos por semana; em 2011 (e até agora), passamos a receber 50. nos meetups [encontros informais de empreendedores] que realizamos, a cada reunião o número de participantes aumenta consideravelmente”, afirma Yuri gitahy, investidor-anjo e fundador da Aceleradora, que apoia star-tups na gestão e com capital semente.

A pesquisa empreendedor digital Brasil, realizada pelo prêmio rBs de empreendedorismo e inovação em setembro de 2011, in-dica que há no Brasil algo entre 800 e 1.000 startups [veja quadro na página ao lado]. para cristiano nobrega, diretor de novos ne-gócios digitais do grupo rBs, o número é bastante representativo. “levando em conta a amostra da pesquisa, pode-se considerar esse número. mas é como uma fotografia: esse foi o retrato de setembro de 2011, possivelmente no decorrer de 2012 teremos novos retratos.” Foram realizadas 770 entrevistas, tanto com em-preendedores como com universidades e organizações que agre-gam startups em todo o Brasil.

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

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sem dúvida, a tendência é de crescimento. “o Brasil tem muita ca-rência, tudo precisa ser feito, por isso as coisas acontecem com muita velocidade. em um ano e meio o cenário mudou radicalmente e vai continuar intenso nos próximos anos”, avalia cássio spina, fundador da Anjos do Brasil, organização que reúne investidores-anjo.

Empreendedor e investidor, um (des)casamentocristiano nobrega chama a atenção para o descasamento entre empreendedor e investidor. “só 20% dos empreendedores de star-tups apresentaram projetos para investidores e a maioria se banca sozinho. o cenário econômico brasileiro dos últimos 15 anos não favoreceu os investimentos no setor, mas com a estabilidade finan-ceira do país isso deve mudar.” no entanto, se de um lado os jovens empreendedores não estão preparados para conquistar recursos, de outro faltam investidores que acreditem no talento brasileiro.

de modo geral, o caminho para conseguir financiamento é linear, começando com aceleradoras, que apoiam o desenvolvimento da ideia e do projeto oferecendo mentores, conselheiros. quando há investimento financeiro, porém, dificilmente é superior a r$ 50 mil.

na segunda etapa, entra em cena o investidor-anjo, pessoa fí-sica, em geral um executivo, que ajuda a transformar protótipos em empresas, e os investimentos ficam em torno de r$ 100 mil. na terceira etapa, as startups conseguem ajuda de capital semen-te para encontrar um modelo de negócio escalável e aumentar a equipe, e então os aportes chegam a cerca de r$ 500 mil. da quar-ta etapa em diante, os investimentos ultrapassam r$ 1 milhão. A partir daí, os empreendedores começam a ter dificuldade para encontrar apoio financeiro.

“estamos apenas começando, o mercado de venture capital é muito pequeno e carecemos de profissionais aptos para gerir os

AND BRAZIL STARTS UP800 a 1.000 startups existem no Brasil(segundo levantamento de setembro de 2011)

2009o investidor-anjo Yuri gitahy recebia

2012o investidor-anjo Yuri gitahy recebe

5 projetos

por semana

50projetos

por semana

em 2009, o Buscapé foi um marco; conseguiu us$ 340 milhões ao vender 91% do negócio

91%

8 22 63

2009 2010 2011

Comparação Brasil x Vale do Silício*

50 negócios com startups no Brasil, somando r$ 500 milhões

700 negócios com startups no vale do silício, somando us$ 5 bilhões

* nos nove primeiros meses de 2011.

Fusões, aquisições e aportes de capital em startups tornados públicos:

de 100 startups, 1 recebe investimentos

O perfil do empreendedor

são jovens (61% têm entre 20 e 30 anos) 61%

75%

86%

95%

do sexo masculino (75%)

de alto poder aquisitivo (86% vêm das classes A e B)

com boa escolaridade (95% estão cursando ou possuem curso superior)

1%

Fontes: empreendedor digital Brasil, pesquisa realizada pelo prêmio rBs de empreendedorismo e inovação (setembro de 2011), e diego gomes, blogueiro especiali-zado no setor e cofundador da everWrite.

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

fundos. por outro lado, buscamos mais pessoas empreendedoras e capacitadas para valorizar seus negócios do que boas ideias, por isso o mercado trabalha com a proporção de 100 para 1, ou seja, de cada cem startups, uma vai receber investimentos —isso explica por que alguns empreendedores brasileiros têm preferido ir tentar a sorte nos estados unidos, especialmente no vale do silício”, diz Humberto matsuda, da performa investimentos.

o que investidores locais como ele argumentam? “os novos em-preendedores têm propostas criativas, mas ainda falta provar po-tencial de valorização, porque para os fundos interessa mais que a empresa se valorize do que cresça, pois visam a venda do em-preendimento”, afirma matsuda. (É diferente, por exemplo, da pos-tura de guy Kawasaki, que, na HSM Management nº 92, disse que a criatividade do empreendedor é o que mais conta.)

de acordo com matsuda, os fundos profissionais, com regis-tro na comissão de valores mobiliários, não chegam a 30 e a maioria está sediada —e fecha negócios— em são paulo. tal ce-nário financeiro pode explicar o segundo aspecto a ser destaca-do da pesquisa empreendedor digital Brasil: 93% das startups estão nas regiões sul e sudeste, com maior concentração em são paulo (62% delas) e forte presença em Belo Horizonte (mg) e Florianópolis (sc).

na região nordeste, recife (pe) desponta com potencial tecnológi-co. outras localidades apresentam tendência de crescimento, como Brasília, campina grande (pB) e cidades que possuem importantes cursos universitários em engenharia e ciências da computação.

No Brasil inteirosegundo a Associação Brasileira de startups (ABs), fundada em outubro de 2011, 30% das startups estão em são paulo (capital e campinas), 20% em minas gerais, 15% no rio de janeiro e 35% es-palhadas por outros estados. “Há startups em Florianópolis, porto Alegre, curitiba, recife, e com menos intensidade em cidades do Amazonas e de rondônia”, confirma gustavo caetano, presidente da ABs e cofundador da samba tech, ambas sediadas em Belo Ho-rizonte. “o cenário está diluído pelo litoral brasileiro e no interior do país por causa de dois fatores principais: a internet e a presen-ça de núcleos de educação fortes, como a universidade Federal de pernambuco [uFpB], a universidade Federal de santa catarina [uFsc], a universidade de são paulo [usp], a universidade esta-dual de campinas [unicamp] e a universidade Federal de minas gerais [uFmg]”, completa.

A proliferação de startups no bairro de são pedro, na zona sul de Belo Horizonte, fez com que ele ficasse conhecido como san pedro valley, numa referência ao vale do silício. “não foi planejado, aconteceu. um foi chamando o outro, dando dica de casas disponíveis, e quando vimos éramos todos vizinhos”, conta diego gomes, da everWrite, que compartilha as redondezas com a deskmetrics, a omnilogic, a Hotmart, a Anuncie.la e muitas ou-tras startups mineiras.

Além da proximidade com a uFmg, quase todos os empreen-dedores do san pedro valley estudaram lá, e a atuação de vários fundos de investimento também ajuda no enraizamento das em-

Você quer saber como começar e se dar bem como empreende-dor? A resposta pode estar no Ledface (www.ledface.com), startup criada por quatro engenheiros formados pela Unicamp e estabele-cida em Campinas. O serviço, lançado no final de 2011, pretende responder a perguntas específicas dos usuários com a inteligência coletiva. Algoritmos selecionam perfis de usuários cadastrados e enviam as questões aos mais capacitados a responder.

Ao contrário dos sites de perguntas e respostas já existentes, nos quais qualquer um pode dar seu “pitaco” e se identificar, a ideia aqui é propor uma única resposta, anônima, que seria mais confiável do que se lançada aleatoriamente na rede. O fato de as respostas serem anônimas, segundo seus criadores, é importante para evitar a exposição de egos. Em contrapartida, isso pode afas-tar pessoas interessadas em ter crédito sobre seu conhecimento.

O Ledface foi lançado a partir de um investimento dos sócios de US$ 30 mil, em português e inglês, já visando o mercado in-ternacional. O serviço é inspirado no Aardvark, comprado pelo Google e por enquanto desativado, mas concorre com o Quora, que tem a mesma pretensão de dar respostas mais precisas e cor-retas com base no conhecimento dos usuários da rede., porém identificando os respondentes.

Investidor-anjo e fundador da Aceleradora, Yuri Gitahy

trabalha na gestão das startups e fornece capital

semente para novos empreendedores

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Ledface: potencializando a inteligência coletiva

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presas; insight venture partners, Benchmark capital, tiger glo-bal, Bv capital, Accel partners e rocket internet são alguns dos mais atuantes. soma-se a isso a presença do centro de pesquisa e desenvolvimento do google e de startups que já se provaram no mercado, como a samba tech.

Fundada em 2005 por gustavo caetano, então com 22 anos de idade, a samba tech surgiu para sanar um problema pessoal: a falta de jogos disponíveis para celular. em 2006, mudou de foco para atuar no negócio de soluções de vídeos online, ou webtv —eles gerenciam e distribuem vídeos para empresas. em 2008, veio o primeiro clien-te de peso, o portal de notícias do grupo Bandeirantes, acompanha-do do investimento de r$ 5 milhões, e, em 2009, a samba tech já possuía 80% do mercado nacional de soluções de vídeos online para organizações. Hoje, com 60 funcionários, estima-se que valha r$ 50 milhões —faturou r$ 15 milhões no ano passado e a previsão é de r$ 20 milhões em 2012. e começou o ano com muitas novidades:

selou joint venture com a Adstream, líder mundial em soluções di-gitais para o mercado publicitário, iniciou a operação da samba Ads, unidade de negócios focada em publicidade em vídeos online, abriu escritório na Argentina e já tem clientes como el comércio no equa-dor, telethon na colômbia e America tv na Argentina.

A capital mineira também abriga a sede do grupo instituto ino-vação, mais conhecido como o organizador do startup Farm, pro-grama de aceleração de negócios digitais em um mês de imersão. o instituto oferece, ainda, consultoria de inovação e transferência de tecnologia para empresas e governos em geral e atua como fundo de investimento. Fundado em 2002, abriu escritório em campinas (sp), atraído pela unicamp, e em Bogotá, colômbia.

“não acredito que haja especificidades regionais; a essência ges-tora de uma startup é a mesma em minas gerais, santa catarina ou pernambuco”, afirma Felipe matos, cofundador do grupo instituto inovação. “o que há é vocação regional: recife tem viés mais tec-

As 10 características de nossa startupTem modelo de negócio replicável e escalável. Isso minimiza o custo unitário de produção e facilita gerar o máximo de receita com o mínimo de custo.

Não se preocupa em “morrer” precocemente. O modelo tradicional se constrange e evita a qual-quer preço não durar ou falir; este, não.

Entre o mapa e o terreno, fica com o terreno. Esse é um dos lemas das startups. Se o modelo tradicio-nal investe anos em planejamentos (as incubado-ras chegam a incubar as empresas iniciantes por quatro anos), as startups fazem acontecer rápido.

Cresce rápido, obrigatoriamente. Em cinco anos, uma startup já quer estar registrando um faturamento anual de R$ 50 milhões. A meta é ambiciosa, mas a ambição é parte im-portante do conceito “startup”.

Seu empreendedor é desapegado. Se o em-preendedor tradicional é passional, este não pensa no longo prazo; empreende em série e, geralmente, vende sua empresa em cinco ou dez anos.

Faz validação de baixo custo. Rejeita as custosas pesqui-sas de mercado para comprovar suas ideias; a internet e outras ferramentas criativas é que lhe dão insights.

Não acredita no valor de uma ideia em si, mas na execução. O exemplo clássico é a disputa jurídica sobre quem inventou o Facebook —não importa; o que vale é quem o executou.

Libera a equipe para inovar. As equipes das startups não buscam diferencial de mercado, e sim a inovação, o desenvolvimento de um novo produto ou de um novo modo de consumir. Para isso, têm total liberdade para criar e um ambiente profissional propício.

Não possui hierarquia de fato. Os escritórios deixam tudo plano, ou seja, presidentes, sócios e funcionários trabalham no mesmo espaço, o que facilita a comunicação constante, e a melhor solução pode vir de qualquer membro da equipe, o que aumenta a confiança.

Colabora até com concorrentes e des-conhecidos. A troca de ideias e serviços entre colegas de trabalho, concorrentes e até desconhecidos é frequente no am-biente startup.

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10Fontes: Yuri Gitahy, da Aceleradora, Gustavo Caetano, da ABS, e Felipe Matos, do Grupo Instituto Inovação, entre outros.

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O escritório comunitário The

Hub, em São Paulo: startup e plataforma para

a colaboração de outras startups

Duas características predominantes dos empreendedores de startups são a juventude e a colaboração constante nos negócios. Os dois fenômenos estão ligados por um terceiro, a geração Y. Os que nasceram no final da década de 1980 e durante os anos 1990 são a maioria nas startups.

