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  • PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DO RIO GRANDE DO SUL

    MESTRADO EM EDUCAO EM CINCIAS E MATEMTICA

    LUCIANO SANTANA AGNE

    RELAES ENTRE CONCEPES SOBRE A NATUREZA DO CONHECIMENTO

    MATEMTICO, PROPOSTAS DIDTICAS E CONCEPES DE ENSINO EM

    DISSERTAES EM EDUCAO MATEMTICA DO PPGEDUCEM DA PUCRS

    PORTO ALEGRE

    2013

  • LUCIANO SANTANA AGNE

    RELAES ENTRE CONCEPES SOBRE A NATUREZA DO CONHECIMENTO

    MATEMTICO, PROPOSTAS DIDTICAS E CONCEPES DE ENSINO EM

    DISSERTAES EM EDUCAO MATEMTICA DO PPGEDUCEM DA PUCRS

    DISSERTAO DE MESTRADO

    Pesquisa realizada no Programa de Ps-Graduao em Educao em Cincias e Matemtica da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, como parte dos requisitos para a obteno do ttulo de Mestre em Educao em Cincias e Matemtica.

    Orientador: Prof. Dr. Joo Batista Siqueira

    Harres

    Porto Alegre

    2013

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    A271

    Agne, Luciano SantAna.

    Relaes entre concepes sobre a natureza do conhecimento

    matemtico, propostas didticas e concepes de ensino em

    dissertaes em educao matemtica do PPGEDUCEM da PUCRS. /

    Luciano SantAna Agne. Porto Alegre, 2013.

    65 f.

    Dissertao (Mestrado) - Pontifcia Universidade Catlica do Rio

    Grande do Sul. Faculdade de Fsica. Programa de Ps-Graduao em

    Educao em Cincias e Matemtica, 2013.

    Orientador: Prof. Dr. Joo Batista Siqueira Harres

    1. Concepo Matemtica 2. Concepo de ensino 3. Educar pela

    pesquisa 4. Epitemologia 5. Propostas didticas

    I. Harres, Joo Batista Siqueira. II. Ttulo.

    Catalogao elaborada por Alessandra V. de Oliveira CRB 10/1844

  • Dedicatria

    Joo Carlos Menezes Agne (in memorian)

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo primeiramente aos meus mestres que me conduziram nessa jornada

    com sabedoria.

    Agradeo ao meu orientador, Prof. Dr. Joo Batista Siqueira Harres, pelo

    acolhimento, pelos ensinamentos, pela pacincia e sabedoria para a construo

    dessa dissertao.

    minha esposa Susana pelo apoio e compreenso.

    minha filha Juliana pela pacincia nos momentos em que estivemos

    afastados para a produo desse trabalho.

    minha me Marli pelo incentivo.

    Aos colegas e professores do curso de mestrado pela colaborao e troca de

    conhecimentos, fundamentais para a minha caminhada.

    Ao meu pai Joo Carlos (in memorian) pelo esforo realizado para a minha

    educao e pelos exemplos de carter que jamais esquecerei.

  • RESUMO

    O presente trabalho investigou as relaes entre as concepes sobre a natureza do

    conhecimento matemtico, as propostas didticas e as concepes de ensino em

    pesquisas de mestrado em Educao Matemtica. Foram escolhidas dissertaes

    nas quais os alunos realizaram pesquisa em sala de aula apoiadas no princpio

    terico Educar Pela Pesquisa. Treze dissertaes de mestrado do programa de Ps-

    graduao em Educao em Cincias e Matemtica da PUCRS foram analisadas. A

    investigao teve abordagem qualitativa interpretativa. Para anlise das informaes

    foi utilizado o mtodo da Anlise Textual Discursiva. Trs dimenses foram

    consideradas nesta anlise: as propostas didticas empregadas nas atividades em

    sala de aula, as concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico e as

    concepes sobre ensino implcitas. Como referencial terico, as concepes sobre

    a natureza do conhecimento matemtico foram analisadas segundo as categorias

    filosficas realismo e antirrealismo, conforme Hacking (1983), Manno (1973) e Del

    Vecchio Jr. (2010). As concepes de ensino foram analisadas segundo os

    pressupostos do Educar Pela Pesquisa. Os resultados revelaram que o ensino de

    Matemtica fundamentado no Educar Pela Pesquisa em sala de aula ajudou a

    promover a aprendizagem de conceitos matemticos, permitindo a construo

    destes conhecimentos. Tambm foi constatado que, mesmo defendendo propostas

    pedaggicas fundamentadas em pesquisa em sala de aula, as pesquisas

    investigadas apresentam uma concepo absolutista acerca da natureza do

    conhecimento matemtico.

    Palavras-chave: Concepo matemtica; Concepes de ensino; Educar pela

    Pesquisa; Propostas didticas.

  • ABSTRACT

    This study has analysed the connections between the conceptions about the nature

    of mathematical knowledge, teaching plans and the conceptions about teaching

    found in Masters in Mathematical Education researches. Studies which featured

    classroom research based on the theory of Education Through Research were

    selected. Thirteen Masters dissertations from the PUCRS Master Degree Program in

    Science and Mathematics Education have been analyzed through a qualitative and

    interpretive approach. The Discoursive Textual Analysis was used to data analysis.

    Three aspects were considered: teaching plans used in classroom activities,

    conceptions of the nature of mathematical knowledge, and the underlying

    conceptions of teaching. As a theoretical framework, conceptions about the nature of

    mathematical knowledge were analyzed according to the categories philosophical

    realism and antirealism as Hacking (1983), Manno (1973) and Del Vecchio Jr.

    (2010). The conceptions of teaching were analyzed according to the assumptions of

    Teach For Search. The results show that the teaching of Math based on Education

    Through Research helped the learning of mathematical concepts, allowing for the

    construction of that knowledge. It was also noticed that, despite the use of teaching

    plans based on research in the classroom, the studies analyzed show an absolutistic

    conception of mathematical knowledge.

    Key-words: Conceptions of math; Conceptions of teaching; Education Through

    Research; Teaching plans.

  • LISTA DE QUADROS E ORGANOGRAMAS

    Organograma 1 Relao entre teorias filosficas e tendncias em

    Educao Matemtica........................................................... 33

    Organograma 2 Relaes entre EPP, modelos didticos e princpios

    filosficos............................................................................... 34

    Quadro 1 Caractersticas do contexto escolar das dissertaes

    analisadas.............................................................................. 36

    Quadro 2 Relao entre as categorias de anlise................................ 39

    Quadro 3 Propostas didticas, concepes de ensino e natureza do

    conhecimento matemtico..................................................... 56

    Quadro 4 Relaes entre Estudo Terico e Pesquisa de

    Campo................................................................................... 58

  • LISTA DE SIGLAS

    EPP Educar Pela Pesquisa

    PPGEDUCEM Programa de Ps-graduao em Educao em Cincias e

    Matemtica

    PUCRS Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul

  • SUMRIO

    1 INTRODUO .......................................................................................................12

    1.1 Direcionamentos da Pesquisa.............................................................................13

    1.2 Estrutura da dissertao......................................................................................15

    2 REVISO DA LITERATURA .................................................................................17

    2.1 Um pouco de Filosofia da Matemtica ................................................................17

    2.2 Tendncias pedaggicas no ensino de Matemtica no Brasil.............................23

    2.3 Modelos didticos no ensino de Matemtica.......................................................28

    2.4 O educar pela pesquisa.......................................................................................32

    3 METODOLOGIA ....................................................................................................37

    4 ANLISE DAS DISSERTAES ..........................................................................40

    4.1 Propostas didticas .............................................................................................41

    4.2 Concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico.............................44

    4.3 Concepes de ensino........................................................................................46

    4.4 Relacionando categorias e concepes..............................................................58

    5 CONCLUSES ......................................................................................................61

    REFERNCIAS.........................................................................................................64

  • 1 INTRODUO

    No Programa de Ps-graduao em Educao em Cincias e Matemtica da

    Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul existem pesquisadores,

    mestrandos e doutorandos que dedicam seus estudos Educao Matemtica.

    Algumas das pesquisas concludas em nvel de mestrado tiveram a preocupao de

    realizar suas investigaes em sala de aula, trabalhando com alunos de vrias

    realidades sociais e nveis de ensino. Nestas pesquisas, algumas propuseram aos

    alunos, seus sujeitos de pesquisa, que realizassem atividades investigativas sobre

    assuntos diversos. Subjacente a estas propostas, segundo Thompson (1992),

    existem concepes resultantes das posturas assumidas pelos pesquisadores em

    seus trabalhos na sala de aula. Essas concepes foram objeto de estudo desta

    pesquisa.

    Concepes sobre ensino de Matemtica so diferentes das concepes

    epistemolgicas dessa cincia. A Filosofia da Matemtica, com seus pesquisadores

    e tericos, nos apresenta respostas sobre a natureza desta cincia, desde Plato e

    Aristteles at os dias atuais. As prticas pedaggicas influenciadas pelas

    tendncias no ensino de Matemtica tambm esto bem estudadas e identificadas

    em trabalhos como o de Fiorentini (1995), entre outros. Mas as concepes sobre o

    ensino de matemtica por meio da pesquisa dentro da sala de aula ainda

    necessitam de maiores estudos.

    O propsito desta dissertao foi compreender quais pressupostos

    fundamentam as propostas pedaggicas em que os alunos desenvolvem pesquisa

    em sala de aula. Para alcanar este intento investigamos no mbito do Programa de

    Ps-graduao em Educao em Cincias e Matemtica da PUCRS e encontramos

    trabalhos valiosos e muito bem elaborados. Ao final escolhemos treze que assumem

    como princpio terico o EPP com os sujeitos realizando investigaes em seu

    ambiente de aprendizagem, ou seja, o aluno fazendo pesquisa para aprender

    Matemtica.

    As dissertaes investigadas apontaram para aes que podem contribuir para

    a melhoria das prticas pedaggicas dos professores de Matemtica. Em todas elas,

    a pesquisa em sala de aula demonstrou ser uma proposta eficiente que proporciona

  • 13

    aos alunos uma aprendizagem contextualizada e muito mais significativa,

    desenvolvendo vrias competncias para enfrentar os desafios do mundo

    contemporneo.

    Todas as dissertaes investigadas afirmam que necessrio o

    desenvolvimento de alternativas para que o ensino de matemtica seja mais

    proveitoso e produtivo. Nesta perspectiva, aliamo-nos com Ramos, Lima e Rocha F

    (2009, p.53) que afirmam que o trabalho em sala de aula fundamentado na pesquisa

    tanto em situaes de sala de aula quanto em processos de formao continuada,

    nas disciplinas de Cincias e Matemtica, contribuem para a qualificao do ensino

    e ampliam as possibilidades de aprendizagem nessas disciplinas.

