“marias dilaceradas e santificadas”: a histÓria do assassinato e da ... · importa também...

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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X “MARIAS DILACERADAS E SANTIFICADAS”: A HISTÓRIA DO ASSASSINATO E DA DEVOÇÃO A MARIA DE BIL E ISABEL MARIA NO ESTADO DO CEARÁ. Daniele Ribeiro Alves 1 Maria Helena de Paula Frota 2 Clara Maria Holanda Silveira 3 Resumo: Maria de Bil e Isabel Maria são personagens que integram a religiosidade popular do Ceará. A devoção a estas “santas populares” são rituais marcados por um dinamismo e uma flexibilidade em relação à hierarquia da Igreja Católica Apostólica Romana, uma vez que não estão centrados em dogmas. Isabel Maria da Conceição, com 28 anos de idade, na cidade de Guaraciaba do Norte-CE, no dia 11 de outubro de 1929, foi assassinada a facadas e jogada no abismo pelo marido, que ficou enciumado com o corte de cabelo da esposa. Ela é conhecida como protetora das esposas espancadas e das mulheres traídas (ALVES, 2012). Maria de Bil, nome grafado junto ao algoz, foi morta, no dia 11 de março de 1926, na cidade de Várzea Alegre, pelo esposo que não aceitava o fim do relacionamento. Ele a esfaqueou três vezes. Tempos depois do episódio, foi erguida uma capela no local do crime. Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que essas mulheres, no imaginário social, aproximam-se dos ideais católicos pela crueldade sofrida, por outro lado, no âmago das narrativas, explicita as resistências do feminino ao ideário passivo, já que elas não acataram as normas estabelecidas pelo companheiro e opuseram-se ao casamento. Tais resistências culminaram no assassínio, a forma mais cruel da violência contra a mulher, permeada de dominação, de honra, poder e masculinidade. Palavras-chave: Religiosidade Popular. Gênero. Devoção. Maria de Bil e Isabel Maria são personagens que integram a religiosidade popular do Ceará. A devoção a estas “santas populares” são rituais marcados por um dinamismo e uma flexibilidade em relação à hierarquia da Igreja Católica Apostólica Romana, uma vez que não estão centrados em dogmas. Os devotos vivenciam suas crenças com possíveis bricolagens, arranjos por eles produzidos, vinculando ou não aos elementos do catolicismo. É a partir das práticas e narrativas de devoção que situamos o objeto de estudo. É uma investigação que oportuniza compreender gestos, memórias, lembranças, esquecimentos e promessas. São as experiências dos devotos, tidas, portanto, como reveladoras de processos sócios históricos, que constroem os sujeitos. Importa também destacar neste trabalho, as implicações do encontro entre o devoto e a pesquisadora, em especial, no caso de Isabel Maria. A motivação inicial pelo assunto supracitado surge a partir da análise documental (FREHSE, 2005) de um dos principais jornais de circulação de Fortaleza O Povo, o qual produziu cadernos especiais com o tema “Santificados”. São eles: Caderno um “Nos Altares de Beira de estrada” (produzido em 30 de abril de 2011, pp.1-13); Caderno dois “Das Paredes de Lembrar, Vidas e 1 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza-Brasil. 2 Doutora em Sociología pela Universidad de Salamanca - Espanha (2000). Atualmente é professora adjunta da Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza-Brasil. 3 Mestra em Políticas Públicas e Sociedade pela Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza-Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

“MARIAS DILACERADAS E SANTIFICADAS”: A HISTÓRIA DO ASSASSINATO E DA

DEVOÇÃO A MARIA DE BIL E ISABEL MARIA NO ESTADO DO CEARÁ.

