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LOGÍSTICA REVERSA DE RESÍDUOS SÓLIDOS: UMA PROPOSTA APLICADA A INDÚSTRIA DE CONFECÇÃO DE VESTUÁRIO Wladmir Henriques Motta (CETIQT) [email protected] Luciene Nascimento de Almeida (CETIQT) [email protected] GIL LEONARDO ALIPRANDI LUCIDO (CETIQT) [email protected] A indústria de confecção de vestuário é a segunda a maior geradora de empregos da indústria de transformação nacional, produzindo, em 2009, 6.680 bilhões de peças confeccionadas, responsáveis por um grande volume de resíduos têxteis, que coontribuem para a degração ambiental. O emprego da logística reversa possibita a redução do impacto sobre o meio ambiente, por meio da adequação das empresas deste segmento à Lei 12.305, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Este trabalho tem como objetivo apontar como a indústria de confecção de vestuário pode organizar-se para a utilização da logística reversa como solução para a evitável contaminação do meio ambiente. Para atingir tal objetivo utilizou-se uma abordagem positivista e qualitativa. Quanto aos fins, classifica-se como explicativa e descritiva. Os dados secundários foram obtidos a partir de material bibliográfico, valendo-se, também, da experiência em campo na área de processos produtivos e ambiental. Para a estimativa do volume de resíduos gerados pela indústria de confecção de vestuário, foi utilizado o painel Delfhi. A proposta de logística reversa para o segmento consiste nas etapas de categorização segregação e acondicionamento dos resíduos têxteis nas confecções; coleta seletiva; recepção, estocagem e despache; reutilização, reciclagem e/ou incineração; e tratamento/destinação final. Como conclusão do estudo, destacou-se a importância do papel da Governança ao compartilhar as soluções propostas, possibilitando sua implementação e a abertura de espaço para novos estudos, que validem o presente trabalho. Palavras-chaves: Logística Reversa, Resíduos Sólidos, Confecção de Vestuário XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no Cenário Econômico Mundial Belo Horizonte, MG, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2011.

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LOGÍSTICA REVERSA DE RESÍDUOS

SÓLIDOS: UMA PROPOSTA APLICADA

A INDÚSTRIA DE CONFECÇÃO DE

VESTUÁRIO

Wladmir Henriques Motta (CETIQT)

[email protected]

Luciene Nascimento de Almeida (CETIQT)

[email protected]

GIL LEONARDO ALIPRANDI LUCIDO (CETIQT)

[email protected]

A indústria de confecção de vestuário é a segunda a maior geradora de

empregos da indústria de transformação nacional, produzindo, em

2009, 6.680 bilhões de peças confeccionadas, responsáveis por um

grande volume de resíduos têxteis, que coontribuem para a degração

ambiental. O emprego da logística reversa possibita a redução do

impacto sobre o meio ambiente, por meio da adequação das empresas

deste segmento à Lei 12.305, que institui a Política Nacional de

Resíduos Sólidos. Este trabalho tem como objetivo apontar como a

indústria de confecção de vestuário pode organizar-se para a

utilização da logística reversa como solução para a evitável

contaminação do meio ambiente. Para atingir tal objetivo utilizou-se

uma abordagem positivista e qualitativa. Quanto aos fins, classifica-se

como explicativa e descritiva. Os dados secundários foram obtidos a

partir de material bibliográfico, valendo-se, também, da experiência

em campo na área de processos produtivos e ambiental. Para a

estimativa do volume de resíduos gerados pela indústria de confecção

de vestuário, foi utilizado o painel Delfhi. A proposta de logística

reversa para o segmento consiste nas etapas de categorização

segregação e acondicionamento dos resíduos têxteis nas confecções;

coleta seletiva; recepção, estocagem e despache; reutilização,

reciclagem e/ou incineração; e tratamento/destinação final. Como

conclusão do estudo, destacou-se a importância do papel da

Governança ao compartilhar as soluções propostas, possibilitando sua

implementação e a abertura de espaço para novos estudos, que

validem o presente trabalho.

Palavras-chaves: Logística Reversa, Resíduos Sólidos, Confecção de

Vestuário

XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no

Cenário Econômico Mundial Belo Horizonte, MG, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2011.

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1. Introdução

Quando se fala em logística, pensa-se em um primeiro momento, na gestão do fluxo de

materiais do seu ponto de aquisição até o seu ponto de consumo. Nesta situação tem-se a

logística direta. Entretanto, recentemente, tem-se dado uma grande atenção à logística que

gerencia o fluxo reverso dos materiais, fluxo este, que diferentemente do que ocorre na

logística direta, inicia-se no ponto de consumo, retornando até o ponto de origem, descarte ou

reciclagem. Ao gerenciamento deste fluxo reverso, dá-se o nome de logística reversa.