“Provavelmente isso acontece porque eles têm mais in-timidade com o mundo digital, são multitarefas por defini-ção, buscam um sentido para a vida —ou seja, não trabalham apenas para ganhar dinheiro—, estão acostumados a viver em ambientes de baixo nível hierárquico —as famílias e as escolas modernas são mais abertas—, têm uma ansiedade enorme e, especialmente, são menos individualistas, gostam de trabalhar coletivamente. Tudo isso é muito bem-vindo nas startups”, avalia Bob Wollheim, cofundador da Sixpix Con-tent, produtora de conteúdo especializada na geração Y, e autor do livro Empreender Não É Brincadeira (ed. Negócio).

A ação colaborativa não é, contudo, pessoas trabalhando juntas, como alguns pensam. “Negócio colaborativo é quando o empreendedor conta com a participação de associados que contribuem com parte do negócio”, explica Wollheim.

A plataforma We Do Logos é um exemplo. O cliente do site ingressa com uma necessidade, como uma logomarca, um site institucional ou uma ilustração, e imediatamente centenas de profissionais têm acesso à demanda e apresen-tam projetos. Ao final, consegue-se, por exemplo, um logo-tipo por um valor inicial de cerca de R$ 250. “Todo mundo ganha: o designer consegue trabalho, o cliente realiza sua meta a um custo baixo e o site fica com uma pequena por-centagem do valor do serviço”, aponta Wollheim.

Outro caso de negócio colaborativo é a rede The Hub, uma espécie de escritório comunitário. Cada empreendedor

paga um aluguel, com planos a partir de R$ 60, para utili-zar o espaço e sua infraestrutura e fazer parte da rede. A iniciativa surgiu em Londres, Inglaterra, em 2006 e chegou a São Paulo em 2008, com a proposta de proporcionar am-biente colaborativo para empreendedores sociais, pessoas que buscam gerar impacto social positivo por meio de seu trabalho e produto. Também estão no The Hub Curitiba, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. No mundo são quase 30 cidades com redes semelhantes.

“Cada empresa pode ter no máximo quatro integrantes e, quando cresce, acaba mudando-se para um lugar pró-prio, mas continua ligada à rede. O principal diferencial é essa participação, pois ela representa o nascimento de novos negócios e parcerias. Aqui predomina a geração Y, pessoas entre 20 e 30 anos de idade. Isso é o normal no The Hub no mundo, pois os Ys não se afirmam pela posse, e sim pela realização”, explica Henrique Bussacos, cofun-dador do The Hub São Paulo, que hoje tem 210 membros e reúne 2 mil pessoas.

A sinergia entre os negócios da rede é garantida por um anfitrião, que observa o potencial colaborativo do grupo e indica as possibilidades para os envolvidos. Por exemplo, um contador presta serviços com custo menor para os in-tegrantes da rede, um designer ajuda um assessor de im-prensa, que, por sua vez, o auxilia com produção de texto, e assim infinitamente.

casOs:We DO LOgOs + The hub

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nológico; são paulo é mais forte em negócios; Belo Horizonte tenta unir tecnologia e negócios e começa a apresentar talento para bio-tecnologia; Brasília se destaca com os portais educacionais volta-dos para concursos; Florianópolis trabalha com a questão do fluxo de informação; e rio de janeiro é mais forte em B2B [business-to-business], moda e entreteni-mento. ou seja, tem mais a ver com o mercado local onde as startups estão inseridas. em geral, elas nascem localmente e crescem globalmente e, muito cedo, acabam buscando o mercado de são paulo e rio de janeiro.”

Bruno inojosa concorda. com 24 anos, recém--formado em ciências da computação pela uni-versidade Federal de pernambuco (uFpe), ele é cofundador da mobiclub. A startup, com um ano de vida, divide espaço com mais 12 incubadas no porto digital de recife e oferece dois produtos principais: desenvolvimento de apli-cativos de acordo com a demanda dos clientes e o mobiclub. este é um aplicativo para pagar a conta em bares e restaurantes: quando chega ao estabelecimento, o cliente informa o número de seu celu-lar para o garçom e acompanha as somas parciais de seu consumo, fecha e paga a fatura sem sair da mesa, enfrentar filas ou falar com um atendente.

“o produto é muito bem-aceito pelos estabelecimentos e pe-los clientes, só que temos de esperar a legislação de nota fiscal eletrônica ser aprovada e implantada”, conta inojosa que, no entanto, quer mudar para são paulo. “quase todas as startups daqui acabam indo.”

Assim como a mobiclub, as dezenas de startups de recife têm como referência o porto digital, que acaba de lançar sua acelera-dora. situado na ilha que deu origem à cidade, é focado no desen-volvimento de software. são cerca de 200 organizações e duas incubadoras (com 16 incubadas) gerando 6,5 mil empregos e fa-turamento estimado em r$ 1 bilhão, 3,5% do piB de pernambuco, incluindo empresas como a microsoft, a oi e a iBm. “As startups se favorecem muito da estrutura do porto, e a gente entra por meio dos convênios com a universidade federal. É um bom começo”, avalia inojosa.

campina grande deve seguir o mesmo caminho de recife, pois sua forte tradição tecnológica propicia o surgimento de startups. “A Fundação parque tecnológico da paraíba atua há 25 anos na região e já formou 83 empresas. Hoje temos 37 incubadas em parceria com universidades, o governo, o sebrae e entidades fe-derais de pesquisa. nosso tempo de incubação leva de três a quatro anos”, explica Francilene procópio garcia, diretora-geral da fundação e secretária-executiva de ciência e tecnologia do estado da paraíba.

Florianópolis vem ganhando repercussão nacional. tornou-se referência de inovação em tecnologia por necessidade, pois a legis-lação ambiental proíbe o estabelecimento de indústrias na região e foi necessário encontrar alternativas para gerar renda e postos de trabalho. outro fator importante foi a fundação de um poderoso curso de engenharia na uFsc há 45 anos. com o apoio dos gover-nos locais e de empresas privadas, a universidade estabeleceu no balneário, em 1984, a Fundação centro de referência em tecno-logia inovadora (certi), que, por sua vez, deu origem à primeira incubadora de empresas de tecnologia do Brasil. Hoje, a capital catarinense abriga 600 empresas de tecnologia, 80% delas micro e

pequenas, que geram 6 mil empregos e receita anual de cerca de r$ 1 bilhão.

A chaordic systems, startup de Florianópolis fundada em 2008, levantou r$ 1 milhão de in-vestimentos iniciais por meio de editais públi-cos de fomento à pesquisa e inovação. “um de nossos produtos é o chaordic onsite, software de recomendações para suporte, mediação e automação do processo de escolha de produtos e serviços pelo consumidor de lojas virtuais”, explica joão Bernartt, um dos sócios. ícones do

e-commerce mundial, como a Amazon e a netflix, há anos utilizam tecnologia similar; no Brasil, a livraria saraiva foi uma das primei-ras redes de lojas a adquiri-la da chaordic.

“editais de concorrência pública e duas incubadoras criam em Florianópolis um cenário favorável para os jovens empreende-dores. e temos gente com ótima formação tecnológica, mas care-cemos de aptidões gerenciais e de mais fundos de investimento”, avalia eric santos, engenheiro, fundador da resultados digitais e mentor da Aceleradora. no Brasil, ainda sempre parece faltar uma peça, mas estamos evoluindo.

Recife tem viés tecnológico e

Campina Grande vai pelo mesmo

caminho

João Bernartt, um dos sócios da Chaordic Systems, de Florianópolis

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com seu método “meG”, a Fundação nacional de Qualidade mostra o empreendedorismo de um celeiro de conhecimento Que serve a empresas em busca de excelência Gerencial, como revela esta reportaGem

uem colabora com a Fundação nacional de Qualidade adora usar a palavra “causa”. e, dependendo do contex-to, o termo chega a significar “cruzada”. “é isso mesmo. a gente procura elevar o nível de gestão para que o brasil seja um país melhor —mais competitivo, mais

rentável, que gere valor para a sociedade”, observa Jairo martins, pernambucano de 61 anos, superintendente-geral da entidade, que, em 2011, completou 20 anos.

a missão da FnQ é disseminar os fundamentos da excelência em gestão e assim aprimorar a qualidade dos processos de produção no brasil. nascida da necessidade de buscar a excelência na ad-ministração de empresas, passou pela criação do prêmio nacional de Qualidade e se expandiu como centro de conhecimento para companhias de grande, médio e pequeno portes e profissionais.

hoje, na área de gestão, quase nada escapa ao escopo da fundação, que já mira os benefícios estruturais decorrentes de grandes eventos como a copa do mundo e a olimpíada. “serão oportunidades de ouro. temos de nos preocupar com o que vai acontecer antes, durante e depois de cada evento. e podemos ajudar, porque os problemas atuais são principalmente de ges-tão”, vaticina martins.

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FNQ = foco naqualidade

a reportagem é de Alex Sabino, colaborador de hsm manaGement.

Jairo Martins, superintendente-geral da Fundação Nacional de Qualidade

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E O MEG GEra dEsEMpENhOUma pesquisa feita em 2011 pela Serasa Experian avaliou a gestão de 202 empresas que aderiram ao Modelo de Excelência em Gestão (MEG) da FNQ. A pesquisa levou em conta o desempenho das empresas em 2000 e em 2010 e comparou os resultados com a média do mercado.

Crescimento de empresas do setor comercial

Margem Ebtida (lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização)

Endividamento de empresas da área de serviços

Margem de lucro ajustada nas empresas de serviços

Dívidas bancárias de empresas industriais

Indicador de investimentos no setor de serviços

Indicador de investimentos na indústria

Empresas pesquisadas 102,6% 27,7% 51%

12,4% sobre o faturamento líquido

37% 14,5% do faturamento

12,1% do faturamento

Média do mercado 74,9% 19,5% 58% 11,1% 46% 12% 7,5%

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ele fala com entusiasmo sobre o trabalho que faz —como gosta de ressaltar— pela “causa”. engenheiro eletrônico formado pelo instituto tecnológico da aeronáutica (ita), aposentou-se na multinacional sie-mens, após 35 anos de carreira —sete como executivo de negócios na alemanha. assim que soube que a FnQ procurava um superinten-dente, candidatou-se e assumiu o posto em março de 2011.

Reconhecimento da qualidadeQuando a entidade foi criada, em 1991, muitos executivos fala-vam sobre qualidade, excelência e sinônimos. no entanto, não sabiam bem do que se tratava, nem tinham muita ideia do que a sistematização do processo de produção poderia fazer pelas em-presas. “são duas décadas em que a FnQ desempenhou relevante papel na disseminação de conceitos e geração de conteúdo para a promoção da melhoria da gestão em organizações de todos os portes e segmentos da sociedade”, resume mauro Figueiredo, presidente do conselho curador.

atualmente reunindo 260 companhias dos setores público e privado, a Fundação nacional de Qualidade é uma instituição sem fins lucrativos. desenvolve atividades visando a capacitação, coo-peração, mobilização, inovação e premiação vinculadas ao plane-jamento estratégico e operacional. também promove práticas de excelência por meio de cursos, seminários, publicações, webchats e programas de benchmarking e oferece o prêmio nacional de Qualidade (pnQ), considerado o maior reconhecimento à qualida-de na gestão corporativa brasileira.

a fundação também está envolvida no mpe brasil — prêmio de competitividade para micro e pequenas empresas, em parceria com o serviço brasileiro de apoio às micro e pequenas empresas (sebrae). em 2011, mais de 32 mil organizações participaram da primeira fase para concorrer à premiação de 2012, um crescimento de 43% em relação ao ano anterior.

a cada 12 meses, 3 mil pessoas são capacitadas em workshops e cursos promovidos pela FnQ. em duas décadas, 490 mil critérios de excelência foram distribuídos e 250 mil pessoas conseguiram capacitação no modelo de excelência em Gestão (meG), o pilar da estratégia [veja quadro abaixo].

“dobramos de tamanho nos últimos cinco anos com a adoção dos fundamentos e práticas da FnQ”, informa Jaime José vergani, diretor

de suprimentos, administrativo e financeiro da randon implemen-tos. a companhia segue os critérios de excelência da fundação desde 1992 e foi finalista do prêmio nacional de Qualidade de 2011.

