material extra controle de constitucionalidade

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Curso preparatório para as carreiras do Senado Federal Prof. Leo van Holthe Pontos enfrentados neste material : Supremacia da Constituição. Controle de Constitucionalidade. Sistemas de Controle de Constitucionalidade. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Ação Declaratória de Constitucionalidade. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Técnicas de decisão judicial em controle de constitucionalidade. Controle de constitucionalidade estadual. 1. Controle de constitucionalidade 1.1. Supremacia da Constituição e Controle de constitucionalidade O controle de constitucionalidade consiste na fiscalização da compatibilidade de uma lei ou ato normativo do Poder Público com as normas da Constituição. A existência de um mecanismo de controle de constitucionalidade das leis e atos do Poder Público pressupõe a rigidez e a supremacia constitucionais, considerando que a supremacia da Constituição é uma consequência direta da rigidez constitucional 1 . Nesse ponto, ressaltamos que a doutrina reconhece dois tipos de supremacia constitucional: a material e a formal. Enquanto a supremacia material relaciona-se, de um ponto de vista sociológico, apenas a uma maior importância da Constituição por tratar das “normas fundamentais do Estado”, a supremacia formal refere-se, de um ponto de vista jurídico, à hierarquia das normas constitucionais perante o resto do ordenamento jurídico. A supremacia formal ou jurídica depende do conceito de rigidez constitucional (só existe nas constituições rígidas), enquanto que a supremacia material existe até nas constituições flexíveis e históricas. 1 Isso é porque a rigidez, ao conceber um procedimento mais solene e dificultoso para a modificação da Constituição, acaba protegendo o texto constitucional da legislação ordinária, tornando-o hierarquicamente superior e conferindo-lhe a supremacia no sentido formal ou jurídico. O princípio da rigidez constitucional é também conhecido como princípio da “imutabilidade relativa” ou da estabilidade constitucional.

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Page 1: Material Extra Controle de Constitucionalidade

Curso preparatório para as carreiras do Senado Federal

Prof. Leo van Holthe

Pontos enfrentados neste material: Supremacia da Constituição. Controle de Constitucionalidade. Sistemas de Controle de Constitucionalidade. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Ação Declaratória de Constitucionalidade. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Técnicas de decisão judicial em controle de constitucionalidade. Controle de constitucionalidade estadual.

1. Controle de constitucionalidade

1.1. Supremacia da Constituição e Controle de constitucionalidade

O controle de constitucionalidade consiste na fiscalização da compatibilidade de uma lei ou ato normativo do Poder Público com as normas da Constituição.

A existência de um mecanismo de controle de constitucionalidade das leis e atos do Poder Público pressupõe a rigidez e a supremacia constitucionais, considerando que a supremacia da Constituição é uma consequência direta da rigidez constitucional1.

Nesse ponto, ressaltamos que a doutrina reconhece dois tipos de supremacia constitucional: a material e a formal. Enquanto a supremacia material relaciona-se, de um ponto de vista sociológico, apenas a uma maior importância da Constituição por tratar das “normas fundamentais do Estado”, a supremacia formal refere-se, de um ponto de vista jurídico, à hierarquia das normas constitucionais perante o resto do ordenamento jurídico.

A supremacia formal ou jurídica depende do conceito de rigidez constitucional (só existe nas constituições rígidas), enquanto que a supremacia material existe até nas constituições flexíveis e históricas.

Daí que o controle de constitucionalidade pressupõe a rigidez e a supremacia jurídica da Constituição, sendo próprio das constituições rígidas, e não das flexíveis.

Quando falamos em controle de constitucionalidade, devemos ter em mente os dois fatores principais que despontam nesse processo: o parâmetro e o objeto do controle.

Parâmetro, cânon ou paradigma constitucional consiste na norma ou conjunto de normas da Constituição que se toma como referência para a declaração de inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo do Poder Público.

Nesse ponto, é de suma importância saber que todos os dispositivos constitucionais – do art.1.º ao art. 250 e as normas do ADCT – servem como parâmetro para a aferição da constitucionalidade dos atos normativos.

Já o preâmbulo, segundo a melhor doutrina, não poder ser parâmetro para a declaração de inconstitucionalidade das leis, por ser desprovido de valor normativo. Para a doutrina majoritária, o preâmbulo não é norma da CF/88, possuindo apenas um valor interpretativo e integrativo.

O objeto do controle será a lei ou ato normativo do Poder Público que sofre o controle de constitucionalidade, podendo ser um ato federal, estadual, distrital ou

1 Isso é porque a rigidez, ao conceber um procedimento mais solene e dificultoso para a modificação da Constituição, acaba protegendo o texto constitucional da legislação ordinária, tornando-o hierarquicamente superior e conferindo-lhe a supremacia no sentido formal ou jurídico. O princípio da rigidez constitucional é também conhecido como princípio da “imutabilidade relativa” ou da estabilidade constitucional.

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municipal, desde que ofenda diretamente a Constituição Federal e seja editado posteriormente a 19882.

1.2. Espécies de inconstitucionalidade

- Inconstitucionalidade material (o conteúdo da lei ou ato normativo é incompatível com o conteúdo da Constituição) versus Inconstitucionalidade formal (as regras de processo legislativo previstas na Constituição Federal não foram observadas na elaboração da lei ou do ato normativo impugnado). Existe uma subespécie de inconstitucionalidade formal, denominada de inconstitucionalidade orgânica, cujo exemplo é o da lei estadual que invade a competência legislativa da União (nesse caso, o órgão que elaborou a norma é incompetente – daí o nome: inconstitucionalidade orgânica).

- Inconstitucionalidade por ação (decorre de um ato positivo do Estado: a elaboração de uma lei incompatível com a Constituição) versus Inconstitucionalidade por omissão (a Constituição exige a edição de ato normativo para o exercício de um direito constitucional e o órgão competente mantém-se inerte)3.

A inconstitucionalidade por omissão pode ser total (ou formal), quando nenhuma providência é adotada pelo administrador ou pelo legislador; ou parcial (ou material), quando a medida efetivada pelo Poder Público é insuficiente.

Não devemos confundir essa classificação com a outra que divide as omissões inconstitucionais em absolutas e relativas.

Na omissão absoluta, entende-se que o poder público tinha o dever de agir e se omitiu (não tomando nenhuma providência — omissão absoluta e total — ou agindo de forma insuficiente — omissão absoluta e parcial).

Na omissão relativa, o poder público não tinha o dever de legislar , mas resolveu atuar, surgindo a omissão quando ele concede um benefício a apenas algumas categorias de pessoas em detrimento de outras, com transgressão ao princípio da isonomia. A omissão relativa, portanto, relaciona-se com o que a doutrina denomina de benefício incompatível com o princípio da isonomia.

6. Nesses casos de omissão relativa (benefício incompatível com o princípio da isonomia), a doutrina afirma que declarar a nulidade da norma apenas traria um prejuízo para as categorias beneficiadas, não resolvendo o problema das que foram prejudicadas.

O melhor, então, seria utilizar a técnica judicial da declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade, a fim de não retirar o benefício já concedido, apenas apelando ao legislador para que estenda o benefício às demais categorias, em respeito ao princípio da igualdade.

- Inconstitucionalidade direta ou imediata (a lei ou ato normativo viola diretamente a Constituição) versus Inconstitucionalidade indireta ou mediata (a norma infralegal - decreto, resolução, instrução normativa, etc. - viola primeiro a lei a que ela se reporta e, por via oblíqua, reflexa, mediata, a CF/88). Este último tipo de inconstitucionalidade é, em verdade, uma crise de ilegalidade, daí se falar em controle de legalidade, e não em controle de constitucionalidade.