Seu conceito é relativamente novo e encontra-se em plena evolução, mas a prática da logística

reversa, apesar de recente, não surgiu agora. Como exemplo temos a logística reversa de

cascos de refrigerante e botijões de gás de cozinha, com a reutilização de seus vasilhames,

práticas estas já realizadas a bastante tempo. Segundo Marcondes e Cardoso (2005), embora

explorada pela indústria seriada desde 1975 em países desenvolvidos, como Inglaterra e EUA,

somente na última década começou a ser estudada no Brasil. Uma área da logística reversa,

em especial a dirigida ao pós-consumo, relacionada diretamente a reciclagem e reuso, tem

chamado a atenção de muitos por ser uma prática ligada diretamente à preservação do meio

ambiente.

Sendo assim, o presente trabalho pretende apontar como o setor de confecção de vestuário,

gerador de resíduos sólidos causadores da degradação ambiental, pode organizar seus

processos para a utilização da logística reversa como solução para a evitável contaminação do

meio ambiente.

A escolha do tema, se justifica pela participação expressiva do segmento de confecção de

vestuário no setor industrial brasileiro e pelo volume de resíduos sólidos gerados, que

contribuem com o crescente impacto ambiental, bem como pela possibilidade de

desenvolvimento econômico sustentável e a redução do impacto sobre o meio ambiente, por

meio da adequação das empresas deste segmento à Lei 12.305, que institui a Política Nacional

de Resíduos Sólidos.

Após a apresentação dos conceitos básicos relativos à logística, logística reversa e meio

ambiente, é dada uma visão panorâmica da indústria de confecção de vestuário com foco na

geração de resíduos têxteis e a forma como os mesmos podem ser abordados num fluxo de

logística reversa.

2. Logística

2.1 Conceitos de Logística

A logística é a ciência que estuda os meios de se levar itens de produção ao consumo,

buscando atender os prazos, com o menor custo. Ela é parte no processo de gerenciamento da

cadeia de suprimentos, planejando, implementando e controlando o eficiente fluxo e

armazenagem de bens, serviços e informações, desde o ponto de origem até o ponto de

consumo, com o objetivo de atender às necessidades do consumidor. Segundo Franzoni e

Freitas (2005), pode-se conceituar a logística como a arte de administrar de forma estratégica

e integrada, planejando, implementando e coordenando o fluxo e armazenamento de matérias-

primas, peças e produtos acabados, assim como, as informações relativas a estas atividades,

desde o ponto de aquisição até o distribuidor final, ao custo correto, no menor tempo possível,

atendendo às necessidades do cliente.

A origem da logística tem relação com as operações militares, segundo Novaes (2007),

durante a guerra os generais precisavam que os materiais bélicos e o socorro médico se

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deslocassem de um lugar para o outro na hora certa. Quem fazia este serviço era um grupo

logístico militar, que trabalhava na retaguarda e em silêncio. Tal necessidade de deslocamento

de produtos também surgiu nas empresas, pois havia a necessidade do deslocamento de seus

produtos das fábricas para os consumidores.

Em um momento inicial, o setor de logística era encarado como gerador de custos, não

agregava nenhum benefício estratégico para as empresas e suas atividades encontravam-se

fragmentadas sob a responsabilidade de diversos departamentos dentro das organizações.

Porém, a partir da década de 50, quando a expansão dos mercados consumidores promoveu

maior preocupação com a distribuição física de bens, houve uma maior preocupação em

estudá-la, conforme apontado por Marcondes e Cardoso (2005). Na atualidade, a logística é

uma grande geradora de vantagem competitiva, conforme afirma Ballou (2005) e através dela

pode-se também otimizar os recursos e aumentar a qualidade dos serviços prestados.

2.2 Logística Reversa

Assim como ocorreu com a logística direta, o conceito de logística reversa também tem

evoluído ao longo do tempo. Inicialmente a logística reversa tratava do movimento de bens do

consumidor para o produtor, por meio de um canal de distribuição, tendo seu escopo limitado

ao movimento que faz com que os produtos e informações sigam na direção oposta às

atividades logísticas tradicionais. Posteriormente, novas abordagens da logística reversa

surgiram, apontando-a como a logística de retorno dos produtos, visando à redução do uso de

recursos, à reciclagem, ações para substituição de materiais, reaproveitamento e remanufatura

de materiais e à disposição final de resíduos, sendo incluída também em sua definição a

questão da eficiência ambiental.

