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INATIVAÇÃO TÉRMICA DA PEROXIDASE PRESENTE NO PURÊ DE MANGA (Mangifera indica Linn.) VARIEDADE PALMER Luciana Kaori Shintani 1 Carmen Cecília Tadini 2 Aurea Yuki Suga 3 i³ Resumo A manga (Mangifera indica Linn.) é uma fruta tipicamente tropical. Bem adaptada ao solo brasileiro e ao gosto da população, tem participação considerável na pauta de exportação nacional. A preferência pelo consumo in natura é dificultada pela alta perecibilidade e suscetibilidade a doenças e injúrias físicas, sazonalidade curta e coincidente com o de outras frutas. Há também deficiências nas cadeias produtivas e de distribuição da manga, apesar de se observar excessos de produção da fruta devido ao entusiasmo gerado pela crescente procura. A industrialização da manga na forma de purê seria uma alternativa a estes problemas. O objetivo deste projeto de Iniciação Científica foi avaliar a atividade das enzimas peroxidase e polifenoloxidase, antes e depois do processamento do purê de manga em trocador de calor a placas e duplo-tubo, para determinação da melhor condição de tempo e temperatura para produção de um purê estável do ponto de vista físico-químico e microbiológico. Houve dificuldades na determinação da atividade da polifenoloxidase, mas para a peroxidase foi observado que tratamento térmico a 75,0 °C reduziu a atividade a 4,3%. Os parâmetros cinéticos também foram obtidos para a peroxidase: D 77,2ºC e z iguais a 14,2 segundos e 14,3 °C, respectivamente. Palavras-chave: purê de manga, tratamento térmico, atividade enzimática. THERMAL INACTIVATION OF PEROXIDASE IN MANGO PUREE (Mangifera indica Linn.) PALMER VARIETY Abstract Mango (Mangifera indica Linn.) is a typical tropical fruit. Well adapted to the Brazilian soil and to the population taste, it has considerable participation in the national exportation. The preference for in natura consume is difficulted by high perishability and susceptibility to diseases and physical damages, short seasonality and coincident to other fruits. There are also deficiencies on the production and distribution of mango, despites the excessive production of the fruit generated by the enthusiasm of increasing demand. The mango industrialization as a puree would be an alternative solution to these problems. The 1 Bolsista do CNPq/PIBIC 2004/2005 2 Professora do Departamento de Engenharia Química da EPUSP 3 Bolsista Doutorado CAPES

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INATIVAÇÃO TÉRMICA DA PEROXIDASE PRESENTE NO PURÊ DE MANGA

(Mangifera indica Linn.) VARIEDADE PALMER

Luciana Kaori Shintani1 Carmen Cecília Tadini2

Aurea Yuki Suga3i³ Resumo

A manga (Mangifera indica Linn.) é uma fruta tipicamente tropical. Bem adaptada ao solo brasileiro e ao gosto da população, tem participação considerável na pauta de exportação nacional. A preferência pelo consumo in natura é dificultada pela alta perecibilidade e suscetibilidade a doenças e injúrias físicas, sazonalidade curta e coincidente com o de outras frutas. Há também deficiências nas cadeias produtivas e de distribuição da manga, apesar de se observar excessos de produção da fruta devido ao entusiasmo gerado pela crescente procura. A industrialização da manga na forma de purê seria uma alternativa a estes problemas. O objetivo deste projeto de Iniciação Científica foi avaliar a atividade das enzimas peroxidase e polifenoloxidase, antes e depois do processamento do purê de manga em trocador de calor a placas e duplo-tubo, para determinação da melhor condição de tempo e temperatura para produção de um purê estável do ponto de vista físico-químico e microbiológico. Houve dificuldades na determinação da atividade da polifenoloxidase, mas para a peroxidase foi observado que tratamento térmico a 75,0 °C reduziu a atividade a 4,3%. Os parâmetros cinéticos também foram obtidos para a peroxidase: D77,2ºC e z iguais a 14,2 segundos e 14,3 °C, respectivamente.

Palavras-chave: purê de manga, tratamento térmico, atividade enzimática.

THERMAL INACTIVATION OF PEROXIDASE IN MANGO PUREE

(Mangifera indica Linn.) PALMER VARIETY

Abstract

Mango (Mangifera indica Linn.) is a typical tropical fruit. Well adapted to the Brazilian soil and to the population taste, it has considerable participation in the national exportation. The preference for in natura consume is difficulted by high perishability and susceptibility to diseases and physical damages, short seasonality and coincident to other fruits. There are also deficiencies on the production and distribution of mango, despites the excessive production of the fruit generated by the enthusiasm of increasing demand. The mango industrialization as a puree would be an alternative solution to these problems. The

1 Bolsista do CNPq/PIBIC 2004/2005 2 Professora do Departamento de Engenharia Química da EPUSP 3 Bolsista Doutorado CAPES

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objective of this project was to study the activity of peroxidase and polyphenol oxidase, before and after thermal processing of the puree in a plate and double-tube heat exchanger for determination of the best combination of time and temperature to obtain a stable physical-chemical and microbiological puree. There were difficulties in the determination of polyphenol oxidase activity, but it was determined that heat treatment at 75 °C reduced the peroxidase activity to 4.3%. The kinetics parameters were also determined to peroxidase: D77.2ºC and z are 14.2 seconds and 14.3 °C, respectively.

