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A CRISE DE 1968 NO INSTITUTO MOÇAMBICANO A Senhora Dona Janet Rae Mondlane, esposa do Presidente da FRELIMO Dr. Eduardo Mondlane e Directora do Instituto Moçambicano, disse numa entrevista a Tor Sellström que, quando a FRELIMO foi fundada em 1962, ela e o seu marido decidiram criar uma escola em Dar es Salaam, na Tanzânia, com o apoio financeiro obtido da Fundação Ford. Segundo ela, a assistência durou apenas cerca de um ano, quando Portugal se queixou ao Embaixador americano em Lisboa de que a fundação estava a financiar um movimento terrorista em Moçambique. A assistência teve de ser cancelada. Com o cancelamento da assistência da Fundação Ford e sabendo que os seus avós se originaram da Suécia, a Sra. Dona Janet Mondlane viajou para aquele país para angariar fundos. Através dela, o Instituto obteve financiamento da Suécia, que continuou até 1968, quando foi suspenso devido à crise de 1968 no Instituto Moçambicano. DISCURSO DO PRESIDENTE MONDLANE À COMISSAO DO INSTITUTO MOÇAMBICANO 1 Figura 47 Instituto Moçambicano em Dar es Salaam. Fonte: © 2019 ANTT–PT/TT/PIDE/D-C/001/1044

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A CRISE DE 1968 NO INSTITUTO MOÇAMBICANO

A Senhora Dona Janet Rae Mondlane, esposa do Presidente da FRELIMO Dr. Eduardo Mondlane e Directora do Instituto Moçambicano, disse numa entrevista a Tor Sellström que, quando a FRELIMO foi fundada em 1962, ela e o seu marido decidiram criar uma escola em Dar es Salaam, na Tanzânia, com o apoio financeiro obtido da Fundação Ford. Segundo ela, a assistência durou apenas cerca de um ano, quando Portugal se queixou ao Embaixador americano em Lisboa de que a fundação estava a financiar um movimento terrorista em Moçambique. A assistência teve de ser cancelada.

Com o cancelamento da assistência da Fundação Ford e sabendo que os seus avós se originaram da Suécia, a Sra. Dona Janet Mondlane viajou para aquele país para angariar fundos. Através dela, o Instituto obteve financiamento da Suécia, que continuou até 1968, quando foi suspenso devido à crise de 1968 no Instituto Moçambicano.

DISCURSO DO PRESIDENTE MONDLANE À COMISSAO DO INSTITUTO MOÇAMBICANO

Quando a direcção da FRELIMO encerrou o Instituto Moçambicano em Março de 1968, no mês seguinte, Abril de 1968, a Comissão do Instituto Moçambicano, liderada pelo Sr. A. C. Mwingira, pediu ao Presidente da FRELIMO, Eduardo Mondlane, para que explicasse as causas dos distúrbios no Instituto.

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Figura 47 Instituto Moçambicano em Dar es Salaam. Fonte: © 2019 ANTT–PT/TT/PIDE/D-C/001/1044

Dirigindo-se à Comissão sobre as causas dos distúrbios no Instituto, o Presidente Mondlane começou por dizer que os problemas foram causados pelos novos regulamentos estudantis introduzidos pela reunião do Comité Central da FRELIMO em Outubro de 1966.

“É nossa opinião que as actuais dificuldades no Instituto Moçambicano resultam da direcção firme e definida que o nosso programa educacional tem seguido desde o final de 1966.”

Pouco depois, o Presidente Mondlane mudou a sua linha de discurso e começou a parcialmente culpar o Padre Gwenjere por “agravar a situação” no Instituto:

“Esta situação foi agravada pela atitude do Padre Mateus P. Gwenjere, um sacerdote moçambicano refugiado, que desde a sua chegada se opôs abertamente à nossa política central relativa ao futuro dos estudantes.”

Continuando, o Presidente Mondlane mudou novamente a sua linha de discurso à Comissão e inteiramente culpou o Padre Gwenjere pelo seu “envolvimento directo na criação da actual triste situação no Instituto Moçambicano”.

