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História dos Tributos no Brasil

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Livro a Historia dos tributos no Brasil

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H i s t ó r i a

d o s T r i b u t o s

n o B r a s i l

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4 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

Pat r o c í n i or ea l i z a ç ã o apo i o

I M AGEM CAPA

1 CartadeJoséBonifácio deAndradaeSilvaaD. Pedro I, Rio deJaneiro, 1º desetembro de1822; manuscrito em3 fls., 210 x 305 mm.São Paulo, Museu PaulistadaUniversidadedeSão Paulo. FotografiadeRômulo Fialdini.

 2 B ATALHA DE V ILADE F RANCA DO C AMPO EM 

25 DEJULHODE 1582 ; gravuraholandesa.In Serrão, JoaquimVeríssimo. HistóriadePortugal(1580-1640). Lisboa, Editorial Verbo, 1979.

 3 Paul Ferrand,M INERAÇÃO DE O URO COM B ATÉIA

(detalhe), s.d.; desenho. In Simonsen, RobertoC. HistóriaEconômicado Brasil (1500/1820),6ªedição. São Paulo, CompanhiaEditoraNacional, 1969 .

 4 Anônimo, Senhor dirigindo trabalho escravo emengenho deaçúcar (detalhe), s.d.; desenho. InSimonsen, Roberto C. HistóriaEconômicadoBrasil (1500/ 1820), 6ªedição. São Paulo,CompanhiaEditoraNacional, 1969 .

 5 Armand Pallière,C HAFARIZ DAS M ARRECAS (detalhe),circa1830; aquarela, 237 x 292 mm.Rio deJaneiro, Museu Histórico Nacional.FotografiadeRômulo Fialdini.

6  AlmeidaJúnior,A P ARTIDA DAM ONÇÃO (detalhe),século XIX; óleo sobretela, 6640 x 3900 mm.São Paulo, Museu PaulistadaUniversidadedeSão Paulo. FotografiadeRômulo Fialdini

7  Moedas deouro, século XVIII. Rio deJaneiro,Museu Histórico Nacional. FotografiadeRômuloFialdini.

I M A GEM D A ORELH A

1  JoaquimdaRochaFerreira,P ROVEDOR DAS M INAS ,1700; óleo sobretela. Museu PaulistadaUniversidadedeSão Paulo. Cf. Créditofotográfico.

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H I S T Ó R I A

D O S T R I B U T O S

N O B R A SI L

 Fer nando José A med 

 P l ínio José Labr iola de C ampos N egreiros

5

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6  h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

H ISTÓRIA DOS TRIBUTOS NO BRASIL

© COPYRIGHT DESTA EDIÇÃO:Sinafresp – Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo.Rua Dona Maria Paula, 123 – 17º andar – Bela Vista – CEP 01319-001 – São Paulo – BRASIL Tel.: 11 3107 4013 – Fax: 11 3105 2344 – [email protected]

AUTORES:Fernando José Amed / Plínio José Labriola de Campos Negreiros

CONSULTORIA E PESQUISA ICONOGRÁFICA:Fernanda Carvalho

REVISÃO DETEXTO:Euclides Alves da Silva / Vera Toledo Piza

CAPA, PROJETO GRÁFICO, EDIÇÃO DE ARTE E PRODUÇÃO EDITORIAL:Idéia Visual / Jun Yokoyama / Alpe Schneider / Hélvio Kanamaru / Gilberto Shiro Ogawa Yole Ferreira Lucas / Maurício Polato Carneiro / Denize de Moura VellosoAl. Santos, 212 – 11 253 1812

COLABORADORES:Moacir Longo / Helder Kanamaru

FOTOLITO:Bureau Bandeirante

IMPRESSÃO E ACABAMENTO:

Todos os direitos reservados aos autores.Proibida a reprodução total ou parcial por qualquer meio, sema expressa autorização dos autores.

Publicado em São Paulo, SP, Brasil.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Índices para catálogo sistemático:1. Brasil: Tributos: História 336.2009812. Tributos: História: Brasil 336.200981

REALIZAÇÃO:Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo – Sinafresp

Magnaprint do Brasil Editora Ltda.Alameda Caiapós, 500 – Tamboré06460-110 – Barueri – SP

Fone: 11 7291 8812 / 421 6270ISBN 85-87900-01-3

Amed, Fernando JoséH I STÓ RI A D O S TRI BU TO S N O BRASI L / Fernando José

Amed, Plínio José Labriola de Campos Negreiros;[colaboradores Helder Kanamaru, Moacir Longo]. ––São Paulo: Edições SINAFRESP, 2000.

Patrocínio: BanespaBibliografia

1. Impostos - Brasil - História 2. Tributação - Brasil -História I. Negreiros, Plínio José Labriola de Campos. II.Kanamaru, Helder. III. Longo, Moacir. IV. Título.

00-1762 CDD-336.200981

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BANESPA

Um longo e importante caminho de apoio eincentivo à cultura.

O Banespa sempre esteve à frente de iniciativas que apresentamcontribuições para o progresso da comunidade: ensino, pesquisa, arte,

esporte e desenvolvimento cultural integram esse projeto de atuação que,hoje, avança no novo século.

É esse o caminho escolhido pelo Banespa:

Uma trajetória com o compromisso de transformar desafiosem importantes referências para a nossa história social, econômica e cultural.

Parceria BANESPA e SINAFRESP ao Projeto de Pesquisa:

HISTÓRIA DOS TRIBUTOS NO BRASIL

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“A todos que colaboraram,inclusive financeiramente, paraque esta obra tenha se tornadorealidade, os nossos sincerosagradecimentos.”

1 Ademar Fernandes Martinez 2 Adherbal Silva Pompeo 3 Afonso Pereira deGouvea Filho 4 Ailson LemeSiqueira 5 Alaor Aparecido Pini6  Alberi Marques Vieira7  Alberto Segura Athayde8 Alberto Seiji Yugue

 9 Alda Matias Lopes10 Aldemir Morales Galharini11 Alvaro Reis Laranjeira12 Americo Castanha Neto13 Ana Paula Martins deCastro

14 Ângelo Cipola15 Antonio Blanco Arcas16  Antonio Bueno da Silva17  Antonio Cândido18 Antonio Carlos Buscardi Ferraz19 Antonio Carlos Fassoni

 20 Antonio Carlos Fernandes 21 Antonio Cordeiro dePaula 22 Antonio JoséLaédeSouza 23 Antonio Lourenço Colli 24 Antonio Peixoto Neto 25 Antonio Rodrigues Pereira 26  Antonio Sebastião Verones 27  Antônio Sérgio Gomes Valente

 28 Aparecido Evaldo Rodrigues 29 Arildo Goulart da Maia 30 Benedito Alves da Silva 31 Benedito Franco da Silveira Filho 32 Benedito Inacio dos Santos Filho 33 Bolivar Fonseca Sampaio 34 Bruno Guaraldo 35 Carlos Alberto Ayres Pereira 36  Carlos Alberto Fontoura Carvalho 37  Carlos AndradeMiranda 38 Carlos Eduardo Viana 39 Carlos Roberto Marcondes Gonçalves 4 0 Carlos Roberto Pedrão

 4 1 Carlos RoqueGomes 4 2 Carmen Silvia Maurício Zedron 4 3 Cassio Lopes da Silva Filho 4 4 Célia Barcia Paiva da Silva

 4 5 Celso Cezário Motta 4 6  CenedrimManoel da Silva 4 7  César Rodrigues dos Santos

 4 8 Clarissa Pinheiro Pereira 4 9 Claudio Damian 50 Cláudio deBelaz Nicolosi 51 Cláudio Marquesi 52 Claudio Tadao Miura 53 Clóvis Panzarini 54 Daniel Pelegrin 55 Darcy Paiva deMattos 56  David Auerbach 57  David Torres 58 Décio Brites 59 Deocacir Menezes60 Diniz Ferreira da Cruz61 DirceMatias Miguel Bedaque

6 2 Dirceu Pereira63 Dorival Ita Adão64 Durvail Soares Pompeo65 Durval deNoronha Goyos Junior66  Edison Nassif Farah67  Edmir Branco da Silva68 Edson Gonçalves Arcanjo69 Eduardo Martins70 Elias Fares7 1 Eran Manuchakian7 2 Erasmo Bardi73 Ernesto Ricca Filho74 Eugênio Evandro Fernandes

75 Fabio JoséRegueira Alves7 6  Fátima Aparecida deCarvalho Rosa77  Fernando Batlouni Mendroni78 Flávio Werneck Rebello deSampaio79 Francisco Marinho80 Gamal Castro Abdo Sater81 Gentil deMiranda8 2 Gervásio Antonio Consolaro83 Giancarlo Lolli84 Gianpaulo Camilo Dringoli85 Gilberto Galvani deOliveira86  Heitor Okuma87  Hélio Cesar Rosas88 HenriqueShiguemi Nakagaki

89 Herivelto Azael Archangelo 90 Hymans Pereira da Silva 91 Iasuaki Kikuti 92 Ideli Dalva Ferrari 93 Ilza Bergamasco Thimoteo 94 Isaías Domingos Sartor 95 Ismael Luiz deSouza 96  Ivo Justino da Silva 97   Jair Fernandes Labinas 98  João Alves Pereira 99  João deOliveira10 0  João Dias Yanes10 1  JoaquimEikemNagata

10 2  JoaquimVaz Gabriel10 3  JorgeAugusto Diniz10 4  JorgeMassatoshi Miyamura10 5  JoséAlberto da Cruz

8 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

C o l a b o r a d o r e s

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10 6   JoséAndréJunqueira Neto10 7   JoséAparecido Sioca10 8  JoséCampizzi Busico10 9  JoséCarlos Cardoso Souza110  JoséCarlos Ficher111  JoséCarlos Fogaça112  JoséCarlos Vaz deLima113  JoséClóvis Cabrera114  JosédeMoraes115  Josédos Santos Martins116   JoséLários117   JoséLuiz Melo118  JoséLuiz Quadros Barros119  JoséMarcondes deAquino120  JoséMarcos Szmyhiel121  JoséMaria Fernandes122  JoséNilton Novoa123  JoséPucci Cuan124  JoséRoberto Mello

125  JoséVergna Júnior126  Kwok Wai Wah127  Laudicir Antonio Frasson128 Leniro da Fonseca129 LidioneteDuarteMartins130 Lucia Delfino131 Luis Carlos Petrillo132 Luiz Antonio Moroni Amorim133 Luiz Carlos da Costa134 Luiz Carlos da Silva135 Luiz Carlos Fernandes136  Luiz Gonzaga deQuadros137  Luiz Gonzaga Medeiros da Silva138 Luiz JoséFerreira

139 Luiz Veronez Neto14 0 Marcelo Marconi deFarias14 1 Marcimedes Martins da Silva14 2 Marco Aurelio Meira Garcia14 3 Marcondes Claudiano R. deOliveira14 4 Marcos Eduardo Tribst14 5 Marcos Magnei deMiranda14 6  Maria Antonieta Pires deAraujo147  Maria Antonietta PastoreOliveira14 8 Maria Izabel Esteves14 9 Maria do Socorro Ferreira dos Santos eSilva150 Maria Teresa Padrão151 Maria Vanda Rodrigues

152 Marilena Berriel Joaquim153 Marília do Prado Iaropoli154 Marino Takeo Kawashima155 Mario deCarvalho Netto156  Mário Flávio da Silva157  Mario Minoru Sato158 Maristela Lemos deAlmeida Gebara159 Maristella Marcondes deAndradePereira Torres160 Massanobu Zaha161 Maurício Busollo Beloube162 Maurício Dias163 Mauro JoséAlves164 Miguel Nucci165 Milton Maximo Zen

166  Mitiko Motooka167  Nelson Hernandes Junior168 Neulizabeth Ferezin Morales

169 Nicola Sagrillo170 Nilo Calandria Ponce171 Noboo Nakasone172 Odair Paiva173 Oriovaldo Rodrigues da Silva174 Osvaldo Santos deCarvalho175 Otávio Condino Júnior176  Paulo deAraujo Godoy177  Paulo Lot178 Paulo Ricardo dos Santos OlimMarote179 Paulo Roberto Bueno180 Paulo Roque181 Pedro Rosalio da Cunha Pereira182 Raimundo Bispo Teles183 Regina Soares Toledo184 Reinaldo Vieira deSousa185 Ricardo deDeus Vidinha Conceição186  Ricardo Iki Chiota187  Roberto Antonio Mazzonetto

188 Roberto Dall'Olio189 Roberto Luiz Marthe190 Roberto Martins deAmorim191 Roberto Ryoichl Asakura192 Rosana Moretz Sohn Monteiro Uzêda193 Ruben Fonseca eSilva194 Rubens JorgeCarreira195 Sebastião Osmar deSouza196  Sergio Armando Gomes Ferreira197  Sergio Yoshiharu Narazaki198 Silvia Galvão Bueno Cintra Franco199 Sumiho Saito

 20 0  Tabir Pirajá deMacedo 20 1  Takashi Suzuki

 20 2  Tohoma Iosio 20 3  Toyohiko Hirano 20 4 Valdemar Aparecido da Costa 20 5 Valdir Radianti 20 6  Valdira Pereira Batista 20 7  Valdivino Paulo Macário 20 8 ValentimGago Rodrigues Junior 20 9 VicentedeMola Careli 210 VicenteManoel Aricó 211 VicenteScardovelli Neto 212 Virgulino Nogueira Neto 213 Vitor Sapienza 214 Wagner Dalla Costa

 215 Waldemar Grau 216  Walter Martini 217  Wilson Friol 218 Wilson Xavier deFarias 219 Zadok dePaula Raphael

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SINAFRESP

D I R E T O R I A

 T R I ÊN I O 1998-2000

PRE S IDE N TE:

David Torres

V I CE-P RE S IDE N TE:

Benedito Franco da Silveira Filho

SE C RE TÁ R IO GERAL :

Décio Brites

SE C RE TÁ R IO -AD J U N T O :

Pedro Rosálio da Cunha Pereira

 T ESOUREIRO :

Luiz Antonio Moroni Amorim

ASSUNTOS I N T E R S I N D I C A I S:

Regina Soares Toledo

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H

á quinhentos anos começavam a ocorrer ospreparativos práticos e abstratos que permiti-

ram a alguns europeus enfrentar o OceanoAtlântico e chegar às terras, até então, por eles desconhe-cidas. Porém, não podemos imaginar que uma iniciativadesse porte tivesse sua origem somente nos instantesimediatos que antecederam a saída para o mar.

Podemos supor que, para ser concebida, essa idéia foiprimeiramente engendrada nos séculos anteriores à en-trada propriamente dita no Oceano, com destino ao des-conhecido. Dessa forma, o que se convencionou chamarde “grandes descobrimentos” (do ponto de vista pura-mente europeu) foi resultado das ações de homens e mu-lheres que encontraram as possibilidades históricas emsuas formas mais maduras, ou, dito claramente, podiam

contar com um já despertado interesse pelo desconheci-do, com a noção de relatividade que se unira ao seu con-vívio, desde os questionamentos científicos que punhamem conflito a crença católica do geocentrismo e, final-mente, com a existência de outros homens e mulheres su-ficientemente poderosos para apoiá-los e financiá-los.

No princípio, o Brasil não era considerado por Por-tugal como algo valioso, pois, embora o território adqui-rido pela Coroa portuguesa fosse imenso, não trouxe ainesperada sorte econômica obtida pelos espanhóis emsuas conquistas do Peru e México. Muito tempo se pas-sou para que a terra recém-aportada pelos portugueses

possibilitasse algum retorno financeiro à Metrópole. Omesmo não se pode dizer das práticas tributárias, umavez que estas podem ser observadas logo nos primeirosinstantes da exploração do pau-brasil em nosso país, istoé, no século XVI.

Os quinhentos anos que nos separam do desembar-que português em nosso país nos permitem deter o olharem vários aspectos sócio-culturais que amadureceram aolongo destes séculos. O estudo da prática tributária, àluz da história do Brasil, contribui igualmente para quese possam e, quem sabe, se julguem os elementos quechegaram aos nossos dias.

Com a certeza de que para entender o presente e tri-lhar o futuro deveríamos, antes de mais nada, ler o pas-sado, nós, do SINAFRESP, resolvemos contar a Histó-ria dos Tributos no Brasil. Através dessa obra, procura-

mos ler a trajetória brasileira sob o enfoque dos tributoscobrados em cada época, procurando contextualizá-la

segundo suas necessidades e perspectivas do momento.À medida em que os capítulos do livro eram pesqui-sados e escritos, foram surgindo uma série de surpresas efatos interessantes envolvendo os tributos cobrados noBrasil, que revelaram, de forma surpreendente, o funcio-namento de nossa sociedade.

Hoje, no instante em que muitos buscam um mode-lo tributário mais justo, eficaz e transparente, o livroHistória dos Tributos no Brasil pretende, quiçá, contri-buir com o momento presente, expondo aquilo de quenós não podemos escapar: a nossa herança histórico-cul-tural.

Com a produção e lançamento deste livro, desejamos

manifestar nossa satisfação pela contribuição oferecidaao aprofundamento dos conhecimentos sobre as diferen-tes políticas tributárias adotadas pelo Brasil. Ao mesmotempo, esperamos que os relatos contidos nesta obrapossam auxiliar na elaboração de um novo modelo fiscal,no qual predominem os princípios da justiça, da eqüida-de, da simplicidade e transparência. Se, ao final, o leitor,profissional do Fisco ou não, tiver mais elementos capa-zes de justificar que o Estado precisa dos recursos gera-dos pelos tributos para prestar serviços e realizar políti-cas sociais, evidentemente nos daremos por satisfeitos.

Para finalizar, cabe ressaltar a valiosa colaboração de

todos quantos contribuíram para a concretização desteprojeto, em especial, a parceria com o Banco do Estadode São Paulo e os contribuintes individuais, cuja relaçãofizemos questão de inserir no livro, para que fique per-petuado o nosso agradecimento.

Estamos cientes de que esta obra é uma valiosa con-tribuição à preservação da memória do Fisco brasileiro,um trabalho de valor histórico e uma fonte de qualidadepara consultas sobre a questão tributária no Brasil.

São Paulo, 22 de abril de 2000 

 D av id T orresPresidente doSINAFRESP 

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O gosto da maravilha e do mistério, quase inseparável da literatura de viagens na erados grandes descobrimentos marítimos, ocupa espaço singularmente reduzido nos escri-tos quinhentistas dos portugueses sobre o Novo Mundo. Ou porque a longa prática dasnavegações do Mar Oceano e o assíduo trato das terras e gentes estranhas já tivessemamortecido neles a sensibilidade para o exótico, ou porque o fascínio do Oriente ainda ab-sorvesse emdemasia os seus cuidados, semdeixar margema maiores surpresas, a verdade

é que não os inquietam, aqui, os extraordinários portentos, nema esperança deles. E opróprio sonho de riquezas fabulosas, que no resto do hemisfério há de guiar tantas vezesos passos do conquistador europeu, é emseu caso constantemente cerceado por uma no-ção mais nítida, porventura, das limitações humanas e terrenas.

(S érgio Bu arque de H olanda, Visão do Paraíso,

5ª ed., São Paulo, Brasiliense, 1992, p. 1)

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Concebido o direito positivo como objeto domundo da cultura, sua historicidade será presençainafastável do correspondente processo cognosci-tivo. A camada de linguagem prescritiva, voltada

para a região das condutas interpessoais, com opropósito de discipliná-las implantando valores, aque chamamos de ordenamento jurídico, surge nocontexto social como gradativo depósito de obje-tivações históricas.

Com efeito, as oscilações semânticas por quepassam os signos idiomáticos no seio da socieda-de têm que ser acompanhadas evolutivamente, parapodermos compreender o objeto cultural “direi-to”, na plenitude de seus conteúdos de significa-ção. Isso implica, desde logo, reconhecer que aconstrução da norma jurídica se acha condiciona-da por situações factuais que organizam o contor-no existencial do sujeito da interpretação, a partirdas quais se inaugura o percurso gerativo de senti-do. Mais. Que a sucessão cronológica dos aconte-cimentos seja devidamente investigada, tomando-se como ponto de referência as circunstâncias mes-mas que cercaram a edição da norma interpretada.

No que tange ao direito tributário, como or-dem posta, tudo se passa da mesma maneira. O vo-

cábulo “tributo”, que já experimentara acepçõesfrancamente negativas, como instrumento deopressão e de discriminação social, atravessou osséculos, vivendo-os intensamente, para assumir,nos dias atuais, a configuração de um valor carís-simo, em que são punidos os comportamentosvioladores do mesmo modo como se tutela o valor“vida humana” ou se protege a integridade físicadas pessoas. Nessa linha, é uma constante das le-gislações modernas a preocupação com o fiel cum-primento dos deveres jurídico-tributários por par-

te dos destinatários, o que representa, por outroângulo, a luta sempre viva para dar eficácia aosmandamentos legais.

12 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

Pr e f á c i o

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É preciso dizer que o sistema de direito positi-vo está imerso na realidade social, de tal sorte queo domínio do jurídico somente aparece aos olhosdo interessado por efeito de um corte de linguagem

que isola aspectos e seleciona caracteres. Para com-preendê-lo, todavia, torna-se imprescindível recu-perá-lo na sua dinâmica existencial, momento emque o ponto de vista histórico passa a ser decisivo.

Analisados os processos de produção normati-va, surpreendidos no plano empírico-social, trava-remos contato com tudo aquilo que, direta ou in-diretamente, teve o condão de influir para a for-mação do ato volitivo que atingiu o nível de inten-cionalidade e objetividade.

Ora, a conturbada trajetória dos sistemas tribu-

tários brasileiros, desde o tempo do descobrimentoaté hoje, é uma função nítida dos acontecimentoshistóricos pelos quais passamos, gerando instabili-dades e insatisfações que acabaram, teimosamente,por provocar baixos índices de eficácia social.

Muito bem. Todo país deve ter orgulho de suahistória, síntese de conquistas e de realizações,mas também repositório dos malogros e dos fra-cassos que a progressão do tempo implacavelmen-te registra. E o Brasil tem muito para celebrar nes-tes quinhentos anos de existência: a integridade deseu território, defendido ardorosamente em cir-cunstâncias memoráveis e expandido por feitos degrande coragem, assim como por eficientes mano-bras diplomáticas; a unidade da língua, falada domesmo modo em toda a extensão do país; a inte-gração das três raças fundantes da nacionalidade,bem como o modo afável como os brasileiros re-ceberam as correntes migratórias; a enorme criati-vidade expressa em sua música popular, tanto namanifestação idiomática, quanto na profusão de

gêneros e de ritmos. Tais conquistas, certamente,seriam motivo de júbilo para qualquer nação. Mas,a história não pode passar por alto pelos gravesproblemas que nos afligem. Ninguém pode con-formar-se com a má distribuição da riqueza, como débito imenso do Estado, com a insegurança pú-blica, com o descuido acerca de providências bási-cas em termos de saúde e educação, com as pági-nas lamentáveis dos golpes políticos, da tortura,do atraso na assistência social e, sobretudo, com amancha inextinguível de ser o Brasil considerado o

maior império escravista da história da humanida-de. Nesse campo, aliás, aquilo que nos consola éverificar que nunca houve povo que não fizesse

inscrever na sua história acontecimentos sobre osquais, mais tarde, viesse a se envergonhar. Sendoassim, o máximo que se pode almejar é a tomadade consciência dos cidadãos do presente, a respei-

to dos erros cometidos no passado. A marcha dotempo, contudo, provoca uma síntese inevitávelporque o processo histórico é necessariamentecontínuo e a avaliação não pode deter-se apenasnos aspectos negativos.

Com todos os sofrimentos, o Brasil segue suacaminhada em direção ao futuro; e aos brasileiroscumpre conhecer sua história, para nela compreen-der sua identidade cultural.

Pelo que foi dito, não posso menos do que elo-giar, de maneira efusiva, a iniciativa desse projeto,

que contou com o apoio efetivo do MEC e foiconduzido de modo competente pelos pesquisa-dores Plínio José Labriola de Campos Negreiros eFernando José Amed.

Nutro a convicção de que esta obra, empreendi-da com seriedade de propósitos, trará muita luzpara a compreensão dos tributos no Brasil, tomadosno seu paulatino processo de implantação, exibindoos defeitos estruturais que em muitas oportunida-des puderam ser verificados, mas também os expe-dientes utilizados no passado para corrigi-los. Opresente trabalho tem a virtude de convocar a aten-ção dos estudiosos para as múltiplas tentativas queforam feitas, para a variedade de técnicas impositi-vas concebidas com o fim de imprimir-lhes eficáciae para a montagem de um quadro que nos oferecevisão ampla e real dos sistemas tributários que ex-perimentamos, sacados da alma de nossa história.

Os especialistas e todos aqueles que porventu-ra se interessem ou venham a se interessar por te-mas tributários ficarão, tenho certeza, devedores

dessa iniciativa brilhante do Sinafresp – Sindicatodos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de SãoPaulo, pela contribuição valiosa para o conheci-mento da matéria e pelas referências históricas quea envolvem em toda a extensão do livro.

São Paulo, 22 de abril de 2000 

Paulo de Barros Carvalho 

Prof. Titular de Direito Tributário da USP e PUC/ SP Advogado 

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Comecemos com um lugar-comum: é imensa e

complexa a diversidade do gosto humano. Desdeque mundo é mundo, criamos uma escala de valo-res subjetivos que nos fazem gostar ou detestarpessoas, coisas, instituições e produtos. Pouquíssi-mas são as exceções neste curioso departamento dacondição humana. Há gente que gosta de sofrer,de música caipira e de quiabo. Tudo bem. O quenunca se viu – nem se verá – é algum alucinadoque goste de pagar tributos.

Nem por isso eles deixam de ser necessários,vindos da quase pré-história da humanidade. A or-ganização social exigia um custo que teria de serpago necessariamente por alguém. Ou por todos –e aí temos a origem do tributo tal como hoje o co-nhecemos.

O grande argumento contra o tributo, que jus-tifica a malquerência universal, está ligado à do-bradinha custo-benefício. Sim, paga-se o tributo,mas qual o meu lucro, ainda que indireto?

Nasce daí, certamente, a constatação de que ahistória do tributo é, de certa forma, a própria his-

tória universal. Os impérios da Antigüidade se for-maram e se mantiveram por conta da cobrança detributos. Grécia e Roma ocuparam a pole positionda era clássica pelo mesmo motivo: a força militarnada mais era do que a conquista e a manutençãodo direito de cobrar tributos.

Para não alongar esta consideração vinda de umnão-especialista, pulemos para o caso brasileironos seus 500 anos, que estamos comemorando.Após a fase do Descobrimento, quando predomi-nou a simples rapina, surgiu a necessidade de or-

ganizar, ainda que precariamente, a sociedade quese formava em segmentos éticos e étnicos hetero-gêneos.

14 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

a C És a ro q u e é d e c é s a r

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Não tivemos a fase de Conquista mas de Des-cobrimento ou de Achamento – como hoje estámais ou menos aceito. Portugal era um reino quevivia sob a proteção de um império – o da Ingla-

terra. Ao descobrir (ou achar) uma vasta Colônia,tentou um aprendizado imperialista e, como tudoneste mundo tem um preço, organizou um sistemade tributos que daria para as despesas.

Foge ao nosso assunto analisar essas despesas.Mas a história do Brasil nasce exatamente dessadesproporção entre o tributo e o benefício. Duasrevoltas premonitórias de nossa independência es-tão vinculadas à truculência do tributo colonial.Filipe dos Santos e Tiradentes, na mesma cidade epelos mesmos motivos, pagaram com a vida a luta

contra aquilo a que chamavam de voracidade dofisco.

 Tecnicamente, creio eu, tributo e imposto de-vem ser diferentes. Na geléia geral do dia-a-dia, ocidadão comum não difere um do outro. É obriga-do a pagar, seja de forma declaratória – como oimposto de renda – seja de forma obrigatória,como os tributos que estão de alguma forma em-butidos em tudo que é produzido, vendido ouconsumido.

Bem administrados em suas diversas etapas(criação, recolhimento e distribuição de benefí-cios), os tributos formam a espinha dorsal do Es-tado, que dá sustentação à Nação, aqui entendidacomo a instituição soberana de um povo. Daí apolêmica que até hoje prevalece sobre aquela pas-sagem do Evangelho em que Cristo, provocado pornacionalistas judeus da época, recomendou dar aCésar o que é de César. Acrescentando: e a Deus oque é de Deus.

Era, sem dúvida, uma submissão provinciana ao

poder de Roma. Mas o sentido de sua mensagemprocurava ser intrinsecamente espiritual, um divi-sor mecânico, geográfico, entre a transcendência ea contingência. De qualquer forma, é ainda umareferência obrigatória quando se pensa em tributo.

Para fazer funcionar uma sociedade, por primi-tiva que seja, é necessário um código aceito por to-dos – ainda que detestado por todos. Pressupõe-seque César seja um ideal, um mal necessário namaioria dos casos. Em nome dele os tributos serãocriados, cobrados e distribuídos em bens e servi-

ços que farão o patrimônio de todos.Evidente que a biografia do tributo, ao longoda história, não é edificante. Tampouco a história

o é. Mas o mundo moderno, após descaminhostrágicos, parece centrar-se em torno de estruturasdemocráticas que, em tese, são capazes de equili-brar o desafio custo-benefício da carga tributária

de cada país.Para isso, nada mais salutar do que conhecer asidas e vindas do tributo, suas excrescências e suasexcelências, sua necessidade, enfim. Periodicamen-te, surgem movimentos untados de boa vontadeque pregam desde a abolição do Estado até a eli-minação de sua manifestação mais antipática, queé a cobrança de tributos. As alternativas apresen-tadas, pelo menos até agora, são fantasticamenteirrealizáveis.

Ao longo do tempo, sociedades de cunho reli-

gioso ou político ensaiaram um tipo de comunida-de em que a cada um seria dado de acordo com asua necessidade. Em universos pequenos, limita-dos no número e no espaço, a experiência foi rela-tivamente bem-sucedida. Mas nem por isso o tri-buto foi abolido: cada um contribuía de algumaforma com alguma coisa para que todos partici-passem do patrimônio comum.

Esse é o conceito fundamental do tributo: suanecessidade e não sua malignidade.

Carlos Heitor Cony 

15

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16  h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

Su m á r i o

APRESEN TAÇÃO

Per í o d o

Pr é-Co l o n i a l ,

1500-1530

 

A pr i m ei r a

et a pa d a

c o l o n i z a ç ã o ,

1530•1580

A f o r m a ç ão

d o g o v er n o -

g e r a l

A at i v i d a d e

ec o n ô m i c a e

a po l í t i c a

t r i b u t á r i a

O Pr o c e sso d e

EM ANCI PAç ÃO

POLÍTICA,

1808•1822

 

O Pr i m ei r o

Rei n a d o ,

1822•1831

Per í o d o

Reg en c i a l ,

1831•1840

 

o seg u n d o

r ei n a d o ,

1840•1889

pr i m ei r a

Rep ú b l i c a ,

1889•1930

Sí n t ese d o s

t r i bu t o s n o

Br a si l

C o l o n i a l

  

M o n a r c a s

po r t u g u eses

d u r a n t e o

per í o d o Br a si l

C o l o n i a l

  

Au t o r i d a d es

f i s c a i s

d u r a n t e

o p er í o d o

Br a si l

C o l o n i a l

  

D a d o s

h i st ó r i c o s

so b r e a s

a l f â n d e g a s

  

D a d o s

h i st ó r i c o s

so b r e a

p r o v e d o r i a -

m o r d a

Fa z en d a r ea l

 

Tr i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•1822

Tr i b u t o s d o BRASI L i m per i a l - 1822•1889 Tr i bu t o s

An ex o s

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17 

Un i ã o I bér i c a ,

1580•1640

 

Seg u n d o

Per í o d o d a

C o l o n i z a ç ã o ,

1640•1808

 

SÉCULO XVI I I :

OPRESSÃO

FISCAL E

RESI STÊN CI A

DOS COLONOS .

m i n er a ç ã o e

o a u g e d a

ex pl o r a ç ão

c o l o n i a l

A c o n j u r a ç ã o

m i n ei r a e a

d e r r a m a

 

A c r i aç ã o d o

i m po st o d e

r en d a

 

a Er a Va r g a s,

1930•1945

 

a Rep ú b l i c a

Po p u l i s t a ,

1945•1964

o r eg i m e

m i l i t a r ,

1964•1985

Br a si l

c o n t em po r ân eo ,

1985•2000

Aspec t o s

g e r a i s d a

ev o l u ç ã o d o

si s t em a

a d u a n e i r o d o

Br a si l

 

Fo n t es e

Bi b l i o g r a f i a

 

d o BRASI L r epu b l i c a n o

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18 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

O que sobrava ficava naColônia, para pagar as despesasda administração das terras

“achadas”, exatamente paraexplorar as suas riquezas e nãopara construir uma nação.

O Brasil vive mergulhado numa crise estrutu-ral e, para sair desta situação, precisa fazer refor-mas de base, dentre elas, a reforma tributária. Aomesmo tempo, a revisão do real papel do Estado,nas suas várias esferas de atuação, é reclamadatanto pela sociedade em geral, quanto por um nú-mero crescente de pessoas que detêm responsabi-lidade de poder na vida pública. O Estado preci-sa de dinheiro para investir e cumprir seu papel deprestador de serviços ao cidadão. Diante desteimpasse, urge saber por quem e como os tributosvão ser pagos. Os trabalhadores, assim como aprodução geradora de empregos, não podem maisser penalizados por taxações abusivas. O capitalespeculativo, extremamente volátil, precisa de

freios, que podem se concretizar com uma tribu-tação mais significativa. Mas essa reforma nãopode ser determinada por avaliações equivocadas arespeito do papel do Estado, que não mais terianecessidade de intervir no processo de desenvolvi-mento econômico da nação, nem mesmo discipli-nar o mercado. O balizamento da reforma teriaque se ater, no mínimo, às seguintes premissas: 1.recuperação da credibilidade dos gestores das fi-nanças públicas; 2. garantia de um fluxo adequadode recursos capaz de viabilizar as funções do Esta-

do; 3. simplificação da legislação e de normas bu-rocráticas, que oneram o contribuinte e a arrecada-ção; 4. transparência e eqüidade; e 5. garantia de-

mocrática de autonomia financeira dos Estados eMunicípios. O fisco também precisa de uma refor-ma, com a valorização profissional e técnica dosseus agentes.

Contudo, um modelo tributário com essas ca-racterísticas não será alcançado com fórmulas mi-lagrosas, nem atropelando o nosso sistema federa-tivo. Nesse sentido, o que se espera do CongressoNacional é uma reforma compatível com os novostempos. Essas idéias parecem estar presentes emquase todos os discursos e debates sobre a questãotributária no país, mas, na hora de formular onovo modelo, não há consenso. Só em um pontoparece haver entendimento. É quanto à complexi-dade e anacronismo do atual sistema. Na verdade,

desde a promulgação da Carta de 88, busca-se re-formular a nossa política tributária, sem que se te-nha obtido sucesso.

Enquanto a referida reforma não vem, os diver-sos segmentos da população brasileira sentem osefeitos danosos de uma legislação tributária con-fusa e injusta, que consagra um sistema regressivode impostos, no qual temos um desnível cada vezmais acentuado entre os tributos diretos, corres-pondentes a menos de 1/ 3 da carga tributária, e osimpostos indiretos, equivalentes a mais de 2/ 3 detoda a arrecadação do país. Portanto, o oposto dasnações mais desenvolvidas, onde existe uma distri-buição da renda mais justa.

Para agravar ainda mais essa desigualdade, a so-negação praticada por aqueles que podem pagarmais é um fato concreto. As isenções e a renúnciafiscal acentuam privilégios de alguns setores, en-quanto outros pagam mais do que podem. E o queé pior: não vêem suas contribuições sendo reverti-das em benefícios sociais.

Para complicar este quadro repleto de proble-mas, a maioria dos Estados brasileiros, nos últi-mos anos, passou a praticar a chamada “guerra fis-cal”, abrindo mão de impostos em favor de gruposempresariais, com a justificativa de atrair investi-mentos industriais, sem considerar os prejuízoscausados à população e os efeitos perversos deuma concorrência predatória entre empresas deum mesmo ramo da produção. É fácil perceber quese trata de uma guerra sem vencedores, exceto osgrupos beneficiados, que usam os mecanismos

oferecidos por essa guerra para reduzir custos pri-vados de produção às expensas do Estado e da so-ciedade. Assim sendo, privatizam-se os escassos

h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

p r ó l o g o

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recursos públicos e induz-se à localização de em-presas em lugar errado do ponto de vista econômi-co, o que vem contribuir para agravar ainda mais ochamado “custo Brasil”.

Por isso, cresce, na população, o sentimento deque a reforma tributária pode vir a ser o instru-mento adequado para remover os obstáculos exis-tentes no caminho do Brasil rumo ao seu desen-volvimento e à superação da crise econômico-fi-nanceira crônica, causada, principalmente, pelodesajuste das contas públicas. Muitos brasileiros aí depositam toda a sua confiança. Acreditam que acapacidade produtiva do país poderá, enfim, liber-tar-se das amarras que impedem mais da metadeda população de participar do mercado consumi-

dor e de sair da situação de pobreza absoluta emque vive.

Porém, é bom registrar que para muitos contri-buintes, a simples menção de uma reforma tribu-tária soa como mais uma forma escamoteada deaumentar impostos e elevar a carga tributária.Acostumados com tributos de variadas espécies,contribuições para diferentes fins, taxas de váriasnaturezas, esses cidadãos, muitas vezes, são toma-dos de surpresa e, em razão disso, acabam vendo oimposto como sinônimo de expropriação, devido àfalta de legitimidade de um sistema que arrecadamuito e pouco devolve ao povo. Essa prevençãodos contribuintes se baseia em contingências his-tóricas, em precedentes que os levam a perder a di-mensão da importância dos tributos para as socie-dades organizadas enquanto instrumentos de sus-tentação da administração estatal, de financiamen-to dos serviços públicos e de execução de obras deinfra-estrutura. Ou seja, uma série de distorçõesna forma pela qual os tributos são usados no Bra-

sil acaba gerando desconfiança e descrença a res-peito dos efeitos de uma reforma tributária. Daí asreações negativas ante o Estado como instituiçãoarrecadadora de impostos. Quem paga nunca estásatisfeito com a obrigação de contribuir; mas tam-bém o Estado nunca está satisfeito com o que re-cebe, porque gostaria de aumentar a sua receita; equem espera receber os benefícios de uma políticatributária que, em tese, deveria servir ao interessepúblico, considera-se lesado diante da má qualida-de dos serviços prestados à população.

Diante de tudo isso, talvez parecesse de menorimportância reconstruir a história dos tributos noBrasil desde a chegada dos portugueses, no ano de

1500. Mas não é. Conhecer como os colonos bra-sileiros acertavam suas contas com o poder colo-nial no século XVI é importante. Saber que os im-postos pagos em espécies existiram até há poucas

décadas também é fundamental. Conhecer deta-lhes sobre a cobrança do dízimo pela Igreja Cató-lica, através do Estado português, poderia mudarnosso comportamento diante da maneira comopagamos determinada taxa por algum serviço pres-tado pelo Estado laico atual. Enfim, vale a penaconhecer a história dos tributos nos dias de hoje,pois mais do que trazer ensinamentos diretos econcretos, os conhecimentos históricos permitemque um povo tenha mais elementos para se auto-compreender. O passado pode ser um desses ele-

mentos. Por exemplo, saber que muitas rebeliõesforam organizadas e levadas adiante, em protestocontra a exploração tributária. Isso nos dá a per-cepção de quanto a reação popular é capaz de re-verter situações de opressão.

É a história que registra como cada colono doBrasil, sob as ordens da Coroa portuguesa, foiobrigado a conviver com uma política fiscal injus-ta, que não respeitava nem a capacidade contribu-tiva das pessoas, nem era seguida de uma lógicaclara. Tributava-se com o intuito de remeter amaior parte dos valores arrecadados para a Metró-pole. O que sobrava ficava na Colônia, para pagaras despesas da administração das terras “achadas”,exatamente para explorar as suas riquezas e nãopara construir uma nação.

Estes antecedentes históricos apontam na dire-ção de significativas mudanças, a partir das últi-mas décadas do século XVIII, quando o sistemacolonial passava a ser cada vez mais questionado.Nascia e crescia uma resistência consubstanciada

na Conjuração Mineira, rebeldia muito ligada àquestão tributária. Essa crise do colonialismo noBrasil, também presente em outras regiões daAmérica, encaminhou o país para a sua emancipa-ção política em 1822. A emancipação econômicanão aconteceu e continua inconclusa até os dias dehoje.

Assim, olhar para a história do Brasil, tendocomo referência principal a questão tributária,permite dar maior atenção a essa mesma questãono momento atual vivido pelo país, além de ofere-

cer uma contribuição para o debate acerca dos 500anos passados, desde a chegada dos portugueses àBahia de Todos os Santos.

19

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20 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L20 h ist ó r ia d o s TRIBUTOS n o BRASIL

 A ssim, pensar a H istória do Brasil significa buscar os elementos pr imários de sua configuração geográfica e de sua constit uição como nação na formação do Estado N acional português, cuja origem vem do século X II , ganhando plenaestrutura a par tir do começo do século X V, quandoinicia a sua ex pansão ultramar ina que, ao final  desse mesmo século, levar ia a frota mar ít ima portuguesa às terras que mais tarde seriam conhecidas como Brasil.

apr esen t aç ão

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A origemdos tributos,a formação do Estado Nacionalportuguês, a descoberta do

Brasil e as políticastributáriasadotadasdesdeo descobrimento.

A origem dos tributos na história da humanida-de está relacionada com o aparecimento do em-brião do Estado. Esta instituição, ao separar os go-vernantes dos governados, fez com que outra sériede instituições dentro do aparelho estatal fossecriada. Uma administração pública, uma força mi-

litar, além de obras públicas. Era necessário queparte da riqueza produzida pela população fossetransferida para um soberano ou agente público;isso dava-se através da tributação. Os governantesprimitivos faziam pressão no sentido de legitimaressa cobrança, ligando-a ao caráter divino do poderpolítico, ou justificando-a com a proteção que estesoberano dava aos súditos em caso de conflitoscom outros povos, o que realmente ocorria.

O fato é que a tributação, em modelos próximosao que aplicamos hoje, só pode ser compreendidadentro de uma estrutura de poder coercitivo. Assim,quando das comunidades primitivas, ou seja, antesdo aparecimento das Cidades-Estado, não havia ne-cessidade da tributação, pois não havia a concepçãode propriedade privada, sendo que os bens erampraticamente coletivos e a riqueza advinda do traba-lho – ao utilizar-se da natureza – era dos trabalha-dores, sem qualquer forma de expropriação.

A possível igualdade de bens entre as pessoas im-pedia – entre outros efeitos – que umas mandassemem outras. Exatamente para se evitar a divisão entregovernados e governantes, para que não houvesse a

criação de uma instituição que separasse os homens,diferenciando-os quanto aos poderes político e eco-nômico. Nessa comunidade primitiva não havia es-paço para os tributos. Assim, é mais seguro creditar

ao aparecimento do Estado a origem da tributação.Esta instituição precisava ser mantida com recursosadvindos de uma população sob seu domínio e pro-teção. Dessa forma, mais do que pagar para que setivesse proteção contra povos inimigos, parcela daresponsabilidade relativa aos tributos deve-se à con-cepção de que o soberano – considerado muitas ve-zes um ser divino – precisava ser sustentado comgrande luxo, devido a essa condição divina. Alémdisso, a natureza pertencia a esse soberano, sendoque os tributos passariam a ser vistos como uma

parte dos frutos retirados dessa natureza. Seria umaespécie de aluguel pela utilização da posse alheia.

O tributo das sociedades antigas que mais raí-zes deixou foi o dízimo, que tem as suas origensquase perdidas, pois “entre os hebreus, segundo aLei Mosaica, deviam ser tributados os dízimos eprimícias para o culto divino. Entre muitos povosantigos, prevalecera o costume de ofertar a décimaparte dos bens da terra para o culto da divindade,ou seja, ao príncipe e ao sacerdote que o represen-tava ou o ministrava”.1

Dessa maneira, os dízimos estiveram presentesem quase todas as sociedades do Mundo Antigo.Daí que, “no Egito, pagavam-se ao príncipe os dí-zimos dos produtos da terra, no tempo dos Ptolo-meus, e provavelmente também na época dos anti-gos Faraós. Quando José anuncia ao Faraó sete anosde abundância a que seguirão sete outros de cares-tia, ele lhe recomenda receber durante os sete pri-meiros anos o quinto dos produtos da terra, isto é,o duplo dízimo, na previsão do período seguinte,durante o qual não seriam possíveis os impostos.” 2

21

 N essa com unidade pr i mi t iva não hav iaespaço para os t r ibutos. A ssim, é mais segur o cr ed i t ar ao apar eci ment o do Es t ado

 a or igem da t r i bu t ação.

 .. . set e anos de abu ndância a qu e segui r ão set e ou t ros de car est i a, el e lhe

 recom enda receber durant e os set e pr imei r os anos o qu int o dos pr od u t os da

 t er ra, i st o é, o duplo d í z imo, .. .

1 Oscar de OLIVEIRA, O s D ízim os Eclesiásticos do Brasil , p. 19.2 Idem, ibidem.

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Nas várias etapas da história do povo hebreu,em parte retratada pelo Antigo Testamento, os dí-zimos sempre são citados como a principal formade tributação.

Em relação à Antiguidade, porém, o papel eco-nômico exercido pelos hebreus nunca foi de gran-de destaque. Apesar de uma região marcada poruma série de conflitos – muitos determinados pelalocalização geográfica estratégica –, as grandes ci-vilizações dessa época encontravam-se em outrosespaços. De fato, dentre os povos e impérios pode-rosos que dominaram espaços enormes durante sé-culos, a grande evidência do Mundo Antigo foiRoma. Nesta civilização, a questão tributária teveum peso importante, mesmo porque o tamanho

desse império condicionava o estabelecimento deuma política fiscal bem mais organizada. Aliás,veio daí, especificamente, o termo em questão,pois “a palavra tributo vem do latim tributum,-i,cujo verbo tributo, -ere significa ‘dar, conceder, fa-zer elogios, presentear’. Designava primitivamenteas exigências em bens ou serviços que as tribosvencedoras faziam às tribos vencidas. Posterior-mente, essas exigências passaram a ser feitas à pró-pria sociedade”. 3

Roma notabilizou-se pela cobrança de impos-tos dos seus cidadãos, mas, principalmente, arre-cadava-os dos povos submetidos ao seu poder. Asua prática expansionista organizava-se a partir dosaque de outras regiões, com a escravização dosvencidos e a cobrança de tributos. Internamente,“o tributo era o principal imposto pago pelos ci-dadãos romanos. Durante a República esse impos-to foi cobrado em ocasiões de guerra, cabendo aoSenado votar a parte que o cidadão, de acordocom as suas posses, deveria contribuir. O tributum

era considerado, então, um empréstimo, e o cida-dão seria reembolsado assim que a presa de guerraou as contribuições do vencido permitissem. Apósa conquista da Macedônia (168 a.C.), o tributumfoi definitivamente extinto para os cidadãos roma-nos, provavelmente porque os tributos que a Ma-cedônia devia pagar à Urbe (Roma) permitiam li-berar os romanos desse dever.” 4

Muito ligado ao termo tributo, que hoje tem oseu significado ampliado a todas as obrigações fis-

cais que uma população paga ao Estado, fisco tam-bém se refere à questão tributária e tem a sua ori-gem ligada ao Império Romano. Assim, “o termofisco vem de fiscus,-i, que era o cesto de junco ou

de vime em que o coletor de impostos romano iacolocando o dinheiro público que recolhia. Já notempo de Cícero, famoso líder político da RomaAntiga, que viveu entre 106 a.C. e 43 a.C., o fiscodesignava, por metonímia, o conteúdo, o próprio Tesouro Público”. 5

Genericamente, é possível afirmar que os povosantigos arrecadavam tributos através da cobrançainterna e sobre povos dominados. Grande parte dasobrevivência do Império Romano – assim comodos grandes impérios da Antiguidade – vinha da

exploração dos povos que haviam sido derrotadosmilitarmente.

Internamente, a cobrança de tributos recaía, emgeral, sobre a importação de mercadorias, agríco-las ou não, como é o caso das civilizações próxi-mas ao Mediterrâneo. No caso do Egito, tambémse cobravam impostos sobre a propriedade da ter-ra, cujo valor dependia da extensão da mesma.

O fim das civilizações antigas, centradas nadesorganização do Império Romano, trouxe parao mundo ocidental a experiência do Feudalismo.Este sistema apresentou a marca especial da com-pleta descentralização político-administrativa. Ouseja, a base de organização desse sistema era ofeudo, em que uns tinham grande autonomia pe-rante os outros, isto é, não havia o Estado centra-lizado. Dessa maneira, as práticas tributárias fo-ram severamente transformadas, mas nem por issodeixaram de manter seus aspectos violentos eopressivos.

Na ordem feudal, a sociedade dividia-se entre o

servo da gleba e o senhor feudal. Em cada feudo,havia as terras dos servos – que tinham a possepermanente sobre elas – e as terras senhoriais.Para que os servos fossem protegidos – entre ou-tras questões –, estes deviam certos direitos ao se-nhor feudal. São os conhecidos direitos senhoriais.Nestes, apresenta-se o direito de cobrar parte daprodução do servo para que este se utilize das ins-talações do feudo, como era o caso das pontes, dasestradas, dos fornos e dos moinhos.

22 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

3 Sílvia Cintra FRANCO, D in heir o P ú bli co e C id ada n ia , p. 18.4 Idem, ibidem.

5 Idem, ibidem.

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As principais obrigações devidas ao senhor feu-dal eram a Corvéia – trabalho forçado de servosnas terras senhoriais; em geral, três dias por sema-na – e as Redevances – retribuições pagas em pro-

dutos ou dinheiro, como a talha (parte da produ-ção), banalidades (presentes obrigatórios), taxa decasamento (se o servo casava-se com mulher defora do Domínio), mão-morta (tributo pela trans-missão de herança). Também o dízimo era pagopara a Igreja Católica.

Na mesma Europa ocidental, a partir do sécu-lo XIV, com a decadência da ordem feudal, inicia-se uma lenta formação dos Estados Nacionais. Ouseja, cada feudo foi abrindo mão da sua autonomiaem nome da centralização político-administrativa,agora nas mãos de um rei absolutista. Este, o re-presentante do Estado – isto quando não se con-fundia com o próprio Estado –, tornou-se o en-carregado da cobrança tributária, a fim de que opoder público tivesse recursos para manter a má-quina estatal e para colocar o poder desse Estadoa serviço da expansão do capital. Caso exemplar éo das nações ibéricas, que financiaram as grandesviagens marítimas com o intuito de dominar novasáreas de comércio.

Assim, pensar a história do Brasil significa bus-car os elementos primários de sua configuração

geográfica e de sua constituição como nação naformação do Estado Nacional português, cuja ori-gem data do século XII, ganhando plena estruturaa partir do começo do século XV, quando se ini-cia a sua expansão ultramarina que, ao final dessemesmo século, levaria a frota marítima portuguesaàs terras que mais tarde seriam conhecidas comoBrasil.

Com estas considerações iniciais, pretendemosapresentar e discutir a história do sistema tributá-rio brasileiro desde a chegada dos portugueses ao

“ancoradouro de Porto Seguro”, até os dias atuais,tarefa de fôlego, que merece muito cuidado. Ini-cialmente, não se pode pensar a política tributária

de uma época sem uma compreensão geral do seucontexto. Ou seja, é necessário conhecer as preo-cupações que o poder público, e não só este, tinhacom a arrecadação de impostos e com o sentido

que dava para formas específicas de arrecadação devalores para a Fazenda pública.Para tanto, deve-se olhar tanto para a estrutura

econômica do país quanto para a administraçãopública, a fim de dimensionar quais as atividadesprodutivas que poderiam ser taxadas ou não. Tra-ta-se de perceber a capacidade e o potencial decada uma dessas atividades em contribuir com ofisco. E mais: além dos impostos diretos ou indi-retos, não se pode ignorar a existência de outrasmaneiras de se transferir riquezas produzidas pela

população para o Erário público.Neste processo de contextualização, depa-

ramo-nos com situações muito distantes daatual realidade, como o fato de, nos primeirosanos da colonização do Brasil por parte daMetrópole portuguesa, a circulação monetáriaser praticamente inexistente – situação quenão impedia a cobrança de impostos, mas quegerava a prática do pagamento dos tributos, namaior parte da vezes, em espécie, ou seja,como parte da própria produção. Essa cobran-ça em espécie, nesse momento da colonização,tornou-se muito mais interessante à Coroaportuguesa.

Ao mesmo tempo, essa contextualização per-mite que se compreenda o espírito do sistema tri-butário de cada época. De certa maneira, trata-sede adentrar o discurso oficial e entender como opoder público justificava cada uma das cobrançasque recaíam sobre a população. Por exemplo: nosprimeiros anos da colonização brasileira, havia

uma taxa adicional cobrada sobre produtos estran-geiros, além de um tipo de imposto de importa-ção. Essa taxa era uma espécie de pagamento porserviço cobrado, já que o governo português alega-va os perigos de se navegar pelo Atlântico, espaçodos ataques piratas.

Assim, se o contexto histórico permite com-preender as várias práticas tributárias existentes noBrasil, é preciso mapear cada um destes momentoscom as suas formas específicas de administração ede política tributária. Alguns cortes cronológicos,

ainda que tradicionais, podem ajudar nessa tarefa,que é a de reconstituir a trajetória dos tributos noBrasil.

23

 .. .ca da feudo foi abr indo mão da su a aut onom ia em nom e da cent ral i z ação

 pol í t i co- admini st rat iva, agora nas mãos de um r ei abs ol ut i st a.

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Ao pensá-los durante os dois primeiros séculosda colonização, é preciso olhar para cada uma dasvilas e cidades que foram formadas. Sem dúvida,torna-se impraticável conhecer a política tributá-

ria estabelecida pelas Câmaras Municipais especí-ficas de cada local – órgãos com poderes para de-cidir acerca das questões de fisco. Desta maneira,esta obra vai centrar a sua atenção nos primeirosanos da colonização, sobre os tributos de caráterregional, dada a possibilidade de acessar a docu-mentação pertinente.

 Tambémé impraticável elencar todos os impostose taxas que estiveram presentes no Brasil. Mesmocoma intenção de buscar a totalidade dos mecanis-mos tributários, a realidade aponta para a necessida-de de centrar a procura nos impostos e nas taxas maissignificativos. Assim, da mesma forma como aconte-ce hoje, existe uma infinidade de taxas, algumas mar-cadas pela extrema especificidade. É preciso deixarclaro que nemtodas as formas tributárias podemserencontradas.

Importa ressaltar que nossa preocupação maiorestá emresgatar, na medida do possível, a relação dapopulação comos tributos. Ou seja, não basta saberquais impostos e taxas foramestabelecidos, quais ór-gãos públicos o fizeramou quemera responsável pelaarrecadação. Urge conhecer os processos de resistên-cia às políticas tributárias, que poderiamse concreti-

zar na sonegação ou emuma rebelião. Enfim, é pre-ciso pensar emhomens concretos, dentro de umcon-texto histórico.

Dadas as considerações apresentadas, buscamosestruturar a pesquisa acerca da história geral dos tri-butos no Brasil aproveitando-nos dos cortes cronoló-gicos estabelecidos pela historiografia brasileira, que,mesmo sendo considerados tradicionais, permitemuma sistematização da questão colocada em foco.Cada umdesses cortes corresponde a determinadasestruturas políticas, administrativas, econômicas e

culturais que, por sua vez, apontarampara práticastributárias diversas. Nesse sentido, esta obra organi-za-se da seguinte maneira:

BRASIL COLÔNIA - 1500•1822

1500-1530 - Esse período é conhecido como Pré-Colonial, no qual a preocupação da Coroa portu-

guesa resume-se em manter a posse das terras“achadas” e fazer o reconhecimento das mesmas,mapeando as potencialidades da “Terra de SantaCruz”. Nesse período, ainda não havia sido inicia-da a colonização da América portuguesa, ao mes-mo tempo em que a principal atividade econômi-ca residia na extração do pau-brasil. Sobre essa ati-vidade, uma concessão da Coroa portuguesa, re-caíam impostos já existentes na legislação de Por-tugal. Ou seja, para se compreender essa práticatributária, especificamente, é inevitável conhecer a

formação do Estado Nacional português. Será nobojo deste evento histórico que o Brasil estará in-serido. Portanto, os tributos que irão recair sobreo Brasil-Colônia devem ser pensados enquantoprodutos de uma nação mergulhada no Mercanti-lismo e dependente da exploração colonial. Comotambém é preciso compreender que o Brasil nãofoi o primeiro espaço colonial dos portugueses,que aplicaram na América fórmulas de exploraçãode riquezas já utilizadas, por exemplo, nas IlhasAtlânticas, como Cabo Verde e Açores. Neste mes-mo período, o poder da Igreja também resultavana cobrança de impostos que beneficiavam estainstituição religiosa. Porém, o chamado períodoPré-Colonial, em função da quase ausência do po-der português nestas terras, não permitia ativida-des econômicas mais significativas, o que implica-va uma política tributária sem maiores relevâncias.

1530-1580 - Por vários motivos, principalmenteno que se refere ao temor de perder a posse dosseus domínios na América, a Coroa portuguesa

opta por iniciar a colonização do Brasil, processoque supunha o povoamento dessas terras. O go-verno português tinha clareza de que o Brasil só

 .. . da mesma for ma com o acon t ece hoj e,

ex is te uma inf inidade de tax as , a lgumas mar cadas pela ex t r em a especi f i ci dade.

 .. . as t er ras por t uguesas na A mér i ca , obj et o de desej o de vár ias naçõeseuropéias , que, por mui tas vezes ,

 t ent aram se est abelecer em par t es do t er r i t ór io por t uguês.

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se tornaria viável com uma atividade econômicaque possibilitasse uma renda para os que para cáviessem e para a Coroa. Se na América espanholaessa atividade rendosa foi a mineração, coube aos

domínios portugueses no Continente a produçãode açúcar não-refinado. E essa opção redundouem sucesso, permitindo que uma quantidade ra-zoável de riquezas fosse dirigida para a Metrópo-le. Esses fluxos monetários, ou mesmo em espécie,que deixavam o Brasil, eram verificados de duasformas básicas: através de impostos diretos ou in-diretos e com as relações comerciais sempre favo-ráveis ao Erário português. Vale ressaltar que osganhos preferenciais advinham das relações co-merciais e não dos impostos ou taxas. Ao mesmo

tempo, o processo de colonização obrigou os por-tugueses a estabelecerem no Brasil uma adminis-tração pública. Esta trazia gastos importantes, jáque os escolhidos não sairiam de Portugal paraganhar pouco em terras americanas. Neste senti-do, parte da arrecadação tributária visava à sus-tentação desses funcionários administrativos. Também eram necessários fundos para a constru-ção das cidades voltadas a essa administração.Ainda nesse período, como nos posteriores, aposse dessas terras não era algo inconteste, sendoas mesmas objeto de desejo de várias nações euro-péias, que, por muitas vezes, tentaram se estabele-cer em partes do território português. Em termostributários, a presença de estrangeiros – ingleses,holandeses, franceses ou espanhóis – e a sua pos-terior expulsão resultavam numa cobrança de no-vas taxas, sob a alegação da necessidade de se con-tratarem forças militares mercenárias, a fim decombater o inimigo invasor. Essa situação foi re-corrente nesse período, como foi recorrente tam-

bém a insatisfação dos colonos brasileiros, cansa-dos de pagar taxas sobre taxas, sempre com o in-tuito de cobrir as despesas com as tropas merce-nárias. Da mesma forma que no período antece-dente, as legislações portuguesas são transporta-das para o Brasil e aqui serão aplicadas.

1580-1640 - Este período da história do Brasilcolonial ficou conhecido como União Ibérica, jáque, devido a problemas dinásticos, a Coroa es-panhola passou a controlar também a Coroa

portuguesa. Assim, legalmente o Brasil passavaao controle de uma nova Metrópole: o poderosoimpério espanhol. Por um lado, a presença

opressiva portuguesa não foi tão efetiva por todoesse período. Dessa forma, os colonos brasileirospuderam sentir uma certa autonomia em relaçãoaos acontecimentos europeus, principalmente

nas regiões mais afastadas dos grandes centrosprodutores de açúcar. Já por outro lado, em vir-tude de vários conflitos ocorrendo na Europa,muitos envolvendo a Espanha, a Holanda, entãoinimiga espanhola, termina por ocupar as princi-pais regiões produtoras de açúcar do Brasil. Osholandeses se instalaram em Pernambuco. Assim,o sistema tributário passou, naquela região, a serorganizado pelos flamengos.

1640-1808 - Este período, relativamente longo,

que vai da Restauração da Coroa portuguesa até avinda da Família Real, pode ser subdividido emdois momentos significativos, colocando-se a mi-neração (século XVIII) como divisor de águas:

a) 1640-1700 - A Restauração Portuguesa,evento que garante novamente a autonomia dePortugal, custou caro ao país ibérico. O resulta-do mais terrível desse processo de autonomia foia perda de grande parte do seu império colonialna África e na Ásia. Além dessas perdas de espa-ços de exploração, outra complicada situação:Portugal liberta-se da Espanha, mergulhadonuma grave crise econômico-financeira. Cofresvazios, acoplados a uma falta de perspectiva eco-nômica. Nesta situação, restou uma única saídaaos colonizadores: voltar-se ao grande espaçocolonial que havia sido preservado após a UniãoIbérica: o Brasil. Este passou a representar a ma-neira de desafogo da decadente economia portu-guesa. Caberia, assim, às terras brasileiras o pa-

pel de tornar-se a grande fonte de renda de Por-tugal. Com essa consciência, o processo de colo-nização brasileira será novamente iniciado peloscolonizadores. Assim, a partir da volta a umacentralização político-administrativa, efetiva-mente se estaria diante da opressão colonial por-tuguesa, aqui inclusa, obviamente, a opressão fis-cal. Vale lembrar que a expulsão dos holandesesde Pernambuco também resultou num processode cobrança de taxas visando à contratação detropas mercenárias. Mais uma vez, a revolta

toma conta da população. Nesse momento, aprodução de açúcar continuava como a principalfonte de riqueza da elite colonial e dos coloniza-

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dores. Porém, os holandeses, expulsos do Nor-deste brasileiro em 1654 – expulsão esta muitoligada a questões tributárias e de financiamentoda produção –, desenvolveram a exploração do

açúcar em suas possessões nas Antilhas Holan-desas. Com isso, poucos anos depois, o açúcardessa região tornou-se mais atrativo ao mercadoeuropeu, graças ao preço mais acessível. Assim, apartir da década de 80 do século XVII, a regiãoaçucareira do Brasil começara a vivenciar umprocesso de crise, que jamais fora estancado ple-namente. Dessa maneira, coube aos portugueses,através do trabalho dos bandeirantes paulistas, atarefa de procurar metais e pedras preciosas comobstinação. O destino das elites de Portugal de-

pendia dessa possível riqueza mineral.

b) 1700-1808 - Este é o momento de maioropressão colonial sobre o território brasileiro.Ao mesmo tempo em que, finalmente, os ban-deirantes paulistas descobriam ouro em MinasGerais, Portugal vinculava-se, enquanto naçãoeconomicamente dependente, aos interesses in-gleses. Essa dependência se consubstancioucom a assinatura do Tratado de Methuen(1703), que designou Portugal como compra-dor preferencial de tecidos dos ingleses e estes,

compradores dos vinhos portugueses. Esse tra-tado selou uma balança comercial permanente-mente desfavorável para Portugal. Esta situa-ção fez com que a Metrópole estreitassse osseus laços com a sua principal Colônia, agoracom a riqueza advinda da mineração. A opres-são fiscal foi inevitável. Assim, com a minera-ção, um sistema tributário especial seria mon-tado, sempre dependendo de toda uma conjun-tura. Ou seja, Portugal buscava a sua sobrevi-vência econômica através dos impostos cobra-

dos na região mineradora, sendo comuns asmudanças nessa tributação nos momentos emque a arrecadação caía. A decadência da produ-

ção de metais preciosos data de 1750 e, a par-tir desta época, a opressiva presença metropo-litana tornou-se ainda mais feroz.

A Derrama, cobrança periódica de impostos

atrasados, é o maior exemplo dessa políticaopressiva. Trata-se da Era Pombalina, em que opoder português esteve nas mãos do marquêsde Pombal, reorganizador da máquina estatalde Portugal, que aumentou os mecanismos deopressão fiscal sobre a Colônia. Não se tratade mera coincidência o fato de os primeirosmovimentos que buscavam a libertação colo-nial terem surgido em Minas Gerais e entre ossetores da elite que sentiam o peso das dívidaspara com o fisco português. A mineração do-

mina todo o século XVIII. Com a sua deca-dência, o foco de exploração colonial teve quese voltar novamente para a agricultura ligada àexportação. É interessante observar que, emmuitos momentos da mineração, a política tri-butária não levou em conta a capacidade con-tributiva dos colonos e sim criou impostos fi-xos, per capita.

1808-1822 - O ano de 1808 é um marco na his-tória colonial brasileira, pois o Brasil receberia apresença da Família Real e da Corte portugue-sas. Devido ao expansionismo napoleônico, res-tou à elite dirigente do reino lusitano refugiar-sena sua principal Colônia. Criou-se, dessa manei-ra, uma situação sui generis, pois a sede da Me-trópole portuguesa passava a ser uma de suas co-lônias. Se a antiga estrutura tributária mantinha-se intacta, a esta foram acrescidas novas formasde impostos, com o claro intuito de sustentar osenormes gastos da elite lusitana aportada nestas

terras. Esse período ficou conhecido como Go-verno Joanino, já que era comandado pelo Prín-cipe-Regente, D. João, mais tarde D. João VI. Éum período de transição do Brasil-Colônia parao Brasil independente. Essa transição foi marca-da por uma dubiedade político-econômica mar-cante, pois, se de um lado o Brasil não era maisuma colônia portuguesa, por outro, ainda nãoera um país independente. A opressão fiscal con-tinuou tão severa quanto em outros momentos.As reações dos brasileiros, que se sentiam preju-

dicados, se fizeram presentes, por exemplo, naRevolução de 1817, em Pernambuco.

26  h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

 .. . o pod er por t uguês est eve nas mãos do marqu ês de Pom ba l , r eor gan i z ador

 da máqu i na est at al por t uguesa,que aumentou os mecanismos

 de op ressã o f i scal sobr e a C ol ôni a.

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TRIBUTOS DO BRASIL IMPERIAL - 1822•1889

1822-1831 - Esse período marca o Iº Impériono Brasil, sob o comando do filho de D. João

VI, D. Pedro I. A partir de um arranjo político,através da política feita nos gabinetes fechados,apenas com a participação das elites coloniais ede portugueses descontentes com os novos ca-minhos, a separação entre Brasil e Portugal con-cretizou-se. Entretanto, as estruturas econômi-cas, sociais e políticas do país pouco se modifi-caram. A economia agro-exportadora baseadana monocultura, no latifúndio e no trabalho es-cravo continuava dominante. Da mesma forma,poucas mudanças ocorreram no processo tribu-

tário. A grande novidade verificada foi o fato deas elites coloniais terem contato econômico ecomercial diretamente com as potências indus-triais da Europa. As grandes rendas do Eráriopúblico continuavam sendo as de taxas alfande-gárias. Porém, a hegemonia política do Iº Impé-rio coube ao imperador, que gastou muito di-nheiro em aventuras militares, tanto internacomo externamente. Os gastos com essas aven-turas foram cobertos com empréstimos externose com o aumento da carga tributária. Tambémocorreram resistências contra o absolutismo deD. Pedro I. E para deixar as coisas ainda em piorsituação, a economia voltada para a exportaçãode produtos primários não andava bem nas pri-meiras décadas do século passado.

1831-1840 - Este é o período das Regências.No conflito político de D. Pedro I com a aris-tocracia rural brasileira, a esta coube a vitória.A abdicação de D. Pedro, em 07/ 04/ 1831, foio grande marco ratificador da força dessa aris-

tocracia. O novo imperador deveria ser D. Pedrode Alcântara, porém, este tinha apenas cincoanos de idade e deveria esperar até os 18 anos

para ser coroado. Assim, urgia ao país um gover-no regencial. Esse foi um dos períodos maisconturbados da história social e política do Bra-sil. Por todos os cantos do país estouraram re-

beliões – as chamadas Rebeliões Regenciais –,quase todas com intuitos separatistas ou de cu-nho federalista. Mais uma vez, a questão tribu-tária motivou parte dessas revoltas. É o caso,por exemplo, da Farroupilha, que abrangeu oRio Grande do Sul e Santa Catarina, motivadapelos altos custos fiscais impostos aos princi-pais produtos da região: o charque e o couro. Osrebelados reclamavam, entre outros pontos, quea política tributária do governo federal termina-ra por favorecer a produção dos países platinos

em detrimento da nacional. De certa maneira, oPeríodo Regencial sintetizou as disputas entre acentralização e a descentralização político-ad-ministrativas, presentes durante todo o Impériono Brasil e nas primeiras décadas deste século.

1840-1889 - Este é o momento do II Império,sob o comando de D. Pedro II. Sua coroação, ain-da que com apenas 15 anos, vinculou-se direta-mente à tentativa, no caso vitoriosa, de conter asrebeliões regenciais. Definitivamente, a aristocra-cia rural assumia o controle do poder político. Omodelo econômico não se transformara e agoracontava com a presença do café, enquanto merca-doria capaz de estabilizar a economia do império.Esse mesmo período pode ser subdividido emoutros dois:

a) 1840-1870 - É o período do domínio da aris-tocracia rural do Centro-Sul. A base econômicacontinua a ser as exportações, a partir da explo-

ração crescente da mão-de-obra escrava. As prin-cipais fontes de renda continuavam a ser as tari-fas alfandegárias. Estas, quando pareciam insufi-cientes para cobrir as despesas do governo impe-rial, receberam um reforço especial em 1844,com a Tarifa Alves Branco, que ampliou as alí-quotas dos produtos importados. Mais do queuma medida de caráter protecionista para a in-dústria nacional, essa medida visou a aumentar asrendas do Erário público.

b) 1870-1889 - Neste período, o país começoua sentir mais fortemente os efeitos da Lei Eusé-bio de Queirós, de 1850, que acabou com o trá-

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 .. . o Per íod o R egenci al sint et i z ou as d i sput as ent r e a cent ral i z ação e

 a descen t ral i z ação pol í t i co- admini st rat iva, present es durant e t od o o I mpér io no B rasi l e nas primeiras décadas deste século.

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fico negreiro para o Brasil. Essa medida, entreoutros efeitos, provocou o deslocamento dos ca-pitais investidos na compra de escravos africa-nos para outros setores da economia, como in-

dústrias, áreas portuárias e financeiras. Ou seja,ainda que de maneira tímida, outras atividades enovos interesses econômicos, sociais e políticoscomeçavam a circular pelo país. Os espaços ur-banos eram modernizados ao receberem novosequipamentos e investimentos, principalmentedos países que vivenciavam a II Revolução In-dustrial. Por outro lado, outra transformaçãoimportante modificaria as estruturas brasileiras:o início do processo de imigração, quando opaís passa a receber um número grande de es-

trangeiros, com o intuito de substituir o traba-lho escravo e complementar a sua ausência, jáque a economia cafeeira crescia enormemente.As atividades econômicas passaram por mudan-ças significativas e também o sistema tributárioteve que se adaptar a essa nova ordem. Assim, osetor econômico mais avançado desse períodopassou a ser o dos cafeicultores do oeste paulis-ta, onde predominava o trabalho assalariado, emdetrimento do trabalho compulsório, ainda pre-sente no Vale do Paraíba e no Norte-Nordeste.Com a expansão dessa nova mão-de-obra, certa-mente foram pensadas e praticadas outras for-mas de tributação. Até então, a idéia de rendaestava quase que apenas centrada na produçãoextraída da terra. É importante ressaltar que apolítica tributária tinha um caráter centraliza-dor, tendência que marcou toda a experiênciamonárquica brasileira.

TRIBUTOS DO BRASIL REPUBLICANO -1889•2000

1889-1930 - O fim da Monarquia e o início da

República foram resultantes, entre outros motivos,da aliança política entre o Exército brasileiro e aoligarquia cafeeira do oeste paulista. Este grupoacabaria exercendo a hegemonia política durantequase todo esse período. A principal marca políti-co-administrativa da época foi a extrema autono-mia estadual, produto de um federalismo contem-plado pela Constituição de 1891, a 1ª republicanae a 2ª do Brasil. Dessa maneira, a política econômi-ca e, consequentemente, a tributária visaram a be-neficiar as regiões mais ricas do país, ligadas à pro-

dução cafeeira. Assim, as oligarquias de São Paulo,Minas Gerais e Rio de Janeiro, através da “Políticados Governadores” e do coronelismo, utilizaram opoder público para beneficiar as suas atividadeseconômicas. Dessa forma, o sistema tributário ti-nha um forte caráter local, cabendo a cada Estadoda federação determinar os impostos que deveriamser cobrados e de que maneira o fariam.

1930- 1945 - Este período da história do Bra-sil ficou conhecido como a Era Vargas. Da ex-trema descentralização político-administrativado período precedente, o país organizou-se a

partir de uma forte centralização. A grandeação do regime Vargas voltou-se para a elimina-ção de qualquer regionalismo, fosse este políti-co ou econômico. Buscou-se criar condiçõespara um desenvolvimento econômico calcadona industrialização. Mexeu-se de maneira radi-cal nas relações trabalhistas, que passaram a sermediadas pelo Estado; daí a introdução de umalegislação trabalhista, coroada pela criação daCLT. Todos os cuidados voltados aos trabalha-dores urbanos não se verificaram em relação aos

trabalhadores rurais. A exploração dos campo-neses parecia estar a serviço da acumulação decapitais para as atividades urbanas. Assim, a

28 h i s t ó r i a d o s TRI BU TO S n o BRASI L

 .. . a pol í t i ca t r i bu t ár ia bu scou faci l i t ar a impor t ação de máqu inas e d i f i cul t ou

 a impor t ação de mer cador iasque o país poderia produzir .

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política tributária adquiriu um caráter nacio-nal, voltado para a nova política de investimen-tos na infra-estrutura industrial. Com o intui-to de permitir o avanço econômico de setores

específicos dessa atividade, a política tributáriabuscou facilitar a importação de máquinas e di-ficultou a importação de mercadorias que opaís poderia produzir. Em relação aos períodosprecedentes, a economia passava por um pro-cesso de sofisticação, fazendo com que tambéma política tributária a ele se adaptasse. As for-mas de tributação tornaram-se, com o passar dotempo, cada vez mais complexas.1945-1964 - Trata-se do período conhecidocomo a República Populista. Na prática, deu-se

continuidade ao crescimento econômico combases industriais inaugurado na Era Vargas. Apolítica tributária continuou sofisticada, emfunção da complexidade que as atividades eco-nômicas foram atingindo. Um momento espe-cial nesse processo: o governo JK, que talvez te-nha inaugurado a política das isenções fiscais,seja através da SUDAM e SUDENE, seja atra-vés de benefícios concedidos às montadoras deautomóveis que se instalaram durante a sua ges-tão (1955-1960). Vale ressaltar que o últimogoverno desse período, o de João Goulart, de-fendia a necessidade de reformas amplas, entreas quais encontrava-se a da reforma fiscal.

1964-1985 - Durante o Regime Militar tam-bém houve um crescimento da economia, queatingiria níveis significativos. Já se trata de ummomento contemporâneo – com um númeromuito grande de impostos, diretos e indiretos– também muito marcado pelas isenções fis-

cais, sempre beneficiando grandes grupos eco-nômicos. Junto à questão tributária ocorre adisseminação de subsídios, principalmente parainsumos industriais e produtos de consumopopular. Também é a época de vários impostoscompulsórios, como o que recaía sobre a com-pra de carros novos, viagens ao exterior e com-bustíveis para automóveis. O modelo tributárioadotado nesse período foi instituído pelaEmenda Constitucional nº 18, aprovada peloCongresso Nacional em 1º de dezembro de

1965 e que entrou em vigor a partir de 1º de janeiro de 1966, vigorando até a promulgaçãoda Carta de 88.

Pós-1985 - Com a redemocratização do país, oproblema tributário vem à tona, mas não é re-solvido. Porém, com a possibilidade de mani-festação política de vários setores sociais, aquestão tributária passa a ser questionada, in-clusive através do Judiciário. A constitucionali-dade de várias leis, medidas provisórias e decre-

tos é colocada à prova junto ao STF. A possibi-lidade de crítica também permitiu que a socie-dade, através de setores específicos, reclamassedo sistema tributário brasileiro, ao apontar al-gumas deficiências graves: a não-consideraçãoda capacidade contributiva no momento de sedecidir acerca de um imposto; uma forte cargafiscal sobre as empresas; número excessivo deimpostos, gerando desentendimento geral;brechas nas leis, o que dificulta a fiscalização efacilita a sonegação, entre outras críticas. Não ésem sentido que se discute, há pelos menos umadécada, a necessidade de uma ampla reformafiscal.

Dessa maneira, cada um desses períodos é ca-racterizado quanto às atividades econômicas e àsestruturas político-administrativas, para que den-tro de um contexto específico sejam apresentadasas formas tributárias, juntamente com as maneirasde arrecadação. Tornou-se fundamental ainda ava-liar como cada época recebia essa carga fiscal, ou

seja, descobrir como as pessoas que deveriam pa-gar esses impostos reagiam a este fato. Nossa in-tenção é encontrar, dentro do quotidiano dos bra-sileiros, as várias maneiras que foram utilizadaspara resistir à sede fiscal dos vários governantesque estiveram à frente do poder público no Brasil,desde a chegada dos portugueses a estas terras. Aomesmo tempo, é preciso dimensionar o problemada evasão fiscal. Tentar conhecer os mecanismosque permitiram, através da história dos tributosno Brasil, a sonegação dos mesmos.

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 .. . com a possi bi l i dade de mani fest ação pol í t i ca de vár ios set or es sociai s, a qu est ão

 t r i bu t ár ia pass a a ser qu est i onada,

inclusive através do Judiciário.

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PERÍODO

Pr É-c o l o n i a l 1500 • 1530

“N ela ( nesta terra) , até agora, não pudemos saber se há ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou ferro vimos. Porém, a terra em si é de muitos bons ares, assim fr ios e temperados, como os de entre D oiro e Minho, porque nesse tempo de agora os achávamos como os de lá. A s águas são muitas, infinitas. Em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar- se-á nela tudo, por causa das águas que tem. Porém, o

 melhor fruto, que dela se pode tirar, me parece que será salvar esta gente. E esta deve ser a pr incipal semente que vossa A lteza nela deve lançar.(...)” 

Carta de Pero Vaz de Caminha

Noronha, o primeiro contribuinte do Brasil.

O pagamento do tributo à Coroa é feito emespécie.

32 Tr i but o s d o BRASIL CO Lo NI Al - 1500•18221ª Parte

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A nomenclatura, período Pré-Colonial,foi criada por alguns historiadores para ca-

racterizar um tempo em que Portugal não po-voou com europeus as terras conquistadas, ou seja,

utilizou-se das mesmas, mas não iniciou um pro-cesso de colonização de fato.Portanto, nos primeiros 30 anos desde a chega-

da dos nossos colonizadores, a preocupação daCoroa portuguesa resumiu-se em manter a possedas terras “achadas”, com a instalação de diversasfeitorias que marcavam o reconhecimento dessasposses, além de algumas incursões pela selva paraconhecer as potencialidades da “Terra de SantaCruz”. Nesse período, não havia sido feita a opçãopela efetiva colonização da América lusitana, já

que os portugueses estavam com as suas atenções eenergias voltadas para a exploração do comérciodas Índias que, naquele momento, atendia aos seusinteresses mercantilistas.6 

Assim, as mesmas razões que aproximaram osportugueses da rica região das Índias afastaram osibéricos do Brasil. Este não apresentava os motivosda cobiça portuguesa: metais preciosos – e, porisso, amoedáveis e fundamentais para as trocas – emercadorias para serem distribuídas por toda aEuropa. Para o espanto dos nossos descobridores,estes encontraram índios, homens por demais es-

tranhos para um europeu em plena fase mercanti-lista, em que a acumulação de riqueza através docomércio era vital, além das crenças religiosas quebeiravam o extremismo.

Os índios – que já habitavam estas terras hámais de 10.000 anos – organizavam-se em comu-nidades primitivas, onde não existia a noção daacumulação de riqueza e nem a preocupação coma produção de excedentes. E era exatamente o queos portugueses procuravam. Não foi sem sentidoque, já desde os contatos iniciais com os primeiroshabitantes destas terras, os navegadores lusos in-sistiram em saber da existência de ouro ou outrometal precioso. Restou aos portugueses, comoafirma a conhecida Carta de Pero Vaz de Caminha,

acreditar no potencial da América, de que eles aca-bavam de tomar posse. Sobre os índios, afirma Ca-minha:

(...) Eles não lavram, nem criam. Não háaqui boi 

nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha,

nem qualquer alimária, que costumada seja ao vi- 

ver dos homens. Nem comem senão desse inhame,

que aqui hámuito, e dessa semente de frutos, que 

a terra e as árvores de si lançam, e com isto an- 

dam tais e tão rijos e tão médios que o somos tan- 

to quanto trigo e legumes comemos. (...) 7 

33PERÍO D O PRÉ-COLON I AL - 1500•1530

6  Eduardo BUENO, A V ia gem do D escobr im ent o, p. 267  Carta dePero Vaz deCaminha, apud Luiz KOSHIBA eDeniseManzi FraysePEREIRA, H ist óri a do B ra sil , p. 34.

O reconhecimento das posses da Coroa portuguesa foi marcado pelo estabelecimento de feitorias em

diversas partes de seu Império.

1. M APPAMUNDI, Universalis Cosmographia, Saint. Dié,1507; gravura. Paris, Biblioteca Nacional.

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E, ao descrever a terra, ainda afirma o “escri-vão da esquadra” comandada por Pedro Álva-res Cabral:

(...) Nela, atéagora, não pudemos saber se há 

ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou 

ferro vimos. Porém a terra em si éde mui tos 

bons ares, assim frios e temperados, como os de 

entre Doiro e Minho, porque nesse tempo de 

agora os achávamos como os de lá. As águas são muitas, infinitas. Em tal maneira égraciosa 

que, querendo-a aproveitar, dar- se-ánela tudo,

por causa das águas que tem. Porém o melhor 

fruto, que dela se pode tirar, me parece que será 

salvar esta gente. E esta deve ser a principal se- 

mente que vossa Alteza nela deve lançar. (...) 8

 Tendo em vista esta última idéia colocada porCaminha, fica claro que a tarefa de disseminar ocristianismo tinha tanta importância quanto re-tirar riquezas do Brasil. Inclusive, apresentava-sea tarefa da catequese como primordial, sendoque a exploração econômica era posta como amaneira material de se garantirem condiçõespara a ação religiosa, mas não como o objetivocentral. De fato, a religião detinha importânciavital na ação dos europeus nos chamados Tem-pos Modernos, que têm início com a desagrega-ção do Mundo Feudal e com a articulação dosEstados Nacionais Modernos, basicamente apartir do século XIV.

Porém, o desinteresse inicial dos portuguesespara com as terras que haviam tomado posse,dando pouca importância à presença milenar dosnativos indígenas, não levou a ignorá-la plena-mente. Portugal sabia do potencial da América e

precisava garantir ali a sua presença. Além disso,aumentar as posses territoriais de um impériofazia parte dos objetivos de qualquer monarcados Tempos Modernos; este mesmo monarca sa-bia que ele seria lembrado em função desses pos-síveis feitos.

Em 1501, já no ano seguinte à chegada da es-quadra de Cabral, foi mandada a essas terrasuma expedição exploradora, com o intuito de re-conhecer, com mais acuidade, as riquezas nãotão aparentes. Assim, vai ser notada a presença

de uma matéria-prima já conhecida pelos ibéri-cos: o pau-brasil, árvore de onde se extrai umamadeira fornecedora de tinta avermelhada, que já era utilizada para se tingir tecido e de custo

muito alto, já que vinha de regiões distantes daEuropa. Sobre a primeira riqueza encontrada noBrasil, informa-nos Roberto C. Simonsen, autorde importante obra sobre a história econômicado Brasil:

Desde os tempos antigos, as conchas de púrpu- 

ra eram procuradas pelos navegadores fenícios 

nas costas do Mediterrâneo. O Oriente, que 

absorvia, para tingir os finíssimos panos fabri- 

cados, uma série de produtos naturais, tinha 

preferência especial pela cor rubra, símbolo de dignidade e nobreza naqueles povos. Com os Cruzados, a Europa ficou conhecendo várias 

substâncias tintoriais do Oriente, e jáno sécu- 

lo XI I se importava o ‘vernizo’, o brasil, em- 

pregado em Florença, para tingir os panos que 

então se fabricavam. Das ilhas africanas, Por- 

tugal extraía a urzela e Colombo játinha de- 

monstrado àEspanha a presença do pau- brasil 

e outras plantas tintoriais nas terras que des- 

cobrira. 9

34 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

8 Idem, ibidem.

9 Roberto C. SIMONSEN, H ist óri a Eco nô m ica do B ras il , p. 52-3.

“Para o espanto dos nossos descobridores, estes encontraram índios, homens

por demais estranhos para um europeu em plena fase mercantilista”.

2. [Í NDIOS ENCONTRANDO NAVEGANTES  ] . In Hans STADEN, Warhaftige Historia vnd 

Deschreibeng eyner Landtschafft ... Gedruckt zu Marpurg,1557; gravura.

São Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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35PERÍO D O PRÉ-COLON I AL - 1500•1530

A descrição das riquezas e potencialidades da terra descoberta pela esquadra de

Cabral ficou a cargo de Pero Vaz de Caminha, que escreveu a D. Manuel I, em 1º

de maio de 1500.

3. M ANUSCRITO. Lisboa, Arquivo Nac ional da Torre do Tombo.

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Porém, tanto a variedade quanto a qualidadedo pau-brasil aqui encontrados eram muito su-periores aos produtos utilizados para a tinturaaté então conhecidos na Europa, substituindo

completamente o equivalente oriental. Dessa ma-neira, enquanto não se efetivava a ocupação e po-voamento do território americano, a exploraçãodo pau-brasil tornou-se a primeira atividadeeconômica do novo espaço colonial. Como todasas conquistas portuguesas eram consideradaspropriedades do Rei e, ao mesmo tempo, este so-berano não possuía recursos suficientes parabancar essa exploração, utilizou-se de uma práti-ca econômica já comum em Portugal, que era aconcessão10 da Coroa portuguesa para a explora-

ção da citada madeira. Assim sendo, o pau-brasilpassou a ser vendido aos países estrangeiros, emespecial à Inglaterra. Por outro lado, como avenda dessa madeira era feita exclusivamente pelaFazenda Real, o concessionário só poderia ex-plorá-la mediante contrato com a Coroa portu-guesa.11

Essa concessão significava que os interessadosnessa atividade deveriam pagar ao Rei portuguêsuma determinada quantia em dinheiro (ou emespécie)12, recebendo o direito de explorar a ma-deira por um determinado tempo. E junto comessas concessões, vinham outras obrigações:

Em troca, a detentora do monopólio exigia que 

o interessado erguesse as primeiras fortifica- 

ções ao longo da costa, iniciasse a colonização 

da nova Terra, e pagasse o Quinto (quinta 

parte do produto da venda da madeira) ao so- 

berano. Esse foi o primeiro tr ibuto instituído 

no Brasil.13

Ou seja, cabia ao explorador do pau-brasiluma tarefa que, naquele momento, o governo por-tuguês não conseguia dar conta: defender as novas

posses. Este era o sentido de se construírem for-tificações por todo o litoral explorado. Efetiva-mente, estava-se diante de uma tributação indire-ta, pois tais construções requeriam recursos quepoderiam se originar do lucro obtido com o pau-brasil. Porém, não demorou muito tempo para oarrendador perceber que o custo de manter a se-gurança das terras americanas era alto demais paraum particular. Apenas os recursos obtidos com opau-brasil eram insuficientes. A tarefa de prote-ção iria para as mãos da Coroa poucos anos de-pois. Ou seja, “o sistema funcionou bem por al-gum tempo, até que tornou evidente não poder oconcessionário, mais tarde (1504) donatário daIlha de São João, que lhe recebeu o nome, manter

o seu negócio em lutas constantes contra os ini-migos de fora e domésticos.”14

Assim, juntamente com a primeira forma de ex-ploração econômica da América portuguesa, chega-

36  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

10 Defato a prática das concessões da Coroa começou bemantes da chegada dos portugueses ao Brasil. Nestesentido, “em1649, umrico mercador deLisboa,Fernão Gomes, arrendou à Coroa, pelo período decinco anos, o exclusivo comércio coma Guiné, nomequeentão sedava à zona conhecida da África alémdo Bojador, comexcepção do castelo deArguim, construído poucos anos antes equeservia deentreposto ao comércio coma região do Rio do Ouro.”Cf. JoséHermano SARAIVA, H ist óri a C on cisa de Por tu gal, p. 139.

11 Cf. Bernardo Ribeiro deMORAES, Sis tema Tr ibutár io da C ons t i tuição de 1969 , p. 34. Ainda sobre isto, temos: “Em 1502, o comércio do pau-brasil foiarrendado a umcristão-novo, Fernão deNoronha, queficou obrigado a enviar emcada ano uma frota deseis navios, a explorar tambémanualmentetrezentasléguas decosta ea instalar feitorias nos lugares mais apropriados. Começou, então, a instalação dos primeiros núcleos deportugueses no litoral brasileiro.”

Cf. JoséHermano SARAIVA, op. cit., p. 160.12 Conformeserá discutido mais adiante, a circulação monetária no Brasil colonial não era substanciosa; dessa maneira, eramcomuns os pagamentos, quaisquer

quefossem, seremfeitos emespécieou mesmo através do escambo, como ocorreu comos índios envolvidos como corteetransporte do pau-brasil.13 Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 34-5.14 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 53-4.

A extração de pau-brasil, feita por nativos indígenas.

4. Lopo Homem, T ERRA BRASILIS , mapa do  Atlas Miller , 1515-1519; manuscrito. Paris,

Biblioteca Nacional.

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zou-se a Ordem de Cristo, que determinava o pa-gamento do dízimo para sustentar as suas ativida-des. Mesmo com a saída dos árabes do territórioportuguês, esse dízimo continuava a ser cobrado.

Agora, com a justificativa de combate aos mourosem outras regiões fora da Europa, como no norteda África.

Porém, o chamado período Pré-Colonial, emfunção do desinteresse e, consequentemente, daquase ausência do poder português nestas terras,não permitia atividades econômicas mais signifi-cativas, resultando numa política tributária semmaiores relevâncias. E como afirma o historiadorportuguês J. H. Saraiva, “a principal importânciado Brasil foi, durante alguns anos, a de escala

para as armadas que se dirigiam de Lisboa à Ín-dia”16 . Assim, por alguns anos, o Brasil não pas-sou de uma grande feitoria. Ou seja, não era maisque um território de passagem e de parada dasembarcações portuguesas que rumavam para oOriente.

Quanto aos rendimentos da Coroa com a ex-ploração do pau-brasil, não é tarefa simples conta-bilizá-los. Inclusive porque se tratava de um negó-cio particular. “Sabe-se, por exemplo, que depoisdos primeiros anos, Fernão de Loronha17  pagavaanualmente 4 mil cruzados pela concessão, o querepresenta, hoje, um poder aquisitivo de cerca de1.000 contos de réis.”18 Considerando-se que essaexploração tenha mantido este ritmo pelos 30 pri-meiros anos da presença portuguesa no Brasil, comos 4.000 cruzados anuais pagos pela concessão, épossível, conforme cálculo feito por Simonsen,que as rendas da Coroa portuguesa tenham atingi-do 30.000 contos. Isto se, de fato, manteve-se amédia de 300 toneladas anuais. Neste ponto, é in-

teressante outro cálculo realizado, agora engloban-do a parte do fisco, ainda que para um período umpouco posterior:

Em 1602, esse pau adquirido pelo contratante 

no Brasil, a 1$000 o quintal, era vendido a 

4$000 em Lisboa, dando por quintal um lu- 

cro de 3$000.

Num embarque de 10.000 quintais, limite 

máximo admitido no contrato, registra-se: 

(contos) 

Renda bruta 40  

A deduzir 

Custo no Brasil 10  Despesas com transportes para Portugal 3 

Pagos àFazenda Real 21  

Total 34  

Saldo 6  

ou seja, 15% sobre o valor total da venda.19

 Também em relação ao pau-brasil, sabe-se que a

sua exploração utilizou largamente a mão-de-obrado nativo indígena. Seria economicamente inviáveltrazer homens da Europa para essa função. Aliás,qualquer forma de trabalho livre seria inviável, peloseu alto custo. As viagens marítimas eram caras, in-clusive pelo valor a ser pago à tripulação. Não eraqualquer marinheiro que se dispunha a viajar emalto-mar, principalmente por causa dos elevados ín-dices de naufrágios, além de outros perigos em ter-ra, como os ataques dos índios. Assim, estes faziamo trabalho mais pesado, que era o corte e o transpor-te da madeira. Em algumas ocasiões, caminhava-seaté 20 léguas com a madeira nas costas. Com a ex-ploração predatória, a cada momento tinha-se queadentrar ainda mais o interior. Para esse trabalho, osíndios recebiam o que se chamou de quinquilharias,ou seja, objetos de pouco valor para os portugueses,mas que muito significavam para os primeiros habi-tantes destas terras. Estabeleceu-se, desta maneira,uma relação de escambo. Ainda aqui há ausência decirculação monetária.

Por outro lado, logo no início da presença portu-guesa em terras americanas, e com a exploração dopau-brasil, surgiu um problema que iria marcar todoo período da colonização do Brasil: a questão docontrabando e das tentativas de forças estrangeirasem ocupar parte das terras do Rei de Portugal. Ocontrabando não era feito só por portugueses, como intuito de não pagar direitos ao rei, mas tambémpor navegadores de outras nações, principalmentefranceses. Estes, assim como os primeiros, tambémutilizavam-se da mão-de-obra indígena para o traba-

lho mais pesado no trato com a árvore.Para os franceses, a presença em terras america-nas era de grande importância. A cobiça pelo pau-

38 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

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brasil tinha como destino uma nascente indústrianacional. O fascínio pelas tintas também os atraía.Estes, na impossibilidade de uma exploração legaldas terras americanas, não se constrangeram em es-

tar presentes no Brasil mesmo contra os interessesda Coroa portuguesa. Aliás, “duas classes de prejuí-zos sofria o comércio português por parte dos fran-ceses: dos mercadores franceses, que organizavamexpedições para vir buscar na Terra de Santa Cruz amadeira tintorial e outros produtos baseados na es-cusa de que havia liberdade nos mares e que era ve-dado aos súditos franceses o comércio com as colô-nias portuguesas ou com as terras virgens da Amé-rica; e dos corsários, muitos dos quais estavam mu-nidos de cartas de corso concedidas pelo próprio

rei de França.” 20

A presença francesa nas costas brasileiras eratão constante que, na Europa, por volta da segun-da metade da década de 20 do século XVI, ao sereferir a essas terras, muitos a colocavam comosendo de posse francesa e não de Portugal. Issopreocupou por demais as autoridades portuguesas,que aumentaram as expedições com o intuito depoliciar o litoral da sua colônia. Porém, percebeu-se que isto seria uma tarefa sem maiores resulta-dos, dada a imensidão do território. Além disso,os franceses já haviam conquistado a confiança dealgumas tribos indígenas, o que facilitava a suapresença na América, que já não tinha certeza seainda era portuguesa ou não.

Não havia qualquer dúvida: a imensa posse por-tuguesa no Novo Mundo corria perigo; e a ameaça,nesse período em questão, já não vinha apenas porparte dos franceses, mas também dos espanhóis. Aessa conjuntura, que apontava para a probabilidadede perder parte deste vasto território, associou-se

outro evento importante: Portugal perdera o mono-pólio sobre o rendoso comércio indiano, pois outrasnações também conseguiram chegar ao Oriente, es-

tabelecendo forte concorrência com os comercianteslusitanos. Da mesma forma, no Oriente aumentou aresistência dos habitantes locais contra a presençaestrangeira – nem sempre marcada por relações pa-

cíficas –, fazendo engrossar os gastos militares por-tugueses. Assim, os ganhos astronômicos verificadosaté então começavam a minguar. Portugal sabia queera preciso encontrar outras fontes de renda.

A associação destes dois eventos – possibilidadecada vez mais eminente de perder as terras brasilei-ras e a diminuição brusca dos rendimentos do co-mércio indiano com o fim do monopólio – permi-tiu aos portugueses resolver o dilema de iniciar ounão a colonização do Brasil. Assim, a partir de1530, a opção por povoar e estabelecer uma admi-

nistração colonial em terras americanas cristalizou-se e começou a ser concretizada. Mas também umoutro fator levou Portugal a se resolver pela coloni-zação do Brasil: os espanhóis haviam encontradominas com metais preciosos nas suas possessões.Este evento trouxe para os portugueses a idéia deque, também nas terras americanas que possuíam,poderia haver os cobiçados metais.

39PERÍO D O PRÉ-COLON I AL - 1500•1530

16   José Hermano SARAIVA, op. cit., p. 162.17  Não sedeveestranhar queaqui o nomedeFernão deNoronha seja grafado como Fernão deLoronha. Essas diferentes grafias deummesmo nomesão

comuns. Muitos nomes tiveramsuas grafias atualizadas. Hoje, por exemplo, escrevemos Fernando deNoronha.18 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 54. Esteautor, na maior partedas vezes queapresenta algumvalor monetário, faz a conversão para a moeda da época

emqueescreveu a sua obra clássica. Inclusive, épossível encontrar tabelas para sefazer a conversão devalores deuma moeda quecirculava no século XVIpara a moeda atual. Porém, apesar deinteressante, emtermos econômicos ehistóricos, estetipo detrabalho não temmaior relevância, pois a riqueza deumaépoca só podeser comparada a ela mesma. Assim, mais do quesaber que4 mil cruzados significam1.000 contos – para o ano de1937, quando a obra deRoberto C. Simonsen foi elaborada –, interessa relacionar essevalor à sua própria época. Nessesentido, importa, sim, saber o quanto essevalor representava

dentro do orçamento da Coroa portuguesa; ou quanto era o rendimento deFernão deNoronha enquanto arrendador do pau-brasil. Enfim, valores monetáriosdevemser comparados dentro deuma realidadeúnica, senão essa comparação perdesentido. Assim, semprequepossível, este texto estará realizando estascomparações.

19 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 63.20 Idem, ibidem , op. cit., p. 56.

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“E porque as minhas rendas e direitos nas ditas terras até aqui não foram arrecadados como cumpr ia, por não haver quem provesse nelas ...e para que a arrecadação deles se ponha em ordem que a meu serviço

 cumpre, ordenei mandar ora às di tas terras uma pessoa de confiançaque sirva de Provedor-Mor de minha fazenda...” 

 Regimento de 17 de dezembro de 154 8

A Pr imeir a et apa d a

c o l o n i z a ç ã o 1530 • 1580

4 0 Tr i but o s d o BRASIL CO Lo NI Al - 1500•18221ª Parte

A concessão de capitanias hereditárias envolvia

obrigações tributárias impostas aos donatários.A institucionalização do fisco emterras brasileiras.

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A Coroa portuguesa, por vários motivos, prin-cipalmente no que se refere ao temor de perder aposse dos seus domínios na América e à crise emrelação ao comércio indiano, optou por iniciar a

colonização do Brasil, processo que supunha se-rem estas terras povoadas e que aqui se instalariauma administração colonial. Neste sentido, não sepode perder de vista que a ação colonizadora su-põem a busca de lucros a partir das riquezas pro-duzidas no Brasil, mas também acarreta um altocusto. Povoar e criar uma administração colonialsupõem, por exemplo, a construção de muitosfortes e palácios; assim como o pagamento defuncionários reais, que não viriam até estas dis-tantes e perigosas terras com salários miúdos ou

com poucas vantagens.Para o historiador português José Hermano Sa-

raiva, a opção por iniciar, de fato, o processo decolonização das terras americanas veio em 1530,com uma expedição dirigida por Martim Afonsode Souza. Nesta data, dar-se-á a fundação de SãoVicente, em cujos terrenos alagadiços se fizeram asprimeiras plantações de cana-de-açúcar e onde se

instalou o primeiro engenho açucareiro. Havia jáportugueses na região. Por iniciativa de um deles, João Ramalho, instalaram os portugueses uma al-deia no sertão, a algumas léguas da costa. Foi essa

aldeia, Piratininga, que veio mais tarde a transfor-mar-se na cidade de São Paulo. 21

Porém, a necessidade emergencial de colonizaro Brasil esbarrava num problema de ordem finan-ceira e de difícil solução: a Coroa portuguesa nãodetinha cabedais suficientes para efetivar esse pro-cesso. Era preciso colonizar sem gastar o dinheirodo poder público. Sob o império desta condição,buscou-se alguma saída razoável. Esta deu-se emdois níveis: um administrativo e outro econômico.

Em termos econômicos, o governo português

tinha clareza de que o Brasil só se tornaria viávelcom uma atividade econômica que possibilitasseuma renda para os que para cá viessem e para aCoroa. Se na América espanhola essa atividaderendosa foi a mineração, coube aos domínios por-tugueses no Continente – até então sem qualquervestígio de metais preciosos – optar pela produçãoagrícola. Não havia outro caminho plausível.

4 1A Pr i m e i r a e t a pa d a c o l o n i z a ç ã o - 1530 • 1580

21  José Hermano SARAIVA,op. cit., p. 162.

O processo de colonização das terras americanas pelos portugueses começa

efetivamente com a fundação da Capitania de São Vicente.

6. João Teixei ra Alb ernaz, Lisboa , 1631, cópia do  ATLAS DO ESTADO DO  BRASIL

por M. Queirós, 1944, São Paulo, Museu Paulista da Universidade de São Paulo.

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Porém, seria possível uma produção que nãofosse muito perecível e cujos custos de frete – queeram muito altos – permitissem a esse produtochegar à Europa com um preço que o mercado

conseguisse absorver? No Velho Continente, haviamais de um século, era crônica a escassez de trigo,alimento básico de grande parte da população. Po-rém, imediatamente, os portugueses perceberamque esse produto, cultivado nas terras americanas,chegaria à Europa por um preço proibitivo, tor-nando esta atividade antieconômica. Assim sendo,esta possibilidade foi descartada. Eram vários osproblemas, sendo o maior deles, talvez, a travessiado Atlântico. Navegar por esse oceano não erauma tarefa tranqüila, devido a vários fatores. As

embarcações – as naus – eram frágeis e, a qualquermovimento mais violento do mar, tendiam a nau-fragar. Era comum as expedições marítimas dessaépoca saírem com várias naus e caravelas e chega-rem ao destino com pouco mais do que a metadeda frota. Havia o perigo das calmarias, que pode-ria aumentar o tempo de viagem em mais de ummês, causando uma série de dificuldades, como asdoenças e a fome. Outro problema sério eram osataques piratas. Estes, entre outros motivos, repre-sentaram razões suficientes para tornar o preçodos fretes muito alto.

Dessa maneira, com essas embarcações, como épossível perceber, não era sem maiores temoresque os portugueses – dentre outros navegadores –saíam pelos mares do mundo. O perigo associava-se a prejuízos de monta.

Ao mesmo tempo, os custos com a tripulaçãotambém não eram baixos. Do comandante da es-quadra até os mais humildes marinheiros, os ga-nhos necessariamente eram maiores do que os re-

cebidos em qualquer atividade em terra firme. So-bre esses ganhos, em relação à elite de navegadoresda esquadra de Pedro Álvares Cabral, tem-se:

Todos esses capitães – assim como os princi- 

pais pilotos e mestres – eram homens muito 

bem pagos. (...) A maior remuneração cabia,

evidentemente, ao comandante-chefe: sabe-se 

que Pedro Álvares Cabral recebeu 10 mil cru- 

zados pela viagem. Cada cruzado valia o equi- 

valente a 3,5 gramas de ouro. Além desta pe- 

quena fortuna, Cabral embolsari a ainda o lu- 

cro referente a 500 quintais de pimenta – ou 

inacreditáveis 30 toneladas – que ele tinha direito de comprar, às próprias custas, e trans- 

portar gratui tamente no navio. A Coroa se 

comprometia a adquirir essa pimenta pelo va- 

lor corrente em Lisboa – cerca de sete vezes o 

preço pago na Índia. 22

Além dessa excelente remuneração que percebiaCabral, outros importantes navegadores dessa

mesma esquadra também recebiam quantias e van-tagens excepcionais, o que determinava, como sesabe, o aumento do custo dessas viagens. Assim,“os capitães das demais naus recebiam mil cruza-dos sobre cada 100 tonéis de arqueação de seusnavios (a maioria, portanto, embolsou cerca de 1,8mil cruzados), acrescidas de seis caixas forras e dapossibilidade de adquirir 50 quintais (ou 300 qui-los) de pimenta para revenda em Lisboa. Mestrese pilotos ganhavam 500 cruzados, quatro caixasforras e 30 quintais de pimenta cada. Os mari-nheiros recebiam 10 cruzados por mês, uma caixaforra e 10 quintais de pimenta, cabendo aos gru-metes a metade disso”. 23

Desta maneira, coube aos portugueses pensarexaustivamente sobre qual seria o produto agríco-la que compensaria gastos tão altos e tantos peri-gos para os navegadores; além do mais, precisariaser uma mercadoria com grande aceitação na Eu-ropa. Após muitas análises, os lusos concluíramque havia apenas um produto que poderia com-

pensar os gastos de produção e de transporte: oaçúcar não-refinado. Essa opção redundou em su-cesso, graças a uma série de fatores. Sabe-se queos portugueses, desde meados do século XV, jáproduziam cana-de-açúcar nas suas possessões noAtlântico, as ilhas de Açores, Madeira e CaboVerde. Ou seja, já tinham experiência nesta pro-

4 2 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

22 Eduardo BUENO, op. cit., p. 26.23 Idem, ibidem , p. 27.24 Estas razões do sucesso da empresa açucareira no Brasil, entreoutras, são apresentadas na obra clássica deCelso FURTADO, Formação Econômica do Brasil,

emespecial no capítulo 2 – “Fatores do êxito da empresa agrícola”. Adiante, serão analisadas as questões tributárias relativas à produção açucareira.25  José Hermano SARAIVA, op. cit., p. 162.26  Bernardo Ribeiro deMORAES, Sis tema Tr ibutár io da C ons t i tuição de 1969 , p. 35.27  Idem, ibidem .

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dução. Ao mesmo tempo, o açúcar refinado erauma mercadoria com uma aceitação muito grandeem terras européias. Foi possível atender a estaforte demanda em função da presença dos fla-mengos, detentores de capitais e com ampla capa-cidade de distribuição do produto. Assim, a expe-riência portuguesa na produção açucareira, aliadaaos capitais e à capacidade comercial dos flamen-gos, associou-se às boas condições naturais do

Brasil, levando a empresa açucareira ao sucesso. 24

E este sucesso teve uma significação clara: a pos-se das terras portuguesas na América estava ga-rantida; senão toda a extensão determinada pelo Tratado de Tordesilhas, uma parte considerávelda mesma.

Se em termos econômicos optou-se pela ex-ploração agrícola de um produto que tinha de-manda na Europa, no campo administrativo a saí-da foi colocar nas mãos de particulares o ônus fi-nanceiro da colonização do Brasil. Isto foi reali-

zado através da instituição das Capitanias Heredi-tárias. Assim:

Em 1534, D. João II I dividiu todo o Brasil em 

capitanias hereditárias, que concedeu a membros 

da pequena nobreza. Os capitães hereditários de- 

viam promover, àsua custa, o povoamento e a co- 

lonização do território das capitanias. ( ...) de um 

modo geral, a falta de poder econômico dos dona- 

tários e as violentas reações dos nativos dificulta- ram a colonização. Mesmo assim, em 1548 já 

existiam ao longo da costa dezesseis povoações por- 

tuguesas que viviam do comércio com Portugal,

para onde mandavam, além dos produtos da flo- 

resta, açúcar, algodão e tabaco. 25

A historiografia acerca deste período afirmaque apenas duas Capitanias deram certo: São Vi-

cente e Pernambuco. Aliás, as duas regiões estive-ram ligadas à produção açucareira. Porém, talveznão seja exato falar em fracasso do sistema das Ca-pitanias, até porque um dos principais objetivosdo governo português foi alcançado: a posse dasterras americanas foi mantida.

Por outro lado, a implantação do sistema deCapitanias Hereditárias supôs a criação de uma le-gislação específica para organizá-las. Dois instru-mentos jurídicos embasavam esta nova organizaçãodo espaço colonial brasileiro. De um lado:

Pelas cartas de doação, o soberano outorgava a 

respectiva capitania ao donatário, delimitava o 

seu território e salientava as características da 

doação e dos poderes, privilégios e obrigações do 

Capitão-Mor e Governador. Tal capitania era 

concedida ao donatário para governar, como se 

governa uma província, e não para explorar 

como uma fazenda. Os donatários ficavam com 

as obrigações de colonizar o solo, fundar povoa- 

ções, nomear aux iliares, conceder sesmarias,etc., acumulando, quando necessário, os poderes 

de legislar, executar e julgar. 26 

De outro:Pelas cartas de foral, era previ sta a povoação,

com a determinação dos direitos, foros, tributos 

e coisas que se pagariam ao Rei e ao Capitão- 

Mor e Governador. (...) As cartas de foral 

consignavam, sem a menor dúvida, o direito 

tributário sobre rendas, direitos, foros e tribu- 

tos que o Capitão-Mor poderia arrecadar para si. Dispunha também sobre reservas de direitos 

e privi légios fiscais da Coroa. 27 

4 3A Pr i m e i r a e t a pa d a c o l o n i z a ç ã o - 1530 • 1580

“Em 1534, D. João III dividiu todo o Brasil em capitanias hereditárias”.

7. Roteiro de Todos os Sinais, Conhecimentos, Fundos, Baixos, Alturas e Derrotas

que há na Costa do Brasil desde o Cabo de São Agostinho até o Estreito de Fernão

de Magalhães, atribuído a Luís Teixeira. Lisboa, Biblioteca da Ajuda.

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Na prática, estes dispositivos legais – que cons-tituíram as Capitanias Hereditárias – colocavamos donatários como agentes fiscais, que deveriamdar conta do arrecadado para o soberano portu-guês. Assim, mesmo com a Colônia sendo povoa-

da pelo elemento português, novos tributos passa-vam a ser cobrados no Brasil. Neste sentido, estesnovos tributos relativos à Coroa portuguesa eram:

✠ Monopólio do comércio do pau-brasil, das es-peciarias e drogas;

✠ Direitos das alfândegas reais, relativos a merca-dorias importadas e exportadas, ou naufraga-das que dão à costa. Em geral, correspondiam a10% do valor total das mesmas;

✠ Quintos dos metais e pedras preciosas (ouro,prata, coral, pérola, cobre, chumbo, estanho etc.);

✠ Dízima do pescado e das colheitas de todos osprodutos da terra, colhidos ou fabricados. 28

Quanto à primeira forma de tributo, ou seja,do monopólio do comércio de algumas mercado-

rias, este efetivava-se através do sistema de contra-tos/ concessões, conforme já se viu acerca do pau-brasil  29 . Ou seja, para se conseguir a concessão, eranecessário pagar uma quantia em dinheiro estipu-lada pelo Rei. Ao mesmo tempo, essa concessãotambém poderia significar a prestação de outrosserviços, como a obrigação de construir uma for-tificação. Esta política de contratos esteve presen-te em grande parte do Brasil colonial, inclusive noque se refere à cobrança de impostos e aos direitosalfandegários. 30

Sobre estes primeiros tributos, também é im-portante observar que muito tempo antes da des-coberta de metais preciosos na região do atual Es-

4 4 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

Os donatários deviam pedir licença e pagar foros pelas fábricas de engenhos que

construíssem em suas terras, incluindo moendas e marinhas de sal.

8. P RAEFECTURA P ERNAMBUCAE PARS BOREALIS UNA CUM P RAEFECTURA DE  ITAMARACA, 1647; gravura.

São Paulo, coleção Guita e José Mindlin.

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tado de Minas Gerais, já estava previsto o impos-to do Quinto. Isto demonstra, entre outros pon-tos, que os portugueses buscaram incessantementeencontrar metais preciosos nestas terras. Como

também demonstra que havia metais e pedras pre-ciosas em outras partes da Colônia. Porém, comoo ouro e o diamante encontrados em Minas Geraisforam de grande monta, outras regiões produtoras,como vale do Ribeira, não foram lembradas.