    Segundo Porln (1993), os modelos didticos fundamentados na investigao

    em sala de aula valorizam as concepes prvias dos alunos para a aprendizagem

    dos conceitos matemticos. Nestes modelos, o aluno constri seu prprio

    conhecimento. Partindo dessa argumentao, pode-se concluir que a investigao

    em sala de aula possui grande potencial didtico e pedaggico.

    Dessa forma, concordo com Ponte e Canavarro (1997) que o ensino de

    Matemtica como desenvolvedor de tcnicas de resoluo de problemas e de

    clculos no faz sentido para um aluno que vive num mundo cheio de tecnologias.

    Compreender conceitos e ideias cientficas e contextualiz-las a partir das suas

    concepes prvias parece ser muito mais significativo para a realidade atual dos

    estudantes.

    Por isso, conforme Thompson (1992), analisar e promover a evoluo das

    concepes e crenas dos professores importante para uma mudana de

    paradigma da Educao Matemtica rumo a um ensino moderno e contextualizado.

    Dessa maneira, as concepes prprias do Educar pela Pesquisa em Matemtica se

    constituem na grande busca desta dissertao.

    1.1 Direcionamentos da Pesquisa

    A afirmativa de Thompson (1992) de que as crenas e concepes dos

    professores de matemtica podem influenciar nas suas prticas pedaggicas, me

    levou a essa pesquisa. As concepes podem ser verificadas nas prticas destes

  • 14

    professores? Pesquisadores como Fiorentini (1995), Garcia (2009), Harres (1998),

    Machado (1997), Mellado; Carracebo (1993), Ponte (1992), Porln (1993), Porln;

    Harres (2002), entre outros, afirmam que sim. Ento, meus questionamentos me

    conduziram a indagar quais concepes fundamentam os modelos didticos

    apoiados no EPP, principalmente no mbito das pesquisas acadmicas realizadas

    nesse campo.

    Para iniciar meus estudos, decidi investigar quais so as concepes dos

    pesquisadores em Educao Matemtica que realizaram suas investigaes com os

    seus sujeitos realizando algum tipo de pesquisa em sala de aula.

    A partir dessa proposta, surgiu o seguinte problema de pesquisa:

    Quais as relaes entre propostas didticas, concepes de ensino e

    concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico em dissertaes

    sobre Educao Matemtica do PPGEDUCEM - PUCRS que utilizam como

    princpio terico o EPP?

    Dada amplitude do problema, tornaram-se necessrias a elaborao de

    questes mais especficas, que contribussem para a compreenso do foco da

    investigao. So as questes de pesquisa:

    Quais as propostas didticas empregadas nas atividades realizadas com os

    alunos, sujeitos das dissertaes investigadas?

    Quais concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico presentes

    nas atividades desenvolvidas em sala de aula nas pesquisas investigadas?

    Quais concepes de ensino por meio de pesquisa emergiram das

    argumentaes dos autores das dissertaes investigadas?

    Com este delineamento para esta investigao, apresentam-se os objetivos da

    pesquisa.

    Objetivo Geral

    Identificar as relaes entre propostas didticas, concepes de ensino e

    concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico nas dissertaes sobre

  • 15

    Educao Matemtica do PPGEDUCEM - PUCRS que utilizam o princpio terico do

    EPP.

    Objetivos Especficos

    Identificar as metodologias de trabalho empregadas nas propostas

    didticas nas dissertaes investigadas;

    Verificar as concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico

    nas atividades de sala de aula nas dissertaes investigadas;

    Compreender as concepes de ensino de Matemtica nas dissertaes

    investigadas;

    Analisar as relaes entre as dimenses de pesquisa;

    Incentivar novos estudos sobre o EPP.

    1.2 Estrutura da dissertao

    Nesta introduo, justificamos a realizao desta pesquisa e definimos os

    pressupostos que sustentam nossa argumentao, alinhavados a partir da questo

    de pesquisa: Quais as relaes entre propostas didticas, concepes de ensino e

    concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico em dissertaes sobre

    Educao Matemtica do PPGEDUCEM - PUCRS que utilizam como princpio

    terico o EPP?

    No capitulo 2 desenvolvemos a reviso da literatura para o entendimento das

    ideias que sustentam a argumentao desta pesquisa. Enfrentamos o rduo desafio

    de compreender as ideias da filosofia da Matemtica que sustentam as concepes

    epistemolgicas dessa cincia at os dias atuais. Neste sentido, caracterizamos o

    logicismo, o formalismo e o intuicionismo.

    Logo aps, buscamos a compreenso das tendncias pedaggicas do ensino

    de Matemtica no Brasil, apoiados nos estudos do Professor Dario Fiorentini.

  • 16

    Julgamos essa abordagem importante porque ela apresenta as posturas

    historicamente praticadas pelos professores de Matemtica desde o incio dos anos

    de 1900 at os dias atuais.

    Concluindo o captulo, apresentamos os modelos didticos da Filosofia da

    Cincia e abordamos o EPP e seus pressupostos tericos.

    O captulo 3 dedicado metodologia empregada no desenvolvimento dessa

    pesquisa e apresentamos a descrio das dissertaes analisadas a partir do

    contexto em que foram realizadas suas investigaes.

    No captulo 4 apresentamos os dados e as anlises das relaes entre

    concepes e prticas em sala de aula dos autores das dissertaes investigadas.

    Neste captulo, surgem as informaes que representam o foco dessa pesquisa, ou

    seja, a relao entre as categorias das propostas didticas, da concepo de ensino

    e da concepo sobre anatureza do conhecimento matemtico dos autores.

    No captulo 5 so feitas as reflexes finais que concluem esta pesquisa.

  • 2 REVISO DA LITERATURA

    Este captulo dedicado a uma anlise das teorias que sustentam os

    argumentos dessa pesquisa.

    Em primeiro lugar, apresentamos as correntes filosficas que influenciaram o

    desenvolvimento da Filosofia da Matemtica desde Plato e Aristteles at as

    correntes filosficas da Idade Mdia que tratavam das questes dos universais. Em

    seguida, apresentamos as correntes que influenciam a Filosofia da Matemtica

    atualmente: logicismo, intuicionismo e formalismo. claro que existem outras

    correntes que influenciam o pensamento matemtico atual, porm a inteno foi de

    apresentar uma viso geral das origens da epistemologia desta cincia, sem esgotar

    o assunto.

    Tambm discutimos as principais tendncias histricas no ensino de

    Matemtica no Brasil, sob a luz dos estudos de Fiorentini (1995), com a inteno de

    traar um paralelo entre os aspectos epistemolgicos da Matemtica e as prticas

    pedaggicas dessa disciplina em sala de aula.

    Na sequncia, falamos dos modelos didticos aplicados em sala de aula pelos

    professores fazendo uma distino entre modelos absolutistas, relativistas e

    evolutivo-construtivistas, usando a classificao de Porln (1993).

    Como esta dissertao pretendeu entender quais as concepes e prticas

    esto presentes nos trabalhos realizados em sala de aula pelos mestrandos do

    PPGEDUCEM PUCRS, encerramos este captulo discorrendo sobre a teoria do

    EPP.

    2.1 Um pouco de Filosofia da Matemtica

    O debate sobre a natureza do conhecimento matemtico fundamentado nas

    questes filosficas subjacentes a esta disciplina, ou seja, exterior Matemtica

    propriamente dita, a qual vem se desenvolvendo a margem das discusses

    filosficas, conforme Hacking (1983) e Del Vecchio Jr. (2010).

  • 18

    As duas grandes vertentes filosficas que norteiam este texto so o realismo

    platnico e o antirrealismo. Essas denominaes filosficas esto em acordo com o

    entendimento de alguns autores que nomeiam a filosofia platnica de realismo e no

    de idealismo, entre eles Del Vecchio jr (2010), Figueiredo (2012), Hacking (1983),

    Manno (1972), Quine (1984) e Silva (2007). Neste contexto, as palavras realismo ou

    idealismo se referem concepo platnica de conceitos matemticos.

    O realismo platnico, conforme Del Vecchio Jr. (2010), uma corrente

    filosfica fundamentada nas idias de Plato em que os conceitos e objetos

    matemticos realmente existem em um mundo ideal e se constituem de entes

    independentes da capacidade humana de pensamento. Para Plato, os objetos

    matemticos so acessados ou sentidos pelo homem, so pr-existentes a nossa

    criatividade e ao prprio homem. O mundo dos objetos matemticos de Plato

    perfeito e incorruptvel e o estudo da Matemtica no passa de um esforo em tentar

    acessar e expressar este mundo ideal. Para Silva (2007), a principal caracterstica

    da filosofia platnica aplicada Matemtica que seus conceitos no so

    inventados pelo homem, mas descobertos por ele.

    A corrente antirrealista, segundo Del Vecchio Jr. (2010), fundamentada na

    filosofia de Aristteles, defende que o conhecimento matemtico resultado da

    vontade humana, ou seja, a Matemtica criao humana, fruto da sua imaginao

    e de suas observaes e interaes com o meio em que vive. Para o antirrealista a

    Matemtica no passa de uma ferramenta que serve para descrever o mundo,

    sendo que as teorias abstratas tambm so instrumentos que podem ser utilizados

    com toda liberdade para esse intento. Neste sentido inveno humana e no pode

    ser descoberta. Dessa maneira, o homem passa a ser um construtor dos conceitos

    matemticos.

    Conforme Quine (1984), essas duas correntes filosficas, realismo platnico e

    antirrealismo, deram origem s trs correntes filosficas na idade mdia: o realismo,

    o conceptualismo1 e o nominalismo. Essas correntes tratam da natureza dos

    universais, que so conceitos metafsicos que caracterizam as idias ou essncias

    comuns a todas as coisas que pertencem a um mesmo conjunto.

    1 A palavra conceptualismo empregada neste texto em conformidade com os autores pesquisados

    que no utilizam o termo conceitualismo.

  • 19

    Os conceitos, segundo Quine (1984), so representaes de algo, ou seja, um

    elo entre o sujeito que conhece e o objeto conhecido. Por meio do conceito o sujeito

    pode se referir as coisas do mundo e comunicar as outras pessoas os seus

    conhecimentos e saberes.

    Os realistas acreditam que estes conceitos realmente existem, independente

    de nossa vontade. As leis naturais so absolutas, inalterveis, verdades eternas.

    Conforme Figueiredo (2012, p. 22), os realistas acreditam que devemos admitir a

    existncia de atributos universais para darmos um tratamento satisfatrio do

    fenmeno da identidade qualitativa entre indivduos numericamente distintos.