Daniele Ribeiro Alves1

Maria Helena de Paula Frota 2

Clara Maria Holanda Silveira3

Resumo: Maria de Bil e Isabel Maria são personagens que integram a religiosidade popular do Ceará. A devoção a

estas “santas populares” são rituais marcados por um dinamismo e uma flexibilidade em relação à hierarquia da Igreja

Católica Apostólica Romana, uma vez que não estão centrados em dogmas. Isabel Maria da Conceição, com 28 anos de

idade, na cidade de Guaraciaba do Norte-CE, no dia 11 de outubro de 1929, foi assassinada a facadas e jogada no

abismo pelo marido, que ficou enciumado com o corte de cabelo da esposa. Ela é conhecida como protetora das esposas

espancadas e das mulheres traídas (ALVES, 2012). Maria de Bil, nome grafado junto ao algoz, foi morta, no dia 11 de

março de 1926, na cidade de Várzea Alegre, pelo esposo que não aceitava o fim do relacionamento. Ele a esfaqueou três

vezes. Tempos depois do episódio, foi erguida uma capela no local do crime. Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que

essas mulheres, no imaginário social, aproximam-se dos ideais católicos pela crueldade sofrida, por outro lado, no

âmago das narrativas, explicita as resistências do feminino ao ideário passivo, já que elas não acataram as normas

estabelecidas pelo companheiro e opuseram-se ao casamento. Tais resistências culminaram no assassínio, a forma mais

cruel da violência contra a mulher, permeada de dominação, de honra, poder e masculinidade.

Palavras-chave: Religiosidade Popular. Gênero. Devoção.

Maria de Bil e Isabel Maria são personagens que integram a religiosidade popular do Ceará.

A devoção a estas “santas populares” são rituais marcados por um dinamismo e uma flexibilidade

em relação à hierarquia da Igreja Católica Apostólica Romana, uma vez que não estão centrados em

dogmas. Os devotos vivenciam suas crenças com possíveis bricolagens, arranjos por eles

produzidos, vinculando ou não aos elementos do catolicismo.

É a partir das práticas e narrativas de devoção que situamos o objeto de estudo. É uma

investigação que oportuniza compreender gestos, memórias, lembranças, esquecimentos e

promessas. São as experiências dos devotos, tidas, portanto, como reveladoras de processos sócios

históricos, que constroem os sujeitos. Importa também destacar neste trabalho, as implicações do

encontro entre o devoto e a pesquisadora, em especial, no caso de Isabel Maria.

A motivação inicial pelo assunto supracitado surge a partir da análise documental (FREHSE,

2005) de um dos principais jornais de circulação de Fortaleza O Povo, o qual produziu cadernos

especiais com o tema “Santificados”. São eles: Caderno um “Nos Altares de Beira de estrada”

(produzido em 30 de abril de 2011, pp.1-13); Caderno dois “Das Paredes de Lembrar, Vidas e

1 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza-Brasil. 2 Doutora em Sociología pela Universidad de Salamanca - Espanha (2000). Atualmente é professora adjunta da

Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza-Brasil. 3 Mestra em Políticas Públicas e Sociedade pela Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza-Brasil.

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Credos” (lançado em 15 de maio de 2011, pp.1-13); e Caderno três “Da Graça de Acreditar ou

Duvidar” (produzido em 05 de junho de 2011, pp.1-13).

Neles há informações sobre os (as) “santos” (as) do Ceará não canonizados. Como é o caso

da história de Maria de Bil, que tem grafado na sua biografia o nome do companheiro que a matou.

Quando Maria estava na sua terceira gravidez desentendera-se com Bil. O motivo de tal contenda

foi o fato dele manter um relacionamento amoroso com a irmã de Maria. Após tal situação, houve a

separação. Inconformado, Bil passou a arquitetar a morte da companheira. Em onze de março de

1926, por volta das dez horas, ele a esfaqueou até a morte. Há relatos que Bil arrancou-lhe toda a

roupa e comeu parte da panturrilha da vítima, numa espécie de pacto com o “além”. Logo depois do

episódio, o mesmo fugiu e com tal sumiço surgiram várias narrativas a respeito do autor do crime.

A crueldade dos fatos comoveu a população varzealegrense. (ARQUIVO HISTÓRICO SOBRE A

HISTÓRIA MARIA DE BIL, 2011).

