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Filosofia e Psicologia no Serviço Social Módulo 1.2 Rodrigo Rizério de Almeida e Pessoa Tânia Aguila Silveira 2012

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Filosofia e Psicologia no Serviço Social

Módulo 1.2

Rodrigo Rizério de Almeida e Pessoa Tânia Aguila Silveira

2012

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Editorial

PresidenteChaim Zaher

Vice-PresidenteAdriana Baptiston Cefali Zaher

Diretoria ExecutivaRafael Gomes Perri

Pró-reitor de Educação a Distância Jeferson Ferreira Fagundes

Diretora Acadêmica Claudia Regina de Brito

Coordenação Pedagógica Alessandra Henriques Ferreira Gladis S. Linhares ToniazzoMarina Caprio

Coordenação do Curso de Serviço Social Ariana Siqueira

Coordenação do Curso de Gestão em Tecnologia da Informação Helcimara Affonso de Souza

Sum

ário

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Page 3: Livro-SS-1.2

Sum

ário Apresentação Uniseb Interativo ...................... 13

Apresentação do módulo ....................................... 15

Psicologia .................................................................... 19Unidade 1: O Estudo do Comportamento Organizacional .. 19

Processo de ensino-aprendizagem .................................................. 19Objetivos da sua aprendizagem ........................................................... 19

Você se lembra? ....................................................................................... 201.1 Organizações e o estudo do comportamento organizacional ............... 21

1.1.1 Disciplinas que contribuem com o comportamento organizacional ... 221.2 Os três níveis do estudo do comportamento organizacional ...................... 25

1.3 Produtividade, absenteísmo, rotatividade e satisfação .................................. 261.4 Tópicos importantes em comportamento organizacional ............................... 28

1.4.1 Diversidade no trabalho.................................................................................. 281.4.2 Estresse ............................................................................................................. 29

1.4.3 A desarticulação da vida familiar ...................................................................... 31Atividade ....................................................................................................................... 32Atividades ...................................................................................................................... 37Reflexão ......................................................................................................................... 39Leitura Recomendada .................................................................................................... 40Referências .................................................................................................................... 41Na próxima unidade ...................................................................................................... 41Unidade 2: O Comportamento Organizacional no Nível do Indivíduo ................ 43Processo de ensino-aprendizagem ............................................................................. 43

Objetivos da sua aprendizagem ............................................................................... 43Você se lembra? ................................................................................................... 44

2.1 Características biográficas ........................................................................ 452.1.1 Idade ................................................................................................... 46

2.1.2 Sexo ................................................................................................ 482.1.3 Estabilidade no emprego ............................................................. 50

2.2 Habilidades ................................................................................ 512.3 Aprendizagem ........................................................................ 54

2.3.1 Teoria do condicionamento clássico .............................. 552.3.2 Teoria do condicionamento operante........................ 56

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2.3.3 Teoria da aprendizagem social .............................................................................. 572.3.4 Modelagem do comportamento ............................................................................ 582.4 Personalidade ........................................................................................................... 59Atividades ....................................................................................................................... 62Reflexão .......................................................................................................................... 63Leitura Recomendada ..................................................................................................... 64Referências ...................................................................................................................... 64Na próxima unidade ........................................................................................................ 65Unidade 3: Percepção e Motivação.............................................................................. 67Processo de ensino-aprendizagem .................................................................................. 67Objetivos da sua aprendizagem ...................................................................................... 67Você se lembra? .............................................................................................................. 683.1 Percepção e sua importância para o estudo do comportamento organizacional ...... 693.2 Fatores que influenciam a percepção ....................................................................... 703.2.1 Fatores de quem percebe ....................................................................................... 713.2.2 Fatores-alvo ........................................................................................................... 713.2.3 Fatores da situação ................................................................................................ 723.3 As distorções perceptivas e os erros de julgamento ................................................. 723.4 Motivação e sua importância para o estudo do comportamento organizacional ..... 743.4.1 Teorias sobre Motivação ....................................................................................... 773.4.1.1 Hierarquia das necessidades de Maslow ............................................................ 773.4.1.2 Teoria de McGregor ........................................................................................... 783.4.1.3 Teoria dos dois fatores ....................................................................................... 793.4.1.4 Teoria da equidade ............................................................................................. 813.4.1.5 Teoria da expectativa ......................................................................................... 82Atividade ......................................................................................................................... 83Reflexão .......................................................................................................................... 84Leitura Recomendada ..................................................................................................... 84Referências ...................................................................................................................... 85Na próxima unidade ........................................................................................................ 85Unidade 4: Grupos e Equipes ...................................................................................... 87Processo de ensino-aprendizagem .................................................................................. 87Objetivos da sua aprendizagem ...................................................................................... 87Você se lembra? .............................................................................................................. 884.1 Definição e classificação de grupos ......................................................................... 894.1.1 Modelo de desenvolvimento de grupo .................................................................. 90

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4.1.2 Estrutura de grupo ................................................................................................. 924.1.3 Pensamento grupal ................................................................................................ 944.2 Equipe ...................................................................................................................... 954.2.1 Desenvolvimento de Equipes ................................................................................ 964.2.2 Equipes de alta performance ................................................................................. 97Atividade ......................................................................................................................... 99Reflexão ........................................................................................................................ 101Leituras Recomendadas ................................................................................................ 102Leitura Recomendada ................................................................................................... 102Referências .................................................................................................................... 106Na próxima unidade ...................................................................................................... 107Unidade 5: Liderança e Comunicação ...................................................................... 109Processo de ensino-aprendizagem ................................................................................ 109Objetivos da sua aprendizagem .................................................................................... 109Você se lembra? ............................................................................................................ 1105.1 Liderança .................................................................................................................1115.2 Teorias de Liderança .............................................................................................. 1125.2.1 Teoria dos traços ................................................................................................. 1135.2.2 Abordagem do comportamento ........................................................................... 1145.2.3 Liderança situacional .......................................................................................... 1165.3 Liderança Estratégica ............................................................................................. 1205.4 Comunicação .......................................................................................................... 1275.4.1 Comunicação com os Colaboradores .................................................................. 1295.4.2 Comunicação com os clientes ............................................................................. 1335.4.3 Comunicação com os fornecedores .................................................................... 1345.4.4 Comunicação com a comunidade ....................................................................... 135Atividade ....................................................................................................................... 135Reflexão ........................................................................................................................ 137Leitura Recomendada ................................................................................................... 138Referências .................................................................................................................... 138Na próxima unidade ...................................................................................................... 141Unidade 6: Poder, Conflito e Negociação .................................................................. 143Processo de ensino-aprendizagem ................................................................................ 143Objetivos da sua aprendizagem .................................................................................... 143Você se lembra? ............................................................................................................ 1436.1 Poder ....................................................................................................................... 144

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6.2 Conflito ................................................................................................................... 1466.2.1 Estilos de gestão de confitos ................................................................................ 1486.2.2 Técnicas de administração de confitos................................................................. 1496.2.2.1 Mediação ........................................................................................................... 1506.2.2.2 Arbitragem ........................................................................................................ 1546.3 Negociação .............................................................................................................. 156Atividade ....................................................................................................................... 163Reflexão ........................................................................................................................ 165Leitura Recomendada ................................................................................................... 166Referências .................................................................................................................... 166Na próxima unidade ...................................................................................................... 168Unidade 7: Visão, Missão, Cultura e Clima Organizacional ................................. 169Processo de ensino-aprendizagem ................................................................................ 169Objetivos da sua aprendizagem .................................................................................... 169Você se lembra? ............................................................................................................ 1697.1 Visão........................................................................................................................ 1717.2 Missão ..................................................................................................................... 1717.3 Cultura organizacional ............................................................................................ 1727.3.1 Elementos da cultura organizacional ................................................................... 1767.3.2 Cultura organizacional x cultura do país.............................................................. 1787.3.3 lnstitucionalização: uma sinalização da cultura organizacional .......................... 1807.3.3.1 Histórias ............................................................................................................ 1827.3.3.2 Rituais ............................................................................................................... 1827.3.3.3 Símbolos materiais ............................................................................................ 1837.3.3.4 Linguagem ........................................................................................................ 1847.4 Clima organizacional .............................................................................................. 1847.4.1 Alguns aspectos do clima produtivo ................................................................... 187Atividade ....................................................................................................................... 189Reflexão ........................................................................................................................ 190Leitura Recomendada ................................................................................................... 190Referências .................................................................................................................... 191Na próxima unidade ...................................................................................................... 192Unidade 8: Estrutura Organizacional e o Comportamento Organizacional ........ 193Processo de ensino-aprendizagem ................................................................................ 193Objetivos da sua aprendizagem .................................................................................... 193Você se lembra? ............................................................................................................ 193

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8.1 Conceito e os elementos da estrutura organizacional ............................................. 1948.2 Tipos de estrutura organizacional ........................................................................... 1968.2.1 Por que as estruturas diferem entre si? ................................................................ 1998.2.1.1 Estratégia ........................................................................................................... 2008.2.1.2 Tamanho da organização ................................................................................... 2018.2.1.3 Tecnologia ......................................................................................................... 2018.2.1.4 Ambiente ........................................................................................................... 2028.3 Os elementos da estrutura organizacional .............................................................. 2048.4 Modelo mecanicista x modelo orgânico ................................................................ 2058.4.1 Os modelos organizacionais e o comportamento do funcionário ........................ 208Atividade ....................................................................................................................... 213Reflexão ........................................................................................................................ 214Leitura Recomendada ................................................................................................... 214Referências .................................................................................................................... 215Na próxima unidade ...................................................................................................... 215Unidade 9: Comportamento e psicologia organizacional ........................................ 217Processo de ensino-aprendizagem ................................................................................ 217Objetivos da sua aprendizagem .................................................................................... 217Você se lembra? ............................................................................................................ 2189.1 Recrutamento ......................................................................................................... 2199.2 Seleção .................................................................................................................... 2229.3 Treinamento ........................................................................................................... 2249.4 Avaliação de Desempenho ...................................................................................... 2279.4.1 Critérios de desempenho ...................................................................................... 2309.4.2 Responsáveis pela avaliação de desempenho ...................................................... 2319.4.3 Métodos de avaliação de desempenho ................................................................. 2329.5 Remuneração e benefícios ...................................................................................... 233Atividade ....................................................................................................................... 236Reflexão ........................................................................................................................ 237Leitura Recomendada ................................................................................................... 237Referências .................................................................................................................... 241

Filosofia e Serviço Social ............................................................................... 243Apresentação da Disciplina ........................................................................................... 243Unidade 1: O que é filosofia?...................................................................................... 245Objetivos de sua aprendizagem .................................................................................... 245

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Você se lembra? ............................................................................................................ 2451.1 Introdução à Filosofia ........................................................................................... 2461.2 O surgimento da filosofia ....................................................................................... 2501.3 A passagem do mito à filosofia .............................................................................. 253Atividades ..................................................................................................................... 259Reflexão ........................................................................................................................ 260Leitura recomendada ..................................................................................................... 261Referências .................................................................................................................... 261Na próxima unidade ...................................................................................................... 262Unidade 2: Filosofia Antiga e Medieval .................................................................... 263Objetivos de sua Aprendizagem .................................................................................... 263Você se Lembra? ........................................................................................................... 2632.1 Introdução ao pensamento grego ........................................................................... 2642.2 Pré-socráticos ou filósofos da natureza .................................................................. 2642.3 A Filosofia Grega Clássica ..................................................................................... 2652.3.1 Sócrates (469-399 a.C) ........................................................................................ 2662.3.2 Platão (427-347 a.C) ........................................................................................... 2682.3.3 Aristóteles (384-322 a.C) .................................................................................... 2702.4 Período Helenístico: O fim de uma era .................................................................. 2722.4.1 Cinismo ............................................................................................................... 2732.4.2 Ceticismo ............................................................................................................ 2742.4.3 Epicurismo .......................................................................................................... 2762.4.4 Estoicismo .......................................................................................................... 2782.5 Filosofia Medieval ................................................................................................ 279Atividades ..................................................................................................................... 281Reflexão ........................................................................................................................ 282Leituras recomendadas .................................................................................................. 283Referências .................................................................................................................... 284Na próxima unidade ...................................................................................................... 284Unidade 3: Filosofia Moderna e Contemporânea .................................................... 285Objetivos de sua Aprendizagem .................................................................................... 285Você se Lembra? ........................................................................................................... 2853.1 Fim da Idade Média ............................................................................................... 2863.2 O Renascimento .................................................................................................... 2873.3 Um novo mundo .................................................................................................... 2923.4 O pensamento moderno ......................................................................................... 294

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3.5 O pensamento contemporâneo ............................................................................... 297Atividades ..................................................................................................................... 301Reflexão ........................................................................................................................ 302Leituras Recomendadas ................................................................................................ 303Referências .................................................................................................................... 303Na próxima unidade ...................................................................................................... 304Unidade 4: Filosofia, Ciência e Técnica .................................................................... 305Objetivos de sua Aprendizagem .................................................................................... 305Você se Lembra? ........................................................................................................... 3054.1 Introdução .............................................................................................................. 3064.2 Ciência e Técnica ................................................................................................... 3084.3 Breve histórico da relação “Técnica e Ciência” ................................................... 3104.4 Os efeitos da técnica .............................................................................................. 3124.5 A técnica e a essência da técnica ............................................................................ 315Atividades ..................................................................................................................... 318Reflexão ........................................................................................................................ 319Leitura Complementar .................................................................................................. 320Referências .................................................................................................................... 320Na próxima unidade ...................................................................................................... 321Unidade 5: O conflito entre o indivíduo e a sociedade ............................................. 323Objetivos de sua aprendizagem .................................................................................... 323Você se lembra? ............................................................................................................ 3235.1 Introdução ao problema ......................................................................................... 3245.2 Doutrina do Direito Divino .................................................................................... 3275.3 Teoria do Contrato Social ..................................................................................... 3285.3.1 Thomas Hobbes (1588 – 1679) ........................................................................... 3285.3.2 John Locke (1632-1704) ..................................................................................... 3305.3.3 Jean-Jacques Rousseau (1712-1788) .................................................................. 3325.4 Liberalismo filosófico ............................................................................................ 3335.5 Socialismo científico .............................................................................................. 3355.5.1 Materialismo Histórico ....................................................................................... 3355.5.2 Socialismo e comunismo .................................................................................... 336Atividades ..................................................................................................................... 338Reflexão ........................................................................................................................ 339Leitura Complementar .................................................................................................. 339Referências .................................................................................................................... 339

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Na próxima unidade ...................................................................................................... 340Unidade 6: O conceito de trabalho ............................................................................ 345Objetivos de sua aprendizagem .................................................................................... 345Você se lembra? ............................................................................................................ 3456.1 Introdução ao problema ......................................................................................... 3466.2 História do Trabalho .............................................................................................. 3496.2.1 O trabalho entre os gregos .................................................................................. 3506.2.2 O trabalho na tradição judaico-cristã .................................................................. 3526.2.3 O trabalho na modernidade ................................................................................. 3536.2.4 O trabalho no Renascimento ............................................................................... 3566.3 O trabalho hoje ....................................................................................................... 356Atividades ..................................................................................................................... 361Reflexão ........................................................................................................................ 362Leitura recomendada ..................................................................................................... 362Referências .................................................................................................................... 363Na próxima unidade ...................................................................................................... 363Unidade 7: O conceito de alienação ........................................................................... 365Objetivos de sua aprendizagem .................................................................................... 365Você se lembra? ............................................................................................................ 3657.1 O que é alienação? ................................................................................................. 3667.2 Feuerbach e a essência da religião ......................................................................... 3667.3 A alienação do trabalho .......................................................................................... 3727.4 Tipos de alienação .................................................................................................. 3767.4.1 Alienação na produção ........................................................................................ 3767.4.2 Alienação no consumo ........................................................................................ 3787.4.3 Alienação no lazer ............................................................................................... 380Atividades ..................................................................................................................... 383Reflexão ........................................................................................................................ 383Leitura Complementar .................................................................................................. 384Referências .................................................................................................................... 384Na próxima unidade ...................................................................................................... 385Unidade 8: Maturidade intelectual e autonomia de pensamento ........................... 387Objetivos de sua aprendizagem .................................................................................... 387Você se lembra? ............................................................................................................ 3878.1 Introdução ao problema ......................................................................................... 3888.2 Sociedade Disciplinar e Sociedade de Controle ..................................................... 389

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8.3 Indústria Cultural ................................................................................................... 3938.4 Maturidade Intelectual ........................................................................................... 4008.5 O homem é construtor de si mesmo ....................................................................... 4048.6 Considerações finais .............................................................................................. 405Atividades ..................................................................................................................... 407Reflexão ........................................................................................................................ 408Leitura Complementar .................................................................................................. 408Referências .................................................................................................................... 409

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o O UniSEB Interativo

Prezado(a) acadêmico(a)Bem-vindo(a) ao Centro Universitário UniSEB

Interativo. Temos o prazer de recebê-lo(a) no novo segmento desta instituição de ensino que já possui mais

de 40 anos de experiência em educação.O Centro Universitário UniSEB Interativo tem se des-

tacado pelo uso de alta tecnologia nos cursos oferecidos, além de possuir corpo docente formado por professores experientes e

titulados. O curso, ora oferecido, foi elaborado dentro das Diretrizes

Curriculares do MEC, de acordo com padrões de ensino superior da mais alta qualidade e com pesquisa de mercado.

Assim, apresentamos neste material o trabalho desenvolvido pelos professores que, por meio da tecnologia da informação e comunicação, proporciona ensino inovador e sempre atualizado.

Este livro, o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e a teleaula integram a base que visa transmitir os conhecimentos necessários à sua formação, além de auxiliá-lo(a) nos estudos e incentivá-lo(a), com as indi-cações bibliográficas de cada unidade, a fim de aprofundar cada vez mais o seu saber.

Procure ler os textos antes de cada aula para poder acompanhá-la melhor e, assim, interagir com o professor nas aulas ao vivo. Não deixe para estudar no final de cada módulo somente com o objetivo de passar

pelas avaliações; procure ler este material, realizar outras leituras e pesquisas sobre os temas abordados e estar sempre atualizado, afi-

nal, num mundo globalizado e em constante transformação, é pre-ciso estar sempre informado.

Procure dedicar-se ao curso que você escolheu, aprovei-tando-se do momento que é fundamental para sua formação

pessoal e profissional. Leia, pesquise, acompanhe as aulas, realize as atividades on-line, desta maneira você estará

se formando de maneira responsável, autônoma e, cer-tamente, fará diferença no mundo contemporâneo.

Sucesso!

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o Prezado(a) estudante,

Seja bem-vindo(a) ao módulo 1.2, o qual contém as disciplinas de Filosofia e Psicologia.

A proposta deste módulo é dar fundamentos para a prática profissional do assistente social, no que corres-

ponde à compreensão que o homem é um ser social, ou seja, um ser complexo, que tem seus aspectos particulares

enquanto indivíduo – pensamentos, sentimentos e emoções, mas que está constantemente em relação social, constituindo-

se também num ser coletivo, formado pelos acontecimentos do passado e atuante na construção do presente e do futuro.

O “olhar” do profissional em Serviço Social precisa ser ampliado e abrangente, sem perder seu objeto e objetivo de trabalho – as expres-

sões da questão social, a fim de poder atuar de forma crítica e cons-ciente de seus direitos e deveres.

A Psicologia contribuirá grandemente para a compreensão de que o ser humano é dotado de sentimentos, razão e principalmente de que é um ser que convive em uma sociedade complexa e diversa. Uma das ex-pressões do convívio em sociedade é o espaço de trabalho profissional, o qual é eixo central das discussões no Serviço Social, pois entende-se que é nele ou a partir dele que se dão as relações em sociedade. A Filosofia nos traz a compreensão sobre o estudo dessas relações e como o homem é capaz de construir e desconstruir sua própria história a partir de uma reflexão sobre sua realidade, por isso identificamos as pessoas como sujeitos, ou seja, são pessoas protagonistas, capazes de

criar novas formas de relações sociais. Ambas as disciplinas nos auxiliarão, portanto, a compreen-

der que o homem é um ser social, envolvido e atuante na cons-trução história da sociedade.

Desejamos a todos bons estudos e aproveitamento do conteúdo proposto.

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o Prezado(a) estudante, Seja bem-vindo(a) à disciplina de

Comportamento e Psicologia Organi-zacional do curso de Graduação de Serviço

Social!Você sabe o que é Psicologia? E para que ela

serve? Você saberia dizer qual a importância da Psicolo-gia para as Organizações? E sobre o estudo do Comporta-

mento Organizacional? O que você tem a dizer? O que será? Quantas questões não? Mas esse será o nosso objetivo nessa

disciplina, trazer respostas e conhecimentos para a sua formação.A psicologia é muito importante e útil na vida em geral, e no

mundo do trabalho em particular. A psicologia se interessa pelos com-portamentos, mas também pelos sonhos, aspirações, desejos, conflitos,

medos, alegrias, pelos valores do indivíduo e pela vida social. A partir dessa disciplina, um conjunto de conhecimentos visa auxiliar o indivíduo,

a ajudar a si mesmo, e a ajudar os outros, a desenvolver seu potencial, sua capacidade e sua autonomia. Esperamos com essa disciplina que as pes-soas compreendam melhor seus próprios comportamentos e os dos outros e também desenvolvam relações interpessoais sadias e produtivas, tanto no trabalho como em suas vidas.

Este material divide-se em nove unidades. Cada unidade apresenta de modo sucinto um campo de estudo do Comportamento e Psicologia Compor-tamental. Iremos encontrar neste material as seguintes temáticas: o estudo do comportamento organizacional; percepção e motivação; grupos e equipes; liderança e comunicação; poder, conflito e negociação; visão, missão, cul-tura e clima organizacional; estrutura organizacional e o comportamento

organizacional, e as práticas de recursos humanos e o estudo de com-portamento organizacional.

Você está convidado, a partir de agora, a aprender mais e a dialogar conosco por meio deste material, que dará a você uma

visão global desta disciplina fascinante que é Comportamento e Psicologia Organizacional.

Pensando em você, fizemos um material fácil e agradável. Aproveite. Você tem muito a desenvolver.

Boa caminhada!

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UniUa

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U O Estudo do Comporta-mento Organizacional

Processo de ensino-aprendizagemNesta primeira unidade você irá compreender al-

guns aspectos da organização e o estudo do compor-tamento organizacional, as disciplinas que contribuem

com o comportamento organizacional, os três níveis do estudo do comportamento organizacional, produtividade,

absenteísmo, rotatividade e satisfação e os tópicos importantes em Comportamento Organizacional. Você está pronto? Então va-

mos lá! Temos muito a aprender!

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar o conceito de comportamento organizacional;

• Discutir os três níveis do estudo do comportamento organizacional;• Apresentar os conceitos de produtividade, absenteísmo, rotatividade

e satisfação;• Conhecer alguns tópicos importantes para o estudo do comportamen-

to organizacional.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Você se lembra?Você saberia me dizer o que significa organização? Você lembra

se já aprendeu esse conceito em algum momento da sua vida? Se obser-varmos ao nosso redor, podemos constatar que quase todas as atividades em nossa sociedade são executadas por uma organização: nascemos em hospitais; somos educados em escola, trabalhamos em empresas, fazemos compras em lojas, nos divertimos no cinema, etc.

Tente me dizer ao menos uma atividade sua que não envolva uma organização?

Concluímos, portanto, que as pessoas obtêm a maior parte de suas necessidades materiais e sociais através das organizações. Além disso, as organizações são constituídas por pessoas e são elas que agem e tomam decisões (LACOMBE, 2005).

Neste contexto, torna-se imprescindível o estudo do comportamento das pessoas nas organizações. Wagner III e Hollenbeck (2006, p.5) afir-mam que “muitos especialistas consideram atualmente as pessoas que formam uma organização como a fonte primeira de vantagem competitiva sustentável”. Ou seja, estes autores afirmam que se a empresa emprega as melhores pessoas e é capaz de mantê-las, esta empresa tem uma vantagem competitiva que dificilmente será alcançada por outras empresas.

O campo de estudos que se preocupa com o impacto do comporta-mento das pessoas nas organizações é denominado comportamento orga-nizacional.

Segundo Robbins (2002), os tópicos básicos que fazem parte da área de estudos do comportamento organizacional são: motivação, com-portamento e poder de liderança, comunicação interpessoal, estrutura e processos de grupos, aprendizagem, percepção, processos de mudanças, conflitos, estrutura organizacional e estresse no trabalho. Estes tópicos serão estudos nos capítulos seguintes, mas antes de aprofundarmos o nos-so conhecimento em cada um deles, é importante entender dois conceitos que serão discutidos: organização e comportamento organizacional.

Vamos ver então o que é uma organização e o que aborda o estudo do comportamento organizacional?

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U.UU OrganizaçõesUeUoUestuUoUUoUcomportamentoUorganizacional

De acordo com Lacombe (2005, p.8), uma organização é um “gru-po de pessoas que se constitui de forma organizada para atingir objetivos comuns”. Segundo Maximiano (2004, p. 27) “as organizações são grupos sociais deliberadamente orientados para a realização de objetivos, que, de forma geral, se traduzem no fornecimento de produtos e serviços”.

Desta forma, a razão de existir de uma organização é servir a esses objetivos que podem ser definidos como uma situação desejada que a or-ganização almeja alcançar (CHIAVENATO, 2005).

Quando uma organização atinge esses objetivos dizemos que esta organização é eficaz. Quando uma organização utiliza seus recursos de maneira econômica dizemos que esta organização é eficiente.

Vamos visualizar no quadro a seguir, as definições de eficiência e eficácia:

Eficiência EficáciaAusência de Desperdícios Capacidade de Realizar ResultadosUso Econômico de Recursos Grau de Realização de ResultadosMenor Quantidade de Recursos para Produzir mais Resultados Capacidade de Resolver Problemas

Quadro 1: Dois conceitos fundamentais sobre o desempenho das organizações Fonte: Maximiano (2004, p. 32)

Uma das várias abordagens que contribuem para a melhoria da efi-cácia organizacional é o estudo do comportamento organizacional.

Tome cuidado com as soluções rápidas! Todos tentamos encontrar solu-ções rápidas e simples para nossos problemas complexos. Mas aqui vai uma

má notícia: no que se refere ao comportamento organizacional, as soluções simples e rápidas costumam ser erradas, pois não conseguem abranger toda a diversidade de organizações, situações e indivíduos. Como dizia Einstein, “tudo deve ser feito da maneira mais simples possível, mas não simplificada.” Quando se trata de compreender as pessoas em seu trabalho, há uma quantidade enorme de ideias simplistas, além de livros e consultores que as promovem. E os livros não tratam apenas de liderança (ROBBINS, 2002).

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Robbins (2002, p. 6) define comportamento organizacional como

um campo de estudos que investiga o im-pacto que indivíduos, grupos e a estrutura têm sobre o comportamento dentro das organizações, com o propósito de utili-zar esse conhecimento para promover a melhoria da eficácia organizacional”. Ou seja, este autor explica que “o com-portamento organizacional aplica o conhe-cimento obtidosobre as pessoas, os grupos e o efeito da estrutura sobre o comportamen-to, para fazer com que as organizações trabalhem mais eficazmente.

U.U.UUDisciplinasUqueUcontribuemUcomUoUcomportamentoUorganizacionalU

Segundo Wagner III e Hollenbeck (2006), o estudo do comporta-mento organizacional apoia-se em outras disciplinas comportamentais. O quadro a seguir resume quais são as disciplinas, bem como com quais tópicos estas contribuem com o comportamento organizacional:

Disciplina Tópicos abordados em C.O.

Psicologia Experimental Teorias sobre aprendizagem, motivação, percepção e estresse

Psicologia Clínica Modelos de personalidade e desenvolvimento humano

Psicologia Industrial Seleção de empregados, atitudes no local de traba-lho e avaliação de desempenho

Psicologia Social e Sociologia Interacionista Socialização, liderança e dinâmica de grupo

Sociologia Teorias sobre estrutura, status social e relações institucionais

Ciência Política Teorias sobre poder, conflito, negociação e controle

Antropologia Teorias sobre simbolismo, influência cultural e análise comparativa

Economia Teorias sobre competição e eficiência

Quadro 2: As disciplinas que serviram de base para o estudo do Comportamento OrganizacionalFonte: Adaptado de Wagner III e Hollenbeck (2006, p.7)

(Obs: a fonte do quadro colocar ao lado deste)

Conexão:

Para ampliar seus conhe-cimentos leia na íntegra o livro

de ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. Tradução Reynaldo Cavalheiro Marcondes. São Paulo:

Prentice Hall, 2002. Você não vai se arrepender. É muito

interessante.

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Segundo Robbins (2002), as áreas que mais apoiam o estudo do comportamento organizacional são: a Psicologia, a Sociologia, a Psicolo-gia Social, a Antropologia e a Ciência Política. A psicologia tem contribu-ído principalmente para o nível micro, ou individual, de análise, enquanto as demais têm contribuído para a nossa compreensão dos conceitos ma-cro, tais como os processos grupais e as organizações. Vamos agora ver algumas contribuições dessas áreas:

– PsicologiaPsicologia é a ciência que busca medir, explicar e, algumas vezes

modificar o comportamento dos seres humanos e dos animais. Os psicólo-gos dedicam-se ao estudo e ao esforço de compreender o comportamento individual. Os cientistas que contribuem nesta área de conhecimento são os que estudam as teorias relativas ao processo de aprendizagem e à per-sonalidade, ou seja, os psicólogos clínicos e, principalmente, os psicólo-gos organizacionais e industriais.

Inicialmente, os psicólogos organizacionais e industriais estudavam os problemas de fadiga, falta de entusiasmo e outros fatores relevantes para as condições de trabalho que poderiam impedir um desempenho eficiente. Mais recentemente, sua contribuição se expandiu para incluir estudos sobre a aprendizagem, percepção, personalidade, emoções, trei-namento, eficácia de liderança, necessidades e forças motivacionais, satisfação com o trabalho, processo de tomada de decisões, avaliação de desempenho, mensuração de atitudes, técnicas de seleção de pessoal, pla-nejamento do trabalho e estresse profissional.

– SociologiaEnquanto a psicologia foca suas atenções sobre o indivíduo, a so-

ciologia estuda o sistema social, no qual os indivíduos desempenham seus papéis, ou seja, estuda as relações das pessoas entre si. Mais especifica-mente, a maior contribuição dos sociólogos foi no estudo do comporta-mento dos grupos dentro das organizações, especialmente as formais e complexas. Algumas áreas do estudo do comportamento organizacional que mais receberam contribuições da sociologia foram a dinâmica de gru-po, o desenho de equipes de trabalho, a cultura organizacional, a teoria e a estrutura da organização formal, a tecnologia organizacional e aspectos como poder, comunicação e conflitos.

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Grupo de Trabalho

– Psicologia SocialA Psicologia Social é uma área dentro da psicologia que mistura

conceitos desta ciência e da sociologia. Seu foco é a influência de um indivíduo sobre o outro. Um dos temas mais investigados pela psicologia social é a mudança – como implementá-la e como reduzir as barreiras para sua aceitação. Além disso, os psicólogos sociais também fazem significa-tivas contribuições nas áreas de mensuração, entendimento e mudança de atitudes; padrões de comunicação; as formas pelas quais as atividades em grupo podem satisfazer necessidades individuais e o processo de tomada de decisão em grupo.

– AntropologiaA antropologia é o estudo das sociedades para compreender os seres

humanos e as atividades. O trabalho dos antropólogos sobre culturas e ambientes, por exemplo, tem nos ajudado a compreender melhor as dife-renças de valores, atitudes e comportamentos fundamentais entre os po-vos de diferentes países ou de pessoas em diferentes organizações. Muito do nosso conhecimento de hoje sobre cultura organizacional, ambiente

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organizacional e diferenças entre culturas dos países é fruto do trabalho de antropólogos ou de pessoas que utilizam sua metodologia.

– Ciência PolíticaEmbora sejam frequentemente subestimadas, as contribuições dos

cientistas políticos para o entendimento do comportamento organizacio-nal têm sido significativas. A ciência política estuda o comportamento dos indivíduos e dos grupos dentro de um ambiente político. Alguns tópicos específicos desta área são a estruturação de conflitos, a alocação de poder e como as pessoas manipulam o poder para o entendimento de seus pró-prios interesses.

U.2U OsUtrêsUníveisUUoUestuUoUUoUcomportamentoUorganizacional

Robbins (2002) afirma que há três níveis de análise no estudo do comportamento organizacional que serão descritas a seguir:

– Nível do indivíduo: estuda as variáveis que afetam o comporta-mento dos indivíduos na organização, tais como: características biográfi-cas (idade, sexo, estado civil), personalidade, valores, atitudes, emoções, percepção, aprendizagem e motivação.

– Nível do grupo: estuda o comportamento dos grupos e trata de tópicos como a diferença entre grupo e equipe, formação de equipes efi-cazes, padrões de comunicação, estilos de liderança, poder e política e os níveis de conflitos que afetam o comportamento grupal.

– Nível dos sistemas organizacionais: estuda as diferentes formas de estrutura organizacional e trata de tópicos, tais como: desenho da or-ganização formal, processos de trabalho, políticas e práticas de recursos humanos.

Segundo Robbins (2002), todos nós somos estudantes do comportamen-to. Desde a mais tenra idade, observamos as ações das outras pessoas e tentamos interpretar o que vemos. Mesmo nunca tenha se dado conta disto, você foi um leitor de pessoas por toda a sua vida. Você observa o que as outras pessoas fazem e tenta compreender o porquê de seu comportamento. Além disso, você também tenta prever o que elas fariam sob determinadas

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circunstâncias. Infelizmente, esta abordagem causal e de senso comum costuma induzir a erros de previsão. Entretanto, você pode aprimorar sua capacidade de previsão substituindo suas opiniões intuitivas por uma abor-dagem mais sistemática. Os estudos que faremos nesta disciplina, e através desse material, revelam importantes fatos e relacionamentos de modo a for-necer uma base para realizar previsões de comportamento mais acuradas. O conceito por trás desta abordagem é que o comportamento não é aleatório. Na verdade, existem algumas consistências fundamentais no comportamen-to de todos os indivíduos que podem ser identificadas e, então, modificadas para refletir as diferenças individuais.

Segundo Robbins (2002), as variáveis estudadas em cada um dos três níveis de análise do comportamento organizacional afetam a produ-tividade, o absenteísmo, a rotatividade, e a satisfação com o trabalho. A seguir, vamos conhecer qual é o conceito de cada um destes tópicos.

U.3UProUutiviUaUe,Uabsenteísmo,UrotativiUaUeUeUsatisfação

Robbins (2002) define a produtividade, a rotatividade, o absenteís-mo e a satisfação com o trabalho como:

– Produtividade: uma organização é produtiva quando consegue atingir seus objetivos, transformando entradas em resultados ao mais baixo custo possível. Desta forma, a produtividade implica eficiência (minimização dos recursos necessários para se alcan-çar os objetivos) e em eficácia (alcance dos objetivos propostos).– Absenteísmo: é o não comparecimento do funcionário ao tra-balho. Quando o funcionário falta, o fluxo de trabalho é inter-rompido e decisões frequentemente importantes precisam ser postergadas.

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Absenteísmo

– Rotatividade: é o fluxo de saída e entrada de pessoal da organiza-ção, voluntária ou involuntária (demissão). Um índice alto de rotatividade resulta em elevação dos custos da empresa com recrutamento, seleção e treinamento de novos funcionários.

– Satisfação é definida por Robbins (2002, p. 21) como a “diferença entre as recompensas recebidas de fato pelo funcionário e aquilo que ele acredita merecer”. Ou seja, se as recompensas recebidas estão além das expectativas do indivíduo este encontra-se satisfeito. Mas se as recompen-sas recebidas estão aquém das expectativas do indivíduo este certamente se sentirá insatisfeito.

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Satisfação no Trabalho

Acabamos de estudar, portanto, a definição de cada um dos concei-tos mais importantes do estudo do comportamento organizacional. Nos capítulos a seguir, estudaremos as variáveis dos três níveis do estudo do comportamento organizacional (indivíduo, grupo e sistemas organizacio-

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nais) e como estas variáveis podem influen-ciar a produtividade, o absenteísmo, a rota-tividade e a satisfação nas organizações.

Mas, antes de entrarmos nessa discussão, vamos elencar alguns tópicos importantes no estudo do comportamento das pessoas dentro das organizações.

U.4UTópicosUimportantesUemUcomportamentoUorganizacionalU

Nesta seção, foram selecionados alguns tópicos considerados im-portantes no estudo do comportamento organizacional. São eles, a saber: diversidade no trabalho, estresse e desarticulação da vida familiar. Eu convido você a estudar cada um deles.

O estudo do comportamento organizacional oferece desafios e oportu-nidades a todos os funcionários de uma organização. Ele aponta para as diferenças e ajuda os gestores a perceberem o valor da diversidade de mão de obra, e quais as práticas que precisam ser modificadas quando se opera em diferentes países. Este estudo pode melhorar a qualidade e a produtivi-dade dos funcionários, mostrando aos gestores como dar autonomia ao seu pessoal e como elaborar e implementar programas de mudanças, melhorar o atendimento ao cliente e ajudar os funcionários a equilibrar vida pessoal e profissional. O comportamento organizacional fornece sugestões para ajudar os gestores a enfrentar a escassez crônica de trabalho. Em tempos de mudanças rápidas e constantes, o estudo do comportamento organizacional ajuda também os gestores a lidar com um mundo de temporariedades e aprender formas de estimular a inovação. Finalmente, este estudo oferece orientação para a criação de um ambiente de trabalho eticamente saudável. (ROBBINS, 2002)

U.4.UUDiversiUaUeUnoUtrabalho

Uma tendência importante atualmente é a contratação de pessoas com necessidades especiais pelas empresas. Robbins (2002) analisou uma

Conexão:

Para aprofundar ainda mais seus conhecimentos, leia

na íntegra outro livro de ROBBINS, S.P. Fundamentos do Comportamento Organizacional. Tradução Reynaldo Cavalheiro Marcondes. São Paulo: Prentice Hall, 2002. Vale a pena!

Você irá ampliar suas concep-ções sobre a Psicologia

Organizacional.

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empresa na qual 75% de seus funcionários tinham algum tipo de proble-ma, seja mental, físico ou emocional, tais como esquizofrenia, autismo, paralisia cerebral e deficiências físicas. Segundo o autor, as pessoas com necessidades especiais ganharam autoestima e autossuficiência e a empre-sa se beneficiou com uma força de trabalho esforçada e dedicada. Segun-do Robbins (2002, p.485) “o absenteísmo nesta empresa é praticamente zero e a rotatividade é muita baixa”.

Ainda citando Robbins (2002), a diversidade do trabalho significa que as organizações estão se tornando mais heterogêneas em termos de raça, etnia e sexo de seus participantes. O termo se refere às mulheres, ne-gros, latinos e asiáticos. Também são incluídos nessa diversidade pessoas com necessidades especiais, pessoas da terceira idade e homossexuais. Administrar a diversidade se tornou uma questão importante em todo o mundo. Este autor ainda ressalta que existem outras categorias da diversi-dade de mão de obra, a saber: parceiros e religião.

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Diversidade no Trabalho

U.4.2UEstresse

Em um mundo em constante transformação, a palavra estresse está sendo pronunciada cada vez mais por pessoas de diferentes profissões e classes sociais. O senso comum nos traz um conceito de algo negativo e nocivo à qualidade de vida do indivíduo. Mas afinal qual é o conceito de estresse?

Wagner III e Hollenbeck (2006, p.121) definem estresse com “um estado emocional desagradável que ocorre quando as pessoas estão inse-

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guras de sua capacidade de enfrentar um desafio percebido em relação a um valor importante”.

Em relação ao estresse Limongi (apud WAGNER III e HOLLEN-BECK, 2006, p.122) afirma: “o estresse é vivido no trabalho pela capa-cidade de adaptação, na qual sempre está envolvido o equilíbrio obtido entre a exigência e capacidade. Se o equilíbrio for atingido, obter-se-à o bem estar, se for negativo, gerará diferentes graus de incerteza, conflitos e sensação de desamparo”.

Robbins (2002, p.548) define o estresse de forma mais complexa: “es-tresse é uma condição dinâmica na qual um indivíduo é confrontado com uma oportunidade, limitação ou demanda em relação a alguma coisa que ele deseja e cujo resultado é percebido, simultaneamente, como importante e incerto”.

O estresse nem sempre tem um impacto negativo no desempenho das pessoas. Robbins (2002, p.558) ressalta que, “para muitas pessoas, um nível baixo ou moderado de estresse pode capacitá-las a realizar melhor seu trabalho, aumentando a intensidade de sua dedicação, sua agilidade mental e sua capacidade de reagir”.

No entanto, um alto nível de estresse ou, até mesmo um nível mo-derado de estresse, mas constante por muito tempo, em geral ocasiona uma queda da produtividade e também da satisfação do funcionário com o trabalho (ROBBINS, 2002).

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Estresse

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U.4.3UAUUesarticulaçãoUUaUviUaUfamiliar

O ingresso das mulheres no mercado de trabalho certamente mo-dificou a estrutura tradicional da família que era centrada na presença da mulher no lar. Com isso, veio também a eliminação da divisão de trabalho que existia anteriormente.

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Família e Trabalho

Neste contexto, Lacombe (2005, p. 387) levanta as seguintes ques-tões em relação a esta desarticulação da vida familiar:

• “Se as mulheres trabalham hoje tanto quanto os homens, como é possível que homens e mulheres continuem a trabalhar tanto quanto os homens trabalhavam antes?”

• “Se a vida dos homens não mudou e das mulheres mudou mui-to, quem está fazendo o que as mulheres faziam antes?”

• “Será que diante de tantas exigências e oportunidades, os pais não estão “delegando” ou até mesmo “terceirizando” a educa-ção de seus filhos para outras pessoas?”.

• “Nesta priorização do trabalho, que valores os pais estão trans-mitindo para seus filhos?”

São questões para reflexão.Para exemplificar as consequências desta desarticulação familiar,

Lacombe (2005) nos afirma que a crise moral que atravessamos no final do século XX e no início do XXI pode ser creditada em grande parte a este fato: a desarticulação da vida familiar. Os indivíduos não se produzem do nada. Pais e educadores, os sistemas de ensino, formação e as atividades artísticas e lúdicas, participam dessa produção do capital humano, por in-termédio da produção e da transmissão de valores.

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AtiviUaUe

Leia o artigo abaixo “Estresse Herói e Vilão” da Revista HSM Ma-nagement de setembro-outubro 1999, e responda às seguintes questões a seguir:

Em entrevista exclusiva, o especialista em psicologia empresarial e esportiva James E. Loehr afirma que o estresse-tensão e o estresse-doen-ça são característicos da vida corporativa, mas, enquanto um estimula as pessoas, o outro pode destruí-las.

A palavra inglesa “stress” possui vários significados, entre os quais “tensão”, “pressão” e a “doença estresse”, a estafa. Transportada para o português, no entanto, vira estresse, que é exclusivamente a doença, de acordo com o dicionário Aurélio. Perde-se o outro sentido do inglês.

Em entrevista exclusiva a HSM Management, o especialista James E. Loehr, autor do livro Stress for Success (ed. Times Business), aponta ao empresariado brasileiro a importância do sentido “tensão”, “pres-são”, no ambiente corporativo, em nome da produtividade e da eficácia. Para facilitar a compreensão dos leitores, HSM Management adotou uma tradução livre, diferenciando estresse-tensão e estresse-doença, apesar de Loehr ter chamado a ambos de “estresse” durante a entrevis-ta, distinguindo-os apenas por “o lado bom” e “o lado ruim”. Assim, elimina-se a possibilidade de interpretações equivocadas, tais como a de que o estresse-doença pode ser bom para a produtividade. Loehr define o estresse-tensão como “o desgaste de energia, emocional, mental ou física, em resposta a um estímulo.” Para ilustrar o estresse-doença, por sua vez, ele dá o exemplo dos profissionais japoneses que chegam a morrer disso.

Se o estresse-doença é contraproducente, a ausência de estresse-tensão também é ruim para o ambiente de trabalho – e até para a vida pessoal –, afirma o especialista. Sem pressões estimulantes e desafiado-ras, a calma pode tornar-se um fator de estresse-doença, segundo ele. A entrevista, transcrita a seguir por tópicos, é de Mercedes Reincke.

Sobre definições de estresse Loehr define o estresse-tensão como “o desgaste de energia, emo-

cional, mental ou física, em resposta a um estímulo.” Em outras palavras, o “custo” bioquímico ou neurológico da reação. Já o estresse-doença é esse desgaste sem limites, como se observa nos japoneses, por exemplo. “Eles cunharam o termo ‘karoshi’ para se referir à morte por excesso

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de trabalho quando começaram a ver muitos funcionários agonizar, sem outra causa aparente senão horas excessivas de tensão e exigências no escritório.” No Japão, explica Loehr, a cultura impõe ao indivíduo fortes fatores de pressão, os “tensivos”: longas jornadas de trabalho, chefes exigentes, uma grande ansiedade de satisfazer o empregador e, nos últi-mos anos, a preocupação financeira.

As pessoas reagem a isso desenvolvendo o estresse-doença, pois não sabem restaurar os mecanismos que as ajudam a recuperar-se do estresse-tensão, diz.

Segundo Loehr, se controlado, o estresse-tensão contribui para que as pessoas se sintam felizes em seu trabalho, fiquem motivadas e estabele-çam para si grandes objetivos.

“A falta de estresse-tensão não é boa: sem estímulos de nenhuma espécie, a própria calma se transforma em tensiva”, afirma.

Sobre o inimigo real As manifestações do estresse-doença são uniformes. “Quando che-

gamos ao limite ou o ultrapassamos - explica Loehr -, todos sentimos o mesmo: tornamo-nos irritadiços, ficamos com pouca paciência e temos dificuldade de nos concentrar. Começamos a perder a capacidade de des-frutar as coisas; com frequência, sentimos medo; aflora o ressentimento e perdemos o apetite”.

Soma-se a esses sintomas uma considerável perda de energia, que se traduz em fadiga crônica e perturbações do sono. “Perdemos o equilí-brio, em geral por causa da falta de recuperação completa”, afirma ele.

O mesmo ocorre, no entanto, com o profissional que está na mais perfeita calma, porque não possui projetos à vista, ou só recebe projetos que estão abaixo de suas capacidades ou expectativas, segundo Loehr. Em ambos os casos, as consequências são devastadoras, diz o especialis-ta. Assim, é de suma importância que as pessoas não sejam tão pressiona-das que o estresse-tensão se transforme em estresse-doença, aquele ponto sem volta. Elas devem ter a oportunidade de se recuperar plenamente, enfatiza Loehr. “A maioria das pessoas culpa o estresse por todos os seus problemas de saúde ou por sua infelicidade, porém há as que, sob essa pressão, são felizes e sãs. O estresse não é o inimigo real”, afirma Loehr. O verdadeiro problema, em sua opinião, é o estresse crônico, que não é resolvido e vira doença. No entanto, se houver períodos de estresse-tensão intercalados com períodos de calma e recuperação ao longo da jornada de trabalho, o panorama muda. “Um pouco de estresse-tensão

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é saudável; na verdade, é a fonte de estímulo mais poderosa. Ele não é negativo nem sinônimo de estresse-doença ou estafa, o estado em que ficamos quando excedemos a capacidade de nosso corpo de administrar o gasto de energia”, diz o especialista.

Sobre finais de jogo Como os atletas, os homens e as mulheres de negócios sabem que

cada meta que alcançam se converte num novo ponto de partida. Por isso, “devem treinar constantemente, alimentar-se bem, respeitar as horas de sono e ter atividade física adequada”, recomendações que normalmente não aparecem nos programas de formação de executivos.

Muitas vezes as exigências a que os gerentes estão submetidos são até maiores do que as dos atletas, diz Loehr. “Trabalham no mínimo entre 8 e 12 horas por dia, seis dias por semana, durante três ou quatro déca-das, enquanto o período competitivo dos atletas não ultrapassa cinco ou seis anos”, complementa.

Como o treinamento é o que diferencia os campeões dos medíocres, quem quiser triunfar deverá modificar a forma como se vê, isto é, mudar de paradigma. “Caso contrário, como todos, será vítima do estresse-doença”, prenuncia ele. Já não adianta desfrutar a sensação de poder que incentiva os workaholics a se aprofundar mais em seu vício, de tal forma que alguns nem sequer reconhecem os múltiplos sinais de alerta. Ao desequilíbrio se somam os erros, as doenças cada vez mais frequentes, as convalescenças prolongadas; desaparece a diversão e surge o tédio. Por outro lado, ao contrário dos atletas reais, os atletas corporativos não têm a possibilidade de revanche na próxima partida.”. O trabalho é a atividade principal; se não conseguirmos suportar a pressão competitiva, ficaremos fora da carreira”, afirma Loehr. Por isso, ele insiste na necessi-dade de se preparar para conseguir sucesso nesse “esporte”.

“Quanto mais tempo alguém se dedicar ao treinamento, maiores serão as probabilidades de ocupar um lugar de destaque no gramado. Quanto mais tempo alguém se dedicar ao treinamento, maiores serão suas chances de se destacar. Um dos segredos dos atletas para ter bom desempenho sob pressão é a preparação mental”, principalmente porque grande parte desse treinamento é, basicamente, mental e emocional.”

Loehr assegura que a visualização de si mesmo em situações críti-cas ajuda o executivo a se desvencilhar da carga psicológica. “Um dos segredos dos atletas olímpicos para terem bom desempenho sob tamanha pressão é a preparação mental”, observa.

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Sobre o menino de ontem “Os otimistas decididos, que sempre pensam positivo, são os que obtêm mais sucesso”, afirma Loehr. Seus opostos, os temerosos, perdem a iniciativa, estão sempre na defensiva e desperdiçam as melhores oportunidades, imersos nesse quadro mental negativo. Para reverter esse quadro, recomenda, primeiramente, tomar consciência: “É preciso estar alerta aos pensamentos negativos: quando aparecerem, deve-se soar o alarme e dedicar o tempo necessário para ‘redirecionar’ o pensamento”. Em pouco tempo, notar-se-à a mudança na visão do mundo e na capacidade de desfrutar o trabalho.

Uma vez que se consiga quebrar o ciclo negativo de resposta aos fatores tensivos, cheio de sentimentos “tóxicos” – que debilitam o sistema imunológico, provocam infelicidade e, com o tempo, se convertem em ira ou ressentimento crônico –, o importante é aprender a retomar o controle das emoções. “O enfoque é duplo”, diz Loehr; “por um lado, é necessá-rio dominar o pensamento e as emoções; por outro, é preciso agir sobre o próprio corpo. Para responder positivamente a determinado estímulo, é preciso pensar em coisas inspiradoras e, ao mesmo tempo, adequar a atitude física para transmitir segurança e confiança. São dois passos simples que permitem colocar o estresse-tensão sob controle.” Entretan-to, é muito difícil para os indivíduos com pouca capacidade de suportar o estresse-tensão superar esse problema. Intolerantes e com tendência a complicar tudo, em geral trata-se de pessoas que foram superprotegidas no passado. “No caso dos que sempre estão cansados e não conseguem tolerar o estresse físico – a menos que sofram de alguma limitação espe-cífica –, nunca se exigiu que se esforçassem”, diz Loehr.

O mesmo acontece no plano mental ou emocional. A proteção ex-cessiva não lhes permitiu crescer: são frágeis, manipuláveis e se deixam afundar rapidamente em estados alternativos de insegurança, medo e raiva. “As coisas mais insignificantes podem desestabilizá-los, sempre se sentem intimidados, brigam com seus companheiros de trabalho, buscam aprovação e fazem o impossível para chamar a atenção. Basicamente – conclui ele –, são pessoas insatisfeitas.”

Sobre o que fazer Mesmo que o componente individual seja relevante, o ambiente de

trabalho tem uma influência enorme. “As empresas que prezam a saúde e o bem-estar de seus funcionários – afirma Loehr – sabem que eles têm necessidade de recuperar suas energias; são essas as que promovem os intervalos regulares, a atividade física e a dieta equilibrada em seus

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refeitórios ou cantinas.” Algumas são muito boas na hora de “inspirar” os funcionários: incorporam uma boa dose de desafio, com os correspon-dentes incentivos, o que gera uma sensação de bem-estar e confiança; todos se comprometem com a missão, sentem-se parte de algo maior e desfrutam isso com entusiasmo. “Liderança e inspiração é a combinação chave – assegura Loehr –, com o adicional do reconhecimento. Quem não se sente importante e apreciado inevitavelmente sofre estresse.”

Contudo, nem sempre as empresas funcionam como muro de ar-rimo. Quando o ambiente é muito competitivo, gera nas personalidades propensas certo grau de vício. De qualquer forma, Loehr está convencido de que competir não é o problema: “Um grande competidor, como Micha-el Jordan, é viciado em competição e adora sê-lo”. As grandes empresas costumam entrar nesse “ciclo”, que para muitos é excitante.

O que fazer para evitar o lado obscuro? Proteger-se, principalmen-te quando a empresa está convencida de que os efeitos do estresse sobre a saúde ou a felicidade são uma questão de caráter pessoal. Nesse caso, os funcionários têm de se cuidar sozinhos.

“Não é por acaso que muita gente, em algum momento, pensa seria-mente em deixar a vida corporativa para começar um projeto próprio”. “Não é por acaso que muita gente, em algum momento, pensa seriamente em deixar a vida corporativa para começar um projeto próprio”, diz Loehr. “O principal motivo é a esperança de ter mais liberdade, mais oportunidades para aproveitar seus talentos e consolidar uma situação financeira sólida, em suma, melhor qualidade de vida”, explica. Ele la-menta que as empresas não se esforcem para encontrar formas criativas de conservar os melhores funcionários.

Sobre comer e dormir No entanto, não só os mais velhos sofrem de estresse. Em maior ou

menor grau, os jovens de hoje, sentem a pressão do sucesso, que parece mais valioso quanto menos tempo se leva para obtê-lo. “Se lhe for dada a oportunidade de se recuperar, o jovem aprenderá a superar isso”, explica Loehr. “Contudo, quando a pressão for prematura, não conseguirá lidar com ela, o que o deixará ainda mais vulnerável”.

É certo que, sob pressão, o crescimento se acelera, mas sempre que houver lugar para a recuperação. Esta, por sua vez, não é só curativa; converte-se também em uma fonte geradora de força interna, muito po-sitiva sob todos os pontos de vista, quer de trabalho, quer pessoal. É o

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mesmo que comer e dormir bem, dois pré-requisitos para quem quiser saber lidar com altos níveis de tensão. “É preciso estar sempre preparado para a próxima catástrofe – resume ele –, caso contrário, seu efeito será devastador”.

Entretanto, não são poucos os que creem que saber “enfrentar a tempestade” é a marca distintiva do executivo bem-sucedido. Sentem que sofrer o estresse-tensão gerado por essa luta é uma forma de ganhar o respeito dos pares e superiores e, em consequência, sacrificam-se até o esgotamento, em sua ânsia de se converter em heróis. Adquirem o estres-se-doença. Essas pessoas arruínam sua saúde e perdem a capacidade de desfrutar o que fazem a ponto de não reconhecerem, ou conscientemente ignorarem, os sinais de alarme que começam a se multiplicar. “Se escu-tarem apenas os sinais que o corpo lhes envia, poderão reduzir o estres-se, manifesto esporadicamente, com curta duração e com tempo para recuperar o equilíbrio depois.” Assim, para Loehr, o estresse não é um “mal” em si mesmo. Ao contrário: “Se soubermos lidar com ele, teremos sucesso”.

Texto disponível em: br.hsmglobal.com

AtiviUaUes

01. Explique as características do estresse-tensão e do estresse-doença abordados no artigo em questão.

02. Quais são os sintomas quando o indivíduo apresenta estresse-doença?

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03. O que uma empresa pode fazer para melhorar o ambiente organiza-cional, segundo Loehr?

04. Uma pessoa sem objetivos, sem projetos, pode vir a gerar estresse-tensão?

Complemente seus estudos com mais alguns exercícios:

01. Defina comportamento organizacional.

02. O que é organização? Uma família pode ser considerada uma organi-zação? Explique.

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03. Compare as contribuições da Psicologia e da Sociologia para o estudo do comportamento organizacional.

04. Quais os três níveis de análise em nosso modelo de comportamento organizacional? Eles estão relacionados? Se estão, como?

05. O que são eficiência e eficácia? Como esses conceitos se relacionam com o comportamento organizacional?

Reflexão

Vimos nesta unidade o conceito de organização e a importância das pessoas como fonte de vantagem competitiva. Uma das várias abordagens que auxilia na melhoria da eficácia organizacional é o estudo do compor-tamento organizacional. Este pode ser dividido em três níveis: do indiví-duo, do grupo e dos sistemas organizacionais. O objetivo do estudo do comportamento organizacional é a melhoria dos índices de produtividade, rotatividade, absenteísmo e satisfação do seu quadro de pessoal. Os temas estresse e diversidade no trabalho bem como a desarticulação da vida

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familiar em decorrência das mudanças na vida profissional das mulheres foram trazidos aqui para reflexão.

Agora reflita, a partir dos conhecimentos adquiridos nesta unidade constata-se a importância da Psicologia nas Organizações. Não é verdade? Será que daremos à Psicologia Organizacional a real importância que ela merece nas nossas concepções? Será que a visão da nossa prática profis-sional irá modificar com os conhecimentos adquiridos? Vale a pena pensar nisso!

LeituraURecomenUaUa

Leia o livro Stress e Trabalho: Uma Abordagem Psicossomática. 4 ed. – Ana Cristina Limongi França e Avelino Luiz Rodrigues. São Paulo: Editora Atlas, 2005.

Este livro proporciona ao leitor a oportunidade de conhecer e re-fletir sobre o desafio de conviver no mundo do trabalho com pessoas e situações inesperadas nos diversos cenários das empresas. Como a pessoa independente, totalmente isolada, é uma abstração. Ela é levada a man-ter constante interação com outras e a concordar com metas, objetivos e valores propostos pelas pessoas com quem convivem, ou a discordar de tais decisões. Por essa razão, o trabalho pode submeter as pessoas a um estresse contínuo e frequentemente crônico e, em consequência, a doenças e frustrações. A preservação da saúde, vista como resultado do desenvolvimento da autoestima e da realização pessoal-profissional, em compatibilidade com a cultura da empresa, é preocupação central no de-senvolvimento deste texto. Entre os temas tratados no livro, destacam-se: abordagem biopsicossocial; ampliação do conhecimento sobre o adoecer; mecanismos de formação de sintomas e doenças; contrato psicológico de trabalho e saúde; conceito, tipos e formas de adaptação ao stress; evolu-ção e novas abordagens sobre stress e burnout; qualidade de vida: reco-mendações e indicadores.

Os livros populares sobre comportamento organizacional costu-mam ter títulos engraçadinhos e são divertidos de ler. Mas podem ser perigosos. Eles passam a impressão de que o trabalho de gerir pessoas é muito mais simples do que na realidade é. Além disso, geralmente baseiam-se nas opiniões, pessoas dos autores, e não em pesquisa ri-

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gorosa. O comportamento organizacional é um assunto complexo. Existem pouquíssimas afirmações sobre o comportamento humano que podem ser generalizadas para todas as pessoas, em todas as situ-ações. O sistema capitalista prega que sempre que surge uma neces-sidade, algum oportunista aparecerá para tentar satisfazê-la. Quando se trata de gerir pessoas no trabalho, existe uma óbvia necessidade de ideias válidas e confiáveis que possam orientar os gestores. Contudo, a maior parte da literatura disponível nas livrarias tende a apresentar soluções superficiais e muito simplistas. Na medida em que as pesso-as compram esses livros, acreditando que eles desvendarão segredos da eficácia na administração, prestam um desserviço a elas próprias e aos seus colaboradores (ROBBINS, 2002).]

Referências

CHIAVENATO, I. Gerenciando com as pessoas. Transformando o executivo em um excelente gestor de pessoas. 3 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

LACOMBE, F. Recursos Humanos: Princípios e Tendências. São Paulo: Saraiva, 2005.

MAXIMIANO, A.C.A. Introdução à Administração. 6 ed. São Pau-lo: Atlas, 2004.

ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prenti-ce Hall, 2002.

WAGNER III, J.A., HOLLENBECK, J.R. Comportamento Organiza-cional. Criando Vantagem Competitiva. São Paulo: Saraiva, 2006.

NaUpróximaUuniUaUe

Serão estudadas nas próximas unidades, as variáveis de cada um dos três níveis do estudo do comportamento organizacional: nível do indiví-duo, do grupo e dos sistemas organizacionais. Vamos começar pelo nível do indivíduo. Você está animado e preparado? Vamos lá?

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UniUa

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UO Comportamento

Organizacional no Nível do Indivíduo

Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade você irá estudar algumas caracte-

rísticas biográficas, habilidades, aprendizagem e per-sonalidade. Como descrito na unidade anterior, há três

níveis de análise no estudo do comportamento organizacio-nal: o nível do indivíduo, o nível do grupo e o nível dos siste-

mas organizacionais. Contudo, nesta e na próxima unidade será abordado o nível do indivíduo e serão estudadas as variáveis que

afetam o comportamento dos indivíduos na organização, tais como características biográficas (idade, sexo, estado civil), personalidade,

habilidades, aprendizagem – que serão estudados nesta unidade – e percepção e motivação – que serão estudados na unidade a seguir. En-

tão vamos lá!

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar as variáveis do nível do indivíduo do estudo do comporta-

mento organizacional;• Discutir como as características biográficas influenciam a produtivi-

dade, o absenteísmo, a rotatividade e a satisfação das pessoas dentro das organizações;

• Compreender a importância da adequação das habilidades dos indiví-duos às demandas do cargo exercido na organização;• Conhecer algumas teorias da aprendizagem e qual a sua aplicabili-

dade nas organizações;• Identificar alguns atributos da personalidade e o seu impacto no

comportamento das pessoas nas organizações.

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Você se lembra?

Você se lembra de já ter ouvido que as pessoas mais velhas são menos produtivas? Ou, que as mulheres faltam mais ao trabalho do que os homens? A análise das características biográficas nos ajudará a refletir sobre estas questões.

Você considera que as pessoas certas devem estar nos lugares cer-tos? O estudo sobre as habilidades nos ajudará a compreender como é importante adequar as habilidades das pessoas às demandas do cargo.

Você acredita que é possível modelar o comportamento das pessoas dentro das organizações? O estudo sobre as teorias de aprendizagem lhes responderá que sim.

E, por último, você acha que os traços de personalidade influenciam o comportamento das pessoas na organização? A compreensão do que é personalidade nos mostrará que sim. Vamos então refletir um pouco mais sobre estas questões?

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2.UUCaracterísticasUbiográficas

As características biográficas que serão estudadas são idade, sexo e estado civil que consistem em dados objetivos e que são obtidos facilmente nos registros pessoais dos funcionários.

Robbins (2002, p.32) analisou es-tudos sobre a relação entre idade, sexo e estado civil com a produtividade, o absen-teísmo, a rotatividade e a satisfação. O qua-dro abaixo ilustra algumas conclusões do autor:

Idade Sexo Estado civil

Produtividade

“Quando existe declí-nio da produtividade devido à idade, ele é superado pelas vanta-gens da experiência”.

“Há poucas evidên-cias de diferenças entre os homens e mulheres no que tange à produtivi-dade”.

“Não há estudos sufi-cientes para embasar qualquer conclusão sobre os efeitos do estado civil sobre a produtividade dos trabalhadores”

Absenteísmo

“Os funcionários mais velhos apresentam ín-dices mais baixos de faltas evitáveis do que os mais jovens”.

“As mulheres fal-tam mais do traba-lho devido as suas responsabilidades para com a família”

“Pesquisas revelam que funcionários ca-sados faltam menos”.

Rotatividade

“Quanto mais velho a pessoa fica, menor é a probabilidade de que deixe seu emprego”.

“Alguns estudos sugerem que as mulheres apresen-tam um índice de rotatividade maior do que os homens. Outros estudos in-dicam que não há diferença”.

“Funcionários casa-dos mudam menos de emprego”.

Satisfação

“A satisfação tende a aumentar com o tempo entre os profissionais. Para os não profissio-nais a satisfação tende a diminuir na meia ida-de voltando a subir nos anos seguintes”.

“Não há evidência de que o sexo do indivíduo influencie na sua satisfação com o trabalho”.

“Os funcionários casa-dos sentem-se mais satisfeitos com o tra-balho do que seus co-legas solteiros”.

Quadro 1: A relação das características biográficas e a produtividade, absenteísmo, rotatividade e satisfação. Fonte: Autora

Conexão: Para ampliar seus

conhecimentos leia o livro de Stephen, P. Robbins. Fundamentos do

Comportamento Organizacional, Pearson Prentice Hall.2004. Nesta obra, o autor mostra

como tirar o máximo proveito das características positivas de cada funcionário, levando em conta

sua personalidade, emoções e motivações, o papel da liderança e a cultura organizacional,

entre outros fatores. O autor mostra ainda como evitar conflitos que podem preju-

dicar as equipes de trabalho e, no longo prazo, até mesmo a

empresa.

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A seguir vamos estudar algumas características biográficas, na visão de Robbins (2002). Venha comigo!

2.U.UU IUaUe

A relação entre a idade e o desempenho do funcionário será, prova-velmente, um aspecto de crescente importância na próxima década. Por quê? Existem, pelo menos, três razões. A primeira é que há um consenso de que o desempenho profissional decai com o passar do tempo. Indepen-dentemente de isto ser ou não verdade, o fato é que muita gente acredita e age de acordo com essa crença. A segunda razão é que, a mão de obra está envelhecendo. A terceira razão, pelo menos nos Estados Unidos, é a legis-lação federal que proíbe a aposentadoria compulsória. A maioria dos tra-balhadores norte-americanos não precisa mais se aposentar aos 70 anos.

Qual é a percepção dos mais velhos? A evidência indica que os em-pregadores apresentam sentimentos confusos. Eles percebem uma série de qualidades positivas nos trabalhadores mais velhos: especificamente a ex-periência, o bom-senso, um forte sentido de ética e o compromisso com a qualidade. Por outro lado, eles também são considerados pouco flexíveis e avessos a novas tecnologias. Em uma época em que as organizações bus-cam indivíduos adaptáveis e abertos às mudanças, esta percepção negati-va associada à idade é, evidentemente, um obstáculo à contratação destes trabalhadores e aumenta a probabilidade de que eles sejam os primeiros demitidos em um processo de corte de pessoal. Vamos examinar essa evidência mais detalhadamente. Qual o efeito que a idade tem, realmente, sobre fatores como produtividade, absenteísmo, rotatividade e satisfação?

Quanto mais velho você fica, menor é a probabilidade de que deixe seu emprego. Essa conclusão tem como base estudos sobre a relação en-tre idade e rotatividade. É claro que isto não chega a ser surpreendente. Quando um trabalhador começa a envelhecer, ele tem menos oportuni-dades de emprego. Além disso, os mais velhos têm menos probabilidade de pedir demissão por causa do seu tempo de casa, o que costuma lhes propiciar salários mais altos, férias remuneradas mais longas e planos de pensão mais atraentes.

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Idade e Trabalho

Existe uma tentação a acreditar que a idade está inversamente re-lacionada com o absenteísmo. Afinal, se os trabalhadores mais velhos têm menor probabilidade de deixar o emprego, não seria natural que quisessem demonstrar maior constância comparecendo ao trabalho mais regularmente? Não necessariamente! Muitos estudos mostram exatamente o contrário, porém, um exame mais cuidadoso revela que a relação entre idade e absenteísmo está muito relacionada ao fato de a ausência ser evitá-vel ou inevitável. Em geral, os trabalhadores mais velhos apresentam índi-ces menores de faltas evitáveis do que os mais jovens. Contudo, quando a falta é inevitável, o absenteísmo dos mais velhos é maior, provavelmente devido a problemas de saúde associados ao envelhecinento e porque eles necessitam de mais tempo para a convalescença.

Como a idade afeta a produtividade? Há uma crença generalizada de que a produtividade diminui com a idade. Normalmente, pressupõe-se que certas habilidades – como rapidez, agilidade, força física e coordenação – se deterioram com o passar do tempo e que a monotonia do trabalho e a falta de estímulo intelectual contribuem para a diminuição da produtivi-dade. As evidências, entretanto, contradizem estas crenças e pressupostos. Por exemplo, durante um período de três anos, uma cadeia de lojas colo-cou em uma de suas unidades apenas funcionários com mais de 50 anos, e depois comparou o resultado desta filial com os das outras cinco lojas da rede, que empregavam pessoal mais jovem. A loja com os funcionários mais velhos teve uma produtividade (medida em termos de faturamento comparado a despesas com pessoal) significativamente maior do que duas das demais lojas e ficou equiparada com as outras três. Outras linhas de pesquisa mostram que a idade e o desempenho no trabalho não estão rela-

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cionados. Essa constatação, inclusive, seria válida para quase todo tipo de atividade, especializadas ou não. A conclusão natural é que as demandas da maioria das atividades, mesmo aquelas com fortes exigências manuais, não são tão grandes para que sua produtividade seja comprometida pelo declínio físico ocorrido com a idade ou que esse declínio é superado pelas vantagens da experiência.

Nosso assunto final é a relação entre idade e satisfação com o tra-balho. Nesse sentido, as evidências são controversas. Muitos estudos indicam uma relação positiva, pelo menos até os 60 anos. Outros estudos encontraram uma relação que resulta em um gráfico em forma de U. Há várias explicações para esses resultados. A mais plausível indica que esses estudos não distinguem funcionários especializados dos que não têm es-pecialização. Quando os dois tipos são estudados em separado, a satisfa-ção tende crescer ao longo do tempo entre os funcionários especializados, enquanto, entre os não especializados, diminui na meia-idade e volta a subir nos anos seguintes.

2.U.2USexo

Poucos temas suscitam mais debates, preconceitos e opiniões sem embasamento do que a questão a respeito de as mulheres poderem, ou não, ter o mesmo desempenho profissional que os homens. Nesta seção, vamos examinar as pesquisas sobre o assunto.

A evidência sugere que, primeiramente, o mais razoável é admitir que há poucas, se é que existem, diferenças importantes entre homens e mulheres capazes de afetar seus desempenhos no trabalho. Não existe, por exemplo, qualquer diferença consistente entre homens e mulheres quanto às habilidades de resolução de problemas, capacidade de análise, espírito competitivo, motivação, sociabilidade ou capacidade de aprendizagem. Estudos psicológicos mostraram que as mulheres tendem a aceitar mais facilmente a autoridade e que os homens tendem a ser mais agressivos e a ter maior expectativa de sucesso, mas essas diferenças são mínimas. Dadas as significativas mudanças ocorridas nos últimos 35 anos em ter-mos do aumento maciço da participação feminina no mercado de trabalho e dos papéis tradicionalmente atribuídos a cada sexo, é melhor partir do pressuposto de que não existem diferenças dignas de nota entre homens e mulheres no que se refere à produtividade no trabalho.

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Mulher e Trabalho

Um aspecto que realmente parece ser diferente entre os sexos, es-pecialmente quando o funcionário tem filhos pequenos, é a preferência por esquemas de trabalho. As mães que trabalham costumam preferir em-pregos de meio período, horários mais flexíveis e a telecomutação, para poder conciliar suas responsabilidades familiares.

Glossário: Telecomutação é o trabalho no qual a ligação do empregado com a organização é substituída pela telecomunicação de forma a substituir qual-quer forma de deslocamento relativo ao serviço. Esse sistema é facilitado por ferramentas tecnológicas como por exemplo, computador, videoconferência. Pode ser eficiente e útil para empresas pois permite que os colaboradores co-muniquem-se mesmo distantes, economizando custos com viagens. Telecomu-tação é a tecnologia que permite que o funcionário trabalhe em sua residência. Com a popularização da internet de banda larga, cada vez mais trabalhadores possuem conexões de rede suficientes para interligar-se às intranets corpora-tivas. Com isso pode-se trabalhar para uma empresa mesmo sem se deslocar fisicamente para o emprego.

E o que dizer sobre o absenteísmo e a rotatividade? As mulheres têm menos estabilidade no trabalho que os homens? No caso da rotatividade, a evidência é que não há diferenças significativas. O índice de pedidos de demissão de mulheres são semelhantes aos dos homens. As pesquisas so-

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bre absenteísmo, entretanto, mostram claramente que as mulheres faltam mais ao trabalho do que os homens. A explicação mais lógica para esse re-sultado é que as pesquisas foram realizadas nos Estados Unidos. E a cul-tura norte-americana tradicionalmente coloca as responsabilidades sobre a família e o lar nos ombros das mulheres. Quando um filho está doente ou alguém precisa ficar em casa para receber o encanador, sempre é a mulher que falta ao trabalho para cuidar disso. Contudo, esta pesquisa é, indubita-velmente, datada. O papel histórico da mulher no cuidado com as crianças e como uma provedora secundária no lar mudou radicalmente na geração passada, e uma grande parcela de homens hoje está tão interessada nos assuntos domésticos e na criação dos filhos quanto as mulheres.

2.U.3UEstabiliUaUeUnoUemprego

A última característica biográfica que vamos analisar é a estabili-dade no emprego. Com exceção das diferenças entre os sexos, não existe outro tema mais sujeito a preconceitos e especulações do que a influência do tempo de casa de um funcionário sobre o seu desempenho.

Já foram feitas diversas análises sobre a relação entre tempo de serviço e produtividade. Se definirmos o tempo de serviço em termos do tempo de permanência em um mesmo emprego, podemos dizer que as evidências mais recentes indicam uma relação positiva entre esse tempo e o desempenho. Portanto, a estabilidade, entendida como experiência no emprego, parece ser uma boa indicadora da produtividade do funcionário.

As pesquisas sobre a relação entre a estabilidade no emprego e o absenteísmo são muito conclusivas. Os estudos mostram, consistentemen-te, que há uma relação inversa entre a antiguidade e o absenteísmo. Na verdade, em termos tanto de frequência de faltas quanto do total de dias não trabalhados, a estabilidade no emprego é a única variável explicativa realmente importante.

A estabilidade é também uma variável importante para explicar a rotatividade. Quanto mais tempo uma pessoa fica em um emprego, menor a probalidade de ela se demitir. Portanto, sendo coerente com a pesquisa que sugere que o comportamento passado é o melhor previsor do compor-tamento futuro, as evidências indicam que a estabilidade de um funcioná-rio em um emprego anterior é uma excelente previsão de sua rotatividade futura.

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Estabilidade e emprego

As evidências demonstram que a estabilidade e a satisfação estão positivamente relacionadas. Na verdade, quando idade cronológica e an-tiguidade no emprego são tratadas separadamente, esta última parece ser um previsor mais consistente e estável para a satisfação com o emprego.

2.2UHabiliUaUes

Segundo Robbins (2002, p. 50) “as habilidades influenciam dire-tamente o nível de desempenho e de satisfação do funcionário, por meio da adequação entre as suas habilidades e as demandas da função”. Desta forma, o bom desempenho e a satisfação do funcionário dependem da or-ganização de selecionar as pessoas com as habilidades correspondentes às exigências do cargo que ocuparão.

Corroborando com Robbins (2002), os autores Wagner III e Hollen-beck (2006, p. 34) afirmam: “os gerentes bem-sucedidos esforçam-se para colocar cada trabalhador na posição que aproveite melhor seus talentos próprios”. Ou seja, a chave do sucesso é colocar as pessoas nas funções certas.

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Habilidades Profissionais

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A psicologia constitui uma disciplina fundamental para a direção das pessoas e para a gestão das organizações. Enquanto ciência do comportamento, ela fornece maneiras de descrever, de compreender e mesmo, algumas vezes, de prever as atividades e os comportamen-tos dos administradores e dos funcionários. Além disso, ela contribui também para o aperfeiçoamento das práticas de administração ao ajudar as pessoas a encontrar sentido em seu trabalho e desenvolver habilidades interpessoais (MORIN, AUBÉ, 2009).

Segundo Robbins (2002, p.35), habilidade “refere-se à capacidade de um indivíduo em desempenhar diversas tarefas dentro de uma função. É uma avaliação daquilo que indivíduo pode fazer”. O autor descreve que as habilidades em geral são construídas sobre dois grupos de fatores:

• Habilidade Intelectual: “é aquela necessária para o desempenho das atividades mentais”.

• Habilidade Física: “é aquela necessária para a realização de ta-refas que exijam resistência, agilidade, força ou características semelhantes”.

Wagner III e Hollenbeck (2006) denominam as habilidades como capacidades ou aptidões e também as divide em físicas e cognitivas (inte-lectuais). Segundo o autor, a habilidade ou aptidão física é composta por três dimensões principais: força muscular, resistência cardiovascular e qualidade do movimento. O quadro abaixo resume estas dimensões:

1. Força Muscular• Capacidade para exercer pressão muscular contra objetos, como: puxá-los,

empurrá-los, levantá-los, carregá-los ou baixá-los.• Exercer força muscular em investidas rápidas (energia muscular)• Exercer força muscular contínua no tempo, com resistência à fadiga (resis-

tência muscular)2. Resistência Cardiovascular

• Capacidade para manter atividade física que resulte em aumento da pulsa-ção por um período prolongado.

3. Qualidade do movimento

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• Capacidade para flexionar e estender os membros do corpo para trabalhar em posições incômodas ou contorcidas

• Capacidade de manter o corpo numa posição estável e resistir às forças que provoquem perda de estabilidade (equilíbrio)

• Capacidade de movimento sequencial dos dedos, braços, pernas ou corpo para resultar em ação qualificada e coordenação.

Quadro 2: As três dimensões da aptidão física.Fonte: Hogan apud Wagner III E Hollenbeck (2006:35).

Segundo Wagner III e Hollenbeck (2006, p. 36), a aptidão cognitiva é composta por quatro dimensões principais: compreensão verbal, habili-dade quantitativa, capacidade de raciocínio e visualização espacial.

Vamos visualizar no quadro a seguir as quatro dimensões da capaci-dade cognitiva:

1. Compreensão Verbal• A capacidade de compreender e utilizar efetivamente a linguagem escrita e

falada.2. Habilidade Quantitativa• A capacidade de resolver todos os tipos de problemas com rapidez e preci-

são, inclusive adição, subtração, multiplicação e divisão, bem como de apli-car regras matemáticas.

3. Capacidade de Raciocínio• A capacidade de pensar indutiva e dedutivamente a fim de criar soluções

para problemas novos.4. Visualização Espacial• A capacidade de detectar com precisão a disposição espacial dos objetos

com relação ao próprio corpo.

Quadro 3: As quatro dimensões da capacidade cognitiva.Fonte: Nunnually apud Wagner III e Hollenbeck (2006, p.36).

Um exemplo de adequação entre as habilidades do funcionário e as exigências do cargo é a seleção de uma pessoa com habilidade quantitati-va para desempenhar a função de contador. Só para ilustrar a importância da reflexão sobre o assunto, pensem sobre a seguinte questão: como pro-vavelmente seria o desempenho e a satisfação de um indivíduo sem as ha-bilidades físicas necessárias selecionadas para trabalhar como bombeiro?

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Para identificar se um determinado indivíduo possui as habilidades necessárias para o exercício de sua função na empresa, existem vários testes tanto de aptidões físicas quanto de aptidões cognitivas que apuram com precisão as habilidades dos indivíduos.

2.3UAprenUizagem

Aprendizagem é definida por Robbins (2002, p.37) como “qualquer mudança relativamente permanente no comportamento, que ocorra como resultado de uma experiência”.

A aprendizagem envolve mudança. A mudança pode ser boa ou má do ponto de vista organizacional. As pessoas podem aprender comportamentos desfavoráveis – como apegar-se a preconceitos ou reduzir seu desempenho – bem como comportamentos favoráveis. Outra questão, a mudança precisa ser relativamente permanente. Mudanças temporárias podem ser apenas reflexivas e não representar qualquer aprendizado. Assim, o requisito de ser permanente deixa de fora mudanças comportamentais causadas por fadiga ou por adapta-ções temporárias. Num outro aspecto, a definição do autor está focada no comportamento. O aprendizado acontece quando não se reflete em seu comportamento, não é aprendizado. Finalmente, há necessidade de alguma forma de experiência para a aprendizagem. A experiência pode ser adquirida diretamente, através da observação ou prática, ou indiretamente, como pela leitura. Mas, a questão central continua: essa experiência resultou em uma mudança relativamente permanente no comportamento? Se a resposta for positiva, podemos afirmar que houve aprendizado (ROBBINS, 2002).

Muitas empresas utilizam o conhecimento sobre aprendizagem para aumentar a produtividade, reduzir erros, absenteísmo, atrasos e acidentes do seu quadro de empregados.

A seguir, serão estudadas as teorias de aprendizagem relevantes para o estudo do comportamento organizacional:

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2.3.UUTeoriaUUoUconUicionamentoUclássico

O condicionamento clássico surgiu na virada do século XX com um fisiologista animal chamado Ivan Petrovich Pavlov. A descoberta dos reflexos condicionados, que é a base desta teoria, foi descoberta aciden-talmente pelo pesquisador quando estudava as glândulas salivares de cães. Pavlov realizava cirurgia nas glândulas salivares de cães que permitia a coleta das secreções digestivas fora do corpo por meio de um tubo. Com este experimento, Pavlov observava que o cão sempre salivava quando era colocado alimento em sua boca. A grande descoberta, no entanto, ocorreu acidentalmente quando, depois de um determinado tempo de experimento, o cão passou a salivar antes mesmo da comida ser dada. Ou seja, a comida não precisava ser colocada na boca dos cães para que estes salivassem, mas bastavam ver a pessoa que costumava alimentá-los para começarem a salivar (SCHULTZ; SCHULTZ, 1981).

Para dar continuidade ao experimento, Pavlov começou a tocar uma sineta para os cães e observou que isto não provocava nenhuma salivação. Mas quando o pesquisador apresentava ao animal um pedaço de carne, a produção de saliva aumentava consideravelmente. Pavlov passou então a tocar a sineta e em seguida apresentar o pedaço de carne para os cães. Depois de repetidas vezes, o cão passou a salivar apenas com o som da sineta, sem necessariamente a apresentação da carne. Na verdade, o cão aprendeu a responder (a salivar) ao toque da sineta. Pavlov denominou a carne como estímulo não condicionado porque é um estímulo inato e o to-que da sineta como estímulo condicionado porque embora originalmente ela fosse neutra, depois de associada à carne (um estímulo não condicio-nado) passou a produzir uma resposta (salivar) diferente de quando era apresentado sozinho (ROBBINS, 2002).

Segundo Robbins (2002, p.39), o condicionamento clássico pode ser usado para explicar vários eventos na organização onde as pessoas asso-ciam um estímulo neutro a um estímulo condicionado, como o exemplo a seguir: “em uma indústria manufatureira, todas as vezes que os membros da diretoria vinham visitar as instalações da fábrica, o gerente mandava limpar os vidros e fazer uma faxina nos escritórios”. Segundo o autor, mesmo que a lavagem das janelas não tivessem nada a ver com a visita da diretoria, as pessoas haviam aprendido a associar a limpeza das janelas com a visita dos superiores.

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2.3.2UTeoriaUUoUconUicionamentoUoperante

A teoria do condicionamento operante surgiu no início do século XX com Burrhus Frederick Skinner que assume que o comportamento tende a se repetir se este conduz a uma recompensa ou evita uma punição.

Bergamini (2006, p.75) define condicionamento operante como “aprendizagem de uma resposta voluntária ao estímulo mediante as con-sequências de respostas anteriores, como, por exemplo, aprender a dirigir um automóvel”.

Segundo Schultz e Schultz (1981, p. 281), “o comportamento operante opera no ambiente do organismo”. Na teoria condicionamento clássico, por exemplo, o cão não precisa realizar coisa alguma para re-ceber alimento. No condicionamento operante é necessário que o com-portamento se concretize para que haja uma recompensa, ou seja, evitada uma punição. Robbins (2002, p. 40) corroborando com Schultz e Schultz (1981) afirma que “as pessoas deverão adotar comportamentos desejáveis se receberem reforço positivo para isso”.

Robbins (2002) nos traz alguns exemplos:• se um aluno deseja tirar boas notas (recompensa ou reforço po-

sitivo), este deve responder corretamente às questões da prova (comportamento desejável);

• se um representante de vendas deseja ganhar uma boa comis-são (recompensa ou reforço positivo), este deve gerar um gran-de volume de vendas (comportamento desejável);

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Fracasso nas Vendas

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• se um adolescente chega em casa no horário combinado com os pais (comportamento desejável), este evita ficar de castigo (evita a punição).

No entanto, se o comportamento não é reforçado, ou seja, não é re-compensado, a probabilidade que ele se repita diminui até a sua extinção. Por exemplo, “se o chefe promete a um funcionário realizar uma boa avaliação de desempenho caso ele faça horas extras em um período de muito movimento e isto não acontece, a probabilidade de este funcionário fazer horas extras quando esse chefe pedir novamente diminui” (ROBBINS, 2002, p. 40).

2.3.3UTeoriaUUaUaprenUizagemUsocial

Você já ouviu aquela frase de que é melhor aprender com os erros dos outros do que com os próprios erros? Na verdade as pessoas não só aprendem com os erros dos outros, mas também com os acertos dos ou-tros. Isso é o que diz a teoria da aprendizagem social.

Soto (2005) argumenta que a aprendizagem social é a mais com-plexa das teorias da aprendizagem e é adquirida por meio da análise da conduta de outro sujeito.

Segundo Bandura (apud Wagner III e Hollenbeck, 2006, p. 98) “a maioria das pessoas aprende comportamentos observando os outros e mo-delando os comportamentos que percebem ser eficazes”.

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Aprender com o outro

Como a teoria do condicionamento operante, a teoria da aprendiza-gem social também assume que o comportamento ocorra em função das suas consequências. No entanto, não necessariamente a pessoa tenha que passar pela experiência direta para conhecer as consequências de um de-

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terminado comportamento, mas basta simplesmente observar outra pessoa emitindo este determinado comportamento e as suas consequências. Por exemplo, se um funcionário observa que um colega de trabalho faz horas extras na empresa toda vez que seu chefe solicita e este colega for promo-vido, certamente este funcionário também fará horas extras sempre que solicitado por seu chefe visando a uma promoção.

2.3.4UMoUelagemUUoUcomportamento

Segundo Robbins (2002, p.41) a modelagem do comportamento “é realizada através do reforço sistemático de cada uma das etapas que conduzem o indivíduo para mais perto da resposta desejada”. Wagner III e Hollenbeck (2006, p. 98) descrevem o processo de modelagem como o ato de “recompensar aproximações sucessivas rumo a um comportamento desejável, de forma que chegar perto vale”.