“No entanto, não demorei muito em Londres antes de receber uma chamada de Dar es Salaam para regressar sem demora, o que fiz imediatamente. Ao chegar a Dar es Salaam … descobri que o Padre Mateus Gwenjere … continuava a incitar os estudantes a rebelarem-se não só contra a direcção do Instituto Moçambicano mas também contra a direcção da própria Frente”.

O Padre Gwenjere chegou a Dar es Salaam em Setembro de 1967. Assim sendo, não teria criado os problemas que, conforme o próprio Presidente Mondlane admitiu no inicio do seu discurso, iniciaram no final de 1966 quando O Comité Central da FRELIMO anunciou novos regulamentos estudantis e os estudantes perceberam de que a FRELIMO estava séria em implementá-los.

Como recém-chegado à FRELIMO, o Padre Gwenjere precisaria de ter poderes extraordinários para, em tão curto espaço de tempo, convencer os estudantes a se revoltarem contra a direcção da FRELIMO: um mês após a sua chegada a Dar es Salaam, ele foi enviado para Nova Iorque, nos Estados Unidos, para discursar na Assembleia Geral das Nações Unidas. Regressou a Dar es Salaam no final de Novembro de 1967 que era o final do ano lectivo de 1967 no Instituto Moçambicano, com os estudantes dispersos para os campos de treino militar durante as férias de fim de ano.

Além do mais, o Padre Gwenjere não era professor no Instituto Moçambicano, conforme a FRELIMO e a maioria dos escritores e acadêmicos alegam. Foi professor de Português na Escola de Formação de Enfermagem da FRELIMO, localizada a cerca de um a dois quilómetros do Instituto Moçambicano. Note-se que ele trabalhou na escola de enfermagem durante apenas algumas semanas, após o que ele decidiu, por sua livre vontade, abandonar o seu trabalho de docente, a fim de se envolver inteiramente na actividade política com o seu grupo de Baraza-la-Wazee (Conselho de Anciãos). De facto, foi ao nível político que o Padre Gwenjere realizou intensa actividade que causou danos irreparáveis à direcção da FRELIMO. Por razões desconhecidas, a direcção da FRELIMO evita referir-se a este assunto.

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Concordar que o Padre Gwenjere foi responsável pelos distúrbios no Instituto Moçambicano equivale a concordar que foi igualmente responsável pelos distúrbios causados pelos estudantes moçambicanos no estrangeiro. Os estudantes moçambicanos no estrangeiro, particularmente nos Estados Unidos, Quénia e Checoslováquia, entraram em rebelião aberta, protestando contra a decisão de interromper os estudos, após a sua primeira graduação, para prestarem serviço militar na FRELIMO.

Quando o Presidente Mondlane criticou fortemente esses estudantes no estrangeiro por se recusarem a interromper os seus estudos, a secção norte-americana da União Nacional de Estudantes Moçambicanos (UNEMO) respondeu com um panfleto igualmente contundente intitulado “a Revolução Moçambicana Atraiçoada” de Maio de 1968. Conforme o título revela, no seu panfleto de nove páginas em português, os estudantes acusaram o Presidente Mondlane de ser um “fantoche imperialista que traíra a Revolução Moçambicana”.

O que seria correcto dizer e o Presidente Mondlane e outros membros da direcção da FRELIMO deliberadamente evitaram admiti-lo, foi que a postura corajosa do Padre Gwenjere, opondo-se abertamente às políticas da FRELIMO sem medo, encorajou os estudantes a apresentarem as suas próprias reivindicações. O Padre juntou-se à FRELIMO num período em que os militantes deste movimento temiam a liderança militar, que muitas vezes recorria à força das armas para resolver as diferenças internas. Ao criticar abertamente as políticas da FRELIMO destemido e a sua postura ousada encorajaram os estudantes a se rebelarem.

