livro lingua portuguesa

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  • Lngua Portuguesa

    Mltiplos olhares, mltiplos saberes para a

    formao do pedagogo

  • Apresentao

    Voc j pensou que estamos rodeados por diversas manifestaes

    lingusticas em nossa vida social cotidiana? Palavras, cores, imagens, sons,

    gestos, uma variedade de formas semiticas de representar e significar nossa

    realidade.

    Dentre essas diversas manifestaes, como j dito, h a palavra, realizada,

    nas diferentes situaes de interao, por meio da linguagem verbal. Um

    simples Oi ou um feliz Bom dia, em nossas conversas do dia-a-dia, podem ser

    exemplos de como usamos a linguagem verbal para nos comunicarmos.

    esse nosso caminho nesse manual de estudos: investigar a linguagem.

    Vamos estudar a lngua portuguesa, sua forma, sua funo, seus sentidos.

    Vamos procurar entender o uso que fazemos da lngua e como,

    cientificamente, podemos explicar esse uso. Vamos percorrer caminhos

    diversos: os estudos gramaticais, os estudos lingusticos, os estudos

    lingusticos-aplicados, por exemplo, alm de entender um pouco mais sobre

    como a lngua, os textos, os gneros textuais/discursivos e o discurso no

    apenas medeiam nossas prticas sociais, como as significam.

    Em termos de organizao, nosso manual de lngua portuguesa inicia

    tratando dos conceitos de lngua, linguagem e Lingustica, apresentando

    explicaes sobre esses conceitos e sobre as contribuies da Lingustica para

    a formao do professor. Logo depois, vamos tratar das diferentes concepes

    de gramtica e as concepes de lngua que as subsidiam. Em nosso terceiro

    captulo, vamos discutir os nveis de descrio lingustica, especificamente os

    nveis fontico-fonolgico, morfolgico e sinttico. No quarto captulo, nossa

    discusso se centra nos estudos atuais sobre texto, gneros

    textuais/discursivos e discurso. Ao final, no captulo cinco, vamos estudar os

    estudos lingusticos aplicados ao ensino da linguagem.

    Esperamos que ao fim do estudo desse manual, voc possa compreender

    como importante e interessante estudar a linguagem. Tenha um excelente

    percurso de estudos!

    O autor.

  • SUMRIO

    Captulo 1 - O estudo da linguagem 1.1 O que linguagem? O que lngua? 1.2 Lingustica versus gramtica: rotas divergentes 1.3 Como estudar a lngua? 1.4 A importncia dos estudos lingusticos para a formao do professor 1.5 Os 1os estudos cientficos da lngua: os escritos de F. de Saussure Captulo 2 As gramticas 2.1 A gramtica tradicional 2.2 A gramtica descritiva 2.3 A gramtica gerativa 2.4 A gramtica funcional 2.5 Concluindo o assunto Captulo 3 - Os nveis de estudo da lngua: a palavra e a frase 3.1 O nvel fontico-fonolgico: principais conceitos e categorias 3.2 O nvel morfolgico: principais conceitos e categorias 3.3 O nvel sinttico: principais conceitos e categorias Captulo 4 - Outros nveis de estudo da linguagem: o texto, o gnero e o discurso 4.1 Os diferentes conceitos de texto 4.1.1 A concepo sociossemitica d texto 4.1.2 A concepo sociocognitivista de texto 4.2 Os fatores de textualizao 4.2.1 A coeso 4.2.2 A coerncia 4.2.3 A intencionalidade 4.2.4 A aceitabilidade 42.5 A situacionalidade 4.2.6 A intertextualidade 4.2.7 A informatividade 4.3 A relao entre texto e gneros do discurso 4.4 As contribuies da anlise do discurso 4.5 Linguagem e interao social

  • Captulo 5 - Repensando os estudos da linguagem aplicados ao ensino 5.1 O panorama das diferentes perspectivas de ensino e aprendizagem da leitura na escola 5.2 O panorama das diferentes perspectivas de ensino e aprendizagem da escrita na escola; 5.3 A leitura, a escrita e os estudos de letramento 5.4 Prtica de reflexo-ao da prtica docente Consideraes finais Referncias

  • Captulo 1

    O estudo da linguagem

    Voc j parou para pensar como a linguagem significa nossa vida

    social? Em outras palavras, voc j reparou que estamos rodeados por

    linguagem? Vejamos:

    Imagem 01: uma sinaleira/semforo: http://visaoacessivel.blogspot.com.br/2011/05/acessibilidade-e-preciso-mais.html

    Imagem 02/03: a placa de PARE e a placa de PROIBIDO FUMAR: http://pandalemon.blogspot.com.br/2012/01/pare-de-fumar-hoje-metodo.html

    Veja como cores e imagens podem representar diferentes sentidos: pare,

    siga, ateno, proibido fumar so os sentidos que podemos recuperar a partir

    das imagens acima. Estamos recuperando sentidos da linguagem. A

    linguagem, portanto, possui diferentes formas de manifestao, podendo ser

    verbal, visual, gestual. Um falante da Lngua Brasileira de Sinais (LIBRAS), por

    exemplo, se ocupara da manifestao gestual para se comunicar. Um desenho

    animado, na TV, se ocupa da linguagem verbal e visual. Dessa forma,

    podemos entender que a linguagem que possibilita a comunicao. Mas,

    afinal, o que linguagem?

  • 1.1 O que linguagem? O que lngua?

    Todos ns nos comunicamos diariamente, seja de forma oral, escrita,

    visual, verbo-visual, etc, seja um bilhete que deixamos para algum, um e-mail

    que enviamos para um colega, seja lendo uma revista, um jornal, um romance.

    Assim, perceptvel a importncia da linguagem para a comunicao.

    Alm disso, na escola, comeamos a pensar na linguagem de forma

    sistemtica e abstrata: estudamos a sintaxe, a morfologia, por exemplo,

    procurando entender os elementos que compem as sentenas e as formas

    que se aglutinam para formar palavras, respectivamente. Contudo, existem

    outros caminhos de se investigar a linguagem, diferentemente do vis

    gramatical. Podemos investigar a linguagem nas comunidades primitivas, nas

    comunidades indgenas. Podemos estudar a relao entre linguagem e

    crebro, entre linguagem e sociedade, entre linguagem e histria. Ainda,

    podemos traar caminhos mais densos e complexos para se estudar os sons

    de uma dada lngua, os elementos formadores dessa lngua e ainda seus

    falares e variedades. Os caminhos so mltiplos, mas, por demandarem de

    mtodos cientficos, no conseguem ser respondidos pelas gramticas;

    demandam uma cincia a Lingustica: a cincia da linguagem.

    Veremos mais adiante o que a Lingustica estuda e como estuda. No

    momento, iremos percorrer algumas explicaes sobre nossas questes

    iniciais: o que linguagem? O que lngua?

    Est implcito na formulao da pergunta o que linguagem? o reconhecimento de que as lnguas naturais, notadamente diversas, so manifestaes de algo mais geral, a linguagem. PETTER, Margarida. Linguagem, lngua, lingustica. In: FIORIN, Jos Luiz. Introduo lingustica. So Paulo: Contexto, 2008, p. 13.

    Os primeiros organismos terrestres desenvolveram mecanismos primitivos de troca capazes de transmitir informaes sobre espcie, gnero e inteno. Essa transmisso ocorria atravs do que ento consistia o meio mais sofisticado da natureza: a comunicao qumica. Os milhes de anos da necessidade contnua de se entrar em contato com outra criatura da mesma espcie para fins reprodutivos exigiram mtodos de comunicao ainda mais complexos. Desse processo evolutivo nasceu a linguagem em seu sentido mais amplo.

  • Cada tipo de linguagem usada na natureza difere entre si. Quanto mais profundamente se investiga, mais se descobre sobre a habilidade comunicativa de cada espcie, distinguida por definies cada vez mais elaboradas do conceito de linguagem. Em sua definio mais simples, linguagem significa meio de troca de informaes. Essa definio permite que o conceito de linguagem englobe expresses faciais, gestos, posturas, assobios, sinais de mo, escrita, linguagem matemtica, linguagem de programao (ou de computadores), e assim por diante. A definio tambm abarca a linguagem qumica das formigas e a dana das abelhas (hoje sabemos que ambos os insetos tambm usam simultaneamente outros meios de expresso comunicativa). FISCHER, Steven Roger. Uma breve histria da linguagem: introduo origem das lnguas. So Paulo: Novo Sculo, 2009, p. 175.

    Imagem 04: Portal www.acessobrasil.org.br do dicionrio de Libras.

    Imagem 05: Karl Von Frisch observou que as abelhas que voltam depois da descoberta de alimentos, realizam um conjunto de danas e imediatamente para a fonte de alimento. As abelhas realizam dois tipos de dana: uma em forma de "espiral" e a outra em forma de "oito". Disponvel em: http://epitemologando.blogspot.com.br/2010/12/comunicacao-animal-e-linguagem-humana.html

  • O que podemos perceber nas explicaes acima que, ambos os

    autores, consideram a linguagem como um conceito amplo que pode

    abranger/acolher diferentes manifestaes: a linguagem humana, a linguagem

    animal, a linguagem de computadores, a linguagem qumica, etc. Mas e sobre

    a lngua? O que lngua?

    A lngua representa cultura, histria, identidade, pertencimento. Falar uma

    lngua pertencer a algum lugar social, ter uma histria, ter uma cultura

    ser algum. A lngua representa valores e ideologias e nos possibilita nos

    comunicar e, simultaneamente, construir sentidos, apreciaes, ideias.

    Vejamos, por exemplo, as diferenas que a lngua portuguesa do Brasil (PB)

    apresenta em relao lngua portuguesa de Portugal (PP):

    Imagem 06: A relao entre PB e PP. Disponvel em: http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=1614

    Assim, podemos entender que a lngua nos remete nao, cultura,

    histria, identidade. Entretanto, no somente fatores scio-histrico-culturais

    que podem ser investigados no estudo da lngua, mas tambm seus elementos

    constituintes: os sons (fones, fonema), as formas composicionais/derivacionais

    (morfemas), as formas sintticas (sintagmas), por exemplo. Dessa forma, ao

    estudar a lngua, podemos nos encaminhar a duas grandes direes: estudar o

    seu sistema, ou estudar sua relao com o social. Com isso, a Lingustica, rea

    cientfica de estudo da lngua(gem) se constri por meio de diferentes

    domnios, e cada uma delas objetiva estudar a lngua(gem) sob um

    determinado ponto de vista, o que veremos a seguir.

  • 1.2 Lingustica versus gramtica: rotas divergentes

    Voc est iniciando seus estudos sobre a linguagem e suas mltiplas

    manifestaes semiticas. A cincia que estuda a linguagem denominada de

    Lingustica. Uma cincia muito nova, cujo seu incio se data em meados de

    1916, aps a publicao na Europa do Curso de Lingustica Geral, de

    Ferdinand de Saussure, professor de lingustica geral. Contudo, verificaremos

    que antes do incio do sculo XX j se pensava em termos cientficos sobre a

    lngua, j se realizava a Lingustica. Nesta seo, vamos percorrer estudos

    atuais sobre o conceito de Lingustica.