Outra observação acerca desta relação fiscal:dízima, conforme a origem do termo denuncia, re-fere-se à décima parte do valor total de um servi-ço ou mercadoria. E, normalmente, a prática reve-lou-se desta forma. Porém, muitas vezes, Dízimapoderia significar outra porcentagem, como 2%. 31

Inclusive, a Dízima revela-se como uma das for-mas tributárias mais remotas, conhecida desde aAntiguidade. 32

Acerca deste primeiro elenco de impostos, fi-nalmente, é possível verificar que tanto os Quintosquanto as Dízimas eram pagos, muito provavel-mente, em espécie. Como já se afirmou, a circula-ção monetária era de pequena monta, inclusiveporque praticamente inexistia o trabalho assalaria-do. Utilizavam-se outras formas para se efetivaremas trocas. O pagamento de tributos sem a presen-ça de numerário esteve presente em grande partedo Brasil colonial, principalmente nas regiões maisafastadas dos maiores centros econômicos, locali-zados no litoral. 33

Roberto C. Simonsen apresenta um quadro dedireitos fiscais, além de outros de caráter mais ge-ral, por parte dos donatários:

✠ a doação efetiva de cerca de 20% das terras dacapitania;

✠ as marinhas de sal, as moendas de água e quais-quer outros engenhos que se levantassem emsuas terras, não podendo pessoa alguma cons-truí-los sem sua licença ou sem lhes pagar o

foro devido;

✠ a escravização dos índios em número ilimitadoe a autorização para vender uma certa quota nomercado de Lisboa (geralmente limitada a 39por ano);

✠ 50% do valor do pau-brasil e do pescado;

✠ a redízima das rendas e direitos pertencentes àCoroa;

✠ o direito de postagem dos barcos que pusessemnos rios, precedendo a taxação das câmaras,com a aprovação do Rei;

✠ as alcaidarias-mores das vilas e povoações, comos foros, rendas e direitos, devendo-lhes contri-buição e homenagem os beneficiados com taisconcessões;

✠ uma contribuição de 500 réis anuais nos ta-belionatos das vilas e povoados criados nacapitania;

✠ exercício da jurisdição civil e comercial dentrode determinados limites. 34

Bernardo Ribeiro de Moraes, especialista emDireito Tributário – daí a sua preocupação em res-gatar alguns dados em relação à história dos tribu-tos brasileiros –, apresenta uma lista parcialmente

4 5A Pr i m e i r a e t a pa d a c o l o n i z a ç ã o - 1530 • 1580

28 Idem, ibidem , p. 36.29 Ainda sobrea administração da exploração do pau-brasil, épossível afirmar: “(...) O pau-brasil foi monopólio da Coroa portuguesa desdeo descobrimento

do Brasil. Logo depois, a Coroa passou a explorá-lo através de‘contratadores’, aos quais concedia o privilégio da extração edo comércio daquela madeira.Em1649, coma constituição da Companhia Geral do Comércio do Brasil, empresa comprivilégio da Coroa, foi-lheconferido o monopólio da exploraçãodo pau-brasil. Em1664, encampada a Companhia pelo governo português, voltou o pau-brasil às mãos da Coroa, que instalou, emPorto Seguro, uma‘Administração do Pau-Brasil’. Conhecem-seos nomes detrês dos administradores quegerirama extração do pau-brasil: Gaspar de Barros Calheiros (1644),Francisco deAmorim(1649) ePaulo Barbosa (1649/ 1663).”Cf.  I nt ern et , Siteda Receita Federal na Internet, www.receita.fazenda.gov.br.

30 A questão dos contratos será tratada emoutro momento destetrabalho.31 “Já houvecasos desedenominar dízima os 2% (dois por cento) sobreo pão exportado para fora do Reino.”Cf. Bernardo Ribeiro de MORAES, op. cit., nota

número 60, p. 36.32 Segundo umdicionário deeconomia, tem-seo verbeteDízimo: “Tributo obrigatório cobrado pela Igreja Católica durantea IdadeMédia. Correspondia à

décima parteda produção do camponês ou mestreartesão. Originou-sena França no século IV edifundiu-sepor toda a Europa. O pároco ou dizimeiro erao encarregado da cobrança. No Brasil colonial, a Coroa portuguesa cobrava o dízimo graças a uma bula papal queconcedia essedireito à OrdemdeCristo,

cujo mestreera o rei dePortugal. O dízimo foi abolido na Europa a partir da Revolução Francesa eno Brasil perdurou até a Independência.”Cf. PauloSANDRONI (consultor), D ici on ár io de E con om ia , p. 121.33  Tanto que, quando a Corteportuguesa vem ao Brasil em1808, o Príncipe-Regente, D. João, ordena a organização deuma casa bancária, como objetivo

maior deser umbanco emissor. Porém, mesmo comesta atitude, não seefetivou a circulação monetária por todos os cantos do Brasil.34 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 83.

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diferente da elencada por Roberto C. Simonsen.Dessa maneira, a respeito dos tributos relativos aodonatário (Capitão-Mor e Governador) – tambémfazendo parte do sistema de Capitanias Hereditá-

rias –, tem-se:

✠ Monopólio das explorações das moendasd’água e de quaisquer outros engenhos;

✠ Direitos de passagem dos rios (barcagem);

✠ Quinto do produto do pau-brasil, das especia-rias ou drogas, originárias da capitania;

✠ Dízimo do quinto dos metais e pedras precio-

sas que se encontrarem na capitania;

✠ Meio dízimo do pescado;

✠ Redízima de todas as rendas da Coroa. 35

Uma leitura desatenta dos direitos tributáriosdo donatário – até pela denominação e conteúdodestes tributos – poderia levar à idéia de que se ti-nha no Brasil uma ordem feudal. Esse equívocoseria ainda maior, sabendo-se do direito desse do-natário de distribuir terras através das sesmarias.É preciso deixar claro que uma ordem feudal só éplenamente caracterizada diante da existência delaços de dependência pessoal; isto, a partir dadoação de um feudo ou parte de um. Ou seja, odoador da terra passa a contar com a solidarieda-de irrestrita de quem recebeu a doação, a qual in-clusive poderia ser revista. Esta situação não ocor-reu no Brasil; assim, apesar de alguns historiado-res apresentarem a organização das Capitanias

Hereditárias como exemplo da existência do siste-

ma feudal no período colonial, isto não aconte-ceu. Quem recebia terra tinha que fazê-la produ-zir num prazo máximo de cinco anos e pagar ostributos relativos à exploração da sua posse. Nada

além disso.Ao mesmo tempo, a recente presença portugue-sa no Brasil não permitia um sistema organizadode arrecadação de impostos, mas apenas algumasindicações. Também não existia um sistema tribu-tário sistematizado, como não havia preocupaçõesde caráter orçamentário. Aliás, preocupação quenão esteve na pauta dos colonizadores em nenhummomento; saber exatamente quando seriam arreca-dados e como esses valores seriam gastos pareceque só foi prática vigente a partir da emancipação

política.Assim, “quem arrecadava e fiscalizava os tribu-

tos não eram os donatários das capitanias, masservidores especiais da Coroa (‘rendeiros’) e seusauxiliares (‘contadores’, ‘feitores’ e ‘almoxari-fes’ 36  ). E esse princípio de modelo arrecadadortalvez tenha sido também o início das dificulda-des dos colonos em relação às autoridades tribu-tárias. Essas dificuldades se concretizavam emfunção da enorme autoridade de tais agentes doErário Real luso. Sobre essa questão, afirma Ro-cha Pombo:

Durante o período das donatarias, cada capitão do- 

natário tinha junto de si os oficiais encarregados da 

arrecadação dos dízimos pertencentes àCoroa, e de 

fiscalizar a administração do monopólio do pau-bra- 

sil e de outros produtos da terra que el-rei se reser- 

vara. Foram a princípio os almoxarifes e recebedores,

e depois os contadores nas diferentes capitanias, e os 

vedores, que superintendiam e vigiavam o fisco em 

todo o domínio. Os almoxarifes eram também in- 

4 6  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

35 Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 37.36  Eramatribuições dos almoxarifes: a) enviar os saldos deexercícios decada ano ao Tesoureiro-Mor, sediado na Bahia; b) ir, a cada cinco anos, pessoalmente,

exibir os livros por eles escriturados, à Provedoria-Mor na Bahia. Cf. Benedito FERREIRA, L egisl ação T ri bu tá ri a ( A H ist óri a da T ri bu ta ção no B ras il ) , p. 25.Ainda sobreos almoxarifes, há as seguintes informações: “(...) Os Almoxarifados, emPortugal, à época do descobrimento do Brasil, eramas repartições fiscaisregionais, encarregadas decentralizar a arrecadação dos tributos erendas da Coroa. No Brasil, porém, embora o almoxarife continuasseresponsável pelaarrecadação tributária, os Almoxarifados foramintegrados numa repartição maior, a Provedoria da Fazenda Real, ondeficavamsubordinados à autoridadedoProvedor, quehabitualmentechefiava tambéma Contadoria, a Tesouraria ea Alfândega. Perdeu, por isso, o Almoxarifado o destaquequegozava emPortugal.Acresceque, no Brasil, o cargo dealmoxarife esteveno princípio ligado ao de‘feitor’, queera quemgeria as atividades braçais deextração do pau-brasil, decarga e descarga dos navios e de transportedemercadorias. Comisso, os almoxarifes sedesligaramumtanto das atividades burocráticas exercidas peloProvedor epelo Escrivão, perdendo prestígio epoder. Numa etapa posterior, no século XVII, os almoxarifes foramseparados dos feitores, ficando limitadosàs funções dearrecadação edeguarda debens evalores. Aliás, ainda hoje, o termo Almoxarife significa o responsável pela guarda econservação debens

móveis. Isso foi conseqüência direta da última etapa deevolução do cargo, no século XVIII, quando eles foramos responsáveis exclusivos pela administraçãodos Armazéns Reais, espalhados pelas diversas capitanias. Existiramalguns almoxarifados isolados, fora das provedorias, comexistência autônoma, ainda quesubordinados a aquelas. Outros, embora integrados nas Provedorias, tiverampapel importante o suficientepara seremidentificados eteremsua atuaçãonotada.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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cumbidos de efetuar as despesas que deveriam ser fei- 

tas de conta do erário régio. Os deveres de tais fun- 

cionários e as relações em que ficavam com os capi- 

tães, eram declarados nos respectivos forais, e em se- 

guida definidos pelos atos avulsos da metrópole se- 

gundo as necessidades ocorrentes. 37 

É importante ter em conta que as práticas tri-butárias que chegaram ao Brasil colonial são her-deiras diretas do que se tinha em Portugal, istoquando não eram cópias muito mal adaptadas.No caso das comarcas portuguesas, tinha-se o se-guinte:

A cobrança das rendas e impostos de cada comarca,

assim como o pagamento das mercês e tenças, corriam pelos almoxarifados, espécie de repartição financeira que funcionava nas principais cidades e vilas. Cada 

um tinha àsua frente um funcionário real, o almo- 

xarife, que era assistido por um tesoureiro, um escri- 

vão e, quando o serviço do cargo exigia, um ou mais 

ajudantes. O movimento era objeto de imediato regis- 

tro, para se verificarem ulteriormente as contas pres- 

tadas àCoroa. Os almoxarifes recebiam ‘cartas de 

quitação’, ou seja, balancetes com a indicação das re- 

ceitas e despesas a seu cargo. O sistema vinha dos fins 

do século XII e manteve-se sem grande alteração,

salvo no que respeita ao número de circunscrições fi- 

nanceiras que, com o surto político do Estado, foi au- 

mentado. 38

Este início de prática tributária trazia consigovícios e defeitos que se perpetuariam por toda ahistória do Brasil. Talvez esta assertiva possa estarmarcada por uma dose de exagero; mas não deixade ser real o quanto algumas heranças coloniais

ainda fazem parte do presente brasileiro. Decor-rentes da longa distância que separava Portugaldas suas terras na América, inúmeras maneiras dese burlar o fisco foram sendo gestadas. É pratica-mente unânime entre os historiadores a idéia deque a sonegação fiscal esteve sempre presente emtodo o Brasil colonial. Mais do que a sonegaçãodo contribuinte, ocorria a constante corrupçãopor parte do funcionário régio responsável pelaarrecadação. Ou seja, a maneira como se elegeram

os tributos a serem cobrados e a forma como istoseria feito, e por quem, levaram à institucionaliza-ção das fraudes fiscais. Mais do que a má vontadedos contribuintes, a estrutura fiscal e suas decor-

rências engendravam as condições para que o arre-cadado fosse sempre inferior ao que minimamenteprojetavam as autoridades fiscais lusas.

A Coroa portuguesa acreditava que, ao com-prometer os donatários com a arrecadação tributá-ria, as rendas do fisco seriam efetivamente cobra-das e prestar-se-iam contas delas. Haveria organi-zação e interesse por parte dos capitães em tomarprovidências para que efetivamente os responsáveispor essa tarefa agissem, já que parte do arrecada-do ficaria em mãos desses donatários. Porém, em

regra, verificou-se situação diversa. Isto aconteceuem algumas capitanias, mas, em geral, os funcioná-rios fiscais não tinham ação. Ou então muitos de-les “ou mancomunavam-se com os capitães paraenriquecer-se e voltar ao reino, ou reduziam-se àcompleta desídia, chegando alguns a não fazermesmo receita para os próprios vencimentos”. 39

Se, no momento inicial da colonização, a op-ção pelas Capitanias Hereditárias parecia a organi-zação político-administrativa mais acertada – in-clusive por não ter que dispor de recursos da Co-roa, tornou-se a única saída plausível –, passadospoucos anos, o governo português começava a re-pensar qual seria a melhor forma de garantir umaeficiente exploração das suas terras na América.Os problemas derivados da opção pelas capitaniasnão tardaram a aparecer: as atividades econômicashaviam-se concentrado em poucas regiões, princi-palmente em função da cana-de-açúcar; o assédioàs terras portuguesas na América continuava, porparte das potências européias, caso clássico da

França. Da mesma maneira, o esboço de sistematributário articulado com o sistema das CapitaniasHereditárias demonstrava nítidos sinais de supera-ção, mesmo tendo sido instituído há tão poucotempo.

4 7 A Pr i m e i r a e t a pa d a c o l o n i z a ç ã o - 1530 • 1580

37  ROCHA POMBO, H ist óri a do B raz il , volumeII, p. 161-2.38  JoaquimVeríssimo SERRÃO, H ist óri a de Por tu gal [ 15 8 0 - 16 4 0 ] , p. 331.39 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 162.

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“Eu El- Rei faço saber a vós Tomé de Souz a, fidalgo de minha casa quevendo eu quanto serviço de D eos e meu he conservar e nobrecer as

 capi tanias e povoações das terras do brasil e dar ordem e maneira comque melhor e mais seguramente se possam ir povoando paraeixalçamento de nossa santa fé e proveito de meus reinos e senhorios e

 dos naturaes delles, ordenei ora de mandar nas di tas terras faz er uma fortaleza e povoação grande e fort e em povoações e se ministrar justiça e proveito nas cousas que cumpr irem a meus serviços e aos negócios de minha faz enda e a bem das partes. ( ...) ” 

 Regimento de D om João III 

A fo r maç ão d o

g o v er n o -g er a l

4 8 t r i but o s d o BRASIL COLo NI Al - 1500•18221ª Parte

A centralização da administração colonial e o

aparecimento dos provedores da Coroa. A autoridadefazendária ganha autonomia. Aparecemos rendeirose os arrematadores que, mediante licitação, cobramos tributos emnome da autoridade real. A resistênciado colono.

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Como a doação das capitanias para os capitãestinha um caráter definitivo, coube à Coroa portu-guesa uma solução intermediária: criou-se o Go-verno-Geral, na tentativa de centralizar a adminis-

tração colonial, e, ao mesmo tempo, retomaram-seas capitanias que não tinham sido ocupadas devi-damente pelos seus donatários, conforme rezava alegislação de doação dessas largas faixas de terra.Assim, coexistiriam as capitanias dentro da ordemdo Governo-Geral.

Importa ressaltar que a desorganização da prá-tica tributária teve destacado papel na decisão por-tuguesa em direção à centralização político-admi-nistrativa. Em um Regimento Régio datado de 17de dezembro de 1548, Antônio Cardoso de Barros

recebia a incumbência de ser Provedor-Mor; partedesse regimento afirma:

E porque as minhas rendas e direitos nas di- 

tas terras atéaqui não foram arrecadados 

como cumpr ia, por não haver quem provesse 

nelas .... e para que a arrecadação deles se po- 

nha em ordem que a meu serviço cumpre, or- 

denei mandar ora às ditas terras uma pessoa 

de confiança que sirva de Provedor-Mor de 

minha fazenda...”  4 0

Neste documento, o rei de Portugal declara suaforte preocupação com a ineficiência na cobrançade tributos e busca amparo numa pessoa de suaconfiança. As palavras do rei apontam o sentidodos impostos cobrados: trata-se de uma renda vin-culada à própria pessoa do soberano e não do Es-tado português 4 1. E como o soberano portuguêsdepositava a máxima confiança neste funcionário,o Provedor-Mor, as suas atribuições eram extensas

e fundamentais:

✠ superintender e fiscalizar a arrecadação de tri- 

butos e o seu recolhimento ao Tesouro da Coroa,

e fiscalizar a produção de açúcar nos engenhos; 

✠ em conjunto com o Governador-Geral, prover 

cargos públicos; 

✠ julgar as causas que excediam a alçada dos Pro- 

vedores-Parciais, em Conselho Especial;

✠ punir os funcionários faltosos, aplicando pena de 

prisão e mandá-los ao Reino;

✠ e conhecer os defeitos e causas referentes às ses- 

marias, com alçada acima de 10$000 – dez 

mil réis. 4 2

Por sua vez, esse Provedor-Mor seria auxiliadopor Provedores-Parciais, com atribuições seme-lhantes pelas capitanias da Colônia, mas sempredependentes das ordens superiores:

(...) Jáos Provedores-Parciais ou Provedores de capitania tinham as seguintes atribuições: 

✠ superintender a fiscalização e o reconhecimento 

da arrecadação nas respectivas capitanias; 

✠ prestar contas ao Provedor-Mor, anualmente, em 

relação àreceita e despesa; 

✠ punir os oficiais da fazenda, a ele subordinados,

nos casos de erros, negligência ou desonestidade; 

✠ julgar causas referentes às sesmarias com alçada 

até10$000 – dez mil réis; 

✠ arrecadar para a Coroa os bens das pessoas fa- 

lecidas sem deixar testamentos, ou sem nomear 

testamenteiros; 

✠ providenciar em suas jur isdições a construção de 

navios destinados àvigilância e defesa das capi- 

tanias; 

✠ exercer a fiscalização dos engenhos, na cabotagem 

nas vias de comunicação entre uma capitania e 

outra. 4 3

O primeiro governador-geral do Brasil foi Toméde Souza. Este veio em março de 1549, indicado

4 9A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

4 0 Regimento de17 dedezembro de1548, A pu d  ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 162.

4 1 EsseEstado, tipicamenteabsolutista, era caracterizado por essa confusão entreo poder público eos interesses da dinastia que estivesseno poder. Só doisséculos mais tarde, enquanto fruto das idéias lançadas pelo Iluminismo, a figura do rei começara a seseparar das coisas do Estado.

4 2 Benedito FERREIRA, op. cit., p. 23-4.4 3 Idem, ibidem .

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pelo soberano português, que deixava explícitos ospoderes e as tarefas deste nobre português, inclusi-ve no que se refere à questão tributária:

Eu El-Rei faço saber a vós Toméde Souza, fi- dalgo de minha casa que vendo eu quanto ser- 

viço de Deos e meu he conservar e nobrecer as 

capitanias e povoações das terras do brasil e dar 

ordem e maneira com que melhor e mais segu- 

ramente se possam ir povoando para eixalça- 

mento de nossa santa fée proveito de meus rei- 

nos e senhorios e dos naturaes delles, ordenei 

ora de mandar nas ditas terras fazer uma for- 

taleza e povoação grande e forte em povoações e 

se ministrar justiça e proveito nas cousas que 

cumpr irem a meus serviços e aos negócios de minha fazenda e a bem das partes, etc. 4 4

 Tomé de Souza chegou ao Brasil acompanhadodo Provedor-Mor escolhido pelo soberano portu-guês. Dada a situação caótica das finanças colo-niais, conforme apontava o Regimento de 17 dedezembro de 1548, não foram poucas as tarefas deAntônio Cardoso de Barros:

Primeiro tratou de informar-se das condições 

em que se achavam as coisas da fazenda nas di- 

versas capitanias, tomando as providências mais 

urgentes para, de acordo com os respectivos ca- 

pitães, estabelecer em todos os portos as indis- 

pensáveis repartições fiscais, e fazendo com o 

Governador o provimento interino dos cargos 

necessários. Ao mesmo tempo cuidou de cons- 

trui r na Bahia casas e armazéns para alfânde- 

ga. Assim que teve tudo em nova ordem na ca- 

pital da colônia, saiu a visitar as capitanias do 

sul atéS. Vicente, onde regularizou os negócios do fisco, encarregando da provedoria da fazenda 

ao nobre e honrado Braz Cubas, que havia pou- 

co tinha tido loco- tenente do donatário. Tanto 

em Santos como nas demais vi las marítimas 

onde esteve, ordenou que se construíssem casas 

para alfândega; e quando, por fins de 1550, se 

recolheu àBahia, tinha razão para dizer que es- 

tava mudada aquela fase de anarquia com que 

tanto se impressionava a metrópole. 4 5

Na prática, a escolha de Tomé de Sousa comogovernador-geral do Brasil tinha um significadomaior: estabelecer de fato uma organização admi-nistrativa para a colônia lusitana na América. Des-

ta maneira, os regimentos que o nomearam paraesse cargo tinham amplitude capaz de tratar damaior parte dos assuntos que interessavam direta-mente à Coroa portuguesa. Em especial, cuidavamde questões relacionadas – direta ou indiretamen-te – aos tributos, como não poderia ser diferente, já que era necessário que os custos da colonizaçãofossem pagos pela exploração colonial. Não haviasentido os portugueses terem prejuízo com o Bra-sil; no máximo, imaginava-se algum gasto maiordo que os ganhos, mas por um breve período e

como investimento para tempos futuros. Dessamaneira, entre esses pontos colocados nos regi-mentos trazidos por Martim Afonso de Souza, en-contram-se:

✠ taxar o preço do pau-brasil aos concessionários 

especiais e garantir o monopólio da Coroa nesse 

produto; 

✠ acompanhar o Provedor-Mor nas diversas capi- 

tanias, informando-se dos impostos e rendas,

modo de sua arrecadação e apl icação; 

(...) 

✠ percorrer todas as capitanias ao longo da costa,

acompanhado do Provedor-Mor e consultar com 

este os respectivos capitães, ouvidores e oficiais 

da fazenda, a fim de prover a tudo quanto fosse 

de interesse de seu governo e defesa da terra, for- 

tificando-a onde julgasse conveniente e reparan- 

do as fortificações jáexistentes etc. 4 6 

Portugal tinha clareza da necessidade de umaexploração organizada sobre estas terras. Era pre-ciso evitar que a desorganização administrativa re-sultasse em sangria para o tesouro real. Daí a im-portância especial do Provedor-Mor, assim comoda sistematização das alfândegas.

 Junto às prerrogativas do Provedor-Mor, jámencionadas, também vinha uma série de obriga-

50 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

4 4 A pu d  Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 87.4 5 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 162-163.4 6  Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO,  B ras il H ist óri a - tex to e con su lt a - 1- C olôn ia , p. 122-123.

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ções. Era importante para a Coroa portuguesa tero máximo de controle sobre os funcionários quecuidavam das coisas do fisco. Mesmo porque, pormais rigoroso que fosse esse controle, como já seviu, as fraudes contra as rendas do rei tornaram-seregra durante todo o período colonial. Entre estasobrigações, encontramos:

Os Provedores de capitania eram obrigados a 

dar anualmente conta da receita e da despesa ao Provedor-Mor; aos almoxarifes cumpria, tam- 

bém anualmente, enviar os saldos do exercício 

ao tesoureiro, na Bahia. Deviam ainda os al- 

moxarifes, de cinco em cinco anos ir àcapital 

prestar contas, levando para isso todos os livros 

do almoxarifado. 4 7 

O controle do Provedor-Mor sobre seus subor-dinados era ainda maior, pois em caso de falta gra-ve destes caberia até a pena de prisão. Além disso,

a desconfiança da Coroa portuguesa era tanta, queos funcionários régios que estivessem envolvidoscom a cobrança de tributos deveriam dispor deuma fiança, além de colocarem os seus bens paracobrir quaisquer possíveis prejuízos que causassem.

Os Provedores das capitanias também tinhamuma série de atribuições e prerrogativas. Eles“eram juízes das alfândegas das respectivas prove-dorias, tinham jurisdição criminal sobre os oficiais

de fazenda do seu distrito, para os processar porerros de ofício, podendo condená-los não só àperda do cargo como a qualquer outra pena emque pudessem incorrer”. 4 8

Os Provedores-Mores também deveriam auxi-liar o Governador-Geral diretamente em tudoquanto dissesse respeito ao governo da terra; fazerconstruir umas casas para alfândega, acomodadaspara o despacho e boa arrecadação de direitos,uma vez estabelecida a povoação da Bahia. Alémdisso, competia-lhes:

51A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

4 7  Rocha POMBO, op. cit., volumeII, p. 163.4 8 Idem, ibidem .

9. Assim como os Provedores-Mores deviam saber das receitas e despesas dos

provedores de capitanias, senhores de engenho mantinham registros sobre sua

própria contabilidade, como Antonio Castelo Branco, em seu BORRADOR EM QUE LANÇO

TODAS AS CARTAS QUE ESCREVO , PRINCIPIADO EM AGOSTO DE  1742, ESTANDO NA B AHIA , SÉCULO XVIII,

manuscrito. São Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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✠ ordenar o estabelecimento das casas encarregadas 

dos negócios da Fazenda Real, com os livros ne- 

cessários a esse fim, sendo um para a escritura- 

ção das rendas e seus títulos e outro para os fo- 

rais, regimentos, provisões, ordenados, tenças,contratos, arrendamentos e matrícula da gente do 

soldo; 

(...) 

✠ exigir a prestação de contas anuais de receita e 

despesa dos provedores das capitanias, enviando- 

se os saldos aos tesoureiros residentes na Bahia 

(...). 4 9

 Também é importante ressaltar que as autorida-des fazendárias do Brasil colonial tinham plena au-tonomia em relação às outras autoridades portu-guesas. Esta autonomia deveria ser plenamenteobedecida; caso houvesse alguma intervenção defora da Fazenda numa questão deste caráter, estaera considerada usurpadora, incorrendo em váriaspenalidades. Disso pode-se derivar o quanto erafundamental para o governo português a questãodo fisco. Inclusive, o poder dado aos Provedoresultrapassava as questões fiscais, estabelecendo, porcausa disso, situações de conflitos com a populaçãolocal, que dominava algumas atividades econômicase que era passível de cobrança de tributos:

[ Exerciam] inspeção sobre o trabalho dos enge- 

nhos, sobre comunicações de umas para outras 

capitanias pelo sertão, e sobre cabotagem, etc.

Eram sua própria natureza, as mais espinhosas 

as funções desses oficiais da Fazenda. Os impos- 

tos esmagavam o produtor e o comerciante. 50

Se, por um lado, havia a forte preocupação dofisco português em sistematizar a cobrança de tri-butos, fazendo dessa tarefa uma forma de arreca-dar mais e melhor, os contribuintes sentiram con-cretamente os abusos cometidos pelos agentes fis-cais. Vários momentos da atividade de recolhi-mento e fiscalização dos tributos tornavam-se ar-bitrários, muito em função da extrema autonomiaconferida a esses agentes. Violência e cobrança de

tributos, não poucas vezes, caminham junto. So-fria, como não poderia ser diferente, o contri-buinte, à mercê da vontade pessoal e econômicados fiscais e dos outros funcionários do Erário

português. Rocha Pombo, neste sentido, é muitoesclarecedor:

A princípio [os impostos] , eram os dízimos e os 

benefícios dos capitães; os quintos sobre metais 

e pedras preciosas; as sisas, as alcavalas, os im- 

postos de chancelaria (selo), o de passagem, o 

dos engenhos e dos molinetes, etc.; e os múlti- 

plos e exaustivos impostos lançados pelas Câ- 

maras. A tais excessos juntava-se o rigor do 

fisco, mesmo pelas dificuldades que tinha de ser 

feita a arrecadação. Nos portos, os dízimos de ‘embarque’ não permitiam grandes abusos, e 

não davam lugar, portanto, a que os agentes fiscais com abusos mais clamorosos punissem as 

faltas do contribuinte. 51

Porém, a situação de relativa legalidade das re-giões portuárias, onde a circulação de mercadoriasera maior, não se repetia pelos espaços distantesdo litoral. Gradativamente, os postos fiscais iam-se multiplicando pelo interior da Colônia, sempreatrás das novas frentes econômicas que se abriam. Junto às estações de arrecadação, como foi regradurante a colonização portuguesa nas terras ame-ricanas, postavam-se forças militares, que busca-vam garantir o efetivo pagamento dos tributos e orespeito às autoridades constituídas para esse fim.A violência marcou a presença portuguesa em ter-ras brasileiras; no caso dos tributos, esta revelou-se através dos tributos em si, além de algumas prá-ticas violentas de arrecadação.

Se o Erário português fazia da cobrança de tri-butos um meio de sustentar os gastos com a colo-nização do Brasil, normalmente sem qualquer tipode preocupação com a capacidade contributiva doscolonos – daí a proliferação de impostos, taxas econtribuições sem maior racionalidade e sim coma marca da necessidade imediata –, os mecanismosde cobrança também trouxeram muitos contratem-pos aos contribuintes. Além do poder ilimitadodos funcionários do fisco, Portugal fez a opção

52 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

4 9 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 123.50 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 164.51 Idem, ibidem .

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pela cobrança de impostos através dos rendeiros,sujeitos que participavam do sistema de arremata-ção ou contratação. Esta forma de cobrança tor-nou os inúmeros tributos ainda mais penosos.

Cada colono conhecia, de um modo ou de outro,a crueldade dos homens do fisco.A arrematação trata-se de um sistema marcado

por uma série de regras burocráticas, mas com umobjetivo muito claro: passar para o arrematador osriscos da cobrança, em todas as suas possibilida-des. Competia ao fisco português apenas a escolhado arrematador dos tributos, cabendo a este iratrás do valor que o governo havia determinado.Como se pode observar, este tipo de organizaçãode cobrança era muito conveniente ao fisco

lusitano. Ainda que com a experiência da minera-ção, no século XVIII, as dívidas com o fisco me-tropolitano chegaram a alcançar níveis quase insu-portáveis aos interesses dos colonizadores, comose verá adiante.

Ao arrematador dos tributos também não dei-xava de ser uma condição interessante. Dependen-do do tipo de obrigação fiscal e de como esta fos-se cobrada, seus rendimentos poderiam ser muitomaiores do que o prometido para o fisco metropo-litano. Ao mesmo tempo, podia esse arrematadortrabalhar com o dinheiro ou mercadorias arrecada-dos como tributos até acertar as contas com a Fa-zenda Real. De certa maneira, tratava-se de umaatividade de risco, por mais que certas projeçõesfossem feitas, tomando o ano ou período anterio-res como referência. Porém, como se afirmou, asuposta segurança do Erário português não eraconfirmada pela prática. Nem sempre o valor pro-metido no processo de arrematação era devida-mente pago e a própria arrematação, marcada pela

lisura:

János processos de licitação se davam quase 

sempre as fraudes mais escandalosas: ora os 

Provedores faziam vingar as suas preferências 

escolhendo os licitantes que mais lhes convi- 

nham; ora alteravam as condições dos contratos 

de modo a favorecer os protegidos; e às vezes 

chegando atéa mancomunar-se com especulado- 

res de terra na exploração de lucrativos arren- 

damentos. 52

Ou seja, o processo de licitação, desde o seuprincípio, poderia ser viciado, beneficiando supos-tos funcionários da mais alta confiança do rei por-tuguês. Esta situação perpetuou-se durante o perío-do colonial: em todos os escalões da administraçãoportuguesa no Brasil, a corrupção corria solta. Pormuitos motivos, inclusive a longa distância que se-parava as terras americanas da Europa, a Coroa por-tuguesa não conseguiu evitar tais desvios.

Mas se o fisco português perdia em função dasfraudes durante as licitações, a tendência era o con-tribuinte perder muito mais. Sem qualquer dúvida,

o arrematador não podia perder tempo em recupe-rar os valores investidos com a arrematação; sobre asua cabeça, uma espada pronta para cair estava ins-talada: era a dívida para com a Fazenda Real. Assim,quanto mais severa fosse a cobrança dos tributosdevidos, maior a chance de lucro com o negócio.Daí as relações entre os cobradores de tributos e oscolonos brasileiros não terem sido caracterizadaspela harmonia ou justiça. Restava ao que tinha aobrigação fiscal obedecer aos interesses maiores, nocaso, dos arrematadores.

53A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

52 Idem, ibidem .

As constantes desvalorizações das moedas portuguesas de ouro e prata ajudavam

o fisco português a tirar vantagens ao aumentar o valor das mesmas.

10. a. Dobra de 16 escudos de ouro, 1731, D. João V; b. 7500 réis de ouro, 1826,

D. Pedro IV; c. real de prata D. Manuel; d. tostão de prata ,1827, D. Pedro IV;

e. Cruzado de ouro D. Manuel; f. 20.000 réis contramarcado em ouro, 1727,

D. Maria II. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

a.

b.

d.

e.

f.

c.

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Entretanto, o transtorno maior ocorreu quandose introduziu a moeda metálica na Colônia. Estefato fez com que a situação dos colonos só piorasse. Tendo a lógica do sistema colonial, como pilar bási-

co, retirar riquezas do espaço explorado, também nomomento de dar valor às moedas de ouro e prata ogoverno português buscava tirar vantagens. A formamais usual de ganhar ainda mais no Brasil foi prati-car constantes desvalorizações dessas moedas. As-sim, sempre era preciso mais ouro ou prata para amanutenção de um mesmo valor. Porém, se para ocolono a cobrança de tributos através da moeda tra-zia mais prejuízos, para o fisco português, o paga-mento em espécie não era dos mais interessantes.

Esses males referentes à cobrança fiscal em es-

pécie foram recorrentes, pois esta situação estevepresente no Brasil colonial por muito tempo.Como se afirmou anteriormente, só a partir do sé-culo XIX o uso de moeda metálica passou a sermais freqüente; e isto nas regiões litorâneas. Nointerior, ainda por muitos anos, continuou-se como escambo, não só para o pagamento de impostos,mas para quase todas as relações econômicas,como pagamento de serviço, de mercadorias e desalários. 53 Tanto que:

Os artigos mais estimados constituíam verdadeiro 

padrão para a permuta: tais como o açúcar, o ta- 

baco, o cacau, o cravo, o algodão, etc. Cada artigo 

desses tinha preço fixo corrente, e corria ‘como di- 

nheiro’. No Paráe em outras capitanias do norte,

a vara de algodão ‘reputava-se por 200 réis’; a 

arroba de cravo por 5$400 réis, e a de cacau por 

3$600. Na Bahia foi por muito tempo o pau- 

brasil que regulou para a troca. No sul, depois que 

se descobriram as minas, girava o ouro em pó

como dinheiro, às oitavas. 54

Na maior parte das vezes, era interessante parao contribuinte pagar em espécie, ou seja, com fra-ções do que ele havia produzido. Mas poderiaacontecer de o arrematador não aceitar o paga-

mento dessa maneira e a dívida, grande e perene,ser estabelecida, trazendo, mais tarde, novos pro-blemas para os colonos. Assim, era comum o arre-matador, através da ação dos seus subordinados,

protelar a cobrança de impostos, não aceitandogêneros produzidos no Brasil, tornando aindamais trágica a situação dos colonos.

O pagamento de tributos em espécie, assimcomo as outras relações econômicas mediadasatravés do escambo, trazia outro problema sério: afalsificação e adulteração das mercadorias que ser-viam como troca. Um dos produtos que mais eramadulterados era o algodão:

Em 1724, o Governador do Maranhão, João 

da Maia da Gama, fez publicar edital, ‘decla- rando que como a moeda da terra eram rolos de pano, e novelos de fio, costumavam falsificá-la 

metendo dentro dos novelos trapos, paus, etc.; e 

ao próprio pano tecendo-o ralo, e de dezoito a 

vinte cabrestilhos, em vez de vinte e seis, taxa- 

dos pelo alvaráde 22 de Março de 1688; de 

modo correndo o rolo de pano ralo por vinte mil 

réis na terra, mandado para Lisboa não dava 

mais do que cinco ou seis: pelo que determina- 

va o Governador, sob pena de três meses de pri- 

são cominada no sobredito alvará, que em vez 

de novelos se usassem meadas de fio, e que o 

pano, bem tapado, e de vinte e seis cabrestilhos,

trouxesse o nome do tecelão. 55

Este edital do governador do Maranhão não dei-xa dúvidas: o algodão era uma moeda corrente naregião e passível de fraudes. Efetivamente, pode-seconsiderar uma forma de burla do fisco metropoli-tano. Ou seja, é possível considerar esta espécie de

sonegação fiscal como uma maneira de resistência àopressiva política fiscal portuguesa. O próprio do-cumento oficial aponta para dados concretos: umrolo de pano com preço contado a 20$000 réis aquino Brasil, chegava valendo 75% menos em Lisboa.Com isso, o governador exigia a troca dos rolos de

54 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

53 Acerca da questão da circulação monetária, emrelação ao final do século XVII, afirma Capistrano deAbreu que: “Por aqueletempo ocorria no Brasil emgeral umfenômeno dealta gravidade. As frotas traziamou quase, porqueas vezes falhavam, maltas decomissários quevendiamas fazendas emais artigosnecessários à população, levando o açúcar e mais gêneros da terra, queseconvertiamemfeira buliçosa evariada por algumas semanas para logo recair naestiagemhabitual. Ultimamentenotava-sequeos comissários continuavamsima vir comos carregamentos, mas não queriammercadorias emretorno, exigiamdinheiro decontado.”Capistrano deABREU, Paulística: a pretexto deuma moeda deouro, in: Ensaios e Es tudos (C r í t ica e His tór ia), 2ª Série, p. 141.

54 Idem, ibidem .55 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 170.56  Idem, ibidem .57  Idem, ibidem .

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pano pelos de fio, por entender que não seria pos-sível falsificá-los. Mais uma vez, falhou a tentativadas autoridades metropolitanas. Rocha Pombo ava-lia que parte significativa das fraudes cometidas

contra o fisco português derivava de uma legislaçãorigorosa e, ao mesmo tempo, ineficiente. 56 

Porém, vale destacar que a opressão fiscal nãovinha exclusivamente dos tributos regulares, masdas cobranças extraordinárias. Como já se viu an-teriormente, a inexistência de um orçamento dascontas públicas originava a prática do poder públi-co aumentar a arrecadação sempre que as necessi-dades se apresentassem e das maneiras que estives-sem à mão, independentemente de quaisquer aná-lises mais apuradas das condições contributivas

dos colonos. Também os legisladores fiscais portu-gueses, na maior parte da vezes, não davam aten-

ção aos efeitos econômicos das suas deliberações.Além disso, a totalidade dos tributos lançados re-caía sobre todos os colonos. Mas com característi-ca importante: parte da elite econômica colonial

poderia fugir a essa violenta carga tributária. As-sim sendo, observa-se a presença de privilégios,isenções de tributos e outros favores excepcionaisvoltados aos senhores da terra. Estes ficavam isen-tos dos impostos de alguns produtos, tais como ocacau, o anil, a canela, o café etc., quando era dointeresse da Metrópole introduzir ou fomentar arespectiva cultura. 57 

 Também, em muitos momentos, as CâmarasMunicipais, mesmo quando dispensadas de paga-mento de quota de impostos especiais, continua-

vam cobrando-os. Neste sentido, Aureliano Leite– historiador paulista – informa que:

55A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

O imposto emergencial para reconstrução de Lisboa, destruída pelo terremoto de

1755, pesou sobre os colonos, que corriam o risco de vê-lo tornar-se, como

tantos outros, compulsório e pe rmanente.

11. LISBOA ANTES E  DURANTE O T ERREMOTO; século XVIII; gravura de Mateus Sautter.

Lisboa, Museu da Cidade.

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Aos 22 de novembro [ de 1676] , a Câmara de 

São Paulo representa àmetrópole, pedindo a re- 

levação da quota-parte que cabe àcapitania no 

imposto de 200.000 cruzados lançados contra o 

Brasil, para auxílio do ajuste de paz com a Ho- 

landa e Inglaterra. 58

Nesta atitude dos vereadores de São Paulo háuma clara contestação aos abusos do fisco portu-guês. Os colonos resistiam da maneira como erapossível. A representação era uma dessas formas.Porém, a mais comum, como já se afirmou, era asonegação, que, para muitos estudiosos da históriado Brasil, era incentivada pela própria organizaçãoda cobrança dos tributos. Além, é claro, da quase

natural tendência a não se desejar pagar tributos, oque ocorre em quase todas as sociedades e tempos.

De fato, as contribuições emergenciais pesavammuito sobre a população colonial. Várias situaçõesdeterminavam a ação do fisco metropolitano, nosentido de estabelecer estas cobranças:

Eram quotas para indenizações de guerra; eram 

impostos especiais para manter tropas de guarni- 

ção nos portos e atéem fortalezas, como aconte- 

ceu em 1630, quando a Bahia se preparava 

contra os intrusos em Pernambuco; eram dona- 

tivos para casamentos de príncipes; era o impos- 

to para a reconstrução de Lisboa; e outras taxa- 

ções que caíam sobre os povos como castigo novo 

para que sentissem como os velhos eram suaves...

Nos seus apertos, quando tinha obras inadiáveis,

ou serviços, para que não havia recursos no te- 

souro, valia-se primeiro a metrópole de certos 

expedientes: tomava empréstimos como adianta- 

mento de receita; emitia apólices: lançava mão de 

depósitos públicos e atédo dinheiro dos órfãos: ou então socorria-se ao processo expedito de re- 

cunhar a moeda, elevando o valor do metal. Re- 

correu- se mesmo àloteria para prover a certas 

obras pias, espalhando bilhetes pelas possessões do 

ultramar. Quando tais recursos reduziam ou fa- 

lhavam de todo, vinham os donativos, os impos- 

tos especiais e temporários, as fintas  59 – tudo 

reclamado com muito jeito, mas bem mungido depois que pegava...60

Ou seja, muitas das contribuições para umadespesa específica, como o casamento de umpríncipe ou princesa61 – que significava um gas-to extraordinário, pois nele incluíam-se o dote ea festa de casamento –, deveriam ser cobradaspor um tempo limitado, até que toda a despesa

fosse coberta. Porém, essas contribuições acaba-vam se eternizando, fazendo com que a popula-ção, depois de alguns anos, as pagasse de manei-ra automática, sem mais saber ao que exatamen-te se referiam. Ironicamente, havia representan-tes da família real portuguesa que já haviammorrido e as taxas relativas às suas núpcias con-tinuavam vigorando.

São vários os exemplos concretos dessa tribu-tação excepcional, com o caráter de contribuição, já que o governo português alegava que os colo-nos receberiam dividendos do serviço que seriaoferecido pela Coroa portuguesa. E mesmo esta-belecendo o novo tributo, relacionando-o à pres-tação de um serviço, o governo português nãocumpria a sua parte. Não em poucas situações, orecolhimento dessas contribuições se dava de for-ma violenta, trazendo terror para as populaçõesmais afastadas dos centros mais importantes.Como a autoridade fiscal detinha poderes ilimita-dos dentro das suas atribuições, a presença deste

representante do Rei português assustava cada co-lono brasileiro.

56  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

58 Aureliano LEITE, H ist óri a da C iv il iz ação Pa u li sta , p. 40.59 Afirma Benedito Ferreira: “Dentreos chamados tributos extraordinários pontificaramcomo iniqüidadeos maiores o ‘finta’eo ‘derrama’; o primeiro, pela sua

destinação, deu origemno Brasil, parece-me, ao verbo fintar, roubar, dar prejuízo, apesar da finta ter a característica detributo ocasional eprovisório, eter asua aplicação demaneira a onerar cada umsegundo as suas posses ou rendas. Raramenteos recursos ‘arrancados’ dos colonos como ‘finta’ tinhama suadestinação ao núcleo ético da sua justificativa, queseria custear a construção deobras do uso comum, como pontes eestradas invariavelmente; sendo maisdecretada no interior da Colônia, a arrecadação destinava-seao provimento de tropas militares que transitavamde passagem para outras capitanias econstruções deigrejas, como tambémcobrir gastos supérfluos das autoridades coloniais.”Cf. Benedito FERREIRA, op. cit., p. 25. Já Savério Mandêtta, sobrefinta, afirma: “(...) eramtributos lançados proporcionalmenteaos rendimentos decada um, não havendo grandediferença, entrea significação deumda do outro (derrama) termo. Verifica-sea sua aplicação deforma arbitrária no interior, ou para a construção deigrejas, pontes oucaminhos, atépara prover as tropas depassagemdeumpara outro local. E ainda quando os quintos, pelo contrabando do ouro, não atingiama importância

prevista, a derrama vinha onerar desapiedadamenteos contribuintes mais honestos. Afora outras conjunturas, como a guerra contra os holandeses, aqui, eaguerra entrea França ea Inglaterra, na Europa, quando ‘espontaneamente’os contribuintes concorriamcomavultadas quantias.”Cf.: Savério MANDÊTTA,

 I m post os, ta x as e con tr ib u ições: resen ha hi stó ri ca do regim e fi scal n o B ra sil , p. 493.

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Não faltam exemplos de violenta ação fiscal nodecorrer da nossa História. Diante disto, percebe-se que as relações entre o fisco português e a popu-lação colonial nunca tiveram a marca da tranqüili-

dade nem da justiça. Além disso, os tributos e arre-cadações excepcionais eram criados ao sabor dosacontecimentos, prejudicando as atividades econô-micas, que exigiam um mínimo de planejamento. Tudo em nome do objetivo maior do governo por-tuguês: transferir riquezas das suas colônias para aMetrópole, sempre a partir das necessidades desta.

Dessa maneira, é importante ter claro que as re-lações entre a Metrópole portuguesa e o Brasil co-lonial sempre estiveram marcadas por uma decisivacontradição: a riqueza produzida no Brasil, de uma

forma ou outra, deveria ser transferida para Portu-gal. Ora, as decisões político-administrativas fun-damentais partiam do território europeu. E paraque essa transferência de riqueza fosse possível, vá-rios mecanismos foram estabelecidos. Porém, essacontradição entre os interesses metropolitanos e osda elite colonial não foi a única, apesar de todauma tradição historiográfica brasileira ter ficado aatentar apenas sobre ela. Dessa forma, quando seanalisa o processo de emancipação do Brasil, des-taca-se uma genérica luta entre este país e Portugal,como se todos os brasileiros tivessem os mesmosinteresses. O mesmo valeria para os portugueses. Éfundamental entender que, mesmo em Portugal, oimenso império colonial não trouxe dividendoseqüitativos para todos os habitantes do pequenopaís ibérico. Sabe-se que lá havia uma poderosa eli-te mercante – diretamente beneficiada pelo mono-pólio do comércio colonial – somada a um grupode privilegiados nobres e burocratas, que se con-trapunham a uma grande massa de miseráveis, os

quais não desfrutavam das riquezas advindas doBrasil. A estes últimos restava continuar vivendo assuas dificuldades nas pequenas vilas lusitanas, so-nhando com alguma riqueza possível no Brasil,como ocorreu com a mineração, que permitia – aomenos relativamente – ganhos rápidos.

A organização social e econômica portuguesamarcada pelas fortes diferenças também existia

no Brasil, com uma clara separação entre umaelite proprietária de terras e o resto da popula-ção, inclusive com uma grande parcela de escra-vos indígenas e africanos. Estes, juntamente com

os chamados brancos pobres – homens que eramlivres, mas não eram proprietários –, eram ex-plorados por essa elite colonial. Assim, se a ex-ploração portuguesa atingia a elite colonial,esta, conseqüentemente, fazia o mesmo com amassa trabalhadora do local. Portanto, o ônusdo pagamento dos tributos recaía, em últimainstância, sobre esses trabalhadores, escravos oulivres. Isto porque, além de serem efetivamenteos produtores das riquezas que tanto interessa-vam a Portugal, eram mais explorados na medi-

da em que a transferência de riquezas aumenta-va, visando ao benefício metropolitano. Em sín-tese: a burguesia mercantil e a Coroa portugue-sas exploravam a elite colonial, que, por sua vez,repassava esses prejuízos à massa de trabalhado-res, escravos ou não.

Neste sentido é que se pode entender como ocontrabando vai se estabelecer nas terras brasileiras,tornando-se uma verdadeira instituição. O comér-cio ilegal foi de tal monta, que jamais o governoportuguês conseguiu coibi-lo; nem as tentativas deminimizá-lo foram marcadas pelo êxito. Sobre a es-tratégia do contrabandista, afirma Rocha Pombo:

Compreendemos agora como o contrabando,

desde o princípio, e cada vez mais irreprimível,

nos hábitos, e quase que dizíamos na vida nor- 

mal da colônia: foi o grande recurso de que 

procuravam valer-se os colonos contra os gada- 

nhos do fisco. O contrabandista sofria perda de 

toda a fazenda, e mais degredo, na maioria dos 

casos para Angola. O governo foi agravando as penas; e no seu desespero, sentindo- se impoten- 

te para coibir um abuso que tão funestas con- 

seqüências tinha para o erário régio, não hesi- 

tava em tomar as medidas mais iníquas na es- 

perança de que com o escarmento se emendas- 

sem, ou pelo menos se contivessem em certos li- 

mites os criminosos.6 2

57 A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

6 0 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 172.6 1 Sobrea questão dos tributos quetinhamo objetivo decustear os casamentos reais, pode-selembrar do quefoi citado por Capistrano deAbreu no seu texto

“Paulística: a pretexto deuma moeda deouro”, sobreo dotedeummilhão decruzados por conta do casamento, em1661, da infanta D. Catharina comCarlos II, monarca inglês, a ser pago dentro do prazo de16 anos, devidamenterateado pelas capitanias. Como os recursos da Coroa não eramsuficientes parahonrar o compromisso, ao Brasil foi lançada uma contribuição anual devintemil cruzados. Cf.: Capistrano deABREU, op. cit., 2ª Série, p. 138.

6 2 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 173-4.

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É preciso lembrar que as rendas advindas dosdireitos de entrada e saída de mercadorias eramo grosso da arrecadação tributária portuguesa,ao menos até o evento da mineração, no século

XVIII. Portanto, daí se compreendem os esfor-ços do fisco português no sentido de evitar essasangria na sua receita. Ao mesmo tempo, essetributo era o que mais pesava sobre a elite colo-nial. Era uma questão crucial para o Erário me-tropolitano acabar com o contrabando. Não fal-taram ações concretas: muitos navios entravamclandestinamente nas terras brasileiras e não sócompravam os gêneros da terra como vendiampor aqui mercadorias européias. E não haviameios de se impedirem tais espertezas.

Durante todo o período em que Portugal foimetrópole do Brasil, o contrabando esteve pre-sente. Leis, decretos, portarias, entre outras for-mas legais, não tiveram o poder de acabar comatividade tão lesiva ao cofres portugueses. Quan-to mais a Metrópole criava restrições ao comér-cio ilegal, quanto mais reforçava a vigilância,mais os contrabandistas encontravam formas decontinuar a mantê-lo.

Estas organizações ilegais se espalhavam portoda a Colônia, o que dificultava a ação repres-siva de Portugal, inclusive porque a elite colonialpatrocinava essas ações:

Em 1755 (e jáa época do ouro declinava) re- 

cebeu o Vice-Rei Marquês do Lavradio partici- 

pação oficial da ‘descoberta, em Lisboa, de uma 

sociedade de contrabandistas de diamantes e 

ouro em pó, com ramificações no Rio de Janei- 

ro e em Minas’... O governo da metrópole teve 

logo notícia positiva deste grande concluo; tan- 

to assim que entre as diversas providências que tomou deu ordens para serem presos e remetidos 

para a corte alguns ourives. Alguns dias depois,

vinha outro aviso referindo-se àdescoberta de 

‘uma nova sociedade de contrabandistas’, e 

mandando que remetessem presos para Lisboa 

outros acusados.63

Além da região norte, a região sul também foiespaço privilegiado para a ação ilegal, em funçãodas características da bacia do Prata, local de am-pla circulação de mercadorias. Daí ter sido tão co-

biçada por várias nações.Neste local havia um agravante: tratava-se deuma área fronteiriça entre os domínios portu-gueses e espanhóis na América. A bacia do Pra-ta, muito por causa da facilidade de comunica-ções determinada pelos rios navegáveis, traziauma quantidade significativa de mercadorias e decomerciantes ilegais. Tanto que parcela impor-tante dos metais preciosos encontrados no Bra-sil, em Minas Gerais e outras regiões, saiu ilegal-mente pela região do Prata. O ouro brasileiro era

trocado por mercadorias que vinham de várioslugares da América espanhola, assim como daEuropa e da África. E não há dúvida de que, coma mineração, a ação dos contrabandistas chegouaos níveis mais espetaculares.64 E pouco restavaao governo português no sentido de evitar tal es-cárnio:

Tornou-se o mal tão difícil de corrigir, e a 

desordem tão alarmante, que a metrópole deu 

um decreto singularíssimo, sob o ponto de vis- 

ta do direito administrativo e que por isso 

mesmo parece mais um aviso ou remoque do 

que um expediente de governo... Chegara a ser 

tão desbragado e escandaloso o que se fazia, a 

despeito dos esforços da Coroa, em todo o do- 

mínio, que aténo estrangeiro repercutiu. Em 

1800, o enviado extraordinário em Estocol- 

mo dá, para Lisboa, notícia do comércio clan- 

destino nas costas do Brasil; e semelhante de- 

núncia desorienta de tal modo a alta adminis- 

tração portuguesa, que esta não se limitou a mandar, por meio de uma Carta de 17 de 

Março do referido ano, que se executassem as 

leis repressivas do contrabando: responsabili- 

zou o Vice-Rei e os Governadores pelos con- 

trabandos que se continuassem a fazer...65

58 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

63 Idem, ibidem .64 O contrabando, quando do augeda mineração no Brasil – emmeados do século XVIII –, atingiu seus níveis mais significativos emfunção da granderiqueza

quecirculou pela Colônia. Por todos os cantos do Brasil, o ouro eas pedras preciosas retirados da região mineradora chegavamenquanto valor para a trocapor mercadorias contrabandeadas. Inclusive, a maior partedo ouro quesaiu do Brasil colonial no século XVIII tomou essecaminho, enão a simples saídailegal destas riquezas. O assunto do contrabando voltará a ser tratado especificamente, quando seanalisar a mineração.

65 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 174-5.

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A partir desta manifestação da Corte portu-guesa, esta tomava consciência de que o contra-bando era tão volumoso também graças aos fun-cionários da Fazenda, exatamente os que deveriam

ser os primeiros a combater tais ilegalidades, de-fendendo os interesses do rei de Portugal e da bur-guesia mercantil metropolitana. Estes funcionáriosreais não apenas faziam vistas grossas ao contra-bando – até porque obtinham vantagens com ele–, como também utilizavam-se do poder dos seuscargos para realizar negociatas. Mais uma vez,pode-se creditar a longa distância que separava aMetrópole da Colônia para explicar parte dessasações. Assim, para o soberano de Portugal, só ha-via uma saída para combater essa sangria nas suas

finanças: controlar os seus funcionários, que teori-camente deveriam ser de extrema confiança. Nestesentido, um evento dá conta desta nova postura daCoroa portuguesa:

Na capitania do Maranhão, em 1751, encon- 

trou Mendonça Furtado em tal desgoverno as 

coisas da fazenda que teve de tomar medidas de 

grande rigor contra os culpados. Mais auda- 

ciosos do que nas rapinas que faziam pelas 

mãos dos prepostos, tornaram-se os almoxari- 

fes no manejo das contas falsas, e quando lhes 

convinha, no recurso dos desfalques. Aquele 

probo e honesto administrador cuidou logo de 

corrigir a anarquia, encarregando um juiz 

austero, o próprio Ouvidor Geral, das diligên- 

cias indispensáveis contra os defraudadores da 

Fazenda. O referido magistrado verificou, sem 

muito trabalho, ‘os grandes roubos que se da- 

vam’ na arrecadação; e pelas contas que exa- 

minou, reconheceu desfalques, no almoxarife,

de cerca de 30.000 cruzados. Os livros acu- savam despesas escrituradas em duplicatas, en- 

quanto, pelo que respeitava àreceita, de uma 

grande parte por escriturar, ‘não se falando – 

dizia o Governador na comunicação a El-Rei 

– nesta matéria em muitas despesas ‘duvida- 

das’ por excessos de preços...’ etc... O que se 

conclui dos documentos, em mui tos casos, éque 

os Provedores, almoxarifes, arrematantes de 

impostos, contratadores de sal e outros artigos 

e funcionários de toda ordem, e atéaltas auto- 

ridades da colônia, chegavam a formar verda- 

deiras quadr ilhas para tais depredações sob a 

égide das leis.6 6 

Os homens da confiança estrita do rei acabamse tornando o maior problema no que se refere àarrecadação tributária. Uma parte significativa doque entrava nos cofres públicos era desviada paramãos particulares. Ou ainda: muitos dos funcio-nários que tinham como parte do ofício cobrartributos se omitiam, certamente para beneficiar odevedor.

Nunca é demais lembrar que as concepções ad-

ministrativas e de poder da época consideravamque o dinheiro arrecadado através de tributos,como de outras maneiras, pertencia ao patrimôniodo rei e não ao Estado português. Ou melhor: oque era do Estado misturava-se completamentecom o que era do soberano. Assim, ao cuidar maldo dinheiro do rei, esses funcionários da Fazendaestavam cometendo um crime de extrema gravida-da: o lesa-majestade. Porém, um fator complicavaa situação da Corte portuguesa quando esta dese- java punir com rigor os funcionários corruptos.Estes, em regra, tinham ligações com a nobrezaportuguesa. Quando não eram nobres, tinham al-gum tipo de ligação com esse grupo. Assim, quan-do um funcionário real envolvia-se em algum atode improbidade, era difícil puni-lo. Praticamente,não se encontra documento referindo-se a funcio-nários públicos punidos com rigor, apesar da le-gislação ser muito clara nesse sentido.

Porém, a corrupção e os desmandos dos fun-cionários da Fazenda Real não traziam apenas

prejuízos ao próprio rei. Como já se viu, a açãodo fisco português nunca primou pela justiça. Eum outro prejuízo se delineou entre os colonos:foi na relação entre estes e os contratadores decertos produtos.67  Esse contratador adquiria o di-reito de ser o único fornecedor de uma determi-nada mercadoria; destas, a que mais conflitos ge-rou foi o sal – de extrema importância para a épo-ca pelas suas propriedades como tempero e, prin-

59A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

6 6  ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 175-6.67  O contratador detributos foi figura importanteno Brasil colonial. O seu significado, alémdeoutras análises, será objeto deatenção quando for discutida a

economia do século XVIII, emespecial a mineração, já que, nestemomento da história colonial brasileira, foi crucial a participação destes personagens,inclusive ligados à Conjuração Mineira.

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cipalmente, como conservador de alimentos.68

Quem detinha esse monopólio aproveitava-sedessa situação, tornando o preço do produtosempre algo exorbitante; isso quando a distribui-

ção da mercadoria não era simplesmente boicota-da por esses contratadores. Dentre os inúmerosconflitos ligados ao problema do sal, um casotornou-se muito conhecido:

Em Santos, no tempo de Conde de Sarzedas, foi 

tal o desespero e a indignação do povo contra o 

conluio em que se punha o provedor da alfân- 

dega com o contratador do sal, para fazer, pela 

carestia, subir o preço deste artigo, que os ha- 

bitantes, tendo àfrente o próprio Juiz de Fora 

daquela vila, arrombaram os depósitos dali, re- tirando e distribuindo pelas casas, o sal de que se precisava.69

Este episódio é importante porque, de umlado, mostra como as autoridades fazendáriasmostravam-se omissas em relação às funções doscontratadores, que podiam fazer o que desejas-sem para aumentar os seus ganhos; de outro lado,permite que se perceba que havia reação popularcontra essas situações de extrema exploração. In-clusive, essas reações populares se generalizarampor toda a história do Brasil. O senso comumtratou de pensar a história do povo brasileirocomo isenta de maiores conflitos, com uma po-pulação sempre aceitando com tranqüilidade asimposições dos setores mais fortes da sociedade.Dessa maneira, fala-se em africanos aceitando pa-cificamente a sua condição de escravos, o mesmoacontecendo com os índios e, hoje, em relação aovasto setor de excluídos que existe no Brasil.

Quando os grupos explorados saem à luta pelasobrevivência, colocam-se esses movimentoscomo desprovidos de qualquer racionalidade emotivados por interesses escusos de agrupamen-

tos radicais. Porém, em qualquer momento dahistória do Brasil, todos os setores da sociedadeque se sentiram prejudicados, de uma maneira ououtra – conforme as suas possibilidades –, busca-

ram espaço para resolver tais questões. Como ahistoriografia brasileira, na sua maior parte,guarda íntimos vínculos com as elites que sempredirigiram este país, nunca se deu a devida atençãoàs inúmeras revoltas populares contra os mais di-versos abusos.

Alguns historiadores70 trazem dados sobre a re-volta contra o contratador do sal. Roberto C. Si-monsen, por exemplo, acerca desse evento envol-vendo o contratador da capitania de São Paulo, re-lata que:

A história assinala a proeza de Bartolomeu de Fa- ria, paulista de valor, natural de Jacareí, que, por 

volta de 1710, reunindo a sua escravaria e agre- 

gados de confiança, partiu para Santos onde, de 

surpresa, assaltou os armazéns de sal, vendendo- 

o ao público pelo seu justo valor, de 1.280 réis o 

alqueire, incluídos os 400 réis adicionais do Erá- 

rio Real; carregou como pôde as suas tropas, pa- 

gou aos contratadores o sal retirado àquela base e 

voltou serra acima, destruindo pontes e pontilhões 

para se pôr ao abrigo da tropa que em Santos,

partiu no seu encalço.71

Nas informações deste autor, há algo interes-sante: apesar da reação violenta contra o contrata-dor – de certa maneira, uma violência contra oErário Real –, os rebeldes fazem questão de reco-lher os tributos devidos à Coroa em relação ao salretirado dos armazéns de Santos e vendido ao pre-ço de costume para a época.

Por outro lado, não há qualquer notícia acercadas providências que se tomaram contra o contra-tador do sal.7 2 Existe a possibilidade de que, atra-vés de conluio com as autoridades da capitania de

6 0 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

6 8 Afirma Roberto C. Simonsen: “O sal, elemento essencial para a alimentação humana eproduto indispensável para a criação, foi desdeos primeiros temposimportado dePortugal.”Cf. Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 179.

6 9 ROCHA POMBO, op. cit., volumeII, p. 176-7.7 0 Cf. Aureliano LEITE, op. cit., p. 40; Manuel Eufrásio de Azevedo MARQUES,  A pon ta m ent os his tó ri cos, geográf icos, bio grá fi cos, esta tí sti cos e n oti ciosos da

Província de São Paulo, p. 430.7 1 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 1827 2 Ainda sobrea distribuição do sal emregimedecontrato – assimcomo deoutras mercadorias –, afirma o historiador Lemos Brito que“convémreferir que

o estanco decertos gêneros sefazia, antes, no Brasil, aqui eali, conformeas necessidades das próprias capitanias. Desde1665 seestancara o sal; em1690

chegou a Metrópolea proibir o uso, pelos brasileiros, do sal encontrado nas salinas ou lagos do país!” Cf. JoséGabriel deLemos BRITO, Pontos de partida par a a his tór ia econô m ica do B ra sil , p. 75. Ainda sobreesta proibição, afirma Roberto C. Simonsen: “Como desenvolvimento da Colônia, começou a setornarinteressante para o Erário Real o monopólio desal no Brasil e, a exemplo dos demais, o seu estanco era geralmentearrematado por contratadores, queseobrigavama uma contribuição anual fixa à Fazenda Real.”Cf. Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 180.

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São Paulo, nada tenha acontecido. E não era ape-nas com o sal que essas situações ocorriam. Emmeados do século XVI, os moradores de SantoAndré fazem uma representação ao Rei de Portu-

gal reclamando do preço da farinha.73

A importância do sal fazia com que os rendimen-tos dos contratadores fossem altos, principalmente apartir do momento em que este produto passa a serestanco real. Esses contratadores faziam valer as suasprerrogativas, ganhando, geralmente, muito mais doque deveriam pagar à Fazenda Real, isto quando pa-gavam. Dessa maneira, sofriam todos os colonos,pela condição de mercadoria tão básica. Porém, opadecimento dos que dependiam do sal não termi-nava neste ponto. Outro problema se avizinhava:

como produto essencial, o fisco português, assimcomo as Câmaras Municipais, viam nele a possibili-dade de fácil tributação. Ou seja, não havia como fu-gir ao consumo do sal. Assim, “não obstante a ren-da já auferida como estanco, a metrópole viu, nessaprocura do artigo, ummeio de obter, por adicionais,novas rendas de que careciam. O sal era artigo degrande consumo, fácil de tributação e arrecadação.”74

Inclusive não só os consumidores de sal foram víti-mas de tributação especial sobre algumas mercado-rias, mas também criou-se o imposto do vinho –para custear a distribuição de água pela cidade doRio de Janeiro, isto no início do século XVII 75 ; em1641, poucas décadas após, novo imposto sobre ovinho, agora com o intuito de sustentar as tropas se-diadas na mesma cidade.7 6  Em 1681, imposto sobrea aguardente77 ; em 1689, estabelecia-se um impostosobre o azeite importado para cobrir o soldo dosgovernadores do Rio de Janeiro.78

Ou seja, valia a regra da ausência de planosacerca da arrecadação e das despesas. E quando

estas eram inesperadas, recorria-se a taxações espe-ciais, das quais a população não tinha como fugir.De certa maneira, tributar vinho e aguardente noBrasil Colônia deixou heranças até os dias atuais,principalmente, se for observado, os impostosmais altos recaem sobre as bebidas e o cigarro. Po-rém, de todas essas mercadorias, o sal foi a que so-freu o maior número de imposições fiscais.

6 1A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

7 3 Manuel Eufrásio deAzevedo MARQUES, op. cit., p. 335.74 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 181.

7 5 Vivaldo COARACY, O Rio de Janeiro no século X V II , p. 44-5 e 80.7 6  Idem, ibidem , p. 110.77  Idem, ibidem , p. 205.7 8 Idem, ibidem , p. 218-9.

12. Para evitar a sangria de dinheiro para a Colônia, as moedas eram marcadas

pela Metrópole portuguesa, que não permitia que moedas fossem cunhadas

no Brasil. a. Carimbo de 4.400 sobre 4 cruzados de D. João III; b. carimbo de 500

sobre 400 réis de D. João IV; c. carimbo de 250 sobre 200 réis de D. João IV;

d. carimbo 200 sobre 100 réis de D. João III; e. carimbo de 100 sobre meio-tostão

marcado 75; f. carimbo 75 sobre meio-tostão dos Filipes. Rio de Janeiro,Museu Histórico Nacional.

a.

b.

c.

d.

e.

f.

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Casamentos e exéquias reais faziam incidir mais

impostos sobre uma população já esfalfada por

inúmeras contribuições exigidas pelos poderes

públicos. Quanto mais os cofres públicos eram

sangrados pelas elites, mais taxas, diretas ou

indiretas, eram cobradas. Despesas da Família

Real nos anos de 1842 e 1843, relacionadas a

somas gastas com casamentos de príncipes, nos

valores de 150:000$000 e 100:000$00.

13. In: O B ALANÇO DA  DYNASTIA...OFFERECIDO AO GOVERNO

P ROVISÓRIO DOS  E STADOS  U NIDOS DO BRAZIL POR J.S.

BOTAFOGO. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1890.

São Paulo, Coleção Par ticular.

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6 3A f o r m a ç ã o d o g o v er n o -g e r a l

Outras situações também geraram revoltaspor parte dos colonos brasileiros. Havia umaprática da Fazenda portuguesa que visava atransferir, com rapidez, valores para Portugal.

 Tratava-se da desvalorização da moeda. Esta, detempo em tempo, dependendo dos interesses fi-nanceiros portugueses, tinha o seu valor altera-do. Ou seja, a mesma quantidade de metal pre-cioso passava a valer menos. Isto acarretava pre- juízos imediatos. Neste sentido, Aureliano Leitefala de uma revolta, sem apresentar maiores de-talhes, do povo de São Paulo contra a baixa dovalor da moeda, ocorrida em fevereiro de 1694.Porém, com a reação dos paulistanos, a Coroavolta atrás na sua deliberação.79

Outra medida do governo português sobre amoeda: proibiu, por muitos anos, a circulação,na Colônia, de moedas cunhadas em Portugal enão deixava que fossem cunhadas no Brasil. Estamedida visava claramente a evitar a sangria dedinheiro da Metrópole para a Colônia. Este es-paço poderia, conforme a época e a atividadeeconômica, render muito mais do que o capitalaplicado em Portugal. O temor português degrandes riquezas sendo transferidas e reproduzi-das na sua colônia americana explica essa ação daFazenda régia portuguesa. Conforme essa proi-bição, como já foi comentado, as relações de tro-ca se davam de um produto ou serviço por outro,o que determinou que várias mercadorias passas-sem a exercer o papel de moeda, até com valorespreestabelecidos. Mas deve-se registrar que a ex-trema exploração sobre os colonos americanosexercida pelo fisco português tinha alguns limites.Quando as contribuições e taxas eram lançadas so-bre estas pessoas, as reações eram imediatas. Por

conta de contingências, uma determinada regiãopoderia estar em dificuldades e não poderia arcarcom a sua parte dentro do estabelecido pela Fa-

zenda Real. Assim, quando uma vila entendia queas suas dificuldades eram definitivas, esta recorriaao governo português, solicitando, através da suaCâmara Municipal 80 , isenção fiscal. Diante de uma

realidade incontestável, resolvia o fisco metropoli-tano aceitar o pedido dos brasileiros. É nesse sen-tido que em 1735, “aos 31 de dezembro, uma car-ta-régia dispensa os habitantes da vila de Itu deconcorrerem com impostos para os casamentosreais, devido à sua pobreza.” 81 Essa situação repe-tiu-se por algumas vezes, mas não chegou a ser re-corrente.

7 9 Aureliano LEITE, op. cit., p. 44. Na obra H ist óri a E con ôm ica do B ra sil , deRoberto C. Simonsen, p. 68-73, há umquadro comas moedas cunhadas emPortugal desdea unificação destepaís – por volta de1128 –, atéo reinado deD. João VI, de1799 a 1826. É importanteressaltar quemuitas dessas cunhagenscircularampelo Brasil equeoutras moedas estrangeiras tambémestiverampresentes na Colônia, muito por conta do contrabando; inclusive, ocorreu a fortepresença das moedas espanholas, principalmentedurantea União Ibérica (1580-1640).

8 0 “João Francisco Lisboa fez notar, ainda quesereferindo especialmenteao Maranhão ePará, a importância queassumiramna história do Brasil as câmarasmunicipais. Mas o mesmo sepodedizer emrelação às demais cidades do Brasil, eemespecial do Rio deJaneiro edeSão Paulo. Elas não só taxavamo preçodos salários edos artigos decomércio, mas regulavamo curso eo valor da moeda; estabeleciamprovidências sobretoda a atividadeeconômica da colônia;atreviamimpor ou a recusar tributos; deliberavamsobrea criação elocalização das povoações esobrea paz ou a guerra comos índios; prendiamou castigavamfuncionários; faziamalianças políticas entresi; e, finalmente, chegavama nomear ea suspender governadores. Só nas cidades, como Bahia eo Rio deJaneiro,

onderesidiu o governador-geral, esta suprema autoridadeda colônia conseguiu preservar o seu poder do domínio das câmaras municipais, o qual nas demaiscapitanias sefez sentir compreponderância. Segundo Rocha Pombo, algumas câmaras da colônia chegarama ter emLisboa representantes efetivos.” (JaimeCortezão - História dePortugal). Cf. Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 181.

8 1 Aureliano LEITE, op. cit., p. 59.

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“Q ualquer descaminho do tabaco, por qualquer destas partes do Brasil, fora do registro e guias, debaix o do que tudo vai despachado, tem por pena a perda do tabaco e da embarcação em que se achar e mais cinco anos de degredo para A ngola ao autor desta culpa. ( ...) E, quanto mais rigorosas são estas penas, tanto maior prova são do muito a que subiu o

 contrato e do grande lucro que têm todos os pr íncipes. ” 

 A ntonil 

A at i v i d ad e ec o n ô m i c ae a po l í t i c a t r i bu t á r i a

6 4 t r i but o s d o BRASIL COLo NI Al - 1500•18221ª Parte

A importância da produção açucareira. A tributação

sobre escravos e açúcar, as grandes fontes de receitasda Coroa portuguesa. Couro e tabaco são fontescomplementares.

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Nessa primeira etapa da colonização do Brasil,o destaque econômico ficava por conta da produ-ção do açúcar, o que acabou permitindo que umaquantidade razoável de riquezas fosse dirigida

para a Metrópole. Esses fluxos monetários, oumesmo em espécie, que deixavam o Brasil, eramverificados de duas formas básicas: através de im-postos diretos ou indiretos e por meio de relaçõescomerciais sempre favoráveis ao Erário português.Vale ressaltar que os ganhos preferenciais advi-nham das relações comerciais e não dos impostosou taxas. Mas é claro que estes também contri-buíam muito para o Erário Real.

É possível dimensionar os ganhos da Coroa por-tuguesa com a tributação do açúcar brasileiro graças

aos dados recolhidos pelo padre João Antônio An-dreoni – ou Antonil – jesuíta italiano, que esteve noBrasil por quase um quartel, entre fins do séculoXVII e início do XVIII, e que deixou uma obra deextrema importância: Cultura e Opulência do Brasil .Neste trabalho, há um minucioso cuidado com acontabilidade das principais atividades econômicasda época.82 Em relação ao açúcar, os dados sãoapresentados da seguinte maneira:

custos de uma caixa de açúcar branco macho de trin- 

ta e cinco arrobas: 

Pelo caixão no engenho, ao menos 1$200 

Por se levantar o dito caixão $050  

Por 86 pregos para o dito caixão $320 

Por 35 arrobas de açúcar a 1$600 56$000 

Por carreto àbeira-mar 2$000  

Por carreto do porto do mar atéo trapiche $320 

Por guindaste no trapiche $080  

Por entrada no mesmo trapiche $080  

Por aluguer do mês no dito trapiche $020 

Por se botar fora do trapiche $160  

Por direitos do subsídio da terra $300 Por direito para o forte do mar $080  

Por frete do navio a 20$ 11$520  

Por descarga em Lisboa, para a alfândega $200 

Por guindaste na ponte da alfândega $040 

Por se recolher da ponte para o armazém 83 $060 

Por se guardar na alfândega $050  

Por cascavel de arquear, por cada arco $080 

Por obras, taras e marcas $060  

Por avaliação e direitos grandes,

a 800 réis, e a 20 por 100 5$600  

Por consulado a 3 por 100 $840  

Por combói a 140 réis por arroba 4$900 

Por maioria $600  

O que tudo importa 84$560  

Fonte: João Antônio ANDREONI (pseud. Antonil), op. cit ., p. 229-230.

Ou seja, “com o encaixotamento, transporteaté os trapiches, aluguel destes, embarque, impos-tos na terra, fretes, despesas na Alfândega e arma-zenagem em Lisboa, direitos, consulado e outras,despendiam-se, no início do século XVIII, cercade 45% do custo do açúcar fino e 60% nos açú-cares inferiores.” 84 Assim, o açúcar branco macho85

saía das terras brasileiras cotado a 1$600 réis a ar-roba, chegando a Lisboa a mesma arroba a 2$410

réis. Grande parte desse aumento relacionava-se

65A a t i v i d a d e ec o n ô m i c a e a p o l í t i c a t r i b u t á r i a

8 2 Há umfato interessantequeenvolvea publicação do livro deAntonil na Europa. Ao levar a cabo a intenção depublicar a sua obra, isto em1711, o governoportuguês percebeu os possíveis males eos sérios prejuízos queesta poderia trazer aos seus interesses econômicos, já quenela o padre italiano trata deinúmeros detalhes acerca das atividades econômicas da mais importante colônia portuguesa naquele momento. Dessa maneira, a obra de Antonil foiconsiderada umato deespionagem, sendo, imediatamenteapós a publicação, proibida. Só muitos anos mais tardevoltou a ser publicada. Sobreesta questão,afirma A. P. Canabrava: “Publicada em1711, a edição foi quasetotalmentedestruída emcumprimento ao veto eseqüestro régio. Salvaram-seapenas uns rarosexemplares. (...) Os motivos do confisco de C ultura e O pulência, segundo Taunay, prender-se-iamà inconveniência da divulgação das riquezas expostas assimà cobiça deoutras nações (...)”. Cf. A. P. CANABRAVA, João Antônio Andreoni esua obra, in: ANDREONI, João Antônio (pseud. Antonil), C u l tu r a e

O pulência do B rasi l, p. 27-28.83 Sobreos armazéns, tem-se: “ArmazémReal - Depósito dearmas, munições, fardamento, ferramentas, alimentos, equipamentos náuticos eoutras mercadorias,

destinadas ao uso das forças militares da Coroa ou mesmo derepartições civis, queexistia nas sedes das capitanias eempovoações estrategicamentelocalizadasno interior ou no litoral. Era habitualmentechefiado por umalmoxarife emuitas vezes estava instalado dentro defortificações militares. Nos locais ondehouvesseProvedoria da Fazenda Real ficava subordinado a ela enela se integrava. Aparecemfora das sedes das capitanias no final do século XVII ese

difundempelo interior no Ciclo do Ouro.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.84 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 111.85 “Açúcar decor branca, procedenteda partesuperior das formas, chamada cara deforma. É o demelhor qualidade.” Cf. A. P. CANABRAVA, João Antônio

Andreoni esua obra, in: João Antônio ANDREONI (pseud. Antonil), op. cit., p. 121.

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aos tributos, fossem diretos ou indiretos. Aindaque não se possa ignorar, como já se afirmou, oalto custo dos fretes, praticamente 20% do custoinicial da mercadoria.

E não há como negar que os direitos tributáriosrecolhidos por Portugal representavam uma consi-derável soma de recursos, tendo em vista que a em-presa açucareira foi extremamente rendosa, movi-mentando valores altíssimos. A economia açucarei-ra foi responsável pela viabilização da presençaportuguesa colonial no Brasil, justamente porque oNordeste brasileiro era responsável por toda a pro-dução mundial, pelo menos até os fins do séculoXVII. Graças a esse monopólio, os lucros da in-dústria açucareira permitiram a instalação de uma

administração colonial perene, que, como já se viu,tinha um custo alto e que só poderia ser paga coma efetivação de uma fonte de renda compatível.

Apesar da inexistência de dados precisos sobreo tamanho da produção de açúcar no Brasil, assimcomo o preço dessa mercadoria nas mais distintasépocas, algumas informações foram preservadas e

dão a dimensão dessa atividade econômica para asfinanças de Portugal. Neste sentido, afirma Rober-to C. Simonsen que:

O açúcar que havia caído em 1506 ao preço de 

300 réis por arroba, pouco mais de 2 gramas 

ouro, foi de novo subindo atéalcançar, em fins do 

século XVI , preço em ouro 6 vezes maior; e 7 

vezes mais, quando atingiu, na primeira metade 

do século XVI I , o período do seu apogeu. 8 6 

Quanto à produção brasileira, as estatísticassão pouco precisas. Vários historiadores e cronis-tas apresentam números divergentes ou mesmo

66  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

O estabelecimento de engenhos de açúcar no Nordeste brasileiro viabilizou aexploração econômica da Colônia, assim como “os lucros da indústria açucareira

permitiram a instalação de uma a dministração colonial perene”.

14. Franz Post, P  AISAGEM COM P LANTAÇÃO, 1668; óleo sobre tela. Rotterdam,

Museum Boijmans Van Beuningen.

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contraditórios. Roberto C. Simonsen prefere uti-lizar os dados mais modestos, evitando cair emqualquer exagero. Para este pesquisador, é possí-vel falar numa produção de mais de dois milhões

de arrobas, isto às vésperas da presença holande-sa no Brasil. Daí discordar de alguns autores,como Henri Raffard, que afirma que a produçãodessa mercadoria atingiu a cifra de quatro mi-lhões de arrobas. Ou ainda F. L. Bulamarqui, queaumenta essa cifra para cinco milhões.

Estes números desencontrados não podem es-conder uma realidade cristalina: a arrecadação tri-butária da Coroa portuguesa foi significativa nesteperíodo por conta da grande produção de açúcar. Tratava-se, sem dúvida, da grande fonte de renda

do fisco metropolitano. E não deixa de ser interes-sante que essa fonte tributária recaísse sobre os di-reitos de saída desta mercadoria. Ainda quanto aopapel desempenhado pelos tributos cobrados so-bre o açúcar para o fisco português, temos as pa-lavras de Roberto Simonsen:

Não éexagerado calcularem em 25% sobre a ex- 

portação do açúcar, as rendas obtidas diretas e in- 

diretas, auferidas pela Coroa portuguesa. Foi no 

império do açúcar que Portugal se apoiou no sé- 

culo XVII ; no ouro e no açúcar do Brasil foi 

buscar, no século XVII I , os seus principais pro- 

ventos. Havia terminado o período deficitário da 

Terra de Santa Cruz, que, desde então, e por du- 

zentos anos, ia proporcionar fortes saldos àMe- 

trópole portuguesa. (...) 87 

Porém, o sucesso da empresa açucareira só foipossível em função da opção pela mão-de-obra es-crava. Não havia qualquer possibilidade de organi-

zar a produção agrícola na América portuguesautilizando-se do trabalho assalariado. Para que oslucros auferidos fossem substanciosos, os saláriosa serem pagos não poderiam ser grandes. Dessamaneira, não havia como atrair mão-de-obra daEuropa. Pouquíssimos portugueses se aventura-riam nestas terras a troco de um salário miúdo.Quem saiu do Velho Mundo, rumando para o Bra-sil, ou o fez com intuito religioso ou para ganhar,rapidamente, muito dinheiro. Não era o caso de

um trabalhador europeu desqualificado. Valia maisa pena continuar na pobreza nas seguras terrasportuguesas do que vir para terras que foram co-nhecidas como o próprio paraíso, mas que, para a

maioria, não passava do inferno, de tal montaeram os sofrimentos e as privações.Assim, o desenvolvimento da produção açuca-

reira dependia do trabalho compulsório. Mais: osistema colonial dependia da exploração da mão-de-obra escrava. Era preciso que o custo desta pe-sasse o menos possível. Inicialmente, optou-sepelo trabalho do homem indígena. Porém, poucosanos depois, percebeu-se que a mão-de-obra afri-cana seria muito mais interessante, principalmen-te em termos econômicos. Considerando-se que o

escravo indígena pouco lucro dava enquanto mer-cadoria, já que era apresado aqui mesmo no Bra-sil, o negro africano só poderia chegar a estas ter-ras através do tráfico negreiro, aliás, negócio alta-mente rendoso. Quase todas as nações européias,assim como os grandes negociantes, perceberam oincrível potencial dessa atividade econômica. Tor-nou-se um excelente negócio, assim como o era oinvestimento num engenho de açúcar. Portugue-ses, espanhóis, holandeses, franceses e ingleses,entre outros, envolveram-se em profundidade nes-se ramo de negócio. Obtinham-se lucros rápidos egrandes, com um risco muito pequeno. Daí nãohaver qualquer coincidência entre o fato de a In-glaterra ter sido o país que mais recebeu vanta-gens com o tráfico negreiro e, ao mesmo tempo,ter sido a pioneira na Revolução Industrial a par-tir da segunda metade do século XVIII. Para sedimensionar os lucros deste comércio, basta levarem conta que aproximadamente 10 milhões deafricanos foram retirados de suas terras e trazidos

para a América.A Coroa portuguesa só fez aumentar os seuslucros em função deste tráfico. Se, por um lado,esses escravos tornaram-se a mão-de-obra dosengenhos – e mais tarde das minas –, portanto,os verdadeiros produtores das riquezas coloniais,de outro, eram mercadorias passíveis de tributa-ção. Para cada escravo que chegava ao Brasil, as-sim como em outras colônias portuguesas, paga-va-se um imposto de entrada. Cobravam-se

6 7 A a t i v i d a d e ec o n ô m i c a e a p o l í t i c a t r i b u t á r i a

8 6  Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 112.8 7  Idem, ibidem , p. 121.

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3$000 réis por cabeça; este valor foi aumentado,conforme Carta-Régia de 10 de julho de 1699,para 3$500 réis. Além disso, quando houve acorrida para as regiões mineradoras, já em iní-cios do século XVIII, surgiu um novo imposto:

para cada escravo que saísse dos engenhos em di-reção às minas, pagar-se-iam 4$500 réis. Ouseja, para o governo português, o tráfico revelou-se um grande negócio.

Esta tributação em relação aos africanos va-riou durante a existência desta instituição. Assim,

Houve épocas em que o comércio da África para 

o Brasil era livre, exigindo a Coroa apenas 

4$000 por escravo exportado. Além desse im- 

posto, cobravam-se em outras fases direitos, no 

Brasil, que variavam entre 3$000 e 4$500.Noutros, o Governo outorgou monopólios, le- 

vando o imposto até8$700.8 8

 Também foi criado um imposto sobre a vendade escravos “ladinos”, isto é, aqueles que já esta-vam vivendo na colônia há algum tempo. Este im-posto era de 5% sobre a venda deste escravo.

 Já no século XIX, “de acordo com o Alvará de

25 de abril de 1818, sobre direitos aduaneiros,cada negro novo, de mais de 3 anos, trazido daÁfrica, deveria pagar, além dos direitos já existen-tes, e que então montavam cerca de 6$000, umataxa adicional de 9$600. Parte deste adicional de-veria constituir um fundo para promover a coloni-zação branca.”89 Vale ressaltar que no início do sé-culo XIX, com a expansão da ordem industrial, aInglaterra, como grande potência da época, ques-tionava a validade do tráfico negreiro e exigia queo Brasil começasse a mover-se no sentido de aca-

bar com ele. Assim, as novas taxações visavam atornar o uso da mão-de-obra compulsória cadavez mais desinteressante.

6 8 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

“Se, por um lado, esses escravos tornaram-se a mão-de-obra dos engenhos – e

mais tarde das minas –, portanto, os verdadeiros produtores das riquezas

coloniais, de outro, eram mercadorias passíveis de tributação.”

15. ALAGOA AD..., 1671; gravura. São Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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Em fins do século XVIII, ainda em relação aotráfico negreiro, coube à Coroa portuguesa ou-tro papel, que ia além de cobradora de tributos:ao lado dos ganhos com os impostos, o poder

metropolitano resolveu também participar dotráfico, passando a comprar diretamente escravosna África e revendê-los nas suas colônias. “PelaCarta Régia de 21 de dezembro de 1697, seaplicou, com esse objetivo, a soma de 25.000cruzados. (...) A Carta Régia de 16 de novembrode 1697 diz expressamente que o Rei tomará a siintroduzi-los a bem dos povos. Em 6 de feverei-ro de 1703, fixou-se o preço de cada um em160$000; e a Provisão de 24 de fevereiro de1719, em 300$000, apesar de reconhecer que ao

Rei ficava cada um, posto nas capitanias, em94$000!” 90

Dessa maneira, é preciso entender que a op-ção pela escravidão não tinha como intuito pri-meiro atender às demandas por mão-de-obra esim o estabelecimento de uma ordem, no sentidomais amplo do termo. Assim, “como o próprionome indica, o escravismo colonial é um sistemaque se baseia numa dupla exploração: a escravis-ta e a colonial. (...) Teoricamente, os grandes be-neficiários seriam os senhores de engenho. Ocor-re, entretanto, que, tendo a exploração um cará-ter colonial, a maior parte da riqueza acabava setransferindo para as mãos da burguesia mercan-til e, também, para o Estado metropolitano.” 9 1

A transferência da riqueza produzida no Bra-sil para as mãos da burguesia mercantil portu-guesa dava-se através de uma relação comercialexploradora, exclusivamente colonial. Atravésdessa sistemática, o Brasil, enquanto um espaçocolonial, só poderia comprar e vender aos portu-

gueses. Daí as mercadorias aqui produzidas se-rem normalmente subvalorizadas, enquantoaquelas que chegavam à Colônia, vindas da Eu-ropa, eram comercializadas a preços altos. Quan-to ao Estado português, o grosso das suas fontesvinha da cobrança dos inúmeros tributos.

E estes tributos não derivavam apenas do trá-fico negreiro e da produção açucareira, mas de

outras atividades econômicas que, mesmo nãosendo tão rendosas quanto às acima citadas,também representavam fontes seguras de rendasfiscais para o governo metropolitano.

Uma outra fonte de renda que se desenvolveuno Brasil colonial diz respeito à criação de gado.Esta possibilitou uma série de outras atividades,como transporte, vestuário, alimentação, entreoutras. Por um longo período, destacou-se o cou-ro como a parte mais rendosa desse ramo; a pro-cura por essa mercadoria era tão grande que, àsvezes, matava-se o gado apenas para extrair-lhe ocouro. 9 2

A pecuária, em função das suas inúmeras for-mas de exploração, foi fundamental para susten-

tar a atividade açucareira. Aliás, foi graças a estaque a criação de animais foi introduzida. Dentrode um engenho de açúcar os animais exerciampapéis importantes, como: força motriz, trans-porte, alimentação, couro.

Assim como acontecia com o açúcar, partesignificativa do custo final do couro dependiados altos impostos estabelecidos na época. Opeso da carga fiscal pode ser verificado atravésdos seguintes dados:

Vale cada couro em cabelo 2$100  

De o salgar e secar $200  

De o carregar ao curtume $040  

De o curtir $600  

Importa tudo Rs. 2$940  

Um meio de sola vale 1$500  

De o carregar àpraia $010  

Do frete do navio $120  

De descarga para a alfândega $010  

Por todos os direitos $340  

Importa tudo Rs. 1$980

Fonte: João Antônio ANDREONI (pseud. Antonil), op. cit ., p. 313.

6 9A a t i v i d a d e ec o n ô m i c a e a p o l í t i c a t r i b u t á r i a

8 8 Idem, ibidem , p. 138.

8 9 Idem, ibidem , p. 138-9.9 0 Idem, ibidem , p. 138.9 1 Luiz KOSHIBA eDeniseManzi FrayzePEREIRA, op. cit., p. 31.9 2 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 167.

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No que se refere aos impostos cobrados pelofisco português, verifica-se que estes representa-vam mais de 20% sobre o couro curtido e mais de30% sobre o couro em cabelo. Tais porcentagens

assemelhavam-se às cobradas do açúcar. Basica-mente, as regiões produtoras concentravam-se naBahia, em Pernambuco, no Rio de Janeiro e no sulda Colônia. Porém, no século XVII, a região pla-tina, sob o domínio espanhol, também iniciou essaexploração econômica, vindo a fazer concorrênciacom o couro brasileiro, inclusive no próprio espa-ço colonial. Por conta deste fato, não tardaram aaparecer atitudes mais severas por parte da Coroaportuguesa em relação à região platina:

Acorreu, solícito, o Governo português em de- fesa do Erário Real e um alvaráde 1680 proibia o consumo de sola no Brasil que não 

fosse fabricada dentro do Reino. É de supor que 

a abundância e o baixo preço do artigo, na Ba- 

cia do Prata, tivessem também inf luído no âni - 

mo real para a instalação da Colônia de Sacra- 

mento, nesse mesmo ano.

Todas as fazendas de criar pagavam dízimos de 

acordo com a sua importância e produção. Na 

nova Colônia do Sacramento, a maioria dos 

couros exportados era, porém, proveniente de 

gado bravio caçado nos pampas, quando não do 

contrabando das possessões espanholas para al i 

levado pelos índios. Escapavam assim aos dízi- 

mos; daía solicitude do Governo Real criando,

em 1699, os quintos do couro da Colônia do 

Sacramento, e determinando que todo o artigo 

ali produzido fosse exportado para o Rio de Ja- 

neiro. Nesse mesmo ano lançavam-se novos im- 

postos sobre os couros importados de Buenos Aires. 93

Dessa maneira, é visível que o fisco portuguêsestava atento aos momentos em que a massa arre-

cadada diminuía. Quando isto ocorria, as atitudeseram imediatas. Nem sempre através do meiosmais eficientes. E poucos anos mais tarde, em1702, o Governo português passou a vender o di-

reito de arrecadação do quinto relativo ao couro:

Em 1702 éadjudicado o contrato das vendas 

dos quintos dos couros reais por 6 anos a 

60.000 cruzados anuais (...) .

Em 1729 jáo couro valia menos e a adjudi- 

cação foi feita na base de 500 réis, cruzado e 

quarto, por peça exportada.

Em 1705, o contrato dos quintos dos couros 

era arrematado pelo tropeiro Cristóvão Pereira de Abreu. Em 1732 o ajuste estabelecia 550 réis por couro de boi e 400 réis pelo de vaca ou 

novilha. 9 4

Por estes dados, verifica-se uma política fiscalbem flexível no que se refere às condições do mer-cado. Quando ocorria uma baixa na cotação doproduto, era inevitável uma revisão no valor doscontratos de arrematação. Inclusive, em 1761, emfunção de alguns interesses específicos da Coroaportuguesa, coloca-se em vigor um decreto realisentando de direitos de saída e de entrada todocouro produzido no Brasil.

 Também adquiriram certa importância a pro-dução e a exportação do tabaco. Planta origináriada América, aos poucos foi chegando à Europa,tornando comum o seu consumo em meados doséculo XVII, quando o seu comércio foi efetiva-do, sendo muito utilizado na troca por escravosafricanos. Inicialmente, utilizou-se esse produto

enquanto um medicamento, acreditando-se noseu grande poder terapêutico; inúmeras enfermi-dades recebiam o uso do tabaco. Cronistas doBrasil Colonial exaltavam as ricas propriedadesdesta planta:

7 0 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

9 3 Idem, ibidem , p. 168-169. Sobrea Colônia deSacramento há informações acerca desua alfândega, instituição importantepara segarantir a arrecadação dosdireitos deentrada edesaída: “Situada emColônia, à margemdo Rio da Prata, hoje território uruguaio. Apesar dejá estar prevista a cobrança detributosaduaneiros na Colônia deSacramento, no Regimento deManuel Lobo, seu fundador em1680, só em1732 foi estabelecida essa alfândega. A tomada dacidadepor tropas espanholas em1762, encerrando o domínio português, extinguiu definitivamenteessa alfândega. Não chegou a ter Provedoria da FazendaReal enão foi possível ainda descobrir o nomedenenhumJuiz dessa aduana.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

9 4 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 169.9 5  João Antônio ANDREONI (pseud. Antonil), op. cit., p. 247.9 6  Idem, ibidem , p. 248.97  Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 368.

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Os que são demasiadamente afeiçoados ao taba- 

co o chamam erva santa. (...) Homens háque,

parece, não podem viver sem este quinto ele- 

mento, cachimbando a qualquer hora em casa e 

nos caminhos, mascando as suas folhas, usando de torcidas e enchendo os narizes deste pó. (...) 

Eu, que de nenhum modo uso dele, ouvi dizer 

que o fumo do cachimbo, bebido pela manhãem 

 jejum moderadamente, desseca as umidades do 

estômago, ajuda para a digestão e não menos 

para a evacuação ordinária, alivia ao peito que 

padece fluxão asmática e diminui a dor insu- 

portável dos dentes. 95

Porém, o mesmo cronista, que não era adepto

do fumo e não parecia acreditar em tantas proprie-dades medicinais, também colocava algumas obje-ções ao mesmo:

O mascá- lo não étão sadio, porém, assim como 

mascado pela manhã, em jejum, moderadamen- 

te, serve para dessecar a abundância dos humo- 

res do estômago assim o uso imoderado o rela- 

xa; e, pela continuação, obra menos, altera o 

gosto, faz grave o bafo, negros os dentes, e dei- 

xa os beiços imundos. 96 

De qualquer modo, o vício do tabaco fez comque o consumo aumentasse. Dessa maneira, a aten-ção do governo metropolitano não deixou escaparos ganhos que poderia obter com esse produto,tanto que “ (...) a Coroa, vislumbrando a grandefonte de renda que poderia ter na exploração, tor-nou a distribuição do fumo um monopólio do Es-tado, e de tal forma, que a renda auferida pelo Te-souro, que orçou em certas épocas por três ou

quatro vezes o valor do produto posto em Lisboa,passou a constituir uma das principais receitas doerário português.” 97 

Com números relativamente precisos, RobertoC. Simonsen demonstra quais foram esses ganhosdo fisco português:

7 1A a t i v i d a d e ec o n ô m i c a e a p o l í t i c a t r i b u t á r i a

Mercadorias produzidas no Brasil, como a farinha de mandioca, eram tributadas pela Coroa.

16. Johann Moritz Rugenda s, P REPARAÇÃO DOMÉSTICA DA FARINHA DE MANDIOCA , 1835; aquarela. São

Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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Em 1642, durante a ocupação holandesa, o 

comércio do tabaco foi monopolizado e o estan- 

co arrendado por 32.000 cruzados. ( ...) Mais 

tarde, tornou-se comércio livre, mas foram do- 

brados os direitos alfandegários em Portugal.Voltou- se a ser monopolizado em 1659, em 

que o contrato renderia cerca de [ 76.800 cru- 

zados] . Em 1716, esteve o seu contrato arren- 

dado por 1.400.000 cruzados. ( ...) De acor- 

do com o depoimento de Antonil, a renda do ta- 

baco, nessa época, em dízimos, direitos alfande- 

gários e arrendamento do estanco, foi de cerca 

de 2.200.000 cruzados. ( ...) Em 1722, es- 

teve arrendado por 1.8000.000 cruzados; em 

1753 a 1781, por 2.200.000. ( ...)  9 8

Ou seja, em algumas épocas, surpreendente-mente, o tabaco chegou a render mais do que opróprio ouro, ainda que nos momentos em queeste encontrava-se em processo de decadência.

Outros números também mostram os ganhosdo fisco português com a produção e exportaçãodo tabaco:

O rolo do tabaco 8$000  

O couro e o enrolado nele 1$300  

O frete para o porto da Cachoeira $550 

O aluguer no armazém da Cachoeira $040 

O frete para a cidade da Bahia $080  

A descarga no armazém da cidade $020 

O aluguer no armazém da cidade $040 

O chegar àbalança do peso $010  

O pesar, a dez réis por rolo, e bota fora $010 O peso da balança, a três réis por arroba $024 

Direitos e fretes e mais gastos em Lisboa 2$050 

O que tudo importa doze mil,

cento e vinte e quatro réis 12$124  

Vão, ordinariamente, cada ano, da Bahia,

vinte e cinco mil rolos de tabaco; e a doze mil,

cento e vinte e quatro réis, importam 

trezentos e três contos e cem mil réis 

303:100$000 

Vão, ordinariamente, cada ano,

das Alagoas de Pernambuco, dous mil

e quinhentos rolos; e, a dezasseis mil,

seiscentos e vinte réis, por ser melhor

o tabaco, importam quarenta e um contos,

quinhentos e cinqüenta mil-réis 

41:550$000 

Importa todo este tabaco trezentos

e quarenta e quatro contos, seiscentos

e cinqüenta mil-réis 344:650$000  

Fonte: João Antônio ANDREONI (pseud. Antonil), op. cit ., p. 250.

Assim como já acontecia com outros produtostropicais, parte significativa do custo final do taba-co era determinada pelos tributos cobrados pelofisco metropolitano. Como esta mercadoria foi-setornando a cada momento mais cobiçada, o au-mento considerável do contrabando parecia a ten-dência natural. Daí as medidas repressivas tomadaspela Coroa portuguesa, no sentido de tornar essecomércio ilegal o mais rarefeito possível  99 . As pe-nalidades que atingiam os contrabandistas não pa-reciam tranqüilas:

Qualquer descaminho do tabaco, por qualquer 

destas partes do Brasil, fora do registro e guias,

debaixo do que tudo vai despachado, tem por 

pena a perda do tabaco e da embarcação em que 

se achar e mais cinco anos de degredo para An- 

gola ao autor desta culpa. ( ...) E, quanto mais rigorosas são estas penas, tanto maior prova são 

do muito a que subiu o contrato e do grande lu- 

cro que têm todos os príncipes.10 0

Por este trecho, parece claro que os altos lucrosoriginários do contrabando do tabaco, basicamen-

72 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

9 8 Idem, ibidem , p. 368-9.9 9 Essecontrolepara coibir o contrabando podeser verificado através da criação da Alfândega do Tabaco, especialmentena Bahia. Como sevê: “(...) Aduana

especializada na exportação de fumo, criada em1702, era dirigida por umSuperintendentedo Tabaco, quecuidava, alémda arrecadação dos tributosincidentes sobrea exportação dessegênero, tambémda classificação eda qualidadedo produto exportado. Em1751, coma criação das Mesas deInspeção

do Açúcar eTabaco, dirigidas por um colegiado de Inspetores, as alfândegas do tabaco passarama sesubordinar a elas, desaparecendo a figura doSuperintendentedo Tabaco. A Alfândega do Tabaco da Bahia sesituava vizinha à Igreja do Corpo Santo. Pareceter sido extinta em1827, junto comasMesas deInspecção.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal , www.receita.fazenda.gov.br.

10 0  João Antônio ANDREONI (pseud. Antonil), op. cit., p. 252.

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te em direção aos grandes mercados consumidores,que eram a Europa e a África, bastariam para com-pensar os riscos de uma pena como a de ser degre-dado para Angola, ou mesmo outra colônia portu-guesa na África, situação que significava, não pou-cas vezes, a própria morte do condenado. Assim,

em muitas ocasiões, apesar dos perigos, os riscosdavam lugar à cobiça.Se o fisco português não impedia que o contra-

bando desse sempre passos mais ousados, isto nãodeve ser creditado apenas ao fato dos largos lucrosque beneficiavam esses praticantes do comércioilegal. É preciso que se detenha um pouco de aten-ção à capacidade dos colonizadores do Brasil emconter tal atividade em prejuízo do seu fisco. A es-trutura de cobrança nunca foi conhecida por suaeficiência. Assim, o contrabandista tinha a motiva-

ção dos altos lucros, mas também contava com acorrupção e a ineficiência dos homens do fiscometropolitano, quando não a colaboração.

De certa maneira, o que aconteceu com o taba-co também se verificou com quase todos os produ-tos tropicais. O Pacto Colonial – ou ExclusivoMetropolitano, conforme expressão criada na épo-ca – impedia que houvesse livre comércio entre oscolonos brasileiros e qualquer outra parte do

mundo que não fosse Portugal. Aliás, esse comér-cio deveria ser concretizado, necessariamente, atra-vés da intermediação portuguesa. Assim, as merca-dorias coloniais, além de serem cotadas a preçosrisíveis, não poderiam ser vendidas na quantidadeque desejavam os produtores locais. Estes ficavamà mercê dos interesses e da capacidade de trans-porte e comercialização da burguesia mercantilportuguesa. Ora, a situação limitava o potencialprodutivo colonial de forma estrangulante. As de-mandas européias eram superiores à capacidade de

comercialização dos portugueses. É possível afir-mar, por conta dessas limitações que, sem a inter-mediação do Pacto Colonial, o Brasil compraria

7 3A a t i v i d a d e ec o n ô m i c a e a p o l í t i c a t r i b u t á r i a

“...rendimentos ao Erário Real. Inclusive, a pesca da baleia, por suas qualidades

especiais muito adequadas às necessidades coloniais, recebeu particular atençãoportuguesa.”

17. Leandro Joaquim, P ESCA DA B ALEIA, c. 1790. Rio de Janeiro, Museu Nacional

de Belas-Artes.

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mais e também produziria e venderia mais. Provadisso encontra-se no período da vinda da FamíliaReal portuguesa, em inícios do século XIX, que,com a liberalização de grande parte do comércio

internacional, o do Brasil com o exterior apresen-tou aumento significativo.Assim, as limitações impostas pelo Pacto Colo-

nial, juntamente com a política tributária severa,impunham aos comerciantes o lucrativo caminhodo contrabando. Por este caminho, fugia-se docontrole comercial rígido e da perda de uma par-cela considerável de lucro, que ficava nas mãos daFazenda Real. Isto sem citar todas as dificuldadesque a elite colonial encontrava para romper comos ditames burocráticos, presentes nos momentos

de se pagarem os tributos. Sem dúvida, o contra-bando aparecia como a saída mais lucrativa, apesardos riscos.

E o fisco português retirava ainda vantagensde outras mercadorias produzidas no Brasil eque eram comercializadas com a Europa, sem-pre – como regra básica do sistema colonial –

através da intermediação da burguesia mercan-til metropolitana. Tratava-se do algodão – que,como já se viu, chegou a funcionar como moe-da –, da mandioca, do arroz, do cacau, da bau-nilha, do cravo, da canela, da pimenta, da gomacopal, do anil, da baleia, entre outros produtosda terra.

Cada um desses produtos, em tempos especí-ficos, apresentou bons rendimentos ao ErárioReal. Inclusive, a pesca da baleia, por suas qua-lidades especiais muito adequadas às necessida-

des coloniais, recebeu particular atenção portu-guesa:

74 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

Para custear batalhas terrestres e navais contra estrangeiros invasores, o fisco

português cobrava taxas dos colonos para a contratação de milícias mercenárias.

18. M APA DO C  ABO DE  S  ANTO AGOSTINHO NO SÉCULO XVII, fac-símile, (s.d.). São Paulo,

Biblioteca Municipal Mário de Andrade.

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Em 1603, favoreceu a introdução da indústria 

da baleia, àqual deu nesse ano princípio, na 

Bahia, um biscainho chamado Pedro de Urecha,

que trouxe para isso duas barcas e alguma gen- 

te de Biscaia. Esta indústria desenvolveu- se de tal modo que, logo daía poucos anos, começou 

a arrematar- se o contrato dela a 600 a 

700$000 por ano. ( ...)

Em 1798, foi abolido o privilégio do contrato 

das baleias, ordenando que todos pudessem ir a 

pesca delas, preparar o azeite, etc., e concedendo 

carta de naturalização aos estrangeiros que, du- 

rante 10 anos, servissem a baleeiros portugue- 

ses. O monopólio chegou a produzir 100.000 

cruzados anuais. Cada baleia dava um conto de réis em 16 pipas de azeite e 16 arrobas de bar- 

batanas.10 1

Ao mesmo tempo, o processo de colonizaçãoobrigou os portugueses a estabelecerem no Brasiluma administração pública. Esta trazia gastos im-portantes, já que os escolhidos não sairiam dePortugal para ganhar pouco em terras americanas.Neste sentido, parte da arrecadação tributária vi-sava à sustentação desses funcionários administra-tivos. Também eram necessários fundos para aconstrução das cidades voltadas a essa adminis-tração.

Ainda nesse período, como nos posteriores, aposse dessas terras não era algo inconteste, sendoo território português na América objeto de dese- jo de várias nações européias, que por muitas ve-zes tentaram por aqui se estabelecer. Assim, a pre-sença de ingleses, holandeses, franceses, como es-panhóis, faz parte da história colonial brasileira.

Em termos tributários, a presença de estrangeirose a sua posterior expulsão resultava numa cobran-ça de novas taxas, sob a alegação da necessidade dese contratar forças militares mercenárias ou não, afim de combater o inimigo invasor. Essa situaçãofoi recorrente nesse período. Como foi recorrente

também a insatisfação dos colonos brasileiros,cansados de pagar taxas sobre taxas, sempre com ointuito de cobrir as despesas com as tropas. Comono período antecedente, as legislações portuguesas

são transportadas para o Brasil e aqui serão aplica-das.

75A a t i v i d a d e ec o n ô m i c a e a p o l í t i c a t r i b u t á r i a

10 1 PÔRTO-SEGURO, H ist óri a G eral do B ras il. A pu d  Roberto C. SIMONSEN, cp. cit., p. 373-374. Como intuito decontrolar a exploração das baleias, osportugueses criaramumórgão comessefimespecífico: “Real Pescaria das Baleias - Órgão queseencarregou da exploração do monopólio da pesca dasbaleias, após o vencimento do contrato comInácio Pedro Quintela, por força do alvará de24 deabril de1801. A idéia era liberar a pesca a todos os queseinteressassem, mas não aparecerampretendentes: a solução adotada foi criar a Real Pescaria deBaleias, dirigida por umAdministrador estatal. Em1816,

constituiu-seuma empresa deeconomia mista entrea Coroa eumgrupo decomerciantes do Rio deJaneiro, como fito detornar rentável a Real PescariadeBaleias. Essa organização tinha sedena Rua Direita (atual Primeiro deMarço), n. 36. Apesar dos esforços edo avultado patrimônio, constituído pelasvárias ‘armações’existentes no litoral brasileiro, os negócios não correrambemeo contrato foi rescindido em1825. No ano seguinte, encerrou-sea RealPescaria deBaleias, coma incorporação do seu patrimônio à Fazenda Nacional.” Cf. Internet, SiteReceita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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“Q uando, em 1623, se organizou o socorro para a Índia, Felipe IV  mandou impetrar um breve para as igrejas, mosteiros e comendas pagarem 20 0 .0 0 0 cruz ados de subsídio para recuperação de O rmuz ; mas o clero reagiu, invocando os antigos pr ivilégios do Reino. Baseado numa antiga ordenação do progenitor, o monarca determinou então faz eruma lei contra os bens de raiz dos conventos que, sendo recebidos sem a

 autorização da C oroa, deveriam reverter para esta.” 

 Joaquim Veríssimo Serrão

Un i ã o i b ér i c a 1580 • 1640

76  t r i but o s d o BRASIL COLo NI Al - 1500•18221ª Parte

A reorganização da administração fazendária no Brasil.

O aperto fiscal e os gastos militares para enfrentar asameaças externas.

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Este período da história do Brasil colonialficou conhecido como União Ibérica, já que,por conta de problemas dinásticos, a Coroa es-panhola passou a controlar também a Coroa

portuguesa.Em 1578, o jovem rei português Dom Sebas-tião morreu em luta contra os mouros no norte daÁfrica, na famosa batalha de Alcácer Quibir. Estesoberano lusitano não havia deixado descendentesdiretos ou indiretos em Portugal. Pesquisas recen-tes sobre esta fase da história portuguesa apontamque Dom Sebastião sempre foi aconselhado a secasar e para isso muitas mulheres foram indicadas,sempre ligadas à nobreza européia. Entretanto, orei português recusou a todas, colocando sempre

uma série de dificuldades frente ao matrimônio.Assim, depois de um período regencial em substi-tuição ao rei desaparecido aos 24 anos de idade,passou a reivindicar a Coroa de Portugal o rei es-panhol Felipe II, este, parente distante de DomSebastião.

Na verdade, a história portuguesa havia come-çado com a conquista da sua autonomia nacional,libertando-se da Espanha. Esta nação, por suavez, sempre sonhou em voltar a ter domínio sobre

Portugal. A crise sucessória do trono portuguêscontribuiu decisivamente para a concretização daspretensões espanholas. A partir de 1580, Felipe IIpassava também a reinar sobre Portugal, o que re-sultou na chamada União Ibérica, ou seja, doisreinos sob o poder de uma mesma Coroa.

Ao mesmo tempo, a União Ibérica tambéminteressava a setores específicos da sociedadeportuguesa. Nobres e burgueses, cada classe comobjetivos diferentes, apoiaram a unificação dasCoroas sob a direção de Felipe II. O historiador

português José Hermano Saraiva esclarece estesinteresses:

Foi para o rei de Castela que se inclinou ‘a nata 

quase toda da nobreza e a gente de substância’,

no dizer de um documento da época. No meio da 

depressão geral, a união com Castela represen- 

tava para quem tinha alguma coisa a perder a 

única saída viável. Para os nobres (cuja situa- 

ção jádifícil se agravou muito com o pagamen- 

to dos resgates dos prisioneiros de Alcácer Qui- 

bir), a escolha do rei castelhano significava a 

possibilidade de ‘manterem o seu estado’, isto é,

cargos, fortunas e ofícios cortesãos, porque Feli- 

pe I I era poderoso e rico.10 2

Ou seja, para os nobres portugueses, a questãomais importante referia-se à defesa das suas possesmateriais e de seus rendosos cargos na Corte; te-riam a garantia de receber, com regularidade, suaspolpudas tenças. Não demonstravam qualquer li-

gação com supostos ideais nacionais. Sentiram-semais protegidos sob a guarda de Felipe II e do seupoderoso império. Já em relação à burguesia, as ra-zões diziam respeito às vantagens comerciais ad-vindas da união das duas Coroas: a abertura dafronteira terrestre com Castela; o suporte do nos-so comércio com o Oriente, dado pela esquadraespanhola, que nessa época era a mais forte da Eu-ropa; o possível acesso às ricas regiões produtorasde prata da América Central, de domínio espa-nhol, aos nossos comerciantes.

7 7 u n i ã o i b é r i c a - 158 0•1640

10 2  José Hermano SARAIVA, op. cit., p. 170-171.

19. F ELIPE  II, REI DE  E SPANHA , E  I DE  P ORTUGAL, s.d., buril . Rio de Janeiro,

Fundação Biblioteca Nacional.

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Além disso, nobres e burgueses apoiavam a pre-sença espanhola porque esta poderia combater ossetores populares portugueses, que eram contra aunificação dos dois reinos e que pretendiam fazereclodir um movimento mais radical acerca do pro-cesso de sucessão da Coroa portuguesa. Assim, aUnião Ibérica, muito mais do que uma interferên-cia violenta dos espanhóis nos assuntos internosde Portugal, significou uma entrada estratégica,

com o intuito de solucionar problemas pontuaisdas elites portuguesas.