Empresas de energia dominamnos últimos anos, a premiação tem sido dominada por empresas de energia. os resultados são atribuídos ao planejamento de longo prazo e à dedicação a uma estratégia organizacional e de busca da excelência. das 15 homenageadas, dez foram do ramo energético.

essa hegemonia não surpreende os que acompanharam o pro-cesso de perto. ao contrário, é vista como exemplo para outros se-tores da economia. “Queremos que sirva de modelo. as empresas de energia, quando se começou a falar em privatização, olharam

Entrega do Prêmio Nacional de Qualidade de 2011, realizada em dezembro, que destacou a qualidade da gestão de empresas de energia elétrica

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Crescimento de empresas do setor comercial

Margem Ebtida (lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização)

Endividamento de empresas da área de serviços

Margem de lucro ajustada nas empresas de serviços

Dívidas bancárias de empresas industriais

Indicador de investimentos no setor de serviços

Indicador de investimentos na indústria

Empresas pesquisadas 102,6% 27,7% 51%

12,4% sobre o faturamento líquido

37% 14,5% do faturamento

12,1% do faturamento

Média do mercado 74,9% 19,5% 58% 11,1% 46% 12% 7,5%

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as necessidades dos usuários, fizeram progra-mas estruturados para todos os distribuidores. isso começou há dez anos, quando deram início ao processo de capacitação do pessoal”, res-salta martins. Quatro foram premiadas e seis, consideradas destaques pelos critérios estabe-lecidos pela FnQ. todas elas são organizações que aderiram ao meG.

“precisamos estar preparados porque nossa atividade vai mudar ainda mais nos próximos dez anos. desde a década de 1990, as empresas de energia se envolveram profundamente com a causa da qualidade [na gestão]. o reconhecimento prova que estamos cumprindo a obrigação de oferecer eficiência nos serviços prestados à população”, comemo-ra hélio viana pereira, presidente da cpFl piratininga, uma das premiadas em 2011.

Além das empresasno decorrer dos 20 anos, a FnQ conseguiu aprofundar seu viés de centro de conhecimento. aos filiados, oferece uma gama de recur-sos que conta até com softwares de autoavaliação e banco de boas práticas. compartilha mais de 500 exemplos de gestão, abrangendo liderança, estratégias, clientes, sociedade, responsabilidade socioam-biental, informações, pessoas, processos e resultados, temas também abordados nas publicações produzidas pela entidade regularmente.

um dos desafios que enfrenta é se adequar às mudanças não ape-nas empresariais, mas também do cotidiano das pessoas, aspectos que se refletem na rotina de gestão. “antes, a gente tinha um cenário de globalização. hoje, é de rapidez e redes de relacionamentos. o

cliente está aqui dentro, a volatilidade é muito grande. vivemos um momento em que influên-cias climáticas interferem nos negócios. o mo-delo acompanha a evolução do cenário. é pre-ciso se adaptar rapidamente”, analisa martins.

para ele, a FnQ está pronta para influir em questões maiores no brasil. chegou o mo-mento em que a fundação entrará no campo de batalha dos problemas estruturais. alguns gargalos seculares, como educação e saúde

públicas, estarão no centro do debate, passando também por questões de infraestrutura, qualificação de funcionários e comba-te à cultura do desperdício.

Já foram feitos contatos com a confederação nacional da indús-tria e a câmara de Gestão criada pela presidência da república. “esses problemas são grandes. a construção civil é uma das áreas onde existe maior desperdício. somos procurados [para discutir o assunto] e temos planos para colaborar. o país estará muito expos-to com os eventos esportivos dos próximos anos”, lembra martins.

é um trabalho gigantesco, assim como é manter e eventualmente elevar o padrão de excelência para quem acredita no meG. Quando completar 25 anos, em 2016, a FnQ espera estar inserida em con-texto bem mais favorável para o país, estruturalmente. “os funda-mentos de excelência, ética empresarial e gestão são importantes para qualquer empresa”, defende ricardo corrêa martins, diretor institucional da FnQ. não só para as empresas, mas para o brasil.

A FNQ está pronta para

atacar nossos problemas estruturais

A 19ª edição do Seminário Internacional em Busca da Excelência, que aconteceu em junho de 2011, destacou o tema “Gestão da inovação para sustentabilidade”

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reportagem HSm management moStra como e por que a líder do mercado de Saúde braSileiro virou caSe de SuceSSo da preStigioSa Harvard buSineSS ScHool. a autora do eStudo, profeSSora regina Herzlinger, atirou no que viu e acertou também no que não viu

Ee o empreendedorismo contínuo

a reportagem é de Adriana Salles Gomes, editora-executiva de HSm ma-nagement.

m 1982, o médico Jorge da rocha foi aos estados unidos em busca de um professor brasileiro da boston university que, segundo lhe contaram, poderia ajudá-lo a resolver um problema insolúvel no brasil: montar um sistema de

informações gerenciais para sua empresa, a amil, algo então inédito em nosso mercado de saúde —ainda mais para uma companhia de assistência à saúde de pequeno porte, como era a sua então.

a viagem rendeu: não só ele conseguiu o que procurava, como ainda teve um valioso insight, que dividiu, na volta, com o funda-dor da amil, edson bueno. para rocha, ficara nítido que a verda-deira razão da riqueza da sociedade norte-americana é o conhe-cimento. bueno quis ir conferir ele mesmo a ideia. no início de 1983, os dois aterrissaram no aeroporto de boston em uma fria noite de domingo, passaram de táxi pela biblioteca da Harvard business School e pararam: ela chamava a atenção pela imponên-

Amil em HarvardFotos: Divulgação

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cia e por ter todas as luzes acesas às 10 horas da noite. estava lotada de executivos estudando. “essa imagem nos marcou para sempre”, disse Jorge da rocha, presidente da amil assistência mé-dica internacional, em um depoimento emocionado no vídeo que está circulando no que hoje é um grupo de empresas enorme, for-mado por cerca de 22,3 mil funcionários. “ali percebemos que, se quiséssemos realmente construir uma grande empresa, teríamos de nos apoiar no conhecimento”, afirmou.

o vídeo foi produzido para comunicar a todos os colaboradores que a amil se tornara um estudo de caso em Harvard, “amil and the Health care System in brazil”, pelas mãos de sua mais importante professora de gestão de saúde, regina Herzlinger. e, embora esse tipo de vídeo tenha função motivacional, a razão para orgulho é real.

virar estudo de caso em Harvard pode ser considerado o equi-valente empresarial do oscar de melhor filme. trata-se do método de estudo mais tradicional e consagrado do mundo dos negócios, e entre as brasileiras que tiveram tal honraria estão ambev, embraer e vale. em gestão de saúde, isso ganha contornos especiais, porque Herzlinger, cujo mais recente livro tem o sugestivo título “quem ma-tou o health care”, veio buscar inspiração para a saúde dos eua em um país emergente tanto quanto o procura no sistema suíço.

como, porém, Harvard descobre uma empresa? por sorte? dinhei-ro importa? como apura as informações? o que acontece depois? HSM Management foi investigar esses bastidores, descritos a seguir, e igualmente fez uma descoberta: Harvard atirou no que viu e acer-tou também no que não viu. em outras palavras, Herzlinger foi atraí-da pelo Sistema integrado de Saúde que a amil montou nos últimos três anos, mas, ao descrever suas causas e consequências, revelou o raro empreendedorismo contínuo de uma empresa estabelecida.

O INTERESSE E A PRODUÇÃOo case começou a nascer em novembro de 2010, quando regina Herzlinger fez uma palestra no Health Summit, em São paulo, a con-vite da amil e da HSm, sobre sua especialidade: “health care privado com foco no paciente”. crítica voraz da maioria das instituições de saúde dos eua por não serem voltadas para os clientes, ela se quei-xa da falta de poder de escolha destes; seu próprio plano de saúde lhe é imposto pela Harvard university.

no almoço da palestrante com executivos da amil após a apresen-tação, eles confessaram admirar suas ideias e contaram que tinham implementado algumas delas no brasil, como a verticalização seleti-va, em que, além da operação, a empresa oferece médicos, clínicas, hospitais e laboratórios próprios, mas não obriga o paciente, em boa parte dos planos, a ir a eles —há livre escolha na rede credenciada.

“nossos executivos mostraram à regina que, enquanto cada player especializado nos eua vê e atende uma parte do elefante, a amil consegue ver e atender o elefante inteiro —e mantendo o poder

de escolha do usuário”, explica dulce pugliese, cofundadora do gru-po amil e vice-presidente do conselho de administração da amilpar, usando o “elefante” como metáfora para o negócio da saúde.

Herzlinger voltou para boston e, em fevereiro de 2011, propôs à amil desenvolver o estudo, avisando que a empresa não poderia interferir em nada. o trabalho de coleta foi feito, em quatro inten-sos meses, pelo pesquisador sênior da HbS para a américa latina, ricardo reisen de pinho, que foi executivo do setor financeiro e é membro do conselho de administração de várias companhias. pinho entrevistou gestores da amil e da agência nacional de Saúde Suple-mentar (anS) —que deu informações sobre os clientes e a concorrên-cia— e consultou uma série de fontes secundárias.

a professora escreveu o caso e, em junho de 2011, a amil rece-beu-o para revisão de números. pugliese até achou que a prática de reduzir preços aumentando a qualidade precisava ser mais bem explicada para não parecer artificial —“reduzir infecção hospitalar corta custo”—, mas Herzlinger não autorizou a empresa a fazê-lo. de qualquer modo, como todos na amil concordaram, a essência de sua gestão estava ali.

O ESTUDO DE CASOapós um panorama inicial do mercado de saúde no brasil —público e privado— e uma breve história da amil, o estudo destacou:

• Cultura. como Herzlinger escreve, “durante anos, os gestores mais

graduados eram médicos, com pouca ou nenhuma formação em gestão” (ainda são, mas agora têm formação complementar em ges-tão). o sensibilizador convívio com o sofrimento dos pacientes teria levado a amil a desenvolver uma cultura voltada para os clientes e também para os colaboradores, a fim de que estes cuidem dos clientes, “pautada pela qualidade da saúde e pela acessibilidade”.

• Essência do modelo de negócio. enquanto a maioria das operado-ras brasileiras se concentra nos clientes corporativos, de markup inferior, porém mais “seguros”, a amil tem ampla gama de pro-dutos de atendimento voltados tanto para clientes corporativos quanto para pessoas físicas de renda variada por meio de marcas

enquanto cada player vê e atende uma parte do elefante,a amil conSegue ver e atender o elefante inteiro.”

Dulce Pugliese, cofundadora e acionista do grupo amil, vp do conselho da amilpar

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

como oneHealth, amil, medial e dix. vende também serviços adi-cionais, como o amil resgate Saúde e a assistência internacional.

• Expansão horizontal e vertical. como cerca de 75% dos custos fixos de uma prestadora de saúde são despesas com hospitais, centros médicos, laboratórios e médicos, a empresa vem fazendo uma série de aquisições e promoveu a integração vertical para reduzi-los, entre outras coisas, com mais eficientes rotinas apoia-das em tecnologia e processos e o reforço de seu poder de compra com os fornecedores de materiais.

• Sistema Integrado de Saúde. em 2009, a amil apresentou o con-ceito, um modelo de assistência que permite a transferência de pacientes entre hospitais gerais e especializados e centros médicos conforme suas necessidades. isso garante tanto um serviço mais preciso e rápido ao paciente como um uso melhor e mais eficiente de recursos. os pacientes são segmentados em três níveis, o que, por sua vez, determina as condições dos contratos com os médicos: i (emergências e primeiros socorros), ii (consultas por especialidade) e iii (doenças crônicas ou probabilidade de desenvolvê-las; são 12%

da base de clientes e respondem por 60% das despesas médicas). “os profissionais dos níveis i e ii, por exemplo, devem encaminhar os pacientes de nível iii para profissionais de nível iii, e estes podem receber bônus associados a metas”, escreve Herzlinger (se, na fre-quente pesquisa de satisfação que a amil faz com os pacientes, estes não souberem o telefone celular de seus médicos, perdem pontos).

• PAQV e GPAR. o sistema integrado é acompanhado por estraté-gias de prevenção de doenças e pelo programa amil qualidade de vida (paqv), em que são feitos perfis dos usuários dos planos corporativos para tomar medidas preventivas a distúrbios car-díacos, diabetes e câncer de próstata e de mama. como relata

Uma “medical city” é como os gestores da Amil descrevem seu Hospital das Américas, erguido no bairro carioca da Barra da Tijuca e previsto para abrir parcialmente este ano. O complexo englobará dois blocos de hospital, um de consultórios médicos (só com grandes especialistas), um de serviços complementares e um de auditório —incluirá uma sala de simulação para cirurgia robótica que o Brasil não tem. A expectativa é de que se torne um centro de referência nacional e, talvez, internacional.

Vale acrescentar que a edificação é “verde”, ou seja, segue os padrões de sustentabilidade estabelecidos pelo Green Building Council para redução dos impactos ambientais. Embora ainda em discussão, pode ser montado, no mesmo local ou próximo, um centro de treinamento Amil também para profissionais de enfermagem, tanto internos como externos.

Uma cidade da medicina

1972 1978 1980 1993

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aprendemoS que é a medicina de alta qualidade que gera oS melHoreS reSultadoS financeiroS.”

