material aula 11.02.2015 - história do direito penal1

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PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO PENAL – EAD MÓDULO FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL MODERNO Data: 11/02/2015 PROFESSOR Professor: Dr. Antônio Carlos da Ponte 1. Material pré-aula a. Tema História do Direito Penal Brasileiro – a construção do Direito Penal Objetivo pátrio b. Noções Gerais “2.2 Brasil Colonial No período pós-descobrimento do Brasil, a legislação de Portugal era a mesma vigente na nova colônia. As Ordenações Afonsinas, e as Ordenações Manuelinas, esta última com vigência até 1603, pouco influíram na colônia incipientemente formada, narra-se inclusive que nenhum exemplar das Ordenações havia em território da colônia em 1587. Já em relação às Ordenações Filipinas, estas por mais de dois séculos, na parte criminal, vigoraram no país, tendo sido revogadas no Brasil pelo Có-digo de 1830. Contempla o livro V das Ordenações, em seu título CXXXV, disposições acerca do tema do menor delinquente As principais disposições referem-se a: (a) não fazer distinção entre infância, a puerícia ou mocidade, e a puberdade, como era de praxe desde o direito romano; (b) não relacionar a prática delituosa com a capacidade penal para o fim de afastar da órbita penal infantes ou impúberes. Confere certa diferenciação de tratamento no que se refere à sanção a ser aplicada. Assim, afasta a pena de morte para o menor de 17 anos, ainda que o delito praticado mereça tal sanção. Contudo, será punido penalmente, devendo a pena ser aplicada de acordo com o arbítrio do julgador. Também fica ao arbítrio do julgador condenar o menor de 20 e maior de 17 anos à pena total ou parcial. Já o maior de 20 que cometer delito será condenado a mesma pena que o maior de 25 anos.

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História do Direito Penal Positivo Brasileiro - André Estefam013

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  • PS-GRADUAO EM DIREITO PENAL EAD

    MDULO FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL MODERNO

    Data: 11/02/2015 PROFESSOR Professor: Dr. Antnio Carlos da Ponte 1. Material pr-aula

    a. Tema

    Histria do Direito Penal Brasileiro a construo do Direito Penal Objetivo ptrio

    b. Noes Gerais

    2.2 Brasil Colonial No perodo ps-descobrimento do Brasil, a legislao de

    Portugal era a mesma vigente na nova colnia. As Ordenaes Afonsinas, e as Ordenaes Manuelinas, esta ltima com vigncia at 1603, pouco influram na colnia incipientemente formada, narra-se inclusive que nenhum exemplar das Ordenaes havia em territrio da colnia em 1587.

    J em relao s Ordenaes Filipinas, estas por mais

    de dois sculos, na parte criminal, vigoraram no pas, tendo sido revogadas no Brasil pelo C-digo de 1830. Contempla o livro V das Ordenaes, em seu ttulo CXXXV, disposies acerca do tema do menor delinquente As principais disposies referem-se a: (a) no fazer distino entre infncia, a puercia ou mocidade, e a puberdade, como era de praxe desde o direito romano; (b) no relacionar a prtica delituosa com a capacidade penal para o fim de afastar da rbita penal infantes ou impberes.

    Confere certa diferenciao de tratamento no que se

    refere sano a ser aplicada. Assim, afasta a pena de morte para o menor de 17 anos, ainda que o delito praticado merea tal sano. Contudo, ser punido penalmente, devendo a pena ser aplicada de acordo com o arbtrio do julgador. Tambm fica ao arbtrio do julgador condenar o menor de 20 e maior de 17 anos pena total ou parcial. J o maior de 20 que cometer delito ser condenado a mesma pena que o maior de 25 anos.

  • As disposies das Ordenaes Filipinas que tratam do

    tema so consideradas retrgadas, de um rigor exacerbado, tendo em vista que as Ordenaes no conferiam aos impberes o tratamento que era conferido j em Roma, poca da Lei das XII Tbuas, que admitia a distino entre pberes e impberes, para subtrair estes ltimos ao regime punitivo comum, sujeitando-os apenas a castigatio.

    Ainda no direito romano (Cdigo de Justiniano)

    estabelecida a distino entre infantes menores at sete anos e impberes de 7 a 14 anos mantendo-se os primeiros isentos de qualquer julgamento penal.