    Para os conceptualistas, um conceito somente o que possvel de ser

    entendido pela nossa mente, a representao intelectual das coisas. Para Manno

    (1972, p. 234) os conceitos so construes mentais, existentes s no pensamento,

    dotados, no entanto, de um valor, de uma estrutura, de um contedo inteligvel.

    Para os nominalistas, um conceito apenas um nome, uma expresso

    fontica. Eles rejeitam as concepes abstratas, ideais, e admite apenas as

    realidades empricas. Um conceito fruto da abstrao operada sobre as realidades

    empricas.

    Estas trs correntes filosficas deram origem, na Filosofia da Matemtica

    contempornea, segundo Quine (1984), as trs vertentes que iriam dominar no final

    do sculo XIX as discusses sobre Filosofia da Matemtica, que so: o logicismo

    que deriva do realismo, o intuicionismo, derivado do conceptualismo e o formalismo,

    que deriva do nominalismo.

    O movimento logicista tem sua base filosfica no realismo (Manno, 1972), que

    deriva, por sua vez, do realismo platnico. Esse movimento tem por objetivo definir

    todos os conceitos matemticos em termos lgicos, definindo assim uma Matemtica

    pura, consistente e com uma forma de apresentao mais simples. Os principais

    matemticos que defenderam a corrente logicista foram Dedeking, Frege e

    Weierstrass (SILVA, 2007).

    O principal objetivo dos logicistas tornar a Matemtica uma cincia sem

    contradies. Nela a Geometria fica restrita ao espao, enquanto a Aritmtica

    reduzida razo, Lgica, como funo apenas do pensamento humano e no da

  • 20

    sensibilidade. Os logicistas defendem que a Matemtica a nica responsvel pelo

    desenvolvimento do pensamento lgico (Ibidem, 2007).

    Para alcanar os objetivos logicistas, eles necessitavam desenvolver um

    sistema lgico mais sofisticado e preciso. Segundo Silva (2007), este

    desenvolvimento de novas notaes, expresses e formas de anlise, permitiu o

    desenvolvimento da informtica e suas tecnologias no sculo XX. Alm disso, no

    sculo XIX, em funo do desenvolvimento que o logicismo trouxe para a

    Matemtica, surgiram as geometrias no euclidianas e a teoria dos conjuntos com a

    atual noo de infinito.

    Na concepo logicista, a Matemtica, com seus conceitos e objetos, existe

    independente da vontade humana, ou seja, os objetos e conceitos matemticos

    existem, mesmo que no tenhamos conhecimento. So entes do mundo platnico

    ideal e no fsico, independentes de espao e de tempo. Segundo Silva (2007, p.

    226), Frege admite que o acesso ao universo dos nmeros se d apenas pela

    razo, logo, para Silva (2007), os nmeros so entes ideais do mundo platnico,

    porm pertencentes a uma categoria especial, pois so objetos lgicos. Para os

    logicistas a Matemtica um conhecimento a priori, ou seja, existe independente

    dos sentidos, mas acessvel a eles.

    (...)objetos matemticos so reais. Sua existncia um fato objetivo, totalmente independente de nosso conhecimento sobre eles. Conjuntos finitos, conjuntos infinitos no numerveis, variedades de dimenso infinita, curvas que enchem o espao todos os membros do zoolgico matemtico so objetos definidos, com propriedades definidas, algumas conhecidas, muitas desconhecidas (DAVIS; HERSH, 1985. p. 359).

    A linguagem lgica utilizada pela corrente logicista, expressa os entes

    matemticos que habitam este mundo ideal platnico.

    (...)existe um mundo matemtico paralelo ao mundo sensvel, mas radicalmente distinto deste, ao qual temos acesso exclusivamente pela razo. O mundo real instancia imperfeitamente o mundo ideal da Matemtica, e por isso a Matemtica aplica-se, ainda que imperfeita e aproximativamente, a ele (SILVA, 2007. p. 226).

    Esta concepo filosfica valoriza muito o trabalho intelectual. Atualmente a

    pesquisa em Lgica Matemtica representa as idias dos logicistas por meio das

    investigaes em Matemtica pura. Porm, os matemticos que pesquisam em

    Matemtica pura geralmente no se ocupam com questes filosficas.

  • 21

    O logicismo foi o marco fundamental para o surgimento da moderna Lgica

    Matemtica e para o aparecimento de novos pensadores matemticos que,

    contrapondo os logicistas, tentaram sistematizar a Matemtica de uma forma

    diferente, partindo sempre da intuio. Esses pensadores desenvolveram a corrente

    Matemtica conhecida como intuicionismo (SILVA, 2007).

    Conforme Manno (1972), a corrente intuicionista que derivada da filosofia

    conceptualista, surge contrapondo-se ao logicismo. Esta corrente admite a

    existncia de entes matemticos, porm somente na medida em que so

    construdos pela mente humana. O principal pensador e idealizador dessa corrente

    foi Brower, que admitiu as idias de conhecimento a priori de Kant. Na perspectiva

    apriorista, o conhecimento se adquire pela razo, no pela experincia, ou seja,

    deduzido. Desta maneira o conhecimento no pode ser adquirido pela percepo

    nem pela sensibilidade, tampouco pela experincia.

    No intuicionismo os objetos e conceitos matemticos no so considerados

    pr-existentes em um mundo ideal, como no logicismo. Devem ser construdos

    partindo-se dos nmeros naturais por meio de certa quantidade de procedimentos

    lgicos (DAVIS e HERSH, 1985). Essa corrente considera o ser humano possuidor

    de uma intuio a cerca dos nmeros naturais, partindo disso todo desenvolvimento

    de conceitos matemticos. Em funo disso, os intuicionistas defendiam a

    reconstruo de toda a Matemtica, iniciando pelos seus fundamentos, partindo

    sempre da intuio.

    Os termos primitivos e os axiomas elementares fazem parte de intuies primordiais, mesmo que conexas com experincias empricas. O que os formalistas e outros matemticos estabelecem como axiomas e dedues, chamam-lhe, os conceptualistas, evidncia. Todo conceito Matemtico mergulha suas razes num terreno pr-matemtico. Partindo destas evidncias elementares, a Matemtica deve seguir um processo construtivo, isto , apoiar-se em afirmaes das quais se possa fazer demonstrao, a comear pelo teorema da induo completa dos nmeros naturais. Fazendo consistir os nmeros na construo mental, (da, a sua afinidade com o velho conceptualismo), ligam a matemtica aos processos psicolgicos e s intuies elementares em particular (MANNO, 1972, p. 235).

    Para o intuicionismo, segundo Machado (1997, p. 40), a Matemtica uma

    construo de entidades abstratas, a partir da intuio do matemtico. Em funo

    disso, os intuicionistas se utilizam de uma formalizao rigorosa, mas apenas para

    expressar as suas construes mentais.

  • 22

    Quanto relao da Matemtica com o mundo emprico, para os intuicionistas,

    os entes e objetos matemticos no surgem da relao emprica, no tm essa

    necessidade, devem ser construdos passo a passo pela mente do matemtico. As

    observaes de fenmenos naturais so um problema interno do observador e no

    consequncia da sua relao com o mundo exterior a sua mente (MANNO, 1972).

    A corrente formalista, derivada da filosofia nominalista, tambm considera que

    os entes matemticos no so pr-existentes em um mundo ideal. Essa corrente

    considera que o mtodo axiomtico dedutivo de fundamental importncia para o

    entendimento dos conceitos matemticos (MANNO, 1972). Nesse mtodo, toda a

    Matemtica pode ser construda a partir de verdades no demonstrveis que, num

    desencadeamento lgico de proposies, podem ser demonstradas todas as suas

    verdades (SILVA, 2007). David Hilbert foi o principal expoente da corrente formalista

    da Matemtica.

    O formalismo tambm defende a idia de que a Matemtica pode ser

    totalmente deduzida. Porm se diferencia do intuicionismo, pois no acredita na

    intuio das ideias matemticas, mas sim na construo de conceitos partindo de

    ideias primitivas que no so demonstrveis, os axiomas. Para os formalistas a

    Matemtica consiste numa construo lgica e formal de conceitos verdadeiros que

    partem de um sistema axiomtico de definies e teoremas.

    Para os formalistas, as regras e os smbolos matemticos no tm nenhum

    significado, a no ser o significado formal, estritamente sinttico, da a caracterstica

    nominalista do formalismo.

    Segundo este ponto de vista, os termos, smbolos e regras vigentes no seio da Matemtica no tm, per se, nenhum outro valor ou significado alm do estritamente formal. No se deve pedir qualquer significado aos smbolos e as regras matemticas para alm do estritamente sinttico, vigente entre os signos. Deste modo, o problema do significado e da verdade subtrado a qualquer relao extrnseca e limitado ao domnio estritamente matemtico (MANNO, 1972, p. 258).

    O objetivo principal do formalismo era eliminar os paradoxos e contradies da

    Matemtica e o mtodo axiomtico foi a sada encontrada. Dessa maneira, para os

    formalistas, se a Matemtica fosse toda reescrita de maneira rigorosa por um

    sistema formal, ela poderia ser entendida como verdade absoluta.

  • 23

    Nesta seo realizamos um estudo das correntes filosficas que influenciaram

    o desenvolvimento da Filosofia da Matemtica: o logicismo, o intuicionismo e o

    formalismo. Essas correntes influenciam at hoje as concepes dos matemticos.

    Mas e no ensino de Matemtica, quais concepes tiveram mais influencia nas

    prticas em sala de aula?

    A prxima seo apresenta um estudo das ideias do professor Dario Fiorentini

    sobre as tendncias pedaggicas do ensino de Matemtica no Brasil e suas

    concepes epistemolgicas.

    2.2 Tendncias pedaggicas no ensino de Matemtica no Brasil

    O ensino de Matemtica vem ocorrendo sob influncia de diversas tendncias

    pedaggicas oriundas das concepes dos sujeitos integrantes desse processo

    (THOMPSON, 1997). Com base nisto apresentamos a relao histrica entre os

    aspectos epistemolgicos da Matemtica e as prticas pedaggicas dessa disciplina

    em sala de aula.

    At a dcada de 1920, conforme Damzio (1996), predominava no ensino de

    Matemtica uma pedagogia tradicional, na qual o aluno era adestrado nas tcnicas

    operatrias, nos teoremas e era mensurado pela quantidade de informao que era

    capaz de acumular em sua memria. Nesta poca eram comuns as provas orais e

    escritas e os castigos, orais e fsicos, queles que no atingiam os objetivos

    exigidos.

    Para Fiorentini (1995), com uma forte influncia da pedagogia tradicional,

    predominou no Brasil, at o final da dcada de 1950, a tendncia formalista clssica.

