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UMBANDA UMBANDA UMBANDA A MANIFESTAÇÃO DO ESPÍRITO PARA A CARIDADE MÓDULO I - AS ORIGENS DA UMBANDA PAI JURUÁ “Todas as entidades serão ouvidas, e nós aprenderemos com aqueles Espíritos que souberem mais e ensinaremos àqueles que souberem menos e a nenhum viraremos as costas e nem diremos não, pois esta é à vontade do Pai” (Caboclo das Sete Encruzilhadas)

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Page 1: Livro Modulo 1_Origens Da Umbanda

UMBANDAUMBANDAUMBANDAA MANIFESTAÇÃO DO ESPÍRITO

PARA A CARIDADE

MÓDULO I - AS ORIGENS DA UMBANDA

PAI JURUÁ

“Todas as entidades serão ouvidas, e nós aprenderemos com aqueles Espíritos que souberem mais e ensinaremos àqueles que souberem menos e a nenhum viraremos as costas e nem diremos não, pois esta é à vontade do Pai”

(Caboclo das Sete Encruzilhadas)

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Pai Juruá – 1956

“O RITUAL DO ROSÁRIO DAS SANTAS ALMAS BENDITAS”

“Umbanda – A Manifestação do Espírito para a Caridade – Módulos I, II, III e IV” / Pai Juruá

São Caetano do Sul, 2013 985 p.

Fundação Biblioteca Nacional

Escritório de Direitos Autorais Certificado de Registro ou

Averbação

Nº Registro: 533.475 – livro: 1024 – folha: 149

Todo o material (textos, fotografias e imagens) disponibilizados neste livro estão sob a proteção da “LEI DO DIREITO AUTORAL Nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998”. É proibida toda e qualquer comercialização dos mesmos, em quaisquer meios de comunicação, sem prévia consulta e autorização pessoal do autor. Para reprodução sem fins comerciais, é obrigatória a divulgação da autoria do material aqui disponibilizado.

CAPA: Concepção artística do Caboclo das Sete Encruzilhadas, instituidor da

Umbanda, Guia Espiritual de Zélio de Moraes

Page 3: Livro Modulo 1_Origens Da Umbanda

ÍNDICE OS VENERABILÍSSIMOS DA UMBANDA..........................................................................................................01 PREFÁCIO...........................................................................................................................................................03 O PASTOR DA UMBANDA.................................................................................................................................11 A IMPLANTAÇÃO DA UMBANDA NO BRASIL.................................................................................................15 A PEQUENA DESBRAVADORA.........................................................................................................................55 REPRODUÇÃO DA FITA CASSETE Nº 31, GRAVADA POR LILIA RIBEIRO..................................................58 EM 1971, A SENHORA LILIA RIBEIRO, DIRETORA DA TENDA DE UMBANDA LUZ, ESPERANÇA, FRATERNIDADE – RJ, GRAVOU UMA MENSAGEM DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS NA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE........................................................................................63 REPRODUÇÃO DE TRECHOS DA FITA CASSETE Nº 50, GRAVADA POR LILIA RIBEIRO.........................66 REPRODUÇÃO DA FITA CASSETE Nº 52, GRAVADA POR LILIA RIBEIRO..................................................68 PRIMEIRO RELATO ESCRITO SOBRE A TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE...................78 REPORTAGEM DE LILIA RIBEIRO SOBRE A FUNDAÇÃO DA UMBANDA – 1971.......................................84 LILIA RIBEIRO – UMBANDA – INÍCIO DE UMA LONGA JORNADA...............................................................89 LILIA RIBEIRO – TESTEMUNHOS PARA A POSTERIDADE..........................................................................102 LILIA RIBEIRO – MENSAGEM DE ZÉLIO........................................................................................................107 “EU FUNDEI A UMBANDA” – MATÉRIA ENVIADA POR LILIA RIBEIRO PARA A REVISTA “GIRA DE UMBANDA”......................................................................................................................................108 LILIA RIBEIRO SOBRE OS 70 ANOS DA INCORPORAÇÃO DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS.............................................................................................................................................114 FEDERAÇÃO COMEMORA DIA DA UMBANDA.............................................................................................117 E ASSIM NASCEU O PRIMEIRO TERREIRO DE UMBANDA – LILIA RIBEIRO............................................118 A CARIDADE ESPÍRITA NO RIO DE JANEIRO...............................................................................................121 O CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS E A EVOLUÇÃO DOS RITOS AFRO-BRASILEIROS.............123 CABANA DE PAI ANTONIO..............................................................................................................................125 AUTÓGRAFO DE ZÉLIO DE MORAES............................................................................................................126 COMO CONHECI ZÉLIO DE MORAES.............................................................................................................127 EIS QUE O CABOCLO VEIO A TERRA “ANUNCIAR” A UMBANDA.............................................................133 FREI GABRIEL MALAGRIDA – O CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS...............................................142 ESTÓRIA DA ENCARNAÇÃO NO BRASIL DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS.........................150 FOTOS GERAIS DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE, EM BOCA DO MATO – CACHOEIRA DE MACACÚ...............................................................................................................................152 ZÉLIO FERNANDINO DE MORAES..................................................................................................................164 ALGUNS ASPECTOS DA VIDA DE ZÉLIO FERNANDINO DE MORAES.......................................................171 UMBANDA NÃO FAZ O SANTO NEM FEITURA DE CABEÇA.......................................................................174

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CARIDADE NÃO É MERCADORIA PARA SER VENDIDA – UMBANDA PURA E DECENTE ESTÁ SENDO TRAÍDA POR VIGARISTA...................................................................................................................178 REGIMENTO INTERNO DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE........................................182 SESSÕES E RITUAIS DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE...........................................193 O QUE É A LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA............................................................................199 DOIS RELATOS DE TRABALHOS ESPIRITUAIS DA LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS................................................................................................221 ENTREVISTA COM DONA LYGIA CUNHA, NETA DE ZÉLIO DE MORAES E RESPONSÁVEL PELA CONDUÇÃO DAS SESSÕES NA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE...............................223 REPORTAGEM DA “REVISTA ESOTERA”, DE FEVEREIRO DE 2006, COM IMPORTANTES INFORMAÇÕES DE ZILMÉIA DE MORAES.....................................................................................................231 ANTONIO ELIEZER LEAL DE SOUZA – O PRIMEIRO ESCRITOR DA UMBANDA......................................238 HINO DA UMBANDA.........................................................................................................................................258 OS PRIMEIROS INTELECTUAIS DA UMBANDA.............................................................................................264 OS CONGRESSOS DE UMBANDA..................................................................................................................273 CRONOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO MOVIMENTO UMBANDISTA NO BRASIL......307 DIA NACIONAL DA UMBANDA........................................................................................................................313 INSTITUIÇÃO DO DIA NACIONAL DA UMBANDA..........................................................................................315 LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA NA VISÃO DE UM APRENDIZ..............................................316 CURIOSIDADES................................................................................................................................................403 HOSPITAL NACIONAL DE UMBANDA............................................................................................................419 O OLHO DE DEUS.............................................................................................................................................422

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OS VENERABILÍSSIMOS DA UMBANDA

Mãe Maria Santíssima Nosso Senhor Jesus Cristo Os praticantes da Caridade da denominada “Linha de Umbanda”, chamaram a si a iniciativa dessa luta, de combate sem tréguas ante a extensão da maldade exercida pelos encarnados e desencarnados malvados, conhecendo bem a gravidade, a responsabilidade, as asperezas e os espinhos dessa luta, certos de que não lhes será recusada a assistência e o valioso auxílio capital dos bons amigos do espaço, aceitando agradecidos os de todos, seja qual for a sua personalidade, por mais humilde que seja ou pareça ser, desde que se identifiquem os desejos e as intenções, numa ação conjunta, conduzidos e iluminados por uma ofuscante Estrela, a Mãe Maria Santíssima, e como guia, Nosso Senhor Jesus Cristo. Sob as bênçãos da Venerabilíssima Mãe Maria Santíssima, e amparados pelo Venerabilíssimo Nosso Senhor Jesus Cristo e Seu Evangelho Redentor, trabalhamos na Umbanda. Na Umbanda, amamos com extremado carinho e profunda gratidão, a Venerabilíssima Mãe Maria Santíssima, devotando-lhe honra e gratidão. Reconhecemos em Mãe Maria Santíssima, um Espírito evoluidíssimo, que já havia conquistado, há milhares de anos, eminentes virtudes, tornando-a apta a desempenhar na crosta terrestre tão elevada missão, recebendo em seu seio o Emissário do Cristo Planetário, Nosso Senhor Jesus Cristo, que se fez homem para se transformar “no modelo da perfeição moral que a humanidade pode pretender sobre a Terra”. Fazemos de nossas palavras, a de nosso confrade, Pai Valdo:

“A Mãe Maria Santíssima é a Estrela brilhante, encharcada da luz do amor e da misericórdia de Deus. Ela nos abraça, nos acolhe, nos cura e nos aponta o único caminho viável de ascender ao Reino de Deus, Reino de paz, e alegria permanentes, que é Jesus e o Seu Evangelho, quando vivenciado e amado. A Umbanda nasceu dos braços de Mãe Maria Santíssima, com o Caboclo das Sete Encruzilhadas, pois o mesmo sempre teve a maior consideração devocional por esta Mãe de Amor, bem como foi o seu sinal que marcou a primeira Tenda mandada erigir por ele, sob o título de “Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade”. Segundo as palavras do Caboclo das Sete Encruzilhadas: “Assim como Maria acolhe em seus braços o Filho, a Tenda acolheria aos que a ela recorressem nas horas de aflição”. Mãe Maria Santíssima é a Estrela da Umbanda. A sua vibração materna, a invocação de seu poder divinal está nos lábios, no coração e no trabalho de todos os Guias Espirituais; nos trabalhos dos Caboclos, na oração e trabalhos dos Pretos-Velhos. Está enfim, em todas as atividades umbandísticas sérias, pois ela é o braço materno da misericórdia Divina a acolher os filhos que chegam com suas dores e problemas, e os encaminham amorosamente ao médico Divino que é Jesus, o Divino Pai Oxalá, seu amado filho.

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A Umbanda venera, ama e concentra suas irradiações debaixo da bênção materna dessa Mãe Santíssima. Maria é a Mãe que nos ajuda na subida ao monte da perfeição, pela reforma íntima e trabalho assíduo em viver o Evangelho de Jesus. Todo umbandista, nesta festa (religiosidade) de fé e alegria com a presença querida desta Mãe Santíssima, ouve e bebe suas palavras dirigidas aos nossos corações, vindas dos textos evangélicos, nas Bodas de Canaã: “Fazei tudo que Ele (Jesus) lhes mandar”. Os Guias Espirituais da Umbanda nos dizem:

Estás acabrunhado, busque Maria; ela é a Senhora da consolação.

Estás desesperado, busque Maria; ela é a Mãe da esperança.

Estás preocupado, busque Maria; ela é a conselheira materna e fiel.

Estás doente, busque Maria; ela é a saúde dos enfermos.

Estás triste, busque Maria; ela é a causa da nossa alegria.

Estão lhe perseguindo e fazendo sofrer, busque Maria; ela é a defesa maternal. Em tudo, busque Maria; ela é a Estrela Matutina, refúgio e força dos fracos e imperfeitos, a Mãe do Divino Amor. A Umbanda sem a Mãe Maria Santíssima é uma Umbanda sem Jesus; e a Umbanda sem Jesus não é Umbanda, pois Ele é o Pastor Divino das Almas, que, por meio do Seu Evangelho Redentor nos ensina, e se torna o caminho para a felicidade, que consiste na implantação do Reino de Deus em nós. O Caboclo das Sete Encruzilhadas foi claro e tácito ao instituir o Movimento Religioso Umbandista no plano físico. Ele disse claramente: “...Vim para criar uma nova religião, baseada no Evangelho de Jesus e que terá como seu maior mentor o Cristo...” Tendo a Umbanda como missão maior orientar e acolher os que sofrem, ajudando-os em sua caminhada encarnatória, e apontando-lhes o caminho da verdadeira libertação contida nos ensinamentos evangélicos, perderia seu status de religião, religação com Deus, se não tivesse no alto de sua fé, doutrina e ritual a imagem e presença de Jesus Cristo, nosso senhor e redentor. Não podemos, contudo, nos esquecer que Aquela que trouxe ao mundo encarnado a presença do Filho de Deus, foi esse Espírito iluminado, Mãe Maria Santíssima, que se tornou, assim, a Mãe de toda a humanidade e a intercessora maior, diante do seu Filho, em favor de todos nós, Espíritos caminhantes, endividados e carentes de fé, amor, paz e alegria”.

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Alguns religiosos confundem a honra que os Umbandistas tributam a Mãe Maria Santíssima, com a adoração que se deve a Deus. A Bíblia usa o termo “adorar” em várias acepções, tanto no sentido de “douleuo” como de “latreuo”, como diz a “Vulgata”, Bíblia original e escrita em latim por São Jerônimo. “Tu adorarás o teu Deus” (Mt 4, 10). “Abraão, levantando os olhos, viu três varões em pé, junto a ele. Tanto que ele os viu, correu da porta da tenda a recebê-los e prostrando em terra os adorou” (Gn. 18,2). Eis os dois sentidos bem indicados pela própria Bíblia:

Culto de latria (grego: “latreuo”) quer dizer adorar. Aparece nas escrituras gregas cristãs como adoração no sentido de culto, ritos, cerimônias – É o culto de adoração suprema que se deve somente a Deus e consiste em reconhecer nele a Divindade única, prestando uma homenagem absoluta, como criador absoluto, ou seja, reconhecer que Ele é o Senhor de todas as coisas e Criador de tudo. Por ser adoração suprema, é um ato interno da alma que pode se manisfestar de formas variadas, conforme as circustâncias e as disposições da alma de cada um. “Amarás ao Senhor teu Deus de todas as formas, de todo o seu coração, de todo o seu entendimento e com todas as suas forças” (Marcos 12:30).

Culto de dulia (grego: “douleuo”) quer dizer honrar. É derivado do verbo grego “douléuo” que trás como equivalente, servir, ser subserviente, com honra. Honra tributada em razão de qualquer excelência – É especial aos Guias Espirituais e aos Santos, por serem Espiritos justos e virtuosos.

Culto de hiperdulia (grego: “hyper”: acima de; “douleuo”, honra), ou seja, honra acima de – honrar com reverência; que está acima da dulia, acima do culto de honra sem atingir o culto de adoração; por isso o prefixo “Hiper”, mas abaixo de Latrêutico = Latria) é prestado a quem está acima da dignidade dos Santos e dos Guias Espirituais (=dulia), mas abaixo de Deus (= Latria) – É o culto efetuado a Nosso Senhor Jesus Cristo, a Mãe Maria Santíssima, aos Sagrados Orixás, aos Anjos, etc.

Portanto, para a Mãe Maria Santíssima, Nosso Senhor Jesus Cristo e os Sagrados Orixás, rendemos o culto de hiperdulia, ou seja, horamo-los com reverência. Adoramos supremamente, somente a Deus Pai.

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PREFÁCIO

Queremos registrar, explicitamente, que é nosso, e só nosso, de maneira indivisível e absoluta, todo e qualquer ônus que pese por quaisquer equívocos, indelicadezas, desvios ou colocações menos felizes que, porventura, sejam ou venham a ser localizadas neste livro, pois, temos certeza plena de que se tal se der terá sido por exclusiva pequenez deste menor dos menores irmãos de Jesus, deste que se reconhece como um dos mais modestos dos discípulos umbandistas. Todo o material utilizado na feitura desta obra é divido em:

1) Profundas e exaustivas pesquisas;

2) Orientações espirituais; e, 3) Deduções calcadas na lógica, na razão e no bom senso.

Não podemos nos esquecer do que escreveu Kardec, em “A Gênese” – capítulo I, item 50: “... os Espíritos não revelam aos homens aquilo que lhes cabe descobrir, usando de pesquisas, esforço continuo, estudos aprofundados e comparações com outros estudiosos”. Foi exatamente isso que fizemos. Realizamos longas e exaustivas pesquisas a fim de sermos fiéis ao que realmente aconteceu, bem como coletamos informações da espiritualidade para posteriormente colocar algumas poucas observações, tudo dentro dos ensinamentos crísticos, da razão e do bom senso. A Espiritualidade Superior nos faz atingir o conhecimento da verdade por nós mesmos, por intermédio do raciocínio, ao invés de submeter um Espírito Iluminado ao sacrifício de descer ao plano físico para nos elucidar. Não devemos apenas nos esconder atrás de um Espírito em psicografias ou mensagens psicofônicas para escrevermos doutrina religiosa; devemos somente pedir a intervenção espiritual quando o assunto fugir totalmente à nossa compreensão; aliás, todo o conhecimento já está no mundo; basta ter paciência e perseverança para encontrá-los. As bases primordiais do conhecimento e das normas divinas já foram fartamente explicadas pelos Espíritos crísticos das diversas filosofias e religiões; o ser humano está capacitado a dispô-las da mesma maneira que melhor atendam à sua concepção. "Tenho a impressão de ter sido uma criança brincando à beira-mar, divertindo-me em descobrir uma pedrinha mais lisa ou uma concha mais bonita que as outras, enquanto o imenso oceano da verdade continua misterioso diante de meus olhos”. (Isaac Newton) Muito já se tem escrito sobre o que é Umbanda, e este é mais um apontamento sobre suas características e finalidades. Não pretendemos “impor” nada a ninguém, mas sim, levar todos a pensarem melhor, a fim de enxergarem outras realidades e plasmarem em suas mentes, a religiosidade maravilhosa da Umbanda. “Tem muita gente falando que se copiam assuntos e verdades... mas a verdade não se copia, a verdade existe, não é filhos? E se ela existe ela não é copiada; ela é divulgada por muitos seres, de muitas formas, por vários estilos de esclarecimento sobre ela mesma. Vejam bem: as linguagens dos grupos espiritualistas são diferentes e, as que são corretas, pretendem levar os discípulos da Terra a um mesmo ponto: o ponto do esclarecimento e da chegada do amor e da consciência na Terra. Os filhos tem que saber que a realidade da vida na Terra e a vida no Cosmos é contemplada de inúmeras formas e tem explicações baseadas na verdade imutável... Mas tem outros pontos de vista sobre elas também...” (Cacique Pena Branca – Mensagem canalizada por Rosane Amantéa) Essa explicação é perfeitamente compatível com a posição colocada em “o Evangelho Segundo o Espiritismo”, cap. XXIV, onde diz que: “Cada coisa deve vir ao seu tempo, pois a sementeira lançada a terra, fora do tempo não produz...”. Os Espíritos procedem, nas suas instruções, com admirável prudência. “... As grandes idéias jamais irrompem de súbito. As que se assentam sobre a verdade sempre têm precursores que lhes preparam parcialmente os caminhos. Depois, em chegando o tempo, envia Deus um homem com a missão de resumir, coordenar e completar os elementos esparsos, de reuni-los em corpo de doutrina. Desse modo, a idéia, ao aparecer, encontra Espíritos dispostos a aceitá-la”. (Trecho da introdução de “O Evangelho segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec – IV) É sucessiva e gradualmente que eles têm abordado as diversas partes já conhecidas da doutrina, e é assim que as demais partes serão reveladas no futuro, à medida que chegue o momento de fazê-las sair da obscuridade.

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Nossa esperança é que você, leitor, se sensibilize com o que está escrito aqui, e verá uma Umbanda calcada nos ensinamentos crísticos, na razão e no bom senso, movida pela noção do conhecimento do que representa essa grande religião perante a humanidade. De acordo com seus próprios recursos e reconhecendo as limitações das circunstâncias muitas vezes impostas, temos a certeza que você fará de tudo para compreendê-la e divulgá-la. Os conhecimentos impressos neste livro, com certeza são breves pincelada da realidade cultural umbandística. Como disse o venerável Espírito de Ramatís: “A Umbanda, portanto, ainda é o vasilhame fervente em que todos mexem, mas raros conhecem o seu verdadeiro tempero”. E como cantava Pai Antonio, manifestado em Zélio de Moraes (Conforme gravação na fita 52 a – 23 minutos e 10 segundos, disponibilizada juntamente com esse livro):

Tudo mundo que Umbanda Que, que, que Umbanda

Mas, ninguém sabe o que é Umbanda Mas quer, quer, quer Umbanda

Umbanda tem fundamento. Mas quer, quer, quer Umbanda

Mas, ninguém sabe o que é Umbanda Temos certeza que existem muitas maravilhas a serem descobertas sobre a Umbanda. Todos têm uma natural curiosidade do que é e o que representa toda essa religiosidade genuinamente brasileira e muitos até agora estavam em dúvidas, pois lhes faltavam recursos literários para compreendê-la. Pode ser que muitas das noções aqui apresentadas poderão não ser aceitas e que podemos inclusive contrariar muitas pessoas. Em nossas observações particulares não pretendemos aviltar a doutrina praticada em seu Terreiro ou aceita por você, mas somente estamos colocando mais um ponto de vista e esperamos que todos leiam e reflitam, usando a razão e o bom senso, para depois verificar a veracidade dos ensinamentos por nós esposados. “Mais vale repelir dez verdades que admitir uma só mentira, uma só teoria falsa” (pelo Espírito de Erasto). Máxima repetida em “O Livro dos Médiuns”, 20º capítulo, item 230, página 292. Para emitirmos uma crítica, temos que estar escudados em conhecimentos culturais profundos e militando diariamente dentro da Religião de Umbanda, pois somente assim poderemos nos arvorar em advogados de nossas causas. Não podemos simplesmente emitir opiniões e conceitos calcados em “achismos” (o achar e a mãe de todos os erros), ou mesmo escudados tão somente pelo que outros disseram ser a verdade absoluta. Lembre-se que tudo esta sendo feito para o bem e a grandiosidade da Umbanda. Da nossa parte, estaremos à disposição, pessoalmente, para dirimir dúvidas e fornecer os esclarecimentos necessários a tudo o que neste livro foi escrito. A UMBANDA É DE TODOS, NEM TODOS SÃO DA UMBANDA Um dia, hão de chegar, altivos e de peito impune, pessoas a dizer-lhes: sou umbandista, tenho fé em Oxalá, tenho mediunidade… com altivez e força tal que chegarão a lhe impressionar. Mas quando olhar bem seu semblante, você o verá opaco, translúcido e sem o calor de um verdadeiro entusiasta e batalhador em prol da mediunidade umbandista. A Umbanda é uma corrente para todos, mas nem todos se dedicam a ela como deveriam. O verdadeiro umbandista sente, vive, respira, se alimenta espiritualmente nela. Não com fanatismo, mas sim com dedicação aflorada no fundo d’alma. Ser umbandista é difícil por ser muito fácil; é só ser simples, honesto e verdadeiro. Não batam no peito e digam ser umbandistas de verdade, mas procurem demonstrar com trabalho, luta, dedicação e, principalmente, emoção de estar trabalhando nessa corrente. Eu lhe garanto que a recompensa será só sua. Falange Protetora (Trecho do livro “Umbanda é Luz” de Wilson T. Rivas)

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Somente pode testemunhar quem realmente milita com fé, amor, desprendimento e mangas arregaçadas, para a grandeza desta tão magnífica Religião Nacional. No Módulo I, estaremos disponibilizando todo um material histórico das origens da Umbanda. Segundo o Caboclo das Sete Encruzilhadas, nenhuma religião nasce plena. Ela nasce em fase embrionária e como uma criança ela cresce e se desenvolve. Somos sabedores que no surgimento de qualquer evento importante que permeia a vida de muitos, com o passar dos tempos, quando tudo se inicia somente com observações calcadas na oralidade, pela falta documental comprobatória, muita coisa acaba transformando-se em mito e/ou estórias.

Por isso, na realização do “Módulo I – Origens da Umbanda” – procuraremos ser fiéis nos relatos, sem mudar uma vírgula sequer. Em alguns assuntos, tomamos a liberdade de tecer pequenas observações, mas calcadas da razão, a fim de esclarecer ou mesmo dirimir certas dúvidas. Muitos falam sobre o Caboclo das Sete Encruzilhadas, mas, infelizmente, raros são os que seguem suas orientações. Muitos dão muitas desculpas, todas calcadas na idiossincrasia. Propagam o Caboclo como instituidor da Umbanda, mas, deixam suas evidentes e claras normas relegadas a uma Umbanda lírica, histórica e ultrapassada, alegando que a Umbanda evoluiu desde a sua criação, e por isso, muita coisa que o Caboclo das Sete Encruzilhadas orientou que não usa-se ou fizesse, hoje, já pode ser usado e feito com justificativas esfarrapadas, sem comprovação e sem a anuência da espiritualidade maior, aduzindo que a Umbanda progrediu e hoje tudo pode ser usado a bel prazer. O Caboclo das Sete Encruzilhadas institui a Umbanda como religião e normatizou-a com preceitos simples, mas, que teriam de serem seguidos a risca. A partir da fundação da Umbanda, muitos umbandistas derivaram das práticas originais, criando o que chamamos de: “Modalidades de Umbanda”. Se essas modalidades de Umbanda, mesmo não seguindo todas as normatizações do instituidor, estiverem praticando a caridade desmedida, a compaixão, fé, amor, humildade, desprendimento, desapego, perdão e perseverança, estão no caminho certo, mas, estariam mais seguros, seguindo todas as normatizações do fundador. Só teríamos que nos posicionar, e classificarmos que modalidade de Umbanda se pratica, para que o leigo pudesse se posicionar. Estaremos discutindo as modalidades e os preceitos do instituidor, mais aprofundadamente, no 2º Módulo. Inclusive, afirmamos que nem todo Espírito que “baixa” em Terreiro é autorizado a dirigir ou agir em nome da Umbanda. Seguimos a regra evangélica que diz: “Amados, não creiais a todo Espírito, mas provai se os Espíritos são de Deus, porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo.” (I João, 4:1). Observem o que o Capitão Pessoa, dirigente da Tenda Espírita São Jerônimo, um das sete Tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, em 1942 disse: “... O Caboclo das Sete Encruzilhadas é o legítimo senhor de Umban-da no Brasil; nenhuma entidade, por grande que seja, intervém nos trabalhos da magia branca sem uma prévia combinação com ele”... – “O que deseja, sobretudo, é que este ritual (nota do autor: ritual da Umbanda) seja praticado apenas por Guias autorizados, porque não são todos Espíritos que baixam nos Terreiros que se acham à altura de praticá-lo”... Já lemos relatos de irmãos ainda insistindo que não foi o Caboclo das Sete Encruzilhadas que fundou a Umbanda; outros, dizem que Zélio de Moraes era kardecista e, portanto, montou uma Umbanda kardequizada. Tudo pura conjectura. São opiniões calcadas somente em achismos, pois carece de comprovação documentária, fonográfica, discográfica ou mesmo filmográfica. Por isso, primamos pela farta documentação histórica no Módulo I, juntando em anexo farta documentação escrita, jornalística e fonográfica. Contra depoimentos documentais e relatos gravados, não há argumentos. Cremos que muita coisa ainda há de aparecer e ser esclarecida quanto à história da Umbanda, do Caboclo das Sete Encruzilhadas, da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade e de Zélio Fernandino de Moraes. Verificar esses dados históricos já foi como procurar agulha num palheiro; hoje esta sendo como procurar agulha num agulheiro. Mas, se todos que tiverem um pequeno dado histórico e comprovado contribuírem, com certeza poderíamos juntar todas as peças do tabuleiro e assim descortinar o movimento umbandista brasileiro em sua real beleza e funcionalidade. Temos poucos, mas, fiéis trabalhadores engajados no resgate histórico da nossa amada Umbanda. Uns estudiosos concordam e outros discordam dos entendimentos sobre os relatos históricos. Uns merecem e outros desmerecem a descoberta que alguns fizerem em fatos documentais. A verdade e uma só: Quem participou juntamente do Caboclo das Sete Encruzilhadas em sua missão na terra já desencarnou e não deixou nada, a não ser comentários espaçados. Por isso, achamos bonito entender certos aspectos de como tudo era, mas damos verdadeiro valor e insistimos obsessivamente, que nós umbandistas devemos sim, atentar para o que o Caboclo deixou como “Linhas Mestras” a serem seguidas; o resto são somente fatos históricos para satisfazer a curiosidade.

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Seria o mesmo que deixarmos de lado os ensinamentos de Jesus, para somente atentar, discutir, brigar, para provar se ele era moreno, se tinha 1.80 de altura, se era casado, se mantinha relações sexuais, se teve filhos, se bebia vinho, etc., o que não iria de maneira nenhuma acrescentar em nada a nossa evolução espiritual. Pela extensão, o livro: “Umbanda – A Manifestação do Espírito para a Caridade” foi dividido em 04 (quatro) Módulos, cada um estudando vários aspectos da doutrina Umbandista, para que todos possam, passo a passo, vislumbrar esta maravilhosa religião. No “Módulo I – As Origens da Umbanda” está, somente, o estudo histórico da Umbanda, inalterados; e somente em poucas partes fizemos algumas considerações; quanto ao restante dos Módulos (II, III e IV), estarão impressas noções sobre a doutrina umbandística, suas características, atributos e atribuições, bem como seus aspectos esotéricos e exotéricos, com total visão da Umbanda Crística. Por serem progressivos, facilitará o estudo da Umbanda tanto nas Sessões de Educação Mediúnica e Doutrinária, bem como em cursos preparatórios de médiuns; assim, quando os médiuns terminarem os Módulos, com certeza estarão escudados nos conhecimentos gerais umbandísticos necessários ao seu desenvolvimento como médium umbandista. Esta obra também servirá grandemente para todos aqueles, simpatizantes, estudantes, sociólogos, antropólogos religiosos e curiosos, que querem saber o que é Umbanda. Obs.: Se alguém reconhecer suas idéias impressas neste livro e não ver o devido crédito comunique-se conosco, onde iremos sanar tal entrave, verificando a veracidade dos fatos. Afinal, quando uma verdade espiritual vem à tona, com certeza, vários médiuns sérios a recebem simultaneamente. Vejam o que diz Kardec: “Estai certos, igualmente, de que quando uma verdade tem de ser revelada aos homens, é, por assim dizer, comunicada instantaneamente a todos os grupos sérios, que dispõem de médiuns também sérios, e não a tais ou quais, com exclusão dos outros”. (“O Evangelho Segundo o Espiritismo”, capítulo 21, item 10, 6º §. (5)). Em nossas pesquisas, deparamos com um fórum aberto no site de Umbanda: “www.redeumbanda.ning.com”, que nos chamou atenção. Dizia assim: Uma regra para reger a todos. É possível? (Publicado por M.R.C. em 13 Setembro de 2008 às 11h20min) Cada pessoa tem sua leitura da vida de acordo com uma série de fatores, educação familiar, estudo didático, meio que vive... Observa-se uma variedade gigantesca de diferentes formas de levar seu viver. Esse aspecto nos acompanha em diversas áreas de nosso dia-a-dia, e não poderia ser diferente na Umbanda.

“... Muitas portas levam a morada do Pai...”

É realmente possível conseguir uma linguagem única para a Umbanda? Decretar regras gerais nesta situação não alimentaria o preconceito e a intolerância, tendo em vista esses muitos níveis de entendimento? Bom pensar. Cigano. Responder até Marcos Alberto Corado

Oi amigo A Casa ter regras – normas pré-estabelecidas para o seu funcionamento se fazem necessário, no que diz as necessidades básicas como:

Manter organização própria, segundo as normas legais vigente, estruturada de modo a atender a finalidades por ela proposta.

Estabelecer metas para a casa, em suas diversas áreas de atividades, planejando periodicamente

suas tarefas, e avaliando seus resultados.

Facilitar a participação dos freqüentadores nas atividades da casa.

Estimular o processo do trabalho em equipes.

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Dotar a casa de locais e ambientes adequados, de modo a atender em primeiro lugar as atividades prioritárias.

Não envolver a casa em quaisquer atividades incompatíveis ao fundamento da prática do bem e da

caridade.

Zelar para que as atividades exercidas nos preceitos fundamentados pela casa sejam gratuitas, vedando qualquer espécie de remuneração.

Aceitar somente os auxílios, doações, contribuições e subvenções, bem como firmar convênios de

qualquer natureza ou procedências, desvinculados de quaisquer compromissos que desfigurem o caráter da instituição, ou que impeçam o normal desenvolvimento de suas atividades, em prejuízos das finalidades nos trabalhos espirituais, preservando, assim, a independência administrativa da entidade.

Manter a disciplina quanto a horários, vestuários, comportamento, ética... etc., boa conduta para que nos trabalhos práticos os objetivos sejam alcançados.

A casa ter um grupo de estudo, com a participação de todos trabalhadores.

Falei de alguns tópicos, quanto à parte de organização estrutural, para o bom funcionamento da espiritual. Quanto a este, cada casa tem uma tarefa a ser desempenhada. Estas tarefas são planejadas no mundo espiritual, com mentores já designados, trabalhos a serem realizados, médiuns que vão participar do processo daquela casa etc.; por isso que toda atividade espiritual de uma casa deve ser gerida pelo mentor da mesma, mas infelizmente em nossa vaidade e orgulho interferimos neste processo, muito das vezes colocando nosso objetivo pessoal, nossos interesses, interesses de outros que pode nos beneficiar etc., aí vem às diversidades, não diversidades naturais pela interação de encarnados e Espíritos pela diferença do próprio grau evolutivo de um e de outro no modo de levarem seus trabalhos, mas querendo alcançar objetivos dentro dos parâmetros do bem e da caridade, mas sim diversidades que são contrários à ética, a moral e os bons costumes. Aí se instala a diversidade, calcada no aproveitar, levar vantagem, denegrindo a imagem da Umbanda. Por essa pequena conversa entre irmãos num fórum de Umbanda, observamos no feliz comentário do Sr. Marcos Alberto Corado, a questão da dificuldade de se formalizar um estudo coeso na Umbanda, devido à diversidade de cultura, conhecimento, etc. Pela diversidade cultural, fica difícil “escrever” sobre a Umbanda, sem ser tachado de nariz empinado ou mesmo de querer ser “expert”, somente por não coadunar com conceitos pré-estabelecidos por outrem. Por isso, antes de prosseguirmos, vamos alertar aos leitores que não estamos aqui falando em nome da Umbanda em si, coisa que, atualmente ninguém pode fazer, a não ser o seu instituidor, o Caboclo das Sete Encruzilhadas; o máximo que pode acontecer, que também é o nosso caso, é vivenciar, estudar e divulgar a “modalidade umbandista” a qual está ligado; afinal, o que existe são aos sub-grupos dentro da Umbanda. Divulgamos uma doutrina calcada na razão e no bom senso, preconizada pela modalidade “Umbanda Crística”. Portanto, se alguém não coadunar com os nossos ensinamentos, é fácil: feche o livro, não leia mais e siga os seus próprios passos, com a sua própria compreensão. “Tempus est mensura motus rerum mobilium” (O tempo é o melhor juiz de todas as coisas). “Nada aceiteis sem o timbre da razão, pois ela é Deus, no céu da consciência. Se tendes carência de raciocínio, não sois um religioso, sois um fanático”. “Não devem vocês impor as suas idéias de maneira tão radical. Cada Espírito é um mundo que deve e pode escolher por si os caminhos que mais lhe convém”. (pelo Espírito de Miramez). Irmãos umbandistas, nunca se esqueçam: O exemplo é a maior divulgação de uma doutrina superior.

“Não obrigamos ninguém a vir a nós; acolhemos com prazer e dedicação as pessoas sinceras e de boa vontade, seriamente desejosas de esclarecimento, e estas são bastante para não perdermos tempo correndo atrás dos que nos voltam às costas por motivos fúteis, de amor próprio ou de inveja”. “Reconhece-se a qualidade dos Espíritos pela sua linguagem; a dos Espíritos verdadeiramente bons e superiores é sempre digna, nobre, lógica, isenta de contradições; respira a sabedoria, a benevolência, a modéstia e a moral mais pura; é concisa e sem palavras inúteis. Nos Espíritos inferiores, ignorantes, ou orgulhosos, o vazio das idéias é quase sempre compensado pela abundância de palavras. Todo pensamento evidentemente falso, toda máxima contrária à sã moral, todo conselho ridículo, toda expressão grosseira, trivial ou simplesmente frívola, enfim, toda marca de malevolência, de presunção ou de arrogância, são sinais incontestáveis de inferioridade num Espírito”. (Allann Kardec)

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Se quiserem, muito poderão aprender com os mais velhos e experimentados dentro da Umbanda. Lembre-se que tudo o que fizerem de bom com os mais velhos, estarão plantando nesses corações sementes de luz, que no amanhã poderão clarear os seus próprios caminhos. “Amamos as catedrais antigas, os móveis antigos, as moedas antigas, as pinturas antigas e os velhos livros, mas nos esquecemos por completo do enorme valor moral e espiritual dos anciãos”. (Lin Yutang)

Importante: Não leia de um livro, somente um tópico ou aleatoriamente, emitindo sua opinião sobre o entendido somente naquele capítulo. Leia-o do começo até o final, pois, muitos assuntos vão-se completando, esclarecendo o tema. Parafraseando Torres Pastorinho: Para podermos interpretar com segurança um texto doutrinário, é mister:

1º) Isenção de preconceitos; 2º) Mente livre, não subordinada a dogmas;

3º) Inteligência humilde para entender o que realmente está escrito, e não querer impor ao escrito o que se

tem em mente;

4º) Raciocínio perquiridor e sagaz;

5º) Cultura ampla e polimorfa, mas, sobretudo; e,

6º) Coração desprendido (puro) e unido a Deus. É imprescritível o direito de exame e de crítica e em nossos escritos não alimentamos a pretensão de subtrairmo-nos ao exame e à crítica, como não temos a de satisfazer a toda gente. Cada um é, pois, livre de o aprovar ou rejeitar; mas, para isso, necessário se faz discuti-lo com conhecimento de causa, vivência e cultura, e não somente com interpretações pessoais, ou mesmo impondo a sua “verdade”. “Do ponto de vista psicológico, a verdade pode ser entendida sob três aspectos: a minha verdade; a verdade do outro; e a verdade absoluta; a verdade é muito relativa; a verdade absoluta é Deus” (Divaldo Franco). E temos como verdade absoluta provinda do Pai, tudo o que está calcado na razão, no bom senso e nos ensinamentos crísticos; o ponto de vista calcado no personalismo é pura idiossincrasia.

CRÍTICA E SERVIÇO

“Se muitos companheiros estão vigiando os teus gestos, procurando o ponto fraco para criticarem, outros muitos estão fixando ansiosamente o caminho em que surgirás, conduzindo até eles a migalha do socorro de que necessitam para sobreviver.É impossível não saibas quais deles formam o grupo de trabalho em que Jesus te espera”. (Pelo Espírito de Emmanuel)

Ainda estamos na primeira fase da Umbanda (100 anos), a da implantação, já ingressando na segunda fase, a da doutrinação. Muita coisa ainda há de mudar. Hoje, fazemos, cremos e pregamos uma Umbanda. Amanhã, faremos, creremos e pregaremos outra Umbanda, calcada na Espiritualidade Maior. Mas, temos que preparar o terreno para as mudanças que virão futuramente. Ainda nos encontramos presos na egolatria, no egocentrismo e na idiossincrasia, sem ouvirmos atentamente o que nos passa a espiritualidade, pois ainda encontramo-nos preocupados tão somente com fatores externos, esquecendo as mudanças interiores, esquecendo de nos educar nos ensinamentos evangélicos, legados pelo meigo Rabino da Galiléia. Vamos envidar todos os nossos esforços para as mudanças atuais que se fazem necessárias, a fim de que possamos unidos, nos preparar condignamente, para sermos fieis medianeiros e depositários da confiança da Cúpula Astral de Umbanda, em Aruanda.

Importante:

Como já dissemos, o Módulo I foi todo escrito pautado em fatos históricos. A repescagem de dados históricos é tarefa árdua. Pode ser que após o lançamento deste Módulo apareçam mais informações históricas sobre Umbanda; acontecendo, imediatamente estaremos incluindo no livro e na contracapa avisaremos que houve um acréscimo, colocando o capítulo e a página que foram alterados ou mesmo acrescentados. Pedimos aos irmãos que tenham documentos históricos sobre a Umbanda (fotos, reportagens, gravações fonográficas e/ou filmográficas), nos enviem as reproduções, para podermos enriquecer os documentos históricos, que serão disponibilizados gratuitamente.

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Umbandista que não estuda e não se

dedica ao labor mediúnico

caritativo, não é umbandista; é

simplesmente um simpatizante.

Pai Juruá

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VENERANDO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS

Abrindo esse livro, queríamos encontrar uma maneira de homenagear o iniciador da Religião de Umbanda, mas, faltavam-nos palavras, quando encontramos um texto maravilhoso. Não poderíamos nos expressar tão majestosamente como o fez o Capitão Pessoa, um dos baluartes da Umbanda, em 1942, ao homenagear o nosso pastor, o Venerando Senhor Caboclo das Sete Encruzilhadas. Portanto, emocionadamente, fazemos das suas as nossas palavras:

O PASTOR DA UMBANDA “Bem-aventurados os que têm fé, porque esses verão a Deus Nosso Senhor”. A fé é uma das virtudes funda-mentais de todas as religiões. Sublime por excelência, sem ela nada se poderá realizar no terreno espiritual e é por seu intermédio, dependendo da sua maior ou menor intensidade, que as almas se habilitam a levar avante a missão de que se incumbiram. A fé remove montanhas, cura as enfermidades do corpo e da alma, transforma os criminosos em cordeiros, faz o milagre – maravilhoso entre todos – do ladrão subir aos Céus com Jesus Cristo. Foi a fé que levou uma grande alma a realizar em nossa terra uma formidável obra de reforma religiosa, com a implantação, em nosso meio, da Lei de Umbanda. E esta realização é tanto maior quando todos nós sabemos que, no Brasil essencialmente católico, de há 40 anos passados, era quase um crime pensar-se em fazer modificações de ordem espiritual, que pudessem afetar, de leve sequer, o prestígio dos padres de Roma. A realização da tarefa, por isso mesmo espinhosíssima, que sobre os seus ombros tomou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, de organizar a Lei de Umbanda no Brasil, é um verdadeiro milagre de fé, que nos leva a um sentimento de grande amor e de profundo respeito por essa entidade, que se faz pequenina e que procura velar-se sob a capa de uma humildade perfeita. É a ele – ao Pastor de Umbanda – que se deve a purificação dos trabalhos de magia nos Terreiros; é a ele que espiritualmente está entregue a direção de todas as Tendas de Umbanda no Brasil. O Caboclo das Sete Encruzilhadas é o verdadeiro Guia da Umbanda, o pastor das ovelhas de Yemanjá, aquele com quem todos os outros Guias lá no alto combinam, quando querem colaborar nos seus Terreiros. Foi ele quem assumiu perante Oxalá o compromisso de expurgar a Umbanda do rito essencialmente africanista que se vinha praticando desde as primeiras levas de escravos trazidos pelos portugueses.

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Foi ele quem provocando uma guerra com os Espíritos das trevas, diretamente interessados com a implantação dos trabalhos de magia negra, não vacilou um só momento em seguir o programa traçado e arrebanhando as suas ovelhas – verdadeiro Pastor de Umbanda – vai continuando a sua obra de propagação com as constantes inaugurações de Tendas que, filiadas ou não à Tenda de Nossa Senhora da Piedade, são realmente suas, estão, queiram ou não queiram os seus organizadores, debaixo de sua orientação espiritual. Que os que nos lêem não se esqueçam desta verdade: o Caboclo das Sete Encruzilhadas é o legítimo senhor de Umbanda no Brasil; nenhuma entidade, por grande que seja, intervém nos trabalhos da magia branca sem uma prévia combinação com ele. Sei que muitos não concordarão com o nosso pensamento, pelo que peço perdão e licença para elucidá-lo. O meu intuito não é diminuir qualquer das entidades que baixam nos Terreiros de Umbanda e muito menos ferir qualquer suscetibilidade; eu sei, e todos sabem, que podem descer nos Terreiros entidades maiores que o Caboclo das Sete Encruzilhadas, embora não se declarem como tal, mas essas entidades que vem prestar socorro a filhos que sofrem, vem e voltam sem a responsabilidade que cabe ao Caboclo das Sete Encruzilhadas, que recebeu a missão de purificar os trabalhos da magia. Como prova, aí estão as suas Tendas, formando um todo homogêneo, organização que não tem similar e que vem resistindo a todas as campanhas que tem sofrido. As minhas declarações não têm outro sentido a não ser que o Caboclo das Sete Encruzilhadas foi realmente o comissionado para esse fim; ele não vai inovar, veio apenas purificar o que já se fazia no país há algumas centenas de anos; ele não destruiu os rituais praticados, antes deu-lhe força e método e o propagou com sua organização maravilhosa. Verdadeiro Mestre da Magia Branca, responsável pela pureza do seu ritual, ele não poderia abandoná-la, porque o considera sagrado; ao contrário, ele nos ensinou a amá-lo e a respeitá-lo, porque ninguém melhor do que ele sabe que não há religião sem ritual. O que ele deseja, entretanto, é que este ritual de Umbanda, humilde, mas cheio de luz, seja nivelado ao ritual elevado das grandes religiões e isento de toda inferioridade e da prática de coisas inúteis e perniciosas. O que deseja, sobretudo, é que este ritual seja praticado apenas por Guias autorizados, porque não são todos Espíritos que baixam nos Terreiros que se acham à altura de praticá-lo. Essas minhas declarações são tanto mais insuspeitas quanto todos sabem o grande amor que eu e todos os que fazem parte da Casa de São Jerônimo temos ao Caboclo da Lua, que é por nós considerado uma entidade de grandes poderes e elevada espiritualidade. Todavia, e para isso chamo a atenção de todos, por muito grande que seja, ele não hesitou em trabalhar sob a Chefia do Caboclo das Sete Encruzilhadas, e foi ele quem organizou e lhe ofereceu a Tenda de São Jerônimo, que espero será um dos esteios de sua obra formidável. Há alguns anos, previmos que Umbanda seria a futura religião do Brasil, numa visão feliz que posteriormente foi plasmada num estudo humilde e modestamente ofertado pelos filhos de São Jerônimo aos filhos de Santo Agostinho, que a nós são unidos pelo coração e pelos mesmos ideais. Então, a Umbanda era perseguida não só pelos outros credos religiosos, mas ainda, pelas autoridades constituídas que a rebaixavam ao nível da magia negra. Hoje, começamos a ver raiar a alvorada de Umbanda, porque são as próprias autoridades que nos convocam para uma confissão pública de Umbanda como credo religioso, permitindo que, com essa designação, as Tendas de Umbanda funcionem. É a nossa vitória, ou antes, a grande vitória do Caboclo das Sete Encruzilhadas. O que nós todos lhe devemos é de valor inestimável; jamais poderemos pagar os benefícios espalhados a mancheias por ele e pelos Espíritos que acorreram ao seu chamado para ajudá-lo no cumprimento de sua missão. É uma felicidade para nós prestar ao Caboclo das Sete Encruzilhadas essa homenagem, rendendo-lhe um elevado preito de gratidão com o nosso reconhecimento público de que ele é o legitimo Pastor de Umbanda, o único diretamente responsável perante Oxalá por todas as Tendas já organizadas entre nós e por todas as que vierem a se organizar. Este Espírito de eleição, cuja fé é um incentivo para os nossos Espíritos entibiados, cheios de irresoluções, fracos no cumprimento do dever, rebeldes quando não vemos que as coisas marcham sempre ao sabor dos nossos desejos; este Espírito de luz, cujo amor a Oxalá o levou a não ver os espinhos que o feriram ao longo da penosa jornada que teria de percorrer durante tão duros anos, bem merece ser enaltecido por todos os filhos de fé que se sentem felizes no ambiente humilde de Umbanda e que nem de leve suspeitam de seu verdadeiro valor, da sua singular grandiosidade.

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Habituados a ouvir dizer: “O Caboclo das Sete Encruzilhadas baixa tal ou qual Terreiro”, os adeptos de Umbanda imaginam que ele é “mais um” entre os inúmeros que vem para a sua missão de caridade. Já é tempo de corrigir-se o erro; ele não é “um entre muitos”, em Umbanda ele é o “primeiro entre todos”, porque foi comissionado para purificar os seus trabalhos; não há entidade que lhe não preste a sua homenagem, e todos, sem vaidade, sentem-se felizes em auxiliá-lo na sua obra de comissionado, pela qual ele vem lutando há mais de 40 anos. As injustiças, as ingratidões, os escárnios, a zombaria, que lhe tem sido feitas durante todo este tempo, jamais contribuíram para um desfalecimento, por minutos que fosse de sua parte, em levá-la avante. Assim como a tremenda campanha feita contra Nosso Senhor Jesus Cristo, por aqueles que, sem luz, desejavam o aniquilamento de sua obra e o desaparecimento de sua doutrina, só contribuiu para que ela com mais rapidez e segurança se propagasse pelo mundo inteiro, assim também toda a campanha de desmoralização e todo o sistema de intrigas urdido até hoje contra a obra formidável do Caboclo das Sete Encruzilhadas só tem contribuído, e cada vez mais contribuirá, para o seu engrandecimento e para que por todos os séculos se mantenha de pé. Foi a fé que o ajudou a realizar esta obra, que um dia será gigantesca e se espalhará também pelos confins do mundo; é pela fé que ele pretende nos levar aos pés do doce Oxalá, de quem é um humilde devoto. Verdadeiro Pastor de Umbanda, ele vela constantemente pelas suas ovelhas, a fim de que não se contaminem com o hábito pestilencial da magia negra, e sereno, como só os grandes podem ser, ele sorri, confiante na vitória de sua obra, porque sabe que a fé é o seu alicerce, a sustentará pelos séculos afora”. (Por José Álvares Pessoa (Capitão Pessoa), dirigente da Tenda Espírita São Jerônimo – uma das 7 Tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas – em reportagem no Jornal – “Semanário”, número 91 – ano III – página 15 – 1958) Os trechos em negrito são apontamentos nossos, pois achamos importante grifá-los pelas suas importâncias. “Quem tem olhos para ver, que veja”. Existirão os que ignorarão, pelas suas equivocadas interpretações pessoais. UM POUCO MAIS SOBRE O PASTOR DA UMBANDA A obra de espiritualização dos adeptos da Lei de Umbanda pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas nesses quase cinqüenta aos de trabalho ininterrupto das suas Tendas, é alguma coisa de que devemos nos orgulhar, Apraz-me rememorar, constantemente, a fim de que fique bem fixado na mente e no coração de todos os umbandistas e com o objetivo de dar um grande impulso para maior engrandecimento da obra, o desprendimento de todos os que, durante esse tão largo lapso de tempo, vem colaborando, com rara tenacidade, para a conservação do patrimônio espiritual e moral constituído, como uma herança preciosissima para nós, pelo humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas; Todo aquele que, sem parti-pris, se der ao trabalho de fazer um estudo honesto sobre a história da Umbanda no Brasil, terá que chegar à conclusão – para nós muito honrosa e sobremodo grata – de que foram as Tendas do Caboclo das Sete Encruzilhadas que sem receio dos trabalhos afanosos, das lutas incessantes com os que tinham interesse em combater-nos, num trabalho consciente de obediência à orientação do maravilhoso Guia, expurgaram os adeptos de Umbanda das tendências para a magia-negra, impondo aos que as freqüentavam um ritual simples, honesto, digno, de caridade real, porque aos mesmo tempo que cura os males físicos dos que as buscam, doutrina os Espíritos mal acostumados, que comumente confundem Espiritismo de Umbanda com feitiçaria. Não há nada melhor, nem mais admirável a se constatar até hoje. Se lançarmos um olhar em torno de nós, havemos de ver desde tempos que não vão muito longe, porque estão nítidos a memória de todos a Tenda Nossa Senhora da Piedade, tendo à sua frente o Espírito luminoso que é o nosso Guia, atraindo sempre milhares de adeptos que, em busca de lenitivo para os seus males de toda a espécie, a procuram como a verdadeira Meca de Umbanda! Do seu seio saíram todas as organizações no gênero feitas à sua imagem e semelhança; é uma comunidade em que todos os elementos, todos os líderes e os melhores médiuns conhecidos de Umbanda, foram feitos sob as suas vistas nas suas Casas, conviveram com o Caboclo das Sete Encruzilhadas, dele recebendo suas luzes; aprenderam e transmitem as suas magníficas lições. A semente da verdadeira Umbanda saiu dos jardins de sua organização. Ainda hoje é ele o Maomé dessa nova religião, que toma vulto e já se propaga pelo País inteiro, do Norte ao Sul, do Leste ao Oeste.

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Com a humildade que o caracteriza, limitou-se ele a preparar o edifício da fé, da espiritualidade simples e pura; ligou Umbanda ao Evangelho de Jesus, adotando o lema Espírita – “Fora da caridade não há salvação”; jamais pleiteou para a sua organização bens materiais, palácios ou ritual luxuoso; as suas Casas continuam a ser o que sempre foram; portas abertas para todos os que sofrem, sem distinção de classe, credo ou cor; dinheiro é expressão que não se usa, porque a prática da caridade é feita nos moldes pregados no Evangelho de Jesus, sem se olhar as condições das pessoas que batem à sua porta. “Daí de graça o que de graça recebeis”. Somos realmente os legítimos herdeiros de uma fortuna preciosa! A herança que nos foi legada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas constitui patrimônio riquíssimo, não em bens da terra, que depressa se acabam, mas precioso pelo que encerra do ponto de vista espiritual e, portanto, eterno. Temos direito nos sentir orgulhosos e felizes, mas, também cabe-nos uma pesada tarefa m qual a de multiplicar a riqueza que nos dói confiada, fazendo-a render juros altíssimos que, aplicados com a honestidade com que até hoje trabalhamos, possam vir a ser distribuídos pela imensa família constituída pelos filhos do Caboclo das Sete Encruzilhadas, que aumenta em proporção animadora dia a dia. O nosso dever é, pois, muito maior do que os nossos direitos. Não é com a mera formalidade das promessas que podemos dar conta da nossa tarefa. O trabalho que temos diante de nós é talvez ainda mais árduo do que o que coube aos pioneiros que organizaram a obra há cerca de cinqüenta anos. Os nossos inimigos combatam-nos a descoberto em todos os setores. Não temos mãos a medir, talvez não tenhamos mesmo tempo para um pequeno repouso; temos que estar unidos mais do que nunca e sempre vigilantes. Ao tempo da ditadura passamos por momentos de verdadeira apreensão. Várias circunstâncias nos levaram a crer que iríamos ser privados de nossa situação; exigências da lei e das autoridades e causas materiais de diversas espécies pareciam ir privar-nos de tudo; chegamos a recear que fossemos obrigados a fechar as nossas casas. Tudo isso nada mais foi, do que um simples interregno para a segunda fase dos nossos trabalhos, que se mostram tão promissores e que abençoados pelo nosso grande Guia, levaremos mais adiante e mais fortes do que nunca. Por isso, torna-se necessário em torno do nosso querido Chefe, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, e que, confiantes na proteção que nunca nos faltou, não esmoreçamos no cumprimento do dever, como tutelados de Nosso Senhor Jesus Cristo, cujo Evangelho é a nossa norma de conduta e o nosso código de honra, e como legítimos herdeiros do Caboclo das Sete Encruzilhadas, a quem humildemente pedimos força e serenidade para a luta, fé e amor para continuar a realização da sua obra, espalhando com o desinteresse que tem sido o lema de nossa vida, a caridade de que os pobres necessitam. (Por José Álvares Pessoa (Capitão Pessoa), dirigente da Tenda Espírita São Jerônimo – uma das 7 Tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas – em reportagem no Jornal – “Semanário”, número 110 – ano III – página 15 – 1958) Consideramos o Sr. José Álvares Pessoa , uma pessoa brilhante, vanguardeiro e intelectual, sempre colocando a Umbanda em seu verdadeiro patamar. O Capitão Pessoa juntamente com Leal de Souza nos legaram alguns pensamentos doutrinários do Sr. Caboclo das Sete Encruzilhadas, onde nos vislumbramos com a seriedade e simplicidade de tudo. Pena hoje, só vermos a simples doutrina e “Linhas Mestras” do instituidor da Umbanda sendo praticada por raríssimos Terreiros de Umbanda.

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A IMPLANTAÇÃO DA UMBANDA NO BRASIL

Relataremos agora, após exaustivos estudos e pesquisas, o relato do inicio da Umbanda, bem como da vinda do seu iniciador, o Caboclo das Sete Encruzilhadas: De uma tradicional família católica das Neves, São Gonçalo, Rio de Janeiro, nasce no dia 10 de abril de 1891, Zélio Fernandino de Moraes, filho de Joaquim Fernandino Costa e Leonor de Moraes Silva, filha do poeta José de Moraes Silva e Anna de Moraes e Silva, pais do Dr. Epaminondas de Moraes, diretor da “Colônia de Alienados” em Vargem Alegre, que atendeu Zélio em seus “ataques”. “Com a seguinte afirmativa: “Umbanda é a manifestação do Espírito para a Caridade”, demarcando o advento do Caboclo das Sete Encruzilhadas, no dia 15 de novembro de 1908, iniciará a trajetória de Zélio Fernandino de Moraes, diretamente ligada ao processo de legitimação e institucionalização do culto umbandista, bastante significativa na construção de uma identidade contemporânea de referência nacional, que irá considerar a Umbanda como uma religião brasileira, legitimada através dos elementos socioculturais rememorados, que constituem a reelaboração da sua própria história”. (Sérgio Estrellita da Cunha)

A Umbanda é anunciada Falar sobre Umbanda não é fácil, embora pareça, visto esta, ser freqüentemente considerada como um subproduto dos cultos afro e por isso, colocada sob sua influência direta no tocante e fatores como ritualística, doutrina e conceitos sobre as Hierarquias Espirituais (Orixás). Por isso, muitos escritores, que não são umbandistas – dignos de respeito – se vêem capacitados a escrever sobre Umbanda, simplesmente por considerá-la um mero item, um subproduto, dentro da religião ou cátedra que se especializaram. A verdade é bem diferente, pois a Umbanda tem uma sistemática própria, toda uma ciência independente e complexa em sua essência, bastante adversa dos cultos afros, do kardecismo, do catolicismo e outros, que muitas vezes até mesmo desdenham da eficácia e da seriedade do movimento umbandista, apontando-o como um mero apêndice, apenas por ser simples em sua aparência externa. Na Umbanda, quanto mais simples, melhor. Para os ensinamentos umbandistas, não existem segredos e nem mistérios.

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Esta é uma das regras ditadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, quando de sua manifestação inicial como religião. E como religião temos o seguinte: “Religião é um sistema solidário de crenças e práticas relativas a coisas sagradas, que unem em uma mesma comunidade moral, todos os que a ele servem”. Sendo assim, podemos afirmar que a Umbanda é uma religião. A sua doutrina se caracteriza pelas infiltrações positivas de outros costumes, pela falta de coesão e de origem única, por isso a consideramos universalista, e até por isso, crística. Em sua essência é uma religião crística e brasileira, porque apesar de ter culturação doutrinária mesclada em algumas verdades eternas desenvolvidas nas filosofias afro/ameríndia/espírita/católica/ocultista/orientalista, com fenomenologia mediúnica, desenvolveu-se e consolidou-se num credo apropriado à evolução, temperamento, cultura e anseio do povo brasileiro. Ressente-se ainda de uma coesão cultural. Tende, porém com o tempo, à uniformização, tornando-se homogênea, com uma base única e universalista, assim que forem corrigidas as poucas discrepâncias que permaneceram em conseqüência de idiossincrasias, das superstições, fetichismos, totemismos, magias e doutrinas herdadas, que não coadunam com o pensamento crístico e nem com a simplicidade umbandística. Pelo imenso número de adeptos que a Umbanda possui não é difícil surgir em seu meio, alguém portador das qualidades necessárias para reestruturá-la e fazer com que todas as casas de culto se unam sob uma cultura coesa. Entendemos que a Umbanda, enquanto religião é nova e é brasileira. Está fundamentada em Deus, nas mensagens crísticas dos Mestres Cósmicos, na crença na existência dos Poderes Reinantes do Divino Criador, conhecida por todos como Orixás, cujo conhecimento inicial nos legaram os cultos afros, assim como no conhecimento, respeito e uso dos elementos da Natureza legados pelos Pajés, calcada na fenomenologia mediúnica ensinada na Codificação Espírita, nas orientações de alguns Espíritos militantes no movimento Kardecista, nas práticas esotéricas Orientais e Ocultistas e na crença em Nosso Senhor Jesus Cristo, na Mãe Maria Santíssima, nos Anjos, alguns Santos legados pelo catolicismo popular. Tentar dar a Umbanda, como ela é praticada atualmente, uma origem diferente, de uma religião nova, é faltar com o bom senso. Tudo surgiu timidamente nas práticas da pajelança indígena, e nos vários cultos afros vindos com os escravos. No início do século XX já era popular e se espalhava por muitos rincões do Brasil, mas, sem a nomenclatura de Umbanda. Estava sendo efetuado um ensaio de sua manifestação, bem com uma arregimentação de Espíritos disposto a prática da caridade. O que realmente aconteceu é que já havia as manifestações mediúnicas de Espíritos regionalizados, mas não havia ainda surgido o nome Umbanda e seus postulados. Os rituais ainda eram praticados de maneira confusa e deturpados. Foi quando, por misericórdia Divina, foi enviado através da mediunidade de um “jovem”, um índio brasileiro, que veio sanear o já existente, formando a partir dai as bases do novo culto, estruturando-o e divulgando-o como religião, não só à população carente, pois como a mediunidade popular era praticada, espantava àqueles mais cultos e estudiosos, pois viam naquelas manifestações, mediunismos voltados ao atraso espiritual (baixo espiritismo), pois eram calcados em práticas sem base nenhuma de concordância, espiritualidade e bom senso, sedimentadas praticamente em feitiçarias com fins pecuniários e manifestações medianímicas rústicas e primitivas. O catolicismo, religião de predominância, repudiava a comunicação com os mortos. A doutrina Kardecista estava preocupada apenas em reverenciar e aceitar, como nobres, as comunicações de Espíritos que se pautavam numa linguagem catedrática e rebuscada. O Candomblé como religião estruturada somente surgiria no Rio de Janeiro na década de 1930 (segundo o antropólogo Reginaldo Prandi), não aceitava a incorporação de Eguns (O termo Egun ou Egum é uma palavra da língua Yoruba usada no Candomblé que significa Alma ou Espírito de qualquer pessoa falecida iniciada ou não. O termo Egum é muito abrangente, pode ser desde um Espírito considerado de luz, de um parente, como um Espírito desorientado obsessor que precisa ser afastado). Deus, por misericórdia, atento ao cenário existente, ordenou que se estruturasse aquela que seria uma Religião Mediúnica, aberta a todos os Espíritos de boa vontade que quisessem praticar a caridade, independentemente das origens terrenas em outras encarnações, suas religiosidades, e que pudessem dar um freio ao radicalismo mediúnico magístico negativo existente, e os que surgiriam futuramente no Brasil. Começou a se plasmar, a Religião de Umbanda, com suas hierarquias, bases, atributos, atribuições, funções e finalidades. Enquanto isso, no plano terreno surge no ano de 1904, o livro Religiões do Rio, elaborado por “João do Rio”, pseudônimo de Paulo Barreto, membro emérito da Academia Brasileira de Letras. No livro, o autor faz um estudo sério e inequívoco das religiões e seitas existentes no Rio de Janeiro, naquela época, capital federal e centro sócio/político/cultural do Brasil. O escritor, no intuito de levar ao conhecimento da sociedade os vários segmentos de religiosidades que se desenvolviam no então Distrito Federal, percorreu Igrejas, Templos, locais de feitiçarias, Macumbas, sessões baseadas na tradição africana, Sinagogas e outros, entrevistando pessoas e testemunhando fatos. Não obstante tal obra ter sido pautada em profundas pesquisas, em nenhuma página desta respeitosa edição cita-se o vocábulo Umbanda, pois tal terminologia era desconhecida.

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No final de 1908, uma família tradicional de Neves, um bairro de São Gonçalo, fronteiriço com a cidade de Niterói, foi apanhada de surpresa por fatos considerados sobrenaturais; o jovem Zélio Fernandino de Moraes, na época um jovem com 17 anos se preparava para ingressar na Marinha como aluno oficial quando começou a sofrer estranhos “ataques”. Esse mal estar físico e psíquico era caracterizado por posturas de um velho, falando coisas desconexas, como se fosse outra pessoa que havia vivido em outra época, ou ainda, assumindo uma forma física que lembrava um felino lépido e desembaraçado que parecia conhecer todos os segredos da Natureza. Como esse estado de coisas foi se agravando, a família recorreu ao Dr. Epaminondas de Moraes, médico da família e tio de Zélio, que era diretor da “Colônia de Alienados” em Vargem Alegre. Após examiná-lo e observá-lo durante vários dias, reencaminhou-o à família, dizendo que a loucura não se enquadrava em nada do que ele havia conhecido, ponderando ainda, que melhor seria encaminhá-lo a um padre, pois o garoto mais parecia estar endemoniado. Como acontecia com quase todas as famílias importantes da época, também havia na família Moraes um sacerdote católico. Através desse padre, tio de Zélio, foi realizado um exorcismo, sem o sucesso esperado, pois os chamados ataques prosseguiam, apesar de tudo. Depois de algum tempo, Zélio passou alguns dias com uma espécie de paralisia, prendendo-o a cama, sendo levado por sua mãe a uma benzedeira, que, segundo relatos, era médium de um Espírito chamado tio Antonio. Alguém sugeriu que “isso era coisa de espiritismo” e que era melhor levá-lo à Federação Espírita de Niterói (segundo relatos, essa Federação era dirigida por José de Souza), município vizinho àquele em que residia a família Moraes (Neves), pois era presumido que àqueles fenômenos estariam ligados a manifestações de entidades sobrenaturais. Alguns alegam que a Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas era uma Umbanda kardequizada (Umbanda Branca), pelo fato de que o pai de Zélio era kardecista (Seu pai, Sr. Joaquim Fernandino Costa, gostava muito de ler e estudar as obras de Allan Kardec). Isso é totalmente desqualificado, pois pelos próprios relatos históricos nos esclarecem que Zélio apresentava vários problemas comportamentais, e que fora encaminhado a um médico, a um padre, a uma benzedeira e por último, por sugestão de uma conhecida, a um Centro Espírita. Se seu pai fosse kardecista, porque então já não diagnosticou o problema e levou seu filho ao Centro que freqüentava??? Zélio mesmo, numa entrevista diz: “Surpreendi-me haver dialogado com aqueles austeros senhores de cabeça branca, em volta de uma mesa onde se praticava um trabalho, para mim desconhecido”; se o culto kardecista era desconhecido do próprio Zélio, como poderia seu pai ser kardecista? O pai de Zélio assim como toda a sua família eram católicos fervorosos; o Sr. Joaquim não era kardecista na acepção da palavra; em época, com a novidade dos livros de Kardec, muitos, por curiosidade, liam os livros, coadunando com os ensinamentos racionais de Kardec. O máximo que podia ter acontecido em época, seria o Sr. Joaquim, juntamente com outros, realizavam estudos da Codificação Kardequiana em seu lar. Neste momento irá se iniciar um relato de referência à construção da identidade umbandista, quando através de Zélio Fernandino de Moraes, irá se manifestar o “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, trazendo a mensagem da manifestação do Espírito para a caridade, o foco de trabalho do ritual, devoção, religiosidade, liturgia, daquela que foi denominada Religião de Umbanda, com uma contundente proposta institucionalizadora: “...Vim para criar uma nova religião, baseada no Evangelho de Jesus e que terá como seu maior mentor o Cristo...” (Caboclo das Sete Encruzilhadas) Vamos aos dados históricos do nascedouro da Umbanda: 14 DE NOVEMBRO DE 1908 Segundo a Sr. Zélia de Moraes Lacerda (filha de Zélio), em gravação efetuada em 1992, por Solano, Mãe Mariazinha e Dr. Júlio, na fita de nº. 45 (disponibilizada juntamente com este livro em nosso site), aos 07 minutos e 30 segundos da gravação, assim relata: ... (Solano pergunta) dia 14 de novembro de 1908, Zélio de Moraes estaria em cama, e que de repente ele se levanta, se alceia quase na cama, porque não conseguia se levantar porque estava doente, e teria dito com uma voz que já não era dele, que no dia seguinte o aparelho estaria curado. Este fato ocorreu mesmo? (Zélia responde); bom; ocorreu, mas o seguinte; ele foi antes; foi na casa desta preta (nota do autor: esta negra, era uma rezadeira, que a mãe de Zélio o levou para ser benzido); eu faço questão de dizer; a Umbanda nasceu na humilde casa de uma preta, lá na Rua São José. Eva (nota do autor: Segundo alguns relatos escritos, o nome da rezadeira que benzeu Zélio, seria Cândida. Mas, segundo o relato fonográfico da própria Zélia, tendo ao fundo também a voz de Zílméia de Moraes, o nome da benzedeira seria Eva); ela recebia uma entidade chamada Tio Antonio e disse a ele (nota do autor: Zélio) que o irmão dele (nota do autor: irmão de Tio Antonio, que seria conhecido como Pai Antonio. Em época de escravidão, quando negros aportavam no Brasil, todos eram batizados pelo clero, e recebiam, todos, o nome do Santo do dia, o padroeiro ou de devoção; portanto, possivelmente, em vida, a entidade espiritual Tio Antonio, tinha um irmão, também chamado Antonio) iria trabalhar com meu pai.

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(Solano pergunta) E qual o endereço dessa preta; (Zélia responde) Rua São José, em Fonseca, um bairro de Niterói. ...(Solano pergunta) Essa primeira manifestação, quando ele disse, que o aparelho no dia seguinte, estaria curado, foi no dia 14; não foi isso? (Zélia responde) Foi na casa de Eva... (nota do autor: pelo relato da Srª. Zélia, dia 14 de novembro de 1908, na casa da rezadeira Eva, houve uma manifestação mediúnica em Zélio (não sabemos qual Espírito era; possivelmente, poderia ser o próprio Pai Antonio), dizendo que no outro dia Zélio estaria curado. Portanto, pelo relato acima descrito, a primeira manifestação mediúnica de um Guia Espiritual em Zélio de Mores com comunicação, deu-se na casa da rezadeira Eva e não na Federação Espírita de Niterói (que foi a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas). Com certeza mais alguma revelação deve ter sido dita pelo tal Espírito, mas, somente a mãe de Zélio, que estava presente poderia nos dizer. Por isso, o dia 14/11/1908 é considerado pelas filhas de Zélio de Moraes como a data formal do nascimento da Umbanda; se elas assim achavam, com certeza o próprio Zélio teria dito isso. A anunciação formal da Umbanda deu-se ma primeira sessão, em casa de Zélio no dia 16/11/1908, e não no dia 15/11/1908.

15 DE NOVEMBRO DE 1908 Zélio foi convidado a participar da sessão e José de Souza determinou que ele tomasse lugar à mesa. Tomado por uma força estranha e alheia a sua vontade, Zélio levantou-se e disse: “Aqui está faltando uma flor”. Saiu da sala indo ao jardim e voltando logo após com uma flor, que colocou no centro da mesa. Esta atitude causou um enorme tumulto entre os presentes, principalmente porque, ao mesmo tempo em que isso acontecia, ocorreram surpreendentes manifestações de Índios e Pretos-Velhos em todos os médiuns da Mesa de Trabalho Kardecista. O diretor da Sessão Kardecista achou aquilo tudo um absurdo e advertiu-os, com aspereza, citando o “seu atraso espiritual” e convidando-os a se retirarem. Estava caracterizado o racismo espirítico desde aquele instante, e infelizmente perdura até hoje. Novamente, essa força estranha tomou o jovem Zélio e através dele um Espírito falou: “Por que repeliam a presença dos citados Espíritos, se nem sequer se dignaram a ouvir suas mensagens. Seria por causa de suas origens sociais e da cor?”. A essa admoestação da entidade, que estava com o médium Zélio, deu-se uma grande confusão, todos querendo se explicar, debaixo de acalorados debates doutrinários, porém a entidade “resoluta” mantinha-se firme em seus pontos de vista. Nisso, um vidente pediu que a Entidade se identificasse, já que fora notado que ela irradiava uma luz positiva. Ainda mediunizado, através do médium Zélio o Espírito respondeu: “Se querem um nome, que seja este: sou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque, para mim, não haverá caminhos fechados”. O vidente interpelou a entidade dizendo que ele se identificava como um índio, mas que via nele restos de trajes sacerdotais. A entidade respondeu então: “O que você vê em mim, são restos de uma existência anterior. Fui padre jesuíta e o meu nome era Gabriel Malagrida. Acusado de bruxaria, fui sacrificado na fogueira da Inquisição, em Lisboa, no ano de 1761. Mas em minha última existência física, Deus concedeu-me o privilégio de nascer como Caboclo brasileiro”. E ainda, usando o médium, anunciou o tipo de missão que trazia do astral: fixar as bases de um culto, no qual todos os Espíritos de Caboclos e Pretos-Velhos poderiam executar as determinações do Plano Espiritual, e que no dia seguinte (16 de novembro de 1908) manifestaria na residência do médium, às 20h00min, e fundaria uma Tenda Espírita que falaria aos pobres, humildes, doentes, necessitados do corpo da alma, onde haveria igualdade para todos, encarnados e desencarnados. E ainda foi guardada a seguinte frase, que a entidade pronunciou no final: “Levarei daqui uma semente e vou plantá-la nas Neves (bairro onde o médium morava) onde ela se transformará em árvore frondosa”. Durante o desenrolar da entrevista, entre muitas outras perguntas, o vidente teria perguntado se já não bastariam às religiões já existentes e fez menção ao Espiritismo. O Caboclo respondeu da seguinte forma: “Deus, em sua infinita bondade, estabeleceu na morte, o grande nivelador universal, rico ou pobre, poderoso ou humilde, todos se tornariam iguais na morte, mas vocês, homens preconceituosos, não contentes em estabelecer diferenças entre os vivos, procuram levar essas mesmas diferenças até mesmo além da barreira da morte. Por que não podem nos visitar esses humildes trabalhadores do espaço, se apesar de não haverem sido pessoas socialmente importantes na Terra, também trazem importantes mensagens do além?”. Ao final, o vidente fez a seguinte pergunta: pensa o irmão que alguém irá assistir o seu culto? Ao que o Caboclo respondeu: “Cada colina de Niterói atuará como porta-voz anunciando o culto que amanhã iniciarei”. 16 DE NOVEMBRO DE 1908 – A PRIMEIRA SESSÃO Zélio de Moraes, em 1975, com 83 anos de idade, na tranqüilidade do sítio em que reside em Cachoeiras de Macacú (Boca do Mato), relatou o que ocorreu no dia seguinte, 16 de novembro de 1908 à repórter e dirigente de Umbanda, Srª Lilia Ribeiro:

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Minha família estava apavorada. Eu mesmo não sabia explicar o que se passava comigo. Surpreendia-me haver dialogado com aqueles austeros senhores de cabeça branca, em volta de uma mesa onde se praticava um trabalho, para mim desconhecido. Como poderia, aos 17 anos, organizar um culto? No entanto, eu mesmo falara, sem saber o que dizia e porque dizia. Era uma sensação estranha: uma força superior que me impelia a fazer e a dizer o que nem sequer se passava pelo meu pensamento. E no dia seguinte, em casa de minha família, na Rua Floriano Peixoto, 30, em Neves, ao se aproximar à hora marcada – 20h00min – já se reuniam os membros da Federação Espírita, seguramente para comprovar a veracidade do que fora declarado na véspera; os parentes mais chegados, amigos, vizinhos e, do lado de fora, grande número de desconhecidos. Às 20h00min, manifestou-se o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Declarou que se iniciava, naquele momento, um novo culto em que os Espíritos dos velhos africanos, que haviam servido como escravos e que, desencarnados, não encontravam campo de ação nos remanescentes das seitas negras, já deturpadas e dirigidas quase exclusivamente para trabalhos de feitiçaria, e os índios nativos da nossa terra, poderiam trabalhar em benefício dos seus irmãos encarnados, qualquer que fosse a cor, a raça, o credo e a condição social. A prática da caridade, no sentido do amor fraterno, seria a característica principal deste culto, que teria por base o Evangelho de Jesus e como Mestre Supremo o Cristo. Em seguida, o Caboclo fez uma série de revelações sobre o que estava à espera da humanidade: “Este mundo de iniqüidades mais uma vez será varrido pela dor, pela ambição do homem e pelo desrespeito às leis de Deus. As mulheres perderão a honra e a vergonha, a vil moeda comprará caracteres e o próprio homem se tornará efeminado. Uma onda de sangue varrerá a Europa (nota do autor: 1ª Guerra Mundial), e quando todos acharem que o pior já foi atingido, uma outra onda de sangue (nota do autor: 2ª Guerra Mundial), muito pior do que a primeira voltará a envolver a humanidade”. No final dessa reunião, o Caboclo ditou certas normas para a seqüência dos trabalhos, inclusive atendimento absolutamente gratuito, roupagem branca, simples, sem atabaques, nem palmas ritmadas e os cânticos seriam baixos, harmoniosos. A esse novo tipo de culto que se formava nessa noite, a entidade deu o nome de “UMBANDA”, que seria “a Manifestação do Espírito para a Caridade”. Posteriormente, reafirmou à Leal de Souza que “Umbanda era uma Linha Branca de Demanda para a Caridade”. Deve-se ressaltar que, inicialmente o Caboclo chamou o novo culto de “Alabanda” (esmiuçaremos melhor esse assunto no capítulo: “O Significado da Palavra Umbanda”, no Módulo II). Também nesse dia 16, foi fundada uma Tenda com o nome “Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade”, porque, segundo as palavras do Caboclo das Sete Encruzilhadas: “Assim como Maria acolhe em seus braços o Filho, a Tenda acolheria aos que a ela recorressem nas horas de aflição”. Observem que as informações que nos foram dadas seria que os primeiros umbandistas utilizavam o termo “Espírita” no registro social de seus Terreiros pelo fato de estarem se protegendo das perseguições policiais da época. Na realidade, o uso do termo “Tenda Espírita”, teve como causa o fato de em época não se poder registrar o nome Umbanda que não era reconhecida como religião. O termo “Espírita” já tinha certa respeitabilidade por parte da sociedade elitista carioca, embora, igualmente, sofriam perseguições e preconceitos pela população católica em geral. Portanto, não se utilizava “Tenda Espírita” tão somente para se ocultar atrás do nome “Espírita” para não sofrer perseguições. Se fosse para se esconderem ou mesmo se protegerem das perseguições por trás do nome “Espírita”, porque então utilizaram o sobrenome “Tenda”; não teria lógica; só o termo “Tenda” já os denunciaria. Na realidade, as perseguições por parte da República iniciaram somente a partir de 1920, sob o governo de Washington Luiz, se estendendo até o governo de Getúlio Vargas. Se assim o foi, não existiam perseguições pelo poder público de 1908 até 1920. O uso do nome “Espírita” era somente pelo fato de que os dirigentes espirituais da Linha Branca de Umbanda e Demanda consideravam-na ser uma associação e/ou sociedade com o Espiritismo, ou seja, uma modalidade de Espiritismo, pois seguiam os ensinamentos da codificação kardequiana, que, aliás, não depõe em nada do praticado pela Linha Branca de Umbanda, que também é “Doutrina Espírita”. O Kardecismo era e é tido por nós como outra modalidade do dito Espiritismo; cremos assim, pois Espiritismo não é religião; “O Espiritismo era apenas uma simples doutrina filosófica; foi a Igreja quem lhe deu maiores proporções, apresentando-o como inimigo formidável; foi ela, enfim, quem o proclamou nova religião. Foi um passo errado, mas a paixão não raciocina melhor” (O que é Espiritismo). “O espiritismo não é, pois, uma religião. Do contrario teria seu culto, seus templos, seus ministros” (Revista Espírita de 1859). “Desta feita, opta por um procedimento diferente. Já dissera nove anos antes (1859) de forma peremptória, que o espiritismo não era religião, enquanto essa palavra significasse culto formal, igreja ou seita, crença mística e piedosa ou coisa assim”. (É o espiritismo uma religião? Revista Espírita, pg.351 a 360, ref. Dezembro de 1868). Kardec afirma: “... Uma vez que, por toda parte que haja homens, há almas ou Espíritos, que as manifestações são de todos os tempos, e que o relato se encontra em todas as religiões, sem exceções. Pode-se, pois, ser católico, grego ou romano, protestante, judeu ou muçulmano, e crer nas manifestações dos Espíritos, e por conseqüência, ser Espírita; a prova é que o Espiritismo tem adeptos em todas as seitas” (O que é Espiritismo, p. 189). Por essa afirmativa sem contestação, no entendimento dos Espíritos que militam nas lides umbandistas, a Umbanda também é uma modalidade espírita; por isso colocavam como designativo de seus Terreiros, “Tenda Espírita”, e nunca “Centro Espírita” que é o termo utilizado pelos kardecistas; mas, os seguidores do kardecismo não aceitaram e não aceitam tal dissertativa, mas, os fatos estão ai;o resto é pura conjectura.

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Segundo uma entrevista gravada em vídeo de nossa propriedade, com a Srª. Lygia Cunha (Neta de Zélio) e seu filho Leonardo Cunha dos Santos (bisneto de Zélio), quando às perseguições policiais em época de Zélio de Moraes por causa de atabaques, Leonardo diz: “...o uso dos atabaques; nunca usamos; que o contrário do que eu já ouvi, que eles (Tenda da Piedade) não usavam que era para não atrair a atenção da polícia; não. A polícia foi um problema nos primórdios da Umbanda, mas não se usava atabaques por conta da polícia; o Chefe (Caboclo das Sete Encruzilhadas) nunca permitiu.. para nossa casa, só pontos cantados; nem palmas; porque o Chefe não queria. Mas se vocês forem investigar vocês vão envolver polícia e a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, mas numa outra base, nunca numa base de medo, até porque muitas das pessoas que freqüentavam essa Casa foram delegados, foram oficiais de polícia, oficiais do exército como meu outro avô, que chegou a ser general do exército”. Só por essa afirmação fidedigna, chegamos a conclusão que não havia perseguições policiais na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade no que tange a nominação da Tenda e muito menos que não se usava atabaques para fugir de acossamentos. Essa coisa de perseguições a esse nível foi puro achismo de quem não se preocupa em pesquisar fatos históricos, e somente emite opiniões calcadas em suas idiossincrasias. Disse ainda o seguinte: “Todas as entidades serão ouvidas, e nós aprenderemos com aqueles Espíritos que souberem mais e ensinaremos àqueles que souberem menos e a nenhum viraremos as costas e nem diremos não, pois esta é à vontade do Pai”. Ditadas as bases do culto, após responder, em latim e em alemão, às perguntas dos ali presentes, o Caboclo das Sete Encruzilhadas passou à parte prática dos trabalhos, curando enfermos, fazendo andar aleijados. Antes do término da sessão, manifestou-se um Preto-Velho, Pai Antônio, que vinha completar as curas. Nos dias seguintes, verdadeira romaria formou-se na Rua Floriano Peixoto. Enfermos, cegos, paralíticos vinham em busca de cura e ali a encontravam, em nome de Jesus. Médiuns, cuja manifestação mediúnica fora considerada loucura deixaram os sanatórios e deram provas de suas qualidades excepcionais. Quando o Caboclo das Sete Encruzilhadas incorporava, cantava o seguinte ponto: “Chegou, chegou, chegou com Deus. Chegou, chegou, o Caboclo das Sete Encruzilhadas”. “A primeira vez em que os videntes o vislumbraram, no início de sua missão, o Caboclo das Sete Encruzilhadas se apresentou como um homem de meia idade, a pele bronzeada vestindo uma túnica branca, atravessada por uma faixa branca onde brilhava, em letras de luz, a palavra “Cáritas”. Depois de muito tempo, só se mostrava como um Caboclo com tanga de plumas e mais atributos dos pajés silvícolas. Passou, mais tarde, a ser visível na alvura de sua túnica primitiva, mas há anos acreditamos que só em algumas circunstâncias se reveste da forma corpórea, pois os videntes não o vêem, e quando a nossa sensibilidade e os outros Guias assinalam a sua presença, fulge no ar uma vibração azul e uma claridade dessa cor paira no ambiente”. (Leal de Souza)

UMBANDA – A MANIFESTAÇÃO DO ESPÍRITO PARA A CARIDADE

A partir de uma contundente declaração do “Caboclo” através de Zélio de Moraes, iniciava um novo culto em que os Espíritos dos ancestrais africanos, ex-escravos, como também os indígenas brasileiros, abarcando a todas as almas afins que estivessem aptas a trabalharem em prol dos irmãos encarnados, de pluralidades diversas, sejam de caráter étnicos, religiosos e socioculturais, onde a “Manifestação do Espírito para a Caridade”, através de um direcionamento de amor fraterno, seria a principal característica deste culto, embasada no Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, e considerando como Mestre Supremo, o Cristo Planetário. É mister salientar, que de acordo com este novo culto, ir-se-ia trazer uma nova proposta regeneradora com relação aos chamados remanescentes das “seitas negras”, que estavam sendo considerados uma deturpação, pois estariam ligadas aos chamados rituais de feitiçaria, encomendas de trabalhos de magia negra, (macumbarias), no senso comum, onde na maior parte dos casos, usavam determinados mecanismos magísticos negativos, no intuito de prejudicarem algum incauto. O “Caboclo das Sete Encruzilhadas” através de Zélio estabelece as normas e procedimentos litúrgicos e ritualísticos deste novo culto. Seriam denominadas “Sessões” os períodos dos trabalhos com as entidades espirituais, diariamente, das 20h00min ás 22h00min; estando os médiuns de maneira uniforme com vestuários de cor branca, atendendo a “clientela” gratuitamente. Quando foi relatado o ritual preconizado pelo “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, por intermédio de Zélio de Moraes, são percebidas algumas reelaborações das tradições religiosas afro-brasileiras, consideradas exageros, supérfluo como nos remete a sua própria fala: “O Caboclo das Sete Encruzilhadas nunca determinou o sacrifício de aves e animais, quer para homenagear entidades, quer para fortificar a minha mediunidade”. Nos rituais estabelecidos pelo “Caboclo”, não deveriam ser utilizados atabaques, palmas ritmadas, apenas os cânticos entoados com firmeza, no intuito de incorporar as entidades espirituais e para manutenção da corrente vibratória de pensamentos. Demais adornos, espadas, capacetes, escudos, vestimentas multicores, rendas, lamês, que eram considerados adereços fomentadores da vaidade dos chamados “aparelhos”, determinados indivíduos que iriam incorporar os Guias do astral, não estavam de acordo com as orientações que iriam ser aceitas nos Terreiros que seguiriam o ritual que a entidade iniciou.

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O vestuário seria branco, confeccionado a partir de um tecido modesto. O uso de colares ritualísticos, chamados de guias, seriam determinadas pelas entidades que iriam se manifestar. É deixado claramente que não é a quantidade das guias que daria força ao médium, indivíduo que tinha a possibilidade de receber as entidades da Aruanda, como bem relatou em uma entrevista à jornalista Lilia Ribeiro da Revista “Gira de Umbanda” no ano de 1972: “A guia deve ser feita de acordo com os protetores que se manifestam. Para o Preto-Velho deve-se usar a guia de Preto-Velho, para o Caboclo a guia correspondente ao Caboclo. É o bastante. Não há necessidade de carregar cinco ou dez guias no pescoço”. Os principais elementos de preparação mediúnica seriam os banhos de ervas, os Amacis, as concentrações nos ambientes da Natureza: praias, florestas, cachoeiras, pedreiras, montanhas, campos, lagoas, jardins, etc., para refazimento energético e harmonizações. O aspecto doutrinário seria embasado no Evangelho de Jesus, sendo bastante severos os testes que iriam considerar aptos os indivíduos que deveriam cumprir a missão de manifestar o Espírito para a caridade, a mediunidade na Umbanda. (Sérgio Estrellita da Cunha, com complementações do autor) O Caboclo das Sete Encruzilhadas, já nos mostrava que a Umbanda é caridade. A prática da caridade, no sentido do amor fraterno, seria a característica principal do culto umbandista, que teria por base o Evangelho Redentor do Mestre Jesus, e que teríamos como Mestre Supremo, o Cristo Planetário.

O PRETO-VELHO PAI ANTONIO

Segundo testemunhas idôneas, ainda nessa noite (16 de novembro de 1908), manifestou-se um Preto-Velho, de nome Pai Antonio, um portento de sabedoria e de força espiritual. Quando essa entidade se manifestou, parecia estar pouco à vontade frente a tanta gente e que, se recusando permanecer na mesa onde se dera à incorporação, procurava passar despercebido, humilde, aparentando alta idade e apresentando o corpo curvado, o que dava ao jovem Zélio um aspecto estranho, quase irreal. Essa entidade logo despertou profundo sentimento de carinho e bem estar entre os presentes. Perguntado, então, por que não se sentava à mesa, com os demais irmãos, respondeu: “Nego num senta não meu sinhô, nego fica aqui mesmo. Isso é coisa de sinhô branco i nego deve arrespeitá”.

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Era a primeira manifestação desse Espírito iluminado e que, diante da insistência dos irmãos encarnados, disse: “Num carece preocupá não, nego fica no toco que é lugá di nego”. A atitude dessa sábia e portentosa entidade tinha a finalidade principal de incutir, desde o início, a humildade nos presentes. Procurava assim, demonstrar que se contentava em ocupar um lugar mais singelo, mostrando que poderia se adaptar a qualquer situação, e que os futuros Terreiros de Umbanda não precisavam ser palácios e fortalezas de mármore e ouro. A tentativa de transmitir a humildade continuou através de respostas bem simples e que não mostravam a real condição espiritual e sabedoria desse valoroso enviado do Astral Superior. Perguntado como havia sido sua morte física, disse que havia ido à mata apanhar lenha, sentiu alguma coisa estranha, sentou-se e nada mais se lembrava. Sensibilizado com tanta humildade, alguém lhe perguntou respeitosamente se ele sentia saudade de alguma coisa que havia deixado na Terra. Pai Antonio respondeu então: “Minha cachimba; nego qué o pito que deixou no toco... Manda mureque buscá”. Era a primeira vez que algum Espírito pedia alguma coisa material, o que causou grande espanto nos presentes. Era uma forma de introduzir o ato de fumar cachimbo, pelos Pretos-Velhos incorporados, o que nós sabemos hoje ser usado para benefício dos médiuns e consulentes. Do mesmo modo, os Caboclos também passaram a usar cachimbos e charutos, com a mesma finalidade. Desse modo surgiu um ponto cantado que ainda hoje é utilizado em vários Terreiros:

“Meu cachimbo está no toco manda moleque busca; No alto da derrubada meu cachimbo ficou lá;

Que arruda tão bonita que Vovó mandou arrancar; Mas não chore meu netinho que Vovó manda plantar”.

O ponto que mostraremos a seguir mostra que Pai Antonio conhecia medicina (chegou a “debater” várias vezes com alguns médicos) e que uma das suas principais ordens e direitos era a cura espiritual dos consulentes merecedores:

“Dá licença, Pai Antonio que eu não vim lhe visitar; Eu estou muito doente, vim prá você me curar. Se a doença for feitiço pulará em seu Congá.

Se a doença for de Deus ai: Pai Antonio vai curar. Coitado de Pai Antônio; Preto Velho curador;

Foi parar na detenção ai; por não ter um defensor; Pai Antônio é kimbanda, é curador; Pai Antônio é kimbanda, é curador;

É pai de mesa, é curador; É pai de mesa, é curador”.

ESTES EU POSSO CURAR, AQUELES SÓ A MEDICINA Algumas testemunhas contam que alguns médicos dos sanatórios de doenças consideradas mentais, como o de Jurujuba, em Niterói, enviavam uma relação de doentes e a entidade, possivelmente o “Orixá Mallet”, incorporado em Zélio, indicava os que efetivamente eram portadores de perturbações psíquicas e aqueles que eram qualificados como obsedados pelos malefícios da baixa magia, tendo a possibilidade de cura imediata, através dos procedimentos ritualísticos preconizados pelo “Caboclo das Sete Encruzilhadas”: “Estes, eu posso curar, podem se direcionar á residência do meu aparelho. Os outros são realmente enfermos mentais, então a cura compete à medicina vigente”. A DOUTRINA E A CONDUTA DO MÉDIUM A parte prática dos trabalhos maravilhava a todos e as curas de obsedados se repetiam diariamente. A doutrina umbandista, ministrada pelo “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, chamado de “O Chefe”, era refletida semanalmente, todas às quintas-feiras, na própria residência de Zélio de Moraes. Nestas aulas eram explicitados os mais variados conceitos de fraternidade, humildade, relembrando as principais passagens do Evangelho de Jesus, tendo aconselhamentos acerca dos procedimentos nas relações do cotidiano, prevenções ligadas á uma vida saudável, e das regras de atendimento pertinentes. Dizia ele: “Daí de graça o que de graça recebeste! São três os perigos que ameaçam o médium: 1º) A vaidade; 2º) A consulente mulher para o médium homem e vice-versa; e, 3º) E o dinheiro. A vil moeda que leva o homem a perder o caráter, e o médium que mercantilizar a sua missão, a faltar aos compromissos com o mundo superior”.

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Embora, não seguindo a carreira militar a que se destinava, pois sua missão mediúnica não o permitiu, Zélio nunca fez profissão da mediunidade. Trabalhava para o sustento de sua família e diversas vezes contribuiu financeiramente para manter as Tendas que o Caboclo das Sete Encruzilhadas fundou. Ministros, industriais e militares, que recorriam ao poder mediúnico de Zélio para a cura de parentes enfermos e os viam recuperados, procuravam retribuir o benefício através de presentes, ou preenchendo cheques vultosos. “Não os aceite; devolve-os” – ordenava sempre o Caboclo. E Zélio, hoje, diz de cabeça erguida: “Nunca recebi um centavo pelas curas praticadas pelos Guias. O Caboclo abominava a retribuição monetária ao trabalho mediúnico. Não há ninguém que possa dizer, no decorrer destes 66 anos, que retribuiu uma cura – e foram aos milhares – com dinheiro. Retribuíram isto sim, com a sua fé, ajudando o trabalho do Caboclo e de Pai Antônio, como Cambonos, ou assumindo a direção material das Tendas fundadas, ou participando da corrente mediúnica, quando tinham condições para isto”. E Zélio lembra o nome de muitos dos seus colaboradores mais antigos: “Júlio Viana, médium excepcional, de transporte e de incorporação; o deputado José Meirelles, que se tornou presidente da Tenda São Pedro; o advogado Belarmino Tati, o seu Cambono; major, na época, hoje general, Alfredo Marinho Ravasco; o general Aristóteles Santos; João Bustamante de Sá; José Albino Coelho; Alfredo Rego; Olívio Novaes; Leal de Souza, jornalista que publicou uma série de reportagens sobre a Tenda Nossa Senhora da Conceição; João Salgado, da Tenda Santa Bárbara; José Mendes, da Tenda São Pedro; Paulo Lavois, da Tenda de Oxalá; José Álvares Pessoa, da Tenda São Jerônimo; Floriano Manoel da Fonseca, figura que se tornou verdadeiro patrimônio moral da Umbanda, pela atividade que desenvolveu durante décadas, graças a uma conduta exemplar e à firmeza de suas convicções”. Conta a Sra. Zilméia de Moraes, em várias entrevistas, que ela e sua irmã Zélia, cediam os seus dormitórios para o devido acolhimento daquelas pessoas consideradas obsedadas, isto é, doentes espirituais. Existia uma enorme empatia com referência a prática dos trabalhos, das curas e desobsessões, sendo estudada a parte teórica e doutrinária através de reuniões semanais. A SEDE INICIAL DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE

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Neste imóvel, localizado na Rua Floriano Peixoto, n.º 30, em Neves, São Gonçalo – Niterói/RJ iniciou-se a Religião de Umbanda, onde, no dia 16 de novembro de 1908, o Caboclo das Sete Encruzilhadas anunciou o advento da única e genuína religião brasileira. Então, como mencionado anteriormente, a partir de 16 de novembro de 1908, inicia-se os trabalhos ritualísticos da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, sob a direção espiritual do “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, através do jovem médium Zélio de Moraes, com a autorização da família, na supervisão direta do Sr. Joaquim Fernandino da Costa, seu pai. A Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, primeiramente situada no bairro das Neves, São Gonçalo, próximo a cidade de “Niterói”, foi transferida e reorganizada posteriormente á então capital federal, na cidade do Rio de Janeiro, se sediando na Rua Theóphilo Ottoni, nº 90, sobrado. De acordo com o seu estatuto, no capítulo I, referente a organização e seus fins, registrado no Cartório Teffé,em 07 de junho de 1940, situado na Rua do Rosário, 84, onde funcionava o “Registro de Títulos e Documentos do Distrito Federal – 1º Ofício”, a Tenda se constituía numa instituição de caridade, onde deveria se professar a doutrina espírita, composta de pessoas de ambos os sexos, sendo ilimitado o número de associados, com tempo indeterminado de duração e capital a constituir.

É importante salientar, que não consta neste primeiro momento, a proposição de uma ritualística umbandista propriamente dita, pelo menos formalmente registrada, porque não era aceito na época a especificação de termos que remetessem a uma determinada cultura marginalizada, passível de especulação, perseguição policial e drasticamente discriminada pela sociedade vigente, principalmente se tivesse referência a uma religiosidade advinda da escravidão negra ou de rituais de pajelança e curandeirismo indígena. A prática da caridade deveria ser material e espiritual, divulgando a doutrina preconizada pelo Evangelho de Jesus, prestando sem distinção de cor, credo, ideologia, a assistência aos necessitados do corpo, da mente e do Espírito. Como também, sem nenhuma retribuição pecuniária, referente aos trabalhos e atividades caritativas praticadas, enfatizando a fala do próprio Zélio de Moraes. Como orientação destas práticas terapêuticas, o estatuto previa o estabelecimento de um Regimento Interno, que seria organizado pela diretoria da Tenda, sob a orientação do Guia Chefe, através do Sr. Zélio de Moraes. Eram proibidas as discussões políticas, religiosas e de demais assuntos que não fossem considerados condizentes com as propostas de trabalho preconizadas pela Tenda Espírita de Nossa Senhora da Piedade.

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A Tenda referida deveria ser administrada por uma diretoria e um conselho deliberativo. A diretoria deveria compor-se de cinco membros: Presidente, secretário, tesoureiro, procurador e diretor geral. O conselho iria compor-se de vinte membros, que seriam eleitos pela assembléia geral, composta de dois terços dos sócios quites com as suas mensalidades, na primeira convocação, e na segunda com o maior número de associados. Competia ao conselho deliberar acerca da diversidade dos assuntos ligados à manutenção salutar das atividades da Tenda, como: eleição da sua diretoria, aprovação do regimento interno, análise dos procedimentos ritualísticos e avaliação das diretrizes administrativas em termos gerais. A diretoria pertinente deveria usar das suas atribuições estatutárias na organização do regimento interno da Tenda, estabelecendo um ordenamento interno capaz de atender as necessidades dos seus associados, trabalhadores e freqüentadores, harmonicamente ligados ao efetivo compromisso dos trabalhos espirituais desenvolvidos. O regimento interno estabelecido preconizava as diretrizes ritualísticas, organizacionais, normatizando as relações entre os diversos membros que articulados fomentavam o pleno funcionamento da instituição. A Tenda teria como “Chefe Espiritual”, o “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, considerado o criador da Umbanda no Brasil no ano de 1908. A entidade denominada de “Orixá Mallet” da vibratória de “Ogum”, seria o responsável pelos trabalhos de desobsessões (descarregos) e desmanche de magias negras. O Preto-Velho chamado de “Pai Antônio” seria a entidade responsável pelos processos de curas das doenças. Ainda seriam designadas outras entidades que iriam se responsabilizar pela parte espiritual das Sessões umbandistas, representadas pelos médiuns da Tenda e respaldadas pelo Sr. Zélio de Moraes. Haveria Sessões de Caridade, de Educação Mediúnica e de consultas exclusivas, como também, Sessões Especiais de desobsessão. Seriam divididas entre Sessões de “Caboclos” e “Pretos-Velhos”, a partir das ritualísticas pertinentes a cada uma delas, além de uma orientação doutrinária fundamentando os trabalhos espirituais realizados. Um calendário litúrgico foi instituído, a ser seguido pelo período de um ano, compreendendo as denominadas “Sessões Festivas”, de caráter ritualístico, comemorativo, considerando-se datas importantes e solenes da Tenda, homenageando as diversas “Linhas Espirituais” que auxiliavam os trabalhos caritativos desenvolvidos, através da crença da existência de seres desencarnados que atuavam juntos aos médiuns devidamente preparados a este intento. Assim temos:

O dia 20 de janeiro ligado a Oxossi, a São Sebastião e aos Caboclos;

O dia 23 de abril ligado a Ogum e a São Jorge);

O dia 13 de maio ligado aos Pretos-Velhos (Almas dos Pretos Cativos);

O dia 13 de junho ligado a Santo Antônio e ao Pai Antônio;

O dia 15 de setembro em homenagem à Nossa Senhora da Piedade;

O dia 27 de setembro ligado aos Ibejis a São Cosme e São Damião e a Linha das Crianças;

O dia 30 de setembro ligado a Xangô e a São Jerônimo;

O dia 16 de novembro na lembrança do aniversário do Caboclo das Sete Encruzilhadas;

O dia 4 de dezembro ligado a Yansã e a Santa Bárbara;

O dia 8 de dezembro ligado a Yemanjá e Oxum e a Nossa Senhora da Conceição;

Supostamente o dia 25 de dezembro estaria ligado a Oxalá (Nascimento de Jesus Cristo). Auxiliando e dando suporte à realização das sessões umbandistas, atendendo, orientando, operacionalizando, zelando pelo bom funcionamento dos trabalhos espirituais da Tenda, existiam os Cambonos, que eram considerados os secretários e assessores diretos das entidades incorporadas, a quem eram distribuídas diversas funções de acordo com as necessidades requeridas. Eles controlavam, interagiam e faziam cumprir as normas e procedimentos preconizados pelo regimento interno estabelecido pela diretoria, aprovado pelo conselho deliberativo e autorizado pelo “Caboclo das Sete Encruzilhadas”.

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Algumas obras doutrinárias básicas eram recomendadas como o “Evangelho Segundo o Espiritismo”, “O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos Médiuns”, todos de Allan Kardec, como o livro “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda”, do jornalista Leal de Souza. Estas leituras davam embasamento teórico aos trabalhos realizados na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade. Na prática os procedimentos ritualísticos articulados dinamizavam as Sessões umbandistas, dentro de um determinado espaço propício, onde eram realizados os trabalhos espirituais. Todos os membros participantes, incluindo o dirigente principal, os subchefes, médiuns desenvolvidos, médiuns em desenvolvimento, Cambonos e assistência, se colocavam em posição de concentração, respeito e atenção, na formação de uma corrente harmônica de pensamentos, com o objetivo de se iniciar as atividades mediúnicas previstas para aquela determinada data em questão. O “Congá” estaria paramentado com vistosas toalhas brancas, flores ornamentais, principalmente de rosas brancas, a flor símbolo da Mãe Maria Santíssima, velas acesas, diversos copos com água dispostos, dando embasamento e assentamento magístico ao ritual que iria se iniciar. Imagens dos Santos católicos representantes dos chefes das Linhas dos Orixás, Entidades e Guias, que deveriam incorporar nos seus aparelhos a fim de dar desenvolvimento a toda à terapêutica exigida nas atividades espirituais propriamente ditas. Com o intuito de purificar o ambiente do ritual umbandista, eram queimadas algumas ervas e resinas odoríficas em um fogareiro de barro, geralmente contendo carvão vegetal, incenso, benjoim, alecrim, alfazema, cânfora, mirra, comumente chamado de defumador, direcionando-o a todos os presentes na Tenda. A partir daí, seria realizada uma conversação doutrinária, riscados e firmados os pontos cabalísticos e entoados os pontos cantados pertinentes, sendo estabelecida uma egrégora magística de vibrações consideradas salutares a um efetivo resultado, atingindo os objetivos pré-estabelecidos. Com a prece de abertura proferida, geralmente era a “Prece de Cáritas” ou a “Prece de Ismael”, sendo feitas as saudações e assentamentos aos Orixás (era riscados os pontos cabalísticos referentes às seis Linhas (Orixás), firmados com flores, velas, bebidas e ponteiros, dando segurança aos trabalhos espirituais), chefes de falanges e as devidas exortações litúrgicas, seria iniciada a Sessão umbandista, com a chamada do Guia Chefe do dirigente, o “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, cuja insígnia era representada por uma flecha transpassando um coração. Acreditando na presença das entidades do astral, se processaria os trabalhos de caridade, com o direcionamento dos médiuns desenvolvidos a participarem de uma “Mesa de Trabalho, efetivando as devidas desobsessões e posteriormente atendendo a assistência nos seus inúmeros problemas de ordem emocional, material e espiritual. Após a realização desta etapa de contato entre “encarnados e desencarnados”, através dos intermediários, chamados médiuns, dadas as orientações pertinentes através do “Chefe”, seria encerrada a sessão umbandista com uma prece de agradecimento, revigoração e engendramento dos trabalhos praticados durante o período estabelecido á realização do culto de Umbanda. No tocante ao desenrolar das sessões umbandistas, existem algumas crônicas escritas pelo jornalista Leal de Souza, através das suas visitações á Tenda Nossa Senhora da Piedade, que descrevem os fatos pitorescos, percepções das nuances doutrinárias, ritualísticas e das interações entre os mais diversos participantes, incluindo as dos capítulos 23 e 25 do livro “O Espiritismo, A Magia e As Sete Linhas de Umbanda”, escrito em 1933, na Cidade do Rio de Janeiro. Inicialmente, a Tenda Nossa Senhora da Piedade, funcionou em Neves, nos arredores de Niterói. Segundo informações do Sr. Renato Guimarães, disporemos das sedes históricas que a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade já esteve instalada:

1º) Rua Floriano Peixoto nº. 30, Neves, São Gonçalo/RJ (residência de Zélio Fernandino de Moraes): 16/11/1908 – antes de 07/06/1940

2º) Rua São Pedro, nº. 133, sobrado, Centro, Rio de Janeiro/RJ: 1936 – ?

3º) Rua Dom Gerardo nº. 51, Centro, Rio de Janeiro/RJ: ? – ?

4º) Rua Senador Nabuco nº. 122, Vila Isabel, Rio de Janeiro/RJ (sede da Tenda Espírita São Jorge): ? –

1998

5º) Rua Teodoro da Silva nº. 997, Grajaú, Rio de Janeiro/RJ: 1998 – 1999

6º) Rua Sá Viana nº. 69, Grajaú, Rio de Janeiro/RJ (sede da Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade): ? – ?

7º) Rua José Ribamar P. Ramos nº. 271, Boca do Mato, Cachoeiras de Macacú/RJ (sede da Cabana de Pai Antônio): ? – atualmente

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Abaixo uma reportagem efetuada em 1936, onde descreve-se o “espanto” de uma Tenda de Umbanda, taxada pela população de “Macumba”, ter se instalada em pleno centro urbano do Rio de Janeiro. Era a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, com o Caboclo das Sete Encruzilhadas tirando a Umbanda da periferia, levando-a para a classe “média\alta”. Repare nessa reportagem a tendência preconceituosa do repórter e como ele se refere ao culto de Umbanda de maneira jocosa. Pelas nossas pesquisas, em época, tachavam de “Terreiro” todo culto efetuado ao nível do chão, na periferia, sendo a maioria de cultuadores negros, as famosas Macumbas, e, “Tenda” todo culto efetuado em sobrados, no centro da cidade, sendo a maioria de cultuadores brancos.

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Zélia de Moraes Lacerda declarou em 1990 que, além do trabalho nas Sessões de Caridade, Zélio de Moraes dava muitas consultas através da psicografia. A partir do momento que a direção da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade é transferida para as filhas do médium (Zélia e Zilméia de Moraes) Zélio parte para um “exílio” voluntário na região serrana do Rio de Janeiro, no Município de Cachoeiras de Macacú, numa pequena localidade privilegiada pela Natureza, chamada Boca do Mato, continuando os trabalhos espirituais na Cabana do Pai Antonio, vindo há falecer alguns anos depois.

A Tenda Nossa Senhora da Piedade funcionava normalmente com sessões as segundas, quartas e sextas-feiras, dirigidas por Dona Zélia e Dona Zilméia, filhas de Zélio de Moraes. Atualmente, a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade funciona na Cabana de Pai Antonio, em Cachoeira de Macacú, com trabalho realizado 01 vez por mês, dirigido pela filha da Srª Zilméia, Srª. Lygia Cunha. Nesse recanto maravilhoso da Natureza, Zélio de Moraes viveu os últimos dias de sua existência física.

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Neste espaço Umbandista, Zélio Fernandino de Moraes dava segmento aos trabalhos caritativos, através do iluminado e querido Preto Velho Pai Antônio. Localiza-se em Boca do Mato, Distrito de Cachoeiras de Macacú – RJ.

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A CRIAÇÃO DAS SETE TENDAS DE UMBANDA Na continuidade deste memorável relato, com o passar dos dez anos da fundação da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, em 1918, o “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, claro, através do seu médium Zélio de Moraes, declara que iria se iniciar a segunda parte da sua missão, que seria a criação das sete Tendas consideradas os núcleos onde se propagaria a Religião de Umbanda. A partir de alguns componentes da própria Tenda matriz dirigida pelo Caboclo, foram designados os indivíduos que iriam fundar as demais Tendas umbandistas. Estes recebiam orientações, esclarecimentos e exortações, nas reuniões de quintas-feiras, de como deveriam formar as novas Tendas, em termos doutrinários, de preparação dos corpos mediúnicos, da organização dos estatutos, da administração e dos procedimentos ritualísticos e litúrgicos. Vamos a alguns relatos do Sr. Antonio Eliezer Leal de Souza, em época: AS TENDAS DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS O Caboclo das Sete Encruzilhadas fundou e dirige quatro Tendas: - de Nossa Senhora da Piedade, a matriz, em Neves, subúrbio de Niterói encravado no município de São Gonçalo e as de Nossa Senhora da Conceição, São Pedro e de Nossa Senhora da Guia, na Capital Federal, além de outras no interior do Estado do Rio. O processo de fundação dessas Tendas foi o seguinte: - O Caboclo das Sete Encruzilhadas, que é vulgarmente denominado o “Chefe”, quer pelos seus auxiliares da Terra, quer pelos do espaço, escolheu, para seu médium, o filho de um espírita e, por intermédio dos dois, agremiou os elementos necessário à constituição da Tenda de Nossa Senhora da Piedade. Dez ou doze anos depois, com contingentes dessa Tenda, incumbiu a Sra. Gabriela Dionysio Soares de fundar, com o Caboclo Sapoéba, a de Nossa Senhora da Conceição e quando a nova instituição começou a funcionar normalmente, encarregou o Dr. José Meirelles, antigo agente da municipalidade carioca e deputado do Distrito Federal, e os Espíritos de Pai Francisco e Pai Jobá, com o auxílio das duas existentes, da criação da Tenda de São Pedro. Mais tarde, ainda com o Dr. José Meirelles e o caboclo Jaguaribe receberam a incumbência de organizar, com os egressos da Tenda do pescador, a de Nossa Senhora da Guia. Cada uma dessas Tendas constitui uma sociedade civil, cabendo a sua responsabilidade legal e a espiritual, ao respectivo presidente que é nomeado pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, independente de indicação ou sanção humana, e por ele transferido, suspenso, ou demitido livremente, bem como os médiuns que o “Chefe” designa e pode, se o entender, afastar de suas Tendas.

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A organização espiritual é a seguinte: cada Tenda tem um Chefe de Terreiro, – presidente espiritual – um substituto imediato e vários eventuais, chamados estes, pela ordem de antiguidade na Tenda, e todos designados pelo Guia geral. A Hierarquia, na ordem material, como na espiritual, é mantida com severidade. Cercam o Caboclo das Sete Encruzilhadas muitos Espíritos elevados que ele distribui, conforme a circunstância, pelas diversas Tendas, mas esses Espíritos e mesmo os Orixás não diminuem nem assumem autoridade dos presidentes espiritual e material, e trabalham de acordo com eles. Os próprios enviados especiais mandados, de longe em longe, com mensagens dos chefes e padroeiros das Linhas, só as proferem depois do consentimento dos dois dirigentes. Até o “Chefe”, quando baixa e incorpora em qualquer das Tendas, não se investe na direção dos trabalhos, mantendo o prestigio de seus delegados. Na primeira quinta-feira de cada mês celebra-se na Tenda Matriz, uma sessão privativa dos presidentes, e seus auxiliares, e médiuns dos chefes de Terreiro, e nessa assembléia o Caboclo das Sete Encruzilhadas faz as observações necessárias, louvando ou admoestando, sobre os serviços do mês anterior, e dá instruções para os trabalhos do mês corrente. As Tendas realizam, isoladamente, sessões públicas de caridade, sessões de experiência, e as de descarga. As segundas se dividem em duas categorias: as que têm por objetivo a escolha e o desenvolvimento dos médiuns das diversas Linhas e a outra, facultativa, visando estudos de caráter científico. As sessões de descargas são consagradas à defesa dos médiuns. Na segunda sexta-feira de cada mês, os presidentes, médiuns, e auxiliares de cada Tenda trabalham conjuntamente na matriz; no terceiro sábado, na de Nossa Senhora da Conceição e no quarto na de Nossa Senhora da Guia. Anualmente, as três Tendas fazem um retiro de vinte e um dias, fora da cidade, com cerimônias diárias em suas sedes e nas residências de seus componentes. Há, mensalmente, uma vigília de vinte e quatro horas, em que se revezam os filhos das Tendas de Maria (nota do autor: Aqui, Leal de Souza de refere a Mãe Maria Santíssima). Efetuam-se em certas circunstâncias, atos idênticos, as mesmas horas, nessas três Tendas. Celebram-se, ainda, outras reuniões, internas ou externas, inclusive as festivas. Em nenhuma Tenda é lícito realizar qualquer trabalho sem a autorização expressa do “Chefe”, e nenhum presidente pode submeter ao seu julgamento pedido que não se inspire na defesa e no beneficio do próximo. Para o serviço de suas Tendas, o Caboclo das Sete Encruzilhadas tem as suas ordens Orixás e Falanges de todas as Linhas, incluída na de Ogum, a falange marítima do Oriente. E bastam essas anotações para que se compreenda o que é uma organização da Linha Branca de Umbanda e Demanda, concebida no espaço e executada na Terra. (Trecho extraído do livro: “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” – de Leal de Souza – 1933) A TENDA NOSSA SENHORA DA PIEDADE Sobe a presidência do Sr. Zélio Moraes, médium do Caboclo das Sete Encruzilhadas, erigida em sítio tranqüilo, entre árvores, a Tenda Nossa Senhora da Piedade é a casa humilde dos milagres. Atacada de moléstia fatal, a filha de um comerciante de Niterói, agonizava sofrendo, e como a ciência humana se declarasse impotente para socorrê-la, seu pai, em desespero delirante, numa tentativa extrema, suplicou auxílio à modesta Tenda das Neves. Responderam-lhe que só à noite, na sessão, o Guia poderia tomar conhecimento do caso. Regressando ao lar, o desconsolado pai encontrou a filha morta e, depois de fazer constatar o óbito pelo médico, mando tratar o enterro. No entanto, à noite, na Tenda de Nossa Senhora da Piedade, aberta a sessão, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, manifestando-se, disse aos seus auxiliares da Terra, ainda desconhecedores o desenlace da doença, que se concentrassem, sem quebra da corrente, e o esperassem, pois ia para o espaço, com suas Falanges, socorrer a enferma que lhes pedira socorro. Duas horas depois voltou, achando aqueles companheiros exaustos, do longo esforço mental. Explicou-lhes, então, na pureza da sua realidade, a situação, e mandou-os que fossem em nome de Jesus, retirar a morta da mesa mortuária, e comunicar-lhe que a misericórdia de Deus, para atestar os benefícios do espiritismo, permitia-lhe viver, enquanto não negasse o favor de sua ressurreição.

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Confiante em seu chefe, os humildes trabalhadores da Tenda da Piedade cumpriram as ordens recebidas, e a moça não só ficou viva, como curada. O médico, que lhe tratou da moléstia, e que lhe constatou o óbito observou-a, por algum tempo, até desistir de penetrar o misterioso de seu caso, classificando-o na ordem sobrenatural dos milagres. Meses depois, a mesa do almoço, conversando, a ressurreta contestou com firmeza, negando-a, a ação espiritual que lhe restituir a vida material, porém nessa ocasião adoeceu de uma indigestão, falecendo em menos de vinte e quatro horas. Uma associação de grande autoridade no espiritismo, ao ter conhecimentos desses fatos, resolveu apurá-los com severidade, para desmenti-los ou confirmá-los sem sombra de dúvida e, num inquérito rigoroso, com auxilio das autoridades do Estado do Rio de Janeiro, estabeleceu a plena veracidade deles, publicando, no órgão de Federação Espírita a sua documentação. A média mensal das curas de obsedados que iriam para os hospícios como loucos, é de vinte e cinco doentes, na Tenda da Piedade. Os Espíritos que baixam nesse recinto não procuram deslumbrar os seus consulentes com o assombro de manifestações portentosas, mas as produzem muitas vezes, que lhas exigem as circunstâncias. Os auxiliares humanos do Caboclo das Sete Encruzilhadas, na Tenda que é, por excelência, a sua Tenda, mesmo os que têm posição de revelo na sociedade, não se orgulham dos favores que lhes são conferidos e procuram, com doçura e humildade, merecer a graça de contribuir, como intermediários materiais, para a execução na Terra, dos desígnios do espaço. (Trecho extraído do livro: “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” – de Leal de Souza – 1933) A TENDA DE NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO Perguntaram ao presidente da Tenda de Nossa Senhora da Conceição: - Acreditas em Nossa Senhora da Conceição? Para responder, ele interrogou: - O amigo acredita na Virgem Maria, Mãe de Jesus? - Acredito, afirmou o ironista. - Pois Nossa Senhora da Conceição é a Virgem, mães de Jesus. Se a Tenda corresponde a sua finalidade que importa o seu nome? Virgem Maria, ou Nossa Senhora da Conceição. As prevenções contra a Igreja determinam investidas bravias contra o passado e a mutilação de grandes nomes históricos, reduzindo teólogos da estatura de Santo Agostinho e mártires do porte de São Sebastião, a vulgaridade anônima de Agostinho e Sebastião. Ofuscam-se, desse modo, na evocação dessas gloriosas figuras, os seus máximos predicados, – os predicados que o catolicismo exaltou e os Centros Espíritas reconhecem, transformando esses iluminados em seus padroeiros e dirigentes espirituais. A essa ríspida intolerância, prefiro o sábio exemplo de Allan Kardec, chamando São Luiz ao Espírito que mais o auxiliou na codificação do Espiritismo. Se os magnos luzeiros do Espiritismo científico e os kardecistas podem invocar Jesus como o Redentor, o médium de Deus, o Salvador, e Nosso Senhor Jesus Cristo, por que não poderemos nós, os humildes, invocar a Virgem Maria, com a Rainha do Céu, ou Nossa Senhora da Conceição? Quer a chamemos, como o Caboclo das Sete Encruzilhadas, Mãe das mães, ou, como na Federação Espírita, Nossa Mãe amantíssima. Virgem sem pecado, Maria Puríssima, ou como os católicos, Nossa Senhora, ou, como os filhos de Umbanda, Mãe Axum (Oxum) e Amanjár (Yemanjá), – Maria Imaculada é sempre a imaculada Maria, e pela diversidade dessas invocações não deixa de ouvir o clamor e a prece dos crentes. Nossa Senhora da Conceição é uma variante invocativa do nome de Maria, mas na Linha Branca de Umbanda, conserva o sentido místico, ligando à Terra ao espaço. Acredito, ainda, que Nossa Senhora da Conceição tenha representação visível no espaço, pois afirmam Espíritos que conosco trabalham, e se qualquer entidade, mesmo para espalhar o mal, pode-se revestir do aspecto que lhe convenha, é claro que Maria poderá assumir a aparência que deseje, ou produzir formações fluídicas necessárias ao consolo e a fé daqueles que a procuram no espaço, como o esplendor da maternidade realçada pela pulcritude (nota do autor: qualidade do que é pulcro; beleza, formosura) virginal.

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As Falanges de Nossa Senhora da Conceição, ensinam os Espíritos, são as mais numerosas da Linha Branca de Umbanda e Demanda, pois sob essa invocação, que o resume na Linha, o culto de Maria possui o maior número de adeptos, e para atendê-los em suas súplicas, qualquer que seja o seu credo, essas legiões incontáveis descem e sobem, incessantemente, do espaço à Terra, e da Terra ao espaço. Compreendem essas Falanges as entidades que viveram, na última encarnação, nas matas cortados pelos arroios ou rios, pelos Espíritos das regiões litorâneas, pelo povo do mar, pelos que foram, no mundo material devotados a Virgem Maria, e pelos que a esses se agregaram por afinidades. A exigência da atenção devida aos invocadores de Maria é tão premente, e constante, que raras vezes os elementos de suas Falanges podem passar pela Tenda humílima de seu nome. O Chefe do Terreiro dessa Tenda – presidente espiritual, – é o Caboclo Corta Vento, da linha de Oxalá; seu substituto imediato, e o Caboclo Acahyba, da Linha de Euxoce (Oxóssi), e eventuais Yara, da Linha de Ogum, Timbiry da Falange do Oriente, e o Caboclo da Lua da Linha de Xangô. E pelo dever de assumir a responsabilidade social de minha investidura, acrescento que sou o presidente da Tenda de Nossa Senhora da Conceição, ou, mais modestamente, o delegado humano incumbido, pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, de coordenar a ordem material necessária à execução dos trabalhos espirituais. (Trecho extraído do livro: “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” – de Leal de Souza – 1933) A TENDA NOSSA SENHORA DA GUIA A Tenda de Nossa Senhora da Guia, presidida pelo Sr. Durval Vaz, e esplendidamente instalada nesta capital, é uma instituição primorosa, preenchendo, de modo completo, os fins que, pelo prisma humano, inspiraram a sua fundação. Possui, já desenvolvidos, revezando-se na intensidade brilhante de seus trabalhos, sessenta médiuns de todas as Linhas e prepara, nas experiência de desenvolvimento, sob a direção de Guias vigilantes, mais duzentos e trinta, oficialmente matriculados nos seus programas. Com esses elementos, a Tenda Estrela do Oriente pode atender, como realmente atende, distribuindo socorros de todas as naturezas, aos necessitados de várias espécies, que solicitam amparo e auxílio aos Centros Espíritas de Caridade. Só as suas sessões públicas das terças-feiras concorrem consulentes cuja média oscila entre trezentos e trezentos e cinqüenta. Reduzindo-os ao mínimo de trezentos, e fazendo cálculo por meses de quatro semanas, ou terças-feiras, conclui-se que a Tenda de Nossa Senhora da Guia socorre, mensalmente, mil e duzentos necessitados, ou quatorze mil e quatrocentos por ano. Além da sessão pública, realiza, também semanalmente, as duas sessões de experiências, para a escolha e desenvolvimento de médiuns, e outros estudos, as extraordinárias, ou especiais, impostas pelas circunstâncias, quando se tornam precisas, e as de descarga, em defesa de seus componentes. Trabalham em seu Terreiro, como chefe presidente espiritual, o Caboclo Jaguaribe, como se imediato, o Caboclo Acahyba, e como substitutos eventuais, pela ordem de antiguidade na Tenta, Garnazan, o Caboclo Sete Cores, e mais Gira Mato e Bagi, todos pertencentes às grandes Falanges da Linha de Euxóce (Oxóssi). Possuem, ainda, esses trabalhadores tantos auxiliares quantos são os médiuns desenvolvidos. O labor, nessa Tenda, é dos mais profícuos, e o número crescente das pessoas que procuram, cheias de confiança, o seu terreiro atesta, de modo eloqüente, a eficiência espiritual de seus protetores e o generoso caráter dos seus dirigentes humanos. Essa é a mais nova das Tendas do Caboclo das Sete Encruzilhadas, a sua última criação, e o seu advento ainda se liga ao nome do Dr. José Meirelles, já desencarnado, que foi, na Terra, o obreiro infatigável ao serviço daquele grande missionário. (Trecho extraído do livro: “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” – de Leal de Souza – 1933) As datas da fundação de cada Tenda não é precisa, e por isso optamos por não conjecturarmos quanto à data precisa da criação de cada uma. O inicio das fundações deu-se de 1918 a 1935. As Tendas foram assim distribuídas:

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Tenda Espírita São Pedro (segundo Zélio de Moraes, a primeira Tenda fundada), primeiramente designada a Sra. Gabriela Dionysio Soares, médium do Caboclo Sapoéba, e, posteriormente, com José Meirelles Alves Moreira (falecido em 31 de Maio de 1928), agente da Prefeitura e Deputado Federal, médium de Pai Francisco” e “Pai Jobá. Em 1952 passou às mãos de Corina da Silva, médium do Pai Vicente, que veio primeiramente a se fixar na Ilha do Governador, Rio de Janeiro, RJ: (? – 1952 – ?) e posteriormente num sobrado da Praça 15 de Novembro, Rio de Janeiro. Atualmente encontra-se na rua Visconde de Santa Isabel, nº. 39, Vila Isabel – Rio de Janeiro/RJ.

Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, a Leal de Souza, médium do Caboclo Corta Vento, que veio se fixar na Rua da Quitanda, nº 201, Rio de Janeiro?RJ.

Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia, com Durval Vaz de Souza, médium do Caboclo Jaguaribe, que veio a se fixar na Rua Camerino, nº. 59, Rio de Janeiro/RJ.

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Tenda Espírita São Jerônimo, com José Álvares Pessoa (Capitão Pessoa) médium do Caboclo da Lua, que veio a se fixar na Rua Visconde de Itaboraí, nº. 08, Rio de Janeiro/RJ.

Tenda Espírita São Jorge, com João Severino Ramos (Suboficial Enfermeiro), médium de Ogum Timbiri, do Caboclo Teimoso de Aruanda, de Seu Baiano e Pai Felipe, que veio a se fixar na Rua Dom Gerardo, nº. 45, Rio de Janeiro. Atualmente encontra-se na Rua Senador Nabuco, nº. 122, Vila Isabel, Rio de Janeiro/RJ.

Tenda Espírita Oxalá, com Dr. Paulo Lavois (médico), médium de Pai Serafim, que veio a se fixar na atual Avenida Presidente Vargas, 2567, Rio de Janeiro/RJ.

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Tenda Espírita Santa Bárbara, com João Aguiar Salgado, que veio se fixar num sobrado, a Rua São Pedro, nº 133, Rio de Janeiro/RJ, onde, antes, funcionava a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.

(As fotos de Durval Vaz de Souza, Capitão Pessoa e Paulo Lavois, são do arquivo pessoal de Diamantino Trindade Fernandes. A foto de João Aguiar Salgado nos foi dada por um freqüentador da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, em época de Zélio; atrás da foto estava escrito – Seu João, da Tenda Santa Bárbara; achamos ser o seu dirigente) Apresentaremos uma reportagem de 1936, onde consta a calúnia e a perseguição efetuada sobre a Tenda Espírita Santa Bárbara:

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A partir de 1918, quando do início da fundação das sete Tendas do Caboclo das Sete Encruzilhadas, surge mais um Terreiro, a Tenda Espírita Mirim em 1924. Em 1920 no Rio de Janeiro, o médium kardecista Benjamin Gonçalves Figueiredo (26/12/1902 - 03/12/1986), teve a primeira manifestação de uma Entidade que identificou-se como Caboclo Mirim, que vinha com a finalidade de criar um novo núcleo de crescimento para a Umbanda. Assim, toda a família do médium foi chamada a participar.

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Eram ao todo 12 pessoas que deram início em 1924 ao que foi chamada a Seara de Mirim. Após 18 anos, em 1942, foi fundada a Tenda Espírita Mirim, à rua Sotero dos Reis, 101, Praça da Bandeira; mudou-se, posteriormente, para a rua São Pedro e depois para a sua magestosa sede propria, na antiga Rua Ceará, hoje Avenida Marechal Rondon, 597, bairro de São Francisco Xavier, nas proximidades do Maracanã. Em sua nova sede e durante alguns anos, a Tenda Espírita Mirim chegou a registrar diariamente, uma frequencia de 3.000 assistentes. E o que é mais notável é que tal número de frequentadores eram atendidos em apenas 2 horas de trabalho, tal quantidade de médiuns passistas e de descarga, para atender a tão grande multidão. Mas, onde o médium Benjamim Gonçalves Figueiredo havia se iniciado como umbandista? Encontramos uma importante informação postada no – http://registrosdeumbanda.wordpress, num arquivo de áudio/cassete contendo a entrevista de Jota Alves de Oliveira com Zélio Fernandino de Moraes, na década de 1970, contendo diversos assuntos muito pertinentes à história da Umbanda, dando-nos a visão e o depoimento do médium do Caboclo das Sete Encruzilhadas sobre a história da religião. Vamos a um trecho do interesse deste artigo: SOBRE A DESCENDÊNCIA DA TENDA ESPÍRITA MIRIM E O SEU FUNDADOR BENJAMIM GONÇALVES FIGUEIREDO (DESCENDE DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE)

A ligação entre Zélio de Moraes e Benjamim Gonçalves Figueiredo No áudio, ouvimos Zélio contar que Benjamim passou a frequentar a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade para que o desenvolvesse na Umbanda; em uma dessas ocasiões, o Orixá Mallet, incorporado em Zélio, pegou Benjamim e, após carregá-lo nas costas por meio quilômetro, o atirou no mar, tendo, logo após o fato, dito que Benjamim já estava pronto pra começar a trabalhar com a Umbanda. Infelizmente, na fita não há o período em que isso teria ocorrido, mas se olharmos a história da Tenda Espírita Mirim, podemos supor quando isso ocorreu. No antigo site da Tenda Espírita Mirim, que reproduzimos parcialmente abaixo, lemos que: “O Kardecismo veio para o Brasil através da família Figueiredo. Em 1920, esta família realizava sessões de Kardec na Rua Henrique Dias nº. 26, na Estação do Rocha, Rio de Janeiro. No dia 12 de Março de 1920, o médium Benjamim Gonçalves Figueiredo, teve a primazia de incorporar, pela primeira vez, o Caboclo Mirim, grande Mestre que veio para nos ensinar a Escola da Vida, que poucos conheciam na época. Após a sua chegada, O Caboclo Mirim anunciou que aquela seria a última sessão de Kardec e que as próximas Sessões passariam a ser de Umbanda. Em uma de suas mensagens ele disse que a partir daquele momento a Tenda Espírita Mirim seria reconhecida mundialmente e advertia que a mesma seria uma organização única no gênero em todo o Brasil, cujo método seria adotado por outras Tendas, até mesmo em outros Estados da Federação, o que, mais tarde, teríamos a oportunidade de comprovar. O Caboclo Mirim, Espírito missionário, preparou a antena receptiva daquele que seria o intermediário do seu programa, de suas ordens e de suas mensagens, ou seja, o seu médium, que preservaria a sua missão e que cumpriria, religiosamente, a sua tarefa. Uma família inteira é convocada para preparar a Tenda Espírita Mirim, para nela, firmar os postulados da nova organização. Os chamados ou escolhidos foram: José Nunes de Figueiredo Filho, Judith Gonçalves Figueiredo, Benjamim Gonçalves Figueiredo, Eugênia Gonçalves Figueiredo, Hercílio Latino Gonçalves, Abgail Maria Gonçalves, Davi Latino Gonçalves, Benjamim Franklin Gonçalves, José Fróes e João da Mota Mesquita Filho. Foram 12 como os apóstolos de Jesus! Coincidências! Aos 13 dias do mês de Março do ano de 1924 considerou-se fundada a

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Tenda Espírita Mirim, por ordem do Caboclo Mirim, através do seu jovem médium, Benjamim Gonçalves Figueiredo”. (Fonte: “Tenda Espírita Mirim”. Apresentação. Disponível em <http://www.tendaespiritamirim.com.br>. Acesso em 03 setembro de 2007) Perceberam que entre a ordem do Caboclo Mirim e a fundação da Tenda Espírita Mirim existe um período de exatos 4 anos? Perceberam, também, que antes da ordem do Caboclo Mirim, a família de Benjamim não trabalhava com Umbanda, apenas com kardecismo? Ora, se:

1º) Benjamim e sua família desconheciam a Umbanda em 1920; 2º) Só iniciaram as atividades da Tenda Espírita Mirim (Tenda de Umbanda e não de kardecismo) em

1924;

3º) Zélio nos conta que Benjamim freqüentou a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade para aprender com ele sobre a Umbanda, tendo sido batizado no mar por Orixá Mallet e considerado, então, pronto a trabalhar com a Umbanda;

4º) Pelas regras da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, em seu regimento interno, é Orixá Mallet

quem autorizava ou não a matrícula de pessoas como membros da Tenda, bem como considerava àquelas que achava desenvolvidas a dar passes, consultas, auxiliar trabalhos de desenvolvimento mediúnico e outros que se realizavam na Tenda.

Podemos supor que nesses 4 anos, entre 1920 e 1924, Benjamim foi membro da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, com autorização de Orixá Mallet, tendo sido desenvolvido e considerado pronto por esta entidade a começar a trabalhar com a Umbanda e, só depois disso, é que Benjamim teria fundado a Tenda Espírita Mirim, junto de seus familiares. Ou seja, embora Renato Ortiz tenha escrito que: “(…) a Umbanda se desenvolve paralelamente em diferentes Estados sem que exista, pelo menos de maneira comprovada, uma relação de influências entre os diversos Terreiros. Em meados dos anos 20, existe em Niterói a Tenda de Zélio de Moraes; no Rio de Janeiro a de Benjamim Figueiredo, e Porto Alegre a de Otacílio Charão.” (Fonte: Breve nota sobre a Umbanda e suas origens. In: Religião e Sociedade. p. 134-137. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1986.) E outros pesquisadores tenham se baseado nele quando escreveram sobre o início da Umbanda, podemos afirmar comprovado pelo áudio em questão, que há, sim, uma relação da Tenda Espírita Mirim com a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, uma vez que a Tenda Espírita Mirim pode ser considerada mais uma Tenda de Umbanda descendente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade. Talvez, a Tenda Espírita Mirim seja a segunda Tenda descendente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, mas não podemos afirmar isso por enquanto, pois ainda não conseguimos descobrir a data de fundação da Tenda Espírita São Pedro (só sabemos que foi anterior a 04 de março de 1927). Resta, agora, descobrirmos se Otacílio Charão, antes de embarcar para a África, em 1916, freqüentava a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade ou alguma casa de Macumba carioca. Se freqüentava a primeira, então teríamos que o Centro Espírita Reino de São Jorge, fundado em Rio Grande/RS, em 1926, é outra Tenda descendente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, mostrando uma relação entre as primeiras Tendas de Umbanda e a antiguidade da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade sobre todas as demais. Outro apontamento do Sr. Renato Guimarães: O que é interessante neste segundo endereço (Rua Theóphilo Ottoni nº 90 sobrado, Centro, Rio de Janeiro, RJ: antes de 07/06/1940 – ?) que serviu de sede da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, é que ele fica a exatos 580 metros da praia da atual Praça Mauá e a exatos 430 metros da praia do atual 1º Distrito Naval. Ai, vocês, leitores, devem estar se perguntando: e daí? Bom, se vocês ouvirem de novo a fita da postagem “A ligação de Zélio de Moraes e Benjamim Figueiredo”, a partir dos 17 minutos, vocês ouvirão Zélio falar que Benjamim começou a freqüentar a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, quando ela, (T.E.N.S.P.), tinha mudado sua sede para a cidade do Rio de Janeiro e que Orixá Mallet carregou Benjamim nas costas, por meio quilômetro, ou 500 metros, até a praia. Entenderam agora? Existe uma grande probabilidade de Benjamim ter freqüentado a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade na época que ela tinha como sede um imóvel no centro da cidade do Rio de Janeiro e não na época que ela funcionava na casa onde Zélio vivia com seus pais. Resta, agora, descobrirmos quando houve a mudança da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade para aquele segundo endereço.