Por exemplo, “se um funcionário que costuma chegar rotineiramen-te meia hora atrasado, chegar apenas 20 minutos, devemos reforçar essa melhoria até que ele se aproxime do comportamento desejável” (ROB-BINS, 2002, p. 40).

Robbins (2002) e Wagner III e Hollenbeck (2006) afirmam que há quatro maneiras de modelar o comportamento segundo Skinner, são elas, a saber:

• Reforço positivo: ocorre quando a consequência do comporta-mento é uma recompensa agradável, por exemplo, um vendedor bate sua cota de vendas do mês e recebe um ganho financeiro extra (comissão),

• Reforço negativo: ocorre quando a consequência do comporta-mento é a retirada de alguma coisa desagradável, por exemplo, um funcionário termina os relatórios solicitados por seu chefe no prazo combinado para evitar uma bronca.

• Punição: consiste em causar uma condição desagradável na tentativa de eliminar um comportamento indesejado. A utiliza-ção da punição para inibir o comportamento indesejado tende a funcionar apenas quando o agente punidor está por perto, por exemplo, o funcionário que é pego acessando sites de relacio-namento durante o trabalho recebe uma suspensão. A punição neste caso só funcionará caso o chefe desse funcionário estiver todo o tempo monitorando-o.

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• Extinção: eliminação de qualquer reforço que esteja mantendo um comportamento, por exemplo, funcionários de uma fábrica param de ser remunerados por número de peças produzidas, pois estão produzindo muitas peças defeituosas.

Para concluir, as empresas podem utilizar o reforço positivo, o re-forço negativo, a punição e a extinção para modelar o comportamento de seus funcionários e com isso aumentar a produtividade, reduzir erros, absenteísmo, atrasos e acidentes.

2.4UPersonaliUaUe

Robbins (2002, p. 88) descreve personalidade como sendo “a soma total das maneiras como uma pessoa reage e interage com as demais” e descreve traços de personalidade como sendo “características marcantes que podem descrever o comportamento de uma pessoa”.

Conexão: Para ampliar seus conhecimentos, leia o livro de Estelle M. e Caroline Aubé. Psicologia e Gestão. Tradução: Maria Helena C.V. Trylinski. São Paulo: Atlas, 2009. Este livro consegue transpor conceitos e elementos da psicologia humana ao contexto da gestão, oferecendo ao leitor uma visão contemporânea das articulações entre esses dois importantes campos do saber e da prática organizacional: psicologia e gestão. A obra apresenta uma verdadeira introdução aos fundamentos psicológicos do comportamento hu-mano nas situações de trabalho. A forma de abordagem empreendida pelas autoras transmite aos leitores conhecimento de base que o ajudarão a desen-volver relações sadias e produtivas para compreender melhor seu próprio comportamento e o dos outros, não apenas no ambiente de trabalho, como também na vida em geral. É um ótimo livro. Vale a pena conferir!

Wagner III e Hollenbeck (2006, p. 42) afirmam que “dado o vasto número de traços de personalidade descritos na literatura científica, preci-samos de algum tipo de esquema de classificação para entender os traços em si e suas inter-relações”. A maior parte da literatura sobre personalida-de está focada nas cinco grandes dimensões da personalidade: extrover-

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são, ajustamento emocional, afabilidade, senso de responsabilidade e inte-resse. A descrição de cada uma destas dimensões está no quadro a seguir:

1. Extroversão• Sociável, gregário (vive em bando), decidido, falante e expressivo2. Ajustamento Emocional• Emocionalmente estável, não deprimido, tranquilo, satisfeito3. Afabilidade (simpatia)• Cordial, confiante, de boa índole, tolerante, colaborador, complacente4. Senso de responsabilidade• Digno de confiança, organizado, perseverante, íntegro, empreendedor5. Interesse• Curioso, imaginativo, criativo, sensível, aberto, brincalhão

Quadro 4: As cinco dimensões da personalidadeFonte: Barrick e Mout apud Wagner III e Hollenbeck (2006, p. 41)

Várias empresas utilizam programas de mensuração da personalida-de na avaliação de desempenho, na promoção e até mesmo na seleção de empregados. A ideia é ajustar o indivíduo a um trabalho específico. Neste contexto, Robbins (2002, p. 92) descreve alguns atributos de personalida-de que influenciam o comportamento das pessoas nas organizações:

• Centro de controle: percepção de uma pessoa sobre a fonte de seu destino. As pessoas podem ser internos, ou seja, que acredi-tam controlar o próprio destino, ou externos, que acreditam que sua vida é controlada por fatores alheios a sua vontade como a sorte ou o acaso. Robbins (2002, p.92) afirma que pessoas do grupo dos externos costumam ser menos envolvidas com o trabalho, apresentam maior índice de absenteísmo e são mais alienadas quanto ao seu ambiente de trabalho do que as pessoas do grupo dos internos.

• Maquiavelismo: “grau em um indivíduo é pragmático, mantém distância emocional e acredita que os fins justificam os meios”. Robbins (2002, p.93) afirma que “para trabalhos que requerem habilidades de barganha (como as negociações trabalhistas) ou oferecem recompensas significativas pelo sucesso (como nas vendas comissionadas), os indivíduos altamente maquiavélicos serão produtivos”.

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• Autoestima: “grau em que os indivíduos gostam de si mesmo”. Robbins (2002, p. 94) afirma que indivíduos com autoestima elevada acreditam possuir a capacitação necessária para ter sucesso, aceitam desafios e são mais satisfeitos do que os indi-víduos com baixa autoestima.

• Automonitoramento: um traço de personalidade que mede a capacidade de um indivíduo em adaptar seu comportamento a uma determinada situação. Robbins (2002, p.94) afirma que “indivíduos com elevada capacidade de automonitoramento prestam mais atenção ao comportamento dos outros e são mais fáceis de adequar”.

• Propensão a assumir riscos: há pessoas que têm maior dispo-sição a correr riscos do que outras. Segundo Robbins (2002, p. 95) “uma alta propensão a correr riscos pode conduzir um cor-retor de valores a um melhor desempenho”, mas por outro lado “uma alta propensão para correr riscos pode significar um obs-táculo na carreira de um contador que trabalha com auditoria”.

• Personalidade Tipo A: “pessoa excessivamente competitiva e que parece sofrer de uma urgência crônica em obter cada vez mais coisas em cada vez menos tempo”. Segundo Robbins (2002, p. 95) este tipo de trabalhador é mais rápido, preocupa-se mais com a quantidade do que com a qualidade do seu traba-lho, raramente é criativo e baseia-se em experiências passadas quando confrontados com um problema.

• Personalidade Tipo B: contrário da personalidade tipo A, ou seja, “raramente se sente pressionado a obter número crescente ou a participar de cada vez mais eventos em um tempo cada vez menor” (ROBBINS, 2002, p. 95).

Nesta unidade, estudamos o nível individual do comportamento organizacional. Vimos como as características biográficas influenciam a produtividade, o absenteísmo, a rotatividade e a satisfação das pessoas nas organizações.

Vimos também a importância de se adequar as habilidades das pes-soas às demandas do cargo em que exercem na organização, isto é colocar a pessoa certa no lugar certo.

Estudamos quatro abordagens referentes à aprendizagem das pes-soas nas organizações: condicionamento clássico, condicionamento ope-

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rante, aprendizagem social e modelagem do comportamento. Observamos que muitas empresas utilizam o conhecimento sobre aprendizagem para aumentar a produtividade, reduzir erros, absenteísmo, atrasos e acidentes do seu quadro de empregados.

E, por último, vimos o conceito de personalidade e como esta pode influenciar o comportamento das pessoas nas organizações.

AtiviUaUes

Agora é com você. Vamos exercitar?

01. Analise os trechos abaixo e explique qual teoria da aprendizagem cada trecho representa:

a) Adriano, recém-contratado para ser vendedor de uma concessionária de automóveis, observou que um colega de trabalho havia sido demitido por não ter cumprido a cota mensal de venda de acessórios automotivos, apesar de ser considerado um dos melhores vendedores da loja. Seu che-fe argumenta que a venda de acessórios automotivos é uma diretriz da empresa e deve ser seguida. Depois de ocorrido este fato, Adriano nunca deixa de oferecer acessórios aos compradores de carros zeros. Qual teoria da aprendizagem este trecho representa? Explique sua resposta.b) Todas as vezes que o presidente de uma multinacional visita uma das filiais brasileiras, seus diretores preparam um café da manhã com todos os funcionários da empresa apesar de isto nunca ter sido solicitado ou exigido pela matriz. Qual teoria da aprendizagem este trecho representa? Explique sua resposta.c) Há três anos, a empresa X estabeleceu um programa de participação nos lucros em grupo, ou seja, se um determinado departamento cumpre a sua meta anual, seus empregados recebem uma porcentagem dos lucros da empresa no final do ano. O que se observou é que depois da implanta-ção deste programa, praticamente todos os departamentos cumpriram suas metas em todos os anos. Qual teoria da aprendizagem este trecho represen-ta? Explique sua resposta.

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02. Para cada atributo da personalidade abaixo, indique um trabalho cor-respondente:

( a ) Maquiavelismo ( )( b ) Propensão a assumir riscos ( )( c ) Personalidade B ( )

( 1 ) Vendedor de carros( 2 ) Cientista ( 3 ) Corretor da Bolsa de Valores

Justifique sua resposta.

Reflexão

Agora reflita! A partir dos conhecimentos adquiridos nesta unidade, não podemos deixar de dar a devida importância às teorias que fundamen-tam o trabalho do assistente social, bem como as contribuições da psicolo-gia organizacional. Vale a pena pensar nisso!

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LeituraURecomenUaUa

Não deixe de ler o livro Psicologia Aplicada à Administração de Empresas – Psicologia do Comportamento Organizacional, de Cecília Whitaker Berganimi. São Paulo: Atlas, 2006.

Esta obra trata dos aspectos mais relevantes e atuais do comporta-mento humano nas organizações. Parte da concepção de que as questões com que se defrontam os administradores, têm, na maioria das vezes, um nítido conteúdo humano, muito mais do que simples decorrência de pro-blemas técnicos.

No âmbito das empresas, as questões tratáveis via ciências do com-portamento seriam, assim, em número superior às que resolvam mediante simples ajustes que não envolvem o quadro de pessoal. A ação administra-tiva no que se refere às funções de planejamento e controle, sobretudo no que diz respeito às estratégias organizacionais e de direção, estaria voltada essencialmente para aspectos humanos, abrindo grande leque de aplica-ções para os conhecimentos desenvolvidos pela Psicologia Social.

A orientação desta obra fundamentou-se na preparação de um texto que procurou atender aos problemas mais representativos que envolvem a condução de pessoas diante dos desafios propostos por um ritmo sem pre-cedente de mudanças que se sucedem ininterruptamente no sentido de res-saltar a validade da aplicação da Psicologia à administração de empresas.

Referências

BERGAMINI, C.W. Psicologia Aplicada à Administração de Em-presas. Psicologia do Comportamento Organizacional. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

MORIN. E.; AUBÉ Caroline. Psicologia e Gestão. Tradução: Maria Helena C.V. Trylinski. São Paulo: Atlas, 2009.

ROBBINS, S. P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Pren-tice Hall, 2002.

SCHULTZ, D.P., SCHULTZ, S.E. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cultrix, 1981.

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SOTO, E. Comportamento Organizacional. Impacto das Emoções. São Paulo: Pioneira Thompson Learning 2005.

WAGNER III, J.A., HOLLENBECK, J.R. Comportamento Orga-nizacional. Criando Vantagem Competitiva. São Paulo: Saraiva, 2006.

NaUpróximaUuniUaUe

Na próxima, unidade estudaremos as seguintes variáveis ainda do nível individual: percepção e motivação. Fique atento e venha comigo!

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UniUa

UeU3

U Percepção e Motivação

Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade você irá estudar a percepção e

sua importância para o estudo do comportamento organizacional. Além disso, você conhecerá os fatores

que influenciam a percepção, as distorções perceptivas e os erros de julgamento, motivação e sua importância para

o estudo do comportamento organizacional e as teorias sobre motivação. Assuntos muito interessantes e importantes para sua

formação.

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar as variáveis do nível do indivíduo do estudo do compor-tamento organizacional;

• Apresentar o conceito de percepção;• Discutir as distorções perceptivas e os erros de julgamento;• Apresentar o conceito de motivação;• Discutir as principais teorias da motivação.

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Você se lembra?

Você com certeza já ouviu falar sobre percepção. Você lembra o seu significado? A percepção assume um papel relevante na aprendizagem, bem como nas relações humanas. E não podemos deixar de acrescentar que o estudo da percepção é muito importante no comportamento orga-nizacional. As pessoas veem um mesmo evento ou objeto de maneiras diferentes. Por exemplo, uma postura mais enérgica de um chefe pode ser percebida de diversas maneiras. Um subordinado pode aprovar tal postura percebendo esta postura como necessária ao funcionamento do grupo, ou-tro subordinado pode perceber esta postura como autoritária. Percebeu?

Portanto, nesta unidade será estudado qual o conceito de percepção, quais os fatores que influenciam a percepção e quais as distorções percep-tivas mais comuns e suas implicações no contexto organizacional. Vamos ver como você percebe este tema?

Por que o homem trabalha? Você já pensou sobre isso. O tema moti-vação discutirá sobre esta reflexão. Aqui será visto o conceito de motiva-ção e serão apresentadas as cinco mais importantes teorias motivacionais que discutirão por que o homem trabalha.

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3.UUPercepçãoUeUsuaUimportânciaUparaUoUestuUoUUoUcomportamentoUorganizacional

Percepção consiste na seleção, interpretação, organização e recupe-ração das informações obtidas pelos sentidos no ambiente. Estas informa-ções captadas no ambiente pelos nossos sentidos são as sensações. Desta forma, é através da percepção que um indivíduo organiza e interpreta as suas impressões sensoriais para atribuir significado ao seu meio.

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O estudo da percepção é de extrema importância porque o compor-tamento das pessoas. Cada pessoa percebe a realidade de forma única. E isso não é diferente dentro das organizações.

Segundo Robbins (2002) a percepção pode ser definida como o processo pelo qual os indivíduos organizam e interpretam suas impressões sensorias com a finalidade de dar sentido ao seu ambiente. Entretanto, o que uma pessoa percebe pode ser substancialmente diferente da realidade objetiva. Geralmente, embora não necessariamente, existe desacordo. Por exemplo, é possível que todos os funcionários de uma empresa a vejam como um excelente local para trabalhar – condições favoráveis de trabalho, de tarefas e atividades interessantes, boa remuneração, administração responsável e compreensiva – mas, como a maioria de nós sabe, é muito raro encontrar tal unanimidade. Por que a perceção é importante para o estudo do comporta-mento organizacional? Simplesmente porque o comportamento das pessoas baseia-se em sua percepção da realidade, não na realidade em si. O mundo importante para o comportamento é o mundo na forma em que é percebido.

Soto (2002, p.66), afirma que “a percepeção é importante no compor-tamento organizacional, já que costuma fazer com que diferentes pessoas tenham diferentes interpretações ou visões, inclusive contraditórias, do mes-mo fato ou pessoa”. O autor ressalta ainda que, muitas vezes, dentro de uma

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organização, os administradores e seus subordinados, colegas ou supervisores veem e descrevem a mesma situação de maneira diferente. Isso é devido a vários fatores que influenciam a percepção, os quais veremos a seguir.

3.2UFatoresUqueUinfluenciamUaUpercepção

Soto (2002, p.65) define percepção como “processo ativo de perce-ber a realidade e organizá-la em interpretações ou visões sensatas”.

Desta forma, a percepção é um processo ativo e é influenciado por nos-sa experiência passada como afirma Berstein (apud Bergamini, 2006, p.108):

“A percepção é o processo por meio do qual as sensações são inter-pretadas, usando-se o conhecimento e a compreensão do mundo, de tal forma que o transforme numa experiência significativa. Assim sendo, a percepção não é um processo passivo de simplesmente absorver e decodificar as sensações que aparecem (...) o cérebro apreende as sensações e cria um mundo coerente, frequentemente percebendo a informação que falta e usando a experiência passada para dar sentido àquilo que se vê, se ouve ou se toca”.

O ato da percepção não é influenciado apenas pela nossa experi-ência passada, mas por um conjunto de fatores que pode estar em quem percebe, no objeto ou alvo que está sendo percebido ou no contexto da situação em que a percepção é realizada. A figura abaixo ilustra os fatores que influenciam a percepção:

Percepção

a) Fatores de quem percebe:• Atitudes• Motivos• Interesses• Experiência• Expectativas

b) Fatores – “alvo”:• Novidade• Movimento• Sons• Tamanho• Antecedentes• Proximidade

c) Fatores da situação• Momento• Ambiente do trabalho• Ambiente social

Figura 1: Fatores que influem na percepção. Fonte: SOTO (2002, p.67)

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3.2.UUFatoresUUeUquemUpercebe

Quando um indivíduo olha um alvo e tenta interpretar o que ele vê, a interpretação é fortemente influenciada pelas características pessoais do indivíduo que o percebe. Robbins (2002) e Soto (2002) afirmam que entre as características pessoais mais relevantes que afetam a percepção, estão:

• Atitude: ou predisposição a agir de uma determinada maneira, pode fazer com que pessoas vejam a mesma coisa, mas inter-pretem de maneira contraditória o mesmo fato, por exemplo, duas pessoas recebem um convite para um evento festivo da empresa, uma das pessoas fica de mau humor, pois é uma pes-soa tímida e não gosta de interagir com as outras pessoas en-quanto a outra fica de bom humor porque é extrovertida e gosta de interagir com outras pessoas.

• Motivações: necessidades insatisfeitas ou motivações estimu-lam os indivíduos e podem exercer uma forte influência sobre a percepção, por exemplo, se estamos com fome provavelmente prestaremos mais atenção aos restaurantes que existem na cida-de do que quando acabamos de comer.

• Interesses: atendemos aqueles aspectos do mundo que nos ro-deia que se relacionam com os nossos interesses, por exemplo, é mais provável que um cirurgião plástico perceba um nariz imperfeito do que qualquer outra pessoa.

• Experiências passadas: em geral, as experiências passadas ser-vem para anular o interesse em um objeto, ou seja, objetos ou eventos que nunca foram experimentados são mais perceptíveis do que aqueles já conhecidos.

• Expectativas: estas podem distorcer nossa percepção, fazendo com que a gente veja aquilo que espera ver, por exemplo, espe-ra-se que um gerente de recursos humanos goste de gente.

3.2.2UFatores-alvo

Segundo Robbins (2002) e Soto (2002), as características do alvo que está sendo observado podem afetar o que é percebido, por exemplo:

• As pessoas barulhentas costumam chamar mais atenção do que as quietas (sons).

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• A intensidade, o tamanho a mudança e a repetição dos estímu-los frequentemente determinam nossa atenção.

• Objetos próximos ou parecidos tendem a ser percebidos em conjunto (proximidade).

• A relação do alvo com o cenário influencia a percepção deste (figura-fundo).

A figura representa um exemplo depredisposição individual para organizar umadada experiência: o que você vê, duas faces,

um vaso (cálice) ou ambos?

3.2.3UFatoresUUaUsituação

Segundo Robbins (2002) o contexto dentro do qual percebemos os objetos ou eventos é muito importante, pois os elementos que fazem parte deste contexto influenciam nossa percepção.

Por exemplo, “posso não reparar uma jovem de 25 anos em traje de noite e maquiagem pesada em uma boate em um sábado à noite, mas com certeza eu repararia se esta mesma jovem em traje de noite e maquiagem pesada aparecesse em uma sala de aula em uma segunda-feira de manhã. O observador e o alvo não mudaram, mas o contexto é diferente e afeta a percepção” (ROBBINS, 2002, p. 119).

3.3UAsUUistorçõesUperceptivasUeUosUerrosUUeUjulgamento

Como já descrito anteriormente, a nossa percepção do que está ao nosso redor está sujeita a uma série de distorções e ilusões que nos levam a ver as coisas e as pessoas com as quais interagimos de maneira bem di-ferente daquela que realmente são.

Bergamini (2006, p. 109), afirma que, em geral, as distorções per-ceptivas se dão através de enganos cometidos por:

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a) Estereótipos: “consiste na impressão padronizada de um grupo de pessoas para influenciar a percepção de um indivíduo em particular”. Por exemplo, a ideia de que todo adolescente é irresponsável.

b) Efeito Halo: “ocorre quando uma característica positiva ou ne-gativa de um indivíduo encobre todas as demais características que ele tem”. Por exemplo, a ideia de que o fato de alguém ser excelente no esporte lhe dê condições de ter o mesmo sucesso ao enfrentar qualquer tipo de desafio.

c) Percepção seletiva: “ocorre quando qualquer característica que faça um objeto ou pessoa sobressair venha a aumentar sua probabilidade de ser percebido”. Por exemplo, uma moça que possui um corpo exuberante não passa despercebida na rua e dificilmente se prestará atenção em algum outro atributo dela.

d) Efeito contraste: “não se avalia uma pessoa de forma isolada, isso significa que a percepção pode ser influenciada por outras pessoas anteriormente percebidas”. Por exemplo, na seleção de candidatos, contamina-se a apreciação feita sobre o candidato anterior com as características da pessoa seguinte.

e) Projeção: “ocorre quando o percebedor atribui à pessoa suas próprias características pessoais”. Por exemplo, como eu, ele é tímido, portanto, sei como se sente.

Robbins (2002, p. 122) acrescenta ainda que há alguns erros que distorcem o julgamento que fazemos em relação ao comportamento dos outros, são eles a saber:

a) Erro fundamental de atribuição: “tendência de subestimar a influência dos fatores externos e superestimar a influência dos valores internos no julgamento do comportamento alheio”. Por exemplo, “uma gerente de vendas está pronta a atribuir o fraco desempenho de seus vendedores à preguiça deles, e não ao lançamento de um produto concorrente inovador”.

b) Viés de conveniência: “tendência de as pessoas atribuírem seu próprio sucesso a fatores internos e colocarem a culpa dos seus fracassos em fatores externos”. A seguinte frase exemplifica esta tendência: só cheguei aonde cheguei devido a minha de-terminação e só não fui mais longe por falta de oportunidades.

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c) Profecia autorrealizada: “ocorre quando uma pessoa tem uma percepção distorcida de outra, e a expectativa resultante é que a segunda se comporte de maneira coerente com essa percepção”. Por exemplo, se um professor acredita que um determinado aluno seja muito in-teligente e espera que este aluno tire ótimas notas nas provas durante o ano le-tivo, certamente este aluno não decepcionará sua professora. Mas se um professor acredita que um aluno não seja esforçado e este fará o mínimo apenas para passar de ano, certamente este aluno obterá notas medianas nas provas. Ou seja, a expectativa torna-se realidade.

3.4UMotivaçãoUeUsuaUimportânciaUparaUoUestuUoUUoUcomportamentoUorganizacional

Se fosse solicitado a você para indicar uma pessoa plenamente satis-feita consigo mesma, e que acredita que já tenha conquistado tudo o que queria nesta vida, certamente você teria muita dificuldade em encontrar essa pessoa.

O ser humano em seu estado psicológico normal raramente está satisfeito consigo mesmo e sempre almeja algo que ainda não disponha. Ilustrando tal observação, Bergamini (2006, p. 137) afirma que “quando se constata a estagnação do indivíduo, já se pode levantar a suspeita de que algo não vai bem, já se pode colocar em dúvida a normalidade e o ajustamento da sua personalidade”.

A autora complementa ainda que “é, portanto, considerada como normal a ação permanente de cada ser humano, e estagnar seria o mesmo que abrir mão da vida normal de cada um” (BERGAMINI, 2006, p. 138).

Desta forma, o ser humano, em condições normais, está sempre em busca de algo como, por exemplo, saúde, conforto, bem-estar e sempre foge das condições adversas ou que ameaçam a saúde, o conforto e o bem-estar.

Conexão:

Conexão: Para ampliar seus conhecimentos, leia o capítulo

– Sensação e Percepção, cap. 3, p. 80 - do livro de Morris, Charles G. e

Maisto, Albert A. Introdução à Psicologia. Tradução Ludmilla Lima, Marina Sobreira

Duarte Baptista. 6. ed. São Paulo: Prentice Hall, 2004. É um assunto

que irá auxiliar seus estudos. Não deixe de conferir.

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Esses alvos perseguidos pelo ser humano são denominados como motivos e podem ser definidos como “necessidades, carências, interesses e desejos que impulsionam as pessoas em certas direções” (BERGAMI-NI, 2006, p. 137).

A dinâmica desta busca permanente é o que chamamos de motivação. Segundo Maximiano (2004, p. 267) “a palavra motivação deriva do

latim motivus, movere que significa mover”. A palavra indica o processo pelo qual o comportamento humano é incentivado, estimulado ou energi-zado por algum tipo de motivo ou razão. (MAXIMIANO, 2004).

A motivação corresponde ao processo psicofisiológico responsável pelo desencadeamento, pela manutenção e pela cessação de um comportamen-to, assim como pelo valor apetitivo ou aversivo conferido aos elementos do meio no qual se exerce esse comportamento. A motivação é um processo psicofisiológico que depende das atividades do sistema nervoso tanto quan-to das atividades cognitivas. Da perspectiva da neurofisiologia, a motiva-ção é a variável responsável pelas flutuações do nível de ativação, isto é, depende do grau de dispersão ou de vigília de uma pessoa. Da perspectiva da psicologia, a motivação corresponde às forças que são a causa de com-portamentos orientados para um objetivo, forças que permitem manter esses comportamentos até que o objetivo visado seja atingido. Nesse sentido, a motivação garante a energia de que uma pessoa necessita para agir em seu ambiente (MORIN; AUBÉ, 2009).

Já Robbins (2002, p. 152) define o conceito de motivação como “processo responsável pela intensidade, direção e persistência dos esfor-ços de uma pessoa em relação ao alcance de uma determinada meta”.

A definição dos três elementos da motivação (intensidade, direção e persistência) descritos por Robbins (2002) está resumida no quadro abaixo:

Direção: o objetivo do comportamento motivadoIntensidade: força dos motivosPermanência: o tempo durante o qual a motivação se manifesta

Quadro 1: Os elementos da motivação.Fonte: Adaptado de MAXIMIANO (2002, p. 268).

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O conceito de motivação é amplamente explorado em estudos en-volvendo o comportamento humano nas organizações. Segundo Bergami-ni (2006), o estudo da motivação pode ser aplicado a todos os campos da atividade humana e é, em especial, aquele reservado às organizações que muitos pesquisadores dedicaram grande parte dos seus esforços no senti-do de poder entender que objetivos motivacionais são mais frequentemen-te procurados no trabalho.

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Motivação nas Organizações

Em Maximiano (2004, p. 269), a motivação para o trabalho é defi-nida como “um estado psicológico de disposição, interesse, ou vontade de perseguir ou realizar uma tarefa ou meta” Segundo o autor, a motivação para o trabalho é resultante de uma interação entre os motivos internos das pessoas e os estímulos da situação ou ambiente. A figura abaixo de Maxi-miano (2004, p. 269) ilustra tal observação:

Motivos Internos:necessidade, aptidões,valores e outros

Motivos Externos:estímulos ou incentivosdo ambiente

Motivação

Figura 2: A motivação é resultante de uma interação de motivos complexos, internos e externos.

Fonte: MAXIMIANO (2004:269).

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3.4.UUTeoriasUsobreUMotivação

Há várias teorias que buscam entender quais objetivos motivacio-nais as pessoas buscam no trabalho. Mais diretamente, essas teorias bus-cam descobrir por que o homem trabalha. A seguir, serão demonstradas as principais teorias motivacionais.

3.4.U.UUHierarquiaUUasUnecessiUaUesUUeUMaslow

Em 1948, o pesquisador Abraham Maslow desenvolveu uma teoria sobre motivação que propõe a seguinte hierarquização dos motivos huma-nos:

“Em primeiro nível o pesquisador coloca a busca pela satisfação das necessidades corporais ou fisiológicas tais como fome e sede, no segundo nível coloca a busca do atendimento das necessidades de segurança tais como abrigo e proteção, no terceiro nível coloca os incentivos sociais tais como amizade e aceitação pelo grupo que, uma vez satisfeitos, precedem os dois últimos níveis que são o do-mínio do conhecimento e autoestima tais como o reconhecimento e o status social e, o último nível que consiste no atendimento das necessidades de autorrealização”

BERGAMINI, 2006, p. 147).

Maslow assinalou ainda que à medida que um indivíduo vá satisfa-zendo cada um desses níveis de necessidades, a motivação movimenta-se ao nível de necessidades imediatamente superior com o propósito de satisfazê-las (SOTO, 2002).

A figura a seguir ilustra a teoria de Maslow e exemplifica a busca pela satisfação das necessidades no contexto organizacional:

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Autorrealização

Estima

Sociais

Segurança

Fisiológicas

– trabalho criativo e desafiante– diversidade de tarefas e autonomia– participação nas decisões

– responsabilidade por resultados– reconhecimento e orgulho– oportunidade de promoção

– amizade dos colegas– espírito de equipe– executivo amigável

– condições seguras de trabalho– remuneração e benefícios– estabilidade no emprego

– intervalos de descanço– conforto físico– horário de trabalho flexivel

Figura 3: A hierarquia das necessidades humanas e os meios de satisfação.Fonte: CHIAVENATO (2005, p.218).

Para concluir, portanto, pode-se afirmar que segundo a teoria da hie-rarquia das necessidades de Maslow, a motivação do indivíduo dependerá de sua carência naquele momento. É importante, desta forma, a organiza-ção conhecer quais são as necessidades que estão em jogo para um deter-minado indivíduo em um determinado momento.

3.4.U.2UTeoriaUUeUMcGregor

Douglas McGregor desenvolveu sua teoria motivacional a partir de uma postura crítica à filosofia administrativa. McGregor considerava manipuladora e coercitiva a postura das empresas para com seus empre-gados.

Neste contexto, McGregor propõe em sua teoria que “cada indivíduo por si mesmo é capaz de comprometer-se com seu autodesenvolvimento no trabalho, sem que haja a necessidade de coação externa e quando isto não ocorre, o problema certamente está na própria organização e não no indivíduo” (BERGAMINI, 2006, p. 150).

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McGregor propõe ainda duas visões distintas e contrárias do ser hu-mano: uma baseada no ponto de vista convencional da tarefa administrati-va que detém uma visão negativa da natureza humana denominada como Teoria X e, outra baseada em sua teoria motivacional que detém uma vi-são positiva da natureza humana denominada como Teoria Y.

Robbins (2002, p. 153), no quadro abaixo, resume as premissas da Teoria X e da Teoria Y de McGregor:

Teoria X Teoria Y

• Os funcionários, por natureza não gostam de trabalhar e, sempre que possível, tentarão evitar o trabalho

• Os funcionários podem achar o trabalho algo tão natural quanto descansar e se divertir

• Como eles não gostam de trabalhar, precisam ser coagidos, controlados ou ameaçados com punições para que atinjam as metas

• As pessoas demonstrarão auto-orientação e autocontrole se es-tiverem comprometidas com os objetivos

• Os funcionários evitam responsabili-dades e buscam orientação sempre que possível

• As pessoas, na média, podem aprender a aceitar, ou até buscar, a responsabilidade.

• A maioria dos trabalhadores colo-cam a segurança acima de todos os fatores associados ao trabalho e mostram pouca ambição.

• A capacidade de tomar decisões inovadoras pode estar em qualquer pessoa, não sendo um privilégio exclusivo daquelas em posições hierárquicas mais altas.

Quadro 2: Teoria X versus Teoria Y de Mc GregorFonte: Adaptado de ROBBINS (2002, p.153)

Robbins (2002) descreve as implicações motivacionais da análise de McGregor associando esta teoria à hierarquia das necessidades de Mas-low. O autor afirma que a Teoria X assume que as necessidades de nível baixo, tais como as necessidades fisiológicas e de segurança dominam o indivíduo e, a Teoria Y assume que são as necessidades de nível alto, tais como as necessidades sociais, de estima e autorrealização que dominam.

3.4.U.3UTeoriaUUosUUoisUfatores

A teoria dos dois fatores foi desenvolvida por Frederick Herzberg e nasceu do seu interesse em pesquisar, diretamente no contexto de traba-lho, quais os fatores que se acham relacionados com a satisfação e aqueles

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que determinam a insatisfação no ambiente de trabalho (BERGAMINI, 2006).

O pesquisador esperava que se um objetivo motivacional quando atingido traz a satisfação, então a sua inexistência deveria trazer a insatis-fação. E, da mesma forma, se alguém se sente insatisfeito pela inexistên-cia de algum fator motivacional, o oferecimento do mesmo deveria trazer satisfação. No entanto, não foi o que Herzberg concluiu ao analisar os re-sultados de sua pesquisa (BERGAMINI, 2006).

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As conclusões de Herzberg ao analisar os dados de sua pesquisa se-gundo Bergamini (2006, p. 154) foram:

“Há fatores que, quando estão presentes, proporcionam alto nível de satisfação, mas a insatisfação determinada por sua ausência não chega a ser significativamente proporcional – são os fatores que foram denominados motivacionais. Diferentemente, há fatores que, quando estão ausentes, proporcionam grande insatisfação, mas a sua presença não traz o mesmo nível percentual de satisfação – são os fatores que Herzberg chamou de higiênicos”.

Chiavenato (2005, p. 224-225) descreve os fatores higiênicos e mo-tivacionais como:

• Fatores higiênicos: “também denominados fatores extrínsecos ou fatores ambientais, pois estão localizados no ambiente, abrangem as condições dentro das quais as pessoas trabalham e apenas evitam a insatisfação, mas não provocam a satisfação. Os principais fatores higiênicos são: o salário, os benefícios so-

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ciais, o tipo de gerência que as pessoas recebem, as condições físicas e ambientais de trabalho, as políticas de diretrizes da empresa, o clima organizacional e os regulamentos internos”.

• Fatores motivacionais: “também denominados fatores intrín-secos, pois estão relacionados com aquilo que a pessoa faz e desempenha e envolvem os sentimentos de crescimento individual, de reconhecimento profissional e as necessidades de autorrealização”. Quando os fatores motivacionais estão presentes, eles elevam a satisfação das pessoas no trabalho. O quadro a seguir exemplifica os fatores higiênicos e os fatores motivacionais:

Fatores motivacionais Fatores higiênicosConteúdo do cargo (Como a pessoa se sente em relação ao cargo)

Contexto do cargo (Como a pessoa se sente em relação à empresa)

• O trabalho em si mesmo

• Realização pessoal

• Reconhecimento do trabalho

• Progresso profissional

• Responsabilidade

• Autonomia e independência

• Valorização do que faz

• Orgulho do que faz

• Condições físicas e psicológicas de trabalho

• Salários e prêmios de produção

• Benefícios e serviços sociais

• Cultura organizacional

• Estilo de gestão do executivo

• Políticas da empresa

• Ambiente de trabalho

Quadro 3: Fatores motivacionais e os fatores higiênicos Fonte: Chiavenato (2005, p.226).

3.4.U.4UTeoriaUUaUequiUaUe

A teoria da equidade afirma que “os indivíduos comparam as entra-das e os resultados de seu trabalho com aqueles de outros funcionários, e respondem de maneira a eliminar qualquer injustiça” (ROBBINS, 2002, p. 165).

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A figura a seguir ilustra a relação de contribuições e recompensas e a comparação que os indivíduos fazem com os demais:

Recompensas individuaisversus

Recompensas dos outrosontribuições individuais Contribuições dos outros

Comparação = PercepçãoRec. individuais/Cont. individuais < Rec. dos outros/Cont. dos outros = sub-recompensado

Rec. individuais/Cont. individuais = Rec. dos outros/Cont. dos outros = equidade

Rec. individuais/Cont. individuais > Rec. dos outros/Cont. dos outros = super-recompensadoFigura 4: Teoria da Equidade

Fonte: Robbins (2002, p.165).

3.4.U.5UTeoriaUUaUexpectativa

Robbins (2002, p. 167) afirma que a teoria da expectativa sustenta que “a força da tendência para agir de uma determinada maneira depende da força da expectativa de que a ação trará certo resultado, e da atração que este resultado exerce sobre o indivíduo”. A figura a seguir ilustra a teoria da expectativa:

• Esforçoindividual

• Recompensaorganizacionais

Relação 1 Relação 3

• Desempenhoindividual • metas pessoais

Objetivo FinalRelação 2

Relação 1: Relação esforço-desempenho Relação 2: Relação desempenho-recompensa

Relação 3: Relação recompensa-metas pessoas

Figura 5 - Teoria da expectativaFonte: Robbins (2002, 167).

Segundo Robbins (2002, p. 167), a teoria da expectativa enfoca três relações:

1. Relação esforço-desempenho: “probabilidade percebida pelo indivíduo de que certa quantidade de esforço vai levar ao de-sempenho”;

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2. Relação desempenho-recompensa: “grau em que o indivíduo acredita que um determinado nível de desempenho vai levar à obtenção de um resultado que se deseja”;

3. Relação recompensa-metas pessoais: “grau em que as recom-pensas organizacionais satisfazem as metais pessoais ou as necessidades do indivíduo, e a atração que estas recompensas potenciais exercem sobre ele”.

Robbins (2002) resume a teoria da ex-pectativa da seguinte forma: Em termos mais práticos, esta teoria sugere que um funcionário se sente motivado a des-pender um alto grau de esforço quando acredita que isto vai resultar em uma boa avaliação de desempenho, que a boa avaliação vai resultar em recompen-sas organizacionais, tais como bonifica-ção, aumento de salário ou promoção, e que estas recompensas vão atender a suas metas pessoais.

AtiviUaUe

01. Assista ao filme O Náufrago, direção de Robert Zemeckis, ano 2000, gênero Drama e depois, identifique as cinco categorias de necessidades de Maslow.

Sinopse: Chuck Noland (Tom Hanks) é um inspetor da Federal Express (FedEx), multinacional encarregada de enviar cargas e corres-pondências, que tem por função checar vários escritórios da empresa pelo planeta. Porém, em uma de suas costumeiras viagens, ocorre um acidente, que o deixa preso em uma ilha completamente deserta por 4 anos. Com sua noiva (Helen Hunt) e seus amigos imaginando que ele morrera no acidente, Chuck precisa lutar para sobreviver, tanto fisicamente quanto emocionalmente, a fim de que um dia consiga retornar à civilização.

02. Leia o artigo de Cristiane Carlis Nakamura; Josiane C. Fortunato, Lú-cia Maria Rosa, Rodrigo Marçal, Thais A. A. Pereira, Daniel Freitas Bar-bosa. Motivação no Trabalho. Maringa Management: Revista de Ciências

Conexão:

Para ampliar seus conheci-mentos, leia o capítulo - Motivação

e Emoção, cap. 8, p. 261 - do livro de Morris, Charles G. e Maisto, Albert A. In-trodução à Psicologia. Tradução Ludmilla Lima, Marina Sobreira Duarte Baptista. 6. ed. São Paulo: Prentice Hall, 2004.

É muito interessante e irá comple-mentar seus estudos nesta

temática. Vale a pena conferir.

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Empresariais, v. 2, n.1, p. 20-25, jan./jun. 2005, e discuta a seguinte afir-mação: “Ninguém motiva ninguém”. Você pode encontrá-lo no seguinte endereço: www.ibmex.com.br/artigos/Motivacao_no_trabalho.pdf. Vale a pena. Você tem muito a aprender.

Reflexão

Vimos porque o estudo da percepção é importante já que o compor-tamento das pessoas é baseado na interpretação que fazem da realidade e não na realidade em si. Além disso, cada pessoa percebe a realidade de forma única. E isso não é diferente dentro das organizações.

A motivação também é um conceito importante e consideramos ser algo inato ao ser humano. Foram estudadas também várias teorias que buscam entender quais objetivos motivacionais as pessoas buscam no tra-balho. Em suma, procuramos entender por que o homem trabalha.

Agora reflita! A partir dos conhecimentos adquiridos nesta unidade não podemos deixar de pensar na relevância da percepção e nas teorias motivacionais que podem fundamentar e influenciar a sua formação. Você considera que estas teorias modificam o comportamento organizacional? Vale a pena pensar nisso!

LeituraURecomenUaUa

Leia o livro Motivação nas Organizações de Cecília W. Bergamini, 5 ed. São Paulo: Atlas, 2008. Nesta obra, buscou-se comprovar por que promessas de prêmios ou ameaças de punições podem comprometer peri-gosamente o bom desempenho das pessoas no trabalho, bem como gerar problemas à continuidade e à eficácia nos negócios.

No mundo globalizado e em perpétua mudança, cada vez mais o potencial produtivo de cada pessoa representa o diferencial entre as em-presas. Esse diferencial só existe caso se possa contar com pessoas ver-dadeiramente motivadas. A motivação das pessoas é, dessa forma, mais valiosa para as empresas do que para essas próprias pessoas que precisam trabalhar, quer estejam motivadas ou não. Portanto, é preciso guiar-se por novos parâmetros e reformular velhos paradigmas na administração do potencial energético representado pela busca da satisfação motivacional. A motivação depende tão somente da pessoa e do trabalho que faz, não daquelas coisas que cercam esse trabalho.

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Referências

CHIAVENATO, I. Gerenciando com as pessoas. Transformando o executivo em um excelente gestor de pessoas. 3 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

MAXIMIANO, A.C.A. Introdução à Administração. 6 ed. São Pau-lo: Atlas, 2004.

MORIN, E. M; AUBÉ, C. Psicologia e Gestão. Tradução Maria Hele-na C.V. Trylinski. São Paulo: Atlas, 2009.

BERGAMINI, C.W. Psicologia Aplicada à Administração de Em-presas. Psicologia do Comportamento Organizacional. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prenti-ce Hall, 2002.

SOTO, E. Comportamento Organizacional. Impacto das Emoções. São Paulo: Pioneira Thompson Learning, 2005.

NaUpróximaUuniUaUe

Na próxima unidade, estudaremos o nível do grupo de estudo do comportamento organizacional, mais especificamente falando de Grupo e Equipes. É um assunto muito importante e irá complementar os estudos realizados nesta unidade. Fique atento!

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UniUa

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Grupos e Equipes

Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade, você irá estudar o nível do gru-

po de estudo do comportamento organizacional, a saber, Grupo e Equipe. Os assuntos desenvolvidos

serão: definição e classificação de grupos, modelo de desenvolvimento de grupo, estrutura do grupo, pensamento

grupal, equipe, desenvolvimento de equipes e equipes de alta performance. Temáticas muito interessantes que irão contribuir

muito para a sua prática profissional.

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar as variáveis do nível do grupo do estudo do comporta-mento organizacional;

• Discutir sobre os principais aspectos que compõem gerenciamento do comportamento dos grupos no trabalho;

• Compreender os principais aspectos que compõem o gerenciamento de equipes.

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Você se lembra?Você com certeza já ouvir falar sobre o que é uma organização. Você

já parou para pensar que toda organização é um sistema social, formado primariamente por pessoas, sentimentos, interesses e motivações? Esses aspectos são articulados não só individualmente como também coletiva-mente (ROBBINS, 2002).

Na unidade anterior, você aprendeu sobre os fundamentos do com-portamento individual no trabalho e sobre como este pode influenciar o desempenho da organização. Agora neste capítulo, você estudará sobre o comportamento coletivo e suas implicações no mundo empresarial.

Para começar a nossa discussão, vale lembrar que comportamento coletivo dentro de uma organização é explicitado pela ação dos grupos e das equipes que constituem a empresa.

Mas você considera que o estudo dos grupos e equipes é importan-te? Vamos refletir juntos?

Uma das grandes contribuições da Escola das Relações Humanas foi a descoberta do fator psicológico, ou seja, a constatação de que o de-sempenho das pessoas depende essencialmente dos fatores emocionais e comportamentais – como por exemplo, bom tratamento, reconhecimento pelo trabalho realizado, relacionamento amigável com a gerência e com os colegas de trabalho – do que dos fatores do ambiente físico – ilumina-ção, ruído, limpeza, etc (MAXIMIANO, 2006).

Dentro deste contexto, podemos inferir que o grupo influencia o comportamento individual, já que as pessoas são motivadas pela necessi-dade de “pertencerem” a um grupo e de ter o seu comportamento “aprova-do” pelos seus membros. Muitas vezes essa necessidade de identificação com o grupo é tão forte que o comprometimento em relação à gerência fica em segundo plano.

Então, uma das formas de aumentar o nível de produtividade de uma organização é investir na integração social e no desenvolvimento de uma ligação forte entre o grupo e a organização. Entendeu?

Vamos estudar agora sobre os grupos e as equipes? Cada um desses aspectos será detalhado nos itens subsequentes.

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4.UUDefiniçãoUeUclassificaçãoUUeUgrupos

As pessoas se reúnem em grupos por diversos motivos (ROBBINS, 2002):

• Segurança: reduzir a insegurança de “se sentir só”, criando for-ças para enfrentar as ameaças;

• Status: ser incluído em um grupo pode ser visto como algo importante para o indivíduo, na medida em que o grupo propor-ciona reconhecimento para seus membros;

• Autoestima: os grupos podem dar a seus membros uma sensa-ção de valor próprio na medida em que a filiação faz com que seus membros se valorizem entre si;

• Associação: os grupos podem satisfazer necessidades sociais; • Poder: muitos objetivos só são possíveis de serem alcançados

através da ação grupal; e • Alcance de Metas: há ocasiões em que é preciso mais de uma

pessoa para realizar uma determinada tarefa, em função da necessidade de diferentes talentos, conhecimentos ou poderes para que uma meta seja atingida.

Mas como podemos definir um grupo?

Grupo pode ser definido como a reunião de dois ou mais indiví-duos, interdependentes e interativos, que se juntam, visando à obten-ção de um determinado objetivo (ROBBINS, 2002).

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De acordo com Maximiano (2006), os grupos podem se formar de maneira espontânea (grupos informais) ou por decisão da organização (grupos formais).

Geralmente os grupos informais nascem dentro dos grupos formais, devido à proximidade física, à semelhança social, à identidade de inte-resses e aos problemas similares que todos enfrentam. (MAXIMIANO, 2006).

Nos grupos formais, o comportamento das pessoas é estabelecido em função das metas e objetivos organizacionais, podendo ser organiza-dos em duas formas distintas (ROBBINS, 2002):

• Grupos de comando: composto por pessoas que se reportam diretamente a um executivo;

• Grupos de tarefa: formados por pessoas que se juntam para executar determinada tarefa.

Já os grupos informais podem ser classificados em duas categorias (ROBBINS, 2005):

• Grupos de interesse: reúne pessoas em torno de um objetivo comum não relacionado à organização, como por exemplo, gostar do mesmo esporte ou de um mesmo conjunto musical; e

• Grupos de amizade: formado em função das características co-muns entre seus membros e da afinidade existente entre eles.

Em uma organização, há grupos formais e informais (MAXIMIA-NO, 2006). Normalmente, os grupos informais nascem dentro dos grupos formais, devido à proximidade física, à semelhança social, à identidade de interesses e aos problemas similares que todos enfrentam (RIBEIRO, 2006).

4.U.UUMoUeloUUeUUesenvolvimentoUUeUgrupo

Além de conhecer os motivos que levam à formação dos grupos, é interessante também entender o processo de desenvolvimento dos mes-mos, a fim de que a empresa possa implantar ações gerenciais que auxi-liem na sua otimização.

Os grupos geralmente passam por uma sequência padronizada em sua evolução, que é denominada de Modelo de Cinco Estágios de Desen-volvimento do Grupo (ROBBINS, 2002):

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• Formação: é caracterizado por uma grande dose de incerteza sobre os propósitos do grupo, sua estrutura e sua liderança. Os membros estão testando o terreno para descobrir quais os com-portamentos aceitáveis no grupo. Este estágio termina quando os membros começam a pensar em si mesmos como parte do grupo;

• Tormenta: fase em que ocorrem conflitos dentro do grupo. Os membros aceitam a existência do grupo, mas mostram resistên-cia aos limites impostos à individualidade. Há também conflito sobre quem controlará o grupo. Ao final deste estágio, haverá uma hierarquia de liderança relativamente clara;

• Relacionamento: são desenvolvidos relacionamentos mais pró-ximos entre os membros e o grupo passa a demonstrar coesão. Existe agora um forte sentido de identidade grupal e de cama-radagem. Este estágio de normalização se completa quando a estrutura do grupo se solidifica e ele assimila um conjunto de valores que define qual deve ser o comportamento correto de seus membros;

• Desempenho: a estrutura do grupo é totalmente funcional e aceita. A energia do grupo transferiu-se do esforço de conhecer e compreender uns aos outros para o desempenho da tarefa que deve ser realizada; e

• Interrupção: a tarefa foi cumprida e o grupo se decompõe. Esta fase não serve para os grupos permanentes de trabalho, somente para os grupos temporários, como comissões, equipes, forças-tarefa e similares.

Para cada uma das fases de desenvolvimento, a empresa pode im-plantar ações gerenciais que auxiliem no fortalecimento dos grupos e na otimização do trabalho executado por seus membros.

Mas como o gestor pode formar um grupo que seja coeso e cujo tra-balho agregue valor à organização?

Uma técnica bastante utilizada para auxiliar os gestores nesse sen-tido é a sociometria, que busca, através da aplicação de questionários e realização de entrevistas descobrir de quem as pessoas gostam ou não, e com quem elas gostariam ou não de trabalhar. Os dados levantados são sintetizados em um mapa – o sociograma – que mostra graficamente as interações preferidas. Com base nessas informações, o gestor pode formar

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grupos com maior probabilidade de seus membros trabalharem de forma mais coesa (DESSLER, 2003).

E qual a vantagem de uma organização possuir grupos coesos?Quando as relações interpessoais entre os membros de um grupo

são fortes, a comunicação se torna mais eficiente, reduzindo o nível de falhas e conflitos (RIBEIRO, 2006).

Os conflitos e lutas pelo poder tornam a participação em um grupo menos atraente, e os empregados têm maior probabilidade de sair. Assim, pode-se dizer que a composição do grupo pode ser um importante previ-sor da rotatividade!

Além disso, quando as relações interpessoais são fortes, cria-se um senso de identidade entre os membros do grupo, já que eles compartilham de valores e ideias comuns, tornando a convivência muito mais fácil e comprometimento para alcançar metas comuns (DESSLER, 2003).

4.U.2UEstruturaUUeUgrupo

Todos os grupos possuem normas – padrões aceitáveis de comporta-mento que são compartilhados pelos seus membros. As normas sinalizam aos membros do grupo o que deve ou não ser feito em determinadas cir-cunstâncias. As normas são importantes porque (ROBBINS, 2005):

• Facilitam a sobrevivência do grupo;• Aumentam a previsibilidade do comportamento de seus mem-

bros;• Reduzem problemas interpessoais embaraçosos; e• Permitem que os membros expressem os valores centrais do

grupo e esclareçam o que é diferenciado sobre a identidade dele.

Diversos fatores estruturais do grupo mostram ter relação com o desem-penho. Entre os mais destacados, encontramos a percepção do papel, as normas, as injustiças de status, tamanho do grupo, seu perfil demográfico, a tarefa do grupo e a coesão. Existe uma relação positiva entre a percep-ção do papel e a avaliação de desempenho do funcionário. O grau de congruência entre o chefe e seu subordinado em relação à percepção do trabalho influencia a maneira como ele vai ter seu desempenho julgado. Se a percepção que o funcionário tem de seu trabalho corresponde às

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Dentro deste contexto, vale também lembrar que existem evidências consideráveis de que os grupos exercem forte pressão sobre os indivíduos para mudar suas atitudes e comportamento para conformarem-se aos pa-drões e normas estabelecidas (MAXIMIANO, 2006).

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Estrutura de grupo

Outro ponto a destacar quando falamos em grupo é o status, que pode ser definido como a posição social atribuída a um grupo ou mem-bros de um grupo por outras pessoas. Quanto maior o status de um grupo, maior é o prestígio desfrutado pelos seus membros e maior a liberdade para os membros se desviarem das normas estabelecidas (ROBBINS, 2005). Esta descoberta explica porque muitos atletas famosos, estrelas de cinema, vendedores extraordinários ou acadêmicos respeitados parecem livres das exigências de aparência e normas sociais.

expectativas que o chefe tem de seu papel, ele terá uma boa avaliação de desempenho. As normas controlam o comportamento dos membros do grupo, estabelecendo padrões do que é certo e errado. Se o gestor conhece as normas de determinado grupo, poderá explicar o comportamento de seus membros. Quando essas normas valorizam resultados de nível elevado, os executivos podem esperar desempenhos individuais bem melhores do que quando as normas do grupo visam restringir os resultados. Da mesma forma, as normas que sustentam comportamentos antissociais aumentam a probabilidade de que os funcionários se envolvam em atividades desviantes (ROBBINS, 2002).

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Finalizando este item, todo grupo possui um líder, que influencia fortemente o pensamento e as atitudes dos membros do grupo. Por outro lado, cada elemento do grupo possui um papel a ser desempenhado (MA-XIMIANO, 2006).

4.U.3UPensamentoUgrupal

O pensamento grupal descreve as situações em que pressões para a conformidade impedem que o grupo avalie criticamente propostas in-comuns, minoritárias ou impopulares. Esse fenômeno ocorre quando os membros do grupo estão tão preocupados em conseguir a unanimidade que as normas em relação ao consenso passam por cima da avaliação re-alista das alternativas de ação e da possibilidade de expressão dos pontos de vista desviantes, minoritários ou impopulares (DESSLER, 2003).

É importante destacar que as injustiças em relação ao status geram frus-trações e podem influenciar negativamente a produtividade e a disposição do funcionário em se manter na organização. Entre os indivíduos mais sen-síveis às injustiças, a incongruência pode levar a uma redução da motivação e a uma busca intensa por uma maneira de restabelecer a justiça (por exem-plo, procurando outro emprego). Além disso, como as pessoas de menor status tendem a participar menos, os grupos com diferenças muito grandes de status entre os membros podem inibir a participação de alguns e preju-dicar o desempenho. O impacto do tamanho do grupo em seu desempenho depende da tarefa a ser realizada. Os grupos maiores são mais eficazes para tarefas de levantamento de informações. Os menores são mais eficazes para tarefas de grandes, deve-se procurar estabelecer medidas para o desempe-nho individual dentro do grupo. A coesão pode ter uma função importante ao influenciar o nível de produtividade do grupo. Se a influência vai ou não acontecer, depende das normas do grupo em relação ao desempenho. (RO-BBINS, 2002).

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Pensamento Grupal

Isto descreve uma deterioração da eficiência mental do indivíduo, seu senso de realidade e de julgamento moral como resultado da pressão do grupo. Os membros do grupo racionalizam quais-quer resistências às suas premissas. Os membros exercem pressões diretas sobre aqueles que expressem dúvidas mo-mentâneas. Aqueles membros que têm pontos de vista diferentes tentam evitar desviar-se do que parece ser o consenso do grupo, ficando calados. Parece haver uma ilusão de unanimidade (ROBBINS, 2002).

4.2UEquipe

Em relação ao comportamento coletivo, o grande desafio de uma organização é transformar os grupos em equipes.

Mas qual a diferença entre grupo e equipe?A equipe pode ser conceituada como um grupo em que os esforços

individuais resultam em um nível de desempenho maior do que a soma das entradas individuais. Organizadas apenas em grupos, os esforços não são coordenados entre si, não havendo sinergia entre as pessoas para o alcance das metas e objetivos (ROBBINS, 2002).

Há diversos tipos de equipes encontradas na literatura (DAVIS; NEWSTRON, 1992):

Conexão:

Para aprofundar seus estudos, leia o capítulo – Fun-

damentos do comportamento em grupo, cap. 8, p. 185-205 – do livro de ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prentice Hall, 2002. É muito interessante e

irá complementar seus estudos nesta temática. Vale a pena

conferir.

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• Solução de problemas: grupos do mesmo departamento que se reúnem para discutir como melhorar a qualidade, a eficiência e as condições do ambiente de trabalho;

• Autogerenciadas: grupos que realizam atividades interdepen-dentes e assumem as responsabilidades de seus antigos supe-riores;

• Multifuncionais: funcionários do mesmo nível hierárquico, mas de diferentes setores, que se juntam para cumprir uma tarefa; e

• Virtuais: grupos que usam a tecnologia de informação para reu-nir seus membros de forma que possam alcançar um objetivo em comum.

4.2.UUDesenvolvimentoUUeUEquipes

Muitas organizações acreditam que a formação de uma equipe é uma resolução milagrosa para qualquer tipo de dificuldade empresarial, ficando sua utilização banalizada e deturpada (ARAÚJO, 2001).

A razão para o fracasso do trabalho em equipe em muitas empresas é o comportamento apresentado pelos seus membros. Muitas vezes não há cooperação entre os membros na realização das atividades para o cum-primento das metas. Há casos em que falta um gerenciamento eficaz do trabalho realizado pelos membros (ATTADIA, 2007).

No verdadeiro trabalho em equipe, embora os membros possam trabalhar em posições fixas, deve haver um esforço para cobrir os com-panheiros, ajustando-se as forças e fraquezas da equipe ao contexto da organização. Os membros têm que ser treinados juntos para ajustarem-se mutuamente. Há também necessidade de flexibilidade com respeito ao trabalho e desempenho individual (DRUCKER, 1995).

Segundo Robbins (2002) existem alguns autores que não poupam esfor-ços em defender a ideia da criação de equipes eficazes. Os componentes básicos para a criação de equipes eficazes podem ser resumidos em qua-tro categorias gerais. A primeira seria o projeto do trabalho que engloba: autonomia; variedade de habilidades; identidade de tarefas; significância das tarefas. A segunda diz respeito à composição da equipe que seria: ha-bilidades dos membros; personalidade; alocação de papéis; diversidade; tamanho da equipe; flexibilidade e preferência dos membros. A terceira se

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4.2.2UEquipesUUeUaltaUperformance

Vale destacar que as empresas contemporâneas precisam de equipes capazes de atuar em ambientes turbulentos e de produzir resultados que gerem vantagens competitivas efetivas (MORGAN, 2000).

Um dos caminhos para atender a essa demanda é a formação de equipes autogeridas, também conhecidas por equipes de alta performance (ARAÚJO, 2001). A autogestão consiste na autonomia completa de uma equipe para executar um projeto ou para administrar um empreendimento (CURY, 2000).

Para isso um dos elementos fundamentais é a descentralização de autoridade (MAXIMIANO, 2006). O processo de descentralização pode ser conceituado como a delegação de poder e autoridade, tendo como contrapartida o respectivo aumento do nível de responsabilidade (DAFT, 2005).

No contexto das equipes autogeridas, a descentralização consiste em uma filosofia gerencial que visa libertar os seus membros do estreito con-trole e dependência dos altos centros de decisão, gerando como resultado uma força de trabalho diferenciada em termos de competências, altamente motivada para produzir resultados, com liberdade para programar e dirigir suas próprias atividades, e preparada para assumir responsabilidade e ris-cos (CURY, 2000).

refere aos recursos e outras influências contextuais: recursos adequados; liderança; clima de confiança e avaliação de desempenho e sistemas de recompensas. Finalmente, as variáveis do processo refletem o que acontece na equipe de modo a influenciar sua eficácia. Apesar de todas as colocações anteriores, tenha em mente duas precauções. A primeira é que as equipes diferem quanto a sua forma e estrutura. É preciso ter cuidado de não aplicar rigidamente esses princípios a toda e qualquer equipe. Os componentes bá-sicos devem ser usados como um roteiro, não como uma prescrição rígida. A segunda cautela que deve ter é que o modelo parte da premissa de que as equipes são sempre preferíveis ao trabalho individual. A criação de uma equipe eficaz em uma situação em que o trabalho seria melhor realizado por um indivíduo equivale a resolver a perfeição do problema errado.

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Atualmente as empresas têm utilizado o empowerment como mé-todo de descentralização de poder e autoridade para equipes autogeridas. O método parte do princípio de que os colaboradores são verdadeiros elementos geradores da competitividade empresarial, incentivando o comprometimento entre os membros, por meio de um processo de criação de vínculos profundos entre os objetivos empresariais e os objetivos dos membros da equipe (ARAÚJO, 2001).

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Equipes de Alta Performance

No entanto, é importante ressaltar que para beneficiar-se da ferra-menta, a empresa precisa estar preparada culturalmente para aplicá-la adequadamente (ROBBINS, 2002). No caso das equipes autogeridas são requisitos fundamentais para o sucesso do empowerment (MAXIMIA-NO, 2006):

• O aprimoramento da comunicação dentro da equipe é funda-mental para o bom andamento dos trabalhos;

• Interação entre os membros da equipe, bem como com outras equipes, é fundamental para a troca de experiências e resolução otimizada de problemas;

• Necessidade de clareza e conhecimento por parte de todos os integrantes da equipe das tarefas necessárias para realizar os objetivos;

• Intercâmbio de papéis entre os integrantes na realização das tarefas, deixando-os multifuncionais e polivalentes;

• Os papéis de liderança podem ser desempenhados por diferentes pessoas e também são intercambiáveis. Quem é líder num mo-mento, pode ser liderado em outro, dependendo da situação;

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• As funções de apoio à operação ou objetivo principal estão em-butidas na própria equipe: controle de qualidade, manutenção, suprimentos, apoio administrativo;

• A equipe deve dispor de todas as informações necessárias para lastrear o processo decisório; e

• A equipe tem autonomia para tomar as decisões que afetam a organização e realização das tarefas: distribuição e intercâmbio de tarefas, com-pensação de faltas, planeja-mento de férias, requisição de materiais e serviços, seleção, treinamento e transferências de pessoal.

AtiviUaUe

01. Os grupos podem ser formais e informais. Os grupos informais são compostos pelos laços de amizade e não estão submetidos às estruturas organizacionais. Dentro das organizações, existem alguns tipos de grupo e estes definem as formas como as atividades serão realizadas. Um grupo de comando é determinado pelo ____________________________ da orga-nização.a) organograma b) diretor da organizaçãoc) supervisor do grupod) pelo próprio grupo

02. A coordenação do curso de Serviço Social de uma determinada insti-tuição está estruturando um grupo de pesquisa sobre Empreendedorismo. A ideia é que esse grupo, dentro das várias linhas de pesquisa definidas, aumente a produção científica do curso e preste assessoria a microem-presários que queiram abrir seu próprio negócio. O grupo já conseguiu um espaço dentro dessa instituição, bem como computadores para rea-lizar suas atividades. As reuniões têm ocorrido uma vez por semana. Até o momento, o grupo não estabeleceu as metas individuais de produção científica de cada membro, nem definiu a programação de atendimento ao

Conexão:

Para aprofundar seus estudos, leia o capítulo - Compre-

endendo as equipes de trabalho, cap. 9, p. 211-226 – do livro de ROBBINS,

S.P Comportamento Organizacional. São Paulo: Prentice Hall, 2002. É uma leitura

muito relevante para sua formação. Não deixe de ler.

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público. Alguns membros apresentam limitação de tempo de dedicação às atividades do grupo enquanto outros querem maior envolvimento. Além disso, não há uma definição clara das responsabilidades de cada membro, nem da estrutura hierárquica. Na verdade, não há uma liderança clara en-tre os membros. De acordo com seus conhecimentos sobre os estágios de desenvolvimento dos grupos, qual o nível de desenvolvimento do grupo de pesquisa sobre Empreendedorismo dessa instituição?a) formaçãob) tormentac) normalizaçãod) desempenhoe) interrupção

03. Compare os conceitos de grupo de comando, tarefa, interesse e amizade.

04. Leia as sentenças abaixo e assinale a alternativa correta de acordo com seus conhecimentos sobre trabalho em equipe:

As equipes autogerenciadas assumem as responsabilidades de seus antigos chefes I

As equipes multifuncionais realizam tarefas de diferentes naturezas num determinado departamento II

Nas equipes eficazes, as responsabilidades são coletivas, uma vez que não são definidos os papéis dos participantes III

As equipes eficazes possuem um propósito comum que é traduzido em termos de metas de desempenho específicas, mensuráveis e realistas IV

O sistema de recompensas de uma equipe eficaz deve ser competitivo para garantir o alcance das metas V

a) As sentenças I e II são verdadeiras.b) As senteças II e III são verdadeiras.c) As sentenças I e IV são verdadeiras.d) As sentenças I e III são falsas.e) As sentenças IV e V são falsas.

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05. Compare os conceitos de grupos de comando, de tarefa, de interesse e de amizade.

06. Descreva o modelo de cinco estágios de desenvolvimento do grupo.

07. As equipes não geram conflitos? Os conflitos não são uma coisa ruim? Por que, então, os executivos devem apoiar o conceito de equipe?

Reflexão

Agora reflita! Você concorda que o comportamento coletivo corres-ponde ao comportamento dos grupos e das equipes? Além de conhecer os motivos que levam à formação dos grupos, é interessante também enten-der o processo de formação dos mesmos, a fim de que a empresa possa implantar ações gerenciais que auxiliem na otimização do processo, mini-mizando os pontos de gargalo e na obtenção de melhores resultados.

Você acredita que as equipes são grupos que trabalham de forma sinérgica e, quando autogeridas, constituem-se em uma força de trabalho diferenciada em termos de competências, altamente motivada para produ-zir resultados, com liberdade para programar e dirigir suas próprias ati-vidades e preparada para assumir responsabilidade e riscos? Pense nisso, pois essas reflexões irão ampliar sua maneira de enxergar o mundo.

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LeiturasURecomenUaUas

Para aprofundar seus estudos, leia o capítulo – Os Pequenos Gru-pos: trabalhar em equipe, cap. 8, p. 303 – 336 – MORIN, E. M; AUBÉ, C. Psicologia e Gestão. Tradução Maria Helena C.V. Trylinski. São Paulo: Atlas, 2009. É muito interessante. Vale a pena conferir!

Consulte também os sites abaixo, e você encontrará artigos interes-santes para aprofundamento dos estudos:

www.rausp.usp.brwww.rae.com.br

LeituraURecomenUaUa

Para aprofundar seus estudos leia o texto abaixo: Transformando indivíduos em membros de equipe. Texto disponível em: ROB-BINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prentice Hall, 2002.

Mas muitas pessoas não se encaminham naturalmente para o trabalho em equipe. Elas são do tipo solitário, ou pessoas que preferem ser reconhecidas por suas realizações individuais. Existe também um grande número de organizações que, historicamente, alimentam rea-lizações pessoais. Elas criaram um ambiente de trabalho competitivo, no qual apenas os fortes sobrevivem.

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Se essas empresas adotarem o trabalho em equipe, o que fazer com os funcionários egoístas e egocêntricos que criaram? Os países

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diferem em termos do valor que atribuem ao individualismo e ao coletivismo. As equipes se ajustam melhor a culturas coletivistas. O que acontece se uma organização tenta implantar o trabalho em equipe em uma população de trabalhadores nascidos e criados em uma sociedade altamente individualista? Como tão bem colocou um autor ao descrever o papel das equipes nos Estados Unidos: “Os norte-americanos não cresceram aprendendo a funcionar em equipe. Na escola, nunca recebemos um boletim do grupo, nem aprendemos o nome dos marinheiros da tripulação de Cristóvão Colombo. Essa limitação valeria também para países como Canadá, Inglaterra, Austrália e outros que têm sociedades altamente indivi-dualistas.

O desafioO sucesso do funcionário não é mais definido em termos de seu de-sempenho individual. Para ter um bom desempenho como membro de uma equipe, a pessoa precisa ser capaz de se comunicar aberta e honestamente, confrontar diferenças e resolver conflitos, bem como sublimar suas metas pessoais para o bem do grupo. Para muitos funcionários, esta é uma tarefa difícil – quando não impossível. O desafio de criar membros de equipes é maior quando: a) a cultura vigente é altamente individualista e; b) as equipes estão sendo intro-duzidas em uma organização que sempre valorizou as realizações individuais. Isto descreve as dificuldades enfrentadas, por exemplo, pelos dirigentes de empresas como AT&T, Ford, Motorola e outras grandes organizações nos Estados Unidos. Estas empresas prospe-raram contratando e recompensando estrelas do mundo empresarial e criaram um clima competitivo que estimulava as conquistas e o reconhecimento individuais. Os funcionários destas organizações podem ficar abalados com uma súbita mudança que valorize o tra-balho em equipe. Um funcionário veterano de uma grande empresa, que fez sucesso trabalhando sozinho, descreve sua experiência de integrar-se a uma equipe da seguinte forma: “Estou aprendendo mi-nha lição. Acabo de obter minha primeira avaliação de desempenho negativa em 20 anos de carreira”.Por outro lado, o desafio enfrentado pelos executivos é menor quando a implantação de equipes ocorre em culturas nas quais os

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funcionários possuem fortes valores coletivistas – como no Japão ou no México –, ou em organizações novas, que utilizam equipes desde o início de sua estrutura de trabalho. A Saturn Corp., por exemplo, é uma subsidiária norte-ameircana da General Motors. A empresa foi projetada para funcionar com equipes desde o seu nas-cimento. Todos os contratados pela Saturn sabiam, desde o início, que iriam trabalhar em equipes. A capacidade de ser um bom mem-bro de equipe era uma qualificação básica para a contratação.

Modelando os membros da equipeAs opções básicas que os executivos têm para tentar transformar indivíduos em membros de equipes vêm resumidas a seguir.

SeleçãoAlgumas pessoas já possuem habilidades interpessoais para ser membros eficazes de equipes. Quando se contratam membros de equipes, além das habilidades técnicas requeridas pelo trabalho, deve-se assegurar que eles tenham condições de desempenhar seus papéis no grupo.Muitos candidatos não possuem habilidades para trabalhar em equipe. Isso é especialmente verdadeiro para aqueles habituados às contribuições individuais. Quando encontram esse tipo de candida-to, os executivos têm três opções básicas. O candidato pode passar por um treinamento para se transformar em membro de equipe. Se isso não for possível, ou não funcionar, as duas outras opções são: transferi-lo para uma outra unidade da empresa que não trabalhe em equipe (caso exista) ou não contratá-lo. Nas organizações já existentes e que estão se reestruturando para o trabalho em equipe, pode-se esperar que alguns funcionários resistam a essa mudança e nem sequer possam ser treinados. Infelizmente, esses indivíduos acabam se tornando vítimas fatais da abordagem de equipes.

Treinamento Em uma visão mais otimista, uma grande parcela das pessoas habi-tuadas aos valores individuais pode ser treinada para se transformar em membros de equipes. Especialistas em treinamento conduzem exercícios que permitem aos funcionários experimentar a satis-

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fação que a equipe de trabalho pode proporcionar. Geralmente, isso é feito através de workshops para ajudar os funcionários a aprimorar suas habilidades de resolução de problemas, comunica-ção, negociação, administração de conflitos e gerenciamento. Os funcionários aprendem também o modelo de cinco estágios de de-senvolvimento do grupo. Na Verizon, por exemplo, o treinamento enfoca o processo de passagem da equipe pelos vários estágios até a sua consolidação. E durante todo o tempo os funcionários são lembrados da importância da paciência, pois as equipes levam mais tempo para tomar decisões do que os funcionários que trabalham individualmente.

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No Estado de Missouri, a Speciality Motor Division, da Emer-son Electric, obteve um notável sucesso ao conseguir que os 650 membros de seu quadro de pessoal não apenas aceitassem, mas recebessem com entusiasmo o treinamento para trabalhar em equi-pe. Foram trazidos consultores externos para ajudar a desenvolver habilidades práticas para o trabalho em equipe. Menos de um ano depois, os funcionários haviam aceitado entusiasticamente o valor do trabalho em equipe.

Recompensas O sistema de recompensas precisa ser reformulado para estimular os esforços cooperativos, em vez dos competitivos. Por exemplo, a Hallmark Cards instituiu um bônus anual para o alcance das metas de equipe, juntamente com seu sistema de incentivos individuais. A Trigon Blue Cross Blue Shield mudou seu sistema para recom-pensar qualquer diferença entre as metas individuais e os compor-tamentos de equipe.

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Referências

ARAÚJO, L. Organização, sistemas e métodos e as modernas ferramentas de gestão organizacional: arquitetura, benchmarking, empowerment, gestão pela qualidade total, reengenharia. São Paulo: Atlas, 2001.

ATTADIA, L. C. L. Diagnóstico do nível de capacitação gerencial das micro e pequenas empresas: um estudo multicasos no setor mo-veleiro de São José do Rio Preto. São Paulo, 2007. Tese (Doutorado em Administração) - Programa de Pós-Graduação em Administração. Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA). Uni-versidade de São Paulo (USP). 277p.

CURY, A. Organização e métodos: uma visão holística. São Paulo: Atlas, 2000.

DAFT, R. Administração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

As promoções, os aumentos de salário e outras formas de reco-nhecimento devem ser dados aos indivíduos por sua eficácia como membros colaborativos das equipes. Isso não significa que se deva ignorar a contribuição individual; ela deve ser equilibrada com as contribuições para o bem da equipe. Exemplos de comportamentos que devem ser recompensados são o treinamento de novos colegas, o compartilhamento de informações, o auxílio para resolver conflitos e o desenvolvimento de novas habilidades necessárias à equipe.Por último, não devemos esquecer: as recompensas intrínsecas que os funcionários podem receber da própria equipe de trabalho. As equipes oferecem a camaradagem. É estimulante e gratificante fazer parte de uma equipe de sucesso. A oportunidade de se engajar em seu desen-volvimento pessoal e ajudar os colegas da equipe a crescer pode ser uma experiência muito gratificante e recompensadora para os funcio-nários.

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DAVIS, K; NEWSTROM, J. Comportamento Humano no Trabalho. São Paulo: Pioneira, 1992.

DESSLER, G. Administração de Recursos Humanos. 2 ed. São Pau-lo: Prentice Hall, 2003.

DRUCKER, P. Administração em tempos de grandes mudanças. São Paulo: Thomson Learning, 1995.

MAXIMIANO, A.C.A. Introdução à Administração. 6 ed. São Pau-lo: Atlas, 2004.

MAXIMIANO, A. Teoria geral da administração: da revolução ur-bana à revolução digital. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

MORGAN, G. Imagens da organização. São Paulo: Atlas, 2000.

RIBEIRO, A. L. de. Gestão de pessoas. São Paulo: Saraiva, 2006.

ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prenti-ce Hall, 2002.

ROBBINS, S.P. Administração: mudanças e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2005.

NaUpróximaUuniUaUe

Na próxima unidade, iremos continuar a estudar o nível do grupo de estudo do comportamento organizacional, só que agora veremos Lideran-ça e Comunicação. É uma leitura importante e irá aprofundar os estudos realizados nesta unidade. Fique atento!

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UniUa

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Liderança e Comunicação

Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade, você irá estudar liderança, teo-

rias de liderança, liderança estratégica, comunica-ção e comunicação organizacional. Assuntos muito

importantes para sua formação. Além disso, você poderá fazer relações com as outras unidades. O que você acha de

discutir cada um desses aspectos?

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar as variáveis do nível do grupo do estudo do compor-

tamento organizacional;• Apresentar os principais aspectos e teorias que permeiam o conceito de liderança;

• Discutir sobre liderança do ponto de vista estratégico;• Mostrar a importância do processo de comunicação no exercício da

liderança.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Você se lembra?Você com certeza já ouviu falar de liderança nas organizações. Você

acredita que os líderes conseguem induzir as pessoas a realizar certos objetivos e alcançar determinadas metas, não só por meio dos poderes formais (GIL, 2001), mas também, pelo seu carisma e influência pessoal? (MARRAS, 2000).

Na prática, encontrar líderes não é fácil. Um recente estudo da con-sultoria McKinsey, envolvendo 400 altos executivos e 6.500 gerentes de 56 grandes empresas de todo o mundo apresentou dados reveladores: 7% dos entrevistados disseram que suas empresas têm líderes suficientemente preparados para oportunidades e desafios do futuro, e 75% dos entrevis-tados afirmaram que seus chefes brecam o aprendizado e atrapalham o desenvolvimento dos talentos na organização. Esse estudo também ressal-tou que companhias com estratégias de desenvolvimento de talentos e de lideranças têm, em média, um retorno sobre investimentos 22% superior às demais (VASSALO, 2003).

Outra pesquisa, desenvolvida pela Fundação Dom Cabral, confirma que as organizações que vêm trabalhando na formação de líderes têm apresentado melhorias significativas no desempenho: as empresas anali-sadas apresentaram 87% de aumento na produtividade, 74% de redução de custos, 79% de melhoria no clima organizacional, 57% de aumento na rentabilidade e 50% de elevação na receita (LACERDA, 2006).

Embora investir em liderança pareça uma estratégia viável para a competitividade das organizações, observa-se que ainda não há caminhos concretos para o desenvolvimento da capacidade de liderança de uma or-ganização.

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5.UULiUerança

Ao longo do tempo, o conceito de liderança sofreu uma série de al-terações à medida que o próprio conceito de administração evoluiu. Esse fato pode ser ilustrado tomando como base as escolas da administração, que marcam as mudanças de paradigma dentro desta área de conhecimento.

Na escola clássica, a organização era vista como um sistema técnico e o papel do gerente era dirigir o trabalho dos subordinados (MAXIMIA-NO, 2006). Dentro desse contexto, a liderança estava relacionada à auto-ridade formal e baseada, muitas vezes, no uso do poder coercitivo para alcançar os resultados desejados (DAFT, 2005).

No entanto, o trabalho pioneiro de autores como Mary Parker Fol-let, Chester Barnard e Kurt Lewin começou a apontar que o conceito de liderança era mais amplo do que o vigente na escola clássica. Mary Parker Follet, ao desenvolver um estudo sobre as necessidades do indivíduo no trabalho, concluiu que a coordenação ao invés da coerção seria mais ade-quada à administração das organizações. Chester Barnard, ao destacar a natureza cooperativa das organizações, ressaltou a importância do papel do executivo como elo entre os propósitos da organização e o esforço dos indivíduos no trabalho (MAXIMIANO, 2006).

Os resultados do trabalho desses autores foram fundamentais para a consolidação da chamada escola comportamental da administração, onde a organização passa a ser vista como um sistema social, e a relação amigável dos colaboradores com os respectivos gerentes torna-se um dos aspectos fundamentais para o desempenho adequado no trabalho e, con-sequentemente para a produtividade das organizações (MAXIMIANO, 2006). É no berço desta escola que temas como liderança e motivação são definitivamente incorporadas ao escopo papel do gerente (GIL, 2001).

Outro aspecto importante na discussão do conceito de liderança, é o fato de esta capacidade estar, necessariamente, vinculada à aceitação espontânea do líder pelo grupo. Sem liderados não há liderança efetiva (ROBBINS, 2002).

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ImportanteO líder é um instrumento do

grupo, por isso, quem quiser can-didatar-se a posições de liderança deve aprender a sintonizar-se com os problemas e interesses e moti-vações dos colaboradores.

(DAVIS, NEWSTROM, 1992)

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A crença de que a experiência é um bom indicador da eficácia da lide-rança é bastante forte e amplamente aceita. Infelizmente, a experiência por si só, não é um bom indicador da eficácia da liderança. As empresas procuram cuidadosamente candidatos para os cargos mais altos com base em suas experiências. Da mesma forma, as empresas exigem vários anos de experiência. Obviamente, a administração acredita que a experiência é um dado importante. Mas a evidência não corrobora com esta crença. Estudos comprovam que os executivos mais experientes não são mais eficazes do que aqueles com pouca experiência. Uma das falhas na lógica do “a experi-ência é que conta” é o pressuposto de que o tempo passado em uma mesma função seja uma medida válida de experiência. O fato de uma pessoa estar na mesma função há 20 anos e outra há apenas dois não significa, necessa-riamente, que a primeira seja dez vezes mais experiente que a última. Um segundo problema é que existe uma variabilidade entre as situações que influencia a transferência e a relevância das experiências. A situação em que a experiência foi obtida dificilmente será comparável à nova situação enfrentada. O trabalho, os recursos alocados, a cultura organizacional e as características dos liderados diferem. Por isso, uma outra razão pela qual a experiência não é um bom indicador de capacidade de liderança é dada, sem dúvida, pela variabilidade das situações enfrentadas pelo líder. (ROBBINS, 2002).]

5.2UTeoriasUUeULiUerança

Vamos agora discutir sobre as diversas teorias de liderança.

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5.2.UUTeoriaUUosUtraços

Durante muito tempo a liderança foi considerada uma característica pessoal inata e o líder considerado uma pessoa “diferenciada” das outras por meio de seus traços de personalidade (CERTO, 2003).

Assim, uma das primeiras teorias sobre liderança consistia em estu-dar a personalidade da figura do líder, tentando entender quais comporta-mentos, traços e atitudes eram determinantes na eficácia de seu desempe-nho (GIL, 2001).

Essa teoria, denominada abordagem dos traços, deu origem a uma série de pesquisas, baseadas em biografias e em incidentes críticos, que tentavam identificar os traços de personalidade comuns aos “grandes líde-res” (MAXIMIANO, 2006).

Nesse sentido, Gil (2001) destaca seis características básicas: vi-são orientadora, paixão, integridade, confiança, curiosidade e ousadia. Robbins (2002) ressalta a ambição e energia, o desejo de liderar, a hones-tidade e integridade, a autoconfiança, a inteligência, a flexibilidade e os conhecimentos relevantes para o trabalho. Já Maximiano (2006) ressalta a iniciativa, a facilidade de relacionamento pessoal e o senso de identidade pessoal.

Infelizmente, as pesquisas fundamentadas na teoria dos traços não foram conclusivas, ou seja, a presença de qualquer das características de liderança identificadas em uma pessoa não é garantia para tornar-se um líder (LACOMBE; HEILBORN, 2003).

Além disso, a abordagem dos traços apresenta pelo menos quatro limitações (ROBBINS, 2002):

– não existe nenhum traço universal que possa prever a liderança em qualquer situação;– os traços tornam-se mais aparentes em situações “fracas” do que em situações “fortes”, ou seja, em contextos onde não há normas comportamentais rígidas e ausência de incentivos a determinados tipos de comportamento, podendo os líderes ex-pressar suas tendências inatas. Assim, a capacidade de prever a liderança por meio da teoria dos traços torna-se limitada;– as evidências são pouco claras quanto à separação de causa e efeito; e– os traços funcionam melhor para prever o surgimento da lide-rança do que para distinguir entre líderes eficazes e ineficazes.

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Se a teoria dos traços tivesse sido comprovada, teria proporcionado uma base científica para a seleção das pessoas “certas” para assumir deter-minadas posições formais de liderança (DAFT, 2005).

Mesmo não tendo nenhum valor efetivamente científico, essa teoria ainda é bastante explorada por algumas empresas para vender livros e trei-namentos, e também por certos “candidatos a líder” que desejam ver sua imagem projetada na mídia (MOTTA, 2004).

Embora a teoria dos traços não seja capaz de identificar um líder, ela contribui para a discussão da influência do perfil do líder no desempenho da empresa (ROBBINS, 2002).

5.2.2UAborUagemUUoUcomportamento

Quando ficou claro que a eficácia dos líderes não estava ligada aos traços, a liderança passou a ser vista como um papel interpessoal que qualquer pessoa pode desempenhar (MAXIMIANO, 2006) e como uma habilidade a ser aprendida pela experiência ou por meio da educação e do treinamento (CERTO, 2003).

A teoria que dá sustentação a essa visão de liderança é denominada Abordagem do Comportamento (GIL, 2001). Em essência, essa teoria procurou identificar os determinantes críticos do comportamento dos lí-deres, a fim de não só possibilitar à organização treinar as pessoas para a liderança, como também, permitir a elaboração de programas para im-plantar padrões comportamentais nos indivíduos que desejassem se tornar líderes eficazes (ROBBINS, 2002).

Como resultado das pesquisas realizadas sob esta abordagem, tem-se o estabelecimento de uma série de classificações acerca dos estilos de liderança.

Há dois estilos básicos de liderança identificados desde a antiguida-de: autocracia e democracia. Na autocracia, o líder concentra o poder de decisão em suas mãos. A utilização desse estilo de forma patológica leva à tirania, ou seja, ao abuso do poder. Na democracia, o líder permite a parti-cipação dos liderados na tomada de decisão (MAXIMIANO, 2006).

Essa forma de classificação do estilo de liderança foi bastante utili-zada durante longo tempo pelas organizações, pois se encaixava com a vi-são da escola clássica e da escola das relações humanas, respectivamente (GIL, 2001).

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Seguindo esta ideia, Kurt Lewin identificou três tipos de liderança distintos nas organizações em relação ao uso do poder e da autoridade: a liderança autoritária, a liderança democrática e a liderança liberal (MAXI-MIANO, 2006). O quadro abaixo sintetiza esses estilos.

Aspecto Estilo de liderança

Uso da autori-dade e poder

• Estilo autocrático: O líder fixa as diretrizes, toma as deci-sões, sem qualquer participação do grupo. Cabem aos fun-cionários operacionalizar as tarefas. O líder é dominador.

• Estilo democrático: O líder estimula e orienta o debate sobre os objetivos e decisões a serem tomadas. Quem decide é o grupo. O grupo debate as tarefas e o líder aconselha e dá orien-tação para que o grupo decida. O líder procura ser um orientador da equipe, baseando as críticas e elogios em fatos.

• Estilo liberal: O grupo tem total liberdade para definir objeti-vos, tomar decisões e dividir tarefas. O líder assume o papel de membro do grupo e atua somente quando é solicitado

Quadro 1: Estilos de liderança quanto ao uso do poder e da autoridadeFonte Adaptada: Attadia (2007)

As pesquisas científicas sobre o assunto avançaram, no final dos anos 40, procurando identificar os padrões de liderança que resultassem em desempenho eficaz (GIL, 2001).

Dentro deste contexto, foram identificados dois comportamentos de liderança distintos: orientação para a produção/tarefas e orientação para as pessoas (ROBBINS, 2002).

O primeiro comportamento refere-se a líderes que tendem a enfa-tizar os aspectos técnicos e práticos do trabalho. O segundo compreende líderes que enfatizam as relações interpessoais (MAXIMIANO, 2006).

O quadro a seguir faz um resumo dos estilos de liderança, levando em conta o tipo de comportamento adotado.

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Aspecto Estilos de liderança

Comportamento do Líder

• Orientado para tarefas: os líderes com este comporta-mento tendem a enfatizar os aspectos técnicos e práticos do trabalho, enfatizam a preocupação com a realização das tarefas e o alcance das metas, bem como, o cumprimento de prazos, do orçamento e dos padrões de qualidade;

• Orientado para pessoas: enfatizam as relações interpes-soais; demonstrando interesse pessoal nas necessidades de seus funcionários e aceitando as diferenças entre os membros do grupo. Caracteriza também, o estilo do líder que busca valorizar o desenvolvimento de sua equipe.