    Nesta concepo, a Matemtica clssica com seus formalismos era o centro da

    aprendizagem. A prtica em sala de aula ocorria pela transmisso sistematizada

    com a memorizao dos contedos pelos alunos e centrada na figura do professor,

    dono absoluto da verdade.

    A prtica formalista clssica caracteriza-se pela nfase nas idias e formas da

    Matemtica clssica, sobretudo no modelo euclidiano e na concepo platnica de

  • 24

    Matemtica. Esta prtica tem uma viso esttica, a-histrica e dogmtica das idias

    matemticas, como se essas existissem independente dos homens.

    (...) ensinavam-se e estudavam-se as disciplinas matemticas no por seus valores intrnsecos ou utilitrios, mas como meios de elevao espiritual no sentido de conhecimento da natureza da verdade absoluta, a fim de atingir a disciplina suprema (MIGUEL, apud FIORENTINI, 1995, p. 6).

    A tendncia formalista clssica era centrada na figura do professor, detentor do

    conhecimento, e nos livros didticos, escritos sob a perspectiva de que a

    Matemtica era detentora da verdade absoluta. Ao aluno cabia apenas copiar e

    reproduzir os conceitos.

    Didaticamente, o ensino nessa tendncia pedaggica foi acentuadamente livresco e centrado no professor e no seu papel de transmissor e expositor do contedo atravs de prelees ou de desenvolvimentos tericos na lousa. A aprendizagem do aluno era considerada passiva e consistia na memorizao e na reproduo (imitao/repetio) precisa dos raciocnios e procedimentos ditados pelo professor ou pelos livros (MIGUEL, apud FIORENTINI, 1995, p. 6).

    Ainda segundo Fiorentini (1995), esta tendncia pedaggica compatvel com

    a concepo platnica, pois os conhecimentos no so construdos nem inventados,

    mas sim descobertos. E o papel do professor apenas o de informar seus alunos,

    pois se o conhecimento j foi descoberto e sistematizado nos livros didticos, ento

    cabe ao aluno apenas copiar e reproduzir.

    Com o intuito de promover uma educao diferente, surge um movimento de

    intelectuais que, descontentes com as prticas presentes, fundam um movimento

    denominado de Escola Nova ou Escola Emprico-ativista. Este movimento vem fazer

    oposio escola clssica tradicional que no considerava a natureza da criana

    em desenvolvimento (DAMZIO, 1996).

    Na prtica emprico-ativista, conforme Fiorentini (1995), a Matemtica deixa de

    ser um conhecimento fundamental e passa a ser algo entendido pelo aluno que

    neste momento passa a ser o centro das atenes didticas e da aprendizagem

    enfim, um ser ativo e pensante. Esta prtica tinha uma concepo idealista a cerca

    da cincia. Buscava o desenvolvimento da criatividade dos alunos com tcnicas de

    aprendizado baseadas na descoberta, era um mtodo conhecido como o aluno

    aprende fazendo (p. 11). Os mtodos de ensino consistiam de atividades

    desenvolvidas em pequenos grupos, com rico material didtico e em ambiente

  • 25

    estimulante. Nesta prtica, era muito forte a defesa do uso de materiais concretos

    como, por exemplo, Material Dourado de Maria Montessori.

    Fiorentini (1995) afirma que esta tendncia pedaggica no rompe com o

    mundo ideal platnico, pois ainda acredita que o aluno aprende Matemtica pela

    descoberta.

    Epistemologicamente, entretanto, esta tendncia no rompe com a concepo idealista de conhecimento. De fato, continua a acreditar que as ideias matemticas so obtidas por descoberta. A diferena, porm, que elas preexistem no num mundo ideal, mas no prprio mundo natural e material que vivemos. Assim, para os emprico-ativistas, o conhecimento matemtico emerge do mundo fsico e extrado pelo homem atravs dos sentidos (FIORENTINI, 1995, p. 9).

    Entre os anos 60 e 70 predominou a tendncia formalista moderna ou

    movimento da Matemtica Moderna, a qual era uma prtica pedaggica com grande

    influncia dos Estados Unidos da Amrica. Esta prtica escolar era estruturada de

    forma lgica pela teoria dos conjuntos, com forte nfase nos axiomas e nos aspectos

    estruturais que fundamentam a Matemtica pura (Ibidem, 1995).

    A Matemtica Moderna era centrada na figura do professor, o qual buscava a

    transmisso e assimilao da linguagem e dos processos de sistematizao e

    estruturao lgica da Matemtica, por parte dos alunos. O ensino voltava a ser

    acentuadamente formal com o professor demonstrando os conceitos matemticos

    na lousa e os alunos copiando e reproduzindo esses conceitos. Assim, o aluno

    aprendia as estruturas subjacentes aos conceitos Matemticos e isso era mais

    importante que a aprendizagem matemtica (Ibidem, 1995).

    A tendncia tecnicista surgiu na dcada de 1970 e era uma prtica que

    buscava a eficincia, empregando tcnicas especiais de ensino. Nesta prtica, o

    ensino de Matemtica atuava na preparao e integrao da pessoa ao sistema

    dominante, tornando-se assim uma pea til para a sociedade. A prtica tecnicista

    era marcada pelos modelos acabados chamados de tecnologias de ensino (p. 16),

    no qual os educadores j recebiam prontas as formas de organizao e controles e

    as tcnicas de ensino e planejamento que deveriam ser utilizadas (Ibidem, 1995).

    Na prtica em sala de aula, a tendncia tecnicista se caracterizou por um

    mtodo em que o aluno desenvolvia uma aprendizagem mecnica, com exerccios

    repetitivos e sem a compreenso das teorias que fundamentam a Matemtica. A

  • 26

    habilidade exigida do aluno era a de resolver problemas atravs de tcnicas prontas,

    como a aplicao de frmulas. Este sistema foi a base do ensino na poca da

    ditadura militar em nosso pas. Epistemologicamente, concebe a Matemtica como

    formalista derivada do logicismo (Ibidem, 1995).

    Conforme Fiorentini (1995, p. 20), foi a partir das dcadas de 1960 e 1970 que

    se comea a sentir, no Brasil, a presena do construtivismo piagetiano. Nessa

    poca o construtivismo passa a ser uma grande referncia na inovao das prticas

    de ensino de Matemtica e das outras disciplinas. Esta prtica se baseia na

    construo de conceitos, com o auxlio de materiais concretos, como os Blocos

    Lgicos de Zoltan P. Deines (Ibidem, 1995).

    O construtivismo surge como uma prtica pedaggica a partir da epistemologia

    gentica de Jean Piaget.

    Embora Piaget no tenha se preocupado em construir uma teoria de ensino ou de aprendizagem do ponto de vista educacional, foi exatamente a partir da epistemologia gentica piagetiana que o construtivismo emergiu como tendncia pedaggica, passando, ento, a influenciar fortemente as inovaes do ensino da Matemtica (FIORENTINI, 1995, p. 18).

    Para o construtivismo, a Matemtica uma construo humana constituda

    pelas estruturas e pelas relaes abstratas entre as grandezas e formas, reais ou

    possveis. O aluno desenvolve o pensamento lgico, a partir da ao, ou seja, um

    processo interior de construo do conhecimento. A prtica pedaggica centrada

    no aluno e o professor tem o papel de orientador e problematizador.

    Por isso, essa corrente prioriza mais o processo que o produto do conhecimento. Ou seja, a Matemtica vista como um constructo que resulta da interao dinmica do homem com o meio que o circunda. A apreenso destas estruturas pela criana se d tambm de forma interacionista, especialmente a partir de abstraes reflexivas, realizadas mediante a construo de relaes entre objetos, aes ou mesmo entre idias j construdas (FIORENTINI, 1995, p. 20).

    Nesta tendncia, o pensamento no tem limites. A Matemtica por ser uma

    construo humana formada pelas relaes abstratas ou reais entre as grandezas e

    as formas, se relaciona com o intuicionismo. O conhecimento matemtico no

    resulta do mundo ideal platnico nem do mundo natural, mas sim da interao e

    reflexo do homem com o ambiente em que vive e com as atividades que

    desenvolve (Ibidem, 1995).

  • 27

    A tendncia socioetnocultural surgiu nos anos de 1980 a partir de estudos que

    pesquisadores do ensino de Matemtica passaram a fazer sobre os aspectos scio-

    culturais do ensino dessa disciplina (Ibidem, 1995). Na poca acreditava-se que

    alunos oriundos de classes sociais menos favorecidas no tinham condies de

    acompanhar e desenvolver o aprendizado formal em funo de suas carncias

    sociais. Segundo Fiorentini (1995, p. 24), como resultado destas pesquisas, como

    por exemplo, s de Carraher et al (1988), Dambrosio (1990) e Patto (1990),

    percebeu-se que isto no era verdade. Ou seja, as crianas de classes sociais mais

    pobres no so carentes de conhecimento e de habilidades cognitivas, pois sua

    experincia de vida diferente da experincia das crianas de classes mais

    favorecidas, mas por isso no so menos ricas culturalmente.

    Com isto, a tendncia socioetnocultural, que causou uma forte influncia no

    campo da pesquisa em Educao Matemtica, valoriza o saber e a cultura popular

    trazidas pelo aluno e sua capacidade de produzir conhecimento frente realidade

    em que vive. No mbito da Educao Matemtica, esta tendncia chamada de

    Etnomatemtica. Nesta tendncia, a Educao Matemtica produzida de maneira

    no formal, com aplicao na prtica cotidiana e social, compreendendo a realidade

    e formando conscincia crtica e poltica e com troca de experincias entre aluno e

    professor (Ibidem, 1995).

    Segundo Luckesi (2000), a Etnomatemtica fundamentada na tendncia

    progressista libertadora e considerada uma prtica pedaggica progressista. A

    prtica pedaggica Progressista se baseia na anlise crtica das realidades sociais,

    na valorizao das experincias vividas pelos alunos e na relao educador-

    educando calcada numa contextualizao da realidade das relaes sociais.

    A tendncia progressista libertadora, que tem como seu principal expoente

    Paulo Freire, questiona concretamente a realidade do contexto em que est inserido

    o homem, sujeito deste processo, e suas relaes com o meio natural e com outros

    homens.

    Para Luckesi (2000), esta tendncia visa transformao do contexto atravs

    da educao crtica e no-formal, com sujeitos engajados na valorizao das

    experincias vividas como base da relao educativa.