O que causou distúrbios no Instituto Moçambicano e no exterior? Do que este autor testemunhou as causas dos distúrbios no Instituto Moçambicano e no estrangeiro foram a introdução, pelo Comité Central da FRELIMO, de regulamentos radicais para estudantes no Instituto Moçambicano assim como o assassinato do Secretário de Defesa e Segurança da FRELIMO, Filipe Samuel Magaia, em Outubro de 1966.

A morte de Filipe Magaia e a divisão do seu Departamento de Defesa e Segurança em dois, com

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Defesa para Samora Machel e Segurança para Joaquim Chissano, ambos "sulistas",

foi vista pelos estudantes, na sua maioria nortenhos, como uma estratégia para concentrar todos poderes, politico-militar e de segurança, nas mãos do grupo dos sulistas.

Durante o período em que este autor esteve no Instituto Moçambicano, nunca viu o Padre Gwenjere incitar os estudantes a rebelarem-se. É verdade que ele aparecia muitas vezes no Instituto. Ele aparecia, no entanto, no final do dia, depois de suas actividades políticas com membros de Baraza-la-Wazee (Conselho de Anciãos), pois a casa onde ele morava, pela primeira vez, estava situada cerca de um a dois quilómetros depois do Instituto. Sempre que aparecesse no Instituto, era cercado pelos estudantes que o conheciam, notadamente pelos seus ex-estudantes da Missão de Murraça e pelos ex-seminaristas de Zóbuè, ambos recém-chegados ao Instituto e que, portanto, não eram responsáveis pelos distúrbios que, como o próprio Presidente Mondlane admitiu no início do seu discurso à Comissão, começaram em Dezembro de 1966, depois do Comité Central da FRELIMO ter anunciado novos regulamentos estudantis.

Quando chegou a hora dos estudantes partirem para Nachingwea e outros acampamentos militares durante as férias, muitos deles fugiram do Instituto, atravessando a fronteira para Nairóbi, no Quénia. No início do ano letivo de 1968, a inquietação continuou, com os estudantes não querendo assistir às aulas e convocando uma reunião com a direcção da FRELIMO para apresentarem suas queixas. O primeiro encontro com os alunos foi presidido pelo Secretário do Departamento de Educação e Cultura, Armando Guebuza, e contou com a presença da Directora do Instituto Moçambicano, Dona Janet Mondlane; Deão do Instituto Moçambicano, Eduardo Bacião Coloma; assim como membros do corpo docente. Os estudantes reclamaram que os professores do Instituto Moçambicano não estavam qualificados e o nível de educação era baixo. Para além desta reclamação relacionada com os seus estudos, a maior parte das outras questões que colocaram eram de natureza política.

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Presidente Eduardo Mondlane com Samora Machel tido como mentor do novo regulamento estudantil. Fonte: : © 2019 Centro de Documentação e Formação Fotográfica. Maputo.

Deão do Instituto Moçambicano João Joaquim Unhay numa reunião com a Directora do Instituto Janet Mondlane. Fonte: © 2019 Centro de Documentação e Formação Fotográfica, Maputo

Na segunda reunião com os estudantes, o Presidente Mondlane pediu ao seu Vice-Presidente, Uria Simango, que ouvisse as queixas dos estudantes. Numa reunião que manteve com os estudantes em 15 de Fevereiro de 1968, Uria Simango foi acompanhado por Marcelino dos Santos e pelo Deão Eduardo Coloma. Os estudantes repetiram as mesmas perguntas feitas durante o primeiro encontro com Armando Guebuza. Perguntaram igualmente por que razão os filhos dos dirigentes da FRELIMO não estudavam juntamente com outros refugiados moçambicanos. Simango apenas anotou as perguntas feitas, prometendo respondê-las mais tarde.