A logística reversa é apontada por Donato (2008) como sendo a área da logística que trata dos

aspectos de retornos de produtos, embalagens ou materiais ao seu centro produtivo,

movimentando materiais reaproveitados que irão retornar ao processo tradicional de

suprimento, produção e distribuição.

O planejamento da logística reversa, também conhecida com logística inversa, utiliza os

mesmos processos que o planejamento da logística direta, apresentado algumas dificuldades

maiores quanto às previsões de demanda e aos custos, devido à pulverização dos pontos de

coleta.

Conforme apontado por Leite (2009), os primeiros estudos sobre logística reversa são

encontrados nas décadas de 1970 e 1980, tendo seu foco principal relacionado ao retorno de

bens a serem processados em reciclagem de materiais, denominados e analisados como canais

de distribuição reversos.

A logística reversa, segundo Dias (2005), procura encontrar um meio eficiente de trazer do

ponto de consumo, os bens e materiais que foram vendidos, até o ponto de origem. A logística

reversa quando utilizada pelas organizações, acaba passando para seus clientes a imagem de

uma empresa que procura se desenvolver sustentavelmente.

Outro beneficio, que hoje ainda é ignorado por grande parte das organizações, mas que deve

ganhar relevância nos próximos anos, é o poder que a logística reversa tem de unir a indústria,

o atacado/distribuidor, o varejo e os demais elos da cadeia de abastecimento em torno de

vantagens mútuas.

Dentre as diversas definições existentes para a logística reversa, a definição de Leite (2009) é

uma das mais completas e atuais, conforme pode-se verificar a seguir:

Logistica reversa é a area da logística empresarial que planeja, opera e controla o

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fluxo e as informações correspondentes, do retorno dos bens de pós-venda e de pós-

consumo ao ciclo de negócios ou ciclo produtivo, por meio dos canais de

distribuição reversos, agregando-lhes valor de diversas naturezas: economico,

ecologico, legal, logistico, de imagem corporativa, entre outros. (LEITE, 2009, p.16

e 17).

Segundo Leite (2009), a logística reversa pode ser dividida em duas áreas de atuação, a

logística reversa de pós-venda e a logística reversa de pós-consumo (não necessariamente

pelo consumidor final). A logística reversa de pós-venda, diz respeito à devolução de produtos

com pouco ou nenhum uso e ocorre, normalmente, na devolução de produtos com falha no

funcionamento imediatamente após sua compra, produtos avariados no transporte, dentre

outras ocorrências.

Já a logística reversa de pós-consumo, área da logística reversa de maior interesse no presente

estudo, trata dos produtos que foram utilizados até o fim de sua vida útil, mas que mesmo,

após seu descarte, podem ser reutilizados através da reciclagem ou descartados com segurança

através da logística reversa. Segundo Leite (2009), algumas das formas de reaproveitamento

dos produtos são: a reciclagem, a reutilização, o desmanche ou o próprio descarte.

Os descartes são uma agressão à natureza. Desta forma, tornou-se necessário um

planejamento reverso do pós-consumo, visando ao retorno e à recuperação dos produtos

utilizados, visto que na cadeia comercial o ciclo dos produtos não termina quando os mesmos

são descartados. Daí a importância da reciclagem e do reaproveitamento destes produtos para

o meio empresarial, já que trata-se da responsabilidade da empresa sobre o fim da vida de

seus respectivos produtos.

No Brasil, um passo importante no sentido de regulamentar a responsabilidade no que tange

aos resíduos sólidos foi a Lei 12.305, de 02 de agosto de 2010, que instituiu a Política

Nacional de Resíduos Sólidos, que são aqueles que resultam de atividades de origem

industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de varrição (ABNT, 2004).

A implementação da lei ainda gera diversas dúvidas, não trazendo beneficos imediatos, mas já

demonstra a importância do assunto.

Devido a maior conscientização em escala mundial e ao aumento da preocupação com a

preservação do meio ambiente por parte da população, governos e organizações, aliada à forte

concorrência que o mercado global impõe às organizações, somados, ainda, à pressão por

resultados e diferenciação no mercado, a logística reversa vem assumindo um papel de

destaque como ferramenta de suporte à preservação do meio ambiente.

2.3 Meio Ambiente

A definição de meio ambiente é muito ampla, englobando vários elementos não só os

naturais, como também os culturais, artificiais e a vida em geral, tanto humana, quanto animal

e vegetal. Conforme citado por Calil (2009), ao se abordar o assunto meio ambiente, destaca-

se o meio ambiente natural, envolvendo as florestas, oceanos, fauna, flora, seres humanos,

enfim tudo que foi gerado pela natureza. O termo contempla também o chamado meio

ambiente artificial, envolvendo tudo o que foi criado e modificado pelo homem, como por

exemplo, os centros urbanos, as cidades propriamentre ditas.