  • 28

    Segundo Fiorentini (1995), podemos citar como uma tendncia pedaggica

    emergente, a histrico-crtica. Nesta tendncia busca-se um saber dinmico, vivo,

    em que o educando estimulado, interna e externamente, a (re)produzir e

    (re)significar conhecimento matemtico com diferentes nveis de sistematizao e

    abstrao, acumulado ao longo da histria da humanidade. Um fator muito

    importante desta tendncia que ela prope o ensino da Matemtica atravs do

    desenvolvimento, em sala de aula ou em outro ambiente de estudo, da histria do

    pensamento que deu origem aos conceitos matemticos. O educador deve trabalhar

    o conceito de forma que o aluno entenda a idia, construda historicamente, que deu

    origem ao conceito matemtico estudado no momento e, desta forma, se aproprie do

    conhecimento de forma definitiva e com liberdade de pensamento e ao na

    aplicao na sua realidade cotidiana.

    Nesta seo discorremos sobre os aspectos histricos importantes que

    influenciam at hoje as prticas de ensino de Matemtica em sala de aula. Porm,

    existem outras perspectivas que so fundamentadas nas crenas e posturas dos

    professores na sua atuao com os alunos. Estas abordagens do ensino de

    Matemtica e de outras disciplinas so conhecidas tambm como Modelos Didticos

    e so objeto de estudo da prxima seo.

    2.3 Modelos didticos no ensino de Matemtica

    Segundo Thompson (1997), o entendimento e as crenas que cada professor

    traz para sala de aula, influenciam decisivamente na sua prtica e na articulao de

    propostas curriculares que envolvem a aprendizagem dos conceitos matemticos,

    com sua aplicabilidade ou no no mundo real.

    O entendimento e as crenas dos professores, tratados doravante

    simplesmente como concepes, tm a sua natureza fundamentalmente cognitiva e

    formam-se na interao do sujeito com seus pares e com o meio em que ele est

    inserido.

    As concepes formam-se num processo simultaneamente individual (como resultado da elaborao sobre a nossa experincia) e social (como resultado do confronto das nossas elaboraes com as dos outros). Assim, as nossas concepes sobre a Matemtica so influenciadas pelas

  • 29

    experincias que nos habituamos a reconhecer como tal e tambm pelas representaes sociais dominantes (PONTE, 1992, p. 01).

    Na sala de aula, segundo Thompson (1997), o professor de Matemtica tem

    grande influncia na aprendizagem dos seus alunos. Consequentemente, suas

    concepes podem influenciar decisivamente na formao destes alunos. Cada

    professor carrega consigo um entendimento do que se deve aprender em

    Matemtica e, para colocar isso em prtica, utiliza um modelo didtico alicerado

    nas suas concepes para alcanar o objetivo de promover a aprendizagem

    Matemtica.

    De maneira geral, segundo Ponte (1992), as concepes dos professores

    apontam para uma viso absolutista e instrumental da Matemtica. Porm ele

    ressalta que existem alguns educadores que se diferenciam dos demais por assumir

    uma proposta em que a Matemtica entendida como uma cincia dinmica, viva e

    em constante evoluo. Estes permitem aos sujeitos envolvidos no processo

    educativo reelaborar seu conhecimento e contextualiz-lo.

    Para entender melhor os modelos didticos utilizados pelos educadores de

    Matemtica, possvel fazer uma relao entre as concepes sobre a natureza das

    cincias e os modelos didticos propostos por tericos e pesquisadores da rea.

    Para tanto, em linhas gerais, trs grandes vertentes podem ser abordadas como

    fundamentos para essa idia: as concepes absolutistas, as concepes

    relativistas e as concepes evolutivo-construtivistas, conforme Harres (1998) e

    Prlan e Harres (2002).

    Thompson (1997) afirma que os modelos ou metodologias de trabalho em sala

    de aula, esto diretamente ligadas s concepes de conhecimento cientfico dos

    professores. Harres (1998) afirma que diversas investigaes demonstraram que a

    maioria dos educadores apresenta uma viso epistemolgica inadequada sobre a

    natureza das cincias. Alguns possuem um entendimento empirista com uma prtica

    fundamentada no racionalismo, caracterizando o absolutismo epistmico de Steffen

    Toulmin.

    Segundo Mellado e Carracedo (1993), o modelo tradicional de ensino est

    fortemente relacionado s concepes epistemolgicas que defendem o

    racionalismo e o empirismo. Essas concepes valorizam o raciocnio matemtico

  • 30

    formal obtido por meio de uma forte atividade mental como nica maneira de se

    obter conhecimento. A Matemtica entendida como uma verdade absoluta e

    definitiva, com seus conceitos prontos e acabados. As propostas que se

    fundamentam nesta perspectiva epistemolgica valorizam o contedo a ser

    ensinado aos alunos, seguem um currculo previamente concebido e no permitem

    que haja alteraes na sua sequncia (FIORENTINI, 1995).

    O modelo absolutista, conforme Mellado e Carracedo (1993), no considera

    importante as concepes prvias dos alunos. Isso ocorre porque o currculo j est

    pronto e definitivo, no permitindo mudanas. Qualquer atividade escolar fora do

    que est previsto no currculo pode ser considerado como perda de tempo e um

    empecilho para os trabalhos em sala de aula.

    Segundo Harres (1998), o sistema educativo em geral se caracteriza por uma

    perspectiva absolutista. Isso se deve ao fato de que a sociedade tambm apresenta

    uma postura absolutista, mesmo que no defenda essa posio explicitamente.

    O fracasso geral do modelo tradicional de ensino parece ter afetado pouco as bases do sistema educativo. Uma possvel explicao pode estar no fato de que o prprio sistema educativo compartilha de uma concepo absolutista do conhecimento. Forjado dentro de uma sociedade tambm absolutista, dificilmente este sistema pode auto-questionar-se. Neste caso, podemos conceber a postura do professor, longe de uma opo deliberada e consciente de ser ineficiente, como uma adaptao natural a um modelo resistente a novas alternativas (HARRES, 1998, p. 72).

    Conforme Harres (1998), o modelo relativista defende que para justificar o

    ensino de um determinado contedo necessrio se levar em conta o contexto

    social e os indivduos envolvidos neste processo. Para os relativistas, o carter

    social da construo do conhecimento o centro de suas propostas pedaggicas,

    ou seja, consideram que os conceitos cientficos s podem ser aprendidos quando

    so contextualizados na realidade do aluno.

    O relativismo defende tambm no ser possvel traar uma clara demarcao entre filosofia e cincia emprica e entre a epistemologia e a sociologia do conhecimento. Em outras palavras, para analisar as condies de justificao de um determinado saber necessrio levar em conta o contexto em que a justificao feita, quem a faz, para que se faz, etc. (HARRES, 1998, p. 40).

    No modelo relativista, segundo Forquim (2000), os contedos ensinados na

    escola so considerados como conhecimentos pertencentes ao contexto em que

  • 31

    essa escola est inserida. Os contedos formais devem ser desconstrudos em prol

    desse entendimento, sendo contextualizados e enriquecidos com os valores

    estticos, morais e sociais dos sujeitos pertencentes quela realidade. Os contedos

    a serem estudados nas escolas devem ser adaptados aos elementos culturais da

    sociedade.

    O relativismo epistemolgico diz respeito questo dos contedos considerados de ensino como contedos do saber, e o problema que se coloca diz respeito s contribuies e aos limites da sociologia do conhecimento como instrumento de anlise e de desconstruo dos saberes transmitidos pela escola. Porm os contedos veiculados pelo ensino no so somente saberes no sentido estrito, so tambm elementos mtico-simblicos, valores estticos, atitudes morais e sociais, referenciais de civilizao. Assim, pois, a questo de determinar o que vale a pena ser ensinado ultrapassa a questo do valor da verdade dos conhecimentos incorporados nos programas (FORQUIN, 2000, p. 51).

    Contrapondo s prticas absolutistas de ensino, Harres (1998) cita as prticas

    denominadas de evolutivo-construtivistas como uma alternativa para o ensino

    tradicional e afirma que essa denominao justifica-se porque consideram o

    conhecimento como algo em permanente evoluo e construo, o que as distingue

    das concepes absolutistas (p. 82). Essas perspectivas pedaggicas consideram

    que as concepes prvias dos alunos so fundamentais para o processo de

    aprendizagem e entendem que o conhecimento est em constante construo.

    De maneira geral, os modelos didticos fundamentados nas concepes

    evolutivo-construtivistas entendem que os alunos devem construir a sua

    aprendizagem apoiados no seu conhecimento anterior e sempre de maneira ativa e

    contextualizada. O aluno passa a ser o centro do processo didtico e no mais um

    receptor passivo de informaes, com ideias prvias importantes para a construo

    de conceitos matemticos (HARRES, 1998).

    Para Garcia (2009), nas posturas construtivistas de ensino de Matemtica, os

    alunos so incentivados a propor ideias, levantar hipteses, testar modelos,

    contextualizar e generalizar conceitos. A expectativa que, o aumento do

    envolvimento e da participao tenha como conseqncia o aumento do prazer de

    aprender, fruto da percepo da relevncia da Matemtica para o problema (p. 182)

    Os modelos didticos absolutistas, relativistas e evolutivo-construtivistas

    permeiam as prticas pedaggicas no ensino de Matemtica na atualidade. Porm,

    outra perspectiva de aprendizagem que vem influenciando as atividades escolares e

  • 32

    investigada no mbito do Programa de Ps-Graduao em Cincias e Matemtica

    da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, conhecida como Educar

    pela Pesquisa. Na prxima seo abordamos esse tema e analisamos o

    entendimento de alguns autores sobre o assunto.

    2.4 O educar pela pesquisa

    Nesta pesquisa considerei a perspectiva de aprendizagem EPP semelhante ao

    modelo didtico Investigativo de Prlan (1993). Ambas as teorias convergem em

    pontos importantes.

    O modelo didtico fundamentado na investigao em sala de aula, conforme

    Porln (1993) valoriza as concepes prvias dos educandos como determinantes

    da sequencia de atividades a serem desenvolvidas em sala de aula. Ramos, Lima e

    Rocha F (2009, p. 56) afirmam que nesse modelo o estudante protagonista de

    suas aprendizagens, superando as concepes tradicionais de ensino e de

    aprendizagem.

    Nesta perspectiva, Porln (1993) sustenta que os educadores devem

    primeiramente fazer um levantamento para saber quais so as concepes prvias e

    os conhecimentos escolares prvios dos alunos, para assumir o papel de

    facilitadores do processo de ensino e aprendizagem. A partir desse entendimento a

    prtica investigativa em sala de aula assume grande potencialidade didtica, pois

    todo o conhecimento a ser gerado e construdo na escola passa a ter uma postura

    epistemolgica prpria. Isso implica na anlise de diferentes tipos de informao, ou

    seja, buscar essas informaes em diferentes reas do conhecimento

    potencializando a investigao com olhar crtico sobre as questes estudadas.