Edson Bueno, cofundador e maior acionista do grupo amil, presidente do conselho da amilpar

o médico cirurgião edson de godoy bueno e a pediatra dulce pugliese compram a casa de Saúde São José, maternidade de duque de caxias (rJ).

bueno funda a amil assistência médica e convida o cardiologista Jorge ferreira da rocha para sócio.

a linha telefônica “dois, três, um, mil” vira mantra; aviões e helicópteros de resgate simbolizam a amil; é a década do marketing —e da expansão nacional.

a amil torna-se a primeira prestadora de serviços de saúde do país a oferecer cobertura para clientes fora do território brasileiro.

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os laboratórios da amil se fundem com os da daSa (delboni auriemo), criando a maior empresa de diagnósticos do brasil. a amil vira case de regina Herzlinger (foto), uma das maiores autoridades em health care.

Herzlinger, a amil ainda desenvolveu o software chamado ges-tão de pacientes de alto risco (gpar), para identificar grupos de clientes com esse perfil e “monitorá-los de acordo com os pro-tocolos existentes”. entre os nove grupos de risco identificados estão idosos e mulheres grávidas.

• Gestão de riscos. Segundo o case HbS, investimentos em tecnolo-gia da informação e em processos são fundamentais para explicar a abordagem da amil. a empresa gerencia o risco médico com base no conceito de “liberdade assistida”, conferindo poder de decisão a funcionários e associados, mas monitorando-os e con-trolando-os com processos —e vai “tomando medidas preventivas e corretivas sempre que necessário”. um exemplo é sua teleme-dicina, que permite a médicos de nível i em áreas remotas trocar ideias com especialistas de São paulo. Já o risco de cobrar o pre-ço fixo por um evento desconhecido é diluído, por exemplo, pelo rastreamento dos funcionários dos clientes corporativos (análise do trabalho, hábitos e estilo de vida de cada um para ajustar os

prêmios, além de tomar medidas preventivas). o risco de uma má exposição na mídia, que preocupa toda empresa, é prevenido com ferramentas de mídia como o portal www.podtersaude.com.br, “no qual médicos e jornalistas discutem qualidade de vida e questões de saúde”, e com iniciativas de responsabilidade social, como a abordagem de “surtos de doenças como a dengue, normalmente não cobertos por planos de saúde”, cujas vítimas ela fez questão de atender e o divulgou em campanhas publicitárias.

• Operações. Herzlinger enfatiza que a rede própria é grande, mas a rede de terceiros responde por 70% das despesas médicas. o case mostra o esforço da amil para otimizar recursos e servir melhor os clientes, ilustrando-o com a criação de pequenas re-des regionais dentro das cidades maiores e o incentivo aos mé-dicos a utilizar seus consultórios como “sedes”, com ferramentas gerenciais da empresa.

A AULA INAUGURALa aula inaugural de 2011 do mba de gestão de saúde da professo-ra regina Herzlinger na Harvard business School seria sobre o case amil e foi marcada para o final de agosto de 2011, com a presença de executivos da empresa. na véspera, já era nítido o interesse desper-tado pelo estudo, quando representantes de vários clubes de Harvard quiseram encontrar-se com pugliese para saber mais da empresa —o clube das mulheres, o latino-americano, o de health care. e a aula, com mais de 40 alunos do mundo inteiro, levou duas horas.

como é próprio do método “case study”, Herzlinger pedira aos alunos que lessem o texto antes para responder a uma pergunta em sala: “Há duas potenciais aquisições de operadoras de saúde para a amil fazer no brasil —a lynx e a Samcil. qual ela deve escolher e por quê?”. a professora também instigou a turma a avaliar se a amil pos-suía as seis forças que geram inovação no setor de saúde: players, recursos, políticas públicas, tecnologia, clientes e accountability.

1999-2000 2010-20112007 2009

Surge o total care,

centro de medicina

preventiva para quem

tem doenças crônicas.

é criada a holding amilpar e a empresa lança cerca de 27% de suas ações na bovespa.

a amil adquire o controle da medial Saúde, maior empresa de assistência médica do estado de São paulo.

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aprendemoS que, enquanto um HoSpital requer eScala, uma empreSa de Saúde exige maior foco na qualidade e na capacidade de Se diferenciar.”

Jorge da Rocha, ceo da amil assistência médica internacional

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NA INIcIAtIvA DO SISteMA INteGrADO De SAúDe

NOS reSUltADOS

OS SINAIS DO eMpreeNDeDOrISMO

• Acesso ao conhecimento

• Promoção de eventos médicos e científicos

• Participação em eventos nacionais e internacionais

• Integração com centros médicos nacionais e estrangeiros

• Tecnologia da informação avançada

• Análise de dados e expertise em cruzamento de dados

• Padrões para avaliação de riscos

• Definição do perfil dos associados

• Prevenção primária: em grupos saudáveis em estado de risco

• Prevenção secundária: populações contaminadas, mas sem sintomas

• Monitoramento de riscos e aumento da consciência de hábitos saudáveis

• Iniciativas eficientes no sistema de excelência da Amil

• Programa intensivo para pacientes crônicos e pacientes em condições sérias

• Centros de referência (centros de excelência) para procedimentos de alta complexidade

• Qualificação, tecnologia e aspecto humanitário

1 Saber2 Prever 3 Prevenir

4 Tratar

10,1% de market share nacional

5,8 milhões de clientes

9,3 bilhões de receita anual(em 2011)

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8,6% de Ebitda (ajustado, em 2011)

7 centros ambulatoriais Total Care

22hospitais próprios

centrosmédicos44

3cidades brasileiras atendidas

Fontes: Amil e Harvard Business School.

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o caSo da amil é muito empreendedoriSmo, o tempo todo, aSSociado à coragem de mexer em time que eStá ganHando.”

Paulo Marcos Senra Souza, diretor e assessorda presidência do grupo amil

as respostas dos estudantes foram interessantíssimas, assim como as perguntas que fizeram a pugliese, nas palavras do diretor paulo marcos Senra Souza: “eles nos deram muitas ideias, inclusive, e mencionaram coisas que já estamos fazendo”.

o que queriam saber? por exemplo, se a amil não se interessaria em vender sua tecnologia, até em outros países, ou se, dada a escas-sez de profissionais —médicos, enfermeiros, técnicos de enferma-gem— no país, ela não planejava montar centros de ensino, e assim por diante. uma curiosidade: a amil acabou comprando a lynx, só que, naquele momento, tratava-se de uma negociação sigilosa.

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centros de tratamento do Resgate Saúde

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

DEPOIS DA AULAregina Herzlinger pareceu gostar muito do novo relacionamento que inaugurou com a amil. avisou que reescreveria o caso em breve para contemplar questões levantadas pelos estudantes, pediu que a mantivessem informada de toda e qualquer evolução do modelo de negócio da empresa, disse que voltaria ao brasil mais vezes. mais significativo de tudo, no entanto, foi sua sugestão de a amil fazer uma fellowship, ou seja, estruturar um programa para receber alunos do mba de health care da HbS. empresas como o google fazem isso.

e, assim, a amil, que se aproximou de Herzlinger com base em sua vontade de aprender, transforma-se em escola. no início de julho, a empresa recebe seu primeiro fellow norte-americano para um pro-grama de dez semanas focado em inovação estratégica em serviços de saúde. o custo corre inteiramente por conta da amil, mas vale a pena, segundo paulo marcos. “isso nos obriga a organizar e entender melhor nossas forças”, diz ele. “Já valeria a pena só pela felicidade que isso causou aos gestores que criaram e gerenciam os progra-mas”, complementa dulce pugliese.

O OUTRO ALVO ACERTADOo “empreendedorismo” contínuo e eficiente da amil é insinua-do ao longo de todo o case, embora não nomeado. fica evidente, por exemplo, no item “cultura”, porque esta é ativamente construí-da, com treinamento e campanhas publicitárias. ou na vontade de aprender, citada várias vezes. ou na gestão de risco, já que a amil implantou o primeiro sistema de underwriting do setor no brasil (a ciência de calcular um risco e criar preço adequado para ele em um sistema eletrônico), depois de aprender sobre ele nos eua. nem é preciso explicar o empreendedorismo por trás do Sistema integrado de Saúde, que, com muita tecnologia e inteligência médica, reduziu custos e abriu portas para planos para a classe média emergente.

a maior evidência do empreendedorismo contínuo da amil, porém, é que, menos de um ano depois do estudo de caso de Harvard, já há um grande número de novidades na empresa. pugliese não quer falar muito delas, mas suas atuais funções na corporação são reveladoras: ela é a responsável pelo comitê de ensino e pesquisa e pelo de sustentabilidade —esta, entendida no sentido amplo de garantir o futuro da organização. o laboratório excellion e o Hospital das américas ilustram bem isso [veja qua-dro acima e na página 122].

a amil evita personalizações, mas dulce pugliese é, sem dúvida, um “peso-pesado” empreendedor para essas áreas. responsável pela operação norte-americana da amil até seu encerramento, esta-va ligada diretamente a uma das maiores fontes de aprendizado do negócio, e em seu currículo constam desde a criação do primeiro cti (centro de terapia intensiva) pediátrico da américa latina, no Hos-pital Somicol de duque de caxias (rJ), até o primeiro atendimento telefônico 24 horas de uma operadora de health care nos eua.

Se a internacionalização está nos planos empreendedores? “nunca deixou de estar”, apressa-se a responder pugliese, sem pormenores, mas ressalvando que o mercado brasileiro também tem muito por fazer (74% da base de clientes está em quatro estados). na amil, contudo, o empreendedorismo não é só o das grandes iniciativas. como diz paulo marcos, parafraseando o ar-quiteto mies van der rohe, “o diabo está nos detalhes” e é preci-so ser empreendedor para lidar com cada um deles. “por exem-plo, um desafio é resolver o problema de ausência nas consultas sem fazer o que a concorrência faz, de marcar três pacientes para o mesmo horário, porque o overbooking é tão ruim quanto a ociosidade”, explica o executivo. ele resume: “o caso da amil é muito empreendedorismo, o tempo todo, associado à coragem de mexer em time que está ganhando”.

LEGADO DO CASOo modelo de health care dos sonhos de Herzlinger é o suíço: todos os cidadãos são obrigados a comprar seguro de operado-ras privadas e estas pagam os hospitais, governamentais, para atendê-los. Seria ele replicável em países com população supe-rior a 7,8 milhões de habitantes e sem uma renda per capita tão elevada como a suíça? dificilmente.

uma comparação como essa e um distanciamento como o de Har-vard podem mesmo trazer à tona qualidades de gestão que, segundo peter drucker dizia, a “autocrítica excessiva” dos brasileiros impede de ver. o estudo de caso já valeria por isso, porém tem mais subpro-dutos: o fortalecimento das marcas amil e brasil diante de formado-res de opinião, a estruturação da empresa para ensinar (e aprender), o orgulho da equipe —itens que geram mais empreendedorismo.

HSM Management

Há dois anos, a Amil adquiriu o hospital Pró-Cardíaco (RJ), e com ele veio essa empresa de pesquisas de células-tronco e terapia celular. Trata-se do único laboratório do Brasil autorizado a fazer, além da manipulação, a multiplicação celular, necessária à terapia. A Ex-cellion Serviços Biomédicos representará o início das pesquisas para a empresa, que pretende focar tecnologias órfãs (que não ge-ram patentes e, portanto, tendem a ser abandonadas pela indústria farmacêutica em geral, mas causam benefício imenso aos pacientes

e ao sistema de saúde). O diferencial da Amil é poder oferecer a aplicação da pesquisa a pacientes de 30 hospitais (somando os da empresa e os de Edson Bueno).