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O Guia Espiritual Pai Roberto e Benjamim Figueiredo

Pela fita, ouvimos que a entidade Pai Roberto trabalhava com um médium do bairro de Alcântara, São Gonçalo/RJ, antes de passar a trabalhar com Benjamim Figueiredo. Ainda, segundo a fita, quando houve a visita de Benjamim ao Terreiro do citado médium, a entidade Pai Roberto, incorporado, disse a Benjamim que ele abandonaria o cavalo (médium) dele e ai passar a trabalhar através da mediunidade do Benjamim, abandonando o médium anterior e os trabalhos de feitiçaria que fazia através dele. Creio, com essas considerações, conseguiremos mostrar a você, leitor, a importância do áudio. Hoje, pouquíssimos Terreiros formados pelo Caboclo Mirim, e mesmo seus descendentes, guardam e praticam na totalidade o que foi orientado pelo seu iniciador.

*********//********* Cremos que a Tenda Espírita Mirim não fez parte das sete Tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas pelo fato de que o Sr. Benjamim juntamente com o Caboclo Mirim criou uma ritualística própria, distanciando-se em alguns aspectos, das “Linhas Mestras” instituídas pelo fundador da Umbanda; também a o fato de que toda a família de Benjamim já possuía um Centro Espírita, que após as orientações do Caboclo das Sete Encruzilhadas transformou-se em Tenda de Umbanda. Na Tenda Mirim não se usava velas, nem se adotavam os colares presos ao pescoço, dito guias. Não se fazia uso de Pemba, nem pólvora, nem ponteiros (tudo isso é de uso intenso do Caboclo das Sete Encruzilhadas). O elemento material que o Caboclo ou Preto-Velho usa é charuto e o cachimbo, nada mais. Embora os Caboclo Mirim aboliu muitas das práticas utilizadas pela então Macumba reinante, contrariando as orientações do Caboclo das Sete Encruzilhadas, absorveu o uso dos tambores em seus rituais festivos. No período seguinte, ainda surgiram várias Tenda umbandistas, como:

Grupo Espírita Reino de São Jorge, Rio Grande/RS, em 1926;

Tenda de Pai Benedito, Vila Mariana – São PauloSP, em 1927;

Grupo Espírita Humildes de Jesus, em 12 de dezembro de 1928;

Congregação dos Franciscanos Espíritas de Umbanda, Centro – Porto Alegre/RS, em 1932;

Centro Espírita de Caridade Jesus, Rio de Janeiro/RJ, em 1932;

Centro Espírita Caridade de Jesus, em Vila Isabel – Rio de Janeiro/RJ, em 1932;

Tenda de Umbanda Nossa Senhora Aparecida, Ponte Pequena, São Paulo/SP, em 1934;

Centro Espírita Caminheiros da Verdade, Engenho de Dentro, Rio de Janeiro/RJ, em 1936;

Casa de Caridade Pai Matheus, Bairro Penha – São Paulo/SP, em 21 de setembro de 1937. Ainda em funcionamento, atualmente, como: “Templo da Estrela Azul – Casa de Caridade Umbandista”, em São Caetano do Sul/SP);

Cabana Pai Joaquim de Luanda, Méier – Rio de Janeiro/RJ, em 28 de julho de 1937;

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Cabana Espírita Senhor do Bonfim, em 6 de setembro de 1939. Ainda em funcionamento na Rua Sales Guimarães, nº. 67 – Engenho Dentro – Rio de Janeiro, RJ

Tenda Espírita Fé e Humildade, em setembro de 1941;

Tenda Espírita Humildade e Caridade, em setembro de 1941;

Cabana Pai Thomé do Senhor do Bonfim, em setembro de 1941;

Centro Espírita Religioso São João Batista, em setembro de 1941; e muitas outras. As Tendas, que foram fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas gradativa e sucessivamente, deveriam realizar determinadas sessões de caridade, de experiência e as de descarga. Seriam respectivamente momentos de socorro espiritual às diversas necessidades humanas, de aprimoramento mediúnico, de estudos científicos e doutrinários, e de limpeza densa, que se caracterizavam em descarregar as más influências, os miasmas negativos, as desobsessões, defendendo o ambiente, o corpo mediúnico e a assistência em geral. Não seria lícita a realização de “qualquer trabalho sem a autorização expressa do Caboclo das Sete Encruzilhadas”, dizia o nosso cronista Leal de Souza. Leal de Souza, ainda relatando que: “para o serviço de suas Tendas, o “Chefe”, tem as suas ordens Orixás e Falanges de todas as Linhas, incluída, na de Ogum, a Falange marítima do Oriente. Bastando essas anotações para que se compreenda o que é uma organização da Linha Branca de Umbanda e Demanda, concebida no espaço e executada na Terra”. Além das reuniões promovidas às quintas-feiras, na segunda sexta-feira de cada mês, todos os componentes das respectivas Tendas fundadas, trabalhavam juntos na Tenda matriz, sendo que em alguns momentos havia rodízios entre os diversos agrupamentos umbandistas. Todo o ano era realizado um retiro de vinte e um dias, fora da capital, ocorrendo várias cerimônias em todas as sedes e nas residências dos dirigentes. Mensalmente havia uma vigília de vinte e quatro horas, com revezamentos entre os diversos componentes das Tendas, celebrando sessões festivas, de confraternização, de fortalecimento espiritual, como o ritual do “Amaci”, ainda realizado na Tenda Nossa Senhora da Piedade, todo o dia 15 de novembro, considerado o Dia da Umbanda, se caracterizando um evento de profunda devoção umbandista, através dos banhos das ervas sagradas, devidamente colhidas, realizando a lavagem de cabeça, com o objetivo de fortalecer e manter adequadamente uma ligação vibracional com os Guias do astral. Seguindo a tradição, é realizado uma cerimônia com as fitas correspondentes a cada Orixá das Sete Linhas de Umbanda, firmando em conjunto um ponto cabalístico engendrando o trabalho realizado. No ritual do Amaci, a Sra. Zilméia, filha de Zélio de Moraes, se banha na mistura, pois é a presidente de honra da Tenda da Piedade, Cabana de Pai Antônio, em Boca do Mato, Cachoeira de Macacú, RJ. Na continuidade, prosseguindo com os médiuns de graus mais elevados, passando a participar do banho com a mistura das ervas, os demais médiuns da casa. Este ritual é bastante conhecido e de grande difusão na Umbanda, sendo mantido este cerimonial deste a fundação da Tenda matriz, em 16 de novembro de 1908. As atividades desenvolvidas nas sete Tendas procuravam seguir as orientações do “Chefe”, como mencionado anteriormente, geralmente agrupando inúmeros adeptos, atendendo os necessitados do corpo e da alma, em inúmeras problemáticas evidenciadas, confortando, neutralizando obsessões, realizando possíveis curas das doenças, físicas, mentais e espirituais. Algumas entidades se nomeiam quando no atendimento junto à assistência, nos trabalhos realizados nas sete Tendas, assim temos: O Caboclo Corta Vento, da Linha de Oxalá; o Caboclo Acahyba, da Linha de Oxossi; o Caboclo Ogum Yara, da Linha de Ogum; o Caboclo da Lua, da Linha de Xangô, todos pertencentes a Tenda Nossa Senhora da Conceição. Como os da Tenda Nossa Senhora da Guia: O Caboclo Jaguaribe, o Caboclo Garnazan, o Caboclo Sete Cores, o Caboclo Gira Mato, o Caboclo Bagi, pertencentes à Linha de Oxossi, direcionando os trabalhos através dos médiuns capacitados a este intento, de acordo com as orientações doutrinárias e diretrizes ritualísticas do “Caboclo das Sete Encruzilhadas”. Através de uma disciplina exigente, todas as ações contrárias às orientações doutrinárias preconizadas pela Linha Branca de Umbanda e Demanda, são devidamente reparadas, de acordo com as regras estabelecidas, pois poderiam causar inúmeros danos ao ambiente espiritual, provocando o afastamento das “entidades da luz”, prejudicando o conceito de integridade das Tendas umbandistas, que teriam que suportar determinadas penalidades, dentro da lei de causa e efeito, no cumprimento de um resgate pelas faltas cometidas, principalmente ligadas às deturpações das diretrizes ritualísticas padronizadas que norteavam as orientações estabelecidas. Além das atividades doutrinárias, ritualísticas, de atendimento e de preparação mediúnica, existiam as celebrações, isto é, as festividades dos padroeiros e dos chefes das Linhas umbandistas, já citados, sendo

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realizadas alocuções, preces, orações, na transmissão de mensagens de auto-estima, motivando as pessoas a suportarem as suas provações terrenas com perspectivas de superação humana. Só tinha um porém: Haviam as chamadas em época de “festas”, sempre religiosas, com louvação, mas, logo após, os trabalhos caritativos com atendimentos fraternos eram realizados. Pai Antonio dizia: “Festa é fazer a caridade!”. Compareciam a estas “festas” convidados eméritos, visitantes, irmãos de outras Tendas umbandistas, médiuns, dirigentes e chefes de Terreiro, em um ambiente acolhedor onde imperava uma alegria religiosa e devocional. Eram compartilhados momentos de confraternização entre “encarnados” e “desencarnados”, procurando ser mantido uma harmonia ambiental. Uma das festas mais cogitadas nos meios umbandistas é o dia de São Cosme e São Damião, que são considerados os protetores das crianças, onde os médiuns incorporavam Espíritos de tenra infância, sendo necessária toda a atenção, como bem relata a Sra. Zilméia, que procura tratar todos os seres com um carinho fraternal, vigiando a atuação destas entidades na ligação sutil com os médiuns, porque dizem que quando se apossam destes, verifica-se uma mudança brusca de comportamento, ocorrendo ações infantilizadas, podendo haver indiscrições nos diálogos estabelecidos, sem escrúpulos sócio-culturais, expressando impulsivamente pensamentos inapropriados, fora das conveniências da sociedade vigente. Contudo, percebe-se uma flexibilidade existente na filosofia umbandista, absorvendo valores culturais diferentes, porém considerados convergentes na capacidade de articular a síntese das diversas formas de religiosidade manifestadas. O advento do “Caboclo das Sete Encruzilhadas” e a proposição do culto umbandista constitui um marco histórico na memória dos vários umbandistas espalhados pelo Brasil afora, como bem afirmou o Sr. Pedro Miranda em uma entrevista à Revista Espiritual de Umbanda, nº 4: “Podemos dizer que a partir de Zélio, surgiu uma doutrina para a Umbanda. Já existiam manifestações em vários pontos da Cidade do Rio de Janeiro e do Brasil, de médiuns que incorporavam Pretos-Velhos e Caboclos, mas não dentro daquele princípio filosófico trazido pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. Esse é um marco doutrinário importantíssimo. Quando ele diz, de forma bem específica, que a “Umbanda é a manifestação do Espírito para a Caridade”, é um marco histórico, é a doutrina, mas já existiam as manifestações. A mensagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas foi mais para que nós, médiuns, nos situássemos dentro daquela nova posição doutrinária”. Para que esta doutrina fosse estabelecida direcionaram-se algumas estratégias de institucionalização, sustentando a legitimação do culto de Umbanda, na reflexão de uma proposta passível de construção de uma religião brasileira, no amálgama dos mais variados valores das religiosidades aqui, no Brasil, vivenciados e influenciados pelas culturas européia, africana, indígena, asiática, que articulados sincreticamente, incorporados, bricolados, emergiam na perspectiva da manifestação, no decorrer de um processo histórico, de uma identidade religiosa, como resultado da miscigenação dos diversos traços culturais evidenciados nas práticas umbandistas. Sendo estas práticas delineadas através de uma doutrina preconizada nos moldes espíritas, pois davam uma certa base de cientificidade às manifestações das entidades do astral, descaracterizando as influências animistas fetichistas remanescentes dos cultos Banto, classificados pejorativamente como “macumba”, baixo espiritismo, onde se reuniam pessoas de “baixo escalão”, realizando inúmeros trabalhos de magia negra, no intuito de prejudicar alguém, sendo classificadas de “macumbeiras”, “kimbandeiros”, porém muitas vezes solicitadas pelas classes abastadas, na encomenda de feitiços de várias naturezas, sendo percebidos os valores e os preconceitos da época em questão. A evangelização doutrinária presente na ritualística umbandista norteava a busca da sua legitimação e institucionalização na tentativa de superação dos rituais considerados primitivos, pois apesar da utilização de determinados elementos de outrora, dos respectivos cultos mencionados, estes teriam um fundamento explicado pela sua razão de ser, isto é, com base científica, enfatizando propostas evolucionistas e progressistas, com referência ao Kardecismo, que assim engendradas, dariam credibilidade, aceitabilidade e respeitabilidade aos pressupostos preconizados pelo culto de Umbanda, através do “Caboclo das Sete Encruzilhadas”. Com o decorrer dos anos, novas Tendas foram surgindo no Rio e em outros Estados, favorecendo a rápida expansão do Movimento Umbandista visando abarcar o maior número de pessoas no menor espaço de tempo possível. Para encerrarmos este capítulo, queremos falar um pouco de uma pessoa que teve grande atividade dentro do Movimento Umbandista. Estamos nos referindo a José Álvares Pessoa, já citado anteriormente, como dirigente da Tenda de São Jerônimo. Por volta de 1935, quando já estavam em funcionamento seis das sete Tendas mencionadas anteriormente, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, demorava-se na definição do fundador da Tenda de São Jerônimo. Dizia o

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Caboclo, que o dirigente adequado não havia aparecido. Numa noite de quinta-feira, durante uma reunião doutrinária, José Álvares Pessoa, kardecista e grande estudioso de todas as correntes espiritualistas, não dando muito crédito aos relatos que ouvira sobre os magníficos trabalhos espirituais realizados em Neves, resolveu ir pessoalmente a Tenda Nossa Senhora da Piedade. Logo que chegou à porta da sala onde se reuniam os médiuns do Caboclo das Sete Encruzilhadas, esse interrompeu a palestra dizendo: “Já podemos fundar a Tenda São Jerônimo. O seu dirigente acaba de chegar”. O Capitão Pessoa, como era chamado, foi tomado de surpresa, pois era desconhecido naquele ambiente. Não havia anunciado a sua visita; apenas viera para comprovar os fatos que lhe haviam narrado. Após um breve diálogo, o Caboclo demonstrou conhecer a fundo o Capitão Pessoa que foi convencido a assumir a responsabilidade da fundação e direção da Tenda Espírita São Jerônimo. O Capitão Pessoa, até então, desconhecia o que era Umbanda, fato que podemos observar em sua entrevista a Leal de Souza e que está transcrita na página 439 do livro de Roger Bastide chamado As Religiões Africanas no Brasil. Segundo o Capitão Pessoa, “A fundação da Umbanda foi decidida em Niterói (Estado do Rio) há mais de trinta anos, em uma “Macumba” que ele visitava pela primeira vez. Até ali, ele fora um espírita kardecista. O pai-de-santo investiu-o dos poderes de presidente da Tenda de São Jerônimo, que devia funcionar na Capital, e lhe disse que importava organizar a Umbanda como religião”. José Alvares Pessoa foi um atuante umbandista, e um dos responsáveis pela legalização da prática da Umbanda no Brasil. Em 1945, José Álvares Pessoa, juntamente com outros umbandistas obtiveram junto ao Congresso Nacional a legalização da prática da Religião de Umbanda. Discurso pronunciado por José Álvares Pessoa na Tenda Espírita São Jerônimo (Rio de Janeiro, 30/09/1954) A Umbanda caminha a passos largos para a realização de um ideal que acariciamos há longo tempo e que pequenina semente, plantada por um grupo de homens de fé e de boa vontade há mais de 40 anos, orientados e dirigidos pelos Espíritos de eleição que são o Caboclo das Sete Encruzilhadas e os seus abnegados companheiros. Nasceu e cresceu regada com o suor de tantas criaturas altruístas que vêm dando o melhor de sua vida por tão nobre causa, e hoje, qual mangueira frondosa, aconselha-nos à sua sombra acolhedora. Este ideal que é a transformação de Umbanda na religião que dominará todo o território brasileiro, e daqui, com a graça de Deus, há de espalhar-se por este continente abençoado que é o continente do futuro, nós o veremos concretizado em obra imorredoura e, apesar dos tropeços que a cada momento ainda perturbam a nossa marcha, para a qual são inúteis os obstáculos, haveremos de vencer com galhardia, triunfando de todos os empecilhos que porventura ainda teremos de enfrentar. Achamo-nos arregimentados como para uma batalha iminente e, escudados na nossa fé inquebrantável em Nosso Cristo Oxalá e amparados pelas inúmeras hostes de Espíritos benfazejos que almejam ver implantadas nesta Terra uma religião isenta do interesse vil das coisas materiais, nada tememos, porque o limpo de coração tem Deus consigo. É preciso que nos convençamos e que conosco se convençam todos os que direta ou indiretamente tiverem conhecimento do nosso movimento, que Umbanda não deseja ser tomada como Espiritismo, nem experimental, nem mágico, porque Umbanda faz questão de mostrar-se tal qual é – pura e simplesmente religião, magia e espiritismo religioso cristão que um dia empolgará a Terra de Santa Cruz e se espalhará pelos quatro cantos deste continente. Umbanda é simples, humilde, espiritual, magia, espiritismo e cristianismo; propugna pela felicidade dos humildes que a procuram, levando alívio aos que, abatidos pelos sofrimentos, quer moral, material ou espiritual, não se envergonham de ajoelhar-se aos pés dos Pretos-Velhos ou dos seus intrépidos Caboclos para implorar o seu auxílio e a sua graça. Os Espíritos que baixam em nossos Terreiros não vivem na beatitude excelsa dos Céus dos padres católicos; permanecem sempre, como eles mesmos dizem, na Aruanda, que é lugar de trabalho onde estão sempre alertas aos sofrimentos dos desgraçados deste planeta de expiação, para acorrer no momento propício, para dar-lhes força para levarem avante as demais provas a que estão sujeitos. E nós, a exemplo dos nossos Guias admiráveis, só nos preocupa o alívio que possam obter os nossos irmãos em sofrimento. Em Umbanda não nos preocupamos com as pesquisas dos laboratórios científicos e psíquicos, onde pesa-se o fluido, verificam-se as formações do ectoplasma que produz as materializações e modelam-se em cera os membros dos Espíritos materializados; nem tampouco nos debruçamos horas a fio sobre os livros para indagar da natureza do corpo físico de Jesus. O que nos interessa não é o corpo físico do Mestre Divino e sim a sua essência mesmo, o seu ego imponderável, a caridade que irradia sobre nós todos, é que a seus pés vivamos em oração.

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Nos Terreiros de Umbanda, onde despidos dos enfeites dos sacerdotes que oficiam nos grandes templos, os seus médiuns, pobres e humildes como os pescadores que acompanhavam o Salvador, deixam as canseiras dos seus trabalhos de cada dia para servirem de instrumentos aos Guias que realizam a Caridade, que a milhares já têm beneficiado; onde não reina o espírito de lucro, nem domina o ideal do mando. Não há tabela de preços para a quantidade de graças que espalham os Pretos-Velhos e os Caboclos, pelos filhos que os buscam; não há hora para se fazer a caridade, porque inúmeras são as vezes que pobres operários e humildes empregados, desprezando o tempo que lhes sobra para o descanso a que têm direito, entram pela madrugada nos trabalhos do Terreiro para levar a esperança que sempre se concretiza numa realidade boa para o desgraçado ou o poderoso que bate à porta de nossas Tendas sempre escancaradas para todos e freqüentadas por enormes multidões. É verdade que há umbandistas desgarrados que recebem pelos trabalhos de seus Guias, mas onde há o trigo há sempre o joio e é preciso que ambos cresçam para que este seja colhido e lançado ao fogo. Umbanda já é bastante conhecida, mesmo pelos que não a praticam; todos sabem que nos seus Terreiros a caridade é feita gratuitamente; o nosso lema é dar de graça o que de graça recebemos. É, pois, chegada a hora em que desassombradamente devemos nos apresentar diante de todos em igualdade de condições com as outras religiões que sem perseguições vicejam à sombra da lei. Umbanda, por seus elementos representativos, prepara-se para fazer frente aos que, convencidos de que são os únicos detentores da verdade e das lições do Divino Mestre, movem contra ela uma perseguição tenaz porque pressentem a sua vitória para muito breve. Umbanda é grande, apesar da humildade com que se manifesta o seu ritual e a sua liturgia se encontra a cada passo no Velho e no Novo Testamento, nos templos do Egito e da velha Índia. Por mais remota que seja a religião encontra-se nela, sem nenhum esforço, vestígios da Umbanda. É um engano pensar-se que Umbanda é uma invencionice de pobres pretos africanos, arrastados como escravos pela infâmia dos negreiros para as terras brasileiras. Umbanda é milenar; Umbanda não tem idade. É verdade que o movimento da implantação da Umbanda pura tem pouco menos de meio século, o que se compreenderá bem quando se dispensar alguns minutos para um raciocínio simples. O Brasil que tem menos de cinco séculos tem sido desde a sua descoberta um campo de fácil conquista dos padres católicos que aqui aportaram com as primeiras caravelas. Tiveram esses senhores a visão profundamente inteligente do que seria no futuro a Terra de Santa Cruz. É aqui que se implantaram e impuseram sua vontade. É de notar-se que naquela época os nossos colonizadores seguiam a religião dos seus antepassados; não havia concorrentes, portanto tinham cem por cento de probabilidade para se imporem e dominarem. Mas o tempo corre, as coisas mudam. O homem que é sempre irrequieto procura ver novos horizontes e busca sempre à novidade. Como a vinda dos pobres cativos não imaginavam os seus algozes que também veriam a semente da religião que no futuro faria concorrência à religião que trouxeram da terra mãe. E agora, a despeito de todos e de tudo, a magia de Umbanda se arregimenta para tomar o lugar que lhe compete como verdadeira religião, tão espiritual como qualquer outra, propugnando pelo ideal de doutrina cristã que nos toca a alma mais de perto. Mas, a Umbanda trazida pelos pretos era tão velha, ou ainda mais velha do que o continente de onde vinha. Raça das mais antigas, a negra era detentora de segredos invioláveis que não transpunham os umbrais dos seus templos. Por isso, deturpada pelos seus portadores e sem ambiente para propagar-se rapidamente, demorou a Umbanda até agora a aparecer com a sua característica verdadeira, livre dos erros que no seu rito estavam arraigados, como o ouro que somente depois de bateado, desprende-se da terra suja com que se achava misturado. A Umbanda é hoje esta magnífica realização que estamos vendo; palpita como um corpo vivo cujos órgãos são todos perfeitos. É uma máquina cujas peças ajustadas funcionam sem o menor embaraço. Prontos para uma ação decisiva estamos todos a postos, intrépidos, com os olhos voltados para o nosso Guia Maior, Nosso Cristo Oxalá, em cujos pés depositamos as nossas esperanças, os nossos anseios, os nossos sofrimentos e a certeza plena de vitória. Sabemos que esta vitória ainda está longe, mas no longínquo horizonte onde se encontra esta vitória, divisamos a figura do Verbo Solar Oxalá, resplendente de luz, cercado pelas Sete Linhas de Umbanda que lhe rendem eterna homenagem e lhe pedem incessantemente que lhes conceda a graça de reunir num único bloco toda a família umbandista para que a Umbanda seja a maior força viva do Brasil, a sua verdadeira religião. E sabemos também que neste dia glorioso em que mais uma vez nos achamos aqui reunidos para comemorar o nosso Orixá Xangô, as falanges gloriosas de todos os Orixás de Umbanda que presidem a nossa festa,

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rejubilando-se conosco, entoando curimbas ao Altíssimo, dão-nos a certeza de que com Ele contaremos para a realização da nossa missão; dar-nos-ão força para a luta, inspiração nos momentos difíceis, luz para não errarmos no caminho e a proteção do que necessitamos para alcançarmos o bem maior que é a absoluta felicidade espiritual. Meus amigos, entoemos um hino de louvor ao nosso admirável São Jerônimo, o nosso todo poderoso Xangô, pedindo-lhe bênçãos e graças para todos nós e para a Casa que tanto amamos, a sua Tenda. (José Álvares Pessoa – 1954) Algumas reportagens do Capitão Pessoa, em época, estarão sendo disponibilizadas em nosso site, juntamente com esse livro ORIXÁ MALLET – O CAPITÃO DE DEMANDA

Concepção do Orixá Mallet – Príncipe Malaio – O “Capitão de Demanda” da Tenda Espírita Nossa

Senhora da Piedade Demanda, ao contrário de ser entendida como somente sendo um mal feito, na realidade significa: “Ação judicial; causa; disputa, combate, guerra, peleja; à procura de; à cata de; em busca de”. A partir de 1913 passou a atuar, através de mediunidade de Zélio de Moraes, uma Entidade da vibração de Ogum que se identificava como Orixá Mallet, chamado de “Capitão de Demanda”. De acordo com Leal de Souza, essa Entidade portentosa, emissária da Luz, atuava mais no terra-a-terra e trouxe consigo do espaço dois auxiliares, que haviam sido indígenas malaios na última encarnação. Dispunha essa Entidade ainda, dentre os elementos do Caboclo das Sete Encruzilhadas, de cinco Falanges selecionadas do Povo da Costa, semelhante às tropas de choque dos exércitos da Terra, seis Falanges do Oriente, além de arqueiros de Oxossi, inclusive núcleos da Falange de Ubirajara. Encontramos duas formas de apresentação do nome dessa Entidade Espiritual: Mallet, e/ou Malê. Qual seria a certa? Na certeza, só ele mesmo poderia dizer. Vamos aos estudos destes nomes, para que, pela razão e bom senso, podermos entendê-lo da forma correta. Cada um veja, reflita e escolha o que acha ser mais correto. É somente um nome e nada mais. Como o próprio Caboclo das Sete Encruzilhadas disse: “Se querem um nome, que seja esse...”.

Atualmente, os malaianos se referem ao termo “Mallet” como: “Uma ferramenta com uma cabeça grande, usado para golpear uma superfície sem danificá-la”.

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“Mallet” também é designativo de nome. No Brasil, encontramo-lo no nome de um importante personagem militar: “Émile Louis Mallet, mais conhecido como Marechal Emílio Mallet, o Barão de Itapevi (Dunquerque, 10 de junho de 1801 — Rio de Janeiro, 2 de janeiro de 1886), foi um militar brasileiro nascido na França. Homem de grande porte físico, com 2,01 metros de altura e 120 quilogramas de peso. É Patrono da Artilharia do Brasil e na data de seu aniversário é comemorada o Dia da Artilharia”.

Somos sabedores que o Orixá Mallet, em sua última encarnação, foi um principe Malaio, seguidor do Islamismo, trazendo-o e ensinado-o na África, Indonésia e por fim, em sua terra natal, a Malásia. Teve grande influência e veneração pelos ensinamentos espirituais espalhados principalmente entre os escravos da cidade de Cabo. Ele é creditado por ter trazido o Islã na África do Sul. Pela grande penetração espiritual dada ao povo africano, pode ter recebido o nome – “Malê – que na lingua Iorubá quer dizer: “muçulmano”. Portanto, esse poderia ser efetivamente seu nome correto.

Por trabalhar integrado a vibratória de Ogum, especialista em desmanches de magias negras e descarregos (desobsessões), carreou como companheiros de trabalhos, diversas outras entidades espirituais também especialistas nestes misteres. Muitos dos Caboclos(as) da Mata, ligados a vibratória dos Orixás Oxossi, Xangô e Yansã, e principalmente de Ogum, trabalhadores da Umbanda, são conhecidos na Umbanda Crística como “Caboclos da Mata Demandadores”, pelas formas particulares como lidam com possíveis desmanches de magias negras, combatendo o mal, aplicando a Lei e a Justiça Divina. Suas maiores atuações se fazem nos processos de Descarregos (desobsessão). Alguns Caboclos Demandadores são particularmente identificados por muitos umbandistas como: “Caboclos Africanos”, por plasmarem mediunicamente a forma de um silvícola africano; mas, nesta Linha Espiritual encontram-se Espíritos, que quando encarnados, pertenceram a várias plagas. Na Umbanda, os Caboclos Africanos não existem como Linha especial de Trabalho Espiritual em particular e não devem ser tratados como tal, mas, estão integrados, incorporando, trabalhando e sendo identificados como Caboclos da Mata. Não nos esqueçamos: Linha de Trabalho Espiritual é composta por arquétipos sociais e não raciais. Na Umbanda, os “indígenas” que tiveram encarnações em solo africano, ou mesmo nos aparecem fluidicamente como africanos, não gostam, e não se identificam como sendo “Caboclos Africanos”, mas tão somente como “Caboclos da Mata”.

O Orixá Mallet, o Capitão de Demanda da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, vibratoriamente da Linha de Ogum, que identificava-se fluidicamente como um malaio, manipulava com maestria as energias sutis da Natureza, exigindo para determinados trabalhos a calma dos campos, a altura das montanhas, o retiro das florestas, e as forças desagregadoras das ondas do mar. Leal de Souza que conviveu vários anos com essa Entidade, nos relata um caso presenciado por ele: “Na primeira vez que o vi a sua grande bondade, para estimular minha humilde boa vontade, produziu uma daquelas esplêndidas demonstrações. Estávamos cerca de vinte pessoas numa sala completamente fechada. Ele, sob a curiosidade fiscalizadora de nossos olhos traçou alguns pontos no chão, passou, em seguida, a mão sobre eles como se apanhasse alguma coisa; alçou à sinistra, e abrindo-a, largou no ar três lindas borboletas amarelas, e, espalmando a destra na minha, passou-me a terceira”. – Hoje, quando chegares a casa, e, amanhã, no trabalho, será recebido por uma dessas borboletas.

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E, realmente, tarde da noite, quando regressei ao lar e acendi a luz, uma borboleta pousou no meu ombro e na manhã seguinte, ao chegar ao trabalho, surpreenderam-se todos os meus companheiros, vendo que outra borboleta, também amarela, como se descesse do teto, pousava-me na cabeça. Tive ocasião de assistir à outra de suas demonstrações, fora desta Capital, à margem do Rio Macacú. Leváramos dois pombos brancos, que eu tinha a certeza de não serem amestrados, porque foram adquiridos por mim. Colocou-os o Orixá Mallet, como se os prendesse sobre um ponto traçado na areia, onde eles quedaram quietos, e começou a operar com fluídos elétricos para fazer chover. Em meio à tarefa disse: – Os pombos não resistem a esse trabalho. Vamos passá-los para a outra margem do rio. Pegou-os, encostou-os à fronte do médium e alçando-os depois, soltou-os. Os dois pássaros, num vôo alvacento, transpuseram a caudal, e fecharam as asas na mesma árvore ficando, lado a lado, no mesmo galho. Passada a chuva que provocara, disse: – Vamos buscar os pombos. Chegamos à orla. O Orixá Mallet, com as mãos levantadas, bateu palmas e os dois pombos recruzando as águas, voltaram ao ponto traçado na areia”. Príncipe reinante, na última encarnação, numa ilha formosa do Oriente, o delegado de Ogum é Magnânimo, porém, rigoroso, e não diverte curiosos: – ensina e defende. Outro relato: João Severino Ramos, umbandista conhecido em todo o Brasil, dirigente da sexta Tenda fundada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas – Tenda Espírita ao Jorge, relatava as maravilhas a que assistiu às margens do Rio Macacú, onde muitos incrédulos se tornaram fiéis seguidores da doutrina do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Ele inclusive, pois da primeira vez que lá estivera isso há mais de 40 anos, fora disposto a não se deixar convencer. Sucediam-se demonstrações da presença de um poder superior. Mas ele continuava descrente. E pediu uma prova decisiva. Através da mediunidade de Zélio, manifestava-se, nesse dia, o Orixá Mallet, que atuava principalmente no combate aos trabalhos de magia negra e na cura de obsedados. Apanhando uma pedra, o Orixá Mallet jogou-a na testa de Severino. Vendo-o cair no rio, os seus companheiros correram para socorrê-lo, temerosos de que a correnteza o levasse. Não se movam – ordenou o Orixá Mallet – Ele voltará sozinho. Minutos depois, João Severino transpôs a margem do rio. Estava transfigurado. Incorporava uma entidade que daria, depois, o nome de Ogum de Timbiri e se tornou o Guia Espiritual da Tenda Espírita São Jorge, fundada em 1935.

Ogum Timbiri – Mestre Himalaico

“A Tenda Espírita São Jorge foi à sexta casa fundada com a orientação direta do Caboclo das Sete Encruzilhadas, em 15 de fevereiro de 1935.

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João Severino Ramos recebeu orientação para fundar e dirigir a Tenda, cujo mentor é um Mestre do Himalaia que veio trabalhar na seara de Umbanda na irradiação de Ogum, apresentando-se como Ogum Timbiri. Também era médium do Caboclo Teimoso de Aruanda, de Seu Baiano, de Pai Felipe e de Exu Tiriri. João Severino Ramos quando recebeu orientação para fundar a Tenda Espírita São Jorge integrava o corpo mediúnico da Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia, sob a direção do nosso irmão Durval, que funcionava num sobrado da Rua Camerino, na cidade do Rio de Janeiro. Acompanharam João Severino Ramos, a Tia Albina, médium de Pai Cipriano e do Exu Vampiro. Nosso irmão Bastos que exerceu durante muitos anos a Vice-Presidência da Tenda Espírita São Jorge. Feliciano Lopes de Almeida, médium de Ogum Beira Mar, do Caboclo Caribá, de Pai Jovino das Almas, de Pai João, de Pedro Mineiro e do Exu Arranca Toco. Feliciano Lopes de Almeida dirigiu os trabalhos da Tenda Espírita São Jorge por muito tempo, principalmente, no período em que João Severino Ramos teve que embarcar para a Itália, na fase da Segunda Guerra Mundial, trabalhando como enfermeiro nos campos de batalha. José Cândido, médium do Caboclo Nazareno, de Pai Fabrício das Almas e de Exu Sete Encruzilhadas. Henrique Pinto, médium de Ogum Guerreiro, de Pai José e de Seu Tranca Rua das Almas. Doguiar, médium de Pai Joaquim e de Exu Veludo. Jovelina, médium de Pai Jeremias, do Caboclo Serra Negra e de Exu Guerreiro e tantos e tantos irmãos que nos lograram o exemplo da dedicação e responsabilidade mediúnica. Exerceram a Presidência da Tenda Espírita São Jorge, o Dr. Antônio Pedro Barbosa. Almirante; nosso irmão Olivério Soares Bittencourt, nosso irmão Batista; nosso irmão Mário Basile Sampaio; nosso irmão Nélson Silva e atualmente o nosso irmão Jose Carlos Lopes Coelho (Tico)”. (http://tendaespiritasaojorge.blogspot.com) Apresentaremos duas reportagens de João Severino Ramos, publicadas num periódico no Rio de Janeiro. Observemos como era o pensamento de um dirigente de uma das Tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas: MOVIMENTO ESPIRITUALISTA BRASILEIRO

(Direção José Álvares Pessoa) JOÃO SEVERINO RAMOS – Médium-Chefe e diretor dos trabalhos da Tenda Espírita São Jorge e 2º vice-presidente da União Espírita de Umbanda. CABOCLOS E PRETOS-VELHOS DA UMBANDA Um dos motivos até a pouco afegados por numerosas pessoas espíritas ou não, para justificar as aplicações para forma de trabalhos dentro das Tendas Espíritas de Umbanda dirigidas por Guias “Caboclos”, por elas considerados numa categoria inferior aos que atuam nos demais Centros Espíritas. Sente-se, entretanto, por toda parte, que tais reservas estão desaparecendo diante da surpreendente eficácia das atividades benéficas dos nossos Caboclos e Pretos-Velhos, nos trabalhos nas Tendas de Umbanda, de cura e de desobsessão, realizando não raras vezes em menos de um mês, o que na antiga modalidade científica levaria talvez mais de um ano. A razão por que tal fenômeno se verifica é que constitui em si mesmo um dos objetivos dessa grandiosa organização espiritual. No presente capítulo desejo elucidar o quanto possível, a natural curiosidade do povo a respeito dessas personalidades por vezes exóticas, em sua forma de falar e de agir, sempre envoltas numa grande modéstia, quando os Caboclos e Pretos-Velhos nos falam de si próprios, atribuindo-se invariavelmente ausência absoluta de conhecimentos mais altos.

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A verdade, porém, é que um Espírito “Caboclo” que chegue a obter permissão de incorporar num médium, entre nós, para trabalhar pelo bem do próximo, está muitos graus acima da cultura mais aprimorada de qualquer ente humano por mais sábio que este se julgue. E a prova disto é que nenhum homem culto ainda conseguiu “derrubá-los” com a sabedoria, sendo pelo contrário, por eles elucidado sob múltiplos fenômenos cuja causa muitas vezes desconhece. Os Caboclos e Pretos-Velhos são em geral Espíritos que completaram o seu curso de aperfeiçoamento moral através de sucessivas encarnações na Terra, a última das quais teve lugar no recesso das matas seculares, com a finalidade precípua de se familiarizarem com as variadíssimas propriedades terapêuticas da flora americana. Daí uma das razões pelas quais esses bondosos amigos sempre recorrem às plantas medicinais para a cura de moléstias que a atual farmacopéia não consegue debelar. Sua linguagem simples e ao alcance de todas as inteligências, caracteriza-se algumas vezes pelo exotismo de dialetos absolutamente desconhecidos entre nós, recorrendo esses Espíritos freqüentemente à parábola para nos obrigarem a exercitar, desenvolvendo a nossa capacidade de raciocínio. Usando habitualmente desta nas sessões de trabalhos de cura e desobsessão, cuja média de freqüência é de pessoas menos cultivadas, os Espíritos chamados Caboclos e Pretos-Velhos podem transformá-la por completo, empregando expressões da mais alta intelectualidade, com uma eloqüência e riqueza de imagens capazes de encantar as pessoas de cultura aprimorada. Tem assim, estes abnegados trabalhadores do espaço infinito a faculdade de utilizar a linguagem que melhor se adapte ao ambiente em que tenham de operar. Casos existem, e não poucos, de médicos notáveis, absolutamente descrentes do Espiritismo, comparecerem às Sessões da chamada Tenda Espírita de Umbanda com a intenção preconcebida de colher argumentos para combater cá fora essa organização que tantos adeptos vem criando por toda a parte, e, ao cabo de alguns minutos de conversação com o Guia Chefe dos trabalhos, converterem-se sem reservas, tal a sabedoria demonstrada por esses Guias Espirituais, elucidando, os quais sempre nos misteres mais árduos de sua clínica. E assim se explica o ingresso nos trabalhos das Tendas de Umbanda, nela exercendo abnegadamente elevadas funções mediúnicas, de verdadeiros Espíritos de escol ao serviço da medicina na presente encarnação, cuja clínica grandemente se desenvolveu pelo acerto e precisão. É que, sendo médico um Espírito essencialmente intuitivo, cujo acerto no exercício da profissão tem de depender do grau de desenvolvimento desta faculdade mediúnica, a intuição, o seu ingresso numa organização espiritual, como a de Umbanda, faculta-lhe a aproximação de entidades especializadas na arte de curar, capazes de esclarecê-lo, instruindo-o para o bom êxito da sua elevada missão de curar os enfermos do corpo. Um fato recente, registrado nesta capital, pode bem servir para demonstrar o grau de elevação desses nossos amigos invisíveis que se acham incumbidos de difundir entre nós a doutrina salutar do Espiritismo, através das Linhas Espirituais da Umbanda. Relatando-o, omitirei os nomes das pessoas nele envolvidas, por não ser meu intuito senão o de exemplificar para esclarecimento dos mestres estudiosos, acerca do valor dos Guias, Espíritos que se nos apresentam em forma de Caboclos e Pretos-Velhos. Como é natural, pratica-se a forma de trabalhos característicos dentro dos seus rituais. Seus dirigentes prosseguiam satisfeitos, na faina abençoada de poder socorrer a quantos lhes batiam à porta; enfermos do espírito e do corpo, ajudados no espaço infinito por algumas falanges de grandes Caboclos, um dos quais as guiava e protegia, por delegação de entidades superiores. E os trabalhos caminham, segundo a capacidade de produção da Tenda em referência, Como, porém, todos quantos na Terra nos dedicamos ao Serviço do Mestre, como obreiros da Seara Divina, temos, porém, de ser experimentados a todos os momentos em nossa capacidade de resistência às influências do mal que nos espreitam a oportunidade de nos desviar do bom caminho, os dirigentes daqueles núcleos deram ouvidos a certa influência que lhes dizia ser a Linha de Umbanda uma forma inferior de praticar o Espiritismo, sugerindo-lhes a transformação da Tenda em Centro Científico, onde poderiam gozar da presença de entidades realmente superiores ao invés de Caboclos atrasados. Mal seguros na sua diretriz, e certamente pouco elucidados ainda acerca do valor e finalidades desta grandiosa organização espiritual que é a chamada União Espiritista do Brasil, as diretorias das Tendas decidiram apelar para a União Espiritista de Umbanda aceitar a sugestão, e após ter dado conhecimento do seu propósito ao Guia Espiritual Chefe desta organização, um Caboclo autêntico, com a adoção da orientação e forma de trabalhos do último quartel de século passado. Iniciadas as suas Sessões sob a nova modalidade, tiveram os dirigentes das antigas Tendas a satisfação de constatar segundo a palavra dos novos Guias Chefes, que ali estavam diversos luminares, prontos a cooperar para o maior êxito dos trabalhos. Se alguma dúvida pudesse existir no espírito dos dirigentes, acerca da veracidade eloqüente em que mostravam pródigos os antigos doutores da Terra, cuja linguagem e elevação de sentimentos tanto deliciavam os ouvidos da diretoria e pequena assistência no novo Centro. E as sessões prosseguiram, sempre assistidas pelos grandes nomes que tanto fizeram pela doutrina em sua última estada entre nós, até que, meses decorridos, algo de anormal começava a empanar a alegria da direção da antiga Tenda de Caboclos.

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É que os negócios materiais de alguns de seus membros estavam tomando aspecto desagradável, que os seus Guias de então não conseguiam modificar. O homem inteligente e dotado de várias capacidades agarrou-se a tudo quanto pudesse honestamente, e contribuir para atender às necessidades imperiosas do lar. Fez-se pintor, e nessa arte conseguiu dominar de certo modo a adversidade que tanto o preocupava. Seu espírito refletiu em sua situação e concebeu a idéia de invocar o antigo Chefe Espiritual da Tenda, o desprezado Caboclo, para ouvi-lo acerca do que se passava. Talvez ele tivesse meios de tirá-lo da dificuldade em que se debatia com sua família. Assim decidido, atraiu-o a uma consulta amiga em sua própria residência, o recinto sagrado da família, onde só a verdade, a pureza, a harmonia e o amor devem existir. “Não estas, então, satisfeito com o teu espiritismo científico? Foi indagando logo de começo, o velho amigo Caboclo. Meu Filho; continuou: vós brancos da Terra sois muito fáceis de iludir. Na vossa ignorância e na vossa vaidade, nem sequer vos apercebeis de estardes sendo levados para o abismo, na suposição de estardes subindo para Jesus; que te aconteceu, foi à conseqüência lógica da tua resolução, abandonando uma forma de trabalhos que tanto beneficiava esses sofredores da Terra para te dedicares ao espiritismo de conversa, em que se aprende, mas não se produz. Mas fica sabendo, agora, que aqueles doutores que vocês escutavam com tanto orgulho, éramos nós mesmos, “os Caboclos atrasados” das matas virgens, que lá nos apresentávamos com nomes supostos, para satisfazer a vossa vaidade e a vossa ignorância; mas, descansa porque Jesus não despreza ninguém. Trata de organizar as nossas Tendas de Umbanda. Vamos voltar ao que éramos; simples humildes, e tudo se transformará para ti”. Foram, mas ou menos, essas palavras do velho Caboclo aos seus amigos da Terra. A transformação operou-se com a restauração das Tendas de Umbanda. Como que por milagre, foi reintegrado no seu posto de tabelião, restabelecendo-se também a normalidade de suas vidas. São Guias, Espíritos de grande valor de chefes espirituais, os que muita gente ainda chama desprezivelmente de Caboclos. Certo intelectual, escritor e jornalista de mérito, mas curioso, apenas, das coisas transcendentes, lembrou-se de perguntar certa vez a um dos Guias Chefes Espirituais de maior projeção entre nós, que operam sob a forma de Caboclos, qual a razão, a imperiosa necessidade por que assim se manifestam nos médiuns, quando todos sabiam da sua grande elevação espiritual, e do imenso poder que já dispunha entre os abnegados trabalhadores nas Tendas de Umbanda; a entidade interrogada, que pitava no momento o seu charuto, tocou o charuto de leve, a parte acesa sobre a mesa que estava sentada uma pessoa para aliviar a cinza longada, salivou calmamente para o lado, deixando que a saliva caísse perpendicularmente no recipiente apropriado, e esclareceu: “Nego; você vai dizer uma coisa para o Caboclo. Se você que é um nego limpo, inteligente e gosta de andar sempre de branco, tiver um serviço a fazer dentro de uma oficina onde os utensílios sejam de natureza grosseira, e cujo ambiente enfumaçado ou impregnado de resíduos graxosos lhe possa sujar o terno; você irá com ele para trabalhar de uma a duas horas por dia nessa oficina? O intelectual respondeu-lhe prontamente: “Está visto que não. Nesse caso eu vestiria um macacão apropriado”. “Pois é isto exatamente que nós fazemos, informou o Caboclo. Para vir trabalhar no meio de vocês, brancos da Terra, nós, por maior que seja a nossa elevação espiritual, preferimos recorrer ao nosso macacão que é o nosso perispírito, de quando fomos Caboclos, para podermos suportar as vibrações grosseiras do vosso ambiente terreno, ainda impregnadas de ódio, inveja, egoísmo, e que só o nosso grande desejo de vos ajudar a melhorá-lo, dá forças para suportar”. Ai está nessa pequena elucidação, uma síntese perfeita do que são os Caboclos da Linha de Umbanda. (Texto de João Severino Ramos. Jornal “O Semanário” – 1956 – ano II – número 70 – página 11) SALVE UMBANDA Caminhos tortuosos, começo de estrada do qual os filhos retiram as pedras para encontrarem passagem mais livre quando se virem encaminhados noutras linhas mais elevadas. Sim, meus irmãos. Os chamados filhos da Umbanda são os abridores de suas próprias estradas. Chama-se Terreiro de Umbanda ao local dos trabalhos, por ser onde baixam os Guias com a missão de ensinar-vos a manejar as picaretas, as enxadas. São os Guias Espíritas, estes em sua maioria de Caboclos e Pretos-Velhos, de grande evolução espiritual, achando-se por isto preparados para se apresentarem humildes e pacientes, encaminhando-nos com carinhos e as mais das vezes fazendo-se parecer conosco para melhor vos sentirdes em sua presença. Depois que estiverdes encaminhados, isto é, quando já houveres aberto a vossa estrada através do estendal de sofrimentos peculiares ao nosso mundo; quando tiverdes aprendido a dominar e vencer os vossos defeitos, e enriquecidos os vossos fluidos como faz o homem do campo com seus músculos, então ireis, irmãos, sendo conduzidos ao caminho da pena, da escrita e da filosofia. Encontram-se nos Terreiros de Umbanda, verdadeiros iniciados, grandes trabalhadores, muitos dos quais certas pessoas tentam desviar sob a alegação de serem “grandes” e que por isto não devem estar mais naquele meio. Deveis, irmãos, fechar vossos ouvidos à semelhante conselhos e caminhar para frente, recordando-nos que eles são, em grande parte, meios de experimentação a vossa decisão e vossa fé.

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Nós, Espíritos, Guias e condutores, precisamos do vosso concurso para o desempenho de nossa missão na Terra, como a própria Terra precisa de professores para o esclarecimento dos irmãos. Caminhamos, pois, com decisão e fé, certos de que, servindo aos nossos Guias Espirituais, estaremos servindo a Deus. Ser iniciado em Umbanda é ser chefe de turma, e as turmas não poderiam trabalhar sem um Chefe Espiritual Superior. Depois que as estradas estiverem abertas, e Linha de Umbanda desaparecerá na sua missão terrena, prosseguindo os seus trabalhos espirituais relacionados com as Estrelas, o Sol, a Lua e os Astros que banham a Terra de longe. Certos Espíritos já estiveram também na Terra em cumprimento de missão divulgadora dos ensinos da filosofia Hindu, e outras mais propagadas pelo Espiritismo. Segui-os, pois; mas se os irmãos entenderdes melhor com um Caboclo, um Preto-Velho, um Africano ou qualquer outra aparência que Guia Espírita possa usar para desempenhar sua missão naquele grupo de médiuns trabalhadores, ouvi-o, e se ouvirdes com fé e lhe seguires os ensinamentos, encontrareis a estrada que vos ligará as outras de todas as demais religiões que forem bem interpretadas e sentidas. Não, irmãos, deveis preocupar com os que estão em cima, porque em verdade não há acima nem abaixo; há apenas para cada um a missão que veio cumprir; cumpri irmãos, bem a vossa, e sereis irmãos tão grande quanto os maiores. O grande pode executar pequenos trabalhos; o pequeno pode executá-los grandes. Os umbandistas podem ser comparados na Terra a enormes bandos de trabalhadores de camisa arregaçada, peito nu, descalços, fortes, tostados pelo sol e satisfeitos, apresentando ao Chefe Supremo sua tarefa terminada e sendo pagos espiritualmente como os trabalhadores da Seara Divina, que recolhem-se à noite para descansar após um dia de produtivo labor. Não é menor o homem porque trabalha descalço dentro do Terreiro de Umbanda. Trabalhais e sentir-vos-ei bem, sendo umbandistas. A estrada é uma só, os atalhos é que são diversos, conduzindo a mesma. Cada religião leva os filhos, seus adeptos conforme seu grau de desenvolvimento e força de vontade. No alto da montanha, porém, todas elas se encontram e se confundem numa só, que é a verdade, a luz, a perfeição. Todos os Guias trabalham para o mesmo fim que é caminhar. Caminhar irmãos! Tudo caminha, os Astros, a Terra, nada estaciona. É uma força suprema e divina das leis da Natureza, caminhando-vos irmãos para a verdadeira liberdade espiritual. Não desanimeis irmãos. Resisti. A dor fortalece, encoraja; ela vos conduz irmãos, às alturas celestiais, transportado-vos para fora da Terra. Os olhos choram, mas vede irmão que as plantas também choram ao receberem o doce orvalho matinal. Não desesperei irmãos. Fosse o orvalho ressequido e não seria belo. Os pássaros cantam o hino harmonioso. Será canto ou choro? Vós irmãos não o sabeis; entretanto, vós irmãos, encantais com seus gorjeios. O mar gira, debate-se constantemente, e vós irmãos, o achais belo. Esperando que um dia, nós irmãos reunamos todos, sendo todos iguais, onde mestre e discípulos se compreenderão como verdadeiros filhos do mesmo Pai e filhos de Deus. Por enquanto estamos preparando-vos irmãos, para os exames finais na Terra, de que sois filhos, feitos de matéria densa e alimentados vagamente pelo espaço espiritual para depois de, todos preparados, a Terra pode mostrar seus irmãos, filhos de Umbanda, banda da Terra, o seu irmão Jesus, o maior médium de Umbanda, e a Deus nosso Pai, de todas as forças que fará realizar a ceia, com bandos de apóstolos, de sementes deixadas na Terra, cada vez que as forças supremas foram enviadas a visitá-la, sempre que estas forças conseguem acalmar os filhos da Terra, apelam ao Pai Supremo que é Deus. Vós irmãos sou também chamados, não pela força completas na Natureza e das forças espirituais e Divinas. Sarava todos irmãos, umbandistas e espiritualistas. Salve as forças supremas. (Texto de João Severino Ramos. Jornal “O Semanário” – 1956 – ano II – número 86 – página 05) Por curiosidade, vamos disponibilizar o trecho de uma entrevista efetuada ao dirigente da Tenda Espírita São Jorge, Sr. José Carlos Lopes Coelho (Tico), que nos esclarece certos aspectos de como eram seus trabalhos em época de Zélio de Moraes: Na época do Caboclo das 7 Encruzilhadas, como era a dinâmica das Giras na Tenda Espírita São Jorge? (horários, uniformes, regras, etc.) TESJ – As giras aconteciam às segundas, quartas e sextas feira das 20 às 22 horas. O dirigente, na primeira quinta-feira de cada mês, participava das reuniões de estudo com o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Era grande o número de médiuns e de consulentes. A Tenda funcionava então na Rua Dom Gerardo, nº 45, em prédio alugado. Quando este prédio foi requisitado pelo dono, a Tenda ficou um tempo parada enquanto se construiu, às pressas, um Terreiro em Vila Isabel (Rua Senador Nabuco, 122) onde hoje funcionamos, e muitos consulentes se afastaram bem como alguns médiuns também fundaram suas próprias casas.

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A diminuição do corpo mediúnico fez com que as giras ficassem restritas às segundas feiras e somente algumas poucas giras festivas ocorrem em outros dias da semana. A mudança geográfica – da Praça Mauá para Vila Isabel – e a situação de risco que a cidade como um todo sofre no atual contexto também é fator que contribui para um certo esvaziamento. Quanto ao uniforme, ainda é o mesmo, semelhante ao da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade e outras casas surgidas na época: guarda-pó branco com o símbolo da Tenda no bolso esquerdo da parte de cima e calça branca por baixo do guarda-pó (feminino); jaleco com o símbolo da Tenda no bolso esquerdo e calça branca (masculino). Em giras festivas é permitido o uso de roupas que estejam de acordo com a entidade ou Orixá homenageado”. (http://tendaespiritasaojorge.blogspot.com)

Hoje, a Tenda Espírita São Jorge se distanciou das normatizações instituídas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. TRABALHO ININTERRUPTO Dezenas de Tendas foram fundadas sob a orientação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, no Estado do Rio, em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Sul. Sempre que possível, o médium Zélio participava pessoalmente da instalação das novas Tendas. Quando o trabalho material não o permitia, enviava médiuns capacitados para organizar e dirigir a nova casa. Em Belém do Pará foi fundada a Tenda Mirim Santo Expedito, pelo então tenente Joaquim Bentes Monteiro, que solicitou sua transferência do Rio para aquele Estado, especialmente para cumprir essa missão, com sua esposa, Consuelo Bentes Monteiro. Um dos médiuns dessa Tenda, Evaldo Pina, atualmente no Rio, pertencendo hoje ao quadro dirigente da Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade (Tenda que descende da Tenda Espírita São Jerônimo), estava em visita a Zélio e ouviu deste a descrição da fundação daquela casa, em todos os pormenores, como se o fato datasse de semanas, apenas. E através de Zélio recebeu uma mensagem do dirigente, já desencarnado, citando fatos conhecidos apelas pelos dois. Em todo o Brasil existem Tendas fundadas diretamente pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. Algumas delas se desviaram dos seus ensinamentos, que aliado ao fato do crescimento rápido e desordenado, criou uma espécie de caos que predomina até hoje. Outros mantêm-se fiéis aos princípios ditados pelo Sr. Caboclo das Sete Encruzilhadas. Existem Tendas, que não tiveram contato direto ou indireto com o iniciador da Umbanda, mas mantém a pureza e a singeleza de seus ensinamentos – isso se deve ao plano espiritual. Em 1939, o Caboclo determinou que se fundasse uma Federação (que posteriormente passou à denominação de União Espírita da Umbanda do Brasil) para congregar as Tendas Umbandistas e que deveria ser o núcleo central desse culto, em que o simples uniforme branco de algodão dos médiuns, estabelecia a igualdade de classes, e a simplicidade do ritual permitia dedicar integralmente o tempo das sessões ao atendimento dos necessitados.

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Mais tarde, surgiu o Jornal de Umbanda, que durante mais de vinte anos foi um porta voz doutrinário de grande valor e no qual colaboraram efetivamente, entre outros, Cavalcanti Bandeira, Reinaldo Xavier de Almeida, Olívio Novais e o escritor Jota Alves de Oliveira. O ritual preconizado pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas é simples e desprovido das complexidades ritualísticas e magísticas praticadas pela “Macumba” vigente no Distrito Federal de então. São palavras textuais de Zélio de Moraes:

O Caboclo das Sete Encruzilhadas nunca determinou o sacrifício de aves e animais, quer para homenagear entidades, quer para fortificar a minha mediunidade.

O Caboclo das Sete Encruzilhadas não admitia atabaques e nem mesmo palmas nas sessões. Apenas os cânticos, muito firmes e ritmados, para a incorporação dos Guias e a manutenção da corrente vibratória.

Capacetes, espadas, adornos, vestimentas de cores, rendas e lamês não são aceitos nos

Templos que seguem a sua orientação. O uniforme é branco, de tecido simples.

As guias (colares) usadas são apenas as que determinam a entidade que se manifesta. Não é a quantidade de guias o que dá força ao médium.

Os banhos de ervas, os Amacis, as concentrações nos ambientes da Natureza, a par do ensinamento doutrinário, na base do Evangelho, constituem os principais elementos de preparação do médium. E são severos os testes que levam a considerar o médium apto a cumprir a sua missão mediúnica.

(Trechos extraídos das obras: “A Umbanda e sua História” – Diamantino e Trindade – Editora Ícone. “Umbanda Cristã e Brasileira” – Jota Alves de Oliveira – Ediouro.” Jornal: Umbanda Hoje” – Ano III – n.17 – 2000. “Umbanda: A Manifestação do Espírito para a Caridade”, por Sérgio Estrellita da Cunha. Documentos de Lilia Ribeiro. Pesquisas em sites na NE, e, observações, adaptações e materiais do autor.

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A PEQUENA DESBRAVADORA

Lilia Ribeiro

Ao iniciarmos a série de documentos históricos sobre a Umbanda, não poderíamos deixar de homenagear a desbravadora, senhora Lilia Ribeiro, contemporânea de Zélio de Mores, que colecionou vasto material histórico, comprovando a veracidade da existência do primeiro umbandista e da primeira Tenda de Umbanda do Brasil. Todas as informações documentadas com detalhes da trajetória do “Caboclo das Sete Encruzilhadas” e de Zélio de Moraes na Umbanda foram possíveis pelos relatos colhidos e coordenados pela Srª Lília Ribeiro. Os primeiros relatos sobre a existência de Zélio de Moraes, do Caboclo das Sete Encruzilhadas e da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, deram-se com Leal de Souza em 1924, através de duas reportagens no jornal “A Noite”; uma relatando um impressionante caso de cura (vide página 76 deste livro), e outra, uma Sessão de desobsessão (vide página 77 deste livro). Posteriormente, em 1932, através do livro: “O ESPIRITISMO, A MAGIA E AS SETE LINHAS DE UMBANDA”, o primeiro livro escrito sobre a Umbanda. Além disso, Lilia debateu tenazmente, em debates e reportagens, as normatizações da Umbanda efetuadas pelo Senhor Caboclo das Sete Encruzilhadas, defendendo de unhas e dentes o preconizado pelo venerável Caboclo. Lilia escreveu e gravou depoimentos importantes, mostrando claramente que a Umbanda instituída pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas é simples, harmoniosa, sem roupagens coloridas e cheias de rendas, sem adereços, sem sacrifício de animais, sem atabaques, sem cobranças, sem beberagens, sem dançarias, sem vaidades, sem festas regadas a comes e bebes, sem rituais e magias disparatados e complicados, sem profusão de oferendas e despachos. Após uma série de reportagens, Lilia calou-se por muitos anos, guardando o precioso material histórico, que por um pedido da mesma só poderia vir à tona após o seu desencarne. Porque a senhora Lilia assim pediu? Porque guardou veladamente todo esse material por tantos anos sem disponibilizá-lo? A vivência nos diz o óbvio: as perseguições, os ataques, as decepções, as demandas efetuadas pelos que se diziam umbandistas, mas de fato eram desarticuladores e principalmente os que deturparam tudo o que o instituidor da Umbanda, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, normatizou. Pelo acossamento sofrido, possivelmente pelos que estavam ao seu lado, Lilia recolheu-se e esperou o momento certo para tudo isso vir à baila, o que somente aconteceu, infelizmente, após ter desencarnado.

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Lilia Ribeiro foi fundadora e mãe espiritual da Tenda Espírita Nossa Senhora do Rosário, em 1955. Essa Casa foi originária da Tenda de São Jerônimo, uma das sete criadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas na primeira fase de expansão de nossa Religião. Posteriormente, em 23/04/1965, mudou a razão social para “Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade”. Era médium do Caboclo Mata Virgem. Lilia Ribeiro era repórter e jornalista, editando o Boletim “Macaia”, e foi quem deu entrada à história da Umbanda, longe dos mitos; a história real, com fatos. Durante todo o período que pode conviver com Zélio de Moraes e com suas filhas Zélia de Moraes Lacerda e Zilméia de Moraes Cunha, Lílian constituiu um grande acervo de gravações, perto de 90 (noventa) fitas históricas, dentre as quais, uma grande quantidade de fitas com gravações de Zélio de Moraes, do Caboclo das Sete Encruzilhadas e pontos cantados na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, verdadeiros pontos de raiz. Também constituiu vários textos sobre ensinamentos, rituais, pontos e trabalhos executados naquela Tenda e na Cabana de Pai Antonio, em Cachoeira de Macacú/RJ. Aqui, neste despretensioso livro, disponibilizaremos somente as reproduções documentárias importantes sobre a Umbanda. Algumas poucas fitas dos pontos cantados na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade já veiculam em vários sites e blogues na Net. Portanto, nesse momento, queremos expressar nossa profunda gratidão a senhora Lilia Ribeiro, rogando a Deus, a Jesus, a Mãe Maria Santíssima, aos Sagrados Orixás e ao Senhor Caboclo Mata Virgem, que a cubram de bênçãos, e que seu Espírito imortal sinta paz nesse momento precioso, pois como foi pedido, tudo esta sendo disponibilizado. A Lilia dizemos: “Minha irmã querida. Já está sendo feito. Tenha paz em seu coração. Seu trabalho não foi em vão. Tudo está saindo na hora certa e frutificará, pois essa foi a vontade do Pai. Desejamos nesse momento, que receba o nosso preito e o nosso amor, com eterna gratidão. Um beijo no seu coração, nossa pequenina desbravadora”. Peço aos umbandistas, que sempre se lembrem em suas orações, dessa “pequena desbravadora”, a Mãe Lilia Ribeiro, por tudo o que nos legou. Quis a graça de Deus, as bênçãos do Senhor Caboclo das Sete Encruzilhadas, a anuência espiritual da nossa irmã Lilia Ribeiro e o desprendimento de dois filhos de fé, Mãe Maria de Omulú (Maria das Graças Viana) e Pai Solano (Solano Filardi), (a quem devemos nosso preito e gratidão, pois sem o concurso deles nada disso chegaria a público), dirigentes da “Casa Branca de Oxalá”, situada na cidade “Lagoa Santa/MG”, que as reportagens de Lilia Ribeiro chegasse em nossas mãos, e aqui as disponibilizaremos sem cortes e sem emendas. As reproduções documentárias e fatos históricos que comprovam o que acima foi relatado, está documentado com reportagens e entrevistas com o próprio Zélio de Moraes, com o Caboclo das Sete Encruzilhadas, com o Pai Antonio e pessoas que conviveram em época do início da Umbanda, tudo documentado pela senhora Lilian Ribeiro. Optamos por disponibilizar as cópias dos originais juntamente como esse livro, para mostrar que tudo não é invenção da nossa cabeça, mas, simplesmente fatos históricos, e com testamentos documentários não há argumentos. Também apresentaremos várias reportagens efetuadas pela senhora Lilia Ribeiro no jornal “Diário de Notícias”, na década de 1970, e outras sobre a Umbanda, pesquisadas e colecionadas pelo autor, disponibilizadas juntamente com esse livro no ícone: “Materiais Históricos sobre a Umbanda”.

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TRANSCRIÇÃO DAS GRAVAÇÕES HISTÓRICAS

Disponibilizaremos adiante, por escrito, alguns poucos relatos que achamos importantes, das gravações efetuadas pela senhora Lilia Ribeiro, onde poderemos vislumbrar, na fonte, mensagens e conversas do Caboclo das Sete Encruzilhadas, do Pai Antonio e de Zélio Fernandino de Moraes Pelos anos das fitas cassetes e falta de tecnologia em época, alguns trechos das gravações são incompreensíveis. De onde não entendemos o que se fala, colocaremos uma série de reticências (.....................) Às vezes, um ou outro trecho pode parecer rústico, mas, é pelo fato de o Espírito estar usando sua maneira simples, peculiar e regional de expressão. Em alguns trechos das gravações, Zélio de Moraes está falando, e, logo em seguida, fala o Caboclo das Sete Encruzilhadas ou o Pai Antonio. Isso se dá normalmente em médiuns com algumas dezenas de anos de trabalhos mediúnicos ininterruptos, onde a variação entre médium e Guia Espiritual é tênue, e as manifestações se dão de modo harmonioso sem a necessidade de remelexos e trejeitos próprios de manifestações mediúnicas na Umbanda. De algumas fitas disponibilizaremos a íntegra; de outras, somente trechos de relevo, pois muito do que é dito se repete, por serem gravadas em época dos aniversários da Umbanda e consequentemente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade. Em nosso site, juntamente com esse livro, no subitem “Materiais Históricos sobre a Umbanda”, disponibilizaremos as gravações históricas que se encontram em nossa posse, cópias de documentos históricos bem como dezenas de reportagens efetuadas desde a fundação da Umbanda. Deixamos de transcrever todas as fitas, para que o leitor possa, pessoalmente, ouvi-las na fonte, com atenção.

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TRANSCRIÇÃO DA FITA CASSETE Nº 31, GRAVADA POR LILIA RIBEIRO Gravação feita pela senhora Lilia Ribeiro, diretora da TULEF (Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade – RJ), no dia 16 de novembro de 1972, com o Caboclo das Sete Encruzilhadas.

“Chegou, chegou. Chegou com Deus. Chegou, chegou; o Caboclo das Sete Encruzilhadas”

Meus queridos irmãos, neste momento, vindo do espaço, permitam que neste estudo para amenizar sofrimentos dos que estão na Terra, encarcerados em seus corpos, estou satisfeito porque tem gente que é feliz, porque todos vocês vem me ajudando na obra que tomei missão, no espaço, de implantar, a Umbanda de humildade, amor, e caridade, aproveitando um jovem moço em meio daqueles senhores, velhos kardecistas, para dizer que o preto, tinha direito, porque vieram da África trazidos pelos brancos. Os estrangeiros que acreditavam que os caboclos que eram nativos. Tomei a missão e vejo neste instante grandes representações. Não estão todas, por que por este Brasil a fora, criei Tendas de Umbanda construtivas, sadias, com moral e dando de graça o que de graça se recebe. Do sul do país aos estados do norte, ouviam a minha palavra, desenvolviam médiuns e fui criando Tendas de grandes médiuns; encontrei grandes médiuns; pude fazê-los, incorporei bem, trabalhei na Caridade, tomando a direção de uma Tenda, e assim foi se criando Tendas. Meus irmãos, me satisfaz estar entre vocês porque naquele dia 15 de novembro na Federação Kardecista, eu anunciei a Tenda de Nossa Senhora da Piedade, do modo que a mãe tinha piedade de seu filho, que tivesse piedade desta humanidade. Grandes coisas foram feitas na Tenda; grandes coisas eu pude fazer para aqueles que estavam com certeza, crentes que a Tenda não teria vida para que no dia segundo dia eu anunciasse a eles, não, a Umbanda, Deus comigo, mas, Deus conosco, do nosso lado, será a religião deste fim de século. Meus irmãos, eu disse: vou levar daqui uma semente, vou plantar nas Neves e aquela árvore ficará frondosa para dar a sombra para todos os seus filhos, a todos aqueles que precisassem de uma sombra amena, os que dizem sentirem o queimar do sol de crimes, de vícios, de paixões que se criavam, que existiam como existem ainda hoje no meio da humanidade. A Tenda da Piedade foi criada e progrediu, faz hoje 64 anos da primeira comunicação aos meus irmãos. Aqueles coronéis que me cercavam, aqueles velhos que me cercavam, estavam admirados de um menino fazer e dizer aquilo que eu dizia, aquilo que eu pregava e anunciava. Pois bem meus irmãos, está formada a nossa Umbanda, com grande sacrifício, porque é preciso curar, é preciso levar aos médiuns, aqueles que se julgavam deserdados da sorte, a misericórdia de Deus, o conforto, para eles compreenderem que a palavra do Espírito é a continuação nossa, que fazia a harmonia dos lares e curava os enfermos. Chamei Pai João, fui buscar Orixá Malê, para comigo trabalharem e criarem Tendas. Encontrei muitos descrentes. Aqui está o representante da Tenda São Jorge, talvez vocês não saibam como Severino, um grande médium que foi, como este médium se desenvolveu. Era descrente. Leal de Souza, e a mãe de Geraldo Rocha foi pedir ao Orixá Malê para fazer um trabalho com pássaros na beira do rio Macacú. Severino que não acreditava nem em Deus, também foi meus irmãos, a vista de todos aqueles que nos cercavam, todos que estavam assistindo a sessão, alguns já estão mortos, não podem dar aqui sua palavra, mas eu estou dizendo que tem aqui quem falta. Pois bem meus irmãos; os pombos levados pela mãe de Geraldo Rocha, e levados por Leal de Souza, Orixá, tirou-os da gaiola que estavam, e segurando eles, falou no bico do pombo; eles precisam trabalhar, e vou avisar vocês, o que é a proteção. Severino ria. Era um dia de sol, algumas nuvens corriam no espaço. Todo mundo ia apanhar chuva; vamos mandar aqueles pombos pro outro lado de lá do rio para que eles não se molhem, para voltarem e continuarem o nosso trabalho. Não demorou poucos minutos e a chuva caiu molhando a todos que estávamos ali reunidos. Passada a chuva, e os pombos fugiram para o outro lado do rio, Orixá Malê fez com eles voltassem, e tornassem em seu ninho. Severino duvidava; então, como ele não acreditava em Deus, o Orixá Malê que era mais, pegou uma pedra redonda na margem do rio e deu com a pedra na testa, e ele pá. Ele caiu dentro do rio.

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Corre e tal; não; não pega; ele foi quem se achou na pedra, e tem um Ogum que ele trabalha, e quis mostrar a ele, que ele não tinha fé em Deus, mas foi com uma pedra que fez dele um médium dentro das matas, nas margens do rio Macau. Vêem vocês que a luta foi grande para formar estas Tendas, tudo se faz, mas hoje estou satisfeito porque sinto no coração de vocês que os vossos corações estão unidos ao meu Espírito para ir aos pés de Jesus pedir perdão, para que possamos ser seus alunos, seus inimigos que recebam de seus corações um perdão e também para aqueles que podem desejar o mal. Acredito que o manto de Nossa Senhora, virá ao agasalho de todos vocês na Umbanda do humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas. Sempre fui pequenino e pequenino continuo; sou mais humilde dos Espíritos que baixa ao planeta; tenho dito, tenho escrito e continuo a ser satisfeito pela Umbanda, todo dia, de estado a estado; a Umbanda hoje é grande, porque em São Paulo que se criou 20 Tendas, em Santos, enfim, em Minas, e por ai afora, na capital da República e no estado do Rio; nossa Umbanda continua progredindo, como aquela que eu desejo, como aquela que é preciso encontrar, nesta casa, quando aqui estou trazendo ao coração daqueles que dirigem, que é a humildade, o amor que pratica a caridade. E venho encontrando e dando força aos dirigentes destas Tendas, e aos médiuns, para que esta Tenda possa sempre ser grande e ser o espelho das outras Tendas, porque meus irmãos, infelizmente, o nosso irmão Floriano que está ao meu lado sabe perfeitamente disto, que a nossa Umbanda, criada por mim, o Espírito, só desejava encontrar de branco, com roupas de pouco custo, nada de seda, nada de cores que pudessem, como eu vou dizer, o pobre ficar triste, quando vocês botarem uma vestimenta. A nossa Umbanda de humildade, amor e caridade, é esta que se prática em nossa Tenda, Tenda de Nossa Senhora da Piedade. Por isso meus irmãos, que as outras Tendas, os umbandistas, podem fazer aquilo que muito bem desejarem; todos eles poderão fazer o que quiserem, mas, eu posso garantir uma coisa, que o meu aparelho nunca aceitou a vil moeda em troca de uma cura ou de um feito, porque a vil moeda só serve para atrapalhar o homem ou mulher que é médium. E vocês, eu sei perfeitamente, que existem Tendas, pelos pantos (nota do autor: panto – termo que indica tudo, inteiro). Nós temos uma choupana no mato, do Velho Pai João, naquela época, que foi o primeiro na nossa Umbanda, grandes teres (nota do autor: teres – “posses, bens – homens de posse”) que o bom ...., generais junto de mim, que podem dizer; - naquela época, um cheque de um milhão era muita coisa; me deram o cheque por cura, e eu dizia ao meu aparelho – não pegue; botavam na minha mão e eu devolvia. Por isso meus irmãos, que vocês possam fazer a caridade, possam receber de Deus a sua misericórdia e que todo médium possa fazer o bem, curar com suas mãos, com sua reza. A questão é andar por uma linha reta, numa consciência pura e limpa. É não receber nada, enfim, olhar para o seu semelhante como se fosse um verdadeiro irmão, com este amor de irmão para irmão. Como o menor Espírito que baixa sobre a Terra eu saúdo a falange de Caboclos que me cercam, que me cercaram quando iniciei. Temos aqui diversos Caboclos; como um certo..., e tem Caboclos também de Ogum, de Xangô, que estão nas Sete Linhas, mas devo dizer que o Caboclo das Sete Encruzilhadas que é o meu Espírito pertence a falange de Oxossi meu Pai. Que Oxossi possa tomar conta de vocês. Que Oxossi, que o padroeiro dessa capital, abençoe a vocês neste momento. E este pequenino Espírito deseja a todos presentes, proteção e os corpos sem os negativos para amenizar os vossos males. Com fé, que tenham nesses momentos a proteção da falange de Oxossi e as outras Linhas que aqui presentes, para levar harmonia aos vossos lares, harmonia aos vossos corações. Talvez possam gozar a vida conforme o Pai vem falando a seus filhos, dentro daquela humildade, dentro do amor de irmão para irmão e praticando a caridade. Lembre-se, que eu seja decente; o menor dentre todos; humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas. Eu salvo ao meu lado à Tupinambá e a outros Espíritos, 7 Flechas, Caboclo Roxo, enfim a quantidade de Espíritos de Oxossi e de Ogum, que estão presentes; de Xangô. Eu felicito a vocês todos que estão na matéria, para que estes Espíritos comigo, possam carregar o que há de ruim, invadindo, sacudindo as vossas casas de alguma coisa que possa estar por lá, para que vocês tenham dias melhores, para que os filhos tenham mais saúde e paz para praticar a verdadeira Umbanda do humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas. Que a paz, neste momento baixe a que se ergam para todos os passos da luz e repasse para todos vocês debaixo do manto de Nossa Senhora da Piedade. Nota do autor: Nesse momento, pelo ouvido por nós na fita, cremos ter havido a incorporação de Pai Antonio, que prossegue com o senhor Floriano:

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- O papai; saudando e salve a Umbanda. (palmas) - Tá tudo bonito. - Ai que saudades eu tenho. Saudade de você. - Como você está Floriano? Tu ta bom meu filho?

Nota do autor: Floriano Manoel da Fonseca – fundador da Cabana Espírita Nosso Senhor do Bonfim –

Rio de Janeiro/RJ 1939 – médium do Caboclo Urubatão - A benção meu pai. - Tu ta bom meu filho. Como é que vai? - Graças a Deus meu pai. Eu estou bem meu senhor, talvez melhor do que aquilo que eu mereça. - Não deixa de levar umas pedradinhas não é meu filho? - Muito contente de estar aqui comungando com esta vibração sublime, com este trabalho maravilhoso que vocês da espiritualidade trazem até esta Terra para ajudarem também a carregar esta cruz. É preciso todo mundo compreender que deste mundo nada se leva, só as boas ações. Infelizmente, nós, Espíritos encarnados ainda somos imbuídos de muito egoísmo e muita animalidade, por isso queremos sempre a posse de tudo, desde as coisas mais insignificantes, até as coisas realmente mais valorosas, esquecendo-nos que realmente nada que temos que cultivar, isto que o senhor ensina; misericórdia, amor, paz, compreensão, piedade, como é também o nome deste símbolo maravilhoso de Nossa Senhora, que o Senhor, Caboclo das Sete Encruzilhadas escolheu para batizar o primeiro Templo de caridade que forma naturalmente uma plêiade de Templos, que vieram a seu tempo, naturalmente por inclinação do Astral superior, enriquecer a terra de Santa Cruz, para trazer auxílio as estas comunidades, a estas searas benditas, o conhecimento da coisas espirituais e ajudar por outro lado ao mais pobres e mais humildes a carregarem as suas cruzes com mais entusiasmo, com mais força, para que assim a Umbanda e o seu Caboclo das Sete Encruzilhadas que é o senhor, vieram inaugurar nessa cidade maravilhosa que é o Rio de Janeiro, e pudessem realmente, ou na terra de Araribóia em Niterói, que são dias de tal maneira, que foi como que uma clarinada no raiar de uma nova era que se expandiu distante. Por isto nós estamos aqui comungando com os 64 anos desta vida laboriosa, desta vida intensa e de muita renúncia para o seu aparelho, que é naturalmente o espelho no qual todos nós, filhos ou não da Umbanda, todos nós que queremos progredir, devemos nos espelhar, porque em realidade se não houver renúncia de nossa parte, nós não podemos construir nada de bom.

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Além do mais a mediunidade, o intercâmbio entre o mundo espiritual e o mundo material, reserva para cada um de seus trabalhadores um caminho, que embora cheio de urzes, mas uma aurora esplendorosa ao término da caridade. Porque segundo nos ensinam você mesmos, Espíritos de Caboclos e Pretos-Velhos, o trabalho de médium corresponde exatamente a uma tarefa nobilitante, e que ele aceitou, porque com maiores possibilidades ele poderá alcançar o caminho da glória, e regenerando-se, ele pode também descontar as falhas, as faltas, e porque não dizer também, os crimes de encarnações passadas. O seu trabalho foi, renuncia, e torna-se valoroso, por que ele esta trabalhando para si, também ajudando os seus irmãos a progredirem nesse mundo que, embora ele aceita como de provas e expiações, ele também vai chegar ao seu ponto culminante, de mundo de regeneração. Por isso, querido Pai Antonio, nós estamos felizes, porque há 25 anos apenas, somos calouros nesse trabalho de pesquisa principalmente, em aprendizado imenso, dessa maravilha com a sua sapiência, que nos traz a Umbanda, quer seja essa que o Caboclo das Sete Encruzilhadas nos ensinou, ou esta outra sincretizada com os trabalhos com os nossos irmãos que se afinam mais, ainda, com as práticas e sistemas vindo de África. Entretanto, nós queremos, percebemos e sentimos por intuição, que tudo isso foi preparado na espiritualidade, de forma que, a Terra do Cruzeiro trouxe, preparado de maneira que chegasse ao ponto em que o emissário do senhor viesse, especialmente dizer aos filhos da Terra de Santa Cruz, que o Brasil é o coração do mundo, a pátria do Evangelho. Estamos felizes Pai Antonio.

“Chegou, chegou. Chegou com Deus. Chegou, chegou, o Caboclo das Sete Encruzilhadas”

Nota do autor: Nesse trecho, pelo fato de ouvirmos o ponto do Caboclo das Sete Encruzilhadas novamente, este retornou e prosseguiu na palestra: - E assim foi feita a nossa Umbanda no Brasil. Passaram-se os anos e tudo aquilo que eu disse, apelando para quem está presente, de muitos anos que me acompanha, falando, pedindo e fazendo exemplos de Jesus quando passou na Terra, quando ia da Palestina para a Galiléia, e foram ao seu encalço pedir harmonia para sua casa; a resposta foi esta: “- Vocês fechem os olhos para a casa de seus vizinhos, fechem a boca para não se virar contra quem quer que seja, não julguem para não ser julgado, pense em Deus que a paz entrará em suas casas. “ É do Evangelho; e tomaram por ensinamento as minhas palavras, e a Tenda começou a seguir o seu ritmo, aquele que eu desejava. Passado alguns anos, em 20 e poucos, em 18, no fim da guerra, eu ensinava que camadas negras baixariam ao planeta Terra, e que em 69, em 69 e 68, esses Espíritos já estariam reencarnados em outros corpos, enviando grandes perturbações a esta planeta. A mulher perderia a honra e a vergonha, e o homem, o caráter. A tantas três, assististe a primeira. Não é verdade? Entretanto, a Igreja, o Vaticano estavam incrédulos. Eu sentia que os tempos se aproximavam; e o tapa no filho rejeitado; porque os críticos seriam os primeiros a querer ouvir as ordens emanadas do Vaticano. Estão vendo o estado que está isso ai. Atualmente nos estamos sabendo, o que se passa pelo mundo inteiro. Infelizmente já não tem mais aquele respeito pela palavra do papa. Infelizmente. A religião, seja ela qual for, desde que tenha por base acreditar em Deus, acredito que seja uma boa religião; desejar a teu próximo o que deseja para ti, cumprir os mandamentos das Leis de Deus é ser perfeito e principalmente, em qualquer religião, mas principalmente na religião espírita, para que o médium seja o instrumento que possa ser tocado por qualquer professor de música, que venha executar uma sinfonia. Por isso meus irmãos, criei Sete Tendas, na capital da República, no Distrito Federal.

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Os mais humildes tragam amor no coração, mas amor de irmão para irmão, porque as vossas mediunidades ficarão muito mais limpas e puras, dignas de qualquer Espírito superior que possa baixar, que os vossos aparelhos estejam sempre limpos, que os vossos instrumentos estejam sempre afinados com as virtudes que Jesus pregou na Terra, para que tenhamos boas comunicações, boas proteções, para que todos aqueles que correm em busca de socorro nas nossas casas de Umbanda, nas nossas casas de caridade em todo o Brasil. Meus irmãos, esse aparelho já esta velho, já com 80 anos, a fazer, mas já começou antes dos 18 anos. Se eu disser que o ajudei para que ele pudesse casar, para que não ficasse a andar dando cabeçadas, para que fosse um médium aproveitado, como eu disse na Federação e esta lá escrito, fui procurar as mediunidades que ele tinha, para fazer a nossa Umbanda no Brasil. E todos estes, a maior parte de todos estes que trabalham em Umbanda, se não passaram por nossa Tenda, passaram por filhos saídos desta Tenda e que criaram outros terreiros. Das 7 Tendas criadas por mim no Distrito Federal, muitas Tendas tem saído para fazer a caridade aos seus semelhantes, a nos seguir. A lembrança que Jesus veio ao planeta Terra, na humilde manjedoura, não foi por acaso. Não. Foi porque o Pai assim o quis, determinou, porque podia ter procurado uma casa de um potentado daquela época, mas não, foi escolher aquela que seria a mãe de Jesus, o Espírito que vinha traçar a humildade, os seus passos, para ter paz, saúde e felicidade. Aproveitando o nascimento de Jesus, a humildade que ele baixou neste planeta, numa humilde manjedoura, o Anjo que anunciou a Maria que ela ia ser mãe sem ser esposa, que a estrela que iluminou aquele estábulo, que levou os três reis magos a sua presença, vinde até vocês iluminando os vossos Espíritos, tirando os escuros de maldades, por pensamentos, por práticas e ações que tinham sido pensadas ou praticadas, que Deus perdoe tudo aquilo que vocês tenham feito, que Deus perdoe as maldades que possam ter sido pensadas, para que a paz possa reinar nos vossos corações e nos vossos lares. Eu, meus irmãos, como menor Espírito que baixou na Terra, mas amigo de todos, numa concentração perfeita dos Espíritos que me rodeiam neste momento, peço que eles sintam as necessidades de cada um de vós e que ao sairdes deste Templo de caridade, que encontreis os caminhos abertos, os vossos enfermos melhores e curados e saúde para sempre nas vossas matérias. Com paz, saúde e felicidade, com humildade, amor e caridade, sou e serei sempre o humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas.”

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EM 1971, A SENHORA LILIA RIBEIRO, DIRETORA DA TENDA DE UMBANDA LUZ, ESPERANÇA, FRATERNIDADE – RJ, GRAVOU UMA MENSAGEM DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS NA TENDA

ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE

Trabalho de Desobsessão (Descarrego) na Mesa de Trabalho da Tenda Espírita Nossa Senhora da

Piedade – 1973 (arquivo de Diamantino F. Trindade)

No ano de 1971, um dia após a fundamentação da Umbanda completar 63 anos, reuniram-se, na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, médiuns e assistidos para ouvir a palestra proferida por Zélio de Moraes, e pelo Senhor Caboclo das Sete Encruzilhadas. Eis a palestra:

“Chegou, chegou, chegou com Deus,Chegou, chegou, o Caboclo das Sete Encruzilhadas”. Ao meu lado está o Caboclo das Sete Encruzilhadas, para dizer a vocês que esta Umbanda, tão querida de todos nós, fez ontem 63 anos. Na Federação Espírita do Estado do Rio, presidida por José de Souza, conhecido por Zeca, rodeada por gente velha, homens de cabelos grisalhos, um enviado de Santo Agostinho me chamou para sentar à sua cabeceira. Havia uma ordem; ele fora jesuíta até aquele momento, chamava-se Gabriel Malagrida, e, naquele instante iria anunciar a Lei de Umbanda, onde Negros e Caboclos pudessem se manifestar, porque ele não estava de acordo com a Federação, que não recebia Negros, nem Caboclos. Pois, se o que existia no Brasil eram Caboclos, eram nativos, se quem veio explorar o Brasil trouxe para trabalhar e engrandecer esse país, os negros da costa da África; como uma Federação Espírita não recebia Caboclos e Negros? Então disse o Espírito: “Amanhã, na casa de meu aparelho, na Rua Floriano Peixoto, número 30, será inaugurada uma Tenda Espírita com o nome de Nossa Senhora da Piedade, que se chamará Tenda de Umbanda, onde o Negro e o Caboclo possam trabalhar”. Houve balbúrdia, embora eles reconhecessem a minha mediunidade; mas eu era muito moço, havia completado 17 anos e por doença havia sido levado à Federação por que os médicos não me davam jeito. Esse Espírito, que nós chamamos de Chefe, Caboclo das Sete Encruzilhadas, se manifestou na Federação, chamando aqueles senhores, todos de cabelos grisalhos, para assistir à primeira Sessão de Umbanda em minha casa. E o presidente perguntou: “E o meu irmão acredita que irá ter alguém lá amanhã? A resposta do Caboclo das Sete Encruzilhadas: “colocarei no cume de cada montanha que circunda Neves, uma trombeta tocando, anunciando a existência de uma Tenda Espírita onde o Negro e o Caboclo possam trabalhar”. Isso aconteceu no dia 15 de novembro de 1908. No dia 16 de novembro, a nossa casa ficou cheia, e posso dizer aos meus irmãos: só o fiz levado por esse Espírito que é o nosso Guia, porque eu não queria aceitar, estava sem saber, achando uma coisa extraordinária.

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Eu iria assumir a responsabilidade de ter uma Tenda Espírita, de receber um Guia para fazer com que os doutores fossem lá buscar a cura para seus entes queridos. (nota do autor: Agora, incorporado, o Caboclo das Sete Encruzilhadas continua): “Meus irmãos, tudo isso se deu. O meu anunciar da Tenda, foi tomar o meu aparelho e começar a curar aqueles que estavam lá, fosse por isso, ou fosse por aquilo. Mas Deus, que é sumamente misericordioso, levou um cego e outras pessoas, como também paralíticos, na Tenda da Piedade, na minha frente. E eu disse: caminhem, e quando chegarem perto de mim estavam curados. Passaram-se os anos, e tudo aquilo que eu disse, apelando para quem está presente e que há muitos anos me acompanha, falando, seguindo e trazendo exemplos de Jesus quando esteve na Terra, que foram ao seu encalço pedir harmonia para sua casa, a resposta foi esta: “vocês fechem a boca para não murmurar contra quem quer que seja; não julgueis para não serdes julgados; pensem em Deus, que a paz entrará suas casas”. Tomaram as minhas palavras como ensinamento, e a Tenda começou a seguir o seu ritmo como eu desejava. Na década de 1920, com o fim da guerra, eu anunciava que as camadas negras baixariam ao Planeta Terra, e que em 1968, 1969, esses Espíritos já estariam encarnados em outros portos e viriam trazer a perturbação a este Planeta. A mulher perderia a honra e o homem o caráter. Entretanto, eu sentia que os tempos se aproximavam e que os bispos seriam os primeiros a não querer ouvir as ordens emanadas do Vaticano. Atualmente, nós sabemos o que está se passando pelo mundo inteiro. Já não se respeita a palavra do Papa, infelizmente. Porque a religião, seja ela qual for, desde que tenha por base acreditar em Deus, acredito que seja uma religião boa. Desejar ao seu próximo aquilo que deseja pra si, cumprir os mandamentos da Lei de Deus, é ser perfeito, e, em qualquer religião, mas principalmente na religião Espírita, para que o médium seja um instrumento que possa ser tocado por qualquer Espírito que possa vir trabalhar. Por isso meus irmãos, criei sete Tendas na capital da República, no Distrito Federal. A primeira foi criada e entregue à nossa irmã Gabriela. Mais tarde, dois ou três anos depois, passei para o José Meirelles, que era um deputado federal que havia ido à Tenda Nossa Senhora da Piedade em busca da cura de sua filha. E a resposta do velho Pai Antonio: “vá à sua casa; no último canteiro, vai mexer a terra e achar umas raízes. Vai cozinhar as raízes, dar à sua filha e ela estará curada”. Eram batatas, porque naquela época ainda não haviam florido e ainda estavam embaixo da terra, cheia de raízes. Foi um esteio, foi um elo, um braço direito para me ajudar e fazer com que essa Umbanda chegasse ao ponto em que está chegando. Criei a Tenda de Nossa Senhora da Guia, de Oxossi, criei a Tenda de Oxalá, a Tenda São Jorge, a Tenda de Xangô, a Tenda de Santa Bárbara... Finquei sete Tendas. Depois de funcionarem, formadas essas Tendas, vamos criar a Federação de Umbanda no Brasil. Chamei Hidelfonso Monteiro, Maurício Marcos de Lisboa, major Alfredo Ramalho, hoje general, enfim, juntei cinco pessoas para fazermos a Federação de Umbanda no Brasil. Mais tarde, a Tenda da Piedade continuou a trabalhar, contando com a assistência deste aparelho por quem falo; continuou a produzir, a curar, ajudando a uma casa de saúde, pois os médicos nos procuravam, iam à casa do meu aparelho para saber quais os loucos que tinham cura, dando os nomes e apontando. E aqueles que eram atuados por Espíritos, nós afastávamos esses Espíritos e a loucura passava, Mais tarde, veio então a formação de um jornal, para a divulgação da nossa Umbanda, e para isso contamos com o secretário da Tenda, Luis Marinho da Cunha, com Leal de Souza e outros que eram fervorosamente espíritas, pelas coisas que sentiam e pelas coisas que recebiam pelas graças de Deus. Meus irmãos, a Umbanda continua. Nasceu em 1908 na Federação Espírita de Niterói. Hoje a Umbanda está em todos os Estados; médiuns saíram daqui porque eu não pude levar meu aparelho até lá, mas levei-o ao Estado de São Paulo, onde criei mais de vinte Tendas, em Minas, no Espírito Santo... Porque curas foram realizadas e foi necessário criar Tendas Espíritas da nossa Umbanda querida nesses Estados. A Umbanda tem progredido e vai progredir. É preciso haver sinceridade, honestidade e eu previno sempre aos companheiros de muitos anos: a vil moeda vai prejudicar a Umbanda; médiuns que irão se vender e que serão, mais tarde, expulsos, como Jesus expulsou os vendilhões do templo. O perigo do médium homem é a consulente mulher; do médium mulher é o consulente homem. É preciso estar sempre de prevenção, porque os próprios obsessores que procuram atacarem as nossas casas fazem com que toque alguma coisa no coração da mulher que fala ao pai de Terreiro, como no coração do homem que fala à mãe de Terreiro. É preciso haver muita moral para que a Umbanda progrida, seja forte e coesa.

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Umbanda é humildade, amor e caridade – esta é a nossa bandeira. Neste momento, meus irmãos, que rodeiam diversos Espíritos que trabalham na Umbanda do Brasil: Caboclos de Oxossi, de Ogum, de Xangô. Eu, porém, sou da falange de Oxossi, meu pai, e não vim por acaso, trouxe uma ordem, uma missão. Meus irmãos sejam humildes, tenham amor no coração, amor de irmão para irmão, porque vossas mediunidades ficarão mais puras, servindo aos Espíritos superiores que venham a baixar entre vós. É preciso que os aparelhos estejam sempre limpos, os instrumentos afinados com as virtudes que Jesus pregou aqui na Terra, para que tenhamos boas comunicações e proteção para aqueles que vêm em busca de socorro nas casas de Umbanda. Meus irmãos: meu aparelho já está velho, com 80 anos a fazer, mas começou antes dos 18. Posso dizer que o ajudei a casar, para que não estivesse a dar cabeçadas, para que fosse um médium aproveitável e que, pela sua mediunidade, eu pudesse implantar a nossa Umbanda. A maior parte dos que trabalham na Umbanda, se não passaram por esta Tenda, passaram pelas que saíram desta Casa. Tenho uma coisa a vos pedir: se Jesus veio ao planeta Terra na humildade de uma manjedoura, não foi por acaso. Assim, o Pai determinou. Podia ter procurado a casa de um potentado da época, mas foi escolher aquela que havia de ser sua mãe, este Espírito que viria traçar à humanidade os passos para obter paz, saúde e felicidade. Que o nascimento de Jesus, a humildade que Ele baixou a Terra, sirva de exemplos, iluminando os vossos Espíritos, tirando os escuros de maldade por pensamento ou práticas. Que Deus perdoe as maldades que possam ter sido pensadas, para que a paz possa reinar em vossos corações e nos vossos lares. Fechai os olhos para a casa do vizinho; fechai a boca para não murmurar contra quem quer que seja; não julgueis para não serdes julgados; acreditai em Deus e a paz entrará em vosso lar. É dos Evangelhos. Eu, meus irmãos, como o menor Espírito que baixou a Terra, mas amigo de todos, numa concentração perfeita dos companheiros que me rodeiam neste momento, peço que eles sintam a necessidade de cada um de vós e que, ao sairdes deste Templo de caridade, encontreis os caminhos abertos, vossos enfermos melhorados e curados, e a saúde para sempre em vossa matéria. Com um voto de paz, saúde e felicidade, com humildade, amor e caridade, sou e sempre serei o humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas”.

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TRANSCRIÇÃO DE TRECHOS DA FITA CASSETE Nº 50, GRAVADA POR LILIA RIBEIRO

Transcreveremos abaixo, parte da entrevista gravada por Lilian Ribeiro com o Sr. Zélio Fernandino de Moraes no dia 22 de outubro de 1970, que faz algumas referências aos Exus. Gravação feita com a voz de Zélio de Moraes. Nota do autor: Em toda trajetória histórica da Linha Branca de Umbanda e Demanda sempre ouvimos falar em Caboclo e Preto-Velho, mas em nenhum momento, sobre os Exus. Portanto, vamos agora atentar para os ensinamentos do Senhor Zélio de Moraes, calcados nas orientações do Senhor Caboclos das Sete Encruzilhadas: Lilian Ribeiro: Sr. Zélio, é sobre o trabalho dos Exus. Existem Tendas que dão consultas com Exus em dias especiais além das consultas normais de Pretos-Velhos e Caboclos. Como o Sr. vê isso?

Zélio: Eu sei disto, que há muitas Tendas que trabalham com Exus, eu não gosto porque é muito fácil se manifestar com Exu, qualquer pessoa médium, um mau médium se manifesta com Exu, basta ter um Espírito atrasado; ou também fingindo um Espírito, por isso não gosto e fujo disto, na minha Tenda não se trabalha com Exu por qualquer motivo.

Nota do autor: Vejam que o Sr. Zélio diz: “... na minha Tenda não se trabalha com Exu por qualquer motivo...”; podemos notar que o trabalho com os Exus seria um trabalho “especial”, ou seja, seria chamado somente em casos de necessidade e para resolver problemas específicos. Os Exus Umbanda não são Guias Espirituais, portanto, não procedem à atendimentos fraternos; isso é reservado somente aos Guias Espirituais gabaritados para tal mister. O Sr. Zélio também nos diz sobre a problemática da facilidade de mistificação, podendo ocorrer puro animismo, ou a presença de obsessores kiumbas ou de Exus Pagãos. Isso é uma coisa muito séria. A roupagem fluídica dos Exus Umbanda, bem como seus modos de ser, muito próximos aos humanos, facilitam, e muito, a mistificação consciente ou inconsciente por parte de médiuns incautos.

Lilian Ribeiro: Mas o Sr. não considera o Exu um Espírito trabalhador como todos os outros Orixás?

Zélio: Depois de despertado, porque o Exu é um Espírito admitido nas trevas; depois de despertado, que ele dá um passo no caminho da regeneração é fácil ele trabalhar em benefício dos outros. Assim eu acredito no trabalho do Exu.

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Nota do autor: Nesta pergunta, quando o Sr. Zélio diz “depois de despertado, que ele dá um passo no caminho da regeneração é fácil ele trabalhar em benefício dos outros”, pode-se notar que estes Espíritos pretendem um local melhor, pretendem uma posição melhor e para isto escolheram o trabalho caritativo nos Terreiros de Umbanda. Lilian Ribeiro: Não haverá casos em que outros Orixás vibrando em outras Linhas não possam resolver de imediato alguns problemas de filhos e, não seria o Exu aí o mais indicado para resolver, por estar mais perto materialmente, por estar mais aceito nos trabalhos materiais?

Zélio: O nosso Chefe, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, nos ensinou assim, isto faz 60 anos, que o Exu é um trabalhador. Como na polícia tem soldado, o chefe de polícia não prende, o delegado não prende, quem prende são os soldados, cumprem ordens dos maiorais, então o Exu é um Espírito que se encosta na Falange, que aproveita para fazer o bem, porque cada passo para o bem que eles fazem vai aumentando a sua luz, de maneira, que é despertado e vai trabalhar, quer dizer, vai pegar, vai seduzir este Espírito que está obsedando alguém, então este Exu vai evoluir. É assim que o Caboclo das Sete Encruzilhadas nos ensinava.

Lilian Ribeiro: De que modo o Exu é um auxiliar e não um empregado do Orixá ou vice-versa?

Zélio: Eu não digo empregado, mas é um Espírito que tende a melhorar, então para ele melhorar ele vai fazer a caridade junto com as falanges, correndo em benefício daqueles que estão obsedados, despertando e ajudando a despertar o Espírito para afastá-lo do mal que ele estava fazendo, então ele se torna um auxiliar dos Orixás.

Nota do autor: Nestas duas perguntas ele deixa claro que os Exus são a polícia espiritual das casas de Umbanda e que trabalham sob as ordens das Linhas de Trabalhos Espirituais da Umbanda. Zélio nos orienta que os Exus trabalham ostensivamente no auxílio aos obsedados, e, no trato direto com os obsessores, principalmente os que vêm do Reino da Kimbanda, despertando-os das suas letargias mentais, convencendo-os a se integrarem às falanges trabalhadoras do bem.

“Para o bom êxito dessas atividades caritativas, têm esses Guias (nota do autor: Guias Espirituais da Umbanda) como seus auxiliares, Espíritos de todas as categorias, de todas as origens, mesmo de condição e mais atrazada, obedientes e identificados com as finalidades, animados de boa vontade, prestando os servições que lhes são pedidos, ordenados e possíveis na medidas de suas forças, num exercício que constitue a mais eficaz e produtiva escala de aperfeiçoamento moral primário, sem que prejudicada possa ser essa educação moral, pela liberdade que lhes é permitida nos seus usos e costumes familiares, caracterizando sua origem, com as quais se tornam possíveis aqueles que se utilizam dos seus serviços no seu próprio benefício e dessa causa santa, porque beneficia toda a humanidade”. (Texto de: José Rodrigues Lopes de Barros (Aprendiz). Diário Carioca – Quarta-Feira, 22 de Fevereiro de 1933 – página 08) “... Exus, como bem exemplificado por Leal de Souza em 1933, são Espíritos com baixo grau evolutivo. O que os diferencia dos demais ao mesmo tempo em que permite a sua manifestação nos rituais de Umbanda, é o seu conhecimento sobre magia, manipulação de energia, que pode ter sido adquirido tanto em vida, quanto já depois do desencarne. Possuem, portanto, grau de evolução baixo se em comparação com os Espíritos das demais 06 Linhas – já que Exu se encontra na sétima, a “Linha de Santo”, que possui Santo Antônio como patrono – por este motivo, a sua manifestação na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade e nos ritos dirigidos pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, sempre ocorreu debaixo de grande respeito e cuidado, com médiuns, data e local específicos. Geralmente, a manifestação de Exus se fazia e ainda se faz somente necessária nas Sessões de Descarga, Sessões estas fechadas ao público, pois tem a única finalidade de fragmentar todo e qualquer resquício de energias negativas existentes na Tenda e nos médiuns integrantes. As consultas não são autorizadas, pois como bem afirmado logo acima, é seguido o entendimento que não há o porquê de se consultar Espíritos que na maioria dos casos possuem o mesmo ou inferior grau de evolução que o consulente. São os Espíritos mais atrasados e mais cegos a se manifestarem na Umbanda. Não há vantagem, pois ainda necessitam de instrução. Mas fica claro, que Exus são cultuados na Linha Branca de Umbanda e Demanda sim; podem fazer suas descargas e trabalhar quando permitido, mas não dão consultas, assim como não se faz obrigações para a aproximação ou melhor contato mediúnico com esta qualidade de Espíritos nos seus respectivos médiuns...” (Pedro Kritski – médium da Tenda Espírita Santo Antonio, oriunda da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade) – (nota do autor: colocamos uma parta da última frase em negrito para que todos atentem que em Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas não se usa das tais “obrigações” para firmar Exu e Pomba-Gira em nenhum médium)

Segundo informações da Srª Lygia, neta de Zélio de Moraes e atual dirigente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, o primeiro Exu que incorporou na Tenda, sendo seu responsável, é o Sr. Marabaroo, sendo sua primeira médium a Srª. Zilka, irmã de Zélio de Moraes e posteriormente passou a trabalhar com um médium da Tenda, conhecido por “Sr. Pinto”. Zélio de Moraes em 67 anos de trabalhos mediúnicos ininterruptos nunca “incorporou” um Exu.

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TRANSCRIÇÃO DA FITA CASSETE Nº 52, GRAVADA POR LILIA RIBEIRO

Pai Antonio incorporado em Zélio de Moraes na Cabana de Pai Antonio, em Boca do Mato – Cachoeiras

de Macacú – RJ (década de 1970)

“Chegou, chegou, chegou com Deus. Chegou, chegou o Caboclo das 7 Encruzilhadas”

Nota do autor: Zélio fala: Queridos irmãos, ao meu lado está o Caboclo das 7 Encruzilhadas para dizer a vocês que esta Umbanda tão querida de todos nós, fez ontem 63 anos. Que na Federação kardecista do Estado do Rio, presidida por José de Souza, conhecido por Zeca e rodeado de gente velha, homens de cabelos grisalhos, um enviado de Santo Agostinho me chamou para sentar a sua cabaceira, trazia uma ordem, fora jesuíta até aquele momento, chamava-se Gabriel Malagrida, daquele instante ele ia criar a lei da Umbanda, onde o Preto e o Caboclo poderiam se manifestar porque ele não estava de acordo com a Federação kardecista que não recebia Pretos nem Caboclos, pois, se no Brasil, o que existia no Brasil eram caboclos, eram nativos, se no Brasil, quem veio explorar o Brasil, trouxe para trabalhar, para engrandecer este país, eram os pretos da costa da África, como é que uma Federação Espírita não recebia caboclo nem preto? Então disse o Espírito: amanha na casa de meu aparelho na Rua Floriano Peixoto 30, será inaugurada uma Tenda Espírita com o nome de Nossa Senhora da Piedade e se chamará Tenda de Umbanda onde o Preto e o Caboclo pudessem trabalhar. Houve balburdia embora eles reconhecessem a mediunidade que eu trazia, mas eu era muito moço, pois eu tinha feito 17 anos e por doença fui levado a Federação porque os médicos não me davam jeito. Então este Espírito que nós chamamos, Chefe, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, implantou na Federação, chamando aqueles senhores todos de cabelos grisalhos, senhores de responsabilidade para assistirem a sessão na rua Floriano Peixoto nº 30, e o presidente da Federação perguntou: e o irmão vai acreditar que lá tenha alguém amanhã? A resposta do Caboclo: “botarei no cume de cada montanha que circula Neves, uma trombeta tocando anunciando a existência de uma Tenda Espírita onde o Preto e o Caboclo pudessem trabalhar”. Foi a 15 de novembro de 1908. No dia 16 de novembro a nossa casa ficou cheia, e eu posso dizer aos meus irmãos, só fiz levado por este Espírito que é o nosso Guia porque eu não queria aceitar; eu estava sem saber, achando uma coisa extraordinária, eu ia assumir uma responsabilidade de ter uma Tenda Espírita, de receber um Guia para fazer que os outros doutores fossem lá a buscar a cura para seus entes queridos.

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Nota do autor: A partir daqui, incorporado, assume o Caboclo das Sete Encruzilhadas: Pois meu irmão, tudo isto fiz eu, o meu anunciar da Tenda foi tomar o meu aparelho e começar a produzir, a curar aqueles que estavam lá, o fosse por isso, ou fosse por aquilo, mas Deus que é sumamente misericordioso levou um cego e outras pessoas, como também paralíticos, na Tenda da Piedade, na minha frente, eu disse à vista de todos; se tem fé levanta e caminha, porque quando chegar perto de mim estará curado. Passaram-se os anos e tudo aquilo que eu disse, apelando para quem está presente de muitos anos que me acompanham, falando, pedindo e trazendo exemplos de Jesus quando passou na Terra, que foram ao seu encalço pedir harmonia para sua casa, a resposta foi esta: “Você feche os olhos para a casa de seus vizinhos, feche a boca para não murmurar com quem quer que seja, não julgues para não ser julgado, pense em Deus que a paz estará na sua casa”. É do Evangelho, e tomaram pelo ensinamento as minhas palavras e a Tenda começou a seguir o seu ritmo, aquilo que eu desejava. Passado alguns anos, já em 20 e poucos em 18 no fim da guerra, eu anunciava que camadas negras baixariam ao planeta terra, e que 69, 68 estes Espíritos já estariam encarnados em outros corpos e iriam trazer perturbações a este Planeta. A mulher perderia a honra e a vergonha, e o homem o caráter. Apelo para quem assistiu e está presente; não é verdade? No entretanto, a igreja, o Vaticano estava decrépito; eu sentia que os tempos se aproximavam e o papa não seria respeitado porque os bispos seriam os primeiros a não querer ouvir as ordens emanadas do Vaticano. Estão vendo o que está se passando; atualmente nós estamos sabendo o que se passa pelo mundo inteiro. Já o papa não se respeita; a palavra do papa, infelizmente, porque a religião seja ela qual for, desde que tenha como fundamento acreditar em Deus, acredito que seja uma religião boa. Desejar ao seu próximo aquilo que deseja para si, cumprir os mandamentos da lei de Deus é ser perfeito, e principalmente em qualquer religião, mas principalmente na religião Espírita, para que o médium seja um instrumento que possa ser tocado por qualquer professor de música que venha executar uma qualquer coisa, uma valsa, qualquer música enfim. Por isso meus irmãos, criei Sete Tendas na capital da república no Distrito Federal. A primeira foi criada e entregue a nossa irmã Gabriela; mais tarde, 2 anos ou 3 anos depois passei para José Meirelles que foi também, que era um deputado federal, que foi em busca de cura de sua filha, e a resposta do velho Pai Antônio: “Vai a tua casa, do último canteiro vai arrancar, mexer a terra e encontrar umas raízes, vai cozinhar estas raízes e dar a tua filha que ela estará curada”, era batata da angélica, porque não havia naquela ocasião flores; as batatas estavam somente debaixo da terra. Foi um esteio, foi um elo, foi um braço direito para me ajudar, para que esta Umbanda chegasse ao ponto que está chegando. Depois das Tendas criadas, criei a Tenda de Nossa Senhora da Guia, de Oxossi, criei a Tenda de Oxalá, a Tenda de Ogum. a Tenda de Xangô, a Tenda de Santa Barbara, enfim, criei Sete Tendas. Depois de elas funcionarem, depois de tirar os médiuns destas Tendas para que os médiuns pudessem trabalhar em outras Tendas, formadas estas Tendas, vamos criar a Federação de Umbanda no Brasil. Chamei Hidelfonso Monteiro, Maurício Marcos de Lisboa, Major Alfredo Marinho Ravache, hoje General, era major naquele tempo; enfim, botei cinco pessoas para fazer a Federação de Umbanda no Brasil. Criou-se a Federação, e ela começou; então a Federação kardecista veio embargando porque não podia ser Espírita, não podia ter o nome, enfim estas coisas do mundo, mas, a Federação de Umbanda, foi criada, está criada, está funcionando. Mais tarde a Tenda da Piedade continuou a trabalhar contando com a assistência deste aparelho que falo; continuou a produzir, a curar, porque a cura de loucos nestes 63 anos, trabalhando para uma casa de saúde, que os médicos nos procurava, iam a nossa casa, a casa do meu aparelho para pedir, para saber quais os loucos que tinham cura, dando os nomes e apontando, esse, esse, esse e esse tem cura, os outros não, porque esses são atuados por Espíritos e nós vamos afastar estes Espíritos e a maluquice passa. Veio então mais tarde a formação de um jornal de propaganda para a nossa Umbanda. Ai contamos com o secretário da Tenda, Luiz Marinho da Cunha, contamos com Leal de Souza e outros que eram fervorosamente Espíritas pelas coisas que ele sentia e pelas coisas que ele recebeu, das graças de Deus, transmitidas por nós a sua pessoa. E meus irmãos, a Umbanda continua; nasceu em 1908 na Federação kardecista de Niterói, está lá escrito, presidida por José de Souza que conheciam por Zeca que era chefe do Toc Toc, do arsenal da Marinha de Niterói; Antonio Simplício da Costa, Joaquim Santino Costa, José Tavares, enfim, uma quantidade que está tudo escrito e a Umbanda começou em 1908 na Federação kardecista de Niterói.

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Hoje, a Umbanda está em todos os Estados, porque médiuns daqui saíram para o Rio Grande porque não pude levar o meu aparelho lá, mas levei ao estado do Rio, levei a São Paulo onde criei 20 Tendas, em Minas, enfim, no Espírito Santo também têm, de curas que fez lá e foi necessário se fazer Tendas Espíritas da nossa Umbanda querida nestes Estados. A Umbanda tem progredido e vai progredir; é preciso haver sinceridade na Umbanda, sinceridade, este amor de irmão para irmão porque eu prevenia, sempre prevenia apelando para o General, hoje General e para companheiros que me acompanham a muitos anos; a vil moeda vai atrapalhar a Umbanda, médiuns que vão se vender e que serão mais tarde expulsos como Jesus expulsou os vendilhões do templo. O perigo do médium homem é a consulente mulher, do médium mulher, o consulente homem. E preciso estar sempre de prevenção porque os próprios obsessores, os próprios Espíritos que atacam as vossas casas fazem com que toque alguma coisa ao coração da mulher que fala com o pai de Terreiro, como faz atacar o coração do homem que fala a mãe de Terreiro. E é preciso ter muito cuidado, haver moral para que a Umbanda progrida e seja uma Umbanda de humildade, amor e caridade. É esta a nossa bandeira, e acreditem vocês meus irmãos, acreditem vocês, que neste momento me rodeiam diversos Espíritos que vem trabalhando na Umbanda do Brasil, porque havia necessidade, não veio por acaso não, eu trouxe uma ordem, uma missão, porque venho a muito tempo dizendo aquilo que ia acontecer, desde o terremoto de Lisboa em 1755 até este momento. E tudo que aquilo que eu dizia que ia acontecer acontecia. Pois bem, sejam humildes, tragam amor no coração, mas amor de irmão para irmão porque as vossas mediunidades ficarão muito mais limpas e puras, sutil a qualquer Espírito superior que possa baixar. Que os vossos aparelhos estejam sempre limpos, que os vossos instrumentos sejam sempre afinados com as virtudes que Jesus aplicou na Terra para que tenham boas comunicações, boas proteções, para todos aqueles que possam em busca de socorro nas nossas Casas de Umbanda, nas nossas Casas de Caridade em todo o Brasil. Meus irmãos, este aparelho está velho já com 80 anos a fazer, mas começou antes dos 18, se eu disser que eu o ajudei para que ele pudesse se casar, para que ele não pudesse andar dando cabeçadas, para que fosse um médium aproveitado como eu disse na Federação e está lá escrito. Fui procurar as mediunidades que ele tinha para fazer a nossa Umbanda no Brasil. E todos estes, a maior parte ou todos estes que trabalham na Umbanda se não passaram por esta Tenda, passaram por filhos saídos desta Tenda e criaram outros Terreiros. Das Sete Tendas criadas por mim no Distrito Federal, muitas Tendas têm saído para fazer a caridade ao seu semelhante, ao seu próximo. Tenho uma coisa a vos pedir, a lembrança que Jesus veio ao planeta Terra na humilde manjedoura não foi por acaso; não; foi porque o Pai assim quis, determinou, porque podia ter procurado a casa de um potentado daquela época, Deocleciano e outros, mas não, foi escolhida aquela que seria Mãe de Jesus, o Espírito que vinha traçar a humanidade em seus passos para ter saúde paz e felicidade. Aproveitando o nascimento de Jesus, a humildade que ele baixou neste Planeta na humilde manjedoura, que os Anjos que anunciaram a Maria que ela ia ser mãe sem ser esposa, os Anjos, a estrela que iluminou aquele presépio, aquele estábulo que levou os três reis magos a sua presença, sirva para vocês, iluminando os vossos Espíritos; o mal que tenham praticado, que Deus perdoe tudo aquilo que vocês tenham feito; que perdoe as maldades que possam terem sido pensadas, para que a paz possa reinar em vossos corações e nos vossos lares. Eu, meu irmão, como o menor Espírito que baixou nesta Terra, mas amigo de todos, numa concentração perfeita de Espíritos que me rodeiam neste momento, que eles sintam a necessidade de cada um e ao saírem deste Templo de Caridade, que vocês encontrem os caminhos abertos os vossos enfermos melhorados e curados e a saúde para sempre nas vossas matérias, com paz saúde e felicidade, com humildade amor e caridade, sou e serei sempre o humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas. Dá um guardanapo pra limpar o nariz do cavalo Nota do autor: Aqui, Pai Antonio manifestou-se: - Sarava Capitão Major, como diz, hoje não é mais Capitão Major, não é meu filho? Não é visto meu fio? Como vai Lolinha ta bom meu fio? Que tempo o veio não vê ela. Nota do autor: Neste momento vários médiuns pedem a benção ao Pai Antonio. Para não confundir a fala das pessoas com o Guia Espiritual, o que Pai Antonio falar, colocaremos em itálico. - Deus lhe salva, meus fio.

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- Sete Encruzilhadas não falou; ele quis agradecer as fias do cavalo, mas cavalo, por duas veis cavalo queria interromper o que Sete Encruzilhadas falava e ele e Caboclo, como dize, vem tomando conta não é isso meu filho? Cavalo não queria falar, ficou com vergonha de falar dos fios deles como dize. Mas velho agradece a Zéria, a carneirinho tudo, não é isto meu filho? - Sarava a minha passarada toda como dizem, não é isso meu fio? - Não tem pássaro nesta mesa não meu fio? Tem? - Começou com pombinha branca né meu fio? É pássaro né meu fio? - Tem passarinho como dize. O que é que você diz meu fio não tem passarinho ai não meu fio? - Tem? Tem tico-tico - Tico-tico no fu... Tico-tico no fubá Tico-tico no fubá né não fio Tá meu fio? Tá bom. Sarava Portugal É o que meu filho? Microfone - Micofone? É pra ouvir ai o senhor, transmitir ai o seu verbo. - Ah, tá bom. Quero dizer: Nota do autor: Nesse momento, Pai Antonio puxa um ponto cantado:

Tudo mundo que Umbanda

Que, que, que Umbanda Mas, ninguém sabe o que é Umbanda

Mas quer, quer, quer Umbanda Umbanda tem fundamento.

Mas quer, quer, quer Umbanda

- Sarava - Na minha tempo tomava marafo, hoje não pode beber de marafo, não é meu fio? Então da um bocadinho de água pro pai. - Deus lhe salva como diz. - Que assim seja. - Sarava os Tereiros como diz. - Você que representa Tereiro de Ogum. É a Tenda de Ogum. - Ocê sabe como Severino desenvolveu? Sei sim senhor, por diversas vezes ele tem conversado comigo.... - Ele era incrédulo, ele não acreditava em nada, aquelas pessoa que não acredita em nada não é meu fio? - É ver pra crer.

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- Então pediu pra levar um casal de pombos, e capitão Malé, capitão foi lá, como diz, Orixá foi fazer um trabalho, o sol tava bonito, ele diz vai chover, os pombos não podem se molha, solta os pombos, eles vão sentar aqui. O pombo sentou, Severino falou espiando, estava na beira do rio, grande. - Mas os pombos, foi perguntar quem trouxe, foi o Severino que comprou ali perto das barcas, como é que chama? Mercado. Não, quem trouxe fui eu, quem comprou fui eu, tava numa caixa e veio, o pombo foi pra lá. Agora vai chover e choveu mesmo, Severino foi ficando, meio espiando. - É isso tudo é engraçado mais ainda não vi nada de espiritismo; tá bom , vai ver. Passou a chuva, bateu palma, vem cá pombo, o pombo voltou, sentou-lhe no ombro, ele não acreditou ainda, mas será? Isto é o Espírito? - É. Então me dá uma pedra; apanhou uma pedra e disse, vamos se concentrar bem; pensa em Jesus. Ele pensou, deram-lhe uma pedrada na testa que ele ficou uns dias sem poder nem sair de casa com os olhos todo inchado, foram apanhar ele por água abaixo, enganchou numa pedra, Não pega ele, deixa ele enganchado na pedra, veio com Ogum, não é verdade meu filho? É, verdade sim. - Como dizer, teve que aprender, custou, mas aprendeu. - Deus lhe salve. - Está forte o Severino? Está bem sim, é que infelizmente nós só recebemos a comunicação hoje, eu não pude ir lá. - Você dá um abraço pra Severino ........................ Olha como tem dumba (Nota do autor – dumba: mulher), como dize, tem uma porção não é verdade? Olha como dize, como é que tu chama a criança? O nome? - É Pedro. - Pedro. É um nome de respeito meu filho, sabe disso? Quando a gente fala em Pedro a gente bate no chão, salva, salva São Pedro. São Pedro salva, não é isso meu fio? Não é mesmo? Capitão Major tá lembrando aquele pontinho né? - Não é pra você não. A gente puxava pra gente assim.

Tatá na Aruanda Eu na calunga

Olha quanta dumba de Zig zig zig

Eu sem nenhuma

- Sarava - Todo mundo diz que precisa de Zimbo como dizem não é meu fio? Zimbo (nota do autor – zimbo: dinheiro) sabe o que é meu fio? - E vem no Terreiro; meu pai eu tô sem dinheiro, não tem nenhum vintém. - Veio então puxava aquele pontinho,

Tem vintém mamãezinha, não tem não minha cafio?

Olha tia Maria como vem sambando, Olha tia Maria como vem gingando

- Sarava

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- E assim nós vamos trabalhando na Umbanda meu fio, aqueles pontinhos antigos né meu fio, né? É daquele tempo o primeiro ponto que puxaram pra mim foi este, “Zig Zig e eu sem nenhuma”. - Puxaram pra você? Então você era danado por muié em meu fio? Hiiiiiiii... - Ele agora disse uma coisa que deve ter saído sem querer. - Que vale é que não tem ninguém escutando, nós tamo falano aqui nós dois só não é. - Pois é isso criança. Olha Pedro, que São Pedro te abençoa, que tá com ...................... Assim seja. - São Pedro te abençoa. Vamos ..................... Quero pedir uma coisa ao senhor. - Pode pedir, como diz, não sendo zimbo meu fio, veio não tem zimbo, mas... Quero pedir ao senhor que me dê bastante inspiração para poder realizar aquilo que realmente almejo realizar. Sou um filho da Tenda de São Jorge, iniciado, orientado com a força de Ogum, um médium, tipicamente um médium de corrente, médium que procura dentro da minha possibilidade de entendimento dar o máximo de beneficio para aqueles que precisam. Hoje eu fui, digamos assim empurrado para ajudar na União Espiritista de Umbanda, que é originaria da Federação Umbandista do Brasil, sob a inspiração do Caboclo das Sete Encruzilhadas. A nossa luta é muito grande, entendemos nós, que se naquela época o Caboclo iniciava uma nova etapa de trabalho mediúnico, me parece que na atualidade, a Umbanda, os médiuns da Umbanda, precisam muito da doutrina, muito do esclarecimento espiritual. Então eu queria pedir ao senhor, e a este grupo de Espíritos que já vem trabalhando a longos anos. Uma série de médiuns que desempenharam uma missão importante na espinha dorsal da Umbanda, que estes Espíritos possam nos ajudar, nos clarear nossa mente, e que nós tenhamos um equilíbrio de conduta de ação para que a espiritualidade possa nos ajudar a dizer aquilo que nós entendemos e achamos que seja certo. - Que assim seja. Vai ajudar como dize. Depois vocês têm ai como dize, como é que chama, véio conhecia o pai dele, pequenino, a mãe dele e o pai iam lá pra falar com véio, tá entendendo meu fio, mas ele era pequeno, cresceu, ficou grande e tal e quando foi também foi como diz, foi pra cadeira, como é, como deputado né meu fio; como umbandista né meu fio. Hoje é fio dele, não conheço; mas conheço o avô, o avó, conheço a parentada toda dele, conhecia muito o pai e a mãe de Áttila, e as tias todas não é Maria? - Leonor, Joaquim e aquela gente toda, não é isso, Oscar, tudo aquilo. De modo criança, passou por esse Terreiro muita gente. Hidelfonso que foi tesoureiro que trabalhou com veio, 18 ou 19 anos nesta casa, e o pai deste que canta, como é que chama meu fio, pai de Ciro Monteiro. - Depois véio mandou ele tomar côco, caroço de abacate e comer, você lembra, sabe quem é meu filho? Que criou uma porção de, uma porção de ..................., depois veio começou a esculhambar ele porque panhava as músicas que véio cantava e começou fazer negocio pra carnaval, pra tudo, isto não tá certo, como dize. Lamartine Babo - Eu disse: que isso seu magricela, então você vem pra cá fazer isso? Não, não faça não. Aquele negócio do............. ta compreendendo? - Mas tudo passou, ele já tá cá com nós do outro lado não é isso meu filho, engordou, ficou bom, depois como diz, chegou o tempo, passou mesmo não é meu fio? Pois é criança esse mundo é assim mesmo não é meu fio; ninguém sabe, e a mãe diz tô estudando, de onde vem, e você não sabe de onde vem e pra onde vai, senhor sabe Pedro? Não senhor. - Não sabe né meu fio? Tu não sabe o dia de amanhã né? Ninguém sabe né meu fio? Então vamos ter fé em Deus, não é isso, vamos ter fé em Jesus, vamos ter fé nos Santos, não é verdade meu fio? É verdade. - As igrejas pegaram os Santos, amarraram e botaram no canto da parede. Cavalo foi ver Nossa Senhora da Piedade lá em..., onde foi Maria?

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Taboraí. - Unaí não, outro Taboraí. - Taboraí; tá. Nossa Senhora da Piedade os Santos tudo amarrado com corda lá no canto cheio de poeira; cavalo ficou triste; as lágrimas corria; será possível que acabaram com os Santos; botaram só coisinhas no altar? Mas a vida é essa né? - Tem Preta-Velha, estas pretas tudo quer me beijar; não senhor, não pode beijar, não senhor, nem tem marafo nem coisa nenhuma, né meu filho? - Sete Encruzilhadas foi apanhar um Espírito que diz que era o mais feiticeiro que tinha ai na..., por perto, era veio, o ponto mesmo diz, muita gente não canta direito mas o canto mesmo é esse meu filho? - O senhor sabe o ponto de veio não sabe meu filho? Não. - Não sabe? - Pai Antônio da Quimbanda Ah sei perfeito. - Não é verdade meu filho? - Esse ponto tem 63 anos também, foi no dia que Sete Encruzilhadas falou, capitão foi depois uns 05 anos depois, 05 ou 06 né Maria? Um senhor Capitão Major se lembra, como é que chama, Tiro. Aristóteles. - Que tem Terreiro ai também, trabalhou muito aqui, foi um ................................, bom, aqui ele não leva dinheiro, mas, a maior parte dos médiuns quer levar vida com isto, vão trabalhar no espiritismo pra cobrar. Véio ai lava as mão, cada um faz o que bem entende né meu fio? Se tu plantar o bem vai colher o bem se plantar o mal não é isso meu filho? Não é verdade? É verdade. - Então como diz, deixa a coisa anda, vamo piar, Olha aqui, o Zéria, hoje é dia de Caboclo minha fia? Hoje é dia de Caboclo. - Híiiiiii, chama mestiço aqui meu fio? Tem tanto Preto aqui meu fio. Sete Encruzilhadas deve ta, mandou ele ... - Não posso deixar de chamar Sete Flechas; ele tá tomando conta da Tereza. Ta errado isso, eu tenho que chamar o Sete Flechas. - Perai; chamou os Caboclos todos, os que puderam que vieram com Sete Encruzilhadas não é isso os Pretos.......... - Sarava. - Olha aqui, capitão agora chegou no Terreiro, capitão veio tarde né capitão? Veio não ...................... O Pai Antônio, antes do senhor subir eu quero que veja o quadro aqui que eu mandei colocar na moldura; o senhor quer me cruzar por favor? - Véio agora tá cobrando; noutro tempo não cobrava mas agora tá cobrando. Tô agora no zimbo como diz né Quantos beijos o senhor quer pra cobrar, 1 dúzia? - Tu tem dente ou tá sem dente; se tá sem dente véio não gosta... Nota do autor: Aqui, Pai Antonio juntamente com os médiuns puxam um ponto cantado

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É lá na Jurema;

Que o Caboclo luta; E vence demanda;

Com Oxossi seu rei; Com o arco e a flecha; E o canto de guerra;

Atira-se a luta; E sai vencedor;

De joelhos em terra; O Chefe da tribo;

Agradece a vitória; A Jesus Redentor.

- Então o que que tá fazendo, tô fazendo uma mironga aqui meu fio Nota do autor: Aqui, Pai Antonio juntamente com os médiuns puxam dois pontos cantados:

Eles são três Caboclos; Caboclos do Jacutá;

Eles giram noite e dia; Para os filhos de Oxalá;

Sete com mais sete; Com mais sete, vinte e um;

Salvando os três sete; Todos três de um a um; Sete Montanhas gira;

Quando a noite vai chegar; Seu irmão Sete Lagoas; Quando o dia clarear;

E ao romper da aurora; Até alta madrugada;

Gira o Caboclo; Das Sete Encruzilhadas.

Quando nas matas se ouve um canto; Da passarada em bando a cantar;

Uma Cabocla nas margens do rio em prantos; A proteção de Oxum foi rogar;

Com sua fé na Rainha das águas; E a proteção da falange do mar; O rio fica com todas as mágoas;

Salve Oxum, salve a Mãe Yemanjá.

- Vocês cantaram ponto né meu filho? Aquele magro tirou dessa curimba e fez uma negócio; fez uns canto ai, como é que chama ele. Lamastine né meu filho? Fez uma música com isso né, essas toadas. Lamartine Babo - Ai véio escuiambou ele; não pode fazer estas coisas não. Nota do autor: Aqui, Pai Antonio juntamente com os médiuns puxam alguns pontos cantados:

Ogum, que abalou as estrelas; Que abalou as areias;

E as ondas do mar, Ogum; Ogum, a hora é boa;

Abre os meus caminhos; Firma esse congá, Ogum.

Dê deloucau;

Dê deloucau auê; Xangô, olha Ogum de o dé;

Olha Ogum de lê Xangô; Olha Ogum de o dé;

Olha Ogum de lê.

De quando em quando; Quando eu venho de Aruanda;

Trazendo Umbanda; Pra salvar filhos de fé;

Ô marinheiro olhas as costas do mar; Ô Japonês, ô Japonês; Olha as costas do mar; Egum, Egum, Egum;

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É Timbiri;

Egum lá nas ondas do Oriente, ia; Mas quando Zambi; Vem de Aruanda, ia;

Para salvar os filhos de Umbanda, ia; Sou marinheiro;

Eu sou marinheiro; Sou marinheiro, sou marinheiro;

E navego nas ondas do mar.

Nota do autor: Nesse trecho, outro guia espiritual falou através de uma médium:

Estes filhos de marola pede... Na paz de Zambi, por maior que seja a tempestade, estes filhos pode sempre se salvar. Que as embarcações gloriosas pode entrar sempre aí, sempre no porto pra salvar estes filhos de fé. Nota do autor: Pai Antonio canta seu ponto de subida:

Fica com Deus que eu vai embora; Benção de Deus pra todos filhos.

Nota do autor: Após, são cantados alguns pontos, encerrando a fita.

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APRESENTAREMOS A PARTIR DAQUI ALGUMAS REPORTAGENS, ALGUNS DOCUMENTOS,

OPINIÕES, COMISSÕES, FOTOS, ETC., HISTÓRICOS SOBRE A UMBANDA.

GRANDES PARTES DESTES DOCUMENTOS

ESTARÃO DISPOSTOS JUNTAMENTE COM ESTE LIVRO, NO ÍCONE: “DOCUMENTOS HISTÓRICOS

SOBRE A UMBANDA”.

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PRIMEIRO RELATO ESCRITO SOBRE A TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE

Leal de Souza, espírita fervoroso, em suas andanças pela cidade do Rio de Janeiro em pesquisas nos Centros Espíritas existentes, chegou a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade. Cremos que foi após essa reportagem, que Leal de Souza se interessou e se converteu para a Linha Branca de Umbanda e Demanda.

Transcreveremos a reportagem: ... Há poucos dias, na vizinha cidade de Niterói, uma linda moça, na flor da idade, cheia de sonhos azuis e ilusões douradas, adoeceu de enfermidade misteriosa. Foram chamados bons médicos e a enferma não melhorou. Antes, piorou. Novos doutores foram consultados, porém a donzela, agravando-se rapidamente o seu estado, foi julgada sem salvação. Em desespero, seu pai, um comerciante abastadíssimo, ouviu os conselhos de um amigo e solicitou os socorros ao Centro Espírita Nossa Senhora da Piedade, onde se manifestam Espíritos de Caboclos, mas, acabara de pedir tais auxílios, quando recebeu a noticia do desenlace fatal: sua filha falecera ás 5 horas da tarde. Voltou o pai em pranto, para o seu lar abalado. Veio um médico, examinou a moça e lavrou o atestado de óbito. Lavou-se e vestiu-se o corpo. Foi colocado, sob flores, na mesa mortuária, entre velas bruxuleantes. Um sacerdote fez a encomendação. Às 8 horas da noite, ao iniciar a sua sessão, o Centro Espírita Nossa Senhora da Piedade, não tendo sido avisado do falecimento, fez uma prece pela saúde da moça já morta. Manifestando-se o Espírito do Guia e protetor do centro, disse: “Um grave perigo ameaça a pessoa por quem orais. Continue as vossas preces com fervor e sem interrupção, até que eu volte, pois vou sair para socorrê-la”. Os Espíritas do Centro Nossa Senhora da Piedade, orando com fervor, esperaram cerca de duas horas, e, ao termo delas, manifestando-se de novo, o Espírito de seu Guia disse-lhes: “Está salva a moça”. Espíritos maus, convocados por motivo de ordem pessoal, haviam envolvido a jovem em fluidos venenosos, que a estavam matando. Não se quebrara, porém, o fio que liga o Espírito ao corpo. Às 8 horas da noite, terminou o narrador, a moça continuava na mesa funerária, com todos os sinais de morte. Às 9 horas, uma demonstração de vida animou-lhe a face e, percebendo-a, seu padrinho preveniu seu pai. Retirada da câmara mortuária e reposta em seu leito, à moça reabriu os olhos, e, momentos após, erguia-se curada, completamente boa. Os Espíritos dos Caboclos, em combate travado nos espaços, tinham vencido os Espíritos maus... (Leal de Souza – jornal “A Noite” – Da Cruzada Espírita – Terça-Feira, 15 de Janeiro de 1924)

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Transcreveremos a reportagem: Atravessando em procura do arrabalde das Neves, a cidade de Niterói, perguntávamos, no bonde, a quanto passageiro ficava ao alcance de nossa voz: - Conhece, por ventura, nas Neves, a farmácia do Sr. Zélio? - Não. - E o Centro Espírita Nossa Senhora da Piedade?

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Quase ao termo da viagem, porém, ouvimos formulada pelo Sr. Eurico Costa, a dupla resposta afirmativa, e, em companhia desse gentil cavalheiro, cujo destino, nessa noite, era o nosso, fomos, primeiro, à farmácia do presidente daquele Centro, e, em seguida, com o farmacêutico, à sede da associação procurada. Varando, por um corredor, filas compactas de gente, conseguimos aproximarmo-nos da mesa mediúnica, ocupando uma cadeira, à esquerda do presidente, ao lado de uma senhorita que vigiava os médiuns, pronta a socorrê-los, ou auxiliá-los, em caso de transe violento. Não conhecíamos uma só das pessoas presentes, e a nossa entrada não foi vista pelo diretor da reunião, Dr. José Meirelles, que, no momento, de olhos fechados, fazia uma prece. Apenas ocupamos o lugar designado pelo nosso condutor, ao findar a oração do dirigente, a senhorita Zaira Heintze, num grande pulo, e em transe, tentou levantar-se e sair, mas os seus movimentos eram desordenados e incoerentes. Auxiliou-a, a senhorita de vigia, e a médium, atirando a cabeça para trás, sacudia, como um penacho, os cabelos cortados, e batia com as mãos sobre a mesa, e, a babar-se, continuou a bater com as mãos. Nessa incômoda posição permaneceu por mais de meia-hora, discutindo, por vezes, com o Sr. Meirelles. As suas frases, porém, não passavam de repetições pejorativas ou raivosas das do diretor. - És um Espírito infeliz! - Qual infeliz, seu hipócrita. Em meio desse combate, entrou em transe o Sr. Zélio de Moraes e, saudado como sendo o Caboclo das Sete Encruzilhadas, chefe espiritual do famoso Centro, fez, em linguagem enérgica, uma vibrante exortação, suplicando e ordenando a intensificação da fé. O médium, nesse transe, parecia dividido, em seu corpo, em duas partes, pela desconexão de seus movimentos. Tinha ereto e firme o busto, alçada a cabeça, o rosto torneado em desenho vigoroso, os braços agitados em gestos apropriados às expressões de seus lábios, mas da cintura pra baixo, um temor convulsivo, abalando-o, fazia-lhe bater com os pés nas tábuas do chão, produzindo um rumor apressado de caixa de guerra em célere ruflo. Surpreendendo o Dr. Meirelles, o médium pediu parar apertar-nos a mão, e, sob olhar espantado da assistência, acercando-nos o Sr. Zélio, ouvimos: - Pode dizer que apertou a mão de um Espírito. A minha esquerda, está uma irmã que entrou aqui como tuberculosa e à minha direita um irmão vindo do hospício. Curou-os, aos dois, Nossa Senhora da Piedade. Pode ouvi-los. Junto ao senhor, naquele canto, está o Espírito de uma senhora, que diz ser sua mãe. - Deve ser engano. Nossa mãe, graças a Deus, vive e goza saúde. Era a terceira vez que, numa Sessão Espírita, médiuns em transe acusavam a presença, a nosso lado, de uma senhora que afirmavam eles, dizia ser nossa mãe. O “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, porém, bradou: - Quem é então? Tem de falar! Há de incorporar e dizer quem é. Despertou-se então o Sr. Zélio de Moraes e o Dr. Meirelles recomeçou o seu esquisito debate com a senhorita Zaira. Ao fim de minutos, caíram em transe simultâneo aquele médium e uma moça clara, de bom corpo, vestida com elegância. Esta saltou com fúria e tombou de flanco, batendo rijamente a cabeça no solo, onde, por momentos, ficou estendida. Tornaram-se mais bruscos, então, os movimentos da senhorita Zaira. Iniciando, com calma, a conversa com o Sr. Meirelles, o médium Zélio, entrou, depois, a queixar-se de violências que lhe estavam fazendo dizia, Caboclos e Pretos invisíveis para nós, e, acendendo-se em cólera contra a nossa pessoa, chamando-nos “careca”, disse que, com os seus companheiros ali incorporados as duas médiuns, anda a seguir-nos, com o intuito de prejudicar o nosso serviço e a nossa vida, desde que fizemos, nesta reportagem, uma injustiça ao Centro da rua Laura de Araujo. O Dr. Meirelles, começando a compreender quem éramos, convidou a entidade presente a definir a injustiça por nós praticada. A resposta foi que havíamos dito que, naquele Centro, o trabalho Espírita é remunerado. - Mas é ou não verdade? - Não é! Arriscamos, então uma frase em nossa defesa, contestando-nos o médium: - Ninguém é obrigado a dar. Dá quem quer. - Foi o que noticiamos.