2 A jurisprudência consolidada do STF (vide ADI n.º 2, Rel. Min. Paulo Brossard) considera que os atos do Poder Público anteriores a 1988 não podem sofrer controle de constitucionalidade, pois se submetem ao fenômeno da recepção constitucional. Com isso, os atos anteriores à CF88, se com ela materialmente compatíveis, serão recepcionados pela Carta Magna, permanecendo válidos; os que forem materialmente incompatíveis serão considerados não recepcionados, o que equivale à simples revogação desses atos. 3 A CF/88 trouxe dois mecanismos para combater a inconstitucionalidade por omissão: o mandado de injunção (art.5.º, LXXI) e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão – a ADI por omissão (art.103, §2.º).

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- Inconstitucionalidade originária (o Poder Público produz uma norma incompatível com a Constituição já em vigor, fazendo com que o ato seja inconstitucional desde a sua origem) versus Inconstitucionalidade superveniente (a norma nasce constitucional, mas torna-se incompatível com a Carta Magna supervenientemente, seja pelo surgimento de uma nova Constituição, seja em virtude de reforma no texto constitucional).

1.3. Sistemas de controle de constitucionalidade

a) Controle Político - o controle é exercido por órgãos de natureza política, distintos do Poder Judiciário - podendo ser um órgão do Legislativo, do Executivo ou, ainda, um órgão especial. É o sistema adotado na França;

b) Controle Jurisdicional - o controle é feito por órgãos do Poder Judiciário. É o sistema adotado nos EUA e, como regra, o adotado no Brasil.

c) Controle Misto - certas categorias de lei são submetidas ao controle político e outras ao controle jurisdicional. É o sistema adotado na Suíça.

1.4. Tipos de controle

a) Quanto ao momento:

- Controle Preventivo - a priori - controle realizado antes de a norma ser definitivamente elaborada.

- Controle Sucessivo, Repressivo - a posteriori- é o controle feito após a norma ser definitivamente elaborada.

b) quanto aos órgãos competentes:

- Controle Difuso ou Aberto - o controle é exercido por vários órgãos - no Brasil, exercido por qualquer juiz ou tribunal;

- Controle Concentrado ou Fechado - o controle é feito por um único órgão ou por poucos órgãos competentes. No Brasil, o controle concentrado é realizado pelo STF quanto à Constituição Federal e pelos Tribunais de Justiça quanto às Constituições Estaduais.

c) quanto à via utilizada:

- Controle por via de exceção ou de defesa, incidental, incidenter tantum - controle concreto - no controle por via de exceção, a inconstitucionalidade da lei é arguida incidentalmente, no curso de um processo judicial onde estão sendo discutidos direitos subjetivos.

O controle incidental é realizado diante de uma lide, de uma situação concreta, sendo a questão da inconstitucionalidade prejudicial4 ao julgamento do mérito da causa e produzindo efeito somente entre as partes5.

- Controle por via de ação direta, via principal - controle abstrato, em tese - no controle por via de ação, determinadas autoridades públicas ou entidades (ex.: Presidente da República e Conselho Federal da OAB) podem ajuizar uma ação autônoma (ADI, ADC, ADI por omissão, ADPF) cujo objetivo principal é a declaração da inconstitucionalidade da lei, sem levar em conta qualquer caso concreto, com o efeito de declarar a nulidade da norma, retirando-a definitivamente do ordenamento jurídico.

4 Decisão de mérito de que depende o julgamento da causa.5 No controle concreto de constitucionalidade, o pedido principal da causa é um bem da vida (liberdade, propriedade, etc), enquanto a declaração da inconstitucionalidade da lei apresenta-se como prejudicial ao julgamento da causa, tendo como único efeito a invalidação da lei para aquele caso concreto, sem retirá-la do ordenamento jurídico.

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Nesse tipo de controle, a fiscalização da constitucionalidade dos atos normativos é feita “em tese”, sem haver uma lide ou discussão de quaisquer situações individuais subjetivas.

1.5. Controle de constitucionalidade no Brasil

No Brasil, o controle preventivo é eminentemente político, realizado por órgãos políticos, seja pelo Poder Legislativo, seja pelo Executivo.

Exemplos: exame da constitucionalidade de um projeto de lei pelas Comissões de Constituição e Justiça (CCJs) da Câmara e do Senado e o veto do Presidente da República, quando se baseia na inconstitucionalidade da norma (veto jurídico)6.

Excepcionalmente, o controle preventivo poderá ser realizado pelo Poder Judiciário. Nesse sentido, o STF admite a impetração de mandado de segurança por parlamentar durante a elaboração de uma lei ou emenda constitucional, quando o processo de elaboração da norma violar o “devido processo legislativo” - arts. 59 a 69 da CF/88.

O controle repressivo brasileiro, por sua vez, é predominantemente jurisdicional, combinando-se o modelo norte-americano ou difuso-incidental com o modelo europeu ou concentrado-principal (a serem posteriormente estudados). Por esse motivo, a doutrina afirma que o Brasil adotou, como regra, o controle repressivo jurisdicional “misto”7.

Ocorre que, excepcionalmente, o controle repressivo pode ser realizado por órgãos políticos. Exemplos: CF, art.62 (medida provisória) e art. 49, V, da CF (o Congresso Nacional pode sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa).

1.6. Histórico

O controle de constitucionalidade surge no Brasil a partir da Constituição de 1891 com um controle difuso ou aberto (realizado por qualquer juiz ou tribunal) e incidental (arguido como questão prejudicial em um caso concreto), inspirado no modelo norte-americano.

A Constituição de 1934, mantendo o modelo difuso e incidental, introduziu a cláusula de reserva de plenário, a competência do Senado Federal para suspender a execução, no todo ou em parte, de lei ou ato declarado inconstitucional pelo Poder Judiciário e a representação interventiva (ADI Interventiva).

A Constituição outorgada de 1937 manteve basicamente o modelo de controle de constitucionalidade instaurado no Brasil desde 1891. Como grande inovação, estabeleceu um odioso mecanismo de limitação da autoridade das decisões do Poder Judiciário ao prever, no seu art.96, parágrafo único, que:

no caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou à defesa de interesse nacional de alta monta, poderá o Presidente submete-la novamente ao exame do Parlamento; se este a confirmar por dois terços de votos de cada uma das Câmaras, ficará sem efeito a decisão do Tribunal.

6 O Presidente da República, nos termos do art.66, §1.º da CF, pode vetar um projeto de lei por considerá-lo contrário ao interesse público (veto político) ou por considerá-lo inconstitucional (veto jurídico), quando, então, estará realizando controle preventivo de constitucionalidade. 7 O sistema de controle de constitucionalidade adotado como regra pelo Brasil foi o jurisdicional e não o misto (combinação do jurisdicional com o político). O que a doutrina afirma é que pelo fato de o Brasil adotar o controle jurisdicional, combinando os modelos norte-americano (difuso-concreto-incidental) e o europeu (concentrado-abstrato-direto), o nosso sistema seria o jurisdicional misto.

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A Constituição de 1946, mais precisamente a Emenda Constitucional nº16/65, introduz no Brasil o controle abstrato de constitucionalidade das leis ao criar a “representação de inconstitucionalidade genérica” (equivalente à atual ADI genérica), cuja legitimidade ativa foi conferida com exclusividade ao Procurador-Geral da República e sujeita à competência originária do STF.

A partir da Constituição de 1988, o modelo abstrato/concentrado de controle de constitucionalidade passa a ser predominante no Brasil, principalmente com o reforço da ADI genérica e a criação da ADC - ação declaratória de constitucionalidade - pela emenda constitucional nº03/93. São inovações trazidas pela CF/88:

a) Ampliação da legitimidade ativa para a propositura da ADI genérica, nos termos do art103, I a IX.

b) Criação da ADI por omissão e do mandado de injunção.

c) Previsão de citação do Advogado-Geral da União para defender a lei ou o ato normativo impugnado e da manifestação do PGR para atuar como defensor da Constituição nas ADIs genéricas, assim como em todos os processos de competência do STF.

d) Criação da ação declaratória de constitucionalidade (ADC) pela EC n.º03/93.

e) Criação da arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), outro instrumento de controle abstrato das normas, regulamentado pela Lei n.º 9.882/99.