A excellion e a área de pesquisas

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os megaeventos de 2014 e 2016, com a ambiciosa meta de serem verdes, exigem das empresas aprendizado e gestão criativa para superar restrições de prazo e orçamento, conforme reportagem

or maiores que sejam os problemas em torno da realiza-ção da copa do mundo e da olimpíada, alguns até mesmo em âmbito judicial, a mobilização que provocam gerou um processo interessante do ponto de vista gerencial. em pri-

meiro lugar, o país estabeleceu uma meta realmente ambiciosa para 2014 e 2016 —quer ser o primeiro país a seguir as melhores práticas de sustentabilidade em eventos desse porte—, e isso, por si só, já dei-xaria qualquer especialista em estratégia orgulhoso. “a copa verde não foi imposta pela fifa [federação internacional de futebol]; é um desejo e um esforço de todos nós”, como explica a designer de ilumi-nação Luciana constantin, responsável pelos projetos de iluminação de algumas arenas. em segundo lugar, as mais diferentes empresas estão sendo obrigadas a inovar para conseguir atender às limitações de orçamento e de prazo.

no caso da copa do mundo, a meta se materializou assim: os 12 estádios que estão sendo construídos ou reformados terão de rece-ber o certificado Leed (Leadership in energy and environmental de-sign), o sistema de certificação ambiental de edificações mais usado no mundo. “a ideia é o brasil fazer uma ‘copa verde’ mesmo”, conta João alberto viol, presidente nacional do sindicato nacional das em-presas de arquitetura e engenharia consultiva (sinaenco).

as exigências mínimas para a certificação Leed são as mesmas para todas as construções, que poderão obter o selo prata, ouro ou platina, conforme a pontuação obtida, como explica felipe faria, ge-rente de relações institucionais e governamentais do green building council brasil (gbc brasil). os créditos se dividem entre: espaço sus-tentável; eficiência do uso da água; energia e atmosfera; materiais e recursos; qualidade ambiental interna; inovação e processos; e cré-ditos regionais. “a maioria dos estádios deve alcançar o nível prata, mas o de brasília tem a ambição de obter o selo platina”, revela. o resultado prático disso? um estádio como o castelão, de fortaleza, economizará 69% de água reaproveitando água da chuva.

os critérios para concessão de financiamento foram o empurrão do governo para que as empresas abraçassem a estratégia. o banco nacional de desenvolvimento (bndes) criou uma linha de financia-mento —bndes procopa arenas— para algumas obras em estádios, como as arenas das dunas (rn), fonte nova (ba) e da amazônia, definindo, como obrigação contratual, que as obras financiadas atendam às exigências do gbc brasil. outro programa do banco, o bndes procopa turismo, é dirigido a hotéis que consigam certifica-ção de eficiência energética nível “a” dentro do programa de efici-ência energética nas edificações (procel edifica). além disso, o gbc

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Meta x gestão

a reportagem é de Weruska Goeking, colaboradora de Hsm management.Fo

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Maquete da Arena Pantanal, em Cuiabá (MT), e, no detalhe, o projeto do lounge, em arquivos digitais; essa arena substituio antigo Estádio José Fragelli, que foi demolido

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

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brasil, em parceria com o projeto aliah, faz concursos para escolher projetos de hotéis sustentáveis desenvolvidos por jovens arquite-tos. os vencedores serão construídos no rio de Janeiro, sede dos Jogos olímpicos, e nas outras cidades da copa. como as empresas brasileiras estão conduzindo esse processo?

Inovação 1: lâmpadas LED + fluorescentes o escritório acenda projeto de iluminação, sob a batuta de Lucia-na constantin, é responsável por quatro projetos luminotécnicos da copa de 2014: as arenas pantanal, das dunas, da amazônia e de per-nambuco. o que está sendo criado em cada caso engloba os estádios, praças e restaurantes, a fim de garantir a continuidade de uso após o fim do evento. a inspiração para os projetos luminotécnicos veio das arenas na alemanha e na África do sul.

entre os itens que constam dos projetos estão o desligamento automático do sistema de iluminação e as luminárias das áreas ex-ternas com potência maior que 100 W, que devem ter eficiência mínima de 60 lm/W (lúmen por watt). a inovação? para vencer o desafio do prazo e do aperto orçamentário, constantin usará lâmpadas fluo rescentes e de descarga na maior parte dos espaços internos, para deixar uma “folga orçamentária” para o uso de Led nas fachadas e no pódio, onde os critérios de poluição luminosa do Leed são mais rígidos.

Inovação 2: estrutura metálica e processo o público está acostumado a ver cobertura de concreto em está-dios de futebol como o maracanã, mas o que predominará agora são as estruturas metálicas, que são mais duráveis (mais susten-táveis, portanto), mais limpas e não geram desperdício, já que são produzidas no tamanho exato. além disso, modernizam o visual das construções, driblam a escassez de mão de obra e ajudam a cumprir o cronograma. “o sistema não é inédito, mas ainda é pouco aplicado”, explica sérgio coelho, diretor da gcp arquitetos, do projeto da arena pantanal, em cuiabá.

“com o setor aquecido e a consequente falta de mão de obra, fo-mos obrigados a mudar a lógica, mesmo com a estrutura metálica tendo um custo elevado. e não vale só para ela; quem não tiver todo o processo construtivo inovador, não consegue cumprir os prazos”, complementa José carlos martins, vp da câmara brasileira da indús-tria da construção (cbic). em muitos casos, parte é feita em estrutura de concreto e outra parte, em estrutura metálica.

a fachada do estádio de cuiabá, por exemplo, será feita de estru-tura metálica e fechada com tecido de pvc, o que permite a passa-gem de ventilação e de luz —o tecido de pvc já existe, mas nunca foi usado na escala em que se está usando no brasil. “essa é, sem dúvida, uma de nossas grandes inovações arquitetônicas”, garante gisleine coelho de campos, diretora do centro de tecnologia de obras de infraestrutura do instituto de pesquisas tecnológicas (ipt).

Já as estruturas de concreto usadas terão versões especiais e de alta resistência, permitindo a construção de grandes vãos.

Inovação 3: arena desmontável outra inovação trazida pelos projetos das arenas está nas arquiban-cadas. no estádio de cuiabá, alguns lugares serão desmontáveis.

“nosso projeto é flexível e a capacidade pode cair até 27 mil com a desmontagem de parte das arquibancadas do anel superior. elas se-rão remontadas em outros equipamentos esportivos, provavelmente em dois estádios menores”, explica sérgio coelho. afinal, a proposta é que o legado da copa não seja exclusivo da arena pantanal, mas se estenda a outras áreas da capital mato-grossense, provavelmente dois estádios com capacidade de 10 mil pessoas cada um. “a estru-tura metálica é o que permite desmontar e remontar”, diz coelho.

outra peculiaridade da arena pantanal é o fato de a arquibanca-da não seguir o típico formato elíptico contínuo dos estádios, mas ter quatro módulos separados, viabilizando estruturas que, além de independentes e desmontáveis, terão ventilação cruzada, melhoran-do a sensação térmica da arquibancada coberta. espelhos d’água na área externa, sob o público, umidificarão o ar.

O modelo Mineirão e a Olimpíadaum dos casos mais interessantes é o do mineirão. além do reuso da água da chuva e da parceria com a companhia energética de minas gerais (cemig) para a geração de energia solar fotovoltaica suficiente para abastecer 70 casas, o estádio reaproveitou boa parte dos ma-teriais resultantes da demolição de seus anéis inferiores. também usou aço doado para reciclagem por sucateiros e o concreto tritu-rado no terreno do canteiro de obras durante as chuvas de verão, dispensando o uso de brita, como conta ricardo barra, diretor-presi-dente do minas arena. até as árvores cortadas foram reaproveitadas —por artesãos locais. e a cobertura, com estrutura tubular, terá uma membrana feita de politetrafluoretileno (ptfe), que parece teflon. “a própria chuva ou o uso de esguichos tirará a sujeira”, diz barra.

para a olimpíada, o mesmo fenômeno deve ocorrer: as metas ver-des estão nas licitações e foi contratada a consultoria do inglês dan stein, responsável pela sustentabilidade dos Jogos de Londres.

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Gisleine Coelho de Campos, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT); Felipe Faria, do Green Building Council Brasil (GBC Brasil); e Luciana Constantin, do Acenda Projeto de Iluminação

HSM Management

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Cada vez mais empresas estabeleCidas adquirem o Controle de jovens negóCios empreendedores no brasil. reportagem investiga o que aConteCe Com o empreendedorismo do fundador quando ele se torna funCionário e Com a empresa adquirida, por meio de três estudos de Caso

e você acompanha o noticiário, sabe que o brasil está vivendo um movimento aparentemente infindável de fusões e aquisições e que os pequenos negócios de em-preendedores têm sido alvo preferencial nessa onda,

seja por servirem como porta de entrada para quem vem de fora e quer instalar-se nesse mercado emergente, seja com o objetivo de injetar vitalidade em negócios mais maduros.

o que acontecerá, no entanto, com esses empreendedores quando forem “adquiridos”? eles se dobrarão ao establishment ou desafiarão os novos chefes? vão se adaptar a uma burocra-cia ou fazer com que os outros se adaptem a seu dinamismo? nossos empreendedores saberão encaixar-se em uma gestão mais bem formatada?

HSM Management investigou situações similares no passado e descobriu três casos emblemáticos que antecipam o que virá: o da meri sistemas e tecnologia, adquirida pelo grupo alemão voith; o da informed, comprada pela diasonics e depois pela ge; e o da HotWords, incorporada pelo grupo espanhol Canalmail. Com base nesses depoimentos, nós até nos permitimos inventar uma palavra: “pós-empreendedor”.

Meri: sorte de voltar às origens o engenheiro mecânico silvio roberto romero iniciou sua car-reira em 1986 como estagiário da voith, primeira grande mul-tinacional no brasil fornecedora de equipamentos na área de

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O pós--empreendedor do Brasil

a reportagem é de Mônica Trevisan, redatora de Hsm management.

papel e celulose. em 1992, foi transferido para a matriz, em Hei-denhein, na alemanha, conheceu a meri, empresa especializada em meio ambiente, e viu aí uma oportunidade de empreender por conta própria.

em 1997, romero montava a meri sistemas e tecnologia, em são paulo, uma joint venture 15% sua e 85% da matriz alemã, dedicada a fabricar sistemas de tratamento primário para recupe-ração e reuso de águas e para reutilização de fibras de papel. “a meri alemanha fornecia a tecnologia e eu implantei um modelo de gestão de baixo custo, alta performance e muito focado no negó-cio, sem desperdício. eu era o sócio diretor, tinha uma secretária e a gente terceirizava tudo: contador, advogado, fabricação”, conta o empreendedor, que gerenciava seu negócio com total liberda-de. segundo ele, a empresa manteve crescimento anual médio em faturamento na ordem de 20% a 25%, movimentava aproximada-mente r$ 7 milhões por ano em equipamentos de tratamento de água e possuía market share de 85%, com apenas dez funcionários —uma situação bem confortável.

em 2006, contudo, nessas voltas que o mundo dá, o grupo voith adquiriu 60% da matriz da meri alemanha para iniciar sua divisão de meio ambiente. e, da noite para o dia, romero tornou--se sócio de seu primeiro empregador —ele manteve a participa-ção de 15%—, agora com o cargo de diretor-comercial. primeira novidade: o modelo de negócio da meri brasil havia sido muito ampliado. “meu negócio, até 2006, era vender máquina, na faixa de r$ 500 mil, e passou a ser vender instalação, por r$ 5 milhões”, diz. a companhia começou a atuar também no mercado de non paper business (agronegócio, cervejarias, sucos e refrigerantes)

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

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e empresas de outros setores além de papel e celulose passaram a integrar sua carteira de clientes, como Citrosuco, Cargill e Cer-vejaria itaipava. Hoje a meri brasil contabiliza 350 instalações em 15 anos de existência.

o maior crescimento foi a principal e feliz consequência da aquisição. romero conta que de 2006 a 2008 o crescimento anual médio em faturamento da meri ficou na faixa de 30% a 35% e atingiu 100% de 2011 aos primeiros meses deste ano, com a mesma equipe. o que mudou? “tivemos mais estrutura com o novo sócio, respaldo financeiro do grupo e transferência de know-how da matriz com os treinamentos e a participação em projetos de outras empresas do grupo em todo o mundo. Houve um amadurecimento geral da equipe que está comigo desde o início, que é um pessoal treinado e que me dá uma efi-ciência muito forte.” romero afirma que prevê um faturamento de r$ 20 milhões no ano fiscal alemão, que vai de outubro de 2011 a setembro de 2012.

por enquanto, só vantagens. ele não perdeu autonomia? o em-preendedor garante que não. para ele, o único impacto complica-do da chegada da voith foi ter de se adequar aos sistemas admi-nistrativos e operacionais, mas isso foi superado logo no primeiro ano. romero parece ter dado sorte, na verdade. “minha formação profissional foi na voith. eu cresci dentro da cultura dessa em-presa e da cultura corporativa alemã de modo geral, e levei essa filosofia e forma de trabalhar para a minha empresa; isso facilitou muito nossa integração”, conclui.