• Orientado para o desenvolvimento: valorizam a expe-rimentação, buscam novas ideias, geram e implementam mudanças.

Quadro 2: Estilos de liderança quanto ao tipo de comportamento adotado pelo líderFonte Adaptada: Attadia (2007)

Acreditando que os estilos de liderança já definidos não represen-tavam a realidade dos dias atuais, pesquisadores na Finlândia e na Suécia identificaram um novo estilo, orientado para o desenvolvimento, cuja principal característica é a capacidade de adaptar-se rapidamente às mu-danças do ambiente (DAFT, 2005).

As pesquisas acerca desse estilo confirmam sua existência como uma dimensão separada e independente das demais, e apontam que os líderes que exibem esse tipo de comportamento contribuem para a maior satisfação dos funcionários e são vistos como mais competentes (ROB-BINS, 2002).

Depois de tudo o que já aprendemos, fica a pergunta: existe um esti-lo de liderança melhor que outro?

A abordagem comportamental produziu uma série de variáveis que impactam no desempenho do líder, mas não há um estilo que possa ser definido como o padrão a ser seguido.

5.2.3ULiUerançaUsituacional

Embora a teoria dos traços e a abordagem do comportamento te-nham sua relevância para a ampliação dos conhecimentos sobre a capa-

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cidade de liderança, observa-se que nenhuma delas foi capaz de prever o sucesso da liderança (DAFT, 2005).

Assim, os pesquisadores sobre o assunto passaram a levar em con-ta a influência do ambiente no sucesso da liderança (ROBBINS, 2002), passando a uma visão muito mais complexa do tema (GIL, 2001). A essa nova abordagem deu-se o nome de Liderança Situacional (MAXIMIA-NO,2006).

Este conceito destaca que o estilo do líder deve ajustar-se à situação. Vários autores tentaram elucidar esta questão identificando os fatores si-tuacionais que influenciavam a capacidade de liderança, criando diversos modelos para lidar com essas variáveis situacionais (LACOMBE; HEIL-BORN, 2003).

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Um dos modelos mais conhecidos é o de Fiedler que identifica três fatores situacionais básicos que determinam a eficácia da liderança (RO-BBINS, 2002):

• Relação entre líder e liderados: o grau de confiança, credibili-dade e respeito que os membros do grupo têm em seu líder. A medida utilizada para esta dimensão é se a relação entre líder e liderado é boa ou ruim;

• Estrutura da tarefa: o grau de procedimentos estabelecidos no trabalho, ou seja, se as tarefas são estruturadas ou não estrutu-radas. A medida utilizada para este aspecto é se a estrutura da tarefa é alta ou baixa; e

• Poder da Posição: está relacionada com o nível de autoridade do cargo ocupado pelo líder na organização e o grau de influ-ência que ele líder tem sobre as variáveis de poder (legítimo,

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recompensa, punição). A medida utilizada para esta variável é se o poder da posição é forte ou fraco.

Outra teoria a ser destacada é a do Recurso Cognitivo, que ressalta a influência do estresse no papel de liderança e discute como a inteligência e a experiência de um líder afetam sua reação ao estresse (MAXIMIANO, 2006).

A essência dessa teoria destaca que o estresse é inimigo da racio-nalidade, sendo difícil para o líder pensar lógica e analiticamente quando está sob forte tensão (ROBBINS, 2002).

O modelo de Hersey-Blanchard elege como critério relevante de avaliação da situação a maturidade do subordinado, sendo que quanto maior o nível de maturidade menor deve ser o uso da autoridade pelo líder (GIL, 2001).

O respectivo modelo baseia-se na lógica de que os líderes podem compensar as limitações motivacionais e de capacitação de seus segui-dores e para isso identifica quatro comportamentos específicos de líderes, indo do mais diretivo ao mais liberal, que devem ser adotados em função da capacidade e da motivação dos liderados (ROBBINS, 2002).

Como ponto forte, este modelo destaca o reconhecimento da com-petência e da motivação do liderado como elementos críticos do processo de liderança. Como ponto fraco, destaca-se o fato de que a maturidade é um conceito subjetivo e dinâmico, sendo difícil de mensurá-la. (MAXI-MIANO, 2006).

Uma quarta teoria a ser comentada é a Teoria da Troca entre Líder e Liderado, que basicamente se diferencia das demais por argumentar que todo líder age de maneira não homogênea em relação aos membros de sua equipe, tratando melhor o grupo mais próximo a ele (ROBBINS, 2002).

A Teoria da Meta e do Caminho propõe que uma das funções de um líder eficaz é ajudar os subordinados no alcance de suas metas, fornecendo orientação e o apoio necessário para assegurar que tais metas sejam com-patíveis com os objetivos da organização (DAFT, 2005). Para isso, identi-fica duas classes de variáveis contingenciais que moderam a relação entre o comportamento do líder e os resultados obtidos (ROBBINS, 2002):

• Variáveis ambientais: a estrutura da tarefa, o sistema formal de autoridade e o grupo de trabalho; e

• Características pessoais do funcionário: centro de controle, experiência e capacidade percebida. Esses aspectos pessoais

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determinam como o ambiente e o comportamento do líder são interpretados pelos liderados.

De acordo com essa teoria, o comportamento do líder será eficaz quando o líder oferecer qualquer coisa que falte ao liderado ou ao ambien-te de trabalho, podendo assumir quatro tipos de comportamentos, depen-dendo da situação: líder diretivo, apoiador, líder participativo e orientado para a conquista (ROBBINS, 2002).

Nota-se que as teorias situacionais estudadas enfatizam especial-mente o papel dos liderados, mas não levam em conta se eles aceitam ou não a figura do líder, sendo este um aspecto negativo dessas teorias (ATTADIA, 2007). Com base nas teorias estudadas, o quadro 3 faz uma síntese dos fatores situacionais de liderança.

Aspecto Fatores situacionais da liderança

• Estrutura da tarefa • pouco estruturada x muito estruturada• pouco complexa x muito complexa

• Relação entre líder e liderado

• confiança x desconfiança• relação boa x relação ruim

• Poder da posição

• poder legítimo: autoridade originada pela posição administrativa formal ocupada. Quanto mais alto na hierarquia da empresa, maior é esse poder.

• poder de recompensa: origina-se da autoridade de outorgar recompensas a outras pessoas, a fim de influenciar o comportamento dos subordinados. Essas recompensas podem ser formais, como au-mentos de salários ou promoções, ou ainda, infor-mais como louvor, atenção e reconhecimento.

• poder de coerção: refere-se à autoridade de punir os subordinados, em função de comportamentos indesejados pela empresa.

• Nível de estresse no trabalho

• alta tensão• média tensão• baixa tensão

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• Tratamento dispen-sado pelo líder aos

liderados

• grupo de dentro: favoritos do líder que têm toda a confiança, recebem uma parcela desproporcional de atenção do líder e costumam ser alvo de privilé-gios especiais

• grupo externo: que recebem menos tempo do líder, menos recompensas controladas por ele e seu relacionamento se baseia nas interações formais de autoridade

• Nível de maturidade dos liderados

• liderados incapazes ou desmotivados a executar uma tarefa: o líder deve fornecer orientações cla-ras e específicas.

• liderados incapazes, mas motivados: o líder deve oferecer muita orientação para a tarefa para compensar a falta de habilidade dos liderados, além de muita orientação de relacionamento para “conquistá-los”

• liderados capazes, mas desmotivados: o líder deve seu um estilo apoiador e participativo

• liderados capazes e motivados: líder deve ser um veículo para o autodesenvolvimento dos liderados.

• Comportamento do líder perante as necessidades dos

liderados

• líder diretivo: faz com que os liderados saibam o que se espera deles, organiza o trabalho a ser feito e fornece instruções precisas sobre como as tare-fas devem ser realizadas.

• líder apoiador: é amigável e demonstra sensibilida-de pelas necessidades de seus subordinados.

• líder participativo: consulta os liderados e utiliza suas ideias antes de tomar decisões.

• líder orientado para a conquista: estabelece metas desafiadoras e espera que os liderados ofereçam o melhor desempenho possível.

Quadro 3: Fatores situacionais da capacidade de liderançaFonte Adaptada: Attadia (2007)

5.3ULiUerançaUEstratégica

Basicamente, seis aspectos são apontados como essenciais para o exercício da liderança no contexto da gestão estratégica de pessoas (AT-TADIA, 2007), são eles: as competências do líder, o seu carisma, sua ca-pacidade de comunicação, sua capacidade de negociação, sua capacidade de motivação, sua capacidade ética; e sua disposição em servir.

Vamos discutir sobre cada um desses aspectos?

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O conjunto de competências do líder corresponde aos conhecimen-tos, habilidades e atitudes necessárias para que o profissional desenvolva as atribuições e responsabilidades referentes à carreira em que está inseri-do na organização (DUTRA, 2004).

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As competências do líder devem agregar valor econômico à em-presa e valor social ao indivíduo, envolvendo os seguintes saberes: agir, mobilizar, aprender, comprometer-se, assumir responsabilidades, ter visão estratégica (FLEURY; FLEURY, 2004).

É conveniente destacar que as competências podem ser exercidas pelo líder em diversos níveis de complexidade (DUTRA, 2004).

No que diz respeito à força do líder pelo seu carisma, ressaltam-se os seguintes comportamentos:

• Atitude positiva e segura para a criação de uma clima de con-fiabilidade entre os membros participantes (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997);

• Facilidade de relacionamento pessoal (MAXIMIANO, 2004);• Capacidade de criar uma visão atrativa que ofereça aos lidera-

dos um sentido de continuidade, vinculando o presente a um futuro melhor (ROBBINS, 2002);

• Ser exemplo de comportamento, através de palavras e ações (DAFT, 2005);

• Articular a visão de futuro de forma realista, atrativa e acreditá-vel (ROBBINS, 2002);

• Mostrar a importância dos liderados no alcance dos objetivos e metas para a realização da visão de futuro (ROBBINS, 2002);

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• Incitar e inspirar as pessoas a darem o máximo de si na busca dos objetivos do grupo (MAXIMIANO, 2006);

• Usar argumentos claros e consistentes no esclarecimento dos papéis e das exigências das tarefas (MARTINELLI; ALMEI-DA, 1997); e

• Modificar a maneira de seus seguidores verem as coisas, aju-dando-os a pensar de uma nova forma (DAFT, 2005).

Em relação à capacidade de comunição, verifica-se que os líderes têm o grande desafio de “vender” ideias, seja para clientes, fornecedores, parceiros de negócio ou colaboradores. Nesse sentido, a comunicação é a principal arma utilizada pelo líder para estabelecer uma relação de confiança com seus interlocutores e convencê-los a “comprar” sua ideia e segui-lo (CORRADO, 1994).

Para melhor desempenhar seu papel, o líder pode articular a co-municação de várias formas, assegurando a transmissão das informações (MARTINELLI, GHISI, 2006):

• Como criadora de identidade em relação ao indivíduo;• Para identificar e expressar ideias;• Para informar fatos e conhecimentos, de forma instrumental;• De maneira regulatória para controlar o comportamento; • Para promover relacionamentos; e • De forma imaginativa, estimulando a liberdade de pensamento.

No exercício de suas funções, o líder deve articular a habilidade de comunicação nos seguintes níveis (TORQUATO, 2002):

• Nível intra: diz respeito à capacidade e/ou habilidade do geren-te ser comunicativo;

• Nível inter: trata-se da comunicação entre dois interlocutores; • Nível grupal: comunicação entre gerente e grupos; e• Nível coletivo: nesse nível, gerentes, superintendentes, direto-

res, usam os meios clássicos de comunicação organizacional, como por exemplo, boletins, jornais e revistas, para transmitir mensagens a públicos específicos ou gerais.

Para articular de forma efetiva o papel de comunicador, o líder pre-cisa desenvolver duas habilidades fundamentais: saber falar e saber ouvir (MAXIMIANO, 2006).

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A habilidade de saber falar está relacionada com a capacidade de comunicação verbal e não verbal do líder (CERTO, 2003).

Seguindo esta ideia é realizada uma síntese no quadro a seguir das boas práticas relacionadas à comunicação oral e não verbal (ATTADIA, 2007):

Comunicação oral• A voz deve estar ajustada ao local e ao número de pessoas a serem comunicadas• Evitar a dicção deficiente, que atrapalha o entendimento da mensagem• Utilizar palavras de fácil entendimento. A utilização de linguagem rebuscada,

culta ou muito técnica, pode criar a falsa imagem de uma pessoa muito erudi-ta, criando um distanciamento da plateia

• Evitar a utilização excessiva de palavras estrangeiras para não parecer arrogante • Evitar atitude verborrágica, ou seja, falar sem parar como se o silêncio fosse

um crime• Preparar o que será dito, ordenando as ideias com clareza. • Eliminar vícios de linguagem para não tornar a mensagem cansativaComunicação não verbal• Manter atitude posi tiva e modesta. • Evitar atitude hipnotizadora, ou seja, uma postura muito estática, causando

sonolência na plateia• Evitar postura espalhafatosa, chamando excessivamente a atenção do público• Evitar postura tímida• Observar atentamente a expressão corporal do receptor da mensagem • Tomar cuidado ao utilizar brincadeiras com a plateia• Não fazer julgamentos precipitados acerca do receptor da mensagem

Quadro 4: Boas práticas da comunicação verbal e não-verbalFonte: Attadia (2007, p. 102)

A habilidade de ouvir é outro aspecto fundamental da comunicação gerencial, envolvendo a capacidade de assimilar os fatos e os sentimentos para interpretar o significado genuíno de uma mensagem (MAXIMIANO, 2004).

Embora aproximadamente 75% da comunicação eficaz esteja rela-cionada à habilidade de escutar, a maioria das pessoas gasta apenas entre 30% e 40% de seu tempo ouvindo. A eficiência da maior parte das pessoas na escuta gira em torno de 25%. (DAFT, 2005).

Essas estatísticas demonstram o quanto a habilidade de ouvir é defi-citária, levando a muitas falhas de comunicação (ROBBINS, 2002):

• Percepção seletiva: as pessoas só ouvem aquilo que lhes interessa;

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• Distorção seletiva: o receptor ouve a mensagem e a modifica de acordo com seu sistema de crenças, aumentando àquilo que não foi dito; e

• Retenção seletiva: o receptor retém aquilo que é positivo e re-força as suas crenças pré-existentes.

Saber ouvir exige atenção, energia e talento. O ouvinte ativo é aque-le que utiliza a linguagem corporal para entender a mensagem, e apresenta uma postura adequada para encorajar o transmissor da mensagem a com-pletar o processo de comunicação (MAXIMIANO, 2004).

O bom ouvinte é atento não só à fala, mas também, aos aspectos não verbais da comunicação, sabendo criar empatia com a pessoa que está trans-mitindo a mensagem. É rápido na compreensão e na criação da sua visão sobre o assunto abordado. Finalmente, é flexível o suficiente para receber críticas e mudar de opinião quando achar pertinente (TORQUATO, 2002). O quadro a seguir faz um resumo das boas práticas da habilidade de ouvir:

Boas práticas da habilidade de ouvir

• Manter postura atenta e olhar direcionado ao transmissor da mensagem• Apresentar atitude calma, não demonstrando inquietação nem ansiedade• Encorajar o transmissor a continuar a mensagem por meio de acenos de

cabeça, movimentos faciais, palavras e gestos• Evitar desligar-se quando o assunto é desinteressante • Apresentar comportamento defensivo durante a exposição da mensagem• Apresentar questões altamente pertinentes ao que está sendo comentado,

mostrando que está compreendendo a mensagem• Recapitular o que o transmissor disse, sintetizando sua fala• Evitar a audição seletiva• Ser capaz de ouvir críticas sem ofender-se• Evitar a avaliação prematura do transmissor da mensagem• Esperar o emissor acabar a mensagem, para tecer comentários• Não formular mentalmente a resposta antes do término da mensagem• Ser capaz de ouvir opiniões contrárias às próprias crenças e valores

Quadro 5: Boas práticas da habilidade de ouvirFonte: Attadia (2007, p.104)

Além da capacidade de comunicação, uma das habilidades mais importantes para um líder é a capacidade de negociação. Na literatura,

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alguns autores defendem a ideia de que os negociadores são natos, mas a maioria dos estudiosos sobre o assunto enxerga a negociação como uma habilidade que pode ser desenvolvida por qualquer pessoa e aprimorada com a prática (MARTINELLI; ALMEIDA, 1998).

É consenso geral a existência de um conjunto de características que formam o perfil do negociador eficaz. Ele precisa concentrar-se nos objetivos, discutir proposições, proporcionar alternativas à outra parte, ter objetividade no equacionamento dos problemas, apresentar propostas concretas, saber falar e ouvir, colocar-se no lugar da outra parte e saber interpretar o comportamento das pessoas (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997).

Vale também comentar sobre a capacidade ética do líder. Ele é o principal responsável para instaurar a ética empresarial (ARRUDA; WHI-TAKER; RAMOS, 2005).

Isso acontece porque ele é o personagem central na tomada de de-cisões da empresa. Muitas vezes o líder é obrigado a tomar as decisões exigidas pela empresa eticamente censuráveis contra sua consciência. Em outros momentos, para tomar uma decisão ética, coloca em risco o seu cargo (ASHLEY, 2005).

Assim, pode-se dizer que o líder desempenha papel decisivo para que a empresa converta-se em um verdadeiro espaço ético que decorre de um processo de aprofundamento, esclarecimento e determinação das res-ponsabilidades dos membros que a compõem (PINEDO, 2003).

O líder ético tem que encarnar verdadeiramente os propósitos e va-lores assumidos pela organização, não pode simplesmente representar um papel. Ele deve praticar a virtude, personificando a coragem, a bondade, a nobreza, a dignidade, a sabedoria, a cordialidade, a autenticidade, justiça, presença de espírito e autocontrole (MORRIS, 2006).

Não é apenas um educador profissional, ele orienta seus colaborado-res com instruções para a vida, encorajando-os a melhorar continuamente (PINEDO, 2003). Torna-se base para inspirar a confiança porque seu compromisso com a verdade é firme (ARRUDA; WHITAKER; RAMOS, 2005).

Fechando este item, é conveniente discutir sobre a capacidade do líder em servir. Atualmente um conceito que vem sendo amplamente di-fundido através da Teoia da Liderança Servidora, consiste na habilidade de influenciar pessoas para trabalharem entusiasticamente em prol de objetivos comuns, pela força do caráter (HUNTER, 2006). Essa abordagem baseia-se

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na disposição do líder em servir e buscar o bem-estar de toda a organização, conquistando a lealdade dos colaboradores (MARINHO, 2005).

O líder servidor é voltado ao crescimento e desenvolvimento da equipe, posicionando-se como um facilitador destes processos, fazendo os resultados acontecerem e reconhecendo o valor único de cada colaborador para a organização (LACERDA, 2006).

Dentro do contexto da liderança servidora, o papel do líder sofre uma modificação, deixando de ser uma figura voltada exclusivamente ao controle do desempenho e à busca por resultados, para também atuar como coaching/mentoring dos membros de sua equipe, ou seja, o líder passa a ser o elemento que direciona a equipe, auxilia seus membros a de-senvolverem suas capacidades individuiais e atuam como mediadores em possíveis situações de conflito (DUTRA, 2004).

O coaching/mentoring é a pessoa responsável por desenvolver outras pessoas na organização, lidera grupos e orienta-os técnica e admi-nistrativamente a assumir supervisão formal de projetos e pessoas. É tido como referência para o colaborador que está sendo treinado (GIL, 2001).

A atuação como coaching/mentoring pode ser analisada sob dois as-pectos, no que tange à gestão estratégica de pessoas: no plano individual e no plano coletivo.

No plano individual, o coaching/mentoring tem como dever orientar o colaborador sob a sua responsabilidade no aprendizado de suas funções e responsabilidades, bem como no desenvolvimento das competências ne-cessárias para apresentar o desempenho esperado pela organização (GIL, 2001).

Nesse sentido, deve atuar como educador, mostrando os pontos fortes e fracos do colaborador e auxiliando-o na elaboração de um plano de ação para que o colaborador adquira os co-nhecimentos, desenvolva as habilidades e aprenda os comportamentos críticos para a função em que exerce na organização (DESSLER, 2003).

No plano coletivo, o coaching/mentoring deve atuar como nego-ciador de objetivos e metas a serem alcaçadas pela equipe, fornecendo as

Conexão:

Para aprofundar seus estudos, leia o texto - Os perigos do treina-

mento para a liderança, cap. 11, p. 272 - do livro de ROBBINS, S.P Comportamen-to Organizacional. São Paulo: Prentice Hall,

2002. É uma leitura muito relevante para sua formação. Não deixe de ler. Você com certeza mudará suas concepções

sobre o assunto.

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condições de trabalho necessárias para que os mesmas sejam alcançadas. (MAXIMIANO, 2006).

No papel de coaching/mentoring, o líder deve incutir nos membros da equipe uma visão positiva dos objetivos e metas, mostrando de forma tangível a importância da atuação da equipe para desempenho da orga-nização, incentivando a criação de soluções criativas para os problemas da empresa, bem como uma postura favorável à mudança e à inovação (ROBBINS, 2002).

5.4UComunicação

Estima-se que os gerentes gastam 80% de seu tempo em atividades de comunicação e 20% em atividades administrativas (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997), o que mostra a importância desse processo na gestão de uma organização.

A comunicação é um processo não só de transferência, mas de en-tendimento de informações (MAXIMIANO, 2007), sendo composto pelos seguintes elementos (DAFT, 2005):

• Mensagem: conjunto de informações que é transmitida; • Emissor: codifica a mensagem e envia-a através de um canal de

comunicação;• Receptor: recebe a mensagem transmitida, decodificando-a;• Canal de comunicação: é o veículo utilizado para transmitir a

mensagem; e• Feedback: é a resposta de um receptor à comunicação, reali-

mentando o processo e assegurando que a mensagem foi com-preendida. A figura abaixo ilustra o processo de comunicação:

EMISSOR

Significado pretendido

Codificação

Canal deComunicação

RECEPTOR

Decodificação

Significado percebido

Mensagem

Feedback

Figura 1: Processo de comunicaçãoFonte Adaptada: Maximiano (2007) I50

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No que diz respeito à composição da mensagem é sempre importan-te lembrar que quanto mais clara e objetiva, maiores as chances de a mes-ma ser compreendida de forma efetiva pelo interlocutor (DAFT, 2005).

Entre o emissor e o receptor podem existir ruídos que se transfor-mam em barreiras de comunicação, que atrapalham a compreensão efeti-va da mensagem (MAXIMIANO, 2004):

• Barreiras pessoais: interferências causadas pelas emoções, va-lores, interesses, nível de conhecimento das pessoas envolvidas no processo de comunicação;

• Barreiras físicas: barulho, iluminação, calor, distância física; e• Barreiras semânticas: são as interferências causadas pelos sig-

nificados diferentes que uma palavra ou um gesto podem ter.

Para evitar a criação de barreiras ou ruídos na comunicação, a es-colha do canal de comunicação adequado é crítica para que a mensagem chegue sem distorções ao receptor (MALINA; SELTO, 2000).

Basicamente, três tipos de canais de comunicação são identificados: oral ou pessoal, escrito e eletrônico (DAFT, 2005). Geralmente as empre-sas mesclam a utilização desses tipos de canais de comunicação, levando em conta o conteúdo da mensagem e o público que irá recebê-la (MAXI-MIANO, 2007).

No que diz respeito ao feedback, destaca-se que este processo é crítico para a tomada de ações corretivas e/ou melhoria em relação ao processo de comunicação na organização (DAFT, 2005). O feedback é o termômetro da organização no que diz respeito a sua capacidade de comu-nicação e desempenho organizacional (MALINA; SELTO, 2000).

Verifica-se que muitas empresas encontram dificuldades em desen-volverem um processo de feedback eficiente, prejudicando o processo de comunicação. Dentre os vários problemas encontrados, destacam-se: au-sência total, inconstância; feedback fornecido de forma destrutiva, feedback atrasado, feedback realizado com métodos subjetivos e feedback não emitido diretamente pelo emissor (BATEMAN; SNELL, 1998).

Medo da Comunicação. Um grande obstáculo à comunicação eficaz é que algumas pessoas entre 5 e 20 por cento da população

– sofrem de um debilitante medo da comunicação. Embora a maioria deteste falar em público, o medo da comunicação é um problema

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Agora vamos estudar a Comunicação Organizacional?A comunicação organizacional consiste no processo de transmissão

das informações da empresa aos seus diversos públicos: colaboradores, clientes, fornecedores e comunidade (TORQUATO, 2002). O que você acha de discutir cada um desses aspectos?

5.4.UUComunicaçãoUcomUosUColaboraUores

A comunicação interna é direcionada aos colaboradores de todos os níveis hierárquicos e áreas organizacionais (CORRADO, 1994), abran-gendo todos os conteúdos relativos ao cotidiano da administração, com a finalidade de orientar, atualizar, ordenar e reordenar o fluxo das atividades funcionais (TORQUATO, 2002).

Trata-se do suporte informacional-normativo da organização, en-volvendo os seguintes tipos de mensagens: normas, instruções, políticas comerciais/negociais, políticas de desenvolvimento de pessoal, políticas de promoção, políticas salariais, políticas de gestão/organização/moder-nização, regulamentos, portarias, avisos, informações sobre novos lan-çamentos, programas, produtos e/ou serviços, mudanças institucionais e

bem mais sério porque afeta toda uma categoria de técnicas de comunicação. As pessoas sofrem desse problema, sentem tensão ou ansiedade, sem motivo aparente, em relação à comunicação oral ou escrita. Por exemplo, o medo da comunicação oral pode tornar ex-tremamente difícil uma conversa com outra pessoa ou provocar uma grande ansiedade apenas por falar ao telefone. Consequentemente, es-sas pessoas preferirão lançar mão de fax ou memorando para transmi-tir suas mensagens quando um simples telefonema seria muito mais rápido e adequado. Os estudos indicam que as pessoas que temem a comunicação oral procuram evitar situações em que ela é necessária. É razoável esperar alguma autosseleção de maneira que essas pessoas não busquem certas atividades, como magistério, em que a comunica-ção oral seja o requisito predominante. Mas quase todos os trabalhos requerem alguma comunicação oral. É preciso estar consciente que nas organizações existem inúmeras pessoas com sérias limitações em sua comunicação oral e que tendem a racionalizar a questão dizendo a si mesmas que a comunicação não é tão importante para o exercício

eficaz de suas funções. (ROBBINS, 2002)

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programáticas, projetos de expansão/racionalização da rede, movimentos negociais, resultados de campanhas (BUENO, 2003).

No contexto empresarial atual, a comunicação é uma ferramenta bastante útil e eficiente para fazer com que os funcionários assimilem a visão da organização e para influenciá-los a se comportarem de maneira a realizar os objetivos e metas estabelecidas (MALINA; SELTO, 2000).

Em toda organização é comum encontrar problemas de comunica-ção interna, como por exemplo: falta de clareza na definição de responsa-bilidades, falta de conhecimento pleno do negócio, dissonâncias norma-tivas, excesso de informações, defasagem tecnológica da comunicação, inadequação de linguagens, sistema de distribuição inadequado, ausência de critérios editoriais (TORQUATO, 2002).

Essas falhas acabam se transformando em barreiras de comunica-ção, que devem ser eliminadas. A seguir, são resumidas as principais bar-reiras na comunicação interna (DAFT, 2005):

• Diferença de status e poder entre as pessoas envolvidas: as pes-soas com baixo poder são relutantes em passar as notícias ruins para cima na hierarquia;

• Necessidades e objetivos diferentes de um departamento ou setor para outro: cada departamento está preocupado com os próprios problemas e necessidades, não apresentando uma vi-são sistêmica da organização;

• Comunicação inadequada para uma tarefa específica: se for usada uma estrutura de comunicação centralizada para as tare-fas, não haverá informações suficientes circulando para resol-ver os problemas;

• Inexistência de canais formais de comunicação: reduzem a efi-cácia da comunicação em todos os sentidos; e

• Coordenação ruim: significa que as partes da organização estão trabalhando isoladamente.

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com Importante

Para eliminar as falhas de comunicação interna, as se-guintes medidas podem ser tomadas pelos gestores: in-formatizar a comunicação, enxurgar as massas informa-tivas, segmentar temáticas, preparar os colaboradores para a recepção das informações e aperfeiçoar o grafis-mo/estética da linguagem utilizada (TORQUATO)

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Seguindo esta ideia, um programa eficiente e eficaz de comunicação interna pode trazer muitos benefícios à organização (TORQUATO, 2002):

• Motivar e integrar o corpo funcional, estabelecendo mecanis-mos e ferramentas de informação, persuasão e envolvimento;

• Criar climas favoráveis à mudança de realidade, tornando a or-ganização sensível às transformações;

• Direcionar as ações para as metas principais, racionalizar esfor-ços, priorizar situações e tomar decisões ágeis e corretas;

• Construir as bases de uma cultura proativa e fundamentalmente direcionada ao foco negocial;

• Criar elementos de sinergia inter-setores, contribuindo para o desenvolvimento do conceito do trabalho cooperativo;

• Abrir as comunicações ascendentes, permitindo maior capaci-dade de vazão aos potenciais e energias criativas do corpo fun-cional, maximizando a força produtiva da organização;

• Permitir aos níveis gerenciais maior compreensão, acompa-nhamento e interpretação das tendências sociais e uma leitura crítica mais adequada dos cenários políticos e econômicos, por meio de comunicações especializadas; e

• Despertar sentimento de vitória e orgulho em todos os níveis hierárquicos.

Vale destacar que o desenvolvimento de um programa de comunica-ção interna deve levar em conta que, internamente, o fluxo de informações ocorre em três direções: descendente, ascendente e lateral. Assim, o plano de comunicação interna deve ser elaborado abrangendo essas três direções (CORRADO, 1994).

A comunicação descendente ocorre de cima para baixo, ou seja, dos níveis hierárquicos mais elevados para os níveis operacionais (MAXI-MIANO, 2006). Por meio dela é possível fortalecer os valores da empresa e modelar o comportamento organizacional (ROBBINS, 2002), já que possui caráter diretivo, ou seja, está relacionada à comunicação de obje-tivos, estratégias, metas, planos, procedimentos e instruções de trabalho (DAFT, 2005), bem como de informações sobre fatos que envolvem a or-ganização, decisões importantes que afetarão o futuro, problemas que a em-presa esteja enfrentando e eventos que estão programados (CERTO, 2003).

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O principal problema com a comunicação descendente é a distorção ou perda do conteúdo da mensagem, que chega em cerca de 25% (TOR-QUATO, 2002).

Embora essa distorção não possa ser completamente eliminada, a utilização correta dos canais de comunicação, a consistência entre as men-sagens verbais e não verbais, bem como a implantação de mecanismos de escuta ativa podem manter a precisão da comunicação descendente (MA-LINA; SELTO, 2000).

Já comunicação ascendente, como o próprio nome diz, ocorre de baixo para cima, ou seja, do nível operacional para o estratégico (MAXI-MIANO, 2006).

A comunicação ascendente é muitas vezes difícil de ser implantada pelo fato da cultura da empresa não incentivar os colaboradores a falarem o que pensam acerca da empresa. Há casos em que os colaboradores têm medo de se manifestar e depois serem punidos ou até mesmo serem desli-gados da empresa.

Nesse sentido, é fundamental que o plano de comunicação interna esclareça ao colaborador sobre as novas práticas da empresa e faça um trabalho motivacional que mostre a importância da visão e opinião do co-laborador para a melhoria do desempenho organizacional.

Somente após esse trabalho de valorização dos colaboradores é que a organização poderá implantar canais de comunicação para que ele mani-feste sua opinião, sem resistência e/ou medo. É importante que os canais de comunicação busquem ouvi-lo não só quanto aos aspectos de melhoria da empresa, como também a respeito dos aspectos de satisfação e insatis-fação em relação às política de gestão de pessoas da empresa.

Há várias estratégias que podem ser utilizadas para melhorar a co-municação ascendente, destacando-se entre elas: programas de sugestões, pesquisas de clima organizacional e reuniões de funcionários com geren-tes, contato direto com os dirigentes (DAFT, 2005).

É importante lembrar que quem está na linha de frente, fabricando produtos ou prestando serviços, é que realmente tem informações con-cretas sobre problemas e necessidades do sistema produtivo, reclamações e elogios dos clientes e outros aspectos da empresa e sua administração, devendo por isso valorizar a comunicação com o colaborador e estimular a comunicação ascendente (TORQUATO, 2002).

A comunicação lateral ocorre no sentido horizontal, ou seja, entre os departamentos ou unidades de negócio, tendo a finalidade não só de in-

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formar, mas também requisitar apoio e coordenar as atividades. Por meio dela é possível resolver problemas interdepartamentais, facilitar a realiza-ção de projetos e a execução de processos, bem como trocar experiências e conhecimentos, contribuindo de forma substancial para o aprendizado organizacional (MAXIMIANO, 2006).

A comunicação lateral pode ser operacionalizada pelo uso de siste-mas integrados de informações, internet, intranet, reuniões interfuncionais e também através de painéis nos locais de trabalho, com informações a respeito do desempenho da empresa (DAFT, 2005).

5.4.2UComunicaçãoUcomUosUclientes

A comunicação voltada aos clientes envolve vários objetivos, des-tacando-se o fortalecimento da marca do produto/serviço, seduzir clientes potenciais, reter e fidelizar os clientes da carteira e aumentar a venda do produto/serviço (BAIRON; PEREZ, 2002).

O marketing através do uso da propaganda, promoção de vendas, relações públicas e outras ferramentas de comunicação é área organiza-cional, que normalmente, promove as ações de comunicação com o clien-te (CHURCHILL Jr.; PETER, 2003).

Para criar uma imagem de credibilidade e confiança junto aos clien-tes é fundamental que a empresa aja com responsabilidade social, criando mecanismos de ouvidoria para registrar as necessidades, sugestões e críti-cas dos clientes (ETHOS, 2006).

Dentro deste contexto, observa-se que muitas empresas já têm ins-talado em sua estrutura o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC). Mas para que ele cumpra com seu objetivo é de extrema importância que o mesmo seja ativo, focado não só na recepção de sugestões e reclamações dos clientes, mas que tenha uma programa de comunicação voltado ao esclarecimento de dúvidas do consumidor e de feedback em relação à solução de problemas ocorridos com o produtos/serviços, bem como de resposta às críticas e reclamações (BAIRON; PEREZ, 2002).

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A empresa pode instaurar outros canais para ouvir os clientes como, por exemplo, os sistemas de avaliação de produtos e serviços através de formulários distribuídos aos clientes após a compra do produto e/ou utilização do serviço. Outras empresas mais arrojadas fazem reuniões pe-riódicas com grupos de clientes, para que eles participem do processo de desenvolvimento de um novo produto (MAXIMIANO, 2006).

Não importa o mecanismo ou canal escolhido, o que pode acontecer é a deixar de ouvir o cliente.

5.4.3UComunicaçãoUcomUosUforneceUores

Normalmente, a área responsável pelo relacionamento com o forne-cedor é a área de produção, que deve manter uma relação de parceria com seus fornecedores (MOTTA, 2004).

Nesse sentido, o processo de comunicação pode ser utilizado como ferramenta para isso, sendo identificadas as seguintes práticas de comuni-cação (ETHOS, 2006):

• Criar canal de ouvidoria ativo para o fornecedor expressar suas reclamações, dúvidas e sugestões;

• Divulgar de forma clara e objetiva os critérios de seleção de fornecedores utilizados pela empresa;

• Fornecer informações educativas e/ou sobre o mercado que contribuam para desenvolvimento dos fornecedores; e

• Fornecer periodicamente feedback sobre o desempenho dos fornecedores, de forma que eles possam efetuar ações correti-vas em suas estruturas.

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5.4.4UComunicaçãoUcomUaUcomuniUaUe

Cada vez mais as organizações têm que equilibrar as visões institu-cional e mercadológica, de modo a garantir, ao mesmo tempo, o reforço da imagem de uma empresa comprometida com os seus diversos públicos e a obtenção de resultados favoráveis (BUENO, 2003).

A comunicação com a comunidade começa com a prestação de contas das ações da empresa, ou seja, a disponibilização de informações obrigatórias sobre sua saúde financeira, por meio da publicação do Balan-ço Patrimonial e Demonstrações de Resultado, bem como, da publicação do Balanço Social, que contém informações sobre os projetos e ações sociais desen-volvidos pela empresa.

Estudos comprovam que os consumidores costumam admirar as empresas que fomentam prá-ticas de responsabilidade social, desenvolvem projetos sociais, preocupam-se com o meio ambien-te e coíbem a corrupção (ETHOS, 2006). Dentro deste contexto, é de fundamental importância que a empresa desenvolva um plano de comunicação de suas ações sociais, a fim de que a sociedade possa ter acesso a essas infor-mações.

AtiviUaUe

01. Leia o texto e faça um quadro-resumo das principais teorias de lide-rança, destacando as diferenças entre elas.

02. Na empresa PXT se alguém não está satisfeito com o salário, pode fazer uma contraproposta. Esse é um exemplo do uso de que tipo de comunicação? a) Ascendenteb) Descendentec) Laterald) Horizontale) Nenhuma das anteriores

Conexão:

Para ampliar seus conheci-mentos, leia – Questões Atuais na

Comunicação: barreiras de comunicação entre homens e mulheres; silêncio como

comunicação; a comunicação “politicamente correta” e comunicação multicultural, cap. 10,

p. 247 – 251 – do livro de ROBBINS, S. P. Comportamento Organizacional. São Paulo:

Prentice Hall, 2002. É uma leitura muito interessante para sua formação. Irá abrir

seus horizontes na forma de refletir sobre a comunicação.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

03. Nos últimos seis anos, a rede paulista de restaurantes especializados em grelhados “Bon Grillê”, que faturou 45 milhões de reais no ano pas-sado, concentrou na internet a maior parte da comunicação com suas 51 franquias. Vão por e-mail muitos documentos importantes, como decisões estratégicas, contratos e avisos de atraso de pagamentos. Desde agosto do ano passado, a rede vem usando ferramentas de certificação digital, que conferem às mensagens eletrônicas o valor de um documento com peso legal. Além disso, permitem saber se um e-mail chegou e se foi mesmo aberto pelo destinatário. Hoje, toda a correspondência considerada estra-tégica pela “Bon Grillê” é enviada a franqueados, clientes, bancos e for-necedores com a certificação eletrônica. (Fonte Adaptada: Revista Exame, maio 2007). A certificação digital resolveu qual aspecto problemático do processo de comunicação da empresa? a) Mensagem, que passou a ser transmitida com peso legal.b) Receptor, que passou a ter maior facilidade em decodificar a mensagem.c) Feedback, uma vez que as mensagens enviadas passaram a ser confir-madas quanto ao recebimento e leitura pelo destinatário.d) Canal de comunicação, que passou a ter certificação digital e) Nenhuma das anteriores

04. Em relação aos seus conhecimentos sobre o processo de comunicação com fornecedores, assinale a alternativa correta.a) As organizações devem manter um canal de ouvidoria para o forne-cedor, para captar não só as reclamações, como também as sugestões dos mesmos.b) Para estreitar o relacionamento com os fornecedores, as empresas de-vem assumir uma atitude educativa, contribuindo para desenvolvimento dos mesmos.c) As empresas devem fornecer periodicamente feedback sobre o de-sempenho dos fornecedores, de forma que eles possam efetuar ações cor-retivas em suas estruturas. d) As alternativas a, b, c estão corretas. e) Nenhuma das anteriores está correta.

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05. Em relação aos seus conhecimentos sobre liderança, assinale a alter-nativa correta:a) A liderança é inata. b) Cada líder tem um estilo próprio e imutável.c) O exercício da liderança depende da aceitação pelos liderados, do seu nível de satisfação e motivação, bem como de sua capacidade técnica e sua disposição em assumir responsabilidades.d) As alternativas a,b,c estão corretas. e) Nenhuma das anteriores.

Reflexão

A liderança é um dos aspetos fundamentais da gestão estratégica de pessoas. O comportamento do líder é o ponto de referência para os cola-boradores, que tendem a demonstrar atitudes semelhantes àquelas cultiva-das pelo líder.

No entanto, não há uma “receita de sucesso” para o exercício da liderança nas organizações. Vista como habilidade a ser desenvolvida, observa-se que há vários estilos de liderança que podem ser aplicados no intuito de melhorar o desempenho da empresa. No entanto, cada caso é um caso, pois a liderança é situacional.

Do ponto de vista estratégico, o líder deixa de atuar como controla-dor do desempenho das pessoas e passa a ser um agente ativo no desen-volvimento profissional de cada colaborador, bem como, passa a ter um papel fundamental no compartilhamento e na negociação dos objetivos e metas das equipes e áreas organizacionais.

A comunicação é um elemento de fundamental importância para compartilhar informações entre a organização e seus stakeholders: co-laboradores, clientes, fornecedores, comunidade. Quando utilizada de forma adequada, constitui-se em uma ferramenta poderosa para a empresa compelir as pessoas a alcançar seus objetivos, bem como para transmitir seus valores e fortalecer sua imagem.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

LeituraURecomenUaUa

Para aprofundar seus estudos, leia o capítulo: Liderança: Processos Grupais e o Comportamento Organizacional. O livro é de Maria Apareci-da Ferreira de Aguiar. Psicologia Aplicada à Administração. São Paulo: Saraiva, 2005. Você vai gostar!

Referências

ARRUDA, M. C. C; WHITAKER, M. C.; RAMOS, J. M. R. Fundamen-tos de ética empresarial e econômica. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

ASHLEY, P. A. Ética e responsabilidade social nos negócios. 2ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

ATTADIA, L. C. L. Diagnóstico do nível de capacitação gerencial das micro e pequenas empresas : um estudo multicasos no setor moveleiro de São José do Rio Preto. São Paulo, 2007. Tese (Doutorado em Admi-nistração) - Programa de Pós-Graduação em Administração. Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA). Universidade de São Paulo (USP). 277p.

BAIRON, S; PEREZ, C. Comunicação & marketing: teorias da comu-nicação e novas mídias um estudo prático. São Paulo: Futura, 2002.

BATEMAN, T; SNELL, S. Administração: construindo vantagem competitiva. São Paulo: Atlas, 1998.

BUENO, W.C. Comunicação empresarial: teoria e pesquisa. Barueri: Manole, 2003.

CERTO, S. Administração moderna. 9ª. ed. São Paulo: Prentice Hall, 2003.

CORRADO, F.M. A força da comunicação: quem não se comuni-ca...como utilizar e conduzir as comunicações internas e externas

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para criar valores e alcançar os objetivos nas empresas. São Paulo: Makron Books, 1994.

CHURCHILL, Jr.; G. A. PETER, J. P. Marketing: criando valor para os clientes. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

DAFT, R. Administração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

DAVIS, K; NEWSTROM, J. Comportamento Humano no Trabalho. São Paulo: Pioneira, 1992.

DESSLER, G. Administração de Recursos Humanos. 2 ed. São Pau-lo: Prentice Hall, 2003.

DUTRA, J. Competências: conceitos e instrumentos para a gestão de pessoas na empresa moderna. São Paulo: Atlas, 2004.

ETHOS. A Rede Ethos de Jornalistas. Disponível em <http://www.ethos.org.br/docs/conceitos_praticas/indicadores/temas/consumidores.asp> acesso em 19/07/06.

FLEURY, A.; FLEURY, M., C. Estratégias empresariais e formação de competências: um quebra-cabeça caleidoscópico da indústria brasileira. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2004.

GIL, A. Gestão de Pessoas: enfoque nos papéis profissionais. São Paulo: Atlas, 2001.

HUNTER, J.C. Como se tornar um líder servidor. Rio de Janeiro: Sextante, 2006.

LACERDA, D. A vez dos lideres anônimos. Revista Você SA. São Paulo: Abril, ed. 98. 6/08/2006.

LACOMBE, F.; HEILBORN, G. Administração: princípios e ten-dências. São Paulo: Saraiva, 2003.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

MALINA, M; SELTO, F. Communincating and controlling strate-gy: an empirical study of the effectiveness of the Balanced Score-card. University of Colorado at Boulder and University of Melbourne, september 2000.

MARINHO, R. M. et al. Liderança: uma questão de competência. São Paulo: Saraiva. 2005.

MARRAS, J. Administração de recursos humanos: do operacional ao estratégico. São Paulo: Futura, 2000.

MARTINELLI, D.P.; ALMEIDA, A. P. Negociação: como transfor-mar confronto em cooperação. São Paulo: Atlas, 1997.

MARTINELLI, D. P.; GHISI, F. A. (org.) Negociação: aplicações práticas de uma abordagem sistêmica. São Paulo: Saraiva, 2006.

MAXIMIANO, A.C.A. Introdução à Administração. 6 ed. São Pau-lo: Atlas, 2004.

MAXIMIANO, A. Teoria geral da administração: da revolução ur-bana à revolução digital. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

MAXIMIANO, A. Introdução à Administração. São Paulo: Atlas, 2007.

MORRIS, T. E se Harry Potter dirigisse a General Electric? São Paulo: Planeta, 2006.

MOTTA, F.C.P. Introdução à organização burocrática. São Paulo: Thomson Lerning, 2004.

PINEDO, V. Ética e valores nas empresas: em direção às corpora-ções éticas. Reflexão, ano 4, n. 10, outubro de 2003. Disponível em <http://www.ethos.org.br> acesso em 30/08/06.

ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prenti-ce Hall, 2002.

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TORQUATO, G. Tratado de comunicação organizacional e política. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002.

VASSALLO, C. Quem vai liderar sua empresa no futuro? Revista Exame. Edição 793. São Paulo: Abril, 28/05/2003.

NaUpróximaUuniUaUe

Na próxima unidade, iremos continuar a estudar o nível do grupo de estudo do comportamento organizacional, só que agora veremos Poder, Conflito e Negociação. Assuntos muito interessantes. Você verá aspectos favoráveis e desfavoráveis de cada uma dessas temáticas. Além disso, conhecerá as estratégias utilizadas na gestão de conflitos e na negociação. Vamos conhecer esses assuntos?

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UniUa

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Poder, Conflito e Negociação

Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade você irá estudar Poder, Conflito

e Negociação. Assuntos relevantes. Você verá que estas temáticas têm relação com o mundo do trabalho

e estão presentes nas relações interpessoais. Muitas ve-zes as pessoas pensam que os temas poder e conflito tem

significado negativo. Todavia, você constatará que poder e conflito possuem aspectos tanto favoráveis quanto desfavorá-

veis. Além disso, você estudará a importância da negociação nas relações organizacionais. Vamos lá!

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar as variáveis do nível do grupo do estudo do comporta-mento organizacional.

• Apresentar ao aluno os principais aspectos que permeiam o conceito de poder.

• Discutir sobre as técnicas e estratégias utilizadas na gestão de conflitos.• Apresentar a evolução do conceito de negociação e as estratégias utilizadas.

Você se lembra?Você já estudou, ou leu alguma coisa sobre poder? Você já parou

para pensar neste conceito? E de conflito? Você sabe da importância da negociação no mundo do trabalho?

As organizações são sociedades políticas, nas quais os jogos de interesses, as lutas pelo poder, influências, competições e conflitos

tornam as negociações uma constante (MELLO, 2003).Justamente pelo fato das pessoas usarem de forma excessi-

va ou abusiva o poder, este apresenta uma conotação negativa (MONTANA; CHARNOV, 2003).

No entanto, o poder é um dos elementos principais no processo de negociação de resolução de conflitos

(RIBEIRO, 2006). Vamos estudar sobre a relação entre poder,

conflito e negociação?

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Que táticas de poder as

pessoas usam para transformar suas bases de poder em ações espe-

cíficas? Ou seja, quais opções as pessoas têm para influenciar seus chefes, colegas ou

funcionários? As pesquisas identificam algumas táticas de influência distintas: Legitimidade,

Persuasão Racional, Apelo Inspirativo, Consulta, Troca, Apelos Pessoais, Insinuação, Pressão e

Coalizão (ROBBINS, 2002).

6.UUPoUer

Uma das definições mais consagradas para o poder é a capacidade de realizar e de exercer controle sobre as pessoas, acontecimentos, situa-ções e sobre si próprio (COHEN, 1980).

O poder, normalmente, está associado diretamente ao cargo ocupa-do por um indivíduo em uma organização, sendo que quanto mais alto o cargo maior é o seu poder (ROBBINS, 2005).

É importante lembrar que o poder, nas mãos de uma pessoa, pode perdurar por muito tempo, por isso é muito importante saber a quem atri-buir poder (SPARKS, 1992).

Outro ponto a destacar é que o poder nunca deve ser um objetivo em si, mas sim, um meio para se che-gar a um fim (MOTTA, 2004).

Do ponto de vista organizacional, o poder articulado pela alta ad-ministração gerando tipos de distintos de obediência e envolvimento entre os funcio-nários (RIBEIRO, 2006).

Com base nessa ideia, o estudioso Amitai Etzioni definiu três cate-gorias de organização (MAXIMIANO, 2007):

• Coercitiva: o objetivo é controlar o comportamento das pessoas por meio de punições e da obediência sem questionamento, for-mando um contrato alienatório entre o colaborador e a empresa.

• Utilitária: o objetivo é alcançar resultados por meio de barga-nha com os colaboradores, formando um contrato psicológico de caráter calculista, sendo para isso utilizado o poder manipu-lativo (recompensas).

• Normativa: o objetivo é realizar a missão por meio do compro-metimento real dos colaboradores, que passam a internalizar as crenças e valores da organização, formando um contrato psico-lógico moral.

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Poder nas Organizações

Do ponto de vista individual, o poder pode ser classificado em duas categorias: poderes pessoais e circunstanciais.

Os poderes pessoais são inatos, ou seja, são inerentes ao indivíduo (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997).

Os poderes pessoais podem ser classificados nos seguintes tipos (MARTINELLI; ALMEIDA, 1998):

• Poder da moralidade: transmitido desde a infância. Está rela-cionado com os valores morais e os padrões éticos de determi-nada cultura.

• Poder da persistência: perseverança para atingir os objetivos.• Poder da capacidade persuasiva: mostrar a importância de algo

à outra parte, especialmente se considerar três fatores: (a) en-tender o que o outro está dizendo; (b) os argumentos devem ser incontestáveis e (c) satisfação das necessidades.

• Poder da atitude: ações positivas ou negativas que determinam o comportamento influenciando as decisões.

Os poderes pessoais estão presentes em qualquer situação, seja de ne-gociação ou de conflito. Cabe a cada indivíduo utilizá-los para potencializar a solução do conflito ou para alcançar o objetivo almejado na negociação.

Já os poderes circunstanciais enfocam a situação, o momento, o tipo de negociação, a influência do meio na mesma (COHEN, 1980). Esses poderes devem ser utilizados oportunamente para o alcance dos objetivos desejados (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997).

• Especialização: conhecimento e experiência sobre o que está sendo negociado.

• Posição: autoridade relacionada ao cargo ocupado.• Legitimidade: relatório, documentos, provas e informações so-

bre o que está sendo negociado.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

• Precedente: fato ocorrido anteriormente utilizado como argu-mento para gerar mudanças em procedimentos/comportamentos

• Concorrência: tornar algo valioso à medida que se cria uma disputa pelo que está sendo negociado.

• Riscos: disposição x aversão ao risco. • Recompensa: oferecer um “prêmio” para reforçar a posição no

processo de negociação.• Punição (poder coercitivo): oposto da recompensa, toda pessoa

ou instituição que tenha o poder de punir ou tirar algo de al-guém. Para rebater o poder coercitivo, o negociador deve supe-rar seus medos e preparar-se para defender seus princípios.

6.2UConflito

A capacidade de administrar conflitos é um dos aspectos que permeiam o com-portamento organizacional.

O processo de conflito tem início quando uma das partes percebe que a outra parte afeta, ou pode afetar, alguma coisa que a primeira considera importante (ROB-BINS, 2002).

Existem muitas definições de conflito. Apesar dos diferentes sentidos que o termo adquiriu vários temas comuns estão presen-

tes na maioria das definições. O conflito precisa ser percebido pelas partes envolvidas; a existência ou não do conflito é uma questão de percepção. Se ninguém tiver noção de existência do conflito, há um acordo geral de que ele não existe. Outros aspectos comuns nas defi-nições são a oposição ou incompatibilidade e alguma forma de intera-ção. Esses fatores estabelecem as condições que determinam o ponto

inicial do processo de conflito (ROBBINS, 2002).

O conflito em uma organização pode ter diversas causas (LACOM-BE; HEILBORN, 2003):

• Falhas de comunicação. • Diferenças de expectativa.

Conexão:

Para aprofundar seus conhecimentos leia o capítulo 13 - Poder e Política, p. 300 -

324 - do livro de ROBBINS, S. P. Comportamento Organizacional. São

Paulo: Prentice Hall, 2002. É uma leitura muito importante. Irá ampliar suas ideias sobre o

assunto.

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• Incompatibilidade de objetivos.• Interpretação de diferentes dos fatos.

Levando em conta as causas dos conflitos, eles podem ser classifica-dos em três categorias (ROBBINS, 2002):

• De tarefa: relacionado a conteúdo e objetivos do trabalho.• De relacionamento: relações interpessoais entre superior e su-

bordinado e entre colegas de trabalho.• De processo: relacionado à forma como o trabalho é realizado.

Na verdade o conflito está tão incorporado ao dia-a-dia das em-presas, que a maior parte das pessoas lida com ele de forma quase que inconscientemente, sendo vital para o crescimento e sobrevivência das organizações.

O que o torna um conflito bom ou ruim é a sua natureza construtiva ou destrutiva (DAFT, 2005). Na literatura há três visões diferentes sobre o conceito conflito (ROBBINS, 2002), que estão sintetizadas no quadro a seguir.

Visão Descrição

Tradicional• Visão negativa.• Conflito é visto como algo ruim e danoso.• Causa possíveis: erro, disfunção, mau funcionamento.• Deve ser evitado para o melhor desempenho do grupo.

Das relações humanas

• Visão positiva.• O conflito é algo natural nos grupos e organizações, não po-

dendo ser eliminado.• Pode ser benéfico para o desempenho do grupo.

Interacionista

• O conflito é algo essencial para que o desempenho do grupo seja eficaz.

• O conflito possibilita a autocrítica.• O conflito leva à mudança e inovação. • O conflito possibilita a criação de soluções criativas.

Quadro 1: Visões sobre conflitoFonte: Elaborado pela autora com base em ROBBINS (2002)

A forma de enxergar um conflito está muito relacionada ao perfil psicológico do líder (ALBRECHT; ALBRECHT, 1995) e ao estilo de ad-ministração utilizado por ele para solucioná-lo (MARTINELLI, 2002).

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6.2.UUEstilosUUeUgestãoUUeUconfitos

Em relação ao estilo de administração e solução de conflitos, uma pessoa pode agir com base em quatro impulsos em uma situação de confli-to: controle, desconsideração, deferência e confiança (JUNG apud MAR-TINELLI; ALMEIDA, 1998).

A combinação entre esses impulsos dá origem a quatro estilos para solução de conflitos (SPARKS apud MARTINELLI; ALMEIDA, 1998), conforme mostra o quadro a seguir.

Estilo Descrição

Restritivo

• Impulsos para o controle e desconsideração.• Dominador, agressivo e pronto para o combate.• Inflexível.• Ansioso por ser ouvido.• Desinteresse pelo que os outros pensam.• Obtenção de ganhos, sem se preocupar com a outra parte.• Não cooperativo.

Ardiloso

• Impulso para a desconsideração e deferência.• Objetiva-se chegar a qualquer resultado.• Conservador, reservado, metódico.• Examina minuciosamente todos os itens.• Falam pouco.• É solitário e trabalha segundo as regras.• Falsa impressão de concessões, levando o negociador à

Superconfiança.• Representam fonte de aborrecimento pois são falsos.

Amigável

• Impulso para a deferência e confiança.• Cooperativos e até simpáticos.• Objetiva-se manter o relacionamento, independente do fato

de alguma conquista substancial ser atingida ou não.• Falam muito e ouvem pouco.• Procura proteger-se com a ajuda de terceiros.• Julga-se simpático a todos.• Tendência de desvio da questão central.• Permite que os outros assumam o controle.

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Confrontador

• Impulso para a confiança e controle.• Inclui os outros como parceiros.• Contestam as questões e trabalham mutuamente para che-

gar a um acordo ganha-ganha.• Persistentes e persuasivos.• Apresentam posições claras e ouvem com atenção.• Encoraja os outros.• Se interessa por negociações mais arriscadas (desafio à

criatividade).

Quadro 2: Estilos para solução de conflitosFonte: Elaborado pela autora com base em (MARTINELLI; ALMEIDA, 1998).

Na realidade não há um estilo melhor que outro. O indivíduo deve utilizá-los de acordo com a situação.

6.2.2UTécnicasUUeUaUministraçãoUUeUconfitos

Além do perfil e estilo de solução, o gestor tem a sua disposição uma série de técnicas para estimular e solucionar o conflito (ROBBINS, 2002).

O quadro a seguir sintetiza essas técnicas.

Objetivo Tipos

Estimular o conflito

• Comunicação de mensagens ambíguas ou ameaçadoras.• Inclusão de estranhos na equipe, com comportamen-

tos e valores diferentes.• Reestruturação da organização, alteração de regras e

equipes.• Nomear um advogado do diabo

Solucionar o conflito

• Resolução de problemas por meio do encontro entre as partes conflitantes.

• Criação de meta compartilhada.• Acomodação, abafamento do problema. • Não-enfrentamento do conflito.• Suavização do problema, numa tentativa de criar inte-

resses comuns entre as partes conflitantes.• Concessão, estimular as partes a abrirem mão de

algo, chegando a um acordo comum.• Dominação.• Investimento em treinamento.

Quadro 3: Técnicas para administração de conflitosFonte: Elaborado pela autora com base em ROBBINS (2002)

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Em muitas situações de conflito, é útil contar com a participação de uma terceira pessoa para auxiliar no encaminhamento da solução. Exis-tem duas formas de solução de conflito envolvendo uma terceira parte: mediação e arbitragem.

Vamos ver a diferença entre essas duas técnicas?

6.2.2.UUMeUiação

O processo de mediação pode ser conceituado como a intervenção pacífica de uma terceira parte/pessoa para a solução de um determinado conflito, produzindo um acordo satisfatório, em que a solução é sugerida e não imposta às partes interessadas (MATOS, 2003).

Essa terceira parte que vem participar da negociação deve ser al-guém que não esteja diretamente envolvido na situação, mas que possa ser útil para resolvê-la (MELLO, 2003).

Em países como os Estados Unidos, é mais comum contar-se com pessoas que exercem esse tipo de atividade profissionalmente, sendo até mesmo credenciada para esse fim.

O mediador deve ser alguém imparcial, podendo ser um amigo comum, nos casos de negociações mais simples, ou uma pessoa absoluta-mente neutra, que ambas as partes conheçam, que venha a auxiliar no pro-cesso, ou pode ser ainda um profissional, habilitado para exercer esse tipo de atividade, habituado a lidar com essas situações e que as tenha como sua atividade profissional (MARTINELLI, 2002).

Além dos fatores anteriormente citados, deve-se levar em conta os seguintes aspectos em uma mediação para que ela seja bem-sucedida:

• O mediador deve ser um especialista no assunto que está sendo negociado.

• Os envolvidos devem saber que o fator tempo é fundamental para uma mediação.

• Disposição das partes envolvidas em fazer concessões.• O mediador deve encontrar uma solução e exigir o compromisso

de ambas partes no fechamento do acordo.

A mediação é baseada em regras e procedimentos preestabelecidos. O objetivo do mediador é ajudar as partes a negociar de maneira mais efe-tiva. O mediador não resolve o problema, deve conduzir as partes a chegar até a solução. A sua função é a de ajudá-las a buscar o melhor caminho

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e fazer que estejam de acordo, depois de encontrada a solução. Assim, o mediador tem controle do processo, porém não dos resultados (MARTI-NELLI, 2002).

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Mediação de Conflitos

O mediador tem um papel muito importante nas questões relacio-nadas à comunicação entre as partes. O objetivo é maximizar a utilização das habilidades interpessoais das partes, de forma a capacitá-las a nego-ciar cada vez melhor (ROBBINS, 2002).

Embora possam existir diversas variações em um processo de mediação, basicamente o esquema geral de funcionamento é o mesmo. Normalmente ele o inicia fazendo uma reunião com as partes envolvidas, visando a estabelecer regras gerais segundo as quais o processo de media-ção irá ocorrer.

O mediador procura, durante a sua atividade, ouvir as duas partes, isoladamente ou em conjunto, tentando entender as questões que são colo-cadas por ambas e identificar interesses, prioridades e desejos, de forma a tentar levar o conflito para uma solução colaborativa ou de compromisso. O mediador procura, então, juntar as partes, tentando levá-las a explorar as soluções possíveis (MARTINELLI, 2002).

A fase final do processo de mediação é o acordo, que pode ser torna-do público, por meio de uma declaração ou contrato. É importante que, no acordo, as funções e responsabilidades, de cada parte, fiquem muito claras e bem definidas para que se obtenha um comprometimento efetivo e que tudo seja cumprido.

Nas mediações bem-sucedidas, os negociadores tendem a estar comprometidos com o acordo que é gerado. Dessa forma, a taxa de imple-

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mentação efetiva dos acordos gerados é bastante alta. Em algumas situa-ções, porém, a mediação apresenta desvantagens ou tem menos chance de ser bem-sucedida.

Assim, pode-se dizer que a mediação é menos efetiva ou apresenta mais dificuldade para ser usada nas seguintes situações (MARTINELLI, 2002):

• Os negociadores são inexperientes e julgam que, se eles utili-zarem uma linha de ação dura, a outra parte pode simplesmente se entregar.

• Há muitas questões em jogo, e as partes não conseguem entrar num acordo quanto às prioridades.

• As partes estão fortemente comprometidas com as suas posições. • Há muita emoção, paixão e intensidade nos conflitos. • Uma das partes possui um conflito interno e não está muito se-

gura do que fazer. • As partes diferem quanto aos seus principais valores sociais. • As partes diferem substancialmente quanto às suas expectativas

daquilo que é uma declaração razoável e justa.• Os pontos de resistência das partes são incompatíveis (o má-

ximo que uma parte pode dar ainda é muito menos do que o mínimo aceitável pela outra parte).

A duração de um processo de mediação é muito variável, por cau-sa da natureza e do grau de dificuldade associado ao conflito. Durante o processo, o mediador, além de facilitar a própria negociação em si, pode auxiliar as partes envolvidas nas suas concessões, nos acordos e desacor-dos que surgem no processo e assim por diante. Dessa forma, é difícil estabelecer um período para a mediação, que pode estender-se muito além daquilo que seria previsível ou encerrar-se muito antes do que se poderia esperar (MARTINELLI, 2002).

A mediação pode ser útil em várias situações de conflito como, por exemplo, em relações de trabalho, em negociações contratuais, em pequenas exigências, em divórcios, em disputas civis ou comunitárias, dentre outras. A sua utilização tem sido cada vez mais intensa em dispu-tas comunitárias por terras, entre vendedores e clientes, em alocações de moradias estudantis e entre diferentes grupos de estudantes que disputem determinado espaço nas escolas ou nas comunidades (MARTINELLI; GHISI, 2006).

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As principais vantagens de contar com um mediador na solução de um conflito (MARTINELLI, 2002):

• As partes ganham tempo para se acalmar, já que elas interrom-perem o conflito e o descrevem para uma terceira parte.

• A comunicação pode ser melhorada, visto que a terceira parte interferem na comunicação, ajuda as pessoas a serem claras, além de trabalhar para que os envolvidos ouçam melhor a outra parte.

• Frequentemente, as partes têm de determinar que questões real-mente são importantes, porque a terceira parte pode pedir para priorizar alguns aspectos.

• O clima organizacional pode ser melhorado, pois as partes po-dem descarregar a raiva e hostilidade, retomando a um nível de civilidade e confiança.

• As partes podem procurar melhorar o relacionamento, princi-palmente se essa tarefa for facilitada por uma terceira pessoa.

• A estrutura de tempo para resolver a disputa pode ser estabele-cida e revista.

• Os custos crescentes de permanecer no conflito podem ser con-trolados, principalmente se continuar na disputa estiver custan-do às pessoas dinheiro ou oportunidades.

• Acompanhando e participando do processo, as partes podem aprender como a terceira parte as orienta para, no futuro, serem capazes de resolver as suas disputas sem auxílio.

• As resoluções efetivas pairam a disputa e para o desfecho po-dem ser atingidas.

Como desvantagens, pode-se citar (MARTINELLI, 2002):• As partes se enfraquecem potencialmente ao chamar uma ter-

ceira pessoa, deixando uma imagem de certa incapacidade para resolver o conflito.

• Há também uma inevitável perda de controle do processo ou dos resultados (ou de ambos), dependendo de que tipo de pes-soa é chamada para ser a terceira parte (se um mediador ou um árbitro).

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6.2.2.2UArbitragem

A arbitragem é considerada a forma mais comum de resolução de disputa através de uma terceira pessoa. Pode ser conceituada como um processo de julgamento com o veredito de um árbitro, a partir das necessi-dades das partes (ALBRECHT; ALBRECHT, 1995)

Normalmente envolve procedimentos formais, regidos por leis específicas e relacionados à questão/problema que está sendo negociada (MELLO, 2003).

Nos procedimentos formais, que são regidos por lei ou por acordos contratuais, como questões trabalhistas ou acordos empresariais, há nor-malmente uma posição muito clara e rígida de um conjunto de políticas sobre as quais as regras de arbitragem devem se apoiar (MARTINELLI, 2002).

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Arbitragem

Num processo de arbitragem, cada parte apresenta a sua posição para o árbitro, que, por sua vez, estabelece uma regra ou um conjunto de regras a respeito das questões envolvidas. Os pedidos das partes podem ser aceitos ou não, dependendo das regras do processo, As decisões do árbitro, por sua vez, podem ser voluntárias ou obrigatórias, dependendo das regras e dos compromissos prévios entre as partes (MARTINELLI, 2002).

No seu desenrolar, o árbitro tanto pode optar pela solução proposta por um dos participantes, como pode ele mesmo propor uma solução com-pletamente diferente ou, ainda, chegar a um meio termo entre as propostas dos dois lados envolvidos (MARTINELLI; GHISI, 2006).

As principais vantagens da utilização da arbitragem são:

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• Torna possível uma solução clara para as partes. • Há a opção de escolher ou não a solução indicada.• Os árbitros normalmente são escolhidos por serem justos, im-

parciais e sábios e, dessa forma, a solução vem de uma fonte respeitada e com crédito.

• Os custos de prolongar a disputa são evitados.• As decisões dos árbitros tendem a ser consistentes com os jul-

gamentos recebidos dos tribunais.

A arbitragem, porém, apresenta uma série de desvantagens (MAR-TINELLI, 2002):

• As partes tendem a abandonar o controle sobre os resultados. • As partes podem não gostar do resultado.• Se a arbitragem é voluntária, elas podem sair perdendo, caso

decidam não seguir a recomendação do árbitro. • Há um efeito de aceitação da decisão, que mostra que existe

menor comprometimento com soluções arbitradas por dois mo-tivos: as pessoas não participam da construção dos resultados e a declaração recomendada pelo árbitro pode ser inferior àquela que prefeririam. E, havendo menor envolvimento com o resul-tado, automaticamente haverá menor comprometimento com a implementação.

• A pesquisa em arbitragens frequentemente mostra que há um resultado frio.

• Há também um efeito que mostra que as partes, ao saberem que há uma longa história de recorrência às arbitragens, tendem a perder o interesse pela negociação, a tornarem-se passivas e dependentes da terceira parte, buscando apenas auxiliá-la na solução do conflito.

• Há um outro efeito que mostra que, com a utilização cada vez mais intensa da arbitragem, os resultados passam a ser cada vez menos satisfatórios.

• Há, ainda, o efeito dos vieses, que mostra que os árbitros po-dem ser percebidos como não sendo imparciais, mas sim incor-porando ao processo as suas próprias tendências. Isso costuma ocorrer ainda mais quando um árbitro tende a tomar uma série de decisões sequenciais que favoreçam sempre o mesmo lado.

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A negociação é uma

atividade contínua nos grupos e nas organizações. A barganha

distribuída pode solucionar as disputas, mas geralmente tem um efeito negativo sobre

a satisfação dos negociadores por estar focada no curto prazo e ser confrontadora. A barga-

nha integrativa, por seu lado, tende a oferecer resultados que satisfazem todos os envolvidos,

além de construir relação de longa duração. (ROBBINS, 2002)

Dessa forma, é realmente fundamental que, antes de utilizar uma terceira pessoa num processo de solução de conflito, as partes reflitam bem sobre a conveniência de solicitar essa intervenção.

Para isso, é muito importante que pensem no tipo de conflito exis-tente, nos estilos das pessoas envolvidas, na importância do conflito para elas, no tempo disponível para a negociação, nos custos envolvidos no processo e na disponibilidade de recursos existentes, nos poderes que es-tão por detrás, no volume e qualidade das informações à disposição, além da frequência da utilização de uma terceira parte no processo (MARTI-NELLI, 2002).

E, após pesar todos os prós e contras, caso realmente optem pela utilização de uma terceira parte no processo de solu-ção do conflito, é fundamental avaliar também qual será a melhor forma de utilização dessa terceira pessoa no pro-cesso, verificando criteriosamente as vantagens e desvantagens de cada uma das opções de solução por meio de ajuda externa (MARTINELLI; GHISI, 2006).

6.3UNegociação

Uma das habilidades mais importantes para a solução de um conflito é a capacidade de negocia-ção. De acordo com Ma-tos (2003), a negociação é uma constante dentro da atividade gerencial.

Desde a estratégia às práticas operacionais, a negociação deve estar presente para que a participação, a coope-ração, a iniciativa e a criatividade surjam (MARTINELLI; ALMEIDA, 2002).

Conexão:

Para aprofundar suas leituras, leia o texto – Mito ou Ciência:

A fonte da maioria dos Conflitos é a falta de Comunicação. Este texto está no

capítulo 14 – Conflito e Negociação, p. 330, do livro de ROBBINS, S. P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prentice Hall,

2002. Você irá gostar.

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Para ser um negociador eficaz, o gestor precisa concentrar-se nas razões do conflito, ter objetividade no equacionamento dos problemas e saber interpretar o comportamento das pessoas (MARTINELLI; ALMEI-DA, 1997).

Outro ponto importante é que exercendo o papel negociador, o gestor deve facilitar as relações entre as partes envolvidas no conflito entre membros da negociação e é sensível às reações dos participantes da negociação, incentivando a reflexão e mostrando que muitas vezes as po-sições assumidas entre as partes não são opostas, e sim, complementares (MELLO, 2003).

Até a década de 1980, poucas eram as referências ao tema negocia-ção, tanto no âmbito nacional, quanto no internacional (MARTINELLI, 2002).

A negociação era vista como uma habilidade inata do ser humano ou como uma atividade derivada da experiência prática, despertando pou-co interesse do meio acadêmico (MARTINELLI; ALMEIDA, 1998).

No entanto, com as mudanças ocorridas no ambiente competitivo, a partir da década de 80, o tema negociação passou a receber especial aten-ção, sendo amplamente discutido, tanto no contexto empresarial como no acadêmico (MARTINELLI, 2002).

Mas a que se deve essa mudança de foco em relação ao tema nego-ciação?

Com a intensificação da globalização, houve um aumento substan-cial das transações comerciais entre os países, exigindo que as empresas passassem a desenvolver a sua capacidade de negociação a fim de so-breviver em um mercado caracterizado pela concorrência mundial Além disso, o excesso de oferta de muitos produtos e serviços contribuiu para que os clientes se tornassem mais exigentes, levando às empresas a desen-volverem novas técnicas de negociação em vendas e de fidelização dos clientes.

Diante desse contexto de acirrada competição, as organizações in-tensificaram o investimento em qualidade e inovação, como fatores de diferenciação, exigindo uma mudança de postura em relação à negociação com os fornecedores, que passaram a ser vistos como parceiros do negó-cio, garantindo não só insumos adequados às especificações técnicas para produção dos produtos e prestação dos serviços, como também o abasteci-mento contínuo da linha de produção. Atualmente, verifica-se a existência de múltiplas teorias sobre o tema negociação, buscando não só relacioná-

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lo aos vários aspectos inerentes à atividade humana, como também, per-meando as diversas áreas da administração.

Observa-se na literatura a existência de várias definições a respeito do tema negociação, abrangendo diferentes aspectos e visões. A seguir será apresentada uma retrospectiva histórica dessas definições:

• COHEN (1980): define a negociação como o uso da informa-ção e do poder, com o fim de influenciar o comportamento den-tro de uma “rede de tensão”.

• FISHER e URY (1985): enxergam a negociação como um pro-cesso de comunicação bilateral com o objetivo de se chegar a uma decisão conjunta.

• ACUFF (1993): negociação é o processo de comunicação com o objetivo de atingir um acordo satisfatório sobre diferentes ideias e necessidades.

• STEELE, MURPHY e RUSSILL (1995): definem a negociação como o processo onde as partes se movem de suas posições ini-ciais divergentes até um ponto no qual o acordo pode ser obtido.

• BARZEMAN e NEALE (1998): negociação é tomar as melho-res decisões de forma racional com a finalidade de maximizar os interesses de ambas as partes.

No início da década de 80, a negociação tinha uma conotação “ganha-perde” (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997), na medida em que era vista como um processo de influência em relação ao comportamento da outra parte, através do uso do poder e da informação (COHEN, 1980).

A ideia de negociação estava vinculada à capacidade do negocia-dor conseguir “tirar vantagem” e maximizar os interesses individuais. De certa forma, existia uma postura competitiva entre os negociadores, fundamentada pelo objetivo de “vencer” a negociação (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997).

Consequentemente, as relações negociais tinham como foco o curto prazo e resultados imediatos, já que a “parte que perdeu negociação” di-ficilmente estaria disposta a manter contato e realizar novas negociações já que foi prejudicada uma vez e não gostaria de ser lesada novamente (MARTINELLI, 2002).

No Brasil, essa visão “ganha-perde” de negociação pode ser expres-sa pelo “jeitinho brasileiro”, que é uma característica cultural formadora da capacidade de flexibilidade e adaptação do povo brasileiro, sendo mui-

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to positiva a princípio; no entanto, há um revés: o uso recorrente do “jei-tinho” acaba por causar uma certa aversão a regras e a minúcias, gerando indisciplina mental e um comportamento excessivamente persuasivo para alcançar os interesses pessoais (COHEN, 2000).

Em um segundo momento, a negociação é reconhecida como um processo de comunicação bilateral e satisfatório para ambas as partes.

Isso significa que a negociação passa a ser vista como um processo “ganha-ganha”, pautado pelo entendimento recíproco das necessidades de cada uma das partes e por um esforço conjunto para o fechamento de um acordo satisfatório (STEELE; MURPHY; RUSSILL, 1995).

Observa-se uma mudança de foco na negociação, enfatizando o longo prazo, a obtenção de resultados compartilhados e a manutenção do relacio-namento duradouro entre as partes (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997).

Na prática, para se chegar ao ganha-ganha, a comunicação bilateral é um aspecto crítico, devendo por isso ser estimulada em todas as etapas do processo. (SHELL, 2001).

Vale lembrar que as negociações nas organizações, normalmente, en-volvem mais que dois lados, sendo mais complexas. Por isso, para promover acordos integrativos é fundamental considerar os interesses básicos dos di-versos grupos e subgrupos dentro e fora da empresa (MARTINELLI, 2002).

Por ser um conceito em formação e estar amplamente relacionado com a forma como as pessoas se relacionam e como as empresas estabe-lecem seus acordos, verifica-se a existência de vários mitos em torno do tema negociação (MARTINELLI, 2002).

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Este item tem como objetivo discutir e esclarecer os mitos mais co-nhecidos (SHELL, 2001):

• Bons negociadores nascem bons negociadores: isto é inexato; existem muito poucos negociadores naturais, na verdade, eles são “produzidos” pelo meio. A negociação pode ser vista como uma habilidade a ser aprendida e desenvolvida, sendo para isso necessário o estudo e a prática dos conceitos que permeiam esta capacidade.

• A experiência é a chave da negociação bem sucedida: o apren-dizado gerado pela experiência, sem dúvida, é fundamental para o aprimoramento da capacidade de negociação. No entan-to, o foco excessivo na experiência individual pode bloquear a troca de conhecimentos com outras pessoas e também pro-mover um excesso de autoconfiança, levando muitas vezes, o negociador ao erro.

• Negociadores efetivos se arriscam sempre: na verdade os nego-ciadores efetivos correm riscos calculados, ou seja, antes de se arriscarem eles analisam muito bem a situação, buscando obter o maior número de informações a respeito da situação de de-cisão. Mediante uma análise crítica de todas as alternativas de solução, eles, então, tomam sua decisão.

• Bons negociadores não contam com a organização: isto é uma crença falsa. Os bons negociadores contam com a organização não só para ajudá-lo a levantar as informações necessárias para tecer um acordo otimizado, como também para dar suporte a cada uma das etapas do processo de negociação.

Falamos de mitos sobre negociação. Mas quais são as condições essenciais para se negociar com êxito? Eles estão sintetizados a seguir (MATOS, 2003):

• Precisar negociar: que implica na consciência da necessidade.• Querer negociar: que leva a vontade firme de obter acordos de

cooperação.• Saber negociar: que significa ter a capacidade de acionar os

meios adequados.

De acordo com o autor, a motivação e o conhecimento são funda-mentais para o processo de negociação. Saber decodificá-los em lingua-

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gem inteligível, em atitudes e comportamentos integrativos, condiciona o êxito do processo. À vontade, o conhecimento situacional, a inteligência, a atitude afetiva e a tecnologia de conversação criam o cenário, o clima e a ação para bons desempenhos e resultados. Assim, além da consciência das necessidades e da vontade sincera de encontrar soluções mutuamente satisfatórias, é preciso o conhecimento específico, uma metodologia para negociar.

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Na prática são identificados alguns estilos desempenhados pelos negociadores:

• Negociador efetivo: conhece detalhadamente os fatos relacio-nados à negociação, documenta as declarações, faz questões realistas, esclarece pontos fundamentais.

• Negociador analítico: apresenta os argumentos de maneira lógica, negocia com base na agenda de negociação e gosta de estabelecer regras para negociação.

• Negociador relativo: facilita relações entre membros da nego-ciação, estabelece boas relações com outra parte, sensível às reações dos negociadores.

• Negociador intuitivo: habilidade para trazer ideias, enxerga claramente os pontos fundamentais da negociação, examina implicações futuras das propostas, examina a negociação em seu todo.

Encontra-se na literatura vários modelos que tentam sistematizar as estratégias de negociação. Para ilustrar este livro, o modelo escolhido foi a proposta de Martinelli e Almeida (1997) por ser simples e didática. Esses autores destacam a existência de quatro estratégias básicas de nego-ciação, conforme mostra o quadro a seguir.

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Acomodação

• Você perde e o outro ganha.• A questão não é importante para você.• Você valoriza o seu relacionamento com a outra parte.• Você está sob pressão por causa do tempo e quer terminar tudo

rapidamente.

Evitar

• Você perde e o outro perde.• A questão é relativamente insignificante para ambas as partes.• Você pode construir um relacionamento com base em sofrimento

mútuo.• O tempo e/ou custo da transação são as principais considerações.

Competitiva

• Você ganha e o outro perde.• Preservar o relacionamento com a outra parte não é importante.• Busca apenas de interesses pessoais.• Você não pode lançar mão de uma situação que ambos saiam ga-

nhando, porque a outra pare tirará proveito de você.• Você tem tempo para vencer a outra parte.

Cooperativa

• Você ganha e o outro ganha.• Identificação das necessidades da outra parte.• Necessidades são complementares.• Valorização do relacionamento com a outra parte.• Você tem tempo suficiente para procurar um recurso que seja satis-

fatório para todos.• Ambas as partes buscam um melhor resultado.

Quadro 4: Estratégias de NegociaçãoFonte Adaptada: MARTINELLI; ALMEIDA (1997)

Em relação às táticas de negociação, Gil (2001) apresenta as seguin-tes sugestões:

• Não deixar clara a decisão final, estendendo o tempo da nego-ciação.

• Adiar a decisão para uma outra data.• Precipitar o desfecho.• Apoiar-se na argumentação de algum membro do grupo adver-

sário, desviando o foco.• Propor mudanças na proposta inicial até chegar a ruptura.• Deslocar a discussão para outro tema.• Desequilibrar a outra parte através do comportamento inade-

quado, como por exemplo, sentar-se muito próximo do adver-sário, mudar o padrão usual do modo de sentar, manter-se em silêncio, fazer muitas perguntas até o outro negociador perder seu raciocínio.

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• Blefar, ou seja, fornecer uma in-formação incorreta na esperança de que a outra parte revele a verdade.

• Apelar para o lado emocional do oponente, levando-o a sentir-se culpado, insinuando consequências, procurando ameaçar o adversário com a argumentação de que sua inflexi-bilidade pode conduzir a consequências desfavoráveis para ambas as partes e desafiar o adversário.

AtiviUaUe

Para concretizar a venda de um imóvel de alto padrão, o corretor Paulo apresentou ao Sr. Marcos, comprador potencial, todos os pontos fortes do apartamento: tamanho do apartamento, número de suítes (3), a existência de churrasqueira na sacada, amplitude das salas de estar, de TV e jantar, qualidade dos armários embutidos e do acabamento, funcio-nalidade da cozinha planejada e a existência de três vagas na garagem. Ciente das necessidades de seus clientes quanto à busca por qualidade de vida para ele e sua família, Paulo fez questão de salientar a existência de completa área de lazer, composta de piscina, sauna, quadra de esportes, sala de ginástica, salão de festas, churrasqueira, além de brinquedoteca para as crianças. Durante a visita pela área de lazer, o Sr. Marcos sinalizou que estava encantado com o apartamento, mas que acreditava que o valor do mesmo estava fora de suas possibilidades financeiras, era mais alto do que poderia pagar. Para demonstrar que o preço do apartamento era justo e que o mesmo era um ótimo investimento, Paulo trouxe informativos de outros imóveis similares, mostrando que o preço estava compatível com o mercado, e também notícias de jornal que deixavam claro que a loca-lização do imóvel vendido era privilegiada e que o bairro onde estava lo-calizado encontrava-se em ascensão, o que significava que o apartamento seria valorizado ainda mais ao longo do tempo. O Sr. Marcos demonstrou preocupação quanto a distância do apartamento em relação ao centro da cidade. Imediatamente, Paulo levou o Sr. Marcos para dar uma volta no bairro, destacando os principais pontos comerciais e provando que o

Conexão:

Para ampliar sues estudos, leia o capítulo 14 – Conflito e

Negociação, p. 325 – 347 – do livro de ROBBINS, S. P. Comportamento

Organizacional. São Paulo: Prentice Hall, 2002. É uma leitura válida para a sua

formação. Confira!

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mesmo tinha vida própria. Quando o Sr. Marcos demonstrou que estava efetivamente interessado no imóvel, Paulo marcou uma reunião com o proprietário. Investidor na área de imóveis, o proprietário desejava vender o apartamento com lucro. Para satisfazer as necessidades do proprietário e do cliente, Paulo estabeleceu três possíveis estratégias de venda: 10% de desconto à vista, 5% de desconto se o apartamento fosse pago em duas vezes e a opção do cliente dar 50% de entrada e financiar o restante em até 12 vezes. Em seguida, marcou uma reunião entre o Sr. Marcos e o pro-prietário do apartamento. Antes de tocar nos pontos fundamentais da ven-da do apartamento, Paulo preocupou-se em “quebrar o gelo” entre o pro-prietário e o cliente, criando uma aproximação entre ambos. Paulo cuidou para que tanto o Sr. Marcos, quanto o proprietário se sentissem totalmente seguros durante o processo de negociação. Durante a reunião, Paulo se-guiu uma pauta para conduzir o processo de negociação: apresentação dos documentos de ambas as partes que mostravam a idoneidade dos mesmos, colocação das opções de pagamento, esclarecimento de todas as dúvidas das partes envolvidas e fechamento do acordo através da formalização de proposta de venda. Foram necessárias algumas rodadas de negociação, para o fechamento do acordo, onde o apartamento foi vendido pelo preço desejado pelo proprietário e nas condições de pagamento desejadas pelo cliente: 30% de entrada e financiamento do valor restante em 36 vezes. Após o acordo, Paulo cuidou de todos os tramites burocráticos, agilizando a concretização do processo de venda

Fonte: elaborado pela autora.

01. Diante da situação exposta, qual o estilo de negociação utilizado por Paulo nessa negociação? a) Relativob) Efetivoc) Intuitivod) Analíticoe) Nenhuma das anteriores.

02. Diante da situação exposta, qual a estratégia de negociação adotada por Paulo nessa negociação? a) Acomodaçãob) Evitar

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c) Competitivad) Cooperativae) Nenhuma das anteriores.

03. A Truck maior fabricante de carrocerias de caminhões do país apre-senta uma política de recursos humanos que visa a satisfação dos colabo-radores. Uma das formas de fazer isso é por meio da valorização das ideias dos funcionários, que são efetivamente implementadas. A cada nova ideia implementada, seu autor recebe entre 100 e 500 reais. Os autores das 10 melhores ideias do ano ganham uma viagem com acompanhante para um lugar escolhido do Brail. As organizações podem usar o poder em relação aos colaboradores de três maneiras: coercitiva, manipulativa e normativa. Tomando como base seus conhecimentos sobre o assunto, qual tipo de poder é utilizado pela Truck para gerenciar as relações com os colabora-dores? a) Poder coercitivo, pois o comportamento dos colaboradores é controla-do pela implementação de novas ideias. b) Poder normativo, pois com a implantação das novas ideias os colabo-radores tornam-se mais comprometidos. c) Poder manipulativo, pois a criação de novas ideias e implantação das mesmas são recompensadas através de prêmio em dinheiro.d) Poder coercitivo, pois a criação das novas ideias está vinculada a um prêmio em dinheiro. e) Nenhuma das anteriores.

Reflexão

Uma das definições mais consagradas para o poder é a capacidade de realizar e de exercer controle sobre as pessoas, acontecimentos, situa-ções e sobre si próprio. Você já pensou nisso? Mas, é verdade.

Do ponto de vista organizacional, o poder articulado pela alta ad-ministração gerando tipos distintos de obediência e envolvimento entre os funcionários. Com base nessa ideia, o estudioso Amitai Etzioni definiu três categorias de organização: coercitiva, utilitária e normativa.