1.7. Controle jurisdicional difuso ou aberto (e concreto)

O controle difuso ou aberto (também conhecido como: controle incidental, incidenter tantum, por via de exceção, por via de defesa, indireto, ou, ainda, controle concreto) surge, e com ele a teoria do controle de constitucionalidade, em 1803 na Suprema Corte norte-americana, no célebre caso Marbury x Madison.

Como visto, este controle caracteriza-se por ser exercido por qualquer juiz ou tribunal no caso concreto, quando uma das partes, em um determinado processo individual, argúi a inconstitucionalidade de uma lei incidentalmente, por via de exceção.

No controle difuso, a declaração de inconstitucionalidade não é o objeto principal da ação. A questão da inconstitucionalidade surge quando uma das partes alega como “causa de pedir” ou como argumento de defesa a incompatibilidade de uma lei ou ato normativo com o texto da Lei Maior.

A questão da inconstitucionalidade nesse tipo de controle pode ser alegada por qualquer das partes, pelo Ministério Público, ou ainda, pode ser conhecida pelo juiz ou tribunal de ofício, uma vez que o Judiciário tem a obrigação de zelar pelo cumprimento da Constituição, sendo essa verdadeira matéria de ordem pública (que são exatamente as questões que podem ser conhecidas pelo juiz independentemente de alegação das partes).

O controle difuso pode ser realizado em qualquer espécie de ação (ação ordinária, ação de alimentos, reclamação trabalhista, habeas corpus, mandado de segurança etc.)8.

Os efeitos do controle de constitucionalidade difuso ou aberto são, via de regra:

a) EX-TUNC: retroagem à data da publicação da lei; e

8 O STF já pacificou o entendimento pelo qual a ação civil pública pode ser utilizada como mecanismo de controle difuso de constitucionalidade, apesar dos seus efeitos “erga omnes”, bastando que a declaração de inconstitucionalidade da lei seja arguida incidentalmente, como fundamento do direito difuso, coletivo ou individual homogêneo que se quer proteger.

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b) INTER PARTES: produz efeitos somente entre as partes, fazendo com que a lei deixe de ser aplicada apenas no processo em que foi julgada.

Ocorre que nos termos do art.52, inciso X, o Senado Federal pode: “suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do STF”.

Isso significa que o Senado Federal pode ampliar os efeitos da declaração incidental de inconstitucionalidade, desde que a decisão tenha sido proferida pelo STF, tornando-os “ERGA OMNES” e “EX NUNC”.

Assim, o Senado Federal, ao “suspender a execução” da lei impugnada, estará concedendo eficácia geral - erga omnes - a uma decisão até então restrita às partes do processo, fazendo com que a lei perca sua eficácia em relação a todos os cidadãos, não podendo mais ser aplicada.

Sobre a ampliação dos efeitos do controle difuso pelo Senado Federal, algumas observações:

1) A doutrina majoritária entende ser um poder discricionário do Senado Federal ampliar ou não os efeitos da declaração de inconstitucionalidade proferida pelo STF em sede de controle incidental.

2) O art.52, inciso X, somente se aplica para as declarações de inconstitucionalidade proferidas pelo STF no controle difuso, posto que, no controle concentrado (exemplo: ADI genérica), as declarações de inconstitucionalidade já produzem efeitos contra todos.

3) Considera-se que a decisão do Senado Federal é irreversível.

4) Para a doutrina majoritária (José Afonso da Silva e Alexandre de Moraes), a resolução do Senado Federal produz efeitos “ex nunc” (isto é, a partir da publicação dessa resolução, a lei declarada inconstitucional pelo STF num caso concreto fica com a sua eficácia suspensa).

Ocorre que, no âmbito da Administração Pública federal direta e indireta e por força do Decreto presidencial n.o 2.346/97 (art. 1.º), a resolução do Senado Federal produzirá efeitos “EX TUNC”, retroagindo até a data de entrada em vigor da norma declarada inconstitucional.

1.7.1. Cláusula de reserva de plenário

O art. 97 da CF/88 dispõe que os tribunais somente poderão declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo pelo voto da MAIORIA ABSOLUTA de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial.

Assim, quando a inconstitucionalidade de uma lei for arguida em sede de tribunais por uma das partes do processo, os juízes do órgão fracionário (câmara ou turma recursal) a que competir o julgamento da causa, terão duas opções:

1ª) se rejeitarem a alegação de inconstitucionalidade, prosseguirão com o julgamento do processo (notem que a cláusula de reserva de plenário só se aplica à declaração de inconstitucionalidade da lei, podendo o órgão fracionário do Tribunal declarar a sua constitucionalidade);

2ª) se acolherem a alegação de inconstitucionalidade, será lavrado acórdão a fim de que o incidente de inconstitucionalidade seja submetido ao tribunal pleno ou órgão especial que lhe faça as vezes, nos termos do art. 93, inciso XI (art.481, caput, do Código de Processo Civil).

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Ocorre que o art. 481, parágrafo único, do CPC trouxe duas importantes exceções para a cláusula de reserva de plenário. Prescreve o referido dispositivo legal que os órgãos fracionários dos tribunais não precisam submeter a arguição de inconstitucionalidade ao plenário, ou ao órgão especial, quando já houver:

a) pronunciamento anterior do plenário ou do órgão especial do mesmo tribunal sobre a matéria; ou

b) pronunciamento anterior do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão.

Concluindo, podemos afirmar que a cláusula de reserva de plenário somente se aplica quando os juízes do Tribunal decidem pela inconstitucionalidade da lei impugnada e, mesmo assim, desde que não haja um pronunciamento anterior do plenário ou do órgão especial do próprio tribunal ou do STF, hipóteses em que o órgão fracionário pode valer-se desta decisão anterior para, ele próprio, declarar a inconstitucionalidade da norma sem necessidade de remessa para o órgão máximo do seu Tribunal.

1.8. Controle jurisdicional concentrado e abstrato

O controle concentrado é aquele realizado exclusivamente pelo órgão de cúpula do Judiciário: o STF quanto à Constituição Federal e os Tribunais de Justiça quanto às Constituições Estaduais.

Por meio do ajuizamento de ações específicas, o controle concentrado busca a discussão “em tese” (controle abstrato) da compatibilidade de um ato normativo com a Lei Maior, sem levar em conta qualquer situação subjetiva individual.

Nesse sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que o controle abstrato faz instaurar um processo objetivo, sem partes, no qual inexiste um litígio, uma lide, referente a situações concretas ou individuais, apensa busca-se a harmonia do ordenamento constitucional e a defesa da ordem jurídica.

No controle concentrado, a declaração de inconstitucionalidade da lei, em regra, tem efeitos “ERGA OMNES” (contra todos), VINCULANTES (para os demais órgãos do Poder Judiciário e para a Administração Pública Direta e Indireta federal, estadual e municipal), além de retirar a norma do ordenamento jurídico com efeitos “EX TUNC” (retroativos).

O controle de constitucionalidade concentrado no STF é realizado mediante as seguintes ações:

a) ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) Genérica (CF, art.102, I, “a” e Lei 9.868/99);

b) ADI Interventiva (CF, arts. 34, VII e 36, III);

c) ADI por Omissão (CF, art.103, §2.°);

d) ADC ou ADECon - Ação Declaratória de Constitucionalidade (CF, art.102, I, “a” e Lei 9.868/99);

e) ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (CF, art.102, §1.° e Lei 9.882/99).

1.8.1. ADI Genérica

A ADI genérica é a ação típica do controle de constitucionalidade abstrato no Brasil. Sendo um controle abstrato, a ADI aprecia a constitucionalidade de uma lei ou ato normativo “em tese”, sem discutir casos concretos ou direitos subjetivos, com a

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exclusiva finalidade de garantir a harmonia do ordenamento jurídico e proteger o sistema constitucional.

