livro - não é Óbvio

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    “Eu acho que é isso que vocês chamam de trabalho em equipe”, disse Paul amargamente, revirando osolhos.

    “Se realmente quiser falar em trabalho em equipe, em vez de eu lhe enviar a toalha de mesa, que talvocê me enviar a cliente aqui? Vai ser uma trabalheira a menos para todos”.

    Decepcionado com seu colega, Paul decidiu tentar outro caminho. Ele ligou para Roger, o gerente dodepósito regional. Suas filhas frequentavam a mesma escola, e as famílias tinham se tornado amigas. “Oi, Rog.

    Desculpe incomodá-lo, mas eu tenho um pedido. Será que me consegue uma toalha série KTL-1860?”“... Ok, Paul. Posso adicioná-la à sua próxima remessa, na quarta-feira.”

    “Obrigado, Roger, vou verificar novamente com a cliente e ligo de novo.” 

    Paul desligou e virou-se para a senhora idosa. “Minha senhora, fico feliz em informar que a toalha podeestar aqui na quarta-feira”, relatou ele, com o melhor sorriso de serviço ao a tendimento ao consumidor queconseguiu dar.

    “Oh, eu não sei não”, disse ela, friamente. “Eu estou ocupada nas quartas -feiras, e não quero deixarpara a última hora. Talvez, se tiver tempo, eu passe aqui.”

    Paul observou desanimado ela sair da loja e amaldiçoou baixinho o fato de ter se preocupado emintervir. Ele tinha apenas piorado sua situação. Era quase certeza que essa mulher não ia voltar para comprara toalha de mesa. Isso significava que a toalha ia acabar como excedente para a loja. Ele já estava fazendo

    uma liquidação para se livrar do excedente, com pouco ou nenhum lucro. Não havia necessidade de encher aloja de itens que não seriam vendidos rápido o bastante. Mas se ele não pedisse e ela voltasse, ela ficaria tãodecepcionada que ele não só perderia uma venda, mas uma cliente. Arriscar-se a perder vendas ou ficar comexcedentes? Este dilema o atormentava. Não admira que os lucros de sua loja não fossem mais elevados. Seele soubesse exatamente o que os clientes comprariam...!

    Ele ligou para Roger novamente. “Mande-me a toalha de mesa, por favor, Rog. Vou preencher oformulário de pedido especial quando voltar para minha mesa. Só espero que alguém a compre”, e então Paulacrescentou: “Roger, você tem uma bola de cristal no estoque?

    “Pedi duas à matriz, mas me disseram que vai demorar um pouco.” O sorriso de Roger era quaseaudível.

    Paul desligou, e ficou se perguntando novamente se havia algo mais que poderia ser feito para

    aumentar a rentabilidade de sua loja. E a resposta foi um simplesmente não. Vendas versus excedente era umdilema que só uma bola de cristal poderia resolver.

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    “Então eu vou deixá-la para o meu outro bebê”, respondeu ele. “Caroline irá comandar o showperfeitamente sem mim”.

    Paul congelou na cadeira, e Caroline começou a protestar: “Pai, isso não é nem hora-” 

    “TIO DARREN!” gritou Ben com o homem bonito de cabelos pretos que estava parado, sorrindosilenciosamente, na porta da varanda.

    “Surpresa!” Darren exclamou, e se aproximou para abraçar Lydia. “Feliz aniversário, mãe! Eu teria

    chegado mais cedo, mas houve um atraso no La Guardia.”“Não haveria atraso nenhum se trabalhasse em Miami”, repreendeu Henry. “E então poderíamos ver

    mais os gêmeos e não apenas nos feriados.”

    “É bom ver você também, papai.” O irmão mais velho de Caroline sentou-se entre a sobrinha e osobrinho, dando um abraço a cada um. “Mas não acabou de dizer que vai ter muito tempo, talvez até paravisitar seus netos em breve?”

    “Aceita alguma coisa?” interrompeu Lydia, como sempre, servindo de anteparo ao marido e ao filho.“Podemos fazer um hambúrguer para você rapidinho.”

    “Não, obrigado, mãe. Vou apenas querer duas porções de sobremesa”.

    Caroline se inclinou e beijou o irmão na bochecha. Enquanto Paul servia bolo ao seu antigo colega de

    quarto, disse: “Temos muito que conversar.”

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    Capítulo 3

    “Eu poderia ter tomado um táxi, sabe”, disse Darr en enquanto colocava o cinto de segurança.

    Paul insistiu em levar o seu antigo colega de faculdade para o aeroporto. “Faz tempo que não temosuma conversa tranquila, só nós dois. Achei que deveria aproveitar a oportunidade”, respondeu, esperando osinal de trânsito mudar. “Então, está saindo com alguém no momento?”

    “Você combinou esse papo com a minha mãe? Não, não neste momento. O trabalho está meocupando muito.”

    “Algum grande projeto não o deixa dormir?” perguntou Paul, ao virar o Grand Cherokee para a  BroadCauseway. O trânsito não estava muito pesado.

    “Estou envolvido numa série de iniciativas, e qualquer uma delas pode se transformar de repente emalgo grande”, respondeu Darren, e seus olhos azuis cinzentos brilharam. “O mundo do capital de risco é c heiode surpresas. Na verdade, eu acho que fechei um acordo de última hora uns quinze minutos antes de aparecerlá ontem.”

    “E eu pensando que tinha vindo para a Flórida para o aniversário de sua mãe,” disse Paul.

    “De qualquer forma, eu tinha certeza que agora você não teria que se empenhar tanto em cada

    negócio. As oportunidades não deviam estar atrás de você, e não vice-versa?”“Sim, eu também pensava assim”, disse Darren, batendo os longos dedos na janela e olhando para a

    água. “Mas até eu encontrar meu próprio nicho, é assim que funciona. Você precisa ter uma reputação deespecialista, para as oportunidades irem atrás de você.”

    “Entendo. Então, até lá, você se mata para que outra pessoa possa ter lucros a longo prazo, enquantotudo o que lhe resta são os honorários de intermediário. Você não gostaria de ser o chefe, em vez de ser só ointermediário?

    “Espere aí, já vejo onde isso vai dar.” Darren se mexeu no banco para olhar diretamente para seucunhado. “Você está falando de investimentos ou de artigos de cama, mesa e banho?”

    “Eu acho que você deve pensar em voltar para a empresa”, disse Paul, determinado. Entrando na I -95,ele acrescentou: “Nós todos sabemos que Henry sempre o quis como seu sucessor.”

    “De jeito nenhum vou voltar a dirigir a empresa para ele. Mudei-me para Nova York para conseguir meuespaço”, afirmou Darren. “Além do mais, pelo que vejo, artigos de cama, mesa e banho é um ramo lento, nadarealmente muda. Com empreendimentos, o céu é o limite. Há sempre novas direções para se desenvolver,sempre algo emocionante te esperando.”

    “Sim, talvez esteja certo.” Mesmo sendo uma chance remota, Paul raciocinou, ele tinha que ver se adeterminação de Darren tinha arrefecido. Aparentemente, não tinha.

    “Claro que estou certo”, foi a resposta. “Além disso, Caroline será uma boa presidente”.

    “Ela será uma grande presidente, mas quando isso acontecer, eu não poderei deixar o empresa”.

    “Deixar?” Darren ficou genuinamente surpreendido. “O que está falando?”

    “Darren, sabe que estou empacado com esta loja.”

    “Você já ficou empacado antes, e sempre que conseguiu sair e surpreender a todos. Estavadesesperado quando estava no Departamento de Aquisições e então teve a ideia daqueles critérios brilhantespara abertura de novas lojas. Muito disso foi incorporado ao plano de expansão da empresa. Conheço vocêmelhor do que imagina, Sr. White.” O capitalista nunca tinha visto o seu melhor amigo tão abatido. Tentandolevantar o ânimo de Paul, Darren continuou: “Lembra na  faculdade, quando ficou atrasado no último ano,porque arrumava qualquer pretexto para ir visitar Cara na Flórida?

    No entanto, foi o 3º melhor da nossa turma. “Estou confiante de que vai encontrar uma saída para sairdessa.”

    “Quem me dera ter a sua confiança”, Paul deu de ombros. “Desde que assumi em Boca, a loja sódespencou no ranking; este trimestre, caí para oitavo lugar.”

    “Então, talvez não devesse estar no comando de uma loja. Você tem um tipo diferente de inteligência,aquela necessária para gerenciar grandes sistemas. Na sua próxima promoção, você vai se achar de novo, ese destacar.”

    “Lembra-se da condição que impus quando entrei na empresa?” perguntou Paul retoricamente.

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    “Eu sei, eu sei”, Paul pediu desculpas. “Mas eu tinha de tentar.”

    “Você vai ter que passar por isso, acho.”

    “Sim”.

    “E o que Caroline diz sobre essa ideia sua de sair?”

    “Ela ainda não sabe”, Paul desacelerou, permitindo que uma van cinza os ultrapassasse.

    “Eu não consigo achar um modo de dizer a ela. Há anos, ela me diz que seria tão bom podermos ir juntos para o trabalho. Eu não sei como dizer a ela que não vai acontecer.” 

    “Você precisa dizer.” disse Darren, ao entrarem no aeroporto internacional de Miami. “Se há uma coisaque aprendi com meu divórcio, é que deve discutir o que o incomoda o quanto antes.”

    Encostando perto do terminal de partidas, ele respondeu: “Eu sei. Eu só tenho que descobrir como.“Quando chegar o momento certo, Paul raciocinou, ele diria a Cara. Antes disso, esperava que uma soluçãoviesse a seu encontro, fazendo com que a difícil conversa fosse completamente desnecessária.

    “E se você acabar deixando a empresa,” Darren disse ao abrir a porta do carro para poder sair, “metelefone. Você sabe que eu valorizo seu talento.” 

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    Capítulo 4

    Paul estava escovando os dentes, quando seu celular tocou. Caroline se esticou toda na cama king-size até a cabeceira e atendeu.

    “Oh, entendo”, disse ela, se levantou e caminhou até o banheiro. “Querido, é o alarme da empresa”.

    Ele rapidamente enxaguou a boca e pegou o telefone.“Sim?”

    “Sr. White, é a Darla do Serviço de Emergência Granbury. Um vazamento de água foi detectado nodepósito A-5 do Shopping Boca Beach.” A voz dela era quase metálica. Paul confirmou a ligação, e voltou aescovar os dentes. Um dos aspectos agravantes de ter celular era que as pessoas que monitoravam alarmesautomáticos conseguiam encontrar você em qualquer lugar, a qualquer momento.

    Ele vestia uma calça cinza quando o celular tocou novamente.

    “Bom dia, Ted,” Paul cumprimentou alegremente seu gerente de loja. “Tudo pronto na loja para achegada da nova coleção?”

    “Sim, mas temos um grande problema. Um problemão.” O sorriso de Paul desapareceu com a respostade Ted. “Um cano estourou no teto do depósito. Tem água por toda parte. Eles acab aram de fechar os canosprincipais, então poderei de entrar e ver num minuto.”