De acordo com a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo número 225

de 1988, está descrita a seguinte definição: “o meio ambiente é bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida, impodo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de

defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

O que se tem observado no mundo todo, por décadas, são intervenções humanas no meio

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ambiente, sendo que após o século XX, devido aos avanços das indústrias, tais intervenções

passaram a ser cada vez maiores e mais impactantes, assim como suas consequências. Os

resultados catastróficos destas ações já começaram a ser sentidos nos mais diversos pontos do

planeta Terra e das mais variadas formas, o que de certo modo tem provocado um movimento

mundial de preocupação com as questões de preservação do meio ambiente.

Percebeu-se então que o esforço necessário para tentar sanar e proteger o meio ambiente

contra os males já percebidos e os que estariam por vir, necessitavam de uma ação conjunta

que envolvesse empresas, indivíduos, governos e nações.

Como resultado desta preocupação eminente criaram-se Leis de proteção ambiental, que

como apontadas por Leite (2009), pressionaram as nações e as empresas a se adequarem a

nova realidade mundial frente à quase irreversível degradação do meio ambiente. Com isto, as

organizações começaram a utilizar o conceito de responsabilidade ambiental, que

paralelamente ao crescimento econômico, haveria uma preocupação com o meio ambiente e

os impactos que suas atividades poderiam trazer.

De acordo com Milaré (2006), um dos primeiros movimentos de alerta em relação à

necessidade de conservação do meio ambiente ocorreu com a Conferência de Estocolmo em

1972, onde os países começaram a reconhecer que suas atividades econômicas traziam danos

ao meio ambiente e muitos desses danos já eram considerados irreversíveis. Uma das

consequências imediatas deste encontro, foi a conscientização da maioria dos líderes

mundiais, de que caso não se unissem e tomassem medidas efetivas contra a destruição do

meio ambiente, estariam pondo em risco a vida atual no planeta e a de seus descendentes.

Em 1990 surgiu o IPCC (International Panel for Climate Changes), primeiro mecanismo de

caráter científico, criado com a intenção de alertar o mundo sobre o aquecimento do planeta.

Em 1992, aconteceu a 2ª Conferência Internacional sobre Meio Ambiente, a RIO 92, realizada

no Brasil, com a presença de mais de 160 líderes de Estado, tendo como um de seus

resultados mais expressivos a assinatura da Convenção Marco Sobre Mudanças Climáticas.

Em 1995, foi divulgado o segundo informativo global do IPCC e em 1998, conforme

apontado por Doant (2008), deu-se a primeira reunião do Clima em Kyoto, quando foi

firmado um protocolo que teve por objetivo realizar acordos internacionais com o intuito de

estabelecer metas de redução na emissão de gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera,

principalmente por parte dos chamados países industrializados. Houve algumas etapas antes

da definição final do protocolo de Kyoto, desde a primeira reunião que ocorreu em Toronto

em 1988, onde alguns líderes de países e a comunidade científica se reuniram para discutir

sobre as mudanças climáticas.

No Brasil, conforme mencionado anteriormente, o mais recente passo foi dado com a Lei de

Resíduos Sólidos, número 12.305 de 02 de Agosto de 2010, que obriga os fabricantes a

providenciarem todo a logística de coleta e destinação para os produtos de pós-consumo,

impondo aos diversos elos da cadeia de suprimento a aceitar as devoluções de seus clientes.

Neste caso, as empresas fabricantes de óleo lubrificantes, lâmpadas fluorescentes, baterias de

celulares, entre outros produtos potencialmente poluentes, passam a ser por lei responsáveis

por todo o processo de logística reversa de seus produtos após seu consumo (pós-consumo).

A logística reversa de pós-consumo, apontada pela Lei 12.305 como norteadora das ações no

setor público, da indústria e dos próprios consumidores quanto à destinação correta dos

resíduos sólidos, aborda algumas atividades que podem trazer benefícios ao meio ambiente,

como a reciclagem e o descarte. A palavra reciclagem foi introduzida ao vocabulário

internacional no final da década de 80, quando se constatou que as fontes de petróleo e outras

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matérias-primas não renováveis poderiam estar se esgotando. A reciclagem seria um canal

reverso de revalorização onde os materiais integrantes do produto de pós-consumo que foi

descartado são extraídos industrialmente, transformando-se em matérias primas secundárias

(não extraída diretamente da natureza) ou recicladas, para serem posteriormente incorporadas

na fabricação de novos produtos. Reciclar é sinônimo de economia de energia, poupança de

recursos naturais, trazendo de volta ao ciclo produtivo o que foi jogado fora ou descartado.