De modo que, a partir de 1580, com a uniãodas Coroas espanhola e portuguesa, legalmente oBrasil passava ao controle de uma nova Metrópo-le: o poderoso império espanhol. Mas isto não sedeu de maneira absoluta, já que no acordo feitoentre as duas nações – elaborado de maneira secre-ta –, a Espanha de Felipe II garantia o máximo deautonomia aos portugueses. Este soberano, duran-te o seu reinado, fez valer os seus compromissos.

Em termos de organização administrativa sur-giram algumas modificações; no que se refere à Fa-zenda Real, tem-se:

78 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I A l - 150 0• 18 221ª Parte

A Fazenda Real organizava-se para administrar todos os territórios do Império

português.

20. Conquistas portuguesas. In: C IVITAS  ORBIS  T ERRARUM, de Georgius Braunius

e Franz Hohemberg, vol. I, Colônia, 1572.

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79u n i ã o i b é r i c a - 158 0•1640

As finanças eram reguladas pelo Conselho da 

Fazenda, fundado em 1591, que tinha um 

presidente, com o título de vedor da Fazenda,

quatro conselheiros, dos quais dois seriam le- 

trados, e secretários para os seguintes departa- mentos: Reino, Índia, Brasil, Mina, Guiné,

São Tomé, Cabo Verde, Ordens Militares, Aço- 

res, Madeira, África, Casa dos Contos e Ter- 

ças. Eram órgãos dependentes deste Conselho a 

Casa da Índia, a Casa dos Contos e as Alfân- 

degas. A Felipe I I se devem medidas para o seu 

bom funcionamento, como ‘o livro da Rezão da 

receita e despeza’ que em 1593 passou a servir 

de registro.10 3

Para o Brasil, esta nova condição política dePortugal trouxe algumas modificações. Por umlado, a presença opressiva portuguesa e espanholanão foi tão efetiva por todo esse período. Os espa-nhóis estavam muito mais preocupados com assuas questões dentro da Europa, lugar em quetambém submetiam outros povos a seu extensoimpério; também estavam muito mais atentos àssuas possessões em outras partes da América,como era o caso do México e do Peru, de ondeeram retiradas grandes quantidades de prata. Por-tanto, os interesses da Espanha em relação ao Bra-sil reduziam-se a alguns lugares específicos, comoa região localizada em limites com o Prata, no Sul;assim como as regiões já ricas produtoras de açú-car, como era o caso do Nordeste.

Porém, isto não significou a total ausência decomando dos espanhóis em terras brasileiras. Osibéricos sabiam das pretensões estrangeiras em re-lação ao Brasil e tinham consciência de que erapreciso proteger estas terras. Holandeses e france-

ses, principalmente estes, faziam-se presentes comconstância nas costas da grande colônia portugue-sa na América. Jamais abandonaram o sonho de es-tabelecerem-se nessas regiões e formarem suaspossessões. A Espanha sabia disso e buscou saídasno sentido de proteger essas terras.

Assim, era preciso organizar formas de se com-bater a presença estrangeira pelas costas do Brasil.Como era de se esperar, qualquer movimentaçãomilitar supunha gastos; estes teriam que ser cober-tos com o aumento da carga fiscal. Dessa maneira,

No ano de 1591 levantou o cardeal Alberto o 

tributo do consulado para se armar uma frota 

permanente com um duplo fim: defender o lito- 

ral e proteger os navios vindos do Oriente e do 

Brasil. Todas as mercadorias que entrassem e saíssem pelos portos do Reino pagariam a taxa 

de 3%, revertendo o dinheiro para a repartição 

encarregada de executar aquela medida, a qual 

funcionava em Lisboa e dispunha de cônsules,

 juízes, almoxari fe e oficiais.10 4

Na falta de recursos públicos para a realizaçãoda proteção dos interesses comerciais e coloniaisportugueses, deveria recair sobre toda a populaçãoa cobrança de um novo tributo, agora com caráter

extraordinário. A população portuguesa não rece-beu com muita alegria esta nova carga fiscal, queteve, como conseqüência imediata, uma alta verti-ginosa dos preços e a decorrente queda do poderde compra.

Da mesma maneira que o povo português sen-tiu fortemente as conseqüências econômicas dacriação de um tributo, também os colonos brasilei-ros sentiram os efeitos nefastos dessa postura go-vernamental. Mais tributos significavam a diminui-ção da capacidade de consumo das mercadorias im-portadas por parte dos colonos; também significa-vam que as mercadorias brasileiras aumentariam depreço ao chegarem ao Velho Continente, tambémdiminuindo a sua demanda.

Porém, talvez o reflexo mais danoso para os co-lonos do Brasil estivesse na transferência desse tipode prática tributária para as terras portuguesas naAmérica, que ocorreria durante todo o tempo dapresença européia no local. Sempre que as rendasdos governos, em qualquer das instâncias, eram in-

suficientes para suprir os gastos imediatos, recor-ria-se aos impostos extraordinários. O que agrava-va esta situação, como já se afirmou, era a comple-ta ausência de planejamento por parte dos dirigen-tes políticos dos primeiros séculos do Brasil colo-nial; ou seja, inexistia a prática dos orçamentos pú-blicos, não havendo qualquer previsão razoávelacerca dos gastos públicos num determinado perío-do. Dessa maneira, diante de qualquer gasto maiselevado, do qual o Erário Real não desse conta, op-tava-se – de forma quase automática – pelos novos

tributos. Muitas vezes, estes surgiam prejudicandoseriamente a vida do homem comum, assim comoas atividades econômicas como um todo.

10 3  JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit. p. 252-4.10 4 Idem, ibidem , p. 42.

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Anos mais tarde – agora sob o Império de Fe-lipe IV–, recorria-se, mais uma vez, aos tributosemergenciais, com o fim específico de retomar re-giões ibéricas invadidas por potências européias.Porém, desta vez, buscaram-se recursos num setoracostumado a não contribuir com o Erário Real,ou seja, aqueles ligados à Igreja:

Quando, em 1623, se organizou o socorro 

para a Índia, Felipe IV mandou impetrar um 

breve para as igrejas, mosteiros e comendas pa- 

garem 200.000 cruzados de subsídio para re- 

cuperação de Ormuz; mas o clero reagiu, invo- 

cando os antigos privi légios do Reino. Baseado 

numa antiga ordenação do progeni tor, o monar - 

ca determinou então fazer uma lei contra os 

bens de raiz dos conventos que, sendo recebidos 

sem a autorização da Coroa, deveriam reverter 

para esta.10 5

Por dois anos os conflitos se alastraram. De um

lado, o clero português recusando-se ao pagamen-to de qualquer tributo e a perder as propriedadesque lhe haviam sido doadas sem a permissão reale, de outro, o Erário Real, sedento por recursos,sempre necessários para as incursões militares.Dessa “queda de braço”, ao menos na aparência,

vence Felipe IV, que consegue receber contribui-ções pecuniárias do clero:

Finalmente, o clero estabeleceu um acordo com 

a Coroa para o cumprimento dos dois breves: 

1º, o subsídio de 200.000 cruzados, a repar- 

tir em quatro anos das rendas eclesiásticas do 

Reino; 2º, o dos mesados, com o rendimento dos 

primeiros meses de vacatura dos bispados e 

mais benefícios do padroado real, numa só con- 

tribuição de 190.000 cruzados.10 6 

Vale ressaltar que esta resistência ao pagamen-to de tributos – que, na verdade, se constituíanuma contribuição no sentido que visava à feiturade uma tarefa específica – por parte do clero só foipossível por conta do prestígio desse grupo, o qualpodia se proteger da sanha do fisco do Estado emvirtude dos seus privilégios históricos, conquista-dos, pouco a pouco, desde a constituição do Esta-do Nacional português, isto no século XII. Porém,

nem todos os portugueses, e muito menos os co-lonos brasileiros, tinham estes privilégios. Já em relação ao Brasil, apesar de transforma-

ções que não atingiram as raias da radicalidade, anova situação de Portugal se fez sentir. Felipe II,ao assumir também o poder português, cuidou de

8 0 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

10 5 Idem, ibidem , p. 103.10 6  Idem, ibidem , p. 104.10 7   TambémemPortugal, FelipeII assustou-secomas finanças desorganizadas das cidades evilas lusas: “FelipeII foi informado do excesso degastos que

ocorria no orçamento das câmaras. Feita a necessária diligência, chegou-seà conclusão dequehavia erros na avaliação das rendas, o queperturbava a gestão

financeira das povoações. Contribuía para isso a desordemdos arquivos camarários, ondemuitas verbas destinadas à gestão pública não tinhamregistro. Afimdepôr cobro a tais dificuldades, o monarca ordenou que, daí para o futuro, ‘as rendas dos concelhos das cidades, vilas elugares desteReino senãodespendão mais nas cousas, ena forma declarada por minhas ordenações. (...)’Os provedores das comarcas deviamtambéminformar-sedas despesas feitaspelos vereadores, ordenando quetudo fosselançado emlivro próprio (...).”Cf.: JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 262.

Com orçamento deficitário, falta de víveres, armas e cobres, a situação do Rio de

 Janei ro, ass im c omo de outras regiões brasile iras, preocup ou os admin istrado res

da União Ibérica.

21. S T . S EBASTIEN V ILLE  E PISCOPALE DU  BRÉSIL. RIVIERE DE  J  ANEYRO, 1698; gravura. São Paulo,

Coleção Guita e José Mindlin.

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saber como andavam as finanças das diversas capi-tanias brasileiras. As primeiras informações quechegaram ao soberano espanhol não pareceramanimadoras10 7 :

(...) as capitanias de Pernambuco, Bahia e I ta- 

maracárendiam 30.000 cruzados, seguindo 

para o Reino 10.000 cruzados e ficando o 

resto no Brasil para os encargos do governo e 

da administração. Naquelas capitanias, o rol 

das despesas orçava em 22.835 cruzados, in- 

cluindo os 7.500 que se atr ibuíam aos padres 

da Companhia de Jesus. No relatório não indi- 

cam os rendimentos e encargos das outras capi- 

tanias, porque o governador ainda não obtivera 

todos os elementos da parte dos almoxarifes lo- cais. Mas era de crer que em todas elas – Es- 

pírito Santo, I lhéus, Rio de Janeiro e São Vi- cente 10 8 – a despesa excedesse a receita pelas 

muitas dificuldades com que as capitanias lu- 

tavam pela sua conservação.10 9

Nem todas as regiões puderam apresentar da-dos concretos. No entanto, mesmo naquelas queo fizeram, a situação não era das mais tranqüilas.Esta situação deve ter assustado Felipe II, mas osintoma mais grave é a constituição de uma polí-tica tributária ao sabor dos acontecimentos, semqualquer forma de planejamento.110 Com orça-mentos não organizados, estas regiões padeciamde males quanto à dificuldade de defender suasterras da presença de estrangeiros, ou mesmo deataques indígenas. Quanto ao Rio de Janeiro, ocaso era bem sintomático. Lá, a situação era defi-citária, com falta de mantimentos e armas; e tam-bém o engenho real carecia de obras e de cobre,

dando prejuízo tanto à Fazenda quanto aos mo-radores111.

Esta crise financeira de diversas capitanias che-gava aos ouvidos das nações européias interessadaspor estas terras. Ao saberem da crise, tinham cons-ciência das limitadas possibilidades de reação dos

colonos brasileiros e das autoridades portuguesas.De certa maneira, a falta de cuidados para com aproteção da terra estimulava, ainda mais, a açãodas potências da Europa interessadas em se estabe-lecerem na América portuguesa, a cada momentomais desprotegida.

Essa latente vulnerabilidade não poderia resul-tar apenas na invasão territorial, mas na aceleraçãodo contrabando, coisa que prejudicava o ErárioReal de maneira mais imediata. Para conter a pre-sença estrangeira só havia uma saída: urgia uma

reorganização da administração colonial, em espe-cial no que tange às finanças públicas. Uma vezprecárias, estas não tinham como fazer frente àsiminentes ameaças. Também não seria possívelaceitar práticas pouco honestas por parte dos fun-cionários reais. O caso apresentado a seguir ilustraesta situação:

Em setembro de 1583, o Provedor-Mor da 

Fazenda, Martim Carvalho, fora a Pernambu- 

co pôr em ordem o socorro da Paraíba. Deu-se 

então conta de que o provedor local, Miguel 

Gonçalves Vieira, obrigara os mercadores que 

faziam avenças nos contos do Reino a trazerem 

escravos de Angola para aquela capitania e ali 

efetuarem o pagamento dos respectivos direitos.

Tal abuso deu ao almoxarife de Pernambuco 

um ganho de vinte e tantos mil cruzados, com 

a conivência de um Vicente Correia. Quando se 

viram descobertos, os dois oficiais sonegaram os 

livros de assentos para evitar que o Provedor- 

Mor obtivesse dados mais concretos. Todavia,Martim Carvalho, ‘achando estes e outros mui- 

8 1u n i ã o i b é r i c a - 158 0•1640

10 8 São Vicente, como espaço do início da colonização portuguesa na América, foi umdos primeiros lugares a receber a presença deuma alfândega, como essasinformações podemdemonstrar: “[A alfândega deSantos] originou-seda Alfândega deSão Vicente, cujo porto era impróprio para navios demaior calado.A mudança do porto para sua localização atual gerou a fundação da cidadedeSantos ea transferência da aduana para esta. A própria Provedoria da FazendaReal acompanhou a alfândega, mudando-setambémpara Santos. As sucessivas modificações políticas na capitania não influíramna atividadeaduaneira;mesmo depois da mudança da capital para São Paulo, no final do século XVIII, a Provedoria permaneceu algumtempo emSantos. Tornada autônoma pelacriação da Junta da Real Fazenda da Capitania deSão Paulo, passou a ser dirigida pelos Juízes deFora deSantos, queacumulavama função deJuízes daAlfândega. Teveumfugaz momento deglória duranteo Ciclo do Ouro, mas só setornou realmenteimportanteemmeados do século XIX, quando sefirmoucomo o maior porto exportador decafédo mundo.” Ou ainda: “Há fortes indícios dequea primitiva Alfândega deSantos, antes do maremoto de1541,sesituasseno velho ‘Porto das Naus’emSão Vicente. O baixo calado da enseada do Tumiaru ea destruição acarretada pelo maremoto levaramos vicentinosa mudar o porto ea aduana para o local ondehojeestão, na cidadedeSantos.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www. receita.fazenda.gov.br.

10 9  JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 168-9.110 Sobreo período da União Ibérica afirma-se“mesmo quea administração da Fazenda ea da Justiça tenhampecado por falta deeficiência edevisão (...)”,ou seja, éa reafirmação das precárias condições da Fazenda Real, mesmo agora nas mãos da Espanha. Cf.: JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 256.

111  JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 169.

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tos roubos na Fazenda de Sua Magestade’,

mandou prender o almoxarife e Vicente Cor- 

reia, não podendo fazer o mesmo ao Gonçalves 

Vieira, por ser homem com influência na terra,

mas ordenou que o provedor se considerasse preso na residência.112

Esta situação, como já se viu, não era exceção.Não foram poucas as situações em que os respon-sáveis pela Fazenda pública desviavam recursosdesta em proveito próprio. No desvio destes recur-sos era comum a participação de alguns contri-buintes, que viam nesses conluios a possibilidadede pagar poucos tributos. Apesar desta situação seperpetuar na administração colonial do Brasil, as

autoridades metropolitanas apenas se davam contados desvios deste dinheiro quando havia muita ne-cessidade dele. Era o caso, por exemplo, de se for-mar, com urgência, uma frota naval para defenderalguma região do território português na América.Nestes momentos, descobria-se que os cofres pú-blicos estavam completamente vazios, incapazes defazer frente a despesas vultosas. Vale lembrar tam-bém que alguns desses funcionários podiam serpunidos por seus atos; outros, porém, devido àssuas boas relações em Portugal, escapavam dequalquer tipo de punição.

Em virtude de a administração colonial estarmarcada pela desorganização e pela corrupção dealtos funcionários, coube aos novos dirigentesportugueses – agora sob o domínio espanhol –estabelecer uma reorganização administrativa eindicar outras pessoas para os postos no Brasil,pois demonstravam fortes preocupações na áreada Fazenda pública, tendo também, como objeti-vo, evitar que o contrabando continuasse a reinar

pelo litoral brasileiro. Assim, Francisco Geraldes,ao ser nomeado governador do Brasil em 1588,recebeu uma série de tarefas da administraçãoportuguesa:

Logo que chegasse a Salvador, devia Geraldes 

convocar os membros da Junta Provisória e, na 

presença do juiz e vereadores locais, apresentar 

as cartas de nomeação e fazer o auto de jura- 

mento de sua pessoa. Sem perda de tempo cabia- 

lhe informar-se do estado das capitanias e po- 

voações, assim como da situação das tribos na- 

tivas, em especial das que se impunha pacificar.

Era preciso saber quantos povoadores havia, os barcos, armas e munições disponíveis, a fim de 

a Coroa acorrer com urgente socorro.113

E a questão mais importante seria outra:

Devia também o governador impedir o comér- 

cio de naus estrangeiras, que no Brasil carrega- 

vam açúcar e outros produtos com prejuízo da 

Fazenda Real.114

 Também havia a necessidade de povoar aindamais as regiões coloniais brasileiras que, por suariqueza já conhecida pelas potências estrangeiras,eram alvos fáceis e previsíveis. Assim, os dirigentesque chegavam aos seus novos domínios tambémrecebiam tarefas nesse sentido.

Porém, como compensação e prática já estabe-lecida, esses novos colonos receberiam terras mastambém obrigações, tais como:

(...) residir na povoação da Bahia, não pode- 

rem vender nem alhear as terras nos três anos 

a contar da posse e cumprirem o dízimo que era 

devido àOrdem de Cristo, de acordo com o fo- 

ral concedido às ditas terras.115

Ou seja, nem nos momentos em que havia mui-ta necessidade de povoar a terra, o fisco portuguêsabria mão dos seus tributos. E grande parte desteseram gastos, mesmo diante de tantas dificuldades,com o clero. Inclusive, em termos percentuais,

eram somas significativas:

E de tal modo a capitania se desenvolveu que,

no ano de 1601, a despesa de Sergipe atingia 

296$000 réis, sendo 196$000 para os en- 

cargos da administração e o restante para o 

clero local, não havendo despesas militares a 

assinalar.116 

Um terço dos gastos de uma capitania nova –Sergipe – era consumido pelas despesas do clero, ou

seja, com salários ou construção e manutenção detemplos. Trata-se, sem dúvida, de um exagero, se seconsiderarem as dificuldades financeiras de quase

8 2 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

112 Idem, ibidem , p. 170.

113 Idem, ibidem , p. 172.114 Idem, ibidem .115  JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 176.116  Idem, ibidem , p. 178.

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todas as capitanias do Brasil. Inclusive, era impor-tante saber o que se arrecadava e como se gastavanas várias capitanias brasileiras. Para o início do sé-culo XVII, têm-se os seguintes dados:

No ano de 1601, os dízimos da terra do Brasil 

foram arrendados por seis anos a Gabriel Ribei- ro, pela quantia de 42.000 escudos. A despesa do Estado era de 42.351$867, o que excedia a 

receita. As capitaniasmaisonerosaspara o te- souro eramasdaBahia (19.732$600), Per- nambuco(12.528$471), RioGrandedoNor- 

te (3.225$180) e Paraíba (2.255$070), ou seja, a zona do Nordeste. Mas nas restantes ca- 

pitanias a situação era idêntica, não sendo as rendas bastantes para cobrir a despesa.117 

Destes dados, é possível perceber a preocupa-ção com os gastos militares, que tinham como ob- jetivo claro garantir a segurança da terra com aação dos estrangeiros. Na realidade, a defesa terri-torial passou a se constituir na questão primordialdo governo. Além do medo de perder posses noBrasil, as autoridades reais tinham noção das suasperdas tributárias com o comércio ilegal. Corsá-

rios e comerciantes ilegais sabiam que, com aUnião Ibérica, o império filipino havia-se tornadogrande demais, o que aumentava as dificuldades nasua proteção.

E não eram apenas os corsários que assustavamos comerciantes portugueses: o perigo incluía osmercadores estrangeiros que vinham comerciar emterras brasileiras e que, mesmo com autorizaçãoreal, constituíam uma velada ameaça aos direitosda Coroa. “Este tráfico prejudicava o comércio

português, além de facilitar a entrada do calvinis-mo e de outras formas de heterodoxia que punhamem perigo a unidade religiosa do Brasil”.118

Esses comerciantes estrangeiros traziamprejuízossignificativos para o Erário Real. Como os colonosbrasileiros acabavamtambémtendo lucros comessasrelações, diminuía o campo de ação das autoridadesportuguesas. A sonegação fiscal era denunciada:

Tal o caso do açúcar, que pagava 10% de di- 

reitos de embarque para a Metrópole, mas sen- 

do o envio para fora do Reino ‘os açuquares não valem ha fazenda de Sua Magestade os ditos di- 

reitos de saída, nem 4% pello modo de que se despachão, assi no peso como na avaliação.’ 119

Essa evasão fiscal preocupou de tal modo osportugueses, que medidas severas foram pensadase colocadas em prática. Na essência, proibiram-senavios estrangeiros de fazerem comércio com as

possessões portuguesas.Porém, para a decepção das autoridades fazen-

dárias portuguesas, as novas determinações nãoforam cumpridas na sua totalidade. Os comercian-tes estrangeiros continuavam a contar com a cola-boração de alguns colonos brasileiros. Existem vá-rios relatos que mostram a participação destesnesse comércio ilegal, que tantos prejuízos traziaao Erário Real.

Entre as mercadorias que integravam esse con-

trabando ilegal encontrava-se o pau-brasil, aindaobjeto muito aceito no mercado europeu. Comoera possível abater essa árvore em qualquer pontoda costa brasileira, as autoridades coloniais não ti-nham controle sobre quem fazia ilegalmente essetrabalho. Inclusive, por ser feito em pontos muitodiferentes, a fiscalização não tinha como ser efeti-vada. Com essa nova sangria no seu erário, coubeàs autoridades portuguesas coibir tais abusos:

Avisada da grave situação, a Coroa decidiu in- 

tervir: doravante nenhuma pessoa seria autori- zada a mandar cortar madeiras, por si ou por 

intermédio de feitores e escravos, sem licença do provedor da Fazenda em cada uma das capita- nias; e a dita licença era apenas dada aos que 

gozavam de boa cotação por parte das autorida- des. O nome dos beneficiados seria inscrito num livro de assentos, com a indicação da quantida- 

de e locais em que a madeira fora recolhida.12 0

Essa preocupação com o pau-brasil devia-se aofato de essa mercadoria gerar rendimentos impor-tantes para a Coroa portuguesa. Até porque, en-quanto atividade extrativista, não necessitava demaiores investimentos por parte do Estado nem departiculares. Algumas estatísticas demonstram essaimportância para o fisco lusitano:

Segundo os dados que apresenta Figueiredo Fal- cão, o rendimento do pau- brasil atingiu, no ano 

de 1607, a soma de 24.000$000, sendo 

8 3u n i ã o i b é r i c a - 158 0•1640

117  Idem, ibidem .118 Idem, ibidem , p. 202.119 Idem, ibidem .120 Idem, ibidem .

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60$000 cruzados a renda do estanco da ma- 

deira, pago em pólvora de 12.000$000 réis o 

quintal, a João Nunes Correia. Os direitos do 

pau-brasil perfaziam 42.000$000, sendo de 

105$000 cruzados a renda dos dízimos a Gabriel Ribeiro da Costa, que detinha o con- 

trato desde 1601.12 1

 Todavia, em termos de presença externa em ter-ras portuguesas na América, os males não se resu-miram aos ataques de corsários ou na prática do co-mércio ilegal: foram além. Existia um plano de fixa-ção, de fato, de estrangeiros pelas costas brasileiras:

O que sucedeu em 1597, quando os franceses 

tentaram instalar-se no Maranhão, de que se apoderaram com maior força em 1611; e su- cedeu, sobretudo, aquando da criação da Com- 

panhia Holandesa das Índias Orientais, em 

1602, que, embora visando mais a posse do 

Estado Português da Índia, veio a ser o prólo- 

go da ação militar destinada a erigir um Bra- 

sil holandês.12 2

E essas invasões iriam se efetivar anos mais tar-de, especialmente a holandesa, no Nordeste açuca-reiro, como se analisará adiante.

Ao mesmo tempo, se as ameaças externas mos-travam-se a cada momento mais reais, a administra-ção colonial repetia erros já antigos. Os novos go-vernadores mandados após a União Ibérica não ha-viam conseguido resolver problemas mínimos.Continuava-se a reclamar dos administradores e,principalmente, dos funcionários corruptos. DiogoBotelho123, governador de 1602 a 1609 – que veiosubstituir Francisco de Sousa –, deparou-se com os

mesmos problemas do seu antecessor. Antes de to-mar posse do seu cargo na Bahia, passou um anoantes por Olinda para ver de perto o espaço econô-mico mais importante do Brasil. Viu como Per-nambuco estava organizado e começou a agir:

Ali se demorou um longo ano, visando resolver 

os problemas da capitania onde a inimizade dos 

colonos criara focos de mal-estar: ‘De tudo o 

povo desta terra recebia grande escândalo e 

opressão’, como mais tarde o próprio governa- 

dor havia de reconhecer. Determinou que não houvesse acumulação nos ofícios públicos, mo- 

dificou o sistema de pagamento dos empregados 

do fisco, que passaram a auferir salários fixos 

e não por percentagem, ordenou que a venda do 

vinho e a descarga das Fazendas se tornassem 

atividades francas. (...) Não esteve tão-pouco 

inativo para o governo do Estado, pois mandou vigiar o rendimento da Fazenda Real nas vá- 

rias capitanias.12 4

Mais uma vez, surgem os problemas com osfuncionários da Fazenda Real que não davam con-ta do que era arrecadado nas suas respectivas capi-tanias. Estes funcionários aproveitavam-se da máorganização da administração portuguesa, assimcomo das dificuldades extremas relacionadas aotransporte, de maneira geral, no Brasil do século

XVII e dos posteriores. Poucas e péssimas estra-das tornavam as viagens entre as capitanias verda-deiras aventuras, somando-se a isso a presença deladrões pelo caminho.

 Já por outro lado, em virtude de vários confli-tos ocorrendo na Europa – basicamente a disputaentre Holanda, Inglaterra e Espanha pela hegemo-nia marítima –, as regiões açucareiras do Brasilpassam a ser alvo da presença invasora dos holan-deses. Estes se instalaram em Pernambuco, comose verá adiante, depois da tentativa frustrada deocuparem a Bahia. Dessa maneira, o sistema tribu-tário passou, em Pernambuco, a ser organizado pe-los flamengos.

E a União Ibérica, depois de quase 60 anos emvigor, começou a entrar em crise. Se de 1580 a1620 a economia portuguesa andava bem – mes-mo porque o império espanhol vivia o seu apogeu–, no período posterior, de 1620 a 1640, a situa-ção começou a se complicar. Os nobres e os co-merciantes portugueses já não sentiam tanta vanta-

gem com o domínio espanhol. A relativa autono-mia administrativa portuguesa em relação aos es-panhóis começara a naufragar, já que aumentou ointeresse do império de Felipe IV em dominar, defato, Portugal.

A mudança da postura espanhola se deve, basi-camente, ao novo papel exercido pela Espanha nageopolítica mundial de inícios do século XVII. Ogrande império espanhol começa a sofrer quedassignificativas; a Invencível Armada era derrotadano canal da Mancha pelos ingleses. A prata da

América começa a dar nítidos sinais de esgotamen-to. E esse quadro trágico era completado pelas in-vasões estrangeiras aos domínios espanhóis

8 4 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I A l - 150 0• 18 221ª Parte

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espalhados por todos os cantos do planeta. Nocaso específico do Brasil, nessa ocasião, efetivou-sea presença dos holandeses.125

Os comerciantes portugueses se sentiram pre-

 judicados com a nova situação, pois em virtude deguerras constantes envolvendo a Espanha, o co-mércio ultramarino ficou dificultado pelos inúme-ros bombardeios. Esses mercadores já não viamcomo vantajoso manter as Coroas unidas. A situa-ção agravar-se-ia, pois,

O Governo espanhol impunha o agravamento da 

carga tributária. A exigência de participação 

nas despesas da armada que foi socorrer a Ba- 

hia levantou protestos. A questão do pagamento 

das tenças aos fidalgos portugueses, que o Go- verno de Madrid exigiu em 1631 que fosse fei- ta com o rendimento das contribuições portu- 

guesas, motivou a oposição da Câmara de Lis- 

boa, que se recusou a assumir essa responsabili- 

dade e propôs que a receita fosse obtida por um 

agravamento das sisas, a pagar por todo o País.

Mas o povo reagiu violentamente a cada novo 

agravamento dos impostos. Em 1629 houve 

motins populares no Porto por ter ocorrido o 

rumor de que se pretendia tributar a fiação de 

linho. Também a imposição de novos encargos 

aos pescadores de Lisboa ocasionou, alguns anos 

depois, a resistência popular.126 

Esta situação de crise se avolumou por conta daquestão tributária. As finanças espanholas iam male esta Coroa resolveu que os próprios portuguesesdeveriam arcar com as despesas referentes aos seusnobres, além de participar do custo da defesa do

Brasil. Porém, a insatisfação maior viria dos seto-res populares, sendo que os problemas mais gravesiniciaram-se em Évora, em 1637, devido ao lança-mento de novas sisas para pagar tenças de fidalgose vencimentos em atraso. A proposta partira da

Câmara de Lisboa, portanto, não era propriamen-te uma exigência espanhola.

Estes setores populares portugueses, que sesentiram prejudicados diante dos caminhos toma-

dos pela União Ibérica, alegaram que nunca ha-viam sido beneficiados pela união com os espa-nhóis e que, num momento de crise, eram obriga-dos a dividir os prejuízos. A revolta popular deÉvora, alimentada pelo sentimento contra anobreza, esquentou ainda mais e acabou se espa-lhando pelo país todo. Mais tarde, com a ajuda dasforças militares espanholas, o movimento foi re-primido e a liderança, enforcada.

Porém, o mais importante deste movimentopopular português refere-se ao estopim da revolta,

que foi o problema tributário. Quando uma popu-lação sente-se no direito de ir contra determina-ções legais, é porque o pagamento dos novos im-postos realmente esbarra no limite das condiçõespopulares. No caso em questão, trata-se de umacarga fiscal violenta, que fazia com que as péssi-mas condições de vida da população mais pobrefossem ainda mais agravadas.

Ao mesmo tempo, a ação dos populares deÉvora, ao invadir o palácio e queimar documentosrelativos aos direitos públicos, é revestida de umaforte simbologia. Enfurecidos, queimaram exata-mente o documento oficial que registrava a co-brança de tributos, motivo de tanta revolta.

 Também é importante perceber como um acon-tecimento em Portugal influenciava a vida no Bra-sil. Esta influência não se dava nem de maneiraimediata nem mecânica. Porém, como a circulaçãode pessoas entre a Metrópole e a Colônia era demonta, as experiências populares, de um modo ououtro, eram transmitidas de Portugal para cá. As-

sim, as revoltas de 1637 chegaram ao Brasil e cla-ramente apontavam para a questão tributária comoa causadora de tanta insatisfação popular. Tambéma população colonial se revoltaria por conta de tri-butos considerados injustos.

8 5u n i ã o i b é r i c a - 158 0•1640

121  JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 211.122 Idem, ibidem , p. 203.123 É interessanteque, quando Diogo Botelho édestituído do cargo degovernador, eleserecusa a voltar a Portugal enquanto a Coroa não lhepagasseos salários

devidos; tambémseus servidores próximos não haviamrecebido estes salários. Por conta desselitígio, entreoutras questões, Diogo Botelho por muito tempoficou conhecido como umgovernante quehavia enriquecido devido ao seu cargo, desviando dinheiro do Erário Real. Porém, apesar da fama, isto nãocorrespondia à verdade. Cf.: JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 212.

124  JoaquimVeríssimo SERRÃO, op. cit., p. 204.125 “Os ataques dos Ingleses eFranceses aos domínios ultramarinos intensificaram-se. Os persas, apoiados pelos Ingleses, conquistaramOrmuz em1623. Nesse

mesmo ano, os Holandeses apoderam-sedeSão Salvador da Bahia, capital do Brasil, dondeforamexpulsos (...). Em1630 conquistaramPernambuco (...).”Cf. JoséHermano SARAIVA,  H ist ór ia C on cisa de Por tu gal, p. 203-4.

126  Idem, ibidem , p. 204.

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“A cobrança [ dos antigos] débitos, promovida após a retirada de N assau( 164 4 ) , agravada pelo declínio dos preços do açúcar, aux iliou a revolta

 dos ant igos ocupant es contra o domínio holandês.” 

 Roberto C . Simonsen

O seg u n d o per í o d od a c o l o n i z a ç ã o1640 • 1808

8 6  t r ibu t o s d o BRASIL COLo NI Al - 1500•18221ª Parte

A restauração portuguesa e a era da mineração.

A expulsão dos holandeses. O declínio da produçãoaçucareira se dá emmeio a uma grave crise econômicana Metrópole. O Brasil torna-se a grande fonte dereceita de Portugal coma exploração mineral.

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Este período, relativamente longo, que vai daRestauração da Coroa Portuguesa até a vinda daFamília Real, pode ser subdividido em dois mo-mentos significativos, colocando-se a mineração

(século XVIII) como divisor de águas. Como sig-nificado maior desta época, tem-se a efetiva pre-sença do colonialismo português, no que este ti-nha de mais explorador. Por um lado, as restriçõesmercantilistas foram aplicadas, o que impedia queos colonos brasileiros pudessem manter relaçõescomerciais livres, sendo obrigados a realizar trocasapenas através dos mecanismos criados pela Coroaportuguesa; e, por outro, ocorreu uma centraliza-ção político-administrativa. A verdadeira face dapresença opressiva portuguesa nas terras brasilei-

ras se fez sentir a partir deste momento.

1640 • 1700 – A Restauração Portuguesa, em1640, evento que garante novamente a autonomiade Portugal, custou caro ao país ibérico, talvez aci-ma das suas forças. O resultado mais terrível des-se processo de autonomia foi a perda de grandeparte do seu império colonial na África e na Ásia.No caso asiático, tratava-se de espaços de longatradição comercial, cuja perda acarretou danoseconômicos significativos. Quanto à África, perde-ram-se regiões em que os portugueses dominavamo lucrativo comércio de escravos.

Além desses desfalques nos espaços de explora-ção colonial, outra complicada situação pode serobservada: Portugal liberta-se da Espanha mergu-lhado numa grave crise econômico-financeira. Co-fres vazios, acoplados a uma falta de perspectivaseconômicas. A gravidade das condições portugue-sas pode ser compreendida por uma análise daépoca, 1657, realizada pelo Conselho da Fazenda

do pequeno país ibérico:

A Índia (...) acha-se hoje reduzida miseravel- 

mente a seis praças principais, que são: Mo- 

çambique, sem defesa; Goa, pouco segura; Co- 

lumbo, invadida pelos Holandeses; Macau, sem 

comércio, desesperada (...); Angola, nervo das 

fábricas [ atividades] do Brasil, necessita de 

prevenção contra os desejos que os Castelhanos,

Ingleses e Holandeses têm de nos tirarem os ne- 

gros e os levarem às Índias, às Barbadas e ou- 

tras partes. A ilha de S. Tomé, onde se juntava 

o dinheiro de panos para engrossar o trato de 

Angola, se pôs em termos que jánão parecem 

desta Coroa, pois com ela não temos comércio 

nenhum. A costa da Guiné, donde saía a rique- za que deu nome àpraça da Mina, étoda de 

estrangeiros que nos fizeram a guerra só com o 

cabedal que tiram daí. Cabo Verde, escala im- 

portantíssima, de todas as navegações, estásem 

resistência, no arbítrio de quem se determinar 

a invadir.127 

Ou seja, as conhecidas áreas de comércio colo-nial portuguesas encontravam-se em condiçõesprecárias. Havia sobrado pouco daquele que fora

um dos maiores impérios coloniais conhecidos. Oque restava, quase nada rendia aos lusitanos. Atéporque:

A este problema, somava-se a corrupção dos 

funcionários administrativos encarregados do 

controle do comércio indiano, que permitiram o 

contrabando livre para Veneza e outras regiões,

mediante polpudos subornos. O monopólio por- 

tuguês de especiarias convertia-se assim num 

mero fantasma, com amplos rendimentos des- 

viados das mãos do Estado para as de inescru- 

pulosos atravessadores.128

Quanto ao Brasil, a situação não era menosgrave:

O Brasil, substância principal desta Coroa,

pede socorro, e são-lhe necessários. O Mara- 

nhão, que prometia um novo império, não se 

pode adiantar, mal se sustenta no que é, e re- 

ceia a cobiça dos estrangeiros, que o ameaçam.Às ilhas adjacentes a este reino (que constituem 

a terça parte dele) se vêem faltas de fortifica- 

ções e reduzidas àpobreza em que nunca se vi- 

ram pelo comércio que lhes tirou a Companhia 

Geral: Portugal finalmente se acha sem forças,

nem ânimo para se sustentar, assim porque a 

Fazenda Real, totalmente exausta nos juros,

tenças, ordenados e outras consignações do bem 

público, não só falta para partidas grossas 

[ grandes despesas] e para pagar o que deve de 

8 7 seg u n d o PERÍ O D O d a c o l o n i z a ç ã o - 164 0 • 180 8

127   José Hermano SARAIVA,op. cit., p. 231-2.128 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 189.

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 justiça, mas ainda para despesas miúdas, nas 

ocasiões mais principais. Quantas vezes não há 

quinze ou vinte mil- réis para gastos de uma 

caravela que traga da Pederneira madeiras que 

estão cortadas? (...) Quase se não pagam jáor- denados aos oficiais dos armazéns.129

Além do panorama, que só apresentava dificul-dades, parecia não haver qualquer saída. Não haviamais como aumentar tributos em Portugal. Os se-tores particulares já estavam suficientemente sufo-cados por inúmeros impostos e taxas. Segundo José Hermano Saraiva,

Esta situação manteve-se atéa entrada do ouro 

brasileiro. As receitas do Estado sobre a produ- ção interna de bens decresceram constantemen- te, e uma grande parte do rendimento da Coroa 

era o imposto cobrado nas alfândegas e a renda 

dos contratos para a exploração de produtos 

brasileiros.130

Diante de tamanha tragédia, restou uma únicasaída aos colonizadores lusos: voltar-se ao grandeespaço colonial que havia sido preservado após aUnião Ibérica – o Brasil. Este passou a representara maneira de desafogo da decadente economiaportuguesa, tornando-se, assim, a grande fonte derenda de Portugal.

Com essa consciência, o processo de coloniza-ção brasileiro será re-significado por parte dos co-lonizadores. A partir da centralização político-ad-ministrativa131 e das restrições mercantilistas132,efetivamente instaura-se a opressão colonial por-tuguesa, aqui inclusa, obviamente, a opressão fis-cal. Vale lembrar que a expulsão dos holandeses de

Pernambuco também resultou num processo decobrança de taxas visando à contratação de tropasmercenárias. Mais uma vez, a revolta tomou contada população.

Nesse momento, a produção de açúcar conti-nuava sendo a principal fonte de riqueza da eli-te colonial e dos colonizadores. Porém, os ho-

landeses, expulsos do Nordeste brasileiro em1654 – expulsão esta muito ligada às questõestributárias e de financiamento da produção –,organizaram o cultivo de açúcar nas Antilhas

Holandesas. Com isso, poucos anos depois, oaçúcar dessa região se torna mais atrativo aomercado europeu, graças ao menor preço. Assim,a partir da década de 80 do século XVII, a re-gião açucareira do Brasil começava a vivenciarum processo de crise, que jamais foi estancadoplenamente. Dessa maneira, coube aos portugue-ses, através do trabalho dos bandeirantes paulis-tas, procurar metais e pedras preciosas com obs-tinação. O destino das elites de Portugal depen-dia dessa possível riqueza mineral. Arriscou-se

tudo o que foi possível.

8 8 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

129  José Hermano SARAIVA,op. cit., p. 232.130 Idem, ibidem , p. 233.131 “(...) as mudanças observadas no comportamento econômico de Portugal com relação ao Brasil, aumentando a exploração colonial, deveriam ser

acompanhadas detransformações no campo político-administrativo, no sentido de estabelecer uma centralização político-administrativa edeafirmar opoder metropolitano sobrea colônia.Assim, a par das medidas econômicas restricionistas, do estabelecimento dos monopólios comerciais, veremos a Coroa estender e ampliar o seu domínio,numa verdadeira ‘febrecontroladora’.”Cf.: Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI eRicardo MARANHÃO, op. cit., p. 192.

Padre Antonio Vieira inspirou a criação da Companhia Geral do Comércio do

Brasil, em 1649, visando a incrementar o comércio entre Metrópole e Colônia.

22. Frontispício de OBRAS DO GRANDE  P  ADRE  ANTONIO V IEYRA , DA C OMPANHIA DE  J ESUS .

T. I: A P  ARIZ CHEZ  S PÉ RUE  S T . J  ACQUES ELA  V ISITATION , s.d. (manuscrito). São Paulo,

Coleção Guita e José Mindlin.

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Ao mesmo tempo, se a presença colonialopressiva havia-se tornado mais aguda em virtu-de das novas condições econômicas portuguesas,a sociedade brasileira começara a ter mais cons-

ciência dos significados do sistema colonial.Mesmo incapaz de compreender o funcionamen-to de tal sistema como um todo – e nem caberiaqualquer tipo de cobrança acerca dessa consciên-cia por parte dos colonos da época –, grupos de-les começavam a sentir concretamente a explora-ção colonial. Mais do que isso: os colonos pas-saram a reagir, a partir das suas condições mate-riais. Essa opressão portuguesa começava a serobjeto de questionamentos. O português, que noinício da colonização vinha ao Brasil como al-

guém interessado em sofrer com as dificuldadesimpostas por estas terras, mas com a perspectivade talvez enriquecer, e daí desfrutar desses ga-nhos em sua terra natal, começa a fincar raízesna Colônia, desejando que a riqueza produzidacontinuasse por aqui e não fosse, quase que in-teiramente, para Portugal. Gradativamente, opeso da exploração colonial se faz sentir. Agrande crise portuguesa derivada das guerraspelo restabelecimento da sua autonomia nacio-nal foi decisiva, como se afirmou.

Ao mesmo tempo, para se compreender as re-lações que foram sendo criadas entre Portugal eBrasil, é preciso conhecer os mecanismos de fun-cionamento do sistema colonial. Este engendra-va dois pólos claros de contradição, que maistarde desembocariam no processo de emancipa-ção política, iniciado em fins do século XVIII.De um lado, os conflitos entre uma elite colonialagrária e a burguesia mercantil portuguesa. Esta,com o monopólio do comércio para o Brasil, fa-

zia valer os seus privilégios, explorando ao máxi-mo os produtores brasileiros, através de umaequação simples, mas nem por isso menos per-versa: pagava-se pouco pelos produtos coloniais

e vendiam-se as mercadorias vindas de fora apreços exorbitantes. A lógica dessa prática tinhaum único objetivo: transferir as riquezas produ-zidas na Colônia para a Metrópole. Assim, as

tensões entre a elite colonial e a burguesia esta-mental eram inevitáveis, tornando uma marca es-pecial nas relações entre Portugal e a sua maisimportante colônia.

E outra contradição marcava o espaço brasilei-ro enquanto um lugar de exploração colonial. Amesma elite local, explorada pela burguesia mer-cantil portuguesa, também sobrevivia através deuma forma de exploração, no caso, a do trabalhoescravo; inicialmente do índio, mais tarde tambémdo homem africano. Assim, estabeleceu-se a outra

contradição básica gerada pelo sistema colonial,agora com caráter interno: senhores de terra con-tra escravos. Este tipo de exploração de trabalhoera a única maneira de tornar o Brasil um lugarviável em termos econômicos, se considerada a ló-gica do colonialismo português. Enfim, os escra-vos foram os que verdadeiramente produziam asriquezas nesse espaço colonial.

Se, por um lado, os senhores de terra – a elitecolonial – sofriam com a exploração advinda daMetrópole, em última instância, esta exploraçãoera repassada, com muito mais ímpeto, para osafricanos e indígenas, vítimas do trabalho compul-sório, alicerce básico do sistema colonial. Destar-te, da mesma maneira que a elite colonial passou aresistir à opressão metropolitana, também os es-cravos lutaram contra a exploração dos senhoresde terra.

Estas contradições se consubstanciaram em re-beliões, principalmente a partir do último quarteldo século XVII. Assim,

(...) as contradições entre metrópole e colônia se 

manifestaram de diversas maneiras: de um 

lado, como protesto ao regime comercial mono- 

8 9seg u n d o PERÍ O D O d a c o l o n i z a ç ã o - 164 0 • 180 8

132 O principal mecanismo criado pelos colonizadores para efetivar a prática do mercantilismo foi a Companhia deComércio: “(...) A Companhia Geral doComércio do Brasil, empresa privada mas comprivilégio da Coroa Portuguesa, foi fundada, em6 de fevereiro de1649, para promover o incremento docomércio entreo Brasil ePortugal. O inspirador detal realização foi o PadreAntônio Vieira, queconseguiu atrair grandes capitais denegociantes deorigemhebraica. A Companhia tinha o monopólio dos vinhos, azeites, farinhas ebacalhau vendidos no Brasil. E tinha, também, a responsabilidadedeorganizar eescoltar as frotas comerciais que, uma vez por ano, carregavam, no Rio deJaneiro eBahia, mercadorias brasileiras para Portugal. A partir de1664, porém,a Companhia foi encampada pela Coroa quetransformou sua administração num‘tribunal régio’, isto é, numa repartição pública. Os negócios, porém,continuarama decair, razão pela qual foi finalmenteextinta, em1720. A Companhia tinha sucursais denominadas ‘Administração da Junta do ComércioGeral’ em Salvador, em Recife e no Rio de Janeiro. Nesta última, a Administração era composta pelo Ouvidor, que era seu Juiz-Conservador, pelo

Administrador, pelo Tesoureiro, pelo Almoxarifeepelo Escrivão do Almoxarife. Em16 dejulho de1711, expediu-seCarta Régia ‘declarando quea fazendada Junta do Comércio Geral era Fazenda Real, como as demais repartições, ecomo tal fossetratada’. Há menções da Administração da Junta do ComércioGeral no Rio deJaneiro em1694, no Recifeem1693, ena Bahia emtoda a década final do século XVII. À Administração da Junta do Comércio Geralestava subordinada a Administração do Pau-Brasil, monopólio régio a ela concedido.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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polista, como na Revolta de Beckman (1684) 133,

no Maranhão; de outro, como uma guerra entre 

senhores e escravos fugitivos, como em Palmares 

(1694), em Alagoas; mas também como con- 

flito entre senhores de engenho e mercadores,como na Guerra dos Mascates (1709-1711),

em Pernambuco; e, enfim, como reação àopres- 

são fiscal, exemplificada pela Revolta de Vila 

Rica (1720) , em Minas.134

Porém, neste período, havia uma questão pen-dente ainda do momento final da União Ibérica,que era a presença dos holandeses no Nordeste,centrados em Pernambuco, a região economica-mente mais próspera do Brasil. A presença dos ba-

tavos devia-se aos interesses destes em relação aoaçúcar. Por conta das guerras entre Holanda e Es-panha, este império proibiu que os holandeses tra-vassem relações comerciais com o Nordeste açuca-reiro. Como eram fortes os interesses da Holandanesta atividade desde o século XVI, optaram porocupar a região. Tentaram na Bahia, mas foram re-chaçados; porém, conseguiram ocupar Pernambu-co e regiões vizinhas, a partir de 1630.

A ocupação holandesa trouxe modificaçõespara a região. Se inicialmente foram hostilizadospela elite local, graças à habilidade dos dirigentesbatavos estabeleceram-se relações razoavelmenteharmônicas por, ao menos, duas décadas. Sobreeste episódio, afirma Roberto C. Simonsen:

Apesar da destruição de várias fazendas e enge- 

nhos e das dificuldades da mão-de-obra e de lutas 

constantes com os antigos donos da terra, jáem 

1639 conseguiram os novos ocupantes exportar 

33.000 caixas, mais de 600.000 arrobas. 135

Na verdade, a elite pernambucana teve de deci-

dir por um dos dois caminhos possíveis: continuarresistindo ao invasor ou tentar algum tipo de acor-do. Como as forças bélicas dos holandeses erammuito superiores às dos senhores de engenho e dapopulação pernambucana, o segundo caminho pa-receu o único viável, até porque o mais importan-te era a manutenção dos seus lucros, independen-temente de estar ou não traindo a Coroa portu-guesa.

Ao mesmo tempo, também não interessavamais aos holandeses a continuação dos conflitos

com os brasileiros, pois a tão desejada retomadada lucrativa produção açucareira não poderia maisser adiada. Os altos custos da presença flamengaem terras portuguesas na América necessitavam deum retorno rápido136 . Dessa maneira,

(...) holandeses e brasileiros abastados foram-se 

acomodando, entrando em mútua relação de in- 

teresses. A Companhia da Índias Ocidentais,

‘(...) nesse intuito, dirigiu uma proclamação aos 

habitantes, na qual os concitava a, em vez de se 

exporem constantemente aos azares da guerra, se 

submeterem voluntariamente ao domínio da 

Companhia que, em troca, lhes prometia garan- 

tir suas propriedades e manter seus direitos e li- 

berdade de culto. Permitia-lhes, outrossim, não 

só comerciar com os Países-Baixos, como pagar 

pela metade os impostos que então pagavam à 

Espanha. (...) ’ 137 

90 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

133 Esta rebelião está intimamente relacionada com a criação da Companhia de Comércio do Maranhão, como se pode observar: “(...) O segundo

empreendimento visando à exploração do comércio colonial foi a Companhia do Maranhão, derivada do contrato negociado em1678 e1679, entre ogoverno português eumgrupo deacionistas, para a exploração do tráfico comercial entreo Pará, o Maranhão ea Metrópole. Umalvará de12 dejunhode1682 confirmou esseacordo. Essa companhia, tambémconhecida por ‘Estanco do Maranhão’, tinha o monopólio completo do comércio no MaranhãoePará, mas o seu principal negócio era o tráfico deescravos africanos. Os seus créditos eramcobrados executivamente, como se fossemda Fazenda Real. Tão draconiano era o sistema que, em1684, estourou a revolta liderada por Beckman. Embora sufocado o movimento, o estanco, segundo Simonsen, teriasido logo abolido. Há opiniões divergentes. Rodolfo Garcia discorda eafirma queo monopólio perdurou ainda por vários anos. César Augusto Marques,emseu Dicionário, informa que, em1677, por acordo entre o governo e a população, seestabelecera ummonopólio decertos produtos, especialmentemanufaturas deferro eaço, usadas nos ‘resgates’ comos índios. Esseempreendimento teveo nomede‘Estanco da Fazenda Real’. Dois anos depois, oGovernador do Maranhão propôs a abolição do estanco, emrazão dos avultados prejuízos, sugerindo que ele fosse substituído por contratadoresparticulares. A Coroa aceitou a proposta e, em1682, o alvará já citado confirmou o assento do Estanco do Maranhão, avençado, junto como contrato doCacheu, comManuel Pedro Valdez, Pedro Álvares, Pascoal Pereira Jansen eoutros comerciantes da Metrópole. Segundo Marques, a rebelião deBeckmannão resultou na extinção imediata do estanco, tanto que, em1686, seabria devassa contra os quereclamavamcontra ele.”Cf. Internet, Siteda ReceitaFederal, www.receita.fazenda.gov.br.

134 Luiz KOSHIBA eDeniseManzi FrayzePEREIRA, op. cit., p. 61. Quando analisada a mineração no Brasil, será discutida a revolta deFelipedos Santos de1720, talvez o primeiro movimento demaior amplitudeno Brasil colonial quetevecomo motivação básica a questão tributária.

135 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 118.136  “A Companhia da Índias Ocidentais precisa recuperar emtempo hábil seus investimentos eos prejuízos quetivera na luta contra brasileiros, portugueses e

espanhóis, desde1624. Basta lembrar queas despesas feitas no Brasil ascendiamà fabulosa soma de45 milhões deflorins, semcontar as perdas sofridasembatalhas terrestres emarítimas.”Cf.: Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI eRicardo MARANHÃO, op. cit., p. 173.

137  Idem, ibidem .

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 Johann Mauriti us van Nassau -Siege n, a serviç o da Companh ia da s Índi as Oc ident ais

dos Países Baixos, governante do Brasil holandês entre 1637-1644.

23. In Gaspar Barléus. RERUM PER OCTENIUM IN BRASILIAE ET ... Amstelodami, Typographeio

Ioannis Blaev, 1647, gravura em cobre. Rio de Janeiro, Fundação Biblioteca Nacional.

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Estas boas relações foram efetivadas quando aCompanhia das Índias Ocidentais passou para ocomando do Conde João Maurício de Nassau-Siegen, que soube administrar as relações com a

elite açucareira. Com isso, a produção, mais doque retomada no seu ritmo normal, vivenciou umincremento.

Porém, os tributos relativos à produção deaçúcar – além de outras atividades econômicas –passaram a ser devidos à Companhia Holandesadas Índias Ocidentais e não mais ao fisco portu-guês. Alguns números sobre esses tributos mere-cem ser vistos; para o ano de 1639, verificaram-se os seguintes valores arrecadados:

francos 

Dízimos do açúcar e direitos

sobre víveres 350.000  

Direitos sobre mercadorias

holandesas 400.000  

Direitos sobre o açúcar

introduzido na Holanda 300.000  

Renda de engenhos,

capitais e escravos 2.400.000  

Total 3.450.000  

Fonte: Roberto C. SIMONSEN, op. cit ., p. 118.

Anos depois, já com o comando de Mauríciode Nassau, segundo Agenor de Roure, as rendaspúblicas subiram para 8.869.950 francos. ParaRoberto C. Simonsen, estes números, provavel-mente, estariam abaixo da realidade. Para alicer-çar a sua tese, este autor apresenta dados que es-

tariam numa brochura aparecida em Amsterdã,em 1639, em grande parte transcrita por Ners-cher e que parece ter sido redigida por um conhe-cedor da situação, onde estão indicadas as se-guintes rendas prováveis da Companhia no Brasil,sem computar as presas de guerra em terra e mar:

florins 

Dízimos sobre o açúcar e mais

os direitos de 20% sobre uma

produção total de 33.000

caixas de 20 arrobas(9.000 caixas a 240 florins) 2.160.000 

Fretes e direitos de inspeção

sobre as 24.000 caixas

pertencentes a particulares 1.440.000 

Contribuições sobre o tabaco,

sal, pau-brasil e

outras exportações 400.000  

Lucros sobre 5.000 escravos,

adquiridos em Angola a

30 florins e vendidos entre 300

e 500 florins por cabeça 150.000  

Vendas dos engenhos confiscados,

terrenos para cultura

e construções 500.000

Contratos de vinho, cervejas,

farinhas, gado, balanças,

passagens, pontes, etc. 200.000  

Direitos de inspeção, fretes

e avarias sobre o consumoe transporte de vinhos espanhóis 252.000 

Idem sobre vinhos franceses 

258.000 

Idem sobre azeite 

46.500 

Idem sobre cervejas 

43.500 

Idem sobre vinagres,

peixes salgados, etc. 27.000  Idem sobre sebos e couros 22.000  

Idem sobre farinha, biscoitos,

manteiga, óleos de linhaça

e de baleia, especiarias, etc. 450.000 

Idem sobre panos, lãs,

sedas, cobre, ferro, aço,

estanho, pranchas, etc. 477.850  

Fonte: Roberto C. SIMONSEN, História Econômica do Brasil, p. 119.

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Ou seja, essa gama de tributos e rendas advin-das de atividades econômicas resultava, aproxi-madamente, em 14.812.649 francos; em moedaportuguesa, 1.285:450$000 réis.

 Toda esta prosperidade no Brasil holandês sónão foi maior porque muitos portugueses, emfunção da guerra com os holandeses, fugiram daregião. Como os holandeses não conseguiramatrair imigrantes de outros locais, como alemães,“resolveram estimular a volta dos portugueses,proporcionando créditos e outras facilidadespara incentivar a produção açucareira.” 138

De certa maneira, os holandeses, sob a dire-ção de Maurício de Nassau, conseguiram con-quistar a confiança de antigos produtores de

açúcar, aumentando ainda mais os bons índiceseconômicos da região. Porém, essa relativa tran-qüilidade em Pernambuco foi quebrada quandoveio governar o Brasil holandês um conselho for-mado por três pessoas. Maurício de Nassau nãoinspirava mais a confiança dos dirigentes daCompanhia das Índias Ocidentais. Ele foi acusa-do de gastar muito dinheiro em constantes con-quistas, diminuindo, dessa maneira, os lucros daCompanhia das Índias Ocidentais. Esta, enquan-to uma empresa com capital essencialmente par-ticular, troca a direção da empresa. Além disso,recaía sobre Nassau outra acusação ainda maisséria: corriam boatos de que o dirigente do Bra-sil holandês desejava construir nos seus domí-nios um império particular, desvinculando-se domando da Holanda.

Com essas acusações, foi inevitável a substi-tuição do conde Maurício de Nassau. Mesmopreterido, ao deixar Pernambuco, fez questão deapresentar alguns conselhos aos seus sucessores,

sugerindo-lhes uma relação diplomática na co-brança dos impostos devidos pelos donos dasterras, pois, uma vez sentindo-se cobrados comexcessiva rigidez, talvez eles não tivessem condi-ções de continuar a produzir o açúcar. Entretan-to, os novos dirigentes da Companhia das ÍndiasOcidentais não aceitaram as sugestões de Nassau,passando a não ter qualquer benevolência paracom os senhores de engenho. Assim,

93seg u n d o PERÍ O D O d a c o l o n i z a ç ã o - 164 0 • 180 8

138 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 120.

As rendas da Companhia das Índias Ocidentais dos Países Baixos relativas ao

Brasil eram computadas em florins, moedas obsidionais holandesas.

24.a. XII florins, ouro, 1645; b. III florins, ouro, 1646; c. VI florins, ouro, 1645;

d. III florins, ouro, 1645; e. XXXX soldos, prata, 1654. Rio de Janeiro,

Museu Histórico Nacional.

a.

b.

c.

d.

e.

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A cobrança [ dos antigos] débitos, promovida 

após a retirada de Nassau (1644), agravada 

pelo declínio dos preços do açúcar, auxiliou a 

revolta dos antigos ocupantes contra o domínio 

holandês.139

Essa cobrança de antigos débitos tornou-se detal forma severa, que se iniciaram os confiscos daspropriedades, dos escravos e de todos os outrosbens. A aversão aos holandeses, resguardada pelosmomentos de euforia econômica, voltava com todaa força. Voltava a guerra contra os invasores.

Após uma longa luta, os portugueses consegui-ram expulsar os batavos do território brasileiro.Porém, para estabelecer a paz com a Holanda,houve custos:

(...) anuiu Portugal, para a assinatura da paz 

definitiva, em pagar àHolanda uma indeniza- 

ção de 4.000.000 cruzados (...) em dinheiro,

açúcar, tabaco, e sal, tal o empenho que havia 

de por cobro àsituação! Para essa indenização 

concorreu o Brasil com 1.920.000 cruzados,

pagos em 16 anos, àrazão de 120.000 cru- 

zados por ano.14 0

Ou seja, a cota do Brasil, nesta indenização,significou que os brasileiros – assim como todosos colonos do Império português espalhados pelomundo – é que deveriam pagar por esta dívida fei-ta com a Holanda. Para esse fim, foi adotada umataxa extraordinária a ser paga por todos os colo-nos, já que o governo português alegava que o Bra-sil deveria ser responsável pelos gastos da FazendaReal com sua própria proteção. Sobre a questão do

pagamento dessa indenização para os holandeses,o historiador Capistrano de Abreu traz uma sériede elementos:

9 4 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

Diante das Câmaras, como a de São Paulo, o povo e os gentis-homens sabiam das

taxas decretadas pelo Império port uguês. Tanto as regulares como as extras, queoneravam ainda mais as capitanias.

25. José Wasth Rodrigues, P  AÇO MUNICIPAL DE  S  ÃO P  AULO EM  1628, 1920; óleo sobre tela.

São Paulo, Museu Paulista da Universidade de São Paulo.

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(...) Francisco Barreto [vencedor de Guararapes e Governador-Geral] reuniu no palácio do Sal- vador as pessoas mais notáveis e acordou com elas as cotas das capitanias. A Bahia, como a 

mais opulenta, pois Pernambuco apenas saía de uma guerra devastadora, e Rio de Janeiro estava quase todo preso ainda dentro das serranias da Guanabara, tocou metade; Pernambuco, I tama- racáe Paraíba entrariam com 30.000, Rio de Janeiro com 26.000, São Vicente com 4.000 cruzados. I lhéus, Porto Seguro e Espírito Santo não ficaram isentos, mas suas contribuições ser- viriam para as quebras. O pedido, donativo ou finta real (tributo não era porque as cortes não 

intervinham) correria desde agosto de 1662.(...) 14 1

Capistrano de Abreu ainda revela como o paga-mento dessa indenização afetou fortemente a capi-tania de São Paulo:

A 5 de agosto de 1662 na Câmara de São Paulo, perante o povo e os bons da Vila, foram lidas as cartas régias ao Governador geral do Estado e a provisão deste de 28 de abril ati - 

nentes ao objeto, e eleitos procuradores para tratar do caso em Santos, onde, parece, deviam reuni r-se os procuradores das diferentes Câ- maras, os capitães Dom Simão de Toledo e An- tonio Ribeiro de Moraes. O resultado da con- ferência divulgou-se a 2 de novembro: São Paulo com seu distrito pagaria 580.000 réis acrescidos no ano seguinte, por ordem do Con- de de Óbidos, de mais 70.000: 650.000 réis anuais portanto, durante 16 anos.14 2

Vale lembrar que o governo português impu-nha a arrecadação de uma determinada contribui-ção, mas deixava que cada capitania ou CâmaraMunicipal decidisse como iria fazer o recolhimen-to desses valores. Ou seja, o que importava à Me-trópole era que a quantia requerida fosse remetidapara Lisboa. Assim, São Paulo teria que organizaressa arrecadação, o que trouxe várias situações detensão, como podemos verificar a seguir:

A Câmara paulista, em que era juiz ordinário Estevão Ribeiro Bayão Parente, o futuro con- quistador dos sertões baianos, votou logo o es- tanco do vinho do reino, da aguardente do rei- 

no e da terra e do azeite. Em janeiro de 63 mandou fazer listas dos contribuintes de cada bairro, que seriam entregues a dois moradores incumbidos da cobrança. A 21 de setembro lançaram-se quartéis para que todos os mora- dores sujeitos ao pedido pagassem a anuidade atéo dia de Todos os Santos. A 3 de novembro mandou- se proceder contra os que não queriam pagar. A 4 de março de 64, reunidos a Câma- ra e os homens bons com assistência do Ouvi- 

dor, reconheceram que apenas se apuraram 100.000 réis. E o primeiro exercício termi- nara em agosto! 14 3

Ficam evidentes as dificuldades de uma regiãopobre em pagar a cota relativa à indenização parase garantir o acordo de paz com a Holanda. Po-rém, essas dificuldades não sensibilizavam aquelesque tinham a responsabilidade de mandar essaquantia para a Coroa portuguesa. Era preciso, por-tanto, reforçar a cobrança. Inclusive, é preciso

mostrar o quanto os paulistas deviam se sentir in- justiçados, e por várias razões. Inicialmente, o mo-rador de São Paulo nunca teve qualquer benefíciono que se refere à produção açucareira. Essa rique-za nunca chegou às suas mãos; mesmo porque nãohavia sequer esboço de unidade territorial que pu-desse, por exemplo, fazer com que tributos cobra-dos numa região mais rica fossem transferidospara beneficiar as mais pobres, como era o caso deSão Paulo. Ao mesmo tempo, os paulistas não fa-

ziam idéia do que significava tal contribuição.Nesse sentido, com o fracasso da arrecadação, foicriada uma nova sistemática para que, de fato, ocompromisso fiscal fosse honrado:

Para a finta real votou-se que cada carga de fa- rinha de trigo pagaria 40 réis, cada peça de pano 240, cada arroba de carne de porco man- dada para Santos 40 réis; carne de vaca ou porco consumida na Vila 20 réis a arroba; a 

9 5seg u n d o PERÍ O D O d a c o l o n i z a ç ã o - 164 0 •180 8

139 Idem, ibidem , p. 120.14 0 Capistrano de ABREU, op. cit., p. 138.14 1 Idem, ibidem , p. 138.14 2 Idem, ibidem , p. 138-139.14 3 Idem, ibidem , p. 139.

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arroba de fumo 40 réis, o couro de vaca 10 

réis, a peruleira de melado 30, cada cabeça de 

gado descido para Santos 1 tostão, botija de 

azeite de amendoim ou carrapato 2 vinténs, de 

vinte pães vendidos nas vendagens 1 vintém.

Essas taxas deveriam ser comunicadas aos mo- 

radores de Parnaíba, Jundiaí, I tu e Sorocaba.

Os de Parnaíba não estiveram por elas. Voltou- 

se ao sistema de comissários de bairros: a 1º de 

novembro prestaram juramento de fintar verda- 

deiramente, sem atender a ódio, parentesco ou 

amizade, os de Taramenbé, os da Vila de Ca- 

guacu, de São Miguel, de Marueri, dos Três Ju- 

requis, de João Pires Monteiro, Manuel Rodri- 

gues Moraes, Dom Francisco de Lemos, de S.Amaro, de Caocaia, do Forte (Carapicuíba?) e 

de Cotia.14 4

Por mais que a sistemática de arrecadação fos-se revista e ampliada, havia uma realidade que sesobrepunha à ganância fiscal dos representantes daopressão colonial no Brasil. Em última instância,não havia apenas a má vontade em pagar por aque-le tributo extraordinário, mas a real impossibilida-de. Dessa maneira, segundo o resultado da apura-ção do desembargador João da Rocha Pita, em1679, temos que:

O prazo primitivo de 16 anos fora ampliado 

ao de 24 no Rio e São Vicente – na Bahia a 

32: assim a anuidade paulista desceu de 650$ 

a 433$333. Nos exercícios de 1663 a 1678 

foram expedidas para Santos com 12 remessas 

de letras, panos de algodão etc. 3:237$. A

partir de 1678 pagamento e fornecimentos di- 

versos a Jorge Soares de Macedo, a Dom Rodri- go de Castelbranco, a Dom Manoel Lobo, ao 

desembargador sindicante João da Rocha Pi ta,

em 14 adições montaram a 2: 856$670; com 

outros acréscimos ficaram os moradores de São 

Paulo restando ainda 238$665 réis.

O desembargador, não podendo deter-se na co-brança desse saldo, deu as contas por ajustadas edesobrigados os vereadores e moradores de tudoquanto até ali estavam a dever do donativo, sob a

condição de que se cobraria o restante nos doisprimeiros anos que faltavam para se ultimar a fin-ta, pedido ou donativo.14 5

Porém, a saída dos holandeses do Brasil, des-

vinculando-se da produção açucareira do Nordes-te da Colônia, trouxe problemas muito maioresque essa dívida contraída em nome da paz com osbatavos. Ao organizar o cultivo do açúcar nas An-tilhas, conseguiram, por ele, um preço mais baixodo que o dos brasileiros, além de um frete mais ba-rato, dada a distância entre as Antilhas e a Europaser menor do que a do Brasil.

Assim, a partir do início da década de 80 doséculo XVII, os flamengos, com seu açúcar maisbarato, vencem a concorrência travada com o pro-

duto similar brasileiro. Era o início de um longoprocesso de decadência para o Nordeste açucarei-ro, ainda que esta decadência não tenha significa-do a perda da importância econômica dessa regiãono quadro geral das atividades produtivas do Bra-sil. Mesmo com a mineração e, no século XIX,com o café, o açúcar nunca deixou de ser um ele-mento importante entre os produtos brasileirosvoltados à exportação.

Com a crescente diminuição dos rendimentoseconômicos do açúcar, coube aos portugueses en-contrar outra saída econômica, que garantisse aoErário Real os cabedais tão esperados. Como oscolonizadores sabiam da inviabilidade de outra ri-queza que não fosse a dos metais amoedáveis e daspedras preciosas, toda energia passou a se concen-trar na procura dos mesmos. Através da ação dosbandeirantes paulistas – incentivados por amplaspromessas do governo português –, depois de vá-rias décadas de incessante busca, finalmente, no fi-nal do século XVII, um grande filão de ouro foi

encontrado.Dessa forma, começava a salvação da decaden-te economia portuguesa, ao mesmo tempo quetambém se dava início à mais severa política colo-nialista sobre o Brasil, através do terror adminis-trativo e político, assim como a partir de uma prá-tica fiscal opressiva e, muitas vezes, extremamenteinjusta.

9 6  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

14 4 Idem, ibidem , p. 139-140.14 5 Idem, ibidem , p. 140-141.

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97 s eg u n d o PERÍ O D O d a c o l o n i z a ç ã o - 1640 •180 8

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“Artigo 1º

Sua M ajestade El- Rei de Portugal promete, tanto em seu nome, como no de Seus Sucessores, admi tir para sempre, de aqui em diante, no Reino de

 Portugal os panos de lã e mais fábricas de lanifício de Inglaterra, comoera costume até o tempo em que foram proibidas pelas leis, não obstantequalquer condição em contrário.” 

Tratado de Methuen – 1703

séc u l o x v i i i : o pr essÃof i sc a l e r esi st ên c i ad o s c o l o n o s

98 t r ibu t o s d o BRASIL COLo NI Al - 1500•18221ª Parte

O momento de maior opressão colonial. A política

tributária não leva emconta a capacidade contributivados colonos. A tributação na era Pombalina. A sonegaçãovira arma para resistir aos abusos. Os contratadores esuas relações comos funcionários reais. Os caminhosdo ouro. O conflito tributário coma Metrópole emPernambuco. A Guerra dos Mascates.

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Este é o momento de maior opressão colonialsobre o Brasil. A situação econômica portuguesaexigia que o máximo de riquezas fosse transferidopara os cofres de Portugal. Nunca as finanças lu-

sitanas dependeram tanto da sua colônia na Amé-rica. Os rendimentos advindos do Brasil já nãoeram tratados apenas como complementos das ati-vidades econômicas da Metrópole, mas como es-senciais. Essa opressão tendeu a fortalecer-se namedida em que aumentava a dependência portu-guesa em relação ao domínio britânico. Foi porisso que, a partir de 1750, com o Marquês dePombal e com a decadência da mineração, essaopressão chegou a níveis insuportáveis, gerando odesejo da emancipação colonial. Porém, antes do

governo pombalino, a situação dos colonos brasi-leiros não era melhor. Isto devido ao rei portu-guês, D. João V:

Governando de 1706 a 1750, D. João V teve,

pela duração, um dos mais longos reinados lu- 

sos, e, pelo ouro do Brasil, um dos mais ricos; 

mas o valor atribuído a ele pelo povo ébem me- 

nos glorioso, como se vêpor uma quadrinha po- pular da época: 

‘Nós tivemos cinco reis,

Todos chamados Joões; 

Os quatro valem milhões 

O quinto nem cinco réis.’ 

9 9séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

O Marquês de Pombal e Conde de Oeiras, secretário de Assuntos Exteriores e

Guerra e secretário de Estado no reinado de D. José I, reformou o Estado

português e providenciou, a partir de 1750, o aumento da opressão tributária

sobre a colônia brasileira, da qual a Metrópole dependia para manter suas

rendas.

26. Louis Michael Van Loo, S EBASTIÃO J OSÉ DE  C  ARVALHO E  MELO , M ARQUÊS DE  P OMBAL, 1766;

óleo sobre tela. Oeiras, Câmara Municipal de Oeiras, Portugal.

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Durante seu reinado, marcado por verdadeira 

orgia de gastos suntuários, possibilitados pelas 

imensas riquezas extraídas das minas da colô- 

nia, notabilizou-se a monarquia lusa por fazer 

presentes fantásticos a princesas de boas rela- ções com o soberano. 14 6 

Porém, a maior parte dos recursos obtidos com ariqueza mineral do Brasil não foi destinada, nessaprimeira metade do século XVIII, aos presentesreais, ainda que estes representassem, simbólica ematerialmente, todo o desprezo dos soberanos abso-lutistas para com a população não-nobre; havia al-gum respeito pelos ricos burgueses, nunca pela ar-raia miúda – também chamada de populacho. Assim,

parcelas importantes desses valores – nunca é de-mais lembrar que vinham do trabalho dos escravos edo recolhimento sempre conflituoso dos inúmerostributos – também foram destinadas a grandes obraspúblicas, normalmente na própria Metrópole:

(...) os cofres da Coroa, momentaneamente abar- 

rotados enquanto o bulhão não escoava para a 

Inglaterra (...) forneceram também muitos recur- 

sos para obras públicas, necessárias àrepresenta- 

ção do poder absolutista; e também para investi- 

mentos destinados a reforçar o frágil mercantilis- 

mo português cada vez mais dependente do britâ- 

nico. Obras como o mosteiro de Mafra 14 7 , o aque- 

duto das Águas Livres, o canal hidráulico da 

‘Vala de Azambuja’, bem como uma série de tra- 

balhos artísticos realizados sob sua proteção de 

Mecenas, forneceram a D. João V o esplendor su- 

perficial e fácil do monarca realizador. 14 8

Mas, ao mesmo tempo em que, finalmente, os

bandeirantes paulistas descobrem ouro em MinasGerais, no final do século XVII – realizando omaior sonho português em relação ao Brasil desde

a chegada do colonizador em 1500 –, Portugaltorna-se nação economicamente dependente dosinteresses do já poderoso capitalismo inglês. Istofez aumentar ainda mais a importância do Brasil

para a economia portuguesa. Essa dependência foisendo construída durante o século XVII, após aseparação entre Portugal e Espanha, com o fim daUnião Ibérica, em 1640, conforme já se analisou.Uma série de tratados comerciais foram instituí-dos, sempre prejudiciais à economia lusitana. Po-rém, não havia outra saída para a Metrópole doBrasil, já que sua situação financeira era dramática.Neste sentido, afirma-se:

10 0 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

14 6  Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 263.14 7  Sobreesta grandiosa obra, afirma-se: “Para quemleu o romancedeJoséSaramago, ‘Memorial do Convento’, emcuja construção D. João V esbanjou o ouro

quevinha das Minas Gerais, a analogia éinsopitável. Saramago exibe o retrato do despotismo. O capricho do rei faz erigir, a ferro efogo, o suntuosoconvento e palácio real deMafra, pelos trabalhadores portugueses, literalmente ‘Mortos, Assados, Fundidos, Roubados,Arrastados’, naquela obra devaidadeepieguicereal.”Cf.: Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, L etr ad os, Fi da lgos e C on tr at ad ores de T ri bu tos no B ras il C olon ia l, p. 37. Grifos do autor.

14 8 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 263. Decerta maneira, épossível fazer uma analogia entre as condiçõeshistóricas dePortugal eEspanha duranteo período da colonização da América, especificamenteemrelação ao momento deexploração dos metais preciosos.A Espanha, queencontra a prata já no século XVI, explora-a semimaginar queestemetal poderia umdia acabar. Assim, ao invés deaplicar os recursosobtidos com essa exploração em atividades produtivas, que gerassem alguma baseeconômica para quando essa prata começassea escassear, a opção

espanhola foi “aqui agora”, fazendo com que a maior parte da riqueza retirada da América fossetrocada por mercadorias estrangeiras, claramentesupérfluas, como roupas, perfumes, entreoutros objetos queserviamexclusivamenteàs elites espanholas. Veio a decadência da mineração de prata daAmérica espanhola e comela a completa falência das finanças da Espanha, queficou seminvestimentos mais produtivos esemqualquer renda maissignificativa. Portugal, à semelhança espanhola, ainda queemcondições históricas diferentes, tambémdesperdiçou a riqueza retirada das regiões mineiras.

Por concessão real, as companhias de comércio tinham plenos poderes

comerciais. A Rainha D. Maria I, mãe de D. João VI, compareceu em 1780,

em Lisboa, ao rito de extinção da Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba.

27. RETRATO DE  D. M ARIA I, final do século XVIII; óleo sobre tela. Mariana,

Museu Arquidiocesano de Mariana.

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Entre estes acordos, destaca-se aquele assinado 

com a Inglaterra Republicana de Cromwell – em 

1654 (...).

Um dos artigos do tratado de 1654 era secreto e dispunha que os impostos de alfândega a serem 

cobrados pelas mercadorias inglesas entradas em 

Portugal não excederiam a 23% de seu ‘justo 

valor’ e, em caso de necessidade, submetia essa 

avaliação a uma eventual fiscalização por parte 

de ‘dois mercadores ingleses, residentes e morado- 

res em Portugal’.

Por outro lado, o acordo permitia às embarcações 

britânicas comerciar com as colônias lusitanas.

No caso do Brasil, excluía-se apenas o tráfico 

dos ‘estancos’ (bacalhau, farinha de trigo, vinho,azeite e pau-brasil), que eram monopólio da 

Companhia Geral de Comércio do Brasil.14 9

Com a assinatura do Tratado de Methuen, em1703, que determinava Portugal como compradorpreferencial dos panos ingleses e estes, comprado-res dos vinhos portugueses, a materialização dodomínio britânico sobre a nação lusitana estavadefinitivamente estabelecida e era irreversível.

 Tamanho interesse inglês pode ser sintetizadoem um tratado quase telegráfico, que continhaapenas três artigos curtos, mas de extrema gravida-de para os destinos da economia portuguesa. As-sim como da sua principal colônia. Diziam essesartigos:

Artigo 1º– Sua Majestade El-Rei de Portugal 

promete, tanto em seu nome, como no de Seus 

Sucessores, admitir para sempre, de aqui em 

diante, no Reino de Portugal os panos de lãe 

mais fábricas de lanifício de Inglaterra, como era costume atéo tempo em que foram proibidas pe- 

las leis, não obstante qualquer condição em con- 

trário.

Artigo 2º– É estipulado que a Sua sagrada e 

Real Majestade Britânica, em Seu Próprio 

Nome, e no de Seus Sucessores, seráobrigada a 

admitir na Grã-Bretanha os vinhos do produto 

de Portugal, de sorte que em tempo algum (haja 

paz ou guerra entre os Reinos de Inglaterra e de 

França) não se poderáexigir direitos de Alfân- 

dega nestes vinhos, ou debaixo de qualquer outro 

título direta ou indiretamente, ou sejam trans- portados para a Inglaterra em pipas, tonéis ou 

qualquer outra vasilha que seja, mais que o que 

se costuma pedir para igual quantidade ou me- 

dida de vinho da França, diminuindo ou abaten- 

do uma terça parte dos direitos de costume.

Arti go 3º – Os Exmos. Senhores Plenipoten- 

ciários prometem e tomam para si, que Seus 

Amos acima mencionados ratificarão este trata- 

do, e que dentro do termo de dois meses se pas- 

sarão as ratificações.150

Esse tratado – de fato, marcado pela simplici-dade dos termos – selou uma balança comercialpermanentemente desfavorável para Portugal, jáque esta nação comprava muito mais panos ingle-ses do que seus vinhos eram adquiridos. Além domais, os panos ingleses, vendidos sempre em quan-tidades crescentes, permitiram o desenvolvimentoda indústria na Inglaterra, o que, mais tarde, deuorigem à Revolução Industrial. Também outro re-sultado trágico para a economia lusitana: a nascen-te manufatura portuguesa não pôde resistir àsmercadorias inglesas, que chegavam ao país ibéricoa preço sem qualquer possibilidade de concorrên-cia. Dessa maneira, parte considerável do ourobrasileiro foi parar na Inglaterra.

Esta situação fez com que Portugal estreitasseos seus laços com a sua principal colônia, agoracom a riqueza advinda da mineração. A opressãofiscal foi inevitável. Assim, com a mineração, umsistema tributário especial seria montado, sempre

dependendo da conjuntura. Ou seja, Portugal bus-cava a sua sobrevivência econômica através dos im-postos cobrados na região mineradora, sendo co-muns mudanças nessa tributação nos momentosem que a arrecadação caía. Mais tarde, com a de-cadência da produção de metais preciosos, a partirde 1750, a opressiva presença metropolitana tor-nou-se ainda mais feroz. A Derrama151, cobrança

10 1séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

14 9 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 224.150 Idem, ibidem .

151 Derrama “(...) deriva-se do castelhano ‘garrama’, eeste, do árabe‘garama’, econstituía a contribuição repartida entre os habitantes decidades, vilas epovoações; da capitania e, por vezes, da própria colônia, revestindo-segenericamente de caráter local e municipal. Destinava-sea obras públicas dosmunicípios, quando não setratava deencargos relativos à côngrua paroquial, isto é, remuneração doada a curas epárocos, para suprir insuficiência debenesses (pés dealtares) ou a falta dedotação do tesouro.”Cf.: Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 492-493.

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periódica de impostos atrasados, é o maior exemplodessa política opressiva. Trata-se da Era Pombalina,em que o poder português esteve nas mãos do Mar-quês de Pombal, reorganizador da máquina estatal

portuguesa, que aumentou os mecanismos de opres-são fiscal sobre a Colônia. Não foi mera coincidên-cia que os primeiros movimentos que buscavam a li-bertação colonial surgem em Minas Gerais e entreos setores da elite, que sentiam o peso das dívidaspara com o fisco português. A mineração dominatodo o século XVIII. Com a sua decadência, a sedede exploração colonial teve que se voltar novamen-te para a agricultura ligada à exportação. É interes-sante observar que, em muitos momentos da mine-ração, a política tributária não levava em conta a ca-

pacidade contributiva dos colonos e sim criava im-postos fixos, per capita . Inclusive, sob o governo doprimeiro-ministro de D. José I, Marquês de Pombal,uma reviravolta ocorre nas relações entre Metrópo-le e Colônia, já que a monarquia portuguesa esteveimbuída das idéias do Iluminismo. Assim,

(...) no primeiro ano da posse de Pombal no 

elevado cargo, definiam-se claramente as prio- 

ridades do novo governo, em sua política mer- 

canti l e imperial. Os produtos vitais do siste- 

ma comercial luso-brasileiro, açúcar, fumo e 

ouro, seriam protegidos por disposições legais e 

defendidos dos interesses estabelecidos. Enérgica 

tentativa foi feita para racionalizar a máquina 

arrecadadora do tributo básico – o quinto real.

Os devedores coloniais foram protegidos contra 

as execuções sumárias. Casas de inspeção fo- 

ram criadas para regular preços dos produtos 

fundamentais da colônia.152

Para o novo momento da administração portu-guesa, a racionalização era o fundamento básico.Assim, apesar de uma política fiscal dura, havia ca-sos especiais necessários, englobando os produtos

que sustentavam a economia colonial. Por exem-plo, os grandes proprietários de escravos, commais de trinta peças, estariam livres de execuçõeshipotecárias153, que colocariam em risco os ganhosdesses donos de terra e, consequentemente, a Fa-zenda Real portuguesa no momento de recolhertributos. Ou ainda sobre a Era de Pombal, é pos-sível afirmar que:

As mudanças que realizou na política do Esta- 

do eram de modo a fortalecer sua presença nas 

alfândegas, nos tr ibunais, nas atr ibuições esta- belecidas para os funcionários, na cobrança de impostos e nas exigências feitas àpopulação.

Restringiu e combateu certas casas nobres e or- 

dens religiosas (as Casas de Aveiro e de Távo- 

ra e a Companhia de Jesus) de influência e li- 

gações ultramarinas e internacionais.154

Essa racionalização da administração pomba-lina não impediu que novos tributos fossem esta-belecidos, até porque, para Pombal, era precisoretirar o máximo possível de riquezas da Colônia.Mas, a questão mais significativa refere-se ao fatode o primeiro-ministro de D. José I ter dado oprivilégio de cobrar tributos – muitos através doscargos públicos – aos grandes comerciantes doReino, que no Brasil passaram a controlar asCompanhias de Comércio, estas que detinhamsobre determinadas regiões da Colônia o direitoexclusivo de realizar transações comerciais – e

10 2 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

152 Kenneth MAXWELL, A dev assa da dev assa , p. 30153 “O governo deu proteção mais direta aos devedores do interior. Em1752 qualquer proprietário quetivessemais do que30 escravos, emMinas, estava livre

deexecução hipotecária. Quatro anos depois foi baixada uma lei para proibir os processos decobrança dedívidas, quetinhamcontribuído para a decadênciadas atividades açucareiras eligadas ao fumo, emPernambuco.”Cf.: Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 31.

154 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 269.155 Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 41.156  Companhia deComércio era umempresa quepossuía capital privado eestatal, queganhava a concessão do rei de Portugal para ter amplos poderes

comerciais sobreuma determinada região do Brasil. Assim, qualquer entrada ou saída demercadoria só poderia ser realizada pelas mãos dessa CompanhiadeComércio, assimcomo o rendoso tráfico negreiro. Essa concessão era comprada junto à Fazenda Real. Essas Companhias deComércio sintetizavamaessência do Sistema Colonial, pois impediamquequalquer colono pudessecomerciar comoutra região livremente. Quando da presença holandesa no Brasilaçucareiro, a exploração econômica da região sedava pelas mãos da Companhia das Índias Ocidentais, modelo quefoi copiado pelos portugueses desdeoséculo XVII erecuperado por Pombal no século seguinte. Especificamentesobrea Companhia deComércio dePernambuco eParaíba, tem-se: “(...) Umadas mais infelizes tentativas dePombal deintervir na ordemeconômica. Foi estabelecida em1759 esua instituição foi confirmada por alvará de13 deagosto daqueleano. Tinha umcapital de2.000.000 decruzados, mas, já em23 dejulho de1761, umoutro alvará autorizava vultoso empréstimo do tesouroportuguês a essa companhia. Ela tinha o monopólio do comércio nas duas capitanias etambémdo tráfico delas para a Costa da África, pelo prazo devinte

anos. Em1778, a Câmara dePernambuco (isto é, do Recife) protestou contra o ‘insuportável jugo da Companhia Geral dePernambuco eParaíba’. Em1780, vencido o prazo desua existência, ela perdeu o monopólio do comércio efoi extinta. Seu fimfoi comemorado comum‘TeDeum’ emLisboa, aoqual compareceu atéa Rainha, D. Maria I. Em5 dejunho de1787, nomeou-seJunta para ‘liqüidação das contas da Companhia dePernambuco eParaíba’.Essa Junta só foi extinta por decreto de7 deabril de1813.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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que foram objeto de extrema revolta por partedos colonos brasileiros, que se sentiram explora-dos por essas empresas. Assim, afirma KennethMaxwell:

I nácio Pedro Quintella, também ligado aos in- 

teresses de fumo e membro de ambas as compa- 

nhias do Brasil, era contratante dos dízimos,

na Bahia: o direito de cobrar dízimos fora de- 

volvido pela Igreja, em troca de quanti as fixas 

pagas pelo estado, e a arrecadação do tributo 

era contratada pelo Conselho Ultramarino com particulares, geralmente pelo prazo de três anos,

como qualquer outro contrato metropolitano ou 

colonial. Quintella, também nos anos de 1754 

e 1755, tinha os direitos de cobrar tari fas a 

todos os navios extra-frota que chegassem ao 

porto do Rio. De modo semelhante, JoséRodri- 

gues Esteves, outro diretor da Companhia de 

Pernambuco, cobrava os direitos sobre os escra- 

vos importados para Bahia.155

Mas, de maneira geral, o fisco metropolitanobuscava suprir as necessidades da Fazenda Real,independentemente da capacidade que os colo-

nos tinham de pagar os tributos; também poucoimportava se alguma taxação atrapalhasse o de-sempenho de determinadas atividades econômi-cas. O raciocínio da prática tributária portugue-sa era inverso ao justo: cobrava-se o que era ne-cessário, ignorando-se os riscos desta cobrançasem limites. Ou melhor, mais do que limite, ha-via uma atitude do governo lusitano: sempre quea sanha do fisco português causava danos a algu-ma atividade econômica, corria-se no sentido desanar aqueles males. Mas, normalmente, tratava-

se de ações improvisadas ou paliativas.Neste sentido compreendem-se, ainda sob ogoverno de Pombal, alguns setores da economiacolonial recebendo por parte da Companhia deComércio de Pernambuco.156  Nesta capitania, osprodutores de couro foram isentados dos impos-tos acerca desse produto, com o objetivo de ven-cer a concorrência com aquele produto que vinhada América espanhola.

E ainda com Pombal, outras mudanças ocorre-ram nos aspectos que ligavam a cobrança de tribu-

tos, como da reorganização do aparato repressivo,com caráter militar. Neste sentido, afirma o brasi-lianista Kenneth Maxwell:

10 3séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

“ Os Dragões de Minas, a força regular e profissional da capitania, foi organizada

em oito companhias, tendo sido padronizados os soldos”.

28. José Wa sth Rod rigues, DRAGÕES REAIS DAS  MINAS  GERAIS , aquarela. In U NIFORMES DO

EXÉRCITO BRASILEIRO: 1730-1889. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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Também na estrutura fiscal e militar da Amé- 

rica portuguesa ocorriam mudanças revolucio- 

nárias no esquema do sistema colonial tradicio- 

nal. Peritos militares estrangeiros foram con- 

tratados para reorganizar as forças armadas do Brasil. O tenente-general João Henrique Bohm 

foi nomeado comandante-em-chefe e Jaques 

Funck chefe de engenheiros e da artilharia.157 

A preocupação portuguesa era clara quanto àspretensões estrangeiras. As cidades coloniais con-tinuavam desprotegidas; uma expedição militar dequalquer nação européia, com pouco mais de deznavios, tomaria o poder nessas cidades. Porém, aomesmo tempo em que poderiam se proteger dos

inimigos externos, também havia proteção contraos inimigos internos; ou seja, qualquer contesta-ção ao domínio metropolitano seria facilmente re-primida. A preocupação com a ordem interna ficaclara com os detalhes da nova organização militarque foi estabelecida:

A racionalização militar da missão de Bohm 

seria complementada pela criação de unidades 

interdependentes nas diferentes capitanias bra- 

sileiras. (...) A nível de capitania, foram cons- 

tituídos regimentos de infantaria e de cavalaria 

auxiliar. Por exemplo, em Minas foram orga- 

nizados 13 regimentos de cavalaria auxiliar,

comandados por coronéis escolhidos ‘entre as 

pessoas principais, de maior crédito e fidelida- 

de das que hána capitania’. Além disto, com- 

panhias de tropas de infantaria irregulares fo- 

ram organizadas, visando àmobilização – em 

caso de emergência – dos numerosos negros e 

mulatos integrantes da população rural e urba- 

na. Os Dragões de Minas, a força regular e profissional da capitania, foi organizada em 

oito companhias, tendo sido padronizados os 

soldos.158

De fato, o que deixava o governo português in-seguro eram as tensões sociais oriundas da explo-ração colonial, aqui inclusa a contradição entre se-nhores e escravos. As tropas regulares estariam

atentas a qualquer insatisfação por parte dos colo-nos. Pombal sabia que as reações tendiam a ocor-rer, dado o aumento considerável da presença ex-ploradora da elite portuguesa em terras brasileiras.

Porém, não bastavam forças militares organiza-das, bem pagas e que estivessem atentas às regiõescom maior probabilidade de resistência aos man-dos metropolitanos. Era preciso construir umanova ordem administrativa, que soubesse dimen-sionar a riqueza colonial, ao mesmo tempo queconseguisse projetar as reais possibilidades de reti-rar essas riquezas produzidas. Não bastava criarimpostos, taxas e contribuições; não bastava au-mentar o corpo de funcionários administrativos,que poderia evitar a evasão fiscal.

O sentido geral dessas modificações adminis-trativas passava pela idéia da centralização. Pombalacreditava que essa postura centralizadora, junta-mente com uma racionalização geral da estruturado Estado português, permitiria aumentar as ren-das reais. Porém, outras ações eram imperativas:

Com elevados vencimentos para os funcioná- 

rios, modernas técnicas de escrituração, regular 

elaboração de balanços e, como a Junta do Co- 

mércio, sujeita a estrito segredo em sua atuação,

a nova máquina administrativa era controlada 

por João Francisco da Cruz, o primeiro tesou- 

reiro-geral.159

Essas novas posturas administrativas não tarda-ram em chegar à principal colônia portuguesa des-de 1640:

Foram os novos métodos de contabilidade e de 

função de supervisão da Fazenda Real que ti- 

veram maior impacto nas colônias (...) sendo estabelecidas tesourarias, ou Juntas da Fazen- 

da, em todas as capitanias brasileiras, cada 

qual com sua jurisdição separada mas respon- 

sáveis perante a Fazenda Real por gastos e re- 

cibos expedidos regularmente, de maneira pa- 

dronizada e exata. Com a Real Fazenda, as 

Juntas da Fazenda das capitanias deviam re- 

crutar funcionários entre os ‘homens abastados

10 4 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

157  Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 62.158 Idem, ibidem , p. 62-3.159 Idem, ibidem .16 0 Idem, ibidem .16 1 Idem, ibidem , p. 63-4.

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e prudentes’ locais, especialmente os mais ricos 

comerciantes, que deviam ser estimulados me- 

diante a fixação de soldos atraentes a colocar 

sua perícia comercial a serviço dos negócios pú- 

blicos. ( ...) 160

Os novos dirigentes portugueses, inspiradosem parte por algumas idéias iluministas, pensaramem vários detalhes, criando mecanismos que nãoacabariam completamente com os desvios fiscais,mas estes seriam reduzidos a um grau suportável:

A Junta da Fazenda de Minas Gerais, criada 

em 1765, recebeu minuciosas instruções para 

atuar em 1769 e constituiu-se definitivamen- 

te em 1771. As despesas deviam ser divididas pelas listas militares, eclesiásticas, civis e ex- traordinária, e a Junta seria responsável pela 

arrematação dos contratos da capitania, que no 

caso de Minas Gerais implicavam as importan- 

tes taxas de entrada e os dízimos locais, bem 

como os direitos de trânsito. (...) De fato, pela 

primeira vez um órgão colonial, sob a presidên- 

cia de um governador que limitava e apreciava 

a participação local, tornava- se o único respon- 

sável pela tesouraria regional e por todas as 

despesas e arrecadações, salvo o quinto real.

Este último tributo continuaria sob a responsa- 

bilidade das Casas de Fundição, sendo uma re- 

ceita de que a Junta não podia dispor, total- 

mente remetida para a metrópole.161

Na prática, as ações de Pombal, em relação aoBrasil, objetivavam colocar, nos cargos mais im-portantes da Colônia, parte da elite local, além depessoas da sua mais estrita confiança. Era preciso

garantir que as riquezas brasileiras não se dirigis-sem para mãos que não fossem as portuguesas,

mesmo que, logo em seguida, recheassem os cofresingleses.

Ao mesmo tempo, é preciso compreender comose organizava a cobrança dos tributos relativos àsentradas de mercadorias, às passagens de rios e aosdízimos, realizados pelos contratadores, o quedava a esse mecanismo de arrecadação, como já seviu, um caráter privado; ou seja, a responsabilida-de da arrecadação tributária ficava nas mãos depessoas a partir de uma concessão estatal.

Desses tributos, o que menos rendia ao fiscometropolitano era o imposto que se cobrava para

10 5séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

A expedição de Alexandre Rodrigues Ferreira não estaria isenta da cobrança feita

pelo fisco metropolitano sobre o direito de passagem em rios, já que suas

canoas também conduziam mantimentos e cargas.

29. Frontispício da V IAGEM FILOSÓFICA ÀS CAPITANIAS DO GRÃO-P  ARÁ , RIO NEGRO , M ATO GROSSO

E  C UIABÁ (1783-1792). Rio de Janeiro, Fundação Biblioteca Nacional.

16 2 Sobreessetributo, afirma-se: “(...) Velho tributo, dos mais antigos queseconhecem, chegou ao Brasil no começo do século XVIII, embora tenha havidotentativas para implantá-lo na Bahia, a fimdeprivilegiar Lourenço Correia deBrito, herói da guerra contra os holandeses. A partir de1700, porém, as‘passagens sobreos rios’começarama ser cobradas esemultiplicaramcomincrível rapidez. As necessidades geradas pelo intenso tráfego para as minas earentabilidadedessetributo foramas causas desua criação. O tributo continuou a ser cobrado atédepois da Independência, mas aos poucos entrou emdecadência. No Segundo Império, as ferrovias deramo golpe final na sua existência. Curiosamente, o tributo ressurgiu há poucos anos na ponte Rio-Niterói, como nomegenérico de‘pedágio’. (...) As passagens dos rios comportavamtrês modalidades dearrecadação: a) direta, por agentes do fisco; b)arrematada, através delicitação, a contratadores; ec) concedida, como recompensa a serviços prestados à Coroa; éo caso das passagens dos rios Jaguari,Mogi-Guaçu, Grande e Corumbá, conferidas a Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhanguera II. O tributo incidia sobre os passageiros e as cargastransportadas, segundo tabelas variáveis de lugar para lugar. As passagens poderiamser feitas através de pontes ou deembarcações enão podiamserestabelecidas emrios quepudessemser vadeados, mas só nos chamados ‘rios caudais’. A ‘arrematação’das passagens era uma licitação promovida pelas

Provedorias da Fazenda Real e, depois, pelas Juntas da Real Fazenda. O vencedor da licitação secomprometia a pagar uma quantia fixa à Fazenda,ressarcindo-seatravés da cobrança deuma taxa aos viajantes queusassemas pontes ou barcas postas à sua disposição na ‘passagem’. Existirampassagensemquasetodas as capitanias do sul do Brasil eemalgumas do Nordeste. Não encontramos, entretanto, nenhuma quesesituassena Amazônia.”Cf. Internet,Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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dar direito de passagens sobre rios16 2. Aqui valia osistema de cobrança através dos contratos. Assim,

Ao contratador pertenciam todos os rendimen- 

tos que produzissem as passagens dos rios Ver- 

de, Sapucaíe Piedade, onde cobraria 80 réis 

em dinheiro, por pessoa, e 160 réis de prata 

por cada cavalo, ‘na forma das mais passagens; 

e em nenhum dos portos delas haverámais ven- 

das, ou rancho, que dele contratador, na mesma forma que nos mais rios em que hápassagens e 

se pratica’.

As canoas que conduzissem mantimentos ou 

cargas, rio abaixo ou r io acima, pagariam o 

mesmo que nas demais passagens da comarca.

O contratador não poderia ter canoa no rio.

Os moradores dos barrancos e os mineradores 

do rio poderiam, desde que não dessem passa- 

gem a pessoa alguma ou cavalo, além do seu uso, sob pena de pagarem 50 oitavas de ouro ao contratador. 163

E ainda existiam outras condições apresentadasem contratos diversos. Por exemplo, em um outro,também sobre os direitos de passagens sobre rios,o contratador Manoel Antunes Nogueira aceitavauma série de obrigações:

O contratador cobraria os seguintes direitos pe- 

las passagens: ‘por cada pessoa de qualquer 

qualidade, condição ou sexo, que de uma para 

outra parte passar: 80 réis de prata; por cada cavalo ou besta muar com carga ou sem ela: 

160 réis; por cabeça de gado vacum que passar 

na ponte: 160 réis; por carro que passar: 300 

réis.164

Como se afirmou, em termos absolutos165 , osdireitos de passagens dos rios, mesmo na regiãomais rica do Brasil colonial, não tiveram a impor-tância dos direitos de entrada. Assim, sobre o im-posto que recaía sobre todas as mercadorias que

chegavam a uma determinada região da Colônia,pode-se afirmar:

10 6  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

Os direitos de entrada tiveram grande importância no sistema tributário lusitano,

e tropeiros como estes tinham suas cargas examinadas para que se impusesse o

tributo de acordo com a classificação dos gêneros de comércio.

30. Jean Baptis te De bret, P OBRES TROPEIROS DE  S  ÃO P  AULO, 1834; aquarela. São Paulo,

Coleção Guita e José Mindlin.

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O sistema do tributo das entradas depende es- 

sencialmente dos Registros, ou postos aduanei- 

ros, situados em todos os acessos para o interior 

da capitania, dentro de suas fronteiras. Neles 

se examinam as caravanas de tropas de carga e se faz a imposição do tributo sobre as quatro 

categorias em que se classificam os gêneros de 

comércio: secos, molhados, gados (semoventes) e 

escravos. Grande parte dos lançamentos se faz 

para liquidaçãoa posteriori, isto é, nos locais 

a que se desti navam as mercadorias, mediante 

créditos emitidos pelos comerciantes ou pelos 

tropeiros. Para a cobrança de tais créditos, fez- 

se necessário organizar em Vila Rica o banco 

central em que eles são escriturados e redistri- 

buídos aos cobradores, acompanhados de rela- ções para o competente controle. Tais relações se 

chamam atualmente borderôs, e os títulos que relacionavam se compreenderiam na espécie das 

promissórias. Como os contratantes também 

necessariamente negociam, emitem-se letras de 

câmbio da praça central contra as praças filiais 

e Registros e vice-versa. Estas são exigíveis à 

vista. As promissórias, entretanto, admitem to- 

lerâncias de prazo que a matriz de Vila Rica 

pretende limitar a seis meses sem grande suces- 

so. A escrituração básica éde contas-correntes,

livros de dever e haver, além dos borradores 

diários.166 

Os direitos de entrada se constituíam numarica fonte de recursos para o fisco metropolitano,principalmente numa região de exploração mine-ral, como foi o caso de Minas Gerais, já que a en-

trada de mercadorias era relevante em termos dequantidade – e como se sabe, o imposto recaía so-bre o peso das mercadorias –, pois as necessidadesda população local eram enormes: iam desde osalimentos, passando por animais para transporte,escravos, além de instrumentos de trabalho especí-ficos para a mineração. Portanto, se a Coroa por-tuguesa retirava significativos ganhos com a arre-cadação do Quinto, o que era recolhido atravésdos direitos de entrada não era desprezível. Aindasobre esse tributo, afirma-se:

O tributo das Entradas era um imposto sobre a circulação de mercadorias, com a característica de 

aduana interna da capitania mineradora. Os Re- 

gistros eram postos de arrecadação e fiscalização,

onde o preposto do contratador (o administrador 

do Registro) e o funcionário da Real Fazenda (o 

fiel), que às vezes eram a mesma pessoa, se encar- 

regavam de efetuar o lançamento, ou com a co- 

brança imediata do imposto ou – ou que era mais 

comum – com a formalização do crédito tributá- 

rio, através de uma nota promissória ou título de 

dívida do comerciante, viandante ou tropeiro, a ser 

paga em geral no local de destino da mercadoria 

10 7 séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

163 Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 155-156.164 Idem, ibidem , p. 156-157.165 Sobre esses valores, afirma-se: “No quadro mais importante, de rendimento das passagens do Rio das Mortes, até 1776, ele apresentava valores anuais que

oscilavamentre 1 conto, 485.000 réis, em1711, e 6 contos, 500.000 réis emcada umdos anos de 1748, 49, 50. Em1776, o valor anual é de 2 contos,957.416.” Cf.: Mauro de Albuquerque MADEIRA, op. cit., p. 157. Porém, o fato de render pouco emrelação aos outros tributos não evitou algunsconflitos, como o relatado a seguir: “[A] passagemCubatão deSantos já existia em1717, quando foi objeto deuma demanda judicial entreos Jesuítas ea Fazenda Real. Ainda existia em1786 eem1795, quando foi arrematada por contratadores particulares. Ela selocalizava sobreo rio (ou baía) Canium,umbraço demar no estuário santista. Isso provocou grandes discussões, pois as passagens só podiamser estabelecidas sobreágua doce. Os Jesuítas alegavam

quetinhamuma concessão régia para tal, mas nunca a exibiram. Quando Pombal os expulsou, a passagemfoi confiscada para a Fazenda Real, semqueaquestão da sua legalidadehouvessesido decidida. Apesar dos veementes apelos dos moradores, a Fazenda Real mantevea cobrança dessa taxa sobretodosos quesedirigissempara o planalto ou delepara o litoral. Seu arrematanteem1786 foi o coronel Bonifácio JosédeAndrada, servidor fazendário epai doPatriarca da Independência, JoséBonifácio deAndrada eSilva.”

16 6   Tarquínio J. B. deOLIVEIRA,C orrespondência ativa de João Roiz de M acedo, p. 79. Ainda sobreos Registros, afirma-se: “(...) Repartições arrecadadoras efiscalizadoras, estabelecidas no começo do Ciclo do Ouro, para cobrar o tributo das ‘entradas’, queera umimposto sobrea circulação demercadorias.Ajudavam também a reprimir o contrabando de ouro e de diamantes edesempenhavam funções policiais, dificultando a movimentação das pessoasprocuradas pela Justiça. Atravessaramos séculos XVIII eXIX, sendo abolidas apenas nos primeiros anos da República. A própria República, porém, logoos restabeleceu na Amazônia, no começo do século XX, com o nome de ‘Registros Fiscais’”. Cf. Internet, Site da Receita Federal,www.receita.fazenda.gov.br. E tambémexistia uma variantedesses Registros, como sepodeobservar: “Contagens - Posto defiscalização earrecadação dostributos incidentes sobre animais em trânsito de uma capitania para outra. Eram uma variedade dos ‘Registros’, diferindo destes pelo fato de seremespecializadas na tributação desemoventes. Apesar da especialização, fiscalizavamearrecadavamoutros tributos dos contribuintes quepor elas passassem.A expressão ‘contagem’foi usada pela primeira vez emMinas Gerais para designar o posto defiscalização do ribeirão das Abóboras, quedeu origemà atualcidadedeContagem, naqueleEstado deMinas Gerais. A expressão, entretanto, vulgarizou-semais emGoiás ondeessas repartições existiramemmaiornúmero. As contagens eramdirigidas por servidores denominados ‘contageiros’, posteriormenteunificados coma categoria dos Fiéis deRegistro. Em1798,porém, a Rainha D. Maria I determinou queesses cargos não fossemmantidos equeseus ocupantes fossemprovidos emoutros. Site da Receita Federal

(www.receita.fazenda.gov.br). Quanto à cidademineira deContagem, tem-se: ‘Contagemdas Abóboras - Localizava-seno local onde hojeestá situada acidadedeContagem, emMinas Gerais, a quemdeu nome. Começou a funcionar em9 deagosto de1716. Foi extinta em1809, por provisão da Junta daReal Fazenda deMinas Gerais, datada de7 dejunho desseano. Anteriormente, em1765, estava desativada; possivelmente, nunca voltou a operar. Tambémera conhecida por Registro das Abóboras epor Registro da Encruzilhada.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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tributada. O administrador e o fiel do Registro 

eram ou deviam ser ajudados e garantidos pela 

patrulha policial/ militar (em geral, um cabo e 

dois soldados), cuja tarefa era evitar ou reprimir 

o descaminho, o contrabando ou extravio de mer- cadorias, que não deveriam transitar para a capi- 

tania por veredas, matos ou matas desguarnecidas 

das repartições fiscais, que eram os Registros.167 

Assim, o papel do contratador de tributos éfundamental para se compreender a organizaçãoda prática tributária no Brasil-Colônia. Estabele-ciam-se relações muito íntimas entre esses contra-tadores – normalmente ricos comerciantes, repre-sentantes da elite colonial – e os funcionários

reais, estes nem sempre interessados em defender,estritamente, os direitos tributários da Metrópole.Daí a afirmação de que “o próprio sistema de ar-rendamento privado do tributo era causa e efeitoda privatização da coisa pública, da patrimoniali-zação do Estado. A sociedade era excessivamentedominada pelo Estado e, ao mesmo tempo, esteera apropriado pelos interesses privados da classedominante.”168 Ou seja, as coisas públicas estavammisturadas aos interesses particulares, sendo os úl-timos os mais beneficiados.

A confusão entre esses interesses se devia, prin-cipalmente, pela maneira como se processava aprática da cobrança de tributos através dos contra-tos de arrematação de alguns deles. Sobre essa sis-temática, tem-se:

O contratador arrematava em leilão, por preço 

fixo, o total de imposto que ele deveria recolher 

aos cofres da Real Fazenda, relati vo ao tr iênio 

sob contrato. A partir daí, tratava de gerir com 

autonomia a cobrança tributária dos contri- buintes. Empregava os administradores dos re- 

gistros, que coordenavam os seus auxiliares,

caixeiros, cobradores. A Junta da Fazenda da 

capitania devia nomear os fiéis de cada registro,

que eram os fiscais ou funcionários da Coroa.

Contudo, era freqüente que o administrador do 

registro fosse também nomeado fiel, embara- 

lhando na mesma pessoa as funções privada e 

pública de ser empregado do contratador e fun- 

cionário do Rei. Ao primeiro cabia zelar pelo 

lucro do contratador, ao segundo, pelo interes- 

se da Coroa, que estavam ligados. Sem a efeti- 

va cobrança fiscal, o contratador ficaria insol- vente e o Erário Régio deixaria de receber os 

tributos.169

Essa mistura de funções na mesma pessoa eraproposital, apesar de ir contra a legislação vigente,porque interessava essencialmente ao contratador,pois:

O contratador era um capitalista/ arrendatário de 

tributos, que precisava manter controle permanen- 

te sobre os seus prepostos (administradores de re- gistros, procuradores), sobre os funcionários pú- blicos da área fiscal (fiéis e provedores dos regis- 

tros), sobre o aparato policial/ militar que devia 

reprimir os descaminhos e, finalmente, sobre os 

numerosos contribuintes/ devedores do imposto 

arrecadado. Era uma tarefa complexa, de que 

muitas vezes os contratadores se desincumbiram 

mal, ficando insolventes para com a Fazenda Real 

e tendo, ao final de muitos anos, seus bens penho- 

rados pelo Erário Régio.170

Dessa maneira, as relações entre o contratadore as autoridades dentro de uma determinada capi-tania eram as mais extensas possíveis. O rendimen-to final do contratador dependia, muitas vezes, daboa vontade do governador da capitania em ques-tão. Ou seja, como a tarefa de arrecadar tributosdependia de uma força militar minimamente orga-nizada e eficiente, e estava nas mãos do governa-dor, necessariamente, este e o contratador deve-

riam ter algum grau de convergência. Mais umavez, a mistura do público com o privado concreti-zava-se. Cabia ao governador colaborar ou nãocom o contratador. Essa colaboração, de uma ma-neira ou outra, deveria ser compensada pelo con-tratador. Estava-se diante de um processo de cor-rupção quase que inevitável.

E mesmo quando havia estreita colaboração en-tre o contratador, o governador e outras autorida-

10 8 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

167  Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 116.16 8 Idem, ibidem .16 9 Idem, ibidem , p. 117.170 Idem, ibidem , p. 119.

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des de uma capitania, não era garantido que osdesvios fiscais seriam evitados. A realidade não eraessa. Cada contratador tinha que ter o máximo dehomens de sua inteira confiança – e que primas-

sem pela competência – para evitar tais desvios.Mas havia também outras questões que marca-vam o sistema de contratos e de registros:

Em geral, o esquema contábil funcionava assim: 

o comerciante ou transportador (‘condutor’) ou 

viandante passava com as suas cargas no regis- 

tro, onde o administrador contabilizava um tí- 

tulo de crédito do imposto (entradas), a ser co- 

brado no local de destino das mercadorias ou de 

residência do devedor e conforme a maior ou 

menor eficiência dos representantes do Contra- to. Estes deviam remeter o dinheiro e receber ou enviar títulos de crédito, de ou para a capital – 

Vila Rica –, onde o contratador desempenhava 

a frenética tarefa de missivista e controlador 

financeiro e comercial do Contrato, quando não 

estava viajando, em lombo de burro, pelos seus 

domínios ou para o Rio de Janeiro.

O ponto nevrálgico do Contrato era a cobran- 

ça dos débitos fiscais, para não falar nos desca- 

minhos das mercadorias que escapavam do re- 

conhecimento formal de crédito tributário e só

poderiam ser recuperadas através do confisco,

mediante denúncias.17 1

Como o contratador das entradas em MinasGerais tinha que cuidar de muitos registros aomesmo tempo, era preciso um controle muito rígi-do, pois as correspondências eram transportadasem lombo de burro – portanto, sempre muito de-

moradas – e, além disso, os encarregados deviamser sempre pessoas da maior competência. Atéporque não foram poucos os casos em que funcio-nários do contratador eram pegos desviando partedas mercadorias que deveriam ser tributadas. Essaprática, que prejudicava o contratador, fazia comque este tivesse que manter uma fiscalização cons-tante em cada registro. Nas cartas do contratador João Rodrigues de Macedo, estas preocupaçõespodem ser percebidas.