Há também a narrativa de Isabel Maria da Conceição que, com 28 anos de idade, na cidade

de Guaraciaba do Norte-CE, no dia 11 de outubro de 1929, foi assassinada a facadas e jogada no

abismo pelo marido Antônio Raimundo Nonato da Silva, que ficou enciumado com o corte de

cabelo da esposa. As peregrinações na capela de Isabel, conforme Pereira (2005), são feitas, na sua

maioria, por mulheres que sofrem violência doméstica. Ela é conhecida como protetora das esposas

espancadas e das mulheres traídas (ALVES, 2012).

Analisando as histórias de cada uma, o que nos intriga são as especificidades das

devoções em torno destas “santas” populares e a maneira como são representados socialmente.

Diante disso, a escolha de Maria de Bil e Isabel Maria se deve, principalmente, a três critérios:

primeiro, a questão de gênero, a construção de um sistema simbólico de significados em torno da

devoção a uma mulher; segundo, a crueldade dos crimes; e terceiro, a história intrigante dessas

figuras.

Interessa-nos, entretanto, problematizar a produção da santidade feminina (Maria de Bil e

Isabel Maria) engendrados pelos devotos das personagens em questão. Nesse viés, os

questionamentos que norteam a pesquisa são: como se constitui a santidade feminina através da

devoção a Maria de Bil e Isabel Maria? Que questões de gênero gravitam em torno da devoção a

Maria de Bil e Isabel Maria? Qual o conjunto de rituais pertencentes à devoção em questão, no Dia

de Finados? Essas perguntas delineiam e indicam os objetivos deste estudo que são: entender como

se constrói a santidade feminina engendrada pelos devotos em torno da figura de Maria de Bil e

Isabel Maria; compreender os sentidos de gênero que estão presentes no caso específico da devoção

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a essas “santas” populares; apreender as manifestações ritualísticas no que se refere à devoção a

Isabel Maria e a João das Pedras no Dia de Finados.

A devoção: bricolagens e fé vivida

A devoção é entendida neste estudo como um sistema de trocas simbólicas (BOURDIEU,

1992) entre o fiel e o objeto, no qual os grupos religiosos admitem um acesso direto ao sagrado. É

um ritual que abrange os cultos improvisados e a fé espontânea, construída e vivida à margem da

institucionalização (JURKEVICS, 2004). É uma “eterna gratidão por alguma graça ou intercessão

obtida no passado” (PAZ, 2011, p.49). É, sem dúvida, a produção de uma eficácia simbólica

(ROCHA, 2012).

Tais práticas religiosas, a que chamo de religiosidade popular, são construídas e

reconstruídas pelos atores sociais (com técnicas e táticas de poder) que ditam quais os símbolos que

comporão seus ritos, quais rituais serão realizados e que conduta religiosa seguirão. Dessa forma, a

capela à beira de estrada em Guaraciaba do Norte-CE, bem como, a capela num local íngreme e de

difícil acesso em Várzea Alegre- no Cariri Cearense, são recintos sagrados com suas próprias

características, onde os devotos vivenciam sua fé. São espaços de confrontos e tensões, expressos

em uma lógica paradoxal, de complementaridade e de subversão aos valores e às hierarquias da

Igreja Católica. Essas questões salientadas são primordiais para pensar como esses devotos

reinterpretam suas bases religiosas atualizando ou reinventando cada qual à sua maneira. Afinal, as

santas-mulheres-assassinadas são expressões de uma religiosidade híbrida e de um verdadeiro

“sincretismo em movimento” (SILVEIRA; MENDONÇA, 2014), refletindo, contudo, a pluralidade

religiosa contemporânea.

Religiosidade popular: manifestação de uma cultura híbrida

Entender o fenômeno religiosidade popular é ter clareza do repertório teórico bastante

diversificado, que comporta múltiplas ideias. Os diversos pesquisadores, dentre eles Beozzo (1982),

Brandão (1980), Fernandes (1982), Espírito Santo (1980) e Trapero (2011)4, sabem como é

4Para Beozzo (1982), a religiosidade popular seria “patrimônio de classes sociais exploradas e oprimidas” (p.745).