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- Mas não devia ter noticiado! Objetou o médium. - Por quê? O jornalista não cometeu uma injustiça. Disse uma verdade. - Mas essa verdade prejudicou o Centro fazendo com que muita gente o abandonasse. A moça clara, de pé, debatia-se em fúria, segura, pelos braços, por dois cavalheiros e a senhorita Zaira protestava: - O Encruzilhada não é aquele que esteve ali. Sou eu! O médium em transe, dirigindo-se ao diretor dos trabalhos, considerava: - Você acha que o espiritismo não pode ser pago. Mas quem não tem emprego, como é que há de fazer espiritismo? E, continuando, desenvolveu, em favor do Centro da Rua Laura de Araujo, argumentos semelhantes aos que ouvimos, no Centro José de Araújo, à rua Dr. Bulhões, formulado por um dos dirigentes daquela associação. Dirigiu-se, em seguida, às duas moças, chamando-as, respectivamente, João e Eduardo. Acalmou-se a senhorita Zaira, e a outra, a clara, escapando-se dos braços que a amparavam, caiu sentada na cadeira. - Bem. Vou-me embora! Vamos, João! Vamos, Eduardo! Convidou o Sr. Zélio. Ergueram-se as duas moças, mas o Dr. Meirelles declarou: - É inútil! Não saireis daqui em estado de perseguir alguém. Escutai-me, e proferiu uma prece comovedora. - Sou Sofia, disse o Sr. Zélio. Se for para nosso bem, iremos. Se formos enganados, pagarás. Vamos, João. Vamos Eduardo. Despertaram-se, então, os três médiuns. Pediu concentração o diretor, e o Sr. Zélio, novamente em transe, curvado, numa linguagem deturpada, dizendo ser Pai Antônio, tomou as mãos de um enfermo, e, acompanhado pelos presentes, começou a cantar:

“Dá licença Pai Antonio que eu não vim lhe visitar; Eu estou muito doente, vim prá você me curar.

Findo esse ato, e depois de um transe quase mudo da senhorita Severina de Souza, havendo o Guia, como se disse, mandado que se realizasse um trabalho especial em benefício de um louco fugido do hospício e ali presente, declarou-se encerrada a sessão. Retirando-se a assistência, foram afastados os bancos da sala e iniciados os preparativos para o trabalho especial. Só ficaram no recinto os médiuns, o louco, três homens que o acompanhavam e nós. Uma senhorita, com um defumador fumegante, percorreu a sala, envolvendo cada pessoa em ondas de fumaça aromática, e a cantar, acompanhada pelos circunstantes, uma canção cujo estribilho era: “Quem está de ronda é S. Jorge, S. Jorge é que está de guarda!” Entregou o defumador a um cavalheiro, que saiu para fora a agitá-lo, caminhou em duas direções e, voltando fechou a porta. O Sr. Zélio, assumindo a direção do trabalho, ocupou, ao lado de seu pai, perto da parede, a cabeceira da mesa, ficando um médium. Por detrás do enfermo, “fechando a concentração”, sentaram-se o Dr. Meirelles e uma senhorita, e, formando a terceira fila, os três companheiros do doente, ladeavam a mesa as médiuns Severina de Souza e Maria Isabel Morse, enfrentando a senhorita Zaira e a elegante moça clara. A jovem que empunhara o defumador e nós que ocupamos lugares à esquerda da mesa. Falando ao louco da mesa, disse o Sr. Zélio:- Vamos fazer um trabalho para o senhor ficar bom. Pense em Deus. Como o senhor não pode fazer uma idéia de Deus, veja se consegue reproduzir na mente a imagem de Jesus. Fez, com fervor, três orações; a Deus, a Nossa Senhora da Piedade, e ao Caboclo das Sete Encruzilhadas, e, convidando para começar, cantou, acompanhado pelos demais: “Santo Antônio é ouro fino, arreia a bandeira e vamos começar! “

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O canto, monótono, melancólico, desdobrando-se em toada embaladora parecia acariciar as almas. Não faltava majestade ao ambiente. O louco, de súbito, rompeu numa cantoria de sons inarticulados, e entraram em transe, atuadas, – disseram-nos, por protetores, as médiuns Isabel e Zaira. Esta informou, então, ao Sr. Zélio que, no momento, duas entidades agiam sobre o doente. - Deixa o aparelho e faz incorporar em um deles. Mando o outro para outra máquina. Conto contigo. Instantaneamente, recobrou-se e caiu em novo transe a senhorita Zaira. Sacudindo-se, a vociferar, quis deixar a cadeira, mas foi dominada pela senhorita de vigia. Ao mesmo tempo, dando uma ruidosa gargalhada, a moça clara, num pulo, atirava-se de costas no solo, enquanto o louco, serenando a face, emudecida. Entraram em discussão a senhorita Zaira, que dizia haver sido “o padre Alfredo, vigário do Meyer”, e o Sr. Zélio. Sustentava aquela que perseguir alguém e encaminhá-lo, pelo sofrimento, para o progresso espiritual; e sofria ardente contestação de parte do último. De pronto abriu o presidente “novo ponto” cantando o coro “Santo Antônio é Santo maior”. Erguendo-se a pouco e pouco do chão, a moça clara ocupou a cadeira, e, olhos fechados, encarando Zaira, acusou:- Mentiste! Nunca praticaste a caridade! Não te acompanho mais! Tu me arrastaste! Falando aos protetores, pediu ao Sr. Zélio que levassem aqueles irmãos, “para o raio de luz” e o cântico entoado pelo coro reproduzia aos nossos ouvidos uma canção da Macumba. Sobre esse coro, cantando a meia voz, em tom arrastado, pairou, por alguns momentos, grave, em tom forte, vibrando, um canto que saia dos lábios de Zaira, e começava: “Oremos. Glória in excelsis Déo!” Variou, ainda uma vez, o coro, a senhorita Zaira gritou que iria, mas voltaria; a moça clara, em gemidos lamentosos, implorou perdão, e, as duas, quase tombando, saíram de transe, enquanto todos bradavam: – Viva Deus. Mas, sem demora, encurvaram-se em novo transe as duas médiuns. Ambas são moças muito gentis, mas, de face subitamente deformadas, com os maxilares avançando, ficaram quase horríveis. Caminhando dobradas em passos arrastados, com a cabeça abatida na linha dos joelhos, percorreram a sala e fizeram passes no louco. Zaira, que descalçara os pés, e, por estar em transe, não havia, em estado consciente, assistido na primeira sessão, ao caso mediúnico relativo à Rua Laura de Araujo, agora, na segunda, conversando conosco, fazia referências aos três Espíritos então reputados presentes. Tornadas as duas médiuns ao estado de vigília, o Sr. Zélio perguntou ao louco se estava melhor. - Estou bem, respondeu ele serenamente. - Bem. Vamos encerrar, disse o presidente, e o coro rompeu:

“Santo Antônio é ouro fino, suspende a bandeira, vamos encerrar”. (Texto de Leal de Souza – Jornal: “A Noite” – Quarta-Feira, 7 de Maio de 1924 – Ano XIV – nº 4.470)

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LILIA RIBEIRO SOBRE A FUNDAÇÃO DA UMBANDA – 1971

Zélio de Moraes encabeçando a Mesa de Trabalho na Tenda Espírita Nossa Senhor da Piedade, em

reunião comemorativa

Em fins de 1908, uma família tradicional de Neves (Niterói), Estado do Rio, foi surpreendida por uma ocorrência que tomou aspecto sobrenatural: o jovem Zélio Fernandino, que acometido de estranha paralisia, que os médicos não conseguiam debelar, e de cujas causas não tinham feito diagnóstico seguro, certo dia ergueu-se no leito e declarou: “amanhã estarei curado”. No dia seguinte, levantou-se normalmente e começou a andar, como se nada, antes, lhe houvesse tolhido os movimentos. Contava com 17 anos, e destinava-se à carreira militar, à Marinha, a exemplo dos irmãos mais velhos. A medicina não soube explicar o que acontecera. Os tios, sacerdotes católicos, colhidos de surpresa, nada esclareciam. Um amigo da família sugeriu, então, uma visitação à Federação Espírita de Niterói, presidida, na época, por José de Souza. No dia 15 de novembro, o jovem Zélio foi convidado a participar da sessão que ali se realizava. O dirigente dos trabalhos determinou que ocupasse um lugar à mesa. Iniciou-se a sessão; tomado de uma força estranha e superior à sua vontade, contrariando as normas que impediam o afastamento de qualquer dos componentes da Mesa, o jovem levantou-se, dizendo: “aqui está faltando uma flor”; saiu da sala; voltou logo depois, trazendo uma flor, que depositou no centro da mesa. Essa atitude insólita causou quase um tumulto. Restabelecida a “corrente”, manifestaram-se Espíritos que se diziam de pretos escravos e de índios. Foram convidados a se retirarem, advertidos do seu estado de atraso espiritual. Novamente uma força estranha dominou o jovem Zélio e ele falou, sem saber o que dizia. Ouvia, apenas, a sua própria voz perguntar o motivo que levava os dirigentes dos trabalhos a não aceitarem a comunicação desses Espíritos e porque eram considerados atrasados apenas pela diferença de cor e de classe social que revelavam. Seguiu-se um dialogo acalorado, em que os responsáveis pela mesa procuravam doutrinar e afastar o Espírito desconhecido que se manifestava e mantinha argumentação segura.

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Um dos médiuns videntes perguntou, afinal: - Porque o irmão fala nesses termos, pretendendo que seja aceita, por esta Mesa, a manifestação de Espíritos que, pelo grau de cultura que tiveram, quando encarnados, são claramente atrasados? Porque fala deste modo, se estou vendo que me dirijo, neste momento, a um jesuíta e sua veste branca reflete uma aura de luz? E qual é o seu nome, irmão? - Se julgam atrasados os Espíritos de pretos e de índios, devo dizer que amanhã, em casa deste aparelho, darei inicio a um culto em que esses pretos e esses índios poderão dar a sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem saber o meu nome, que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim. - Julga o irmão que alguém irá assistir ao seu culto? – Perguntou, com certa ironia, o médium vidente. - Cada colina de Niterói atuará como porta voz, anunciando o culto que amanhã se iniciará. 16 de Novembro de 1908 Zélio de Moraes, hoje com 83 anos de idade, na tranqüilidade do sítio em que reside, em Cachoeiras de Macacú, relata-nos o que ocorreu no dia seguinte, 16 de novembro de 1908. “Minha família estava apavorada. Eu mesmo não sabia explicar o que se passava comigo. Surpreendi-me haver dialogado com aqueles austeros senhores de cabeça branca, em volta de uma mesa onde se praticava um trabalho, para mim desconhecido. Como poderia, aos 17 anos, organizar um culto? No entanto, eu mesmo falara, sem saber o que dizia e porque dizia. Realmente, tivera uma sensação estranha: uma força superior que me impelia a fazer e a dizer o que nem sequer passara pelo meu pensamento. E no dia seguinte, em casa de minha família, na Rua Floriano Peixoto, 30, em Neves, ao se aproximar a hora marcada – 20 horas – já se reuniam os membros da Federação Espírita, seguramente para comprovar a veracidade do que fora declarado na véspera, os parentes mais chegados, os visinhos e, do lado de fora, grande numero de desconhecidos. Às 20 horas, manifestou-se o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Declarou que se iniciava, naquele momento, um novo culto em que os Espíritos dos velhos africanos, que haviam servido como escravos e que, desencarnados, não encontravam campo de ação nos remanescentes das seitas negras, já deturpadas e dirigidas apenas para trabalhos de feitiçaria, e os índios nativos da nossa terra, poderiam trabalhar em benefício dos seus irmãos encarnados, qualquer que fosse a cor, a raça, o credo e a condição social. A prática da caridade, no sentido do amor fraterno, seria a característica principal desse culto, que teria por base o Evangelho de Jesus, e como Mestre Supremo o Cristo. O Caboclo estabeleceu as normas em que se processaria o culto: Sessões – assim se chamariam os períodos de trabalho espiritual – diários, das 20 às 22 horas; os participantes estariam uniformizados de branco e o atendimento seria gratuito. Deu, também, o nome desse movimento religioso que se iniciava: disse primeiro: “Allabanda”, mas, considerando que não soava bem a sua vibratória, substituiu-o por Aumbanda, ou seja, Umbanda, palavra de origem sânscrita, que se pode traduzir por: “Deus ao nosso lado” ou “o lado de Deus”. Sobre isso, reportamo-nos a uma observação de Ramatis, no livro “Missão do Espiritismo”, referindo-se a Umbanda: A palavra AUM é de alta significação espiritual, consagrada pelo Mestres: BANDHÂ, em sua expressão mística iniciática, significa movimento incessante, força centrípeta emanada do Criador. A palavra AUM-BANDHÂ, pronunciada na forma de um mantra, aproxima-se melhor da sonorização Ombanda, sendo ajustada à doutrina de Umbanda, praticada no Brasil.” E adiante: Os africanos praticavam a magia indistintamente... Em face dos costumes da civilização, é inexeqüível a prática da Umbanda nos moldes e ritualismo genuíno africano... Acontece que antes dessa denominação de Umbanda, os ritos e intercâmbios mediúnicos eram somente conhecidos como Candomblé ou Macumba, sob o domínio completo do africano versado na magia grosseira. Voltemos ao relato de Zélio:

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A casa de trabalhos espirituais, que no momento se fundava, recebeu o nome de Nossa Senhora da Piedade, porque assim como Maria acolhe nos braços o Filho, também seriam acolhidos, como filhos, todos os que necessitassem de ajuda ou de conforto. Ditadas as bases de culto, após responder, em latim e em alemão, às perguntas dos sacerdotes ali presentes, o Caboclo das Sete Encruzilhadas passou à parte prática dos trabalhos, curando enfermos, fazendo andar aleijados. Antes do término da sessão, manifestou-se um Preto-Velho, Pai Antonio, que vinha completar as curas. Nos dias seguintes, verdadeira romaria formara-se na Rua Floriano Peixoto. Enfermos, cegos, paralíticos vinham buscar a cura e ali a encontravam, em nome de Jesus. Médiuns, cuja manifestação mediúnica considerada loucura, deixaram os sanatórios e deram provas de suas qualidades excepcionais. Este posso curar; aquele só a medicina Cinco anos mais tarde, o Caboclo trouxe uma entidade originária da Malásia, que se identificou como Orixá Malett e especializou-se no combate à magia negra e na cura de obsedados. Testemunhas que presenciaram o fato, contam que alguns médicos dos sanatórios do Estado do Rio mandavam a relação dos seus doentes e o Orixá Mallet apontava os que eram portadores de perturbações psíquicas. - “Estes eu vou curar” – e os acolhia na residência do médium. Os outros eram realmente enfermos mentais; a cura competia à medicina. João Severino Ramos, umbandista conhecido em todo o Brasil, desencarnado em fins do ano passado, relatava as maravilhas a que lhe foi dado assistir, às margens do Rio Macacú, para onde o Orixá Mallet conduzia os médiuns e onde alguns incrédulos se tornaram fiéis seguidores da doutrina do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Contava ele que certo dia – isso há mais de 40 anos – resolveu assistir aos trabalhos. O Orixá Mallet pedira que lhe levassem dois pombos. Assim que chegaram ao local, mandou que abrissem a gaiola e as aves voaram para uma árvore. - Agora, virão pousar no meu ombro – disse o Orixá, através do seu médium Zélio. E assim aconteceu. - Podem voltar para a árvore – ordenou ele, pouco depois. E os pombos voaram para a árvore. A experiência foi repetida mais uma vez. Embora as aves fossem adquiridas no caminho, sem nenhuma possibilidade de serem ensinadas; Severino se mostrava incrédulo. O Orixá Mallet preveniu que se abrigassem, porque iria chover. No céu límpido, a chuva não demorou a cair. E assim que a entidade falou: “Vai fazer sol”, o sol voltou a brilhar. Ainda assim, Severino permaneceu em dúvida. Tratava-se, de certo, de magia, sem nenhuma influência espiritual. Pediu uma prova decisiva. O Orixá Mallet não se fez de rogado. Apanhando uma pedra, jogou-a na testa do descrente. João Severino caiu no rio; os seus companheiros correram para o socorrer, temerosos de que a correnteza o levasse. - Não se movam – ordenou o Orixá Mallet – Ele voltará sozinho. Minutos depois, Severino transpôs a margem do rio. Estava transfigurado. Através dele se manifestava, pela primeira vez, uma entidade que daria, depois, o nome de Timbiri e se tornou o Guia Espiritual da Tenda São Jorge, fundada em 1935. A Doutrina Se a parte prática dos trabalhos maravilhava a todos e as curas de obsedados se repetiam diariamente, a parte doutrinária do culto era estudada em reuniões, às quintas-feiras, na residência de Zélio. O Caboclo explicava a sua doutrina de amor, de fraternidade.

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Lembrava as passagens principais do Evangelho; recomendava o procedimento correto na vida material; o cuidado indispensável com a saúde; um conceito de moral elevado e o “daí de graça o que de graça recebestes”. Dizia ele: são três os perigos que mais ameaçam o médium: a vaidade; a consulente mulher para o médium homem e vice-versa; e o dinheiro, a “vil moeda”, que leva o homem a perder o caráter e o médium, que mercantilizar a sua missão, a faltar aos compromissos com o mundo superior. Embora não seguindo a carreira militar a que se destinava, pois sua missão mediúnica não o permitiu, Zélio trabalhava para o sustento de sua família. Nunca fez profissão da mediunidade e diversas vezes contribuiu financeiramente para manter os templos que o Caboclo das Sete Encruzilhadas fundava. O ritual preconizado pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas excluiu tudo que de supérfluo nos legaram as seitas africanas. O culto, cuja prática seria denominada “sessão”, se realizaria à noite, das 20 às 22 horas, para atendimento público, com passes e recuperação de obsedados. O uniforme a ser usado pelos médiuns seria todo branco, de tecido simples. Não se permitiria retribuição financeira pelo atendimento ou pelos trabalhos realizados. Os cânticos não seriam acompanhados de atabaques nem de palmas ritmadas. As guias usadas são apenas as que determinam a entidade que se manifesta. Não é a quantidade de guias que dá força ao médium. Os banhos de ervas, os Amacis, as concentrações nos ambientes da Natureza – ao lado do ensinamento doutrinário, na base do Evangelho – constituem principais elementos de preparação do médium. E são severos os testes que levam a considerar o médium apto a cumprir a sua missão mediúnica. A herdeira espiritual de Zélio Após 55 anos de atividades à frente da Tenda da Piedade, Zélio de Moraes entregou a direção a sua filha, Zélia, que com a cooperação da irmã Zilméia, e do esposo, Dr. Júlio, cumpre a missão difícil de orientar um templo que deve ser, em qualquer momento, o espelho de uma doutrina de amor, de simplicidade, de verdadeira caridade. Ao lado da esposa, Isabel, médium do Caboclo Roxo, Zélio continua em atividade, na Cabana do Pai Antonio, em Cachoeiras de Macacú. A maior parte das horas do seu dia são dedicadas, ainda hoje, ao atendimento de portadores de enfermidades psíquicas e de todos os que os procuram, em busca da solução de seus problemas emocionais, morais até mesmo materiais. Aos sábados, realizava-se a sessão publica da Cabana, de que participam alguns médiuns da Tenda Nossa Senhora da Piedade, e sempre Zélia e sua irmã. Mensagem de Zélio Em todo o território brasileiro existem templos fundados diretamente pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, ou descendentes destes. Alguns desvirtuaram os seus princípios; outros mantém-se fiéis às normas iniciais. Em Belém do Pará foi fundado um templo, há mais de 30 anos, a Tenda Mirim Santo Expedito, por um tenente do Exército, Joaquim Bentes Monteiro, que solicitou a sua transferência da então capital do Distrito Federal para àquele Estado, com sua esposa Consuelo, especialmente para cumprir essa missão. Um dos médiuns dessa Tenda, Evaldo Pina, atualmente no Rio, pertencendo hoje ao quadro de dirigente da Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade (TULEF), Tenda que descende da Tenda Espírita São Jerônimo. Esteve em visita a Zélio e ouviu deste a descrição da fundação daquela Casa, em todos os pormenores, como se o fato datasse de semana, apenas. E através de Zélio recebeu uma mensagem do dirigente, já desencarnado, citando fatos conhecidos apenas pelos dois. Zélio de Mores contou, entre os seus companheiros, seguidores leais da doutrina do Caboclo das Sete Encruzilhadas, Júlio Viana, médium excepcional, de transporte e de incorporação; o deputado José Meirelles, que se tornou presidente da Tenda São Pedro; o advogado Belarmino Tati, o seu Cambono; major, na época, hoje general, Alfredo Marinho Ravasco; o general Aristóteles Santos; João Bustamante de Sá; José Albino Coelho; Alfredo Rego; Olívio Novaes; Leal de Souza, jornalista que publicou uma série de reportagens sobre a Tenda Nossa Senhora da Conceição; João Salgado, da Tenda Santa Bárbara; Paulo Lavois, da Tenda de Oxalá; José Álvares Pessoa, da Tenda São Jerônimo.

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Posteriormente, contou com a colaboração de Floriano Manoel da Fonseca, figura que se tornou verdadeiro patrimônio moral da Umbanda, pela atividade que desenvolveu a 51 anos, graças a uma conduta exemplar e à firmeza de suas convicções. De José Álvares Pessoa transcreveremos o trecho de um artigo, publicado, por volta de 1957, no Suplemento Espiritualista de “O Seminário”, e que define nitidamente a missão do Caboclo das Sete Encruzilhadas: “A tarefa que sobre os seus ombros tomou o Caboclo das Sete Encruzilhadas: – organizar a Lei de Umbanda no Brasil – é um verdadeiro milagre de fé e nos leva a um sentimento de profundo respeito por essa Entidade que se faz pequenina e procura velar-se sob a capa de uma humildade perfeita. É a ele que se deve a purificação dos trabalhos nos Terreiros. Não veio destruir o ritual e sim dar-lhe força e método, manter sua pureza propagá-lo com a sua organização maravilhosa. O que nós todos lhe devíamos é inestimável; jamais poderemos retribuir os benefícios espalhados por ele e pelos Espíritos que acorreram a seu chamado. Esse Espírito, cuja fé é um incentivo para os nossos Espíritos, cheios de indecisões, fracos no cumprimento do dever, rebeldes quando não vemos satisfeitos os nossos desejos, bem merece ser enaltecido por todos os filhos de fé que se sentem felizes no ambiente humilde de Umbanda, e que nem de leve suspeitam do seu verdadeiro valor Ele não é um entre muitos, é o primeiro entre todos, porque foi comissionado para o estabelecimento da Lei, a purificação dos rituais, verdadeiro Pastor da Umbanda, cuja obra, que um dia será gigantesca, se espalhará pelos confins do mundo porque a fé, que é o seu alicerce, a sustentará pelos séculos afora”.

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LILIA RIBEIRO – UMBANDA – INÍCIO DE UMA LONGA JORNADA Reportagem de Lilia Ribeiro, em 1972, sobre alguns aspectos da Umbanda, em bases com os ensinamentos do Caboclo das Sete Encruzilhadas:

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LILIA RIBEIRO – TESTEMUNHOS PARA A POSTERIDADE

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LILIA RIBEIRO – MENSAGEM DE ZÉLIO

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“EU FUNDEI A UMBANDA” – MATÉRIA ENVIADA POR LILIA RIBEIRO PARA A REVISTA “GIRA DE UMBANDA”

A imagem abaixo, mostra a capa do primeiro número da revista Gira de Umbanda (1971) dirigida por Atila Nunes Filho, bem como o editorial do primeiro número da Revista Gira da Umbanda, de 1972, editada por Átila Nunes Filho

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(Capa da revista e editorial do arquivo pessoal de Diamantino F. Trindade) Disponibilizaremos a reportagem “Eu Fundei a Umbanda” publicada na revista “Gira de Umbanda”, no original, feito pela senhora Lilia Ribeiro, junto a Zélio de Moraes:

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LILIA RIBEIRO SOBRE OS 70 ANOS DA INCORPORAÇÃO DO CABOCLO

DAS SETE ENCRUZILHADAS

Zélio de Moraes e um grupo de médiuns na Cabana de Pai Antonio

Caboclo das Sete Encruzilhadas – 70 anos de incorporação em seu médium: Zélio de Moraes A 15 de novembro celebra-se o septuagésimo aniversário de incorporação do Caboclo das Sete Encruzilhadas. O seu médium, Zélio de Moraes, contava, 17 anos. Pertence a uma família católica de tradição, composta quase exclusivamente de militares e sacerdotes. O jovem médium surpreendeu a todos, com a manifestação espontânea de uma entidade que, dando o nome de Caboclo das Sete Encruzilhadas – porque não haveria caminhos fechados para sua trajetória – anunciou a sua missão de estabelecer um culto, no qual os Espíritos, que se apresentavam como de índios e pretos escravos, pudessem cumprir a missão que o astral lhes determinara: purificar o culto, originário no Oriente, mas trazido ao Brasil pelos escravos, que se deturpara nas ultimas décadas do século passado, tornando-se instrumento de interesses pessoais. Aproveitando a magia milenar dos velhos africanos, homens interesseiros usavam esse poder oculto apenas em detrimento de terceiros, semeando malefícios e obsessões e usufruindo o lucro financeiro tanto para causar mal como para libertar as suas vítimas. UMBANDA – palavra de origem sânscrita, segundo os estudiosos, conhecida entre nós do vocabulário africano, mas que não caracteriza culto religioso – foi a denominação que a entidade deu a esse movimento cristão, que tinha por base a mensagem do Cristo e se difundiu extraordinariamente, transformando-se na verdadeira Religião Nacional, originária, com a nossa raça, do branco, do negro e do índio. A fundação dos sete templos que deviam formar o alicerce desta religião foi concretizada ao termo de mais de 20 anos de trabalho construtivo, ininterrupto. Provas extraordinárias de um poder superior, milhares de curas de enfermos que a medicina terrena desenganara, esclarecimentos doutrinários em aulas semanais na residência do médium, em Neves, Niterói, através das quais a entidade preparava moral e espiritualmente os seus auxiliares, foram os pontos principais para efetuar a primeira parte da missão do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Desses sete templos, que nasceram na casa por ele fundado em 16 de novembro de 1908 – a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade – (a denominação espírita era devida ao fato de não ser a Umbanda reconhecida como culto religioso, não se permitindo legalizar sociedades com esse nome) – centenas de outras surgiram, visando a disseminação da doutrina de amor e fraternidade que, embora muito conhecida através do Evangelho, raramente era praticada.

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Nesse crescimento religioso, que a partir de 1930 tomou vulto extraordinário, nem todos os dirigentes souberam manter a função de missionários da espiritualidade. A vaidade, a ignorância, as tentações que a “vil moeda”, como dizia o Caboclo, exerce sobre o homem, são as principais responsáveis pelo grande número de Centros, Tendas ou Cabanas que usam o nome de Umbanda pela vibratória intensa do termo – sem, contudo, seguirem as normas estabelecidas pela entidade, desvirtuando a verdadeira codificação elaborada em longos meses de estudos e trabalho prático. Nem todos souberam manter o “slogan”: “Umbanda é a manifestação do Espírito para a Caridade”. E então, o modesto uniforme branco de algodão deu lugar, nalgumas casas que se diziam umbandistas, a vestimentas coloridas, luxuosas, onde a renda e o lamê de alto custo deslumbram o assistente, dando-lhe uma impressão de luxo e estabelecendo, indevidamente, a diferença de situação econômica entre os membros de uma comunidade religiosa. O ritmo seguro dos cânticos teve o complemento dos instrumentos de percussão, atraindo o Guia não mais pela concentração da mente, mas, principalmente, pelo ritmo de música nativa. A presença dos Caboclos, nos Terreiros, deixou de objetivar exclusivamente a prática da caridade, para constituir uma reunião festiva, na qual os médiuns, incorporados ou não, dançam – não a dança sagrada que constituía parte dos cultos da antiguidade, mas a dança profana, sem significação nenhuma de religiosidade. E, com o correr dos tempos, o conceito “daí de graça o que de graça recebestes”, foi esquecido naqueles locais, sendo substituído pelos cartazes que estipulam preço para “consultas” de Pretos-Velhos, de Exu e das “Ciganas”. A magia que o Caboclo das Sete encruzilhadas e os seus auxiliares praticavam, incorporados em médiuns cônscios de suas responsabilidades, para curar, retirar obsessores, encaminhar os desviados da trilha do amor fraterno e da caridade, deu lugar à magia terra-a-terra, regada de sangue e motivada pela ambição de maior lucro financeiro. UMBANDA cresceu e difundiu-se. Milhares de Templos cumprem sua missão de caridade e de esclarecimento. Centenas de casas que, sob o nome de Centros Espíritas ou Templos de Umbanda, nada mais são do que locais de comércio ilegal da mediunidade, aos quais, por vezes, falta até mesmo a mediunidade mais elementar; desvirtuaram os objetivos elevados da doutrina, obrigando-nos a dizer que nem tudo o que traz o nome de Umbanda, é realmente, Umbanda. Neste mês de novembro, quando celebramos 66 anos da primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, quando prestamos nossa homenagem, com respeito e gratidão, a Zélio de Moraes, que até os últimos dias de sua vida, com 84 anos, dedicando as horas, quase todas, do seu dia ao cumprimento da missão que lhe foi delegada – julgamos oportuno lembrar a necessidade de congregar todos os templos umbandistas que seguem, nos conceitos e na prática, o Evangelho de Cristo, a doutrina do Caboclo das Sete Encruzilhadas, para que a Umbanda continue crescendo e se difundindo cada vez mais, sem permitir que sejam deturpados os seus propósitos. Existem, é justo dizer, numerosos templos que, embora adotando vestimentas coloridas, atabaques e rituais complexos, dirigem os seus trabalhos apenas para o bem, seguindo os conceitos evangélicos, objetivando a melhora íntima dos seus componentes. Isto nos leva a sugerir o retorno à antiga denominação de Umbanda, “Linha Branca”, para as Tendas que seguem o ritual do Caboclo das Sete Encruzilhadas, determinando como “Linha de Nação” os que se enquadram na descrição acima. Feita, assim, a distinção apenas dos rituais, permanecendo os conceitos do bem, do amor e da fraternidade, seriam mais facilmente afastados da comunidade umbandista os falsos sacerdotes que utilizam o sagrado nome da Umbanda em benefício de suas aspirações pessoais de vaidade e de enriquecimento ilícito. A TULEF (Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade), como descendente de um dos sete Templos fundados, nas primeiras décadas deste século, pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, conserva o ritual preconizado pela entidade: uniforme branco, sem adornos, sem os vistosos penachos que nada significam, pois, na realidade, a denominação Caboclo caracteriza apenas uma classe no plano astral – sem atabaques, sem palmas ritmadas, sem sacrifícios de sangue, sem admitir preço para o atendimento espiritual, pois os nossos médiuns não aceitam, nem esperam, retribuição material pelos benefícios prestados, através de sua mediunidade, aos irmãos que vêm a esta Casa em busca de uma palavra de conforto, de um lenitivo para as dificuldades da vida terrena ou de um simples esclarecimento doutrinário.

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“Os conceitos emitidos através da mediunidade de Zélio de Moraes determinaram uma Linha de Trabalho que será, mais hoje, mais amanhã, aquela que definirá os rumos verdadeiros da Umbanda”. (Floriano Manoel da Fonseca, Presidente da União Espiritista do Brasil, em época de Zélio de Moraes).

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E ASSIM NASCEU O PRIMEIRO TERREIRO DE UMBANDA – LILIA RIBEIRO

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AUTÓGRAFO DE ZÉLIO DE MORAES

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COMO CONHECI ZÉLIO DE MORAES

Ronaldo Antonio Linares com Zélio Fernandino de Moraes e sua esposa Maria Isabel de Moraes

Nota do autor: Esse relato mostra quando Ronaldo Antonio Linares (Presidente da Federação de Umbanda do Grande ABC/SP), em 1970, encontra-se com Zélio Fernandino de Moraes e dá o início a divulgação de sua obra em São Paulo. Até este ano, a maioria das Tendas de Umbanda paulistas já eram aos milhares; o interessante é que somente após o ano de 1972, a história oficial da Umbanda foi amplamente divulgada na grande São Paulo. Até então, em São Paulo, poucos umbandistas sabiam da história e muitos até, da existência de Zélio Fernandino de Moraes e do Caboclo das Sete Encruzilhadas.

“Para mim, ele, sem dúvida nenhuma, é o Pai da Umbanda.” (Ronaldo Antonio Linhares) Em julho de 1970, eu estava numa das minhas viagens ao Rio de Janeiro, com fragmentos de uma informação que havia colhido de uma conversa com o Sr. Demétrios Domingues, segundo o qual a mais antiga Tenda de Umbanda seria a de Zélio de Moraes. Eu me encontrava em São João do Meriti/RJ, já de saída para São Paulo, quando decidi que procuraria essa pessoa e se é que ela realmente ainda existia. Após me informar de como chegar a Cachoeiras de Macacú, atravessei a ponte Rio/Niterói e, tomando a estrada para Friburgo, consegui chegar, depois de várias informações erradas. Caía à tarde naquela cidade. Era dia de jogo do Brasil na copa do mundo, o que serviu para complicar meu trabalho. Em todo local que pedia informações, todos estavam com olhos grudados na televisão. Meu carro, embora novo, tinha um mau contato no rádio e a minha companheira Norminha passou metade da viagem dando tapas embaixo do painel, para ouvir o jogo. Várias vezes ela me disse que aquilo era uma loucura e que o melhor era voltarmos ao Rio de Janeiro, mas eu estava determinado a esclarecer o assunto de uma vez por todas. Ao entrar na cidade, que é muito pequena, dirigi-me primeiro a um bar, pedindo as primeiras informações, pois contava encontrar uma pessoa muito popular na cidade. Fiquei muito surpreso com o fato de que ninguém soube dar-me nenhuma informação, nem quanto à figura de Zélio nem quanto à sua Tenda. Essa pessoa que eu procurava, se ainda estivesse viva, devia ser um ancião e, assim pensando, procurei uma farmácia, pois nessas pequenas comunidades os velhos quase sempre freqüentam regularmente a farmácia. Nova decepção: ninguém conhecia Zélio e nem havia ouvido falar de sua Tenda.

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Cheguei a procurar a Igreja local e indaguei ao padre, apresentando as minhas credenciais de repórter. Este também declarou nada saber a respeito de quem eu procurava (mais tarde vim a saber que a família Morais não era conhecida do padre, como participava financeiramente das realizações sociais da igreja). Já quase desistindo, parei numa padaria, em uma das travessas da cidade, e foi lá que encontrei o “louco”. Demos-lhe este nome porque durante a nossa conversa ele pareceu não ser um indivíduo equilibrado. Afirmou conhecer Zélio e disse-me que ele tinha um bar em Boca do Mato. Contestei imediatamente, pois as informações que eu tinha diziam que Zélio morava em Cachoeiras. Depois de muitas explicações, fiquei sabendo que Boca do Mato era um bairro desse micro município, com praticamente uma única rua que terminava na mata, daí o nome que lhe deram: Boca do Mato. Um tanto temeroso ainda, convidei o “louco” para que nos levasse até o local. Norminha estava apavorada com a minha atitude, achando que estávamos sendo conduzidos a uma emboscada. O cair da tarde era frio e garoava muito, lembrando uma tarde de inverno paulistano. A região serrana talvez propiciasse esse clima. Ao voltarmos à estrada, o “louco” apontava para a propriedade mais bonita e dizia: “Eu vendi para o deputado, para o gerente do Banco do Brasil, etc.”. Se era fato ou não, o certo é que jamais ficaremos sabendo. Finalmente uma curva na estrada, nenhuma casa aparente, ele nos pede para entrarmos à direita. Só a menos de dez metros da entrada é que eu consegui enxergar a saída. O receio transformou-se em medo. Apesar de tudo, fomos em frente: uma rua sinuosa, várias pontes, algumas casas esparsas, nenhuma casa de comércio aberta. Paramos e ele disse: “É aqui!”. A casa estava fechada. Bati palmas várias vezes; numa casa vizinha uma janela se abriu e uma senhora de meia-idade, muito atenciosa, perguntou: “Vocês estão procurando quem?” Mostrei-lhe as credenciais e expliquei tudo. “Sou repórter e preciso encontrar Zélio”. Ela então me esclarece: “Seu Zélio está muito doente e não há ninguém em casa”. Finalmente alguém confirmou que Sr. Zélio existia. Perguntei onde o encontrava e ela disse: “Ele está na casa da filha, em Niterói”. Senti como se tivesse pisado num alçapão, pois havia passado por Niterói e levei duas horas para chegar até ali. Teria de fazer todo o caminho de volta. Perguntei se ela teria o endereço. Ela, muito educada, respondeu: “Não sei exatamente onde eles moram, mas tenho o telefone da filha”. Depois de assegurar-me de que realmente o apartamento ficava em Niterói, despedi-me. O “louco” estava eufórico, a informação era correta. Paramos em Cachoeiras de Macacú e eu o gratifiquei. Ele agradeceu e saiu correndo com o dinheiro em direção ao primeiro bar, “como um louco”. Voltei para Niterói. Norminha dizia que o louco era eu por continuar naquela busca inútil, mas me acompanhava, apesar de tudo. Já não se falava mais em futebol, somente se encontraríamos ou não o Sr. Zélio. Chegamos em Niterói por volta das 19 horas. Assim que deixei a estrada, cruzei algumas ruas e cheguei a uma farmácia. “Cariocamente” estacionei o carro na calçada, desci, apresentei minhas credenciais e pedi para usar o telefone. Logo, em minha volta estava estabelecida a confusão. “O senhor é repórter? Foi crime? Onde foi? Quem morreu?” Tentando ignorar as perguntas, consegui completar a ligação. Do outro lado da linha uma voz de menina atendeu-me. Eu disse apenas que era de São Paulo, que queria entrevistar o Sr. Zélio e que havia sido informado de que ele se encontrava naquele telefone. A mocinha pediu-me que esperasse um instante. Eu a ouvi transmitindo as informações que lhe dera. Outra voz no aparelho, desta vez a de uma senhora; explico os objetivos da minha visita (em nenhum momento declinei meu nome). Ouço a pessoa com quem estou conversando dirigir-se à outra e explicar: “Papai, há um senhor de São Paulo ao telefone, que veio entrevistá-lo. O senhor pode atendê-lo?” E, para minha surpresa, ouço lá no fundo uma voz cansada responder: “É Ronaldo, minha filha, que estou esperando há muito tempo. O homem que vai tornar o meu trabalho conhecido em todo o mundo”. Eu ouvia e não acreditava. Eu não havia dito a ninguém o meu nome e, no entanto, ele sabia de tudo, como se estivesse informado. Pedi o endereço, trêmulo e emocionado. Não me saía da cabeça como ele sabia quem eu era. Agradeci ao farmacêutico e saí “pisando fundo”. Na Avenida Almirante Ari Pereira, perguntei a um, a outro e, finalmente, estava defronte ao prédio. Um tanto receoso, encostei o veículo. Passam os andares e finalmente o elevador para. Tive a impressão de que meu coração havia parado também. Descemos, na nossa frente havia duas portas. Bati à porta da direita. Ela abriu-se. Era a mocinha gentil que me atendera da primeira vez: “Sr. Ronaldo?”

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“Perfeitamente!” “Um momentinho”. A porta da sala é a outra e Dona Zilméia vai atendê-lo. O espaço que separava uma porta da outra não ultrapassava três metros. Com quatro passos estava diante da outra, que já começava a abrir-se. Diante de mim, uma senhora sorriu muito educada e perguntou: “O senhor Ronaldo?” Confirmei e apresentei Norminha, minha esposa. A sala era um “L” e, no canto direito, um velhinho, usando pijama com uma blusa de lã por cima, sorriu para mim. O apartamento era modesto; havia um enorme aquário numa das pernas do “L”. Ao ver a frágil figura do velhinho, veio-me à cabeça que aquele deveria ser, no mínimo, irmão gêmeo de Chico Xavier, tal a sua semelhança física com o famoso médium kardecista. Tomado de grande emoção, aproximei-me do senhor Zélio. Ele sorriu e disse, brincando: “Pensei que você não chegaria a tempo”. Não sei por que, mas aproximei-me, ajoelhei-me diante daquela figura simpática e tomei-lhe a bênção. Ele tomou minhas mãos, fez-me sentar ao seu lado e repreendeu a Norminha, dizendo-lhe: “Por que você não queria vir para cá”? Quando consegui falar, disparei uma “rajada” de perguntas. Eu estava totalmente abalado, o homem parecia saber tudo sobre mim e procurava acalmar-me, dizendo: “Sei perfeitamente o que você quer saber e não há motivo para que esteja tão nervoso”. Sua presença me acalmava. Dona Zilméia, depois de conversar conosco por 15 minutos, explicou que era seu dia de tocar os trabalhos e desculpou-se, dizendo que precisava sair. Pedi-lhe o endereço da Tenda e, depois de tudo anotado, ela retirou-se e fiquei na companhia do senhor Zélio. Ele realmente tinha todas as respostas para minhas perguntas e, na maior parte do tempo, antecipava-se a elas. Coisa que até hoje não consigo compreender. Eu estava diante de alguém como nunca havia visto antes. Finalmente eu encontrara o “homem”.

Zélio de Moraes e as primeiras manifestações espirituais na Umbanda: Quando do primeiro contato de Ronaldo Linares com Zélio de Moraes, este lhe narrou como tudo começou:

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Em 1908, o jovem Zélio Fernandino de Moraes estava com 17 anos e havia concluído o curso propedêutico (equivalente ao Ensino Médio atual). Zélio preparava-se para ingressar na Escola Naval, quando fatos estranhos começaram a acontecer-lhe. Ora ele assumia a estranha postura de um velho, falando coisas aparentemente desconexas, como se fosse outra pessoa e que havia vivido em outra época; e, em outras ocasiões, sua forma física lembrava um felino lépido e desembaraçado, que parecia conhecer todos os segredos da Natureza, os animais e as plantas. Este estado de coisas logo chamou a atenção de seus familiares, principalmente porque ele estava preparando-se para seguir carreira na Marinha, como aluno oficial. Este estado de coisas foi se agravando e os chamados “ataques” repetiam-se cada vez com mais intensidade. A família recorreu, então, ao médico Dr. Epaminondas de Morais, também da família, diretor da “Colônia de Alienados” em Vargem Alegre e tio de Zélio. Após examiná-lo durante vários dias, reencaminhou-o à família, dizendo que a loucura não se enquadrava em nada do que ele havia conhecido, ponderando, ainda, que melhor seria encaminhá-lo a um padre, pois o garoto mais parecia estar endemoninhado. Como acontecia com quase todas as famílias importantes da época, também havia na família um padre católico. Por meio desse sacerdote, também tio de Zélio, foi realizado um exorcismo para livrá-lo daqueles incômodos ataques. Entretanto, nem esse nem os outros dois exorcismos realizados posteriormente, inclusive com a participação de outros sacerdotes católicos, conseguiram dar à família Morais o tão desejado sossego, pois as manifestações prosseguiram, apesar de tudo. A partir daí, a família passou a correr atrás de toda e qualquer melhora, ou melhor, informação, que lhe trouxesse a esperança de uma solução para seu filho querido. Um dia, alguém sugeriu que isso era coisa de espiritismo e que o melhor era encaminhá-lo a recém-fundada Federação Kardecista de Niterói, município vizinho àquele em que residia a família Morais, ou seja, São Gonçalo das Neves. A Federação era então presidida pelo Sr. José de Souza, chefe de um departamento da Marinha, chamado Toque Toque. O jovem Zélio foi conduzido, em 15 de novembro de 1908, a presença do Sr. José de Souza. Estava num daqueles chamados ataques, que nada mais eram do que incorporações involuntárias de diferentes Espíritos; e lá chegando, o Sr. José de Souza, médium vidente, interpelou o Espírito manifestado no jovem Zélio e foi aproximadamente este o diálogo ocorrido: Sr. José: “Quem é você que ocupa o corpo deste jovem?” O Espírito: “Eu? Eu sou apenas um Caboclo brasileiro”. Sr. José: “Você se identifica como Caboclo, mas eu vejo em você restos de vestes clericais”. O Espírito: “O que você vê em mim são restos de uma existência anterior. Fui padre, meu nome era Gabriel Malagrida e, acusado de bruxaria, fui sacrificado na fogueira da Inquisição por haver previsto o terremoto que destruiu Lisboa em 1755. Mas, em minha última existência física, Deus concedeu-me o privilégio de nascer como um Caboclo brasileiro”. Sr. José: “E qual é seu nome?” O Espírito: “Se é preciso que eu tenha um nome, digam que sou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, pois para mim não existirão caminhos fechados. Venho trazer a Umbanda, uma religião que harmonizará as famílias e que há de perdurar até o final dos séculos”. No desenrolar desta “entrevista”, entre muitas outras perguntas, o Sr. José de Souza teria perguntado se já não bastariam às religiões existentes e fez menção ao espiritismo então praticado, e foram estas as palavras do Caboclo das Sete Encruzilhadas: “Deus, em Sua infinita bondade, estabeleceu na morte o grande nivelador universal: rico ou pobre, poderoso ou humilde, todos se tornam iguais na morte. Mas vocês homens preconceituosos, não contentes em estabelecer diferenças entre os vivos, procuram levar essas mesmas diferenças até mesmo além da barreira da morte. Por que não podem nos visitar esses humildes trabalhadores do espaço, se, apesar de não haverem sido pessoas importantes na Terra, também trazem importantes mensagens do além? Por que o “não” aos Caboclos e Pretos-Velhos? Acaso não foram eles também filhos de Deus?” A seguir, fez uma série de revelações sobre o que estava à espera da humanidade: “Este mundo de iniqüidades mais uma vez será varrido pela dor, pela ambição do homem e pelo desrespeito às leis de Deus. As mulheres perderão a honra e a vergonha, a vil moeda comprará caracteres e o próprio homem se tornará afeminado. Uma onda de sangue varrerá a Europa e quando todos acharem que o pior já foi atingido, uma outra onda de sangue, muito pior do que a primeira, voltará a envolver a humanidade, e um único engenho militar será capaz de destruir, em segundos, milhares de pessoas. O homem será uma vítima de sua própria máquina de destruição.”

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Prosseguindo diante do Sr. José de Souza, disse ainda o Caboclo das Sete Encruzilhadas: “Amanhã, na casa onde meu aparelho mora, haverá uma mesa posta a toda e qualquer entidade que queira ou precise se manifestar, independentemente daquilo que haja sido em vida, todos serão ouvidos e nós aprenderemos com aqueles Espíritos que souberem mais e ensinaremos àqueles que souberem menos e a nenhum viraremos as costas e nem diremos não, pois esta é a vontade do Pai”. Sr. José: “E que nome darão a esta Igreja?” O Caboclo: “Tenda Nossa Senhora da Piedade, pois da mesma forma que Maria ampara nos braços o filho querido, também serão amparados os que se socorrerem da Umbanda”. A denominação de “Tenda” foi justificada assim pelo Caboclo: “Igreja, Templo, Loja, dão um aspecto de superioridade, enquanto que Tenda lembra uma casa humilde”. Dessa forma, em São Gonçalo das Neves, vizinho a Niterói, do outro lado da Baía de Guanabara, na sala de jantar da família Morais, um grupo de curiosos kardecistas compareceu, no dia 15 de novembro de 1908, para ver como seriam estas incorporações, para eles indesejáveis ou injustificáveis. O diálogo do Caboclo das Sete Encruzilhadas, como passou a ser chamado, havia provocado muita especulação e alguns médiuns, que haviam sido escorraçados de mesas kardecistas, por haverem incorporado Caboclos, Crianças ou Pretos-Velhos, solidarizaram-se com aquele garoto que parecia não estar compreendendo o que lhe acontecia e que de repente se via como líder de um grupo religioso, obra que deveria durar toda a sua vida e que só terminaria com a sua morte, mas que suas filhas Zélia e Zilméia prosseguem com o mesmo afã. A Tenda de Umbanda Nossa Senhora da Piedade existe até hoje. Seu patrono segue sendo o Caboclo das Sete Encruzilhadas. A história se encarregou de mostrar e provar a exatidão das previsões do Caboclo das Sete Encruzilhadas. As duas primeiras guerras, as bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki e a grande degeneração da moral que abala os países do mundo. O poder do dinheiro e o total desrespeito à vida humana são provas incontestáveis do poder e da clarividência do Caboclo das Sete Encruzilhadas. A Tenda Nossa Senhora da Piedade é reconhecida hoje como a primeira Tenda de Umbanda e a data de 15 de novembro de 1908 é reconhecida como a data de fundação oficial da Umbanda. Nota do autor: Ronaldo Antonio Linares fez seu primeiro contato com Zélio de Moraes em 1970. Antes disso, em 1969, o pesquisador norte-americano David St. Claire fez a mesma descoberta em sua estada no Brasil, bem como a jornalista e dirigente de Umbanda Lilian Ribeiro, igualmente em 1970. Raízes do Ritual Umbandista Quando Ronaldo Linhares efetuou os primeiros contatos com Zélio de Moraes, indagou sobre a origem do ritual umbandista e ele fez os seguintes esclarecimentos: O rito nasceu naturalmente, como conseqüência, principalmente, da presença do índio e pela presença do elemento negro, não tanto pela presença física do negro, mas sim pela presença do Preto-Velho incorporado, e, para ser mais preciso, no mesmo dia e pela primeira vez houve a incorporação de Pai Antonio, naquela que haveria de ser a primeira Tenda de Umbanda do Brasil. A Tenda Nossa Senhora da Piedade. Segundo relato de Zélio de Moraes, o Caboclo das Sete Encruzilhadas havia avisado que subiria para dar passagem a outra entidade que desejava se manifestar. Assim se manifestou no corpo de Zélio de Moraes, o Espírito do velho ex-escravo, que parecia demonstrar sentir-se pouco à vontade frente a tanta gente e que, se recusando a permanecer na mesa em que se dera a incorporação, procurava passar despercebido, humilde, aparentando muita idade e o corpo curvado, o que dava ao jovem Zélio um aspecto estranho, quase irreal. Essa entidade parecia tão pouco à vontade, que logo despertou profundo sentimento de compaixão e de solidariedade entre os presentes. Questionado então por que não se sentava à mesa, com os demais irmãos encarnados, respondeu: “Negro num senta não, meu sinhô. Negro fica aqui mesmo. Isso é coisa de sinhô branco i negro deve arrespeitá”. Era a primeira manifestação desse Espírito iluminado, mas a morte não retoca seu escolhido, mudando-o para o bem ou para o mal. Não havia afastado desse injustiçado o medo que ele tantas vezes havia sentido ante a prepotência do branco escravagista e, ante a insistência de seus interlocutores, disse: “Num carece preocupá não, negro fica nu toco, que é lugá di negro”. Procurava, assim, demonstrar que se contentava em ocupar um lugar mais singelo, para não melindrar nenhum dos presentes.

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Indagado sobre seu nome, disse que era “Tonho”, “Pai Antonio”. Surgiu, assim, esta forma de chamar os Pretos-Velhos de “Pai”. Ao responder como havia sido sua morte, disse que havia ido à mata apanhar lenha, sentiu alguma coisa estranha, sentou-se e nada mais se lembrava. Sensibilizado com tanta humildade, alguém lhe perguntou respeitosamente: “Vovô; o senhor tem saudade de alguma coisa que deixou ficar aqui na terra?” Este respondeu: “Minha cachimba, negro qué pito que deixou no toco. Manda mureque buscá”. Grande espanto tomou conta dos presentes. Era a primeira vez que algum Espírito pedia alguma coisa de material, e a surpresa foi logo substituída pelo desejo de atender ao pedido do velhinho. Mas ninguém tinha um cachimbo para ceder-lhe. Na reunião seguinte, muitos pensaram no pedido e uma porção de cachimbos, dos mais diferentes tipos, apareceu nas mãos dos freqüentadores da casa, incluindo-se alguns médiuns que haviam sido afastados de Centros Espíritas Kardecistas, justamente porque haviam permitido a incorporação de índios, pobres ou pretos como aquele e que, solidários, buscavam na nova casa, a Tenda Nossa Senhora da Piedade, a oportunidade que lhes fora negada em seus centros de origem. A alegria do velhinho em poder pitar novamente o seu cachimbo logo seria repetida quando os outros médiuns já mencionados também passaram livremente a permitir a presença de seus Caboclos, de seus Pretos-Velhos e demais entidades consideradas não doutas pelos kardecistas de então, pobres tolos preconceituosos que confundiam cultura com bondade. Foi dessa maneira que foi introduzido na “mesa de trabalho” o primeiro rito. Outros lhe seguiram, como, por exemplo, quando houve a informação de que os índios tinham o hábito de fumar e que foram eles que primeiro descobriram as propriedades dessa planta que eles enrolavam num enorme charuto, que era usado coletivamente por todos os participantes de seus cultos religiosos, sendo desta forma uma espécie de planta sagrada. Desde que haja moderação e cautela, negar o pito ao Preto-Velho seria hoje uma grande maldade. Entretanto, deve-se sempre ter em mente que o seu uso deve ater-se somente ao rito e evitar-se os abusos e as deturpações que testemunhamos constantemente, não raras vezes, tocando as raias do absurdo e do escândalo, para o desprestígio desta religião que nasceu sob o signo da paz e do amor. Atualmente, sabe-se que o uso do fumo pelas entidades incorporadas tem o efeito purificador quando elas atendem alguma pessoa com problemas espirituais. A fumaça age como um desagregador de maus fluidos, atingindo o perispírito dos Espíritos obsessores. Por extensão destes hábitos incorporados ao Terreiro, passou-se a oferecer doces às crianças incorporadas e, às vezes, a promover festas infantis. Contudo, o que é usual nestes casos, e naturalmente influindo desta ou daquela forma nas demais maneiras de incorporação, sempre com o objetivo de tratar os incorporantes (Espíritos) como velhos e queridos amigos a quem recebemos com grande satisfação. Com a “liberdade” trazida pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, as pessoas afugentadas da elitizada doutrina kardecista de então passaram a freqüentar a nova religião. Uma boa parcela dessas pessoas era de raça negra (no Rio de Janeiro). Isso fez com que a Umbanda passasse a contar com uma boa parte de médiuns de raça negra, que se sentiam muito à vontade pela ausência de preconceitos. Estes médiuns começaram a enriquecer o ritual umbandista e hoje muitos rituais com o nome de Umbanda são praticados, muitos nem são Umbanda; são misturas desconexas de ritos, mas, quando encontramos um verdadeiro Terreiro ou Tenda de Umbanda, algo dentro de nós nos emociona; é como estivéssemos sentindo a presença de Cristo e de N.Sra. na humildade dos Pretos-Velhos; na simplicidade dos índios Caboclos em sua pureza mental e moral e no cheiro bom da arruda... alecrim... alfazema e guiné...

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EIS QUE O CABOCLO VEIO A TERRA “ANUNCIAR” A UMBANDA Nota do autor: Após termos estudado a versão oficial do início da Umbanda no Brasil, vamos estudar também a versão de um estudioso, Mestre em História Comparada. Descerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; pelo que também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus. (Lucas 1:35) Resumo: Neste artigo ofereceremos um novo olhar sobre a “anunciação” da Umbanda: a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas no médium Zélio de Moraes, numa sessão da Federação Espírita de Niterói, no dia 15 de Novembro de 1908. Como todo mito-fundador, a narrativa entremeia a realidade com fantasia. Mas o que interessa é o valor simbólico que o mito representa para os atuais adeptos, cuja importância se compara ao nascimento de Jesus, para os cristãos. Nesta perspectiva, proponho uma análise alternativa àquelas realizadas por Diana Brown e Emerson Giumbelli, nas quais a relevância simbólica do evento fora suplantada por questões relativas à consolidação da classe média carioca. As teorias de Pierre Bourdieu sobre o funcionamento do campo religioso me auxiliaram na tarefa de justificar o ostracismo vivido por Zélio de Moraes. O que estava em jogo naquele momento era a busca pela legitimidade de uma religião periférica, e não quem fora o precursor da Umbanda. 1 – Introdução: A manifestação de Espíritos de negros e de índios, tão comuns na Umbanda, já ocorria espontaneamente nos rituais da Macumba desde meados do século XVIII. Longe de ser um culto organizado, a Macumba era um agregado de elementos da cabula banto, do culto jeje-nagô, das tradições indígenas e do catolicismo popular, sem o suporte de uma doutrina capaz de integrar os diversos pedaços que lhe davam forma. É desse conjunto heterogêneo, acrescida de elementos egressos do kardecismo (foi este último grupo que se apropriou do ritual da Macumba, impôs-lhe uma nova estrutura e, articulando um novo discurso, deu início ao processo de legitimação, que se consubstanciou com a fundação de Federação Espírita de Umbanda em 1939), que nascerá a nova religião. Mas de onde vem a Umbanda? Acredita-se que o vocábulo “Umbanda” designasse, entre os africanos, sacerdote que trabalha para a cura. Na Macumba, o vocábulo “embanda” ou “Umbanda” também designava o chefe do Terreiro ou, simplesmente, sacerdote, nunca uma modalidade religiosa. O umbandista Matta e Silva relata no livro “Umbanda e o Poder da Mediunidade” que o vocábulo “Umbanda”, como bandeira religiosa, não aparece antes de 1904 (MATTA E SILVA, 1987, p. 13). Entretanto, no depoimento deste mesmo autor, encontra-se o registro de que, em 1935, conhecera um médium com 61 anos de idade, de nome de Nicanor, que praticava a Umbanda desde os 16 anos, ou seja, desde 1890, incorporando o Caboclo Cobra Coral (Idem. Ibidem, p. 14). Outro autor umbandista, Diamantino Trindade, reproduziu no livro “Umbanda e Sua História” parte de uma entrevista do jornalista Leal de Souza – publicada no Jornal de Umbanda, em Outubro de 1952 – na qual afirmava que o “precursor da Linha Branca fora o Caboclo Curugussú (Sobre o Caboclo Curugussú, não foram obtidas outras informações que pudessem esclarecer a ação desta manifestação espiritual), que trabalhou até o advento do Caboclo das Sete Encruzilhadas” (TRINDADE, 1991, p. 56). O vocábulo “Umbanda” vai ganhar status de religião quando o Caboclo das Sete Encruzilhadas manifestado no médium Zélio de Moraes, no dia 15 de novembro de 1908, “anuncia” (Tomo emprestado aqui o significado de “anunciação” a semelhança do que ocorreu com a passagem bíblica quando o Anjo Gabriel apareceu a Virgem Maria para anunciar a vinda do messias: Jesus) o início de uma nova prática religiosa. Este evento representa, hoje, para o Movimento Umbandista (Entendemos como Movimento Umbandista a união dos adeptos da nova religião a fim de se protegerem contra a repressão policial. Esta união se consolidou na criação da Federação Espírita de Umbanda (1939), na realização do Primeiro Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda (1941) e na produção e divulgação de todo um discurso legitimador das práticas umbandistas, que se traduziram na publicação de livros, jornais, revistas, programas de rádios etc.) o marco fundador da religião, um divisor de águas entre a Macumba – que era compreendida na época como “baixo-espiritismo” cuja prática nem sempre estava direcionada para fins elevados – e o “Espiritismo de Umbanda”, voltado para a prática do amor ao próximo. Misto de lenda e de realidade, a “anunciação” da Umbanda sofre algumas variações de narrador para narrador, mas a estrutura básica se mantém inalterada. Zélio de Moraes, aos 17 anos, começou apresentar alguns distúrbios os quais a família acreditou que fossem de ordem mental e encaminhou o rapaz para um hospital psiquiátrico. Dias depois, não encontrando os seus sintomas em nenhuma literatura médica, foi sugerida à família que lhe encaminhasse a um padre para um ritual de exorcismo. O padre, por sua vez, não conseguiu nenhum resultado.

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Tempos depois Zélio foi levado a uma benzedeira conhecida na região onde morava que lhe diagnosticou o dom da mediunidade e lhe recomendou que “trabalhasse” para a caridade. Por sugestão de um amigo de seu pai, Zélio foi levado a Federação Espírita de Niterói, no dia 15 de novembro de 1908. Ao chegar à Federação foi convidado pelo dirigente daquela instituição a participar da sessão. Logo em seguida, contrariando as normas do culto, Zélio levantou-se dizendo que ali faltava uma flor. Foi até um jardim apanhou uma rosa branca e colocou-a no centro da mesa. A atitude do rapaz provocou uma estranha confusão no local: ele incorporou um Espírito e simultaneamente diversos médiuns apresentaram incorporações de Caboclos e Preto-Velhos. Advertido pelo dirigente do trabalho, a entidade incorporada no rapaz perguntou por que era proibida a presença daqueles Espíritos. Outro médium, que tinha o dom da vidência, quis saber da entidade o porquê dela falar daquele modo, pois via que era um padre jesuíta e lhe perguntou o nome. A resposta foi: (...) se julgam atrasados os Espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho, para dar início a um culto em que estes pretos e índios poderão dar sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome que seja Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim. (GUIMARÃES e GARCIA, 2002, não paginado). No dia seguinte, no bairro de Neves – município de São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro –, estavam presentes à casa do médium membros da Federação Espírita, parentes, amigos, vizinhos e do lado de fora uma multidão de desconhecidos. Às 20 horas, o Caboclo se manifestou no corpo de Zélio de Moraes e disse que naquele momento iniciava-se um novo culto, no qual os Espíritos de africanos e de índios poderiam trabalhar em benefício de seus irmãos encarnados e disse, também, que a nova religião se chamaria Umbanda. O grupo fundado pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas recebeu o nome de Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, porque “assim como Maria acolhe em seus braços o Filho, a Tenda acolheria aos que a ela recorrerem nas horas de aflição” (TRINDADE, 1991, p. 62) – (A Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade encontra-se ainda em atividade no município de Cachoeira de Macacú, região serrana do Rio de Janeiro). A Pietá, (mater dolorosa), serviu de inspiração para o Caboclo das Sete Encruzilhadas escolher o nome da Tenda Nossa Senhora da Piedade.

Imagem de Nossa Senhora da Piedade

2 – Interpretações do mito-fundador Para um grupo significativo de umbandistas, o dia 15 de novembro de 1908 assumiu o caráter de data de fundação da religião (O dia 15 de novembro foi instituído como Dia Nacional da Umbanda durante o III Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda, em 1973. Nesta data, que passou a fazer parte do calendário umbandista, a maioria dos Terreiros comemoram a fundação da Umbanda e rendem homenagem ao Caboclo das Sete Encruzilhadas).

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Entretanto, a antropóloga Diana Brown (1985) indica o aparecimento da Umbanda apenas na década de 1920 e aponta Zélio de Moraes e seus seguidores como egressos do Espiritismo: “Zélio de Moraes, que no relato da sua doença, da posterior cura, e da revelação de sua missão especial para fundar uma nova religião chamada Umbanda fornece aquilo que considero um mito de origem da Umbanda. Não posso estar totalmente certa de que Zélio foi o fundador da Umbanda, ou mesmo que a Umbanda tenha tido um único fundador, muito embora o Centro de Zélio e aqueles fundados por seus companheiros tenham sido os primeiros que encontrei em todo o Brasil que se identificavam conscientemente como praticantes de Umbanda (...). “Muitos integrantes deste grupo de fundadores eram como Zélio, kardecistas insatisfeitos, que empreenderam visitas a diversos centros de “Macumba” localizados nas favelas dos arredores do Rio de Janeiro e de Niterói”. Realmente, devo concordar com Diana Brown que não se pode ter certeza de que Zélio de Moraes tenha fundado a Umbanda. Principalmente porque alguns dados referentes a aquele evento não puderam ser confirmados, havendo inclusive várias divergências entre as informações contidas no mito da “anunciação”. A narrativa faz referência à participação de Zélio na mesa kardecista atendendo ao convite do presidente da Federação Espírita de Niterói, José de Souza. Entretanto, consultando o Livro de Atas nº. 1 desta instituição, constata-se que o cargo era ocupado por Eugênio Olímpio de Souza. E mais, não consta o nome de nenhum José de Souza entre os membros da diretoria e muito menos na relação de associados. Tampouco consta no referido livro de atas à realização de reunião naquela data. Segundo informações prestadas pela Diretora de divulgação da Federação Espírita de Niterói (atual Instituto Espírita Bezerra de Menezes), Yeda Hungria, na ocasião a Federação ainda não dispunha de sede própria, ocupando uma sala na Rua da Conceição – Centro de Niterói –; portanto, não haveria condições do jovem Zélio buscar rapidamente uma flor para enfeitar a mesa. Nota do autor: num relato fonográfico (fita nº. 45, disponibilizada juntamente com esse livro em nosso site), aos 09 minutos e 48 segundos... (pergunta de Solano) Deixa eu lhe perguntar. Foi na casa desse seu avô (nota do autor: Joaquim Fernandino Costa), que se conta o caso daquela primeira manifestação do Caboclo, quando ele diz – “falta uma rosa na mesa” – e que ele anuncia que no dia seguinte seria fundada (nota do autor: a Umbanda). (Zélia responde). Foi; porque nos morávamos com o meu avô”... Com mais esse relato, se verídico, tiramos a conclusão de que a fala do Caboclo – “falta uma rosa na mesa”, deu-se numa reunião em casa de Zélio, também no dia 15/11, e não na Federação em Niterói. Com certeza, em casa de Zélio, existia um jardim. Portanto corrobora com a versão de que na Federação, no centro de Niterói, não haviam jardins a disposição tão facilmente. Segundo os Guias Espirituais, muitos umbandistas consideram a “rosa branca” como símbolo da Umbanda, mas, não é isso que o Caboclo das Sete Encruzilhada quis dizer com o ato; a presença da rosa branca na Mesa de Trabalho ou no peji, representa a Mãe Maria Santíssima. Assim, somos levados a pensar que, se realmente o fato ocorreu, pode não ter acontecido na Federação, mas talvez em algum Centro Espírita filiado a esta, cujo nome se perdeu ao longo da repetição desta tradição oral (Segundo Yeda Hungria, na época, a instituição já realizava sessões espíritas em suas dependências. Entretanto, estas reuniões não geravam atas. Portanto, não há como afirmar se houve sessão naquele dia. Quanto a registros de distúrbio provocado por Espíritos “indesejados”, não haveria também motivo para serem realizados, uma vez que a manifestação desses Espíritos e a conseqüente doutrinação era prática usual na mesa kardecista. Assim, seria lícito supor que a possível manifestação de um Caboclo na sessão espírita passaria despercebida, porque era comum a manifestação de Espíritos tidos como “atrasados” nas sessões. Contudo, penso que não seria comum a manifestação de um Caboclo anunciando a criação de uma nova religião, a menos que ninguém tenha levado a sério). No que diz respeito à afirmação de Diana Brown de que a fundação da Umbanda tenha ocorrido em meados da década de 1920, por iniciativa de um grupo de kardecistas, sou levado a discordar da pesquisadora. Vejamos: em artigo publicado no livro “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda”, editado pelo jornalista Leal de Souza em 1933, o autor afirma que o Caboclo das Sete Encruzilhadas “baixava” há 23 anos em uma casa pobre nos arredores de Niterói (SOUZA, 1933, p. 78). Isto é, pelo menos, desde 1910. Acredito que Brown tenha sido levada a se enganar, pois o período coincide com a transferência da Piedade (Doravante passo a me referir a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade apenas como Piedade) para outro endereço ainda em São Gonçalo. Outro fator que poderia ter contribuído para a confusão da pesquisadora estadunidense seria, talvez, o período em que ocorreu a criação de Tendas filiadas à Piedade, cuja maioria se deu ao longo daquela década. Segundo o mito, o Caboclo das Sete Encruzilhadas havia orientado seu médium para a abertura de outras Tendas com a finalidade de propagar a nova religião. Ao todo, foram criadas sete Tendas por orientação da entidade. Até mesmo os responsáveis pela direção dos novos Templos foram indicados pelo Caboclo. Assim, temos: Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia, com Durval de Souza; Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, com Leal de Souza; Tenda Espírita Santa Bárbara, com João Salgado; Tenda Espírita São Pedro, com José Meirelles; Tenda Espírita Oxalá, com Paulo Lavois; Tenda Espírita São Jorge, com João Severino Ramos; e Tenda Espírita São Jerônimo, com José Álvares Pessoa (Não há registros confiáveis sobre as datas de fundação de todas as Tendas, sabe-se apenas que a primeira foi inaugurada em 1918 e a última em 1935, ou seja, Zélio de Moraes levou 17 anos para cumprir a determinação da entidade responsável pelos trabalhos).

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Além destas, várias Tendas foram fundadas sob orientação do Caboclo das Sete Encruzilhadas em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Pará (TRINDADE, 1991, p. 69). Com relação à proximidade de Zélio de Moraes com o Kardecismo, além do fato do Caboclo ter se manifestado em uma Sessão Espírita, se justifica apenas pela fé professada por seu pai, Joaquim Ferdinando Costa, que realizava encontros em sua casa para a leitura da obra de Allan Kardec (Ubiratan Machado sublinha que na virada do século XIX para o XX era comum à realização de reuniões para estudar as obras de Allan Kardec sem que isso representasse conversão ao Espiritismo, muitos reafirmavam que continuavam católicos. Cf. MACHADO, 1997, p. 224). Segundo Zilméia de Moraes Cunha – única filha viva do médium – seu pai nunca fora kardecista. Pelo contrário, a família era tradicionalmente católica. Ela sublinha, contudo, que após a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, muitos kardecistas passaram a freqüentar assiduamente a Piedade, vindo alguns deles ingressarem no corpo mediúnico da casa. Diamantino Trindade reforça a hipótese de proximidade de Zélio com o catolicismo, tanto na presença de muitas imagens de Santos no altar da Piedade, quanto no hábito de homenagear Santos católicos ao nomear os Templos filiados à Piedade (Idem. Ibidem, p. 68). Cabe lembrar também que o Caboclo das Sete Encruzilhadas não era um Espírito qualquer, segundo o mito, ele fora o padre jesuíta Gabriel Malagrida em reencarnações anteriores. A presença do Catolicismo no mito da “anunciação” da Umbanda pode ser observada também num quadro onde fora pintado mediunicamente a imagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas. A pintura apresenta um indígena no primeiro plano, tendo no plano intermediário um mastro com a bandeira do Brasil tremulando e logo adiante sete caminhos unidos a um único ponto de origem e, no plano de fundo, há elementos relativos à Natureza do nosso país. O quadro é simbolicamente riquíssimo, permitindo inúmeras interpretações.

Caboclo das Sete Encruzilhadas – pintura exposta na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade

O que nos interessa aqui, entretanto, são os sete caminhos que o Caboclo tem para percorrer no sentido de propagar a Umbanda.

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A união destes caminhos, a encruzilhada, lembra-nos a praça de muitas igrejas do interior, que oferece aos fiéis sete opções de trajetos para chegar até o Templo. Estes caminhos fazem referência aos sete dons do Espírito Santo: Sabedoria, Entendimento, Conselho, Fortaleza, Ciência, Piedade e Temor, cujos valores, são procurados no culto ao Divino Espírito Santo. A análise desta simbologia nos sugere a interpretação de que o Caboclo das Sete Encruzilhadas seria a manifestação de um “Espírito Santo”, talvez um anjo, que viria “anunciar” o início de uma religião que falaria aos humildes. Portanto, totalmente distante das interpretações que qualificavam as entidades da Umbanda como demoníacas.

3 – Uma análise comparativa da relevância da “anunciação” da Umbanda A pergunta que se faz neste momento é qual a relevância de se identificar quem, quando ou como se iniciou o Movimento Umbandista? Acredito que a resposta esteja no valor simbólico atribuído pelos atuais adeptos à manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas na pessoa de Zélio de Moraes. Este simbolismo pode ser avaliado pelo calendário litúrgico da religião, no qual o dia 15 de Novembro aparece ao lado das tradicionais datas comemorativas dos Orixás, com direito a realização de sessão festiva cuja finalidade é render homenagens tanto ao Caboclo das Sete Encruzilhadas quanto ao médium. É possível encontrar em alguns Terreiros até a fotografia do Zélio ornamentando o Congá (O Congá é o local onde se encontra o altar e onde também ficam os médium durante as sessões). Mesmo que seja somente um “mito de origem”, como propõe Diana Brown, a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas não pode ser relativizada, uma vez que para os umbandistas a data tem o mesmo valor simbólico do Natal para os cristãos, do Rosh Hashaná para os judeus e da Hérgira para os muçulmanos (O Natal marca o nascimento de Jesus para os cristãos; o Rosh Hashaná é o ano novo judaico contado a partir da fuga dos hebreus do Egito; e a Hégira, dos muçulmanos, marca a fuga de Maomé de Meca para Medina). Portanto, não me satisfaz a análise que Emerson Giumbelli (2003) propõe sobre o mito fundador da Umbanda e a importância de Zélio de Moraes para o Movimento Umbandista. Para Giumbelli, o mito fundador centrado na figura de Zélio de Moraes e da manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas é uma construção tardia, que se inicia contemporaneamente à morte do médium – em 1975 – e que corresponderia a um período de dispersão doutrinária e ritual e de uma divisão institucional (Idem. Ibidem, p. 189). Não vejo, a princípio, consistência nessa justificativa para se buscar nas origens da Umbanda um elemento aglutinador para o Movimento Umbandista. Se observarmos a estrutura organizacional do movimento, perceberemos que a união dos umbandistas sempre foi circunstancial; haja vista o excessivo número de Federações, Confederações, Uniões e Conselhos existentes (Cf. BIRMAN, 1985. p 80-121). As questões doutrinárias e rituais desde a realização do Primeiro Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda (1941) sempre foram tensas entre o grupo que defendia o rompimento da Umbanda com as práticas mais africanizadas e aqueles que delas não abriam mão. É significativa a posição de Tancredo da Silva Pinto – o Tatá Tancredo – no livro “Fundamentos de Umbanda”, sobre as propostas de desafricanização divulgadas nas palestras daquele Congresso. O autor diz que acha graça quando ouve os “líderes da Umbanda Branca” dizendo que a religião sofre influência das tradições africanas. Para ele “a Umbanda é africana, é um patrimônio da raça negra” (FREITAS e PINTO, 1957, p. 58). Tancredo, inclusive, vai romper com a Federação Espírita de Umbanda e fundar a Congregação Espírita de Umbanda do Brasil. Giumbelli continua sua análise discorrendo uma vasta bibliografia etnográfica na qual Zélio de Moraes e o Caboclo das Sete Encruzilhadas não aparecem antes da década de 1970, ambos tiveram de esperar as pesquisas de Diana Brown e Renato Ortiz para passar a existir na literatura acadêmica. Depois, se debruça sobre várias obras umbandistas e sobre o Jornal de Umbanda – veículo oficial da União Espiritualista Umbanda do Brasil, herdeira de Federação Espírita de Umbanda –, nos quais o nome de Zélio de Moraes não aparece ou, quando citado, aparece de forma discreta. O autor conclui que as referências ao médium, principalmente aquelas encontradas no Jornal de Umbanda, apenas reconhecem a antiguidade dos vínculos de Zélio de Moraes com a Umbanda, contudo jamais chegaram a ponto de alçá-lo à posição de fundador da religião. Mais do que isso, insinuam uma subordinação de Zélio ora à sua condição de médium (como tanto outros na Umbanda), ora à sua condição de intermediário de uma entidade espiritual (que, diga-se, não lhe devia exclusividade). Sendo assim, compreende-se por que mesmo os textos que tratam das origens ou da história da Umbanda, ou do Caboclo das Sete Encruzilhadas, no jornal da UEUB no final da década de 1950 não se sentem obrigados a mencionar o nome de Zélio. (GIUMBELLI, 2003. p. 194).

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Diante da extensa documentação apresentada pelo autor não há o que se discutir, mas cabe a possibilidade de se propor outra interpretação para a ausência de Zélio de Moraes nas obras de seus contemporâneos. Antes, porém, devo lembrar que o Leal de Souza (Na época Leal de Souza dirigia a Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, uma das filiais que formam o septo de casas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas), relatou ao Jornal de Umbanda, na edição de Outubro de 1952, que coubera ao Caboclo das Sete Encruzilhadas a incumbência de organizar a “Linha Branca de Umbanda”, seguindo as determinações dos “Guias superiores” que regem o planeta. Quando se apresentou pela primeira vez, em 15 de novembro de 1908, para iniciar sua missão, mostrou-se como um velho de longa barba branca; vestia uma túnica alvejante, que tinha em letras luminosas a palavra Caridade. Depois, por longos anos, assumiu o aspecto de um Caboclo vigoroso; hoje é uma claridade azul no ambiente das Tendas. (SOUZA. Apud TRINDADE, 1991, p. 56).

Na mesma entrevista, Leal de Souza vai fazer referência a Pai Antônio, um Preto Velho, que se manifestou no mesmo dia em que fora fundada a Piedade: “Pai Antônio, o principal auxiliar do Caboclo das Sete Encruzilhadas, e que baixa no mesmo aparelho, Zélio de Moraes, e que eu já vi discutir medicina com doutores. É o Espírito mais poderoso do meu conhecimento” (Idem. Ibidem, p. 57). Portanto, existe pelo menos uma referência no Jornal de Umbanda sobre a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, no médium Zélio de Moraes, no dia 15 de Novembro de 1908, com a finalidade de organizar a “Linha Branca de Umbanda”. Mas concordo com Giumbelli, é pouco, quase nada! Assim, recorro às teorias de Pierre Bourdieu (2004) sobre o funcionamento do campo religioso para me auxiliar na tarefa de propor uma interpretação alternativa do ostracismo vivido por Zélio de Moraes. Bourdieu nos ensina que: “toda seita que alcança êxito tende a tornar-se Igreja, depositária e guardiã de uma ortodoxia, identificada com as suas hierarquias e seus dogmas” (Idem, Ibidem, p. 58). Parto do princípio de que as publicações umbandistas estudadas por Giumbelli foram produzidas num período em que a Umbanda já desfrutava de alguma legitimidade institucional. A partir do modelo “bourdiano”, comparo a Federação Espírita de Umbanda com a hierarquia eclesiástica e Zélio de Moraes com a figura do profeta, isto é, aquele que pelo exercício legítimo do poder religioso – que no nosso caso é a manifestação de uma entidade espiritual que se apresenta como fundadora da Umbanda – teria condições de competir no campo religioso com o monopólio doutrinário difundido pela Umbanda institucionalizada, pondo em risco a legitimidade da nova religião. Bourdieu argumenta que para a conservação do monopólio de um poder simbólico e da existência da instituição eclesiástica, caberia à Igreja buscar recursos para suprimir a ação do profeta, seja pela sua eliminação ou pela sua subordinação e reconhecimento da legitimidade do monopólio eclesiástico (Id. Ibid. 61). Ora, foi isto que ocorreu com Zélio de Moraes. Ele se subordinou às orientações da hierarquia eclesiástica, isto é, da cúpula da Federação Espírita de Umbanda, até mesmo porque teria ajudado a fundar a instituição, seguindo as orientações do Guia Espiritual. Encontra-se nos Anais do Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda, uma menção a intervenção do Caboclo das Sete Encruzilhadas na fundação da Federação Espírita de Umbanda. Antes de iniciar a palestra, o representante da Tenda Espírita São Jorge, Antônio Barbosa, rende homenagem ao Caboclo dizendo: “(...) rendo homenagens ao Guia Espiritual, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, o idealizador da Federação Espírita de Umbanda”. (Cf. Anais, 1942, p. 165). Situação inversa sofreu Tancredo da Silva Pinto, que não rompeu apenas com a Federação Espírita de Umbanda, mas com a própria Umbanda ao criar o Culto de Omolokô (Omolokô, Culto afro-brasileiro que admite no mesmo ambiente tanto as práticas do Candomblé quanto a da Umbanda. Cf. OMULU, 2002). Zélio de Moraes, segundo depoimentos de pessoas que tiveram oportunidade de conviver com ele, tinha personalidade tímida e modesta. “Era uma pessoa que não gostava dos holofotes da ostentação pública”, comenta o jornalista Ronaldo Linares, autor de uma curta biografia do médium, publicada no livro Os Decanos (MESTRE XAMAN, 2003, p.17-27). Não era da personalidade de Zélio arvorar-se em líder da Umbanda, ou “não era este o desejo do plano espiritual”, ponderou Lygia Cunha, neta do médium em conversa informal com o autor desta dissertação. Acredito, portanto, que não era interesse da cúpula umbandista fazer grandes reverências ao médium Zelio de Moraes, pois, como deixa claro Bourdieu, representaria um risco à legitimidade da própria instituição, uma vez que a legitimidade religiosa poderia se deslocar da Igreja instituída para o profeta. Em contrapartida à subordinação de Zélio ao poder da hierarquia eclesiástica, lhe foram concedidos em vida pequenos reconhecimentos pelos serviços prestados a Umbanda, como nomeá-lo para o posto de “inspetor” da Federação, conceder a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade o “diploma de filiada número um”, ou conferindo-lhe o título de “Decano dos Babalawôs da União” (GIUMBELLI, 2003, p. 193-194).

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A partir do momento que a direção da Piedade é transferida para as filhas do médium (Zélia e Zilméia de Moraes) e ele parte para um “exílio” voluntário na Região Serrana do Rio de Janeiro, vindo a falecer alguns anos depois, abre-se espaço para a cúpula umbandista reconhecer a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas como fundadora da religião e Zélio de Moraes como seu pioneiro. Essa atitude vem reforçar o caráter legitimador da hierarquia umbandista, uma vez que ela instituiu o dia 15 de Novembro como o “Dia Nacional da Umbanda”, em assembléia a realização durante o 3º Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda, em 1973, no Maracanãzinho. Este fato ocorreu dois anos antes da morte do médium.

4 – Considerações finais Não queremos aqui defender a tese de que as práticas umbandistas não existiam antes da “anunciação da Umbanda” pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. Pelo contrário, reconhecemos que a manifestação de Espíritos de indígenas e pretos já ocorria a algum tempo nos rituais da Macumba e nas sessões do Espiritismo popular. O que procurei enfatizar neste artigo foi que a manifestação daquele Caboclo marcou o rompimento entre aquilo que era compreendido como “baixo-espiritismo” com o que se convencionou chamar de “Espiritismo de Umbanda” na obra dos intelectuais da nova religião. Para mim, a divisão é clara: o que havia antes era uma seita, fruto de um ritual heterogêneo, praticada por segmentos subalternos da sociedade; o que passou a existir depois foi uma religião que se apropriou da filosofia kardecista e de dogmas cristãos, sendo professada por elementos da classe média em ascensão. Nesta perspectiva, a figura do médium Zélio de Moraes, e do Guia Espiritual que lhe assistiu durante a vida, adquire papel de relevância na trajetória do Movimento Umbandista. Foi a partir da ação deste, dentre outros pioneiros, que se intensificou a busca pela legitimação da nova religião, minimizando-se assim a ação da Delegacia de Tóxicos e Mistificações sobre os Terreiros e a intolerância dos segmentos conservadores da sociedade. Ao longo do processo de consolidação da religião umbandista, foi atribuído a Federação Espírita de Umbanda a dupla função:

1ª) De representante dos interesses dos adeptos junto aos órgãos públicos. 2ª) E de órgão normatizador das práticas umbandistas. Por esse motivo, acredito que os interesses

coletivos sobrepujaram aos interesses particulares, não cabendo, portanto, uma figura messiânica para a Umbanda.

Acredito, igualmente, que Zélio de Moraes estava ciente de seu lugar na religião, mas em nenhum momento arvorou-se em “Papa” da Umbanda nem almejou altos postos na administração daquela instituição representativa. Não quero dizer que ele fosse uma pessoa abnegada e altruísta ao ponto de não ser atraída pelo brilho da notoriedade, mas a humildade foi sua maior virtude. Talvez tenha se espelhado no exemplo do Caboclo das Sete Encruzilhadas que se apresentava dizendo: “sou apenas um Caboclo brasileiro”. (José Henrique Motta de Oliveira - Mestre em História Comparada - UFRJ/ PPGHC) Encontramos também, uma informação curiosa sobre o fato:

O VERDADEIRO LOCAL DA PRIMEIRA MANIFESTAÇÃO DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS Embora não seja um consenso entre os umbandistas, a maioria considera o dia 15 de novembro de 1908, data da primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas no médium Zélio Fernandino de Moraes, como sendo a data de fundação da Umbanda. Embora a menção histórica mais antiga desse fato seja de 1948 (uma foto tirada nesse ano no Centro Espírita Caminheiros da Verdade, na sessão comemorativa dos 40 anos da Umbanda, disponível na página 30 da revista Nossa História de outubro de 2006), os relatos mais popularizados sobre a primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas foram compilados no início da década de 1970, de forma independente, pelos jornalistas Ronaldo Linares e Lília Ribeiro. Em ambas as histórias, obtidas através de entrevistas com o próprio médium Zélio de Moraes, podemos ler que a primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, naquele médium, teria ocorrido em uma sessão realizada na Federação Espírita de Niterói, cujo nome verdadeiro era Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, no dia 15 de novembro de 1908.

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Buscando encontrar registros históricos que comprovassem a veracidade do fato relatado por Zélio de Moraes, o médium Márcio Petersen Bamberg, também conhecido como “mestre Thashamara”, entrou em contato com o Instituto Espírita Bezerra de Menezes, nome atual da antiga Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, e foi informado que no Livro de Atas nº 1, da Federação, não constava nenhuma sessão realizada naquele dia. Um renomado pesquisador da história umbandista, o médium José Henrique Motta de Oliveira, também conhecido como “mestre Arashakamá”, chegou a lamentar na página 94 da sua obra “Das Macumbas à Umbanda”, que se o fato realmente tivesse ocorrido, poderia não ter sido na Federação de Niterói, mas em algum Centro Espírita filiado a ela, cujo nome teria se perdido ao longo da tradição oral. Embora ainda não tenha como comprovar com registros históricos, o nome do Centro Espírita onde teria ocorrido a primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas não se perdeu: o nome dele é Grupo Espírita Santo Agostinho. E como cheguei a esse nome? Tentarei resumir a história para vocês. A primeira idéia veio do próprio médium Márcio Bamberg: naquele mesmo contato com o Instituto Espírita Bezerra de Menezes, ele foi informado que a Federação Espírita de Niterói não possuía sede própria em 15 de novembro de 1908, ocupando uma sala na Rua da Conceição nº. 33, no centro de Niterói, então capital do Estado do Rio de Janeiro. Nas diversas vezes em que eu li essa informação, nunca me chamou a atenção o fato da Federação não possuir sede própria. O estalo para isso veio quando eu li o livro “No Mundo dos Espíritos”, de Antônio Eliezer Leal de Souza. Lá, em sua página 368, Leal de Souza nos diz que a Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro era filha do Grupo São João Baptista e abrigava nas salas de sua sede, além deste grupo, mais dois Centros Espíritas, isso em 1924. Quando eu li essa informação, pensei na hora: se a Federação abrigava Centros Espíritas em suas dependências em 1924, será que a sala que ela ocupava em 1908 não era uma sala da sede do Grupo São João Baptista, Centro que lhe havia dado origem? Com essa idéia na cabeça, entrei em contato com o próprio Instituto Espírita Bezerra de Menezes, buscando comprovar a veracidade dessa informação do Leal de Souza. Para minha surpresa, descobri que a sala que a Federação usava como sede em 1908 não pertencia ao Grupo São João Baptista e, sim, ao Grupo Espírita Santo Agostinho. Nesse mesmo contato, fui informado que ambos, Grupo São João Baptista e Grupo Espírita Santo Agostinho, eram dois dos Centros fundadores da Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, em 30 de junho de 1907, e que dessa data até algum momento da década de 1910, a Federação funcionara na sede do Grupo Espírita Santo Agostinho, na Rua da Conceição nº 33, no centro de Niterói, então capital do Estado do Rio de Janeiro. Assim sendo, quando Zélio foi à Federação Espírita de Niterói, em 15 de novembro de 1908, ele na verdade foi à sede do Grupo Espírita Santo Agostinho, local onde funcionava a Federação. Talvez nunca saibamos qual era a instituição que realizava a sessão naquele dia, mas muito provavelmente não era a Federação, e sim, o Grupo Espírita Santo Agostinho... (Texto de Renato Guimarães) Como o Sr Renato dissertou acima, sobre a possível manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas ter se dado num Grupo Espírita que cedeu seu espaço para o funcionamento da Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, encontramos outra versão dos fatos que disponibilizaremos abaixo. HISTÓRICO DA FUNDAÇÃO DA FEDERAÇÃO ESPÍRITA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO EM NITERÓI Data do início do século passado, as iniciativas da espiritualidade para a união dos espíritas do Estado do Rio em uma associação federativa. A associação “Deus, Cristo e Caridade”, fundada em 25 de junho de 1902, tinha como finalidade principal a construção de um Centro Espírita, onde os adeptos do Espiritismo pudessem se reunir.

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Em 21 de agosto de 1905, o “Grupo Espírita Santo Agostinho” designa uma comissão para angariar donativos para a construção do Centro. Em janeiro de 1907, passa por Niterói o presidente do Centro Espírita de Porto Alegre, RS, Israel Corrêa da Silva, e consegue interessar os espíritas de Niterói para a criação de uma Federação Estadual. Assim, a idéia inicial de construção de um Centro Espírita evolui para a fundação da Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro. O objetivo da nova entidade, de âmbito estadual, é “a congregação e a união dos espíritas”. Fundada em 30 de junho de 1907, seu primeiro presidente é Eugênio Olímpio de Souza. A FEERJ passa a funcionar na Rua da Conceição, 33, a principal de Niterói, pagando aluguel mensal de “60 mil réis”. O terreno para a construção da sede própria custou “três contos e trezentos mil réis” e a obra foi orçada em “25 mil contos de réis.” Em 30 de janeiro de 1922, a FEERJ, reunida para homenagear o Dr. Guilherme Taylor March, o “médico dos pobres”, desencarnado em 21 de junho daquele ano, decide pela construção do Orfanato Dr. March. A pedra fundamental é lançada em 3 de dezembro de 1932, na rua Desembargador Lima Castro, 235 e a inauguração se dá em 3 de outubro de 1934. A construção custou “35 contos e vinte e cinco mil e setenta e cinco réis”... (http://www.iebm.org.br/?pg=historico#ld) Analisando:

Não encontramos registros que diz existir especificamente a “Federação Espírita de Niterói”, em 1908 (somente encontramos um registro com essa denominação, somente em 1920), mas sim, a Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro (FEERJ), sediada em Niterói.

Em 1905, o Grupo Espírita Santo Agostinho designa uma comissão para angariar fundos para construir

a FEERJ.

Diz que em 1907 foi fundada a FEERJ, cujo primeiro presidente era Eugênio Olímpio de Souza, passando a funcionar na Rua Conceição, 33, em Niterói, inclusive pagando aluguel de 60 mil reis.

Se a FEERJ foi fundada em 1907, é fato que já existia. Diz que o primeiro presidente foi Eugênio Olimpio de Souza. Não conseguimos localizar o tal José de Souza, que, possivelmente poderia ser somente um “diretor de mesa”, ou seja, um dirigente capacitado para dirigir os trabalhos espíritas no tal dia, e não um dirigente da Federação em si. Também pode ter acontecido que Zélio de Moraes se enganou no nome do presidente da Federação, dizendo ser Zeca de Souza, e na realidade era o Sr. Eugênio Olimpio de Souza, pois, provavelmente esteve com esse senhor uma ou duas vezes, isso em 1908. Diz que a Federação foi fundada em 1907, funcionando na Rua Conceição, 33, e pagando aluguel de 60 mil reis, então, não podia ser na sede do Grupo Espírita Santo Agostinho, que, em 1905 já existia e não podia ser na Rua Conceição, pois segundo o documento acima, o imóvel havia sido alugado para a FEERJ em 1907. Portanto, pelo acima exposto, podemos dizer que a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas se deu na Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, e não na Federação Espírita de Niterói. A manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas foi no Grupo Espírita Santo Agostinho, ou foi na própria FEERJ, já fundada, conforme informações acima? Podem restar certas dúvidas, mas, o importante e que ela efetivamente se deu, seja num ou noutro.

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FREI GABRIEL MALAGRIDA – O CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS

Vamos a um breve relato da vida de Frei Gabriel Malagrida – o Jesuíta: Uma comprovação da existência do Frei Gabriel Malagrida pode ser feita no livro de Henrique José de Souza, Eubiose: A verdadeira Iniciação, 4ª ed. Rio de Janeiro: Associação Editorial Aquarius, 1978. Segundo Henrique José de Souza: "Gabriel Malagrida, ancião de 80 anos, foi queimado por Verdugos (Inquisição), em 1761" (págs. 250-251). Existe, na Biblioteca de Amsterdã, uma cópia do seu famoso processo, traduzido da edição de Lisboa. Malagrida, com efeito, foi acusado de feitiçaria e de manter pacto com o Diabo, que lhe havia revelado o futuro. A profecia comunicada pelo “inimigo do gênero humano” (quer dizer das profecias comunicadas aos Santos da Igreja, inclusive Santa Odila, que profetizou até a última guerra) ao pobre Jesuíta visionário está concebida nos seguintes termos: “O Réu confessou que o demônio, sob a forma da Virgem Maria, lhe tinha ordenado a escrever a vinda do Anti-Cristo; que havia de existir, a bem dizer, três anti-Cristos sucessivos, e que o último nasceria em Milão, da sacrílega união entre um frade e uma freira, etc.”. E por aí outras tantas coisas que o obrigaram a confessar. No ano de 1689, as margens do rio Como, na Vila de Monagio, nascia um menino que recebeu o nome de Gabriel Malagrida (cujo nome significa: “As vozes harmoniosas de Deus”). Desde cedo Gabriel demonstrou tendências místicas. Entrou para o seminário de Milão onde foi ordenado e professou na Companhia de Jesus em 1711. Gabriel desejava cumprir sua missão no Brasil, porém, Tamborini, o Geral da Companhia de Jesus, havia lhe reservado a cadeira de Humanidades no Colégio de Bastis, na Córsega. Mais tarde conseguiu se transferir para Lisboa, em 1721, onde depois de algum tempo conseguia embarcar para o Maranhão, no Brasil. Gabriel e o Brasil Nessas terras, Gabriel pregou internando-se no sertão, enfrentando sérios perigos e vencendo com a fibra de quem se julgava destinado a cumprir uma missão superior no Planeta, uma missão de conquistar almas para o Céu. Apresentava evidentes sintomas mediúnicos ouvindo vozes misteriosas e chegou mesmo a pensar que operava milagres.

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Em 1727 começou a árdua tarefa de catequizar os índios no Maranhão, conseguindo nessa mesma ocasião amansar a feroz tribo dos Barbassos. Fundou no Maranhão uma missão que teve grande desenvolvimento, sustentando uma peregrinação apostólica. Foi em seguida, em 1730, para a Bahia e Rio de Janeiro onde continuou a pregar, alcançando grande ascendência sobre os índios. Apareceu então, convertido no apóstolo do Brasil. Dizia que conversava com Deus e que lhe aparecia a Virgem Maria, e para completar seus feitos, descrevia os “milagres” que operava. Em 1749 partiu para Lisboa, onde foi recebido com fama de Santo por muitos fiéis. Nessa época Dom João V se encontrava muito doente e Gabriel, a seu pedido, o assistiu nos seus últimos momentos. Em 1751 retornou ao Brasil onde ficou ate 1754, ano em que foi chamado a Lisboa pela Rainha Dona Mariana da Áustria. Encontrou no poder, Sebastião José, o terrível Marquês de Pombal, que não permitiu sua presença por muito tempo junto à Rainha. Por esse motivo, Gabriel se isolou durante algum tempo em Setúbal. Gabriel e a Inquisição No dia 1° de novembro de 1755, Lisboa foi destruída por um terremoto. Correu o boato que a catástrofe era castigo do Céu. Pombal mandou publicar um folheto escrito por um padre, explicando o fenômeno e as causas naturais que o determinaram. Gabriel apareceu em público com um opúsculo, onde procurava corrigir o teor da publicação. Nesse opúsculo, Gabriel afirmava que o terremoto era verdadeiramente um castigo do Céu. Pombal enfurecido mandou queimar o opúsculo e desterrou Gabriel para Setúbal. Em setembro de 1758, ocorreu um atentado contra a vida de Dom José. Algumas semanas antes, Gabriel havia escrito uma carta ameaçadora ao Marquês de Pombal. Gabriel foi preso, em 11 de dezembro, como responsável pelo atentado e encarcerado nas prisões do Estado. Pombal vasculhou seus livros e nessa oportunidade lhe atribuiu passagens que pareciam pouco ortodoxas, e foi entregue a Inquisição. Gabriel foi condenado à pena de garrote e fogueira, sendo executado na Praça do Rossio em 21 de setembro de 1761.

Depois deste fato, a Companhia de Jesus foi declarada ilegal. Todos as suas propriedades foram confiscadas e os jesuítas expulsos do território português, na Europa e no Ultramar. Gabriel Malagrida reencarnou no Brasil (talvez para se refazer da árdua encarnação como jesuíta) se preparando para a importante missão que lhe estava reservada dentro do Movimento Umbandista no século XX, como Caboclo das Sete Encruzilhadas.

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ACORDÃO DOS INQUISIDORES DO PADRE GABRIEL MALAGRIDA

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(Cópia do Acordão (Resolução (acordo) efetuado entre políticos para concretizar ou anular medidas que se encontram em votação, de maneira que os mesmos compartilham benefícios e/ou privilégios (entre si), sem que haja consideração ética) , do arquivo de Diamantino Fernandes Trindade)

A MÉDIUM VIDENTE REVELA UM PADRE JESUÍTA Em 16 de novembro de 1919, o Caboclo das Sete Encruzilhadas revela ao seu médium Zélio de Moraes, uma das existências, na Itália pelo ano de 1689, como padre jesuíta; confirmando a vidência da médium quando de sua primeira manifestação, em 15 de novembro de 1908, na sede da Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, em Niterói: –“Fui padre jesuíta italiano. Nasci na Vila de Menaggio, nas margens do Como em 1689 e morri em Lisboa no ano de 1761. Desde criança que mostrei manifestar tendências para o mais exagerado misticismo. Tendo completado na Itália (Milão) os estudos teológicos, professei na Companhia de Jesus (1711). Quis vir para o Novo Mundo missionar, mas o General da Companhia Tamborini opôs-se ao meu desejo, reservando-me o lugar de professor de humanidade no Colégio de Bastis, na Córsega. Decidi, porém, realizar o meu projeto, conseguindo, mais tarde, partir para Lisboa, em 1721, de onde embarquei para o Maranhão. Por essas terras distantes andei pregando. Internei-me no sertão, afrontando os mais extraordinários perigos e vencendo-os com a intrepidez de um homem que se julga destinado a cumprir na Terra uma missão superior. Julgando-me escolhido para conquistar almas para o Céu, ouvia vozes misteriosas, que me incentivavam a prosseguir na minha cruzada. Cheguei a persuadir-me que fazia milagres. Por obediência às ordens que me foram transmitidas, voltei ao Maranhão, em 1727, para catequizar os índios; sendo essa ocasião que consegui amansar a feroz tribo dos Barbassos, fundando uma missão que teve grande desenvolvimento. Voltando ao Maranhão, em 1730, sustentei uma espécie de peregrinação apostólica. Fui à Bahia e ao Rio de Janeiro e, meti-me no mato a pregar. Tal predomínio alcancei sobre os índios e de tal modo me insinuei no espírito dos crentes, que em pouco tempo tinha sobre eles uma absoluta ascendência. Apareci convertido no apóstolo do Brasil. Diziam que falava com Deus, que me aparecia a Virgem Santíssima, que conversava com os Santos e para completar os meus prodígios, citava os milagres que operava. Com esta forma de santidade, parti para a Europa, em 1749. Após trabalhosa viagem, cheguei a Lisboa. De todos os lados acudiram os fiéis a venerar-me. D. João V, que já se achava no último extremo, acolheu-me com verdadeiro júbilo; teve uma valiosa intercessão minha. Quando D. João V agonizava, fui eu quem o assistiu em sua hora final. Em 1751, voltei ao Brasil e por aqui me demorei até 1754, ano em que cheguei a Lisboa, a chamado da Rainha viúva, D. Mariana da Áustria. Desta vez, encontrei no poder Sebastião José. O Ministro não permitiu que eu me conservasse muito tempo junto a Rainha enferma e, foi por esses e outros motivos que me ausentei para Setúbal, para não sofrer a presença do Ministro. Por seu lado, Pombal deixou-me em paz, mas os acontecimentos vieram pôr-me em foco e atirar-me para ruína total. Arrasada Lisboa pelo terremoto, espalhou-se que a enorme catástrofe fora um castigo do Céu. Para contrariar estas informações, mandou o Ministro compor e publicar um folheto escrito por um padre, explicando o fenômeno e as causas naturais que o determinaram. Apareci em público com um opúsculo: “Juízo da Verdadeira Causa do Terremoto”, que padeceu a Corte de Lisboa no dia 1º de novembro de 1755. Nesse opúsculo, procurei retificar o que se lia no folheto que Pombal mandou distribuir, asseverando que o terremoto fora efetivamente um castigo do Céu. Pombal, irritado, limitou-se a mandar queimar o opúsculo e a desterrar-me para Setúbal. Chega o ano de 1758 e, no mês de setembro, ocorreu o atentado contra a vida de D. José e eu, que antes tinha uma carta ameaçadora ao Primeiro-Ministro, fui preso, em 11 de dezembro, e transferido para o Colégio da sua Ordem em Lisboa, considerado réu dessa majestade e encerrado nas prisões do Estado em 11 de janeiro de 1759. Pombal, que já tinha posto os jesuítas fora do reino, achou que a ocasião era excelente para exaltar a campanha com conceito popular e, eu seria a vítima. Rebuscaram os meus livros e nesta oportunidade me atribuíram passagens que pudessem parecer pouco ortodoxas e, entregue à Inquisição, fui condenado à pena de garrote e da fogueira. Sentença executada na Praça do Rossio, em Lisboa, a 21 de setembro de 1761. Meu nome: Frei Gabriel Malagrida. (Umbanda – A Manifestação do Espírito para a Caridade – Sérgio Estrellita da Cunha) Frei Gabriel Malagrida, após anos de contato amistoso e amigável com os indigenas no Brasil, efetuando um trabalho explêndido de evangelização, respeitando a religiosidade dos indigenas, posteriormente, voltou ao pais que amou, o Brasil, encarnado como um silvicola. Será que tudo isso foi a toa: Coincidencia?

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Em época, com certeza, já estava sendo traçada a formação da Umbanda. Um indio brasileiro (Sete Encruzilhadas), com formação concreta calcada no Evangelho Redentor (foi padre numa vida anterior, especializado em catequização), conseguiu arrebanhar e instruir, tanto indios como ex-escravos, já em Aruanda, para trabalhos caritativos no que seria a Umbanda. O plano espiritual superior é sabio. Portanto, não e pelo fato do Caboclo das Sete Encruzilhadas ter sido um frei em vida anterior, que influenciou a Umbanda com noções e doutrinas católicas, mas sim, normatizou-a com conceitos verdadeiros, trazendo para a Umbanda o Evangelho Redentor, o respeitabilissimo Pentatêuco Kardequiano, os ensinamentos crísticos, a razão, o que é bom e certo, rejeitando o que é mal e supérfluo. O Caboclo das Sete Encruzilhadas, a exemplo de quando esteve encarnado como Frei Gabriel Malagrida, continuou, como Guia Espiritual, a missão na área caritativa e de orientação, agora através dos Guias Espirituais da Umbanda, oferecendo a ciência da vida para todos nós. QUEM SÃO OS JESUITAS? Os jesuítas são padres da Igreja Católica que fazem parte da Companhia de Jesus. Esta ordem religiosa foi fundada em 1534 por Íñigo López, mais tade conhecido como Inácio de Loyola.

Filho mais novo de um nobre basco de antiga família, nasceu no Castelo de Loyola, perto de Azpeitia, no País Basco. Quando jovem, foi soldado e lutou no cerco de Pamplona pelos franceses, em 1521, sendo gravemente ferido em combate (uma bala de canhão quebrou-lhe as duas pernas). Em sua longa convalescença, leu muito sobre a vida de Cristo e dos Santos e, finalmente, resolveu dedicar sua vida a serviço de Deus. Após um ano de retiro na Catalunha, fez uma peregrinação a Jerusalém. De 1524 a 1534, consagrou-se aos estudos e graduou-se mestre em letras pela Universidade de Paris. Nessa cidade, desenvolvia um trabalho evangélico junto ao povo e, como era leigo, despertou suspeitas entre as autoridades da Igreja. De qualquer forma, agrupou ao seu redor sete estudantes (entre os quais o futuro São Francisco Xavier) com o intuito de catequizar os muçulmanos na Palestina. Diante da impossibilidade da missão o grupo, agora com dez integrantes, apresentou-se ao papa Paulo III e colocou-se a sua disposição para quaisquer fins. Assim fundou-se a Companhia de Jesus, em 1540, quando Paulo III deu à associação o título de ordem religiosa, da qual Inácio, padre desde 1537, foi o primeiro superior-geral, atribuindo-lhe como objetivo a reconquista católica em regiões protestantes. De fato, os jesuítas constituíram a linha de frente da contra-reforma a serviço do papado – ao qual prestavam um voto especial de obediência. A educação foi considerada por Inácio de Loyola o principal instrumento de reconquista dos protestantes e de catequização dos gentios. Assim, os jesuítas fundaram missões, retiros, colégios e universidades. Seu papel na colonização do Brasil, por exemplo, merece destaque, em especial pela contribuição dos padres José de Anchieta, Manoel da Nóbrega, Antonio Vieira e Gabriel Malagrida. Inácio de Loyola modelou a espiritualidade elevada e dinâmica de seus

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religiosos a partir de seu livro “Exercícios Espirituais”, um clássico da literatura espiritual muito difundido ainda nos dias de hoje, graças aos muitos retiros pregados e dirigidos pelos jesuítas. Foi canonizado em 1622 A Companhia de Jesus foi criada logo após a Reforma Protestante (século XVI), como uma forma de barrar o avanço do protestantismo no mundo. Portanto, esta ordem religiosa foi criada no contexto da Contra-Reforma Católica. Os primeiros jesuítas chegaram ao Brasil no ano de 1549, com a expedição de Tomé de Souza. Objetivos dos jesuítas:

Levar o catolicismo para as regiões recém descobertas, no século XVI, principalmente às Américas;

Catequizar os índios, transmitindo-lhes as línguas portuguesa e espanhola, os costumes europeus e a religião católica;

Difundir o catolicismo na Índia, China e África, evitando o avanço do protestantismo nestas regiões;

Construir e desenvolver escolas católicas em diversas regiões do mundo.

Tivemos alguns Espíritos encarnados no Brasil como jesuítas, que tiveram grande ascendencia na formação espiritual do nosso país. Frei Gabriel Malagrida (Umbanda), Padre José de Anchieta/Frei Fabiano de Cristo (Kardecismo) e Padre Manoel da Nóbrega (Kardecismo). Coincidência existirem três Espíritos reencarnados em terras brasileiras, todos jesuítas, que influenciaram decisivamente a religiosidade de uma nação??? Só por curiosidade: Alguns Espíritos atuaram desde o início da história no Brasil, para que pudesse tornar-se um celeiro de onde o Evangelho Redentor irradiar-se-ia por toda a parte. Estavam encarnados os Espíritos de Frei Gabriel Malagrida (cuja história já contamos acima), Padre Manoel da Nóbrega, e o Padre José de Anchieta , e todos eles tiveram presença decisiva na evolução das idéias sociais e humanas em nossa terra. PADRE JOSÉ DE ANCHIETA

O Padre José de Anchieta foi um dos que impediram a implantação de tribunais inquisitoriais no país, rejeitando qualquer atitude discriminatória ou de perseguição. A instalação da absurda inquisição criaria aqui, sem dúvida, muitos miasmas e matrizes na contabilidade reencarnatória dos paulistanos e brasileiros, criando embaraços para seu desenvolvimento cultural e humano. O Padre Anchieta representou uma presença marcante na história da cidade desde seu início. Lingüista, dramaturgo, prosador e poeta, considerado o pai da literatura brasileira, constituindo praticamente o Quinhentismo no país, sendo um dos fundadores, juntamente com o Padre Manoel da Nóbrega, do famoso Real Collegio de São Paulo.

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O ambiente era muito primitivo, sendo necessário muito desprendimento e abnegação para enfrentar o cotidiano da época. Foi um grande defensor e protetor dos índios Guaranis. O PADRE JOSÉ DE ANCHIETA REENCARNOU COMO FREI FABIANO DE CRISTO

O Frei Fabiano de Cristo (1676-1747) nasceu em Aldeia Soengas/Portugal, registrado com o nome de João Barbosa. Ouvindo falar das minas de ouro e outros metais preciosos no Brasil, o jovem João se entusiasmou em vir conhecer o país, o que ocorreu em início do século 18. Seguiu para a Vila de Parati, na enseada de Angra dos Reis, onde passou a fazer a Carreira das Minas, percorrendo as cidades do atual Vale do Paraíba. Algo faltava em João Barbosa, como um ardor religioso latejava em seu coração e, em 1704, se desfez de todos os bens e foi para o Rio de Janeiro, no Convento Santo Antônio do Rio de Janeiro, pleitear seu ingresso na Ordem, sendo-lhe dado o nome de Fabiano. Começaram as manifestações de erisipela crônica, que muito fizeram sofrer Fabiano. Era por todos admirado, por sua simplicidade, paciência, humildade, sempre se aprestando ao trabalho, na caridade junto aos sofredores. Frei Fabiano, como Espírito, inspirou a criação de uma das mais notáveis instituições espíritas de Assistência Social do país, que atende na Capital mais de duas mil famílias. O ensino continua a ser um compromisso de Frei Fabiano/Anchieta. Este Espírito, que acompanhou o trabalho da Casa Transitória desde o início, oficializou sua presença na própria designação da instituição e ainda tem inspirado muitas outras instituições espíritas espalhadas por todo o Brasil. O ESPÍRITO FABIANO DE CRISTO TRABALHANDO PELA ASSISTÊNCIA SOCIAL ESPÍRITA Fabiano de Cristo é um nome que está estritamente vinculado às iniciativas de várias instituições espíritas que prestam trabalho de assistência social. A CAPEMI (Caixa de Pecúlio dos Militares), fundada pelo espírita Sr. Jaime Rollemberg (1913-1978), também criou o Lar Fabiano de Cristo e várias casas de amparo aos carentes em vários Estados do Brasil (do Amazonas ao Rio Grande do Sul), socorrendo os menos favorecidos pela sorte. PADRE MANOEL DA NÓBREGA Manuel da Nóbrega (1517-1570) nasceu em Minho/Portugal e chegou ao Brasil em 1549. Exerceu importantes papéis na atividade colonizadora, destacando-se a defesa da liberdade dos índios, criação de aldeias; cultivou a música na evangelização; promoveu o ensino das primeiras letras nas escolas: ler e escrever; fundou colégios em Salvador, Pernambuco, São Paulo e no Rio de Janeiro.

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O Padre Manuel da Nóbrega, como homem de fé, pronunciou como últimas palavras antes de morrer: Eu vos dou graças, meu Deus, Fortaleza minha, Refúgio meu, que marcastes de antemão este dia para a minha morte, e me destes a perseverança na minha religião até esta hora.

O PADRE MANOEL DA NÓBREGA PARTICIPOU DA CODIFICAÇÃO ESPÍRITA COMO EMMANUEL O Espírito Manuel da Nóbrega, que se manifesta espiritualmente como Emmanuel, ditou mensagem na Codificação Espírita, que consta em O Evangelho segundo o Espiritismo, Cap. XI, 11, intitulada O egoísmo (Paris, 1861), como um obstáculo ao progresso. EM ENCARNAÇÃO ANTERIOR, O PADRE MANOEL DA NÓBREGA TERIA SIDO O SENADOR ROMANO PÚBLIUS LÊNTULUS, CONHECIDO POR NÓS COMO O ESPÍRITO DE EMMANUEL

Espírito de Emmanuel

O Espírito Emmanuel começou a manifestar-se ao médium Chico Xavier em 1927, orientando-o e conduzindo-o no roteiro cristão à luz da Doutrina Espírita. Através de Chico Xavier ditou mais de cento e quinze livros (nove em parceria com outros Espíritos), obras essas que totalizaram mais de sete milhões de exemplares.

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ESTÓRIA DA ENCARNAÇÃO NO BRASIL DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS

Nota do autor: achamos esse relato interessante, mas, por falta total de comprovação histórica documental e testemunhal, tachamo-la de “estória”. Por curiosidade, vamos disponibilizá-lo: Esta história chegou até nós, da T.E.F.L. (Tenda Espírita Fraternidade da Luz – fundada em 08 de Abril de 1948, por Henrique Landi Júnior), há muitos anos através de uma entidade – um Caboclo de Oxossi – enviado do Caboclo das Sete Encruzilhadas, cujo médium não temos informação se ainda está encarnado. Resolvemos passar este relato, para a forma escrita, para que não se perca na bruma do tempo e da nossa memória. Ao que se tem informação, é que o Caboclo das Sete Encruzilhadas, é um Espírito muito antigo, já encarnado ao tempo da vinda do Mestre Jesus à Terra e que na roda de suas encarnações , jamais apareceu no nível em que trabalham os nossos “compadres” Exus, como alguns, face à semelhança de nomes, tentam explicar. Ao tempo do Brasil Colônia, mais precisamente no Estado do Rio de Janeiro, em uma localidade às margens do Rio Paraíba do Sul, chamada hoje de Barra do Piraí. Precisamente neste local, o rio atingia uma grande largura e o seu leito tomava um aspecto sinuoso, ali existia uma fazenda de diversas culturas, entre as quais e em maior escala, a do café e da cana-de-açúcar. Tal propriedade era administrada por uma família portuguesa, que ao contrário de outras existentes nas proximidades, ali não era exigido o braço escravo. Os negros que lá trabalhavam, recebiam além da casa e alimentação, uma remuneração em moeda, por isso era a propriedade mais próspera do local, isto graças à forma de administração adotada por seus proprietários. Próximo dali vivia uma tribo de índios da Nação Tupi-Guarani, com os quais, os fazendeiros mantinham um excelente relacionamento. O Chefe da tribo era moço e possuía uma razoável cultura, pois fora alfabetizado na Capital, apaixonou-se por uma das filhas do fazendeiro, que correspondeu ao seu afeto vindo a casar-se com ele, contrariando os costumes de ambas as comunidades.

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Após a união, ela engravidou, tendo que viajar a Capital do Rio de Janeiro para tratamento médico, demorou-se algum tempo e ao regressar recebeu uma horrível notícia: que um grupo de índios estranhos na localidade, de surpresa, tentaram invadir a fazenda para saqueá-la, os fazendeiros pediram socorro e os guerreiros Tupi-Guarani, vieram, mas não puderam impedir que os pais da moça e seus irmãos fossem mortos. Na batalha, o chefe Tupi-Guarani, seu marido, ficou gravemente ferido, vindo também a falecer em conseqüência. Ao todo, sete pessoas foram assassinadas pela tribo invasora. E todos foram sepultados, em uma ilha situada no Rio Paraíba do Sul, dentro da fazenda. E a moça grávida, única remanescente da família de fazendeiros, ia todas as tardes rezar na ilha, junto às sete cruzes que demarcavam os locais onde seus pais, irmãos e esposo foram sepultados. Porém, em uma dessas tardes, em que rezava junto ao túmulo do esposo, sentiu-se em trabalho de parto e ali mesmo deu à luz a um menino, seu filho com o chefe Tupi-Guarani, cujo corpo estava naquele local sepultado. O menino cresceu cercado do imenso carinho de sua mãe e recebeu ensinamento proveniente de duas culturas: a cristã adotada por sua mãe e a outra orientada pelo Pajé da tribo de seu pai. Estudou na Capital do Estado e posteriormente na Corte, recebendo instrução superior de Direito. Como advogado teve intensa atividade profissional em defesa de escravos nos Tribunais do Rio de Janeiro, que eram acusados de crimes pelos senhores escravagistas. Na qualidade de chefe de sua comunidade indígena, disfarçadamente, invadia as fazendas de regime escravo, libertando os cativos e colocando-os em local seguro. Na verdade ninguém conseguia identificar o chefe que comandava o grupo indígena libertador de escravos, ora ele se apresentava com o aspecto físico de indivíduo alto, ora baixo, às vezes gordo e outras vezes magro, cada ataque era comandado por uma pessoa diferente e assim ele conseguia se manter no anonimato, conseqüente a dupla personalidade. O seu verdadeiro nome era Caboclo das Sete Cruzes Ilhadas, por ter nascido no local onde existiam sete cruzes em uma ilha, porém o povo por corruptela o chamava de Caboclo das Sete Encruzilhadas, nome que ele adotou humildemente, até mesmo em sua vida espiritual. Tal nome ficou fixado pelo povo escravo, que o adorava, e quando o grupo surgia na estrada eles cantavam uma toada que tinha a seguinte letra:

“Lá vem, lá vem, bem longe na estrada. Lá vem, lá vem, o Caboclo das Sete Encruzilhadas”.

Após ter desencarnado, voltou através da mediunidade de Zélio Fernandino de Moraes, em novembro de 1908, como Espírito mensageiro, colocando as bases da Umbanda, no Rio de Janeiro. (Henrique Landi – G.E.E.H.L. Jr da Tenda Espírita Fraternidade da Luz)

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FOTOS GERAIS DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE, EM BOCA DO MATO – CACHOEIRA DE MACACÚ

Cabana do Pai Antonio, sede da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, atualmente

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Zilméia de Moraes manifestada com a Preta-Velha Vó Tiana

Zilméia manifestada com o Caboclo Branca Lua firmando a Mesa de Umbanda

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Zélia manifestada com o Caboclo Sete Flechas, firmando a Mesa de Umbanda

Zélia manifestada com o Caboclo Sete Flechas firmando a Mesa de Umbanda

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Caboclo Sete Flechas (mãe Zélia), Caboclo Branca Lua (mãe Zilméia) firmando a Mesa de Umbanda

Médium cumprimentando a Mesa de Umbanda na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade

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Médium firmando a Mesa de Umbanda na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade

Mãe Ziméia e médiuns da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade

Fotos antigas de médiuns da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade:

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Mãe Zilméia de Moraes com a Preta-Velha Tiana

Médiuns da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade

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Assistido recebendo passe de um Caboclo na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade – 1990 (Arquivo

de Diamantino F. Trindade)

Atendimento Fraterno com Pretos-Velhos na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade – 1990 (Arquivo

de Diamantino F. Trindade)

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Vó Tiana manifestada em Zélia de Moraes, atendendo – 1990 (Arquivo de Diamantino F. Trindade)

Caboclo Sete Flechas manifestado em Zélia, procedendo ao Amaci – 1985 (Arquivo de Diamantino F.

Trindade) Fotos atuais da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade em Cachoeira de Macacú:

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Mesa de Trabalho

Preparação da Mesa de Trabalho

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Lygia Cunha (neta de Zélio de Moraes), atual dirigente, manifestada, em atendimento fraterno

Fotos externas da Cabana de Pai Antonio:

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As fotos externas pertencem ao arquivo do Sr. Felipe Deininger Hlibka Em São Gonçalo/RJ, no bairro Camarões, existe a Rua Zélio de Moraes.

Zélio de Moraes, fundador da Umbanda é homenageado com nome de rua, em Santa Cruz, na cidade do Rio de Janeiro/RJ O Prefeito César Maia do Rio de Janeiro atendeu à proposta do vereador Átila Nunes, dando o nome de uma Rua no bairro de Santa Cruz ao instituidor da Umbanda, Zélio Fernandino de Moraes, o médium do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Segundo César Maia, “a homenagem não é apenas ao fundador dos princípios da Umbanda no Brasil, mas como também uma homenagem ao centenário dessa religião”. Para o Prefeito carioca, a proposta do vereador Átila Nunes vai ao encontro de milhões de brasileiros que professam a Umbanda, incluindo os cariocas. O decreto do prefeito César Maia dando o nome de Zélio de Moraes a uma rua do município, foi publicado no diário oficial do Rio de Janeiro no último dia 21 de agosto. Art. 1.º: Fica reconhecido como logradouro público da Cidade do Rio de Janeiro, de acordo com o PAA 8161/PAL 25028, aprovado em 23/06/1964, e tendo em vista o Decreto n.º 5.625, de 27 de dezembro de 1985, com denominação oficial aprovada de “RUA ZÉLIO DE MORAES”, o logradouro antes conhecido como Rua P, que começa na Avenida Roberto Moura, lado par, 140 metros depois da Rua Agaí e termina na Rua Agaí, com 398 metros de extensão. Art. 2.º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Rio de Janeiro, 20 de agosto de 2008 — 444.º ano da Fundação da Cidade

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ZÉLIO FERNANDINO DE MORAES

67 ANOS DE TRABALHO MEDIÚNICO ININTERRUPTO NA UMBANDA

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“Zélio de Moraes foi um médium exemplar e com o Caboclo das Sete Encruzilhadas se conjugaram numa brilhante missão. Foram vanguardeiros ostensivos que plantaram as primeiras sementes da reação e do protesto doutrinário, contra as práticas fetichistas das matanças e dos sacrifícios a divindades,... etc.” (palavras de W. W. da Matta e Silva).

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Zélio Fernandino de Moraes e sua esposa Maria Isabel de Moraes (1968)

Arquivo particular de Diamantino Fernandes Trindade Zélio de Moraes casou-se muito cedo com Maria Izabel de Moraes. Tiveram quatro filhos, sendo eles Zélio Morse de Mores, Zélia de Moraes, Zarcy Morse de Moraes e Zilméia de Moraes. Somente suas filhas, Zélia e Zilméia seguiram o mediunato na Umbanda. Zarcy Morse de Moraes seguiu a carreira futebolística, jogando profissionalmente no Botafoto FC, e segundo seus familiares, posteriormente, no Societa Sportiva Palestra Itália em São Paulo:

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Altar particular de Zélio de Moraes

MENSAGEM DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS – SER ESPÍRITA “Ser Espírita é ser clemente, É ter alma de crente, Sempre voltada para o bem! É ensinar ao que erra, Entre os atrasos da Terra, Não fazer mal a ninguém. É sempre ter por divisa, Tudo o que é nobre e suaviza, O pranto, a dor, a aflição. É fazendo a caridade, Evitar a orfandade, O abismo da perdição. Em Deus, sempre ter crença Profunda, sincera e imensa, Consubstanciada na fé. É guardar bem na memória, Os bons conselhos e as glórias, De Jesus de Nazareth.

É perdoar a Injúria, De quem já não tem um pão. É se tornar complacente, Para o inimigo insolente, Tendo por lema o perdão!

Ser Espírita é ser clemente, É ter a alma de crente, Sempre voltada para o bem! É ensinar ao que erra, Entre os atrasos da Terra, Não falar mal de ninguém”.

(20 Jan 1933 – Caboclo das Sete Encruzilhadas através do seu médium: Zélio de Moraes)

Mensagem de Zélio Fernandino de Moraes O conteúdo de nossas mentes é o que trazemos ao mundo que nos cerca, ao mundo de cada um, e que nos acompanha. Agora, mais do que nunca, eu compreendo a palavra de Cristo: “Bem-aventurados os puros de coração”. Sim, verdadeiramente felizes são os que não enxergam tristezas, os que não prejudicam a ninguém com seu julgamento. Esses são felizes.

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Nós outros, que queremos seguir outras trilhas: a da justiça com as próprias mãos; a do julgamento segundo nossa própria bitola da vida; a justiça segundo nossas verdades. Nós nos deparamos com o reflexo de tudo isso num grande espelho onde se refletem nossas ansiedades injustificadas, que reduzem a vitalidade do corpo e aprisiona o Espírito. A vida após a morte não deveria ser espetáculo de surpresas para quem trabalhou anos a fio na mediunidade. Servindo de ponte entre Espíritos e homens, passamos grande parte fazendo, e pouco tempo pensando, aproveitando os ensinamentos e conversando com aqueles que estão ao nosso lado em silêncio, mas que não muitas vezes detentores de muitas verdades – não as “nossas” verdades, mas ensinamentos que devem ser compartilhados. Até hoje não me pediam a palavra. Respeitei o não pedido. Mas agora que o fazem, deixem-me alertá-los: Conversem mais entre vocês – umbandistas, espíritas, cristãos. Vivam mais em alegria de confraternização e não em disputa de quem é maior, ou melhor. Aos olhos de Deus somos filhos iguais. Fazem-nos constantemente vingadores de uma causa que não é mais justa: nosso amor próprio ferido. Temos que ser tão superiores de modo a que o nosso amor amorteça as pedradas, e retornemos ao ofensor amando. É necessário aprender na escola da vida, sabendo humildemente absorver problemas, transformando-os em exemplos edificantes de resgates de dívidas. Meus filhos; que eu poderia dizer-lhes mais do que se amem e se compreendam, para que a par de toda a cultura espiritualista de que são detentores, não lhes sejam cobrados minutos de atenção e gentileza ao amigo ou à criança que sofre. Deus seja louvado. Que adianta trabalhar 20 anos se em um minuto nos negarmos a calar e escutar com carinho e paciência aqueles que nos procuram, por certo com carência, por necessidade de amor? Abraços do sempre amigo, Zélio de Moraes. (Zélio de Moraes – FUGABC – Federação Umbandista do Grande ABC – revista: “Mensagens e Orações de Umbanda” – Editora Modus – nº 01) Em 1967, após 59 anos de atividade junto a Tenda Nossa Senhora da Piedade, Zélio entregou a direção dos trabalhos às suas filhas Zélia (Falecida em 2001) e Zilméia (falecida em 2010) e passou a viver em “Boca do Mato” (localidade do Município de Cachoeiras de Macacú, a 160 quilômetros do Rio de Janeiro) ao lado de sua esposa Dona Isabel (falecida em 1981), médium do Caboclo Roxo. Nesse recanto, privilegiado da Natureza, continuou a atender os necessitados do corpo e da alma, na “Cabana de Pai Antonio”. Ronaldo Linares, presidente da Federação Umbandista do Grande ABC, em época, gravou uma mensagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas, através de seu aparelho: “Meus irmãos: sejam humildes. Tragam amor no coração para que vossa mediunidade possa receber Espíritos superiores, sempre afinados com as virtudes que Jesus pregou na Terra, para que as necessidades possam encontrar socorro nas nossas casas de caridade. Aceitem meu voto de paz, saúde e felicidade com amor”. A última mensagem de Zélio de Moraes é de 1973 e foi transmitida através de Ronaldo Antônio Linares pela Rádio Cacique de São Caetano do Sul. Era assim: “Umbandistas de São Paulo. A vocês todos eu desejo muita paz e felicidade. Há muita gente em São Paulo que me conhece, pois por aí passei muitas vezes, curando doentes com rezas e preces. Com a fé que tenho muita gente ficou curada. Por isso, a esses irmãos de São Paulo, aos umbandistas que praticam a Umbanda sem pensar na vil moeda, no dinheiro, o meu abraço fraternal. O dinheiro estraga os homens e as mulheres. A vocês umbandistas sinceros, eu desejo muitas felicidades. Que Jesus irradie as vossas casas e os vossos corações. Que Jesus permita que as falanges do bem, que assistem a Umbanda de humildade, amor e caridade pura, a Umbanda criada pelo Caboclo das Sete encruzilhadas, que é uma corrente poderosa, possa levar a cada lar uma centelha de luz, retirando de vossas casas os Espíritos que estejam nas trevas, para que todos os enfermos sejam curados. Desejo a vocês paulistas, paz, saúde e felicidade. Salve a nossa Umbanda de humildade, amor e caridade”. Ao terminar sua missão entre nós, Zélio desencarnou em 03 de Outubro de 1975, aos 84 anos; contava 67 anos dedicados às atividades mediúnicas ininterruptas, pois até quase às vésperas de sua “morte”, continuava atendendo aos necessitados, realizando curas, dando provas constantes de sua clarividência.

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Enfermo, deixara o sítio de Boca do Mato e permanecia na casa das Neves, em tratamento. No dia 30 de setembro, dizia ele ao genro, Dr. Júlio de Oliveira Castro, que o visitava diariamente: - Só mais três dias e estarei bom. Realmente, três dias depois Zélio passava à vida espiritual. Durante toda vida lutou por uma Umbanda pura, simples, honesta, não corrompida pelo dinheiro, com médiuns “dando de graça o que de graça estavam recebendo de Deus”. Zélio Fernandino de Moraes dedicou 67 anos ininterruptos, ilibados, de sua vida à Umbanda, tendo retornado ao plano espiritual em 03 de outubro de 1975, com a certeza da missão cumprida.

Túmulo onde estão os restos mortais de Zélio de Moraes, no Cemitério de Maruí, em São Gonçalo

Seu trabalho e as diretrizes traçadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas continuam em ação através de sua neta, Srª Lygia Cunha, que têm em seu coração um grande amor pela Umbanda, árvore frondosa que está sempre a dar frutos a quem souber e merecer colhê-los. Paz e luz ao seu Espírito amigo, tolerante, humilde. Deus te abençoe irmão. Pouco tempo depois do desencarne de Zélio, o noticioso “Macaia”, dirigido por Lilia Ribeiro, apresentava o seguinte texto:

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ALGUNS ASPECTOS DA VIDA DE ZÉLIO FERNANDINO DE MORAES Encontramos um texto muito interessante sobre a vida de Zélio de Moraes, pois nunca soubemos sua vida profissional, e do seu sustento, já que ele não vivia da Religião de Umbanda. No site: “www.povodearuanda.com.br“, encontramos uma parte de sua vida até agora obscura: ZÉLIO DE MORAES – VEREADOR

Partes do texto que nos chama atenção:

“(...) cujo pai, fazendeiro, foi o primeiro a exportar frutos dos laranjais gonçalenses para a Inglaterra no princípio do século passado”.

Povo de Aruanda – Aqui o texto mostra a atividade do pai de Zélio. “Casado com dona Isabel de Moraes, com ela teve duas filhas, Zélia e Zilméia, (nota do autor: na verdade, Zélio de Moraes teve quatro filhos: Zélia de Moraes, Zilméia de Moraes, Zélio Morse de Moraes e Zarcy Morse de Moraes) e às quais passou a direção da Tenda original em 1963 e mudou residência, com a esposa, para Boca do Mato, em Cachoeiras de Macacú, RJ, onde faleceu em 03-10-1975.”

Povo de Aruanda – Aqui o texto dá o ano exato da mudança de cidade de Zélio, quando ele transferiu-se para a Boca do Mato – Cachoeiras do Macacú (RJ).

“(...) sendo a última delas em Neves, onde criou uma escola primária para as crianças pobres do bairro, e começou a expandir sua crença por todo o território nacional”.

Povo de Aruanda – Aqui um outro fato que é do desconhecimento de muitos ou mesmo da maioria, na Rua Floriano Peixoto nº. 30 Neves – São Gonçalo – RJ, na T.E.N.S.P. (Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade) funcionou uma escola primária. Aqui um dos fatos que mais nos chamou atenção dos nossos irmãos Edenilson Francisco e Renato Henrique Guimarães Dias, com toda certeza é a parte que mais irá chamar a atenção de todos e vos falo que tenho toda a saga documentada através de e-mails trocados pelo irmão Edenilson Francisco para poder confirmar tal fato, tanto que ele e o irmão Renato Henrique ficaram eufóricos quando o senhor Jorge César Pereira Nunes os atendeu prontamente e ainda nos enviou as fotos para confirmar os fatos. Vamos subdividir o trecho acima; daí farei alguns comentários.

“Zélio, entretanto, não se dedicava apenas à sua crença. Como era norma não receber recompensa pelo bem distribuído, dedicava-se às atividades profissionais normais, assumindo os negócios de seu pai (...)”

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Povo de Aruanda – Interessante e ao mesmo tempo raro isso acontecer, infelizmente muitos Pais e Mães de Santo, vivem do Santo e não para o Santo, mas vamos à frente...

“Zélio, entretanto, não se dedicava apenas à sua crença. Como era norma não receber recompensa pelo bem distribuído, dedicava-se às atividades profissionais normais, assumindo os negócios de seu pai, e fez uma incursão na política, elegendo-se vereador em 18-05-1924 e empossado em 10 de junho seguinte. Foi reeleito para um segundo mandato em 10-04-1927, empossado no dia 30 seguinte e escolhido por seus pares, na mesma data, para secretário do Legislativo Gonçalense. Após cumprir o mandato de três anos, afastou-se da política. Quando de seu falecimento, a Câmara Municipal deu seu nome à Rua (Vereador) Zélio de Moraes, no bairro de Mangueira.”

Povo de Aruanda – Sim vocês estão lendo corretamente; Zélio de Moraes foi vereador e foi reeleito vereador da Cidade de São Gonçalo; ele como vereador preocupava-se muito com as escolas públicas, segundo o irmão Eder (filho da T.E.N.S.P.) ele conversou a respeito do assunto com dona Zilméia e ela o disse que realmente seu pai foi vereador e todo o salário era revertido na ajuda a população carente de São Gonçalo, tal como ele diminuiu em grande parte seu patrimônio em caridade ao povo tão sofrido de São Gonçalo.

O Senhor Jorge Cesar Pereira Nunes, contato dos irmãos Edenilson e Renato, diz em um de seus e-mails assim: “Na Câmara Municipal de São Gonçalo não há anais das sessões, razão pela qual pouco consegui saber da vida parlamentar dele, de vez que as atas das sessões são resumidíssimas. Os jornais da época (e só havia um na cidade) falam pouco sobre os vereadores e, no caso do Zélio, a ele se referem sempre respeitosamente, por ocasião de seu aniversário de nascimento. Para maior esclarecimento, estou enviando, em anexo:

1ª) O texto original que escrevi, e que foi modificado para inclusão no site da Revista de História; e, 2ª) As fotos da página do jornal “A Gazeta”, com foto do Zélio, de 1929, quando era anunciada a

candidatura dele à reeleição”. Povo de Aruanda – Com toda certeza isso é uma grande perda, as Atas serem resumidas na ocasião, mas o que interessa é que temos mais um pedaço da história de nossa querida religião, e principalmente fotos para comprovarmos a verdade, pois aqui em Povo de Aruanda primamos pela verdade sempre.

As fotos e a reportagem devemos aos incansáveis irmãos Edenilson Francisco e Renato Henrique Guimarães Dias, esses irmãos que conseguiram resgatar a matéria em questão e as fotos históricas que estão aqui; temos que aplaudir a iniciativa desses irmãos... Encontramos num periódico de São Paulo, o reconhecimento do Zélio de Moraes como vereador fluminense:

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Encontramos no periódico “Correio da Manhã”, de 1933, na seção de Junta Comercial, que Zélio de Moraes era sócio de uma empresa de mineração na mina de carvão Pinhal da Gama, situada no município de Siqueira Campos, no Estado do Paraná. A empresa chamava-se – “Hulha Brasileira Companhia Limitada”.