A terceira reunião teve lugar na noite de 23 de Fevereiro de 1968, com o próprio Presidente Mondlane. O Presidente da FRELIMO chegou inesperadamente ao Instituto e realizou uma reunião informal com os estudantes. Começou por inteirar aos estudantes sobre a sua visita as zonas libertadas no interior de Moçambique. Ele disse aos estudantes que visitou as áreas libertadas das províncias de Cabo Delgado e Niassa para se inteirar do desenvolvimento da luta. Da mesma forma, falou sobre a boa produção agrícola nas áreas libertadas da Província do Niassa onde, segundo ele, o milho "atingia a sua altura". Mondlane era um homem alto de quase dois metros.

Os estudantes, que não estavam interessados no que lhes estava a dizer, começaram a fazer-lhe perguntas e uma das perguntas que fizeram foi por que razão a direcção da FRELIMO era composta por pessoas provenientes apenas da sua tribo (shangaan). O Presidente Mondlane negou que a direcção do movimento estivesse cheia de pessoas da sua tribo. Como já era tarde, ele prometeu aos estudantes que apareceria no dia seguinte para provar que estavam errados. Cumprindo a sua promessa, o Presidente Mondlane apareceu no Instituto na manhã do dia seguinte para uma reunião com os estudantes. Ele estava acompanhado pelos seguintes líderes: Uria Simango,

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Marcelino dos Santos, Lázaro Nkavandame, Armando Guebuza, Mariano Matsinhe e o Deão Eduardo Coloma.

Na reunião que manteve com os estudantes em 24 de Fevereiro de 1968, o Presidente Mondlane respondeu as perguntas dos estudantes, principalmente a que tratava do tribalismo na FRELIMO. No seu esforço para convencer os estudantes de que havia paridade na direcção da FRELIMO, ele tomou a iniciativa de escrever no quadro os nomes de todos os membros do Comité Central da FRELIMO, a sua origem, e as suas tribos.

Uma atmosfera de desordem se seguiu à reunião quando o Presidente Mondlane escrevia os nomes. Os estudantes constantemente irritavam o Presidente Mondlane, a quem interrompiam, gritando "tribo Shangaan" para cada nome que escrevesse no quadro. Muitos dos estudantes do Instituto, que vinham do Centro e do Norte de Moçambique, acreditavam genuinamente que todos os sulistas pertenciam à tribo Shangaan, a tribo do Presidente Mondlane. Além disso, recusavam-se a reconhecer como seus líderes alguns dos líderes que o Presidente Mondlane colocava na lista dos nortenhos. Para ser específico, recusaram-se a reconhecer Marcelino dos Santos e Armando Guebuza, embora nascidos em Nampula, Norte de Moçambique. Da mesma forma, eles recusaram-se a reconhecer como seu líder Mariano Matsinhe, nascido em Tete, no centro de Moçambique, enfatizando que pais desses líderes eram originários do Sul de Moçambique. Quando a lista final estava pronta, a mesma demonstrava claramente que a maioria dos membros do Comité Central era do Sul de Moçambique, embora nem todos pertençessem à tribo do Presidente Mondlane. No final, o Presidente da FRELIMO reconheceu que os estudantes tinham razão em insistir que a maioria dos líderes da FRELIMO eram sulistas. No entanto, ele proferiu as seguintes palavras para se defender:

“Quando nomeamos indivíduos para cargos de chefia, nós não olhamos para sua tribo ou região, mas para sua competência”.

Essa afirmação piorou a situação. Os estudantes entenderam isso como significando que a maioria das pessoas das regiões Centro e Norte eram incompetentes. Tornou-se difícil acalmá-los. A reunião teve de ser interrompida.

UM ATAQUE ARMADO

Embora o Presidente Mondlane tenha implicado o Padre Gwenjere no incidente de Março que levou ao encerramento do Instituto, ele não teve absolutamente nada a ver com este incidente que foi unicamente causado por alguns membros da liderança da FRELIMO. Em 5 de Março de 1968, um estudante chamado Daniel Baulene Chatama agrediu um outro estudante chamado Paulino Xadreque, acusando-o de ser um espião que constantemente transmitia informações à direcção da FRELIMO. O Deão Eduardo Coloma reportou o assunto aos líderes da FRELIMO que viviam em Changombe. Na noite do mesmo dia, por volta das 22h30, o Chefe de Defesa Samora Machel, o Chefe de Segurança Joaquim Chissano, e Aurélio Manave do Departamento de Saúde, acompanhado por um soldado da FRELIMO viciado em drogas, chamado Luís Arranca-Tudo, todos armados com pistolas, foram para o Instituto 'ensinar uma lição' aos estudantes .