    “De quanta água estamos falando?” Paul perguntou, e sentou-se para calçar as meias e os sapatos.

    “Eu não tenho ideia, mas um bocado. Não sei a extensão dos estragos ainda, mas   ouvi o John daLivraria Kaffee dizer que todo o seu estoque foi destruído”.

    “Eu estou a caminho.”

    Paul contou a situação para Caroline, pediu a ela que se desculpasse com os filhos por não estar nocafé da manhã, e saiu correndo pela porta, com o paletó e a gravata na mão.

    No caminho para a I-95, Paul ligou para o seu gerente de andar.

    “Ted, me conte rápido o que aconteceu.”

    “Parece que a maioria das caixas não foi atingida”, informou Ted, e Paul suspirou aliviado. “Estamoslevando todas as caixas que foram danificadas para cima.”

    “Quando todas estiverem lá em cima, peça a uns funcionários que procurem nas caixas o que pode s errecuperado, mas continuem carregando o restante das caixas,” exigiu Paul. “A umidade e os odores podemfacilmente penetrar nos tecidos.”

    “Se eu colocá-las no estacionamento?”

    Paul tomou uma decisão rápida enquanto entrava na interestadual. “Não, coloque tudo dentro da loja.Ligue-me em meia hora e me atualize.”

    Seu jipe nunca andara tão rápido antes.

    Na sexta tentativa, em algum lugar perto de Aventura, Paul finalmente conseguiu falar com o

    administrador do shopping. “Raul, é o Paul da Hannah’s Shop.  Eu estou indo para o shopping. Como está asituação?”

    “Paul, não posso falar agora. Não se preocupe, está tudo sob controle. Nosso empreiteiro já está aqui,e dentro de três ou quatro dias, tenho certeza de que tudo voltará ao normal. “Raul desligou ante s que Paulpudesse fazer mais perguntas.

    Quando Paul se aproximava de Deerfield Beach, Ted ligou.

    “Sim, Ted.”

    “Esvaziamos todas as caixas que foram danificadas e estamos verificando as mercadorias”, disse ele.“Mike e Isabella acabaram de chegar, então começamos a trazer o resto das caixas, como você pediu.”  

    “Obrigado, Ted. Eu estarei aí em uns dez minutos.”

    Paul agradeceu por seu subordinado mais responsável ter chegado cedo naquela manhã.É sempre bom saber que você pode confiar em alguém.

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    Encostando na vaga reservada, Paul não pôde deixar de ver as pilhas de livros molhados e caixas desapato no estacionamento. Droga, pensou ele, quanto prejuízo!

    Kadence, a proprietária da Livraria Kaffee, estava parada, estupefata, em sua doca de carga.

     A visão era assustadora, e Paul começou a temer que Ted havia subestimado o verdadeiro estrago àsmercadorias de sua loja.

    Paul entrou em sua loja através da doca de carga. Ele cumprimentou um dos funcionários do andar

    que estava esperando com um carrinho de mão vazio ao lado do elevador de serviço. Passando rapidamentepor sua sala, o gerente da loja de Boca tinha que ver como a loja estava. No interior dela, abaixo de corações eflechas que comemoravam o Dia dos Namorados, um cordão humano tinha sido criado, e sua equipetrabalhava para trazer a mercadoria para dentro. Ele se aproximou de Ted que estava de pé ao lado de trêsvendedores que desembalavam e checavam as mercadorias.

    “Qual é o prejuízo?” 

    “Tivemos sorte, chefe”, o jovem respondeu. “Eu acho que a embalagem plástica protegeu a maior partedas mercadorias das caixas encharcadas de água. Mas perdemos alguns rolos de carpete de parede e umasérie de cortinas, não sabemos ainda quantas.”

    Paul ficou aliviado. Considerando a situação do seu vizinho, ele tinha realmente tido sorte. “Obrigado,Ted. Você está fazendo um grande trabalho”, disse Paul honestamente. Ele virou-se para todos os seus

    funcionários e disse: “Vocês estão indo muito bem. Eu realmente agradeço o esforço e o trabalho em equipe.Muito obrigado.”

     Ao olhar para a situação, ficou claro para Paul que a loja não abriria naquele dia. Para poder abriramanhã, ele tinha de liberar o estoque o mais rapidamente possível.

    “Estou indo para o estoque”, disse ao homem do sul de Miami. “Preciso ver isso com meus própriosolhos.”

     A primeira coisa que Paul sentiu ao sair do elevador de serviço foi o cheiro de umidade. Muita águadeve ter danificado vários livros, sapatos e sabe-se o que mais para criar um cheiro tão forte tão rapidamente. As instalações do depósito no subsolo do shopping tinham um sistema de ventilação tão antigo quanto osvisitantes mais frequentes do shopping. Se não secasse logo, o andar todo ia ficar cheirando a mofo.

    O piso cinza ainda estava molhado, então, Paul teve de pisar com cuidado para chegar a seu estoque.

     As portas duplas foram abertas para ventilar, e ele viu uma rachadura no teto, de onde a água ainda pingava.Ele olhou para as estantes de unidades industriais que geralmente continham as inúmeras caixas de mais de2.000 diferentes itens, as SKUs, que sua loja vendia. A água havia atingido quatro prateleiras, então ele tinhatido muita sorte de tão poucos danos terem ocorrido. Ele agradeceu aos deuses da cobertura plástica e daembalagem a vácuo.

    Ele passou a olhar para o estoque de Kadence, ao lado do dele. O lugar estava uma bagunça. Umagrande parte do teto tinha desabado, e se via a rachadura nas tubulações antigas. Grandes blocos de gessodecoravam o chão, em meio a páginas ensopadas, capas de livro e cartões em forma de coração molhados.

    No meio do depósito estava um homem de meia-idade com um tufo de cabelos pretos, usando ummacacão de trabalho que dizia: “Encanamentos Al” em letras amarelas nas costas. Ele estava dando ordens aum jovem que parecia ter medo de sua própria sombra.

    “Então, qual é o veredicto?” Paul perguntou ao encanador.“A combinação mortal de tubulações antigas e o frio repentino da noite passada,” foi a resposta.

    “Tivemos um caso como este em Palm Beach no ano passado.”

    “Eu sou do estoque A-5 ao lado. Quanto tempo até eu poder guardar minha mercadoria de volta noestoque?”

     Al coçou a testa com um lápis, e deu um passo para a direita, como se a iluminação lá fosse melhor.“Seis, talvez sete semanas”.

    “Você quer dizer dias, não é?” disse Paul, demonstrando seu choque.

    “Não há como demorar menos do que isso”, relatou o encanador. “Eu tenho que abrir o teto da seçãointeira, substituir as tubulações principais, e fechá-lo como estava. Como se não bastasse, o sistema todo é tão

    velho, que nem sei se consigo encontrar as juntas que se encaixem. Há uma boa chance de termos desubstituir todo o sistema. E eu não posso me responsabilizar por nada deixado aqui até terminarmos otrabalho.”

    “Não há como concluí-lo antes?” Paul estava profundamente preocupado.

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    “Não”, respondeu Al, e depois acrescentou, “Ainda estou no meio de três outros projetos. Larguei tudopara vir para cá, e Deus sabe quais outras situações de emergência aparecerão antes de terminar estetrabalho”.

    “Mas quinta-feira é Dia dos Namorados!” disse Paul desesperadamente. “Preciso do estoquefuncionando!”

    “Ah, obrigado por me lembrar”, disse o encanador. “Eu preciso mesmo comprar umas rosas para a

    minha esposa.” Paul desceu as escadas, furioso, e entrou no escritório do administrador do shopping, só para

    encontrar outros três gerentes da loja gritando com Raul.

    “Eu não tenho mais espaço!” alegou, Raul, em desespero. “A Livraria Kaffee e a Loja de SapatosEleganz foram mais atingidas, então lhes dei as duas áreas que tinha.”

    “E o que você está fazendo para resolver a situação?” gritava Jimenez, o gerente da loja de ferragens.

    “Estamos consertando as tubulações. É só o que posso fazer. O seguro vai cobrir eventuais danos.Vocês não têm com que se preocupar.” O administrador bigodudo do shopping parecia estar recitando ummanual.

    “Não se trata só dos estragos”, insistiu, Paul agitando os braços. “Estamos quase no Dia dosNamorados – Eu não posso me dar ao luxo de perder vendas!”

    “Não há nada que eu possa fazer a respeito”, disse Raul. “Mas todos os danos serão cobertos.Quaisquer danos.”

    Paul deixou a sala de Raul frustrado. Nenhuma solução fora oferecida e ele teria que abrir a loja, senão hoje, mais tardar amanhã. Mas o que ele podia fazer com o seu estoque? Onde ele o colocaria? Um localde armazenamento alternativo teria de ser encontrado imediatamente.

    Voltando à Hannah’s Shop, desta vez pela porta da frente, ele ficou surpreso com o número de caixasque enchia os corredores até o fundo.

    Todo o pessoal estava ocupado. Alguns desembalavam caixas danificadas, alguns verificavammercadorias, e outros enxugavam as mercadorias revestidas de plástico. Até sua secretária Alva estavacoberta de toalhas.

    Ele entrou em sua sala, abriu as páginas amarelas e começou a ligar para armazéns próximos.“Você precisa de espaço de armazenamento hoje? Bem, tenho certeza de que podemos entrar num

    acordo. O que acha de R$ 250 o metro quadrado?”

    Três minutos mais tarde, “Sinto muito, mas acabamos de alugar o último espaço que tínhamos. Pareceque teremos vaga daqui a duas semanas. Quer fazer uma reserva?”

    O último da lista dizia: “O que você quer? Esse é o preço em Boca. Você quer algo mais barato? Eutenho vaga em Delray Beach.”

    Paul baixou a cabeça em desespero. Parecia que ele não teria outra opção senão pagar um preçoexorbitante, a fim de manter a loja aberta. E isso significava quase nenhum lucro até que os tubos fossemconsertados, e não havia como prever quando seria. Esta foi a gota, agora não havia maneira de melhorar odesempenho da loja e justificar a sua promoção. Seu cargo na Hannah’s Shop logo viraria fumaça.

    Neste momento, Ted entrou correndo.

    “Chefe, pode vir à doca de carga? O caminhão chegou com a nova coleção”.

    “Essa não!” Paul tinha esquecido completamente da remessa. Ele havia pensado em usar a manhãpara substituir o display, mas ao invés disso eles ficaram envolvidos numa emergência. Ele correu para fora eviu o motorista do caminhão descarregando paletes de mercadoria.

    “Não, não, não!” gritou Paul. “Você não pode descarregar isso - não está vendo – não temos lugar paracolocar tudo isso!”

    “Eu só faço o que me mandaram”, disse o motorista. “Eu vou deixar essa coisa aqui.”

    “Não descarregue mais nada. Pare, por favor”, implorou Paul. “Espere, vou ligar para seu patrão”.