Brandão (1980) destaca que a religiosidade popular não é a sacralização de uma ordem social, mas espaço onde estão as

lutas de poder entre dominância política e resistência. Para Fernandes (1982) é um erro supor que a divisão de classes

separa as religiões de forma estática, como se não tivessem vínculos verticais, como se não fossem fluídas e não

promovessem uma comunicação entre as classes. Segundo Trapero (2011, p.38), a religiosidade popular se nutre com

elementos provenientes uns do sentimento religioso universal da vida, outros da cultura própria de um povo e outros,

sim, da revelação cristã.

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desafiante este tema, uma vez que criaram as mais diversas concepções a respeito de tal conceito.

Até o século XIX, principalmente, com o processo que ficou conhecido como “romanização”,

política de renovação do catolicismo tendo como modelo a ortodoxia romana, tratava-se o

“popular” como ligado ao vulgar, ao supersticioso e oposto ao “clerical”. Para Sanchis (1992, p.26)

“é sempre em relação à outra que qualquer versão de prática social aparece como popular o que

supõe um campo comum, uma dependência e, contestando esta dependência estrutural, uma

dinâmica de autonomia”.

Todavia, não interessará nesta investigação pormenorizar os consensos e as contradições

entre as diferentes formas de compreender esse conceito. “Mais do que refletir sobre esta noção, é

preciso refletir com esta noção” (PAZ, 2011, p.37). Falar de religiosidade popular no Brasil é

compreender que foi marcadamente colonial, com a incorporação e reincorporação de diversas

espiritualidades: europeias, africanas e indígenas (MOTT, 1997). As tradições pagãs, católicas,

judaicas, africanas e indígenas eram vividas no cotidiano da população colonial, difundindo

sabbats, missas e calundus, segundo Souza (1995), em meio a tensões das Visitações do Santo

Ofício e ao espanto de viajantes estrangeiros que chegavam por aqui e, conforme Vainfas (1999) se

escandalizavam com o “desvirtuamento do cristianismo”.

Como se nota, é inegável a influência do catolicismo nas práticas religiosas populares,

devido, sobretudo, ao contexto histórico-cultural brasileiro (HOORNAERT, 1982). No Nordeste

brasileiro, por exemplo, nas famílias mais abastadas, era comum a tradição do oratório com santos

variados de devoção popular (MOTT, 1997). Ademais, na Serra da Ibiapaba, local da pesquisa,

houve forte colonização dos jesuítas, que vinham ao Ceará com a finalidade de converter os índios à

fé católica (GIRÃO, 1986; SOUZA, 2003). Apesar da resistência indígena, os ministros de fé cristã

continuaram com suas cruzadas espirituais (XAVIER, 2010). Já no Cariri cearense, houve

influência de grupos missionários capuchinhos, que praticavam um catolicismo lusitano

caracterizado por um Deus piedoso e vingativo. Um misticismo tão presente e peculiar da região.

Como pensar a religiosidade carirense sem citar Padre Cícero, Padre Ibiapina e o Beato José

Lourenço, que são verdadeiros cabides da religiosidade? O Cariri é um mundo que se inventa e se

reinventa sua própria prática religiosa. (HOORNAERT, 2006; PAZ, 2011; DELLA CAVA, 1977).

De fato, a religiosidade popular no Brasil é dinâmica, está imersa numa realidade fluída, que

ao mesmo tempo pode assimilar simbólicos do catolicismo, como pode contaminá-los através da

criatividade e de seus próprios repertórios simbólicos. É um sagrado não ortodoxo, híbrido,

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contornado a lápis, pois, conforme as necessidades dos sujeitos há um trânsito entre o institucional e

o não institucional na busca de novas experiências de fé.