Competência – a ADI em face da Constituição Federal só pode ser proposta perante o STF.

Objeto – pode ser objeto da ADI genérica uma lei ou ato normativo do poder público federal ou estadual (ou distrital no uso de competência estadual).

Caso uma lei municipal viole a Constituição Federal, tal inconstitucionalidade poderá ser declarada no âmbito do controle difuso, que pode chegar até o STF por Recurso Extraordinário; ou, ainda, no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), a ser posteriormente estudada.

Além de ser oriundo do poder público federal ou estadual (ou distrital), a jurisprudência do STF estabeleceu alguns requisitos que devem ser atendidos cumulativamente a fim de que a lei ou o ato normativo possa ser objeto de ADI. São eles:

1) a lei ou ato normativo deve ter emanado do Poder Público;

2) a lei ou ato normativo deve ser posterior à Constituição de 1988;

3) a lei ou ato normativo deve ser geral, abstrato e impessoal;

4) a lei ou ato normativo deve ofender diretamente a Constituição;

5) a lei ou ato normativo deve estar em pleno vigor.

A partir do cumprimento desses requisitos, a jurisprudência do STF entende que cabe ADI para impugnar, dentre outros:

a) emendas constitucionais;

b) normas das Constituições Estaduais;

c) tratados internacionais (inclusive os de direitos humanos);

d) decretos e regulamentos autônomos;

e) medidas provisórias;

f) regimentos dos tribunais;

g) atos administrativos dotados de abstração, generalidade e impessoalidade (pareceres normativos do Poder Executivo, resoluções administrativas dos tribunais, etc.).

Em sentido contrário, a jurisprudência do STF entende que não pode ser objeto de ADI, dentre outros:

a) normas constitucionais originárias (pelo princípio da unidade da Constituição, não existem “normas constitucionais inconstitucionais” na Constituição originária, devendo as “aparentes contradições” serem harmonizadas e interpretadas sistematicamente);

b) leis ou atos normativos anteriores à CF/88 – não são inconstitucionais, mas sim revogados pela CF/88;

c) leis e atos de efeitos individuais e concretos (exemplos: lei que autoriza a instituição

de sociedade de economia mista, lei que cria dotações orçamentárias etc.);

d) decretos regulamentares e regulamentos executivos (ofendem a Constituição apenas de maneira indireta);

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e) súmulas dos tribunais, por não apresentarem características de ato normativo;

f) sentenças coletivas ou convenções coletivas de trabalho.

Legitimidade - possuem legitimidade para propor a ADI: Presidente da República, Mesa do Senado Federal, Mesa da Câmara dos Deputados, Mesa da Assembléia Legislativa (ou da Câmara Legislativa do DF), Governador de Estado (ou do DF), o Procurador-Geral da República, Partido Político com representação no Congresso Nacional, Confederação Sindical ou Entidade de Classe de âmbito nacional, Conselho Federal da OAB.

Apesar de a Constituição não ter feito qualquer distinção entre os legitimados ativos, a jurisprudência do STF passou a exigir de alguns legitimados a demonstração de um vínculo entre a matéria impugnada na lei e as suas finalidades institucionais específicas, a que se deu o nome de “pertinência temática”. A partir disso, o STF passou a reconhecer dois tipos de legitimados:

a) os legitimados neutros ou universais – que não precisam provar a sua pertinência temática, podendo ajuizar ADI sobre quaisquer leis ou atos normativos, independentemente do seu conteúdo. São eles: o Presidente da República, Mesas do senado Federal e da Câmara dos Deputados, Procurador-Geral da República, Conselho Federal da OAB e partido político com representação no Congresso Nacional.

b) os legitimados interessados ou especiais – que devem demonstrar a existência de um vínculo entre a matéria impugnada na lei e as suas finalidades institucionais específicas. São eles: o Governador de Estado (e do DF), mesa da Assembléia Legislativa (e da Câmara Legislativa do DF), Confederação Sindical e Entidade de Classe de âmbito nacional.

Pedido de desistência - não há possibilidade de pedido de desistência de ADI, quem quer que seja o autor da ação, em respeito ao princípio da indisponibilidade da instância.

Caráter dúplice - a ADI possui caráter dúplice ou ambivalente, ou seja, se julgada improcedente, se transforma numa ADC (ação declaratória de constitucionalidade), com todos os seus efeitos, nos termos do art.24 da Lei n.º 9.868/99.

Prescrição e decadência - a propositura de ADI não se sujeita à prescrição ou decadência, pois as inconstitucionalidades nunca se convalidam.

Julgamento da ADI - o julgamento da ADI será realizado pelo plenário do STF e necessita do voto da maioria absoluta de seus membros - art. 97 da CF/88. Para ser instaurada a sessão, é necessário um quorum de 2/3 dos Ministros do STF (8 ministros).

Efeitos - a decisão definitiva de mérito da ADI possui, via de regra, efeitos:

1) “ERGA OMNES” - as decisões em sede de ADI não se restringem às partes do processo, possuindo eficácia geral, contra todos. A declaração de inconstitucionalidade na ADI resulta na retirada da norma impugnada do ordenamento jurídico, tendo essa decisão eficácia geral;

2) “EX TUNC” - diante do princípio da nulidade das normas inconstitucionais9, as decisões em ADI declaram a inconstitucionalidade das leis com efeitos retroativos, a fim de retirá-la do ordenamento jurídico desde o seu início.

9 A declaração de inconstitucionalidade de uma lei representa a declaração de sua nulidade (não de sua inexistência, anulabilidade ou simples irregularidade).

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Em regra, as decisões definitivas de mérito das ADIs são proferidas com efeitos retroativos. Ocorre que, como veremos adiante, o art.27 da Lei n.o 9.868/99 possibilita a manipulação dos efeitos da ADI pelo Supremo Tribunal Federal, que poderá declarar a inconstitucionalidade da lei com efeitos ex nunc ou até pro futuro;

3) VINCULANTES - as decisões definitivas de mérito das ADIs vinculam os demais órgãos do Poder Judiciário (não o próprio STF) e o Poder Executivo (Administração Pública Direta e Indireta das esferas federal, estadual, distrital e municipal), que devem absoluto respeito ao quanto decidido nesta ação.

A principal consequência do efeito vinculante consiste na possibilidade de qualquer interessado ajuizar uma reclamação no STF (CF, art.102, inciso I, alínea “l”), para exigir o respeito à decisão da Suprema Corte em sede de ADI e, se for o caso, desconstituir o ato do Poder Judiciário ou do Executivo que a desrespeitou.

4) REPRISTINATÓRIOS - com a declaração de inconstitucionalidade de uma lei, ocorre a plena restauração da eficácia da legislação anterior que havia sido revogada pela lei inconstitucional. Como a declaração de inconstitucionalidade resulta na nulidade da lei, são considerados inválidos todos os efeitos que a lei impugnada já produziu no passado, inclusive o efeito de ter revogado a legislação anterior que com ela mostrou-se incompatível.

Manipulação dos efeitos da ADI por parte do STF - Art. 27 da Lei 9.868/99: Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista

razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o STF, por maioria de 2/3 dos seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Com essa possibilidade de manipulação do STF, podemos afirmar que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade de uma ADI são, em regra, erga omnes e ex tunc, pois o STF, mediante o voto de 2/3 dos seus membros e por razões de segurança jurídica, pode restringir a abrangência dessa decisão ou, ainda, conferir-lhe efeitos ex nunc ou pro futuro.

Concessão de liminar - a medida cautelar na ADI, salvo nos período de recesso e de férias, quando poderá ser excepcionalmente concedida pelo Ministro-Presidente do STF ad referendum do Tribunal, será concedida por decisão da maioria absoluta dos seus membros (6 ministros). Para ser instaurada a sessão, é necessário um quorum de 2/3 dos Ministros do STF (8 ministros).