Key words: mango puree, heat treatment, enzymatic activity.

1. Introdução

As frutas sempre exerceram fascínio sobre o homem, relatam escribas religiosos antigos. Cor, aroma, sabor e suas propriedades saudáveis atraem e induzem ao consumo.

A manga (Mangifera indica Linn.) é originária da Ásia Meridional e Arquipélago Indiano e foi trazida ao Brasil pelos portugueses no século XVI. País de clima tropical e solo naturalmente fértil, como comprova o histórico comercial nacional de importante exportador de produtos agrícolas, figura entre os dez maiores produtores de manga, segundo dados da FAO, tendo produzido 850 000 Mt em 2004 (FAO, 2005). O consumo se dá em sucos, sorvetes, biscoitos, iogurtes, bebidas alcoólicas e não-alcoólicas, doces, barras de cereais e, principalmente, in natura.

A junção de fatores como a adaptabilidade da manga e a proliferação de numerosas doenças em plantações de outras frutas incentivaram muitos produtores a abandonar seus antigos cultivos ou a incorporar a manga em suas terras.

Desta forma, registrou-se uma super oferta da fruta em 2002 com perspectivas de aumento da produtividade para os próximos anos, diminuindo o preço da manga e o lucro dos produtores (HENRIQUE, 2002).

No entanto a alta perecibilidade e suscetibilidade a doenças e danos físicos dificultam o consumo da fruta ao natural. Exige-se, portanto, um complexo sistema de plantio, condução, colheita, tratamento pós-colheita, armazenagem, transporte e exposição nos pontos de venda a fim de mantê-las vistosas para o consumidor, que busca qualidade a preços baixos. Contabiliza-se ainda o fato de se tratar de um fruto sazonal, de safra entre novembro e março no Brasil, que não dispõe de sistemas eficientes de comercialização e armazenamento, desperdiçando um enorme potencial produtivo.

Segundo Faveret Filho et al. (s.d), apenas 10% da produção de frutas chega ao consumidor em sua forma natural, como era de se esperar ao levar em conta os obstáculos apresentados. Uma alternativa para um melhor aproveitamento da potencialidade de produção frutícula, evitar super oferta, escassez em tempos de entressafra e fugir da deficiência na infra-estrutura de produção, transporte e distribuição, seria o processamento industrial, onde há também a possibilidade de aproveitamento do que é desperdiçado no

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campo. Ainda, segundo Gonçalves (2000), é vantajoso industrializar alimentos por agregar maior valor ao produto.

O presente trabalho de Iniciação Científica esteve atrelado a um projeto maior, uma Tese de Doutorado do autor³ citado. Desta forma, os objetivos e resultados foram de comum interesse e de grande valia para ambas as partes, dado que a troca de informações e divisão de tarefas proporcionaram mútuo benefício.

Este projeto teve como objetivo determinar a atividade enzimática da peroxidase e da polifenoloxidase, antes e depois do processamento em trocador de calor a placas e duplo-tubo, para determinar a melhor condição de tempo e temperatura para produção do purê de manga.

2. Revisão Bibliográfica

2.1. Manga

A manga (Mangifera indica Linn.) é originária da Ásia Meridional e Arquipélago Indiano, sendo nativa do Ceilão e região do Himalaia, onde aparece em florestas. O Brasil foi o primeiro país americano a cultivar a mangueira, trazida pelos portugueses no século XVI e plantada inicialmente no Rio de Janeiro (CAMARGO FILHO; ALVES; MAZZEI, 2004).

As variedades de manga podem ser agrupadas de acordo com a aptidão para uso culinário. Para consumo in natura, destacam Haden, Tommy Atkins, Keitt, Palmer, Ruby, Zill e Van Dick; para elaboração de compotas em calda: Imperial, Carlota, São Quirino, Nom Plus Ultra, Haden, Palmer, Kent e Zill; para fabricação de néctar: Carlota, Palmer, Manga D’água e Sensation.

A manga é constituída de água, sais minerais, carboidratos, ácidos orgânicos, proteínas, vitaminas e pigmentos. Sua composição química varia com as condições de cultura, a variedade e o estágio de maturação. Jagtiani; Chan Jr.; Sakai (1988) atestam as seguintes variações durante o amadurecimento:

• Aumento na quantidade de sólidos solúveis, pH, açúcares totais, sacarose, carotenos e intensidade do sabor;

• Diminuição na quantidade de sólidos insolúveis, acidez e teor de amido;

• Constância na quantidade de sólidos totais;

• Aumento das taxas de respiração e transpiração até um pico seguido de diminuições;

• Escurecimento da polpa: de amarelo claro para amarelo escuro ou laranja.

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Por se tratar de um fruto delicado e frágil do ponto de vista físico e biológico, sazonal e de safra curta, atrelado a uma cadeia produtiva deficiente e que conta com excessos de produção pela crescente procura, pode-se encontrar na industrialização uma solução para contornar os obstáculos à sua comercialização.

2.2. Purê de manga

O purê de manga é uma solução em potencial para grande parte dos problemas apresentados. Além de agregar valor a um produto primário, traz comodidade e se aproxima muito da fruta ao natural.