    Vimos na introduo acima que Lingustica corresponde o estudo

    cientfico da linguagem. Em outras palavras, corresponde a estudar a

    linguagem em suas mltiplas manifestaes semiticas e sob diferentes pontos

    de vista: podemos estudar, por exemplo, a linguagem luz de um paradigma

    formalista ou funcionalista, ou ainda, podemos estudar a linguagem sob um

    vis estruturalista, gerativista ou dialgico. Enfim, so muitos os caminhos e

    diferentes os percursos. Vejamos uma sntese das ideias:

    Podemos estudar a linguagem sob dois pontos de vista diferentes: o

    formalismo e o funcionalismo. Ambas so posies tericas e metodolgicas

    que subsidiam os estudos no campo da Lingustica. Dessa forma, um linguista

    (um pesquisador sobre a linguagem) pode ser formalista ou funcionalista, por

    exemplo. Outro aspecto inicialmente importante a ser enfatizado com

    referncia ao quadro acima que, ao estudar a linguagem cientificamente, todo

    pesquisa baseia-se em uma concepo de lngua e esta, por sua vez,

    apresenta ao pesquisador:

    (a) a compreenso sobre a funo da lngua;

    (b) o correlato cognitivo, isto , a explicao sobre a relao entre lngua e

    cognio;

    (c) o correlato contextual, isto , a importncia (ou no) entre linguagem e

    situao social.

    Em suma, ao desenvolver uma pesquisa em Lingustica, voc inicialmente

    deve atentar para sua escolha de paradigma terico-metodolgico, baseado na

    concepo de lngua que ancora seu percurso de pesquisa.

  • Mas afinal, o que Lingustica? Vejamos algumas explicaes:

    A Lingustica o estudo cientfico da linguagem. A palavra lingustica comeou a ser usada em meados do sculo XIX para enfatizar a diferena entre uma abordagem mais inovadora do estudo da lngua, que estava se desenvolvendo na poca, e a abordagem mais tradicional da filologia. Hoje em dia, comum fazer uma distino bem ntida entre a Lingustica como cincia autnoma, dotada de princpios tericos e de metodologias investigadoras consistentes, e a Gramtica Tradicional, expresso que engloba um espectro de atitudes e mtodos encontrados no perodo de estudo gramatical anterior ao advento da cincia lingustica. WEEDWOOD, Barbara. Histria concisa da Lingustica. So Paulo: Parbola, 2002, p. 9-11.

    A Lingustica uma cincia recente: inaugurou-se no comeo do sculo XX. No foi sem dificuldades que a reflexo sobre a linguagem conseguiu se impor como cincia. Para isso, teve de demonstrar o apuro de seu mtodo e a configurao precisa de seu objeto. A Lingustica definiu-se, com bastante sucesso entre as cincias humanas, como o estudo cientfico que visa a descrever ou a explicar a linguagem verbal humana. ORLANDI, Eni Puccinelli. O que Lingustica. So Paulo: Brasiliense, 2009, p. 9.

    A cincia lingustica contribui em muito para guardar o conhecimento humano. [...] A Lingustica continua evoluindo, como as lnguas que ela investiga. Isso no ocorre apenas devido a novas descobertas, mas tambm devido s fluidas mudanas, interesses e prioridades sociais que afetam o rumo dos estudos da linguagem. A cincia da linguagem, o passo na autorrealizao do homem, hoje totalmente desabrochada e com sua prpria e nica dinmica, ir, sem dvida, continuar a realar o entendimento e a valorizao da linguagem da humanidade em evoluo e seu aparentemente infinito potencial por muitos sculos ainda por vir. FISCHER, Steven Roger. Uma breve histria da linguagem: introduo origem das lnguas. So Paulo: Novo Sculo, 2009, p. 175.

    Veja como as explicaes nos levam a entender que a Lingustica uma

    cincia recente, com mltiplos caminhos e com uma procura por

    ressignificao contnua. Objetiva investigar a linguagem diferentemente de um

    vis gramatical, portanto, Lingustica e gramtica se opem.

    Lingustica cabe o estudo cientfico da linguagem e, gramtica, uma

    reunio no-cientfica de normas e regras de uso padro da lngua. A

    diferena, como podemos ver, est na relao cientfico versus no-cientfico.

  • Quantos de ns achamos que saber uma lngua saber todas as regras

    gramaticais dessa lngua? Ou que, para ser um excelente professor de lnguas,

    temos que saber todas as regras gramaticais dessa lngua? Aqui, estamos

    propondo exatamente o oposto: ser professor de lnguas no basta apenas

    saber as regras e convenes de ordem lexical e gramatical, mas, sobretudo,

    entender cientificamente a linguagem. E, para estudarmos a lngua

    cientificamente, devemos adentrar os caminhos diversos da Lingustica.

    1.3 Como estudar a lngua?

    Nesta seo, iremos identificar e compreender os diversos caminhos da

    Lingustica. No fique preocupado em querer compreender tudo de uma vez

    s. Voc ver em seu curso de graduao diferentes disciplinas em Lingustica,

    a partir das quais saber um pouco de cada domnio desse campo da cincia.

    Alm disso, ao final de seu manual, h uma listagem de referncias que

    podero ser consultadas em sua biblioteca.

    Existem vrios caminhos em Lingustica, isto , vrias reas e subreas de

    estudo. Apresentaremos de forma sinttica algumas reas para que voc

    possa compreender as diferentes rotas de estudos sobre a linguagem:

    1.3.1 As reas nucleares da Lingustica

    Podemos entender por reas nucleares as disciplinas cujo foco esteja nos

    elementos que compem o sistema de dada lngua natural. Vejamos:

    (a) Fontica rea que estuda os fones de dada lngua em uso, isto , rea

    que estudo as realizaes sonoras da fala. Por exemplo, na palavra

    casa identificamos 4 (quatro) fones: [ka.sa].

    (b) Fonologia rea que estuda os fonemas de dada sistema lingustico de

    uma lngua natural. Por exemplo, na palavra carro, temos 3 (trs)

    fonemas: /kA. Ro/.

  • (c) Morfologia rea que estuda os morfemas, as menores unidades de

    sentido da lngua. Por exemplo, na palavra meninos, temos 3 (trs)

    morfemas: menin+o+s.

    (d) Sintaxe rea que estuda os sintagmas, as construes sintagmticas

    das oraes. Por exemplo, na sentena (1) Os meninos chegaram,

    teremos [SN+SV], isto , um sintagma nominal, [os meninos], seguido de

    um sintagma verbal, [chegaram].

    (e) Semntica rea que estuda os significados das palavras. Por exemplo,

    na sentena (2) O menino parou de fumar, quais os acarretamentos

    dessa sentena a partir do verbo parou?

    (f) Pragmtica embora, para muitos estudiosos esta rea no se encaixa

    nas reas nucleares, apresentamos nesse manual como uma rea

    ncleo que busca investigar a lngua em seu contexto de uso. Por

    exemplo, quando algum enuncia (3) Fecha a porta!, poderemos ter um

    sentido pragmtico de sugesto, pedido, ordem, etc.

    Assim, voc pode realizar pesquisas luz das diferentes reas nucleares

    acima. Alm disso, temos outras reas de estudo em Lingustica, como

    apresentado na seo abaixo.

    1.3.2 As reas no-nucleares da Lingustica

    A Lingustica tambm se preocupa em investigar a relao entre lngua e

    cognio e ngua e sociedade, nas seguintes reas:

    (a) Psicolingustica rea que busca investigar a relao entre a linguagem

    e a cognio;

    (b) Aquisio da Linguagem rea que busca investigar os processos de

    aquisio de lnguas naturais;

    (c) Lingustica Textual rea que busca investigar a relao entre

    linguagem, texto e contexto;

    (d) Sociolingustica rea que busca investigar a relao entre linguagem e

    sociedade no que diz respeito variao e mudana lingustica.

  • (e) Anlise de Discurso rea que busca investigar a relao entre

    linguagem, sociedade e histria, entendendo que toda a linguagem em

    uso se caracteriza enquanto discurso;

    H outras reas que voc ir conhecer ao longo de seu curso de

    graduao. O importante voc saber que existem vrios caminhos para

    estudar a linguagem cientificamente e a escolha da rea vai depender de seu

    objetivo de pesquisa. Por exemplo, se seu objetivo for entender como a criana

    adquire a linguagem em termos sintticos, voc pode desenvolver um estudo

    em Aquisio da Linguagem e Sintaxe. Por outro lado, se seu objetivo

    entender o discurso das notcias na mdia contempornea, voc pode seguir

    um estudo em Anlise de Discurso, por exemplo. Solicite ao seu professor,

    endereos eletrnicos de revistas cientficas para voc entender as diferentes

    rotas de pesquisa em Lingustica.

    1.4 A importncia dos estudos lingusticos para a formao do professor

    http://www.google.com.br/search?num=10&hl=pt-BR&site=imghp&tbm=isch&source=hp&q=aula+de+portugu%C3%AAs&oq=aula+de+portu

  • Nos campos da lingstica e da lingstica aplicada, assim como de

    outras esferas de investigao cientfica - educao, psicologia, sociologia a

    preocupao com o ensino, enquanto instncia social e histrico-culturalmente

    instituda-, tem revelado diversas reflexes, seja a partir de pesquisas

    empricas, seja em estudos tericos (GERALDI, 1984; 1997; BRITTO, 1997;

    2003; MARTINS, 1991; ROJO, 2000; KLEIMAN, 2001; MATNCIO, 2001;

    ANTUNES, 2003; MARCUSCHI, 2008).