A decisão da medida cautelar da ADI possui, em regra, efeitos ex nunc, erga omnes, vinculantes (para os demais órgãos do Poderes Judiciário e para o Executivo) e repristinatórios.

Nos termos do art.11, §1.º, da Lei n.º 9.868/99, a medida cautelar da ADI, dotada de eficácia contra todos, será concedida com efeitos ex nunc (regra geral), salvo se o Tribunal entender que deva conceder-lhe eficácia retroativa (ex tunc).

Já o art.11, § 2.º, da referida Lei prevê que a concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente (efeitos repristinatórios), salvo expressa manifestação do STF em sentido contrário.

Quadro-resumo:

EFEITOS DAS DECISÕES EM SEDE DE ADI

LIMINAR DEFINITIVA DE MÉRITO

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– EX NUNC, salvo se o STF expressamente conceder eficácia retroativa (ex tunc).

– EX TUNC, salvo o art.27 da Lei nº 9.86899 (eficácia ex nunc ou até pro futuro).

– VINCULANTES para o resto do Poder Judiciário e para o Executivo (Federal, Estadual e Municipal), mas não para o Legislativo.

– VINCULANTES para o resto do Poder Judiciário e para o Executivo (Federal, Estadual e Municipal), mas não para o Legislativo.

– ERGA OMNES. – ERGA OMNES, salvo o art. 27 da Lei n.º 9.86899.

– REPRISTINATÓRIO, salvo expressa manifestação do STF em contrário.

– REPRISTINATÓRIO.

Advogado-Geral da União - dispõe o art.103, §3.º, da CF88: “Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado.”

Entende a doutrina majoritária, com base nesse dispositivo constitucional, que a atuação do AGU é vinculada, devendo o mesmo obrigatoriamente opinar pela constitucionalidade da norma, ainda que seja gritante a violação da Constituição. O AGU atuará tanto na defesa da legislação federal, quanto na defesa da legislação estadual.

Procurador-Geral da República - já o PGR atua na defesa da Constituição, e não da norma impugnada, tendo uma atuação independente que pode resultar em parecer tanto pela constitucionalidade, quanto pela inconstitucionalidade da norma.

Ressalte-se que o PGR deverá ser previamente ouvido não só nas ADIs, como em todos os processos de competência do STF (CF, art.103, §1.º).

Intervenção de terceiros - não se admitirá intervenção de terceiros no processo da ADI (art.7.º da Lei 9.868/99).

Recorribilidade - a decisão que julga a ADI genérica é irrecorrível, salvo embargos declaratórios, não cabendo também ação rescisória (art. 26 da Lei n.º 9.868/99).

1.8.2. Ação declaratória de constitucionalidade (ADC)

Competência - só pode ser proposta perante o STF.

Finalidade - esta ação tem a finalidade de declarar a adequação de uma lei infraconstitucional com a Carta Política, transformando a presunção relativa de constitucionalidade que toda lei possui em presunção absoluta, devido aos seus efeitos vinculantes.

Objeto - somente poderá ser objeto de uma ADC uma lei ou ato normativo do poder público federal, nunca uma lei estadual ou municipal.

Requisito - há necessidade de demonstração de “comprovada controvérsia judicial”. Ou seja, deve estar acontecendo no Brasil um estado de incerteza sobre a constitucionalidade da lei, exigindo-se a comprovação de inúmeras ações em andamento em juízos ou tribunais em que a constitucionalidade da lei esteja sendo impugnada.

Legitimidade - com a EC n.º 45/04 (“Reforma do Judiciário”), a legitimidade da ADC passou a ser a mesma da ADI genérica, ou seja: Presidente da República, Mesa do Senado Federal, Mesa da Câmara dos Deputados, Mesa da Assembléia Legislativa

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(ou da Câmara Legislativa do DF), Governador de Estado (ou do DF), o Procurador-Geral da República, Partido Político com representação no Congresso Nacional, Confederação Sindical ou Entidade de Classe de âmbito nacional e o Conselho Federal da OAB.

Pedido de desistência - não há possibilidade de pedido de desistência, não importando quem seja o autor da ação, em respeito ao princípio da indisponibilidade da instância.

Caráter dúplice - a ADC possui caráter dúplice ou ambivalente, nos mesmos termos da ADI genérica, ou seja, se julgada improcedente, se transforma numa ADI, com todos os seus efeitos.

Julgamento da ADC - o julgamento da ADC, igualmente ao da ADI (Lei nº 9.868/99) será realizado pelo plenário do STF e necessita do voto da maioria absoluta de seus membros (6 ministros). Para ser instaurada a sessão, é necessário um quorum de 2/3 dos Ministros do STF (8 ministros).

Efeitos - a decisão definitiva de mérito da ADC possui efeitos: ex tunc, erga omnes e vinculantes (para os demais órgãos do Poder Judiciário e para a Administração Pública Direta e Indireta federal, estadual e municipal).

Liminar e suspensão de processos - o art. 21 da Lei 9.868/99 traz a possibilidade de concessão de liminar por parte do STF que consistirá na suspensão de todos os processos no Brasil que tratem da matéria cuja constitucionalidade se discute, até o seu julgamento final ou pelo prazo máximo de 180 dias, quando os processos voltarão a ter o seu curso normal.

Entende-se que a decisão da medida cautelar da ADC tem efeitos ex nunc, erga omnes e vinculantes.

Advocacia-Geral da União - a Advocacia-Geral da União não atua na ADC, pois, em verdade, ninguém atuará como defensor da “inconstitucionalidade” da lei ou ato normativo federal.

Procurador-Geral da República - como afirmado anteriormente, o PGR atua em todos os processos de competência do STF, inclusive em ADC. Atuará, como sempre, de maneira independente, podendo se manifestar tanto pela constitucionalidade, quanto pela inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo federal.

Recorribilidade - a decisão que julga a ADC é irrecorrível, salvo embargos declaratórios, não cabendo também ação rescisória.

1.8.3. ADI Interventiva

A ADI interventiva, também denominada de “representação interventiva”, está prevista no art. 36, inciso III, da CF/88, sendo modalidade de controle de constitucionalidade direto e concentrado no STF.

Legitimidade - A propositura da ADI interventiva é exclusiva do Procurador-Geral da República (PGR).

Hipótese de cabimento - quando um ato omissivo ou comissivo, normativo ou concreto, estadual ou distrital ferir um “princípio constitucional sensível” da CF/88 (art.34, inciso VII).

Concessão de liminar - devido à sua natureza, não há possibilidade de concessão de liminar.

Por meio da ADI interventiva, o PGR ajuíza uma ação (representação interventiva) no STF, impugnando um ato estatal ou distrital que venha a violar um dos

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“princípios constitucionais sensíveis”10 da CF/88 (art.34, inciso VII), a fim de que a nossa mais Alta Corte julgue procedente o pedido de intervenção federal e, nos termos do art.36, inciso III, requisite ao Presidente da República a sua decretação, sendo esta uma hipótese de intervenção federal obrigatória e vinculada para o Chefe do Executivo.

1.8.4. ADI por omissão

A ADI por omissão foi introduzida no Direito brasileiro pela CF/88 (juntamente com o mandado de injunção) com o objetivo de dar efetividade às normas constitucionais que dependem de complementação legislativa, combatendo a denominada “síndrome de inefetividade das normas constitucionais”.

Competência - só pode ser proposta perante o STF.

Hipótese de cabimento - a ADI por omissão é cabível quando uma norma constitucional, para ter plena eficácia, precisa ser complementada total ou parcialmente pelo legislador ou pelo administrador e este não cumpre o seu dever constitucional.

Requisito - é requisito da ADI por omissão o “dever constitucional de ação”. Ou seja, a Constituição deve ter condicionado a eficácia de uma norma do seu texto à edição de uma lei ou ato administrativo.

Legitimidade – A mesma da ADI genérica e da ADC (CF, art. 103).