Ao consultar os termos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, 2005), constata-se que no Brasil não existe legislação para análise de produtos novos como o purê de manga, que é avaliado de acordo com a norma destinada ao suco de manga.

A Instrução Normativa Nº 12, de 10 de setembro de 1999, estabelece os padrões de identidade e as características mínimas de qualidade para polpa de fruta destinada ao consumo exclusivamente como bebida. Define-se polpa de fruta como sendo o produto não fermentado, não concentrado, não diluído, obtido de frutos polposos através de processo tecnológico adequado, com um teor mínimo de sólidos totais específico para cada fruta (ANVISA, 2005).

Estabelece-se que a polpa ou purê de manga deve ter coloração amarela, aroma e sabor próprios, além de doçura e leve acidez. A Tabela 2.2.1 apresenta a composição do purê de manga aceitável para consumo.

Tab. 2.2.1 – Composição do purê de manga estabelecida pela Anvisa para consumo como bebida

Mínimo Máximo

pH 3,3 4,5

Sólidos solúveis em ºBrix, a 20 ºC 11,0 -

Acidez total expressa em ácido cítrico (g/100g) 0,32 -

Açúcares totais naturais da manga (g/100g) - 17,00

Sólidos totais (g/100g) 14,00 -

Fonte: ANVISA, 2005.

2.3. Tratamento térmico

O tratamento térmico se faz necessário para retenção das qualidades de sabor e aroma, além de ter vital importância no processo de inativação de enzimas, objeto de estudo deste projeto.

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Sabe-se que a resistência térmica de microrganismos capazes de se desenvolver no purê de manga é menor que a de enzimas como peroxidase e polifenoloxidase, presentes na manga (LABIB et al., 1995). Desta forma, determinar as condições em que ocorre inativação enzimática implica obter um produto seguro do ponto de vista microbiológico.

2.3.1. Peroxidase (POD)

A peroxidase, classificada como uma enzima oxirredutora, participa de numerosos processos fisiológicos nas plantas, entre eles, perda de coloração, sabor, textura e nutrientes da fruta. No entanto, sua função não se restringe a aspectos negativos, sendo fundamental no desenvolvimento de sabor e cor de alimentos como o chá preto, diminuição do amargor e adstringência dos produtos do cacau e formação de aldeídos e aminoácidos (LIMA; PASTORE; LIMA, 2001).

Sabe-se que a POD não existe nos frutos como uma enzima isolada, e sim como grupos de isoenzimas, cuja versatilidade e quantidade de reações associadas a ela é superior a qualquer outra conhecida.

Marin; Cano (1992) estudaram o comportamento da peroxidase em função da quantidade de proteínas durante o amadurecimento das variedades Lippens e Smith. Em ambos os casos ocorre aumento na atividade da POD nos doze primeiros dias e constância no valor após este período, sendo que a quantidade de proteínas apresenta um comportamento oposto: decréscimo seguido de constância. Este resultado condiz com o fato de que a enzima é o pivô transformador da proteína, além de demonstrar a dinâmica de sua atividade quando em sua forma natural, não processada.

Em Prabha; Patwardhan (1986) determinou-se a atividade da POD na casca e na polpa de manga. Em ambos os casos, a atividade apresenta crescimento até um máximo, quando então decai, durante o processo de maturação. Para a polpa, no entanto, os valores obtidos são maiores que para a casca.

Outra importante propriedade da peroxidase é sua alta estabilidade térmica, sendo portanto, muito utilizada para determinação dos níveis de qualidade através de sua inativação por calor.

Uma vez que este projeto está fundamentado na maior resistência térmica das enzimas sobre a dos microorganismos, analisar o comportamento da POD antes e após o processamento térmico é de importância primária (ROBINSON, 1991), principalmente após estudo de Zawistowski; Biliaderis; Eskin (1991), que aponta uma maior estabilidade térmica da peroxidase sobre a polifenoloxidase.

2.3.2. Polifenoloxidase (PPO)

A polifenoloxidase destaca-se entre outras enzimas vegetais por ser responsável pelo escurecimento característico que acompanha a maturação. Por oxidação, a enzima converte componentes fenólicos em quinonas instáveis que são posteriormente polimerizadas, sendo

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os produtos formados responsáveis pela formação de pigmentos escuros. O esquema abaixo ilustra esta reação.

Fig. 2.3.2.1. Oxidação do catecol em quinona sob ação da PPO Durante o amadurecimento, Prabha; Patwardhan (1986) observaram aumento da

atividade da PPO na casca em duas etapas e atividade nula na polpa.

Para análise desta atividade enzimática, Park et al. (1980) determinaram o melhor substrato para o estudo da PPO em mangas. Foram analisadas as atividades enzimáticas para o catecol, ácido caféico, catequin, ácido clorogênico, pirogaliol e L-tirosina, sendo este último monofenólico. Concluiu-se que há atividade apenas nos componentes o-difenólicos, sendo que a atividade medida para o catecol foi a mais alta.

Estudo de Oktay et al. (1995) também determinou o melhor substrato para análise da PPO em frutas. Para maçãs variedade Amasya, determinou-se que o catecol é o substrato mais apropriado para a análise enzimática.