Informed e o status de gestor ousadoo engenheiro eletrônico edson lopes iniciou sua trajetória pro-fissional na área da eletromedicina, como estagiário da siemens, no final da década de 1970. em 1980, partiu para a toshiba e ficou lá por quase quatro anos, chegando a gerente nacional de vendas. mas a recessão e as demissões inerentes o levaram a empreender, e ele abriu primeiro uma empresa de lobby, por causa dos relacionamentos que havia travado durante suas in-cursões profissionais. foi ao participar do maior encontro de radiologia do mundo, a radiological society of north america, que encontrou sua vocação: lopes viu um pequeno projetor da shimadzu que permitia a impressão do ultrassom, uma novidade na época, e quis fornecer isso no brasil.

passou a comprar aparelhos de ultrassom em desuso, que re-formava e vendia. e assim surgiu a empresa que em breve se chamaria informed e acabou firmando contrato de 13 anos com a shimadzu, inicialmente para vender aquele projetor aqui. a informed se tornou o maior dealer mundial da companhia japo-nesa. “fomos, por cinco anos, líderes de mercado no país ven-dendo tomografia computadorizada, ressonância magnética, raio X, ultrassom. Competíamos com a ge, a siemens e a philips e chegamos a ter 130 funcionários e filiais pelo brasil.”

em 1992, a informed assinou contrato com a norte-americana diasonics, agregando mais um produto a seu portfólio, e, em ju-lho de 1997, lopes a vendeu para essa empresa, mantendo-se à frente da operação brasileira, como Ceo. a perda aí foi da repre-

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A Meri Brasil, de Silvio Romero, foi adquirida pelo Grupo Voith, seu primeiro empregador e um velho conhecido

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

sentação da shimadzu, mas ele tinha autonomia. só que, sete meses depois, a diasonics foi adquirida pela ge e o executivo não gostou: discordava de aspectos relativos à cultura e ao modo de atuação da multinacional e não quis aceitar o convite de continuar a dirigi-la. em abril de 1998, contudo, após intensa negociação que incluiu a exigência da permanência da equipe, lopes assinou contrato e se manteve como Ceo da área de negócios ge ultrassom para a améri-ca latina por nove anos.

“Claro que o início da operação com a ge foi difícil, mas éramos um grupo pequeno, unido, bem desenvolvido e deu tudo certo.” e ele complementa: “a informed possuía aquele ímpeto, aquela pujança de uma empresa jovem e ousada, só que obviamente não tinha nem um milésimo da retaguarda de uma ge. as pessoas desenvolveram--se muito na ge, intelectual, profissional e financeiramente”. a ge ultrassom cresceu muito, e a filial brasileira com ela: o faturamento anual subiu de us$ 270 milhões em 1998 para us$ 1 bilhão em 2005 —us$ 110 milhões saíram do brasil.

para lopes, a ge foi uma escola fantástica, porém ele admite que ficou “cansado” a partir de determinado momento e que tentou deixar a empresa “algumas vezes”. nem a perspectiva de ser, no brasil, o country manager de todas as áreas da companhia relacionadas com medicina o demoveu da ideia de ir embora. talvez fosse um caso de empreendedor serial, entediado e

ansiando pela aventura de empreender. o fato é que, depois, ele capitaneou um negócio próprio, implementou outro e se aventurou num desafio regional: após um ano de quarentena, em que cumpriu a cláusula de não competir, comprou, com um ex-colega da ge, uma empresa de ultrassom norte-americana, que manteve até a recessão de 2008, quando iniciou negociações com a italiana esaote Heal-thcare, quarta maior fabricante mundial de ultrassom, para juntos montarem uma filial brasileira. abriu-a em maio de 2009 e, em 2010, ela já faturava cerca de us$ 24 milhões. em meados de 2012, foi contratado por outra italiana, a bracco, que produz contrastes radiológicos, para presidir toda sua operação latino-americana.

HOTWords: velocidade da internetHiperativo, aos 20 anos gustavo morale ingressou na sats global media como contato publicitário e logo se tornou estagiário de cria-ção. seu objetivo era trabalhar com desenho e ganhar bem, e foi

cursar publicidade e propaganda na pontifícia universidade Católica (puC). mudou-se para ou-tra pequena agência, de publicidade online, viu que “ganhavam dinheiro com certa facilidade” e pensou que queria ter a própria agência. aos 21 anos, no segundo ano de faculdade, fundava, com um amigo, a agência digital White Cat, que funcionou de 1999 a 2005, atendendo cerca de 40 clientes, entre eles troller, bavaria e Kaiser.

“O início da operação com a GE foi difícil,

mas deutudo certo”

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Edson Lopes, que teve sua Informed comprada pela GE, em foto tirada na Esaote;

agora preside a Bracco na América Latina

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MINIDOSSIÊGestão à brasileira

morale foi “aprender a fazer business” na pós-graduação em gestão empresarial e inovação tecnológica da escola superior de propaganda e marketing. fez outra tentativa, frustrada, de empla-car um negócio no mercado de comunicação, até unir-se com três sócios para montar, em 2006, a HotWords in-text advertising, que já tem uma rede de 35 mil sites parceiros (portais, revistas, jornais, blogs...), onde são realizadas as ações de comunicação on-line da empresa para “os maiores anunciantes do país, como itaú, bradesco, fiat, volkswagen e unilever”.

para quem não conhece, o sistema HotWords identifica as pala-vras que podem ser grifadas de acordo com os objetivos de cada campanha de comunicação, e o usuário vê o anúncio ao passar o mouse sobre elas (mouseover). “oferecemos uma capacidade de segmentação altíssima. o anunciante investe de r$ 20 mil a r$ 30 mil mensais e fala exatamente com o público-alvo”, afirma morale, vendendo seu peixe.

em 2008, a HotWords já tinha operação na argentina e no méxico e, em 2009, foi vendida para o grupo Canalmail, líder no segmento de e-mail marketing na espanha. mas o que mu-dou? basicamente, o poder de fogo, o que combinou muito com a personalidade irrequieta, ambiciosa e empreendedora de morale, que continua podendo aproveitá-la à vontade.

a HotWords foi para o mundo —é líder na américa latina (está entrando na Colômbia, no Chile e nos estados unidos latinos), em portugal e na espanha em seu segmento. morale se mantém como Ceo, além de acionista minoritário, e isso ampliou sua atuação —e seu poder. ele não tem só 20 funcionários sob seu comando; já são 60 e provavelmente serão 100 até o final de 2012. não é apenas Ceo da HotWords no brasil, mas global, e é membro do board do grupo me-dia response, holding da qual fazem parte tanto a HotWords como

a adquirente Canalmail. seu negócio atinge mais de 140 milhões de usuários em língua portuguesa e espanhola, segundo a quantcast, e, em 2012, o executivo prevê aumento de aproximadamente 50% no faturamento da empresa. ele também está passando de comprado a comprador: “este ano, devemos adquirir outras operações”.

esse crescimento não seria possível sem a parceria, e não apenas pelas novas oportunidades abertas, como reconhece morale. por mais empreendedor que ele fosse, precisava de estrutura e know--how. “está sendo fundamental o aporte de know-how que os exe-cutivos do grupo media response me fazem: em gestão de negócios, controles, aquisições, fusões”, diz.

Visão de sucessoparece não haver dúvida sobre a mudança que uma fusão ou aquisi-ção, e toda a estrutura e as oportunidades que vêm com isso, provo-ca no tipo de empreendedorismo existente: o empreendedor de uma startup é um, o empreendedor que vai ser líder corporativo é outro. gustavo morale resume assim a figura desse “pós-empreendedor”: “temos de virar Ceos de verdade”.

o gosto por empreender, contudo, não morre. edson lopes, que se tornou um gestor disputado por multinacionais, é enfático: “onde eu estiver, gosto é de fazer acontecer”. romero concorda. se tem um negócio, prepare-se: você pode ser o próximo pós-empreendedor.

Gustavo Morale, da HOTWords, tornou-se um

CEO e seu negócio ganhou alcance mundial fo

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FORMAÇÃO

A estratégia, a educação e a bicicleta

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O senso comum ensina que basta você aprender a andar de bicicleta uma vez e nunca desaprenderá e, nos campos da gestão e da estratégia de empresas, a crença de muitos executivos parece ser idêntica. Na vida real, contudo, se o ciclista que não treina constantemen-te não tem resistência ou velocidade e muito menos encara terrenos aciden-tados e descidas íngremes, o mesmo acontece com o gestor e, especialmen-te, no que se refere a estratégia.

Essa é a crença de Derek Abell, ex-presidente do prestigiado IMD, fundador da European School of Ma-nagement, em Berlim, Alemanha, e referência na área de estratégia empre-sarial desde que lançou ao mundo sua teoria de dupla estratégia (como sua “dual strategy” foi traduzida no Brasil), em 1993. Em sua concepção, as em-presas devem sempre ter duas estraté-gias, uma para o presente e outra, mais visionária, para o futuro.

Nesta entrevista exclusiva a HSM Management, Abell, que assumiu recentemente o cargo de dean inter-nacional da HSM Educação, atualiza seu pensamento dizendo que se tor-nou necessário adaptar a estratégia e desdobrá-la a cada momento, o que depende do aprendizado constante dos gestores. E, para ele, o aprendi-zado gerencial tem de se assemelhar a aprender a pedalar: não se pode aprender só em livros; é preciso cair, ralar o joelho e até quebrar a perna, se necessário. Se essa experiência pu-der ser proporcionada pela educação executiva como simulação, melhor.

Há quase 20 anos, você falou em dupla estratégia, mas mesmo uma boa estra-tégia simples é rara hoje. Por quê?A explicação está na distribuição da li-derança pela empresa. Entre os líderes segmentados, cada um acha que a em-presa está em boas mãos por causa de todos os outros e que, por isso, não pre-cisa externar sua visão e seus valores e, assim, mobilizar as pessoas; ele acre-dita que tudo acontecerá com e-mails.

Mesmo não cuidando de tudo como antigamente, os dirigentes continuam

tendo de se envolver com as pes soas, olhando-as nos olhos, cumprimentan-do-as e explicando-lhes no que creem. Sem isso não há estratégia.

Fracassar ficou mais fácil hoje?Acho que os fracassos aumentaram, sim, mas não necessariamente fra-cassos definitivos. O maior fracasso é permanecer imóvel enquanto o mun-do se move. Parece mais seguro não arriscar, porém são as empresas que as sumem mais riscos —e se movem— as mais bem-sucedidas.

Pesquisadores como Jim Collins insis-tem na cautela... Como o risco se rela-ciona com sua dupla estratégia?Quando escrevi o livro sobre a dupla estratégia, em 1993, não dominava completamente o conceito; tive um insight apenas. Entendia a neces-sidade de dualidade —mudar e, ao mesmo tempo, ser operacional— e até falava sobre dirigir um negócio e inová-lo ao mesmo tempo, mas ainda não sabia como se faz isso.

Aprendi muito desde então. Hoje posso dizer que são necessárias três iniciativas: (1) a companhia deve construir uma plataforma nova para o futuro, e não confiar só no que tem hoje; (2) deve obrigatoriamente en-fatizar a inovação, porque é isso que conduz ao futuro; (3) deve fazer a transformação contínua da estraté-gia. As pessoas que são boas em mo-ver as empresas para o futuro fazem essas três coisas o tempo todo.

E, quando se tem de fazer uma fun-dação para o futuro, não se pode es-premer demais os recursos, reduzindo demais o pessoal e os orçamentos, por-que essa plataforma vai diminuir. Isso tudo aterroriza os “burocratas”, que querem se agarrar ao que têm hoje.

A entrevista é de Fernando Serra, dean nacional da HSM Educação e especialista em estratégia, e Jorge Carvalho, associado de conteúdo da HSM do Brasil.

Em EntrEvista Exclusiva, DErEk

abEll, DEan intErnacional

Da hsm EDucação E funDaDor Da

EuropEan school of managEmEnt,

DiscutE a rElação EntrE

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prático EstruturaDo

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Você tem exemplos reais para nos dar?A IBM é uma organização que cons-trói permanentemente, assim como a Nestlé. Vejo também muitas empre-sas familiares que constroem sempre.

Seu foco passou da estratégia à educa-ção executiva. Por quê? Ela é importan-te para a estratégia das empresas? Sim. Não basta preparar as pessoas para que gerenciem as empresas ade-quadamente, como sempre fizemos, a fim de que sejam boas gestoras e im-plementadoras. Agora também temos de prepará-las para mudanças maci-

ças, o que, para ser franco, temos feito pouco nas escolas de negócios; trata--se menos de análise e conhecimento e mais de execução de estratégia.

Ou seja, a estratégia precisa da execu-ção —esta é parte da transformação contínua de que você falou— e a execu-ção precisa da educação executiva... É bem por aí. Nas escolas de ne-gócios, precisamos ajudar as pes-soas não apenas em planejamento

analítico do momento, mas a saber como mobilizar os outros a fim de que façam alguma coisa, pois so-zinho não se vai longe. É necessá-rio inspirar as pessoas. E as visões inspiradoras não são fáceis, já que têm a ver com a criação de tensões: com elas, as pessoas se dão conta de que existem coisas que gosta-riam de ter, mas não têm.

Por exemplo, um ponto funda-mental nisso tudo é que a educação executiva trabalhe a habilidade de comunicação. Não acredito que fa-çamos o suficiente nesse aspecto. E

veja bem: não falo em manipulação. Mentes limpas e bem-intencionadas, que poderiam convencer as pessoas a abraçar algo novo, não o conseguem porque lhes falta habilidade —ou pai-xão—, e, assim, sua ideia de constru-ção de futuro fica adormecida.