Diante de tamanha repercursão, as questões relacionadas ao meio ambiente passaram a ser

vistas diferentemente por muitos cidadãos em todo o mundo. Leite (2009) afirma que em

algum momento os bens produzidos serão de pós-consumo, portanto é necessário que se

viabilizem meios controlados para o descarte desses bens no meio ambiente. Desta forma, a

logística reversa de pós-consumo surgiu como uma forma de descarte controlado e passou a

ter seu papel reconhecido como uma das ferramentas essenciais nesta luta contra a degradação

do meio ambiente.

3. Metodologia

De acordo com Frankfort-Nachmias e Nachmias (1996), metodologia é um sistema de normas

e procedimentos explícitos em que uma pesquisa é desenvolvida e contra a qual quaisquer

possíveis questionamentos devem ser apresentados.

A ciência, portanto, constitui-se em um conjunto de proposições e enunciados,

hierarquicamente correlacionados, de maneira ascendente ou descendente, indo

gradativamente de fatos particulares para fatos gerais (indução) e vice-versa (dedução),

comprovados (com a certeza de serem fundamentados) pela pesquisa empírica (MARCONI e

LAKATOS, 2000).

Escolheu-se para esta pesquisa a abordagem positivista. De acordo com Gil (1991), esta

abordagem está ligada à experimentação e fundamenta-se na observação, podendo levar à

construção de teorias e, até mesmo, de leis, justificando a escolha feita.

Quanto ao tipo de pesquisa, trata-se de um estudo qualitativo. Com base na proposta de Gil

(1991) e Vergara (2004) pode-se caracterizá-la do seguinte modo:

a) quanto aos fins, classifica-se como explicativa e descritiva, pois visa a identificar os fatores

que determinam ou contribuem para a ocorrência de resíduos têxteis na atividade de

confecção industrial, bem como a descrever o fluxo de logística reversa para tais resíduos;

b) quanto aos meios, os dados secundários foram obtidos a partir de material bibliográfico

como livros, sites institucionais, normas técnicas, relatórios setoriais, diagnósticos e leis, em

busca de subsídios para auxiliar o estudo proposto. Valeu-se, também, da experiência em

campo dos autores na área de processos produtivos e ambiental do setor em foco.

Para a estimativa do volume de resíduos gerados pela indústria de confecção de vestuário foi

utilizado o painel Delfhi, mediante consulta a um grupo de quatro especialistas em que se

buscou conhecer a opinião acerca do percentual de desperdício no setor de corte, principal

processo gerador de resíduos.

4. A Indústria e o Setor de Confecção de Vestuário

De acordo com o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC),

desde o início da década de 2000 o apoio a Arranjos Produtivos Locais (APLs) vem sendo

adotado como política pública de desenvolvimento, na qual a dimensão local passa a ser vista

como um eixo orientador de promoção econômica e social (MDIC, 2011).

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APLs são aglomerações de empresas localizadas em um mesmo território, que apresentam

especialização produtiva e mantêm vínculos de articulação, interação, cooperação e

aprendizagem entre si e com outros atores locais, tais como: governo, associações

empresariais, instituições de crédito, ensino e pesquisa etc. (REDESIST, 2011).

O reconhecimento de que políticas de fomento a micro, pequenas e médias empresas são mais

efetivas quando direcionadas a APLs, fez com que tais arranjos passassem a ser tratados como

prioridade do governo federal, “formalizada nos seus Planos Plurianuais desde 2000, no Plano

Nacional de Ciência Tecnologia e Inovação 2007-2010 e na Política de Desenvolvimento

Produtivo 2008-2013, entre outros.” (MDIC, 2011). Para o Governo, a vantagem de políticas

públicas direcionadas para APLs está na possibilidade de alavancagem do desenvolvimento

local; já para as empresas, a vantagem de fazer parte de um APL se relaciona com o

aproveitamento de oportunidades associadas à proximidade física com outras empresas e das

relações de cooperação, decorrentes da convergência de interesses e perspectivas de ganhos

coletivos, viabilizados pela articulação de diversos atores organizados em governança.

Entende-se por governança de um APL os diferentes modos de coordenação, intervenção e

participação dos diferentes agentes, como Estado, empresas, cidadãos, organizações não-

governamentais etc. nos processos de decisão locais, bem como as diversas atividades que

envolvem a organização dos fluxos de produção e do processo de geração, disseminação e uso

de conhecimentos (STAINSACK, 2006).