Um exemplo da contabilidade está na carta di-rigida ao administrador geral do Contrato na capi-tania de Goiás:

‘No registro do Caminho Novo passam fazen- das que vão para essas minas, e como tenho or- 

denado ao administrador dele, que émeu primo 

Domingos JoséGomes, fie dos que aípassarem,

hei de remeter a Vm. os seus créditos para a co- 

brança deles; tanto deles como de qualquer ou- 

tra cobrança, ou dependência do Contrato, que 

Vm. fizer, deve ser debaixo do dito prêmio de 

5.000 cruzados por ano, remetendo-me a esta 

capital, com segurança, qualquer quantia que 

por bem dos ditos créditos receber.172

Não se tratava de uma contabilidade simples,mesmo porque envolvia regiões dispersas pela ca-pitania de Minas Gerais. Na prática, o contrata-dor – através de uma correspondência numerosa –recebia e passava informações sobre valores a se-rem recebidos e deveriam ser remetidos para ele.Outro exemplo dessa correspondência pode serobservado na descrição das cobranças contida nacarta ao administrador geral do contrato na co-marca de Serro Frio (Tejuco):

‘Agora remeto a Vm. 28 créditos pertencentes ao 

Registro do Caminho Novo, que vão importando 

em 3:058$474 rs., como se vêdas ditas listas 

que acompanham os ditos créditos, que uma é 

para Vm. e vai assinada por mim, e outra épara 

Vm. assinar e remeter-me logo. Vm. na lista que 

mandar e acompanhar a remessa que fizer, per- 

tencente ao contrato, háde nela declarar de quem 

cobrou, número do crédito, a que lista pertence e 

de que Registro; bem entendido que não só estas declarações são para os créditos do Caminho, que 

a Vm. remeto, assim como dos demais. Quanto à 

cobrança que Vm. fizer dos direitos dos Registros 

dessa Comarca, só basta que Vm. declare a quan- 

tia que remeter, a que Registro pertence, para se 

fazer os abonos.173

Esse processo de controle sobre cada registro, ede todo trabalho daí derivado, durava um período

10 9séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

171 Idem, ibidem , p. 126.172 Idem, ibidem .173 Idem, ibidem .

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de três anos – normalmente tempo de duração deum contrato desse tipo. Vencido esse tempo, cabiaao contratador pagar o valor contratado ao ErárioRégio. Sabe-se da inadimplência e do atraso dos

contratadores, quase como regra. E mesmo comuma justiça lenta, o não pagamento dessas dívidaspara com o fisco português gerava penhora e con-fisco de bens. Sobre essa questão, afirma-se:

A execução das dívidas através das penhoras de 

bens era o estágio final da cobrança dos contri- 

buintes inadimplentes. E, ao que parece, era uma 

das fontes mais ricas de ocupação e renda para 

advogados, juízes e oficiais da justiça colonial.

Nenhum contratador passava sem bons advoga- 

dos. Cláudio Manuel da Costa o foi de João Roiz de Macedo e de Joaquim Silvério dos Reis, entre outros.174

Efetivamente, o contratador experimentava osdois lados em relação à cobrança fiscal. Da mesmamaneira que corria no sentido de cobrar os impos-tos devidos pelas pessoas que haviam entrado commercadorias na região das minas, sabia que seriacobrado pela Coroa assim que terminasse o triênioem que fosse responsável pelo recolhimento dostributos relativos às entradas. Daí viver a experiên-cia sui generis : de executor a executado de dívidasfiscais. Porém, se o contratador podia contar comassistência de bons advogados – o que não aconte-cia com os contribuintes menores – e com a mo-rosidade da justiça, o mesmo privilégio não faziaparte das condições daqueles pequenos contri-buintes. Em última instância, cair nas garras da justiça dentro do espaço colonial até poderia serum bom negócio. Ainda que muitos contratadores

não conseguiram arcar com as suas dívidas, tendoseus bens confiscados. Outros, apesar da mesmainadimplência, foram perdoados pela FazendaReal, caso de Joaquim Silvério dos Reis, um dosdelatores da Conjuração Mineira.175

Além dessas questões, uma outra colocava-sena prática dos contratadores de impostos. Em al-gumas ocasiões, seria interessante ao próprio con-tratador permitir a evasão fiscal. Senão, vejamos:

Como os contratantes e seus sócios também 

eram comerciantes, éfácil imaginar a tentação 

de passarem mercadorias em seu próprio nome,

tornando-se devedores de si próprios, i sto é, do 

Contrato, o que redundaria numa fraude con- tra o credor do tributo, a Coroa. Tal movimen- 

tação comercial aumentaria as probabilidades 

de insolvência fiscal do contratador e, portanto,

de não recolhimento do preço arrematado aos 

cofres do Erário.

Pela própria natureza clandestina da evasão 

fiscal, édifícil obter comprovação documental 

dos desvãos ou i licitudes contábeis. Nessa área,

os indícios e presunções são mais viáveis.176 

Ao mesmo tempo, para a Metrópole, assimcomo para os contratadores que iriam arrecadaros tributos, havia um mecanismo importantepara fazer com que as riquezas da região aurífe-ra não acabassem saindo das Minas Gerais semqualquer controle: tratava-se dos caminhos le-gais criados pela Coroa lusitana, que eram passa-gens obrigatórias para todos os que se dirigissemàs minas. Os antigos caminhos, que já existiamantes da “corrida ao ouro” do fim do séculoXVII, foram adaptados para que as autoridadesportuguesas pudessem saber quem passava e como que passava, entrando ou, principalmente,saindo daquela região. Sobre esses caminhos,afirma-se:

Esses caminhos eram os que a Coroa considera- 

va válidos para a saída oficialmente controlada 

do ouro. Existiam outras vias importantes,

como as de São Francisco, que ligavam o nor- 

deste tanto com as Gerais, quanto as minas de Goiás, ou a rota preponderantemente fluvial 

que levava de São Paulo às minas de Cuiabá.

Entretanto, foram nestas ligações usuais com 

Minas que se estabeleceram os sistemas mais 

eficazes de controle fiscalista, os registros e as 

barreiras. Estes estabelecimentos oficiais poli- 

ciados, para cobrança dos impostos, constituíam 

passagem obrigatória. Comumente, em torno 

110 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

174 Idem, ibidem , p. 129.175 O caso destecontratador conhecido por sua ação detraição ao movimento rebeldedeMinas Gerais, a conhecida Conjuração Mineira, será apresentado

commais detalhes no decorrer destetrabalho. JoaquimSilvério dos Reis, alémdas dívidas perdoadas, ainda recebeu outros benefícios.17 6  Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 131-132.

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deles se erigiam casas, pousos e acabava por de- 

senvolver-se uma cidade: éo caso, por exemplo,

de Moji -Mi rim e Moji -Guaçu.177 

Esses caminhos – os “caminhos do ouro” –não foram capazes de inviabilizar a prática do con-trabando. Tiveram o papel de dificultar, mas nãode impedir, que muitos tropeiros circulassem qua-se livremente por outras vias que não as oficiais.Neste sentido, sabe-se que:

I númeras rotas de passagem de tropas existi- 

ram, além das oficiais. Algumas delas, como a 

‘estrada francana’, passando pelas atuais Casa 

Branca e Franca, também davam origem a no- 

vos pousos e núcleos. Entretanto, torna-se mui- to difícil diferenciar nitidamente o ‘caminho oficial’ do ‘descaminho’, pois muitas rotas uti- 

lizadas para diversos fins comerciais foram 

usadas para o escoamento do ouro. (...) 

O ouro não quintado, porém, ia facilmente 

para fora das Gerais, fundamentalmente para 

pagar artigos ali entrados. Uma das principais 

vias de abastecimento, por onde o metal fugia 

aos controles, era o chamado ‘Caminho do Ser- 

tão’, praticado intensamente desde o século 

XVI I . Estabelecendo a ligação entre Minas e o 

nordeste, pelo interior, ele acompanhava o cur- 

so do rio das Velhas atéàmargem direita do 

São Francisco, que estabelecia a comunicação 

com as principais trilhas provenientes do sertão 

nordestino e do Recôncavo.178

Este caminho ilegal partia das Minas Gerais enão parava no Recôncavo Baiano, mas passava ain-

da por Pernambuco, chegando até o Maranhão;como também permitia que o ouro e o diamantesaíssem de lá sem pagar os direitos do Quinto, dei-xando esse prejuízo para a Coroa. Ou seja, atravésdesse descaminho , as mercadorias poderiam entrarna região do ouro sem pagar qualquer direito deentrada – trazendo prejuízo direto aos contratado-res de tributos. Dessa maneira,

O ‘Caminho do Sertão’ era de grande impor- 

tância. Por ele ‘não só subia muito ouro das la- 

vras, sem pagamento dos direitos de Sua Majes- 

tade,... como desciam gêneros de comércio, ne- 

gros e atémesmo senhores de engenho’. A medi- da dessa importância pode ser dada pela exis- 

tência de restrições que, desde 1701, a Coroa 

impunha ao trânsito ali. Nesse ano, tentou- se 

fechar o caminho, porém, dada a importância 

do abastecimento de carne para as nascentes ci- 

dades mineiras, pelo Alto do São Francisco, o 

Regimento de 1702 atenuou as restrições, per- 

mitindo a passagem de rebanhos.179

Esse não era um caminho ilegal. As autoridades

portuguesas tentaram discipliná-lo, no sentido deevitar que a circulação de mercadorias fosse ilimita-da, o que se mostrou irrealizável. Assim como nes-se caminho, em outros praticou-se o comércio ilegalem função da mineração, inclusive tornando-se

111séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

177  Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 247.178 Idem, ibidem , p. 248.179 Idem, ibidem .

“Os artifícios utilizados para burlar o fisco atingiam uma razoável sofisticação.

As imagens de santos trabalhadas em madeira muitas vezes levavam o cobiçado

metal em seu bojo, daí a denominação popular de ‘santos-do-pau-oco’.”

31. NOSSA S ENHORA DO ROSÁRIO, século XVIII, Paracatu, Minas Gerais; madeira

entalhada, policromada, estofada e dourada, 2,02 m, Ouro Preto.

Museu da Inconfidência.

Page 111: Livro a História Dos Tributos No Brasil

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complicado avaliar o tamanho do contrabandonessa época, mas que se sabe muito maior que emoutras regiões da Colônia, já que Minas foi poronde mais riquezas circularam durante a explora-

ção colonial portuguesa. Assim, vejamos:

A avaliação histórica do comércio aurífero no 

século XVI I I esbarra necessariamente com o 

fato de que não háuma idéia sequer aproxi- 

mada do volume de ouro desviado para fora do 

controle oficial. Os sintomas àdisposição in- 

dicam uma grande intensidade do desvio; bas- 

ta lembrar que os caminhos não-ofi ciais eram 

muitas vezes mais percorridos que os sujeitos à 

fiscalização, como, por exemplo, aquele aberto 

pelo particular João Gonçalves do Prado, que passava pelo espigão-mestre da serra do Espi- 

nhaço, passando pela zona de Curvelo e a ba- cia do alto rio das Contas.180

Esse não era o único caminho ilegal, que des-viava parcelas importantes da renda tributária doscontratadores e da Coroa:

Muito ouro foi levado para o sul, proveniente 

tanto das Gerais quanto das minas de Cuiabá.

Nesta última região, altos funcionários chega- 

vam a ter tal participação no contrabando, que 

iam ao ponto de solicitar àCoroa alguma for- 

ma de legalização da atividade, dada a inefi- 

ciência de qualquer tentativa de controle. No 

extremo sul, o ouro era levado para os rios da 

bacia platina e transacionado com artigos euro- 

peus, trazidos principalmente por navios ingle- 

ses. Atépadres da Companhia de Jesus partici- 

pavam ativamente dessas operações.181

Aliás, como se sabe, os padres tinham grandefacilidade em praticar certas ilegalidades, já quenão eram obrigados a aceitar revistas em registrose barreiras. Ao mesmo tempo, a criatividade doscontrabandistas parecia não ter limite:

Os artifícios uti lizados para burlar o fisco 

atingiam uma razoável sofisticação. As imagens 

de santos trabalhadas em madeira muitas vezes 

levavam o cobiçado metal em seu bojo, daía de- 

nominação popular de ‘santos-do-pau-oco’.

Um sino de ouro revestido de bronze foi encon- 

trado recentemente em pesquisas na antiga re- gião aurífera de Goiás Velho, e práticas como 

esta parecem ter sido comuns.18 2

Em relação à quantidade de ouro e de pedraspreciosas contrabandeados do Brasil, não existequalquer cálculo mais preciso, dado ser uma ati-vidade que não deixa qualquer vestígio docu-mental mais exato. Porém, é possível inferir queao menos a metade dessa produção tenha saídodo Brasil sem que o Quinto respectivo fosse pa-

rar nos cofres de Lisboa. Como esses mineraisnão tributados eram trocados por mercadoriasconsumidas na própria região mineira, a quanti-dade foi grande.

Por outro lado, o outro tributo também arre-cadado através dos contratos era o dízimo. Espe-cificamente, o dízimo eclesiástico, já que o ter-mo dízimo era colocado como tributo de umasérie de outras mercadorias, mas que se referia auma parcela a ser cobrada, que poderia ser 10%ou não. Certamente, grande parte dos problemasencontrados em relação à cobrança dos direitosde entrada também estava presente na ação doscontratadores desse tributo. Porém, o dízimo ti-nha as suas especificidades, que precisam serpontuadas:

O sistema dos dízimos écompletamente diverso.

Abrange todos os serviços e negócios de mercado- 

rias dentro da própria capitania, assumindo as- 

pecto dos atuais impostos de renda, sobre servi- 

ços, sobre produtos industrializados e sobre a circulação de mercadorias. Cada subdivisão ter- 

ritorial (vilas, distritos mais importantes e res- 

pectivos territórios) tem seu exator e coletor. A

principal forma de lançamento éa por avença- 

mento com o produtor, o comerciante ou o pres- 

tador de serviços. Fora daí, a imposição édireta 

nas vias de comunicação e ao arbítrio dos cobra- 

dores.183

112 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

18 0 Idem, ibidem .18 1 Idem, ibidem .18 2 Idem, ibidem .18 3  Tarquínio J. B. deOLIVEIRA, op. cit., p. 79-80.

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Porém, os dízimos traziam embutidos na suaconcepção mais do que um mero tributo cobradopor um Estado:

Não se estranhe a fonte legal desse tributo, dada a sua natureza simultaneamente sacra e leiga, da 

Coroa e da Igreja, duas instituições naquele 

tempo irmãs siamesas. (...) 

Em termos históricos e práticos, os dízimos eram 

arrecadados pela Coroa portuguesa, através dos 

seus funcionários ou prepostos – inclusive os 

contratadores – e destinados às suas despesas,

entre outras, àmanutenção da Igreja Católica,

quase um Estado dentro do Estado absolutista.

Os dízimos eram ‘a décima parte de todos os bens móveis licitamente adquiridos, devida a Deus e a 

seus Ministros por insti tuição divina e consti- 

tuição humana’.184

Para a população, esse tributo tinha uma sig-nificação especial, porque revertia para os custosrelacionados com a Igreja Católica. Em função daprofunda religiosidade popular – sempre vincula-da a um terror exercido pela própria Igreja Cató-lica, que tinha nas mãos o Tribunal da Santa In-quisição –, pagar ou não essa obrigação fiscal tra-zia à tona outras questões, como a do pecado.Assim, “os párocos, os pregadores e os confesso-res devem inculcar nos fiéis – que também são ossúditos – a obrigação de pagar os dízimos, sobpena dos castigos divinos da ‘esterilidade das ter-ras e destemperança dos tempos’. Quem impedirou dificultar a cobrança dos dízimos sofrerá apena religiosa da excomunhão, além da multa de

cinqüenta cruzados.”185

Da mesma maneira queocorria com os outros tributos, a Igreja Católicalançava mão dos seus teólogos para darem ar de justiça a tais pagamentos que beneficiavam o Es-tado português:

A justificação ideológica deste tributo éespecial- 

mente religiosa. Segundo as ‘Constituições Pri- 

meiras do Arcebispado da Bahia’, os que não pa- 

gam o dízimo cometem o pecado do furto e os que 

o pagam poderão conseguir os prêmios temporais,

eternos, e evitar os castigos da pobreza e esterili- 

dade e outros com que a justiça divina ameaça por seus Santos e Profetas aos transgressores 

deste preceito.’ Como Deus éque ‘dáo incremen- 

to dos frutos’, ele teria reservado para si (na 

pessoa dos ministros da Igreja) a décima parte 

daqueles.186 

Ao mesmo tempo, existia uma classificaçãoacerca desse tributos. Assim, “os dízimos eramreais – ou prediais –, dos frutos dos prédios outerras, colhidos sem ou com o trabalho humano;

pessoais, a décima parte dos frutos do trabalho ouindústria da pessoa; e mistos, dos frutos provindosem parte do trabalho humano e em parte da terra,por exemplo, peixes, animais, aves de criação oucaça.”187  E a legislação da Igreja, principal benefi-ciária deste tributo, deixava claro o que devia sertributado ou não:

Na enumeração das ‘Constituições Pr imeiras’ 

estão a mandioca, milho, arroz, açúcar, tabaco,

bananas, aipins, batatas, favas, feijões e outros 

legumes, laranjas, limões, cidra, hortaliças e 

cousas semelhantes; madeiras e lenhas e todos os 

frutos da terra, naturalmente ou por indústria 

dos homens, inclusive as pedras preciosas e mi- 

nerais de ouro, prata e cobre e outros, exce- 

tuando, porém, o ouro tributado pelo quinto do 

Rei. Cobram-se dízimos também de todos os 

animais, gados, aves, peixes, enxames, mel,

cera, lã, queijos, leite, manteiga, patos, adens,

perus, galinhas, frangões e outras aves a mão; 

dos frutos e ganhos dos engenhos de açúcar,moinhos, azenhas, fornos de pão, tijolo e cal; e 

dos pombais, pesqueiras, águas ardentes e seme- 

lhantes.188

Além disso, “os dízimos pessoais são definidoscomo ‘a décima parte de todo o ganho e lucro li-citamente por via de qualquer ofício, artifício, tra-

113séc u l o x v i i i : o p r essã o f i s c a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

184 Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 138.

185 Idem, ibidem , p. 140.18 6  Idem, ibidem , p. 139.18 7  Idem, ibidem .18 8 Idem, ibidem .

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to, mercancia, soldada, jornais de qualquer servi-ço, tirados os gastos e despesas.’Portanto, as ativi-dades hoje chamadas terciárias, de serviços, paga-vam dízimos, depois de abatidas as despesas neces-

sárias à obtenção da sua renda.”189

Ou seja, qual-quer forma de rendimento devia ser tributada nosentido de se recolherem os dízimos.

Como a prática de tributar através da cobrançada décima parte do rendimento de qualquer ativi-dade produtiva vem desde o Mundo Antigo, D.Oscar de Oliveira, autor de uma obra clássica so-bre o assunto190 , entende ser preciso caracterizarcom detalhes os dízimos eclesiásticos, para quenão se confundam com outras práticas tributárias,inclusive algumas que estavam em vigor no Brasil

colonial. Assim, afirma que:

Estritamente eclesiásticos (espirituais, sacra- 

mentais), para se distinguir dos dízimos domi- 

nicais ou feudais, e temporais como, por exem- 

plo, as dízimas alfandegárias e as décimas (im- 

postos prediais urbanos) portuguesas. Os dízi- mos dividiam-se em reais e pessoais (os reais,

ditos também prediais, provêm de frutos que se 

colhem ou de outras rendas de terras ou casas.

Em geral, sob denominação de reais, estão tam- 

bém incluídos os dízimos mistos, que são em 

parte reais, em parte pessoais: são os que se ad- 

quirem de coisas que exigem trabalho ou indús- 

tria, como gados, leite, lã. Subdividem-se os 

reais em maiores e menores; os primeiros cons- 

tam de trigo, vinho, frutos maiores; os últimos 

de hortaliças. Novais são os dízimos provenien- 

114 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

Sobre os bens patrimoniais dos clérigos incidiam dízimos. Os réus

eclesiásticos da Inconfidência Mineira, que tiveram julgamento especial,

tiveram seus bens arrolados nos processos da devassa.

32. AUTOS CRIMES - J UÍZO DA C OMISSÃO CONTRA OS RÉUS ECLESIÁSTICOS DA C ONJURAÇÃO

FORMADA EM MINAS  GERAIS , 1791. Ouro Preto, Museu da Inconfidência.

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tes de terras que, estando antes abandonadas,

começaram a ser trabalhadas; os de terras já 

cultivadas denominam-se antigos.191

Se os dízimos reais eram tão bem classificados,o mesmo ocorria com os dízimos pessoais, dei-xando claro que a intenção dos legisladores eraque não sobrasse a menor dúvida sobre quem ouo quê deveria ser tributado em benefício da Igre- ja Católica. Nesse sentido, sobre os dízimos pes-soais tem-se:

Os dízimos pessoais são os que provêm da in- 

dústr ia dos fiéis e dos lucros das artes, profis- 

sões e ofícios. Papais são os que os Romanos 

Pontífices, por intermédio de coletores pontífi- ces, cobram dos benefícios eclesiásticos, por cau- sa de alguma urgente necessidade ou pública 

utilidade da Igreja. São dízimos ordinários os 

que se tributam estavelmente dos frutos ou lu- 

cros; os extraordinários são impostos pelos Pa- 

pas, por uma causa especial, por exemplo, em 

subsídios de guerras contra os infiéis.192

Por outro lado, havia regras claras quanto aoquê e quando este tributo deveria ser pago aos co-fres do Erário Real:

Estabelecem as Decretais que os dízimos reais 

devem ser pagos íntegros, a saber, sem se terem 

em conta os gastos, enquanto que os pessoais 

devem ser pagos dos lucros de indústria, tiradas 

as despesas. Os reais são tributados após a co- 

lheita dos frutos; os pessoais se pagam cada ano,

num dia determinado.193

No bojo do debate sobre o que deveria ser ob- jeto ou não de tributação, uma questão no mínimocuriosa: os ganhos que tinham a marca do ilícitodeveriam ou não ser taxados? Para os preceitos daIgreja, o lucro advindo do crime não pode ter umade suas frações colocadas a serviço da coletividadecatólica, pois esta riqueza não teria dignidade.

Ao mesmo tempo em que o Estado portuguêsesforçava-se por cobrar os dízimos eclesiásticoscom a maior eficiência possível – quase sempreatravés dos contratadores, como já se observou –,

cabia à Igreja, através dos seus ideólogos, justificaresse tributo, segundo Oscar de Oliveira.194 Porisso, leis tão detalhistas também tinham que resol-ver uma questão básica nesse campo: quem deveriapagar o dízimo? Somente os católicos, que se be-neficiavam diretamente dos serviços religiosos? Noímpeto de arrecadar somas sempre significativas,as legislações da Igreja Católica tinham resposta:

Quanto aos dízimos pessoais, só os que têm di- 

reito de receber benefícios espirituai s dos páro- 

cos devem tributá- los. A estes não estão sujei- tos os Clérigos e os Religiosos.

(...) 

Quanto aos dízimos reais, geralmente estão 

obrigados a pagá-los todos os que têm terras 

sujeitas ao direito dos dízimos, ainda que os 

proprietários fi xem domicílio fora da paróquia,

a não ser que estejam isentos por privi légio 

apostólico, costume, prescrição ou pacto. Por- 

tanto, os Judeus e outros infiéis, não em razão 

da pessoa (porque não participam dos benefícios 

espirituais da Igreja), mas em razão do lugar 

per se estão obrigados ao pagamento dos dízi- 

mos, se possuem terras em regiões cristãs, que 

estejam sujeitas a esse ônus real. 195

Na prática, cristãos ou não, pagar-se-iam os dí-zimos. De certa maneira, quando se fazia uma pes-soa não-cristã pagar essa espécie de taxa pelos ser-

viços espirituais oferecidos pela Igreja Católica,cometia-se uma injustiça, ao mesmo tempo que eraincoerente com os próprios princípios da legisla-ção eclesiástica. E o clero tinha que arcar com ofisco em relação aos dízimos? Sobre esse ponto, aorientação também era marcada por detalhes e ex-ceções:

115s éc u l o x v i i i : o p r es sã o f i sc a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

18 9 Idem, ibidem .19 0 Oscar de OLIVEIRA, O s D ízim os Eclesiásticos do Brasil .19 1 Idem, ibidem , p. 15-16.

19 2 Idem, ibidem , p. 16.19 3 Idem, ibidem .19 4 Idem, ibidem , p. 16-17.19 5 Idem, ibidem , p. 17-18.

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Também os Clérigos devem pagar dízimos de 

seus bens patrimoniais, não, porém, dos bens 

que possuem por título espiritual , como benefí- 

cios. Os Religiosos devem tributar dízimos da- 

quelas terras que, antes de lhes pertencerem, se acham sujeitas ao ônus decimal, mas estão todos 

isentos de pagar os dízimos dos frutos de suas 

hortas, dos alimentos destinados aos seus ani- 

mais, por exemplo, feno, e das terras novas, isto 

é, terras não cultivadas, que eles lavram com as 

próprias mãos ou com as próprias despesas.19 6 

Efetivamente, o clero dificilmente era tributa-do; isso só ocorria quando as riquezas produzidasfizessem parte dos seus bens pessoais. Apesar de a

legislação eclesiástica ser detalhista, ou talvez emrazão dela, os religiosos eram considerados comoque administradores dos bens divinos na Terra.Assim, não cabia penalizá-los. Porém, as mesmasleis que davam a isenção fiscal ao clero colocavama este grupo uma tarefa de extrema importância:convencer cada fiel da necessidade de pagar os dí-zimos. Nas Constituições Primeiras do Arcebispa-do da Bahia, promulgadas em 1707, a questão dosdízimos foi objeto de preocupação. Numa dessasConstituições, as obrigações do clero eram deter-minadas com clareza, como na Constituição 416:

Para que de matéria tão grave, como éo precei- 

to de pagar dízimos, não possa haver ignorân- 

cia, e todos os fiéis com pronta vontade a ob- 

servem, mandamos a todos os Párocos de nosso 

Arcebispado sob penas de obediência, que nas 

estações que fizerem a seus fregueses nos pri- 

meiros Domingos do mês de Abril, de Agosto, e 

de Dezembro e nos mais dias declarados no tí- 

tulo 74 do livro quinto das Constituições, lhes leiam a Constituição precedente, e depois de 

lida lhes declarem a obr igação que têm de pagar 

dízimos, para que venham no reconhecimento 

dos casti gos, que Nosso Senhor dáesterilidade 

das terras e destemperança dos tempos, porque 

muitas vezes são efeitos da Divina Justiça, jus- 

tamente merecidos, por se não cumprir inteira,

e fielmente com este preceito.197 

As tarefas do clero, no sentido de fazer comque a prática do pagamento dos dízimos eclesiás-ticos fosse efetivada, não terminavam com essaslembranças contínuas feitas aos fiéis, em três do-

mingos especiais durante o ano, nem ameaçá-loscom castigos terríveis. As lembranças tinham queser constantes. Ainda nas Constituições Primeirasdo Arcebispado da Bahia, agora na sua Constitui-ção 417, a questão continuava a ser colocada:

E porque o direito obriga, sob pena de pecado 

mortal, aos Pregadores (ainda sendo Regulares) 

a que exortem, e persuadam nos Sermões, que 

fizerem no primeiro, quarto, e último Domingo 

da Quaresma, e nas festas da Ascensão de Cris- 

to, Pentecostes, Assunção e nascimento da Vir- gem Nossa Senhora, e nos Domingos de Outu- bro (o que se deve entender, quando os Párocos 

das Igrejas assim lho requerem), portanto nos 

Sermões, e Práticas, que fizerem nas ditas fes- 

tas principalmente, assim o cumpram, e guar- 

dem, maiormente pregando fora da Cidade; bas- 

tando que dentro dela os Confessores façam a 

mesma exortação. E os Párocos, quando isto re- 

querem, mostrarão (sendo necessário) aos pre- 

gadores esta Constituição, para que vejam o pe- 

cado, que cometem, e entendam que por Nós po- 

dem ser castigados e também suspensos do exer- 

cício da pregação.198

Ou seja, tão pecaminoso quanto o ato de nãopagar os dízimos (ou incentivar o não-pagamento)devidos aos representantes de Deus na Terra, era aomissão do clero em não cobrar de cada fiel as suasobrigações fiscais. Um padre que não observassetodo o ritual no sentido de convencer os católicos a

pagarem o dízimo seria penalizado. A pena tantopodia ser uma advertência quanto a proibição dapalavra; ou seja, o clérigo não poderia fazer ser-mões.

Ao mesmo tempo em que havia uma conver-gência de interesses entre Estado português e aIgreja Católica no Brasil, no sentido de se co-brarem os dízimos, os litígios iniciavam-se quandoda questão da cobrança. Nas relações que se foram

116  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

19 6  Idem, ibidem , p. 18.197  Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia , A pu d  Oscar de OLIVEIRA, op. cit., p. 27-28.19 8 Idem, ibidem .19 9 Oscar de OLIVEIRA, op. cit., p. 72.

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estabelecendo entre a instituição católica e o po-der público lusitano, várias tensões tiveram espaço.Desde questões ligadas ao uso do índio como es-cravo, passando pelo problema da autonomia dasordens religiosas que vieram ao Brasil para o tra-

balho catequético. Nem sempre as autoridadesportuguesas aceitavam a liberdade de ação dessespadres e bispos, principalmente os jesuítas. Porém,em última instância, todas as divergências entre es-sas instituições acabam por refletir uma explora-ção ainda maior dos colonos. A maneira como osdízimos eram (ou deveriam ser) cobrados revelaessa situação:

A fiscalização e a cobrança dos dízimos eclesiás- 

ticos foram desde o começo objeto da mais meti- 

culosa solicitude por parte do governo, que, em todos os tempos coloniais, não cessava de ditar re- 

gulamentos, por vezes rigorosos e irritantes. Re- 

comendava aos oficiais que os cobradores fossem 

diligentes e exatos no lançamento e cobrança dos 

dízimos, ameaçando-os com penas, caso relaxas- 

sem no cumprimento de seus deveres.19 9

Como a Igreja tinha o poder e a capacidade deditar as consciências por essa época, mostravaque, se houvesse displicência quando da arrecada-ção dos dízimos, cometer-se-ia um pecado dosmais graves, um pecado mortal, conforme expres-são largamente utilizada até há pouco tempo. Opecado concretizava-se a partir do momento emque tudo o que havia sobre a Terra era de proprie-dade divina, sendo os dízimos uma espécie decontribuição que os homens deveriam dar por uti-lizar-se desses bens. Dessa maneira, o pouco em-

penho em recolher esses tributos que pertenciama Deus significava retirar algo que era de origemdivina. Portanto, se sonegar uma riqueza que era

117 s éc u l o x v i i i : o p r es sã o f i sc a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

Os clérigos deviam convencer os fiéis a pagarem os dízimos, muito embora

discutissem suas exceções em relação ao fisco.

33. [Eclesiásticos]. In L. Buvelot & Auguste Moureau. RIO DE  J  ANEIRO P ITORESCO, 1842;

aquarela. São Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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do rei já era considerado um crime grave, tirar deDeus beirava a possibilidade de não haver perdão.Aliás, uma das penas para os que eram omissosdiante dos direitos divinos era a excomunhão.

Num mundo marcado pelo imaginário religioso, apressão exercida por esses preceitos da Igreja faziadiferença, tendo efeitos. Porém, se a Igreja insis-tia, com regras recorrentes, na necessidade de essaarrecadação ser feita com afinco, é sinal de quequem podia sonegar, o fazia; mesmo correndo osperigos da ira divina.

Como a principal riqueza explorada na Colô-nia era o açúcar – isto até o advento da minera-ção –, as autoridades metropolitanas sabiam que

esse produto deveria ser mais controlado do queoutras atividades. Dom Oscar de Oliveira, quefoi bispo de Mariana nos anos 60 deste século,mostra como esse controle era nitidamente maisrígido entre os produtores de açúcar:

(...) aos seus fabricantes se impuseram leis se- 

veras, para se evitar qualquer fraude no paga- 

mento deles [dízimos] . Assim, os mesmos regi- 

mentos de 1707 ordenavam a cada senhor de 

engenho, ou a seus feitores, ou purgadores, a fa- 

zerem anualmente livros, que fossem numera- 

dos e rubricados pelos oficiais régios, e onde de- 

viam aqueles consignar a quantidade de canas 

entradas, a quantidade e qual idade de açúcares 

produzidos, e os nomes das pessoas que tivessem 

parte nas ditas produções. 20 0

E o controle não parava nessas providências.Era preciso evitar qualquer tipo de desvios dos tri-butos que pertenciam a Deus, mas eram recolhidospelo Estado português e destinados ao clero, comoàs construções religiosas:

Chegado o mês de agosto, prossegue a instrução 

régia, em que se começa a fazer açúcar, devem os 

provedores ir aos engenhos para dizimá-los. E 

sendo chamados partam logo, ‘sem dilatação al- guma e com muita diligência, sob pena de vinte cruzados para o senhorio do engenho’. Se falta- 

rem uma segunda vez, serão suspensos de seus 

ofícios por seis meses. Levarão os oficiais régios 

os livros dos Dízimos, e estando lápresentes os 

senhores de engenhos ou seus feitores e os purga- 

dores, e o feitor dos contratadores de dízimos,

caso tenham sido contratados perguntarão com 

 juramento sobre os santos Evangelhos, se dos en- 

genhos saiu ou se produziu mais algum açúcar,

e se assim foi, serão punidos os culpados. Nota- 

118 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

34. Fachada das Casas de Câmara de Cadeia de Mariana, Minas Gerais. Brasília,

Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

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rão os provedores em seus livros a quantidade e 

as qualidades dos açúcares ali produzidos, os 

nomes das pessoas a quem pertencem, e quanto 

cada pessoa pagou de dízimos. Por fim, exarem 

nos livros a data do dia e ano. 20 1

O fato de os produtores de açúcar terem de ju-rar diante da Bíblia que não estavam evitando opagamento dos dízimos demonstra o papel con-trolador da religião na sociedade brasileira da épo-ca colonial. Sagrado e profano misturavam-se detal maneira, que a culpa e o medo do castigo atéproduziam uma arrecadação maior.

Mesmo tendo as marcas especiais da mineraçãoe do período pombalino, o século XVIII começa

com um conflito muito significativo entre Metró-pole e Colônia em relação às questões tributáriasem Pernambuco. Ou melhor, as questões tributá-rias tiveram um peso importante, como outrosproblemas envolvendo Olinda e Recife. Nessa ca-pitania, tantos anos nas mãos dos batavos, havia aimportante produção de açúcar, que se originoucom o início da colonização portuguesa. Esse pro-duto sempre permitiu altos ganhos para os senho-res de engenho, mas muito mais para os portugue-ses; e também para os holandeses, que financiavama produção e distribuíam o açúcar pela Europa.Porém, a ascensão da atividade açucareira sofreuum revés a partir da expulsão dos holandeses doNordeste brasileiro, em 1654. Como já foi dito,esses passaram a desenvolver a produção do açúcarnas Antilhas e, poucos anos depois, por volta de1680, essa região já produzia uma mercadoriamais barata do que o açúcar brasileiro. Era o iní-cio de uma crise na região açucareira da Colônia.O Brasil sentia o peso de vender menos para o ex-

terior.Especificamente em Pernambuco, os senhoresde engenho concentraram-se em Olinda, cidadeque tinha autonomia político-administrativa, con-substanciada pela presença de uma Câmara Muni-cipal. Este poder local era ocupado apenas pelosproprietários rurais, conhecidos por “homensbons”. Só estes tinham acesso ao cargo de verea-dor. Desta maneira, outros setores sociais não po-deriam influenciar as decisões desse poder. Ao

mesmo tempo, as prerrogativas das Câmaras Mu-nicipais eram extensas – ainda que esse poder te-nha sido muito diminuído após 1642, com a cria-ção do Conselho Ultramarino, que tinha como

objetivo a centralização da administração colonial.Nestas casas legislativas decidia-se o preço demercadorias e salários, castigos para escravos fugi-tivos, possíveis guerras contra os índios, entre ou-tras questões. E tinham nas mãos o estratégico po-der de criar tributos e suas sistemáticas de arreca-dação. Portanto, frise-se, estando em posição do-minante na Câmara Municipal de Olinda, os se-nhores de engenho, mesmo vivendo, por volta doinício do século XVIII, uma situação de refluxonas exportações, continuavam poderosos em Per-

nambuco. Já Recife – localizada a poucos quilômetros de

Olinda – acabou se tornando o espaço dos comer-ciantes portugueses. Em função da presença ho-landesa, essa cidade recebeu inúmeros equipamen-tos urbanos, vivendo assim um florescimento.Mais do que isso: os comerciantes portugueses daregião enriqueceram muito, principalmente com asaída dos holandeses. Eles passaram a ser os prin-cipais financiadores dos senhores de engenho deOlinda. Com a crise estabelecida a partir de 1680,eles tornaram-se grandes credores dos produtoresde açúcar. Em função disso, generalizaram as exe-cuções de dívidas. As propriedades começaram amudar de mãos.

Dessa maneira, as tensões foram inevitáveis. Eo que ainda piorava a situação dos senhores de en-genho era que cabia aos comerciantes portugueses,pejorativamente chamados de mascates, o direitode arrecadar os tributos daqueles. Ou seja, muitosmascates tornaram-se arrematadores – ou contra-

tadores – de impostos. Como esse arrematadorpagava um valor fixo à Coroa e percebia, enquantolucro, a diferença entre o que pagava e o que efeti-vamente arrecadava, a truculência fazia parte doquotidiano desses comerciantes.

Aos senhores de engenho somente restou umamaneira de se contrapor ao domínio econômicodos portugueses de Recife: a utilização do poderda Câmara Municipal, que tinha jurisdição sobre acidade. Na prática, Olinda tinha direito de impor

119s éc u l o x v i i i : o p r es sã o f i sc a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

20 0 Idem, ibidem , p. 72-3.20 1 Idem, ibidem , p. 73.

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120 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

As Câmaras Municipais, edifícios onde também funcionavam as cadeias, davam

autonomia administrativa às cidades e tinham o poder de criar tributos e

organizar sua sistemática de arrecadação.

35. Fachada das Casas de Câmara de Cadeia de Goiás, Goiás. Brasília, Secretaria

do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

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uma legislação tributária para Recife. E isso aca-bou por acontecer: os senhores de engenho co-brando impostos cada vez mais altos dos comer-ciantes. Estes, com esse aumento tributário, passa-

ram a defender a sua participação na Câmara Mu-nicipal de Olinda, o que foi conquistado, porémnão surtiu maiores efeitos, pois a maioria conti-nuava pertencendo aos senhores de engenho.

Para os mascates, dessa maneira, só havia umasaída: fazer Recife ter a sua autonomia municipalpara não mais ter que depender da legislação im-posta pelo olindenses. Assim, passaram esses co-merciantes a reivindicar junto à Coroa portuguesaque Recife deixasse de ser subordinada a Olinda ese tornasse autônoma, com direito a Câmara Mu-

nicipal. Após uma série de ingerências junto à Me-trópole, finalmente o rei de Portugal, D. João V,em 1709, elevou Recife à condição de município.Essa decisão real aguçou as tensões entre os doisgrupos sociais e, sob a alegação das dificuldadesem relação ao estabelecimento dos limites geográ-ficos entre as duas cidades, os senhores de engenhoatacam a cidade de Recife, para destruir o símbo-lo da autonomia municipal no Brasil colonial: opelourinho 20 2, recém-construído. Era o início daconhecida Guerra dos Mascates. Um panfleto daépoca – “Calamidades de Pernambuco”, de auto-ria dos senhores de engenho – deixava claros osmotivos de tantas tensões, já consubstanciadas emconflito armado:

Que por nenhuma dívida, ainda que seja da 

Fazenda Real, assim das que estão contraídas 

como das que a diante se contraírem, se façam 

execuções aos senhores de engenho lavradores de 

cana, ou roças em nenhuns bens seus assim mó- 

veis como de raiz, outros de qualquer qualida- de que sejam mas somente nos rendimentos se 

possam executar, e que os açúcares se não re- 

matem, por nenhumas dívidas, e o receberão 

pelo preço que sair, pois Sua Majestade o man- 

da dar, e isto serálimitação do tempo e para 

sempre. 20 3

O documento dos senhores de engenho primapela clareza; aceitava que as dívidas fossem cobra-das, aqui inclusas as contraídas por conta do pa-

gamento de tributos aos arrematadores, porém,não aceitava que suas propriedades fossem confis-cadas. Eles desejavam que suas dívidas fossemamortizadas a partir dos seus ganhos, nunca pelos

seus bens.A Guerra dos Mascates durou de 1710 a1711, terminando com a interferência real emapoio aos comerciantes portugueses, como foi-setornando regra na história colonial do Brasil: asmais simples reivindicações dos colonos, mesmoem se tratando da elite colonial, eram despreza-das. A sanha por arrancar destas terras o máximopossível de riquezas não permitia outra atitudedos colonizadores. Daí a atenção especial em re-lação aos tributos, fonte direta de renda por par-

te da Metrópole.

121s éc u l o x v i i i : o p r es sã o f i sc a l e r es i s t ên c i a d o s c o l o n o s

20 2 O pelourinho era umtronco queficava emfrenteà Câmara Municipal equeservia para castigar os escravos publicamente.20 3 A pu d  Caio PRADO Jr., Evolução Política do Brasil, p. 41.

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“Os mineiros não eram os principais responsáveis pelo grande fluxo de contrabando de ouro: este se encontrava nas mãos dos propr ietár ios rurais, dos funcionár ios, dos padres e, especialmente, das caravanas de mercadores que forneciam produtos manufaturados, cavalos, gado eescravos às zonas de mineração – através deles é que o ouro escapava ao

 controle governamental e alimentava o comércio ilegal.” 

 K enneth Max w ell 

m i n er a ç ã o e o a u g ed a ex pl o r a ç ã oc o l o n i a l

122 t r ibu t o s d o BRASIL COLo NI Al - 1500•18221ª Parte

A tributação pelo sistema do Quinto. As Casas de

Fundição. As rebeliões contra a opressão fiscal.O código mineiro e o regimento dos superintendentes.Os sistemas de finta e de capitação. O rigor tributáriono distrito diamantino.

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Apesar de todo o significado do conflito opon-do os colonos à Metrópole em Pernambuco, que,em última instância, revelava as contradições deri-vadas da ordem colonial, a síntese do século

XVIII encontra-se nas regiões mineiras. Nelas aexploração portuguesa atingiu o seu auge. Assim,analisar as relações entre Brasil-Portugal na mine-ração passa por se compreender como se deu a re-tirada de riquezas, principalmente através da tri-butação. Ou seja, é preciso entender a lógica e aprática tributárias impostas pelos interesses me-tropolitanos em terras brasileiras.

Ao mesmo tempo, o Quinto, assim como osoutros tributos que eram pagos pelos colonos doBrasil, eram justificados, de uma maneira ou outra.Ou seja, por meio das palavras com origem religio-sa ou temporal, buscava-se colocar essa tributaçãodentro de lógica marcada pela justiça. Dessa for-ma, os dízimos eclesiásticos eram colocados comoforma de sustentar a estrutura da Igreja Católica,construindo e mantendo templos, além do susten-to dos ministros dessa instituição. Quanto aoQuinto, o mais importante tributo da época áureada mineração – até porque tudo o que era arreca-dado era enviado diretamente para Portugal –, não

faltavam justificativas para a sua cobrança. Nesse

sentido, tem-se um pouco desse discurso com atentativa de mostrar o quão justo era tal tributo,que tantas mazelas trouxe para os moradores dasregiões produtoras de minérios preciosos:

O capítulo IX da Terceira Parte de ‘Cultura de Opulência do Brasil’, de Antonil, sob o título ‘Da cobrança de pagar a El-Rei nosso senhor a Quinta parte do ouro que se tira das minas do Brasil’, éa defesa escolástica da arrecadação dos quintos do ouro. O conjunto do livro flui de pena objetiva e amena do observador do proces- so colonial de produzir açúcar, tabaco, gado e ouro. Este capítulo, porém, descarrila em estilo 

redundante e apologético, para fornecer a justi- ficação ideológica daquele tributo real.  20 4

Assim, o padre jesuíta Antonil partia para assuas considerações, que apontavam para a justifi-cativa religiosa da cobiça de tal tributo:

Louvando-se na elaboração doutrinária de mais de vinte doutores e teólogos (...), esforça-se An- tonil em provar que o quinto do ouro baseia-se em ‘lei dispositiva e moral e que obriga antes da 

sentença do juiz, em consciência’, por serem as 

123m i n er a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

20 4 Mauro de Albuquerque MADEIRA, op. cit., p. 67.

“... Os direitos do rei sobre todas as riquezas minerais da colônia eram

incontestes...” Os metais das minas eram patrimônio que luzia aos olhos de

todos, mais ainda dos administradores da Fazenda Real.

36. M APA DE LAVRAS EM  M INAS  GERAIS , século XVIII; aquarela. São Paulo,

Coleção Guita e José Mindlin.

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minas patrimônio do rei, resguardado pela eru- 

dição dos teólogos e pelas bulas dos Papas.

O rei éo senhor patrimonial das minas e os 

vassalos devem pagar o imposto do quinto como obrigação moral, de consciência. As Ordenações 

do Reino são claras: ‘Entre os Direitos Reais se 

contam os veeiros e minas de ouro e prata e 

qualquer outro metal.’ A conseqüência para os 

vassalos é‘que de todos os metais que se tira- 

rem, depois de fundido e apurado, paguem o 

quinto, em salvo de todos os custos. 20 5

Antonil vai além na sua argumentação de pro-var que os direitos do rei sobre todas as riquezas

minerais da Colônia eram incontestes:

[ Antonil] cita muitos teólogos para provar que 

as minas e seus metais, ‘assim nas Índias como 

em qualquer outra parte, pertencem ao direito 

de El-Rei, como seu patrimônio e parte do seu 

supremo domínio, quer se achem em lugar pú- 

blico, quer se achem em terras ou fazendas par- 

ticulares.’ Mas como hágastos para tirar os me- 

tais das minas, os reis se contentam apenas com 

a quinta parte deles!  20 6 

Ainda havia outras questões para serem justifi-cadas; era o caso, por exemplo, do motivo peloqual esse tributo tinha que ser arrecadado. Ouseja, para quê essa riqueza seria utilizada:

Para a sustentação e gastos do Príncipe, ‘em 

prol da república e para a conservação e au- 

mento da fé’, cobrasse esse ‘justo e bem ordena- 

do tributo’, fundado em ‘justiça comutativa,

como a de quaisquer outros pactos e promessas de qualquer outro justo contrato que costumam 

admitir os contraentes em suas convenções e que 

ainda que a lei não acrescente pena aos trans- 

gressores, sempre deviam pagar esses quintos 

por ser obrigação intrínseca, e que o pôr- lhe a 

pena épara facilitar mais a cobrança do que se 

lhe deve, e não para fazer uma lei meramente 

penal.  20 7 

O desfile de argumentos do padre Antonil pre-cisava ainda de uma conclusão que fosse irrefutável:

Talvez ainda inseguro da fortaleza dos argu- 

mentos, o ideólogo apela para a ficção contra- 

tualista  20 8, um dos braços da multissecular 

tradição do Direito Natural: trata-se de ‘um 

contrato entre El-Rei e os vassalos, para que 

El-Rei os governe e os súditos o sustentem com 

os tributos e pensões. 20 9

 Toda a preocupação de Antonil estava plena-mente compatível com a época em que veio aoBrasil colonial. A força representada pelas idéias epráticas religiosas fazia do discurso com funda-mentação teológica um pilar básico para que par-celas da população fossem convencidas de que oato de pagar tributos era absolutamente justo.Numa sociedade marcada pela concepção de peca-do e culpa – principalmente, a partir de um árduotrabalho de construção ideológica feito pela pró-pria Igreja Católica –, algum efeito acabava tendoentre os colonos do Brasil, ainda que Mauro deAlbuquerque Madeira afirme que:

De certo que os rudes mineradores e comercian- 

tes do Brasil não tomavam conhecimento explí- 

cito das circunvoluções verbais dos letrados 

eclesiásticos e civis, a justificar a cobrança de 

tributos reais. Pagavam ou sonegavam, na me- 

dida do possível e por força da sanção, da pena 

de perdimento, confisco ou degredo. 210

Mas, de qualquer maneira, é importante ressal-tar que Antonil, assim como outros pensadores,estiveram a serviço dos interesses coloniais portu-gueses, pois eram capazes de utilizar-se dos maisvariados argumentos e teorias para fazer com que

124 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

20 5 Idem, ibidem .20 6  Idem, ibidem .20 7  Idem, ibidem , p. 6820 8 Sobrecontratualismo, afirma-se: “O contratualismo emsuas diversas caracterizações (Althusius, Hobbes, Spinosa, Pufendorf, Locke, Rousseau, Kant)

tentava conciliar ou reciprocamentealicerçar a coerção eo consenso, quesempreforamas pilastras do Estado. A coerção estatal – o monopólio da força

– sempre foi mais eficienteeduradoura, quando acompanhada do queGramsci chamaria dehegemonia, ou consenso social, baseado no predomínioideológico dos valores da classeou camada dominanteou emascensão histórica.”Cf.: Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 68.

20 9 Idem, ibidem .210 Idem, ibidem .

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a população do Brasil aceitasse as perversas práti-cas tributárias. Esse era o caso do Quinto, assimcomo dos mais estranhos tributos que faziam par-te do quotidiano colonial.

Por outro lado, para que se possa dimensionarcomo as relações foram-se estabelecendo entre aprática tributária portuguesa nas regiões minera-doras e a população local, é importante apresentardados da produção aurífera, assim como relacionaresta produção com outros dados da época, tam-bém vinculados a metais preciosos. Sobre a produ-ção de ouro em Minas Gerais, no século XVIII,existem os seguintes números:

Quinquênios Quilogramas  

1700-1705 1.470  

1706-1710 4.410  

1711-1715 6.500  

1716-1720 6.500  

1721-1725 7.000  

1726-1729 7.500  

1730-1734 7.500  

1735-1739 10.637  

1740-1744 10.047  

1745-1749 9.712  

1750-1754 8.780  

1755-1759 8.016  

1760-1764 7.399  

1765-1769 6.659  

1770-1774 6.179  

1775-1779 5.518  

1780-1784 4.884  

1785-1789 3.511  

1790-1794 3.360  

1795-1799 3.249  

Fonte: PINTO, V. N., O Ouro Brasileiro e o Comércio Anglo-Português ,

p. 114.Apud RubimS. L. deAQUINO et all i ,Um sonho de liberdade – A Conjuração de Minas , p. 41.

Os dados acerca da produção aurífera ficam mais

claros se colocados diante dos rendimentos que essemetal proporcionou ao fisco português. Na tabela aseguir, esses números podem ser observados:

Ano Rendimentos Ano Rendimentos em arrobas em arrobas  

1714 30 1751 124  

1715 30 1752 55  

1716 30 1753 107  1717 30 1754 118  

1718 25 1755 117  

1719 25 1756 114  

1720 25 1757 110  

1721 25 1758 89  

1722 37 1759 ?  

1723 37 1760 93  

1724 18 1761 111  

1725 132 1762 102  1726 90 1763 102  

1727 73 1764 100  

1728 78 1765 94  

1729 35 1766 132  

1730 92 1767 87  

1731 ? 1768 84  

1732 148 1769 84  

1733 88 1770 92  

1734 238 1771 81  1735 89 1772 82  

1736 ? 1773 78  

1737 ? 1774 75  

1738 237 1775 75  

1739 291 1776 76  

1740 234 1777 70  

1741 ? 1778 72  

1742 98 1779 71  

1743 100 1780 65  1744 280 1781 72  

1745 122 1782 65  

1746 127 1783 62  

1747 130 1784 58  

1748 5 1785 54  

1749 128 1786 49  

1750 124 1787 43  

FONTE: Segundo o “Mappa do rendimento queproduzio o Real Quinto

do Oiro na Capitania deMinas Gerais desdeo anno de1700 a 1787...”,RAPM, VIII (1908) 575-7. Apud Kenneth MAXWELL,

A devassa da devassa – A I nconfidência Mineira:Brasil e Portugal, 1750- 1808 , p. 286-288.

125m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

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Através desses números, é possível perceberque a produção mineira chegou ao auge em mea-dos do século XVIII; a partir dessa época, ini-ciava-se o declínio da produção. A título de

comparação, vale ressaltar que esta quantidadede ouro levada de Minas Gerais foi maior do queo mesmo metal retirado da América espanholadurante dois séculos. 211 Porém, tanta riquezaextraída das Minas Gerais não tornou esta regiãoum espaço de igualdades. Assim, tem-se:

De um lado tínhamos os agentes da adminis- 

tração colonial e os enr iquecidos senhores de 

lavras; de outro, um vasto contingente de ho- 

mens pobres e expropriados, oprimidos pelo 

fisco e colocados àmargem de uma sociedade exploradora. 21 2

Assim, é preciso ter claro que a economiamineira não trouxe lucros para todos os que seaventuraram por aquelas terras – e não forampoucos os que deixaram tudo para trás em bus-ca do precioso metal; pessoas de todas as partesda Colônia e de Portugal faziam parte de umnumeroso contingente humano.

Ao mesmo tempo em que nem todos pude-ram usufruir das riquezas da região, a sede peloouro produziu uma escassez sem limites de ali-mentos e de outras mercadorias. Por mais para-doxal que possa parecer, em meio a tantos re-cursos, a fome tornou-se presença constanteentre os moradores da região das Minas. As di-ficuldades com o abastecimento, associadas àtotal preocupação em procurar ouro, fizeramcom que os preços das mercadorias se tornas-sem proibitivos:

Valor em Valor

Mercadorias São Paulo em Minas 

(réis) ( réis)  

1 alqueire de farinha

de mandioca 640 43.000  1 libra de açúcar 120 1.200  

1 caixa de marmelada 240 3.600  

1 galinha 160 4.000  

1 queijo da terra 120 3.600  

1 queijo flamengo 640 19.200  

1 boi de corte 2.000 120.000  

1 cavalo 10.000 120.000  

Fonte: Afonso TAUNAY,História Geral das Bandeiras Paulistas ,

tomo IX, p. 291.Apud Antonio MENDES Jr.,Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO,

Brasil História – texto e consulta – 1 Colônia , p. 246.

Quanto aos tributos cobrados sobre a regiãomineradora, sabe-se que estes não se resumiramao conhecido Quinto, ainda que este fosse omais importante. Ou seja, conforme já consta-vam nos Regimentos das Minas do início do sé-culo XVII, caberia ao Erário Real 20% daquantidade do ouro arrecadado. Aos moradoresda região mineira ainda recaíam outros tributos,como “os dízimos devidos ao rei e os direitosde passagem exigidos aos que atravessassem ouse utilizavam dos rios existentes na Capita-nia.” 213 Daí uma das razões do encarecimentodas mercadorias que chegavam a Minas Gerais.Nesse sentido, vale conhecer os caminhos queeram percorridos para que uma mercadoria che-gasse até essa região:

Tomando, como exemplo, o trajeto de um pro- 

duto indispensável como o sal, podemos perceber 

os entraves naturais e legais que eram impostos 

ao seu comércio. Segundo Myriam Ellis, um al- 

queire de sal que no Rio de Janeiro custava 

720 réis (preço que vigorou atémeados do sé- 

culo XVI I I ) pagava, somente como imposto de 

entrada nas Minas, 750 réis (taxa que onera- 

va todos os ‘comestíveis e molhados’). Além des- 

ta taxa, as ‘despesas de avarias’ e os problemas 

advindos dos longos percursos (preservação do produto) faziam com que o sal fosse vendido em Minas pelo preço de 3.600 réis o alqueire. A

126  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

211 “Calcula-sequeMinas Gerais, no século XVIII, contribuía com70%da produção brasileira, visto existirem outras áreas de extraçãoaurífera, no caso Goiás eMato Grosso. Por sua vez, o ouro extraídoentreos séculos XVI eXVIII no Brasil correspondeu a 50% detodaa produção mundial, o que determinava a supremacia de MinasGerais.” Cf.: RubimS. L. deAQUINO et alii, U m sonho de liberdade

 – A con ju raçã o de M in as, p. 41.212 Idem, ibidem .213 Idem, ibidem , p. 51.214 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO,

op. cit., p. 251.215 Idem, ibidem , p. 251.

216  RubimS. L. deAQUINO et alii, op. cit., p. 51.217  Idem, ibidem .218 Idem, ibidem .219 Idem, ibidem , p. 51-2.

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região mais próxima fornecedora deste artigo,

além de sua parcela importada, era a dos ser- 

tões marginais do rio São Francisco, subindo o 

sal por este rio em barracas. 214

E não era apenas o sal, juntamente com outrosprodutos comestíveis, que viviam tal realidade:

Quanto ao ferro, artigo indispensável como 

matéria-prima para os instrumentos de traba- 

lho nas lavras, sendo proibida a sua fabricação 

na colônia, provinha de Lisboa a alto preço; 

neste estavam incluídos o lucro do comerciante 

português, o frete marítimo e o lucro do inter- 

mediário do Rio de Janeiro. Um quintal de fer- 

ro manufaturado em instrumento de trabalho valia, no Rio, entre 4.800 réis e 6.000 réis.Na reexportação para Minas eram acrescenta- 

das as despesas de transporte e as taxas de en- 

trada – taxas essas que, em lugar de serem 

proporcionais ao valor das mercadorias, eram 

calculadas sobre o peso delas; assim o ferro era 

altamente taxado. Pagando em torno de 

4$500 somente de imposto, um quintal de fer- 

ro era vendido em Minas pelo preço de 14.000 

réis. 215

Não foi preciso muito tempo para que os mi-neradores percebessem o caráter opressivo das prá-ticas tributárias dos colonizadores. O caminho daresistência à opressiva política fiscal portuguesaparecia natural. Assim,

Em 1712 explodiu um motim em Vila do 

Carmo contra o desembargador Antônio da 

Cunha Souto Maior, que foi expulso devido a 

questões fiscais. 216 

Ou ainda:

Em 1715 houve a violenta Revolta do Morro 

Vermelho contra o governador Brás Baltasar da 

Silveira que, cumprindo determinações da Co- 

roa, havia restabelecido a cobrança do ouro por 

bateias. O movimento rapidamente se alastrou 

por outras comarcas mineiras, obrigando o go- 

vernador a fugir para Vila Rica e a substituir 

a cobrança por bateias pelo sistema do quinto atéatingir 30 arrobas anualmente. 217 

Porém, como a sede fiscal portuguesa não eracontida senão por pouco tempo, as revoltas contraessa opressão tendiam a se multiplicar, tornando-se mais radicais. Dessa maneira:

Em 1716 descobriu- se uma conspiração no 

Rio das Velhas contra os governantes. A denún- 

cia de que se articulava a deposição das autori- 

dades levou àprisão de dois dos acusados.

Em 1718, questões fiscais provocaram a Sedi- 

ção de São Francisco, novamente opondo opres- 

sores e oprimidos. 218

Opressores e oprimidos, na realidade, represen-

tavam, de um lado, os que se beneficiavam de umapolítica fiscal injusta e de uma minoria que enri-quecia; de outro, os que arcavam com os altos im-postos, além de vítimas de preços abusivos paraprodutos de primeira necessidade. E a resistênciados que sentiam concretamente a opressão portu-guesa não parava de se manifestar:

A instituição das Casas de Fundição acarretou,

em 1719, ‘a revolta dos paulistas instalados 

em Pitangui que, dirigidos por Domingos Ro- 

drigues do Prado (genro de Bartolomeu Bueno 

da Silva), mataram o Juiz e expulsaram o Ca- 

pitão-Mor da Vila.’ 

Contra os revoltosos foram enviados qui- 

nhentos soldados que ocuparam Pi tangui,

sendo Prado condenado àforca. Como o réu 

fugiu para Goiás, enforcou-se, em seu lugar,

um boneco. 219

Porém, foi ainda devido ao estabelecimento daCasa de Fundição em Vila Rica que uma rebeliãomais significativa ocorreria nas Minas Gerais. Aexigência dos administradores da região minera-dora – de fazer com que todo o ouro encontradopassasse pela Casa de Fundição, lá sendo retiradoo Quinto e recebendo o carimbo indicador de queo metal já havia pago os direitos reais e que, porisso, poderia circular legalmente – trouxe muitodescontentamento para os lavradores. Além dopagamento de tributos em si, considerado excessi-

vo, outras questões atrapalhavam a vida destescontribuintes.

127 m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

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Independentemente do lugar em que havia sidoachado o metal precioso, era obrigação do minera-dor levá-lo até a Casa de Fundição. Com as péssi-mas condições de transporte, uma viagem comeste fito poderia durar mais de um mês; além dalonga distância e das estradas com poucas condi-ções de trânsito, pesava sobre as pessoas que sedispunham a pagar o devido ao Erário Real aameaça de perigosos ladrões, que se escondiam pe-

los caminhos do ouro.Outro problema tão sério quanto o anterior:os lavradores não confiavam nos funcionáriosreais, que deveriam cuidar da fundição e recolhi-mento do Quinto. Pela longa tradição colonial decobranças injustas e violentas de impostos, acre-ditava-se que parte do ouro deixado para serquintado poderia ser roubada pelos funcionários.Dessa maneira, quando a Intendência das Minas –órgão responsável pela administração da regiãomineradora, hierarquicamente ligado diretamente

ao rei, e somente a este – anunciou a criação daCasa de Fundição em Vila Rica, explode mais umarebelião:

Ela [ Revolta ou Sedição de Vila Rica] se deu 

contra a política colonial portuguesa. Os rebel- 

des opunham-se ao funcionamento das Casas 

de Fundição, exigiam o fim do monopólio da 

Coroa sobre o sal e protestavam contra a baixa 

dos postos aos oficiais de Ordenança onde não 

houvesse tropas organizadas. Todas essas moti- 

vações e outras decorrentes do comportamento 

do Conde de Assumar, então governador da 

Capitania, rejeitando privi légios de indivíduos pertencentes àaristocracia mineira, contribuí- 

ram para a rebelião. 22 0

Efetivamente, as questões fiscais participavamde forma decisiva do eclodir dessa revolta. As Ca-sas de Fundição, assim como o monopólio sobre osal – que encarecia absurdamente este produto –,empurraram alguns homens contra a opressão por-tuguesa. “Dentre seus dirigentes sobressaíram-se orico mestre-de-campo Pascoal da Silva Guimarães,

o doutor Manuel Mosqueira Rosa, o sargento-morSebastião da Veiga Cabral, os frades Vicente Bote-lho e Francisco de Montealverne, Manuel de A.

128 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

A criação da Casa de Fundição de Vila Rica pela Intendência das Minas e a decisão

do Conde de Assumar, então governador da Capitania, rejeitando privilégios de

indivíduos pertencentes à aristocracia mineira, contribuíram para a rebelião

popular liderada por Filipe dos Santos Freire. A reação metropolitana foi punir

sem remorsos os revoltosos, esquartejando seu líder.

37. Casa de residência do Conde de Assumar, Vila do Ribeirão do Carmo (Mariana).

Mariana, Minas Gerais.

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Fonseca, João Ferreira Diniz e Filipe dos SantosFreire, líder e representante das camadas popularese acusado de ser o maior agitador do movimen-to.” 22 1 Curiosamente, todos esses rebeldes eram

portugueses, o que demonstra, entre outros pon-tos, que não se tratava de um conflito entre portu-gueses e brasileiros, mas entre os colonos que vi-viam no Brasil e a sede fiscal do Erário Real por-tuguês, sempre insaciável.

Como em qualquer outro movimento, quecontestasse as autoridades metropolitanas, a re-pressão à rebelião dos mineiros fora brutal, reple-ta de ilegalidades. Para os dirigentes portuguesesaqui na Colônia, era inadmissível que qualquercolono ousasse contrapor-se às regras ditadas por

Lisboa. Dessa maneira, os participantes do movi-mento receberam um tratamento violento:

O Conde de Assumar, que se encontrava em 

Ribeirão do Carmo, não tinha forças militares 

para enfrentar os rebeldes. Quando recebeu re- 

forços necessários, invadiu Vila Rica e prendeu 

os revoltosos. Após incendiar as casas de vários 

cabeças do movimento, mandou enforcar Filipe 

dos Santos Freire, sem qualquer julgamento.

Em seguida, o cadáver do rebelde foi atado às 

caudas de quatro cavalos e esquartejado.

(...) 

Remetidos os presos para o Rio de Janeiro, a fim 

de serem enviados para Portugal, frei Vicente 

Botelho e Pascoal da Silva faleceram, antes de 

serem anistiados, como os demais. (...)  22 2

Apesar da morte de dois dos rebeldes, aparen-

temente por causa natural, apenas um deles foiexecutado: Filipe dos Santos, o único que manti-nha ligações com os setores populares presentesna região mineira. Não foram poucas as vezes nahistória do Brasil colonial – mas também em ou-tros momentos do Brasil independente – que osparticipantes de um mesmo movimento recebemtratamentos diferenciados, apesar da mesma açãorebelde. A tendência da Coroa portuguesa, atravésdos seus administradores no Brasil, era punir

exemplarmente os representantes dos setores po-pulares. Quando o rebelde estava vinculado às eli-tes portuguesas, dificilmente a pena era tão seve-ra, apenas quando a gravidade do caso obrigava ao

governo de Lisboa atitudes rígidas, com o intuitode manter a sua autoridade sem nenhum tipo decontestação.

Esse vigor repressivo dos portugueses não im-pediu que, durante todo o século XVIII, quase deforma cíclica, outras rebeliões fossem se consti-tuindo, sempre tendo como pivô das lutas a opres-siva prática fiscal metropolitana, associada a diri-gentes políticos violentos e usurpadores.

Assim, quando da organização da Inconfidên-cia Mineira, em 1789, já existia no imaginário mi-

neiro uma longa tradição de lutas. Toda esta tradi-ção de contestar a presença ostensiva do fisco por-tuguês terminou por se concentrar neste momentoespecífico. Porém, a rebelião que teve Tiradentescomo um dos participantes esteve ligada a um mo-mento muito especial da história do Brasil colo-nial e do mundo europeu e norte-americano.

 Trata-se de uma época denominada de Crise doAntigo Regime ou Crise do Sistema Colonial –também conhecida como a Era das Revoluções.Com a Revolução Industrial, a partir da liderançae hegemonia da Inglaterra, os espaços coloniaispassaram a ser questionados. O discurso britânicoapontava para as incongruências do Sistema Colo-nial, acusando-o de limitador do desenvolvimentoeconômico das nações. Dessa maneira, para os in-teresses ingleses, era muito mais promissor que osespaços coloniais deixassem esta condição, passan-do a ser nações emancipadas; isto posto, livres dapresença ostensiva das suas respectivas metrópoles,poderiam comercializar livremente com todos os

países do mundo. Também chegavam ao Brasilidéias que rechaçavam as práticas políticas absolu-tistas, colocando, como saída, a possibilidade degovernos que representassem, de fato, os interessespopulares.

No caso de Minas Gerais, além de absorverparte desse ideário do chamado Iluminismo, haviauma especificidade econômica de extrema impor-tância. Como já se disse anteriormente, após1750, a produção aurífera decaía regularmente.

129m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

22 0 Idem, ibidem , p. 52.22 1 Idem, ibidem .22 2 Idem, ibidem .

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Com a diminuição da produção, caía junto a quan-tidade de tributos recolhidos em Minas. Esta si-tuação foi lida de maneira distorcida pelo ErárioReal. Para este, não se tratava de uma diminuição

no ritmo da produção do ouro, e sim, do aumen-to da sonegação e do contrabando do estimadometal. Portanto, caberia às autoridades portugue-sas no Brasil apertar o cerco contra a populaçãomineira, com o objetivo de aumentar a arrecadaçãofiscal. Faltava, na visão do fisco real, controle so-bre a região e não a compreensão da situação dedeclínio econômico.

Mas, é preciso ter clareza de que o contraban-do não estava localizado apenas na produção deouro ou de diamantes, apesar das autoridades

portuguesas terem conhecimento de que a maiorparte do metal precioso não passava pela tributa-ção. Outras mercadorias contrabandeadas, quechegavam às Minas Gerais, eram mais preocupan-tes para o fisco real. Isto porque, muitas vezes, es-tas eram pagas com ouro não quintado. Na verda-de, essa ação ilegal generalizava-se pela Colôniacomo um todo:

Os mineiros não eram os principais responsá- 

veis pelo grande fluxo de contrabando de ouro: 

este se encontrava nas mãos dos proprietários 

rurais, dos funcionários, dos padres e, especial- 

mente, das caravanas de mercadores que forne- 

ciam produtos manufaturados, cavalos, gado e 

escravos às zonas de mineração – através deles 

éque o ouro escapava ao controle governamen- 

tal e alimentava o comércio ilegal. 22 3

Mas, um grupo, em especial, exercia esse con-trabando com muito mais tranqüilidade que os

outros, inclusive fazendo com que as autoridadescoloniais tivessem tanta preocupação, que chega-ram a proibir a instalação de algumas ordens reli-giosas nas Minas Gerais:

Particular notoriedade desfrutavam os clérigos 

que, por estarem livres das revistas nos postos de 

controle, podiam levar grandes quantidades sem 

dificuldades. 22 4

E, apesar de conhecidos os caminhos do con-trabando, nem sempre foi possível ao governo por-tuguês coibi-los. Faltavam meios, em muitos mo-mentos, quando não a boa vontade dos funcioná-

rios reais, facilmente corruptíveis:

O contrabando de ouro ia de Minas Gerais 

para Buenos Aires ou, assim como o provenien- 

te de Cuiabáe Mato Grosso, para as provín- 

cias espanholas próximas. Ali era trocado a 

uma taxa favorável por prata, e esta voltava às 

cidades portuárias brasileiras, onde era usada 

para comprar manufaturas contrabandeadas,

quer dos comissários, quer dos oficiais e mari- 

nheiros das frotas. Um grande comércio ilegal,

que usava o próprio sistema de frotas como co- bertura e meio de exportar e de remeter dinhei- 

ro, estabelecia-se, assim, paralelamente ao trá- fico legal e às vezes o sobrepujava. Esta situa- 

ção era estimulada pela debilidade do poder es- 

tatal que caracterizou os últimos anos de D.

João V.  22 5

Ao mesmo tempo, a economia mineira trouxemuitas novidades em termos de organização daColônia. Ocorreu um aumento demográfico sig-nificativo; deu-se o mesmo com a entrada de es-cravos africanos, o que levou à articulação de umtímido mercado interno. Ou seja, por conta daextrema especialização da região das minas, sóhouve preocupação com a produção do rico mi-nério. Dessa maneira, os produtos para abasteceraquela região tinham que vir de outros espaçosda própria Colônia, como gado do Nordeste e doSul, açúcar do Nordeste, além de outros alimen-tos das regiões que circundam as Minas Gerais,

como São Paulo. Assim, pela primeira vez, arti-culava-se a troca mercantil entre as várias regiõesdo Brasil, que anteriormente não tinham qual-quer relação entre si, já que se reportavam direta-mente a Portugal. Essa novidade trouxe conse-qüências também no que se refere ao contraban-do, que provocava, entre outros efeitos, sangriana arrecadação fiscal do fisco português. A ativi-dade ilegal do contrabando não foi algo centradoapenas na região mineira, mas esteve presente em

130 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

22 3 Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 27.22 4 Idem, ibidem .22 5 Idem, ibidem .

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todo o espaço colonial português na América.Esteve espalhada por todos os cantos em quequalquer atividade econômica fosse minimamen-te rendosa. Assim, tem-se:

As atividades dos intrusos e dos contrabandis- 

tas não se limitavam aos principais centros do 

comércio (Bahia, Rio e Pernambuco): também o 

comércio ilegítimo de drogas e especiarias, no 

Amazonas, era mui to rendoso, e a situação no 

Paráe Maranhão era complicada pelas ativida- 

des comerciais das ordens religiosas. Os colonos 

do extremo norte eram afastados das vantagens 

do tráfico amazonense e acusavam as ordens 

religiosas de exercer uma proteção possessiva 

dos indígenas. 22 6 

Porém, o que mais atrapalhava os colonos, quetinham como concorrentes ao comércio colonialas ordens religiosas, eram os privilégios dessasordens:

Os missionários não apenas pregavam (tinham 

fazendas com mais de 100 mil cabeças de gado,

só na ilha de Marajó, propriedades produtoras 

de açúcar e o resultado das expedições indíge- 

nas coletoras de produtos nativos da floresta 

amazônica, cravo, cacau, canela), eles também 

conduziam uma operação mercantil de grande 

escala, resul tante de anos de acumulação de ca- 

pital, de cuidadoso reinvestimento e desenvolvi- 

mento. Quando uma frota de 10 ou 11 navios 

estava para chegar de Lisboa ou Porto, suas 

mercadorias eram levadas para a costa atlânti- 

ca por comboios de canoas. Reunidas no arma- 

zém do Colégio dos Jesuítas, isentas de tributos 

e de direitos alfandegários, eram comercializa- dos em uma feira organizada enquanto os na- 

vios estavam no porto. 22 7 

Além do fato de haver contrabando por to-dos os cantos da Colônia onde alguma riquezaera produzida, a Coroa portuguesa tinha quearcar com os privilégios que detinham os cléri-

gos; privilégios estes que se enraizaram com odecorrer dos séculos. Porém, as relações entreo poder temporal do soberano português e opoder não só espiritual da Igreja não se resu-

miam à questão da isenção fiscal no tocante aocomércio. As ligações entre a religião católica ea monarquia lusitana começaram muito antesda colonização da América e tinham múltiplosaspectos.

Na verdade, uma compreensão mais clara dasrelações estabelecidas entre a Igreja Católica e aMonarquia em Portugal remonta ao século IVda era cristã, quando, após três séculos de per-seguição pelo Império Romano, o cristianismopassa à condição de religião oficial. 22 8

Essa concepção de religião associada ao po-der temporal continuou a ser aceita durante todaIdade Média. Isso não significou que houvessesempre harmonia entre estas instituições. Muitoao contrário: várias foram as tensões entre o pa-pado e o poder dos reis. Mas, de qualquer ma-neira, “a proteção do Estado trouxe sempre pri-vilégios e benefícios materiais para a Igreja, massignificou sempre compromisso, e não poucasvezes, opressão da Igreja.” 22 9 Ou seja, tratava-sede uma religião sempre próxima ao poder, sem-pre pronta para contribuir na opressão dos seto-res explorados pela ordem feudal, quando era ocaso.

Entre os direitos que a Igreja cedera ao Esta-do, um vincula-se diretamente à questão tribu-tária do Brasil-Colônia; refere-se à cobrança dosdízimos, dinheiro que servia para a sustentaçãomaterial da Igreja, inclusive no que se refere aotrabalho de catequese dos índios e dos africa-nos. Neste sentido, Riolando Azzi afirma:

O padroado conferia aos monarcas lusitanos o 

direito de cobrança e administração dos dízimos 

eclesiásticos, ou seja, a taxa de contribuição dos 

fiéis para a Igreja, vigente desde as mais remo- 

tas épocas.

131m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

22 6  Idem, ibidem , p. 28.

22 7  Idem, ibidem .22 8 Riolando AZZI, A instituição eclesiástica durante a primeira época colonial, in: Eduardo HOORNAERT et alli, H istória da Igreja no Brasil -

 pr im eira época, tom o 2, p. 160-161.22 9 Idem, ibidem .

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A arrecadação dos dízimos era o sistema usado 

durante a Idade Média para o sustento do cul- 

to e dos seus ministros. Cada cristão deveria 

contribuir com a décima parte dos lucros usu- 

fruídos com o trabalho da terra, para as despe- sas da Igreja. 23 0

Efetivou-se, com o padroado, a administraçãoda religião nas mãos do poder temporal. Assim, oclero passava a ser parte do funcionalismo públi-co, obedecendo antes às ordens do rei de Portugaldo que de Roma. Porém, apesar das diversas for-mas que mantinham o clero dependente do Esta-do, não foi isso que acabou prevalecendo. Em mui-tos eventos, a Igreja afrontou o poder da Coroa

portuguesa, assim como os interesses de diversossetores proprietários de terra e escravos espalha-dos pela Colônia. Dentro dessa estrutura – a dopadroado – é que se deve compreender o podereconômico da Igreja e do clero. Também é precisoter clareza de que o padroado afastou o clero bra-sileiro, no período colonial, das orientações deRoma, deixando-o suscetível à corrupção e ao des-vio da sua verdadeira função.

Assim, se os padres eram pagos pelo poder pú-blico com renda advinda do recolhimento do dízi-mo, também outras despesas relativas ao catolicis-mo dependiam do Erário Real. Portanto, caberia àmesma Fazenda Real custear a construção de tem-plos religiosos. Aliás, esse costume de cobrar tri-butos da população com o intuito de bancar aconstrução de igrejas não cessou quando da eman-cipação política de 1822, mas se manteve durantetodo o Império brasileiro, até porque o padroadocontinuava a existir. Daí não haver sentido em secobrar impostos de qualquer espécie do clero.

Muito menos – aí mais por questões religiosas –revistar padres nos registros ou alfândegas, o queseria o mesmo que os acusar de contrabando ou deoutro ato ilícito.

Porém, as tensões entre o Estado português e aIgreja foram aguçadas com o período pombalino,em que o ministro do rei D. José I fazia questão decolocar de lado todos os setores metropolitanos ecoloniais que se posicionavam acima dos interessesdo Estado português, fossem em termos políticos,

administrativos ou econômicos. Daí a análise deKenneth Maxwell sobre esta questão:

A Companhia de Jesus foi uma das vítimas mais 

evidentes dos acontecimentos postos em marcha pelas pretensões imperiais do governo de Pombal 

e pelas tentativas de nacionalizar setores do sis- 

tema comercial luso-brasileiro. Dado o pano de 

fundo do esforço para povoar e explorar tão 

grande território tropical e subtropical, para es- 

timular casamentos indo-europeus e consolidar o 

domínio nacional, o choque com os jesuítas tinha 

de surgir como inevitável subproduto. Os jesuí- 

tas dominavam as fronteiras nos dois pontos 

mais sensíveis e vitais do sistema imperial de D.

Luís da Cunha: o rio Amazonas ao norte e os rios Uruguai e Paraguai ao sul. (...) 

(...) A isenção de que gozavam as missões do 

extremo norte, quanto às contribuições para o 

Estado, criara uma tensão entre elas e a admi- 

nistração secular que tentava consolidar as fi- 

nanças e fortificar o Amazonas. 23 1

No entanto, não apenas os jesuítas deveriam sercombatidos – muito em função da isenção fiscalde que dispunham –, mas também outros grupossociais que só atrapalhavam os interesses de umEstado português forte. Assim, parte significativada nobreza portuguesa perdeu alguns dos seus pri-vilégios tributários, o que levou a sérios conflitosentre estes e o governo de Pombal.

Por outro lado, a mesma sorte do clero – e atéentão da nobreza – em ter isenção fiscal não atingiao resto dos colonos brasileiros. E com o desenvol-vimento da mineração, o que nunca foi tranqüilo

começou a ficar mais tenso. Assim, a já rígida pre-sença fiscal portuguesa nas terras mineiras apenas sefez ainda mais forte. Nunca houve tanta violênciasobre os contribuintes como a partir da segundametade do século XVIII. Nunca a capacidade con-tributiva dos moradores daquela região havia sidotão desrespeitada. Mais uma vez, o fisco portuguêsinvertia a ordem lógica no que se refere a qualquerpolítica tributária; ou seja, a cobrança deveria ocor-rer no sentido de recolher parte do que era efetiva-

132 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

23 0 Idem, ibidem , p. 163.23 1 Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 42.

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mente produzido. A ação portuguesa concentrava-se em outra direção: tentava recolher tributos quefossem capazes de cobrir os grandes déficits da ba-lança comercial lusitana com a Inglaterra, ainda sob

o nocivo efeito do Tratado de Methuen.Esta política fiscal passou a atingir todos os se-tores da sociedade das Minas Gerais. Aqueles maispopulares continuavam a sofrer as mesmas dificul-dades de sempre: fome, impostos altos, desabaste-cimento, exploração do trabalho por parte dos se-nhores de lavras, abuso de poder das autoridadesportuguesas.

Porém, antes de adentrar especificamente a In-confidência Mineira, é importante apresentar to-das as etapas da prática fiscal em relação à produ-

ção aurífera, que ocorreram durante o séculoXVIII. Vale ressaltar que estas práticas estiveramvinculadas às necessidades imediatas da FazendaReal, daí as mudanças constantes na maneira dearrecadar esses valores.

Desde o início do século XVII já existia legis-lação específica para cuidar da produção minera-dora. “O ‘Código Mineiro’ de 1603 e 1618 (...)estabelecia que todos os súditos do rei podiam ex-trair livremente o metal, desde que reservassempara a Fazenda Real a quinta parte do produto;autorizava a criação de Casas de Fundição, paraonde deveria ser levado o metal extraído para serfundido em barras, depois de deduzido o impos-to; a demarcação das terras minerais, a fiscalizaçãodas jazidas e a cobrança do quinto ficavam sob aresponsabilidade de um provedor, elemento quedeveria possuir amplos conhecimentos de minera-ção. Com o regimento de 1618 as atribuições des-se provedor foram ampliadas, principalmente noque concerne à cobrança dos impostos.” 23 2

Neste ponto, observam-se ao menos duas ques-tões interessantes: o famoso imposto do Quintonão foi criação da época da descoberta do ouro emMinas Gerais, mas já estava presente nas legisla-ções portuguesas – inclusive inspiradas nas Orde-nações Filipinas do século XVI, da Espanha –desde o século XVII; e mesmo as maneiras de co-brar os impostos e de administrar as regiões mi-neiras já estavam contempladas nas citadas legisla-ções. Outro ponto de interesse refere-se ao perfildo provedor dessa atividade exploradora, que de-

veria ser uma pessoa gabaritada no que se refereaos temas da mineração. Ou seja, desejava-se umprofissional que não apenas tivesse a função de co-brar impostos, mas também que conhecesse os

meandros da mineração, para que a procura de me-tais preciosos fosse ampliada ao máximo. Caberiaainda a este provedor transmitir informações téc-nicas, apoiando os que saíam à procura do ouro.

Porém, este código de 1618, por mais queapontasse para a lógica de acumulação das rique-zas produzidas no Brasil, encaminhando-as para aMetrópole, necessitou passar por algumas modifi-cações em virtude da nova realidade encontradacom a descoberta de ouro nas Minas Gerais. Nes-ta região, a quantidade de metal foi por demais vo-

lumosa para que uma legislação anterior desseconta de administrá-la. Além disso, é preciso terem conta que a situação econômica lusitana exigiauma atenção especial quanto ao fluxo da produçãoaurífera. As finanças portuguesas viviam uma si-tuação tão dramática, como já se viu, que seria in-suportável qualquer sangria fiscal. Dentro destascircunstâncias, não restou aos portugueses senãocontrolar cada grama de ouro encontrado; nadapoderia ser perdido. Mas não bastava evitar a so-negação fiscal; caberia ainda uma política que am-pliasse a produção.

133m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

23 2 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 238.

Os provedores deviam ter informações técnicas a respeito da mineração, além de

zelarem pela fiscalização das jazidas e a arrecadação do quinto do ouro para a

Fazenda Real.

38. Instrumentos de extração, fundição, aferição e transporte de ouro, alguns

provenientes da antiga Casa de Fundição de Vila Rica (Ouro Preto). Rio de Janeiro,

Museu Histórico Nacional.

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Neste sentido, em 1702, o governo de Lisboacolocaria em vigor o “Regimento dos Superinten-dentes, Guarda-Mores e Oficiais Deputados paraas Minas do Ouro”. As novas condições portugue-

sas exigiam essa legislação atualizada. “Em termosgerais, o novo regimento mostrava a preocupaçãodas autoridades metropolitanas em assegurar osprivilégios da Coroa na atividade e, nesse sentido,a ênfase em incentivar a produção e, principalmen-te, em facilitar a sua ação fiscal (cobrança das ren-das da Coroa provenientes dos quintos).” 23 3

Através do novo regimento, as regiões minera-doras passariam a ser administradas por um órgãoespecífico, um verdadeiro governo dentro da admi-nistração colonial. Este organismo – a Intendência

das Minas – só deveria responder por suas açõesao rei português; detinha, portanto, dentro da re-gião das minas, a mais ampla autonomia.

A Intendência das Minas ampliou as atribuiçõesem relação aos regimentos anteriores: “administra-tivamente, era o órgão responsável pelo policia-mento da mineração – fiscalizar e dirigir as explo-rações; juridicamente, funcionava como tribunal deprimeira e última instância nas questões relativas àssuas atribuições; finalmente, como órgão fiscal, erao responsável pela cobrança dos tributos.” 23 4

O provedor existente a partir da legislação an-terior fora substituído por um superintendente,com prerrogativas mais amplas. “Tratava-se nãomais de um homem ligado à mineração, mas umconhecedor da legislação vigente, defensor que erados interesses da Coroa. Nas funções ligadas dire-tamente à exploração, o superintendente era assis-tido por um guarda-mor e guarda-menores, que de-veriam suprir os conhecimentos práticos do antigoprovedor. Teoricamente, deveria funcionar, através

desses elementos, como órgão de orientação técni-ca e de fomento à exploração.” 23 5 Na prática, istonunca aconteceu; a Intendência das Minas reduziu-se a uma mera cobradora de impostos. 23 6 

Porém, quanto ao principal tributo a ser cobra-do sobre o ouro achado, não houve modificação. Oscolonos brasileiros deveriam pagar ao Erário Realum quinto do nobre metal encontrado. A questãodo imposto não foi um problema em si para a novaforma de administração nas regiões mineiras e simcomo deveria ser consubstanciada essa cobrança.

Ou seja, como os representantes da Coroa portu-guesa realizariam a efetiva arrecadação tributária éque trazia problemas aos colonizadores.

Com o início da mineração nas Minas Geraisem fins do século XVII, a Intendência das Minasresolveu estabelecer as Casas de Fundição. Nestas,a forma de arrecadação era simples: “todo o ouroextraído (em pó ou em pepitas) deveria ser levadoa um desses locais, onde o metal seria fundido embarras, depois de deduzida a quinta parte de seu

valor correspondente ao tributo. Essas barras se-riam marcadas com o selo real e desta forma deve-ria circular o ouro na colônia.” 23 7 

Porém, para o minerador, não era tranqüiloviajar por muito tempo a fim de encontrar a Casade Fundição mais próxima de Minas Gerais, quese localizava em Taubaté, na capitania de São Pau-lo. Estas dificuldades em pagar o imposto devido,além da discordância com seu alto valor, levaramparte desses mineradores para o campo da simplessonegação. Dessa maneira, parte considerável do

ouro deixava de ser quintada e serviu como moedade troca para uma série de mercadorias. A reaçãodo fisco português se fez rápida:

134 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

“Nas Casas de Fundição, a forma de arrecadação era simples: ‘todo o ouro

extraído (em pó ou em pepitas) deveria ser levado a um desses locais, onde o

metal seria fundido em barras, depois de deduzida a quinta parte de seu valor

correspondente ao tributo. Essas barras seriam marcadas com o selo real e desta

forma deveria circular o ouro na Colônia.’”

39. Barras de ouro (quinto), Mato Grosso, século XVIII; Minas Gerais e Goiás,

século XIX. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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A verificação desses descaminhos levou a Coroa 

a tomar medidas de policiamento: em 1700 fo- 

ram nomeados por decreto régio provedores e es- 

crivães encarregados de fiscalizar o pagamento 

dos quintos. Além disso, foram criados centros de inspeção, pol iciados, nos caminhos de saída das 

regiões mineiras, os chamados Registros  23 8. Por 

esses locais eram proibidos de passar aqueles que 

não possuíam uma guia especial, fornecida pelas 

autoridades competentes, discriminando a quan- 

tidade de ouro que levavam e o local de fundição 

para onde se dirigiam. 23 9

Além desse mecanismo de fiscalização, tam-bém seria possível pagar o quinto devido no pró-

prio Registro, quando fossem efetivadas transa-ções comerciais. Por outro lado, ainda com apreocupação em facilitar o pagamento do tribu-to real, “a Coroa, ordenou, em 1704, o fecha-mento das Casas de Fundição da região de SãoPaulo e suas operações foram transferidas paraos portos de Parati e Santos, saídas marítimasdas Minas.” 24 0

Apesar do estabelecimento de novas formasque garantissem a arrecadação do máximo possí-vel de tributos, a quantidade de ouro transferidapara os domínios da Fazenda Real não contenta-va as autoridades metropolitanas. Estas tinhamconsciência de que parte do que deveria ser reco-lhido para o Erário Real terminava vazando porcaminhos estranhos. Assim, todas as energias dofisco português concentravam-se no sentido deencontrar uma forma de cobrar o Quinto aindamais eficiente. Apenas a existência dos Registrose das Casas de Fundição parecia facilitar a vidados colonos que desejavam burlar o fisco.

Dessa maneira, em 1710, surgiu uma novaforma de arrecadação, que visava a cercar de to-dos os lados os que insistiam na sonegação:

(...) houve uma tentativa de se cobrar o impos- 

to diretamente sobre o número de escravos em 

serviço efetivo nas minas, ou seja, uma taxa 

baseada na proporcionalidade entre o trabalha- 

dor e a sua produção em ouro. Essa forma de arrecadação não vigorou por muito tempo,

principalmente pelas revoltas que ocasionou.

(...)   24 1

Estas revoltas baseavam-se na completa injusti-ça fiscal decorrente desse sistema de arrecadação.O simples fato de se ter escravos não garantia queo ouro seria encontrado. Dessa maneira, caberia aosenhor de escravos – dono de lavras – pagar estetributo, independentemente da quantidade de me-

tal precioso encontrado. Este sistema, que consis-tia numa tributação per capita , durou muito poucotempo.

Como a preocupação do Erário Real era deapenas arrecadar, sem qualquer disposição emcompreender as necessidades dos mineiros, maisuma vez trocava-se a prática tributária em relaçãoao ouro, agora com a sugestão das autoridadesportuguesas no Brasil:

(...) a Junta da Fazenda de Vila Rica propôs à 

Coroa o pagamento de uma quantia anual 

fixa, em substituição ao quinto: o chamado sis- 

tema de fintas (quotas de arrecadação). Neste 

ano [ 1713] a proposta equivalia àcontribui- 

ção de 30 arrobas de ouro, montante que as 

Câmaras arrecadavam mediante fintas lança- 

das aos mineradores (quantias cobradas tendo 

em vista a importância das datas – lugares de 

mineração – e o número de escravos emprega- 

dos); mas ti nha como condicionante a supressão 

dos Registros e a permissão da livre circulação do ouro para fora da capitania sem guia e sem 

pagamento de qualquer outro direito. 24 2

135m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

23 3 Idem, ibidem .23 4 Idem, ibidem .23 5 Idem, ibidem .23 6  Sobreesta questão, afirma o historiador Caio Prado Júnior: “Seus funcionários, bacharéis eburocratas inteiramentealheios a assuntos demineração, não

deramnunca umpasso no sentido depromover melhorias, tentar o aperfeiçoamento dos processos empregados na extração do ouro; ajudar (...) a indústriaconfiada à sua guarda ou às pessoas nela ocupadas. (...) Na realidade, nada interessava senão o quinto.” Caio PRADO Júnior, Formação do Brasil

C ontemporâneo, p. 177. A pu d Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 238.23 7  Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 239.23 8 “Os Registros erampostos fiscais instalados nos pontos obrigatórios depassagem, ondeseexaminavamas cargas para o pagamento detributos, eevitar-

seo contrabando.”Cf.: Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 498.23 9 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 239.24 0 Idem, ibidem .24 1 Idem, ibidem .24 2 Idem, ibidem .

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Apesar da supressão temporária do Quintocom o Sistema de Fintas, a carga fiscal continuavatão pesada quanto antes. De fato, não houve a di-minuição dos valores pagos por parte da popula-

ção mineira, já que a renda dos tributos que nãoestivessem relacionados com o ouro continuavasendo arrecadada da mesma maneira, só que comoutro destinatário: as Câmaras Municipais. Porém,esta forma arrecadadora não durou muito tempo:

Em 1718, como ajuste desta quota anual, a 

quantia foi reduzida para 25 arrobas anuais, mas 

sendo devida ao rei, em compensação, a renda dos 

Registros relativa aos impostos pagos pelas merca- 

dorias que entravam nas Minas, impostos esses que 

pertenciam atéentão às várias comarcas. 24 3

Neste ponto, interessa destacar que a Coroaportuguesa olhava para as Minas Gerais não ape-nas com preocupações em relação à arrecadaçãooriunda da extração aurífera. As rendas obtidasatravés dos impostos de entrada e saída de merca-dorias eram de tal maneira volumosas, que a Fa-zenda Real percebeu em muito pouco tempo o ta-manho do seu prejuízo. Assim, se o imposto querecaía diretamente sobre o ouro era o objetivo cen-tral da política tributária lusa, não havia desleixoem torno das outras fontes fiscais, como era o casodos impostos sobre a circulação de mercadorias.Da mesma maneira, é possível compreender a po-lítica metropolitana no sentido de evitar que a Co-lônia produzisse qualquer manufatura que viesse aconcorrer com os produtos vindos da Europa.Daí, ainda, a forte atenção no sentido de se evitarqualquer forma de contrabando, que significavavender menos ao Brasil e, consequentemente, arre-

cadar menos impostos, o que tornaria o prejuízoainda maior.Ao mesmo tempo, com o sistema de fintas, a

população mais pobre acabou sendo vítima da vio-lência fiscal lusitana. Isto porque a cobrança doQuinto estava nas mãos dos homens mais ricos daregião mineira:

(...) atéconstruírem [as] Casas de Fundição 

eram as Câmaras que lançavam o imposto do 

quinto. Como as oligarquias locupletam-se e 

controlam as Câmaras, cobram impostos princi- palmente dos pobres, livrando os ricos do grosso 

das contribuições. 24 4

E as injustiças não paravam por aí. Como a Fa-zenda Real portuguesa tinha apenas interesse noimposto que seria efetivamente remetido para aMetrópole, em muitos momentos não esteve preo-

cupada com a forma de arrecadação. Esta ficava acargo do governador de Minas. Assim, quando oSistema de Fintas passou a ser utilizado, algumasdistorções foram-se estabelecendo:

Baltasar da Silveira [ governador em 1713] ,

incapaz de ajustar os interesses do rei e dos mi- 

neradores, decidiu por métodos desiguais para 

várias comarcas. Quando se descobre que em 

algumas regiões paga-se mais que em outras, os 

mineradores revoltam-se e depois de várias es- 

caramuças, onde o governador quase morre, fu- gindo de um lugar para outro, ele foi obrigado a aceitar o quinto em 450 quilos de ouro.

Mas os motins continuam na zona das minas.

O governador éacusado de proteger alguns ri- 

cos mineradores e persegui r outros. 24 5

Assim, o Sistema de Fintas acabou por estarpresente no quotidiano dos colonos mineiros porpouco mais de cinco anos. A posição da Junta daFazenda Real de Vila Rica deixou de preponderar.Na visão da Fazenda Real, a forma mais eficientede se cobrarem os direitos fiscais relacionadoscom a mineração passava pela recuperação da idéiaoriginal das Casas de Fundição. Estas deveriamvoltar a funcionar – inclusive com a construção devárias dessas instituições – a partir de 1719, masas reações desencadearam inúmeras revoltas, comoa já citada de Felipe dos Santos, em 1720. Coubeàs autoridades portuguesas reprimirem as insatis-

fações dos colonos radicados nas Minas Geraispara a efetivação das Casas de Fundição.Apesar do aumento da arrecadação – mesmo

porque a produção tendia a crescer por essa época–, a sede fiscal lusa continuava a aterrorizar cadamorador das regiões mineiras. Não se pode deixarde lado o fato de que, a cada momento, aumentavao déficit das relações mercantis com a Inglaterra. Atransferência de ouro brasileiro – após breve, equase formal, passagem pelos cofres reais portu-gueses – tornava-se mais volumosa. Aos portugue-

ses não restava outra saída. As Casas de Fundição já não pareciam tão eficientes quanto necessitava ofisco lusitano. Este percebia que a sonegação fiscal

136  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

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apenas aumentava. Era preciso encontrar um meioque efetivasse a arrecadação fiscal e que atendesseaos anseios portugueses. Em outras palavras, o Erá-rio luso caminhava no sentido de encontrar maior

eficiência na arrecadação. Dessa forma, em 1735,instituiu-se uma nova prática tributária: a Taxa deCapitação dos Escravos e o Censo das Indústrias:

Esse sistema tinha uma vantagem fundamental 

para a Coroa, pois o imposto assim estabeleci- 

do recaía não somente sobre os faiscadores ou 

mineiros, como também atingia, pelo Censo das 

Indústrias, um raio maior de pessoas. 24 6 

Ou seja, não seriam mais apenas as pessoas

envolvidas e diretamente relacionadas com a pro-dução aurífera que seriam atingidas pelo rigorfiscal, como se já não pagassem inúmeros tribu-tos. Na lógica do colonizador, a circulação de ri-quezas na região das Minas Gerais era faustosa eprecisava ser explorada ao máximo. Além domais, com a capitação, aumentava a dificuldadedos sonegadores.

Por outro lado, era um sistema de cobrança deimpostos que pesava sobre os mineradores:

Ela éfixada em 4,75 oitavas de ouro ‘por cabe- 

ça’, isto é, mais ou menos 17 gramas de ouro 

para cada escravo. Acontece que nem todo escra- 

vo dava essa produção: de novo, as lavras menos 

produtivas pagam uma porcentagem maior. 24 7 

Ao mesmo tempo, esse odiado sistema de ar-recadação tinha funcionamento relativamentesimples:

No que se refere aos mineradores, consisti a em taxa cobrada por escravo, produtivo ou não, de 

ambos os sexos e maiores de 12 anos. Os fais- 

cadores, ou seja, os mineradores que não pos- 

suíam escravos – homens livres ou mesmo es- 

cravos forros – deveriam pagar idêntica taxa 

sobre si mesmos. 24 8

 Tratava-se, claramente, de uma política fiscalinjusta, pois desconsiderava, de forma absoluta,a capacidade contributiva de cada minerador. Ofato de um senhor de escravos possuir cem ho-

mens não garantia que a sua produção de ourofosse superior à de qualquer outro mineradorcom uma quantidade bem menor de braços. As-sim como o faiscador – normalmente, uma pes-soa pobre – nem sempre teria como pagar o in- justo tributo estabelecido pela insaciável Fazen-da Real da Metrópole. Sobre este sistema de ar-recadação tributária, afirma Mauro de Albuquer-que Madeira:

Historicamente estáprovado que a capitação – 

de 1735 a 1751 – favoreceu o erário da Co- roa portuguesa e oprimiu a população mineira com forte espoliação fi scal. (...) Veja (...) as 

queixas contra a capitação das Câmaras de 

Vila Rica, Vila Nova da Rainha, Vila do Ribei- 

rão do Carmo, Vila de São Josée Vi la de São 

João del Rei, entre 1741 e 1744: ‘Clamores e 

súplicas das Câmaras em nome do povo.’ Não 

por acaso, o ministro de Ultramar Martinho de 

Mello e Castro serodiamente desejou ressuscitar 

a capitação, em 1788, contra toda a exequibi- 

lidade política e econômica. 24 9

Para muitos historiadores, a sistemática da ca-pitação trouxe, com o passar dos anos, sérios da-nos à mineração. Isto porque:

(...) os mineradores, conscientes que terão que 

pagar produzindo ou não, começam a procurar 

apenas o ouro de aluvião. Isso significa explorar 

só o ouro de superfície, soterrando grandes veios 

subterrâneos, que demandariam mais escravos e tempo atécomeçarem a produzir. O que resulta,

evidentemente, na exaustão das minas. 25 0

Quanto ao Censo das Indústrias, também setratava de uma tributação simples, mas não menosopressora:

137 m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

24 3 Idem, ibidem .24 4  Júlio José CHIAVENATO, A s vá ri as fa ces da I n con fi dên cia M in eir a, p. 34.24 5 Idem, ibidem .24 6  Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO,  B ra sil H ist óri a - tex to e cons u lt a - 1 C olôn ia , p. 239.24 7   Júlio José CHIAVENATO, op. cit., p. 35.24 8 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 239-240.24 9 Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 87.25 0  Júlio José CHIAVENATO, op. cit., p. 35.

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Oficinas, lojas e hospedarias – e nisso consis- 

tia a inovação da taxa de capitação – estavam 

incluídas no pagamento, sendo para tanto divi- 

didas em três categorias, com taxas correspon- 

dentes. 25 1

 Juntamente com esse aperto fiscal – agora in-cluindo setores econômicos anteriormente isentosdeste tipo de incidência tributária –, vieram açõesarbitrárias por parte da Fazenda Real:

O tributo deveria ser pago em duas prestações 

em datas determinadas, e o atraso ou o não-pa- 

gamento levava ao confisco de bens equivalente 

 àquantia devida. Este confisco, por vezes vio- 

lento e abusivo, consistia em um dos motivos pelos quais a taxa de capitação tornou- se alta- mente impopular.  25 2

Em 1751, momento em que a produção aurífe-ra das Minas Gerais iniciava a sua decadência, ofisco metropolitano aboliu a Taxa de Capitação,reintroduzindo as Casas de Fundição, acopladas asistema de quotas anuais. Esta quota passou a serde 100 arrobas por ano. Mas uma novidade seriaapresentada aos colonos mineradores pouco anosdepois: a Derrama. Esta seria a cobrança dos im-postos atrasados, que ocorreria sempre que o fiscoportuguês considerasse as condições oportunas.Sobre essa nova sistemática de cobrança temos:

A Carta Régia de 3 de dezembro de 1750 esti- 

mou o quinto em 1.456 quilos de ouro anuais.

Até1766 sempre se conseguiu pagar este míni- 

mo, às vezes atéexcedendo-o. A partir desse ano,

todo o retrospecto de técnicas erradas nas lavras 

começa a aparecer e a produção a baixar. Então,a derrama écobrada de fato. 25 3

Inclusive, vale destacar, foi o temor da decretaçãoda Derrama em fins dos anos 80 do século XVIIIque alimentou o movimento de contestação ao Sis-tema Colonial mais importante das Minas Gerais: a

Conjuração Mineira, como se verá adiante.Ao mesmo tempo, vale ressaltar que os sistemasde cobrança tributária acerca do Quinto, assimcomo de outras obrigações fiscais, ocasionavaminúmeros debates entre os responsáveis pelas deci-sões, como por aqueles que se sentiam na obriga-ção de dar as suas sugestões no sentido de tornaressas cobranças justas e, principalmente, eficientes.Ou seja, o fato de uma sistemática ter sido im-plantada não significava que algum consenso haviasido atingido. Pelos meios possíveis, esses críticos

mostravam as suas insatisfações. Especificamenteem relação à cobrança do Quinto através da capi-tação, têm-se as observações e análises de Alexan-dre de Gusmão 25 4 , que havia construído o projetoda Capitação. Segundo este crítico do sistema deCasas de Fundição e da quota de 100 arrobas:

(...) os beneficiários da nova lei seriam ‘os ecle- 

siásticos, os homens de governança, os poderosos,

os mercadores e os comboieiros’, e os prejudica- 

dos, os mineiros pobres e a Real Fazenda. Ele 

considerava três classes de pessoas que tiram ou 

ajuntam ouro em Minas Gerais: 1º, os minei- 

ros, que extraem da terra; 2º, os agricultores 

(roceiros) e os artesãos, os oficiais e funcioná- 

rios, que trocam os seus produtos ou serviços por 

ouro; 3º, os comboieiros – que vendem nas mi- 

nas escravos, animais de carga e gado – e os co- 

merciantes, que trazem mercadorias para as pes- 

soas das duas primeiras classes. Os comboieiros 

e mercadores levavam continuamente o ouro 

para fora das minas, além dos clérigos, que po- deriam fazê-lo por não serem fiscalizados nos 

postos de registros. Essas categorias são os prin- 

138 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

25 1 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 240.25 2 Idem, ibidem .25 3  Júlio José CHIAVENATO, op. cit., p. 35-36.25 4 SobreAlexandredeGusmão, afirma Mauro deAlbuquerqueMadeira: “(...) é(...) exemplo deintelectual orgânico a serviço incondicional do rei. Elefoi

Secretário deD. João V, por volta de1730 atéa mortedo monarca em1750. Nascido no Brasil, numa prestigiosa família deSantos, tevemuitos irmãospadres, frades efreiras, pois esteera o caminho preferencial para quemnão era nobreequeria seguir a carreira deletrado. (...) Apesar deser amigo econselheiro do rei, foi importunado pelo Santo Ofício, vindo a morrer na Espanha, quando fugia das suas malhas, sob acusação de judaizante. (...) Elefoi o autor do projeto delei da capitação (1734), quesubstituiu as casas defundição deouro.”(p. 71) Ou ainda: “(...) membro da Academia Real deHistória, morador da CortedeLisboa, mas, por mercêdo rei, proprietário dos ofícios deTabelião edeEscrivão da Ouvidoria de Vila Rica — ofícios

queelearrendava a serventuários substitutos. Esses ofícios rendiama fortuna anual de10.000 cruzados anuais (cerca decinco contos deréis), enquanto,como Conselheiro do Conselho Ultramarino, elerecebia, mais tarde, 300.000 réis por ano. (...) AlexandredeGusmão éo exemplo consumado eextremodo letrado quealcançou o ponto máximo da carreira, como valido do Rei eassimilado aos privilégios, status epoderio declasse da nobreza portuguesa.”Cf.: Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 88.

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cipais fraudadores do quinto e não os mineiros,

que, em geral, não se afastam das suas lavras.

Em não se obtendo as 100 arrobas de ouro 

anuais nas Casas de Fundição – o que será, se- 

gundo ele, freqüente por causa do contrabando –, restaráo recurso da derrama. Se esta se der 

sobre os mineiros, seráinjusta, porque estes, se- 

gundo Gusmão, não são os fraudadores. Se a 

derrama recair sobre toda a população, haveráa 

mesma queixa do tempo da capitação, que inci- 

dia sobre todos, mineiros ou não. 25 5

Este mesmo crítico da nova sistemática de co-brança do famigerado Quinto também tinha sériasrestrições à Derrama, devido ao seu caráter injus-

to e à violência inerente à sua efetivação. Alexan-dre de Gusmão entendia que os benefícios da sis-temática anterior haviam sido abandonados e queeram introduzidos novos defeitos, que gerariam adiminuição da arrecadação. Em última instância,este crítico do Sistema de Capitação tinha apenasem mente a preocupação em manter os mesmos ní-veis de arrecadação, o que já não era possível, de-vido ao esgotamento das minas, coisa que os por-tugueses jamais admitiram. Continuavam acredi-tando que a sonegação e o contrabando eram osúnicos responsáveis pela diminuição das rendas doEstado lusitano em relação ao ouro brasileiro. Ale-xandre de Gusmão deixava clara essa posição denão acreditar no início de esgotamento das minasda Colônia:

Gusmão defendia ardorosamente as prerrogati- 

vas fiscais da Coroa. Os contribuintes da Co- 

lônia que se arranjassem e pagassem. A nova lei 

parecia- lhe ao mesmo tempo perigosa para os 

interesses do fisco e mal feita, podendo even- tualmente vir a prejudicar atémesmo os habi- 

tantes de Minas Gerais. ‘Pode ser menos a ex- 

tração de ouro, por terem cansado as lavras,

como láse explicam. Pode por outra parte esta 

diminuição das lavras antigas achar-se com 

grande excesso compensada pela novas, que se 

descobriram no Paracatu e em outros lugares.

Enfim pode haver tais circunstâncias, que pon- 

deradas na face do País façam o partindo das 

cem arrobas ou minimamente desvantajoso para 

Sua Majestade, ou onerosa para o Povo.’   25 6 

As posturas de Alexandre de Gusmão acercadas sistemáticas a serem empregadas nas regiõesauríferas conflitavam com as de outro magistradoda época. Como se afirmou, as questões no campotributário não eram monolíticas; mesmo com oslimites impostos por uma ordem absolutista, osdebates ocorriam. Nesse sentido, Teixeira Coe-lho 25 7 discordava da defesa que Alexandre de Gus-mão fazia do Sistema de Capitação, mas também

não aceitava a Derrama. Além das divergênciasquanto à melhor forma de se cobrar o Quinto, ha-via uma ainda mais profunda: a razão pela qual aquantia de impostos relativos ao Quinto diminuíacontinuamente após 1750. Para Alexandre deGusmão, isso devia-se à fraude, ao contrabando eà sonegação da população de Minas Gerais. Assim,com um sistema de arrecadação mais eficiente, omontante do Quinto recolhido voltaria aos níveisdesejáveis pelo fisco português. A visão de Teixei-ra Coelho é diferente, pois este afirma:

Numa estocada que hoje poderíamos aplicar 

tanto a Alexandre de Gusmão quanto a Marti- 

nho de Melo e Castro, diz Teixeira Coelho: ‘É 

fácil o atribuir somente aos extravios a falta de 

ouro do quinto, pondo de máféna real presen- 

ça de Sua Majestade os habitantes de Minas.

Desse modo poupam o trabalho os que assim o 

representam, devendo ser mais exatos, e devendo 

fazer nesta matéria muito importante uma apli- 

cação e uma indagação mais profunda. Persua- dem-se muitos de que o presente método de co- 

brança do quinto nas Casas de Fundição do 

ouro concorre para a diminuição dele, porque 

facilita os extravios: eu não nego que o dito mé- 

todo tem seus inconvenientes, mas não cabe na 

providência humana o estabelecer um, que não 

139m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

25 5 Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 73.25 6  Idem, ibidem , p. 73-74.

257  “Esseerudito magistrado, voltando a Portugal, publicava a sua ‘Instrução’, em1780, quando era desembargador da Relação do Porto. Na década de70eumpouco antes fora Intendentedo Ouro emVila Rica eProcurador da Coroa na Junta da Real Fazenda, alémdeassessorar três governadores dacapitania deMinas Gerais. (...) o letrado típico tinha consciência da importância do seu trabalho intelectual (...) para ajudar os fidalgos governadores natarefa dedirigir a colônia mineradora.”Cf.: Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 77.

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os tenha.’ ‘A prova que hádos extravios do ouro 

não éevidente, éconjectural.’ ...Todos os homens 

 judiciosos da Capitania de Minas, os que esti- 

veram nela com os olhos abertos, estão persua- 

didos de que a falta de ouro procede unicamen- te de se não tirar da terra. 25 8

Para Teixeira Coelho, a diminuição da produ-ção de ouro era a causa fundamental das pequenasquotas do Quinto que passaram a chegar a Portu-gal. E mais: seria injusto acusar os moradores deMinas Gerais pelas quantidades pouco atrativasdesse ouro quintado. Este letrado não duvida dasonegação, mas a coloca em um outro patamar deanálise:

Embora reconheça algum extravio de ouro não quintado nos navios chegados a Lisboa, ele ar- 

gumenta que a falta de 25 ou mais arrobas do 

quinto – abaixo das 100 arrobas da lei –, nos 

últimos anos (a partir de 1764), se fosse de- 

corrente apenas do contrabando, seria resultado 

de um enorme excedente de produção de ouro 

extraviado, superior a 125 arrobas anuais,

volume de produção de metal precioso facilmen- 

te notado ou apreendido, o que, aliás, acontecia 

com os diamantes, mais fáceis de extraviar do 

que o ouro. 25 9

 Teixeira Coelho, a serviço dos interesses colo-nialistas portugueses no Brasil, entendia que outratarefa era mais urgente do que tentar tirar ouro deonde não havia mais: era preciso descobrir por quêa produção aurífera nas Minas Gerais tinha ten-dência permanente de queda. Uma das primeirascausas levantadas pelo literato relacionava-se com

“a pobreza dos mineiros, que os transforma emsimples faiscadores, juntamente com os seus escra-vos, e os impede de executar serviços pesados de‘romper cachoeiras, conduzir águas altas e des-montar morros’, ou de evitar que o tempo daságuas lhes arrombe os cercos e arraste o cascalho eas rodas. Uma parte dos escravos também é des-viada para os serviços da lavoura, o que enfraque-ce a ‘fábrica mineral’.” 26 0

Outra causa levantada para uma produção sem-pre decrescente do ouro ainda era apontada:

Háfalta de escravos e o seu preço éalto, em 

face do controle monopolista dos comerciantes do Rio de Janeiro e do excesso de direitos e tri- 

butos: além dos cobrados na África, por cada 

negro se pagam, no Rio, 4$500 réis no con- 

trato de saída, 500 de despacho, 160 nas pas- 

sagens dos rios Paraíba e Paraíbuna e 3$000 

réis de entradas no registro de Matias Barbosa.

Acrescentem-se ainda 40 réis ao escrivão de 

polícia do Rio, por cada escravo, e 4$000 réis 

de subsídio voluntário, que foi cobrado durante 

mais de vinte anos. O autor calculava que, por 

ano, entravam em Minas cerca de quatro mil escravos, inclusive os destinados àagricul tura e 

aos serviços domésticos. 26 1

 Teixeira Coelho, ao apresentar como uma razãodo processo de diminuição da produção auríferaem Minas Gerais a ausência de escravos – basica-mente pelo preço alto –, deixa transparecer uma si-tuação que se aproxima do paradoxal. O custo finalde um escravo que chegasse a Minas tinha dois pe-sos fundamentais: de um lado, o alto custo de saí-da no Rio de Janeiro, já que essa atividade era mo-nopolizada por comerciantes portugueses, em si-tuação absolutamente dentro da lógica do sistemacolonial, assim como das práticas mercantilistas;ou seja, fazia parte do processo remeter as riquezasproduzidas na Colônia para a Metrópole através damonopolização das atividades econômicas, queeram controladas pela máquina estatal e entreguesaos representantes da burguesia mercantil portu-guesa; não havia espaço para críticas aos brasileiros

que se sentissem prejudicados por essa prática.Por outro lado, além do alto custo inicial co-brado pela entrada de cada escravo no Rio de Ja-neiro, uma quantidade significativa de tributos eracobrada por aqueles que se dirigissem a Minas Ge-rais. Isso deixava esta já cara mão-de-obra com umpreço proibitivo, principalmente para um pequenominerador, que mal poderia bancar a sua própriasobrevivência; quanto mais se se pensar na sua

14 0 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

25 8 Idem, ibidem , p. 78.25 9 Idem, ibidem .26 0 Idem, ibidem , p. 78-79.26 1 Idem, ibidem , p. 73.26 2 Idem, ibidem , p. 80-81.