As experiências em campo: Dia de Finados e a devoção a Isabel Maria e Maria de Bil

O Dia de Finados, data dedicada aos mortos no calendário católico (MAIA, 2008), não se

resume apenas ao cemitério, existe outros espaços, porém com uma dinâmica diferenciada.

Exemplo disso é à capela de Isabel Maria, em Guaraciaba do Norte, na Serra da Ibiapaba5, que fica

à beira de estrada, descendo uma ladeira, próxima a um abismo e distante de residências. No local

existe uma variedade de santos, a foto de Isabel Maria, uma grande quantidade de roupas, ex-votos,

nomes grafados nas paredes...

Lá escutei vários relatos de milagres6: “Meu filho estava desenganado pelo médico, quando

eu pedia a Isabel Maria e fui alcançada”; “Eu sempre peço a Isabel Maria e recebo graças”. “Ela é

milagrosa” (devotos de Isabel Maria). Para os devotos de Isabel Maria, a ida ao local é uma forma

de agradecer e reestabelecer laços entre mortos e vivos. As narrativas são em torno de uma mulher

que morreu cruelmente e tornou-se milagrosa.

Além da capela de Isabel Maria, existe uma cruz em um abismo, onde a referida mulher foi

jogada. É um local bastante íngreme. Descemos com muita dificuldade em meio as seguintes

palavras “Tenha fé em Isabel Maria que você consegue.”; “Aqui foi um local de sofrimento

mesmo”. Aceitar ir aquele espaço era a única maneira de sentir a intensidade de “afetos, sensações e

percepções, que geralmente não são significados” (FAVRED-SAADA, 2005). “Era necessário

experimentar a intensidade do lugar”. Para aquelas pessoas que estavam ali, aquele era um recinto

sagrado e de penitência. Era necessário vivenciar e sentir-se afetado pela sensação de sofrimento e

insegurança.

Para os devotos dos personagens em questão, o Dia de Finados, vai além do momento de

salvação dos mortos, conforme os dogmas do catolicismo. Os santos fazem parte do cotidiano das

pessoas. É possível entrever, a partir das narrativas, que tais “santos” são evocados em momentos

de sofrimentos, angústias e alegrias. Quando um devoto afirma que foi Isabel Maria quem curou seu

5 A região da Ibiapaba está localizada no noroeste do Estado do Ceará e compreende as cidades de Viçosa do Ceará,

Ipu, Carnaubal, Tianguá, Ubajara, Ibiapina e Croatá, bem como Guaraciaba do Norte e São Benedito. Guaraciaba do

Norte é uma cidade brasileira do estado do Ceará, a 320 km de Fortaleza. População aproximada de 38.529 habitantes

(IBGE-2006: SITE PREFEITURA MUNICIPAL DE GUARACIABA DO NORTE-CE)

6 .Visita realizada em Novembro de 2016.

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filho e isso mudo totalmente o percurso de uma vida, nos faz pensar que Isabel Maria é uma

componente chave na história desse sujeito.

Em outro momento, já no Cariri Cearense7, em Várzea Alegre8, No Dia de Finados9,

pudemos presenciar também alguns ritos dos devotos a Maria de Bil. O local em questão é de difícil

acesso. É o lugar de morte de uma mulher, que se tornou milagrosa, entremeada ao sumiço de Bil

de seu ex-companheiro. Notamos, nesse dia, que há um sistema de trocas, mantendo e eforçando a

continuidade deste ritual. “Ela é muito milagrosa, as pessoas fazem promessa com ela e alcançam

todas as promessas que fazem.. Todos os anos, dias de finados, tou aqui, pagando promessa, venho

ascender velas, rezar pra ela, porque eu acredito muito nela”. (devota de Maria de Bil).

“Ao pagar a promessa, o promesseiro cumpre com o ritual sagrado e renova a intermediação

com o santo para outras promessas” (CARVALHO, 2011, p.143). Em relação ao devoto, é o seu

dever de fidelidade, através do cumprimento de suas promessas e o seu direito de receber a “graça”.