    Ele pegou o celular e ligou para o depósito regional.“Rog, é Paul, estou com uma emergência aqui.” Paul contou a situação para Roger, e perguntou se o

    motorista podia levar de volta a nova remessa.

    “Claro, Paul. Deixe-me falar com ele.”

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     A sala do gerente da filial da Hannah’s Shop de Boca Raton tinha sido mobiliada de acordo com opadrão da rede: uma mesa marrom clara média, atrás da qual havia uma cadeira de encosto alto, um quadrobranco de um lado, uma estante na frente dele e sete cadeiras de metal com assento acolchoado marrom. Aúltima tinha sido desdobrada, e lá estavam os seis chefes de departamento e o gerente da loja.

    Diante de seus empregados, Paul White sentou-se na cadeira alta, e suas feições mostravamdistintamente seu descontentamento. Em sua mesa estavam as listas dos itens a serem enviados para odepósito que eles tinham compilado. As listas estavam ridiculamente curtas. Paul calculou que todas as listas

    combinadas representavam menos de um quarto do inventário que tinha sido trazido do estoque.“Gente, não é isso”, ele começou, segurando sua  frustração. “Obviamente, eu não me expliquei

    corretamente. Nós não temos espaço para todas as mercadorias. Mantenham apenas o estritamentenecessário.” 

    “O que quer que eu faça?” argumentou Isabella. “Eu não posso ficar sem meus produtos. Se eu enviá -los, o que vou vender?”

    “Isabella”, disse Paul com veemência, “mesmo se lotar as prateleiras e os compartimentos superioresde armazenamento que tem em seu departamento, você não poderá espremer tudo lá dentro”.

    “Eu pensei em manter alguns deles na cozinha, e talvez alguns mais no corredor,” tentou ela.

    “Eu preciso do corredor para meus carpetes”, afirmou Javier, sua voz grave quase melódica. “É o único

    lugar que vão caber!”“Ei! Usar a cozinha foi ideia minha”, Mike se levantou e enfiou o dedo no próprio peito. “Eu vou colocar

    as minhas coisas lá primeiro!”

    “Silêncio!” Paul levantou a voz. “E sente-se, Mike. Ninguém vai usar a cozinha, e nada seráarmazenado no corredor. Se o fizéssemos, ficaria tão lotado, que não seria nem capaz de chegar às caixas.”

    Como ninguém respondeu, ele continuou. “O depósito concordou em enviar -nos tudo o que quisermostodo dia. Vou frisar novamente. Por causa da nossa crise, e enquanto não pudermos usar nosso depósito,Roger, nosso gerente do depósito regional comprometeu-se a enviar todo dia o que precisamos de nossosestoques. Então, necessitamos manter apenas o que esperamos vender imediatamente. Não há necessidadede manter montanhas de inventário na loja por ora.”

    “O que quer dizer com 'o que esperamos vender imediatamente?” Perguntou Fran, desconfiada.

    Paul teve de pensar por um momento antes de responder. “O que pedirmos durante o dia,receberemos na manhã seguinte. Então, na verdade, precisamos manter apenas o que esperamos vender emum dia.”

    Mike jogou as mãos para cima, “Eu não faço a mínima do que vou vender hoje.”

    “Hoje nós não vamos vender nada”, disse Ted amargamente. Voltando a Paul, ele continuou. “Euposso imprimir a média de vendas diárias de cada SKU. Eu não acredito que é isso que você quer deixar naloja?”

     Antes que Paul pudesse responder, Mike explodiu: “As médias são uma piada. Um dia não vendenada, no seguinte, um milhão. Se eu não tiver mercadoria suficiente, eu não poderei vendê-la, no dia bom. Semantiver as médias, as vendas desta loja irão pelo ralo, com certeza.”

    Os outros gerentes concordaram. Maria, que dirigia o departamento de banho, gritou: “Na maioria dosdias eu não vendo nem mesmo uma única toalha de banho grande, mas uma vez eu vendi quarenta num dia!”

    “Quarenta?” Paul ficou espantado. “Isso é muito distante da sua média diária. Quantas vezes issoacontece? Quantas vezes vende vinte delas num dia?”

    “Aconteceu uma vez, há cerca de um ano, mas isso pode acontecer novamente a qualquer momento”,disse ela defensivamente. Mesmo sendo Maria a menor funcionária, suas opiniões eram sempre expressasbem alto.

    “Você não pode agir com base em algo que acontece uma vez na vida” Paul foi firme. “Isso ésubmeter-se à histeria”.

    O debate continuou por um longo tempo. Finalmente, os gerentes de departamento pressionaram Paula fechar um acordo para manter, de cada SKU, um montante igual a vinte vezes a média diária de vendas. No

    entender de Paul, a histeria tinha vencido o debate, mas faltava-lhe forças para continuar discutindo. Ele nãocomera algo desde que tinha acordado nessa manhã e agora estava pagando o preço.

    Os gerentes de departamento saíram, mas Ted ficou. “Não tem algo a fazer? “disse Paul. “Eles estãoesperando que você imprima a média diária de vendas.”

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    “Imediatamente, chefe, mas eu tenho só uma pergunta. O depósito sempre nos envia caixas inteiras,mas você fala em pedir itens individuais. Será que vão fazer isso por nós? Eles são mesmo capazes de fazerisso?”

    Lembrando-se mais uma vez de não subestimar seu gerente de loja, Paul disse: “Você está certo, nãopensei nisso. Vou verificar com o Roger, e ver o que pode ser feito. Enquanto isso, vá gerar as listas. Nossascaixas devem estar prontas para ser retiradas.”

    Quando Ted deixou sua sala, Paul tomou um longo fôlego e ligou para Roger novamente.

    “Desculpe incomodá-lo, Rog. Eu sei que fez de tudo para me ajudar, e sou muito grato por sua oferta.”Paul pigarreou, pouco à vontade. “Mas tenho outro problema. Eu não posso mais receber caixas inteiras deprodutos.”

    “Sim, eu sei. Eu já pensei nisso”, disse Roger, surpreendendo seu amigo.

    “É claro que se eu enviar -lhe uma caixa cada vez que você pedir um item, logo, logo, você vai ter seuinventário inteirinho de volta na loja. Eu discuti isso com o meu pessoal. É uma verdadeira dor de cabeça paranós, mas encontramos uma maneira de resolver. Iremos enviar-lhe unidades individuais, conforme nos pedir”.

    “Devo-lhe um favor enorme, Rog.”

    “Muito mais do que um”, e o riso de Roger fez Paul sorrir. “Para começar, você leva as meninas ao balétanto este domingo quanto no próximo.”

    “Fechado”.

    *****************************************************************************

    Maria bateu à porta de Paul.

    “Entre”.

    “Chefe, estamos começando a fazer o que você disse,” a baixinha informou a ele.

    “Enviar tudo acima de vinte dias significa que mandamos para o depósito não apenas o que tínhamosem estoque, mas também muitas mercadorias que estão dispostas na loja. Você estava ciente disto, ou seráque entendemos mal o que nos mandou fazer?”

    “Eu sei que algumas coisas que estavam na loja têm de ser enviadas.”

     A resposta de Paul poderia ter sido dita num tom mais suave.

    “Chefe”, insistiu Maria, com as mãos nos quadris. “Não são algumas coisas. Metade das prateleirasficará vazia.”

    Ele passou os números pela cabeça. A loja mantinha cerca de quatro meses de inventário, metadearmazenado no subsolo. Assim, manter apenas vinte dias significa manter menos da metade do que tinham naloja no momento. Maria tinha razão, e prateleiras vagas estavam longe de ser o que ele tinha em mente. Noentanto, depois de tanto discutir que vinte dias era algo histérico, ele não pretendia reabrir essa discussão. Emtodo caso, até que o estoque estivesse de novo funcionando, Roger enviaria o que Paul solicitassediariamente. Por isso, realmente não era necessário manter nem mesmo um mês de inventário.

    “Atenham-se ao plano”, disse ele com firmeza. “Nós concordamos em manter apenas vinte vezes amédia de vendas diárias, então que seja. Tudo o que sobrar, espalhem bem nas prateleiras para deixar a lojacom uma cara decente.”

    “Ok, você é quem manda.”

    Poucos segundos depois que ela saiu, Paul ouviu Maria dizer a Ted na cozinha algo que soava como“el jefe es loco”, e enquanto seu leal gerente de loja tentava acalmar Maria, Paul torcia para ela estar errada.

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    Capítulo 5

     As luzes no grande edifício do centro de Miami, que abrigava a matriz da Hannah’s Shop estavamsendo apagadas, uma a uma, como se o prédio fosse fechando os olhos com o cair da noite. Andando pelocorredor do andar superior, Caroline sentiu o vazio, e desejou estar em casa com o marido e os filhos. Se o paidela conseguisse seu intento, e a nomeasse presidente, ela teria que se acostumar com este sentimento.

    Espiando através das pesadas portas duplas da sala de Henry, ela o viu estudando um relatório de capa verde.Bateu

    baixinho, para não assustá-lo.

    “Papai, você tem um minuto?”

    “Não, mas vou ouvi-la de qualquer maneira,” o homem careca sorriu, pousando o relatório em suagrande mesa. Os tons vermelhos e castanhos que compunham sua sala complementavam bem sua presença.

    “Você ouviu falar do Leon’s?” perguntou Caroline enquanto se sentava numa cadeira de mogno emfrente de Henry. Leon’s era um fabricante de jogos de cama com base na Geórgia.

    “Eu soube que estão com problemas, nada mais.”

    “Eu falei recentemente com Jason Hodge, o mais jovem da família”, relatou ela. “Parece que ele e os

    irmãos decidiram não colocar mais dinheiro na empresa.”“É uma pena. Eu conheci Leon há muitos anos. Ele jamais teria permitido que isso acontecesse, que

    Deus o tenha”, comentou Henry, e emitiu um suspiro. Leon Hodge não tinha resistido a um ataque cardíacodois anos antes. “Você sabe, querida, que quando comecei, tudo que compramos era feito nos EUA. Agora,quase nada é. Bem, lá se vai outro.”

    “É muito cedo para descartá-los”, opôs-se Caroline. “Leon é uma boa empresa. Com sua excelentequalidade e design, é provável que eles continuem a operar sob nova direção.”

    Henry acenou com a mão: “Quem compraria um poço sem fundo hoje?”

    “Talvez nós?”

    Henry estreitou os olhos, “Conte-me mais, menina.”

    Caroline sorriu. Desde que ela era pequena, seu pai a chamava de “minha menina quando elaconseguia surpreendê-lo positivamente. Ela foi para o lado dele da mesa e os dedos dançaram sobre oteclado. “Aqui estão os demonstrativos financeiros da Leon’s durante os últimos cinco anos”.

    “Então, você fez sua lição de casa”, disse Henry aparentemente satisfeito. “De onde conseguiu isso?”

    “De Jason,” respondeu Caroline secamente e voltou a se sentar, esperando que seu pai examinasse osdocumentos. Seus olhos percorreram a tela, e quando pararam, ele perguntou: “Como é que as vendas sedeterioraram tanto, tão rapidamente?”