    Posteriormente, dentre as vrias tentativas de reforma

    da arcaica legislao portuguesa, a de maior realce foi o projeto de Cdigo Criminal de Melo Freire, elogiado pela doutrina pelo avano das ideias que nele se projetavam. Neste Cdigo a questo do menor ser tratada seguindo os parmetros do direito romano. Conforme Augusto Thompson, o projeto mencionado:

    Declara o 5. incapazes de todo o delito e pena os

    infantes, mas, passada a infncia, responder o agente pelo crime, sendo castigado segundo sua malcia e conhecimento. Esclarecem as Provas que, com base nas leis romanas, fazia-se na Europa distino entre infncia, puercia ou mocidade e puberdade. Aquela indo at os sete anos, a segunda at os 14 e a terceira at os 25. Do que resulta entender-se que somente os menores de sete anos gozavam de inimputabilidade completa. A matria est complementada no Ttulo IV, 27, onde h determinao no sentido de que os menores de 25 anos e maiores de 20 recebam a pena ordinria, que ser amenizada para os rus de idade inferior.

    Cabe tambm observar que as Ordenaes Filipinas

    contemplavam como condenao para determinados crimes, a pena no s para o agente da conduta proibida como tambm para os seus descendentes, atingindo assim menores de qualquer idade e sem qualquer relao com o fato criminoso. Pode-se afirmar que alguns menores j nasciam com a espada da justia ou de Dmocles pendente sobre sua cabea. Exemplo desta pena ocorre no crime de lesa-majestade (Ttulo VI) e sodomia (Ttulo XIII).

  • Em um caso, excepcionalmente, as Ordenaes relevavam de todas as penas em razo da idade: a mulher, menor de 13 anos, que tem ajuntamento carnal com parentes e afins (Ttulo XVII).

    2.3 Brasil Imprio Com o movimento social que culminou com a

    proclamao da Independncia em 1821, foi necessrio uma nova legislao que embasasse as recentes mudanas institucionais.

    Assim, em 1824, era promulgada a Constituio do

    Imprio, contendo algumas das ideias mais recentes surgidas no seio da burguesia europeia, fruto de intenso amadurecimento das ideias renovadoras que brotavam no velho continente.

    Nesta Constituio veio a previso, em seu art. 179,

    18, da necessidade de organizao de um Cdigo Civil , e Criminal, fundado nas slidas bases da justia, e equidade.

    Assim, em 1830, entra em vigor o Cdigo Criminal do

    Imprio, legislao de grande rigor cientfico, muito elogiado poca, dizendo-se dele que dois penalistas belgas (Haus e Mittermayer) aprenderam o portugus para melhor estud-lo.

    Em relao idade penal, em seu art. 10, 1., trouxe

    a regra de que no se julgaro criminosos os menores de 14 anos, porm, provando-se que os menores de 14 anos praticaram o delito com discernimento, eles seriam recolhidos s casas de correo, pelo tempo que o juiz entendesse necessrio fixar, desde que no excedesse idade de 17 anos (art. 13).

    Dispunha ainda o Cdigo que o juiz poderia impor as

    penas da cumplicidade ao ru maior de 14 e menor de 17 anos, se assim lhe parecesse justo (art. 18, 10, 2. parte).

    J havia a previso neste ordenamento penal da

    menoridade como circunstncia atenuante do crime, alcanando o delinquente menor de 21 anos (art. 18, 10). A propsito, observa Magalhes Noronha, baseado nas lies de Roberto Lyra, que a previso da menoridade como circunstncia atenuante uma originalidade do Cdigo de 1830, desconhecida, at ento, das legislaes francesa (1810) e napolitana (1819), que o influenciaram.