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O Arranca-Tudo, que foi enviado para os dormitórios dos estudantes, chutava e atirava os estudantes dos seus beliches para o chão, obrigando-os, a maioria deles semi-nus, a marchar e reunir-se na verdadeira moda da FRELIMO. Um estudante que escapou da rede correu para a delegacia próxima para alertar a polícia tanzaniana sobre a presença de homens armados no Instituto Moçambicano. A polícia chegou e neutralizou os agressores. Enquanto Arranca-Tudo conseguiu escapar, Aurélio Manave foi brutalmente espancado pela polícia tanzaniana por ter sido encontrado na posse de uma pistola que havia disparado tiros. Quanto aos outros dois, Samora Machel e Joaquim Chissano, ambos reivindicaram imunidade por serem líderes seniores da FRELIMO e não foram, portanto, tocados pela polícia. A directora do Instituto Moçambicano, a Sra. Dona Janet Mondlane, pagou uma multa de 15.000 xelins para que Aurélio Manave e o Deão Eduardo Coloma fossem libertos.

Conforme revelado anteriormente, o Presidente Mondlane estava no Reino Unido quando os líderes da FRELIMO agrediram estudantes no Instituto Moçambicano. Quando ele regressou, ouviu apenas a versão deles e mandou encerrar o Instituto, ordenando que todos os estudantes fossem para o Campo Militar de Nachingwea.

Os estudantes recusaram-se a aderir à ordem. Como grupo, eles foram para o escritório do Vice-Presidente da Tanzânia, Rashidi Kawawa, para pedir a sua intervenção. Os estudantes permaneceram no escritório de Kawawa durante a maior parte do dia sem serem recebidos. Por volta das quatro da tarde, eles viram um grupo de polícias armados indo em sua direcção, gritando "choto-kulia, choto-kulia" ("esquerda e direita, esquerda e direita") em suaíli. O líder do grupo de policiais avançou e disse: "Senhores, vocês estão presos!" Os estudantes receberam ordens para entrar num camião estacionado ao lado deles e foram conduzidos para uma prisão próxima. Mais tarde, os estudantes perceberam que foram detidos com a intenção de mantê-los juntos até o regresso do Vice-Presidente da Tanzânia, que estava numa visita provincial.

Alguns dias depois, foram libertos e levados de volta ao Instituto Moçambicano para uma reunião. Estiveram presentes na reunião os líderes da FRELIMO, líderes do Governo Tanzaniano representados por Rashidi Kawawa e Lawi Sijaona, e o representante do Comité de Libertação da OUA, George Magombe. Dirigindo-se à reunião, o Presidente Mondlane disse, entre outras coisas, o seguinte:

“O Comité Central da FRELIMO decidiu e disso informamos que, a partir de hoje, o Instituto Moçambicano está encerrado e todos os estudantes devem seguir para o Campo Militar de Nachingwea”.

O Dr. Mondlane disse ainda que o Comité Central da FRELIMO havia decidido encerrar o Instituto e enviar todos os estudantes para Nachingwea, porque eles não estavam interessados em prosseguir seus estudos naquele instituição. Ao ouvir a decisão acima, os estudantes apelaram ao Vice-Presidente tanzaniano para que não permitisse que fossem enviados para o Campo Militar de Nachingwea, por recearem que seriam enviados para o interior de Moçambique e mortos. A decisão do Vice-Presidente tanzaniano foi de que os estudantes não poderiam ser forçados a ir a Nachingwea contra a sua vontade.