    “Conheço os irmãos Hodge desde que era pequena, nunca se deram bem. Ao encontrar com eles n oano passado, eu sei que isso não se alterou. Desde que o velho morreu, gastam mais tempo em lutas pelopoder, em quem é responsável pelo quê, do que em comandar seus negócios. Quando peço uma cotação,acredita que os três irmãos têm que aprovar qualquer proposta? Tudo demora uma eternidade, está ficando

    impossível trabalhar com eles.”Este era o pior pesadelo de qualquer um que fundasse a sua própria empresa, supôs Henry, que seus

    próprios filhos reduzissem a escombros tudo o que havia construído.

    Pelo menos com Caroline ele não tinha medo disso. Balançou a cabeça enquanto Caroline continuava.

    “Pai, eu acho que temos uma grande oportunidade aqui. Eu acho que podemos facilmente transformara Leon’s, quase imediatamente, em um ativo lucrativo para nós”. 

    “Como?” Henry a incentivou a continuar.

    Caroline estava bem preparada. Com confiança, ela respondeu: “Nós somos o seu maior cliente,constituímos quarenta% das vendas deles. Mas para nós, eles são um fornecedor relativamente pequeno.Menos de seis% dos nossos produtos de cama são da Leon’s. Se nós dobrarmos as aquisições deles, mesmose eu abaixar nosso preço de compra em 5%, isso os deixará no azul. Abra o outro documento na pasta paraver os cálculos.”

    “Não há necessidade”, Henry tirou a mão do mouse, e virou a tela para fora. “Com margens brutas dequarenta%, é óbvio que esse aumento nas vendas vai resolver os seus problemas financeiros. Mas, minhamenina, e a velha regra “atenha-se ao que você sabe, pura e simplesmente? Nós vendemos produtos têxteis,

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    não os fabricamos. Nós realmente não sabemos muito sobre o complicado processo de concepção deprodutos, sem mencionar os de produção.”

    “Nós não, mas Jason sabe.” respondeu Caroline com firmeza. “Ele cresceu no ramo, e seu pai otreinou bem.”

    “Tenho certeza de que sim. Então você já discutiu o assunto com ele, e...?” O pai dela levantou umasobrancelha.

    “E ele está não apenas disposto, mas realmente ansioso para continuar como presidente da Leon’s.Desde que, claro, seus irmãos fiquem de fora. Eu acho que por um salário razoável e bônus modestos,podemos contratá-lo por cinco anos.”

    “Você cobriu bem este aspecto, mas por que está tão confiante de que podemos, na atual base, vendero dobro da quantidade atual? Eu odiaria ficar com mais excedentes do que conseguimos escoar através denossos pontos de venda.”

    Caroline parou por um momento e depois disse: “Se eu estivesse absolutamente certa de que nãohavia problema para vendê-los, eu teria dobrado as quantidades há muito tempo. É aqui que preciso da suaajuda, papai. Você tem que me ajudar a convencer Christopher a dar a esses produtos uma visualização maiore melhor dentro de nossas lojas.”

    “Hmm...” foi a resposta. “E quem vai fiscalizar essa empresa? Para quem Jason prestará contas? Eles

    são muito pequenos para prestarem contas diretamente ao presidente”, comentou Henry.“Eu não pensei nisso”, admitiu Caroline. “Jason pode falar com o vice -presidente executivo de

    Operações ou o de Compras. Estou disposta a assumir o encargo suplementar.”

    “Não seria algo que a distrairia? Não se apresse em responder. Leve em 

    conta que você teria que conhecer a empresa dentro e por fora. Seria você que lutaria pelosinvestimentos adicionais de que precisarão. E que garantiria que eles tenham a estratégia certa decrescimento. Caroline, você acha que deve dedicar tanto tempo a algo que representa cerca de 10% deapenas uma família de produtos dentre tantos outros?

    Tenha em mente que o foco da Leon’s não deve apenas ser o que interessa à Hannah’s Shop. Nãodeve depender de nós como seu único cliente.”

    “Por que não?” atacou sua  filha. “Não é hora de a Hannah’s Shop passar a ter produtos de marcaprópria? Muitas redes têm seus próprios produtos sobre os quais ganham margens maiores. Eu verifiquei, esim, há casos em que as redes perderam dinheiro em tais empreendimentos, mas na maioria dos casosaumentaram a rentabilidade.

    Você não acha que agora que a concorrência está mais acirrada do que nunca, devíamos começar aexplorar isso?” 

    O presidente da maior rede de artigos de cama, mesa e banho do sudeste do país se inclinou paratrás, meditativo, e pôs as mãos atrás da cabeça.

    Esta falta de resposta provocou Caroline a declarar: “Estou convencida de que devemos agarrar estaoportunidade e comprar imediatamente a Leon’s.”

    Henry conhecia o temperamento da filha. Ele sabia que o melhor

    remédio seria paciência e moderação. Como futura presidente da empresa, havia algumas coisas queela teria que reconhecer e absorver. Assim, após um tempo, ele disse calmamente: “Filha, me ouça. Eu achoque você tem o instinto assassino que todo bom empresário tem que ter. Também aprendeu a preparar umdiscurso persuasivo e ampliá-lo com sua capacidade de pensar por si. Você acabou de demonstrar isso - meconvenceu de que é hora de reexaminar a nossa política quanto a ter nossa própria marca de produtos. E euconcordo que a Leon’s é uma boa empresa que tem os produtos certos, e que podemos facilmente transformá -la num ativo bom. Mas...”

    “Mas sua decisão é que não compraremos a Leon’s”, completou Caroline.

    “Correto”.

    “Por quê?”, perguntou ela, num tom de derrota. Toda a preparação dela tinha sido descartada com umapalavra dele. Ela podia sentir o ar saindo de seu balão.

    “Pense sobre o que acabamos de discutir. Adquirir a Leon’s só faz sentido dentro de uma estratégiamais ampla de desenvolvimento de nossos produtos de marca própria. Mas essa estratégia nos obriga a darrespostas a muitas questões importantes. Primeiro, temos de cuidar para que não se crie confusão nastrincheiras, confusão que acabará por se voltar para nós como conflitos que consumirão nosso tempo eatenção. Portanto, temos que determinar as diretrizes da divisão de displays entre os produtos da marca e dos

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    produtos normais. E temos que decidir a estrutura organizacional; não é uma questão trivial, como vocêcertamente notou.” 

    “Isso não deve demorar muito”, foi a resposta de Caroline. Se essa foi a base para as objeções dele àideia, talvez ela ainda o fizesse mudar de ideia.

    Henry ignorou seu comentário e continuou. “Há mais do que uma maneira de obtermos produtos damarca. Se quisermos evitar erros e tropeços, temos que construir os critérios para a aquisição de produtos da

    marca; sob quais condições deveríamos comprar da empresa produtora, quando fornecer a concepção eterceirizar a produção, e quando pedir exclusividade para os produtos que levam o nosso nome”.

     A sabedoria do ponto de vista de Henrique começou a se infiltrar em Caroline.

    Ele respirou profundamente e continuou. “E ainda temos de decidir o ritmo de implementação, incluindoum plano de investimento detalhado. O cuidado ao tomar decisões sobre todas estas questões é a chave parao sucesso ou fracasso. Chegar a decisões prudentes leva tempo. Caroline, eu aprendi errando que não souJohn Wayne. Quando atiro da cintura, em geral acerto meu próprio pé”.

    Caroline podia perceber claramente o mérito nestas palavras. Ainda assim, ela se sentia obrigada adizer: “Mas quando conseguirmos fazer todas essas coisas, a Leon’s já terá sido vendida. Nós vamos perderesta oportunidade de ouro, e essa oportunidade é rara. Não deveríamos adquirir a Leon’s e depois fazer todo ometiculoso planejamento estratégico? Nós aprenderemos muito com um piloto.”

    “Caroline, por favor, me escute.” Henry esperou até que seus olhos se encontrassem. “A diretriz maisimportante para um presidente é a de nunca embarcar numa nova direção estratégica como resultado de umaoportunidade específica, não importa quão única e promissora a oportunidade possa parecer. Oportunidadesvão e vêm. Permitir que elas gerem impacto sobre a estratégia garante que o resultado será uma estratégia emzigue-zague. E a certeza de que mais cedo ou mais tarde, a empresa irá em zigue-zague contra uma paredede tijolos.” Henry inclinou-se suavemente e acariciou a mão de Caroline. “Filha, esta é a lição mais importanteque posso lhe ensinar. Você deve aprender a controlar seus instintos. Não se deixe distrair por oportunidadesde ouro; muitas vezes elas são armadilhas douradas.”

    Imersa em pensamentos, Caroline levantou-se, “Meus anos nas Compras me condicionaram a agarraras oportunidades. É isso exatamente o que eu faço, dia após dia. É o que me faz uma boa gerente decompras. É isso que sou, e ponto final. Eu não acredito que possa fazer uma mudança tão profunda. Papai,você acabou de me convencer que eu simplesmente sou inadequada par a ocupar sua cadeira.”

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    Capítulo 6

    “Paul, nós temos um problema. Sua loja está nos deixando loucos.”

     A ligação de Roger veio apenas quatro dias após o estouro dos encanamentos, e Paul, com o telefonena mão, sentiu seus temores se materializarem.

    “Eu sabia”, disse ele. “Abrir caixas para pegar um item simplesmente não podia dar certo.”“Não é esse o problema”, respondeu Roger. “São os telefonemas constantes. Eu tenho de dirigir um

    depósito regional, e não uma lanchonete fast food. Preciso que meu pessoal trabalhe, e não só fiquerecebendo pedidos do seu a cada vinte minutos.”

    Paul pensou por um minuto. Cada um de seus seis gerentes de departamento ligando pelo menos umavez a cada duas horas: não era surpresa que isso criasse uma confusão no depós ito. “Sinto muito”, disse ele,desculpando-se. “Eu vou cuidar para que cada gerente de departamento apresente uma lista para o depósitouma vez por dia.”

    “Não, Paul, uma lista só. É porque providencio sua remessa apenas uma vez por dia, no final do dia”,explicou Roger. Ele acreditava firmemente que qualquer complicação, não importa quão pequena, sempredaria problemas. “A coisa mais simples seria se você me enviar uma lista combinada por e-mail no final do dia.”

    “Combinado, Rog. Obrigado por tudo novamente.”“Espere, esquecemos alguma coisa”, disse o gerente de depósito. “Lembra que recebi de volta sua

    nova coleção? Bem, sei que você não tem espaço para tudo isso. Mas você precisa dessa mercadoria. Quantodisso devo enviar para você?”

    “Pode me enviar vinte dias de cada SKU?”, pediu ele. 

    “Como vou saber o que isso significa?” Roger riu. Como todos os

    gerentes de loja, pensou ele, Paul via as coisas de uma única direção  – a da de gerente de loja. “Vocêtem que ser um pouco mais específico do que isso.”