    Dentre as diversas pesquisas, diferentes autores tm enfatizado o papel

    das contribuies da Lingustica e da Lingustica Aplicada como norteador para

    o desenvolvimento das prticas de ensino e aprendizagem (leitura, produo

    textual e anlise lingstica) e para formao de competncias e habilidades

    necessrias a essas prticas.

    isso que as orientaes complementares aos Parmetros Curriculares

    Nacionais (PCN) postulam:

    O ensino de Lngua Portuguesa, hoje, busca desenvolver no aluno seu potencial crtico, sua percepo das mltiplas possibilidades de expresso lingstica, sua capacitao como leitor efetivo dos mais diversos textos representativos de nossa cultura. Para alm da memorizao mecnica de regras gramaticais ou das caractersticas de determinado movimento literrio, o aluno deve ter meios para ampliar e articular conhecimentos e competncias que possam ser mobilizados nas inmeras situaes de uso da lngua com que se depara (...) (BRASIL, 2002, p. 55)

    Rodrigues (2007) faz a seguintes explicaes sobre a contribuio da

    Lingustica para a formao do professor:

    (a) Contribuies da sociolingustica: Dentre as cincias da linguagem, a sociolingstica foi das primeiras a desenvolver reflexes voltadas para questes que dizem respeito ao ensino de lngua materna na educao bsica. Uma das grandes contribuies foi a introduo da noo de variao lingstica nas discusses acerca da variante lingstica utilizada na escola (BAGNO, 2001; BORTONI-RICARDO, 2002; 2011).J em 1977, em simpsio apresentado na XXIX Reunio Anual da SBPC, Castilho discute a necessidade de rever o conceito de norma priorizado no ensino da gramtica, tendo em vista a diversidade lingstica do alunado, conseqncia da estratificao que fez emergirem classes sociais divididas em alta, mdia e baixa. (CASTILHO, 2002). O uso da variedade de prestgio caracteriza um ensino voltado para as camadas privilegiadas da populao, entretanto, com a democratizao do ensino, aumenta o contingente de alunos provenientes das camadas populares (de zonas rurais e urbanas) que

  • tm acesso escolarizao, mas no dominam a variante de prestgio (BAGNO, 1997; CALVET, 2002; COELHO, 2001; FARACO, 2005; GORSKI, 2001; BORTONI-RICARDO, 2000). Em trabalho mais recente, Silva (2002) discute no s a diversidade das variedades lingsticas utilizadas pelos alunos, mas a diferena das escolas que atualmente recebem os alunos provenientes de classes sociais distintas e, portanto, com falares distintos, dependendo do grupo social ao qual pertencem. Segundo a autora, as discusses acerca de possveis mudanas no ensino de lngua materna chegam quando chegam s escolas particulares, freqentadas por quem tem maior acesso ao padro lingstico ensinado na escola; por outro lado, pouco ou nada do trabalho dos sociolinguistas chega s escolas pblicas, freqentadas pelos alunos das camadas populares ((BAGNO, 1997; CALVET, 2002; COELHO, 2001; FARACO, 2005; GORSKI, 2001; BORTONI-RICARDO, 2000).A autora destaca que ao continuar privilegiando a gramtica normativa nas situaes de ensino, a escola brasileira ignora o trabalho dos sociolinguistas que demonstra que, mesmo a variedade brasileira culta, precisa de uma atualizao, pois h usos por muito tempo considerados no-cultos que hoje j so perfeitamente aceitos. (SILVA, 2002, p. 257-258). (RODRIGUES, 2007, p. 1611).

    (b) Contribuies da Lingustica textual: Nesse movimento de repensar o

    que ensinar, os estudos da Lingstica Textual apresentaram contribuies que, de certa forma, se inclinaram para um trabalho mais voltado para o texto. Leal (1988, p. 140) toma por referncia os princpios da gramtica do texto e da perspectiva funcional da frase tanto para o estudo da sintaxe em lngua portuguesa quanto para anlise e produo de textos, proposto por Combettes (1983) para o estudo e ensino do francs. A autora, a partir da noo de dinamismo comunicativo, aponta como aspectos possveis de serem abordados na anlise de textos as formas de progresso temtica e a relao das mesmas com a tipologia do texto, seja ele descritivo, narrativo ou argumentativo. Assim, os tradicionais exerccios de anlise e interpretao de textos se voltaro no apenas para a identificao da tipologia textual, mas procuraro encontrar na estrutura formal os elementos que compem tambm essa tipologia. (LEAL, 1988, p. 144) Como se pode perceber, aspectos das tipologias textuais comeam a despontar como contedos de leitura a serem trabalhados na disciplina de Lngua Portuguesa, mesmo que restritos progresso temtica, identificao e estruturao das tipologias. De acordo com a perspectiva defendida por Leal (1988, p. 145), com relao produo de textos escritos, "podero ser exploradas as propriedades da textualidade coeso, coerncia para desenvolver formas de construo ainda no dominadas pelo estudante; para explicar e corrigir falhas observadas nas redaes. (ADAM, 1997; 2000; 2002; BENTES, 2004; 2005; KOCH, 2004; 2005; 2008; MARCUSCHI, 2005; 2008; RODRIGUES, 2004; 2006). Koch e Fvero (2000) defendem que a Lingstica Textual, por meio da comparao/diferenciao de textos, poderia apresentar contribuies ao estudo e ao desenvolvimento da competncia textual, mais especificamente no que tange

  • produo/inteleco de textos. Partindo do entendimento de que caberia Lingstica Textual a tarefa de definir critrios para uma descrio global dos diversos tipos de textos, as autoras apresentam a sua "Contribuio a uma tipologia textual". (RODRIGUES, 2007, p. 1613)

    (c) Contribuies da Psicolingustica: A fim de traar um panorama das metodologias de ensino da produo textual e esclarecer o papel da Psicolingstica na metodologia enunciativista, Bonini (2002) faz um levantamento em manuais de redao e em textos acadmicos, publicados a partir da dcada de 1960. Ele comea a discusso pelo "mtodo retrico-lgico", o qual se baseia na concepo de escrita como forma de organizar o pensamento, assim, "aprender a escrever equivale a conhecer as regras gramaticais que, em ltima instncia, valem mais como frmulas lgicas do raciocnio que como uma descrio da lngua". (BONINI, 2002, p. 29). O autor destaca que, nesse mtodo de ensino, a correo do professor essencial para dar uma direo correta ao texto do aluno. As tcnicas de ensino "esto a servio, fundamentalmente, da apropriao dos esquemas bsicos de textos a narrao, a dissertao e a descrio. Por isso, a tcnica principal a de desenvolver o texto dentro de um esquema abstrato. O "mtodo textual-psicolingstico" toma a escritura e a leitura como processos psicolingsticos complementares, prevendo a utilizao dos modelos tericos de estudo experimental da escritura, como o de Hayes e Flower (1980), para balizar o ensino de produo escrita (SCLIAR-CABRAL, 2004; 2005; VAN DIJK, 1998; 2000). Por outro lado, o autor faz uma ressalva quanto ao papel da Psicolingstica no ensino, destacando "que sua finalidade desvendar o processamento de produo e recepo" e no ensinar a ler e escrever. Mas no "mtodo interacionista" que ganha destaque a noo de interao, a qual abre a possibilidade para que a produo textual seja entendida como ao de linguagem. Nesse sentido, a figura do interlocutor fundamental, mesmo que inicialmente seja um interlocutor castrador, que julga e que espera do aluno a reproduo da sua voz que, muitas vezes, a voz presente no livro didtico. Entretanto, a existncia desse interlocutor nico ainda no viabiliza a intersubjetividade e a troca autntica, pois prevalece no ensino de lngua a didtica da reproduo homognea da voz do professor. (RODRIGUES, 2007, p. 1615)

    (d) Contribuies da teoria da enunciao: Na ltima dcada, muitas pesquisas apontam para o trabalho com Lngua Portuguesa na escola tendo por objeto de ensino os gneros discursivos (ou textuais). Esta reorientao das atividades de produo escrita, j implementada em outros pases na dcada de 80, chega s escolas brasileiras com o advento da publicao das Propostas Curriculares dos Estados e dos Parmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998). A maioria dos trabalhos produzidos no Brasil sobre gneros discursivos e mesmo sobre gneros textuais toma como referncia inicial a Teoria da Enunciao, cujos fundamentos provm do Crculo de Bakhtin (1998[1979]; 2003[1975]; 2006[1929]; 2008[1929]; 2010[1920]).

  • J em 1929, Bakhtin (2006[1929], p. 92) defendia que uma lngua viva s pode ser compreendida na totalidade de uma enunciao concreta, no sendo possvel isolar as formas lingsticas fora da comunicao verbal. Para o autor, os enunciados s se realizam na interao verbal, pois o centro de gravidade da lngua no reside na conformidade norma da forma utilizada, mas na nova significao que essa forma adquire no contexto.Tendo em vista que na interao verbal que se constituem os gneros do discurso e que sua delimitao se d nas diferentes esferas sociais, o ensino de lngua no pode mais ignorar a natureza social da linguagem.Considerando que a enunciao puramente social e que os gneros discursivos do acabamento ao enunciado, visto que no existe enunciado fora de um gnero, o enfoque lingstico-enunciativo desponta como a alternativa para o ensino de lngua. Assim, no bojo dessas reflexes que, na segunda metade da dcada de 1990, feita mais uma reforma no ensino brasileiro, culminando na elaborao de Propostas Curriculares nos estados e publicao dos Parmetros Curriculares Nacionais, em 1998. (RODRIGUES, 2007, p. 1616).

    O que se pretendeu nessa seo, foi levantar as contribuies de

    algumas reas da Lingstica que, mais recentemente (nas ltimas trs

    dcadas), tiveram certa influncia sobre o objeto de ensino da disciplina de

    Lngua Portuguesa, a fim de melhor compreender as mudanas na sua

    configurao curricular hoje, tambm denominada "crise no ensino da Lngua

    Portuguesa". Mas, em que medida essas contribuies chegaram efetivamente

    escola? Uma hiptese parece provvel: considerando que as relaes entre

    sujeitos sociais so sempre dialgicas, essas teorias em maior ou menor

    grau chegaram s escolas brasileiras, seja pela via dos documentos oficiais

    seja pela via da formao inicial e/ou continuada.

    1.5 Os 1os estudos cientficos da lngua: os escritos de F. de Saussure

    Saussure (2006[1916], p. 15) indaga: Qual o objeto, ao mesmo tempo

    integral e concreto, da Lingustica?. Para o autor, essa questo complexa e

    deixa muitas marcas de discusso. Ainda, ele discute que outras cincias,

    diferentemente da Lingustica, trabalham com objetos de estudo dados a priori

    e que ainda podem ser pesquisados sob diversos pontos de vista, como, por

  • exemplo, os percursos metodolgicos nas cincias exatas. Na Lingustica,

    como bem esclarece Saussure (2006[1916], p. 15, grifos nossos): nada de

    semelhante ocorre. Partindo disso, o autor explica que: (a) a linguagem

    constitui-se de um lado social e de um lado individual, sendo impossvel um

    conceber-se sem o outro. Alm disso: A cada instante, a linguagem implica ao

    mesmo tempo um sistema estabelecido e uma evoluo: a cada instante ela

    uma instituio atual e um produto do passado. (p. 16). Assim, para Saussure

    (2006[1916), frente a tantas particularidades, preciso colocar-se

    primeiramente no terreno da lngua e torn-la a norma para todas as

    manifestaes da linguagem. O autor apresenta, por conseguinte, a sua

    explicao do que seja a lngua, o verdadeiro objeto da Lingustica:

    Mas o que a lngua? Para ns, ela no se confunde com a linguagem; somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. , ao mesmo tempo, um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenes necessrias, adotadas pelo corpo social para permitir o exerccio dessa faculdade nos indivduos. Tomada em seu todo, a linguagem multiforme e heterclita; o cavaleiro de diferentes domnios, ao mesmo tempo fsica, fisiolgica e psquica, ela pertence, alm disso, ao domnio do individual e ao domnio do social; no se deixa classificar em nenhuma categoria de fatos humanos, pois no se sabe como inferir sua unidade. A lngua, ao contrrio, um todo por si e um princpio de classificao. [...] o exerccio da linguagem repousa numa faculdade que nos dada pela Natureza, ao passo que a lngua constitui algo adquirido e convencional, que deveria subordinar-se ao instinto natural em vez de adiantar-se a ele.[...] A lngua que faz a unidade da linguagem (SAUSSURE, 2006[1916], p. 17-18, grifos nossos).