    A proposta pedaggica do EPP possui quatro pressupostos fundamentais:

    A convico de que o educar pela pesquisa a especificidade mais prpria da educao escolar e acadmica; O reconhecimento de que o questionamento reconstrutivo com qualidade formal e poltica o cerne do processo de pesquisa; A necessidade de fazer da pesquisa atitude cotidiana no professor e no aluno; A definio de educao como processo de formao da competncia histrica humana (DEMO, 2011, p.7).

  • 33

    Conforme Demo (2011), quando o ambiente escolar se torna um lugar de

    investigao, os sujeitos participantes desse processo constroem conhecimentos,

    estabelecem um ambiente de respeito e dilogo e fortalecem os valores formadores

    do ser humano historicamente constitudo, exercitando assim a cidadania plena.

    A educao escolar se diferencia dos outros espaos educacionais justamente

    pela oportunidade de se construir conhecimento pela pesquisa. Este ambiente tem a

    capacidade de proporcionar a interao entre teorias cientficas com a prtica

    contextualizada criando a possibilidade de reconstruo e (re)significao de

    conceitos e ideias (DEMO, 2011).

    Demo (2011) afirma que o EPP consagra a capacidade do aluno em questionar

    o meio em que vive e a sua realidade, proporcionando a ele a deciso de mudar ou

    no o seu contexto social. o que este autor define como a qualidade formal e

    poltica da educao. Formal pela bagagem de conhecimento cientfico adquirida na

    escola e poltica pelo desenvolvimento do questionamento reconstrutivo do aluno.

    Educar pela Pesquisa , portanto, imprimir qualidade formal e poltica aprendizagem... estruturar o trabalho pedaggico de modo a propiciar a formao de um sujeito com autonomia para aprender, com disposio para solucionar problemas, num processo que visa, ainda, amadurecer os aspectos crtico, tico e cooperativo de um sujeito que reivindicar participao poltica, na luta pela qualificao da vida tanto no sentido individual quanto coletivo. Nesse sentido, a pesquisa na sala de aula concretiza-se por meio do questionamento reconstrutivo, da reconstruo de argumentos e da comunicao e validao desses argumentos (RAMOS, LIMA e ROCHA F, 2009, p. 56).

    Conforme Porln (1993), o desenvolvimento do pensamento reflexivo e

    autnomo se define como a principal finalidade da educao escolar. Esse

    pensamento reflexivo tem o papel de mediador entre o conhecimento cotidiano e o

    conhecimento cientfico. Porm, a reflexo por si s no suficiente, pois requer

    uma reconstruo e (re)significao crtica das teorias cientficas a partir da sua

    aplicao no cotidiano dos alunos.

    Seguindo o pressuposto de que o processo de ensino e aprendizagem na

    proposta do EPP se inicia pelos questionamentos dos alunos (MORAES e LIMA,

    2004), a linguagem adotada fundamental para que se estabeleam as relaes

    lgicas entre o conhecimento cientfico e as concepes prvias dos alunos.

    Os estudantes reconstroem os seus argumentos, pois partem do que j conhecem. No h como aprender algo sobre o que no se conhece o mnimo que possibilite estabelecer relaes lgicas. Por isso, s se aprende

  • 34

    o que j se sabe. Dito de outro modo, s possvel aprender o que pode estabelecer relao com o conhecimento que j se tem. Isso est intimamente relacionado com a prpria linguagem que se construiu e com a qual se pode operar (RAMOS, LIMA e ROCHA F, 2009, p. 58).

    Prlan (1993) argumenta que a perspectiva da pesquisa em sala de aula

    centrada na escola, como postura prpria da instituio, pode proporcionar uma

    transformao progressiva dos processos de ensino e da prpria sociedade. Esta

    condio s se sustenta se o professor assumir uma postura de investigao e

    reflexo crtica na sua prtica diria. Para isso, Demo (2011) afirma que o professor

    deve atualizar e melhorar seu projeto pedaggico constantemente, produzindo e

    reelaborando conhecimentos de acordo com os desafios que encontra no seu dia a

    dia. Segundo o autor, esse processo proporciona ao educador a reconstruo

    constante de uma teoria crtica para a educao e tem a capacidade de melhorar

    todo o processo educativo escolar.

    Neste sentido, o papel do professor fundamental na proposta do EPP. Ele o

    grande coordenador das atividades. Aquele que disponibiliza condies para que a

    aprendizagem acontea efetivamente. Para Demo (2011) o professor, ao assumir a

    postura de pesquisador, no pretende que sejam criados conhecimentos cientficos

    novos, mas prope e cria condies para que os alunos reconstruam e

    (re)siginifiquem os conceitos cientficos j existentes, contextualizando-os em sua

    realidade.

    Conforme Demo (2011), a proposta pedaggica do EPP consiste numa postura

    que envolve todos os sujeitos do processo educativo e impacta diretamente na

    sociedade. Nesta perspectiva os alunos e os professores se envolvem diretamente

    numa ao afirmativa e inovadora de educao, questionando a realidade,

    argumentando sobre fatos e fenmenos, reconstruindo significados e propondo

    aes alternativas aos problemas encontrados.

    Neste captulo abordamos um pouco de Filosofia da Matemtica para entender

    os fundamentos filosficos dessa cincia. Vimos, com isso, que esses fundamentos

    filosficos influenciam as prticas dos professores em sala de aula, conforme os

    tericos estudados nos revelam. Essa influncia um processo histrico que

    verificamos quando analisamos as tendncias histricas das prticas pedaggicas

    no ensino de Matemtica na Brasil. Desse processo, verificamos que as prticas dos

  • 35

    professores podem ser agrupadas conforme os modelos didticos absolutistas,

    relativistas e evolutivo-construtivistas. Tambm analisamos os pressupostos do EPP.

    Os organogramas abaixo resumem a fundamentao terica e as relaes

    entre as teorias defendidas neste trabalho. O organograma 1 apresenta as relaes

    entre as teorias filosficas e as tendncias pedaggicas no ensino de Matemtica no

    Brasil. O organograma 2 uma ousadia deste autor, pois nenhum terico defende

    explicitamente as relaes entre os modelos didticos e as filosofias de Plato e

    Aristteles. Porm, nos parecem muito claras estas relaes.Neste organograma

    so apresentadas as relaes entre EPP, modelos didticos e os princpios

    filosficos citados.

    Organograma 1 Relao entre teorias filosficas e tendncias em Educao Matemtica

    Fonte: O autor (2012).

    Realismo

    platnico Antirrealismo

    aristotlico

    Realismo Conceptualismo Nominalismo

    Logicismo

    Formalista clssica

    Emprico-ativista

    Movimento Matemtica

    Moderna

    Intuicionismo Formalismo

    Construtivismo

    Tecnicismo

    Etnomatemtica Histrico-crtica

  • 36

    Organograma 2 Relaes entre EPP, modelos didticos e princpios filosficos.

    Fonte: O autor (2012).

    No prximo captulo tratamos da metodologia de anlise dos dados que

    sustentou esta pesquisa.

    Realismo platnico

    Antirrealismo aristotlico

    Modelo didtico absolutista

    Modelo didtico relativista

    Modelo didtico evolutivo-construtivista

    EPP

  • 3 METODOLOGIA

    Esta pesquisa consistiu no estudo de treze dissertaes de mestrado

    aprovadas no mbito do Programa de Ps-Graduao em Educao em Cincias e

    Matemtica da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul no perodo de

    2004 a junho de 2012. Esta investigao teve abordagem qualitativa interpretativa

    conforme propem Ldke e Andr (1986), Bogdan e Bicklen (1994), Serrano (1998 e

    2007) e Wildemuth (1993).

    Segundo Serrano (1998), a metodologia qualitativa apropriada quando o

    fenmeno investigado complexo e no pode ser quantificado, como foi o caso, o

    do propsito de identificar as concepes subjacentes s treze dissertaes

    investigadas e relacion-las com as propostas didticas dos pesquisadores.

    No incio da investigao foram identificadas um total de 224 dissertaes

    elaboradas no perodo de 2004 a junho de 2012. Destas, 95 tratavam de Educao

    Matemtica. Das quais, 56 foram elaboradas a partir de trabalhos desenvolvidos em

    sala de aula com alunos. Finalmente, foram selecionadas treze dissertaes que

    tinham como objeto a pesquisa em sala de aula realizada pelos alunos e apoiaram o

    princpio terico do EPP.

    Em sequncia, foram realizadas leituras das dissertaes selecionadas com a

    finalidade de organizar o material. Logo aps, foi elaborada uma planilha contendo

    as informaes gerais de cada dissertao, consideradas relevantes para o incio

    deste estudo: objetivo da pesquisa, questes de pesquisa, metodologia de anlise

    de dados, mtodo de trabalho, concepes de ensino, concepo sobre a natureza

    do conhecimento matemtico implcito, caracterstica dos sujeitos, idade mdia, nvel

    social e regio, nvel escolar, contedo matemtico abordado, cidade, tipo de escola,

    tempo de trabalho em sala de aula, ano da pesquisa, resultados obtidos e atividades

    desenvolvidas pelos alunos. Destes dados emergiram as dimenses relevantes para

    esta pesquisa: concepo de ensino de Matemtica por meio de pesquisa,

    concepo sobre a natureza do conhecimento matemtico e a proposta didtica

    para as atividades realizadas em sala.

    A seguir apresentamos a caracterizao das dissertaes analisadas a partir

    do contexto de investigao. As treze dissertaes selecionadas so caracterizadas

  • 38

    sob o prisma dos ambientes em que foram produzidas as suas investigaes.

    Elas so apresentadas segundo o ano concluso, tipo de escola, regio do RS onde

    fica situada a escola, o nvel escolar e as idades dos sujeitos da pesquisa. O quadro

    a seguir mostra essas informaes.

    Quadro 1 Caractersticas do contexto escolar das dissertaes analisadas

    Tipo de escola

    Regio Dissertaes

    (por autor) Ano de

    concluso Nvel escolar Idades

    Lipp (2009) 2009 7 EF 10 a 15 Metropolitana de Porto Alegre Cunha (2012) 2012 6 EF 10 a 15

    Interior do RS Marmitt (2009) 2009 8 EF 14 a 15 Municipal

    No consta Altenhofen (2008) 2008 5 EF 11 a 13

    Camargo (2004) 2004 2 EM 16 Metropolitana

    de Porto Alegre

    Jnior (2010) 2010 8 EF 14 Estadual

    Interior do RS Diedrich (2009) 2009 3 EM 16 a 18

    Metropolitana de Porto Alegre

    Soares (2005) 2005 Sries iniciais No consta

    Ficagna (2005) 2005 1 a 3 EM 15 a 18

    Toni (2006) 2006 3 EM 17 a 18

    Particular

    Interior do RS

    Molon (2001) 2011 EJA EF a partir de 15

    Nina (2005) 2005 3 EM 16 a 18 Pblica 2 Interior do RS

    Boesing (2009) 2009 5 a 8 EF No consta

    Fonte: O autor (2012).