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UMBANDA NÃO FAZ O SANTO NEM FEITURA DE CABEÇA

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O Jornal “Notícias Populares” (acima), de São Paulo, publicou uma matéria em 15 de junho de 1977 onde o tema abordado era feitura de santo e de cabeça na Umbanda. Nessa matéria, Zélio de Moraes apresenta uma mensagem aos umbandistas de São Paulo: A INDÚSTRIA DE “FAZER SANTO” É UMA VIGARICE O fundador da Umbanda, o Caboclo das Sete Encruzilhadas (que foi padre em vidas anteriores), ao se incorporar no médium fluminense Zélio de Moraes, ditou as normas de como deviam funcionar os Terreiros de Umbanda, praticando a caridade gratuita; sem tocar tambores (atabaques) nem palmas no acompanhamento dos cânticos; fazer desobsessão (descargas) transportando os Espíritos maus para os médiuns de incorporação, doutrinando-os e afastando-os, aliviando os doentes, curando-os da falsa loucura. Zélio de Moraes, que faleceu aos 83 anos, em 1975, ao ser entrevistado por Ronaldo Antonio Linares, presidente da Federação Umbandista do Grande ABC, na Rua Visconde de Inhaúna, 1.174, Vila Gerty, em São Caetano do Sul, diz: “Não havia Umbanda antes de 1908. Havia a chamada macumba, que era feita pelo Candomblé, por causa das oferendas aos santos. A Umbanda não é macumba, não é Candomblé. Na Umbanda não se usa isso. Nós não batemos tambor (atabaque). Quem bate é macumba. Nossa Umbanda não tem tambor e nem palmas, nem roupa de seda. Aqui, em meu Terreiro, se usa roupa simples de algodão e sapato de corda (conhecida como: “alpercata ou alpargata”) ou descalço. Não tem seda e nem luxo. Tenho ouvido que muitos umbandistas aqui na Guanabara estão “fazendo santo”. Médium fazer santo? Eu não creio nisso. Trazemos isso do berço; Ninguém bota santo na cabeça dos outros. Em nossas sessões, temos a preocupação de curar os loucos (descarregos/desobsessões). Já foram curados muitos, que estavam em sanatórios e que eram de outras religiões. Eu trabalho com o Orixá Mallet, de Ogum, que foi trazido pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas para curar os loucos e obsedados”. Incorporar Orixá? Zélio de Moraes, na sua entrevista a Ronaldo Antonio Linares, tira a máscara de muitos chefes de Terreiro que dizem ter Orixás incorporados. “Orixá não se incorpora. São Espíritos que trabalham na sua irradiação, não na sua força. Não são os Orixás que se incorporam, mas são os seus enviados. Na Umbanda não existe feitura de cabeça nem coroação. Eu não acredito nisso. O Caboclo das Sete Encruzilhadas nunca mandou “fazer cabeça” de ninguém. Isso não Existe. Nem isso, nem coroação”. Existe em São Paulo uma Federação de Umbanda, dirigida por falso umbandista, que obriga os chefes de Terreiro a “fazerem o santo” e reúne os médiuns do Terreiro para lhes tirar o dinheiro para que o pai de santo dê “obrigações para o santo”. Isso não existe na Umbanda. Estão corrompendo a Umbanda utilizando o ritual do Candomblé, que também não tem fundamento nenhum. Estão transformando os Terreiros em rituais de Umbandomblé, e depois os chefes de Terreiro não entendem nada de Umbanda nem de Candomblé, conforme declarou o Senhor Demétrio Domingues, que está lutando para separar a Umbanda do Candomblé. Ele nos dizia: Umbanda não é Candomblé. Umbanda é Umbanda. Candomblé é Candomblé. Querer misturar as duas coisas só traz confusões, pois o chefe do Terreiro passa a não entender nem de Umbanda nem de Candomblé. A verdade é que estão corrompendo a Umbanda, obrigando santo, dar obrigações para o santo, tirando o dinheiro dos filhos de santo”. A mensagem de Zélio A última mensagem de Zélio de Moraes é de 1973 e foi transmitida através de Ronaldo Linares pela Rádio Cacique de São Caetano. Era assim: “Umbandistas de São Paulo. A vocês todos eu desejo muita paz e felicidade. Há muita gente em São Paulo que me conhece, pois por aí passei muitas vezes, curando doentes com rezas e preces. Com a fé que tenho muita gente ficou curada. Por isso, a esses irmãos de São Paulo, aos umbandistas que praticam a Umbanda sem pensar na vil moeda, no dinheiro, o meu abraço fraternal. O dinheiro estraga os homens e as mulheres. A vocês umbandistas sinceros, eu desejo muitas felicidades. Que Jesus irradie as vossas casas e os vossos corações.

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Que Jesus permita que as falanges do bem, que assistem a Umbanda de humildade, amor e caridade pura, a Umbanda criada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, que é uma corrente poderosa, possa levar a cada lar uma centelha de luz, retirando de vossas casas os Espíritos que estejam nas trevas, para que todos os enfermos sejam curados. Desejo a vocês, paulistas, paz, saúde e felicidade. Salve a nossa Umbanda de humildade, amor e caridade. Dois anos depois, em 1975, Zélio de Moraes falecia em Neves, próximo de São Gonçalo, no Estado do Rio. Durante toda vida lutou por uma Umbanda pura, não corrompida pelo dinheiro, com médiuns “dando de graça o que de graça estavam recebendo de Deus”. Mensagem de Sete Encruzilhadas A jornalista Lilia Ribeiro, do jornal “GIRA DE UMBANDA”, gravou a seguinte mensagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas, fundador da Umbanda no Brasil, incorporado no médium Zélio de Moraes, em 1972. “A Umbanda tem progredido e vai progredir. É preciso haver sinceridade, honestidade e eu previno sempre aos companheiros de muitos anos: a vil moeda vai prejudicar a Umbanda; médiuns que irão se vender e que serão, mais tarde, expulsos, como Jesus expulsou os vendilhões do templo. O perigo do médium homem é a consulente mulher; do médium mulher é o consulente homem. É preciso estar sempre de prevenção, porque os próprios obsessores que procuram atacarem as nossas casas fazem com que toque alguma coisa no coração da mulher que fala ao pai de Terreiro, como no coração do homem que fala à mãe de Terreiro. É preciso haver muita moral para que a Umbanda progrida, seja forte e coesa. Umbanda é humildade, amor e caridade – esta é a nossa bandeira. Neste momento, meus irmãos, que rodeiam diversos Espíritos que trabalham na Umbanda do Brasil: Caboclos de Oxossi, de Ogum, de Xangô. Eu, porém, sou da falange de Oxossi, meu pai, e não vim por acaso, trouxe uma ordem, uma missão. Meus irmãos sejam humildes, tenham amor no coração, amor de irmão para irmão, porque vossas mediunidades ficarão mais puras, servindo aos Espíritos superiores que venham a baixar entre vós. É preciso que os aparelhos estejam sempre limpos, os instrumentos afinados com as virtudes que Jesus pregou aqui na Terra, para que tenhamos boas comunicações e proteção para aqueles que vêm em busca de socorro nas casas de Umbanda. Meus irmãos: meu aparelho já está velho, com 80 anos a fazer, mas começou antes dos 18. Posso dizer que o ajudei a casar, para que não estivesse a dar cabeçadas, para que fosse um médium aproveitável e que, pela sua mediunidade, eu pudesse implantar a nossa Umbanda. A maior parte dos que trabalham na Umbanda, se não passaram por esta Tenda, passaram pelas que saíram desta Casa. Tenho uma coisa a vos pedir: se Jesus veio ao planeta Terra na humildade de uma manjedoura, não foi por acaso. Assim, o Pai determinou. Podia ter procurado a casa de um potentado da época, mas foi escolher aquela que havia de ser sua mãe, este Espírito que viria traçar à humanidade os passos para obter paz, saúde e felicidade. Que o nascimento de Jesus, a humildade que Ele baixou a Terra, sirva de exemplos, iluminando os vossos Espíritos, tirando os escuros de maldade por pensamento ou práticas. Que Deus perdoe as maldades que possam ter sido pensadas, para que a paz possa reinar em vossos corações e nos vossos lares. Fechai os olhos para a casa do vizinho; fechai a boca para não murmurar contra quem quer que seja; não julgueis para não serdes julgados; acreditai em Deus e a paz entrará em vosso lar. É dos Evangelhos. Eu, meus irmãos, como o menor Espírito que baixou a Terra, mas amigo de todos, numa concentração perfeita dos companheiros que me rodeiam neste momento, peço que eles sintam a necessidade de cada um de vós e que, ao sairdes deste Templo de caridade, encontreis os caminhos abertos, vossos enfermos melhorados e curados, e a saúde para sempre em vossa matéria. Com um voto de paz, saúde e felicidade, com humildade, amor e caridade, sou e sempre serei o humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas”.

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CARIDADE NÃO É MERCADORIA PARA SER VENDIDA – UMBANDA PURA E DECENTE ESTÁ SENDO TRAÍDA POR VIGARISTA

JORNAL NOTÍCIAS POPULARES – 12/06/1977 – reportagem de Moacyr Jorge Nota do autor: Moacyr Jorge foi um destemido jornalista, adepto radical e defensor da Linha Branca de Umbanda e Demanda preconizada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, desde 1966.

Zélio de Moraes, fundador da Umbanda em 15 de novembro de 1908 e fundador dos primeiros Terreiros de Umbanda no Rio de Janeiro, concedeu uma entrevista a jornalista Lilia Ribeiro, que estava acompanhada de Lucy e Creusa, em 1972, a revista “Gira de Umbanda” (redação na Rua do Ouvidor, 63, sala 913, Rio de Janeiro), que era dirigida pelo Deputado Átila Nunes, da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, líder umbandista eleito por milhares de votos pelos umbandistas cariocas. A entrevista de Zélio de Moraes prova que a Umbanda foi deturpada e está sendo levada ao descrédito popular pela infiltração de vigaristas e malandros que comercializam o sofrimento humano, passando a cobrar consultas e a enganar doentes aflitos e desesperados com despachos em encruzilhadas (a maior vigarice do mundo). Vamos destacar trechos da entrevista concedida por Zélio de Moraes que comprovam a deturpação da Umbanda em nossos dias: “Os meus Guias nunca mandaram sacrificar animais, nunca permitiram que se cobrasse um centavo pelos trabalhos efetuados. No Espiritismo, não se pode pensar em ganhar dinheiro. Deve-se pensar em Deus e no preparo da vida futura. O Caboclo das Sete Encruzilhadas que incorporou em 15 de novembro de 1908, não permitia atabaques, nem palmas para marcar o ritmo dos cânticos, nem objetos de adorno, como capacetes e cocares, etc.”. Ai está à prova: Os vigaristas e malandros da Umbanda cobram consultas e dão listas para despachos. Infernizam os visinhos com atabaques e enganam doentes com problemas espirituais. Com 82 anos de idade, este homem é considerado por um pequeno grupo de umbandistas “o fundador da Umbanda”. Cabelos grisalhos, fisionomia serena e simples, Zélio de Moraes, através do seu Guia Espiritual, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, só sabe praticar o amor e a humildade.

- Na minha família, todos são da marinha: almirantes, comandantes, um capitão-de-mar-e-guerra... Só eu que não sou nada...” - comentava sorrindo Zélio de Moraes, aos amigos que o visitavam, nessa manhã ensolarada. E a repórter, antes mesmo de se apresentar, retrucou: - Almirantes ilustres, capitães-de-mar-e-guerra há muitos; o médium do Caboclo das Sete Encruzilhadas, porém, é um só.

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Levantando-se, Zélio de Moraes – magrinho, de estatura mediana, cabelos grisalhos, fisionomia serena e de uma simplicidade sem igual – acolheu-me, como se fôssemos velhos conhecidos. Nesse ambiente cordial, sentindo-me completamente à vontade, possuída de estranho bem-estar, esquecendo, quase, a minha função jornalística, iniciei uma palestra, que se prolongaria por várias horas, deixando-me uma impressão inesquecível. Perguntei-lhe como ocorrera a eclosão de sua mediunidade e de que forma se manifestara, pela primeira vez, o Caboclo das Sete Encruzilhadas. - Eu estava paralítico, desenganado pelos médicos. Certo dia, para surpresa de minha família, sentei-me na cama e disse que no dia seguinte estaria curado. Isso a foi a 14 de novembro de 1908. Eu tinha 16 anos. No dia 15, amanheci bom. Meus pais eram católicos, mas, diante dessa cura inexplicável, resolveram levar-me à Federação Espírita de Niterói, cujo presidente era o Sr. José de Souza. Foi ele mesmo quem me chamou para que ocupasse um lugar à mesa de trabalhos, à sua direita. Senti-me deslocado, constrangido, em meio àqueles senhores. E causei logo um pequeno tumulto. Sem saber por que em dado momento, eu disse: “Falta uma flor nesta mesa; vou buscá-la”. E, apesar da advertência de que não me poderia afastar, levantei-me, fui ao jardim e voltei com uma flor que coloquei no centro da mesa. Serenado o ambiente e iniciado os trabalhos, verifiquei que os Espíritos que se apresentavam aos videntes como índios e pretos, eram convidados a se afastar. Foi então que, impelido por uma força estranha, levantei-me outra vez e perguntei por que não se podiam manifestar esses Espíritos que, embora de aspecto humilde, eram trabalhadores. Estabeleceu-se um debate e um dos videntes, tomando a palavra, indagou: - “O irmão é um padre jesuíta. Por que fala dessa maneira e qual é o seu nome? Respondi sem querer: - “Amanhã estarei em casa deste aparelho, simbolizando a humildade e a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem um nome, que seja este: sou o Caboclo das Sete Encruzilhadas”. Minha família ficou apavorada. No dia seguinte, verdadeira romaria formou-se na Rua Floriano Peixoto, onde eu morava, no número 30. Parentes, desconhecidos, os tios, que eram sacerdotes católicos e quase todos os membros da Federação Espírita, naturalmente em busca de uma comprovação. O Caboclo das Sete Encruzilhadas manifestou-se, dando-nos a primeira Sessão de Umbanda na forma em que, daí para frente, realizaria os seus trabalhos. Como primeira prova de sua presença, através do passe, curou um paralítico, entregando a conclusão da cura ao Preto Velho, Pai Antonio, que nesse mesmo dia se apresentou. Estava criada a primeira Tenda de Umbanda, com o nome de Nossa Senhora da Piedade, porque assim como a imagem de Maria ampara em seus braços o Filho, seria o amparo de todos os que a ela recorressem. O Caboclo determinou que as sessões seriam diárias; das 20 às 22 horas e o atendimento gratuito, obedecendo ao lema: “Daí de graça o que de graça recebestes. O uniforme totalmente branco e sapato tênis. Desse dia em diante, já ao amanhecer havia gente à porta, em busca de passes, cura e conselhos. Médiuns que não tinham a oportunidade de trabalhar espiritualmente por só receberem entidades que se apresentavam como Caboclos e Pretos-Velhos, passaram a cooperar nos trabalhos. Outros, considerados portadores de doenças mentais desconhecidas revelaram-se médiuns excepcionais, de incorporação e de transporte. Citando nomes e datas, com precisão extraordinária, Zélio de Moraes relata o que foram os primeiros anos de sua atividade mediúnica. Dez anos depois, o Caboclo das Sete Encruzilhadas anunciou a segunda fase de sua missão: a fundação de sete Templos de Umbanda e, nas reuniões doutrinárias que realizava às quintas-feiras, foi destacando os médiuns que assumiriam a direção das novas Tendas: a primeira, com o nome de Nossa Senhora da Conceição e, sucessivamente, Nossa Senhora da Guia, São Pedro, Santa Bárbara, São Jorge, Oxalá e São Jerônimo. - Na época - prossegue Zélio – imperava a feitiçaria; trabalhava-se muito para o mal, através de objetos materiais, aves e animais sacrificados, tudo a preços elevadíssimos. Para combater esses trabalhos de magia negativa, o Caboclo trouxe outra entidade, o Orixá Mallet, que destruía esses malefícios e curava obsedados. Ainda hoje isso existe: há quem trabalhe para fazer ou desfazer ou desmanchar feitiçarias, só para ganhar dinheiro.

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Mas eu digo: não há ninguém que possa contar que eu cobrei um tostão pelas curas que se realizavam em nossa casa; milhares de obsedados, encaminhados inclusive pelos médicos dos sanatórios de doentes mentais... E quando apresentavam ao Caboclo a relação desses enfermos, ele indicava os que poderiam ser curados espiritualmente; os outros dependiam de tratamentos material... Perguntei então a Zélio, a sua opinião sobre o sacrifício de animais que alguns médiuns fazem na intenção dos Orixás. Zélio absteve-se de opinar, limitou-se a dizer: - Os meus Guias nunca mandaram sacrificar animais, nem permitiriam que se cobrasse um centavo pelos trabalhos efetuados. No Espiritismo não pode pensar em ganhar dinheiro; deve-se pensar em Deus e no preparo da vida futura. O Caboclo das Sete Encruzilhadas não adotava atabaques nem palmas para marcar o ritmo dos cânticos e nem objetos de adorno, como capacetes, cocares, etc. Quanto ao número de guias (colares) a ser usado pelo médium, Zélio opina: - A guia deve ser feita de acordo com os protetores que se manifestam. Para o Preto-Velho deve-se usar a guia de Preto-Velho; para o Caboclo, a guia correspondente ao Caboclo. É o bastante. Não há necessidade de carregar cinco ou dez guias no pescoço... Considera o Exu um Espírito trabalhador como os outros: - O trabalho com os Exus requer muito cuidado. É fácil ao mau médium dar manifestação como Exu e ser, na realidade, um Espírito atrasado, como acontece, também, na incorporação de Criança. Considero o Exu um Espírito que foi despertado das trevas e, progredindo na escala evolutiva, trabalha em benefício dos necessitados. O Caboclo das Sete Encruzilhadas ensinava o que Exu é, como na polícia, o soldado. O chefe de polícia não prende o malfeitor; o delegado também não prende. Quem prende é o soldado que executa as ordens dos chefes. E o Exu é um Espírito que se prontifica a fazer o bem, por que cada passo que dá em benefício de alguém é mais uma luz que adquire. Atrair o Espírito atrasado que estiver obsedando e afastá-lo, é um dos seus trabalhos. E é assim que vai evoluindo. Torna-se, portanto, um auxiliar do Orixá. Relembrando fatos passados em mais de meio século de atividade espiritualista, Zélio refere-se a centenas de Tendas de Umbanda fundadas na Guanabara, em São Paulo, Estado do Rio, Minas, Espírito Santo, Rio Grande do Sul. A Federação de Umbanda do Brasil, hoje União Espiritista de Umbanda do Brasil, foi criada por determinação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, a 26 de agosto de 1939. Da Tenda Nossa Senhora da Piedade saiam constantemente médiuns de capacidade comprovada, com a missão de dirigirem novos templos umbandistas; entre eles, José Meirelles, na época deputado federal; José Álvares Pessoa, que deixou uma lembrança indelével de sua extraordinária cultura espiritualista; Martinho Mendes Ferreira, atual presidente da Congregação Espírita Umbandista do Brasil; Carlos Monte de Almeida um dos diretores de culto da T.U.L.E.F. (Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade); João Severino Ramos, trabalhando ainda hoje, ativamente, inclusive na Assessoria de culto do Conselho Nacional Deliberativo da Umbanda. Outros, fugindo às rígidas determinações de humildade e caridade do Caboclo das Sete Encruzilhadas, desvirtuaram normas do culto. Mas a Umbanda, preconizada através da mediunidade de Zélio de Moraes, difundiu-se extraordinariamente e hoje podemos encontrar suas características em Tendas modestas e nos grandes Templos, como o Caminheiros da Verdade e a Tenda Mirim, nos quais a orientação de João Carneiro de Almeida e Benjamin Figueiredo mantém elevado nível de espiritualidade, no Primado de Umbanda, uma das mais perfeitas entidades associativas da nossa Religião. Durante mais de cinqüenta anos, o Caboclo das Sete Encruzilhadas dirigiu a Tenda Nossa Senhora da Piedade; após esse tempo, passou a direção à filha mais velha do médium, dona Zélia, aparelho do Caboclo Sete Flechas. Entretanto, Pai Antonio continua trabalhando, na Cabana que tem o seu nome, localizada num sítio maravilhoso, em Cachoeiras de Macacú. O Caboclo manifesta-se ainda em datas especiais, como foi, por exemplo, o 63º aniversário daquela Tenda. (nota do autor: entrevista feita em 1972) Da gravação feita durante a celebração festiva, reproduzimos para os leitores, o trecho final da mensagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas:

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A Umbanda tem progredido e vai progredir muito ainda. É preciso haver sinceridade, amor de irmão para irmão, para que a vil moeda não venha a destruir o médium, que será mais tarde expulso, como Jesus expulsou os vendilhões do templo. É preciso estar sempre de prevenção contra os obsessores, que podem atingir o médium. É preciso ter cuidado e haver moral, para que a Umbanda progrida e seja sempre uma Umbanda de humildade, amor e caridade. Essa é a nossa bandeira. Meus irmãos: sede humildes, trazei amor no coração para que pela vossa mediunidade possa baixar um Espírito superior; sempre afinados com a virtude que Jesus pregou na Terra, para que venha buscar socorro em vossas casas de caridade, todo o Brasil... Tenho uma coisa a vos pedir: Se Jesus veio ao planeta Terra na humilde manjedoura, não foi por acaso, não. Foi o Pai que assim o determinou. Que o nascimento de Jesus, o Espírito que viria traçar à humanidade o caminho de obter a paz, saúde e felicidade, a humildade em que ele baixou neste planeta, a estrela que iluminou aquele estábulo, sirva para vós, iluminando vossos Espíritos, retirando os escuros da maldade por pensamento, por ações; que Deus perdoe tudo o que tiverdes feito ou as maldades que podeis haver pensado, para que a paz possa reinar em vossos corações e nos vossos lares. Eu, meus irmãos, como o menor Espírito que baixou à Terra, mas amigo de todos, numa concentração perfeita dos Espíritos que me rodeiam neste momento, peço que eles sintam a necessidade de cada um de vós e que, ao sairdes deste Templo de caridade, encontreis os caminhos abertos, vossos enfermos curados e a saúde para sempre em vossa matéria. Com o meu voto de paz, saúde e felicidade, com humildade, amor e caridade, sou e serei sempre o humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas.

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A seguir, apresentaremos o Regimento Interno da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, formulado com a participação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, para termos uma noção de como se processava todo o desenrolar dos trabalhos espirituais e materiais em época de Zélio de Moraes. Junto com o regimento estarão algumas considerações pertinentes de um irmão de fé, Cláudio Zeus, que faz o estudo de alguns trechos, com comentários interessantes:

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REGIMENTO INTERNO DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE

Nota do autor: Para melhores realces, as apreciações e comentários de Cláudio Zeus dentro do contexto, estarão em itálico, dentro de uma tabela. A Diretoria da Tenda, usando das atribuições estatutárias, por ordem e segundo orientação do nosso “Chefe Espiritual” - O Caboclo das Sete Encruzilhadas - resolveu aprovar o presente Regimento Interno, a fim de estabelecer a necessária ordem interna e para atender aos seus associados, trabalhadores e freqüentadores, na maior harmonia e o mais completo aproveitamento dos trabalhos espirituais. CAPÍTULO I DAS SESSÕES EM GERAL Art. 1° - As sessões da Tenda, que deverão começar às 20 horas e terminar às 22 horas, com a tolerância de 15 minutos no máximo, sobre a hora de encerrar, dividem-se: Primeiro aparte: Observemos que havia tempo determinado para a realização de Sessões. A mim foi explicado, quando de meu início, que esse tempo visava cautela para com os próprios médiuns, evitando desgastes desnecessários e muitas vezes nocivos, tanto à saúde física quanto mediúnica dos mesmos, incluindo-se aí o possível animismo imperante a partir do momento em que, por estarem cansados, médiuns costumam perder os contatos positivos com seus protetores, principalmente os de fase consciente. a) Sessões de caridade: b) Sessões de desenvolvimento mediúnico e de consultas exclusivamente para “trabalhadores do Terreiro”; c) Sessões especiais; Segundo aparte: Havia orientação para que se fizessem sessões exclusivas para médiuns e trabalhadores do Terreiro, fossem elas de atendimento ou de desenvolvimento. Interessante porque você já deve ter lido sobre isso em alguns de meus textos. Parágrafo único - Essas sessões terão lugar: a) DE CARIDADE (Sessões públicas). Às segundas-feiras - Trabalho de “Caboclo”; Às terças-feiras - Trabalhos de “Pretos Velhos” e “Caboclos”; Às sextas-feiras - Trabalhos de “Pretos Velhos”. Terceiro aparte: Reparou que não havia determinação para Sessões de Exu em relação à caridade? Perceba que entidades de trabalho para a Umbanda eram Caboclos e Pretos-Velhos apenas. Essa informação se torna interessante na medida em que muitos afirmam que Exu era Linha de Trabalho de Umbanda até para o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Onde estão eles então, na Tenda Nossa Senhora da Piedade? Para as consultas nesses dias, serão distribuídas aos assistentes, por ordem cronológica de chegada à Tenda à partir das 18 horas, cartões numerados com o nome do “Guia”que os deverá atender. b) DE DESENVOLVIMENTO MEDIÚNICO E CONSULTAS AOS “GUIAS “EXCLUSIVAMENTE PARA TRABALHADORES DO TERREIRO (Sessões privativas) 1) Só poderão tomar parte nessas sessões médiuns e cambonos matriculados, não sendo permitidos assistentes nem consultas por parte dos acompanhantes;

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2) Para freqüentá-las, torna-se necessário que o Guia Chefe do Terreiro, após verificar a necessidade de desenvolvimento mediúnico, encaminhe a pessoa interessada, privativamente, a “Orixá Mallet” para que este autorize ou não a respectiva matricula; 3) Essas sessões são divididas em duas partes: 1ª – Das 20 às 21 horas - Trabalho de desenvolvimento mediúnico; 2ª – Das 21 às 22 horas - Consultas aos “Guias”, exclusivamente para os trabalhadores os quais poderão falar a mais de um “Guia”, conforme as possibilidades do momento. Quarto aparte: Nota-se claramente nessas disposições a importância que era dada, tanto a médiuns quanto aos demais trabalhadores do Terreiro. Isto é muito importante se ter em mente, já que esses são na realidade, os sustentáculos para os trabalhos que possam vir a ser realizados – médiuns e trabalhadores (ogãs e demais) mal orientados ou com problemas particulares e psicológicos acabam atrapalhando mais que ajudando. c) ESPECIAIS: Entende-se por sessões especiais: 1 – Sessões do “Chefe” (Sessões públicas) na primeira Quinta-feira de cada mês. Sessões em que a presença do Chefe Espiritual era garantida. 2 – Sessões de “descarga” de “Orixá Mallet” (Sessões privativas). Na Quarta-Feira, véspera da Sessão do “Chefe”, são privativas dos trabalhadores da Tenda não se permitindo assistentes nem consultas. Sessões que visavam tirar dos médiuns quaisquer cargas acumuladas durante os trabalhos em dias de Sessões públicas e mesmo na vida diária. No grupo onde iniciei, elas se chamavam Sessões de Expurgo. 3 - Sessões de “demanda” (Sessões privativas) Em dia e hora designados pelo “Guia” que estiver encarregado de executar e dirigir os trabalhos. Só poderão ser realizadas, com autorização especial do “Chefe”, a qual será transmitida por “Pai Antonio”, e nela só poderão tomar parte os trabalhadores e pessoas que foram devidamente escaladas ou autorizadas pelo referido “Guia”. Percebe-se ainda aqui a preocupação de só se realizar sessões deste tipo com a presença de médiuns preparados, médiuns estes apontados como potencialmente preparados e não com a presença de todos os outros, já que isso poderia (como já expliquei em outros textos) trazer até mesmo riscos à saúde mediúnica destes. 4 - Sessões destinadas exclusivamente ao estudo da doutrina, desenvolvimento de outras mediunidades e aperfeiçoamento de cambonos, etc. Às quintas-feiras, com exceção da 1ª de cada mês. Só poderão ser freqüentadas por médiuns desenvolvidos e auxiliares, cambonos ou pessoas designadas pelo “Chefe”, não sendo permitidos assistentes nem consultas por parte dos acompanhantes. Perceba-se que o Caboclo das Sete Encruzilhadas se preocupava também com o desenvolvimento de outras mediunidades e não somente a de incorporação e, além disso, preocupava-se também com o estudo da Doutrina. Mas que Doutrina seria essa? Vamos ver mais à frente. 5 - Sessões Festivas (Sessões públicas): Em 20 de Janeiro - de Oxossi (São Sebastião). Em 23 de Abril - de Ogum (São Jorge). Em 13 de Maio - de Pretos Velhos (Pretos Cativos).

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Em 13 de Junho - de Santo António e Pai António. Em 15 de Setembro - de aniversário da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade. Em 27 de Setembro - de Cosme e Damião (Falange de crianças). Em 30 de Setembro - de Xangô (São Jerônimo). Em 16 de novembro - de aniversário do Chefe. Em 04 de Dezembro - de Ynhaçã (Santa Bárbara). Em 08 de Dezembro - de Yemanjá (Nossa Senhora da Conceição). São sessões públicas comemorativas de datas solenes da Tenda e funcionam com horário especial, que será estabelecido na ocasião pelo Chefe. Nelas poderão participar médiuns e cambonos de outros Terreiros, desde que a Tenda a que pertençam tenha sido devidamente convidada. Muito interessante: Alguém consegue ver nessa relação de Sessões Festivas alguma que fosse para Exu? Acho que não! E mais uma coisinha: Perceba-se também que se formos considerar “Orixás” o que o Caboclo das Sete Encruzilhadas considerava, com nomes africanos, veremos somente aqui, nessa relação de festas: Oxossi, Ogum, Xangô, Inhaçã e Yemanjá. As Sete Linhas de Trabalho seriam “fechadas” com Crianças (Cosme e Damião) e Pretos Velhos.

DA DIREÇÃO DAS SESSÕES Art. 2° - As sessões serão dirigidas por um médium ou cambono designado pelo “Chefe”, o qual será auxiliado pelo cambonos Chefe. Parágrafo único - São atribuições do dirigente: a) Abrir e encerar as sessões; b) Organizar a mesa nas sessões de caridade, designando os médiuns auxiliares para compô-la e substituindo-os nas ocasiões que julgar necessário; c) Cumprir e fazer cumprir por parte de todos, indistintamente, os dispositivos previstos nesse Regimento e ordens em vigor: d) Resolver todos os casos omissos que chegarem ao seu conhecimento, quer no plano material, quer no espiritual, devendo, conforme o caso , dar ciência da solução adotada, na primeira oportunidade, ao Presidente da Tenda ou ao “Chefe” – Caboclo das Sete Encruzilhadas; e) Tomar todas as medidas que julgar necessárias para o bom andamento da sessão e que não estejam previstas nesse Regimento, ouvido, na ocasião, o Guia Chefe do Terreiro. DA REALIZAÇÃO DAS SESSÕES Art. 3° - As sessões terão início às 20h00min com o defumador, o qual deverá terminar no máximo às 20h20min, até quando será permitida a entrada de assistentes e trabalhadores. Isso é muito importante de se anotar porque essa medida visava fazer com que todos os presentes tivessem passado pela defumação. Acho que não preciso dizer o porquê.

§ 1° - As exceções do presente artigo, no qual diz respeito a entrada após às 20h20min, serão da alçada exclusiva do dirigente da sessão, ouvido o Guia Chefe do Terreiro; Observar também: existiam exceções.

§ 2° - Nas sessões de caridade, a porta será aberta entre 21h10min e 21h20min, para saída das pessoas já atendidas e ingresso dos retardatários.

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Ingresso de retardatários somente depois da gira firmada e não a qualquer momento com riscos e quebra de corrente. Art. 4° - A abertura dos trabalhos, que será feita com uma preleção doutrinária conversando, principalmente, sobre assuntos atinentes à Linha de Umbanda, seguida de prece, terá a duração máxima de 15 minutos. § 1° - As consultas e passes só poderão ter início depois de baixar o Guia Chefe do Terreiro; § 2° - Nos dias de desenvolvimento mediúnico, serão feitas explicações apropriadas sobre pontos cantados e riscados, durante 20 minutos aproximadamente, sendo prestados, na ocasião, todos os esclarecimentos que a esse respeito forem solicitados. Observe-se mais uma vez que a preocupação com a boa orientação dos médiuns em desenvolvimento era marca registrada do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Acredito piamente que ele entendia muito bem que médiuns, tanto podem ser muito bons para o Terreiro, quando conscientes de suas responsabilidades e bem preparados, como podem ser exatamente os pontos fracos por onde o Baixo Astral pode ir tomando conta. Art. 5° - As sessões de caridade terminarão, obrigatoriamente, por uma descarga espiritual feita pelo Guia Chefe do Terreiro. No meu entender e também como aprendi, isso é fator primordial. Médium que volta pra casa carregando nas costas as energias negativas de outros ou do ambiente, com certeza vai se desgastando aos poucos e quando chegar a perceber... Parágrafo único: Iniciada essa descarga, cessarão, imediatamente, as consultas aos Guias no ponto em que estiverem, não sendo permitido, sob qualquer pretexto, e a quem quer que seja, se dirigir aos mesmos ou aos demais participantes do Terreiro. A fim de que não haja perturbação do trabalho por quebra de corrente. Quebra de Corrente. Isso é tão importante quanto à própria respiração dentro de um Terreiro. CAPÍTULO II DOS TRABALHADORES DO TERREIRO MÉDIUNS EM GERAL Art. 6° - Médiuns desenvolvidos: São os médiuns cruzados que tem autorização de “Orixá Mallet”, para dar passes e consultas, bem como auxiliar os trabalhos de desenvolvimento mediúnico, e outros quaisquer que se realizarem na Tenda, de acordo com esse Regimento. Distintivo: FAIXA VERMELHA na cintura. Art. 7° - Médiuns em desenvolvimento: a) Auxiliares: São os médiuns de desenvolvimento mediúnico adiantado, já classificados por “Orixá Mallet”. São obrigados a comparecer às sessões de quarta-feira, não podendo, contudo, freqüentar o Terreiro em outro qualquer dia, a não ser na qualidade de assistente. Mais um dispositivo importantíssimo: Sempre que posso, procuro informar sobre a importância de não ter médiuns iniciantes em giras de trabalho, nem como cambonos, já que, por ingenuidade e falta de preparo, costumam ser os mais vulneráveis a atuações de energias e entidades do Baixo Astral. Existem exceções? Existem, é claro!

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Mas a Regra é esta até por lógica, e se os médiuns iniciantes forem poupados, pelo menos no início de suas práticas, de estarem entrando em contato com energias e entidades que não conhecem, com certeza só terão a ganhar. Aí, uma vez me disseram assim: “Que nada, é melhor mesmo que vão encarando “as barras pesadas” de começo e aprendendo, com isso, a levarem tombo e se levantarem”. Um bom conselho, talvez... Mas será que aplicam essa “técnica” também no aprendizado sobre a vida a seus próprios filhos carnais? Será que os deixam, sem medos ou críticas, enfrentarem a vida sem conselhos, ensinamentos e até mesmo reprimendas? E será que se agirem assim não vão acabar se arrependendo como tantos que vemos por aí sabendo depois, pela mídia, que seus “pobres e queridos filhos” estão diretamente envolvidos no comércio de drogas proibidas? Sei não! O pior é que em caso de médiuns iniciantes, além de poderem se prejudicar, poderão prejudicar a todo o grupo mediúnico, na medida em que, fatalmente, serão eles os principais alvos do Baixo Astral com conseqüentes quebra de correntes e até mesmo necessidade de atendimento imediato e particular. Vamos pensar um pouquinho mais sobre isso? Art. 8° - Os médiuns em geral, devem dar máxima passividade possível às entidades que se aproximarem, para que essas possam trabalhar com plenitude de irradiação e de força. Acredito que isso seja norma em qualquer Terreiro, até hoje. CAMBONO EM GERAL Art. 9° - Aos cambonos cruzados - secretários dos Guias - compete: § 1° - Ao cambono Chefe: a) Cumprir e fazer cumprir no Terreiro, pelos médiuns, cambonos e assistentes, todas as origens vigorantes, velando pela boa e perfeita normalidade e regularidade dos serviços a seu cargo; b) Fiscalizar o preparo e execução do defumador no início de cada sessão; c) Superintender todos os serviços atribuídos aos demais cambonos, controlando a distribuição de todo material que se fizer necessário à realização dos trabalhos; d) Controlar e disciplinar a chamada dos consulentes; e) Esforçar-se para manter os trabalhadores e assistentes, em constante concentração espiritual, não permitindo que cruzem braços e pernas, que conversem e que procurem ter curiosidade sobre o que se passa no Terreiro, além de tudo mais que possa perturbar ou quebrar a corrente fluídica durante as sessões; f) Levar ao conhecimento do dirigente da sessão, qualquer irregularidade que notar, antes, durante e após os trabalhos; g) Finalmente acatar e fazer cumprir as resoluções que eventualmente possam ser emanadas do dirigente da sessão ou Guia Chefe do Terreiro. Em relação ao item “E”, percebemos a importância que era dada à participação da assistência que, embora alguns não levem em conta, é importantíssima na formação da egrégora do Terreiro. Uma Assistência dispersiva, não concentrada, conversando entre si, também pode provocar maior carga de trabalho para os médiuns com não muito boas conseqüências ao longo do tempo. § 2°- O Cambono Chefe deverá ser substituído em seus impedimentos por um dos cambonos substitutos; § 3°- Ao Cambono Tronqueira: Além das atribuições dos cambonos substitutos e auxiliares, fica especialmente encarregado de:

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a) Fazer parte, obrigatoriamente, da mesa nas sessões de caridade, auxiliando os trabalhos de descarga e de doutrinação que se fizerem necessários aos espíritos sofredores que nela baixarem. § 4°- Ao cambono subchefe: Além das atribuições dos cambonos auxiliares, especialmente: a) Zelar pelo asseio e correção do uniforme dos trabalhadores do sexo feminino; b) Fiscalizar o vestiário das senhoras; c) Exercer controle da passagem que dá acesso ao toalete durante os trabalhos. § 5°- As funções desse cambono, que está subordinado diretamente ao cambono chefe, serão privativas do sexo feminino e só poderão ser exercidas, em caso de substituição eventual, por pessoa do mesmo sexo, designada pelo “Chefe”, para esse fim. § 6°- Ao cambono substituto: Além das atribuições dos cambonos auxiliares, especialmente: a) Substituir os cambonos chefe e tronqueira em seus impedimentos eventuais; b) Secundar e auxiliar o cambono chefe em todas as suas atribuições; c) Executar as ordens de serviço relativa à subdivisão de trabalhos e atividades que cada um deve superintender durante as sessões. § 7° - Ao cambono auxiliar: Além das atribuições ainda não previstas: a) Acatar e fazer cumprir as ordens recebidas do cambono chefe; b) Receber das mãos do cambono chefe todo material que se fizer necessário ao Guia que assistir, salvo se o mesmo possuir material próprio, caso em que levará apenas ao conhecimento do cambono chefe a natureza do material a ser empregado; c) Dar plena e geral assistência ao Guia com o qual estiver trabalhando, não podendo dele se afastar sem sua permissão; d) Abster-se de ouvir as consultas, somente intercedendo nas mesmas em caso de ser chamado pelo Guia e apenas para atender ao assunto que por ele lhe for atribuído; É terminantemente vedado: 1° - Revelar ou comentar a natureza das consultas e bem assim procurar tirar qualquer proveito dos assuntos tratados nas mesmas; 2° - Tomar ou procurar tomar conhecimento das consultas dadas por outros Guias, seja por curiosidade, seja por qualquer outro motivo. § 8° Ao cambono zelador: Além das atribuições dos cambonos auxiliares, especialmente: Zelar pelo “Jacotá” (altar), trazendo-o sempre limpo. Zelar pelo asseio e higiene de todas as dependências da Tenda: Providenciar para que todos os objetos e utensílio à ela pertencentes estejam sempre limpos, arrumados em ordem e em seus devidos lugares; § 9° - Esse lugar será exercido por pessoa do sexo feminino diretamente subordinada à direção da Tenda; Distintivo dos cambonos cruzados: Faixa verde na cintura. O que está acima nem é preciso comentar. São determinações de âmbito puramente material. CAPÍTULO III DAS DISPOSIÇÕES COMUNS AOS TRABALHADORES DA TENDA Art. 10 - Os trabalhadores da Tenda (médiuns e cambonos), indistintamente, são obrigados:

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a) Médiuns desenvolvidos e cambonos: Matricular-se compulsoriamente, pelo menos uma vez por semana, em dia que escolher de comum acordo com a Direção da Tenda; b) Comparecer às sessões em que estiverem matriculados ou escalados, só podendo faltar por motivo justificado; c) Avisar, com a devida antecedência, a impossibilidade de seu comparecimento à sessão, justificando a falta; d) Manter a concentração no Terreiro, curimbando em voz alta os pontos que forem sendo puxados; e) Fazer, nos dias de sessão a que se obrigarem, uso de banho de descarga, cuja espécie será indicada pelo Guia que receber (caso dos médiuns desenvolvidos), ou pelo o que der assistência (caso dos cambonos), ou ainda pelo Guia Chefe do Terreiro, quando este terminar, sendo que, para os médiuns em desenvolvimento (sessão de Quarta-Feira), esse banho será feito com 5 folhas de mangueira. f) Fazer uso do uniforme adotado (conservando-o limpo) e seus distintivos, não podendo permanecer no Terreiro em condições diferentes; g) Procurar conhecer os pontos riscados e cantados (curimbas), bem como os seus significados, e, quando ignorá-los, pedir esclarecimento ao Guia Chefe do Terreiro ou ao dirigente dos trabalhos. Alt. 11° - Os trabalhadores que sem motivo justificado faltarem a quatro sessões consecutivas, nas quais estejam matriculados, ou para as quais tenham sido escalados, ficarão privados de trabalhar na Tenda, condicionalmente: a) Os médiuns: Enquanto “Orixá Mallet” não autorizar a sua volta ao Terreiro; b) Os cambonos: Até que suas faltas sejam justificadas pela Direção da Tenda; Parágrafo Único: Os trabalhadores suspensos, só poderão freqüentam as sessões em caráter de assistente, sendo vedado mudarem roupa de trabalho com o intuito de permanecer no Terreiro. Art. 12° - Os médiuns desenvolvidos e cambonos poderão tomar parte nos trabalhos de qualquer sessão na Tenda, ainda que nela não estejam matriculados, desde que para isso tenham o assentimento do Guia Chefe do Terreiro. Art. 13° - Os antigos trabalhadores da Tenda, afastados transitoriamente por motivos independentes de sua vontade, poderão freqüentar e tomar parte em qualquer trabalho que se realize na Tenda, salvo o caso de proibição expressa do Guia Chefe do Terreiro após o início da sessão. Art. 14° - Fica terminantemente proibido aos trabalhadores: a) Afastar-se do Terreiro durante as sessões sob qualquer pretexto ou motivo, sem a devida autorização do dirigente dos trabalhos; b) Trabalhar, sob pretexto algum, fora do recinto da Tenda ( em suas casas ou em outro qualquer Terreiro), salvo o caso de autorização especial dada pelo “Chefe”; c) Fazer comentários de qualquer natureza, dentro ou fora do Terreiro, pessoais ou telefônicos, com referência aos assuntos que tenham sido tratados nas sessões, ou sobre outros quaisquer que digam respeito à vida privada de cada um. O Artigo 14, em seus ítens “b” e “c”, eram e ainda são considerados muito importantes porque, trabalhar em casa, sem a proteção da egrégora do Terreiro, é uma forma de se arriscar e trabalhar em outro Terreiro seria o mesmo que estar jogando em um Clube e ir treinar em outro - é claro que se pode antever certos problemas daí advindos. Proibição quanto a fazer comentários de qualquer natureza etc e tal, era e sempre será norma a ser cumprida por qualquer médium, do Terreiro que for. Art. 15 ° - A secretária manterá os livros que forem necessários ao registro de matrículas dos trabalhadores e controle de seu comparecimento às sessões. CAPÍTULO IV

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DOS ASSISTENTES Art. 16° - A entrada na Tenda só é vedada: a) às pessoas alcoolizadas ou embriagadas: b) às pessoas portadoras de armas ou animais; c) às pessoas manifestamente mal intencionadas ou a desordeiros conhecidos. Sem querer mexer com ninguém, mas, fazendo uma observação em vista de certas permissividades hoje existentes, será que alguém diria que a não permissão de entrada, nesses casos, seria falta de caridade? § 1° - São deveres dos assistentes: a) Munir-se, logo após à sua chegada, do cartão numerado para a respectiva consulta; b) Procurar acomodação na parte reservada a assistência, onde deverá se conservar até a hora de sair, com o respeito e dignidade devidos a um Templo Religioso; c) Acatar as ordens gerais da Tenda e as que lhes forem transmitidas pelos cambonos; d) Manter-se em elevação, se souber, o curimba (ponto cantado que estiver sendo puxado), para possibilitar uma perfeita e harmônica corrente fluídica, desde o início do defumador até o encerramento da sessão; e) Atender prontamente, sob pena de perder a vez, ao chamado do cambono para a consulta. § 2° - É vedado terminantemente aos assistentes, consultarem a mais de um Guia na mesma sessão. Ops! Já existia isso naquela época. Já existiam os “corre giras” e os “corre guias”. § 3° - O assistente que tiver necessidade de qualquer natureza deverá dirigir-se ao cambono mais próximo, de preferência de seu sexo e expor o que deseja, para que este providencie como se fizer necessário. § 4° - Na ocasião da abertura da porta às 21:10 horas para saída das pessoas atendidas e retardatários, deverá ser observado o mais completo silêncio. Respeito aos médiuns, entidades e à egrégora que deve ser mantida sem desvios de pensamento ou comportamento. CAPITULO V DAS DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 17 - Por princípio doutrinário e em se tratando de reuniões de caridade puramente cristã, as pessoas que vierem à Tenda, devem se abster de pensamentos e propósitos que contrariem as virtudes exemplificadas por Jesus. Assim sendo, as consultas não poderão versar sobre assuntos que fujam aos princípios capitulados nas Dez Mandamentos, constantes do Evangelho. § 1° - São deveres de todos os freqüentadores: Procurar conhecer o Espiritismo Cristão pela leitura de obras doutrinárias tais como: O Evangelho, segundo o Espiritismo; O Livro dos Espíritos; O Livro dos Médiuns; O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda.

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Esse Capítulo é importantíssimo para que se deixem, de vez, de dizer coisas como: “Umbanda tem que largar o cristianismo e voltar às raízes africanas”, ou então, “Umbanda é um Culto Afro”, ou mesmo que “Umbanda com orações e leitura de livros espíritas é Kardecumbanda”, comentários esses muito observados na Internet por conta de pessoas que, claramente, não conhecem em que princípios a Umbanda do Brasil se formou.. Lendo o acima exposto e observando certos posicionamentos, percebemo-los totalmente inadequados em relação a todos os que agem por esta cartilha, seguindo o que já determinava o Caboclo das Sete Encruzilhadas há quase 100 anos atrás. Será que são eles os “errados”, se é que existem erros de ritualística nesse sentido? O caso é que a Umbanda é fundamentalmente cristã e, de acordo com outros princípios e ritualísticas que cada Terreiro achou por bem adotar, pode ter seus rituais mais africanizados, mais puxados para as práticas chamadas de orientais, esotéricas, ocultista, etc. Mas o “miolo”, o fundamento maior é o de ter os ensinamentos do Cristo como base para todas as outras aplicações. E que ensinamentos do Cristo são esses: Amor ao próximo – Caridade (ajuda ao próximo), sem o que, não pode ser Umbanda. § 2° - Durante as sessões ou trabalhos de Terreiro é expressamente proibido: a) Palestrar ou tratar assuntos estranhos à doutrina; b) Fazer comentários maldosos sobre os irmãos da Tenda; c) Proferir palavras de gírias ou de interpretações duvidosas, obscenas ou provocadoras de risos; d) Fazer gestos ofensivos à moral ou aos bons costumes; e) Lançar suspeitas, provocar ódios, difamar ou fazer comentários desabonadores sobre a vida privada de qualquer pessoa; f) Desrespeitar ou incitar ao desrespeito, os artigos, parágrafos e alíneas do presente Regimento e ordens em vigor na Tenda; g) Ingressar ou permanecer no recinto onde estão instaladas a Tesouraria e a Secretária da Tenda, com exceção dos componentes da Diretoria e pessoas encarregadas de serviços especiais. CAPÍTULO VI DAS DISPOSIÇÕES FINAIS Art. 18 - A Tenda tem como “Chefe Espiritual” o Caboclo das Sete Encruzilhadas, também chamado simplesmente - o “Chefe”- criador de Umbanda no Brasil no ano de 1908. “Orixá Malllet” é o trabalhador da Linha de “Ogum” (São Jorge), Chefe de Falange, encarregado dos trabalhos de demanda. “Pai Antonio” é a entidade que serve de intérprete a “Orixá Mallet” e que comumente transmite as ordens do “Chefe”. “Guias e Chefes de Terreiro” são as entidades designadas pelo “Chefe” para dirigir e se responsabilizar pela parte espiritual das sessões. Art. 19 - O presente Regimento entrará em vigor na data em que for ratificado pelo “Chefe”, em sessão especial, para isso convocada. Toda pessoa que se tornar associada da Tenda o faz espontaneamente, para cooperar na sua manutenção e progresso, motivo pelo qual deverá cumprir a risca, todos os seus deveres e principalmente manter em dia o pagamento de sua mensalidade.

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COMENTÁRIOS FINAIS: Ao descobrir esse documento colocado em pdf para que se baixe em http://ebooks.brasilpodcast.net/ebook.php?id=762 pude perceber o quanto ele nos mostra, independente de outros textos que já “rolam” na Internet, do que seria e como funcionaria a Umbanda segundo a concepção do Caboclo das Sete Encruzilhadas e Zélio Fernandino de Moraes já que um Regimento Interno é documento escrito ou ditado diretamente pelas pessoas (encarnado e/ou desencarnado, no caso) envolvidas na questão e não apenas fruto de possíveis interpretações de terceiros (sem querer tirar o valor dos mesmos). E o que pudemos observar de importante nesse documento? 1- Que não havia, na Umbanda original, trabalhos com as falanges de Exu e nem se firmava tronqueira para eles. Qualquer depoimento em contrário poderá ser tomado como duvidoso em vista deste documento. 2- Que as Sessões (hoje Giras ou Engiras) eram determinadas para as Falanges de Trabalho (Caboclos e/ou Pretos Velhos) e não para as Linhas de Trabalho ou “Orixás” para os que entendem melhor assim (Ex: Xangô hoje, Oxossi dia tal, Ogum mais adiante...). Isso é importante porque em um mesmo dia de Sessão poderiam estar presentes, tanto Caboclos(as) de Xangô, quanto de Ogum, quanto de Oxossi, e até Pretos Velhos, como podemos observar em relação às Sessões de Terças-Feiras, tudo de acordo com as necessidades: 3- Que O Caboclo das Sete Encruzilhadas determinou realmente Linhas de Trabalho e não de Orixás, utilizando-se de alguns nomes africanos, todos devidamente ancorados as Linhas de Santos Católicos, talvez apenas Linhas de Trabalho em que os Caboclos e Pretos-Velhos (e suas contrapartes femininas) poderiam trabalhar. Perceba como ele trata a entidade que se auto-intitula Orixá Malê: “Orixá Mallet” é o trabalhador da Linha de “Ogum” (São Jorge). Percebeu? Um trabalhador. E mesmo se auto-intitulando Orixá Mallet, não uma divindade da Linha de Ogum ou, como costuma-se falar também, “um Capangueiro do Orixá Ogum”. Existe uma sutil diferença em se colocar as entidades como da Linha de Ogum (São Jorge) e não como Falangeiro de Ogum (Orixá), ainda que se lhes dê o mesmo nome (Ogum, no caso). No entanto, essa sutil diferença já nos mostra que a Umbanda de Caboclo das Sete Encruzilhadas não era Umbanda de Orixás (divindades) e sim de Linhas de Trabalhos através das quais apresentavam-se entidades espirituais – Caboclos – Pretos-Velhos e mais raramente Crianças. 4- Que o Caboclo das Sete Encruzilhadas determinou Sete Linhas de Trabalho sendo elas, pelo que se pode observar nas festas anuais: Yemanjá, Oxossi, Ogum, Xangô, Inhaçã, e segundo alguns, Oxalá e Exu que, no entanto, não são citadas, nem nos dias de trabalho e nem nas festas comemorativas. Encontramos sim, bem citadas, as Linhas de Pretos-Velhos (Almas) e Crianças – as demais eram comemorativas dos Guias Chefes, da Umbanda em si e da Tenda Nossa Senhora da Piedade. Por que ele determinou Sete? Está aí uma outra boa pergunta que deveriam ter feito a ele. 5- Que não vemos aqui a inserção de Oxum, Nanã, Obaluaê, Omulú, Oxalá, Oiá, Obá ou qualquer outro considerado Orixá nas Nações afro. Se a Umbanda Original fosse de Orixás, seria pelo menos razoável que, já em seu início, considerasse os 16 escolhidos pelo Candomblé dentre tantos outros africanos, não acha? 6- Vemos, por um outro lado, que Santo Antonio, também Santo Católico mas não considerado Linha de Trabalho então, também era festejado em seu dia, já por influência de Pai Antonio – ambos eram festejados em 13 de junho. 7- Que a Doutrina básica da Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas baseava-se em livros Kardecistas e num outro que talvez fosse o único escrito na ocasião: O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda – do senhor Leal de Souza que veio a ser médium da Tenda Nossa Senhora da Piedade recebendo, posteriormente, a incumbência de abrir a Tenda de Nossa Senhora da Conceição (veja bem: não é de Yemanjá ou Oxum). Aliás, sobre o senhor Leal de Souza, consta na história que ele divulgava ter sido o Caboclo Curugussú aquele que preparara o terreno para que o CDSE viesse, após, anunciar a Umbanda Branca. Dizia-nos ele numa entrevista publicada no Jornal de Umbanda de outubro de 1952, com o título de “Umbanda – Uma Religião Típica do Brasil: “ A Linha Branca de Umbanda é realmente a religião nacional do Brasil, pois que, através dos seus ritos, os espíritos dos ancestrais, os pais da raça, orientam e conduzem a sua descendência. O precursor da Linha Branca foi o Caboclo Curugussú, que trabalhou até o advento do Caboclo das Sete Encruzilhadas que a organizou, isto é, que foi incumbido pelos Guias Superiores, que regem o nosso ciclo psíquico de realizar na Terra a concepção do espaço”...

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Infelizmente o médium Leal de Souza, que inclusive ensaiou uma codificação das Linhas de Umbanda (que cito abaixo) não deixou claro quem teria sido o médium do Caboclo Curugussú e nem onde ele teria se manifestado. Segundo ainda Leal de Souza, em 1925, seriam as Linhas de Umbanda como se seguem:Oxalá (Nosso Senhor do Bonfim), Ogum (São Jorge), Euxossi/Oxossi (São Sebastião), Shangô/Xangô (São Jerônimo), Nhan-Shan /Yansã (Santa Bárbara), Yemanjá (Nossa Senhora da Conceição) e Almas – utilizei a grafia como a encontrei e a que agora vemos. Perceba que mesmo aqui não há menção a Exus na Umbanda e, para conhecimento de todos, essas linhas de trabalho foram ratificadas no 1º Congresso Brasileiro de Espiritismo e Umbanda realizado em 1941, no Rio de Janeiro. O que isso quer dizer? Que para que fosse realmente reconhecido como Umbanda, todo e qualquer grupamento deveria seguir estas determinações, assumindo estas Linhas de Trabalho. Quer dizer também que, na ocasião, todos os que se auto-rotularam Umbanda e não seguiam estas determinações, já estavam se valendo de um nome ritualístico do qual não deveriam lançar mão. E também nos posiciona melhor sobre os porquês de hoje em dia existirem tantas diversidades. O fato é este: O Congresso não teve a força que deveria ter ou, por outro lado, suas determinações não foram reconhecidas por uma grande parte que queria “fazer Umbanda”... mesmo não fazendo. Mas como não introduzirmos Oxum? E Exu? Vai ficar fora da Umbanda? Como diz o popular: “Tudo o que se repete de forma contumaz acaba virando verdade” e, como desde o início à Umbanda foram adicionadas Linhas outras e também outras formas de trabalho, desde que os Princípios Basilares da Umbanda sejam respeitados, cada grupamento espiritual tende a aceitar e adotar mais essas ou aquelas Linhas, esse ou aquele ritual, essa ou aquela liturgia ou mesmo técnica de trabalho como é hoje a Apometria que, mais rudemente, já era executada em diversos Centros de Umbanda, mormente os que eram (e ainda são) chamados de “Mesa Branca”. O que não vale mesmo é um grupamento querer “puxar a brasa pra sua sardinha” e dizer que Umbanda tem que voltar às raízes afro que nunca teve, ou que tem que deixar o Cristianismo (observe que não é Catolicismo) de lado, como se este não fosse um de seus pilares. Que outras Linhas agregadas não podem ser aceitas na Umbanda. Dentro de padrões, pelo menos racionais, podem sim, dependendo do Chefe Espiritual da Casa de Umbanda (o que manda mesmo) que obrigatoriamente tem que ser ou um Caboclo ou um Preto-Velho, esses sim, marcas registradas da Umbanda. O que não pode é essas Linhas Agregadas tomarem conta da Banda e saírem, por exemplo, em louvação à Mãe Lua, à Mãe Terra, etc., ou criando giras e rituais somente seus a ponto de mudarem totalmente os objetivos maiores das Sessões ou Giras de Umbanda, ou fazerem como Chefe Espiritual do Terreiro: baianos, mineiros, exus, ciganos etc. e tal. Todos podem ser entidades de grande valor nos trabalhos, desde que a eles tenham sido ensinados os objetivos e formas de trabalho da Umbanda, mas, como são agregados auxiliares, não tem ordem de comando para dirigirem verdadeiros Terreiros de Umbanda, a não ser sob vigilância de um Verdadeiro Caboclo ou Preto Velho. E como sei que alguns, ao lerem, vão logo querer defender as Falanges de Ciganos, deixo bem claro que não há ataque algum a qualquer tipo de falange neste texto e sim constatação de fatos. Vou adiantando aqui que, embora venham sendo aceitos em alguns Terreiros (não todos) e não há muito tempo, como querem fazer crer outros mais, essas falanges têm suas formas de ver e agir, bem assim como princípios religiosos e de louvação, bastante distintos do que sempre foi preconizado para a Umbanda e, até onde sei, há até mesmo indicações para que seus altares sejam diferenciados do altar mor dos Terreiros – o Congá. E pra reforçar ainda mais, vemos em muitos Terreiros Giras especialmente organizadas para o dia dos Ciganos e Ciganas, numa clara demonstração (só não percebe quem não quer) de que a ritualística deles tem que ser especial – sem Caboclos ou Pretos Velhos por perto – e, preferencialmente, com louvação a Santa Sara e não a Orixás ou Santos, embora já se veja, por parte de mais alguns, uma tentativa de adaptação dessas crenças para justificarem ciganos como povo de Umbanda. Tenho nada contra quem faz assim e o que vou dizer não lhes tira o valor quando chegam para trabalhar pela Caridade verdadeiramente. Cada um chama e trabalha com as entidades que achar melhor e até muito positivamente, eu creio. Mas que são entidades fora do contexto de Umbanda, lá isso são. Saudações fraternas a todos. Faltava-nos ainda saber, com mais detalhes, como se processavam as sessões e os rituais na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade. As mesmas podem ser observadas no – REGIMENTO INTERNO DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE, acima. Iremos aqui, sucintamente enumerá-los a fim de nos inteirarmos superficialmente como eram efetuados.

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SESSÕES E RITUAIS DA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE

Sessão de Caridade:

Caracteriza-se por ser Sessão de Caridade, àquela destinada ao atendimento fraterno aos assistidos efetuadas por Pretos-Velhos e/ou Caboclos. Sessão de Mesa:

No centro da Tenda é disposta uma “Mesa de Trabalho” de madeira com cadeiras ao redor. Às cabeceiras sentam-se os médiuns responsáveis pelos trabalhos que ali irão ocorrer. Nas outras cadeiras à volta de mesa sentarão os médiuns que efetuarão o trabalho requerido (desobsessão (descarrego), firmezas, etc.). Enquanto se procede os trabalhos na mesa, o restante dos médiuns manifestados juntamente com os cambonos realizam os trabalhos de caridade em atendimentos fraternos. A Mesa de Trabalho em si é um objeto indispensável nas Sessões de Umbanda, uma vez que serve de apoio e contato para os trabalhos de um modo geral. É em volta da Mesa de Trabalho que os médiuns se reúnem para sessões específicas. É a partir dela que é realizado um estudo, rezas, preleções, reuniões, evangelização, consultas ou desenvolvimento mediúnico. É através dela que os médiuns realizam seus trabalhos de desobsessão. Enfim, pode-se utilizar a Mesa de Trabalho para diversos fins.

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Sessão de Descarga: Esta Sessão é exclusivamente restrita aos médiuns da Tenda. Caracteriza-se como principal tarefa, a de efetuar descarregos dos membros e da Tenda em si. Durante esta Sessão, os Caboclos incorporam em seus médiuns, dando-lhes firmeza, logo após “sobem” e permitem, se for o caso, sob a regência do Guia Chefe, a incorporação de Exus nos médiuns previamente escolhidos para efetuarem à limpezas mais específicas. Esse descarrego é realizado uma vez por mês ou quando determinado pela necessidade. Sessão de Doutrina: É a Sessão doutrinária e de desenvolvimento mediúnico realizada pelo Guia Chefe. Em época, era realizada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, onde dava seu parecer sobre os assuntos ritualísticos da Tenda e acerca das demais por ele fundadas, bem como também instruir seus Dirigentes. Sessão Extraordinária: Esta sessão se caracteriza pela realização de batizados e casamentos, ou reuniões gerais com outras Tendas para formalizar festividades e outros. AS SESSÕES FESTIVAS E ESPECIAIS DA LINHA BRANCA As sessões festivas na Linha Branca de Umbanda e Demanda, são comemorações e homenagens às Linhas, menos da sétima: a Linha de Santo.

O dia 20 de janeiro ligado a Oxossi e São Sebastião/Caboclos; O dia 23 de abril ligado a Ogum e São Jorge; O dia 13 de maio ligado aos Pretos-velhos (Almas dos Pretos Cativos); O dia 13 de junho ligado a Santo Antônio e ao Pai Antônio; O dia 15 de setembro em homenagem à Nossa Senhora da Piedade; O dia 27 de setembro ligado aos Ibejis e São Cosme e São Damião/Linha das Crianças; O dia 30 de setembro ligado a Xangô e São Jerônimo; O dia 16 de novembro na lembrança do aniversário do Caboclo das Sete Encruzilhadas; O dia 4 de dezembro ligado a Yansã e Santa Bárbara; O dia 8 de dezembro ligado a Yemanjá e Oxum e Nossa Senhora da Conceição.

Para não confundirmos as festas religiosas com festas profanas regadas a comes e bebes, vamos relembrar as palavras de Pai Antonio: “Festa é fazer a caridade”. As festas na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade eram realizadas em comunhão religiosa, e, posteriormente, os trabalhos caritativos em atendimentos fraternos ocorriam normalmente. O RITUAL DAS FITAS OU RITUAL DA GARRAFA DE MALLET

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Este ritual fora trazido pelo Orixá Mallet através de Pai Antônio não conseguindo precisar a data com certeza.

Antes de qualquer coisa devemos entender que o Ritual das Fitas precede o Amaci por questões fluídicas, mas que são rituais intimamente ligados. Na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade realizam-se três dias seguidos de trabalhos para somente concluir o Amaci. No primeiro dia, geralmente uma sexta-feira, realiza-se, a Sessão de Descarga que têm por objetivo eliminar fluidos danosos; no segundo dia realiza-se o Ritual das Fitas de Mallet e caridade; e no terceiro dia consecutivo, o Amaci. O Ritual das Fitas consiste em reforçar as ligações fluídicas dos médiuns com as Sete Linhas, para que no dia seguinte o Amaci fixe estes fluidos na coroa dos médiuns. São organizadas as fitas (branca, verde, vermelha, amarela, azul clara e roxa) representativas das Sete Linhas. Prepara-se uma garrafa de cerveja branca.

A sessão tem seu início, como de costume, onde a Mesa de Umbanda é formada, e o Guia Chefe manifestado, abre os trabalhos. Após, os Caboclos e/ou Pretos-Velhos incorporam em seus médiuns para lhes dar firmeza; após isto estes Guias desincorporam, e começa o ritual. O Cambono Chefe auxiliado pelos outros cambonos organizam as fitas e as amarram na ponta da garrafa. Então o Cambono Chefe ergue a garrafa até certa altura, e são feitas algumas filas de médiuns; na ponta de cada fila, encabeçando-a está um Babá da Tenda que segurará uma das fitas. O Guia Chefe do Terreiro então solicita os pontos cantados de cada uma das Linhas, e todas as filas começam a trançar as fitas na garrafa. Depois de trançada, a garrafa é guardada para ser despachada no dia seguinte após o Amaci. O Ritual das Fitas termina, e a Mesa de Umbanda é levantada. A importância deste ritual está em fortalecer as ligações fluídicas entre as Linhas e a coroa dos membros da Tenda.

SESSÃO DO AMACI

Nota do autor: A palavra Amaci é a forma aportuguesada do termo Yorubá – “Amã tìsi” –, que quer dizer: Amã: “partícula que indica hábito, costume”, usada com o verbo – Tìsí: “empurrar para dentro”. Portanto, Amaci quer dizer: “o hábito de empurrar para dentro”, numa alusão a “empurrar” a força vital das ervas para dentro da cabeça, nos centros de força etéricos. Não posso dizer ao certo em que momento da história da TENSP este ritual surgiu, mas sabe-se muito bem a sua finalidade e sua importância desde que foi trazido pelo espírito de Pai Antônio sob ordens de Orixá Mallet. No Candomblé, existe um ritual homônimo que utiliza a lavagem de cabeça com ervas, porém bem distinto deste praticado na Umbanda e que descreverei de maneira simples e objetiva... O seu objetivo é basicamente, com a lavagem de cabeça, limpar o campo energético do médium para a melhor aproximação de energias dos Espíritos mais elevados da Umbanda. Para os consulentes, é uma boa oportunidade para limpar o campo energético do corpo e trazer fluidos melhores; estes podem participar desde que vestidos com roupa branca e em preceito, o que nos leva a concluir que este ritual tem por objetivo maior anular e neutralizar fluidos danosos de quem assim desejar, agindo de maneira mais indireta na mediunidade dos indivíduos. A Sessão de Amaci só é feita depois do Ritual de Fitas de Orixá Mallet, pois é energeticamente dependente deste...

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O Rito A lavagem da cabeça dos médiuns é feita sobre uma cama de folhas de mangueira, elas tem a função de descarga, de atrair energias negativas do campo energético do corpo. As folhas são colhidas por médiuns homens escolhidos pela entidade dirigente da sessão já na sessão de Fitas; neste grupo deve estar presente pelo menos um “cambono” ( membro responsável pela organização material da Tenda, bem como a manutenção da ordem e da disciplina durante as sessões ) para supervisionar os médiuns na manutenção da concentração, enquanto as mulheres preparam e limpam a Tenda com água e sal grosso. Durante todo o processo de colheita das folhas até a montagem da cama é entoado o ponto específico para o ritual: “Mangueira, mangueira; Mangueira de Umbanda; Folha por folha Umbanda; Lá no mato tem Umbanda; Vamos cruzar; Para salvar; Filhos de Umbanda com seu patuá” Depois de colhidas, as folhas são levadas para a Tenda onde são selecionadas, ou seja, são utilizadas somente as folhas inteiras e sem manchas e com elas é montada a cama no meio do salão. São riscados os pontos das seis Linhas de Umbanda em frente ao congá por seis babás da casa (escolhidos pela entidade dirigente dos trabalhos), seguidos dos pontos riscados de Exu correspondes a cada uma das seis linhas.

Feito isso, o Guia chefe recebe todos os médiuns e pessoas que desejam participar do ritual, que são orientados a mentalizar pedidos de bons agouros e boa ventura desde a colheita de sua folha até o momento em que o Guia dirigente dos trabalhos irá recebê-la para picá-la em pequenos pedaços (folhas estas de qualquer espécie, com exceção de folhas com espinhos, comigo-ninguém-pode e folha de mangueira). Estas folhas são picadas junto à uma bacia de ágata de cor branca num banho que é composto por todas as bebidas usadas na casa, dentre elas as bebidas correspondentes às sete linhas.

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Em ordem de tempo de casa, os membros da Tenda vão deitando na cama de folhas para a lavagem da cabeça pelo Guia chefe que de acordo com a necessidade, vai pedindo o ponto cantado específico de cada Linha ou entidade, que geralmente se manifestam assim que o médium se levanta.

As folhas são descarregadas em um rio e as pessoas que participaram do rito, por questões fluídicas, devem permanecer por pelo menos 03 dias com o banho na cabeça, ou então podem lavá-las em uma cachoeira com o Guia chefe da casa.

Terminada a lavagem, é feita a queima da pólvora que cobre os pontos riscados de ligação e dos comandantes das respectivas falanges de Exu pelos mesmos Babás escolhidos anteriormente pela cabeceira da Mesa de Umbanda (pontos riscados das seis Linhas), que depois de acesos são limpos com aguardente e água, após isso são levantados todos os pontos da Mesa de Umbanda fazendo a limpeza com as suas respectivas bebidas dispostas nos pontos durante toda a sessão, é feita a prece de encerramento e o Hino de Umbanda encerrando assim as atividades da casa depois de 03 dias seguidos de sessão. (Pedro Kritski)

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A MESA DE UMBANDA

A Mesa de Umbanda se constitui por uma série de pontos que são riscados à frente do Peji seguindo uma ordem hierárquica. Em primeiro o ponto do Guia-Chefe da Tenda, aos lados os Subchefes, abaixo destes, vêm os pontos riscados das seis Linhas Brancas. Somente os Babás podem riscar a Mesa de Umbanda. Vale ressaltar que, a Mesa de Umbanda é riscada antes do início da Sessão pelo Guia-Chefe da Tenda. Os pontos da mesa possuem um modo próprio de serem firmados.

Ziméia de Moraes (filha de Zélio) e Lygia Cunha (neta de Zélio) firmando a Mesa de Umbanda

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O QUE É A LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA Vamos expor algumas noções sobre a Linha Branca de Umbanda e Demanda preconizada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, expostos por Leal de Souza, primeiramente em reportagens no Diário de Notícias com o título “A Magia e as Sete Linhas de Umbanda”, e posteriormente agregadas e disponibilizadas em um livro: “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” (1933), ensinamentos esses, seguidos pela Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, até hoje. Disponibilizaremos algumas dessas importantes reportagens, entre as quais, algumas não estão inseridas no livro citado; algumas estarão inseridas em outros assuntos deste livro. Todas as reportagens originais de Leal de Souza estarão disponibilizadas juntamente deste livro, em nosso site, sob o título “Reportagens Históricas”. Nesses escritos vamos entender o que é a Linha Brande Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas, suas características, rituais e finalidades. Observaremos que a Linha Branca de Umbanda é uma modalidade de Espiritismo, com peculiaridades ritualísticas e doutrinárias, acatando e apregoando a Doutrina Espírita, mas, sem ser kardecismo, que é outra modalidade de espiritismo. Aliás, em Doutrina Espírita não há nada que condene as práticas da Linha Branca de Umbanda; pelo contrário, prova-as elucidando-as.

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O livro anterior a que se refere à reportagem, é o “No Mundo dos Espíritos”, uma coletânea de tudo o que foi escrito por Leal de Souza nas reportagens intituladas: “Inquérito A Noite”, pelo jornal “A Noite”.

AS SUBDIVISÕES DO ESPIRITISMO O espiritismo no Rio de Janeiro, como em toda parte, varia em modalidades, dividindo-se em ramificações. Possuímos, nesta capital, centros ligados pela orientação e pelos ritos à tradição dos velhos tempos egípcios. Temos as diversidades das lojas teosóficas, a que faço, com simpatia, estas referências receosas, pelo dever de constatar-lhes a existência, pois muitos teosofistas não gostam de ser confundidos com os espíritas. Contam-se, também, institutos moldados com adaptações locais sobre antigos modelos indianos. O espiritismo cientifico, com o rigor integral de suas pesquisas, é o menos cultivado na antiga capital do Brasil, certamente pelos pendores religiosos de nosso povo. O kardecismo, que reputa os seus aderentes os únicos praticantes da doutrina, como a pregava Allan Kardec, igualmente varia, onímodo, em seus processos e práticas. Há centros representativos da intransigente pureza do espiritualismo sem liga, e os há revestidos de altiva nobreza intelectual, a par dos humílimos, constituídos dos chamados pobres de espírito. A LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA A organização das Linhas no espaço corresponde a determinadas zonas na Terra, por largos ciclos no tempo. Atendem-se, ao constituí-las, as variações de cultura moral e intelectual, aproveitando-se as entidades mais afins com as populações dessas paragens. Por isso, o Espiritismo de Linha se reveste, nos diversos países, de aspectos e característicos regionais. Nas Falanges da Linha Branca de Umbanda e Demanda já se identificaram índios de quase todas as tribos brasileiras, sendo que numerosos foram europeus em encarnações anteriores; pretos da África e da Bahia, portugueses, espanhóis, muitos ilhéus malaios, muitíssimos hindus. Pode-se, no Terreiro de Umbanda, estudando-se as manifestações de Caboclos e Pretos, estabelecer as diferenças raciais, distinguir as tendências das mentalidades desses dois ramos da árvore humana, surpreender os costumes de seus povos e comparar as duas psicologias. O Caboclo autêntico, vindo da mata, através de um aprendizado no espaço, para a Tenda, tem o entusiasmo intolerante do cristão novo; é intransigente como um frade, atirando a face os nossos defeitos e até com as nossas atitudes se mete. Ouvindo queixas dos que sofrem as agruras da vida, responde zangado que o Espiritismo não é para ajudar ninguém na vida material, e atribui os nossos sofrimentos a erros e faltas que teremos de pagar. Mas, em dois ou três anos de contato com as misérias amargas de nossa existência, suaviza a sua intransigência e acaba ajudando materialmente os irmãos encarnados, porque se condói de sua penúria e deseja vê-los contentes e felizes.

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O Preto, que gemeu no eito sob o bacalhau do feitor, esse não pode ver lágrima que não chore, e quase sempre sai a desbravar os caminhos dos necessitados, antes que lhe peçam. O negro da África difere um pouco do da Bahia; aquele, na sua bondade, auxilia a quem pode, porém, às vezes, se irrita com os jactanciosos e com os ingratos, mas o da Bahia, em casos semelhantes, enche-se de piedade, pensando nas dificuldades que os maus sentimentos vão levantar na estrada de quem os cultiva. A Linha Branca de Umbanda e Demanda tem o seu fundamento no exemplo de Jesus, expulsando a vergalho os vendilhões do templo. Às vezes, é necessário recorrer à energia para reprimir o sacrilégio, consistente na violação das leis de Deus em prejuízo das criaturas humanas. O homem prejudica o seu semelhante por inconsciência, ignorância ou maldade. Nos dois primeiros casos, a Lei de Umbanda, manda esclarecer a quem está em erro, até convencê-los de sua falta, impedindo-o, desde logo, de continuar a sua ação maléfica. No segundo caso, reprime singelamente o perverso. Pra exemplificar: a polícia, com freqüência, sitia e fecha Centros Espíritas, ou que como tais se apresentam e prende os seus componentes. Quando o Centro, como tantas vezes tem acontecido, é da Linha Branca, o seu Guia considera: “A autoridade cometeu uma injustiça, sem a intenção de cometê-la. O seu desejo era cumprir o dever, defendendo a sociedade. Confundiu a nossa Linha com a outra, tratando-nos como malfeitores sociais”. Devemos procurar esclarecer os poderes públicos, para evitar confusões semelhantes. Se a Casa atingida pela perseguição policial pertencia à Magia Negra, o que raríssimas vezes acontece, as entidades espirituais reagem e castigam até com brutalidade os repressores de sua atividade. Há muitos ex-delegados que conhecem a causa de desgraças que os feriram na situação social na paz dos lares. O objetivo da Linha Branca de Umbanda e Demanda é a prática da Caridade, libertando de obsessões, curando as moléstias de origem ou ligação espiritual, desmanchando os trabalhos de Magia Negra, e preparando um ambiente favorável a operosidade de seus adeptos. Os sofrimentos que nos afligem são uma prova, ou provação, ou provém dos nossos próprios erros, ou da maldade dos outros. Em caso de prova, temos de suportá-la até o limite extremo, e os filhos de Umbanda procuram atenuá-las, ensinando-nos a resignação, mostrando-nos a bondade de Deus, que nos permite o resgate de nossas culpas sem puni-las com penalidades eternas, descrevendo-nos os quadros de nossa felicidade futura. Se as nossas dores e dificuldades significam conseqüências de nossas faltas, os Protetores de Umbanda nos aconselham a repará-las, conduzindo-nos com amor e paciência, ao arrependimento. Na terceira hipótese, reprimem energicamente os malvados que nos perseguem do espaço para cevar ódios da Terra. Nas angústias de nossa vida material, afastam de nosso ambiente, purificando-o os fluidos da inveja, da cobiça, da antipatia e da inimizade. O tratamento da obsessão, as curas das doenças de natureza espiritual, constitui os trabalhos de caridade; os outros, os de demanda; porém, os dois são absolutamente gratuitos. Se algum médium se esquece de seus deveres e recebe dinheiro, ou coisa correspondente, pela caridade feita, pelo seu Protetor, este se retira, abandonando-o à entidades que em geral o reduzem a miséria. A hierarquia, na Linha Branca, é positiva, mantendo-se com severidade. Todos os seus dirigentes espirituais proclamam e reconhece a autoridade de Ismael, Guia do Espiritismo no Brasil. A incorporação é sempre um fenômeno complexo, que se processa mediante acidente psicológico, físico e espiritual, e tem na Linha Branca de Umbanda a expressão máxima de sua transcendência. Vulgarmente, basta que o Espírito se assenhoreie dos órgãos cerebrais, vocais, e manuais, ou de todos os chamados nobres, para fazer a comunicação verbal ou escrita, e dar passes. Na Linha Branca, precisa apropriar-se de todo o organismo do médium, porque nesse corpo vai viver materialmente algumas horas, movendo-se, utilizando-se de objetos, às vezes suportando pesos. A incorporação na Linha Branca é quase uma reencarnação, no dizer de um Espírito. Dir-se-á que todos os socorros prestados pela Linha Branca poderiam sê-lo, sem os seus trabalhos, pelos altos Guias, pelos Espíritos superiores. Os Espíritos de luz que baixam à Terra, e se conservam em nossa atmosfera orientam Falanges ou desempenha outras missões, e não contrariam, nem poderiam contrariar, desígnios em que se enquadram as funções de todos os servos da fé, grandes ou pequeninos, se em algumas situações lhes é permitido exercer a sua ação instantânea em favor de quem soube merecê-la, na maioria das circunstâncias deixam o indivíduo, pelas faltas do passado ou pelas culpas do presente, submeter-se ao que lhe parece uma degradação.

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Estamos numa época amargurada de arrogante orgulho intelectual e insolente vaidade mundanaria, e, para abater a paropsia desses orgulhosos, os episódios de suas existências se encadeiam de modo a arrastá-los a implorar e a receber a misericórdia de Deus, por intermédio dos Espíritos mais atrasados, ou que como tais se apresentam. OS ATRIBUTOS E PECULIARIDADES DA LINHA BRANCA Os chamados atributos da Linha Branca de Umbanda e Demanda, em seu uso vulgar, causam viva impressão de extravagância ridícula as pessoas de hábitos sociais aprimorados, convencendo-as do atraso dos Espíritos incumbidos de usá-los. Mas essas práticas assentam em fundamentos razoáveis. Procuremos esclarecê-las, dizendo, do pouco que sabemos, o que nos for permitido divulgar. Antes, porém, é conveniente estabelecer e afirmar que as imagens muitas vezes existentes nos recintos das Sessões da Linha Branca, não representam um contingente obrigatório do culto, pois são, apenas, permitidas, ou, antes, significam uma concessão dos Guias, tornando-se, com freqüência, necessárias para atender aos hábitos e predileções de muitíssimas pessoas e de muitíssimos Espíritos. Quando se coloca uma imagem num recinto de trabalho, celebra-se o seu cruzamento, cerimônia pela qual se estabelece a sua ligação fluídica com as entidades espirituais responsáveis pelas reuniões. Renova-se essa ligação automaticamente sempre que há Sessão, durante a qual a imagem se transforma em centro de grandes e belos quadros fluídicos. Encaremos, agora, o assunto principal deste escrito.

Linguagem: A Linha Branca de Umbanda e Demanda tem um idioma próprio, para regular os seus trabalhos, designar os seus atributos e cerimônias, e evitar a divulgação de conhecimentos suscetíveis de uso contrário aos seus objetivos caridosos. Em suas manifestações, conversando entre si, os Espíritos, para não serem entendidos pelos assistentes, empregam o linguajar de cabindas africanas, de tribos brasileiras, das regiões onde encarnaram pela última vez. No trato com as pessoas, excetuados os grandes Guias, usam da nossa língua comum, deturpando-a a maneira dos Pretos ou dos Caboclos. Esses trabalhadores do espaço desejam que os julguem atrasados, afim de que os indivíduos que se reputam superiores e são obrigados a recorrer à humildade de Espíritos inferiores percebam e compreendam a sua própria inferioridade.

Roupa: Usam-se, em certos trabalhos, roupas brancas, para evitar o amortecimento e arritmia das

vibrações, pelas diversidades de coloração. Pode-se acrescentar que os filhos de Umbanda aconselham o uso habitual dos tecidos claros, pelas mesmíssimas razões expressas no apelo dirigido, há anos pelo clube médico desta capital, quando pediu a população carioca o abandono dos padrões escuros.

Calçados: Em certas ocasiões, trabalha-se com os pés descalços, quando não é possível mudar o

calçado na Tenda, pois os sapatos com que andamos nas ruas pisam e afundam principalmente nas esquinas em fluidos pesados que se agitam como gazes a flor do solo, e que dificultam as incorporações ou se espalham pelo recinto da reunião, causando perturbações.

Atitudes: Não se permite cruzar as pernas e os braços durante as sessões, porque, como vimos na

Magia Negra, essas atitudes quebram ou ameaçam violentamente a cadeia de concentração, impedem a evolução do fluido com que cada assistente deve contribuir para o trabalho coletivo; determinam, com essa retenção, perturbações físicas e até fisiológicas e impossibilitam a incorporação, quando se trata de um médium. Ao descer de certas Falanges, como em alguns atos de descarga, sacode-se o corpo em cadência de embalo, na primeira hipótese, para facilitar a incorporação, e na segunda para auxiliar o desprendimento de fluidos que não nos pertençam.

Guia: É um colar de contas da cor simbólica de uma ou mais linhas. Fica, mediante o cruzamento, em

ligação fluídica com as Entidades Espirituais das Linhas que representa. Desvia, neutraliza ou enfraquece os fluidos menos apreciáveis. Periodicamente, é lavado, nas sessões, para limpar-se da gordura do corpo humano, bem como dos fluidos que se aderiram, e de novo cruzada.

Banho de Descarga: Cozimento de ervas para limpar o fluido pesado que adere ao corpo, como um

suor invisível. O banho de mar, em alguns casos, produz o mesmo resultado.

Cachaça: Pelas suas propriedades, é uma espécie de desinfetante para certos fluidos; estimula outros, os bons; atrai, pelas vibrações aromáticas, determinadas entidades, e outros bebem-na quando incorporados, em virtude de reminiscência da vida material.

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Fumo: Atua pelas vibrações do fogo, e do aroma. A fumaça neutraliza os fluidos magnéticos adversos. É freqüentemente ver-se uma pessoa curada de uma dor de cabeça ou aliviada do incomodo momentâneo de uma chaga, por uma fumarada.

Defumador: Atua pelas vibrações do fogo, e do aroma, pela fumaça e pelo movimento. Atrai as

entidades benéficas e afasta as indesejáveis, exercendo uma influência pacificadora sobre o organismo.

Ponto Cantado: É um hino muitas vezes incoerente, porque os Espíritos que nos ensinam, o

compõem de modo a alcançar certos efeitos no plano material sem revelar aspectos do plano espiritual. Tem, pois, duplo sentido. Atua pelas vibrações, opera movimentos fluídicos e, harmonizando os fluidos, auxilia a incorporação. Chama algumas entidades e afasta outras.

Ponto Riscado: É um desenho emblemático ou simbólico. Atrai, com a concentração que determina

para ser traçado, as entidades ou falanges a que se refere. Tem sempre uma significação e exprime, às vezes, muitas coisas, em poucos traços.

Ponteiro: É um punhal pequeno, de preferência com cruzeta na manda, ou empunhadura. Serve para

calcular o grau de eficiência dos trabalhos, pois as forças fluídicas contrárias, quando não foram quebradas, o impedem de cravar-se ou o derrubam, depois de firmado. Tem ainda a influência do aço, no tocante ao magnetismo e a eletricidade.

Pólvora: Produz, pelo deslocamento do ar, os grandes abalos fluídicos.

Pemba: Bloco de giz. Usa-se para desenhar os pontos. Esses recursos e meios não são usados

arbitrariamente em qualquer ocasião, nem são necessários nas sessões comuns. A pólvora, por exemplo, só deve ser empregada em trabalhos externos, realizados fora da cidade, ao ar livre. Nos últimos anos, os Guias não têm permitido que os Centros ou Tendas guardem ou possuam em suas sedes pemba, punhais, ou pólvora, concorrendo, com as suas instruções, para que sejam obedecidas as ordens das autoridades públicas.

AS SETE LINHAS BRANCAS A Linha Branca de Umbanda e Demanda, compreende Sete Linhas: a primeira de Oxalá; a segunda de Ogum; a terceira, de Euxoce (Oxossi); a quarta, de Xangô; a quinta de Nha-San (Yansã); a sexta de Amanjar (Yemanjá); a sétima é a Linha de Santo, também chamada de Linha das Almas. Essas designações significam, na língua de Umbanda – a primeira, Jesus, em sua invocação de Nosso Senhor do Bonfim; a segunda, São Jorge; a terceira, São Sebastião; a quarta, São Jerônimo; a quinta, Santa Bárbara; e a sexta, a Virgem Maria, em sua invocação de Nossa Senhora da Conceição. A Linha de Santo é transversal, e mantém a sua unidade através das outras. Cada Linha tem o seu ponto emblemático e a sua cor simbólica. A de Oxalá, a cor branca; a de Ogum a encarnada; a de Euxoce (Oxossi), verde; a de Xangô, roxa; a de Nha-San (Yansã), amarela; a de Amanjar (Yemanjá), azul. Oxalá é a linha dos trabalhadores humílimos; tem a devoção dos Espíritos de Pretos de todas as regiões, qualquer que seja a Linha de sua atividade, e é nas suas Falanges, com Cosme e Damião, que em geral aparecem as entidades que se apresentam como Crianças. A Linha de Ogum, que se caracteriza pela energia fluídica de seus componentes, Caboclos e Pretos da África, em sua maioria, contém em seus quadros as Falanges guerreiras de demanda. A Linha de Euxoce (Oxóssi), também de notável potência fluídica, com entidades, frequentemente dotadas de brilhante saber, é, por excelência, a dos indígenas brasileiros. A Linha de Xangô pratica a caridade sob um critério de implacável justiça: – quem não merece, não tem; quem faz, paga. A Linha de Nhan-San (Yansã) consta de desencarnados que na existência térrea eram devotados de Santa Bárbara. A Linha de Amanjár (Yemanjá) é constituída dos trabalhadores do mar, Espíritos das tribos litorâneas, de marujos, de pessoas que perecem afogadas no oceano.

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A Linha de Santo é forma de pais de mesa, isto é, de médium de “cabeça cruzada”, assim chamados porque se submeteram a uma cerimônia pela qual assumiram o compromisso vitalício de emprestar o seu corpo, sempre que seja preciso, para o trabalho de um Espírito determinado, e contraíram “obrigações”, equivalentes a deveres rigorosos e realmente invioláveis, pois acarretam, quando esquecidos, penalidades aspérrimas e inevitáveis. Os trabalhadores espirituais da Linha de Santo, Caboclos ou Negros, são egressos da Linha Negra, e tem duas missões essenciais na Branca – preparam, em geral, os despachos propiciatórios ao Povo da Encruzilhada, e procuram alcançar amigavelmente de seus antigos companheiros, a suspensão de hostilidades, contra os filhos e protegidos da Linha Branca. Por isso, nos trabalhos em que aparecem elementos da Linha de Santo, disseminados pelas outras seis, estes ostentam, com as demais cores simbólicas, a preta, de Exu. Na Falange geral de cada linha figuram Falanges especiais, como na de Euxoce (Oxossi), a de Urubatan, e na de Ogum, a de Tranca-Rua, que são comparáveis as brigadas dentro das divisões de um exército. Todas as Falanges tem característicos próprios para que se reconheçam os seus trabalhadores quando incorporados. Não se confunde um Caboclo da Falange de Urubatan, com outro de Araribóia, ou de qualquer Legião. As Falanges dos nossos indígenas, com os seus agregados, formam o “Povo das Matas”; a dos Marujos e Espíritos da Linha de Amanjar (Yemanjá), o “Povo do Mar”; os Pretos Africanos, o “Povo da Costa”; os Baianos e mais negros do Brasil, o “Povo da Bahia”. As diversas Falanges e Linhas agem em harmonia, combinando os seus recursos para a eficácia da ação coletiva. Exemplo: ... Muita vez, uma questiúncula mínima produz uma grande desgraça... Uma mulatinha que era médium da Magia Negra, empregando-se em casa de gente opulenta, foi repreendida com severidade por ter reincidido na falta de abandonar o serviço para ir a esquina conversar com o namorado. Queixou-se ao dirigente do seu antro de magia, exagerando, sem dúvida, os agravos, ou supostos agravos recebidos, e arranjou, contra os seus patrões um “despacho” de efeitos sinistros. Em poucos meses, marido e mulher estavam desentendidos, um, com os negócios em descalabro, a outra, atacada de moléstia asquerosa da pele, que ninguém definia, nem curava. Vencidos pelo sofrimento e sem esperança, o casal, aconselhado pela experiência de um amigo, foi a um Centro da Linha Branca de Umbanda, onde, como sempre acontece, o Guia, em meia hora, esclareceu-o sobre a origem de seus males, dizendo quem e onde fez o “despacho”, o que e por que mandou fazê-lo. E, por causa desse rápido namoro de esquina, uma família gemeu na miséria, e a Linha Branca de Umbanda fez, no espaço, um de seus maiores esforços. Propiciou-se as entidades causadoras de tantos danos, com um ”despacho” igual ao que as lançou ao malefício, e, como o presente não surtisse resultado, por não ter sido aceito, os trabalhadores espirituais da Linha de Santo agiram, junto aos seus antigos companheiros de Encruzilhada, para alcançar o abandono pacífico dos perseguidos, mas foram informados que não se perdoava o agra a médiuns da Linha Negra. Elementos da Falange de Euxoce (Oxossi) teceram as redes de captura, e os secundou, com o ímpeto costumeiro, a Falange guerreira de Ogum, mas a resistência adversa, oposta por blocos fortíssimos, de Espíritos adestrados nas lutas fluídicas, obrigou a Linha Branca a recursos extremos, trabalhando fora da cidade à margem de um rio. Com a pólvora sacudiu-se o ar, produzindo-se formidáveis deslocamentos de fluidos; apelou-se, depois, para os meios magnéticos, e, por fim, as descargas elétricas fagulharam na limpidez puríssima da tarde. Os trabalhadores de Amanjar (Yemanjá), com a água volatizada do oceano, auxiliados pelos de Nha-San (Yansã), lavaram os resíduos dos maléficos desfeito e, enquanto os servos de Xangô encaminhavam os rebeldes submetidos, o casal se restaurava na saúde e na fortuna. A LINHA DE SANTO A missão da Linha de Santo, tão desprezada quanto ridicularizada até nos meios cultos do Espiritismo, é verdadeiramente apostolar. Os Espíritos que a constituem, mantendo-se em contato com a banda negra, de onde provieram não só resolvem pacificamente as demandas, como convertem, com hábil esforço, os trabalhadores trevosos. Esse esforço se desenvolve com tenacidade numa gradação ascendente.

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Primeiro, os conversores lisonjeiam os Espíritos adestrados nos maléficos, gabam-lhes as qualidades, exaltam-lhe a potência fluídica, louvam a mestria de seus trabalhos contra o próximo, e assim lhes conquistam a confiança e a estima. Na segunda fase do apostolado, começam a mostrar aos malfeitores o êxito de alcançar a Linha Branca com a excelência de seus predicados. Aproveitando para o bem um atributo nocivo, como a vaidade, os obreiros da Linha de Santo passam a pedir aos acolhidos para a conversão, pequenos favores consistentes em atos de auxílio e benefício a esta ou àquela pessoa, e, realizado esse obsequio, levam-nos a gozar, como uma emoção nova, a alegria serena e agradecida do beneficiário. Convidam-nos, mais tarde, para assistir os trabalhos da Linha Branca, mostrando-lhes o prazer com que o efetuam em cordialidade harmoniosa, sem sobressaltos, os operários ou guerreiros do espaço, em comunhão com homens igualmente satisfeitos, laborando com a consciência e paz. Fazem-nos, depois, participar desse labor, dando-lhes, na obra comum, uma tarefa à altura de suas possibilidades, para que se estimulem e entusiasmem com o seu resultado. E quando mais o Espírito transviado intensifica o seu convívio com os da Linha de Santo, tanto mais se relaciona com os trabalhadores do amor e da paz, e, para não se colocar em esfera inferior àquela em que os vê, começa a imitar-lhes os exemplos, elevando-se até abandonar de todo a atividade maléfica. Depois que esse abandono se consumou, o converso não é incluído imediatamente na Linha, mas fica como seu auxiliar, uma espécie de adido, trabalhando sem classificação. Geralmente, nessa fase, exalta-o o desejo de se incorporar efetivamente às Falanges braças e a seu trabalho de fé se reveste daquele ardor com que se manifestam, pela ação ou pelo verbo, os crentes novos. Permitida, afinal, a sua inclusão na Linha de Santo, ou em alguma outra, o antigo serventuário do mal vai resgatar as suas faltas, corrigindo as alheias. OS PROTETORES DA LINHA BRANCA DE UMBANDA Os protetores da Linha Branca de Umbanda e Demanda, invariavelmente são, ou dizem que são, Caboclos ou Pretos. Entre os Caboclos, numerosos foram europeus em encarnações anteriores, e a sua reencarnação no seio dos silvícolas, não representa um retrocesso, mas o início, pela identificação com o ambiente, da missão que, como Espíritos, depois de aprendizado no espaço, teriam de desempenhar na Terra. Outros pertenceram, na última existência terrena, a povos brancos ou Ocidente, ou amarelos, da Ásia, e nunca passaram pelas nossas tribos. Os restantes, porém, com o círculo de sua evolução, reduzidos, até o presente, à zona psíquica do Brasil, têm encarnado e reencarnado, com alternativas, em nossas cidades ou matas, estando, quase todos, no espaço, há mais de meio século. O mesmo, quanto a Negros. Esses Protetores se graduam numa escala que ascende dos mais atrasados, porém cheios de bondade, aos radiantes Espíritos superiores. O Protetor, na Linha Branca é sempre humilde e, com a sua língua atravessada, ou incorreta, causa uma impressão penosa de ignorância, mas freqüentemente, pelos deveres de sua missão, surpreende os seus consulentes, revelando conhecimentos muito elevados. Exemplo: Uma ocasião, numa pequena reunião de cinco pessoas, um Protetor Caboclo descarregava os maus fluidos de uma senhora, enquanto também incorporado, um Preto-Velho, Pai Antônio, fumava um cachimbo, observando a descarga. - Cuidado, Caboclo avisou o Preto. O coração dessa filha não está batendo de acordo com o pulso. - Como é que Pai Antônio viu isso? Deixe verificar, pediu um médico presente à sessão. Depois da verificação, confirmou o aviso do Preto, que o surpreendeu de novo, emitindo um termo técnico da medicina, e explicando que o fenômeno não provinha, como acreditava o clínico, de suas causas fisiológicas, porém de ação fluídica, tanto que terminada a descarga, se restabelecia a circulação normal no organismo da dama. E assim aconteceu.

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O doutor, então, quis conversar sobre a sua ciência com o Espírito humilde do Preto, e, antes de meia hora, confessava, com um sorriso, e sem despeito, que o Negro abordara assuntos que ele ainda não tivera oportunidade de versar, e estranhava: - Pai Antonio não pode ser o Espírito de um preto da África e não se compreende que baixe para fumar cachimbo e falar língua inferior ao cassanje (dialeto crioulo do português falado nessa região; por ext. português mal falado e escrito.) - Eu sou preto, meu filho. - Não, Pai Antonio. O senhor sabe mais medicina do que eu. Por que fala desse modo? Há de ser por alguma razão. O Preto-Velho explicou: - Eu não baixo em roda de doutores. Doutor, aqui só há um, que és tu, e nem sempre vens cá. Depois, meu filho, se eu começo a falar língua de branco, posso ficar tão pretensioso como tu, que dizes saber menos medicina de que eu; disse, numa linguagem, arrevesada, que traduzimos. Os Protetores da Linha Branca em geral se especializam, no espaço, em estudos ou trabalhos de sua predileção na Terra e baixam aos Centros e incorporam para um objetivo definido. Acontece, porém, que muitas vezes são induzidos a erros pelos consulentes, com a cumplicidade dos presidentes de sessões. Uma pessoa os interroga sobre assunto de que não tem conhecimento pleno. - Não entendo disso, meu filho. Na Sessão imediata, e nas outras, o curioso ou necessitado, insiste no seu pedido interrogativo, até que o trabalhador do espaço, receoso de inspirar a desconfiança com a confissão de sua ignorância, embarafusta pela seara alheia, e comete erros, logo remediados pelo Chefe do Terreiro, que é um Espírito conhecedor de todos os trabalhos e recurso da Linha. Salvo em caso de necessidade absoluta, os Protetores da Linha Branca de Umbanda incorporam sempre nos mesmos médiuns. As razões são simples e transparentes: habituaram-se a mover aqueles corpos, conhecem todos os recursos daqueles cérebros, e, pela constância dos serviços, mantêm os seus fluidos harmonizados com os dos aparelhos, o que lhes facilita a incorporação, aliás, sempre complexa e, em geral, custosa: – quanto mais elevado é o Espírito tanto mais difícil a sua incorporação. OS ORIXÁS Cada uma das Sete Linhas que constituem a Linha Branca de Umbanda e Demanda tem vinte e um Orixás. O Orixá é uma entidade de hierarquia superior e representa, em missões especiais, de prazo variável, o alto Chefe de sua Linha. É pelos seus encargos comparável a um general, ora incumbido da inspeção das Falanges, ora encarregado de auxiliar a atividade de Centros necessitados de amparo, e, nesta hipótese fica subordinado ao Guia geral do agrupamento a que pertencem tais Centros. Os Orixás não baixam sempre, sendo poucos os núcleos espíritas que os conhecem. São Espíritos dotados de faculdades e poderes que seriam terríficos, se não fossem usados exclusivamente em beneficio do homem. Em oito anos de trabalhos e pesquisas, só tive ocasião de ver dois Orixás, um de Euxoce (Oxossi), o outro de Ogum, o Orixá Mallet. E o Orixá Mallet, de Ogum, baixou e permanece em nosso ambiente, em missão junto às Tendas criadas e dirigidas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. Trouxe, do espaço, dois auxiliares, que haviam sido malaios na última encarnação, e dispõe, dentre os elementos do Caboclo das Sete Encruzilhadas, de todas as Falanges de Demanda, de cinco falanges selecionadas do Povo da Costa, semelhantes as tropas de choque dos exércitos de Terra, além de arqueiros de Euxoce (Oxossi), inclusive núcleos da Falange fulgurante de Ubirajara. Entende esse “Capitão de Demanda” que as pessoas de responsabilidade nos serviços da Linha, necessitam, a quando e quando, de provas singulares, que lhes revigore a fé, e reacenda a confiança nos Guias, e muitas vezes lhes dá, no decorrer dos trabalhos de sua direção. Na vez primeira em que o vi, a sua grande bondade, para estimular a minha humilde boa vontade, produziu uma daquelas esplendidas demonstrações. Estávamos cerca de 20 pessoas numa sala completamente fechada.

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Ele, sob a curiosidade fiscalizadora de nossos olhos, traçou alguns pontos no chão, passou em seguida a mão sobre eles, como se apanhasse alguma coisa; alçou a sinistra e, abrindo-a, largou no ar três lindas borboletas amarelas, e, espalmando a destra na minha, passou-me a terceira. - Hoje, quando, chegares a casa, e amanhã, no trabalho, serás recebido por uma dessas borboletas. E, realmente, tarde da noite, quando regressei ao lar e acendi a luz, uma borboleta amarela pousou no meu ombro, e na manhã seguinte, ao chegar ao trabalho, surpreenderam-se os meus companheiros vendo que outra borboleta, também amarela, como se descesse do teto, pousava-me na cabeça. Tive ocasião de assistir à outra de suas demonstrações, fora desta capital, a margem do Rio Macacú. Leváramos dois pombos brancos, que eu tinha a certeza de não serem amestrados, porque foram adquiridos por mim. Colocou-os o Orixá, como se os prendesse, sobre um ponto traçado na areia, onde eles quedaram quietos, e começou a operar com fluidos elétricos, para fazer chover. Em meio à tarefa disse: - Os pombos não resistem a este trabalho. Vamos passá-los para a outra margem do rio. Pegou-os, encostou-os as fontes do médium, e alçando-os depois, soltou-os. Os dois pássaros, num vôo alvacento, transpuseram a caudal, e fecharam as asas na mesma árvore, ficando lado a lado, no mesmo galho. Passada a chuva que provocara, disse: - Vamos buscar os pombos. Chegamos à orla do rio. O Orixá, com as mãos levantadas, bateu palmas, e os dois pombos recruzando as águas, voltaram ao ponto traçado na areia. Príncipe reinante, na ultima encarnação, numa ilha formosa do Oriente, o delegado de Ogum é magnânimo, porém, rigoroso, e não diverte curiosos: – ensina e defende. Exigem os seus trabalhos, tantas vezes, revestidos de transcendente beleza, a quietude plana dos campos, a oxigenada altura das montanhas, o retiro exalante das flores ou a largueza ondulosa do mar. OS GUIAS SUPERIORES DA LINHA BRANCA Os Centros Espíritas são instituições da Terra com reflexo no espaço, ou criação do espaço com reflexo na Terra. Um grupo de pessoas resolve fundar um Centro Espírita, localiza-o e começa a reunir-se em Sessões. Os Guias do espaço mandam-lhes, para auxiliá-las e dirigi-las, Entidades Espirituais de inteligência e saber superiores ao agrupamento, porém, afins com os seus componentes. Esses enviados dominam em geral o novo Centro, mas não o desviam dos objetivos humanos determinantes de sua fundação. Os Guias do espaço resolvem instituir na Terra, para a realização de seus desígnios, Tendas que sejam correspondentes a núcleos do outro plano, e incumbem de sua fundação os Espíritos que reúnem e selecionam os seus auxiliares humanos e os dirigem de conformidade com as finalidades espirituais. Tanto os grupos de origem terrena, como os originários do espaço, ficam, em linhas paralelas, submetidos à direção de Guias superiores, que se encarregam de ordená-los em quadros divididos entre eles. Esses Guias são chamados Espíritos de luz, que já não se incluem, pela sua condição, na atmosfera de nosso Planeta, porém, deslocados para a Terra em missão tanto mais penosa, quanto mais elevada é a natureza espiritual do missionário. Desses missionários, alguns jamais têm a necessidade de recorrer a um médium e exercem a sua autoridade através de Espíritos que também muitas vezes não incorporam e transmitem ordens e instruções às entidades em contato direto com os Centros e grupos humanos. Há, porém, Espíritos de luz, que pelas exigências de sua missão, baixam aos recintos de nossas reuniões, incorporam-se nos médiuns e dirigem efetiva, e até materialmente, os nossos trabalhos.

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Frequentemente, no primeiro caso, há Centros que não sabem que estão sob a jurisdição de determinado Guia e que chegam a ignorar a sua permanência em nosso ambiente, sem que se lhes possa fazer, por isso, qualquer censura, pois os seus Guias imediatos não julgaram necessário ou conveniente fazer essa revelação. As criações originárias do espaço se caracterizam pela sistematizada solidez de sua organização, pelos métodos e concatenações de seus trabalhos, e pelo inflexível rigor de sua disciplina. Dessas criações a que melhor conheço é a fundada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas.

A CURA DA OBSESSÃO Cura-se a obsessão, nos centros kardecistas, branda e lentamente, mediante a doutrinação do obsessor, e, como este freqüentemente tem numerosos companheiros, o doutrinador tem de multiplicar os seus esforços. O obsessor, quando se atirou a pratica do mal, usou do livre arbítrio concedido por Deus a todas as criaturas, e o kardecista, no seu rigorismo doutrinário, procura demonstrar-lhe o erro, encaminhando-o para a felicidade. E, nesse elevado empenho, discute, ensina, pede, até convencê-lo. O obsessor sempre resiste e cede demoradamente. Por isso e para restaurar as forças físicas do obsedado, o kardecista, paralelamente à doutrinação, faz um tratamento de passes. Assim, cura o paciente e ao mesmo tempo regenera o agente do malefício. Na Linha Branca de Umbanda, o processo é mais rápido. O kardecista é um mestre; o filho de Umbanda é um delegado judiciário. Entende que pode usar do seu livre arbítrio para impedir a prática do mal. O Espírito, o protetor, é, na Linha Branca de Umbanda, quem se incumbe da cura. Inicialmente, verifica o estado fisiológico do enfermo, para regular o tratamento, dando-lhe maior ou menor intensidade. Em seguida, aconselha os banhos de descarga, para limpeza dos fluidos mais pesados, e o defumador para afastar elementos de atividade menos apreciável. Investiga, depois, a causa da obsessão e se a encontra na magia, realiza imediatamente o trabalho propiciatório de anulação, e igual ao que determinou a moléstia. Freqüentemente, basta esse trabalho para libertar o obsedado, que fica, por alguns dias, em estado de prostração. Se a causa da doença (permitam-me o vocábulo) era antiga e o doente não se refez logo, e nos casos que não são ligados a magia, o protetor afasta o obsessor, manda doutriná-lo, e se o rebelde não se submete é levado para regiões, ou estações do espaço, de onde não pode continuar a sua atuação maléfica. Não raro, quando o obsedado não assiste à sessão em seu benefício, o protetor, atraindo-o durante o sono, por um processo magnético, traz o seu Espírito à reunião, e incita-o a reagir contra os estranhos que desejam dominá-lo, mostra-lhe que não está louco e que deve provar, com a sua conduta, a sua integridade mental. À medida que os obsessores são afastados, para que o organismo do paciente não se ressinta da falta dos fluidos que lhe são retirados, fazem-se lhe passes, e, finda a sua incumbência, com a restituição daquele a si mesmo, pede-lhe o protetor que procure qualquer médico da Terra ou do espaço, para seguir um tratamento reconstituinte, se a obsessão o depauperou. AS FESTAS DA LINHA BRANCA Para mostrar, na esfera da realidade terrena, uma organização da Linha Branca de Umbanda e Demanda, citei a que melhor conheço, porém essa citação de modo algum representa a primazia, quer sob o aspecto de prioridade, quer sob o de superioridade. Outras, sem dúvida, existem em nosso meio, fundadas e dirigidas pelos grandes missionários do espaço, e entre os numerosos Centros que funcionam isoladamente, muitos são ótimos, preenchendo, de modo completo, as finalidades da Linha. O próprio Caboclo das Sete Encruzilhadas, assiste, fora de sua organização, outras Tendas, e costuma auxiliar com suas Falanges os trabalhadores de boa vontade que o invocam e chamam em suas reuniões, e creio que os demais Protetores não deixam de atender aos apelos de corações honestamente devotados ao serviço do próximo, em nome de Deus. Numa instituição da disciplina peculiar à Linha Branca de Umbanda e Demanda, é natural que a transgressão consciente as suas leis não fique impune. Em geral, os culposos são abandonados pelos Guias, e sem esse amparo a que estavam habituados, tropeçam, a cada passo, em dificuldades e caem sob o domínio de entidades que os infelicitam.

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Para os casos especiais, em que os erros, pela função de quem os comete, causam danos a outros e prejudicam o conceito da Tenda e da Linha, há penalidades ásperas, de efeitos imediatos. Na Linha Branca de Umbanda e Demanda, também há alegrias, que se expressam em festividades. Seis dessas festas têm o caráter de obrigação ritualística, – são as dos padroeiros e Chefes das Linhas, variando, porém, o modo de realizá-las. Algumas vezes, são simples sessões comemorativas, com alocuções e preces; outras, comportam a participação de Espíritos que incorporam para produzir orações referentes ao dia, ou para transmitir mensagens de estímulo, de Entidades Superiores. Frequentemente, a festa é realizada pelos Espíritos incorporados, e, neste caso, assume características especiais, segundo a Linha que se festeja. A essas festas, comparecem, além dos médiuns, convidados, e outras pessoas, e esse agrupamento de gente que nem sempre passou pela Sessão de Caridade, ou pela de descarga, obriga às medidas extraordinárias, para conservar um ambiente harmônico. Assim, sem que o percebam os assistente, enquanto a alegria religiosa os empolga, os seus Guias e mais Protetores, estão efetuando trabalhos que revestem, não raro, de intensidade excepcional. No dia de Cosme e Damião, baixam festivamente às Tendas Espíritos infantis e com os quais é necessário, além de carinho fraternal, certa vigilância, porque eles, apossando-se dos médiuns, procedem como crianças e, como estas, são indiscretos, comentando sem respeito às conveniências sociais, qualquer pensamento menos nobre ou mais atrevido, que surpreendam em algum cérebro. No fim das grandes demandas, isto é, quando se remata vitoriosamente um esforço maior em beneficio do próximo, também se realiza, sem caráter obrigatório, uma festa em que se confundem na mesma satisfação, aos Espíritos e os homens. No encerramento do retiro anual, a sua última cerimônia é festiva, mas é íntima, abrangendo apenas os que, pelos seus encargos, são seus participantes forçados. É rigorosamente ritualística, e de uma grande beleza. O KARDECISMO E A LINHA BRANCA DE UMBANDA A Linha Branca de Umbanda e Demanda está perfeitamente enquadrada na doutrina de Allan Kardec e nos livros do grande codificador, nada se encontra susceptível de condená-la. Cotejemos com os seus escritos os princípios da Linha Branca de Umbanda, por nós expostos no “Diário de Notícias”, edição de 27 de novembro de 1932. A organização da Linha no espaço corresponde à determinada zona da Terra, atendendo-se, ao constituí-la, as variações de cultura e moral intelectual, com aproveitamento das Entidades Espirituais mais afins com as populações dessas paragens. Allan Kardec, a página 219 do “Livro dos Espíritos” escreve: “519. As aglomerações de indivíduos, como as sociedades, as cidades, as nações, tem Espíritos protetores especiais”. “Tem, pela razão de que esses agregados são individualmente coletivas que, caminhando para um objetivo comum, precisam de uma direção superior.” “520. Os Espíritos protetores das coletividades são de natureza mais elevada do que os que se ligam aos indivíduos?” “Tudo é relativo ao grau de adiantamento, que se trate de coletividades, que de indivíduos. E quanto às afinidades na mesma página: “Os Espíritos preferem estar no meio dos que se lhes assemelham, acham-se aí mais à vontade e mais certos de serem ouvidos. Por virtude de suas tendências, é que o homem atrai os Espíritos, e isso quer esteja só, quer faça parte da sociedade, uma cidade, ou um povo. Portanto, as sociedades, as cidades e os povos são, de acordo com as paixões e o caráter neles predominantes, assistidos por Espíritos mais ou menos elevados”. Os protetores da Linha Branca de Umbanda se apresentam com o nome de Caboclos e Pretos, porém, frequentemente, não foram nem Caboclos nem Pretos. Allan Kardec, a página 215 do “Livro dos Espíritos”, ensina: “Fazei questão de nomes: eles (os protetores) tomam um, que vos inspire confiança”. Mas como poderemos, sem o perigo de sermos mistificadores, confiar em Entidades que se apresentam com os nomes supostos? Allan Kardec, a página 449 do “Livro dos Espíritos”, esclarece:

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“Julgai, pois, dos Espíritos, pela natureza de seus ensinos. Não olvideis que entre eles há os que ainda não se despojaram das idéias que levaram da vida terrena. Sabei distingui-los pela linguagem de que usam. Julgai-os pelo conjunto do que vos dizem; vede se há encadeamento lógico em suas idéias; se nestas nada revela ignorância, orgulho ou malevolência; em suma, se suas palavras trazem todo o cunho de sabedoria que a verdadeira superioridade manifesta. Se o vosso mundo fosse inacessível ao erro, seria perfeito, e longe disso se acha ele”. Ora, esses Espíritos de Caboclos ou Pretos, e os que como tais se apresentam, pela tradição de nossa raça, e pelas afinidades de nosso povo, são humildes e bons, e pregam, invariavelmente, sem solução de continuidade, a doutrina resumida nos dez mandamentos e ampliada por Jesus. Entre os Protetores da Linha Branca, alguns não são Espíritos superiores, e os há também atrasados, porém, bons, quando o grau de cultura dos protegidos não exige a assistência de entidades de grande elevação, conforme o conceito de Allan Kardec, a página 216 do “Livro dos Espíritos”: “Todo homem tem um Espírito que por ele vela, mas as missões são relativas ao fim que visam, não dais a uma criança, que está aprendendo a ler, um professor de filosofia”, e em trecho já transcrito explica: “que tudo é relativo ao grau de adiantamento, quer se trate de coletividades, quer de indivíduos”. Esses trabalhadores, porém, na Linha Branca, estão sob a direção de Guias de maior elevação, de acordo com o dizer de Allan Kardec a pagina 318 do “Livro dos Espíritos”, sobre os Espíritos familiares, que “são bons, porém, muitas vezes pouco adiantados e até levianos. Ocupam-se de boa mente com as particularidades da vida íntima e só atuam com ordem ou permissão dos Espíritos protetores”. O objetivo da Linha Branca é a prática da caridade e Allan Kardec, no “Evangelho Segundo o Espiritismo”, proclama repetidamente que “fora da caridade não há salvação”. A Linha Branca, pela ação dos Espíritos que a constituem, prepara um ambiente favorável a operosidade de seus adeptos. Será isso contrário aos preceitos de Allan Kardec? Não, pois vemos, nos períodos acima transcritos que os Espíritos familiares, com ordem ou permissão dos Espíritos protetores, tratam até de particularidades da vida íntima. No mesmo livro, a página 221-22, lê-se: “525. Exercem os Espíritos alguma influencia nos acontecimentos da vida? - Certamente, pois que te aconselham.” “- Exercem essa influência, por outra forma que não apenas pelos pensamentos que sugerem, isto é, tem ação direta sobre o cumprimento da coisa? - Sim, mas nunca atuam fora das leis da Natureza”. Na página 214 do “Livro dos Espíritos” consta: “A ação dos Espíritos que vos querem bem é sempre regulada de maneira que não vos tolha o livre arbítrio” e a página 222 o mestre elucida: Imaginamos erradamente que aos Espíritos só caiba manifestar sua ação por fenômenos extraordinários. Quiséramos que nos viessem auxiliar por meio de milagres e os figuramos sempre armados de uma varinha mágica. Por não ser assim, é que oculta nos parece a intervenção que tem nas coisas deste mundo, e muito natural o que se executa com o concurso deles. Assim é que, provocando, por exemplo, o encontro de duas pessoas que suporão encontrar-se por acaso; inspirando a alguém a idéia de passar por determinado lugar; chamando-lhe a atenção para certo ponto, se disso resultar o que tenham em vista, eles obram de tal maneira que o homem, crente de que obedece a um impulso próprio, conserva sempre o seu livre arbítrio”. Assim, os Caboclos e Pretos da Linha Branca de Umbanda, quando intervém nos atos da vida material, em beneficio desta ou daquela pessoa, agem conforme os princípios de Allan Kardec. Na Linha Branca, o castigo dos médiuns e adeptos que erram conscientemente, é o abandono em que os deixam os Protetores, expondo-os ao domínio de Espíritos maus. A página 213 do “Livro dos Espíritos” Allan Kardec leciona: “496. O Espírito, que abandona o seu protegido, que deixa de lhe fazer bem, pode fazer-lhe mal? - Os bons Espíritos nunca fazem mal. Deixam que o façam aqueles que lhe tomam o lugar. Costumais então lançar a contar da sorte as desgraças que vos acabrunham, quando só as sofreis por culpa vossa”. E adiante, na mesma página:

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“498. Será por não poder lutar contra Espíritos malévolos que um Espírito protetor deixa que seu protegido se transvie na vida? - Não é porque não possa, mas porque não quer”. A divergência única entre Allan Kardec e a Linha Branca de Umbanda é mais aparente do que real. Allan Kardec não acreditava na magia, e a Linha Branca acredita que a desfaz. Mas a magia tem dois processos: o que se baseia na ação fluídica dos Espíritos, e esta não é contestada, mas até demonstrada por Allan Kardec. O outro se fundamenta na volatilização da propriedade de certos corpos, e o glorioso mestre, ao que parece, não teve oportunidade, ou tempo, de estudar esse assunto. Nas últimas páginas 356-357 de suas “Obras Póstumas”, os que as coligiram observam, sob a assinatura de P. G. Laymarie: “No congresso espírita e espiritualista de 1890, declararam os delegados que, de 1869 para cá, estudos seguidos tinham revelado coisas novas e que, segundo o ensino tração por Allan Kardec, alguns dos princípios do Espiritismo, sobre os quais o mestre tinha baseado o seu ensino, deviam ser postos em relação com o progresso da ciência em geral realizados nos 20 anos”. Depois dessa observação transcorreram 42 anos e muitas das conclusões do mestre tem de ser retificadas, mas a sua insignificante discordância com a Linha Branca de Umbanda desaparece, apagada por estas palavras transcritas do “Livro dos Espíritos”, páginas 449-450: “Que importam algumas dissidências, divergências mais de forma do que de fundo? Notai que os princípios fundamentais são os mesmos por toda a parte e vos hão de unir num pensamento comum: o amor de Deus e a prática do bem”. E o amor de Deus e a prática do bem são a divisa da Linha Branca de Umbanda. A FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA E A LINHA BRANCA DE UMBANDA A Federação Espírita Brasileira é a instituição mais importante, e sem dúvida, a de mais autoridade, do Espiritismo no Brasil. Acusam-na, às vezes, de retardatária e intransigente, porém, a lentidão de seu passo garante a segurança de sua marcha, e nunca a sua intransigência desceu da esfera ideal dos princípios para as diatribes contra os indivíduos ou os ataques às associações. As atitudes da Federação onde fulguram e ainda brilham tantas poderosas inteligências, são sempre discretamente ponderadas, ornando-se, não raro, de sedutora elegância moral, manifesta em atos de gentileza social. Tive ocasião de apreciá-las, conhecendo-lhes os fundamentos, em circunstâncias diversas, de grande delicadeza, quando o médium Mozart, depois de uma excursão miraculosa pelo Estado do Rio e Minas Gerais, começou a perder a simpatia das massas, veio para esta capital e anunciou que receberia e trataria enfermos na sede da Federação. Esqueceu-se, porém, de consultar previamente os diretores dela, e a velha instituição, na consciência de sua responsabilidade, não correu a imprensa, com escândalo, a desmentir o médium esquecediço. Ao contrário, ouvidos os seus Guias, entrou em preparativos para receber o famoso intermediário e seus consulentes. Em meio a esse labor preparatório, aliás, sem espalhafato, e apenas visível. Conversando com um de seus dirigentes, o ilustre Manuel Quintão, perguntei-lhe quando se iniciariam as consultas de Mozart. - Ele não virá a Federação, disse-me, mostrando-me, em reserva, a comunicação dos Guias da Casa. O nosso irmão afamado por tantos fulgentes benefícios mediúnicos ao próximo, segundo o comunicado, não estava, no momento, em condições favoráveis à ação de seus protetores, e não deveria, portanto, correr os riscos de um fracasso, na mais importante Casa Espírita do país. Mas não seria necessário molestá-lo com um recusa hostil, pois os Guias, sem escandalizar a cidade, evitariam, de modo normal, a sua anunciada passagem pela Federação. - E para que esses preparativos? Perguntei. - O comunicado dos Guias é secreto, e os preparativos são indispensáveis, porque, se não os fizéssemos, pareceria que abandonávamos um médium que se aproxima da Federação na hora em que está sendo atacado. E assim foi. Mozart não compareceu à Federação, nem ela o atirou as feras.

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Outra ocasião, a polícia pediu o parecer da Federação sobre alguns Centros ditos Espíritas, porém, menos apreciáveis. A Federação, longe de fulminá-los com uma bordoada, recusou o cetro papalino que a autoridade lhe oferecia, e respondeu que não os conhecia, e, portanto, não podia julgá-los, nem se atribuía esta função. Conversando sobre esse caso, com o mesmo Sr. Manuel Quintão, diante do eminente Sr. Guilhon Ribeiro, que o aplaudia, ouvi dele esta explicação: - Esse julgamento é da alçada de Deus. A Federação julga, não denuncia, nem acusa. Perguntei-lhes qual era o papel da Federação: - Evangelizar, doutrinar impessoalmente. E acrescentou: - Evitamos, porém, que as nossas palavras possam atingir alguém, ferindo-o em nome da Federação, porque a Federação não persegue nem derruba ninguém, e quando pode, estende a mão para que se levantem os que caíram. Esse é, parece-me, o critério da Federação, adversa ao escândalo que Jesus condenou. Tanto quanto posso julgar através de relações com as altas personalidades que têm orientado as diversas fases de sua administração, o venerável instituto observa com benevolência todos os Centros em Caridade, e não contrapõe palavras e obras. Em face da Linha Branca de Umbanda, com esse ponto de vista, a sua atitude de neutralidade simpática não a incluindo em seus quadros federativos pelo receio de que os seus processos possam gerar confusões difíceis de desfazer. Ao invés de anatematizar os Caboclos com os exorcismos de fúrias escandalosas, os homens da Federação preferiram estudar, a sério, essas manifestações, e segundo admirável estudo publicado no “Reformador”, concluíram que esses Caboclos que baixam em nossas Tendas, são Espíritos de europeus, alguns antigos conquistadores de nossas terras, outros seduzidos pela fama dela, que atraídos, para o nosso ciclo psíquico, reencarnaram nas nossas selvas.

Nota do autor:

Manuel Justiniano de Freitas Quintão, melhor conhecido apenas como Manuel Quintão (Valença, 28 de maio de

1874 — Rio de Janeiro, 16 de dezembro de 1955), foi um jornalista, escritor e médium espírita brasileiro. Foi presidente da Federação Espírita Brasileira em 1915, 1918, 1919 e 1929.

“... Em relação aos termos cuja genealogia estamos acompanhando, pode-se notar que, nas décadas de 20 e 30, os espíritas da FEB cultivavam opiniões bem particulares, pois preservaram em termos mais formais do que substantivos a oposição entre “falso” e “verdadeiro” espiritismo. Ou seja, ao contrário de jornalistas e policiais, não associavam o “falso” ou “baixo” espiritismo a um conjunto necessariamente articulado de rituais, crenças, personagens. Isso possibilitava, por exemplo, posições ambíguas e flexíveis quanto à manifestação de Espíritos de “Negros” e “Caboclos”, não diretamente condenadas.

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Já a propósito daqueles que tinham suas práticas reprovadas, havia uma permanente disposição para acolher quaisquer “ovelhas desgarradas”, submetendo-as aos influxos de uma saudável e corretiva propaganda: “Doutrinar em larga escala, vulgarizar, exemplificar sobretudo, individual e coletivamente, é o que nos cabe fazer” (Reformador, 1 nov. 1919). Os diretores e porta-vozes da FEB, pela imprensa e pelo Reformador, insistiriam, portanto, na ilegitimidade ou na inconveniência da repressão ao “baixo espiritismo”. Diante disso, fica ainda mais interessante perceber como a instituição terá um papel significativo na dinâmica de combate oficial às práticas do “baixo espiritismo”. (O “baixo espiritismo” e a história dos cultos mediúnicos - Emerson Giumbelli) Para entendermos um pouco melhor, a direção da Federação Espírita Brasileira, devido às perseguições sofridas por parte do governo, procurou expor os cultos que estavam incursos da lei vigente. Daí, formulou um texto oficial, dirimindo a Linha Branca de Umbanda de ser baixo ou falso espiritismo. Temos que dar valor à luta que os espíritas em época travaram, para demonstrar uma doutrina coesa e legalizar as práticas espíritas. Cremos que dá para imaginar a recém Umbanda em tudo isso. Portanto, não é o Espiritismo que é contra a Umbanda, mas somente a ignorância de alguns prosélitos kardecistas. Vamos a um texto elucidativo: O PERÍODO REPUBLICANO Com a Proclamação da República do Brasil (15 de novembro de 1889), a 22 de dezembro a FEB congratula-se com o Governo Provisório pelo advento do novo regime. Entretanto, estando o país ainda sem uma Constituição, o Decreto nº 847, de 11 de outubro de 1890, promulgou o Código Penal da República. Este diploma, de inspiração positivista, associava a prática do Espiritismo a rituais de magia e curandeirismo, conforme expresso em seu Artigo 157, que rezava: "É crime praticar o Espiritismo, a magia e seus sortilégios, usar de talismãs e cartomancias, para despertar sentimentos de ódio ou amor, inculcar cura de moléstias curáveis ou incuráveis, enfim, para fascinar e subjugar a credulidade pública. Pena: prisão celular de 1 a 6 meses e multa de 100$000 a 500$000." Os espíritas protestaram junto a Campos Sales, então Ministro da Justiça, sem sucesso. O relator do Código, João Batista Pinheiro, limitou-se a afirmar que o texto referia-se à prática do chamado "baixo Espiritismo". Em 22 de dezembro de 1890, Bezerra de Menezes, enquanto presidente do “Centro da União Espírita do Brasil”, oficiou ao Presidente da República, Marechal Deodoro da Fonseca, acerca do novo Código Penal. Preocupado com possíveis focos de resistência ao regime, o Governo autorizou a polícia a invadir reuniões e residências à procura de opositores. Como consequência, em 1891, na cidade do Rio de Janeiro, vários espíritas chegaram a ser detidos. Perseguidos e proibidos de se reunirem, os poucos Centros Espíritas então existentes viram-se na contingência de fecharem as suas portas, a fim de que não incorressem nas penas da Lei. A própria FEB foi obrigada a suspender a publicação de sua revista, o “Reformador” neste momento. Será nesse contexto, entretanto, que Bezerra de Menezes funda o Grupo Espírita Regeneração (18 de fevereiro de 1891), a “Casa dos Benefícios”. Em 1893, no auge da segunda Revolta da Armada, o Governo endureceu ainda mais o regime. Os espíritas apresentaram um novo protesto ao Congresso Nacional contra o Código Penal, uma vez mais em vão, de vez que a comissão revisora do Código não atendeu às reivindicações formuladas por aqueles. Vitimado por dificuldades externas e internas, o Reformador deixou de circular no último trimestre daquele ano. O “Grupo Espírita Fraternidade”, após ter alterado os seus estatutos passando a denominar-se “Sociedade Psicológica Fraternidade”, Revolta da Armada, extinguiu-se, e, no Natal desse mesmo ano, Bezerra de Menezes encerrou a série “Estudos Filosóficos” que vinha publicando no O Paiz. No ano seguinte (1894), com o abrandamento da situação política, Augusto Elias, em conjunto com Fernandes Figueira e Alfredo Pereira, inicia uma campanha financeira para subsidiar os projetos da FEB. O Reformador voltou a circular... ... Remontam ainda à primeira década do século XX as primeiras grandes dissidências no movimento espírita, a primeira em Niterói, com o estabelecimento da Umbanda, segundo a tradição por iniciativa do Caboclo das Sete Encruzilhadas (1908), e a segunda, em Santos (1910), que se intitulou "Espiritismo Racional e Científico Cristão", sistematizada por Luís de Matos e Luís Alves Tomás. DO ESTADO NOVO AO PACTO ÁUREO Desde a década de 1920 registravam-se choques entre o espiritismo e a psiquiatria. Henrique Roxo (1877-1969), em seu “Manual de Psiquiatria” (1921) dedica um capítulo inteiro ao espiritismo, reproduzindo o discurso médico e católico da época, ainda marcado pelo escravismo, que remetia a crença, no país, a resquícios do fetichismo africano, observando: "Vê-se muito frequentemente o que se observa no cinema, nessas danças de negros, com seus movimentos extravagantes, suas contorções e seus gestos." Os profissionais formados na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro consideravam o espiritismo como uma patologia contagiosa, capaz de incapacitar grandes contingentes humanos para o trabalho. Devia, por essa razão ser reprimida pelas autoridades e erradicada por meio de campanhas de saúde pública: O combate ao espiritismo deve ser igualado ao que se faz à sífilis, ao alcoolismo, aos entorpecentes (ópio, cocaína, etc.), à tuberculose, à lepra, às verminoses, enfim a todos os males que contribuem para o aniquilamento das energias vitais, físicas e psíquicas do nosso povo, da nossa raça em formação. O doutorando, apelava à Liga Brasileira de Higiene Mental e à Igreja Católica para sensibilizarem a opinião pública e os poderes constituídos, propondo mesmo uma “Semana Antiespirita” à semelhança da então existente “Semana Antialcoólica”, para mobilizar a sociedade contra esse mal.

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Antônio Xavier de Oliveira, na obra “Espiritismo e Loucura” (1931), afirmou que dos casos por ele estudados no “Pavilhão de Assistência a Psicopatas”, 1.723 pessoas enlouqueceram “só exclusivamente pelo espiritismo”. E acerca de “O Livro dos Médiuns”: É a cocaína dos debilitados nervosos que se dão à pratica do espiritismo. E com um agravante a mais: é barato, está no alcance de todos, e por isso mesmo, leva mais gente, muito mais aos hospícios, do que a “poeira do diabo”, a “coca maravilhosa”... É o tóxico com que se envenenam, todos os dias, os débeis mentais, futuros hóspedes dos asilos de insanos. Lêem-no, assimilam-no, incluem a essência diabólica de que é composto, caldeiam os conhecimentos nele adquiridos nas sessões espíritas. Nesse mesmo ano (1931) Murilo de Campos e Leonídio Ribeiro publicam o livro anti-espiritismo “O Espiritismo no Brasil”, buscando relacionar o Espiritismo com a Medicina, e onde se lê: “A prática do espiritismo é um problema de polícia, é crime contra o código penal”... (http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_do_espiritismo_no_Brasil) CABOCLOS E NEGROS A Federação Espírita Brasileira, insuspeita, no caso, por ser kardecista, e as sessenta e cinco sociedades espíritas federadas, todas, como kardecistas, igualmente insuspeitas, no Conselho Federativo reunido nesta capital, em Outubro de 1926, aprovaram e adotaram, sobre as manifestações de Espíritos de Caboclos e Negros, um parecer que pode servir de esclarecimento à conduta de quem não pertença a Linha Branca de Umbanda. O parecer, que está inserto às páginas 205-206, da Resenha dos trabalhos daquele Conselho, foi provocado por uma consulta da Tenda Espírita de Caridade, desta capital, e foi aceito, além desse Centro, e mais a Federação, pelas seguintes instituições espíritas: Alagoas:

Grupo Dr. Manoel Antonio da Cruz – Maceió; Centro Espírita Alagoano “Mello Maia” – Maceió.

Bahia:

União Espírita Baiana. Ceará:

Centro Dr. Dias da Cruz – Iguatú. Distrito Federal:

Trabalhadores da Última Hora; Cultivadores da Fé e da Verdade; Centro Espírita Beneficente Francisco de Assis; Centro Espírita União dos Filhos Pródigos; Centro Espírita Antonio de Pádua; Tenda Espírita de Caridade; União Espírita Rio Pedrense – Oswaldo Cruz; Centro Espírita Vicente de Paulo; União Espírita Luz e Caridade – Quintino Bocaiúva; Centro Espírita de Jacarepaguá; Centro Espírita Francisco de Assis – Méier; Centro Espírita Discípulos de Jesus – Campo Grande; Cruzada Espírita Suburbana – Engenheiro Leal; Centro Espírita Maria Magdalena – Ramos; Centro Espírita Maria Magdalena – Praia Formosa; Centro Espírita Fraternidade – Marechal Hermes.

Espírito Santo:

Federação Espírita do Espírito Santo;

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Centro Espírita Henrique José de Mello – Vitória; Centro Espírita Maria Santíssima – Vitória; Grupo Espírita Amor e Caridade – Vitória; Grupo Espírita Paz, Luz e Humildade – Vitória; Centro Espírita João Casemiro dos Santos – Vitória; Centro Espírita Jesus, Espírito Santo e Caridade – Afonso Cláudio; Agremiação Espírita Bezerra de Menezes, Amor e Caridade – Afonso Cláudio.

Maranhão:

Centro Espírita Maranhense São Luiz; Centro Espírita Coroatense Antonio Vieira – Coroatá.

Mato Grosso:

Grupo Espírita Vicente de Paulo – Ladário. Minas Gerais:

Grupo Espírita Vinte e Cinco de Dezembro – Caxumbú; Grupo Espírita Paz e Caridade – Montes Claros; Casa Espírita – Juiz de Fora; Centro Espírita Dias da Cruz – Juiz de Fora; Centro Espírita Paz, Luz e Amor – Cataguases; Centro Espírita Cristão – Cambuquira.

Para:

União Espírita Paranaense. Pernambuco:

Federação Espírita Pernambucana; Centro Espírita João Baptista – Limoeiro.

Rio de Janeiro:

Centro Espírita de Valença; Federação Espírita do Rio de Janeiro; Centro Espírita Friburguense; Grêmio Espírita Bittencourte Sampaio – Petrópolis; Sociedade Espírita Humildade e Caridade – Andrade Araújo; Centro Espírita Fé, Esperança e Caridade – Nova Iguaçu; Centro Espírita Bittencourt Sampaio – Barra Mansa.

Rio Grande do Norte:

Federação Espírita Riograndense do Norte. Rio Grande do Sul:

Federação Espírita do Estado do Rio Grande do Sul. São Paulo:

Centro Amor e Luz – Guaratinguetá; Igreja Espírita de Piracicaba; Centro Caridade e Amor – Pindamonhangaba; Amor e Caridade – Bauru; Centro Espírita de São Paulo – Capital; Sinceridade e Fé – Albuquerque Lins; Luz, Caridade e Amor – Igarapava; Centro Celso Garcia – Capital; Paula Ortiz – Jacareí;

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Paz Consoladora – Casa Branca; A Nova Luz – Campinas; Amor e Caridade – Itirapina; Maria Nazareth – Capital; União Espírita de Dois Córregos.