    Paul percebeu que não havia realmente como Roger saber quais eram suas vendas diárias. Ele fez umcálculo rápido. “Mande-me um décimo dos pedidos originais.”

    “No problemo, compadre.”“Obrigado, Rog. E obrigado por ter comentado.”

    *****************************************************************************

    Paul sentou em sua sala, revisou as listas que os chefes de departamento tinham feito, antes de enviara Roger. Ele não conseguia entender essas listas.

    Não havia correlação entre os montantes necessários para um futuro imediato e o que os chefes dedepartamento haviam apresentado. Se ele aprovasse tudo, a loja em breve ficaria inundada de caixas demercadoria novamente. Ele entrou no sistema de alto-falantes e chamou os chefes de departamento a suasala.

    “Eu estava olhando a lista que apresentaram, e gostaria de saber como a produziram.” Paul virou -separa o experiente gerente do departamento de artigos de cozinha, “Vamos começar com você, Mike. Aquantidade que pediu fará os estoques ultrapassarem a marca de vinte dias.”

    “Mas há coisas que eu nem pedi”, explicou Mike. “No final, uma coisa compensa a outra.” 

    “Isso não explica como decidiu o que pedir, nem quanto”, observou Paul.

    “Bem, eu olhei para as prateleiras, e parece que há muito espaço, por is so estou pedindo parapreenchê-las”, respondeu ele com sinceridade.

    “Ah, entendi”, respondeu Paul. Começando a se sentir incomodado, ele se voltou para a mulher deóculos, sentada ao lado de Mike. “Janine, são muitas toalhas de mesa”, disse ele. Ela pedir a vinte de cada deum arco-íris de toalhas de mesa, apesar de a maioria das cores

    ser vendida a uma taxa de um item por dia.“Hoje, as toalhas de mesa vermelhas estavam saindo como água, e eu queria garantir que não ficaria

    sem elas amanhã”, disse ela.

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    “Fico feliz em saber que a vermelha está vendendo bem. Mas como estão as outras cores?”, perguntouele.

    “Vendi três toalhas azuis e duas verdes”, respondeu ela. “Eu só quero me garantir para não ficar semnenhuma delas.” 

    “Mas de cada uma, ainda tem cerca de vinte unidades. Por que você pediu tantas a mais? Qual é alógica disso?”

    Ele dispensou a resposta dela com impaciência e virou-se para Fran. A dela era de longe a menor lista,e seus números não tinham sido arredondados para cima. Três de um item, seis de outro.

    “Como você chegou a estes números?”

    “Eu contei quanto ainda tinha, e subtraí dos números de vinte dias.”

    “Você é um anjo de ordem neste caos”, elogiou Paul. “Este é modo certo de trabalhar. Eu quero quetodos façam o que ela fez.”

    “Paul, você não espera que eu faça isso todos os dias, né?” Fran estava irritada. “Levei quase duashoras! É tempo sem atender os clientes, também!”

    “Isso significa uma contagem geral do inventário?”, perguntou Javier. “Isso levaria horas!” 

    “Você vai pagar as horas extras?” Maria continuou. 

    “Desculpe por dizer isso, chefe”, disse Ted, “mas uma contagem de inventário completa todo d ia vaitomar tempo demais. Não há outra solução?”

    “Você está certo, Ted. Deve haver uma solução melhor.” disse Paul, e fez uma pausa para refletirsobre o que Fran tinha feito. Como ela tinha chegado à sua lista? Primeiro, ela tinha pego a meta de vinte dias,e depois contou seu estoque completo no final do dia, e subtraiu um do outro.

    Paul riu em voz alta para espanto do seu pessoal, quando percebeu que o que Fran tinha feito eraapenas uma forma elaborada de reconstruir as quantidades vendidas durante o dia, informação acessível aotoque de um botão.

    “Sinto muito”, desculpou-se. “Foi um longo dia, e Fran me ajudou a descobrir o que precisamos. Tudode que precisamos são as vendas diárias, que é a mercadoria que saiu da loja, e é essa mercadoria que temosde trazer do depósito. Vocês não têm mais de gerar listas para o Roger. O computador irá produzir a lista deitens vendidos a cada dia. Podem voltar ao trabalho, e obrigado por terem vindo.”

    Enquanto os outros chefes de departamento levantavam-se da desconfortável cadeira dobrável, Mariapermaneceu sentada. Ela não parecia tão feliz com o resultado.

    “Mas e as coisas que estão esgotadas e alguém pede?”, perguntou ela.

    “Há meia hora, alguém perguntou sobre roupões de banho que não temos há um tempo, e sa iu semcomprar nada.”

    Maria sempre tem que ter a última palavra!, pensou Paul consigo mesmo, mas ao invés disso, eledisse, “Bem colocado, Maria. Cada um deve fazer uma lista desses itens, e nós iremos adicioná -la ao pedidoenviado para o depósito. Nós pediremos uma quantidade equivalente a vinte dias. Está bom assim?” 

    Ele sabia que eles não conseguiriam esses itens. A loja tinha pedidos em aberto de cada um dos itens

    a que ela se referia. E se a loja não os tinha, era porque o depósito regional também não tinha. Mas para quediscutir?

    “Está bom, chefe,” Maria sorriu, refletindo o alívio de tensão na sala de Paul.

    Paul ficou feliz que dessa vez ela não tinha usado a palavra loco.

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    Capítulo 8

    Paul desceu com o elevador de serviço ao subsolo do shopping.

    Quase quatro semanas haviam se passado desde aquela manhã terrível, e ele ficou satisfeito pordescobrir que os corredores já não fediam. Raul tinha acabado de lhe informar que as últimas junções

    tinham sido encontradas, por isso o trabalho estaria concluído antes do previsto, e Paul desceu correndo asescadas para ver se conseguia uma data para levar sua mercadoria de volta.

     Ao entrar no estoque, viu que as novas tubulações no teto estavam intactas, mas ainda não rebocadas. Ao ouvir o barulho da obra do depósito vizinho, ele espiou lá dentro “Estamos indo bem ou não?” gritou Al, oencanador.

    “Está maravilhoso, maravilhoso”, respondeu Paul e deu um tapinha nas costas do homenzinho. “Vocêtem ideia de quando posso trazer as minhas coisas para cá?

    “Só mais uma semana, no máximo”, foi a resposta. “Temos que fazer um teste amanhã cedo. Tenhoque verificar se está tudo à prova d'água, e ainda temos de rebocar tudo. Fale comigo amanhã à tarde, queterei uma ideia melhor.”

    Paul agradeceu efusivamente. Ele ficou aliviado ao saber que em breve as coisas voltariam ao normal.

    *****************************************************************************

    “Papai, Rachel vai dar uma festa do pijama no aniversário neste fim de semana”. Lisa prendeu seucinto de segurança e perguntou: “Eu posso ir, né?”

    “Eu vou ter que falar com sua mãe, mas acho que tudo bem.” Como sempre nas quartas -feiras, Paultinha ido buscar sua filha na volta para casa. Quando a menina começou a enumerar os convidados, o celulardele tocou.

    “Querida, eu tenho que atender”, disse Paul. “Alô, é o Paul White”.

    “Olá, Paul, é Bob do Financeiro. Lembra de mim do piquenique da empresa?”

    “Sim, claro,” Paul tinha uma vaga ideia de um homem gordinho, com óculos de tartaruga que suava embaldes. “Bob, você está no viva-voz, e minha filha está no carro comigo”.

    “Tudo bem, Paul, tenho certeza que ela ficará feliz em saber que você ficou em primeiro lugar estemês,” relatou Bob. “Eu quis ligar para lhe dar a boa notícia. Parabéns!”

    “Excelente!” Paul reprimiu sua descrença. “Obrigado por me avisar. Tenho certeza que todos na lojaficarão felizes de saber disso amanhã.”

    “Não tem de quê, Paul,” disse o encarregado do Financeiro. “Por favor, mande lembranças a Caroline.”

    Paul encerrou a ligação educadamente. Não era a primeira vez que alguém pensava em ganhar pontospor bajular o genro do chefe.

    “Nossa, papai”, disse Lisa. “Você é o número um! Vai ganhar algum prêmio?”“Um grande beijo da minha filha”, caçoou Paul. “Mas não se anime muito, provavelmente é só um

    reajuste.” Embora as vendas da loja tenham sido melhores, recentemente, ele sabia que não havia como terficado em primeiro.

    “Reajuste?” perguntou a menina. “O que significa isso?”

    “É quando as pessoas do Financeiro fazem uma alteração em partes da empresa, sem comprar ouvender nada”, tentou explicar. Vendo seu olhar confuso no retrovisor, ele tentou outra explicação. Incapaz decriar um exemplo apropriado ao caso, contentou-se com um que, ao menos, esclareceria o conceito.

    “Por exemplo, se os preços dos imóveis sobem numa área, então o valor da propriedade da empresavai lá para cima também. E estes contadores registram-no como lucro, embora não tenha sido ganho nenhumdinheiro.”

    Visivelmente decepcionada, Lisa disse: “Então não é de verdade?”

    “Não, querida. Veja, os números da loja provavelmente voltarão ao lugar no mês que vem.” Emborafeliz por sua loja haver alcançado o primeiro lugar, Paul não estava satisfeito. Falso sucesso não era sucesso.

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    “Ah,” disse ela, mas de repente se animou. “Não importa, papai, você ganha o beijo de qualquermaneira. Principalmente se eu puder ir à festa da Rachel.” 

    *****************************************************************************

    “Mãe, sabia que os reajustes podem colocar você em primeiro lugar, mas não de verdade?” Assim que Paul e Lisa entraram pela porta da frente, Caroline desceu para encontrá-los no hall de

    entrada. Ela estava usando seu vestido de noite favorito, quase pronta para a festa beneficente a qual elesiriam nessa noite. Como ela não tinha ideia a que sua filha se referia, Caroline olhou para Paul, querapidamente pediu a sua filha para lhes dar licença e irem para o escritório.

    “Vá fazer algo produtivo”, sugeriu ele. “Como ver televisão.”

    “Pode explicar isso?” Caroline estava curiosa.

    “Bob do Financeiro ligou,” Paul largou sua pasta e começou a desatar o nó da gravata. “Ele disse que aloja ficou em primeiro na região este mês, então eu expliquei a Lisa que são apenas reajustes, e não númerosreais”. 

    “Reajustes? Que tipo de reajuste levaria sua loja ao primeiro lugar?” perguntou Carolineencaminhando-se para as escadas. “Além disso, não faz sentido. Se fossem reajustes, o Financeiro não terialigado. Eles nunca lhe dariam parabéns se você não tivesse nada a ver com isso.

    “Talvez seja exatamente o oposto. Talvez o puxa -saco do Bob quisesse que eu soubesse que devo aele meu ranking elevado. Querida, vou tomar um banho rápido e já venho.” Paul entrou no espaçoso banhei ro junto à suíte master.