Do ponto de vista individual, o poder pode ser classificado em duas categorias: poderes pessoais e circunstanciais. Os poderes pessoais são inatos, ou seja, são inerentes ao indivíduo. Já os poderes circunstanciais enfocam a situação, o momento, o tipo de negociação, a influência do

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meio na mesma. Esses poderes devem ser utilizados oportunamente para o alcance dos objetivos desejados.

A capacidade de administrar conflitos é um dos aspectos que per-meiam o comportamento organizacional. O processo de conflito tem iní-cio quando uma das partes percebe que a outra parte afeta, ou pode afetar alguma coisa que a primeira considera importante.

Uma das habilidades mais importantes para a solução de um confli-to é a capacidade de negociação.

Atualmente, observa-se uma mudança de foco na negociação, enfa-tizando o longo prazo, a obtenção de resultados compartilhados e a manu-tenção do relacionamento duradouro entre as partes.

Pense nestas questões, elas são importantes para sua prática profis-sional.

LeituraURecomenUaUa

Para ampliar seus conhecimentos, leia o livro Negociação e admi-nistração de conflitos – de Antônio André Neto, Eugenio Rodrigues do Carvalhal, Gersen Martins de Andrade, João Vieira de Araújo. 2 ed. Fun-dação Getúlio Vargas. Nesta obra os autores comentam que a negocia-ção está presente de forma intensa na vida contemporânea. Ao negociar, envolvemo-nos em trocas, concessões e barganhas, nas quais as questões substantivas em jogo estão colocando em risco as relações e criando opor-tunidades para os relacionamentos. Competir ou colaborar está entre os principais dilemas presentes nas negociações. As ideias propostas neste livro indicam como se pode abordar processos de negociação, visando acordos que satisfaçam todas as partes envolvidas. Você vai gostar!

Referências

ALBRECHT, K.; ALBRECHT, S. Agregando valor à negociação: processos de negociações inovadores, equilibrados e bem-sucedidos. São Paulo: Makron Books, 1995.

ASHLEY, P. A. Ética e responsabilidade social nos negócios. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

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DAFT, R. Administração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

GIL, A. Gestão de Pessoas: enfoque nos papeis profissionais. São Pau-lo: Atlas, 2001.

LACOMBE, F.; HEILBORN, G. Administração: princípios e tendên-cias. São Paulo: Saraiva, 2003.

MARTINELLI, D.P.; ALMEIDA, A. P. Negociação: como transformar confronto em coopera-ção. São Paulo: Atlas, 1997.

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MAXIMIANO, A. Introdução à administração. São Paulo: Atlas, 2007.

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MOTTA, F.C.P. Introdução à organização burocrática. São Paulo: Thomson Learning, 2004.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

ROBBINS, S.P. Comportamento organizacional. São Paulo: Prenti-ce Hall, 2002.

ROBBINS, S.P. Administração: mudanças e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2005.

SHELL, G. R. Negociar é preciso: estratégias de negociação para pes-soas de bom senso. São Paulo: Negócio, 2001.

SPARKS, D. B. A dinâmica da negociação efetiva: como ser bem-suce-dido através de uma abordagem ganha-ganha. São Paulo: Nobel, 1992.

STEELE, P.; MURPHY, J.; RUSSILL, R. It’s a deal: a practical nego-tiation handbook. Ingla-terra: McGraw-Hill, 1995.

NaUpróximaUuniUaUe

Na próxima unidade, iremos estudar o conceito de Visão, Missão, Cultura e Clima organizacional. Temáticas interessantes para o mundo do trabalho e para as relações interpessoais. Vamos lá?

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UniUa

UeU7

Visão, Missão, Cultura e Clima Organizacional

Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade você irá estudar Visão, Missão, Cul-

tura e Clima Organizacional. Assuntos muito impor-tantes para sua formação. Além disso, você poderá fazer

relações com as outras unidades. Vale a pena conferir!

Objetivos da sua aprendizagem• Compreender os conceitos de visão e missão organizacional.

• Apresentar os principais aspectos que permeiam o conceito de cultura organizacional.

• Discutir sobre os fatores que influenciam o clima da organização.

Você se lembra?Você é capaz de falar sobre a cultura, a visão e a missão de uma

organização com alguém? Então, após conhecer os princípios básicos do comportamento individual e coletivo, vem à tona a questão: será possível modelar o comportamento das pessoas a fim de que os objetivos da orga-nização sejam efetivamente alcançados?

A resposta para esta pergunta é sim! E o meio para conseguir isso é denominado cultura organizacional.

Até que a organização se torne institucionalizada, o fundador representa um papel decisivo na formação da ideologia central da empresa e na criação do senso de identidade entre os seus membros

(JOHANN, 2004). É a partir das crenças e valores do fundador que se forma a

cultura organizacional de toda empresa (ROBBINS, 2002). Derivados da visão e missão idealizadas pelo fundador,

os valores e crenças, normalmente, sinalizam quais são os comportamentos apropriados e aceitáveis na organização

(FLEURY et al, 1996). Compartilhados com os colaboradores, os va-

lores e crenças do fundador são aprimorados, ao longo do tempo, com base na evolução da natu-

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Comportamento e Psicologia Organizacional

reza do trabalho da organização e por meio da interação da empresa com o ambiente empresarial (FLEURY; FLEURY, 1997). Com as realizações e conquistas da organização eles vão sendo confirmados até se transforma-rem na base da cultura organizacional (ROBBINS, 2002).

No caso das empresas brasileiras observam-se alguns valores co-muns: foco no curto prazo, aceitação passiva da distância de poder entre superior e subordinado e individualismo (HOFSTEDE, 1984), o que explica o comportamento imediatista e centralizador de muitos líderes, bem como o comportamento pouco comprometido dos colaboradores, que priorizam o alcance de seus objetivos pessoais em detrimento dos objeti-vos organizacionais.

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7.UUVisão

A visão pode ser conceituada como a declaração dos propósitos da organização acerca do que aspira e idealiza a respeito de seu futuro, cons-tituindo-se no ponto inicial da elaboração do planejamento estratégico a ser desenvolvido e implementado pela empresa, podendo ser conceituada de várias formas. (OLIVEIRA, 2001).

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Visão Organizacional

Vale destacar que a visão deve ser resultante do consenso e do bom senso de um grupo de líderes e não da vontade de uma única pessoa.

Os líderes que oferecem uma visão clara, coerente e sustentada po-dem conduzir os destinos da empresa de forma mais consistente.

Por isso, é fundamental que a visão seja desenvolvida dentro de uma cultura voltada para resultados e que leve em conta as necessidades dos acionistas, empregados, clientes, fornecedores e comunidade (MA-XIMIANO, 2004). Uma das barreiras à efetividade de uma organização é justamente a definição de uma visão de futuro não executável (KAPLAN; NORTON, 1997).

7.2UMissão

Enquanto a visão de uma empresa é expressa dentro de uma aborda-gem mais ampla e voltada a longo prazo, representando a capacidade de enxergar o futuro da organização, a missão é a tradução desse futuro em termos mais simples, agindo de forma orientadora e delimitadora da ação empresarial (OLIVEIRA, 2001).

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Pode ser conceituada como a razão de ser da empresa, determinando porque ela existe e qual é o negócio dela em termos de necessidades de mercado atendidas e áreas básicas de atuação (MAXIMIANO, 2004).

A missão deve ser entendida como uma identificação a ser seguida, mas nunca algo específico a ser alcançado, pois pode mudar ao longo do tempo (OLIVEIRA, 2001), por isso recomenda-se não expressar na de-claração de missão os produto que ela oferece ao mercado. Deve-se evitar o estabelecimento definições longas pois a assimilação da missão pode ficar prejudicada (DAFT, 2005).

7.3UCulturaUorganizacional

Quando uma organização torna-se institucionalizada, ela passa a ter um valor por si mesma, criando um sistema de convicções próprio e independente da figura do fundador, que passa a nortear o destino e as decisões da empresa (ROBBINS, 2002). Esse sistema de convicções cor-responde à ideologia central da empresa e é denominado cultura organiza-cional (JOHANN, 2004).

As pesquisas sugerem que existem sete características básicas que, em seu conjunto, apreendem a essência da cultura de uma or-

ganização: 1 – Inovação e assunção de riscos. O grau em que os fun-cionários são estimulados a inovar e a assumir riscos; 2 – Atenção aos detalhes. O grau em que os funcionários demonstrem precisão, análise e atenção aos detalhes; 3 – Orientação para os resultados. O grau em que os dirigentes focam mais resultados do que as técnicas e os processos empregados para seu alcance; 4 – Orientação para as pessoas. O grau em que as decisões dos dirigentes levam em consideração o efeito dos resultados sobre as pessoas dentro da organização; 5 – Orientação para a equipe. O grau em que as atividades de trabalho são mais organizadas em termos de equipes do que de indivíduos; 6 – Agressividade. O grau em que as pessoas são competitivas e agressivas, em vez de dóceis e aco-modadas; 7 – Estabilidade. O grau em que as atividades organizacionais enfatizam a manutenção do status que em contraste com o crescimento

(ROBBINS, 2002).

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A cultura organizacional pode ser definida como o conjunto de va-lores e crenças em que a empresa acredita (FLEURY; FLEURY, 1997), fornecendo uma compreensão aos membros da organização sobre quais são os comportamentos apropriados e aceitáveis no ambiente de trabalho (ROBBINS, 2002).

Assim, quando uma organização adquire uma permanência institu-cional, os modos aceitáveis de comportamento tornam-se auto-evidencia-dos para seus membros (ECCLES; NOHRIA; BERKLEY 1992).

Dentro deste contexto, a cultura organizacional assume as seguintes funções (SROUR, 1998):

• Estabelecer a identidade da organização.• Promover a integração entre seus elementos internos, pelo

compartilhamento de valores.• Possibilitar a adaptação da organização com o ambiente externo.• Basicamente, uma cultura organizacional pode ser classificada

de duas formas: forte ou fraca (ROBBINS, 2002). As principais diferenças entre elas estão sintetizadas no quadro a seguir.

Cultura forte Cultura fracaVantagens Vantagens

• Os valores essenciais são intensamen-te acatados e compartilhados.

• OPferece aos funcionários uma com-preensão clara da maneira como as coisas são feitas na organização.

• Ferece estabilidade.• Sujeita todos níveis hierárquicos aos

mesmos padrões de comportamento.• Permite alinhar metas.• Permite partilhar métodos.• Fornece estrutura e controle, sem ne-

cessidade de criar regras e regulamen-tos, diminuindo a burocracia.

• Funciona como um substituto da forma-lização.

• Permite transições de poder sem maio-res sobressaltos.

• Reduz a rotatividade e contribui para a retenção de talentos.

• Gera coesão, lealmente e comprometi-mento entre os membros.

• Oferece maior flexibilidade à organização.• Maior abertura à diversidade, possibili-

tando que funcionários com diferentes perfis trabalhem juntos.

• Assimilação dos padrões de comporta-mento trazidos com a contratação de novos funcionários.

• Maior facilidade para aceitar a adoção no-vos métodos, técnicas e procedimentos.

• Menor resistência à mudança.• Maior facilidade para operacionalizar

com sucesso processos de aquisição e fusão.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Desvantagens Desvantagens• Pode ser usada para apoiar a manipu-

lação e o controle ideológico.• Pode criar problemas na realização de

mudanças que podem melhorar a eficá-cia da organização.

• Pode dificultar a operacionalização de processos de aquisições e fusões, mui-tas vezes levando-os aos fracasso.

• Os valores essenciais da organização são parcialmente acatados e comparti-lhados pelos membros da organização.

• Inexistência de um comportamento pa-drão a ser seguido.

• Necessidade de criar procedimentos, regras para a organização funcionar.

• A falta de clareza no modo de agir pode conflitos entre os membros.

• Dificulta a criação de um ambiente de coesão, lealmente e comprometimento.

• Dificuldade de alinhar metas e objetivos.

Quadro 1: Diferenças entre cultura forte e fracaFonte: Attadia (2007), p 89

Toda cultura, forte ou fraca, admite a coexistência de subculturas, que expressam valores específicos de um grupo, de uma área organizacio-nal ou departamento (ROBBINS, 2002), o que não significa, em absoluto, antagonismo aos valores e pressupostos essenciais da cultura principal (JOHANN, 2004).

Na maioria das organizações, é possível constatar o estabelecimen-to dos seguintes tipos de subcultura, conforme mostra o quadro a seguir (ROCHA, 1999):

Tipo Descrição

Ocupacionais

• Formadas por categorias de profissionais com necessidades de autonomia no trabalho, ou com competências específicas. Con-flitos podem surgir se estas necessidades ou competências não forem reconhecidas.

Étnicas ou raciais

• Desenvolvem-se quando grupo que detém a autoridade é com-posto por uma maioria de etnia ou raça diferente.

De gerações

• Aparece quando a organização apresenta um quadro de funcio-nários extremamente variado com relação à idade. É interessante notar que existe um consenso, em relacionar o nível de autoridade das pessoas à idade das mesmas.

De sexos• Surge da diferença acentuada de comportamentos e valores exis-

tente entre mulheres e homens, que leva, na maioria das vezes, à discriminação sexual e ao surgimento de conflitos.

Quadro 2: Tipos de subculturasFonte: Adaptada Rocha (1999)

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Observa-se que nas culturas fortes há pouca margem ao surgimento de subculturas (ROBBINS, 2002). Nas culturas fracas, verifica-se, muitas vezes, o surgimento de subculturas baseadas nas experiências vividas pe-los grupos/departamentos (JOHANN, 2004).

Épocas de crise podem gerar contraculturas, que reúnem elemen-tos que discordam frontalmente dos valores da cultura central (ROCHA, 1999). Neste caso, a contracultura representa fonte de resistência e confli-to podendo dar desestabilidade à organização (FLEURY et al., 1996). O quadro sintetiza os tipos de contracultura.

Tipos Descrição

Nós

x

Adiministração

• Todas as ações da administração são vistas como ameaçadoras e ofensivas.

• Aparentemente há submissão, mas entre os membros o descontentamento e a cumplicidade são evidentes, gerando reações como “corpo-mole” na realização de tarefas, ausência na trabalho e não cumprimento de tarefas.

Nós

x

Trabalho

• A monotonia inerente a determinadas tarefas faz com que o grupo desenvolva algumas formas de lidar, reduzir ou aguentar essas condições. Gastam muito tempo com conversas fúteis e piadas, ou produzem o mínimo indispensável.

Nós

x

Outros departamentos

• Ocorre quando um departamento acha que o outro é “criador de problemas”, e vice-versa, resultando em “guerras” interdepartamentais.

Nós

x

Clientes

• o pessoal do “front-office” enxerga o cliente como um adversário, em função das experiência negativas vividas

Quadro 3: Tipos de contraculturaFonte: Adaptada Rocha (1999)

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7.3.UUElementosUUaUculturaUorganizacional

Uma das formas de estabelecer uma cultura forte ou evitar a criação de contra-culturas é por meio da capacidade da cultura organizacional em reforçar padrões desejados de comportamento (ECCLES; NOHRIA; BERKLEY, 1992). Isso pode ser conseguido por meio da articulação dos elementos que formam a cultura organizacional.

O quadro a seguir apresenta os principais componentes da cultura organizacional, que se articulados adequadamente, podem modelar o comportamento individual e coletivo dos membros da organização:

Aspectos Descrição

Socialização

• O processo de adaptação dos novos funcionários à organização deve ter como objetivo a transmissão dos valores e atitudes que permeiam a cultura da organização.

• Treinar gerentes internamente pelas pessoas de es-calões superiores.

Normas

• Todo comportamento que é esperado, aceito ou apoiado pelo grupo, esteja ele fixado formalmente ou não.

• Através das normas, as pessoas são recompensa-das ou punidas, confrontadas ou encorajadas, acei-tas ou rejeitadas.

Implantação de rotinas

• Procedimentos padrões sobre como as atividades devem ser realizadas. Podem ser formais ou não.

Rituais e Cerimônias

• Podem ser definidos como sequências repetitivas de atividades que expressam e reforçam os valores fundamentais da organização.

• Existem vários tipos de rituais: passagem de status, reforço do comportamento, integração.

Heróis• Modelo de comportamento a ser seguido, inspiram

confiança, dada a magnitude de seus atos.• Pessoa em que os colaboradores se espelham, pois

representam o sucesso.

Histórias• As histórias são narrativas sobre acontecimentos

reais que são utilizadas para mostrar o “modo certo de fazer as coisas” dentro da organização

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Mitos• Os mitos são narrativas não sustentadas por fatos

reais, que apresentam algo ou algum feito fantástico, porém consistentes com os valores da organização.

Tabus • Os tabus demarcam e indicam “territórios proibidos”, indi-cando o que não é correto fazer dentro da organização

Slogans • Tornam tangíveis os valores, crenças e objetivos da organização, possibilitando sua memorização

Artefatos• Ambiente de trabalho agradável.• Arquitetura da organização.• Layout da organização.• Modo como as pessoas se vestem.

Linguagem• As organizações, com o passar do tempo, costumam de-

senvolver termos próprios para descrever equipamentos, escritórios, pessoas-chaves, fornecedores e situações rela-cionadas ao negócio no qual a empresa está inserida.

Quadro 4: Elementos da cultura organizacionalFonte Adaptada: Attadia (2007)

A modelagem do comportamento tem como objetivo criar um senso de identidade individual entre o colaborador e a organização, de forma que cada empregado possa compreender seu papel no alcance dos objeti-vos e metas (RIBEIRO, 2006).

Na verdade, embora seja perene, a cultura de uma empresa deve ser capaz de incorporar as mudanças estratégicas e operacionais realizadas pela organização (ATTADIA, 2007).

Dentro desse contexto, é interessante comentar que a cultura da or-ganização deve passar periodicamente por um processo de revalorização, a fim de dar uma nova significado aos valores essenciais (SROUR, 1998).

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Cultura organizacional

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Basicamente, um programa de revalorização da cultura corporativa abrange as seguintes fases (JOHANN, 2004):

• Sensibilização. • Diagnóstico/formação dos modelos sociais. • Ativação dos mecanismos de revalorização.• Modelagem da nova cultura.

7.3.2UCulturaUorganizacionalUxUculturaUUoUpaís

É interessante também ressaltar que a cultura de uma organização é influenciada pela cultura da sociedade/país onde ela está inserida (MOR-GAN, 2000).

As pesquisas realizadas por vários autores indicam que a cultura do país tem um impacto maior sobre os colaboradores do que a cultura orga-nizacional, por mais forte que ela seja na modelagem do comportamento dos funcionários (ROBBINS, 2002).

Uma das pesquisas mais famosas e reconhecidas no sentido de defi-nir critérios para caracterizar a cultura de um país e/ou sociedade, e traçar como suas características impactam a organização e o desempenho dos colaboradores, foi desenvolvida por Hofstede (1984) que identificou cin-co parâmetros para caracterizar cultura de um país/sociedade:

• Distância do poder: até que ponto é aceita a ideia de desigual-dade de distribuição de poder como melhor tipo de organização social.

• Controle das incertezas: esta dimensão diz respeito ao grau de necessidade de controlar incertezas.

• Coletivismo/individualismo: orientação para metas comuns (coletivismo) ou priorização de objetivos pessoais (individua-lismo).

• Masculinidade/feminilidade: atribuição de papéis específicos a cada um dos sexos. As culturas masculinas são duras, firmes, mais competitivas e acreditam que as pessoas desejam reconhe-cimento e oportunidades de crescimento profissional. As cultu-ras femininas são voltadas à educação e desenvolvimento das pessoas, bem como uma preocupação com o estabelecimento de boas relações e com qualidade de vida das pessoas.

• Temporalidade: importância dada ao fator “tempo”. A orien-tação para o longo prazo se revela pelo foco em recompensas

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futuras, garantia de emprego e pelo comportamento austero e perseverante. A orientação para o curto prazo tem seu foco no presente imediato, revelando comportamentos voltados para o respeito à tradição, cumprimento das obrigações sociais, pre-servação da dignidade, auto-respeito e prestígio.

No caso do Brasil, observa-se que a cultura é caracterizada pelos seguintes aspectos: grande concentração de poder, aversão ao risco; equi-líbrio entre aspectos masculinos e femininos na gestão e visão imediatista. (HOFSTEDE, 1984).

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Cultura do Brasil

Essas características da cultura brasileira impactam a cultura organi-zacional das empresas brasileiras de forma positiva e negativa, conforme mostra o quadro a seguir:

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Comportamento e Psicologia Organizacional

Aspectos Positivos Aspectos Negativos• Flexibilidade e capacidade de adap-

tação.• Relações dirigidas pela emoção.• O ambiente profissional é um lugar

para fazer amigos. • Maior disposição de colaborar, prin-

cipalmente em momentos de crise.• Criatividade.• Capacidade de perceber diferenças

individuais e de grupos, e de atuar de acordo com essas diferenças.

• O “jeitinho brasileiro” como mecanis-mo para quebrar regras e conseguir algo de interesse.

• Excesso de autoconfiança. • Tendência a acreditar que crises que

vão sempre passar. • Dificuldade de lidar com conflitos

diretos. • A lealdade é construída em torno

das pessoas e não da empresa. • Tendência ao paternalismo. • Maior tolerância a funcionário que

não fazem a sua parte.• Os heróis são os apagadores de

incêndio.• Pessoas com perfil planejador são vis-

tas como enfadonhas e burocráticas.

Quadro 5: Impactos das características da cultura brasileira nas organizações Fonte: Elaborado pela autora com base em Cohen (2000)

Mediante essas constatações, isso sig-nifica que quando uma empresa se interna-cionaliza, ela deve montar um programa de adaptação de sua cultura organizacional em relação à cultura do país em que está se insta-lando, caso contrário, a empresa terá dificulda-des em manter os colaboradores em sua estrutura.

7.3.3Ulnstitucionalização:UumaUsinalizaçãoUUaUculturaUorganizacional

Segundo Robbins (2002), a ideia de enxergar as organizações como culturas – nas quais existe um sistema de convicções compartilhado por todos os membros – é um fenômeno relativamente recente. Até meados da década de 1980, as organizações eram vistas, quase sempre, apenas como uma forma racional de coordenar e controlar um grupo de pessoas. Pos-suíam níveis verticais, departamentos, relações de autoridade e assim por

Conexão:

Para ampliar seus estu-dos, leia o capítulo 16 – Cultura

Organizacional, p. 372 – 396 – do livro de ROBBINS, S. P. Comporta-mento Organizacional. São Paulo:

Prentice Hall, 2002. É uma leitura válida para a sua

formação. Confira!

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diante. Mas, as organizações são mais do que isso. Elas têm personalidade própria, assim como as pessoas. Podem ser rígidas ou flexíveis, hostis ou apoiadoras, inovadoras ou conservadoras.

Os estudiosos da teoria das organizações admitem esse fato ao reco-nhecer o importante papel que a cultura desempenha na vida dos membros das organizações. É interessante notar, entretanto, que a origem da cultura como uma variável independente que afeta as atitudes e o comportamento dos funcionários remonta há mais de 50 anos, a partir da noção de institu-cionalização (ROBBINS, 2002).

Quando uma organização se institucionaliza, ela assume uma vida própria, independente de seus fundadores ou de qualquer um de seus membros. Ross Perot criou a Electronic Data Systems (EDS) no início da década de 1960, mas a abandonou em 1987 para fundar uma nova empresa, a Perot Systems. Apesar de sua saída, a EDS continuou o seu caminho. Sony, Gillette, McDonald’s e Disney são alguns exemplos de organizações que sobrevivetam aos seus fundadores e a qualquer um de seus membros.

Além disso, quando uma organização se institucionaliza, passa a ter um valor por si mesma, independentemente dos bens e serviços que produz. Ela adquire imortalidade. Se seus objetivos iniciais não são mais relevantes, ela não fecha suas portas, ao contrário, ela se redefine. Um exemplo clássico disto é a March of Dimes. Ela foi criada originalmente para custear a batalha contra a poliomielite. Quando a doença foi prati-camente erradicada na década de 1950, a instituição não encerrou suas atividades. Ela redefiniu seus objetivos como um fundo de pesquisa para a redução da mortalidade infantil e da malformação fetal.

Para Robbins (2002), a institucionalização opera para produzir uma compreensão comum entre os membros da organização acerca do que é o comportamento apropriado e, fundamentalmente, significativo. Assim, quando uma organização assume uma postura institucional, os modos aceitáveis de comportamento se tornam amplamente auto-aceitáveis e quais não são. A maneira como os funcionários serão socializados depen-derá tanto do sucesso obtido no processo de seleção, em relação à adequa-ção entre os valores dos recém-chegados e os da organização, como da preferência dos dirigentes quanto aos métodos de socialização.

A seguir iremos estudar como os funcionários aprendem a cultura. A cultura, segundo Robbins (2002) é transmitida aos funcionários de diver-

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sas maneiras, e as mais poderosas são as histórias, os rituais, os símbolos e a linguagem.

7.3.3.UUHistórias

No tempo em que Henry Ford II foi o presidente da Ford Motor Co., era praticamente impossível encontrar um executivo que não houvesse es-cutado a história sobre o que ele dizia para seus executivos quando eles se tornavam muito arrogantes: “É o meu nome que está no prédio”. A mensa-gem em bastante clara: Henry Ford II dirigia a empresa.

A Nike tem alguns altos executivos que passam boa parte de seu tempo contando histórias da empresa. E essas histórias pretendem passar a mensagem do que é a Nike. Quando eles contam a história sobre como um dos fundadores da empresa, Bill Bowerman (treinador de atletismo no Estado de Oregon), colocou borracha na máquina de fazer wafiles de sua mulher para conseguir um sapato mais apropriado para corridas, eles es-tão falando do espírito de inovação da Nike. Quando os novatos escutam as história de Steve Prefontaine, atleta carismático que lutou para fazer da corrida um esporte profissional e por melhores equipamentos, eles estão aprendendo sobre o comprometimento da Nike com a ajuda aos atletas.

Histórias desse tipo circulam em diversas organizações. Elas ge-ralmente se referem a eventos ocorridos com fundadores de empresas, quebras de regras, sucessos estrondosos, reduções de força de trabalho, recolocações de funcionários, reações a antigos erros, lutas organizacio-nais. Essas narrativas vinculam o presente com o passado e oferecem ex-plicação e legitimidade para as práticas vigentes.

7.3.3.2URituais

Os rituais são sequências repetitivas de atividades que expressam e reforçam os valores fundamentais da organização – quais objetivos são os mais importantes, que pessoas são importantes e quais pessoas são dis-pensáveis.

Um dos rituais mais conhecidos da Wal-Mart é o grito de guerra da empresa. Criado pelo seu fundador, Sam Walton, como uma forma de motivar e unir a força de trabalho, esse grito, semelhante aos das torcidas esportivas, serve para unir os funcionários e reforçar a crença, apresen-tada por Walton, de que eles são importantes para o sucesso da empresa.

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Rituais semelhantes são utilizados pela LBM, Ericsson, Novell, Deutsche Bank e Pricewaterhouse-Coopers.

7.3.3.3USímbolosUmateriais

Os escritórios centrais da Alcoa não se parecem em nada com a ma-triz de uma empresa tradicional. Existem poucas salas individuais, mesmo para os altos executivos. As instalações da empresa são constituídas, es-sencialmente, por cubículos, áreas comuns e salas de reuniões. Esse visual informal sinaliza para os funcionários que a Alcoa valoriza a abertura, a igualdade, a criatividade e a flexibilidade.

Algumas empresas oferecem a seus altos executivos limusines com motorista e livre acesso aos jatos da companhia para suas viagens. Outros não gozam de tantos benefícios, mas ainda podem dispor de um carro para uso pessoal e passagens aéreas pagas pela empresa. Mas o carro é um veículo comum de passeio (sem o motorista) e a viagem aérea é na classe turística de uma companhia aérea comercial.

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Símbolos materiais

O espaço físico da empresa, o tipo de carro disponível para os executivos ou a forma como eles fazem suas viagens aéreas são apenas alguns exemplos de símbolos materiais. Outros poderiam incluir o tama-nho da sede, a elegância do mobiliário e a aparência e vestuário dos exe-cutivos. Esses símbolos materiais sinalizam para os funcionários quem é importante, qual o grau de igualdade almejada pelos dirigentes e o tipo de comportamento considerado apropriado (como assunção de riscos, con-servadorismo, autoritarismo, participação, individualismo etc.).

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7.3.3.4ULinguagem

Muitas organizações e unidades dentro de organizações utilizam a linguagem como forma de identificação dos membros de sua cultura ou subcultura. Ao aprender essa linguagem, os membros demonstram sua aceitação da cultura e, assim fazendo, ajudam a preservá-la.

Na Knight-Ridder Information, empresa de redistribuição de infor-mações econômicas sediada na Califórnia, os funcionários usam um jar-gão próprio que inclui número de acesso (indicando o número atribuído a cada indivíduo no banco de dados), KWIC (referente à sigla de key-wods-in-context, ou palavras-chave no contexto, em português) e operador rela-cional (procura, em um banco de dados, por nomes ou palavras-chave sob algum critério determinado).

As organizações costumam desenvolver, com o passar do tempo, termos próprios para descrever equipamentos, escritórios, pessoas-chave, fornecedores, clientes ou produtos relacionados a seu negócio. No come-ço, os novos funcionários se perdem no meio de tantas siglas e jargões, mas, depois de seis meses na empresa, aqueles termos se tornam parte integrante de sua própria linguagem. Após ser assimilada, essa terminolo-gia funciona como um denominador comum, que une os membros de uma cultura ou subcultura.

7.4UClimaUorganizacional

Para um desempenho organizacional excelente é fundamental que as pessoas estejam comprometidas com os objetivos da empresa e que es-tejam satisfeitas com ambiente de trabalho. Dentro deste contexto, surge o conceito de clima organizacional.

Segundo Mallet (2009), o conceito de clima organizacional tem desper-tado um interesse crescente nos administradores brasileiros desde a década de 70. Não por acaso ou modismo, mas por puro pragmatismo. O que a prá-tica tem demonstrado é que há uma relação direta entre o clima do ambiente de trabalho, a produtividade, a capacidade de inovação e, consequentemen-te, a lucratividade. Um estudo conduzido pela Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (EAESP-FGV) validou este conhe-cimento essencialmente empírico ao demonstrar que entre 1997 e 2005 as

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O clima organizacional refere-se ao sentimento dos colaboradores em relação trabalho diário, ao grau de interação entre indivíduos, grupos e áreas organizacionais, ao nível de satisfação no trabalho, ao nível de mo-tivação e às práticas de gestão de pessoas, como recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento, avaliação de desempenho, remuneração e carreira (CURY, 2000).

Há uma forte inter-relação entre os conceitos de cultura e clima or-ganizacional, embora sejam fenômenos distintos.

É importante destacar que a cultura organizacional têm caráter des-critivo, ou seja, formaliza as crenças e valores da organização e mostra como eles podem ser articulados para que sejam compartilhados por todos os membros da organização (ROBBINS, 2002). Já o clima organizacional tem caráter avaliativo, captando os sentimentos dos colaboradores em re-lação à organização (FLEURY et al., 1996).

Um índice alto de insatisfação em relação ao ambiente de trabalho afeta a qualidade dos produtos e a produtividade da empresa, enquanto que um alto índice de satisfação aumenta a probabilidade dos funcionários comprometerem-se com o alcance dos objetivos e metas da organização (CURY, 2000).

Dentro deste contexto, é importante destacar que o ambiente e as condições de trabalho devem ser estruturados para o desenvolvimento do pleno potencial do colaborador e para motivá-lo a aumentar a produ-tividade, alcançar as metas da organização e apresentar um desempenho superior no trabalho (DESSLER, 2003).

Cabe também comentar, que o clima da organização deve ser ava-liado periodicamente por meio de pesquisa junto aos colaboradores (GIL, 2001).

Melhores Empresas para Trabalhar no Brasil apresentaram retorno 170% acima do Índice Ibovespa e rentabilidade do patrimônio líquido de 17,8%, resultado superior à média das 500 Maiores Empresas do Brasil (11,3%). O estudo revela que o mercado brasileiro está definitivamente deixando para trás a era em que os ativos tangíveis, como máquinas e estoques, eram os únicos que movimentavam a economia. Estamos entrando num território al-tamente complexo e subjetivo, onde as pessoas – suas crenças, valores, com-portamentos e relacionamentos – passam a ser determinantes para o sucesso ou o fracasso do seu negócio.

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Clima organizacional

A pesquisa de clima não pode gerar falsas expectativas nos colabo-radores, por isso é fundamental que sejam determinados os responsáveis e prazos para os planos de ação, assegurando a realização das mudanças apontadas como necessárias na organização (JOHANN, 2004).

A pesquisa de clima organizacional deve ser elaborada por equipe multifuncional, que em primeiro lugar deve conscientizar e sensibili-zar os colaboradores a responderem com seriedade o questionário, para posteriormente aplicá-lo. A coleta e análise dos dados devem receber tratamento estatístico adequado e serem realizadas por pessoas treinadas. Os resultados devem ser divulgados em tempo hábil e discutidos com os colaboradores de forma construtiva (ATTADIA, 2007).

Clima organizacional para Mallet (2009), é a qualidade do ambiente que é percebida ou experimentada pelos participantes da empresa e que influencia o seu comportamento. É aquela “atmosfera psicológica” que todos nós percebemos quando en-tramos num determinado ambiente e que nos faz sentir mais ou menos à vontade para ali perma-necer, interagir e realizar.

Somos influenciados pelo clima organi-zacional e, ao mesmo tempo, o influenciamos. Esse ciclo de influências criará um efeito o qual chamamos de “realimentação de auto-reforço”, fa-zendo com que certas características da cultura sejam amplificadas através de comportamentos repetidos nas relações do dia-a-

Conexão:

Para ampliar seus estudos sobre o assunto, leia o livro de

Gasparetto, Luiz Eduardo. Pes-quisa de Clima Organizacional. São

Paulo: Scortecci. É uma leitura importante. Confira!

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dia. Assim, se a cultura organizacional for virtuosa, esse ciclo amplificará comportamentos construtivos, gerando mais produtividade com qualidade de vida. Mas, se a cultura for viciosa, o ciclo de influências arrastará a empresa para comportamentos cada vez mais destrutivos, prejudicando a produtividade, desgastando as pessoas e os seus relacionamentos.

Portanto, torna-se vital conhecermos os fatores que dificultam a ma-nutenção de um clima organizacional produtivo se pretendemos intervir de forma significativa.

7.4.UUAlgunsUaspectosUUoUclimaUproUutivoU

Para Mallet (2009), os problemas de relacionamento entre colegas, gestores e subordinados, a falta de uma comunicação eficiente, as atitudes negativistas e a instabilidade emocional são os principais inimigos de um clima organizacional otimizado para a produtividade.

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Veja alguns aspectos que podem interferir no clima de uma organi-zação.

Quando aumenta: turnover (perda de talentos); reclamações traba-lhistas; retrabalho; desperdício; perdas diversas.

Quando diminui: produtividade; motivação; assiduidade; inovação. Os prejuízos gerados por uma má gestão do clima organizacional

são catastróficos. Para termos uma ideia da dimensão do problema, vamos avaliar o impacto de apenas três dos principais efeitos ocasionados por um ambiente de trabalho inadequado.

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• Baixa produtividade. Pesquisas indicam que colaboradores com baixos índices de motivação, utilizam somente 8% de sua capacidade de produção. Por outro lado, em setores/áreas/em-presas onde encontramos colaboradores motivados este mesmo índice pode chegar a 60%.

• Gastos com rescisões. Segundo pesquisa realizada pela consul-toria Produtive, de Porto Alegre, 60% dos executivos em pro-cesso de recolocação no mercado foram demitidos por questões comportamentais. Perceba que as principais causas das resci-sões não foram por incompetência técnica, mas pela incapaci-dade de estabelecer relacionamentos interpessoais construtivos e atitudes produtivas.

• Gastos com seleção e treinamento. Este é um item que dispensa pesquisas. Toda empresa tem uma boa noção dos altos custos de tempo e dinheiro envolvidos no processo de seleção e trei-namento do seu pessoal.

A melhoria do clima organizacional é um desafio bastante complexo dado o alto grau de subjetividade envolvido nesse processo. As pesqui-sas de clima organizacional apenas trazem um mapeamento do ambiente psicológico, mas não têm o poder (nem a pretensão) de prover soluções efetivas para o problema. Se pretendemos obter melhorias realmente ex-pressivas e sustentáveis sobre o clima, precisaremos investir em progra-mas práticos capazes de intervir no que acontece “da pele para dentro” das pessoas, e que, portanto, não se limitem a oferecer apenas teorias, mode-los e conceitos. (MALLET, 2009)

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Programas estruturados, que priorizem a otimização dos comporta-mentos produtivos através da redução de estresse e reatividade, bem como do aumento do discernimento e do bem-estar do colaborador. Assim, iniciamos um processo em cadeia que começa com a melhoria do clima do indivíduo e que poderá culminar com a evolução de toda a cultura organizacional.

Mallet (2009) conclui nos esclarecendo que as situações de trabalho antigamente, eram realmente bem mais simples que hoje. Mas, a verdade é que o mercado evoluiu muito nesses últimos 30 anos e, se sua empresa deseja garantir seu lugar ao sol neste novo cenário é importante investir na melhoria do clima organizacional através da melhoria do clima das pessoas.

AtiviUaUe

01. Modificar a cultura de uma organização é extremamente difícil, mas as culturas podem ser modificadas, assinale a alternativa incorreta:a) Uma crise dramática. Refere-se a um choque que desestabilize o sta-tus quo (estrutura da empresa) deixando a organização sem parâmetros e exija o questionamento da cultura vigente.b) Troca de liderança. Uma nova liderança que propõe um novo esquema de valores pode ser percebida como mais capaz de responder à crise. c) Culturas fracas. São mais fáceis de serem mudadas do que as mais fortes.d) O Fundador se afasta da empresa e contrata mão de obra especializa-da para continuar a administração da empresa.e) Organizações são jovens e pequenas. Quanto mais jovem a organiza-ção, mais enraizada a sua cultura.

02. Os rituais fortalecem a cultura de organização. Assinale a alternativa que é um exemplo de um ritual redução de conflitos utilizado pela empresa Masa (Fonte: Revista Exame, 2006).a) Dentre as iniciativas estão a criação de um código de conduta e ética para nortear a relação funcionário-empresab) A empresa também apresenta o Projeto MultiTalentos, que oferece à população cursos profissionalizantes para começar um pequeno negócio e aumentar a renda familiar. c) Oferecimento de programas de reconhecimento moral e financeiro aos funcionários e medidas de estímulo à criatividade do pessoal.

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d) A cada dois meses, Ulisses reúne os funcionários no refeitório, para esclarecer pontos como os cenários do mercado nacional e internacional, o posicionamento da empresa, a evolução do faturamento, os lucros e as principais realizações sociais, entre outros. e) Nenhuma das anteriores.

Reflexão

Em função de cada empresa apresentar características culturais distintas pode-se dizer que a cultura organizacional além de propiciar um senso de identidade, possui também o papel de “definidora de fronteiras”, na medida em que cria distinções entre as organizações.

Cada empresa tem uma cultura própria, sendo difícil de ser copiada por outra organização. Por isso, quando modelada adequadamente, a cul-tura organizacional pode ser uma fonte de vantagem competitiva para a organização.

Os elementos da cultura organizacional explicitam os comporta-mentos aceitáveis e não aceitáveis dentro da organização e servem como um guia para a empresa desenvolver um modelo de disseminação e refor-ço da cultura organizacional

O clima organizacional mede a satisfação do colaborador em rela-ção ao ambiente de trabalho, sendo uma ferramenta de extrema importân-cia para eliminar fontes de insatisfação no trabalho e focos de resistência à mudança. Ao permitir, a compreensão dos aspectos que satisfação no trabalho, o clima organizacional torna-se uma questão crítica para ser ge-renciada pela organização. Você já pensou nisso? Fique atento!

LeituraURecomenUaUa

Para ampliar seus conhecimentos, leia o livro Gestão do Clima Organizacional – de Ricardo Silveira Luz. Belo Horizonte: Qualitymark. Esta obra é fruto da longa experiência autor como executivo, professor e consultor. Sem se prender a discussões teóricas, o autor aborda o tema com a objetividade pertinente ao tema e apontando caminhos a serem seguidos pelas empresas visando melhorar as relações de trabalho que podem vir a prejudicar a produtividade e a motivação dos colaboradores. Uma poderosa ferramenta gerencial para gestores e profissionais de Re-cursos Humanos.

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Confira – sites para aprofundamento dos estudos. Você vai gostar!www.ibmecsp.edu.brwww.ufmg.br

Referências

ATTADIA, L. C. L. Diagnóstico do nível de capacitação gerencial das micro e pequenas empresas : um estudo multicasos no setor moveleiro de São José do Rio Preto. São Paulo, 2007. Tese (Doutorado em Admi-nistração) – Programa de Pós-Graduação em Administração. Faculda-de de Economia, Administração e Contabilidade (FEA). Universidade de São Paulo (USP). 277p.

CURY, A. Organização e métodos: uma visão holística. São Paulo: Atlas, 2000.

DAFT, R. Administração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

DESSLER, G. Administração de Recursos Humanos. 2 ed. São Pau-lo: Prentice Hall, 2003.

ECCLES, R. G.; NOHRIA, N.; BERKLEY, J. D. Beyond the hype: redescovering the essence of management. Boston: Harvard Business School Press, 1992.

FLEURY, M.T. et al. Cultura e poder nas organizações. São Paulo: Atlas, 1996.

FLEURY, A.; FLEURY, M., C. Estratégias empresariais e formação de competências: um quebra-cabeça caleidoscópico da indústria brasi-leira. 3ª. ed. São Paulo: Atlas, 1997.

GIL, A. Gestão de Pessoas: enfoque nos papéis profissionais. São Pau-lo: Atlas, 2001.

HOFSTEDE, G. Culture’s consequences: international differences in work-related values. London: Sage Publications, 1984.

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Comportamento e Psicologia Organizacional

JOHANN, S. L. Gestão da cultura corporativa: como as organiza-ções de alto desempenho gerenciam sua cultura organizacional. São Paulo: Saraiva, 2004.

KAPLAN, R. S.; NORTON, D. P. Mapas estratégicos – Balanced Scorecard: convertendo ativos intangíveis em resultados tangíveis. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

MALLET, R. O poder do ambiente sobre a produtividade. 2009. Disponível em <http://www.webartigos.com> Acesso em: 03 de janei-ro de 2010.

MAXIMIANO, A.C.A. Introdução à Administração. 6 ed. São Pau-lo: Atlas, 2004.

MORGAN, G. Imagens da Organização. São Paulo: Atlas, 2000.

OLIVEIRA, D. Planejamento estratégico: conceitos, metodologia e práticas. São Paulo: Atlas, 2001.

RIBEIRO, A. L. de. Gestão de pessoas. São Paulo: Saraiva, 2006.

ROBBINS, S. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prentice Hall, 2002.

ROCHA, E. P. G. O que é mito. 9 ed. São Paulo: Brasiliense, 1999.

SROUR, R. H. Poder, cultura e ética nas organizações. 12ª. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 1998.

NaUpróximaUuniUaUe

Na próxima unidade você irá estudar o conceito de estrutura organi-zacional. Além disso, você compreenderá os conceitos e as diferenças de organizações mecanicistas e organicistas, sua relação com o ambiente e seu impacto sobre o comportamento organizacional. Venha comigo!

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UniUa

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Estrutura Organizacio-nal e o Comportamento

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Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade você irá estudar o conceito de estru-

tura organizacional, quais são os seus componentes, os tipos de estruturas que os administradores podem

escolher, as vantagens e desvantagens de cada tipo e o seu impacto sobre o comportamento dos funcionários. Serão es-

tudados também os conceitos e as diferenças de organizações mecanicistas e organicistas, sua relação com o ambiente e seu

impacto sobre o comportamento organizacional. Não perca. Você vai gostar.

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar as variáveis do nível dos sistemas organizacionais do estu-

do do comportamento organizacional.• Compreender o conceito de estrutura organizacional.• Identificar quais são os elementos da estrutura organizacional e sua

influência sobre o comportamento dos indivíduos na organização.• Conhecer os conceitos de organização mecanicista e organização

organicista e a influência sobre o comportamento dos indivíduos na organização.

Você se lembra?Você se lembra de ter ouvido alguém dizer alguma coisa sobre

estrutura organizacional? Você sabia que as organizações possuem estruturas diferentes que têm um impacto sobre o comportamento

de seus funcionários. Isso revela a importância do estudo das diferentes estruturas organizacionais.

Além disso, é importante que os administradores sai-bam como estruturar uma organização de maneiras dife-

rentes a fim de obter vantagem competitiva. Para isso, é preciso conhecer as forças e fraquezas das diferentes

maneiras de estruturação (WAGNER III; HOL-LENBECK, 2006, p. 300).

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8.UUConceitoUeUosUelementosUUaUestruturaUorganizacional

Wagner III e Hollenbeck (2006, p.301) definem estrutura organiza-cional como “uma cadeia relativamente estável de interligações entre as pessoas e o trabalho que constituem na organização”. O autor compara a estrutura de uma organização a uma estrutura de aço de um edifício ou o esqueleto do corpo humano que separa as partes diferentes entre si e tam-bém ajuda a manter tais partes interligadas (WAGNER III; HOLLENBE-CK, 2006, p. 301).

A definição de estrutura organizacional de Robbins (2002, p. 401) é mais sucinta “uma estrutura organizacional define como as tarefas são formalmente distribuídas, agrupadas e coordenadas”.

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Estrutura Organizacional

Uma estrutura organizacional é composta por seis elementos: espe-cialização do trabalho, departamentalização, cadeia de comando, amplitu-de de controle, centralização e descentralização e formalização.

Cada um desses elementos responde a uma questão básica do de-senho da estrutura organizacional. No quadro a seguir, Robbins (2002, p.402) descreve tais perguntas e suas respostas:

A pergunta-chave A resposta é dada por1. Até que ponto as atividades podem ser subdi-

vididas em tarefas separadas? Especialização do trabalho

2. Qual a base para o agrupamento das tarefas? Departamentalização3. A quem os indivíduos e os grupos vão se

reportar? Cadeia de comando

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4. Quantas pessoas cada administrador pode dirigir com eficiência e eficácia? Amplitude de controle

5. Onde fica a autoridade no processo decisório? Centralização e descentralização6. Até que ponto haverá regras e regulamenta-

ções para dirigir os funcionários e os adminis-tradores?

Formalização

Quadro 1: Seis questões básicas às quais os administradores devem responder ao planejar a estrutura organizacional apropriada

Fonte: Robbins (2002, p.402)

A seguir veremos sucintamente o conceito de cada um destes ele-mentos:

a) Especialização do trabalho: “grau em que as funções na orga-nização estão subdivididas em tarefas separadas” (ROBBINS, 2002, p. 402).

b) Departamentalização: divisão da organização em “blocos de trabalho chamados de departamento (...). Cada departamento realiza uma parte do trabalho total, que é necessária para a rea-lização dos objetivos organizacionais” (MAXIMIANO, 2004, p. 212). As formas de departamentalização mais comuns são: por funções, por produto, por localização geográfica, por pro-cessos, por cliente e matricial.

c) Cadeia de comando: “linha única de autoridade que vai do topo da organização até o escalão mais baixo, determinando quem se reporta a quem na empresa” (ROBBINS, 2002, p. 405).

d) Amplitude de controle: “número de pessoas subordinadas a um gerente” (MAXIMIANO, 2004, p. 217).

Pat Harpell aprendeu, com sua experiência, uma lição que poucos empreendedores conseguem aprender: ter pessoas demais se reportando diretamente a você pode prejudicar o seu desempenho. Harpell dirige uma empresa de Marketing, fundada por ela em 1982. À medida que esta crescia, ela contratava mais funcionários. No final, contava com 18 pessoas, todas se reportando diretamente a ela. Levou alguns anos, mas finalmente, ela reconheceu que tinha de reduzir esse número. Mas, conseguiu perceber que estava ficando sobrecarregada, pois todos a procuravam para tudo. Mas, quando reduziu o número de funcionários para seis, conseguiu tempo para

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e) Centralização x Descentralização: a centralização consiste no “grau em que o processo decisório está concentrado em um único ponto da organização” e descentralização consiste na “ampliação do processo decisório para a participação dos esca-lões inferiores” (ROBBINS, 2002, p. 407).

f) Formalização: “grau em que as tarefas dentro da organização estão padronizadas” (ROBBINS, 2002, p.408).

As diferentes configurações dos elementos descritos anteriormente resultam em diferentes tipos de estrutura organizacional. Veremos a seguir quais são os tipos de estrutura organizacional mais comuns atualmente.

8.2UTiposUUeUestruturaUorganizacional

Vamos estudar agora os tipos de estruturas organizacionais mais co-muns que é a estrutura simples, a burocracia e a estrutura matricial. Além desses três tipos de estruturas, vamos constatar também nesta unidade os novos tipos de estruturas organizacionais que são: a estrutura de equipe, a organização virtual e a organização sem fronteiras.

Segundo Robbins (2002, p.410-417), a definição de cada uma des-sas estruturas, bem como suas características são apresentadas a seguir:

a) Estrutura simples: “caracterizada por baixo grau de departa-mentalização, grande amplitude de controle, autoridade cen-tralizada em uma única pessoa e pouca formalização”. Este tipo de estrutura é mais encontrado em pequenos negócios onde o proprietário é o principal dirigente. As vantagens da

se dedicar a assuntos mais importantes. A experiência de Harpell não é comum entre os empreendedores. De maneira geral, eles tendem a querer fazer tudo, supervisionar todo mundo e tomar todas as decisões. Um estudo realizado com empreendedores revelou que entre uma dúzia dos mais popu-lares princípios de administração, a amplitude de controle é o que eles me-nos apreciam. Apenas 23% dos participantes concordaram que a amplitude de controle não pode ser muito grande e só 16% acreditam que o principal executivo não pode tratar pessoalmente de todos os problemas. (ROBBINS, 2002).

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estrutura simples são: simplicidade, agilidade, flexibilidade, manutenção barata e clareza das responsabilidades de cada um. A desvantagem é que não é uma estrutura adequada para grandes empresas, pois à medida que uma organização cresce o processo decisório torna-se mais lento devido a sua centra-lização. Outra desvantagem é o risco de tudo depender apenas de uma pessoa (ROBBINS, 2002, p.410).

b) Burocracia: “estrutura com tarefas operacionais extremamente rotineiras, realizadas através de especialização, regras e regu-lamentos muito formalizados, tarefas que são agrupadas em departamentos funcionais, autoridade centralizada, pequena amplitude de controle e processo decisório que acompanha a cadeia de comando”. A vantagem da burocracia é a economia de escala e a duplicação mínima de pessoal e equipamentos devido o agrupamento das especializações afins em departa-mentos funcionais. Outra vantagem advém da centralização das decisões e da alta formalização que torna o processo deci-sório mais ágil. As desvantagens são: conflitos entre as unida-des devido a alta especialização das funções, as metas das uni-dades funcionais podem se sobrepor às metas da organização, preocupação excessiva com regras e regulamentos e falta de autonomia dos empregados (ROBBINS, 2002, p.411).

c) Estrutura matricial: estrutura que cria uma dupla linha de autoridade mediante a combinação da departamentalização funcional com a departamentalização por produto. Segundo Robbins (2002, p.412) a “principal vantagem da estrutura matricial é sua capacidade de facilitar a coordenação quando a organização realiza uma multiplicidade de tarefas complexas e interdependentes”. Existe outra vantagem da estrutura matri-cial. Ela facilita a alocação eficiente de especialistas. Quando indivíduos altamente especializados ficam restritos a um único departamento funcional ou de produto, seus talentos são mo-nopolizados e subutilizados. A estrutura matricial consegue as vantagens de economia de escala ao oferecer à organiza-ção tanto os melhores recursos quanto uma maneira efetiva de assegurar sua utilização eficiente. As desvantagens são a confusão que ela provoca, a sua propensão a estimular lutas de poder e o estresse que causa nos indivíduos.

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d) Estrutura de Equipes: utilização das equipes como meio básico de coordenação das atividades de trabalho. Robbins (2002, p.413) argumenta que a “estrutura de equipe desmonta bar-reiras departamentais e descentraliza o processo decisório ao nível das equipes de trabalho”. A estrutura de equipe também requer que os funcionários sejam tanto generalistas quanto es-pecialistas.

e) Organização Virtual: “Organização pequena que terceiriza a maior parte das funções de negócios. É altamente centralizada, flexível, com pouca ou nenhuma departamentalização”. Rob-bins (2002, p. 414) argumenta que quando as empresa adotam esta estrutura é com o intuito de terceirizar a manufatura a exemplo da Nike e da Reebok que terceiriza sua manufatura para empresas localizadas em países com baixo custo de mão-de-obra como a Índia. A maior vantagem deste tipo de estrutu-ra é que a empresa concentra-se seus esforços naquilo que faz de melhor. Outra vantagem é sua flexibilidade. Ela permite que pessoas com ideias inovadoras e com pouco dinheiro possa competir com sucesso com grandes organizações. A principal desvantagem desse tipo de estrutura é que ela reduz o controle dos dirigentes sobre pontos-chave do seu negócio.

f) Organização sem fronteiras: Organização que busca eliminar a cadeia de comando, ter amplitude ilimitada de controle e substituir os departamentos por equipes autônomas. Segundo Robbins (2002, p. 416) “este tipo de estrutura elimina as fron-teiras internas da organização, tanto verticalmente (hierarquia) como horizontalmente (departamentos) e quebra as barreiras externas entre a empresa e seus clientes e fornecedores”.

A Burocracia está Morta: este argumento é falso. Algumas caracterís-ticas da burocracia encontram-se em declínio. Esse modelo está passando por evidentes mudanças, mas está longe de ser considerado morto. A buro-cracia tem como característica a especialização, a formalização, a departa-mentalização, a centralização, a reduzida amplitude de controle e a adoção da cadeia de comando. Essas características desaparecem nas organizações modernas? Apesar de algumas mudanças, a burocracia continua viva e com boa saúde em muitos lugares. Continua a ser a forma estrutural dominante

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8.2.UUPorUqueUasUestruturasUUiferemUentreUsi?

Nas seções anteriores, descrevemos uma variedade de modelos or-ganizacionais que vão desde a burocracia altamente estruturada e padroni-zada até a organização sem fronteiras, solta e amorfa. Os outros modelos que descrevemos situam-se em algum ponto entre esses dois extremos.

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Estrutura Organizacional

Para Robbins (2002) temos também dois modelos extremos de estrutura organizacional. Vamos chamar um dos extremos de modelo me-canicista. Ele geralmente é sinônimo de burocracia, com extensa departa-mentalização, alta formalização, rede limitada de informações (principal-mente com comunicação descendente) e pouca participação dos baixos escalões no processo decisório. No outro extremo está o modelo orgânico, que lembra bastante a organização sem fronteiras. Ele é achatado , utiliza equipes multifuncionais e multi-hierárquicas, tem baixa formalização, possui uma ampla rede de informações (utilizando a comunicação lateral e ascendente, além da descendente) e envolve uma grande participação no processo decisório.

Com esses dois modelos em mente, agora estamos preparados para responder à questão: por que algumas organizações são estruturadas em

na indústria manufatureira, no setor de serviços, em hospitais, escolas e universidades, bem como nas associações civis e militares. Por quê? Ela ainda é a maneira mais eficiente de organizar as atividades em larga escala (ROBBINS, 2002).

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termos mecanicistas enquanto outras seguem características orgânicas? Quais são as forças que influenciam essas escolhas?

Nas próximas páginas, será apresentado as principais forças iden-tificadas como causas ou determinantes de uma estrutura organizacional, segundo Robbins (2002):

8.2.U.UUEstratégia

A estrutura de uma organização é um meio para ajudar a adminis-tração a conquistar seus objetivos. Como os objetivos derivam da estra-tégia geral da organização, é absolutantentee lógico que a estratégia e a estrutura devem estar intimanente relacionadas. Mais especificamente, a estrutura deve seguir a estratégia. Se a administração fizer uma mudança significativa na estratégia da empresa, sua estrutura precisará ser modifi-cada para acomodar e apoiar a mudança.

A maioria dos modelos estratégicos de hoje foca três dimensões da estratégia – inovação, minimização de custos e imitação – e o sistema es-trutural mais adequado para cada uma delas.

Até que ponto uma organização procura lançar importantes novi-dades em termos de produtos ou serviços? Uma estratégia de inovação não é uma estratégia só para pequenas mudanças cosméticas no que já é oferecido, mas uma orientação para novidades realmente singulares. Ob-viamente, nem todas as empresas buscam a inovação. Essa estratégia pode caracterizar a 3M ou a Apple, mas não uma empresa conservadora como a varejista Marks & Spencer.

Uma organização que busca uma estratégia de minimização de cus-tos controla rigidamente seus custos, limita os gastos com inovações des-necessárias ou esforço de marketing e reduz o preço de venda de produtos básicos. Esta é a descrição da estratégia da rede Wal-Mart ou de empresas que comercializam produtos alimentícios.

As organizações que adotam uma estratégia de Imitação tentam ca-pitalizar as vantagens das duas anteriores. Elas buscam minimizar riscos e maximizar as oportunidades de lucro. Sua estratégia é entrar em novos mercados ou lançar novos produtos só depois que a viabilidade deles tiver sido testada pelos inovadores. Elas tomam as ideias dos inovadores e as copiam. Os fabricantes de artigos de moda em massa, que “roubam” as ideias dos estilistas, seguem essa estratégia. Esse rótulo talvez caracteri-ze empresas conhecidas, como a IBM e a Caterpillar. Elas seguem seus

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concorrentes menores e mais inovadores com produtos melhores, mas somente depois que os concorrentes demonstraram que há mercado para esses produtos.

Os inovadores precisam da flexibilidade da estrutura orgânica, en-quanto os minimizadores de custos buscam a eficiência e a estabilidade da estrutura mecanicista. Os imitadores combinam ambas as estruturas: ado-tam um modelo mecanicista para manter controles rígidos e custos baixos em suas atividades vigentes e, ao mesmo tempo, criam subunidades orgâ-nicas voltadas à busca de novidades.

8.2.U.2UTamanhoUUaUorganização

Existem evidências consideráveis de que o tamanho da organização influencia significativamente sua estrutura. Por exemplo, as grandes orga-nizações – aquelas que empregam 2.000 ou mais pessoas – tendem a ter mais especialização, maior departantentalização, mais níveis verticais e mais regras e regulamentos do que as empresas pequenas. Contudo, essa relação não é linear. Na verdade, o tamanho afeta a estrutura de maneira decrescente. O impacto do tamanho diminui na medida em que a organi-zação se expande. Por que isso acontece? Essencialmente, quando uma empresa tem cerca de 2.000 funcionários, já é bastante mecanicista. Um adicional de 500 funcionários não fará muita diferença. Por outro lado, acrescentar 500 funcionários a uma empresa que tem apenas 300 prova-velmente resultará na necessidade de mudança para uma estrutura mais mecanicista.

8.2.U.3UTecnologia

O termo tecnologia refere-se, aqui, aos meios pelos quais uma empresa transforma insumos em resultados. Toda organização tem pelo menos uma tecnologia para converter seus recursos financeiros, humanos e fïsicos em produtos ou serviços. A Ford Motors, por exemplo, utiliza predominantemente o processo da linha de montagem para fabricar seus produtos. Por outro lado, as universidades podem utilizar diversas técni-cas didáticas – as sempre populares aulas expositivas, o método de estudo de casos, o método de exercícios práticos, o ensino programado, e assim por diante. As estruturas organizacionais se adaptam às suas tecnologias.

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Muitos estudos foram dedicados à relação entre estrutura e tecnolo-gia. Os detalhes desses estudos são bastante complexos e, por isso, vamos diretamente ao ponto tentando resumir o que sabemos.

O tema comum da diferenciação de tecnologias é seu grau de rotini-zação. Isso significa que as tecnologias tendem para atividades rotineiras ou não-rotineiras. No primeiro caso, as operações são automatizadas e pa-dronizadas. As atividades não-rotineiras são personalizadas. Elas incluem atividades variadas, como restauro de móveis, confecção sob medida e pesquisa genética.

Que relações existem entre a tecnologia e a estrutura? Embora não seja uma relação muito forte, descobriu-se que as tarefas rotineiras estão associadas às estruturas mais verticalizadas e departamentalizadas. A rela-ção entre tecnologia e formalização, no entanto, é bastante acentuada. Es-tudos mostram consistentemente que a rotina está associada à presença de manuais de regras, descrição de tarefas e outras documentações formais. Finalmente, descobriu-se que há uma relação interessante entre tecnolo-gia e centralização. Parece lógico que as tecnologias rotinizadas estejam associadas às estruturas centralizadas enquanto as não-rotinizadas, que dependem do conhecimento dos especialistas, são vinculadas à delega-ção da autoridade decisória. Essa posição tem obtido algum apoio, mas uma conclusão mais genérica sobre o assunto sugere que a relação entre tecnologia e centralização é moderada pelo grau de formalização. A regu-lamentação formal e o processo decisório centralizado são mecanismos de controle, e os executivos podem substituir uma pelo outro e vice-versa. As tecnologias rotinizadas devem ser associadas a um controle centrali-zado quando houver um mínimo de regras e regulamentos. Contudo, se a formalização for alta, a tecnologia rotinizada poderá ser acompanhada de descentralização. Assim, podemos prever que a tecnologia rotinizada leva à centralização, mas apenas quando a formalização é baixa.

8.2.U.4UAmbiente

O ambiente de uma organização é composto pelas instituições ou forças externas que têm o potencial de afetar o seu desempenho. Elas incluem, tipicamente, fornecedores, clientes, concorrentes, agências regu-latórias do governo, grupos de opinião pública e outros.

Por que a estrutura de uma organização é afetada pelo seu ambien-te? Por causa das incertezas desse ambiente. Algumas organizações en-

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frentam ambientes relativamente estáveis – neles, poucas forças estão em mutação. Não há, por exemplo, novos concorrentes, nenhuma inovação tecnológica por parte da atual concorrência nem atividades de grupos de opinião pública que possam influenciar a organização. Outras empresas enfrentam ambientes muito dinâmicos – mudanças rápidas de legislação que afetam seus negócios, novos concorrentes, dificuldades na aquisição de matéria-prima, mudança constante nas preferências dos consumidores e assim por diante. Os ambientes estáveis geram bem menos incertezas do que os dinâmicos. Como a incerteza é uma ameaça à eficácia da organi-zação, os executivos farão de tudo para minimizá-la. Uma das formas de reduzir a incerteza ambiental é fazer ajustes na estrutura da organização.

Pesquisas recentes ajudaram a esclarecer o que significa incerteza ambiental. Foram identificadas três dimensões no ambiente de uma orga-nização: a capacidade, a volatilidade e a complexidade.

A capacidade de um ambiente refere-se ao grau em que ele conse-gue sustentar o crescimento. Ambientes ricos e em crescimento geram re-cursos abundantes, que podem ajudar a organização em tempos de relativa escassez.

A capacidade abundante abre espaço para que a organização cometa erros, o que não acontece quando a capacidade é escassa. No ano de 2004, por exemplo, as empresas que operavam com software empresarial multi-mídia tinham ambientes relativamente abundantes, enquanto as organiza-ções de intermediação de negócios enfrentavam uma escassez relativa.

O grau de instabilidade de um ambiente é capturado na dimensão da volatilidade. Onde existe um alto grau de mudança imprevisível, o am-biente é dinâmico. O ambiente dinâmico atrapalha quando os executivos têm de fazer previsões acuradas sobre as probabilidades associadas a di-versas alternativas de decisão. No outro extremo, está o ambiente estável. As mudanças ocorridas na década de 1990 nos países do Leste Europeu e o fim da Guerra Fria tiveram um efeito avassalador sobre a indústria ar-mamentista norte-americana. Isso transformou o ambiente das principais empresas do setor – como Lockheed Martin, General Dynamics e Nor-throp Grumman – que passou de relativamente estável para dinâmico.

Finalmente, o ambiente deve ser avaliado em termos de sua comple-xidade, ou seja, o grau de heterogeneidade e de concentração dos elemen-tos ambientais. Os ambientes simples são homogêneos e concentrados. Isso pode descrever a indústria do tabaco, pois há relativamente poucos participantes. Para essas empresas, é fácil manter vigilância sobre a con-

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corrência. Em comparação, os ambientes caracterizados pela heterogenei-dade e pela dispersão são chamados de complexos. É o caso das empresas que atuam com a Internet. Todos os dias parece surgir um “vizinho novo no bairro”, que concorrerá com os provedores em atividade.

Existem evidências que relacionam os graus de incerteza ambiental a diferentes arranjos estruturais. Mais especificamente, quanto mais escas-sos, dinâmicos e complexos o ambiente, mais orgânica a estrutura deve ser. Por outro lado, quanto mais abundante, estável e simples o ambiente, mais adequada será a estrutura mecanicista.

8.3UOsUelementosUUaUestruturaUorganizacionalU

Robbins (2002, p. 422) avalia quais são os efeitos de alguns ele-mentos da estrutura organizacional no comportamento do funcionário e destaca a importância das diferenças individuais.

A seguir serão descritas as conclusões de Robbins (2002, p. 422-424):a) Especialização do trabalho: segundo Robbins (2002, p.422)

“as evidências indicam que, de modo geral, a especialização do trabalho contribui para uma maior produtividade do fun-cionário, mas ao preço de sua satisfação com o trabalho ser reduzida”. O autor ressalta ainda que “embora mais gente hoje rejeite as tarefas super especializadas do que as gerações an-teriores seria ingênuo ignorar a realidade de que uma parcela da força de trabalho ainda prefere a rotina e a repetição dos trabalhos super especializados”. Algumas pessoas querem um trabalho que exijam o mínimo de sua capacidade intelectual e que ofereça a segurança da rotina. Para essas pessoas a espe-cialização do trabalho é uma fonte de satisfação.

b) Amplitude de controle: segundo Robbins (2002, p. 423) “a revisão das pesquisas indica que não há evidência suficiente para corroborar uma relação entre amplitude de controle e o desempenho do funcionário”. O que se observa é que algumas pessoas preferem ser deixadas a sós, enquanto outras preferem a segurança de um chefe sempre presente.

c) Centralização e Descentralização: segundo Robbins (2002, p. 423) “há evidências suficientemente fortes que relacionam a centralização e a satisfação com o trabalho”. Além disso, Ro-bbins (2002, p. 423) afirma que “as evidências indicam que a

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participação no processo decisório está positivamente relacio-nada com a satisfação com o trabalho”.

Para finalizar a discussão sobre os efeitos dos elementos da estrutura organizacional e o comportamento do funcionário, Robbins (2002), resume: as pessoas não selecionam os funcionários de maneira aleatória. Existem evi-dências substanciais de que os indivíduos são atraídos, selecionados e perma-necem nas organizações que se ajustam às suas características pessoais. (...) Dessa forma, os efeitos da estrutura sobre o comportamento dos funcionários são indubitavelmente reduzidos quando o processo de seleção facilita a ade-quação das suas características individuais com as da organização.

8.4UMoUeloUmecanicistaUxUmoUeloUorgânicoU

Burns e Stalker (apud Andrade e Amboni, 2007, p. 184) desenvol-veram uma pesquisa com vinte indústrias inglesas a fim de verificar a rela-ção existente entre as práticas administrativas e o ambiente externo.

Os autores chegaram a conclusão de que as organizações possuíam características diversas, e com base nesses resultados, os autores classifi-caram as organizações como mecanicistas e organicistas conforme mos-traremos no quadro a seguir:

Organizações Mecanicistas• Estrutura vertical por meio de uma minuciosa divisão do trabalho.• As atividades eram desenvolvidas por especialistas, segundo os cargos da organização.• As decisões eram tomadas pelo nível estratégico.• O comando era único, ou seja, cada empregado deveria se reportar a um único

superior.• Sistema rígido de controle.• A comunicação ascendente, de baixo para cima, passa por um processo de racionaliza-

ção – só sobe para os níveis hierárquicos o que for de interesse da alta administração.• Amplitude de controle do supervisor com menos número de empregados vinculados

em decorrência da divisão minuciosa do trabalho.• As relações verticais prevalecem no ambiente de trabalho.• Os empregados deveriam seguir cegamente as normas e os procedimentos sem

poder de questionamento.• Ênfase nos princípios universais da Teoria Clássica.

Fonte: Burns e Stalker (apud ANDRADE e AMBONI, 2007:184).

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Organizações Mecanicistas• Estruturas organizacionais mais flexíveis, com menos níveis hierárquicos.• Desenho de cargos baseado nos princípios de complementaridade de competências.• As decisões são tomadas em todos os níveis da empresa, de acordo com tipo e a

amplitude.• O conhecimento é pré-requisito para o desenvolvimento das atividades.• O número de empregados vinculados a cada superior é mais amplo em decorrência

do desenho do cargo.• Valorização das comunicações ascendentes, de baixo para cima, e das organiza-

ções informais.• Ênfase nos postulados da Escola de Relações Humanas.

Quadro 3: Característica das Organizações Organicistas Fonte: Burns e Stalker (apud ANDRADE e AMBONI, 2007:185).

Chiavenato (2005, p.21) define uma organização mecanicista como “centralizadora, rígida e controladora” e a organização organicista como “descentralizadora, flexível e impulsionadora”.

Vamos visualizar na figura a seguir como seria uma estrutura de uma organização mecanicista e de uma organização organicista, bem como as principais diferenças entre elas:

Figura 1: Modelo Mecanicista versus Modelo Orgânico

Modelo Mecanicista Modelo Orgânico• Alta especialização.• Rígida departamentalização.• Clara cadeia de comando.• Amplitude de controle limitada.• Centralização.• Alta formalização.

• Equipes Multifuncionais.• Equipes Multierárquicas.• Livre fluxo de informações.• Amplitude de controle abrangente.• Descentralização.• Baixa formalização.

Fonte: ROBBINS (2002, p.418)

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Segundo Andrade e Amboni, (2007, p.185), as organizações meca-nicistas convivem melhor em um ambiente estável, pois neste há pouca ou nenhuma mudança imprevista ou repentina. Devido a esse fato, a organi-zação mecanicista não necessita modificar com frequência seus produtos, há pouca variação na demanda; a legislação que afeta a organização e os seus produtos geralmente permanecem inalteradas por muito tempo e em geral não há desenvolvimento tecnológico setorial, de modo que não é necessário o investimento da organização em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos.

Segundo Andrade e Amboni (2007, p.185), o empregado de uma or-ganização mecanicista é um especialista, pois desenvolve sempre a mes-ma tarefa, possui visão cega do que faz para a organização, não conhece o início-meio-fim do ciclo envolvido para o desenvolvimento da atividade e não pode questionar.

Já as organizações organicistas são mais apropriadas para ambien-tes em constante transformação onde sempre há inovação em produto, mercado, legislação e tecnologia. Por esta razão, suas estruturas organi-zacionais possuem poucos níveis hierárquicos, os cargos são desenhados para valorizar a complementaridade de competências e para facilitar as interações entre os públicos interno e externo. (ANDRADE e AMBONI, 2007, p.185).

Segundo Andrade e Amboni (2007, p.185), o empregado de uma organização organicista deve ser flexível, ágil e ter uma atuação proativa perante o ambiente em transformação.

No que tange à preferência dos empregados em relação a um mode-lo e outro, podemos afirmar que apesar da liberdade e flexibilidade ineren-tes ao modelo organicista, nem todas as pessoas sentem-se satisfeitas em organizações que adotam este modelo. É o que Robbins (2002, p.422) res-salta: Nem todo mundo prefere a liberdade e a flexibilidade das estruturas orgânicas. Algumas pessoas se sentem mais satisfeitas e são mais produti-vas que o seu trabalho é padronizado e a ambiguidade é minimizada – ou seja, sob a estrutura mecanicista.

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8.4.UUOsUmoUelosUorganizacionaisUeUoUcomportamentoUUoUfuncionário

Segundo Robbins (2002), a estrutura da organização pode ter efeitos significativos sobre seus membros. Nesta seção, vamos avaliar diretamen-te quais são esses efeitos.

Uma revisão das evidências que ligam as estruturas organizacionais ao desempenho e à satisfação dos funcionários nos conduz a uma con-clusão bastante clara: não se pode generalizar! Não é todo mundo que prefere a liberdade e a flexibilidade das estruturas orgânicas. Algumas pessoas se sentem mais satis-feitas e são mais produtivas quando seu trabalho é padronizado e a ambiguidade é minimizada – ou seja, sob uma estrutu-ra mecanicista.

Assim, qualquer discussão relativos aos efeitos do modelo organizacional sobre o comportamento dos funcionários precisa consi-derar as diferenças individuais. Para ilustrar este ponto, vamos considerar as preferências dos funcionários pela especialização do trabalho, amplitu-de de controle e centralização.

As evidências indicam que, de modo geral, a espedalização do trabalho contribui para uma maior produtividade do funcionário, mas o preço é a redução de sua satisfação no trabalho.

Contudo, essa afirmação ignora as diferenças individuais e o tipo de trabalho que cada pessoa realiza.

A especialização do trabalho não é uma fonte inesgotável de produ-tividade mais alta. Os problemas começam a surgir, e a produtividade a cair, quando as deseconomias de realizar tarefas repetitivas é limitada su-peram as economias da especialização. Como a força de trabalho tornou-se mais educada e desejosa de trabalhos que sejam intrinsecamente re-compensadores, o ponto em que a produtividade começa a declinar parece ser alcançado mais rapidamente hoje do que em décadas passadas.

As tarefas das mulheres que trabalham na linha de montagem de panelas de pressão, em uma fábrica em São Paulo, são altamente padroni-zadas. As diferenças individuais influenciam a maneira como elas reagem a este trabalho super-especializado. Muitas podem apreciar a rotina e a

Conexão:

Para ampliar seus estudos, leia o capítulo 15 – Fundamen-tos da Estrutura Organizacional,

p. 349 - 369 - do livro de ROBBINS, S. P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prentice Hall, 2002. É um capítulo importante para complemen-

tar os conhecimentos adquiridos anteriormente. Confira!

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repetitividade de suas tarefas porque trabalhar ao lado das colegas lhes dá a possibilidade de criar vínculos sociais no serviço

Embora mais gente hoje em dia rejeite as tarefas superespecializa-das do que as gerações anteriores, seria ingênuo ignorar a realidade de que uma parcela da força de trabalho ainda prefere a rotina e a repetição de trabalhos superespecializados. Algumas pessoas querem um serviço que exija o mínimo de sua capacidade intelectual e que ofereça a segurança da rotina. Para esses indivíduos, a alta especialização do trabalho é fonte de satisfação.

A questão empírica que se coloca é, evidentemente, se esta parcela representa 2 ou 52 por cento dos trabalhadores. Como existe uma certa auto-seleção na escolha das carreiras, podemos concluir que os resultados comportamentais negativos da alta especialização têm maior probabilida-de de aparecer em carreiras de profissionais com alta qualificação, alme-jadas por indivíduos com grande necessidade de crescimento pessoal e de diversidade.

Uma revisão das pesquisas indica que não há evidência suficiente para corroborar uma relação entre a amplitude de controle e o desempe-nho do funcionário. Embora seja intuitivamente atraente argumentar que uma grande amplitude de controle pode levar a um desempenho melhor do funcionário por permitir uma distância maior da supervisão e dar mais oportunidade para a iniciativa pessoal, as pesquisas não corroboram essa posição. Até hoje, não é possível afirmar que qualquer amplitude de controle seja a melhor para gerar bom desempenho e alta satisfação no trabalho. O motivo, novamente, pode ser imputado às diferenças indivi-duais: alguns preferem ficar sós, enquanto outros preferem a segurança de um chefe sempre presente. Consistentemente com as diversas teorias contingenciais sobre liderança podemos esperar que fatores como as ex-periências e as capacidades dos funcionários, bem como a estrutura de suas tarefas, possam explicar quando uma amplitude de controle grande ou pequena contribuirá para seu desempenho e satisfação. Contudo, existe alguma evidência de que a satisfação de um executivo aumenta conforme o crescimento do número de subordinados sob sua supervisão.

Encontramos evidências suficientemente fortes que relacionam a centralização e a satisfação ao trabalho. De maneira geral, as organizações menos centralizadas possuem uma quantidade maior de participação no processo decisório. As evidências indicam que a participação no processo decisório está positivamente relacionada à satisfação no trabalho, mas,

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novamente, surgem diferenças individuais. A relação entre descentraliza-ção e satisfação é mais forte entre os funcionários com baixa auto-estima. Como esses indivíduos têm menos confiança em suas próprias habilida-des, eles preferem compartilhar as decisões, o que significa não ter de enfrentar sozinhos a responsabilidade pelos resultados.

Concluiu-se que para maximizar o desempenho e a satisfação dos funcionários, deve-se levar em consideração as diferenças individuais – como experiência, personalidade e tarefa.

A cultura nacional também influencia a preferência pela estrutura e, por isso, deve ser levada em conta. As organizações que trabalham com pessoas onundas de países com culturas de grande distância do po-der – com é o caso da Grécia, da França e da maioria dos países latino-americanos – terão funcionários muito mais propensos a aceitar o modelo mecanicista do que as que empregam gente que vem de países com pouca distância do poder. Assim, é preciso considerar as diferenças culturais juntamente com as diferenças individuais ao fazer previsões sobre como a estrutura afetará o desempenho e a satisfação dos funcionários.

Um comentário um tanto óbvio precisa ser feito antes de encerrar-mos esta seção. As pessoas não selecionam seus empregadores de maneira aleatória. Existem evidências substanciais de que os indivíduos são atraí-dos, selecionados e permanecem em organizações que se ajustam às suas características pessoais. Os candidatos que preferem a previsibilidade, por exemplo, provavelmente buscarão emprego em estruturas mecanicistas, enquanto os que gostam de autonomia tenderão mais para os modelos orgânicos. Dessa forma, os efeitos da estrutura sobre o comportamento do funcionário são indubitavelmente reduzidos quando o processo de seleção facilita a adequação das características individuais com as da organiza-ção.

O tema desta unidade é o fato de a estrutura interna da organização contribuir para explicar e prever o comportamento. Além dos fatores in-dividuais e de grupo, as relações estruturais em que as pessoas trabalham têm influencia sobre as atitudes e os comportamentos dos funcionários.

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Estrutura Interna

Quais são as bases da afirmação de que a estrutura tem impacto tanto sobre as atitudes como sobre o comportamento? A medida que a es-trutura organizacional reduz a ambiguidade para os funcionários – escla-recendo questões como “O que devo fazer?”, “Como devo fazê-lo?”, “A quem devo me reportar?” e “Quem devo procurar se tiver um problema?” –, ela molda suas atitudes e lhes fornece motivação e facilidades para ob-ter melhores níveis de desempenho.

Evidentemente, a estrutura também restringe os funcionários, limi-tando e controlando o que eles fazem. Por exemplo, organizações estrutu-radas com altos níveis de formalização e de especialização, estrita adoção de cadeia de comando, pouca delegação de autoridade e pequena amplitu-de de controle proporcionam muito pouca autonomia a seus funcionários. O controle nessas empresas é rígido e o comportamento tem pouco espaço para variação. Por outro lado, as organizações estruturadas com pouca especialização, baixa formalização, grande amplitude de controle, e assim por diante, oferecem maior liberdade a seus funcionários e, por isso, apre-sentam uma variação muito maior de comportamentos.

Resumindo: a estratégia, o tamanho, a tecnologia e o ambiente determinam o tipo de estrutura de uma organização. Para efeito de sim-plificação, vamos classificar os modelos estruturais em duas categorias: mecanicista e orgânico. Os efeitos específicos do modelo estrutural sobre o desempenho e a satisfação dos funcionários serão moderados pelas pre-ferências individuais e pelas normas culturais.

Um último ponto: os executivos precisam lembrar que as variáveis estruturais – tais como especialização do trabalho, amplitude de controle, formalização e centralização – são características objetivas que podem ser medidas pelos pesquisadores. Os achados e conclusões oferecidos nesta unidade são, de fato, resultado direto do trabalho desses estudiosos. Mas, os funcionários não medem de forma objetiva essas características estru-turais.

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Organizações e Pessoas

Eles observam as coisas a seu redor de maneira inconsciente e for-mam os seus próprios modelos implícitos do que parece ser a estrutura da organização. Quantas pessoas o entrevistaram antes que o emprego lhe fosse oferecido? Quantas pessoas trabalham no mesmo departamento ou no mes-mo edifício? Existe um manual das políticas da empresa? O manual está facilmente disponível e as pessoas o seguem de verdade? Como a empresa e seus dirigentes costumam ser descritos na imprensa? As respostas a essas perguntas, somadas às experiências anteriores e aos comentários dos colegas, levam o funcionário a formar uma imagem genérica e subjetiva da estrutura da organização. Essa imagem, contudo, pode não ter nada que ver com as re-ais características objetivas da estrutura orgarnizacional.

A importância desses modelos implícitos de estrutura organizacio-nal não deve ser menosprezada. As pessoas respondem às suas percepções como se elas fossem a realidade objetiva. Por exem-plo, a pesquisa sobre as relações entre muitas das variáveis estruturais e os subsequentes níveis de desempenho e satisfação no trabalho estão longe de ser consistentes. Explicamos essas discrepâncias em fun-ção das diferenças individuais. Contudo, outra causa para essas inconsistências pode ser a diferença de percepção das características objetivas. Os pesquisado-res sempre focam os níveis reais dos vários

Conexão:

Para ampliar seus conheci-mentos sobre a temática estrutura

organizacional, leia o livro de Djalma de Pinho Rebouças de Oliveira. Estru-tura organizacional: uma abordagem

para resultados e competitividade. São Paulo: Atlas, 2006. Você irá fazer

uma excelente leitura.

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componentes estruturais, mas isso pode ser irrelevante se as pessoas interpretarem componentes similares de maneiras diferentes. A questão fundamental, portanto, é entender como os funcionários interpretam a es-trutura de sua organização. Isso seria capaz de oferecer um indicador mais preciso do seu comportamento do que as características objetivas em si.

AtiviUaUe01. Classifique em qual Escola da Administração cada modelo organiza-cional se baseia.

( a ) Modelo mecanicista ( )( b ) Modelo organicista ( )

( 1 ) Escola Clássica( 2 ) Escola das Relações Humanas

Faça uma revisão sobre as Escolas da Administração que você estu-dou na disciplina de Administração Geral no início do curso e justifique sua resposta.

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02. O desenho a seguir representa qual tipo de estrutura organizacional? Descreva quais são as suas vantagens e desvantagens. Por que não é apro-priada para grandes empresas?

Proprietário daempresa

Vendedor BVendedor AAssistente

Administrativo eFinanceiro

Office Boy

Reflexão

Vimos nesta unidade que a estrutura de uma organização influencia o comportamento das pessoas. No entanto, em relação à especialização do trabalho, amplitude de controle, formalização e centralização há de se considerar as diferenças individuais. Há o indivíduo que deseja trabalhar com autonomia, mas há também aquele que se sente seguro com a presen-ça e a estruturação do trabalho pelo seu superior. E para concluir, como já dito anteriormente, as pessoas são atraídas para trabalhar em organizações que se ajustam as suas características e preferências pessoais.

LeituraURecomenUaUa

Leia o livro de SLATER, Robert. Jack Welch, O executivo do sécu-lo: os insights e segredos que criaram o estilo GE. São Paulo: Negócios, 2001. Nesta obra são relatados os insights e segredos que criaram o estilo

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General Electric. Relato, escrito pelo jornalista Robert Slater, da trajetória deste grande executivo que, em 1981, tornou-se presidente da General Electric, transformando-a na companhia com o maior valor de mercado do mundo: as ações da GE subiram 50% somente no ano passado e ela é, hoje, a quinta empresa norte-americana em faturamento, que chega a 90,84 bilhões de dólares anuais. A leitura revela diferentes aspectos do executivo mais admirado dos EUA: honestidade, energia e incrível capa-cidade de comunicação.

Referências

ANDRADE, R.O., AMBONI, N. Teoria Geral da Administração. Das origens às Perspectivas Contemporâneas. São Paulo: Makron Books do Brasil. Editora Ltda.

CHIAVENATO, I. Gerenciando com as pessoas. Transformando o executivo em um excelente gestor de pessoas. 3 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

MAXIMIANO, A.C.A. Introdução à Administração. 6 ed. São Pau-lo: Atlas, 2004.

ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prenti-ce Hall, 2002.

WAGNER III, J.A., HOLLENBECK, J.R. Comportamento Organi-zacional. Criando Vantagem Competitiva. São Paulo: Saraiva, 2006.

NaUpróximaUuniUaUe

Na próxima unidade, iremos estudar as práticas de recursos huma-nos: Recrutamento, Seleção, Treinamento, Avaliação de Desempenho; Remuneração e Benefícios e o estudo de comportamento organizacional. É um assunto interessante. Irá fazer você pensar e ficar curioso como estas práticas ocorrem dentro de uma organização. Venha comigo!

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Processo de ensino-aprendizagemNesta unidade você irá estudar as práticas de

recursos humanos: Recrutamento, Seleção, Trei-namento, Avaliação de Desempenho; Remuneração e

Benefícios e o estudo de comportamento organizacional. São aspectos muito importantes dentro de uma organiza-

ção. Vamos discutir esses assuntos?

Objetivos da sua aprendizagem• Apresentar as variáveis do nível dos sistemas organizacionais

do estudo do comportamento organizacional.• Discutir sobre as práticas de recursos humanos à luz do estudo

do comportamento organizacional.

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Você se lembra?Você se lembra de alguém ter dado o devido valor as pessoas dentro

de uma organização? Já dizia Henry Ford que “as duas coisas mais impor-tantes de uma empresa não aparecem nos seus demonstrativos financeiros: sua reputação e suas pessoas” (LACOMBE, 2005, p.16).

Uma empresa é uma entidade social constituída por pessoas e são elas que tomam decisões e determinam o seu futuro.

A administração de recursos humanos possibilita a obtenção de vantagem competitiva para a organização por meio das pessoas através da seleção e retenção de talentos humanos.

Corroborando com esta ideia, Wagner III e Hollenbeck (2006, p.5) afirmam que “muitos especialistas consideram atualmente as pessoas que formam uma organização como a fonte primeira de vantagem competitiva sustentável”.

Neste contexto, as políticas e práticas de recursos humanos desem-penham um papel importante no que tange a produtividade e a satisfação das pessoas em uma organização.

É importante conhecer quais são estas práticas e quais são as tendên-cias atuais em relação à gestão de pessoas. A seguir, veremos especifica-mente as seguintes práticas de recursos humanos: recrutamento, seleção, treinamento, avaliação de desempenho e remuneração e benefícios.