Apesar dessas vantagens observadas, Oliveira (2009) ressalta que não há conexão direta entre

a dinâmica produtiva de um APL (aumento do número de empresa, da quantidade produzida,

das receitas das empresas etc.) e o desenvolvimento local sustentável, tendo em vista que o

“desenvolvimento econômico de um cluster como, por exemplo, o aumento da produção,

pode exacerbar problemas locais como o agravamento da poluição, caso a qualidade

ambiental não seja controlada.” (OLIVEIRA, 2009, p. 24).

Diversos municípios brasileiros são hospedeiros de APLs de confecção de vestuário. De

acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Vestuário (ABRAVEST, 2011), esta

atividade é a segunda maior geradora de empregos da indústria de transformação nacional,

gerando, em 2009, 6.680 bilhões de peças confeccionadas.

4.1 A Geração de Resíduos Têxteis na Confecção de Vestuário

O ciclo de produção de uma peça de vestuário é, de forma simplificada, composto pelas

etapas de elaboração do encaixe dos moldes das partes componentes, enfesto (disposição do

tecido em camadas sobrepostas), corte do tecido, costura, arremate, revisão, etiquetagem,

dobra e embalagem.

A maior parte dos resíduos têxteis é gerada no processo de corte e está relacionada,

principalmente, às características do molde da peça de vestuário produzida. O tipo de molde,

ou seja, a sua forma, tem influência sobre a geração de resíduos, pois os contornos das partes

componentes determinam o encaixe dessas partes entre si, o que reduz ou aumenta o

desperdício de tecido no processo de corte. Tendo em vista que a folha de tecido é retangular

e as partes componentes a serem encaixadas nesse retângulo possuem formas variadas, deduz-

se que, embora seja possível reduzir as perdas por meio de planejamento adequado do

processo, melhoria da qualidade da matéria-prima, treinamento da mão-de-obra e utilização

de tecnologia informatizada CAD (Computer Aided Design), sempre haverá um desperdício

de tecido que não poderá ser evitado.

Além da geração de resíduos de tecido, ainda há a geração de resíduos de papel utilizado no

encaixe dos moldes; de embalagens de papelão e invólucros das matérias-primas e aviamentos

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como canudos de papelão, sacos e carretéis plásticos etc. No entanto, tais resíduos não são

alvo deste trabalho.

Na ausência de um inventário nacional de resíduos sólidos com dados atualizados que aponte

o volume de resíduos têxteis da indústria de confecção de vestuário e que balize este estudo,

optou-se por buscar esta informação com base no consumo de fios e filamentos e na

estimativa de desperdício gerado no processo de corte do tecido na indústria de confecção.

Segundo o Brasil Têxtil (2010), em 2009 foram consumidos 2.119.888 toneladas de fios e

filamentos convertidos em tecidos planos e de malha. O desperdício de material têxtil no setor

de corte, obtido pelo painel Delphi, em diferentes segmentos do vestuário (camisaria,

jeanswear, lingerie etc.), considerando a média entre o encaixe manual e informatizado,

apontou para um percentual médio de 20%, o que permite considerar que, somente no

processo de corte de peças de vestuário são produzidas, aproximadamente, 423.978 toneladas

de resíduos têxteis ao ano. Apesar de ser classificado como resíduo não perigoso, esse

volume, ao ser disposto diretamente sobre o solo, provoca degradação ambiental.

5. Proposta de Logística Reversa para Resíduos Têxteis da Indústria de Confecção

Considerando que na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve-se priorizar a não

geração e a redução de resíduos, a proposta de logística reversa apresentada neste estudo para

resíduos têxteis da indústria de confecção de vestuário consiste nas seguintes etapas:

a) categorização, segregação e acondicionamento dos resíduos têxteis nas confecções;

b) coleta seletiva;

c) recepção, estocagem e despache;

d) reutilização, reciclagem e/ou incineração.

5.1 Segregação, Categorização e Acondicionamento

As fibras têxteis podem ser naturais (vegetais ou animais) ou químicas (artificiais ou

sintéticas). As diferentes propriedades de cada fibra são responsáveis por suas características

específicas. Para atenuar características que representam desvantagens ou intensificar aquelas

que representam vantagens, é possível misturar duas ou mais fibras, seja no processo de

fabricação da mesma, na fiação ou na tecelagem. Essa mistura pode ser feita em diferentes

proporções, originando tecidos de variadas composições.

No processo produtivo da indústria de confecção de vestuário, o setor de corte, de acordo com

a programação de produção, realiza o corte de diferentes produtos em tecidos de diferentes

composições. À medida que as partes componentes são cortadas em blocos, também são

destacadas as camadas de resíduos de tecido. A segregação é, então, uma etapa que deverá

ser realizada dentro da própria empresa, após cada processo de corte, e consiste em separar, os

resíduos de cada composição de tecido processado. Estes resíduos têxteis devem ser

categorizados em relação às fibras que os compõem e à proporção em que elas participam da

mistura. Identificar corretamente é de grande importância para que o material possa seguir o

fluxo reverso correto, pois o tipo de fibra ou mistura determina ou interfere nas possibilidades

de valorização dos resíduos.