Santa Catarina:

Centro Caridade de Jesus – São Francisco. O parecer é, na íntegra, o seguinte: PARECER – Os Espíritos não têm entre si linguagem articulada; a linguagem deles é ideológica, por assim dizer, como projeção do pensamento, Mas, se admitimos, e isto é do caráter dos próprios ensinos doutrinários, que os Espíritos se manifestam com as características de sua individualidade terrena, frequentemente ou mais comumente a da última encarnação – não há estranhar que o façam no idioma que aqui falaram. Espiritualmente falando, não deve haver uma linguagem de africano, ou de bugre, como não há Espíritos pretos, nem caboclos, nem japoneses ou slavos. O que há são Espíritos que se manifestam desta ou daquela forma, nesta ou naquela linguagem, de acordo com as circunstâncias de tempo e meio, tendo em vista tais ou quais objetivos e, possivelmente, aproveitando afinidades mediúnicas. O que é condenável não é a linguagem nem a credencial com que se apresentam Espíritos quaisquer, e sim a improcedência ou banalidade – quando não nocividade – de tais ou quais manifestações. Sem ofensa aos princípios doutrinários, pode admitir-se que os Espíritos adaptem as suas manifestações de modo a melhor impressionarem os seus interlocutores. Assim como um homem ilustrado, entre rústicos, tem de baixar o nível da sua expressão e mesmo das suas idéias, para melhor ser compreendido e atendido, assim pode e deve fazer um Espírito, logicamente. O essencial é que a fala visando fins elevados, porque, neste caso, há eu tolerar os meios pelos fins. Não devemos perder de vista que a tarefa dos desencarnados é complexa e adstrita a particularidades que nos escapam. Se tudo tem uma razão de ser, se nada pode furtar-se ao crivo da Lei, não podemos, em tese e de modo absoluto, condenar coisa alguma. Em regra, ao falar de manifestações tais, a primeira idéia que ocorre, é a de fetiches e batuques. Ora, isso não entra no quadro doutrinário, porque é necromancia, superstição, bruxaria (em sentido genérico), baixo espiritismo, porque feito com Espíritos, mas não Doutrina Espírita. Porém, a verdade é que sabemos de Grupos onde se manifestam Pretos e Caboclos que – sem embargo da forma pitoresca ou bizarra, suscitam a fé, produzem curas espirituais e psíquicas, concorrem, finalmente, para o levantamento do nível moral coletivo, que é o escopo primacial da Doutrina, assim, pois, se o critério evangélico é o seguro estalão pelo qual devemos guiar-nos, só é passível de suspeição a árvore que não produz bons frutos, porque é pelo fruto que se conhece a árvore. A Federação, em tese não infirma as manifestações de “Caboclos” nem de “Pretos”, conquanto não as adote como norma mais eficiente de trabalho, achando que do mesmo modo devem proceder as Sociedades adesas, uma vez que, como acima fica dito, tais práticas são, não há negar, Espiritismo, porém, não são Doutrina Espírita. Acata, entretanto, todos os bons frutos, como tais reconhecidos. Rio de Janeiro, 06 de Outubro de 1926 – José Juvêncio do Sacramento – Codro Palissy – Pedro de Camargo – Epiphanio Bezerra – Manuel Quintão. Humilde filho de Umbanda, aceito esse parecer, acrescentando-lhe, porém, esta elucidação: - Se a Doutrina Espírita admite, explica e legitima essas manifestações, é porque as enquadra em seus princípios, e, conseqüentemente, não se pode condená-las nem inquiná-las em seu nome. A LINHA BRANCA, O CATOLICISMO E AS OUTRAS RELIGIÕES Ensina Allan Kardec, à pagina 434 do “Livro dos Espíritos”, que a religião se funda na revelação e nos milagres, e acrescenta, na página 440 da mesma obra: - “O Espiritismo é forte, porque assenta nas próprias bases da religião”. Sendo assim, a religião de origem divina, não podemos esperar que as derrubem os nossos ataques, nem devemos considerá-la merecedora de nossas zombarias. Os filhos de Umbanda respeitam e veneram todas as religiões e, sobretudo, a Igreja Católica pelas suas afinidades com o nosso povo e ainda pelas entidades que a amparam no espaço.

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Obra terrestre originaria do espaço, a Igreja Católica está cheia da sabedoria dos iluminados, e a Linha Branca de Umbanda pede, com freqüência, a sua tradição, e aos seus altares, elementos que lhe facilitem a missão de amar a Deus, servindo ao próximo, e nisso não se afasta de Allan Kardec, pois a página 442 do “Livro dos Espíritos” lê-se: “O espiritismo não é obra de um homem. Ninguém pode inculcar-se como seu criador, pois, tão antigo é ele quanto à criação. Encontramo-lo por toda a parte, e em todas as religiões, principalmente na religião católica, e ai com mais autoridade do que em todas as outras, porquanto nela se nos depara o princípio de tudo quanto há nele: os Espíritos em todos os graus de elevação, suas relações, ocultas e ostensivas com os homens, os Anjos guardiões, reencarnação, a emancipação da alma durante a vida, a dupla vista, todos os gêneros de suas manifestações, as aparições, e até as aparições tangíveis. Quanto aos demônios, esses não são senão os Espíritos maus, salvo a crença de que eles foram destinados a passar perpetuamente no mal”. Estamos convencidos de que se os espíritas estudassem com mais profundeza e com ânimo desprevenido à liturgia da Igreja, haveriam de perceber-lhe um sentido oculto, compreendendo que na majestade sonora das naves se conjugam todas as artes para favorecer o êxtase e desprender a alma, elevando-a a Deus. Sou dos que acreditam que o catolicismo, como todas as igrejas, vai entrar num período luminoso de reflorescimento, revigorado e rejuvenescido por surpreendentes reformas para as quais vão cooperar, com o antagonismo de suas diretrizes, as correntes materialistas de nosso tempo e a evidência multiplicada dos fenômenos espíritas. Um espírita eminente, o Dr. Canuto de Abreu, que é, além de médico e advogado, um verdadeiro teólogo, entende que o espiritismo trouxe para a Igreja Católica um dogma novo – o da reencarnação, e para todas as religiões necessárias a evolução humana, um principio correspondente a esse. Procurando penetrar o futuro, acreditamos que o espiritismo triunfará na Igreja, sem destruí-la. Assim como invoca o consenso unânime dos povos para demonstrar a existência de Deus, a Igreja invocará a universalidade das manifestações espíritas para aceitar o espiritismo, e talvez época surja em que os templos tenham escolas e corpos médiuns. Longe de prejudicar o espiritismo, isso lhe aumentará a força, o prestígio e a eficácia, colocando sob a orientação dos espíritos as corporações sacerdotais. Voltando, porém ao presente, acrescentemos que a Linha Branca de Umbanda, que conta, entre os seus Guias, tantos antigos padres, não procura intervir na vida da Igreja para atacar o seu clero, limitando-se a observar que há clérigos ruins, como há péssimos presidentes de Sessões Espíritas, e que nem aqueles, nem estes, com seus erros e falhas, atingem a Igreja e o Espiritismo. Ante a Igreja, qualquer que ela seja, católica, ou protestante, como diante do sacerdote, quer pastor, quer padre, é de simpatia e respeito a atitude do filho de Umbanda e o conselho que aqui poderíamos deixar aos crentes daqueles templos se resume em poucas palavras: - Segue rigorosamente os preceitos de tua religião, e Deus estará contigo. A DOUTRINAÇÃO DO PRETO-VELHO Um cavalheiro de brilhante posição, trajando boas roupas, e gostando orgulhosamente de estadear importância, surpreendido por uma ameaça de revés, na esperança de aparar o golpe, iminente da desventura, foi a uma Sociedade Espírita solicitar apoio e socorro aos protetores espirituais. Levaram-no a um médium em que se manifestava, sobrado ao peso centenário da idade, um Preto de origem africana, ou que como tal se apresentava, Ouviu-lhe o Protetor a história e a exposição queixosa de seus receios e dúvidas, e um remate ardente de súplica. Estendeu-lhe o Protetor a mão, pedindo: - Beija a mão ao Preto-Velho. E depois do ósculo: - Senta-se ai, no chão, ao pé do Preto-Velho. E vendo-o, com a sua elegância no soalho: - Tu não tens vergonha de beijar a mão do Preto-Velho:

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- Não. O Espírito incorporado pediu um cachimbo e, baforando uma fumaça, continuou: - O filho não conhece um italiano que às vezes passa lá pelo teu escritório? Um já meio velho, a roupa muito usada, as botas sem salto. Parece que ele te conhece. - Sim, sei quem é. - Ele já teve dinheiro, não é? - Sim, já teve posição. Foi homem de fortuna. - E teve negócio contigo, não? - Tivemos negócios; altos negócios. O Protetor soprou uma fumaça: - Esses dias ele falou contigo, parece que não gostaste. - Não me lembro. - Filho, tu não enganas o velho. Olha, depois, ele quis falar contigo, tu não paraste na rua. - Pode ser. - Velho compreende, meu filho. Na tua posição não ficam bem, não é? - Sim, não fica, meu pai. - É verdade, filho. O que vale é dinheiro. O italiano perdeu o dinheiro, não importa que seja um bom homem, que tivesse te ajudado, não vale mais nada. Constrangia-se, mudo, o consulente, e o velho prosseguia. - O teu negócio está ruim, filho. Nessa marcha, acabas como o italiano, Ah! Filho, qualquer dia, ninguém para mais na rua para falar contigo. - O meu pai me ajude. - Mas filho; eu estou abaixo do italiano. Ele é branco, eu sou preto; ele ainda tem roupa de cidade; eu ando com roupa de negro cativo. - O meu pai é um Espírito. - Ele também. A diferença é que ele tem um corpo, e eu não. - Porém o senhor pode ajudar-me. - E tu podes ajudá-lo, ao coitado do italiano. Pois tu queres que te ajudem e não queres ajudar os outros? - Eu podendo, ajudarei. Escachimbando , em sua meia língua, o Protetor continuava: - Vamos ver, vamos ver. E com um sorriso: - Olha lá filho. Cuidado com os pretos. Preto-velho tem um irmão carnado, um preto-velho que anda ai pela cidade. É o seu retrato. É o preto-velho sem tirar nem por. Ele é médium, e não sabe. Às vezes, eu tomo o corpo dele e ando ai pela cidade. Qualquer dia passa por mim. Eu te chamo. Quero ver se beijas a mão do Preto-Velho, no meio da rua. Acanhado, mas resoluto, o elegante prometeu:

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- Beijo, meu pai. Rindo alto, o protetor considerou: - A necessidade é negra. És capaz de beijar a mão de tosos os pretos da cidade, Mas no meio da rua, filho. Não te escondas nalgum corredor. E diante do embaraço do orgulhoso: - Não te amofines. O Preto-Velho não se encontrará contigo antes que se endireite o teu negócio. Depois, não faz mal que o encontres e não pares na rua. Não precisarás mais dele. A INSTITUIÇÃO DE UMBANDA Nos artigos sobre a Linha Branca de Umbanda e Demanda, explicamos a sua organização no espaço, de acordo com as necessidades de determinadas zonas terráqueas, por largo ciclo de tempo, com o concurso de elementos espirituais afins com os habitantes dessas regiões; o seu fundamento evangélico, inspirando-se no exemplo de Jesus, ao expulsar os vendilhões do templo; e o seu objetivo – a prática da Caridade, libertando de obsessões, curando as moléstias de origem ou ligação espiritual, anulando os trabalhos da Magia Negra, e preparando um ambiente favorável a operosidade de seus adeptos. Mostramos, em seguida, o rigor de sua hierarquia, as causas dos usos de seus atributos, e as dos apetrechos semelhantes aos empregados pelas Linhas adversas; a natureza, a necessidade e o efeito dos despachos; a sua constituição em Sete Linhas e a formação das Falanges que as integram e tornam eficientes; a ação isolada de cada Espírito, a ação da Falange, a de cada Linha, e o esforço combinado de todas. Estudamos os Protetores de suas Tendas, ou Centros, a razão pela qual tantas entidades superiores se apresentam como Caboclos broncos ou Negros ignorantes; a diversidade de origem deles, em referência as suas últimas encarnações na Terra, a sua bondade humilde e o seu alto saber disfarçado em mediocridade. Constatamos, em cada Linha, a inspeção constante de vinte e um Orixás, Espíritos dotados de faculdades e poderes extraordinários, e vimos a grandeza luminosa de seus Guias supremos, tratando, com certa amplitude, desses iluminados com que temos estado em contato. Observamos, ainda, uma instituição da Linha Branca de Umbanda e Demanda, com a sua organização terrena correspondendo a do espaço, com os seus serviços do plano material articulando-se no plano espiritual, regendo-se, em cima e em baixo, por um sistema que a coloca ao nível de qualquer religião regular. E dentro dessa harmonia, com as responsabilidades e as funções, sob inquebrável disciplina hierárquica, definidas, quer para os Espíritos, quer para os homens, verificamos ações que se comparam aos velhos milagres consagrados pela auréola, no altar. Não conhecemos, no Espiritismo, nada que se compare, como organização, às Tendas de Maria (nota do autor: aqui, Lal de Souza faz uma alusão a Mãe Maria Santíssima) do Caboclo das Sete Encruzilhadas, e basta citá-las para mostrar que a Linha Branca de Umbanda e Demanda é uma grande e legítima instituição religiosa. O FUTURO DA LINHA BRANCA DE UMBANDA A evolução da Linha Branca de Umbanda e Demanda depende e acompanhará a evolução das populações situadas na zona terráquea de sua ação e influência. Tanto mais decline a magia em suas operações danosas à criatura humana, quanto mais se simplificarão os processos da Linha Branca, obriga a exercê-los de conformidade com as circunstâncias decorrentes da atuação de forcas espirituais e camadas fluídicas maleficamente empregadas. Destinada, também, a quebrar o orgulho mental e mundano de nosso tempo, à medida que o progresso moral dos homens se acentue, a Linha Branca acompanhando-o modificará o caráter, ou a natureza de suas manifestações, adaptando meios novos de servir a Deus, esclarecendo e amparando o próximo. Dia virá, certamente ainda distante no tempo, em que não haverá necessidade de recorrer aos meios materiais para alcançar efeitos espirituais, em que o aparecimento de Caboclos e Pretos-Velhos nos Terreiros das Tendas apenas ocorrerá esporadicamente, para não deixar perecer a lembrança destas épocas de duro materialismo e pesado orgulho utilitarista, que tão árdua e penosa tornam a missão dos Espíritos incumbidos da assistência aos homens, como trabalhadores da Linha Branca de Umbanda.

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A Linha, então, terá aprimorado a sua organização atual e, dentro dos quadros do Espiritismo, será uma instituição de grande fulgor, regrada pela sistematização severa que a de agora esboça, articulando, cada vez mais, o seu plano terreno no alto plano do espaço, de que é reflexo. Nessa idade, os falquejadores (Quem desbasta, em geral com machado, facão) do grande tronco, como os chama o Caboclo das Sete Encruzilhadas, os humildes presidentes e trabalhadores de Tendas, hoje incompreendidos e injuriados, abençoarão, no espaço, libertos da matéria, os sofrimentos e as calúnias que afrontaram na Terra, no cumprimento de uma tarefa muitas vezes superior aos seus méritos e energia. Quando, porém, raiará o esplendor dessa aurora? Esperemo-lo, confiantes. Por mais que tarde, há de vir e, para quem se coloca na sua ação espiritual no mundo material, sob o ponto de vista espírita, a lentidão das coisas não gera o desânimo, porque o tempo não tem limite e o Espírito é imperecível. Presentemente, as forças maléficas que a Linha Branca tem de enfrentar, na defesa da humanidade, tomam um desenvolvimento assombroso, sob o impulso da exasperação dos piores sentimentos humanos, irritados até a revolta pelas amarguras econômicas oriundas dos erros e crimes do egoísmo de indivíduos e povos, acumulando-se ininterruptamente através de numerosas gerações. Os institutos mais inferiores, por tanto tempo reprimidos por sentimentos assentes em preconceitos fundamentados em princípios religiosos, derribadas essas convenções pelos abalos sociais dos últimos decênios, irrompem com a fúria das torrentes represadas, ameaçando o mundo de uma subversão moral completa. A Linha Branca de Umbanda e Demanda é um dos elementos de reação e defesa com que o Espiritismo, ao lado das religiões espiritualistas, tem de dominar essa avalanche tumultuaria e arrasadora, competindo-lhe, a Linha Branca na região terreal de sua influência, a parte mais penosa da Demanda, pois tem de se agir com a flor, que embalsama, e com a espada, que afugenta, entre as hostilidades e as desconfianças de alguns de seus aliados no amor a Deus e na prática do bem. Esse terrível surto do mal tem de ser quebrantado, e a Linha Branca, que hoje se encapela em ondas espumantes de oceano em tempestade, será, na bonança, o azul lago placidamente refletindo as luzes do céu. E, pois que estas linhas serão publicadas na manhã que nos recorda o sorriso de Jesus infante, na manjedoura de Belém, seja permitido ao humilde filho de Umbanda enviar saudações e votos de paz no seio de Cristo, aos crentes e sacerdotes de todos os templos, com uma súplica fervorosa pelo bem estar daqueles que se privam do conforto da fé, e desconhecem Deus.

**********//********** Reafirmamos mais uma vez. A importância de se ler o livro de Leal de Souza – “O Espiritismo, A Magia e as Sete Linhas de Umbanda”, o primeiro livro editado sobre a Umbanda no Brasil, onde está disposto a Umbanda primeva do Caboclo das Sete Encruzilhadas, disponibilizado em nosso site juntamente com este livro, no ícone – “Livros Históricos”. Também poderão optar por comprá-lo na “Editora Conhecimento”.

**********//**********

Vamos agora a uma entrevista muito interessante efetuada pelo irmão Cláudio Zeus com a neta de Zélio de Moraes, que nos esclarece muito sobre a condução dos trabalhos realizados pelo Senhor Caboclo das Sete encruzilhadas:

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DOIS RELATOS DE TRABALHOS ESPIRITUAIS DA LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA DO CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS

DEFLAGRAÇÃO ESPONTÂNEA DE PÓLVORA

O interior do Estado do Rio de Janeiro, em sítio tranqüilo e quase deserto, pois conta poucos habitantes, uma pequena seção de grandes Tendas realizava trabalhos vulgares, de doutrinação de Espíritos surpreendidos na prática do mal. O Chefe do Terreiro, isto é, o Guia Espiritual, havia desincorporado, deixando a reunião ao menos aparentemente, sob a direção e responsabilidade exclusivas do presidente humano, e tudo corria serenamente, sem incômodos, apesar de uma outra tentativa de reação dos rebeldes que estavam sendo doutrinados. Num repente, abalando com a surpresa, o organismo de seu médium desprevenido, o Guia incorporou, pedindo: Vamos levar esses infelizes para o espaço. Temos trabalho sério. Uma a uma, a ligeiro toque na fronte dos respectivos médiuns, as entidades em erro deixaram os aparelhos, encaminhando-se, conduzidas pelos protetores, a centros especiais da regeneração no plano espiritual. O Guia Preveniu: Estão queimando as nossas Tendas. E emendou: Ainda estão em preparativos. Mais cinco minutos e tocam fogo. Vamos defender-nos, já e já. Para compreensão do público, é necessário dizer que as Tendas da Linha Branca de Umbanda, na prática da caridade, são constantemente forçadas a desfazer trabalhos de magia negra e a quebrar arremetidas de entidades espirituais empenhadas em servir ódios e paixões terrenas. Com isso, irritam esses Espíritos e enchem de cólera as criaturas que com eles trabalham, pois não só lhe ferem o orgulho, sempre insolente nestes desventurados, como os prejudicam materialmente, visto com têm eles a infelicidade de mercadejar com a habilidade sinistra dos malfeitores do espaço. Tais indivíduos, com o auxilio de tais Espíritos, fazem trabalhos formidáveis com o intuito de fechar essa ou aquela Tenda da Linha Branca que os prejudicou, e a Tenda alvejado, logo prevenida pelos seus Guias, reage com rapidez, à altura da agressão, elevando os recursos da defesa. Tratam-se, desse modo, verdadeiras grandes batalhas. Assim, os adversários da Linha Branca recorrem, com freqüência, à pólvora, para perturbá-las, atingindo os médiuns com espessas camadas de fluidos rudes e bruscamente deslocadas, e produzindo outros efeitos. O Guia da pequena reunião ordenara, como vimos, à defesa imediata, e dizia: “O nosso Chefe é bom demais para esse Planeta. O Sete Encruzilhadas não quer que faça mal nem aos inimigos que nos perseguem. Temos, pois, de limitar-nos à defesa, deixando, apenas, que os perversos sejam atingidos pelo reflexo de sua maldade. E basta isso para castigá-los. Mandou traçar, prolongando à soleira da porta, uma linha emblemática de pólvora. Concentração; pediu. Coração limpo e pensamento firme em Deus, nosso Pai. O nosso fogo vai ser aceso com o de lá. Silenciosos, as frontes inclinadas, os assistentes tinham o aspecto grave de pessoas absorvidas por uma idéia, ou presas à engrenagem de um raciocínio, na solução de algum problema. E na vibração desse silêncio, sem que se lhe chegasse lume, como se se incendiasse espontaneamente, a linha emblemática de pólvora explodiu num rápido clarão, enchendo a sala de fumaça. (Leal de Souza – Diário de Notícias – 2ª seção – Rio de Janeiro, Quinta-Feira, 29 de Dezembro de 1932) AÇÃO DE UM ESPÍRITO SOBRE UM SAPO Tenda de Nossa Senhora da Piedade. Sala de oito metros de comprimento sobre três de largura. Os trabalhos, com a assistência de quinze pessoas, correm serenos com a regularidade harmoniosa de sempre, sob a direção espiritual do Orixá Mallet, da Falange de Ogum, incorporado em seu médium. Em cavalheiro estabelecido em rua do centro, na Capital Federal, porém, morador no subúrbio, em Engenho de Dentro, recorrera àquele Espírito, queixando-se, ao mesmo tempo, de males do corpo e desorientação nos negócios e atribuindo a causas espirituais esses infortúnios.

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O trabalhador, isto é, o Chefe superior das Falanges de Demanda das Tendas de Maria (nota do autor: alusão a Mãe Maria Santíssima), estabeleceu, com precisão rigorosa, as causas espirituais desses malefícios, confirmando as suspeitas da vitima deles: Trata-se de um caso de magia negra. Continuando a investigar, determinou quem a encomendara, a razão desse recurso às forças ocultas, o preço ajustado e pago para desfechar o golpe, o individuo com que se fez o negócio macabro, as entidades do espaço que o realizaram, o local onde foi executado. Era necessário neutralizá-lo, desfazendo-o, e esse trabalho não comportava demora ou atraso. E o Orixá começou imediatamente a realizá-lo, sem ferir as atenções, pois todos os presentes estavam mais ou menos habituados a esse gênero defensivo de práticas de caridade. A Sessão durava uma hora. Súbito o Orixá declarou: É preciso um sapo. Não era possível, àquela hora, naquela sala, arranjar um sapo. Visse se podia fazer o trabalho com outro meio, pediram as pessoas de responsabilidade na Tenda. É indispensável um sapo! Repetiu o delegado de São Jorge. Algo irritado, um dos auxiliares humanos exclamou: Mas. Orixá, onde é que vamos arranjar um sapo a esta hora? Outro acrescentou: O Orixá devia ter pedido antes de começar o trabalho. Também o Sr. R... vem a última hora fazer a consulta, e quer logo fazer o trabalho! Admoestou outro. Severo, erguendo-se, o Orixá circungirou o olhar pelos circunstantes, e impondo-lhes silêncio, mandou-os que se alinhassem em duas filas, da porta da rua, à janela fechada do fundo. Pediu um copo de vidro, e colocou-o no chão, entre as duas fileiras, no extremo interior, e sentando-se no soalho, solicitou e acendeu um charuto. Abram a porta. Escancarem-na, ordenou. Aberta a porta, explicou: Vamos esperar o sapo. Ninguém sai do lugar, ninguém fala. Concentração. Concentrar no sapo, Orixá? Num gesto violento de negação contrariada, sacudiu a cabeça, e, depois, alçando a mão, indicou o alto. Deus. E completou: Eu chamo o sapo... Quedaram-se, todos, num silêncio cheio de vibrações mentais, olhos postos no chão, alguns, outros as pálpebras caídas, muitos mirando, fora, as ramagens das árvores em oscilação sob o sussurro leve da brisa, enquanto, o olhar no copo, o busto do médium apoiado nas mãos espalmadas no soalho, o charuto à boca, o Orixá baforava, envolvendo-se em fumaça. Transcorreram dez, quinze, quase vinte minutos, e de dentro da noite, como se brotasse da terra, um sapo, aos saltos, chegou à porta, e, transpondo-lhe a soleira, entrou na sala, e, coaxando e pulando, passou entre as duas filas de pessoas, até chegar ao extremo do aposento, para, no salto final, meter-se no copo. O Orixá, sem espanto, sem espalhafato, disse àquele em cuja defesa trabalhava: Pegue esse copo, e na primeira encruzilhada devolva esse sapo a quem lh´o mandou. E acabou-se o mal. Tudo vai melhorar; a saúde e os negócios. E assim foi, de fato. Para o cavalheiro em questão, tudo melhorou: da saúde aos negócios. (Leal de Souza – Diário de Notícias – 2ª seção – Rio de Janeiro, Quinta-Feira, 28 de Dezembro de 1932)

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ENTREVISTA COM DONA LYGIA CUNHA, NETA DE ZÉLIO DE MORAES E RESPONSÁVEL PELA CONDUÇÃO DAS SESSÕES NA TENDA ESPÍRITA

NOSSA SENHORA DA PIEDADE No final do ano de 2007, descobri, por pura sorte, o perfil de um rapaz chamado Marcelo, que vinha a ser filho de Dona Lygia, neto de dona Zilméia e bisneto de nosso já conhecido Zélio Fernandino de Morais, a quem coube, ainda que alguns rejeitem, a criação de uma nova religião, através da entidade que se apresentou como Caboclo das Sete Encruzilhadas, nos idos de 1908, como já é do conhecimento de todos... ou leram esta parte da historia da Umbanda em outros lugares. De inicio confesso que fiquei meio tímido para contatá-lo, tanto que levei alguns dias pensando se deveria ou não, como seria recebido, se teria alguma resposta, embora achasse que deveria fazê-lo pois, “viajando” por Comunidades como Orkut, MSN e outras, pude perceber que ainda são muitas as dúvidas que existem, não só sobre a figura de Zélio, do Caboclo e principalmente do culto religioso que este batizou de Umbanda. Além disto, ainda havia encontrado, nessas viagens, as informações mais disparatadas sobre certos rituais que alguns afirmavam, até com “certa certeza”(?), que existiam nas práticas das Tendas fundadas por Zélio e o Caboclo das Sete Encruzilhadas, a quem passarei a chamar de “Chefe”, como carinhosamente até hoje ele é tratado pela família e por aqueles que com eles se alinham. Pois bem. Tomei coragem e entrei com contato com o Marcelo que me respondeu até além de minha expectativa, fornecendo-me endereços e telefones que, é obvio, não serão aqui divulgados, de forma que eu pudesse me contatar com sua mãe, dona Lygia Cunha, o que fiz. E quando o fiz pela primeira vez, por telefone, ela deve se lembrar que cheguei a me espantar por ficar sabendo que a família residira por muitos anos em um prédio bem defronte ao que eu moro (local em que ela estava neste momento e se preparava para a última Sessão do ano que ocorreria dois dias após), e por coisas que a vida não explica, eu nunca soubera. Conversamos por um bom tempo. Minha proposta de preparar este questionário que se segue foi muito bem aceita e cheguei a combinar de estar presente nessa próxima sessão, o que infelizmente, por motivos particulares, não me foi possível, ficando eu de enviar-lhe as perguntas por e-mail para que sobre elas refletisse e escolhesse sobre o que gostaria de escrever, acrescentar, modificar ou não, e tivesse tempo suficiente para até mesmo, em caso de necessidade, buscar subsídios junto a sua mãe, dona Zilméia, sobre assuntos de que talvez não tivesse conhecimento; coisas que teriam acontecido quando ainda muito jovem e não tinha assumido seu cargo atual dentro da Tenda. Com todas as suas ocupações de mãe, avó, dona de casa, da Tenda, etc., etc., dona Lygia, pacientemente nos forneceu respostas às principais perguntas que, de acordo com minhas “viagens” antes citadas, me pareciam necessárias para melhores informações, já que como vemos, muitos têm os acontecimentos de 15 e 16 de novembro de 1908 como marco inicial da Umbanda, mas mesmo entre esses, uma grande parte não sabe como foi ou é a Umbanda preconizada pelo Chefe. As perguntas e respostas que se seguem foram as que de mais importância via eu no momento, e as estou colocando da mesma maneira que foram e vieram, ou seja, sem interpretações pessoais minhas. Questionário: Pergunta: Há pouco tempo em que uma revista de Umbanda saiu uma reportagem na qual dona Zilméia teria dito que matavam um porco para Ogum uma vez por ano e que isso era feito desde os tempos do senhor Zélio. Por tudo que já conhecia da Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas, sempre soube que sacrifícios de animais eram proibidos pelo Caboclo. Como se explica então essa “imolação de um porco para Ogum”, se nem seria este o animal adequado, de acordo com os rituais afros? Obs.: Esse comentário deu origem a diversos debates em que os africanistas afirmavam que o Caboclo das Sete Encruzilhadas também fazia sacrifícios. Resposta: O ritual para elaboração da comida de Ogum foi trazido por Orixá Mallet (uma das entidades que atuavam junto ao Caboclo das Sete Encruzilhadas, também de meu avô) que seria obrigatoriamente um sarapatel. O sarapatel era feito com os miúdos de um porco castrado, por isso usava-se o animal com esta característica. Ele era morto por uma pessoa de fora do Terreiro, fora da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, habilitado e contratado para tal. A carne era usada como alimento para qualquer refeição. Isto seria sacrifício? Hoje não mais existe esta contratação e a comida é feita, como para todos os Orixás, compra-se os ingredientes nos mercados. E quanto a sua dúvida, não ser o porco adequado nos rituais afro, nada sei; nós estamos falando da Umbanda do Caboclo. Não fazemos sacrifícios; qualquer dúvida é só visitar-nos.

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Pergunta: Sobre Exus: Como eram e são agora compreendidos os Exus na visão da Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas? Já trabalham com eles? O que os fez mudar, se assim procedem? Pergunto isso porque há um texto na Internet em que o próprio Zélio explicava como o Chefe e ele viam os Exus e o porquê de não trabalharem com eles. Resposta: Os Exus eram e são compreendidos da mesma forma, desde a fundação da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade; não houve qualquer mudança. Não há sessões de Exus. Continuam sendo, como dizia o Caboclo, os soldados, os trabalhadores do nosso Terreiro; são chamados somente quando necessário, normalmente nas descargas ou em outros trabalhos de defesa contra a magia.

Pergunta: Iniciei em um Centro Espírita que, embora kardecista em sua raiz, tinha sessões de Umbanda de Mesa Branca e que dizia seguirem a Umbanda preconizada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. Nesse Centro não havia velas, atabaques ou Congá. Era assim na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade? O que mudou desde então para vocês que estão mais próximos da Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Resposta: A Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade sempre trabalhou com velas, pembas, ponteiros, fumo, defumadores; temos Congá, que nada mais é que um altar com imagens de Santos; nunca usamos atabaques. Trabalha-se também com pontos firmados que são usados nas sessões e os pontos cantados, sem qualquer acompanhamento instrumental. Só voz. Para o nosso entender nada mudou na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.

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Se houve mudanças em Tendas criadas por meu avô, isto não é de nossa alçada. Nós continuamos fieis aos ensinamentos e preceitos do Chefe (como também chamamos o Caboclo das Sete Encruzilhadas) e esta será sempre a nossa luta.

Pergunta: Como é feita a iniciação de médiuns da Tenda? Quando eles são considerados prontos? Resposta: Existe na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade as chamadas Sessões de Desenvolvimento sob a responsabilidade de um Babá da casa, ajudado por outros médiuns antigos. As sessões dividem-se em duas partes; uma teórica e outra prática, na qual a incorporação dos médiuns em desenvolvimento é trabalhada. Após algum tempo participando desses trabalhos são considerados semi-prontos pela indicação do Guia Chefe. Após esta indicação, deverão ser burilados nas Sessões de Caridade, muitas vezes trabalhando como médiuns de atração, até receberem ordem para trabalharem na Casa, dando passes. Não há tempo marcado e cada um tem o seu tempo para desempenhar tal tarefa. Pergunta: Tendo a Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas tomado como ponto de partida os ensinamentos kardecistas, eu perguntaria em que momento as oferendas e/ou obrigações com comidas ou de outro qualquer tipo começaram a fazer parte dos rituais? Resposta: Apesar da primeira manifestação pública do Caboclo das Sete Encruzilhadas ter se dado na Sede da Federação Espírita de Niterói, as práticas da Umbanda não partiram de ensinamentos kardecistas, até porque os kardecistas de então, rejeitavam as manifestações de Pretos-Velhos e Caboclos por considerarem “Espíritos pouco evoluídos”. Aliás, o próprio Caboclo foi convidado a deixar o recinto na ocasião de sua incorporação. Não quero dizer com isto que rejeitemos os ensinamentos de Kardec. Os usamos para entender as questões relacionadas aos processos de evolução espiritual, reencarnação, etc., e temos profundo respeito pelas práticas dos kardecistas. Nossas práticas partiram dos ensinamentos que foram trazidos pelo próprio Chefe, por Pai Antonio e posteriormente por Orixá Mallet (entidades recebidas por meu avô). E quanto a sua pergunta sobre oferendas, etc., foi a partir da chegada do Orixá Mallet (segundo informações da minha mãe). Pergunta: Orixá Mallet – Vocês devem ter tido bastante contato com essa entidade. Poderiam me responder se era uma entidade ligada ao africanismo? Seria ele um desses que se acostumou a chamar de “capangueiro de Orixá”? Ou apenas uma entidade da linha de Ogum Malê? Ele era um Espírito (que tivesse vivido antes na Terra) ou um elemental/Orixá como compreendem os ritos de candomblé? Resposta: Eu infelizmente não tive muito contato com Orixá Mallet, pois era muito jovem e não freqüentava assiduamente as suas sessões, os seus trabalhos. Orixá Mallet não era ligado ao africanismo, nem “capangueiro de Orixá”, como você questiona. Ele era malaio e se apresentou com este nome; foi o Guia que veio para resolver “as demandas” do Centro e da própria Umbanda em seu nascedouro. Falava pouco e sua comunicação se dava predominantemente por gestos, era bastante rápido e exigente nas suas ações e nos trabalhos que realizava. Como se apresentava como malaio e pelas descrições de sua aparência, acredito que tenha tido uma existência terrena como o Chefe e Pai Antônio.

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Pergunta: O que vocês teriam a dizer dessas falanges que estão aparecendo na Umbanda como: Ciganos, Malandros, Boiadeiros, Lixeiros, Mendigos, Caipiras...? Resposta: Sobre as falanges que você pergunta: Ciganos, malandros e boiadeiros, temos conhecimento. Lixeiros, mendigos e caipiras... nunca ouvi falar, nada sei sobre elas. Na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade não trabalhamos com nenhuma delas, embora eventualmente alguma entidade possa se manifestar com trejeitos típicos de malandros e também com movimentos de um boiadeiro.

Pergunta: Qual a opinião de vocês quanto ao uso de paramentos, vestimentas que caracterizam certas entidades (Boiadeiros, Exus, Caboclos), como cocares, chapéus de couro, chicotes, laços e outros dentro dos rituais de Umbanda? Resposta: Esta Umbanda com paramentos não conheço, não usamos e particularmente não vejo necessidade de roupas, adereços ou qualquer tipo de fantasias.

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Pergunta: Qual a opinião atual de vocês sobre as vestimentas que devem usar os médiuns para trabalhos dentro da Umbanda? O que mudou desde o Caboclo das Sete Encruzilhadas para cá? Resposta: A nossa Umbanda continuará a usar um uniforme simples, como é desde a sua fundação. Para as mulheres um vestido branco c/ comprimento normal complementado com um calção por baixo até o joelho e, os homens calça comprida branca e camisa branca. Por praticidade esta camisa vem sendo substituída por um jaleco branco simples. Trabalhamos descalço. Os médiuns usam uma fita vermelha na cintura e os cambonos uma fita verde.

Pergunta: O Ponto riscado do Caboclo das Sete Encruzilhadas é uma encruzilhada encimado por um coração transpassado por uma flecha? Mais algum detalhe? Resposta: O ponto riscado do Caboclo é um coração transpassado por uma flecha somente.

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Pergunta: Qual a opinião de vocês sobre essa volta do Caboclo das Sete Encruzilhadas anunciada pela médium Adriana Berlinsky que escreveu recentemente dois livros aos quais ainda não tive acesso, que teriam sido psicografados pelo Chefe? Resposta: O Caboclo continua tendo o seu Centro, a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, com excelentes médiuns incluindo a filha carnal de Zélio de Moraes, sem qualquer mudança nas suas diretrizes e práticas desde a sua criação. Assim sendo me causa certo estranhamento que ele possa ter escolhido um médium sem nenhum contato com esta casa para se manifestar. Além disso, segundo informações recebidas através de outras entidades que com ele trabalhavam na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, o Chefe, após cumprir sua missão junto a Zélio de Moraes, já estaria em esferas ainda mais elevadas do astral superior, não mais realizando trabalhos em nosso plano.

Pergunta: Após o falecimento de Zélio, já tiveram alguma notícia dele, do Caboclo das Sete Encruzilhadas ou de Pai Antônio, ou de qualquer outra entidade que com ele trabalhasse? Resposta: Sim, o meu avô já esteve conosco, a sua última mensagem foi em novembro de 2007 na abertura da Sessão do Amaci. O Caboclo aparece para nós, em momentos muito especiais em nosso Terreiro e os médiuns videntes percebem sua presença manifestada na forma de um clarão de luz azul. Os seus recados são trazidos através de Caboclos e/ou Pretos em algumas ocasiões. Pai Antônio já incorporou algumas vezes com minha mãe, também em nossas sessões, trazendo muita alegria e uma imensa saudade.

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Pergunta: Há pouco tempo tive a oportunidade de ler em uma certa comunidade do Orkut que talvez lhes interessasse (aos membros dessa comunidade) comprar a casa onde morou o Sr. Zélio, em Neves, para que ali fosse criado uma espécie de marco do início da Umbanda, mas que alguém que teria ido ao local teria se deparado com uma pessoa que, embora da família, seria evangélica e nada interessada em Umbanda ou qualquer coisa parecida. Vocês têm conhecimento desses fatos (da possível compra e da pessoa que lá reside)? Resposta: Freqüenta hoje o Terreiro da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade uma das pessoas da comitiva que esteve em visita a casa. Existia sim esta idéia, mas não sei como surgiu. A pessoa que os recebeu é católica (sic) e não evangélica e é bisneta da tia Zilka (única irmã de meu avô). São os atuais moradores da casa, seus pais e irmãos. O meu avô nunca foi favorável a qualquer culto a sua personalidade ou a valorização de algo material ligado a Umbanda, como um imóvel, por mais importante que seja para a nossa história. Assim sendo nos arrepia a idéia de um “Museu da Umbanda” ou coisa parecida, com fotos, objetos de meu avô ou algo similar. Uma “casa de Umbanda” só tem sentido para nós se for para a prática da caridade e para isto, como diria o Chefe, basta a copa de uma árvore.

Pergunta: A que fatos ou interpretações vocês atribuem essa diferenciação tão grande de Umbandas hoje existentes e a essas afirmações de que: “Já existia Umbanda antes do Caboclo das Sete Encruzilhadas e que ele não teria criado a Umbanda e sim anunciado ou mesmo, como afirmam outros, socializado?”.

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Resposta: Em relação às diferenças acredito no lema “cada cabeça uma sentença”. A Umbanda não é dogmática porque o Chefe assim o quis. Não foi criada uma doutrina, talvez para permitir que aquele que seja dotado de mediunidade e afeito aos seus ideais possa se tornar um trabalhador de suas causas. A coisa mais importante é que paute suas práticas na humildade, no amor e na caridade. Nós na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade procuramos manter as práticas como nos foram ensinadas pelas entidades recebidas por meu avô. Para cada uma delas existe uma razão, uma justificativa nem sempre muito clara. Procuramos ser um esteio do que foi preconizado por estas entidades, entretanto sem termos a pretensão de sermos melhores que quaisquer outros. Quanto a existência da Umbanda antes do Caboclo, só podemos falar por aquilo que está na nossa história e o que nos foi ensinado: A Umbanda é uma religião brasileira que incorpora elementos de todos os povos constituintes de nossa nação, especialmente do índio, do negro e do branco europeu, nascida por ordem do astral superior, através do Caboclo das Sete Encruzilhadas voltada principalmente para a prática da caridade. Seu nascimento se deu em São Gonçalo – RJ em 15 de novembro de 1908 no bairro de Neves.

Pergunta: Que tipo de mensagem vocês gostariam de deixar para os Umbandistas de todas as vertentes atuais?

Resposta: Importante é que tenham pureza em seus corações. A fé é a maior alavanca. A Umbanda para nós sempre será baseada na simplicidade, no amor, na caridade e principalmente na humildade. Nunca se afastem desses ensinamentos. Façam sempre suas orações pedindo orientação aos mestres espirituais. Salve Oxalá e que Ele os abençoe.

OBSERVAÇÕES IMPORTANTES:

1) Todo este texto, após montado, foi remetido para Dona Lygia para que tivesse sua aprovação e recebesse qualquer emenda que bem achasse necessária.

2) As fotos que acompanham a matéria (algumas das muitas que foram enviadas à família) foram feitas

em 26/04/2008, durante a Sessão em homenagem a Ogum e com permissão de Dona Lygia por quem fui muito bem recebido.

3) Que se observem, através das fotos, o tipo de indumentária utilizada pelos médiuns, bem como a

ausência de atabaques no recinto do Terreiro, o que desmentem peremptoriamente muitos dos comentários expostos em mídias.

4) Como fiquei sabendo lá mesmo, em breve a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade terá seu Site

na Internet e, assim que ficarmos sabendo o endereço, ele será aqui exibido. Que Oxalá nos abençoe e ilumine a todos, são também meus sinceros votos! (Cláudio Zeus – Maio de 2008)

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REPORTAGEM DA REVISTA ESOTERA, DE FEVEREIRO DE 2006, COM IMPORTANTES INFORMAÇÕES DE ZILMÉIA DE MORAESSOBRE OS TRABALHOS NA TENDA ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA PIEDADE

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ANTONIO ELIEZER LEAL DE SOUZA

O PRIMEIRO ESCRITOR DA UMBANDA

Antônio Eliezer Leal de Souza nasceu em Livramento (antiga Santana do Livramento), Rio Grande do Sul, em 24 de dezembro de 1880. Quando jovem, foi alferes e participou da Guerra de Canudos, mas desligou-se do Exército, já cansado de sofrer prisões por combater o governo de Borges de Medeiros. Passou então a dedicar-se ao jornalismo em Porto Alegre. Depois de algum tempo na área, mudou para o Rio de Janeiro e resolveu cursar Direito, sem concluí-lo. Naquela cidade, destacou-se como diretor e repórter dos jornais “A Noite”, “Diário de Notícias” e “A Nota”. Foi um grande participante do movimento umbandista. Foi o dirigente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, uma das sete casas fundadas pelo Sr. Caboclo das Sete Encruzilhadas. Leal de Souza desencarnou em 1948, no Rio de Janeiro, deixando as seguintes obras publicadas: “O Álbum de Alzira”, “Almanaque Regional”, “Bosque Sagrado”, “Canções Revolucionárias”, “No Mundo dos Espíritos”, “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” (considerado realmente, o primeiro livro sobre Umbanda lançado no Brasil), “A Biografia de Getúlio Vargas”, “A Rosa Encarnada” (romance Espírita), “A Transposição dos Umbrais”, entre outros. Pois é, caro leitor, Leal de Souza ousou escrever pela primeira vez sobre Umbanda, num jornal de grande divulgação do Rio de Janeiro, em 1932, em plena repressão da Ditadura Vargas. Leal de Souza, que nós já sabemos ter sido o dirigente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, era poeta, jornalista e escritor e foi o primeiro umbandista que enfrentou a crítica feroz, ostensiva e pública, em defesa da Umbanda do Brasil, ou seja, daquele movimento inicial preparado pelo Caboclo Curuguçú e assumido pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas.

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Isto aconteceu numa época que era quase um crime de heresia de falar em tal assunto. Foi o primeiro que tentou definir, em diversos artigos, o que era Umbanda ou o que viria a ser no futuro esse outro lado que já denominava de Linha Branca de Umbanda e Demanda. Nessa época, para os fanáticos religiosos, alguns católicos e alguns kardecistas sectaristas, tudo era apenas: “Macumba”. Em 1925, Leal de Souza publicou o livro: “No Mundo dos Espíritos”, compilado de uma grande série de reportagens suas, através do jornal – “A Noite”, com o título: “No Mundo dos Espíritos – Inquérito A Noite”. Esse material é importante ser lido, pois nos passa um panorama, em época, das manifestações dos Espíritos em Centros Espíritas, Feitiçarias, Mistificações, Macumbas, etc. Os relatos são fidedignos e interessantes.

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Capa do livro: “No Mundo dos Espíritos” – 1925, de Leal de Souza. Este é o primeiro livro que aborda o tema Umbanda:

Leal de Souza, a partir de 1920, iniciou entrevistas a jornais e revistas, tentando explicar das razões e da finalidade da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”. Ele registrava – sem talvez prever o valor e a dimensão que teria para a posteridade, e para a história dessa Umbanda, que abarca milhões de adeptos na atualidade. A dignidade e a sinceridade desse valoroso escritor nunca foi posta em dúvida, pois seus registros ocorreram desde 1920, época de grandes perseguições e preconceitos ostensivos contra os Terreiros de Umbanda, fatos que perduraram por muitos anos. Leal de Souza foi um participante ativo e dedicado, durante 10 anos, da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade e amigo pessoal de Zélio de Moraes, dali se afastando, por ordem e em boa paz, a mando do Caboclo das Sete Encruzilhadas, para dirigir a Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição. Nota-se, então, que ele estava bem familiarizado com a importante missão dessa portentosa Entidade do Astral Superior. Leal de Souza não poderia ter inventado o Caboclo Curugussú, e muito menos falseado a verdade, visto que era um fiel adepto do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Leal de Souza foi o primeiro ensaísta de uma espécie de normatização, pois naquela época ele tentava classificar (segundo o seu conhecimento de então) as 7 Linhas da Umbanda. Um jornal do Paraná chamado “Mundo Espírita”, entrevistou-o, em 1925, sobre Magia e as Sete Linhas da Umbanda. Nessa entrevista ele classificou as 7 Linhas da seguinte maneira : OXALÁ (Nosso Senhor do Bonfim) – OGUM (São Jorge) – EUXOCE (São Sebastião) – SHANGÔ (São Jerônimo) – NHAN-SAN (Santa Bárbara) – AMANJAR (Nossa Senhora da Conceição) – AS ALMAS. Devido ao seu prestígio e ao seu conhecimento, o 1º Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda, realizado em 1941, no Rio de Janeiro, aprovou essas Sete Linhas. As Sete Linhas de Umbanda constituem seguramente, um dos assuntos mais polêmicos da Umbanda, pois cada Federação ou Terreiro procura “criar” os seus próprios conceitos sobre as Sete Linhas. Em alguns lugares pode-se perceber a existência de mais de 20 Linhas, o que deve causar, na verdade, um grande emaranhado de confusão entre Santos, Orixás e Entidades; Esse emaranhado de Linhas vai aos poucos sendo desenrolado...

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A edição matutina de 8 de Novembro de 1932, do Diário de Notícias, da antiga Capital Federal, anunciava: “A larga difusão do Espiritismo no Brasil é um dos fenômenos mais interessantes do reflorescimento de fé. O homem sente, cada vez mais, a necessidade do amparo divino, e vai para onde o arrastam seus impulsos conforme sua cultura e a sua educação, ou para onde os conduzem as sugestões do seu meio. E o que se observa em nosso país ocorre, igualmente nos Estados Unidos e na Europa, atacada, nestes tempos, de uma curiosidade delirante pela magia”... Mas, em nenhuma região o Espiritismo alcança a ascendência que o caracteriza em nossa Capital. É preciso, pois, encará-lo com a seriedade que a sua difusão exige. No intuito de esclarecer o povo e as próprias autoridades sobre o culto e as práticas amplamente realizados nesta cidade, o Diário de Notícias convidou um especialista nesses estudos, o senhor Leal de Souza, para explaná-los, no sentido explicativo em suas colunas. Esses mistérios, se assim podemos chamar, só podem ser aprofundados por quem os conhecem. Convidamos o senhor Leal de Souza por ser ele um Espírito tão sereno e imparcial que exercendo até setembro do ano próximo findo o cargo de redator-chefe de “A Noite”, nunca se valeu daquele vespertino para propagar a sua doutrina e sempre apoiou com entusiasmo as iniciativas católicas. O senhor Leal de Souza já era conhecido pelos seus livros quando realizou o seu famoso inquérito sobre o espiritismo. “No Mundo dos Espíritos”, lançado com grande êxito pela imparcialidade e discrição com que descrevia as cerimônias e fenômenos então quase desconhecidos de quem não freqüentava os Centros. Depois de convertido ao Espiritismo, o senhor Leal de Souza fez durante seis anos, com auxílio de cinco médicos, experiências de caráter científico sobre essas práticas, e principalmente sobre os trabalhos dos chamados Caboclos e Pretos. O senhor Leal de Souza, nos seus artigos sobre “Espiritismo e as Sete Linhas de Umbanda” não vai fazer propaganda, porém, elucidação, mostrando-nos as diferenciações do Espiritismo no Rio de Janeiro, as causas e os efeitos que atribui as suas práticas, dizendo-nos o que é e como se pratica a feitiçaria, tratando não só dos aspectos científicos como do uso do defumador, da água, da cachaça, dos pontos, em suma, da magia negra e branca. Esperamos que as autoridades incumbidas da fiscalização do Espiritismo e muitas vezes desaparelhadas de recursos para diferenciar o joio e o trigo, e o povo, sempre ávido de sensações e conhecimentos, compreendam, em sua elevação, os intuitos do Diário de Notícias. Na próxima quinta-feira, iniciaremos a publicação dos artigos do senhor Leal de Souza, sobre o Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda. “E a primeira série desses artigos, escritos diariamente ao correr da pena, que constitui este livro. A primeira série de artigos de Leal de Souza no Diário de Notícias deu origem ao livro “O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda”, editado em 1933, com 118 páginas, nas antigas oficinas gráficas do Liceu de Artes e Ofícios, na Avenida Rio Branco, 174, Rio de Janeiro. Em 2009, a Editora do Conhecimento reeditou a obra, com apresentação de Diamantino Fernandes Trindade. Deste histórico documento reproduziremos os capítulos I, XIII, XX (um pequeno trecho) e o XXIII. No capítulo I de sua obra, Leal de Souza procura esclarecer os leitores, no sentido de que as religiões em expansão, que se caracterizam pelas manifestações dos Espíritos desencarnados, não podem atacar ou destruir algum outro credo religioso (é bom lembrar a influência da Igreja Católica sobre as massas populares, naquela época) e sim, mostrar a imortalidade da alma e revigorar a Fé em Deus. Vejamos então o que diz Leal de Souza nesse primeiro capítulo (Explicação Inicial): “O Espiritismo não é clava para demolir, é uma torre em construção, e, quanto mais se levanta, mais alargam os horizontes e a visão de seus operários, inclinando-os à tolerância, pela melhor compreensão dos fenômenos da vida. Como nos ensina o seu codificador (Allan Kardec), o Espiritismo não veio destruir a religião, porém, consolidá-la e revigorar a fé, trazendo-lhes novas e mais positivas demonstrações da imortalidade da alma e da existência de Deus. As religiões sabem-no todos, são caminhos diversos e às vezes divergentes, conduzindo ao mesmo destino terminal. O indivíduo, está sob a assistência de Deus, pois mesmo as regras que aos seus contrários pareçam absurdas ou degradantes, como a confissão, no catolicismo, ou a benção solicitada aos pais de Terreiro, no Espiritismo de Linha (Umbanda), revelam um grau de humildade significativo de radiosa elevação espiritual.

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Seria negar a Deus os atributos humanos da inteligência e justiça ao admitirmos que o Criador fosse capaz de desprezar ou punir as suas criaturas, porque não amam do mesmo modo, orando com as mesmas palavras, segundo os mesmos ritos. Deus não tem partido, e atende a todos os seus filhos, de onde quer que o chamem com amor e fé, parta a prece do coração de um Cardeal, ajoelhado na glória suntuosa de um altar, ou saia à oração do peito de um sertanejo, caído no silêncio pesado da selva. Os homens é que escolhem, pela sua cultura, ou pelas tendências de cada alma, em seu núcleo de evolução, a maneira mais propícia de cultuar e servir a Divindade. Com estas idéias, é claro que não venho provocar polêmicas, e seria desconhecer os intuitos do Diário de Notícias, ou aventurar-me à propaganda agressiva dos meus princípios. Pretendo, nestes artigos, esclarecer, quanto o permitam meus conhecimentos, práticas amplamente celebradas nesta Capital, estabelecendo diferenciações, para orientação popular, e mostrando a importância de coisas que parecendo burlescas, são, com freqüência, sérias e até graves. É, pois que tratarei também, e principalmente, do Espiritismo de Linha, na fórmula da Linha Branca de Umbanda: – salve a quem tem fé; salve a quem não tem fé”. Uma das tarefas mais importantes desses pioneiros do Movimento Umbandista da época era separar o “joio do trigo”, elucidando os novos adeptos sobre as diferenças entre Umbanda, Kardecismo e Macumba. Muitas confusões se faziam na cabeça dos recém-chegados ao Movimento Umbandista, principalmente pela generalização desses cultos em torno do termo “Macumba”, prática que ainda hoje vigora em algumas cabeças menos esclarecidas e “surdas” aos clarins dos novos tempos. É comum ouvirmos certas pessoas dizerem que vão a uma Macumba quando, na verdade estão indo a um Terreiro de Umbanda. Vejamos a opinião de Leal de Souza (em 1932) sobre a “Macumba” no capítulo XIII de seu livro: “A Macumba se distingue e caracteriza pelo uso de batuques, tambores e alguns instrumentos originários da África. Essa música bizarra em sua irregularidade soturna, não representa um acessório de barulho inútil, pois exerce positiva influência nos trabalhos, acelerando, com suas vibrações os lances fluídicos. As reuniões não comportam limitações de hora, prolongando-se, na maioria das situações, até o alvorecer. São dirigidas sempre por um Espírito, invariavelmente obedecido sem ter diversificações, por que está habituado a punir os recalcitrantes com implacável rigor. É, de ordinário, o Espírito de algum africano, porém também há de Caboclos. Os métodos, seja qual for a entidade dirigente são os mesmos, porque o Caboclo aprendeu com o africano. Os médiuns que ajudam o aparelho receptor do Guia da reunião às vezes, temem receber as Entidades auxiliares. Aqueles lhes ordena que fiquem de joelhos, dá-lhes um copo de vinho, porém com mais freqüência, puxa-lhes, com uma palmatória de cinco buracos dos alentados bolos. Depois da incorporação, manda queimar-lhes pólvora nas palmas das mãos, que se torna incombustível quando o Espírito toma posse integral do organismo do médium. Conhecendo essa prova e seus resultados quando a incorporação é incompleta, apassivam-se os aparelhos humanos, entregando-se por inteiro àqueles que devem utilizá-los. Os trabalhos que, segundo os objetivos, participam da magia, ora impressionam pela singularidade, ora assustam pela violência, surpreendem pela beleza. Obrigam a meditação, forçam ao estudo, e foi estudando-os que cheguei à outra margem do Espiritismo”.

1. Generalização feita a cultos afro-brasileiros.

2. Sabemos hoje que o som dos atabaques estimula o animismo vicioso.

3. Na verdade, Caboclos e Pretos-Velhos, beberam na mesma fonte de conhecimentos”. Do capítulo XX do livro de Leal de Souza escolhemos um trecho que relata, ao mesmo tempo, a humildade e a sabedoria das Entidades que baixam na Umbanda:

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“O protetor, na Linha Branca, é sempre humilde, e, com sua linguagem atravessada, ou incorreta, causa uma impressão penosa de ignorância, mas freqüentemente, pelos deveres de sua missão, surpreendem seus consulentes, revelando conhecimentos muito elevados”. Exemplo: Uma ocasião, numa pequena reunião de cinco pessoas, um protetor Caboclo descarregava os maus fluídos de uma senhora, enquanto, também incorporado, um Preto-Velho, Pai Antonio, fumava um cachimbo, observando a descarga: Cuidado, Caboclo, avisou o preto. O coração dessa filha não está batendo de acordo com o pulso. Como é que Pai Antonio viu isso? Deixe verificar, pediu um médico presente à sessão. E, depois da verificação, confirmou o aviso do preto, que o surpreendeu de novo, emitindo um termo técnico da medicina, e explicando que o fenômeno não provinha, como acreditava o clínico, de causas fisiológicas, porém de ação fluídica, tanto que, terminada a descarga, se restabeleceria a circulação normal no organismo da dama. E assim aconteceu. O doutor, então quis conversar sobre sua ciência com o Espírito humilde do preto e, antes de meia hora, confessava, com um sorriso, e sem despeito, que o negro abordara assuntos que ele ainda não tivera oportunidade de versar”. Como o leitor pode perceber, através da vestimenta humilde dos Caboclos e Pretos-Velhos esconde-se, não raras vezes, uma potente sabedoria científica e humanística. Para encerrar este capítulo, transcreveremos o capítulo XXIII. No qual Leal de Souza escreve sobre o Caboclo das Sete Encruzilhadas, Entidade a qual esteve ligado por muitos anos. “Se alguma vez tenho estado em contato consciente com algum Espírito de Luz é, sem dúvida, aquele que se apresenta sob o aspecto agreste, e sob o nome bárbaro de Caboclo das Sete Encruzilhadas. Sentindo-o ao nosso lado, pelo bem estar espiritual que nos envolve e sensibiliza, pressentimos a grandeza infinita de Deus, e, guiados pela sua proteção, recebemos e suportamos os sofrimentos com uma serenidade quase ingênua, comparável ao enlevo das crianças nas estampas sacras, contemplados, da beira do abismo, sob as asas de um anjo, as estrelas do Céu. O Caboclo das Sete Encruzilhadas pertence à falange de Oxossi, e sob a irradiação da Virgem Maria, desempenha uma missão ordenada por Jesus. O seu ponto emblemático representa uma flecha atravessando um coração, de baixo para cima; a flecha significa direção, o coração o sentimento, e o conjunto orientação dos sentimentos para o alto, para Deus. Estava esse Espírito no espaço, no ponto de intersecção de sete caminhos, chorando sem saber o rumo que tomava, quando lhe apareceu, na sua inefável doçura, Jesus, e mostrando-lhe, numa região da Terra, as tragédias da dor e os dramas da paixão humana, indicou-lhe o caminho a seguir, como missionário do consolo e da redenção. E em lembrança desse incomparável minuto de sua eternidade, e para se colocar no nível dos trabalhadores mais humildes, o mensageiro de Cristo tomou o seu nome dos caminhos que o desorientavam, e ficou sendo o Caboclo das Sete Encruzilhadas. E já vinte e três anos, baixando em uma casa pobre de um bairro paupérrimo, iniciou a sua cruzada, vencendo, na ordem material, obstáculos que se renovam quando vencidos e derrubados, e dos quais o maior é a qualidade das pedras com que deve construir o novo templo. Entre a humildade e a doçura extremas, a sua piedade se derrama sobre quantos o procuram, e não poucas vezes, escorrendo pela face do médium, as suas lágrimas expressam a sua tristeza, diante dessas provas inevitáveis a que as criaturas não podem fugir. A sua sabedoria se avizinha da onisciência. O seu profundíssimo conhecimento da Bíblia e das obras dos doutores da Igreja, autorizam a suposição de que ele, em alguma encarnação, tenha sido sacerdote, porém a medicina não lhe é mais estranha do que a Teologia. Acidentalmente, o seu saber se revela. Uma ocasião, para justificar uma falta, por esquecimento, de um de seus auxiliares humanos, explicou, minucioso, o processo de renovação das células cerebrais, descreveu os instrumentos que servem para observá-las e contou numerosos casos de ferimentos que as atingiram, e como foram tratados na Grande Guerra deflagrada em 1914.

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Também para fazer os seus discípulos compreenderem o mecanismo, se assim posso expressar-me, dos sentimentos, explicou a teoria das vibrações e a dos fluídos, e numa ascensão gradativa, na mais singela das linguagens ensinou a homens de cultura desigual as transcendentes Leis da Astronomia. De outra feita, respondendo a consulta de um espírita que é capitalista em São Paulo e representa interesses europeus, produziu um estudo admirável da situação financeira criada para a França, pela quebra do padrão ouro na Inglaterra. A linguagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas varia, de acordo com a mentalidade de seus auditórios. Ora chã, ora simples, sem um atavio, ora fulgurante nos arrojos da alta eloqüência, nunca desce tanto, que se abastarde, nem se eleva demais, que se torne inacessível. A sua paciência de mestre é como sua tolerância de chefe, ilimitada. Leva anos a repetir, em todos os tons, através de parábolas, por meio de narrativas, o mesmo conselho, a mesma lição, até que o discípulo, depois de tê-la compreendido, comece a praticá-la. A primeira vez em que os videntes o vislumbraram, no início de sua missão, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, se apresentou como um homem de meia idade, a pele bronzeada vestindo uma túnica branca, atravessada por uma faixa branca onde brilhava, em letras de luz, a palavra “Cáritas”. Depois de muito tempo, só se mostrava como Caboclo com tanga de plumas e mais atributos dos Pajés silvícolas. Passou, mais tarde, a ser visível na alvura de sua túnica primitiva mas há anos acreditamos que só em algumas circunstâncias se reveste da forma corpórea, pois os videntes não o vêem, e quando a nossa sensibilidade e os outros Guias assinalam a sua presença, fulge no ar uma vibração azul e uma claridade dessa cor paira no ambiente”... O Caboclo das Sete Encruzilhadas jorrava serenidade, doçura e principalmente Piedade. Aqueles que por Graça conheceram o Caboclo das Sete Encruzilhadas relatam que não era raro ver, durante as sessões, lágrimas escorrendo as faces de seu aparelho quando incorporado. Sua Misericórdia em ver seus pobres e amados filhos da Terra sofrendo o afligiam.

Este Espírito formidável e bem-aventurado nas Graças do Senhor, possuía todo tipo de conhecimento, nunca deixara uma pergunta sem uma resposta, poderíamos até afirmar que seu conhecimento era quase onisciente. Possuía extraordinário conhecimento de medicina e teologia, com as quais deixava os doutos da Igreja e da área médica, estupefatos, pois, abordara assuntos que nem ao menos eles tinham conhecimento ou refletido sobre a causa para descobrir o efeito. A sua linguagem e forma de se expressar variava, de acordo com a faixa intelectual de quem o abordara, para que fosse de fácil compreensão daqueles que o consultavam. Em muitas ocasiões discursava em alta eloqüência, dentro dos arrojos da língua, e quando compareciam pessoas com menor saber, descia mais seu vocabulário, para que todos ouvissem , entendessem e aprendessem. Passou todos os anos ensinando através de parábolas e ensinos, e sua paciência e tolerância nunca sumiu. Continua a nos contar, Leal de Souza, sobre uma ocasião, certamente interessante de se observar: “Resolvi, certa vez, explicar os dez mandamentos da Lei de Deus aos meus companheiros e, à tarde, quando me lembrei da reunião da noite, procurei, concentrando-me, comunicar-me com o missionário de Jesus, pedindo-lhe uma sugestão, uma idéia, pois não sabia como discorrer sobre o mandamento primeiro. Ao chegar à Tenda, encontrei seu médium, que viera apressadamente das Neves, no município de São Gonçalo, por uma ordem recebida a última hora, e o Caboclo das Sete Encruzilhadas, baixando em nossa reunião, discorreu espontaneamente sobre aquele mandamento e, concluindo, disse-me: Agora nas outras reuniões, podeis explicar os outros, como é vosso desejo. E esse caso se repetiu: - havia necessidade de falar sobre as Sete Linhas de Umbanda, e, incerto sobre a de Xangô, implorei, mentalmente, o auxílio desse Espírito, e de novo o seu médium, por ordem de última hora, compareceu, numa alocução transparente, as nossas dúvidas sobre a quarta linha.” Como o leitor pode perceber, Leal de Souza não era vidente e os seus relatos foram buscados na vidência mais ou menos apurada dos citados médiuns. Claro que isso implica em determinadas deturpações que podem levar a desvios da realidade. No entanto, não é nossa função tecermos críticas às qualidades dos médiuns de então e sim, registrar os fatos historicamente, através da honestidade de Leal de Souza, valoroso “escriba” dos primórdios do Movimento Umbandista. (Trecho extraído da obra: Umbanda e sua História – Diamantino Fernandes Trindade – Editora Ícone, com complementações do autor) Entrevista com Leal de Souza, publicada no “Jornal de Umbanda” em outubro de 1952, com o título de “Umbanda– Uma Religião Típica do Brasil”:

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“Leal de Souza, poeta, escritor e jornalista é um dos mais antigos umbandistas do Brasil. Dirige a Tenda Nossa Senhora da Conceição, considerada por José Álvares Pessoa, uma das Tendas mestras. Diz, Leal de Souza, que: a Linha Branca de Umbanda é realmente a Religião Nacional do Brasil, pois que, através de seus ritos, os Espíritos ancestrais, os pais da raça, orientam e conduzem sua descendência. O precursor da Linha Branca foi o Caboclo Curugussú, que trabalhou até o advento do Caboclo das Sete Encruzilhadas, que a organizou, isso é, que foi incumbido pelos Guias superiores, que regem o nosso ciclo psíquico, de realizar na Terra a concepção do Espaço. Esse Espírito une a intransigência à doçura. Quando se apresentou pela primeira vez, em 15 de novembro de 1908, para iniciar sua missão, mostrou-se como um velho de longa barba branca; vestia uma túnica alvejante, que tinha em letras luminosas a palavra “CARIDADE”. Depois, por longos anos, assumiu o aspecto de um Caboclo vigoroso; hoje é uma claridade azul no ambiente das Tendas. A sua missão é, portanto, a de preparar Espíritos encarnados e desencarnados que deverão atuar no Espaço e na Terra, na época futura em que ocorrerá um acontecimento da importância do advento de Jesus no mundo antigo. O Caboclo das Sete Encruzilhadas chama Umbanda os serviços de caridade, a demanda, os trabalhos para neutralizar ou desfazer os da magia negra. A organização da Linha é um primor minucioso. Espanta a sabedoria dos Espíritos que se apresentam como Caboclos e Pretos-Velhos a que são tanto mais humildes e quanto mais elevados. Em geral, as pessoas que freqüentam as sessões, não as conhecem na plenitude da sua grandeza, porque tratam do seu caso pessoal, sem tempo para outras explanações. O Caboclo das Sete Encruzilhadas, que é dotado de rara eloqüência, quando se manifesta em público, costuma adaptar a sua linguagem à compreensão das pessoas menos cultas, que são consideradas como sendo as mais necessitadas de conforto espiritual. Foi esse Espírito que há vinte anos, conforme ficou apurado em inquérito policial, reproduziu o milagre do Divino Mestre, fazendo voltar à vida, uma moça cuja morte fora atestada pelos médicos. Pai Antônio, o principal auxiliar do Caboclo das Sete Encruzilhadas, e que baixa pelo mesmo aparelho, Zélio de Moraes, e que eu já vi discutir medicina com os doutores. É o Espírito mais poderoso do meu conhecimento. A seguir, Leal de Souza, referiu-se a outras entidades que baixaram em Tendas de Umbanda. Na Tenda de São Jerônimo, há entre outros, dois Espíritos de grande poder e vasta ciência que utilizam o mesmo aparelho, Anízio Bacinca: Pai João da Costa do Ouro e o Caboclo da Lua. Este, quando saiu da minha Tenda para fundar a de Xangô, estava ditando a um oficial do Exército um livro sobre o “Império dos Incas”. O Chefe do Terreiro da Tenda de Oxalá é Pai Serafim e seus trabalhos têm produzido milagres; baixa por Paulo de Lavoir, médico como não há muitos. Pai Elias, baixa pelo Dr. Maurício Marques Lisboa, presidente da Tenda Filhos de Santa Bárbara. É velhíssimo e sapientíssimo.Segundo outros Guias, esse Espírito numa de suas encarnações, foi sumo sacerdote da Babilônia e depois Papa, em Roma, para chegar como Preto-Velho no Terreiro de Umbanda. Nota-se que Pai Elias foi sumo sacerdote, mas seu aparelho não é sumo sacerdote de Umbanda. O indivíduo que se envaidece desse título seria um doente de vaidade e morreria de ridículo. Catumbé, da Tenda de São Miguel, baixa por Luiz Pires, é filósofo e alquimista. Pai Vicente, que baixa pela Sra. Corina da Silva, presidente da Tenda de São Pedro, na Ilha do Governador, é um Espírito de saber profundo, que abrange a literatura, a filosofia de todos os tempos. Os seus trabalhos produzem efeitos miraculosos. Citei apenas alguns Espíritos de meu conhecimento, pois como esses, os há em todas as Tendas. Não esqueçamos que o labor desses Espíritos tem duas finalidades, atrair a criatura e ensiná-la a amar e servir o próximo. Com a sua manifestação, pelo corpo dos médiuns, provam a imortalidade da alma e os benefícios que fazem, servem para elevar o beneficiário, pela meditação ao culto do amor a Deus e, portanto, à prática de suas Leis. É de suma importância a leitura do livro – “O Espiritismo, A Magia e as Sete Linhas de Umbanda” – de Leal de Souza, o primeiro livro escrito sobre Umbanda, onde teremos uma boa idéia do que era a Linha Branca de Umbanda e Demanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas, e a luta dos umbandistas já na década de 1920, procurando saneá-la, e como dito em linhas atrás – “Uma das tarefas mais importantes desses pioneiros do Movimento Umbandista da época era separar o “joio do trigo”, elucidando os novos adeptos sobre as diferenças entre Umbanda, Kardecismo e Macumba”. O livro: “O Espiritismo, A Magia e as Sete Linhas de Umbanda” – de Leal de Souza estará sendo disponibilizado gratuitamente junto com esta obra em nosso site, ou podem adquirir a mesma obra reeditada pela Editora Conhecimento. Juntamente, estarão as reportagens originais, publicadas no “Diário de Notícias” intilulada: “A Magia e as Sete Linha de Umbanda”, bem como as reportagens também originais publicadas no “A Noite”, intitulada: “No Mundo dos Espíritos – Inquérido A Noite”.

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A Macumba sofreu um processo de “umbandização”, que continua até os dias atuais, onde a Cúpula Astral de Umbanda, homeopaticamente, a cada dia, está incutindo em todos, os verdadeiros conceitos crísticos da Umbanda, sua simplicidade, sua eficiência, sua beleza e os reais caminhos doutrinários e ritualísticos, desmistificando-a gradativamente. O tempo é um grande aliado, e futuramente os detratores dirão: “Deus escreve certo, por linhas tortas”.

Reunião da Sociedade dos Homens de Letras, em 1915. Olavo Bilac aparece na foto indicado pelo

número 15 e Leal de Souza pelo número 16. (Foto do arquivo de Diamantino Fernandes Trindade) LEAL DE SOUZA – NOTA DE FALECIMENTO O primeiro escritor da Umbanda, Leal de Souza, desencarnou em 01 de novembro de 1948. Na página 11 do jornal do Brasil do dia 2 de novembro de 1948, foram publicados três anúncios sobre o fato: “Dr. Leal de Souza. A Tenda de Nossa Senhora da Conceição sente-se pesarosamente no dever de comunicar o passamento de seu presidente – Dr. Antonio Eliezer Leal de Souza, e convida todas as suas co-irmãs, seus companheiros e amigos para os seus funerais, à Rua Santa Alexandrina, nº 255, às 14 horas. “Tabelião Leal de Souza (falecimento) – Elza Ribeiro de Veiga, Ernani Ribeiro Meyer e família, Carlos Alberto Motta e senhora, Luiz Carlos Ponce de Leon e família. Carlos Alberto Motta e senhora, cunhado, sobrinhos e afilhados participam aos parentes e amigos o falecimento de Antonio Eliezer Leal de Souza, ocorrido ontem em sua residência, à Rua Santa Alexandrina, nº 255, de onde sairá o féretro às 16 horas de hoje, para o Cemitério de São João Batista. “Tabelião Leal de Souza (falecimento) – Gabriella Ribeiro Leal de Souza, Luiz Alberto Leal de Souza, Victor José Leal de Souza, Lauro Walter Leal de Souza, Regina Maria Vairão Leal de Souza, Sonia Gaertner Leal de Souza e Ana Maria Vairão Leal de Souza, esposa, filhos, noras e neta comunicam aos seus parentes e amigos o falecimento de Antonio Eliezer Leal de Souza, ocorrido ontem em sua residência, `Rua Santa Alexandrina, nº 255, de onde sairá o féretro às 16 horas de hoje, para o Cemitério de São João Batista” (http://mandaladosorixas.blogspot.com.br/search?updated-min=2012-01-01T00:00:00-08:00&updated-max=2013-01-01T00:00:00-08:00&max-results=50) Pela seriedade, prestigio, moral e principalmente por ser um seguidor fiel e propagador tenaz da Linha Branca de Umbanda e Demanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas, Leal de Souza era respeitado tanto no meio religioso como no meio político/social/jornalístico/intelectual do então Distrito Federal. Mas, também, como umbandista foi acusado injustamente de práticas censuráveis. Vamos a um relato jornalístico do ano de 1932:

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Consideramos o Sr. Leal e Souza o maior divulgador e defensor da Linha Branca de Umbanda. Durante os anos, Leal de Souza acabou por colecionar diversos adversários, alguns poderosos, entre o governo vigente, kardecistas e macumbeiros, que diariamente em periódicos, bombardeavam-no de acusações mentirosas e levianas, procurando de todas as formas desacreditá-lo. Muitas das calúnias eram pelo fato de Leal de Souza ter-se tornado umbandista numa sociedade altamente preconceituosa. O último capítulo deste livro (Linha Branca de Umbanda) é relatado algumas das perseguições e calúnias sofridas por parte de kardecistas. Vamos disponibilizar agora uma reportagem altamente caluniosa, para que o leitor avalie o que Leal de Souza sofreu, principalmente por ter abraçado a Linha Branca de Umbanda como meta a seguir. Pelo escrito tendencioso do texto, observaremos ter sido formulado por alguém seguidor de determinada religião.

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Em contrapartida, apresentaremos uma bela reportagem do periódico “Revista da Semana”, publicado entre 1950 – 1959, por Armando Pacheco, onde Olavo Bilac revela o poeta, o escritor, o repórter, o espírita e o tabelião Antonio Eliezer Leal de Souza:

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HINO DA UMBANDA

Para entender o Hino da Umbanda devemos saber que o mesmo está ligado à história do seu autor: José Manuel Alves (J. M. Alves). Nascido em 05 de Agosto de 1907 em Monção, Portugal, já, em sua terra natal, era ligado a música, tendo dos 12 aos 22 anos tocado clarineta na Banda Tangilense, em sua cidade natal. Com pouco mais de 20 anos, em 1929, vem para o Brasil, indo residir no interior do Estado de São Paulo. No mesmo ano, mudou-se para o Tatuapé, bairro da capital São Paulo, ingressando na Banda da Força Pública do Estado de São Paulo, onde ocupou vários postos, aposentando-se como capitão. Em paralelo a esta função exerceu a carreira de compositor de músicas populares e, ao longo da mesma compôs dezenas de músicas as quais foram gravadas por famosos intérpretes da época: Irmãs Galvão, Osni Silva, Ênio Santos, Grupo Piratininga, Carlos Antunes, Carlos Gonzaga entre outros. Suas composições mais famosas foram: Em 1955, Juanita Cavalcanti gravou a marcha “Pombinha Branca” de sua autoria em parceria com Reinaldo Santos; em 1956, Zaccarias e sua Orquestra gravaram o dobrado “Quarto Centenário”, de sua parceria com Mário Zan. Compôs ainda valsas, xotes, dobrados, baiões, maxixes e outros gêneros musicais. Em 1957, realizou sua única gravação no antigo disco de vinil, o “LP”, acompanhado de sua banda, sendo a gravadora a RCA Victor. Mas… e a Umbanda? Aonde entra? Para a Umbanda, e para vários Terreiros compôs diversos pontos gravados por diversos intérpretes, como por exemplo:

Hino da Umbanda; Defuma com as ervas da Jurema; Corre Gira Pai Ogum; Homenagem à Mãe Menininha (gravado por

J. M. Alves / Ariovaldo Pires); Ponto de abertura (gravado por J. M. Alves /

Terezinha de Souza e Vera Dias); Ponto dos Caboclos; Prece a Mamãe Oxum; Coroa da Jurema

Santa do meu altar (gravado por J. M. Alves /

H. Junior); São Jorge Guerreiro; Sarava Banda; Sarava Oxossi; Saudação aos Orixás; Xangô rolou a pedra; Xangô, rei da pedreira; Hino do Primado de Umbanda do Estado de

São Paulo, Entre outros.

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Uns dizem que J. M. Alves era cego; outros, que ele tinha sérios problemas nas vistas, procurando o Caboclo das Sete Encruzilhadas a fim de obter uma cura. Também dizem que o Caboclo lhe explicou que não seria possível uma cura, pois a doença tinha fundo cármico; que embora não tenha conseguido sua cura, se apaixonou pela Umbanda, e, portanto, compôs uma música, apresentando-a ao Caboclo, que gostou tanto que resolveu apresentá-la como Hino da Umbanda. Agora perguntamos: De onde tiraram isso: Qual a fonte? É histórica? É verídica? Como conseguiram saber que J. M. Alves era cego ou tinha problemas nas vistas? Como afirmam que ele apresentou a música ao Caboclo das Sete Encruzilhadas e este apresentou-a como Hino da Umbanda? Pela falta de comprovação, cremos que tudo isso só pode conjecturas. Para uma das questões, temos a resposta: Pela foto do Sr J. M. Alves apresentada abaixo temos uma certeza: Cego ele não era. Por usar óculos, até pela idade (aparência e cabelos brancos), podia no máximo ter alguma deficiência nas vistas.

José Manuel Alves (do lado esquerdo da foto, de óculos), numa festividade do Primado de Umbanda de São Paulo

Agora, uma coisa é certa: A letra foi composta por José Manuel Alves e a melodia foi composta por Dalmo da Trindade Reis (maestro do Conjunto Musical da Polícia Militar do Rio de Janeiro), em 1961, e originalmente tinha como título: “Refletiu a Luz Divina”, sendo cantada nos Terreiros como um ponto comum. Somente ganhou o status de “Hino da Umbanda” sendo oficialmente adotado como tal, no 1º Congresso de Umbanda em 1962, ganhando o status de Hino oficial, somente após 1977. Vamos prestar então nossa homenagem, agradecendo a Deus a oportunidade de poder cantar este Hino, e aos seus autores: José Manuel Alves e Dalmo da Trindade Reis, que mostraram com este Hino a simplicidade, a humildade e a missão da nossa amada Umbanda. A partitura oficial do Hino foi feita em 20 de Janeiro de 1984 (cópia do original abaixo, gentilmente cedida pela Mãe Maria de Omulú da Casa Branca de Oxalá/MG) por Dalmo da Trindade Reis, maestro tenente do conjunto musical da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

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Na versão original, quando o Hino da Umbanda era cantado, não se repetia a última estrofe. Com o tempo, os umbandistas adotaram repetir a última estrofe – quem somos nós para irmos contra àquilo que o povo escolhe – portanto, também repetimos sempre a última estrofe quando o proferimos. A regra diz que não devemos bater palma após entoar qualquer Hino. Assim também o é para o Hino da Umbanda. A confusão se dá pelo fato de que, automaticamente, ao terminarmos o Hino, proferimos: “Sarava a Umbanda”, e é nesse momento que se deve aplaudir.

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Não esquecendo de que, ao entoarmos o Hino da Umbanda devemos nos postar em pé e com a mão direita colada ao peito, por cima do coração, enquanto o entoamos; esse é o sinal de amor e respeito que devemos ter pela religião.

**********//********** HINO UMBANDISTA Apresentamos um disco, faixa única, de rotação 78, provavelmente da década de 1940, intitulado: “Hino Umbandista” de autoria de: Iris Fossati Guimarães e Jerson D´Oliveira, orquestrado pelo afamado maestro Radamés Gnattali, adquirido em época de seu lançamento pela nossa avó materna, Mãe Alice, 1ª dirigente do Templo da Estrela Azul – Casa de Oração Umbandista. Esse disco é uma raridade, pelo fato de que dispõe de uma música intitulada “Hino Umbandista”, anterior a composição “Refletiu a Luz Divina”, composta pelo senhor J. M. Alves, na década de 60, sendo posteriormente adotada pelos umbandistas como “Hino da Umbanda”. Não encontramos absolutamente ninguém que o conhecesse, nem os mais velhos umbandistas que conhecemos, bem como nas pesquisas realizadas na Net; não encontramos nenhuma referência. Inclusive, este disco, é desconhecido pela própria família do maestro, não fazendo parte do acervo histórico dedicado a ele.

Radamés Gnattali (Porto Alegre, 27 de janeiro de 1906 — Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1988) foi um arranjador, compositor, e instrumentista brasileiro. Estudou com Guilherme Fontainha no Conservatório de Porto Alegre; na Escola Nacional de Música, com Agnelo França. Terminou o curso de piano em 1924 e fez concertos em várias capitais brasileiras, viajando também como violista do Quarteto Oswald, desde então passou a estudar composição e orquestração. Em 1939 substituiu Pixinguinha como arranjador da gravadora Victor. Durante trinta anos trabalhou como arranjador na Rádio Nacional. Foi o autor da parte orquestral de gravações célebres como a do cantor Orlando Silva para a música Carinhoso, de Pixinguinha e João de Barro, ou ainda da famosa gravação original de Aquarela do Brasil (Ary Barroso) ou de Copacabana (João de Barro e Alberto Ribeiro) - esta última imortalizada na voz de Dick Farney. Em 1960 embarcou para Europa, apresentando-se num sexteto que incluía Acordeão, Guitarra, Bateria e Contrabaixo. Foi contemporâneo de compositores como Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga, Anacleto de Medeiros e Pixinguinha.

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Na década de 70, Radamés foi teve influência na composição de choros, incentivando jovens instrumentistas como Raphael Rabello, Joel Nascimento e Mauricio Carrilho, e para a formação de grupos de choro como o Camerata Carioca. Também compôs obras importantes para o violão, Orquestra, concerto para piano e uma variedade de choros. Foi parceiro de Tom Jobim. No seu círculo de amizades Tom Jobim, Cartola, Heitor Villa-Lobos, Pixinguinha Donga, João da Baiana, Francisco Mignone, Lorenzo Fernandez e Camargo Guarnieri. É autor do hino do Estado de Mato Grosso do Sul —a peça foi escolhida em concurso público nacional. Em janeiro de 1983, recebeu o Prêmio Shell na categoria de música erudita; na ocasião, foi homenageado com um concerto no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, que contou com a participação da Orquestra Sinfônica do Rio de Janeiro, do Duo Assad e da Camerata Carioca. Em maio do mesmo ano, numa série de eventos em homenagem a Pixinguinha, Radamés e Elizeth Cardoso apresentaram o recital Uma Rosa para Pixinguinha e, em parceria com a Camerata Carioca, gravou o disco Vivaldi e Pixinguinha. Radamés foi um dos mestres mais requisitados nesse período, demonstrando uma jovialidade que encantou novos chorões como Joel Nascimento, Raphael Rabello e Maurício Carrilho. Nasceu assim uma amizade que gerou muitos encontros e parcerias. Em 1979 surgiu, no cenário da música instrumental, o conjunto de choro Camerata Carioca, tendo Radamés como padrinho. A saúde começou a fraquejar em 1986, quando Radamés sofreu um derrame que o deixou com o lado direito do corpo paralisado. Em 1988, em decorrência de problemas circulatórios, sofreu outro derrame, falecendo no dia 13 de fevereiro de 1988 na cidade do Rio de Janeiro.

Maestro Radamés Gnattali

Segundo nos informou o filho do maestro Radamés, a compositora da letra, senhora Iris Fossati Guimarães era uma musicista influente e parenta do senhor Radamés. O Maestro Radamés era simpatizante da Umbanda. Dizia: “Eu sempre trabalhei em música popular e gosto muito. Aliás, devo a isso, eu fazer alguma coisa de brasileiro, hoje, aprendendo com o povo, pois só o povo ensina essa coisa”. Esta composição é cantada como o Hino da Umbanda Crística. Esta é a letra:

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“Avante, avante, umbandista Sol do novo porvir, Oxalá nos aponta o caminho que devemos seguir,

Sempre avante lutando, Para o bem da humanidade,

Sob a luz desse ideal, Nossa lei será a caridade, A nossa fé, a nossa luta, Será salvar a todo irmão,

Pois só assim cumpriremos, Nossa sagrada missão,

Seja na Terra ou no Céu, Estaremos a servir,

A legião umbandista, Do nosso imenso Brasil”.

O “Hino Umbandista” pode ser ouvido na abertura do nosso site: www.umbanda.com.br.

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OS PRIMEIROS INTELECTUAIS DA UMBANDA “Por intelectuais da Umbanda entendemos os homens e mulheres que se lançaram ao trabalho exegético, bem como de codificação ritual da nova religião” (Artur Isaia) É nosso dever fazer o registro dos principais umbandistas que conseguiram destaque na literatura de Umbanda:

Leal de Souza, em 1932, com “O Espiritismo, a Magia, e as Sete Linhas de Umbanda”.

Waldemar Bento, em 1932, com “Magia no Brasil”.

João de Freitas, em 1939, com “Umbanda”.

Emanuel Zespo, em 1941, com “Codificação da Lei de Umbanda”.

Lourenço Braga, em 1946, com “Trabalhos de Umbanda.

Mestre Yokanan, em 1954, com “Evangelho da Umbanda”.

Mestre Yapacani (Wilson Woodron da Matta e Silva), em 1956, com “Umbanda de Todos nós”.

Cavalcanti Bandeira, em 1970, com “O Que é a Umbanda”.

Em 1970, João Alves de Oliveira. Foi contemporâneo de Zélio de Moraes. Era médium do Caboclo Sete Flechas, dirigente da “Seara de Umbanda Tupinambá – sediada na Rua Manuel Machado, 467, Vaz Lobo”, co-irmã da Tenda Mirim, autor dos importantíssimos livros: “O Evangelho na Umbanda”, “Magias da Umbanda”, “Umbanda Cristã e Brasileira”.

Entre outros...

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Devemos destacar que Diamantino Coelho Fernandes, um dos organizadores do 1º Congresso de Espiritismo de Umbanda, conseguiu algum sucesso com algumas obras. Em 1947, a União Espiritista de Umbanda do Brasil lançou um periódico denominado “Jornal de Umbanda”, importante veículo de divulgação umbandista que chegou a contar com a colaboração de Wilson Woodrow de Matta e Silva e do Capitão José Álvares Pessoa. A divulgação do Movimento Umbandista ganhou corpo quando entrou em cena o radialista e escritor Áttila Nunes. Foi uma importante personalidade do rádio brasileiro e um defensor incansável da liberdade religiosa. Criou e produziu o primeiro programa de rádio voltado para os cultos afros: “Melodias de Terreiro”, que foi ao ar pela primeira vez em 1947 no Rio, pela então Rádio Guanabara, durante três décadas. Na literatura conseguiu sucesso com a obra “Antologia de Umbanda”, chegando a ser eleito Deputado Estadual. Áttila Nunes Pereira nasceu em Niterói, Estado do Rio de Janeiro em 16 de junho de 1908. Era filho de Joaquim e Alice, esta, dirigente de um Terreiro de Umbanda. Conheceu Bambina Bucci em 1937, por quem nutriu uma paixão imensa. Bambina Bucci, esposa de Áttila Nunes, tornou-se o seu braço direito e companheira inseparável. Ela foi seu esteio, seu braço direito até que ele desencarnasse em 26 de outubro de 1968. Dessa relação amorosa nasceu Átila Nunes Filho. Áttila Nunes ingressou na imprensa em 1935. Foi sócio fundador do Sindicato da Associação Guanabarina de Imprensa. Escreveu nos jornais Diário Fluminense, Gazeta de Notícias, Revista do Disco, A Notícia e o Dia. Como radialista começou sua carreira em 1931 na Rádio Educadora do Brasil. Atuou na PRE-6, Rádio Sociedade Fluminense até 1937. Em 1938 ingressou na Rádio Tamoio onde lançou programas que marcaram época. Na Tamoio e na Rádio Tupi atuou até 1948, quando, então, passou para a Rádio Guanabara, onde foi locutor, animador, redator, diretor de auditório e chefe de programação. Iniciou suas apresentações umbandistas em 1948, evoluindo para o lançamento do programa “Melodias de Terreiro”, que esteve no ar por mais de 30 anos, e, após o falecimento de Áttila Nunes, continuou no ar durante algum tempo comandado por Bambina Bucci e Áttila Nunes Filho. Eleito deputado em 1960, destacou-se pela sua atuação na Assembléia Constituinte e na Assembléia Legislativa. Foi um dos elaboradores da Constituição do Estado da Guanabara. No exercício do seu mandato (1960-1962) pronunciou 254 discursos, a maioria deles, em defesa da Umbanda. No Rio de Janeiro, o periódico “Revista do Rádio”, em 1959, lançou a seguinte reportagem:

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Foi o primeiro parlamentar eleito pelos umbandistas no Brasil, tendo se destacado pela conquista da mais importante aspiração dos seguidores dos cultos afro-brasileiros: o fim da perseguição religiosa por parte da então polícia carioca. Desencarnou na cidade do Rio de Janeiro em 26 de outubro de 1968. Toda a trajetória de Áttila Nunes pode ser resumida na frase de sua autoria: "Umbanda unida, Umbanda forte!" “Áttila Nunes goza de imenso prestígio entre os seguidores as leis de Umbanda, graças, principalmente ao programa “Melodia de Terreiro”, que apresenta à noite, pela Rádio Guanabara, e para o qual já escreveu inúmeros poemas e preces em louvor das Entidades Espirituais. Áttila Nunes já pintou também vários quadros sob inspiração mediúnica, entre eles “Pai Benedito”, “Filho do Fogo”, “Raio de Luz”, e, recentemente, “Janaina, que apresentamos ilustrando este texto. Sobre seu último quadro (ele enviará cópias fotográficas a quem solicitar) e veterano radialista explica: Janaína é uma entidade que baixa em vários Terreiros do Rio e dos Estados, especialmente na Bahia. Janaína representa para muitos uma deusa cigana e para outros é um Cabocla da Linha das águas”.

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(Revista do Rádio – Rio de Janeiro – 1948 a 1970) Defendeu, através de seus programas de rádio, o direito à liberdade de culto e o respeito à religião. Criou as Caravanas da Fé, realizando o primeiro cadastramento dos Terreiros do Rio de Janeiro. Escreveu preces e poemas, publicados mais tarde no livro recordista de vendagem “Antologia da Umbanda” No auge da era do Rádio, Áttila Nunes comandou programas e lançou artistas, como Chacrinha, Chico Anísio, Luis Gonzaga e J. B. de Carvalho (João Paulo Batista de Carvalho 26/4/1901 – 24/8/1979) que notabilizou-se como cantor de pontos de Macumba e pontos de Umbanda. Iniciou a carreira artística em 1931, liderando o Conjunto Tupi na extinta Rádio Cajuti, O Conjunto Tupi foi um dos primeiros a ter programa de Umbanda em rádio, durante muitos anos, além de realizar inúmeras gravações na Odeon. O grupo se apresentou na maior parte das emissoras cariocas, sendo freqüentemente interrompido pela polícia, que invadia os auditórios de seus programas, quando as pessoas entravam em transe ao ouvir os pontos de macumba e orações. Foi preso inúmeras vezes, sempre dizendo que saia livre graças a sua amizade com Getúlio Vargas. A partir de fins da década de 1960 passou a gravar uma série de LPs de pontos de Macumba e pontos de Umbanda, muito vendidos em casas de artigos de Umbanda de todo o Brasil.

J. B. de Carvalho dá a benção a um consulente

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Áttila Nunes era um umbandista honesto e sincero e tinha realmente muito amor à sua religião. Na sua coluna “Gira de Umbanda”, na Gazeta de Notícias, escrevia artigos vibrantes e destemidos em defesa da Umbanda verdadeira e mostrando ao público as trapaças e deturpações dos falsos umbandistas.

Transcreveremos o corajoso artigo de Áttila Nunes do jornal Gazeta de Notícias: GIRA DA UMBANDA – ÁTTILA NUNES

Já vi muita bobagem, muita tolice, já assisti coisas na televisão que até hoje me fazem estremecer pelo total nonsense (nota do autor: “sem sentido”; é uma expressão inglesa que denota algo disparatado, sem nexo), dos participantes. Indivíduos despreparados, cidadãos sem a mínima base e conhecimento da Religião de Umbanda no seu aspecto doutrinário e científico.

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Pessoas, enfim, sem traquejo para o diálogo, sem o preparo mental e psicológico para o debate, sem a mínima prática para falar em público e até mesmo sem a cultura que se faz necessária para as dissertações ou para responder aos entrevistadores da TV, têm comparecido a alguns programas e as tolices que proferem só têm contribuído para o demérito da nossa religião. Minha decepção (e a de milhares de irmãos umbandistas) é total quando vejo um presidente de uma entidade federativa ou um chefe de Tenda (programa “O Homem do Sapato Branco”, “Caso Isaltina”, etc.), gaguejar, titubear, e finalmente, ser derrotado num debate ao qual não deveria ter comparecido jamais. Sinto-me triste, fico desanimado quando vejo um babalaô com seus filhos se exibindo na televisão (ou nos campos de futebol), dançando para uma platéia de leigos, desmoralizando a Umbanda (ou o Candomblé) com a amostragem de alujás, de “incorporações”, com demonstrações (na TV) dos nossos rituais, com tudo aquilo que jamais deveria ser exposto em público, isto é, fora de nossos Templos, dos nossos Terreiros. Registro, ainda – com profunda tristeza – a inconsciência de alguns companheiros que, com suas exibições na TV, acarretam males terríveis à nossa Umbanda. Muito sofremos. Muitas vitórias conquistadas pela nossa Umbanda ao longo desses últimos 10 anos têm-se diluído, vem se transformando em derrotas com as exposições de vaidade de certos chefes e malungos, com o exibicionismo de alguns irmãos nossos, com a mania de determinados cavalheiros (desejosos de fazerem seu cartaz a qualquer preço) de se projetarem, de se fazerem notados, de criarem uma popularidade a toque de caixa. Por tudo isso, jamais darei meu apoio a sonhos mirabolantes, jamais concordarei com exibições na televisão e combaterei, até o último instante de minha vida, os desfiles nos palcos ou nos estádios de esporte. Não sou radical no meu ponto de vista, contrário à exteriorização de nossos rituais. Não chego a ponto de achar que devemos nos aprisionar em nossos abassás (nota do autor: Terreiro). Reconheço que não podemos ficar adstritos exclusivamente ao recesso de nossos Terreiros. Não, somos prisioneiros, não somos fanáticos, pesamos na balança do bom-senso os nossos atos, as nossas ações. Nossos bacuros (nota do autor: filho), nossos trabalhadores, não vivem manietados, não são escravos. Não impomos em nossa religião os rigores que são impostos aos frades, às freiras, aos pastores, aos batistas, e aos budistas, etc. Ao contrário somos livres, praticamos o culto dentro de normas bastante liberais e até mesmo mais evoluídas do que as de outros cultos, de outras crenças. Sou inteiramente favorável (e venho estimulando há 20 anos) as reuniões nas praias no dia 31 de dezembro, acho imprescindível às peregrinações às matas (macaias), preconizo constantemente, a necessidade de seguirmos os nossos preceitos com rigor; devemos manter os velhos hábitos, devemos fazer as nossas obrigações, nossos assentamentos, devemos ir à cachoeira, à praia e até mesmo (quando necessário) devemos ir à Kalunga Pequena (cemitério), ao Cruzeiro das Almas, à Kalunga Grande (mar). Devemos salvar Olukum, Aloxum, Dandalunda, Inaê Mabo, Yemanjá, Janaína, as Iaras, etc. Devemos entregar nossos padês, nossos ebós, nossas oferendas, nossas “mesas”, nossos arcos”, em suma, devemos continuar umbandistas como foram nossos pais e nossos avós. É nosso dever mostrar a nossa convicção mantendo as nossas irradiações e tudo aquilo que herdamos dos nossos antepassados. Sou totalmente favorável ao exposto nas linhas acima, já que no cumprimento sincero de nossas obrigações – não há o mínimo resquício de vaidade, não há exibição nessas atividades, nesses preceitos que fazemos fora de nossos Terreiros. W. W. da Matta e Silva, o renomado escritor umbandista, o autor de numerosas obras dentre as quais destaco “Doutrina Secreta da Umbanda”, compareceu à televisão. Sua presença no grande programa de J. Silvestre, “Show Sem Limite”, marcou mais uma vitória para a nossa Umbanda. Valorizou a nossa crença, revigorou as nossas convicções, reforçou as bases do grande Templo umbandista, representado por cerca de 80.000 tendas espalhadas em todo país. Matta e Silva enfrentou as câmeras da TV Rio com dignidade, com respeito, com energia, com profundo conhecimento de causa, com o destemor dos guerreiros indômitos. Ressaltou o poder da crença umbandista. Reafirmou sua fé, não titubeou, não gaguejou, argumentou com firmeza, com consciência, em linguagem simples e, ao mesmo tempo, erudita. Fez se compreender pelos leigos, pelos irmãos de fé e por todos aqueles que tiveram a felicidade de vê-lo e ouvi-lo no famoso “Show Sem Limite”; Estou quase certo de que o insigne escritor e Tatwa W. W. da Matta e Silva está de acordo com os meus pontos de vista no que tange às exibições de Terreiros nos palcos ou nos estádios esportivos.

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O querido Mestre Matta e Silva (que é rigoroso em suas apreciações sobre a prática do umbandismo) é, sem dúvida uma das vozes mais autorizadas, é um arauto do bom-senso, e um malango, a quem devemos prestar a nossa homenagem e, sobretudo, devemos respeitar (mesmo que às vezes discordamos de um ou outro ponto) a sua pregação que sabemos sincera. Nosso dever é ouvi-lo atentamente, devemos ler os seus livros com a certeza de estarmos ouvindo a voz de um mestre. Devemos nos curvar respeitosamente diante de seu talento, de sua cultura, dos seus profundos conhecimentos da Umbanda como religião, como filosofia e como ciência. Homens como W. W. da Matta e Silva, João de Freitas, Henrique Landi Jr., Cavalcanti Bandeira, Pena Ribas, Mauro Rego Porto e João Guimarães deviam ser convocados, de vez em quando, para nos proporcionar aulas de umbandismo, para fazerem pregações de alto nível como a que ouvimos segunda-feira última na TV Rio. Os depoimentos, as considerações, as explicações que esses autênticos líderes podem nos fornecer diante das câmeras e microfones, viriam desfazer a má impressão deixada por alguns cidadãos que tanto diminuíram a Umbanda quando de suas aparições no horrível programa “O Homem do Sapato Branco” e nos entreveros sobre o “affaire” Isaltina e seu parceiro Sebastião Pedra d´Água (Bolha d´Água como disse nosso irmão Aranha). As grandes vozes têm que ser ouvidas. Lutemos contra a palhaçada, contra a bisonhice, contra os vaidosos, contra os exibicionistas. Ergamos uma muralha invencível contra os destruidores da Umbanda! Utilizemos o poder dos nossos Guias, usemos as nossas forças espirituais para deter a onda de insensatez que ameaça nossa Religião. Não podemos manter posição contemplativa diante das tolices arquitetadas pelos vaidosos, pelos fariseus, pelos “profiteurs” (nota do autor: do francês: aproveitadores) da ingenuidade de alguns que se aliam a tudo sem medir as conseqüências. Acima de tudo, a nossa gloriosa Umbanda; acima de tudo a dignidade da nossa crença, dos nossos irmãos de santo que dão tudo de si pelo bem de todos” (Trecho extraído da obra: Umbanda e sua História – Diamantino e Trindade – Editora Ícone) BAMBINA BUCCI

Viúva de Áttila Nunes, de quem se tornou braço direito e companheira inseparável na década de 40, Bambina Bucci é brasileira, descendente de italianos, tendo nascido numa fazenda em Batatais, no Estado de São Paulo, no dia 10 de junho de 1920. Em 1948 nasceu seu único filho, Átila Nunes Filho, deputado desde 1970, maciçamente votado pelos umbandistas.

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Inteligência viva, temperamento nervoso, agitado, Bambina Bucci fez o ginasial no Rio, completou seus estudos na terra bandeirante e diplomou-se na Escola Normal de sua terra natal. Ingressou no rádio em 1940. Locutora, rádio-atriz, produtora de programas, umbandista convicta e dotada de grande facilidade de escrever, produziu dezenas de preces e poemas, destacando-se Mensagem da Fé, Oração do Enfermo, Prece ao Alto, Mensagem de Oxalá, Prece do Cruzeiro das Almas, Oração à Mãe de Jesus, Gratidão, Creio em Deus, Meditação, Procura a Tua Luz, Oração dos Cegos, Caboclo da Mata, Sete Penas Brancas, Mensagem de Lázaro e Prece do Presidiário. A metapsíquica sempre exerceu grande fascínio sobre Bambina Bucci que, possuindo dons extraordinários de vidência-auditiva, prestou bons serviços aos que a procuravam imbuídos de fé. Grande parte de sua vida tem sido dedicada ao estudo do sobrenatural e dos fundamentos do espiritismo em todas as suas formas, principalmente no que tange ao culto religioso da Umbanda. Seu espírito de curiosidade, entretanto, leva-a a voltar, também, suas atenções ao esoterismo e até mesmo ao agnosticismo, doutrina que declara o absoluto inacessível ao espírito humano. Vereadora eleita e reeleita por 16 anos para a Câmara Municipal do Rio, autora de dezenas de leis municipais que garantiram a igualdade religiosa, Bambina Bucci produziu e apresentou durante três décadas o Programa Melodias de Terreiro, o mais antigo programa do rádio brasileiro, hoje produzido e apresentado pelo seu filho, o deputado Átila Nunes Filho e pelo seu neto, Átila Nunes Neto, na Rádio Metropolitana AM 1090 do Rio de Janeiro, podendo ser acessado na primeira rádio web de Umbanda do Brasil. Dos pontos cantados no programa “Melodias de Terreiro”, surgiram vários discos de vinil. Rádio Melodias de Terreiro: (http://www.radiomelodiasdeterreiro.com.br/) (http://tendaespiritasaojorge.blogspot.com/2009/06/bambina-bucci.html - com complementação do autor) O trabalho de Áttila Nunes e de Bambina Bucci não parou por ai. Família Áttila Nunes – 60 Anos em Defesa da Umbanda

Átila Nunes Filho, Átila Nunes Neto e Átila Alexandre Nunes

Átila Nunes Filho, carioca, nascido em 14 de dezembro de 1948, é pai de Átila Nunes Neto (falecido) e Átila Alexandre Nunes. Umbandista, é deputado desde 1970, por umbandistas e candomblecistas pelo antigo Estado da Guanabara, manteve-se fiel aos ideais de seu saudoso pai. É autor de todas as leis que garantem a liberdade religiosa, bem como o respeito a todos os credos no Estado do Rio de Janeiro, considerado o estado da Federação com o maior número de leis que garantem a liberdade da prática religiosa. Iniciou sua atividade política em 1968, logo após o desencarne de seu pai, Áttila Nunes. Átila Nunes Filho continua empenhado na união dentro da Umbanda e seu reconhecimento por toda a nação. Ele tem sido uma voz viva em defesa da Umbanda. Em Defesa da Umbanda O Portal “EM DEFESA DA UMBANDA” (www.emdefesadaumbanda.com.br) é uma rede de amigos e voluntários idealizado pela família Átila Nunes que tem como objetivo divulgar, orientar, esclarecer, catalogar, resgatar, educar e incentivar a cultura e a tradição relacionadas à religião de Umbanda. O combate à intolerância e à discriminação sofridas pela Umbanda e demais religiões de matrizes africanas é uma das principais bandeiras da equipe que participa desse portal. O Portal “Em Defesa da Umbanda” é um espaço destinado à cooperação virtual entre religiosos, freqüentadores, dirigentes, sacerdotes, médiuns, ogãs, cambonos, interessados, estudiosos , curiosos e entusiastas da nossa religião.

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OS CONGRESSOS DE UMBANDA

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Em 1941, alguns líderes umbandistas realizaram no Rio de Janeiro o 1º Congresso de Espiritismo de Umbanda com a participação de alguns umbandistas de São Paulo. Esse Congresso pretendia ser de âmbito nacional, porém acabou sendo apenas um evento local. Dentre os objetivos desse Congresso podemos destacar: a preocupação com a desafricanização e uma tentativa de criar uma codificação para a Umbanda. Essa temática voltou a ser abordada no 2º Congresso, realizado em 1961 e no 3º realizado em 1973. Várias tentativas de codificação foram tentadas isoladamente, por alguns autores, tanto no sentido de codificar, como de evangelizar a Umbanda. Isso permitiu a alguns escritores, conseguir relativo sucesso no mercado literário umbandista. É bom lembrar que o 1º Congresso aprovou as Sete Linhas de Umbanda propostas por Leal de Souza. Vamos apresentar o intróito deste Congresso, a fim de nos inteirarmos do seu conteúdo:

Detalhe do Primeiro Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda em 1941 no Rio de Janeiro.

ESPIRITISMO DE UMBANDA – INTRODUÇÃO As práticas espiríticas no Brasil vêem se desenvolvendo há mais de meio século, contando hoje com um ativo assas numeroso de bons serviços prestados ás classes menos favorecidas, quer na parte doutrinaria propriamente dita, quer na parte moral, educativa, e na experimentação fenomênica. Introduzido neste país poucos anos após o aparecimento das obras de Kardec, no último quartel do século passado, o maior desenvolvimento do Espiritismo operou-se principalmente na parte religiosa, que é o trabalho dos dirigentes dos Centros Espíritas com a finalidade de implantar a fé no coração das massas, despertando nelas o sentimento de fraternidade e amor ao próximo. Neste sentido a codificação realizada por Allan Kardec ainda constitui a obra fundamental sobre a qual se baseiam os espíritas do Brasil, desconhecendo a maioria dos adeptos desta corrente de pensamento filosófico a grande bibliografia oriental, de cuja fonte multimilenar emanaram todas as seitas, crenças e filosofias, o Espiritismo inclusive. A reunião do 1° Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda, em outubro último, veio trazer uma nova luz ao estudo do Espiritismo entre nós, com a investigação criteriosa a que se entregaram os seus organizadores, em torno desta modalidade de práticas espíritas, cujo número de adeptos cresce de modo notável por toda parte.

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Pode, mesmo, dizer-se, que o Espiritismo no Brasil acaba de transpor os umbrais de uma nova era com a realização deste primeiro Congresso, cujo êxito excedeu a todas as expectativas, tanto no número e qualidade dos estudos apresentados, quanto no volume da assistência que ali compareceu durante as oito noites consecutivas de suas reuniões. A IDÉIA DO CONGRESSO O conceito alcançado entre nós pelo Espiritismo de Umbanda nestes últimos vinte anos de sua prática, deu motivo à fundação nesta capital de elevado número de associações destinadas especialmente a esta modalidade de trabalhos, cada qual procurando desempenhar-se a seu modo, para atender a um número sempre crescente de adeptos. Sua prática variava, entretanto, segundo os conhecimentos de cada núcleo, não havendo, assim, a necessária homogeneidade de práticas, o que dava motivo a confusão por parte de algumas pessoas menos esclarecidas, com outras práticas inferiores de espiritismo. Fundada a Federação Espírita de Umbanda há cerca de dois anos, o seu primeiro trabalho consistiu na preparação deste Congresso, precisamente para nele se estudar, debater e codificar esta empolgante modalidade de trabalho espiritual, a fim de varrer de uma vez o que por aí se praticava com o nome de Espiritismo de Umbanda, e que no nível de civilização a que atingimos não tem mais razão de ser. A COMISSÃO ORGANIZADORA Em sua reunião do mês de Junho do ano passado, a Diretoria da Federação Espírita de Umbanda nomeou a Comissão abaixo para organizar o Congresso, tarefa que por mais de uma vez a mesma julgou superior às suas forças, tais as dificuldades encontradas para a realização de semelhante desiderato. Assistida, entretanto, em todos os momentos, pelos Mensageiros invisíveis do Bem, Mestres e Instrutores dos trabalhadores de Umbanda, a Comissão apresentava em fins de Julho seguinte o esquema do programa elaborado para o referido certame, em torno de cujos pontos deveriam girar os trabalhos a serem apresentados em plenário. REUNIÕES PREPARATÓRIAS No sentido de colher elementos de estudo e coordenar os trabalhos em andamento, a Comissão Organizadora, sempre assistida pelo presidente da Federação Espírita de Umbanda, Sr. Eurico Lagden Moerbeck, efetuou várias reuniões preparatórias do Congresso, durante as quais desejou ouvir a palavra autorizada dos Guias espirituais das Tendas acerca da orientação a seguir. A primeira reunião teve lugar, assim, na “Tenda de São Jerônimo”, em fins do mês de Agosto, ao fim da qual a Comissão Organizadora melhor pôde estimar o vulto dos obstáculos a vencer, diante da desorientação que ali se patenteou acerca dos fins colimados. Não desanimaram, porém, os seus componentes. Na reunião seguinte, efetuada em princípios de Setembro na “Tenda Humildade e Caridade”, uma luz mais forte se projetou sobre a Comissão, firmando-se desde então o roteiro pelo qual a mesma deveria seguir dali por diante. Nova reunião teve lugar na “Tenda de São Jorge”, ainda no mês de Setembro, com um novo êxito para o andamento dos trabalhos, pois que novos esclarecimentos foram trazidos à Comissão Organizadora pelos Guias Espirituais, os quais se manifestaram satisfeitos com o que vinha sendo realizado, e que mais não era do que a execução de planos previamente traçados no Alto. A quarta reunião preparatória verificou-se na “Tenda de Nossa Senhora da Conceição”, a 5 de Outubro, na qual se estudaram novos aspectos dos trabalhos em preparo, recebendo-se por intermédio dos Guias espirituais cujos médiuns ali compareceram, uma nova exortação ao trabalho preparatório do Congresso, cujas linhas principais estavam sendo traçadas com o agrado dos nossos Instrutores invisíveis. Uma quinta e última reunião foi realizada já às vésperas do Congresso, com a presença de quase toda a Diretoria da Federação Espírita de Umbanda, vários médiuns chefes de Terreiro de Tendas ainda não ouvidas e representantes especiais de outras, durante a qual foram ultimados os preparativos e traçado o programa definitivo dos trabalhos, programa este que foi cumprido nas reuniões de 19 a 26 de Outubro de 1941.

O PROGRAMA Foi este o programa elaborado pela Comissão Organizadora do 1º Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda:

1) HISTÓRIA — Investigação histórica em torno das práticas espirituais de Umbanda através da antiga civilização, da idade média até aos nossos dias, de modo a demonstrar à evidência a sua profunda raiz histórica.

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2) FILOSOFIA — Coordenação dos princípios filosóficos em que se apóia o Espiritismo de Umbanda, pelo estudo de sua prática nas mais antigas religiões e filosofias conhecidas, e sua comparação com o que vem sendo realizado no Brasil.

3) DOUTRINA — Uniformização dos princípios doutrinários a serem adotados no Espiritismo de

Umbanda, pela seleção dos conceitos e recomendações que se apresentarem como merecedoras de estudo, para o maior esclarecimento dos seus adeptos.

4) RITUAL — Coordenação das várias modalidades de trabalho conhecidas, a fim de se proceder á

respectiva seleção, e recomendar-se a adoção da que for considerada a melhor delas em todas as Tendas de Umbanda.

5) MEDIUNIDADE — Coordenação das várias modalidades de desenvolvê-la e sua classificação

segundo as faculdades e aptidões dos médiuns.

6) CHEFIA ESPIRITUAL — Coordenação de todas as vibrações em torno de Jesus, cuja similitude no Espiritismo de Umbanda é “Oxalá”, o seu Chefe Supremo.

Encerrando a presente exposição julgada necessária pela Comissão abaixo, como introdução à leitura dos trabalhos enfeixados no presente volume, os quais constituem o maior esforço até hoje realizado no Brasil acerca do Espiritismo de Umbanda, um apelo aqui se consigna a todos os estudiosos da matéria, no sentido de uma contribuição mais ampla a ser enviada ao II Congresso, projetado para o ano de 1943. Rio de Janeiro, Maio de 1942. A Comissão Organizadora do Congresso: JAYME S. MADRUGA – ALFREDO ANTÓNIO REGO – DIAMANTINO COELHO FERNANDES. Desse Congresso surgiu o livro do 1º Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda.

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“Neste Congresso foi apresentada tese pela Tenda S. Jerônimo, propondo a descriminalização da prática dos rituais de Umbanda. O autor, Dr. Jayme Madruga, a par de um minucioso estudo de todas as constituições já colocadas em vigência no Brasil, busca também em projetos como o da Constituição Farroupilha e nos códigos penais até então vigentes e no que haveria de vigorar após 01 de janeiro de 1942, os argumentos mostrando que o caminho da Umbanda começava a ser aberto e que caberia aos Umbandistas buscar acelerar o processo com declarações e resoluções partindo daquele congresso, em prol da descriminalização da prática da Umbanda. Em 1944, vários umbandistas ilustres, entre eles vários militares, políticos, intelectuais e jornalistas, apresentam ao então Presidente Getúlio Vargas um documento intitulado “O Culto da Umbanda em Face da Lei” e consegue daquela autoridade a descriminalização da Umbanda. Este fato, que foi extremamente positivo, trouxe como subproduto uma perda de identidade muito grande Por parte de nossa religião, uma vez que todos os Terreiros, das mais variadas seitas, incluíram em seus nomes a palavra Umbanda como forma de fugir à repressão policial. Como nossa religião, nessa época, não tinha um rito claramente definido e nem a formação de sacerdotes, o que gera uma hierarquia, a Umbanda ficou à mercê dessa deturpação; outro fato que fortaleceu essa descaracterização foi que, sendo um período de crescimento, não se buscava a qualidade dos Terreiros que se filiavam à Federação, ou à União que lhe sucedeu, e, finalmente, ao CONDU”. (http://povodearuanda.files.wordpress.com/2008/07/correio-da-umbanda-2007-06-edicao-18.pdf)

(Foto do arquivo de Diamantino F. Trindade)

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Disponibilizaremos um trecho do livro: ”Culto de Umbanda em Face da Lei”, onde é feita uma entrevista com o Capitão José Álvares Pessoa: ENTREVISTA COM O CAPITÃO PESSOA Jornal Correio da Noite, 17 de novembro de 1944 Nesta entrevista, José Álvares Pessoa fixa a situação das 500 mil pessoas que se dedicam aos fenômenos psíquicos no Distrito Federal. Nesse momento diversas reportagens abordavam a questão judicial suscitada pela família de Humberto de Campos, à propósito dos direitos autorais referentes às obras psicografadas por Chico Xavier. Tais reportagens aguçaram a curiosidade da opinião pública sobre os temas espiritualistas, tão em voga na época. Mostra ainda a necessidade de licença policial para exercer a função de sacerdote. O Capitão Pessoa era considerado uma autoridade sobre o assunto e, assim se expressou nas suas considerações iniciais:

– É curioso observar o extraordinário aumento que se vem registrando na freqüência das casas que entre nós se dedicam aos estudos e à prática do espiritismo. O fenômeno é, sobretudo impressionante no Distrito Federal, onde de dia para dia surgem mais núcleos de irradiação, sejam “centros”, “tendas”, “cabanas”, ou que nome tenham, todos funcionando sempre apinhados e acusando freqüência cada vez maior. O fato, a nosso ver, se justifica pelas condições do momento excepcional que vivemos. O mundo passa por uma tremenda crise de sofrimento. Nos campos de batalha imperam a morte e a devastação. Fora deles, choram os indivíduos e as famílias a perda dos entes queridos que morreram na luta e sofrem as angustias da incerteza quanto à sorte dos que ainda permanecem de armas na mão. Há milhões de indivíduos sem pão, milhões de crianças chorando com fome ou definhando por falta de alimentação adequada. A geração que surge vem marcada com os sinais da inferioridade resultante de todas essas coisas, tanto no físico, como no moral, como na esfera espiritual. Nunca se chorou tanto, nunca se sofreu tanto, como nos dias tristes que vivemos. E é justamente a infelicidade, o sofrimento, que mais impele o individuo para as coisas do Espírito. A doutrina espírita. Abrindo à alma humana horizontes novos, dando-lhe a certeza de que não sejam suscetíveis de redenção, que não há condenações eternas e inexoráveis, que a justiça divina se exerce através da divina misericórdia e que uma e outra são infinitas e perfeitíssimas, e a cada pecador, por mais tremenda que seja a falta cometida, por mais fragorosa que tenha sido a queda, proporcionam oportunidades para se redimir completamente, para se aperfeiçoar, para se purificar, e, portanto, para subir na escala espiritual. É a essas condições que atribuímos a vitória sempre crescente da causa espírita e o grande, o formidável impulso que está tomando agora.

O jornalista indaga sobre a diversidade de crenças espíritas; e o entrevistado esclarece:

– Não há, propriamente, diversidade de crenças espíritas. Há diversidade de ritual. Os fenômenos espíritas começaram a ser estudados de maneira metódica, racional, por Allan Kardec, que foi o codificador do espiritismo. Mas há manifestações espíritas que se realizam sob outro ritual, constituindo o chamado espiritismo de Umbanda. É o que realizavam nossos antigos africanos, que o trouxeram da África. A sua prática é, por certo, antiqüíssima e fora impossível fixar-lhe a origem. O ritual é diferente, as manifestações também são diferentes do espiritismo de Kardec, mas umas e outras são manifestações espíritas. Como em certas religiões há diversidade de ritual, conforme os povos que a praticam, também no espiritismo o mesmo se verifica. Mas, em última análise, Umbanda e Kardec são folhas do mesmo tronco – o espiritismo – que, por sua vez, como as outras crenças, constituem ramos de uma árvore comum – a fé religiosa. A CONFRATERNIZAÇÃO DOS ESPÍRITAS

– É verdade, responde o Sr. Pessoa a uma pergunta nossa, que vimos trabalhando no sentido de obter-se intima aproximação entre os que se dedicam ao espiritismo, seja qual for o ritual que sigam. Se as fontes da nossa doutrina é a mesma, se um só é o nosso objetivo – o aperfeiçoamento espiritual – não se justifica que vivamos isolados uns dos outros. Ao contrário, o que é certo é que nós nos completamos. Nenhuma outra religião pode oferecer ao pensamento humano o que oferecemos – um formidável acervo de verdades comprovadas por cientistas da mais alta responsabilidade e de renome universal, mediante experiência com todos os rigores dos métodos científicos. Sim, porque nós temos o chamado “espiritismo científico”, que se dedica a estudar os fenômenos espíritas à luz dos conhecimentos e das técnicas científicas mais exigentes. É só no espiritismo que isso se vê. Mas, como dizia, procuramos articular entre si todos os que se dedicam ao espiritismo, para maior segurança do progresso da crença espírita ee mais fácil realização dos nossos objetivos, que, como já disse, se resumem no aperfeiçoamento espiritual. O movimento inicial nasceu no espiritismo de Umbanda. Com essa finalidade, foi fundada a União Espiritualista Umbanda de Jesus, que visa a articulação de todos os centros em que se pratica o espiritismo de Umbanda em todo Brasil, e principalmente no Distrito Federal, onde, aliás, essa doutrina atingiu surpreendente desenvolvimento. Queremos uniformizar a nossa liturgia, o nosso ritual, a orientação seguida para o preparo dos sacerdotes de Umbanda. Depois virão outros itens do programa, inclusive a assistência social aos que se dedicam à nossa crença.

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Os nossos irmãos de Kardec já têm as suas agremiações, como essa pujante Federação Espírita Brasileira que congrega centenas de centros de sua especialidade. Têm eles, ainda, obras notáveis que não devem ser esquecidas, pela sua alta benemerência social – o Hospital de Clínicas Allan Kardec, o Abrigo das Crianças, e o Abrigo dos Velhos, pertencentes à União dos Discípulos de Jesus, o Abrigo Tereza de Jesus e outros. Aí está. Congregando todas essas entidades, teremos realizado uma admirável obra de confraternização religiosa, que há de marcar época, permitindo o aperfeiçoamento cada vez maior do nosso corpo de doutrina. OS ESPÍRITAS PERANTE A SOCIEDADE

– E os espíritas não pretendem arregimentar-se para as suas reinvindicações? Pergunta o jornalista. – Com o Divino Mestre, eu lhe direi que o nosso reino não é deste mundo. O que nos preocupa precipuamente é o aperfeiçoamento espiritual. Encaramos a nossa presença neste mundo como uma passagem fugaz, que pedimos a Deus seja a mais curta possível, Aqui estamos para realizar uma tarefa de aperfeiçoamento. Quando adquirimos um corpo humano, com todas as suas deficiências e inferioridades, com todas as suas fraquezas, e todos os males que o acometem, estamos trabalhando pela nossa purificação, através do sofrimento. A morte para nós é uma redenção. Que recebemos com alegria e gratidão. Por isso mesmo, temos os olhos voltados sempre para a eternidade. Mas, aqui estando no desempenho de uma missão que a misericórdia divina nos deu, da melhor maneira possível. Não podemos olvidar os deveres que temos para com os nossos semelhantes, para com as nossas famílias e para com o Estado. A Cesar o que e de Cesar, a Deus o que é de Deus... O espírita, por isso mesmo, deve ser bom cidadão, cumprindo a rigor os seus deveres, para com o país e para com a Sociedade, dentro da ordem, do trabalho e da solidariedade humana. E – digam as nossas autoridades – o espírita é em geral bom cidadão. Não se vêem agremiações espíritas perturbando a ordem publica, conspirando contra a estabilidade das instituições, fazendo revoluções. Não se registrou o quinta-colunismo1 entre os espíritas. Cumpre-nos colaborar na vida com elevação e patriotismo. É justo que também colaboremos no aperfeiçoamento das nossas leis e das nossas instituições. Não falhamos jamais ao cumprimento de nossos deveres cívicos, Atualmente, ainda não dispomos de completa liberdade de ação. O espiritismo ainda não obteve integral liberdade de culto. Ainda somos olhados com desconfiança, ainda dependemos de autorização e fiscalização policiais para a instalação dos nossos templos e para a celebração dos atos do nosso culto. Os nossos sacerdotes ainda são previamente fichados e licenciados pela Policia. É só o espiritismo que pode apresentar ao exame de consciência universal esse crisol. Mas, compreendemos ainda nisso uma provação, que um dia há de desaparecer. Todas as religiões foram recebidas com desconfiança, muitas foram perseguidas e oprimidas. Nos primeiros tempos do cristianismo, os cristãos só podiam respirar os ares das catacumbas. O sangue dos mártires ensopou as arenas de Roma. É verdade, porem, que o estoicismo dos cristãos e a sua fé inquebrantável abalaram o ânimo dos seus perseguidores e propiciaram ao cristianismo a vitória magnífica que deu ao mundo a civilização ocidental. O espiritismo também há de transpor a fase negativa, em que se lhe recusa o elementar direito à liberdade de culto, concedido indistintamente às demais religiões. As leis – bem o compreendemos – retratam o pensamento dominante na época em que são feitas, mas o progresso lhes vai indicando e impondo modificações que as aperfeiçoam. O nosso código Comercial, por exemplo, foi feito ao tempo em que a navegação transoceânica se fazia a vela. Isso não impediu que se mantivesse em vigor até hoje, o que prova a excelência da obra, muito embora leis posteriores – e até leis não escritas, mas resultantes dos usos e costumes – viessem ajustando, aqui ou ali, o seu texto às conquistas do progresso. Assim há de ser também com o que interessa ao espiritismo. O progresso há de vir. Os espíritas não constituem apenas uma meia dúzia desprezível de indivíduos. Mais trinta e seis mil, já preparados, aguardam apenas licença policial para o inicio do seu alto ministério espiritual. Convém lembrar que os nossos sacerdotes, os médiuns, além da preparação religiosa, passam por uma seleção muito rigorosa, do ponto de vista médico, só começando a trabalhar depois de declarados física e mentalmente aptos e de registrados na Policia, o que pressupõe, também, atenta investigação de antecedentes. Só um dos nossos templos – a Tenda Mirim – utiliza mil e seiscentos médiuns, devidamente registrados, e acusa uma freqüência mensal superior a quarenta mil pessoas. É preciso notar que não podem freqüentar as cerimônias espíritas os menores. Computadas as crianças, filhas de pais espíritas, a quanto montará a população espírita do Distrito Federal? E a do Brasil? Só as estatísticas oficiais poderão revelar com segurança a situação, que nós bem conhecemos. Não pretendemos fundar nenhum partido político, conforme já se nos perguntou. Não temos preocupações políticas. Examinaremos serenamente os programas com que se apresentarem à consciência cívica do país os candidatos, no momento oportuno, e então fixaremos a orientação a seguir pelos que quiserem ouvir o nosso conselho. Quinta-coluna é uma expressão usada para se designar todo aquele que atua dentro de um grupo, praticando ação subversiva ou traiçoeira, em favor de um grupo rival. O termo surgiu durante a guerra civil espanhola (1936-1939) para designar a comunidade de madrilenhos simpatizantes do general Francisco Franco.

 

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OS CONGRESSOS DE UMBANDA: 1941 - 1961 - 1973 - REALIZADOS DO RIO DE JANEIRO A partir de 1939, o Movimento Umbandista começou a ganhar corpo e estruturar-se a fim de obter o status de religião brasileira. Primeiro, criou-se a Federação Espírita de Umbanda nesse mesmo ano, atual União Espiritista de Umbanda do Brasil, cujo objetivo primordial era servir de interlocutor entre os Templos filiados, o Estado e a sociedade. Depois promoveu-se o Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda (1941), cuja finalidade era a unificação do culto e a normatização de uma doutrina mínima.

O Congresso traria, também, à luz explicações de cunho científico que pudessem desmistificar algumas práticas mágicas, como a utilização de banhos com ervas, defumadores, charutos, cachimbos, bebidas alcoólicas, pólvora, punhais, etc.; e, ainda, correlacionaria a origem da Umbanda a um tempo remoto, imemorial que, sem negar a herança africana, transcenderia a própria África escravizada: Lemúria, Atlântida, Vedas, Índia e Egito. Ao analisarmos o conteúdo simbólico das comunicações apresentadas durante o Congresso de 1941, observa-se que os intelectuais de Umbanda, em busca de legitimidade, tentaram construir uma identidade mais próxima do “cientificismo” kardecista do que das “primitivas” religiosidades africanizadas. A estratégia adotada estava em sintonia com a conjuntura política, pois a ditadura Vargas via com bons olhos a religião Espírita, muito mais do que a Católica. Cabe lembrar que, na época, os Terreiros de Umbanda eram obrigados a ser registrados nas Delegacias de Polícia e que era obrigatória a inclusão da palavra Espírita no nome do Templo para que se efetivasse tal registro, liberando o funcionamento do Terreiro. Em 1961, Henrique Landi Júnior foi eleito pelas Comissões Organizadoras do 2º Congresso Brasileiro de Umbanda, o seu Presidente Nacional. Assumiu a Presidência e passou a coordenar os trabalhos das Comissões e reuniões preliminares em outros Estados.

Henrique Landi Junior (de branco) Henrique Landi Júnior e sua esposa Maria Augusta Landi juntamente com Áttila Nunes (pai)

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Prontas as comissões, com suas teses elaboradas, realizou-se no Maracanãzinho (Rio de Janeiro), em 28 de julho de 1961, a Festa de Congraçamento do 2º Congresso Brasileiro de Umbanda, em que compareceram cerca de quatro mil médiuns uniformizados, além de grande público assistente. Foi nesse Congresso que o Hino da Umbanda foi oficialmente adotado em todo o Brasil, como o Hino Oficial da Umbanda.

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Vamos ao pensamento de quem esteve nos Congressos de 1941 e 1961. Observem quão atuais são as questões e que, infelizmente, nada foi concluído pelos umbandistas, prevalecendo às práticas contrárias às normatizações do Instituidor da Umbanda:

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Ao centro, de óculos, o Sr. Jayme Madruga e ao seu lado (esquerdo) o Sr. Floriano Manoel da Fonseca TEXTO DE CAVALCANTI BANDEIRA

O objetivo de apresentar este texto não é de codificar e sim de apresentar uma visão no mínimo interessante de alguém que muito participou, trabalhou e estudou sobre Umbanda. Também podemos observar que esta preocupação é antiga dentro da Religião, formalmente se pensa em “codificação” desde 1941 no primeiro Congresso de Umbanda. No longo caminho apontando aos crentes, a Umbanda marcha num sentido evolutivo para a realidade espiritual, porém necessita ter certa igualdade que possa servir de unidade doutrinária e permitir a prática semelhante em todos os Terreiros. Todavia, não deve incorrer no perigo de fixação em dogmas, tabus ou práticas ultrapassadas sem explicações lógicas ou aceitação de sua maioria. O futuro exige a codificação do culto de Umbanda para não serem perdidos os trabalhos dos Pretos-Velhos e dos Caboclos, que tanto procuram ensinar aos crentes e dar uma orientação segura, capaz de evitar as mistificações e deturpações desses que procuram viver à custa dos Terreiros ou dos que lá vão buscar um alívio ou um conselho espiritual. Há ainda aqueles que teimam em ser diferentes e únicos. Realmente é difícil estabelecer normas básicas que possam servir de denominador comum aos cultos, como as práticas orientadas pelos ensinamentos transmitidos pela tradição oral. Necessita a Umbanda de ter uma liturgia por todos aceita e seguida, senão, sofrerá as alterações naturais decorrentes dessa transformação oral do ensinamento, em função daquele que transmite e do que ouve. Participando do II Congresso Brasileiro de Umbanda, reunido no Rio de Janeiro, em julho de 1961, concorremos com dois trabalhos; um com o título: “INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA E ETIMOLÓGICA DO VOCÁBULO UMBANDA”, o outro: “DOGMATISMO E HIERARQUIA”, que levados a plenário, foram amplamente discutidos e aprovados pelos Congressistas reunidos nesse conclave. Apresentamos o trabalho sobre a palavra Umbanda, porque não era possível que se praticasse um culto, sem definir a origem etimológica e o significado original da palavra, em virtude de ser ponto básico definindo o sentido religioso.

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Nesse Congresso, fomos indicados para integrar a “Comissão Nacional de Codificação ao Culto de Umbanda”, e realizando-se a primeira reunião da Comissão em São Paulo, fomos escolhidos para o cargo de Relator de Religião que, se foi uma confiança depositada pelos codificadores, acarretou maiores encargos e responsabilidades pela extrema seriedade e profundidade do assunto. Tivemos grande empenho para realizar as tarefas, que não foram complementadas no tempo previsto, de modo que proposto o III Congresso Brasileiro de Umbanda, para o ano de 1973, no Rio de Janeiro, fomos designados para presidir a Comissão Organizadora de tão importante conclave, que, no mesmo sentido, é mais uma busca de codificação dos cultos e união dos umbandistas. Face às divergências encontradas e das dúvidas quanto às origens e fontes de onde surgiu o culto, que alguns pretendiam fosse hindu – sem justificar com dados concretos e seguros –, elaboramos um ensaio histórico, no qual condensamos nosso pensamento pessoal, porque sem a real raiz histórica não seria possível desenvolver o tema dentro dos fatos comprovados, evidenciando as fontes demonstráveis em trabalhos sérios e de outros autores insuspeitos e imparciais. Demonstrando a antiguidade do homem e do conhecimento africano; a prática milenar de sua religiosidade e de suas iniciações; não quisemos e não queremos, absolutamente, levar a Umbanda para o africanismo, porque seria uma volta. Mas evidenciar sua origem em cultos que já de há muito tinham delimitadas a liturgia e a teogonia de modo preciso, servindo como base histórica, porque não foram inventadas e nem apareceram de uma noite para o dia, e sim, subindo a escada evolutiva que lhe permitiu a sucessividade continuada das épocas. O roteiro histórico é necessário para compreender a realidade panorâmica dos múltiplos rituais e feitios da Umbanda, como hoje é vista. As contribuições marcantes de cada origem e a evolução principal processada precisam ser apontadas, pois, seria embaraçosa a tentativa de entendimento dos fundamentos iniciais e dos que se queiram imprimir aos rumos de uma codificação, ainda mais quando pretendem dar força a lendas não apoiadas pela tradição secular. A realização do presente estudo exigiu a leitura da maioria dos livros Umbandistas, entrevistas com vários seguidores de diversas religiões e pesquisas em alguns estados do Brasil, inclusive pedidos de informações a conceituadas organizações culturais, notadamente de Angola, na África, e a pessoas de renome nesse campo. Como também a busca em livros sérios de pesquisadores e de outros que combatem a Umbanda, pois nada afirmamos sem uma base real; e não aceitamos certas invencionices e artifícios, fatos comuns quando um assunto repousa em parcelas dispersas de ensinamentos ensombrados por lendas de múltiplas origens. Julgamos isso importante para o conhecimento, porque, dá o sentido da realidade sedimentada através do tempo, embora as modificações decorrentes da evolução, do sincretismo e da diluição no passar dos anos, com a assimilação de outras idéias e conceitos dos grupos raciais em contatos que, por si sós, são suficiente para escurecer as origens, se vistas superficialmente. Como afirma o Dr. Oswaldo Santos Ribas, médico em Curitiba: “Ao tratarmos de uma religião como a Umbanda, sincretizada das grandes seitas que têm surgido e cujas origens se perdem nos albores da civilização, nem sempre poderemos, quer pela sociologia, antropologia, etnografia, história, etc., basear-nos nos fundamentos ditos cientificamente aceitos. A verdade é uma só: as leis divinas são as únicas imutáveis e a evolução é um dos seus máximos preceitos. Nada se perde e tudo se transforma, diz a física. Igualmente, assim também é na espiritualidade e nos estudos que nos propomos. Teremos de acompanhar as transformações sucessivas, ocorridas quanto o próprio modo de religar”. Debatemos assunto com vários chefes de culto e realizamos diversas conferências; agradecemos, pois, o auxílio dado e a ajuda recebida, especialmente aos que contribuíram com seus conhecimentos iluminados pelas iniciações, esclarecendo temas tão controvertidos e ainda não definidos em vários pontos básicos. Falta uma unidade doutrinária, filosófica e cientifica do que a surgida em nossa literatura, que ressalta apenas o lado folclórico, executando-se alguns livros doutrinários de escritores umbandistas, e de estudiosos que procuram, com isenção de ânimos, encontrarem a essência que se esconde em meio a problemática das apresentações. Os diversos caminhos percorridos pelos umbandistas convergem para uma junção nos cultos praticados, con-correndo, para isso, os livros e as confraternizações religiosas, como meios de uma aproximação efetiva e unificadora. Muito livro há surgido sobre a Umbanda, cada qual tem o direito de apresentar o lado dessa problemática, pois convenhamos, cada um lança um facho de luz ao alcance e gosto de determinado grupo, assim, também, desmancham trevas permitindo uma claridade em sentido unificador.