Na verdade, supõem direitos e deveres para as partes que compõem esse “contrato”.

Percebemos ainda que muitas pessoas, ao chegaram à capela, apalpam e beijam vários

santos “oficiais” e “não oficiais”. A reza do terço também foi comum, naquele dia, em favor da

alma falecida. É uma troca simbólica entre Maria de Bil e o devoto, reforçando laços relacionais e o

pedido feito. A repetição das palavras também era uma prática recorrente, como “Louvado Seja,

Louvado Seja”. As expressões que se repetem possibilitam uma maior eficiência dos pedidos

realizados. “Eu já fiz (promessa) me peguei, agora, a fé também é em Deus e nela também. Primero

Deus, depois ela” (devota de Maria de Bil).

Nos dois casos supracitados, é perceptível que o local da devoção é um “lugar de memória

sacramental”. Memória que envolve o dito e o silenciado, o sofrimento e a conquista. A memória é

“aberta à dialética da lembrança e do esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas,

vulnerável a todos os usos e manipulações, susceptível de longas latências e de repentinas

revitalizações [...] elo vivido no eterno presente” (NORA, 1993, p.9). A reza e a vela presente nos

rituais analisados são os elementos principais no estabelecimento das relações entre mortos e vivos.

São sinais que os vivos mandam aos entes queridos para reafirmar sua memória. (REESINK, 2006).

É também a rememoração e a reafirmação da eficácia simbólica dos santos. É um recinto de rezas,

pagamentos de promessas, de sinal da cruz, de ajoelhar-se, de impor as mãos sobre o peito e repetir

7 O Cariri, administrativamente, abrange atualmente 26 municípios, incluindo Várzea Alegre. 8 Várzea Alegre é um município no semi-árido sertanejo do Ceará. Distante 467 km de Fortaleza, com área da Unidade

Territorial de 835,71 km2, o município, conforme site oficial da Prefeitura da cidade tem uma população de 38.434

habitantes. 9 Visita realizada em Novembro de 2012. (SITE OFICIAL DA PREFEITURA DE VÁRZEA ALEGRE-CE).

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frases e gestos. É uma “devoção gestual, afetizada, íntima” (PAZ, 2011, p.49). São, portanto,

devotos com discursos, que expressam “uma religiosidade apegada ao mágico e ao maravilhoso,

onde o que é extraordinário, que foge à explicações fundadas numa relação de causalidade direta é

milagroso”(PAZ,2011, p.57)

Santidade feminina e as questões de gênero

Nesta pesquisa, é perceptível que o catolicismo está entremeado nas práticas e nos rituais a

Maria de Bil e a Isabel Maria. Segundo Faustino (2005), a grande complexidade do catolicismo no

Brasil é que se abre e se permite diversificar, de modo a oferecer, em seu interior, quase todos os

estilos de crenças e de práticas da fé existentes também fora dele. Além disso, é importante

acrescentar que, se por um lado, a dinâmica do catolicismo contemporâneo se abre, a partir do

século XX, para a participação dos sujeitos nos mais variados movimentos dos “laicos”

(MIRANDA, 2010), proporcionando-os um contato direto com o sobrenatural e o sagrado, por

conta de documentos papais que buscavam reinterpretar a relação entre a Igreja e o mundo

(CARRANZA; MARIZ; CAMURÇA, 2009). Por outro, o imaginário católico, a partir da própria

aparelhagem hierárquica, ainda é capaz de estimular ideias provenientes do mito fundador - Jardim

do Éden, o que coloca as mulheres dentro da instituição em lugares determinados e em situação de

submissão em relação à autoridade masculina (ARY, 2000; NUNES, 2000).