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possibilidade de fazer um investimento de montana aquisição de um homem africano! Assim, indi-retamente, mecanismos do próprio sistema colo-nial geravam situações de prejuízos, quando deve-riam trazer benefícios para a Coroa. Dessa forma,alguns ganhos intermediários não permitiam que aprodução de ouro mantivesse um patamar aceitá-vel. Essa era uma contradição, entre muitas, do sis-

tema colonial. Teixeira Coelho entendia que a diminuição dosganhos metropolitanos com o Quinto derivavamais de razões minerais do que da simples fraude.Por isso, não aceitava a aplicação da Derrama. Paraesse letrado, o caos dominaria a região das minasse aquela violenta cobrança de impostos atrasadosfosse efetivada:

A conseqüência lógica de todo esse arrazoado é 

a condenação firme do recurso da derrama,

porquanto o problema não éo contrabando de ouro, mas a sua pequena produção e a pobreza 

dos mineiros.

O ex-intendente do ouro e procurador da Co-roa explica porque a Junta da Fazenda Real de VilaRica não tem feito lançar a derrama para comple-tar a quota de 100 arrobas anuais: o resultado se-ria a penhora das roças, das lavras e dos escravosdos mineiros, a ruína total da Capitania de MinasGerais e a míngua dos outros direitos do ErárioRégio – as entradas, os dízimos, as passagens dos

rios, o subsídio literário, os donativos, as terçaspartes, além dos rendimentos das alfândegas doRio, de Lisboa e Porto, pela redução do comércioe da produção de bens.

Ele conclui que a cobrança da derrama iria aba-lar ‘os alicerces que sustentam o peso dos interes-ses do Estado’. 26 2

Embora Teixeira Coelho não acreditasse naDerrama, esta posição não o fazia um defensor doantigo método da capitação. Esta sistemática, se-

gundo o nobre serviçal da Coroa portuguesa, foitalvez a mais maléfica para a produção aurífera,por ter deixado explícitas as suas conseqüências

14 1m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

40. Guia e Barra de Ouro, 1814; ouro, Casa de Fundição de Sabará.

Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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apenas anos mais tarde. Inclusive, é possível atri-buir a este funcionário régio uma sensibilidademaior em relação aos numerosos devedores dasMinas Gerais, que experimentavam uma situação

próxima à falência. Essa sensibilidade – que secontrapunha a um colonialismo feroz, preocupadocom a arrecadação e jamais com a vida concreta decada morador da região em questão – derivava, emparte, da presença de Teixeira Coelho em Minas.Ou seja, para os funcionários portugueses, locadosna Metrópole, a falta de contato com a realidadecolonial era uma mera abstração. A longa distância– seja esta física ou de interesses – que separava aelite metropolitana e a maior parte dos minerado-res, assim como outros colonos brasileiros, era tão

grande que não havia qualquer possibilidade dehaver percepção quanto às verdadeiras e reais difi-culdades pelas quais passavam os mineiros.

Ao mesmo tempo, as críticas de Teixeira Coe-lho às sistemáticas conhecidas e às que estavamsendo gestadas não resolviam uma questão mais doque pragmática para o fisco português: como con-tinuar cobrando impostos, de maneira que os co-lonos pudessem pagá-los e não diminuísse brutal-mente a arrecadação tributária? Outro importantefuncionário real tentou resolver esse problema,para isso apresentando uma idéia:

D. Rodrigo [Joséde Menezes] , na exposição 

enviada a Martinho de Mello e Castro, em 4 

de agosto de 1780, critica a cobrança de quin- 

to nas Casas de Fundição e a livre circulação 

de ouro em pó dentro da capitania de Minas,

estabelecidas pela lei de 3/ 12/ 1750, mas 

estámuito longe de admitir a volta do método 

de capitação. Ele propõe a extinção das Casas 

de Fundição e a criação da Casa da Moeda em Vila Rica, onde se deveria transformar todo o 

ouro, não em barras, mas em moeda, ao valor 

de 1$200 réis a oitava, preço que o mineiro 

receberia na Casa da Moeda, pelo ouro ali 

aportado. Nesse preço de compra do ouro pela 

Fazenda Real jáestariam descontados os 20%

do quinto, jáque o valor efetivo da oitava 

(3,586 gramas) de ouro era de 1$500 

réis. 26 3

Era um caminho novo que se propunha, quepoderia apresentar algumas vantagens:

(...) economizar ia as despesas de manutenção 

das Casas de Fundição e revogaria a circulação legal do ouro em pó dentro de Minas – fonte 

permanente de contrabando dos comerciantes,

que o exportavam a 1$500 réis a oitava, sem 

pagar o quinto. 26 4

As propostas de D. Rodrigo iam além da sim-ples substituição das Casas de Fundição por umaCasa da Moeda 26 5. Era preciso adotar medidas maissignificativas, no sentido de realimentar a econo-mia mineira, até porque, sem esse renascimento,

não haveria como aumentar, ou mesmo manter, aarrecadação fiscal. Dentre as suas sugestões, tem-se: o fomento da produção mineral, ou seja, expe-dições para tentar descobrir novas minas (Cuiaté,sítio dos Arrepiados). E também a “criação de umfundo de financiamento dos mineiros, por conta daFazenda Real, a juros de 8% ou 9% ao ano, paradesenvolver a produção de Minas e, em conseqüên-cia, aumentar a arrecadação dos impostos”. 26 6 

Além dos mais conhecidos tributos que re-caíam sobre a população colonial, como os direi-tos de entrada e de saída de mercadorias e doQuinto, outras taxas eram arrecadadas. Normal-mente, eram obrigações fiscais relacionadas a al-guma questão específica, com a aparência de umataxa. Essa tributação especial talvez tenha causa-do tantos transtornos quanto os impostos regula-res. Além do mais, alguns desses tributos eram co-locados para resolver problemas específicos daMetrópole, isto é, não seriam revertidos para asnecessidades coloniais. Isto já acontecia, como já

se verificou com o Quinto, que era remetido inte-gralmente para Portugal. Quanto aos direitos desaída e de entrada de mercadorias, por exemplo,parte significativa costumava ficar na própria Co-lônia, ainda que esta renda fosse dirigida, normal-mente, para os gastos da administração colonial.Esta tinha a função de garantir a exploração doBrasil enquanto espaço dependente; dessa manei-ra, uma contradição estabelecia-se: a exploraçãocolonial era sustentada pela própria riqueza pro-duzida pelos colonos.

14 2 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

26 3 Idem, ibidem , p. 82.26 4 Idem, ibidem , p. 82-83.

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Neste sentido, podem-se colocar alguns instru-mentos tributários presentes no Brasil colonialalém dos conhecidos: Subsídio Voluntário, Subsí-dio Literário e Donativos, Terças Partes e Novos

Direitos dos Ofícios de Justiça e Fazenda.Em 1755, um violento terremoto destruiu amaior parte do centro de Lisboa. Este desastreocorreu dentro do governo de D. José I, que tinhacomo seu primeiro-ministro o Marquês de Pom-bal. Este não teve dúvidas quanto a quem penali-zar por um acontecimento nas terras do Reino: to-dos os colonos espalhados pelo vasto império por-tuguês, no mundo todo. Apesar da grandiosidadedesse império, a sua maior parte trazia mais gastosdo que renda para as finanças lusitanas. Apenas al-

gumas regiões africanas, que eram fornecedoras deescravos para o Brasil, rendiam o suficiente parabancar as despesas de uma administração custosa.Fora este espaço, somente uma colônia tinha po-tencial para arcar com o aumento da carga tributá-ria: o Brasil. Ou seja, os colonos de todos os espa-ços lusitanos deveriam colaborar com a reconstru-ção de Lisboa.

Assim, no ano seguinte ao do terremoto, os co-lonos do Brasil são informados de que seriamobrigados a pagar uma contribuição para custear areconstrução da capital do Reino, através do Sub-sídio Literário. Sobre este novo tributo, afirmaMauro Albuquerque Madeira:

O subsídio literário voluntário foi um impos- 

to e não um eufemismo criado para financiar 

a reconstrução de Lisboa destruída pelo terre- 

moto de 1755. Na Capitania de Minas foi 

cobrado a partir de agosto de 1756, do se- guinte modo: de cada escravo novo que entras- 

se pelos Registros de Minas Gerais: 4$800 

réis; de besta muar nova: 2$400 réis; de ca- 

valo ou égua nova: 1$200 réis; cabeça de 

gado vacum: 450 réis; barril de vinho ou 

aguardente do reino: 300 réis; venda de 

aguardente de cana fabricada no país: 1$200 

réis por mês, inclusive nas vendas dentro ou 

fora dos engenhos.

A cobrança deveria durar dez anos, mas acabou se prorrogando até1778. As câmaras munici- 

pais a contragosto se comprometeram com o pa- gamento de mais esse imposto. 26 7 

14 3m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

26 5 É importanteressaltar quejá haviamsido criadas Casas da Moeda no Brasil, conformeestas informações dão conta: “Casas da Moeda - Bahia. Criadaem8 demarço de1694, para cunhar moeda provincial para o Brasil, uniformizando-a eampliando o meio circulante. O Rei dePortugal abriu mão daSenhoriagem, tributo a ele devido, para facilitar o seu funcionamento, e determinou quea Casa da Bahia seguisseo regimento da Casa da Moeda deLisboa, no quefossepossível. Era dirigida por umProvedor, tambémJuiz da Casa da Moeda, queseria substituído nos impedimentos pelo Escrivão daReceita. A Casa da Moeda da Bahia foi instalada na Praça do Palácio, na CidadeAlta, no local ondefora a Alfândega, emprédio adaptado. As primeirasmoedas ficaramprontas em5 dejaneiro de1695. Sua letra monetária era ‘B’. Em1698 a Casa da Moeda encerrou suas atividades na Bahia, transferindo-separa o Rio deJaneiro. Só foi restabelecida em1714, mas desta vez coma cobrança da Senhoriagem. Funcionou durantemais deumséculo, encerrandosuas atividades em1830 esendo formalmenteextinta em1834. Em1803 tinha-sechegado a determinar sua mudança para Goiás, mas isso não ocorreu.

O prédio quea abrigava acabou por ser demolido no século XIX, construindo-seemseu lugar uma biblioteca pública. (...) Casa da Moeda do Rio de Janeiro - A Casa da Moeda da Bahia foi transferida para o Rio deJaneiro em1698, emobediência à Carta Régia de12 dejaneiro desseano. Em1700foi novamenteremovida, desta vez para Pernambuco, mas em1702 estava devolta ao Rio deJaneiro. E atéhoje, quasetrês séculos decorridos ainda estána ‘cidademaravilhosa’, conservando o mesmo nomeeas mesmas atribuições. Em1698, a Casa da Moeda, vinda da Bahia por mar, comseu pessoal eferramentas, foi instalada na rua Direita, atual Primeiro deMarço, no prédio dos armazéns da Junta deComércio, nas proximidades da ladeira deSãoBento. Ao voltar dePernambuco, em1702, novamenteseinstalou no mesmo local. Sua letra monetária era ‘R’. Junto coma Casa da Moeda, usando seupessoal einstalações, estabeleceu-se, em1703, uma Casa dos Quintos, para arrecadar o tributo daqueles quenão quisessemtrocar seu ouro por moedas. Tornando-seinadequadas as dimensões do prédio da Junta do Comércio, a Casa da Moeda transferiu-separa duas casas dos frades carmelitas, no Terreirodo Carmo, hojePraça XV. Isso ocorreu por volta de1707. Nas invasões francesas, a Casa da Moeda foi afetada deformas diversas. Em1710, travou-senas suas proximidades a principal batalha; vencidos os invasores, partedos prisioneiros foi recolhida à cadeia existentena Casa da Moeda. Na invasão deDuguay-Trouin, em1712, a Casa da Moeda foi obrigada a pagar a avultada soma de110:077$600 (cento edez contos, setenta esete mil e seiscentosréis), como partedo resgateda cidade. Alémdisso, foi pesadamentebombardeada, ficando inutilizadas as suas oficinas, o quea obrigou a suspender ostrabalhos por muitos meses. Em1743, o CondedeBobadela, Gomes FreiredeAndrade, edificou no local umnovo prédio, o imponentePalácio dosGovernadores. A Casa da Moeda ficou ocupando uma partedo térreo, voltada para a rua Direita. Já no século XIX, em1814, a Casa da Moeda mudou-separa o antigo rudimento deMuseu deHistória Natural, na rua do Sacramento, a famosa ‘Casa dos Pássaros’, quecompartilhou como Erário Régio.No período emqueestevena rua do Sacramento, a Casa da Moeda emitiu, pela primeira vez na América, selos postais, os célebres ‘olhos deboi’. Nesse

edifício, a Casa da Moeda ficou até1868, quando foi removida para o prédio próprio, especialmenteconstruído para ela na Praça da Aclamação, hojePraça da República. (...)”. Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

26 6  Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 83-84.26 7  Idem, ibidem , p. 110.

41. Olhos de boi, 1º selo postal brasileiro, gravados na Casa da Moeda do Rio

de Janeiro em chapas de cobre e emitidos nos valores de 30, 60 e 90 réis; 1843.

Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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Ou seja, na prática, cada morador das MinasGerais deveria arcar com os prejuízos de um aci-dente ocorrido na Metrópole. O interessante é quea Fazenda Real estabelecia uma cota para cada ca-pitania e esta deveria decidir como a arrecadaçãoseria realizada. No caso de Minas Gerais, essa taxarecairia sobre a entrada de mercadorias na região.Em outras áreas, a taxa era cobradaper capita . Aomesmo tempo, um imposto que deveria ser cobra-do por um determinado tempo acabava tendo oprazo inicial desrespeitado pela própria Coroa.

Assim, muitas dessa taxas foram sendo criadas e ofator motivador das mesmas deixava de existir, maselas continuavam sendo cobradas. Além da injusti-ça latente, a carga fiscal sempre aumentava, che-gando às raias do insuportável.

Porém, como o subsídio possivelmente seriacobrado através dos direitos de entrada na capita-nia de Minas e esta arrecadação estava nas mãosdos contratadores, a maior parte do que foi arre-cadado não chegou ao seu destino:

Pelo depoimento de Teixeira Coelho, deve ter havido arrecadação através de contratadores,

porquanto o Conde de Valadares, governador da 

Capitania de Minas Gerais, ‘conseguiu desco- 

brir quantias avul tadas que estavam em mãos 

particulares, as quais fez cobrar e recolher ao 

cofre da Real Fazenda, tomando contas às câ- 

maras que achou alcançadas’. E ‘para obviar à 

malícia dos povos e àomissão dos oficiais das 

comarcas, e para se evitarem para o futuro os 

ditos prejuízos, ordenou este governador que as 

câmaras se fizessem livros, para descreverem 

nele distintamente os nomes de todos os rendei- 

ros, e as quantias que pagassem, e que estes li- 

vros se apresentassem nas respectivas intendên- cias, ao tempo em que os tesoureiros das mes- 

mas câmaras fizessem os pagamentos de cada 

um dos quartéis do dito donativo; e ordenou 

também aos comandantes que lhe remetessem 

relações individuais dos rendeiros dos seus dis- 

tritos, para que, sendo conferidas pelos livros 

das câmaras, se pudesse averiguar a verdadeira 

soma do mesmo donativo’. 26 8

Em última instância, uma parte do que deveria

seguir em direção à Metrópole ficou nas mãos dealguns contratadores. Repetia-se a situação que setornou regra na esfera da administração colonial:

14 4 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

O Conde de Valadares, governador de Minas, buscando ‘por fim à malícia dos

povos e à omissão dos oficiais das comarcas’, ordenou que se fizessem livros para

que as intendências tivessem controle sobre rendas e donativos da capitania,

especialmente relativos aos diamantes.

42. Livro de registros de bilhetes passados para pagamento de jornais de escravos

à Real Extração de Diamantes, 1787. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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um funcionalismo desatento aos desvios de recur-sos do Erário metropolitano. Essa desatenção,como já se sabe, podia estar vinculada às práticascorruptas, tão comuns na época. Mas o desvio

dessa renda, como de outras tantas, também tinharelação com a desorganização e despreparo da ad-ministração colonial. O governador mencionadona citação acima sabia da necessidade de algumcontrole sobre o que era arrecadado para o subsí-dio voluntário. Daí a exigência de livros contábeismais especificados, que não misturassem recursosfiscais de várias origens, que dificultariam, sobre-maneira, o controle por parte das principais auto-ridades da Colônia.

Por outro lado, os desvios verificados na co-

brança desse tributo não significaram que poucofoi remetido para o fim que o havia criado:

O total das remessas do subsídio voluntário 

das câmaras de Minas Gerais para a Corte 

portuguesa, entre 1757 e 1778, segundo os 

dados de Teixeira Coelho, teria sido de 986 

contos e 12.188 réis. Com algumas diferen- 

ças, o autor da Memória Histórica da capita- 

nia de Minas Gerais apurou, para o período 

1757/ 1770, o valor de 705 contos e 

30.026 réis. 26 9

Mesmo com tantos desvios, não foi uma arre-cadação ínfima que chegou aos cofres lusitanos.Mais uma vez, parte da riqueza produzida no Bra-sil iria servir para resolver problemas de Portugal.Essa era a lógica da presença portuguesa em terrasamericanas, dentro da qual encontrava-se a estru-tura tributária. Não cabia aos colonos qualquer re-clamação mais sistemática, mas sim seguir os ca-

minhos já conhecidos da sonegação fiscal e docontrabando, práticas que permitiam que algunsbrasileiros não tivessem que contribuir com o en-riquecimento dos administradores portugueses.

Ainda com Pombal à frente do governo portu-guês, outro tributo foi criado, também recaindo,de uma maneira ou outra, sobre todos os colonos.Desde que assumiu o seu posto de primeiro-minis-tro de D. José I, o Marquês de Pombal tinha clare-za de que era preciso retirar qualquer influência

sobre o poder, em Portugal, de grupos sociais e re-ligiosos que, sem apresentar qualquer contribuiçãomais efetiva aos interesses do Estado português,ainda o prejudicavam. A Companhia de Jesus, Or-

dem dos padres jesuítas, enquadrava-se nesse cam-po. Agia em Portugal e nas suas colônias e maldava qualquer satisfação ao rei. Tinha uma série debenefícios, como a imunidade fiscal, além de dis-cordar de uma série de posturas coloniais, queatrapalhavam a exploração do Brasil; foi assim emrelação aos índios, que eram escravizados em vá-rias regiões da Colônia, mas que eram defendidos– ao menos em tese – pelos jesuítas. Não forampoucos os conflitos entre os grandes proprietáriosrurais e os jesuítas, por conta da defesa, por parte

destes, do cumprimento de leis que não permitiama escravização dos índios.

Na prática, os jesuítas haviam-se instalado naAmérica, tanto a portuguesa quanto na parte espa-nhola, e formavam estruturas à parte das adminis-trações coloniais das nações ibéricas. Ou seja, atra-vés das suas fazendas e das missões indígenas, es-ses padres acabaram fazendo surgir regiões quaseautônomas, sem maiores vínculos com as Coroasde Portugal ou Espanha. Essa extrema autonomia, juntamente com ações que prejudicavam os inte-resses pombalinos no fortalecimento do Estadoportuguês, aumentou as contradições entre o apa-relho estatal português e a Companhia de Jesus. Astensões só tendiam a se tornar cada vez maiores.Assim como Pombal já estava em confronto comos interesses de uma nobreza cortesã, que só sabiasugar os recursos do Erário público, também os je-suítas se defrontaram com a fúria do Ministro. Osreligiosos passaram a ser perseguidos e acabaramexpulsos de Portugal, assim como de todas as suas

colônias. Muitos desses jesuítas ainda acabaramencarcerados na Metrópole. Consequentemente,também foram expulsos do Brasil.

Além de cuidar da catequese dos índios, cabiaaos jesuítas a educação formal na Colônia. Ouseja, as poucas escolas que havia no Brasil nesseperíodo eram responsabilidade dos representantesda Companhia de Jesus. Assim, com estes fora doBrasil, a educação teria que passar para outrasmãos. O Estado português assumiu essa tarefa.

14 5m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

26 8 Idem, ibidem .26 9 Idem, ibidem, p. 111.

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Porém, esse ensino seria custeado pelos própriosbrasileiros, não com os tributos já existentes, masatravés de uma nova taxa, que seria criada para essefim. Tratava-se do Subsídio Literário. Inclusive,

essa taxa acabou por ter um caráter definitivo, poiso oferecimento da escolarização, ainda que precá-ria, seria permanente. Não é sem sentido que, mes-mo estando o Brasil já emancipado de Portugal,durante o século XIX, o Subsídio Literário conti-nuou a ser cobrado em várias regiões do país,mantendo a mesma denominação. Sobre o Subsí-dio Literário, afirma-se:

(...) foi um imposto criado para custear o ensino 

público (‘sustentação dos mestres régios’), em 

1773, e cobrado em Minas Gerais a partir de 1774. Rendeu, segundo a ‘Memória Histórica’,

de 1774 a 1779 e 1787, 34 contos e 40.689 

réis. Era cobrado sobre cada barril de aguarden- 

te de cana, nos engenhos: 80 réis; por cabeça de 

gado que cortasse nos açougues: 225 réis.

Ao que parece, não houve arrematação de con- trato para arrecadação desse imposto, que era 

cobrado pelas Câmaras Municipais e pela Jun- 

ta da Real Fazenda. Provavelmente o seu bai- 

xo valor não apetecia o instinto de lucro dos 

rendeiros. 27 0

Ainda entre esses tributos considerados poucoimportantes – mas que somados a tantos outrosacabavam exercendo um peso forte sobre as finan-ças dos colonos – havia os Donativos, Terças Par-

tes e Novos Direitos dos Ofícios de Justiça e Fa-zenda, que, mesmo não recaindo sobre toda a po-pulação, oneravam parte dos funcionários reais:

14 6  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

“(...) A Ouvidoria do Rio das Mortes, que estava pagando adiantado o donativo

daquele ofício, ao passo que, no triênio anterior, ficara devendo o donativo do

mesmo ofício que desempenhara em Sabará, onde tinha apresentado fiador. ”

43. Atestado de Ouvidor e Corregedor da Comarca do Rio das Mortes, 1777.

Ouro Preto, Museu da Inconfidência.

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Os oficiais de Justiça e Fazenda em geral rece- 

biam seus emolumentos e rendas das partes e 

demandantes. Eram escrivães de diversos tipos 

(da Ouvidoria, das execuções, dos feitos da Fa- 

zenda, da câmara, dos órfãos, da almotaçaria etc.), meirinhos, tabeliães, inquisidores, tesou- 

reiros dos ausentes, partidores, porteiros dos 

auditórios, procuradores de causas, alcaides e 

outros.

Esses ofícios às vezes tinham proprietários. Na 

maioria dos casos não tinham, e a sua serven- 

tia era provida pelo rei a ‘pessoas idôneas’, me- 

diante a obrigação destas de pagarem àCoroa 

‘donativos’, ‘terças partes’ ou ‘novos direitos’,

que eram impostos que tinham alguma analogia – mutatis mutandis – com o atual imposto de 

renda sobre rendimentos de serventuários ou profissionais autônomos ligados aos serviços 

 judiciários. 27 1

Apesar de ser um tributo específico para um se-tor da sociedade colonial – aliás, setor este marca-do por muitos privilégios –, certamente esta con-tribuição fiscal terminava por resvalar em outrossetores sociais, ainda que indiretamente. Sobre as Terças Partes, tem-se:

(...) eram um terço do rendimento do ofício, em 

geral arbitrado este rendimento pelo governador 

e pelo ouvidor da capitania. Deviam ser cobra- 

dos pelo almoxarife da Fazenda Real e remeti- 

dos para o Conselho Ultramarino, em Lisboa; 

o oficial provido devia apresentar fiança em ga- 

rantia do pagamento do tributo. 27 2

Ao mesmo tempo,

As serventias dos ofícios também podiam ser 

providas por ‘donativos’ para a Fazenda Real.

Os ‘governadores e mais pessoas a que perten- 

ce nomear serventuários’ passariam provimen- 

tos de preferência a quem oferecesse o ‘donati- 

vo’ mais elevado, e mediante fiança. Aquele de- 

veria ser pago ao fim de cada seis meses ao 

Provedor da Fazenda, que o remetia pelas fro- 

tas a Lisboa.

Em geral, os ofícios eram providos por um triê- nio e, em caso de falecimento do titular, o herdei- 

ro poderia sucedê-lo atéo fim do período. 27 3

Assim como em relação aos outros tributos,também esse era marcado pela sonegação; as difi-culdades que o fisco português tinha para recebê-lo, com o passar dos anos, só iam-se complican-do. Aproveitando-se das brechas da legislação, osarrematadores conseguiam burlar a frágil fiscali-zação das autoridades portuguesas instaladas na

Colônia:

Teixeira Coelho, apesar de elogiar o Conde de 

Valadares, seu patrono, por ter feito ‘crescer 

muitos donativos dos ofícios, pelo zelo com que 

se havia nas arrematações deles’, criticava- os 

como prejudiciais àboa administração da jus- 

tiça na capitania de Minas Gerais. ‘Os rema- 

tantes lançam às vezes quantias mais avultadas 

do que as dos rendimentos dos ofícios remata- 

dos’. Achava que se devia arbitrar um ‘donati - 

vo’ racional, adequado às receitas dos ofícios.

‘No ano de 1777 se estavam devendo àReal 

Fazenda de donativos e terças partes dos ofícios 

344:764$089 réis’, dívida cuja cobrança 

considerava impossível. 27 4

Como Teixeira Coelho não acreditava que es-ses valores seriam pagos ao fisco lusitano, cabiaao poder público evitar que as dívidas fossemavolumadas:

(...) o fundamental era que ‘os habitantes de 

Minas se não constituam devedores àReal Fa- 

zenda para o futuro.’ Para isso, era necessário 

que os serventuários pagassem sempre adianta- 

dos, ‘no princípio de cada um dos trimestres, os 

respectivos donativos dos ofícios que servi rem,

porque deste modo se evitam as execuções e as 

14 7 m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

27 0 Idem, ibidem .27 1 Idem, ibidem , p. 111-112.27 2 Idem, ibidem , p. 112.27 3 Idem, ibidem .27 4 Idem, ibidem .

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demoras na cobrança deste ramo de rendas 

reais.’ Ele citava como exemplo um escrivão da 

Ouvidoria do Rio das Mortes, que estava pa- 

gando adiantado o donativo daquele ofício, ao 

passo que, no triênio anterior, ficara devendo o donativo do mesmo ofício que desempenhara em 

Sabará, onde tinha apresentado fiador. E isto 

acontecia com quase todos. 27 5

De forma clara, Teixeira Coelho preferia que acobrança de obrigações fiscais atrasadas não caíssenas mãos dos aparelhos judiciais, pois a maneiracomo estes funcionavam fazia com que as execu-ções ficassem quase impossíveis, já que os proces-sos arrastavam-se por muitos anos. Daí a análise

de Mauro de Albuquerque Madeira:

Parece-me que a má-vontade contra os trâmi- 

tes judiciais e suas personagens – juízes, advo- 

gados, funcionários – era uma forma escapista 

de evitar a crítica do sistema fiscal como um 

todo, jogando-se a culpa do excesso de deman- das sobre o próprio aparelho burocrático- legal 

encarregado de dirimi- las. 27 6 

Inclusive, essas personagens ligadas ao aparelho judicial tinham sempre o interesse em que os lití-gios fiscais fossem multiplicados, pois, dessa ma-neira, as suas possibilidades de maiores ganhostambém tendiam a se multiplicar. A discussão, nocampo jurídico, de uma determinada dívida de umarrematador para com a Fazenda Real podia se es-

tender por muitos anos. Não só o réu da FazendaReal lucrava não pagando as suas dívidas enquan-to não se julgava o caso, mas também os advoga-dos se beneficiavam pela contratação dos seus ser-viços. Perdia, sim, a Fazenda Real, que demoravamuito para receber tributos acertados em contra-tos de arrematação. Isto é, quando conseguia rece-ber esses valores. Assim, a regra que imperou emrelação às questões tributárias, durante todo o pe-ríodo colonial, também aqui estava presente: cadacolono, dependendo do seu poder, fazia o que eranecessário, dentro da legalidade ou não, para evi-tar os abusos do fisco metropolitano.

Além das riquíssimas reservas de ouro, outraregião das Minas Gerais guardava um outro recur-so mineral também muito cobiçado pelo coloniza-dor português. Tratava-se dos diamantes, desco-bertos contemporaneamente ao ouro, só que maisao norte do atual estado de Minas Gerais, no lo-cal denominado de Distrito Diamantino. Apesarda presença de bandeirantes na região desde o fi-

nal do século XVII, a notícia da descoberta dessapedra preciosa só veio a público em 1729, o queprovocou, à semelhança da região aurífera, umdeslocamento populacional dos mais intensos.Nesta vila, porém, a violência das autoridadesportuguesas conseguiu exceder a todos os limitesaté então conhecidos. Viver na região dos diaman-tes significou ter a sua vida vigiada nos mais ínti-mos detalhes. Mais do que isso: o direito de vidae de morte dos habitantes estava nas mãos dasmais importantes autoridades da região. E como

14 8 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

27 5 Idem, ibidem , p. 112-113.27 6  Idem, ibidem , p. 113.

Os contratos de monopólio davam exclusividade ao contratador para exploração

de diamantes.

44. Bilhete da Casa da Administração Geral dos Diamantes, Tijuco, 1779;

cento e vinte oitavas. Intendência dos Diamantes e Real Extração. Rio de Janeiro,

Museu Histórico Nacional.

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não poderia ser de maneira diversa, morar no Dis-trito Diamantino significava ser controlado pelaação feroz do fisco lusitano. Este não demorou ase fazer presente:

De 1730, quando foi promulgado o primeiro 

Regimento referente àextração e distribuição dos 

diamantes, até1740, impuseram-se como co- 

brança do quinto o sistema de capitação e a ces- 

são de datas através do pagamento de taxas mí- 

nimas estabelecidas, quando não havia ofertas 

maiores. Estas taxas eram aumentadas arbitra- 

riamente, segundo a estimativa que a Coroa fa- 

zia da abundância de pedras, ou para coibir a 

exploração intensa das gemas e evitar a queda do 

seu preço no mercado europeu, o que implicou na suspensão de sua exploração nos anos 1734 a 

1737. 27 7 

Os mesmos mecanismos de arrecadação doouro utilizados nas Minas Gerais – só que comum grau de violência ainda mais severo – chega-ram rapidamente ao Distrito Diamantino 27 8 . Emum espaço como em outro, a lógica da ação tri-butária portuguesa mantinha-se intacta: era pre-ciso que o montante recolhido fosse sempre omaior possível. Nos momentos em que as auto-ridades fiscais sentiam que nem todo o potencialcontributivo de alguma região estava sendo ple-namente aproveitado, repensava-se, até com cer-ta agilidade, o esquema de cobrança de tributos.Esse repensar poderia também estar vinculado àsnecessidades monetárias mais imediatas da Fa-zenda Real da Metrópole. De qualquer maneira,é preciso deixar claro que, para os interesses docolonizador, não importava que o sistema de ar-

recadação fosse modificado com extrema fre-qüência. Importava, sim, buscar sempre a efi-ciência.

Dessa maneira, a prática da cobrança do Quin-to através da capitação, nos primeiros anos doDistrito Diamantino, foi logo modificada:

(...) procurando ter maior controle da explora- ção e escoamento dos diamantes, substituiu o 

antigo sistema pelo de contratos de monopólio.

Por ele, dava- se a exclusividade de exploração 

a um único contratador. O primeiro foi firma- 

do com João Fernandes de Oliveira, em 1740,

que o renovou por várias vezes, cedendo a ex- 

clusividade apenas durante os anos de 1749 a 

1752, para Felisberto Caldeira Brant. 27 9

Em função das relações estabelecidas entre o

fisco português e o contratador, a região dos dia-mantes viveu experiência diversa das verificadasnas regiões do ouro:

Pelo contrato, a procura de diamantes ficava li- 

mitada ao rio Jequitinhonha; não se permitiam 

mais de 600 escravos trabalhando na minera- 

ção, pagando cada um 230$000 como taxa 

anual de capitação; e dava aos contratadores 

plena soberania sobre a região e seus moradores,

ficando subordinados apenas àIntendência, mas 

contando com sua ajuda e apoio para enfrentar 

as resistências e protestos da população local. 28 0

Além disso, o fato de ser um espaço de menoramplitude e, ao mesmo tempo, um local onde a ri-queza poderia ser escamoteada de maneira maisfácil, fez com que a rigidez metropolitana se tives-se constituído de maneira mais rigorosa. A preocu-pação portuguesa com o Distrito Diamantino tor-nou-se tão significativa, que esse espaço foi prati-

camente isolado do resto da Colônia.Para essa região foi mandada uma força militarde elite, com homens geralmente vindos de Portu-

14 9m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

27 7  Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 242.27 8 O papel de organizador da região dos diamantes ficava nas mãos da Intendência dos Diamantes, commúltiplas funções: “(...) Órgão encarregado de

administrar o monopólio régio da mineração dediamantes, sediado no Serro Frio, emMinas Gerais. Foi criada pela carta régia de 30 deoutubro de1733einstalada em1734, ao mesmo tempo emqueseestabelecia a célebreDemarcação Diamantina, território de‘25 léguas emquadra’, ondea entrada ea saídadepessoas eramsubmetidas a rigoroso controleeno qual atéa mineração deouro foi proibida. A Demarcação era rodeada por umcinturão de‘registros’epequenos quartéis, para reprimir o extravio dediamantes. A administração era chefiada por umIntendente-Geral (habitualmente o Ouvidor da Comarca),auxiliado por umFiscal, umEscrivão, umMeirinho eumEscrivão do Meirinho. Em1771, a Intendência dos Diamantes foi integrada na Real Extração deDiamantes, sediada no antigo Tejuco, atual Diamantina, emMinas Gerais. A extração dediamantes atéessa data era feita por contratadores, entreos quaisforamcélebres Felisberto Caldeira Brant e João Fernandes deOliveira, pai e filho (esteamanteda famosa Chica da Silva). O cargo de Intendentedos

Diamantes subsistiu até 13 de maio de 1803, quando a lei dessa data o substituiu pelo Intendente Geral das Minas. A Intendência dos Diamantes,entretanto, só foi abolida pelo art. 23 da Lei de25 deoutubro de1832.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

27 9 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 242.28 0 Idem, ibidem .

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gal e auxiliados por capitães-do-mato – recaindosobre estes a escolha, por conhecerem bem cadapalmo de terra. Com toda esta fiscalização, a vidados colonos passou a ser controlada nos mais ínti-

mos detalhes. Tamanha vigilância objetivava que ariqueza da região não se perdesse nas mãos dos so-negadores e contrabandistas, assim como não fos-se desviada pelos escravos quando estivessem mi-nerando; dessa maneira, o trabalho dos escravosera sempre muito vigiado. 28 1

 Tendo o arraial do Tejuco se tornado o centroadministrativo do Distrito Diamantino, o con-trole do mesmo era exercido por um intendente,com poderes fiscais, judiciais e administrativos.Esse intendente tinha, como prerrogativa, total

autonomia, tanto perante a autoridade do gover-nador de Minas Gerais, como da do vice-rei daBahia. 28 2

Valia para a região dos diamantes a mesma ló-gica que sempre moveu a Fazenda Real lusa: cadaatividade econômica específica do seu principal es-paço de exploração colonial deveria render o má-ximo de tributos. Estes seriam cobrados sobre osprodutos locais, mas também sobre a entrada e asaída das outras mercadorias. Assim, no arraial do Tejuco, os portugueses ganhavam dinheiro com aprodução de diamantes, como ainda sobre cadaproduto de subsistência que ali entrava.

Por outro lado, todo esse aparato repressivoque recaía sobre o Distrito Diamantino não o im-pediu de se constituir num forte centro de contra-bando e sonegação fiscal. O excessivo controle fezcom que se aplicassem novos mecanismos paraburlar a Fazenda Real.

Conforme K. Maxwell, um sistema administrati-vo bem montado não garante, de saída, que não haja

corrupção ou que haja contenção de fraudes 28 3

, jáque é preciso levar em conta as pessoas que irãoexecutar determinadas deliberações. Além disso,havia sempre um crônico problema, que marcavaas relações entre o fisco português locado na Me-trópole e os representantes da Coroa lusa no Bra-sil: a separação física tão significativa resultava emcontrole fragilizado. Nesse sentido, as ilegalidades

frente às questões tributárias foram recorrentes naregião dos diamantes:

O Distrito Diamantino, meticulosamente regula- 

mentado pelas provisões de 1771, e sob direta responsabilidade apenas dos administradores e do 

tesoureiro lisboeta, tinha-se transformado em 

próspero centro de contrabandistas de diamantes.

Seguidamente, senão invariavelmente, os contra- 

ventores atuavam com a conivência dos funcioná- 

rios administrativos e dos militares locais. Alguns 

residentes de importância, como o Dr. JoséVieira 

Couto, por exemplo, cuja família se dedicava am- 

plamente ao furto e ao contrabando de diamantes,

destacava propositadamente escravos para as pa- 

trulhas militares, sem dúvida visando proteger seus interesses ilegais, jáque a condição social dos 

escravos-soldados os tornava completamente inca- pazes de sustentar as severas leis restr itivas do 

150 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

28 1 “Os escravos tinhamquetrabalhar curvados, defrentepara seu capataz, demodo a peneirar o cascalho nos alguidares. Eramobrigados a trocar delugares

freqüentementepara quefosseinútil esconder nas pedras ou na terra algumdiamanteencontrado.”Cf.: Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI eRicardoMARANHÃO, op. cit., p. 242.28 2 Idem, ibidem .28 3 Kenneth MAXWELL, op. cit ., p. 88.

No Distrito Diamantino, o controle fiscal, judicial e administrativo metropolitano

era muito rigoroso e a lavagem de diamantes era feita sob o olhar de feitores,

que vigiavam cuidadosamente os escravos.

45. John Ma we, V ISTA DE NEGROS LAVANDO DIAMANTES NO  RIO J EQUITINHONHA NO C ERRO DO F RIO,

1812; gravura. São Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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Distrito. As estritas regulamentações sobre a en- 

trada na região eram contornadas por licenças li- 

berais permitindo o trânsito de mascates importa- 

dores de cachaça. Tais licenças protegiam os co- 

merciantes ambulantes das atenções das patrulhas militares e a cachaça era um produto de permuta 

para barganhar diamantes roubados pelos traba- 

lhadores. 28 4

Não era apenas a contravenção do contrabandoque envolvia importantes pessoas no Distrito, mastambém outras modalidades de crimes. E nãoeram apenas os homens de prestígio que pratica-vam inúmeras ilegalidades:

Violando os regulamentos, uma grande classe de artesãos, integrada por alfaiates, sapateiros, mé- dicos de um ou outro tipo, taverneiros e afins,

permaneciam no distrito diamantífero. Devido a 

suas íntimas relações com os mineiros, tais ho- 

mens logo passaram a agir como intermediários 

dos contrabandistas, de quem recebiam dinheiro 

para a compra de pedras preciosas. Embora os 

funcionários fiscais do distr ito não se compro- 

metessem diretamente com o contrabando, mem- 

bros de suas famílias figuravam, muitas vezes,

entre os contraventores notórios. 28 5

A presença opressiva portuguesa na região dosdiamantes, vez por outra, não perdoou nem os cola-boradores mais próximos da Coroa lusitana, que ha-viam cometido alguma falha grave, segundo a óticada mesma Coroa. Falta grave, quase como regra, eratentar burlar o fisco metropolitano. Neste sentido:

Em 1752, Felisberto Caldeira Brant, senhor 

do terceiro contrato de diamantes, foi preso sob a acusação de fraudar a Coroa e levado a fer- 

ros para Portugal. 28 6 

Este ato da Coroa, de trancafiar um rico con-tratador de impostos, tratando-o como um crimi-noso igual a qualquer outro, revela quais as ques-tões centrais que moviam as ações de Portugal em

relação a essa rica região. Inclusive, com a medidacontra o antigo contratador, desencadeou-se umaforte onda de controle sobre a região, tornando-a,como já se afirmou, quase que completamente iso-

lada do resto da Colônia.Porém, é importante levar em conta que, setodo aparato legal e administrativo imposto pelaCoroa portuguesa não evitou os mais abusadosdesvios fiscais na região dos diamantes, em rela-ção, principalmente, ao recolhimento do Quinto –apesar de um controle quase absoluto –, isto nãosignificou que outros campos da ação tributáriaestivessem resolvidos. Inclusive em áreas fiscaiscom possibilidades de controle mais tranqüilas.Neste sentido, a inabilidade das autoridades fa-

zendárias na Colônia pode ser apresentada:

A Junta da Fazenda de Minas não era mais 

operante em suas outras atribuições: a contra- 

tação das receitas das capitanias, os dízimos e 

as entradas. Os pagamentos contratados atra- 

savam-se, por anos, em elevada proporção do 

montante ajustado originalmente; mui tas vezes 

atrasavam- se atéos anos depois de vencido o 

prazo do lançamento oficial. 28 7 

Não era uma operação que exigisse maioreshabilidades por parte da Junta da Fazenda, poisera um contrato estabelecido através de valorespré-fixados, em que, ao final deste, cabia ao con-tratador acertar as quantias anteriormente combi-nadas. Por mais que fosse uma situação de risco,os contratadores detinham uma série de garantias,inclusive com forças militares a seu serviço. Oscasos de devedores junto ao fisco mineiro se mul-tiplicavam:

João Rodrigues de Macedo, por seis anos contra- 

tante das entradas (a partir de 1776) em ju- 

nho de 1786 só pagara 298:664$798 réis do 

montante contratado de 766.726$612 réis.

João Rodrigues de Macedo foi também contra- 

tante dos dízimos, entre 1777 e 1783, pelo 

montante ajustado de 395.372$957 réis: até 

151m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

28 4 Idem, ibidem , p. 88-89.

28 5 Idem, ibidem , p. 89. Por exemplo: o padreOliveira Rolim, filho deumtesoureiro, aproveitava dessa condição familiar epraticava uma série deirregularidades,como o contrabando deescravos.

28 6  Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI e Ricardo MARANHÃO, op. cit., p. 273.28 7  Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 89.

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1786 somente um terço desta soma 

(100:272$952 réis) fora pago, o que lhe dei- 

xava um débito com a Junta da Fazenda de Mi- 

nas no valor de 763.168$019 réis: esta era 

uma soma correspondente ao triplo da receita 

oficial da capitania em 1777 e somente um 

pouco inferior a 17 vezes o valor anual do tri- 

buto de sal de todo Brasil no ano de 1776. E 

Rodrigues de Macedo não era uma exceção.  28 8

 João Rodrigues de Macedo é considerado, por

muitos estudiosos da história colonial, se não omais importante contratador da época, ao menoso que melhor sintetiza esse tipo de personagem.Foi uma das pessoas mais ricas da região mineira.Como se verá adiante, chegou a ser banqueiro dogovernador da capitania de Minas Gerais. Algunsdos seus dados biográficos são referências para secompreender o seu papel no que diz respeito àsquestões tributárias do final do século XVIII:

João Roiz de Macedo  28 9 surge na paisagem vi- 

larriquense em fins de 1775. Teria cerca de trinta e cinco anos, supondo que tenha nascido 

em Coimbra (c. 1730). ( ...) gente abonada,

pois o irmão Bento Rodrigues de Macedo, a seu 

pedido, pode assumir encargos vultosos em fa- 

vor de terceiros. (...) 

Antes de deslocar- se para Vila Rica, terátido 

próspero comércio no Rio de Janeiro, onde tem 

tio e primos enriquecidos, particularmente o 

primo Domingos JoséGomes, bem relacionado,

que João associa a seus negócios, divide com ele 

a administração dos contratos. (...) 

Ainda no domínio das suposições, écrer-se que tenha vindo para o Brasil com cerca de 10 anos 

de idade na companhia do provável tio, Des.

Antônio Roiz de Macedo, Provedor Geral da 

Real Fazenda na Capitania de Minas no tr iê- 

nio de 1741 a 1744 – o que explicaria pelo 

menos em parte dois aspectos de sua vida: o 

enorme prestígio de que usufrui e a sua forma- 

ção bem mais brasileira do que lusitana.

Além de amigo de D. Antônio de Noronha [ go- 

vernador de Minas Gerais] , João Roiz de Ma- cedo vem do Rio munido de financiadores con- sideráveis: o comerciante Antônio Gonçalves 

152 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

Residência do contratador João Rodrigues de Macedo, o mais importante

contratador da época, hoje Casa dos Contos, em Ouro Preto.

46. Casa dos Contos – Escola de Administração Fazendária , Ouro Preto.

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Ledo, sócio em múltiplos negócios, e Manuel Mendes de Oliveira, que lhe fizera empréstimo 

de grandíssima quantia, cuja liquidação fez nos anos sucessivos de 1776 e 1777. Em Minas,

associa-se a JoséAires Gomes, senhor de enor- mes terras no Caminho entre a Mantiqueira e 

a Borda do Campo. Em Vila Rica, encontra no Capitão-Mor JoséÁlvares Maciel um abaliza- 

do e competente conselheiro. Maciel fora caixa 

do rendeiro das entradas (1759-1761), Do- mingos Ferreira da Veiga, o qual abrangia a 

Capitania de São Paulo, onde estava relaciona- do com a melhor gente. Os saldos devedores 

desse contrato o haviam de aborrecer por mui- 

tos anos... 29 0

As dificuldades a respeito das primeiras rela-ções de João Rodrigues de Macedo com os con-tratos não o fizeram desistir desse tipo de inves-timento. Sua trajetória pelas regiões mineirascontinuaria:

Em 1761, transferiu- se para o Tejuco, como caixa do contrato de diamantes de João Fernan- 

des de Oliveira, o velho, função em que foi mal 

sucedido, deixando-a quando o Des. João Fer- nandes de Oliveira (o moço) tomou o contrato 

paterno e expandiu a fortuna a níveis nunca sonhados, tornando-se o homem mais rico de 

todo o império lusitano e um dos mais ricos do mundo. 29 1

E um dos biógrafos de João Rodrigues de Ma-cedo ainda coloca:

O poder econômico (ou a coragem financeira) de João Roiz de Macedo permite- lhe não só ar- rematar o contrato das entradas de Minas Ge- 

rais, mas no mesmo ato o das capitanias de São Paulo, Goiás e Mato Grosso!  29 2

Esse contratador tornou-se ainda mais represen-tativo por estar nessa posição quando a economia

mineira do ouro entrou em crise e a necessidade decobrar os impostos atrasados agitava as autoridadesligadas ao poder metropolitano. Além disso, estevemuito próximo a muitos dos conjurados mineiros,

mesmo sem qualquer participação no movimentode resistência ao colonialismo português. E, comoqualquer outro contratador, era muito amigo de im-portantes dirigentes nas Minas Gerais.

Daí compreender-se que o atraso em recolheraos cofres públicos da Fazenda Real o valor doscontratos não deve ser creditado a um possívelmero descaso dos contratadores, mas a uma sériede fatores. Talvez o mais significativo: as estrei-tas relações econômicas entre os contratadores e

as autoridades que representavam os interessesportugueses no Brasil. Ou seja, cada contratadordevia dar conta das suas dívidas ao governadorlocal, porém, na maior parte dos casos, havia ne-gócios entre eles. Assim como a própria caracte-rística do contrato engendrava os descaminhos:

Vaci lações e subornos na época dos contratos 

também eram previsíveis, mas os funcionários da Junta também recebiam consideráveis somas,

pelo sistema de propinas, em função dos contra- 

tos, tendo-as como contribuições perfeitamente legais a suas remunerações oficiais. O governa- 

dor de Minas, por exemplo, ganhava das propi- nas dos vários contratos de Minas uma quan- 

tia que alcançava a metade dos seus vencimen- tos oficiais, e o mesmo se dava com os magis- 

trados membros da Junta. 29 3

Vícios de origem acoplados a interesses con- junturais faziam com que a fraude e a corrupção

estivessem presentes no quotidiano do poder fis-cal das capitanias da Colônia. Aos contratadoresimportava protelar os pagamentos ao máximo;aos governadores só interessava cobrar de quemnão lhes davam benefícios. Em última instância,a ordem administrativa e econômica de várias re-giões coloniais brasileiras permitia e facilitava re-lações escusas entre fiscais e fiscalizados. Os con-

153m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

28 8 Idem, ibidem , p. 89-90.28 9 O contratador João Rodrigues de Macedo tambémé chamado de João Roiz de Macedo, como é o caso do trabalho de Tarquínio J. B. de Oliveira acerca da

correspondência ativa desse contratador.29 0  Tarquínio J. B. de OLIVEIRA, op. cit., p. 13-14.29 1 Idem, ibidem , p. 14.29 2 Idem, ibidem .29 3 Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 90.

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tratadores trocavam favores com os governadorese outras autoridades e funcionários públicos,num conluio de difícil detectação por parte dorei português. Assim, afirma Kenneth Maxwell

sobre esse problema:

Além de tudo, o sistema de propinas proporcio- 

nava uma cobertura ideal para o suborno e a 

corrupção, especialmente para homens como 

João Rodrigues de Macedo, que muitas vezes 

atuavam como banqueiros do governador e que,

invariavelmente, em suas atividades mercantis e 

negócios em geral, concediam facilidades credi- 

tícias aos ministros e funcionários da adminis- 

tração da capitania. 29 4

E os interesses não se limitavam a esses pontos:

A lassidão da Junta na cobrança das dívidas 

permitia que homens como João Rodrigues de 

Macedo usassem tanto os lucros contratuais quanto os montantes devidos em suas próprias 

especulações, enquanto o controle das receitas al- 

fandegárias feito por um dos maiores negociantes 

locais facilitava a manipulação e a evasão destes 

tributos em benefício pessoal dos interesses co- 

merciais de tais contratadores. Apesar da gritan- 

te evidência da maior eficácia da administração 

direta dos contratos pela Junta, e das muitas de- 

núncias do sistema feitas ao ministro, em Lisboa,

continuava o descalabro administrativo e admi- 

tia-se o acúmulo de atrasos dos contratantes. Por volta de 1788, somente quanto às entradas, o 

montante atrasado jáalcançava a impressionan- te cifra de 1.554.552$539 réis. 29 5

154 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

Ainda que “a fraude e a corrupção estivessem presentes no quotidiano do

poder fiscal das capitanias da Colônia”, documentos como estes tinham

validade legal.

47. Apólice de Dívida de 400$00, ao Sargento-Mor Antonio José da Costa,

assinada por Joaquim Francisco de Seixas Sotomaior, deputado da

 Junta da Rea l Faze nda, d e 16 de mai o de 1797. Ri o de Janeiro,

Museu da Fazenda Federal.

29 4 Idem, ibidem .29 5 Idem, ibidem .29 6  Idem, ibidem , p. 108-109.

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Portanto, a lógica portuguesa de explorar aomáximo, exaurindo as reservas monetárias dos co-lonos supostamente mais ricos, valia para alguns,geralmente os que estavam distantes do poder po-

lítico-administrativo da Colônia. Porém, nem porisso essa lógica de exploração deixou de aguçar amiséria da maior parte dos brasileiros, que, asso-ciada a outros fatores, fez com que uma série de re-beliões se espalhasse pelo Brasil. De uma maneiraou outra, essa lógica de exploração acabava sendoquestionada, mesmo que nem todos tivessem clare-za de como se montava a exploração de Portugal;até porque muitos dos colonos, como esses comer-ciantes – também contratadores –, detinham ga-nhos consideráveis mesmo numa ordem colonial;

aliás, principalmente por causa da ordem colonial.Muitas dessas mobilizações dos moradores do

Brasil colonial foram organizadas pelos setoresmais elitizados – como os senhores de terra e deescravo –, inconformados com a sanha tributáriados portugueses, que não lhes permitia um míni-mo de acúmulo de riquezas, que poderiam permi-tir que esse capital fosse reaplicado aqui no Brasil.Mas outros setores da sociedade colonial, maisdistantes das elites, também sentiram o peso daopressão metropolitana e, sempre que possível, serebelaram. A história do Brasil é recheada dessesmovimentos, que não estão restritos ao períodocolonial.

Para se dimensionar o que significava para amaior parte dos colonos a presença opressiva por-tuguesa – nos campos tributário e administrativo,especialmente –, vale a pena seguir um pouco oscaminhos seguidos por um desses colonos, numaviagem entre o Rio de Janeiro, capital da Colôniadesde 1763, e a região mineira:

O viajante atravessava a Baía de Guanabara 

em pequena embarcação atéa boca do Rio Inho- 

merim onde, no Porto de Estrela, um comboio 

de 70 mulas aguardava. Perto da fronteira da 

capitania o trem de mulas, subdividido em gru- 

pos de sete animais, para melhor vencerem as 

dificuldades da estrada e do cruzamento dos 

rios, era submetido àvistoria para cobrança de 

direitos, pelos agentes coletores de entradas.

Produtos secos – categoria compreendendo todas 

as mercadorias não comestíveis – pagavam a taxa uniforme de 1.125 réis por arroba e mo- lhados – comestíveis e bebidas – tinham de pa- 

gar a taxa de 750 réis por 2 a 3 arrobas de 

peso. Os comerciantes, em geral, tinham crédi- 

to, não pagavam a dinheiro – um fator respon- 

sável, em parte pelo estado de endividamento 

crônico dos contratantes das entradas. Na peri- gosa estrada sobre a íngreme Serra da Manti- 

queira, os comboios encontravam os destaca- 

mentos dos Dragões de Minas. Os cavalarianos 

– ostensivamente procurando contrabandistas 

de diamantes – seguidamente se dedicavam a 

suas próprias atividades especulativas. Depois 

de Igreja Nova (hoje em dia, Barbacena), local 

afamado por suas mulatas e persistentes prosti- 

tutas mulatas, o país mudava. Colinas ondu- 

ladas da zona chamada de campos apresenta- 

vam uma paisagem ampla, sem cobertura flo- restal contínua. Logo as elevadas montanhas da 

Serra do Espinhaço surgiam. 29 6 

Desta longa descrição, saltam aos olhos as difi-culdades que perpassavam o dia-a-dia de um mer-cador mais modesto, que não contasse com a pro-teção de um contratador ou qualquer outra pessoacom poder na Colônia. Soma-se a essas dificulda-des o fato dos perigos naturais, além dos muitosladrões de beira de estrada. Ao mesmo tempo, éinteressante a sistemática de cobrança sobre asmercadorias que entravam na capitania das MinasGerais, os direitos de entrada, que eram calculadosapenas pelo peso, sem nenhuma outra diferencia-ção, o que facilitava distorções graves; pois os va-lores agregados a cada mercadoria dependem mui-to pouco do seu peso. Porém, não era assim queentendia o fisco português.

155m i n e r a ç ã o e o a u g e d a ex pl o r a ç ã o c o l o n i a l

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“Pelos caminhos que Tiradentes patrulhava passava o contrabando do padre O liveira Rolim. Este padre ‘presenteava’ freqüentemente Tomás A ntônio G onzaga, juiz superior e delegado da Junta da Fazenda. Servia de intermediár io nas negociações D omingos de A breu Vieira, que, por sua

vez , entregava anualmente 4 0 oitavas de ouro a C láudio Manuel daC osta, seu advogado e sócio, para usar nos subornos.” 

 Júlio José C hiavenato

a c o n j u r a ç ã om i n ei r a e a d er r a m a

156  t r ibu t o s d o BRASIL COLo NI Al - 1500•18221ª Parte

A opressão tributária sobre os mineradores.

A taxação sobre o ouro não leva emconta a decadênciada mineração. A sonegação e as dívidas para como fiscoportuguês. A Derrama é uma ameaça. Os preparativosdo levante e sua motivação. A participação da elitee de Tiradentes na conjura. A nova ordemmundialna virada do século XVIII.

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Diante de um quotidiano marcado pela violên-cia institucionalizada, as parcelas populares ten-diam a se revoltar contra o Sistema Colonial, mes-mo sem clareza maior do seu significado, como já

se afirmou. Porém, parte considerável dessas mo-bilizações questionando a presença opressiva por-tuguesa no Brasil ainda se encontravam encober-tas pelo tempo, esperando pelo trabalho dos his-toriadores. Apenas alguns desses movimentos decontestação ao colonialismo português foramtransformados em História; inclusive, na maiorparte, transformados em História oficial, ou seja,servindo aos interesses mais conservadores,capazes de permanecer intactos dentro da socie-dade brasileira. 29 7 

Ao mesmo tempo, como foram poucas as rebe-liões coloniais estudadas a fundo, cultivou-se aidéia, por sinal equivocada, de que a populaçãobrasileira, mesmo sendo alvo das mais terríveis ex-periências de exploração, pouco se dispôs a lutarcontra essa situação. Trata-se de outro mito, cons-truído ainda a partir de interesses conservadores,sempre desejosos de identificar o brasileiro com oamorfo ou inerte. A História do Brasil mostrauma situação muito diferente.

Neste sentido, é preciso compreender que omovimento de contestação ao colonialismo portu-guês, ocorrido a partir da ação de importantes ho-mens da elite mineira no século XVIII, não deveser considerado o mais importante movimento quebuscou se contrapor ao domínio português. Po-rém, para este trabalho, trata-se de uma experiên-cia significativa, pois o que fundamentou a revoltade parte da elite mineira foi a questão fiscal. Osníveis de exploração em relação aos tributos torna-ram-se insuportáveis. Assim, olhar para os aconte-

cimentos de 1789 tem o objetivo de verificarcomo uma política tributária, sem qualquer tipode preocupação com o contribuinte, pode chegar amobilizar não apenas os setores populares – nor-malmente marcados pelas exclusões mais amplas –,mas parcelas das elites.

Passados dois séculos, a polêmica acerca dessemovimento continua. A começar pela forma comoele tem sido denominado. Longe de ser uma ques-tão menor, o nome dado a um evento histórico

pode ser revelador. Assim, tem-se:

Durante décadas, os historiadores reproduzi - 

ram em suas obras o termo Inconfidência Mi- 

neira, desprezando o emprego da expressão 

Conjuração Mineira.

E por que a denominação Conjuração Mineira 

émais adequada do que a usualmente utiliza- 

da Inconfidência Mineira? 

O que ocorreu em Minas Gerais não foi um ato de infidelidade dos colonos para com Portugal ou seu soberano, mas sim um projeto de liber- 

tação para o Brasil, que contou com a partici- 

pação de um grupo de pessoas dispostas a pôr 

fim ao domínio colonial que Portugal exercia 

sobre o país. (...) Traidores, ou inconfidentes,

esses homens o foram segundo a ótica das auto- 

ridades coloniais. Como brasileiros, não pode- 

mos continuar a explicar a História do Brasil 

de acordo com a perspectiva dos europeus. 29 8

Mas a Conjuração Mineira não deve ser com-preendida apenas como reflexo mecânico da opres-são tributária, mas dentro de um contexto maior,como o Iluminismo, a Revolução Industrial, a In-dependência das Treze Colônias, entre outros.Como é preciso estar atento para os acontecimen-tos relativos à dinâmica da economia aurífera du-rante o século XVIII, assim como para a estrutu-ra de poder que se estabeleceu nessa mesma época

e região.Conforme dados já apresentados acerca da pro-dução de ouro em Minas Gerais no século XVIII,foi a partir da segunda metade desse século que amineração atingiu o seu auge e, consequentemen-te, iniciou o seu momento de declínio. Para o go-

157 a c o n j u r a ç ã o m i n e i r a e a d e r r a m a

29 7  A História oficial, por exemplo, dedica-sea cultuar os rebeldes queparticiparamda Conjuração Mineira, inclusivetirando dessemovimento o maior “herói”nacional, como severá adiante. Porém, poucos anos depois, deu-seummovimento tambémdecontestação ao colonialismo português, agora na Bahia, aConjuração dos Alfaiates ou Baiana. Esta, senão foi completamenteesquecida pela historiografia oficial, não merecemaiores referências. João deDeusNascimento, Manuel Faustino dos Santos, Lucas Dantas eLuís Gonzaga das Virgens, pela participação no movimento baiano, foramcondenados aoenforcamento eesquartejamento. Quemconheceesses homens eseus destinos? Quemsabeo queeles fizerampara quetivessemdeseguir o mesmo caminho

queT iradentes? Sea Conjuração Mineira tevea participação majoritária da elitebranca mineira ecolocava as questões sociais emsuspenso, o mesmo nãoaconteceu comos baianos, talvez protagonistas do primeiro movimento queassociava o caráter social coma luta contra o colonialismo. Esqueceu-sedosconjurados baianos, edemaneira proposital.

29 8 RubimSantos Leão deAQUINO et alii, op. cit., p. 7.

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verno de Portugal, o reflexo foi imediato: os ren-dimentos tributários da região estavam diminuin-do. Isto em si não era uma novidade. Sempre queisso acontecia, atribuía-se ao fato de os mecanis-

mos de cobrança de impostos não estarem adequa-dos para um determinado momento. Jamais passa-va pela cabeça dos dirigentes coloniais que a pro-dução poderia estar realmente em declínio, que asminas passavam por um normal processo de esgo-tamento.

Na lógica portuguesa, o problema tinha outrofundamento: havia aumentado a sonegação fiscal.Os colonos brasileiros estavam encontrando cami-nhos no sentido de burlar a Fazenda Real. Era pre-ciso coibi-los. E mais: mesmo que a produção au-

rífera estivesse em decadência, esta não era umaquestão que coubesse ao governo metropolitanoresolver. O poder colonial entendia que este espa-ço tinha uma série de obrigações fiscais para comPortugal, portanto, não caberia qualquer contesta-ção a um aperto nos impostos, não importando sea ganância lusitana estivesse gerando a ruína doscolonos das Minas Gerais. Importava, sim, aosportugueses, manter a saúde de uma economia queapenas caminhava para a completa dependênciadiante do poderoso capitalismo inglês.

Além da imposição de novos tributos, sempreretirando riquezas que as elites mineiras tinhaminteresse que ficassem na própria região, algo ater-rorizava cada um dos devedores da Coroa portu-guesa – principalmente aqueles que deviam verda-deiras fortunas e que não tinham qualquer inten-ção de se desfazer dos seus patrimônios para pagarao fisco metropolitano. Havia a forma violentacom que esses devedores eram chamados a cumprirsuas obrigações para com a Fazenda Real. O con-

fisco de bens era inaceitável para pessoas que seconsideravam tão importantes. Jamais admitiriamreceber o tratamento dado aos setores populares.Sentiam-se, não com pouca razão, como integran-tes do poder nas Minas Gerais. Apesar de algunsconflitos com autoridades burocráticas fiéis ao reiportuguês, exerciam cargos importantes em MinasGerais, assim como em outras capitanias.

Especificamente em relação à Conjuração Mi-neira, havia a questão dos impostos atrasados.Desde a época do Marquês de Pombal existia uma

nova sistemática tributária: a Colônia deveria re-meter 100 arrobas de ouro como imposto a cadaano. Sempre que a arrecadação não atingisse essa

cifra, a diferença seria contabilizada para uma co-brança posterior. Quando o valor devido chegassea um patamar que o fisco português considerasseinaceitável, a cobrança era feita pelo sistema que

recebeu o nome de Derrama.No ano de 1789, o valor de impostos atrasadoshavia atingido níveis significativos e começaram acircular boatos em Minas Gerais, de que o gover-nador da capitania estava preparando a decretaçãoda temida Derrama. Mais do que isso: Lisboa ha-via mandado esse novo governador para MinasGerais exatamente com a tarefa de cobrar os im-postos atrasados. A Derrama era temida por setratar de uma cobrançasui generis , já que caracteri-zada pela violência dos responsáveis pela ação.

Como numa batalha de guerra, as tropas militaresportuguesas cercariam as regiões que deveriam pa-gar tais impostos. Os cobradores entrariam emcada casa com a assistência dos militares.

Com o avolumar desses boatos de decretaçãoda Derrama, que havia sido suspensa em 1773,parte da elite colonial, vinculada à mineração econcentrada entre Minas Gerais e Rio de Janeiro,passou a se organizar no sentido de se defender daviolenta cobrança fiscal. Em relação ao ano de1789, os impostos atrasados atingiam a incrívelquantia de 596 arrobas de ouro. Os números eramassustadores. A paciência desse grupo social haviachegado ao seu limite. Assim, fortemente influen-ciados pelos acontecimentos internacionais ante-riormente citados, uma conjuração começou a serdiscutida. Como se tinha clareza da impossibilida-de de qualquer negociação com os interesses me-tropolitanos, achou-se o caminho da emancipaçãopolítica, como já haviam feito as Treze Colôniasda Inglaterra na América do Norte em 1776.

Além do projeto histórico de romper qualquerlaço com Portugal, planejava-se para Minas Ge-rais: a organização de uma universidade em São João Del Rei e o desenvolvimento das manufatu-ras, a partir da constituição do regime republica-no. Quanto ao problema da escravidão, não existeentre os historiadores convergência sobre o que se-ria feito. Fala-se de conjurados que eram a favor daabolição do trabalho compulsório, porém, como amaior parte dos rebeldes era de grandes proprietá-rios de escravos, parece pouco provável que esta

posição fosse consensual. 29 9

Para uma compreensão maior dessa conjuração,vale conhecer um pouco mais sobre as pessoas que

158 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

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levaram o movimento adiante. É possível estabele-cer uma ordem de importância para os conjura-dos, dividindo-os em quatro grupos distintos  30 0 ,a saber:

O primeiro grupo engloba os conjuradosatuantes, ou sejam, aqueles que mais fizeram paraa ocorrência do levante, colocando-os na linha defrente dos acontecimentos. Eram eles:

1. Alferes Joaquim Joséda Silva Xavier, o Tiradentes 

2. Doutor JoséÁlvares Maciel 

3. Tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade 

4. Padre Carlos Corrêa de Toledo e Melo 

5. Padre Joséda Silva de Oliveira e Rolim 

6. Coronel Inácio Joséde Alvarenga Peixoto 

7. Coronel Francisco Antônio de Oliveira Lopes 8. Sargento-mor Luís Vaz de Toledo Piza 9. Tenente-coronel Domingos de Abreu Vieira  30 1

Este grupo dos mais atuantes, com exceção de Tiradentes, pertencia à elite mineira, muitas ve-zes ocupando cargos de confiança da Coroa por-tuguesa.

 Já um segundo grupo era constituído por pes-soas que eram consideradas pelas suas ligações comas letras e a literatura, que teriam papéis relaciona-dos à elaboração dos textos legais da região quan-do da conquista da emancipação política. Mastambém ligadas a importantes cargos públicos,além de advogados de contratadores, a maior partecom problemas com a Fazenda Real. Tratava-se dosdoutores Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antô-nio Gonzaga e do Cônego Luís Vieira da Silva.

Um terceiro grupo era formado pelos conjura-dos que tiveram pouco envolvimento com a ação deresistência à opressão lusitana. Aqui se colocam o

doutor Domingos Vidal de Barbosa, o padre Ma-noel Rodrigues da Costa, o capitão José de Rezen-de Costa e seu filho homônimo.

Finalmente, havia o grupo dos que, mesmo sa-bendo da ação de conjuração, não a denunciaram àsautoridades responsáveis pelo governo portuguêsem Minas Gerais. Faziam parte desse grupo:

1. Doutor Salvador de Carvalho do Amaral Gurgel 

2. Padre Joséde Oliveira Lopes 

3. Coronel JoséAires Gomes 

4. Antônio de Oliveira Lopes 

5. Capitão João Dias da Mota 6. Vicente Vieira da Mota 

7. João da Costa Rodrigues 

8. Alferes Vitoriano Gonçalves Veloso 

9. Fernando JoséRibeiro 

10. JoséMartins Borges  30 2

Entre os conjurados mais atuantes, sem dúvida, Tiradentes é o único que representava os setoresnão-elitizados da sociedade mineira. Era um alfe-res, baixa patente das forças militares sediadas na

Colônia. Além disso, trabalhava como um práticodentista – sabia arrancar dentes e fazer próteses –,daí o seu apelido; ou seja, estava vinculado ao tra-balho manual, coisa que causava espanto paraaquela elite colonial escravocrata, que consideravatrabalho coisa de negro. Ao mesmo tempo, apesardo posto de alferes, nunca atingiu cargos de maiorimportância social.

159a c o n j u r a ç ã o m i n e i r a e a d e r r a m a

29 9 Quasetodos os conjurados eramproprietários deescravos, o queera normal para a época emquestão. Porém, alguns deles não detinhampoucos escravos.Francisco Antônio deOliveira Lopes era dono de69; JoséAires Gomes, 116 eInácio JosédeAlvarenga Peixoto, 132.

30 0 Esta classificação está estabelecida emRubimSantos Leão de AQUINO et alii, op. cit., p. 67.30 1 Idem, ibidem .30 2 Idem, ibidem .

48. Relógio de algibeira, século XVIII, Londres, Inglaterra; prata, 0,052g. Pertenceu

a Joaquim José da Silva Xavier, Tiradentes, arrolado no seqüestro de seus bens.

Ouro Preto, Museu da Inconfidência.

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Demonstra-se a situação social destes conjura-dos através de poucas informações disponíveis.Inácio José de Alvarenga Peixoto estudou na famo-sa Universidade de Coimbra e exerceu uma série de

atividades públicas no Brasil e em Portugal. Che-gou a ser ouvidor em São João Del Rei  30 3. Francis-co Antônio de Oliveira Lopes era fazendeiro e mi-nerador, além de também comandar a CavalariaAuxiliar de São João Del Rei. Também Domingosde Abreu Vieira tinha alta patente militar, além defazendeiro e administrador do Real Contrato dosDízimos. Tomás Antônio Gonzaga foi ouvidor emVila Rica, atual Ouro Preto; ocupou vários cargospúblicos, inclusive o de provedor das Fazendas. JáCláudio Manuel da Costa, também formado em

Coimbra, foi secretário de governo da capitania deMinas Gerais por vários anos. “Vicente Vieira daMota tinha o posto de capitão das Ordenanças emMinas Novas e guarda-livros do contratador JoãoRodrigues de Macedo”. 30 4

Outro conjurado importante, que esteve àfrente das principais decisões da rebelião, foi opadre José da Silva de Oliveira Rolim. Alguns da-dos sobre esse personagem – ligado à produçãode diamantes no Distrito Diamantino – são sig-nificativos:

O Padre Joséda Silva de Oliveira Rolim, filho 

do segundo caixa (tesoureiro) de diamantes,

ocupava- se pessoalmente – com impressionante 

gama de subterfúgios – com a garimpagem em 

 áreas proibidas atéa importação ilegal de escra- 

vos. Surpreendido por um funcionário da ad- 

ministração, ele entregava somente uma parte 

da produção total que considerava suficiente 

para cobrir a parte que escondia para si. 30 5

Nem de longe é possível falar numa rebeliãocom caráter popular. Porém, também não é possí-vel deixar de destacar o papel exercido nesse pro-cesso por Tiradentes. Ao contrário dos seus com-panheiros conjurados, não era um grande proprie-tário e lutava com dificuldades para sobreviver naregião mineradora. Sobre ele, afirma-se:

Nascido na Fazenda Pombal, na época perten- 

cente ao termo da Vila de São Josédel Rei 

(atual Tiradentes), e que hoje integra o muni- 

cípio de Ri tápolis, Tiradentes tentou um pouco 

de tudo na vida: minerador, tropeiro, dentista.

Em agosto de 1787 licenciou- se para ir ao Rio 

de Janeiro tratar de assuntos pessoais e comer- 

ciais (ambicionava solucionar o problema do 

abastecimento de água na cidade através da ca- 

nalização de córregos). 30 6 

Existem outros relatos sobre a vida pessoalde Tiradentes, os quais inclusive ressaltam tersido a sua vida sempre recheada de fracassos em

quase todos os aspectos. Num desses relatos,temos:

Joaquim Joséda Silva Xavier foi batizado em 

12 de novembro de 1746, data geralmente 

atr ibuída ao seu nascimento. (...) Era o quar- 

to filho entre sete irmãos. Dois deles foram pa- 

dres e um capitão de milícias. Seus pais eram 

pequenos fazendeiros, de instrução mediana.

Órfão aos onze anos, foi viver com o padrinho,

um dentista que o iniciou na profissão. (...) 

Tudo tentou e quando as coisas não davam cer- 

to, voltava a arrancar dentes. Hátestemunhos 

de que ele era bom nisso: fazia extrações sem 

dor e ‘ornava a boca de novos dentes, feitos por 

ele mesmo, que pareciam naturais’, como disse 

frei Raimundo de Penaforte.

Vida dura: aos 14 anos o adolescente Joaquim,

de aspecto enfezado, trabalhava pelos sertões nas 

tropas de carga, com destino ao Rio de Janeiro ou Bahia. (...) Em 1767, portanto aos 21 anos, já 

comerciava por conta própria, com tropa de mu- 

las, atendendo encomendas e mascateando.

Também usava umas ‘águas mi lagrosas’, que 

trazia do Rio, curando feridas e achaques. Até 

pequenas cirurgias não eram problema. Sabia 

160 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

30 3 Ainda sobreIgnácio JosédeAlvarenga Peixoto, afirma-se: “(...) umbrasileiro (...) quecompusera fastidiosos poemas emhomenagema Pombal esua família,foi nomeado ouvidor (magistrado real superior) da comarca deRio das Mortes, em Minas Gerais. Tratava-sede posição por ele mesmo escolhida,especificamente, porquetinha amplos interesses (terras emineração) no sul da capitania.”Cf.: Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 64.

30 4 RubimSantos Leão deAQUINO et alii, op. cit., p. 69.30 5 Kenneth MAXWELL, op. cit., p. 89.30 6  RubimSantos Leão deAQUINO et alii, op. cit., p. 59-60.

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manipular ervas e aplicava emplastros. Chegou 

a ser sócio de um padre numa botica, perto de 

Rosário, em Vila Rica.

(...) 

Em 1781, aos 35 anos, foi nomeado coman- 

dante do Destacamento do caminho do Rio.

Devia vigiar a serra da Mantiqueira, foco de 

bandidos que assaltavam os viajantes e saída de 

contrabando de ouro e pedras preciosas. 30 7 

 Talvez Tiradentes pudesse ser colocado no roldos conjurados que mais estivessem vinculados aoidealismo de ver a separação de uma parte do Bra-

sil de Portugal. Foi o mais ativista dentre os quelutavam contra a opressão da Metrópole. Comosempre realizava viagens em direção ao Rio de Ja-neiro, aproveitava e propagava a revolta contraPortugal abertamente, para quem quisesse escutar.Essa atividade revolucionária iria prejudicá-loquando do julgamento; havia várias testemunhasque o ouviram falar em rebelião.

Por muito tempo foi visto como um partici-pante menor, que nem sequer conhecia os planosda rebelião integralmente; assim como foi vistocomo o mais ignorante entre tantos letrados. Po-rém, hoje se sabe que Tiradentes estudava a Cons-tituição dos Estados Unidos, sempre buscandoquem pudesse traduzi-la do inglês. Também é pre-ciso pensar que esse rebelde criou vínculos com arebelião contra a tirania portuguesa por motivospessoais. Talvez acreditasse que o único caminhoque lhe restasse, numa vida pautada por muitosfracassos, fosse participar de uma rebelião, que, sevitoriosa, poderia lhe render alguns benefícios.

Interessantemente, Tiradentes é consideradoum herói nacional  30 8. Vale ressaltar que a idéia de Tiradentes, enquanto herói, faz parte de uma sutilconstrução, já que este personagem foi quase es-quecido por um século. Como republicano, Joa-

quim José da Silva Xavier não poderia ser lembra-do quando da efetivação do processo de emancipa-ção política em 1822, pois a construção do Esta-do Nacional brasileiro, a partir desse evento, veio

através de uma monarquia. Seria, portanto, contra-ditório, para essa forma de governo, cultuar um re-publicano. Assim, a partir de 1870, quando o mo-vimento republicano passa a se organizar no Bra-sil, foi preciso encontrar algum personagem histó-rico que pudesse servir de base para a luta contraa Monarquia. 30 9 Encontrou-se um homem que,cem anos antes, por lutar contra a opressão colo-nial, fora morto por ordem de D. Maria I, bisavóde D. Pedro II, que era o imperador do Brasil.

Pouco se sabia sobre Tiradentes. Porém, para

quem deseja construir um herói, nada melhor doque isso. A ausência de informações sobre o alferes,que ousou resistir aos desmandos lusitanos e quefora capaz de assumir a sua participação na con- juração, permitiu que se criasse uma infinidade decaracterísticas para o homem que acabava de serconsiderado herói nacional. Porém, se em histórianão existem heróis, também Tiradentes não podeser colocado nesta condição. Na verdade, o alferes,que tanto circulou pelas Minas Gerais, foi umhomem do seu tempo, com experiências que poucose assemelham às de um herói de fato, se esteexistisse.

Para a construção de Tiradentes, não forampoupados elogios. Como muito pouco se sabia so-bre a sua vida antes da Conjuração Mineira, o su-posto título de herói lhe cabia. Porém, com as no-vas pesquisas historiográficas que foram surgindo,descobriram-se outras facetas da vida desse perso-nagem, que possibilitaram novas explicações parase compreender o motivo de um envolvimento tão

significativo na rebelião contra o poder português.Sabe-se hoje que o mesmo Tiradentes, lutandopelo estabelecimento de uma política fiscal umpouco mais justa, esteve envolvido com a cobran-ça de tributos quando exerceu o cargo de alferes:

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30 7   Júlio José CHIAVENATO, op. cit., p. 25-26.30 8 Emuma pesquisa feita, emmeados dos anos 80, entreestudantes do ensino fundamental emédio, constatou-sequeexistiamheróis brasileiros equeo mais

reconhecido era exatamenteTiradentes, colocando-seà frente deD. Pedro I, D. Pedro II, Princesa Isabel, Antônio Conselheiro, Zumbi, entre outros.Coloca-seTiradentes, entreoutros méritos, como o mártir da emancipação política do Brasil. Ver Paulo MICELI, O M ito do Herói N acional, p. 18-32.

30 9 Sobrea criação deTiradentes enquanto herói, afirma Júlio JoséChiavenato: “Em1882 os republicanos criaramo ClubeTiradentes, cultuando seu herói acada 21 deabril, mas écoma proclamação da República queseoficializa o herói. Em21 deabril de1890, 98º aniversário da sua morte, houvea primeira

grandefesta oficial, commarchas cívicas etc. Nestedia o marechal Deodoro da Fonseca presidiu uma solenidadequetevecomo orador Silva Jardim.Começaramentão a erigir estátuas ea financiar a historiografia quemitifica o herói. O ápicedessa construção deumherói dá-seno regimemilitar de1964,como a lei 4.897 queo torna patrono da nação brasileira eo decreto 56.168, queobriga quesua imagemtenha semprea barba que lembra Jesus Cristo.”Cf.: Júlio JoséCHIAVENATO, op. cit., p. 83.

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Neste posto por nomeação da rainha, teria co- 

mandado a patrulha do Caminho Novo, que li- 

gava Minas ao Rio de Janeiro. Por aíera 

transportado o ouro das minas, o que exigia vi- 

gilância constante contra assaltos, desvios e ne- gros fugidos amotinados: uma tarefa muito su- 

perior às possibilidades da pequena patrulha 

comandada pelo alferes. 310

Ou seja, o mesmo Tiradentes, que se opôs à ex-ploração fiscal portuguesa, exerceu função no sen-tido de garanti-la. A população mineira, que seutilizava do Caminho Novo – estrada criada noinício do século XVIII entre Rio e Minas, a qualpermitia que se chegasse à região mineradora em

15 dias, quando nos caminhos anteriores essa mes-ma viagem chegava a durar mais de dois meses –,sentia a forte opressão metropolitana visível poreste caminho. Aliás, a sua criação ligava-se direta-mente às intenções portuguesas de evitar qualquerdesvio na arrecadação fiscal. Inclusive, o alferes Ti-radentes era reconhecido pelos seus superiorescomo um eficiente executor das ordens do contra-tador e das autoridades de Minas Gerais:

Cabe destacar o trabalho profissional de Tira- 

dentes, enquanto comandante de destacamento, e 

o apreço que lhe tinha João Roiz de Macedo, por 

sua eficiência e honorabilidade.

Em carta dirigida ao Alferes Comandante Joa- 

quim Joséda Silva Xavier, em Sete Lagoas, diz 

o contratador: ‘Foi-me muito estimável a de 

Vm. em me participar das novidades que têm 

acontecido nesse sertão a respeito dos prejuízos 

que se têm seguido ao rendimento do Contrato,

de que fico a Vm. muito e muito obrigado. O 

Anspeçada Felix Saraiva leva ordem de S. Ex- cia. respeito ànova guarda e quartel que se há 

de fazer naquela picada; e quando forem os sol- 

dados necessários, espero de Vm. que em tudo 

obre como tem mostrado o seu zelo. 311

Mais uma vez, vale a clareza de que Tiradentesera um homem do seu tempo, portanto, tinha queter um meio de sobrevivência, mesmo que este fos-se questionado por ele mais tarde. Ainda que o al-

feres não trabalhasse diretamente para o governoportuguês e sim para contratadores. Mas tambémse sabe que as ligações entre os contratadores e aFazenda Real eram as mais amplas possíveis, mal

havendo uma separação mais clara de interesses.Ao mesmo tempo, como comandante da patru-lha do caminho que ligava Minas ao Rio de Janei-ro, os problemas com a imagem de Tiradentes co-meçavam a aparecer. O papel estratégico desse ca-minho, que levava à rica região das minas, envolviafortes interesses, desde os dos contrabandistas,passando pelos dos contratadores, além obviamen-te, do fisco português. Assim, trabalhar nesta ati-vidade significava, quase como regra, estar ligado aum número grande de complicações. Até porque o

contrabando, atividade considerada ilegal, era pra-ticado com a maior tranqüilidade por amplos se-tores da sociedade mineira. Ou melhor, nem todospoderiam burlar o fisco, enquanto que os contra-tadores o faziam sem maiores danos:

(...) a maioria dos ricos contrabandeava. Era a 

forma de escapar aos impostos. Como havia gen- 

te poderosa envolvida no contrabando, os Dra- 

gões de Minas fingiam não ver a contravenção,

limitando-se a perseguir os bandidos notórios e 

deixando escapar certas comitivas, protegidas 

pelo próprio governo. 312

Ou seja, o contrabando não era eficazmentecombatido, principalmente porque as autoridadesque deveriam evitar a sua ocorrência estavam liga-das a interesses muitas vezes escusos. E, de fato,eram pessoas de muita importância em Minas Ge-rais que tiravam benefícios da sonegação fiscal:

Pelos caminhos que Tiradentes patrulhava pas- sava o contrabando do padre Oliveira Rolim.

Este padre ‘presenteava’ freqüentemente Tomás 

Antônio Gonzaga, juiz superior e delegado da 

Junta da Fazenda. Servia de intermediário nas 

negociações Domingos de Abreu Vieira, que, por 

sua vez, entregava anualmente 40 oitavas de 

ouro a Cláudio Manuel da Costa, seu advoga- 

do e sócio, para usar nos subornos. 313

162 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0•18 221ª Parte

310 Paulo MICELI, op. cit., p. 44.311 Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 121.312  Júlio José CHIAVENATO, op. cit ., p. 27.313 Idem, ibidem .

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Eram importantes homens de Minas, que esti-veram envolvidos com a Conjuração Mineira. Pes-soas que estavam dentro do círculo de poder naColônia e se utilizavam dessa aproximação paraaumentar seus patrimônios, sem qualquer cerimô-nia. Indiretamente, Tiradentes, como se afirmou,participava dessas tramóias, mesmo sendo um ele-mento menor dentro de uma engrenagem podero-sa. Por outro lado, essa situação só poderia sermantida enquanto as autoridades superiores da re-gião fossem coniventes:

Mas chegou o novo governador Cunha Mene- zes. Não que ele fosse honesto: apenas seu grupo entrou no negócio, desalojando os anti- gos. Assim, muitos militares e funcionários que lucravam com o contrabando foram afas- tados e por isso, ofi cialmente, soube-se que eram subornados. 314

Cunha Menezes 315 era verdadeiramente odiadopelos letrados que haviam perdido os antigos pri-

vilégios. Seu governo era marcado por um sem-nú-mero de arbitrariedades, tudo em nome dos seusinteresses, como dos seus próximos. Daí ter sidosatirizado por uma obra poética apócrifa – Cartas 

Chilenas –, de autoria ainda não definitivamente re-solvida. Alguns estudiosos mantêm a dúvida: seriade Tomás Antônio Gonzaga ou de Cláudio Ma-

nuel da Costa? Ou de ambos? Não faltava a essesrepresentantes da elite mineira capacidade paraproduzir crítica tão ácida.

E foi no contexto de resistência à violência donovo governador que, mais uma vez, a figura de Tiradentes apareceu:

Os Dragões, descontentes, começam a falar em liberdade. Mas o novo governador percebe que estão despeitados com a perda dos subornos. É quando afirma-se que Tiradentes recebeu di- 

nheiro para deixar passar o contrabando de Joaquim Silvério dos Reis e Rodrigues Macedo.(...) Tiradentes era protegido de Abreu Vieira, o provável intermediário do ‘negócio’ e o próprio Silvério dos Reis em depoimento disse que era seu ‘amigo’.  316 

Essa acusação fez com que Tiradentes sofressemais um revés na sua vida já muito conturbada.Perdeu o cargo de comandante, passando a exercerpapéis pouco relevantes na sua tropa, deixando de

lado qualquer ilusão de subir na hierarquia militar.Continuaria, parece que definitivamente, um relesalferes. Isto é, se não houvesse uma significativatransformação na ordem legal em Minas Gerais. Talvez por isso a ligação de Tiradentes com aConjuração Mineira. Mais do que os destinos deuma região colonial cansada da opressão de Portu-

163a c o n j u r a ç ã o m i n e i r a e a d e r r a m a

314 Idem, ibidem .315 SobreCunha Menezes, assimcomo os outros nobres quetinhamcargos deconfiança da Coroa portuguesa, afirma-se: “Os nobres, esses vêmao Brasil, para

governá-lo, mandar, fornicar, desmandar, como umCunha Menezes, umCondedeAssumar, ou deumValadares, comdata para voltar ao Reino econtinuara carreira ociosa defidalgos.”Cf.: Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit ., p. 38.

316   Júlio JoséCHIAVENATO, op. cit., p. 27.

Vila Rica foi palco dos acontecimentos políticos da Conjuração Mineira,

deflagrados pela decretação da Derrama.

49. Armand Pallière, V ISTA DE  V ILA RICA, cerca 1820; óleo sobre tela. Ouro Preto.

Museu da Inconfidência.

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gal, os sucessivos fracassos na vida pessoal do alfe-res parecem tê-lo feito procurar um caminho maisradical para dar cabo de tamanhas humilhações.Seria possível que, num governo nascido daquelaelite mineira, a vida de Tiradentes pudesse dar umsalto de qualidade.

Vale ressaltar que os problemas do Alferes Joaquim José da Silva Xavier não estiveram limi-tados ao campo profissional. Nesse, os fracassossomavam-se aos obtidos na sua vida pessoal:

Não era levado a sério pelos homens do seu tempo. Isso devia magoá-lo. Os da sua classe riam dele abertamente, por essa mania de repú- blica. Os companheiros de conspiração temiam sua indiscrição. Os poderosos debochavam da 

sua capacidade de organizar qualquer levante.O governador Cunha Menezes chamava-o de ‘mariola’ e ‘tagarela’. 317 

Mal poderiam seus contemporâneos imaginarque um homem que andava com a Constituiçãodos Estados Unidos debaixo do braço, que era ummilitar de baixa patente, que freqüentava bares depouca reputação, poderia falar sério quando se re-feria à luta contra o poder explorador do coloni-zador português. Porém, sua vida pessoal ainda

guardava outros momentos difíceis:

Com as mulheres também não deu certo. Pare- ce que gostava das bem novinhas. Antonia Ma- ria do Espírito Santo processou-o e nos autos consta que ele a seduziu ‘com promessas de ca- 

samento, debaixo das quais lhe roubou sua pu- dicícia’.

Mas a menina, de 16 anos, não era tão ino- cente, pois só cedeu às promessas e foi para a cama depois que ele a presenteou com uma es- crava grávida. Assim mesmo, ele usou de vio- lência para retirá- la da casa da mãe, em 1786: portanto, játinha 40 anos, não foi ‘ar- roubo de juventude’.

No ano seguinte, Antonia Maria deu àluz uma menina, que recebeu o nome de Joaquina.Ele mal viu a fi lha porque viajou para o Rio.Voltou 18 meses depois e ficou fur ioso ao des- cobrir que a inocente mocinha teve outros ho- 

mens durante a sua ausência.  318

Esse episódio ainda renderia mais complica-ções para o alferes. Fez questão de tomar de voltaa escrava que havia presenteado com seus íntimosinteresses. “Mas em 1789 Tiradentes foi preso e aFazenda Real confiscou seus bens, entre eles a es-crava e sua cria. Antonia Maria entrou na justiça:queria recuperar a escrava e sua cria, e provou comdocumentos que elas haviam sido doadas pelo Ti-radentes. Mas a promotoria anulou a doação, ale-

gando que ela foi feita por motivos torpes, ou seja,para que Tiradentes tivesse a menina em suacama.” 319

Dessa maneira, as frustrações pessoais, profis-sionais e econômicas de Tiradentes devem ser leva-

164 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

317  Idem, ibidem , p. 30.318 Idem, ibidem .319 Idem, ibidem . Este autor ainda fala sobreuma possível filha deT iradentes: “A historiografia oficial informa sobreoutra mulher, Eugênia Maria deJesus,

comquemTiradentes teria umfilho, João deAlmeida Beltrão. Beltrão, sobrenomedisfarçado para não incidir sobreo menino a ‘infâmia’ lançada contra opai. Os seus descendentes atéhoje recebemuma pensão do Estado. Mas Sérgio Faraco, em A lgu m a V erd ad e, contesta a versão oficial: ‘Eugênia era apenas a

irmã mais velha deAntonia Maria e, portanto, cunhada do alferes.’Mas deixa uma brecha: embora o cadeteJosédeAlmeida Beltrão tenha reconhecido omenino João deAlmeida como seu filho, podeser ‘queo reconhecimento tenha sido uma farsa e, nas noites outonais de1786, o brioso JoaquimJoséandassea colher frutas maduras decama emcama emcerta casa na periferia deVila Rica...’”Cf.: Júlio JoséCHIAVENATO, A s V ár ia s Fa ces d a I n con fi dên cia M in eira ,p. 30.

32 0 Os rebeldes mineiros tinhamumprograma político:“1. Estabelecimento da capital da República emSão João del Rei;2. Criação deuma casa da moeda efixação do câmbio para 1$500 réis por oitava deouro;3. Abolição das restrições legislativas quepesavamsobreo Distrito Diamantino;4. Liberação das manufaturas;5. Estabelecimento defábrica depólvora;6. Libertação deescravos emulatos nascidos no Brasil;7. Fundação da UniversidadedeVila Rica;8. Abolição do exército permanenteesua substituição por uma milícia nacional decidadãos;9. Criação deparlamentos locais eumcentral;10. Tomás Antônio Gonzaga governaria os três primeiros anos, ao fimdos quais haveria eleições;11. Perdão das dívidas extensivo a todos.”

Cf.: Luiz KOSHIBA eDeniseManzi FrayzePEREIRA, op. cit., p. 79.

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das em conta quando se busca compreender o seuenvolvimento no movimento que muitos enten-diam ser premente para romper os laços coloniaiscom os lusitanos. De fato, o alferes envolveu-se decorpo e alma na Conjuração Mineira.

Mas, o idealismo e o ativismo de Tiradentes,sozinhos, não foram capazes de efetivar a sonha-da rebelião, levando-a à vitória. Os rebeldes esti-veram atentos a muitos detalhes 32 0 – inclusive de-senharam a bandeira da região autônoma do jugoportuguês (hoje a bandeira do estado de MinasGerais) –, porém, não gastaram muitas energiascom as questões mais concretas de uma ação mi-litar. Além do mais, a eclosão do movimento de-pendia de uma ação do governador de Minas Ge-rais, que decretaria a Derrama. Com essa atitude,acreditavam os conjurados, parcelas consideráveisda população mineira iriam se revoltar, já que otemor da cobrança violenta dos impostos atrasa-dos era latente.

O Visconde de Barbacena, governador de Mi-nas Gerais desde 1768, mesmo sem saber que arebelião teria como motivo imediato a Derrama,tinha consciência das dificuldades econômicasda região. Não ignorava que o endividamentocom a Coroa atingia sobremaneira a elite minei-

ra. Dessa maneira, por mais estranho que possaparecer, percebeu que qualquer efetivação da co-brança de dívidas antigas poderia trazer algumaconturbação para a sociedade mineira. Evitou,ao máximo que pôde, decretar a violenta cobran-ça de impostos.

Apesar de defender os interesses portuguesesem terras brasileiras, Barbacena tinha um mínimode sensibilidade política. Não queria ser respon-sabilizado por qualquer desordem que pudesse vira ocorrer nos seus domínios. Assim, mesmo antes

do movimento ser denunciado, o governador deMinas Gerais suspendeu a Derrama. 32 1 Os rebel-des não tinham mais fator que desencadeasse a re-volta.

Porém, mesmo depois de Barbacena ter cance-lado a Derrama e de saber dos planos dos conju-

rados, recebeu a delação por escrito de JoaquimSilvério dos Reis, o conhecido traidor. Ele fezmais do que trair: fez questão de que as autorida-des portuguesas em Minas Gerais o reconheces-sem como o primeiro delator. 32 2 Isto porque a de-lação no Brasil-Colônia era regiamente compensa-da pela Coroa. Tradição reforçada pelo Tribunalda Santa Inquisição. Havia benefícios materiais,como o recebimento de uma pensão anual. Nocaso da delação de alguma pessoa para a Inquisi-ção, por exemplo, tinha-se direito sobre parte dosbens do denunciado. Sobre o delator Joaquim Sil-vério dos Reis, são poucas as informações:

(...) nasceu em Leiria, em Portugal, em 1756.

Era coronel da Cavalaria de Milícias e contra- tador dos direitos de entrada na Capitania de Minas. Possuía fazendas, com mais de 200 es- cravos, no Arraial da Igreja Nova da Borda do Campo, hoje a cidade de Barbacena.

Em 1789 devia a soma de 200.423$000 à 

Fazenda Real, 149 referentes ànão-prestação de contas do contrato de contratador no triênio de 1782 a 1784.  32 3

Ou ainda:(...) apelidado de Joaquim Saltério e pelas próprias autoridades portuguesas considerado ‘doloso, frau- dulento e falsificador’ e tendo ‘um caráter disposto para qualquer maldade’, não hesitou em seguir os caminhos mais abjetos para atingir seus fins. Baju- lou, mentiu, traiu, recorreu a embustes e astúcias para obter títulos, cargos, pensões e rendas. 32 4

 Joaquim Silvério dos Reis foi contratador de

tributos para a Coroa. Devido a essa função, tinhauma dívida imensa para com o fisco português.Sabia que, com a Derrama, seria fatalmente atingi-do, perdendo todos os seus bens. Não resta qual-quer dúvida quanto ao seu ato de traição aos con- jurados: precisava do perdão das suas dívidas. Bus-

165a c o n j u r a ç ã o m i n e i r a e a d er r a m a

321 Sobreesta questão, afirma Mauro de AlbuquerqueMadeira: “A cegueira ideológica atingeo ponto máximo de incompetência política emMartinho deMello eCastro, ao querer, em1788, extrair as cemarrobas deouro, via derrama, duma colônia mineradora emfranca decadência. (...) o fiel letrado TeixeiraCoelho teveo bomsenso decombater essa proposta, emnomedos interesses da própria Coroa Portuguesa. Se tivessesido empreendida a derrama, aInconfidência Mineira teria tido boas chances deêxito.”CF.: Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, op. cit., p. 51.

32 2 Em25 defevereiro de1791, obteveuma declaração do ViscondedeBarbacena atestando queele, Silvério dos Reis, era o primeiro denunciante.32 3 RubimSantos Leão deAQUINO et alii, op. cit., p. 78.32 4 Idem, ibidem , p. 116.

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cou o caminho mais fácil. A recompensa não de-morou a chegar:

Foi beneficiado por dois atos régios, em outubro de 1794. Por decreto real de 4 daquele mês concedeu- lhe o hábito da Ordem de Cristo com 200$ de tença. Tença era uma pensão concedi- da a alguém por serviços prestados. Dez dias após, D. João, em nome da rainha D. Maria I ,mandava levantar seqüestro dos bens daquele traidor feito pela Fazenda Real pela dívida de 167.533$700.

A 20 de dezembro de 1794 obteve a concessão do título de ‘fidalgo da Casa Real, em foro e moradia’, assim como a nomeação para tesou- 

reiro-mor da Bula da Santa Cruzada de Mi - nas Gerais, de Goiás e do Rio de Janeiro.(...) Com a Corte portuguesa járesidindo na cidade do Rio de Janeiro, foi premiado, em 4 de agosto de 1808, com a pensão anual de 400$000.  32 5

 Joaquim Silvério dos Reis morreu no Maranhãoem 1818. Como nunca deixou de ser marcadocomo o delator da Conjuração Mineira, precisou vi-ver naquela capitania escondendo a sua identidade.

Porém, é preciso deixar claro que Silvério dosReis não foi o único delator do movimento de Mi-nas Gerais. Outro delator foi Inácio Correia Pam-plona, que também recebeu uma série de benefícios:

Com a proteção do Visconde de Barbacena li- vrou-se de comparecer aos tribunais, ganhou muito dinheiro fornecendo víveres às tropas aquarteladas em Minas Gerais, tendo morrido em uma das suas fazendas, perto de São João del Rei. Era o ano de 1810. 32 6 

Um terceiro nome também participou da de-lação:

(...) Basílio de Brito Malheiros do Lago. Con- 

tinuou seus negócios escusos, como contrabandis- ta, assassino, chantagista e estelionatário. 32 7 

Se, por um lado, as autoridades portuguesasforam atenciosas para com os delatores, o mesmonão poderia acontecer em relação aos conjurados.Eles haviam cometido um crime inaceitável paraa Coroa portuguesa; a punição deveria ser a maisviolenta e severa possível. As penalidades varia-ram de caso a caso. Alguns foram inocentados ea maior parte, condenada. Entre os condenados,

166  t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

32 5 Idem, ibidem , p. 117-118.32 6  Idem, ibidem , p. 119.

32 7  Idem, ibidem .

Dos reús da Inconfidência Mineira,

só Tiradentes foi condenado à forca,

ainda que todos os envolvidos

tivessem atentado contra a Coroa

portuguesa.

50. Sentença da rainha D. Maria I

 AUTOS DE  DEVASSA DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA,

volume original, sétimo e último

(fls.93 e 93v), 1792. Ouro Preto.

Museu da Inconfidência.

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23 foram degredados. Quase uma dezena foicondenada à morte. Porém, ao mesmo tempo emque as penas eram anunciadas, todas elas foramcomutadas para o degredo perpétuo. Houve ape-

nas uma exceção: Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.Este não apenas foi condenado à morte; deve-

ria morrer enforcado – por ser a morte mais hu-milhante possível para a época – e o seu corpo,esquartejado, sendo as partes colocadas em umponto na estrada entre o Rio de Janeiro e MinasGerais, local em que o alferes tantas vezes pre-gou a rebelião contra o colonialismo português.Enfim, seguindo uma tradição da época, o corpode Tiradentes, um condenado, deveria ser macu-

lado, desrespeitado o quanto possível. Além dis-so, os seus bens seriam confiscados e a sua casaem Vila Rica, destruída e salgada, além de seusdescendentes serem considerados infames porvárias gerações.

Mas uma pergunta fica no ar: por quê apenas Tiradentes acabou sendo a vítima da pena capi-tal, se ele não era o único nome importante daConjuração Mineira? Na verdade, é possível pen-sar no processo que julgou os conjurados comouma farsa. O fato de as penas terem sido comu-

tadas com extrema velocidade revelava que o go-verno português não tinha intenção de executartodos os envolvidos. Ao mesmo tempo, na con-cepção da Coroa portuguesa, o crime era por de-mais grave para que a pena não fosse pesada. Erapreciso deixar claros os limites de atuação doscolonos e que o governo da Metrópole jamaisadmitiria qualquer contestação ao seu domínio.Para tanto, exigia-se um exemplo forte.

Ao mesmo tempo, esse exemplo forte nãopoderia recair sobre pessoas de muito prestígio

na Corte, inclusive aquelas que já tinham exer-cido cargos de confiança do rei. Muitos dosconjurados tinham influências dentro da Corteportuguesa. Essa influência não permitia quemuitos fossem tratados com a violência deseja-da pelas autoridades coloniais. Assim, de qual-quer maneira alguém precisaria servir comoexemplo.

A pena capital acabou recaindo sobre Tira-dentes. Havia razão para isso. Ele era o menosilustre dos conjurados, tinha um cargo de alferes,

de baixa patente militar. Não tinha qualquerprestígio, tanto aqui no Brasil como em Portu-

gal. Ao mesmo tempo, foi o único réu que assu-miu a sua participação no movimento. Não sepode ignorar, ainda, que Tiradentes tinha contrasi vários testemunhos – inclusive dos próprios

conjurados –, já que tinha a tarefa de ser o pro-pagador das idéias de revolta. Dessa maneira,tudo se encaixava dentro dos desígnios portu-gueses: um homem precisa ser condenado à mor-te e Tiradentes tinha esse perfil bem definido.

Como se afirmou em outro momento, não épossível considerar a Conjuração Mineira comoo mais importante movimento de contestação aocolonialismo português. Ocorreram outros mui-to mais radicais, como a Conjuração dos Alfaia-tes, em 1798, na Bahia, com a participação dos

setores populares e com uma repressão aindamais brutal. Porém, a rebelião organizada emMinas tinha vínculos fortes com a questão fiscal.A Derrama atingiria todos os habitantes da capi-tania, não se limitando aos que estivessem liga-dos diretamente à extração aurífera; cada mora-dor teria que contribuir com o pagamento dosimpostos atrasados. Ao mesmo tempo, a Derra-ma assustava os mais ricos moradores de MinasGerais, pois, como antigos contratadores, de-viam verdadeiras fortunas ao fisco lusitano. Tan-

to isso é verdade que Joaquim Silvério dos Reisdelatou a rebelião exatamente dez dias depoisque foi chamado à Fazenda Real, para ser comu-nicado de que teria de pagar a sua dívida o maisrápido possível.

Mais uma vez, a questão tributária atrapalha-va a vida dos colonos. A cada dia sentia-se maiso peso do colonialismo português. Este, longede pensar na arrecadação fiscal como um meca-nismo de levar benefícios aos colonos do Brasil,via na cobrança de impostos um meio de arcar

com as suas crescentes dívidas para com a Ingla-terra. Esse ímpeto metropolitano não diminuiuapós o desmantelamento da Conjuração Mineira.Assim como antes, toda a exploração fiscal con-tinuaria ainda por muito anos.

Por outro lado, esta exploração sobre a popu-lação colonial não se restringia aos tributos rela-tivos ao ouro. O morador das Minas, por exem-plo, tinha uma carga fiscal grande, principalmen-te no que se refere ao imposto sobre as mercado-rias que entravam na região. E a quantia arreca-

dada não era nada desprezível, como os dadosseguintes podem comprovar:

167 a c o n j u r a ç ã o m i n e i r a e a d e r r a m a

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Anos Rendimentos Anos Rendimentos 

1718 13:537$678 1747 191:066$479  

1719 55:134$720 1748 191:058$391  

1720 55:134$720 1749 191:034$128  

1721 65:071$102 1750 191:034$128  

1722 93:880$240 1751 192:585$596  

1723 93:880$240 1752 197:239$600  

1724 94:744$808 1753 197:239$600  

1725 97:388$480 1754 198:921$544  

1726 97:388$480 1755 203:967$333  

1727 94:751$369 1756 203:967$333  

1728 86:990$038 1757 181:535$379  

1729 86:990$038 1758 114:239$519  

1730 89:259$991 1759 195:739$519  

1731 96:069$851 1760 195:739$519  

1732 96:069$851 1761 195:739$519  

1733 104:944$060 1762 195:881$000 

1734 131:566$612 1763 195:881$000 

1735 131:566$612 1764 195:881$000 

1736 138:274$580 1765 203:438$420 

1737 158:398$546 1766 182:294$470 

1738 158:398$546 1767 182:294$470 

1739 162:420$458 1768 166:630$853 

1740 174:486$319 1769 125:638$908 

1741 174:486$319 1770 125:638$908 

1742 174:502$478 1771 125:638$908 

1743 174:550$958 1772 166:660$173 

1744 174:550$958 1773 168:099$010 

1745 178:679$838 1774 169:632$796 

1746 191:066$479 1775 156:788$732 

FONTE: Cálculo dos rendimentos das entradas da CapitaniadeMinas Gerais desdeo seu princípio atéo ano de1776, apresentado por Teixeira Coelho na “Instrução para o Governo da Capitania das Minas”,RIHGB, vol. XV, p. 413. Apud Mafalda P. ZAMELLA,O Abastecimento 

da Capitania das Minas Gerais no século XVII I , p. 232-234.

A partir desses dados, é possível inferir que aarrecadação fiscal não recaía apenas sobre o ouro.A quantidade de recursos advindos da circulaçãode mercadorias para Minas Gerais não era nadadesprezível. E além do Quinto e dos direitos deentrada e saída, outros tributos também deveriamser pagos pela população da capitania. Porém,como já se observou anteriormente, mais do que opeso da carga tributária, recaía sobre os moradoresde Minas Gerais, assim como de outras regiões daColônia, a forte violência do sistema de cobrançadesses tributos. Tinha-se a violência da injustiçado tributo em si, juntamente com a violência doscontratadores, arrematadores, dos responsáveis,entre outros, pelas Casas de Fundição, pelos Re-gistros, pelas passagens de rios, pela arrecadação

fiscal e dos governadores. Neste sentido, comoafirma Savério Mandêtta, viver no Brasil Colonialnão era muito fácil:

As guerras externas com franceses, ingleses, ho- landeses e espanhóis, as internas com o gentio (...) prolongando-se por longos anos a fio; o acentuado espírito de aventura daqueles que para estes lados do Atlântico se atufavam deses- peradamente nas empresas mais arriscadas e perigosas, àcata de ouro e pedras preciosas, dos 

tesouros de que tanto se falava: a completa e exagerada autonomia conferida aos serviços da Real Fazenda bem como o excesso de autorida- de concedida aos seus serventuários; a exorbi- tância e imoderação dos tributos a provocar distúrbios, sublevações e revoltas; (...) o mono- pólio do sal; a instabilidade do sistema admi- nistrativo; as impertinências e interferências ilícitas e intempestivas do clero na política (...) ; e o interesse da Corte em exigir insacia- velmente grandes riquezas, mediante severíssi- 

mo sistema tributário (...)  32 8

Por outro lado, é preciso ter dados acerca doquanto os contratadores deviam para a FazendaReal na capitania de Minas Gerais. São númerosque permitem que se perceba o porquê de tanto te-mor por parte das elites mineiras. Vejamos:

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32 8 Savério MANDÊT TA, op. cit., p. 508-509.

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(em contos de réis) 

I nício-Triênio Contratador Contrato Arrematação Débito em  (e propinas) set/ 1786  

10/ 1727 Francisco Ferreira de Sá entradas 110:466$800 1:150$382  

07/ 1747 Manoel Ribeiro dos Santos dízimos 276:114$000 9:310$846 10/ 1751 JoséFerreira da Veiga entradas 591:718$802 145:005$529  

10/ 1754 JoséFerreira da Veiga entradas 617:999$000 165:207$336  

07/ 1756 João de Souza Lisboa dízimos 214:010$040 18:903$802  

07/ 1762 João de Souza Lisboa dízimos 231:635$040 119:835$005  

07/ 1765 Adm. Pela Fazenda Real dízimos 261:300$665 -- -  

01/ 1759 Domingos Ferreira Veiga entradas 593:067$150 85:402$592 

01/ 1762 João de Souza Lisboa entradas 589:242$000 258:757$847  

01/ 1765 Antonio JoséR. Tenebres passagens 6:615$500 2:242$897  

01/ 1765 Antonio JoséR. Tenebres passagens 202$000 145$486  

01/ 1765 JoséNunes de Mello passagens 156$550 83$288  

07/ 1765 Tomás Ferreira Carvalho dízimos (sertão) 16:160$000 11:434$749 

01/ 1767 Manoel G. Heleno passagens 578$329 379$235  

01/ 1768 Luís Caetano de Moura passagens 1:616$000 1:076$114  

01/ 1768 Luís Caetano de Souza passagens 8:080$000 742$061  

07/ 1768 Ventura F. Oliveira dízimos 190:265$241 11:768$219  

01/ 1771 Henrique Dias Vasconcelos passagens 673$332 490$428  

07/ 1774 Pedro Luís Pacheco Cunha dízimos 190:235$541 87:964$327 

01/ 1776 João Roiz de Macedo entradas 766:726$612 466:454$840 a 12/ 81 (2 tr iênios) 

08/ 1777 João Roiz de Macedo dízimos 395:378$957 283:607$121 a 12/ 83 (2 triênios e 5 meses) 

01/ 1784 Domingos de Abreu Vieira dízimos 197:867$375 196:699$302 

01/ 1778 Manoel JoséBarbosa passagens 30$300 20$200  

01/ 1783 Valentim JoséCarvalho passagens 909$000 710$960  

01/ 1782 Joaquim Si lvério dos Reis entradas 355:612$000 220:423$149 

01/ 1784 Bonifácio Pereira Veloso passagens 1:212$000 1:212$000  

01/ 1784 Francisco Nunes Braga passagens 1:111$000 1:111$000  

01/ 1784 Francisco Nunes Braga passagens 31$805 31$805  

01/ 1785 JoséPereira Marquês entradas 375:812$000 360:897$638 (a vencer em jan/ 1789) 

01/ 1786 Manoel SáFortes Nogueira passagens 10:201$000 10:201$000 

01/ 1786 Felizardo Cardim Barbosa passagens 919$100 919$100  

FONTE: CombaseemOscar deOLIVEIRA, Os Dízimos Eclesiásticos do Brasil – nos períodos da Colônia e do Império , Belo Horizonte,UniversidadeMinas Gerais, 1964, p. 199 a 205, eAnuário do Museu da I nconfidência , Ouro Preto, 1953, ano II.

Apud Mauro deAlbuquerqueMADEIRA, Letrados, Fidalgos e Contratadores de Tributos no Brasil Colonial , p. 132.

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Em outras palavras, o que essa elite temia é queviesse para governar a capitania algum represen-tante do rei que efetivasse a cobrança dos impos-tos atrasados. Como já se observou, o não-paga-mento desses valores, que não se constituíam es-sencialmente em impostos – na verdade, eram dí-vidas derivadas de um contrato para a arrecadaçãofiscal –, poderia resultar em confisco de bens, au-mentando o temor dos poucos que conseguiramenriquecer na região mineira.

A opressão fiscal que atingia cada um dos co-lonos brasileiros também passou a atingir os res-ponsáveis pela cobrança. Esta situação de opres-são, que não se resumia aos aspectos tributários,trouxe uma novidade nas relações Metrópole-Co-lônia, a partir do último quartel do século XVIII:

o desenvolvimento da consciência de exploraçãocolonial e a conseqüente idéia de emancipação po-lítico-administrativa, surgida do seio da elite colo-nial. Esta passou a perceber como os seus interes-ses já não eram mais um mero prolongamento dosinteresses centrados na Metrópole. O desenvolvi-mento econômico e o enriquecimento de uma eli-te na maior parte das regiões do Brasil acendem odesejo de separação. Da mesma forma, os interes-ses portugueses já não eram os da maioria dos in-tegrantes da elite colonial. A emancipação política

parecia o único caminho possível.Com a decadência da produção aurífera – ini-ciada a partir de 1750 –, as Minas Gerais deixama atividade mineira, canalizando suas energias parao setor agrícola e da criação de animais. Ou seja,ocorreu uma reviravolta econômica, que não fez aregião reviver os momentos de grande riqueza, mastambém não lhe permitiu experimentar qualquerforma de regressão econômica.

Se, de um lado, as transformações levadas acabo pelo que ficou conhecido como Revolução

Industrial – juntamente com Iluminismo, Revolu-ção Francesa e Independência das Treze Colônias– fizeram com que o Sistema Colonial fosse ques-tionado com ações concretas – daí a ConjuraçãoMineira –, também houve significados econômi-

cos para o Brasil, ainda enquanto um espaço de ex-ploração portuguesa. A nova ordem econômicamundial fez o Brasil voltar às suas origens de iní-cio da colonização: novamente esta terra serviapara uma produção de matérias-primas para a Eu-ropa, marcada pelo vigor de uma ordem industrial.Aumentaram as demandas por algodão 32 9, anil,açúcar, tabaco, entre outras mercadorias brasilei-ras. Este momento ficou conhecido como o Re-nascimento Agrícola, em que o Brasil passava aocupar um novo lugar dentro da economia inter-nacional.