Sabe-se que a distribuição de enzimas não é uniforme na planta. Segundo Labib et al. (1995), a atividade da pectinesterase e da poligalacturonase é maior na casca do que na polpa de manga: 39,0 e 0,75 unidades/100 g na casca e 4,5 e 0,55 unidades/100 g na polpa. Os autores afirmam ainda que a quantidade de pectinesterase na casca é maior que na polpa em todas as variedades de manga. Esta constatação é importante para o presente projeto por determinar alterações importantes quando o purê é preparado com ou sem a casca

Estudo de Katwa; Ramakrishna; Rao (1982) relata o isolamento, purificação e determinação de algumas propriedades da PPO da casca da manga variedade Raspuri. Estudou-se sua estabilidade térmica em três diferentes temperaturas (85, 75 e 65 °C), constatando-se ordem de reação primária e perda de 50% da atividade em 3, 16 e 25,5 minutos, respectivamente. Observou-se também que a polifenoloxidase purificada não apresenta alterações significativas nos valores de pH, temperatura ótima e estabilidade térmica quando comparada com a enzima em sua forma original.

Park et al. (1980) também estudaram a inativação da polifenoloxidase em manga por tratamento térmico. A variedade Haden foi processada a 75, 80 e 85°C, de onde também se constatou ordem de reação primária. A perda de 50% da atividade se deu em 2,1 e 4,0 minutos para 85 e 80°C, respectivamente.

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2.4. Reologia

A reologia estuda o comportamento de um material quando submetido a uma tensão. Ensaios reológicos são fundamentais na indústria química por serem determinantes em cálculos de vazões, perda de carga, na seleção de bombas, testes de vida de prateleira, análises sensoriais entre outros.

Os fluidos cuja taxa de deformação se relaciona linearmente com a tensão de cisalhamento são denominados “newtonianos”. Aos “não-newtonianos”, uma segunda classificação divide os fluidos entre dependentes do tempo, subdivididos ainda em tixotrópicos e reopéticos, e independentes do tempo, que são os plásticos de Bingham, os dilatantes (shear thickening) e os pseudoplásticos (shear thinning).

Diversos estudos reológicos indicaram a natureza não-newtoniana do purê de manga. Nestes estudos, o purê foi classificado como um fluido pseudoplástico, ou seja, sua viscosidade aparente decresce com o aumento da tensão de cisalhamento (COSTA; ANDRADE, 2000; GUERRERO; ALZAMORA, 1998; ROY; JOSHI; NATH, 1997; SUGAI, 2002).

2.5. Parâmetros cinéticos

No estudo da cinética de inativação térmica de enzimas adotam-se alguns parâmetros para facilitar os cálculos da determinação da melhor condição tempo-temperatura (PENNA; MACHOSHVILI, 1997):

O valor “D” ou Tempo de Redução Decimal é definido como o intervalo de tempo à temperatura de tratamento constante para uma redução de 90% da atividade enzimática, inicialmente presente no produto.

“z” representa o intervalo de temperatura que ocasiona uma variação de 10 vezes no valor de D. Quanto menor for z, maior a variação do tempo de redução decimal com a temperatura de exposição.

“F” é dado como o intervalo de tempo de aquecimento necessário, à temperatura de referência constante, para se obter o nível de inativação pré-estabelecido.

O bom entendimento do significado destes parâmetros aliado à correta manipulação matemática permite prever o comportamento da cinética de inativação para condições não executadas experimentalmente, ou seja, a partir dos dados de alguns ensaios, é possível predizer resultados.

3. Materiais e Métodos

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3.1. Matéria-prima

Foram utilizadas mangas da variedade Palmer, doadas por um produtor da cidade de Monte Alto, estado de São Paulo.

3.2. Purê de manga

As mangas foram selecionadas, lavadas, descascadas e suas sementes, retiradas. Os pedaços de manga foram esmagados com despolpadeira Hauber Macanuda, modelo DM-Ji, com peneira de 1,0 mm para remoção das fibras. Conforme se mostrou necessário, adicionou-se ácido cítrico cristal ao purê para que o pH do produto fosse inferior a 4,5.

3.3. Processamento contínuo do purê de manga

Os ensaios contínuos foram conduzidos em trocador de calor a placas de bancada, a 75, 80 e 85 ˚C, e em trocador duplo-tubo, a 65, 70 e 75 ˚C, com diferentes vazões em todos os ensaios.

Em trocador de calor a placas, determina-se o tempo de retenção pela razão entre volume do tudo de retenção e vazão volumétrica.

vazãovolume

t tuboretenção = (1)

Em trocador de calor duplo-tubo, o processamento do purê de manga é considerado um caso típico de pasteurização por escoamento contínuo via enchimento asséptico ou a frio (TOLEDO, 1991). A velocidade média do fluido, Vméd, é dada pela razão entre a vazão volumétrica, Q, e a área transversal do tubo de retenção, A. Ou melhor:

AQVméd = (2)

Conhecendo-se o perfil de velocidades do fluido (laminar) e sabendo que o purê de manga é um fluido pseudoplásico, cujo comportamento é bem descrito pela Lei de Potência, pode-se calcular a velocidade correspondente ao escoamento no centro do tubo, que é a máxima para as condições dadas:

( )( ) médmáx VnnV

113

++= (3)

“n” corresponde ao índice de comportamento, cujo valor de 0,3 foi determinado experimentalmente para o purê de manga (SUGAI, 2002).