Tais considerações são primordiais para avançar naquilo que chamamos de gênero - um

sistema simbólico de significados, que configura e reflete posições hierárquicas e antagônicas entre

homens e mulheres (GIFFIN, 1994; SCOTT, 1995). Gênero é uma forma primária de dar

significado ao mundo, inclusive, ao sexo (SCOTT, 1995). É uma fabricação (BLUTER, 2003). É

uma “fantasia instituída e inscrita sobre a superfície dos corpos [...] produzidos como efeitos da

verdade de um discurso sobre uma identidade primária e estável” (VALE, 2007, p.66).

Gênero na formulação de Scott (1995) define espaços, “lugares sociais”; confere valores;

constrói diferenças; constitui e justifica hierarquias. Nesse contexto, o conteúdo da referida

formulação compõe-se de quatro elementos: primeiro, um campo simbólico; segundo, um conjunto

de normas; terceiro, a noção de fixidez e permanência binária reproduzida nas instituições e

organizações sociais; e o quarto, o plano da subjetividade. Portanto, gênero é ação, poder, relação.

São sujeitos construídos e desconstruídos de códigos linguísticos, representações culturais,

engendrados nas relações de raça, classe... (DE LAURETIS, 1994). Indagamos, portanto, como

inserir a temática sobre religiosidade popular nos estudos de gênero?

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Primeiro, é evidente que os corpos pesam normas e esquemas regulatórios através de uma

reiteração forçada de preceitos, inclusive, católicos (BUTLER, 2000). Outrossim, é através da

corporeidade que os seres humanos relacionam-se com o mundo, inscrevendo uma teia de

significações e de valores. O corpo, nesse sentido, deve ser compreendido como um “fenômeno

social e cultural” (LE BRETON, 2007, p.7). “O corpo é uma potencialidade que é elaborada e

desenvolvida nas relações sociais” (HASTRUP, 2010, p.76).

Segundo, é na corporeidade que eclode o sistema simbólico, de representações e de

imaginários sobre o religioso. A pesada materialidade dos corpos justifica condutas, conceitos e

referências (MAIA, 2008b; MAUSS, 2003), inclusive, de santidade. A sociedade faz corpo

(PEREZ, 2013). O conhecimento cultural é transmitido por meio do corpo, o lócus da experiência

(HASTRUP, 2010).

É nessa perspectiva, que é preciso pensar sobre o ethos da santidade que atravessa a

referência de feminilidade de Maria de Bil e Isabel Maria. Corpos que pesaram condutas e não se

conformaram completamente com as normas pelas quais sua materialização foi imposta (BUTLER,

2000). O corte de cabelo, mesmo com a proibição do marido, bem como, a separação, num período

de valorização do casamento, permite-nos refletir sobre corpos que resistem a regulações

estabelecidas.

São casos, contudo, que perpassam por uma clara legitimação da violência revestida de um

conjunto de expressividade corporal do sagrado. Já que o “santo” é aquele que transforma o próprio

corpo em dádiva (MAUSS; HUMBERT, 2005). Além do que, a morte é o evento fundador das

prestações e contraprestações obrigatórias, no qual a promessa, a graça e o pagamento da promessa

ou da obrigação estabelecem a coesão e ligação dos devotos com o “santo”.

Felix Caluccio (1986) oferece algumas pistas para se pensar esta temática dos santos não

canônicos. Ele aponta a existência de duas categorias principais de santos não canônicos: a dos

iluminados, “pessoas especiais” que dedicaram a vida às atividades de caridade e defesa dos pobres,

e a das vitimas de abandono, violência ou injustiça. Dentro da segunda categoria, existem algumas

tipologias: 1) Anjos, categoria reservada às crianças mortas vítima da negligência ou do abandono;

2) Vítimas inocentes, categoria utilizada para adolescentes e adultos espancados, estuprados e

assassinados por motivações perversas ou banais; e 3) Pessoas de “vida errada”, categoria usada

para criminosos e prostitutas que se arrependeram na hora da morte e obtiveram perdão dos

pecados. Maria de Bil e Isabel Maria, na concepção de Caluccio (1986), tornaram-se objeto de

devoção popular porque foram vítimas de morte violenta, atestando que a noção de martírio está

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longe de ter se tornado obsoleta, evidenciando que são transportados preceitos católicos sobre o

corpo sagrado às ações cotidianas dos devotos.