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Tudo tem uma razão de ser, e cada um segue o caminho que se ajusta ao seu modo particular de ver e sentir, e através da palavra é que estabelece essa comunicação que une e congrega. A Umbanda é uma vasta porta aberta pelos seus rituais, cânticos, sentidos de popularização e de que o homem participa e sente diretamente o atendimento ao seu caso; assim a individualização concorre para uma diversidade de práticas, abrangendo todas as cultuações. Nota-se, porém, que há uma linha de continuidade canalizando os vários afluentes de todas as origens para uma integração e uma uniformidade de destino num futuro próximo, sendo bem oportuna a comunicação de Ramatís, através de Hercílio Maes no livro “Mediunismo”, quando diz: “A Umbanda que ainda não cimentou sua unidade doutrinária definitiva, nem afirmou o seu sistema único de trabalho em todas as latitudes do orbe, através do seu sincretismo afro-católico, transforma-se num trampolim favorável aos católicos, protestantes e outros religiosos dogmáticos para se familiarizarem com os ensinamentos da Reencarnação e a disciplina da Lei do Carma. As imagens, os cânticos, o incenso, as velas e as oferendas dos rituais de Umbanda, algo parecido aos usos da Igreja Católica, atenuam o medo provinciano dos católicos pelas manifestações mediúnicas; e pouco a pouco incutem-lhes o gosto pelo conhecimento da imortalidade do espírito pregada por todas as filosofias reen-carnacionistas. Os chefes, as falanges e a linhas de Umbanda, com seus caboclos, pretos-velhos e silvícolas apesar da multiplicidade de costumes, temperamentos e propósitos diferentes do serviço que executam junto à matéria entrelaçam-se por severos compromisso, deveres hierárquicos e obrigações espirituais, que ainda não puderam ser compreendidas satisfatoriamente pelos seus próprios profitentes. No vasto panorama de relações entre o plano material e o mundo oculto, alicerçados pelo processo da magia, no âmbito da Umbanda, ainda repontam combinações confusas e tolices condenáveis, à conta de elevado comedimento espiritual. Ainda lutam os umbandistas para alcançar a sua constituição doutrinária e escoimarem-na das excrecências ridículas que deformam a sua base esotérica. Nesse terreno foi mais feliz o Espiritismo, que partiu de uma unidade concreta e alicerçada por investigações incessantes, com “testes” mediúnicos que exauriram Kardec mas o ajudaram a extirpar com êxito as con-tradições. Os exotismos e as encenações ridículas da prática mediúnica desorientada. A Umbanda, portanto, ainda é o vasilhame fervente em que todos mexem, mas raros conhecem o seu verdadeiro tempero”. Nós mesmos sabemos de tanta coisa que se propala como Umbanda ou em nome da Umbanda; e outras práticas que todos nós condenamos, porque é preciso realmente sentir a Umbanda. Ressalta-se, assim, a necessidade de ter “a sua constituição doutrinária”, a sua codificação básica, porém elástica em certos aspectos, tendo em vista a diversidade encontrada em certos aspectos, tendo em vista a diversidade encontrada que não permite, no momento, a rigidez regular de normas, especialmente, no tocante a certas alterações de ritual embora, este deva ter uma linha ajustável e sóbria, sem os exageros dispensáveis, que mais dificultam a fé do crente do que favorece o seu aprendizado, ou a difusão para obter adeptos. Tem de ser o denominador comum, uma orientação ritualística aproximativa, porém dentro da firmeza filosófica-religiosa, de modo a evitar desuniões e interpretações errôneas, fazendo permanente esse pensamento codificador do Dr. Leopoldo Betiol médico e engenheiro em Porto Alegre: “Queremos agora o que quisemos sempre: União, progresso, entendimento, harmonia, concórdia, paz; cooperação que sirva para erguer o nível mental da Umbanda, levando-a ao mais alto ponto de significação moral e doutrinária; isto que fizemos nossa causa, que nunca foi uma questão de pessoas que na altura do mérito sempre soubéramos louvar, acatar e respeitar. Aos que já revelaram sadia compreensão o nosso cordial muito obrigado. Sei que não faltam trabalhadores de boa vontade e muita fé, por isso mesmo, por causa da muita fé, a Umbanda gasta 60 anos para operar uma mudança do seu nível rasteiro suportando a crítica ferina dos impostores. É este vexame que nós queremos terminar se o irmão umbandista quiser cooperar”. Não é coisa que se possa fazer de afogadilho, nem em prazo determinado. Prevendo a complexidade da matéria e vastidão do problema, apresentamos para o regimento interno da Comissão Nacional de Codificação do Culto de Umbanda, em 1961, a seguinte emenda: O trabalho a ser apresentado pela Comissão será matéria para discussão e aprovação do Congresso Extraordinário, como anteprojeto de um código capaz de acompanhar a evolução e o aperfeiçoamento no decorrer do tempo”. A preocupação constante de haver de uma orientação firme para a Umbanda se faz sentir há muito tempo. Já em 1939, João Freitas dá como diálogo, as suas idéias cometendo o fanatismo e o homem supersticiosos, que entravam o desenvolvimento do culto. Afirma que o seu interlocutor refere: “A necessidade de se observar com precisão o ritual; e de haver livros e organizações federativas capazes de evitar as “literatices” prolixas e decepcionantes que se escondem em ora-tória e formas vocabulares em verdadeira oscilação intelectual. Em suma, acabar-se-ão os charlatães, porque ninguém se arvorará em chefe de Terreiro sem estar devidamente munido de credenciais”.

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Confirmando essa preocupação dominante, os umbandistas reuniram-se no Rio de Janeiro, em 1941, no I Con-gresso Brasileiro, quando iniciaram uma sistemática de codificação, ampliada com a realização II Congresso em 1961, a qual foi uma constante do temário do III Congresso Brasileiro de Umbanda, em 1973, pela preocupação máxima das Federações em obter uma estruturação administrativa e religiosa como se evidencia no lema adotado: “Organizar para Unir”. Em 1953, o livro de Emanuel Zespo, intitulado “Codificação da Lei de Umbanda” que, apesar de insuficiente, demonstra a preocupação permanente dos sinceros, em querer estruturar os cultos existentes, dentro de uma base coordenada evitando, assim, abusos e excessos. Nessa mesma época, Lourenço Braga afirmava o seguinte: “Se a Umbanda fosse unificada, isto se todos trabalhassem nos mesmos dias, nas mesmas horas, da mesma forma, com o mesmo rituais, com os mesmo pontos riscados e os mesmo pontos cantados, (letras e músicas), etc., seriam os resultados de efeitos maravilhosos, seria uma sinfonia perfeita de vibrações harmoniosas, cujas conseqüências, para os filhos da Terra, seriam surpreendentes e repletas de benefícios; devemos trabalhar para o progresso da Umbanda, mas de uma Umbanda como deve ser: isenta de materialidade, de ignorância, de atraso, de práticas condenadas pelo bom senso. Deve ser pura, elevada e evolucionista. Quando se atinge um certo grau de progresso espiritual, não é admissível se retroagir”. O futuro exige a codificação para a Umbanda como culto organizado e não se tumultuarem os seguidores pela contradições de ensinamentos desordenados; nessa época com conhecimentos científicos em que tudo deve ser explicado à luz da razão. Com a realização do III Congresso Brasileiro de Umbanda, em Julho de 1973, foram adotadas resoluções importantes nesse sentido, especialmente em relação ao temário do referido conclave, que estava dividido em dois itens principais: Aspectos doutrinários e filosóficos e aspectos administrativos e legais. Foi, assim fundado um Órgão Nacional Interfederativo agrupando os Estados e Federações respectivas, visando uma estrutura administrativa metódica e uniforme para todo o Brasil, bem como foi adotado um só hino, e declarada a data de 13 de Maio como o Dia Nacional da Umbanda. A codificação se impõe, especialmente visando aos que abusam da credulidade alheia para a satisfação egoística e deturpada de interesses próprios, por vezes, menos confessáveis, colaborando para o mal maior. Porque sem amor ao interior que eleva e santifica, surge a hipocrisia de princípios para o uso externo, apenas convencionais, quando em seu interior procedem em desacordo com os ensinamentos da sã moral em seu verdadeiro sentido, pois só vale o sentir; e esse interno baseado na intenção do ato e, assim, as contas serão apreciadas apenas pela Justiça Divina, conforme as dívidas contraídas. Os bons frutos só podem ser dados pelas boas árvores, de modo que se faz sentir a sintonia do médium em relação ao trabalho executado ou desejado como nos ensina Ramatís: “Cultive cada trabalhador o seu campo da meditação educando a mente indisciplinada e enriquecendo os seus próprios valores no domínio do conhecimento, multiplicando as afinidades com a esfera Superior, e observará a extensão dos tesouros de serviço que poderá movimentar em benefício dos seus irmãos e de si mesmo. Sobretudo, ninguém me engane relativamente ao mecanismo absoluto em matéria de mediunidade”. Esclarecendo que o valor real está na qualidade do médium, que deve ser tolerante e orientador, e não deve macular a sua vida com os interesses e caprichos de vaidade pessoal. Não devemos esquecer um fato importante: Estamos vivendo uma religião para o futuro e não para o momento presente, sendo assim, precisamos sentir o pensamento geral e a orientação seguida; pelo menos o conteúdo doutrinário e a orientação filosófica devem ser estudados e apreciados de modo seguro e preciso, porque a promoção é o meio visado para propagar as idéias e essas devem estar desenvolvidas, permitindo raciocínio em função da época cientifica em que vivemos e que possa, por todos ser compreendida, mesmo que não concordem com o explicado. Dando uma apreciação de síntese, visamos principalmente a Codificação do Culto de Umbanda, mas a certeza de que o pensamento codificador se processará lentamente através dos anos, numa sedimentação que depende exclusivamente dos verdadeiros chefes de culto, aos quais cabe essa grande tarefa e respon-sabilidade, perante os crentes e a Lei Divina. Julgamos ter cumprido a missão que, se melhor não o seja, vale pela intenção e o desejo de vencer a Causa. Procuramos transmitir a idéia de modo positivo e correto, sem quaisquer interesses pessoais, ou desejos subalternos de evidências passageiras, pois estas se perdem no passar dos dias e se confundem no pó da estrada da vida, porque lampejam por instantes, sem a força esclarecedora que se proteja no tempo e no espaço. (Texto extraído do livro “O que é a Umbanda” de Cavalcanti Bandeira – Editora Eco 1973)

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O 3º Congresso de Umbanda, realizado no Maracanãzinho de 15 a 21 de julho de 1973, instituiu o dia 15 de novembro como o “dia Nacional da Umbanda”, legitimando assim a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas como fundador da religião e Zélio Fernandino de Moraes como seu pioneiro, dois anos antes do seu desencarne. É de suma importância a leitura do livro: “PRIMEIRO CONGRESSO BRASILEIRO DO ESPIRITISMO DE UMBANDA” – Trabalhos apresentados ao 1° Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda, reunido no Rio de Janeiro, de 19 a 26 de Outubro de 1941; a fim de avaliar a luta dos primeiros umbandistas pela pureza da nossa Umbanda. Existem alguns conceitos doutrinários obscuros, mas, a maior parte do livro e excelente. Este livro estará sendo disponibilizado gratuitamente junto com esta obra em nosso site. Desde a sua fundação, a Tenda Espírita São Jerônimo, assim como outras, sofreram tenazes perseguições por parte da polícia. Das tantas, disponibilizaremos uma reportagem sobre uma das perseguições a essa Tenda, e, com o passar dos anos, o Capitão Pessoa, perseverantemente, juntamente com outros umbandistas, conseguiu legalizar a Umbanda perante a lei, como já explicitado acima. Vamos à reportagem:

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Não poderíamos deixar de disponibilizar, uma Carta-Aberta corajosamente escrita pelo Capitão Pessoa, dirigida ao Presidente da República, defendendo a Umbanda das perseguições policiais, cobrando providências: PERSEGUIÇÃO ÀS TENDAS ESPÍRITAS PELA POLÍCIA DO ESTADO DA GUANABARA Protesto d´O Semanário – Carta-aberta ao Presidente da República, pelo presidente da Tenda Espírita São Jerônimo, José Álvares Pessoa A “imprensa sadia” tem registrado nestas últimas semanas, sem, aliás, protestar contra elas, como seria de seu dever, antes estimulando-as com seu sensacionalismo, inauditas violências praticadas por um comissário de polícia do Estado da Guanabara contra Tendas Espíritas, principalmente umbandistas, a pretexto de “combater o baixo espiritismo”. Trata-se de uma violação flagrante do dispositivo constitucional que garante a plena liberdade de cultos em nosso país, bem como de um retrocesso aos tempos medievais, quando assuntos de foro íntimo, como a religião, eram objeto da interferência indébita das autoridades eclesiásticas e civis. A polícia não tem o direito de perseguir quem quer que seja por ser adepto deste ou daquele credo ou praticar este ou aquele rito. Muito menos o direito de invadir domicílios ou lugares onde se professam esses credos e se praticam esses ritos, a pretexto de considerá-los “condenáveis” ou de estarem sendo desvirtuados de seus fins por maus elementos. Se esses elementos incidirem em sanções penais, que estas recaiam sobre eles pelas formas e meios legais, cujo exame e aplicação cabe a justiça. Nunca através de “comandos policiais” puramente sensacionalistas e que não têm outro fim senão o de servirem de pasto à “imprensa sadia” sempre em busca de escândalos ou de instrumento de perseguições e vinditas que não se compadecem com o espírito de tolerância, de compreensão humana e de liberalismo do povo brasileiro. Por isso, protestamos, com todo vigor essas manifestações truculentas de um reacionarismo ultramontano que as nossas as tradições de cultura e os nossos sentimentos democráticos repelem, fazendo nossas as corajosas palavras com que o Sr. José Álvares Pessoa, presidente da Tenda Espírita São Jerônimo, desta capital, se dirigiu ao Sr. Juscelino Kubitschek, na Carta-Aberta que a seguir reproduziremos, e esperando que o chefe da Nação e o chefe do Executivo do Estado da Guanabara tomem no caso, as providências imediatas e enérgicas que ele está exigindo, a bem da própria autoridade mora do governo. Às vítimas dessa perseguição inquisitorial, que mais parece obra de insano que outra coisa qualquer, franqueamos as nossas colunas, para a divulgação de seus protestos e a defesa de seus direitos constitucionais violados pela polícia carioca, que não tem tempo para “limpar” a cidade dos profissionais do crime que perturbam o sossego de sua população, mas tem tempo de sobra para perseguir as Tendas Espíritas. (Texto de Oswaldo Costa) A CONSTITUIÇÃO ASSEGURA O FUNCIONAMENTO DOS CENTROS ESPÍRITAS O artigo 141 da Constituição, parágrafo 7, é claro como água: - “E inviolável a liberdade de consciência e de crença e assegurado o livre exercício dos cultos religiosos”. O parágrafo 12 é taxativo: - É garantida a liberdade de associação para fins lícitos. Nenhuma associação poderá ser compulsoriamente dissolvida senão em virtude de sentença judiciária”. O fato da Igreja estar separada do Estado, um dos principais fundamentos do regime democrático, não impede que o mesmo Estado, através da Câmara dos Deputados, das Assembléias Legislativas e Câmara Municipais, conceda auxilio a subvenção à Igreja Católica e outros cultos, principalmente, o Espiritismo, cujo número de adeptos no Brasil, é superior a 3 milhões de pessoas. o antigo policial Deraldo Padilha, famoso pela sua caça aos malandros e prostitutas, recém chegado da Itália, onde levou vida folgada, ganhando em dólar como membro de uma comissão de seleção de imigrantes para o Brasil, resolveu investir contra as organizações espíritas, fechando-as sumariamente, quando não leva o pânico aos crentes, com a sua presença, geralmente, precedida de verdadeiro aparato bélico. Antes de mais nada é um atentado à Constituição de 1946, em pleno vigor. Quem abrir o orçamento da União e, principalmente, o Diário Oficial do Estado da Guanabara, encontrará mais de 800 instituições religiosas, recebendo auxílios do Governo, para que as mencionadas organizações possam

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realizar uma obra social e humanitária, socorrendo os desvalidos, prestando assistência médica dentária e alimentar. O próprio Estado, separado da Igreja, reconhece a necessidade de ampará-la, através de subvenções que são dadas indistintamente. Não há preocupação de servir a uma religião, e sim, a todos os credos que praticam, realmente, o bem. Nenhuma instituição, seja católica, protestante, espírita, etc., pode receber um só centavo do Estado sem que esteja devidamente registrada e com a sua diretoria em pleno exercício, eleita em pleitos disputados. E o que faz o policial Deraldo Padilha, lotado no 22º D. P., no subúrbio? Na sua volúpia de publicidade barata, na ânsia de querer permanecer sempre no cartaz, na impossibilidade de rasgar as calças dos malandros à navalha, de raspar a cabeça de infelizes que fazem “trottoir” (nota do autor: É o caminhar que as prostitutas fazem quando ficam a espera de seus clientes), resolveu levar o pavor às associações espíritas, cujo funcionamento é permitido pela Carta Magna. O último censo revelou que existem, no Brasil, milhares de templos doutrinando as principais religiões espalhadas pelo mundo, como sejam o catolicismo, protestantismo, espiritismo, esoterismo, budismo, etc. A fé não pode ser padronizada, como deseja o delegado Deraldo Padilha. O ser humano escolhe a sua religião por um ato de consciência. Os caminhos de Cristo, de Lutero, Allan Kardec, Krisnamurti, Elifas Levi, são estradas que levam o homem ao mesmo Deus. E o Brasil, país com cerca de 60 milhões de habitantes, jamais conheceu o espírito de intolerância religiosa. Aqui crescem todas as religiões, num respeito mútuo. Todas prestam inestimáveis serviços à pobreza. O próprio Estado reconhece o papel relevante das mencionadas instituições, contemplando-as com auxílios e subvenções que são dados por todas as Casas Legislativas. É por tudo isso que a opinião pública está profundamente chocada com a atitude arbitrária do policial Deraldo Padilha, useiro e vezeiro na prática de violências contra pessoas indefesas. A sua vítima, agora, é o Centro Espírita, geralmente com um quadro social que abriga milhares de pessoas humildes. A tudo isto assiste impassível o coronel Luiz Jacques, chefe de Polícia do Estado da Guanabara, uma cidade com 3 milhões de habitantes, considerada uma das mais cultas do mundo, e que não pode ser teatro de cenas de vandalismo praticadas por um arbitrário policial. CARTA ABERTA AO CHEFE DA NAÇÃO Por José Álvares Pessoa Exmo. Sr. Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira: Em meados de 1955, tive a honra de ser levado à presença de V. Exª. por um amigo comum. Era então V. Exª candidato da oposição à Presidência da República e a sua campanha se processava num clima de inseguranças e de incertezas, com mil boatos a correr, como é de praxe nesta terra carioca. V. Exª. acolheu-me com a sua natural simplicidade, que põe à vontade até mesmo a mais tímida criatura, e tivemos oportunidade de conversar uns bons quinze minutos sobre o que era de vital interesse, para V, Exª como candidato, para mim como seu eleitor. Espiritualista que sou, presidente de uma Tenda Espírita, a de São Jerônimo, como sede na Rua Visconde de Itaboraí, bem no centro da cidade, com uma freqüência de mais de trinta mil pessoas mensalmente, eu desejava, naquele momento, sabendo-o católico praticante, obter da própria boca de V. Exª. a declaração de que, se eleito, V. Exª. não permitira jamais, como relação à questão religiosa, que a nossa Constituição fosse ferida. V. Exª. com a ombridade e sinceridade que tão bem o caracterizam, fez a declaração, que me foi gratíssimo ouvir, de que jamais no seu governo poderia haver perseguição a este ou aquele credo. É para lembrar a V. Exª. as suas próprias palavras, e pedir-lhe que não as renegue no momento em que se acha prestes a deixar o Poder, que volto hoje à sua presença. E volto convicto de que V. Exª., até o presente momento, se acha absolutamente isento de culpa quanto a perseguição que o Departamento Federal de Segurança Pública está realizando contra as Tendas Espíritas, que se contam aos milhares no Estado da Guanabara, sob o ridículo pretexto de combater os maus espíritas e a macumba.

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Presidente, a Polícia nunca se lembrou de que no seio de todas as classes, de todos os credos, quer religiosos, quer políticos, há bons e maus. A Polícia, ao pretender expurgar os meios espíritas cariocas dos seus maus elementos, não se lembra de que também deveria usar dos mesmo meios de repressão contra os maus elementos de outras confissões religiosas. É contra esta atitude de dois pesos e duas medidas que, neste momento, me dirijo a V. Exª. Nós espíritas, nesses atribulados quarenta anos em que nos firmamos em todo o país, temos sido as vítimas prediletas da prepotência policial, que, nós o sabemos, é bem dirigida pela mão oculta do clero romano. Mas, mesmo quando este pobre país viveu dias de terror durante a época da ditadura, nós conseguimos sobreviver e nenhum poder prevaleceu contra nós. Não há de ser agora, quando vivemos num período constitucional de calma e tranqüilidade, governado por V. Exª, o mais generoso dos homens, dotado de sentimentos da mais alta nobreza e de um espírito de justiça de escol, que nós espíritas vamos temer a ação da Polícia, que, de abuso em abuso, vem fechando Centros Espíritas, perseguindo criaturas indefesas, na persuasão de que o mais alto Poder ficará surdo ao clamor que se levanta contra esses atos de prepotência. Venho hoje, pois, a presença de V. Exª., reclamar o cumprimento de sua promessa de candidato, de que jamais permitiria a perseguição religiosa no país. Chegou o tempo de agir, por isso mesmo, estou agora pedindo as providências enérgicas de V. Exª., junto ao Sr. Chefe de Polícia, a fim de que seja posto termo, imediatamente, às medidas que foram e continuam a ser postas em prática contra os adeptos do espiritismo, que, como todos os adeptos de outros credos, têm o direito de amar a Deus do modo que melhor lhes parecer. Certo de que V. Exª., que tem uma memória privilegiada, não esqueceu a promessa feita a um patrício que foi seu cabo eleitoral junto aos espíritas ora perseguidos, e de que agirá para que cesse a perseguição policial, antecipo a V. Exª. os meus melhores agradecimentos,q eu representam também os agradecimentos de alguns milhões de espíritas brasileiros. (O Semanário – ano V – número 225 – 09 de Setembro de 1960) Esclarecendo um pouco mais sobre as perseguições policiais, e, em particular, o delegado Deraldo Padilha, acossador das práticas espíritas, principalmente a Umbanda, achamos a seguinte e interessante reportagem:

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(O Semanário – número 227 – ano V – semana de 17 a 23 de Setembro de 1960)

Deraldo Padilha – Comissário de Polícia no Rio de Janeiro – 1952

Temos aqui um dos vários personagens controversos que fazem parte da história do Rio de Janeiro. O Comissário de polícia Deraldo Padilha. Começou na policia nos anos 40 sendo um policial comum passando por vários distritos. Na década de 50, mais precisamente em 1951 ele foi nomeado para combater a prostituição da cidade. Padilha era truculento, severo e intransigente. Com ele não funcionava a conversa; era adepto da cadeia, tapa, borrachada e pescoção. Ele percorria a cidade de norte a sul com sua equipe sendo o terror das prostitutas e também dos casais de namorados. Padilha confundia namoro com prostituição, casal abraçado e namorando na rua era imoral. Resultado: cadeia. Invadia Terreiros de Umbanda, espancando os médiuns, arrastando os dirigentes para a rua, quebrando atabaques, destruindo imagens, numa época em que para se abrir um Terreiro era necessário um alvará e ir a uma delegacia policial. Padilha era tão intransigente que foi deposto desse cargo por interferência do Presidente da República, pois a imprensa carioca pressionava para isso.

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CRONOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO MOVIMENTO UMBANDISTA NO BRASIL

1889 – Entre 1888 e 1889 já haviam manifestações de Caboclos e Pretos-Velhos, sob o comando do Caboclo Curugussú, segundo o relato do escritor Wilson Woodrow da Matta e Silva, baseado nas informações de Leal de Souza.

1908 – Primeira reunião de Umbanda (registrada oficialmente), com a participação do Sr. Caboclo das Sete Encruzilhadas e Pai Antonio, na mediunidade de Zélio Fernandino de Moraes. Nesse ano histórico, foi anunciada e formalizada a Umbanda como religião.

1917 – Zélio Fernandino de Morais recebe ordens da espiritualidade para fundar Sete Tendas de

Umbanda: Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição – Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia – Tenda Espírita São Jorge – Tenda Espírita São Jerônimo – Tenda Espírita São Pedro, Tenda Espírita Santa Bárbara e Tenda Espírita Oxalá.

1918 – Fundação oficial (com registro em cartório), do 1º Templo Umbandista do Brasil: “Tenda Espírita

Nossa Senhora da Piedade”.

1920 – A Umbanda espalha-se pelos Estados de São Paulo, Pará e Minas Gerais. Em 1926 chega ao Rio Grande do Sul e em 1932 em Porto Alegre.

1925 – Normatização das 7 (sete) Linhas de Umbanda pelo escritor e umbandista Elieser Leal de

Souza. 1932 – É editado o livro “O Espiritismo – a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” (o primeiro livro de

Umbanda editado no Brasil), com relatos da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.

1935 – Fundação da sétima Tenda Espírita de Umbanda ordenada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas – “Tenda Espírita São Jerônimo”.

1939 – O Caboclo das Sete Encruzilhadas determina a fundação da 1ª Federação Umbandista do

Brasil – “Federação Espírita de Umbanda”.

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1940 – Registro em Cartório do Estatuto da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.

1941 – Reúne-se, na cidade do Rio de Janeiro, o Primeiro Congresso de Espiritismo de Umbanda. Outros Congressos havidos posteriormente retiraram acertadamente o nome espiritismo que, de fato, pertence aos espíritas brasileiros, os quais seguem a respeitável doutrina codificada por Alan Kardec. Em suma, o espírita pratica o espiritismo e o umbandista pratica umbandismo. Neste Congresso foi também apresentada tese pela Tenda Espírita São Jerônimo, propondo a descriminalização da prática dos rituais de Umbanda. O autor, Dr. Jayme Madruga, a par de um minucioso estudo de todas as constituições já colocadas em vigência no Brasil, busca também em projetos como o da Constituição Farroupilha e nos códigos penais até então vigentes e no que haveria de vigorar após 01 de janeiro de 1942. Os argumentos mostravam que o caminho da Umbanda começava a ser aberto e que caberia aos Umbandistas buscarem acelerar o processo com declarações e resoluções, partindo daquele congresso, em prol da descriminalização da prática da Umbanda.

(http://estudodaumbanda.wordpress.com/page/2/)

1944 – O Capitão José Álvares Pessoa, juntamente com inúmeros umbandistas ilustres, entre eles vários militares, políticos, intelectuais e jornalistas, apresentam ao então Presidente Getúlio Vargas um documento intitulado “O Culto da Umbanda em Face da Lei” e consegue daquela autoridade a descriminalização da Umbanda. Este fato, apesar de ter sido extremamente positivo, trouxe como subproduto uma perda de identidade muito grande por parte de nossa religião, uma vez que todos terreiros, das mais variadas seitas, incluíram em seus nomes a palavra Umbanda como forma de fugir à repressão policial. Como nossa religião não tinha um rito claramente definido e nem a formação de sacerdotes, o que gera uma hierarquia, ela acabou ficando à mercê dessa deturpação; outro fato que fortaleceu essa descaracterização foi que, sendo um período de crescimento, não se buscava a qualidade dos Terreiros que se filiavam à Federação, ou à União que lhe sucedeu. (http://estudodaumbanda.wordpress.com/page/2, com adaptações do autor )

1947 – É editado o primeiro jornal de Umbanda. Segundo o jornal “Semanário”, número 128, Ano III, de 25 de Setembro de 1958, o jornal de Umbanda foi fundado por Olívio Novaes, Floriano Manoel da Fonseca, Zélio Fernandino de Moraes, e, Alfredo Rego Filho.

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1950 – A Umbanda no Rio Grande do Sul elege Moab Caldas deputado federal.

1953 – É inaugurada a 1ª Federação Umbandista em São Paulo – “Federação de Umbanda do Estado de São Paulo”, fundada pelo Senhor Alfredo da Costa Moura.

1956 – A Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade lançou seu boletim mensal “A Caridade”.

Reproduzo, a seguir, a primeira página do primeiro e segundo números desse periódico:

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1957 – Grande penetração política da Umbanda.

1958 – A Umbanda no Rio de Janeiro elege Áttila Nunes para deputado federal.

1961 – Realização do 2° Congresso Nacional de Umbanda.

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1967 – Foi criado na cidade do Rio de Janeiro, o Conselho Nacional Deliberativo de Umbanda (CONDU), que congrega as Federações de Umbanda existentes ao longo do país, atualmente, contando com mais de 46 Federações, de norte a sul do país, reunindo representantes de mais de 40.000 Terreiros de Umbanda;

1970 – A jornalista Lilia Ribeiro, diretora da Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade – RJ,

gravou a primeira mensagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, contando como tudo começou. Lilia Ribeiro foi a primeira pessoa a difundir amplamente a fundação da Umbanda.

1972 – Pai Ronaldo Linares encontra-se com Zélio Fernandino de Moraes e dá o início a divulgação da

sua existência e da sua obra, em São Paulo.

1973 – Realização do 3º Congresso Nacional de Umbanda. Dia 15 de Novembro é oficializado como o Dia Nacional da Umbanda.

1975 – Após 66 anos de dedicação à Umbanda, no dia 03 de Outubro de 1975, Zélio Fernandino de

Moraes retorna ao Plano Espiritual.

2003 – O MEC oficializa a FTU – Faculdade de Teologia Umbandista – primeira instituição do gênero.

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DIA NACIONAL DA UMBANDA Segue um texto muito pertinente com o mês corrente extraído de ”A Umbanda Brasileira”, livro de José Fonseca publicado em 1978, depois de passar pelo Jornal” Gira de Umbanda” em 1976. É uma carta de esclarecimento do C.O.N.D.U. sobre a escolha do 15 de Novembro como dia nacional da Umbanda, bem como o seu significado para a religião e o movimento umbandista. O Conselho Nacional Deliberativo da Umbanda foi criado em 12 de Setembro de 1971 sendo o primeiro órgão umbandista de caráter nacional, que conseguiu agregar em sua reunião de 1976, 25 federações de Umbanda de todo o país, totalizando mais de 40.000 terreiros e tendas representadas no evento, que teve entre as suas pautas, a escolha do dia nacional da Umbanda. É interessante observar no texto o desconhecimento existente na década de 70 de grande parte do movimento umbandista da história ocorrida em 1908 – bem como do próprio rito original, cujo estudo e análise ainda hoje é renegado pela grande maioria dos umbandistas – os motivos da escolha do 15 de novembro pelo próprio Caboclo das Sete Encruzilhadas para a sua manifestação e a anunciação da nova religião, as considerações feitas sobre o 13 de maio, como sendo a data mais apropriada para representar a Umbanda, o que representa a existência de uma grande associação na época, da origem da Umbanda, o seu surgimento, com as religiões e a cultura afro-brasileira. Posição ainda sustentada por grande parte das vertentes africanistas de Umbanda, que relutam em reconhecer fatos históricos; a Umbanda como religião puramente brasileira, a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, Zélio e o Caboclo das Sete Encruzilhadas como os fundadores e precursores da Umbanda. PORQUE MILHÕES DE BRASILEIROS ESCOLHERAM 15 DE NOVEMBRO COMO O DIA NACIONAL DA UMBANDA O CONSELHO NACIONAL DELIBERATIVO DA UMBANDA (C.O.N.D.U.) – por intermédio de sua representante no Estado do Amazonas, a Cruzada Federativa Espírita de Umbanda, tomou conhecimento do comentário da sessão “Umbanda – Quimbanda” do jornal “ A Notícia”, de Manaus, em 11 do corrente mês, sob o título “Escolha Justa”, no qual se lê que “ a suposta escolha de 15 de novembro para ser considerado o Dia da Umbanda, sugerida num encontro umbandista, no Rio de Janeiro, vinha decepcionando”… e que “a data diz respeito à Proclamação da República, nada tendo a ver com a Umbanda, o que significa que foi sugerida por profanos, por quem desejava apenas homenagear um centro”… ”Os umbandistas amazonenses disseram que o 13 de Maio, data da libertação dos escravos é realmente a mais indicada”. O C.O.N.D.U. esclarece que:

1. A data de 15 de Novembro foi proposta pelas entidades federativas do Rio de Janeiro, na I Convenção Anual deste Conselho, da qual participaram 25 federações, representando a maioria absoluta dos Estados; e que não opuseram qualquer objeção à escolha.

2. Entre as datas sugeridas – 13 de Maio, consagrada aos Pretos Velhos – e 22 de Novembro – dia de

Araribóia – venceu por unanimidade 15 de Novembro. Nessa data, em 1908, manifestou-se pela primeira vez, numa sessão da Federação Espírita, em Niterói, uma entidade que declarou trazer a missão de estabelecer um culto, no qual os espíritos de índios e de escravos poderiam desenvolver seu trabalho espiritual, organizado no plano astral do Brasil. Na época, esses espíritos aproximavam-se das reuniões espíritas, mas as suas mensagens eram recusadas, por serem eles considerados atrasados, tendo em vista a condição de humildade com que se identificavam.

A entidade, que se apresentou aos videntes como um mentor espiritual, deu o nome de CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS. No dia seguinte, verdadeira multidão compareceu à residência do médium – um jovem de 17 anos, Zélio Fernandino de Moraes, de tradicional família fluminense. A entidade manifestou-se e determinou as normas do novo culto, que teria o nome de UMBANDA, declarando fundado o primeiro templo de Umbanda, cuja prática seria exclusivamente a caridade espiritual, através de passes, desobsessões e curas de enfermos. O templo, que tomou o nome de Tenda Nossa Senhora da Piedade, funciona ainda hoje, no centro do Rio de Janeiro (Rua D. Gerardo, 51) com uma filial ( Cabana de pai Antônio ) num sítio em Boca do Mato, Cachoeiras de Macacú, completando, em Novembro próximo, 69 anos de atividade. Prosseguindo a sua missão, o Caboclo das 7 Encruzilhadas fundou mais 7 templos, cujos dirigentes foram escolhidos entre os grupos de médiuns preparados nas sessões doutrinárias que a entidade estabelecera, às quintas-feiras à noite, para esclarecimentos sobre a doutrina espírita, o Evangelho e as normas ritualísticas da Umbanda. Estas normas determinavam: médiuns uniformizados de branco, cânticos sem acompanhamento de atabaques nem palmas ritmadas; preceitos baseados apenas em água, Amaci de ervas, flores e pemba, atendimento totalmente gratuito, não sendo admitido estabelecer nem aceitar retribuição financeira de espécie alguma. Os templos, organizados administrativamente, mantinham-se pelas contribuições dos associados.

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3. Milhares de templos, em quase todos os Estados, descendem desse grupo inicial, conservando, em sua maioria, a pureza da doutrina e da ritualística. Formou-se assim a religião de Umbanda – denominada, de início, Lei de Umbanda, ou Linha Branca de Umbanda – cujos mentores são os Caboclos e os Pretos-Velhos.

4. Justifica-se, portanto, a escolha da data de 15 de Novembro, por não se prender apenas a uma das

falanges principais da Umbanda e sim a ambas: Caboclos e Pretos Velhos.

5. A referência feita à Proclamação da República deve-se ao fato de ter sido ela determinante da igualdade religiosa estabelecida pela primeira vez na Constituição da República, em 1889, o Estado deixou de ter uma religião oficial, permitindo assim que todos os credos, inclusive a nossa doutrina, se difundissem livremente.

(Jornal “Gira de Umbanda” 1976) (Pedro Kritski) Disponibilizaremos agora, uma cópia original do artigo supracitado, do Jornal “Gira de Umbanda” – 1976:

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INSTITUIÇÃO DO DIA NACIONAL DA UMBANDA

Dia Nacional da Umbanda Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos LEI Nº 12.644, DE 16 DE MAIO DE 2012 Institui o Dia Nacional da Umbanda.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Fica instituído o Dia Nacional da Umbanda, que será comemorado, anualmente, em 15 de Novembro.

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 16 de maio de 2012. 191º da Independência e 124º da República. DILMA ROUSSEFF Anna Maria Buarque de Hollanda Luiza Helena de Bairros Este texto não substitui o publicado no DOU de 17.5.2012

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Portanto, a partir desta data, oficialmente a Umbanda é reconhecida pelo Estado Maior como religião. Também tem um fato curioso: Muitos religiosos brigam com ardor para que o Estado Maior retire do calendário anual os feriados ditos religiosos, pois conota preferências, e todos também querem que suas religiões tenham igualmente um feriado nacional. Com isso não teremos que nos preocupar, pois o Dia da Umbanda sempre será feriado, devido a ser comemorado no mesmo dia da proclamação da República. Coincidência né???

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LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA NA VISÃO DE UM APRENDIZ Iremos disponibilizar alguns textos sobre a Linha Branca de Umbanda, escritos entre 1932 e 1935, por um estudioso da Doutrina Espírita, e freqüentador das Tendas Espíritas seguidoras da “Linha Branca de Umbanda e Demanda” do Sr. Caboclo das Sete Encruzilhadas, formulados pelo comerciante (sócio proprietário da Sociedade Laticínio Via Láctea Nevada Ltda.) e vice-presidente do Sindicato dos Representantes Comerciais do Rio de Janeiro, o Sr. José Rodrigues Lopes de Barros, de origem portuguesa, que se apresenta com o pseudônimo de: “Aprendiz”, desde 1908 como o mesmo diz em um dos seus textos: “Devo confessar com toda a lealdade que, os meus vinte e cinco anos de crença, dedicação e observação das práticas espíritas em suas várias modalidades, a freqüência com regular assiduidade nas Tendas Espíritas onde se praticam e exercem atividades caritativas, rigorosamente cristãs, por entidades do espaço, componentes da denominada “Linha Branca de Umbanda”... (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 16 de Fevereiro de 1933 – página 09);

Até então, tínhamos conhecimento que o único divulgador da doutrina apregoada pela Linha Branca de Umbanda e Demanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas era o Sr. Leal de Souza. Por influência da Espiritualidade, conseguimos resgatar os textos abaixo que contêm em suas linhas, alguns aspectos da doutrina esposada pelo instituidor da Umbanda; o Aprendiz, com certeza, consultou os Guias Espirituais das Tendas Espíritas seguidoras do Caboclo das Sete Encruzilhadas, para angariar conhecimentos, e raciocinando com a razão, expô-los como o fez, com maestria. Observem que na maioria dos escritos, o “Aprendiz” também está defendendo a Linha Branca de Umbanda dos ataques de alguns ditos kardecistas ignorantes, intransigentes, preconceituosos, puritanos e conservadores de então, pois estes já, em época, queriam a todo custo, por pura ignorância dos ditames doutrinários da Linha Branca de Umbanda, de expurgá-la da doutrina Espírita, pois tachavam-na de baixo espiritismo, e seus seguidores de ignorantes, mistificadores e exploradores. O “Aprendiz” em seus textos mostra que a doutrina da Linha Branca de Umbanda do Senhor Caboclo das Sete Encruzilhadas está totalmente integrada à doutrina dos Espíritos Superiores, organizadas por Allan Kardec, e por isso, em época, era amplamente conhecida como uma modalidade de espiritismo, chamada de: “Espiritismo de Umbanda”. Aliás, desconhecemos quem está autorizado a dar um diploma e carteirinha de espírita para alguém. Observamos nas entrelinhas, que o “Aprendiz” fala em nome da “Linha Branca da Umbanda e Demanda”, e embora o surgimento de outros Terreiros em desacordo com as “Linhas Mestras” do Caboclo das Sete Encruzilhadas, magistralmente, em seus textos, o Aprendiz nos ensina a respeitar todas as modalidades, desde que sejam voltadas a pratica do amor, da fé, da simplicidade, da humildade e da Caridade desmedida.

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O “Aprendiz”, em nome da Linha Branca de Umbanda e Demanda também faz diversos alertas, a muitos falsos umbandistas da época, pelas práticas espúrias e feitiçarias efetuadas a bel prazer, todas com fins pecuniários. Em algumas observações sobre rituais, apetrechos, defumadores, cerimônias, o Aprendiz tece comentários calcados em sua visão pessoal, que vimos ser limitada pela falta de informações científicas magísticas, o que não desmerece em nada todo o conteúdo. Hoje, já temos explicações plausíveis calcadas na razão, de todo o arsenal natural utilizados pelos Guias Espirituais, em auxilio ao próximo. Em dias atuais, observamos umbandistas preocupados somente em cultuarem Orixás, realizarem festejos um após o outro, homenagear Exus e Pombas-Gira, dançarem efusivamente com roupagens coloridas e vistosas, dando ênfase a magias, oferendas e despachos disparatados, ostentando-se travestidos com indumentárias regionais, bebericando, aliando-se a Espíritos de má formação moral, defendendo-os e exaltando-os como Guias Espirituais, e ai por fora. Pelos relatos do Aprendiz, vislumbraremos os reais Guias da Umbanda, humildes, amorosos, compassivos, evangelizadores, rezadores, intercessores, preocupados com a libertação das pessoas, enternecendo corações, e não somente Guias preocupados em travestirem-se coloridamente, dançarinos, alcoólicos, fumistas, galhofeiros; vamos ver Guias Espirituais que não estão preocupados com homenagens e exaltações; vamos ver Guias Espirituais que quando manifestados, sua preocupação é tão somente para ensinar ou trabalhar; vamos ver Guias Espirituais que nos orientam que: Festa em Terreiro é Caridade. Podem igualmente observar, que em todos os relatos, em nenhum momento foi dado ênfase ao uso de atabaques, roupas coloridas e adereços. Em nenhum momento foi relatado Sessões especificas e nem atendimentos fraternos com Exus e Pombas-Gira. Também não encontramos referência a feituras de cabeças, camarinhas, coroações, cultos e festejos para Orixás, festas regadas a comes e bebes e nem dançarias extasiantes. Somente encontramos as presenças marcantes de Espíritos Guias Espirituais em atendimentos fraternos, realizando desobsessões, preocupados em evangelizar e bem orientar e quem os procurassem, todos, obreiros humildes, sem vaidades, sem cultos individuais, somente querendo servir e nada mais. Assim foi e são os trabalhos mediúnicos dos que se pautam pelas normatizações do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Hoje, raros são os Terreiros que seguem, a totalidade das “Linhas Mestras” da “Linha Branca de Umbanda e Demanda” ditadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. O Caboclo das Sete Encruzilhadas tentou iniciar seus trabalhos juntamente com uma plêiade de Espíritos dispostos as práticas caritativas nas religiões já existentes, mas não foi aceito. Na época da implantação da Umbanda no Brasil, o catolicismo, religião de predominância absoluta, repudiava a comunicação com os mortos. O Espírita kardecista estava preocupado com a pureza doutrinária e apenas reverenciava e aceitava como nobres as comunicações rebuscadas de Espíritos considerados ilustres, catedráticos, com formação européia, trajados com fraques e cartolas. O Candomblé como religião estruturada somente surgiria no Rio de Janeiro na década de 1930 (segundo o antropólogo Reginaldo Prandi), não aceitava a incorporação de Eguns (Espíritos que tiveram vida na Terra). O Caboclo só teve uma saída: resolveu então, fundar uma nova religião, e seguir com o proposto perante a Espiritualidade Maior. Temos certeza que muitos irmãos kardecistas, hoje, respeitam e entendem o trabalho grandioso da Umbanda perante a espiritualidade. Mas, infelizmente, como em outrora, muitos outros irmãos kardecistas ainda encontram-se petrificados em elucubrações filosóficas idiossincrásicas, presos no ostracismo da ignorância. Muitos podem nos perguntar: Mas porque dar tanta atenção e ênfase, tentando se explicar para os ditos kardecistas? A resposta é simples. Todos vão observar, na realidade, que a Linha Branca de Umbanda e Demanda instituída pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas é considerada pelos Guias Espirituais como uma modalidade de Espiritismo, portanto, seguindo também a risca, o preconizado pelos Espíritos na codificação kardequiana, somente com algumas peculiaridades que em nada ferem o codificado. Não caberia, portanto, tantas ofensas e preconceitos, mas sim, entendimento e auxilio mútuo para melhor aperfeiçoamento doutrinário e mediúnico. Com os pensamentos contrários de muitos irmãos kardecistas de renome, acabou-se criando um fosso imenso entre as duas religiões. Observem que não nos interessa o julgamento e o que pensa o Católico, o protestante as seitas pentecostais e as néo-pentecostais, pois não fazemos parte da mesma linha doutrinária, e só temos em comum os ensinamentos de Jesus que são indiscutíveis. Os Espíritos da Umbanda, em tempo algum, jamais se pronunciaram negativamente ou pejorativamente contra quem os ofende. Somente nos orientam a ignorar tudo isso, pois o trabalho é grande e o tempo é curto. Os textos do Aprendiz se iniciaram após uma série de artigos publicados em periódicos, onde alguns kardecistas de renome, formadores de opiniões, expuseram seus achismos e idiossincrasias acerca das manifestações de Caboclos e Pretos-Velhos, e das práticas da Umbanda. Conseguimos uns poucos destas reportagens com pérolas agressivas e medíocres, que disponibilizaremos abaixo (O BOM SENSO, REAJUSTAMENTO DE OPINIÕES, NO SEIO DO ESPIRITISMO, O QUE É ESPIRITISMO).

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Observem bem, como se referem aos Guias da Umbanda de forma jocosa, pedante e desrespeitosa, dando-nos a impressão que o Centro Espírita seria a “Casa Grande” e a Umbanda, a “Senzala”. A Umbanda nasceu em um racismo e preconceito espirítico, continuou através das décadas e, infelizmente, após mais de 100 anos de existência, persiste até hoje. Mas, bem diz Ramatis: "A Umbanda tem fundamento e, quando for conhecido todo seu programa esquematizado no Espaço, seus próprios críticos verificarão a comprovação do velho aforismo de que Deus escreveu certo por linhas tortas!" O BOM SENSO Pela exemplar vida, pelo muito amor e humildade, Jesus o Cristo, é o expoente máximo do bom senso. Se se considerar com sensatez e bastantes critério, o que atualmente se passa na vida terrena, vê-se que por toda a parte lavra a iniqüidade e a ignorância, a ambição desmedida impera, a preocupação geral é a megalomania, a vaidade e a ostentação onde estão vitoriosos o egoísmo =, o orgulho e a presunção, o atraso moral visível, em contraste, com antagonismo, com o grande adiantamento matéria e progresso, tudo com detrimento do bom senso. O Consolador prometido por Jesus, o Espiritismo, é indivisível; consiste no cumprimento dos dez mandamentos da Lei de Deus, na observação dos sagrados preceitos dos Evangelhos de Jesus, segundo São Marcos, S. Matheus. S. Lucas e São João, e em procurar a doutrinação dos Espíritos atrasados, sofredores, que são muitos milhões e que estão no espaço. O Espiritismo não pode subdividir-se; é um só e único. Estas crendices com o falso nome de espiritismo, patenteiam o grande atraso moral, muita ignorância e falta de “bom senso”, como: baixos espiritismos, magias, ocultismos, exoterismos, obras de pais de santos, tirar e botar pontos, Candomblés, cangerês, trabalhos de Terreiros e tantas outras feitiçarias, fetichismos de Africanos e Caboclos, etc. Os praticantes destas crenças são dignos de comiseração e de compaixão pelo atraso moral e ignorância em que se acham. Precisam, esses infelizes, de bons conselhos e de que se deva implorar fervorosamente ao bom Deus que tenha misericórdia deles, que tudo isso fazem pela falta de “bom senso”. A todo verdadeiro espírita repugnam estes desvarios e deve ter-se muita força de vontade para vencer, libertando-se deste meio, os que ali se encontram; implorar ao Altíssimo, que em sua bondade infinita tenha piedade de criaturas tão atrasadas, esses que estão passando por tais provações. Todo o homem que tiver a alta virtude do “bom senso”, saberá seguir as pegadas de Jesus, o Rabi da Galiléia, será bastante cordato e circunspecto, terá bastante seriedade e gravidade nas ações e nas palavras, e o discernimento preciso para distinguir o que é bom do que é mau. Com toda a atenção lendo-se as monumentais obras de Allan Kardec, manancial de belos conhecimentos da doutrina espírita, neles encontrarão a sabedoria e todos obrarão judiciosamente e com “bom senso”. Sendo o Espiritismo um só, estes erros provam, evidentemente, o grande atraso moral e a ignorância as doutrina; por esta infelicidade, frutos da irreflexão tornam-se esses tais, dignos do perdão de Deus. Os bons espíritas compadecidos devem orar e implorar ao bom Deus e a Jesus que os ilumine e liberte desse estado de atraso. (Texto de Américo Santos – Gazeta de Notícias – Terça-Feira, 29 de Maio de 1928) REAJUSTAMENTO DE OPINIÕES A propósito do estudo do ponto “Método” da ordem do dia dos trabalhos da semanal última da Liga Espírita do Brasil, intercorrentemente surgindo discussão acerca das manifestações dos Espíritos de “Caboclos” e “Africanos”, o Sr. Estevam Ferreira de Magalhães, vice-presidente da Liga Espírita do Brasil, fez o seguinte reajustamento de opiniões: Venho, como dizemos, em nossa linguagem familiar, por em pratos limpos a questão dos “Caboclos” e “Africanos”, nos nossos Centros Espíritas; e isso sem me preocupar em agradar ou aborrecer os nossos estudiosos companheiros, mas sim, firmando-me na minha razão, na minha consciência e nos Evangelhos. No fundo, a questão resume-se nisto: Nós temos vergonha da visita aos nossos Centros, desses irmãos ainda atrasados em suas trajetórias para o infinito; da mesma forma que nos envergonhamos quando em nossos salões de recepções, se apresentam seres maltrapilhos, nos estendendo familiarmente a mão.

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Suas presenças perturbam o bom tom do meio. É a nossa vaidade que, na eminência de ser atingida pela crítica impiedosa e ferina dos que se consideram pairando em planos superiores, reclama contra a presença do intruso. É o nosso orgulho que reage, quando a harmonia na ordem social se altera com a presença desses seres ainda incultos. Mas, analisemos com serenidade o assunto, porquanto ele é de importância capital para o espírita cristão. Se devemos tomar para modelo dos nossos Espíritos em evolução, aquele reformador incomparável que se chamou Jesus Nazareth, quando movimentava um corpo de carne sobre a Terra; se devemos ver nos seus ensinamentos, a regra certa, invariável, capaz de alcandorar os nossos Espíritos aos planos superiores da criação. Se nos considerarmos os continuadores de sua obra genial de aperfeiçoamento, e por conseqüência de redenção humana, teremos forçosamente de seguir os Seus exemplos, se quisermos possuir o seu imenso poder moral entre os homens e Espíritos. E quais foram os exemplos deixados por Ele aos seus irmãos da Terra? Sabeis todos, meus caros companheiros, destaca-se entre eles, a profunda piedade pelas criaturas simples, e as desviadas de suas rotas naturais, traçadas no plano divino. Ele, o Cristo de Deus, estendia a mão a adúltera, comia com publicanos e não se sentia diminuído quando em companhia desses indivíduos de má vida. Quão longe estamos Dele! Todavia, se Jesus é o nosso modelo; se Jesus é o nosso Mestre, devemos imitá-lo em tudo o que for suscetível de ser imitado pelos nossos pobres Espíritos. Deus espalhou a mediunidade por sobre todas as criaturas, cultas e incultas. Por quê? Não está isso indicando a grandiosa solidariedade que de existir entre todos os seus filhos? Não está isso indicando que devemos estudar essas faculdades em todas as suas manifestações, desde as de ordem inferior às mais elevadas? Como poderemos estudá-las e ajudar os nossos irmãos que ainda se encontram no princípio da sua evolução, nos primeiros degraus da lendária escada de Jacob; será afastando-os de nós? Não! Nisto como em tudo mais, deveremos seguir os exemplos do Mestre, ajudando-os, instruindo-os e aprendendo com eles o que eles poderem dar. Vou tocar em um ponto melindroso da questão: Sabemos que os Espíritos criados simples e ignorantes se encontram em uma infinidade de estados ou graus de evolução, no espaço como na Terra; assim, o “Caboclo” ou o “Africano” – eu me refiro àqueles que realmente o são – não poderão apresentar-se com as mesmas características de um Espírito evoluído; enquanto este disserta sobre assuntos elevados, aquele pedia “marafo” (nota do autor: cachaça) e nos responderá mais facilmente satisfazendo a nossa curiosidade ou nos ajudará a realizar alguma pretensão mais ou menos inconfessável. Enquanto o Espírito de ordem elevada, consciente de suas responsabilidades nos afasta o mais possível dos nossos erros, o de ordem inferior, inconscientemente, alimentará esses vícios, e estaremos então dentro da figura evangélica; se um cego conduz outro cego, ambos cairão no fosso. Enquanto o Espírito de ordem elevada se comunica irradiando em torno de si uma serenidade, por vezes impressionante o de ordem inferior o faz por meio de gestos desordenados, danças bizarras, canções inexpressivas, etc. Estará certo tudo isso? Sim; porque representa um estado natural do individuo. Mas, esse estado se perpetuará nesse individuo? Não; porque a ação do progresso o fará evoluir, e veremos o “Caboclo” e o “Africano” de hoje, transformado em um ser elevado amanhã. Assim, entre dois grupos de espíritas, por exemplo, José de Abreu e João de Deus, de um lado, e, Riachão e Pena Verde do outro; não são os primeiros que se deverão adaptar aos métodos de trabalhos dos segundos, mas sim, Riachão e Pena Verde que deverão esforçar-se para imitar os métodos de José de Abreu e João de Deus. Resumindo, direi: Recebamos nos nossos Centros todos os Espíritos que tiverem permissão para o fazer; ouçamo-los, aproveitamos deles o que for bom, e recusemos o que for frívolo e não nos interessar; e quando algum nos pedir paraty, charutos, etc., digamos: “meu amigo, não te daremos isso; esses vícios, como todos os mais, devem desaparecer de entre os homens; como queres que os perpetuemos no espaço entre os Espíritos”?

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Quando um Espírito se apresentar às nossas reuniões de uma forma bizarra, com gestos esquisitos, danças macabras, peçamos aos mesmo que na singeleza de seu pensamento diga o que quer, sem o ritual de que se cerca, porquanto o Espírito deverá despir-se sempre e o mais possível da forma grosseira da matéria, esforçando-se para atingir os planos superiores da criação. Assim procedendo cumpriremos os nossos deveres de espíritas e de cristãos; façamos subir o nível coletivo de conhecimento espiritual e com inteligência impulsionaremos esse progresso, porém, lembremo-nos de que Deus sabe esperar pela boa vontade de seus filhos, e só os forçará a avançar quando, por demais indolentes, por si mesmos não o podem fazer. Tenhamos paciência em esperar o desenvolvimento da sementeira que fizermos no campo da vida; o mau de hoje será o bom de amanhã; o ignorante atual, o sábio do futuro. (Texto de: Estevam Ferreira de Magalhães “Gazeta de Notícias – Domingo, 6 de Outubro de 1929 – página 08) NO SEIO DO ESPIRITISMO Infelizmente o espiritismo ainda não está sendo praticado de uma maneira uniforme como deveria sê-lo, de acordo com os ensinamentos exarados no Código legado por Allan Kardec, à humanidade. Há de tudo no espiritismo pregado no Brasil, e, principalmente no Rio de Janeiro, onde impera o chamado – “Espiritismo de Terreiro”, tão do agrado de muita gente civilizada e mesmo de jornalistas de destaque no nosso meio. O “Espiritismo de Terreiro” é uma prática esquisita e exótica, que, pelo maravilhoso que nele se observa, pela cantarias plangentes e curiosas, pelas manifestações de entidades que se dizem Caboclos ou Africanos, falando uma linguagem rebarbativa e incompreensível, que represente a sua linguagem verdadeira falta da caridade para com os presentes que não nos entendem, atraem uma assistência heterogênea de curiosos e basbaques. E esta epidemia está proliferando em todo o Distrito Federal e adjacência, constituindo verdadeira calamidade para os incautos, que, desprevenidos, ali se aglomeram diariamente, absorvidos nos salamaleques ridículos dos pseudo “médiuns”, os quais não passam se simples anímicos. O que mais admira, é ver homens de letras e senhoras ilustradas, e, principalmente, jornalistas, e estes com espiritualidade, que têm a obrigação de perscrutar pelo dever de ofício, fanatizados nesses ambientes grosseiros de espiritismo de fancaria. A “cachaça”, que constitui para grande maioria de crentes do espiritismo (não digo espírita, porque ser espírita é matéria difícil), as manifestações Caboclas ou Africanas, dissemina-se cada vez mais, o que é para lamentar. O espiritismo não transmite palavras; transmite pensamento, e por que razão o médium recebe pensamento e transmite aos assistentes palavras em patuá ou dialetos, principalmente se a maioria dos médiuns receptores são conscientes? Está no dever do presidente de mesa, sempre que os pseudo médiuns começarem sua “arenga” em língua incompreensível, dirigirem a palavra ao suposto Espírito, observando-lhe, que ele está faltando com a caridade para com os seus semelhantes ali presentes, por estar falando língua diferente da que é usado no país; aconselhá-lo a voltar ao mundo espiritual, a fim de lá aprender a linguagem corrente, para depois, então, voltar e se manifestar. Se todos os presidentes de mesa assim procedessem, cessariam por completo estas cenas ridículas que se observam em numerosos centros, onde os médiuns são submetidos aos caprichos dos tais Caboclos e Africanos, que, ainda terra a terra, fumam, bebem e praticam toda série de atentados a higiene e a moral. Há tempos assistimos uma Sessão prática de espiritismo, na sede da União Espírita Trabalhadores de Jesus, num Centro bem organizado pelo nosso confrade Luiz Moraes, e tivemos ocasião de observar que esse nosso confrade, sempre que qualquer médium começava a engrolar qualquer patuá Caboclo ou Africano, ele dizia imediatamente ao Espírito julgado presente: “meu irmão, vós estais faltando com a caridade para conosco; ide ao espaço e aprendei a língua que falamos e depois podeis voltar”. Quando se tratava efetivamente de um Espírito, ele se afastava e breve voltava para dar uma manifestação em ordem e em linguagem corrente. Quando se tratava de um médium viciado, anímico, este revoltava-se e não voltava habituado a iludir ao público, e, o que era mais clamoroso, iludir-se a si próprio. Combatamos, pois, os patuás Caboclos e Africanos, para honra e glória do espiritismo são e verdadeiro, tal como nos legou Kardec. (Texto de João da Luz – Diário Carioca – Terça-Feira, 15 de Julho de 1930 – página 11)

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O QUE É ESPIRITISMO Dizem alguns que é bruxaria, outros que é negócio com o diabo, outros que é religião nova inventada pelos dissidentes. Nada disso. O Espiritismo é uma ciência finíssima, especialíssima, destinada às pessoas que se interessam pelo bem estar futuro, e não aos que tudo esperam alcançar nesta vida de trabalho e de mestria, que é terrena. O Espiritismo não é nenhuma religião. Explica sem a nossa posição no além, nossas relações com os humanos, nossas predileções, mas ensina como devemos desvencilhar-nos dos empecilhos que tolhem a nossa marcha para o infinito. O organizador da doutrina afirmou que o Espiritismo não é religião. Os corifeus modernos querem por força encaixá-la na religiosidade, resultando disso a formação das macumbas, onde se vê um misto, um “imbroglio” de Catolicismo e de Espiritismo, um bruxedo afinal, uma feitiçaria que se torna perigosa às almas fracas. De um dia para outro formam-se Centros Espíritas sem o necessário conhecimento do mundo oculto, o que é perigoso. O Espiritismo deve adotar o mesmo critério adotado pela medicina e pela farmácia, que não admitem pessoas que não possuam os conhecimentos necessários para as manejarem. Quanta coisa há por ai com o rótulo de Espiritismo e que não passa de baixa feitiçaria inconsciente. Quantos males têm produzido semelhantes Centros. É preciso, pois, que se acautelem os incautos e que primeiramente se instruam no perfeito conhecimento das obras de Allan Kardec, afim de que possam ingressar na sublime doutrina. Nada de obras de Roustaing, nem de outros incompreensíveis, baseadas nas falsas informações dos capciosos evangelhos, organizados pela igreja romana. (Texto de Hélio Baptista – Diário Carioca – Sábado, 06 de Maio de 1933 – página 02) Após estas e outras reportagens que não tivemos acesso, denegrindo os Caboclo, Pretos-Velhos e a Umbanda, deflagrou uma série de outras, onde alguns irmãos trabalhadores e simpatizantes umbandistas, deixaram suas impressões (“NA CASA DE MEU PAI HÁ MUITAS MORADAS”, A VOZ DE UM ESPÍRITO, “HUMILHA-SE, SERÁ EXALTADO; EXALTA-SE, SERÁ HUMILHADO”, e, LUTA INTERNA NO ESPIRITISMO): “NA CASA DE MEU PAI HÁ MUITAS MORADAS” Pobre de nós mortais que, longe de nos abrigarmos nas leis santas do Nosso Divino Mestre que nos ensina a amar o próximo, procuramos em discussões inúteis acirrar os ânimos, resultando disso não a união e sim a desunião daqueles que se julgam sob os efeitos e sob a compreensão das vidas futuras e passadas. Não existe no Espiritismo linhas demarcadoras. O Espiritismo, na sua essência pura não admite competições. Assim nos ensina Jesus, dizendo: “Todos são filhos de Deus, e para Deus tem que voltar um dia”. “Na casa de meu Pai, há muitas moradas”. Para o crente nas verdades espíritas, a principal morada que se deve procurar é aquela onde se abriga o sentimento da Caridade espontânea e desinteressada. E aquela é que a nossa alma se confraterniza num consolo com os humildes e com os desgraçados. É aquela que reprimindo o egoísmo e as susceptibilidades mundanas, esquecemos as ofensas e perdoamos sinceramente os ofensores. É o anseio constante de nos aperfeiçoar, corrigindo os nossos erros, sentindo as nossas faltas e evitando molestar o nosso próximo. Deixemos, pois, as práticas. Esqueçamos a vaidade da nossa intelectualidade trabalhada pelos estudos e pelo desejo de nos exibir. Abandonemos toda a veleidade de sermos os mais esclarecidos na doutrina. Releguemos para os orgulhosos os preconceitos de cor e de casta, e num requinte de amor ao Nosso Pai Supremo, devemos lembrar que o lema de Revelação é somente: Fé, Humildade e Caridade, ou por outra: “Sem a Caridade não pode haver salvação”. Tenhamos, pois, fé em Deus Onipotente, humildade perante nossos irmãos, e Caridade na acepção da palavra, e em toda a sua complexidade. E que Deus me perdoe, sempre. (Texto de Peregrino – Diário Carioca – Sábado, 21 de Janeiro de 1933 – página 10)

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A VOZ DE UM ESPÍRITO Chegam ao espaço os ecos das vossas tristes divergências. Alguns de vós, meus irmãos, achaís que deveis vir a público acusar Espíritos. Alguns de vós, meus irmãos, achais que deveis sair de vossas casas onde realizais as vossas Sessões, para lançar o descrédito sobre Espíritos. Não simpatizeis meus irmãos, com os Espíritos que se apresentam como Caboclos ou como Pretos, e por conta da vossa antipatia os indicais ao desprezo dos que não pertencem a vossa doutrina. Considerai, meus irmãos, que assim como vós não sois senhores de vossa atividade, não fazeis livremente o que pretendei, e sois obrigados a ir a determinados lugares ou fazer certas coisas, por força de vossas funções no mundo material, os Espíritos também não fazem o que lhes apraz. Pensai, caríssimos irmãos, que os Espíritos também possuem sensibilidade e que bastaria a vossa aversão, para que esses Pretos e Caboclos perdessem o desejo de baixar ao plano em que os injuriais. E se a esse plano descem, é porque Deus assim o quer. Antes de voltardes a público, a atacar entidades do espaço, fazei um confronto entre a vossa conduta e a deles. Tivestes conhecimento de que em algum Centro, algum Espírito de Preto, algum Espírito de Caboclo tivesse respondido às agressões com que os invectivais? Tratai de verificar, meus irmãos, se algum Espírito de Preto ou de Caboclo fez algum benefício, embora insignificante, a alguém, e depois verificai se os ataques que lhes fazeis causaram algum bem a qualquer criatura. O mais triste, meus irmãos, é que andais agredindo a Espíritos, para desacreditar a irmãos vossos do mundo material. Andais perturbados pelo ódio, e o ódio não deve existir no coração de quem profere o nome de Deus. Vi, há dois ou três dias, uma instituição espírita anunciar aulas por sessões práticas destinadas a esclarecer o público sobre processos que muitos indivíduos praticam para proveito próprio. Que tristeza, meus irmãos! Sois espíritas, sois membros de uma instituição espírita e para ferirdes um só homem lançais o descrédito sobre inúmeros trabalhadores, que se no vosso conceito estão em erro, também, no vosso conceito, são honestos, são honrados, são crentes. Se os que aquele anuncio lançaram e que, como membros de uma instituição espírita, pretendem aceitar o espiritismo, assim se deixam arrastar pelos ressentimentos pessoais, é natural que nós, os espíritas, lhes perguntemos, em prato: - para onde levais o vosso rebanho? Há duas instituições espíritas no Brasil, duas grandes instituições – a Federação e a Liga. A Federação Espírita Brasileira, colocando-se sob o critério mais elevado, reconheceu a legitimidade das manifestações de Caboclos e Pretos, pois a descida deles a Terra não depende da vontade dos homens, A Liga Espírita resolveu, ao contrário, condenar essas manifestações e desmoralizam esses Espíritos. As palavras da Liga Espírita são públicas. Permitam os irmãos que me pediram para ser dada a público esta comunicação, que eu assim termine: Meus irmãos da Liga Espírita do Brasil; não usurpeis a Deus o direito e a faculdade de julgar os Espíritos, e não pretendais governar o espaço, pois não governais o mundo material em que viveis. (Texto de: “Um Médium” – Diário de Notícias – Sexta-feira, 03 de Fevereiro de 1933 – 2ª seção – página 06) “HUMILHA-SE, SERÁ EXALTADO; EXALTA-SE, SERÁ HUMILHADO” Quão contristador é para nós que somos crentes nas verdades do Espiritismo, vermos a porfia de confrades, uns procurando com boa fé e com superior humildade esclarecer um pouco as causas e os fenômenos espíritas; outros intransigentes, cheios de orgulho, a fulminar, no alto de sua sabedoria, num quase, tudo aquilo que acham que não vem da codificação de Kardec. Ainda ontem, “Vanguarda” trazia um artigo de um astro do espiritismo carioca que, irritado, pedia aos seus confrades que não lhe importunassem com perguntas sobre Espíritos de Caboclos e Africanos. Tem razão no seu modo de ver o ilustre propagandista do Espiritismo.

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Como em muitos Centros Espíritas que existem nesta capital, o infeliz que não possuir uma indumentária mais cuidada, não pode ouvir as palavras dos pregadores, dos inspirados, dos cultos, porque estes Centros não recebem os maltrapilhos, embora eles sejam os mais carecedores da palavra de conforto e de instrução da doutrina. É muito justo que os Espíritos de selvagens e dos africanos também não possam afluir a essas sessões, porque a sua inferioridade (no parecer dos estudiosos), irá deslustrar o cenáculo dos sábios e dos luminosos, embora a essas qualidades sejam elevados pela vaidade e pela imaginação de vários diretores e líderes da doutrina de Kardec. Doutrina de amor, de igualdade, de justiça, que condena o orgulho, a vaidade, essa doutrina devia ser interpretada com a tolerância e a benevolência, provando assim que o espírita amando a Deus, ama o próximo, o seu irmão. No espaço não existe castas, e na própria codificação de Kardec os estudiosos encontram a razão de ser de todas as entidades que os orgulhosos combatem porque se julgam diminuídos em travar relações com um Espírito que quando encarnado teve na sua matéria a cor de azeviche ou bronzeada. Volvemos à razão e como nos ensinou Jesus, separemos o joio do trigo, e de coração aberto, estendamos a mão a todos numa confraternização de amor e de compreensão da grandeza, sem ostentação da doutrina espírita. Lembre-se bem da passagem do Evangelho: “Humilha-se, será exaltado; exalta-se, será humilhado”. (Texto de Peregrino – Diário Carioca, 23 de Fevereiro de 1933 – página 11) LUTA INTERNA NO ESPIRITISMO Os kardecistas e os umbandistas com razão combatem os quimbandeiros; e por seu turno os umbandistas, injustamente, são combatidos pelos kardecistas. Que sejam combatidos os médiuns quimbandeiros, é razoável, porque eles representam um mal à sociedade; porém, combater os médiuns que se dedicam a magia branca, é um erro dos confrades kardecistas. Qual a razão dos kardecistas criticarem a magia branca e seus adeptos? Eu mesmo respondo: julgam os kardecistas que os umbandistas elaboram em erro, aceitando Espíritos de Caboclos e Africanos, etc., como Guias e Protetores e alegam que esses Espíritos são inferiores ou atrasados e por esse motivo não estão na altura de serem Guias de Centros ou Tendas, nem tampouco protetores de médiuns. Porém afirmo com absoluta segurança, que eles estão enganados, e provo, argumentando com a lógica. Pergunto; qual a condição necessária para um Espírito ser considerado um Guia ou Protetor? Todos responderão: ter luz. Pergunto; qual a condição para um Espírito ter luz? Todos responderão: ser virtuosos. Pergunto, ainda; ter virtudes é privilégio de alguma raça? Se é privilégio, estaremos então diante do absurdo de termos de aceitar Deus como injusto; porém, como Deus é justíssimo, não poderá, portanto, haver raças privilegiadas; logo, os Caboclos, os Africanos e outros, poderão ser Guias, porque podem também, com os da raça branca, ter evoluído moralmente, através de sofrimentos e assim tornarem-se virtuosos. Assim sendo, podem, por afinidades, se agruparem em falanges para praticar a Caridade em volta deste Planeta. (Texto de: Lourenço Braga – Diário da Noite, 01 de Setembro de 1939 – página 05) Vamos, a partir de agora, disponibilizar todos os textos que encontramos do Aprendiz, que magistralmente expõe a candura, a singeleza e a compassividade dos trabalhadores espirituais da Umbanda. Em algumas reportagens, o Aprendiz cita o termo “ignorância ou ignorante” definindo alguns Espíritos trabalhadores da Umbanda, não em termos pejorativos como muitos podem entender, mas tão somente para definir um estado de quem ignora ou desconhece alguma coisa, não tendo o conhecimento de um objeto determinado. PRÁTICAS ESPÍRITAS – COMENTÁRIOS DE UM APRENDIZ Há inúmeras criaturas que por estranharem a diversidade de métodos usados nas práticas espíritas, nalguns desses métodos encontram apenas motivos para fazer classificações desairosas, humilhantes, ridículas, e o que é mais lastimável ainda, vejam razões para fazer acusações precipitadas, qualificando os praticantes de cujos métodos discordam desonestos e exploradores da credulidade pública.

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Esta forma de ajuizar só pode ser oriunda de um ponto de vista nascido de uma falta de critério, de tolerância, e de uma intransigência, contrárias aos mais sagrados princípios espíritas, impróprios portanto de todos os que se intitulam crentes e adeptos de suas doutrinas. Um ponderado raciocínio levaria por força esses juízes precipitados a conclusões mais razoáveis e menos injustas, mais lógicas e menos falhas, não tendo por base as simples aparências despidas da análise dos atos e das intenções que os animam. Se aqueles que se consideram possuidores de um grau de cultura que reputam assas elevado, estão ainda tão longe de poder compreender idealizando o Supremo Arquiteto do Universo, O Criador da Natureza, não podem certamente exigir que os menos cultos possuam uma mais perfeita compreensão d´Essa Entidade Divina, compreensão essa que ultrapassaria a todos os limites da inteligência humana. Se no exercício de um culto religioso, criaturas há que revestem suas práticas de formalidades ou rituais em perfeita harmonia com a sinceridade de suas convicções, ou não sei onde possam ser encontradas razões para que se vejam nessas práticas um crime, e nos praticantes uns criminosos, se as finalidades são as mais nobres e dignas. Se os silvícolas no seu grau de incultura rendendo sincera homenagem a seus deuses, os de suas crenças religiosas procuram simbolizá-los em qualquer coisa material; se agindo dessa forma, estão convictos de dar sincera expansão a seus sentimentos religiosos, para nós que possuímos um grau de cultura mais elevado, estarão em erro, necessitando de luzes, mas não se tornam pelas suas sinceras convicções, merecedores de humilhações e atos de perseguição, que colocam por certo em plano muito mais inferior os seus inadvertidos autores. O ritual usado nas práticas de culto religioso não afeta absolutamente a sinceridade de seus autores, e por mais extravagantes que pareça ser, ou seja, não implica na falta de sinceridade, a ninguém podendo ser dada razão para por tais motivos a sujeitar ao ridículo, ao repúdio geral. Nada de precipitações; convenhamos que as aparências nem sempre são o reflexo das intenções que tanto podem ser sinceras ou deixar de o ser, por mais belas ou mais desagradáveis que se mostrem; e as finalidades desonestas, podem ser disfarçadas por todas as formas feias ou bonitas. Raciocinemos... se Deus em Sua Alta Sabedoria permite por julgar do certo necessário que sobre a Terra habitem ainda irmãos nossos de condição primitiva, nada mais lógico que usem hábitos e linguagem que lhes é peculiar; e se na Terra entre nós, isso se constata, pelas mesmas razões se deve constatar a existência espiritual em idênticas condições, hábitos costumes e linguagens. Dentro dessa racional conclusão, se necessário se torna o contato com esses nossos irmãos, tanto na Terra como no espaço; se preciso se tornar o fazer-mos compreendidos por eles, se queremos captar as suas simpatias e o seu concurso para que colaborem em finalidades que nos interessa, é claro que teremos que nos adaptarmos a eles, aos seus hábitos e costumes, até que pela ordem natural de todas as coisas eles tenham conseguido se adaptar aos nossos, não nos cabendo direito nem capacidade para impor outras normas e diretrizes contrárias a essa ordem natural. Não ignoramos que pelas leis da evolução, esses nossos irmãos terão que percorrer a escala do progresso chegando um dia ao grau em que nos encontramos; não seremos decerto nós quem teremos de retroceder até onde eles se acham; mas certo é que, enquanto nos separar essa distância verificada nessa escala do progresso humano, a desigualdade de condições, de hábitos e de costumes, há de fazer-nos sentir e notar. Nem a distância nem a desigualdade, porém, constituem empecilhos ao fato de, em troca das luzes que podemos levar a esses nossos irmãos, nos emprestem eles os seus melhores esforços e boa vontade, para bom êxito do nosso desideratum, ou seja, o exercício da prática da Caridade; e para finalidade tão nobre nós tenhamos de nos solidarizarmos com seus hábitos, seus costumes e sua linguagem, os quais são de seu agrado e conveniência, e que para muitos pode parecer um ritual que adotamos. Se os mesmos tolerantes acham que deve predominar a preocupação de proporcional aos assistentes um espetáculo agradável, sem dúvida que propicias não são as práticas de Caridade, menos ainda, quando os elementos ativos, são irmãos nossos muito dignos, porém de origem primitiva, sejam africanos, Caboclos ou de outras raças, como ex-habitantes de regiões selvagens, os quais pela sua condição social têm que usar hábitos e costumes que estão em perfeita harmonia com sua condição. Necessário e útil deve ser sem dúvida, que os que se dedicam com sinceridade a essas práticas de Caridade com esses elementos, também a verdadeira compreensão das mesmas e sua razão de ser, podendo explicá-las aos assistentes para que deles seja afastada toda a idéia supersticiosa que possa trazer como conseqüência a obsessão e o fanatismo por tais práticas, que nada têm de sobrenatural ou hipotética.

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É preciso que fique patenteado que por mais extravagantes que pareçam os métodos dessas práticas ou outras, não podem elas absolutamente modificar ou contrariar as leis naturais; a sua ação é proporcional e limitada dentro do merecimento e da permissão Divina. Se os métodos usos ou costumes diferem ou destoam de nosso meio civilizado, não diferem na ação que está em relação com o merecimento e as intenções. Se nas práticas de Caridade especialmente, presidir a preocupação de vaidades exibicionistas, elas serão fatalmente prejudicadas nas suas finalidades, e cedo ou tarde sentirão as conseqüências os que alimentarem essa vaidade. A tendência pela ordem natural do progresso é para futura abolição de rituais e símbolos, que acabarão por se tornarem desnecessários; mas até lá há que tolerá-los admitindo-os e compreender-se a sua razão de ser, diante das finalidades. Embora não seja eu um fervoroso adepto praticante ou mesmo assistente constante a essas práticas nesse meio, só motivos posso encontrar nos praticantes sinceros, para louvores pela sua abnegação, pelo seu desprendimento pessoal, pela honestidade de suas intenções, pela sinceridade de sua fé, suportando com todo o heroísmo e galhardia as conseqüências resultantes de sua nobre e elevada missão, num meio onde imperando elementos incultos mais vasto é o campo do sofrimento e da dor, demandando a anulação de seus efeitos, um esforço considerável, sujeito a conseqüências inevitáveis. Se é verdade que a missão desses abnegados obreiros consiste em proporcionar a educação moral aos nossos irmãos que dela mais necessitam, se essa missão consiste em encaminhá-los para a estrada do Bem, se consiste em proporcionar-lhes o alívio aos seus sofrimentos, se consiste em nos precaver contra as suas más influências conscientes ou não, se crime existe é decerto no ato de persegui-los, repudiá-los humilhá-los sob o fútil pretexto de que seja baixo espiritismo, falso espiritismo ou idêntica classificação, esquecendo o quanto tem de nobre e digna tal missão. Inúmeros são sem dúvida os exploradores, os perversos e malvados que exploram os sentimentos e a dor, alheios, mas é prudente que se aprenda a distingui-los, vendo-os onde eles se encontram e não onde não podem nem devem estar. Concordemos em que, existe sim essa infame espécie de criaturas para as quais os interesses próprios estão acima de tudo, mas daí, não se queira concluir que estejam apenas onde a ignorância não é refratária a bondade, onde a humildade não é antídoto da Caridade, onde a pobreza dos meios não é empecilho da riqueza de dotes de nobreza, e as condenações resultem da vaidade dos juízes. As finalidades deveriam ser para a consciência dos apressados em julgar suficiente justificativa para que os meios se tolerem e expliquem, e estes não podem deixar de estar em harmonia com a ação precisa, com as circunstâncias do meio e do momento, com as intenções e muito outros fatores que se não são de todos conhecidos, nem por isso deixam de existir. As finalidades deveriam ser para a consciência dos apressados em julgar, suficiente justificativa para que os meios se tolerem e expliquem, e estes não podem deixar de estar em harmonia com a ação precisa, com as circunstâncias do meio e do momento, com as intenções e muito outros fatores que se não são de todo conhecidos, nem por isso deixam de existir. O argumento de que muitos se servem para condenar as manifestações desses nossos irmãos, na sua condição de atraso, emprestando aos Espíritos a faculdade de se manifestarem em linguagem coerente e hábitos civilizados, não pode prevalecer diante das leis que limitam a sua ação proporcional a condição e suponho que é querer avançar em demasia, pretendendo violar essas leia, ou colocá-las ao sabor de quem quer que seja. Que avance quem quiser sentir os passos embargados; eu me contentarei em obedecer e não determinar, embora meu desejo fosse de dar passadas de légua e meia para chegar à perfeição que todos devem ambicionar e para onde todos se encaminham, e nessa estrada distinguindo uns em nossa dianteira, outros ainda na retaguarda. Se nós não podemos ou queremos auxiliar mutuamente como seria o nosso dever, não semeemos o caminho de empecilhos para dificultá-lo aos que vêm na retaguarda ainda trôpegos, e com a vista curta na penumbra. Que ninguém se esqueça de que na humildade tem sido e serão eternamente colhidos os mais sublimes exemplos de moral e puros sentimentos, cujo maior e mais digno símbolo se acha personificado em Jesus Cristo.

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Que a Caridade se exerça por todas as formas ou métodos; que as palavras de conforto, de coragem, de fé e de amor fraterno, sejam apregoadas em qualquer idioma repelida a preocupação de diversidade; este deve ser o lema de todos aqueles que se dizem ou consideram sinceros e verdadeiros cristãos. Que Deus na Sua Infinita Bondade e Misericórdia se apiede da humanidade ainda tão cheia de vaidades e orgulho, tão impregnada de egoísmo, afastando para bem longe das criaturas as trevas que as envolvem. Que a paz de Deus fique convosco. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 5 de Julho de 1932 – página 06) PRÁTICAS ESPÍRITAS Prosseguindo nas considerações que deram motivo à publicação feita sob o título acima, cujo artigo infelizmente estava bastante truncado, não tanto que não pudessem ser compreendidas as intenções, seja-me permitido voltar ainda a tratar do assunto, que a meu ver carece de toda a atenção por parte dos Espíritas. Quando me refiro a práticas Espíritas não entram em minhas cogitações, as que são exercidas por profissionais ou exploradores, e sim as praticadas por todos aqueles que se sentem animados das nobres intenções da Caridade. A ignorância nunca foi nem poderá ser empecilho – a prática da Caridade. Se a prática da Caridade é condição essencial ao progresso espiritual, não se podem nem se deve absolutamente impedir essa prática aos que desse progresso mais necessitam, e que são sem dúvida os que se encontram em nível inferior, condição de atraso primitiva, e o número desses irmãos é incalculável pelo seu elevado número, tanto na Terra como no espaço. A nenhum de nós encarnados me parece seja dado o direito de criar empecilhos, levantar obstáculos, ridicularizar ou repudiar esses nossos irmãos, pelo fato de praticarem a Caridade, por processos que se harmonizam com a sua condição de atraso, com o seu grau de desenvolvimento espiritual, muito embora em desarmonia com o nosso grau de civilização. Em que princípio se poderão firmar os Espíritas para negar aos criminosos o direito de regeneração, resgatando os seus crimes, com o exercício da prática de atos dignos e meritórios? A regeneração efetuada pelo resgate consiste em atos de Caridade, ou em demonstrações de cultura? Sejamos mais ponderados em nossos raciocínios e julgamentos mais tolerantes e menos vaidosos, menos orgulhosos de um saber que desaparece diante da Sabedoria Divina. Os indígenas, habitantes ainda do nosso Planeta, usam como sabemos, hábitos, costumes e linguagem inteiramente diversos dos nossos, sem que isso constitua razão para considerá-los indignos de confabularem conosco em seu ou nosso benefício na satisfação de interesses mútuos e de toda a humanidade. Ninguém se atreverá decerto, a acusar esses abnegados missionários que, embrenhando-se pelas matas virgens, levam a essas tribos de silvícolas a palavra da fé Cristã, as luzes da civilização que desconhecem. Quem poderá divisar nessas confabulações de finalidade tão nobre, ato digno de censura ou repúdio? Respondeu-me um prezado irmão de crença as minhas considerações, que não devemos retroceder, solidarizando-nos com esses nossos irmãos, mas ao contrário, cabe-nos fazê-los avançar até nós. Parece-me haver em tal observação, uma leve dose de vaidade, que deve ser inteiramente repelida, porque nos falha capacidade autorizada para impor tal avanço, o qual se fará como determinarem as Leis Divinas, e não como muito erradamente cremos entender deve ser. Há, sem dúvida, erro de apreciação, porque não se retrocede absolutamente, pelo fato de confabular com esses irmãos, sejam eles Caboclos ou Negros, tanto mais quando as finalidades são nobres e dignas. Descer a uma posição de humilde não diminui ninguém; antes, eleva, e não se chama a isso retroceder, pois nada se perderá pelo que merecidamente se houver adquirido. O malvado ou o benfeitor não perde a sua qualidade, seja qual for a origem ou nacionalidade, e clamorosa injustiça é por certo emprestar a esses pobres silvícolas, pela sua condição social, privilégio de incapacidade moral.

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Se da confabulação, do contato provocado ou não resultarem benefícios mútuos, não sei como se possam negar esses benefícios, alegando como irrisório pretexto serem conseguidos com práticas de “baixo espiritismo”. Ídolos, símbolos, dogmas e rituais, só servem certamente para os que deles sinceramente julgam necessitar ainda, e essa sinceridade não pode ser posta em dúvida, quando nenhuma razão existe para isso, senão quando se cerram os olhos – para não ver as finalidades, e se arregalar para ver os meios. Já disse e repito, sou o mais insuspeito para emitir estas considerações, por não ser freqüentador ou praticante dos métodos a que me refiro. Faço, entretanto, a justiça, não de vir defendê-los porque não necessitam da minha defesa, mas de explicá-los como melhor me parece; se acertar dou-me por satisfeito de ter concorrido para desfazer dúvidas e divergências existentes; se errar, dou-me ainda por muito satisfeito, certo de que serei corrigido por quem possuir melhores luzes, permanecendo na minha muito humilde condição de aprendiz. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 09 de Julho de 1932 – página 07) PRÁTICAS ESPÍRITAS Raciocinemos... Existem no espaço, inúmeros irmãos desencanados em estágio, digamos, conservando ainda sua primitiva condição de atraso espiritual, sejam, Caboclos, Negros, etc., e sobre isso não creio haver menor dúvida. Para conduzir esses irmãos encaminhando-os na senda do progresso espiritual, há irmãos de luz, investidos da personalidade de chefes de tribos, e no fiel cumprimento de sua sublime missão, como tal se nos apresentam. Não vemos absolutamente razões para que esses irmãos se sintam na obrigação de trair sua missão, revelando sua verdadeira identidade, por simples satisfação dos caprichos de quem quer que seja, que se julgue com o direito de duvidar dessa sua personalidade. Ponho de parte as mistificações prováveis e admissíveis em determinados casos, cuja explicação o momento não comporta pela sua extensão. Muito maior e mais elevada é sem dúvida a responsabilidade desses irmãos no cumprimento de sua missão perante os habitantes do espaço, que perante nós encarnados, para que desçam a satisfazer nossa curiosidade e dúvidas injustificadas quando nos negamos a ver suas finalidades, para somente condenar e reprovar os meios de que se utilizam para satisfação de seus nobres desígnios. A personalidade de que se encontram investidos esses obreiros da Caridade, está suficientemente explicada pelo meio em que é exercida sua missão, sendo obedecidos e respeitados, reconhecidos como chefes, numa personalidade que poderá ter sido real em anteriores encarnações. A sua ação se exerce onde o meio lhes é propício e simpático, despreocupados por completo do juízo que sobre eles queiram fazer os ignorantes, certos de que esse juízo em nada afetará a sublimidade da missão que lhes foi determinada, por quem está em plano muito além das mesquinharias humanas. Entre os elementos que os rodeiam, que lhes prestam auxílio no exercício da Caridade, há os que têm plena consciência do seu estado, e os que ainda a não possuem; mas tanto uns como outros, têm a convicção da autoridade exercida pelos referidos chefes, obedecendo-lhes cegamente na repressão do mal, ou seja, encaminhando-os por bem ou a força, a abandonar suas vítimas sobre as quais atuam (atuação fluídica), isso quando essa atuação não constitua em merecido castigo ao que chamamos provação. Convenhamos, que o bem e o mal existem, sendo sua ação exercida e permitida por Deus, na razão direta do merecimento de cada um. Arrebatando no espaço ovelhas desgarradas, perniciosas pela sua grande ignorância e maldade, não só são encaminhadas para o aprisco, como ainda nos acautelam a sementeira para que ao seja devorada, anulando todos os nossos esforços. Lastimável é sem dúvida que esses humildes pastores da Santa Seara de Jesus, se vejam alvo pela sua condição humilde, do repúdio por parte de irmãos nossos inadvertidos e apressados no julgá-los e acusá-los. Haverá porventura ainda quem ignore que alva pode ser a alma de um Negro, como negra a de um branco? Cor não significa qualidade, nem ignorância e humildade significam maldade.

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Aprendamos a divisar o bem e o mal onde eles estiverem, mais meticulosos nas nossas observações, para não fazermos juízos precipitados e errôneos. Os métodos emprestados, como uso de ingredientes, utensílios, ídolos, símbolos, cânticos, pontos e outras coisas mais, que tanto horror causam a muitos, que tanta estranheza e repugnância lhes ocasionam, estão em harmonia com os elementos que deles se servem, pela sua condição de atraso, convictos porém, da necessidade de seu uso, em razão de seu próprio conhecimento, sem que daí nos possa advir prejuízo algum. Não poderá, de certo, alguém transportar da mata virgem um silvícola, exigindo-lhe que se apresente numa capital civilizada com nossos hábitos e linguagem que desconhece inteiramente, entretanto, a despeito de desconhecer esses nossos hábitos e civilização, nada o impede de alimentar nobres sentimentos, e ser capaz de praticar dignos atos. Classificar-se como Magia Negra, a prática espírita que pelos seus métodos destoem de nosso meio civilizado, é erro de apreciação grave porque a meu ver, só se pode entender por Magia Negra a pratica exclusiva do mal, e Branca quando seja para o bem, sejam quais forem os processos empregados. A prática do mal pode perfeitamente ser exercida, sem que se desviem os praticantes do mais intransigente Kardecismo digamos para distinguir as práticas. Os meios não traduzem os fins, mas os fins justificam os meios, assim como nem tudo que é belo é bom, nem tudo que é feio é mal. Prosseguirei em minhas considerações, se isso me é ou for permitido sem que afasta de minhas simples condição de aprendiz. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 12 de Julho de 1932 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS O muito digno, prezado e ilustre confrade, Dr. João Torres, dd. Presidente da Liga Espírita do Brasil, pelas colunas do jornal “A Vanguarda”, de 11 do corrente, concedeu-me a subida honra de contestar minhas considerações sobre as práticas espíritas, traduzidas em artigo publicado no DIÁRIO CARIOCA. Com o devido respeito que merece o prezado confrade, reconhecendo-lhe a autoridade na matéria, eu peço-lhe que me perdoe se tenho de vir novamente a público, discordando de suas contestações, refutá-las, pelos motivos que exponho. Sou um fervoroso admirador de Kardec, muito longe de pretender na minha insignificante qualidade de aprendiz, abalar os alicerces fundamentais e superiores das suas doutrinas, se é verdade essas doutrinas nos não autorizam a práticas empíricas, também nos não desautorizam a tolerá-las. Eu não tive a pretensão de justificar métodos, mas sim, explicá-los, mostrando a sem razão daqueles que acreditam seus autores, dignos das perseguições policiais, quando os move exclusivamente a ação da Caridade, sem proveitos pessoais. Não podia aconselhar ninguém a subordinar-se à ignorância de Espíritos encarnados ou desencarnados, mas sim, às suas boas intenções caritativas, deixando de considerar essa ignorância que não desconheço nem neguei, mas que coloco em plano secundário, a qual poderá ocasionar erros, sem prejudicar absolutamente às finalidades nobres e dignas. O exemplo do paralelo não me parece ter cabimento no caso, pois se é verdade que existe submissão como se pensa, repito, é simplesmente as finalidades, constatadas a nobreza e a dignidade dos fins, sem que me preocupassem a diversidade dos métodos, não rendendo culto senão à sublimidade da missão. Considero digno de perdão e tolerância, o ignorante animado por intuitos nobres, e esta é a situação daqueles que no exercício da Caridade, se não podem divisar neles, interesses pessoais ou materiais, embora haja quem os acredite dignos de repúdio e o que é mais triste ainda, confrades que os apontam à perseguição das autoridades policiais. Os mestres não se devem realmente subordinar aos discípulos senão quando reconheçam neles cultura inferior, mas qualidades morais superiores, sendo necessário que se não confunda, cultura com moral. Por mim confesso, que prefiro viver entre incultos com moral, do que com intelectuais sem ela.

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Não tivesse o progresso intelectual maior desenvolvimento que o moral, e a humanidade não seria vítima de tantos sofrimentos e desgraças, como conseqüência desse desequilíbrio. Nós não ignoramos, de certo, que a intransigência de grande número de nossos confrades vai ao ponto de não consentir nas manifestações de Espíritos de Caboclos e Africanos, considerando essas personalidades como sinônimos de indignidade ou perversidade. Louvores merece, de certo, a Liga Espírita do Brasil, pela acolhida que em suas reuniões encontram esses nossos humildes irmãos, sendo muito provável, que quando encaminhados sejam para as suas reuniões, já o sejam em estado de se converterem – por simples conselhos, e não em tal estado de atraso, que os impeça de poderem receber as luzes que os ofuscariam, na densidade das trevas que os envolvem ainda. A mim não me preocupam os meios, repito, cuja explicação está com disse, no grau de atraso dos elementos que emprestam seu concurso à ação da Caridade, progredindo por essa forma o que é sem dúvida, a mais digna. A convivência passiva eu nunca a considerarei desonrosa – quando tiver como coniventes irmãos nossos, cuja infelicidade consista em sua ignorância de nossos hábitos civilizados, porém passivos na prática da Caridade. O fato, porém é que se a ação for Caritativa, se não existir a mais leve intenção de exploração, eu gostaria que me dissessem onde poderá ser encontrada razão justa para aconselhar a repressão policial. Será que dentro da Caridade a salvação esteja entre as grades das prisões? Apesar de, como já declarei, não ser um praticante ou freqüentador constante das referidas práticas em questão, eu serei conduzido com toda a resignação para a prisão, pela mão de meus humildes confrades, solidário inteiramente com as finalidades nobres e dignas dos que exercem a ação da Caridade. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 13 de Julho de 1932 – página 06) PRÁTICAS ESPÍRITAS Respondendo ainda ao muito ilustre e prezado confrade Dr. João Torres, seja permitido esclarecer melhor minhas considerações para que possam ser compreendidas, bem como o meu ponto de vista. Quando digo que não sou praticante ou mesmo um freqüentador assíduo das práticas a que me refiro, quero apenas demonstrar a minha insuspeição para assumir a atitude que tenho mantido, na intenção exclusiva de desfazer as divergências que separam os verdadeiros e sinceros praticantes Espíritas, havendo, porém, irmãos confrades que discordem das minhas intenções; tenho apenas a lastimar não me secundem. Quem como eu, com o meu espírito de observador, teve oportunidade de encontrar em vários Centros Espíritas onde as práticas são as citadas, muita sinceridade, muito sacrifício pessoal, exclusiva intenção e ação caritativa, tendo sempre a presidi-la a palavra de Deus, evocada a todos os momentos, sua proteção mesmo pelas entidades de aparência ou realidade inculta e silvícola, notando entre os assistentes e praticantes materiais criaturas de todos os variados graus de cultura, de posições sociais definidas, inclusive bacharéis em letras. Constatando ainda mais, que a Caridade nos casos em que por Deus foi permitida, era uma realidade fartamente testemunhada, e não uma farsa, diante um tal resultado de minhas observações não poderia nunca em consciência, acusar esses dignos obreiros de impostores, farsantes ou exploradores, capazes pela sua ação de desmerecerem da consideração e respeito de todos os seus confrades. Não poderia eu também permitir que sejam eles vítimas de acusações injustas, ou conservar-me indiferente ante essas acusações, com declarada intenção de os atirar ao desprezo, ao repúdio, ou ao ridículo geral. Faltariam aos mais sagrados princípios Cristãos, se me solidariza-se com os que demonstram uma intolerância e uma intransigência, que Kardec não aconselhou em suas doutrinas. O que eu fiz, todas as criaturas de bom senso farão decerto, foi procurar a explicação mais racional, para a razão de ser dessas práticas, partindo do princípio que, “nada existe no Universo, que não tenha razão de existir”.

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Se eu fosse transportado para um país inteiramente desconhecido por mim, onde os hábitos, o idioma e os costumes fossem completamente diversos dos meus, necessitando eu de me fazer compreendido e atendido, não querendo cair no desagrado de seus habitantes, por mais ridículos que fossem ou parecessem ser esses hábitos e costumes, era em dúvida a mim que me cabia adaptar-me a eles e não eles adaptarem-se aos meus, isso pelos, até que lhes fosse possível e permitido compreenderem, que os meus estavam mais em harmonia com o progresso da humanidade, com os dos povos mais civilizados. Mais ainda se explicará essa forma de proceder e de agir, se o interesse fosse todo meu em captar as simpatias desses habitantes para finalidades que o meu grau de progresso reputa como nobres porque são Cristãs, e que se traduzem na ação de encaminhá-los para o progresso moral especialmente, evitando suas más influências naturais de seu atraso, das quais são vitimas nossos irmãos, entre eles talvez acusadores. O ridículo dos hábitos, costumes e idiomas, se assim os querem ver, não parece possam ser obstáculo às finalidades, tanto mais se fora desse meio e dessa ação, não se perde nem a personalidade, nem o grau de progresso adquirido, antes adquirida a certeza de haver cumprido um dever Cristão. Não se crimina decerto senão pelas intenções, por mais belos que sejam os meios, e não procedam aos receios dos que imaginam verem transportados para fora das salas de sessões, os hábitos e costumes peculiares dos silvícolas, sendo a passividade suficientemente explicada dentro da ação do meio espiritual e das finalidades. Os símbolos, os ídolos e o ritual, impressionam apenas os elementos cujo grau de atraso não permite ainda compreender a verdade, não nos cabendo cegá-los com o seu brilho. Fazendo-os progredir moralmente muito mais teremos lucrado nós e eles, do que procurando apenas ou de preferência torná-los mais cultos. Façamos que sejam bons, antes que sejam inteligentes. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 21 de Julho de 1932 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS Prosseguindo nas minhas considerações e intenções, tenho a acrescentar mais alguns comentários, os quais julgo precisos para melhor esclarecimento. Eu não desejo entrar na apreciação de práticas da Magia Negra, cuja ação é exercida por criaturas indignas, demonstrando um grau de perversidade e covardia repugnantes, muito embora sabedor que os métodos se assemelham comumente, por se tratar com entidades ativas do espaço, de condições de atraso idêntico. A diferença que existe, entretanto, é bastante grande, sendo que uns são mal encaminhados por dirigentes piores, outros bem encaminhados por melhores dirigentes. Denominaremos, portanto, os primeiros como praticantes de Magia Negra e os segundo de Magia Branca, não se devendo confundi-los sem que se verifiquem as suas finalidades. Assim, pois, uns cercam-se de maus elementos, utilizando-os para a satisfação de suas maldades e interesses pessoais; outros se rodeiam de elementos desejosos de fazer o bem para o exercerem em nome de um Deus que outro não é senão o nosso. Sendo todos esses elementos da mesma origem, ex-habitantes das mesmas regiões, conhecedores dos processos usados por seus irmãos de raças para a prática do mal, mais fácil lhes é evitá-los ou anulá-los. A ação dos bem intencionados, esses que se contam no número de nossos amigos, consiste no combate a maldade, obrigando os malfeitores a desfazer ou deixar de exercer sua ação maldosa, convertendo-os a trazendo-os para as fileiras dos repressores desse mal. Fazer ou desfazer o mal de que são vítimas as criaturas humanas que habitam entre nós na Terra, é atuar fluidicamente sobre elas, ou livrá-las das cargas de maus fluidos e seus autores. O cerimonial observado, os objetos, ingredientes, símbolos, ídolos, defumadores, etc., são a reprodução dos hábitos desses nossos irmãos os quais pela sua ignorância, se encontram sujeitos a grandes influências supersticiosas, sendo dominados e vencidos em seus baixos instintos, mais pela superstição, do que pela palavra ou pela força bruta.

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A necessidade de ser exercido o domínio sobre eles, para bom êxito das nobres finalidades, explica o fato porque são amedrontados e alimentada a sua superstição. Isto não nos deve causar espanto, pois para demonstrar até onde pode ir o poder da superstição, basta citar que entre nós, a uma hora desta capital, vivem sertanejos, os quais não cochilam em tirar as tripas de um seu semelhante por um simples cálice de cachaça; entretanto, preferem deixar-se matar a ter que se locomover em durante à noite na estadas, apavorados pelas aparições de almas e outras tolices. A vida espiritual de irmãos de tal condição de atraso, em nada se diferencia da vida que tiveram na Terra, se acreditarmos que inúmeros deles desencarnaram a talvez séculos passados, tendo habitado em regiões selvagens onde a civilização jamais penetrou; pode-se calcular qual seja o grau de atraso, predominando decerto neles, mais o instinto que o raciocínio que mal desponta ainda. Em alguns artigos publicados recentemente sobre assuntos espíritas, tenho observado comentários que me parecem com referência indireta à matéria que tenho abordado, notando que só por maldade ou por ignorância, se pretende estabelecer a confusão, demonstrando uma clara intransigência e radicalismo que se teima em negar. Eu não estou absolutamente advogando exploradores de práticas espíritas ou práticas de exploradores; tenho procurado ser o mais claro possível, ressalvando por várias vezes os que agem exclusivamente dentro do terreno da Caridade. Desses é que tenho ocupado, não os desejando ver como se teima em vê-los misturados com os praticantes da Magia Negra, demonstrando essa teimosia, flagrante intransigência e intolerância imprópria de espíritas, contra o que venho protestando. Não me movem absolutamente interesses subalternos; o que não posso, é concordar em que se maldiga a mão que deposita a esmola, ou que se lhe empresta menos valor porque a mão que a dá seja mais ou menos escura, mais ou menos calejada. Prosseguirei se me for permitido. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 24 de Julho de 1932 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS Há, como sabemos, variadas modalidades nas práticas espíritas; essas variedades encontram, porém, sua explicação no grau de desenvolvimento moral e intelectual, dos elementos ativos dessas práticas. Nota do autor: Em várias reportagens observaremos o Aprendiz insistir em dizer que a Linha Branca de Umbanda é uma modalidade de espiritismo, bem como ressaltando sempre, que os Caboclos e Pretos-Velhos são Espírito de grandíssima moral. Vamos analisar tudo isso, num pensamento kardequiano: “(...) Para que possa existir um laço forte que prenda entre si os adeptos do Espiritismo e suas Associações ou Sociedades, numa convivência harmônica, produtiva e tranqüila, faz-se mister que todos lhe percebam o objetivo moral, o compreendam e o apliquem a si mesmos...” Kardec frisou bem a questão do “objetivo moral, o qual, os Caboclos e Pretos-Velhos são diplomados, Kardec ainda nos falou sobre as Associações ou Sociedades do Espiritismo. Não esta ai integrada a Umbanda como modalidade??? O que deve distingui-las, segundo a minha maneira de ver, não são as modalidades, mas sim os fins, e só pelas finalidades se devem as mesmas definir e julgar os seus autores. Para sua classificação, deve imperar uma superioridade e independência de análise, livre de todos os preconceitos sociais, da intolerância e intransigência que só poderão dar margem a julgamentos precipitados, injustos e reprováveis. Se fosse possível admitir que a boa ação, a nobreza dos fins pudessem ser perturbados ou ofuscados pela falta de cultura, nem assim explicaríamos dentro dos ensinamentos espíritas, como achar, que só entra as grades das prisões houvesse lugar para todos aqueles que se arrogam a praticar a Caridade, sem possuir a cultura. Cristo pregou o bem, o Amor e a Caridade, sem reprovar modalidades de seu exercício, e essas virtudes cada qual as pode e deve praticar de acordo com a sua capacidade moral e intelectual.

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A permissão para a invocação de irmãos desencarnados, confabulação, doutrina e encaminhamento, o auxilio mútuo, esse intercâmbio estabelecido entre o mundo material e espiritual, nós a devemos encarar mais como de nosso interesse do que dos desencarnados, sem alimentar a pretensão de acreditar esse intercâmbio, apenas como indispensável ao progresso desses nossos irmãos habitantes do mundo espiritual. Não; esse progresso não ofereceria absolutamente solução de continuidade, pelo fato de lhe faltar a nossa interferência, a qual se explica mais pela necessidade que temos dos exemplos que nos são precisos ao nosso aperfeiçoamento, o que não quer dizer que desse intercâmbio não resulte uma harmonia de interesses. Dividimos as luzes que já possuímos com aqueles que das mesmas carecem, e recebemos as que carecemos dos que, se encontrando em plano superior, estão aparelhados a dividirem conosco as que já possuem; mas é necessário que compreendamos que essas luzes não são exclusivamente representadas pelo desenvolvimento intelectual, mas muito principalmente pela moral, e ambos quando poderem ser ministrados mutuamente. O que distingue, enobrece e enaltece as criaturas perante o Criador, é o seu desenvolvimento moral, a elevação de sentimentos e atos, e não a intelectualidade sem aqueles predicados, e isto é princípio rudimentar cristão. Espiritismo sim, para aqueles que têm a felicidade de possuir um grau de raciocínio suficiente, para compreendê-lo nas suas teorias, na ciência e nos fatos que o comprovam; fetichismo para aqueles que não tendo a ventura de possuir um raciocínio senão imberbe, têm apenas como base da sua ação a simples experiência e os hábitos tradicionais. Deixarão, de certo, de serem fetichistas um dia, quando lhes for permitido deixar de o ser, mas não nos cabe o direito ou a capacidade de revogar leis naturais que determinam que a evolução se faça gradativamente, e não em saltos como querem os visionários. Repito mais uma vez: é minha intenção demonstrar dentro de minha limitada capacidade, a razão de ser de atos e fatos, que uns estranham e outros não querem nem ao menos admitir, firmados dentro de um ponto de vista que acabará por levá-los a protestar contra a existência de irmãos de raças primitivas habitando ainda em nosso Planeta, exigindo a sua transferência para outro. Só por maldade ou ingenuidade se poderá teimar em ver nas minhas atitudes intenções duvidosas; reconheço, desejando o progresso humano tão rapidamente quanto seja possível, mas não posso reconhecer em quem quer que seja motivos para impor ou forçar sua marcha, pretendendo com isso sobrepor-se às leis da Natureza. O que tenho dito é bem claro; não reprovo absolutamente a ação da Caridade por questões de modalidades, não concordando em que se humilhe, se ridicularize, se repudie, se escorrace, se aponte a perseguição das autoridades policiais, irmãos nossos muito dignos, muito honestos, muito desinteressados e bem intencionados, pelo fato de adotarem modalidades que estão em desacordo com a nossa maneira de agir e pensar. Ao invés de ver contestadas estas considerações que me parecem traduzir verdades incontestáveis, vejo torcidas as minhas intenções, confundindo-as para que fique a impressão de que, advogo exploradores e praticantes de Magia Negra, e como o pior cego é aquele que não quer ver, fica a cada um o direito de me julgar como lhe pareça. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 26 de Julho de 1932 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS Prosseguindo nas considerações que têm motivado as mesmas, ou seja, sobre as diferentes modalidades de práticas espíritas, seja-me permitido continuar a tratar do assunto, no sentido de melhor esclarecê-lo. Persistem os críticos e juízes apressados, em emitir opiniões e julgamentos tendo apenas por base meras e simples aparências puramente materiais, negando-se a ver nos fins a justificativa dos meios, não permitindo que os curtos de raciocínio e inteligência, o direito de praticar o bem, como se tal prática pudesse ser privilégio dos inteligentes. Não se quer admitir, considerando-se até impossível, que dentro de um corpo negro ou bronzeado possa aninhar-se uma alma tão alva como a dos mais brancos. Não se quer admitir que um silvícola, seja na aparência ou na realidade, mesmo que se encontre animado dos mais elevados sentimentos, possa ser mais que um mistificador, um embusteiro, e não se quer chamar a isso intransigência e intolerância.

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Por semelhante prisma, todos aqueles que se atreverem a praticar a Caridade, não se encontrando revestidos de hábitos e costumes compatíveis com os da moderna civilização, não tendo uma casaca e chapéu alto, são mistificadores, são exploradores, macumbeiros praticantes da Magia Negra. Se praticam o bem, se espalham a Caridade, mas, não possuem inteligência, cadeia com eles; esta é a mentalidade de alguns confrades, que supondo-se com a razão, negam a ignorância o perdão pelo crime de serem ignorantes. Consideram-se humilhados com a convivência entre silvícolas, mesmo quando seja no exclusivo exercício da mais sublime de todas as misérias, a da Caridade, pelo único fato de se consentir que continuem a usar os únicos hábitos que conhecem, pelos quais se identificam conosco. Que não haja confusões; identificação de hábitos não é identificação de maldade; não é personificação de perversidade, de indignas intenções, quando muito identificam uma condição de atraso pela qual ninguém pode ser considerado merecedor da condenação de quem quer que seja, e muito menos ainda por quem se considera espírita. Há uma linguagem sublime e incomparável, linguagem universal, que não é exclusividade de castas, de raças ou de condições sociais; é a do coração, que se traduz pelos atos dignos e elevados, nunca por simples palavras mais ou menos buriladas, ou pela beleza do porte e dos lábios que as pronunciam. Incomparavelmente bela e sedutora é essa linguagem entre a humildade entre aqueles que tiveram apenas como berço as relvas da mata virgem, por escola a Natureza, desconhecendo ainda os vícios das modernas civilizações que ofuscam, envaidecem, orgulham e cegam. Acusam-se os praticantes sinceros da passividade dada a essas referidas práticas, silenciando-se sobre as finalidades que a explicam sobejamente, esquece-se que, mais fácil é um inteligente passar-se por tolo, que um tolo por inteligente, evidenciando-se por esta razão, que a mistificação tem o seu melhor campo nos meios mais cultos e habilidosos. Os Espíritos que se nos apresentam tal como se encontram, no seu grau de atraso, que se identificam pelos hábitos que os revestem; não podem por isso ser classificados como mistificadores, nem por tal motivo se deve por em dúvida a sinceridade de suas intenções, de sua cooperação em prol da Caridade, desde que razões mais fortes se nos apresentem para tanto. Ato de desumanidade, parece-me deve ser o de se pretender recusar a esses pobres irmãos do espaço a consideração que aos próprios animais que nos são úteis não recusamos, colocando-os dessa forma em escala inferior a esses animais. Se a ação e a passividade se acham restritas ao momento e ao recinto, limitadas ao fim caritativo, não vejo porque tanto pavor, tanta repulsa, tanta perseguição e combate. Desse já explicado convívio para fins tão úteis aos conviventes, nada se perderá decerto do que se tenha adquirido; antes se concorrerá para que progridam no terreno da moral, os nossos infelizes irmãos do espaço, que tanto carecem desse progresso. Se não é aconselhável a propagação de tais métodos ou modalidades, também não é aconselhável que se condene os que as praticam com sinceridade e bem intencionados. É preciso que exista quem se disponha a arriscar a vida para que o náufrago se salve e os que a arriscam em tais circunstâncias não merecem por isso a censura de quem quer que seja; antes são glorificados pelo seu altruísmo. Não é propriamente este o caso, porque do benefício praticado os resultados auferidos são mútuos, livrando uns das responsabilidades infalíveis que lhes acarreta a prática do mal, e outros da ação desse mal como vítimas diretas ou indiretas. Se a ação é boa, é útil a humanidade, é caritativa, deixará de o ser porque lhe chamam fetichismo ou espiritismo? Antes fetichismo sincero que espiritismo mentido, e ninguém dirá que se não possa ser perverso dentro das práticas que não sejam fetichistas. Continuarei a aconselhar aos meus prezados confrades e amigos, e que sejam menos intransigentes, mais complacentes nos seus juízos, e o faço revestido da minha simples e humilde condição de aprendiz. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 28 de Julho de 1932 – página 05)

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PRÁTICAS ESPÍRITAS Continuando nos comentários sobre práticas espíritas, tenho-me limitado a procurar explicá-las segundo meu modo de entender, no intuito de desfazer a prevenção com que são encaradas, quando delas se diverge por incompatíveis com os nossos hábitos, criticadas por tal sem a devida justiça e critério. Elas se identificam com o meio, sem afetar os fins, e deixariam de ser sinceras se assim não fossem, demonstrando por uma análise criteriosa, como as Leis Naturais absolutas. Nas manifestações por incorporação, as contrações e deformações psíquicas nos médiuns, quando se tratem de Espíritos de condição muito inferior, demonstram apenas a falta de afinidade fluídica, ou antes, uma reação de fluídos cujas vibrações divergem e se repelem pela diversidade, sendo que por esta razão as incorporações se operam violentamente, evitadas piores conseqüências pelos Guias Espirituais que cooperam no exercício das finalidades dignas e caritativas. Sabe-se que a matéria fluídica seja de Espíritos encarnados ou desencarnados está no seu grau de densidade vibratória, em perfeita relação com o grau de progresso dos mesmos, daí a repulsa e atração da boa ou má ação fluídica. Mais claramente: o bem atrai o bem repelindo mal; assim como mal atraindo o mal repele o bem. Assim, possuindo o médium fluídos de densidade superior aos do Espírito que se pretende incorporar, só com grande esforço se consegue essa incorporação pelo choque resultante, a despeito de toda a passividade do médium. Para que uma incorporação se torne mais ou menos perfeita, será preciso que haja afinidade fluídica entre o médium e o Espírito, sem o que se torna difícil ou impossível mesmo, tal seja a violência da repulsa, atenuada por vezes pelos Guias, quando como disse, as finalidades são úteis. Pelas mesmas razões, um Espírito de grande elevação moral, sentirá as mesmas dificuldades ou mesmo impossibilidade de incorporação nos nossos médiuns, limitando sua ação nas intuições dadas, ou transmitindo-se conosco por meio de enviados seus, de condição mais ou menos idêntica à nossa e dos médiuns. Por tais motivos se explicam as preferências entre Espíritos e médiuns, dadas as facilidades como se operam as manifestações já habituais. O médium que se presta a receber a incorporação de um Espírito de condição muito inferior a sua, sujeitar-se-ia as conseqüências resultantes dessa diferença, se após a incorporação assistida pelos nossos Guias, não tivessem seus fluidos densidade bastante para reagir e repelir as cargas fluídicas do Espírito em questão, ao qual deu incorporação. Concluem-se logicamente, que se o médium se achar revestido de fluidos elevados, o Espírito por mais rebelde e inferior que seja, será vencido e dominado na sua maldade pela repulsa fluídica. A reação se opera independente da vontade dos Espíritos, em obediência e sujeição, porém, das Leis e energias Naturais e se assim não fossem nós seriamos a todo o momento vítimas da ação fluídica dos malvados, ação traduzida por pensamentos e atos, sendo, entretanto, permitida essa ação e seus efeitos, quando merecida pelas suas vítimas. Exemplifiquemos para maior clareza. Se alguém alimentar maus pensamentos, desejos ou atos, produzirá vibração fluídica relativa, estabelecendo desde logo uma atração de cargas fluídicas de densidade idêntica vibratória, cujos efeitos repercutirão diretamente não só sobre si próprio, como sobre todos quantos se encontrem nas mesmas condições. Para que eliminadas sejam as más vibrações fluídicas, é necessário que deixem de existir as suas origens não só presentes como anteriores. Só existe uma única e exclusiva forma de se neutralizar a ação do mal, é praticando o bem. Todos aqueles que pautarem seus atos e pensamentos dentro dos verdadeiros princípios cristãos se encontrarão fora do alcance da ação do mal, cuja ação se poderá fazer sentir sim, mas somente pela responsabilidade de dividas anteriores, a qual deixará de se fazer sentir, quando resgatadas tiverem sido essas dividas, pagas com desconto e não com juros, graça a Magnanimidade Divina.

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Pelas explicações dadas se evidencia claramente, como e porque somos os únicos responsáveis pelo que de mal nos possa suceder, e somente em nós mesmo devemos procurar e achar a razão de nossos sofrimentos, os quais procuramos sempre encontrar nos nossos visinhos. Já vou-me desviando do ponto em que iniciei e assim termino por hoje, aguardando a oportunidade de poder prosseguir em minhas considerações como aprendiz. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 30 de Julho de 1932 – página 07) PRÁTICAS ESPÍRITAS Em continuação... As manifestações por incorporações dos Espíritos de Chefes de Caboclos ou Africanos como Guias Espirituais, se revestem dos mesmos caracteres, não se podendo estranhar esse fato uma vez que se encontram esses irmãos investidos de uma personalidade real, senão no seu atual estado de uma outra encarnação primitiva, a qual não lhes é dado traírem, nem se encontrando obrigados a dele se despirem pela satisfação das dúvidas dos incrédulos. Como já me referi, essa personalidade se justifica no desempenho de uma sublime missão, a qual lhes foi designada, e pela qual respondem não perante os que deles entendem duvidar, mas de quem tem autoridade para determinar. Se há quem se julgue no direito de por em dúvida a sua identidade e as probabilidades que apresento como racionais, deve demonstrar o contrário, não pretendendo satisfazer mantendo-se dentro do terreno da negativa simples. Já procurei explicar como melhor entende a razão do cerimonial observado nas referidas práticas, as quais, ou antes, o qual se identifica perfeitamente com os elementos do espaço que os adotam nas referidas práticas, traduzindo por essa forma a sinceridade com que agem e se nos apresentam. Sendo o meio propicio a superstição pelo seu grande atraso de cultura, é explicável que predomino a mesma nos atos e tudo quanto os revestem, sejam objetos, etc., sem que disso resulte prejuízo para as finalidades, nem para os assistentes materiais, cuja passividade se cinge às finalidades. Esse cerimonial ou ritual, para nós como assistentes materiais de um meio civilizado, só pode ter um caráter simbólico, uma vez que não nos é dado divisar a sua ação fluídica no mundo espiritual, onde indiscutivelmente ela se exerce, a despeito de haver quem sobre isso ponha dúvidas. Ninguém pensou ainda de certo em transportar esses hábitos para o nosso mundo civilizado; isso seria um verdadeiro contrassenso e receio infundado; nem mesmo se aconselha a propagação das modalidades pelos demais Centros e reuniões de práticas espíritas. Tolerá-los pelas finalidades dignas e nobres, é o que nos ordena o critério e bom senso. Pretender-se negar que essas práticas deixem de ser espíritas e que não sejam tão verdadeiras e de fim elevado como a dos mais intransigentes que as neguem por discordância; também não me parece que seja juízo acertado. Que se classifique como baixo espiritismo todos aqueles que visem à prática do mal ou da exploração puramente material. Compreende-se e explica-se, mas, classificá-lo como falso não representa essa classificação à expressão da verdade. Que ninguém se iluda supondo que não seja verdadeira a ação por ser maldosa, que se livre as suas vítimas a essa ação e seus efeitos evitando se tornarem dignas e merecedoras das mesmas, e que se livrem da mesma forma os seus autores praticantes, das responsabilidades assumidas com tão perversa e covarde ação, na certeza absoluta de que não ficarão impunes seus nefandos e negros crimes. Convençam-se de que o mal só deixará de existir quando ninguém mais se torne digno dele, dependendo simplesmente do esforço próprio de cada um a conquista do merecimento ou desmerecimento do bem ou do mal. Sobre verdades tão lógicas e incontestáveis devem assentar a felicidade de toda a humanidade, e o regime social de verdadeira e sincera fraternidade. Tirar a vida de um semelhante, seja qual for a modalidade, é sempre um crime de gravidade idêntica; assim como a boa ação não perde seu valor ou diminui seu grau por questão de simples forma ou método. Praticar o bem, é sempre praticar o bem, seja qual for a forma, e cada um o deve praticar como melhor saiba e possa fazer.

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A palavra de conforto, de coragem e de conselho não varia de valor seja qual for o idioma com que se pronuncie, e, entretanto, uns parecem mais bonitos que outros. Não nos devemos preocupar de certo com o que desagrada a vista, antes de ver se desagrada ao coração, ou antes, procuremos ver mais com o coração que com os olhos que muitas vezes nos enganam. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 03 de Agosto de 1932 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS A humanidade não estaciona nem retrocede na marcha do progresso espiritual, compelida pelo sofrimento e pela dor, para a sua perfeição moral a qual lhe é absolutamente indispensável a sua felicidade. A conversão dos malvados e dos ignorantes só se faz pela convivência com os melhores e mais cultos, sem que nessa convivência se possa ver um mal ou um erro, senão de apreciação. Se passividade se pode observar nas práticas espíritas a que me venho referindo, deve-se constatar que essa passividade é mútua, e de interesse e conveniência mútuas, sendo mais acentuada dos cultos e bons, para com os menos cultos e maus, tendo em vista, que dos melhores parte a iniciativa e a conveniência de um fiel e cabal desempenho da missão, que tem por finalidade exclusiva a prática da Caridade. Consciente pelo seu grau de cultura e ensinamentos cristãos, da responsabilidade dessa missão, infantilidade seria acreditar-se que retrocedem no seu grau de desenvolvimento, pela convivência útil e precisa os que se dedicam a tais práticas, como infantilidade seria acreditar-se que da mesma em desígnios tão nobres, não sejam colhidos salutares benefícios, pelos nossos pobres irmãos cuja infelicidade consiste no seu grande atraso espiritual. pelo qual tanto terrores causam a confrades nossos. Se da passividade que são acusados os referidos praticantes, resultam indiscutíveis benefícios mútuos e um mais fácil e melhor êxito, razões mais fortes não podem ser vistas para que prejudicado seja esse bom êxito, por meros escrúpulos de alguém. Se dessa passividade pudessem ser constatados interesses pessoais e materiais, explicar-se-ia o escrúpulo ou a repugnância; mas se a passividade não vai além de simples formalidades ou modalidades dos obreiros construtores da empreitada, se ela se limita apenas a consentir que ajam livremente dentro das suas possibilidades dentro de seus rudimentares conhecimentos e hábitos, não se justifica o repúdio ou a repulsa de que são alvo os seus sinceros e bem intencionados autores. Não se pretenda ver nas modalidades em questão, um ritual de culto de religião diversa da Espírita, quando essas modalidades são a reprodução de hábitos e costumes, bem como linguagens usadas em vida por esses nossos irmãos agora no espaço como Espíritos, mas, ex-habitantes de regiões de sua última encarnação. Compreende-se o ponto de vista de alguns confrades, os quais entendem não só dever permitir que aqueles irmãos persistem no uso dos referidos hábitos evitando a convivência com os mesmos, no sentido de forçá-los a se adaptarem ao nosso meio civilizado, mas se devem esquecer esses confrades de que essa adaptação não está a mercê de nossa vontade, e que não podemos sobrepor-nos a vontade de quem sabe melhor a que faz, do que nós o que dizemos e pensamos. Se a conversão ou adaptação referida se pudesse fazer com a facilidade e desejo louvável dos sinceros espíritas, a lugar pelo elevado número deles, já não deveria existir no espaço nenhum irmão nosso em semelhante condição de atraso. Com referência ainda a passividade observada nessas práticas, a qual se condenam o reprova, é preciso notar-se que em geral tanto os praticantes como os assistentes, desconhecem até a significação do cerimonial, cânticos, pontos, etc., despreocupados mesmo com essa significação que lhes interessa muito menos que as finalidades de suas práticas. Interessados pelos fins caritativos, deixam-se conduzir pelos Guias nessas práticas, numa orientação que está em desarmonia com a assistência material, mas não com a espiritual de onde parte e para quem serve essa orientação. Se fosse um profundo conhecedor daqueles hábitos e costumes indígenas, poderia entrar em maiores minúcias e detalhes, desfazendo esse aparato misterioso para muitos, mas que, entretanto, nada tem de sobrenatural ou hipotético. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 05 de Agosto de 1932 – página 05)

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PRÁTICAS ESPÍRITAS Em continuação... Já desenvolvi os comentários e considerações que me parecem suficientes para demonstrar a razão de ser das práticas espíritas em questão, denominadas como da “Linha Branca de Umbanda”. Se não desci a maiores minúcias, detalhando a significação de todos os atos, utensílios e objetos de que se revestem essas práticas, foi não só por me parecer inútil, como porque não sendo assíduo assistente, me não foi dada a oportunidade de um mais minucioso estudo, havendo, porém, que o posso fazer satisfatoriamente e que virá a público mais tarde nesse sentido. Resumi a explicação que podia dar interpretando o cerimonial como a reprodução de hábitos e costumes peculiares ao meio espiritual, da forma de viver que tiveram na Terra em sua derradeira encarnação, os nossos irmãos que emprestam seu valioso concurso a ação referida. Alguns desses irmãos, tendo adquirido rudimentares luzes sobre o culto religioso católico as misturam no seu culto indígena, dando ao mesmo um aparato por vezes exótico. Assistindo-se a uma dessas reuniões e práticas, tem-se a impressão de transporte a uma dessas regiões onde os habitantes são indígenas, negros e caboclos, e ali entre eles se opera toda a ação independente de nossa interferência direta, como meros assistentes animados do desejo de com o concurso daqueles obreiros, aliviar os sofredores de seus padecimentos, especialmente se resultantes das influencias fluídicas de Espíritos irmãos daquelas raças. Nós não ignoramos que infelizmente há criaturas de uma perversidade e covardia tão grandes que não trepidam em atrair e evocar esses Espíritos, utilizando-os na sua ignorância e baixos instintos, para a satisfação de vinganças, caprichos ou interesses puramente pessoais e materiais, instigando-os sob falsas promessas a perseguirem suas vítimas, ou seja, irmãos encarnados convivendo em nosso meio. Recorrendo ao mesmo meio, lançando mão dos mesmos elementos, a única intenção dos bem animados é livrar essas pobres vítimas dessas malignas influências, realizando esse desideratum por bem ou a força, resultando dessa ação e intenções, inegável e indiscutivelmente, um salutar benefício mútuo. Sendo essa ação exercida numa região de indígenas, por elementos seus habitantes, nada mais acionais que livremente ajam de acordo com seus hábitos e costumes, não se lhes podendo exigir que tenham outros que desconhecem. Essa liberdade de ação a qual em nada pode prejudicar a assistência, e que se quer chamar passividade com atos que se acredita fazerem retroceder os assistentes na escala do progresso intelectual. Não devemos, porém, esquecer-nos para uma apreciação menos intransigente de quem o progresso intelectual se poderá fazer em poucos momentos, mas o progresso moral só se fará por etapas, com o resgate do passado. Os cânticos (pontos) entoados pela assistência são adotados como meio de atração de falanges que por eles atendem, como meio de concentração, saudação de chegada ou despedida de tribos e seus chefes, atraídos ao local para desempenho eficaz da ação. Se nos fosse possível transpor este véu que nos separa do mundo espiritual, verificaríamos como nada têm de extraordinárias as referidas práticas, exercidas num meio humilde e pobre de cultura e raciocínio. Pelas considerações desenvolvidas, se deve concluir que é preciso ser-se mais ponderado nas apreciações para mais acertadas conclusões. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 07 de Agosto de 1932 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS Um prezado confrade que com seus artigos doutrinários ilustra as colunas desta seção, perdendo por vezes a serenidade, introduz nesses artigos referências as minhas considerações, não o fazendo com intuito de argumentar elucidando o assunto em questão, mas para ridicularizar torcendo o sentido e as intenções das referidas considerações já fartamente explicadas.

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Realmente, o que eu nunca pretendi, foi dar explicações a quem não tem vontade de compreender, porque delas entenda não precisar, ou por simples prazer de contrariar. Todo o Santo Evangelho a que se apega esse confrade, para aqueles que o conhecem, e mesmo para os que não têm a felicidade de conhecer, resume-se em muito poucas palavras, e que por pouco não deixam se significar tudo: “Faz o bem, sem olhar a quem”, porque, “Fora da Caridade não há salvação”. Aqueles que tiveram a verdadeira compreensão destas simples verdades, não necessitam de outro Evangelho, porque nem todos o sabem ou podem ler. Convença-se o prezado confrade de que, para fiel execução de tão sublimes princípios cristãos, não há absolutamente necessidade de modalidade que tenham por fim a satisfação de preconceitos sociais. Convença-se o prezado confrade de que para ser espírita, preciso é que se tenham sentimentos elevados e dignos; mas que para alimentar esses sentimentos não é imprescindível que se seja espírita intransigente e intolerante. Persiste o ilustre confrade em classificar como “falso espiritismo” ou macumba, todos aqueles que não sejam exercidos por Espíritos civilizados conhecedores de hábitos modernos negando aos pobres ignorantes o direito que lhes assiste de praticarem a Caridade, taxando-os de falsos, macumbeiros e mandingueiros. Entender que, linhas africanas, caboclas e de brancos como as classifica segundo seu paladar, e cuja classificação eu abstenho de comentar, constituem seitas religiosas diferentes da espírita, não desejando compreender que a diferença consiste apenas nos hábitos peculiares e cada raça. Praticar a Caridade com toda a sinceridade, desde constatada fique essa sinceridade, não me parece que seja alterar as doutrinas do Mestre; negar essa comprovada sinceridade e boas intenções, chama-se a isso simplesmente caluniar. Pelo ponto de vista do prezado irmão e confrade quem não puder ou não souber ler o Evangelho, está impedido de praticar o bem, tem que ser atirado para o rol dos falsos, dos indignos, macumbeiros e mandingueiros, perversos e malvados. Mas convenhamos que se hajam sofismas, não são de quem procura por as coisas em termos tão claros e simples; não são decerto de quem defende réus acusados de crimes que o cometeram, e mesmo ainda que os tivessem cometido, eu me sentiria mais digno no papel de defensor, do que no de acusador; assim é que ensina o meu evangelho, o da minha consciência, o verdadeiro cristão. Convido muito sinceramente os inimigos e acérrimos combatentes das referidas práticas, a um exame minucioso nos atos, nas intenções e na nobreza dos sentimentos que animam os praticantes a que me refiro, e como resposta obtenho apenas a calúnia; assim costumam proceder os inimigos do espiritismo, mas nos que se dizem espíritas, confesso que estranho esse procedimento. Só me resta aconselhar aos que não dando absolutamente direito a acusações e dúvidas sobre seu caráter e procedimento cristão, se tornam vítimas delas, que desprezem essas acusações e essas dúvidas, para prosseguir na sua missão, indiferentes ao juízo dos irrefletidos, que não querem ver pelo prazer de serem cegos. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 12 de Agosto de 1932 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS Cada povo ou cada raça diversa tem seus hábitos, costumes e linguagem tradicionais, os quais pela ordem natural do progresso tendem a convergir para uma unificação, para um estado de civilização já atingido por alguns povos da Terra. A condição de atraso que se encontram ainda alguns desses povos, a cor ou grau de intelectualidade, nunca poderá constituir razão bastantes para que sejam desconsiderados pelos demais, e muito menos pior aqueles que professam doutrinas, as quais não admitem outra distinção, senão a do valor moral como qualidade única imprescindível ao merecimento, perante o Criador. Fora desta lógica, tudo mais é simples produto da vaidade, orgulho ou egoísmo humano, mais ou menos disfarçados.

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O fato de se negarem qualidades morais constatadas para se divisar tão somente modalidades modernizadas, poderá ser tudo quanto queiram, menos espiritismo cristão; é querer-se sobrepor a vontade de Deus, não querendo consentir na existência daquilo que Ele entende dever existir. Sofisma é sem dúvida embaralhar o bem com o mal, para por esse embaralhamento apenas devassar o que é mal, encobrindo e negando o bem, numa teimosia obsessão ou fanatismos inexplicáveis. Sofisma é decerto negar que o intercâmbio com irmãos desencarnados, por serem eles de condição inferior a nossa na escala do progresso espiritual não seja Espiritismo, não sejam práticas tão espíritas como a desses ingênuos que pretendem fazer crer o contrário. Apressados e irrefletidos são os juízos que demonstram com suas implacáveis sentenças, além de manifesto desconhecimento da ação que condenam, uma incapacidade de julgar pela intolerância que lhes veda por completo, o direito e a razão de sentenciarem acobertados por uma doutrina na qual não existe apoio para suas implacáveis sentenças, por ter essa doutrina como princípios fundamentais a tolerância e a magnanimidade. São esses juízos que se recusam por vaidade ou capricho descabido, descer a uma análise de atos e de intenções daqueles que se movem tendo por fito em sua ação a exclusiva prática da Caridade, preferindo a esse ato de justiça e humildade, a calúnia, o repúdio, a condenação formal, apontando os autores a repressão das autoridades policiais, como dignos de ilustrarem as lajes frias das prisões. Preferem esses juízes classificar esses abnegados obreiros da Caridade, como reles macumbeiros, praticantes do falso espiritismo, operadores da Magia Negra, mandingueiros e outras mimosidades que muito honram estes juízes. Fingem não saber distinguir uma criatura sincera de uma criatura francamente explorada e mentirosa, e por comodidade confundem-nas pretendendo assim dar uma demonstração de sensatez, uma aparência de santidade nas sentenças que para tanto são profusamente precedidas do nome de Jesus e o Santo Evangelho, como se fossem culpados de tanta falta de critério, como se pudessem encampar estranhas atitudes de quem não soube ou não compreendeu o que leu. Não me cansarei de repetir ainda uma vez, que nunca pensei em advogar exploradores reconhecidos ou mal disfarçados, apesar de convencido que esses mesmos são mais dignos de lástima do que da sentença de implacáveis juízes, pela tremenda responsabilidade que assumem com procedimentos indignos; mas apesar de minhas constantes ressalvas, há quem persista em ver-me “pai de santo” disfarçado, ou proprietário de alguma Tenda rendosa; daí a explicação para as investidas que sou alvo, as estocadas por tabela, dissimuladas nas entrelinhas dos artigos doutrinários, quebrando a monotonia religiosa dos mesmos para uso externo. Não modificarei, porém, a minha diretriz dentro do ponto de vista em que me coloquei, embora desgostando com isso alguns confrades patrocinando a causa de todos aqueles que exerçam sinceramente a prática da Caridade, seja qual for a sua modalidade, mesmo que dela discorde, não me preocupando a cor da pela dos irmãos que a praticam, que por ser negra ou bronzeada se torna mais digna. Colocarei sempre um plano secundário essas tão combatidas modalidades, deixando-as ao critério dos que as entendem, convictos da sinceridade do bom êxito de suas finalidades, numa certeza absoluta de que não são menos cristãos que os mais modernos cristãos. Meus lábios não se mancharão, beijando agradecido a mão negra que me estende a esmola, a qual recebo com a gratidão devida e merecida, vendo nessa esmola a mais sublime demonstração senão de um ato de intelectualidade, um ato de Caridade Cristã. Por mais que rebusque em meu fraco raciocínio, confesso que ainda não me foi possível compreender, em nome de que princípio Cristão se pode ou deve negar o direito a criaturas humanas de serem úteis entre si, auxiliarem-se mutuamente, numa permuta de benefícios, da qual resulte um avanço moral, sob o fútil pretexto de uma diversidade de raças, de costumes, de hábitos, de linguagem, ou de condições sociais. Por tais razões tão fúteis, cava-se um insondável abismo, e proíbe-se que alguém se arrisque a descer a esse abismo, para de lá arrancar nossos caros irmãos, onde os atiram os nossos impensados confrades, esquecendo-se que de lá já viemos todos e por certo que com o auxílio daqueles que pensavam diversamente, com teorias menos modernas talvez, mas mais fraternas, menos egoístas. Perdoai-me prezados confrades, se vos melindro com a franqueza de minhas palavras; vede nelas apenas a sinceridade sem a intenção de molestar.

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Um vosso humilde aprendiz. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 13 de Agosto de 1932 – página 07) PRÁTICAS ESPÍRITAS Dou-me por satisfeito, por bem empregado meu tempo e minhas palavras, pois ao que vejo quem ainda ontem discordava “in totum” já hoje se mostra inclinado a concordar com as manifestações de Caboclos e Africanos revestidas de suas habituais linguagens. A questão agora está somente na repulsa ou na repugnância pelo uso de utensílios domésticos e ingredientes, os quais são utilizados nas referidas práticas, porque fora delas, no mundo material ninguém há que estranhe esse uso. A questão limita-se, portanto, ao fato de se considerar que os Espíritos em sua qualidade não têm necessidade do referido uso, com o que, aliás, estou de pleno acordo, como, porém, não seremos nós quem teremos de concordar ou discordar, e sim eles que pela sua ignorância estão convencidos do contrário; temos que encarar e analisar a questão por esse lado. O que tenho afirmado, é que nos não é dado transformar esses Espíritos, fazendo-os dar um salto na escala do progresso, salto impossível por que não se fará como quisermos e sim como tem de ser. Não cabe o exemplo com o qual se procura argumentar em contrário, porque com tal exemplo, o que fica demonstrado é que, sendo o número de graus da escala do progresso infinito, o Espírito citado para esse exemplo com a sua manifestação provou ocupar um grau suficiente a poder aceitar as luzes que lhe foram dadas. Se é verdade que existem irmãos em condições de poderem receber essas luzes, também é verdade que muitos outros seriam cegados pelas mesmas, pelas profundas trevas em que vivem ainda. Se os prezados confrades a quem tanto repugnam esses utensílios e ingredientes, quisessem fazer um estudo minuciosos, talvez me pudessem responder: - qual a razão por que médium que com o Espírito incorporado absorve a tal marafa (paraty), nenhum paladar ou efeito sente dessa bebida quando terminada a manifestação ou incorporação? Talvez me pudessem responder com acerto, porque razão o médium que não suporta sequer o cheiro da bebida alcoólica, absorve-a manifestado sem sentir absolutamente o menor vestígio, e como este, outros idênticos fenômenos pudessem ser melhor explicados? O estado de atraso desses Espíritos empresta-lhes uma convicção de vida material, pela grosseria do corpo fluídico que os reveste, convictos de todas as necessidades materiais como se na Terra vivessem ainda, sendo por essa razão satisfeitos imaginariamente, em razão da Caridade que nos prestam, e de cujo exercício lhes advém um relativo progresso moral. Mantendo-os nessa ilusão, parece-nos um erro ou um grande mal, não é, entretanto, tão grande se considerarmos que não se encontram eles aparelhados ainda para poderem compreender a verdade e a utilidade real resultante dessa forma de agir, não impedindo que cheguem a devida e verdadeira compreensão quando o seu estado o venha a permitir. Tudo está no ponto de vista da análise se considerarmos que a desgraça como se nos apresenta, traz sempre consigo um bem, embora isto pareça um contra-senso ou uma utopia. Repito ainda uma vez, não tenho capacidade para justificar o que à existência por si já justifica; limito-me a explicar a razão de ser, pela forma como entendo acertada, podendo errar, mas não lançando mão de sofismas ou de subterfúgios, antes sendo o mais claro possível para me fazer entendido. Lembra-se a conveniência de unificar as modalidades das práticas, adaptando-as ao nosso meio de civilização, mas concordando com essa conveniência, eu continuarei a dizer que não me parece dependa isso exclusivamente da nossa vontade, não nos cabendo determinar, mas sim, obedecer aceitando as coisas como são e não como queremos que sejam. Para melhor esclarecer o meu ponto de vista, vou fazer uma comparação material que me parece ter todo o cabimento no caso em questão.