    “Quanto mais eu penso nisso”, disse Caroline, seguindo-o, “mais fico convencida de que o Financeironão teve nada a ver com seu ranking. O ranking interno é algo tão sensível que o Financeiro sabe que nuncadeve brincar com ele. Querido, deve ser verdade. Deve ser algo que realmente alavancou o desempenho daloja.”

    “Tudo bem, talvez esteja certa”, admitiu Paul enquanto colocava suas roupas amarrotadas no cesto.“Realmente tive vendas muito boas este mês. Mas não tem nada a ver com igo. Você sabe que as vendas

    sempre flutuam, muitas vezes sem razão aparente.”“Tenha dó, Paul, você põe de lado rápido demais.” Caroline começou a jogar ideias, querendo

    desvendar esse mistério. “Você não lançou nada de novo? Não mudou alguma coisa?”

    “Algumas coisas mudaram para mim mesmo. Com certeza estão diferentes agora, mas só que piores”,gritou o marido de dentro da água quente. “Desde o estouro das tubulações tudo virou de ponta -cabeça. Oestoque está em obras, então toda a mercadoria é guardada fora. Com Roger me enviando mercadoriasdiariamente do regional, eu venho vivendo um dia após o outro”. 

    “Sim, eu sei”, Caroline disse, e saiu para experimentar três pares diferentes de brincos. Quando Paulsaiu do chuveiro com um roupão verde, secando os cabelos, ela continuou, “Se sua loja está indo melhor,alguma coisa deve ter mudado. Ela está operando de uma maneira estranha nessas últimas semanas. Talveztenha algo a ver com isso. Você não notou nada de positivo?”

    “Bem, as vendas estão em alta, e já que eliminei várias mercadorias, mais do que era realmentenecessário, a disposição está muito melhor. Será que a disposição tem um impacto tão grande nas vendas?”

    “Tem, sim”, respondeu Caroline à sua pergunta pseudo-retórica e se sentou para calçar os sapatos desalto. “Uma disposição mais bonita atrai muitos mais clientes para dentro da loja.”

    “Mas o número de pessoas na loja não aumentou”, Paul pegou as calças do smoking recém -passadodo cabide e começou a vesti-lo. “Eu monitorei cuidadosamente. Todo dia os caixas registram de vinte a 30%mais, mas o número de clientes que entram na loja não é diferente de antes. Acredite, depois de tantos anosempacado nessa loja, eu teria notado uma diferença”. 

     Atenta à frustração expressa nas palavras do marido, Caroline ficou ainda mais determinada a insistir,para tentar entender a inesperada conquista de Paul.

    “Então, deve ser que o aumento das vendas não é porque as pessoas entram mais na loja, mas que,

    em média, cada pessoa que entra na loja compra mais”, concluiu.

    “O que poderia causar isso?”

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    “Não sei”, sinalizou Paul, na falta de ideias, enquanto ela colocava abotoaduras nas mangas dele.

    “O que pode aumentar as vendas em vinte a trinta%?” Caroline perguntou em voz alta. “Não são osmotivos de sempre, como promoções ou coleções excepcionais. Então, o que pode ser?

    Paul terminou de endireitar a gravata. “Eu lhe disse, são apenas flutuações”.

    “Talvez”, respondeu Caroline, e entregou a seu marido o colar que ele lhe havia comprado na ocasiãodo 10º aniversário de casamento. “Pode me ajudar a pôr?”

    Com o colar colocado e de casaco, o casal desceu para o piso inferior da sua casa em Belle Meade.Lisa estava na cozinha, ajudando Juanita a preparar o jantar, e Ben estava concentrado no console de jogo noescritório. Eles interferiram em ambas as atividades para dar um beijo de despedida e de boa noite, e disserama Juanita que voltariam por volta das onze.

    Caroline pegou as chaves perto da porta de forma decidida, e ele entendeu que ela é que dirigiria. Aodar a partida, Caroline disse: “Sabe, querido, há outra coisa que aumenta as vendas. No entanto, não vejocomo isso pode explicar o seu caso.” 

    “O que é?”, perguntou Paul.

    “Todo mundo acusa as Compras pela perda de vendas; Se tivéssemos comprado o suficiente doproduto certo... ou se o tivéssemos enviado logo. Sou sempre pressionada a reduzir as faltas. Mas eu não vejocomo o comportamento estranho de sua loja pode ter reduzido isso.”

    “Nem eu, mas o engraçado é que eu tenho menos faltas, bem menos do que costumava ter,” confirmouPaul. “Mas isso não pode ser a força motriz por trás do aumento das vendas. Dois ou 3% eu até acreditaria.Mas vinte? Sem chance.”

    “Apenas dois ou 3%?” retrucou Caroline, surpresa com a resposta. “Isso vai contra todos os relatos quevocê me conta. Durante os últimos três anos sempre se queixou sobre todas as faltas que teve. Toda essacomoção foi por algo que praticamente não afeta as vendas?”

    Paul começou a falar, mas Caroline o interrompeu, e pisou com raiva o acelerador. “Não –  nãoresponda, não é só você. Toda semana eu levo gritos dos gerentes regionais, protestando por não tercomprado estoque suficiente, pressionando-me a expedir este ou aquele item. No entanto, aqui está você,alegando que isso não é realmente importante. Sem essa, José”.

    “Eu nunca disse que não é importante, claro que é”, disse Paul na defensiva, esperando que eladesacelerasse. “Dois ou 3% é muito significativo. Mas as vendas perdidas devido à escassez respondem pormais do que isso. Afinal, os itens que vendemos são intercambiáveis. As pessoas vêm querendo toalhas ecompram toalhas. Se não encontram a toalha dos sonhos, contentam-se com outra.”

    “Mas e lençóis?” desafiou ela, entrando na rampa de acesso à Route 195. “Se vou comprar lençóis, e aloja está sem os lençóis de que gosto, não só eu não compro, mas provavelmente não vou voltar a essa loja!”

    “O que está falando?” Paul repreendeu sua esposa, brincando. “Lençol é o ramo da sua família – vocênunca teve que ir a uma loja para comprá-los! Mas enfim, você é mais exigente que a maioria.”

    “Talvez seja”, rebateu ela, ainda insatisfeita com a resposta. “Mas você está perdendo todos os cliente sexigentes, e sua clientela é de senhoras exigentes de Boca. Francamente, acho que as faltas são a principalrazão para as pessoas saírem da loja de mãos abanando”.

    “Tenha dó, Cara, não perca a perspectiva”, disse Paul, vendo as luzes da rua cintilando na água. “Paracomeçar, apenas um em cada cinco clientes que entra na loja realmente realiza uma compra. E não é devido àescassez. Desafio-a a encontrar-me uma mulher atrás de um novo tapete ou jogo de cama que não visite, pelomenos, algumas lojas antes de realmente comprar.”

    O instinto de Caroline dizia aos gritos que Paul estava errado, que o impacto da escassez sobre asvendas perdidas era muito maior do que sua estimativa. Mas como provar isso a ele? Ela tentou outraabordagem. “Quantas faltas costuma ter? Ou melhor, se pegar a lista de SKUs que sua loja devia ter e fizer umlevantamento do estoque, quantos itens você não tem?”

    Paul cantarolou um pouco. “Mmmm... algo em torno de um terço e um quarto, acho eu. Sim, temosfaltas de 500 ou 600 de duas mil SKUs que minha loja devia ter. Mas querida, infelizmente, isso não é porcausa de mim ou de Roger.”

    Caroline ignorou sua tentativa de culpar as Compras. Esse não era o verdadeiro assunto em questão.

    Ela deixou uma Subaru ultrapassá-la antes de pegar a saída norte para Alton Road. “Imagino que as SKUs queestão esgotadas são as mais populares, né?”

    “Naturalmente”. 

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    Capítulo 9

    Na manhã seguinte, quando Paul entrou pela porta traseira, viu Javier e Janine tomando café nacolorida cozinha. Ele ficou imaginando se os dois estavam se vendo depois do expediente.

    “Bom dia”, ele os cumprimentou, ao passar.

    Javier o deteve. “Bom dia, chefe. Ouvi dizer que a obra lá embaixo está quase terminada. Eu acho queas coisas vão voltar ao normal em breve, certo?”

    “Sim, em mais ou menos uma semana”, disse Paul. “Obrigado pela paciência. Me diz uma coisa,apesar do caos, como foram as coisas?”

    “Eu trabalhei bastante, mas foi bom”, respondeu o gerente da seção de tapetes e carpetes.

    “E com você, Janine?” 

    “Todos os meus clientes estão sorrindo,” respondeu a loira que dirigia a seção de jogos de mesa.“Deve ser o seminário sobre o poder do pensamento positivo para o qual você nos enviou. Realmentefunciona!”

    “Parece ótimo!” Paul fez um sinal de positivo.

    Continuando na linha da conversa da noite anterior, ele perguntou: “E quantas faltas vocês têm? Querodizer, no mês passado, quantas SKUs se esgotaram?”

    “Muito menos do que o normal. Se costumava faltar coisas quase uma vez por hora, agora me faltaalgo uma vez, talvez duas vezes por dia. Sabe de uma coisa, chefe”, disse ela, animadamente, “talvez essaseja a razão para o bom clima. Encontrar o que querem em nossas prateleiras deixa os clientes maissatisfeitos”.

    “Pode ser, mas quanto isso influenciou as vendas?”

    “Claro que as pessoas compram mais quando acham o que estão procurando”, disse ela.

    “Este é o meu caso, também”, concordou Javier, com um sorriso no rosto.

    *****************************************************************************Paul usou o sistema para verificar quantas SKUs haviam aparecido na lista de faltas de janeiro. Ele,

    então, verificou como esses itens venderam em fevereiro. A renda desses itens correspondia aproximadamenteao aumento nas vendas. Obviamente, o fato de mais desses itens estarem disponíveis na loja tinha sidoresponsável pelo grande aumento das vendas.

    Ele, então, verificou a lista de faltas de fevereiro, e viu que elas tinham caído de vinte e nove para 11%.Caroline estava certa, e Janine, também. Ter menos faltas foi o principal motivo para a melhora.

    No entanto, a questão da noite anterior ainda permanecia. Como ele poderia ter menos faltas do que onormal? Além disso, se a loja estava vendendo muito mais, seria de se esperar que houvesse mais faltas, nãomenos. Ele só havia transferido seu estoque de um depósito para outro, ainda mais longe.

     A única explicação plausível era que Roger não tinha apenas enviado do lote de Paul, mas que

    também tenha aumentado as remessas do depósito regional. O velho Rog.

    Não, isso não poderia ser a explicação. Para cada uma das SKUs faltando havia um pedido em aberto;o sistema o gera quando o estoque na loja cai abaixo do nível de estoque mínimo predeterminado. Portanto, ofato de haver faltas na loja era porque não havia disponibilidade também no depósito regional. De onde é queesses itens apareceram de repente? Será que uma grande remessa especificamente com os itens faltanteschegara ao porto? Não era provável. O que estava acontecendo?

    Ele pegou o telefone.

    “Roger, bom dia.”

    “Oi, Paul, e aí?”