Procedimento – A Lei 12.063/09 introduziu alguns dispositivos na Lei 9.868/99, a fim de regular o procedimento da ADI por omissão, cujos aspectos mais relevantes para concursos, passamos a destacar:

a) Em caso de excepcional urgência e relevância da matéria e por decisão da maioria absoluta de seus membros, desde que presentes na sessão pelo menos 8 ministros, o STF poderá conceder medida cautelar, que poderá consistir na suspensão da aplicação da lei ou do ato normativo questionado, no caso de omissão parcial, bem como na suspensão de processos judiciais ou de procedimentos administrativos, ou ainda em outra providência a ser fixada pelo Tribunal (art. 12-F da Lei 9.868/99).

b) Em caso de omissão imputável a órgão administrativo, as providências deverão ser adotadas no prazo de 30 (trinta) dias, ou em prazo razoável a ser estipulado excepcionalmente pelo Tribunal, tendo em vista as circunstâncias específicas do caso e o interesse público envolvido (Art. 12-H, § 1º, da Lei 9.868/99).

Efeitos da decisão – conforme decisão do STF, a ADI por omissão terá dois efeitos básicos: declarar a mora do legislador ou do administrador em cumprir o seu dever constitucional de legislar (efeito declaratório); exortando-o a editar a norma regulamentadora (efeito mandamental).

O art.103, §2.º, estabelece um tratamento diferenciado:

a) se a omissão for do poder competente (Poder Legislativo) - será dada ciência ao poder respectivo, sem estipulação de prazo para a elaboração da lei, nem possibilidade de responsabilização administrativa;

b) se a omissão for de órgão administrativo - será dada ciência ao órgão, sendo fixado o prazo de 30 dias para suprir a omissão (ou algum outro prazo razoável a ser estipulado excepcionalmente pelo Tribunal, conforme visto acima), sob pena de responsabilidade da autoridade omissa.

ADI por omissão x mandado de injunção

ADI por omissão Mandado de injunção

10 Assim chamados porque se relacionam com a organização fundamental da Federação brasileira e sua violação, além da inconstitucionalidade, pode resultar na decretação de uma intervenção federal.

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- Hipótese de controle abstrato e concentrado de constitucionalidade (CF, art.103, §2º)

- Hipótese de controle concreto e difuso de constitucionalidade (CF, art.5º, LXXI)

- Declara a mora do órgão competente e exige a elaboração da norma regulamentadora da Constituição

- Dá o direito constitucional, ainda não regulamentado, no caso concreto11

- Competência: STF (CF, art.103, §2º) - Competência: STF (CF, art.102, I, “q” e II, “a”), STJ (CF, art.105, I, “h”), TRE (CF, 121, § 4º, V) e TJ ( art.125, § 1º)

1.8.5. Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF)

A ADPF é prevista pelo art. 102, §1.º, da CF/88 e tem seu processo e julgamento regulado pela Lei n.º 9.882/99.

Competência - só pode ser proposta perante o STF.

Legitimidade ativa - a mesma da ADI genérica, nos termos do art. 2.o da Lei 9.882/99.

Hipóteses de cabimento – de acordo com o art. 1.o da Lei nº 9.882/99, caberá o ajuizamento de uma ADPF para:

a) evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do Poder Público (art.1.o, caput);

b) quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição (art.1.o, parágrafo único).

Na primeira hipótese, temos a ADPF direta ou autônoma que visa a evitar (caráter preventivo) ou reparar (caráter repressivo) lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público (federal, estadual, distrital ou municipal).

Na segunda hipótese, temos a ADPF incidental ou por equiparação, cabível quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição.

A ADPF incidental permite que qualquer dos legitimados do art.103 da CF/88 provoquem o Supremo Tribunal Federal para que o mesmo resolva com eficácia geral (“erga omnes”) uma controvérsia constitucional relevante instalada em um processo judicial concreto.

Pelo seu objeto (ato do Poder Público federal, estadual, distrital ou municipal), percebe-se que a ADPF veio para completar o sistema de controle de constitucionalidade concentrado no STF, fazendo com que atos do Poder Público até então insuscetíveis de ADI ou ADC, conforme a jurisprudência do STF (exemplo: leis

11 A posição dominante no STF “era” a posição não-concretista, pela qual a decisão em mandado de injunção apenas declarava a inércia do Poder Público na regulamentação de uma norma constitucional (eficácia declaratória) e exortava o legislador a elaborar a regulamentação do preceito constitucional (eficácia mandamental), não cabendo ao Poder Judiciário produzir a norma faltante e aplicá-la ao caso concreto. Posteriormente, o STF modificou o seu entendimento, passando a admitir a possibilidade de o próprio Poder Judiciário emitir uma regulação provisória, enquanto não suprida a lacuna legislativa. Esta decisão foi tomada nos Mandados de Injunção de n.os

708/DF, 712/PA e 670/ES, julgados em 25.10.2007, quando se discutiu o direito de greve do servidor público (vide Informativo do STF n.o 485).

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municipais e o direito pré-constitucional), passem a ser objeto de controle concentrado de constitucionalidade no Supremo via ADPF.

Preceito fundamental – o parâmetro do controle de constitucionalidade via ADPF são os “preceitos fundamentais” da Lei Maior. Cabe ao STF a tarefa de definir quais normas constitucionais podem ser caracterizadas como “preceitos fundamentais”.

Concessão de liminar – de acordo com o art. 5.o da Lei n.º 9.882/99, é cabível a concessão de liminar na ADPF por decisão da maioria absoluta dos membros do STF (6 ministros). Em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou ainda, em período de recesso, poderá o relator conceder a liminar, ad referendum do Tribunal Pleno.

Nos termos do art. 5.º, §3.º, da Lei 9.882/99, a liminar da ADPF poderá consistir na determinação de que juízes e tribunais suspendam o andamento de processo ou os efeitos de decisões judiciais que apresentem relação com a matéria objeto da ADPF (salvo se decorrentes da coisa julgada) até seu julgamento final.

Julgamento da ADPF - o julgamento da ADPF será realizado pelo plenário do Supremo e necessita do voto da maioria absoluta de seus membros (art. 97 da CF/88), presentes 2/3 deles (quorum de instauração da sessão), ou seja, 8 ministros.

Efeitos - a decisão definitiva de mérito, em regra, possui efeitos: ex tunc, erga omnes e vinculantes.

O art.11 da Lei 9.882/99 permite ao STF manipular os efeitos da decisão da ADPF, desde que por razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social e pelo voto de 2/3 dos seus membros. Nesses casos, a decisão da ADPF poderá ter seus efeitos reduzidos ou apenas ser eficaz a partir do seu trânsito em julgado (ex nunc) ou até de outro momento que venha a ser fixado em data futura pelo STF (inconstitucionalidade pro futuro).

Caráter subsidiário - determina o art.4, §1.º, da Lei nº 9.882/99 que não será admitida ADPF quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.

O STF já assentou que, considerando o caráter acentuadamente objetivo da ADPF, o juízo da subsidiariedade dever levar em consideração apenas os demais processos objetivos já consolidados no sistema constitucional — a ADI e a ADC.

Recorribilidade - A decisão da ADPF é irrecorrível, não podendo ser objeto igualmente de Ação Rescisória.

Reclamação no STF - Caberá o ajuizamento de reclamação por qualquer interessado contra ato judicial que desrespeite a autoridade da decisão proferida pelo STF em sede de ADPF.

1.9. Técnicas de decisão utilizadas no controle de constitucionalidade

a) Interpretação conforme a Constituição – o princípio da interpretação conforme a Constituição é utilizado quando uma lei admite mais de uma interpretação (normas plurissignificativas), sendo que algumas afrontam o texto constitucional, enquanto outras não.

Nesses casos, o princípio da supremacia da Constituição e a presunção de constitucionalidade das leis exigem que se adote as interpretações compatíveis com a Carta Política, declarando-se inconstitucionais todas as demais que se incompatibilizem com a Lei Maior.