Esta Vmáx calculada permite determinar o tempo de retenção mínimo que uma certa quantidade de fluido permanecerá no tubo de retenção:

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máxmín V

Lt = (4)

“L” corresponde ao comprimento do tubo de retenção do trocador duplo-tubo e vale

14,18 m.

3.3.1. Características dos trocadores de calor a placas e duplo-tubo

O trocador de calor a placas, marca ARMFIELD FT43A, possui os seguintes componentes e acessórios: unidade processadora de pasteurização, tanque de alimentação de 4 L, bomba peristáltica, variador de vazão, controlador de temperatura, circulador de água fria e interface para aquisição da temperatura através de termopares tipo T, acoplada a PC, ARMFIELD FT43A-90IFD. A vazão máxima de trabalho é de 30 L/h de produto.

Utilizou-se uma configuração das placas de 6 : 4 : 1, ou seja, seis passes no aquecimento, dez passes na regeneração e quatro passes no resfriamento (Figura 4.3.1) e tubo de retenção de 75,8 cm³ nos ensaios.

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Figura 3.3.1. Arranjos das três seções de troca térmica do trocador de calor a placas utilizado nos experimentos.

Saída do produtopasteurizado

Saída da água fria

Entrada da água fria na seção de

resfriamento

RESFRIAMENTO

4 de 1 4 de 1

Sistema de Refrigeração

Entrada da água quente

Saída do produto da seção de

aquecimento

Entrada do produto crú na

seção de regeneração

AQUECIMENTO

6 de 1 6 de 1

REGENERAÇÃO

Saída da água quente

Entrada do produto quente na seção de

regeneração

10 de 1 10 de 1

Tubo de Retenção

Sistema de Aquecimento

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O trocador de calor duplo-tubo apresenta bateria de dez módulos de troca térmica na seção de aquecimento de 1,8 m de comprimento cada um, com tubo interno de diâmetro externo 6 mm e interno de 4,5 mm e tubo externo de diâmetro 30 mm. Um tubo de retenção, de mesmo diâmetro do tubo interno do módulo de troca térmica liga a seção de aquecimento à seção de resfriamento. As duas seções são equivalentes.

Uma bomba monofuso excêntrico marca NETZSCH modelo 3NE10A com variador de freqüência marca DANFOSS modelo VLT Micro foi acoplada aos módulos de troca térmica para bombeamento do purê e para realização do ciclo de limpeza.

Usou-se também um gerador de vapor marca CLAYTON modelo RO430 para fornecimento de vapor para aquecer o sistema de água quente da seção de aquecimento. Instalou-se ainda uma válvula solenóide marca SPIRAXSARCO modelo D892DPVC ligada a um controlador de temperatura marca COEL modelo HW500 que foi conectado a um termopar tipo J marca IOPE.

3.4. Análises físico-químicas

3.4.1. pH: medição em pH-Stat Radiometer modelo PHM-290.

3.4.2. Acidez titulável (expressa em porcentagem de ácido cítrico): determinação conforme metodologia descrita em AOAC (1995).

3.4.3. Sólidos solúveis (°Brix): medição em refratômetro marca Carlzeiss Jena (711849), com correções de temperatura (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 1976).

3.4.4. Sólidos totais: determinação conforme metodologia descrita em AOAC (1995) e INSTITUTO ADOLFO LUTZ (1976).

3.4.5. Sólidos insolúveis: determinação pela diferença entre os valores de sólidos totais e sólidos solúveis.

3.4.6. Atividade da enzima peroxidase: determinada conforme metodologia descrita por Khan; Robinson (1993).

Para a obtenção do extrato, homogeneizou-se o purê com solução tampão fosfato de sódio 0,001 M (pH 7,5), em banho de água com gelo, na proporção de 1 g de purê para 2 mL de solução. Para remover impurezas e clarificar os extratos, utilizou-se filtro de pano e centrifugação por 20 minutos (4 °C) a 19000 g.

Para determinação da atividade da peroxidase, analisou-se a mistura de 2,7 mL de solução tampão fosfato de sódio 0,01 M (pH 6,0) com H2O2 (0,03%), 0,2 mL do extrato de peroxidase e 0,1 mL de solução de o-dianisidina (1%) em espectrofotômetro, a 25 °C, em comprimento de onda de 460 nm.

3.4.7. Atividade da enzima polifenoloxidase: determinada conforme metodologia descrita por Lima; Pastore; Lima (2001) e Oktay et al. (1995).

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No estudo da polifenoloxidase, extraiu-se a enzima utilizando 10 g de purê em 20 mL de solução tampão fosfato de potássio 0,025 M (pH 7,5). A mistura foi homogeneizada por 3 minutos a 4 °C e centrifugada a 11000 g durante 15 minutos a 0 °C.

Determinou-se a atividade da PFO via análise em espectrofotômetro da solução contendo 0,3 mL de extrato enzimático, 3,6 mL de catecol e 5,1 mL de solução tampão de fosfato de potássio, a 25 °C. O comprimento de onda utilizado foi de 420 nm.

4. Resultados e Discussão

Inicialmente, são apresentados os dados relativos aos ensaios em trocador de calor a placas e duplo-tubo. Posteriormente, é demonstrado como determinar os parâmetros cinéticos além de uma pequena consideração a respeito da polifenoloxidase.