Você está escrevendo um livro sobre aprendizado? Conte-nos a respeito. Comecei a pensar sobre o que quere-mos dizer ao usar a palavra “aprendi-

zado” no contexto empresarial, pois existem diferentes tipos de aprendiza-do, embora a palavra seja uma só. Por exemplo, se você quisesse aprender a andar de bicicleta, mesmo que eu lhe indicasse 5 mil livros sobre isso, você não conseguiria andar de bicicleta len-do os livros. Infelizmente, ou felizmen-te, existem partes da liderança e da ges-tão que, assim como andar de bicicleta, exigem ação e não conhecimento de livros. E quem pensa que pode ensinar isso só distribuindo pedaços de papel e pedindo que as pessoas leiam está co-metendo um grave erro.

Os gestores precisam tentar, treinar e treinar, como quando as crianças aprendem a andar de bicicleta, e mui-tas escolas de negócios ainda insistem na leitura de livros. As escolas têm de trazer projetos de laboratório para a sala de aula e trabalhar com professo-res que tenham a prática administrati-va. Como é possível ser um professor de administração sem nunca ter tido experiência prática em algum negócio? Para mim, não é.

Agora, devo dizer que a educação executiva está mudando muito, e rá-pido, e alguns alunos potenciais se sentem tão assustados com isso que preferem se trancar em seus escritó-rios, como se um tigre os ameaçasse.

“a inovação tEm Essa função DE sEr um motor quE conDuz ao futuro: sE você não ligá-lo,a organização nunca sairá Do lugar”

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“nEnhum DEclínio [DE uma EmprEsa] acontEcE Da noitE para o Dia; é um longo procEsso cancErígEno”

A estratégia, a educação e a bicicleta

O que dizer para os gestores que odeiam a perspectiva de estudar?Digo que já há executivos que se sen-tem tão confortáveis com o presidente de uma empresa como no ambiente acadêmico, movimentando-se felizes entre as diferentes instituições, desco-brindo que professores e gestores for-mam um ótimo time. Esses tendem a se dar bem melhor na dupla estratégia.

Como você vê a atual pesquisa acadê-mica em gestão? Faltam mais expe-riências com as empresas, não? Com certeza! Deveríamos aprender algo com os cursos de medicina: in-vestigar o desenvolvimento de uma empresa como se investiga o histórico e o contexto de um paciente com cân-cer. Isso nos dirá onde estão os sinais de perigo antes que o pior aconteça e significa que não podemos analisar só o fim da linha; temos de olhar o que veio antes. Deve-se entender quando a companhia não pratica a inovação, quando não tem políticas de recursos humanos adequadas, quando não de-senvolve a próxima geração de líderes, e assim por diante.

Nenhum declínio acontece da noite para o dia; é um longo processo can-cerígeno que fornece alguns indicati-vos, e a ideia de entender esses sinais precocemente e analisá-los como uma espécie de ciclo é muito importante.

Você tem três filhas. Se uma delas qui-sesse se tornar executiva, que conse-lho você lhe daria?Muitos colegas meus, que são pais, me perguntam o que fazer com filhos e filhas. Alguns jovens não querem nem ir à faculdade, nem desejam es-colher uma carreira. Bem, o que repa-rei é que as pessoas que se apoiam em duas pernas são mais estáveis do que as que se apoiam em uma. É ótimo estudar qualquer coisa, mas, se você só souber essa coisa, é menos ótimo. Em qualquer atividade, as pessoas que parecem estar bem no mundo são aquelas que têm bases amplas. Podem ser engenheiros, mas também estu-daram um pouco de administração;

podem ser arquitetos, mas entendem coisas sobre o mercado imobiliário ou sobre liderança.

Acredito que estamos em um mun-do em que a especialização está cres-cendo e não deveria. Muitos jovens ficam presos em caixas cada vez mais estreitas por sua educação e de repen-te precisam saber muitas coisas.

Sou a favor do intercâmbio de jo-vens; isso muda a vida deles, se eles o fizerem com 17 ou 18 anos de ida-de. Viagens alargam muito a visão. Minhas filhas não me ouvem muito [risos], mas eu sempre lhes recomen-dei coisas como: “Se você for visitar uma cidade diferente, leve seus tênis e explore-a, indo a museus, vendo o que está acontecendo, sendo humilde para

entender as diferenças de local para local”. Duas delas trabalha-ram e estudaram na Índia, e lhes fez mui-to bem entender que nem tudo é alemão, francês ou inglês.

Existe alguma fór-mula básica para os jovens gestores que querem avançar na carreira executiva? Não, tanto que nem to-dos precisam de MBA, por exemplo, por mais que vendamos isso; tudo depende da empre-sa em que o jovem está e do que ele faz. O único ponto que creio ser comum a todos é: ser

muito cuidadoso com o chefe, não só no relacionamento, mas na escolha dele. Quando vai a uma entrevista de emprego, o jovem deve ser tanto o en-trevistado como o entrevistador. Ele precisa perceber se aquela pessoa vai ajudá-lo ou espremê-lo.

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Dean internacional da HSM Educação e pro-fessor emérito da European School of Ma-nagement and Technology (ESMT), da qual foi fundador, Derek Abell integrou o corpo docente da Harvard Business School de 1969 a 1981 e foi professor de estratégia e marketing no IMD, em Lausanne, Suíça, de 1981 a 2003. É autor de livros clássicos como Administrando com a Dupla Estratégia (ed. Pioneira) e Definição do Negócio (ed. Atlas). Também publicou, entre outros, Strategic Market Planning (ed. Prentice Hall), Compe-titive Market Strategies e Alternative Stra-tegies for Strategy Research in Marketing (ambos, ed. Marketing Science Institute).

A escola de negócios da HSM Conforme explicam Abell e Fernando Ser-ra, seu dean nacional, a HSM Educação foi concebida para ser um modelo educacional inovador, um hub que integra conteúdos gerados por uma rede de conhecimento global, formada por executivos, professores com experiência corporativa, empresários, empresas e os maiores experts internacio-nais nas áreas de negócios. Em parceria com universidades brasileiras como PUC--RS, PUC-PR e Mackenzie, ela busca um programa de educação executiva que, mais que em conhecimento, baseie-se no tripé compartilhamento-saber fazer-saber ser.

abEll E a HSM EduCAÇÃO

FORMAÇÃO FORMACÃO A estratégia, a educação e a bicicleta

Como será o futuro da estratégia?Sobre o futuro, ninguém sabe respon-der. Para eu dizer como será a estra-tégia no futuro, teria de começar me perguntando como foi a estratégia no passado, como está se modificando e então pensar no que pode acontecer. Vale a pena prestar atenção, talvez, a cinco tendências do mundo atual:

1) Nem todas as estratégias vêm dos laboratórios de pesquisa e desenvolvi-mento. Em outras palavras, algumas das novas coisas e oportunidades para a diferenciação não têm a ver com pro-dutos, e sim com design, como vários produtos da Apple. As estratégias de muitas empresas não são dependentes de tecnologias, mas de serviços.

2) Na maneira como definimos o negócio, o escopo, embora continue a ser um dos aspectos mais importantes, de algum modo anda negligenciado. Na verdade, algumas companhias são bem-sucedidas porque definem seus negócios diferenciadamente, levando em conta o escopo, desde o começo.

2) Estratégia não tem relação apenas com os clientes ou com o que fazemos para eles, mas com como nos defini-mos verticalmente. Temos de conhecer

nosso lugar na cadeia de valor. Muitas empresas estão terceirizando coisas que antes possuíam para se livrar dos custos fixos, e isso parece funcionar. As melhores organizações do mundo procuram pelas melhores pessoas, in-dependentemente de onde venham.

4) É com o empreendedorismo e a tomada de decisões que as pessoas podem vencer ou perder nos negócios. Isso difere da tradição corporativa que rezava que a estratégia reside em en-tender aquilo em que somos bons e usá-lo. Os empreendedores nos ensi-nam o contrário: se você reconhecer as oportunidades antes dos outros, pode entrar no mercado antes, conseguir os recursos mais rapidamente, achar o dinheiro, encontrar a tecnologia em algum lugar e dar conta do serviço.

5) As boas estratégias resultarão não só do que se faz, mas também da paixão por fazer coisas importantes para a sociedade como um todo. Nós sabíamos isso até 50 anos atrás, po-rém esquecemos nos últimos 20.

Nessa lista você mal citou “valor”, que é a palavra do momento —alguns gestores se agarram a ela como a uma tábua de salvação porque veem maior

valor como sinônimo de preço e lucro maiores. O que você pensa disso?Penso que esses gestores se esquecem de pensar no comportamento do con-sumidor. Eles acham que o consumi-dor quer cada vez mais e fazem pro-dutos exageradamente desenvolvidos.

O que o consumidor quer é uma so-lução que funcione, para ele ou ela, e o que pode ser de mais valor para o cliente pode custar menos para a em-presa —e para o cliente.

Vocês conhecem aquelas grandes máquinas amarelas da Caterpillar? Em alguns dos mercados da empresa, aquele maquinário pesado não é mais necessário, porque o sistema rodo-viário já está construído e as minas, cavadas. Máquinas pequenas e bem mais baratas são muito mais neces-sárias. Um equipamento caro não tra-duz as necessidades desses mercados e, assim, não lhes proporciona valor.

Muitas empresas alemãs têm difi-culdade em competir com as chinesas hoje por isso: os clientes veem valor em ofertas simples que resolvam seu problema, não complexas.

HSM Management

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assuntopessoal

Você sabia? Os hábitos não podem

ser eliminados; eles devem ser substituídos.

Os processos de negócios são hábitos executados em

grande escala.

Há momentos em que as pessoas são mais flexíveis

diante de mudanças de hábitos de consumo, como quando se mudam, casam ou têm filhos. As empre

sas que conhecem seus clientes aproveitam para estimular novos hábitos.O homem é um animal de costumes.

Muitas de nossas atividades diárias não são respostas a decisões deli-beradas, mas a ações inconscientes, isto é, hábitos. Desde o de preparar o primeiro café pela manhã até o de seguir sempre pelo mesmo caminho para o escritório, todo dia levamos a cabo um sem-número de ações como atos reflexos. Algumas delas são inócuas; outras podem consti-tuir obstáculo a nosso desempenho, como chegar sistematicamente atra-sado ao trabalho.

Charles Duhigg, jornalista do New York Times e autor de The Power of Habits: Why We Do What We Do in Life and Business (ed. Random House), garimpou a psicologia experimental e a neurologia para entender como o cérebro cria hábitos e como alguém pode desfazer-se daqueles que mi-nam a produtividade.

Como autômatos�Quando executamos um hábito, pensamos menos. Nossa atividade neurológica se reduz até quase se apagar�, explica Duhigg. Apesar de não estarmos condenados a realizar essas ações habituais perpetuamen-te, elas não podem ser eliminadas, mas apenas substituídas por outras. A chave para dominá-las é entender como funcionam.

Os cientistas explicam que os hábitos compõem-se de um gatilho, uma roti-na e uma recompensa. O gatilho dá a

ordem para o cérebro passar ao modo automático e indica que hábito precisa-rá lançar mão em cada situação. A roti-na é o comportamento em si, que pode ser físico, mental ou emocional. Final-mente, a recompensa ensina ao cére-bro se vale a pena guardar um hábito particular para execução futura. Com o tempo, o circuito gatilho-rotina-re-compensa-gatilho-rotina-recompensa torna-se mecânico.

Duhigg revela que as pessoas que identificam gatilhos simples e recom-pensas claras podem estabelecer há-bitos de treinamento mais consistentes. Por exemplo, se você não quer faltar à academia pela manhã, deve escolher um gatilho óbvio, como calçar os tênis antes do café ou deixar a roupa de gi-nástica perto da cama toda noite. O prê-mio será a satisfação pela tarefa cum-prida em seu plano de vida saudável. Depois de um tempo, seu cérebro se antecipará à recompensa e emitirá um impulso que fará com que não queira mais faltar à academia.

Se o que você quer é eliminar maus hábitos, o segredo é modificar um componente do circuito por vez. �Para mudar uma rotina, é preciso manter o velho gatilho e substituir o com-portamento por algo cujo prêmio seja também uma velha recompensa. Não tente mudar tudo de uma vez�, alerta o pesquisador.

Você não consegue deixar de fumar toda tarde à mesma hora? Que dese- jo o gatilho (o momento do dia) e a re-

compensa satisfazem? Talvez não seja a vontade de fumar, mas de socializar. Substitua o cigarro por um bate-papo com os colegas e veja se surte efeito. Se praticar com frequência, é provável que chegue lá.