Além disso, na modernidade, a Igreja Católica acolhe o modelo de mulher bondosa, ou seja,

Maria com o menino Jesus é o protótipo da feminilidade santa, é o marianismo, o culto da

superioridade espiritual feminina, que representa sua capacidade infinita de humildade e sacrifício.

(ARY, 2000; NUNES, 2000).

Contudo, a hipótese inicial é que o imaginário do corpo santificado ainda hoje,

frequentemente, construído pela Igreja Católica, numa visão moral dualística, na qual a noção de

carne é diametralmente oposta à do espírito, alinha-se com a produção de “imagens”, que povoam

as ideias dos devotos sobre o corpo sacralizado. Não obstante, é no relacionamento entre o conceito

de pecado e conduta sexual, “que as doutrinas oficiais da Igreja têm mais vigorosamente penetrado

nos baluartes do pensamento popular” (PARKER, 1992, p.116). Destarte, a separação do corpo e da

alma, da sexualidade e da espiritualidade, uma noção dual do catolicismo barroco se perpetua até o

momento atual, possibilitando a construção e reconstrução do “modelo de santidade”, seja no

contexto da fé burocratizada, seja no contexto da “fé espontânea” da religiosidade popular.

Em contrapartida, as narrativas em torno de Maria de Bil e Isabel Maria, tratadas aqui como

práticas sociais e produtoras de sentido, revelam como as pessoas estruturam suas experiências

passadas e constroem sua noção de fé e santidade (SILVA, 2002; PATAI, 2010). “Quando os

sujeitos constroem suas narrativas, realizam uma reelaboração constante sobre o que eles viveram.

Nesse momento, fazem uma reflexão sobre o vivido, o que permite que refaçam o seu mundo e se

reconstruam nele como sujeitos” (GUSSI, 2008, p.12).

Assim, as narrativas escutadas são construções e reconstruções da memória em torno de

como se tornaram devotos e da fé a tais “santas”. É uma forma de “contar-se” e de rememorar

investida de uma aura simbólica. Paradoxalmente, o ser devoto a Maria de Bil e a Isabel Maria é

também transbordar a ortodoxa do catolicismo oficial, este ainda é um espaço para um determinado

“modelo” de santidade feminina. A história destas mulheres assassinadas é presença viva nas falas

dos devotos, reacendendo, portanto, biografias de “santas Marias às avessas”: mulheres pobres,

negras, do interior do Nordeste e mortas pelos companheiros de forma cruel, porque não aceitaram

padrões instituídos.

Referências

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“Marias torn apart and sanctified”: the story of the murder and the devotion to Mary of Bil

and Isabel Maria in Ceará State.

Astract: Maria de Bil and Isabel Maria are personages that are part of the popular religiosity of

Ceará. The devotion to these "saints" are rituals, marked by a dynamism and flexibility in relation to

the hierarchy of the Roman Catholic Church, since they are not centered on dogmas. Isabel Maria

da Conceição, with 28 years of age, in the city of Guaraciaba North-Ceará , on 11 October 1929,

was murdered and thrown into the abyss by her husband, he do not accepted the hair cut of his wife.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

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She is known as protector of the wives beaten and women betrayed. Maria de Bil, name written

beside of murderer, she was dead on 11 March 1926, in the city of Várzea Alegre, the spouse who

did not accepted the end of the relationship. He stabbed three time. Some time later after the

episode, was erected a chapel at the crime scene. Paradoxically, at the same time that these women,

in social imaginary, who approach the of ideal Catholics by the cruelty suffered, On the other hand,

at the heart of the narratives, explains the resistance of the feminine to passive ideals, Since they do

not yet complied with the standards set by companion and opposed to marriage. Such resistance

culminated in the murder, the most cruel violence against women, permeated with domination, of

honor, power and masculinity.

Keywords: Popular religiosity. Gender. Devotion.