4.1. Tratamentos térmicos aplicados ao purê de manga

4.1.1. Ensaios em trocador de calor a placas

Inicialmente, foram realizados três ensaios de processamento contínuo de purê de manga em trocador de calor a placas, com três condições de vazão e temperatura. A quantidade de manga processada em cada ensaio e as condições de processo são apresentadas nas Tabelas 4.1.1.1 e 4.1.1.2, respectivamente.

Tab. 4.1.1.1 - Quantidade de mangas processadas no trocador de calor a placas.

Massa das mangas (g) Massa do purê (g) Rendimento (%)

Ensaio 1 16 675,3 8 358,8 50,1

Ensaio 2 18 578,8 9 640,3 51,9

Ensaio 3 16 078,0 8 068,0 50,2

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Tab. 4.1.1.2 - Condições dos processos conduzidos em trocador de calor a placas.

Vazão volumétrica (m3/s)

Tempo de retenção (s)

Temperatura na saída do tubo de retenção (°C)

Ensaio 1

C1 1,5E-06 51,7 73,9 ± 0,4

C2 2,1E-06 36,6 75,3 ± 1,1

C3 2,7E-06 28,6 73,9 ± 0,4

Ensaio 2

C4 1,7E-06 44,8 85,9 ± 0,5

C5 1,9E-06 40,7 85,9 ± 0,3

C6 2,5E-06 30,8 86,0 ± 0,6

Ensaio 3

C7 7,3E-06 103,5 79,2 ± 0,6

C8 1,4E-07 53,9 81,2 ± 1,5

C9 6,0E-07 125,5 78,2 ± 0,7

Em cada ensaio, foram coletadas amostras de purê não processado e processado em cada uma das três condições de tempo e temperatura. Nestas amostras foram efetuadas as análises físico-químicas mencionadas: pH, acidez titulável, sólidos solúveis, sólidos totais e sólidos insolúveis, cujos resultados são apresentados na Tabela 4.1.1.3.

Tab. 4.1.1.3 - Análises físico-químicas das amostras dos ensaios conduzidos em trocador de calor a placas.

Amostra

pH

Ac. titulável

(% acido cítrico)

Sol. solúveis

(°Brix)

Sol. Totais

(%)

Sol. Insolúveis3

(%)

Ensaio 1¹ 4,433 ± 0,006 0,213 ± 0,001 13,4 ± 0,0 15,7 ± 0,0 2,3

Ensaio 2¹ 4,484 ± 0,005 0,215 ± 0,001 14,0 ± 0,0 16,7 ± 0,0 2,3

Ensaio 3² 4,467 ± 0,006 0,214 ± 0,003 12,6 ± 0,0 15,1 ± 0,0 2,5

¹ Foram adicionados 0.05% de ácido cítrico para correção do pH ² Foram adicionados 0.125% de ácido cítrico para correção do pH 3Calculado por diferença

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Os resultados obtidos da atividade residual da peroxidase nesta fase inicial são apresentados na Tabela 4.1.1.4.

Tab. 4.1.1.4 – Atividade da peroxidase nas amostras não processadas e atividade

residual da enzima após processamento em trocador de calor a placas.

Atividade da Peroxidase Atividade ¹ Atividade residual ²

Não processada 1 0,4260 1

C1 0,0285 0,067

C2 0,0175 0,041

C3 0,1040 0,244

Não processada 2 0,0058 1

C4 Não foi observada atividade

C5 Não foi observada atividade

C6 Não foi observada atividade

Não processada 3 0,0057 1

C7 Não foi observada atividade

C8 Não foi observada atividade

C9 Não foi observada atividade ¹ UAbs/mL.min a 460 nm ² Em relação à amostra não processada

Pelos resultados obtidos, foi observado que as temperaturas acima de 78 °C (condições C4 a C9) não foi detectada a atividade da enzima peroxidase após o tratamento térmico. A 75,3 °C, a atividade residual foi de 4,1%, a mínima detectada.

A partir destes resultados, verificou-se a necessidade de mais ensaios. Optou-se pela utilização do trocador de calor duplo-tubo, uma vez que os ensaios em trocador a placas foram de difícil execução. Este trocador foi dimensionado originalmente para pasteurização de leite, o que talvez explique as dificuldades encontradas no tratamento térmico do purê de manga, que é um produto muito mais viscoso. Já o trocador duplo-tubo foi projetado para o tratamento térmico do purê de banana, produto mais semelhante ao purê de manga. A utilização deste trocador possibilitaria ainda a execução de condições mais brandas de tratamento térmico, já que a velocidade de alimentação deste equipamento é maior que no trocador a placas, implicando menor tempo de retenção e, conseqüentemente, condições mais brandas de operação.

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4.1.2 Ensaios em trocador de calor duplo-tubo

Outros três ensaios foram realizados, cada qual com três condições de tempo e temperatura, excetuando-se o primeiro, no qual quatro condições foram testadas. A quantidade de manga processada em cada ensaio e as condições de processo são apresentadas nas Tabelas 4.1.2.1 e 4.1.2.2, respectivamente.

Tab. 4.1.2.1 - Quantidade de mangas processadas no trocador de calor duplo-tubo.