    Dessa forma, procurando entender a lngua como um instrumento criado e

    fornecido pela coletividade e que se comporta como unidade da linguagem,

    Saussure (2006[1916]) discute o lugar da lngua nos fatos da linguagem,

    especificamente, a partir do circuito da fala. Por esse conceito, o autor entende

    que nesse ato haja pelo menos dois indivduos, por categorizao A e B,

    estejam conversando, o ponto de partida da fala se situa no crebro do

    indivduo A, no qual os conceitos acham-se associados s imagens acsticas

    que os exprimem: para o autor, essa questo implica trs processos um

    psquico, um fisiolgico e outro fsico.

  • O dado conceito que se constitui mediante relao recproca com a

    imagem acstica resulta de um fenmeno psquico; a transmisso do crebro

    dos impulsos da imagem acstica para a produo de voz no aparelho fonador,

    um processo fisiolgico; a produz de som em ondas sonoras, por sua vez,

    ser um processo fsico. Ao final, o processo ocorre em B numa ordem inversa:

    do ouvido ao crebro, transmisso fisiolgica da imagem acstica; no crebro

    associao psquica dessa imagem com o conceito correspondente. Se B, por

    sua vez, fala, esse novo ato seguir de seu crebro ao de A [...].

    (SAUSSURE, 2006[1916]). Esse, para o autor, sintetiza os processos de

    audio e fonao que, por sua vez, se constituem de outros trs processos:

    psquico, fisiolgico e fsico, como explicado acima. Vejamos a imagem abaixo

    que ilustra a ideia de Saussure no Curso.

    Disponvel em: http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.scielo.br/img/revistas/delta/v19n1/18

    Para o autor, devemos nos centrar no estudo da lngua, por ser sistemtica

    e objetiva e no no estudo da fala, por ser esta heterognea e subjetiva. Alm

    disso, a fala apresenta-se social, em oposio fala que se apresenta

    individual, apenas acessria. Vejam como Saussure (2006[1916]) explica as

    diferenas entre linguagem (faculdade da lngua), lngua (fato social langue)

    e fala (fato individual parole):

  • 1) Ela um objeto bem definido no conjunto heterclito dos fatos da linguagem. Pode-se localiz-la na poro determinada do circuito em que uma imagem auditiva vem associar-se a um conceito. Ela a parte social da linguagem, exterior ao indivduo, que, por si s, no pode nem cri-la, nem modific-la; ela no existe seno em virtude duma espcie de contrato estabelecido entre os membros de uma comunidade. Por outro lado, o indivduo tem necessidade de uma aprendizagem para conhecer-lhe o funcionamento; somente pouco a pouco a criana a assimila [...]. 2) A lngua, distinta da fala, um objeto que se pode estudar separadamente. No falamos mais as lnguas mortas, mas podemos muito bem assimilar-lhes o organismo lingustico [...]. 3) Enquanto a linguagem heterognea, a lngua assim delimitada de natureza homognea: constitui-se num sistema de signos onde, de essencial, s existe a unio do sentido e da imagem acstica, e onde duas partes do signo so igualmente psquicas. 4) A lngua, no menos que a fala, um objeto de natureza concreta, o que oferece grande vantagem para seu estudo. Os signos lingusticos, embora sendo essencialmente psquicos, no so abstraes; as associaes, ratificadas pelo consentimento coletivo e cujo conjunto constitui a lngua, so realidades que tm sua sede no crebro [...]. (SAUSSURE, 2006[1916], p. 22-23).

    Para Saussure (2006[1916], p. 24), a lngua uma instituio social, um

    sistema de signos capaz de exprimir ideias. Assim, para o autor, podemos

    conceber uma cincia que estude a vida dos signos no sei da vida social. A

    cincia dos signos Saussure denominou de Semiologia, e a Lingustica seria

    uma parte da Semiologia. Segundo o autor, a tarefa do lingista definir o que

    faz da lngua um sistema especial no conjunto dos fatos semiolgicos. (p. 24).

    A natureza do signo lingustico

  • Imagem retira da verso em francs de 1916.

    Saussure (2006[1916], p. 79) afirma que a unidade lingustica uma coisa

    dupla, constituda da unio de dois termos. Na explicao sobre o circuito da

    fala, Saussure (2006[1916]) j mencionava que os termos implicados no signo

    lingustico eram ambos psquicos e que estavam unidos no crebro por um

    vnculo de associao (veja a seo anterior desse manual). Veja a explicao

    do autor:

    O signo lingustico une no uma coisa e uma palavra, mas um conceito e uma imagem acstica. Esta no o som material, coisa puramente fsica, mas a impresso (empreinte) psquica desse som, a representao que dele nos d o testemunho de nossos sentidos; tal imagem sensorial e, se chegarmos a cham-la material, somente nesse sentido, e por oposio ao outro termo da associao, o conceito, geralmente mais abstrato. (SAUSSURE, 2006[1916], p. 80)

  • Dessa forma, o autor afirma que o signo lingustico uma entidade

    psquica de duas faces, como representada na figura acima. O conceito

    (significado = So) e a imagem acstica (significante = Se) esto intimamente

    unidos e um reclama o outro, um dependente do outro. Para Saussure

    (2006[1916]), o signo, portanto, corresponde combinao do conceito e da

    imagem acstica e apresenta duas caractersticas primordiais: a arbitrariedade

    e a linearidade do significante.

    Quanto arbitrariedade do signo, podemos entender que o lao que une o

    significado ao significante arbitrrio, medida que no h nenhum lao

    natural do signo com a realidade. Em outras palavras, h um

    convencionalismo: todo signo passa a ser uma conveno socialmente

    estabelecida. No h nessa caracterstica a ideia de que o significado dependa

    da livre escolha de seus falantes, mas que o Se arbitrrio em relao ao

    significado. Na verdade, o signo s tem valor dentro de um determinado

    sistema lingustico, do qual elemento integrante. A arbitrariedade resulta na

    questo de que um grupo no pode modificar aquilo que uma comunidade j

    convencionalizou. Saussure (2006[1916], p.82) d o exemplo da palavra mar

    que poderia ser expressa por qualquer outro significante, assim como palavras

    de outras lnguas, como, por exemplo, professor em portugus refere-se a

    profissionais de qualquer nvel de escolaridade. Nos EUA, teacher professor

    de educao bsica e professor o profissional de ensino superior.

    Em relao linearidade do significante, o autor explica que, sendo de

    natureza auditiva, o significante se desenvolve linearmente no tempo, por

    representar uma extenso e por seguir uma linha imaginria. Alm disso, o

    autor discute que, diferentemente dos significantes visuais, os significantes

    auditivos ou acsticos dispem de uma linha virtual de tempo, pois seus

    elementos se apresentam sempre um aps o outro. Por exemplo, se

    enunciarmos casa, a imagem acstica se forma pela sequncia de fonemas

    /ka.za/. Esses fonemas seguem uma linha virtual no tempo, isto , os sons no

    so simultneos. Outro exemplo poderia ser a escrita, posto que ao

    escrevermos, substitumos a sucesso do tempo pela linha espacial dos signos

    grficos.

  • Se, com relao ideia que representa, o significante aparece como escolhido livremente, em compensao, com relao comunidade lingustica que o emprega, no livre: imposto. Nunca se consulta a massa social nem o significante escolhido pela lngua poderia ser substitudo por outro. Este fato, que parece encerrar uma contradio, poderia ser chamado familiarmente de a carta forada. Diz-se lngua: Escolhe!; mas acrescenta-se: O signo ser este, no outro. Um indivduo no somente seria incapaz, se quisesse, de modificar em qualquer ponto a escolha feita, como tambm a prpria massa no pode exercer sua soberania sobre uma nica palavra: est atada lngua tal qual . (SAUSSURE (2006[1916], p. 85)

    Saussure (2006[1916]) est discutindo, no fragmento acima, a imutabilidade

    do signo lingustico, procurando explicar que a lngua no pode ser comparada

    a um contrato puro e simples; ela s pode ser admitida numa coletividade. O

    signo lingustico escapa vontade individual. A lngua sempre uma herana

    da poca precedente. Contudo, para o autor, h um efeito contrrio tambm, a

    mutabilidade, o efeito de alterar mais ou menos rapidamente os signos

    lingusticos. Para o autor, os dois efeitos so solidrios, pois o signo est em

    condies de alterar-se porque continua. (SAUSSURE, 2006[1916], p. 89).

    Vale ressaltar que, para o autor, o que domina a persistncia da matria

    velha. Eis porque o princpio de alterao se baseia no princpio de

    continuidade. (p. 89).

    Em primeiro lugar, no nos equivoquemos sobre o sentido dado aqui ao termo alterao. Poder-se-ia fazer acreditar que se tratasse especialmente de transformaes fonticas sofridas pelo significante ou ento transformaes do sentido que afetam o conceito de significado. Semelhante perspectiva seria insuficiente. Sejam quais forem os fatores de alterao, quer funcionem isoladamente ou combinados, levam sempre a um deslocamento da relao entre o significante e o significado. (SAUSSURE (2006[1916], p. 89, grifos do autor).

    A sincronia e a diacronia

    Saussure (2006[1916], p. 94) discute que poos lingistas conseguem

    perceber qual a verdadeira interveno do fator temporal para a Lingustica.

    Segundo o autor, o tempo pode colocar tal cincia em rotas essencialmente

    divergentes. Ainda esclarece que:

  • A maior parte das outras cincias ignora essa dualidade radical; o tempo no produz nelas efeitos particulares. A astronomia verificou que os astros sofrem mudanas notveis; no est obrigada, por isso, a cindir-se em duas disciplinas. A Geologia raciocina quase constantemente acerca de sucesses; mas quando chega a se ocupar dos estados fixos da Terra, no faz disso objeto de estudo radicalmente diverso. Existe uma cincia descritiva do Direito e uma histria do Direito; ningum ope uma a outra [...]. (SAUSSURE, 2006[1916], p. 94)

    O que o autor procura explicar na citao acima que as cincias

    deveriam ter interesse em especificar o eixo sobre o qual esto situados os

    objetos de que se ocupam: o eixo das simultaneidades ou o eixo das

    sucesses. Vejamos as figuras a seguir:

    http://desenhantes.wordpress.com/2010/12/27/anatomia-das-funcoes/

    Na primeira figura, se pensarmos a relao entre os eixos AB, estaremos

    no eixo das simultaneidades que, segundo o autor, concernente s relaes

    entre coisas coexistentes, de onde toda a interveno do tempo se exclui.

    (SAUSSURE, 2006[1916], p. 95). Se, por outro lado, pensarmos nos eixos CD,

    estaremos nos eixos das sucesses, sobre o qual no se pode considerar

    mais que uma coisa por vez, mas onde esto situadas todas as coisas do

    primeiro eixo com suas respectivas transformaes. (p. 95).

    sincrnico tudo quanto se relacione com o aspecto esttico da nossa cincia, diacrnico tudo o que diz respeito s evolues. Do mesmo modo, sincronia e diacronia designaro respectivamente um estado de lngua e uma fase de evoluo. (SAUSSURE, 2006[1916], p. 96).