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As modalidades das práticas espíritas são como que os cursos escolares, divididas em primários, secundários e superiores. Aqueles que ainda não conhecem as primeiras letras, ingressam nos cursos primários onde podem aprendê-las, não se dirigindo de certo para as academias de estudos superiores, por serem primárias as escolas ou os cursos; não quer dizer que ali se não aprenda alguma coisa, assim como seria irrisório que os métodos das academias fossem adotados nas escolas primárias. Os métodos ou modalidades são, portanto, de acordo em harmonia com os cursos; assim as práticas espíritas tão combatidas e a que me venho referindo, representam o curso primário da moral e da Caridade, para os que desconhecem completamente as primeiras letras. Creio ter-me feito compreender com esta comparação, embora imperfeita talvez, mas é a que melhor me assaltou no momento. Prosseguirei se me for permitido na firme intenção de esclarecer tanto quanto seja possível o assunto em questão. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 14 de Agosto de 1932 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS Em continuação... Permita o prezado irmão e confrade que, embora indiretamente se tenha dignado a atender as minhas considerações, que me sirva do exemplo que contrapôs as mesmas, para que argumentando com o referido exemplo, sem me desviar de meu ponto de vista, chegar a conclusões que deixou de considerar e as quais reputo interessantes. Que me seja desculpada a minha prolixidade talvez fastidiosa, mas necessária a me tornar melhor compreendido, sem margem a sofismas. As conclusões que se tornaram evidentes com o exemplo demonstrado são a meu ver as seguintes: Qualquer Espírito, por ser ou parecer de ordem inferior intelectual, não se encontra por tal razão inibido de exercer a Caridade alimentando sentimentos elevados, ainda mesmo que, em razão dessa inferioridade, julgue precisar satisfazer seus desejos e vícios materiais, os quais poderão ser ou deixar de ser satisfeitos segundo o pensar de alguém. Que a satisfação desses vícios, não exerce ação prejudicial à boa moral que o Espírito possa possuir, provado como ficou com o citado Espírito no exemplo, o que era dotado dos bons sentimentos, apesar de absorver marafa (paraty). Sendo esse o Espírito de desencarnado recente pela familiaridade e convivência, portanto, em condições capazes de uma fácil adaptação ao referido meio, não podendo nem devendo ser absolutamente comparado aos de inferioridade muito maior, como ex-habitantes de regiões virgens da civilização, de um desencarne que pode datar de muitos séculos. Que o referido Espírito, sendo já bastante evoluído moralmente, não o era ainda intelectualmente, pela sua persistência no uso de sua linguagem peculiar. Que a evolução moral se consegue também pelo exemplo, e não somente pelos conhecimentos de evangelhos; que a consciência espiritual se adquire sem a necessidade absoluta de tratados espíritas, reputados por muitos como indispensáveis (esta afirmativa não importa no menosprezo por todas as obras espíritas, cujo valor incontestável não foi ainda posto em dúvida pelos praticantes de modalidades divergentes). Que se pode perfeitamente ser espírita cristão pelos atos e pelos pensamentos, sem se conhecer os mais modernos métodos e modalidades de escola. Que o referido Espírito, a despeito de sua aparente condição de inferioridade (bebendo ainda marafa), era de tal elevação moral, capaz de lhe emprestar suficiente superioridade para assumir a direção espiritual de um grupo espírita, fonte de Caridade. Depois destas simples conclusões, eu deixo aqui ao prezado irmão a liberdade de responder para melhor elucidação às seguintes perguntas: Por que motivo a tal marafa absorvida pelo médium com o Espírito incorporado, não deixou o menor vestígio no organismo do mesmo?

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Teriam os efeitos do álcool sido anulados, e como, ou teriam influenciado sobre o corpo fluídico do Espírito? Como pode essa ação ser anulada no organismo dos médiuns, dando-lhes apenas o caráter de imaginária? Se essa ação foi provadamente imaginária, porque então tanta repugnância e repressão sofre dos combatentes da orientação combatida, encarando-se essa ação simplesmente no ponto de vista material? Pergunto ainda aos meus prezados irmãos: Por que razão os adversários das modalidades em questão, não acusam e responsabilizam quem consente na existência de Espíritos em condições de tanta inferioridade, dando-lhes a convicção plena de que ainda vivem na Terra, carecendo de necessidades materiais? Por que razão os intransigentes defensores de modalidades modernas não apontam ao Dr. Augusto Mendes os responsáveis pela existência desses nossos irmãos em tão lastimável estado de inferioridade? Por que não responsabilizam e acusam quem permite a suas manifestações, revestidas ainda de seus desejos, compatíveis com seu estado espiritual? Porque razões não mandam enclausurar nas masmorras do mundo espiritual esses infelizes, até que estejam em condições de poderem prescindir de seus vícios e seus hábitos, até que aprendam nossos hábitos e linguagem? Não seria mais acertado proibir que se comunicassem conosco para não caírem no desagrado dos que os consideram indesejáveis, e mais ainda os que aceitam suas comunicações, procurando incutir-lhes o exercício de Caridade, ensinando-lhes os primeiros passos para sua regeneração moral? Por hoje não vou mais longe; prosseguirei se for necessário e oportuno. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 16 de Agosto de 1932 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS – ADEDECISMO – A LINHA BRANCA DE UMBANDA O nosso muito prezado e ilustre Leal de Souza, sem dúvida o mais profundo conhecedor da prática da Magia Branca da “Linha de Umbanda”, vem pelas colunas do “Diário de Notícias” com brilhantismo inigualável, procurando explicá-las minuciosamente, demonstrando a sua razão de ser, revelando-nos a maravilhosa organização existente no mundo espiritual, dos elementos combatentes do mal que assoberbadas criaturas humanas, especialmente as que se encontram ainda inclinadas. Existindo, como é sabido e notório, considerável número de malvados formando falanges no espaço, ocasionando graves males e perturbações ao bem estar da humanidade, constituíram-se e organizaram-se verdadeiros exércitos com seu estado maior composto de Espíritos em missão (Guias e Protetores) para dar combate a essa falange de malvados por ignorância, por prazer ou por perversidade. Fazem parte desses exércitos de Caridade, Espíritos de todas as raças usando, como conhecedores, os mesmos processos e as mesmas armas. O que há de extraordinário é apenas a perfeição da organização, a grandiosidade do empreendimento, o heroísmo dos combatentes, a sublimidade da sua missão, o desprendimento e a abnegação desse formidável exército de obreiros do Bem e da Caridade, que age sob a proteção Divina, guiado por Jesus Cristo. Ninguém, decerto, pensará em vencer simplesmente pela palavra de regeneração convertendo pela mesma, uma aluvião de maldades, armados dos mais baixos instintos e ardis, enfrentando os sem outras armas. A palavra é sem dúvida suficiente sem, para aqueles, cujo estado moral lhes permita ouvi-la e compreende-la, mas não basta infelizmente para muitos, e para estes só a força poderá convertê-los. Haverá um mal no emprego desta força em tais casos? Não, absolutamente, se a conversão não só aproveita ao convertido, com as vitimas indefesas de sua persistência na prática do mal, não podem ser em número bastante elevado. Essa luta que se trava no espaço, entre os filiados à “Linha Branca de Umbanda”, e, esse incomparável aluvião de malvados justifica sobejamente o emprego de armas e processos idênticos, em harmonia com o meio em que essa luta se desdobra, e são esses processos que constituem as modalidades pelos adversários das mesmas.

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A solidariedade de novos elementos que reforcem as hostes dos batalhadores, conseguida por dádivas e oferendas à sua atração exercida por vários e convenientes meios, são ainda um complemento das modalidades que se observam nas práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda”, adversária irreconciliável da Magia Negra, seus praticantes e seus efeitos perniciosos, das quais todos somos maiores ou menores vítimas. A ação que exerce no mundo espiritual e a nós viventes na Terra, cabe-nos apenas auxiliá-la dada a sua sublime finalidade, não nos sendo motivo de preocupação e agrado ou o desagrado dos espectadores que se limitam a analisar as aparências sem mais quererem ou poderem compreender e aceitar, e deixem aos demais o direito de se sacrificarem numa luta que bastantes Espíritos têm sem dúvida, mas que não é menos grandiosa, menos gloriosa pelos riscos e pelos perigos de que se reveste. É por certo bem mais cômodo e agradável ser praticante kardecista; não se lhes invejam essa comodidade e esse prazer; o que se pede como um direito e como justiça é um mais ponderado raciocínio, uma mais minuciosa análise, uma mais refletida atitude, para que não continue a predominar a calúnia e a perseguição. Sejamos mais espíritas, menos vaidosos e orgulhosos.

(Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 21 de Dezembro de 1932 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS Prosseguindo nas considerações que vinha fazendo pelas colunas deste jornal, as quais como frisei por várias vezes, tinham como fim premeditado chamar a liça às autoridades no assunto, certo de que as havia, e ainda da necessidade de ver convenientemente esclarecida a mesma, propositadamente baralhado ou ignorado, causando uma série de desinteligências entre a família espírita. Tenho hoje razões bastantes para me sentir regozijado vendo em campo como personagem principal, aquele que forceja e reconhece-lhe a maior capacidade aliada aos melhores conhecimentos do assunto, estudioso profundo das práticas espíritas em todas as suas modalidades, e que outro não é senão Leal de Souza, o autor da célebre reportagem de “A Noite”, que presentemente pelas colunas do “Diário de Notícias” ventila a questão. Era de prever pela importância do assunto, que Leal de Souza fosse contraditado sinceramente pelos que discordem de suas teorias apesar de que as tem explicado suficientemente dentro da lógica e da razão, isso, entretanto, não é o que tem sucedido, como se poderá constatar, preferindo os adversários enveredar pelo terreno da agressão numa pretensão irritante em fugir a verdade, confundindo para caluniar, pelo prazer de negar publicamente aquilo que reconhecem intimamente por atos e por fatos. Esses Papas do Espiritismo, como bem disse Leal de Souza, não defendem princípios, mas posições de destaque entre os adeptos das doutrinas, receando perdê-las, mais preocupados com a sua perda que com os esclarecimentos que necessitam os que nele confiam. Tem o ilustre confrade envergadura suficiente para se defender das aleivosias de seus adversários, confundindo-os como vem fazendo, arrancando-lhe a máscara e sacudindo-lhes as teias em que se deixam envolver pela sua intransigência conservadora, que os tem levado a pretender impor normas e modalidades de se exercer a caridade, subordinado-a ao seu belo prazer. Um de seus contraditores, vindo a público disfarçadamente, como gato sobre brasas, sem contestar as afirmações e argumentos de Leal de Souza, certamente por incontestáveis, lança a pecha caluniosa e faz uma insinuação inverídica e malévola, pretendendo convencer que são os kardecistas os perseguidos, quando em verdade são os perseguidores pela intransigência de atitude que assumem, as quais sem Kardec, não autorizam. É falso que os praticantes da chamada “Linha Branca de Umbanda” combatam os kardecistas; eles apenas se defendem das acusações injustas que lhes fazem alguns de seus confrades, afirmando e prontificando-se a provar que suas práticas são espíritas e rigorosamente sinceras e caritativas Cristãs, muito embora não queiram admitir como senda kardecistas. Não se afirma que sejam kardecistas, mas incontestavelmente são Cristãs porque são caritativas as referidas práticas, queiram ou não os seus adversários e não é possível fazer ver quem não quer. Estão esses confrades representando o papel dos inimigos do espiritismo que negam sem conhecerem aquilo que negam. Chamados a analisar a questão, recusam-se para poderem persistir numa negativa que se não é de interesse particular é demonstração de ignorância ou de perversidade.

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Mais lealdade meus caros confrades; dentro da doutrina espírita kardecista não há apoio para atitudes confusas, senão hipócritas, e perdoar as franquezas de um modesto. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 22 de Dezembro de 1932 – página 08) PRÁTICAS ESPÍRITAS – ESPÍRITAS KARDECISTAS E ESPÍRITAS QUE NÃO O DEIXAM DE SER O nosso prezado confrade Leal de Souza, focalizando essa tão debatida questão das modalidades das práticas espíritas, conseguiu com raro brilhantismo e precisão reunir uma série de argumentos colhidos das próprias obras de Kardec, pelas quais demonstrou claramente que já previa e admitia-o, a diversidade de formas sem prejuízo dos fins, não existindo, portanto, razões para que continuem os intransigentes a manter suas atitudes à sua sombra. Os praticantes espíritas da “Linha Branca de Umbanda” sempre acataram com o devido respeito e consideração, os ensinamentos de Kardec, não o culpando nunca pela intolerância dos que os não souberam ler ou compreender, a qual vai ao ponto de negar que o intercâmbio que exercemos com o mundo espiritual e seus habitantes, seja espiritismo, esquecidos de que, não deixaria de o ser, ainda mesmo que nos não animassem as mais nobres intenções. Não tem querido os nossos confrades, descer a uma análise dos nossos atos, preferindo lavrar condenações, sem permitir a defesa dos réus, e chamam a essa forma de julgar, kardecismo, nós, entretanto, fazemos mais elevado conceito de Kardec, acreditando-o e reconhecendo-lhe, pelas suas doutrinas que não desconhecemos, incapacidade para apadrinhar esses juízes de última hora. Afirma um confrade, pelas colunas do “Farol”, jornal editado em Niterói, que não se pode admitir que um Espírito evoluído possa, como prova, tomar uma personalidade de categoria inferior. O seu erro está: primeiro em confundir missão com prova, muito embora a missão não deixe de constituir uma prova; e, segundo, em duvidar que, quando prova seja, possa ela ser perdida pelo próprio Espírito, que na mesma encontra utilidade para si ou seus semelhantes. Prova ou missão tanto poderá ser imposta, como solicitada, e devemos concordar que não somos nós que os Espíritos devem satisfações de suas missões ou provas. “A l´ocurez on connait l'artisan” (nota do autor: “Você pode dizer a um artista por seu trabalho”), diz o velho provérbio francês, e se isso não bastar para os nossos confrades, que nos ensinem melhor maneira de podermos identificar os bons e os maus, distinguindo-os. O altruísmo das palavras e dos atos de nossos “Guias Espirituais” são para nós suficiente prova de sua elevação moral; sua personalidade nos é revelada, sendo motivo para anagogia. Os nossos caros confrades parecem que gostam da chirinola e procuram fazê-la para satisfação e contento dos inimigos de nossas doutrinas, que divisam nela um excelente meio de propaganda contra as mesmas; nós, entretanto, estamos perfeitamente tranqüilos quanto ao desfecho da contenda, da qual sairemos todos, amigos sinceros e leais. Se o desejo é humilhar-nos, nós aceitamos a humilhação, convictos de que ela nos elevará; não nos diminuirá perante Deus, em nome de quem exercemos a nossa atividade na defesa dos que sofrem e que acorrem às nossas Tendas de trabalho. Falo em nome coletivo, embora sem autorização para o fazer; faço-o porém por um dever de solidariedade moral, que, considero ingratidão negar. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 23 de Dezembro de 1932 – página 10) PRÁTICAS ESPÍRITAS - MODALIDADES Tenho procurado dar uma vaga idéia sobre a significação do variado ritual das práticas espíritas que se distinguem nas suas modalidades e que por elas se caracterizam. Vingando as da chamada “Linha de Umbanda”, delas me tenho ocupado especialmente por incompreendidas, e por tal razão reprovadas por confrades.

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Não haveria papel e tinta bastante que pudessem comportar minuciosamente o significado e a razão de ser de cada ato, objeto, utensílio, cântico, dístico, traços, alimentos, bebidas, defumadouros, ponteiros, espadas, etc. Todo esse cerimonial com tudo quanto o reveste, não é mais do que a cópia exata da vida material dos Espíritos que o usavam em vida nas regiões em que habitavam e que continuam a usar como se nelas habitassem ainda. Se nos pudéssemos transportar a essas regiões, verificaríamos essa verdade e a variedade de hábitos entre as diferentes tribos de raças mais ou menos selvagens. Cada tribo tem as suas insígnias, os seus chefes, suas danças, toadas, etc., pelas quais atendem quando precisa se torne seu auxilio como guerrilheiros propensos sempre para a luta, bem ou mal encaminhados pelos que a eles recorrem como instrumentos, dada a sua em geral completa ignorância. Trava-se no espaço uma luta constante entre essas tribos as quais formam verdadeiras falanges, umas chefiadas por malvados ao serviço do mal, outras chefiadas por obreiros do bem (nossos Guias amigos e Protetores), em combate contra o mal e seus autores e ainda outras que tanto se prestam para um como para outro fim, segundo as recompensas que lhes são dadas ou prometidas. Os nossos Guias chefiam falanges ao serviço exclusivo da Caridade, educando nessa ação os maus ou ignorantes, alistando-os em suas fileiras, com a plena consciência de seu estado, e com os poderes que lhes são concedidos para o desempenho da missão recebida de quem determina e não obedece senão a si próprio. Os Guias das tribos ou falanges ao serviço do mal, são em geral conscientes de seu estado e da ação malvada que exercem, e chefiam, mantendo por conveniência própria a ilusão e a ignorância dos seus comandados para sua melhor utilidade à perversidade dos seus fins. Estes guias perversos, indignos, são por vezes dotados de inteligência bastante, e perfeitos conhecedores do manejo da ação fluídica, exercendo-a com elevado poder, pelos seus conhecimentos e manhas; daí se poderá imaginar até onde, e qual a extensão da sua maldade aliada à inteligência tão indignamente aplicada. São estes os piores inimigos e que mais difícil se torna vencê-los, contra os quais se explica a ação violenta e enérgica dos abnegados amigos que nos auxiliam a dominá-los na sua maldade, não só no benefício de suas vítimas, como no seu próprio, impedindo que se agrave cada vez mais a enorme responsabilidade que já lhes pesa. Se há quem nisto veja um erro, de certo não possui o raciocínio bastante para discernir e distinguir de que lado está a razão. Os manicômios estão repletos de vítimas de tão malvadas criaturas, as quais poderiam ser aliviadas, se a vaidade e o orgulho não cegassem os materialistas, intoxicados pelo seu extraordinário saber monopolizados. Só a vaidade ainda impede que se deixe de reconhecer o valor dos benefícios recebidos; que se seja cego à nobreza e a sublimidade do sacrifício; que se seja surdo às palavras de amor e fraternidade; que se não queira ver a palavra de Deus presidindo todos os atos, para apenas fazer ressaltar o negro ou o bronzeado da pele que cobre esses obreiros da Caridade Cristã. É preciso que se seja muito ingênuo ou muito hipócrita para desconhecer que as maneiras polidas, os gestos diplomáticos, as palavras sedutoras, a elegância dos trajes, e a alvura da pele, podem muito bem encapar um coração negro, uma ama de hiena. Ainda que esta verdade possa ferir alguém, certo é que, mais facilmente se encontrará a sinceridade e o amor no coração dos humildes que nos dos poderosos; e a perversidade não é monopólio dos fracos, não é privilégio dos Negros ou de Caboclos. A maldade tem para o inteligente um campo muito mais vasto que para os ignorantes, que nem ao menos a sabem disfarçar. E aqui eu inverto o provérbio italiano: “Se nom é vero, é bem trovato”. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 24 de Dezembro de 1932 – página 10)

PRÁTICAS ESPÍRITAS – INTERCÂMBIO COM O MUNDO ESPIRITUAL Em nossas relações com o mundo espiritual somos assistidos e recebemos comunicações diretas e indiretas de entidades espirituais de várias condições de adiantamento moral; é, pois, sobre estas comunicações que eu pretendo fazer alguns comentários na intenção de elucidar dúvidas, sem, entretanto, me acreditar incapaz de errar, ante agradecido, se corrigido for, em prováveis erros.

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O corpo fluídico de cada entidade espiritual, seja encarnado ou não, tem um grau de intensidade vibratória, em perfeita relação com o seu desenvolvimento, ou seja, seu adiantamento moral, para que, portanto, um Espírito se comunique conosco, é necessário que haja uma determinada afinidade fluídica; ao contrário, essa comunicação ou se torna difícil ou mesmo impossível. A afinidade fluídica ocasiona uma atração maior ou menor segundo a harmonia dessa afinidade; assim, como a sensível desigualdade provoca uma repulsa inevitável, assim, pois, como um Espírito muito atrasado tem grande dificuldade ou impossibilidade de em se aproximar estabelecendo contato com um Espírito elevado; pela mesma razão, um elevado encontra as mesmas dificuldades quando em relações com atrasados; daí as facilidades ou dificuldades observadas nas comunicações a que assistimos. É comum em alguns Centros ou em Sessões Espíritas privadas, verem-se Espíritos manifestados direta ou indiretamente, declararem-se entidades elevadíssimas, como sejam as de apóstolos de Jesus, e como tal serem acolhidos, não passando entretanto, de médiuns ou Espíritos mistificadores, esses que assim se querem fazer acreditar, devendo ser repelidos e desmascarados. Esses Espíritos pela elevada condição de progresso que desfrutam, apenas se poderão comunicar conosco por intuições a distância, servindo-se de médiuns dignos, ou por intermédio de enviados seus, Espíritos estes que ocupam um grau de progresso que lhes permite servirem como intermediários. Suponhamos por exemplo, que o Espírito de um dos apóstolos ocupa o grau “dez” na escala do progresso enquanto que nós na Terra, apenas reunimos a média “dois”. O Espírito intermediário será escolhido entre os que se encontrem, digamos, entre o “quatro e o oito”, para que assim se possa tornar mais fácil a afinidade fluídica, evitada a natural repulsa. Estas razões não estão na dependência de nós ou desses Espíritos, mas sim, submissos a leis naturais imutáveis e invioláveis. Os Espíritos de condição atrasada vivem como comumente dizemos, “terra a terra”, ocupando uma camada em que as energias, ou antes, as vibrações fluídicas se harmonizam mais ou menos, não podendo absolutamente ultrapassá-la, sair fora de seus limites, pela repulsa que lhes opõem as vibrações mais elevadas das outras camadas. Por idênticos motivos os habitantes das camadas mais elevadas se encontram na impossibilidade de descerem as mais atrasadas, somente dentro das quais seria possível a comunicação direta conosco, pela incorporação ou outras mediunidades. Mistificador é, portanto, todo aquele que diretamente se comunica conosco, sob a capa de Espíritos assaz elevado; e ignorante ou obcecado, aquele que a aceita cegamente. Não há muito ainda que ouvi da boca de um infeliz médium a afirmativa e que no Centro que freqüentava, creio que na estação da Penha, recebiam comunicações, por incorporação, de “Jesus Cristo”. Seria uma blasfêmia tal fato se não tivesse a perdoá-lo a obsessão e a crassa ignorância dos que em tal comunicação acreditam como verdadeira; e as conseqüências já se faziam sentir nesse mesmo médium, o qual foi dispensado pelos seus patrões descrentes, que, começaram a divisar no seu empregado, sintomas de loucura trágica. Estas mistificações são geralmente o resultado de um castigo à vaidade de médiuns que a força de lisonjas se compenetram dum valor e um merecimento que lhes não pertence, acabando ridicularizados e humilhados por essas mistificações, ou ainda em razão do uso indevido ou indigno que fazem da mediunidade. Em tais casos, esquecidos ou ignorantes de suas faculdades mediúnicas, abusando das mesmas, as transformam de instrumento de resgate, em instrumento de maiores compromissos. Voltando ao assunto de que me desviei, direi que a afinidade fluídica é o maior fator das comunicações, do intercâmbio entre o mundo material e o espiritual, e que quando um Espírito de condição muito elevada tem de se comunicar mesmo por intuição conosco, procura fazê-lo através de um médium que possua uma moral na altura do merecimento, e que, com a preferência se não envaideça; daí a razão dos preferidos serem escolhidos entre os mais humildes. Explicado fica assim também a razão por que, quando os Espíritos se harmonizam por afinidades com um médium, o preferem e escolhem habitualmente para suas comunicações.

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Essas afinidades resultam de uma aproximada harmonia de sentimentos, de pensamentos e atos; em resumo, de um grau de progresso idêntico, mais ou menos, podendo-se observar pela forma mais ou menos fácil dessas comunicações, o grau de afinidade entre o Espírito e o médium. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 29 de Dezembro de 1932 – página 10) PRÁTICAS ESPÍRITAS – AFINIDADES FLUÍDICAS Tem-se dito com razão e probabilidades perfeitamente racionais, que os Espíritos que se nos apresentam chefiando falanges de obreiros do Bem e da Caridade, investidos de personalidades que os caracterizam como chefes de tribos de Caboclos ou Negros são Espíritos de luz, em função de nobre e elevada missão junto aos obreiros que comandam e a todos nós que compartilhamos dos benefícios que semeiam. Há quem ponha em dúvida a sinceridade de seus atos e bem assim a sua elevação espiritual, pelo fato de não revelarem pela sua linguagem ou pelas modalidades de seus hábitos, essa elevação; mas essas dúvidas são infundadas e fácil é demonstrar a falta de fundamento. Investidos os Espíritos de luz, de uma personalidade de condição inferior para o desempenho de uma missão, essa investidura é completa, é perfeita, é real e sujeita a todas as suas conseqüências, as quais são tão inevitáveis, como serão para quem quer que se encontra ainda na mesma condição de atraso, não obstante podem esses Espíritos para o bom desempenho de sua missão usar forças e conhecimentos que possuem, nunca porem se sentirão na obrigação ou na satisfação de revelarem sua verdadeira condição para serem agradáveis, desfazendo dúvidas dos que por vaidade julgam seus superiores. Não sendo a sua missão converter incréus vaidosos ou bisbilhoteiros, esperam apenas que pelas obras sejam identificados os seus autores, e se para alguém não bastarem essas provas, que continuem aguardando as diretas, que convencem pelo sentir, pela dor. A personalidade de que se investe o Espírito de luz na missão referida, é correspondente a de alguma de suas anteriores encarnações, investido da mesma num meio conveniente e adequado, não se podendo furtar as influências desse meio, dentro do qual se justifica sua ação e investidura. O general identifica-se, comanda e é obedecido pelos seus comandados, pela farda que veste e pelos bordados e galões que a ornam; sem estas insígnias apenas é conhecido pelos mais íntimos e a sua autoridade desaparece perante seus subordinados; assim acontece com esses Espíritos, em missão de comando e ação. Verificada que fosse a falsidade da investidura por muito digno que possa ser o que o investe, desmoralizada e desprestigiada seria imediatamente essa autoridade fictícia por aqueles que infelizmente na sua ignorância apenas conhecem aparências e não realidade, fardas e galões, em vez de autoridade moral. Investido da farda, o militar impõe e se submete à disciplina, evitando a anarquia entre as suas tropas; assim acontece também com esses Espíritos, que necessitam de serem obedecidos e respeitados pelos seus subordinados, com razões mais fortes e dignas de toda a nossa consideração e respeito, porque a sua missão é incomparavelmente elevada, sublime e nobre; é a de instruir soldados no combate ao sofrimento e a dor, levando o alívio aos que sofrem, o pão do Espírito aos famintos, a luz aos que vivem nas trevas, e a fé e a coragem aos que desfalecem, o amor aos corações empedernidos pela crueldade, a esperança aos desiludidos, a alegria aos que choram. Quem tem por fito e missão tão prodigiosa obra de Caridade, não se sente de certo atingido pelas dúvidas, pelas humilhações, e pelo ridículo de que são alvo por parte dos inadvertidos críticos e juízes, aos quais poderão responder com as mesmas palavras de Jesus Cristo: “Perdoai-lhes Senhor; não sabem o que fazem, nem o que dizem”. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 03 de Janeiro de 1933 – página 10) PRÁTICAS ESPÍRITAS – RECEIOS INFUNDADOS Ao que se presume, dada a repulsa manifestada publicamente por alguns de nossos confrades em evidência na atualidade, pelas práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda”, em suas modalidades de aparência exótica no nosso meio social, receiam esses confrades, que haja a pretensão de generalizar essas modalidades, impondo-as ou adaptando-as em substituição às que se caracterizam com a nossa civilização. Supõem talvez os nossos confrades, que possam vir a ser introduzido nos salões de nossa sociedade, ou nos centros espíritas kardecistas, digamos para distingui-los no meio social espiritual, os caxambus (nota do autor: Dança de Negros, espécie de batuque ao som do tambor) e os batecuns (nota do autor: Barulho de sapateados e palmas) que tanto horror lhes causa, não devendo, no entanto, nutrir tais preocupações que não tem o menor fundamento.

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Tudo no Universo é relativo, e nas criaturas não deixa de o ser. Operam os obreiros kardecistas num meio que se nivela ao nosso, no seu grau de evolução, guiados por Espíritos superiores no exercício da Caridade, usando, portanto, modalidades peculiares, e se entre esses obreiros ou necessitados, alguns Negros ou Caboclos se confundem, pode-se afirmar sem erro, que a sua condição de progresso espiritual se acha nivelada ao meio, com a qual se confunde por afinidades fluídicas. A ação caritativa exercida pelos praticantes da “Linha Branca de Umbanda”, meus caros confrades, se não quereis que seja tão nobre como a vossa, se em verdade reconheceis que se não reveste de aparato e serenidade tão sedutores, deveis ao menos fazer a justiça de reconhecer e proclamar, que é sem dúvida bem mais espinhosa, mais rude, mais povoada de perigos e abismos, mais infestada de sofrimentos e de dores pela triste condição de atraso moral do meio que é exercida. Afrontado todos os perigos decorrentes desse meio, sofrendo por vezes suas conseqüências inevitáveis, esses abnegados obreiros da Caridade Cristã têm razões para se entristecerem com as acusações que lhes são feitas, e ainda mais quando elas partem de confrades, que deixam de ver em sua ação uma necessidade de cujos benefícios compartilham embora ignorando, para divinizarem a satisfação de um prazer ou finalidades malévolas. Leal de Souza, o mais legítimo e o mais autorizado embaixador na Terra dessa falange de guerrilheiros do espaço, que combate com ardor a ação maléfica da qual somos todos os maiores ou menores vítimas, acaba de nos demonstrar clara e racionalmente, a surpreendente organização dessa falange do Bem com a mais poderosa combatente, o mais formidável exército espiritual mobilizados por espíritos elevados, investidos de personalidades e autoridades indispensáveis à luta que se trava com a Magia Negra, sua ação e seus autores. Solidários nossos confrades com essa luta e seus comandantes, emprestam-lhe o concursos que lhes é pedido ou exigido, passíveis às suas ordens, em benefício próprio e de todos quantos lhes solicitam defesa, vítimas da ação maléfica dos ignorantes ou dos malvados do espaço. Não são, portanto, criação dos praticantes terrenos essas modalidades com as quais se tornam solidários e passivos, explicadas as mesmas pela relatividade com o meio espiritual e necessária ao bom êxito das finalidades. Repugna a muitos confrades esta luta por lhes parecer anti-caritativa; o meio, entretanto, assim o exige e o justifica, se não bastasse a necessidade de livrar a humanidade de tantos sofrimentos e ainda a de evitar agravem suas responsabilidades os praticantes do mal, persistindo em sua prática. Essa luta é travada num campo onde as armas e os processos são equivalentes e as palavras seriam infrutíferas, não impedindo que se empreguem estas quando necessárias e profícuas. Força não sobrepuja a palavra senão quando se torna aquela indispensável, e esta inútil, bastando-nos saber que os dirigentes superiores que comandam essas hostes de guerrilheiros, são Espíritos clarividentes de categorias elevadas no desempenho de missões que lhes foram designadas, para cujo cumprimento se investem de personalidades adequadas. Jesus Cristo pregou pela palavra e pelo exemplo, o amor ao próximo, mas chicoteou quando achou que assim devia fazê-lo, como castigo aos que o mereceram, e infelizmente ainda há muito quem o mereça. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 07 de Janeiro de 1933 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS Já se tem clara e categoricamente demonstrado que as práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda” estão em perfeita congruência com os princípios da doutrina Espírita, sem que desvirtuados sejam os fins premeditados, só quais se fundam no exercício exclusivo da Caridade Cristã dentro da qual nenhuma criatura se perderá. A obra enciclopédica de Rivail não foi, não é, nem será deturpada por aqueles que sincera e honestamente se entregam aos exercícios da Caridade por modalidades que não traduzem métodos, mas sim necessidades ocasionais em harmonia não só com os meios, como os fins. Um nosso confrade vem de há tempos classificando as práticas acima referidas como “empíricas”, combatendo-as incessantemente, não nos habilitando a lhe responder, e, contestá-lo por ignorâncias que o sentido que pretende dar à sua classificação por ser variada.

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Se for sua intenção mimosear-nos com o título de charlatães, deve fazê-lo sem rebuços, para que tenha direito ao mérito pela sua amabilidade e prova de tolerância, e bem assim para que se possa compreender a maneira como interpreta as doutrinas das quais se arvora intransigente defensor. Se ao contrário, entende esse confrade que se baseiam as modalidades da “Linha Branca de Umbanda” na simples experiência, então lhe poderia dizer, que se por tal razão há quem nos julgue errados, mais errado está de certo, quem na experiência não tem base suficiente para suas afirmativas. A cura das enfermidades sejam elas de qualquer origem, melhor, senão maior eficácia tem tido na experiência, do que na própria ciência dos homens, que na mesma tem seu apoio, sua base mais sólida. Se algo há que lamentar nestas controvérsias entre os professantes de princípios e fins que se harmonizam, são as sentenças draconianas lavradas contra confrades, cujo maior crime consiste em não saberem, nem concordarem com disfarces, reputando suas atitudes e condutas nobres, dignas e elevadas a despeito do seu desagrado, para os que preferiram aparatos sedutores embora hipócritas. Não ignoramos, prezados confrades, que as modalidades de nossas práticas, se não prestam em absoluto a satisfação de vaidades exibicionistas pela humildade do meio em que são exercidas, não sendo por esse motivo invejadas, se elevado é o número dos que as preferem, é sem dúvida porque, em nossas Tendas, e seus humildes Terreiros, tem encontrado a acolhida que necessitam os que às suas portas tem vindo bater. Não me prende a essas Tendas chefiadas espiritualmente pelo “Caboclo das Sete Encruzilhadas” o mais pequeno cargo de responsabilidade; assistente não muito assíduo, apenas faço esta declaração para demonstrar a minha insuspeição, não importando ela na diminuição da mais completa solidariedade à sinceras, honestas e rigorosamente Cristãs práticas espíritas, que ali poderá testemunhar o mais escrupuloso observador, desconhecedor que seja da idoneidade dos elementos ativos materiais. A vós, pois, que com tão infrutificado ardor combateis aquelas modalidades e seus compartilhantes, que os apontais a perseguição das autoridades policiais, da repudia de seus confrades, atraindo sobre eles a humilhação pública, eu ousarei perguntar-vos: Tendes porventura conhecimento de que ali seja comerciada a Caridade por mais insignificante que tenha sido o seu preço? A alguém foi pedida ou exigida qualquer recompensa pelos benefícios prestados nessas Tendas de Caridade? Satisfeita a vossa curiosidade e a observação, se nada de desonesto ou de interesse material vos foi dado constatar, perguntai então a vossa consciência onde estão os charlatães, os falsos ou baixo espíritas praticantes de magia negra, que a vossa intolerância vos leva a divisar? Lembrai-vos prezados confrades que ninguém responde senão pelos seus próprios atos e pela extensão de suas conseqüências; dentro deste dogma se encontram os que acusam e condenam inocentes. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 17 de Janeiro de 1933 – página 02) PRÁTICAS ESPÍRITAS O nosso muito prezado e ilustre confrade Leal de Souza tem com a sua aprimorada cultura e conhecimentos profundos sobre as práticas espíritas, em suas diferentes modalidades, sido feliz nas suas coarctadas, que não deixam margem a sofismas e subterfúgios. Das suas considerações pela clareza com que vêm sendo expostas pelas colunas do “Diário de Notícias”, se conclui que ressalta não só a necessidade, como a grande vantagem de que se congreguem todos os de boa vontade e bem intencionados, coadjuvando a mesma finalidade que se resume na prática exclusiva da Caridade Cristã. Para o feliz êxito e maior eficácia desse nobre desideratum, todos os meios devem ser tolerados, explicada suficientemente a sua razão de ser pela elevação e dignidade dos fins supracitados. Se as práticas da “Linha Branca de Umbanda” não se revestem de um caráter doutrinário pela palavra, não deixam de ter esse caráter pela ação, pelo exemplo e pelo castigo quando necessário, indispensável e útil. Tão depressa seja possível impedir que os maus elementos que povoam o espaço persistam em sua atuação maligna, mais depressa suas vítimas se livrarão da mesma.

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Se a doutrinação se torna insuficiente, não só pela sua incompreensão, como pelo grau de perversidade dos malvados, justifica-se a violência da ação e o emprego do castigo como necessário e útil ao bem estar geral da humanidade. O castigado se sofre com esse castigo merecido pela sua obstinação, aufere muito maiores benefícios com a sua conversão, ou pelo menos com o abandono do exercício do mal, porque não terá agravadas as suas responsabilidades se persistir no erro. Há, porém, que notar ainda, que o fato de se impedir pela força que um malvado exerça o mal, não se pode em absoluto classificar como um castigo, antes um grande benefício para o autor e suas vítimas. Há que notar ainda, que a ação violenta e enérgica se emprega unicamente quando indispensável, e em um meio no qual não pode ser evitado, sendo com prejuízo dos que pela sua condição assim o exigem, exercida a mesma por elementos de condição relativa. Se a ação é exercida por elementos de raças e condições relativas, embora superiormente, é a esses elementos que cabe ditar modalidades não menos relativas, e não aos suplicantes ou as vítimas, e muito menos ainda aos espectadores e aos que se arvoram em críticos cegos e surdos. Não se pode de certo apreciar uma representação, quando apenas se podem ver os camarins e os cordões dos cenários criticando ou aplaudindo-se uma representação que se não viu. Esta é a situação dos que criticam modalidades sem possuir a sensibilidade visual capaz de atingir a ação no terreno espiritual onde elas têm o seu verdadeiro campo de proporções infinitas. Não se pode absolutamente com razões por em dúvida a capacidade moral dos graus espirituais, principais orientadores dessas modalidades, pelas sobejas provas que os identificam, e se é verdade que essa idoneidade moral, essa elevação espiritual, se encontram encapadas na humildade de suas personalidades transitórias, que lhes não tiram o mérito, antes o dignificam. Seria interessante se não prova de ridículo orgulho pretender-se ofuscar seu mérito e a nobreza de sua ação, por não menos ridículos preconceitos sociais nos quais impera a hipocrisia. Dezenove séculos são decorridos já, e os exemplos e ensinamentos de humildade que nos legou o Mestre, estão muito longe de poderem ser imitados pelos seus filhos, que o não tolerariam nem habilitariam hoje, senão como um diplomata de casaca e chapéu alto, insatisfeito com a elevação das palavras e atos. A verdade deve ser dita e proclamada ainda que fira aos que a não querem ver. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 18 de Janeiro de 1933 – página 10) PRÁTICAS ESPÍRITAS – FETICHISTAS, FALSOS ESPÍRITAS, MACUMBEIROS A conclusão a que se chega das críticas e reprovações das práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda” é que em geral os críticos e improvisados juízes desconhecem inteiramente aquilo que condenam; ao contrário não se desfariam em polêmicas e argumentos que nenhuma referência tem com o assunto em questão, e que nada absolutamente provam em contrário do que se tem dito sobre as modalidades das referidas práticas, nem ao menos explicando a razão de ser dos variados epítetos e das acusações formuladas por simples prazer de agredir ou caluniar. Não conheço pessoalmente nenhum dos acusadores e agressores senão através das suas atitudes, as quais pretendem apoiar no Evangelho que interpretam ao seu sabor e que não pode de forma alguma acampar agressões. Desprezados os princípios da tolerância e da fraternidade explícitos em todos os Evangelhos, desprezada a respeito pela idoneidade moral dos seus semelhantes, os críticos e juízes improvisados e apressados, transformam seus confrades em êmulos, escachando-os com epítetos que primam pela variedade e prodigalidade agressiva. É fértil a imaginação desses Papas Espíritas em criar intenções que não existem, em ver crimes e criminosos na diversidade das modalidades, quando em verdade que provam desconhecer, não se derrogam princípios nem fins. Fartamente explicada com toda a clareza a razão de ser das referidas modalidades, não por mim humilde e modesto aprendiz, mas pelo erudito digno e sincero confrade Leal de Souza, o mais devotado obreiro da Caridade Cristã dentro das modalidades que se caracterizam pela humildade de seus praticantes, persiste-se apesar de tudo, sem explicação, o porquê em achar na clareza das mesmas margem a dúbias interpretações.

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“Fetichismo” (nota do autor: “Culto dos fetiches, ou feitiços; veneração exagerada, supersticiosa, de objetos inanimados

que se crê estarem ligados aos Espíritos e que, por isso, passam a representá-los simbolicamente”). salvo erro, significa o culto a fetiches (nota do autor: “Objeto que se cultua por se atribuir valor mágico e/ou sobrenatural). e não consta que entre os elementos ativos materiais ou espirituais se ensinem ou se renda culto a fetiches (entre os praticantes da “Linha Branca de Umbanda”), essa classificação não tem, portanto, nenhuma procedência senão ainda na ignorância dos classificadores. Eu tomarei a liberdade de aconselhar ao confrade que de há tempos vem combatendo as referidas modalidades, designando-as ora como fetichistas, ora de falso e baixo espiritismo, ou ainda como de macumbas, a que procure analisá-las convenientemente, bem como a idoneidade de seus praticantes; procure como curiosidade ao menos ler a que a propósito das mesmas tem sido publicado pelas colunas do “Diário de Notícias” de autoria de Leal de Souza, contestando as suas considerações, se entender na sua perspicaz sabedoria não traduzirem a expressão da verdade, certo de que será o primeiro a lhe agradecer as melhores luzes que pode trazer sobre o assunto. Deus, Cristo e os Espíritos que se destacam pela sua elevação moral, sejam Santos ou como lhes queiram chamar, tem para os praticantes da “Linha Branca de Umbanda” tanto ou maior merecimento, é digno de tanta ou maior veneração como são para aqueles que se acreditando privilegiados no saber, os pretendem monopolizar dentro de sua orientação, que pode ser mais adaptável a época, mas não aos meios nem aos fins. Nega que a Caridade seja Caridade pela humildade de que a pratica; nega o valor da obra por que o artista não é um gentleman, porque não tem escola, porque é preto ou bronzeado, porque veste uma simples tanga ao invés de um elegante costume, e por tal prisma não tolerariam, hoje, novo messias que não viesse de casaca e chapéu alto, pretendendo disfarçar ante os papalvos um orgulho e uma vaidade patenteadas. Convençam-se de uma vez para sempre que a Caridade não é privilégio de castas, raças ou indivíduos, seja qual for a sua condição social; o seu exercício é possível e permitido a todas as criaturas humanas, e maior é a sua nobreza entre os humildes e os incultos que os inteligentes e os poderosos,... dentro dela todos acharão a sua salvação. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 20 de Janeiro de 1933 – página 07) PRÁTICAS ESPÍRITAS – ATITUDES QUE NÃO SE EXPLICAM Já se vão tornando irritante a controvérsia sustentada sem o menos fundamento, pela intransigência de alguns confrades, que outra preocupação não tem demonstrado senão o prazer de florear agressões cuja razão não explicam. Não será o estilo gongorista, nem com palavras eufônicas que se justificam agressões disfarçadas entre frases doutrinárias e capítulos do Evangelho; aos juízes improvisados cabe senão como satisfação ao auditório perante o qual lavram suas sentenças, como dever de consciências, fazer preceder essas sentenças das necessárias provas, positivando-as, se não quiserem vê-las transformadas em calúnias e em caluniadores ou juízes. Não devem esquecer ou ignorar os juízes, que as acusações feitas publicamente podem ter como conseqüência, lógica, as perseguições das autoridades e dos inimigos que delas se utilizam como arma de ataque, e assim sendo, devem também saber qual a responsabilidade moral que assumem, pela qual terão que responder inevitavelmente um dia, como a mesma clemência que usaram para acusar. Senhores juízes e críticos dos atos alheios; tenham ao menos a franqueza de demonstrar menos por palavras de retórica pueril, do que por atos patentes, que são detentores de uma moral superior à dos humildes Negros e Caboclos que se entregam a sincera prática da Caridade Cristã, e que acusais de fetichistas, macumbeiros, falsos ou indignos espíritas. Meus caros confrades; não basta o saber empunhar ou ler de um Evangelho, destacar a beleza de seus capítulos para que alguém se julgue com direito de formular acusações sem provas. Os réus têm o direito de exigir essas provas e a idoneidade de moral dos que a não sabem divisar e respeitar em seus semelhantes. Melhor seria silenciar ou confessar francamente o completo desconhecimento da etnografia humana, da razão de ser das coisas. Porque o bom senso e a razão não autorizam a persistência ridícula da afirmativa de que a Caridade não seja Caridade, ainda mesmo que se admitisse a hipótese de ser praticada por quem tem a intenção de mistificar.

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Convenhamos caros confrades que se tendes autoridade para acreditar como mistificadores aqueles que a praticam, e mistificados os que em verdade recebem essa Caridade; abençoada seja sempre essa mistificação que traz o alivio aos que dele se sentem privados. Que persista em ser vítima do mal quem não quiser dele ser aliviado como mistificação pelos mistificadores, como os julgam os seus acusadores, na suposição talvez de que não haja quem saiba como é fértil a imaginação dos vaidosos e orgulhosos na arquitetura de ardis que lhes impeça, de forçá-los a dobrar os joelhos para beijarem agradecidos, a mão do Preto-Velho ou do Caboclo, sempre pronta a enxugar as lágrimas que a dor faz deslizar pelas faces que o sofrimento enrugou. Orgulho indomável que a tantos martírios e desgraças arrastas a humanidade; como quebrar-te senão pela dor e pelo sofrimento, senão te bastou o sublime exemplo que te legou o Nazareno, e que mil novecentos e trinta anos foram insuficientes para te fazer compreender a sua sublimidade e grandeza. Que Deus se apiede de todos nós. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 21 de Janeiro de 1933 – página 10) PRÁTICAS ESPÍRITAS Para a indispensável regeneração do caráter e conseqüente progresso moral da humanidade, em benefício de seu bem estar e felicidade, suponho que todas as modalidades e todos os caminhos trilhados se justificam, seja por habitantes das mais progressivas metrópoles, ou das mais selvagens regiões do Planeta. Por maior que possa apresentar-se a diversidade de linguagens, a excentricidade de hábitos e costumes que caracterizam os povos e as criaturas humanas, identificando-as com o seu meio social, não constituem essas diversidades obstáculo ao desejo e ao exercício da prática efetiva da Caridade. Não é Caridade, dever, obrigação ou privilégio exclusivo de raças, castas, classes ou indivíduos, mas sim, dever cristão de todos os filhos de Deus Pai, entre os quais se não podem tolerar ou admitir distinções. A ninguém é dada autoridade moral para pretender impedir o exercício da Caridade, e quem pretensiosamente tentar assumir essa autoridade, seja qual for o pretexto, será pelo mais leve raciocínio e lógica reduzido ao ridículo. É necessário que se não queira confundir Tenda de Caridade Cristã, com escolas de ensino leigo; se naquelas se proporcionam pelo exemplo, pela ação e pela palavra e educação moral como finalidade capital, nestas há especialmente o cuidado da educação intelectual. Sendo inteiramente diversas as finalidades, não se pode exigir uniformidade de métodos, sendo os mesmos adequados as mesmas. Incontestável é a utilidade de ambas essas finalidades, mas o raciocínio nos leva a reconhecer a primazia da educação moral, e, portanto, a razão de ser de nos merecer maiores cuidados e melhor atenção. O Espiritismo não nos veio revelar uma moral nova desconhecida por nós; veio sim, consolidá-la mostrando-nos a imortalidade da alma, indicando à humanidade a maneira como se deve conduzir pela responsabilidade que cada um assume com a mesma conduta para com os semelhantes, o inevitável resgate dessa responsabilidade e como resultado a necessidade imprescindível de aperfeiçoar os seus sentimentos e os seus atos. Não é necessário ser espírita para que se seja bom e digno, mas, somente pode ser encontrada na razão lógica dos seus princípios a razão de ser de nossos sofrimentos, de nossas alegrias e da nossa própria existência. Alongados os horizontes pelas suas revelações de além-túmulo, é nos dado compreender quem fomos, o que somos e o que seremos segundo nossa conduta passada, presente e futura. Pelas suas revelações, melhores compreensões podem ter da grandeza Divina, Sua Justiça e Seu Amor, constituindo todas essas revelações a mais sólida base no mais sólido terreno sobre os quais se ergue hoje majestosamente a sublime moral Cristã, só ela capaz de conduzir a humanidade aos pés de Seu Criador, como digna e merecedora das Suas Graças, numa completa harmonia de Paz e Amor. Jesus, na sua passagem pela Terra, preocupou-se mais em legar nos exemplos de moral que de intelectualidade certo de que muito mais nos aproveitavam aqueles, e que foram sem dúvida a razão de ser de seu martírio e da sua missão.

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Pregando e exemplificando o Amor entre todos os seus filhos, não deixou de castigar quando julgou necessário fazê-lo, mas não castigou a ignorância, e sim a maldade dos perversos, os que se utilizavam da crença religiosa e dos templos dedicados ao culto para explorar os seus semelhantes; e enquanto assim procedia com os vendilhões do templo, perdoava as ofensas diretas reconhecendo a ignorância dos seus autores. Diante de tão nobres exemplos, os que agindo em seu nome procuram aliviar e confortar os sofredores, encaminhando os transviados do caminho do dever, fazendo-o pela forma que lhes é propícia e conveniente, não podem nem devem pela sua abnegação verem-se acusados, censurados, criticados e humilhados, por não observarem modalidades que lhes pretendem impor os que por tal razão se sobrepõem à autoridade do Mestre. As modalidades podem agradar ou desagradar aos que se preocupam mais com os seus aparatos, mas para aqueles que têm uma nobre finalidade preconcebida, não valem senão pela sua utilidade e conveniência ao êxito do desideratum e isso deveria explicá-las suficientemente. Infelizmente, porém, nem a profusão a clareza dos detalhes e das minúcias tem bastado para os que preferem ignorar para persistirem nos prazer de agredir e acusar. Seja tudo pelo Amor de Deus. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 26 de Janeiro de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS Devo confessar com toda a lealdade que, os meus vinte e cinco anos de crença, dedicação e observação das práticas espíritas em suas várias modalidades, a freqüência com regular assiduidade nas Tendas Espíritas onde se praticam e exercem atividades caritativas, rigorosamente cristãs, por entidades do espaço, componentes da denominada “Linha Branca de Umbanda”, não consegui ainda sair do terreno do aprendizado, para que me possa apresentar como profundo conhecedor da significação minuciosa das referidas modalidades, certo de que outros há que com maior capacidade as poderão traduzir. Consciente, preocupado mais com a razão de ser e as finalidades, absorvido com a beneficência dos efeitos resultantes da ação, com a análise da sinceridade e honestidade das intenções e de seus autores, tenho-me despreocupado com os pequenos detalhes e minúcias, com as aparências extravagantes, dos gestos, das linguagens e mesmo de atos, pela convicção lógica de que apenas caracterizam hábitos e costumes, maneiras de agitar energias fluídicas, peculiares e propícias das diferentes raças de povos, que constituem os meios, dentro das quais se desenvolvem e exercem as atividades, sem que por essas razões se tenha o direito de duvidar da sinceridade, recusando a solidariedade e passividade necessárias e úteis aos meios e as finalidades, indubitavelmente nobres. Esforçando-me para publicamente demonstrar o resultado de minhas observações, justificando a razão de ser das modalidades combatidas sem razões lógicas que mereçam atenção, afastada de antemão qualquer suspeita de falta de sinceridade, expus claramente, exemplificando a lógica da razão de ser, mas a despeito de todos os meus esforços e boa vontade, não bastam reconheça, para satisfação dos incrédulos, dos cegos e surdos, por vaidade ou prazer, com os quais não pretendo gastar tempo e palavras. Combatem-se as modalidades em questão, confundindo-as propositalmente com as práticas exploradoras, perseguem-se, ridicularizam-se humilham-se e infamam-se os seus autores como réus de crimes que se fantasiam, e quando os réus vitimas das injustiças desses juízes de fancaria, pedem, insistem pelo direito sagrado que lhes assiste como defesa, um exame minucioso, uma análise rigorosa em todos os seus atos taxados como indignos, desonestos e criminosos, como resposta apenas conseguem ver redobrada a violência das agressões, como demonstração de um desejo diabólico de caluniar, de agredir e chama-se a isso Espiritismo, chamam-se a tais processos de doutrinas evangelizadoras. Que nos diga o bom senso, se não é mais preferível e agradável conviver com a ignorância humilde dos Pretos e dos Caboclos, que entre a mentalidade moderna dos sábios espíritas que professam essas sábias teorias. Que nos digam esses sábios, se a ação nobre e caritativa deixa de o ser, ou perde sua virtude, quando praticada conscientemente por um humilde, pobre de cultura ou mesmo por um criminoso? Que nos digam se por tais razões se torna digna de gratidão a boa ação? Que nos digam se a condição de inferioridade social de qualquer criatura humana é motivo para que se impeça o exercício da Caridade, e logicamente por esse exercício a sua educação e progresso moral? Que nos digam se hábitos e costumes de vida silvícola, são significados de perversidade ou de sentimentos indignos?

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Que nos digam se Deus na Sua Sublime Justiça e Amor seja cego ou sendo para os que lhe dão outra denominação nas suas invocações? Que nos digam, se as súplicas e as preces endereçadas a Deus tenham maior valor e eficácia, pronunciadas em Latim, Francês ou Guarani? Que nos digam, se o Negro africano por ser habitante das selvas, não pode possuir tanta sinceridade nos seus atos, na sua palavra, na sua crença e nas sua fé, como o mais “civilizado” parisiense? Que nos digam se, por comer feijão com farinha em cuia, se alimentam sentimentos menos nobres, que quando se servem iguarias em pratos de porcelana? Que nos digam enfim, se por uma simples tanga ou uma casaca se pode avaliar o caráter do seu dote? E não vamos mais longe, para não sentirmos o contraste da moralidade entre um batuque ou um caxambu, e um baile da nossa alta sociedade. Não humilhem aqueles que se nos não podem dar lições de civilização, talvez nos possam dar alguma proveitosa lição de moral e muitos há que delas sentem a sua falta. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 2 de Fevereiro de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS Prosseguindo na série de considerações que venho fazendo sobre as práticas espirituais da “Linha Branca de Umbanda”, na intenção de explicá-las e a sua razão de ser, tanto como me permitem os rudimentares conhecimentos de que disponho sobre o assunto, tem-me animado ainda à preocupação de defender aqueles que, dentro dessas modalidades, agindo com sinceridade honestidade e eficácia comprovada, se tem tornado alvo constante de agressões, mais lamentáveis quando partem de criaturas que lhes negam a legitima qualidade de confrades. Por várias ocasiões tenho frisado com clareza que não advogo práticas de exploradores e malvados, nem exploradores de práticas caritativas ou não. Esta ressalva deveria ser bastante para que deixassem de persistir os pretextos para as agressões, as quais, entretanto, continuam pelo prazer dos agressores e dos que os aplaudem. Discordar sinceramente das referidas modalidades é um direito que se não contesta, mas essa discordância deve ser baseada em razões dignas de serem analisadas, comentadas e convenientemente esclarecidas pelos que nutrem esse desejo sincero de aceitar; mas o que se estranha, o que absolutamente se não explica é que haja criaturas acreditando-se espíritas só vejam motivos para caluniar e humilhar, dando publicamente um lamentável exemplo de intolerância e falta de fraternidade. Graças à intolerância e a intransigência dos discordantes daquelas modalidades, segundo a sua mentalidade, a honestidade, a sinceridade, a idoneidade, a nobreza da ação no terreno exclusivo da Caridade Cristã nada valem, não merecem consideração nem respeito. Por tal mentalidade, todos quantos se atreverem a escrever o Bem e a Caridade, fora dos métodos de agrado dos Papas do Espiritismo, serão por eles mimoscados com epítetos de variada expressão deprimente e difamatória, e se não se encontram enclausurados nas prisões comuns, não é de certo porque o não desejem os amáveis confrades, mas porque mais tolerantes se tem mostrado às autoridades policiais. Estou crente de que não precisarei lembrar a esses caros confrades a reflexão, o raciocínio e a compreensão que devem presidir às suas sentenças condenatórias draconianas, as suas classificações, bem assim a inteira responsabilidade que assumem publicamente, devendo saber a quem terão de dar contas das mesmas. Pelas responsabilidades das acusações terão que responder, um dia, perante o mesmo juiz, a quem todos devem a satisfação de seus atos, e não serão os que agem sinceramente, convictos de que os anima a intenção de semear a Caridade, socorrendo seus irmãos que se iludirão, com a arquitetura de disfarces sofismas ou hipocrisia de atitudes que não traduzem a realidade. A “Linha Branca de Umbanda” como se denominou o exército de obreiros do espaço que tem a seu encargo o combate sem tréguas à Magia Negra, destruindo os seus efeitos, anulando-os, inutilizando os seus autores pelos meios que lhes são peculiares e propícios, tem entre nós um elevado número de auxiliares, os quais, isoladamente ou em agrupamentos (Tendas ou Centros de Caridade), se tornam solidários e passivos com a nobreza da iniciativa, sujeitando-se com essa solidariedade e passividade, a não pequenos sacrifícios em conseqüência lógica das imperfeições dos elementos que constituem o meio, entre o qual se operam a ação maligna e o seu combate.

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O heroísmo, o devotamento, o desprendimento pessoal, a soma de pesados sacrifícios do próprio organismo carnal, a afronta de sérios perigos na defesa do sofrimento de seus irmãos, tem como prêmio dos ilustres confrades as humilhações e as insinuações caluniosas que lhes atiram publicamente. Falsos ou mentirosos espíritas, baixos ou indignos, macumbeiros ou exploradores da Magia Negra, são deste quilate as condecorações que lhes reservam os seus confrades como prêmio ao mérito a que fazem jus. Evidente se torna a preocupação e a intransigência que esses confrades têm na defesa de princípios e meios em flagrante desinteresse pelos fins, quando precisamente nas finalidades regida a explicação, a justificativa da razão de ser dos meios sem alteração dos princípios, que só a cegueira dessa intransigência vê derrogados. Não satisfazem, de certo, explicações justificativas para os que preferem ignorá-las, obsedados pelo horror e pela repugnância que sentem pela ignorância humilde do meio em que se exerce a ação, que a vaidade teima em negar seja caritativa. Entre o elevado número dos que se contam como auxiliares nas referidas práticas, e entre os que a essas Tendas tem acorrido em busca de alívio para seus sofrimentos, encontram-se, hoje, inúmeros que ainda ontem encampavam e aplaudiam as mesmas agressões. Nenhuma animosidade ou ressentimento é dado alimentar-se contra inimigos que sejam; as portas da Tenda de Caridade da “Linha Branca de Umbanda” estão franqueadas não só para os sofredores, como para todos os que desejem testemunhar e analisar a honestidade da sua ação. Nelas todas serão bem-vindos, sem distinções de raças, castas, cores ou posições sociais e cada um terá aquilo que merece e lhe é permitido por Deus. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 05 de Fevereiro de 1933 – página 13) PRÁTICAS ESPÍRITAS Permita-me o prezado confrade que abrilhanta as colunas desta seção com seus artigos de combate e reprovação às práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda”, que embora acatando com o respeito que me merecem todas as opiniões sinceras, continue a discordar das suas, até que lhe seja possível provar as acusações que formula sem distinções, contra todos aqueles que agindo com a mais rigorosa honestidade e sinceridade se sentem envolvidos nessas acusações pelas modalidades de suas atividades espirituais no exclusivo exercício da Caridade Cristã. Há um ponto sobre o qual devemos estar de pleno acordo é quanto ao comércio e a exploração da Caridade, seja qual for o seu disfarce, seja quais forem às modalidades utilizadas, ambas de certo as condenamos, e, combatemos com toda a energia como contrárias aos mais sagrados princípios espíritas cristãos que ordenam se dê de graça o que de graça se recebe. Feita esta ressalva, sinto-me a vontade para solicitar do prezado confrade se digne prestar o valioso serviço à opinião pública, de apontar onde se encontram os falsos, os baixos ou indignos praticantes da Caridade Cristã Espírita, na intenção ao menos de que os evitem aqueles que se acham animados da boa fé. Estou certo de que se o prezado confrade se dignasse proceder a uma escrupulosa análise nas Tendas de Caridade onde as modalidades são as referidas em questão, observando com o máximo rigor os atos, as intenções, as causas e os efeitos, e, bem assim a idoneidade moral dos praticantes, terminaria por constatar que suas englobadas acusações difamantes e deprimentes, constituem um crime do qual se encontraria no dever de se penitenciar perante àqueles que se tornaram vítimas da sua irreflexão. Acusando, está o confrade no dever de provar suas acusações, e é apenas isso que desejam os que se não consideram merecedores das mesmas. Diz o ilustre confrade que não tolera que se emprestem a Caboclos ou Africanos poderes superiores, não admitindo, portanto, que um Espírito de condição elevada, possa assumir uma humilde personalidade no sublime cumprimento de uma nobre e digna missão caritativa, opinião esta, com a qual discordo inteiramente, porque admito até que a despeito da inferioridade e humildade de qualquer criatura que seja, não se encontra por tal razão impedida de fazer o bem, de poder praticar boas e dignas ações, tanto mais que o exercício do Bem e da Caridade é condição indispensável ao progresso de todas as criaturas.

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Não ignora que haja infelizmente quem se utilize da ignorância de muitos dos nossos irmãos do espaço para a prática do mal, mas não procedem dessa forma, aqueles cuja finalidade consiste precisamente em combater, livrando-nos desses malvados e seus perversos condutores, procurando convertê-los pelos meios mais adequados em relação com os mesmos, inutilizando-os e as suas malignas ações. Pergunta o prezado confrade, porque senão utilizam os falsos espíritas e os macumbeiros dos Espíritos já evoluídos para a prática do mal. É uma pergunta ingênua para ser por eles respondida, e a qual eu não terei a menor dúvida em responder quando o confrade me puder provar que procedo dessa forma, ou aqueles a quem tenho emprestado minha solidariedade moral no nobre exercício da Caridade, defendendo-os de seus acusadores gratuitos. Não é o cenário ordinário do feitiço que afugenta os bons, e sim, a perversidade, a hipocrisia, a vaidade e o orgulho dos autores; a pobreza do cenário traduz muitas vezes a humildade e a pobreza do meio, pelo que ninguém pode ser considerado criminoso ou indigno de merecer a consideração alheia. Que cada um continue a dar aquilo que tem, com teorias baseadas em dados que podem ser taxados de falso, mas que sejam sinceros; que seja o produto de uma consciência e um raciocínio puro e honesto. Ainda bem que o prezado confrade reconhece que Deus não faz seleções entre os seus filhos; somos nós que pretendemos estabelecê-las por vaidade ou orgulho, sentimentos estes que levam criaturas humanas a julgar que aqueles que por sua infelicidade se acham ainda nas profundezas dos abismos, só devem dali ser retirados quando puderem instalar um elevador automático moderno, porque as cordas são um instrumento e um meio muito antiquado e mais vagarosas, podendo ainda sujar as mãos dos seus salvadores. Perdoe-me o prezado confrade a franqueza de minhas considerações, produto de um simples e modesto aprendiz. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 08 de Fevereiro de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS As atividades de nossos irmãos do espaço, as energias fluídicas dos que podem dispor, são provocadas e exercidas por várias formas, meios diversos e finalidades distintas. Se alguém pretender identificá-las aos seus autores materiais, e, espirituais, sem o risco de caírem com ela, indispensáveis se tornam proceder a uma escrupulosa análise das referidas atividades, especialmente das finalidades pelas quais se explicarão os meios e as modalidades. É preciso não se ignorar que há práticas espíritas de rigorosa e sincera honestidade com nobres intenções caritativas; há práticas exclusivamente científicas sem caráter algum religioso; há práticas mais ou menos rendosas, exercidas como profissão ou não, com intenções dignas, indignas ou indiferentes dos praticantes; há práticas de ignorantes sem maldosas intenções e sem viso de interesses pessoais; há práticas de vaidosos ou orgulhosos exibicionistas, e há, finalmente, as mais perniciosas, que são as dos perversos praticantes da Magia Negra por prazer, maldade ou interesse, exercidas com ou sem conhecimento das graves responsabilidades dos seus autores. Sejam quais forem os meios ou modalidades e os fins não se podem negar sejam elas espirituais, desde que entram em ação entidades do espaço e suas energias fluídicas não se enquadrando em nenhum delas a classificação de falso espiritismo. Falsas práticas, nenhuma são ainda que pareçam ser aos autores espectadores ou vítimas, sendo suficientes a vontade e as intenções para que provocada e exercida seja a ação, em maior ou menor grau, cujo grau está na respectiva escala, em relação com as circunstancias do meio, da vontade, do desejo, das intenções e do merecimento de cada um. Não deve haver dúvidas sobre a execução da ação a qual se poderá refletir nas pessoas visadas ou nos próprios autores, quando dignos da mesma, como recompensa relativa às intenções que os animam, uma vez que a referida ação seja provocada pelo simples pensamento traduzindo a vontade, podendo a sua execução ser feita consciente ou inconscientemente para as entidades materiais. Sendo a ação do bem e do mal permitidas por Deus na razão direta do merecimento de cada um, explicado está o motivo porque, nem sempre a criatura boa e bem intencionada consegue ver satisfeitas as suas boas intenções e como por vezes uma criatura indigna e mal intencionada pode exercer o bem independente das suas qualidades, mas merecido por quem o receba. O mérito está mais na pessoa que recebe do que na que dá, podendo estar ambas ou nenhuma se não são dignas do mesmo.

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É comum verem-se criaturas satisfeitas em suas aspirações quando justas e merecidas, recorrendo a reconhecidos exploradores de práticas espíritas, as quais propagam e enaltecem o valor dos exploradores, sem que mérito algum lhes caiba por atos, exercidos a revelia de suas personalidades, como instrumentos inconvenientes que foram da ação benéfica constatada. Não é menos comum verem-se outras em contínua peregrinação pelos Centros de Caridade, sem conseguirem a satisfação de seus desejos, porque não sejam justos, ou porque os não mereçam, e então propagam a descrença e a ineficácia da ação caritativa dos referidos Centros e da própria doutrina. As responsabilidades contraídas nesta ou em anteriores encarnações são inevitáveis; a ninguém é dado evitá-las, não há ardil ou força humana capaz de impedir que qualquer criatura se furte ao resgate dos compromissos assumidos, por força de Leis Naturais imutáveis. Se todas as criaturas se compenetrassem de tão sublime verdade, não assumiriam decerto, com a prática de atos menos dignos a responsabilidade, cujas conseqüências não poderão ser evitadas e daí grandes benefícios resultariam para a paz e felicidade humanas. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 11 de Fevereiro de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS É no abuso do livre arbítrio que se encontra a causa dos sofrimentos de suas vítimas e seus autores, estes, pela responsabilidade desse abuso. Predominando ainda entre a humanidade a preocupação pela satisfação de interesses pessoais, desprezados são os interesses alheios, em conseqüência do que, se desenrola a luta desmedida de competições e conquistas numa inteira despreocupação pela única felicidade que se pode e deve aspirar a felicidade espiritual, para conquista da qual se torna absolutamente indispensável a regeneração do caráter, a condução pautada dentro dos mais sagrados princípios da pura e sublime moral Cristã. As práticas espíritas caritativas sinceras e honestas são inegavelmente a mais salutar escola do exercício da bondade, tanto no mundo material como no espiritual, eficazes como o melhor meio de educação moral proporcionada pela palavra exemplificada por atos caritativos, são ainda a mais abundante fonte de alívio de grande número de sofredores e de seus sofrimentos. Mas, se é verdade incontestável que estas práticas se revestem de tão sublimes virtudes, não é menos verdade que, quando exercida por exploradores e perversos, se transformam no mais pernicioso cancro humano nas mais intensas fábricas de martírios e desgraças, de misérias psíquicas e morais, são o melhor instrumento de perversão tanto de encarnados como desencarnados, de cuja ignorância se utiliza para fins de exploração e maldade. Treme-se de pavor ante a simples lembrança de que criaturas há sobre a Terra, capazes de transformarem práticas espíritas malvadas em profissão ou fonte de renda, e a verdade infelizmente é que existem em não pequeno número espalhados em todos os cantos, essas infames e covardes criaturas que de humanas tem só a forma. Aninhados nos seus antros de Magia Negra como feras repugnantes, desenvolvem suas negras e infames atividades convictas da impunidade de seus crimes, constatados pelas autoridades policiais, desde que essas ignóbeis atividades se desenvolvem entre o mundo espiritual, onde a justiça terrena não pode sentenciar. Mudem-se, porém, esses miseráveis com a impunidade de sua atividade criminosa e indigna, a sua perversidade e as funestas conseqüências de seus atos, as suas tremendas responsabilidades terão de ser inevitavelmente resgatadas, até ao último ceitil, e essas responsabilidades abrangem a parte que lhes toca, pela infâmia de reduzirem infelizes ignorantes ou malvados, fazendo-os comparsas e cúmplices de seus crimes. Ainda bem que contra esses ambiciosos e covardes, contra a sua negregada atividade, contra a ação maléfica que exercem servindo-se de seus irmãos do espaço, cuja ignorância e maus fluídos aproveitam, se erguem, se intensificam e arregimentam em maravilhosa organização guerreira espiritual, esses devotados e heróicos combatentes que constituem e exercem a defesa e o combate de tão perniciosas atividades, esses nossos amigos obreiros da Caridade, soldados da “Linha Branca de Umbanda”, terror dos malvados e dos exploradores. É de lamentar que tão mal compreendidos sejam estes devotados guerreiros, pelos que desconhecendo as suas nobres virtudes colocam em dúvida a sua sinceridade, ridicularizando-os, humilhando-os, pela sua condição modesta e pela modalidade de suas atividades.

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Infelizmente para a satisfação de caprichos e interesses pessoais, não trepidam os interessados ante a infâmia dos meios e das conseqüências recorrendo a esse, comerciantes da desgraça alheia, nem eles tão pouco pela sua ambição em servi-los, e entre os que assim procedem se encontram muitas criaturas de posição social destacada e que na sociedade onde convivem hipocritamente se fazem passar por descrentes da ação e da existência espiritual, servindo-se, entretanto, da mesma para vinganças, perseguições ou conquistas de proveitos materiais. A sua covardia, a sua perversidade e a sua falta de caráter se nivelam com a dos infames aos quais recorrem furtivamente para a satisfação de pretensões indignas ou merecidas, esquecidos ou duvidando da responsabilidade que lhes toca como prêmio da sua ação. Triste, bem triste, será o despertar para a realidade, quando se sentirem esmagados pelo peso de seus crimes, afogados pelas lágrimas que fizeram derramar, atormentados pelos gemidos e pelos queixumes das suas vítimas indefesas; tarde demais para evitar o castigo merecido. Quisera poder gritar e ser ouvido por esses desgraçados para adverti-los das tremendas responsabilidades que assumem diante da extensão das suas maldades, pedirem-lhes que se reflitam um momento sequer no peso dessas responsabilidades e desgraças que semeiam, as quais não haverá força humana capaz de evitar como recompensa lógica de uma atividade indigna, do abuso vil e ignóbil do seu livre arbítrio. E a esses inadvertidos que procuram conquistar posições imerecidas a custa do sacrifício e do sofrimento de seus semelhantes, servindo-se da ignorância dos nossos irmãos do espaço e suas energias ativas malignas, eu lhes direi que muito terão de amargar pelas satisfações momentâneas obtidas por tais processos na vida material, quando as vítimas sacrificadas lhes exigirem contas como seus autores. Não se progride nem se conquista a felicidade real pela força, pelo ardil, ou pela moeda, mas sim pelo merecimento, pela elevação de caráter; fora disto, tudo ilusório, momentâneo e transitório. Que Deus esclareça os ignorantes e os malvados. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 12 de Fevereiro de 1933 – página 13) PRÁTICAS ESPÍRITAS – COMBATE A MAGIA NEGRA Deve ser este o brado que deve repercutir em todos os recantos da Terra, como quem anunciando a era de uma ofensiva sem tréguas contra autores, ação, e as funestas conseqüências das práticas espíritas de Magia Negra, profusamente exercida dos exploradores ambiciosos e perversos, numa extensão tão clamorosa que justifica a necessidade e a energia da luta do combate acérrimo. Não cogita de uma luta para satisfação de vinganças, de ódios, de invejas ou quaisquer sentimentos anticristão, mas sim, de defesa contra a ação maléfica de indignos, de covardes e malvados que utilizando-se da ignorância e fraqueza de instintos de seu irmãos desencanados, os arrastam ao serviço das suas infames satisfações, ambições exclusivamente materiais e pessoais, conduzindo aqueles infelizes ao caminho da desgraça onde vão semeando o sofrimentos e a dor, agravando cada vez mais as suas responsabilidades, e elevando o número de desgraçados. Falando elementos, as autoridades terrenas, para que exerçam uma indispensável repressão contra esses perversos exploradores praticantes da Magia Negra, sobram sem dúvida esses elementos para aqueles que dentro das práticas espíritas se sentem animados das mais nobres intenções, e encorajados pelo desejo de exercerem essa indispensável e útil repressão, sem que, desvirtuadas sejam essas nobres intenções pela energia de uma ação, cuja elevação de finalidade justifica. A energia da luta e do combate tem e presidi-la tanto por princípio como por fim a exclusiva prática da Caridade, e não deve em absoluto descer ao terreno da vingança seja contra quem for, seja qual for o grau de perversidade do autor, seja qual for a extensão de seus males. Quando a conversão dos perversos ou ignorantes não pode ser satisfeita mutuamente, seja pela palavra ou pelo exemplo demonstrativo da necessidade e das vantagens da mesma, resta como recurso extremo, quebrar e anular a ação desses malvados, sendo sem dúvida esse recurso mais digno, do que abandoná-los consentindo-lhe que semeando o sofrimento, agravem o peso das suas responsabilidades, pela persistência na sua ação devastadora da tranqüilidade de suas vítimas. As modalidades de que se reveste essa luta não poderão de forma alguma deixar de estar em relação com o meio e as circunstâncias que o cercam, não devendo absolutamente justificarem a separação ou a divergência dos combatentes, quando as finalidades não são quebradas em sua sonoridade identificando-se em perfeita harmonia pela sua elevação.

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Tolher-se o livre arbítrio de uma criatura humana quando do mesmo abusa em prejuízo dos seus semelhantes, não pode constituir um crime ou um erro, quando se tem a convicção de que, desse abuso resultam vítimas, sendo a maior vítima o próprio autor desse abuso, pela responsabilidade de que sobre si acarreta. Ato de caridade deve ser, portanto, impedir-se de ser empregada a energia, que só o grau de rebeldia requer, e torna necessária. Os praticantes da Caridade Espírita da denominada “Linha Branca de Umbanda”, chamaram a si a iniciativa dessa luta, de combate sem tréguas ante a extensão da maldade exercida pelos praticantes da Magia Negra, conhecendo bem a gravidade, a responsabilidade, as asperezas e os espinhos dessa luta, certos de que não lhes será recusada a assistência e o valioso auxílio capital dos bons amigos do espaço, aceitando agradecidos os de todos, seja qual for a sua personalidade, por mais humilde que seja ou pareça ser, desde que se identifiquem os desejos e as intenções, numa ação conjunta, conduzidos e iluminados por uma ofuscante estrela... a Virgem Mãe Santíssima, como guia Jesus Nazareno Não importa de certo a esses trabalhadores, nem lhes sobra o tempo para que se preocupem com impensados, o que apegados aos preconceitos sociais se não limitam apenas a lhes negarem sua solidariedade moral que seja, nessa luta tão nobre e elevada, como confrades que negam ser, combatemos e apontamos a execração de seus irmãos, como indignos de merecerem consideração e respeito. Não se satisfazem esses irrefletidos com as humilhações a que tem procurado submeter os obreiros da “Linha Branca de Umbanda”, procurando ainda embaraçar, dificultando a sua ação, senão a defesa intransigente desses preconceitos, os quais se esforçam por enquadrar dentro dos Evangelhos e das obras dos escritores, entre as quais se acomodam melhor que as palavras de retórica balofa, os exemplos das ações nobres e caritativas. Nas fileiras dos combatentes contra a Magia Negra, há lugar pra todos os de boa vontade, seja qual for a sua raça ou cor, seja qual for a sua condição de progresso espiritual, e essas fileiras aumentarão cada vez mais pelos que com exemplos se vão convertendo de obreiros do mal, em combatentes do mesmo, em obreiros do Bem. Se há quem acredite humilhar-se alistando-se nessas fileiras; se há quem se acovarde diante dos espinhos desta luta, que se recolha no silêncio desse orgulho e dessa falta de coragem, onde não seja perturbado pelos que apenas divisam a nobre missão que tem a cumprir. Seja-me permitido advertir esses infelizes transviados, menos pelos males que possam ocasionar nessa luta, que pelas suas próprias obras cujas responsabilidades assumem, vós praticantes da Magia Negra, meditai bem, refleti no Negror e na imensidade de vossos crimes; lembrai-vos de que nunca será tarde para retroceder no caminho; lembrai-vos de que nunca será tarde demais para a reflexão e arrependimento; inevitável será a responsabilidade de vossos atos e suas conseqüências; o resgate é imprescindível, temeridade é sem dúvida e persistência no erro o agravo da responsabilidade, sob o peso das quais sereis vencidos, esmagados, fatalmente; recuar desse caminho que palmilhais em vosso próprio benefício. Que Deus tenha piedade de vós, permitindo aos obreiros da “Linha Branca de Umbanda” possam, eles manietar a vossa ação, aniquilar as vossas maldades, cassar o vosso livre arbítrio, apressando a oportunidade do resgate da vossa criminosa ação. Animam esses obreiros da Caridade o desejo e a ação de defesa das vossas vítimas, sem vos almejar senão a vossa conversão tão depressa quanto seja possível e permitido por Deus na sua misericórdia e bondade infinita. Que Deus vele por todos os seus filhos. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 16 de Fevereiro de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS – COMBATE A MAGIA NEGRA É necessário que se compreenda a ação e se reconheça a enormidade de extensão dos graves malefícios espalhados pelos infames obreiros da Magia Negra, para se poder avaliar o quanto é necessária a conjugação de todas as criaturas de boa vontade, empregando o máximo de se esforço para que incentivada e redobrada seja a intensidade da luta, do combate sem tréguas aos autores e aos nefastos efeitos da sua ação. A mais perfeita e poderosa organização de combate existente no momento, tal como no-la descreveu brilhantemente o muito ilustre e prezado confrade Leal de Souza, deve-se sem dúvida a esse Espírito iluminado que a chefia e que se acoberta na humilde personalidade do Caboclo das Sete Encruzilhadas.

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Se grande é indubitavelmente o seu poder benéfico e o da organização que preside no espaço, coadjuvada por seus auxiliares terrenos, se eficaz e frutífera tem sido a sua ação, se extraordinários tem sido os benefícios semeados nessa luta titânica encetada e travada em favor das pobres vítimas indefesas da ação traiçoeira da Magia Negra, é indispensável que se reconheça o quanto mais fértil seria a colheita desses benefícios, se esse grande e abnegado trabalhador e seus soldados tivessem ao menos a solidariedade moral de todos aqueles que, ainda mesmo não sendo espíritas, ou não sendo apologistas das suas modalidades de ação, tenham a defesa de que, aliviados possam ser os sofredores e aliviados sejam os seus próprios sofrimentos como um dever de Caridade recíproca, reservando alguns poucos minutos diários para em fervorosa prece ao Criador, implorar a sua proteção e o seu amparo a esse devotado combatente e seus humildes soldados que engrossam as fileiras de seu admirável exército. Nenhuma razão justa pode prevalecer para que recruzada seja essa coadjuvação, quando a mesma é solicitada e precisa em nome de tão digna missão, numa luta que prima pela elevação e nobreza das suas finalidades. Recusem-se se assim o quiserem, a solidariedade, as modalidades prevalecer para que recusada se neguem a cooperar nas mesmas os que sinceramente discordam por motivos cuja razão se não pretende mais comprovar, quando o que se pede não é a aprovação ou a passividade com os meios, e sim a solidariedade moral que seja apenas as finalidades, que em verdade se não pode negar sejam dignas e merecedoras que não sejam úteis e necessárias ao bem estar a felicidade e a paz de toda a humanidade, especialmente das vítimas e dos autores da ação nefastas e devastadora da Magia Negra. Não se imploram remunerações ou agradecimentos como retribuição aos esforços e aos sacrifícios dessa falange de abnegados obreiros da Caridade, ou que se ousa implorar em seu nome por voto espontâneo; é a insignificante contribuição de uma prece erguida com fervor e fé ao Pai de Misericórdia, para que esses batalhadores tenham revigoradas e centuplicadas as suas energias para com a possível brevidade alcancem o completo triunfo a definitiva vitória nessa luta, nesse renhido combate ao mal, pela conversão dos malvados pela sua inatividade ou transformação em obreiros da Caridade. Cessem de hostilidades aos meios, a humildade de seus elementos ativos da Terra ou do espaço, a sua condição de progresso espiritual, a sua raça ou a cor da sua epiderme, a pobreza da sua linguagem, na certeza de que mais altos pairam os seus desígnios, mais elevados pairam os sentimentos que os guiam nessa heróica luta, na qual se não desconhecem os deveres fraternos para com os vencidos. Se não bastarem à clareza destas palavras, se não forem suficientes para que se possam traduzir os sentimentos que animam os que se proferem, se ainda apesar de tudo apenas continuares a ver modalidades e através das mesmas, macumbeiros, falsos e baixos espíritas, que Deus vos perdoe a vossa prazenteira cegueira, e que nos permita atingidos pela mesma em vossas acusações, perdoar-vos também. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 19 de Fevereiro de 1933 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS Por várias vezes tenho afirmado em minhas considerações, como resultado de uma demorada e criteriosa observação, que, em geral, os chefes Guias Espirituais das práticas da “Linha Branca de Umbanda” são Espíritos de elevado grau de progresso, investidos de uma personalidade transitória mais ou menos demorada, necessária e útil a uma predestinada finalidade de comprovada elevação, pelos atos e seus efeitos. Quanto a mim, repito, pelas provas colhidas em minhas observações, adquiri razões suficientes para não alimentar dúvidas sobre a identidade real, ou antes, sobre a condição de progresso espiritual dos referidos Guias, testemunhando a sua sinceridade e honestidade de suas atividades espirituais, seus efeitos traduzidos claramente pelos benefícios profusamente semeados. Para o bom êxito dessas atividades caritativas, têm esses Guias como seus auxiliares, Espíritos de todas as categorias, de todas as origens, mesmo de condição a mais atrasada, obedientes e identificados com as finalidades, animados de boa vontade, prestando os serviços que lhes são pedidos, ordenados e possíveis na medida de suas forças, num exercício que constituem a mais eficaz e produtiva escala de aperfeiçoamento moral primário, sem que prejudicada possa ser essa educação moral, pela liberdade que lhes é permitida nos seus usos e costumes familiares, caracterizando sua origem, com as quais se tornam possíveis aqueles que se utilizam dos seus serviços no seu próprio benefício e dessa causa santa, porque beneficia toda a humanidade. Os referidos Guias ao se investirem da personalidade com que se apresentam, agem assumindo essa personalidade não apenas exteriormente, mas no corpo fluídico, um organismo fluídico por tal razão sujeito a todas as conseqüências naturais relativas a todos os que se encontram no mesmo grau vibratório, apenas podendo dispor de maiores energias conferidas para o desempenho da sua missão.

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O seu organismo fluídico é perfeitamente idêntico ao da personalidade de que se investem, sendo esse o motivo por que as suas incorporações nos médiuns se revestem das mesmas dificuldades, com contrações que demonstram a diversidade fluídica existente entre eles e os médiuns de que se servem, não podendo em razão desse fato servir de base para por em dúvida a verdadeira identidade do Espírito. Casos há decerto, e não são raros, em que a humilde personalidade de um Preto ou de um Caboclo, representa o complemento de uma provação, como um castigo do orgulho cultivado em anterior encarnação, numa posição social de destaque, seja de um médico, de um escritor, de um ministro, de um imperador, etc. Essa personalidade, como digo, pode ser apenas momentânea, exigida pelo meio em que se torna precisa e útil; casos há constatados, em que o Espírito se apresenta em personalidades diferentes relativas ao meio, devendo ser elas correspondentes a suas anteriores encarnações, facultada e mudança pelas circunstâncias do meio e das atividades a serem desenvolvidas. À personalidade estão submissos todos os característicos reais, dentro das leis naturais que não podem ser alteradas; evitá-los é despir essa personalidade, e ela se destina como espiritual que é menos para nós que para o mundo dos Espíritos. Não se pode em absoluto considerar seja um retrocesso o fato de um Espírito se investir de uma personalidade humilde, a não ser que se pretenda considerar a humildade como indignidade, mais lógica e racional é divisar-se, em tal fato, em certos casos, um processo intelectual avançado, mas um progresso moral que lhe não faz parelha. Estas são as conclusões que posso deduzir de um raciocínio e de uma observação que demonstram um desejo de acertar, de aprender, e que inegavelmente fazem ressaltar a maravilhosa criação divina. Sua justiça e amor. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 22 de Fevereiro de 1933 – página 08) PRÁTICAS ESPÍRITAS – ESPIRITISMO E NÃO FETICHISMO Não sendo apenas por prazer de travar polêmica, mas sim com o fito de esclarecer atitudes interpretadas indevidamente por criaturas que suponho animadas de boa vontade e sinceridade, é, no entanto, com satisfação que acolho a opinião divergente sustentada pelo prezado confrade que se tem dignado contrastar-me com devida cortesia. Tenho motivos para me regozijar ao ver encurtada a distância que nos separa, sem que tenha eu tido precisão de arredar-me do meu ponto de vista, não ignorando que a despeito de nos encontrarmos separados por interpretações divergentes, ambos nos encaminhamos para um termo onde com certeza nos encontraremos numa perfeita harmonia de finalidades. Lastimo que o meu ilustre antagonista, sequer por um instinto de curiosidade se não tenha dado ao sacrifício de ler a série de artigos publicados pelo insigne mestre Leal de Souza no “Diário de Notícias”, já agora reunidos em um pequeno volume à venda nas livrarias, nos quais encontrará valiosos esclarecimentos sobre a matéria que tem dado lugar a controvérsia, ou pegam nas práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda”. Estou convencido de que lendo essa obra, o meu ilustre confrade daria por esgotados todos os argumentos falhos de que se tem servido para negar e duvidar da razão de serem modalidades que tanto lhe repugnam, confessando com justiça a sua falta de fundamento nas dúvidas suscitadas sobre a sinceridade e a honestidade dos que as praticam, tanto no terreno material como espiritual. Atribuo apenas à falta de uma análise ponderada o fato do confrade acreditar que as referidas modalidades maculem a santidade do Evangelho que não é apenas seu, mas, nosso também, nem tampouco os princípios doutrinários de Kardec, nos quais se enquadram perfeitamente, com menos intransigência que a observada por alguns dos seus discípulos. Que me perdoe o confrade, mas quer me parecer que as modalidades em questão, pela humildade do seu meio, são ao menos propícias ao cabotinismo, quanto à prática de atos imorais, onde interesses materiais á assunto fora de discussão, desde que as tenho reprovado com a máxima energia. O que se não pode nem deve é torcer a verdade, negando-se que o exercício da Caridade praticado por inteligentes ou ignorantes, seja o mais eficaz meio de aperfeiçoamento moral. Ninguém pretende, de certo, convencer da grandeza das entidades inferiores, como diz o irmão, mas sim dos atos daqueles cuja grandeza se identifica pela elevação dos mesmos.

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Lógica faltará com mais possibilidade aos que procuram analisar pela rama, aos que procuram ver irradiada outra luz nos Espíritos, que não seja a que provém das irradiações produzidas por atos e pensamentos dignos, nobres e elevados. Apreciações exteriores de polidez de gestos e linguagens, elegância de porte e costumes; essas fascinam as criaturas ao ponto de cegarem-nas, levando-as a deixar de aceitar, negando agradecimentos pelos benefícios recebidos, sob o protesto de ser o beneficiado de condição social superior ao benfeitor, pretendendo-se escravizá-los a preconceitos que são o maior mal da humanidade. Acha o prezado antagonista que na sua consciência é um mal ou um erro dar a Espíritos inferiores a incumbência de atividades caritativas, encaminhando-se nessa escola de progresso moral por outros mais adiantados e pelos que os estimulam, cegos a sua inferioridade, convicto de que a superioridade só poderá ser conquistada pelo exercício dessas atividades que beneficiam a todos indistintamente, inclusive os que os humilham. Mas veja o prezado irmão, quanta incoerência há nas suas palavras, traduzindo o desespero da causa cuja razão lhe falha, quando escreve (que é um fato conhecido que os seus confrades, falsos espíritas, se utilizam da magia para encontrarem Deus e Jesus nas macumbas denominadas, e dominadas por conveniências, locupletados com Caboclos e Africanos com o rótulo de “Linha” de suas invenções, cuja procedência não compreende), assim por ai fora. Esforcei-me por compreender o que pretende significar com tudo isso, e confesso que fiquei aparvalhado sem saber senão que chama de confrades a esses patifes que fazem essas maluquices todas. Mais aparvalhado eu fiquei ainda depois de tudo isso, quando o irmão declara finalizando que não acredita que a “Linha Branca da Umbanda” só trabalhe para o Bem, mas, se ela é uma ramificação do verdadeiro espiritismo, não quer saber da sua origem, não fala mal dela nem acusa os seus confrades. Vou ver se consigo compreender agradecendo essa final declaração, lamentando tenha o meu prezado irmão se espalhado tanto, batendo-se contra moinhos de vento, supondo-os soldados inimigos. Não sei se haverá por ai Linhas de outras cores. A Branca, pela sua palavra simples, significa cristalidade, limpidez, elevação, dignidade, nobreza, bondade de atos; não se pode confundir em absoluto com a oposta, a Negra, cuja ação combate, colocando-se na defesa de seus efeitos. São perfeitas e rigorosamente distintas; confundi-las, só por maldade ou ignorância. Linha são a divisa; Brancas as intenções e as finalidades de Umbanda, por imperarem nas suas fileiras elementos silvícolas aparentes ou reais. Permita o meu prezado irmão que não ultrapasse eu as raias de um simples e modesto. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 25 de Fevereiro de 1933 – página 11) PRÁTICAS ESPÍRITAS – TOQUE DE RECOLHER É chegado o momento de cessarem as divergências que separam aqueles que, dentro dos mesmos princípios, têm por finalidades a prática da Caridade Cristã e a regeneração moral da humanidade. A fase de sofrimentos que atravessamos nos demonstra a necessidade de evitá-las, combatendo as suas origens, as suas causas, e estas residem sem dúvida, nas imperfeições das criaturas que se preocupam mais com a satisfação dos prazeres e vícios materiais, do que com a sua tranqüilidade moral. No mundo espiritual, bastante é o número de nossos irmãos em precárias condições de atraso que lhes emprestam baixos instintos, tornando-nos vítimas das suas malignas atuações fluídicas, causa de graves perturbações de conseqüências incalculáveis, traduzidas em sofrimentos de toda a ordem, provocando divergências, animosidades, ódios e rancores, que arrastam por vezes as criaturas às lutas fratricidas ou às conflagrações internacionais. Entre os que povoam o espaço e nos vitimam com as suas influências fluídicas, se encontram os que partiram desta existência, tombando no campo das lutas com o coração transbordante de desejos de vingança; e nesse triste estado se conservam, atuando sobre os que se encontram ainda entre nós, na mesma afinidade de sentimentos, concorrendo para que perdure ou se alastre uma atmosfera que fatalmente nos arrastará às mais funestas calamidades. É indispensável que se intensifique a campanha de regeneração por todas as formas possíveis, em todos os terrenos, especialmente no terreno espiritual, pela palavra de doutrinação, pelo exemplo da ação, usando a energia quando ela se torne útil e necessária às finalidades em questão.

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Se as relações cada vez mais estreitas que mantemos com o mundo espiritual nos facultam como bem intencionados o desenvolvimento de uma benéfica e salutar campanha em favor do progresso moral da humanidade, proporcionam infelizmente aos perversos e covardes a oportunidade de se exercitarem nas práticas da Magia Negra, explorando-a nos seus interesses pessoais e materiais executando o ignorantes e malvados dos espaço à atuar sobre suas vítimas terrenas, sob falsas promessas e ilusórias compensações. É inacreditável que esses infames fabricantes de sofrimentos e sofredores não compreendam a extensão da responsabilidade de sua negra devastadora ação. Não nos cabe, decerto, a nós, a autoria do castigo que merecem, nem nos deve preocupar a sua execução, convictos da sua infalibilidade por força das Leis Naturais invioláveis pela Justiça Divina. O que nos deve preocupar, sim, é a anulação das suas atividades nefastas, arrancando-lhes das suas mãos esses pobres infelizes que consciente ou inconscientemente lhes servem de instrumento, convertendo-os por bem ou a força, quando assim a exijam, em seu próprio benefício. Que importa que para a eficácia de tão sublime finalidade tenham de ser utilizadas modalidades, não comprometendo a moral, cujo fito é precisamente elevá-la, engrandecê-la? Que importa que a maioria dos obreiros dessa missão sejam constituídos por irmãos privados dos conhecimentos da civilização, se os animam os mesmo propósitos que visamos, se nos auxiliam no cumprimento dessa missão com a melhor boa vontade, usando os meios relativos aos seus conhecimentos? Que direito nos assiste de lhes impor diretrizes num terreno que desconhecemos, quando mais do que eles, necessitamos do seu auxílio? Infantilidade é sem dúvida querer alguém na Terra sobrepor-se aos conhecimentos e à autoridade moral dos Guias do espaço, que encaminham esses obreiros na sua missão sublime, desmerecendo a nobreza dessa missão, porque as modalidades sejam contrárias aos preconceitos sociais, persistindo numa atitude que se tornará ridícula pela falha da lógica que a explique. Que todos os de boa vontade se congreguem nos mesmos desígnios; que todos se aliem na mesma campanha de saneamento moral; que todos se identifiquem nas mesmas finalidades; para alcançá-las todos os caminhos são dignos, não devendo ser interceptados para quem quer que lá deseje chegar. Deus abençoará esses obreiros. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 26 de Fevereiro de 1933 – página 11) PRÁTICAS ESPÍRITAS – RÉPLICA É com mais profundo pesar que sou provocado a vir em público lavrar o meu protesto, revoltado contra as aleivosias, contra as insinuações caluniosas contidas na carta do Sr. Presidente da Liga Espírita do Brasil, endereçada e publicada na “Vanguarda” de 22 do corrente, cuja carta acidentalmente me foi dada a ler por um confrade e amigo. Estupefato, começo por não acreditar em absoluto que os membros das entidades filiadas à Liga Espírita, às quais seria de presumir o senhor presidente representa-se, endossem as aleivosias assacadas em seu nome contra os seus confrades, pelo crime de praticarem a Caridade Cristã usando modalidades adequadas ao meio espiritual, no qual são verdadeiramente exercidas com a desaprovação e o desagravo daquele senhor, que por qualquer motivo, arvorado em Papa Espírita, insulta e agride-os. A despeito das afirmações e de todas as demonstrações públicas da sinceridade e da rigorosa honestidade das referidas práticas espíritas, da clareza e da elevação comprovada das suas finalidades, da idoneidade posta à prova dos seus praticantes, esse cavalheiro, contrariado publicamente na sua maneira de pensar, depois de haver declarado que não combateria em público, se bem que continuando a discordar, direito incontestável e reconhecido, surpreende-nos na sua incontida explosão de despeito, atirando sobre os que se atrevem a contrariá-lo uma série de insultos em insinuações baixas e caluniosas, pouco dignas da autoridade com que as profere. Não fora a autoridade de que se investiu para assacá-las, e não mereceriam a consideração da réplica. Confesso, apelando para o testemunho dos que me tem honrado com a leitura dos meus rabiscos nas colunas deste jornal, que apesar da estreita convivência com a ignorância humilde dos Pretos e Caboclos, ainda não me ensinaram eles os baixos e indignos processos, aprendidos na elite, de caluniar e agredir os que discordam do meu pensar.

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Na humildade ignorante, seja real ou aparente desses selvagens do espaço, eu apenas tenho colhido os mais sublimes exemplos de elevação moral, palavras de conforto e conselhos Cristãos, pronunciados na sua linguagem arrevesada mas traduzindo sentimentos de nobreza de seu caráter, não se confundindo absolutamente com a polidez das agressões que constituem os princípios exemplares dos Papas Espíritas, para quem os praticantes da “Linha Branca de Umbanda” não passa de “espertos”, “exploradores” e outras sandices que não vale repetir aqui. Conhecida publicamente minha atitude na defesa e justificativa da sinceridade e da honestidade dos que se acham fora do alcance de qualquer suspeita dentro das referidas modalidades, mais do que a eles me atingem as acusações caluniosas, lamentando que o Sr. Presidente da Liga Espírita tenha feito trincheira de papel das obras de Kardec para o ataque desferido contra seus confrades, procurando nelas o apoio que jamais poderá encontrar para maneiras tão descorteses, intolerância tão chocante, intransigência tão agressiva, forma de julgar tão insensata, orgulho tão mal disfarçado. Faço, entretanto, sem favor ao grande mestre Kardec, a justiça de o não acreditar capaz de abrigar em seus ensinamentos que não desconheço formas de proceder, de exclusiva responsabilidade e capacidade de seu autor. Para que se não suponha que me acomodo com duelos de calúnias e agressões públicas, recusando antes a luta para a qual me falham armas e terreno, ignorante no seu manejo, convido insistente e respeitosamente o exmo. Sr. Presidente da Liga Espírita a vir nessa qualidade em público, positivar individualizando às acusações que formulou na referida carta, autorizando-o desde este momento a levar o escrúpulo da sua análise aos meus atos públicos e privados em todos os terrenos, nas minhas atividades comerciais e industriais, numa labuta consecutiva de trinta e dois anos nesta capital. Freqüentando com alguma assiduidade as seções práticas de Caridade das Tendas Espíritas de Nossa Senhora da Conceição e Nossa Senhora da Guia, ambas nesta cidade e adotando as modalidades em questão, embora sem cargo de responsabilidade da sua direção, sem, entretanto me achar autorizado, tomo por mim a liberdade de convidá-lo a trazer publicamente as provas de que nelas seja explorada qualquer criatura humana, que se aceitem ou peçam recompensa por mais disfarçadas que sejam, que se exijam sequer agradecimentos pela Caridade distribuída, que se disfarcem por qualquer forma interesses de ordem material, que se explore aproveitando em proveito pessoal e ignorância de quem quer que seja. Levado o exame e análise até a vida privada dos responsáveis pela direção terrena dessas Tendas, se provadas não poderem ser as aleivosias assacadas tão graciosamente, eu me julgarei com o direito de exigir publicamente que a Liga Espírita do Brasil não continue a ter seus destinos geridos por quem não possui o controle de seus nervos, de seus sentimentos e instintos, colocando em tão delicada e triste situação as entidades que represente, senão a própria doutrina que justifica sua organização e sua existência. Que me perdoem Deus e os meus confrades, meus excessos de revolta, culpado como me acredito de os ter tornado alvo das agressões que os atingiram, talvez pela evidência com que os defendia, que considerei a considerarei preferível a covardia de um silêncio que poderia ser interpretado como a confissão dos crimes imputados. Não temo a responsabilidade da defesa assumida, certo quando tomei essa iniciativa de que não faltaria quem me sobrepujasse na intelectualidade que a possuo em fraco grau para que dela me envaideça ou orgulhe, da sinceridade das minhas palavras e da honestidade dos meus atos, especialmente no terreno espiritual, não pretendo fazer monopólio, mas não posso permitir sem revolta e protesto, que pretenda alguém, por mais cultura se julgar privilegiada na elevação e nobreza dos sentimentos que devem presidir essas palavras e esses atos, e que conferem a qualquer o direito de dizer-se espírita. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 02 de Março de 1933 – página 08) PRÁTICAS ESPÍRITAS “Os humildes serão elevados, os orgulhosos serão humilhados”. Este axioma cristão encerra em sua estrutura o mais sublime princípio da Justiça Divina. Firmado neste princípio tenho encontrado nele o melhor e mais sólido apoio, para demonstrar claramente, à luz meridiana do Sol, sem subterfúgios ou sofismas a razão de ser dos fatos que vejo contestados ou postos em dúvida, sem que argumentos mais lógicos, mais sensatos lhes emprestem outra interpretação. Aceite a incontestabilidade desse preceito da Justiça Divina, não se pode negar, senão crer como verdade, que as criaturas humanas evoluídas apenas nas faculdades intelectuais sejam submetidas à investidura de uma personalidade, à qual pela sua condição social do meio se sujeite a humilhação.

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Como conseqüência lógica, nada mais razoável e claro que um imperador ou um soberano de ontem cultivando o orgulho e a vaidade, se encontrem disfarçados hoje na carcaça um Preto ou de um Caboclo, humildes personalidades estas que significam o prêmio merecido pelos sentimentos cultivados em existências passadas, pela violação do preceito Divino. Constituindo a humildade da personalidade uma prova indispensável ao progresso moral daqueles que incorreram nas penas da humilhação, pode-se decerto admitir que seja essa prova completada na Terra ou no espaço, como uma missão entre os irmãos da mesma raça. Sendo a vaidade e o orgulho, por infelicidade nossa, largamente cultivados entre nós, é de prever que, elevado seja o número de irmãos nossos no mundo material e espiritual, os quais se encontram submissos a essa prova de resgate. A revelação da identidade dos que passam por essa prova, constituiria para os mesmo uma humilhação maior e isso nos é vedado a nós, como a eles talvez, a ninguém cabendo direitos de impor a revelação. Por vezes nos é dado compreender ou conhecer essa identidade quando espontaneamente no-la revelam, ou a divisamos através dos conhecimentos e ensinamentos que desses Espíritos colhemos quando úteis e precisos às causas dignas, por tais permitidos e ministrados. Inúmeros e constantes são os exemplos que se nos deparam no intercâmbio que mantemos com o mundo espiritual, especialmente no meio humilde e caritativo, só não testemunhados pelos que acreditam uma indignidade o convívio espiritual com os humildes, pelos que se julgam feridos no seu orgulho, tendo de dobrar o joelho e depositar o ósculo de reconhecimento na mão preta ou bronzeada que lhe proporcionou a Caridade, que o arrancou do abismo em que se afundava. Para esses orgulhosos, digam-se eles espíritas ou não, não faltarão de certo às carcaças de Pretos-Velhos e de Caboclos que lhes deixarão aqueles a quem humilharam, que atiraram ao ridículo e ao repúdio dos seus irmãos, e então, quando engalanados com essas carcaças como prêmio ao seu mérito, quantos desejarão os carinhos, a passividade dos “falsos espíritas”, dos “macumbeiros” que divisam em todos os entes humanos filhos de Deus. Ignoram esses espíritas de “Alta Cultura”, que pela qual fora condição de um filho de Deus, se não merecer ele a gratidão e a consideração de seus irmãos, é pelo menos merecedor da sua compaixão, em hipótese alguma podendo com razão e justiça tornar-se alvo de humilhações, de ridículos e muito menos atiradas por aqueles que se fazem acreditar como espíritas. “Ad Majorem Del Gloriam”. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 05 de Março de 1933 – página 08) PRÁTICAS ESPÍRITAS – NO CAMPO DA LUTA A hora permite o comodismo da inatividade aos cristãos de boa fé, de boa vontade, quando todos podem concorrer na medida das suas forças para o feliz êxito de um desideratum que se traduz com clareza, sem lugar para interpretações duvidosas. O concurso solicitado não é, como se possa imaginar, para métodos de atividades que a alguém desagradem; é sim, exclusivamente para as finalidades que se revestem de uma elevação e de nobreza incontestáveis; é para a regeneração do caráter dos que desconhecem a moral cristã. A ninguém é dado recusar esse concurso solicitado, quando suficiente e valioso ele poderá ser, como o sacrifício de alguns minutos de recolhimento numa fervorosa prece ao Altíssimo para que conforte e revigore o esforço daqueles que na Terra e no espaço se empenham nessa luta, se submetendo às suas refregas, sentindo mais de perto as suas conseqüências, sujeitos a crítica e as acusações dos irrefletidos. A súplica elevada ao Altíssimo será precedida pela imploração do perdão para esses infelizes que só a ignorância faz arrastá-los ao abismo, onde se encontram sob o peso das suas negregandas atividades. Nem por sombras deve ser esquecido o sentimento de fraternidade que a todos deve unir, como filhos do mesmo Pai, numa luta em que a vitória favoreça mais aos vencidos que aos vencedores. Proclamada a intensificação desta luta, redobram de atividade os praticantes da Magia Negra, fazendo voltar todas as suas atenções, cheio de ódios e de desejos de vinganças contra aqueles que se propõem a anular as suas nefandas atividades, contra os que lhes embargam os passos na estrada por onde tem semeado as dores, as lágrimas e o sofrimento, visando-os diretamente, forçando-os a uma defesa constante, a uma vigilância mais cuidadosa, abrigados e protegidos pelos bons amigos Guias do espaço, e pela muralha erguida, sustentada e solidificada pela fé em Deus, contra a qual se quebrarão e anularão todos os seus esforços.

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Arregimentados no espaço todos os elementos de boa vontade, dentro da perfeita organização mantida pelos Guias Espirituais no desempenho da missão que lhes foi conferida, cresce dia a dia esse exército de combatentes, engrossando cada vez mais as suas fileiras pelos que vão sendo convertidos, numa luta que só terá tréguas quando conquistado pelo desideratum que a provocou e incentivou. Que Deus ilumine os obreiros da Caridade. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quinta-Feira, 09 de Março de 1933 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS – AMAI AO PRÓXIMO, COMO A VÓS MESMOS Dentro deste preceito Divino terá que firmar-se a base da única e verdadeira fraternidade universal, não existindo forma de regime social capaz de estabelecer a igualdade, nem tratado internacional que possa assegurar a paz entre a humanidade antes da convicção absoluta e geral da necessidade imprescindível do respeito e fiel cumprimento desse preceito como o mais sólido alicerce para a paz duradoura e salutar. Não formo ao lado dos pessimistas por índole, reconhecendo que, a despeito de todos os entraves criados pelos que se interessam pela lutas armadas, a despeito da falta de sinceridade que nem sempre preside os atos e as palavras dos que aparentemente se interessam pelo problema da paz, muito se tem avançado nesse terreno, mas muito mais se terá de avançar, cabendo a vanguarda aqueles que animados dos melhores propósitos, guiados e iluminados pelos ensinamentos espíritas, mais que ninguém tem por dever sagrado desenvolver e lavrar o campo para que profusa seja a sementeira e farta a colheita. É deveras lamentável o contraste que nos oferecem alguns maiorais, confrades do mesmo credo, investidos do bastão de “líderes” de seus irmãos de crença, demonstrando ignorarem ou tão mal cultivarem os sublimes princípios doutrinários, fazendo brotar e alastrarem-se animosidades alimentadas por uma intransigência de pontos de vista que só encontra acolhimento na vaidade e no orgulho disfarçado na intangibilidade, em que colocam e interpretam esses princípios, incompatibilizando-os com os mais sagrados preceitos cristãos. Convenhamos que, por maior que seja a ignorância ou a maldade de ente humano, não lhes tiram o direito de irmãos, filhos do mesmo Deus, não sendo decerto repudiando-os, atirando-os ao isolamento do convívio da maldade de seus iguais que se pratica obra fraterna; não será ridicularizando-os, humilhando-os pela sua pobreza de cultura e sentimentos, pela sua precária e inferior condição social, pela pobreza de linguagem e costumes que se conseguirá fazer frutificar a verdadeira fraternidade. Convenhamos prezados confrade, que essas formas de pensar e agir não se harmonizam com os ensinamentos espíritas cristãos, nem poderão ser interpretadas pelas criaturas de senso como a maneira aconselhável e exemplar de se “amar ao próximo, como a si mesmo”. Não será separando, criando animosidades entre criaturas que tem a animar seus atos os mesmos propósitos de nobreza, que se praticará obra meritória espírita cristã. Maior gravidade assume essas irrefletidas atitudes, quando partindo de pessoas ou em nome de coletividades, a quem cabe o dever de exemplificar a tolerância, o amor ao próximo, a fraternidade e a clemência para com os pressupostos criminosos, ou mesmo os que o sejam. Maior gravidade assume essas irrefletidas atitudes, quando partindo de pessoas ou em nome de coletividades , a quem cabe o dever de exemplificar a tolerância, o amor ao próximo, a fraternidade e a clemência para com os pressupostos criminosos, ou mesmo os que o sejam. Se o criminoso assume com a prática do crime uma responsabilidade equivalente, inevitável não há senão que lastimar, e ter compaixão do seu ato pelo qual responderá com todas as suas conseqüências, desde que nos não seja dado impedir a sua prática para acusá-lo de seu crime; tem ele a própria consciência que melhor que ninguém julgará os seus atos sem errar. Como espírita que procuro e me esforço de ser, confesso que me não seduz a toga de juiz de meus irmãos; antes, recusarei sempre que puder a investidura, consciente da sua responsabilidade. O pseudônimo que adotei, traduz a aversão pela exibição e a modéstia de minha fraca cultura; dele não abrirei mão, como demonstração da falta de covardia moral. Que me seja permitido permanecer na humildade da minha simples condição de aprendiz. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 18 de Março de 1933 – página 09)

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PRÁTICAS ESPÍRITAS – LINHA BRANCA DE UMBANDA Não é possível a clareza e a simplicidade das considerações que tenho feito sobre a razão de ser das modalidades dessas práticas espíritas, possam deixar margem a interpretações, insinuações e conclusões capciosas. Na falta de fundamentos lógicos, sinceros e honestos, torna-se a realidade das coisas e dos fatos, citando-se trechos dos Evangelhos, cuja verdadeira interpretação serve apenas para reforço das minhas considerações e do meu ponto de vista, contrário ao orgulho, a vaidade, ao egoísmo, a falta que naturalmente sentem de se pretende num esforço vão disfarçar com evasivas e subterfúgios, na suposição de que todos são leigos, de que possa ser confundida a Caridade com a maldade. Os materialistas e os céticos negam a veracidade dos fenômenos pelos quais se comprova a existência espiritual, numa obstinada recusa ao estudo e a observação dos mesmos e suas causas, pelo receio que naturalmente sentem de se verem forçados a se curvarem ante a realidade que negam, sendo por tais motivos combatidos pelos espíritas. A sua obstinação intransigente tem, no entanto, imitadores entre alguns dos que os combatem, esquecidos de que mantém para com os confrades do mesmo credo procedimento semelhante; outra coisa se não observa entre os que combatem as práticas espíritas cujas modalidades se não restringem pela cegueira da sua vaidade inviolável. Convidados com insistência a analisar a sinceridade, a honestidade e a razão de ser da diversidade dos métodos, preferem como se fora mais digna, mais nobre e elevada, a agressão e a calúnia, esquivando-se do convite da convicção, inconfessada de que aceitá-lo, seria reconhecer o erro de uma campanha injusta senão indigna. Não serei eu que me deixarei arrastar para o terreno pessoal reconhecendo o incompatível com a moral Cristã que me esforço por elevar; não me agrada o lamaçal dos interesses, das paixões e vícios materiais, evitando-os tanto quanto me seja possível. Defendendo-me e defendendo as vítimas das agressões desses irrefletidos maus espíritas, lancei um repto aos pródigos agressores, o qual não mereceu a consideração de uma resposta, de uma satisfação que a consciência dos acusadores ordena não seja negada, pela autoridade de que se investe para formular essas acusações, pela superioridade do plano em que se colocam e fazem empenho de serem vistos. Como única satisfação, viram-se repetidas as irritantes e caluniosas acusações, sem elemento que as possam provar ou ao menos explicar, lamentando que entre os agredidos pela solidariedade que emprestam as modalidades em questão se encontrem intelectuais notórios, cuja notoriedade impede que, além de se verem emparelhados com “espíritas”, não a possam ser nos varais da carruagem triunfal que conduz esses altos dignatários espíritas, que não compreendem como esses intelectuais se não envaidecem de seu saber; repelindo a convivência com esses míseros Pretos e Caboclos. Sejamos leais, convindo que haja uma dificuldade a vencer para que se estabeleça a harmonia de pontos de vista, consistindo essa dificuldade em não se querer deixar fugir a oportunidade da ostentação de uma superioridade moral, que não pode ser demonstrada por dotes intelectuais apenas, mas por exemplos que tenham por princípio a humildade, a fraternidade, o amor ao próximo. Não podem compreender e conhecer as verdadeiras necessidades os que por covardia ou vaidade se recusam a descer a humildade e as imperfeições lógicas do meio, a sentir de perto o seu contato que lhes repugna, a suportar resignadamente todas as suas conseqüências, afrontando todos os perigos a que se expõem aqueles que tem como finalidade que reputam digna, nobre, elevada e Cristã, levar o alívio aos desgraçados que por sua desventura habitam ainda nas trevas dos mais profundos abismos, de onde talvez já foram arrancados por outros e onde não desejaríamos permanecer esquecidos, abandonados, pelo comodismo egoísta, pela covardia ou vaidade dos que se encontram livres, já na estrada ampla do progresso. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 26 de Março de 1933 – página 08) PRÁTICAS ESPÍRITAS – LINHA BRANCA DE UMBANDA A insinuação de que combatemos o kardecismo é aleivosa; apresenta uma falsidade, com intenções que se diziam facilmente. Somos combatidos acusados e agredidos, e a nossa atitude tem sido apenas de defesa, cabendo a intransigência de alguns kardecistas a responsabilidade da luta que provocaram e mantém, muito contra o nosso desejo, distraídos dos afazeres espirituais, forçados a vir a público desfazer e anular essa campanha de intrigas e difamações, alimentada pelos que nada construindo, pretendem tudo destruir.

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Cessem as acusações, ou provem-nas se isso lhes é possível, é esse o desejo que alimentamos e não o de manter polêmica como fosse parecer a alguém, e o assunto está por demais esclarecido para os que querem compreendê-lo. Não é absolutamente exato que se pretendam estabelecer preferências para estas ou aquelas modalidades, classificando umas superiores as outras; há nessas insinuações perfídia evidente, pois tem-se frisado claramente que essas modalidades se explicam pela harmonia existente entre as mesmas e o meio espiritual, em cujo terreno se desenvolve a ação. Não nos cabe impor métodos ou modalidades, senão no terreno material em que habitamos; é de certa infantilidade querer-se estender os nossos preconceitos sociais a um mundo de condições muito diversas, desconhecidas poderemos dizer, em sua grande parte. Tudo tem a sua razão de ser, e é sabido que não tomba uma folha seca que não seja pela vontade de Deus. Se somos os enfermos necessitados de ser curados, não temos senão que nos entregarmos confiantes nas mãos do facultativo, e se constatamos pelas suas curas que lhe não falha a competência para exercício da sua profissão ou missão, será porventura justo que se veja ele acusado de inepto, indigno ou desonesto, porque se alimente de ervas, fale o idioma diverso do nosso, use traje diferente, ou more numa cabana ao invés de um palacete? Os medicamentos repugnantes em geral, mas nem por isso os recusamos quando necessitados pela cura dos males que nos afligem, sujeitando-nos por vezes a maiores sacrifícios e dores que os da própria enfermidade, tendo em vista a conservação da vida da matéria, ou seja do corpo material. Não propagamos nem aconselhamos a preferência de métodos; cada qual segue ou adota os que melhor lhe convém e agrada, dentro das mesmas finalidades, é claro, sobre as quais não devem prevalecer dúvidas quanto a sua nobreza e elevação; o que não podemos é recusar a Caridade a quem no-la solicita, quando em nossas mãos estejam os meios precisos, e é isso que estamos crentes; todos os bons Espíritas devem fazer, sem a preocupação de mesquinharias de interesse pessoal. Queremos a liberdade e o direito de agir com honestidade no exercício da Caridade, pelos meios que nos são facultados pelos seus principais e diretos autores, aqueles que os acharem por isso dignos de pedradas, que atirem. P.S. – Agradecido ao prezado amigo Sr. Joaquim Ferreira do Nascimento pela sua solidariedade e conforto. Em resposta a sua pergunta tenho a dizer-lhe, que a Tenda de Nossa Senhora da Conceição é na Rua da Quitanda, nº 201, e as sessões públicas de Caridade nas Terças-Feiras, às 20 horas. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 04 de Abril de 1933 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS – MEDIUNIDADES E SUAS RESPONSABILIDADES Já exemplifiquei uma das formas por que se castiga a vaidade dos médiuns sendo os mesmos abandonados nas salas de Sessões em franco funcionamento, em circunstância tais, que exigem a demonstração pública do mérito e da capacidade do médium envaidecido e assim castigado, uma vez que sem assistência dos Guias Espirituais nada mais consegue se não mistificando sujeitar-se ao ridículo. Esta é uma das formas mais ofensivas do castigo, porque outras há que acarretam não pequenos dissabores e sofrimentos para as suas vítimas, obcecadas por Espíritos galhofeiros e zombeteiros que as sujeitam aos maiores vexames e humilhações em público, acabando por vezes nos manicômios. Estes escrúpulos deveriam constituir uma advertência aos médiuns, para cuja atenção conviria serem chamados pelos dirigentes dos Centros Espíritas sempre que se oferecessem oportunidades durante as Sessões. Os médiuns pela santidade do seu mandato, pela nobreza e desprendimento pessoal com que devem compreender a sua missão, devem ter sempre em mente a exemplificação de uma conduta irrepreensível, modelar, que, lhes assegure não só a confiança, como a sua própria defesa contra as influências fluídicas das imperfeições dos Espíritos atrasados. A conduta moral do médium tem para a boa salutar e eficaz missão de que é investido, importância capital, nela residindo toda a responsabilidade que pesa sobre ele; é portanto indispensável que a não ignore, não sendo a recusa do cumprimento fiel dessa missão o meio aconselhável para que evitada seja qualquer parcela de responsabilidade.

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A recusa desse cumprimento é um ato patenteado de falta de Caridade para com seus semelhantes, entre os quais se encontram os do espaço, privados pela recusa da falha do meio e da oportunidade para prestarem seus serviços Caritativos aos seus irmãos encarnados na Terra, exercício que lhes faculta o seu progresso moral espiritual. Esse ato de falta de Caridade acarreta para o seu ator uma responsabilidade que poderá ser castigada com perturbações e sofrimentos somente remediados e evitados, quando compreendida e reparada a falta, sem mesmo ser levado em consideração o fato de se não utilizar o médium desprezando a oportunidade de seu próprio progresso que conquistado poderia ser com o fiel desempenho da sua missão, que por certo lhe não é dada para ser conservada inativa. Pode-se imaginar a gravidade da falta da Caridade ocasionada com a recusa do médium; se olharmos o grande número de sofredores que dele necessitando se vêem privados com o mesmo, recusa esse injustificado senão por subterfúgios e sofismas que só iludirão ao próprio médium faltoso. Pela importância que reveste as mediunidades e todos estes fatos conseqüentes, quer-me parecer deverem merecer especial atenção os possuidores dessas faculdades, demonstrada a utilidade e a necessidade da sua doutrinação, educação e fiscalização, por parte daqueles que se entregam e dedicam ao seu aproveitamento e exercício, afastado do mesmo temporariamente como medida prudente todos os que se não encontrarem na altura moral do desempenho da sua elevada missão, ou seja, ante de convenientemente educados, para que conscientes das responsabilidades tenham a sua real compreensão, e não tenham que chegar essa realidade pela força do castigo, ao qual a irregularidade de procedimentos faz inevitável mérito. Tanto maior seja a elevação moral do médium, tanto mais elevado seja o seu caráter, tanto mais elevados e nobres sejam os seus sentimentos, maiores serão os resultados, mais eficaz o produto da sua ação e o daquele que o utilizam na sua mediunidade, maiores os benefícios semeados e colhidos, maior será o progresso mútuo com a recompensa como salário merecido dignamente, prodigamente distribuído pelo nosso Pai de Misericórdia, infimamente Generoso e Bondoso. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 05 de Abril de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS – MODALIDADES Há quem condene a passividade que alguns praticantes espíritas dão especialmente dentro das modalidades diretamente visadas, e que se distinguem pela denominação de “Linha Branca de Umbanda”, vendo nessa passividade um erro ou um mal, mas em verdade o erro está mais no ponto de vista em que se colocam os juízes, os quais em geral primam pelo desconhecimento do assunto em suas minúcias. Antes de mais nada há que considerar-se que a ação se desenvolve no mundo espiritual invisível salvo para os videntes, os quais nem sempre podem devassar toda a ação desenvolvida, sendo o número dos assistentes materiais ou auxiliares presentes relativamente insignificante diante dos milhares de Espíritos como elementos ativos, postos ao serviço de finalidades sobre cuja dignidade não podem haver dúvidas. Identificados perfeitamente os Guias Espirituais como de grande elevação, de grande progresso moral, não nos caberia o direito ou a razão de duvidar da ação que presidem, e a passividade se acha explicada, sendo parte insignificante de um considerável número que se agita e opera em nosso benefício e dos que carecendo da Caridade, recorrem ao seu auxílio às suas atividades espirituais. Ninguém pensa de certo em copiar e introduzir em nosso meio civilizado, hábitos, costumes e linguagens primitivas; esse receio é infundado; antes ao contrário, da convivência serão beneficiados os que se acham privados das luzes da civilização, enquanto que o progresso moral será mútuo, dele todos aproveitarão. Os Guias Espirituais, comissionados nas posições de comando e orientação possuem a consciência exata de suas responsabilidades, as quais não podem depender da vontade de criaturas terrenas por maior que seja a sua intelectualidade ou autoridade; se nos colocamos na sua dependência não podemos recusar-lhes a obediência e a passividade que nos é exigida como necessária ao bom desempenho, a eficácia da ação, de cuja ação somos os maiores beneficiados, não sendo é claro, os únicos. Essa ação representa sem dúvida a mais produtiva escola moral dos Espíritos cuja condição de progresso ainda só recente da sua falha; ali eles aprendem a praticar a Caridade, abandonando suas nefastas e indignas atividades, preparados e instruídos para que possam amanhã encarnar num meio compatível com o grau de progresso adquirido nessa escola, nesse exercício. Encarnados amanhã, em nosso meio, facilmente se adaptarão aos costumes e linguagem do mesmo, sem que possam mais constituir em embaraço ao nosso progresso moral, como elementos perniciosos a sociedade.

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Não podem eles serem responsabilizados pelo fanatismo de alguns, ou pela ignorância dos que não compreendendo a realidade dos fatos, os interpretam como querem, ao sabor das sua inclinações, levando a passividade mais longe do que lhe é exigido. Não se deve crer que todos os Espíritos que tomam parte nessas práticas sejam possuidores de muita luz, embora todos coadjuvando para o Bem, cada um guarda a sua escala, no seu grau relativo, nela subindo proporcionalmente de acordo com o seu desenvolvimento, ocupando nesse exército de batalhadores posição relativa, não restando dúvida alguma sobre a elevação espiritual dos comandantes e chefes, pelas enormes responsabilidades que lhes estão afetas como condutores de muitos milhares de nossos irmãos de raças diversas. Tão depressa seja possível converter todos os ignorantes e malvados existentes, nenhuma razão mais justificará a persistência nas modalidades que lhes são peculiares; mas até lá, estão, sobejamente explicadas. A conversão, entretanto, não poderá ser feita por aqueles que os repudiam, os evitam e lhes negam o direito de progredirem, de se desenvolverem pelo exercício do Bem, numa atitude irrefletida e anti-humanitária, que nada tem de Espírita ou de Cristã. O que se não pode negar é a docilidade, a grande humildade, o devotamento, a bondade dos Pretos e dos Caboclos na sua ação Caritativa, nas suas palavras de ânimo e conforto; os Pretos mais afáveis, mais expansivos, mais alegres, sempre bem humorados, enquanto que os Caboclos sempre ríspidos, sisudos, amigos da rigorosa disciplina e obediência, muito pouco sorridentes, mais ativos que faladores. A bondade preside todos os atos e palavras e a evocação da fé, do respeito a Deus, as precede invariavelmente, sem que qualquer ultrapasse os limites da máxima humildade, cultivando o verdadeiro amor ao próximo. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 8 de Abril de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS – RACIOCINANDO As atividades da Magia Negra são por infelicidade um fato que se não pode contestar, especialmente pelas vítimas de suas tristes conseqüências. É claro que essas atividades indignas e malignas são provocadas e exercidas por irmãos nossos do espaço e da Terra, cuja condição de atraso e ignorância lhes empresta instintos em relação com os mesmos. Tanto maior seja esse atraso, essa ignorância, essa falta de sentimentos, maiores e mais graves se torna a extensão da ação maligna que esses infelizes semeiam entre os seus irmãos encarnados especialmente alvejados. Em conseqüência da sua ignorância, da imperfeição dos sentimentos, mantém esses Espíritos uma situação que os impossibilita de poderem compreender por palavras doutrinárias, a necessidade, a utilidade e conveniência própria da sua regeneração, da sua conversão; dai a explicação do emprego dos meios violentos e enérgicos, da ação repressiva e do castigo por vezes infligido, para que impedida seja a persistência e como conseqüência o aumento de responsabilidade da sua ação nefasta, e a defesa das suas vítimas, quando recorrem ao auxílio da ação da Magia Branca. Dada a condição de rebeldia e de perversidade daqueles infelizes, são os problemas de interesse mútuo e coletivo, nos quais esses elementos ativos se acham envolvidos, encaminhados para um meio onde melhor podem ser solucionados pela energia, e esse meio adequado está onde as práticas caritativas se distinguem como da “Linha Branca de Umbanda”, exercidas estas por Espíritos (embora guiados por outros de grande clarividência) de condição idêntica, mas bem intencionada, desejosos de praticarem o Bem como soldados obedientes à direção inteligente digna e nobre dos seus Guias. Quando os problemas a resolver são dos que entram em seus meio, elementos maus sim, mas com alguns esclarecimentos, já capazes de os fazerem converter pela simples doutrinação, são então encaminhados para os núcleos espíritas, os quais há quem distingue como kardecistas, digamos. Não se suponha que estas sejam incapazes de resolverem os problemas por mais graves, ou aqueles, estes por mais fáceis; o que se conclui é a harmonia estabelecida com o meio, tornando mais fáceis as soluções. Assim, para os fortes na maldade e fracos na cultura, os mais fortes na ação e menos forte na palavra, para os fracos na maldade, os mais fortes na palavra, mais fracos na energia ativa. Em resumo para maior clareza das considerações, exemplos:

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Uns núcleos constituem as escolas primárias para os leigos, outros as escolas superiores para aqueles que já possuem o curso primário. Os métodos não podem decerto serem os mesmo; devem ser adequados, e não se deve querer matricular leigos nas escolas superiores, onde nada poderiam compreender. Para a educação e instrução de todos, são naturalmente designados professores capazes; assim se pode exemplificar a organização existente no espaço entre os Espíritos, bem assim a relação que há entre os espíritas e os meios para onde são encaminhados, para receberem a educação, ou para auxiliarem a proporcioná-la aos mais necessitados. A necessidade de tornar profusas as escolas de ensinos primários se justifica diante do elevado número de leigos, pela necessidade de se apressar a evolução da humanidade, pela necessidade do seu progresso moral, evitando, diminuindo as conseqüências resultantes da ação perniciosa dos leigos. Quando não existirem mais Espíritos em tão precárias condições de atraso (leigos) nem os métodos nem as escolas primárias terão mais razão para existirem; até lá há que compreender-se a necessidade da sua existência, não lhes criando obstáculos, porque isso importará no retardamento da marcha do progresso humano, na concorrência para a persistência da ignorância, ou seja, da maldade, do sofrimento e da desgraça. Creio fazer-me compreender com as grosseiras comparações demonstrativas da ação caritativa exercida com as atividades dos espíritas por modalidades que podem variar nas suas formas, mas que se harmonizam nos fins indubitavelmente. Nas práticas da “Linha Branca de Umbanda”, entra mais em ação a energia, não kardecistas; a palavra em erro estão naqueles que interpretando de forma diversa a sua razão de ser, teimam em querer que os leigos sejam matriculados nas academias, entendendo que os professores das escolas primárias são tão leigos como os seus alunos, a despeito das demonstrações comprovadas da sua capacidade educativa, da sua idoneidade moral. A falta do raciocínio nos leva a erros que poderiam ser evitados, se houvesse mais ponderação e menos pressa nas conclusões. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 26 de Abril de 1933 – página 05) PRÁTICAS ESPÍRITAS – A MAGIA NEGRA Proliferam assustadoramente entre nós, os antros da Magia Negra, estendendo os seus tentáculos em todas as direções, lançando a desgraça, enfermidades, misérias, desarmonias e lágrimas em todos os lares, a troco de alguns mil réis, para satisfação dos infames, perversos e covardes, que se supõem ao abrigo das responsabilidades de seus negregados crimes. Propagada e existência de organizações mistas cujo ponto de concentração se encontra nas Tendas Espíritas da “Linha Branca de Umbanda”, dispondo essas organizações dos mais poderosos elementos de combate à ação aos autores e aos efeitos da Magia Negra, contra as referidas organizações e os seus auxiliares da Terra se voltam a cólera e a peçonha desses infames obreiros da desgraça, visando-os particularmente com os seus trabalhos de magia, na intenção de os aniquilar, revoltados por verem anularem-se suas atividades, e sentindo por vezes o castigo das mesmas, que lhe é infringido quando necessário. Forçados e uma rigorosa vigilância, os Guias do espaço, para defesa da integridade de seus auxiliares terrenos, não temem a ação desses malvados, a qual se choca e anula resvalando de ricochete sobre seus responsáveis, que atingidos se sentirão pelo peso das suas indignas responsabilidades, forçados a reconhecê-las, abandonando suas infelizes vítimas, suas infames profissões. É necessário que esses desgraçados se convençam de que por maiores que sejam suas maldosas atividades, não conseguirão quebrar a muralha que se levanta em favor do Bem, defendida com galhardia, denodo, heroísmo e tenacidade, pela ação incessante dos obreiros da Caridade, dos soldados humildes da “Linha Branca de Umbanda”. É inacreditável que dentro de organismos de aparência humana se acoitem almas de hienas, de tigres felinos, que a troco de recompensas materiais, não trepidam em levar ao luto, a orfandade, a loucura da obsessão, a fome e a dor a tantos lares da nossa sociedade. Mas sem isso nos parece inacreditável pela sua hediondez, que dizer das pessoas cultas, das criaturas de posição social de destaque, que se não envergonham, não sentem abrasada a consciência ao transpor o limiar desses antros da maldade, em busca da satisfação de ódios, paixões e desejos pessoais.

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São conhecidos inúmeros desses cavalheiros e damas da alta sociedade, que só crêem nas práticas espíritas quando para fins ignóbeis, praticadas por criaturas que se igualam nos sentimentos, na moral e na alma, e quando se lhes fala em espiritismo sincero e honesto, dizem que é macumba e feitiçaria; isto quando não vão para as colunas dos jornais perseguirem os espíritas, ou para os confessionários papar hóstias e Salve-Rainhas, para demonstrarem que são bons católicos. Cruel desilusão lhes trará a medalha no seu revesso; doloroso será o despertar para a realidade da vida; cruciantes as dores da recompensa; escaldantes como lavas as lágrimas do arrependimento. Não é o pavor ou a covardia que nos leva a persistir na advertência a esses infelizes desgraçados, para que atentem na enormidade das suas tremendas responsabilidades; é sim a convicção absoluta do seu inevitável resgate, a certeza da recompensa ao mérito, a intangibilidade da justiça de Deus. Seria sem dúvida preferível e desejo dos bem intencionados, vendo-os convertidos, ao invés de vencidos, o que indiscutivelmente sucederá senão pela energia dos que se lhes opõem, pela dor que os abaterá e aniquilará, e que de qualquer forma terão que bendizer agradecendo ao Criador, o ter permitido lhes fosse impedida a continuação da prática do mal, como meio caritativo de evitar responsabilidades maiores e mais graves. Possuem os que se exercitam na prática da Caridade, a fé precisa e a confiança suficiente nos seus Guias Espirituais, para não temerem os efeitos da ação maléfica dos que por tal razão, os vêem como inimigos, não é receio que lhes inspiram esses infelizes cegos pela sua grande maldade, mas sim piedade e compaixão. Avante pelo Bem da humanidade contra o mal em todas as suas formas por todos os meios Cristãos, contra o agrado dos cegos, dos tolos, dos orgulhosos e dos maus. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 5 de Maio de 1933 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS A humanidade em sua marcha progressiva para atingir a perfeição, acha-se mutuamente encadeada desde os pequenos núcleos constituídos por famílias, até os grandes continentes e aos planetas sucessivamente, num esforço igualmente mútuo, conjunto, independente da vontade isolada de quem quer que seja, subordinada a mesma, às Leis da Natureza. A nenhuma criatura humana é dado com razão o direito, para que mantenha indiferença ante a fraqueza ou a precariedade do estado moral dos seus semelhantes, ante os males que os afligem, sendo dever cristão e de benefício próprio, o auxilio, a cooperação recíproca de todas as criaturas em geral, para que a marcha do progresso para a conquista da felicidade suprema e eterna não seja retardada, estorvada pelos inativos e os indiferentes, por indolência, por egoísmo, por ignorância ou perversidade, em atitudes condenáveis, as quais acarretam indubitavelmente para os que as assumem, responsabilidades relativas aos malefícios causados no seu grau de eficiência. A desarmonia imperante observada entre irmãos, filhos dos mesmos pais, alastra-se e propaga-se assustadoramente pela cegueira da satisfação dos interesses exclusivamente materiais, até as lutas armadas entre potências, povos e raças, numa frisante demonstração de incompreensão, de desconhecimento ou desprezo pelos dois mais sublimes preceitos divinos legados por Jesus, gravados com letras de fogo que os séculos tornam cada vez mais incandescentes, e que a despeito da sua singeleza encerram um completo e perfeito Evangelho. “Amar a Deus sobre tudo, e ao próximo como a si mesmo”... “Não fazer aos seus semelhantes, aquilo que não quiser que lhes façam”... Nenhum de nós ignora certamente que sobre o Planeta Terra existem muito milhões de criaturas humanas vivendo num estado de primitivo atraso, no qual nos cabem algumas responsabilidades pela indiferença, pelo isolamento em que os temos deixado abandonados, em geral apenas lembrados, não para lhes proporcionarmos as luzes da nossa civilização, mas para espoliá-los em suas propriedades e direitos, para explorá-los na sua ignorância, desinteressando-nos inteiramente do seu progresso moral e intelectual, persistindo em manter e aprofundar abismos que deles nos separam com os preconceitos vaidosos e orgulhosos das sociedades modernizadas, preconceitos que animam, que incentivam rivalidades e ódios, esquecendo por completo que o Pai é Deus, e que como irmãos nos devemos ver e tratar. Privados do contato do convívio da sociedade civilizada permanecem ainda na Terra, e inúmeros povoando o espaço, desencarnados, num estágio que lhes permita oportunamente encarnarem naquele meio, de posse já então dos precisos conhecimentos, do necessário desenvolvimento, para que se não tornem estorvo a essa sociedade, ao seu progresso.