Massa das mangas (g) Massa do purê (g) Rendimento (%)

Ensaio 4 39 025,2 21 219,0 54,4

Ensaio 5 42 794,3 20 553,4 48,0

Ensaio 6 37 738,3 20 947,2 55,5

Tab. 4.1.2.2 Condições dos processos conduzidos em trocador de calor duplo-tubo.

Vazão volumétrica (m³/s)

Tempo de retenção (s)

Temperatura na saída do tubo de retenção (°C)

Ensaio 4

C10 3,78E-06 40,7 75,3 ± 1,1

C11 6,17E-06 25,0 75,0 ± 1,1

C12 9,33E-06 16,5 76,2 ± 1,4

C13 1,21E-05 12,8 77,2 ± 0,8

Ensaio 5

C14 1,46E-05 10,6 65,3 ± 0,3

C15 7,58E-06 20,3 64,7 ± 0,5

C16 3,75E-06 41,1 64,6 ± 0,5

Ensaio 6

C17 1,49E-05 10,3 70,1 ± 0,2

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C18 7,61E-06 20,3 69,3 ± 0,2

C19 3,65E-06 42,3 69,6 ± 0,1

Nas amostras foram conduzidas as análises físico-químicas cujos resultados estão apresentados na Tabela 4.1.2.3.

Tab. 4.1.2.3 - Análises físico-químicas das amostras dos ensaios conduzidos em trocador de calor duplo-tubo.

Amostra

pH

Ac. titulável

(% acido cítrico)

Sol. solúveis

(°Brix)

Sol. Totais

(%)

Sol. Insolúveis3

(%)

Ensaio 4¹ 4,403 ± 0,044 0,22 ± 0,00 17,1 ± 0,0 18,0 ± 0,1 0,9

Ensaio 5¹ 4,324 ± 0,009 0,22 ± 0,00 18,3 ± 0,2 18,9 ± 0,0 0,6

Ensaio 6² 4,361 ± 0,010 0,24 ± 0,01 18,3 ± 0,2 19,3 ± 0,0 1,0

¹ Foram adicionados 0.05% de ácido cítrico para correção do pH ² Foram adicionados 0.125% de ácido cítrico para correção do pH 3Calculado por diferença Os resultados obtidos da atividade da peroxidase são apresentados na Tabela 4.1.2.4.

Tab. 4.1.2.4 – Atividade da peroxidase nas amostras não processadas e atividade residual da enzima após processamento em trocador de calor duplo-tubo.

Atividade da Peroxidase Atividade ¹ Atividade residual ²

Não processada 4 0,3800 1

C10 Não foi observada atividade

C11 0,0165 0,043

C12 0,0565 0,149

C13 0,0400 0,105

Não processada 5 0,3700 1

C14 0,2700 0,730

C15 0,2650 0,716

C16 0,1450 0,392

Não processada 6 0,6600 1

C17 0,5150 0,780

C18 0,4830 0,732

C19 0,0570 0,086

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¹ UAbs/mL.min a 460 nm ² Em relação à amostra não processada

A atividade residual mínima detectada foi na condição C9, de 4,3%, apesar de na condição C10 não se observar atividade. Uma vez que não é possível uma completa inativação da atividade enzimática, sugere-se que, provavelmente, a metodologia utilizada não seja sensível o bastante para detectar atividades muito baixas.

4.2. Determinação dos parâmetros cinéticos

A determinação dos parâmetros cinéticos foi realizada com os dados obtidos no trocador duplo-tubo por um processo iterativo, no qual se buscou a convergência do valor z, que inicialmente foi estimado. Para estes cálculos, considerou-se escoamento isotérmico no tubo de retenção.

Cada uma das condições de tratamento térmico, que resultou em uma certa inativação térmica da peroxidase, equivale a um intervalo de tempo de aquecimento a uma temperatura de referência constante.

Neste trabalho, a temperatura de referência considerada foi a máxima de cada ensaio, assim como feito por Tajchakavit; Ramaswamy (1997).

zTT

mínT

ref

reftF

)(

.

.

.10

= (4)

Em um gráfico semi-logarítmico da atividade residual da peroxidase em função dos valores de FTref., três retas foram obtidas, cujos negativos inversos dos coeficientes angulares forneceram os três valores de D, um para cada temperatura de referência

Em um gráfico semi-logarítmico de D em função da temperatura de referência, uma única reta foi obtida, cujo negativo inverso do coeficiente angular forneceu o valor de z, que foi comparado com o valor inicialmente estimado. Após a obtenção de valores compatíveis, encerrou-se o processo iterativo.

Para efeito ilustrativo, encontram-se detalhados na Tabela 4.2.1 os valores determinados na última iteração executada. As retas correspondentes também são apresentadas nas Figs. 4.2.1 e 4.2.2.

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Tab. 4.2.1 – Valores da última iteração para determinação de z

Z estimado = 14,327 °C T

(°C) Vazão (m³/s)

Vméd

(m/s) Vmáx (m/s)

tmín (s)

Ativ. Res. (%) log (Ativ. Res.) Fequiv.