  • Para o autor, a lngua um sistema do qual todas as partes podem e

    devem ser consideradas em sua solidariedade sincrnica. (SAUSSURE,

    2006[1916], p. 102). Ou ainda,

    Como as alteraes jamais so feitas no bloco do sistema, e sim num ou noutro de seus elementos, s podem ser estudadas fora do sistema. Sem dvida, cada alterao tem sua repercusso no sistema; o fato inicial, porm, afetou um ponto apenas; no h nenhuma relao interna com as conseqncias que se podem derivar para o conjunto. Essa diferena de natureza entre termos sucessivos e termos coexistentes, entre fatos parciais e fatos referentes ao sistema, impede de fazer de uns e de outros a matria d uma nica cincia.

    A biografia

    Leia a biografia de Ferdinand de Saussure abaixo. No se esquea de

    investigar mais sobre o assunto. Bom estudo. Uma dica online est no artigo a

    seguir. Acesse-o e boa pesquisa: http://www.filologia.org.br/viisenefil/09.htm.

    No prximo captulo, voc vai percorrer as diferentes concepes de

    gramtica que se entrecruzam nas mais diferentes reas da Lingustica. Voc

    j deve se deparado com algumas gramticas na escola; agora, voc vai

    entender as diferenas tericas e metodolgicas entre elas.

  • Captulo 2

    As gramticas

    Voc j se perguntou por que falamos da forma que falamos? Em outras

    palavras, por que combinamos os elementos da lngua de uma certa forma e

    no de outra? Por exemplo, veja as seguintes sentenas abaixo:

    (1) Pedro comeu bolo hoje no intervalo da escola.

    (2) Hoje, no intervalo da escola, Pedro comeu bolo.

    (3) *O hoje, intervalo, no bolo comeu da Pedro escola.

    Por que conseguimos entender as sentenas (1) e (2) e no a (3)? Ou

    como indaga Martelotta (2009):

    [...] Os falantes combinam os elementos na frase de modo como bem entendem ou existem restries impostas pela lngua no que diz respeito a esse processo? Se existem restries, qual a sua natureza? Elas provm dos padres de correo de uso da lngua impostos pela comunidade? So arbitrrias? Refletem o funcionamento natural da mente humana, sendo, portanto, universais? Podemos dizer que essas questes retratam as preocupaes bsicas do cientista que deseja compreender a natureza e o funcionamento das lnguas naturais [...]. (MARTELOTTA, 2009, p. 43).

    Sob essa perspectiva, procuraremos compreender como as diferentes

    gramticas, sob olhares diferenciais, analisam a lngua. Alm disso, vamos

    apresentar quais as principais diferenas tericas e metodolgicas de cada

    uma delas. Segundo Mendona (2004), tem-se trs conceitos difundidos entre

    os lingistas: normativa, descritiva e internalizada. Veja uma sntese dessas

    ideias:

  • Normativismo Descritivismo Inatismo/Gerativismo

    Gramtica Normativa - conjunto sistemtico de normas para bem falar e escrever, estabelecidas por especialistas com base nos usos da lngua consagrado pelos grandes escritores da literatura.

    Gramtica Descritiva conjunto de regras de estruturao e organizao do uso da lngua. um sistema de noes mediante as quais se descrevem os fatos de uma lngua, permitindo associar a cada expresso dessa lngua uma descrio estrutural e estabelecer suas regras de uso.

    Gramtica Inata conjunto de saberes lingsticos que o falante/ouvinte de uma lngua desenvolve dentro de certos limites impostos pela sua prpria dotao gentica humana, em condies apropriadas de natureza social e antropolgica.

    Lngua concebida como sistema imanente e a linguagem como faculdade humana da lngua. A fala desconsiderada.

    A lngua concebida como sistema heterogneo que se constri mediante as prticas de uso da linguagem. A linguagem a instncia constitutiva da lngua.

    A lngua vista como sistema gerador e a linguagem como faculdade cognitiva desse sistema.

    Aprender a gramtica significa dominar as diferentes regras de estruturao da norma padro da lngua.

    Aprender a gramtica significa ser capaz de distinguir, nas expresses de uma lngua, as categorias, as funes e as relaes que entram em sua construo.

    Aprender a gramtica significa internalizar as regras que operam uma determinada lngua.

    Ensinar gramtica, nessa concepo ensinar lngua, isto , ensinar norma culta, desprezando outras variedades.

    Ensinar gramtica atentar para como se constroem as diferentes relaes e estruturaes da lngua em suas diversas variedades.

    Ensinar gramtica significa atentar para as regras operacionais que constituem as estruturas da lngua.

    O que podemos perceber que h uma ntima relao entre as

    concepes de lngua e as concepes de gramtica. A gramtica de ordem

    normativa est, como podemos ver, aliada a uma concepo de lngua luz do

    estruturalismo lingustico. A gramtica descritiva, por sua vez, alia-se uma

    concepo funcional de linguagem, ao passo que a gramtica gerativa

    construda sob o escopo dos estudos lingusticos gerativistas. Vejamos agora

    algumas consideraes mais especficas sobre as diferentes concepes de

    gramtica.

  • 2.1 A gramtica tradicional

    http://www.google.com.br/search?hl=pt-B

    A gramtica tradicional, muito divulgada nas prticas escolares da

    educao bsica, tem sua origem na Grcia Antiga, principalmente aos estudos

    ligados lgica e s relaes entre linguagem e realidade. A gramtica

    tradicional vem geralmente organizada sob a ordem dos diferentes nveis da

    lngua: fontico-fonolgico, morfossinttico e semntico. Martelotta (2009)

    explica que a gramtica tradicional caracteriza-se por trs aspectos gerais: a

    no-cientificidade; o descritivismo idealizado e o prescritivismo.

    A no-cientificidade diz respeito no relao da gramtica tradicional com

    os achados da Lingustica contempornea. A sistematizao da gramtica

    tradicional est essencialmente alicerada na origem dos estudos gregos da

    lgica. O que melhor caracteriza essa tradio a viso, inaugurada por

    Aristteles, de que existe uma forte relao entre linguagem e lgica.

    Desenvolveu-se a partir da a tendncia de considerar a gramtica um estudo

    relacionado disciplina filosfica da lgica, que trata das leis de elaborao do

    raciocnio. (MARTELOTTA, 2009, p. 45).

  • Entre os objetivos do estudo da linguagem est, portanto, a descoberta dos mecanismos e procedimentos que utilizamos tanto para produzir os sinais sonoros dos mecanismos e procedimentos que utilizamos tanto para produzir tanto os sinais sonoros e grficos que constituem nossos discursos quanto para atribuir-lhes sentido. Uma parte desses mecanismos e procedimentos recebe o nome de gramtica, tanto na acepo de conhecimento intuitivo e prtico da lngua que qualquer usurio possui, quanto na acepo de descrio formal desse conhecimento mediante uma terminologia especializada. Ao estudarmos a lngua com o objetivo de explicitar sua gramtica isto , como descrio formal do conhecimento socialmente construdo -, baseamo-nos necessariamente em um modelo terico. Como impossvel ter acesso ao processamento da linguagem no crebro das pessoas, este modelo constitui, na verdade, uma hiptese sobre como essa lngua se organiza estruturalmente para ornar possveis a expresso e a compreenso de sentidos. O modelo terico que se adota para descrever o portugus compreende, por exemplo, a ideia de classes de palavras, como adjetivos, verbo e preposio; as noes funcionais de sujeito e objeto; a oposio entre pretrito perfeito e imperfeito; os conceitos de slaba tnica e slaba tona; a distino entre frase declarativa e frase imperativa, entre diversos outros conceitos. Nenhum modelo pode ser rgido, mas sempre precisa ser concebido como uma forma homognea e coerente. Diferentemente, entretanto, do modelo coerente e homogneo em que o estudioso se baseie para descrev-la, a lngua se apresenta, na realidade de seu concreto, como algo dinmico e flutuante, s parcialmente redutvel ao modelo de que estamos falando. Enquanto as categorias e regras que constituem o modelo de descrio nos parecem reconhecveis como dados discretos e bem distintos entre si, os fatos reais do uso efetivo da lngua parecem muitas vezes resistir a uma rotulao precisa e bem-sucedida. Por que isso acontece? Uma resposta possvel a seguinte: por ser ao mesmo tempo um meio de expresso de todos os contedos que a mente humana pode conceber e um meio de comunicao desses contedos nas mais diversas situaes e para os mais variados fins, a lngua tem a natureza de um sistema extraordinariamente verstil e adaptvel, que se pode resumir numa palavra: criatividade. [...]. A histria dos estudos gramaticais , tambm, a histria da insatisfao dos estudiosos da linguagem com os modelos descritivos construdos por eles. Toda verdade provisria esta , talvez, a nica certeza que fica quando observamos a maneira pela qual o conhecimento humano construdo no curso da histria. No pode ser diferente quando o assunto linguagem: nenhum modelo de anlise, por mais refinado e complexo que seja, consegue abarcar toda a sua complexidade. Desta constatao derivam necessariamente dois postulados: (a) uma anlise abrangente do funcionamento da lngua sempre depender da conciliao de conceitos emprestados a diferentes perspectivas tericas; (b) qualquer modelo descritivo tem limitaes; portanto, natural que encaremos qualquer anlise como um corpo de afirmaes sujeito a reformulaes. (AZEREDO, 2008, p. 29-31).

  • 2.2 A gramtica descritiva

    http://www.google.com.br/search?um=1&hl=pt-

    Perini (2009) explica-nos que a gramtica descritiva, resultados de

    pesquisas cientficas sobre o funcionamento da lngua, tem por objetivos

    descrever a estrutura da lngua, partindo de princpios tericos muito mais

    rigorosos do que aqueles em que se baseiam as gramticas atualmente

    disponveis, para chegar a uma anlise bastante diferente da usual. (PERINI,

    2009, p. 21). Segundo o autor, todos os princpios utilizados para a anlise

    descritivista tm sito fruto de estudos recentes no campo da Lingustica

    contempornea. Com isso, a gramtica descritiva apresenta-se como uma

    orientao terica e atualizada para o estudo da lngua.

    Ainda, de acordo com Perini (2009), a gramtica descritiva teve seu incio

    de construo com Back & Matos (1972), Macambira (1982), Mateus (1983)

    que, como afirma Perini, foram passos de consolidao de estudos descritivos.

    O autor discute enfaticamente a defasagem dos estudos da gramtica da

    lngua portuguesa, principalmente ao que concerne sistematizao rigorosa e

    pouco cientfica da gramtica tradicional: falta de coerncia terica, falta de

    adequao realidade da lngua e um normativismo sem controle. (PERINI,

    2009, p. 21).