Ocorre que a regra da “interpretação conforme” só pode ser utilizada quando a norma inferior impugnada efetivamente apresente algum significado que se harmonize

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com a Constituição. Assim, o Poder Judiciário não pode funcionar como “legislador positivo”, dando à norma um sentido que nitidamente não foi o pretendido pelo legislador.

Por isso, se a única interpretação possível para compatibilizar a norma com a Constituição contrariar o sentido inequívoco que o Poder Legislativo lhe pretendeu dar, não se aplica o princípio da interpretação conforme a Constituição, devendo-se declarar a inconstitucionalidade da lei.

b) Declaração parcial de nulidade sem redução de texto – ocorre esta técnica quando o Tribunal declara a nulidade parcial da lei, mantendo intacto o seu texto original, reduzindo apenas a sua interpretação ou a sua aplicação.

Assim, não há supressão de qualquer parte do texto da lei. Em verdade, o que é restringido é a aplicação, em relação a determinadas pessoas ou a certos períodos de tempo; ou a interpretação – o sentido – da norma.

No primeiro caso, temos como exemplo uma lei que institua um tributo sujeito ao princípio da anterioridade tributária, pelo qual é vedado cobrar tributo no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou (CF, art. 150, inciso III, “b”). Se esta lei determinar que ela entra em vigor na data de sua publicação, podemos reduzir a sua aplicação, sem reduzir o texto, para afirmar que ela só produzirá efeitos a partir do exercício financeiro seguinte ao de sua publicação. Nesta hipótese, foi utilizada a técnica da “declaração parcial de nulidade sem redução de texto”.

No segundo caso (redução da interpretação da norma), temos a hipótese da “interpretação conforme a Constituição”. Nessa linha de raciocínio, podemos afirmar que a “declaração parcial de nulidade sem redução de texto” é o gênero, sendo a “interpretação conforme a Constituição” umas de suas espécies.

Essa é a posição dominante do Supremo Tribunal Federal, exposta no parecer da

Procuradoria-Geral da República na ADI n.º 3.324/DF, cujo trecho transcrevemos:Apesar de alguns doutrinadores alertarem para a necessidade de se separar conceitualmente os dois institutos (interpretação conforme e declaração de nulidade sem redução do texto) – vide MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional. São Paulo: Saraiva; 1999; p. 235 –, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem conjugado as duas expressões, tanto em sede de medida cautelar (ADIMC n.º 1668/DF, “suspensão cautelar sem redução de texto para dar interpretação conforme”; ADIMC n.º 1.344/ES, “suspensão da efi cácia parcial do texto sem redução de sua expressão literal por interpretação conforme”; ADIMC n.º 2.325/DF, “emprestar interpretação conforme e sem redução de texto no sentido de”) quanto em decisões de mérito (ADI n.º 1.098/SP, “procedência em parte para, sem redução de texto, excluir interpretações que”; ADI n.º 234/RJ, “por inconstitucionalidade parcial quanto a todas as interpretações que não sejam”). Cf. SAMPAIO, José Adércio Leite. A Constituição reinventada pela Jurisdição Constitucional. Belo Horizonte: Ed. Del Rey; 2002, p. 213 […] A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está repleta de exemplos de decisões que, mesmo em sede de medida cautelar, deram a determinado dispositivo normativo interpretação conforme à Constituição para se declarar a nulidade de uma norma dele derivada sem a redução de seu texto (in http://www.pgr. mpf.gov.br/pgr/fonteles/manifestacoes/adi/ documentos/adi3324.pdf).

Devemos alertar, conforme dito no julgado acima, que parte da doutrina entende haver uma clara distinção entre os dois institutos: enquanto a “declaração parcial de nulidade” consiste em uma proclamação de inconstitucionalidade (afirma-se, na decisão, que a norma é inconstitucional se interpretada nesse ou naquele sentido); a “interpretação conforme” resulta em uma declaração de constitucionalidade (a parte dispositiva da decisão atesta que a lei é constitucional desde que interpretada de determinada forma).

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Ressalte-se que caberá ao candidato, em sua prova, diferenciar a jurisprudência dominante do STF do entendimento da melhor doutrina acima exposto.

c) Declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade (também denominada de declaração de inconstitucionalidade de caráter restritivo) – algumas decisões, apesar de reconhecerem uma inconstitucionalidade, não implicam em declaração de nulidade. São elas: a ADI por omissão, onde não há ato a ser declarado nulo, uma vez que a inconstitucionalidade está exatamente na omissão; e a ADI interventiva, em que a decisão do STF não anula o ato – o que deve ser feito pelo decreto interventivo do Presidente da República – mas apenas julga procedente a Intervenção Federal proposta pelo PGR.

Outra hipótese de declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade é a inconstitucionalidade pro futuro, quando a Alta Corte brasileira declara a inconstitucionalidade de determinada lei, deixando para decretar a sua nulidade em momento posterior, conforme demonstrado na jurisprudência abaixo:

O STF julgou procedente ADI para declarar a inconstitucionalidade de lei estadual que criou um Município, mas sem declarar a nulidade da lei impugnada pelo prazo de 24 meses (mantendo a lei a sua validade e vigência nesse período), até que o legislador estadual estabeleça novo regramento. No caso concreto, considerou-se que, não obstante a inexistência da lei complementar federal a que se refere o § 4º do art. 18 da CF, o Município em questão fora efetivamente criado a partir de uma decisão política, assumindo existência de fato como ente federativo dotado de autonomia há mais de 6 anos, o que produzira uma série de efeitos jurídicos, não sendo possível ignorar essa realidade fática, em respeito ao princípio da segurança jurídica. Ressaltou-se, entretanto, que a solução do problema não poderia advir da simples decisão da improcedência do pedido formulado, haja vista o princípio da nulidade das leis inconstitucionais, mas que seria possível primar pela otimização de ambos os princípios por meio de técnica de ponderação. Diante dessa realidade, o STF, aplicando o art. 27 da Lei 9.868/99, afastou a declaração ortodoxa da nulidade da lei, mantendo a sua validade pelo prazo de 24 meses, como forma de resguardar a segurança jurídica e o interesse social (ADI 2.240/BA, Trib. Pleno, rel. Min. Eros Grau, j. 09.05.2007, v. Informativo STF n.º 466).

d) Declaração de Constitucionalidade de lei ainda constitucional – essa técnica permite ao Tribunal declarar a constitucionalidade de uma norma, mas, ao mesmo tempo, ressalvar que essa condição pode variar no tempo pela modificação de circunstâncias fáticas. Nesses casos, pode ocorrer uma “progressiva inconstitucionalidade” da norma que ainda é constitucional, mas que pode se tornar incompatível com a Lei Maior com o decorrer do tempo e com a modificação de circunstâncias fáticas (também denominada de “situação constitucional imperfeita”, “situação ainda constitucional” ou “situação em trânsito para a inconstitucionalidade”).

Nesse sentido, o seguinte julgado do STF: “EMENTA: Ministério Público: legitimação para promoção, no juízo cível, do ressarcimento do dano resultante de crime, pobre o titular do direito à reparação: C. Pr. Pen., art. 68, ainda constitucional (cf. RE 135328): processo de inconstitucionalização das leis. 1. A alternativa radical da jurisdição constitucional ortodoxa entre a constitucionalidade plena e a declaração de inconstitucionalidade ou revogação por inconstitucionalidade da lei com fulminante efi cácia ex tunc faz abstração da evidência de que a implementação de uma nova ordem constitucional não é um fato instantâneo, mas um processo, no qual a possibilidade de realização da norma da Constituição – ainda quando teoricamente não se cuide de preceito de eficácia limitada – subordina-se muitas vezes a alterações da realidade fáctica que a viabilizem. 2. No contexto da Constituição de 1988, a atribuição anteriormente dada ao Ministério Público pelo art. 68 C. Pr. Penal – constituindo modalidade de assistência judiciária – deve reputar-se transferida para a Defensoria Pública: essa, porém, para esse fim, só se pode considerar existente, onde e quando organizada, de direito e de fato, nos moldes do art. 134 da própria Constituição e da lei complementar por ela ordenada: até que – na União ou em cada Estado considerado –, se implemente essa condição de viabilização da cogitada transferência constitucional de atribuições, o art. 68 C. Pr. Pen. será considerado ainda vigente: é o caso do Estado de São Paulo, como decidiu o plenário no RE 135328.” (RE 147776/SP, 1ª Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 19.05.1998, DJ 19.06.1998, p.9).