  • A idade de 21 anos tambm era considerada na

    aplicao da pena de gals, que por expressa previso no poderia ser imposta aos menores desta idade (art. 45, 2.). Tal pena, nesse caso seria substituda pela de priso com trabalho. Em relao natureza das penas, Ruy Rebello Pinho distingue entre o menor livre e o menor escravo:

    Ao menor livre, de acrdo com o grupo de idade, eram

    aplicveis tdas as penas previstas no Cdigo exceo de morte, gals e aoites. () Para os menores escravos, a pena por excelncia eram os aoites. No apenas por fazerem o criminoso sentir o castigo da pena, mas principalmente pelas vantagens de todas as espcies que ofereciam aos senhores, os quais no se privavam do brao negro, to necessrio economia do Imprio, cuja estabilidade em parte nele se fundava.

    necessrio ressaltar que as legislaes penais do

    sculo XIX em geral adotavam, em relao ao tratamento conferido ao menor, sistemas diversos, sendo que um primeiro sistema dividia a vida humana em dois perodos, adotando como marco, na maioria das legislaes, a idade de 16 anos. Menores desta idade tinham a seu favor a presuno de que no possuam o necessrio discernimento para a prtica delituosa, para sofrerem punio era necessrio que se provasse discernimento e assim, seriam sancionados como os adultos. J o segundo sistema, que se aproxima do direito romano, faz uma diviso de idades distinguindo infantes e impberes, considerando os infantes inimputveis absolutamente. J em relao aos impberes, estes deveriam ter o discernimento investigado para que pudessem responder criminalmente, se presente o discernimento, a menoridade, como regra, acarretava a reduo da pena.

    Enquanto o nosso Cdigo Criminal de 1830 adotou o

    primeiro sistema, assim como o Cdigo Penal da Frana, da Blgica, de Luxemburgo e do Mxico; o Cdigo Penal de 1890 adotou o segundo sistema, a esteio da legislao penal da Itlia, da Alemanha, da Dinamarca, e tambm de vrios outros pases: Espanha, Argentina, Chile, Uruguai, Peru e Costa Rica, dentre outros.

    Tobias Barreto, um dos mais ilustres penalistas

    brasileiros, apontado por Magalhes Noronha como o maior vulto do direito penal daquela poca, culminncia do direito penal do

  • Imprio, escreveu, dentre outras obras, em 1892, uma intitulada Menores e loucos em direito criminal, tendo tecido severas crticas a variados pontos do Cdigo no trato do tema. Inicialmente, discordou da opo pelo sistema adotado no Cdigo francs, entendendo prefervel a considerao de que o simples fato da idade j seria suficiente para se presumir a falta de capacidade e compreenso da conduta ilcita. Tambm criticou a possibilidade de aferio do discernimento do menor de qualquer idade, at mesmo de uma criana de cinco anos. Aponta, ainda nessa obra, uma incongruncia do legislador, afirmando que, uma vez tendo o legislador optado pelo sistema do discernimento, ao menos deveria ter seguido o Cdigo Penal francs, que fixou a idade em 16 anos e no em 14 anos como fez o Cdigo de 1830.

    2.4 Brasil Repblica 2.4.1 Cdigo Penal de 1890 O Cdigo Penal da Repblica de 1890 foi criticado por

    ter sido elaborado antes da Constituio da Repblica, ficando em curto espao de tempo desatualizado por no estar em consonncia com os princpios penais da nova Constituio. Tal fato pode ser atribudo urgente necessidade de alterao da lei penal em vigor, principalmente depois de abolida a escravido.

    Neste Cdigo, encontramos dispositivos que tratam da

    questo da idade penal de maneira diversa da legislao anterior, embora no seja possvel afirmar-se que o Cdigo fez opo unicamente pelo critrio biolgico, porque ele no se afastou totalmente da considerao acerca do discernimento. Nele h a separao entre infncia e puberdade com efeitos distintos, (art. 27, 1. e 2.) de modo que os menores de nove anos no so considerados criminosos, enquanto os maiores de nove e menores de 14 anos s no sero considerados criminosos se tiverem agido sem discernimento.

    Aos menores de nove anos, embora no sujeitos a

    legislao penal, no h referncia quanto ao tratamento que deveriam receber caso praticassem uma infrao penal.

    A imputabilidade, para os menores compreendidos

    entre 9 e 14 anos, ficava na dependncia de se comprovar ou no

  • discernimento, enquanto a imputabilidade sem exame do discernimento, iniciava-se a partir dos 14 anos.