Assim, com o final do século XVIII e o iníciodo seguinte, além da decadência da mineração e doRenascimento Agrícola, outra grande novidadedespontou no nosso cenário colonial: a vinda da

Família Real Portuguesa ao Brasil, em 1808, que,apesar de muitas modificações, não fez da explora-ção algo suportável. Porém, esse momento serávisto adiante, já discutindo o processo de emanci-pação política do Brasil.

Conforme mencionado anteriormente, aConjuração Mineira, embora tenha sido conside-rada como o primeiro dos movimentos a buscara libertação colonial, não foi o único nem o maisradical. De certa maneira, a rebelião de MinasGerais esteve reduzida ao campo das relações en-

tre Metrópole e Colônia, não abarcando ques-tões de cunho social. Talvez aqui esteja a grandediferença, se comparada à Conjuração Baiana oudos Alfaiates, ocorrida em 1798. A participaçãode setores sociais mais elitizados foi regra emMinas; no caso da Bahia, esta participação ficourestrita aos momentos iniciais da rebelião.Quando esta radicalizou em direção ao confron-to com o poder metropolitano, o comando re-belde já se encontrava nas mãos do setores baia-nos mais populares, colocando a questão racial e

social na ordem do dia, sem deixar de criticar aopressão colonial.A participação de setores brancos, entusias-

mados pelas conquistas da Revolução Francesa– principalmente em relação ao momento em

170 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

32 9 A importância do algodão só tendeu a seavolumar, dada a ligação dessa matéria-prima comos avanços da Revolução Industrial. Assimsendo, tambémasautoridades fiscais portuguesas estiveramatentas, criando mecanismos para evitar queessa mercadoria deixassedepagar os tributos devidos. Dessa maneira,têm-seestas informações: “Alfândega do Algodão - Recife - Nomedado à Mesa deInspeção dePernambuco, por decreto de11 dejaneiro de1819, masquejá era usado vulgarmentedesde1799. A Mesa deInspeção era umórgão colegiado, especializado emprodutos deexportação como o tabaco, o açúcareo algodão. Cabia-lhefiscalizar eclassificar a qualidadedos produtos exportados, alémdecobrar certos tributos sobreo comércio exterior. Não foi possívelapurar qual o nomedo cargo do encarregado dechefiá-la, mas as mesas deinspeção eramdirigidas por umcolegiado deinspetores. Havia, igualmente, umGuarda-Mor, a quemcompetia dirigir a fiscalização.”Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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que os jacobinos estiveram no poder –, tambémentusiasmou os representantes das classes po-pulares:

Nas articulações mais efetivas do movimento,destacavam- se João de Deus Nascimento, de 24 anos, e Manuel Faustino dos Santos, o Lira, de 23, ambos mulatos e alfaiates de profi ssão (o que valeu o epíteto de Conjuração dos Alfaia- tes). É importante notar que os artífices que fabricavam roupas se situavam em posições bastante baixas na estratificação social de ho- mens livres. Como os senhores e grandes comer- ciantes contavam geralmente com escravos que lhes confeccionavam as roupas, ou as importa- vam, os alfaiates ‘de tenda’ tinham uma escassa 

clientela de pessoas de poucas posses, e rara- mente mais que o mínimo para o sustento, além de serem socialmente depreciados por exercerem um trabalho ‘vil’, isto é, manual. 33 0

Outras pessoas ligadas aos setores mais pobrese discriminados da sociedade baiana também en-volveram-se na luta contra o colonialismo portu-guês:

(...) destacavam-se também, como organizado- 

res, os soldados de milícias Luís Gonzaga das Virgens, de 36 anos, e Lucas Dantas de Amo- rim Torres, de 24, também mulatos. Uns e ou- tros dedicavam-se àintensa pregação entre a população de Salvador, conseguindo grande quantidade de adeptos e apressando-se nos pla- nos revolucionários. O Tenente Agui lar Panto- 

 ja também participava ativamente das arti cula- ções, chegando a ser apontado mais tarde como chefe mil itar da conjura. 33 1

Em agosto de 1798, a capital da Bahia amanhe-ceu coberta por panfletos que anunciavam a lutacontra o colonialismo e por uma sociedade iguali-tária. A questão tributária, assim como o problemado comércio livre das imposições do monopóliometropolitano, faziam parte do programa revolu-cionário. Em um desses panfletos, essas e outrasquestões eram colocadas:

Aviso ao Clero e ao Povo Bahiense.

O Poderoso e Magnífico Povo Bahiense Repu- blicano desta cidade da Bahia Republicana considerando nos muitos e repetidos latrocínios feitos com os títulos de imposturas, tributos e direitos que são cobrados por ordem da Rainha de Lisboa e no que respeita àinutilidade da es- cravidão do mesmo Povo tão sagrado e Digno de ser livre, com respeito àliberdade e igual- dade ordena, manda e quer para o futuro seja feita nesta cidade e seu termo a sua revolução para que seja exterminado para sempre o pés- simo jugo reinável na Europa (...) outrossim manda o Povo que seja punido com pena vil para sempre todo aquele Padre regular e não 

regular que no púlpito, confessionário, exorta- ção, conversação por qualquer forma, modo e maneira de persuadir os ignorantes, fanáticos e hipócritas, dizendo que éinútil a liberdade Po- pular. (...) 

O Povo. 33 2

A questão tributária é claramente apresentada,pois pesava mais sobre as camadas mais pobres dapopulação baiana. Essas parcelas da sociedade não

tinham como fugir ao pagamento dos tributos, di-ferentemente do que acontecia com as pessoasmais poderosas do Brasil colonial. Assim, com apublicação dos panfletos, as autoridades baianaspassaram a procurar os responsáveis pela tentativade rebelião e de afrontar o poder português. Comisso, poucos dias depois, foi preso Luís Gonzagadas Virgens, acusado de ser o redator dos panfle-tos. Uma tentativa de libertá-lo através de umaação armada fracassou. Isto, juntamente com asvárias delações que foram surgindo, fizeram com

que o movimento fosse desbaratado. A partir des-se momento, assim como acontecera nas MinasGerais, começava a repressão a mando de Portugal,ainda sob a coroa de D. Maria I, que havia exigidoforte punição aos conjurados mineiros. Quanto aomovimento baiano, por ter sido liderado, no mo-mento da ação, por mulatos e setores populares daBahia, a rainha portuguesa exigiu punições ainda

171a c o n j u r a ç ã o m i n e i r a e a d e r r a m a

330 Antonio MENDES Jr., Luiz RONCARI eRicardo MARANHÃO, B ra sil H ist ór ia - tex to e con su lt a - 2 I m pér io, p. 70.331 Idem, ibidem , p. 70-1.332 Idem, ibidem , p. 71.

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mais severas. Porém, nem todos estes revolucioná-rios foram tão atingidos pela ação repressiva dePortugal:

A elite branca dos primeiros momentos da pre- gação revolucionária e das conversas com Lar- cher não sofreu quase nada, mesmo porque boa parte dela se afastara das manobras conspirató- rias. Os que ainda estavam implicados vale- ram-se do dinheiro e do prestígio para escapar 

 àrepressão: Inácio Siqueira Bulcão conseguiu escapar por ser casado com a filha de secretário de governo; Agui lar Pantoja, apesar de ser bas- tante implicado, foi ajudado de fora da cadeia por seus amigos ricos, que conseguiram fazer as testemunhas negarem seu envolvimento. Ho- 

mens como Silva Lisboa, Pe. Agostinho Gomes,o farmacêutico Lasdislau Figueiredo e Melo não foram molestados pelas devassas, como muitos outros. 33 3

Se a elite branca pôde se safar da repressão por-tuguesa, o mesmo não ocorreu com os mulatosque levaram a luta até onde foi possível. Para esses,a perseguição foi implacável. “D. Maria I, em car-tas, exigia que todos os implicados, mesmo aque-les que não participassem diretamente da conjura,

mas que tivessem ciência dela e não a delatassem,fossem punidos. A Coroa chegava a instruir os tri-bunais da Bahia para que, no caso dos condenadosque recebessem pena de degredo, eles não fossemmandados para colônias portuguesas na África, esim para territórios fora da jurisdição lusa, paraque ‘o veneno dos seus falsos princípios não possa jamais contaminar aqueles dos seus vassalos’. Aviolência da repressão estava na razão direta do ca-ráter popular do movimento.” 33 4

Dessa maneira, veio a forte presença da repres-

são portuguesa, que jamais aceitou qualquer con-testação por parte dos colonos brasileiros:

O processo teve 34 réus. Destes, 23 eram mu- latos, que ocupavam posições muito baixas na escala social – 10 eram escravos, 4 tinham nascido escravos e sido alforriados e os demais eram soldados ou artesãos, havendo vários com 

ofício de alfaiate. Mesmo entre os 10 brancos,predominava a origem modesta, havendo 7 sol- dados e oficiais e dois artesãos. As penas foram pesadas: seis dos réus foram condenados àmor- te; João de Deus Nascimento, Manuel Faustino dos Santos, Lucas Dantas e Luís Gonzaga das Virgens foram enforcados e esquartejados, en- quanto Luís Pires conseguiu não ser agarrado e o último, Romão Pinheiro, teve a sua pena co- mutada em degredo. Os demais condenados ti - veram penas de degredo ou prisão. O processo,eivado de lances de arbitrariedade, chegou a apresentar o negro humor de um pedido do ad- vogado de defesa: que os réus, uma vez sendo inevi tável a sua morte, fossem poupados da hu- milhação do esquartejamento. Nem isso o tri- 

bunal concedeu, e Salvador foi inundada pelo cheiro dos cadáveres dos quatro revolucionários,espostejados e pendurados em lugares de grande afluência. 33 5

Como também aconteceu com a ConjuraçãoMineira, cada um dos delatores do movimentobaiano foi agraciado com cargos públicos e compensões vitalícias. Porém, o mais importante é en-tender que mais essa conjuração mostrava como ocolonialismo português sobre o Brasil começava a

dar passos em direção à sua superação. Cada umdesses movimentos, que questionavam a presençados interesses portugueses aqui, colocava entravesà continuação dessa opressiva presença.

Essa tentativa de revolução também marcaria ofim do século XVIII e o início de um novo sécu-lo, repleto de transformações para o Brasil. Deri-vado da Revolução Francesa, surge o poderoso Im-pério Napoleônico, que, através de um expansio-nismo agressivo, modificou bastante a geopolíticaeuropéia, com reflexos claros nas Américas. Nesse

sentido, como conseqüência desse expansionismo,a Família Real portuguesa foi obrigada a fugir dastropas de Napoleão Bonaparte, prontas para inva-dir o pequeno país ibérico, dirigindo-se ao Brasil,acompanhada de toda a Corte portuguesa. Maisde 10 mil pessoas, de uma hora para outra, apor-taram em terras brasileiras, a mais rica colônia lu-sitana, além de longe o suficiente das questões eu-

172 t r i b u t o s d o BRASI L CO Lo N I Al - 150 0• 18 221ª Parte

333 Idem, ibidem , p. 72.334 Idem, ibidem .

335 Idem, ibidem , p. 72-3

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ropéias. Com o estabelecimento do Brasil como anova sede do Império português – condição no

mínimo estranha –, começava, a largos passos, ocaminho da Colônia em direção à sua emancipaçãopolítica. Porém, em termos econômicos, o país co-meçava a deixar os laços coloniais de lado e a vin-cular-se à dependência econômica inglesa, a maisimportante nação dentro da esfera do capitalismoindustrial da época. Estes caminhos pelos quais oBrasil passou a trilhar serão tratados a seguir.

173a c o n j u r a ç ã o m i n e i r a e a d e r r a m a

51. Francisco Bartolozzi, E MBARQUE DO P RÍNCIPE  REGENTE DE  P ORTUGAL NO C  AIS DE  BELÉM ,

COM TODA A F  AMÍLIA REAL , EM 27 DE NOVEMBRO DE  1807, ÀS  11 HORAS DA MANHÃ; c. 1808;

gravura a buril. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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2 ª Parte

T RI BU T O S D OBRASI L I M PERI AL 1822 • 188 9

✠ O Processo de Emancipação Política – 1808-1822

✠ O Primeiro Reinado – 1822-1831

✠ Período Regencial – 1831-1840✠ O Segundo Reinado – 1840-1889

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1 8 2 2 - 1 8 8 9

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“1º – Q ue sejam admissíveis nas alfândegas do Brasil todo, e quaisquer

 gêneros, fazendas e mercadorias transportadas ou em navios estrangeiros das potências, que se conservaram em paz e har monia com a minha real C oroa, ou em navios dos meus vassalos, pagando por entrada 24 % ; a saber: 2 0 %  de direitos grossos e 4 %  de donativos já estabelecidos, regulando-se a cobrança destes direitos pelas pautas ou aforamentos, porque até o presente momento se regula cada uma das ditas alfândegas,

 ficando os vinhos, águas, ardentes e az eites doces, que se denominam molhados, pagando o dobro dos direitos, que até agora nelas sat isfaz iam.” 

 A C arta R égia de 28 de janeiro de 180 8

o pr o c esso d eem a n c i pa ç ã o po l í t i c a1808• 1822

176  TRI BUTO S DO BRASIL imper i al - 1822•1889 2 ª Par te

O Brasil entra no jogo de poder da Inglaterra no mundo.

A Carta Régia de 28 de janeiro de 1808 e os novosimpostos criados pela Corte portuguesa no Brasil.

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O dia 7 de setembro de 1822 é consideradoum marco na história brasileira, pelo fato de de-marcar o rompimento das relações coloniais en-tre Brasil e Portugal. De forma semelhante, écomum que se associe a figura de D. Pedro I àimagem do grande líder e finalizador do proces-so que culminou com a emancipação política doBrasil.

Pelo que vimos até aqui, no entanto, podemosperceber que este processo de emancipação políti-ca já se delineara nos anos finais do século XVIII,pois o nosso país não se encontrava imune às gran-des transformações políticas e econômicas que segestavam na Europa e Estados Unidos no final dosOitocentos.

As grandes alterações econômicas que se reali-

zaram na Inglaterra e que culminaram com a Re-volução Industrial sinalizavam uma mudança pro-funda nos paradigmas até então conhecidos naconstrução da riqueza das nações. A introdução damão-de-obra assalariada como meio de liberar ca-pitais então aplicados no tráfico de escravos passa-va a permitir a integração de um maior número depessoas naquilo a que hoje damos o nome de mer-cado. Talvez tenha sido este o primeiro passo paraque o mercado se transformasse neste espaço ondese negociam tanto mercadorias quanto força de

trabalho.Na liderança daquilo que se tornaria o planomais eficaz do ponto de vista do acúmulo de ri-quezas, a Inglaterra desencadeou um processo querapidamente caminhava para que as antigas rela-ções econômicas entre as metrópoles e as colônias– o imperialismo mercantilista – se tornassem ob-soletas. A sustentação filosófica das práticas eco-nômicas desta Inglaterra, às vésperas de se consti-tuir no maior Império de seu tempo, era dada peloliberalismo, corolário de idéias, aspirações e inten-

ções que logo se transformaria numa crença que,inclusive, valorava e predestinava o futuro da hu-manidade.

Fruto, por um lado, de uma ofensiva frente àortodoxia econômica marcadamente mercantilistae cartorial, o pensamento liberal acompanhava ossucessos da nova estrutura político-econômica bri-tânica e hipervalorizava os seus desdobramentos.Visto sob um prisma mais genérico, o liberalismo,pelo próprio conteúdo ideológico, incentivava aruptura das barreiras comerciais impostas pelasvelhas nações mercantilistas, para que uma nova

era se iniciasse. Se possível, com os ingleses ocu-pando o lugar de seus predecessores.

Sob o lema de que todos são livres na disputacomercial, a igualdade de condições mercantis per-mitiria subliminarmente que os mais aptos e pre-parados tomassem a dianteira deste processo. Anova nação líder, no entanto, sempre teria para sia justificativa de que a vitória tenha ocorrido semque nenhum dos lados contasse com qualquer es-pécie de privilégio – aqueles típicos da nobreza se-nhorial, por exemplo.

Para a história portuguesa e brasileira dessaépoca, é sintomática a relação de dependência paracom os britânicos, uma vez que as riquezas colo-niais afluíam seguramente para a grande ilha aonorte da Europa. Num sentido, o desfecho realiza-

do a sete de setembro de 1822, lido novamenteatravés desta história, pode ser tomado como umdos resultados de ajuste das relações portuguesas ebrasileiras para com a principal nação do séculoXIX no mundo.

Do ponto de vista político, as transformaçõesocorridas no século anterior, a Independência dosEstados Unidos e a Revolução Francesa, anuncia-vam mudanças profundas calcadas na luta incondi-cional contra os privilégios de poucos – os bem-nascidos – frente à maioria do povo. A nova visão

democrática, recuperada e reinventada a partir deuma distante inspiração ateniense, aparecia comoum sistema de governo razoável, no qual, de formasemelhante ao que dissemos sobre o liberalismo, as justificativas sobre o domínio de uns sobre os ou-tros poderiam se fundamentar no plano da igual-dade, em que os iguais se interpelam.

No nosso caso, as tentativas de rompimento dadependência de Portugal – como vimos nas Incon-fidências Mineira e Baiana – redundaram em fra-casso, com o acréscimo dos contornos de tragédia

no tratamento violento dado pelo reino portuguêsà sua mais importante colônia. De uma forma quepoderíamos até tomar como costumeira, as trans-formações políticas em nosso país não se realiza-riam de dentro para fora – intrinsecamente – masde fora para dentro – extrinsecamente. Se tomar-mos a independência brasileira como o objetivomaior das revoltas do século XVIII na Bahia e emMinas Gerais, observamos que este resultado foiatingido – apesar de não visado e de forma quaseque contingencial – muito mais pela ingerência dosingleses nos assuntos econômicos da nossa nação.

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Neste sentido, os acontecimentos que se preci-pitaram nos momentos que antecederam a vindada Família Real portuguesa ao Brasil, em 1808,podem ser tomados como mais efetivos na direçãodo rompimento futuro do Brasil com Portugal, doque aqueles outros que estiveram em torno das re-voltas sediadas em Vila Rica ou Salvador. De talforma, que a nossa independência, sonhada pelosinconfidentes mineiros e baianos, foi realizadapelo futuro monarca de Portugal, D. Pedro IV, onosso Pedro I. Se para o mundo – especialmentepara a Inglaterra – a separação entre Brasil e Por-tugal representava o desfecho de um processo quealmejava a liberdade de atuação mercantil na ex-Colônia, para os brasileiros, a independência podeser tomada como um rearranjo político de pouca

monta. Lembremo-nos de que a liberdade civil deum escravo somente veio a ocorrer às vésperas doséculo XX, com o 13 de maio de 1888, ou seja, aLei Áurea, 66 anos após a independência brasilei-ra. Podemos dizer, no entanto, que do ponto devista da economia mundial, o Brasil já era um paíslivre desde 1808, com a abertura dos portos às na-ções amigas – diga-se, Inglaterra. Portugal, já hámuito, nada mais era do que um reino que nãopossuía luz própria e que somente poderia orbitarem torno de uma ou outra nação mais poderosa.

 Toda a fragilidade do reino lusitano ficaria ex-posta a partir dos acontecimentos que se sucede-ram após a chegada de Napoleão Bonaparte ao go-verno da França, no fim do século XVIII. Enten-dido como aquele que poderia dar um desfecho aolongo e tortuoso processo revolucionário francês,Bonaparte deu início a uma série de espetacularesinvasões – militares e econômicas – que levaram opânico às casas reais de várias nações européias deentão. Inútil dizer que os reinos ibéricos, já distan-tes de suas grandes glórias, tornaram-se presas fá-

ceis perante as aspirações expansionistas do impe-rador dos franceses. Se a Espanha foi rapidamenteanexada aos domínios napoleônicos, seria Portugalo próximo a perder a sua independência, de fato edireito.

Outros eventos preparavam, no entanto, umasolução diferenciada para o caso português. Emsua aspiração pelo domínio europeu, a política deBonaparte esbarrava na outra nação que, como vi-mos, disputava a primazia de ser a mais poderosado continente, ou seja, a Inglaterra. Impossibilita-da de alçar um ataque contra a marinha real

britânica, coube à política napoleônica a criaçãode estratagemas que visavam ao enfraquecimento

inglês. De tal forma, que se colocou em práticauma proibição de realização de comércio da partede todas as nações dominadas pela França paracom a Inglaterra. O Bloqueio Continental, nomeda tentativa bonapartista de isolamento da Ingla-terra, foi um elemento de considerável importân-cia nas decisões que D. João, o Príncipe Regentede Portugal deste início de século XIX, viria a to-mar.

Consta que figuras proeminentes do reino por-tuguês já sugeriam que a casa real lusitana pensas-

se em se transferir para o Brasil, quando do inícioda investida napoleônica contra as principais na-ções européias. Oliveira Lima afirma que esta idéiahavia sido sinalizada por D. Luiz da Cunha ePombal e, inclusive, pelo próprio D. João VI,quando do momento de entreveros com a Espa-nha. Já em 1803, D. Rodrigo de Souza Coutinho,eminente personagem nas relações entre Brasil ePortugal, já indicava em carta ao príncipe regentea possibilidade deste se estabelecer no Brasil  336 .De fato, o aceleramento dos fatos que dispunhamas forças de Bonaparte nas fronteiras de Portugal,

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O Brasil foi o último país a conceder liberdade civil aos escravos.

52. Lei Áurea, 13 de maio de 1 888. Rio de Janeiro, Ministério da Justiça/

Arquivo Nacional.

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ao mesmo tempo que jogava este país para o inte-rior dos planos de reação da Inglaterra, limitava asalternativas possíveis do Estado português. Apósuma série de encontros entre os ministros lusos eo ministério exterior inglês, a Corte portuguesadeixa o país em 29 de novembro de 1807, seguidade perto por uma esquadra inglesa, que tinha amissão de escoltar os navios lusitanos rumo aoBrasil. Os acontecimentos futuros, já no Brasil,iriam entrar em sintonia com uma conjuntura quedispunha os interesses de Portugal a reboque daspreocupações político-econômicas britânicas. Paradiversos historiadores, a chegada de D. João aoBrasil e a “interiorização da Metrópole” 337  marca-vam o grande rompimento formal frente ao passa-do colonial brasileiro. Do ponto de vista dos tri-

butos, a alteração somente pôde começar a serapreciada a partir de 28 de janeiro de 1808, pou-cos dias depois de D. João pisar o solo brasileiro,quando se promoveu a abertura dos portos brasi-leiros às nações amigas.

Car ta Rég iad e 28 d e jan eir o d e 1808

Conde da Ponte do meu conselho, governador e capi- tão general da capitania da Bahia. Amigo, eu o prín- cipe regente vos envio muito saudar, como aquele, que amo. Atendendo, representação que fizestes subir à minha presença, sobre se achar interrompido e suspen- so o comércio desta capitania com graves prejuízos dos meus vassalos e de minha fazenda real, em razão das críticas e públicas circunstâncias da Europa, e queren- do dar sobre este importante objeto alguma providên- cia pronta e capaz de melhorar os progressos de tais danos: Sou servido ordenar interna e provisoriamen- te, em quanto não consolido um sistema geral, que efe- tivamente regule semelhante matéria, o seguinte: 

1º - Que sejam admissíveis nas alfândegas do Brasil todo, e quaisquer gêneros, fazendas e mercadorias transportadas ou em navios estrangeiros das potências,que se conservaram em paz e harmonia com a minha real coroa, ou em navios dos meus vassalos, pagando por entrada, 24%; a saber: 20% de direitos grossos e 4% de donativos jáestabelecidos, regulando-se a co- brança destes direitos pelas pautas ou aforamentos,porque atéo presente momento se regulam cada uma das ditas alfândegas, ficando os vinhos, águas, arden- 

tes e azeites doces, que se denominam molhados, pa- gando o dobro dos direitos, que atéagora nelas satis- faziam; 

2º - Que não só os meus vassalos, mas também os di- tos estrangeiros possam exportar para os portos, que bem lhes parecer, a benefício do comércio, e a agricul- tura, que tanto desejo promover todos, e quaisquer gê- neros coloniais, a exceção do pau-brasil, e outros no- toriamente estancados, pagando por saída os mesmos direitos jáestabelecidos nas referidas capitanias, fican- 

do entretanto como em suspenso, e sem o vigor todas as leis; atos régios ou outras ordens, que atéaqui proi- biam neste Estado do Brasil o recíproco comércio en- tre meus vassalos, estrangeiros o que tudo assim fareis executar com o zelo e a atividade que de vós espero.

Escrita na Bahia, em 28 de janeiro de 1808.Príncipe Regente.

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336  Oliveira LIMA,  D . João V I n o B ras il , p. 43- 44.337  A expressão “interiorização da Metrópole”deve-seà professora Maria Odila Leiteda Silva Dias que, comgrandeperspicácia, nos permitea introdução no

nível da alteração quesefez no Brasil destemomento.

53. Carta régia de 28 de janeiro de 1808. Rio de Janeiro, Ministério da Justiça/

Arquivo Nacional.

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A transferência da Família Real portuguesapara o Brasil, evidentemente, acarretou despesas ea única fonte de receita da época era recorrer àcriação de um tributo. Segundo Bernardo Ribeirode Moraes, “cada serviço novo instituído no paísexigia o aumento ou a criação de um tributo novo,estabelecido sem racionalidade. Tudo era feito semo exame da real necessidade. O objetivo dos tribu-tos era apenas o aumento de receita para atenderàs urgentes medidas do momento.” 33 8 Segundo omesmo autor, algumas das novas contribuiçõeseram:

✠ Direitos de guindaste, instituídos pelo Alvaráde 25 de abril de 1808;

✠ Pensão para a capela imperial, no Alvará de 20de agosto de 1808;

✠ Contribuição de polícia, no decreto de 13 demaio de 1809;

✠ Imposto de selo sobre papel, no Alvará de 17de junho de 1809. 33 9

Bernardo Ribeiro de Moraes cita Amaro Caval-cante, lembrando que a máquina administrativa

era “um conjunto de peças diversas, umas desco-nexas, outras mal aparelhadas, algumas imprestá-veis mesmo.” 34 0 Ou seja, manifestava-se uma situa-ção constituída durante todo o processo de colo-nização. Não havia um critério uniforme de siste-ma fiscal que primasse pela objetividade e abran-gência. As necessidades imediatas da Coroa portu-guesa ditavam a criação de novos tributos.

Interessante observar que a cobrança desses tri-butos estava relacionada à manutenção da própriaCorte, que se encontrava no Brasil. Tratava-se en-

tão de uma outra orientação fiscal, que não aque-la que visasse ao retorno em serviços ou benefíciosda população. A esse respeito, alguns historiadoresentendem que:

a máquina administrativa joanina, hipertrofiada,destinava-se antes de mais nada a atender os de- 

sígnios do grupo de poder efetivo, a nobreza buro- crática. No Brasil, onde essa nobreza estava mais distante de suas fontes de riqueza não-estatais, ou seja, as terras, bens imóveis etc., o aparelho de Es- tado deveria hipertrofiar- se ainda mais para asse- 

gurar àquela elite os meios de sustento de uma lu- xuosa vida cortesã. Tudo isso exigia, de imediato,receita muito maior de um governo cujas finanças,evidentemente, estavam abaladas pela mudança para o Brasil: isso acarretava aumentos gerais de impostos, taxas novas, que incidiam sobre os bra- sileiros e geravam descontentamentos. Na medida em que os antigos impostos eram ressuscitados,como aquele que chegava a taxar a simples colhei- ta individual de cocos, aumentavam as queixas,principalmente das províncias, que não viam nes- 

ses aumentos um correspondente incremento de obras públicas, como no Rio. 34 1

180 T R IB U T O S D O B RA SI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

338 Bernardo Ribeiro deMORAES, Sistema Tri butário da Constitu ição de 196 9 , p. 43.339 Idem, ibidem .34 0 Amaro CAVALCANTE, Elementos de Finanças, p. 443, apud Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 44.

34 1 Antonio MENDES Jr, Luiz RONCARI eRicardo MARANHÃO,  B ra sil H ist ór ia, tex to e con su lt a, I m pér io, p. 112.

Para a manutenção da Corte no Brasil e da "luxuosa vida cortesã" da nobreza

burocrática, foi preciso a conservação tanto dos aumentos de impostos e novas

taxas fiscais assim como do modo de vida baseado nas relações senhor-escravo,

o que gerava constantes descontentamentos populares.

54. Recibo de compra e venda de escravo, 1841. Rio de Janeiro, Instituto Histórico

e Geográfico Brasileiro.

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Diga-se também que a Corte joanina transpôsao Brasil os vícios de uma máquina burocráticaque deve ter encontrado um meio ideal para todasérie de prevaricações. Os mesmos autores citadosacima entendem que o quadro estatal brasileiro in-dicava “altos cargos, preenchidos por nobres regia-mente pagos, que mal apareciam para assinar pa-péis; e os cargos mais humildes, de escriturários,meirinhos e atendentes, mal pagos e cujos salários,sistematicamente atrasavam, às vezes até seis me-ses, em função das dificuldades financeiras do erá-rio, o que criava um círculo vicioso de ineficiência,gorjetas e desvios de impostos.” 34 2

A carta régia que abria os portos nacionaistambém estipulava que toda mercadoria importa-da estaria sujeita ao pagamento de direitos alfan-

degários no valor de 24%, sem distinção dos na-vios, nacionais ou estrangeiros. Mais tarde, insti-tuiu-se uma taxa alternativa de trânsito da ordemde 4%. A preocupação com a tributação alfande-gária, logo na chegada da Corte ao Brasil, não eraprematura e nem impensada. Roberto Simonsen 34 3

nos traz elementos indicadores de que as rendasdas alfândegas portuguesas constituíam as princi-pais fontes da receita do reino. O mesmo autoracrescenta que a política econômica do impérioportuguês do início do século XIX ainda repousa-

va na produção brasileira. Diga-se que, além dePortugal consumir grande parte desta produção,era através dos portos lusitanos que a mesma eraescoada para outras nações do mundo. SegundoSimonsen,

os navios portugueses ganhavam com seus fretes marítimos e as alfândegas de Lisboa ganhavam com as exportações brasileiras; ganhavam os co- missários portugueses com a armazenagem e re- venda desses produtos; ganhavam novamente as 

alfândegas com a entrada das manufaturas es- trangeiras, para o consumo do reino e da colônia,trocadas em elevada proporção por artigos brasi- leiros. 34 4

A importância dos impostos alfandegários e asupremacia inglesa nas relações com Portugal fica-

ram bastante evidenciadas quando da formalizaçãodos Tratados de 1810, assinados em 19 de feverei-ro daquele ano. Através destes, ficava estabelecidoo rumo comercial e tributário do país pelos anosque se seguiram. Apontavam os tratados que os di-reitos aduaneiros sobre as mercadorias portugue-sas tornavam-se 1% mais caros que aqueles sobreos produtos ingleses. Ou seja, as mercadorias por-tuguesas pagariam a taxa de 16% ad valorem e as in-glesas pagariam 15%. Aos navios ingleses era con-cedido o mesmo tratamento que aos portugueses evice-versa com relação à Inglaterra. Em se tratan-do, porém, de marinhas mercantes que se encon-travam em grande disparidade, era notória a vanta-gem da navegação britânica. Com isto, a reciproci-dade era apenas aparente, uma vez que os ingleses

tinham as melhores condições de realização de umcomércio mais volumoso que os portugueses.

Um outro aspecto dessa reciprocidade aparen-te se dava na entrada de produtos ingleses noBrasil e a exportação de mercadorias brasileiraspara a Inglaterra. A nossa balança comercial tor-nava-se deficitária, uma vez que não era possívelvender mais do que comprar. Em resumo, estedéficit também acarretava prejuízos aos comer-ciantes ingleses que, muitas vezes, não conse-guiam receber o pagamento devido pela aquisição

de suas mercadorias no Brasil. Os artigos 3º, 4º,5º e 7º dos Tratados de 1810 visavam também àreciprocidade de tratamento dos súditos, produ-tos e navios das duas nações (Portugal e Inglater-ra), “com referência a quaisquer impostos, tribu-tos e aos direitos alfandegários e despesas nosportos”.  34 5 No artigo 18º, anotava-se que “os ne-gociantes ingleses teriam a vantagem de dar cau-ção para pagar direitos de alfândegas, dentro dosprazos de três a seis meses, nas mesmas condiçõesasseguradas aos vassalos de Portugal.” 34 6  O porto

de Santa Catarina tornava-se aberto à Inglaterracomo meio de facilitação do comércio britânicocom Buenos Aires.

Após os Tratados de 1810, os impostos de en-tradas de mercadorias estrangeiras no Brasil fica-ram da seguinte forma:

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34 2 Idem, ibidem , p. 113.34 3 Roberto C. SIMONSEN, H ist óri a Econ ôm ica do B ra sil ( 15 0 0 / 18 2 0 ) , p. 390-391.34 4 Idem, ibidem , p. 396.34 5 Idem, ibidem , p. 398.

34 6  Idem, ibidem , p. 399.

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✠ Livres, as mercadorias estrangeiras que já tives-sem pago direitos em Portugal e bem como osprodutos de maior parte das colônias portu-guesas.

✠ Sujeitas à taxa de 24% ad valorem as mercado-rias estrangeiras diretamente transportadas emnavios estrangeiros.

✠ Sujeitas à taxa de 16% ad valorem as mercado-rias portuguesas e também as estrangeiras, im-portadas sob a bandeira lusa.

✠ Sujeitas à taxa de 15% ad valorem as mercado-rias britânicas importadas sob a bandeira ingle-

sa ou portuguesa. (Esta disposição foi assinadaem 18 de outubro de 1810, em data posteriorà assinatura dos Tratados.)

Segundo o já citado Roberto Simonsen,

somente em 1818 éque foram tomadas provi- dências pelo governo português para melhorar a situação do comércio luso-brasileiro. Vinhos e aguardentes estrangeiros foram fortemente ta- xados. Os direitos sobre as mercadorias portu- 

guesas baixaram de 16% a 15%, ficando as- sim equiparados às inglesas. Mesmo as manu- faturas da metrópole entraram a gozar, na sua exportação para o Brasil, de uma redução de 5%, a título de prêmio. As produções asiáticas passaram a pagar 3%, ao invés de 8%. 34 7 

O comércio brasileiro ficou, de fato, nas mãosdos ingleses e o contrato constituía um sério obs-táculo ao estabelecimento de relações comerciaiscom outros países. Fracassaram, pois, os trabalhos

que, em 1816, vieram tentar fomentar o comércioentre a França, já sem a presença de Bonaparte, e oentão Reino Unido de Portugal e Brasil. Só em1826 – ano em que venceu o Tratado de 1810com a Inglaterra – foi estendida à França e Portu-gal e, em 1828, às outras nações a igualdade de di-reitos pagos pelas importações inglesas. A cobran-ça nas alfândegas dos 15% era feita de acordo como preço estipulado na pauta e não de conformida-de com o valor corrente dos gêneros.

Uma das conseqüências mais imediatas dos

acordos de 1810 deu-se na questão monetária.Roberto Simonsen enumera os seguintes aspectosdecorrentes deste tratado, quando afirma que:

o desequi líbrio monetário provocado pelo exces- so de importação se traduzia em flutuações cambiais e a impossibilidade de se montarem indústrias no país, conjugada com a insuficiên- cia das exportações, converteu- se numa queda do poder aquisitivo.(...) Os tratados de comér- cio elaborados com as nações européias em ge- 

ral, na mesma base tarifária que o realizado com a Inglaterra, e a separação de Portugal do modo por que foi realizada nos fizeram perder boa parte do mercado seguro; o português, que tínhamos para os produtos do norte.  34 8

182 T R IB U T O S D O B RA SI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

34 7  Idem, ibidem , p. 403.34 8 Idem, ibidem , p. 404.34 9 Idem, ibidem .350 Amaro CAVALCANTE, M eio C ir cu lan te N acio n al, B ras íl ia, apu d , Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 406.351 Idem, ibidem .

55. O numerário utilizado no país no início do século XIX era composto por moedas de ouro do

Império: 6.400 réis, ouro, 1822, Peça da Coroação D. Pedro I; 6.400 réis, ouro, 1823 ,D. Pedro I;

6.400 réis, ouro, 1832, D. Pedro I I; 10.000 réis, ouro, 1841, D. Pedro II; 20.000 réis, ouro, 1849,

D. Pedro II. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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Diz Simonsen que aquelas regiões sentirammuito isso e experimentaram depressões por todoo século. 34 9 Este autor cita Amaro Cavalcante 35 0 ,segundo o qual, no início do século XIX, o nume-rário do país estava:

entre 9 e 10 mil contos, sendo 2/ 3 em ouro e 1/ 3 em prata. O cobre era em pequena quantidade, estando o seu poder liberatório li- mitado a 100 réis. Somente no final da era colonial éque passou esta moeda a ter o papel preponderante nos centros provinciais. O pa- drão legal vigente no Brasil era regulado pela lei de 4 de agosto de 1688 modificada pela de 4 de abril de 1722. A relação estabelecida entre os dois metais, o ouro e a prata, era de 

1 para 16, sendo o preço legal de uma oitava de ouro amoedado 1$600 réis e de prata,100 réis. Atéo ano de 1810 – disse o Mi - nistro da Fazenda Araújo Viana, no seu rela- 

tório sobre o meio circulante apresentado à Câmara em 1883 – a nossa moeda legal era,de fato, a de ouro, e a de prata fazia então ofícios de troco a essa moeda, pelo seu limita- do giro; as moedas de ouro de 6$400 réis e 

de 4$000 réis e a moeda de prata represen- tavam três diferentes padrões – pois que, sen- do a senhoragem nas moedas de 6$400 réis na razão de 6 2/ 3, esta era nas de 4$000 réis de 18 1/ 2 % aproximadamente, e nas de prata de 15% – sendo a relação legal do valor do ouro para a da prata de 1 para 13 1/ 2 aproximadamente; quando a relação in- dicada pelo mercado era termo médio, de 1 para 16.  35 1

Simonsen reporta-se ainda a Calógeras (La Po- litique Monétaire du Brésil ) que, do ponto de vistade circulação, dividiu o Brasil em duas zonas dis-tintas:

183O pr o c ess o d e em a n c i p a ç ã o p o l í t i c a - 180 8• 1822

O Banco do Brasil foi criado em 1812 por iniciativa de D. Rodrigo de Souza Coutinho.

56. Bilhete do Banco do Brasil, assinado à mão, autenticado pela coincidência da

linha de corte, século XIX. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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✠ Cidades comerciais da costa, onde centraliza-vam-se as transações e numerário;

✠ Região agrícola, sem necessidade de dinheiro,vivendo de seus próprios recursos, onde se lan-çava mão do gado para as liquidações das dife-renças das permutas efetuadas numa economianaturalista. 35 2

Os distritos mineradores já passavam tambémpara a produção agrícola pastoril; e os seus meios

de subsistência eram quase todos importados dasgrandes propriedades das regiões vizinhas, pagosem pó de ouro, ainda uma importante produçãolocal.

O padrão de vida colonial, mesmo nas classesmais abastadas, era em geral bem inferior ao queusufruíam os componentes da comitiva real queaportou no Brasil em 1808. A chegada dos novos15 mil habitantes, acrescidos aos 60 mil de todasas classes com que contava a cidade, obrigou a in-tensificação das importações, tanto maior quantoo consumo dos recém-chegados avultava de muito

comparativamente com o escalão de vida pobre daColônia 35 3. Diz Simonsen que a crise na balançacomercial perdurou por mais de 40 anos (depoisdos acordos de 1810):

Refletiu- se esse estado de coisas na moeda circu- lante. As disparidades entre os valores da moeda em circulação fizeram com que, a princípio, as espécies de ouro provinciais expulsassem as na- cionais, em obediência àconhecida Lei de Gres- ham. Com a desvalorização monetária acentua- 

da após 1815, os portugueses criaram outros meios de pagamento para fazer face aos encargos do Erário Régio e às transações comerciais. 35 4

Segundo Calógeras, na obra citada por Rober-to Simonsen,

desde 1711 que a administração do distr ito diamantífero de Minas Gerais tinha a facul- dade de sacar títulos pagáveis na chegada dos fundos enviados pela admini stração de Lisboa.

Os ‘bilhetes de extração’, como eram chamados,

184 T R IB U T O S D O B RA SI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

Sobre a compra e venda de escravos de ganho, ou negros ladinos, incidia a meia-sisa.

57. Henry Chamberlain, U MA BANCA DE MERCADO, 1822; aquarela. São Paulo, Coleção Guita

e José Mindlin.

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sempre foram pontualmente reembolsados e até 1776 circulavam como moeda e eram mesmo recebidos pelo fisco para qui tação de impostos.A partir de 1816, o valor dos bilhetes baixou 

de 20%. Os bilhetes das Casas de Fundição,

criados pelo decreto de 1803, sacados contra Juntas da Fazenda e o Tesouro Real, estabele- ceram uma nova circulação fiduciária, ‘Bi lhe- tes de Permuta’ ou ‘Bi lhetes de Extração’.Eram, estes últimos, certificados de depósitos negociáveis. Eram lastreados, não por um de- 

terminado depósito, mas pela massa geral do ativo das administrações contra os quais eram sacados. Daíao papel-moeda o passo era fácil de transpor.  35 5

Segundo Simonsen, a origem do papel-moedaem Portugal está ligada à emissão dos emprésti-mos em apólices efetuados pelo Erário Régio, en-tre 1796 e 1797, para fazer face às despesas daguerra contra a França. 35 6  O primeiro banco emPortugal somente foi criado em 1821, oito anosapós a criação do Banco do Brasil (por iniciativade D. Rodrigo de Souza Coutinho, em 1812). Se-gundo Spix e Martius (Reise in Brasilien ), antes mes-mo da chegada da Corte ao Brasil, já funcionava

no Rio um banco nascido da união dos principaiscomerciantes; emitiam notas, visto que as moedasde ouro e prata em circulação não representavam ovolume do capital em ação. Parecia até que váriaspessoas depositavam seus salários ali. 357 

Do ponto de vista tributário, novos impostosou taxas são conhecidos pelos brasileiros a partirda chegada da Família Real portuguesa, uma vezque os tributos perfazem a maneira mais rápida deentesouramento por parte do Estado. Surge a pri-meira modalidade de imposto predial de nossa

história (décima urbana), que era cobrado na or-dem de 10% sobre o valor locativo dos imóveis. Apartir de 1809, há o surgimento de outras medi-das que visam a aumentar a receita: décima de he-ranças e legados, sisa dos bens de raiz e meia-sisa

dos escravos (5% sobre o valor do escravo herda-do ou doado). São as três primeiras formas de im-posto de transmissão de propriedade. Nesse ano,também se inicia a cobrança do imposto de consu-

mo (sobre gado e aguardente). 358

Percebe-se que aintenção do fisco era tributar toda e qualquer mo-vimentação comercial mesmo nas circunstânciasem que se encontrava o país, notoriamente em di-ficuldades econômicas.

Neste sentido, as isenções também eram acena-das com o objetivo de estimular uma ou outra ini-ciativa. É assim que, em 1810, um alvará isenta deimpostos de exportação (e concede prêmios pecu-niários e distinções honoríficas) os indivíduos quese destacassem na cultura de árvores de especiaria

fina, farmácia, tinturaria e artes. Esta isenção seriapor 10 anos a começar da data de exportação e seestenderia aos pagamentos dos dízimos de produ-ção, os quais ainda eram cobrados e se encontra-vam consignados no orçamento das províncias noano de 1861. Outra isenção seria observada quan-to ao imposto da dízima urbana, ano de 1811,quando quem construísse em aterros ou terrenosenxugados, ou quem construísse em terrenos pan-tanosos, não necessitaria recolher este tributo, res-pectivamente por 10 e 20 anos.

Segundo Roberto Simonsen,

no início do século XIX, além do dízimo tra- dicional de todos os produtos agrícolas, dos di- reitos aduaneiros de exportação sobre todos os gêneros, dos direitos de importação sobre quais- quer mercadorias, segundo a pauta jáconheci- da, o contribuinte brasileiro estava sujeito a uma porção de impostos especiais, que com- 

preendiam nos últimos anos de reinado, salvo algumas pequenas modificações locais. Deve-se 

também levar em consideração que diferentes portos cobravam diferentes direitos de entrada e saída de mercadorias. O açúcar branco pagava,no Recife, 60 réis por arroba e o mascavado,30 réis. No Rio, todos os produtos embarcados

185O pr o c esso d e em a n c i p aç ã o p o l í t i c a - 180 8•1822

352 Idem, ibidem , p. 407.35 3 Idem, ibidem .354 Idem, ibidem .35 5 Pandiá CALÓGERAS, L a Pol it iqu e M on éta ir e du B rés il , sema indicação depáginas, apud , Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 409.35 6  Idem, ibidem .

357  Idem, ibidem , p. 410.35 8 Paul HUGON, O Im posto: Teoria M oderna e Prin cipais Sistemas, p. 160.

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sofriam taxa uniforme de 2%. Os direitos co- brados em Pernambuco regulavam com os pre- ços ali correntes, 6 a 10% sobre o valor do gê- nero exportado. Noutros casos, a proporção era contudo menor  35 9.

De uma forma sistemática, nos primeiros anosapós a chegada do príncipe regente ao Brasil, onosso país conheceu os seguintes impostos:

✠ Subsídio real ou nacional, representado por di-reitos sobre a carne verde, os couros crus oucurtidos, a aguardente de cana e as lãs grossei-ras manufaturadas no país;

✠ Subsídio literário, para custeio dos mestres-es-

colas, incidindo sobre cada rês abatida, aguar-dente destilada e, em algumas províncias, comoo Maranhão, sobre a carne-seca no interior, àrazão de uma pataca por seis arrobas;

✠ Imposto em benefício do Banco do Brasil (fun-dado em 1812), de 12.800 réis, recaindo sobrecada negociante, livreiro e boticário, loja deouro, prata, estanho e artigos de cobre, tabacoetc., e do qual estavam isentas somente as lojasde barbeiro e sapateiro;

✠ A taxa suntuária, também em benefício do Ban-co do Brasil, sobre cada carruagem de quatro eduas rodas (no Maranhão, o imposto era de 12mil e 10 mil réis, respectivamente);

✠ A taxa sobre engenhos de açúcar e destilações,maior ou menor segundo a província (no Ma-ranhão, a taxa era de 3200 réis sobre cada en-genho de moer cana e na Bahia, de 4 mil réissobre cada alambique);

✠ A décima do rendimento anual das casas equaisquer imóveis urbanos, taxa somente cobra-da no litoral e lugares mais populosos do inte-rior e que não atingiam propriamente o sertão;

✠ A sisa, que era umimposto de 10% percebidosobre a venda das casas e outros imóveis urbanos;

✠ A meia-sisa, que era um imposto de 5% perce-bido sobre a venda de um escravo que fosse ne-gro ladino, isto é, que já tivesse algum ofício;

✠ Os chamados novos direitos, representados poruma taxa de 10% sobre os salários dos empre-gados nos departamentos da Fazenda e Justiça.

É novamente Roberto Simonsen quem nos dizque “afora esses impostos gerais e outros muitos,abrangendo selos, foros de patentes, direitos dechancelaria, taxas de correio, sal, sesmarias, anco-ragem etc., pesavam sobre o contribuinte os im-postos particulares cobrados pelos magistradosem certos lugares e que entravam para o tesourolocal, figurando como taxas municipais” 36 0 – des-te gênero era o direito de 320 réis pago por cabe-ça de gado exportado da comarca de Paracatu, oude 80 réis sobre cada carga de algodão exportadoda vila de Caeté 36 1. Segundo o mesmo autor, atra-

vés da organização fiscal do reino, eram os impos-tos indiretos os que maiores receitas proporciona-vam ao orçamento real, sendo difícil discriminar aparticipação do Brasil. 36 2

O período joanino também pode ser lido atra-vés das manifestações de revolta contra os excessose desmandos do governo. Nesse sentido, é mode-lar o caso da Revolução Pernambucana de 1817,que, além de promover a luta contra o Império, co-locou em pauta os aspectos mais injustos da polí-tica tributária na região. Afastadas do epicentro

econômico do país desde o impacto da exploraçãodo ouro no Sudeste brasileiro, as lideranças per-nambucanas viam-se isoladas das decisões políti-cas centralizadas na capital do Império. Manifes-tando ideais liberais nos moldes daqueles que sedesenvolveram nos Estados Unidos por ocasião desua independência, os revolucionários de Pernam-buco desejavam a substituição da Monarquia pelaRepública e, evidentemente, a separação de Portu-gal. Os aspectos sociais apareciam nas aspiraçõespor justiça social, inclusive pelo fim da escravidão.

Esmagados pela fúria e a violência típicas da açãolusitana em solo brasileiro, os principais líderesforam exemplarmente executados no mesmo anode 1817, uma vez que os revolucionários, mesmocom a adesão da Paraíba, do Rio Grande do Nor-te e de Alagoas, não conseguiram vencer as forçascoligadas da Bahia e do Rio de Janeiro.

A Revolução Pernambucana de 1817 se insereno contexto tributário uma vez que, mesmo em setratando de uma região já empobrecida, tanto pelaperda de importância do açúcar no cenário mun-dial como pelas altas e baixas do algodão, era alvo

186  T R IB U T O S D O B RA SI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

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de toda série de taxas que visavam à manutençãoda Corte em solo brasileiro. Por outro lado, se doponto de vista econômico Pernambuco se encon-trava em decadência, o mesmo não se poderia di-zer acerca de suas orientações políticas. A presen-ça holandesa no século XVII e a aceitação, pelaselites locais – inclusive os padres –, das idéias li-berais então em voga garantiam à Província umpensamento que poderia almejar a compreensãodos assuntos mais delicados que envolvessem osrumos do país. Pernambuco já havia respirado o

oxigênio do poder e muitas de suas lideranças pos-suíam a prática política de intervenção nas maté-rias relacionadas ao futuro do Brasil.

A política tributária imposta por D. João na re-gião possibilitava a criação de tensões, uma vezque, mesmo em meio à falta de recursos, os impos-tos ou eram majorados ou novos eram estabeleci-

dos. Este foi um importante ingrediente para pro-mover o espírito de revolta que tomou conta departe da população pernambucana, insatisfeitacom a situação que se criava na região.

Neste sentido, podemos perceber que, de fato,houve um ajuste com os principais elementos quecompõem o ideário liberal, uma vez que se lutavanão somente pela diminuição de tributos mas con-tra aqueles que estipulavam a política tributária.Além disso, os revolucionários pernambucanos, namedida em que aspiravam à proclamação da Repú-

blica, sinalizavam igualmente um objetivo políticobem claro. Num sentido, demonstravam uma níti-da identidade com o liberalismo professado namesma época por ingleses e norte-americanos, evi-dentemente muito distante daquele superficial daCoroa portuguesa instalada no Brasil.

187 O pr o c ess o d e em a n c i p a ç ã o p o l í t i c a - 180 8• 1822

“A Revolução Pernambucana de 1817 se insere no contexto tributário uma vez que,

mesmo em se tratando de uma região já empobrecida, tanto pela perda de

importância do açúcar no cenário mundial como pelas altas e baixas do algodão,

era alvo de toda série de taxas que visavam à manutenção da Corte em solo

brasileiro”.

58. Luís Schappriz e F. H. Carls, C  AES DA RUA DO T RAPICHE ; litogravura, Recife,

Museu do Estado de Pernambuco.

35 9 Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 414.36 0 Idem, ibidem , p. 414-415.36 1 Oliveira LIMA,  D . João V I n o B ras il , sema indicação bibliográfica, apud Roberto C. SIMONSEN, op. cit., p. 415.

36 2 Idem, ibidem , p. 420.

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“Ninguém será isento de contribuir para as despesas do Estado em proporção dos seus haveres.” 

Constituição de 1824 – Artigo 179

o pr i m ei r o r ei n a d o1822• 1831

188 TRI BUTO S DO BRASIL i mper i al - 1822•1889 2 ª Par te

A Constituição outorgada de 1824 e as promessas de

umsistema tributário mais justo. O consumo passa a termaior carga tributária.

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Desde a vinda da Família Real portuguesa, apequena nação ibérica, praticamente, havia sidogovernada pelos ingleses. Porém, a situação geo-política era outra a partir de 1814. Napoleão Bo-naparte já havia sido derrotado, pela última vez,em 1815. O Congresso de Viena estabelecia, aofim do período napoleônico, a restauração dostronos usurpados pela beligerância de Bonapartee o retorno da Europa ao momento em que se en-contrava antes das investidas francesas. O sentido

da Revolução Francesa, no entanto, não conse-guiria mais ser extirpado e os ventos liberais vol-tavam, vez ou outra, a soprar sobre a Europa, as-sim como sobre as colônias latino-americanas.Como é natural após uma experiência revolucio-nária, os principais motes de luta deixaram res-quícios e o liberalismo entrava nos reinos euro-peus pela via constitucional: os reis retomavam opoder mas governavam a nação através de umaCarta Magna.

189o p r i m e i r o r e i n a d o - 1822• 1831

59. D. Pedro I, Príncipe Regente. Manuel Araújo de Porto-Alegre,

D. P EDRO I, 1826; óleo sobre tela. Rio de Janeiro, Museu Histórico

Nacional.

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Se a Espanha aprovara em 1812 uma Constitui-ção liberal que predefinia o lugar do rei, em 1820acompanhamos o mesmo movimento em solo por-tuguês. A chamada Revolução do Porto, lideradapela elite comercial daquela cidade, terminou porestabelecer o liberalismo em solo lusitano. Esteacontecimento guarda uma ligação imediata com osfatos que iriam definir os rumos políticos do Bra-sil em meio a este cenário. As Cortes portuguesas,assim como o parlamento luso, pedem o retornoimediato de D. João VI a Portugal; e este, em 1821,não vê outra alternativa senão acatar tal pedido. OBrasil, por sua vez, que desde 1815 já se encontra-va na condição de Reino Unido de Portugal e Al-garves, possuía representantes no parlamento por-tuguês e estes enfrentavam toda série de dificulda-

des e restrições no que dizia respeito à autonomiapolítica brasileira. Mais uma vez, o liberalismo seapresentava como uma justificativa tanto da buscada isonomia interna ao reino de Portugal como damanutenção das diferenças e da situação colonialdo Brasil, acima de tudo ainda tomado como amais importante colônia portuguesa.

A flexibilidade política e a habilidade da Casade Bragança aparecem novamente em D. João VI,quando este, ao retornar para Portugal em 1821,

deixa aqui o seu filho D. Pedro como príncipe re-gente. O futuro Imperador do Brasil, que não pas-saria à História graças às virtudes políticas aliadasà sabedoria mas muito mais pelo seu temperamen-to instável e sua paixão pelas mulheres, acaba pen-dendo muito mais para o lado das elites agrárias epolíticas do Brasil de então. Estas, desgostosascom os desejos de recolonização da nação, inves-tem maciçamente sobre o Príncipe Regente, perce-bendo talvez que suas atitudes apaixonadas pode-riam levá-lo à liderança formal e simbólica do mo-vimento de separação brasileira. Visto sob esteprisma, o processo imediato, que termina com odia 7 de setembro de 1822, já pode ser visto comogestado e aspirado mais como uma reforma do quecom um rompimento de grande monta. De fato, os

grupos que cercam D. Pedro, se passaram a desejara independência do Brasil, o fizeram muito indire-tamente, uma vez que visavam, de fato, à manuten-ção de uma situação que lhes era confortável. Se amesma permanecesse sem a ruptura efetiva comPortugal, poderíamos supor que, ao menos a cur-to prazo, estas elites agrárias nada teriam do quereclamar.

Mais uma vez, ao que parece, as aspirações por-tuguesas de retomar o controle excessivo sobre oBrasil e a não-percepção de que aqui já se forjara

uma elite diretiva dos assuntos econômicos e polí-ticos precipitaram o rompimento brasileiro comPortugal. Uma observação mais atenta das açõesde D. Pedro nos leva a supor que ele tenha exerci-do o papel de fiel da balança que, num movimen-to imprevisível, poderia pender para o grupo queo rodeava na Corte carioca ou para o outro ladodo Atlântico, onde, de fato, encontravam-se suasraízes culturais. A elaboração de sua figura comoum herói talvez se deva muito mais ao sentimentode relaxamento – aquele que sucede imediatamen-

te à vitória numa contenda imprevisível – que pos-sa ter tomado conta do grupo político brasileiroque o cercava. De fato, pela personalidade instávelque apresentava, José Bonifácio e outras liderançaspolíticas da época deviam se encontrar aliviadosapós o desfecho, tipicamente temperamental e ex-plosivo, que demarcava a independência formal doBrasil. Ao Imperador coube a titulação e toda a sé-rie de comendas que, aparentemente, deveriamcumprir um papel de reforço positivo frente à suareação aos estímulos da elite agrária e política doBrasil de então.

190 T R IB U T O S D O BR A SIL i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

Dirigente do Reino Unido de Portugal e Algarves, D. João VI retornou a Portugal

em 1821, a pedido do parlamento luso e das Cortes portuguesas.

60. Jean Bapti ste Debret, D. J OÃO VI, 1816; óleo sobre tela. Rio de Janeiro, Museu

Histórico Nacional.

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191o p r i m e i r o r e i n a d o - 1822• 1831

A instabilidade emocional do monarca, no en-tanto, tenderia a predominar e isto aconteceu logoque se abrandou a satisfação provocada pelos elo-gios que recebeu, uma vez que o Brasil se separoude Portugal. Acima de tudo, o Imperador deveriafazer aquilo que, ao que parece, era uma das pes-soas menos indicadas a cumprir: governar o país.

Posto que nenhuma situação provável existiria, naqual constantemente D. Pedro tivesse que se mos-trar e reagir como Defensor Perpétuo do Brasil, esendo que o governo da então jovem nação, mes-mo que independente, ainda contava com interlo-cutores portugueses e partidários da reação emsuas hostes, D. Pedro ainda continuaria a cumpriro seu papel de fiel da balança, porém, sem que des-ta vez se constituísse um espaço propiciador deuma ação heróica do mesmo nível que aquela quepossibilitou seu grito retumbante às margens doIpiranga.

Os desmembramentos políticos preparavam,no entanto, uma outra atitude intempestiva e apro-ximável daquelas típicas dos heróis, mesmo quereforçasse aspectos absolutistas. Neste sentido,vale conhecer os acontecimentos que envolveram aelaboração da primeira Constituição do Brasil.

À frente da recém-independente nação, a única

monarquia da América, colocavam-se dois espec-tros da cultura política. O liberalismo, então emvoga nas principais nações européias, onde as casasreais se suplantavam ao legislativo, e o conservado-rismo, resultado dos séculos de estruturação dasrelações entre a Colônia e a Metrópole; e marcada-mente o perfil político do intempestivo Impera-dor. Não resta dúvida que, se D. Pedro I fosse tri-butário de algum rescaldo político, este seria o deorigem absolutista, tal como o demonstra o resul-tado das suas experiências patriarcais e senhoriaisno domínio político. Uma coisa era pensar a his-

“...em 25 de março de 1824, a primeira Constituição do Brasil foi outorgada pelo

Imperador. Apesar de contar com a aplicação do modelo de Estado Moderno proposto

por Montesquieu, ou seja, com três poderes – legislativo, executivo e judiciário –

a Carta Constitucional possuía um outro, transposto do mais puro absolutismo:

o poder moderador.”

61. Constituição de 1824, peças ornamentais. São Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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tória européia e seu caminho civilizador rumo àsconstituições. Outra, completamente diferente, erapensar na autodeterminação de uma colônia ou ex-colônia, mais distante da civilização do que o per-mitiam os continentes separados pelo Atlântico.

Nas discussões que antecederam à elaboraçãoda primeira Constituição brasileira, ficava patenteque D. Pedro I não estava disposto a abrir mão dospoderes que fariam dele um Imperador à moda deLuís XIV. Diga-se que os ventos liberais tambémsopravam por aqui e já era perceptível a existênciade grupos políticos que alçavam a cena partidária,desejosos de autonomia. Acima de tudo, os ideaisliberais justificariam, como na Europa, o livre-ar-bítrio de setores da sociedade que já possuíamuma visão estratégica do país. A possibilidade de

autodeterminação conferida pela Constituição nosmoldes do liberalismo era interessante para umnascente setor urbano – marcadamente dirigidopelos maçons –, que aspirava por um maior pesona interlocução política.

Pode-se dizer que o resultado destas aspiraçõesmais liberalizantes tenha aparecido no ante-proje-to da Constituição elaborado em 1823. Exóticoaos olhos do grupo conservador que se estabeleceuem torno do Imperador, este ante-projeto serviucomo mote do primeiro golpe do executivo contra

o legislativo na história brasileira. D. Pedro I dis-solveu a Assembléia Constituinte, os principaiselementos da oposição liberal foram presos e a ela-boração de uma Constituição passou a ser atribui-ção de um Conselho composto por membros indi-cados pelo Imperador. Assim, em 25 de março de1824, a Constituição do Brasil foi outorgada porD. Pedro I. Apesar de contar com a aplicação domodelo de Estado Moderno proposto por Mon-tesquieu, ou seja, com três poderes – legislativo,executivo e judiciário –, a Carta Constitucional

possuía um outro, transposto do mais puro abso-lutismo: o poder moderador. Em outras palavras,competia ao Imperador a escolha dos presidentesdas províncias, dos senadores, dos membros doConselho de Estado e a nomeação de juízes. OImperador, no uso do poder moderador, poderiaigualmente dissolver a Câmara dos Deputados.

É motivo de controvérsias entre os historiado-res o fato de se apontar o retorno da Família Reala Portugal como tendo contribuído para elevar ograu da crise financeira brasileira. Entende-se maisrazoavelmente que tenha sido retirada do Brasiluma grande quantidade de ouro e prata, o que osanos futuros, após a saída de D. João VI, somenteviriam a comprovar. Ao mesmo tempo, a separaçãoformal entre Brasil e Portugal não implicou umacompleta reformulação das leis tributárias entãoexistentes no país. Mesmo após a outorga daConstituição, os tributos eram regulados por leisorçamentárias, cabendo à Câmara dos Deputadosa competência privativa para a elaboração de leisneste sentido.

Segundo Bernardo Moraes 36 3, “os orçamen-

tos da receita eram inaceitáveis, dada a inexis-tência de elementos que permitissem avaliar areceita ou calcular as despesas. Os gastos eramefetuados sem orientação ou conhecimento dasreais condições do Tesouro Público. Permaneciaa má distribuição dos tributos.” Outro críticoda estruturação tributária do período é AmaroCavalcante. Para ele, as contribuições “tinhamsido criadas e eram lançadas e arrecadadas semmétodo, ordem, uniformidade ou sistema, nasdiversas províncias desde os mais remotos tem-

pos coloniais.” 36 4

Do ponto de vista dos tributos, o Brasil inde-pendente herdou do período colonial uma precáriaestrutura. De alguma forma, pode-se dizer que omomento da independência do país, em 1822,acenava para um desejado rompimento inclusivecom os excessos fiscais que vinham da Coroa. Éassim que, em Manifesto do Príncipe Regente doReino do Brasil aos Governos e Nações Amigas,em 6 de agosto de 1822, D. Pedro diz que Portu-gal queria que “os brasileiros pagassem até o ar

que respiravam e a terra que pisavam”. Em outromanifesto, ao próprio povo brasileiro, proferidono dia 1º de agosto também de 1822, o Imperadorasseverava que os brasileiros teriam um sistema deimpostos que iria respeitar “os suores da agricul-tura, os trabalhos da indústria, os perigos da nave-gação e a liberdade do comércio”. E este sistema

192 T R IB U T O S D O BR A SIL i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

36 3 Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 48.36 4 Amaro CAVALCANTE, Elementos de Finanças, apud , Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 48.36 5 GuilhermeDEVEZA, “Política tributária no período imperial” in Sérgio BuarquedeHOLANDA ePedro Moacyr CAMPOS (org.), H ist óri a G eral da

C ivi l i zação Brasi lei ra, I I , O Brasi l Monárquico, volume4, O D ecl ínio e Queda do Império, p. 60.

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seria tão “claro e harmonioso”, que facilitaria “oemprego e a circulação dos cabedais”, desvendan-do “o escuro labirinto das finanças”, que não per-mitia ao cidadão “lobrigar o rasto do emprego quese dava às rendas da Nação”. 36 5

De fato, até o momento da separação políticaformal de Portugal, o quadro tributário brasileirose encontrava da seguinte forma:

✠ Direitos aduaneiros de entrada de acordo comos fixados nos Tratados de 1810 e posterior-mente revistos em 1818;

✠ Dízimos sobre os gêneros de cultura e criação;

✠ Imposto de exportação representado pela

taxa de 2% sobre todos os gêneros não sujei-tos a qualquer outro subsídio ou direito desaída, na forma do alvará de 25 de abril de1818;

✠ Décima sobre o rendimento líquido anual dosprédios urbanos ou sobre o valor do aluguelarbitrado, no caso de neles morarem os seusdonos;

✠ Sisa cobrada à razão de 10% sobre o valor detodas as compras, vendas e arrematações debens de raiz;

✠ Novo imposto de carne verde que era consti-tuído pela contribuição de cinco réis em cadaarratel de carne fresca de vaca;

✠ Subsídio literário correspondendo a um realem cada arratel de carne verde que se cortasseem açougues e a dez réis em canada de aguar-dente da terra; em 1805, a contribuição sobrea carne passou a ser de 320 réis sobre cada rêsabatida e a da aguardente, de 10 réis por medi-da, regulada pela canada de Lisboa;

✠ Impostos sobre aguardente de consumo;

✠ Imposto sobre seges, lojas e embarcações, co-nhecido também como o “imposto do Banco”em vista de se constituir a cota da Fazenda Realno capital do Banco do Brasil;

✠ Imposto sobre o tabaco de corda, cobrado nabase de 400 réis por arroba;

193o p r i m e i r o r e i n a d o - 1822• 1831

“Não se tratou, por exemplo, de questionar a existência da escravidão e isto numa

época em que o paradigma da mão-de-obra assalariada já era uma realidade nos

grandes centros mundiais. Em um certo sentido, a independência brasileira

estabeleceu mais um marco daquilo que se desejava, do que aquilo que, de fato,

ocorreu.”

62. Victor Frond , S  AÍDA PARA A ROÇA. In Ribeyrolles, Charles & Frond, Victor. Brazil

pittoresco. Paris, 1861. São Paulo, Coleção Guita e José Mindlin.

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✠ Novos e velhos direitos que remontavam à an-tiga legislação portuguesa e que eram pagospara o provimento de empregos e de outros tí-tulos expedidos pelas autoridades gerais e pro-vinciais;

✠ Direitos sobre escravos que se despachavampara as minas;

✠ Imposto do selo do papel e décima das heran-ças e legados;

✠ Meia-sisa dos escravos ladinos – todos aquelesque não são havidos por compra feita aos nego-ciantes de negros novos e que entram pela pri-meira vez no país, transportados da Costa da

África;

✠ Contribuições diversas como taxas dos cor-reios, dízimos de chancelaria, terças de ofícios,direitos de portagem, pedágios, taxas de trânsi-to entre as províncias, cobradas não raro pelasautoridades locais. 36 6 

Pode-se, na verdade, supor que estas conside-rações do jovem príncipe regente – DefensorPerpétuo do Reino do Brasil em título honorífi-

co concedido pela maçonaria – estavam muitomais em consonância com o clima político daépoca, que jogava o regente de encontro às elitesbrasileiras desejosas do rompimento com a na-ção portuguesa. Dito de outra forma, pouco po-deria se esperar de alterações mais profundas naestrutura fiscal brasileira, e isto, se pensarmos

no cidadão contribuinte. Evidentemente, o rom-pimento com Portugal faria com que a receitaarrecadada pela cobrança dos tributos não maissaísse do Brasil. Porém, a forma dessa cobrançae a arquitetura tributária sofreriam poucas trans-formações.

 Tal continuidade poderá talvez ser nuançada senos detivermos na espécie de ruptura que se pro-cessou entre Brasil e Portugal. Fruto de uma qua-se atualização para com a geopolítica do período,a independência brasileira se ajustava aos interes-ses comerciais da principal nação da época – a In-glaterra –, uma vez percebidas as bases precárias earcaicas expressas nos moldes do colonialismopraticado pelos portugueses. Na história de Por-tugal, ao longo dos séculos XV e XVI, época essa

marcada pelas grandes conquistas e pelos desco-brimentos, a relação metrópole-colônia, de fato, jáhavia manifestado sinais de colapso, o que, no Bra-sil, de direito, iria se confirmar em 7 de setembrode 1822.

A alteração, no entanto, surpreende pela au-sência de repercussões mais profundas, sendo que,por vezes, apenas parece uma objetivação maiorda interlocução entre o Brasil e a Inglaterra, pos-to que os portugueses já não precisavam mais agircomo intermediadores. Não se tratou, por exem-

plo, de questionar a existência da escravidão e istonuma época em que o paradigma da mão-de-obraassalariada já era uma realidade nos grandes cen-tros mundiais. Em um certo sentido, a indepen-dência brasileira estabeleceu mais um marco da-quilo que se desejava, do que aquilo que, de fato,ocorreu.

194 T R IB U T O S D O BR A SIL i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

O hábito de cheirar rapé, muito comum no século XIX, era tributado em 24% de

acordo com o decreto de 30 de dezembro de 1822.

63. Caixa de rapé, século XIX, Bahia; prata. Salvador, Museu de Arte da Bahia.

36 6  Idem, ibidem , p. 61, 62.

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Neste sentido, a estrutura tributária do paíspouco se alterou. Os direitos de entrada demarca-dos e estipulados pelos Tratados de 1810 conti-nuavam em vigor e eram os responsáveis principaispela arrecadação no Brasil. Diga-se, no entanto,

que, desde a abertura dos portos pela Carta Régiade 28 de janeiro de 1808, vários tributos, muitosdos quais tinham suas raízes na legislação colonial,foram criados ou reformulados, e isto para atenderàs demandas do Tesouro. Alguns destes tributoseram gerais e outros de aplicação puramente local,dentre os quais se podem citar, à guisa de exemplo,os impostos criados pelo decreto de 13 de maio de1809, para prover as despesas da Divisão Militarda Guarda da Polícia e da iluminação da cidade doRio de Janeiro.

Para os autores da História Geral da Civilização Brasileira  36 7 , não resta dúvida de que eram os bensde consumo – fosse através de direitos aduaneirosou de outros tributos internos – que suportavam amaior carga fiscal, “ao lado de singelas tentativasde tributação da riqueza ou de suas manifestaçõesanteriores”. Mesmo sendo amplo o espectro deação do fisco, os resultados financeiros não corres-pondiam à amplitude do campo tributário nemcolaboravam no sentido de desenvolver o país. Oque se percebia nitidamente era a falta de um sen-tido de eqüidade na distribuição dos encargos pú-blicos, o que a décima urbana poderia, de certomodo, atenuar.

Em 30 de dezembro de 1822, um decreto deD. Pedro I mandava sujeitar os gêneros de indús-tria e manufatura portugueses aos direitos de 24%de importação; admitia a entrada de rapé estran-geiro, mediante o pagamento do mesmo imposto,salvo o de produção inglesa, que incorria apenasem 15%, de conformidade com o tratado de co-

mércio de 1810; e, finalmente, estabelecia taxas fi-xas em mil réis para os gêneros denominados mo-lhados. Percebe-se, evidentemente, que a Inglater-ra era o país que contava com os privilégios co-merciais no Brasil.

Do ponto de vista político, Martim FranciscoRibeiro de Andrada havia sido o primeiro minis-tro da Fazenda do Brasil independente e procura-ra pôr em ordem as finanças do país, reorganizan-

do os serviços de arrecadação. A ele sucedeu Ma-nuel Jacinto Nogueira da Gama, que, em exposi-ção de 26 de setembro de 1823, apresentava o es-tado lastimável da Fazenda Pública nacional. Em1824, um outro ministro da Fazenda, Mariano

 José Pereira da Fonseca, recomendava às adminis-trações das províncias que colaborassem com amaior porção possível de sua renda pública paraos gastos extraordinários “que a nação enfrentavapara a defesa e reconhecimento de sua indepen-dência.” 36 8 Segundo Guilherme Deveza, “o maisfácil a fazer era recorrer ao crédito externo ou àsemissões de papel-moeda através do Banco doBrasil ao invés de se criar novos impostos que in-cidissem sobre os direitos aduaneiros, demarcadospelos acordos com a Inglaterra.” 36 9

A Carta outorgada de 25 de março de 1824, aprimeira Constituição do Brasil Independente, de-clarava em seu artigo 179, número 15:

Ninguém seráisento de contribuir para as des- 

pesas do Estado em proporção dos seus haveres.

Uma vez que este princípio fosse seguido, es-taria o Brasil em consonância com o liberalismovigente desde a Constituição Francesa de 1791 eem busca de uma eqüidade maior no pagamentode tributos. Se levado a cabo, o princípio acimafaria com que se reformulasse completamente osistema fiscal brasileiro. Diga-se que apenas ficouna forma da letra e sua aplicação esbarrou na es-trutura sócio-econômica do Brasil de então. AConstituição de 1824 também manteve as provín-cias afastadas da discussão sobre as legislações fis-cais, cabendo à Câmara dos Deputados esta atri-buição exclusiva.

195o p r i m e i r o r e i n a d o - 1822• 1831

36 7  Idem, ibidem , p. 61.36 8 Idem, ibidem , p. 63.36 9 Idem, ibidem .

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“O Ato Adicional de 1834 constitui outro passo à tendência descentralizadora e discriminatória de rendas tr ibutár ias estabelecidas pelas leis de 1832 e 1833. Inúmeros autores apontam a importância do aludido A to para a concretização de uma discriminação de rendas tributár ias, caracterizando-o como o pr imeiro esboço ou ensaio de

 discriminação de rendas no Brasil.” 

 Bernardo R ibeiro de Moraes

per í o d o r eg en c i a l1831• 1840

196  TRI BUTO S DO BRASIL imper i al - 1822•1889 2 ª Parte

A questão fiscal e a Guerra dos Farrapos. O período desistematização dos impostos no Brasil. O Ato Adicionalde 1834. A competência das assembléias provinciais delegislar sobre tributos. A divisão das receitas entre ogoverno central da Corte, províncias e municípios.

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A distância entre as atitudes absolutistas de D.Pedro I e a aspiração liberal do grupo urbano e departe da elite agrária do Brasil caminhou para umdesfecho no ano de 1831. Na verdade, não se tra-ta de querer encontrar nenhuma profundidade li-

beral em meio a estes grupos que se colocavam naoposição a D. Pedro I. De fato, os anseios destessetores eram pela autodeterminação não da popu-lação, mas sim de si mesmos. Poder-se-ia se dizerque já dispunham para si de um programa políti-co de Brasil passível de ser viabilizado sem a inge-rência absolutista do Imperador. As elites agráriase urbanas já concebiam um projeto político, libe-ral apenas na superfície, mas conservador de todosos benefícios e privilégios que antes somente osportugueses poderiam usufruir. Isso pode ser de-

monstrado pela manutenção de uma ordem econô-mica e política que excluía a maior parte dos bra-sileiros da participação e da divisão das riquezasproduzidas. Além de manter a escravidão, absolu-tamente incompatível com um esquema que sepretendia liberal.

Este hiato foi consubstanciado no dia 30 deabril de 1831, com a abdicação de D. Pedro I que,como fizera uma vez seu pai, retorna a Lisboa paraa disputa do trono português, não sem antes dei-xar o poder brasileiro nas mãos de seu filho, entãouma criança de cinco anos, que deveria ser o futu-ro Imperador do Brasil. A abdicação de D. Pedro Ianuncia uma série de revoltas que saem das lutaspolíticas entre o executivo e o legislativo na capi-tal do Império e ganham as ruas de variadas pro-víncias do Brasil. A participação popular, tal comoaquela vista na Conjuração Baiana, volta a ocorrer,como resultado do descontentamento dos demaisgrupos políticos, desejosos de participação no ce-nário mandatário da nação.

Não que pudéssemos dizer que tais manifesta-ções expusessem um itinerário organizado de in-terlocução junto ao poder. Tratava-se, na maioriados casos, de movimentos marcados pela partici-pação de uma massa da população mais miserávele que se encontrava à margem de todo e qualquerbenefício oriundo do Estado ou das parcelas maisilustradas do país. Há que se observar, também,que algumas das revoltas contaram com a partici-pação da ampla maioria das camadas alijadas de

qualquer participação política no Brasil de então.Estas manifestações seriam aquelas clivadas pelassoluções mais violentas, típicas da cultura odiosaque floresceu no país desde a morte do primeiroíndio ou da execução do primeiro escravo que

abandonou suas obrigações na lavoura.É assim que, no período regencial, acompanha-mos revoltas tais como a Cabanagem (1835-1840) no Pará, a Guerra dos Farrapos ou Farrou-pilha (1835-1845), partindo do Rio Grande doSul e chegando até Santa Catarina, a Sabinada(1837-1838) na Bahia e a Balaiada (1838-1841)no Maranhão e no Piauí.

Destes movimentos revoltosos, merece desta-que, do ponto de vista tributário, a Guerra dosFarrapos. A questão fiscal era um dos motivos do

descontentamento dos produtores gaúchos decharque, couro e muares, uma vez que a pesada ta-xação do Império impedia que estes gêneros con-corressem com aqueles outros produzidos poruruguaios, paraguaios e argentinos. Muitos dosprodutos do Rio Grande do Sul também eramonerados pela bitributação, uma vez que tambémeram taxados nos locais de venda em algumas pro-víncias brasileiras. No Manifesto de 1838, publi-cado no dia 20 de setembro noCorreio do Povo , lia-se que:

O Governo de Sua Majestade Imperial, o Im- perador do Brasil, tem consentido que se avilte 

o Pavilhão Brasileiro, por uma covardia re- 

preensível, pela máescolha dos seus diplomatas,

e pela política falsária e indecorosa de que usa 

com as nações estrangeiras.

Tem feito tratados com potências estrangeiras,

contrários aos interesses e dignidade da Nação.

Faz pesar sobre o povo gravosos impostos e 

não zela os dinheiros públicos. ( gr i fo nosso) Tem contraído dívidas tais e por tal maneira que ameaçam a ruína da Nação.

Tem permitido contrabandos vergonhosos e ex- 

tremamente prejudiciais (...)  37 0

A revolta se iniciara quando o líder do movi-mento, Bento Gonçalves, exigiu a renúncia do pre-sidente da província em 1835. Pouco depois, Por-to Alegre era ocupada e, no ano de 1836, era pro-

197 per í o d o r eg en c i a l - 1831•184 0

37 0 Antonio MENDES Jr, Luiz RONCARI eRicardo MARANHÃO,  B ra sil H ist óri a, tex to e con su lt a, I m péri o, p. 229.

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clamada a República Rio-Grandense. Os revolto-sos estendem o seu domínio até Santa Catarina,onde também se proclama a República Juliana.Nas campanhas militares, Giuseppe Garibaldi, fu-turo líder da unificação italiana, desempenhara um

papel de importância. A rebelião somente seriacontornada no ano de 1845, com a participaçãode Luís Alves de Lima e Silva, o futuro Duque deCaxias. Para se ter uma idéia da força política des-te movimento, basta observar o modo como o Im-pério acolheu a política de encerramento da rebe-lião. Todos foram anistiados, os oficiais revoltososforam incorporados ao Exército nacional, as terrasocupadas ou confiscadas durante a guerra foramdevolvidas, todo escravo que houvesse participadodo conflito foi alforriado.

De uma maneira geral, a saída de D. Pedro I dogoverno abriu espaço para que o desejo latente deampliação do poder provincial tomasse conta dosânimos de algumas das províncias brasileiras. Nãoraro era o objetivo separatista e republicano, deonde podemos supor que a figura do Imperadoramalgamasse uma estrutura precária, que primavapela distinção em seu mais alto grau. De fato, asfronteiras brasileiras bem que representavam umaunião apenas desejada do Brasil. Observe-se, porexemplo, a distância existente entre o Norte e Nor-deste do país para com o Sudeste. As regiões quegravitavam em torno de Salvador ou Recife já ha-viam respirado o oxigênio do poder nos primeirosduzentos anos de colonização portuguesa. Temposuficiente para que se forjasse uma cultura de do-mínio político no interior das famílias relacionadasaos engenhos produtores de açúcar. A invasão eposterior expulsão holandesa e real fracasso do ne-gócio açucareiro nordestino na competição antilha-na, somadas à descoberta do ouro nas Minas Ge-

rais e à transferência da cultura do poder para oRio de Janeiro, terminaram por limitar a interlocu-ção destas elites locais junto à política nacional.

Vários comentadores da história tributária bra-sileira apontam o período regencial como um mar-co na sistematização dos impostos no Brasil. Savé-rio Mandêtta descreve desta forma o período emquestão:

O espaço de tempo que vai da partida de D.

Pedro I atéa proclamação da maioridade de D.

Pedro II , abrangendo, portanto, mais de nove 

anos, representa para o setor administrativo 

grande passo na transformação do regime fiscal,

e tão rico éem ocorrências vinculadas direta- mente àreforma por que, em cada período, ia 

ele passando, de poder asseverar-se positiva- 

mente, ter sido o alicerce sobre o qual foi se fundamentando a estrutura do sistema hoje 

adotado. 37 1

Bernardo Ribeiro de Moraes alude ao períodocom o seguinte comentário:

O Ato Adicional de 1834 constitui outro pas- 

so àtendência descentralizadora e discrimina- tória de rendas tributárias estabelecidas pelas 

leis de 1832 e 1833. Inúmeros autores apon- tam a importância do aludido Ato para a con- 

cretização de uma discriminação de rendas tri- 

butárias, caracterizando-o como o primeiro es- 

boço ou ensaio de discriminação de rendas no 

Brasil.  37 2

Paul Hugon refere-se a este momento como sen-do “de grande interesse para o estudo da tributaçãono Brasil”. 37 3 Guilherme Deveza observa que:

(...) embora as leis orçamentárias se aperfeiçoas- 

sem de ano para ano, na parte da despesa, quer 

geral, quer provincial, os componentes da receita 

continuavam a ser apresentados de forma frag- 

mentária, não permitindo ao contribuinte brasi- 

leiro a visão completa do modo como era onera- 

do. Daía importância da lei de 24 de outubro 

de 1832, que orçou a receita e fixou a despesa 

para o ano financeiro de 1833-1834. Nesta lei aparecem, pela primeira vez, as ‘Rendas pú- blicas’ divididas em ‘Receita Geral’ e ‘Receita 

Provincial’; sob a receita geral enfileiravam-se os 

vários itens que a compunham, mas quanto àre- 

ceita provincial l imitou-se a lei a dizer que lhe 

pertenciam ‘todos os impostos ora existentes não 

compreendidos na receita geral’.  37 4

198 T R I B U T O S D O B R ASI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

37 1 Savério MANDÊTTA,  I m post os, T ax as e C on tr ibu ições , p. 541.37 2 Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 51.

37 3 Paul HUGON, op. cit ., p. 163.37 4 GuilhermeDEVEZA, op. cit., p. 67.

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Percebe-se que o período regencial procurou semover orientando-se pela clarificação dos aspec-tos tributários. Curioso observar que esta questãotenha tido oxigênio para ser refletida neste instan-te. De fato, o momento político nacional primavapor se encontrar em meio a um nicho onde a cen-

tralização do poder, típica do período que o an-tecedera, não era uma característica marcante. Aausência de um monarca e a espera pela maiorida-de de outro podem ter contribuído para que o pe-ríodo fosse caracterizado pela atenção concedidaàs províncias. Os movimentos de revolta contri-buíram para a reorientação política; e é de se su-por que algumas lideranças locais percebessemeste momento como propício para recolher àsprovíncias alguns dos tributos que somente eramcobrados e convertidos em receita para o Império.

A reputação às províncias neste período pode serinserida num contexto maior, que se seguirá até o

final do Segundo Império e ocupará principal-mente as hostes republicanas. Da ênfase na im-portância das províncias ao federalismo, o passodado não era tão grande assim. Podemos suporque já se encontrava em estado embrionário omote de luta dos grandes opositores ao excessivo

poder imperial.É claro que o conceito de tributar as províncias já existia. O inovador, no caso, era o próprio po-der central estabelecer e discriminar quais seriamos tributos de uma ou de outra esfera. Interessan-te também observar que, o que para o contribuin-te de hoje é uma evidência – as tributações dife-renciadas entre os governos federal, estadual e mu-nicipal –, teve data de nascimento na história doBrasil e mais exatamente no interior de um perío-do que é tradicionalmente visto como um hiato

entre a saída de um imperador e o aguardo da che-gada do próximo: o período regencial.

199per í o d o r eg en c i a l - 1831•184 0

“O espaço de tempo que vai da partida de D. Pedro I até a proclamação da

maioridade de D. Pedro II, abrangendo, portanto, mais de nove anos, representa

para o setor administrativo grande passo n a transformação do regime fiscal...”64. Manuel Araújo de Porto-Alegre, S  AGRAÇÃO DE  D. P EDRO II, 1840; óleo sobre tela.

Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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20 0 T R I B U T O S D O B R ASI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

O conceito de tributar províncias, existente no bojo do federalismo, veio

transformar o sistema tributário brasileiro.

65. Cândido Mendes,  ATLAS DO IMPÉRIO DO BRAZIL. Rio de Janeiro, 1868. São Paulo,

Coleção Guita e José Mindlin.

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Savério Mandêtta entende que:

dois fatos de suma importância, no concernente 

 àorganização fiscal do país, emergem e deter- 

minam mutações essenciais na criação e aplica- 

ção dos tributos, bem como nos serviços de ar- recadação e fiscal ização dos serviços: 

a) a reorganização do Tesouro Nacional; b) a designação de competência do Governo 

Central e das Províncias e as respectivas espe- 

cificações. 37 5

Através da Lei de 4 de outubro de 1831, foramextintos o Tesouro Nacional, o Conselho da Fa-zenda, as juntas provinciais e foi organizado o

 Tribunal Nacional do Tesouro, além das Tesou-rarias das Fazendas nas províncias. O Tribunal do Tesouro organizou-se da seguinte forma:

a) presidente (Ministro da Fazenda); 

b) um inspetor geral; 

c) um contador geral; 

d) um procurador fiscal, com título de Conse- 

lheiro, todos nomeados pelo Imperador.

Competia-lhe: 

a) a suprema direção e fiscalização da renda e despesa; 

b) a distribuição e contabilidade de todas as 

rendas públicas e a administração dos próprios 

nacionais; 

c) instituir rigoroso exame sobre o estado de ar- 

recadação e distribuição das rendas nacionais.

Foram criados no Tesouro Nacional: 

a) a inspetoria geral; b) o contador de revisão; 

c) a tesouraria geral.  37 6 

Para que adentremos ainda mais aquilo que foia primeira Reforma Tributária do país – ou seja, aprimeira racionalização do sistema tributário na-cional –, devemos observar os impostos que foram

abolidos no referido período. Apenas no ano de1831, a Dízima arrecadada na Bahia somente seriaaplicada na exportação, ficando isentos de tributa-ção todos os gêneros que fossem levados de umaprovíncia para outra; os impostos de importação

de gêneros e mercadorias entre as províncias foramabolidos, mesmo que pudessem ser criadas barrei-ras alfandegárias entre as mesmas; foram extintosos tributos sobre pescado, foros, sesmarias, pren-sas de engenho de açúcar e o subsídio nacional;isentaram-se livros, máquinas ainda não em usonas províncias, prédios urbanos nas vilas e povoa-ções com menos de 100 casas, assim como a pól-vora; foram abolidos os direitos de entrada do sal,excetuando-se apenas a contribuição de $080 poralqueire. 37 7  Em 1832, extinguiu-se o imposto do

Banco (sobre lojas).Mudanças são operadas também no que dizia

respeito às questões alfandegárias. Nesse sentido,observamos que:

A Regência, apesar dos freqüentes tumultos e 

rebeliões, encontrou tempo para organizar ad- 

ministrativamente o Império, dotando-o de uma 

estrutura governamental centralizada, mas ra- 

cional. A Fazenda Pública foi objeto de uma re- 

forma total, entre 1830 e 1832, com a extin- 

ção do Erário Régio, das Juntas e do Conselho 

da Fazenda, substituídos pelo Tr ibunal do Te- souro Público e pelas Tesourarias Gerais. Cria- 

ram-se as Mesas de Rendas e as Coletorias, ao 

mesmo tempo em que se aboliam numerosas re- 

partições locais, que jánão tinham razão para 

existi r.

As Alfândegas ganharam finalmente uma nova 

legislação, para substituir o velho foral da Al- 

fândega de Lisboa, de 1587. Em 25 de abril de 1832 foi baixado por decreto o Regulamento das Alfândegas do Império, substituído por um 

novo em 22 de junho de 1836. Paralelamente,

a Regência criava, nos portos onde não houvesse 

aduana, as Mesas de Rendas, regulamentadas 

por decreto de 30 de maio de 1836. Os velhos 

Juízes da Alfândega foram, em 1834, substi- 

tuídos pelos Inspetores da Al fândega. 37 8

20 1per í o d o r eg en c i a l - 1831•184 0

37 5 Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 542-543.37 6  Idem, ibidem , p. 543.37 7  Idem, ibidem , p. 545.37 8 Cf. Internet, Siteda Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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Passo significativo rumo à conclusão da Refor-ma Tributária foi dado com as leis de 24 de outu-bro de 1832 e de 8 de outubro de 1833. As des-pesas e as receitas foram definitivamente divididasentre geral e provincial. Para se analisar mais a

fundo este novo quadro tributário, é preciso ob-servar melhor a sistematização dos tributos no in-terior destas determinações:

Rec eit a Ger al

✠ Direitos de importação e exportação, baldeação e 

reexportação, emolumentos que se cobram nas 

alfândegas; 1/ 2 % de assinados das armazena- 

gens, ancoragem e faróis; 

✠ Contribuições da junta de comércio sobre volu- 

mes e embarcações e o imposto de banco; o de 5%das embarcações estrangeiras que passam a na- 

cionais e 5% da renda das nacionais; 

✠ Direito de 25% do ouro, sisa dos bens de raiz,

porte do correio de mar e terra e o imposto para 

a Caixa de Amortização da Dívida Pública; 

✠ Dízimo do açúcar, algodão, café, tabaco, fumo e 

contribuição sobre algodão; dízimo do gado va- 

cum e cavalar; 20% dos couros do Rio Grande do Sul e 40% da aguardente na Bahia; 

✠ Selo das mercês, dízimos de chancelarias, novos e 

velhos direitos das graças e títulos expedidos pelo 

Poder Executivo e pelos tribunais e emolumentos 

que se cobram nos tribunais de Justiça, na chan- 

celaria das ordens do carneiro e das três ordens 

militares, mestrado; e contribuição do montepio; 

✠ Matrícula nos cursos jurídicos e acadêmicos e rendimentos da Casa da Moeda; 

✠ Venda do pau- brasil e dos próprios nacionais,

renda diamantina e foros de terrenos de mari- 

nha, bens de defuntos e ausentes, cobrança da dí- 

vida ativa e da bula da cruzada; 

✠ Emissão de apólices dos empréstimos estrangei- 

ros; rendas eventuais e não classificadas que pro- 

vêm dos arsenais e marinha e da renda dos va- 

sos de guerra, l impa das alfândegas e rendimen- 

to da fábrica de pólvora; 

✠ Saldos e sobras da receita geral e provincial.

Rec eit a Pr o vin c ial

✠ Todos os impostos existentes na época e não com- 

preendidos na receita geral, calculados em

2.386:000$000. 37 9

Em 1834, somente para se ter uma idéia dos im-postos que cabiam às províncias arrecadarem, temos:

✠ À transmissão de propriedade a título gratui to,

excluindo-se a das apólices; 

✠ Às taxas de viação em estradas das províncias e 

navegação de rios internos; 

✠ Aos rendimentos das indústrias e profi ssões per- 

mitidas em lei; 

✠ À renda do capital pessoal, cuja avaliação se ba- 

seava nas despesas suntuárias ou no valor loca- 

tivo da habitação; 

✠ Ao gado de consumo e aguardente. 38 0

20 2 T R I B U T O S D O B R ASI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

37 9 Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 546-47.

38 0 Idem, ibidem , p. 550.38 1 Idem, ibidem , p. 551-552.

66. C  ASA DA  MOEDA, Rua Azeredo Coutinho, Rio de Janeiro, 1921 (planta baixa), s.d.,

Museu da Fazenda Federal.

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Entre os anos de 1837 e 1840, o último doperíodo regencial, foram ainda abolidos os se-guintes tributos:

✠ Os direitos de 50 réis nos couros (Pernambuco 

e Alagoas); 

✠ Os donativos do azeite (Bahia); 

✠ A contribuição de 60 réis em saca de algodão 

exportado (Pernambuco) e de 120 réis (Bahia); 

✠ A contribuição de 10% sobre a carne seca ex- portada (São Pedro); 

✠ A contribuição de 80 réis por tonelada de carne 

seca exportada (Pernambuco); 

✠ 40% adicionais da aguardente (Bahia); 

✠ Do direito da parte (São Pedro); 

✠ A décima da chancelaria foi substituída por 2%de valor de qualquer demanda; 

✠ A contribuição sobre couros para consumo nas 

províncias. 38 1

Ao final do período regencial, como se podenotar, temos um quadro tributário positivo, devi-do à discriminação de receitas. De acordo com aConstituição, as Assembléias Provinciais já po-diam deliberar, segundo as suas receitas e despesas,quais seriam os impostos necessários, contantoque não prejudicassem as imposições gerais do Es-tado (Lei nº16, de 12/ 08/ 1834). Tal possibilida-

de já sinalizava para a orientação política do pe-ríodo, que era de dividir relativamente o poder en-tre o governo central e as províncias. A referida leiapontava que:

A Regência Permanente em Nome do Impera- 

dor o senhor D. Pedro I I , faz saber a todos os 

súditos do Império que a Câmara dos Depu- 

tados, competentemente autorizada para refor- 

mar a Constituição do Império, nos termos da 

Carta de Lei de 12 de outubro de 1832, de- 

cretou as seguintes mudanças e adições àmes- ma Constituição.

20 3per í o d o r eg en c i a l - 1831•184 0

A Casa da Moeda é considerada Área de Segurança Nacional. Teve muitos endereços

no Brasil, na Bahia, no Rio de Janeiro e em Brasília.

67. F  ACHADA DA C  ASA DA  MOEDA, Rio de Janeiro, s.d., Museu da Fazenda Federal.

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Artigo 1º - O direito reconhecido e garantido 

pelo artigo 71 da Constituição seráexercitado 

pelas Câmaras dos Distritos e pelas Assem- 

bléias que, substituindo os Conselhos Gerais, se 

estabeleceram em todas as províncias com o tí- 

tulo de Assembléias Legislati vas Provinciais.(...) 

Artigo 10º - Compete às Assembléias Legisla- 

tivas Provinciais legislar: (...) 

Parágrafo 5º - Sobre a fixação das despesas 

municipais e provinciais e os impostos para elas 

necessários, contanto que estes não prejudiquem 

as imposições gerais do Estado. As Câmaras 

poderão propor os meios de ocorrer às despesas 

dos seus municípios.

É interessante que observemos algumas leispromulgadas pela Assembléia Legislativa da pro-víncia de São Paulo, com o intuito de perceber atipificação fiscal que a Lei nº16, de 12/ 08/ 1834,permitia 38 2:

Agência Fiscal - Criaráo Governo uma Agên- 

cia Fiscal junto àestação de ferro na Luz para 

cobrar o imposto dos gêneros despachados na 

mesma estação e que não houverem pago em al - 

guma Barreira - Lei nº93 de 24 de Abril de 

1870, art. 35º. 38 3

Agente fiscal - Foi criado este emprego munici- 

pal em Botujurú, Município de Iguape, com a 

grati ficação de 80$000. Res. nº97, de 29 de 

Abril de 1870.  38 4

Agentes Fiscais - A eles e aos Coletores que, ex- 

cedendo os prazos para o recolhimento dos saldos,

provarem causa justa, foi o Governo autorizado a relevar as multas e perda de porcentagem. - Lei nº88, de 18 de Abril de 1870.  38 5

Água Potável - Para o encanamento dela e cons- 

trução de um chafariz na Cidade de Lorena foi 

a Câmara Municipal respectiva autorizada a 

contrair um empréstimo de 4:000$000 pagá- 

vel em quatro anos com o produto das rendas 

municipalizadas e do imposto sobre portas e ja- 

nelas. - Res. nº40, de 8 de Abril de 1868.  38 6 

A questão do Padroado, a ligação entre o Esta-do e a Igreja, presente na Constituição de 1824,permitia que se cobrassem tributos para a constru-ção de igrejas. Através deste sistema, que já era umatradição em nosso país desde a Colônia, o Impera-dor poderia indicar nomes para o preenchimentodos cargos eclesiásticos mais significativos, o quedependia somente de uma confirmação papal. Oclero, por sua vez, recebia auxílios diretos do gover-no, o que fazia com que os padres praticamente fos-

sem funcionários do governo. Neste sentido, dentretantos outros, um caso exemplar é aquele que obser-vamos no município de Amparo, no ano de 1864:

Amparo - Exclusivamente para as obras da Ma- 

triz desta cidade foram estabelecidas as seguintes 

imposições municipais: 40 réis por arroba de 

café, 20 réis por arroba de açúcar e 30 réis por 

canada de aguardente que se produzir no Muni- 

cípio; 10 mil réis anuais por cada loja de fazen- 

das secas ou de ferragens, e escritório de Tabelião 

e Escrivão; 6 mil réis por armazém de louça e de 

molhados, e 2 mil réis por taberna que for ma- triculada na Coletoria para o pagamento dos im- 

postos gerais; 20 mil réis por cada indivíduo que 

exercer a profissão de Advogado, Médico, Cirur- 

gião e Capitalista; 20 mil réis pelas casas que 

venderem sal, de um alqueire para cima; 4 mil 

réis por alfaiates, 2 mil réis por sapateiros, 2 mil 

réis por ferreiros, 4 mil réis por pedreiros, 10 

mil réis por empreiteiros de taipas, 10 mil réis 

por ourives, 10 mil réis por marceneiros, 4 mil réis por carpinteiros, 2 mil réis por meirinhos.Os habitantes da Cidade que não estiverem com- 

preendidos nos artigos supra, pagarão 160 réis 

anuais e o mesmo pelas pessoas deles dependentes 

de 10 anos para cima.

20 4 T R I B U T O S D O B R ASI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

38 2  Todas as citações a seguir fazempartedo R epert óri o das L eis P rom u lgad as pela A ssem bléi a L egisl at iv a da P rov ín cia de S. Pa u lo desd e 18 35 até 18 7 5, ordenadoeoferecido à mesma Assembléia por João Carlos da Silva Telles, São Paulo, Typografia do Correio Paulistano, deJ. R. deA. Marques, 1877.

38 3 Idem, ibidem , p. 8.38 4 Idem, ibidem .38 5 Idem, ibidem .38 6  Idem, ibidem , p. 10.38 7  Idem, ibidem , p. 26-27.38 8 Idem, ibidem , p. 415.

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Pagarão os tropeiros 320 réis por cada animal com que trabalharem para fora da Cidade.

Os vendedores de animais cavalares e muares,

entrados de fora do Município pagarão mil réis 

por cada animal que venderem.

Os que de fora do Município vierem a ele 

para vender escravos pagarão 10 mil réis por 

cada um.

Os que matarem rezes para o consumo do 

Município pagarão 4 mil réis anualmente.Os que tiverem casas de aluguel pagarão 2 mil réis por cada uma anualmente, inclusive 

os quartos.

Os que tiverem carros por negócio pagarão 4 

mil réis anualmente por cada um.

Os que tiverem olarias para o fabrico de te- 

lhas e tijolos, não sendo para o consumo pró- 

prio pagarão 10 mil réis anualmente. - Res.

nº 29, de 22 de Abril de 1864.  38 7 

São várias as leis promulgadas neste período,que impunham tributos por conta da construção

ou da melhoria das igrejas espalhadas pelos muni-cípios paulistas. Do mesmo teor de ligação entreIgreja e Estado eram ordens fiscais relacionadasinclusive às festas das Igrejas. É assim que a Leinº13 de 27 de fevereiro de 1847 dizia que:

Os que quiserem ti rar esmolas para as festivi- 

dades religiosas fora da Paróquia em que elas 

houverem de fazer-se, pagarão o imposto de 10 

mil réis em cada Freguesia que percorrerem, o qual seráaplicado às despesas da respectiva Matriz. Os que tirarem tais esmolas sem licen- 

ça da Autoridade Policial da Paróquia e conhe- 

cimento do pagamento do imposto, serão multa- 

dos em 30 mil réis, além do imposto. 38 8

De fato, a Igreja se encontrava intimamente en-trelaçada com o Estado, como podemos perceberno espaço escolhido para a divulgação daquelesque pagaram impostos corretamente no ano de

1861:

20 5per í o d o r eg en c i a l - 1831•184 0

Sobre construções de igrejas e festas religiosas incidiam impostos com alíquotas

diferentes, dependendo do período histórico em que foram cobrados.

68. F ESTA DO DIVINO, século XIX; aquarela sobre papel. São Paulo, Coleção Partic ular.

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Impostos Provinciais - Os empregados encarre- 

gados da sua cobrança são obrigados a fazer no 

último dia de cada mês uma lista nominal de to- 

dos os contribuintes que durante o mês tenham 

pago o imposto em dinheiro ou título que o repre- 

sente, com designação da quantia recebida e res- pectivo imposto, e afixarão essa lista no interior 

da Matriz da Paróquia, em lugar em que possa 

ser vista por todos, tendo cuidado em que ela per- maneça afixada por espaço de sessenta dias; e re- 

meteráuma cópia dela, autenticada pelo seu Es- 

crivão, ao Tesouro Provincial, com as contas do 

mês para a competente fiscalização e liquidação.

Lei nº16, de 3 de Agosto de 1861, art. 24.  38 9

Interessante avaliar o papel destinado ao fiscal,

observando as Leis e Posturas Municipais aprova-das pela Assembléia Legislativa de São Paulo em1869. Nesse ano, segundo o Artigo 92 do Capí-tulo II, que tratava das atribuições do Fiscal, ve-mos que:

O fiscal venceráo ordenado de 350 mil réis, e é 

obrigado, sob a pena de multa de 5 mil réis, para 

o desempenho dos deveres que lhe incumbe o arti- 

go 85 da Lei de 1º de outubro de 1828: 

Parágrafo 1º - A fazer 4 correções ordinárias tri- 

mensalmente, em dia que marcarápor edital, com espaço de quinze dias pelo menos, e diferente da- 

quele em que a Câmara tiver de começar as suas 

sessões ordinárias. Além dessas correções faráex- 

traordinárias, quando o bem público o exigir.

Parágrafo 2º - A apresentar em cada reunião or- 

dinária da Câmara atéo 2º dia, o relatório do 

estado do município em geral, e do que tiver ocor- 

rido nas correções anteriores, propondo as medi- das que julgar convenientes àboa administração da Câmara, e sobre posturas.

Parágrafo 3º - A assistir aos alinhamentos e ni- 

velamentos.

Parágrafo 4º - A apresentar àCâmara uma re- 

lação das multas impostas.

Artigo 93 - O Fiscal, além do ordenado terá: 

1º, das multas que impuser e arrecadar 5%; 

2º, de cada alinhamento e nivelamento, mil 

réis. 39 0

No Capítulo III da mesma lei, observamos asseguintes atribuições do Procurador:

Artigo 94 - O Procurador, além dos 6% a que tem direito pela Lei de 1º de outubro de 

1828 (art. 81) perceberáa título de gratifi- 

cação, mais 6% do que for arrecadado. É 

obrigado além dos deveres que lhe incumbe o 

referido artigo: 

Parágrafo 1º - A fazer o lançamento de todos os 

impostos estabelecidos, no mês de Julho, em livro para esse fim destinado, e rubricado pelo Presi- 

dente. Desse lançamento remeterácópia àCâma- ra na sua 1º sessão.

Parágrafo 2º - A promover a cobrança amigável 

e judicialmente de todos os impostos e multas.

Parágrafo 3º - A ter talões impressos de todos os 

impostos, os quais serão numerados e rubricados 

pelo Presidente da Câmara.

Parágrafo 4º - A passar os conhecimentos e reci- bos aos contribuintes, cortados dos talões e nume- 

rados sucessivamente atéo último que passar no 

fim do ano financeiro.

Parágrafo 5º - A apresentar atéo 2º dia de 

cada sessão ordinária a conta da receita e des- 

pesa da Câmara do trimestre findo, e uma re- 

lação nominal de todas as pessoas que pagarão 

impostos e mul tas, com declaração da quantia e número do talão, e artigos que foram infrin- gidos.

Parágrafo 6º - A apresentar outra relação das 

que ficarão por pagar e o estado de cobrança.

Parágrafo 7º - A dar aos contraventores recibos 

das multas que pagarem.

20 6  T R I B U T O S D O B R ASI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

38 9 Idem, ibidem , p. 474.390 C oleção de Leis e Posturas Mu nicipais aprovadas pela A ssembléia Legislativa Provincial de S. Paulo no ano de 186 9 , São Paulo, Typografia a Vapor deJorge

Seckler & Comp., 1885, p. 80-81.

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Parágrafo 8º - A fazer o lançamento da receita e 

despesa da Câmara em livro especial para esse 

fim, com todas as especificações da natureza da 

renda e das autorizações para a despesa. 39 1

No entanto, pode-se observar que ainda haviaum número excessivo de rubricas e que as provín-cias, mesmo que contempladas pela receita de tri-butação, ainda se encontravam no limiar de um de-senvolvimento fiscal mais autônomo. Pelo fato deserem discriminadas como passíveis de receberemtributos específicos e por não se encontrarem sa-tisfeitas com o que obtiveram, algumas delas iriamamadurecer idéias de autonomia frente aos exces-sos do poder imperial. Para se ter uma idéia, ob-servem-se os impostos existentes na Lei orçamen-

tária nº108, de 20 de maio de 1840, meses antesdo Golpe da Maioridade:

Rec eit as Ger ais(Go ver n o Cen t r al )

✠ Direitos sobre importação (15%), sobre o chá 

(30%), sobre a pólvora (50%), sobre a reex- 

portação (2%), sobre armazenagem (1,4%),

sobre exportação (7%), etc.

✠ Direitos sobre as embarcações estrangeiras que passam a ser nacionais (15% de seu valor); Lei 

de 15 de novembro de 1831, art. 51.

✠ Direitos novos e velhos dos empregos e ofícios ge- 

rais, pelas mercês gerais (privi légios e faculdades 

recebidas, como o caso de dignatário da Ordem 

da Rosa); Lei de 11 de abril de 1661.

✠Emolumentos de certidões, de polícia, etc.

✠ Dízima da Chancelaria. I nicialmente era uma 

pena que se impunha àquele que fazia máde- 

manda (perdia), revertendo uma receita para o 

fisco (10% sobre o valor da causa), conforme 

Alvaráde 25 de setembro de 1655. Mais tar- 

de foi substituída pelo imposto de 2%; Lei 

nº98, de 31 de outubro de 1835.

✠ Décima adicional das corporações de mão morta.

Estas corporações pagavam a décima urbana com 

100% de acréscimo; Decreto de 7 de novembro 

de 1831.

✠ Sisa dos bens de raiz. Criada pelo Alvaráde 3 de junho de 1809, incidia nos contratos de com- 

pra e venda, de arrematações, de trocas e doações 

de bens de raiz (10%).

✠ Imposto adicional sobre bebidas espirituosas.

✠ Imposto sobre barcos do interior.

✠ Imposto sobre despachantes e corretores.

✠ Imposto sobre exportação (instituído pelo Alva- ráde 25 de abril de 1818), com o produto da 

arrecadação dividido entre governo central e pro- víncias.

✠ Imposto sobre mineração de ouro e de outros me- 

tais (ouro em pó, ouro em barras, etc.) . Substi- 

tuiu o quinto do ouro; Lei de 27 de outubro de 

1827.

✠ Imposto do selo do papel. Criado pelo Alvaráde 

17 de junho de 1809, incidia sobre todos e 

quaisquer títulos, folhas de livros, papéis foren- ses e comerciais.

✠ Imposto sobre lojas. Criado pelo Alvaráde 20 

de outubro de 1812, recaindo sobre cada loja,

armazém ou sobrado.

✠ Imposto sobre seges, carruagens e carrinhos. Al- 

varáde 20 de outubro de 1812.

✠ Imposto sobre venda de embarcações nacionais (navios e embarcações). Alvaráde 20 de outu- 

bro de 1812.

✠ Imposto sobre loterias. Lei de 11 de outubro de 

1837.

✠ Taxa dos escravos. Cobrada por escravo possuí- 

do. Lei de 8 de outubro de 1835.

20 7 per í o d o r eg en c i a l - 1831•184 0

39 1 Idem, ibidem , p. 81.

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Rec eit as Pr o vin c iais(Gover n o d as Pr o vín c ias)

As províncias poderiam criar qualquer tributodesde que fosse diferente daqueles que fossem de

competência exclusiva do governo central.

✠ Décima dos legados e herança, pagos pelos her- 

deiros ou legatários.

✠ Dízima dos gêneros (açúcar, café, etc.).

✠ Imposto sobre a transmissão da propriedade móvel.

✠ Novos e velhos direitos.

✠ Meia-sisa dos escravos ladinos (que sabiam ler).

✠ Subsídio literário, com diversas finalidades as- 

sistenciais.

✠ Décima dos prédios urbanos (décima urbana),

que incidia sobre os proprietários de prédios si- 

tuados na cidade do Rio de Janeiro e lugares no- táveis do município da corte (10% do rendi- mento líquido). Este imposto foi criado pelo Al- 

varáde 27 de julho de 1808 e transmitido a 

favor das províncias pela Lei nº58, de 3 de ou- 

tubro de 1834. Mais tarde passaria a ser deno- 

minado Imposto Predial.

✠ Taxa de viação em estradas provinciais e de na- 

vegação em rios internos (passagem dos rios).

✠ Imposto sobre casas de leilão e modas. Lei de 15 de novembro de 1831.

20 8 T R I B U T O S D O B R ASI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

Ainda em 1835, era cobrada uma taxa pela propriedade de plantéis de escravos.

69. Jean Baptis te De bret, E NTRUDO, RIO DE  J  ANEIRO, 1823, aquarela sobre papel.Rio de Janeiro, Fundação Museus Castro Maya.

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Rec eit as mun ic ipais(Gover n o d o s Mun ic ípio s)

Os municípios tinham os tributos que asprovíncias definiam como próprios e por isso

variavam de acordo com a província a que per-tencessem. 39 2

Bastante significativa é a análise da Lei nº108,de 26 de maio de 1840, que fixou a despesa e or-çou a receita para o ano financeiro de 1840-1841.Para se ter uma idéia, citaremos alguns destes nú-meros:

✠ Despesa Geral, de 19.073.853$815;

✠ Receita Geral, de 16.500.000$000;

✠ Despesas com “os alimentos de Suas Al tezas Im- 

periais”, de 16.800$000;

✠ Despesas com a Câmara dos Deputados e Secre- 

taria, de 275.328$000; 

✠ Despesas com Vacinas, de 1.750$000; 

✠ Despesas com Bispos e Relação Eclesiástica, in- 

cluída a quantia de 1.200$ para sustentação do 

Bispo resignatário D. Thomáz de Noronha, des- 

de já, de 22.813$334; 

✠ Dotação de S. M. o Imperador, desde já, de 

240.000$000; 

Percebe-se, desde aquela época, que o déficit jáera previsto em orçamento e o lançamento de no-vos impostos deveria ser o meio para dar cabo des-ta situação. A partir da discriminação da receita

do Império, o governo partiria para a cobrança deuma série de taxas que dessem conta da coberturado prejuízo. É interessante enfatizar novamenteque as despesas com a Igreja, uma vez que esta ins-tituição estava ligada ao Estado, eram previstas nopróprio orçamento do Império e, neste sentido,mesmo que se propalasse a idéia da liberdade decredo, todos deveriam contribuir, na forma dosimpostos dos mais diferentes tipos, para as melho-rias ou manutenção da Igreja Católica. Em nossa

história, foi somente a partir da Constituição de1891 que esta situação chegou a um termo, umavez que estabeleceu-se a separação entre esta Insti-tuição e o Estado.

20 9per í o d o r eg en c i a l - 1831•184 0

39 2 Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 52-55.

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 Em 1879 , cria- se o imposto de transporte. Já ex istia algo semelhante desde 1837 ( imposto de bestas e cavalos que entram na cidade e imposto de embarcações em trânsito já ex istiam no Município N eut ro). N as províncias sempre ex istiu, sob denominações diferentes, imposto do giro, de trânsito, de incorporação, de viação. Esse imposto continuou a faz er

 parte da renda geral e provincial. O governo da U nião cobrava 1$ sobre as passagens acima de 90 $ nas estradas de ferro e acima de 9$ nas barcas a vapor; passagens abaix o desse preço nada pagavam.

o seg u n d o r ei n a d o1840 • 1889

210 TRI BUTO S DO BRASIL imper i al - 1822•1889 2 ª Parte

O federalismo emergente e a nova partilha do bolotributário. A Guerra do Paraguai abre caminho para o fim

da escravidão e o advento da república.Aparecemnovostributos coma modernização da economia. As provínciasreclamammaior participação no bolo tributário. O caféabre novo ciclo econômico e gera novo pólo de poder.