    Para a anlise das informaes relevantes a esta pesquisa, foi utilizada a

    Anlise Textual Discursiva conforme Moraes e Galiazzi (2011). Esse processo tem

    incio pela unitarizao e desmontagem dos textos para a obteno de unidades

    com significado relevante para o estudo que est sendo feito. Essas unidades com

    significados so organizadas e codificadas para, logo aps serem organizadas em

    categorias com contedos semelhantes. Essas categorias so consideradas

    2 As dissertaes que caracterizaram o tipo de escola como pblica no definiram se eram municipais, estaduais

    ou federais.

  • 39

    intermedirias, pois sero reorganizadas em categorias mais abrangentes. Desse

    processo surgem as categorias finais sobre as quais so escritos metatextos que as

    descrevem. Esses metatextos so utilizados para a redao do texto final de anlise

    (MORAES e GALIAZZI, 2011).

    Como resultado desta anlise foi elaborada outra planilha contendo as relaes

    entre as dimenses relevantes para o objetivo desta pesquisa, conforme o quadro 2,

    no prximo captulo.

    Aps a descrio das dissertaes elencadas para este trabalho,

    apresentamos os pontos principais que surgiram no processo de anlise.

  • 40

    4 ANLISE DAS DISSERTAES

    Iniciamos este captulo apresentando um quadro que mostra a relao entre as

    categorias: propostas didticas, concepes de ensino e concepes sobre a

    natureza do conhecimento matemtico. Esse quadro constitui o foco central de

    anlise dessa pesquisa.

    Na seo 4.1 so descritas as categorias de anlise das propostas didticas

    dos autores das dissertaes nas atividades desenvolvidas com os seus sujeitos de

    pesquisa em sala de aula. Essas categorias foram nomeadas como Atividades

    Experimentais, Estudo Terico, Modelagem na Educao e Pesquisa de Campo.

    Na seo 4.2 so descritas as categorias de anlise das concepes sobre a

    natureza do conhecimento matemtico dos autores. Essas concepes revelam o

    entendimento destes autores sobre a natureza do conhecimento Matemtico

    implcitas nas atividades realizadas em sala de aula. Essas categorias foram

    nomeadas como Descoberta e Ferramenta.

    Na seo 4.3 so apresentadas as categorias de anlise das concepes de

    ensino de Matemtica que surgem implcitas no discurso dos autores das

    dissertaes. Esses autores no demonstram explicitamente as suas concepes,

    por isso, so identificadas no processo de anlise, subjacentes s suas

    argumentaes. Essas categorias foram nomeadas como Contextualizao,

    Estratgia, Linguagem, Questionamento e Ensino Significativo.

    Na seo 4.4 apresentamos os resultados gerais do processo de anlise dos

    dados levantados nessa pesquisa.

    A seguir, apresentamos o quadro das relaes entre as categorias de anlise.

  • 41

    Quadro 2 Relao entre as categorias de anlise. Dissertaes

    (por autor) Categorias das propostas didticas

    Categorias das concepes de ensino

    Categoria das concepes matemticas

    Camargo (2004) Estudo terico Contextualizao Descoberta

    Soares (2005) Estudo terico Linguagem Ferramenta

    Nina (2005) Modelagem na educao Estratgia Descoberta

    Ficagna (2005) Pesquisa de campo Contextualizao Ferramenta

    Toni (2006) Pesquisa de campo Questionamento Ferramenta

    Altenhofen (2008) Pesquisa de campo Contextualizao Ferramenta

    Boesing (2009) Pesquisa de campo Estratgia Ferramenta

    Marmitt (2009) Estudo terico Ensino significativo Ferramenta

    Lipp (2009) Pesquisa de campo Contextualizao Ferramenta

    Diedrich (2009) Estudo terico Ensino significativo Ferramenta

    Jnior (2010) Atividades experimentais Linguagem Ferramenta

    Molon (2011) Atividades experimentais Ensino significativo Ferramenta

    Cunha (2012) Estudo terico Ensino significativo Ferramenta

    Fonte: O autor (2012).

    Na prxima seo apresentamos as categorias das propostas didticas

    utilizadas pelos autores das dissertaes em seus trabalhos em sala de aula.

    4.1 Propostas didticas

    Neste captulo so apresentadas as categorias de anlise das propostas

    didticas adotadas em sala de aula pelos autores das dissertaes investigadas.

  • 42

    As atividades desenvolvidas pelos alunos em sala de aula demonstraram as

    diferentes propostas didticas utilizadas pelos autores das dissertaes investigadas

    e foram agrupadas em quatro categorias que representam todos os trabalhos, que

    so: Atividades Experimentais, Estudo Terico, Modelagem na Educao e

    Pesquisa de Campo.

    Atividades Experimentais

    Na categoria denominada Atividades Experimentais, os alunos construram

    retas, tringulos e figuras geomtricas, realizaram medidas e montaram

    experimentos em laboratrio. Os conceitos matemticos foram construdos pelos

    alunos a partir do seu conhecimento escolar prvio. Nas dissertaes desta

    categoria, os professores e os alunos se envolveram no planejamento e nas

    investigaes, pois buscaram compreender a Matemtica como uma disciplina que

    envolve raciocnio, conceitos teis e prticos, com a inteno de desenvolver a

    postura de pesquisador nos sujeitos envolvidos no processo. Em todos os trabalhos

    pertencentes a essa categoria, as atividades desenvolvidas em sala de aula tinham

    como principal caracterstica a investigao de conceitos matemticos a partir do

    estudo e da observao de objetos.

    Aps anlise dos questionrios do Pr-teste chegou-se concluso de que era necessrio aprofundar os conhecimentos de Geometria Plana optando-se, para tal, pela elaborao, conforme escolha dos alunos, de duas Unidades de Aprendizagem: a confeco da camiseta, pois os alunos estavam prximos da formatura no ensino fundamental, e pela construo de uma maquete, lembrando a casa prpria (MOLON, 2011, p. 35).

    Estas investigaes se desenvolveram partindo de atividades experimentais

    com posterior estudo dos conceitos matemticos.

    Estudo Terico

    Nesta categoria, as atividades desenvolvidas em sala de aula sempre partiram

    da pesquisa sobre os conceitos matemticos envolvidos no trabalho. Os alunos

    apoiavam suas investigaes em estudos sistemticos e em busca de informaes

    na internet.

    O desenvolvimento de atividades com o apoio de softwares foi muito presente

    nessa categoria.

  • 43

    Um dos interesses na utilizao de um software em ambiente educacional , alm de promover a aprendizagem dos contedos regulares, proporcionar aos alunos a manipulao de uma ferramenta que lhe seja til futuramente, principalmente quando estes forem em busca de uma colocao no mercado de trabalho. A planilha possui recursos que contemplam a explorao de contedos matemticos diversos e, sobretudo, possibilita ao aluno o acesso a um software que o qualifica profissionalmente (CUNHA, 2012, p. 31).

    Esses estudos tinham a finalidade de aplicar conceitos matemticos a

    problemas e desenvolver o raciocnio lgico dos alunos por meio da investigao de

    tcnicas matemticas para a resoluo.

    Modelagem na Educao

    Na categoria denominada Modelagem na Educao houve o envolvimento do

    professor pesquisador e dos alunos no desenvolvimento das investigaes. O

    planejamento das atividades sempre iniciava pelo debate em sala de aula para a

    busca de assuntos que fossem de interesse dos alunos e que fizessem parte do seu

    cotidiano. Porm, sempre prevaleciam as escolhas do pesquisador que determinava

    os assuntos que mais se adequassem aos contedos matemticos que ele pretendia

    trabalhar com os alunos. Isso demonstra que os pesquisadores valorizavam os

    conhecimentos escolares prvios dos seus sujeitos de pesquisa, porm

    apresentavam uma postura absolutista na medida em que determinavam qual tema

    era importante para a aprendizagem dos alunos.

    Embora as experincias dos alunos sejam falhas e fragmentadas, o dilogo com o professor lhes permite identificar assuntos importantes para o processo educacional. [...] O segundo obstculo foi definir o problema, ou seja, o que estudar dentro do tema escolhido. Neste momento, muito importante a presena do professor para direcionar o trabalho, caso contrrio, os alunos podem pesquisar elementos que no levam a um modelo matemtico. O objetivo foi responder a uma pergunta ou dvida dentro do tema escolhido, por meio da Matemtica (NINA, 2005, p. 87).

    A caracterstica da descoberta de conceitos matemticos presentes nos objetos

    e fenmenos modelados muito forte nesta categoria. Os alunos deviam redescobrir

    relaes matemticas em seus trabalhos, criando modelos matemticos sempre com

    a orientao dos pesquisadores. Os conceitos matemticos resultantes dessa

    descoberta foram considerados como verdades absolutas. Este modelo de trabalho

    buscou o desenvolvimento do conhecimento cientfico a partir de objetos e

    fenmenos presentes no cotidiano dos alunos, porm com a interveno do

    pesquisador que sempre definia o tema a ser estudado.

  • 44

    Pesquisa de campo

    Em todas as dissertaes que foram categorizadas como Pesquisa de Campo

    os alunos realizaram investigaes fora da sala de aula, entrevistando pessoas ou

    buscando a compreenso de fenmenos sociais. Neste processo de pesquisa, os

    alunos constataram posteriormente, sempre com a interveno do professor

    pesquisador, as relaes matemticas existentes.

    Sugeri aos alunos que realizassem uma pesquisa com um grupo de 100 pessoas com a seguinte pergunta: Qual seleo voc acha que vai ganhar a Copa de 2006?. Os alunos mostraram-se bastante entusiasmados com a proposta, j que o assunto era de interesse geral e todos estavam ansiosos em saber se a maioria compartilhava das suas opinies. [...] As pessoas entrevistadas eram vizinhos, colegas, familiares e os alunos combinaram os locais em que entrevistariam as pessoas para no haver coincidncia de entrevistados. Entrevistaram as cem pessoas e registraram seus resultados e comentrios num formulrio. Um dos objetivos desta pesquisa foi compreender o conceito de porcentagem atravs de fraes. Os alunos organizaram as respostas em forma fracionria e desta maneira, encontraram as fraes de denominador cem (ALTENHOFEN, 2008, p. 51).

    Este processo valorizou as concepes prvias dos alunos e o seu contexto

    social, pois as questes investigadas foram definidas pelos prprios alunos, sujeitos

    desses trabalhos. A Matemtica serviu como instrumento para caracterizar e

    descrever os resultados.

    Na prxima seo apresentamos as concepes sobre a natureza do

    conhecimento matemtico dos autores das dissertaes investigadas.