  • A Lingustica se tem desenvolvido grandemente nos ltimos tempos; no Brasil passamos do quase nada da dcada de 60 at uma comunidade numerosa, com produo intensa, frequentemente de boa qualidade, em praticamente todas as grandes reas da disciplina. [...] Descobrem-se coisas novas e reiterpretam-se velhas descobertas, lanando mais luz sobre a nossa lngua, sobre a realidade lingustica do pas e sobre a linguagem em geral. Uma gramtica obra de sntese e, como tal, depende do estado da pesquisa em cada uma das reas consideradas. O resultado, portanto, desigual: em certos pontos, possvel incluir na descrio resultados de pesquisas relevantes e razoavelmente completas; em outros casos, preciso contentar-se com indicaes mais programticas; s vezes, nada mais se pode fazer do que definir o problema e clamar por mais pesquisas. [...]. Os estudos de gramtica portuguesa tendem atualmente a reduzir-se ao exame da literatura anterior (que, por sua vez, muitas vezes se limita a repetir ou parafrasear a literatura ainda mais antiga), complementado, ocasionalmente, com opinies muito pouco justificadas. Observa-se em alguns casos uma tentativa, sempre muito tmida, de lanar mo de dados da lngua atual (como quando se admite a existncia de construes do tipo ele vai me telefonar). bem verdade que faltam estudos empricos suficientemente amplos e confiveis nos quais basear uma anlise do padro moderno brasileiro. Mas h pontos que jamais so questionados, e que poderiam s-los desde j, como as prprias bases tericas da gramtica e a atitude normativista que atualmente a permeia. [...]. O primeiro problema a enfrentar quando se pretende elaborar uma gramtica o de definir que lngua vai ser descrita. No caso da gramtica descritiva, o termo lngua portuguesa bastante ambguo e se aplica a diversas variedades nitidamente diferenciveis. Por exemplo, todos podemos distinguir claramente a fala de um portugus de Lisboa da de um brasileiro de Belo Horizonte; podemos igualmente distinguir a fala de um indivduo criado na cidade da de uma pessoa criada no campo e analfabeta. [...] A gramtica descritiva uma tentativa de descrio de uma variedade padro da lngua portuguesa. Por conseguinte, ocupa-se basicamente da lngua escrita. Gostaria de acentuar que isso no significa que as variedades coloquiais no sejam dignas de estudo e que no seja urgente levar a efeito a tarefa de descrev-las. Na verdade, tem-se feito muita pesquisa sobre o portugus coloquial, em suas variantes regionais, sociais, situacionais, etc., mas talvez, ainda seja cedo para se tentar uma sntese que possa ser chamada de a gramtica do portugus falado [...]. (PERINI, 2009, p. 22-25, grifos do autor).

  • 2.3 A gramtica gerativa

    http://www.google.com.br/search?hl=pt-

    As discusses acerca da gramtica gerativa ou gerativo-transformacional

    inicia em 1957 com a publicao de Estruturas Sintticas, de Noam Chomsky,

    conforme vimos em nosso captulo 4 desse manual didtico. Nesse trabalho,

    Chomsky apresenta severas contestaes perspectiva comportamentalista

    de estudos da cognio, o behaviorismo de Skinner. Como explica Martelotta

    (2009), Chomsky procura ressaltar o componente criativo da linguagem por

    meio de processos mentais que, segundo o autor, so inatos espcie

    humana.

    Assim, podemos entender que a gramtica gerativa procura entender as

    estruturas gramaticais da lngua como um modelo formal. Esse modelo inato

    espcie humana e, por sua vez, faz parte da competncia lingustica de todos

    os sujeitos. Como nos explica Martelotta (2009, p. 59), dois princpios tericos

    bsicos caracterizam a concepo gerativa de gramtica: (i) o princpio do

    inatismo (segundo o qual existe uma estrutura inata, constituda de um

    conjunto de princpios gerais que impem limites na variao entre as lnguas e

    que se manifestam como dados universais. (MARTELOTTA, 2009, p. 59); e (ii)

    princpio da modularidade da mente (que prev que nossa mente modular,

    ou seja, constituda de mdulos ou pares, caracterizados como sistemas

    cognitivos diferentes entre si, que trabalham separadamente. (MARTELOTTA,

    2009, p. 59).

  • Na gramtica gerativa, temos em mente uma outra definio de gramtica, no determinada por um padro de correo [como faz a gramtica tradicional, por exemplo, ]. Vamos comear distribuindo nossa definio de gramtica observando um fato que bastante banal at, mas que tem implicaes imediatas para o que estamos discutindo: do que se sabe at hoje dos reinos animal, vegetal e mineral, s os seres humanos falam. No estamos dizendo que outros seres humanos no disponham de sistemas at bastante sofisticados de comunicao, mas afirmando que s os seres humanos falam de uma certa maneira. S os seres humanos so capazes de combinar itens de um conjunto de elementos segundo certos princpios bsicos, que so em nmero finito, de modo a gerar um nmero infinito de sentenas novas: isto corresponde ao que chamamos de aspecto criativo da linguagemdentro do programa de estudos gerativistas. E mais: parte das verdadeiras excees, isto , dos casos de distrbios neurolgicos graves, todos e apenas os seres humanos falam uma lngua natural, o que quer dizer que as lnguas naturais tm uma ligao estreita com o que definidor da natureza humana: chamemos a esse dote da espcie de racionalidade humana. Dizer que as lnguas naturais esto relacionadas estreitamente com a racionalidade humana equivale a dizer que ns no falamos combinando elementos quaisquer de maneira aleatria, chamando a isso de sentena. Ao contrrio do que quer nos fazer crer a gramtica normativa, quando falamos, mesmo que no estejamos obedecendo s regras dadas como as nicas possveis, estamos fazendo uso de regras que so, em ltima instncia, ditadas pela racionalidade humana. [...] Por que falantes sabem que a situao prpria do portugus brasileiro sem que ningum lhe tenha ensinado isso, dizemos que eles dispem de uma gramtica internalizada, isto , de um conjunto de regras que rege a distribuio de outras formas. (MIOTO, FIGUEIREDO SILVA; LOPES, 2007, p. 18-20, grifos dos autores).

    2.4 A gramtica funcional

    http://www.google.com.br/imgres?q=gram%C3%A1tica+funcional&hl=pt-

  • Neves (1997, p. 15) esclarece-nos que por gramtica funcional podemos

    entender uma teorizao gramatical das lnguas naturais que procura integrar-

    se a uma teoria global da interao social. Em outras palavras, a gramtica

    funcional, diferentemente da gramtica tradicional, procura descrever e

    interpretar o uso da lngua em situaes reais e concretas de interao. Trata-

    se de uma teoria que assenta que as relaes entre as unidades e as funes

    das unidades tm prioridade sobre seus limites e sua posio, e que entende a

    gramtica como acessvel s presses de uso. (NEVES, 1997, p. 15).

    Para a autora, ainda, a gramtica funcional preocupa-se, dentre outros

    aspectos, com a competncia comunicativa de falantes (HYMES, 1974), a

    capacidade que os indivduos tm no apenas de codificar e decodificar

    expresses, mas tambm de usar e interpretar essas expresses de uma

    maneira interacionalmente satisfatria. (NEVES, 1997, p. 15). A gramtica

    funcional, dessa forma, procura entender a descrio das regras para o uso

    social apropriado da linguagem.

    O termo funo apresenta tal variedade de empregos que, com chamar-se funcional a uma teoria lingustica, no se consegue caracteriz-la realmente. Martinet, procurando mostrar o que lingustica funcional (Martinet, 1994), comea exatamente buscando definir funo, termo a que atribui:

    1) O valor de papel, ou de utilidade de um objeto ou de um comportamento(que o adotado pela Sociedade Internacional de Lingustica Funcional SILF);

    2) O valor de papel de uma palavra em uma orao,acrescentando ao sentido que a palavra tem num determinado contexto (que o que est na tradio gramatical);

    3) O valor matemtico de grandeza dependente de uma ou de diversas variveis (valor cuja utilizao em lingustica muito perigosa).

    Para Martinet (1994), o termo funcionalismos tem sentido para os lingistas em referncia ao papel que a lngua desempenha para os homens, na comunicao d sua experincia uns aos outros. (MARTINET, 1994, p. 13). (NEVES, 1997, p. 5)

    Ainda Neves (1997) nos apresenta uma sntese das principais ideias da

    gramtica funcional em relao s orientaes formalistas, que pode ser assim

    explicitada:

  • Categorias Paradigma Formalista Paradigma Funcionalista Lngua Conjunto de oraes. Instrumento de interao

    verbal.

    Funo da lngua Expresso de pensamentos. Comunicao social.

    Correlato cognitivo Competncia: capacidade de produzir, interpretar e julgar oraes.

    Competncia comunicativa: habilidade de interagir socialmente com a lngua.

    O sistema e ouso O estudo da competncia tem prioridade sobre o da atuao.

    O estudo do sistema deve fazer-se dentro do quadro do uso.

    Lngua e contexto/situao As oraes da lngua devem descrever-se independentemente do contexto/situao.

    A descrio das expresses deve fornecer dados para a descrio de seu funcionamento num dado contexto.

    Aquisio da linguagem Faz-se com o uso de propriedades inatas, com base em input restrito e no-estruturado de dados.

    Faz-se com a ajuda de um input extenso e estruturado de dados apresentado no contexto natural.

    Universais lingusticos Propriedades inatas do organismo humano.

    Explicados em funo de restries: comunicativas, biolgicas ou psicolgicas, contextuais.

    Relao entre a sintaxe, a semntica e a pragmtica

    A sintaxe autnoma em relao semntica; as duas so autnomas em relao pragmtica; as prioridades vo da sintaxe pragmtica, via semntica.

    A pragmtica o quadro dentro do qual a sem6antica e a sintaxe devem ser estudadas; as prioridades vo da pragmtica sintaxe, via semntica.

    Adaptado de Neves (1997).

    Veja que voc, ao longo dos ltimos captulos, percorreu caminhos sobre

    as concepes de lngua(gem) e de gramtica nos estudos da linguagem. Pde

    perceber como, de formas diretas e indiretas, as concepes de gramtica

    esto aliceradas s concepes de lngua(gem).

    2.5 Concluindo o assunto

    Como vimos, so diversos os estudos que tm se dedicado a investigar a

    constituio e o funcionamento da lngua sob um vis cientfico (AZEREDO,

    2008; CASTILHO, 2002; PERINI, 2009, NEVES, 1997) seja sob o paradigma

    de ordem formalista, seja sob o escopo do funcionalismo.

  • Por outro lado, a lngua, em ambiente acadmico e escolar, tem sido foco

    de sistematizaes de regras que, em um percurso lgico e no-cientfico, visa

    ordenao de normas regulares da estrutura lingustica, luz de um

    posicionamento padronizado e regulativo a lngua sob a perspectiva da

    gramtica tradicional (tambm denominada normativa).

    Entende-se por formalista, um percurso terico-metodolgico de

    investigao sobre a lngua cujo foco se estabelece na forma, em detrimento

    funo. Em outras palavras, um estudo formalista caracteriza-se por apresentar

    respostas s indagaes a respeito do sistema e dos elementos que o

    compem, desconsiderando qualquer varivel inter/extralingstica. Dessa

    forma, entender o paradigma formal, procurar compreender a forma do

    sistema sinttico da lngua, sem atentar para o fato que essas formas,

    caracterizadas como homogneas, imanentes e objetivas, possam

    desempenhar certa funo em situaes de uso.

    Em geral, a rota formalista, enraizada filosoficamente no positivismo,

    objetiva apresentar modelos lgicos e formalizados de como o sistema da

    lngua se constitui em dada lngua natural. Nosso percurso, portanto, segue a

    viso de que estudar a lngua estudar a estrutura dessa lngua.