(s) D (s) log D

Ensaio 4: Tref = 77,2 °C C10 75,3 3,78E-6 0,238 0,348 40,747 ND ND 30,038 - - C11 75,0 6,17E-6 0,388 0,567 25,009 4,3 0,6335 17,561 - - C12 76,2 9,33E-6 0,587 0,858 16,527 14,9 1,1732 14,071 - - C13 77,2 1,21E-6 0,760 1,111 12,763 10,5 1,0212 12,763 14,205 1,152NP - - - - - 100 2 0 - - Ensaio 5: Tref = 65,3 °C C14 65,3 1,46E-3 0,917 1,340 10,582 73,0 1,8633 10,582 96,154 1,983C15 64,7 7,58E-6 0,477 0,697 20,344 71,6 1,8549 18,468 - - C16 64,6 3,75E-6 0,236 0,345 41,101 39,2 1,5933 36,751 - - NP - - - - - 100 2 0 - - Ensaio 6: Tref = 70,1 °C C17 70,1 1,49E-5 0,938 1,371 10,343 78,0 1,8921 10,343 41,841 1,622C18 69,3 7,61E-6 0,479 0,700 20,257 73,2 1,8645 17,817 - - C19 69,6 3,65E-6 0,229 0,335 42,328 8,6 0,9345 39,045 - - NP - - - - - 100 2 0 - - Z calculado = 14,388 °C ND: Não detectado. NP: Não processado

y = -0,0719x + 2R2 = 0,951

y = -0,0106x + 2R2 = 0,96

y = -0,0232x + 2R2 = 0,837

0,6

0,8

1

1,2

1,4

1,6

1,8

2

0 10 20 30 40

FTref.

log

(ativ

idad

e re

sidu

al)

Tref.=77,2 °CTref.=65,3 °CTref.=70,1 °C

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Fig. 4.2.1 – Determinação de D da enzima peroxidase em purê de manga

y = -0,0695x + 6,5117R2 = 0,9987

1

1,2

1,4

1,6

1,8

2

2,2

64 66 68 70 72 74 76 78 80

T (°C)

log

D

Fig. 4.2.2 – Determinação de z da enzima peroxidase em purê de manga

Estudo de Rosenthal; Rodrigues; Slongo (2005) determinou os valores de D e z da

peroxidase no suco de manga (variedade Ubá ou Carlotinha). A Tabela 4.2.2 apresenta os resultados destes autores e os obtidos neste estudo. Considerando-se as diferenças físico-químicas entre as variedades de manga (pH, teores de sólidos solúveis e insolúveis), o estágio de maturação das frutas, as metodologias empregadas e os equipamentos utilizados, conclui-se que os valores não são discrepantes. A comparação com os valores de literatura dá sustentação aos valores determinados neste trabalho.

Tab. 4.2.2 – Comparação dos valores obtidos de D e z com valores de literatura

Temperatura (°C) D (s) z (°C)

75 284,3 80 128,6

Valores de literatura (ROSENTHAL; RODRIGUES; SLONGO, 2005)

85 32,94

10,68

65,3 96,2 70,1 41,8

Presente estudo

77,2 14,2

14,3

4.3. Polifenoloxidase

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Os dados referentes a peroxidase foram determinados e calculados. Os valores referentes à polifenoloxidase, no entanto, foram descartados.

Nos processamentos conduzidos em trocador de calor a placas, foi possível determinar as atividades residuais da polifenoloxidase. Um obstáculo à continuidade de seu estudo, porém, se deu na incompatibilidade de resultados quando amostras de mesma condição de processo eram analisadas.

Uma explicação pode residir na inadequação da metodologia escolhida ou em problemas na execução da mesma. Contabiliza-se ainda o fato de que as amostras foram congeladas devido à impossibilidade de se determinar todas as atividades residuais imediatamente após o processo. Os efeitos do congelamento nas amostras não foram determinados, mas supõe-se que a formação de cristais de água no purê e a impossibilidade de se atingir a temperatura de congelamento recomendada possam estar por trás da danificação das amostras.

A não reprodutibilidade das análises já seria motivo suficiente para descartar a polifenoloxidase como parâmetro de inativação microbiológica. Esta decisão ganhou ainda mais força após estudo das atividades residuais desta enzima nas amostras do ensaio conduzido em trocador de calor duplo-tubo.

Apesar das condições mais brandas de processo, não foi possível observar atividade residual em nenhuma amostra. Desta forma, todos os cálculos foram baseados nos dados da peroxidase.

5. Conclusões

No total, foram testadas nove diferentes combinações de tempo e temperatura em trocador de calor a placas e dez em trocador de calor duplo-tubo. Os resultados obtidos para a enzima peroxidase mostraram que o processamento do purê de manga realizado a 80°C (Ensaio 3) foi suficiente para que a enzima não apresentasse atividade residual. Já o processamento realizado a 74°C não foi suficiente, sendo que numa das condições testadas (C3), a atividade residual da peroxidase foi de 24,4%.

A polifenoloxidase foi descartada como parâmetro de inativação devido às dificuldades mencionadas. Desta forma, o projeto foi finalizado em função apenas da peroxidase.

A melhor condição de tempo e temperatura do processamento do purê de manga é a que apresenta maior inativação enzimática, ou seja, menor atividade residual.

Dos resultados obtidos neste trabalho, conclui-se que no tratamento térmico a 75,0 °C, houve a maior redução da atividade enzimática: 4,3%.

Os parâmetros cinéticos para a peroxidase também foram determinados: D77,2ºC e z, 14,2 segundos e 14,3 °C, respectivamente.

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Agradecimentos

Ao CNPq pela concessão da Bolsa de Iniciação Científica.

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