    “Eu estou tentando entender uma coisa”, disse Paul. “Você foi me enviando artigos do estoque geral, e

    não apenas da minha pilha?”“Isso. Você não verificou a sua l ista de pedidos especiais?”

    “Você é um amigão, Rog,” respondeu Paul. “Mas não fiz nenhum pedido especial.”

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    “De certa maneira você fez,” Roger parecia se divertir. “Quando as suas listas diárias incluem pedidosde itens que você sabe que não tem há semanas, não é um pedido especial?”

    Paul percebeu que seu amigo se referia aos itens adicionais que Maria tinha pedido para acrescentar àlista diária; itens que faltavam antes do estouro das tubulações. “Mas como é que você tinha os itensdisponíveis? Sempre que você tem no estoque, não envia imediatamente para as lojas o que elas têm emaberto?

    “Depende do que você chama de estoque”, esclareceu Roger. “Todos vocês, gerentes, e ainda mais oscontadores da matriz, ficavam no meu pé por entregar pedidos parciais. Todos alegam que sair dasquantidades pedidas bagunça o balanço do final do trimestre e do final do ano. Parece que é algo tão sério queo novo sistema não me permite enviar quantidades parciais de um pedido”.

    “Fico feliz por você ter encontrado este espaço para despejar sua raiva na contabilidade,” interveioPaul, “mas como isso se relaciona à minha pergunta?”

    “Diretamente”, respondeu Roger. “Se sua loja pede quatro caixas e eu só tenho duas, não possomandá-las para você. Portanto, os depósitos sempre acabam com as sobras, os resíduos. Não tem muitaimportância para nós, porque, por definição, um resíduo é menor do que um pedido de uma única loja, mas emrelação à quantidade diária que você está pedindo, é bastante. É de lá que esses itens vieram.”

    “Roger, muito obrigado”, disse Paul agradecido. “Por causa do que vem fazendo, tenho muito menosfaltas, e como resultado minhas vendas subiram 25% este mês.”

    “Impressionante”, disse Roger satisfeito. “Eu vou dizer ao meu pessoal que embala suas mercadoriasque o trabalho deles tem sido útil.”

    “Agradeça a eles pessoalmente por mim”, Paul encerrou. “E obrigado novamente, Roger. Para lhecompensar, da próxima vez que formos a um jogo do Heats, eu pago os ingressos.”

    “Também ganho um refrigerante?”

    Não só Caroline estava certa, refletiu Paul, mas, graças a Roger, muito mais tinha acontecido. Quandoele deixou Maria adicionar ao pedido para Roger os itens que faltavam para ela, Paul apenas esperavaconseguir um pouco de paz e tranquilidade de seus empregados. Ele tinha muito conseguido mais do que isso.Esses pedidos eram a razão de seu sucesso!

     As faltas tinham caído e as vendas subido, e Paul via claramente a ligação entre as duas. Odesempenho da loja de Boca definitivamente não era o resultado da flutuação de um mês ou de pura sorte.

    Seria este o milagre que ele tinha tanto pedido? Teria ele encontrado a forma sistemática de melhoraro desempenho de uma loja? Se este fosse o caso, então ele tinha ganhado sua programada promoção deforma justa.

    No entanto, a incerteza o incomodava. Alguma coisa não batia. Em geral, o lucro sobre as vendas naHannah’s Shop era de 6%. Portanto, quando as vendas da loja subiram um quarto, a rentabilidade devia teraumentado em 6% disso, 1,5%.

    Isto teria deixado os ínfimos 3,2% de janeiro de Paul para algo perto de 5%. Longe de Delacruz notopo, que se mantinha consistente com mais de 7%. Então, como sua loja foi do oitavo para o primeiro lugar naregião?

    Para tentar desvendar este mistério, ele pediu a Alva para ligar para o Financeiro.

    “Oi, Paul!” Bob parecia genuinamente satisfeito ao ouvir o gerente da loja de Boca.

    “Bob, posso perguntar como minha loja foi no mês passado, em comparação com o resto da região?”perguntou Paul.

    “Como eu lhe disse, a loja de Boca Raton alcançou o primeiro lugar este mês.”

    “Sim, você disse, obrigado”, disse Paul. “E em comparação? Nós fomos muito melhor que as outras?”

    “Paul, eu não me sinto bem divulgando informações sobre outras lojas”, respondeu Bob. “Todas asinformações serão incluídas no relatório que sai na próxima semana. Mas posso lhe dizer os números de seu

    desempenho. Embora não sejam definitivos, a sua loja obteve um lucro extraordinário, alcançando 17,4%. Éassim que você chegou ao primeiro lugar na rede. Nenhuma outra teve um lucro nem perto disso.”

    Paul agradeceu e desligou. O número um em toda a rede? 17.4%? Isso era absurdo. Deve sercontabilidade criativa, reajustes ou simplesmente bobagem. Talvez tivessem registrado a indenização doseguro nos livros como renda.

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    Talvez tivessem anulado o contrato de aluguel desse mês do depósito.

    Mas de uma coisa Paul tinha certeza: que esta rentabilidade não podia ser verdadeira.

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    Capítulo 10

    “Olá, querida”, Caroline disse, aparecendo na entrada de casa. Paul sempre admirara a sua energia.“Fez alguma descoberta?”

    “Descobri que deveria ouvi-la com mais frequência”, Paul confessou e deu-lhe um beijo na bochecha.“Você estava certa. O aumento das vendas não é puro acaso. Está diretamente ligado ao fato de que eu ter

    muito menos faltas. E você estava também estava certa que isso se devia à intervenção de Roger.”“Então você é o primeiro na região!” Caroline sorriu. “Eu disse que era para valer!”

    “Sim, muito”, respondeu ele cinicamente, “com 17.4% de rentabilidade”.

    “Por favor, fala sério”, respondeu Caroline.

    “Soube direto do Financeiro”, disse Paul. “Você vê o absurdo disso?”

    Paul encolheu os ombros e caminhou até a cozinha, para verificar a lasanha feita por ele. Caroline oseguiu, ansiosa.

    “Talvez tenha ouvido errado?” perguntou Caroline. “Ou talvez ele estivesse confuso, e quisesse dizer7.4?”

    Paul virou-se para ela e disse, “17.4%. Bob também disse que eu era o primeiro não apenas na região,mas de toda a rede. Ele não se confundiu. Essa brincadeira de números está me deixando louco.”

    “As pessoas do Financeiro não brinca com números, não com o ranking. Se disseram alguma coisa, éporque já verificaram,” disse sua esposa contrariada, e pegou quatro pratos do armário. 

    Paul estava cético: “Talvez sim, mas ainda parece suspeito para mim.”

    “É estranho.” Caroline admitiu, dispondo os pratos  na mesa da cozinha. “Eu já vi lojas atingiremrentabilidade de dois dígitos, mas era sempre temporário. O grande aumento das vendas em sua loja ébaseado em algo sistemático – é sustentável. Isso é algo muito diferente.”

    “Eu fiz os cálculos, querida”, explicou Paul, ao desligar o forno. O cheiro de tomate, orégano emussarela enchia a cozinha. “Com o aumento das minhas vendas, a lucratividade devia ter atingido 5%, nomáximo.”

    Dispondo os talheres e guardanapos, Caroline perguntou, “Então, de onde vieram  esses 12%, se nãodas vendas? Tenho certeza que você não cortou custos em 12%.”

    “Claro que não. Com a crise, eu fiquei tão apavorado que minhas vendas cairiam que não ousariacortar nada que pudesse comprometer ainda mais as vendas.” Paul franziu a testa , aproximando assobrancelhas. “Espere aí. Pensando bem, no mês passado não gastei um centavo a mais, apesar de minhasvendas aumentarem drasticamente.”

    “Isso é interessante”, Caroline pensou em voz alta, com os óculos nas mãos, “Eu achava que quandoas vendas subiam, havia um aumento proporcional das despesas.”

    “Não neste caso”, respondeu o marido, pondo uma luva de forno. “Eu tive vendas melhores, mas asmesmas despesas do mês anterior. Não só não utilizei os descontos para impulsionar as vendas, mas nãoanunciei tampouco usei horas extras.”

    “Então, os custos gerais foram os mesmos que em janeiro?” Caroline perguntou.

    “Com certeza.”

    “Então, você vendeu mais 28% sem aumentar um centavo aos custos gerais! exclamou ela, e seuentusiasmo apagou de sua mente os óculos que ela ainda segurava. “Isso significa que para a venda extra defevereiro, os únicos custos foram os custos básicos de aquisição! Você obteve a margem de lucro total sobreessas vendas extras como aumento no seu lucro líquido!” 

    “O custo de aquisição é de cerca de metade do preço de venda, certo?” Paul fundamentouanimadamente, com os olhos brilhando, e acenando a luva do forno. “Então, isso significa que a outra metadedas vendas extras da minha loja foi lucro puro”.

    “E metade dos 30% das vendas adicionais perfaz mais 14% de lucro que o levou ao primeiro lugar.”

    Caroline pulou feliz. “Agora vocêacredita que merece estar em primeiro?” 

    “Nossa, é de verdade”, disse Paul, espantado.

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     A calma desceu sobre a cozinha. Caroline finalmente largou os óculos. Paul tirou a lasanha do forno ecolocou-a sobre um tripé no centro da mesa, inundado pelas novas conquistas.

    Ele tinha tornado a loja realmente rentável! Tinha encontrado uma maneira muito melhor de comandaruma loja. Seu desafio agora seria garantir que isso não fosse desperdiçado; só se isso se proliferasse por todaa região, talvez pela rede inteira, sua conquista teria valor. Com estes números, ele sabia sua ascensão naempresa não teria nada a ver com estar casado com a alguém da diretoria. Não havia razão agora paradivulgar seu currículo.

    Ele beijou Caroline apaixonadamente. “Querida, toda aquela correria valeu a pena. Eu tentei apagarum incêndio, e encontrei um caminho para o sucesso.”

    “Era apenas uma questão de tempo”.

    “Obrigado, Cara,” disse Paul, “e muitos agradecimentos mais devem ir para Roger. Mas agora, em vezde lhe pedir para enviar todo o meu estoque de volta, tenho de convencê-lo a continuar com as reconstituiçõesdiárias. Indefinidamente. Isso não será fácil. Enviar-me pequena quantidades a cada dia deve estarenlouquecendo o pessoal. Eu vou ao depósito falar com ele amanhã cedo.”

    “Boa ideia,” disse ela e tirou uma salada da geladeira.

    “Crianças! O jantar está na mesa!” Paul estava ansioso para dizer a Lisa que o primeiro lugar eradefinitivamente para valer.

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    Capítulo 11

    O depósito regional consistia de mais de 7.400 metros quadrados de caixas.