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Ressalte-se que a declaração de constitucionalidade de lei ainda constitucional pode vir associada a outra técnica denominada “apelo ao legislador”, pela qual o órgão julgador rejeita a inconstitucionalidade da norma, mas, diante do possível trânsito para a inconstitucionalidade, conclama o legislador a corrigir essa situação constitucional imperfeita.

e) Princípio da Proporcionalidade – o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade (entendido como princípio constitucional implícito, deduzido do devido processo legal em seu aspecto material, CF, art. 5.º, inciso LIV) é constantemente utilizado pelo STF para aferição da inconstitucionalidade de leis. Como exemplo, temos a ADI 1.158-8/AM onde se declarou, com base nesse princípio, a inconstitucionalidade de lei estadual que concedia vantagem pecuniária de 1/3 sobre a remuneração, a título de férias, para servidores públicos inativos.

1.10. Controle de constitucionalidade pelos tribunais de justiça dos estados e do DF

Dispõe o art. 125, § 2.º, CF/88: “cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais e municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão”.

Esta é a ADI genérica de lei municipal ou estadual em face da Constituição Estadual de competência do Tribunal de Justiça (ou das leis distritais em face da LODF). A CF/88 não estabeleceu sua legitimidade ativa, restringindo-se a proibir que as Constituições Estaduais (ou a LODF) atribuam a sua legitimação a um único órgão. Nessa tarefa, o Supremo admite que a Carta Estadual/LODF traga outros legitimados para a ADI local, sem a necessidade de observância rígida do modelo federal previsto no art. 103 da CF (ADI MC 558/RJ).

A jurisprudência do STF não admite a possibilidade das Constituições Estaduais instituírem, no âmbito dos Tribunais de Justiça, ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal em face da Constituição Federal, por entender que a proteção da Carta Federal no controle concentrado é de competência exclusiva do STF.

Nesse sentido, julgado do STF onde se assentou que o processo objetivo de fiscalização normativa abstrata, instaurável perante os Tribunais de Justiça locais, somente pode ter por objeto leis ou atos normativos municipais, estaduais ou distritais, desde que contestados em face da própria Constituição do Estado-membro (ou, quando for o caso, da Lei Orgânica do Distrito Federal), que representa, nesse contexto, o único parâmetro de controle admitido pela CF, nos termos do art. 125, § 2.º.

Assim, a “ADI estadual/distrital” somente pode adotar como parâmetro ou paradigma do controle de constitucionalidade a Constituição estadual (ou a Lei Orgânica do DF), não a Constituição da República, sob pena de usurpação da competência do STF (como guardião exclusivo da CF no controle abstrato de constitucionalidade) e conseqüente ajuizamento de reclamação no STF para a preservação de sua competência (CF, art. 102, I, “l”).

No mesmo julgado, o STF registrou que é admissível a instauração de “ADI estadual” nos Tribunais de Justiça respectivos (CF, art. 125, § 2.º) para impugnar leis ou atos normativos estaduais e/ou municipais em face da Constituição estadual (ou, se for o caso, da Lei Orgânica do Distrito Federal), ainda que a norma de parâmetro – necessária e formalmente incorporada ao texto da Constituição local – seja reprodução de dispositivos constitucionais federais de observância compulsória pelas unidades federadas, admitindo-se, em tal hipótese, a possibilidade de controle

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recursal extraordinário da decisão local, por parte do Supremo Tribunal Federal (Reclamação n.º3.436 MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello in Informativo do STF n.º 394).

Outro aspecto refere-se à simultaneidade de ajuizamento de ADI estadual/distrital no TJ e ADI federal no STF para impugnação de uma lei estadual que viole ao mesmo tempo a Carta Federal e a Estadual (LODF).

Não seria necessário mencionar que, no caso de leis municipais (ou de leis distritais no uso de competência municipal – v. Súmula 642 do STF), não há possibilidade de ajuizamento de ADI federal no STF, por força do art. 102, I, “a”, da Carta Magna de 1988.

Voltando à questão posta, entende o Pretório Excelso que, no caso de simultaneidade de ADI federal ajuizada no STF e de ADI estadual no âmbito do TJ, as quais impugnem a mesma lei estadual ou distrital, imperiosa é a suspensão da tramitação da ADI estadual, diante das repercussões diretas do julgamento da ADI pelo STF sobre o julgamento da ADI estadual no TJ (ADI MC 1.423 e AgR Rcl 425).

Assim, independentemente de a ADI estadual/distrital possuir como parâmetro uma norma da Constituição Estadual/LODF de repetição obrigatória ou facultativa da Constituição Federal, a decisão do Supremo Tribunal Federal produzirá efeitos diretos e vinculantes sobre a futura decisão do TJ, indicando a necessidade de suspensão do processo da ADI estadual.

O art. 35, inciso IV da CF ainda prevê a possibilidade de ADI interventiva estadual ao dispor que caberá intervenção dos Estados em seus Municípios quando o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de princípios indicados na Constituição Estadual (que serão os “princípios sensíveis” da Constituição Estadual).

A legitimidade ativa da ADI interventiva estadual será do Procurador-Geral de Justiça, chefe do Ministério Público estadual, por força do art. 129, inciso IV da Carta Magna.

Apesar de não haver previsão expressa na CF/88, a doutrina brasileira admite que as Cartas Estaduais, com base no princípio da simetria, estabeleçam também: ADI por Omissão ou ADC em face das Constituições Estaduais, devendo tais ações ser da competência originária do Tribunal de Justiça.

Em relação ao controle difuso ou aberto de leis ou atos normativos estaduais em face da Constituição do Estado, é ele amplo, sem maiores peculiaridades em relação ao controle realizado em face da Constituição Federal.

Uma última questão diz respeito à possibilidade de interposição de recurso extraordinário ao STF da decisão proferida na ADI estadual.

Ordinariamente, quando o Tribunal de Justiça julga a ADI de lei municipal ou estadual em face da Constituição do Estado (ou da LODF), a sua decisão será definitiva, não cabendo recurso para qualquer outro Tribunal.

Ocorre que, a jurisprudência do STF excepcionou esta regra, admitindo hipótese de recurso extraordinário à Alta Corte brasileira quando a ADI perante o Tribunal de Justiça impugnar uma lei ou ato normativo municipal, estadual ou distrital em face de norma da Constituição Estadual/LODF que reproduza dispositivo da Constituição Federal de observância obrigatória pelos Estados-membros/DF.

Assim, desta decisão proferida pelo Tribunal de Justiça em “ADI estadual/distrital”, o Pretório Excelso admite a interposição de recurso extraordinário

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por haver violação simultânea da Constituição Estadual (ou Lei Orgânica do DF) e da Constituição da República (Rcl 383/SP, Trib. Pleno, rel. Min. Moreira Alves, j. 11.06.1992, DJ 21.05.1993, p.9765).

Ressalte-se que, neste caso, a decisão do STF no recurso extraordinário terá efeitos erga omnes, produzindo eficácia contra todos, considerando-se que a interposição do recurso extraordinário não modifica a natureza de controle abstrato da ADI estadual, razão pela qual, nesta hipótese, o recurso extraordinário, apesar de configurar instrumento típico do controle difuso-incidental, produzirá os efeitos próprios do controle abstrato de constitucionalidade.