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9.UURecrutamentoU

Em um mundo globalizado e competitivo de hoje, a escolha da pes-soa certa para trabalhar no lugar certo é vital à sustentabilidade da empre-sa no longo prazo.

Segundo Chiavenato (2005, p. 96), “pessoas bem selecionadas e bem posicionadas não somente contribuem para o adequado funciona-mento da empresa bem como também constituem um significativo poten-cial para futuras incursões da empresa”.

As práticas de recursos humanos responsáveis por escolher as pes-soas para trabalharem em determinados cargos ou funções é o recruta-mento e a seleção.

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Recrutamento

Por recrutamento Chiavenato (2005, p. 98) entende que seja: – “Todos os esforços da empresa em atrair e engajar novos cola-boradores” – “Ação convidativa e aliciadora no sentido de atrair as pessoas e estimulá-las a ingressar na organização”– “Atividade constante e ininterrupta, pela qual a empresa sem-pre tem suas portas abertas ao público interessado”.

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O recrutamento de candidatos a uma vaga na empresa pode ser tanto externo – busca de candidatos a vaga no mercado de trabalho – quanto interno – busca de candidatos que estejam trabalhando na própria empresa a ser transferido ou promovido a uma outra posição.

O que você acha mais vantajoso à empresa o recrutamento externo ou o recrutamento interno? Nos quadros a seguir veremos quais são as vantagens e desvantagens do recrutamento interno e externo para que você possa refletir sobre esta questão:

Um desafio para muitas organizações é conseguir candidatos para as va-gas disponíveis. Para poder contratar pessoas qualificadas, uma organização precisa ter grande número possível de funcionários, a fim de poder escolher entre eles. Para alguns cargos, recrutar candidatos talvez seja relativamen-te fácil. Para outros, em que há poucos candidatos, uma organização deve empregar esforços consideráveis para atrair as pessoas certas para preencher suas vagas. Diversos métodos podem ser usados para recrutar candidatos para um cargo vago. Alguns destes métodos exigem pouco esforço, como colocar um anúncio no jornal, por exemplo. Outros talvez exijam esforços de uma ou mais pessoas, em tempo integral, por exemplo colocar recrutado-res universitários entrevistando funcionários em potencial. As seis possíveis fontes por meio das quais se pode conseguir candidatos, mais comumente utilizadas pelas organizações são: anúncio, recrutamento em escolas, refe-rências pessoais, candidatos independentes, agências de emprego e web. A escolha da fonte da qual serão selecionados os candidatos depende da facili-dade com que as organizações podem recrutá-los (SPECTOR, 2005).

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Vantagens do recrutamento interno Vantagens do recrutamento externoÉ mais rápido e econômico.

Maior validade e segurança.

Maior motivação para o pessoal.

Aproveita investimentos de treinamento.

Proporciona encarreiramento.

Desenvolve espírito sadio de competição entre os funcionários.

Dá valor à prata da casa.

Traz “sangue novo” à empresa.

Renova e enriquece o patrimônio da em-presa.

Aproveita investimentos de treinamento de outras empresas.

Promove criatividade e inovação com idéias vindas de fora.

Sacode o status quo da empresa.

Quadro 1: As vantagens do recrutamento interno e externoFonte: Chiavenato (2005, p.99).

Desvantagens do recrutamento interno Desvantagens do recrutamento externoExige potencial de desenvolvimento dos candidatos para futuras promoções.

Pode gerar conflitos de interesses entre os funcionários.

Pode gerar atitudes negativas dos funcio-nários não escolhidos.

Pode conduzir a uma progressiva adapta-ção e bitolamento das pessoas.

Não pode ser exclusivo, pois limita e cer-ceia o capital humano da empresa.

É um processo demorado e lento.

É um processo oneroso em tempo e em custos.

É menos seguro e confiável que o recru-tamento interno.

Quando monopoliza as oportunidades pode frustrar as expectativas do pesso-al.

Pode sinalizar barreiras aos planos de carreira dos funcionários.

Pode reduzir a lealdade à empresa.

Pode afetar a política salarial da empresa quando o novo funcionário for admitido com salário mais alto.

Quadro 2: As desvantagens do recrutamento interno e externoFonte: Adaptado de Chiavenato (2005, p.99).

A resposta é um programa de recrutamento misto, ou seja, que bus-que candidatos tanto no mercado de trabalho quanto dentro da própria em-presa, isso tende a maximizar as vantagens de cada uma das modalidades de recrutamento e minimizar suas desvantagens.

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9.2USeleção

Após definidos como serão recrutados os candidatos à posição vaga na empresa, é necessário selecionar o candidato que mais se adéque a esta vaga. A prática de recursos humanos responsável por comparar os vários candidatos e escolher o melhor é a seleção.

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Seleção de pessoal

Segundo Robbins (2002, p. 463) “o objetivo da seleção eficaz é adequar as características individuais (capacidade, experiência, etc) aos requisitos do trabalho”. O autor afirma ainda que quando esta adequação não ocorre, tanto o desempenho quanto a satisfação do funcionário ficam prejudicados.

Talvez o maior desafio para o futuro da seleção no trabalho resulte da mudança da essência do trabalho e dos trabalhadores. Os requisitos das características necessárias para o bom desempenho no trabalho estão mu-dando no mundo todo. Pesquisas apontam que o aumento no emprego de equipes de trabalho irá exigir a seleção de pessoas capazes de trabalhar bem em grupo, mas também de pessoas que sejam capazes de executar tarefas. Um outro desafio é acabar com a discriminação na seleção de funcionários. Isso irá exigir uma mudança nas tomadas de decisões para contratar funcio-nários baseados nos fatores de relevância ao trabalho. Utilizar mais a abor-dagem científica na seleção irá ajudar a eliminar as práticas injustas. Uma técnica que está sendo utilizada com sucesso é fazer com que as decisões sejam tomadas por grupo de gerentes e não por determinados indivíduos.

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Portanto, como definir quais são os requisitos do trabalho? Como mensurar e avaliar as características dos candidatos? E, finalmente, como adequar as características do candidato aos requisitos do trabalho? Vamos visualizar a resposta na figura a seguir:

Especificações do cargo

O que o cargo requer

Análise e descrição do cargo para saber quais os requisitos que o cargo exige do seu ocupante

Características do candidato

O que o candidato oferece

Técnicas de seleção para saber se o candidato tem condições pessoais de ocupar o cargo desejado

Versus

Versus

Versus

Figura 1: O conceito de seleção de pessoal como uma comparaçãoFonte: CHIAVENATO (2005, p.104).

O instrumento que permite a definição dos requisitos do trabalho é a análise do cargo ou trabalho. A definição deste instrumento é: “descrição detalhada das atividades inerentes ao trabalho, a determinação da relação ente uma função e outra e a identificação dos conhecimentos, habilidades e capacidades necessários para que o funcionário possa desempenhar com sucesso suas funções” (ROBBINS, 2002, p.464).

Além da análise do cargo, outros dois instrumentos, a descrição e a especificação do cargo ou trabalho, também nos auxiliam na definição dos requisitos do trabalho. A definição de cada uma deles é:

– Descrição do trabalho: “declaração por escrito de tudo o que o funcionário faz, como deve ser feito e por que é feito” (ROB-BINS, 2002, p.464).

Aparentemente, desta maneira é mais difícil fazer contratações tenden-ciosas do que quando uma só pessoa é responsável por decisões. Quando todos têm oportunidades iguais para qualquer cargo, as organizações saem beneficiadas, já que tem um leque maior de talentos de onde selecionar seus funcionários. No final, todos sairão ganhando, porque os candidatos serão escolhidos pelos seus méritos, e as organizações terão uma força de trabalho mais eficaz e todos serão beneficiados. (SPECTOR, 2005).

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– Especificação do trabalho: “estabelece a qualificação mínima que um funcionário deve ter para poder exercer com sucesso suas funções” (ROBBINS, 2002, p.464).

Com a análise, descrição e especificação do cargo respondemos a primeira questão, ou seja, fazemos o levantamento de quais são os requi-sitos do cargo.

Para sabermos quais são as características do candidato e se estas características são adequadas para o exercício do cargo é necessário co-nhecermos as técnicas ou instrumentos de seleção.

Segundo Robbins (2002, p. 464-467) os instrumentos de seleção mais importantes são:

– Entrevistas: técnica largamente utilizada nos processos seleti-vos e são mais indicadas para avaliar inteligência, nível de moti-vação e habilidades interpessoais do candidato:– Testes escritos: os testes escritos mais comuns servem para me-dir inteligência, aptidão, habilidade, interesse e integridade. – Testes de simulação de desempenho: consiste em simular o tra-balho a ser desempenhado pelos candidatos e avaliar como estes se saem nesta simulação.

Assim com a especificação dos requi-sitos do trabalho e das características dos candidatos é possível decidir qual dos candidatos mais se adéqua ao cargo em questão garantindo o seu bom desempe-nho e satisfação com o trabalho.

9.3UTreinamentoU

Em mundo em constante transformação é necessário que as empre-sas fiquem atentas às novas exigências do mercado que obriga a atualiza-ção frequente das habilidades e conhecimentos de seus funcionários.

Conexão:

Para aprofundar seus estudos sobre Recrutamento e

Seleção - leia o capítulo 6, p. 197 a 242 - do livro de Paul E. Spector. Psicologia nas organizações. 2 ed.

Tradução Cid Knipel Moreira e Célio Knipel Moreira. São Paulo: Saraiva,

2005. Você irá gostar.

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Estudos mostram que as mudanças no local de trabalho nas próximas décadas vão exigir novas estratégias de treinamento para as organizações. A partir de 1990 essas tendências se aceleraram, incluindo: mudança demo-gráfica na força de trabalho, uso crescente de tecnologia, internacionaliza-ção, mudança do trabalho manufatureiro para serviços. Essas mudanças vão exigir mais do que o treinamento nas organizações. Foi previsto que a força de trabalho vai envelhecer e que uma proporção maior de mão de obra será composta de minorias. O nível de habilidades necessárias irá crescer como resultado das mudanças tecnológicas que afetam a forma como o trabalho é realizado. As tarefas que exigem uma qualificação relativamente baixa são “coisa do passado” e estão sendo substituídas por trabalho técnico e em serviço que requerem maiores habilidades. Além disso, as empresas estão se tornando mais globais em suas operações e perspectivas. Todas essas mu-danças aumentarão as necessidades de treinamento. Os funcionários mais velhos terão de ser treinados novamente. Os funcionários com baixa qualifi-cação precisarão aprender no trabalho as habilidades que não tiverem apren-dido na escola. A escassez de pessoal tecnicamente treinado pode requerer que as organizações desloquem sua ênfase da seleção para o treinamento. O treinamento irá se tornar uma atividade cada vez mais importante tanto para indivíduos como para as organizações que empregam (SPECTOR, 2005).]

Esta atualização e capacitação de conhecimentos e habilidades são realizadas mediante treinamento. Chiavenato (2005, p.159) define trei-namento como “ato intencional de fornecer meios para proporcionar a aprendizagem”. Já vimos anteriormente que a aprendizagem envolve uma “mudança no comportamento humano decorrente de novos conhecimen-tos, novas habilidades, novas atitudes e novos conceitos” (CHIAVENA-TO, 2005, p. 159-160).

O autor elenca quatro tipos de mudanças de comportamento propor-cionadas pelo treinamento:

1. Transmissão de informações: é a simples transmissão de infor-mações ou conhecimentos tais como dados genéricos sobre a empresa, seus produtos ou serviços, sua estrutura organizacio-nal, suas políticas e diretrizes, suas regras e seus regulamentos. O objetivo deste tipo de treinamento é a preparação das pes-

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soas para a execução imediata das tarefas inerentes ao cargo ocupado.

2. Desenvolvimento de habilidades: o objetivo deste tipo de trei-namento é desenvolver ou melhorar habilidades e destrezas necessárias à execução ou operação de tarefas requeridas pelo cargo tais como operação de máquinas, equipamentos, ferra-mentas entre outras.

3. Desenvolvimento ou modificação de atitudes: segundo Chia-venato (2005, p.159) este tipo de treinamento geralmente envolve a: “mudança de atitudes negativas para atitudes mais favoráveis, conscientização de determinados aspectos do com-portamento pessoal, desenvolvimento da sensibilidade (dos gerentes ou de pessoas que lidam com o público) quanto aos sentimentos e às reações das outras pessoas”.

4. Desenvolvimento de conceitos: Chiavenato (2005, p.160) afir-ma que o objetivo deste tipo de treinamento é: “elevar o nível de abstração e conceitualização de ideias e filosofias, seja para facilitar a aplicação de conceitos na prática administrativa, seja para elevar o nível de generalização desenvolvendo pessoas que possam pensar em termos globais e amplos”.

Os quatro tipos de treinamento apresentados podem ser utiliza-dos isolada ou conjuntamente. Chiavenato (2005, p. 160) dá o seguinte exemplo de um programa de treinamento que utiliza estes quatro tipos conjuntamente: treinamento à vendedores que envolve a transmissão de informações sobre a empresa, mercado e produto; desenvolvimento de habilidades tais como operação de preenchimento de pedido; desenvol-vimento de atitudes tais como tratar o cliente, conduzir um processo de venda; e desenvolvimento de conceitos como por exemplo conceitos de filosofia empresarial.

O treinamento é um processo cíclico composto por quatro etapas: levantamento das necessidades de treinamento; programação do treina-mento para atender às necessidades; implementação e execução do treina-mento e avaliação dos resultados do treinamento.

Vamos visualizar a figura a seguir que ilustrará as quatro etapas de um processo de treinamento:

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• Objetivos da organização• Competências necessárias• Resultados da avaliação de desempenho• Problemas de pessoal• Problemas de produção

• Quem treinar

• Como treinar

• Em que treinar

• Onde treinar

• Quando treinar

• Implementação do programa de treinamento

• Monitoração do processo• Avaliação e medição• Comparação do desempenho atual com o anterior• Comparação dos resultados atuais com os anteriores

Diagnóstico dasituação

Decisão quantoà estratégia

Implementaçãoe ação

Avaliaçãoe controle

Levamentamentodas necessidades

Programaçãodo treinamento

Execuçãodo treinamento

Avaliaçãodos resultados

Figura 2: O processo de treinamentoFonte: Chiavenato (2005, p.161).

Para finalizar, podemos concluir que o treinamento é um processo cíclico que não tem fim e que objetiva alcançar um determinado objetivo que é melhorar o desempenho das pessoas. A seguir, vamos ver quais os conceitos e técnicas da avaliação de desempenho.

9.4UAvaliaçãoUUeUDesempenho

Um dos aspectos mais importantes no estudo do comportamento organizacional é o desempenho das pessoas no trabalho. Mas afinal o que significa desempenho?

Segundo Chiavenato (2005, p.247) desempenhar significa “cumprir uma tare-fa ou obrigação, exercer uma função ou um papel na organização, cumprimento, exercício, atuação, execução”.

Conexão:

Para aprofundar seus estudos sobre Treinamento –

leia o capítulo 7, p. 243 a 278 – do livro de Paul E. Spector. Psicologia nas organizações. 2 ed. Tradução Cid Knipel Moreira e Célio Knipel

Moreira. São Paulo: Saraiva, 2005. É muito interessan-

te. Vale a pena.

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Desempenho no trabalho

Chiavenato (2005, p. 247) afirma que o desempenho humano no trabalho depende de diversos fatores tais como:

– Os objetivos e as metas foram devidamente explicitados?– A tarefa foi desenhada e redesenhada sob medida para a pessoa?– A pessoa está motivada para executar a tarefa e atingir os obje-tivos propostos?– O esforço que a pessoa despenderá será suficiente para a exe-cução da tarefa?– A pessoa possui as habilidades adequadas para a execução da tarefa?– As condições ambientais impõem restrições ou limitações que inviabilizem a execução da tarefa?– Os resultados percebidos pela pessoa – seja em termos de al-cançar os objetivos ou em termos das recompensas recebidas pela empresa – provocam um determinado grau de satisfação?– O grau de satisfação experimentado pelo indivíduo realimenta positiva ou negativamente a motivação para um novo desempe-nho, ou simplesmente não motiva mais?

Vamos observar na figura a seguir um esquema com os fatores de-terminantes do desempenho humano:

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Motivação Esforço Desempenho Satisfação Resultados

Restriçõesambientais

Habilidades

Figura 3: Os fatores determinantes do desempenho humano.Fonte: Chiavenato (2005, p.248).

É importante ressaltar que a satisfação obtida pelo indivíduo fun-ciona como um reforço positivo para um novo desempenho, enquanto a insatisfação ou frustração funciona como um reforço negativo, daí a necessidade da organização se preocupar com todas as questões descritas acima (CHIAVENATO).

Dois fatores importantes que influenciam o desempenho humano no trabalho e que estudaremos a seguir são: avaliação do desempenho e as recompensas oferecidas pela organização.

Segundo Robbins (2002, p. 474) as organizações realizam a avalia-ção de desempenho por vários motivos:

– “Obter informações para embasar decisões de promoções, transferências e demissões”.– “Identificar necessidades de treinamento”.– “Identificar as habilidades e competências dos funcionários que se acham inadequadas”.– “Validar critérios de programas de seleção e desenvolvimento”.– “Fornecer feedback aos funcionários sobre como a organização vê o trabalho deles e”.– “Alocar recompensas”.

Robbins (2002) afirma que a escolha de um determinado sistema de avaliação de desempenho e a maneira como este é administrado pode ser uma importante força de influência sobre o comportamento dos funcioná-rios.

Portanto, ao escolher um sistema de avaliação de desempenho deve-mos responder a três questões:

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1. Quais os critérios de desempenho serão avaliados?2. Quem deve fazer a avaliação?3. Qual o método de avaliação de desempenho será adotado?

9.4.UUCritériosUUeUUesempenho

Segundo Robbins (2002, p. 475-476) as três categorias de critérios mais comuns são:

a) Resultados individuais da tarefa: avaliação da produtividade de um indivíduo ao desempenhar uma determinada tarefa como, por exemplo, um vendedor que é avaliado pelo volume geral de vendas, aumento da receita e número de novos clientes.

b) Comportamentos: este critério é utilizado quando é difícil identificar os resultados específicos que possam ser atribuídos diretamente às ações de um funcionário então avalia-se seus comportamentos como por exemplo um gerente administrativo que é avaliado positivamente se entrega os relatórios no prazo estipulado pela alta administração.

c) Traços: segundo Robbins (2002, p. 474) constitui a categoria mais fraca de critérios, pois é a mais distante do desempe-nho real no trabalho, embora ainda seja muito utilizada pelas organizações. Segundo o autor, alguns exemplos de traços avaliados são: confiabilidade, boa atitude, possuir riqueza de experiências, dentre outros.

O aperfeiçoamento dos sistemas de avaliação de desempenho representa um importante desafio dentro da psicologia organizacional. As medidas objetivas frequentemente são deficientes por não representarem ade-quadamente toda a abordagem do desempenho das pessoas no trabalho. As medidas subjetivas sofrem com o problema da contaminação como resultado das tendências de classificação e dos erros dos supervisores que fazem as avaliações. Há muito que aprimorar em ambos os tipos de medidas de desempenho. Um desafio dos Recursos Humanos é conven-cer as empresas de que elas precisam ter os sistemas de avaliações mais completos e imparciais possíveis. Isso significa investir em recursos e em tempo para o desenvolvimento e a manutenção desses sistemas (SPEC-TOR, 2005).]

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9.4.2UResponsáveisUpelaUavaliaçãoUUeUUesempenho

Segundo Robbins (2002, p.476) a avaliação de desempenho de um funcionário pode ser realizada por:

a) Superior imediato: segundo Robbins (2002, p. 476) cerca de 95% das avaliações de desempenho nos níveis médio e in-ferior da organização são realizadas pelo chefe imediato do funcionário. No entanto, Chiavenato (2005, p. 257) afirma que “corre-se o risco de o chefe tornar-se um “juiz onipresente que julga e avalia o comportamento dos pobres mortais que dele dependem”.

b) Colegas: Robbins (2002, p. 476) afirma que as avaliações re-alizadas pelos colegas de trabalho constituem uma das mais confiáveis fontes de julgamento. Isso ocorre pois as intera-ções diárias com os colegas de trabalho oferecem uma visão abrangente do desempenho de um funcionário. No entanto, há o risco dos funcionários estarem indispostos para julgar o tra-balho de um colega e/ou este julgamento estar enviesado pelas relações de amizade ou animosidade.

c) Auto-avaliação: segundo Chiavenato (2005) é o método de avaliação em que o próprio funcionário deve ser responsável pelo seu desempenho, avaliando os seus resultados e tomando as medidas cabíveis. Chiavenato (2005, p. 257) argumenta que “de pouco adianta o apoio ou a pressão do gerente se a própria pessoa não assume seu papel”. No entanto, deixar a avaliação apenas sob responsabilidade da própria pessoa também não funciona, pois cada um utiliza um peso e uma medida.

d) Subordinados: Robbins (2002, p. 477) afirma que “as ava-liações feitas pelos subordinados imediatos podem oferecer informações precisas e detalhadas sobre o comportamento do administrador, pois os avaliadores estão em contato frequente com o avaliado”. O único problema é o receito dos subordina-dos sofrerem alguma represália por uma má avaliação dada ao chefe (ROBBINS, 2002, p. 477).

e) Avaliação de 3600: segundo Chiavenato (2002, p. 254) “a ava-liação em 3600 representa a inclusão de todas as pessoas que atuam direta ou indiretamente com o avaliado”. Esta avaliação envolve: subordinados do avaliado, fornecedores internos

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(colegas que recebem os resultados do trabalho avaliado), os pares (colegas que trabalham junto com o avaliado), além de fornecedores e dos clientes externos (CHIAVENATO, 2005, p. 254).

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Pessoas e Avaliação de desempenho

9.4.3UMétoUosUUeUavaliaçãoUUeUUesempenho

Segundo Robbins (2002, p.475) os métodos de avaliação de desem-penho mais comuns são:

a) Relatórios escritos: relatório que descreve os pontos fortes e fracos do funcionário, seu desempenho anterior, seu potencial e sugestões para aperfeiçoamentos. Robbins (2002, p. 478) ressalta que “uma avaliação pode ser boa ou má tanto pelas habilidades de escrita do avaliador como pelo nível real de de-sempenho do avaliado”.

b) Incidentes críticos: avaliação daqueles comportamentos que são responsáveis por uma realização eficaz e por uma realiza-ção ineficaz de um trabalho. São considerados apenas compor-tamentos específicos e não traços de personalidade. Segundo Robbins (2002, p. 478) “uma lista de incidentes críticos ofere-ce um rico conjunto de exemplos para mostrar ao funcionário quais são os comportamentos desejáveis e quais precisam ser melhorados”.

c) Escalas gráficas de mensuração: método de avaliação no qual o avaliador dá notas aos fatores de desempenho (quantidade e

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qualidade de trabalho, profundidade do conhecimento, coope-ração, lealdade, honestidade, iniciativa) em uma escala incre-mental de cinco pontos.

d) Escalas de mensuração com âncora comportamental: segundo Robbins (2002, p. 478) é um “método de avaliação no qual os comportamentos reais relativos ao trabalho são medidos em um continuum”. Ou seja, o avaliador dá notas aos funcionários com base em uma série de itens que correspondem a descri-ções comportamentais como, por exemplo, “grau em que o avaliado resolve problemas”.

e) Comparações multipessoais: avaliam o desempenho de um indivíduo em comparação ao desempenho de uma ou mais pessoas. As três comparações mais populares são: a classifica-ção por grupo (classificação dos funcionários dentro de faixas determinadas); classificação individual (classificação dos fun-cionários ordenadamente do melhor para o pior) e comparação em pares (comparação de um funcionário com cada um dos outros, classificando-o como melhor ou pior do par e atribuin-do-lhe uma pontuação baseada no número de vezes em que ele foi o melhor na comparação).

Para finalizar nossa discussão sobre ava-liação de desempenho vamos finalizar elen-cando algumas sugestões de Robbins (2002, p.479-480) para a melhoria das avaliações de desempenho nas organizações: enfatizar mais os comportamentos do que os traços, documentar os comportamentos de desem-penho em um diário, utilizar múltiplos ava-liadores e treinar os avaliadores.

9.5URemuneraçãoUeUbenefícios

Já vimos anteriormente que as recompensas oferecidas pela orga-nização em decorrência do desempenho de um indivíduo determinam a repetição do seu nível de desempenho anterior ou não. Neste sentido, La-combe (2005, p.145) afirma que:

Conexão:

Para aprofundar seus estudos sobre Avaliação de

Desempenho – leia o capítulo 4, p. 109-150 – do livro de Paul E. Spector.

Psicologia nas organizações. 2 ed. Tradução Cid Knipel Moreira e Célio Knipel Moreira. São Paulo: Saraiva,

2005. É muito interessante. Vale a pena.

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“um dos fatos que mais desmotiva um profissional é considerar-se injustiçado em sua remuneração, pois ela afeta não só o nível ma-terial, mas também o bem-estar psicológico das pessoas; por isso, é indispensável haver coerência interna entre as remunerações conce-didas ao pessoal da mesma empresa”.

Além da coerência interna, Lacombe (2005) afirma que a empresa deve se preocupar também com a coerência externa com o mercado, ou seja, coerência entre os salários pagos pela empresa e os praticados pelo mercado de trabalho.

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Remuneração e benefícios

Se a empresa pagar abaixo do mercado, perderá os melhores profis-sionais e sua produtividade se tornará tão baixa que o custo e a qualidade de seus produtos deixarão de ser competitivos. Se pagar muito acima, o custo de produção pode subir a um ponto indesejável, eliminando as mar-gens de lucro mesmo com produtividade alta (LACOMBE, 2005).

Desta forma, a escolha do sistema de remuneração deve considerar a coerência interna e externa, a motivação do pessoal, a produtividade e os custos de mão de obra.

Segundo Lacombe (2005, p.159-165) e Robbins (2002, p.192-197) os sistemas de remuneração mais comuns são remuneração funcional, remuneração pelos resultados, remuneração por habilidades e sistemas mistos de remuneração.

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Se-gundo Robbins

(2002), planos de remuneração por unidades produzidas, incentivos

salarias, participação nos lucros e participa-ção nos ganhos são algumas das formas pos-

síveis de programas de remuneração variável. O que diferencia esta forma de remuneração daquelas mais tradicionais é que, em vez de pagar o funcio-nário apenas por seu tempo de trabalho ou cargo

exercido, uma parte da remuneração se baseia em alguma medida de desempenho, individual ou organizacional. Na remuneração variável, as

quantias recebidas flutuam de acordo com a medição do desempenho.

Vamos verificar a descrição de cada um destes sistemas de remune-ração na figura a seguir:

Sistema de remuneração Definição

Remuneração FuncionalO salário é definido com base na função ou cargo exercido pelo funcionário. (LA-COMBE, 2005:159)

Remuneração pelos Resultados

O salário ou parte dele é definido com base em alguma medida de desempe-nho tais como plano de remuneração por peça produzida, plano de participação nos lucros e participação nos resultados. (ROBBINS, 2002:192)

Remuneração por HabilidadesHabilidades do funcionário ou na varieda-de de funções que ele é capaz de desem-penhar. (ROBBINS, 2002:196)

Sistemas Mistos de Remuneração Utilização de mais de um sistema de re-muneração. (LACOMBE, 2005:164)

Quadro 3: Os sistemas de remuneração Fonte: autora com base em LACOMBE (2005,

p.159-165) e ROBBINS (2002, p.192-197)

S e g u n d o L a c o m b e (2005, p.160), o foco do sistema de remuneração funcional é o cargo e não o desempenho das pessoas. Por isso, o autor ressalta que a tendên-cia atual é que os novos sistemas de remuneração sejam, pelo menos em parte, vinculados aos resultados, me-tas e estratégia da empresa. Alguns exemplos são as gratificações, bônus, participação nos resultados e parti-cipação acionária.

Cabe ressaltar que o salário é apenas uma parcela do pacote de re-compensas que as empresas oferecem ao seu pessoal. Segundo Chiavena-to (2005, p.291) “A remuneração é feita por meio de muitas outras formas

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além do pagamento em salário. Considerável parte da remuneração é feita por benefícios e serviços sociais”.

Segundo Chiavenato (2005, p.293) os principais benefícios e ser-viços sociais são: transporte de pessoal, alimentação, assistência médico-hospitalar, assistência odontológica, seguro de vida em grupo, planos de empréstimos pessoais, serviços social, planos de previdência privada e grêmio ou clube.

Uma tendência atual nas empresas é adequar o pacote de benefícios e serviços pessoais a cada pessoa. Algumas empresas dão o direito “a cada empregado de optar, concentrando-se em alguns benefícios e solicitando pouco de outros, de maneira que, no conjunto das suas opções, assuma um determinado valor global que é igual para todos” (CHIAVENATO, 2005, p.294).

AtiviUaUe

Leia o artigo “Southwest Airlines – Diversão em Primeiro Lugar” da Revista HSM Management de setembro-outubro 2008, e responda as seguintes questões:

01. Por que podemos afirmar que as pessoas fazem a diferença na Sou-thwest Airlines? Quais são as principais ações da empresa que contribuem para isso?

02. Com base no artigo, responda as seguintes questões sobre as práticas de RH na Southwest Airlines:a) O que é considerado importante na seleção de novos empregados para Southwest Airlines?b) Como é avaliado o desempenho dos líderes?c) Como é o sistema de remuneração dos pilotos?d) Você acha que o plano de participação nos lucros oferecido pela em-presa influencia no desempenho de seus empregados?

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Reflexão

Você considera que as políticas e práticas de recursos humanos são importantes no estudo do comportamento organizacional? Pois bem, são e muito. Elas são consideradas uma poderosa ferramenta de modelagem do comportamento influenciando o nível de desempenho e satisfação de cada indivíduo na organização.

Portanto, para se obter vantagem competitiva através das pessoas, não basta apenas selecionar o melhor candidato para trabalhar em uma empresa, é necessário garantir o bom nível de desempenho e a satisfação deste indivíduo. E isto certamente dependerá da eficácia das políticas e práticas de recursos humanos descritas nesta unidade. Pense nisso!

LeituraURecomenUaUa

1. O livro de Paul E. Spector. Psicologia nas organizações. 2 ed. Tradução Cid Knipel Moreira e Célio Knipel Moreira. São Paulo: Saraiva, 2005 – discute os principais temas, descobertas e tendências da Psicologia Organizacional, concentrando-se tanto na ciência como na prática. Entre os assuntos abordados, pode-se citar: a carreira em Psicologia Organiza-cional, a metodologia da pesquisa na área, análise do trabalho e do desem-penho das pessoas, contratação, treinamento e avaliação de funcionários, a relação entre o indivíduo e a organização, motivação, satisfação e com-promisso com a organização, comportamento produtivo e contraprodu-cente no trabalho, saúde e segurança e o contexto social do trabalho. Ao longo dos capítulos há ainda a seção Pesquisa em Detalhes, que trata de diversos assuntos em Psicologia Organizacional já discutidos em revistas e jornais científicos; a seção Réplica Internacional que explora em que ex-tensão as pesquisas norte-americanas influenciam outros países e culturas; e também a seção Na Prática, que traz estudo de casos. Estabelecendo co-nexões entre conceitos dentro dos vários capítulos e entre eles, tornando os fundamentos e descobertas importantes na área mais compreensíveis e equilibrando a teoria e a pesquisa com a prática, Psicologia nas organiza-ções fornece ao leitor uma compreensão única e integrada da Psicologia Organizacional. Não deixe de ler. Irá complementar seus estudos.

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2. Confira abaixo o artigo – Uma ISO para Gestão de Pessoas da Revista Exame. Disponível em: http://portalexame.abril.com.br/ser-vicos/melhoresempresasparatrabalhar/m0099690.html.

Joel Dutra e André Fischer*

Pesquisas realizadas pela FIA nos últimos 20 anos têm mostrado que seis fatores respondem pela qualidade das políticas e práticas de gestão de pessoas: remuneração/benefícios, carreira, educação, saúde, integridade e responsabilidade social e ambiental. A avaliação dessas políticas e práticas está relacionada a indicadores objetivos, de caráter técnico. Ou a empresa tem, ou não tem. E se tem, qual é a sua abran-gência. Atinge toda a sua população ou privilegia um determinado grupo? Nesta primeira pesquisa que realizamos para este Guia, a nota média das 150 melhores empresas no Índice de Qualidade na Gestão de Pessoas ficou em 52,20. Apenas a metade dos 100 pontos possíveis. O indicador com a pior avaliação explora a preocupação da empresa com a integridade do trabalhador. Com a nota 3 qualquer executivo seria reprovado nos nossos MBAs da FIA – e, é sempre bom lembrar, essa é a nota das melhores para trabalhar nesse item. Em defesa das empre-sas, é importante esclarecer que essa nota baixa pode estar relacionada ao fato de muitas não terem atividade industrial e algumas perguntas serem muito específicas, algo que pensamos rever para o próximo ano. De qualquer modo, a nota está mais baixa do que prevíamos o que de-monstra o muito que se pode fazer nesse campo. Quanto ao indicador relativo à carreira, nossa hipótese era de que a nota seria baixa porque as empresas estão pouco estruturadas nesse aspecto. O objetivo desse item era o de chamar a atenção para o papel das empresas no desen-volvimento profissional. Veja por que cada um dos seis indicadores é importante para o sucesso das empresas que querem ser competitivas local e globalmente.

Remuneração e BenefíciosA remuneração expressa a valorização atribuída aos empregados

e a qualidade da empresa na estratégia em gestão de pessoas. Uma re-muneração acima da média do mercado só pode ser sustentada em um ambiente extremamente competitivo e se a empresa possuir e conseguir manter desempenhos acima da média. Se praticada em um ambiente de

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baixo desempenho, torna a empresa pouco competitiva e os salários não serão sustentados no tempo. Essas empresas fatalmente terão que demitir os empregados caros e admitir outros mais baratos. As empre-sas, entretanto, que pagam salários acima da média para empregados em contínuo desenvolvimento e que estão gerando resultados vão sus-tentar sua folha de pagamentos. Os benefícios refletem a preocupação da empresa com o bem-estar de seus trabalhadores em um país onde o Estado está ausente. Os benefícios são medidos pela qualidade em atender necessidades básicas dos trabalhadores, oferecendo condição digna de vida e trabalho.

Carreira ProfissionalPesquisas realizadas pela FIA desde 2000 têm mostrado que o

aspecto mais valorizado pelas pessoas é a perspectiva de crescimento profissional. Para isso, as ações da empresa se referem tanto ao estímu-lo quanto ao suporte para que a pessoa cresça. Um aspecto importante da carreira é o processo de inclusão, ou seja, todas as pessoas que man-têm uma relação de trabalho com a empresa são objetos dessa preocu-pação. Esse será cada vez mais o fator determinante de diferenciação da empresa no mercado.

EducaçãoA educação é fundamental para o desenvolvimento dos profis-

sionais. É também uma ação social relevante, na medida em que ca-pacita as pessoas para a empresa, para o mercado de trabalho e para a sociedade. Também aqui um aspecto importante é a inclusão, ou seja, qual é a população abrangida pela ação da empresa. Quanto maior seu alcance, maior a condição dela sustentar seu nível de competitividade e maior a contribuição da empresa para a sociedade.

Responsabilidade Social e AmbientalUma empresa que se destaca como um bom ambiente de trabalho

deve ser cidadã. Essa questão, além de ser cada vez mais exigida pela sociedade, tem grande impacto na construção do orgulho de pertencer por parte dos trabalhadores. Temos visto com grande preocupação, entretanto, um desequilíbrio entre as ações de responsabilidade social para fora da empresa com relação ao que fazem para dentro dos seus muros. Em outras palavras, encontramos organizações com programas sociais e ambientais interessantes e milionários junto à comunidade e que não conseguem abranger os seus trabalhadores e familiares. Mui-

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tas vezes, pessoas da comunidade têm acesso a benefícios oferecidos pela empresa que não são oferecidos internamente.

Integridade Física, Psíquica e SocialNão podemos pensar numa empresa boa para trabalhar sem preo-

cupação genuína com a integridade de seus funcionários. Não é possível imaginar uma empresa que ofereça risco de vida ou à integridade da pes-soa e que consiga sustentar um bom ambiente de trabalho. A integridade da pessoa não está reduzida só ao aspecto físico, se estende também ao psicológico e social. Para se desenvolver, as pessoas devem se sentir va-lorizadas em relação ao seu trabalho e seguras quanto a sua importância para a empresa e para as pessoas ao seu redor.

SaúdeA questão da saúde não se resume a um bom plano de assistência

médica. Envolve também aspectos educacionais e preocupações com a integridade da pessoa, como se viu no fator acima. Novamente, a in-clusão é essencial. As preocupações com saúde não devem estar ligadas somente aos cargos mais estratégicos, mas com todos os trabalhadores. A questão da saúde também é um item de benefício para o trabalhador, principalmente no que tange à sua família.

Apenas na médiaVeja as notas médias do IQGP e dos seis indicadores de RH que o compõem:Índice de Qualidade na Gestão de Pessoas 52,20Remuneração e Benefícios 52,16Carreira Profissional 49,74Saúde 66,72Educação 65,40Integridade do Trabalhador 30,58Responsabilidade Social e Ambiental 48,61

*Joel Dutra coordena o Programa de Gestão de Pessoas; André Fischer coordena o MBA de recursos humanos da FIA.Ambos são pro-fessores da Faculdade de Economia e Administração da USP

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Referências

CHIAVENATO, I. Gerenciando com as pessoas. Transformando o executivo em um excelente gestor de pessoas. 3 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

LACOMBE, F. Recursos Humanos: Princípios e Tendências. São Paulo: Saraiva, 2005.

ROBBINS, S.P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prenti-ce Hall, 2002.

SPECTOR, P. E. Psicologia nas organizações. 2 ed. Tradução: Cid Knipel Moreira e Célio Knipel Moreira. São Paulo: Saraiva, 2005.

WAGNER III, J.A., HOLLENBECK, J.R. Comportamento Organi-zacional. Criando Vantagem Competitiva. São Paulo: Saraiva, 2006.

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Apr

esentaçã

o Filosofia e Serviço SocialProf. Rodrigo Pessoa

Apresentação da DisciplinaA filosofia é um produto cultural do ocidente

que desde a sua origem, no século VI a.C., influen-cia de um modo ou de outro o pensamento ocidental.

É certo que ao longo do tempo houve momentos em que o livre pensamento foi sufocado, devido ao medo que os

grupos dominantes tinham de perder ou diminuir o seu poder. Contudo, apesar dessas tentativas, levadas a cabo por grupos

religiosos ou políticos, a filosofia persistiu em seu intento de fazer o homem pensar por si mesmo e assim se libertar das imposi-

ções intelectuais dos grupos que controlam a sociedade. Por outro lado, quando pensamos em serviço social devemos

levar em conta o projeto de sociedade que defendemos e a partir do qual devemos atuar. Um projeto societário explicita a imagem de so-

ciedade a ser construída, imagem que carrega consigo os valores que norteiam essa sociedade e os meios necessários para concretizá-la. Por-tanto, um projeto societário é uma proposta ampla, visando ao conjunto da sociedade.

Assim, nossa disciplina tem como objetivo apresentar essa pro-blemática no contexto da reflexão filosófica ou, em outras palavras, pensar filosoficamente sobre essa problemática. Com efeito, os projetos societários ainda são em nossos dias projetos de classe, embora outras dimensões precisem também ser consideradas, como aquelas ligadas às diferenças culturais, étnicas ou de gênero. Em todo caso, as trans-

formações por que passou o capitalismo ainda não foram capazes de diminuir as disputas e diferenças de classe, que justificam ou

explicam as injustiças e a convivência entre riqueza e pobreza, bem-estar e marginalização social. Disso segue que os proje-

tos societários possuem uma forte dimensão política, ligada às relações de poder. E enfim, a história também mostra

que os projetos societários que atendem aos interesses das classes subalternas dispõem de condições menos

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favoráveis do que os projetos ligados aos interesses das classes que con-trolam politicamente a sociedade.

Tendo em vista esse conjunto de problemas, nosso trabalho está organizado como segue: primeiro conheceremos o que é filosofia e como ela se relaciona com os problemas próprios do serviço social; em seguida, apresentaremos brevemente a história da filosofia, a fim conhecer seus principais períodos e pensadores; discutiremos em seguida o problema das relações entre os direitos individuais e coletivos e como esse proble-ma foi pensado na filosofia; conheceremos também algumas das princi-pais doutrinas políticas que explicam por que existe o Estado; em seguida, pensaremos sobre o iluminismo e sua tese da autonomia do sujeito; pen-saremos ainda sobre a questão da técnica moderna e seus mecanismos de manipulação social; no contexto da autonomia individual, conheceremos o que sobre isso pensou o existencialismo do século XX e por fim discuti-remos o conceito de trabalho e alienação social.

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UniUa

UeUU

UO que é filosofia?

Nesta unidade, conheceremos de maneira introdutória o que é filosofia,

quando ela surgiu e como se caracteriza o tipo de abordagem teórica própria do pensamen-

to filosófico.

Objetivos de sua aprendizagemVocê deverá ser capaz de reconhecer a importância

da filosofia para a formação do pensamento ocidental e para a construção do senso crítico de cada ser humano em específico.

Você se lembra?De algum filósofo importante e algumas de suas ideias? O que

chamou mais sua atenção entre as ideias que ele escreveu?

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Filosofia e Serviço Social

U.UU IntroUuçãoUàUFilosofiaU

A filosofia é um produto cultural da humanidade, criado há mais de 27 séculos e que desde então, com maior ou menor influência, tem acom-panhado o desenvolvimento da civilização ocidental. Houve épocas em que permaneceu esquecida ou apagada, quando, durante a Idade Média, as autoridades religiosas consideravam perigoso o seu estudo, já que ele poderia supostamente levar à perda da fé em Cristo.

Contudo, não é possível entender a nossa civilização ocidental sem a fi-losofia, pois foi o tipo de explicação do mundo por ela inaugurado que construiu a nossa visão de mundo. A filosofia con-tribuiu para a formação da religião cristã, especialmente com relação ao catolicismo; foi importante quando do surgimento da ciên-cia, no século XVII; foi responsável pela construção de ideias como as de corpo, alma, espírito, enfim, muitos dos conceitos e ideias que hoje usamos sem conhecer sua origem, tiveram para sua conso-lidação a influência e a contribuição da filosofia.

O estudo da filosofia, dentro de um curso de Serviço Social, tem o objetivo de apresentar a disciplina em caráter introdutório, explicitando as principais características de cada um de seus períodos históricos, assim como relacionando os conceitos da filosofia com os conceitos que tam-bém ajudam a pensar a prática social. Vale lembrar que a filosofia é uma disciplina essencialmente teórica; o seu objetivo é desenvolver nossa ca-pacidade de pensar e criticar, através do estudo e debate acerca de ideias. Como ela será, na prática, utilizada, depende da criatividade de cada um, pois não existe uma única receita de como “aplicar” a filosofia. Seu estudo deve desenvolver o nosso senso crítico e nos tornar capazes de pensar a realidade de modo mais profundo e original, e por consequência, agir de modo mais razoável e inteligente.

Dito isso, façamos uma primeira caracterização do que é filosofia. Em geral, começamos a explicar a filosofia através do significado da pala-vra. A palavra filosofia tem origem grega, pois a filosofia, como veremos, surgiu na Grécia Antiga, e significa: filo, que quer dizer amor, amizade ou atração; e sofia, que significa conhecimento ou sabedoria. Portanto, a filo-

Conexão:

Para uma introdução ao estudo da filosofia, visite o

seguinte endereço: http://portal.filo-sofia.pro.br/. Nesse endereço você en-

contrará, de forma acessível e resumida, a discussão a respeito dos principais e

mais tradicionais problemas com os quais a filosofia se envolveu ao

longo de sua história.

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sofia consiste em um amor ou amizade pelo saber ou conhecimento. Qual conhecimento? Qualquer um. Em certo sentido, podemos dizer que qual-quer pessoa que é “apaixonada” por um tipo de estudo qualquer é filósofa, pois, inicialmente, filosofia significa apenas atração pelo saber.

O primeiro a utilizar a palavra foi o filósofo e matemático Pitágoras, e com isso ele queria expressar o fato de que apenas os deuses são sábios, os homens podem quando muito se aproximar da sabedoria, buscá-la ou sentir por ela atração, mas nunca poderão ser, em sentido estrito, consi-derados “sábios”. Com efeito, nunca saberemos tudo, pois sempre haverá algo de que ainda não sabemos e a capacidade humana de conhecimento é infinita.

Contudo, apesar de ser um “amor ao conhecimento”, a filosofia não se confunde com a ciência. Em que filosofia e ciência são diferentes? Ora, antes de tudo, no fato de que as ciências possuem, cada qual, um objeto específico de estudo. Isso significa que a física, por exemplo, estuda algo de específico e distinto da química, da biologia ou psicologia. Cada ci-ência tem o seu ramo de atuação e só fala a partir dele. Já a filosofia não tem objeto específico, ou seja, podemos usar o tipo de reflexão da filosofia para pensar sobre qualquer assunto. Podemos, pois, refletir filosoficamen-te sobre a vida, sobre o mundo, sobre a ciência, sobre o conhecimento, sobre a sociedade ou ainda sobre as injustiças sociais e como superá-las. Portanto, a filosofia não tem propriamente conteúdo, no sentido de que não tem um único assunto. Trata-se antes de um modo de pensar, que pode ser “aplicado” em qualquer assunto.

Que características possuem esse modo de pensar?

Por um lado, a filosofia evita qualquer tipo de dogmatismo. Um dogma é uma verdade inques-tionável, proferida por alguma autoridade e que todos devem sim-plesmente aceitar. Não se pode du-vidar ou pensar diferente do dogma. A filosofia evita cair nesse tipo de atitude. Ela é sempre aberta a críticas e a novas cons-truções, ou seja, sempre é possível pensar de modo diferente daquele que alguém pensou e seguir um caminho distinto.

Dogmatismo, do grego dogmatikós, significa

o que se funda em princípios ou o que é relativo a uma doutrina. O dog-

matismo designa as verdades inquestioná-veis: o indivíduo, de posse de uma verdade,

fixa-se nela e abdica de continuar a busca por outras verdades. A palavra ceticismo vem do

grego sképsis, que significa investigação, procura. O cético tanto procura que acaba

concluindo pela impossibilidade do conhecimento.

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Filosofia e Serviço Social

Por outro lado, a filosofia também não se fecha no ceticismo. O ceticismo consiste em negar que seja possível alcançar a verdade e que devemos ficar apenas na dúvida. Ora, quando pensamos filosoficamente, apesar de não ser o nosso desejo estabelecer uma verdade inquestionável e única, nem por isso negamos que aquilo que falamos seja uma verdade, ainda que parcial. Filosofia é sempre busca da verdade, ainda que uma busca interminável e jamais concluída.

Além de evitar tanto o dogmatismo quanto o ceticismo, a filosofia caracteriza-se por ser um tipo de reflexão. O termo reflexão vem do verbo latino reflectere, que significa voltar atrás. Filosofar, portanto, significa retomar, reconsiderar os dados disponíveis, revisar, examinar detidamen-te, prestar atenção e analisar com cuidado.

Por outro lado, não é qualquer tipo de reflexão. Não é correto dizer que sempre quando refletimos em algo estamos filosofando. Para que isso aconteça, precisamos seguir alguns caminhos. Quais são eles? Bom, a re-flexão filosófica deve ser:

Radical: dizer que a reflexão filosófica é radical significa afirmar que é uma reflexão profunda, que vai até as raízes da questão ou proble-ma, até os seus fundamentos. Comumente, quando pensamos em algo, permanecemos na superficialidade do que todo mundo diz ou pensa. Pen-sar filosoficamente é ir mais além, pensar de modo próprio e profundo.

Rigorosa: a reflexão filosófica é rigorosa porque segue regras e métodos específicos. Para ser profunda, uma reflexão precisa ser realiza-da com rigor, colocando de lado as conclusões da sabedoria popular ou os preconceitos que sempre trazemos conosco a respeito de determinado tema.

De Conjunto: além do que já foi dito, a reflexão filosófica deve ser também de conjunto, e isso significa que devemos pensar cada problema relacionando todos os seus aspectos, isto é, pensando cada aspecto do problema com relação aos demais, construindo uma visão do todo. Uma reflexão filosófica não pode ser parcial, privilegiando um ponto de vista, mas total ou global.

Todas as vezes, portanto, que pensamos de modo radical, rigoroso e de conjunto estamos filosofando. Você já se perguntou a respeito das relações entre um indivíduo e o grupo social em que ele vive? Se é nos-sa vontade individual ou a vontade coletiva que deve prevalecer? Já se perguntou quem somos nós? O que é razão? O que é virtude? O que é liberdade? Por que nascemos e morremos? De onde viemos e para onde

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vamos? (dentre outras perguntas, é claro!). Tais dúvidas atravessaram os séculos e permaneceram no decorrer do desenvolvimento da humanidade, sem respostas conclusivas. Pensar sobre elas filosoficamente é pensar, como dito, de maneira radical, rigorosa e de conjunto.

Entretanto, muitos de vocês com certeza irão se perguntar: mas para que estudar filosofia? Qual é a sua utilidade? Bom, esse tema é compli-cado, pois a filosofia, estritamente falando, não é, por assim dizer, útil. Como assim? Com ela não aprenderemos como consertar uma torneira quebrada, como organizar as luzes de uma casa ou como armazenar pro-dutos em uma prateleira. Isto é: a filosofia não tem uma utilidade imediata ou prática. Isso significa que ela é completamente inútil?

Não. Com efeito, a filosofia tem uma aplicação indireta, no sentido de que seu estudo desenvolve nossa capacidade de pensar e nosso senso crítico, tornando-nos capazes de refletir sobre a realidade de modo pro-fundo, rigoroso e global. Certamente não podemos “ver” nosso pensa-mento, e isso faz com que frequentemente pensemos que a filosofia nada fez conosco. Mas ela está lá, quando conversamos com alguém sobre algum assunto e conseguimos expor nossos argumentos de forma consis-tente e lógica; quando conseguimos resolver um problema, percebendo sua relação com outros problemas; quando conseguimos relativizar nossas opiniões e aprendemos a ouvir o outro e entender seu ponto de vista. Por-tanto, a questão não é o que podemos fazer com a filosofia, mas sim: o que ela pode fazer conosco? E ela pode transformar nosso pensamento e nos tornar pessoas mais críticas.

Em se tratando da profissão de assistente social em específico, em que direção estaria a contribuição e a importância do estudo da filosofia? Ora, como dito acima, o estudo da filosofia faz com que ampliemos nosso pensamento, quebrando as barreiras que os preconceitos impõem a nossa visão da sociedade. Pensar filosoficamente significa buscar sempre novas respostas, cada vez mais abrangentes, que aumentem a compreensão da vida humana e da prática social, em direção a ações mais eficazes. Assim, os assistentes sociais precisam de um projeto de intervenção que seja ao mesmo tempo eficiente e teoricamente coerente. Dito de outro modo, a ação social pura e simples, sem qualquer apoio em uma visão teórica sobre a realidade, terá repercussões menos sólidas do que as ações co-ordenadas por uma visão crítica e filosófica sobre a sociedade. É claro que o assistente social não pode ser um filósofo, no sentido de se dedi-car exclusivamente à interpretação do real, mas deve agir nele de modo

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transformador. É nessa direção que está a contribuição da filosofia, isto é, oferecer elementos conceituais que irão em seguida embasar a prática social, sempre tendo em vista que a ação sem teoria é vazia, mas a teoria sem ação é infrutífera.

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Essa é, pois, a “utilidade” da filosofia. Se pensar com mais rigor for útil; se abandonar os preconceitos do senso comum for útil; se desenvol-ver nossa criatividade e nossa originalidade for útil; se aprender a ver os diversos aspectos de um problema e entender todos os pontos de vista de uma questão for útil; então a filosofia se mostra da máxima utilidade, seja em que profissão for, especialmente no que diz respeito ao servidor social, que deve ser alguém com conhecimento profundo da sociedade e dos con-flitos humanos, capaz, portanto, de pensá-las de maneira crítica, radical e global e assim propor intervenções sociais inteligentes e mais eficazes.

U.2U OUsurgimentoUUaUfilosofia

Para início de conversa, conheceremos antes de mais nada a origem da filosofia. Sabemos que a filosofia surgiu na Grécia, ao final do século VII a.C e início do século VI a.C., nas colônias da Ásia Menor e da Mag-na Grécia, isto é, na costa ocidental da Ásia e no sul da Itália, regiões que à época pertenciam aos gregos. Uma tradição importante da história sempre pretendeu que o surgimento da filosofia na Grécia e justamente na Grécia foi resultado do gênio especial dos gregos, ou seja, seriam eles um

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povo especial e excepcionalmente inteligente em relação aos povos seus contemporâneos. Essa forma de interpretar o surgimento da filosofia foi denominada de “Milagre Grego”.

Quando falamos em Grécia, não nos referimos a um país unificado, mas sim a um conjunto de cidades-Estado, pólis, independentes umas das outras, tendo em comum apenas a língua e a religião politeísta. Assim, a Grécia era um país fragmentado, no sentido de que não existia, por exemplo, uma legislação que regulasse do mesmo modo a vida de todos os gregos. Contudo, apesar dessa fragmentação as diversas cidades se entendiam como partes de uma mesma unidade cultural, embora essa unidade se devesse apenas à língua e a alguns costumes comuns.

Ora, a ideia de Milagre Grego desconsidera completamente a histó-ria e os conflitos sociais que existem em qualquer comunidade humana. Entende que a filosofia surgiu simplesmente porque os gregos, de forma abrupta e repentina, romperam completamente com os saberes anteriores e criaram como que milagrosamente o pensamento racional. A filosofia, nesse sentido, não teria relação alguma com a religião, os costumes, as condições econômicas, sociais e políticas do período. Essa interpreta-ção do surgimento da filosofia, como se vê, desconsidera as lutas reais e concretas que fazem com que a história aconteça, e pressupõe uma visão idealista do homem, que seria capaz de criar do nada as ideias, sem que essa criação tenha alguma relação com as condições reais e materiais de sua existência.

Contrapondo-se a essa interpretação, o pensador francês Jean-Pierre Vernant mostrou que a história é resultado das ações concretas do homem, e que essas ações estão inseridas no contexto social que lhe é próprio. A história tem por base, portanto, a vida material e social dos homens, e não o acaso ou a predestinação. O surgimento da filosofia, em outras palavras, não foi um milagre, como se pensava até então, mas uma obra humana e mesmo a história de modo geral deve ser entendida assim, como consequ-ência daquilo que o homem faz enquanto ser social em suas relações com os outros.

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De acordo com essa interpreta-ção de Vernant, a filosofia possui forte relação com o contexto social e histórico da Grécia Antiga, e não se realizou como um rompimento com-pleto e radical com a cultura anterior. Em especial, Ver-nant chama a atenção para as relações entre o pensamento filosófico dos gregos e a reli-giosidade de seu povo, mostrando que a filosofia tanto rompeu com o mito quanto trouxe consigo algumas de suas características. Entre filosofia e religião – os mitos, como veremos a seguir – existe uma relação de ruptura e continuidade.

Assim, em uma interpretação da origem da filosofia que supera a ideia de Milagre Grego, o surgimento do pensamento racional torna-se compreensível de acordo com uma série de condições históricas favorá-veis. Entre elas, pode-se citar:

Ócio: os gregos possuíam escravos e por consequência os homens livres dispunham de todo o tempo livre para se dedicar ao estudo ou pesquisa científica. Aristóteles, com efeito, considerava fundamental o tempo livre para o exercício da filosofia. Ele chegou mesmo a afirmar que o homem livre não deveria trabalhar sob hipótese alguma, seja no campo ou na cidade. O trabalho era entendido como uma atividade própria de escravos.

Escrita: a filosofia, ao se desenvolver, acabou por gradualmente substituir a cultura oral do período anterior pela cultura escrita. É claro que os gregos não criaram o alfabeto, mas o aperfeiçoaram, incluindo nele as vogais. O uso da linguagem escrita ajudou a conservar e divulgar o pensamento grego, embora esse uso tenha se desenvolvido aos poucos. Com efeito, Sócrates, um dos mais importantes pensadores antigos, não deixou nada escrito e Platão, para alguns historiadores, não escreveu as partes mais importantes de sua teoria, que a transmita exclusivamente por via oral para os seus discípulos mais inteligentes.

Religião: pode-se supor que a religiosidade dos gregos fosse de natureza mais tolerante ou menos autoritária daquela de povos vizinhos a

Conexão:

Para conhecer em mais detalhes o pensamento de Vernant e seu método de leitura da história consulte o artigo “A

Psicologia Histórica de Jean-Pierre Vernant”, que mostra como foi a trajetória intelectual do autor e como ele chegou a seu método histórico, o qual

defende que a correta interpretação de cada período da história humana só é possível caso nos coloquemos

dentro dos quadros mentais característicos de cada fase histórica, evitando interpretar o passado a partir de costumes, crenças ou da mentalidade do presen-

te. Segue o artigo: http://www.posgrap.ufs.br/periodicos/cadernos_ufs_filosofia/revistas/

ARQ_cadernos_5/alfredo.pdf.

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eles. De fato, eles eram politeístas e os diversos cultos existentes convi-viam entre si de modo relativamente pacífico. Algo de diferente acontecia, por exemplo, entre os judeus, em cujos costumes estava previsto inclusive o apedrejamento.

Política: politicamente, os gregos eram mais livres que os povos por eles considerados bárbaros. Com efeito, os gregos criaram a democracia e incentivavam o livre pensamento e o debate aberto de ideias. É certo que apenas participavam da democracia os homens livres atenienses, ficando excluídos dela os estrangeiros, as crianças, mulheres e escravos. Em todo caso, o espaço de um diálogo aberto e baseado no convencimento racional foi de grande importância, de tal modo que se pode dizer que “a filosofia é filha da cidade”. Essa condição política talvez foi a que maior responsabi-lidade teve no desenvolvimento da filosofia entre os gregos.

Essas condições favoráveis, enfim, explicariam por que a filosofia surgiu justamente entre os gregos, substituindo a visão de que eles tenham sido um povo excepcionalmente inteligente por uma interpretação que leva em conta como era a Grécia à época do advento do pensamento ra-cional, uma interpretação, pois, que entende a história a partir do homem como um ser social em relação dinâmica com os demais.

U.3UAUpassagemUUoUmitoUàUfilosofia

A filosofia surgiu, como vimos, no final do século VII a.C. e início do século VI a.C. À época do surgimento da filosofia, os gregos explicavam o mundo a partir de uma abordagem religiosa da natureza, que lançava mão de figuras so-brenaturais ou divinas para entender, por exemplo, fenômenos naturais ou pro-blemas sociais. Essas figuras perfaziam o conjunto rico da mitologia grega, constituída por uma série de deuses, semideus e heróis. É costume dizer que a filosofia surgiu como um rom-pimento com essa mitologia – embora, como vimos, esse rompimento não tenha sido completo e radical, mas carregado tam-bém de elementos de continuidade.

Conexão:

Para um estudo mais detalha-do da mitologia grega, bem como

para conhecer a distinção entre deuses, ninfas, titãs e outras figuras próprias

da religiosidade mítica antiga, é possível consultar o endereço a seguir, que apresenta as principais lendas e deuses da antiguidade,

assim como discute a influência da religião na vida política, econômica e social dos

gregos: http://www.suapesquisa.com/mitologiagrega/

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Em todo caso, o pensamento racional da filosofia foi aos poucos substituindo a abordagem extranatural da religião, e a essa substituição que se denomina, grosso modo, o advento da filosofia. Essa passagem da mitologia para o logos (uso da razão) ocorreu quando se tornou necessário o uso da inteligência para a solução dos problemas apresentados pela pólis ou cidade-Estado, uma forma de organização social e política desenvolvi-da entre os séculos VIII e VI a.C. Durante o governo democrático, tornou-se necessário o desenvolvimento das habilidades de argumentação, pois os assuntos da cidade eram decididos em conjunto e a partir do debate aberto de ideias, de onde segue que aquele que possuía uma capacidade de argumentação e convencimento maior teria mais influência sobre a comu-nidade e suas ideias seriam mais facilmente aceitas.

Assim, a prática constante da discussão política pelos cidadãos fez com que o raciocínio bem formulado e convincente se tornasse o modo adotado para se pensar sobre todas as coisas, não só as questões políticas. Portanto, há uma estreita ligação entre o desenvolvimento das cidades-Estado e o pensamento racional, o que levou a considerar a filosofia, como dito acima, uma filha da cidade.

Por outro lado, a passagem do mito à filosofia se realizou também como uma passagem de uma explicação da realidade baseada nos deuses para uma abordagem racional do mundo. Essa passagem se expressa atra-vés da distinção entre teogonia, cosmogonia e, por fim, cosmologia.

Ora, a palavra gónos, em grego, significa “relação sexual”. Já o termo teo, presente em teogonia, significa “deus”. Teogonia significa, por-tanto, um tipo de explicação da realidade que entende que todas as coisas são o resultado de relações sexuais entre os deuses. Com efeito, os gregos imaginavam que os deuses mantinham relações sexuais entre si e dessas relações teriam surgido a água, o ar, a terra, enfim, tudo o que existe.

Com o desenvolvimento da cultura grega, eles passaram a explicar o mundo não mais a partir da relação entre os deuses, mas agora pela cosmo-gonia. O termo cosmo significa “mundo” ou “universo”. Cosmogonia é um tipo de interpretação da realidade que entende que o mundo é resultado ainda de relações sexuais, mas agora não mais entre deuses, e sim entre entidades opostas do universo, como o amor e o ódio, a guerra e a paz e assim por dian-te. Ou seja, os gregos passaram a dizer que as coisas no mundo são o resulta-do da “relação sexual”, por assim dizer, entre entidades opostas.

Por fim, os gregos, no auge do desenvolvimento de seu pensamento, passaram a explicar o mundo a partir da cosmologia. O termo logos signi-

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fica estudo ou razão. Portanto, os gregos passaram a explicar a realidade não mais a partir de relações sexuais, mas usando dessa vez a razão ou inteligência humana, e não procurando mais a origem do mundo no sobre-natural ou nos deuses, mas no próprio mundo.

Ora, essa passagem da explicação do mundo através de relações sexuais e de deuses para uma explicação no mundo centrada na razão humana marca a passagem do mito para a filosofia. Assim, a filosofia sur-giu como uma forma de interpretar racional e cientificamente a natureza, substituindo gradualmente a abordagem religiosa anterior.

Por fim, convém também considerar que o mito não se identificava com uma mera lenda ou ficção, contada com a finalidade de entreter as pessoas. Trata-se antes de um modo sobrenatural de explicar a realidade, que usa nessa explicação figuras de deuses ou seres imortais, que seriam as causas de tudo o que acontece no mundo. Não é uma mentira criada para enganar o povo: as pessoas realmente acreditavam no que os mitos diziam. Por outro lado, os mitos possuíam também uma função pedagógica importante, pois era por meio deles que se transmitia às gerações seguintes a cultura grega. Assim, carregados dessa função pedagógica e tendo essa característica de interpretar a realidade, os mitos eram uma forma de saber, e não uma farsa ou mentira.

Para que isso se torne ainda mais claro, conheceremos a seguir um mito grego, para pensar a partir dele que tipo de explicação do mundo era essa que os mitos ofereciam. O mito que conheceremos é bem conhecido: trata-se do mito de Narciso.

Mito de NarcisoO mito de Narciso conta a história de um rapaz extremamente bo-

nito e que era admirado por todas as moças de sua região. Todas eram perdidamente apaixonadas por ele, mas Narciso, devido a sua enorme vaidade, sempre desprezava a todas. Uma dessas moças era a ninfa Eco, e era muito apaixonada por Narciso. Contudo, tinha vergonha de dizer isso a ele. Além do mais, Eco tinha um grave defeito: ela falava demais. Sempre em qualquer conversa Eco tomava a palavra e já não parava de falar. Seu maior e mais importante defeito, portanto, era a tagarelice.

Glossário: Ninfa: na mitologia grega, ninfas são espíritos femininos que ha-

bitam lagos, riachos, rios ou bosques. Em geral personificam a graça criativa e a fecundidade da natureza.

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Certo dia Zeus, o mais importante dos deuses gregos, estava traindo sua esposa Hera com algumas amigas de Eco. Hera, porém, desconfiou da traição e resolveu averiguar o que estava fazen-do o seu marido. Contudo, Eco começou a conversar com Hera para distraí-la e impedir que ela pegasse o marido em flagrante. Como consequência, as amigas de Eco fugiram e Zeus não foi apanhado em traição.

Contudo, Hera descobriu o truque de Eco e resolveu puni-la: uma vez que Eco gostava muito de falar, ela seria castigada com o silêncio: não falaria mais nada, a não ser repetir as últimas palavras que as pessoas dissessem.

Um dia, Narciso andava por um bosque e Eco, escondida, o viu. Como era muito apaixonada por ele, queria lhe falar, mas não podia, de-vido ao castigo que recebera de Hera. Então fez um barulho na mata a fim de chamar a sua atenção. Ouvindo o barulho, Narciso perguntou:

– Quem está aí?– Quem está aí? – respondeu Eco.Narciso, ao ouvir a voz que o respondeu ficou muito encantando,

pois a voz era muito bonita. Perguntou então:– O que você está fazendo aí?

Os deuses gregos eram em tudo semelhantes aos

seres humanos: sentiam inveja, ciúme, traíam, mentiam e tinham até mesmo desejo sexual. O que diferenciava os deuses dos

seres humanos era o fato de possuírem poderes especiais e sobretudo o fato de serem imortais.

Essas características dos deuses gregos desagra-daram muito filósofos como Platão, que chegou a defender a proibição da leitura dessas histórias

às crianças, pois ouvir histórias em que os deuses, personagens que deveriam ser

exemplos, aparecem traindo e men-tindo não seria bom para

sua educação.

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– O que você está fazendo aí? – respondeu Eco.– Ora, venha até aqui!– Venha até aqui! – respondeu Eco.Ao ouvir uma voz tão bela, Narciso encheu-se de curiosidade, pois

supunha ser ela de alguém de uma beleza extraordinária, correspondente ao som que ouvia. Então, falou:

– Saía daí, quero namorar você.– Namorar você, respondeu Eco e saiu de onde estava escondida.Porém, ao vê-la Narciso decepcionou-se e se afastou imediatamen-

te, não escondendo o seu desprezo e ordenando que ela fosse embora. Eco ficou muito triste, de tal forma que perdeu até mesmo o apetite. Como consequência, começou a enfraquecer e por fim transformou-se em rocha. É ela que ouvimos quando, dentro de uma caverna, por exemplo, gritamos algo e recebemos de volta a nossa voz.

Contudo, os deuses sentiram piedade de Eco e resolveram castigar Narciso. Enviaram-lhe então uma forte sede, e ele, desesperado, procurou imediatamente um lago para beber um pouco de água. Quando se apro-ximou do lago, porém, viu sua própria imagem refletida na água, e, sem perceber que era ele próprio, começou a conversar com a imagem:

– Quem é você?Mas a imagem nada respondia. Narciso tentou até tocar a imagem,

mas assim que o fazia, ela se afastava. Então, desesperado de amor, ele pulou na água a fim de abraçar a imagem, pois se sentia incontrolavel-mente apaixonado por ela. O problema é que ele não sabia nadar e, como consequência, morreu afogado.

Para pensarOs gregos usavam mitos como o de Narciso para educar os jovens ou mesmo, em alguns casos, para explicar fenômenos da natureza. O que o mito de Narciso, que acabamos de conhecer, poderia ensi-nar a um jovem?

FilosofiaA filosofia surge, portanto, como uma forma de romper com o tipo

de explicação da realidade que caracteriza o mito. Se o mito antes explica-va a realidade através do sobrenatural ou divino, e afirmava a presença ou interferência dos deuses na vida humana, a filosofia tentará explicar a rea-

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lidade apenas a partir da razão ou inteligência e usando para tanto apenas o mundo, ou seja, sem o recurso a seres ou coisas sobrenaturais.

Isso, como dizemos, aconteceu na Grécia Antiga, mais especifica-mente por volta do século VI a.C. Porém, não foi propriamente na Gré-cia que a filosofia surgiu, mas em colônias gregas, que ficavam na costa ocidental da Ásia e no que é hoje o sul da Itália. O mapa a seguir ajuda a visualizar essa região e aponta as localidades em que viveram alguns dos filósofos antigos.

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Magna

GréciaGréciaMicenas

AtenasSócrates

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Abdera(Democrito)

TróiaClazomenas (Anaxagoras)

Efeso (Heroclito)Mileto (Tales, Anaximandro, Anaximenes)

Jônia

Esparta

Crotona(Pitagoras)

Eléia(XenofanesParmênides

Zenão)

Agngento(Empedócles)

Roma

Mediterrâneo

A costa ocidental da Ásia era conhecida à época como Jônia, e foi nessa região, numa cidade chamada Mileto, que nasceu aquele que é con-siderado o primeiro filósofo, Tales. Onde hoje é o sul da Itália era uma região conhecida como Magna Grécia, e nela floresceu Pitágoras, um dos mais influentes pensadores gregos. Apenas cerca de um século após a cria-ção da filosofia, ela foi para a cidade grega de Atenas, onde floresceram Sócrates, filósofo que divide a filosofia grega em antes e depois dele, além de Platão e depois Aristóteles, que não era ateniense, mas viveu grande parte de sua vida em Atenas.

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AtiviUaUes

01. Qual é o significado da palavra Filosofia?

02. De acordo com o que se disse nessa unidade, em que a filosofia pode contribuir na formação do assistente social?

03. Pode-se dizer que a filosofia é um tipo de reflexão ou pensamento sobre o mundo. Mas não se trata de qualquer tipo de reflexão, isto é, nem sempre quando pensamos, nós o fazemos filosoficamente. Como se carac-teriza a reflexão propriamente filosófica?

04. O que significa Milagre Grego?

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05. Jean-Pierre Vernant propõe uma análise do surgimento da filosofia na Grécia diferente da tradicional interpretação conhecida como Milagre Grego. Como o autor entende que se deve interpretar o surgimento da fi-losofia na Grécia?

06. Diferencie a filosofia do mito.

ReflexãoAbordamos nessa unidade o problema do surgimento da filosofia

na Grécia, o qual foi frequentemente denominado de Milagre Grego. Há de se considerar que essa denominação guarda muito do eurocentrismo tradicional com o qual se entende a filosofia, isto é, a visão de que a Eu-ropa é o centro da civilização mundial. Com efeito, dizer que a filosofia surgiu na Grécia implica desconsiderar o pensamento de desenvolvimento em outras civilizações, notadamente na Índia. Em todo caso, Jean-Pierre Vernant desmontou recentemente essa visão milagrosa do surgimento da filosofia e propôs uma interpretação baseada no entendimento do homem como ser social em conflito e relação com os demais, isto é, uma inter-pretação que leva em conta o contexto histórico da Grécia Antiga para entender, a partir disso, o surgimento da filosofia. Vimos, pois, que essa questão do surgimento da filosofia é problemática e guarda espaço para amplas discussões. Por outro lado, apresentamos também nessa unidade a característica básica da filosofia, isto é, o pensamento racional autônomo, que substituiu a abordagem religiosa do período anterior. Contudo, não é qualquer reflexão que se pode considerar filosófica, mas apenas aquela que se realiza com crítica, rigor e imparcialidade. Enfim, também o assis-

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tente social deve ser capaz de pensar com rigor e crítica as injustiças e de maneira geral os problemas sociais, pois não se pode agir de modo eficaz sem que essa ação seja acompanhada de uma visão teórico-crítica e pro-funda, capaz de tornar a própria ação mais eficiente e de maior alcance.

LeituraUrecomenUaUa

RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. Trad. Breno Silveira. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967, v. I.

No volume I de sua história da filosofia, o pensador inglês Bertrand Russell apresenta não apenas os filósofos gregos e seus pensamentos, mas comenta também as características das cidades gregas e todo o ambiente cultural que antecedeu e possibilitou o nascimento da filosofia antiga.

VERNANT, Jean-Pierre. As Origens do Pensamento Grego. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil S.A., 1989.

Jean-Pierre Vernant modifica o modo de interpretar o surgimento da filosofia na Grécia, abordando o assunto a partir de uma visão histórica, sob a pressuposição de que o homem é um ser social que se autoconstrói. Assim, ele desfaz o mito do Milagre Grego, que sustentava até então que o surgimento da filosofia foi resultado do gênio especial do povo grego, substituindo essa visão pelo exame crítico da cultura antiga.

Referências

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, São Paulo, 2003.

ARANHA, Maria Lucia de Arruda, MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando. 3ª Ed. São Paulo: Moderna, 2003

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1998.

COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filoso-fia. São Paulo: Saraiva, 2010.

MARCONDES, Danilo. Introdução à história da filosofia. 10. ed. São Paulo, Zahar, 2006.

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NaUpróximaUuniUaUeTendo visto nessa unidade que a filosofia surgiu na Grécia por volta

do século VI a.C., como uma forma de romper com o tipo de abordagem da realidade que era própria do mito, e tendo visto ainda que a filosofia é um tipo de reflexão sobre o mundo, crítica e profunda, percebemos que essa é a sua característica que mais contribui para a formação do assistente social. Em outras palavras, o assistente social deve ser alguém capaz não só de agir em prol da sociedade, mas de agir de forma eficaz e duradoura, o que só é possível se sua ação estiver apoiada em uma visão crítica e profunda dos problemas sociais, isto é, uma visão filosófica sobre a sociedade e seus problemas. Ora, só construímos um pensamento crítico se aprendermos a pensar criticamente, e isso o fazemos através do diálogo com os pensadores. Sendo assim, na próxima unidade conheceremos em linhas gerais os quatro períodos em que se divide a história da filosofia, suas principais características e seus principais autores. De fato, é através do diálogo com os grandes pensadores que aprenderemos a também pen-sar por nós mesmos e alcançar assim nossa maturidade intelectual.

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UniUa

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UFilosofia Antiga e Me-

dievalNessa unidade, conheceremos os dois

primeiros períodos da história da filosofia, isto é, a filosofia antiga e medieval, suas princi-

pais características e seus principais autores. A filo-sofia antiga é um dos períodos mais ricos da filosofia,

e foi durante esse período que apareceram os principais campos de pesquisa filosófica. Em seguida, a filosofia entra

em decadência devido ao crescimento gradual do cristianis-mo e o domínio da ideologia cristã durante a Idade Média. É o

que veremos a seguir.

Objetivos de sua AprendizagemVocê deverá ser capaz de identificar as principais características

dos períodos antigo e medieval da filosofia, classificar os autores de um período e outro, bem como discutir a respeito de suas principais

ideias.

Você se Lembra?Você já ouviu falar do filósofo grego Sócrates? Talvez já conheça a

frase: “Só sei que nada sei”. Com efeito, Sócrates é um dos mais impor-tantes filósofos da antiguidade, a ponto de dividir a filosofia antiga em antes e depois dele.

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2.UU IntroUuçãoUaoUpensamentoUgrego

No capítulo anterior, ficamos sabendo como surgiu a filosofia na Grécia, já no século VI a.C., influenciada diretamente pela necessidade de responder aos questionamentos colocados pela democracia, ou seja, no seio da política.

Agora estudaremos quais foram os pensadores que lançaram as ba-ses da filosofia, quais são as suas semelhanças e divergências. Iniciaremos pelos filósofos que foram denominados de pré-socráticos, para depois conhecer o pensamento de Sócrates, Platão e Aristóteles, os filósofos gregos mais importantes e influentes da história do pensamento e por fim conheceremos as ideias dos filósofos do período helenista, a última fase da filosofia antiga.

2.2UPré-socráticosUouUfilósofosUUaUnatureza

Os primeiros filósofos, chamados de pré-socráticos, tinham como objetivo explicar de que todas as coisas são feitas, ou seja, qual é o ele-mento ou os elementos que constituem todas as coisas. Trata-se de uma preocupação física, daí serem considerados como físicos ou filósofos da natureza.

Foi nesse período, portanto, que apareceram as primeiras respostas à pergunta sobre a constituição da matéria, isto é, de que ela é feita. Tales, da cidade de Mileto, é considerado o primeiro filósofo e já com ele se inicia essa pesquisa. Segundo Tales, todas as coisas são feitas de água, entendendo por isso não esse líquido que ingerimos quando estamos com sede, mas um elemento primordial que compõe tudo o que existe. Tales chegou a essa conclusão ao observar que todas as coisas vivas são úmidas, e quando morrem perdem justamente água, ou seja, ressecam. A água está presente também nos alimentos, que dão vida ao seres. Isso justificava para ele afirmar que a água compõe todas as coisas.

Porém, nem todos pensavam assim. Um discípulo de Tales, chama-do Anaxímenes, afirmava que todas as coisas são feitas não de água, mas de ar. Quando o ar se condensa, forma as coisas sólidas; ao se rarefazer, forma as coisas líquidas e depois os gases.

Por sua vez, Heráclito, de Éfeso, pensava diferente. Afirmava que todas as coisas são como o fogo, isto é, tudo muda o tempo todo, como re-

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sultado da luta entre opostos, como a ordem e a desordem, o bem e o mal, o belo e o feio e assim por diante.

Finalmente, Empédocles estabeleceu que a matéria não poderia ser constituída de um único elemento, seja ele a água, o ar ou o fogo, e de acordo com isso afirmava que tudo o que existe é composto de quatro ele-mentos combinados: a terra, o ar, a água e o fogo, doutrina justamente por isso conhecida como teoria dos quatro elementos, que inspirou durante muito tempo – mesmo até a Idade Média – a pesquisa química.

Enfim, Demócrito pensava diferente de todos os anteriores e de-fendia que a matéria é feita de pequenas partículas indivisíveis que ele chamava de átomos. A palavra átomo significa em grego “indivisível”. Assim, imaginava ele que se nós pegássemos um pedaço de papel, por exemplo, e fossemos dividindo-o em pedaços cada vez menores, chegaria um momento em que não se poderia dividi-lo mais e então alcançaríamos o átomo. Essa tese foi retomada muitos século depois pela química mo-derna, e comprovada por experiências feitas em laboratório, embora hoje se saiba que o átomo não é propriamente indivisível.

Como se vê, os pré-socráticos não chegaram a um acordo acerca do elemento que constitui todas as coisas, mas algo eles possuíam em co-mum, a saber, a tendência de explicar o mundo a partir do próprio mundo (terra, ar, etc.), e não a partir de figuras sobrenaturais e sobre-mundanas, como faziam os mitos.

2.3UAUFilosofiaUGregaUClássica

Como visto, o período denominado pré-socrático foi dominado pela investigação da natureza. Essa investigação tinha, enfim, um sentido cos-mológico. A esse período segui-se uma nova fase filosófica caracterizada pelo interesse no próprio homem e nas relações políticas do homem com a sociedade.

A consolidação do que denominamos período socrático da filoso-fia grega foi possível porque entre os séculos V e IV a.C. a Grécia Antiga experimentou grande desenvolvimento cultural e científico. Atenas dispu-nha de um sistema político democrático consolidado por Péricles, o que facilitou a elaboração de uma maneira de pensar livre e autônoma.

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2.3.UUSócratesU(469-399Ua.C)“Só sei que nada sei”

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Sócrates foi o pensador que se tornou referência no pensamento grego, a ponto de ser considerado um divisor de águas da filosofia antiga. Porém, como demonstra a charge acima, tinha também muitos inimigos entre os seus concidadãos.

Sócrates, que nasceu na cidade de Atenas no século V a.C., tinha como objetivo determinar a essência da humanidade, respondendo à questão sobre o que é o homem. Para Sócrates, a essência do homem é a sua psyche, a sua alma, entendendo por alma a consciência, a persona-lidade intelectual e moral do homem. O corpo é receptáculo da alma, e cuidar da alma é a suprema obrigação moral do homem.

Sócrates foi muito popular entre os jovens, ensinando-lhes diversas coisas. Contudo, foi acusado de ensinar doutrinas perigosas e perverter a juventude, além de desrespeitar os deuses da cidade de Atenas e introduzir outras divindades. Como consequência, foi julgado e por fim condenado à morte em 399 a.C., tendo sido obrigado a beber um veneno chamado cicuta.

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Sobre o julgamento de Sócrates, seu discípulo Platão escreveu um texto, apresentando os argumentos que ele utilizara para se defender. Só-crates negava que suas doutrinas eram perigosas e negava também ter sido impiedoso com os deuses da cidade. Porém, ainda assim ele foi condena-do. Era costume, no entanto, que os juízes substituíssem a pena de morte por outra menor, a pedido da defesa. Sócrates sugeriu que sua pena fosse substituída pelo pagamento de uma quantia, mas a quantia que ele ofere-ceu foi tão pequena que ofendeu os juízes, que ainda mais convictamente o condenaram à morte.

Na sua defesa, Sócrates argumentara que não era um homem sábio, e que suas ideias não pervertiam ninguém, além de serem altamente co-nhecidas. Entretanto, todos o consideravam sábio. Qual a razão disso?

Conta-se que certa vez Sócrates foi consultar o oráculo de Delfos para saber se era sábio. O oráculo do deus afirmou que Sócrates era o ho-mem mais sábio do mundo. Sem compreender o oráculo, mas sem duvidar da palavra de um deus, Sócrates foi atrás de pessoas consideradas sábias para entender por que o oráculo o considerava o mais sábio. Consultou políticos, poetas e artesãos, mas decepcionou-se com todos. Questionava-os a respeito daquilo que afirmavam saber, e eles sempre se perdiam. Como consequência, Sócrates atraiu muitos inimigos para si. Contudo, depois de tantas investigações, concluiu: se ele era sábio, como tinha dito o oráculo, não era porque sabia algo, mas porque aquelas pessoas que se diziam sábias, na verdade nada sabiam, mas escondiam sua ignorância. Se Sócrates deveria ser considerado sábio era porque ele, que nada sabia, não dizia saber, ou seja, não escondia sua ignorância. Portanto, ele era sábio porque sabia que nada sabia, enquanto que as pessoas que se diziam sá-bias, nada sabiam, mas fingiam saber. Sócrates era sábio porque não fingia saber, sabia que de nada sabia: “só sei que nada sei.”

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É claro que isso não é meramente um atestado de ignorância. O que Sócrates afirmava era que o sábio deve reconhecer que aquilo que sabe sempre é pouco em relação àquilo que ainda não sabe, ou ainda, que o sábio deve se colocar numa postura aberta em relação ao conhecimento. Com efeito, quem afirma já saber, fecha-se naquilo que sabe e não busca mais conhecimento. O sábio deve sempre se reconhecer um ignorante, e assim sempre estará em busca de mais saber. Ninguém, de fato, sabe tudo, apenas os deuses.

Vê-se, pois, que Sócrates era um homem muito convicto de suas opiniões, a ponto de não temer a própria morte. Além disso, ele dizia ouvir vozes durante sua vida e era sujeito a transes catalépticos. Conta-se que em um manhã ele se pôs a meditar sobre um assunto que não conse-guia resolver. Continuou a pensar no tema até o meio-dia, chegando até a cidade a notícia de que ele estava ali desde a alvorada. Algumas pessoas até, após o jantar, trouxeram camas para assistir ao espetáculo, curiosos para saber se Sócrates permaneceria assim durante toda a noite. E, com efeito, Sócrates não mudou de posição durante toda a madrugada, e na alvorada do dia seguinte, fez uma oração ao sol e retirou-se.

Do ponto de vista de sua pessoa, Sócrates era um homem extrema-mente feio, com nariz chato e uma barriga proeminente. Usava sempre roupas velhas e andava descalço a toda parte, mesmo na neve. Conta-se que suportava como ninguém o frio e a fome, frequente em tempos de guerra. Dominava, enfim, todas as paixões do corpo. Raramente bebia vi-nho, mas quando bebia, fazia-o como ninguém, embora jamais tenha sido visto embriagado.

Por fim, Sócrates tinha o hábito inoportuno de fazer perguntas a quem quer que seja, e isso claro provocava a ira dos charlatães, que eram por ele desmascarados. Mas ele acreditava que através de suas perguntas conseguia retirar o conhecimento de dentro das pessoas. Por isso, se con-siderava uma espécie de parteiro, pois ajudava a dar à luz novas ideias nas pessoas, fazendo-as pensar de modo diferente e mais profundo.

2.3.2UPlatãoU(427-347Ua.C)

Entre as ideias de Platão, suas teses políticas estão entre as mais conhecidas e comentadas. Em seu diálogo A República, descreve o que entende ser uma cidade ideal. Conheçamos, agora, o que Platão pensou a respeito.

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Os livros de Platão foram escritos em forma de diálogos, em que, em geral, o personagem central é Sócrates. Assim, para expor as suas ideias, Platão imaginava várias pessoas conversando entre si, e chegando juntas a uma conclusão qualquer. Essas pessoas, porém, não eram personagens fictícias, mas reais, pessoas concretas que o fi-lósofo conhecia e punha para debater em seus textos. Como Sócrates aparece em quase todos os diálogos como a personagem central, que conduz o debate, às vezes é difícil dizer o que é próprio de Sócrates e o que é de Platão, pois as ideias de Platão são ditas através da boca do personagem Sócrates.

A cidade ideal de Platão deveria possuir três classes: a gente co-mum, os soldados e os guardiões. Apenas estes últimos deteriam o poder político e apenas para eles deveria ser dedicada a educação, com o obje-tivo de torná-los homens corajosos e gentis. Entre os guardiões deveria, pois, ser escolhido o governante, o qual deveria ser filósofo. Essa ideia é conhecida como a teoria do filósofo-rei ou rei-filósofo, e afirma que o co-mandante de um povo deve ser o homem mais inteligente entre todos. Na classe dos guardiões, além disso, não deveria existir riqueza nem pobreza, pois deviam viver em uma espécie de comunismo, morando juntos em pequenos acampamentos, sem que nenhum detivesse propriedade privada de algo. Esse comunismo estende-se também à família: os amigos devem ter em comum as mulheres e os filhos.

Na verdade, Platão rejeitava o casamento para a classe dos guardi-ões. Não deveria existir casamento, mas o Estado escolheria casais para a procriação, selecionando os casais mais saudáveis, para que fossem garantidos filhos também saudáveis. Os casais selecionados para se pro-criar não deveriam se amar, mas cumprir com isso um dever para com o Estado. Por sua vez, os filhos deveriam ser retirados dos pais assim que nascessem, e o Estado teria o maior cuidado em evitar que os filhos soubessem quem são seus pais, ou que os pais soubessem quem são seus filhos. O objetivo era fazer com que as crianças tratassem todos os adultos como se fossem seus pais, e os adultos tratassem todas as crianças como se fossem seus filhos, evitando apego a pessoas específicas.