    Segundo o art. 30: Os maiores de nove anos e

    menores de quatorze, que tiverem obrado com discernimento, sero recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, pelo tempo que ao juiz parecer, contanto que o recolhimento no exceda a idade de dezessete anos. mantida a previso da circunstncia atenuante para o delinquente menor de 21 anos (art. 42, 11), a exemplo do Cdigo do Imprio.

    (trecho extrado do artigo Panorama da idade

    penal na legislao brasileira (da colonizao at o Cdigo Penal de 1969), de autoria Claudia Cristina Barrilari in Revista Brasileira de Cincias Criminais, vol. 91, p. 467, jul/2011)

    c. Legislao

    - Ordenaes Manuelinas (vigente de 1521 a 1603) - Ordenaes Filipinas (vigente de 1603 a 1830) - Cdigo Criminal do Imprio, de 1830 - Cdigo Penal da Repblica, de 1890

    d. Julgados/Informativos

    Mostra-se que entre os chefes, e cabeas da Conjurao o primeiro que suscitou as idias de repblica foi o Ru Joaquim Jos da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes, Alferes que foi da Cavallaria paga da Capitania de Minas, o qual a muito tempo, que tinha concebido o abominvel intento de conduzir os povos daquella Capitania a uma rebelio; pela qual se subtrahissem da justa obedincia devida dita senhora, formando para este fim publicamente discursos sediciosos que foram denunciados ao Governador de Minas atencessor do atual, e que ento sem nenhuma razo foram despresados como consta a folhas 74 folhas 68 verso folhas 127 verso e folha 2 do appenso numero 8 da devassa principiada nesta cidade; e suposta que aquelles discursos no produzissem naquelle tempo outro efeito mais do que o escndalo a abominao que mereciam, contudo como o Ru viu que o deixaram formar impunemente aquellas criminosas prticas, julgo por occasio mais oportuna para continual-as com maior efficcia, no anno de mil setecentos, e oitenta e oito em que o actual Governador de Minas tomou posse do governo da Capitania, e travava de fazer lanar a derrama, para completar o pagamento de

  • cem arrobas de ouro, que os povos de Minas se obrigaram a pagar annualmente, pelo oferecimento voluntrio que fizeram em vinte e quatro de maro de mil setecentos e trinta e quatro; aceito e confirmado pelo Alvar de trs de dezembro de mil setecentos e cincoenta em lugar da Capitao desde ento abolida. (...) Portanto condenam ao Ru Joaquim Jos da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas a que com barao e prego seja conduzido pelas ruas publicas ao lugar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabea e levada a Villa Rica aonde em lugar mais publico della ser pregada, em um poste alto at que o tempo a consuma, e o seu corpo ser dividido em quatro quartos, e pregados em postes pelo caminho de Minas no sitio da Varginha e das Sebolas aonde o Ru teve as suas infames prticas e os mais nos sitios (sic) de maiores povoaes at que o tempo tambm os consuma; declaram o Ru infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens applicam para o Fisco e Cmara Real, e a casa em que vivia em Villa Rica ser arrasada e salgada, para que nunca mais no cho se edifique e no sendo prpria ser avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados e no mesmo cho se levantar um padro pelo qual se conserve em memria a infamia deste abominavel Ru (...) (trecho da sentena de Tiradentes)

    e. Leitura sugerida

    - ESTEFAM, Andr. Direito Penal. Parte Geral. So Paulo: Saraiva, 2013. V. 1, p. 63-78. Disponvel no material de apoio. - PIERANGELLI, Jos Henrique. Cdigos Penais do Brasil. 2a edio. Editora Revista dos Tribunais

    f. Leitura complementar

    - BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, So Paulo: Saraiva, 2014. - BRUNO, Anbal. Direito penal. Parte geral tomo I: introduo, norma penal, fato punvel. Rio de Janeiro: Forense, 2003. - NORONHA, E. Magalhes. Direito Penal. Introduo e Parte Geral. So Paulo: Saraiva, 1973.

  • - PINHO, Ruy Rebello. Histria do direito penal brasileiro: perodo colonial. So Paulo: Editora Universidade de So Paulo, 1973. - PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro: parte geral. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. - RIBEIRO, Carlos Jos de Assis. Histria do direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Zelio Valverde, 1943. - SIQUEIRA, Galdino. Direito Penal Brazileiro parte especial. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos editor, 1924.