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Na continuidade da organização política quevinha do tempo de D. Pedro I, grosso modo, acena partidária dos períodos posteriores se divi-dia entre conservadores e liberais. A rigor, estesgrupos não se diferenciavam tanto, uma vez quese encontravam organicamente relacionados comas esferas do poder. Pode-se dizer, no entanto,que os liberais tinham mais abertura para pensaro país do ponto de vista do federalismo, sendoque os conservadores davam apoio incondicionalà Monarquia centralizadora. A evolução dos fa-tos, principalmente a partir da década de 70 doséculo XIX, fez com que as distinções entre estesdois blocos se definissem com maior clareza. Nofinal da fase regencial, as diferenças entre essasorientações, ao menos no caso brasileiro, eram

apenas superficiais. Como exemplo, lembremo-nos de que os liberais brasileiros deste período

eram adeptos incondicionais da escravidão, algoque deixava qualquer adepto do liberalismo inglêssurpreendido. Devemos levar em consideraçãoque, como já sinalizamos, os grupos políticos or-bitavam em torno do poder e, mesmo que não oocupassem de fato, representavam os interesses defacções econômicas que não se diferenciavam tan-to entre si. É evidente que, com o desenvolvimen-to da economia brasileira deste período, sobretu-do com o crescimento da importância agro-ex-portadora do café, aprofundaram-se as distinçõesquanto aos objetivos imediatos dos fazendeirosrelacionados ao Vale do Paraíba fluminense e osantigos proprietários dos engenhos decadentes doNordeste. Uniam-se, porém, e as divergências aca-bavam se fosse necessária uma nova formação em

torno da manutenção das mesmas regras de jogopolítico já conhecidas.

211O br a si l n o seg u n d o r e i n a d o - 184 0 •1889

70. Louis Alexis Boulanger, D. P EDRO II, bico de pena, assinado, c. 1835.

Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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Devemos enfatizar que a idéia do federalismo,tão cara aos futuros republicanos no embate con-tra a Monarquia centralizadora, já começa a sernutrida no interior do debate político deste perío-

do. Como que asseverando a tese de que os gruposque possuíam alguma orientação distinta quantoaos objetivos políticos costumavam se integrar nosmomentos convenientes, lembremo-nos de que olongo período do Segundo Império, tradicional-mente visto pela historiografia como pacífico etranqüilo do ponto de vista institucional, não co-nhecerá grandes aprofundamentos do debate acer-ca do federalismo. Esta idéia somente virá a sertrabalhada com mais ênfase nos momentos maiscruciais – após a Guerra do Paraguai ou depois do

fortalecimento econômico do grupo cafeeiro dooeste paulista – do Segundo Império onde, apa-rentemente, tudo o que fosse propício à crítica àsinstituições representadas pela Monarquia poderiaser aproveitado.

A identidade entre liberais e conservadores –nomes que remetem a sentidos e significados que,como tentamos mostrar, somente podem ser to-mados à luz das especificidades da história brasi-leira do período, já que estes mesmos sentidos se-riam esdrúxulos às orientações inglesas ou norte-americanas – pode ser bem observada no momen-

to em que é declarada a maioridade de D. Pedro II:dá-se um golpe político nos ditames da Constitui-ção e se inicia o período do Segundo Reinado. Seem 1834 um Ato Adicional antecipava a emanci-

pação do Imperador dos 21 para os 18 anos, em1838 a idéia era permitir que Pedro II passasse areinar aos 15 anos de idade, fato que somente foipossibilitado por meio da ingerência liberal – de-fensora desta idéia – e de um acerto político noSenado brasileiro. No dia 23 de julho de 1840, D.Pedro II assumia o trono e iniciava-se o período deseu reinado no Brasil. As distinções entre liberaise conservadores neste instante eram apenas cir-cunstanciais, cabendo aos primeiros a aproximação junto ao Imperador e aos últimos, a defesa da ma-

nutenção do período regencial. Os anos que se se-guiram iriam demonstrar que a questão de ordementre estes grupos políticos seria rapidamente ul-trapassada.

Se as distinções entre os grupos políticos quecercavam o Imperador eram ínfimas no Rio de Ja-neiro, o mesmo não se pode dizer quanto às outrasregiões do Brasil, principalmente aquelas que jáhaviam possuído, ao menos uma vez, a estruturade poder, com a possibilidade de interferir nos as-suntos nacionais. Este era o caso de Pernambuco,onde a decadência econômica grassava desde a

212 T R IB U T O S D O B RA SI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

No período da Guerra do Paraguai, além das dotações de guerra, um regulamento

de 28 de dezembro de 1867 instruía para que se arrecadasse um imposto pessoal

daqueles que residissem e/ou tivessem moradias no Império.

71. Victor Meirelles de Lima, B ATALHA N AVAL DO RIACHUELO, último quartel do século

XIX; óleo sobre tela. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

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descoberta do ouro na região de Minas Gerais, aolado da relativa diminuição da importância daprodução açucareira. Se a economia não atestavapreponderância aos pernambucanos, o hábito dopoder era bem conhecido. A Revolução Praieira de1848 pode ser vista como um movimento em queas distinções mais profundas no debate políticopernambucano alçam a cena das ruas e incendeiamos ânimos. No interior deste movimento pode-seobservar um confronto entre os conservadores –aqueles que desejam a manutenção das mesmas re-lações de privilégio, inclusive junto ao recente go-verno monarquista – e os liberais – que se orien-tam pela possibilidade de alteração das relaçõesentre a Província e o governo de Pedro I I. As aspi-rações dos revolucionários, muito próximas ao fe-

deralismo, embora não satisfeitas neste instante,somente seriam retomadas nos anos finais do Se-gundo Império, mesmo que então assumissem umsentido mais pragmático e estratégico no interiordo desejo imediato de um novo grupo econômicochegar ao poder. Ao que parece, o federalismo po-deria ter algum sentido de aplicação se fosse guia-do por um setor que se mostrasse mais poderosodo ponto de vista econômico e que não assustasseaqueles que até então se juntavam ao poder tradi-cional do país. Esta tese parece ser justificada pela

própria forma com que o Segundo Império che-gou ao fim, dando lugar à República Federativa.Bastante rico igualmente é acompanhar o con-

fronto entre as Províncias e o governo imperialatravés da discussão tributária do momento. Comovimos, o Período Regencial, ao delimitar os im-postos que seriam cobrados pelo governo e os ou-tros que formariam a receita das Províncias, inau-gurou uma nova sistemática tributária no país.Correspondendo a um instante da história brasi-leira em que algumas Províncias requisitavam

maiores atenções políticas, a discriminação de re-ceitas tributárias contribuiu para o arrefecimentodos ânimos, ao mesmo tempo que deve ter funcio-nado como uma resposta positiva frente às reivin-dicações autonomistas daquelas unidades.

Este estranhamento entre as Províncias e o go-verno imperial ganhará um contorno mais nítidonas discussões tributárias do Segundo Reinado.Não seria temeroso de nossa parte afirmar que setrata da gênese do confronto que irá opor federa-listas e centralistas, já no limiar da República.Essa impressão se baliza pelo que hoje chamaría-

mos de “guerra fiscal”, que pode ser percebida noacompanhamento das alterações operadas no sis-tema tributário brasileiro durante o governo de D.Pedro II.

O período também foi profícuo em questõesexternas, que forçosamente envolveram tanto a po-lítica como a economia do país. A Guerra do Pa-raguai, por exemplo, incidiu diretamente na maté-ria tributária e pode-se acompanhar o vulto desteevento somente pelas grandes modificações que seprocessaram no domínio fiscal no correr dos cin-co anos de sua duração. O conflito permite quepercebamos a dinâmica da tributação no país aocalor do momento de embate entre Brasil e Para-guai: impostos são majorados, outros são criados ealguns poucos são abolidos.

Do ponto de vista político, tradicionalmenteobserva-se que o Segundo Reinado, ou a Monar-quia, como um todo, saiu profundamente abaladotanto com a Guerra do Paraguai (1865-1870)quanto com a abolição da escravatura em 1888. Ahistoriografia revisionista criticou as visões tradi-cionais que interpretavam a Guerra do Paraguaicomo uma luta de nações democráticas contra umditador instalado no governo paraguaio. De modocorrelato, a mesma historiografia tradicional en-tendia que a Guerra surgiu como única solução

frente aos interesses anexionistas do Paraguai, pos-to que, não possuindo uma saída para o mar, so-mente restava a esta nação avançar sobre o Brasil,Uruguai ou Argentina. As já citadas análises críti-cas interpretam o desfecho da Guerra como umatentativa de os países unidos na Tríplice Aliança(Brasil, Argentina e Uruguai) afastarem uma únicanação, que se mostrava mais independente e autô-noma na América Latina. De fato, dados que sina-lizam uma quase erradicação do analfabetismo,uma propalada reforma agrária e um pátio indus-

trial destoante das outras nações do continenteamericano impunham às mesmas o temor peloporvir.

A mesma historiografia revisionista entendeque a Inglaterra também via com bons olhos umatentativa de destruição de um país que, de formadiferente de seus vizinhos, encontrava soluçõeseconômicas sem a tradicional dependência do ca-pitalismo inglês. Cinco anos de confronto termi-naram por desfacelar a nação paraguaia, reduzindoa população do país a níveis alarmantes, destruin-do suas indústrias e bloqueando o seu futuro de-

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senvolvimento de tal forma que, ao que parece, oParaguai de hoje guarda profundos problemasanunciados no final desta guerra.

As repercussões em nosso país também forammuitas e significativas. Do ponto de vista social,entende-se que a ida de muitos escravos à Guerraintroduziu uma contradição no interior da própriaescravidão. Aqueles que pretensamente lutavampela liberdade no Paraguai retornavam ao país ain-da na condição de escravos. Esta guerra tambémtrouxe, como conseqüência imediata, o fortaleci-mento do Exército brasileiro, instituição que ain-da era bastante desorganizada nos anos que ante-cederam ao conflito. Este é um elemento de con-siderável importância quando nos lembramos daparticipação das milícias brasileiras como prota-

gonistas dos acontecimentos que levaram à procla-mação da República em 1889.

Quanto à abolição da escravidão, tratou-se deum evento em que a simples observação da datamais marcante, o 13 de maio de 1888, não permi-te que se perceba, na totalidade, o quanto o pró-prio processo político que construiu a possibilida-de da extinção desta forma de trabalho onerou a

Monarquia. Como vimos, as pressões inglesas já sefaziam presentes desde os acordos que redundaramnos Tratados de 1810, isto é, anos antes da inde-pendência brasileira. Este assédio assume contor-nos mais radicais ao longo do século XIX. Em1845, o Parlamento inglês aprovaria uma lei co-nhecida pelo nome de Bill Aberdeem, na qual aMarinha desta nação teria o direito de revistar osnavios suspeitos de realizarem o tráfico negreiro.O interesse britânico era, única e tão-somente, im-pedir que o capital brasileiro fosse investido naaquisição do contingente humano que vinha parao Brasil rumo ao trabalho compulsório. Para os in-gleses, já há muito inseridos no contexto industrialdo capitalismo, o objetivo era fazer com que a eco-nomia brasileira se movesse aplicando seu capital

na aquisição das mercadorias britânicas. A escravi-dão e seus desdobramentos, há muito, já não inte-ressavam à Inglaterra.

Em se tratando de uma economia que orbitavaem torno dos ingleses – ou daquela nação que semostrasse a mais poderosa do período –, quantomais a escravidão demorasse a ocorrer, mais entra-vava os próprios desígnios britânicos em nosso

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72. José Was th Rodrig ues, INFANTARIA ,  ARTILHARIA E ENGENHARIA, 1889, aquarela.

In:  Uniformes do exército brasileiro: 1730-1889. Rio de Janeiro,

Museu Histórico Nacional.

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país. Pressentida e tomada como o sustentáculo dopoderio econômico dos fazendeiros fluminenses, amão-de-obra escrava era vista como necessáriapara a continuidade da ordem política brasileiraque, como vimos, poucas alterações de vulto pre-senciou ao longo de praticamente toda a sua his-tória. Essa dificuldade atroz de mudança fica ates-tada pela lentidão do processo que terminaria coma abolição da escravidão em nosso país, e isto mes-mo com a Inglaterra no encalço das nossas elitesdirigentes.

Em 1850, o golpe que pode ser considerado fa-tal contra a escravidão veio pela aprovação da LeiEusébio de Queirós, que proibia definitivamente otráfico de escravos para o Brasil. Impondo uma ne-cessidade de adequação da economia brasileira à

forma assalariada de trabalho, esta lei não impediaque o tráfico se realizasse internamente, o que defato continuou a existir. Levemos em consideraçãoque regiões já há muito afastadas do centro de de-cisões econômicas viam no tráfico de escravos umaalternativa frente à estagnação de suas forças pro-dutivas. Isto, a bem da verdade, já vinha ocorren-do desde a transferência do eixo econômico dopaís para o Sul-Sudeste, quando da descoberta eexploração do ouro em Minas Gerais.

A dificuldade maior em alterar o tipo de mão-

de-obra envolvido na produção cafeeira vinha,como vimos, do grupo produtor do Vale do Paraí-ba carioca, o mesmo setor que sinalizava apoio in-condicional à Monarquia, expressamente desde oSegundo Reinado. Podemos dizer que eles pró-prios se auto-apoiavam, uma vez que ocupavam oscargos de destaque do Império, fosse do legislati-vo, do executivo ou do judiciário. A migração daprodução cafeeira para o Estado de São Paulo si-nalizou um processo de mudanças que não se ate-ve somente à geografia. O novo grupo cafeeiro, va-

lorizado pelas safras e pelo aumento do preço dassacas do produto, imbuído da busca de outras so-luções frente ao impasse do final iminente da es-cravidão, apostava na introdução do trabalho assa-lariado. Podemos dizer que, não por isso, se trata-va de um grupo comprometido com aquele libera-lismo já tão decantado na Inglaterra ou mesmonos Estados Unidos. Acima de tudo, havia um tra-ço arrivista que desimpedia e desonerava a buscade novas atitudes perante a forma de produção docafé. Este novo grupo cafeeiro, que constituía anova elite fazendeira do país, possuía melhores

condições históricas para estabelecer a adequaçãoà esta forma de utilização de mão-de-obra no Bra-sil. Tratando-se de uma elite ansiosa pelo poder, oseu traço inovador pode ser visto como necessáriofrente à luta pelo espaço pretendido. De forma se-melhante, o antigo grupo cafeeiro fluminense tam-bém apresentou algumas poucas diferenças de épo-ca para com os donos de engenho do Nordestebrasileiro, o principal segmento econômico, comovimos, de todo o nosso período colonial.

E foi no sentido da troca de mão-de-obra, da es-crava para a assalariada, que parte dos cafeicultorespaulistas se utilizaram de um expediente usado sa-zonalmente desde o Primeiro Reinado brasileiro: aimigração. Verdadeiras levas de estrangeiros chega-ram ao país por volta das três últimas décadas do

século XIX e se concentraram especialmente nasatuais regiões Sul e Sudeste do Brasil. Elevandoconsideravelmente a população economicamenteativa destas áreas, os imigrantes formaram um exce-dente de mão-de-obra também responsável pelo in-cremento dos setores industriais da região Sudeste.

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73. J ORNAL DO C OMMERCIO, Rio de Janeiro, 29/10/1845.

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A opção pela forma assalariada de trabalhomostrou-se adequada à época da economia brasi-leira. Os frutos desta escolha, sobretudo a possibi-lidade de liberação do capital antes aplicado naaquisição de escravos, não tardaram a aparecerpara o forte grupo cafeeiro do oeste paulista. Afundação do Partido Republicano, no ano de1870, consagra um processo no qual as novas eli-tes se arvoram na interlocução política das ques-tões nacionais, fato que a chamada República Ve-lha somente irá corroborar.

Dentre os novos impostos cogitados mas quenão passaram a vigir, temos um ensaio do Impos-to de Renda, um primeiro precursor desta modali-dade de tributo, que provoca, em sua gestação, omesmo mal-estar que hoje pode ser percebido no

momento de acerto de contas com o “leão”. OImposto Predial – ancestral do nosso IPTU –também tem a sua gênese nos momentos que pre-cedem à Guerra do Paraguai. No entanto, esta mo-dalidade de tributo não era costumeiramente co-brada, uma vez que, no interior do confronto po-

lítico que colocava os interesses provinciais emchoque com aqueles do governo central, muitosproprietários de terras não pagavam esta taxa. Osimpostos alfandegários continuavam a ser os prin-cipais fornecedores do numerário da receita orça-mentária do país.

Foi como tentativa de diminuir os já crônicosdéficits orçamentários que a chamada“Tarifa Al-ves Branco” procurou corrigir os excessos da im-portação desmedida para o Brasil. Nesse sentido, alei se inseriu exatamente no âmago da principalfonte de arrecadação do governo. Vigorando a par-tir de 1844, esta tarifa modificava as taxas adua-neiras referentes a quase três mil artigos importa-dos, sendo que alguns produtos foram taxados ematé 60% ad valorem . Importa salientar que o crité-

rio para a tributação se valia de um mote protecio-nista, uma vez que se taxavam mais aqueles produ-tos que pudessem ser elaborados no país ou quefossem considerados supérfluos. De maneira se-melhante ao que hoje ocorre quando da majoraçãode impostos de importação, a polêmica se instalouprincipalmente dentro das hostes de comerciantesimportadores, bem como daqueles países que sesentiram lesados com o protecionismo brasileiro.De uma forma ou de outra, o orçamento brasilei-ro pôde respirar um pouco mais aliviado após a vi-

gência desta tarifa.No período inicial do reinado de Pedro II jásão percebidas outras alterações tributárias, que sedão na abolição de alguns impostos, na modifica-ção de outros ou na elevação de taxas. Muitostributos são majorados em virtude ou das crisessucessivas do café ou de calamidades públicas,como os surtos de febre amarela e de cólera no anode 1863 39 3. Mas o grande acontecimento a pesarna elevação da tributação no país foi, sem sombrade dúvida, a Guerra do Paraguai, uma vez que,

como vimos, o Brasil teve grande participação noconflito. Logo ao início do confronto, foram suge-ridas as seguintes alterações fiscais:

a) a aplicação do imposto direto de quantidade proporcional, isto é, o imposto pessoal, com base no valor locativo da habitação; 

b) a extensão do imposto de indústr ias e pro- fissões a toda e qualquer atividade industr ial ou profissional; 

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A Lei Eusébio de Queirós extinguiu o tráfico de escravos no Brasil em 4 de

setembro de 1850.

74. F. Tironi, S ENADOR E USÉBIO DE  QUEIRÓS , c. 1861; desenho a grafite. Rio de Janeiro,

Museu Histórico Nacional.

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c) a execução do imposto do selo, pelo sistema 

das estampilhas, bem como a sua modificação: o selo proporcional atingindo todos os atos e transações em que o capital viesse a manifestar- se, sob forma de somas e valores, de transmis- sões de uso e gozo de propriedade; o selo fixo alcançando todas as outras formas; 

d) a elevação da décima urbana; da taxa dos escravos; do imposto de 15% sobre loterias e outros. 39 4

Em 1867, novas alterações tributárias são ope-radas 39 5, sendo de grande monta aquela que se fezno imposto de indústrias e profissões, na medidaem que passa a se estender a toda pessoa, nacionalou estrangeira, que exercesse qualquer ofício no

país. Um regulamento deste mesmo ano fornecia

instruções para que fosse arrecadado um impostopessoal – o precursor do atual Imposto sobre aRenda –, cujo alvo seria todo aquele que residisseno país e tivesse casa de habitação arrendada ouprópria, ainda que não vivesse na mesma. As taxasde exportação também foram elevadas. Para se teruma noção mais clara do impacto da Guerra natributação do período, vejamos quais foram os ou-tros tributos que sofreram aumento de sua alíquo-ta de cobrança:

a) o imposto de docas e capatazias ficou subs- tituído pela taxa fixada pelo Governo, prove- niente do serviço de descarga e embarque das mercadorias nas Alfândegas e trapiches, segun- do o peso e o volume; 

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39 3 Segundo Savério Mandêtta, “a agravar ainda mais a situação, no ano subseqüente(1864) registra-setremenda crisecomercial na praça do Rio deJaneiro,que redundou em corridas aos bancos. Esta assumiu proporções tais queos estabelecimentos bancários tiveramde ser guardados por grandes forçaspoliciais”. Cf. Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 560.

39 4 Idem, ibidem , p. 56139 5 Segundo Paul Hugon, dois anos depois, “unifica-se o imposto de indústrias eprofissões, englobando nele o imposto de lojas, decasas demodas, de

despachantes ecorretores ecasa deleilão. Por esta lei, esseimposto passou a constar deduas cotas: fixa eproporcional. Ligeiramentemodificado em1880

e1889, esseimposto chegou aos nossos dias.”. Cf. Paul HUGON, O imposto: teoria moderna e principais sistemas, p. 168.

O trabalho assalariado substituiu a mão-de-obra escrava nas lavouras

monocultoras brasileiras.

75. Fazenda Guatapará, São Paulo, s.d. São Paulo, Acervo Memorial do Imigrante-

Museu da Imigração.

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77. Guia de despacho de importação de querosene inglês, 1899.

Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

"À União reservava-se a exclusividade dos impostos de importação, de consumo, do selo e das

loterias. Com exceção do imposto de importação, todos os outros eram cumulativamente tributados,

tanto pela União como pelos Estados, o que mantém e agrava o problema da dupla ou tripla tributação.76. Bilhetes de loteria federal: extração serviços públicos; festival da educação; Inconfidência e outra.

Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

78. Selos: 100 réis, (2) 200 réis, (2) 1 mil réis,

(2) 5 mil réis, (2) 10 mil réis, (2) 20 mil réis,

(2) 10 réis, 50 réis, (2) 20 réis. Rio de Jane iro,

Museu da Fazenda Federal.

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b) os direitos de exportação e baldeação; 

c) o dízimo do Município; 

d) o expediente de 1/ 2% dos gêneros nacio- nais transportados de uma para outra pro- víncia; 

e) o expediente de 3% dos gêneros estrangeiros desembarcados para consumo; 

f) o imposto de chancelaria; 

g) o imposto sobre os vencimentos, ficando, po- rém, sujeitos ao imposto pessoal. 39 6 

Em 1870, uma vez terminada a Guerra do Pa-raguai, além do número estimado de 100 mil mor-

tos, do ponto de vista dos gastos envolvidos temosas seguintes cifras:

✠ Ministério da Justiça 412:328$574 

✠ Ministério da Marinha 89.014:249$524 

✠ Ministério da Guerra 306.214:424$519 

✠ Ministério da Fazenda 216.270:948$039 

✠ Diversos 1.271:312$039  

✠ Total 613.183:262$695   39 7 

Após a Guerra, o governo imperial começa arever a sistemática tributária 39 8 e são abolidos osseguintes impostos:

a) o imposto de 1% sobre os gêneros navegados 

por cabotagem; 

b) o imposto de ancoragem e doca; 

c) o imposto pessoal.

São isentados de imposto:

a) os jornais e revistas brasileiros publicados no exterior; 

b) as fábricas de lapidação de diamantes e as loterias provinciais em benefício da instrução pública, casas de caridade e asilo de órfãos.

Reduziu-se o imposto de loterias e foram alteradas:

a) a décima urbana, quanto àsua cobrança; 

b) a tarifa geral das alfândegas.

Os seguintes impostos foram restabelecidos:

a) o imposto de farol elevou-se ao dobro; 

b) o imposto de estadia na doca; 

c) os serviços de capatazias e docas voltam ao governo; 

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39 6  Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 563.39 7  Idem, ibidem .39 8 “Da mesma época, éo 1º imposto progressivo do país, o imposto de transmissão depropriedades post - m ort em (1% para os herdeiros emlinha direta e

aumentando até20% para testamentos entreestranhos).” Cf.: Paul HUGON,op.cit.

, p. 169.

79. Sisson, M ANUEL ALVES  BRANCO , V ISCONDE DE  C  ARAVELAS , século XIX; litografia.

Rio de Janeiro, Fundação Biblioteca Nacional.

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d) o imposto adicional de 50% sobre os direi- tos de importação dos vinhos secos. 39 9

É também no período do pós-guerra que sur-gem, em algumas Províncias do Império, reclama-ções contra as Assembléias Provinciais, por contade estarem tributando aquilo que era de esfera ex-clusiva do poder central. Um ponto culminantenessa polêmica foi o parecer do Tesouro Nacional,que arbitrou quais tributos eram de competênciado Império e quais seriam das Províncias:

Impo st o s d e c ar át er ger al :

✠ De importação; 

✠ De exportação; 

✠ De propriedade imóvel; 

✠ De navegação dos mares terri toriais e gran- des rios; 

✠ De viação nas estradas de ferro; 

✠ De transmissão de propriedade imóvel de qual- quer espécie a título oneroso; 

✠ Transmissão de propriedade móvel (apólices de dívida pública nacional fundada) por título su- cessório “ex testamento”ou “ab intestato” ou por doação “causa mortis”.

Impo st o s d e c ar át erprovinc ia l :

✠ De transmissão de propriedade imóvel somente, e móvel a título gratui to, quer por sucessão “ex 

testamento” ou “ab intestato”, quer por doação “inter vivos” ou “causa mortis”; exceto as pro- venientes de apólices da dívida pública; 

✠ De viação nas estradas provinciais e de navega- ção dos rios internos; 

✠ Renda provável ou verificada das indústr ias e profissões legais; 

✠ Renda do capital pessoal, avaliada ou pela des- pesa ou pelo valor locativo da habitação. 4 0 0

Em 1879 cria-se o imposto de transporte. Naverdade, esta taxa vigorava desde 1837 (impostode bestas e cavalos que entram na cidade e impos-to de embarcações em trânsito – já presentes noMunicípio Neutro). Nas Províncias sempre existi-ram, sob denominações diferentes, impostos dogiro, de trânsito, de incorporação, de viação. Esseimposto continuou a fazer parte da renda geral eprovincial. O governo da União cobrava 1$ sobreas passagens acima de 90$ nas estradas de ferro e

acima de 9$ nas barcas a vapor; passagens abaixodesse preço nada pagavam. 4 0 1

Quanto ao sistema fiscal do Segundo Império,apesar de mais organizado que o do período dePedro I, apresentava falhas, que terminavam porprovocar freqüentes déficits orçamentários. Doisaspectos podem ser considerados desfavoráveis aobom funcionamento da política tributária: as for-mas pelas quais eram feitas as cobranças e a pró-pria situação política, que colocava as Provínciasem oposição ao governo central. Neste sentido, al-

guns historiadores apontam que “as formas de co-brança dos impostos eram as mais variadas e con-fusas possíveis, indo desde o ‘arrendamento’ (oucontratação) até à cobrança por agentes do gover-no, o que dificultava não apenas a fiscalização, masaté mesmo uma previsão orçamentária” 4 0 2. Quan-to à situação política, os mesmos autores enten-dem que esta, “a partir de 1821, até 1840, criavaobstáculos quase insuperáveis para carrear as taxasao Tesouro Público. As constantes revoltas e suble-vações das Províncias e sua oposição ao governo

central faziam muitas vezes com que os governosprovinciais se recusassem a enviar ao Rio de Janei-ro os impostos arrecadados” 4 0 3.

É especialmente no final do Segundo Impérioque se sobressaem as discussões que colocam asProvíncias contra o poder central do Império. Se-gundo Paul Hugon,

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39 9 Savério MANDÊT TA, op. cit., p. 565.4 0 0 Idem, ibidem , p. 566.4 0 1 Idem, ibidem , p. 171.4 0 2 Antonio MENDES Jr, Luiz RONCARI eRicardo MARANHÃO,  B ra sil H ist ór ia, tex to e con su lt a, I m pér io, p. 292.4 0 3 Idem, ibidem , p. 292.

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o Ato Adicional (Lei nº16, de 12/ 08/ 1834) permanece em vigência durante todo o Império.Determinando que as Assembléias Provinciais podiam legislar sobre a fixação de impostos, sob a condição única de não prejudicarem as impo- sições gerais do Estado; determinando que o único imposto de competência exclusiva da Corte seria o de importação, deixou campo aberto para as províncias e Municípios criarem impostos provinciais e locais idênticos aos ge- rais, verificando-se pois uma acumulação de competência e de tributos a sobrecarregarem os contribuintes.   4 0 4

A interposição das Províncias nas questões tri-butárias levava, vez ou outra, à bitributação ou até

à tritributação.A correta divisão das receitas tributárias estava

longe de ser bem encaminhada. Muitas Provínciasnão conseguiam se sustentar com aquilo que reti-ravam das receitas que lhes cabiam. Houve casosem que algumas delas passaram ao governo encar-

gos e serviços que não poderiam mais custear. Emoutras palavras, lutavam contra a sua própria auto-nomia. Outras, não se importando com os aspec-tos constitucionais, passavam a receber tributosque eram de exclusividade do poder central, comoera o caso dos direitos de importação. Segundo afala de João Maurício Wanderley, o Barão de Co-tegipe, no ano de 1857, “a circulação dos produ-tos da indústria nacional é gravada em algumasprovíncias com imposições proibitivas; em outrasos próprios gêneros que já pagaram direitos de im-portação são novamente tributados, segundo a suanatureza e qualidade, com o intuito de proteger al-gumas fábricas estabelecidas nas ditas provín-cias.” 4 0 5

Em 1875, o então Visconde de Rio Branco

também se posicionava frente à maneira comoagiam algumas Províncias. Segundo o Ministro, “ésabido que os impostos gerais já abrangem a maiorparte da matéria tributável, e no entanto outroslocais, provenientes daquela dupla origem, têmsido estabelecidos e vão sendo cobrados, quasesempre com a agravação dos primeiros e sem me-direm-se os efeitos nocivos, que de uma tal desar-monia pode provir às forças produtivas do país,isto é, à lavoura, à indústria fabril, ao comércio eao capital móvel ou imóvel.” 4 0 6  Era desejo de Rio

Branco que fosse elaborada uma lei interpretativado Ato Adicional de 12/ 08/ 1834, fato que en-contrava obstáculos no Parlamento.

Em 1877, novamente o Barão de Cotegipe vol-ta à carga e se manifesta, alegando que:

nunca a situação econômica do país reclamou tanto como presentemente as providências legis- lativas, por vezes pedida para que as Assem- bléias Provinciais não transponham os limites dentro dos quais podem decretar impostos. Já 

não ésó a receita geral do Império que sofre com a concorrência das imposições provinciais; o comércio, a população toda se ressente e pro- testa contra a exageração com que em algumas províncias se têm onerado de tributos a produ- ção e o consumo.  4 0 7 

221O br a si l n o seg u n d o r e i n a d o - 184 0 •1889

4 0 4 Paul HUGON, op. cit., p. 172.4 05 A pu d  GuilhermeDEVEZA, op. cit., p. 72-73.4 0 6  GuilhermeDEVEZA, op. cit., p. 77.4 0 7  Idem, ibidem , p. 78.

80. Louis Guedy, J OSÉ  M ARIA DA  S ILVA P  ARANHOS  , V ISCONDE DO RIO BRANCO, s.d.; óleo

sobre tela. Rio de Janeiro, Museu Histórico do Ministério das Relações

Exteriores/Itamaraty.

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O governo imperial, numa demonstração de di-ficuldade em alterar a situação através do Parla-mento, acenou com a possibilidade, caso fossecomprovada a inconstitucionalidade desta discri-minação tributária, de que as Províncias poderiamconseguir o que almejavam. Ao final do Império,ao menos preliminarmente, alguns tributos foramdescentralizados. Tal fato se distingue das visõespolíticas que entendem o período como profunda-mente centralizador. Pode-se dizer que este era odesejo dos políticos mais próximos ao Imperador,mas que não se concretizou, ao menos na matériatributária, permitindo-se a ação das AssembléiasProvinciais e a dupla ou tripla tributação. O Impé-rio não pôde centralizar o poder tributário, mes-mo que assim o desejasse, aceitando a existência de

competências paralelas e uma liberdade de tributa-ção das Províncias. Tais elementos já sinalizam ofortalecimento político de grupos ligados espe-cialmente aos interesses regionais, em detrimentode uma visão compacta, que via o Império como ocentro decisório das questões nacionais. Os anosque se seguem na transição do Império para a Re-pública demonstram que a aspiração de poder porparte das Províncias se consubstanciaria na reali-dade dos primeiros anos do século XX.

O que ainda haveria de ser feito ficaria para o

período republicano, mesmo porque o governo dePedro II já não contava mais com interlocução po-lítica suficiente para encaminhar grandes altera-ções, fosse nesta matéria ou em qualquer outra queenvolvesse o poder no Brasil. Segundo Amaro Ca-valcante, “o Império chegou ao fim sem ter podi-do fundar um sistema tributário – que ao menossatisfizesse a estes dois fins: uma distribuição e ar-recadação conscientemente baseadas nas condiçõeseconômicas do país; uma divisão razoável das con-tribuições públicas, entre receita geral do Império

e a receita particular das províncias.” 4 0 8

Se observarmos o orçamento apresentado àAssembléia Geral Legislativa em 8 de maio de1889 – e não votado –, veremos que a receita pú-blica geral do Império se compunha das seguintesrubricas:

✠ Direito de importação para consumo. Figurado como ‘direitos de importação para consumo’, con- tribuía com a relevante quantia de 60% da re- ceita geral do Império.

✠ Expediente dos gêneros livres de direitos de con- 

sumo.

✠ Expediente de capatazias. Criado pelo Regula- mento de 30 de maio de 1836, exigível a títu- lo de indenização pelas despesas de capatazias,conservação de pontes e guindastes e risco de em- barque e desembarque dos gêneros.

✠ Armazenagem.

✠ Imposto de faróis.

✠ Imposto de doca.

✠ Direitos de exportação dos gêneros nacionais.

222 T R IB U T O S D O B RA SI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

4 08 A pu d  GuilhermeDEVEZA, op. cit., p. 84, sema citação defonte.4 0 9 Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 56-57.

81. E TIQUETA PARA TECIDOS  , REGISTRADA PELA C IA. P ETROPOLITANA, 1888. RIo de Janeiro,

Arquivo Nacional/Ministério da Fazenda.

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✠ Direitos de exportação de pólvora, metais precio- 

sos, ouro em barra e diamantes.

✠ Imposto do selo de papel.

✠ Imposto de transmissão de propriedade.

✠ Imposto de indústrias e profissões (antigo im- posto sobre as lojas).

✠ Imposto de transportes.

✠Imposto predial.

✠ Imposto sobre subsídios e vencimentos (embrião do futuro e atual imposto sobre a renda).

✠ Imposto sobre gado.  4 0 9

Guardando as devidas diferenças que distamo período do início da colonização brasileira doséculo XIX, pode-se dizer que em três aspectoseles se assemelham. A economia brasileira aindase conservava monocultora, agroexportadora e

escravocrata. Essas semelhanças são surpreen-

dentes, principalmente quando se pensa na mão-de-obra utilizada num momento em que a orien-tação econômica das principais nações do mun-do já havia abdicado da escravidão, promovido odesimpedimento do volumoso capital emprega-do no tráfico de escravos e orientado para a in-dustrialização, o paradigma econômico maiscaro ao século XIX. Difícil também encontrar justificativas teóricas, mesmo nas hostes maisconservadoras destas nações em vias de indus-trialização, que advogassem pela causa e pelo

sentido da escravidão.O fato de a escravidão ser uma realidade justi-ficável em nosso país somente atesta a tese de que,no Brasil, as idéias estrangeiras são bem-vindas se justificam a manutenção dos interesses dos gruposque se alternam no poder, grupos estes que poucasdiferenças guardam entre si. Mais uma vez, o de-bate que ansiava pela abolição da escravidão so-mente ganharia a cena pública do país quando es-tas idéias passassem a ter algum interesse estraté-gico na aspiração ao poder. Pode-se dizer, porexemplo, que a abolição também não era visada

223O br a si l n o seg u n d o r e i n a d o - 184 0 •1889

82. Armand Pallière, C HAFARIZ DAS  M ARRECAS , circ. 1830; aquarela. Rio de Janeiro,

Museu Histórico Nacional.

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como um objetivo em si – libertar os escravos, fos-se do ponto de vista do humanismo ou do desim-pedimento de entraves arcaicos da economia –,uma vez que quando estas idéias ganhassem asruas, já o fariam como desdobramento do real in-teresse, que era o de alterar os códigos do governodo Brasil, permitindo que outros setores da eliteeconômica governassem o país por direito, uma

vez que já o faziam de fato.Um dos últimos países do mundo a extinguir aescravidão, o Brasil do século XIX mantinha umaestrutura econômica que privilegiava os fazendei-ros de café do Vale do Paraíba fluminense. Esteproduto, que ocupava o primeiro lugar na pauta deexportação, garantia aos proprietários destas fa-zendas um importante papel no cenário políticode então.

A manutenção do escravismo e da ordem mo-nocultora e agroexportadora sinalizava uma eco-nomia que se encontrava contra o fluxo dirigido,

fosse por ingleses ou por norte-americanos. Aomesmo tempo, a permanência desta situação emnosso país garantia as ligações privilegiadas deuma elite junto ao poder, a continuidade de sua ri-queza e o atraso econômico brasileiro como umtodo. Neste sentido, o caso norte-americano é em-blemático. Desde meados do século XIX, a escra-vidão já se encontrava abandonada nos Estados do

norte deste país. A liberação do capital empregadono tráfico permitia o investimento nos modelosindustriais de desenvolvimento.

Em nosso caso, a transição lenta rumo aos pa-radigmas das economias das nações industrializa-das permitiu o acesso ao consumo apenas a umaprivilegiada elite que cercava o poder palaciano,mas que representava menos de 1% da populaçãodo país, sendo que o restante estava imerso namais profunda e obscura disparidade para comesta minoria. É evidente que a riqueza provocadapelo café, mesmo que nos moldes exclusivistas tí-

22 4 T R IB U T O S D O B RA SI L i m p e r i a l - 18 2 2• 18 8 92 ª Parte

83. Cédula do Tesouro Nacional de 50 mil réis, Bahia, 1828. Rio de Janeiro, Museu

de Valores do Banco Central do Brasil.

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picos de uma cultura na qual grassaram, por maisde trezentos anos, as imposições do Pacto Colo-nial, fez com que novos grupos citadinos mais re-lacionados ao comércio começassem a delinear oseu perfil. É assim que, durante o Segundo Reina-do, mesmo que a passos lentos, a economia brasi-leira conheceu alguns novos índices. Algumas em-presas industriais, bancos, caixas econômicas,companhias de navegação, mineração, de transpor-te urbano, de gás e até mesmo estradas de ferro co-meçavam a dar sinais de vida no Brasil de então.Não que isto significasse uma alteração nos rumosimediatos da economia brasileira do momentoposto. Mas, tais iniciativas ocorriam quase quecomo desdobramentos de um relaxamento daprincipal via produtiva do Brasil. Observemos, por

exemplo, algumas destas iniciativas, com o objeti-vo de compreender as suas pertinências.

O crescimento dos negócios do café fazia comque surgissem novas casas bancárias, provavelmen-te fundadas por fazendeiros relacionados ao mes-mo produto. O espírito de corpo comum ao gru-po econômico ligado ao privilegiado poder impe-rial fornecia o oxigênio para que se pudesse permi-tir a tomada de empréstimos para este ou aquelelatifundiário mais necessitado. As empresas de gásou de transporte público permitiam abastecer de

um mínimo de urbanidade as poucas quadras cen-trais da capital do Império, expressamente aquelaspor onde transitavam os fazendeiros quando emnegócios no Rio de Janeiro. O mesmo se pode di-zer de suas famílias, quando os acompanhavam àcapital do país. As companhias de navegação tam-bém se encaixavam no desejo de ampliação daspossibilidades de exportação do café, de onde sepode supor que a livre concorrência era uma reali-dade tão-somente para o seleto grupo dos planta-dores de café, atualizados então com o modelo de

economia inglesa ou francesa que, no entanto, já seabria à participação de um contingente maior dapopulação local.

O fato era que, se existiam novos setores eco-nômicos e seus desdobramentos sociais urbanos,estes gravitavam em torno da economia escravo-crata e monocultora ainda preponderante. Doponto de vista dos tributos, é digna de nota a ob-servação de um caso exemplar, do qual já podemosaveriguar o sentido e o rumo das adequações quese fizeram necessárias na ordem econômica dopaís, marcadamente quando dos instantes finais do

Império e do advento da República. É o momentode se analisar a economia cafeeira quando esta sedesconcentra do Vale do Paraíba fluminense e sedirige para o oeste, rumo a São Paulo.

Qualquer análise que leve em consideração aeconomia brasileira no período que cubra o Se-gundo Império e a primeira fase da Repúblicadeve, inevitavelmente, levar em consideração a im-portância da produção cafeeira. De fato, pode-seobservar que coube a uma parte significativa dosprodutores de café do Rio de Janeiro consumar oapoio ao Segundo Império. De forma semelhante,os cafeicultores do Estado de São Paulo desdecedo demonstraram potencial corporativo e seuniram em torno da causa republicana, basicamen-te a partir do último quartel do século XIX. Ao

mesmo tempo, estes últimos também se apresenta-ram mais adequados àquilo que já era um desejoinglês, sinalizado nos Tratados de 1810, a saber, aextinção da escravatura e a defesa do trabalho livree assalariado.

225O br a si l n o seg u n d o r e i n a d o - 184 0 •1889

“Os fazendeiros eram contrários à valorização cambial, uma vez que o preço do

café caía nas bolsas estrangeiras ao menos desde 1896.” Este argumento relativo

ao café pode ser observado ainda hoje, quando a cotação do produto nas bolsas

de valores é pontual como um termômetro de medição das finanças do país.

84. C  AFÉ DU  BRÉSIL. In A G AZETA, 1929, São Paulo, Biblioteca Municipal Mário

de Andrade.

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85. Sobrado do comendador Luciano José de Almeida, 1847, Bananal,

São Paulo, hoje Hotel Brasil. Brasília, Secretaria do Patrimônio Histórico

e Artístico Nacional.

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22 7 

Durante muito tempo associado à exploraçãomonocultora, o café já foi acoplado à idéia de quea economia brasileira está sujeita a grandes ciclos.Neste sentido, faria parte do último dos grandesciclos econômicos do país. Seu rastro ainda pode

ser constatado nas regiões por onde foi plantado;e isto, principalmente, por aqueles cafeicultoresque também guardavam vínculos diretos com a po-lítica nacional. Isto observa-se em parte do Valedo Paraíba, que foi o grande produtor de café até1880 e que, após a decadência ocorrida com a per-da dessa condição para o oeste paulista, experi-mentou tal regressão econômica, que deu origem àexpressão de Monteiro Lobato, ao chamar algumascidades dessa região de “Cidades Mortas”: é ocaso de Bananal, São José do Barreiro e Areias, en-

tre tantas outras.Em relação à política tributária, é curioso no-

tar que o café, na medida em que se constituíanuma mercadoria voltada ao mercado exterior, en-grossava a lista dos chamados tributos de saída.Era nos momentos cíclicos de crise da economiacafeeira (caracterizada, normalmente, pela super-produção) que se pensava na introdução de outrostributos relacionados aos demais produtos brasi-leiros. Diga-se que, muitas vezes, acenava-se para aelaboração de incentivos (do ponto de vista dasisenções), para o incremento e valorização de ou-tros itens, que também compunham a economiabrasileira.

Pode-se perceber igualmente que, como já foimencionado, a ligação íntima dos cafeicultorescom as políticas regionais e federal levou à forma-ção de um espírito de corpo entre os produtoresdo café. A discussão em torno da política tributá-ria sobre o produto seguiu, na maioria das vezes,esta cartilha. Ou seja, observamos que nem sempre

o que se visava era ao desenvolvimento da econo-mia nacional como um todo, mas especificamenteà economia cafeeira. Levemos em consideraçãoque, nos instantes que antecederam à ruína do Se-gundo Império e à fundação da República, era achamada “elite cafeeira” quem melhor se posicio-nava no cenário econômico do país. É fácil de seentender que, no acordo estabelecido no início dahoje conhecida “República Velha”, o grupo pau-lista relacionado à produção cafeeira tenha-se no-tabilizado, inclusive no fornecimento de nomes

que vieram a ocupar os cargos máximos do Execu-tivo nacional. Vista através deste viés, a política

tributária brasileira do período em questão pri-mou por favorecer este mesmo grupo, seja acenan-do com incentivos fiscais ou com a garantia dacompra, por parte do governo, do estoque exce-dente de café.

O b r a si l n o seg u n d o r e i n a d o - 184 0 • 1889

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“A lei do selo, senhores, É poderosa e viril :Sacrifica o povo calmo...São progressos do Brasil...

 E viva a calma do povoQ ue gemeu, pagou...pagou...

Q ue venha agora um carimbo, Pra quem tal lei decretou” 

C anção de Eduardo das N eves, 18 99

pr i m ei r a r epú b l i c a1889• 1930

230 TRIBUTOS DO BRASIL r epubl ic an o 3ª Parte

A crise econômica, o encilhamento e o imposto do selo.Como café, os impostos de entrada e saída ganhammaior importância. A divisão das receitas tributárias naConstituição de 1891.

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A abolição da escravidão pode ser consideradaum golpe fatal na Monarquia, mas outros elemen-tos também estiveram presentes na transição paraa República. Além da importância dos novos fa-zendeiros de café de São Paulo, enfatizamos o pa-

pel do Exército, instituição que se organiza maisespecialmente após o desfecho da Guerra do Para-guai.

As orientações positivistas – que defendiam aexistência de um Estado republicano como meio dese estabelecer o progresso – vinham-se fortalecen-do cada vez mais nas hostes militares. Pode-se di-zer que, na década de 80 do século XIX, setores doExército brasileiro já possuíam um projeto políticoque vislumbrava uma alteração mais profunda dasituação nacional. Era sobretudo nas escolas mili-

tares que o positivismo se apresentava e aumentavao número de adeptos. Além de defenderem a Repú-blica, os militares positivistas também viam no fe-deralismo uma solução frente aos crônicos proble-mas gerados pelo centralismo monárquico.

Há que se dizer que a liberação de capital pro-piciada pela abolição do tráfico negreiro, bemcomo pelo próprio fim da escravidão, permitiuque se desenvolvesse uma classe média, notada-mente urbana, que colaborou com o estabeleci-mento de um novo perfil de orientação política.Paulatinamente, num processo que inclusive ultra-

passara o próprio evento da proclamação da Repú-blica, estes segmentos urbanos iriam contribuirpara outra série de alterações, que se processariamnas décadas seguintes do próprio século XX.

Mesmo que o Exército brasileiro representasse

apenas mais uma das vozes dissonantes contra aMonarquia – sem que, contudo, houvesse unani-midade –, coube a esta instituição a liderança ime-diata, pelo menos no que diz respeito ao desfechodo dia 15 de novembro de 1889. Tomando-secomo líder de um movimento multifacetado, oExército transforma o que seria uma parada mili-tar no mote para a proclamação formal da Repú-blica que, uma vez iniciada, tem nos militares osprimeiros presidentes do país. Considerando-seque o estabelecimento desta nova forma de sistema

político não pudesse ser efetivado apenas por meiode um decreto, é certo que a liderança do Exérci-to não tenha conseguido satisfazer a todos os seg-mentos sociais e mesmo suas intenções para com ofuturo do país. Segue-se então um momento noqual as arestas – aquelas que apresentavam visõespolíticas discordantes do Exército – são aparadascom uma firmeza violenta, típica das ações quemarcaram época no Brasil, fosse no período colo-nial ou no imperial.

Diante de uma situação na qual o Exércitoatribuiu para si a missão de salvaguardar a or-

231p r i m e i r a r ep ú b l i c a - 18 89• 1930

“Do ponto de vista tributário, a Constituição de 1891, a primeira da República e a segunda do Brasil,

segundo Bernardo Ribeiro de Moraes firmou a competência fiscal da União (ar tigo 7º) e dos Estados

(artigo 9º) através de um sistema de discriminação rígida de rendas tributárias”.

86. C ONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, 1891. Rio de Janeiro, Ministério da Justiça/Arquivo Nacional

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dem política e social, as aspirações das classesmédias ficaram caladas e os desejos da nova eli-te cafeeira de São Paulo se perfilavam. Configu-rado este novo quadro, é promulgada a primei-ra Constituição da República do Brasil, no ano

de 1891. Tomando como modelo a Carta Mag-na norte-americana, esta Constituição consa-grou o federalismo – impresso no nome oficialdo país, a República dos Estados Unidos doBrasil –, estabelecendo ampla autonomia paraos Estados, que poderiam inclusive arbitrar nocaso de contratação de empréstimos no exte-rior. Estabeleceu a independência dos três po-deres, mas, permanecendo no espectro culturalda Monarquia, reservou extensos poderes aopresidente da República. Ficava estabelecida a

igualdade de todos perante a lei, o voto diretoe a separação entre Igreja e Estado, este últimotalvez o elemento de maior cunho positivista eaquele que mais representava um rompimentopara com aspectos culturais marcadamente mo-nárquicos e coloniais.

Do ponto de vista tributário, a Constituição de1891, a primeira da República e a segunda do Bra-sil, segundo Bernardo Ribeiro de Moraes 4 10 , fir-mou a competência fiscal da União (artigo 7º) edos Estados (artigo 9º) através de um sistema dediscriminação rígida de rendas tributárias . Numsentido, em meio à atmosfera que dispunha espíri-tos favoráveis ao federativismo, tal fato não era dese estranhar. Análise mais acurada, no entanto, nospermite perceber que esta Constituição não con-templou tanto os Estados.

Segundo Nozoe,

na análise da estrutura tributária segundo os 

parâmetros inscritos na Constituição de 1891,

sobressai-se a importância da produção e do co- 

mércio cafeeiros que, ao condicionarem em larga medida e durante anos, o evolver dos demais ra- 

mos da economia, constituíram a fonte funda- 

mental da receita do Estado de São Paulo. As tentativas de rompimento desse vínculo, traduzi- 

das pela legislação fiscal coeva, avolumada espe- 

cialmente em movimentos de estreiteza do merca- 

do do café, resultaram em modificações naquela 

estrutura. Háconfusão no sistema tributário de 

tal forma que era ‘muitas vezes difícil, senão im- 

possível, distingui r as disposições em vigor das 

revogadas’, segundo a impressão do Governador Cardozo de Mello Neto, em 1937. Os juristas 

dedicaram atenção especial ao tema sobre a dis- criminação de rendas após 1889. Nessa ques- 

tão, os consti tuintes republicanos identificaram 

um ponto de possíveis atritos entre a União e os 

estados recém-inaugurados. 4 11

Muitos impostos foram aproveitados daquelesque já eram cobrados no Império, sendo que estesforam redistribuídos de acordo com a estrutura re-publicana. Duas lacunas podem ser observadas nadiscriminação de rendas: a superposição de tribu-tos, sendo que, muitas vezes, União e Estado en-contravam-se em concorrência tributária. E a nãocontemplação dos Municípios, sendo que os tribu-tos destes ficavam a critério do Estado, o que era

232 T RI B UT O S D O BRA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

4 10 Bernardo Ribeiro deMORAES, op. cit., p. 58-64.4 11 Nelson H. NOZOE, op. cit., p. 13.

87. Selos: (2) 15 mil, (2) 50 mil réis, 1 mil réis, (2) 200 réis; Imposto do

Fumo, 10 réis; Selo Penitenciário Cr$ 100; Imposto Saúde Cr$ 1,50; Imposto

de Consumo Cr$ 1.000,00. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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Rec eit a Tr ibut ár iad a Un ião

Consti tuição Federal de 1891 (Art. 7º) 

É da competência exclusiva da União decretar: 

1- impostos sobre a importação de procedência 

estrangeira; 

2- direitos de entrada, saída e estada de navios,

sendo livre o comércio de cabotagem às merca- 

dorias nacionais, bem como às estrangeiras que 

 játenham pago imposto de importação; 

3- taxas de selo, salvo a restrição do artigo 9º,

§ 1º, nº1.; 

4- taxas dos correios e telégrafos federais.

Rec eit a Tr ibut ár iad o s Estad o s

Consti tuição Federal de 1891 (Artigo 9º) 

É de competência exclusiva dos Estados decre- 

tar impostos: 

1- sobre a exportação de mercadorias de sua 

própria produção; 

2- sobre imóveis rurais e urbanos; 

3- sobre transmissão de propriedade; 

4- sobre indústr ias e profissões.

§1.º- taxa de selo quanto aos atos emanados de 

seus respectivos governos e negócios de sua eco- 

nomia; 

§2.º- contribuições concernentes aos seus telé- 

grafos e correios.

234 T RI B UT O S D O BRA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

“...o Encilhamento foi marcado pelo crescimento abrupto da inflação no país. Para

tentar resolver os problemas provocados pelos excessos de tal política econômica,

os anos que se seguiram primaram pela contenção das emissões de moeda, pela

contratação de empréstimos no exterior, pelo aumento dos juros e pela elevação

dos gastos estatais.”

89. C ONTRATO PARA CONSTRUÇÃO DA E STRADA DE  F ERRO OESTE DE  MINAS ENTRE  ROTHSCHILD AND S ONS 

E O GOVERNO BRASILEIRO , 1891. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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Rec eit a Tr ibut ár iad o s Mun icípio s

Constituição Federal de 1891 (No regime daConstituição Federal de 1891, os impostos eram

atribuídos pelos Estados nas respectivas leis de or-ganização municipal. Para dar uma idéia do qua-dro da receita dos Municípios, que aliás não varia-va grandemente de Estado para Estado, transcre-veu-se o de São Paulo, fixado pelo artigo 19 daLei 1.038, de 19 de dezembro de 1906.)

A receita dos Municípios seráconstituída so- 

mente das seguintes verbas: 

1º - da alienação, aforamento e locação de mó- 

veis e imóveis do domínio privado das suas municipalidades; 

2º - do imposto na razão máxima de dois cru- 

zeiros sobre cada milhar de cafeeiros em trata- 

mento e produção; 

3º - das taxas com especial consignação aos 

serviços de canal ização de água potável, esgotos 

de prédios e abertura de estradas que facilitem 

o transporte dos produtos do município; 

4º - das taxas sobre a localização de negocian- 

tes nos mercados, ruas, praças e outros sítios de 

domínio público municipal, bem como sobre os 

negociantes ambulantes e sobre veículos; 

5º - das licenças para inumação e das vendas de terrenos para sepulturas nos cemitérios mu- 

nicipais; 

6º - das tarifas para matadouros, para alinha- 

mentos e aferições e para os depósitos de inf la- 

máveis; 

7º- das concessões de licença para jogos, espetá- 

culos e divertimentos públicos, para edificações,

para a construção de andaimes, coretos para 

depósitos de madeira nas ruas e praças, para a extração de areia ou barro; 

8º - das multas impostas e cobradas no muni- 

cípio por infração de regulamentos municipais; 

9º - das rendas de quaisquer estabelecimentos 

ou serviços municipais; 

10º - das taxas de publicidade que recaem so- 

bre afixação de letreiros, emblemas, anúncios e 

reclamos; 

11º - das taxas de viação, compreendendo cal- 

çadas, terrenos em aberto, cercas, guias e falta 

de encanamento nos prédios urbanos para águas 

pluviais; 

12º - dos emolumentos sobre alvarás de licen- 

ça, certidões, nomeações e aposentador ias.

A configuração política do período republica-no se equilibra, ao menos para o lado do grupo ca-feeiro paulista, a partir do ano de 1894, com achegada de Prudente de Morais ao poder e o iní-cio da fase civil de governo. Até o ano de 1930,quando se abre uma nova fissura na estrutura dogoverno brasileiro, houve um consenso que permi-tiu que paulistas e mineiros se alternassem no go-verno, prática que ganhou o nome deRepública do 

café-com-leite . De certa forma, a chamada PrimeiraRepública, ou República Velha, assinalava uma or-

dem política que vinha se perfazendo desde a dé-cada de 70 do século XIX. Os nossos primeiros

235p r i m e i r a r ep ú b l i c a - 18 89• 1930

A crise inflacionária deixava à mostra a situação deficitária da Fazenda brasileira

no governo de Campos Sales. Se o governo estava à mingua, o povo mais ainda.

90. Promissória no valor de 28 contos, 329 mil e 789 réis, assinada por Campos

Sales em nome de Manuela Joaquina de Moraes, analfabeta, Campinas, São

Paulo, 18 de julho de 1872. Rio de Janeiro, Museu da República.

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presidentes civis eram, para o país, aquilo que osfazendeiros fluminenses representaram para o Se-gundo Reinado. Assim, os equívocos econômicos eseus graves desdobramentos sociais desta primeirafase devem-se, em grande parte, a esta nova lide-

rança política.Neste sentido, o conhecido Encilhamento podeser visto como uma tentativa de se evidenciar umaalteração heterodoxa nos rumos da economia bra-sileira. Tendo como mote o aumento da emissãoda moeda nacional e a posterior queda dos juros,esta política econômica visava, sobretudo, ao cres-cimento dos investimentos estrangeiros em nossopaís. Na realidade, o objetivo em questão não deuo resultado esperado e o Encilhamento foi marca-do pelo crescimento abrupto da inflação no país.

Para tentar resolver os problemas provocados pe-los excessos de tal política econômica, os anos quese seguiram primaram pela contenção das emissõesde moeda, pela contratação de empréstimos no ex-terior, pelo aumento dos juros e pela elevação dosgastos estatais. Desta forma, buscou-se preservaruma situação que apenas pode ser vista como favo-rável para a nova elite instalada no poder republi-

cano, uma vez que também se concedia amploapoio aos produtores do café, de longe o principalproduto brasileiro da pauta de exportações.

Exemplar, nesse caso, é a análise do governo deCampos Sales, que assumiu o poder em meio a

uma grave crise inflacionária, em que a Fazendabrasileira se mostrava completamente deficitária eos cortes públicos eram apontados como soluçãofrente ao impasse. Contraindo um vultoso emprés-timo na Inglaterra, Campos Sales ofereceu comogarantia do pagamento da dívida toda a renda daalfândega, tanto do Rio de Janeiro como das de-mais, se necessário fosse. As receitas da Estrada deFerro Central do Brasil e do serviço de abasteci-mento de água do Rio de Janeiro também foramhipotecadas na ordem da realização deste emprés-

timo. Como desdobramento deste acordo, o gover-no brasileiro se comprometia a encaminhar um sa-neamento das contas públicas. O governo de Cam-pos Sales sustou gastos, aumentou impostos – ofamoso imposto do selo –, abandonou obras pú-blicas, desestimulou indústrias e congelou salários.Segundo Maranhão e Mendes Jr,

Murtinho (Joaquim Murtinho, Ministro da Fa- 

zenda de Campos Sales) e Campos Sales conse- 

gui ram a tão propalada deflação: entre 1898 e 

1902, o câmbio subiu, passando o valor do di- 

nheiro de 8,5 pence por mil- réis para a 2,5 pence por mil- réis. Conseguiram também pagar 

os empréstimos externos do governo anterior,

acumulando um saldo em ouro nos bancos es- 

trangeiros, fazendo crescer a receita pública. Na 

verdade, criaram um elemento sistemático do 

poder central na República Velha: o encaminha- 

mento dos problemas financeiros pelo apelo cres- 

cente ao dinheiro externo, pelo estímulo às in- 

versões estrangeiras; desenvolveram uma siste- mática de política econômica segundo a qual a boa situação nas bolsas européias correspondia 

necessariamente àmanutenção do ‘status quo’ de 

miséria e atraso no interior.  4 13

No meio popular de então, o presidente era co-nhecido por “Campos Selos”, uma vez que determi-nou o uso das estampilhas para que a União tivesse

236  T RI B UT O S D O BRA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

4 13 Antonio MENDES Jr eRicardo MARANHÃO,  B ras il H ist óri a: tex to e con su lt a, vol u m e 3, R epú bli ca V elha , p. 197.4 14 A pu d  Isabel LUSTOSA,  H ist óri a de P resi den tes: a R epú bli ca n o C at ete, p. 284 15 Antonio MENDES Jr eRicardo MARANHÃO,  B ras il H ist óri a: tex to e con su lt a, vol u m e 3, R epú bli ca V elha , p. 203.

 Joaqui m Murt inho, mi nistro da Faze nda, cons eguiu a defl ação: “sustou gastos,

aumentou impostos – o famoso imposto do selo –, abandonou obras públicas,

desestimulou indústrias e congelou salários.”

91. J OAQUIM MURTINHO , MINISTRO DA F  AZENDA DO GOVERNO C  AMPOS  S  ALES  , S .D. Rio de Janeiro,

Museu da República.

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o controle sobre a circulação de mercadorias. Umamúsica da época via este aspecto da seguinte forma:

A lei do selo, senhores,

É poderosa e viril: 

Sacrifica o povo calmo...

São progressos do Brasil...

E viva a calma do povo Que gemeu, pagou...pagou...

Que venha agora um carimbo,Pra quem tal lei decretou... 4 14

A política de valorização cambial levada a cabopor Campos Sales terminou, no entanto, por desa-gradar a camada da elite brasileira mais significativano apoio que fornecia ao governo da República: oscafeicultores de São Paulo. Os fazendeiros eramcon-trários à valorização cambial, uma vez que o preço docafé caía nas bolsas estrangeiras ao menos desde1896. Como meio de encaminhamento de soluçõesfrente ao que poderia significar uma grave fissura emseu bloco de apoio, a política de Campos Sales ado-ta a chamada “política dos governadores”, forma desatisfação dos interesses – ao menos políticos – daselites agrárias do país. Do ponto de vista econômico,a “virada de mesa” desta elite pode ser interpretadapela assinatura do Convênio de Taubaté, em1906.Caracterizado pela total ingerência do Estado na

economia – por meio da regulação do mercado –, oacordo entre os cafeicultores previa que:

✠ os Estados deveriam assumir a obrigação de sus- 

tentar um preço mínimo por saca de café; 

✠ o governo deveria comprar e armazenar uma 

parte da produção se esta fosse considerada como 

excedente; 

✠ haveria uma sobretaxa de exportação que servi - 

ria de garantia para os juros e amortizações dos capitais destinados a executar o programa.

Em outras palavras, através do que ficara es-tabelecido em Taubaté, o governo brasileiro, istoé, a própria receita pública, assumiria os riscosdos negócios que envolviam a produção e a co-mercialização do café. De forma semelhante,com a troca de favores e privilégios típicos doSegundo Reinado brasileiro, a política dos go-

vernadores, no plano político, e a aceitação dosparâmetros expostos pelo Convênio de Taubatéterminavam por novamente equilibrar a balançade poder que, mais uma vez, pendia para os se-tores mais abastados do país. Quando pensamosque a receita pública, como o próprio nome diz,é composta basicamente pelos impostos cobra-dos da população, percebemos que os eventuais ereais prejuízos do negócio cafeeiro eram cober-tos, por incrível que pareça, pelos contribuintesbrasileiros, mesmo aqueles que não tivessemqualquer possibilidade de acesso aos lucros des-sa atividade econômica.

Segundo os já citados Maranhão e Mendes Jr,através das decisões do Convênio de Taubaté,

os governos estaduais comprometiam-se a com- 

prar previamente, por preço fixado, a safra 

prevista de café, desde que fosse limitada a área 

de plantio, para evi tar a superprodução. Os 

bancos estrangeiros, financiando os governos es- 

taduais para essa operação, adqui riam virtual controle sobre a comercialização do produto.Este, uma vez entregue, seria guardado em es- 

toques oficiais, a serem fornecidos aos mercados 

internacionais àmedida da procura. É claro 

que, a médio prazo, isso criaria a necessidade,

tantas vezes ocorrida, de se destruírem os esto- 

ques excedentes – prejuízo pago pelo governo,

vale dizer, pelo povo, através de impostos, atin- 

gindo o conjunto da população, em mais um 

mecanismo de socialização das perdas, comum 

aos Estados capitalistas, agravado na Repúbli- ca oligárquica. 4 15

237 p r i m e i r a r ep ú b l i c a - 18 89• 1930

92. Selos: (2) 500 , 1 mil, (2) 300, (2) 400 réis. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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É importante que se perceba a dificuldade dedesatrelar os mecanismos tributários da produçãocafeeira, o que, de resto, não era um aspecto ino-vador na economia brasileira. Do ponto de vistafiscal, já era notório que se compreendesse que as

maiores receitas da Fazenda viessem através da co-brança dos direitos de entrada e saída. Sendo ocafé o produto a despontar primeiramente na pau-ta de exportações brasileiras, era obviamente esteque balizaria a economia nacional como um todo.Some-se a isso o fato de os interesses dos produ-tores estarem postados no governo, da formacomo se estruturou a alternância de poderes naRepública Velha.

No período compreendido entre os últimosvinte e cinco anos do século XIX e até 1929, a ca-

pital paulista conheceu profundas transformações.São Paulo viu-se acrescida das características decentro manufatureiro e financeiro. Este aspecto,promovido pela acumulação do capital derivadoda cafeicultura, revelou-se igualmente na estruturatributária do Estado. Os impostos mais importan-tes tinham por base o comércio exterior e, em con-trapartida, observava-se a pouca relevância daque-les de orientação interna. Era de se esperar que aestrutura tributária acompanhasse os movimentosda economia.

Segundo Nelson Hideiki Nozoe 4 16 ,

premida entre a escassez de mão-de-obra e a 

necessidade de promover imigração, de um lado,

e a deficiente estrutura tributária, de outro, a 

administração da província restabeleceu o hábi- 

to colonial dos donativos voluntários, de recei- 

ta com aplicação específica. Para institui r o 

fundo de emancipação (artigos 5º, 6º e 18º da 

Lei nº52 de 04/ 05/ 1882 e artigos 6º e 9º 

da Lei nº92 de 17/ 05/ 1883), gravaram-se 

as transmissões, doações e trocas de escravos, os recursos para o serviço de imigração (artigo 1º 

da Lei nº26 de 26/ 03/ 1884) provieram da 

taxação de escravos empregados na lavoura.

Como era de se esperar, principalmente pelosfederalistas, a proclamação da República contri-buiu para a transferência de parte da carga tributá-ria para os recém-nomeados Estados da Federação.Com isso, observa-se uma elevação da receita dealguns Estados, notadamente aqueles relacionados

à produção cafeeira, como era o caso de São Pau-lo. Neste sentido,

o montante arrecadado em 1892 – primeiro 

ano em que os tributos foram arrecadados de 

acordo com a Constituição Federal –, com os 

valores obtidos no exercício anterior, revela ex- 

traordinário crescimento da receita. A receita 

de 1890/ 1, que foi de 9.100 contos de réis,

quadruplicou de 1892 para atingir a cifra de 

38.100 contos de réis. A taxa de crescimento 

seria ainda maior se fosse comparada aos exer- 

cícios de 1888/ 9 e 1889/ 90, nos quais se arrecadou 6.800 e 6.100 contos de réis, res- 

pectivamente. Este resultado foi alcançado ape- 

sar da extinção de alguns impostos.  4 17 

238 T RI B UT O S D O BRA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

4 16  Nelson H. NOZOE, São Paulo: Economia C afeeira e U rbanização – Es tudo da Es trutu ra Tr ibutár ia e das A tiv idades Econômicas na C apital Paulista ( 188 9-

1933) , p. 16.4 17  Idem, ibidem , p. 18.4 18 Idem, ibidem .

93. Selos: Brasil 77 1,30 com carimbo

da Inspetoria da Receita Federal; 2 mil,

(2) 3 mil réis . Rio de Janeiro,

Museu da Fazenda Federal.

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Mesmo que este aumento das receitas pudesse ser“explicado, em parte, pela transferência ao Estadodo imposto de transmissão de propriedade inter-vi-vos e de parte do imposto de exportação de gênerose mercadorias produzidas internacionalmente” 4 18 , é

claro que a ligação mais direta se faz com o aumen-to da importância da produção do café, o que tor-nava a situação financeira do Estado dependente docomportamento do mercado cafeeiro.

Diga-se, de passagem, que tentativas eram ope-radas no sentido de diminuir a dependência tribu-tária do Estado de São Paulo para com o sucessoou fracasso do negócio cafeeiro. Estas tentativas,no entanto, eram sinalizadas pela queda do preçodo produto no mercado externo e, no caso de novasubida, eram abandonadas por completo. Tal foi o

caso da proposta de criação do imposto territorialou do imposto sobre terrenos incultos, elaborada

sob o impacto da queda do preço do café em1896. Todavia, segundo Nozoe,

dispondo de incipiente organização administra- 

tiva – montada durante o Império para arre- 

cadar quase que exclusivamente os direitos de saída no porto de Santos – o lançamento desses impostos apresentava sérios obstáculos, por re- 

querer exaustiva lista das propriedades exis- 

tentes no Estado. A melhora na exportação do 

cafénos anos seguintes, assim como a necessi- 

dade de elaboração de minucioso cadastro de 

propriedades, postergaram o lançamento do im- 

posto territorial. Para estimular o comércio ca- 

feeiro em 1901, o Congresso Estadual autori- 

zou ao Executivo reduzi r dois pontos da alí- 

quota de imposto sobre exportação de cafés en- sacados em tecidos de algodão ou aramina, cul- 

239p r i m e i r a r ep ú b l i c a - 18 89• 1930

Com a proclamação da República em 15 de novembro de 1889, parte da carga

tributária foi transferida para os Estados da Federação.

94. ALEGORIA DA REPÚBLICA, óleo sobre tela, 1889. São Paulo, Fundação Maria Luíza e

Oscar Americano.

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tivados e industrializados no Estado (artigo 

12º da Lei nº817 de 08/ 11/ 1901, reafir- 

mada pelo artigo 16º da Lei nº861-A de 

16/ 12/ 1902). 4 19

Percebe-se, inclusive, que a matéria tributáriacaminhava no sentido de limitar a produção ca-feeira, no caso de baixa do produto no mercadoexterno. Tal mecanismo transformava o governonum regulador do mercado, sendo que o lança-mento de novos tributos era o instrumento, porexcelência, mais utilizado. Foi com esta finalidadeque:

a lei orçamentária para o exercício financeiro de 

1903 instituiu pelo prazo de cinco anos o im- 

posto de 2 contos de réis por 2 hectares e 4 acres – ou cada fração superior àmetade do al- 

queire paulista – de terras ocupadas por novas plantações de café(artigo 10º da Lei nº861-A

de 16/ 12/ 1902, regulamentada pelo Decreto 

nº1099 de 09/ 01/ 1903; pelo artigo 1º da 

Lei nº1099 de 06/ 11/ 1907, manteve-se a 

vigência a partir de 1908). Para auxílio da 

lavoura, a receita proveniente de arrecadação do 

imposto de trânsito sobre o caféde produção do 

Estado foi destinada àdistribuição aos bancos 

de crédito agrícola a serem criados. Como o pre- 

ço do caféainda indicava queda, os lavradores que não dispunham de capitais próprios viam-se 

forçados a recorrer ao crédito dos comissários e 

bancos os quais, por sua vez, diante da exigüi- 

dade da renda agrícola, cautelosamente restr in- 

giam as concessões. 4 20

A ação reguladora do governo federal tambémpode ser percebida por medidas tributárias, tais

como:

a) lei nº966 de 07/ 04/ 1903, que determi- 

nou que os tipos inferiores de cafédeveriam ser 

tributados proibitivamente no intuito de redu- 

zir o volume exportável e para melhorar a con- 

fiança na qualidade do produto.

b) em 1904, a alíquota do imposto de expor- 

tação de caféfoi reduzida de 11 para 9% ad 

valorem.

c) suprimiu- se também o imposto sobre o trân- 

sito do café, e para compensar a queda na re- ceita pública, estabeleceram-se novos tr ibutos,

incidentes em sua maior parte sobre o capital e 

a renda.

d) a partir da safra de 1908/ 9, foi estabele- 

cido um limite de saída do caféem nove mi- 

lhões de sacas, além do qual passava a incidir 

o imposto de 20 % ad valorem cobrado jun- 

tamente com os 9% ad valorem. Conforme os empréstimos eram obtidos, impunha- se uma sobretaxa por saca exportada (3 ou 5 fran- 

cos-ouro). Além disso, quando em 12/ 1908,

na obtenção de empréstimo de 15 mi lhões de 

libras esterlinas, o estoque de cafédo Estado 

existente na Europa e Estados Unidos ficava 

hipotecado. 4 21

24 0 T RI B UT O S D O BRA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

Diante da crise provocada pela Primeira Guerra Mundial, “...foi criada a taxa de

$100 réis por saca de café transportada pelas ferrovias com destino a São Paulo,

Santos ou Rio de Janeiro (art igo 1º da Lei n.º 1553 de 04/10/1917)...”

95. C ERTIFICATE OF  S HARE . C  AUTELA DE AÇÃO  S  ÃO P  AULO BRAZILIAN R AILWAY  C OMPANY  ,

CORRESPONDENTE À EMISSÃO DE  B ARÃO DE  M AUÁ, 1860, para arrecadar recursos para

construção da estrada de ferro Santos – Jundiaí. Coleção Noronha Advogados/SP.

4 19 Idem, ibidem , p. 20.4 20 Idem, ibidem , p. 20-21.4 21 Idem, ibidem , p. 21-22.4 22 Idem, ibidem , p. 25.

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24 2 T RI B UT O S D O BRA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

Em 1908 o café foi tido como bem imóvel sujeito ao

pagamento de dívidas adquiridas fora do país. Os

governos brasileiros nunca deixaram de hipotecar bens

nacionais em empréstimos contraídos no exterior.

97. Duplicatas de empréstimos no valor de 2146 libras

esterlinas de 1908 e de 4200 libras esterlinas de 1911. Rio

de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

A centralização exclusiva da tributação sobre o café não deixava margem para

arrecadação de outras fontes de rendas aos cofres públicos. Diversos ramos

de atividade poderiam ser taxados como, por exemplo, as empresas

industriais e seus ganhos de capital.

98.Imposto sobre Capital Realizado das Empresas Industriais e Sociedades

Anônimas, The SP Transway Light and Procter Cie. Limited, exercício de 1910.

Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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24 3

lores reduzidos, o mesmo foi estendido à saída dequalquer gado vacum (artigo 2º da Lei nº 1764 de31/ 12/ 1920) 4 23. Diga-se que, mesmo em declí-nio, o café ainda fornecia o maior montante den-tro dos tributos arrecadados.

Os acontecimentos da Revolução Constitucio-nalista de 1932 também levaram a alterações naforma pela qual era sistematizada a cobrança detributos no Estado de São Paulo. O então presi-dente do Estado, Pedro de Toledo, decretou feria-do no dia 11 de julho de 1932 e este se estendeuaté 7 de agosto. Isto por conta de uma mobiliza-ção de associações representativas do comércio,das indústrias e dos estabelecimentos bancários,com o intuito de obterem a suspensão temporáriados negócios.

Durante este período de feriado, ficaram susta- das a prescrição de quaisquer direitos e a exi- gibilidade das obrigações civis e comerciais. Em insubordinação ao mando do governo federal, os serviços das repartições fiscais da União, bem 

como das caixas econômicas federais, foram in- corporadas àadministração do Estado. O câm- bio deixou de ser exclusivamente comercializa- do no Banco do Brasil e pôde ser negociado no Banco do Estado de São Paulo. Mercadorias e produtos nacionais, cedidos para o equipamento ou consumo das Forças Constitucionalistas, fi- cavam isentos do respectivo imposto federal.Para suprir a escassez do meio circulante de- corrente da suspensão dos trabalhos do Banco do Brasil, o Tesouro Paulista ficou autorizado 

a emitir os bônus ‘Pró-Constituição’. 4 24

p r i m e i r a r ep ú b l i c a - 1889•1930

4 23 Idem, ibidem ̧p. 26.4 24 Idem, ibidem , p. 31.

Tão importante era o papel do café na economia nacional que a crise pela qual

passava deu margem à criação de novos impostos na tentativa de equilibrar as

contas do governo, como, por exemplo, o imposto sobre o abate de bovinos.

99. Guilherme Gaensly, Armazém de café Telles Quirino, Santos, São Paulo,

1901/1910. Prefeitura do Município de São Paulo, Secretaria Municipal de Cultura,

Departamento de Patrimônio Histórico - Arquivo de Negativos.

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24 5

O período da República Velha ainda guarda,em termos tributários, alguns exotismos própriosde uma prática fiscal caracterizada pelo detalhis-mo. Dessa maneira, chama a atenção uma legisla-ção voltada aos materiais específicos para a pro-dução cinematográfica. Até aproximadamente1925, o filme virgem, quando entrava no país, re-

cebia uma taxação inferior ao impresso. Porém,como as alfândegas não dispunham de meios paradiscriminar um tipo do outro, os comerciantesdeclaravam como virgens muitos filmes que de-pois entravam em cartaz. Cientes dessa situação,as autoridades fiscais estabeleceram um só impos-to para as duas categorias, ou seja, optou-se pelo

imposto de valor mais alto. Cineastas iniciaramentão campanhas, sem sucesso, para que se voltas-se à situação anterior. 4 25

p r i m e i r a r ep ú b l i c a - 1889•1930

No período da República Velha, a legislação voltada aos materiais específicos para

a produção cinematográfica pode ser considerada extravagante.

101. Nita Ney e Luiz Soroa em BRAZA DORMIDA, direção de Humberto Mauro, 1929.

São Paulo, Cinemateca Brasileira.

4 25 Chama a atenção a criação de uma “taxa cinematográfica”, instituída pelo Decreto 21.240 de 1932, que criou a Comissão de Censura Federal enacionalizou o serviço de censura cinematográfica. Esta taxa era correspondente a uma proporção de 400 réis por metro de filme censurado. Outras

questões acerca da produção cinematográfica nos anos 20 e 30 podem ser observadas no trabalho da historiadora Maria Antonieta ANTONACCI,“Trabalho, Cultura, Educação: Escola Nova e Cinema Educativo nos anos 1920/ 1930”, in: Proje to H is tór ia nº 10 , São Paulo, Revista do Programa deEstudos Pós-Graduados emHistória e do Departamento de História, PUC/ SP, dezembro/ 1993.

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Além dos aspectos políticos que deram início àetapa republicana da História do Brasil, é interes-sante observar uma discussão que se processa aolongo de todo um período, que cobre muito maisque a transição da Monarquia para a República. A

maior complexidade da economia mundial destemomento atestava que se faria necessária a criaçãode novas modalidades de impostos. Oriunda dasnações onde a riqueza produzida já começava a serdividida por uma parcela cada vez maior da popu-lação, a idéia da aplicação de uma modalidade deimposto sobre a renda individual do cidadão tam-bém tem penetração no Brasil. Em nosso caso, noentanto, a aceitação desta noção, em meio aos de-bates políticos, apresenta-se como uma possibili-dade de diminuição das já crônicas crises de endi-

vidamento do Erário público. Inútil dizer quemuito dificilmente se pensava, como já em outrasnações do mundo, numa melhor divisão da rendaproduzida pelo país. Em nosso caso, a introduçãodo imposto sobre a renda, além de cumprir a fun-

ção já exposta de melhora de receita fazendária,ajusta-se aos desejos de manutenção de uma situa-ção favorável para os poucos que se integram jun-to ao poder. Qualquer semelhança com o ideárioliberal difundido na Inglaterra ou Estados Unidos

é mera coincidência.Um dos tributos mais importantes da atualida-de, o imposto sobre a renda ou simplesmente IR,trata-se de uma modalidade de tributo que somen-te pode ser pensada no momento em que se presu-me a existência do livre-arbítrio entre os cidadãos:escolhe-se declarar a procedência das rendas. Emum mundo como o nosso, a liberdade concedidaao declarante deu e dá margens a inúmeras suspei-tas. Assim, o Imposto de Renda costuma figurarnos inquéritos que envolvem alguma espécie de

suspeita sobre um cidadão.Sua implantação é datada da virada para o sé-

culo XX e, diferentemente do que se possa imagi-nar, as discussões envolvem tanto o Brasil comooutras nações do mundo, notadamente aquelas ti-

24 7 a c r i a ç ã o d o i m p o s t o d e r en d a

A modalidade de um imposto sobre a renda individual

do cidadão é implantada no país.

102. Recibo de pagamento de imposto de renda do

Conde Francisco Matarazzo, 1926. Rio de Janeiro,

Museu da Fazenda Federal.

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24 8 T RI B U TO S D O B RA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

O imposto geral sobre a renda ou sobre o conjunto líquido da renda

foi instituído em 1922 e o controle sobre sua declaração

e arrecadação ficava a cargo das delegacias gerais.

104. Delegacia Geral do Imposto sobre a Renda, Secção de Revisão,Pedido de esclarecimento a Antonio Manuel Bueno de Andrade,

Rio de Janeiro, 5 de fevereiro de 1932. Rio de Janeiro,

Museu da Fazenda Federal.

“Inútil dizer que a implantação do Imposto de Renda diz respeito ao crescimento

do potencial de produção de uma nação.”

103. Ficha Estatística Pessoa Jurídica, 1910. Rio de Janeiro,

Museu da Fazenda Federal.

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24 9a c r i a ç ã o d o i m p o s t o d e r en d a

106. Circular nº 1 de 3/01/1922, para cumprimento da Lei 4440 de 31 de

dezembro de 1921. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

Desde 1843, o fisco imperial impunha tributos sobre determinadas

categorias de rendas e controlava mensalmente os balancetes das

tesourarias provinciais, fazendo com que a lei fosse cumprida.

105. Circular nº 11, Tesouraria da Fazenda da Província de Minas,

Ouro Preto, referente aos balancetes mensais, assinada por

 José A. Pere ira da Costa, 4 de julho de 187 2. Rio de Ja neiro,

Museu da Fazenda Federal.

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das como mais desenvolvidas, como França ou Es-tados Unidos. Em nosso país, as discussões acalo-radas sobre a procedência ou não da instituiçãodeste tributo vêm desde o Segundo Império e esti-veram associadas aos momentos de déficit de arre-

cadação nas receitas. Assim, pode-se dizer que aspreocupações com a criação do Imposto de Rendacostumam estar dentro de um contexto, inclusivede crise global, como foi o caso da Primeira Guer-ra Mundial (1914-1918).

Inútil dizer que a implantação do Imposto deRenda diz respeito ao crescimento do potencialde produção de uma nação. Trata-se de um tribu-to que, pelo seu nível de abrangência, englobauma grande parcela daqueles que têm acesso àsfontes de renda, isto é, somente pode existir com

mais sentido em sociedades que aumentaram osseus níveis de produção ou que terminaram porpermitir o acesso de um maior número de pes-soas à renda. Nesse sentido, é pertinente observara criação deste tributo num momento de desen-volvimento maior do capitalismo, no início doséculo XX. De tal forma tornou-se paradigmáti-co, que se torna impossível imaginar que a recei-ta de um país possa operar sem a existência des-te imposto.

Ao mesmo tempo, a pertinência da criação doImposto de Renda foi dada pelas discussões emtorno da criação de um Estado nos moldes daque-les uma vez pensados pelos iluministas. Há algo naempreitada deste tributo que busca se filiar à idéiade que os homens podem caminhar para a existên-cia de uma sociedade mais justa, na medida emque se equilibre o acesso de ricos e pobres à rique-za produzida por uma nação. Nesse sentido, o ins-tante da declaração de rendas é cercado de inúme-ras suspeitas e temores; e as justificativas para a so-

negação assumem muitas vezes aspectos políticos,a partir do questionamento sobre a habilidade dogoverno na utilização de todo o montante arreca-dado.

O Imposto de Renda, da forma como o co-nhecemos hoje, incidente sobre a renda total docontribuinte, foi estabelecido no Brasil em 1922e revisto em 1923. Com efeito, o artigo 31 da

Lei de Orçamento nº4625, de 31/ 12/ 1922,dispunha:

Fica instituído o imposto geral sobre a renda,que serádevido anualmente, por toda pessoa fí- 

sica ou jurídica, residente no território do país,e incidirá, em cada caso, sobre o conjunto lí- quido dos rendimentos de qualquer origem.

 Tendo em vista a constatação de algumas difi-culdades para arrecadá-lo, tal como disposto nesteartigo, o Congresso o emendou convenientementena Lei Orçamentária nº4728, de 31/ 12/ 1923(artigo 3º), a fim de facilitar a sua implantação, oque finalmente ocorreu em 1924.

Desde 1843, no entanto, o fisco imperial im-

punha tributos sobre determinadas categorias derendas. A esses conglomerados de impostos, pa-gos separadamente pelo contribuinte, dava-se en-tão o nome genérico de “impostos sobre rendi-mentos”. Segundo Mandêtta, “esta modalidadede imposto não pôde resistir à reação provocada,por apresentar-se, na época, como hoje também,de feição intempestiva e injusta e foi revogadoanos depois”. 4 26  Eram o “imposto sobre subsídiose vencimentos” 4 27  e o “imposto sobre dividen-dos”. Observe-se que “esse imposto atingia, sobforma progressiva, apenas as pessoas que recebes-sem vencimentos dos cofres públicos, como reza-va o parágrafo 1º do artigo 23 daquela lei. Fica-vam isentos apenas os vencimentos das praças depré de terra e mar e vencimentos de militares emcampanha.” 4 28

No período da Guerra do Paraguai, como vi-mos, profícuo na matéria tributária, pensou-se nainstauração de uma modalidade de imposto sobrevencimentos e, mais uma vez, a tentativa mostrou-

se frustrada. Em 1867, durante a Guerra, um re-gulamento de 28 de dezembro “dava instruçõespara a arrecadação do imposto pessoal criado pelaLei nº1.507, de 26 de setembro do mesmo ano,pelo qual se cobraria de cada pessoa nacional resi-dente no Império e tivesse por sua conta casa dehabitação arrendada ou própria, ainda que nelanão morasse.” 4 29

250 3ª Parte T RI B U TO S D O B RA SI L r e pu b l i c a n o

4 26  Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 557.

4 27  Instituído pela Lei nº 317, de 21/ 10/ 1843 que fixou a despesa e orçou a receita do Segundo Império para os exercícios de 1843/ 1844 e 1844/1845.4 28 Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda, Evolução do Imposto de Renda no Brasil, Rio de Janeiro, 1966, nº 25, p. 5-6.4 29 Savério MANDÊTTA, op. cit., p. 563.

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As tentativas de se criar novas figuras tributá-rias durante a vigência de um conflito militar nãoeram inéditas no mundo. Napoleão já lançara mãodeste expediente ainda no início do século XIX,sendo que, anos antes, os Estados Unidos fizeram

o mesmo com a criação de umincome duty .Nova tentativa se operou em regimento baixa-do em 15/ 07/ 1874, que visava à arrecadação doimposto de indústrias e profissões. Determinava,em seu artigo 2º, que as sociedades anônimas fi-cassem sujeitas ao imposto de , % dos dividen-dos distribuídos aos acionistas. E no artigo 20º, oregulamento dispunha que:

Os diretores e gerentes das companhias anôni - mas deveriam apresentar aos agentes fiscais de- 

claração de dividendos anterior ao exercício do lançamento, ou de se não haver distribuído di- videndos. A falta desta declaração ou a fixação do dividendo em menor algarismo do que o real,sujeitaráas companhias ao arbitramento do dito dividendo pelos agentes de arrecadação e os diretores àmulta de 50$000 réis até 200$000. 4 30

Em 1882, porém, já quase ao final do SegundoReinado, temos por completo a supressão do im-posto pessoal e do imposto sobre vencimentos.

Percebe-se que, num período em que o Imperadorse encontrava em situação política delicada e ins-tável, não seria o caso de se criar uma nova moda-lidade de tributo, especialmente aquele que, pelasua própria natureza, incidiria sobre um número

maior de indivíduos. As iniciativas mais expressi-vas, que apontavam para a criação do Imposto deRenda, seriam deixadas para um instante em queas lideranças políticas de nosso país estivessemmais imbuídas e até justificadas pelas profundasalterações econômicas que se desejava realizar. Umgoverno novo, associado às idéias de modernidadee que vinha para romper com o arcaísmo do Impé-rio, convergiria para si um amplo espectro de rea-lizações reformistas.

A idéia do Imposto de Renda foi retomada

com mais vigor em 1891, pelo então Ministro daFazenda, Rui Barbosa, defensor desta modalidadede tributo. A discussão, no entanto, não se desen-volveu adequadamente no Congresso. O entraveconstitucional encontrava-se na Carta Magna de1891, uma vez que esta outorgara aos Estados acompetência para decretar impostos sobre indús-trias e profissões. 4 31

Foi na direção da criação do Imposto de Ren-da que, em 1891, o então Ministro da Fazenda,Rui Barbosa, apontava que:

“Os diretores e gerentes das companhias anônimas deveriam apresentar aos agentes fiscais declaração de dividendos

anterior ao exercício do lançamento, ou de se não haver distribuído dividendos”.

107. Livro de escrituração do Imposto de Consumo de Energia Elétrica, da Coletoria das Rendas Federais em Cabreúva,

Estado de São Paulo, da Empresa Luz e Força de Cabreúva, 1930. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

251a c r i a ç ã o d o i m p o s t o d e r en d a

4 30 Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda, op. cit., p. 6-7.4 31 Não era privilégio do Brasil o enfrentamento de problemas quando das discussões da aplicação do Imposto de Renda. Diga-se que, mesmo nos Estados

Unidos, tambémfora declarada inconstitucional a lei de 28/ 08/ 1894, que criava o Imposto de Renda. Apenas em1909 foi aprovada a emenda e somenteem3/ 10/ 1913 foi implantado o Imposto de Renda naquele país. Na França, as discussões datavamde 1848, tendo sido retomadas em1909 como projetode Caillaux, sendo que o imposto passou a vigorar emjulho de 1914.

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No Brasil, porém, atéhoje, a atenção dos gover- nos se tem concentrado quase só na apl icação do imposto indireto, sob a sua manifestação mais trivial, mais fácil e de resultados mais imedia- tos: os direitos de alfândega. E do imposto so- 

bre a renda, por mais que se tenha falado, por mais que se lhe haja proclamado a conveniência e a moralidade, ainda não se curou em tentar a adaptação, que nossas circunstâncias permitem e as nossas necessidades reclamam.  4 32

É de Rui Barbosa, igualmente, a citação quemuitos anos antes fizera Francisco de Monte-zuma, Visconde de Jequitinhonha, em confe-rência do Conselho de Estado no ano de 1867,na defesa da implantação do Imposto de Ren-

da no Brasil:

A arrecadação deste imposto oferece algumas dificuldades, mormente a princípio; mas em algumas nações a boa- fédos contribuintes di- minui, em grande parte, esse inconveniente, e a boa- fénasce da i lustração do povo sobre a ne- cessidade do imposto e sobre o seu bom empre- go, que deve ser como semente lançada em ter- reno fértil. Talvez que entre nós hámuita gen- 

te que antes quer parecer rica do que confessar que épobre. A arrecadação será, em todo caso,difícil no começo; mas, depois irámelhorando,e afinal se tornarátão perfeita, quanto for possível.  4 33

Em 1896, o futuro presidente da República,Conselheiro Francisco de Paula Rodrigues Alves,também acentuava que:

É este imposto o meio que socorre todas as na- 

ções não só como fonte de receita senão por sua dupla natureza de contribuição complementar e compensadora, que faz desaparecer desigualda- des e coloca sob a ação do fisco mananciais de receita que de outra sorte lhe escapariam não obstante a tendência geral das populações para fraudá-lo.  4 34

Os anos que se seguiram foram, assim, marca-dos por discussões ainda mais acaloradas, que di-vidiam aqueles que eram a favor do tributo e ou-tros que, talvez por temeridade, afastavam-se daidéia. Vale dizer que o próprio Congresso enten-

dia ser esta uma matéria de difícil digestão. O ar-gumento da inconstitucionalidade deixava de tertanta validade a partir do momento em que, nosEstados Unidos, uma emenda apresentada em1909 dava conta da introdução do Imposto deRenda sem que, com isso, se ferisse a Carta Mag-na daquele país.

252 T RI B U TO S D O B RA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

4 32 Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda, op. cit., p. 10.4 33 Idem, ibidem , p. 11.4 34 Idem, ibidem , p. 13.

Ainda com apólices da dívida pública a serem resgatadas na praça, D. Pedro II

preferiu adiar a criação de uma nova modalidade de imposto sobre a renda.

108. Apólice da dívida pública, 1870, Emissão D. Pedro II. São Paulo,

Coleção Noronha Advogados.

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Os anos do início da República demonstramque a criação de uma nova modalidade tributáriase fazia mister, uma vez que, como vimos, a eco-nomia brasileira caminhava par e passo com os su-cessos e infortúnios da produção cafeeira. Nosprimeiros anos da década de 1910, observam-setentativas neste sentido, quando do início da Pri-meira Guerra Mundial. Assim sendo, a fala presi-dencial de Venceslau Brás, em 1915, pode ser vis-ta como sintomática quanto ao quadro de época,bem como contemporânea, se pensarmos nas si-tuações mais próximas a nós:

As condições econômicas e financeiras do Bra- sil, em meados de 1914 jáeram bastante crí- ticas, e isto em conseqüência não só do regime 

de despesas excessivas, que produziam anual- mente vultoso déficit orçamentário, mas tam- bém de diminuição, em grande escala, das ren- das públicas e da desvalorização dos principais produtos de nossa exportação. Essas condições,porém, pioraram de muito, com a irrupção da guerra européia, a qual, desorganizando por completo as trocas internacionais, restringindo os créditos internos e externos e dificultando os 

transportes marítimos, gerou a situação anor- mal e gravíssima com que hámeses lutam todas as nações do mundo. E, no Brasil, infelizmen- te, devido aos erros e às imprevidências de lon- go prazo acumulados, se fizeram sentir, com 

maior violência, os efeitos de tal crise evidente- mente a mais temerosa que o país vem enfren- tando.  4 35

No mesmo ano de 1920, em seu relatório doMinistro da Fazenda, assim se manifestou Home-ro Batista:

Dos impostos diretos, os que mais aconselháveis se fazem àsituação brasileira são os de renda,de que jácriamos alguns títulos com relativa 

facilidade e animador acolhimento. Cumpre- nos perseverar nesse propósito, atéque se com- plete aquele insti tuto de tributação justa, pro- gressiva e geral.  4 36 

No ano seguinte, o deputado Mario Brant, naComissão de Finanças, retorna ao assunto:

Do ponto de vista fiscal, éo mais produtivo e o mais elástico; examinando sob o critério eco- 

nômico, éde todos os impostos o mais inócuo ao desenvolvimento do país e, com taxas modera- das, antes o estimula. Encarado pelo aspecto ético, éo mais justo de todos. Com a vitória universal das idéias democráticas, principal conseqüência da última guerra, éhoje inadmis- sível um país de instituições liberais, principal- mente uma República, sem o imposto geral e progressivo sobre a renda.  4 37 

O percurso para a criação do Imposto de Ren-

da se aproximava de seu fim quando, em31/ 12/ 1921, a Lei nº4440 tributa dividendos, juros, lucro líquido das sociedades, lucros de ban-cos e casas de penhores, bonificações ou qualifica-ções aos diretores-presidentes, juros garantidospor hipoteca, prêmios de seguros, vida, marítimos,lucros fortuitos (prêmios), lucro de fábricas, lucrode comércio, operações a termo, lucro de profis-sões liberais etc. Deve-se levar em consideração

253a c r i a ç ã o d o i m p o s t o d e r en d a

4 35 Idem, ibidem , p. 9.4 36  Idem, ibidem , p. 15.4 37  Idem, ibidem .

109. Rui Barbosa, Ministro da Fazenda em 1891, foi um dos defensores do Imposto

sobre a Renda, c. 1920. Rio de Janeiro, Fundação Casa de Rui Barbosa.

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254 T RI B U TO S D O B RA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

4 38 Idem, ibidem , p. 10.4 39 Idem, ibidem , p. 17.

110. O Conselheiro Francisco de Paula Rodrigues Alves, enquanto Ministro da

Fazenda, era favorável à criação do Imposto sobre a Renda, imaginando formas

de honrar contratos externos vultosos como o aprovado pelo telegrama de

autorização para assinatura de contrato de um milhão de libras esterlinas com

Rotschild and Sons, referente às Leis 25 de 30 de setembro de 1891 e 36 de 26 de

janeiro de 1892, 2 de junho de 1892. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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“ (...)O Estado Novo veio para nos orientar

 N o Brasil não falta nada mas precisa trabalharTem café, petróleo e ouro

 E ninguém pode duvidar.

 E quem for pai de quat ro fi lhosO presidente manda premiar. É negócio casar ( ...) ” 

C anção de A taulfo A lves e Felisberto M art ins, 194 1

a er a v a r g a s 1930 • 1945

256  TRIBUTOS DO BRASIL r epu bl ic an o 3ª Parte

A industrialização avança. Começa o ciclo da borracha.A crise do café e a Revolução de 1930. O levantepaulista de 1932. O modelo tributário da Constituiçãode 1934. A Carta outorgada de 1937. O Estado Novocentralizador e o fimda autonomia dos estados emunicípios. Acelera-se a industrialização. Novasmudanças na política tributária.

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26 0

leiro continuava investindo fortemente no café. Enem poderia ser diferente, uma vez que ele próprioera formado pelas hostes dos produtores cafeeiros.

Se o acordo político entre as elites agrárias eramotivo de atenções sistemáticas, a possibilidade

maior de rompimento deu-se exatamente quandoo principal produto da pauta de exportações teveseu preço reduzido para níveis alarmantes. Impos-sibilitado de reagir frente a um problema econô-mico de ordem mundial – o que acontecia em ou-tros países –, a política dos governadores procuroumais uma vez, e pela última, a articulação políticacomo meio de sustentar o indefensável.

Em 1929, o então presidente da República,Washington Luís, sinaliza o rompimento com apolítica dos governadores e indica outro paulista,

 Júlio Prestes, para as eleições presidenciais. Indi-cando um rearranjo do acordo político tão útil àselites agrárias desde a virada para o século XX – oque de certa forma possibilitou a continuidade ci-vil dos governos da República Velha –, a atitudedo então presidente da República demonstra umaação ofensiva dos fazendeiros do café de São Pau-lo. Evidentemente, a alteração nas regras do jogo

permitiu a abertura de brechas no poder brasilei-ro. É assim que acompanhamos o surgimento deuma certa Aliança Liberal – reunião de forças po-líticas de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraí-ba e de grupos de oposição ao governo, que se en-

contravam em outros Estados da federação. Comoresultado deste consenso, lançou-se o nome deGetúlio Vargas à presidência do Brasil, sendo que

 João Pessoa era o vice da chapa.As eleições realizadas em 1930 mostraram que

a máquina governamental se encontrava a pleno fa-vor para com Júlio Prestes, fato aliás nada estranhoem se tratando de pleitos eleitorais deste período –pense-se na garantia da eleição de candidatos deSão Paulo e de Minas Gerais, prática notabilizadapelo voto de cabresto. Valendo-se da exaltação dos

ânimos populares, principalmente daqueles urba-nos, já bastante combalidos pela exclusão social,pelo aspecto legalista por trás da luta pela posse deGetúlio Vargas em eleições consideradas fraudulen-tas e da temeridade do apoio a Washington Luís, oBrasil acompanhou o evento que entrou para a his-tória com o nome de Revolução de 30.

Longe de anunciar uma situação de estabili-dade política imediata, a chegada de Vargas aopoder representava o início de novas articula-ções, que terminariam por garantir a sua perma-nência na presidência ao menos até 1945. Em-possado, de certa forma, como presidente de di-reito – levando-se em consideração o argumentoagora pragmaticamente válido de que as eleiçõeshaviam sido fraudadas –, restava um longo cami-nho a ser trilhado, a fim de reconhecer Vargascomo presidente de fato. A insatisfação do prin-cipal segmento econômico que apoiava – e era –o governo até Washington Luís expôs-se na Re-volução Constitucionalista de 1932. O desejo de

uma nova Constituição e o então retorno ao es-tado de direito não era, de fato, o objetivo visa-do pelas elites paulistanas – as oligarquias –quando se dá a eclosão do levante de 32. Omote, no entanto, deve ter colaborado para queos ânimos populares fossem insuflados, a pontode se decidir pela revolta civil e pela luta arma-da contra o governo central. Evidentemente, oque se pretendia era que os revolucionários de30 percebessem que a cultura política da Repú-blica Velha não se tinha esgotado simplesmente

pelo fato de se romper a ordem da política dosgovernadores.

T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

115. Antes de ter seu nome lançado para a Presidência da República, Getúlio

Vargas ocupou o cargo de Ministro dos Negócios da Fazenda. Carta de Getúlio

Vargas, Ministro dos Negócios da Fazenda, ao Delegado do Tesouro Nacional em

Londres, acerca de títulos resgatados de Rothschild and Sons, 11 de novembro de

1927. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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Co mpet e t ambémpr ivat ivamen t e à Un ião(Ar t ig o 6º):

I - decretar impostos: 

a) sobre a importação de mercadorias de proce- 

dência estrangeira; 

b) de consumo de quaisquer mercadorias, exce- 

to os combustíveis de motor de explosão; 

c) de renda e proventos de qualquer natureza,

excetuada a renda cedular de imóveis; 

d) de transferência de fundos para o exterior; 

e) sobre atos emanados do seu governo, negócios 

da sua economia e instrumentos de contratos ou 

atos regulados por lei federal; 

f) nos Territórios, ainda, os que a Consti tuição 

atr ibui aos Estados; 

I I - cobrar taxas telegráficas, postais e de outros 

serviços federais; de entrada, saída e estada de 

navios e aeronaves, sendo livre o comércio de ca- 

botagem às mercadorias nacionais, e às estrangei- 

ras que játenham pago imposto de importação.

Co mpet e pr ivat ivamen t eao s Est ado s (Ar t ig o 8º):

I - decretar impostos sobre: 

a) propriedade territorial, exceto a urbana; 

b) transmissão de propriedadecausa mortis ; 

c) transmissão de propriedade imobiliária inter vivos,

inclusive a sua incorporação ao capital de sociedade; 

d) consumo de combustíveis de motor de explosão; 

e) vendas e consignações efetuadas por comer- 

ciantes e produtores, inclusive os industriais,

ficando isenta a primeira operação do pequeno produtor, como tal definido na lei estadual; 

263a e r a v a r g a s - 19 30 • 19 45

Pela Constituição de 1934, competia à União decretar impostos de consumo de mercadorias, exceto combustíveis de motores à explosão. Mais tarde, houve um esforço de

modernização tecnológica e o implemento da indústria de motores no Rio de Janeiro.

118. Fábrica Nacional de Motores, inicialmente projetada para construir aviões, mas fabricando caminhões. Município de Duque de Caxias, Rio de Janeiro, c. 1942.

Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas/CPDOC.

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f) exportação das mercadorias de sua produção 

atéo máximo de dez por centoad valorem , ve- 

dados quaisquer adicionais; 

g) indústrias e profi ssões; 

h) atos emanados do seu governo e negócios da 

sua economia, ou regulados por lei estadual; 

I I - cobrar taxas de serviços estaduais.

§ 1.º - O imposto de vendas seráuni forme,

sem distinção de procedência, destino ou espécie 

dos produtos.

§ 2.º - O imposto de indústrias e profissões 

serálançado pelo Estado e arrecadado por este 

e pelo Município em partes iguais.

Co mpet e ao s Mun ic ípio s(Ar t ig o 13, § 2.º):

Além daqueles de que participam, dos artigos 

8.º, § 2.º, e 10º, parágrafo único, e dos que 

lhes forem transferidos pelo Estado, pertencem 

aos Municípios: 

I - o imposto de licenças; 

I I - os impostos predial e o territorial urbanos,

cobrado o primeiro, sob a forma de décima ou 

de cédula de renda; 

I I I - o imposto sobre diversões públicas; 

IV- o imposto cedular sobre a renda de imóveis 

rurais; 

V- as taxas sobre serviços municipais.

Do ponto de vista de sua aplicação, a Consti-

tuição de 1934 foi a mais curta da República, umavez que, insatisfeito em ceder seu poder para ou-tro presidente eleito pelo voto direto, Getúlio Var-gas desferiu um golpe político-militar no ano de1937, dando início ao período conhecido pelonome de Estado Novo. No mesmo ano, é outorga-da uma nova Constituição, a terceira do períodorepublicano do país. Representando um retratofiel do período que a viu surgir, a nova Carta Mag-na do Brasil garantia plenos poderes ao presidenteda República e instituía um Estado fortemente

centralizador, reduzindo o peso político dos Esta-dos que compunham a federação.

264 T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

Em 1934, era livre o comércio de cabotagem às mercadorias estrangeiras que tivessem pago imposto

de importação, o que poderia ser verificado através de selos e carimbos nas notas de importação.

119. Nota de importação de querosene francês, 1953. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

Os comerciantes e produtores que, durante os anos 1930 e 1940,

requeriam patentes de registro de comércio ficavam isentos

de recolher imposto na primeira operação de venda ou consignação.

120. Recebedoria Federal de São Paulo, Patentes de registro de comércio

a varejo, 1940. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

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Segundo Bernardo Ribeiro de Moraes, a Cons-tituição de 1937 tinha as seguintes característicastributárias:

a) suprimiam-se determinados impostos e unifi- 

cavam-se outros, como o de consumo e o de renda; 

b) a competência tributária era distribuída por 

três esferas públicas; 

c) Municípios continuavam com receitas insu- 

ficientes para o normal atendimento de suas 

atribuições; 

d) havia um campo concorrente para a União e 

os Estados, sendo, entretanto, vedada a bi- tri- 

butação, pois prevaleceria o imposto decretado 

pela União. 4 4 6 

Os aspectos tributários discriminados daConstituição de 1937 são os seguintes:

Co mpet e à Un ião(Ar t ig o 20):

I - decretar impostos: 

a) sobre a importação de mercadorias de proce- 

dência estrangeira; 

b) de consumo de quaisquer mercadorias; 

c) de renda e proventos de qualquer natureza; 

d) de transferência de fundos para o exterior; 

e) sobre atos emanados do seu governo, negócios 

da sua economia e instrumentos ou contratos 

regulados por lei federal; 

f) nos Territórios, ainda, os que a Consti tuição 

atr ibui aos Estados; 

I I - cobrar taxas telegráficas, postais e de outros 

serviços federais; de entrada, saída e estada de 

navios e aeronaves, sendo livre o comércio de ca- 

botagem às mercadorias nacionais, e às estrangei- 

ras que játenham pago imposto de importação.

Co mpet e ao s Est ado s(Ar t ig o 23):

I - decretar impostos sobre: 

a) propriedade territorial, exceto a urbana; 

b) transmissão de propriedadecausa mortis ; 

c) transmissão de propriedade imobiliária in- 

ter-vivos, inclusive a sua incorporação ao capi- 

tal de sociedade; 

d) vendas e consignações efetuadas por comer- 

ciantes e produtores, isenta a primeira operação 

do pequeno produtor, como tal definido na lei 

estadual; 

e) exportação das mercadorias de sua produção 

atéo máximo de dez por cento ad valorem , ve- 

dados quaisquer adicionais; 

f) indústrias e profissões; 

g) atos emanados do seu governo e negócios da 

sua economia, ou regulados por lei estadual; 

I I - cobrar taxas de serviços estaduais.

§ 1.º - O imposto de vendas seráuniforme, sem 

distinção de procedência, destino ou espécie dos 

produtos.

§ 2.º - O imposto de indústrias e profissões será 

lançado pelo Estado e arrecadado por este e pelo 

Município em partes iguais.

Co mpet e ao s Mun ic ípio s

(Ar t ig o 28):

Além dos atribuídos a eles pelo artigo 23º, § 2.º 

desta Constituição e dos que lhes forem transfe- 

ridos pelo Estado, pertencem aos Municípios: 

I - o imposto de licenças; 

I I - os impostos predial e o territorial urbanos; 

I I I - o imposto sobre diversões públicas; 

IV- as taxas sobre serviços municipais.  4 47 

26 5a e r a v a r g a s - 19 30 • 19 45

4 4 6  Bernardo Ribeiro de MORAES, op. cit., p. 70.4 4 7  Evaristo J. GARCIA, op. cit., p. 15-16.

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266  T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

121. O Decreto-Lei 2416 , de 17 de julho de 1940, adotou rubricasmais exatas, reduzindo-as para 40 e aprovando

a codificação das normas financeiras para Estados e Municípios.

Rio de Janeiro, Ministério da Justiça/Arquivo Nacional.

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É necessário que se observe que muitas tentativasforamfeitas como objetivo de tornar a matéria tri-butária mais clara e profícua. No decreto 2.416, de17/ 07/ 1940, adotaram-se rubricas mais exatas, hajavista que antes tínhamos mais de 1000 rubricas rela-

tivas aos tributos e, a partir da legislação citada, o nú-mero tornou-se inferior a 40. Medidas de caráterprotecionista tambémsão adotadas e tal foi o caso daemenda constitucional nº3, de 18/ 09/ 1940, quevedou que Estados, Distrito Federal e Municípiostributassemdireta ou indiretamente a produção e co-mércio, inclusive a distribuição e exportação do car-vão mineral nacional e dos combustíveis e lubrifican-tes líquidos de qualquer origem. Este imposto passa-va a ser de competência exclusiva da União, cabendouma parte do produto da arrecadação aos Estados e

Municípios proporcional ao consumo nos respecti-vos territórios, a fim de a mesma ser aplicada naconservação e no desenvolvimento das suas redes ro-doviárias. Em 1941, o curioso Decreto 3.200, de19/ 04, cria o imposto adicional ao de renda para aproteção à família de muitos proventos e passa a re-cair sobre solteiros, viúvos e casais semfilhos. A mú-sica “É negócio casar”faz umcomentário acerca des-ta modalidade de tributo, que onerava os não-com-promissados comas obrigações paternas:

(...) 

O Estado Novo veio para nos orientar 

No Brasil não falta nada mas precisa trabalhar 

Tem café, petróleo e ouro 

E ninguém pode duvidar.

E quem for pai de quatro fi lhos 

O presidente manda premiar.

É negócio casar (...)  4 4 8

Uma característica marcante do Estado Novo

foi a de tentar disciplinar, em todos os campos, asociedade brasileira. Os esportes não fugiam à re-gra. Assim, a 14 de abril de 1941, surge a primeiraproposta de Lei Orgânica para os desportos no Bra-sil, o Decreto-Lei nº3.199; nessa legislação, tam-bém era criado o Conselho Nacional de Desportos– CND. Ou seja, buscava-se colocar uma ordem naspráticas esportivas do país, sempre com o intuito deque estas estivessem a serviço da nação.

A imprensa esportiva entendia que esta nova le-gislação inaugurava um momento de mudança ra-dical, que traria ganhos imediatos aos esportes; ese a estes, também ao país. Enquanto uma intro-dução ao texto da lei – tão esperada pelos que de-

fendiam a idéia de que os esportes faziam parte daestratégia de construção e de defesa da nação –, aimprensa começava a destrinchar a lei:

O novo órgão exercerávigilância sobre o pro- 

fissionalismo – O futebol seráo esporte bási- 

co da CBD – Todo empregado público ou pri- 

vado poderáser requisitado para defender o es- 

porte brasileiro – As exibições públicas serão 

isentas de quaisquer impostos – Em cada qua- 

dro somente poderáfigurar um jogador estran- 

geiro – Seráestudado o seguro dos jogadores sujeitos a acidentes – Vão ser nacionalizadas e 

uniformizadas as expressões usadas nos espor- 

tes – Serão instituídas associações nacionais de 

 árbitros.  4 4 9

Os primeiros comentários foram os mais oti-mistas possíveis, verificando-se quase uma come-moração pela ação estatal. Porém, esses cronistasesportivos mostravam que se os esportes, agoraoficializados, iriam servir à nação, era necessárioque não recaísse sobre eles uma carga fiscal violen-ta. Isso porque havia muitas reclamações sobre osinúmeros tributos que eram cobrados, principal-mente dos clubes de futebol profissional. Com osesportes sob a direção estatal, acreditava-se quetudo seria resolvido. A conjuntura da época engen-drava esse tipo de crença, pois as atividades espor-tivas, como estratégicas para a formação do ho-mem brasileiro, deveriam estar nas mãos do poderpúblico, preparando esse homem para servir ao

país, fosse em tempo de paz, fosse na guerra.Exemplo desse otimismo pode-se colocar ocronista esportivo Thomaz Mazzoni, que haviabrigado muito pela oficialização dos esportes noBrasil. Ele acreditava que essa legislação resolveriade imediato todos os males do esporte no país.Porém, não foi o que aconteceu e Mazzoni perce-beu isso rapidamente, o que pode ser verificadoem um dos seus artigos:

267 a e r a v a r g a s - 19 30 • 19 45

4 4 8 Ataulfo Alves e Felisberto Martins, O deon, 1941.4 4 9 Criado ontem, pelo presidente Getúlio Vargas, o Conselho Nacional de Desportos, A G az eta , 15/04/ 1941, p. 9. A pu d  Plínio José Labriola de Campos

NEGREIROS,  A N ação En tr a em C am po, p. 213.