Seria prerrogativa do Estado a mentira. Com efeito, o governo deve-ria mentir para os cidadãos para melhor mantê-los sob controle. Entre es-

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sas mentiras, deveria contar para os governados que deus fez três espécies de pessoas: umas de ouro, outras de prata e por fim as demais de bronze ou cobre. As que foram feitas de ouro servem para guardiões, aquelas que foram feitas de prata servem para soldados e aquelas que foram feitas de bronze ou cobre servem para o trabalho

Apesar de dividir as pessoas em classes, Platão afirmava que na cidade ideal todos teriam as mesmas oportunidades, apenas seriam desig-nados para classes diferentes. Os filósofos-reis não teriam nenhum privi-légio, tendo só os bens necessários para sua sobrevivência. Não haveria diferença de oportunidades entre os sexos, sendo cada um designado a fazer uma tarefa de acordo com a sua capacidade. Sendo assim, se fosse considerada apta, uma mulher poderia exercer as mesmas funções que o homem, mesmo o combate na guerra ou o exercício da filosofia.

2.3.3UAristótelesU(384-322Ua.C)

Aristóteles nasceu por volta do ano 384 a.C., em Estagira, na Trácia. Seu pai era médico da família do rei da Macedônia. Aos dezoito anos foi para Atenas, a fim de estudar com Platão. Permaneceu com Platão durante 20 anos, e após a morte do mestre, viajou durante um tempo pelas cidades gregas. Em 343 a.C. tornou-se professor de Alexandre, o Grande, e per-maneceu assim durante cerca de 3 anos, até que Alexandre foi declarado pelo pai maior de idade – tinha então 16 anos – e seu substituto na ausên-cia de Filipe.

A obra de Aristóteles é ampla e diversificada. Algumas das partes mais conhecidas são sua doutrina ética e política, que se identificava com a mentalidade dos homens livres da época em que viveu.

Com efeito, o que é a virtude? Há dois tipos de virtude, segundo Aristóteles: a intelectual e a moral, que correspondem às partes racional e irracional da alma. A virtude intelectual aprende-se pelo ensino, a virtude moral através do hábito. Quanto a esse último tipo de virtude, Aristóte-les afirmava que os cidadãos devem aprender o que é o bem praticando o bem, ou seja, o “caminho se faz caminhando”: praticando boas ações, tornamo-nos bons homens, mediante o hábito ou costume de praticá-las. Mesmo que não pratiquemos uma boa ação porque acreditamos nela, com o tempo, depois de muito a praticar, ficaremos tão habituados em fazê-lo que acharemos natural praticar o bem.

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A virtude, por outro lado, está no meio-termo entre dois extremos, ou seja, virtude significa moderação. Tomemos como exemplo a coragem. A coragem é uma virtude, pois está no meio-termo entre a covardia, que é o medo exagerado por tudo, e a temeridade, que é não ter medo de nada e por consequência agir de modo irresponsável. O mesmo vale para todas as demais virtudes. Acompanhemos o quadro a seguir:

Covardia: ter medo de tudo.

Coragem: saber a hora de agir.

Temeridade: não ter medo algum.

Avareza: excesso de economia.

Liberalidade: gastar com bom senso.

Esbanjamento: gastar tudo sem pensar.

Enfado: ser chato ou incapaz de cordialidade.

Amizade: saber se rela-cionar com afeto.

Condescendente: ser amigo de todos.

A virtude é caminho do meio, nem o excesso para menos nem o excesso para mais. Os excessos são chamados por Aristóteles de vícios. Assim, a virtude – e, por consequência, a felicidade – consiste em se ter coragem, liberalidade e amizade, e assim como para essas virtudes, não exagerar em nenhuma das virtudes. Seguir, portanto, o caminho da mode-ração.

Por outro lado, Aristóteles expressa em seus textos o conjunto dos preconceitos característicos de seu período, isto é, defende a escravidão, rejeita todo tipo de trabalho manual como coisa vil e indigna de um ho-mem livre e sustenta também a inferioridade da mulher, como ao dizer:

O macho é, por natureza, superior, e a fêmea, inferior; um governa, a outra é governada. A coragem de um homem e de uma mulher não são, como supunha Sócrates, iguais: a coragem do homem é mostrada no comando, a da mulher, na obediência. O silêncio, a contemplação de si, é a excelência da natureza da mulher1.

A forma de amor mais perfeita e plena seria o amor entre dois iguais, isto é, a forma mais plena de amor é entre dois homens, visto que não há amizade, segundo ele, entre pessoas desiguais, como o são o homem e a mulher ou o senhor e o escravo. A amizade entre os homens, portanto, é mais perfeita que a amizade entre as mulheres.

Enfim, apesar dessas ideias preconceituosas, enraizadas em seu tempo, Aristóteles está entre os mais importantes pensadores da história

1 aristÓteLes, política. citado a partir de Lombardi, José claudinei; goergen, pedro. Ética e educação: reflexões filosóficas e históricas. campinas: autores associados, 2005, p. 113.

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da filosofia, tendo escrito textos sobre os temas mais diversificados, como ética, política, psicologia, física, lógica e metafísica.

2.4UPeríoUoUHelenístico:UOUfimUUeUumaUera

O que chamamos de Período Helenístico da filosofia grega, foi o pe-ríodo que teve início por volta do ano 322 a.C., quando Alexandre Magno, mais conhecido como Alexandre “o Grande”, expandiu o império mace-dônio, conquistando a Grécia. Alexandre foi um dos alunos de Aristóteles e, além de edificar um imenso império, contribuiu para as pesquisa de seu antigo professor enviando-lhe plantas e animais dos mais diversos lugares por onde passava.

O período é marcado por um forte pessimismo dos filósofos gregos, sobretudo porque eles perderam muito do prestígio ou influência que ti-nham até então no mundo dos negócios. No período anterior, os filósofos, mesmo aqueles para quem esse mundo era uma aparência e falso, cons-truíram projetos políticos com o objetivo de transformar os governos. Em maior ou menor grau, tinham influência sobre os governos.

Alexandre pôs fim à época das cidades-Estado, ganhando força a partir de então a ideia de um Império único, segundo os mesmos princípios administrativos. Por outro lado, diminuiram-se nesse perí-odo as liberdades individuais, justamente devido ao fim da democra-cia, e os filósofos perderam a influência e a participação que tinham na vida pública. Devido a isso, o período helenista (heleno quer dizer “grego”) – assim denominado porque foi uma época de difusão da cultura grega para outras partes do mundo, primeiro por obra de Ale-xandre e depois do Império Romano – é marcado por um forte pessi-mismo intelectual.

Entretanto, com a conquista de Alexandre, iniciou-se o período dos grandes impérios, que limitaram em muito a liberdade individual. Como consequência, uma vez que os filósofos já não tinham a mesma influência no mundo dos negócios, voltaram-se com cada vez maior decisão contra esse mundo, visto como ruim ou injusto, dedicando-se agora a pensar so-bre a salvação ou felicidade pessoal. A pergunta que os filósofos se faziam nesse período já não era, como antes: como criar um bom Estado? Agora

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a filosofia voltava-se para a pergunta: como ser feliz em muito mau e de sofrimento? Portanto, a visão dos pensadores tornou-se cada vez mais subjetiva e individualista.

No tocante à filosofia, observa-se a continuação das escolas Platôni-ca e Aristotélica dirigidas pelos discípulos desses dois filósofos; todavia, não com a mesma força e projeção do período precedente. Com a morte de Alexandre e a desestruturação de seu império, Aristóteles, temeroso, fugiu para a Macedônia. Ele temia que fosse visto como aliado do antigo imperador, uma vez que fora seu professor. Antes, porém, afirmou que o fazia “para evitar um segundo atentado contra a filosofia”, pois o primeiro fora cometido contra Sócrates. Pouco depois, também veio a falecer.

Nos séculos que se seguiram a Aristóteles e seus discípulos, as con-trovérsias filosóficas sobre a condição humana mostraram significativa despolitização, pois não estavam mais focadas na relação do homem com os demais cidadãos, mas passaram a girar em torno do homem concebido como indivíduo, visto não haver mais canais para a participação dos cida-dãos nas decisões do Estado.

A preocupação dos filósofos passou a ser, pois, como já dito, a ques-tão da virtude em um mundo ruim e injusto. Qual seria o caminho para a Felicidade? Assim, nesse clima espiritual de pessimismo em relação ao mundo surgiram quatro escolas de pensamento: o cinismo, o ceticismo, o epicurismo e o estoicismo. Delas se falará a seguir.

2.4.UUCinismo

O cinismo foi fundado por um homem chamado Antístenes, antigo discípulo de Sócrates. Durante a juventude, viveu no círculo aristocrático, não revelando nenhuma doutrina especial. Contudo, por algum motivo rebelou-se contra aquilo em que sempre acreditara e passou a defender apenas a simples bondade. Pregava em praça pública suas ideias, em uma linguagem fácil e acessível ao homem comum. Afirmava que não devia existir governo, propriedade privada, casamento ou religião. Desprezava, além disso, todos os prazeres do corpo como coisa indigna.

Embora Antístenes tenha sido o fundador do cinismo, seu principal representante foi Diógenes, seu discípulo. Inicialmente, o mestre não que-ria aceitar o discípulo, pois ele tinha má fama, devido na verdade a seu pai, preso por falsificar moedas. Inspirado pelo pai, Diógenes afirmava

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que queria “falsificar a moeda do mundo”, ou seja, subverter tudo aquilo que o mundo considerava de valor: riqueza, poder ou prestígio.

Diógenes resolveu viver como um cão, de onde deriva o nome de “cínico”, que significa, em grego, “canino”. Rejeitava todas as conven-ções sociais, seja na maneira de vestir, falar, na moradia ou na decência. Conta-se que tinha o hábito de se masturbar em público, e comparava os homens aos animais: eles não têm vergonha de manter relações sexuais à frente de todos, também o homem não deveria ter. Conta-se ainda que Diógenes vivia dentro de um barril, e que certa ocasião recebeu a visita do próprio Imperador Alexandre, que se dispôs a lhe conceder o favor que pedisse. Diógenes, porém, solicitou apenas que Alexandre não lhe tirasse o sol, pois que o imperador fazia-lhe sombra.

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Diógenes, portanto, considerava sem importância os bens terrenos, procurando se libertar de todos os desejos e se tornar indiferente, tanto à riqueza quanto à pobreza. Sua visão é de que o mundo é mau e seria preci-so, pois, fugir dele. O homem deve se tornar indiferente aos bens externos e se voltar para os bens subjetivos, como a virtude, que ninguém pode nos tirar. Enfim, ensinavam os cínicos o quão é fácil viver com pouco dinhei-ro, como nos bastam alimentos simples, como era tolice amar o próprio país ou ainda lamentar a morte de filhos ou amigos. Nada no mundo exte-rior deve nos fazer mal, pois a virtude e a felicidade estão em nós.

2.4.2UCeticismo

O ceticismo não foi propriamente uma escola original, mas apenas uma doutrina que organizou ideias já conhecidas, em sua maioria. Seu fundador foi um homem chamado Pirro, inicialmente pertencente ao exér-cito de Alexandre e que morreu em 275 a.C.

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O ceticismo nega que exista a verdade. Sendo assim, não há como determinar qual modo de viver é melhor que o outro. Ser bandido é pior do que ser honesto? Não há como afirmar isso, diziam os céticos. Porém, é mais conveniente, para não sofrer castigos sociais, seguir as normas morais vigentes. Por isso os céticos, mesmo sem realmente crer em nada, podiam até mesmo frequentar alguma religião, mas apenas por conveni-ência. É como se alguém, hoje, fosse à igreja no domingo não por acredi-tar no cristianismo, mas para agradar os outros e para conquistar a estima social.

Além disso, os céticos negavam qualquer filosofia que pretendia dizer a verdade. As pessoas, segundo o ceticismo, não deveriam se preocupar com isso, aliás, não deveriam se preocupar com nada. O futuro é inteiramente incerto, então o melhor é viver o presente.

Pirro teria levado suas ideias céticas até o extremo. Sua vida é cercada de lendas. Conta-se, por exemplo, que em certa ocasião um cachorro avan-çou contra ele e mordeu-lhe a perda. Pirro nada fez para retirá-lo, pois, de acordo com a sua filosofia, não se poderia afirmar com certeza se a mordida do cachorro é algo bom ou ruim. Aliás, sua morte também é cer-cada de lendas. Conta-se que andava pelo campo e à frente dele havia um precipício. Pirro continuou andando e supostamente pensava: não posso dizer com certeza se cair do precipício é bom ou ruim. Continuou, pois, andando e caiu, tendo sido assim sua morte. Provavelmente, contudo, es-sas histórias foram inventadas por inimigos de sua escola.

Para exemplificar o tipo de argumentos que os céticos usavam, veja-se a seguir o que disse Sexto Empírico, um dos poucos filósofos céticos cujas obras chegaram até nós:

Aqueles que afirmam positivamente que Deus existe não podem evitar de cair na impiedade, porque, se dizem que Deus controla todas as coisas, o transformam em autor de coisas más; se, por outro lado, dizem que Ele controla somente certas coisas, ou que Ele nada controla, são obrigados a fazer de Deus um ser invejoso ou impo-tente, e fazer isso é, evidentemente, uma impiedade.2

2 russeLL, bertrand. História da Filosofia Ocidental. trad. breno silveira. são paulo: companhia editorial nacional, 1967, p. 272.

Conexão:

Para maiores informações a respeito dos filósofos do período helenista, consulte http://

www.mundodosfiloso-fos.com.br/

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O ceticismo, enfim, defendia a impossibilidade do conhecimento da verdade e de estabelecer qualquer critério definidor da justiça ou da virtu-de. Foi muito influente principalmente entre a gente do povo, mas sucum-biu após a vitória do cristianismo. O movimento, porém, teve diversos desenvolvimentos, que entendiam de diferentes maneiras o que significa ser cético.

2.4.3UEpicurismo

A seita epicurista foi fundada por um homem chamado Epicuro, que se estabeleceu em Atenas e lá organizou a sua escola. O pai de Epicuro era um ateniense pobre e Epicuro nasceu por volta de 342 a.C., não se sabe exatamente onde. Dedicou-se ao estudo de filosofia desde os 14 anos de idade e fundou sua escola em 311, primeiro em uma cidade chamada Mi-tilene, depois, desde 307, em Atenas.

A comunidade fundada por Epicuro parecia sofrer de problemas financeiros, e o próprio Epicuro vivia apenas de pão e água. Frequente-mente pedia ajuda a seus discípulos, pois a escola sobrevivia através de doações voluntárias. Além disso, Epicuro sofria com uma saúde frágil, que suportou com grande fortaleza de espírito. No dia de sua morte, escre-veu a seguinte carta a um amigo:

Neste dia verdadeiramente feliz de minha vida, em que estou pres-tes a morrer, escrevo-te isto. As doenças de minha bexiga e de meu estômago seguem o seu curso com toda a sua severidade habitual; mas, contra tudo isso, está a alegria em meu coração, ao recordar de tua dedicação, desde a infância, para comigo e minha filosofia3.

A filosofia, para Epicuro, é um sistema prático com o objetivo de assegurar uma vida feliz. Contudo, ele impunha suas ideias aos discípulos e não aceitava contestações. Quem o seguisse deveria obedecer a uma espécie de credo, e em função disso, seus discípulos em nada acrescentaram a suas ideias, e a própria escola epicurista não sobre-viveu muito tempo após a morte de seu fundador.

3 in.: russeLL, bertrand. história da filosofia ocidental. trad. breno silveira. são paulo: companhia editorial nacional, 1967, p.276

Conexão:

Para um maior aprofun-damento acerca do contexto histórico em que viveram os

filósofos do período helenista, con-sultar o site a seguir, que explicita a situação histórica da Grécia à

época: http://greciantiga.org/

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Como dito, o objetivo da filosofia, segundo Epicuro, é proporcionar uma vida feliz. Ora, a vida feliz seria uma vida de prazer. Uma vida aben-çoada, diz Epicuro, começa e termina com o prazer. Entre os prazeres que menciona o prazer do estômago está entre os mais constantes, e a ele se subordina mesmo a cultura ou filosofia.

Contudo, os prazeres de que fala são prazeres, por assim dizer, tranquilos, sem o arrebatamento de paixões violentas. Assim, o prazer da saciedade é maior do que o prazer de saciar a fome vorazmente. Comer sem dúvida é um prazer, mas o prazer que se experimenta depois de já ter comido é maior. Devemos assim preferir prazeres que nos levam ao equi-líbrio e à ausência de dor.

Na prática, Epicuro acaba por falar mais em como evitar a dor do que em como provocar o prazer. Em tese, a ausência de dor já seria um prazer. Nesse sentido, não devemos buscar riquezas ou honrarias, pois elas deixam o homem inquieto. O mesmo se pode dizer do poder, ou seja, seria melhor se afastar da vida pública, já que quanto mais poder se tem mais inveja se desperta nos outros. Aqui vale lembrar a canção de Raul Seixas, que dizia: “não quero ser prefeito, pois caso eu seja eleito, alguém pode querer me assassinar”.

Por outro lado, Epicuro condena ainda os prazeres sexuais, e é con-tra o casamento e os filhos porque distraem o homem de ocupações mais sérias.

O prazer social que, pelo contrário, deveria ser buscado a todo custo é a amizade. Ninguém pode viver sem amigos, nem que seja para receber ajuda quando necessitar. Com efeito, sem amizade não se pode ter uma vida segura e sem medo.

Deve-se buscar, pois, amizades, e viver feliz com elas enquanto du-rar a existência, pois, para Epicuro, não existe vida após a morte. A morte significa a desunião das partículas que compõem o nosso corpo, apenas isso. Depois de se desagregar, as partículas de nosso corpo vão compor outros corpos, e assim por diante. Por isso, não se deve temer a morte, pois não há castigo após a vida: nem castigo nem recompensa, pois após a morte nada há. Além disso, jamais nos encontramos com a morte, pois en-quanto somos, ela não é; quando ela for, nós já não seremos mais. Enfim, embora o filósofo admita que existam deuses, defendia que eles não inter-ferem na vida humana, mas procuram eles mesmos o máximo de prazer, sem se preocuparem com os problemas da terra.

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2.4.4UEstoicismoU

O estoicismo foi fundado por Zeno, contemporâneo de Epicuro, e que viveu no terceiro século antes de Cristo. Zeno era um fenício nascido em Cítio, no Chipre, filho de uma família de comerciantes. Foi a Ate-nas provavelmente para tratar de assuntos comerciais, mas lá chegando encantou-se com a filosofia e passou a se dedicar ao seu estudo.

Zeno ensinava que nada acontece por acaso e que o mundo se for-mou pela reunião de diversos elementos. Um dia, esses elementos vão se desunir novamente, mas isso não significa o fim do mundo, tal como pensado pelos cristãos, mas apenas o fim de um ciclo. Após a desunião, os elementos que compõem o mundo voltarão a se unir para depois se desu-nir novamente e assim ao infinito. Logo, tudo o que acontece no mundo já aconteceu antes e irá acontecer de novo por toda a eternidade.

Como se percebe, os estoicos, assim como os gregos de maneira geral, não acreditavam na doutrina da criação do mundo, ou seja, para eles Deus não criou o mundo, pois o mundo já sempre existiu desde todo o tempo. No máximo, Deus apenas organizou os elemen-tos dentro do mundo e lhes deu a configuração que eles têm. Assim, se o mundo não foi criado, ele não teve início, e consequentemente não terá fim. O mundo jamais começou e por isso jamais terminará. Ele sempre existiu assim, tal como é, e sempre existirá.

No que diz respeito à vida humana, a única coisa que interessa é a virtude, a qual é dependente da vontade. Assim, um verdadeiro sábio pode ficar pobre, doente, pode ser preso ou condenado à morte; nada disso o perturbará, pois a virtude é o que o interessa e a virtude está dentro dele. Portanto, o sábio não sente propriamente simpatia por ninguém. Se sua esposa ou filhos morrem, isso não o perturba. Se um amigo o trai, ele não se deixa abalar. Caso entre na política, pode até trabalhar para o bem da humanidade, mas seu verdadeiro interesse é sempre a sua própria felici-dade. Assim, o sábio não é virtuoso porque faz o bem, mas faz o bem para ser virtuoso. Isso significa: ele faz o bem não pensando na pessoa a quem beneficia, mas nele mesmo: fazendo o bem, ele se torna melhor.

O estoicismo teve uma vida mais longa que o epicurismo e conhe-ceu desenvolvimentos diferentes ao longo da história, ao contrário do

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epicurismo, que sempre permaneceu fiel às doutrinas de seu fundador. Grande parte dos chefes de Estado depois de Alexandre se declaravam estoicos, e entre os pensadores do movimento há homens ilustres, como o poeta romano Sêneca e o imperador Marco Aurélio.

Se fossemos resumir o que é um sábio estoico, diríamos, tal como disse Epíteto, um dos mais ilustres filósofos estoicos:

Quem é, pois, um estoico? Aponta-me um homem modelado de acordo com os juízos que emite (...) Aponte-me um que, estando doente, seja feliz; em perigo e, no entanto, feliz; morrendo e, no entanto, feliz; no exílio, e feliz; na desgraça, e feliz.

2.5UFilosofiaUMeUievalU

A filosofia medieval identifica-se com a filosofia católica e consiste no pensamento filosófico que dominou a Europa desde Santo Agostinho até o Renascimento ou começo da Idade Moderna. Os filósofos cristãos anteriores a Agostinho eram intelectualmente inferiores aos filósofos pagãos. Desde Agostinho, os filósofos católicos pas-saram a se dedicar à tarefa de construir gradati-vamente o pensamento filosófico do cristia-nismo.

O pensamento medieval é dividido em dois grandes períodos: a Patrística e a Es-colástica. O nome Patrística deriva de “Pais da Igreja” e se refere aos primeiros filósofos e religiosos que ajudaram a construir as bases teológicas e dogmáticas da religião cristã. Nesse período destaca-se Santo Agostinho, inicialmente um filósofo pagão ligado à filosofia de Platão, mas que em seguida se conver-teu ao cristianismo e se tornou bispo da Igreja. A Patrística, porém, não é conhecida por seus grandes filósofos. Pelo contrário, os principais nomes dessa época são homens religiosos, não filósofos, que ajudaram de alguma forma a construir a Igreja Católica.

Entre esses homens importantes da Patrística está São Jerônimo, autor de uma famosa tradução da Bíblia denominada Vulgata. Trata-se da tradução da Bíblia para o latim, tradução que se tornou canônica. Além dele, Gregório, o Grande, destaca-se também, dessa vez como um dos primeiros defensores da supremacia do papa. Com efeito, até então o papa

Conexão:

Sobre o pensamento me-dieval, a origem histórica do

cristianismo e as influências que ajudaram a construí-lo, consultar http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/

portugue.html.

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era apenas mais um bispo da Igreja, especificamente, o bispo de Roma. Com Gregório, começa a se desenvolver a ideia de que todos os outros bispos devem se subordinar ao bispo de Roma, isto é, ao papa.

Enfim, a Patrística foi importante não pela filosofia que produziu, mas por representar o começo e a formação da religião cristã, que pouco a pouco subjugou o paganismo e deu início a uma nova era no pensamento ocidental.

O período seguinte da filosofia medieval foi a Escolástica. O nome se deve à disputa entre as diversas escolas que foram criadas depois do século XI. Com efeito, em torno das catedrais se formaram verdadeiros centros de ensino e pesquisa, onde eram debatidas questões de teologia ou filosofia, ou mesmo problemas de física ou de ciência natural.

O nome mais importante da Escolástica foi Santo Tomás de Aquino. Ele é importante por sintetizar as ideias de Aristóteles e adequá-las ao pensamento cristão. Sua doutrina tornou-se amplamente aceita e tornou-se mesmo a filosofia oficial da Igreja Católica durante muito tempo.

A Escolástica, portanto, foi um período mais filosófico que a Patrís-tica. A preocupação dos escolásticos era fundamentar a fé cristã a partir de argumentos racionais, ou de apresentar o cristia-nismo como um sistema racional de ideias. A presença e a autoridade crescentes de Aristóteles é uma marca decisiva desse período.

Em geral, o estado de espírito dos homens na Idade Média era de profunda infelicidade diante desse mundo, visto como um “vale de lá-grimas”. A única coisa que tornava suportável a vida era a esperança da bem-aventurança eterna, de uma vida me-lhor depois desta.

O poder político se descentralizou, devido ao fim do Império Romano e o esvaziamento das cidades, resultado da migração em massa para o campo. O guia da sociedade passou a ser os va-lores contidos no evangelho. A sociedade passou a ser dirigida pelo poder da Igreja Católica, poder que era dividido com os proprietários das gran-des fazendas ou feudos: os senhores feudais. O único elemento agregador dessa sociedade era a religião, que preservava e defendia a ideia de uma

Foi durante a Escolástica que surgiram as

primeiras universidades da Europa, sistematizando as pesquisas científicas

e preparando o caminho para o Renasci-mento, que viria em seguida.

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única civilização sob um único governo, em que a Igreja ocupava lugar central.

A Igreja Católica, única instituição a se manter organizada, e até mesmo por essa razão, conseguiu difundir o cristianismo entre os povos bárbaros e ao mesmo tempo preservar elementos da cultura greco-roma-na. Culturalmente, a Igreja Católica exerceu amplo domínio colocando a fé cristã como condição para se chegar à plena sabedoria, em detrimento da razão. Essa fé consistia na crença absoluta nas verdades reveladas por Deus aos homens atra-vés das Sagradas Escrituras.

Enfim, o período medieval é marcado por uma significativa diminuição da liber-dade de pensamento, visto que o catolicis-mo impedia que os filósofos voltassem sua atenção para a busca livre da verdade, pois a única verdade possível era aquela revelada por Deus. Apenas era permitido usar a filosofia para demonstrar pela razão as verdades da fé cristã. Alguns pensadores desse período insistiam, com efeito, que vários elementos da filosofia grega poderiam ser colocados a serviço do cristianismo.

AtiviUaUes

01. O que há de comum entre os diversos filósofos pré-socráticos apre-sentados?

02. O que Sócrates quis dizer ao afirmar: “Só sei que nada sei”?

Conexão:

Para o aprofundamento acerca das características ge-

rias do pensamento e da tradição cristã, é interessante visitar o site do Vaticano http://www.vatican.va/

phome_po.htm.

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03. Critique as ideias políticas de Platão, apresentando os pontos em que você concorda e aqueles dos quais você discorda.

04. O que significa ser feliz para o Cinismo e o Estoicismo?

05. Por que, segundo o Epicurismo, não se deve temer a morte?

06. Explique quais foram as características da filosofia medieval.

Reflexão

Como vimos nessa unidade, é fundamental para o desenvolvimento da filosofia, e poderíamos dizer também: de todo pensamento autônomo, a liberdade de expressão, isto é, uma condição política favorável. Com efei-to, o período mais rico da filosofia foi o Período Clássico, durante o qual a democracia ateniense conheceu sua fase mais importante. Foi nessa época

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que apareceram Sócrates, Platão e Aristóteles. Após o fim da democracia, por meio de Alexandre e depois do Império Romano, a filosofia entra em declínio, até esvaziar-se significativamente durante a Idade Média, perío-do em que a liberdade de pensamento praticamente foi anulada. Isso nos leva a pensar também em nossos dias, no sentido de refletir se a liberdade de pensamento está efetivamente assegurada ou se, pelo contrário, o im-pério da mídia não acaba por subjugar o pensamento autônomo, fazendo com que todos pensem da mesma forma. Sem dúvida esse é um problema que deve ocupar a atenção do assistente social, visto que combater as in-justiças e desigualdades sociais passa por preservar também a autonomia de pensamento de cada um, pois não é um possível garantir um sujeito realizado e plenamente feliz se não lhe for assegurado o pensamento pró-prio, apenas através do qual conquistamos nossa identidade pessoal.

LeiturasUrecomenUaUas

JAEGER, Werner. Paideia: a formação do homem grego. Trad. Artur Parreira. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

O que os gregos chamavam de Paideia não se pode facilmente tra-duzir, pois seria preciso para tanto utilizar as palavras civilização, cultura, tradição, literatura e educação juntas, num mesmo conceito. Entretanto, a compreensão desse conceito é fundamental para o entendimento da men-talidade grega antiga. O livro sugerido acima é o caminho mais profundo e fértil para a incursão no universo da civilização criadora da filosofia ocidental.

RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. Trad. Breno Silveira. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967, v. II.

O segundo volume da História da Filosofia Ocidental do filósofo inglês Bertrand Russell é dedicado especificamente ao pensamento me-dieval, apresentando todo o contexto em que ganhou força o cristianismo, bem como o desenvolvimento do pensamento cristão, desde a Patrística até a Escolástica. É uma fonte importante para quem deseja se aprofundar no estudo do cristianismo medieval.

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Referências

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, São Paulo, 2003.

ARISTÓTELES. A Política. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1998.

MARCONDES, Danilo. Introdução à história da filosofia. 10. ed. São Paulo, Zahar, 2006.

RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. Trad. Breno Silveira. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967, v. II.

NaUpróximaUuniUaUe

Vimos nessa unidade que a filosofia se desenvolveu na Grécia Antiga, conhecendo durante o período clássico sua fase mais importan-te. Em seguida entrou em decadência, primeiro graças às expedições de Alexandre e em seguida do Império Romano. Finalmente, a filosofia foi praticamente expulsa da Europa devido ao predomínio da mentalidade cristã medieval. Na próxima unidade, conheceremos os desenvolvimentos posteriores da filosofia, isto é, como o pensamento racional conseguiu por fim se libertar da Idade Média e abrir as portas da Modernidade, fazendo renascer o pensamento livre e autônomo, que possibilitou em seguida o aparecimento da ciência e com ela tudo o que caracteriza o nosso tempo.

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UniUa

UeU3

UFilosofia Moderna e

ContemporâneaNessa unidade discutiremos a respeito

da origem do pensamento moderno, quando enfim a Europa se liberta da Idade Média e pre-

para o caminho para o advento da ciência. Como veremos, a Reforma Protestante foi fundamental para

a formação da Modernidade, pois libertou o homem do coletivismo medieval, permitindo-lhe assim pensar e agir

por si mesmo. A criação da ciência, por sua vez, desenvolveu no homem a expectativa de uma humanidade melhor, enfim

livre das superstições e voltada para o progresso social. O sécu-lo XX, porém, mostrou ser vã essa esperança, pois as injustiças e

todos os demais problemas sociais ainda persistem, mesmo com o avanço significativo da ciência e da técnica moderna.

Objetivos de sua AprendizagemVocê deverá ser capaz de identificar as principais características

do pensamento moderno e contemporâneo, tornando-se apto para discu-tir a origem histórica da mentalidade que rege o nosso tempo, bem como ser capaz de entender e explicar a crise de valores própria das últimas décadas.

Você se Lembra?Alguma vez você já ouviu alguém dizer que vivemos em uma

“crise de valores”? Lembra-se de ouvir alguém afirmar que a população não respeita mais a polícia ou não acredita mais na política, os filhos

não respeitam os pais ou os alunos não respeitam os professores? Você já parou para pensar nas raízes ou origens dessa tão falada

crise? Com efeito, segundo alguns pensadores contemporâneos vivemos na época em que Deus morreu, isto é, uma época

desencantada.

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3.UUFimUUaUIUaUeUMéUia

Uma série de mudanças de caráter social, político e econômico prepararam o advento da modernidade e o fim da mentalidade própria da Idade Média. Entre essas mudanças pode-se citar:

a) Surgimento do Capitalismo: o sistema de produção me-dieval, isto é, o feudalismo, baseado na propriedade da terra e na agricultura, foi gradualmente substituído por um outro sistema econômico, que ganhou força inicialmente graças ao crescimento do comércio, ao fortalecimento das grandes rotas comerciais e ao surgimento de uma nova classe social: a bur-guesia.

b) Formação dos Estados Nacionais: as nações da Europa, durante a Idade Média, não possuíam a configuração que hoje possuem, isto é, ainda não eram Estados unificados, mas regiões divididas em diversos reinos ou principados. A moder-nidade caracteriza-se pela unificação desses reinos em Estados independentes, o que gerou grande debate político, referente à forma de poder. Por outro lado, o fortalecimento de alguns Estados conduziu ao impulso das grandes navegações e com elas a descoberta do Novo Mundo e o estabelecimento das colônias.

c) Reforma Protestante: o movimento da Reforma, embora ini-cialmente apenas um movimento religioso, teve repercussões culturais amplas. Em primeiro lugar rompeu a unidade religio-sa da Europa, abolindo a ideia de que o homem está entregue aos desígnios de Deus, assumindo por outro lado o trabalho como fonte de graça e origem legítima da riqueza e felicidade. Além disso, os protestantes concebiam a razão como uma ex-tensão do poder divino, e, de acordo com isso, ela não poderia ser rejeitada ou marginalizada, como exigia a Igreja Medieval. Disso resultava que o indivíduo deve ter a liberdade de usar a sua razão de maneira livre e responsabilizar-se por seus atos de maneira autônoma.

d) Surgimento da Ciência: a ciência inventou um novo método de investigação da natureza, isto é, o método experimental, re-jeitando a submissão do pensamento aos dogmas cristãos. Isso era resultado da confiança moderna na razão, como a via capaz

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de explicar o mundo em substituição da religião. Outra conse-quência do crescimento gradual da autoridade da ciência foi o descrédito ou perda de autoridade da Igreja, com cada vez me-nos influência sobre os Estados ou sobre o pensamento social.

e) Invenção da Imprensa: a edição de livros até a Idade Média era um processo extremamente lento, que se realizava graças sobretudo ao trabalho dos monges copistas. A possibilidade de impressão de textos foi de grande utilidade, pois possibilitou a maior divulgação dos textos clássicos gregos e romanos, aces-síveis agora a um número maior de pessoas. Disso resultou o crescimento gradual da liberdade de expressão, embora o aces-so a esses textos, apesar de maior devido à imprensa, ainda se limitava a uma elite social letrada.

Todas essas transformações modificaram sensivelmente o jeito de pensar e viver de grande parte da Europa. Elas, com efeito, preparavam o caminho para o advento do antropocentrismo, isto é, a concepção que colocava em primeiro plano o ser humano e sua capacidade de raciocínio, em detrimento do teocentrismo medieval, que supervalorizava a fé e a religião. Por sua vez, o apreço maior pela razão humana conduziu a uma filosofia laica, ou seja, não religiosa, geralmente otimista em relação à ca-pacidade da razão humana de intervir no mundo, organizar a sociedade e aperfeiçoar a vida do homem.

3.2U OURenascimentoU

O movimento intelectual que possibilitou todo esse conjunto de transformações foi denominado de Renascimento, e teve origem na Itália, entre os século XV e XVI. O Renascimento defendia a retomada do pen-samento clássico antigo, grego e romano, esquecido ou propositalmente escondido durante a Idade Média. O Renascimento ofereceu, por outro lado, as bases conceituais e os valores que tornariam possível, no século XVII, o impulso decisivo da razão e da ciência. Assim, a partir do Renas-cimento ganha força o pensamento que em seguida dominaria a Moderni-dade, pensamento que se baseava então em três conceitos fundamentais, expressos no quadro a seguir:

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Humanismo: o homem percebeu que podia explicar a natureza a partir de sua própria inteligência ou razão, sem a necessidade de re-correr a Deus ou a qualquer agente sobrenatural. O humanismo, além disso, foi um movimento intelectual em defesa do estudo da cultura greco-romana e a retomada dos ideais que exaltavam o ser humano e seus atributos, especialmente a liberdade e a razão.

Racionalismo e Cientificismo: A ciência mostrou-se bem mais eficaz do que a religião para a explicação do mundo, de modo que gra-dualmente conquistou o pensamento dos homens modernos. O renas-cimento, portanto, favoreceu toda uma mentalidade racionalista, que dispôs o homem para investigar os problemas do mundo, aguçando seu espírito de observação sobre a natureza e o fazendo dedicar mais tempo à pesquisa e às experimentações, ou seja, um exame livre do mundo.

Individualismo: era próprio da Idade Média o coletivismo de pensamento, isto é, todos deviam pensar e agir da mesma forma, de acordo com o que a Igreja determinava ser o certo e o aceitável. Por ou-tro lado, a Igreja defendia o sonho de uma única civilização, regida por um só governo, o que prejudicava o espírito nacionalista dos povos. Em substituição a esse coletivismo cristão, a modernidade abre as portas para um mundo marcado pela individualidade dos seres humanos e pela identidade nacional, valorizando e demarcando as diferenças regionais entre as nações.

Portanto, o Renascimento abriu o caminho para o rompimento com a visão medieval do mundo, centrada em Deus ou na religião, substituindo-a pou-co a pouco pela ciência e pela expli-cação experimental. Assim, se na Idade Média a mentalidade típica era o pensamento contemplativo e a submissão inquestionável às verdades da fé, as quais apon-tavam sempre para um além mundo, condenando a vida ter-rena em nome da vida espiritual, o homem moderno se volta para o mundo concreto, e isso não apenas no objetivo de conhecê-lo ou explicá-lo, como ainda de intervir sobre ele e exercer controle sobre a natureza. Esse é o

Descartes foi um filósofo e ma-

temático francês que viveu entre 1596 e 1650 e que é considerado o pai

da filosofia moderna. Ele introduziu uma vi-são da relação entre homem e natureza pensada

a partir da figura do homem como senhor da terra e que também se expressa em Francis Bacon, filósofo inglês que viveu entre os séculos XVI e XVII e para

quem deveríamos arrancar, sob tortura, os segredos da natureza. Desde então, a relação do homem com o mundo é marcada por essa tendência de controle e intervenção, sustentada na ideia de

exploração, cujas consequências nocivas o nosso tempo vivencia na chama-

da crise ambiental.

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ideal presente em pensadores como Descartes – considerado o pai da filo-sofia moderna – e Francis Bacon.

É importante ressaltar, porém, que a passagem da mentalidade me-dieval para a mentalidade científica moderna, não se deu da noite para o dia. Foram necessários muitos anos para que o passado medieval fosse su-perado. Com efeito, os primeiros adeptos das novas ideias não eram com-pletamente emancipados da mentalidade que caracterizou a Idade Média, isto é, pretendiam romper com a autoridade da Igreja, mas colocaram em seu lugar a autoridade dos antigos filósofos. Trata-se de uma mudança sig-nificativa, pois os filósofos gregos discordavam entre si e uma decisão a respeito de suas controvérsias só poderia advir de um juízo pessoal. Con-tudo, poucos homens na Renascença tinham a coragem de defender uma ideia sem a apoiar sobre a autoridade de alguém, ainda que não fosse mais uma autoridade religiosa.

A repulsa à Igreja e à mentalidade medieval, por outro lado, não tinha motivações apenas filosóficas. É de se destacar também o compor-tamento imoral dos membros da Igreja, especialmente os papas. Durante a Renascença, os papas eram menos homens religiosos do que chefes de exércitos. Usavam as tropas da Igreja para aumentar a riqueza pessoal e de sua família. Um exemplo foi o papa Alexandre VI, que governou a Igreja entre 1492 e 1503. Embora papa, ele teve dois filhos, e pretendia fundar um reino para que um deles governasse. Seus projetos não tiveram sucesso, pois o primeiro filho morreu, depois ele próprio faleceu e à época o último filho estava muito doente para assumir as terras que o pai con-quistara. Esse clima de ganância e avareza precedeu e motivou a Reforma Protestante, levada a cabo pelo padre Martin Lutero.

A ganância da Igreja por poder expressou-se também através da per-seguição insistente e cruel a todos aqueles que defendiam as novas ideias. Portanto, muitas pessoas pagaram por todo esse conjunto de transforma-ções sociais, como sempre acontece quando um corpo de ideias coloca em risco o poder constituído. Com efeito, os pensadores que defendiam as ideias renascentistas foram perseguidos e, muitas vezes, duramente puni-dos pelas classes que dominavam a sociedade durante a Idade Média.

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Wik

imed

ia

A forma utilizada pela Igreja Católica para a repressão foi o Tribunal da Santa Inquisição, encarregado de investigar, prender, julgar e condenar os “hereges”1 responsáveis pela divulgação de doutrinas contrárias aos pressupostos da fé cristã. Inúmeros pensadores e milhares de livros cre-pitaram nas fogueiras da Inquisição. O tribunal foi criado em 1232, sob o governo de Gregório IX, e sua ação estendeu-se por vários reinos cristãos, como a Itália, Alemanha, Portugal, França e especialmente Espanha. Tam-bém se fez presente nas colônias desses países, como foi o caso do Brasil. Com o decorrer do tempo, a atividade da inquisição diminuiu, mas ganhou novo impulso no século XVI devido ao avanço do protestantismo.

Em suas investigações, frequentemente os inquisidores usavam métodos de tortura para forçar os acusados a confessar os seus crimes. A Igreja, embora santa, não via nenhum problema nesse expediente. Qual-quer pessoa que fosse suspeita de ensinar ideias contrárias àquelas defen-didas pela Igreja poderia ser alvo de investigação. Nesse período, milha-res de mulheres foram condenadas pela prática da feitiçaria ou bruxaria, ainda que a confissão que assinavam não fosse obtida através de meios muito confiáveis.

Enfim, apesar de ter libertado o espírito humano das amarras da ortodoxia católica, a Renascença não produziu filósofos importan-tes, apenas preparou o caminho para o advento do importante século XVII. O que se fez na Re-nascença foi renovar o estudo de Platão e forne-

1 glossário: heresia: qualquer ato, palavra ou doutrina contrária ao que foi estabelecido pela igreja, em termos de fé. na sua origem grega, heresia significava escolha, uma preferência por uma doutrina. herege era a pessoa que escolheu uma determinada heresia.

Conexão:

Para o aprofundamen-to acerca dos modos de

tortura que a Inquisição utili-zava para retirar a confissão de seus acusados, ver http://

www.misteriosantigos.com/inquisi.htm

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cer a respeito dele e dos filósofos antigos um conhecimento autêntico, não mediado pela interpretação cristã de suas obras. Além disso, apresentou a atividade intelectual como uma aventura social, retirando dela as limi-tações que na Idade Média a tornaram meramente um canal para a con-firmação das verdades da Igreja. Porém, apesar de tudo isso, os homens dessa época não foram, como já dito, originais, pois estavam preocupados demais em conhecer o pensamento antigo para produzir algo de novo.

Por outro lado, é de se destacar também que a Renascença não foi um movimento popular. Pelo contrário, foi um movimento restrito a um pequeno número de intelectuais e artistas, protegidos por homens ricos e poderosos. Por mais que hoje consideremos a Renascença um período de grande importância para a história do pensamento, provavelmente a maior parte da população que vivia à época nem tinha ideia do que estava acon-tecendo.

Além disso, a libertação dos homens em relação à Igreja não signi-ficou sua libertação em relação a todos os tipos de superstição, visto que ainda se continuava a acreditar em magia ou feitiçaria, por exemplo.

Outro efeito negativo dessa libertação dos grilhões medievais foi o afrouxamento moral. No que diz respeito aos governantes, muitos deles adquiriam o poder por meio de traições e depois o mantinham através de fria crueldade. Mesmo os cardeais, quando convidados a festejar a coroa-ção de um papa, levavam o seu próprio vinho, por medo de envenenamen-to.

Porém, ainda assim a Renascença criou obras de notável beleza. Foi importante para libertar o homem da mentalidade medieval, tornando possível o florescimento da liberdade de pensamento e a criação intelec-tual livre. Sem dúvida, os homens ainda não ousavam completamente o pensamento original, presos agora à autoridade não da Igreja, mas dos antigos, mas ainda assim o clima espiritual que a Renascença inaugurou foi importante para abrir as portas para o próximo período do pensamento humano: a Idade Moderna.

Quanto ao pensamento moderno, o que propriamente o distingue do pensamento medieval ou antigo é o desenvolvimento da ciência, cujo auge foi o século XVII. Mesmo a filosofia foi influenciada e influenciou o novo modo de interpretar a realidade. Descartes, por exemplo, considera-do por muitos o primeiro filósofo moderno, foi também um dos criadores da ciência. Porém, os quatro homens que têm lugar de maior destaque na construção da ciência foram Copérnico, Kepler, Galileu e Newton.

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3.3UUmUnovoUmunUo

O Renascimento, como se disse, preparou o homem moderno para todo um conjunto novo de ideias e de valores. O surgimento da ciência, mencionado no último parágrafo, foi um fator de grande importância para a consolidação da mentalidade moderna, mas não o único. Questões de ordem moral e política, que dizem respeito à essência do homem, também foram objeto da atenção dos pensadores de então, sobretudo porque a es-sência humana como compreendida pela Igreja estava agora em crise.

Entre os pensadores que merecem destaque a esse respeito está Michel de Montaigne (1523-1592). Segundo escreveu ele mesmo, sua pretensão era falar sobre si, suas experiências e reflexões, mas acabou por criar uma obra que, no entendimento de seus intérpretes, possui um sig-nificado universal, visto que expressa as angústias e inquietações de todo ser homem, o de ontem, o de hoje e o de sempre.

O pensamento de Montaigne tem um fundo cético, mas também recebeu inspiração do epicurismo e do estoicismo. Defendia ele não ser possível estabelecer para todas as pessoas os mesmos princípios morais, visto que cada um deve construir, a partir de suas próprias disposições pessoais, o conjunto de valores que deve guiar suas ações. Contudo, os valores humanos, apesar de suas diferenças, devem ter em comum um convicto sim à vida.

Essa ideia deveria estar presente também na educação. Os conte-údos a serem ensinados às crianças – e poderíamos dizer também aos adultos que cursam uma faculdade – não devem ser impostos, mas sub-metidos a sua reflexão. Por maior que seja a autoridade da tradição ou de algum filósofo em específico, suas ideias não devem ser ensinadas como se o aluno devesse simplesmente aceitá-las, pois que vindas de uma auto-ridade reconhecida. Ao contrário, deve-se apresentar em conjunto todas as doutrinas, cabendo ao estudante a decisão de definir qual é a melhor. Se, porém, ainda não fosse capaz de decidir por nenhuma, o melhor caminho seria permanecer na dúvida, visto que, segundo Montaigne, apenas os lou-cos tem certeza absoluta de suas ideias.

No que diz respeito à política, merece destaque o pensador italiano Nicolau Maquiavel (1469-1527). Maquiavel nasceu na cidade italiana de Florença, em 3 de maio de 1469 e morreu nessa mesma cidade em 21 de junho de 1527. A Itália da época não era um país unificado como é hoje, mas dividido em diversos territórios, os quais disputavam o poder entre

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si. A disputa e ganância pelo poder não tinha limites: as pessoas faziam o que fosse preciso para dominar os outros, mesmo que isso significasse imoralidade, deslealdade ou desonestidade. Maquiavel apenas expressou em seus livros esse clima espiritual decadente, próprio de sua época.

O livro mais conhecido e comentado de Maquiavel é O Príncipe. O objetivo do livro é ensinar aos governantes como eles conquistam e mantêm o poder político. Embora as ideias de Maquiavel sejam dirigidas aos príncipes da época, elas podem ser trazidas para o nosso tempo, pois, feliz ou infelizmente, continuam em grande medida sendo válidas.

Em primeiro lugar, a honestidade e a moralidade não são essenciais a um prín-cipe, pois o que ele deve fazer é, antes de tudo, garantir o seu poder e autoridade so-bre os demais. Com efeito, diz Maquiavel: “[...] não deverá importar-se de incorrer na infâmia dos vícios, [pois] se encontrará alguma coisa que parecerá virtù, e que leva à ruína; enquanto outra que parecerá vício pode levar à segurança e bem-estar”.2

Em outras palavras: há ações virtuosas que, se praticadas, podem levar à ruína política, enquanto que há ações consideradas moralmente reprováveis que podem trazer bem-estar e segurança. Portanto, não é com a virtude que deve se preocupar o governante, mas com a sua própria se-gurança.

Outra ideia defendida por Maquiavel era a de que o príncipe, por mais que não deva se preocupar com honestidade, deve, porém, parecer ser honesto e passar essa imagem para as outras pessoas. É o que fazem, na prática, alguns políticos ainda nos tempos modernos: vendem a ima-gem de honestidade e seriedade para atrair e conquistar a confiança dos eleitores. O governante, pois, deve fazer o mesmo: vender uma imagem de seriedade e moralidade, mas não precisa praticar essas virtudes. Diz ele: “Aliás, ousarei dizer que, se as tiver [virtudes] serão danosas, enquanto, se parecer tê-las, serão úteis. Deve parecer todo piedade, todo fé, todo in-tegridade, todo humanidade e todo religião – e sê-lo, mas com a condição de estar com o ânimo disposto a, quando necessário, não o seres”3.

2 citado a partir de mattar, J. filosofia e Ética na administração. são paulo: saraiva, 2004, p. 213.3 idem, p. 213

Conexão:

Para o aprofundamento acerca de teorias políticas

dentro da filosofia, consulte o enderereço a seguir, que apresenta

artigos relacionados à teoria política, bem como discussões a respeito

da condição atual da política no Brasil: http://ghiraldelli.

pro.br/

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Portanto, um príncipe não deve agir do modo como age um homem bom, mas estar disposto a, se preciso, ir contra a fé, a caridade, a huma-nidade ou a religião, para a preservação de seu poder e para que atinja seus objetivos. Ele, portanto, não se subordina à moral ou à religião, pois, fazendo o mal, pode, porém, governar bem. Ou seja: às vezes um bom governante é justamente aquele que, sem que ninguém o saiba, age imo-ralmente, enquanto que o príncipe, por assim dizer, “correto” e “honesto”, pode administrar mal ou mesmo perder o cargo.

Hoje é comum o uso do adjetivo “maquiavélico” para se referir a alguém ou a alguma ação considerada má, falsa ou desonesta. Trata-se de uma injustiça para com Maquiavel, visto que ele não defendia a desones-tidade, mas escrevia sobre como, à sua época – e talvez também na nossa, os políticos obtinham o fracasso ou o sucesso.

Enfim, as novas ideias morais e políticas, advindas do começo da Modernidade, embora importantes para o clima espiritual da época, não são tão decisivas, como já se apontou acima, para a formação do pensa-mento moderno quanto o surgimento e consolidação do conhecimento científico, que irá influenciar em seguida todo o modo de pensar da mo-dernidade, modo de pensar cujas consequências nós vivenciamos hoje.

3.4U OUpensamentoUmoUerno

O pensamento moderno apresenta diversas características que o distinguem do período Medieval. Entre essas características está a de-crescente autoridade da Igreja e a crescente autoridade da ciência. Como consequência, a cultura moderna é mais profana que sacra, ou seja, o Estado substituiu a Igreja como autoridade controladora da cultura, mas o Estado não terá sobre os filósofos a mesma influência que a Igreja tinha. Uma outra característica do período Moderno é o crescente poder da clas-se mercantil, que pouco a pouco substituiu a aristocracia na condução da política. Isso se deveu ao desenvolvimento do capitalismo, que colocou cada vez mais poder nas mãos da burguesia.

O poder da ciência, que substituiu a religião, é um poder bem dife-rente daquele que a Igreja exercia sobre os homens durante a Idade Mé-dia. Com efeito, quem rejeita uma tese científica qualquer, nem por isso é punido ou moralmente mal visto. Além disso, a ciência não pretende resolver todos os nossos problemas de uma vez, mas apenas aqueles as-suntos que podem ser verificados na experiência. Por outro lado, ao passo

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que as verdades da religião são eternas e imutáveis, as verdades da ciência são apenas prováveis, e podem ser modificadas sempre que se mostrar necessário.

Acrescente-se a isso o fato de que a ciência mostrou-se muito eficaz no que diz respeito à modificação do mundo, ou seja, mostrou-se que a ciência poderia ser extremamente útil, inicialmente na guerra, devido à construção de armamentos e de aparatos militares mais poderosos, depois na melhoria da própria vida humana, tornando-a menos pesarosa e mais agradável – isso, é claro, não para todos.

Percebe-se, pois, que a ciência significou uma novidade radical em relação ao tipo de pesquisa que se realizava até então, na filosofia ou te-ologia. A distinção mais importante da ciência em relação à filosofia está no método experimental: enquanto que a filosofia demonstrava suas teses apenas através de teorias, a ciência o fará através de comprovações práti-cas na experiência. Além disso, o método experimental exigia unanimida-de: se um cientista demonstrava uma tese qualquer a partir de determinada experiência, todos os demais, repetindo a mesma experiência, deveriam chegar aos mesmos resultados. Isso fez com que os cientistas alcançassem harmonia entre suas ideias, ao contrário dos filósofos, que nunca chega-vam a um consenso a respeito de qualquer problema.

Por outro lado, o avanço da ciência e sua utilidade acabaram por gerar nos homens um sentimento de crescente entusiasmo e otimismo em relação a ela. Seria a ciência finalmente capaz de libertar os homens das amarras das superstições e conduzi-los a uma época de progresso e bem-estar social? Parecia ser essa a esperança iluminista. De fato, após o sécu-lo XVII, em que a ciência atingiu sua maturação e conquistou a maior par-te das mentes pensantes europeias, o século XVIII caracteriza-se por uma firme convicção de que a razão libertará o homem de seus preconceitos e de sua miopia intelectual e enfim conduzirá a humanidade à prosperidade e a uma época de felicidade, em que as injustiças desaparecerão, assim como todos os problemas sociais.

Para tanto, os iluministas defendiam a educação para todos, isto é, a universalização da cultura, até então restrita a um pequeno grupo pri-vilegiado da sociedade. Através da educação e da ciência, a humanidade evoluiria e se tornaria enfim plenamente inteligente e justa.

Além do iluminismo, outro movimento que defendia ideias seme-lhantes foi o positivismo, especialmente na figura do francês Auguste Comte (1798-1857). Tendo lugar no século XIX, o positivismo foi um

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movimento que, grosso modo, levou ao extremo a valorização do método experimental das ciências positivas – aquelas baseadas nos fatos e expe-riências. Essa defesa já estava presente no iluminismo do século prece-dente, mas em Comte recebeu uma ênfase ainda maior. Segundo ele, não é possível qualquer conhecimento senão aquele baseado na observação de fatos. Assim, ele rejeitava por completo as ideias de origem meramente metafísicas (filosóficas), como aquelas vindas da teologia, ou mesmo do estudo da ética ou estética. Em outras palavras, qualquer tipo de conheci-mento que não pode ter por base um fato observável não é válido. Disso resulta um culto à ciência e à sacralização do método científico.

Esse conjunto de ideias, que ainda exercem influência prática em nossos dias, expressa a confiança burguesa nos benefícios da industriali-zação, assim como um otimismo geral em relação ao progresso proporcio-nado pelo capitalismo, progresso guiado pela técnica e pela ciência.

Com efeito, Comte expressa sua visão a respeito da evolução da hu-manidade através de uma doutrina conhecida como lei dos três estágios, segundo a qual as concepções humanas e todos os conhecimentos de que dispomos passam sempre por três estágios sucessivos:

a) Estado Teológico: trata-se do ponto de partida da inteligência humana, caracterizado por uma visão sobrenatural a respeito dos fenômenos naturais, ou seja, quando os homens interpre-tam os fenômenos do mundo como resultado da ação de seres superiores.

b) Estado Metafísico: período em que a influência dos seres sobrenaturais é substituída pela ação de forças abstratas, que representam os seres do mundo. Grosso modo, podemos dizer que o estágio em que a religião é substituída pela filosofia.

c) Estado Científico: consiste no auge do desenvolvimento racional do homem, em que ele combina o raciocínio com a observação da natureza para entender os fenômenos do mun-do. Trata-se, grosso modo, da substituição da filosofia pela ciência.

O positivismo, pois, defende que um dia a humanidade enfim aban-donará todas as formas de religião e se guiará exclusivamente pela ciên-cia e por aquilo que pode ser observado e experimentado, ou seja, o fato positivo. Naturalmente, Deus, que não é um fato observável, não é, nesse

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sentido, positivo, e por isso todo o discurso sobre ele deve ser definitiva-mente abandonado.

Por fim, o positivismo leva ao extremo a valorização moderna pela ciência, advogando uma humanidade plenamente científica, regulada pelas ideias de planejamento e controle, as mesmas ideias que regulam e organizam o universo industrial. Parece pretender, portanto, que a vida humana deva ser administrada como se administra uma fábrica, o que reti-ra dela todo o encantamento em favor da frieza do cálculo e do controle.

3.5U OUpensamentoUcontemporâneo

Como vimos acima, a ciência deu ao homem um poder crescente so-bre a natureza. De tal maneira isso evoluiu que tornou o mundo mera ma-téria-prima para as experiências humanas. Em outras palavras, o mundo perdeu o encantamento que tinha até a Idade Média, tornando-se simples objeto de estudo e pesquisa. O desenvolvimento dessa tendência levou, no século XX, a um sentimento de solidão do homem diante do universo in-finito. O mundo tornou-se absurdo, inexplicável ou incompreensível, e as relações humanas entraram em crise. Isso porque o desenvolvimento cien-tífico andou de mãos dadas com o desenvolvimento do capitalismo, que colocou em primeiro plano os interesses econômicos, os quais tornaram as relações humanas e mesmo o homem mera mercadoria. Disso resultou o nosso tempo, um tempo pouco espiritual, em que os homens se sentem cada vez mais solitários diante de um mundo desencantado e impessoal.

Ora, sem dúvida a ciência se mostrou ser extremamente eficaz quanto ao desejo humano de controle e domínio sobre a realidade. A capa-cidade de transformação da natureza aumentou sensivelmente, e por isso muito se pensou que a ciência poderia finalmente resolver os problemas do homem e conduzir a humanidade a uma época de prosperidade e bem-estar, tal como imaginavam os positivistas.

Essa crença atingiu um momento decisivo, como se viu, no século XVIII, conhecido como o Século das Luzes. Plenamente confiante na ciência, o homem acreditava firmemente que a época de obscuridade pas-sara e que agora se anunciava para a humanidade um futuro de bem-estar e conforto crescente, em que as mazelas do passado seriam esquecidas e a civilização entraria finalmente no caminho da ordem e da justiça. O século XIX é ainda herdeiro dessa confiança na ciência e cheio ainda de esperanças no homem.

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Contudo, veio o século XX, e com ele duas guerras mundiais, a bomba nuclear, a Guerra Fria, a Revolução na Russa, enfim, uma suces-são incrível de horror e atrocidade. Como consequência, a esperança que caracterizara os séculos anteriores perdeu lugar. A ciência, ao invés de resolver os nossos problemas e expulsar definitivamente a obscuridade da mente humana, colaborou, pelo contrário, para tornar a humanidade ainda mais obscura, visto que através dela o homem foi capaz de inacreditáveis maldades e crueldades. Com efeito, milhões de pessoas morreram vítimas da ambição pelo poder ou pela ganância financeira, alvos de técnicas de extermínio sofisticadas, para cuja elaboração contribuíram ideias e con-ceitos da ciência.

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.

Portanto, em lugar da confiança e esperança dos séculos preceden-tes, o século XX é caracterizado pela desilusão, pela desesperança e pelo sofrimento. A Igreja assassinou milhares de pessoas durante a Idade Mé-dia, acusadas de heresias as mais diversas. Mas a ciência, que prometia livrar a humanidade da superstição e conduzi-la para o caminho da paz e da civilização, foi uma das grandes colaboradoras no que diz respeito ao massacre humano de que o século XX tem tantos exemplos.

Por isso, o século XX começa sem conseguir crer em mais nada. Tudo parece agora absurdo e incompreensível. O mundo tornou-se mera-mente um objeto de estudo e pesquisa. As rosas não são mais as “flores no campo”, mas as “plantas do botânico”. Mesmo o homem tornou-se sim-ples objeto de pesquisa, sobre o qual se fala como se fala de um pedaço de ferro dentro de um laboratório. Tudo, pois, parece agora enigmático e confuso.

De acordo com isso, o homem do século XX é bem mais cético do que os homens dos períodos anteriores. Não crê em mais nada, perdeu

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Quando se diz em ausência

de Deus não se pretende afir-mar nada acerca de Deus entendido

como objeto de culto religioso. Aqui, Deus aparece na acepção de uma ideia que dá

sentido e ordem ao mundo. Quando se diz que Deus está ausente, o que se pretende afirmar

é que o nosso mundo é caracterizado pela perda de sentido e de valores, e que, em um

mundo assim, tudo parece ser permitido.

quase inteiramente a fé. Observando isso, Sartre, filósofo francês do sécu-lo passado, pergunta-se: e agora? Como viver em um mundo sem Deus? E citando o autor russo Dostoievski, lembra: “Se não há Deus, tudo é permitido.”

Com efeito, a ausência de Deus é a característica mais decisiva de nosso tempo. Por essa ausência, o que se pre-tende expressar é o desencantamento do mundo, agora regulado exclusivamen-te pelos valores da ciência, em que tudo, e até o próprio homem, se torna objeto de pesquisa. O desejo de controle da ciência atinge até mesmo os sentimentos humanos, visto que há pesquisas que procu-ram explicar e controlar até as nos-sas paixões, como se fosse possível transformar o homem em uma máqui-na perfeitamente previsível e manipulá-vel. O positivismo, assim levado ao extremo, parece assemelhar-se a um desespero patológico de controle da realidade, o que seria justamente a loucura da ciência. Sobre esse desencantamento do mundo, Nietzsche se expressa como segue:

Não ouvistes falar daquele homem louco que, em plena manhã clara, acendeu um candeeiro, correu para o mercado e gritava in-cessantemente: ‘Procuro Deus! Procuro Deus?’ [...] ‘Para onde foi Deus?’, responderam,’eu vos quero dízê-lo! Nós o matamos, vós e eu! Nós todos somos seus assassinos? Como, porém, fizemos isso? [...] Deus morreu! Deus permanece morto! E nós o matamos! Como é que nos consolamos, nós os assassinos de todos os assassinos? Aquilo de mais santo e poderoso que o universo possuiu até agora sangrou sob nossos punhais — quem enxuga de nós esse sangue? Com que água poderíamos nos purificar? Que cerimônias de expia-ção, que divinos jogos teríamos de inventar? A grandeza desse feito não é demasiado grande para nós? Não teríamos que nos tomar, nós próprios, deuses, para apenas parecer dignos dele? Jamais houve um feito maior — e sempre quem tenha apenas nascido depois de nós pertence, por causa desse feito, a uma história mais elevada do que foi toda história até agora!’ — Aqui, calou-se o homem

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louco e mirou de novo seus ouvintes. Também estes silenciavam e olhavam-no com estranhamento. Finalmente, ele arrojou o candeei-ro ao solo, de modo que este se estilhaçou e apagou. ‘Chego cedo demais’, disse ele então; ‘não estou ainda no tempo oportuno. Esse acontecimento formidável está ainda a caminho e peregrina — ele ainda não penetrou nos ouvidos dos homens. Relâmpago e trovão precisam de tempo, a luz dos astros precisa de tempo, feitos preci-sam de tempo, mesmo depois de consumados, para serem vistos e ouvidos. Este feito está ainda mais distante deles do que os astros mais remotos —, e todavia eles o consumaram’. Conta-se ainda que, no mesmo dia, o homem louco teria entrado em diversas igre-jas e nelas entoado seu requiem aetemam Deo. Conduzido para fora e instado a falar, teria ele replicado sempre apenas isto: ‘O que são, então, as igrejas, senão criptas e mausoléus de Deus?”4

Deus morreu. Nós, homens modernos, o matamos. Mas como? Os valores humanos, o encantamento da poesia, a leveza da dança, a duração da música e a mística do teatro foram substituídas pela frieza do cálculo e do controle sobre o mundo. Mesmo a arte se tornou objeto de mani-pulação, a serviço da indústria do entretenimento. O ideal iluminista da educação como via para a libertação humana, converteu-se, na prática, em manipulação social de uma escola a serviço dos valores burgueses. Isso, enfim, expressa o assassinato de Deus, de que são culpados os homens modernos.

Por fim, é justamente isso que caracteriza esse último século: a completa ausência de Deus. Como consequência, tal como no tempo de Maquiavel, os valores morais hoje entraram em desuso. Embora nin-guém o diga explicitamente, muitos consideram a honestidade um valor menor que o sucesso pessoal. Cresce e se aprofunda o individualismo e o egoísmo e, por consequência, as distâncias entre os homens. Daí a pro-funda solidão que caracteriza o nosso tempo. De maneira contraditória, o desenvolvimento de tecnologias de comunicação, que deveriam diminuir as distâncias entre as pessoas, não consegue, no limite, impedir que elas continuem a se sentir solitárias e perdidas em um mundo sem sentido e sem valores.

4 nietzsche apud giacoia Junior, osvaldo. Nietzsche. são paulo: pubLifoLha, 2000. (folha explica). p. 13.

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Resta-nos esperar, como sugere Heidegger, o advento dos novos deuses, e para tanto cumpre a nós nos colocar na abertura que preparará a superação do caráter técnico-científico-industrial da civilização moderna.

AtiviUaUes01. Explique quais foram as mudanças políticas e sociais que prepararam o advento da Modernidade.

02. O que significa Humanismo, Cientificismo e Individualismo?

03. Como deve ser, segundo Maquiavel, o comportamento moral do prín-cipe?

04. Quais são as principais características do pensamento moderno?

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05. Explique a Teoria dos Três Estados, do pensador francês Auguste Comte.

06. Como resultado do desenvolvimento científico e tecnológico da Mo-dernidade, o pensamento contemporâneo traz em si a marca do assassinato de Deus. O que significa dizer que Deus está morto?

Reflexão

Vimos nessa unidade que a Modernidade caracteriza-se por um rompimento com a mentalidade própria da Idade Média, em que prevale-ciam os valores do cristianismo católico dogmático. Rompendo com essa mentalidade, a Modernidade retoma, através do Renascimento, o livre pensamento que era característico do período clássico greco-romano. A liberdade de expressão e de pesquisa que o Renascimento possibilitou permitiu o surgimento e desenvolvimento da ciência, e com ela a ideia de que o homem deve ser o senhor do mundo e retirar dele, mesmo que sob tortura, os seus mistérios. O entusiasmo pela ciência, próprio do ilumi-nismo e depois, de forma ainda mais radical, do positivismo, acabou por limitar o homem ao domínio do que é positivo e observável, retirando o encantamento da vida humana ao torná-la tão controlável como a organi-zação de uma fábrica. Por outro lado, a ciência não nos conduziu ao pro-gresso social, antes consolidou o domínio de uma classe sobre as outras, constituindo-se muito antes em um instrumento de controle da burguesia sobre o restante da sociedade. Ao assistente social a reflexão sobre esse

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problema é imprescindível, pois a intervenção social, para ser mais fe-cunda e eficaz, deve levar em conta essa conjuntura, a fim de propor um debate que torne possível ampliar os benefícios da ciência, ainda restritos a uma parcela da população, para todos os membros da sociedade.

LeiturasURecomenUaUas

ABBAGNANO, Nicola. História da Filosofia. Tradução Conceição Jardim; Eduardo Nogueira; Nuno Valvas. 2 ed.Lisboa: Presença, 1979.

Esse texto aborda, de forma acessível, as características distintivas dos períodos Medieval e Moderno, e as principais ideias de seus autores. É uma referência importante para o estudo e análise da história do pensa-mento.

MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. Trad. Maurício Dias. São Paulo: Penguin Companhia das Letras, 2010.

Essa obra é dedicada aos Médicis, com o objetivo de receber o seu favor, coisa que não aconteceu. Nela Maquiavel descreve como um go-vernante – tendo em vista o contexto do século XV – conquista e preserva o seu poder. Embora escrita há séculos de nós, ainda pode ser usada para a compreensão da política moderna.

Referências

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1998.

_______________. Filosofia. São Paulo: Atual, 1992.

MARCONDES, Danilo. Introdução à história da filosofia. 10. ed. São Paulo, Zahar, 2006.

ROVIGHI, S. V. História da filosofia contemporânea. Tradução Ana Capovilla. São Paulo: Loyola, 1999.

STEGMÜLLER, W. A filosofia contemporânea. São Paulo: EPU, 1977.

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NaUpróximaUuniUaUe

Vimos nessa unidade como se desenvolveu a filosofia moderna, isto é, a partir do rompimento com a mentalidade medieval. Vimos ainda que esse rompimento abriu espaço para o desenvolvimento da ciência e o en-tusiasmo por esse desenvolvimento é justamente uma marca característica da Modernidade, embora tenha atingido na contemporaneidade um está-gio preocupante em que as relações humanas são todas compreendidas a partir dos valores comerciais e industriais burgueses. A industrialização da burguesia, por sua vez, tornou-se possível devido à aproximação entre a ciência e a técnica moderna, com o que a produção capitalista ganhou contornos nunca antes vislumbrados. De fato, essa é outra característica da Modernidade, a saber, a íntima relação entre ciência e tecnologia, as quais são frequentemente confundidas, embora sejam saberes essencial-mente distintos. Na próxima unidade, discutiremos sobre esse problema, apontando as aproximações e distâncias existentes entre a técnica e a ciên-cia e ao mesmo tempo compreendendo por que a intimidade entre as duas é uma marca específica de nosso tempo.

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UniUa

UeU4

UFilosofia, Ciência e

TécnicaTrabalharemos nessa unidade o proble-

ma das relações entre técnica e ciência. Com efeito, esses dois saberes distintos são enten-

didos hoje, dentro da mentalidade comum, como indistinguíveis. E de fato, a proximidade contemporâ-

nea entre tecnologia e conhecimento científico favorece essa visão usual, visto que tanto a técnica moderna não

pode ser concebida sem a ciência experimental, como nem esta continuar o seu progresso sem os avanços tecnológicos.

Enfim, conheceremos ainda a leitura que Heidegger fez sobre esse problema, e saberemos por que ele enfatiza a necessidade de

pensar não a técnica, mas a essência da técnica.

Objetivos de sua AprendizagemVocê deverá ser capaz de diferenciar o tipo de saber que se pode

considerar científico do tipo de saber próprio da técnica. Além disso, deverá ser capaz de pensar o problema moderno da técnica a partir das críticas feitas a ela por Martin Heidegger.

Você se Lembra?De alguma descoberta tecnológica recente, como um novo aparelho

de celular ou uma nova tecnologia da informação? Como essa descober-ta foi apresentada pela mídia, como um progresso técnico ou científico? Com efeito, é comum a confusão entre esses dois saberes que possuem, contudo, fronteiras bem definidas.

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4.UU IntroUução

Segundo Gilles-Gaston Granger, desde a segunda metade do sécu-lo XX, vivemos no que ele denomina de Idade da Ciência. Pode causar estranheza essa denominação, que parece desconsiderar os avanços e significativas mudanças que as ciências provocaram em séculos anterio-res. Contudo, o autor entende que o século XX conheceu renovações e desenvolvimentos sem precedentes, e sobretudo repercussões nunca antes sentidas com tamanha intensidade, seja na vida individual seja na vida social dos homens. Portanto, por mais que a segunda metade do século XX não tenha conhecido propriamente experiências cientificamente re-volucionárias, e seja em grande medida tributária de ideias e descobertas anteriores, foi a partir da metade do século passado que assistimos a de-senvolvimentos e aplicações inéditas dos saberes científicos, o que mudou radicalmente o modo de vida do homem moderno.1

Contudo, a penetração da ciência no seio da vida humana é feita de modo silencioso, porque mediado por avanços técnicos. O desenvol-vimento significativo das mídias, como a televisão e especialmente o microcomputador, além da telefonia móvel, é o que salta à vista quando se fala em avanço científico hoje. Isso demonstra que a ciência desse século assumiu um caráter essencialmente aplicado, de onde resulta sua íntima ligação com a técnica. Essa ligação é de tal forma presente e característica da ciência de nossos dias, que a grande maioria das pessoas confunde com facilidade um avanço científico com um avanço técnico. Esse é um as-pecto importante e próprio de nosso período histórico, visto que para um homem antigo, grego ou romano, por mais engenhoso que pudesse ser um instrumento técnico, quase nunca ele estava associado a um conhecimento científico qualquer. Ao contrário, toda e qualquer atividade manual era tida, por exemplo entre os gregos, como vil e de menor importância em relação ao trabalho intelectual da ciência e da filosofia.

A penetração da ciência através dos avanços técnicos tem ainda ou-tra consequência, que é a universalização de representações científicas no imaginário popular. Isso se deve à divulgação de ideias ou pesquisas cien-tíficas realizada por jornais, revistas ou outros meios e destinada aos mais diversos públicos. Divulgar trabalhos científicos requer algum cuidado,

1 granger, gilles gaston. A ciência e as ciências. trad. roberto ferreira. são paulo: editora unesp, 1994.

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sob pena de apresentar pesquisas acadêmicas com excessiva facilidade, propiciando uma imagem equivocada de ciência.

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Com efeito, a imagem da ciência apresentada frequentemente por veículos de comunicação de massa pode trazer à ciência um caráter de fantasia e magia que ela não possui. Pode também dar uma imagem exa-gerada sobre os avanços científicos, prometendo mais do que eles podem efetivamente cumprir. Por outro lado, a presença de representações da ciência no imaginário coletivo inclui também a posição de recusa da ci-ência, uma espécie de temor direcionado a ela, que pode resultar em sua negação apaixonada em nome de um irracionalismo não refletido. Daí a necessidade de cautela diante de divulgações científicas, como salienta René Thom:

É cientificamente culto aquele que, diante da notícia de um sucesso científico recente, é capaz de avaliar a sua amplitude real e de des-contar a parte do exagero demasiado frequente com o qual os pe-riódicos de vulgarização (e às vezes até as publicações científicas) anunciam a importância de uma descoberta.2

Outro problema que também ocupa a comunidade científica contem-porânea são as consequências éticas dos saberes, ou ainda, das aplicações dos saberes científicos. É frequente ouvir hoje debates sobre o caráter ético ou não ético de determinadas pesquisas científicas, especialmente provocados por grupos religiosos não raro conservadores. É o caso da

2 citado a partir de granger, gilles gaston. a ciência e as ciências, p. 18-19.

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discussão sobre reprodução humana artificial, pesquisa com células-tronco ou mesmo o debate sobre a energia nuclear. Seria o caso de impedir o avanço de determinadas pesquisas? A quem caberia esse controle? Até onde vai a liberdade da ciência?

Enfim, a ciência, com todos os seus avanços e problemas, está presente hoje de forma muito significativa no seio de nossa ci-vilização, o que justifica a atenção especial que se deve dispensar a ela, sobretudo o assistente social, a quem competirá agir em uma sociedade regulada essencialmente por valores técnicos.

4.2UCiênciaUeUTécnica

O que significa ciência e o que significa técnica? Quando podemos considerar determinado conhecimento com sendo científico ou técnico? Procuremos em primeiro lugar nos gregos o significado desses termos, hoje frequentemente entendidos como indistintos.

Antes de mais nada, é preciso ter em vista que tanto a ciência quanto a técnica são tipos de saber. Dizer que as descobertas tecnológicas não são científicas não implica desvalorização da produção técnica. Voltemo-nos a Aristóteles para entender que tipos de saber são uma e outra.

A primeira forma de saber é a sensação, com a qual temos contato imediato com o mundo. Trata-se daquilo que temos acesso através dos cinco sentidos. A sensação não está ligada à linguagem ou a qualquer outro tipo de representação simbólica. Contudo, sensações unidas entre si e ligadas à memória formam o juízo, o qual contém em si a imagem ge-nérica de algo, por exemplo, a imagem genérica de “cachorro”, formada a partir das diversas sensações de cachorro que obtemos através dos sen-tidos, como quando vemos um. Ao vermos um cachorro, temos dele uma sensação, a qual, como dito antes, não vem acompanhada de nenhuma representação simbólica, mas apenas a sensação como tal, o cachorro tal como apreendemos. Depois de repetidas sensações de cachorro, forma-mos então a representação desse animal, e a isso Aristóteles denomina de experiência de algo. A experiência é o que possibilita tanto a ciência quan-to a técnica. Como estas últimas se caracterizam?

Conexão:

Para o aprofundamento da discussão acerca da relação entre ética, ciência e tecnologia, consulte o artigo a seguir, escrito para uma revista de filosofia da

UFMG: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100

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Em filosofia, quando

se diz que algo é necessário pretende-se dizer que algo é ou exis-

te, e não poderia não ser ou não existir, ao passo que algo é contingente quando ele é ou existe, mas poderia muito bem não ser

ou não existir.

Imaginemos que determinado remédio curou a cabeça de um in-divíduo qualquer, por exemplo, Sócrates. Ora, observar que dado remédio curou a cabeça de Só-crates é uma experiência. Porém, se observamos que esse remédio curou também a cabeça de outros tantos indivíduos, e depois de to-das essas experiências concluímos que esse remédio curará todos que sofram de sintomas iguais – unidos então sob um conceito único, como, por exemplo, o conceito de fleumáticos – então utilizamos a arte.

Temos, portanto: sensações, para o que usamos os nossos sentidos; experiências, que resultam de muitas sensações e perfazem a imagem ge-nérica de algo e por fim conceitos, que são fruto de diversas experiências precedentes. Ora, a criação de conceitos é uma característica da arte ou técnica, mas e a ciência?

A ciência caracteriza-se por ser capaz de expressar-se de modo mais completo através da linguagem e é passível de ser ensinada. E sobretudo diferencia-se da arte na medida em que o seu objeto necessariamente é, ou seja, é invariável e constante. Com efeito, só existe ciência do que é cons-tante e imutável, não sendo possível um conhecimento científico daquilo que está sempre mudando.

Pelo contrário, a arte visa àquilo que é contingente e mutante no indivíduo, na medida em que se aplica a objetos que, sendo, poderiam não ser, e cujo princípio de existência reside não em si mesmos, mas em seu criador. De fato, imaginemos um artigo qualquer de artesanato. Ele existe não por si mesmo, mas em função daquele que o criou. Sendo assim, ele existe, mas poderia muito bem não existir.

Assim, embora a técnica seja uma forma de conhecimento, é uma forma inferior de saber em relação à ciência, visto que esta aspira ao que é necessário e é além disso passível de ensino.

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Temos, portanto, de um lado a arte ou técnica, que embora lide com conceitos, trabalha com o que é contingente, e de outro lado a ciência, passível de expressão na linguagem e direcionada ao que é necessário. Outra característica da ciência é que ela é desinteressada, ao contrário da técnica. Como dito acima, a atividade tida como a mais elevada e digna na Antiguidade era o exercício teórico da filosofia. Compreende-se assim por que Aristóteles considerava a metafísica a maior e mais importante de todas as ciências, embora muitos outros saberes fossem mais úteis do que ela. A metafísica é a mais digna das ciências também porque seu estudo é desinteressado e voltado à contemplação da verdade.

Glossário: Metafísica foi o nome dado aos tratados de Aristóteles que sucediam seus textos sobre física. Grosso modo, a metafísica é a filosofia em primeiro lugar, a filosofia propriamente dita, a ciência

voltada para o estudo das causas últimas do ser.

Vejamos agora como se deu ao longo da história a relação entre téc-nica e ciência.

4.3UBreveUhistóricoUUaUrelaçãoU“TécnicaUeUCiência”U

Como já dito, o trabalho manual era considerado na Antiguidade como de menor dignidade e geralmente associado a atividades servis. O ofício dos artesãos, portanto, recebe forte descrédito e nesse contexto as invenções técni-cas raramente possuíam alguma relação com conhecimentos científicos.

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Contudo, isso não impediu o desenvolvimento de diversas técnicas voltadas seja para o trabalho público, seja no trabalho com os metais ou mesmo em programas militares. Assim, observa-se nesse período a exis-tência de técnicas diversas para a construção de máquinas de guerra, o uso de espelhos parabólicos para a concentração de raios solares, além da construção de aparelhos menos úteis voltados para o entretenimento po-pular ou criados com o objetivo de causar espanto.

Nesse primeiro momento, o trabalho dos matemáticos é o que re-cebe maior destaque, sobretudo quanto à construção de instrumentos de medida e mira ou outros destinados ao cálculo de distâncias. Observa-se também que em alguns artefatos as práticas de construção permanecem longo tempo as mesmas, sendo transmitidas através das gerações em for-ma de receitas de procedimentos. As evoluções nesse caso se deviam ao gênio de algum grande inventor, capaz de revolucionar os procedimentos técnicos utilizados em determinado artefato.

Durante o Renascimento, porém, uma importante mudança se deu no modo como o trabalho dos artesãos era visto socialmente. Isso porque muitos deles eram também artistas e cortesãos, respeitados por suas obras e bem posicionados na vida social. É o caso do mais importante deles, Le-onardo da Vinci, um dos maiores inventores de toda a história.

O prestígio de que os artistas desfrutavam foi importante para apro-ximá-los gradativamente da ciência e dos cientistas, retirando do trabalho dos artesãos o descrédito de que tinham sido alvo, raro exceções, durante a Antiguidade e Idade Média. Disso resultou a tendência cada vez maior de aplicação de saberes científicos à construção de objetos, ao mesmo tempo em que possibilitou também que a própria ciência se beneficiasse dos avanços tecnológicos.

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Outra contribuição importante para o desenvolvimento da técnica durante o Renascimento foi a invenção da imprensa, responsável por di-vulgar e popularizar os tratados técnicos já existentes ou que eram fruto do período.

Contudo, apesar dessas primeiras aproximações, os laços entre técnica e ciência só iriam se estreitar de modo mais decisivo e definitivo a partir da Revolução Industrial do século XVIII. Desde então, o impera-tivo de Descartes de tornar o homem senhor e proprietário da natureza irá gradativamente ganhar corpo, até atingir sua plena maturação em nosso tempo.

Em todo caso, vê-se que nem sempre técnica e ciência andaram jun-tas, mas ao contrário sua história inclui períodos de distanciamento e es-tranhamento mútuo, como vimos ao tratar de Aristóteles e sua concepção de ciência. À medida em que nos aproximamos de nosso tempo, a ligação entre as duas torna-se mais estreita, de maneira que hoje é difícil conceber um avanço tecnológico completamente independente de alguma teoria científica, assim como é difícil conceber o avanço científico sem pensar nas máquinas e aparelhos que povoam hoje os laboratórios de pesquisa.

Por fim, cabe lembrar que o avanço tecnológico não depende exclu-sivamente do desenvolvimento científico, como ainda de necessidades ou condições sociais e econômicas. A televisão, por exemplo, embora tenha se beneficiado de saberes científicos, tornou-se possível e ganhou a impor-tância que hoje possui devido a condições econômicas de cada sociedade, bem como a circunstâncias culturais favoráveis ou desfavoráveis.

4.4U OsUefeitosUUaUtécnica

A presença cada vez mais incisiva da técnica no mundo contem-porâneo não trouxe consigo apenas o aumento do conforto e bem-estar dos homens. Algo de nocivo instaura-se também no modo de pensar e no estilo de vida das pessoas. Basta para perceber isso observar o que de diferente há no trabalho do artesão e naquele executado pelo operário ou técnico em uma indústria.

Com efeito, o artesão não meramente repetia gestos exteriores e re-petitivos para a produção de um objeto qualquer. Além dos procedimentos básicos necessários para a fabricação de um produto, ele podia também acrescentar outros que tornassem o seu trabalho algo individuado, ou seja, ele podia se ver no produto fabricado. Além disso, um mesmo produto

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Frederick Taylor

viveu entre 1856 e 1915, na Filadélfia. Inicialmente técnico

em mecânica e operário, tornou-se engenheiro mecânico e é considerado um dos pais da Administração Científica. Ele

pretendia aplicar métodos cartesianos de con-trole e planejamento na produção, mas gerou considerável insatisfação entre seus subordi-

nados, a despeito do bom desempenho das indústrias em que trabalhou.

poderia ser fabricado a partir de técnicas diferentes e ao expor o que fabri-cou, o artesão podia com orgulho dizer: “fui eu quem fez”.

Entretanto, as necessidades sociais de mais produtos, isto é, o au-mento da demanda, exigiu um outro modo de fabricação, que diminuísse o tempo gasto na montagem do produto e ao mesmo tempo aumentasse a produção, com vistas a maiores lucros. Disso resultou a normalização das técnicas e procedimentos de fabricação de objetos, tornando o trabalho operário enfadonho e humanamente não gratificante. Em outras palavras, o antigo artesão é substituído pelo engenheiro e pelo operário.

Nisso também se observa a presença da ciência na técnica moderna, visto ser tendência da ciência a redução dos objetos a esquemas abstratos, o que os torna substituíveis e dispensáveis. Com efeito, o que significa abstração? Grosso modo, trata-se de um procedimento racional que retira o que há de próprio e individual nos objetos para considerar o que neles há de comum e universal. Por exemplo, considerando o que há de comum em todos os cavalos existentes, formo a partir daí o conceito abstrato de “cavalo”. Com isso, o que há de individual neste cavalo específico, o que ele tem de próprio e singular, é desconsiderado em nome de seu conceito abstrato.

O símbolo dessa tendência de raciona-lização encontra-se, por exemplo, na invenção da Teoria Geral da Admi-nistração, que encontra em Frede-rick Taylor uma expressão em-blemática. O que ele propunha era a racionalização da produção através da fragmentação das ta-refas e um controle rigoroso no tempo de sua execução. O objeti-vo era garantir o maior rendimento possível, suprimindo todo gesto não necessário, sob a pressuposição de que o operário não precisa pensar, senão apenas executar movimentos. Como se pode supor, isso tornava o trabalho extre-mamente enfadonho e desgastante, como que “robotizando” as ações dos trabalhadores.

A pretensão de Taylor representa um caso extremo de como a téc-nica aliada à ciência pode resultar também em prejuízo para o homem,

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ao menos para os trabalhadores. É certo, contudo, que hoje a relação do homem com a máquina ganha outros contornos, e as operações repetitivas antes realizadas pelos operários podem ser executadas hoje pelas máqui-nas, o que pode levar à esperança de que o desenvolvimento tecnológico seja capaz um dia de tornar o trabalho algo prazeroso e moralmente grati-ficante.

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Entretanto, o esplendor da técnica não deve desviar nossa atenção da ciência, coisa que, pelo contrário, percebe-se com cada vez maior intensidade. O nível de especialização que a técnica moderna exige pro-duz sujeitos que, embora eficientes na manipulação das ferramentas, são completamente ignorantes das bases científicas sobre as quais elas se as-sentam. O conhecimento dessas bases torna-se ainda mais difícil devido à evolução e rápida mudança por que os instrumentos passam, exigindo que, ao lado da especialização, as pessoas sejam flexíveis o suficiente para se adaptarem às novas tecnologias. Por consequência, vivemos em um período em que muito se faz, mas pouco se pensa.