    Alm de entender o paradigma formal, torna-se importante localizarmos a

    presente discusso no paradigma gramatical. Dentre os vrios percursos

    terico-metodolgicos de estudo gramatical o tradicional, o descritivo, o

    funcional, e o gerativo-transformacional -, direcionemos nossa discusso para

    delineamentos de alguns fundamentos dos escopos gramaticais citados: (i) a

    gramtica tradicional,visa sistematizao das normas do bem usar a lngua.

    Dita as regras com o preceito de que devem ser obrigatoriamente seguidas.

    Alm disso, como pontua Bechara (2011), estudar a lngua gramaticalmente

    saber us-la de forma padro/culta. (ii) a gramtica descritiva entende que

    estudar a lngua descrever e interpretar as formas em relao s funes que

    dada forma exerce no sistema em uma determinada lngua natural. Para Perini

    (2002), estudar a lngua sob o vis da gramtica descritiva entender que no

    basta apenas descrever as formas, preciso, em confluncia, interpretar as

    funes das formas.

  • Com isso, para a gramtica descritiva, somente um erro, aquilo que na

    lngua se torne incompreensvel; (iii) a gramtica funcional aspira a

    compreender como as funes que a lngua desempenha requerem formas

    determinadas por essas funes e consubstanciadas pelas situaes sociais

    de interao verbal. A gramtica funcional, atualmente, alia-se aos estudos

    conversacionais, discursivos, sociocognitivos e pragmticos para entender o

    funcionamento de dada lngua natural. De acordo com Neves (1997), estudar a

    lngua procurar entender as funes que, no uso dessa lngua, as formas

    concretizam; (v) a gramtica gerativo-transformacional, ao fim, entende que a

    lngua um conjunto de sentenas (CHOMSKY, 2005) e que todo sujeito nasce

    com um aparatos capaz de se desenvolver uma dada lngua uma gramtica

    universal que se desenvolve, medida que o sujeito se desenvolve

    biologicamente. Estudar a lngua, segundo Chomsky (2005; 2009), entender

    as regras internalizadas dessa lngua, isto , a competncia lingustica do

    sujeito.

    Dada nossa tradio escolar, h uma tendncia em se identificar o estudo da linguagem com o estudo da gramtica. A lingustica, no entanto, distingue-se da gramtica tradicional, normativa. Ela no tem, como essa gramtica, o objetivo de prescrever normas ou ditar regras de correo para o uso da linguagem. Para a lingustica, tudo o que faz parte da lngua interessa e matria de reflexo. Mas no qualquer espcie de linguagem que objeto de estudo da lingustica: s a linguagem verbal, oral ou escrita. Os sinais que o homem produz quando fala ou escreve so chamados de signos. Ao produzir signos, os homens esto produzindo a prpria vida: com eles, o homem se comunica, elabora sua cultura e sua identidade. Os signos so fundamentais, pois do ao homem sua dimenso simblica: essa que o liga aos outros homens e natureza, isto , a sua realidade social e natural. H, alm dos signos da linguagem verbal, muitas outras espcies de signos que povoam de linguagens a vida do homem: a pintura, a mmica, o cdigo de trnsito, a moda, as linguagens artificiais, etc. Os signos quase sempre, tanto os das linguagens no-verbais quanto os da linguagem verbal, so objetos de uma cincia geral dos signos: a semiologia. Os signos da linguagem verbal tm uma importncia to grande para a humanidade que mereceram uma cincia s para si: a lingustica. (ORLANDI, 2009, p. 10-11).

  • [...] podemos dizer que o modo como compreendemos os fenmenos associados gramtica das lnguas mudou ao longo dos anos, desde a gramtica grega at as escolas mais modernas da lingustica, de uma concepo filosfica que relacionava, sem comprovaes empricas, a lgica do pensamento com a linguagem at o surgimento da lingustica no sculo XIX, quando foram incorporados procedimentos cientficos caractersticos da chamada cincia moderna, surgida no sculo XVII. Com a evoluo dos estudos, essas concepes foram sendo aperfeioadas, abandonadas e at retomadas em funo de novas descobertas cientficas. Atualmente existem duas grandes tend6encias em lingustica. A tendncia gerativista, com sua viso biolgica da linguagem cuja abordagem privilegia os aspectos formais das lnguas, e a cognitivo-funcional, que considera o uso da lngua importante para a compreenso das estruturas das lnguas, propondo uma relao entre biologia e cultura. (MARTELOTTA, 2009, p. 68).

    [...] o termo gramtica, por si s ambguo, seria equivalente s caractersticas de uma lngua que nos so apresentadas em forma de regras e princpios que no se propem a fornecer uma explicao mas, antes, um modelo, que no conseguimos nunca abarcar e dominar integralmente. Pode-se dizer que essa concepo corresponde a um s tempo gramtica (i) descritiva, que pretende depreender o sistema da lngua, atravs do estabelecimento das unidades no interior de cada sistema e de suas relaes opositiva; (ii) gerativa, que constitui um sistema formalizado de regras correspondentes compet6encia lingustica; (iii) funcional, que consiste em um conjunto de estratgias que o falante emprega com a finalidade de produzir comunicao coerente; e ainda (iv) normativa, que focaliza a lngua como um modelo ou padro ideal de comportamento compulsrio em qualquer situao de fala ou escrita. Normalmente se diz que se ensina gramtica para tornar os indivduos capazes de conhecer o funcionamento da linguagem e de falar e escrever bem. A forma como isso se d a grande questo, em funo do conceito de gramtica que est a implcito, uma gramtica normativa que prescreve normas que sero vlidas em todos os contextos, no levando em conta a variao em qualquer dimenso ou nvel. Esse ensino centrado no cdigo tem por trs um juzo de valor. Se pensarmos em gramtica em termos descritivos, de levantamento de unidades opositivas do sistema da lngua e da gramtica internalizada que a criana traz consigo, teramos um ensino centrado na utilizao do cdigo, no uso, propriamente dito, por sua vez, mais eficiente e mais objetivo [ma, seria esse o valor?]. (CALLOU, 2009, p. 15-16).

  • Captulo 3

    Os nveis de estudo da lngua: a palavra e a frase

    Neste captulo, iremos estudar os nveis de anlise das palavras e das

    frases: os conceitos principais no mbito da fontica, da fonologia, da

    morfologia, da sintaxe e da semntica. Lembre-se de solicitar mais referncias

    para seu professor sobre o assunto, pois neste manual, estaremos apenas

    direcionando voc para o estudo.

    3.1 O nvel fontico-fonolgico: principais conceitos e categorias Iremos iniciar nossa seo falando um pouco sobre as relaes entre

    fontica e fonologia e, logo depois, abordar os principais conceitos nessas

    reas. Voc pode se perguntar se Fontica e Fonologia no so conceitos

    equivalentes, se ambas lidam com os sons de uma dada lngua. Contudo,

    saiba que, mesmo lidando com os sons, cada uma lida de forma diferente.

    Cabe Fontica o trabalho com os sons propriamente ditos, como so

    produzidos e recebidos articulatoriamente ou fisicamente. Fonologia, por sua

    vez, cabe a operao e a sistematizao de sons em sistemas. Por exemplo:

    se desejarmos entender como o som [b] produzido no aparelho fonador,

    estaremos investigando-o pelo campo da Fontica. Por outro lado, se

    desejarmos entender como o som [b] entre em relao opositiva no sistema do

    portugus com o som [p] (por exemplo, balaX pala), estaremos investigando

    os sons pelo campo da Fonologia.

    Ainda podemos afirmar que, enquanto a Fontica objetiva estudar os sons

    da fala, a Fonologia busca sistematizar os sons da lngua. Vejamos como nos

    esclarecem Santos e Souza (2008):

    A fontica trabalha com os sons propriamente ditos, como eles so produzidos, percebidos e que aspectos fsicos esto envolvidos em sua produo. A fonologia opera com a funo e a organizao desses sons em sistemas. (SANTOS; SOUZA, 2008, p. 9).

  • No estudo da Fontica, buscamos entender a realizao dos fones. No

    estudo da Fonologia, buscamos compreender a sistematicidade dos fonemas.

    O conceito de fone corresponde realizao concreta, material e fsica de um

    som, por exemplo, na palavra casa, teremos [ka.za], isto , a realizao

    concreta de 4 fones.

    Por fonema, entendemos a menor unidade distintiva de uma dada lngua,

    isto , unidades mnimas que distinguem palavras entre si. Por exemplo, na

    mesma palavra casa, teremos /ka.za/, isto , 4 unidades distintivas. Veja

    como, em Fontica, usamos [ ] para transcrever os sons e, em Fonologia,

    usamos / /. Vejamos a realizao das vogais no Portugus do Brasil (PB).

    Sabemos que h 5 vogais, em termos de letras (grafemas) e 7 vogais, em

    termos de sons.

    http://fonticaarticulatria.blogspot.com.br/2011/05/tabela-fonetica-consonantal.html

    A fontica estuda a substncia, a materialidade dos sons vocais. Ela uma parte da fisiologia ou da fsica acstica, no se ocupando, portanto, da funo lingustica, isto , da estruturao dos sons da fala em um sistema de relaes opositivas e combinatrias para a constituio dos signos de uma lngua compete fonologia. (AZEREDO, 2009, p. 372)

  • http://fonticaarticulatria.blogspot.com.br/2011/05/tabela-fonetica-consonantal.html

    Vejamos, com base em Santos e Souza (2008) a explicao para cada

    particularidade dos sons da tabela acima, ao nvel da Fontica: Modos de

    fonao: fonao corresponde ao uso do sistema da laringe para gerar, com

    ajuda da corrente de ar produzida pelo sistema respiratrio, uma fonte audvel

    de energia acstica que pode ser modificada pelas aes articulatrias do

    aparelho vocal. Sons desvozeados ocorrem quando h a separao das cordas

    vocais, com a glote aberta, deixando a passagem de ar livre, sem vibrar as

    cordas vocais. Sons vozeados, por sua vez, h uma vibrao produzida pelas

    cordas vocais, pois as cordas vocais esto unidas e a glote fechada. Na figura

    A, temos as cordas abertas e na figura B, fechadas.

  • Figura A Figura B

    Fonte: Glote e pregas vocais na respirao, na produo de sons vozeados e no-vozeados (PARKER, 2007, p.137).

    Na tabela das consoantes, h ainda aspectos sobre o ponto e sobre o

    modo de articulao. Vejamos, com base em Santos e Souza (2008, p. 20-22),

    primeiramente, os pontos de articulao:

    (a) Bilabial: diga pata, bata, mata. O 1 som de cada palavra

    produzido pela passagem de ar obstruda pelos lbios. H um

    estreitamento entre os lbios. Veja na tabela acima esses sons.

    (b) Labiodental: o som que se produz com a obstruo do ar entre os

    lbios inferiores e dentes superiores. Fale, por exemplo, faca e vaca,

    veja como [f] e [v] necessitam dos lbios e dos dentes para serem

    realizados concretamente.

    (c) Dental: o som que se produz com a ajuda dos dentes.