    Plataforma sobre plataforma se espalhavam no comprimento e na largura, e quase alcançavam o tetode 8 metros de altura. Enquanto Paul atravessava o depósito, duas empilhadeiras passaram, cada umacarregando grandes paletes de caixas. O caminhão na área de carga estava sendo carregado por três homens

    fortes, com macacão da empresa e equipamentos de proteção.Nos fundos, depois de subir um lance de escadas estava o escritório do gerente, com vista para todos

    os processos do gigantesco complexo. Esperando no topo da escada estava o gerente do depósito afro-americano, com um olhar perplexo no rosto.

    “Então, você finalmente veio recolher suas mercadorias?” Roger brincou. “Eu posso pedir ao meusupervisor para ajudar, caso você se perca.”

    “Ha, ha”, replicou Paul. “Não é à toa que você está em boa forma –  só para chegar à sua sala, perdidois quilos.”

    “Venha, eu vou lhe servir um “chafé” da máquina”, disse Roger. “Então, o que o traz até este pântano?”

    Paul entrou no escritório com ar condicionado e tirou os papéis nos quais ele e Caroline tinham

    trabalhado na noite anter ior. “Acontece que a melhor coisa que aconteceu para mim recentemente foi esseestouro do encanamento. Eu lhe disse que minhas vendas melhoraram, só não havia percebido o impacto total. Agora estou em primeiro lugar na rede!”

    Roger assobiou em reconhecimento.

    “Olhe para estes números”, salientou Paul. “Mostram o quanto as faltas caíram por sua causa, Rog. Eolha aqui, isso mostra apenas as vendas de itens que, sem você, não estariam disponíveis na loja. Estasvendas adicionais impulsionaram meus lucros para 17.4%”.

    “Impressionante!”, respondeu Roger. “E eu sou o culpado por isso? É por isso que você veio aqui –  para me agradecer pessoalmente?” Ele se perguntava por que Paul tinha ido até o depósito.

     Apesar de ter apreciado o gesto, a ligação de ontem tinha sido suficiente para ele.

    “Na verdade, eu não vim só para agradecer a você”, ele respondeu. Com cuidado, ele optou por adiar oque pensava ser uma ideia ameaçadora, a das reposições diárias para toda a região, e preferiu se concentrarnum assunto mais próximo – o de continuar só para sua loja. “Eu tenho outro pedido, um grande favor. Emborao depósito da loja possa estar em condições de uso na próxima semana, acho que devemos continuar atrabalhar da maneira que fizemos neste mês.” 

    Roger ficou em silêncio, concentrando-se. Paul estava preocupado pensando se Roger iria expulsá-lodali. Ele podia ter acabado de sair do reino da amizade e entrado para o campo da bagagem extra.

    “Rog,” ele começou, “estas operações que desenvolvemos podem aumentar os lucros para níveis queninguém achava possível. Você não acha que devemos continuar fazendo isso? Estou pedindo demais?”

    “Você sabe que está pedindo muito”, foi a resposta. “Leva -se tempo, mão de obra, e organização, paranão falar das queixas dos meus funcionários. Todo dia, pegam sua lista, veem o que está na pilha do inventárioda sua loja...”

    Paul tentou interromper, mas Roger continuava a falar.

    “Eles têm que recolher o que está faltando de todo o depósito, trazer isso para sua pilha, abrir caixaspara pegar apenas um ou dois itens, e reembalá-las para transporte. É uma trabalheira, e eles simplesmenteodeiam.”

    “Rog, eu estou ouvindo, mas -”

    “Nunca ninguém lhe disse para não interromper quando os adultos estão falando?” repreendeu ele.“Deixe-me terminar. Durante muito tempo eu achei que havia algo errado com a maneira de o depósito operar.O fato de as lojas manterem meses e meses de inventário, e ainda assim muitas SKUs faltarem simplesmentenão faz sentido. E eu levo muitos xingos, não importa o que faça. Isso só mostra que algo não está certo.”

    Roger tomou um gole do líquido preto na xícara, e continuou, ainda muito focado, “sua ideia de remeter

    para a loja só o que realmente precisa parece a solução que eu procurava. O fato de ter tal impacto nas vendassó apoia isto. Mas para que o sistema seja verdadeiramente eficaz, deve ser implementado para toda a região,não apenas em Boca”.

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    Paul não acreditava no que estava ouvindo. Ele tinha tanta certeza de que teria que implorar a Rogerpara ajudá-lo! A ideia de mudar a forma como todas as lojas da região trabalhavam não era coisa pouca, e eleachou que poderia levar semanas para convencer seu amigo a colaborar. Essa resposta foi uma surpresa.

    “Acontece que,” Roger acrescentou, “para isso teremos que obter a aprovação de Martin.”

    “Aquele muquirana,” disse Paul. Ele não morria de amores por seu chefe direto, o gerente regional.

    Roger continuou, ignorando o comentário do amigo. “Dito isso, ainda estou preocupado com a logística.

    Mesmo se você conseguir a aprovação, são necessárias uma série de mudanças. Enquanto era um favor parauma loja, era uma coisa, mas eu não sei como gerir reposições para o consumo diário de toda a região.Preciso de mais tempo para pensar sobre isso. Paul, eu estou com você, mas antes de fazer qualqueralteração na forma como o depósito funciona, eu preciso saber que esses resultados são sustentáveis”.

    Paul perguntou esperançosamente, “Então o que está dizendo – vamos continuar a receber reposiçõesdiárias?”

    “Sim, claro”, respondeu Roger. “Vamos manter isso até o final do trimestre, e ver como fica. Enquantoisso, vou tentar descobrir como fazê-lo numa escala maior. Eu devo receber umas queixas da minha equipe,mas terão de aguentar.”

    “Eu tenho uma ideia que pode tornar as coisas um pouco mais fáceis para eles”, disse Paul. “Vocêdisse que é uma trabalheira pescar de duas lagoas? Apenas pesque as mercadorias para a minha loja da pilha

    geral”.“Você está ciente de que se eu misturar o estoque da loja de Boca com o inventário do depósito,

    também preciso modificar nos livros,” disse Roger. Verificando se o seu amigo compreendera plenamente asugestão, ele acrescentou: “Você percebe que o que está sugerindo é   abrir mão de quase todo o seuinventário? Uma vez que fizer parte da pilha geral, não posso garantir a sua disponibilidade para você. Nãotenho permissão para alocar meu estoque”.

    “Não é o que me incomoda. A verdadeira questão é que, para tal mudança eu vou precisar daaprovação de Martin,” bufou Paul. “Acha que há uma chance de ele aprovar?

    “Nem ferrando”.

    “Obrigado pelo incentivo,” disse Paul. Ele sabia que Martin era bem pão-duro.

    “Mas já que você fez tanto por mim, tenho que fazer o melhor possível para aliviar seu fardo. Eu voufalar com Martin logo que der.”

    Enquanto caminhavam para frente do depósito, Paul agradeceu seu amigo e mandou lembranças deCaroline para Liz e as crianças. Indo para Boca, Paul se sentiu satisfeito consigo mesmo. Roger colaborarianos próximos dois meses, dando-lhe uma chance real de provar que o sistema funcionava. Além disso, elesconcordavam sobre a implementação deste novo método de gerenciar lojas e seu inventário por toda a região.

     A questão agora saber se ele conseguiria convencer Martin, o gerente regional, a transferir o inventárionos livros?

    *****************************************************************************

    Paul voltou do depósito regional entusiasmado e apreensivo.

    Depois de entrar em sua sala, Paul pediu que Alva ligasse para o gerente regional.

    “Olá, Paul,” ressoou o agradável barítono tom de Martin. “Eu estava prestes a ligar para você. Recebi orelatório do Financeiro. Parece que você ficou em 1º neste mês. Eu sei que as coisas têm sido difíceis, com oestouro da tubulação e tudo, e gostaria de parabenizá-lo pessoalmente. Por favor, diga a todos os seusfuncionários o quanto aprecio o empenho deles.” 

    “Obrigado”, respondeu Paul, “mas não foi apenas empenho. Mudamos a maneira de fazer as coisas. Éum método totalmente novo.”

    “Como?”

    Paul disse a Martin que ele e Roger tinha trabalhado nisso. “Como você pode ver claramente,devíamos aplicar este novo método em toda a região!”

    “Espere um segundo”, disse Martin em um tom que implicava qual dos dois era o superior. “Estou felizque tenha tido um bom mês. Muito feliz. Mas vamos acertar uma coisa. Nós temos um bom sistema, quefunciona bem. Começar a fazer mudanças com base no desempenho de um mês de uma loja é apenasridículo. Ninguém trabalha dessa forma. Você pode estar acostumados com atalhos, sendo o genro e tudo

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    mais, mas eu acredito em métodos prudentes e estabelecidos. Essa é a única forma de alcançar o verdadeirosucesso.”

    “Mas os números falam por si”, disse Paul, fumegando por dentro. Se havia uma coisa na qual ele tinhainsistido, era “sem atalhos”. Deixando o insulto de lado, ele continuou. “Rentabilidade de 17%! Tenha dó, se aloja de Boca apresentasse 7%, não teria ficado satisfeito?”

    “É só por um mês. É uma feliz coincidência,” disse Martin decisivamente. “Você não tem ideia das

    implicações. Pode ser à custa das vendas do próximo mês, o que significa que estará de volta aondecomeçou.”

    “Deixe que Roger e eu continuemos”, Paul persuadir Martin, “e vai perceber que não é um acaso, é umnovo sistema; que tais resultados podem ser obtidos por todas as lojas na região. Tenho certeza de que possoproduzir os mesmos resultados, todos os meses”.

    “Claro”, respondeu Martin. “Mostre-me que é sustentável ao longo de um período significativo, e depoisconversamos.” Afinal, pensou Martin consigo mesmo, ele não tinha nada a perder. Se Paul conseguisse, seriabom  – a região seria líder da rede, e se fracassasse, pelo menos o gerente da loja de Boca teria aprendidouma lição.

    “Tudo bem, Martin. Mas, para isso, preciso que aprove um pequeno entrave burocrático.” Este era oobjetivo de Paul, e ele esperava que sua tática desse certo. Ele havia começado a conversa deliberadamentecom o que seu gerente regional consideraria uma ideia ultrajante, sabendo muito bem que Martin não

    aprovaria. No entanto, isso deixou Martin numa posição onde ele teria de permitir que Paul continuasseoperando do seu modo atual.

    Depois de um curto – e não tão bom – debate, Martin concordou com a transferência formal do estoqueda loja de Paul de volta para o depósito.

     Apesar do mau humor de Martin, Paul sentia que tinha sido bem-sucedido. O gerente regional tinhadado o sinal verde necessário para Paul dar prosseguimento à cooperação com Roger. E Paul sabia que com onovo método de reposição do consumo diário, não havia erro.

    *****************************************************************************

    Uma coisa que Ted detestava na área de carga era o barulho terrível que a esteira transportadora

    fazia. Tentando fingir que não raspava sua medula espinhal, ele reviu a lista de expedição enquanto os doisestagiários punham as caixas no carrinho de mão.

    “Está faltando coisa”, disse ele em voz alta.

    “Não me culpe, sou só o motorista,” foi a resposta impaciente que ele recebeu.