    4.2 Concepes sobre a natureza do conhecimento matemtico

    Neste captulo analisamos as categorias da concepo sobre a natureza do

    conhecimento matemtico dos autores das dissertaes.

    Nas atividades propostas aos alunos pelos pesquisadores das dissertaes

    investigadas, as atividades desenvolvidas podem revelar as concepes sobre a

    natureza do conhecimento matemtico dos autores destas pesquisas. Estas

    concepes implcitas nem sempre so congruentes com a argumentao explcita

    destes autores sobre como os alunos devem aprender Matemtica. Estas

    concepes foram agrupadas em duas categorias: Descoberta e Ferramenta.

  • 45

    Descoberta

    Segundo Fernandes, Luft e Guimares (1996) descobrir algo significa revelar o

    que j existe, o que est escondido, encontrar pela primeira vez. com este sentido

    que as atividades matemticas so desenvolvidas nas dissertaes que apresentam

    esta concepo. Esta categoria se caracteriza por um forte carter de constatao

    da Matemtica existente nos fenmenos e objetos observveis.

    Com o forte carter de desenvolvimento do raciocnio lgico das atividades, os

    autores das dissertaes concebiam os conceitos matemticos como verdades

    absolutas passveis de serem reveladas no processo de investigao em sala de

    aula.

    Apenas duas dissertaes apresentaram esta concepo matemtica em seus

    trabalhos: Camargo (2004) e Nina (2005). A dissertao de Camargo (2009)

    desenvolveu suas atividades de sala de aula buscando a contextualizao dos

    conceitos matemticos. Neste caso os alunos deveriam descobrir as relaes

    matemticas implcitas nos objetos investigados. A dissertao de Nina (2005)

    desenvolveu estratgias de soluo de problemas que revelassem os conceitos

    matemticos existentes nos fenmenos abordados no processo de investigao em

    sala de aula.

    Ferramenta

    Nesta categoria, que abrange todas as outras onze dissertaes investigadas,

    a Matemtica concebida como uma ferramenta para descrever o mundo e

    solucionar seus desafios. Para os autores das dissertaes, a Matemtica

    composta de um conjunto de sinais com significado que se relacionam entre si. Ela

    considerada um poderoso instrumento para dar significado aos fenmenos e

    objetos, podendo contextualiz-los ou no.

    Neste caso, a Matemtica dos livros didticos considerada verdade absoluta

    e impossvel de ser modificada, apenas utilizada. Seus conceitos so definitivos, no

    podem ser mudados ou (re)significados.

    Na prxima seo, so analisadas as 13 dissertaes sob o prisma das

    concepes de ensino implcitas na argumentao de seus autores.

  • 46

    4.3 Concepes de ensino

    Nesta seo so apresentadas e analisadas as categorias das concepes de

    ensino subjacentes s dissertaes estudadas e que emergiram no processo de

    anlise, ou seja, as concepes de ensino de Matemtica por meio de pesquisa dos

    autores das dissertaes. As categorias so: Contextualizao, Estratgia,

    Linguagem, Questionamento e Ensino Significativo.

    Contextualizao

    O sentido da categoria Contextualizao aparece nas dissertaes como sendo

    uma maneira de relacionar o conhecimento matemtico com os fenmenos e objetos

    acessveis ao entendimento dos alunos. Estes fenmenos e objetos fazem parte do

    cotidiano dos alunos ou pelo menos esto presentes de alguma forma na vida deles,

    porm sem que tenham uma relao com o conhecimento cientfico.

    Nas dissertaes estudadas, contextualizar o ensino de Matemtica significa

    identificar e relacionar os conceitos matemticos com fenmenos e objetos da

    experincia dos alunos. Significa colocar os alunos em contato com alguma coisa,

    fenmeno ou objeto, e desta ao, que premeditada pelo professor pesquisador,

    decorre que o indivduo, sujeito da investigao, se situa no tempo e no espao

    desejado.

    Para as dissertaes desta categoria a Matemtica deve sempre ser ensinada

    de maneira contextualizada. Estes trabalhos defendem que contextualizar o ensino

    da Matemtica tambm significa encontrar aplicaes prticas para esta cincia,

    desde que esse fato represente sempre uma relao entre sujeito pesquisador e

    objeto ou fenmeno pesquisado. Isso significa que o aluno no pode ter uma postura

    passiva diante da sua aprendizagem, mas participar ativamente do processo

    questionando, buscando significados e se posicionando frente aos desafios que

    surgem na caminhada em direo a construo do seu conhecimento.

    Estas dissertaes afirmam que a aprendizagem matemtica realizada de

    maneira contextualizada proporciona aos alunos o desenvolvimento do pensamento

    crtico e de competncias para a resoluo de problemas. Dessa forma o aluno

    desenvolve a capacidade de resolver problemas no contexto da sua vida social,

  • 47

    principalmente frente aos desafios do mundo produtivo. Isso tambm desenvolve um

    cidado critico e reflexivo capaz de modificar a realidade em que vive.

    Um pensar crtico essencial para a realizao de um trabalho em equipe, para a resoluo de problemas, bem como para a tomada de decises de forma eficaz e eficiente, baseada em argumentos suportados por razes convincentes. Assim, passa a ser consensual a idia de que o xito de qualquer sistema democrtico depende da capacidade de os indivduos atuarem e intervirem, usando seu potencial de pensamento crtico (Lipp, 2009, p. 24).

    Os trabalhos investigados no restringem a contextualizao do ensino de

    Matemtica aos objetos ou fenmenos do cotidiano dos alunos. Eles tambm

    defendem a idia de que a educao contextualizada tambm estimula a

    criatividade, o esprito inventivo e a curiosidade dos estudantes.

    Para os autores dessas dissertaes, ensinar Matemtica ensinar a pensar

    de forma contextualizada. O ensino pela pesquisa se fundamenta numa

    sistematizao do conhecimento matemtico, na interao entre professor e aluno e

    na descoberta e contextualizao de conceitos matemticos.

    Educar ensinar a pensar e no reproduzir contedos. O ensino pela pesquisa se constitui numa moderna proposta de educao, fundamentada na sistematizao e na forma de interao professor e aluno na busca do conhecimento para formao do cidado e sua interao com a sociedade. A Matemtica deve ser entendida como domnio interpretativo, devendo o conhecimento e a habilidade permanecer no seu contexto de prtica e uso (CAMARGO, 2004, p. 13).

    Nas dissertaes dessa categoria a Matemtica deve ser entendida como uma

    operao mental com aplicao de seus conceitos no contexto da experincia do

    aluno. Cada indivduo deve elaborar a operao mental a partir da sua compreenso

    e leitura de diversas situaes do mundo. A aprendizagem defendida como um

    processo no qual o aluno, a partir das mais variadas interaes com objetos e

    fenmenos, vai complexificando conceitos e reelaborando seu pensamento,

    produzindo assim novas maneiras de conhecer.

    Conforme estes pesquisadores, a contextualizao de ideias deve ser apoiada

    na linguagem. Este processo busca estimular o aluno a expressar a sua

    aprendizagem por meio da expresso escrita e oral em sala de aula,

    contextualizando as suas ideias e interagindo com o meio ao qual est inserido. Os

    alunos fizeram relaes dos fenmenos e objetos presentes no seu cotidiano com os

    contedos Matemticos abordados em sala.

  • 48

    A concepo sobre a natureza do conhecimento matemtico concebida nesta

    categoria como ferramenta importante para descrever os objetos e fenmenos

    presentes na experincia cotidiana dos alunos. O mtodo de desenvolvimento dos

    contedos matemticos apoiado na contextualizao e expresso das ideias por

    meio da linguagem desenvolve uma postura crtica nos alunos e permite que estes

    sejam conduzidos pelo pesquisador abstrao dos conceitos estudados.

    Esta concepo tambm defende que existe Matemtica presente em todas as

    coisas e fenmenos e que possvel sempre questionar e (re)significar

    entendimentos.

    Nesta categoria, a caracterizao de objetos e fenmenos por meio da

    Matemtica sempre enfatiza o aspecto social do conhecimento. Ela defende que

    aprender no simplesmente ter noo das coisas, mas, sobretudo ter competncia

    para mud-las, ou seja, mudar a condio de vida por meio do pleno conhecimento

    das caractersticas dos fenmenos e objetos do cotidiano dos alunos. A modificao

    das coisas e situaes acontece quando os sujeitos passam a questionar. Porm

    isso s possvel com o conhecimento das caractersticas que compem os objetos

    e fenmenos envolvidos.

    Neste aspecto, a Matemtica tida como uma ferramenta importante para a

    caracterizao destes objetos e fenmenos, pois permite tambm, a partir do

    domnio dos seus conceitos, que os sujeitos questionem, modifiquem,

    (re)signifiquem e conheam novas caractersticas das coisas.

    As dissertaes dessa categoria afirmam que a aplicabilidade dos conceitos

    matemticos no contexto de vida dos alunos fundamenta a idia de que essa

    postura de contextualizao da Matemtica em sala de aula desenvolve habilidades

    nos alunos para a resoluo de problemas.

    Nesse sentido, o aluno desenvolve habilidades e vai num processo contnuo realizando associaes (...), da palavra forma, da imagem palavra, enfim vai construindo gradativamente o seu conhecimento. Consequentemente vai desenvolvendo o seu pensamento geomtrico (JNIOR, 2010, p. 134).

    A aprendizagem de conceitos e de procedimentos relativos Matemtica

    podem ser propiciados na prtica em sala de aula e, dessa forma, o aluno deixa de

    ser objeto, tal como no ensino tradicional, para tornar-se sujeito, capaz de auxiliar

    na (re)construo do seu conhecimento.

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    Nesta categoria, a aprendizagem de conceitos matemticos acontece por meio

    de informaes conhecidas pelos alunos. A partir das concepes prvias trazidas

    pelo aluno para a escola, que se desenvolvem os estudos cientficos para que este

    aluno construa estratgias e mtodos para a resoluo de problemas.

    Com isso, a metodologia de trabalho em sala de aula desenvolvida pelo

    professor contribui para construo de conhecimentos e a aprendizagem dos

    conceitos matemticos pelos alunos.

    Penso que uma metodologia contextualizada, na qual as atividades trabalhadas em sala de aula apresentem questes atuais e que fazem parte do cotidiano do educando e sejam importantes para ele, auxiliam na aprendizagem, pois partem de informaes j conhecidas por ele. Assim, o educando reelabora e aprofunda questes j vivenciadas, estabelece relaes, desenvolvendo diferentes estratgias de pensamento e raciocnio (ALTENHOFEN, 2008, p. 09).

    Neste processo, a formao de cidados crticos e conscientes da sua prpria

    realidade, questionador, argumentativo, com capacidad