Enfim, feita essa leitura do lugar atual da técnica moderna e sua íntima ligação com a ciência experimental, resta agora ainda pensar mais profundamente a questão da técnica e o lugar que ela ocupa no pensamen-to contemporâneo. Em outras palavras, perguntamos: o que significa dizer que vivemos na “era da técnica”?

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4.5UAUtécnicaUeUaUessênciaUUaUtécnica

Discutimos acima como a técnica foi vista ao longo do tempo, destacando os períodos Antigo e Medieval como épocas de dissociação entre trabalhos técnicos e pesquisas científicas e o período Moderno como tendo por característica a unidade entre técnica e ciência por meio tanto da aplicação de saberes científicos em artefatos técnicos quanto do uso de aparelhagem tecnológica por parte da ciência. Agora pensaremos de forma mais profunda e filosófica o problema da técnica a partir das ideias de um pensador que sobre isso dedicou grande esforço de pensamento: Martin Heidegger.

O que é, pois, a técnica? Essa questão, tipicamente filosófica, Hei-degger a faz já no começo de seu trabalho A questão da técnica. Inicial-mente, o filósofo observa que o entendimento vulgar sobre o que é a téc-nica afirma ser ela uma “atividade do homem”, em primeiro lugar, e ainda “um meio para um fim”, ou seja, um conjunto de ações ou procedimentos realizados com a finalidade de atingir um objetivo qualquer, a saber, a produção de um objeto. Essa forma de entender o que é a técnica é sem dúvida correta, observa ele, mas caracteriza-se por ser uma determinação demasiado instrumental e antropológica da técnica.

Ora, esse entendimento do que é a técnica é correto, mas não neces-sariamente verdadeiro. Pois trata-se de pensar, segundo Heidegger, não a técnica propriamente, mas a essência da técnica. Pois bem, a essência da técnica reside na verdade, o que ele denomina também de desencobrimen-to.

Heidegger conceitua o que é a verdade a partir da ideia de desen-cobrimento ou desocultamento: a verdade consiste em desencobrir, tirar o véu que encobre alguma coisa. Essa concepção de verdade ele encontra entre os gregos, expressa através da palavra grega para a verdade, ou seja, aletheia. Segundo Heidegger, o homem é um ser que abre e desencobre o mundo, sempre de maneiras diferentes ao longo da história. Por isso o homem é um guardião da verdade, ou seja, desse desencobrir-se do mundo em suas diversas formas.

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Heidegger, pois, afirma que a essência da técnica é o desencobri-mento (verdade). Mas o que significa essência? Ora, a essência de algo significa aquilo que ele é. Por isso a pergunta: o que é a técnica? Afirmar que a técnica é uma atividade humana ou um meio para um fim não diz a essência da técnica, o que ela é, mas apenas como ela se faz ou se proces-sa, ou seja, através do homem, que utilizando-se de determinados meios atinge um fim qualquer. Mas a essência mesmo da técnica, aquilo que ela é, reside não nesse entendimento comum, mas no fato de que a técnica é uma forma de desencobrimento, de tirar o véu do mundo e vê-lo sob de-terminada perspectiva.

Sendo assim, a técnica moderna, ao tirar o véu do mundo (desenco-brir), o que faz ver? Ela faz ver o mundo como um reservatório de ener-gias que deve ser explorado. Portanto, a técnica moderna faz ver o mundo como algo que está disponível para o homem, disponível para que seja explorado. Com isso, a natureza perde seu encantamento para se transfor-mar em objeto de manipulação do impulso humano de dominar o mundo. Em outras palavras, um rio qualquer, por exemplo, deixa de ser o que en-canta e fascina a arte e se torna um dispositivo da usina hidroelétrica. Não é mais a usina que está instalada no rio, mas antes o rio que está instalado na usina, rio que pode ser também, por outro lado, um objeto exposto à visitação turística por uma agência de viagens ligada à indústria de férias. Com isso, o que se pretende dizer é que toda a natureza apresenta-se ago-ra, na técnica moderna, como algo que está lá à disposição dos homens para ser manipulado e dominado.

Por outro lado, não apenas a natureza encontra-se assim disposta, como também o próprio homem descobre-se a si mesmo como aquilo que está à disposição para ser explorado e dominado. Assim é o lenhador na floresta, entendido como estando à disposição da indústria madeireira, que fornece celulose para as revistas. Assim é também o homem consumidor dessas revistas e jornais, entendido como à disposição da manipulação de opiniões que elas levam a cabo.

Entretanto, o homem, mesmo estando também à disposição, como de resto toda a natureza, possui a peculiaridade de se perceber nessa condição e voltar-se contra isso. Não o faz, porém, na maioria das vezes, visto que essa maneira de desencobrir o real como exploração, próprio da técnica moderna, já está de tal modo internalizada que é frequentemente naturalizada, isto é, interpreta-se como “natural” essa maneira de se rela-cionar com a natureza.

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Com efeito, a própria modernidade nasce a partir dessa nova con-cepção de mundo, apoiada na exploração e dominação da natureza. Essa foi a defesa apaixonada da ciência, ou seja, a ideia de que se deve torturar a natureza para arrancar seus segredos, tornando o homem o senhor da terra. De acordo com isso, a ciência, já enquanto teoria pura, encara a na-tureza como um reservatório de energia, ou ainda, como um sistema ope-rativo e calculável de forças, que pode ser manipulado e posto à serviço do homem. Nesse sentido, a física moderna não é experimental porque se utiliza de experimentos, pois já enquanto teoria ela expõe a natureza como esse sistema calculável de forças – o que torna, em seguida, possível ou justificável o uso de experimentos.

Dizer isso significa afirmar que a física ou a ciência moderna de modo geral não preparou o caminho para a técnica moder-na propriamente, mas para a essência da técnica moderna. Mesmo porque a técnica moderna surgiria quase dois séculos após o surgimento da ciência experimental. O que a física preparou, portanto, foi o cami-nho para a essência da técnica entendida como esse desencobrir o mundo a partir da exploração e dominação, isto é, a física predispôs o homem a um tipo de atitude ou de relacionamento com a natureza que a encara como estando à disposição dos interesses humanos.

Em função de tudo isso vivemos, segundo Heidegger, um tempo de perigo. E que perigo é esse? Será que esse perigo reside nas possibilidades nocivas de uso das novas tecnologias? Sem dúvida, o progresso técnico já se revelou danoso nesse sentido, basta considerar os prejuízos causados pela bomba nuclear. Além disso, vozes já podem ser ouvidas criticando as tecnologias da informação e comunicação, acusando-as de facilitar a ma-nipulação de opiniões e por consequência de diminuir o senso crítico dos homens de nosso tempo. Contudo, não é desse perigo de que Heidegger fala. Então de qual?

O perigo reside no fechamento do homem nesse modo de desenco-brir o mundo que é próprio da técnica. Isso porque esse modo de desen-cobrir o real enquanto aquilo que está disponível para exploração encobre e pode impedir outros modos também possíveis de desencobrir o mundo e mais ainda: pode fazer o homem esquecer-se de que ele é o guardião da

Conexão:

para o aprofundamento da discussão a respeito do modo

como Heidegger entende a técnica moderna e sua essência, consulte o artigo a seguir, que trabalha essa questão abordando-a no contexto geral da filosofia do autor: http://

www.pucsp.br/margem/pdf/m16dc.pdf

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verdade, ou seja, do desencobrimento do mundo, e que deve zelar pela verdade. O homem pode entregar-se àquilo que se desencobre – no nosso caso, o mundo como disponibilidade – e esquecer-se do próprio desenco-brimento, esquecer-se da abertura em que consiste a verdade.

Com efeito, em nosso tempo em que o próprio homem se abre como disponibilidade, é a essência humana que se esconde e se afasta. O homem distancia-se cada vez mais de si mesmo e se entrega à ditadura do fazer e da exploração do mundo e de si mesmo. Encontrar-se consigo mesmo, por outro lado, significa em Heidegger reconhecer-se como o guardião da ver-dade, isto é, do desencobrimento, e manter-se aberto para outros modos possíveis de desencobrir o mundo. Quem poderá abrir o mundo de outro modo que não o desencobrimento explorador? A sugestão de Heidegger é a poesia, que deve atravessar todas as artes e toda a vida humana e colocar o homem a caminho de um novo desencobrimento. Talvez seja necessário que a humanidade ainda mais se entregue ao domínio da técnica para que só então apareça a urgência de uma outra abertura do mundo, que supere a figura do senhor da terra, hoje tão arraigada no imaginário coletivo, e nos faça aproximar da natureza de um modo mais imediato e menos utilitário.

AtiviUaUes

01. De acordo com Granger, pode-se considerar que vivemos, desde a segunda metade do século XX, na Idade da Ciência. Que razões o autor apresenta para caracterizar assim o nosso tempo?

02. O que caracteriza o conhecimento científico para Aristóteles e como ele se diferencia da arte ou técnica?

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03. A íntima relação entre ciência e técnica, que caracteriza o mundo mo-derno, teve início no Renascimento. Que fatores favoráveis contribuíram para essa aproximação?

04. A forte presença da técnica no mundo contemporâneo, além dos bene-fícios que trouxe, acarretou também problemas sociais, especialmente em relação ao trabalho operário. Que consequências o domínio da mentalida-de técnica trouxe para o mundo do trabalho proletário?

05. Segundo Heidegger, o que é mais decisivo não é pensar a técnica em si, mas a essência da técnica. Qual é, segundo o filósofo alemão, a essência da técnica moderna?

ReflexãoVimos nesta unidade como o nosso tempo é caracterizado por uma

forte presença da técnica e por sua íntima relação com a ciência, o que as torna para o senso comum indistinguíveis. Contudo, o conhecimento científico e o saber técnico possuem suas peculiaridades, às quais é preci-so atentar. A história desse casamento é, por outro lado, recente, visto que durante a Antiguidade e Idade Média os desenvolvimentos tecnológicos seguiam geralmente caminhos distantes daqueles trilhados pela ciência.

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Enfim, é preciso ter presente também que os benefícios que a técnica trou-xe consigo não podem esconder o que de nocivo ela pode representar. O desejo desenfreado de dominar a natureza, expresso na figura do homem como senhor da terra, que desde a alvorada da modernidade acompanha o pensamento ocidental, pode desviar o homem de sua essência e entregá-lo ao domínio cego da ação. É imperativo, de acordo com isso, que o assis-tente social seja capaz de pensar e discutir sobre esse importante caráter de nossa atual civilização, pois a técnica moderna é um instrumento decisivo de manipulação social e de manutenção do estado atual de desigualdade e distanciamento entre as classes dominadoras e dominadas.

LeituraUComplementar

Kuhn, Thomas Samuel. A estrutura das revoluções científicas. Tra-dução de Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1992

Nessa obra, o autor demonstra de que forma se processam as revo-luções científicas, abordando o tema a partir da noção de paradigma e de mudança de paradigma. Assim, cada teoria científica é inserida dentro de um paradigma, o qual deve ser substituído por outro quando novas desco-bertas tornam insustentável o paradigma anterior. A abordagem de Kuhn é diferente daquela que faz Popper, citado logo a seguir.

Popper, Karl. A lógica da pesquisa científica. São Paulo: Editora Cul-trix, 1972.

Nesta obra, Popper faz uma aguda análise do conhecimento científi-co e seus modos de evolução ou progresso, discutindo ainda temas impor-tantes como o clássico problema da indução, que ele interpreta de modo muito próprio. É uma obra fundamental para a epistemologia contemporâ-nea, apesar das vozes críticas que se levantaram contra o autor.

Referências

BACHELARD, Gaston. Epistemologia. Rio de Janeiro: Zahar, 1977 a.

_______. A formação do espírito científico: a contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1996.

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GRANGER, Gilles Gaston. A ciência e as ciências. trad. Roberto Fer-reira. São Paulo: Editora UNESP, 1994.

HEIDEGGER, Martin. A questão da técnica. In.: HEIDEGGER, Martin. Ensaios e conferências. Trad. Emmanuel Carneiro Leal; Gilvan Fogel; Márcia Sá C. Schuback. 5 ed. Petrópolis: Vozes; Editora Uni-versitária São Francisco, 2008.

RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. Trad. Breno Silveira. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967.

NaUpróximaUuniUaUe

Retomemos o caminho que já percorremos até aqui. Inicialmente, aprendemos que a filosofia surgiu na Grécia como um rompimento com o mito, caracterizando-se por ser uma reflexão crítica e rigorosa sobre o mundo. Em seguida, conhecemos a história da filosofia, desde os gregos passando pelos medievais até alcançarmos os modernos e o nosso tempo. Ficamos sabendo que uma característica decisiva de nosso tempo, que já tem início na Modernidade, é o apreço pela ciência e sua ligação com a técnica. Na próxima unidade, continuaremos a debater os problemas li-gados a nosso tempo, agora a partir de questões políticas que justificam a condição social que descrevemos até aqui. Em outras palavras, falaremos sobre o problema dos limites entre o que é privado e o que é público, isto é, como se deu historicamente a relação do indivíduo com a sociedade, como se justifica a existência do Estado e como se justifica, por outro lado, o sistema econômico em que vivemos, responsável por toda essa condição de exploração que mencionamos nesta unidade.

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UniUa

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UO conflito entre o indi-

víduo e a sociedadeNessa unidade conheceremos

como se deu, desde a Antiguidade até os tempos modernos a relação entre o indivíduo e a

sociedade. Discutiremos também sobre o problema de como se justifica a existência do Estado, ou seja,

por que devemos obediência ao governo civil. Por fim, conheceremos as doutrinas do liberalismo e do socialismo

científico, cujos conflitos, no último século, ultrapassaram os limites da teoria e alcançaram o campo prático e perigoso da

guerra.

Objetivos de sua aprendizagemVocê deverá ser capaz de refletir sobre o problema dos limites

entre o privado e o público, bem como identificar e discutir as teorias que justificam o Estado, além das doutrinas que defendem o capitalis-

mo, de um lado, e o socialismo, de outro.

Você se lembra?Da época em que o Brasil vivia sob o regime militar? A restrição da

liberdade é aceitável, e em que condições? É melhor uma sociedade orga-nizada, mas sem liberdade de pensamento, ou livre, mas com uma coesão social frágil? Com efeito, esse difícil problema ocupa os pensadores da filosofia desde a Antiguidade.

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5.UU IntroUuçãoUaoUproblema

Entre os problemas que sempre acompanharam a filosofia está a questão da relação entre o indivíduo e a sociedade. Em um primeiro mo-mento, na Grécia, a coesão social era garantida pela lealdade à Cidade-Es-tado. Trata-se de uma devoção religiosa e patriótica à cidade. Depois das conquistas de Alexandre, o Grande, e dos romanos, os gregos perderam muito do vigor político de outrora, criando uma ética mais individual e menos social. A coesão social nesse contexto era garantida pela força.

Após adquirir prestígio e autoridade, o cristianismo trouxe de volta a ordem e a coesão social, garantida agora pela lealdade à Igreja, entendi-da como o Corpo de Cristo. Todo poder vem de Deus, que o outorgou ao Papa e ao Imperador. A crença no poder que a Igreja supostamente detinha de mandar os infiéis para o inferno fez com que mesmo imperados se sub-metessem a ela. Isso apenas começa a mudar durante a Renascença, em que os antigos costumes medievais são deixados de lado em nome nova-mente da desordem e do colapso moral. Ocorre um afrouxamento moral, e tudo o que se relaciona à virtude e passa a ser visto como coisa ligada à superstição. É o que vimos quando apresentamos o pensamento político de Maquiavel, que teve lugar nessa época.

Do século XVI em diante o pensamento europeu é dominado pela Reforma, movimento multiforme com motivações políticas, econômicas e religiosas. Especialmente, os príncipes perceberam que se dominassem a religião em seu país seriam bem mais poderosos do que se comparti-lhassem o poder com o Papa. Disso resultou na política uma tendência ao anarquismo, visto que a verdade não era mais estabelecida mediante consulta à autoridade, mas através da meditação íntima.

Como reação ao crescente individualismo moderno surgiram diver-sas perspectivas teóricas. Uma delas, o liberalismo, pretendia delimitar o que é próprio do indivíduo e o que é próprio do Estado, contrapondo-se tanto ao individualismo extremo quanto à autoridade absoluta do Sobera-no. Por outro lado, há também quem pretendia o culto do Estado, atribuin-do a ele tanta autoridade quanto àquela que o catolicismo atribuía à Igreja ou a Deus. É o caso de Hobbes ou Hegel.

Durante toda a história da filosofia, portanto, os filósofos divergiam entre si, divididos entre aqueles que pretendiam estreitar os laços sociais e aqueles que pretendiam afrouxá-los. Em todo caso, sem dúvida é ne-

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Em resu-mo, o problema dos

limites entre o individual e o coletivo se deu ao longo da história,

grosso modo, como segue: antiguida-de clássica: coesão social garantida pela

lealdade à cidade. de Alexandre a Constanino: coesão social garantida pela força. idade

média: coesão social garantida pelo perten-cimento à Igreja. idade moderna: coesão social frágil, garantida pela propaganda

de Estado.

cessária a coesão social, mas dela pode resultar a fossilização do pensamento, devido ao res-peito excessivo à tradição. Porém, a ausência de co-esão conduz à dissolução e a conquista estrangeira. Segundo o filósofo inglês Bertrand Russell, parece que toda civilização começa com um sistema rígido, que depois se afrouxa e conduz enfim à dissolução, a qual, por sua vez, leva a um novo sistema rígido. O liberalismo pretendia o fim desse ciclo, mantendo a ordem social sem a basear no dogma irracional e sem impor mais restri-ções à liberdade além das estritamente necessárias.

Ora, façamos agora uma incursão história para pensar, por outro lado, como o homem foi entendido ao longo do tempo.

Comecemos pelo período clássico. Com efeito, na Antiguidade Clássica o homem não era concebido como indivíduo, mas como cidadão, ou seja, membro de uma comunidade política. Vimos que os gregos cul-tuavam a Cidade-Estado grega, e é costume dizer que a filosofia é “filha da cidade”. Para Aristóteles, por exemplo, o homem é essencialmente um animal político, que por sua natureza é sociável, e qualquer homem que estiver abaixo ou acima disso ou é um animal selvagem ou um deus. Em outras palavras, não se concebe o homem, pelo menos o homem ci-vilizado e educado, senão dentro da cidade, enquanto cidadão e portanto de acordo com as responsabilidades e compromissos que ele tem com a comunidade. Quem se isola perde algo de sua humanidade e se aproxima dos animais selvagens.

Por outro lado, desde as conquistas de Alexandre essa situação mu-dou. As Cidades-Estado caíram agora sob o jugo de um único império, que limitou sobremaneira as liberdades individuais. Impossibilitados de participar da vida política, os filósofos voltaram-se para a busca da felici-dade pessoal ou individual, defendendo a supremacia do indivíduo sobre a sociedade. Em outras palavras, para os filósofos do período que sucedeu a Alexandre, os acontecimentos da vida social não podiam afetar a vida

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privada, pois o homem deveria preocupar-se mais consigo mesmo do que com os outros.

A Igreja modificou novamente o modo de pensar esse problema, defendendo a ideia de uma única civilização sob um só comando. O sonho da unidade da civilização deveria reunir todos os homens em uma mesma comunidade. Também para os cristãos, assim como na Antiguidade Clás-sica, o homem não era entendido como indivíduo, mas enquanto membro de uma comunidade que era a Igreja, denominada de o Corpo de Cristo. Cada homem fazia parte desse corpo, e, aliás, a ideia de um corpo é bem sugestiva: um corpo é uma complexa organização em que cada membro exerce uma função específica e, além disso, cada membro de um corpo só existe unido ao corpo, pois fora dele perde sua razão de ser e morre. Isso significa que o homem perde sua essência se não estiver integrado na co-munidade que era, à época, a Igreja.

Um importante movimento modificou essa visão de unidade da Igreja, e esse movimento foi a Reforma Protestante. Negando-se a sub-meter-se à autoridade do papa, os protestantes, mesmo sem o pretender explicitamente, criaram as condições para o desenvolvimento do indivi-dualismo moderno, que na política, em alguns casos, conduziu à anarquia. BOX EXPLICATIVO: Lembre-se que quando se diz em coletivismo na Idade Média, pretende-se expressar com isso o fato de que nesse período ninguém tinha a liberdade de pensar por si mesmo, seguindo em tudo os mandamentos da Igreja. A Reforma, ao negar a submissão à autoridade religiosa, criou as condições para o individualismo, ideia segundo a qual cada um deve pensar e agir por si mesmo.

À mesma época em que teve lugar a Reforma Protestante, o capi-talismo dava também os seus primeiros passos. O desenvolvimento do comércio exigia uma sociedade equilibrada e em ordem, pois a desordem coletiva poderia ser prejudicial aos negócios. A classe burguesa emer-gente não poderia aceitar tumultos na ordem pública, sob pena de perdas financeiras. Era necessário, pois, garantir a unidade e a ordem, e para isso existiram diversas tendências teóricas que procuravam justificar a existên-cia do Estado e a necessidade de obediência a ele. Entre essas tendências destacam-se a Doutrina do Direito Divino e a Teoria do Contrato Social.

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5.2UDoutrinaUUoUDireitoUDivino

A Doutrina do Direito Divino era defendida sobretudo por membros da Igreja Católica, notadamente por Robert Firmer. De acordo com essa doutrina, a humanidade não é livre para escolher a forma de governo que lhe agrade. Com efeito, a liberdade é perigosa e deve ser evitada. Foi o desejo de liberdade que levou ao pecado de Adão e Eva, o qual introduziu o mal e a morte no mundo. Uma vez que a humanidade não é livre para escolher a forma de governo que lhe agrade, ela deve se submeter à auto-ridade do rei. Mas por quê?

Os reis, de acordo com essa doutrina, são descentes diretos de Adão, o primeiro pai da humanidade. Ora, sendo assim, ele é como um pai para os seus súditos. É importante destacar que à época em que essas ideias foram defendidas o dever de obediência para com o pai era devido durante toda a vida do progenitor. Hoje, após completar a maioridade, as pessoas julgam não precisar mais obedecer rigorosamente às ordens de seus pais, preferindo agir como bem entenderem, mesmo que isso porventura signi-fique contrariar o desejo dos pais. À época, pelo contrário, a autoridade dos pais era vitalícia1 .

Ora, isso significa que o dever para com os reis não é um mero dever civil, mas um dever religioso. Com efeito, a autoridade dos reis foi dada a eles por Deus; eles possuem, pois, direito sagrado ao trono. Contrariar o rei e suas ordens é não apenas um crime, porém mais do que isso: trata-se de uma impiedade ou pecado.

De acordo com essa ideia, a autoridade dos reis é absoluta e irrevo-gável. Ele, sozinho, governa: é ele quem faz as leis – embora não esteja, ele mesmo, sujeito a elas – e é ele quem as executa. É o rei ainda o supre-mo juiz, devendo julgar e punir aqueles que ferem as leis que ele criou. Portanto, o rei reúne em si os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e não precisa prestar contas de suas ações a ninguém.

Contudo, a modernidade já não podia aceitar facilmente teses dessa natureza. Por consequência, outra tendência teórica ganhou força: a Teo-ria do Contrato Social.

1 vitalício é algo que dura para a vida inteira; portanto, enquanto os pais estivessem vivos, os filhos deviam obediência a eles.

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Estado de Natureza seria a

condição do homem quando ainda não existia Estado ou Gover-

no. Não se sabe se os filósofos acredi-tavam que um dia isso realmente ocorreu, ou se era apenas um conceito que usavam para explicar o contrato social. O fato é que

imaginavam um momento da humanidade, há muito tempo atrás, em que ainda não havia governo e especulavam sobre a condição

da sociedade humana nesse estado.

5.3UTeoriaUUoUContratoUSocialUA Teoria do Contrato Social afirma

que o Estado surgiu através de uma espécie de contrato ou acordo cele-brado entre os homens para evitar os inconvenientes do que eles chama-vam de estado de natureza.

A maneira de entender o es-tado de natureza variava de filósofo para filósofo. Vejamos o que os prin-cipais pensadores adeptos dessa teoria afirmavam.

5.3.UUThomasUHobbesU(U588U–UU679)UO inglês Thomas Hobbes estudou em Oxford e recebeu influências

de Bacon e Galileu. Após a Revolução Liberal inglesa exilou-se na Fran-ça, tornando-se professor.

Hobbes pensava que os homens são, por natureza, livres, mas exercem sua liberdade dominando os outros. Em outras palavras, o homem jamais he-sita em fazer mal aos outros, se disso lhe advir algum benefício. Essa seria a condição natural do homem, o modo como ele é, essencialmente.

Ora, se o homem é assim, caso vivêssemos em uma sociedade onde não houvesse Estado, viveríamos em um clima de constante luta ou con-flito. Os homens fariam guerra uns aos outros, e não existiria propriedade nem justiça. Com efeito, se tenho uma casa ou propriedade e mesmo que ela me pertença há muito tempo, tendo nela trabalhado toda uma vida, caso não exista Governo, alguém mais forte do que eu pode invadir minha propriedade e expulsar-me dela, pois, sem Governo, não há justiça. Isso certamente aconteceria, diz Hobbes, pois o homem é lobo do próprio ho-mem, isto é, está sempre disposto a prejudicar o próximo. Para Hobbes, portanto, o homem é por natureza mau, invejoso e corrupto.

Para evitar esse estado de conflito e guerra, os homens teriam se reunido e firmado entre eles um acordo, escolhendo um soberano para governá-los. É importante destacar que não se tem clareza se para Hobbes isso realmente aconteceu ou se é apenas uma ilustração de que ele se utili-zou para explicar sua concepção do Contrato Social.

O fato é que, pelo Contrato, do modo como Hobbes o entendia, o soberano passa a ter poder absoluto sobre todos. Com efeito, ao realizar o

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o Leviatã é a figura

que representa o soberano: absoluto, ele governa sobre todos

e sobre tudo, não devendo satisfações a ninguém.

contrato e escolher o soberano, é como se o povo renunciasse um pouco de sua liberdade em nome da ordem social, dando total e absoluto poder ao soberano. Sendo assim, depois do contrato o povo não tem direitos, ex-ceto aqueles que o soberano lhes conceder. O povo não tem, por exemplo, direito à rebelião.

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Além disso, Hobbes era partidá-rio do poder absoluto: o soberano não deveria dividí-lo com nin-guém, mas exercer sozinho as funções do Executivo, Legislativo e Judiciário. Não devem existir, por consequência, partidos políticos, nem favoráveis nem contrários ao soberano. Muito menos se deve permitir a existência de sindicatos. Por outro lado, o povo, sob nenhum aspecto, participa do poder e tudo o que é feito dentro do Estado tem a função de preservar a autoridade do sobe-rano, mesmo o ensino: os professores só devem ensinar aquilo que for útil ao comandante. Por fim, o soberano é absolutamente livre para fazer o que bem entender e não deve satisfações de suas ações a ninguém.

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Em função de sua visão do poder político, Hobbes concebeu o so-berano através da figura lendária do Leviatã, um monstro mitológico me-diante cuja imagem Hobbes pretendia expressar o poder e a supremacia do chefe de Estado, que estaria acima de todos e de tudo.

Vejamos agora o modo como Locke, por seu turno, entendia o Con-trato Social.

5.3.2U JohnULockeU(U632-U704)

Nascido em Wrington, na Inglaterra, estudou na universidade de Oxford e, apesar do interesse por diversos campos do conhecimento, gra-duou-se em medicina. Escreveu, porém, importantes textos de filosofia, abordando variados assuntos.

Locke entende que o estado de natureza é um estado pacífico, ou pelo menos relativamente pacífico. Afirma que a propriedade privada já existe no estado de natureza, que é anterior à sociedade civil. Esta teoria da propriedade ocupa em Locke um lugar de destaque, na medida em que atesta as origens burguesas de seu pensamento e contribui para aclarar seu êxito.

Sua obra Tratado sobre o Governo Civil, tinha como objetivo expor a sua teoria de Estado, investigando os fundamentos da associação políti-ca (“Governo Civil”), demarcando-lhe o domínio, isolando as leis de sua conservação ou de sua dissolução. A obra de Locke aparece no momento mais oportuno e reflete a opinião da ascendente classe burguesa. A moti-vação desse pensador foi o anti-absolutismo monárquico, ou seja, o desejo de ver a autoridade dos reis limitada pelo consentimento do povo, a fim de eliminar o risco de despotismo. O anti-absolutismo implica a vontade intelectual de abolir, de uma vez por todas, a doutrina de direito divino dos reis.

Entre os direitos que pertencem aos homens nesse estado de natu-reza, Locke situa, com insistência, o da propriedade privada. Segundo ele Deus deu a terra entre os homens em comum, mas quer a razão, que igual-mente lhes deu, que façam da terra o uso mais vantajoso e mais cômodo. Tal comodidade exige certa apropriação individual, primeiro dos frutos da terra, em segundo da própria terra. Essa apropriação tem por base o traba-lho do homem, e é limitado por sua capacidade de consumo.

Como a terra fora dada por Deus em comum a todos os homens, ao incorporar seu trabalho à matéria bruta que se encontra em estado natural,

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o homem tornava-a sua propriedade, estabelecendo sobre ela um direito próprio do qual estava excluído todos os outros homens. O trabalho era, pois, para Locke o fundamento originário da propriedade.2

Para Locke, portanto, a propriedade privada é um direito natural, como o é a vida e o trabalho. Como o Estado pode interferir nisso se são oriundos do direito natural? Para justificar sua tese ele usa inclusive a Bí-blia, afirmando que no começo todos os homens eram iguais e tudo o que existia era de todos igualmente. Porém, o trabalho criou diferenças entre os homens, fazendo com que uns merecessem mais que outros. Locke, com isso, colocou o trabalho como um valor su-perior à riqueza herdada como herança, isto é, a riqueza entendida como mera posse da terra, o que ia ao encontro dos ideais burgueses. Com efeito, justifica ele também o crescimento dos bens, pois, devido ao que foi dito antes, torna-se possível a propriedade ilimitada, ad-quirida com a compra (acumulação de riqueza) e não com o trabalho.

Segundo Locke, por outro lado, os homens estavam bem no estado de natureza (a condição de vida selvagem, anterior à sociedade civil), mas estavam tam-bém expostos a certos inconvenientes. Viver sem um Governo é possível, diz ele, desde que todos obedeçam à lei natural, que, na prática, significa a lei de Deus, ou seja: não roubar, não trair, não matar, etc. Porém, não é possível garantir que todos irão obedecer à lei natural, e caso alguém a desrespeite, quem protegerá os homens?

Sem dúvida, todos os homens são livres, iguais e independentes por natureza, e ninguém pode ser privado dessa condição nem submetido a um poder político sem seu consentimento. Mas quando um número de pesso-as concorda em formar uma comunidade ou governo, passam a constituir um corpo político no qual é a maioria que tem direito de atuar e decidir.

Assim sendo, há a necessidade de se estabelecer um contrato, que é um pacto de consentimento através do qual os homens concordam livre-mente em formar a sociedade civil para consolidar e preservar ainda mais os direitos que possuíam originalmente no estado de natureza.

2 despotismo é o nome que se dá a um governo tirano, cuja autoridade é absoluta e é exercida sem freio de espécie alguma.

Conexão:

Para aprofundar a discussão acerca dos filósofos

modernos mencionados aqui, ou sobre outros que com eles mantêm

relação, consulte o endereço a seguir, que os apresenta de modo acessível

e simples: http://www.geocities.com/cobra_pages/filmod.html

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No Estado Civil os direitos naturais são inalienáveis. A vida, a li-berdade e os bens estão melhores protegidos sobre o amparo das leis, do arbítrio e da força comum de um corpo político unitário. Passar do Estado de Natureza para o Estado Civil não implica em perda de direitos, pelo contrário, os consolida, já que o homem não pode transferir seus direitos para ninguém, pois são direitos inalienáveis. O que faz um Estado ser legítimo, enfim, é o consentimento do povo, o fato de ser o resultado de uma espécie de acordo coletivo.

Por fim, segundo Locke, o objetivo maior e principal da existência do Governo seria a proteção da propriedade privada. É sobre ela que o filósofo se volta com maior insistência, entendendo ser o dever do Esta-do guardá-la e preservá-la. Vê-se assim que ele defendia os interesses da classe social a que pertencia, ou seja, a burguesia.

5.3.3U Jean-JacquesURousseauU(U7U2-U788)

Algumas das ideias políticas mais importantes de Rousseau estão contidas em seu texto O Contrato Social, no qual Rousseau desenvolve os princípios políticos que estão sumarizados na conclusão do Émile (Emílio ou da educação). Começando com a desigualdade como um fato irrever-sível, Rousseau tenta responder à questão do que compele um homem a obedecer a outro homem ou por que direito um homem exerce autoridade sobre outro. Ele concluiu que somente um contrato tácito e livremente aceito por todos permite cada um “ligar-se a todos enquanto retendo sua vontade livre”. A liberdade é inerente à lei livremente aceita. Assim, dizia ele que seguir o impulso de alguém é escravidão, mas obedecer a uma lei auto-imposta é liberdade.

Rousseau imaginava que o homem é bom por natureza, e sempre se presta a ajudar o seu próximo. Sua concepção acerca do ser humano é, portanto, oposta a de Hobbes. Para Rousseau, no estado de natureza o homem viveria em paz, pois é naturalmente impelido à solidariedade. Contudo, ainda assim esse estado não poderia se manter por muito tempo, devido à criação da propriedade privada. Esta foi criada quando o primei-ro homem cercou uma propriedade e lembrou-se de dizer a todos: “é mi-nha!”, encontrando pessoas o suficientemente simples para acreditá-lo.

Ora, para Rousseau a propriedade privada está na origem da desi-gualdade social. Desde quando se inventou a propriedade, fez-se preciso o Estado, no objetivo de protegê-la. Porém, a partir de então o homem, na-

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turalmente bom, tornou-se mau, pois o Estado o corrompeu. Com efeito, se existe Estado existe o poder e a ganância por ele. Por isso o homem, de bom que era no estado de natureza, tornou-se, com a criação do governo, mau e ambicioso.

Contudo, uma vez que se mostrou inevitável a existência do gover-no, este deve agora se reger pela vontade geral, e não pelos caprichos de um soberano absoluto. Também Rousseau, portanto, professa a ideia de um acordo ou contrato entre os homens que estaria na origem do Governo civil e que justificaria a obediência a ele.

Entre os três filósofos citados acima, pois, há a seguinte relação:Hobbes: pensa que o homem é mau por natureza e que o Estado é

necessário, caso contrário os homens viveriam em constante conflito entre si. O soberano, porém, uma vez escolhido, tem poderes absolutos.

Locke: o estado de natureza seria possível caso todos os homens respeitassem a lei natural, mas como não se pode garantir isso, o governo é necessário para defender a propriedade. O soberano, porém, não deve ter poderes absolutos.

Rousseau: o homem é naturalmente bom e solidário. Contudo, desde que a propriedade foi criada, houve a necessidade de se criar o Go-verno, com o objetivo de protegê-la. Como consequência o homem, antes bom, tornou-se mau em função da ganância pelo poder.

5.4ULiberalismoUfilosófico

Além de suas ideias acerca do Contrato Social, Locke também é um dos autores representativos da doutrina política conhecida como liberalis-mo. O liberalismo consiste em um conjunto de ideias e preceitos políticos que, na prática, espelham os interesses da classe burguesa.

De um lado, o capitalismo aprofundou o individualismo moderno, ao qual a Reforma Protestante já havia sinalizado. No pensamento capita-lista, os interesses do indivíduo estão acima dos interesses da coletividade. Cada indivíduo deve, por si mesmo, mediante os seus méritos, alcançar o sucesso pessoal.

Por outro lado, o individualismo extremo pode prejudicar o próprio capitalismo, pois ameaça a coesão social e toda instabilidade social é, na-turalmente, prejudicial ao comércio.

O liberalismo surge, pois, como uma tentativa de conciliar o indi-vidualismo, que o capitalismo defende e aprofunda, com a vida social

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No século XX desen-

volveu-se, como continuação e adequação do liberalismo ao contexto capitalista contemporâneo, o neolibera-

lismo, entre cujas principais defesas estão: mínima participação do Estado na economia; livre circulação de capital internacional; postura política contrária ao protecionismo econômico e a favor da desburocratização do Estado; diminuição do tama-

nho do Estado; combate aos impostos excessi-vos; e defesa de que a base da economia deve

estar na iniciativa privada

ordenada, de que o capitalismo, por sua vez, necessita. Entre os princípios liberais estão:

Tolerância Religiosa: nenhum tipo de conflito deve perturbar a ordem pública, pois qualquer instabilidade na política pode causar danos ao comércio. Assim, no que diz respeito à religião, as pessoas devem ser livres para escolher o credo que melhor lhes agrade.

Apreço pelo protestantismo: a Igreja Católica não via com bons olhos o desejo de lucro dos burgueses, embora ela própria fosse detentora de imensa riqueza. Além disso, o catolicismo condenava a prática da usu-ra . A Igreja Protestante, por outro lado, sobretudo com Lutero e Calvino, defendiam ideias proveitosas para o capitalismo, como o respeito e valo-rização do trabalho e da riqueza, entendida como sinal da predestinação divina ao paraíso.

Respeito ao comércio e à indústria: essa é a chave para o progres-so e o conforto de toda a sociedade, embora, de fato, apenas os burgueses detentores de capital efetivamente se beneficiam desse progresso e con-forto, ficando deles excluídos os operários, ainda submetidos a condições precá-rias de trabalho.

Respeito aos direitos de propriedade: já em Locke a propriedade é en-tendida como um direito inalienável, que é função do Estado proteger; por outro lado, todo o sistema capitalista é baseado justa-mente na propriedade privada dos meios de produção.

O liberalismo, por fim, preten-dia conciliar o individualismo e a vida social ordenada, defendendo os interesses do capitalismo contra a aristocracia. Contudo, no século XIX desenvolveu-se uma teoria cujo objetivo era justamente combater o libe-ralismo e tudo o que dizia respeito ao capitalismo. Essa teoria é o socialis-mo científico, cujo principal defensor teórico foi o alemão Karl Marx3

3 usura: ato de emprestar dinheiro a juro, ou o juro resultado desse empréstimo.

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A dialética pode ser

entendida, grosso modo, como conflito entre opostos. O

método socrático, por exemplo, era dia-lético, porque era baseado sobre o conflito entre as diferentes idéias das pessoas que

participavam de uma discussão.

5.5USocialismoUcientíficoContrapondo-se ao liberalismo e às ideias capitalistas, Marx cons-

truiu uma filosofia política cujo objetivo era conclamar os trabalhadores a se rebelarem contra os patrões e tomar o poder das fábricas, fundando por consequência uma sociedade sem distinção entre chefes e empregados, isto é, uma sociedade supostamente igualitária e justa.

Para compreender sua teoria, comecemos por entender a sua inter-pretação da histórica, denominada por ele de Materialismo Histórico.

5.5.UUMaterialismoUHistóricoO materialismo histórico consiste em uma interpretação da história

que leva em conta as mudanças materiais da humanidade e entende todo o desenvolvimento histórico como o resultado dessas mudanças. Em outras palavras: durante muito tempo acreditou-se que as diferenças entre um período histórico e outro eram devidas às diferenças entre as ideias ca-racterísticas de cada época. Ou seja, o que motivaria as mu-danças na história seriam as mudanças e evoluções nas ideias ou pensamentos dos homens. Contrapondo-se a essa visão, Marx afirmava que as mudanças históricas são o resultado de mudan-ças nos modos como os seres humanos adquirem seus meios de sobrevivência, isto é, mudanças nas con-dições materiais de sua existência.

Essas condições materiais de existência é que definem as ideias, a filosofia, a arte ou religião de cada época. O que caracteriza cada época da história da humanidade, portanto, não são suas idéias, mas o modo como cada época produz seus meios de sobrevivência.

O materialismo histórico, por outro lado, é ainda dialético. Isso porque o movimento da história é resultado do conflito entre três fatores diferentes:

Modo de Produção: O modo de produção é a maneira através da qual cada época produz seus alimentos ou seus meios de sobrevivência.

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Cada época histórica possui seu modo de produção característico, seja a caça e a pesca, a agricultura familiar ou a produção industrial.

Forças Produtivas: Forças produtivas são os instrumentos de trabalho utilizados em cada época, desde instrumentos rudimentares até equipamentos aperfeiçoados, como máquinas ou robôs.

Relações de Produção: Trata-se do relacionamento social que se constrói no interior do processo produtivo. Esse relacionamento pode assumir diferentes feições: a relação entre o senhor e o escravo, entre o nobre e o camponês ou entre o patrão e o empregado.

Pois bem, o materialismo histórico é dialético porque se caracteriza pelo conflito entre esses três fatores. É o conflito entre eles que gera as mudanças na história. Quando os instrumentos de trabalho se modificam, constroem-se novos modos de produção, que por sua vez alteram as rela-ções de produção. Daí o termo dialético usado para se referir ao materia-lismo histórico: porque a história se desenvolve a partir do conflito entre esses três elementos.

5.5.2USocialismoUeUcomunismoOra, Marx percebeu que ao longo da história já passamos por diver-

sas fases. Inicialmente, na Antiguidade, vivia-se do trabalho escravo. Em seguida, ele foi substituído, durante a Idade Média, pela servidão. Por fim, o capitalismo acabou com a servidão e inventou o trabalho assalariado. Porém, a história ainda não acabou. Resta ainda mais uma mudança.

Essa mudança consiste em acabar com a propriedade privada dos meios de produção. Ora, ao longo da história sempre se observou a dis-tinção entre exploradores e explorados. O homem sempre explorou o próprio homem. A relação entre exploradores e explorados variou: ora se deu como a relação entre senhor e escravo; depois como a relação entre nobre e servo, e agora como a relação entre patrão e empregado. Em todo caso, sempre alguém detém os meios de produção – proprietário da terra, por exemplo, ou da fábrica – enquanto que os demais, que não possuem propriedade, trabalham para esse proprietário. Uma sociedade assim é sempre uma sociedade dividida em classes.

Com efeito, o capitalismo consiste basicamente na propriedade pri-vada dos meios de produção. Alguém é dono de uma fábrica ou indústria e as demais pessoas, que não tem condições de também comprar uma empresa, devem trabalhar para ele. Disso resulta a distinção entre duas classes: a classe dos trabalhadores e a classe dos patrões.

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Em que consiste o socialismo? Consis-te em uma revolução social levada a cabo pelos trabalhadores. Através dessa revolu-ção, os trabalhadores tomam o poder das fábricas e acabam com a distinção entre patrão e empregado, ou seja, todos de-vem ser ao mesmo tempo patrões e em-pregados. A isso se denomina socialização dos meios de produção, que se contrapõe à propriedade privada dos meios de produção, característica maior do capitalismo.

É claro que os patrões, que dominam a máquina do governo, farão de tudo para evitar que isso aconteça. Por isso que, para Marx, o socialis-mo deve advir através de uma revolução, que imponha uma Ditadura dos Trabalhadores, e impeça que os patrões, que perderam seus privilégios, retomem-no em seguida.

O socialismo não é, porém, o fim da história. Quando a sociedade, subjugada pela Ditadura dos Trabalhadores, que pôs fim à distinção entre patrões e empregados, quando a sociedade, enfim, estiver habituada a viver sem distinção de classes, o próprio Estado deve se auto dissolver e promover sua extinção. Essa fase histórica é denominada de comunismo, que consiste, pois, na extinção do Estado: trata-se de uma sociedade tão justa e igual que nem carece mais de governo, pois todos têm naturalmen-te as mesmas oportunidades. Não será mais necessário polícia ou força armada e as pessoas viverão plenamente livres.

Portanto, as principais características e distinções entre capitalismo, socialismo e comunismo, grosso modo, são as seguintes:

Capitalismo: propriedade privada dos meios de produção.Socialismo: socialização dos meios de produção.Comunismo: extinção do Estado e concretização de uma sociedade

justa, igual e livre. Essa é, pelo menos, a visão de Marx. Só assim, segundo ele, o tra-

balho deixaria de ser uma exploração e se tornaria em algo prazeroso para todos. Com efeito, a história do conceito de trabalho nem sempre o viu como algo nobre ou digno. Se idealmente o trabalho é canal de realização humana, concretamente foi mais um instrumento de controle e dominação que as classes superiores usaram contra os menos favorecidos. Sobre isso, porém, discutiremos na próxima unidade.

Vi-site o endereço

a seguir para encontrar outras referências a respei-

to do socialismo e suas ideias: http://www.espacoacademico.com.

br/070/70res_pereira.htm

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AtiviUaUes

01. Diferencie o modo com o homem foi pensado na Antiguidade, Idade Média e na Modernidade.

02. Quais eram as principais defesas da Doutrina do Direito Divino?03. O que significa, dentro da Teoria do Contrato Social, o estado de na-tureza?

04. Diferencie o modo como Hobbes, Locke e Rousseau entendiam o es-tado de natureza

05. Qual é a origem do Governo Civil segundo a Teoria do Contrato So-cial?

06. Qual é a principal característica do capitalismo, de um lado, e do so-cialismo, de outro?

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Reflexão

Vimos nessa unidade que as relações entre o público e o privado, ou ainda, entre o que é próprio do indivíduo e o que é próprio da coletividade foram pensadas de formas diferentes ao longo da história. A convivência política era, na Antiguidade, uma condição sem a qual o homem não é propriamente homem. Na Idade Média, por sua vez, a essência do homem precisava estar inserida no Corpo de Cristo que era a Igreja. Rompendo com a autoridade religiosa católica, os protestantes criaram as condições para o advento do individualismo, que na política trouxe consigo o risco da anarquia, levando à necessidade de refletir filosoficamente sobre o que justifica a obediência ao governo civil. Daí o aparecimento da Teoria do Contrato Social e mais tarde do Liberalismo, o qual, grosso modo, justificava os direitos de propriedade e os interesses da classe burguesa. Enfim, essas foram as bases teóricas que deram sustentação filosófica ao novo regime social e econômico que caracterizaria a modernidade, isto é, o capitalismo. Embora os conceitos tenham sido apresentados de forma introdutória e geral, são contudo meios importantes através dos quais o servidor social poderá pensar criticamente sobre as origens políticas de nossa sociedade e as idéias que a justificaram.

LeituraUComplementar

VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia da práxis. Trad. Luiz Fer-nando Cardo. 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

O texto apresenta de maneira simples e acessível os principais con-ceitos da teoria econômica e política de Marx, todas as suas críticas ao sis-tema capitalista e suas propostas de uma nova sociedade. É interessante, mesmo para quem pretenda combater a doutrina socialista, pois explicita quais são as suas principais teses.

Referências

ARANHA, Maria Lucia de Arruda, MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 3ª Ed. São Paulo: Moderna, 2003.

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BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

HOBBES, Thomas. Leviatã ou Matéria, forma e poder de um estado eclesiástico civil. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

ROUSSEAU, Jean Jacques. Do contrato social. São Paulo: Abril, 1983.

RUSSELL, Bertrand. A sociedade humana na ética e na política. Trad. Oswaldo de Araujo Souza. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1956.

RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. Trad. Breno Silveira. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967.

NaUpróximaUuniUaUe

Tendo discutido nessa unidade as ideias políticas e filosóficas que justificavam o regime social e econômico capitalista, discutiremos, a partir da próxima unidade, algumas das mais importantes características desse regime. Naturalmente, o capitalismo consiste em um modo de pro-dução baseado na exploração do homem pelo homem. O veículo dessa ex-ploração é sobretudo o trabalho humano. De canal para a realização pes-soal, o trabalho converteu-se, dentro do sistema produtivo capitalista, em mecanismo de controle e manipulação social. Disso resultou a condição de alienação em que vive o trabalhador dentro desse regime econômico, alienação que é ainda garantida e reforçada pelo tipo de sociedade em que vivemos, isto é, a sociedade de controle. Enfim, a partir da próxima unida-de conheceremos, após discutir o que é o capitalismo e o que o ajudou a se desenvolver (a Reforma Protestante e o Liberalismo), os mecanismos de que ele se utiliza para controlar e manipular a sociedade.

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UniUa

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UO conceito de trabalho

Discutiremos nessa unidade a respeito do conceito de trabalho e os

modos como ele foi interpretado ao longo da história, desde os períodos mais primitivos

até os nossos dias. Veremos que foram diversas as formas de pensar esse tema, incluindo aquelas que

entendiam o trabalho como um canal de libertação e realização humana, até aquelas que enfatizavam o trabalho

como instrumento de dominação e exploração social.

Objetivos de sua aprendizagemVocê deverá ser capaz de discutir a respeito do conceito de

trabalho, aumentando sua compreensão acerca do tema; deverá tam-bém ser capaz de identificar as diversas interpretações que o trabalho

recebeu ao longo da história e por fim, deverá ser capaz de refletir criticamente sobre a forma como o trabalho hoje se apresenta para o

trabalhador contemporâneo.

Você se lembra?Talvez você já tenha assistido algum filme, novela ou lido algum

livro em que alguma personagem se mostrasse humilhada pelo fato de ter de trabalhar. Com efeito, o trabalho já foi visto como uma forma de humilhação e como atividade ligada a pessoas inferiores.

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6.UU IntroUuçãoUaoUproblema

O que se entende por trabalho é algo de muito heterogêneo. Às vezes ele é relacionado à dor, tortura, suor do rosto ou cansaço. Em uma interpretação um pouco mais rigorosa, refere-se à operação de transforma-ção da matéria em objeto de cultura. Esse é o caso quando nos referimos ao trabalho de um carpinteiro, que transforma um pedaço bruto de madei-ra em um objeto útil qualquer, como uma cadeira ou mesa, transmitindo ao objeto fabricado algo de sua própria pessoa. Por outro lado, o trabalho pode ser visto simplesmente como o meio de que se utiliza o homem para sobreviver.

De maneira geral, e grosso modo, podemos dizer que o trabalho é toda atividade na qual o ser humano utiliza sua energia para satisfazer alguma necessidade ou atingir determinado objetivo. Frequentemente o trabalho é confundido com emprego, confusão que é equivocada. Com efeito, a atividade de uma dona de casa no ato de administrar o lar não é remunerado e nem constitui emprego, embora não se deva dizer que ela não trabalhe. Assim, embora trabalhe, ela pode não ter emprego. Ou mes-mo pode ser empregada em uma instituição qualquer e ainda assim traba-lhar como dona de casa, em jornadas duplas ou triplas. Em todo caso, o trabalho realizado enquanto dona de casa não é um emprego, embora não deixe de ser um trabalho.

Assim, o trabalho é uma atividade realizada com fins a satisfazer uma necessidade ou atingir um objetivo. Através dele o homem introduz um mundo novo ao mundo natural, isto é, cria cultura. Grosso modo, cul-tura significa justamente isso: tudo aquilo que é resultado da ação huma-na, desde seus costumes, seu jeito de falar, de se vestir, de se comportar e também os produtos fabricados através de seu engenho. Essa visão do trabalho entende-o como uma atividade propriamente e exclusivamente humana.

De fato, é assim que pensa o trabalho o filósofo alemão Karl Marx (1818-1883). Segundo ele, o trabalho é uma ação humana na medida em que implica um projeto mental que antecipa o objeto que será fabricado. Em outras palavras, o homem, antes de fabricar um produto, projeta-o em sua mente, característica que só o homem possuiria. É o que diz o filósofo em uma passagem famosa de seu texto principal, O Capital:

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Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abe-lha supera mais de um arquiteto ao construir sua colmeia. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes idealmente na imaginação do trabalhador. Ele não transforma apenas o material sobre o qual opera; ele imprime ao material o projeto que tinha conscientemente em mira, o qual constitui a lei determinante do seu modo de operar e ao qual tem de subordinar sua vontade. E essa subordinação não é um ato fortuito. Além do esforço dos órgãos que trabalham, é mister a vontade adequada que se manifesta através da atenção durante todo o curso do trabalho. (Marx. O Capital. Seção III, cap. V).

Assim, o trabalho consiste na concretização do projeto que antes o trabalhador tinha em mente. Com isso o trabalho adquire uma proximida-de estreita com quem o realiza, pois o operário se vê no produto fabricado, isto é, ele imprime algo de si ao produto. É certo que essa característica do trabalho tornou-se problemática no contexto do capitalismo e da produção industrial, em que o trabalhador é forçado a executar operações repetitivas e enfadonhas, e, além disso, não se projeta no produto que fabricou, visto que esse produto não tem nada de si, não foi a concretização de um proje-to que ele tinha em si, mas um projeto da máquina, que ele desconhece e ao qual só terá acesso após concluído o objeto.

Conexão:

para outras indicações a respeito do conceito marxista de trabalho pode-se consultar o artigo a seguir, que aborda o tema mostrando como o trabalho é um conceito central dentro da filosofia de Marx,

constituindo-se mesmo em fator que regula o desenvolvimento da humanidade. Com efeito, o tema da produção e reprodução das condições materiais de existência do homem sempre foi uma preocupação

do filósofo alemão, desde as obras de juventude até os seus textos de maturidade, e determina também sua visão dialética e materialista da história: http://www.ifch.unicamp.br/cemarx/coloquio/Docs/gt9/

Mesa1/trabalho-e-formacao-humana.pdf

Além do que se disse, podemos considerar que o trabalho tem uma dupla função. Para o indivíduo, significa expandir suas energias e desen-volver todas as suas potencialidades, de tal maneira que através disso seja capaz de transformar a realidade social e também a si mesmo. Do ponto de vista social, o trabalho consiste no esforço conjunto dos homens para manter e satisfazer a vida e a sociedade.

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De acordo com o que se disse, o trabalho ocupa um lugar central na vida humana. Ele é responsável por realizar o indivíduo, assim como manter e desenvolver a sociedade. Pelo menos, seria essa uma leitura po-sitiva do trabalho, ainda que concretamente ele não seja vivenciado dessa forma. O trabalho deveria ser um canal de afirmação de nossa identidade ou de realização pessoal. Para tanto, deveria ser moralmente gratificante e tão emocionante ou empolgante como é a atividade de um artista. Con-tudo, concretamente sabemos que o trabalho se realiza o mais das vezes como um labor fatigante e entediante, como a execução de uma atividade penosa e repetitiva, que pouco ou nada contribui para a nossa realização enquanto pessoas. E por quê?

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Segundo Marx, o trabalho tornou-se algo de enfadonho e pesaroso devido à dominação de uma classe social sobre as outras. A dicotomia entre explorador e explorado acompanha a história humana desde muito cedo. Essa dicotomia, por sua vez, assumiu ao longo do tempo diversas feições, como, por exemplo, aquela entre senhor e escravo, ou entre nobre e camponês ou enfim entre patrão e empregado. O domínio de uma classe sobre as outras faz com que o trabalho deixe de ser canal de libertação e de criação e se torna via de castigo e reprodução. Assim, o trabalho é uti-lizado pelas classes dominantes como instrumento para o seu próprio en-riquecimento, mesmo que isso implique a exploração dos demais homens. De fato, ao longo da história, apesar dessa visão ideal e positiva do traba-lho como canal de libertação do homem, ele foi utilizado como veículo de poder e dominação sobre os outros. É o que veremos a seguir.

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6.2UHistóriaUUoUTrabalho

Em tribos primitivas o trabalho é realizado de um modo que, vis-to de fora, poderia parecer bem simples. Os homens vivem da pesca e da caça ou colhem os frutos das árvores. Assim, há entre os homens e a natureza uma relação de intimidade e complementaridade. Nesse caso, ainda não se desenvolveu a tese que mencionamos anteriormente acima do homem como senhor da terra. Aqui, as pessoas da tribo não pretendem dominar a natureza, mas vivem com e através dela.

Porém, dizer que essa forma de trabalho é simples pode ser um equívoco, pois as práticas ligadas ao trabalho são carregadas de significa-do mitológico ou religioso. Podemos supor que o trabalho nessas condi-ções não seja de modo algum um labor no sentido moderno do termo. É realizado como um dever religioso para com a tribo.

Por outro lado, os restos não consumidos da pesca, por exemplo, são jogados de volta ao rio ou queimados na fogueira, isto é, não há aqui acumulação de riqueza. Sem acumulação, não há também distinção entre as pessoas da tribo no que diz respeito à quantidade de posses.

Essa forma de trabalho, contudo, deu lugar em seguida à prática da agricultura. Talvez a agricultura tenha se desenvolvido quando os homens perceberam que após as queimadas nas florestas pequenas plantas brota-vam das cinzas, o que os teria levado a pensar na possibilidade de contro-lar esse florescimento.

Em todo caso, da relação de plantio deve ter surgido a noção de pro-priedade e de produto excedente. Com efeito, ao trabalhar a terra, consu-mindo energia no seu plantio e cuidado, a ideia de que a colheita pertence àquele que nela trabalhou pode ter se desenvolvido naturalmente. Com o que se planta, alimenta-se a si e a família, e o que sobra pode ser, por sua vez, trocado com o vizinho. Posso, pois, trocar com ele um pouco de arroz por um pouco de milho, o que se torna mais complexo se o vizinho possui uma área de cultivo muito maior que a minha. Nesse caso, nossas relações são desiguais, assim como são desiguais os nossos excedentes.

O desenvolvimento da agricultura possibilitou, por sua vez, o cresci-mento do comércio, devido ao excedente tanto no campo quanto no culti-vo dos animais. O comércio, por outro lado, desenvolveu-se também até o ponto de substituir a troca de mercadorias pela compra através de moeda. Assim, pouco a pouco foi se desenvolvendo um modo de adquirir rique-

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za alternativo à agricultura, embora dependente de seus excedentes. Os homens responsáveis por comercializar esses excedentes, os mercadores, aperfeiçoaram suas técnicas de venda e cresceram em todo mundo, nota-damente na Idade Média. Posteriormente, foram chamados de burgueses, visto que realizavam suas atividades nos burgos . Esses burgueses gradati-vamente conquistaram independência em relação aos senhores feudais e à corte dos reis, ao mesmo tempo em que aumentavam sua influência. Essa influência, enfim, tornou-se cada vez maior e hoje, em nosso tempo, são os burgueses que de fato dominam a sociedade e determinam como será organizado o trabalho.

O renascimento das cidades e todo o novo clima intelectual da mo-dernidade acabaram, por outro lado, por criar condições favoráveis ao de-senvolvimento da ciência. Os burgueses perceberam que o conhecimento científico poderia ser um forte aliado no que diz respeito ao aumento da produção. E de fato, conceberam a ideia de aplicar conhecimentos oriun-dos do estudo da natureza e fenômenos físicos à produção industrial, as-sim como aplicar conhecimentos das ciências humanas ao controle social. Essa tendência nós já mencionamos na unidade 3, quando mostramos a intimidade que hoje caracteriza os conhecimentos técnicos e científicos, a ponto de serem frequentemente confundidos.

Após, enfim, essa abordagem mais geral a respeito da história do trabalho, voltemo-nos agora para uma análise mais detida desse problema, iniciando nossa incursão pelos gregos, convencionalmente considerados os pais de nossa civilização.1

6.2.UU OUtrabalhoUentreUosUgregos

Os gregos entendiam de maneira diferente o esforço realizado no cultivo da terra daquele que se volta à fabricação artesanal e por fim o esforço que se volta para a atividade do cidadão quando discute os proble-mas da cidade.

O trabalho do agricultor inicialmente possuía um prestígio seme-lhante aquele de que o guerreiro desfrutava. Isso porque a atividade de

1 glossário: burgo era a expressão usada para designar uma cidade comercial, ou um ambiente comercial localizado fora das muralhas dos núcleos urbanos senhorias, na idade média. eles apareceram no período de decadência do feudalismo e de renascimento das cidades e do comércio. À época, grande parte da população abandonou as plantações e foi viver próxima aos muros dos castelos ou mosteiros. as atividades mais comuns nos burgos eram o comércio e o artesanato.

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cuidar da terra não estava à época, como está hoje, associada à exploração dos recursos naturais com vistas ao benefício humano, mas possuía um significado mítico. O agricultor, com efeito, tinha um pacto com a divin-dade, através do qual se garantia que a colheita seria bem sucedida e a terra ofereceria efetivamente seus frutos.

Os artesãos, por sua vez, embora não fossem mais escravos à épo-ca das cidades-estado, não eram entendidos como homens livres, visto que sua criação não era inteiramente independente, mas orientada para a sobrevivência e se perfazia, pois, como serviço ao usuário, o qual efeti-vamente determinava a criação do objeto e seu uso. De acordo com isso, eles permaneciam na condição de escravos, se não de fato, pelo menos na mentalidade dos homens de então.

A atividade realmente livre para os gregos era a atividade dos cida-dãos que debatiam entre si os assuntos da cidade. Era a isso que eles deno-minavam de práxis, uma atividade não produtiva que visa a ela mesma. O homem livre, de acordo com isso, não é o que fabrica objetos, mas o que usa deles, sem a necessidade de trabalho.

Portanto, os gregos concebiam três tipos de atividades diferentes, com graus também diferentes de liberdade: o labor, a poiesis e a práxis. O labor está associado ao trabalho do corpo pela sobrevivência. É o caso do camponês quando trabalha a terra ou da mulher quando dá à luz. No labor reside certa passividade, pois se está então sujeito aos ritmos da natureza ou às forças biológicas. Por sua vez, a poiesis refere-se ao trabalho do ar-tesão, isto é, à criação de um produto na arte. Essa atividade é mais livre que a anterior, visto que não tem relação com a sobrevivência, no sentido de que o escultor, caso deseje destruir a sua obra, nem por isso ameaça-rá a vida da comunidade. Por último, a atividade mais nobre e digna é a práxis, o exercício da palavra e do discurso no âmbito do debate político. Isso significa que, para os gregos, a vida contemplativa, ou seja, o exer-cício teórico da filosofia, que se realiza concretamente no debate político, é a atividade mais nobre entre todas e a única possível e aceitável para o homem livre.

Analisando esses conceitos e os relacionando a nosso tempo, a filó-sofa Hannah Arendt mostra que hoje, devido ao fato de as pessoas traba-lharem cada vez mais em organizações que funcionam como máquinas, o domínio da práxis, isto é, da palavra ou discurso, está cada vez mais reduzido. Nossa democracia limita esse exercício a um conjunto muito pequeno de pessoas, ficando o restante dos cidadãos reduzidos ao voto.

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Hannah Arendt (1906-1975)

foi uma filósofa política alemã, de origem judaica. Perseguida pelo

regime nacional-socialista, emigrou para os Estados Unidos, onde morreu. É mais conhecida por sua teoria do totalitarismo e

suas análises sobre a banalidade do mal, além de ser lembrada também por suas relações afetivas com o seu então professor Martin

Heidegger.

Porém, quando mais a práxis se reduz tanto mais aumenta o labor, de modo que hoje toda a atividade humana parece reduzida a ele, de onde resulta uma espécie de la-borização do mundo.

Enfim, entre os gre-gos o trabalho manual era visto como vil e humilhante, de forma que o homem livre deveria viver no ócio, como filóso-fo ou político, vivendo da contemplação das ideias ou do debate público. Por fim, vejamos o que o próprio Aristó-teles disse a respeito:

A utilidade do escravo é semelhante à do animal. Ambos prestam serviços corporais para atender às necessidades da vida. A nature-za faz o corpo do escravo e do homem livre de forma diferente. O escravo tem corpo forte, adaptado naturalmente ao trabalho servil. Já o homem livre tem corpo ereto, inadequado ao trabalho braçal, porém apto para a vida do cidadão. (...) Os cidadãos não devem vi-ver uma vida de trabalho trivial ou de negócios (estes tipos de vida são ignóbeis e incompatíveis com as suas qualidades morais); tam-pouco devem ser agricultores os aspirantes à cidadania, pois o lazer (ócio) é indispensável ao desenvolvimento das qualidades morais e à prática das atividades políticas. (Aristóteles. Política, cap. II, 12546b e cap. VIII, 1329a)

Como se vê, não era uma boa coisa nascer com corpo forte na Gré-cia Antiga.

6.2.2U OUtrabalhoUnaUtraUiçãoUjuUaico-cristãA tradição judaico-cristã também é importante para a formação de

nossa civilização ocidental. E também dentro dessa tradição o trabalho manual não é visto com bons olhos. Com efeito, o trabalho é um resultado do pecado original de Adão e Eva, isto é, é apresentado como o castigo enviado por Deus pelo fato de terem eles comido o fruto proibido.

Os cristãos assim entendiam o trabalho, ou seja, como punição, mas ao mesmo tempo ele deveria ser realizado com vistas à saúde do corpo e

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da alma e para afastar os maus pensamentos que decorrem da ociosidade. De fato, todos nós somos familiarizados com o ditado que afirma: “cabeça vazia é oficina do diabo”. Assim, os monges eram obrigados a trabalhar, alternando, claro, o trabalho com os tempos de oração.

Porém, assim como os gregos, também os Padres da Igreja, isto é, os primeiros teólogos ou filósofos defensores do cristianismo, considera-vam a atividade contemplativa como superior ao trabalho manual. Alguns grupos cristãos usavam mesmo o trabalho como forma de penitência, entendendo-o como uma atividade penosa e humilhante. Portanto, por mais que o trabalho fosse obrigatório em algumas ordens religiosas, ele o era não por si mesmo, mas tendo em mira o louvor a Deus através da penitência. Em si mesmo, o trabalho não é uma atividade digna, visto que está associado aos afazeres e assuntos desse mundo.

O trabalho é apenas, portanto, uma via para se alcançar a Deus, através da penitência e da humilhação. Assim, não tendo valor em si, o trabalho, embora obrigatório, era inferior à contemplação ou à oração. De acordo com isso, até poderia ser concebível um santo que fosse preguiço-so; contudo, um santo que não gostasse de oração era algo inimaginável.

Há de se considerar, por fim, que durante a Idade Média essa visão pejorativa do trabalho na prática justificava a exploração do camponês. Afinal, a vida contemplativa, considerada a mais perfeita e digna, não po-deria ser vivida por todos. De fato, alguém deveria efetivamente trabalhar, e como é comum na histórica humana, o trabalho mais penoso ficava a cargo das classes menos favorecidas.

6.2.3U OUtrabalhoUnaUmoUerniUaUeTodos nós provavelmente já ouvimos alguém dizer que o trabalho

dignifica o homem. As leituras que fizemos até aqui não autorizam essa idéia. Ao contrário, durante a Antiguidade e Idade Média o trabalho era visto como algo humilhante e vil, próprio de escravos ou pessoas infe-riores. Quando essa concepção negativa do trabalho começa a mudar e o que motivou essa mudança? Ora, como veremos, a Reforma Protestante possui sobre isso uma grande responsabilidade.

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João Calvi-no (1509-1564) foi um

teólogo cristão francês. Ele foi um dos reformadores mais influentes, e

o conjunto de suas idéias foi denominado de calvinismo, o qual exerceu maior influência em países como a Suíça, Inglaterra, Países Baixos

e Estados Unidos. Ao contrário de Lutero, Calvino nunca foi ordenado sacerdote, e se considerava inicialmente um humanista. Afastou-se da Igreja

Católica e temendo perseguições, fugiu para Genebra, onde morreu. Ele é considerado tão

importante para a língua francesa quanto Lutero o foi para a alemã, isto é, uma

espécie de precursor.

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Com efeito, Lutero defendia que o trabalho possui algo de sagrado e deveria ser vivido como um chamado ou vocação de Deus. Por mais que sua visão do trabalho seja ainda dependente da ideia de punição pelo pe-cado, Lutero entendia que todo aquele em condições de trabalhar deveria fazê-lo obrigatoriamente. Para ilustrar a sua tese, Lutero usava exemplos da própria Bíblia. Mostrava que Jesus trabalhava como carpinteiro, Maria, sua mãe, ordenhava vacas e cuidava dos afazeres da casa e Pe-dro, o mais importante dos apóstolos, tinha orgulho de sua profissão de pescador. Diante de tantos exemplos, o trabalho não poderia ser con-denado como coisa vil e própria de pessoas inferiores, pois vil e antinatural é não o trabalho, mas o ócio. Assim, retirando do trabalho toda a carga conceitual negativa que sempre o caracterizou, Lutero afirmava que a ati-vidade laboral é antes o caminho para a salvação.

Não apenas Lutero, mas Calvino igualmente entendia o trabalho como uma virtude, e no seu caso, associada diretamente a sua doutrina da predestinação. Segundo essa doutrina, que se enraíza em Agostinho, antes mesmo do nascimento de cada um Deus já escolheu as pessoas que serão

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eleitas e aquelas que serão condenadas. De acordo com essa ideia, alguns são predestinados ao sucesso, ao passo que outros ficarão sempre na po-breza. Contudo, ainda que seja assim, todos, pobres ou felizardos, devem trabalhar. De fato, é justamente pelo trabalho que alguém pode alcançar o sucesso e dessa forma realizar a vontade de Deus.

Por outro lado, essa doutrina igualmente afirmava que o sinal da predestinação divina consiste justamente no bem-estar material. Quanto melhor fosse a condição material do indivíduo, mais certo ele poderia es-tar de ter sido eleito por Deus. Daí a necessidade de poupança, visto que se é vontade de Deus que todos trabalhem, ele não quer, porém, que se desfrute dos frutos desse trabalho, que devem ao contrário ser reinvesti-dos para gerar mais trabalho.

Como se vê, a ética protestante referente ao trabalho ia ao encontro das aspirações da burguesia e do capitalismo. O sociólogo Max Weber apontou essa relação com muita propriedade, mostrando como o protes-tantismo se adequava ao espírito do capitalismo. E de fato, era disso que o capitalismo, à época, mais precisava, isto é, de uma religião do trabalho, e de uma ética religiosa que justificasse o imperativo do labor. Era isso justamente que o protestantismo oferecia, também ao defender que a vida que agrada a Deus não é a vida contemplativa e o silêncio da oração que se alcança nos mosteiros, mas a vida jogada no mundo e entregue ao cum-primento das tarefas do século.

A esse caráter sagrado do trabalho se acrescenta o imperativo de não consumir. Os puritanos, com efeito, condenavam a procura de bens mate-riais ou dinheiro, mas isso não por considerar a riqueza em si um mal, e sim por entender que ela pode conduzir à vadiagem e à sensualidade. De fato, a perda de tempo é o primeiro e pior dos pecados, pois toda hora de trabalho perdida é uma hora a menos que se deixou de glorificar a Deus. Por sua vez, a falta de vontade de trabalhar é sinal de que não se está em estado de graça, mas em pecado, visto que é dever do cristão trabalhar. Sem dúvida que, se assim fosse entendida ainda hoje a falta de vontade de trabalhar, a maior parte da população no Brasil e no mundo estaria conde-nada, após a morte, a um triste destino.

Além disso, a ética protestante justificava também a divisão dos ho-mens em camadas sociais, entendendo isso como uma vontade de Deus. Aos eleitos está reservada já nessa vida o bem-estar social e material, enquanto que os condenados devem amargar a pobreza. É certo que para que isso se tornasse possível os protestantes renunciavam ao desfrute de

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seus bens e por consequência acumulavam capital devido à compulsão pela poupança. Por outro lado, visto que os puritanos condenavam o uso da riqueza, ela poderia ser usada como investimento de capital.

Por fim, o protestantismo foi fundamental para o desenvolvimen-to do capitalismo e para a reavaliação do trabalho, oferecendo à classe burguesa trabalhadores sóbrios e convictos de estarem servindo não à indústria, mas a Deus. Além disso, os próprios burgueses podiam agora se tranqüilizar ante a certeza de que a distribuição desigual de riqueza entre os homens é na verdade vontade de Deus, e ninguém pode contrariar ou questionar essa vontade.

6.2.4U OUtrabalhoUnoURenascimentoOutro movimento responsável por reavaliar a concepção de trabalho

recebida da Antiguidade e Idade Média foi o renascimento. Os homens li-gados ao renascimento, além de artesãos, eram também artistas de grande prestígio, tal como Leonardo da Vinci, o mais conhecido deles. O prestí-gio de que desfrutavam enquanto artistas os aproximou dos cientistas e pessoas de influência à época, e contribuiu para fazer com que o trabalho manual, sempre considerado servil, recebesse uma dignidade que nunca antes possuíra.

Assim, a visão renascentista do trabalho o entende como um valor em si, fonte de uma satisfação que não reside na salvação, na renda ou do status, mas na atividade técnica em si. Essa atividade seria um estímulo para o desenvolvimento do homem e um canal através do qual ele expri-me a sua personalidade. Através do trabalho técnico, com efeito, ele se torna um criador e a atividade de criação é a melhor maneira de se preen-cher a vida.

Através desses desenvolvimentos, portanto, a visão a respeito do trabalho sofre decisivas alterações. O homem teórico, sempre até então cultuado, deve agora competir espaço com o homem ativo, construtor do mundo. As atividades que antes recaíam sobre os escravos, isto é, aquelas ligadas à transformação da natureza, agora são próprias de homens livres, que as executam com orgulho e visando sua liberdade.

6.3U OUtrabalhoUhojeA visão burguesa do trabalho, sustentada sobre a ética protestan-

te, conheceu, a partir do século XIX algumas vozes críticas. Entre elas destaca-se Charles Fourier, considerado um pensador utopista. Segundo

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ele, o trabalho realizado no contexto da produção capitalista é repulsivo e deverá ser substituído, no futuro, por um trabalho prazeroso e atraente. A busca do trabalho em função do princípio do prazer, contudo, só encontra expressão, em Fourier, no trabalho no campo, que é realizado ao ar livre, em um espaço amplo e sujeito às mudanças nas estações e cultivo da ter-ra.

Outro pensador que se destaca em suas análises sobre o trabalho é Karl Marx, para quem o trabalho é a essência do homem. Em outras palavras, o homem é aquilo que ele faz. São as condições materiais da existência do homem que determinam quem ele será, e não uma essência humana metafísica anterior ao corpo, como muito se pensou, desde pelo menos Platão.2

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De acordo com isso, o homem não possui uma essência pronta e acabada, mas se constrói e se faz; e isso se dá através do trabalho, pelo qual o homem transforma a natureza, mas também transforma a si mesmo. Essa transformação é, por sua vez, guiada por um projeto prévio que ante-cipa a obra concluída. Como já mencionamos no começo dessa unidade,

2 glossário: utopia comumente significa a expressão de uma civilização ideal, imaginária ou fantástica, em que todos os problemas da sociedade desaparecem e se vive em plena justiça social. o termo guarda, de acordo com isso, o sentido de um projeto irrealizável, um sonho longínquo.

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o trabalho é, para Marx, uma atividade exclusivamente humana. Por mais que os animais possam em alguma medida transformar a natureza, eles o fazem por instinto, seguindo um impulso biológico não calculado. Assim, ainda que uma aranha possa envergonhar o melhor arquiteto, devido a seu grau de precisão e sua destreza, ela não supera nem mesmo o pior dos en-genheiros, visto que o homem, antes de construir, projeta em sua mente o que será a obra. Isso é o que faz do trabalho, para Marx, uma ação própria e exclusivamente humana.

Sendo assim, o trabalho, tal como se concretiza no contexto da pro-dução capitalista, seria em Marx desumano. Isso porque o trabalhador já não projeta o produto antecipadamente em sua mente, pois esse projeto é agora uma função da máquina, restando ao operário ações repetitivas e mecânicas tão como seriam os atos das abelhas ao fazer sua teia. Em ou-tras palavras, o trabalho operário tornou-se desumano.

Por outro lado, a visão marxista de trabalho, se de um lado o en-tende como pertencendo ao reino da necessidade, também advoga pela superação dessa necessidade tendo em vista o reino da liberdade, que se conquista além do trabalho, no tempo livre que deveria ser gradativamen-te aumentado em uma sociedade de mais justiça social.

Paul Lafargue, genro de Marx, escreveu sobre isso, em 1905, o livro O Direito à Preguiça, defendendo mais tempo livre, ou seja, mais vida além do trabalho. Vivemos, pelo contrário, em um contexto social em que o lazer ocupa um espaço cada vez mais marginal. Caso pensemos nos trabalhadores das grandes cidades, perceberemos que a situação é de fato crítica. Além de estarem sujeitos a longas jornadas de trabalho, precisam também enfrentar longas horas de locomoção até o trabalho e deste para casa. Essa situação, não raro, reflete uma espécie de obsessão pelo labor, visto que há atividades que podem ser perfeitamente realizadas em quatro horas de jornada, embora se exija, ainda assim, que o trabalhador dedica a elas todo o seu dia. Parece não ser incorreto afirmar que a atual configu-ração da sociedade tem pelo tempo livre um verdadeiro pavor, tentando evitá-lo o quanto possível.

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Esse temor em relação ao tempo livre se observa mesmo dentro da indústria do lazer. As pessoas precisam se ocupar sempre e a todo mo-mento, ainda que seja com atividades programadas e executadas segundo a mesma lógica e dinâmica do controle industrial. Excursões, visitas a lu-gares turísticos ou históricos e mesmo um dia de praia são atividades que parecem ocupar ou preencher o tempo livre, de que tanto se tem medo.

Conexão:Box Conexão: para o aprofundamento da visão de Lafargue a respeito do trabalho dentro do sistema capitalista, bem como seus argumentos a favor da preguiça ou ócio, pode ser

consultado o artigo a seguir, que apresenta a obsessão pelo trabalho como uma insanidade, ao mesmo tempo em que chama o ócio (tempo livre) de virtude. O artigo deve ser lido como um

convite à leitura do texto de Lafargue, o qual vai contra toda a religião do trabalho que caracte-riza a modernidade: http://www.anped.org.br/reunioes/30ra/trabalhos/GT17-3305--Int.pdf.

Essa obsessão contra o tempo livre ou pelo trabalho seria uma ca-racterística própria da burguesia industrial. Essa classe social, se antes, em sua alvorada, defendia o livre-arbítrio, o retorno alegre à tradição pagã e a glorificação do prazer e da carne, ao se tornar em seguida a classe domi-nante, impôs aos operários a supressão dessas alegrias e paixões em nome da abstinência, o que os tornou uma extensão da máquina. Assim, não é a máquina uma extensão da mão humana, mas o homem que se tornou uma extensão da máquina. Toda essa ideologia tem por base, claro, o impera-

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tivo de máxima riqueza e máximo lucro, mesmo que à custa do bem-estar da grande maioria da população.

Portanto, vivemos hoje em um contexto social em que convivem o desencanto com o trabalho padronizado realizado dentro do sistema de produção capitalista e o desejo de um trabalho voltado ao talento, atração ou gosto pessoal. Não estamos mais no contexto da Reforma Protestante, em que se podia advogar por uma religião do trabalho, pois vivemos na época posterior ao assassinato de Deus, em que todo o mundo perdeu o encantamento de outrora. De fato, essas ideias não são mais capazes de convencer a massa dos trabalhadores, sobretudo após as duas grandes guerras e a invenção do computador. De acordo com isso, nenhum balco-nista, vendedor, funcionário de uma empresa de seguros ou de uma pada-ria, nenhum operário e nem mesmo nenhum professor, médico ou advoga-do pensa estar com o trabalho servindo a seu Deus ou a qualquer entidade divina. Para a maioria dos trabalhadores, seus compromissos profissionais possuem um certo caráter desagradável e a rotina a que são sujeitos lhes trazem poucas satisfações positivas.

Essa é, portanto, a característica do trabalho tal como vivido hoje. No contexto burguês de produção, qualquer manifestação de liberdade é vista com maus olhos. Daí a aversão ao tempo livre, como dito anterior-mente. Para afastá-lo, cria-se na sociedade a necessidade de produção e consumo de coisas supérfluas. O trabalho, por sua vez, tornou-se uma nar-cose social, e como todo narcótico, faz dormir, no sentido de que possui um caráter entorpecedor que afasta o pensamento da falta real de liberda-de em que vive o trabalhador nos dias de hoje. Para cegar o operário dessa sua condição não livre, deixa-se a ele a pequena liberdade de escolher entre marcas diferentes em uma estante de supermercado.

O trabalho, portanto, tem uma função social bem definida, a saber, impedir que as pessoas pensem nos problemas sociais e na condição de exploração em que vivem. Assim, manter as pessoas ocupadas cumpre o objetivo de abafar os protestos e manter inalterado o sistema social. E isso se conquista através da sedução do consumo. Quanto mais se consome, mais se precisa trabalhar, justamente para custear o consumo, em um cír-culo vicioso que impede a oposição ao sistema e sua superação. Por fim, a professora Suzana Albornoz assim sintetiza essa condição de alienação:

Assim, o trabalho hoje não seria só alienante porque o esforço alienado imbeciliza e reduz a capacidade de opor-se ao sistema e superá-lo. O produto do trabalho e o seu consumo escravizam; ter-

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minam o processo de alienação e cooptação do indivíduo, que não pode mais se destacar e opor. O trabalho torna-se necessário porque o produto é visto como tal; e assim se fecha o círculo da nova domi-nação. (Albornoz: 1994, p.77-78)

AtiviUaUes01. Comumente se confunde trabalho com emprego. Explique por que essa confusão é equivocada.

02. Como o filósofo alemão Karl Marx entendia o trabalho?

03. Os gregos diferenciam o labor da poiesis e da práxis. Explique em que consiste a distinção entre essas três formas de atividade humana.

04. Caracterize a concepção judaico-cristã de trabalho.

05. Que novidade os protestantes introduziram em relação à forma tradi-cional como os europeus entendiam o trabalho?

06. Como se caracteriza o trabalho nos dias de hoje?

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Reflexão

Vimos nessa unidade que o conceito de trabalho recebeu ao longo do tempo diversos significados. Inicialmente, entre as comunidades primi-tivas, a relação do homem com a natureza era, por assim dizer, imediata, pois não se concebia ainda o homem como senhor da terra. O trabalho então era investido de um caráter sagrado, e o homem deveria cumprir certos rituais para alcançar dos deuses o sucesso com a caça ou pesca. Já na Antiguidade esse caráter sagrado do trabalho perdeu-se, e ele passou a ser visto, ao contrário, como algo ligado a pessoas inferiores. Essa visão negativa do trabalho perdurou na Idade Média, só sendo superada na Mo-dernidade, graças sobretudo ao pensamento protestante, que tentou nova-mente sacralizar o labor. Contudo, hoje o trabalho novamente perdeu sua conotação divina, constituindo-se, para a grande maioria, em uma ativida-de desagradável e penosa. Em todo caso, como observamos nessa unida-de, o trabalho o mais das vezes se concretizou como um instrumento de dominação de uma classe social sobre as demais, ainda que usando para isso de diferentes ideologias. Cumpre ao servidor social refletir atenta-mente sobre esse problema, pois a justiça social só será alcançada quando estiver assegurado para todos o bem-estar social, que passa pela garantia de uma vida agradável e moralmente gratificante, isto é, pela superação da condição de alienação em que se encontra hoje a grande maioria dos trabalhadores.

LeituraUrecomenUaUa

HANNAH, Arendt. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000.

Essa obra problematiza as formas que o homem se impôs para so-breviver, recebendo daí o seu título: a condição humana, conceito que não se identifica com natureza humana. Além de analisar o trabalho no mundo contemporâneo, ela problematiza também o modo grego de entender as atividades humanas, isto é, o que significa labor, produção e ação.

VÁZQUES, Adolfo Sanchez. Filosofia da práxis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

Esse texto traz as interpretações do pensador mexicano a respeito da filosofia de Marx e o conceito de alienação. Trata-se de um trabalho profundo, que foi objeto de sucessivas revisões, em que o autor discute a

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condição de exploração e alienação do trabalhador no contexto capitalista de produção, sinalizando quais seriam os caminhos de sua superação.

Referências

ALBORNOZ, Suzana. O que é trabalho. São Paulo: Editora Brasi-liense, 1994.

GIANNOTTI, Arthur. Origens da Dialética do Trabalho: estudo so-bre a lógica do jovem marx. Porto Alegre: LPM, 1985.

GIANNOTTI, Arthur. Trabalho e Reflexão: ensaios para uma dialéti-ca da sociabilidade. São Paulo: Brasiliense, 1983.

ROVIGHI, S. V. História da filosofia contemporânea. Tradução Ana Capovilla. São Paulo: Loyola, 1999.

RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. Trad. Breno Silveira. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967.

NaUpróximaUuniUaUe

Vimos nessa unidade que o trabalho frequentemente concretizou-se ao longo da história como um instrumento de controle e manipulação social. Essa característica do trabalho recebe nos dias de hoje uma impor-tância toda singular, visto que se torna agora cada vez mais claro que o trabalho pode ser entendido como um veículo das classes dominantes para a manutenção da condição de exploração e de falta de liberdade em que se encontra o trabalhador na sociedade capitalista. Essa condição de explora-ção se alcança por meio de um círculo vicioso em que se produz na socie-dade a necessidade de produção e consumo de coisas supérfluas, consumo que exigirá para a sua satisfação ainda mais trabalho. Por isso se pode dizer que o trabalho hoje mantém uma forte ligação com a alienação so-cial. De fato, na próxima unidade abordaremos justamente esse problema, conceituando o que é alienação e apresentando os seus tipos possíveis.

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UniUa

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UO conceito de aliena-

çãoNessa unidade iremos discutir a

respeito do conceito de alienação. Em pri-meiro lugar, conheceremos o que sobre isso

disse o filósofo alemão Feuerbach, no qual Karl Marx se inspirou quando construiu a sua própria inter-

pretação do conceito. Porém, em Marx a alienação está ligada ao trabalho, ao passo que Feuerbach a observa no

fenômeno religioso. Por fim, veremos também quais são os tipos possíveis de alienação.

Objetivos de sua aprendizagemVocê deverá ser capaz de discutir o que significa o termo alie-

nação, bem como diferenciar o modo como Feuerbach e Marx enten-diam o conceito; você deverá ainda ser capaz de diferenciar os tipos de

alienação possíveis e como eles se dão concretamente.

Você se lembra?Você já ouviu alguém acusando uma pessoa de alienada? O que

você entendeu por essa acusação? Com efeito, existem diferentes tipos de alienação, mas, como veremos a seguir, todos eles remetem à noção de perda ou falta. Mas o que será que falta a uma pessoa alienada?

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Feuerbach (1804-1872) foi um

filósofo alemão do século XIX, mais conhecido por desenvolver uma

teologia humanista e por ter influenciado o pensamento de Karl Marx. Ele foi aluno do fa-

moso filósofo alemão Hegel, em Berlim, e também estudou ciências naturais. Já em seus primeiros escritos ataca a ideia de imortalidade e em textos posteriores desenvolve sua ideia de que a religião é uma forma de alienação, que projeta os desejos

humanos de perfeição e infinitude em um ser supremo exterior ao homem. Foi tido como

herói por alguns revolucionários, e in-fluenciou muitos dos concei-

tos marxistas.

7.UU OUqueUéUalienação?