Reportagem de Florencia Lafuente

DeSFAzeR-Se De COMPORTAMeNTOS iMPRODuTiVOS exige TRANSFeRiR AçõeS iNCONSCieNTeS PARA O TeRReNO DA TOMADA De DeCiSõeS, SeguNDO O AuTOR CHARLeS DuHigg

autoDeseNVolVImeNto

assuntopessoal

Livre-se dohábito ruim

Hsm management

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Sydney Finkelstein, professor de ges tão da Tuck School of Business, do Dart­mouth College, Estados Unidos, estuda, há 12 anos, os deslizes que acabam com a carreira de líderes renomados e disso fez o livro Por Que Executivos Inteligentes Falham (ed. M.Books). Mesmo sabendo que um erro geralmente não é responsa­bilidade de uma única pessoa, e que re­flete ainda o contexto e as circunstâncias em que tomou suas decisões, vale repas­sar cinco erros que o estudioso apontou em 2011 para aprender com eles.

Leo Apotheker. Decidiu vender o ne­gócio de computadores pessoais da empresa e se arrependeu; recuou quanto ao lançamento de um tablet para concorrer com o iPad. Em me­nos de 11 meses, a HP perdeu mais

de US$ 30 bilhões em valor de ações e demitiu muita gente.

John Corzine. O ex­número um do ban­co Goldman Sachs e ex­governador de Nova Jersey assumiu o comando da MF Global para transformá­la em uma corretora que desafiasse e superasse os riscos, mas os riscos que assumiu foram enormes, como se Corzine fos­se um “caubói das finanças”, conforme Finkelstein. Em outubro de 2011, a em­presa entrou em concordata e Corzine ainda conseguiu explicar o desapareci­mento de US$ 1,2 bilhão.

Reed Hastings. A Netflix deixou de ofe­ recer aluguel de filmes e de operar ape­nas nos EUA para ser um serviço de vídeo online e expandir­se para outros

países, o Brasil incluído. O CEO decidiu aumentar os preços do serviço tradicio­nal e separar, no site, o negócio de alu­guel de filmes da divisão de streaming [forma de distribuição multimídia], e a manobra de expansão, mal comunicada, despertou a fúria dos clientes.

William Weldon. A Johnson & Johnson teve de retirar uma quantidade enorme de produtos do mercado em 2011 por problemas de qualidade e segurança.Para uma multinacional de renome, que fabrica de equipamentos médicos a xam­pu para bebês, isso é imperdoável. “Pou­co se falou sobre isso, porque Weldon é um líder tipo Teflon”, diz Finkelstein.

Mike Lazaridis e Jim Balsillie. A empre­sa canadense faz um dos smart phones mais populares do mundo, o Black­berry, e seus líderes permitiram que concorrentes como a Apple, fabricante do iPhone, e o Google, programador do sistema operacional Android, abo­canhassem parte de seu negócio, por incapacidade de adaptar seu produto aos novos desafios do mercado, se­gundo Finkelstein. Como resultado, as ações da RIM perderam 70% de seu valor em 2011. O fato de ser lide­rada por duas pessoas só gerou mais confusão em torno da companhia. A estrutura de codireção é quase uma garantia de fracasso, segundo o espe­cialista da Tuck School.

Reportagem de Florencia Lafuente

CARREIRA

O PESQUISADOR SyDNEy FINkELSTEIN ESTUDOU ERROS DE CEOS QUE DEvEM SER EvITADOS

NÃO FAÇA O QUE ElEs FAzEm

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É mais fácil culpar os CEOs e falar sobre o que deveria ter sido feito depois que tudo desmorona do que expor as falhas a tempo de evitar o desastre. É o que afirma o pesquisador Paul Schoemaker, da Wharton School, que dirige lá o programa “Executive Education’s Critical Thinking: Real-World, Real-Time Decisions”. Essas falhas, que Schoemaker define como “cenários tabus”, são os sinais de catástrofes que seriam evitadas se recebessem a atenção organizacional, mas calar-se a respeito deles serve para manter a harmonia. Por que os funcionários se calam? Porque duvidam da própria capacidade de compreender um problema por completo, segundo Kristin Smith-Crowe, professora de gestão da David Eccles School of Business, da University of Utah, ou porque na empresa onde trabalham costuma-se “matar o mensageiro” das más notícias, especialmente se o problema envolve líderes. Com frequência, o funcionário tenta se eximir da culpa procurando ficar distante das consequências morais de seu comportamento. Também há os que decidem falar e cometem dois erros usuais: culpam ou julgam, o que aumenta o estresse, ou usam uma linguagem ambígua, dando subsídios para que os outros coloquem o problema de lado. Os antídotos? Transparência, diversidade cultural e incentivo para que todos tracem cenários tabus.

dá pArA EvitAr O pior a tempo?

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Da esquerda para a direita: Leo Apotheker (ex-CEO da HP), John Corzine (ex-MF Global), Reed Hasting (atual Netflix), William Weldon (ex-Johnson & Johnson), Mike Lazaridis e Jim Balsillie (ex-codiretores da RIM)

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Assuntopessoal

Durante 14 anos, Terry Leahy foi CEO da Tesco, tornando-a a maior rede de super-mercados do Reino Unido. Nesse livro, o admirado líder aponta as dez qualidades vitais dos gestores de sucesso e aborda, de modo pessoal, provocativo, realista e, sobretudo, muito prático, os desafios que os executivos enfrentam.

Uma de cada três pessoas que conhecemos é introvertida: prefere escutar a falar, trabalhar sozinha a discutir em equipe. A esses “silencio-sos” devemos desde Os Girassóis, de Van Gogh, até a invenção do microcomputador. O livro de Cain apresenta introvertidos de sucesso e nos convida a valorizar seu potencial de liderança e a mudar nossa visão sobre eles.

Terry leahyCrown Business, junho de 2012

Baseado em um premiado artigo com o mes-mo nome, publicado na Harvard Business Review, Christensen, professor da Harvard Business School e “guru” em inovação, pro-põe, com Allworth e Dillon, pensar no que é verdadeiramente importante em nossa vida para além dos negócios e em como nos man-ter fiéis a nossas metas e valores.

A distância entre as economias ricas e as emergentes está diminuindo. Com isso, a dinâmica global da inovação apresenta mudanças: a inovação flui não apenas dos países desenvolvidos para os que estão em desenvolvimen-to, mas também no sentido contrário. Reverse Innovation explica onde, quan-do e por que a inovação reversa continua aumentando, assim como suas profun-das consequências para as nações, as empresas e os indivíduos.

As credenciais dos autores motivam a leitura: Govindarajan é professor de comércio internacional da Tuck School of Business, do Dartmouth College, Es-tados Unidos, e o primeiro professor re-sidente e consultor-chefe em inovação da General Electric, além de ocupar o

terceiro lugar no último Thinkers 50, o ranking dos maiores pensadores da ges-tão mundial; Trimble, também profes-sor da Tuck, é palestrante de sucesso e consultor de inovação. Ambos focam um ponto tradicional da economia do mundo desenvolvido: as poderosas e bem esta-belecidas corporações multinacionais.

UMa MUDaNÇa De sIsTeMaNão faz muito tempo, grande parte dos negócios nos Estados Unidos e em ou-tras nações desenvolvidas estava cen-trada na exportação dos produtos mais populares em seus mercados domésti-cos. Tal abordagem tende a não render bons resultados, especialmente porque há um abismo entre as necessidades dos países ricos e as dos pobres, e, se-

gundo os autores, o sucesso das empre-sas dependerá da capacidade de enten-der essas diferenças.

Reverse Innovation conta como os lí-deres e gestores seniores inovam nos mercados emergentes e de que manei-ra essas inovações podem desencadear oportunidades no mundo todo. O livro lança luz sobre os desafios e os triun-fos de algumas das companhias líderes mundiais (GE, Deere & Company, P&G e PepsiCo, entre outras) e mostra em deta-lhe o que funciona e o que não.

A verdade é que o futuro está longe de casa para essas empresas. Todos das matrizes devem saber que a inovação reversa é um fenômeno que precisa ser compreendido com urgência. Esse livro certamente ajuda na empreitada.

O NOVO fLUxO DE mIGRAçãO DA INOVAçãO, DOS PAíSES EmERGENTES PARA O RESTANTE DO GLOBO, é O TEmA ABORDADO POR VIjAy GOVINDARAjAN E CHRIS TRImBLE Em REVERSE INNOVATION

InovAção é AquI?

leITUra

oUTras NoVIDaDes

sUsaN CaINAgir, maio de 2012

ClayToN M. ChrIsTeNseN, JaMes allworTh, KareN DIlloNHarperBusiness, maio de 2012

VIjAy GOVINDARAjAN E CHRIS TRImBLE

HARVARD BUSINESS REVIEw PRESS, ABRIL 2012

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Tão proeminente quanto polêmico, Oliver Cromwell teve participação crucial na derrota do regime autoritário do rei Carlos I da Inglaterra e na consequente instauração da república. Imbuído de propósito místico e providencialista, produto do ambiente protestante e profundamente antica-tólico em que fora criado, foi implacável com inimigos e chegou a concentrar mais poder que o próprio soberano.

Oriundo de Huntingdon, no sudeste da Inglaterra, foi elei-to membro da Câmara dos Comuns em 1628 e criticou a tolerância da Igreja Anglicana em relação às práticas ca-tólicas. No ano seguinte, Carlos I dissolveu o parlamento e impôs uma política absolutista que privilegiava a aristocra-cia em prejuízo da nascente burguesia. Em 1640, quando o rei se viu obrigado a reinstituir o parlamento, Cromwell mostrou-se defensor ferrenho do puritanismo e condenou a arbitrariedade das medidas do monarca.

Dois anos mais tarde, as diferenças entre o parlamento, dominado pelos puritanos, e o rei, tendente à tirania, de-sencadearam uma cruel guerra civil. Cromwell, prático e dotado de grande talento militar, apesar de inexperiente, em pouco tempo conseguiu converter-se em general do New Model Army, o exército a serviço da causa parlamen-tarista. As vitórias que obteve foram cruciais para a derrota das forças reais e, somadas a sua capacidade instintiva de liderança, conferiram-lhe muito prestígio em uma épo-ca em que o sucesso no campo de batalha anunciava uma próspera carreira política.

Cromwell também teve papel decisivo no julgamento e na execução de Carlos I, em 1649, e no processo político que se seguiu à morte do rei. A monarquia foi extinta e a república, proclamada, sob a forma de Commonwealth (Comunidade Britânica de Nações), que incorporou a Irlanda e a Escócia por meio de uma terrível matança. Nomeado presidente do conselho de Estado em 1653, Cromwell dissolveu o parla-mento para instalar o protetorado e, como lorde protetor da Commonwealth, assumiu o poder, com direito até mesmo de nomear seu sucessor.

Ainda que, em 1657, tenha rechaçado a possibilidade de tornar-se rei —um grande dilema para quem tinha sido pe-ça-chave na abolição da monarquia—, aceitou ser reempos-sado em uma cerimônia que se assemelhou a uma coroação.

Personagem envolto em grandes contradições, Cromwell foi, para alguns, o herói da revolução puritana e, para ou-tros, um traidor da causa libertária que se transformou em tirano. Líder forte e com características de estadista, devolveu à Inglaterra, graças a uma enérgica política ex-terior, o status de potência europeia e conquistou respeito internacional. Internamente, fomentou a liberalização do comércio e defendeu mais tolerância religiosa. No entan-

to, não deixou de perseguir grupos católicos e garantiu um governo estável, mas distante dos valores republicanos que havia defendido anteriormente.

Cromwell morreu em 3 de setembro de 1658, aos 59 anos. Seu protetorado personalista não conseguiu sobreviver a sua morte, e a república entrou em um período de caos que culminou com a restauração da monarquia. Os historiado-res concordam com o fato de ele ter sido o dirigente militar e político de mais destaque na Grã-Bretanha de sua época, porém seu valor continua controverso.

Oliver CrOmwell, o rei sem coroa

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LÍDERES

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o que eles dizem

sobreverdade

“Engolimos dE uma vEz a mEntira quE nos adula E bEbEmos gota a gota a vErdadE quE nos amarga.”Denis Diderot (1713-1784), escritor e filósofo francês

“os quE não quErEm sEr vEncidos pEla vErdadE sErão vEncidos pElo Erro.”Santo Agostinho (354-430), bispo e filósofo

“a astúcia tEm muitos vEstidos; a vErdadE gosta dE andar nua.”Thomas Fuller (1610-1661), historiador e religioso inglês

“a vErdadE triunfa sozinha; a mEntira sEmprE prEcisa dE cumplicidadE.”Epíteto (50-135), filósofo grego

“sE você rEalmEntE buscar a vErdadE, é nEcEssário quE ao mEnos uma vEz na vida duvidE dE todas as coisas, do modo mais profundo possívEl.”René Descartes (1596-1650), filósofo e matemático francês

“toda EmprEsa prEcisa dE método, quE é a busca da vErdadE para gErar rEsultados.”Vicente Falconi, professor e consultor brasileiro, seguidor de Descartes e seu livro O Discurso do Método

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