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Ao entender que a liderança da FRELIMO não seria capaz de forçar os estudantes a irem para Nachingwea, o Presidente Mondlane disse que os estudantes que se recusassem a seguir para Nachingwea seriam expulsos do movimento. De cerca de 80 estudantes, apenas 15 concordaram em ir à Nachingwea. O Governo da Tanzânia contratou dois autocarros para transportar os estudantes remanescentes para o Campo de Refugiados de Rutamba.

O BOM SAMARITANO

No final de 1969, quase todos estuantes do Instituto Moçambicano, que haviam sido desterrados no Campo de Refugiados de Rutamba, haviam fugido de lá para Nairóbi, no Quénia. Conforme correctamente revelado nos arquivos da PIDE, muitos estudantes, incluindo este autor, conseguiram deixar o Campo de Refugiados de Rutamba depois de obterem dinheiro do Padre Charles Pollet para viajarem para Nairobi no Quénia. Era suficiente para um estudante escrever uma carta para ele a pedir dinheiro. Ele enviava o dinheiro sem perguntar se o estudante pertencia à sua Missão de Murraça.

Em Fevereiro de 1970, o Padre Pollet foi a Nairóbi, no Quénia, para visitar os "seus moçambicanos". No dia seguinte, ele foi preso pela polícia queniana. Todos os moçambicanos que estavam com o Padre, incluindo este autor, decidiram solidariamente ser encarcerados com ele. A polícia queniana, encontrando-se sem espaço suficiente para manter os moçambicanos, decidiu libertar o Padre, após o que o declararam persona non grata.

Em sua carta a um académico, em 15 de Fevereiro de 1997, o Padre Pollet escreveu que, desde a sua infância, ele sempre quis servir os negros em África. Segundo ele, viveu três anos no Ruanda, 21 anos em Moçambique e 30 anos na Tanzânia. Dos três lugares, ele gostou mais de trabalhar para o povo do Centro de Moçambique. Eles eram, para ele, "os mais simpáticos".

Continuando, o Padre acusou, na sua carta, a direcção da FRELIMO de ter morto o seu "filho", Padre Mateus Gwenjere, e de ter escrito ao Governo Queniano para o prender ao ter ido visitar "os seus moçambicanos" em Nairóbi. Um trecho da carta do Padre Pollet, escrito para o académico em francês e traduzido por este autor:

“Quanto ao meu vigário, Padre Mateus Gwenjere, se souber o que lhe aconteceu depois de ter sido sequestrado à noite em Nairobi … O que aconteceu com Simango [Vice-Presidente de Mondlane] e Nungu? Sem dúvida, todas foram vítimas de Samora Machel, como o Mateus. Você sabe o que eles fizeram com ele (o Padre Mateus)?! Ele era como meu filho; tendo, como eu, mais coração do que mente. Ele não nasceu para ser "Presidente", mas teve grande apoio do povo, especialmente dos Macondes do Conselho de Anciãos, que eram todos por ele, daí a raiva de Machel, Chissano e Dos Santos. Se você sabe como ele morreu e aonde, eu ficarei feliz em saber. Depois de ser sequestrado de Nairóbi à noite; acredito que eles o levaram para Maputo onde o torturaram e o mataram.”

Os leitores podem encontrar o texto integral do discurso do Presidente Eduardo à Comissão do Instituto Moçambicano liderada pelo Sr. A.C. Mwingira no livro “Mateus Pinho Gwenjere: Um Padre

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Revolucionário” à venda em algumas livrarias da cidade de Maputo. O livro-mãe "Mateus Pinho Gwenjere: A Revolutionary Priest” assim como a edição portuguesa do livro “Mateus Pinho Gwenjere: Um Padre Revolucionário” também se encontram à venda na Amazon nos seguintes sites: https://www.amazon.com/Mateus-Pinho-Gwenjere-Revolutionary-Priest-ebook/dp/B07SKWZ734 e https://www.amazon.com/dp/1082346233, podendo o leitor lê-lo até quase ao final do segundo capítulo (página 51) sem pagar (grátis).

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