A palavra alienação remete para perda ou falta. É esse o significado do termo quando ouvimos expressões como “bem alienado”, como uma “casa alienada”, por exemplo. Pode-se falar também de alienação mental, e nesse caso faz-se referência ao fato de alguém ter perdido o juízo ou a consciência. É o que acontece também quando se está completamente em-briagado ou após a ingestão de algum narcótico. Aqui se diz que a pessoa está fora de si, é como se ela fosse, de fato, outra pessoa.

De acordo com isso, alguém alienado seria alguém que perdeu a si mesmo, que vive uma vida que não é a sua. Pode-se dizer também que é alguém que perdeu algo de sua humanidade, aproximou-se, pois, dos animais ou mesmo das coisas. A alienação, portanto, consiste na própria negação do ser humano.

O conceito de alienação ganhou força dentro da filosofia a partir do pensamento de Karl Marx. Contudo, Marx retirou seu conceito de outro filósofo, o também alemão Ludwig Feuerbach. É a partir dele, por con-seguinte, que iniciaremos nosso debate acerca do conceito de alienação. Feuerbach parte da análise do fenômeno religioso, ou melhor, do estudo a respeito do conceito de Deus e chega à definição do que é alienação a partir da reflexão acerca de como se forma em nós a noção de Deus.

7.2UFeuerbachUeUaUessênciaUUaUreligião

Como aponta Rubens Alves na apresentação que faz ao tex-to de Feuerbach, A essência da religião, o nome do fi-lósofo alemão quer dizer literalmente “ribeiro de fogo”. Esse nome corres-ponderia à pessoa que foi Feuerbach, visto que não seria possível passar por ele sem se queimar. E no caso de Feuerbach todos se queimaram, tanto católicos quanto protestantes. Isso porque os teólogos cristãos, apesar de suas disputas, sempre falavam

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a partir de um ponto de vista comum que era a fé em Deus. Feuerbach, ao contrário, entendeu que essa aspiração ao sagrado é na verdade uma aspi-ração ao vazio.

Com efeito, todo nosso pensamento sobre Deus seria na verdade um pensamento sobre nós mesmos. A religião nada mais é do que um espelho do homem. É por isso um sentimento que vive no vazio, ao qual aspira. Esse vazio é entendido como uma solidão saudosista de algo indetermi-nado. Freud interpretaria essa saudade a partir de uma perda real, qual seja, aquela da união com o seio materno. A religião seria uma tentativa da alma de recuperar essa união infantil perdida para sempre. Contudo, não há como voltar. O que nos resta, nesse caso, é esquecer a infância e nos educar para a realidade, aprendendo a conviver com a depressão. Feuerbach aponta, porém, outro caminho, que é a criação do objeto de desejo. A religião não deve se limitar à interpretação do passado, mas ao projeto do futuro. Nesse sentido, já em Feuerbach existe a percepção de que uma religião sem teologia tem o nome de política, a qual deve tornar os sonhos reais e nos proporcionar um pouco mais de felicidade no porvir. Em outras palavras, a política é também uma forma de religião, mas uma religião em que não há teologia, isto é, em que não há crença em Deus. A política deveria ser a religião do futuro.

Em suas análises sobre a religião, Feuerbach aponta ainda uma característica importante da filosofia moderna, ausente em períodos an-teriores. Consiste ela no fato de que os filósofos contemporâneos preten-dem unificar a filosofia e a religião, ao passo que sempre foi comum sua distinção ou mesmo sua oposição, visto que à religião era próprio o apelo à autoridade divina, ao passo que à filosofia era característico o uso da sabedoria humana.

Contrapondo-se à posição que entende ser pequena a distinção entre a filosofia e a religião, Feuerbach afirma que há entre as duas uma dis-tinção essencial e as separa mesmo um abismo intransponível. Segundo ele, enquanto a filosofia refere-se ao pensamento e à razão, a religião diz respeito à fantasia e à emoção. A religião, portanto, possui um elemento diverso do pensamento, e isso não de maneira marginal, mas como sua es-sência. De acordo com essa distinção, a religião volta-se para o sentimen-to. Ilustrando essa posição, Feuerbach diferencia o modo como a filosofia antiga e os cristãos entenderam o problema da imortalidade da alma. Para os filósofos antigos a imortalidade só se aplica a uma parte do homem, qual seja, apenas à sua razão. Em outras palavras, a inteligência é imortal,

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mas não o homem singular. Assim, a inteligência de Sócrates não morrerá, mas a sua pessoa, com todas as suas características singulares, é finita. Com efeito, alguns sustentavam o aniquilamento até da memória ou da lembrança, restando apenas o pensamento puro. Uma imortalidade assim concebida, porque abstrata, não é religiosa. Tanto é assim que essa forma de imortalidade foi em seguida condenada pelo cristianismo, que a substi-tuiu pela imortalidade do homem total, real e corporal, uma imortalidade, em suma, em que o sentimento e a fantasia encontram lugar, justamente por ser uma imortalidade sensorial.

Essa observação pode se aplicar, segundo Feuerbach, a toda a reli-gião. O próprio Deus é uma entidade sensorial, objeto de contemplação e visão – da alma, de certo, mas em todo caso uma contemplação da fanta-sia. Em que reside, pois, para o filósofo alemão, a distinção entre filosofia e religião? Ora, a religião é sensorial, estética, ao passo que a filosofia é supra-sensível e abstrata.

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O problema da imortalidade é tratado por ele em diversos momen-tos de sua obra. Ele afirma, por exemplo, que a crença na imortalidade pode ser entendida como fazendo parte de um estágio de infância ou igno-rância da humanidade. Em outra ocasião, diz também que a imortalidade é apenas uma necessidade para homens sonhadores, ociosos, que vivem na fantasia, não para homens ativos ocupados com o mundo concreto.

Em todo caso, embora a imortalidade, como elemento de suma im-portância para a religião, ocupa-o por diversas vezes, a doutrina ou filo-sofia central de Feuerbach reside na tese de que a teologia é antropologia. Isso significa: aquilo que chamamos de Deus nada mais expressa do que

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a essência do homem, isto é, Deus é a essência divinizada do homem, de onde segue que a história da religião ou de Deus é o mesmo que a história do homem. Para justificar essa tese central Feuerbach afirma que o deus grego e romano, ou seja, o deus pagão é apenas um sintoma do mundo e do homem pagão, isto é, finca sua raiz na imaginação e na existência do homem pagão. Da mesma forma, o deus cristão é apenas o objeto da re-ligião cristã, expressando a imaginação e a existência do homem cristão. A diferença entre os dois deuses reflete, pois, a diferença entre os dois homens. Assim, o deus pagão é patriota, visto que o povo pagão era na-cionalista e jamais saía de seus domínios, enquanto que o deus cristão é cosmopolita, uma vez que o homem cristão ultrapassou os limites de sua nacionalidade, não se entendendo a partir de uma nação determinada.

É também de acordo com esse ponto de vista que Feuerbach enten-de a distinção entre monoteísmo e politeísmo. Essa diferença é a mesma que existe entre as espécies e os gêneros. Diversas são as espécies, mas único é o gênero. Assim, muitas são as “espécies” de homens, quer dizer, as raças, mas todas pertencem ao mesmo gênero humano. Existe politeís-mo quando o homem não foi capaz de se elevar do conceito de espécie, que é múltiplo e diversificado, assim como muitos são os deuses. Por sua vez, há monoteísmo quando o homem se elevou das diferenças de espécie e atingiu o conceito de gênero, em que todos os homens se igualam.

No gênero abandonamos as diferenças das espécies para pensar um conceito genérico comum a todas. O gênero não se identifica com os in-divíduos, mas justamente resulta na abstração do que há de comum entre eles. Explica Feuerbach:

Assim como o conceito geral de pedra não é um conceito por assim dizer supramineralógico, um conceito que transcende o campo da minera-logia, não obstante sendo distinto do conceito de seixo, de cal, de espato, não designando exclusivamente uma pedra determinada exatamente por compreender todas; da mesma forma não é também o deus geral e uno, do qual são apagadas todas as características corporais e sensitivas dos deu-ses múltiplos, excluído da essência do gênero humano; é antes apenas o conceito-gênero da humanidade objetivado e personificado. Ou dito mais claramente: se os deuses do politeísmo são entes humanos, da mesma forma é o deus do monoteísmo um ente humano, assim como a palavra homem, não obstante abrangendo muitas espécies de homens, judeus, gregos, hindus, não é por isso um ente sobre-humano. Assim, não existe maior tolice do que deixar que o deus cristão desça do céu para a terra, do

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que atribuir a origem da religião cristã à revelação de um ser diverso do homem. O deus cristão, assim como o pagão, surgiu no homem a partir do homem. É apenas um deus diverso do deus pagão porque também o homem cristão é diverso do pagão.

Com efeito, não há representações do deus judeu ou cristão, tal como há figuras que ilustram Zeus, Atenas, Afrodite ou Baco. Na tradição do Antigo Testamento, há mesmo a proibição de que se faça qualquer ima-gem de deus, proibição que foi desobedecida pelo povo hebreu quando Moisés, pela primeira vez, subiu ao monte onde receberia as tábuas da lei. Ao descer, viu Moisés que o povo havia construído um bezerro de ouro e o adorava. Quebrou então as tábuas e destruiu o bezerro.

Não se pode fazer representações do deus monoteísta na mesma medida em que não se pode fazer uma imagem do homem genérico. Po-demos desenhar um homem em específico, mas não a idéia ou conceito de homem. O mesmo não se dava nas religiões politeístas, em que figuravam diversas representações dos deuses. Por outro lado, não apenas imagens ou desenhos de deuses, como também os próprios deuses aproximavam-se muito, em seu comportamento, dos seres humanos, ao menos na Gré-cia. Assim, sentiam raiva, inveja, ciúme ou pulsão sexual, diferenciando-se dos seres humanos apenas pela imortalidade e por possuírem poderes especiais.1

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1 feuerbach, Ludwig. preleções sobre a essência da religião. trad. José da silva brandão. campinas: papirus, 1989.

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A essência da doutrina de Feuerbach, pois, consiste nessa tese do caráter antropológico da religião. Em A essência do cristianismo ele mos-trara justamente isso: Deus nada mais é do que a projeção das aspirações de perfeição do homem, projeção que origina a ideia de Deus. Sendo assim, deus outra coisa não é do que resultado da imaginação humana, um produto mesmo ou criação do homem. De acordo com isso, não é o homem que é feito a imagem e semelhança de Deus, mas Deus que é feito a imagem e semelhança do homem. Contudo, dizendo isso ele atraiu a atenção dos críticos, para quem essa afirmação significava o mesmo que entender o homem como um ser absoluto, que retira de si mesmo o seu próprio ser.

Ora, Feuerbach não pretendeu afirmar tal coisa. Naturalmente o homem não se fez por si mesmo, mas é um ser dependente, que encontra o fundamento de sua existência fora de si. Porém, esse fundamento não é deus, como afirmavam os inimigos do filósofo, mas a natureza.

Para completar A essência do cristianismo, pois, Feuerbach escre-veu A essência da religião, na qual investiga a religião em geral, e não apenas o cristianismo. Observou nessa obra que os teólogos ou deístas atribuem a deus atributos físicos e morais. Fisicamente, é Deus o criador do mundo; moralmente, ele é o legislador dos homens. Em A essência do cristianismo Feuerbach investigou apenas deus em seus atributos morais, isto é, como a causa dos seres morais ou dos homens. Nessa investigação, concluiu que deus, como um ser moral, consiste na essência espiritual do homem divinizada e objetivada, resultando daí a identidade já citada entre teologia e antropologia. Em A essência da religião, considerando o Deus físico, isto é, o autor da natureza, das estrelas, das árvores e pedras, dos animais e homens (enquanto seres físicos), enfim, como o autor do mun-do, Feuerbach conclui que deus nada mais é do que a essência divinizada e personificada da natureza, de onde segue que a teologia confunde-se também, por outro lado, com a física ou fisiologia.

Por fim, a tese de Feuerbach sobre a religião resume-se no seguinte: teologia é antropologia e fisiologia. Deus é, por um lado, a essência huma-na divinizada e objetivada e por outro lado é também a essência da nature-za divinizada e personificada. Em todo caso, Deus é o próprio homem e o que resulta de sua imaginação.

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A antropologia é uma ciência social que se consolidou como disciplina científica no século XIX. A palavra significa estudo ou reflexão racional ou científica a respeito do homem.

Contudo, embora tenha alcançado o estatuto científico somente no século XIX, não foi apenas então que o homem pensou sobre si mesmo. Assim, desde a Antiguidade há reflexões a respeito da essência da humanidade, pelo menos desde Sócrates, o qual lançou justamente a questão: O que é o homem? Dizer que a teologia é antropologia significa dizer, pois, que o estudo de Deus consiste na verdade no

estudo do homem, visto que Deus é apenas um produto do homem. É nesse sentido genérico que Feu-erbach refere-se também à fisiologia, entendida aqui como o estudo da natureza. Teologia é fisiologia

porque o estudo de Deus é também o estudo da natureza, embora da natureza divinizada e concebida como cheia de deuses.

De onde surge, dito isso, o conceito de alienação? Ora, a tese de Feuerbach é a seguinte: o homem, como ser finito, mortal e imperfeito, tem desejo de infinitude, imortalidade e perfeição. O que ele faz? O ho-mem projeta esses seus desejos de imortalidade e perfeição, desejos que são dele e que o constituem, em um ser exterior ao qual denomina depois de deus. Esse ser é na verdade uma criação humana, uma espécie de figura imaginária que ele criou para depositar nela tudo aquilo que ele não é, isto é, perfeito e infinito. O problema é que essa figura imaginária que é uma criação do homem em seguida ganha vida própria e passa a ditar para o homem como ele deve se comportar e agir. Além disso, essa criação hu-mana exige que o homem se submeta a sua vontade e lhe preste culto.

Em outras palavras, deus, como produto da imaginação humana, volta-se em seguida para o homem, seu criador, e passa dominar sua vida e controlar seu comportamento. Aquele que era um produto do homem converteu-se em seu juiz e no regulador de sua vida. O homem, assim, perdeu o controle sobre seu próprio produto, isto é, alienou-se. Essa é, enfim, a origem do conceito de alienação em Feuerbach.

Marx, como dissemos acima, retirou de Feuerbach seu conceito de alienação. Contudo, as análises de Marx não partem da religião, como em Feuerbach, mas da política, ou melhor, da reflexão acerca da convivência humana no contexto do trabalho. É através do exame filosófico do traba-lho que Marx chegará à ideia de alienação, a qual se ramifica em seguida em diversos tipos. Vejamos, pois, que tipo de análise o filósofo faz do trabalho, continuando e complementando o que já discutimos na unidade precedente.

7.3UAUalienaçãoUUoUtrabalho

Na unidade anterior vimos que o trabalho em Marx é algo de pró-pria e exclusivamente humano. Trata-se de um veículo através do qual

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o homem se constrói e alcança sua realização pessoal, transformando a natureza e também a si próprio. Em que medida ele se transforma através do trabalho?

Conexão:

Para o aprofundamento do tema da alienação em Marx consulte o artigo a seguir, o qual aponta a atua-lidade da crítica marxista da alienação. Segundo o autor do artigo, com efeito, qualquer reflexão acerca da luta dos trabalhadores, seja no passado ou no presente, não pode desconsiderar as contribuições de Marx. Além disso, sua análise do conceito de alienação é feita a partir das relações que ele mantém com a noção de estranhamento. Confira o artigo: http://www.nodo50.org/cubasigloXXI/congreso06/conf3_ra-

nieri.pdf

Para entender essa tese, pensemos no trabalho do artesão ou de um carpinteiro. Ele deseja construir uma mesa, mas pretende fazer uma mesa diferente, original, que ninguém ainda construiu. Para tanto, primeiro projeta como será a sua mesa, construindo mentalmente o seu produto. Depois disso, vai pessoalmente até a loja em que se vende madeira. Esco-lhe ele mesmo o pedaço que mais se adéqua àquilo que tinha mentalmente projetado. Retorna então a sua oficina e tira as medidas, realiza os cortes necessários, cola, prega, monta, desmonta até por fim concluir o seu traba-lho. Mas ainda não acabou. A mesa finalizada ele o fez para alguém. Então o carpinteiro manda avisar ao seu cliente que o produto está finalizado e que podem vir retirá-lo. Enquanto não aparece o cliente, fica o carpinteiro ansioso. Será que irão gostar de seu trabalho? Será que o acharão interes-sante ou não? Por fim, aparece o cliente, mostra-se satisfeito e felicita o carpinteiro por seu trabalho. Naturalmente, o carpinteiro sente-se feliz por se ver reconhecido e por ver valorizado o seu trabalho.

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O exemplo do carpinteiro mostra em que medida o trabalho trans-forma a natureza – pois o pedaço de madeira, antes uma árvore, tornou-se agora uma mesa, isto é, transformou-se em um objeto que atende a expec-tativas humanas – mas também transforma o próprio homem, visto que o carpinteiro mudou algo de si através do contato com o vendedor da loja, por meio do exercício de sua imaginação ao conceber e realizar a obra e mediante o convívio e influência que recebeu de seus clientes e de todos com os quais se relaciona durante o processo em que se realiza o seu tra-balho.

Contudo, esse trabalho transformador da natureza e do homem con-verteu-se na prática, com o modo de produção em série da indústria, em uma atividade que ao invés de libertar, escraviza o homem. Ao contrário de torná-lo mais humano, imbeciliza-o. Em que medida isso se dá?

Vejamos. Tomemos o caso do carpinteiro do exemplo anterior. Como sabemos, o capitalismo gera necessidade de consumo e, além disso, ocupa as pessoas, para impedí-las de pensar. Com efeito, a maioria das pessoas não tem tempo hoje para ir ao carpinteiro encomendar uma mesa, nem para ir à costureira pedir uma roupa, a não ser em ocasiões especiais. Ao contrário, as pessoas dirigem-se a uma loja onde encontram já prontas diversas mesas ou vários estilos diferentes de roupas e basta a elas esco-lher e pagar. No mesmo instante, a mesa ou roupa já é sua, sem a necessi-dade de esperar pela construção da mesa ou confecção da roupa.

Nessas condições, o carpinteiro não poderá sobreviver por muito tempo, visto que o número de clientes é cada vez menor. Para sobreviver, ele deverá abandonar sua oficina e candidatar-se a uma vaga na fábrica de mesas próxima a sua casa. Uma vez admitido, todo o seu trabalho muda. Para começar, ele deixa de ser dono de seu próprio tempo. Se antes po-dia acordar quando bem entendesse e trabalhar pelo tempo que achasse suficiente, agora ele precisa se regular pelos horários da fábrica, os quais determinam quando ele deve acordar e dormir, quando ele deve almoçar e ir embora. Em outras palavras, seu tempo não lhe pertence mais, pois ele o vendeu para o dono da fábrica, que agora controla a sua rotina.

Por outro lado, se antes o carpinteiro projetava antecipadamente a mesa que iria construir, dando a ela um estilo seu, agora ele se vê inserido em um linha de montagem, e é responsável apenas por uma parte da obra, por exemplo, por pregar os pregos em determinado setor da mesa. O en-carregado, por sua vez, lhe diz que agora ele será capaz de construir não uma mesa por dia, mas 500, junto com seus colegas. Porém, seu trabalho

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perde o que tinha de criativo e pessoal, e se dirige a um cliente médio e impessoal. Realiza-se, portanto, através de ações repetitivas e monótonas, e o próprio carpinteiro não tem domínio sobre o produto que está cons-truindo, isto é, não conhece o projeto da mesa, senão depois de vê-la con-cluída. Seu trabalho, dessa forma, não se diferencia muito das ações de uma máquina, que não pensa sobre o que está fazendo, mas executa tudo mecanicamente.

Imaginemos agora que o carpinteiro terminou o seu serviço e volta para casa, cansado naturalmente depois de todo um dia de trabalho. Sabe que precisa acordar cedo no dia seguinte, e por isso mal tem ânimo para fazer outra coisa senão comer e dormir. Em casa, porém, alguém lhe lem-bra que é preciso comprar uma mesa para a cozinha. Quando possível, ele então se dirige a uma loja a fim de efetuar a compra. Contudo, a mesma mesa que ele mesmo ajudou a construir custa mais do que ele pode pagar. Se ele ganha, por exemplo, R$500 por mês, isso significa que, por dia, seu salário consiste em pouco mais de R$16, embora, por dia, ele construa 500 mesas. O preço final de uma delas, entretanto, chega a mais de R$100. O produto que ele mesmo fabricou voltou-se contra ele como um gigante inacessível que exige para o seu consumo uma disciplina de comporta-mento que torne possível a economia necessária para a sua aquisição.

É isso que significa em Marx alienação. Um produto do homem vol-ta-se contra ele e o escraviza, exigindo um conjunto de comportamentos para o seu desfrute. Daí a ligação entre esse conceito de alienação e aque-le de Feuerbach, que apresentamos no começo da unidade. Em Feuerba-ch, um produto do homem, no caso a idéia de Deus, volta-se contra ele e exige do homem culto e uma disciplina rígida de seguimento. Em Marx, um produto do homem, no caso as mercadorias fabricadas, volta-se contra ele e também exige culto, agora o culto do consumo. Pois o trabalhador é também seduzido pela lógica do consumo e deseja também consumir. O que ele deseja consumir, contudo, é aquilo mesmo que ele produziu, agora tornado um outro, que contra ele se volta como algo inacessível. É o caso do operário de uma linha de montagem de veículos de luxo. O produto que ele fabrica é algo que ele mesmo não pode consumir.

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ConexãoNo que diz respeito à reflexão marxista a respeito da religião, é comum que se cite a famosa frase:

“a religião é o ópio do povo”, pretendendo que Marx advogava um ateísmo grosseiro. Com o objetivo de apresentar uma visão mais crítica desse problema, Michael Löwy escreve o estudo que segue, no qual apresenta Marx e Engels como sociólogos da religião, apontando as origens teóricas de suas ideias a

respeito do fenômeno religioso: http://www.scielo.br/pdf/ln/n43/a09n43.pdf.

7.4UTiposUUeUalienação

De acordo com o que vimos até aqui, alienação remete a perda ou falta. De fato, a palavra alienação vem do latim alienare, alienus, e signifi-ca: “aquilo que pertence a um outro”. Assim, alienar consiste em transferir para outro o que é seu. No caso do operário, retira-se dele a posse do pro-duto. Porém, o operário perde não apenas isso, mas também deixa de ser o centro de si mesmo. Com efeito, não escolhe o seu salário, seu horário de trabalho nem o ritmo em que ele se realizará, não escolhe nem mesmo a sua roupa, visto que seu vestuário é determinado pela fábrica, que assim retira as diferenças individuais e iguala a todos.

Além disso, processa-se dentro do sistema produtivo o fetichismo2 da mercadoria, que assume valor superior ao próprio homem. A mercado-ria humanizada acaba por desumanizar o homem ou torná-lo uma coisa, ou ainda: reifica (re significa “coisa”) o homem. O próprio ser humano se torna mercadoria na medida em que sua força de trabalho tem um preço e é justamente isso que ele vende ao capitalista: sua força de trabalho, seu tempo, seu esforço, enfim, vende a si mesmo. Todos os demais tipos de alienação decorrem disso, isto é, dessa perda do produto de seu trabalho. Vejamos, pois, em que tipos de alienação o homem pode se perder.

7.4.UUAlienaçãoUnaUproUução

A alienação na produção consiste na perda do produto fabricado, como exposto acima. Ela é justificada racionalmente primeiro por Henry Ford, o qual introduziu no começo do século XX a produção segundo a lógica da linha de montagem, inicialmente na indústria automobilística. O operário então é reduzido a gestos mecânicos através do parcelamento das tarefas, que tem por base a separação entre concepção e execução

2 glossário: fetichismo: em religião, fetiche é um objeto ao qual se atribui poderes sobrenaturais; em psicologia, consiste na perversão na qual a satisfação sexual é dependente da visão ou contato com determinado objeto, como um sapato ou certas roupas; o fetichismo da mercadoria, por sua vez, consiste na sua animação, isto é, ela se torna “humanizada”: a mercadoria ganha mais importância que o próprio homem, tornado coisa.

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do trabalho. Em outras palavras, um grupo de homens é responsável por conceber, criar e inventar o que vai ser produzido e inclusive como vai ser produzido e outro grupo limita-se à simples execução do que foi por outros planejado.

Cientificamente, esse processo foi sistematizado por Frederick Taylor (1856-1915), autor do livro Princípios de Administração Cientí-fica, em que estabelece as diretrizes de um método racional de produção visando aumentar a produtividade através da economia de tempo e da su-pressão de gestos e comportamentos desnecessários no interior do proces-so produtivo. Embora concebido inicialmente para as fábricas, suas teses foram em seguida transferidas para vários setores da vida humana e para outros tipos de fábricas, alcançando o modo de se conceber os esportes, a medicina, a escola e mesmo as atividades domésticas.

Frederick Taylor viveu entre 1856 e 1915, na Filadélfia. Inicialmente técnico em mecâ-nica e operário, tornou-se engenheiro mecânico e é considerado um dos pais da Administração

Científica. Ele pretendia aplicar métodos cartesianos de controle e planejamento na produção, mas gerou considerável insatisfação entre seus subordinados, a despeito do bom desempenho das indústrias

em que trabalhou. De fato, não é possível submeter por muito tempo os operários a um regime de tra-balho repetitivo e mecânico sem que isso não gere em algum momento um forte descontentamento. O sucesso de Taylor, pois, vinha acompanhado de problemas de relacionamento com os funcionários, por mais que o teórico tentasse convencer os trabalhadores de que seu método de produção fora concebido

para o bem deles, visto que o aumento dos lucros poderia também beneficiá-los.

O ponto de partida de Taylor é a ideia de que o trabalhador é pregui-çoso e executa suas ações de modo incorreto. Portanto, ele precisa ser dis-ciplinado, de tal forma que uma postura adequada do corpo, dos pés e das mãos, possa aumentar a produção. Para o controle dessas ações são cria-dos os cargos de gerência, especializados no treinamento dos funcionários através inclusive do uso de cronômetros, e em seguida responsáveis por sua vigilância.

De certo que não é fácil convencer os operários à submissão de um trabalho rotineiro, repetitivo e irreflexivo, reduzido a gestos mecânicos. Daí a necessidade de métodos de coação, não mais de coação externa, como no caso do antigo feitor de escravos, mas agora uma coação sofisti-cada, capaz de tornar o operário dócil. Isso é feito através da impessoali-dade das ordens, diluídas na figura do Setor de Planejamento, que substi-tui a presença física de um chefe opressor.

Ao mesmo tempo em que as ordens são impessoais, vindas da Di-retoria, o operário é estimulado mediante recompensas ou castigado se

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flagrado em indolência. Surge nesse contexto a figura do operário padrão, embora os funcionários não sejam a rigor tratados como pessoas, e sim como cargos ou ainda manipulados como se manipulam cifras ou coisas.

Essas, enfim, são algumas das técnicas que fazem com que o traba-lho, idealmente libertador, torne-se na prática opressor e mesmo um canal para o controle social das massas.

7.4.2UAlienaçãoUnoUconsumo

O consumo é uma atividade especificamente humana por meio da qual o homem satisfaz as suas necessidades de subsistência, de cultura – como educação e aperfeiçoamento – ou suas necessidades estéticas, quan-do do consumo de arte, por exemplo. Contudo, ao consumir nunca se faz pelo consumo em si, mas sempre tendo em vista um fim qualquer. Quando compramos uma roupa, com efeito, não o fazemos pela compra em si, mas com a finalidade de nos apresentar para alguém de determinada maneira.

Entretanto, em uma sociedade em que a produção é alienada, o con-sumo também tende a sê-lo. Isso se dá mediante a produção artificial de necessidades, levada a cabo especialmente pelos meios de comunicação de massa. Isso é também resultado da forma como é pensado e executado o trabalho. O trabalhador já começa o seu dia mal disposto, pois já acorda quando não quer, depois de assustar-se com o despertador. Passa em se-guida todo o seu dia com medo de receber alguma repreensão do patrão ou chefe. Ao final da jornada, volta cansado para casa e tem ânimo ape-nas para comer e descansar, enfim, preparar-se para um novo dia em que tudo se repetirá. Em uma condição de vida assim, a sedução do consumo encontra o trabalhador em situação vulnerável, facilmente manipulável e disposto a se deixar seduzir pelo prazer da posse de bens. Se não é o traba-lho a fonte de prazer e realização pessoal, o consumo assume essa tarefa, e o faz de modo bastante eficaz. Sobre isso diz Friedmann:

A civilização tenicista não é uma civilização do trabalho, mas do consumo e do “bem-estar”. O trabalho deixa, para um número cres-cente de indivíduos, de incluir fins que lhe são próprios e torna-se um meio de consumir, de satisfazer as “necessidades” cada vez mais amplas.

As “necessidades”, porém, são artificialmente produzidas. O consu-mo, antes um meio para um fim qualquer, torna-se um fim em si mesmo, isto é, consome-se por consumir, sem que a mercadoria consumida signi-

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fique uma real necessidade. Muitas são as pessoas que testemunham usar como método para vencer a tristeza a visita a um shopping e a compra, independente do que se irá comprar. Assim, alguém pode montar uma sala completa de som, mesmo sem gostar de música. Pode-se ter em casa uma biblioteca enorme, e deixar a maioria dos livros sem leitura.

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Outro fator importante que favorece o consumo é a velocidade com que as coisas se tornam velhas. Assim, a cada ano aparecem novos mode-los de celular, televisões mais modernas e com funcionalidades as mais diversas, o que faz com que as pessoas troquem seus aparelhos, seu carro, seus móveis devido ao fato de ter se tornado “indispensável” uma nova tecnologia.3

Conexãoo artigo a seguir analisa o problema do consumo entre as crianças e os jovens. Escrito

por especialistas em Serviço Social, o texto aponta para o papel da mídia quanto ao incentivo ao consumo inadequado. Os jovens estão especialmente expostos às seduções dos meios de comunicação, pois cada vez mais, por diversas razões, passam um tempo maior diante

da televisão ou internet. A própria mídia teria se dado conta de que os jovens constituem um ótimo mercado consumidor. Confira: http://www.alana.org.br/banco_arquivos/arquivos/docs/

biblioteca/artigos/Inf%C3%A2ncia%20e%20Consumeo.pdf.

Assim entendido, o consumo é um poço sem fundo, um desejo que jamais será concretizado ou satisfeito, um querer sempre mais que se con-tenta com o próprio querer. Disso resulta que as pessoas consomem mais do que ganham, impulsionados pelas facilidades que o comércio oferece.

3 friedmann, erich. sete estudos sobre o homem e a técnica. são paulo: difusão européia do Livro, 1968, p. 147.

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Por fim, há de se considerar também a grande parcela da população reduzida ao desejo de consumo, mas sem acesso a ele. Poderíamos ques-tionar por que essa grande massa não se rebela. Ora, há mecanismos so-ciais que impedem a tomada de consciência. Em primeiro lugar, as pesso-as alimentam a ilusão de viver em uma sociedade de mobilidade, em que é possível mudar de classe social e adquirir um maior poder aquisitivo. Todos vivem com a esperança de um dia melhorar de vida, e se por fim não conseguem fazê-lo, atribuem isso à sorte ou a falta de competência pessoal. Além disso, deixam-se seduzir pelo mundo colorido das novelas de televisão, mundo no qual entram como se em um reino de sonhos, em que todos são bonitos, alegres e por fim sempre vencem.

Portanto, não se vê a condição de exploração e de perda de liberda-de em que se encontra a maior parte das pessoas. O homem alienado no consumo perde o poder de contestação e crítica, ficando destruída a possi-bilidade de oposição e de luta contra as injustiças e desigualdades sociais, que permitem apenas a alguns o desfrute do bem-estar social que a socie-dade de consumo propagandeia como se fosse acessível a todos.

7.4.3UAlienaçãoUnoUlazer

O lazer tradicionalmente foi privilégio de uns poucos homens, membros das classes ricas e dominadoras. Na Idade Média, por exemplo, enquanto os nobres podiam consumir o seu tempo – todo o seu tempo, na verdade, pois viviam no ócio – com caçadas, bailes ou jogos, os campo-neses eram submetidos a longas jornadas de trabalho, relacionadas direta-mente ao ritmo da natureza: iniciava-se com o nascer do sol e terminava com o começo da noite. A ausência de iluminação não permitia muita escolha após o pôr do sol.

O advento do capitalismo transformou o modo de se relacionar com o trabalho e com o tempo, como visto anteriormente. O ritmo da natureza foi substituído pelo ritmo do relógio, e os operários eram inicialmente submetidos a longas jornadas de dezesseis a dezoito horas diárias. O pou-co tempo que restava, naturalmente, era gasto com o sono.

Essa situação mudou através da luta dos trabalhadores por mu-danças sociais. Assim, a partir de 1850 volta a ser concedido o descanso semanal. Vota-se em 1919 a lei das oito horas e progressivamente dimi-nui-se a semana de trabalho para cinco dias – embora isso não seja ainda uma realidade para todos. Após 1930 os trabalhadores conquistam outros

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benefícios, como o descanso remunerado (afinal, o descanso não é para o trabalhador, mas para a fábrica, a fim de permitir ao operário trabalhar bem no dia seguinte) e as férias.

Essas conquistas, e especialmente a última, acabaram por fazer surgir o homem de após o trabalho, fomentando a indústria de férias e de lazer. Gerou também o tempo liberado, que não se identifica com o tempo livre em que é possível fazer o que se bem entender, ou mesmo nada. O tempo liberado é gasto no transporte, no qual o trabalhador, sobretudo em grandes cidades, gasta um bom pedaço de seu dia, em ocupações como alimentação e limpeza doméstica, no sono, em obrigações familiares ou religiosas.

O tempo livre surge apenas após o cumprimento de todas essas obri-gações. Assim, ainda que alguém trabalhe trinta horas por semana, não se pode dizer que ela tenha, após o trabalho, todo o tempo livre. Ela precisa se dedicar também aos afazeres da casa ou a diversos outros tipos de obri-gações. Apenas depois disso terá enfim tempo livre. Vê-se que o tempo livre, no caso do trabalhador brasileiro, é bem curto. Dumazedier assim define o tempo livre ou lazer:

O lazer é um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode en-tregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se ou, ainda, para desenvolver sua informação e formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora, após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais .

As funções do lazer, portanto, são múltiplas. Em primeiro lugar, visa o descanso, mas não o descanso para o trabalho. Esse tipo de des-canso pertence não ao tempo livre, mas ao tempo liberado, e é destinado, em última instância, ao trabalho. Por outro lado, o lazer também visa o divertimento, através do qual o trabalhador pode alcançar o equilíbrio psicológico necessário à vida, compensando o esforço do labor. O entrete-nimento também proporciona o exercício de nossa imaginação, mediante o consumo de arte, cinema, teatro ou outras formas de cultura. Por fim, o lazer também visa uma participação social livre, desinteressada, e nesse caso desenvolve nossa sensibilidade perante o mundo.

Vê-se, pois, que o lazer é uma atividade, e não um mero passa tem-po passivo. Através dele, o homem se transforma como pessoa, exercendo uma postura ativa diante da realidade, o que o retira da passividade a qual ele está entregue no mundo do trabalho.

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Entretanto, em uma condição social em que o trabalho e o consumo são alienados, é difícil privar da alienação também o lazer. O operário submetido a longas jornadas de trabalho repetitivo e mecânico pode en-contrar dificuldade em se divertir, devido à fadiga psíquica, mais até do que a física.

Nesse caso, a indústria do lazer pode oferecer a ele, acostumado à passividade, um conjunto de atividades de lazer que segue o impulso da moda, como programas de boliche, danceterias, filmes aclamados pela mídia, sem função crítica ou reflexiva. Isso, evidentemente, no caso de a cidade possuir casas que ofereçam essas diversões a um preço acessível ao trabalhador médio. Em caso contrário, ele passará suas férias em casa, preso às seduções da televisão colorida, e quando muito irá se entreter no bar perto de casa, conversando com os vizinhos enquanto bebe sua cacha-ça.4

Distingue-se, portanto, o lazer ativo do passivo. O lazer ativo envol-ve o homem em sua totalidade, e o permite reformular sua experiência, afastando-o da passividade do trabalho em que ele se reduz a gestos mecâ-nicos e repetitivos. O lazer passivo, ao contrário, ainda o mantém na mes-ma condição de passividade e ele não reorganiza as informações recebidas pela televisão ou pela cultura e por isso poderá assistir a todos os pro-gramas disponíveis e ainda continuar exatamente o mesmo. É certo que a passividade ou atividade dependerá de cada um, isto é, do modo como cada um recebe as informações que lhes vem dos meios de comunicação. Assim, um mesmo filme pode ser recebido de forma crítica ou passiva, a depender de quem o assiste.

Por fim, o lazer alienado é passivo, não transforma o homem, mas o mantém na mesma condição de exploração de antes. O homem, assim entregue à indústria do lazer, perde novamente sua capacidade de crítica e com isso a capacidade de oposição às injustiças e desigualdades que ain-da dão acessível livre ao lazer integral apenas a uma parcela reduzida da sociedade.

4 dumazedier, J. Lazer e cultura popular. são paulo: perspectiva, 1970, p. 34. coleção debates.

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AtiviUaUes

01. O que significa o termo “alienação”?

02. Segundo Feuerbach, a teologia é antropologia e fisiologia. Explique o significado dessa tese do filósofo alemão.

03. O que significa alienação em Feuerbach?

04. Aponte as diferenças entre o trabalho operário antes e após a Revolu-ção Industrial.

05. O que Marx entende por alienação?

06. Explique em que consiste a alienação na produção, no consumo e no lazer.

Reflexão Vimos nessa unidade o que significa o termo alienação. Grosso

modo, alienar significa transferir para outro o que é seu. O debate sobre esse problema ganhou força sobretudo depois de Marx, embora ele tenha recebido influência de outros pensadores, especialmente Feuerbach. Vi-mos que em Feuerbach o conceito de alienação é apresentado dentro do estudo da religião, ao passo que Marx o encontra no mundo do trabalho. Com efeito, idealmente o trabalho deveria ser um canal de promoção e re-

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alização humana, mas na verdade é mais um instrumento de manipulação social, que mantém as classes menos favorecidas sobre controle, impe-dindo-as de pensar criticamente sobre sua condição de exploração e falta de liberdade. A alienação, por sua vez, pode se concretizar de diversos modos, a começar do processo produtivo, do qual resulta a alienação do consumo e do lazer. Cumpre ao servidor social pensar criticamente nessa condição a que está sujeita a maior parte da população, e propor, a partir do exame teórico desse problema, caminhos que atenuem a marginaliza-ção social e que dêem acesso mais amplo à cultura, à educação, ao lazer e a um trabalho efetivamente transformador e realizador.

LeituraUComplementarFEUERBACH, Ludwig. A essência do cristianismo. Trad. José da

Silva Brandão. 2 ed. Campinas: Papirus, 1997.É um dos textos mais conhecidos de Feuerbach, no qual ele apresen-

ta sua tese de que a idéia de Deus se forma em nós a partir da projeção de nossas aspirações de finitude e nossos desejos mais profundos, o que torna Deus em produto da imaginação humana.

Referências

ARANHA, Maria Lúcia Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filo-sofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 1993.

CHAUÍ, Marilena. Filosofia. São Paulo: Atual, 1992.

CODO, Wanderley. O que é alienação. 10 ed. São Paulo: Brasiliense, 1995. Coleção Primeiros Passos, v. 141.

COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filoso-fia. São Paulo: Saraiva, 2010.

FEUERBACH, Ludwig. Preleções sobre a essência da religião. Trad. José da Silva Brandão. Campinas: Papirus, 1989.

STEGMÜLLER, W. A filosofia contemporânea. São Paulo: EPU, 1977.

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NaUpróximaUuniUaUeO nosso estudo está chegando a sua etapa final. O caminho até aqui

já foi bastante rico. Com efeito, começamos conhecendo o que é filosofia e como ela pode contribuir na formação do servidor social. Em seguida aprendemos que a história da filosofia se divide em quatro períodos: a filosofia antiga, medieval, moderna e contemporânea. Conhecemos as principais características de cada fase do pensamento filosófico, bem como alguns de seus filósofos mais importantes. Depois disso discuti-mos a respeito da intimidade entre técnica e ciência, a qual caracteriza o nosso tempo. A técnica, unida à ciência, é um instrumento importante de controle social, como o percebeu rapidamente a burguesia. Após dis-cutir esse problema, conhecemos as doutrinas políticas que justificam o Estado Burguês, assim como as teorias que propõem uma alternativa ao capitalismo, isto é, discutimos acerca do liberalismo e do socialismo. No contexto do debate sobre a burguesia, discutimos a respeito do conceito de trabalho e de como ele foi entendido ao longo da história e por fim, nessa unidade, relacionamos esse debate sobre o trabalho com o conceito marxista de alienação. Na próxima unidade, concluindo o nosso trabalho, discutiremos acerca dos conceitos de Sociedade Disciplinar e Sociedade de Controle, bem como o conceito de indústria cultural, e terminaremos com a apresentação das filosofias que propõem ao homem a superação da sua condição passiva e a conquista de sua maioridade intelectual, o que finalmente tornaria o ser humano um ser social autônomo e regulador de sua própria existência.

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UniUa

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UMaturidade intelectual

e autonomia de pensa-mento

Nessa unidade discutiremos a respeito dos conceitos de Sociedade Disciplinar e Socie-

dade de Controle, idealizados pelos filósofos fran-ceses Foucault e Deleuze. Os conceitos referem-se às

formas que o poder encontrou para tornar mais eficaz o seu domínio e influência. Nesse sentido, discutiremos

também acerca da ideia de Indústria Cultural, movimento que está inserido no contexto da sociedade de controle, de que

falaremos. Por fim, trataremos das filosofias que propõem a supe-ração da condição de escravidão em que vive o homem moderno,

sinalizando para a construção do homem como ser autônomo e re-gular de sua própria vida.

Objetivos de sua aprendizagemVocê deverá ser capaz de diferenciar a Sociedade Disciplinar da

Sociedade de Controle, assim como conceituar o que significa Indústria Cultural; deverá ainda ser capaz de pensar sobre os caminhos que podem libertar o homem de sua alienação social e cultural e conduzí-lo ao cami-nho do livre pensamento e da autonomia intelectual.

Você se lembra?Qual foi o último filme que você assistiu? Ele tinha alguma pro-

posta de discussão séria de algum tema social ou tinha como intenção apenas o entretenimento? Com efeito, a principal característica das

produções culturais do mundo capitalista é passar o tempo das pes-soas, renunciando a qualquer finalidade de crítica ou reflexão.

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8.UU IntroUuçãoUaoUproblema

Ao longo de nosso estudo, vimos que as classes dominadoras da sociedade, de formas diferentes ao longo da história, sempre encontra-ram maneiras de preservar e perpetuar o seu poder e o seu controle sobre as demais classes sociais. A descoberta burguesa de que a técnica, unida ao conhecimento científico, poderia ser capaz de aumentar a produção e aperfeiçoar os mecanismos de controle foi, nesse sentido, decisiva. Se a nossa época pode ser definida como a Idade da Ciência, isso se deve es-pecialmente a essa união entre os conhecimentos científicos e os saberes técnicos. De um lado, as ciências naturais permitem aplicações importan-tes no sistema produtivo, garantindo mecanismos capazes de aumentar significativamente a produção industrial, e de outro, as ciências humanas oferecem recursos conceituais e teóricos responsáveis por aprimorar o controle do comportamento.

Nesse contexto, é cada vez mais importante discutir a respeito da maturidade intelectual do homem e dos meios capazes de lhe assegurar sua autonomia de pensamento. A realização humana passa, com efeito, por sua independência de pensamento, a qual precisa ser entendida como uma meta a alcançar, isto é, o homem precisa construir a sua identidade ao longo de sua vida, visto que ela não está desde já dada e pronta.

Contudo, a construção da identidade do homem, ou seja, sua cons-trução enquanto ser social autônomo, encontra no contexto social em que vivemos decisivas resistências. Como discutimos nas unidades anteriores, a forma como o trabalho é concretamente vivenciado pela maioria dos trabalhadores é não um canal para sua realização como pessoa, mas um mecanismo de controle e uma forma de alienar o homem de si mesmo e assim distanciá-lo de sua identidade.

Terminaremos o nosso estudo abordando, ainda que de maneira su-perficial e rápida, os conceitos de Sociedade Disciplinar e Sociedade de Controle, objeto das reflexões dos filósofos franceses Foucault e Deleuze, e em seguida conheceremos o que significa Indústria Cultural, conceito muito importante entre os filósofos pertencentes à Teoria Crítica, cor-rente de pensamento que teve lugar na Alemanha no século XX. Por fim, mencionaremos as perspectivas filosóficas que defendem a independência intelectual do homem, ou seja, sua maturidade de pensamento.

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8.2USocieUaUeUDisciplinarUeUSocieUaUeUUeUControle

As mudanças sociais próprias da Modernidade, muitas das quais já mencionamos em nosso estudo, isto é, a Reforma Protestante e a tese da independência do homem frente à autoridade, bem como a valorização do trabalho, tornado quase uma forma de culto a Deus; o Liberalismo, cor-rente de pensamento que defendia teoricamente os princípios do capitalis-mo, e ainda a unidade entre ciência e técnica, enfim, a série de mudanças que acompanhou o surgimento de nosso tempo, levou gradativamente à percepção de que o poder deveria aperfeiçoar sua forma de atuação.

De acordo com isso, desenvolveu-se entre os séculos XVIII e XIX aquilo que o filósofo francês Michel Foucault denominou de Sociedade Disciplinar. Trata-se de um tipo de sociedade responsável por organizar e aprimorar os ambientes de confinamento, o que fazia com que os homens passassem de um ambiente fechado a outro: a família, a escola, a fábrica, a universidade e até a prisão e o hospital. Esses ambientes tinham o objeti-vo de tornar mais rígido o controle sobre as pessoas, o que se expressa na forma como eram construídos os edifícios destinados a esses espaços.

Michel Foucault (1926-1984) foi um importante filósofo francês do últi-mo século. Entre os problemas que o ocuparam estão a questão da arqueologia

do saber filosófico, a experiência literária e a análise do discurso. É conhecido ainda por suas críticas às instituições sociais, notadamente a psiquiatria, a medicina e as prisões. Escreveu também Uma história da Loucura e Uma história da Sexu-alidade, em que mostra o lugar decisivo que o poder sempre desempenhou quanto à definição do que é o louco ou do que é o comportamento sexual aceitável. Suas

obras, enfim, analisam com grande agudeza os mecanismos de expressão do poder e visam, em última instância, à “defesa da sociedade”.

Certamente que mesmo antes do século XVIII existiam mecanismos disciplinares, mas apenas a partir de então eles assumem uma configura-ção mais refinada, sendo planejados e executados segundo uma intenção explícita de controle social. Naturalmente essa tendência de controle e planejamento está inserida no contexto do pensamento moderno, que concebe o homem, como já vimos em nosso estudo, como o “senhor da terra”. Poderíamos dizer que não apenas da terra, o homem é concebido também como o senhor do próprio homem, visto que mesmo a humanida-de é também objeto desse impulso de controle.

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O símbolo desse tipo de sociedade é o panóptico. Inicialmente, o termo se refere a um centro penitenciário ideal, em que é possível ao vigilante observar todos os presos sem que estes saibam se estão sendo vigiados ou não. Contudo, a ideia pode ser aplicada a qualquer espaço confinado, isto é, à escola, ao hospital ou ao manicômio e através dele seria possível observar a todos os estudantes, doentes ou loucos, e assim mantê-los sob controle.

Portanto, na sociedade disciplinar, cujo símbolo seria o panóptico, o poder se exerce através da vigilância, controle e posterior correção. A vigilância tem como função adestrar (ou educar) as pessoas para o cumprimento das leis ou normas ditadas pelos detentores do poder. Essa vigilância alcança até mesmo os corpos das pessoas, e os torna dóceis e submissos. Uma expressão dessa vigilância é a autoridade exercida por um professor sobre as crianças. De fato, quando entra na escola a crian-ça ainda possui a leveza e a indisciplina que caracteriza a infância. Aos poucos, o professor a educa (ou domestica) para que ela se sente de deter-minada maneira, voltada para a frente e sem conversar. É o próprio corpo da criança que será modificado e tornado dócil, e para isso será alvo da vigilância constante e atenta do olhar do professor.

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Por sua vez, a punição é responsável por corrigir as pessoas que desobedeçam as normas estabelecidas, tentando fazer com que elas te-mam infringir novamente essas regras. Enfim, o objetivo tanto da puni-ção quanto da vigília é adestrar as pessoas e fazer com que elas sigam o padrão social de comportamento imposto pelos detentores do poder.

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Contudo, Foucault salienta que é mais econômico para o poder vigiar do que punir, de onde resulta a importância que terá na sociedade disciplinar o panóptico, mencionado anteriormente. Com efeito, para a punição, que sempre é individual, visto que cada um “erra” de determinada maneira, é preciso gasto de pessoal e de dinheiro, de sorte que é melhor criar entre os vigiados o medo da vigilância do que propriamente puni-los.

Conexão:

para o aprofundamento do tema da disciplina em Foucault, consulte o artigo cujo endereço segue em anexo. Trata-se de um pequeno texto que aborda de forma breve e sucinta os principais objetivos de Vigiar e Punir, texto no qual Foucault analisa a história da punição como a história da prisão, e as

formas pelas quais o poder se exerceu ao longo da história da Europa: http://www.cirino.com.br/artigos/jcs/30anos_vigiar_punir.pdf.

As análises de Foucault foram revisadas e completadas pelo filósofo Gilles Deleuze. Para Deleuze, as sociedades disciplinares se situam entre o século XVIII e a Segunda Grande Guerra, depois do que são substituí-das por uma nova forma de manipulação social, que ele denomina de So-ciedade de Controle. A característica que para Deleuze é a mais decisiva nas sociedades disciplinares é a presença dos ambientes fechados que ci-tamos acima, isto é, a escola, hospital ou prisão, que funcionam sempre de um modo similar. Já a Sociedade de Controle funciona de um modo mais sutil, que dá mesmo a aparência de ausência de disciplina, quando na ver-dade sua presença é ainda mais significativa. Isso porque a sociedade de controle seria marcada pela interpenetração dos espaços, o que substitui os ambientes fechados das sociedades disciplinares. Aparentemente, não há mais limites definidos, pois tudo se processa como se em rede, em que os ambientes se entrecruzam. Além disso, o tempo é tornado contínuo, de tal forma que as pessoas jamais conseguem concluir nada, uma vez que são envolvidas por uma espécie de formação permanente e nesse sentido estão como que prisioneiras em campo aberto.

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Gilles Deleuze (1925-1995) foi um importante filósofo francês do século XX, dedicado inicialmente ao estudo da história da filosofia, disciplina da qual foi professor

em Sorbonne. Sua obra filosófica é dedicada à interpretação dos filósofos modernos como Espinosa, Leibniz, Nietzsche e Kant e também à interpretação do pensamento de artistas como os escritores Marcel Proust e Kafka. Também é conhecido por suas análises sobre o

cinema, arte que usou também para expressar idéias de sua filosofia. Conheceu Foucault na década de 60 e desde então se tornaram grandes amigos, até a morte de Foucault, em 1984. Juntos, Foucault e Deleuze são tidos como os responsáveis pelo renascimento do interesse

pela obra do filósofo alemão Friedrich Nietzsche.

Nesse sentido, a disciplina, na sociedade de controle, não é elimi-nada, pois o poder ainda precisa adestrar a sociedade. Contudo, agora a disciplina é internalizada ou seu exercício se faz de maneira mais sutil. Para tornar isso claro, observemos como se processam os mecanismos de controle.

Ora, as chamadas telefônicas, as compras de passagem aérea, as transferências financeiras, o uso de cartões de crédito e mesmo as trocas de informação através da rede mundial de computadores podem ser e de fato são vigiadas. Talvez você já tenha recebido em casa uma correspon-dência de um banco ou empresa qualquer fazendo propaganda de seus ser-viços com base em informações sobre sua rotina de compras. Tudo o que se faz hoje parece de domínio público, o que nos remete ao fato de que a vigilância, antes restrita aos ambientes fechados de que falamos, agora se estende ao campo aberto, isto é, parece estar agora em todo lugar.

Em outras palavras, o poder que antes era localizado, visível – encarnava-se no diretor do presídio, hospital ou escola – agora está difuso na rede planetária. Se antes era possível apontar a fonte de que emanava a disciplina, agora ela está em todo lugar e em lugar algum. De fato, o poder atingiu hoje sua forma mais sofisticada, pois o que se manipula são ele-mentos imateriais, ou seja, informações, o conhecimento, a comunicação. Assim, não é mais preciso a vigilância física que caracterizava a socieda-de disciplinar. A vigilância se exerce agora à distância, através da rede: o que se vigia agora são as mensagens ou o trânsito de informações. Isso diz mais sobre as pessoas, com efeito, que seus movimentos físicos.

De acordo com o que se disse, a vigilância e o controle estão gene-ralizados. Todos vigiam os passos de todos. Basta pensar na febre atual pelo Twitter. A própria linguagem que se usa no twitter já é sugestiva: as pessoas têm seguidores. Todo mundo segue todo mundo, todo mundo controla todo mundo. Em um contexto mais amplo, as empresas contro-

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A Teoria Crítica foi um

movimento intelectual que pro-curava conciliar o pensamento teórico

com a prática concreta, isto é, aproximar a filosofia da tensão do presente. Esse movimen-to é associado à Escola de Frankfurt, uma cor-

rente de pensamento inter-disciplinar de inspiração marxista que criticava tanto o capitalismo quanto o socialismo soviético, tentando apontar uma outra via para a justiça social. Portanto, a Teoria Crítica

foi um movimento de crítica social, com vistas a pensar os problemas da sociedade do

século XX e sugerir caminhos para a sua superação.

lam os clientes; as ONG’s controlam as empresas e o governo; o governo controla os indivíduos e os indivíduos se controlam mutuamente.

Outro fenômeno dos últimos anos que testemunha o desenvolvi-mento da sociedade de controle é o crescimento de programas tipo reality shows. Em especial, é de se destacar o Big Brother, inspirado no livro de Ge-org Orwell “1984”. Nessa obra as pessoas de um país fictício são vigiadas o dia inteiro por câmeras que representam os olhos do Es-tado. O livro é escrito em tom de aviso, alertando para a perda de privacidade que caracterizaria no futuro a sociedade. Contudo, esse “perigo” foi investido de um forte caráter sedutor, que faz com que todos queiram ver e serem vistos.

Por fim, outro fenômeno que pode também ser entendido como pertencendo aos mecanismos de controle social é o que a Teoria Crítica denominou de Indústria Cultural, isto é, a produção de cultura que se rea-liza no interior do processo produtivo capitalista. Como veremos a seguir, também a cultura pode ser usada como veículo de alienação e como ins-trumento de manipulação, fazendo com que a grande maioria das pessoas renuncie ao pensamento e à crítica social.

8.3U InUústriaUCultural

Logo de início, quando se fala em Indústria Cultural, ou seja, a pro-dução de cultura no contexto da sociedade de consumo capitalista, vem à tona a questão de saber se essa produção é boa ou ruim, isto é, logo emer-ge um problema ético relacionado à essa produção. Com efeito, trata-se de uma produção direcionada às massas e não às elites intelectuais, e por isso supostamente uma produção menos inteligente. De fato, à indústria cul-tural costuma-se associar facilmente aos meios de comunicação de massa e a cultura de massa, conceitos que são, contudo, de acordo com Teixeira Coelho, distintos.

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Assim, a existência de meios de comunicação de massa não é su-ficiente para dar origem a uma cultura de massa. Quando a imprensa foi inventada no século XV isso não significou o surgimento imediato de uma cultura de massa, visto que aquilo que era reproduzido ainda tinha um consumo restrito à elite de pessoas letradas. Propriamente, a indústria cultural irá aparecer quando da invenção dos primeiros jornais, nos quais teve lugar o romance de folhetim, retratando os costumes da época. Asso-ciado ao romance, outros tipos simplificadores de cultura tomaram lugar, como o teatro de revista, a opereta e o cartaz, que simplificavam respecti-vamente o teatro, a ópera e a pintura.

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Outro fator, contudo, foi também importante para o surgimento da indústria cultural, qual seja, o desenvolvimento de uma economia de mer-cado e da sociedade de consumo. De acordo com isso, pode-se situar o início da indústria cultural na segunda metade do século XIX, inserindo-a no processo de industrialização crescente da sociedade. Essa industria-lização altera sensivelmente o modo de produção e de trabalho humano e estende sua influência a todas as formas de criação, inclusive agora a produção cultural, que passa a se regular pelos princípios da produção em geral, como o uso das máquinas e a submissão do ritmo humano ao ritmo das máquinas; a exploração do operário e a divisão do trabalho. Aliadas a isso, duas características são também muito próprias do sistema capitalista, ou seja, a coisificação e a alienação. Pela primeira se entende a tendência de tornar tudo em coisa, inclusive o próprio homem. Tudo é tornado mercadoria, um bem ou produto, mesmo a educação e a cultura. Como conseqüência, a tendência é um crescente aumento da alienação em suas diversas formas, ou seja, a alienação do trabalho – pois a força de trabalho é vendida e nesse sentido não pertence ao operário – alienação do

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Dwight Ma-cDonald (1906-1982)

foi um escritor, crítico social e de cinema e filósofo político americano.

Escreveu em diversas revistas importantes dos EUA e é considerado um dos pioneiros

no campo dos “estudos culturais”. Sobre ele foi escrita uma biografia denominada Um rebelde em defesa da tradição, de autoria de Michael Wreszin.

Considerado por alguns como indisciplinado e inconsistente, muitos de seus ensaios, contudo,

são considerados clássicos.

produto do trabalho – que não pertence ao operário que o construiu – além da alienação dos projetos de vida e da política, visto que não se tem tempo livre para a reflexão ética e política, senão apenas para a massificação e repetição de esquemas fáceis.

De acordo com isso, diz Teixeira Coelho:Nesse quadro, também a cultura – feita em série, industrialmente, para o grande número – passa a ser vista não como instrumento de livre expressão, crítica e conhecimento, mas como produto trocável por dinheiro e que deve ser consumido como se consome qualquer outra coisa. E produto feito de acordo com as normas gerais em vigor: produto padronizado, como uma espécie de kit para montar, um tipo pré-confecção feito para atender necessidades e gostos mé-dios de um público que não tem tempo de questionar o que conso-me. Uma cultura perecível, como qualquer peça de vestuário. Uma cultura que não vale mais como algo a ser usado pelo indivíduo ou grupo que a produziu e que funciona, quase exclusivamente, como valor de troca (por dinheiro) para quem a produz1

O quadro em que se desenrola a indústria cultura, portanto, é a revolução industrial, o capita-lismo liberal, a economia de mercado e a sociedade de consumo. Embora possa se remeter suas origens ao sé-culo XIX, é no século XX, especialmente com a popu-larização da televisão, que a indústria cultural consolida-se definitivamente.

Por outro lado, quando se fala em indústria cultural e cultura de massa logo vem à cena um problema importante ligado a esse tema, qual seja, a questão da distinção entre cultura superior e cultura de massa. Citando Dwight MacDonald, Coelho lembra que a produção cultural foi dividida por esse autor em três tipos: a superior, a média e a de massa – que se subentende como inferior. É difícil precisar o que se deve entender

1 coeLho, teixeira. o que é indústria cultural. 14 ed. são paulo: editora brasiliense, 1991. coleção primeiros passos, v. 8, p. 11-12.

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precisamente por cultura superior, mas geralmente essa ideia remete aos produtos valorizados pela crítica erudita, tais como as pinturas do Renas-cimento ou obras literárias de difícil leitura. A cultura média seria aquela voltada aos pequeno-burgueses e ao seu conjunto de valores. Assim, qua-dros vendidos em praças públicas ou romances escritos em linguagem simples e com imagens fáceis, podem ser considerados como pertencentes a esse tipo de cultura.

O que é, porém, cultura de massa? Não é simples definir o que se deve entender por isso. MacDonald nos anos 20 e 30 entendeu poder enquadrar-se nessa categoria as histórias em quadrinhos, coisa que não é consenso. Segundo Coelho, seria em primeiro lugar preciso dissociar a cultura oferecida pelos meios de comunicação como a televisão e o rádio da cultura ligada à literatura e ao teatro, e associá-la, ao invés disso, com outros meios de comunicação como a moda, os costumes alimentares e gestuais, e assim por diante.

Em todo caso, dizer precisamente o que é cultura de massa não é simples. Um mesmo produto cultural pode ser entendido por alguns como de massa e por outros não. Associar a produção cultural a classes sociais, por sua vez, não resolve o problema, pois não é sempre correto que a cultura superior seja aquela consumida pela elite. Com efeito, um operá-rio pode muito bem ouvir com satisfação uma audição de Beethoven, ao passo que um grande intelectual pode sentir satisfação em assistir uma produção cinematográfica de massa, como os filmes que representam ca-tástrofes. Por outro lado, as classificações podem não receber unanimida-de. De fato, algumas histórias em quadrinhos podem possuir significativo valor cultural, apesar das vozes que pretendem ser esse tipo de história um exemplo de cultura de massa. E além disso, a obra de determinado autor pode ser considerada em uma época como de pouca relevância e em outra época como de grande valor.

Apesar de todas essas dificuldades, o que se pode dizer para tornar as coisas mais claras é que a distinção entre cultura superior e de massa não deve implicar em um juízo de valor e na censura da última. O que se deve reprovar é a tendência própria da indústria cultural e da cultura média de explorar obras de grande valor cultural e simplificá-las para o consumo, vendendo a aparência de que o consumidor tem diante de si obras de grande valor cultural, quando não passam de simplificações. O consumidor, nesse caso, sente-se consumindo obra de cultura superior, e pode até sentir-se bem porque supostamente compartilhando de uma

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cultura considerada nobre, mas na verdade tem diante de si produtos com pouco ou nenhum valor cultural.

Ao contrário, a cultura de massa não deve ter essa pretensão, mas valorizar suas próprias potencialidades e banalidades, sem a necessidade de referir-se constantemente à cultura superior, mas explorando o que tem de si e sendo por consequência também capaz de produção original. Fazendo isso, a cultura de massa não estará tentando vender, como o faz a cultura média, um produto como sendo de cultura superior. Esse é um embuste característico da cultura média, que faz com que o consumidor se tranquilize porque supostamente experimentou a “verdadeira cultura”, quando na verdade experimentou apenas uma forma deturpada e fácil da-quela que é tida como a cultura superior.

Outra diferenciação que também pode ser feita refere-se àquela existente entre cultura popular e cultura de massa, também denominada pejorativamente de cultura pop. Entre elas existe frequentemente uma re-lação de recusa, quando deveriam ter, ao contrário, segundo Coelho, uma relação de complementação. Os defensores da cultura popular argumen-tam que ela expressa de maneira mais fiel os valores e costumes sociais, visto que é consumida pelos mesmos que a produzem. Se esse é um fator sem dúvida positivo, não é suficiente, contudo, para defender a cultura po-pular contra a cultura pop, de onde ela retira, além do mais, muito de seu dinamismo. Há de se considerar também o fato de que a cultura popular é marcada pelo não questionamento e pela perpetuação de seus processos, ao passo que a cultura pop pode conter algo de subversivo, em certo senti-do, como no caso da moda, que pode alterar costumes sociais.

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Por fim, um outro problema igualmente importante relativo à indús-tria cultural refere-se a suas funções sociais. Ora, diz-se com insistência que a indústria cultural aliena. Caso se tome como certa essa acusação, devemos então nos perguntar como ela realiza essa alienação. Em primei-ro lugar, ela teria uma função narcotizante, que advém de sua ênfase sobre o divertimento, com o qual mascara situações intoleráveis e promove a fuga da realidade. Outra função da indústria cultural seria ainda o reforço das normas sociais, repetidas até a exaustão e de que resulta o conformis-mo social. Além do que foi dito, pode-se também mencionar a deturpação e degradação do gosto popular, a simplificação de seus produtos, a atitude paternalista, que dirige os gostos do consumidor e nessa medida faz dele um sujeito passivo.

É certo que há também vozes em defesa da indústria cultural, as quais apontam, por exemplo, o domínio mais rápido da linguagem por parte das crianças devido à influência da televisão, ou advogam que mui-ta informação pode converter-se em formação, e que a indústria cultural pode unir as nacionalidades ou as classes sociais.

Em todo caso, lidamos aqui com um campo de estudos bastante complexo, visto que o juízo sobre o gosto não tem a mesma validade objetiva que possui um juízo científico qualquer. Dizer o que é arte boa ou ruim é algo que necessariamente partirá de um ponto de vista parcial, que dificilmente pode pretender uma validade universal. O fato é que a cultura de nosso tempo, especialmente agora em que vivemos na Idade da Ciência, é significativamente marcada pela influência da técnica industrial capitalista.

Portanto, o decisivo é que no contexto da sociedade de controle até mesmo a produção cultural converteu-se em mecanismo de dominação, nesse caso de domínio sobre o gosto e sobre o pensamento. Imaginemos um operário, o carpinteiro do exemplo que já usamos, que passa todo o seu dia trabalhando e finalmente chega em casa exausto depois de oito horas de labor. Ao entrar em casa, ele só pode mesmo pensar em se ali-mentar e descansar, e a televisão se mostra um canal privilegiado para isso. Com efeito, as novelas, por exemplo, mostram um mundo todo colo-rido, cheio de pessoas jovens, bonitas e alegres, geralmente consumindo e desfrutando de um conforto que o operário não possui mas sonha em ter. Nesse mundo assim colorido, frequentemente os maus são punidos e os bons, que sofrem durante boa parte da trama, são enfim recompensados com a felicidade de um casamento feliz e filhos saudáveis. Trata-se, pois,

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de um mundo dos sonhos, que anestesia o trabalhador de sua realidade de exploração e falta de liberdade.

É o mesmo que faz os filmes aplaudidos pelo grande público, isto é, abusam das cores e seduzem os expectadores com imagens que fascinam e prendem o olhar, ainda que ao fazê-lo desviam o pensamento da crítica e da reflexão. É assim que se pode entender a razão do sucesso de grandes produções do cinema contemporâneo, as quais não trazem como enredo nada de novo – na verdade, ao começar a assistir o filme, a maioria das pessoas já será capaz de dizer o que acontecerá no meio e no fim – mas ainda assim atraem e seduzem um grande público.

Conexão: para outras referências a respeito do conceito de indústria cultural, consulte o artigo a seguir.

Nele o autor demonstra a atualidade desse conceito e o relaciona com o problema da educação, no sentido de pensar uma alternativa capaz de superar ou resistir ao processo de debilitação do indivíduo

submetido à indústria cultural. Além disso, a análise do autor é feita tendo em vista a condição atual dos meios de comunicação de massa, que intensificaram e aperfeiçoaram os mecanismos de que se utiliza

a indústria cultural.

Por fim, a função da indústria cultural, isto é, da cultura tornada mercadoria (na mesma padaria onde compramos os pãezinhos da manhã podemos também adquirir um CD de música, um filme, um livro, etc.) é seduzir e fascinar as pessoas e assim desviá-las da reflexão sobre a in-justiças e desigualdades sociais. De fato, o trabalhador após todo um dia de trabalho não se encontra em condições de fazer outra coisa senão des-cansar, mas para garantir que isso aconteça e que ele não se envolva com reflexões que tornem explícita sua condição de exploração, a indústria cultural o entretém com imagens e cores que fascinam e seduzem, e assim são como que narcóticos, isto é, fazem dormir o pensamento e a reflexão.

Dito isso, fica agora a questão de pensar como libertar o homem dessa condição de escravidão em que ele se encontra. Alienado no traba-lho, no consumo e no lazer, objeto de manipulação da sociedade de con-trole, submetido às atrações e seduções da indústria cultural, a condição do homem moderno não é das mais edificantes. Como torná-lo consciente de sua própria identidade, libertá-lo enfim e lhe possibilitar a plena reali-zação como pessoa? O caminho não parece ser outro senão aquele que já no século XVIII apontavam alguns iluministas: a educação.

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8.4UMaturiUaUeUIntelectual

Dentro da perspectiva iluminista, a educação está voltada para a for-mação da consciência moral racional, e está relacionada com o desenvol-vimento e exercício da liberdade. Nesse sentido, a educação tanto visa a formação do pensamento autônomo quanto do caráter. No caso de Kant, o mais importante iluminista alemão, a educação é pensada ainda desde um ponto de vista aberto que leve o homem a se cultivar também de forma integral, incluindo as dimensões corporal, intelectual e moral.

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Por outro lado, é característico do Iluminismo a crença em uma hu-manidade melhor, e nesse caso a educação assume uma importância espe-cial e deve estar orientada para o futuro. Fundamentalmente, a educação faz o homem sair da minoridade e entrar na maioridade, através do escla-recimento. Por menoridade Kant entende a incapacidade de suar a própria razão, tornando o homem dependente dos pensamentos de outros. É bem mais fácil seguir o pensamento dos outros do que pensar por si mesmo, mas é dever do homem ultrapassar a menoridade, da qual ele mesmo é culpado, e entrar na maioridade, quando então usará livremente a própria razão.

A superação da minoridade se dá, pois, através do esclarecimento, por meio do qual o homem se liberta das correntes que a si mesmo impôs.

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Isso se realiza pelo cultivo do próprio espírito, que o retira da preguiça de pensar que é própria dos menores. É claro que usar a própria razão não é uma tarefa fácil ou simples, sobretudo no cotidiano, em que preferimos dispensar o esforço pessoal e acatar o que nos dizem. Ser maior espiritu-almente, pelo contrário, requer a recusa de qualquer autoridade externa, como é o caso de autoridades religiosas e governantes e recusa também de qualquer outra autoridade, como a superstição e o vício.

Uma razão assim cultivada e com coragem de se expressar livre-mente necessita ser educada. Se isso é mais fácil no que diz respeito ao indivíduo – basta habituar os jovens desde cedo ao exercício da reflexão – o mesmo não se dá com a sociedade de maneira geral, de onde resulta que a educação é um processo longo que atravessa as gerações. Mas o que significa educar a razão?

Como dito, consiste em aprender a pensar e agir a partir de si mes-mo. Uma primeira dimensão que a educação assim pensada comporta é a dimensão prático-moral, referente à construção do homem como ser livre e portador de dignidade. Assim será atingida a finalidade da educação, que é a consciência moral racional que se exerce através da liberdade.

Contudo, ao mesmo tempo Kant defende também que a educação precisa formar no homem algumas tendências de comportamento, quais sejam: ele deve se tornar: disciplinado, cultivado, prudente e moralizado. Pode parecer estranho sustentar a importância da disciplina, visto que a educação tem como fim último a formação do homem livre. Porém, para Kant não se pode formar homens livres sem que eles sejam antes discipli-nados. Uma criança habituada à indisciplina desde cedo não conseguirá se tornar um adulto verdadeiramente livre.

Por outro lado, a importância da disciplina se relaciona com o fato de o homem ser um animal civilizado, e, pois, ter como dever o controle de seus instintos. Disso resulta mesmo a centralidade da disciplina para o processo educativo. Assim, embora a criança deva ser constrangida por pressão à limitação de suas vontades, isso tem por objetivo torná-la capaz de, no futuro, guiar-se por si mesma. Não é o exercício desregrado do li-vre-arbítrio que torna o homem livre, pois o arbítrio precisa ser educado e gradativamente conduzido até a liberdade. A disciplina, enfim, tem como objetivo polir a rudeza humana e reduzir as influências de um arbítrio mal orientado.

Outra função da educação é tornar o homem cultivado. A cultura refere-se ao desenvolvimento de habilidades com vistas a determinados

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propósitos ou objetivos, isto é, tornar o homem capaz de usar suas habili-dades em relação aos outros sujeitos. Vê-se, pois, que cultura refere-se às faculdades que permitem ao homem atingir os fins a que se propõe.

Por sua vez, a prudência tem como objetivo tornar a criança inteli-gente no uso de seus conhecimentos, agora tendo em vista o desenvolvi-mento das boas maneiras, que permitirão a integração entre o indivíduo e a sociedade e o usufruto proveitoso de seus talentos pessoais. Aqui, pois, tem-se em mira a formação da cidadania, a qual inclui a amabilidade e a civilidade.

Por fim, uma função das mais importantes da educação, segundo Kant, é moralizar o homem. Aqui o filósofo alemão tem em vista a capa-cidade humana de dirigir sua vida, seja seu pensamento seja sua ação, a partir de fins bons, entendidos como aqueles que podem ser aprovados ao mesmo tempo por todos e ser também os fins de cada um. Aqui a educação confere ao homem uma dignidade que é própria de sua espécie, dignidade que não se limita ao exercício formal da razão, mas que também inclui o exercício da liberdade, que é a finalidade da educação moral. Liberdade, porém, que se realiza através do amor ao dever, não como uso desenfrea-do do arbítrio.

Por um lado, pois, a educação moral visa a formação do pensamento autônomo, através de um processo em que gradativamente a criança dei-xa de obedecer cegamente aos comandos dos pais e mestres e alcança a

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maturidade da vontade. É certo que nesse processo a disciplina ocupa um lugar muito importante, pois que ajuda a superar os vícios, mas não é sufi-ciente para a educação moral – sua finalidade é a formação de um cidadão consciente de sua liberdade.

Por outro lado, a educação moral visa à formação do caráter, que consiste naquilo que o homem faz de si mesmo, ao contrário do tempera-mento, que é aquilo que a natureza faz do homem. O caráter deve ser for-mado através do hábito de agir sob o comando de determinadas máximas morais, e enfim ele estará desenvolvido quando for capaz de domar as paixões e possuir firmeza e solidez em relação a seus propósitos e deter-minações.

Esse seria o caminho, segundo Kant, capaz de tornar a humanidade melhor. Apenas a educação poderá fazer com que os homens deixem de pensar a partir dos outros e pensem por si mesmos. Trata-se é claro de um processo longo, que atravessará gerações, mas é o único caminho capaz de libertar o pensamento. Certamente que nesse processo a disciplina ocupa um lugar de destaque, mas apenas como meio através do qual no futuro a pessoa será capaz de ser livre. Por fim, mediante a educação, a qual torna o homem disciplinado, civilizado e moralizado, ele será capaz de desenvolver sua maturidade intelectual, libertando-se dos mecanismos de controle que procuram manipular o seu pensamento e impedi-lo de exercer livremente a crítica e a reflexão.

Assim, se queremos lutar pela justiça social e pela realização plena do homem, e de todos os homens, essa luta deve passar necessariamente, falando desde o ponto de vista iluminista, pela educação. Não, porém, da educação tal como foi concebida pela burguesia, isto é, a educação en-quanto veículo de domesticação e adestramento do homem. De fato, foi isso que as sociedades disciplinares do século XVIII – o mesmo século em que se deu o Iluminismo – fizeram da escola, um lugar de vigilância e controle social. Longe disso, a educação defendida por Kant e pelo iluminismo é aquela que visa à maturidade intelectual e autonomia de pensamento. Esse deve ser, portanto, o caminho para a justiça social, isto é, a conquista da liberdade de pensamento e de uma sociedade liberta da dominação e do controle social, os quais procuram impedir que o homem realize aquilo que mais do que tudo o define como homem: a reflexão.

Por fim, para concluir nossas reflexões a respeito da autonomia do homem, abordaremos brevemente a seguir o que sobre isso nos permite pensar o pensador francês Jean-Paul Sartre.

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8.5U OUhomemUéUconstrutorUUeUsiUmesmo

Sartre é o autor mais representativo da corrente de pensamento co-nhecida como Existencialismo, a qual ganhou força na segunda metade do século XX. A tese básica do existencialismo foi expressa por Sartre atra-vés da sentença: a existência precede a essência. Vejamos o que o filósofo pretendia por isso.

Jean-Paul Sartre (1905-1980) foi um filósofo, escritor e crítico francês do último século, considerado um dos maiores representantes do existencialismo. Além disso, Sartre defendia que os intelectuais devem exercer uma função ativa na sociedade no que diz respeito ao combate das

injustiças e problemas sociais. De fato, ele mesmo foi um militante político, advogando em sua obra e em sua ação causas políticas de esquerda. Por sua vez, o existencialismo foi uma doutrina que, grosso

modo, defendia a liberdade individual, a responsabilidade e a subjetividade do ser humano. Para o existencialismo, o ser humano é um ser único e deve assumir os seus atos e o seu destino.

De acordo com Sartre, o homem é aquilo que ele faz de si. Assim, primeiro o homem existe, para depois criar uma ideia de si e de sua exis-tência. Daí a tese de que a existência precede a essência, ou seja, primeiro existimos para depois conceber teoricamente o que é a existência.

Por outro lado, Sartre toma como ponto de partida a ideia da ine-xistência de Deus. Assim, citando o autor russo Dostoievski, afirma que se Deus não existe, tudo é permitido, isto é, uma vez que Deus não existe o homem está entregue a si mesmo e deve, pois, se responsabilizar ele mesmo por sua vida e por suas ações. Disso resulta a angústia que caracte-riza a existência em um mundo sem Deus: o homem está abandonado a si mesmo e não pode justificar seus atos senão a partir de si mesmo.

Além disso, a angústia caracteriza a existência também pelo fato de que o destino ou futuro do homem não está dado nem pronto, mas precisa ser construído, e o único que pode fazê-lo é o próprio homem. Somos os únicos responsáveis por nós mesmos e quem responderá por nossas ações, sejam elas quais forem, seremos nós mesmos. Ninguém pode nos conso-lar: nós precisamos viver nossa própria vida.

De acordo com isso, deveríamos evitar a prática de pedir conselhos. Pedir conselhos significa transferir a outro a responsabilidade por nossa própria vida. Em outras palavras, significa renunciar a nossa liberdade de escolher e decidir por nós mesmos. Não se pode fazer isso, pois somos inelutavelmente livres ou, como diz o filósofo, somos escravos da liber-dade: o homem está condenado a ser livre. De acordo com isso, ainda que

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ele renuncie a sua liberdade e escolha não escolher, isso também será um ato de escolha, mesmo que seja a escolha de não ser livre.

É claro, porém, que nossa liberdade de escolha não é ilimitada. Com efeito, vivemos em sociedade e por isso não podemos fazer tudo o que bem entendermos, visto que é preciso também respeitar a liberdade do outro. Em outras palavras, não posso exercer minha liberdade através da limitação da liberdade do outro; ao contrário, minha liberdade termina justamente onde começa a liberdade do outro. Ser livre é sempre ser livre com os outros.

Enfim, o existencialismo foi uma corrente que em pleno século XX, em que ganha força a sociedade de controle e se desenvolve a indústria cultural, defendia a liberdade e a autonomia do homem como um ser so-cial responsável por si mesmo e pelos outros. De fato, de minha liberdade enquanto liberdade compartilhada resulta a responsabilidade não apenas por mim, como ainda pelos outros. Disso advém a ideia de participação política. Sou responsável por minhas ações e por minhas omissões, isto é, sou responsável por aquilo que faço de minha vida e também sou respon-sável por aquilo que faço ou deixo de fazer da vida dos outros. Daí a ne-cessidade de engajamento político do intelectual. O intelectual não deve se restringir a sua mesa de trabalho, mas ir até o mundo concreto e lutar contra as injustiças da sociedade, visto que ele é responsável não apenas por si, mas por todos. E isso não apenas no que se refere ao intelectual, como a todas as pessoas: somos sempre responsáveis por nós mesmos e pelos outros. Por isso não podemos nos calar ou fechar os olhos para os problemas que atormentam a sociedade.

8.6UConsiUeraçõesUfinais

O desenvolvimento da história mostrou, como vimos ao longo de nosso estudo, que as classes menos favorecidas possuem condições menos favoráveis para a defesa de seus interesses. De acordo com isso, a história pode ser interpretada como o desenvolvimento progressivo das técnicas de controle e manipulação social, sempre mais sofisticadas.

Tendo em vista isso, nosso estudo orientou-se precisamente pela análise da modernidade e de suas características que justificam ou refor-çam essa manipulação. Assim, vimos que a Reforma Protestante, que de um lado representou a libertação dos homens do jugo das autoridades católicas, também trouxe consigo o risco da anarquia política. Nesse con-

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texto percebeu-se a necessidade de justificar a obediência à autoridade civil, aparecendo para tanto as doutrinas do Direito Divino e do Contrato Social. Além disso, o Liberalismo apresentou-se também como a justifica-tiva teórica para o capitalismo e para a defesa dos valores burgueses.

A burguesia, por sua vez, tão logo reconheceu-se como classe, tra-tou de aumentar e aperfeiçoar o seu poder sobre a sociedade, eliminando as vozes contrárias aos seus interesses. Assim, percebeu desde cedo o papel que o conhecimento científico poderia desempenhar no processo produtivo e pouco a pouco aproximou esse conhecimento dos saberes téc-nicos, de que resultou a unidade entre a ciência e a técnica, que não ape-nas aumentou a capacidade de produção como ainda, no caso das ciências humanas, possibilitou a construção de técnicas mais sofisticas de controle social.

No que diz respeito à produção, a técnica científica idealizou um tipo de trabalho repetitivo e enfadonho, baseado no controle sobre o corpo do operário, eliminando gestos e movimentos desnecessários. O trabalho assim concebido, embora lucrativo para os donos do capital, do ponto de vista do trabalhador significou não um meio para sua realização pessoal, mas um mecanismo que o tornava submisso aos interesses da burguesia e alienado de si mesmo.

De fato, a alienação consiste justamente na perda ou falta, ou ainda, no ato de entregar a outro algo que me pertence. No caso do operário, o que ele entrega é não apenas o produto de seu trabalho, mas o seu pensa-mento e com isso a sua pessoa.

Porém, o poder não deseja que o trabalhador ou a sociedade perceba as suas intenções de controle e manipulação em prol dos interesses dos grupos dominadores. Ao contrário, esforça-se justamente por esconder es-sas intenções. É o que consegue com grande êxito a sociedade de controle, que substituiu a sociedade disciplinar dos séculos XVIII e XIX, em que o poder era localizado e exercido através da vigilância física sobre a socie-dade. Agora o controle e a vigilância estão difusos, sem local definido, em toda parte e em parte alguma.

Exercendo-se de maneira invisível, o poder, contudo, pode ser vis-lumbrado através de alguns de seus mecanismos de submissão, como é o caso da indústria cultural. A produção de cultura, feita de modo a seduzir a sociedade, ao mesmo tempo a desvia da reflexão acerca da exploração e da falta de liberdade em que vive a maior parte da população.

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Para superar toda essa condição de escravidão em que vive o ho-mem o único caminho é, como pensavam os iluministas, a educação, con-cebida, porém, como canal de construção da autonomia de pensamento e da maioridade intelectual da humanidade. Enfim livre, o homem deverá ser capaz de assumir a sua própria existência, como defendia o existen-cialismo, e se responsabilizar por si mesmo. Somente então será capaz de se realizar plenamente. Com efeito, enquanto dominado e submisso aos mecanismos de controle social, o homem não pode ser ele mesmo. Sua realização passa pela afirmação de sua identidade, e para tanto é preciso abandonar a minoridade, na qual o homem pensa sempre como pensam os outros ou como lhe dizem que deve pensar, e conquistar a maioridade de pensamento que o faça finalmente o construtor de si mesmo.

AtiviUaUes

01. Diferencie a Sociedade Disciplinar da Sociedade de Controle.

02. O que significa Indústria Cultural?

03. Encontre um exemplo de produção cultural (filme, livro, música, no-vela, etc.) feita segundo a lógica da indústria cultural e explique em que medida essa produção pertence à indústria cultural.

04. O que significa maioridade intelectual para Kant?

05. Qual é, segundo Kant, a função da educação?

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06. Para Sartre o homem está condenado a ser livre. Explique o que ele quis dizer com essa afirmação.

Reflexão

Vimos nessa unidade que o poder possui diferentes formas de exer-cício. As sociedades disciplinares caracterizam-se pelo uso ostensivo da força e pela presença física do poder, exercido através da vigilância e controle sobre os indivíduos. Por sua vez, a sociedade de controle aperfei-çoou os mecanismos de vigilância e difundiu o poder, não mais localizado facilmente, mas presente em todo lugar e em lugar algum. A manipulação social se exerce ainda através da indústria cultural, que transforma em mercadoria a cultura ao mesmo tempo que desvia as pessoas das injustiças sociais. Que caminho seguir para superar essa condição de escravidão em que vive o homem? Cumpre ao servidor social dedicar a esse problema profunda atenção, visto que o combate à injustiça deve necessariamente passar pela luta em defesa da liberdade do homem e da conquista de sua realização como pessoa. Ora, essa conquista passa pela educação, enquan-to a via que, se bem concebida, pode conduzir o homem a sua autonomia de pensamento e enfim torná-lo capaz de quebrar as correntes que apri-sionam o seu pensar e com isso possibilitar a ele ser o construtor de si mesmo.

LeituraUComplementar

ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclare-cimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985.

Trata-se da obra em que os autores tratam do conceito de indústria cultural e seus mecanismos de atuação. É fundamental para o aprofunda-mento do tema. Nela os filósofos mostram que no século XX a produção cultural se deu através da transferência irrestrita de critérios econômicos

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para o domínio da cultura, o que substituiu seu valor de uso por seu valor de troca.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Trad. Lígia Vassalo. Rio de Janeiro: Vozes, 1984.

Nessa obra o filósofo francês aborda os mecanismos de que se utili-za o poder para moldar corpos dóceis e submissos. Com efeito, percebeu-se que o corpo deveria ser um alvo privilegiado do poder, e sua disciplina é uma característica importante da sociedade disciplinar e seus ambientes de confinamento como a escola, a prisão e o hospital, espaços que pos-suem a mesma estrutura de funcionamento, visto que foram concebidas para atender a objetivos semelhantes.

Referências

CHAUÍ, Marilena. Filosofia. São Paulo: Atual, 1992.

CENCI, Angelo V. Educação e ética: aproximações a partir das pro-postas educativas de Aristóteles e Kant. In.: DALBOSCO, Cláudio; CASAGRANDA, Edison; MÜHL, Eldon (org.) Filosofia e Pedagogia: aspectos históricos e temáticos. Campinas: Autores Associados, 2008.

COELHO, Teixeira. O que é indústria cultural. 14 ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1991. Coleção Primeiros Passos, v. 8.

GILES, T. História do existencialismo e da fenomenologia. São Pau-lo: EPU, 1989.

ROVIGHI, S. V. História da filosofia contemporânea. Tradução Ana Capovilla. São Paulo: Loyola, 1999.

STEGMÜLLER, W. A filosofia contemporânea. São Paulo: EPU, 1977.

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