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Os praticantes da Caridade espiritual denominados da “Linha Branca de Umbanda”, pelo convívio estabelecido nas suas práticas com esses nossos irmãos do mundo espiritual, com o intercâmbio de benefícios mútuos proporcionados nesse exercício concorrem sem dúvida alguma com satisfatória e valiosa eficácia para o progresso moral e intelectual dos mesmos, suprindo assim a falha representada pela indiferença que nos tem merecido em vida na Terra, indiferença que significa uma demonstração de falta de Caridade, de Fraternidade, de Amor. Não é exclusivamente esta a finalidade das práticas referidas, não consistindo apenas na reparação da falha observada, pois dentro delas, da sua ação, se harmonizam variados interesses de relevantes benefícios para a humanidade em geral, os quais ressaltam a mais leve análise, ao mais leve raciocínio, cujos benefícios são indiscutivelmente mútuos. Convenientemente orientados, esses irmãos progridem e nos livram das suas maléficas atuações, as quais ocasionam graves conseqüências impedindo por todas as formas a persistência no erro e no mal, evitando que as graves responsabilidades se agravem; e diminuindo os efeitos sua maldosa ação, concorrendo eficazmente para que de futuro a paz possa ser solidamente implantada em todo o Universo. Basta que se citem estes benefícios mútuos, para que se compreenda a dignidade dessas atividades, tão mal interpretadas por aqueles que primam por desconhecê-las e teimam em julgá-las, supondo explicá-las caluniando os seus autores. Vastíssimo campo de observações e estudos oferece essas práticas espíritas, e mais acertados andariam os que as combatem, despindo-se do orgulho que lhes impede descerem à humildade do meio em que são exercidas, para poderem compreender a beleza, a sinceridade e a grandeza dos sublimes exemplos nelas colhidos, constatando a existência de corações tão alvos em corpos tão negros, almas tão puras em personalidades tão humildes. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 06 de Maio de 1933 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS – LINHA BRANCA DE UMBANDA Não me tem falhado a preocupação de procurar entre nossos irmãos do espaço desencarnados, nas suas freqüentes comunicações verbais ou por escrito, muitas das quais se acham publicadas em jornais e livros, sendo identificadas como de Espíritos de elevados conhecimentos intelectuais, e não menos elevada moral, uma opinião discordante de reprovação, de condenação, de censura, contra as práticas caritativas espirituais, dentro do meio e suas correspondentes modalidades, distinguindo pela denominação de “Linha Branca de Umbanda”. Confesso que a despeito dessa preocupação, dessa minha curiosidade, não tenho conseguido senão, ver, ler e ouvir opiniões e interpretações de muitos ilustres confrades, ainda, com uma carcaça como a minha, os quais pelo ponto de vista de suas interpretações, demonstram persistir na análise dessa tão delicada questão, no terreno pura e exclusivamente material, numa obsessão mais pelo aparato do que se revestem as referidas modalidades, do que com as suas elevadas finalidades, pelas quais se explicam e justificam. Os praticantes que se dedicam ao exercício da Caridade em que se observam essas modalidades, não se preocupam absolutamente em propagá-las aos meios sociais já senhores da nossa civilização, transpondo-as para fora daquele meio e recintos adequados com os quais se identificam e harmonizam, dando-lhes uma passividade requerida para o completo e eficaz êxito das intenções de que se acham animados, as quais ninguém de boa fé será capaz de negar sejam dignas, nobres e Cristãs. Nas considerações que tenho procurado fazer a despeito, não sei como se possa ser mais claro, mais simples e compreensível, isso, entretanto, não tem podido evitar que surjam por várias vezes discordâncias, sem se revestirem de argumentos lógicos, apenas precedidas de acusações sem a menor base, constituindo um estribilho dissonante e irritante como se com ele fosse possível trazerem-se melhores esclarecimentos, melhores luzes, àqueles que se supõe carecendo delas. Ainda agora, pelas colunas desta mesma seção, aparece mais um novo contendor, que se limita a repetir como estréia na arena, aquilo que todos devemos estar fatigados de ouvir, não conseguindo senão provar que, o seu autor é tão sábio e bom juiz como aqueles que o tem precedido na mesma discordância. Como novidade, apenas se atira ardoroso confrade contra Rostaing que felizmente não era Preto nem Caboclo, contra os que entendem ser o Espiritismo uma religião, assuntos que não estão sendo pelo menos por mim discutidos, e termina desancando as macumbas e os macumbeiros; a novidade, porém, maior e mais curiosa, é a lembrança do ilustre confrade, que acha ser necessário um diploma para que se chefie e pratique a Caridade nos Centros e Tendas Espíritas, assim uma espécie de sacerdotes, sendo o diploma conferido pelos Papas Espíritas, aos quais o confrade, desde já se considera, submisso, ou quem sabe candidato ao Papado.

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Por tais razões, por tão extravagantes formas de alguns espíritas interpretarem as coisas, é que meu caro confrade, há muito quem se satisfaça preferindo a humildade dos Pretos e Caboclos, em cujo meio esses sentimentos nefastos do orgulho e da vaidade, pela referida humildade não conseguiram ainda penetrar contaminando-os. Que me perdoe o meu ilustre e prezado confrade se lhe desagradaram estas considerações, mas as minhas intenções são as melhores e as mais inofensivas, não desejando senão melhores e mais lógicos esclarecimentos em favor de uma causa que defendo com a máxima sinceridade e convicção, se me afastar da minha simples e modesta qualidade de aprendiz. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Terça-Feira, 16 de Maio de 1933 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS – LINHA BRANCA DE UMBANDA Tem-se constatado ultimamente um maior desenvolvimento, uma maior profusão de Tendas de Caridade Espíritas, dentro dos moldes característicos da “Linha Branca de Umbanda”, fato este, que para confrades inadvertidos representa um retrocesso, pelo ponto de vista errôneo em que a falta de raciocínio e observação os coloca. Sendo a capital finalidade dessas Tendas o mais enérgico combate a repressão indispensáveis contra as nefandas atividades malignas dos praticantes da Magia Negra, cujas atividades se vê alastrando num crescimento apavorante, não se pode deixar de ver com a máxima simpatia aquele desenvolvimento, e assim sendo, nada mais justo e razoável que aqueles que adquiriram essa plena convicção, se dediquem sincera e honestamente a essas atividades repressoras, que constituem um benefício de utilidade e vantagens indiscutíveis para a humanidade, mais ou menos, vítima das suas influências, dos seus efeitos, ainda que disso haja muito quem duvide. É preciso que se compreenda nitidamente, que as atividades dos praticantes da “Linha Branca de Umbanda” são exercidas por criaturas habitantes do mundo espírita, com a cooperação de elementos terrenos, presididas por Guias do espaço, identificados pela sua elevação moral, capacidade de energias, e conhecimento completo de causa, não lhes faltando o das suas graves responsabilidades, as quais lhe são afetas por determinação superior, conhecedores perfeitos dos mais elevados princípios Cristãos. Usando os meios adequados e precisos, a ninguém que se encontre em plano inferior é dado o direito de supor, que para conseguir a satisfação de uma finalidade caritativa, lhe seja preciso recorrer a processos que possam ser admitidos ou julgados desumanos indignos ou anti- caritativos; mandam a lógica e a razão, portanto, que acreditemos pela confiança que nos devem merecer esses Guias, pela sinceridade das suas intenções, pela fé que os anima, que se as aparências deixam de ser simpáticas, se as modalidades se não compatibilizam com a vida dos meios sociais cultos, muito mais alto falam e pairam as necessidades da evolução moral de todas as criaturas humanas, em cujo atraso se encontra a causa, a razão máter de todos os males, de todos os sofrimentos e desgraças em que ela se encontra afundada. Por mais que se pretenda mascarar a verdade dos fatos e das palavras, não se conseguirá encobrir, que o principal motivo que anima os inimigos combatentes dessas Tendas de Caridade e seus elementos ativos, reside na sua vaidade, no pavor que lhes causa a humildade e a pobreza da cultura daquele meio, num receio vaidoso de que descende ao seu convívio, possa parecer ato de humilhação, seja desprestígio dos seus conhecimentos intelectuais, esquecidos quando se dizem espíritas, de que na humildade assentam todos os demais princípios Cristãos, e que se não poderá de forma alguma ser verdadeiramente Cristão, antes que seja humilde. Para a satisfação de interesses e de vícios materiais, não trepidam as criaturas humanas em descer a prática dos mais baixos, dos mais indignos atos e crimes, entretanto, para o exercício da Caridade, há quem pretenda por modalidades ditadas por preconceitos idiotas, numa vaidosa intransigência, de tal forma cega, que leva os seus autores ao ponto de pretender submeter ao seu domínio, a sua autoridade, ao seu desejo, o mundo espiritual e as leis da Natureza, acastelados num ponto de vista, num plano de superioridade, que se torna ridículo diante da realidade dos fatos incontestáveis. Convenhamos meus prezados confrades, especialmente, que não há como a carcaça de um humilde Preto ou Caboclo, para quebrar a vaidade de certas criaturas, as quais só por essa forma conseguirão compreender o verdadeiro sentido, o real significado, em que consiste o sincero amor ao próximo, a única e verdadeira fraternidade pregada por Jesus Cristo. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 19 de Maio de 1933 – página 11)

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PRÁTICAS ESPÍRITAS Animado de um ardente desejo de aprender, de conhecer minuciosamente a vida no espaço e as energias ativas que se relacionam com a mesma, nesta constante preocupação, tenho por várias ocasiões voltadas a minha atenção para a análise e a observação de detalhes, que por parecerem insignificantes encerram na sua aparência medíocre, grandes e sublimes exemplos de elevação moral, grandes demonstrações de sinceridade e de modéstia, uma humildade que encobre profundo saber e excelsos dotes de bondade e de amor ao próximo. As práticas espíritas Cristãs são no seu exercício ativo, o mais fértil campo, profuso na colheita das mais sublimes lições de fraternidade, colheita que só não beneficia aos que se mantêm indiferentes diante do desenrolar, da sucessão dos fatos, e que tem a oportunidade de presenciá-los senão como praticantes auxiliares, como simples assistentes. Onde, porém, essas lições, esses exemplos, assumem um caráter de elevação surpreendente em razão da grande humildade do meio social, é sem dúvida quando essas práticas caritativas espirituais Cristãs se distinguem pela denominação de “Linha Branca de Umbanda”, em cujo exercício ativo entram elementos espirituais em geral de origem primitiva, ex-habitantes materiais de regiões inteiramente afastadas do contato da civilização, ou muito pouco conhecedores do seu progresso intelectual. Fato este que como se tem podido constatar, não os impede de poderem cultivar sentimentos de nobreza chocantes. Devo confessar com toda a sinceridade, que a despeito de meu esforço no sentido de conduzir-me dentro dos princípios educativos das doutrinas Cristãs, sinto-me por vezes diminuído, numa posição de inferioridade moral contrastante, diante da elevação com que vejo conduzirem-se muitos desses selvagens sejam Pretos ou Caboclos, que inegavelmente de selvagem possuem tão somente as aparências e as origens. Os Guias Espirituais, condutores dessas imensas falanges, desse formidável exército de obreiros do Bem e da Caridade, tenho observado, são de uma intransigência dignificante em todos os atos que porventura atentem contra a mais e sã moral, abandonando ao castigo merecido aqueles que no seu convívio se atreverem a violar os preceitos dessa moral por atos ou por palavras e sentimentos. O meio e a natureza da sua ação elevada e nobre, exigem energias poderosas as quais não podem nem devem ser quebradas por procedimentos que não estejam na altura da dignidade, da nobreza da ação, e essas energias indispensáveis ao êxito das sublimes finalidades estão na dependência direta da conduta, aumentando ou diminuindo em harmonia com a proporção; dai a responsabilidade que todos devem compreender e conhecer; só assim podendo avaliar as suas conseqüências, evitando-as, para não ter que sentir os seu efeitos. É, portanto, lamentável, que ainda haja especialmente entre espíritas, quem se deixando obsedar pelo aparato de que revestem as modalidades em questão, não consiga por tal motivo, divisar, admirar e reconhecer o valor e a grandeza dos efeitos salutares e benéficos da ação caritativa, num desenrolar sucessivo de fatos que constituem um caudal do mais sublimes ensinamentos Cristãos. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 21 de Maio de 1933 – página 21) PRÁTICAS ESPÍRITAS – LINHA BRANCA DE UMBANDA E DEMANDA Prosseguindo na série de considerações que venho fazendo sobre as atividades caritativas espíritas da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”, tenho a acrescentar mais alguns comentários no sentido de explicá-las o mais claramente possível, sem a pretensão de me julgar senão um simples aprendiz, desejoso de acertar, mas com muitas probabilidades de errar, vendo com satisfação as melhores elucidações que os mestres no assunto possam trazer ao conhecimento público. Com referência aos alimentos, bebidas, charutos, fumo, marafa (nota do autor: cachaça), etc., penso que tem uma razão de ser, as quais procurarei explicar, uma vez que não ignoramos, que os Espíritos na sua condição não carecem absolutamente de tais coisas, que representam necessidades e vícios inerentes do organismo carnal, mas devemos lembrar-mos, de que esses Espíritos aos quais são proporcionados, não estão na altura de pensar e sentir como nós a desnecessidade, em conseqüência do grande atraso em que se encontram. Esses Espíritos, em razão da sua precária condição de atraso, possuem um corpo fluídico demasiadamente grosseiro, composto de uma matéria fluídica imperceptível para a nossa visão normal, mas de uma grosseria quase que materializada para seus possuidores, dando-lhes a perfeita e completa ilusão a perfeita e completa ilusão de todas as funções do corpo carnal; assim, procuram eles a satisfação das funções próprias deste, a satisfação de necessidades e vícios, os quais lhes são proporcionados pelos interessados em utilizá-los aproveitando seus serviços no mundo espiritual.

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Das comedorias, beberagens, etc., eles aproveitam somente a sua composição fluídica no grau relativo com a sua condição de atraso, sob a exata impressão da absorção dos alimentos, bebidas, fumo, etc., numa ilusão que não chegou a assumir o caráter de ofensiva. Assim, devemos raciocinar, se para que uma criatura humana deixe de exercer o mal e pratique antes a Caridade, for necessário proporcionar-lhe a satisfação de inofensivos desejos requeridos pela sua ignorância, onde residirá o mal maior, na recusa da satisfação desses desejos, ou no impedimento do exercício da Caridade e persistência do mal? Dir-se-á, que deveríamos convencer esses Espíritos, esclarecendo-os sobre a desnecessidade dos seus desejos mesmo sendo inofensivos, mas, perguntaremos... Estarão essas criaturas na altura de poderem compreender a verdade? Logicamente que não, ao contrário não se justificaram esses seus desejos e como a lucidez que lhes falta, não se encontra na sua ou nossa exclusiva dependência, mas dentro da submissão das leis da Natureza, falta-nos a autoridade para violar essas leis, sobrepondo-nos as mesmas, esperando que esses nossos irmãos, pelo seu próprio esforço aumente o seu merecimento, este sim na sua dependência em relação com as responsabilidades com a sua forma de conduta. Erro está decerto em querermos exigir, que as criaturas tenham uma visão clarividente imerecida, encontrando-se por esta razão envolvida num ambiente de profundas trevas, de cujo ambiente nos não é dado retirá-las antes que isso seja oportuno, por maiores que sejam os nossos desejos e esforços. Impensadamente nos acreditamos mais justos que Deus, pretendendo corrigi-lo no que nos parece ter errado, supondo-nos mais altruístas, mas magnânimos, mais piedosos, sem repararmos no ridículo de nossas atitudes, não querendo aceitar as coisas como elas são, mas sim como as queremos, como se isso não fosse uma utopia, como se a nossa vontade fosse discricionária, não se achasse frenada, regulada pela nossa capacidade moral para que se não transforme numa energia perniciosa para nós mesmos. Tenhamos a paciência de esperar que esses nossos infelizes irmãos do espaço, pelo exercício da Caridade que lhes proporcionará o seu desenvolvimento e progresso moral, possam compreender oportunamente que o seu verdadeiro estado dispensa tudo quanto lhes é desnecessário e que nós acreditamos o seja; até lá, adeqüemos esses desgraçados, afastando-os do exercício do mal e encaminhando-os para as hostes dos trabalhadores do Bem, arrancando-os dos exercícios do mal, alistando-os nos das fileiras daqueles que o combatem, sem nos preocuparmos sejam os seus soldados ou comandantes cobertos por epiderme negra ou bronzeada, a qual lhes empresta uma condição de humildade imposta ou aceite que mais os eleva e dignifica nas atividades caritativas Cristãs. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 18 de Junho de 1933 – página 22) PRÁTICAS ESPÍRITAS Secretariando entidades do espaço (Guias), tenho tido oportunidade de observar que a maioria das criaturas que se dirigem a essas entidades para consultá-las, o fazem animados da esperança ou certeza de que todos os problemas de sua vida e de interesses exclusivamente materiais serão resolvidos por aqueles Guias, o que a ser verdade importaria na anulação das provas a que nos achamos submissos. É preciso não esquecermos que ao encarnar neste Planeta todos carregamos um maior ou menor acervo, compromissos assumidos que nos cabe resgatá-los, vencendo as dificuldades de ordem material que se deparam, e as quais nem sempre como a muitos parece, são provocadas por estranhos desejosos de praticar o mal, devendo antes de tudo lembrarmos se não tornamos credores dos efeitos e das conseqüências das atividades dos malvados. Que valor teria a prova que somos submetidos em nossas encarnações se os nossos irmãos do espaço pudessem impedi-las? Bondosos como são, eles sabem o que representaria para as criaturas que a eles se dirigem a palavra de desânimo, de desilusão, e assim, dificilmente desiludem com a revelação da verdade, sendo as suas respostas sempre de ânimo, de coragem e de esperança, o que não quer dizer que nos não atendem, quando isso lhes é facultado pelo merecimento do paciente. Não é mais repetir-se que: “O mal e o bem, são por Deus permitidos com todos os seus efeitos e conseqüências, em razão direta com o merecimento das criaturas”; ele não existiria, digo, o mal, o sofrimento, a dor e a desgraça, se não existisse quem fosse digno deles; o que importa em dizer ou saber-se logicamente, que para evitá-los é necessário não o merecer.

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Tenho mesmo notado que, assuntos de relativa insignificância, demandando apenas um pequenino esforço das criaturas são levados à solução dos nossos irmãos do espaço, como se lhes coubesse resolvê-los, como se não tivessem esses nossos amigos atividades muito mais dignas e nobres a desenvolver, tamanhas são as desgraças que assolam a humanidade. Tornaram recepto esses nossos irmãos terrenos, a extensão dessas desgraças, ao contrário, não ocupariam a atenção dos Guias e Protetores com mesquinharias, com problemas banais de interesses próprios materiais, quando não, casos íntimos de simples satisfação pessoais, o que revoltaria se não predominasse em geral a ignorância, o desconhecimento sobre a dignidade, sobre a elevação em que devem ser colocadas as práticas e as atividades daqueles Guias Espirituais. A missão desses obreiros da Caridade é precisamente a de velar pelos seus irmãos na Terra, conhecendo tão bem, ou melhor, do que nós, as nossas necessidades; cuidam das mesmas quando lhes é permitido e nos tornamos merecedores, procurando evitar impedindo que sofram os que não merecem; que se não veja, portanto, na falta de satisfação de nossos desejos, senão a falta de nosso merecimento e nada mais. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 23 de Junho de 1933 – página 11) PRÁTICAS ESPÍRITAS A propósito das atividades espirituais caritativas dos elementos da “Linha Branca de Umbanda” seja-me permitido ilustrar a série de considerações que venho fazendo, com alguns exemplos dos inúmeros que de aparência embora insignificante, refletem suficientemente a forma digna e nobre daqueles que, obreiros da caridade, indiferentes a insensatez dos que nas suas humildes condições de Pretos ou Caboclos, encontram sinônimos de ignorância e maldade, motivos ainda para amesquinhá-los, desprestigiá-los, perseguindo-os e negando-lhes o seu valor, o merecimento a que fazem jus, pelas suas elevadas condições, digo qualidades morais. No terreno material, a cena desenrola-se em uma sala de sessões de uma Tenda de Caridade Espírita, no terreno espiritual, esse mesmo recinto representa e se denomina um Terreiro; nele se desenvolvendo as atividades caritativas dos trabalhadores da “Linha Branca de Umbanda”, ou seja, em geral, Caboclos e Pretos. Incorporados nos seus preferidos médiuns, alguns Espíritos de Caboclos (Guias) atendem aos pacientes que a eles se dirigem consultando-os, implorando-lhes remédios para as suas necessidades psíquicas e morais, aceitando os conselhos e as recomendações, palavras de ânimo e conforto, ou alívio de atuações fluídicas malignas, proporcionados esses benefícios pelos referidos Guias. Cada um desses Guias tem a auxiliá-lo um intérprete secretariando-o (cambono), o qual procura, já mais ou menos familiarizado com o mesmo, as suas palavras e recomendações por vezes mal pronunciadas, tornando-os assim mais facilmente compreendidos pelos pacientes. Aproxima-se um cavalheiro de porte distinto, atendendo ao chamado pela ordem numérica. Interrogado sobre se é a primeira vez que assiste a uma sessão espírita daquele gênero, responde afirmativamente, perguntado-lhe o Guia, se não o surpreendem as modalidades de fato surpreendentes para quem as testemunha pela primeira vez, desconhecendo-as completamente em qualquer modalidade. Descarregado por meio de passes ministrados pelo Guia, pergunta-lhe o mesmo a razão da sua presença e qual o seu desejo. O cavalheiro queixa-se de sua grande dificuldade financeira motivada pelo fato de um seu inquilino já lhe ter dado grandes prejuízos não lhe pagando os alugueis, e que não podendo arcar com a continuação de maiores prejuízos, desejava que o mesmo fosse compelido a mudar-se. O Guia pergunta-lhe seu endereço e o respectivo nome, e depois de breve concentração assim lhe responde: Meu filho, o seu inquilino é um homem de bem, mas a sua situação de dificuldades, sobrecarregado com tantos filhos lhe impede de poder satisfazer só seus compromissos; ele de fato não paga porque não tem com o que; se tivesse não lhe daria prejuízo; contudo, o Caboclo é muito pequenino mas vai implorar a Deus nosso Pai que consinta em ajudar aquele filho, proporcionando-lhe meios de poder sair da situação aflitiva em que se encontra, para que não lhe dê maiores prejuízos, uma vez que o filho também está em dificuldades como reconheço; confie pois neste humilde caboclo e ajude-o a pedir a Deus a Sua proteção para que permita possa eu ajudá-lo. Não sei se o cavalheiro esperava por outra resposta, ou por outra ação menos nobre e digna; se, entretanto, tiver tido a calma e o raciocínio para refletir, deve ter compreendido, que a humildade do meio, a ignorância.

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A falta de dotes intelectuais não impede as ações de nobreza, que a intervenção dos Espíritos em missão de Caridade, não pode nem deve ser solicitada e esperada, senão para assuntos e soluções compatíveis com a sua elevação moral. Sirva, pois, este pequeno exemplo para os que souberem aproveitá-lo, compreendendo-o e reconhecendo-lhe na sua simplicidade e sua grandeza. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 30 de Junho de 1933 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS Não são apenas os exemplos de elevação moral, de bondade e de humildade, que dignificam as atividades da “Linha Branca de Umbanda”, mas muitos outros que não devem ser desprezados ou passarem despercebidos. Entre alguns kadecistas intransigentes, combatem-se as práticas espíritas destas modalidades e seu meio, numa suposição muito errônea de seus praticantes e adeptos; repudiam, menosprezam ou lhes disputam primazias inadmissíveis no terreno da Caridade Cristã; essas suposições não têm o menor fundamento como se poderá verificar pelo exemplo que testemunhando-o, o torno público. O cavalheiro em questão era pessoa culta, que pela primeira vez assistia a uma sessão espírita do gênero, embora segundo declarou não desconhece-se inteiramente as doutrinas espíritas. Levado a presença do Guia (Caboclo), este depois de fitá-lo por alguns instantes como que procurando ler-lhe os mais profundos sentimentos e causas extraterrenas, interpelou-o sobre se tinha conhecimento da sua faculdade mediúnica psicográfica, latente, mas não desenvolvida, cuja falta de desenvolvimento era a causa primordial das perturbações que deveria sentir, mais acentuadamente no cérebro, em conseqüência de atuações de Espíritos, os quais divisando-lhe a mediunidade se sentiam por ela atraídos, pretendendo forçar o seu desenvolvimento para sua utilidade prática. Respondeu o cavalheiro, que de fato acreditava na realidade desses fatos, pois sentia e possuía sem saber como, alguma consciência de influências espirituais; perguntando-lhe ainda o Guia se não tinha conhecimento de ser assistido espiritualmente por um Espírito, que declarava possuir alguma elevação. Respondeu o paciente que também suspeitava, mas, não tinha a certeza, aceitando como real a explicação que acabava de receber, desejando que, o Guia (Caboclo) lhe disse-se quem era e o nome de seu assistente, ao que este retrucou não lhe ser permitido revelar a identidade, entretanto procurasse desenvolver a mediunidade, porque a revelação seria feita pelo próprio em ocasião oportuna. Uma vez que se tornava indispensável o desenvolvimento da sua mediunidade, declara o cavalheiro estar pronto para isso, recebendo determinações do Guia nesse sentido, respondendo-lhe o mesmo, que teria de procurar efetuar esse desenvolvimento em outro Centro Espírita da modalidade Kardecista, visto que aquele onde se achava era impróprio, inadequado, visto que nestes a ação é mais prática, mais enérgica, mais violenta e direta, sendo a mediunidade por incorporação a mais precisa e útil, além de que era preciso procurar e estabelecer a afinidade entre o médium, o assistente do mesmo, e o meio para desenvolverem as suas atividades. Como se verifica por este exemplo, não existe preferências, e quando pareçam existir, devemos compreender que razões capitais imperam, para que as afinidades sejam estabelecidas, podendo ainda constatar-se que os conhecimentos que possuem esses Espíritos de Pretos ou Caboclos, não são tão curtos, como supõem aqueles que apenas lhes divisam a carcaça espiritual que os personifica na sua humilde condição, sirva, portanto, mais este exemplo, para desfazer as interpretações apressadas ou vaidosas. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 02 de Julho de 1933 – página 22)

PRÁTICAS ESPÍRITAS Conforme tenho procurado exemplificar, não são apenas as demonstrações de altruísmo que se constatam nas práticas e no exercício caritativo da “Linha Branca de Umbanda”; são também as de inteligência, de pleno e amplo conhecimento de causa, de disciplina, obediência e energia, sem faltar a inteira responsabilidade consciente, da ação em todas as suas conseqüências. Tão nobres dignas e elevadas são indubitavelmente as finalidades daqueles obreiros de Caridade Cristã, que nos sentimos no dever de, acatar com o máximo respeito e tolerância, as modalidades, os meios de que se servem para atingi-las em toda a sua eficiência, não me parecendo caber a alguém o direito, e muito menos autoridade para condená-los como inúteis ou dispensáveis, tanto mais quando somos os mais beneficiados, sem capacidade para produzir nem mais nem melhor dentro do mesmo terreno.

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Não me anima a intenção de fazer propaganda das modalidades em questão, certo de que seria inútil se a causa não fosse digna; observo, no entanto, que a anti-propaganda tem concorrido talvez para que dia a dia a freqüência às sessões dessas Tendas de Caridade aumente extraordinariamente, e não se diga que essa freqüência seja apenas de criaturas incultas, ao contrário, contam-se em elevado número as pessoas de elevada categoria social e cultura; quanto às suas preferências, melhor que eu esses freqüentadores as saberão explicar, provavelmente pela satisfação de suas necessidades, outra não me parece possa ser a razão. Se não é verdade que nos governam os mortos, como a muitos parece e crêem, é certo que por eles somos guiados, amparados e encaminhados, para os meios onde as afinidades se harmonizam, atraídos consciente ou inconscientemente por força de energias naturais, e não serão sem dúvida as reprovações e as críticas dos mais irrefletidos, que quebrarão a harmonia dessas energias que representam a vontade soberana do Criador. Não é único o caso verificado em uma dessas Tendas de Caridade onde um médium perfeitamente desenvolvido, habituado a desempenhar suas faculdades assistido pelo seu Guia Espiritual, em Centros Espíritas Kardecistas, apresentar-se na referida Tenda por ordem expressa de seu próprio Guia, para nesta passar a prestarem os seus serviços em benefício do mesmo desideratum o que prova evidentemente que se desinteligências há quem as alimente não vão além do terreno puramente material, entre aqueles que supõem saber e poder determinar leis no mundo espiritual, colocando os preconceitos sociais acima de tudo. As conclusões que tenho podido chegar são as mesmas decerto e que poderão chegar os que tenham o desejo sincero do aprender, e não se sintam humilhados com a humildade de que se reveste o meio, menos preocupados com ele, do que com a elevação das suas atividades caritativas. Não é criterioso ou honesto proferirem-se acusações e fazerem-se afirmativas que se não provam, e quando convidados a provaram-nas, como resposta se obtenham apenas a repetição ou o silêncio, forma esta de agir, que traduz perfeitamente a falta de sinceridade e sem razão de seus autores. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 09 de Julho de 1933 – página 22) PRÁTICAS ESPÍRITAS – MISTIFICAÇÕES São bastante freqüentes as mistificações observadas o exercício das práticas espíritas mesmo as caritativas, sejam de cunho religioso ou científico, a despeito da repulsa que nos causam, das contrariedades e vexames a que nos submetem, causando por vezes sérios contratempos. Seja qual for à faculdade mediúnica, está ela sujeita a proporcionar-nos essas mistificações, as quais assumem aspectos diversos, sendo muito variadas as suas causas, tornando-se indispensável analisarem-se e conhecerem-se estas, para que se possa ajuizar seus autores e responsabilidades. A não ser que essas mistificações se revestem de um caráter grosseiro, constatadas facilmente por finalidades mercantis, ou satisfação vaidosa e orgulhosa de seus autores e interessados, só um exame minucioso, prudente e ponderado nos pode levar a conclusões acertadas e justas da sua razão de ser, permitindo-nos ainda verificar que nem sempre são merecidas a severidade e a intolerância com que as criticamos e aos seus autores, cujas responsabilidades se nos apresentam sem a gravidade que aparentam. Antes de tudo é bom não esquecermos que em inúmeros casos, as mistificações são permitidas e até facilitadas pelos Espíritos superiores, como prêmio merecido pela vaidade e pelo orgulho, daqueles que se esqueceram do pouco que valem e menos que merecem, fazendo barretadas com chapéus alheios, engalanados com penas de pavão. Aos médiuns indiscutivelmente cabe talvez a maior responsabilidade das mistificações, não se podendo também negar, que agem muitas vezes sem a consciência dessa responsabilidade, muito especialmente quando por qualquer razão oferecem obstáculos a perfeita incorporação do Espírito que deseja manifestar-se, impedindo-lhe a liberdade de o fazer, fato este muito comum em todas as práticas. A falta de afinidade fluídica entre o médium e o Espírito, a diversidade do grau de intensidade vibratória das irradiações fluídicas entre ambos, representa o mais forte obstáculo à perfeita manifestação, sendo por tais motivas atribuídas responsabilidades a um quando cabem ao outro, confundidas assim facilmente as mesmas. No intuito de evitar essas irregularidades, é que os Espíritos esclarecidos se utilizam preferindo mediunidades e médiuns que lhes facilitem a boa manifestação, pela harmonia fluídica, recusando-as, quando a mesma não possa ser estabelecida, trazendo fatalmente como conseqüência erros e mistificações.

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Seria decerto interminável a análise do elevado número das causas que podem levar os médiuns a ocasionar a imperfeição das manifestações, impedindo voluntária ou involuntariamente a livre ação do Espírito, o qual necessita da mais completa passividade do organismo material para regularidade da comunicação e das atividades; passividade esta, com razão recusada e impedida quando preciso se torne reprimir o abuso de entidades espirituais mal intencionadas. Crente de que este assunto pela sua importância mereça mais amplas considerações, espero ter a oportunidade de voltar a abordá-lo; grato pela acolhida que tenho encontrado nas colunas desta benéfica seção. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 22 de Julho de 1933 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS – MISTIFICAÇÕES Entre as causas que arrastam os médiuns a provocar consciente ou inconscientemente as manifestações irregulares, a imperfeição das comunicações estão como vulgares as seguintes: Sentimentos de orgulho e vaidade, carência de fé e confiança, falha de sinceridade e honestidade, intenções menos dignas, fraquezas de caráter, preocupações mundanas, etc., razões estas que impedem o necessário desprendimento e a indispensável passividade. Anote-se que nem sempre a responsabilidade cabe exclusivamente aos médiuns ou aos Espíritos que se procuram comunicar no exercício de suas atividades espirituais, aos assistentes da mesma forma conscientemente ou não, por inadvertência, maldade ou ignorância, se deve essa responsabilidade pela razão de se não comportarem de maneira indispensável a evitar uma atmosfera de irradiações propícias às manifestações e atividades condignas. Existem no espaço, em profusão, Espíritos galhofeiros e perversos, que espreitam todas as oportunidades que se lhes oferecem para a satisfação de seus instintos perniciosos, mistificando e provocando as fraudes observadas constantemente. Se essas oportunidades não forem evitadas pelos responsáveis na direção das atividades espirituais, advertidos os médiuns e os assistentes da forma como devem fazer, fatalmente se tornarão vítimas delas, anulando-se as finalidades, prejudicando-se o seu êxito, demoralizando-as e aos seus autores responsáveis, semeando-se a desconfiança, implantando-se a falta de fé e aumentando o número de descrentes. Não é suficiente ver-se reclamar com uma insistência que se torna irritante a concentração da assistência, sem que se procure explicar-lhe no que consiste essa reclamada e precisa concentração, para que se lhe dê a interpretação devida, em geral compreendida como se fosse a manutenção de uma atitude de quem vela por defuntos, sem mais objetivos. Reputo contraproducente exigir-se do médium a facilidade da incorporação e manifestação, quando por qualquer circunstancia ele a não deseja e procura repelir, oferecendo-lhe obstáculos que redundarão na fraude e na mistificação, conseqüentemente na desmoralização dos que na melhor das intenções emprestam a sua solidariedade honesta e atividade de finalidades nobres e úteis. O exercício das faculdades mediúnicas, sendo um dever para os que a possuem, só deve ser admitido como espontâneo, sem coações, só devendo ser permitidas as imposições que interessam ao próprio médium, pelas obrigações que assumiu para consigo mesmo, consciente dos benefícios que o seu fiel e bom uso lhe trará no presente e no futuro. Entre o fazer um mau uso das faculdades mediúnicas, e não fazer o bom nem o mau, é, de certo, menos grave e mais prudente e inatividade de que, se não proporciona alívio de sofrimentos e sofredores, também os não fabrica. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 30 de Julho de 1933)

PRÁTICAS ESPÍRITAS Nas práticas espíritas caritativas da “Linha Branca de Umbanda e Demanda” pela natureza da humildade do meio em que são exercidas as suas atividades, é o terreno menos propício ao cultivo e desenvolvimento da vaidade e do orgulho, sentimentos estes nos quais reside a maior causa das mistificações, dai o serem elas menos freqüente nesse campo.

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Os Guias Espirituais diretores responsáveis pelas referidas atividades não só condenam como recusam sua cooperação, desde que pressentem que os médiuns lhes impedem por qualquer motivo a necessária passividade, o indispensável desprendimento, e se as razões não forem mais ou menos justificadas, infligem aos autores castigos que se resumem no afastamento, abandonando-os sem defesa, entregues às influências nefastas dos maus elementos que perambulam no espaço, no meio dos quais e contra quem se trava e desenvolve a luta. A severidade, o rigor da disciplina entre os trabalhadores, os abnegados soldados da “Linha Branca de Umbanda”, eles procuram manter estendendo-a aos que aqui na Terra se dispõem a lhes servirem de intermediários e auxiliares em suas atividades, impondo-lhes um regime e uma conduta moral compatível com a altura, com a dignidade das suas nobres finalidades. Um dos seus lemas, pela sua clareza não admite segundas interpretações, e se resume nestas simples palavras: “Filhos de Umbanda não tem querer”, o que significa importando em dizer e saber-se, que quem não poder ou não quiser arcar com as responsabilidades decorrentes dessa luta entre o Bem e o Mal, quem se não sentir com a coragem e o ânimo preciso para cumprir os deveres que lhe são impostos, quem não se encontrar com a disposição e força de vontade precisa para arrostar com os sacrifícios exigidos nessa campanha em prol do sofrimento humano, melhor será que se não envolva nesse meio. O caminho é reto; não existe lugar para vacilações, as quais acarretam consequências que podem não demorar a fazerem-se sentir sobre os seus autores, pelos obstáculos que podem oferecer nessa estrada que necessita da amplidão, para a boa jornada dos que a trilham, com uma finalidade que não merece dúvidas nem contestações, dos que se satisfazem e acomodam como espectadores. Entre aqueles obreiros da Caridade no espaço, e seus auxiliares terrenos, há compromissos a serem fielmente observados e respeitados; da infidelidade do seu cumprimento, aproveitam-se os malvados, para alargarem o campo de ação de suas maldades, e os infiéis não serão poupados como responsáveis pelo abandono a que se atiram. Devemos, pois, ficar certos de que quando constatada poder ser mistificação naquele meio, escusado será procurar encontrar a sua causa fora do médium que a faculta, único responsável pelo seu ocasionamento já indubitavelmente abandonado pelo seu Guia e Protetor, que o submete com o abandono, ao castigo merecido. Sendo o campo de uma luta incessante, renhida e sem tréguas, fácil é avaliar-se a que perigos se expõem os que nesse combate se virem privados da defesa precisa, abandonados no meio desse campo entregues à sanha de inimigos que lhes são invisíveis. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 06 de Agosto de 1933 – página 22) PRÁTICAS ESPÍRITAS – “FILHOS DE UMBANDA NÃO TEM QUERER” Neste lema está perfeitamente significada a severidade intransigente da disciplina, da obediência, as quais se encontram submissos os filhos de – “Umbanda”, ou sejam, os trabalhadores da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”. É familiar nesse meio, o tratamento de pai dado aos Guias Espirituais, e o de filhos dado por eles, aos que em si, e nas suas atividades, confiam ou coadjuvam; assim todos aqueles que lhes prestam concurso na medida das possibilidades e necessidades no mundo terreno, são por aqueles Guias distinguidos como “filhos de Umbanda”. Quando uma criatura se dispõe a prestar o seu auxílio àquelas atividades espirituais caritativas, ingressando no meio em que são exercidas, seja como médium, cambono, ou ocupando qualquer outro cargo, desde que possua as qualidades, a sinceridade, a boa vontade e intenções, o desejo de concorrer para semear o Bem e combater o Mal, é da melhor vontade e agrado recebida, aceita preparada no espaço pelos Guias protetores, a sua defesa uma vez que, passa a ser mais um soldado alistado nas fileiras dos obreiros da Caridade Cristã, não mais podendo ser visto como persona grata por aqueles que formam nas fileiras dos exércitos da maldade, por conseqüência visado pelos seus efeitos. No terreno em que se trava essa luta entre o Bem e o Mal, ou seja, no terreno espiritual, não podem os soldados que se de um organismo material, precaverem-se contra inimigos invisíveis do espaço, dai, ficar a sua defesa confiada aos que lhes são designados como Guias protetores, defesa essa observada e cumprida religiosa e severamente, enquanto que os protegidos e defendidos se não tornem indignos das mesmas, por transgressão das normas impostas pela boa e sã moral Cristã, indispensável à nobreza das atividades.

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Existem compromissos mútuos a serem severamente respeitados, e poderemos ficar certos de que se quebrados forem, serão pelos protegidos e nunca pelos protetores, que tem a plena consciência das responsabilidades que lhes assistem, não mais sujeitos as vicissitudes da matéria, a se sujeitarem as conseqüências lógicas e naturais, que advirão pela conduta irregular, a qual impede a indispensável vigilância, precaução e defesa contra inimigos que espreitam todas as oportunidades e franquezas. Em geral, todos os auxiliares coadjuvantes das referidas atividades recebem com ou sem cerimonial simbólico adequado, como em forma de um batismo, estigmas fluídicos, pelos quais são distinguidos, identificados no espaço como filhos de “Umbanda”, prontamente assistidos e defendidos em todo o qualquer terreno em que se encontre um soldado da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”. Molestar-se um “filho de Umbanda” consiste ofensa grave, punida por aqueles que têm a responsabilidade da sua defesa, a qual só lhe faltará se do abandono se tornar merecedor. Os “filhos de Umbanda”, por força dos compromissos que a luta e suas finalidades exigem, obedecem subordinando-se humildemente aos que tem a direção espiritual da mesma, razão por que não podem ter querer, tornando-se escravos das circunstâncias das referidas atividades e das finalidades; são guiados, não se guiam por si; são meros auxiliares numa atalha em que o seu número é relativamente insignificante, diante dos formidáveis exércitos que habitam no mundo espiritual, onde se trava a ardorosa batalha pelo Bem de toda a humanidade. Se nesse combate, que os combatidos são os maiores beneficiados, não primam pela boa vontade, pela sinceridade de suas dignas e nobres intenções, pela nobreza dos sentimentos que alimentam, pela elevação moral, pelo desejo de fazer o Bem, aliando dos sofrimentos os desgraçados seus semelhantes sem a preocupação de cores, raças ou condições sociais, certos de progredirem concorrendo para o progresso geral de toda a humanidade. O tratamento familiar que lhes é dado e a passividade às suas atividades, não podem absolutamente constituir motivo para condenações, para censuras e críticas, porque senso de seu agrado e conveniência , não causam males nem atentam contra a moral ou contra o bem estar de quem quer que seja, são compatíveis com a humildade do meio e a dignidade das referidas atividades e suas nobres finalidades. Não se que explicações mais se tornem necessárias, para que se convençam os que falam mais o que produzem, dos que se não fatigam na sua obra de destruição, na satisfação de fazerem prevalecer os seus sentimentos de vaidade e orgulho incontidos, pretendendo impor como verdade, a mentira, a falta de lógica e razão. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 13 de Agosto de 1933 – página 23) PRÁTICAS ESPÍRITAS – RESPONSABILIDADES, DEVERES E COMPENSAÇÕES Para a boa orientação e conduta de cada um, seria de indiscutível, real e proveitosa conveniência, muito particularmente aqueles que se dedicam às práticas caritativas espíritas, tivesse perfeita consciência de suas responsabilidades, deveres e proveitos a colher. É preciso que se não ignore, que não constitui absolutamente favor a prática de um ato de Caridade, quando se deve ter a certeza de ser o seu autor relativamente beneficiado com o mesmo, embora não o pratique com a intenção de se favorecido, muito menos ainda, quando o autor carece de benefícios, tendo assumido antecipadamente compromissos, e esta é em verdade a situação daqueles que possuem uma mediunidade, dos que têm no exercício dessas faculdades mediúnicas a oportunidade do resgate de dívidas contraídas, as quais não poderão em hipótese alguma deixar de serem solvidas, pelo fiel desempenho dessas faculdades, não certamente em atividades indignas, porque estas agravam aumentando o número de desgraçados e as conseqüentes responsabilidades. Se de fato alguém há que seja credor de agradecimentos, de louvores pela oportunidade das dignas ações e de seu proveito, esse alguém é Deus que nos faculta a oportunidade, proporcionando-nos por todas as formas o meio de alívios dos nossos sofrimentos, concedendo-nos a assistência espiritual de Guias e Protetores que nos amparam e encaminham. Há, portanto, no exercício das atividades caritativas, um intercâmbio recíproco de benefícios a colher, no mesmo se encontrando o mais salutar cultivo dos verdadeiros sentimentos de fraternidade cristã, o mais seguro, o mais desbravado caminho, a mais ampla e luminosa estrada que poderá conduzir as criaturas humanas à única e tão desejadas paz na qual reside a felicidade eterna.

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O nosso livre arbítrio nos permite a escolha do caminho a seguir; o bom e o mal; nenhuma criatura de bom senso poderá hesitar na escolha, se, contudo, a falta de serenidade e raciocínio nos faltarem enveredando pelo mau caminho, podemos esperar que bem depressa as conseqüências se farão sentir e então, impelidos pelas necessidades, pela dor e pelo sofrimento, nos sentiremos na dura contingência de recuar, de evitar fugindo-lhes, procurando o melhor caminho, muito embora aparentemente não seja o mais cômodo a matéria aos seus vícios e às suas paixões mundanas. Conduzir-me, portanto, a criatura dentro dos elevados preceitos morais cristãos, constitui um dever para consigo mesmo, uma satisfação às suas próprias necessidades, como a mais beneficiada pela sua digna conduta, não podendo existir argumentos lógicos e razoáveis que justifiquem a alimentação de sentimentos de vaidade e orgulho, na suposição errônea de que, a Caridade seja favor concede-la aos que dela carecem, convindo que se saiba que não há que se ser espírita para se nutrirem bons sentimentos, mas há que os ter para se possa ser em verdade. Estas considerações não me parecem deverem apenas interessar aos que se entregam às práticas espíritas, vem, entretanto, muito a propósito como uma advertência aos médiuns que se acreditam privilegiados, que chegam a alimentar a idéia e a convicção toda, de que sejam as suas faculdades mediúnicas um prêmio merecido, daí, o se julgarem credores de lisonjas, de louvores, que o castigo bem depressa fará reduzir à humanidade que desconhecem ou esqueceram como indispensável, como imprescindível filha primogênita das iniciativas e das atividades nobres porque são cristãs, e deixarão de o ser se a humildade exemplificada por Cristo for desprezada. “Que as aras não cresçam mais que os ninhos” (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Quarta-Feira, 16 de Agosto de 1933 – página 04) PRÁTICAS ESPÍRITAS – UM CASO ASSAS CURIOSO Interessantes nunca deixaram de serem os problemas que se deparam nas Tendas de Caridade; ali são levados pelas vítimas da ação maligna dos perversos e dos ignorantes, maior sendo decerto o interesse que despertam para aquelas vítimas que buscam solucioná-los. O caso em questão tem variados aspectos interessantes, despertando a curiosidade de sua análise, podendo-se por qualquer das feições que encerra avaliar-se o seguinte: Há quantas desgraças nos poderão conduzir os perversos habitantes do espaço, quando encontram nos cientistas vaidosos e materialistas ótimos instrumentos inconscientes das suas perversidades. Quantos ardis a perversidade desses infelizes é capaz de arquitetar, para levarem avante as expansões de seus indignos sentimentos. Como aqueles que acusam as práticas espíritas de fábrica de loucos, poderiam em verdade e com razão, embora inconscientemente serem apontados por haverem concorrido, para que uma pobre criatura confiante na sua celebridade científica, fosse levada a prática de um duplo crime, salva do mesmo em tempo, pela assistência espiritual dos obreiros da Caridade, que no espaço se não descuidam das infelicidades de seu irmãos na Terra. Como são consideráveis, extensos, profícuos e relevantes, os serviços que nos prestam esses nossos bons amigos, nossos Guias, salvando-nos da profundeza dos abismos que circundam a estrada da vida, por onde palmilhamos como cegos, aparados na sua extrema bondade e na Misericórdia Divina. Os nomes não importam ao caso, no tenebroso drama cujas funestas conseqüências foram pela Providencia Divina evitadas. Trata-se de um menos de 14 anos, vítima constante de ataques (de nervos, dizia-se), cujo tratamento foi confiado por sua extremosa mãe, a um especialista, psiquiatra de grande renome em nosso meio social. Escusado será dizer-se que nada foi conseguido pelo referido especialista, a despeito da sua pouca parcimônia na cobrança do tratamento, acabando por confessar francamente estar diante de um caso em que nada lhe era possível mais fazer, para conseguir a cura desejada. A sua franqueza produziu como era de prever, forte abalo moral e psíquico na delicada mãe do referido menor, levando-a a guardar o leito, e a um estado de grande fraqueza, o qual deu ensejo a que seu médico assistente suspeitasse tratar-se de um caso de tuberculose.

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Procedido ao exame de escarro, constatou-se positivo o resultado e a infeliz criatura ao lhe ser revelada esse resultado, teve agravado seu estado de saúde, passando a alimentar no seu desespero a triste e funesta idéia de assassinar seu filho e suicidar-se em seguida. Não quis Deus que semelhante desgraça fosse consumada, a que fatalmente seria arrastada aquela infeliz criatura, pela grassa ignorância dos cientistas cheios de vaidade, e pela perversidade dos malvados que no laboratório das suas maldades engendravam esse tenebroso drama, esse triste espetáculo, sendo essa pobre mãe encaminhada para a humildade dos Pretos e Caboclos do espaço, que nas Tendas de Caridade Espíritas remedeiam e corrigem os erros alheios. E o problema cuja gravidade era patente, ali encontrou a sua fácil solução, tendo-se verificado que os ataques de que o menor era vítima não passavam de manifestações mediúnicas, embora exercidas ou provocadas por Espíritos obsessores, que foram afastados cessando seus efeitos. Quanto à tuberculose da pobre senhora, resumia-se na atuação de que estava sendo vítima, por um Espírito desencarnado como tuberculoso, o qual foi igualmente afastado, entrando a mesma em franca convalescença como se poderá constatar. O mais interessante em tudo isso, é que verificou-se logo após, que tinha havido uma troca do escarro examinado, não pertencendo a referida senhora, o que deu resultado positivo e que realmente provinha de uma criatura vítima desse mal. A atuação exercida sobre a pobre senhora lhe emprestava realmente o caráter de uma tuberculose; daí a convicção de se tratar de um caso declarado pelos sintomas de que se revestia, verificado como ficou posteriormente o engano pela troca do escarro, obra satânica dos perversos invisíveis, esses malfadados obreiros da maldade que proliferam no espaço. Não tivessem essas criaturas à felicidade de serem encaminhadas como foram, e a estas horas o noticiário jornalístico teria registrado mais um sinistro drama, uma lamentável tragédia a qual Deus na Sua Infinita Misericórdia não permitiu se realizasse, e recai-se em grande parte a sua responsabilidade moral, sobre aqueles que se orgulham como privilegiados no saber, ridículos deuses na Terra. Não estou autorizado a revelar nomes, nem a apontar a Tenda de Caridade onde foi tão felizmente solucionado este caso; posso, entretanto, afirmar ser a expressão da verdade, não sendo o único a testemunhá-la, não só este, como inúmeros outros. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 17 de Setembro de 1933 – página 22) PRÁTICAS ESPÍRITAS Há cerca de trinta anos que me foi dada a ventura do primeiro contato direto com as práticas espíritas, iniciadas entre famílias, ou seja, entre pessoas que não mereciam suspeitas. A curiosidade de melhor conhecer suas origens, levou-me a procurá-las nas teorias dos mais consagrados mestre em suas obras editadas a respeito, e tal foi à afinidade que encontrei nos seus elementares princípios, que me foi dada a impressão real ou fantástica de que tudo nessas obras encontrei me era familiar, aceitando-os desde logo como reais, como a expressão da verdade incontestável, desde que o meu raciocínio as admitia como lógicas irrefutáveis, provavelmente pela conjugação das teorias com as práticas iniciadas. Devo confessar, realmente, que não foi pela constatação de surpreendentes fenômenos cujas manifestações conheço, através da leitura de suas narrativas, que fui conduzido a conversão; fenômenos esses que nos meus trinta anos de atividades espíritas, não tive oportunidade de testemunhar, nos quais entretanto creio sinceramente, sem que me causem surpresas, seja qual for o maravilhoso caráter que assumam, certo de que nunca serão tanto como o Criador que preside a todas as manifestações, inúmeras das quais fogem a percepção da inteligência humana. A minha crença se encontra firmada em alicerces que podem e devem ser reputados como os mais sólidos, porque são os da lógica e da razão, não me tendo servido a constatação de fenômenos às provas da existência espiritual e da reencarnação, senão para consolidá-los cada vez mais. Nunca pela minha mente passou a dúvida ou a vacilação sobre a existência da Suprema Inteligência Personificada no Criador do Universo, nas Suas Leis Naturais perfeitas e imutáveis, assim me seja sempre possível e permitido em obediência aos princípios da tolerância cristã, contra os profissionais exploradores que disfarçam as suas verdadeiras intenções, ludibriando as suas vítimas inebriadas pelas pompas e pelo fausto de um culto que prima pela insinceridade, numa consagração indisfarçável pelo ouro alheio.

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Compreendendo os ardis engenhosos para a ascensão que aspiram para um mais vasto predomínio sobre as consciências incautas ou fanáticas, não me desejo preocupar aliando-me aos que se esfalfam no momento em combatê-los, no propósito de destruir os falsos preconceitos religiosos, a desmedida e pretensiosa ambição de seus mandatários, tão certo estou de que, a ascensão veloz permitida, o é de certo para que mais fragorosa seja a derrubada quando oportuna, de uma altura de onde se não podem divisar a fragilidade dos alicerces desse templo carcomido pelos interesses pessoais e puramente materiais, os quais se esforçam em demonstrar sólidos, mas que pressentem fugir-lhe o terreno em que assuntam. Prosseguindo nas considerações interrompidas que motivam estas minhas, devo dizer que tenho encontrado no exercício das práticas Caritativas, um infinito campo de observação das mais sábias, sublimes, nobres e dignas lições de fatos e atos que se não surpreendem pelo aspecto fenomenal, se não extasiam a muitos, encantam-me pela sua pureza, pela sua simplicidade, pela inigualável humildade de seus autores, valendo a meu ver não menos que os extraordinários fenômenos apregoados aos quatro ventos como maravilhosos. Estas sublimes lições e exemplos valem sem dúvida muito porque estão ao alcance das mais imberbes inteligências; não embriagam, não extasiam pelo aparato maravilhoso que impede geralmente a sua análise; o seu raciocínio claro, a sua verdadeira significação e conseqüente valor. Na minha simples e modesta condição de aprendiz, na possível constância observada no exercício mais ou menos ativo das práticas espíritas de finalidades Caritativas, tenho achado satisfação plena, relevantes provas colhidas nas Tendas de Caridade, sucedendo-se numa caudal ininterrupta os casos, em uma multiplicidade de formas e de causas infindáveis, entre as quais os detalhes de aparência insignificante têm para mim uma importância relevante, um significado que aproveito e conservo com carinho. Ainda há poucos dias quando secretariava um desses humildes obreiros da Caridade, em suas atividades numa seção pública, atendendo incorporado aos que recorriam aos seus serviços; ao pressentir eu a gravidade da situação originaria de um sério problema que lhe foi encaminhado resolver, diante da rebeldia e perversidade de um considerável número de infelizes que atuavam sobre sua pobre vítima, gravidade essa tal, que arrastou pelo pavor um desses humildes obreiros a se deixar influenciar pela impureza das irradiações à prática de um ato de indisciplina, dirigi mentalmente uma prece ao Altíssimo, implorando-lhe as energias precisas ao amigo que procurava solucionar o grave problema, para que o mesmo triunfasse vencendo aqueles malvados na luta que aceitou e provocou, e que com tanta bravura e confiança travara. Não poderia deixar de triunfar o Bem sobre o mal, para glória desses humildes obreiros da Caridade, trabalhadores da Santa Seara de Jesus para benefício dos vencidos; reprovado e castigado o autor do ato de indisciplina, cheio de boa vontade por certo, mas inadvertido, errado no ponto de vista em que se deixou colocar, mal compreendido, mas, explicável. Terminada que foi a espinhosa tarefa, vencida a luta travada, antes que se afastasse desincorporando o Guia vitorioso, em favor de quem enderecei a referida “prece mental”, longe de imaginar tivesse ela sido testemunhada se não por mim, surpreendeu-me extraordinariamente o fato de ver esse amigo, esse Guia dirigir-se a mim, trocar uma afetuosa e fraternal saudação, e em singelas palavras assim dizer-me: “Caboclo agradece de coração a prece que o filho fez por ele”. Pode esse fato ser banal e muito comum; para mim, no entanto, tem uma importância considerável, tem um valor muito relativo à circunstâncias, cujo comentário o momento pela sua extensão não comporta, esperando ainda oportunamente poder abordá-las. Afastada de mim qualquer pretensão de me julgar credor pela prece endereçada, de acreditar me seja por isso devida à vitória da referida luta, alimentando tão somente a surpresa da revelação de um ato que me parecia ser apenas mental, sem reflexos exteriores pressentidos por alguém, alegra-me bastante a certeza que me foi dada do valor e da consideração da prece, não dita por mim apenas, mas por todos quantos possuam a boa vontade e a sinceridade de poder elevá-las aos pés do Criador, em favor das causas santas e dignas, nenhuma mais que as da Caridade Cristã. Possam em circunstâncias idênticas ter a mesma eficácia e consideração, todas as preces de meus prezados irmãos no auxílio maior ou menor, que possam emprestar a essas atividades espirituais. São os votos do mais modesto, aprendiz. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 29 de Setembro de 1933 – página 04)

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PRÁTICAS ESPÍRITAS – CASOS INTERESSANTES No exercício das atividades caritativas espíritas, como já tive ocasião de dizer aqui, é notório que se sucedem os casos, revestindo-se de caracteres dignos de serem considerados, pelas sábias lições que nos proporcionam, aproveitadas pelos que tem a ventura de os testemunhar. Entre os inúmeros que me tem sido dado presenciar, não resisto ao desejo de tornar públicos os que considero os mais interessantes, para que sirvam de exemplos, e sejam conhecidos quanto são proveitosas as nobres atividades e o altruísmo daqueles que no espaço não permanecem no ócio, como condutores dos fracos e desprotegidos de defesa, entregues ao abandono e a ação maligna e invisível dos perversos. O fato que passo a descrever desenrolou-se em uma modesta Tenda de Caridade Espírita, entre a humildade dos seus trabalhadores espirituais, compostos de Pretos e Caboclos denotados batalhadores da Linha Branca de Umbanda e Demanda, com a devida reserva dos nomes dos personagens em questão. Uma pobre senhora dirige-se a um dos Guias incorporado, (Caboclo) no Terreiro (sala das Sessões), solicitando-lhe, cheia de aflições, a sua interferência no sentido de remediá-las, para que seu marido não continue mais a se embriagar como vem fazendo, apesar de fora do estado de embriagues ser contrário a esse vício, mas não poder explicar porque se deixa vencer pelo mesmo, sendo que, a continuar nessa triste situação, seria fatalmente arrastado ao desemprego, a ruína de sua saúde e a miséria de seu lar, já tão infelicitado pelos desatinos de seu vício incorrigível pelos meios materiais, sendo a criatura em questão, guarda da Alfândega desta Capital. O Guia penalizado promete atender ao seu pedido na medida de suas forças e da permissão divina, recomendando-lhe desde logo que se torna precisa a presença do mesmo, ao que a pobre senhora retruca dizendo-lhe ser isso impossível, por várias razões, não somente pela sua pouca fé e crença, pela natureza de seus serviços que lhe não permitem a ausência nas horas determinadas para as Sessões, e ainda pela perturbação causada pela embriagues. Responde-lhe o Caboclo, que é preciso que ele compareça; que ela sossegue quanto a isso, porque ele irá com certeza. Sucedeu que dois ou três dias após essa ocorrência, é pelo Ministério respectivo requisito um guarda para ser colocado à sua disposição, e apesar de existirem muitos disponíveis, o designado foi o esposo da referida senhora, e que por essa forma, livre da prisão de suas atividades fiscalizadoras, já dispunha do tempo preciso para seu comparecimento à Sessão e sem oferecer obstáculos, ali compareceu acompanhado da esposa. Levado a presença do referido Guia, este interpelou a senhora, lembrando-lhe se ele não lhe havia prometido que seu esposo compareceria; logo, ele não tinha faltado a sua palavra; Deus lhe havia permitido socorrer a pobre vítima. Depois de haver sido afastado a influência espiritual que ocasionava a irregularidade, causa mater do vício da embriaguês; aconselhou o referido Guia o uso de uma substância composta e preparada pelo mesmo, com propriedades fluídicas e materiais antialcoólicos. São decorridos já cerca de vinte dias, e ao que se sabe, não voltou essa criatura a se embriagar, o que leva a crer nos benefícios e na eficácia da ação desse grande amigo do espaço, cujas condições de humildade lhe não impedem a nobreza da ação. Dadas as provas que é licito reputar como suficientes para que se confie no valor e na eficácia da ação, não nos pode merecer dúvidas o valor do seu autor. Podem os incrédulos atribuir ao acaso o desenrolar dos acontecimentos narrados, eu, porém, tenho razões de sobra para acreditar na ação desses abnegados trabalhadores, reconhecendo-lhes a autoria de seu encaminhamento do espaço, tanto mais familiarizado com eles; já me habituei a acompanhá-los nas suas atividades eficazes, quando são permitidas por quem pode, e não precisa pedir permissão a esses incrédulos, esses cegos por prazer ou orgulho. São sem conta os casos desta natureza, constatados, analisados, controlados e testemunhados, não atribuídos ao acaso que esta é a melhor explicação para aquilo que se não sabe explicar, se não são cientistas os que os resolvem, se não são abastados de cultura e são, no entanto, nas suas qualidades morais, na nobreza de seus sentimentos e ação, e isso nos parece bastante para nos merecerem a confiança que neles depositamos. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 08 de Outubro de 1933 – página 22)

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PRÁTICAS ESPÍRITAS Não entrei nos conhecimentos espíritas, nem devo a minha conversão penetrando pela porta das práticas da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”, fazendo esta ressalva para que fique patenteado que não desconheço o Espiritismo nas suas modalidades, digamos rigorosamente kardecista, permitindo me fazer esta distinção, uma vez que há quem as queira distintas. A maioria das obras escritas ou traduzidas em português sobre o assunto, eu as li; não me são, portanto, desconhecidas, e a minha curiosidade, o meu grande desejo de aprender, levaram-me a rebuscar o que de útil fosse possível encontrar nos autores ocultistas e teosofistas de caráter religioso ou puramente científico, desde o seu berço no Oriente, tendo estes conhecimentos reunidos me servido para melhor compreender a grandeza dos ensinamentos de Kardec. Se presentemente, conhecendo suficientemente as finalidades e a razão de ser das atividades e modalidades da “Linha Branca de Umbanda”, a elas me venho dedicando nas medidas de minhas possibilidades com a precisa sinceridade, se consciente de minha ação, senhor de meu claro raciocínio me encontro espontaneamente envolvido no seu meio, não será decerto a satisfação de alguns confrades e amigos, motivos bastantes para que retroceda ou me afaste de um caminho que se lhes parece errado. É sem dúvida pelo desconhecimento que tem do mesmo, e pela suposição de que desconheça, eu, o terreno em que piso. A minha solidariedade incondicional está por demais explicadas, pela nobreza e pela dignidade das referidas atividades, pelas suas incontestáveis finalidades caritativas Cristãs, tudo mais tem para mim um valor secundário, não alimentando outras preocupações, senão as precisas e indispensáveis para a completa eficácia, para a mais produtiva ação, desagrade ela a quem quer que seja. Que importa que me classifiquem como obsedado, que me mimoseiem com epítetos graciosos ou deprimentes, humilhantes e desprezíveis, numa atitude de verdadeira ou fingida piedade. Que me importa que os confrades aristocratas e de luxo não queiram compreender, não possam admitir, como uma criatura sabendo ler e escrever, beijar reconhecida a mão de um humilde Negro seu irmão, mão que o arrancou do atoleiro em que se achava. Não compreendem esses espíritas modernizados, que se não deixam obsedar, como possa uma criatura sentir-se bem e feliz, entre a afabilidade desses humildes Pretos e Caboclos, desses humildes obreiros da Caridade – a quem Jesus classificou como obreiros da sua Santa Seara; como se possa preferir a convivência humilde espiritual desses dignos trabalhadores, afastados do convívio das celebridades intelectuais, cuja moral se desconhece. Não compreendem porque ignoram decerto esses confrades, que tanto se esforçam em combater, ridicularizar e caluniar, aqueles que caminham por caminhos que desconhecem, como possa a carcaça espiritual de alguns desses humildes obreiros da Caridade, ser um instrumento de provação, de castigo por vaidades e orgulhos alimentados por senhores, feitores, carrascos e sabichões, figuras que brilham em destaque pela prepotência exercida sobre seus fracos irmãos em tempos que já lá se vão, esquecidos de que Jesus Cristo afirmou que os grandes e poderosos seriam humilhados, e os fracos e pequenos elevados! Desejo com prazer ser encontrado, envaidecido sim pela humildade do convívio do meio, obsedado sim, pela bondade, pela nobreza e pela elevação dos sentimentos predominantes. O desejo de cooperar de qualquer forma, na grandiosa obre desses abnegados trabalhadores da Seara de Jesus, de tomar parte nessa incessante luta que com tanto denodo e verdadeiro heroísmo mantém contra o mal e suas funestas conseqüências, contra os sofrimentos que afligem a humanidade e seus autores conscientes ou ignorantes me leva a lhes emprestar a minha incondicional embora fraca solidariedade, em suas atividades, na defesa de incontestável sinceridade. Inúmeros confrades se penitenciam hoje, de haverem julgado apressadamente esses humildes Pretos e Caboclos, pondo em dúvida a sinceridade de suas intenções; não me surpreenderá de certo ver amanhã os juízes de hoje seguir-lhes o exemplo, e oxalá não lhes seja preciso conhecerem o seu erro, levados pela necessidade de aproveitarem e valerem-se do socorro dos que tão mal julgaram, humilhando-os e repudiando-os. É preciso em verdade conviver com esses sacerdotes da Caridade, sentir a afabilidade de seus atos e de suas palavras, aprender os seus sentimentos, para compreender a grandeza da sua humildade, a nobreza de seu caráter, vendo o quanto é injusta apreciação dos que ao em vez de lhes seguirem os exemplos, se comprazem em humilhá-los, em deprimi-los e repudiá-los. Que Deus perdoe os insensatos, cegos pela vaidade e pelo orgulho. (Texto de Aprendiz. Diário Carioca – Sexta-Feira, 27 de Outubro de 1933 – página 10)

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PRÁTICAS ESPÍRITAS Nenhum prazer sinto, e é constrangido que tenho de por vezes repetidas sido forçado a usar de uma linguagem em tanto violenta, para rebater referências deprimentes e ridículas pela persistência, contra as práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”, não observada a mais leve consideração pela idoneidade moral de seus autores praticantes, coadjuvantes e adeptos, sinceros, tachados de ignorantes, mistificadores, exploradores e causadores de desídias entre os professantes espíritas, começam os acusadores, juízes improvisados das causas alheias, por fazer empenho que se vejam como bacharéis espíritas, preferindo assim a pecha, aliás, bem merecida de caluniadores, torcendo a verdade por motivos que não confessam mas se divisam. Entendem esses bacharéis, que a Caridade é seu privilégio, só podendo ser exercida por quem tenha lido e decorado os Evangelhos, esquecidos de que obram mais por palavras que por ações, falando mais por palavras que por ações, falando mais do que produzem, muitos prodígios em retórica e parcos em atos meritórios, cheios de autoridade para impor métodos e uniformidades que a Natureza contraria a todos o momentos, como se fosse possível uniformizarem-se de progresso, sobrepondo-se às leis de Deus. Acreditam que em atividades caritativas, a orientação não tenha que ser ditada em perfeita harmonia com os meios, com as circunstâncias dos mesmos, as possibilidades, os limites da permissão, a capacidade dos autores, o merecimento das vítimas, num terreno espiritual que nosso organismo material impede conhecer suficientemente, para indicar caminhos aos que nele vivem. Farta e racionalmente tem sido explicada a razão de ser das atividades dos obreiros da “Linha Branca de Umbanda”; convidados têm sido insistentemente os seus adversários, a analisar a nobreza e a dignidade das mesmas, preferindo, entretanto, por motivos que se não explicam, persistirem por prazer ou por vaidade na posição de espíritas diplomados e aristocratas. Bem se compreende o quanto é mais cômodo, conviver-se com criaturas de mais ou menos idêntico aperfeiçoamento, evitando-se o conto dos que por sua própria infelicidade, se encontram numa escala em que a maldade e as atividades indignas são fartas, mas se é mais cômodo, não é sem dúvida mais útil, que se saiba colocar as coisas nos seus devidos lugares, que nos não acusem como autores de discórdias entre a família espírita; se a nossa atitude é a de defesa contra os ataques e as calúnias dos intolerantes que nos não querem dar tréguas. A triste condição desses nossos irmãos do espaço é motivo mais que suficiente para que pela forma mais adequada os auxiliemos e sair da mesma, não lhes tira em absoluto o direito de filhos de Deus, não nos cabendo impor-lhes condições para os socorrermos, exigindo-lhes conhecimentos e familiaridade com uma civilização que desconhecem e não podem compreender dado o seu atraso moral e intelectual. Convençam-se pois os nossos confrades intransigentes e intolerantes, que se existem trincheiras dividindo os espíritas, não foram elas levantadas pelos que humilde e modestamente, sem alarde de suas nobres e dignas atividades, pedem apenas que não os julguem precipitadamente, que se não lhes convém imiscuírem-se na humildade deste meio, lhes concedam ao menos por tolerância, o direito de fazer bem, sem sair fora dos mais sagrados princípios espíritas, que não desconhecem e sabem defender condignamente. (Texto de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 28 de Outubro de 1933 – página 11)

PRÁTICAS ESPÍRITAS – “SUMMUN JUS, SUMMA INJURIA” É de lamentar que se não fatiguem os juízes das causas alheias, na sua faina de condenar o que por circunstâncias infundadas lhes desagrada. Esse tem sido o critério adotado por amáveis confrades, na sua inclemência manifestada sempre que se lhes oferece oportunidades, pelas aguilhoadas que tiram, disfarçadas e amenizadas por frases cheias de concórdia, em escritos de caráter doutrinário, colocando-me por visado mais diretamente na cruel contingência de repisar em considerações, cuja clareza ao que pareço lhes não convém ver e compreender. Argumentando na defesa da sinceridade e intenções dos trabalhadores da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”, tendo feito preceder esses argumentos com fatos positivos que comprovam suficientemente a realidade desses argumentos, tenho reclamado a análise meticulosa desses fatos, pelos acusadores e juízes; como resposta apenas tenho merecido de uns, felizmente, o silêncio que traduz a conformidade; outros entretanto, persistem nos ataques, negam por simples palavras vãs, como se essa forma fosse bastante para impor suas vaidosas convicções como verdades incontestáveis. Desagrada-lhes verem as coisas colocadas em seus devidos lugares, disputando a primazia de uma superioridade, que os diminui em vez de elevá-los no conceito moral, estabelecendo divisões, cavando barreiras, levantando muralhas divisórias entre professantes de um mesmo credo religioso, dentro de doutrinas que as condenam por princípio inviolável e sagrado, demonstrando flagrantemente a falha de idoenidade moral, para falarem em nome dessas doutrinas e seus princípios.

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Ninguém de entre nós pensou decerto ainda, em lhes negar, deixando de reconhecer o valor de sua ação quando sincera e benéfica, compreendendo-a dentro dos mesmos princípios, numa escala de relativa proporção intelectual, dentro dos limites do meio em que se tornam desnecessárias e inúteis as modalidades que combatem e condenam; mandam, entretanto, o bom senso e o raciocínio, que saibam reconhecer não como um favor, mas como justo e real, que não é inferior o valor da ação exercida numa esfera de maior inferioridade intelectual sim, mas onde as finalidades se identificam perfeitamente, a despeito da aparente diversidade de métodos, sem que violados sejam os princípios por todos reputados nobres e elevados porque são os Cristãos. A liberdade de uso de hábitos e costumes familiares com a inferioridade do meio, dos elementos ativos do espaço, em finalidades nobres e dignas, não importa absolutamente na diminuição do valor das mesmas. Não é decerto o progresso intelectual que preocupa os praticantes da “Linha Branca de Umbanda”, mas sim, o progresso moral, e aquele sem este, lamentáveis e funestas conseqüências têm trazido para a humanidade e talvez não seja erro o afirmar-se que as divergências suscitadas entre os professantes da mesma crença, as quais motivam estas considerações, sejam um reflexo do desaparelhamento em que se caminha nessa marcha em que distanciam tão acentuadamente a cultura e a educação moral. A necessidade de se evitarem e corrigirem essas tristes conseqüências, é que nos leva a descer ao encontro dos que marcham distanciados ou à nossa retaguarda, levando-lhes o auxílio de que precisam para ajudá-los a subirem até onde nos achamos, na satisfação de inegáveis interesses recíprocos. A despreocupação e o desprezo pela sorte, pela condição social de nossos irmãos do Planeta, o egoísmo em que temos vivido, não podia deixar de fazer sentir sobre seus autores as suas relativas conseqüências, apontando-os o caminho que deveríamos ter seguido, forçando-nos a retroceder ao encontro dos que esquecemos, daqueles que abandonamos desumanamente, na suposição errônea de que o poderíamos fazer impunemente esquecidos das responsabilidades que nos cabem, determinadas pelo Criador. Não tem fundamento algum o receio de que os hábitos, os costumes que caracterizam o meio em que constituem as modalidades erradamente combatidas, possam ultrapassar os limites do meio em que se desenvolvem, possam transpor os terreiros das Tendas de Caridade, senão quando exclusivamente no complemento de uma ação puramente espiritual, indispensável ao êxito das finalidades caritativas. Os fanáticos, os hipócritas e os ignorantes, são os únicos responsáveis pelos excessos que se possam verificar, e esses existem em toda a parte e em todos os meios sejam eles cultos ou não; a esses não há senão que perdoar-lhes esclarecendo-os sempre que se possa. É indispensável que se saiba, que para conduzir e comandar nessa ação espiritual os menos afortunados de progresso moral e intelectual, existem os missionários investidos de personalidades adequadas, possuindo a consciência e as luzes suficientes ao fiel desempenho de suas nobres missões, cumprindo-os a nós acatá-los com o devido respeito em sua autoridade e conduta, não pretendendo elementares vaidosas pretensões, sobrepondo-nos a sua autoridade, em atitudes ridículas de críticos e juízes de seus atos. Não podemos, nem devemos ir além da posição que nos é dada, como meros auxiliares e coadjuvantes terrenos, na sua muito nobre e digna ação Cristã, convictos dos grandes e relevantes serviços que prestam a humanidade inteira, com a eficácia completa da mesma. Constitui certamente grave falta, pretender-se obstar a sua ação, sob fundamentos que não são mais que o produto de uma vaidade que o desenvolvimento intelectual empresta às criaturas desconhecedoras da boa e sã moral Cristã, e a essas eu me atrevo a adverti-las de que, não devem esperar do excesso da sua justiça senão a mais clamorosa injustiça. (Texto de Aprendiz. Diário Carioca – Domingo, 12 de Novembro de 1933 – página 22)

PRÁTICAS ESPÍRITAS – A EVOLUÇÃO E A “LINHA BRANCA DE UMBANDA” A evolução moral e intelectual da humanidade, não se opera isolada e individualmente, como a alguém possa parecer. A despreocupação, o descaso e o egoísmo dos que desconhecem ou se desinteressam pelos mais sagrados sentimentos de fraternidade, têm sido o motivo de grandes males que afligem as criaturas humanas, somente possíveis de serem evitados e remediados, quando possamos ter a compreensão nítida e perfeita dos deveres, dos compromissos mútuos assumidos com a convivência nas sucessivas etapas da existência na Terra ou no espaço, cujo fiel cumprimento graças à perfeição da justiça Divina, se torna inevitável e indispensável.

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Esquecidos, desconhecedores ou descrentes da igualdade que nos identifica como seres humanos, filhos de um mesmo Deus, expandimo-nos no cultivo e na alimentação dos mais nefastos e perniciosos sentimentos, imperando por tais razões o orgulho e a vaidade, criando castas, raças e classes privilegiadas, num desmedido egoísmo provocando funestas conseqüências não só para o presente, como para o futuro. O desprezo votado pelos povos, pelas criaturas de condição social inferior e precária, pelos pobres de moral e cultura, o esquecimento e a ignorância de que pertencemos, ontem, ao seu número, nos leva a pretender fundir as cadeias que nos ligam na eternidade da existência, sob a ação do calor da falsidade, da hipocrisia dos preconceitos sociais, amoldados ao sabor de interesses individuais, prestigiados esses preconceitos e habilmente explorados, pelos menos hipócritas profissionais de crenças religiosas deturpadas, nos tem afastado repudiando o convívio social com aqueles que classificamos de selvagens, indiferentes à sua sorte, às suas necessidades e ao seu progresso. Procurando estabelecer e manter o contato espiritual com esses nossos irmãos desencarnados, nada mais fazemos, se não retomar o caminho de onde nos desviamos, no cumprimento de deveres esquecidos proporcionando-lhes aquilo que lhes recusamos, auxiliando-os a se emparelharem conosco dentro da mesma escala na marcha incessante do progresso espiritual a caminho da perfeição, onde pode ser encontrada a felicidade a que todos aspiramos para onde nos impelem as leis da Natureza. Corrigindo o nosso descaso pelos nossos irmãos, proporciona-nos Deus os meios e a oportunidade de reparar essa errônea conduta, facultando-nos o convívio, do qual resulta um intercâmbio de ensinamentos e cultura, na satisfação de compromissos assumidos, de deveres recíprocos, num retorno ao caminho da razão e da justiça, numa demonstração evidente e provada, de que a evolução terá que ser coletiva e nunca isolada; assim o determinam aquelas leis naturais. Os praticantes espíritas terrenos da “Linha Branca de Umbanda” servem-se aproveitando a oportunidade que se lhes oferece, mantendo o convívio com seus irmãos do espaço, desenvolvendo atividades associadas as quais indiscutivelmente pelas formas e meios apropriados, de conformidade com as circunstâncias, concorrem para o progresso moral e intelectual, para o alívio de sofrimentos e males da humanidade, beneficiando com isso não somente a si próprio, mas toda a coletividade, implantando a mais pura e verdadeira fraternidade. (Texto de Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 25 de Novembro de 1933 – página 04)

PRÁTICAS ESPÍRITAS – MODALIDADES Há quem condene a passividade que alguns praticantes espíritas dão especialmente dentro das modalidades diretamente visadas, e que se distinguem pela denominação de “Linha Branca de Umbanda”, vendo nessa passividade um erro ou um mal, mas em verdade o erro está mais no ponto de vista em que se colocam os juízes, os quais em geral primam pelo desconhecimento do assunto em suas minúcias. Antes de mais nada há que considerar-se que a ação se desenvolve no mundo espiritual invisível salvo para os videntes, os quais nem sempre podem devassar toda a ação desenvolvida, sendo o número dos assistentes materiais ou auxiliares presentes relativamente insignificante diante dos milhares de Espíritos como elementos ativos, postos ao serviço de finalidades sobre cuja dignidade não podem haver dúvidas. Identificados perfeitamente os Guias Espirituais como de grande elevação, de grande progresso moral, não nos caberia o direito ou a razão de duvidar da ação que presidem, e a passividade se acha explicada, sendo parte insignificante de um considerável número que se agita e opera em nosso benefício e dos que carecendo da Caridade, recorrem ao seu auxílio às suas atividades espirituais. Ninguém pensa de certo em copiar e introduzir em nosso meio civilizado, hábitos, costumes e linguagens primitivas; esse receio é infundado; antes ao contrário, da convivência serão beneficiados os que se acham privados das luzes da civilização, enquanto que o progresso moral será mútuo, dele todos aproveitarão. Os Guias Espirituais, comissionados nas posições de comando e orientação possuem a consciência exata de suas responsabilidades, as quais não podem depender da vontade de criaturas terrenas por maior que seja a sua intelectualidade ou autoridade; se nos colocamos na sua dependência não podemos recusar-lhes a obediência e a passividade que nos é exigida como necessária ao bom desempenho, a eficácia da ação, de cuja ação somos os maiores beneficiados, não sendo é claro, os únicos. Essa ação representa sem dúvida a mais produtiva escola moral dos Espíritos cuja condição de progresso ainda só recente da sua falha; ali eles aprendem a praticar a Caridade, abandonando suas nefastas e indignas atividades, preparados e instruídos para que possam amanhã encarnar num meio compatível com o grau de progresso adquirido nessa escola, nesse exercício. Encarnados amanhã, em nosso meio, facilmente se adaptarão aos costumes e linguagem do mesmo, sem que possam mais constituir em embaraço ao nosso progresso moral, como elementos perniciosos a sociedade.

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Não podem eles serem e responsabilizados pelo fanatismo de alguns, ou pela ignorância dos que não compreendendo a realidade dos fatos, os interpretam como querem, ao sabor das sua inclinações, levando a passividade mais longe do que lhe é exigido. Não se deve crer que todos os Espíritos que tomam parte nessas práticas, sejam possuidores de muita luz, embora todos coadjuvando para o Bem, cada um guarda a sua escala, no seu grau relativo, nela subindo proporcionalmente de acordo com o seu desenvolvimento, ocupando nesse exército de batalhadores posição relativa, não restando dúvida alguma sobre a elevação espiritual dos comandantes e chefes, pelas enormes responsabilidades que lhes estão afetas como condutores de muitos milhares de nossos irmãos de raças diversas. Tão depressa seja possível converter todos os ignorantes e malvados existentes, nenhuma razão mais justificará a persistência nas modalidades que lhes são peculiares; mas até lá, estão sobejamente explicadas. A conversão, entretanto, não poderá ser feita por aqueles que os repudiam, os evitam e lhes negam o direito de progredirem, de se desenvolverem pelo exercício do Bem, numa atitude irrefletida e anti-humanitária, que nada tem de Espírita ou de Cristã. O que se não pode negar é a docilidade, a grande humildade, o devotamento, a bondade dos Pretos e dos Caboclos na sua ação Caritativa, nas suas palavras de ânimo e conforto; os Pretos mais afáveis, mais expansivos, mais alegres, sempre bem humorados, enquanto que os Caboclos sempre ríspidos, sisudos, amigos da rigorosa disciplina e obediência, muito pouco sorridentes, mais ativos que faladores. A bondade preside todos os atos e palavras e a evocação da fé, do respeito a Deus, as precede invariavelmente, sem que qualquer ultrapasse os limites da máxima humildade, cultivando o verdadeiro amor ao próximo. (Trecho de: Aprendiz. Diário Carioca – Sábado, 8 de Abril de 1933 – página 09) PRÁTICAS ESPÍRITAS – O ESPIRITISMO E SUAS MODALIDADES Antes de iniciar a publicação dos conceitos que me é dado externar, devo declarar que eles partem de um simples aprendiz; produto de observações e raciocínio de quem se sente animado das melhores intenções, possuidor infelizmente de uma cultura muito rudimentar. O que tenho a dizer, não constitui segredo para os assistentes habituais às práticas espíritas que se distinguem pela denominação de Magia Branca da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”, cujas práticas, a despeito de haver quem queira negar sejam espíritas, o são, no entanto, diferindo apenas nas suas modalidades. Para melhor poder fazer-me compreender, eu me colocarei nas fileiras dos que exercem a Caridade pelas modalidades que são o motivo de minhas considerações, e onde em verdade me encontro, como meio auxiliar apagado. As modalidades adotadas nos labores caritativos das entidades espirituais que lhes emprestam o seu concurso ou sua direção para o eficaz êxito do desideratum, têm sido por motivos infundados, pretexto para perseguições e menosprezo, numa atitude irrefletida bastante deplorável quando partida dos que se dizendo confrades esquecem totalmente um dos princípios das doutrinas espíritas, que é a tolerância. Esquivam-se do conhecimento das intenções para só divisarem moralidades que reprovam pelo desconhecimento ou pela falta de sinceridade, seja por má fé. Tão inadvertida atitude de confrades demonstra uma intolerância que só pode ter fundamento na falta de raciocínio, não lhes permitindo o direito de se exibirem como espíritas, advogando princípios que desconhecem ou esqueceram. Por mais atilado que seja o observador, por mais perspicaz que ele seja, não poderá, em absoluto, descobrir e demonstrar que nas intenções e nos atos que as traduzem, praticados estes nas Tendas de Caridade, na humildade dos seus Terreiros, haja interesses subalternos, lucros pecuniários visados, ou mesmo a satisfação de vaidades, por mais disfarçadas que sejam. Todos os que se dedicam a essas práticas têm os seus afazeres materiais, de cujos proventos se mantêm bem ou mal, não temendo uma devassa em suas vidas, podendo os seus adversários ficar plenamente seguros de que a eles, mais do que aos seus antagonistas, lhes repugna a simples idéia de que possa haver criaturas humanas capazes de explorar a dor e o sofrimento de seus irmãos, fazendo do exercício da Caridade profissão ou meio de lucros pessoais.

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O que se almeja como retribuição, pelos benefícios que é dado proporcionar é somente o que todos têm direito para desejar, é unicamente o progresso espiritual, convictos como estão da sinceridade de seus atos, sem desconhecer que a cada um cabe inteira e completa responsabilidade pelos mesmos, sejam eles bons ou maus, sendo suas conseqüências equivalentes e proporcionais. Procura-se conquistar e fazer jus ao progresso espiritual, pela única forma que é dado conhecer-se para tal conseguir, ou seja, exercendo a Caridade, socorrendo todos os que batem às portas das Tendas em busca da mesma, valendo-lhes se Deus assim o permite. Se desagradam a alguém as modalidades não serão de certo aos beneficiados, mas aos que, pela ignorância, pela falta de compreensão, preferem o comodismo da crítica e da negativa, a análise criteriosa, ao estudo e observação que provariam suficientemente a sua harmonia no campo em que são exercidos e o meio espiritual onde se desenrolam. (Trecho de: Aprendiz. Diário de Notícias – Sábado, 27 de Abril de 1935 – 2ª seção) PRÁTICAS ESPÍRITAS – O ESPIRITISMO E SUAS MODALIDADES

Não é propriamente a defesa dos trabalhadores da “Linha Branca de Umbanda” que mais me preocupa, certo de que não podem ter acusações, nem seus acusadores, aqueles que têm a consciência perfeitamente tranqüila perante Deus, aqueles que têm a convicção sincera do fiel cumprimento dos deveres cristãos. Os juízes improvisados julgam e classificam pelas aparências dos meios e com semelhante critério; não é de estranhar que classifiquem aqueles Obreiros da Caridade como mistificadores, feiticeiros, macumbeiros ou exploradores da credulidade pública, falsos espíritas e variadas designações deprimentes, procurando atrair sobre os mesmos a antipatia e a repugnância, isto sem a mais leve consideração e respeito pela idoneidade dos que emprestam sua solidariedade material à sua seção insofismavelmente caritativa. Classifiquem-nos de ignorantes se isso lhes apraz, mas sem esquecer que por ignorantes, ou não possuir elevada cultura não é crime punível, nem tampouco razão bastante para impedir o cultivo dos mais dignos e nobres sentimentos de fraternidade ou a prática de atos que se harmonizem com os mesmos.

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Acusam-nos de usarem modalidades incompatíveis com os hábitos dos povos civilizados, porque nos solidarizamos com práticas de entidades espirituais de condição silvícola, a qual lhes falha capacidade para julgar, seja real ou aparente, esquecidos da conveniência das finalidades, como se fosse a sua intenção proporcionar espetáculos extasiantes dos assistentes, quando muito mais nobre e altruísta é a missão que tem a desempenhar; dispensando perfeitamente os aplausos dos mestres na retórica espetaculosa na forma de agir daqueles Obreiros da Caridade, eu tenho visto apenas motivos para elevá-los no conceito moral das criaturas humanas, lamentando que ignorem que acusam; que condição indispensável ao progresso espiritual de todas as criaturas é o exercício do Bem, e que na certeza desta incontestável verdade não é dado a quem quer que seja o direito de impedir ou semear obstáculos a esse progresso; não explicarão de certo, com razão, porque recusam como meio e obra meritória a oportunidade que se lhes oferece para o exercício do Bem para com seus irmãos. Esquecem-se ainda os irrefletidos juízes, de que precisamente os que mais necessitam de progredir são aqueles que consideramos em maior grau de atraso espiritual. Esquecem-se de quem, do progresso coletivo, seja no mundo material ou espiritual, só poderão resultar benefícios comuns dos quais compartilhem sem dúvida alguma, os que os apontam e ocupam à condenação geral. Ignoram, por completo, que aos Espíritos do espaço, no fiel cumprimento de nobres missões é facultado investirem-se de personalidades necessárias ou convenientes ao seu desempenho. Ignoram certamente que lhes falha a eles, como a nós mesmos, autoridade e competência para desvendar segredos e verdades, que não estamos na altura de compreender, sendo demasiada pretensão exigir-se a revelação da verdadeira identidade de missionários que devem merecer, toda a nossa consideração e respeito pela sublimidade de seus atos, pelo poder de que se revestem e pelos benefícios resultantes dos mesmos. Esquecem-se os críticos apressados de que entre as criaturas humanas nenhuma há que possua poderes ou capacidade bastante para ordenar se opere o progresso, em saltos, ao invés de gradativamente em obediência às leis que regem os destinos do Universo, ou sejam, Divinas. Não sabem certamente os acusadores gratuitos de que, no estado primitivo em que se encontram nossos irmãos de aspecto silvícola no espaço, ou ainda na Terra, não podem conhecer ou usar senão hábitos e costumes, maneiras e linguagens que lhes são peculiares e conhecidos. Seria uma utopia a pretender-se, exigir-lhes sua imediata adaptação ao meio que desconhecem, a sua rápida conversão em criaturas de nosso meio civilizado, antes que isso lhes seja possível e permitido, pelo seu grande desenvolvimento espiritual (Trecho de: Aprendiz. Diário de Notícias – Terça-Feira, 30 de Abril de 1935 – 2ª seção) PRÁTICAS ESPÍRITAS – O ESPIRITISMO E SUAS MODALIDADES Os símbolos, os cânticos e o cerimonial variados de que se revestem como complemento as práticas espíritas da “Linha Branca de Umbanda e Demanda”, para aqueles que habitam nos meios cultos e civilizados nenhuma significação tem; seriam inúteis, sem dúvida, mas não sucede o mesmo em relação ao meio espiritual em que se tornam precisos, onde se desenvolve sua completa ação, devidamente interpretados pelas entidades espirituais onde se explica toda a sua razão de ser. Se conhecêssemos, se nos familiarizássemos com todas as raças, com os habitantes das regiões silvícolas, muitas ainda existentes em nosso Planeta, não nos surpreenderíamos com a variedade do cerimonial que representa seus hábitos e costumes tão variados quantos são os graus de sua civilização. Ali está representada como em revista, a vida desses povos indígenas, na variedade de seus hábitos e costumes, na variedade de suas práticas de cunho religioso, da sua linguagem e de seu desenvolvimento moral. Orientados e guiados por Espíritos esclarecidos, conhecedores de seus hábitos e de seu ritual religioso, são atraídos ou trazidos para os Terreiros de Umbanda, os irmãos desencarnados para que espontaneamente ou forçados, aliviem as vítimas terrenas de suas malignas cargas fluídicas (atuações), utilizados os mesmos depois de esclarecidos e convertidos em valorosos auxiliares a serviço da Caridade, na luta permanente dos bem intencionados contra os trabalhadores do mal, sabendo-se que toda a ação, seja ela benéfica ou maléfica, se exerce e se recente por energias fluídicas.

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Como não ignoramos, os nossos irmãos, que no espaço ainda conservam uma condição de atraso primitivo, permanecem num estado que designamos terra a terra, motivo por que, sendo quase que materializados pela grosseria do seu corpo fluídico; esses infelizes mantêm uma convicção ilusória de que ainda se encontram encarnados, carecendo, portanto, de satisfazerem as mesmas necessidades psíquicas e todos os vícios da matéria, os quais ilusoriamente são satisfeitos, oferecidos na intenção de conquistar a sua simpatia e o seu concurso à causa do Bem da humanidade. Este é, sem dúvida alguma, e processo também usado pelos praticantes da Magia Negra para sua ação maléfica; há, portanto, que analisar e distinguir as verdadeiras finalidades, para que se não confundam pelos meios. Por estas considerações se verifica que importância secundária tem para os assistentes materiais, as modalidades, em relação a nobreza dos fins e alvejar. Não estranhamos o juízo daqueles que confundem os fins pela semelhança dos meios; apenas desejaríamos uma observação mais prudente, meticulosa e com melhor critério. Dizem alguns e não sem razão, que os Espíritos não necessitam de satisfazer vícios que são próprios da matéria, mas, essa maneira de pensar se baseia no ponto de vista errôneo de os equiparar ao nosso grau de adiantamento, quando se encontram por sua infelicidade em um plano muito inferior, Se os seus condutores no espaço com a nossa co-participação lhe proporcionam a satisfação de seus vícios, procurando por essa forma sua obediência, sua subordinação, é pela impossibilidade em que se acham de convertê-los, obrigando-os a dar um salto na escala do progresso espiritual. Para que melhor se compreenda, é preciso não desconhecer que na escala do progresso das criaturas humanas, o número de graus é infinitamente elevado, e que cada ser humano age, pensa e sente em perfeita harmonia com o grau que ocupa na escala do mesmo. Se é verdade que os Espíritos desencarnados não possuem corpo material idêntico ao nosso, possuem, no entanto, um corpo fluídico de tal grosseria, que lhes dá a convicção de se encontrarem ainda encarnados, na posse de seu organismo psíquico, carecendo, portanto, da satisfação das necessidades inerentes do mesmo. Aos médiuns videntes tem sido dado constatar esse fato, podendo identificar o grau de adiantamento dos Espíritos pela densidade de seu corpo fluídico, bem como pela luminosidade das irradiações emanadas pelo mesmo. (Trecho de: Aprendiz. Diário de Notícias – Quinta-Feira, 02 de Maio de 1935 – 2ª seção) PRÁTICAS ESPÍRITAS – O ESPIRITISMO E SUAS MODALIDADES Evidenciado, como ficou que os atos praticados nas Tendas de Caridade, embora parecendo obedecer a um ritual preestabelecido, ou parecendo a produto da fantasia de alguém, tem a sua razão de ser e a sua verdadeira significação no mundo espiritual em cujo meio se harmonizam Convenhamos que ninguém será capaz de levar a intransigência das suas idéias ao ponto de recusar seu salvamento num perigo eminente, somente pelo fato de ser negra ou bronzeada a pele da mão que lhe é estendida, ou ainda porque essa mão não faça parte de um organismo de uma criatura culta. Nenhuma criatura em perigo eminente se lembrará de exigir carteira de identidade e folha corrida ao seu salvador. Será alguém capaz de negar o valor da esmola, ou desmerecer o ato de heroísmo pela humildade ou condição de ignorância do seu autor que a dá ou pratica animado de puros sentimentos fraternos? Convenhamos afinal que tudo quanto existe tem na própria existência sua razão de ser, ainda que nos não seja dado encontrar sua explicação, e ainda que o Bem como o mal existem, sendo a sua ação permitida por Deus, na razão direta do merecimento de cada criatura. Se não podemos arrancar das selvas aqueles que ali vivem ainda em seu estado selvagem, transformando-os por passe de magia em criaturas civilizadas comparadas às das grandes capitais, não nos é, pela mesma razão, possível efetuar essa transformação dos Espíritos ao espaço. Se razões existem para que ainda habitem no Planeta Terra, não sei por que não admitir existam igualmente no espaço, e que em tais condições se nos apresentam e sejam identificados.

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A missão na qual coadjuvamos, exercida pelos Espíritos esclarecidos, pode ser comparada a dos abnegados missionários que se embrenhando nas florestas virgens, levaram aos seus habitantes as luzes da nossa civilização, a fé religiosa e a crença em Deus. Para conseguirem aplacar as iras dos mais selvagens, atraindo as suas simpatias, os acumulavam, por vezes, de bugigangas, amuletos e gulodices, sem que isso constitua motivo de censuras e condenações. Saibam ainda os nossos intolerantes julgadores, que tão relevantes são os benefícios prestados por esses humildes trabalhadores, tantos têm sido os sofrimentos de nossos irmãos por seu intermédio aliviados, que jamais poderemos permitir que sem o nosso protesto se ponha em dúvida a sua elevação moral, a nobreza da missão que desempenham, o valor e altruísmo de seus atos e suas palavras, o conforto de sua palavra cristã. Não os acreditamos na obrigação de satisfazerem as dúvidas daqueles para quem os atos e os fatos são insuficientes provas, duvidam pelo prazer de duvidar, porque se fazem crer profundos conhecedores do que desconhecem. Não será dos que duvidam que devem contas da sua elevada missão, mas sim, a quem tem o poder e a capacidade de lha confiar. Não nos move a nós a intenção de determinar diretrizes. de propagar ou aconselhar a generalidade de métodos e modalidades; nós a aceitamos, procurando simplesmente explicá-las bem assim a razão que nos orienta, sem esquecer que a cor da pele das criaturas humanas nunca foi símbolo de caráter, sem esquecer que a Caridade não é privilégio de intelectuais e demasiado egoísmo mantêm os que supuserem que um Negro ou um Caboclo seja incapaz de possuir todas as virtudes que são dadas possuir a qualquer outra criatura por mais civilizada que se a julgue. (Trecho de: Aprendiz. Diário de Notícias – Sexta-Feira, 03 de Maio de 1935 – 2ª seção) PRÁTICAS ESPÍRITAS – O ESPIRITISMO E SUAS MODALIDADES Confortamos a certeza absoluta de que muito mais a humanidade em geral será, sem dúvida, o seu progresso moral que o intelectual, fartos serão os benefícios regulantes de um futuro em que os nossos irmãos em atraso, hoje possam encarnar em nosso meio, já então encaminhados no exercício do Bem, pela educação que lhes é proporcionada nas práticas caritativas. Acusam-nos de concorrermos para que aqueles nossos irmãos permaneçam no seu grau de atraso, mas essas acusações partem de um ponto de vista errôneo, não nos sendo possível, nem fazer com que estacione o progresso, nem impedir que um Espírito encarne tantas vezes quantas lhe sejam determinadas e precisas ao seu desenvolvimento espiritual, em obediência não a nós, que nada somos e nada valemos, mas às Leis da Natureza que jamais poderão ser contrariadas por quem quer que seja. O progresso se realiza em etapas, gradativamente em sucessivas encarnações e não em saltos como alguns assim o entendem. Bem pernicioso tem sido o desenvolvimento da inteligência das criaturas humanas, quando desprovidas do freio da moral, funestas têm sido as conseqüências da intelectualidade, quando posta ao serviço do mal. Dela tem saído o aperfeiçoamento dos aparelhos de guerra, os engenhos mortíferos, e os mais modernos processos de destruição humana, criação honrosa e digna de seus autores, atestado eloqüente das suas qualidades morais, dos sentimentos morais, dos sentimentos paternos. Toda a nossa preocupação deve voltar-se para o aperfeiçoamento moral das criaturas, especialmente aquelas que pela sua condição demonstram mais da mesma necessitar e assim, certos dessa imprescindível inadiável carência, todas as atividades se devem desenvolver dentro desse terreno, indiferentes aos juízes irrefletidos, ou aos que se interessa mais pelo exibicionismo das atitudes. Que ninguém se atemorize com os apetrechos e os instrumentos da luta travada nos Terreiros; o seu uso se não é totalmente simbólico tem a sua ação toda fluídica, não se lhes dá a finalidade para a qual foram fabricados, Temos visto por vezes os médiuns nessas Tendas de Caridade absorverem cachaça (marafa), em quantidade mais que suficiente para fazer cambalear o mais inveterado beberrão, entretanto, nunca se viu nenhum desse médiuns com o mais leve sintoma de embriaguez, sendo de notar que alguns fora do estado mediúnico não suportam sequer o cheiro de bebidas alcoólicas, sendo que esse fenômeno se observa em relação a outras substâncias absorvidas das quais serve apenas a propriedade fluídica aproveitada para a ação espiritual.

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Analise, pois, o contraste, e dizei com a sinceridade preciosa o que é mais nobre e digno: se utilizar ignorantes para combater o mal e seus autores, transformando-os em queixas da Caridade, ou utilizar irmãos cultos explorando um falso sentimento egoísta a que se chama patriotismo, atirando-os contra seus próprios irmãos em lutas inglórias nas quais os melhores prêmios são a orfandade, a viuvez, a mutilação dos que escapam com vida, a miséria e a dor? Nas lutas travadas nos Terreiros de Umbanda, os soldados que formam em suas fileiras são armados sim, mas de sentimentos nobres, animados do desejo de praticar o Bem, convertendo o maior número possível de maldades, fazendo-os ingressar em suas fileiras enquanto que nas lutas terrenas servem aqueles que maior número de vítimas for capaz de fazer, fornecendo-lhes para tanto os mais hábeis engenhos que a inteligência humana tem conseguido engendrar. Quanto aos Guias Espirituais comandantes desse luta que se trava no espaço sem desfalecimentos, pouco lhes deve interessar que se os veja de pele bronzeada ou negra, possuindo inteira responsabilidade de sua missão, mais lhes deve preocupar o seu fiel desempenho, o seu bom e feliz êxito mesmo porque em verdade, aqui para nós, que não nos ouçam... aqueles que se supõem juízes, não são afinal réus. Não vamos decerto fazer crer que sejam sedutoras as modalidades das práticas de Umbanda, no seu aspecto puramente vistas e contempladas no terreno das conveniências paramente materiais, sem outra finalidade sendo, a espetaculosa. Não é decerto agradável, mas necessária a ação exercida pelos trabalhadores da “Linha Branca de Umbanda” pelos riscos que correm, sofrendo as conseqüências naturais resultantes da luta travada no espaço, conseqüências a que se submetem todos quantos se envolvem em empreendimentos de tal natureza, muito embora sejam dignas de finalidades. (Trecho de: Aprendiz. Diário de Notícias – Terça-Feira, 07 de Maio de 1935 – 2ª seção) PRÁTICAS ESPÍRITAS – O ESPIRITISMO E SUAS MODALIDADES Parece, à primeira vista, um contrassenso a afirmativa de que são inevitáveis as conseqüências que se refletem sobre os trabalhadores da Caridade espírita, entretanto não é. O Universo, em suas mais insignificantes coisas, é regido por leis naturais de perfeição imutáveis, pela mesma, nada, portanto, poderá existir fora dessas leis. Nós, como tudo mais, nos encontramos submissos às mesmas em todos os nossos atos, por mais insignificantes que pareçam ser. Por tal prisma, o herói que se projeta no seio das ondas para salvar o náufrago seu irmão, a despeito do altruísmo de seu ato, não está livre do risco de perecer como vítima, das conseqüências de seu altruísmo. Se desse mal aparente resulta um bem, não é, entretanto, por todos compreendidos, daí a variedade das sentenças quase tantos quantos são os juízes. Esta é a situação em que se encontram aqueles que, no desempenho de uma nobre tarefa, heroicamente sofrem e suportam as conseqüências do meio em que se envolvem, sentindo e sofrendo as influências das cerradas cargas fluídicas dos infelizes que as carrega como bagagem de seu grande grau de atraso. Esta é a situação dos abnegados médiuns, que cedem seu organismo material para a incorporação de Espíritos de uma condição de atraso tal, que provocam reações violentas, saindo por vezes ao menor descuido com contusões pela luta em que se debatem, sem que isso constitua razão para esmorecimentos, tendo a animá-los as benéficas intenções. É. Sem dúvida, um sacrifício que os eleva, que os torna dignos de toda a consideração e gratidão da qual serão, sem dúvida, compensados, ainda que nos não seja dado testemunhar essa compensação, da qual não temos o direito de duvidar pela lógica do raciocínio. Bem mais cômoda e agradável deve ser a convivência com os mais esclarecidos, mas a missão não é educar os já educados, não é dar lições de moral a quem delas não necessita. A missão desses infatigáveis Obreiros da Caridade consiste em arrancar das profundidades da escuridão dos abismos em que se encontram milhares de infelizes, nosso irmãos em espírito, levar-lhes a luz de que tanto necessitam; é procurar salvar os náufragos na eminência do perigo; é evitar que agravem as suas responsabilidades, pela persistência na prática do mal; esta é a verdadeira missão, e mais sublime não poderia ser. Não lhes falta a compreensão do risco e da responsabilidade que sobre eles pesa; não desconhecem eles o terreno que palmilham, se grande é, entretanto, essa responsabilidade, não é menor a fé em Deus, e bem maior seu poder.

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Por maior que sejam a maldade e a perversidade das criaturas humanas, não triunfarão sobre o Bem. Deus não permitirá nunca que os maus vençam os bons e bem intencionados. (Trecho de: Aprendiz. Diário de Notícias – Terça-Feira, 08 de Maio de 1935 – 2ª seção) PRÁTICAS ESPÍRITAS – O ESPIRITISMO E SUAS MODALIDADES Nada haverá a recear de mal, se tem dignas e nobres intenções; por ser-se espírita não se está isento das responsabilidades dos atos presentes e passados; convictos desta inconfundível verdade só por grande inadvertência se poderão argumentar agravando-se as responsabilidades já contraídas pela prática de atos que não sejam condignos com os mais elevados princípios espíritas cristãos, em perfeita harmonia com a consciência de crente e sincero praticante. Deus não é para nós diferente, porque é o de todos; é único; nós o veneramos tanto ou mais do que aqueles que mais o veneram; não é Um Deus que possa ser monopolizado por literatos ou pelos que julgam possuir cultura ou moral privilegiadas, antes, assistindo com a sua misericórdia aos que dela mais necessitam pela sua pobreza de inteligência, de sentimentos e de bens materiais. As portas das Tendas de Caridade nunca se fecham nem para os curiosos e menos ainda para os necessitados, ou para os que pretendam analisar a sinceridade da conduta dos seus obreiros, não existindo em absoluto a preocupação em disfarçar atitudes, certos de que ainda que fosse possível fazê-lo perante os homens, jamais se conseguirá perante Deus. Não nos julgamos de tal covardia, capazes de recusar a Caridade, desviando-nos do caminho trilhado, receosos da crítica e condenação de juízes que demonstram sua falha de critério. Em nossas atividades espirituais não vamos além dos limites da permissão, crentes de que nos não é dado contrariar as Leis da Natureza, desenvolvendo-as em harmonia com o meio, sem pretendermos exigir como absurdo que irmãos nossos, cuja condição é ainda de inferioridade prematura se nos apresentem diferentes do que em verdade o são, como lhes é facultado serem, assim identificando perante nós. Concordamos sem desconhecer que há casos em que o Espírito pode expressar-se em diversos idiomas, os quais lhe são desconhecidos, sendo necessário que as condições o permitam, nunca, porém, o poderão fazer por imposição de quem quer que seja para satisfazer a curiosidade ou a pretensão dos que se encontram com direitos de exigir que Espíritos, digamos, que se encontram no embrião da vida, conheçam hábitos, costumes e linguagens peculiares dos meios civilizados. Não pretendemos forçar os limites das leis da Natureza, nem nos seria possível fazê-lo sujeitando-nos ao ridículo das mistificações; se espinhoso é o caminho por onde trilhamos, não é menos honroso e digno. Fiquem certos os inadvertidos que nos acusam de que quando não mais existirem no Universo, irmãos nossos encarnados ou desencarnados, em condições tão precárias de atraso, nenhuma razão de ser haverá que explique ou justifique as práticas espíritas em questão, ou sejam, as que se distinguem como da “Linha Branca de Umbanda”; até lá, porém, se justificam, pela necessidade de se tornarem necessárias. Cabe-nos o dever fraterno caritativo cristão de envidar todas as atenções e esforços para promover os meios de progresso dos atrasados; não o conseguiremos certamente, evitando o convívio indispensável com nossos infelizes irmãos, nem decerto lançando-os no isolamento de nosso desprezo, furtando-lhes os meios e a oportunidade de progredirem pela forma mais nobre e digna que é o exercício da Caridade. Nós não desejaríamos sentir o peso das conseqüências da vaidade e do orgulho dos que se julgam diminuídos e humilhados no convívio dos humildes, sabendo que se não regeneram criminosos, fazendo-os conviver com outros que ainda mais o sejam. Estas são, repito ainda uma vez, as considerações que nasceram do raciocínio embrutecido ainda de um modesto. (Trecho de: Aprendiz. Diário de Notícias – Quinta-Feira, 09 de Maio de 1935 – 2ª seção) Depois de tudo lido, lembrei-me de alguns dizeres de Chico Xavier, dispostos no livro: “Com Você” – Carlos Bacelli: “Se nas Casas Espíritas, que são consideradas mais liberais, já se aventou a possibilidade de se entregar o comentário apenas aos que fossem portadores do título de doutor ou professor, que dirá das outras religiões, onde os dogmas são tirânicos?” “Às vezes, estamos tão separados, a ponto de uma outra autoridade religiosa de um outro culto dizer: Os espíritas do Brasil conseguiram ser inimigos íntimos”.

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“Precisamos respeitar todos os trabalhos e todos os companheiros”. Finalizando os artigos do Sr. José Rodrigues Lopes de Barros (Aprendiz), disporemos a reportagem onde o mesmo foi preso, somente por ser um trabalhador da Linha Branca de Umbanda e Demanda, em governo de Getúlio Vargas, pelo chefe de polícia: Filinto Müller, o qual agia por ordens superiores. Filinto Muller pronunciara-se totalmente favorável às atividades do espiritismo, julgando-o inofensivo ao regime, mas, agiu em nome da lei, a fim de prender os que eram julgados como suspeitos de agirem contra a lei, com grandíssima influência dos líderes católicos. Observamos que, especificamente, o Aprendiz foi preso, dentre tantos outros umbandistas da frente intelectual em época; cremos que tal se deveu pelo fato de ter sido ele a ir em público, através de periódicos, em total franqueza, defender a Linha Brande de Umbanda e Demanda de seu detratores, que com certeza, deixaram-no em evidência, ocasionando rancores entre religiosos, que com certeza delataram-no como macumbeiro perante a polícia repressora, como era comum. “... Em 1941, Filinto Müller, chefe da polícia no governo de Getúlio Vargas, passou a exigir o registro dos “Centros Espíritas” na Delegacia Política. Todas essas manobras legais justificaram o desencadeamento de mais uma forte onda de repressão aos Terreiros, na maioria das regiões brasileiras em que a religião estava fortemente implantada”... (“A discriminação contra as religiões afro-brasileiras: ontem e hoje” – Ari Pedro Oro e Daniel F. de Bem) A UMBANDA E A IMPRENSA CATÓLICA ... O próximo documento a ser trabalhado é de autoria de Fuchs Vilaça e foi retirado da Cruzada da Boa Imprensa para “O Lampadário”. É um dos mais interessantes, pois trata da postura da Igreja diante das atitudes do Sr. Filinto Müller enquanto chefe de polícia da capital, em 1941: O Espiritismo e o Sr. Filinto Muller O Sr. Filinto Muller impôs-se a conceito geral da nação pelas múltiplas medidas acertadas que tem tomado. É um patriota de boa fibra. (...) Agora é a vez do espiritismo, a maior praga de minha terra. Começou com macumbeiros. Prendeu tudo quanto foi pai de santo dos Terreiros cariocas, que a Radio Tupi em tempo apresentara entusiasticamente em suas redes radiofônicas. Mandou-os para a ilha. Depois fechou todos os Centros, para uma regularização mais rigorosa, e nós sabíamos que poucos se salvavam. Inesperadamente, vem o Sr. chefe de polícia explicar atingirem suas medidas os centros suspeitos e não os dedicados a um culto religioso. Não apoiamos o Sr. chefe de policia. Deve saber S. Ex.ª que todo o espiritismo é nefasto. De qualquer centro, alto ou baixo, saem os desequilibrados para o hospício. Quer S. Ex.ª concordar com os Centros altos porque são freqüentados pelos ricos e, uma vez alteradas as faculdades mentais, eles não precisam de hospícios porque tem o quibus necessário para seu tratamento? Essa medida é economicamente acertada, mas patrioticamente desastrada. Admite S. Ex.ª o funcionamento de certos Centros porque se dedicam a culto religioso. É um remanescente do liberalismo. Em matéria de religião o governo não se intromete. Mas aí é que está o absurdo. Permite a policia a existência de certos Centros por motivos religiosos. Ora, onde ela devia inspirar-se para saber o que é religião? Junto às autoridades eclesiásticas brasileiras, que, mercê de Deus, não desmerecem no conceito universal da Igreja Católica. Então a polícia veria que no espiritismo o que há de religião não é religião, mas uma simples fachada para enganar a ela e outros coitados. (...) A S. Ex.ª, o chefe de policia do distrito federal apresento um critério acertado, já que ele está por meias medidas: Permitir o funcionamento de tantos Centros Espíritas quantas vagas disponíveis houver no hospício da Praia Vermelha. Através desse artigo pode-se perceber a postura da Igreja em relação às últimas medidas repressivas tomadas pela chefatura de polícia do Rio de Janeiro em 1941. Vilaça critica as atitudes seletivas de Filinto Müller no que se refere ao combate do espiritismo, pois apesar de aplaudir a prisão de pais-de-santo e “macumbeiros”, a Igreja se mostra irritada e ao mesmo tempo surpresa com as atitudes do chefe de polícia, quando este resolve explicar o objetivo de suas medidas: atingir os “Centros suspeitos e não os dedicados a um culto religioso”. Em função dessa postura, a Igreja acusa o Sr. Filinto Müller de querer manter os Centros ditos “altos” abertos por esses serem freqüentados por pessoas “ricas”, levando o autor do texto a entender que Filinto Müller é um “remanescente do liberalismo”.

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Nesse momento fica evidente o que Maggie já havia mostrado em relação aos processos criminais que analisou: o aparato policial acabava julgando a própria crença, pois se as medidas repressivas visavam fechar apenas os “centros suspeitos” então é porque a polícia julgava compreender o que era a “verdadeira religião”, ou seja, “sabia” diferenciar quando um Centro Espírita se dedicava ao “verdadeiro culto religioso” e quando se dedicava a “outras coisas” que não poderiam ser entendidas como religião... (A Umbanda Vista do “Altar”: uma reflexão sobre a religião umbandista no discurso católico em Juiz de Fora – Dilaine Soares Sampaio) Vamos a reportagem:

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Depois desse episódio, cremos que por força coercitiva, o Sr. José Rodrigues Lopes de Barros (Aprendiz) calou-se; não encontramos mais nenhuma reportagem assinada por ele.

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CURIOSIDADES

Em meio às pesquisas efetuadas em periódicos disponibilizados, desde 1908, encontramos algumas reportagens curiosas que se referem a Umbanda. Disponibilizaremos as que achamos importantes: A primeira, parecendo ironia, de 1916, portanto, após 08 anos da fundação, encontramos o termo – Umbanda –, pela primeira vez, num pequeno anúncio alusivo a um “comercial”.

O próximo, de 1923, portanto, 16 anos após a fundação, muito interessante, relata o culto conhecido em época por Macumba, onde cita a “Linha de Umbanda”. O que nos chamou a atenção, para a época, é que se trata de uma reportagem séria, sem toques de preconceitos, onde o repórter tenta elucidar da melhor maneira possível. Reparem a similitude atual, principalmente no canzuá (dito em época: canzol ou canzel), e no “bonezinho”, conhecido hoje como: filá, que invariavelmente tem bordado no topo e nas laterais, uma cruz. Foi a primeira reportagem onde encontramos citado no termo Umbanda, utilizado como indicativo de culto religioso:

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Cremos, que a reportagem acima, deva ter sido efetuada no Terreiro do Pai Quintino. Chegamos a essa conclusão, pela fama do “pai de santo” em época, e pelo desenho do peji (altar), e as “espadas” presentes, que seguem os mesmos moldes da foto na segunda reportagem, abaixo. A reportagem a seguir, efetuada por Leal de Souza em 1924, nos mostra um “pai de santo” famoso no Engenho Novo no Rio de Janeiro, praticante da Macumba, mas já, derivando para as práticas da Umbanda. Observemos que eram utilizados elementos que o Caboclo das Sete Encruzilhadas aconselhou não se usassem:

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E finalizando o nosso livro, só para se ter uma idéia mais clara sobre o Terreiro do Pai Quintino em particular, vamos à uma reportagem efetuada anteriormente (Janeiro de 1924) de Leal de Souza (cremos que Leal de Souza ainda não tinha contato com o Caboclo das Sete Encruzilhadas), onde nos relata com mais detalhes os rituais da dita Macumba. Reparem a similitude com muita coisa da Umbanda atual. Gostariamos de colocar a reportagem original, mas, optamos por transcrevê-la, devida a má qualidade do original:

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Pai Quintino, paramentado e com a sua espada de Ogum, em seu canzel, em companhia de seu auxiliar

e de uma criança Íamos, no Engenho Novo, pela Rua Araújo Leitão. Sob os nossos pés, arbustos rasteiros, gramas tenras, águas paradas, buracos enganosos. Aos lados, à espessa vegetação condensando massas de sombras. Era meia noite. Reinava a treva. Cercada de árvores, advínhamos uma casa pelo desenho das portas e janelas, a traços de luz. Um rumor cadente de palmas acompanhando um sussurro melancólico de vozes escapava por entre essas frinchas luminosas. Quando nos aproximamos, abrindo-se uma porta silenciosa em nossa frente, surgiu dela um vulto que, após uma breve inspeção, mandou que entrássemos. Éramos quatro pessoas, pois estavam conosco um jovem paraense de óculos, o senhor Paulo Torres, e o escritor Carlos Nóbrega, homem de prestigio na “Macumba”. Penetramos um aposento escuro, onde se esboçavam figuras em movimento. Mãos quase invisíveis arrebataram os nossos chapéus. Rolamos, então, para a sala contígua, o “canzel” de “Pai Quintino”, tomado assento, após o seu consentimento, num banco encostado à parede.

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Ao fundo, numa espécie de altar, forrado de plano branco, com ornatos vermelhos, imagens diversas, e numerosas, em quadros, e, sobretudo, em estatuetas, representando santos da igreja e talvez ídolos barbarescos; tigelas cheias de água, contendo pedras e cruzes de pão; latas, copos, vidros, um cachimbo, velas acesas em candelabros, um polvarim, garrafas, pacotes de velas, caixas de fósforos… Diante do altar, enterramos no chão, encruzando as laminas, uma espadas de dois sabres de Comblain, com as folhas cheias de cruzes de giz; uma estrela de metal; punhais de varias dimensões; velas ardendo; uma pedra preta, um bloco de vidro branco…Pelas paredes brancas, imagens sagradas e velas bruxuleando em suportes especiais de madeira. Três bancos encostados ao muro, estavam cheios de gente, ficando, porém, as mulheres de um lado, e os homens do outro. No meio da sala, sentado numa cadeira, com os rugosos pés nus e a camisa fora das calças, tendo uma vela acesa na mão, um negro de estatura vultuosa, quase velho, “pai Quintino”, passeava os olhos pelo solo, e tinha, na sua frente, um sabre fincado, um copo, e um santo de gesso enrolado num rosário e pesando sobre dois papeis garatujados. “Pai Quintino” fez um sinal a uma preta, que se ajoelhou aos seus pés e mandou que ela amarrasse aqueles papeis na saia, bateu a palmas e cantou: -Oia o nó, Guiomá! Em coro, os assistentes repetiam: “Oia o nó, Guiomá”. Os papeis não tinham sido amarrados com segurança e, desprendendo-se da saia, rolaram na poeira. Pedindo uma bengala, Quintino deu duas fortes pancadas na cabeça da mulher, ordenando-lhe que reatasse com cuidado a saia, guardando nela os papeis. Riscou, a giz, um circulo no chão, e, dentro do circulo, uma cruz, sobre o qual emborcou o Santo. Apanhando um copo, entornou cachaça em quatro pontos diversos, em torno da imagem emborcada; rabiscou diante de nós e nossos companheiros umas figuras cabalísticas, que foram cobertas de pólvora. Apagou as velas que lhe ardiam aos pés e mandou chegar fogo aos desenhos de pólvora, que deflagravam, ao canto, cadenciado a palmas: -Quema o maus oio ! Quema a má língua ! Era, disseram-nos, um ato preventivo, motivado pela nossa presença de desconhecidos, e destinado a conjurar forças que nos impedissem de fazer mal à “macumba”. Tomada essa precaução, Quintino traçou uma cruz na palma da mão direita e estendeu-a a um homem que nela pois um pouco de pólvora, logo incendiada. Ao clarão estrondeante, o negro, erguendo-se, fez o circulo da sala, e todos lhe beijaram a mão. Quintino passara a ser o Pai Raphael de Umbanda. Chamou a mulher de saia amarrada, e, indicando-lhe a vela que estivera entre seus dedos, determinou: -Minha fia, enterra esta vela de pavio pra baixo, inté a metade numa valla in que não passa água. Falou, por momentos, numa língua africana incompreensível, sacudiu a cabeça violentamente e abaixou o tronco, a dobrar-se, fazendo, com os lábios: “Burr! burr ! burr ! burr ! -A minha língua é a lingua de Angola, mas eu me experico p’ra os meos fio comprehendê. Fez uma dissertação confusa sobre o Gênesis, e terminou: -Mas que há Deus, há! Que há bons esprito, há! Com a graça de Deus, não temo o inferno e diabo. Com a graça do nosso veio Oxalá eu entro em bataia co o inferno, co diabo, cãs treva e eu sô vencedô na bataia. Cravou um punhal na parede, apontou para a imagem do Cristo, com um sorriso embevecido, e disse: - O nosso pai véio Oxalá! Viva o nosso veio Oxalá! Voltando-se para um soldado do Exercito, perguntou: -Quem é mais veio? Quem é mais premero, tu ou teu pai? -Meu pai. -Pois viva o teu pai! E quem veio premero que o premero? Quem é o maió que ta por cima? É os podê de Deus ! Viva os podê de Deus, meu fio ! Viva o mais maió que ta por cima !

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A assembléia repetiu as aclamações, e Raphael continuou: - Há uma justiça do céu e há uma justiça da terra. È preciso arrespeitá os podê do céu e obedece os podê da terra, porque os home não é ermão, meu fio. Uma muié tem dois fio; um é arto, outro é baixo; um é moreno, o outro é claro; um dá pra deputado, outro dá pra ladrão.Deus fez o mundo dereito, meus fio, mas os home pois o mundo às avessa. Agora os home é que tem de endireitá o mundo que elles entortaro. Sentou-se, e pediu o “Santo Gronhonhô”. Alcançaram-lhe numa bandeja, comida pela ferrugem, umas sementes que ele pois na palma da mão e sacudiu no chão, como dados, cantando: -Minha baráio de mamona ! Os assistentes, em coro, repetiam: “minha baráio de mamona”. Raphael, ou Quintino, chamando uma mulata de enorme cabeleira, fez ela ajoelhar-se ao seu lado, de face para o altar, e cantou: “Maria, eh! Maria eh!” Por uns quinze minutos, o coro, batendo palmas, em toada dolente, clamou: -Maria, eh! eh! Maria eh! eh! A mulata começou a mover com os ombros em requebros e passou a bater com as mãos espalmadas no chão… A poeira, batida cadentemente subia em nuvens, espalhando-se pelo ar, e a cabeleira da dançarina genuflexa, desprendendo-se, varria o solo e resvalava sobre o fogo das velas. Depois, levantada por dois homens, a mulher, braços caídos, pernas rígidas, a face a aparecer horripilante por entre o véu dos cabelos, ficou a cambalear volteios, dançando sem consciência até o raiar da aurora. Raphael reatou o sermão, dizendo às mulheres: -Quando o seu fio chora e faiz a travessura, nunca chama ele de peste nem de diabo, porque as criança, é o nosso anjo da guarda. Mãe que chama o fio de diabo, mete o azar dentro de casa. Quando seu marido for desinfeliz e não pode comprar as coisa, não zanga co ele, minhas fia. Diz: a minha fome é grande, mas o pode de Deus é mais maió. Aos homens disse Raphael: -Tudo não pode sê iguá. Tem de have deferença pra se cumpri as lei de Deus. Se todo os home fosse rico, quem havera de querê faze as molasinhas piquena das machina grande? E quem prantava o feijão e o mio? Quem suava no cabo do machado? E quem é que fazia o machado meus fio? Portanto, viva o mais maió que tá por cima e viva o nosso véio Oxalá ! -Viva ! Viva ! bradavam os filhos de Raphael. Mandou ajoelhar-se ao seu lado uma negrinha jovem, de lindas faces, pés descalços, vestido branco, cabelos curtos, e que obedeceu sem alegria. Fez com que lhe tirassem os grampos e cantou: -Ogum eh! Ogum eh! Batendo palmas, os circunstantes romperam a cantar: “Ogum eh! Ogum eh!” -Ogum é São Jorge, segredou-nos o nosso colega Nóbrega. Repare e verá o Espírito incorporar-se à médium. Sebastiana, este era o nome da rapariga, como a outra, entrou a bater com as mãos no solo, porém, verificando que ela evitava o transe, Raphael fazendo-a sentar-se sobre os calcanhares, empunhou uma palmatória, e deu-lhe dois bolos bem puxados. Pediu: “Sangue!” e recebendo um copo de vinho, verteu-o no solo, dando o restante à médium. Esta estendeu a mão a um homem que lhe depôs, na palma, uma porção de pólvora, a que chegou um fósforo. Ao estrondo luminoso, Sebastiana, contorcendo-se continuava, mas modificada: -Percura a minha falange ! Percura a minha falange! De repente, num salto, erguida, a moça, também com as pernas rígidas, com as articulações perras, saiu a voltear, inconscientemente, e tombou de costas, diante do altar. -Levanta ela! Levantada por dois homens, Sebastiana continuou a dança cambaleante, ao canto de:

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-Percura a minha corôa! Com os olhos parados, os maxilares comprimidos, os beiços apertados e escondidos os braços sem governo, respirava em bufidos, quebrava o corpo em corcovos, batia rudemente com os pés. -Eles acreditam que ela recebe São Jorge, mas que é o cavalo do Santo, sussurrou Nóbrega ao nosso ouvido. Mas, atirando-se de bruços, a bailarina de pernas duras bateu com a fronte na pedra preta e, pois os lábios no bloco branco de vidro. Reerguida, puseram-lhe na mão o grande sobre o riscado de cruzes, cantando o coro: -Defende a minha coroa! Ela, ora arrastando o sabre, ora pondo-o no ombro, rodava, rodava, rodava, e de repente, riscando uma cruz no chão, cravou, sobre ela, a arma; e estendeu, para nós, os braços. -Levante-se, abrace-a! Aconselhou Nóbrega. Obedecemos. Abraçando-nos, Sebastiana bateu com o seio esquerdo em nosso ombro direito, e, após, num movimento rápido, tocou o nosso ombro esquerdo com o seio direito, reproduzindo a cena com os nossos companheiros. Fez um sinal a um rapaz indiático, em mangas de camisa, voltou-se com ele para o altar e, como se o coroasse, pôs-lhe a mão na cabeça. Em seguida, começaram a surgir diante dela os que haviam recorrido a “Pai Raphael”, por doenças ou negócios. Sempre inconsciente, pernas endurecidas, a reluzir o suor, a rapariga, quando se lhe aproximava o individuo a ser atendido, tomava as sementes que nos pareceram dados, e, fechando-as, na mão, batia na sua e na cabeça do outro, alongava o braço em oferenda à imagem de São Jorge, e jogava as sementes no chão. Davam-lhe, então, uma vela acesa, e a dançar, a moça fazia essa luz girar ao redor de cada uma das pernas, dos braços, da cabeça e da cintura do cliente, apertava-lhe, em seguida, a destra, e impelia-o, para que se afastasse. Jogadas, uma vez, em intenção a um moço acaboclado, de boas roupas, as sementes, ao serem examinadas, alarmaram os circunstantes. Sebastiana deu um pulo, e acicatando as ilhargas com os punhos cerrados, batia com os pés no mesmo lugar, como se estivesse correndo. Colocou, depois, a vela na cabeça do paciente, e, largando-a, vimos a luz cair, apagando-se. A ansiedade geral argumentou. Novo pulo da dançarina que, desta vez, apoiando-se unicamente sobre o pé direito, com a perna esquerda estendida, a cabeça ereta e os braços abertos como azas, dava a impressão de querer voar. Tornando, porém, ao rapaz, refez, com a vela, a experiência anterior, e, vendo-a apagar-se ao tombar, empunhou o sabre. -É perigo de vida!- disse-nos o nosso confrade Nóbrega. Sebastiana dançando de pernas rígidas, descreveu um circulo ao redor do moço, olhando com face arrogante, como a encarar inimigos. Com a ponta do sabre, riscou no chão o circulo que percorrera, e, rodilhou-o, em seguida, brandindo a arma sobre e entre as nossas cabeças, a desferir pontaços e golpes defensivos. parou, e, levantando o corpo sobre as pontas dos pés voltada para a imagem de S. Jorge, alçou magnificamente o braço e elevou a espada ao teto. Nesse momento, aquela negrinha descalça, de vestido sujo de pó, com os olhos dilatados, o rosto majestoso, resplandecia de beleza, como um anjo esculpido em ébano. Fincando o sabre no solo, retomou a vela, e, resoluta, pô-la sobre a cabeçado rapaz. A luz tombou, rolando pelo solo sem apagar-se. -Viva a fé! Gritou Raphael. -Viva a fé! Gritaram mulheres e homens. Um tipo gordo, claro, de fartos bigodes, avançando, apresentou a Sebastiana os pulsos justapostos, como se estivessem amarrados. Ella, recolhendo um charuto aceso, que lhe alcançaram, descreveu alguns giros de dança, a fumar; apertou a mão do gorducho, encheu a boca de fumo, e, curvando-se, fez a fumaça insinuar-se a atravessar as duas palmas unidas, e, com um giz, gravou cruzes nos sapatos, na testa, nas fontes, na nuca e nas mãos do consulente. Colocando as duas mulheres diante de sua cadeira Pai Raphael, movendo uma vela acesa, recitou uma oração feita de pedaços de outras orações e mandou “acordem”. Sylvia e Sebastiana continuaram a cambalear. Pai Raphael cantou, repetindo-lhe o côro, o canto:

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-Andorinha, leva o meu anjo pr’o ceó ! De repente, a mulata estacou, e, levantando a cabeleira com a mão,olhou em roda, e disparando, saiu do canzel! A pretinha, porém, não saia do transe. Pai Raphael gritou: - Levanta o ponto, e o côro mudou: - O anjo que trouxe, o anjo que leve! O transe não passara. - Encruza ela! Dois homens pegaram Sebastiana pelos braços. Terceiro traçou-lhe, com força, uma cruz na face. Quarto soprou-lhe o rosto. Como Sylvia, está, recobrando-se, deitou a correr, desaparecendo no aposento escuro. Raphael, fazendo aproximar-se dele uma cabocla de lisas madeixas, encheu a boca de paraty, e, com os dentes, arrancou uma porção de cabelos à mulher, e, cuspindo-os no chão, resolveu: - Manda abri uma bananera de São Tomé e bóta esses cabelo dentro, e, anunciou: -Eu vô m’imbora. Todos, um a um, deitando-nos de bruços, no pó, beijamos o solo, entre os pés do bonzo vivo da macumba. E ele, derramando água no chão e formando um barro, considerou: - A terra te fez. A terra te abençoe. A terra te coma. Um a um, todos, metendo os dedos naquele barro, fizemos, com ele, o sinal da cruz, enquanto Raphael cantava: -Eu vou m’imbóra, fica com Deus e Nossa Senhora. Virando-se para o altar, ofereceu: -Deus, Esprito Santo, Maria Santíssima, eu te ofereço esta obrigação, e, ao fim de uma longa reza, aclamou: - Viva os esprito da medicina. Viva os dotô que já morrêro há mais de sessenta anos e tá no céo e tá aqui com nóis tambem ! Tirou os paramentos, pô-los sobre os copos da espada que oscilava no chão, diante do altar e começou a cantar: - O Zamby me chama. Eu tenho de ir. O Zamby me chama, eu tenho de ir. De repente, como um cadáver, como todo o peso do seu corpo, caiu de costas, mas foi amparado vigorosamente por seis braços possantes. Acabara a sessão. Eram quatro horas da madrugada. (Leal de Souza)

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HOSPITAL NACIONAL DE UMBANDA

Em 1964, por iniciativa de alguns umbandistas idealistas, iniciou-se um grande projeto para a construção do Hospital Nacional de Umbanda. Alguns periódicos da época relataram o fato: ERGUER-SE-Á EM JACAREPAGUÁ O HOSPITAL NACIONAL DE UMBANDA – Em prosseguimento ao trabalho de preparação para o lançamento da grande obra que será o HOSPITAL NACIONAL DE UMBANDA, a Junta Governativa do HNU anunciou que já se encontra em fase adiantada a elaboração do projeto arquitetônico do Hospital, e, em breve, será escolhida a fimar construtora que se encarregará da obra. No terreno escolhido e adquirido pela HNU, em Jacarepaguá, deve ter início em fins de fevereiro a construção do que será o maior Hospital da América do Sul, assim como um dos mais modernos em suas instalações e equipamentos. O HNU se destina precipuamente a atender às necessidades dos milhões de umbandistas do Brasil. (A Noite – 09 de Janeiro de 1964)

“UMBANDISTAS CONSTRUIRÃO HOSPITAL – A “Confederação Espírita Umbandista”, a “Tenda Espírita Mirim” e o “Centro Espírita Caminheiros da Verdade”, três das principais instituições umbandistas da Guanabara, estão colaborando na campanha do lançamento da construção do Hospital Nacional de Umbanda, que se destina a ser o maior e mais moderno da América do Sul. A cooperação destas entidades e junta administrativa do HNU, além do apoio moral ao empreendimento, se expressa em ajuda material com a instalação de postos de venda de títulos do Hospital entre os umbandistas. Os postos de venda oferecem aos candidatos e sócios fundadores do HNU, todas informações sobre a natureza e finalidade da grande obra que terá incício, brevemente, possivelmente em Jacarepaguá, em terreno já escolhido. (Diário Carioca – Rio de Janeiro, Sábado, 18 de Janeiro de 1964) “UMBANDA TERÁ HOSPITAL MAIOR DA AMÉRICA LATINA – Para atender a mais de 15 milhões de umbandistas de todo Brasil, será construído brevemente o Hospital Nacional de Umbanda, O maior da América Latina. A encarregada da construção é a Endra S/A, instituição com finalidades filantrópicas que em tempo o mais breve, erguerá o nosocômio em Jacarepaguá. O culto de Umbanda, de formação afrobrasileira estendeu-se, no Brasil, sobretudo às classes mais pobres, razão pela qual se faz necessário esse projeto”. (Diário Carioca – Rio de Janeiro, Domingo, 19 de Janeiro de 1964)

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Para ajudar, todos envidaram esforços para que o projeto saisse do papel, realizando arrecadações, festivais, encontros, shows, para angariar fundos. Infelizmente o projeto não se realizou, e não soubemos o porque.

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Acima a capa de um LP (vinil), com a maquete do futuro Hospital, disco este, cuja toda a renda foi endereçada à construção do nosocômio. Participou deste LP o autor do Hino da Umbanda, J. M. Alves.

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Terminando, não poderiamos deixar de expor um maravilhoso texto de José Álvares Pessoa, onde, não podendo explicar quem é Deus, porque ninguem até hoje o conseguiu dizer com simples palavras, expôs com clareza e sabedoria, um dos Seus atributos:

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O OLHO DE DEUS

É um olhar gelado e transpassante o desse olho incomensurável, que tudo vê, através de sua ronda infatigável pelos mundos sem fim, que são o seu domínio. Na impassibilidade da sua pupila, que se fixa sobre os seres, devassando todos os seus mistérios, esmiuçando todos os seus segredos, existe a força que domina e o raio que estigmatiza. O seu campo de ação é ilimitado; a capacidade humana insignificante para compreendê-lo. Não há, entretanto, criatura que, pelo menos uma vez na vida, não o tenha sentido fixar-se sobre si, sem poder determinar o que nesse momento se passa em seu íntimo, em sua alma. Na interminável ronda dos séculos, o olho vigilante passa e imperturbável se fixa em cada ser e em cada um põe a sua marca. Qual máquina fotográfica, dotada da mais sensível objetiva, que ininterruptamente batesse as suas chapas, o olho Todo-Poderoso, penetrando no íntimo dos seres, esquadrinhando os mais recônditos escaninhos, fixa todos os aspectos interiores da criatura, tirando de cada uma a sua mais perfeita psicografia. Instantaneamente batida, no mesmo momento revelada, esta psicografia é salvo conduto para uns, para outros é a condenação. Entretanto, o olho vigilante nem é bom, nem é mau, nem é justo, nem é injusto, porque está mais além do bem e do mal. A ele não compete determinar o prêmio ou o castigo, limita-se a ver e a gravar nas criaturas o sinal de sua passagem. Atrás de si vêm aqueles a quem ele outorgou o poder de distribuir a sua justiça. Guiados pela luz desse holofote incomparável, que ilumina os abismos mais insondáveis, que marca os maus, pondo a nú toda a hediondez das suas ações, esses auxiliares não precisam fazer estudos sobre as almas, limitando-se a olhar a chapa de cada uma

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Deste simples exame eles inferem qual o prêmio ou o castigo que merecem os seres, fazendo cada um colher o fruto de acordo com a semente que plantou. As Leis de Deus são imutáveis, porque são eternas e são perfeitas, porque emanaram da sua onisciência. Diante do tribunal de sua justiça, não há o perigo de condenar-se o inocente, porque antes de apresentar-se a esse tribunal, o paciente já passou pelo crivo do seu olho imutável, que tudo perscruta, que tudo vê e ao qual nada escapa. O homem, ainda que mergulhado na mais trevosa das ignorâncias, como que tem a presciência dessa coisa terrível, e quanto maior é o crime praticado, tanto maior é a sensação de ter sido visto por alguém... Daí o pavor que se apodera do criminoso, logo após consumado o crime. Do mesmo modo, aquele que pratica uma ação de reconhecido valor, sente sobre si algo que não sabe explicar, e que é a luz gelada desse olho penetrante, que não aprova os atos e nem os desaprova, mas que os fotografa instantaneamente. Na linguagem sânscrita, há um termo - “AKASA” -, que significa éter, e onde se diz estarem registrados o ativo e o passivo da cada entidade. A este registro, os orientais chamam “Livro Akásico”. Esse “Livro Akásico” é como um álbum, onde se encontram todas as chapas fotográficas batidas pelo olho incomensurável, cuja luz gelada transpassa todos os seres e todas as coisas. Quem poderá dizer de onde ele veio, por onde passou, para que lugar se dirige? O olho penetrante, sob cujo controle tudo se encontra, não pode ficar a mercê do controle de ninguém; as mais elevadas entidades se acham sob a sua vigilância, porque o olho incomensurável é o Olho de Deus. (Texto de José Álvares Pessoa. Jornal “O Semanário” – Ano II – número 73 – página 07, segundo caderno – 1956)