5.2 Coleta Seletiva

A coleta de resíduos sólidos previamente segregados conforme sua constituição ou

composição é um dos instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos (BRASIL,

2010). Como a Política Nacional dos Resíduos Sólidos adere ao princípio do poluidor-

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pagador, segundo o qual ao poluidor devem ser imputados os custos necessários ao combate à

poluição, salvo regulamentação contrária entende-se que a coleta dos resíduos de tecido

provenientes do processo produtivo seja de responsabilidade do produtor, cabendo a este

contratar o serviço de coleta seletiva. Para que essa solução seja viável economicamente é

preciso que seja compartilhada entre as empresas de confecções do APL e implementada pela

sua Governança.

5.3 Unidade de Recepção, Estocagem e Despache

A Unidade de recepção, estocagem e despache é o local onde se concentra as atividades de

recebimento, organização, estocagem e despache dos resíduos para seus destinos.

A construção e a manutenção dessa unidade também requerem a ação da Governança do APL,

tendo em vista que também se trata de uma solução que deve ser implementada de forma

compartilhada entre as confecções do APL.

Nas etapas de recepção e de estocagem é de fundamental importância que haja um bom

controle, de forma que reduza o risco de mistura dos resíduos, o que comprometeria, em

alguns casos, a sua reutilização ou reciclagem.

A destinação dos resíduos para reutilização ou reciclagem pode ocorrer de forma direta ou

intermediada. A forma direta consiste na negociação de uma empresa com a unidade de

recepção e estocagem. Já a forma indireta seria intermediada por uma Bolsa de Resíduos

Industriais.

A Bolsa de Resíduos é um canal de negociação entre as empresas que ofertam e demandam

resíduos em todos os setores de atividades. A negociação de resíduos possibilita a conciliação

de ganhos econômicos com ganhos ambientais e melhoria da competitividade empresarial. A

Unidade poderá aderir a diferentes Bolsas de Resíduos, como por exemplo, a da FIEPE

(Federação das Indústrias de Pernambuco), a da FIRJAN (Federação das Indústrias do Estado

do Rio de Janeiro), a da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), a da FIEC

(Federação das Indústrias do Estado do Ceará) e do FIEP (Federação das Indústrias do Estado

do Paraná), entre outras.

5.4 Alternativas de Valorização dos Resíduos Têxteis

Existem basicamente três possibilidades de valorização dos resíduos têxteis: a reciclagem e a

reutilização.

5.4.1 Reutilização

A reutilização consiste no aproveitamento dos resíduos sólidos sem sua transformação

biológica, física ou físico-química (BRASIL, 2010). No caso de resíduos têxteis a principal

alternativa de reutilização é o artesanato. No entanto, a atividade artesanal não é capaz de dar

conta de uma quantidade significativa de resíduo, visto que, geralmente, é realizada de forma

individual, pulverizada e sujeita a descontinuidade. Sendo assim, a organização de artesãos

em cooperativas poderia determinar o aumento da demanda por retalhos de tecido, bem como

a sua continuidade, além da geração de renda, inclusão social e melhoria da autoestima dos

envolvidos.

No entanto, para que a cooperativa tenha êxito considera-se necessário investir em

desenvolvimento de produtos concebidos com design para a geração de produtos artesanais

com valor agregado percebido. Entre os produtos artesanais produzidos a partir de resíduos

têxteis é possível citar tapetes, mantas, almofadas, cortinas, colchas, toalhas de mesa, jogos

americanos, bijuterias, bonecas etc., por meio de técnicas variadas.

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5.4.2 Reciclagem

A reciclagem é o “processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de

suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em

insumos ou novos produtos” (BRASIL, 2010). Um exemplo de reciclagem de resíduos têxteis

é a sua transformação em não tecido (non woven). O não tecido é uma estrutura plana, flexível

e porosa, constituída de véu ou manta de fibras ou filamentos, orientados ou ao acaso,

consolidados por processo mecânico (fricção) e/ou químico (adesão) e/ou térmico (coesão) e

combinações destes.

Na maioria dos casos de não tecido, as fibras/filamentos representam a principal matéria-

prima, em proporções que variam de 30% a 100%. As propriedades das fibras/filamentos

somadas às fornecidas pelo processo de fabricação definem as características finais dos não

tecidos.