    (d) Alveolar: Sons produzidos com a ponta da lngua na arcada alveolar

    (parte ssea atrs dos dentes superiores). Veja na tabela e produza em

    sala com o auxlio do professor. Diga, por exemplo, data.

    (e) Palato-alveolar: sons produzidos com a lngua contra a parte anterior do

    palato duro. Por exemplo, os primeiros sons das palavras tiae dia do

    dialeto carioca.

    (f) Retroflexa: sons produzidos com a lngua levantada e voltada para trs.

    o r do dialeto caipira.

    (g) Palatal: som produzido com a lngua contra o palato duro. Por exemplo,

    em calha, o lh.

  • (h) Velar: o som produzido com a lngua contra o vu palatino, como em

    gata, o [g].

    (i) Uvular: sons produzidos com a lngua contra o vu palatino e a vula.

    Como em orra, no dialeto paulista.

    (j) Glotal: so sons produzidos pelas cordas vocais. Por exemplo, os som

    de r, produzido em Belo Horizonte/MG.

    Voc viu como os sons do PB tm diferentes pontos de articulao em

    nosso aparelho fonador? Para voc saber mais, veja a figura abaixo de nosso

    aparelho fonador:

    Aparelho fonador humano (PARKER, 2007, p.137).

  • http://aprendizdeaprendiz.blogspot.com.br/2011/02/mecanismos-de-producao-de-segmentos.html

    Vamos verificar agora que os sons produzidos em nossa lngua tambm se

    articulam em modos. Vejamos os modos de articulao.

    (a) Oclusivo: som produzido com o fechamento total dos articuladores.

    Dessa forma, o som sai como uma exploso.

    (b) Nasal: sons produzidos com os articuladores bucais fechados, com o ar

    escapando pela cavidade nasal;

    (c) Vibrante: o som produzido quando os articuladores se batem vrias

    vezes e rapidamente. Seria o r do italiano.

    (d) Tepe: um som produzido com uma batida rpida e nica do articulador

    ativo (lngua, maxilar inferior) no passivo (lbio superior, dentes). Seria o

    nosso conhecido r em encontros consonantais.

    (e) Fricativo: so os sons produzidos por uma aproximao dos

    articuladores, de modo que o ar sai produzindo frico.

    (f) Lateral: sons em que a corrente de ar obstruda no centro da parte

    anterior da cavidade oral pela lngua, mas o ar escapa pelas laterais.

  • Para a classificao articulatria das vogais, esto envolvidos o corpo da

    lngua e os lbios. O corpo da lngua pode movimentar-se verticalmente,

    levantando-se ou abaixando-se, ou horizontalmente, avanando ou recuando.

    O parmetro que define o movimento vertical denominado altura e o que

    define o avano/recuo denomina-se anterioridade/ posterioridade. H ainda a

    possibilidade dos lbios estarem distensos ou arredondados. O movimento de

    arredondamento dos lbios ocorre na produo de vogais ditas arredondadas.

    As demais so articuladas com os lbios distensos e so classificadas como

    no-arredondadas.

    (a) Altura da lngua: Alta: so os sons em que a lngua est mais alta. So

    as vogais [i] e [u]. Mdio-alta: a lngua est no plano mdio-alto. So os

    sons [e] e [o]. Mdio-baixo: a lngua est em altura mdio-baixo. So os

    sons abertos de ee de o, como os sons iniciais em ela e dio.

    Baixo: a lngua se encontra bem baixa. o som [a].

    (b) Posio da lngua: Anterior: a lngua est projetada em direo dos

    lbios. Central: a lngua est em posio neutra. Posterior: a lngua est

    mais retrada, em direo faringe.

    (c) Arredondamento dos lbios: Arredondados: os lbios ficam redondos.

    No arredondados: lbios estendidos.

    Vejamos, com base em Santos e Souza (2008), como poderamos

    compreender essas particularidades das vogais em relao. Imagine que o

    desenho abaixo seja a representao de uma lngua:

    http://aprendizdeaprendiz.blogspot.com.br/2011/02/mecanismos-de-producao-de-segmentos.html

  • Com base nessas consideraes, observe a transcrio de dialetos baixo e

    perceba, com a ajuda do professor, a variao entre essas realizaes:

    Voc percebeu como importante compreendermos como os sons so

    realizados em nosso aparelho fonador? Veja como os dialetos apresentam

    sons diferentes, posto estarem em variao. Assim, quando voc estiver em

    sala com seus alunos, procure perceber se eles apresentam variaes quando

    usam a lngua. Lembre-se que essas variaes podem ocorrer por ordem

    geogrfica, social, de idade, de sexo, dentre outros fatores. O importante

    entender que, foneticamente, a lngua heterognea e apresenta variaes

    mltiplas. Enuncie em voz alta os dialetos acima e voc perceber a diferena!

    Vamos tambm, em termos de Fontica e Fonologia, discutirmos os

    encontros voclicos.

    http://aprendizdeaprendiz.blogspot.com.br/2011/02/mecanismos-de-producao-de-segmentos.html

  • No PB, atesta-se a ocorrncia de encontros de dois ou trs segmentos

    voclicos aos quais se d respectivamente o nome de ditongos ou tritongos.

    Eles so formados, em geral, pelas vogais altas anterior [i] e posterior [u].

    Quando essas vogais ocupam as posies perifricas da slaba so chamadas

    de semivogais e apresentam menor proeminncia acentual se comparadas s

    vogais que acompanham. Nesse caso, so representadas respectivamente

    pelos smbolos fonticos [j] e [w].

    Os ditongos constituem-se de dois segmentos voclicos. H, no entanto,

    duas possibilidades de seqncia em uma mesma slaba: vogal semivogal ou

    semivogal vogal. As seqncias finalizadas por semivogal so sempre

    inseparveis e so chamadas de ditongos decrescentes, pois terminam pela

    vogal com menor proeminncia acentual. Na seqncia semivogal vogal,

    chamada de ditongo crescente, j que finalizada pelo segmento de maior

    proeminncia (a vogal), h a possibilidade de esses dois segmentos

    constiturem slabas separadas.

    Ditongos so geralmente tratados como uma sequncia de segmentos.

    Um dos segmentos da sequncia interpretado como uma vogal e o outro

    como semivocide, semicontide, semivogal, vogal assilbica ou de glide.

    Glides podem apresentar caractersticas fonticas de segmentos voclicos ou

    consonantais. a funo dos segmentos na estrutura sonora que justifica a

    anlise mais adequada para os glides em cada lngua em particular. Um

    ditongo, portanto, uma vogal que apresenta mudanas de qualidade

    continuamente dentro de um percurso na rea voclica. As vogais que no

    apresentam mudana de qualidade so chamadas de monotongos (SILVA,

    1999).

    Um ditongo pode ser descrito e identificado com referncia ao segmento

    inicial e final do contnuo. Ao representarmos o ditongo [aj] da palavra pais

    estamos expressando que ocorre um movimento contnuo e gradual da lngua

    entre duas posies articulatrias voclicas: de [a] at [i]. Em tal articulao, os

    dois segmentos [a] e [i] ocupam uma nica slaba. Um desses segmentos o

    ncleo da slaba (no caso, o [a]) e o outro segmento assilbico no podendo

    ser ncleo da slaba e corresponde ao glide [j]. A glide marca a

    assilabicidade. (SILVA, 1999).

  • Um movimento articulatrio de um ditongo difere do movimento

    articulatrio de duas vogais em sequncia, sobretudo quanto ao tempo

    ocupado na estrutura silbica e quanto mudana de qualidade voclica. Por

    exemplo, o par pais e pas. Os ditongos podem ser crescentes (glide+vogal)

    ou decrescente (vogal+glide).

    Nos encontros de trs segmentos voclicos, em que somente um deles

    ocupa o pico silbico, temos os chamados tritongos. Alguns estudiosos

    consideram os tritongos como a fuso de um ditongo crescente e um

    decrescente; outros consideram que tritongos, precedidos de oclusivas velares,

    seriam certamente consoantes complexas seguidas de ditongo. Assim, em

    palavras como Uruguai, o dgrafo gu representaria uma consoante velar

    arredondada ou labializada (CAVALIERI, 2005; SILVA, 2002).

    H ainda encontros de duas vogais, cada uma constituindo o pico de uma

    slaba. Nesse caso, temos os hiatos. So exemplos de hiato as palavras: sa e

    ba. O hiato pode ser intravocabular, quando ocorre dentro de uma palavra, ou

    intervocabular, quando conseqncia do encontro entre uma vogal final de

    uma palavra e a vogal inicial de outra. Temos hiatos nas seguintes seqncias

    (CAVALIERI, 2005):

    - Entre vogais iguais tonas: a) caatinga, coordenao.

    - Entre vogais iguais, sendo a primeira tnica: b) vo, vem.

    - Entre vogais iguais, em que a segunda tnica: c) alcolico, xiita.

    - Entre vogais diferentes tonas: d) doao, estereotipado.

    - Entre vogais diferentes, sendo a primeira tnica: e) Maria, pavio.

    - Entre vogais diferentes, sendo a segunda tnica: f) hiato, freada.

    Os sons vocais so a matria-prima das lnguas naturais. Mas nem todos os rudos que saem de nossa boca so constitutivos de formas da lngua: pigarros, assobios, cliques (efeito sonoro do tipo que se produz com os lbios no gesto do beijo ou com a ponta da lngua contra o cu da boca) no fazem parte do sistema de sons distintivos da lngua portuguesa, por mais que possam ser utilizados para a comunicao entre as pessoas: o pigarro como alerta e censura, o assobio como forma de chamar algum. A substncia sonora por meio da qual as unidades de sentido palavras, enunciados se manifestam tem uma realidade fsica evidente, mas no tem, em princpio, finalidade em si mesma; sua razo de existir , primeiramente,dar corpo aos significados para torn-los acessveis ao interlocutor. Dizemos, por isso, que, embora sejam separveis na anlise, estes dois planos da linguagem o sensvel e o mental s funcionam de modo solidrio. (AZEREDO, 2009, p. 371).

  • Tenhamos sempre o cuidado, porm, de no confundir o plano sonoro da lngua seus sons, fonemas e slabas -, percebido pelo ouvido, com sua representao escrita, que inclui sinais grficos diversos, como letras e traos, percebidos pelo olho. A representao grfica das palavras realizada pelo sistema ortogrfico, que apresenta peculiaridades responsveis por freqentes discord6ancias entre a forma oral e a forma escrita da lngua. Por exemplo, usam-se combinaes de letras chamadas dgrafos para representar um s fonema (como achar em face de mexer, quilo em face de calo); usam-se letras diferentes para representar o mesmo fonema (por exemplo, /z/ em exato, rezar e pensar) ou a mesma letra para representar fonemas distintos (como a letra X em prximo, exato, roxo, sexo). (AZERDO, 2009, p. 375).

    Outra questo que temos que cuidar o conceito de slaba.

    Primeiramente, vamos lembrar que as consoantes no so pronunciadas

    sozinhas, pois elas se apiam nas vogais, ao lado das quais formam unidades

    maiores chamadas slabas: o vocbulo trapaceiros, por exemplo, divide-se

    em quatro slab