São exemplos de emprego de não tecido: médico-hospitalar (máscaras, toucas, aventais,

sapatilhas, ataduras, gazes); doméstico (carpetes, tapetes, cortinas, cobertores, toalhas de

mesa, panos de limpeza); filtração (sólidos (pós), líquidos (óleos, solventes químicos);

automobilístico (isolação térmica e acústica, base de peças moldadas, acabamento de

superfície, carpete); calçados (palmilha, forro); confecção (entretelas); enchimentos (colchas,

edredons); geotêxtil (estabilização do solo, drenagem e controle de erosão); construção civil

(impermeabilização e isolamento térmico e acústico); móveis (proteção das molas dos

colchões e estofados) e higiene pessoal (fraldas e absorventes femininos).

A fabricação de estopa também é um caso de reciclagem. Neste caso, os resíduos têxteis

passam por máquinas que têm a função de desfibrar os retalhos de tecido. Além de estopas, o

produto gerado também se aplica a enchimentos de almofadas, puffs, sofás etc.

Uma boa solução poderia envolver a cadeia têxtil a montante, de modo que fabricantes de

fibras, fios ou tecidos reintegrassem os resíduos têxteis da indústria da confecção no processo

de fabricação de novos tecidos. No entanto, não de deve descartar novos usos que permitam a

utilização industrial desses resíduos em outras cadeias produtivas.

5.4.3 Incineração

A incineração consiste em um processo de destruição sob alta temperatura, de 900 0C a 1250

0C e com tempo controlado, em que ocorre a decomposição térmica via oxidação à alta

temperatura da parcela orgânica dos resíduos, transformando os resíduos em uma fase gasosa

e outra sólida, reduzindo o seu volume, peso e características de periculosidade. No entanto,

não são todos os resíduos que podem ser incinerados. Isto depende da toxicidade e da

natureza do material. No projeto e instalação de uma unidade completa de incineração, é

necessário considerar os seguintes fatores: tipo, quantidade e composição dos resíduos; estado

físico; poder calorífico; composição dos gases de combustão e quantidade e natureza de

qualquer cinza eventualmente gerada (LUCIDO et all, 2004).

As principais vantagens do processo de incineração são a redução drástica do volume a ser

descartado; a redução de impacto ambiental, quando realizado de maneira adequada; a

descontaminação e, principalmente, a recuperação de energia através da co-geração. Desta

forma, o poder calorífico contido no resíduo têxtil pode ser aproveitado com o objetivo de

gerar energia térmica na forma de vapor, como por exemplo, em caldeiras. A principal

desvantagem é o elevado custo, tanto para investimentos iniciais, quanto para os custos

operacionais. A Figura 1 ilustra o modelo proposto.

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Figura 1: Proposta de Logística Reversa para a Indústria de Confecção de Vestuário

Fonte: Elaboração Própria

Processos de

Confecção Confeccionados

Segregação

Resíduos

Sólidos

Coleta

Seletiva

Unidade de

Recepção

Reciclável/

Reutilizável?

Reutilização

Sim

Não

Reciclagem Incineração

Sim

Input

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6. Conclusão

O estudo objetivou propor uma metodologia de destinação dos resíduos sólidos para o

segmento de confecção de vestuário, visando a prepará-lo para o atendimento aos requisitos

propostos pela Lei 12.305, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, apresentando

a contribuição da logística reversa para o gerenciamento adequado dos resíduos gerados pelas

indústrias deste segmento.

A proposta contemplou cinco etapas, a categorização, segregação e acondicionamento dos

resíduos têxteis nas confecções; a coleta seletiva; a recepção, estocagem e despache; a

reutilização, reciclagem e/ou incineração.

Pode-se concluir que as três destinações propostas, se apresentam como soluções viáveis para

o volume de resíduos gerados por este segmento, sendo que cada APL deve realizar o seu

inventário qualitativo e quantitativo dos resíduos gerados, bem como mapear as possibilidades

reais e latentes de valorização dos resíduos existentes em seu entorno.

Levando-se em consideração que um dos princípios adotados pela lei é o do poluidor-

pagador, segundo o qual ao poluidor devem ser imputados os custos necessários ao combate à

poluição torna-se necessário, então, o fortalecimento dos vínculos de articulação, interação e

cooperação entre as empresas do segmento, para que haja um compartilhamento dos custos

incorridos.

O presente estudo pode ser considerado uma proposta inicial de valorização e destinação dos

resíduos gerados pelas empresas de confecção de vestuário, tendo a logística reversa como

ferramenta de suporte, ensejando estudos futuros para o desenvolvimento de pesquisas de

novos produtos, métodos, processos e tecnologias de gestão, reciclagem e reutilização,

conforme apontado pelos princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

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