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 Em 1961, a receita do G overno Federal, estimada em 24 6,6 bilhões de cruz eiros, foi de 317,5 e os gastos atingiram a 4 20 bilhões de cruz eiros. Em vista disso, o C onselho N acional de Economia pregava a necessidade de uma reforma do sistema tributár io.

a r epú b l i c a po pu l i st a1945• 1964

27 0 TRIBUTOS DO BRASIL r epu bl ic an o 3ª Parte

O modelo tributário da Constituição de 1946. Estados emunicípios readquiremautonomia. A industrializaçãoavança, apoiada nos investimentos estrangeiros e embenefícios fiscais.

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272

✠ Taxas.

✠ Contribuições de melhoria.

Tr ibut o s d o s Mun icípio s

n a Co n st it uiç ão d e 1946

✠ Imposto predial e territorial urbano.

✠ Imposto de licença.

✠ Imposto de indústrias e profi ssões.

✠ Imposto sobre diversões públicas.

✠ Imposto sobre atos de sua economia e assuntos de 

sua competência.

✠ Taxas.

✠ Contribuições de melhoria.

Os anos que se seguem à promulgação daConstituição são marcados por ajustes operadosnas formas de cobrança dos tributos, bem comonas esferas de competência onde deveriam incidir.

É assim que, em 19/ 08/ 1953, pela Portaria doMinistro da Fazenda de nº784, nomeia-se umacomissão para a elaboração de um anteprojeto dofuturo Código Tributário Nacional. Embora tenhasido enviado ao Presidente da República e deste

para o Congresso Nacional, não se converteu emlei. Sua parte geral, no entanto, serviria para bali-zar a Reforma Tributária a ser empreendida em1965.

Em 1961, a receita do Governo Federal, esti-mada em 246,6 bilhões de cruzeiros, foi de 317,5e os gastos atingiram a 420 bilhões de cruzeiros.Em vista disso, o Conselho Nacional de Economiapregava a necessidade de uma reforma do sistematributário. Pensava-se nos impostos antieconômi-cos e no problema da discriminação de rendas que

ainda era motivo de controvérsias, uma vez que sepostulava o fortalecimento do poder fiscal daUnião, por um lado, e a ênfase nos poderes dosEstados e Municípios, por outro. O Conselho Na-cional de Economia pregava a necessidade de umasolução mista – tal como a adotada pelos EstadosUnidos, Canadá e Austrália. Segundo BernardoRibeiro de Moraes, “o Conselho Nacional deEconomia desejava que a discriminação de rendastributárias fortalecesse a União, permitindo que os

T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

Em 1961, a moeda corrente no

país era o cruzeiro. A receita

estimada do Governo Federal

era muito baixa, o que levou à

sugestão de reforma do sistema

tributário brasileiro.

124. Nota do índio, 3ª estampa

do valor de 5 cruzeiros. Rio de

 Janeiro, Museu de Valores do

Banco Central do Brasil.

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273

Municípios e Estados tivessem compensação pelaposterior redistribuição da receita fiscal através desubvenções.” 4 52

Ainda de acordo com esta orientação, Ribeirode Moraes entende que, “segundo o fundamento

do Conselho, o imposto encontra justificativa nasua utilização como instrumento de política eco-nômica e de justiça social. Sendo essência desteobjetivo haver uniformidade para certos tributos,em todo o território nacional, não poderia issoocorrer caso estivessem em órbita estadual ou mu-nicipal. Até mesmo subvenções deveriam ser con-troladas.” 4 53

Acerca da má distribuição de rendas para comos Municípios, houve mudança a partir da Emen-da Constitucional nº5, de 21/ 11/ 1961. Através

dela:

a) os Municípios passaram a participar da ar- 

recadação do imposto de consumo (da União) 

na base de 10%; 

b) os Municípios passaram a participar da ar- 

recadação do Imposto sobre a renda na base de 

15% do total; 

c) na iminência ou no caso de guerra externa,

a União ficou com a competência para decretar 

impostos extraordinários, suprimíveis dentro 

de cinco anos, a contar da data da assinatura 

da paz; 

d) os Estados perderam, em favor dos Muni- 

cípios, a competência para tributar o imposto 

sobre a propriedade rural e o imposto sobre a 

transmissão da propriedade imobiliária inter- 

vivos.

Do ponto de vista econômico, a fase que seiniciou em 1945 com o Governo Dutra, sucedi-do por Getúlio, Juscelino Kubitschek, Jânio

Quadros e João Goulart, notabilizou-se pelapresença de capital estrangeiro em nosso país, oque, de fato, não provocou grandes surpresas,uma vez que tradicionalmente o Brasil dependiade recursos financeiros que viessem de fora, maisexatamente dos países que estivessem em melho-res situações. Em meio a um universo de discus-sões acaloradas, fundamentadas num nacionalis-mo exacerbado, os empréstimos eram negocia-dos, importavam-se equipamentos e tecnologias

a r ep ú b l i c a p o p u l i s t a - 194 5• 1964

4 52 Idem, ibidem , p. 76.4 53 Idem, ibidem .

Através da Emenda Constitucional

de 1961, procurou-se administrar

melhor a má distribuição de renda

dos Municípios.

125. Emenda Constitucional

número 3, 1961. Rio de Janeiro,

Ministério da Justiça/Arquivo

Nacional.

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✠ Outros impostos a serem criados, diferentes dos privativos (40% do produto arrecadado vai para o Município onde seja realizada a cobrança).

✠ Taxas.

✠ Contribuições de Melhoria.

Tr ibut o s d o s Estad o sem 1964

✠ Imposto sobre a transmissão da propriedadecau- sa mortis.

✠ Imposto sobre vendas e consignações.

✠ Imposto sobre a exportação de mercadorias de sua produção para o estrangeiro.

✠ Imposto sobre atos regulados por lei estadual, os de serviços de sua justiça e os negócios de sua economia.

✠ Outros impostos a serem criados, diferentes dos privativos (o Estado dá20% do produto da ar- recadação àUnião).

✠ Taxas.

✠ Contribuição de melhoria.

✠ Participação do imposto único sobre combustí- 

veis, lubrificantes, minerais do país e energia elétrica (da União).

Tr ibut o s d o s Mun icípio sem 1964

✠ Imposto predial e territorial urbano.

✠ Imposto de licença.

✠ Imposto de indústr ias e profissões.

✠ Imposto sobre diversões públicas.

✠ Imposto sobre a transmissão de propriedade imo- biliária inter vivos e sua incorporação ao capital das sociedades.

✠ Imposto sobre atos de sua economia e assuntos de sua competência.

Taxas.

✠ Contribuição de melhoria.

✠ Participação na arrecadação do imposto único sobre lubrificantes, combustíveis, minerais do país e energia elétrica.

✠ Participação no imposto sobre a propriedade ter- ritorial rural (da União), pelo total do produto.

✠ Participação na arrecadação do imposto sobre o consumo (da União), na base de 10%.

✠ Participação na arrecadação dos impostos con- correntes (da União ou dos Estados membros),na base de 40% do tributo cobrado dentro do território do Município.

✠ Recebimento do excesso de arrecadação estadual de impostos (do Estado), na base de 30%,quando a arrecadação estadual, salvo a do im- 

posto de exportação, exceder, em Município que não seja o da capital, o total das rendas locais.

276  T RI BU TO S D O BRASI L r ep u b l i c a n o3ª Parte

O curto período de governo de Jânio Quadros procurou “dirigir suas ações em

consonância com as mudanças econômicas da época.”

128. O Presidente discursando na inauguração da escola de Metalurgia em Volta

Redonda, 1961. Walter Firmo/ Agência JB.

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As receitas vinculadas à arrecadação eram, con-tudo, demasiadas. Para se ter uma idéia deste ex-cesso, basta que se observe a relação a seguir:

✠ Fundo de Socorro Contra Secas do Nordeste 

(art. 198 da Constituição); 

✠ Fundo único da Previdência Social(Lei nº3.244, de 14/ 08/ 1957); 

✠ Fundo de Valorização Econômica da Amazônia (art. 199 da Constituição); 

✠ Fundo Ferroviário Nacional (Lei nº2.975,de 27/ 11/ 1956); 

✠ Fundo de Reaparelhamento Econômico(Lei nº2.973, de 26/ 11/ 1956); 

✠ Fundo Federal de Eletrificação (Leis nº2.308,de 31/ 08/ 1954, e nº3.244, de 14/ 08/ 1957); 

✠ Fundo de Valorização Econômica da Fronteira Sudoeste do País (Lei nº2.976, de 28/ 11/ 1956); 

✠ Fundo da Marinha Mercante (Lei nº3.244,de 14/ 08/ 1957); 

✠ Fundo Nacional de Pavimentação(Lei nº2.698, de 26/ 12/ 1955); 

✠ Fundo Portuário Nacional (Lei nº3.421,de 10/ 07/ 1958); 

✠ Fundo Rodoviário Nacional (Leis nº302, de 

13/ 07/ 1948, nº2.004, de 3/ 10/ 1953,e nº2.975, de 27/ 11/ 1956); 

✠ Fundo de Amparo àLavoura Cafeeira(Lei nº2.145, de 29/ 12/ 1953,e Decreto nº40.987, de 20/ 02/ 1957); 

✠ Fundo de Recuperação da Lavoura Cacaueira (Decreto nº41.631, de 4/ 06/ 1957); 

✠ Fundo de Ágios (Financiamentos)(Decretos nº41.003, de 25/ 02/ 1957,e nº41.490, de 14 de maio de 1957); 

✠ Fundo Naval (Lei nº3.244,

de 14/ 08/ 1957); 

✠ Fundo Aeronáutico (Lei nº3.244,de 14/ 08/ 1957); 

✠ Fundo de Assistência Hospitalar(Decreto- lei nº4.958, de 14/ 11/ 1942); 

✠ Fundo Nacional de Ensino Primário(Decreto- lei nº6.785, de 11/ 08/ 1944); 

✠ Fundo Nacional de Ensino Médio(Lei nº2.324, de 25/ 11/ 1954); 

✠ Fundo Social Sindical (Decreto- lei nº2.377,de 8/ 07/ 1940); 

✠ Fundo de Reaparelhamento das Repartições Aduaneiras (Lei nº3.244, de 14/ 08/ 1957); 

✠ Fundo de Melhoramento das Estradas de Ferro 

(Lei nº2.308, de 31/ 08/ 1954); 

✠ Comissão do Vale do São Francisco(art. 29 - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias); 

✠ Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (arts. 169, parágrafo único, e 171da Constituição); 

✠ Banco do Nordeste do Brasil S.A. (art. 198 

da Consti tuição, 1º da Lei nº1.649,de 24/ 08/ 1953); 

✠ Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (art. 198 da Constituição Federal); 

✠ Integralização do capital da Petrobrás pela União (Lei nº2.004, de 3/ 10/ 1953,art. 14); 

✠ Petrobrás (Lei nº2.975, de 27/ 11/ 1956).

27 7 a r ep ú b l i c a p o p u l i s t a - 194 5• 1964

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quando as hostes militares devotas do positivismotambém se arvoraram em solucionar os problemasdo Brasil, acompanhamos uma preparação que saida caserna e vai para os nascentes institutos depesquisa. Deste contato com a tecnocracia, temoso IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais),o IBAD (Instituto Brasileiro de Ação Democráti-ca) e a ESG (Escola Superior de Guerra). Enten-didos como centros de estudos técnicos e sociais,estas instituições sinalizavam uma tomada de po-sição dos militares com relação ao que aspiravamao futuro do país. Em meio a uma situação que

aparecia como caótica – quanto mais desenhadapelos meios de comunicação –, os militares brasi-leiros têm a oportunidade de testar os seus conhe-cimentos a partir de 1964.

O que se inicia é um projeto de reformulaçãodo país, que contava com um número crescente deinvestimentos externos. O período militarcompunha a sua imagem de acordo com projetosgigantescos nas mais variadas áreas, principalmen-te nas estruturais. Órgãos de superintendência –SUDAM (Superintendência para o Desenvolvi-

mento da Amazônia), SUDENE (Superintendên-cia para o Desenvolvimento do Nordeste), SU-

DECO (Superintendência para o Desenvolvimen-to do Centro-Oeste) – passam a ter uma ação vol-tada ao desenvolvimento daquelas regiões consi-deradas pobres de recursos estruturais. Acenandocom possibilidades de subsídios, começavam a ser

instalados pátios industriais no Norte e Nordestedo Brasil. São deste período obras arrojadas, taiscomo a Usina Hidrelétrica de Itaipu, que visavaao abastecimento energético do país por muitosanos, ou a polêmica Usina Atômica de Angra dosReis, début do Brasil naquilo que era consideradotecnologia de ponta em termos de produção deenergia.

A política de subsídios tem seus contornosbem esclarecidos com a criação da Zona Francade Manaus, em 1967, quando se dá início ao

processo de instalação de dezenas de linhas demontagem industrial naquela região, tornadaatraente pela possibilidade de isenção fiscal.

 Também com relação à Amazônia, temos a ten-tativa de construção de uma rodovia – que serealiza muito mais na propaganda ufanista daépoca do que na prática.

A política desenvolvimentista teve o seu re-vés, mesmo que não se pudesse alertar no mo-mento, no aumento descomunal do perfil da dí-vida externa brasileira. Os empréstimos eram to-mados junto aos bancos privados internacionais,que se tornaram credores do país nos anos que seseguiram. Segundo Marcos Napolitano, no pe-ríodo conhecido pelo nome de “Milagre Econô-mico”, a retomada de crescimento econômico dopaís chegou a “10% ao ano, uma das maiores detoda a história do capitalismo.” 4 54 Segundo omesmo historiador, no governo militar, dianteda expectativa de superação dos entraves crôni-cos para a expansão econômica do país – desco-

nhecimento das tecnologias de ponta, poupançainterna baseada em moeda fraca –, a operação doministério da Fazenda “usou duas estratégias bá-sicas: o endividamento, ou seja, a captação de re-cursos financeiros, internos e externos, e o apro-fundamento do arrocho salarial.” 4 55 Os anos quese seguiram demonstraram os desenganos dessapolítica desenvolvimentista, uma vez que a infla-ção voltou, e com níveis muito mais elevados doque aqueles que serviram de mote para o movi-mento militar de 64, quando das críticas ao Go-

verno de João Goulart. Além disso, a distânciaentre os mais ricos e os mais pobres seria ainda

28 0 T RI BU TO S D O BRASI L r ep u b l i c a n o3ª Parte

130. Subsídios foram concedidos pelo governo militar para a construção de um

moderno parque industrial no país, como a Usina Hidrelétrica de Itaipu,

Foz do Iguaçu, 15/3/1992. Marcelo Theobald/Agência JB.

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maior, transformando o Brasil no país onde aconcentração de renda atinge os níveis mais ele-vados do planeta. Outro saldo profundamentenegativo para os anos que viriam à frente seria oaumento considerável da participação do Estado

na economia. Empresas estatais, desacostumadascom a concorrência e geridas, muitas vezes, porquadros de confiança do governo, terminariampor amadurecer uma cultura de clientelismo, naqual as regras de mercado eram abandonadas etrocadas pelos privilégios mais típicos da Repú-blica Velha.

O saldo político, no entanto, é o que iriamarcar o período para a posteridade. Iniciou-seum processo de expurgo de todos aqueles quepudessem representar uma ameaça à ordem –

mesmo que inconstitucional – estabelecida. Se,num primeiro instante, os antigos líderes são re-tirados do contexto por meio de cassações, num

segundo momento, o governo militar inicia novarodada de repressão, a partir de 1968, quandoinvade domicílios, impede as associações de clas-ses, desmantela grupos políticos da clandestini-dade, encarcera centenas de pessoas, tortura-as e

as mata, naquilo que ficou consubstanciadocomo os excessos do poder.Do ponto de vista legal, o regime militar, im-

plantado em 1964 e com mandato até 1967,orientou-se pela utilização de atos institucio-nais, os temíveis AIs. Estes instrumentos possi-bilitavam e concediam uma aparência legalista àsatitudes do novo governo, até que se elaborasseuma nova Constituição. Em janeiro de 1967, eraoutorgada a quinta Constituição da República,que modificava em parte aquela até então vigen-

te (de 1946) e incorporava as medidas que pos-sibilitavam ao governo militar agir como D. Pe-dro I. Dito de outra forma, a nova Carta Magna

28 1o r eg i m e m i l i t a r - 1964 •1985

4 54 Marcos NAPOLITANO, O Regime M il i tar Brasi le iro: 1964 - 1985 , p. 40.4 55 Idem, ibidem .

131. A isenção fiscal promovida pelo regime levou à construção de uma estrada tropical,

hoje retomada pela selva. Rodovia Transamazônica, 04/12/1974. Agência JB/RJ.

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✠ Emenda Constitucional nº 10, de 9 de novem- bro de 1964, que transferiu para a União com- petência para decretar o Imposto sobre a Pro- priedade Territorial e Rural, deixando aos Mu- nicípios apenas parte do produto da arrecadação; 

✠ Lei nº 4.480, de 14 de novembro de 1964, que regulou o Imposto de Renda relativo aos direitos de autor, remuneração de professores e jornal is- tas e vencimentos dos magistrados; 

✠ Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, que alterou a legislação do imposto de consumo; 

✠ Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, que dispôs sobre o Estatuto da Terra, regulando inclu- 

sive a arrecadação do imposto territorial rural; 

✠ Lei nº 4.505, de 30 de novembro de 1964, que alterou a legislação do imposto do selo; 

✠ Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964, que alterou a legislação do Imposto de Renda; 

✠ Lei nº 4.584, de 11 de dezembro de 1964, que concedeu isenção dos impostos de importação e de consumo, para importação de material destinado a ampliação ou instalação da indústria nacional de mecânica pesada.  4 59

Na terceira etapa, foi criada uma Comissão Es-pecial, com a missão de elaborar uma nova discri-minação de rendas, a ser submetida ao Congresso– de maioria governista, inclusive pela imposiçãodas cassações – como projeto de Reforma Consti-tucional. A 18 de junho de 1965, o anteprojetoestava pronto e fora submetido ao Ministro da Fa-zenda. As Emendas Constitucionais propostas en-tão eram:

a) Emenda Constitucional “A”, que dispunha sobre normas legislativas modificando o artigo 5º, parágrafo 2º do artigo 36º, artigo 65º, ar- tigo 67º, artigo 68º e artigo 69º da Consti- tuição de 1946; 

b) Emenda Constitucional “B”, que dispunha sobre o sistema tributário nacional, contendo normas tributárias, consolidando toda a maté- ria fiscal contida na Constituição Federal,

além de acrescentar outras.

Enquanto o anteprojeto era discutido, o gover-no continuava criando leis no sentido da imple-mentação de grandes alterações tributárias. A Leinº 4.728, de 14 de julho de 1965, reformou omercado de capitais; a Lei nº 4.729, do mesmo diae ano, caracterizou o crime de sonegação fiscal, su-

 jeitando os infratores à multa de até cinco vezes ovalor do tributo devido e pena de detenção de seisa dois anos. Lei nº 4.862, de 29 de novembro de

1965, que alterou a legislação do Imposto de Ren-da e ampliou os sistemas de incentivo à contençãode preços. Lei nº 4.864 do mesmo dia e ano, quecriou estímulo à indústria da construção civil. 4 60

Após os trâmites entre Executivo e Legislativo,o que conferia uma aparência de discussão legal, oprojeto de Emenda Constitucional chegou aoCongresso em novembro de 1965. Foi aprovadocom algumas alterações, sob o nome de EmendaConstitucional nº 18, de 1965. É essa a Emendaque compreende a Reforma Tributária, o que, se-

gundo Bernardo Ribeiro de Moraes, seria a pri-meira da República, uma vez que, do ponto de vis-

28 4 T RI BU TO S D O BRASI L r ep u b l i c a n o3ª Parte

A dissimulação e a astúcia presentes no “jeitinho brasileiro” alcançaram o  status

de crime pela Lei n.º 4.729 de 14 de julho de 1965. O crime de sonegação fiscal

é permanência funesta em nossa sociedade.

133. Selo de Imposto de consumo não oficial “Export”, utilizado em cigarros

vendidos por camelôs em São Paulo, evidenciando sonegação fiscal e,

134. Selo oficial de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI),

Controle Classe III-R.

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ta fiscal, nada havia sido substantivamente altera-do desde a primeira Constituição de 1891. Naanálise deste autor, “a discriminação de rendas tri-butárias vinha sendo repetida sempre, sem a menorimaginação. Ninguém cuidava de fazer um novo

sistema, contentando-se sempre com simples alte-rações de competência. As ‘reformas’ tributáriasestabelecidas pelas Constituições de 1934, 1937 e1946 se limitaram a adotar o sistema da MagnaCarta de 1891. (...) A reforma estabelecida pelaEmenda Constitucional nº18, de 1965, não maiscopiou comodamente o sistema tributário ante-rior.” 4 61 A análise da Emenda Constitucional nº18,de 1965, nos mostra que:

a) procurou estabelecer um sistema tributário 

nacional; 

b) discriminou os impostos com referência às suas bases econômicas; 

c) alterou o nome de alguns impostos; 

d) suprimiu vários impostos do sistema tribu- tário; 

e) alterou a competência fiscal de alguns im- postos; 

f) manteve e reforçou certas normas objetivadoras da unidade econômica e política do país; 

g) trouxe incentivos àcoordenação de atividades entre a União, Estados e Municípios; 

h) concentrou impostos na competência da União; 

i) alterou regras de distribuição da arrecadação; 

 j) trouxe maior unidade para certas normas fiscais; 

k) estabeleceu nova discriminação de rendas tributárias.  4 62

Do ponto de vista das esferas de competênciatributária, a partir de 1965, a situação proposta fi-cou da seguinte maneira:

Tr ibut o s d a Un ião

✠ Imposto sobre importação de produtos estran- geiros; 

✠ Imposto sobre a exportação, para o estrangeiro,de produtos nacionais ou nacionalizados; 

✠ Imposto sobre a propriedade territorial rural; 

✠ Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza; 

✠ Imposto sobre produtos industr ializados; 

✠ Imposto sobre operações de crédito, câmbio e se- guro e sobre operações relativas a títulos e valo- res imobiliários; 

✠ Imposto sobre serviços de transporte e comuni - cações, salvo os de natureza estritamente mu- nicipal; 

✠ Imposto sobre produção, importação, circulação,distribuição ou consumo de combustíveis e lubri- ficantes líquidos ou gasosos de qualquer origem ou natureza; 

✠ Imposto sobre produção, importação, distribuição ou consumo de energia elétrica; 

✠ Imposto sobre produção, circulação ou consumo de minerais do país; 

✠ Impostos extraordinários de guerra; 

✠ Taxas; 

✠ Contribuições de melhoria.

28 5o r eg i m e m i l i t a r - 1964 •1985

4 59 Idem, ibidem , p. 95-96.

4 6 0 Idem, ibidem , p. 99.4 6 1 Idem, ibidem , p. 100.4 6 2 Idem, ibidem , p. 104.

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Tr ibut o s d o s Estado s

✠ Imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis; 

✠ Imposto sobre operações relativas àcirculação de mercadorias; 

✠ Taxas; 

✠ Contribuições de melhoria.

Tr ibut o s d o s Mun icípio s

✠ Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana; 

✠ Imposto sobre serviços de qualquer natureza; 

✠ Taxas; 

✠ Contribuições de melhoria.

No calor do momento, sobressaem algumascríticas à Reforma Tributária, especialmente pelofato de ter centralizado em demasia o poder fis-cal da União em detrimento da autonomia finan-ceira dos Estados e Municípios. De qualquer sor-te, em 25 de outubro de 1966, antes do novo sis-tema tributário entrar em vigor – o que somenteocorreu em 1º de janeiro de 1967 –, a Uniãopromulgou a Lei nº 5.172, que dispôs sobre osistema tributário nacional e instituiu normas ge-rais de direito aplicáveis à União, Estados e Mu-nicípios. Esta Lei recebeu o nome de Código Tri-butário Nacional.

Composto de 217 artigos, o Código Tributá-

rio Nacional apresentou as normas sobre a com-petência tributária, suas limitações, regras sobreos diversos impostos e sobre as distribuições de

receitas tributárias. Trouxe igualmente regras so-bre a legislação, a obrigação, o crédito tributáriose a administração da matéria.

A Constituição de 1967 ratificou a EmendaConstitucional nº18, de 1965, e somente acres-

centou uma nova modalidade de tributo na esferade competência da União, os impostos que não ti-vessem base de cálculo e fato gerador idênticos aostributos previstos. Em 1969, era reeditada a Cons-tituição de 1967 e a situação tributária foi referen-dada somente com a alteração no imposto relativoà extração de minerais no país, que também passoua incidir sobre a sua extração.

Significativa desse período, com o intuito decontrolar o cumprimento das obrigações tributá-rias, fora a criação da Secretaria da Receita Fede-

ral  4 63, instituída pelo Decreto 63.659 de 1968,em substituição à antiga Direção-Geral da Fa-zenda Nacional. Este órgão da administraçãopública foi criado num momento em que se ob-servava uma expressiva elevação da carga tributá-ria no país, “que se situava entre 16% e 18% doProduto Interno Bruto (PIB) no início da déca-da, e atingiu níveis superiores a 24% do PIBapós 1968.” 4 64

O final da década de setenta do século XX já apresentava um quadro político muito dife-renciado no Brasil. Os setores do operariado,que se encontravam em um bom momento deorganização, já retomavam a direção de grandesmovimentos reivindicatórios, que espoucaramna região de maior concentração industrial emSão Paulo, Diadema, São Bernardo e Santo An-dré, o ABC. Apesar da repressão, tais eventossinalizavam uma dificuldade maior do governoem exercer o controle das manifestações de cu-nho popular, que clamavam também pela inter-

locução junto ao poder. Sobre essa conjuntura,afirma-se:

28 6  T RI BU TO S D O BRASI L r ep u b l i c a n o3ª Parte

4 63 Evidentemente, a preocupação governamental emcontrolar e mensurar a tributação no Brasil vinha, como já observamos na primeira parte deste trabalho,de longa data. Nesse sentido, os itens que se seguemprocuramexpor as origens da Secretaria da Receita Federal: “1534 - criação das primeiras repartiçõestributárias no Brasil: as Provedorias da Fazenda Real, extintas em1770 pela Coroa Portuguesa, que passou a administração tributária do seu império pormeio do Erário Régio. As provedorias locais foramtransformadas nas Juntas da Real Fazenda, passando a subordinar-se diretamente ao Erário Régio. 1808- vinda da Família Real para o Brasil, coma criação do Conselho da Fazenda, subordinado ao Erário Régio, já no Brasil, para administrar a arrecadação ea fiscalização de impostos. 1824 - criação do Ministério da Fazenda e do Tribunal do Tesouro Público (transformado, em1831, no Tribunal do TesouroNacional). 1850 - no âmbito do Tribunal do Tesouro Nacional surgiu a Diretoria Geral das Rendas Públicas, órgão especializado na administraçãotributária (alterada para Diretoria das Rendas Públicas em1892 e Diretoria da Receita Pública em1909). 1934 - a administração tributária passa a ser

exercida pela Direção Geral da Fazenda Nacional, constituída pelos Departamentos de Rendas Internas, Rendas Aduaneiras e Imposto de Renda. Aestrutura de funcionamento era plurifuncional, cada umadministrando os tributos de sua competência e exercendo as atividades de tributação, fiscalização,arrecadação e apoio administrativo.”Cf.: Internet, Site da Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br.

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A oposição ao regime militar ganhou um gran- de reforço a partir de 1978. Nesse ano, o Sin- dicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Pau- lo, conseguiu organizar a primeira greve bem- sucedida no país desde 1968, na qual foram 

paralisadas as principais montadoras de auto- móveis. A movimentação era inteiramente proi- bida pela lei, mas não pôde ser evi tada. ( ...) Na esteira do êxito da greve surgiu um novo sindicalismo, mais independente do Estado. Se- guindo a tática dos estudantes, líderes sindicais começaram a se reuni r, ignorando as proibições da lei. A inflação alta, associada a uma legis- lação que só previa um reajuste salarial por ano, acabou gerando uma grande insatisfação entre os trabalhadores e contribuiu para que a 

necessidade de movimentação sindical se tor- nasse imperiosa.  4 65

Do ponto de vista político-partidário, o quetambém é um índice significativo das múltiplas vo-zes que se ouvem no período, a solução do biparti-darismo já não contemplava todos os interesses en-tão em jogo na questão da disputa pelo poder.Além dos movimentos populares que se organiza-vam, é o caso de mencionar aqueles setores queguardavam alguma proximidade junto ao poder,mas que já sinalizavam a possibilidade de encami-nhamento próprio das questões. Não se tratavamais de um universo visto pela oposição entre so-mente dois lados; e as orientações se desdobravam.

Desde 1974, com a eleição indireta do presi-dente Ernesto Geisel, já era possível verificar que,dentro das hostes do governo, não havia conver-gência em relação ao rumo político do país. For-ças favoráveis a uma abertura política digladiavam-se contra os defensores da manutenção de um re-

gime fechado. O momento final dessa queda debraços deu-se em fins de 1975 e inícios de 1976.Neste período, o jornalista Wladimir Herzog,bem como o operário Manoel Fiel Filho, forammortos, em condições semelhantes, quando esta-vam sob a guarda do II Exército, sediado em SãoPaulo. Tais acontecimentos levaram à substituiçãodo comandante militar da região e, nos meses se-guintes, à exoneração do ministro do Exército, Síl-vio Frota, o que revelou a perda de espaço políti-

co por parte das forças contrárias à volta do Esta-do de Direito.

Ao mesmo tempo, o resultado das eleições de1974 para renovação da Câmara dos Deputados,das Assembléias Legislativas e de um terço do Se-

nado demonstrou a insatisfação popular, garan-tindo a maioria dos votos para o MDB, o parti-do de oposição. Este elegeu 160 deputados fede-rais – 34% da Câmara – e 16 dos 22 senadores.

Porém, a prometida abertura política do go-verno Geisel avançou menos do que era esperado.Como resposta à vitória da oposição nas eleiçõesde 1974 veio a Lei Falcão, que limitou o uso dorádio e da televisão na propaganda eleitoral. E ogrande retrocesso veio em 1977, com o Pacote deAbril, que, entre outras medidas, colocou o Con-

gresso Nacional em recesso parlamentar e criou afigura do senador biônico , além de ampliar para seisanos o mandato do próximo presidente.

Em 14 de outubro de 1978 era eleito indireta-mente, pelo Colégio Eleitoral, o general João Ba-tista de Oliveira Figueiredo, candidato escolhido earticulado pelo próprio Geisel. O novo presidente– que assumiu em 15 de março de 1979 –, duran-te a “campanha eleitoral”, prometia fazer do paísuma democracia, nem que para isso tivesse que“prender e arrebentar”.

Com a política de Figueiredo, a partir do avan-ço das forças de oposição ao regime, vem a Lei deAnistia, em 1979, além da volta das eleições diretaspara os governos estaduais, as quais já se realizaramdentro do pluripartidarismo, com a organização decinco partidos políticos permitidos desde 1979.

Paralelamente ao processo de esgotamento doregime militar, a economia nacional sentiu o en-fraquecimento provocado pela ausência de grandesinvestimentos externos numa época de contenções,

impostas pela elevação dos preços do petróleo em1973. A inflação, motivo de grandes críticas aosgovernos que antecederam o golpe militar de1964, dava sinais evidentes de retorno.

O regime não tinha mais fôlego para operarmudanças no plano econômico, nem apoio políti-co e social para renovar suas energias. Ao contrá-rio, todos os indicadores apontavam para o agra-vamento da crise, que se confirmaria nos anos se-guintes.

28 7 o r eg i m e m i l i t a r - 1964 •1985

4 64 Idem.4 65  Jorge CALDEIRA et alii, Viagem pela H istória do Brasil, p. 336.

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Do ponto de vista tributário, este é um perío-do no qual se pode avaliar a aplicação do Código

 Tributário Nacional, posto em prática pela Leinº5.172, de 25/ 10/ 1966, uma vez que sua efeti-

vação, na prática, deu-se ao longo da década de 70.De março de 1972 a maio de 1982, temos uma sé-rie de Decretos, Decretos-lei, Leis e EmendasConstitucionais que alteraram o Código, procu-rando corrigir o seu curso. São quatro emendasconstitucionais, cinco decretos-lei, uma lei e umdecreto que modificaram a tributação no país noperíodo supracitado.

Bernardo Ribeiro de Moraes 4 66  aponta os se-guintes aspectos positivos propiciados pelo novocódigo:

a) conferiu caráter nacional integrado ao siste- ma tributário, evitando a coexistência de siste- mas autônomos nas três esferas de governo, não permitindo, assim, a “guerra fiscal” entre os 

Estados e Municípios; 

b) ofereceu racionalidade econômica aos tribu- tos do sistema e trouxe conceitos mais seguros das espécies tributárias (imposto, taxa e con- tribuição de melhoria); 

c) criou mecanismos de compensação (transfe- rências), a fim de permitir a adequada distri- buição de rendas tributárias; 

28 8 T RI BU TO S D O BRASI L r ep u b l i c a n o3ª Parte

A “década perdida” (1980) mostrou que tinha em si permanências funestas, como

a inflação, agora em hiper-espiral, mas também tinha espaço para reformas,

criando possibilidades para mudanças no Código Tributário Nacional.

135. Cédulas queimadas nos fornos do Banco Central, 22/05/1994.

Evandro Teixeira/Agência JB.

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d) deu ao sistema tributário a função de im- portante instrumento de política econômica; 

e) obteve, em relação àUnião, um aumento de arrecadação tributária, que passou de 

19% do PIB (1965) para 25% (1981) ,fato que permitiu a eliminação dos déficits orçamentários.

É o mesmo autor que enumera também os pon-tos negativos do código:

a) ocorrência de um desequilíbrio financeiro em relação àcarência de recursos e disponibilida- des, entre o aumento de despesas e o aumento de receitas. Tal fato énotório, tanto para os Esta- 

dos como para os Municípios, cujas receitas próprias e receitas transferidas são inexpressi- vas para enfrentarem os aumentos das despesas; 

b) alguns impostos são mal-administrados. Os Estados pouco se preocupam com o imposto so- bre a transmissão de bens imóveis e a União nada fez para melhorar o imposto sobre pro- priedade territorial rural, cuja arrecadação pertence aos Municípios; 

c) existência de exagerado número de leis tri- butárias, ordinárias e regulamentares, com real prejuízo para a aplicação do sistema. A confu- são na aplicação da legislação e na orientação dos contribuintes traz maior prejuízo. O que deveria ser um “sistema tributário nacional” passou a ser um cipoal de normas contraditó- rias e confusas; 

d) a impontualidade da União, na entrega das 

receitas financeiras decorrentes de participações,deixa Estados e Municípios carentes de rendas nos momentos apropriados.  4 6 7 

Entendendo que tais fatos somente se agrava-ram em meio à espiral inflacionária que toma opaís pelo início da década de 80, percebe-se quefoi-se criando um clima favorável à alteração demonta no Código Tributário Nacional. Novas

Emendas Constitucionais são estabelecidas, com oobjetivo de corrigir os rumos do sistema tributá-rio nacional. De uma forma geral, tais modifica-ções se orientaram no sentido de aumentar a recei-ta do governo através da criação de novos impos-

tos, pela elevação das alíquotas de outros já exis-tentes ou pela alteração da participação de Esta-dos e Municípios.

28 9o r eg i m e m i l i t a r - 1964 •1985

4 6 6  Bernardo Ribeiro de MORAES, C ompêndio de D ire i to Tr ibutár io, v. 1, p. 169.4 6 7  Idem, ibidem , p. 169-170.

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(...) Entendendo que tais fatos somente se agravaram em meio à espiral inflacionária que toma o país pelo início da década de oitenta,

 percebe- se que foi se criando um clima favorável à alteração de monta

 no C ódigo Tributár io N acional.

br a si l c o n t em po r â n eo1985•2000

29 0 TRIBUTOS DO BRASIL r epu bl ic an o 3ª Parte

No mundo surge o neo-liberalismo. No Brasil a derrotado regime militar. A Constituição de 1988. O novo

pacto federativo define o novo modelo tributário.A partilha das receitas tributárias na reforma de 88.Os impostos emcascata. A guerra fiscal. A criaçãodo Mercosul. A globalização. A reforma tributáriareclamada pela sociedade.

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A década de oitenta viu o surgimento do mo-delo neoliberal de atuação política e econômica,especialmente nas posturas da primeira-ministrabritânica Margareth Thatcher e do presidente nor-te-americano Ronald Reagan. Foi o momento da

ascensão dos yuppies , no qual estes apareceramcomo referências de sucesso 4 6 8 e uma meta a ser al-cançada. Adrian Lyne, ex-produtor de marketing,arriscou-se no cinema e dirigiuNove Semanas e Meia 

de Amor , filme que expôs os excessos, as cores e amundanidade yuppie , sem que isso levasse a qual-quer espécie de apreciação crítica ou desabonado-ra por parte dos espectadores.

O início da década também acostumou o olharincrédulo no que dizia respeito às grandes solu-ções ideológicas. Acerca do comunismo, mais e

mais se apontavam os seus fracassos no que con-cernia não somente à liberdade de expressão, mastambém acerca do ponto de vista econômico. Osreferenciais da economia, indicadores da competi-tividade de mercado, expunham a situação obsole-ta em que se encontravam os estados socialistas. Oneoliberalismo à inglesa também sinalizava que apolítica do bem-estar social – o Wellfare State –,tão caro ao pós-guerra, estava envelhecendo: o in-divíduo deveria se mover com suas próprias pernase o “enxugamento do Estado” vinha aparentemen-te como panacéia. Outro indício de distanciamen-to dos antigos modelos de ação política partidáriafoi o fortalecimento das investidas pelo meio am-biente. Aparentemente descolados dos princípiosde esquerda, grupos ecológicos, como o Greenpea- 

ce , ganharam a cena nos países desenvolvidos e es-tabeleceram novos parâmetros de atuação e críticaaos poderes constituídos.

A suspeita recaiu também sobre o futuro e, nocinema, Blade Runner marcou a década na medida

em que apresentava expectativas que trariam con-sigo os aspectos negativos tanto do 1984 deGeorge Orwell, quanto do Admirável Mundo Novo 

de Aldous Huxley. Um triste e solitário indivi-dualismo também foi pensado, ao mesmo tempoem que a sedução maior recaía sobre o hedonis-mo, um quase neo-epicurismo, que começava a sevincular à auto-imagem que o homem fazia de sipróprio.

A virada para os oitenta também expôs a tri-dimensionalidade em nosso país. Mais e mais setornava difícil a manutenção de um estado decoisas que privilegiasse apenas uma única visão,fosse sócio-cultural, política ou econômica. A

crítica à ortodoxia foi ganhando espaço midiáti-co e o abrandamento da censura permitia a redes-coberta dos temas políticos, mesmo que, comisso, se atingissem as hostes do governo. Maseste, diferentemente da maneira com que reagiuàs intempéries dos períodos mais duros de dita-dura, começava a dar sinais de cansaço. Dito deoutra forma, o monolito apresentava sinais defissura e a composição política em novas bases vi-nha se processando.

A década de oitenta viu o surgimento do mo-delo neoliberal de atuação política e econômica,especialmente nas posturas da primeira-ministrabritânica Margareth Thatcher e do presidente nor-te-americano Ronald Reagan. Foi o momento da

ascensão dos yuppies , no qual estes apareceramcomo referências de sucesso 4 6 8 e uma meta a ser al-cançada. Adrian Lyne, ex-produtor de marketing,arriscou-se no cinema e dirigiuNove Semanas e Meia 

de Amor , filme que expôs os excessos, as cores e amundanidade yuppie , sem que isso levasse a qual-quer espécie de apreciação crítica ou desabonado-ra por parte dos espectadores.

O início da década também acostumou o olharincrédulo no que dizia respeito às grandes solu-ções ideológicas. Acerca do comunismo, mais e

mais se apontavam os seus fracassos no que con-cernia não somente à liberdade de expressão, mastambém acerca do ponto de vista econômico. Osreferenciais da economia, indicadores da competi-tividade de mercado, expunham a situação obsole-ta em que se encontravam os estados socialistas. Oneoliberalismo à inglesa também sinalizava que apolítica do bem-estar social – o Wellfare State –,tão caro ao pós-guerra, estava envelhecendo: o in-divíduo deveria se mover com suas próprias pernase o “enxugamento do Estado” vinha aparentemen-te como panacéia. Outro indício de distanciamen-to dos antigos modelos de ação política partidáriafoi o fortalecimento das investidas pelo meio am-biente. Aparentemente descolados dos princípiosde esquerda, grupos ecológicos, como o Greenpea- 

ce , ganharam a cena nos países desenvolvidos e es-tabeleceram novos parâmetros de atuação e críticaaos poderes constituídos.

A suspeita recaiu também sobre o futuro e, nocinema, Blade Runner marcou a década na medida

em que apresentava expectativas que trariam con-sigo os aspectos negativos tanto do 1984 deGeorge Orwell, quanto do Admirável Mundo Novo 

de Aldous Huxley. Um triste e solitário indivi-dualismo também foi pensado, ao mesmo tempoem que a sedução maior recaía sobre o hedonis-mo, um quase neo-epicurismo, que começava a sevincular à auto-imagem que o homem fazia de sipróprio.

A virada para os oitenta também expôs a tri-dimensionalidade em nosso país. Mais e mais setornava difícil a manutenção de um estado decoisas que privilegiasse apenas uma única visão,fosse sócio-cultural, política ou econômica. A

crítica à ortodoxia foi ganhando espaço midiáti-co e o abrandamento da censura permitia a redes-coberta dos temas políticos, mesmo que, comisso, se atingissem as hostes do governo. Maseste, diferentemente da maneira com que reagiuàs intempéries dos períodos mais duros de dita-dura, começava a dar sinais de cansaço. Dito deoutra forma, o monolito apresentava sinais defissura e a composição política em novas bases vi-nha se processando.

29 1b r a si l c o n t em p o r â n eo - 1985•20 0 0

4 6 8 O início da década de 80 conheceu umnovo boom : eramas Bolsas de Valores que se destacavam, especialmente nos Estados Unidos. A  pers on a queidentificava esse instante era o jovemexecutivo fazedor de milhões. Morador de Manhattan, o yu ppi e, alémde se dedicar ao mercado, possuía roupas finase caras, automóvel de luxo e sempre se encontrava acompanhado de uma bela mulher.

O movimento “Diretas Já” mostrou as mudanças de correlações de força dentro

do bloco hegemônico no poder e o anseio da sociedade pelo Estado Democrático

de Direito.

136. Comício pelas eleições Diretas 84, Candelária, Rio de Janeiro, 11/4/1984.

Vidal da Trindade/Agência JB.

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No Brasil, a década de oitenta começa com omodelo econômico e político adotado pelos mili-tares dando sinais claros de esgotamento. O bipar-tidarismo, que vigorou durante mais de uma déca-da, entra em colapso devido às disputas por mais

espaços no sistema de poder que se observava den-tro do partido oficial, a Arena (Aliança Renovado-ra Nacional), com suas três sublegendas. Com aanistia aprovada em 1979 e com a flexibilizaçãoda legislação partidária, que possibilitou a organi-zação de cinco partidos políticos, sendo três deoposição ao regime, outras mudanças de caráterinstitucional entram em vigor no início da década,entre as quais a realização de eleições diretas paraos governos estaduais no ano de 1982. Neste plei-to, apesar das medidas casuísticas que impunham

a vinculação do voto obrigando o eleitor, que re-cebia uma cédula em branco, a escrever seis nomesde candidatos de um mesmo partido, incluindogovernador, senador, deputado federal, deputadoestadual, prefeito e vereador, o regime militar so-freu fragorosa derrota. A oposição elegeu 10 go-vernadores dos principais Estados, dentre os 23que disputaram as eleições, entre eles os de SãoPaulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.

A oposição conseguia a base política e institu-cional que precisava para acelerar a mobilizaçãopopular necessária para pôr fim ao regime militare implantar o Estado de Direito Democrático. Osgovernadores eleitos pelo voto direto tomam pos-se em março de 1983, em meio ao agravamento dacrise econômica, aprofundada pelo agravamentoda crise da dívida externa, suspensão dos créditosinternacionais e cessação dos investimentos es-trangeiros. O país entra em profunda recessão eco-nômica e o desemprego ganha proporções semprecedentes. Estava pronto o cenário para o início

de um gigantesco movimento popular exigindoeleições diretas para presidente da República, comuma palavra de ordem extremamente singela: “Di-retas Já!”.

O “movimento pelas diretas”, a partir do Co-mício da Sé, no dia 25 de janeiro de 1984, em SãoPaulo, que reuniu 300 mil manifestantes, ganhouas ruas e mobilizou milhões de pessoas em mani-festações realizadas em todo o Brasil, exigindo aaprovação de uma emenda constitucional apresen-tada pelo então deputado Dante de Oliveira. O

clima no País era de grande tensão. A emenda vaià votação no Congresso Nacional, quando o regi-

me monta um forte aparato de pressão militar emBrasília, sob o comando do general Newton Cruz.O Congresso, acuado, rejeita a emenda das diretase mantém a eleição do presidente pela via indireta,por um colégio eleitoral constituído pelos pró-

prios parlamentares que compunham o CongressoNacional e representantes indicados pelas Assem-bléias Legislativas estaduais.

Apesar da derrota da emenda das diretas, o País já não era o mesmo. Assiste-se a uma profundamudança na correlação de forças políticas em es-cala nacional, com uma rachadura irreparável nobloco de forças que dava sustentação ao regimemilitar. Abre-se neste bloco uma expressiva dissi-dência, liderada pelo vice-presidente da República,Aureliano Chaves; pelo presidente do partido ofi-

cialista, o PDS (Partido Democrático e Social),senador José Sarney; e pelo então governador daBahia, Antonio Carlos Magalhães.

 Já estamos em 1984 e tem início o processo su-cessório para a eleição do novo presidente da Re-pública pelo colégio eleitoral. O regime agonizan-te tenta se reproduzir e continuar com dois nomesdisputando a indicação: um militar, o general re-formado Mário Andreazza; e um civil, o então de-

No Brasil, a década de oitenta começa com omodelo econômico e político adotado pelos mili-tares dando sinais claros de esgotamento. O bipar-tidarismo, que vigorou durante mais de uma déca-da, entra em colapso devido às disputas por mais

espaços no sistema de poder que se observava den-tro do partido oficial, a Arena (Aliança Renovado-ra Nacional), com suas três sublegendas. Com aanistia aprovada em 1979 e com a flexibilizaçãoda legislação partidária, que possibilitou a organi-zação de cinco partidos políticos, sendo três deoposição ao regime, outras mudanças de caráterinstitucional entram em vigor no início da década,entre as quais a realização de eleições diretas paraos governos estaduais no ano de 1982. Neste plei-to, apesar das medidas casuísticas que impunham

a vinculação do voto obrigando o eleitor, que re-cebia uma cédula em branco, a escrever seis nomesde candidatos de um mesmo partido, incluindogovernador, senador, deputado federal, deputadoestadual, prefeito e vereador, o regime militar so-freu fragorosa derrota. A oposição elegeu 10 go-vernadores dos principais Estados, dentre os 23que disputaram as eleições, entre eles os de SãoPaulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.

A oposição conseguia a base política e institu-cional que precisava para acelerar a mobilizaçãopopular necessária para pôr fim ao regime militare implantar o Estado de Direito Democrático. Osgovernadores eleitos pelo voto direto tomam pos-se em março de 1983, em meio ao agravamento dacrise econômica, aprofundada pelo agravamentoda crise da dívida externa, suspensão dos créditosinternacionais e cessação dos investimentos es-trangeiros. O país entra em profunda recessão eco-nômica e o desemprego ganha proporções semprecedentes. Estava pronto o cenário para o início

de um gigantesco movimento popular exigindoeleições diretas para presidente da República, comuma palavra de ordem extremamente singela: “Di-retas Já!”.

O “movimento pelas diretas”, a partir do Co-mício da Sé, no dia 25 de janeiro de 1984, em SãoPaulo, que reuniu 300 mil manifestantes, ganhouas ruas e mobilizou milhões de pessoas em mani-festações realizadas em todo o Brasil, exigindo aaprovação de uma emenda constitucional apresen-tada pelo então deputado Dante de Oliveira. O

clima no País era de grande tensão. A emenda vaià votação no Congresso Nacional, quando o regi-

me monta um forte aparato de pressão militar emBrasília, sob o comando do general Newton Cruz.O Congresso, acuado, rejeita a emenda das diretase mantém a eleição do presidente pela via indireta,por um colégio eleitoral constituído pelos pró-

prios parlamentares que compunham o CongressoNacional e representantes indicados pelas Assem-bléias Legislativas estaduais.

Apesar da derrota da emenda das diretas, o País já não era o mesmo. Assiste-se a uma profundamudança na correlação de forças políticas em es-cala nacional, com uma rachadura irreparável nobloco de forças que dava sustentação ao regimemilitar. Abre-se neste bloco uma expressiva dissi-dência, liderada pelo vice-presidente da República,Aureliano Chaves; pelo presidente do partido ofi-

cialista, o PDS (Partido Democrático e Social),senador José Sarney; e pelo então governador daBahia, Antonio Carlos Magalhães.

 Já estamos em 1984 e tem início o processo su-cessório para a eleição do novo presidente da Re-pública pelo colégio eleitoral. O regime agonizan-te tenta se reproduzir e continuar com dois nomesdisputando a indicação: um militar, o general re-formado Mário Andreazza; e um civil, o então de-

29 2 T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

A eleição de um presidente civil coloca fim ao período de ditadura militar.

137. Tancredo Neves, presidente eleito, anuncia seu gabinete ministerial,

12/3/1985. Luciano Andrade/ Agência JB.

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putado federal Paulo Salim Maluf. O escolhido foiMaluf, o que aprofundou a divisão das forças queapoiavam o regime militar.

A oposição, por sua vez, lançou a candidaturado então governador de Minas Gerais, Tancredo

Neves, que logo recebeu o apoio dos dissidentesdo regime ao indicarem para a vice-presidência oentão senador José Sarney. A vitória do candidatoda oposição no colégio eleitoral não foi surpresa.A ditadura chegava ao fim e com ela um novo mo-delo político e econômico, formatado em docu-mento que deu forma à criação da chamada“Aliança Democrática”para a construção da NovaRepública, constituída pelos partidos da oposiçãoe pelos dissidentes do regime. O documento, ex-tremamente sintético, prometia a abertura partidá-

ria, a convocação da Constituinte para institucio-nalizar o Estado de Direito Democrático, uma re-forma fiscal e tributária capaz de eliminar o défi-cit público, acabar com a inflação e retomar ocrescimento econômico.

Na ocasião o País viveu momentos de intensavibração cívica. Uma onda de otimismo percorriatodo o território nacional. Tancredo, eleito em 15de janeiro de 1985, só tomaria posse em 15 demarço. A ansiedade pelo início do novo governoera crescente, porém, ocorreu um fato inesperado.Na madrugada do dia de sua posse, o presidenteeleito tem uma crise de saúde provocada por fortedor abdominal. É internado às pressas e operadoem seguida. Não mais deixaria o hospital até a suamorte, 37 dias depois, em 21 de abril de 1985.

Diante da situação, tomou posse o vice-presi-dente, José Sarney, que iria cumprir todo o man-dato. Durante o discurso de posse, comprometeu-se a seguir as recomendações do presidente entãohospitalizado. Manteria o Ministério já escolhido

e respeitaria todos os compromissos assumidospela “Aliança Democrática” perante a Nação. Oúltimo militar a chefiar o governo, general JoãoBatista Figueiredo, recusou-se a participar do atoprotocolar de posse e passar a faixa presidencial aonovo presidente. Estava definitivamente encerradoo período da era militar.

Sarney assume o governo e logo em seguidacumpre, no plano político, duas das principaispromessas da Aliança Democrática: decreta a aber-tura partidária, com a legalização dos partidos co-

munistas; e convoca as eleições para a AssembléiaNacional Constituinte, que seriam realizadas em

15 de novembro de 1986. Já no plano econômico

a situação era outra. A inflação continuava subin-do e o déficit público também. Quanto às promes-sas de reformas fiscal e tributária, ficariam para aConstituinte.

O ano de eleições para a Constituinte começacom o agravamento da crise econômica. A inflaçãodispara. O povo começa a desconfiar de que ascoisas não sairiam como se desejava na Nova Re-pública. O presidente Sarney resolve fazer mudan-ças no Ministério, a começar pela Fazenda. No-meia o empresário paulista Dilson Funaro, que,

 juntamente com uma equipe de economistas, pre-para um plano de estabilização baseado no conge-lamento de preços e com uma nova moeda; era ochamado Plano Cruzado. Nova onda de euforia seespalha pelo País. O consumo explode, o povo fis-caliza os preços, a economia volta a crescer, comuma situação de pleno emprego na indústria.

O PMDB (Partido do Movimento Democráti-co Brasileiro), o maior partido de oposição ao re-gime militar adotado pelo novo presidente da Re-

pública, recebe apoio maciço da população e issose reflete na esmagadora vitória eleitoral, quandoelege a maior bancada na Assembléia Constituin-te e quase todos os governadores de Estado. OPlano Cruzado foi o seu maior cabo eleitoral, sóque, no dia seguinte ao pleito, ainda durante acontagem dos votos, este Plano ruiu, pois não ha-via mais qualquer base para sustentá-lo. O desa-bastecimento e ágios de até 100% sobre os preçostabelados já se tornaram rotina. O período se-guinte, até a promulgação da Carta Constitucio-

nal de outubro de 1988, foi marcado por sucessi-vas crises e tentativas de estabilização da econo-

putado federal Paulo Salim Maluf. O escolhido foiMaluf, o que aprofundou a divisão das forças queapoiavam o regime militar.

A oposição, por sua vez, lançou a candidaturado então governador de Minas Gerais, Tancredo

Neves, que logo recebeu o apoio dos dissidentesdo regime ao indicarem para a vice-presidência oentão senador José Sarney. A vitória do candidatoda oposição no colégio eleitoral não foi surpresa.A ditadura chegava ao fim e com ela um novo mo-delo político e econômico, formatado em docu-mento que deu forma à criação da chamada“Aliança Democrática”para a construção da NovaRepública, constituída pelos partidos da oposiçãoe pelos dissidentes do regime. O documento, ex-tremamente sintético, prometia a abertura partidá-

ria, a convocação da Constituinte para institucio-nalizar o Estado de Direito Democrático, uma re-forma fiscal e tributária capaz de eliminar o défi-cit público, acabar com a inflação e retomar ocrescimento econômico.

Na ocasião o País viveu momentos de intensavibração cívica. Uma onda de otimismo percorriatodo o território nacional. Tancredo, eleito em 15de janeiro de 1985, só tomaria posse em 15 demarço. A ansiedade pelo início do novo governoera crescente, porém, ocorreu um fato inesperado.Na madrugada do dia de sua posse, o presidenteeleito tem uma crise de saúde provocada por fortedor abdominal. É internado às pressas e operadoem seguida. Não mais deixaria o hospital até a suamorte, 37 dias depois, em 21 de abril de 1985.

Diante da situação, tomou posse o vice-presi-dente, José Sarney, que iria cumprir todo o man-dato. Durante o discurso de posse, comprometeu-se a seguir as recomendações do presidente entãohospitalizado. Manteria o Ministério já escolhido

e respeitaria todos os compromissos assumidospela “Aliança Democrática” perante a Nação. Oúltimo militar a chefiar o governo, general JoãoBatista Figueiredo, recusou-se a participar do atoprotocolar de posse e passar a faixa presidencial aonovo presidente. Estava definitivamente encerradoo período da era militar.

Sarney assume o governo e logo em seguidacumpre, no plano político, duas das principaispromessas da Aliança Democrática: decreta a aber-tura partidária, com a legalização dos partidos co-

munistas; e convoca as eleições para a AssembléiaNacional Constituinte, que seriam realizadas em

15 de novembro de 1986. Já no plano econômico

a situação era outra. A inflação continuava subin-do e o déficit público também. Quanto às promes-sas de reformas fiscal e tributária, ficariam para aConstituinte.

O ano de eleições para a Constituinte começacom o agravamento da crise econômica. A inflaçãodispara. O povo começa a desconfiar de que ascoisas não sairiam como se desejava na Nova Re-pública. O presidente Sarney resolve fazer mudan-ças no Ministério, a começar pela Fazenda. No-meia o empresário paulista Dilson Funaro, que,

 juntamente com uma equipe de economistas, pre-para um plano de estabilização baseado no conge-lamento de preços e com uma nova moeda; era ochamado Plano Cruzado. Nova onda de euforia seespalha pelo País. O consumo explode, o povo fis-caliza os preços, a economia volta a crescer, comuma situação de pleno emprego na indústria.

O PMDB (Partido do Movimento Democráti-co Brasileiro), o maior partido de oposição ao re-gime militar adotado pelo novo presidente da Re-

pública, recebe apoio maciço da população e issose reflete na esmagadora vitória eleitoral, quandoelege a maior bancada na Assembléia Constituin-te e quase todos os governadores de Estado. OPlano Cruzado foi o seu maior cabo eleitoral, sóque, no dia seguinte ao pleito, ainda durante acontagem dos votos, este Plano ruiu, pois não ha-via mais qualquer base para sustentá-lo. O desa-bastecimento e ágios de até 100% sobre os preçostabelados já se tornaram rotina. O período se-guinte, até a promulgação da Carta Constitucio-

nal de outubro de 1988, foi marcado por sucessi-vas crises e tentativas de estabilização da econo-

29 3b r a si l c o n t em p o r â n eo - 1985•20 0 0

A Assembléia Nacional Constituinte esteve repleta de promessas de reformas

fiscal e tributária.

138. Promulgação da Constituição, Brasília, DF, 5/10/1988. Moreira Mariz/

Agência JB.

Page 293: Livro a História Dos Tributos No Brasil

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http://slidepdf.com/reader/full/livro-a-historia-dos-tributos-no-brasil 293/322

mia mediante expedientes que não deram certo,tais como os Planos Bresser e Verão, enquanto ainflação disparava.

É nesse clima de crise econômica agravada pelamoratória da dívida externa, fuga dos investidoresestrangeiros e empenho para exportar a qualquercusto visando a obter divisas para enfrentar os com-promissos mais urgentes nas relações econômicascom o exterior, que funciona a Assembléia Consti-tuinte. Ela é dividida em mais de uma dezena de co-missões temáticas que trabalham, cada uma delas,

sobre um dos capítulos da Carta em elaboração. Es-sas comissões percorreram o País realizando au-diências públicas com a sociedade para debater aspropostas que deveriam entrar no texto constitucio-nal, em um processo democrático de consulta aopovo sem precedentes em nossa história. Todas asquestões de ordem constitucional foram amplamen-te debatidas, quer sejam nas comissões, quer no ple-nário da Constituinte, mas a questão tributária foiuma das que mereceram grande destaque.

Porém, vale ressaltar que, após todo esse deba-

te e trabalhos das comissões temáticas, haveria ocrivo da comissão de sistematização do texto final

da Carta e, mais ainda, do plenário, onde se cons-tituiu um bloco conservador que ganhou a deno-minação de “Centrão”. Esse bloco acabou por di-tar os rumos de todo o processo constituinte. Osavanços alcançados pelos setores mais progressis-tas, que se constituíam em minoria, foram frutosde intenso processo de negociação, inclusive no ca-pítulo do sistema tributário.

No que se refere à questão tributária, as maio-res discussões ficaram concentradas na AssembléiaNacional Constituinte, tendo como ponto de par-

tida o entendimento de que o Código TributárioNacional, aprovado em 1965, ainda em vigor na-quele momento, tinha trazido um aperfeiçoamen-to fiscal ao País, mas precisava de adequação ànova realidade da economia brasileira e à nova or-dem democrática implantada no Brasil. SegundoBernardo Ribeiro de Moraes, os principais pontosconcernentes à matéria fiscal, que constavam dapauta de discussão da Constituinte, eram:

Descentralização e fortalecimento da autono- 

mia dos Estados e dos Municípios; atenuação dos desequi líbrios regionais do país; maior 

mia mediante expedientes que não deram certo,tais como os Planos Bresser e Verão, enquanto ainflação disparava.

É nesse clima de crise econômica agravada pelamoratória da dívida externa, fuga dos investidoresestrangeiros e empenho para exportar a qualquercusto visando a obter divisas para enfrentar os com-promissos mais urgentes nas relações econômicascom o exterior, que funciona a Assembléia Consti-tuinte. Ela é dividida em mais de uma dezena de co-missões temáticas que trabalham, cada uma delas,

sobre um dos capítulos da Carta em elaboração. Es-sas comissões percorreram o País realizando au-diências públicas com a sociedade para debater aspropostas que deveriam entrar no texto constitucio-nal, em um processo democrático de consulta aopovo sem precedentes em nossa história. Todas asquestões de ordem constitucional foram amplamen-te debatidas, quer sejam nas comissões, quer no ple-nário da Constituinte, mas a questão tributária foiuma das que mereceram grande destaque.

Porém, vale ressaltar que, após todo esse deba-

te e trabalhos das comissões temáticas, haveria ocrivo da comissão de sistematização do texto final

da Carta e, mais ainda, do plenário, onde se cons-tituiu um bloco conservador que ganhou a deno-minação de “Centrão”. Esse bloco acabou por di-tar os rumos de todo o processo constituinte. Osavanços alcançados pelos setores mais progressis-tas, que se constituíam em minoria, foram frutosde intenso processo de negociação, inclusive no ca-pítulo do sistema tributário.

No que se refere à questão tributária, as maio-res discussões ficaram concentradas na AssembléiaNacional Constituinte, tendo como ponto de par-

tida o entendimento de que o Código TributárioNacional, aprovado em 1965, ainda em vigor na-quele momento, tinha trazido um aperfeiçoamen-to fiscal ao País, mas precisava de adequação ànova realidade da economia brasileira e à nova or-dem democrática implantada no Brasil. SegundoBernardo Ribeiro de Moraes, os principais pontosconcernentes à matéria fiscal, que constavam dapauta de discussão da Constituinte, eram:

Descentralização e fortalecimento da autono- 

mia dos Estados e dos Municípios; atenuação dos desequi líbrios regionais do país; maior 

29 4 T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

Planos de estabilização econômica heterodoxos foram postos em prática visando

combater a inflação, congelando preços e dando novos nomes às moedas.

139. Camelô Luiz Américo segurando cédulas de cruzados, cruzados novos e

cruzeiros, Rio de Janeiro, 2/12/1990. Ricardo Leoni/Agência JB.

Page 294: Livro a História Dos Tributos No Brasil

7/18/2019 Livro a História Dos Tributos No Brasil

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 justiça fiscal e proteção ao contribuinte; sim- 

pl ificação da tributação e sua adequação às 

necessidades de modernização do sistema pro- 

dutivo; garantia de um mínimo de uni formi- 

dade nacional ao sistema tributário, nos seus 

princípios básicos, mediante a preservação da figura da lei complementar em matéria tribu- 

tária; crescente progressividade do imposto so- 

bre produtos industrializados; criação de no- 

vos impostos.   4 6 9

Uma vez promulgada a Constituição de1988, tomou-se ciência daquilo que a mesmatratava com relação à matéria tributária. No

 Título IV – Da Tributação e do Orçamento,no Capítulo I, do Sistema Tributário Nacio-

nal, vinham elencados os princípios gerais datributação, as limitações ao poder de tributare, por fim, a distribuição das competênciastributárias.

Pela forma da lei, os tributos das respectivas es-feras do governo ficaram da seguinte forma:

Tr ibut o s d a Un ião

✠ Imposto sobre importação de produtos estrangeiros; 

✠ Imposto sobre exportação, para o exterior, de 

produtos nacionais ou nacionalizados; ✠ Imposto sobre renda e proventos de qualquer na- 

tureza; 

✠ Imposto sobre produtos industrializados; 

✠ Imposto sobre operações de crédito, câmbio e segu- 

ro, ou relativos a títulos ou valores mobiliários; 

✠ Imposto sobre a propriedade territorial rural; 

✠ Imposto sobre grandes fortunas; 

✠ Outros impostos; impostos extraordinários, na 

iminência ou no caso de guerra externa; 

✠ Empréstimo compulsório; 

✠ Taxas; 

✠ Contribuições de melhoria.

Tr ibut o s d o s Estado s

✠ Imposto sobre transmissão “causa mortis” e doa- 

ção, de quaisquer bens ou direitos; 

✠ Imposto sobre operações relativas àcirculação de 

mercadorias e sobre prestações de serviços de 

transporte interestadual e intermunicipal e de 

comunicação; 

✠ Imposto sobre propriedade de veículos automotores; 

✠ Adicional do Imposto de Renda incidente sobre 

lucros, ganhos e rendimentos de capital; 

✠ Taxas; 

✠ Contribuições de melhoria.

295b r a si l c o n t em p o r â n eo - 1985•20 0 0

O Plano Collor foi um plano de estabilização econômica que confiscou todos os

ativos monetários, independentemente das liminares da Justiça e do

descontentamento da população.

140. Paulo César Vieira resgata seus cruzeiros bloqueados, Rio de Janeiro,

16/09/1991.Marcelo Régua/ Agência JB.

4 6 9 Bernardo Ribeiro de MORAES, C ompêndio de D ire i to Tr ibutár io, Volume 1, p. 169.

Page 295: Livro a História Dos Tributos No Brasil

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Tr ibut o s d o s Mun icípio s

✠ Imposto sobre propriedade predial e territorial 

urbana; 

✠ Imposto sobre transmissão “inter vivos”, a qual- quer título, de bens imóveis e de direitos reais 

sobre imóveis; 

✠ Imposto sobre vendas a varejo de combustíveis,

líquidos e gasosos, exceto óleo diesel; 

✠ Imposto sobre serviços de qualquer natureza; 

✠ Taxas; 

✠ Contribuições de melhoria.

Tr ibuto s d o D ist r i toFed er al

✠ Impostos atribuídos aos Estados e Municípios; 

✠ Taxas e contribuições de melhoria.

Tr ibutos dos Terr i tór iosFed er ais

✠ Impostos atribuídos aos Estados; 

✠ Impostos atribuídos aos Estados e, cumulativa- 

mente, impostos atribuídos aos municípios, caso 

o Território Federal não esteja dividido em Mu- 

nicípios.

Este sistema tributário passou a vigorar no dia1º de março de 1989, ou seja, a partir do primei-

ro dia do quinto mês seguinte ao da promulgaçãoda Constituição.O modelo tributário aprovado em 88, sem dú-

vida, representou um novo pacto federativo peloqual, segundo José Serra, deputado e membro dacomissão de tributação da Constituinte na época,procurou-se dar mais autonomia aos Estados eMunicípios, abolindo o excessivo centralismo im-

plantado pelo modelo tributário formatado pelaEmenda 18, de 1965. Mas, com isso, criou-se umproblema para as receitas da União. 4 7 0

Na Constituinte, procuramos dar mais autono- 

mia aos Estados e Municípios com a descentra- lização tributária, mas sem nenhuma racionali- 

dade; na verdade, foi fruto de pressões políticas.

Demos mais flexibilidade para o estabelecimen- 

to de alíquotas mais altas do ICMS e a situa- 

ção dos Estados e Municípios melhorou. Porém,

com essa nova repartição, criamos um grande 

problema para a União, que procura ampliar 

sua receita com contribuições, onerando o setor 

produtivo, aumentando a carga fiscal indireta e 

reduzindo a competitividade da produção nacio- 

nal perante o mercado internacional. 4 7 1

29 6  T RI B UT O S D O B RA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

O Real foi engendrado para ser “moeda forte”.

Nos governos de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, o fantasma

da inflação foi exorcizado e a estabilidade da moeda sustenta-se

pelas chamadas “âncoras cambial e dos juros”.

141. Alice Misselino segurando cédulas de reais, C ine Estação Botafogo,

Rio de Janeiro, 28/06/1996. Sandra de Souza/Agência JB.

47 0 Reforma Tr ibutár ia Poss íve l e N ecessár ia – diversos autores, Edições Sinafresp (Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo). 1ª ed.1992 – SP.

4 7 1  José SERRA – Tributação na Economia Globalizada – diversos autores – Edições Sinafresp (Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Pau-lo) – pág. 42.- 1999 – SP.

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Embora descentralizador, com acentuado perfilfederalista, o sistema tributário saído da Consti-tuinte começou a receber críticas e restrições logono dia seguinte à sua aprovação, por ser considera-do extremamente complexo, pouco transparente e

injusto, pois apresenta uma carga tributária com umpeso de mais de 2/ 3 de impostos indiretos e menosde 1/ 3 de impostos diretos. 4 7 2 Além dessas restri-ções levantadas logo após a sua implantação, o sis-tema em vigor propicia o desencadeamento de umaguerra fiscal entre Estados, em busca de investimen-tos industriais. Por essa razão, o movimento em fa-vor de uma reforma tributária ganhou apoio ime-diato da sociedade já no início dos anos 90.

Encerrado o processo de elaboração constitu-cional e promulgada a Carta proclamada pelo de-

putado Ulisses Guimarães, presidente da Assem-bléia Nacional Constituinte, como a “ConstituiçãoCidadã”, o Brasil inicia o ano de 1989 em meio auma crise econômica muito grave e atropelado pelahiperinflação. A impopularidade do presidente José

Sarney bate recordes. O ano é de eleição presiden-cial, tendo em vista que a Constituinte restabeleceuas eleições diretas para presidente. Os grandes par-tidos que dominaram o processo constituinte lan-çam candidatos, assim como os partidos de esquer-

da. Mas é o então governador de Alagoas, Fernan-do Collor de Mello, através de um certo Partido da Juventude (depois de Reconstrução Nacional-PRN), que se apresenta como o paladino do com-bate à corrupção e como “caçador de marajás”.Consegue apoio da grande mídia, dos parlamenta-res dos grandes partidos e vence a eleição.

Collor forma seu governo com figuras desco-nhecidas pelos políticos e pela sociedade, incluin-do algumas extravagâncias, que logo se revelaramquando o Ministério da Economia preparou um

plano de estabilização baseado no confisco de to-dos os ativos monetários, deixando cada correntis-ta de banco ou poupador com a disponibilidadede 50 mil cruzeiros para saque. No discurso pe-rante o Congresso Nacional, o novo presidente

29 7 b r a si l c o n t em p o r â n eo - 1985•20 0 0

472 Yoshiaki NAKANO –  M ercosu l e T ri bu ta ção: M ercad os R egion ai s e G loba li z ação da E con om ia – diversos autores – Edições Sinafresp (Sindicato dos Agen-tes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo) – 1995 – SP.

Em alguns Estados brasileiros, a renúncia fiscal para atrair novas indústrias atinge

muitos bilhões de reais. A Guerra Fiscal, desencadeada por políticas agressivas de

benefícios relativos ao fisco, pode levar a perdas de receitas tributárias. Fábricas,

como a Pirelli do Brasil, preferiram instalar-se na Bahia em vez de São Paulo,

devido a atrativos, como porcentagens de créditos dos valores de impostos pagos.

142. Alves José dos Santos Macedo, funcionário da fábrica da Pirelli em Feira de

Santana, Bahia, 26/6/97. Roberto Setton/Agência Estado.

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empossado prometia acabar com a inflação “comum só tiro”, pregou austeridade fiscal, apresentouum esboço de proposta para uma reforma tributá-ria e defendeu a abertura da economia para produ-tos e capitais estrangeiros.

De fato, logo mandaria proposta de emendaconstitucional, polêmica e de caráter limitado, re-formando o sistema tributário. Começa o debate

sobre a reforma e vão se sucedendo outras propos-tas de diferentes autores. Diversas entidades da so-ciedade civil e de trabalhadores começam a discu-tir a questão tributária, entre elas, o Sinafresp –Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Esta-

do de São Paulo. 4 7 3

A professora Sulamis Dain, titular da cadeira deEconomia do Setor Público, da Faculdade de Eco-nomia e Administração da Universidade Federal doRio de Janeiro, em um debate sintetizou com pre-cisão a proposta do governo e suas deficiências:

“Pondero que éimportante fazer uma distinção 

entre quatro questões que o governo, deliberada- 

mente, tem procurado confundir. As quatro 

questões são conceitualmente distintas: ajuste 

fiscal, reforma tributária, necessidade de fi- nanciamento do setor público e a necessidade de 

financiamento da economia. O Brasil, nesse 

momento, tem que enfrentar esses quatro temas.

Precisa fazer essas quatro reformas. Ajuste fis- 

cal éuma questão de recursos a curto prazo. Já 

a recomposição da capacidade de financiamento 

do setor público requer um ajuste de longo pra- 

zo. Uma reforma tributária não gera necessa- 

riamente mais recursos ou aumenta a carga. Se 

quer corrigir a modelagem dos atuais impostos,

corrigir distorções do sistema tr ibutário atual,

ela pode, inclusive, gerar queda de arrecadação.

Então, o Brasil tem um problema de alavanca- 

gem de recursos para a economia como um todo.

Estes quatro temas são, do meu ponto de vista,

totalmente confusos na proposta do governo. Ele 

começou anunciando uma proposta de reforma 

tributária quando, na verdade, quer fazer um 

ajuste fiscal”.   4 7 4

298 T RI B UT O S D O B RA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

143. Para solucionar seus problemas fiscais e de caixa, o governo neoliberal de

Fernando Henrique Cardoso utilizou expedientes tópicos, como as contribuições

do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira, “imposto do cheque”,

hoje CPMF, Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, Cofins,

Contribuição para Financiamento da Seguridade Social. Modelo de fatura

detalhada de serviços prestados da Empresa Brasileira de Telecomunicações -

Embratel -, especificando alíquotas de cobrança de impostos ICMS e PIS/Cofins.

Rio de Janeiro, Empresa Brasileira de Telecomunicações.

4 7 3 Seminário “Reforma Tributária Possível e Necessária” – anais, diversos autores – Edições Sinafresp – 2ª ed. 1993 – SP. O Sinafresp continuou a prestaresse serviço à sociedade, não só realizando mais quatro seminários para discussão da questão tributária, como tambémeditando três outros livros cujos tí-tulos são: “M ercosul e Tr ibutação – M ercados Regionais e G lobalização da Economia” (1995 – SP), “Reforma da P revidência e Q uestão Tr ibutária” (1998 –SP). Alémdessas obras editou, também, “Gu erra Fiscal (C om ela todos perdem) ” (1998 – SP), contendo uma análise sobre os benefícios fiscais e a íntegrado relatório final da CPI da Assembléia Legislativa de São Paulo que apurou os prejuízos causados à economia paulista pela guerra fiscal, e tambémo tex-to da representação enviada à Procuradoria Geral da República solicitando abertura de Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), impugnando legisla-ção concedente de benefícios fiscais adotada pelos Estados do Amazonas, Goiás e Espírito Santo. A última contribuição dada pelo Sinafresp para o deba-te da questão tributária está contida no livro editado em1999, apresentando umresumo de toda a discussão dos quatro seminários realizados, inclusiveumdeles levado a efeito emLisboa – Portugal, para conhecer e discutir as experiências vividas pela União Européia, coma criação do Imposto sobre Va-lor Agregado (IVA) e harmonização tributária. Este volume, como título “Tributação na Economia Globalizada”, alémdo debate sobre princípio, contém,ainda, umtrabalho dos fiscais de tributos do Estado do Rio Grande do Sul, Luiz Carlos Vitali Bordin e Eugênio Lagemann, e a íntegra de uma propostade reforma tributária, trabalho de equipe da Fundação Getúlio Vargas, elaborado emparceria como Sinafresp e Fenafisco – Federação Nacional do FiscoEstadual, sob coordenação do professor Fernando de Holanda Barbosa.

4 74 Sulamis DAIN – Tributação na Economia Globalizada – diversos autores – Edições Sinafresp (Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de SãoPaulo). p. 35 – 1999 – SP.

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Cintra Cavalcante de Albuquerque, que elaborouum sistema tributário sustentado por um únicoimposto incidente sobre todas operações financei-ras, o chamado “imposto único”.

O governo, apesar de reconhecer a urgência de

uma reforma tributária, devido à necessidade decriar mecanismos de harmonização de tributoscom seus parceiros do bloco econômico do Mer-cosul  4 75 , acabou optando por buscar solução paraos seus problemas fiscais e de caixa através de me-didas tópicas. Entre elas, o uso abusivo das contri-buições como o Imposto Provisório sobre Movi-mentação Financeira, o chamado imposto do che-que – hoje CPMF, Contribuição Provisória sobreMovimentação Financeira – e Cofins, Contribui-ção para Financiamento da Seguridade Social.

Criou também o chamado Fundo de EstabilizaçãoFiscal, que retira 20% das receitas destinadas aosfundos de participação de Estados e Municípiospara uso da União. E, finalmente, conseguiu apro-var a chamada Lei Kandir, que desonera as expor-tações de produtos primários e semi-elaborados,

buscando reduzir o déficit da balança comercial.Mas, essas medidas só vieram acentuar a urgênciade uma reforma tributária de verdade, pois elascontribuíram para agravar o chamado “custo Bra-sil”e enfraquecer ainda mais as já cambaleantes re-

ceitas dos Estados e Municípios.As pressões da sociedade para que a reformatributária seja concretizada são cada vez maiores.O atual sistema, além de profundamente injusto, éextremamente complexo e oneroso para o contri-buinte. O coordenador da Administração Tributá-ria da Secretaria da Fazenda do Estado de SãoPaulo, Clóvis Panzarini, especialista em tributação,faz uma crítica demolidora do atual modelo:

“Por que estamos dizendo, a todo o momento,

que o sistema tributário brasileiro precisa ser mudado? Porque, além do componente custo 

Brasil, o nosso sistema tributário éanacrônico 

e impróprio àharmonização. É anacrônico por- 

que tem vícios importantes: por exemplo, ele 

contém quatro tributos cumulativos, quatro tri- 

30 0 T RI B U TO S D O B RA SI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

Tributos cumulativos incidem sobre produtos industrializados, mostrando a face anacrônica do sistema tributário brasileiro: “enquanto uma

mercadoria produzida no Brasil chega à prateleira do supermercado carregada de Cofins, PIS, IOF e CPMF (os nossos quatro impostos

cumulativos), o produto estrangeiro chega à mesma prateleira sem esse tipo de tributação.”

145. Supermercado Zona Sul, Rio de Janeiro, cupom fiscal com taxação de 18% sobre produto alimentício. FNAC Brasil Ltda., cupom fiscal de

transação comercial sem incidência de imposto ICMS.

4 7 5 MERCOSUL – Mercado comumregulado por tratado assinado por quatro países da América do Sul: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, emmarço de1991, emAssunção (Paraguai) e pelo protocolo de Ouro Preto (MG-Brasil), através do qual ficou estabelecida a união aduaneira e definidas as listas deexceção dos produtos sujeitos a taxação tarifária.

4 7 6  Clóvis PANZARINI – Tributação na Economia Globalizada – diversos autores – Edições Sinafresp (Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado deSão Paulo), p. 207 – 1999 – SP.

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butos em cascata. Neste caso, enquanto uma 

mercadoria produzida no Brasil chega àprate- 

leira do supermercado carregada de Cofins,

PIS, IOF e CPMF (os nossos quatro impostos 

cumulativos), o produto estrangeiro chega à 

mesma prateleira sem esse tipo de tributação.De modo que, os tributos em cascata represen- 

tam uma barreira alfandegária às avessas, pois 

eles tributam nosso sistema produtivo e não 

tributam os produtos do resto do mundo que 

entram em nosso País.”   4 7 6 

Segundo Panzarini, esses tributos, hoje, pro-piciam à União uma receita de cerca de R$ 40bilhões, algo parecido com 20% da carga tribu-tária do País, estimada em 30,25% do PIB. Es-

ses impostos cumulativos criados pela Uniãoganharam importância depois da reforma de 88.As partilhas de receitas previstas pela Carta de1988 fizeram com que a União se desinteressas-se pela cobrança dos tributos compartilhados,pois 58% do IPI, um imposto federal, vão paraos Estados e Municípios; da mesma forma, 48%do imposto de renda. Diante disso, Panzarinipondera que a União, para resolver seus siste-mas fiscais e de caixa, apelou para as contribui-ções que são impostos cumulativos, tributosruins, que penalizam a produção e o consumi-dor nacionais. 4 7 7 

Esse modelo de sistema tributário, no qual têmum grande peso os impostos cumulativos, vigentea partir de 1989, provocou um significativo au-mento da carga tributária no País que, no curtotempo de quatro anos, quando esse tipo de tribu-

tação ganhou relevância, passou de 25,09% para30,18% do PIB, conforme os dados da ReceitaFederal, constantes da tabela a seguir:

Evolução da carga tributária de: 1994 a 1998 

em relação ao PIB 

(Todas as receitas – União, Estados e Municípios) 

Ano Receita PIB Em % do

Tributária PIB  

1994 143.527 572.049 25.09  

1995 195.726 684.116 28.61  

1996 219.115 769.634 28.47  

1997 243.665 856.141 28.46  

1998 263.187 873.082 30.18  Fonte: Secretaria da Receita Federal, Confaz, Cotepe e IPEA

O apelo para os tributos cumulativos, que in-cidem em cascata, foi justificado pelo governo daUnião sob a alegação de que, com a partilha dereceitas estabelecida pela Carta de 88, houve ex-cessiva descentralização dos recursos sem a cor-respondente transferência de encargos para Esta-dos e Municípios. De fato, com o novo pacto fe-derativo estabelecido na Constituinte, os Estadose Municípios elevaram suas participações nobolo tributário, com uma significativa diminui-ção da fatia que cabe à União. A tabela com da-dos da Secretaria da Fazenda do Estado de SãoPaulo, reproduzida a seguir, registra as modifica-ções havidas a partir de 1980, mas sobretudo de-pois de 1988:

30 1b r a si l c o n t em p o r â n eo - 1985•20 0 0

4 77  Idem, ibidem , p. 206-214.

Receita Tributária por nível de Governo 

Em percentual do PIB 

80 88 90 91 92 93 94 95  

Distr ibuição 

Municípios 8,65% 9,66% 13,51% 15,73% 14,93% 18,85% 15,22% 16,29%

Estados 22,17% 27,26% 27,58% 29,65% 28,13% 25,43% 25,41% 26,71%

União 69,18% 63,09% 58,90% 54,62% 56,94% 55,72% 59,37% 57%

Fonte: Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo

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O emperramento da reforma tributária duran-te quase 10 anos nos labirintos do Congresso Na-cional está ligado à questão claramente demons-trada pela tabela. No entender da União, o pactofederativo de 88 retirou-lhe recursos indispensá-veis para a cobertura dos seus encargos. Daí a ne-cessidade de uma reforma do referido pacto, se-gundo a qual ela seja aquinhoada com uma fatiamaior do bolo tributário do País. Já os Estados e

Municípios pretendem uma reforma que mante-nha, no mínimo, a atual partilha dos tributos, eaté mais que isso. Como nunca se chegou a umconsenso ao longo desse tempo, a reforma não an-dou. E esta acomodação não se deu por falta denegociações, mas porque nunca se chegou a umacordo, apesar das inúmeras alternativas apresen-tadas pelas partes.

No final do mês de janeiro do ano 2000, aquestão da reforma tributária entrava em processoreal de tramitação no parlamento brasileiro, após a

aprovação, na Comissão Especial da Câmara dosDeputados, do parecer do relator da matéria, de-

putado Mussa Demes (PFL-PI) que apresentou, juntamente com o relatório, um substitutivo quenão tem apoio do Executivo Federal, nem mesmodentro do seu próprio partido. Mas, as negocia-ções abertas buscavam pontos consensuais paraum acordo, deixando as questões controvertidaspara posterior decisão, quando a matéria chegasseao plenário da Câmara e do Senado. O ponto maispolêmico da proposta de reforma em processo de

tramitação está relacionado com a criação do Im-posto sobre Valor Agregado (IVA), como um tri-buto da Federação, com legislação de abrangêncianacional, arrecadação e administração a cargo dosEstados, com receita compartilhada entre Estadose União. Esse IVA substituiria os ICMSs esta-duais, que possuem 27 legislações diferentes, osISSs municipais e os tributos federais: IPI, CPMF,Cofins, PIS/Pasep e CSLL.

Em resumo, o substitutivo aprovado pela Co-missão Especial de Reforma Tributária da Câmara

dos Deputados prevê as seguintes modificações nosistema tributário brasileiro:

30 2 T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

Durante quase 10 anos, a Reforma Tributária foi adiada pela questão das dotações

orçamentárias imbricada no pacto federativo, mas a distribuição dos tributos

começou a ser discutida pelos poderes competentes.

146. Primeira reunião da Comissão de Controle da Gestão Fiscal: Ministro Pedro

Malan, Pedro Parente, Everardo Maciel, Ma rtus Tavares, Eduardo Guimarães e

outros, 16/09/1998. Gilberto Alves/Agência JB.

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1. Cria o IVA, que substituiráos impostos sobre os 

bens e serviços de três esferas do governo: IPI 

(federal), ICMS (estadual), ISS (municipal).

Substituirátambém o salário educação, o PIS/ 

Pasep, a Cofins. A arrecadação serácomparti- 

lhada entre a União e os Estados. Os municípios ficarão com 25% da parte da receita que cabe ao 

Estado.

• O IVA, assim como éo ICMS, seránão cu- 

mulativo; o valor devido serácompensado em 

cada operação, recaindo em sua totalidade so- 

bre o consumo final.

• A alíquota seráfixada por lei federal, ficando 

a critério dos estados aumentá- la ou diminuí- 

la mediante lei estadual, em até20%.

• Poderáter alíquota seletiva para alguns pro- 

dutos.• Parte da arrecadação serádestinada aos encar- 

gos da União com educação, segur idade social 

e amparo ao trabalhador.

• Serácobrado no lugar do consumo, com prazo 

de transição para a passagem do sistema atual 

de origem para o destino.

2. Cria o IVV, um imposto municipal, com alíquo- 

ta de 4% sobre consumo final de mercadorias e 

serviços, tanto de pessoas físicas como de pessoas 

 jurídicas. Essa alíquota, para se tornar perma- 

nente, teráque aguardar regulamentação.

3. Cria uma contribuição social de 8%, que inci- 

dirásobre a receita líquida dos bancos.

4. Cria um fundo para conservação e recuperação 

de estradas, constituído de um imposto seletivo 

sobre combustível. A vinculação da receita se 

darápara um prazo de cinco anos.

5. Permite a criação de contribuições de melhoria para financiamento de obras públicas pela 

União, Estados e Municípios, só que, ao contrá- 

rio do que estábastante vago no atual texto 

constitucional, explicita as condições que possi- 

bilitam a cobrança sem possibilidade de recorrer 

 às ações judiciais.

6. Permite que os municípios criem as taxas de 

limpeza e iluminação pública.

7. O Imposto Territorial Rural, o ITR, deixa de ser federal e passa para os Estados.

8. Define a noventena, ou seja, um imposto só po- 

deráser cobrado depois de 90 dias após sua 

aprovação. Mantém a anualidade, princípio que 

garante a cobrança de um tributo se aprovado 

em ano anterior. As contribuições ficam fora da 

anualidade, mas terão que submeter-se àno- ventena.

9. Sigilo bancário: o projeto permite que autorida- 

des da área tributária requisitem informações 

bancárias de contribuintes. Os casos e a utiliza- 

ção das informações serão definidos em lei com- 

plementar.

O que mais preocupa nesta disputa que envol-ve as diferentes esferas de governo é que a discus-

são se concentra sobre quem fica com quais im-postos e quem fica com a maior fatia do bolo tri-butário, quando a sociedade e o contribuinte al-mejam um novo sistema tributário, mais justo,mais simples e absolutamente transparente. Alme-

 jam, principalmente, que as receitas dos impostosarrecadados sejam melhor aplicadas pelo Estado,nos seus três níveis, em prestação de serviços deboa qualidade à população. Apesar de toda con-trovérsia existente, é justo assinalar que há conver-gências quanto a alguns princípios, entre eles umsistema tributário que propicie a harmonização edesonere a produção, visando a facilitar a integra-ção e a competitividade da economia do Brasil nomercado mundial, portanto, um fator de desenvol-vimento econômico.

Deve-se destacar, também, que o debate acercada reforma tributária tem levado em consideraçãoa necessidade de se acabar com a guerra fiscal, temconsiderado as transformações na economia globale a nova dinâmica do comércio internacional, ge-

radas principalmente pela formação dos blocos re-gionais, como a União Européia, o Nafta; e, so-bretudo, levando-se em conta o protecionismo queos países mais ricos vêm adotando nas suas rela-ções de comércio com os países dito emergentes,ignorando as regras acordadas pela OrganizaçãoMundial do Comércio, a OMC. Mas, é com vistasà presença do Brasil no Mercosul, bloco econômi-co que tende a obter novas adesões de países sul-americanos, e a provável criação da Alca, Associa-ção de Livre Comércio das Américas, em um pra-

zo máximo de cinco anos, que a reforma tributáriase impõe, para que o Brasil não se coloque na po-

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sição de corpo estranho no mundo econômico epolítico do século 21.

Finalmente, é bom ressaltar que, enquanto sediscute uma reforma tributária ao longo de quaseuma década, o mundo vai experimentando novas

mudanças relacionadas com as atividades econô-micas que se defrontam com modelos tributáriosnem sempre aptos a defender os interesses da so-ciedade e do Estado. O exemplo mais recente refe-re-se ao incremento das transações comerciais viaInternet, o chamado comércio eletrônico. Na me-dida em que aumenta, a cada dia, o volume do va-lor das mercadorias que circulam através desse me-canismo, aumenta também a dificuldade em taxá-lo. Em várias partes do mundo, inclusive no Brasil,

onde esse comércio já atinge nível significativo, osgovernantes têm procurado formas de arrecadaçãoque possam alcançá-lo. Uma dessas formas cogita-das seria a taxação do fluxo de transmissão de da-dos pela Internet. Mas, não se trata, apenas, de um

aumento do comércio de mercadorias por meioseletrônicos em escala planetária; o que preocupamais ainda é a significativa movimentação finan-ceira, que alimenta um mercado global de capitais,hoje, simplesmente, fora de controle. De modoque, caso continue se arrastando no Congresso areforma tributária esperada há muito tempo pelasociedade, quando finalmente sair, corre o risco denascer velha e superada.

30 4 T RI B UT O S D O B RASI L r e pu b l i c a n o3ª Parte

147. Moedas de 1, 5, 10, 25 centavos; e R$ 1,00.

148. Nota de R$ 10,00 comemorativa dos 500 anos do descobrimento do Brasil.

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A- SÍNTESE DOS TRIBUTOS NOBRASIL COLONIAL - 1500/1808

I - Governo-Geral/ Capitanias Hereditárias/Sesmarias

1. Monopólio do pau-brasil, especiarias edrogas (a vintena pertencia ao donatário);

2. Vintena do pescado (de vinte peixes, um);3. Direito de postagem nos rios;4. Quinto sobre todas as pedras preciosas,

ouro, prata, cobre, chumbo, estanho, aljô-far, coral, pérola etc. (ao donatário era re-servada a dedução do dízimo);

5. Donativo e a terça parte dos ofícios;6. Contratos de entradas;

7. Contratos de dízimos;8. A Dízima das colheitas e do comércio com

o exterior;9. Foros, rendas e direitos das alcaiderias-

mores.

II - Outros impostos que foram acrescentadosdurante o período colonial

ORDINÁRIOS:1. Sisas;2. Alcavalas;3. Impostos de chancelaria, isto é, selos cria-

dos pelo alvará de 10 de março de 1797;4. Imposto de passagem;5. Dos engenhos;6. Tributos diversos lançados pelas Câmaras

Municipais;7. Subsídio Literário.

EXTRAORDINÁRIOS:

1. Donativos espontâneos;2. Cotas para indenização de guerra;3. Cotas para manter tropas e fortalezas nas

guerras sustentadas contra franceses e ho-landeses;

4. Donativos para consórcio de membros dafamília real;

5. Imposto de dez anos para a reconstruçãoda cidade e do porto de Lisboa;

6. Imposto de consulado para a organizaçãoda primeira esquadra de comboio.

III - Impostos e taxas pagas ao clero

1. Direitos paroquiais;2. Emolumentos;3. Prós e percalços;

4. Benesses espórtulas.

B - Mo n ar c as po r t ug uesesd ur an t e o Br asi l Co l o n ial

1. D. Manoel, o Venturoso (1469-1521);2. D. João II I, o Piedoso (1521-1557);3. D. Sebastião, o Desejado. Ao herdar o

trono português, este monarca tinhaapenas três anos de idade. Assim sendo,Portugal viveu um período de regências,

tendo como regente, primeiramente, D.Catarina, conhecida como “rainha viúva”,que renunciou ao trono após o 1º ano degoverno. Substituiu-a na regência oCardeal D. Henrique, que governou até1568, quando foi decretada a maioridadede D. Sebastião, aos 14 anos de idade. Oreinado de D. Sebastião durou até 1578,quando este desaparece no norte da África,em guerra;

4. Como D. Sebastião não deixou herdeiros,assume a regência, novamente, o CardealD. Henrique, que governa de 1578 a 1580.

Durante a União Ibérica

5. D. Felipe II da Espanha e I de Portugal(1580-1598);

6. D. Felipe III (1598-1621);7. D. Felipe IV (1621-1640).

Restauração Portuguesa

8. D. João IV, o Restaurador. Fundador dadinastia bragantina (1640-1656);

9. D. Afonso VI, o Vitorioso (1656-1667);10. D. Pedro II, o Pacífico, 3º filho de D.

 João IV, foi Príncipe-Regente de 1668,quando depôs o irmão, D. Afonso VI, até1683, reinando até 1706;

11. D. João V, o Magnânimo (1706-1750);12. D. José I, o Reformador (1750-1777);

30 6  h i s t ó r i a d o s T RI BU TO S n O BRASI L4 ª Parte

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13. D. Maria I, a Piedosa (1777-1816). Noano de 1792, perdeu a razão, assumindoa regência D. João, futuro D. João VI;

14. D. João VI, o Clemente (1816-1826).

C - Aut o r id ad es f isc aisd ur an t e o Br asi l Co l o n ial

Fonte: Internet, Site da Receita Federal (www.receita.fazenda.gov.br)

1. Provedores daFazendaReal/ Juízes daAlfândega

✠ Belchior de Azevedo (1532);✠ Antônio de Oliveira (1537);✠ Antônio Tinoco (1548);✠ Antônio Cubas (1552);✠ Pedro Henriques (titular, nunca exerceu o car-

go,1540?);✠ Leonor da Costa - (viúva de Pedro Henriques)

(1545?);✠ Beatriz da Costa - (filha de Pedro Henriques)

(1551);✠ Brás Cubas (1552-1592);✠ Simão Machado (substituto eventual) (1579-

1583);✠ Pedro Cubas (1592-1615);✠ Luís d’Almada Montarroyo (1603);✠ Luís de Melo Camelo (1605);✠ Gonçalo Pedrosa (1606-1609);✠ Gaspar de Abreu (1609);✠ Diogo da Fonseca (1617);✠ Francisco Alves Correia (1617?);✠ Fernão Vieira Tavares (1622-1624);✠ Pero Pantojo da Rocha (1628-1632);✠ Amador Bueno da Ribeira (1633-1636);✠ Sebastião Fernandes Correia (1636-1639);✠ Domingos da Fonseca Pinto (1639-1640);✠

Sebastião Fernandes Correia (1640-1657);✠ Francisco Machado de Aguiar (não assumiu)

(1643);✠ Sebastião Velho de Lima (1658-1660);✠ Sebastião Fernandes Correia, o Moço (1660-

1663);✠ Manuel Nunes Figueira (1663-1666);✠ André de Góis de Siqueira (1666-1670);✠ Pedro Taques de Almeida (1670-1672);✠ Lourenço de Melo da Cunha (1672-1673);✠ Cipriano Tavares Cabral (1674-1677);

✠ Capitão Paulo Rodrigues de Lara (1677-1686);

✠ Gaspar Gonçalves de Araújo (substituto desde1665) (1686-1690);

✠  Timóteo Correia de Góis (titular desde 1663)(1690-1732);

✠ Antônio Francisco Lustosa (1732-1734);

✠ Dionísio Batista de Mendonça (não assumiu)(1735);✠  José de Godoy Moreira (1734-1765);✠ Domingos Luís da Rocha (interino) (1765);✠  José Honório de Valadares Aboim (1765-

1775);✠ Dr. José Gomes Pinto de Morais (substituto)

(1771-1775).

2. Juízes da Alfândega

✠ Dr. José Carlos Pinto de Sousa (1775-1777);✠ Manuel de Freitas Matos (interino)

(1777-1780);✠ Dr. Marcelino Pereira Cleto (1780-1786);✠ Dr. José Antônio Apolinário da Silveira (1786);✠ Sebastião Luís Tinoco da Silva (1789-1796);✠ Dr. Luís Joaquim Duque Estrada Furtado de

Mendonça (1803);✠ Dr. João de Sousa Pereira Bueno (1803-1819);✠ Gabriel Mendes dos Santos (1820).

D - Dad o s Hist ó r ico s so br eas Al f ân d egas

“A mais antiga repartição tributária do mundo,espalhada por todos os lugares e encontrada em to-das as épocas, a alfândega vem, provavelmente, dosegundo milênio antes de Cristo. Em Portugal, asalfândegas parecem remontar à ocupação romana.Firmaram-se, porém, durante o domínio islâmico;tanto assim que as palavras ‘aduana’ e ‘alfândega’

derivam de radicais lingüísticos árabes. No Brasil,as primeiras alfândegas foram instaladas entre1534 e 1540, junto com as capitanias hereditárias.Mas, suas funções estavam embutidas na estruturadas Provedorias da Fazenda Real, cujo Provedor eratambém Juiz da Alfândega. Essas primeiras alfân-degas foram as de Olinda, depois mudadas paraRecife, Bahia, Ilhéus, Porto Seguro, Vila do Espíri-to Santo (atual Vila Velha), depois mudadas paraVitória e São Vicente, depois mudadas para Santos.A primeira alfândega a ter existência autônoma,

desligada da Provedoria da Fazenda, foi a da Bahia(Salvador), a partir de 1549. O pessoal dessas pri-

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meiras aduanas era reduzido: Provedor, Escrivão, Juiz da Balança, Feitor, Meirinho do Mar e, prova-velmente, alguns guardas. Com o tempo, algumasalfândegas cresceram mas outras tiveram seu movi-mento e suas atividades tão reduzidos que se extin-

guiram, como as de Ilhéus e Porto Seguro. Emcompensação, outras foram criadas: Natal, Paraíba,São Luís, Belém, Rio de Janeiro, Rio Grande, For-taleza, Parnaíba (no Piauí), e Colônia do Sacra-mento (hoje no Uruguai), todas anteriores à Inde-pendência (o período imperial e o republicano se-rão objeto de estudo à parte). O grande impostoaduaneiro, a Dízima da Alfândega, só foi estabele-cido no Brasil no começo do século XVIII, e eracomumente arrecadado por contratadores particu-lares, que arrematavam em leilão o direito de co-

brá-lo. Antes disso, os tributos aduaneiros nãoabrangiam a totalidade das exportações e importa-ções, mas apenas uma parte delas. Isso não signifi-ca que fossem poucos os tributos; havia a Dízimadas Mercadorias Exportadas para Fora do Reino, aDízima das Mercadorias Importadas por Estran-geiros, o Consulado, o Comboio, a Maioria, a Ava-ria e outros. Entravam no Brasil isentas de impos-to as mercadorias vindas de Portugal, que lá hou-vessem pago a Dízima de Saída. Também eramisentas as mercadorias exportadas diretamente paraPortugal. Ao iniciar-se o Ciclo do Ouro, a Alfân-dega do Rio de Janeiro emancipou-se da Provedo-ria da Fazenda Real local, tornando-se autônoma.A partir desse tempo, ganhou dimensões cada vezmaiores, passando a ser a principal da colônia.Nessa época, as aduanas passaram a ser divididasem secções internas, denominadas ‘mesas’: MesaGrande, Mesa da Abertura, Mesa da Balança, Mesada Descarga, Mesa da Estiva, Mesa da Entrada eMesa da Saída. Com a extinção das Provedorias da

Fazenda Real, a partir de 1770, substituídas pelas Juntas da Real Fazenda, as alfândegas foram sendoemancipadas, separando-se a arrecadação dos im-postos internos da dos tributos aduaneiros. A aber-tura dos portos, em 1808, deu às alfândegas con-dições para se tornarem a principal fonte de recei-ta fiscal do Estado. Após a Independência, elas seconstituíram no maior sustentáculo financeiro dotesouro do Império. O advento do Ciclo do Cafégerou divisas que permitiram amplo comércio in-ternacional, aumentando ainda mais a importância

das alfândegas. Na década de 1840, surgiram as‘tarifas Alves Branco’, primeiro ensaio de uma po-

lítica protecionista, que deu margem a longas con-trovérsias entre os livre-cambistas e a nascente in-dústria nacional. A República não pôde prescindirde uma política aduaneira fiscalista, já que a tribu-tação interna era totalmente incapaz de cobrir as

necessidades financeiras do seu tesouro. Só depoisda Grande Depressão de 1929 e, especialmente, apartir da Segunda Guerra Mundial, o Brasil adotouuma orientação francamente protecionista. Isso,necessariamente, importava em elevar as tarifas,mas, ao mesmo tempo, significava reduzir a arreca-dação alfandegária global, em virtude da reduçãodo intercâmbio internacional. Em 1968, a Refor-ma Administrativa do Ministério da Fazenda, queunificou os antigos departamentos subordinados àDireção-Geral da Fazenda Nacional em Secretaria

da Receita Federal, transformou as alfândegas emDelegacias da Receita Federal ou em Inspetorias daReceita Federal. Posteriormente, o Regimento de1992 da Secretaria da Receita Federal transformouem alfândegas, novamente, aquelas Inspetorias cujaatividade única era a do controle de comércio como exterior, tais como as estabelecidas nos portos,aeroportos ou em alguns pontos de fronteira.” Cf.Internet, Site da Receita Federal (www.receita.fa-zenda.gov.br). Fonte:Almanach para a Cidade da Bahia ,Anno 1812, 19 - Foral da Capitania da Bahia - Fo-ral da Capitania de Pernambuco.

E - Dad o s Hist ó r ic o s so br ea Pr o ved o r ia-Mo r d aFazen d a Real

1. Do Brasil

“Estabelecida em 1549, na Bahia, simultanea-mente com a instalação do primeiro Governo-Ge-

ral, tinha a atribuição de coordenar, supervisionare fiscalizar as Provedorias da Fazenda Real exis-tentes nas capitanias. Nessa ocasião foi baixado oRegimento e nomeado primeiro Provedor-MorAntônio Cardoso de Barros, célebre pelo seu trági-co fim, devorado junto com o bispo Pero Fernan-des Sardinha pelos caetés. A Provedoria-mor, aprincípio, tinha dimensões modestas, como as de-mais repartições da época, limitando-se seu pes-soal ao Provedor-Mor, o Contador Geral, o Escri-vão da Provedoria-mor, o Tesoureiro Geral, o Mei-

rinho e o Porteiro, além do Patrão da Ribeira. Osprimeiros provedores-mores faziam viagens de ins-

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peção às demais capitanias, hábito que logo foiabandonado, provavelmente pela longa duraçãodessas ausências, em prejuízo da crescente carga detrabalho. Suas incumbências cresceram, na medidaem que a colônia se desenvolveu, pois cabia ao

Provedor-Mor o julgamento de apelações e agra-vos contra os atos dos provedores das capitanias,além da tomada de contas dos tesoureiros e almo-xarifes e de uma variada gama de tarefas adminis-trativas. Mais importante ainda, na falta do Gover-nador Geral, o Provedor-Mor era membro nato da

 Junta que o substituía ou sucedia, razão pela qualnão poderia se ausentar da capital por muito tem-po. Em 1624, foi desligada da Provedoria-mor doEstado do Brasil uma parte de sua jurisdição, peloestabelecimento de outra Provedoria-mor da Fa-

zenda Real no Maranhão. Nesse mesmo ano, a ci-dade de Salvador, sede da Provedoria do Brasil, foitomada pelos holandeses que a saquearam e incen-diaram, o que resultou na destruição de seus arqui-vos. A partir de 1640 se alternaram dois dos maisimportantes Provedores-mores: Lourenço de BritoCorreia, o herói da resistência contra os holande-ses, e Antônio Lopes de Ulhoa, o mais dedicadoservidor da Fazenda, que entrou rico no cargo esaiu pobre, depois de vinte anos de trabalho. Infe-lizmente, no início do século XVIII, o cargo é to-mado hereditariamente pela família Pegado Serpa,que se locupletou, desmoralizando a instituição elevando-a à extinção. Apesar disso, o Ciclo doOuro compensou com sua riqueza a má gestão ad-ministrativa, mantendo uma aparência de prospe-ridade e importância na Provedoria-mor do Brasil.

 Tanto assim que, em 1755, o seu pessoal era com-posto do Provedor-Mor, do Escrivão da FazendaReal, do Contador Geral, do Escrivão dos Contos,do Escrivão dos Feitos da Fazenda Real, do Escri-

vão do Tesouro, do Tesoureiro Geral, do Almoxa-rife dos Armazéns dos Materiais da Coroa, do Es-crivão deste Almoxarifado, de 6 oficiais do Escri-vão da Fazenda, do Ajudante do Tesoureiro, doRequerente das Causas da Coroa, Fazenda e FiscoReal, do Porteiro da Casa da Fazenda e Contos,do Meirinho das Execuções da Fazenda Real, doEscrivão desse Meirinho, do Patrão-Mor da Ri-beira, do Almoxarife das Armas, Casa da Pólvorae Munições de Guerra, do Almoxarife dos Arma-zéns de Farinha e Mantimentos e dos Escrivães

destes Almoxarifados. Os sucessivos escândalosdos provedores Pegado Serpa levaram o governo

metropolitano a abolir a Provedoria-mor da Fa-zenda Real do Brasil por lei de 3 de abril de 1770,substituindo-a por uma Junta da Real Fazenda. Asatribuições locais da Provedoria-mor, como os ar-mazéns e a ribeira das naus, foram confiadas à In-

tendência da Marinha e Armazéns Reais, criadanessa ocasião. O controle e a coordenação das pro-vedorias e juntas das capitanias foram atribuídasdiretamente ao recém-criado Erário Régio de Lis-boa.”

Site da Receita Federal (receita.fazenda.gov.br).

2. No Maranhão

“Instalada em São Luís, no Maranhão, em1624, em razão da divisão do Brasil em dois go-

vernos gerais (causada, por sua vez, pelo ‘vento ge-ral’, que impedia durante parte do ano a navegaçãoentre o Maranhão e a Bahia). Seu primeiro Prove-dor-mor foi Jácome Raimundo de Noronha, quese celebrizaria depois nas lutas contra os inglesesque ocupavam a foz do Amazonas. Além disso, Já-come Raimundo foi, mais tarde, governador doEstado do Maranhão e nessa qualidade ordenou aexpedição de Pedro Teixeira a Quito, que resultouna incorporação da Amazônia ao Brasil. Em 165l,o Estado do Maranhão foi dividido em dois, como desmembramento do Pará; como conseqüência,a Provedoria-mor também se desmembrou emduas, mas, em 1655, as duas capitanias novamentese reuniram, com o que se restaurou a Provedoria-Mor em São Luís. Nos cem anos seguintes, a sededa Provedoria-mor foi transferida mais uma ouduas vezes para Belém, em virtude de outras mu-danças políticas, mas sempre acabou voltando paraSão Luís. A jurisdição da Provedoria-mor do Ma-ranhão abrangia desde o Piauí até o Amazonas,

num total de 15 capitanias, a saber: Piauí, Mara-nhão, Pará, Rio Negro (depois Amazonas), Ceará,Itapicuru, Icatu, Mearim, Tapuitapera, Caeté, Vi-gia, Gurupá, Joanes (Ilha de Marajó), Cametá,Cabo Norte e Xingu. Ainda existia a Provedoria-mor do Maranhão em 1760, mas provavelmentefoi extinta em 1770, junto com sua congênere daBahia. Se perdurou mais, foi por poucos anos, por-que, em 30/ 12/ 1779, uma carta régia criou a

 Junta da Real Fazenda da Capitania do Mara-nhão.”

Site da Receita Federal (receita.fazenda.gov.br).

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F - Aspec t o s ger ais daevo l uç ão d o sist emaad uan eir o d o Br asi l

“Na década que se iniciou em 1530, o governo

português implantou no Brasil o sistema de Capi-tanias Hereditárias, ou seja, de feudos (sic) conce-didos a nobres, militares e burocratas, com amplaautonomia administrativa, limitando-se a Coroa acobrar neles alguns poucos tributos, conforme es-tabelecido nos forais e cartas de doação. Para isso,instalou em cada capitania uma Provedoria da Fa-zenda Real, encarregada de cobrá-los. Essas prove-dorias tinham, também, a função de aduanas, peloque os seus chefes, os Provedores, eram também

 Juízes de Alfândega.

Sabe-se, pela documentação existente, que qua-se todas as capitanias, exceto as do Maranhão,Santo Amaro e São Tomé, instalaram suas alfânde-gas. Entretanto, no estágio em que se encontram asinvestigações históricas, é impossível saber qual é amais antiga. Há indícios, entretanto, de que talvezsejam as de São Vicente ou a de Pernambuco (ins-talada na época em Olinda).

Não fora, porém, baixado regimento para taisprovedorias, pelo que as atividades aduaneiraseram sujeitas a dúvidas freqüentes e insolúveis. Sóem 1549, quando foi criada a Provedoria-mor daFazenda Real, com sede na Bahia, chefiada porAntônio Cardoso de Barros, é que a Coroa baixouregimentos para este e para os provedores das ca-pitanias. O provedor continuava como juiz da al-fândega, seu chefe, coadjuvado pelo escrivão da al-fândega, o feitor, o meirinho do mar, o juiz da ba-lança e alguns guardas. Além das atribuições mera-mente fiscais, os provedores deviam também agircomo representantes do Rei em outros assuntos,

inclusive na defesa militar. Comandaram, muitasvezes, a defesa das capitanias contra corsários e in-vasores, lideraram bandeiras em busca de metaispreciosos, como Brás Cubas e Francisco Monteiro,e enfrentaram motins populares. E ainda tinhamque cobrar impostos. Os principais impostosaduaneiros, entretanto, não eram cobrados no Bra-sil, uma vez que só mercadorias vindas de Portu-gal podiam entrar aqui. (Não se critique excessiva-mente essa política; todos os países colonialistasda época a adotavam; a Inglaterra a manteve até o

século XX, na Índia e outras colônias.) Os impos-tos cobrados nas alfândegas brasileiras incidiam

sobre as exportações para fora do reino e sobre asimportações feitas por comerciantes estrangeiros.Alguns tributos adicionais, porém, eram cobradossobre as importações e exportações, a título de‘donativos’ou ‘subsídios’.

Ainda no século XVI duas grandes alteraçõesocorreram no sistema aduaneiro do Brasil: a cria-ção da alfândega do Rio de Janeiro, em 1566, queviria a ser a mais importante do país, e a outorgado Foral da Alfândega Grande de Lisboa, em 15de outubro de 1587, modelo de toda a regulamen-tação aduaneira posterior. Por incrível que pareça,esse foral vigorou como legislação básica para asalfândegas brasileiras até 1832.

É no final do século XVI que a Lei de 9 de fe-vereiro de 1591 fecha os portos do Brasil aos na-

vios estrangeiros, que não tivessem licença préviada coroa. Novos diplomas legais em 1605 proibi-ram completamente o comércio com embarcaçõesestrangeiras, com o fito de prejudicar ingleses eholandeses.

Pouco mudou o sistema no século XVII; novasaduanas foram criadas no litoral norte, cresceu oquadro de pessoal de algumas das primitivas, pre-midas pelo incremento do comércio exterior, e ou-tras feneceram, acabando abolidas por falta demovimento no respectivo porto. Sensíveis modifi-cações surgiram, entretanto, no princípio do sécu-lo XVIII. O ouro que os paulistas haviam desco-berto em Minas Gerais revolucionou o comérciointernacional. Tornou-se impossível, para o gover-no português, evitar a avalanche de mercadoriasque se despenhou sobre os portos brasileiros. Fe-chá-los totalmente era um convite ao contrabando,facilitado pela extensão do litoral e pelos escassosquadros de pessoal aduaneiro.

A solução foi uma certa liberalização do co-

mércio, mantido o monopólio metropolitano, istoé, a proibição de comércio direto com outros paí-ses. Mas, produtos estrangeiros passaram a entrarlivremente, via Portugal, nos portos brasileiros.Em compensação, a Coroa impôs a Dízima da Al-fândega a todas as mercadorias entradas ou saídasdo Brasil. Como conseqüência, cresceu o serviçonas aduanas, obrigando o aumento de seus qua-dros. Onde havia um funcionário, passou a existiruma Mesa, ou seja, uma secção, composta de vá-rios servidores. Assim, o Juiz da Balança passou a

chefiar a Mesa da Balança. A Alfândega do Rio de Janeiro, principal porto de escoamento do ouro e

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de importação de mercadorias por ele trocadas,ganhou autonomia, separando-se da Provedoria daFazenda Real da capitania.

À medida em que o Ciclo do Ouro se tornavamais importante, o comércio exterior também

crescia, a despeito de algumas crises periódicas decurta duração. As aduanas sobreviventes da estag-nação econômica do século XVII se firmaram eganharam espaço na administração fiscal da época.Paradoxalmente, por volta de 1770, no momentoem que a mineração entrava em decadência, oMarquês de Pombal instituiu o Erário Régio e as

 Juntas da Real Fazenda e extinguiu as velhas pro-vedorias, tornando as alfândegas autônomas, des-ligadas da arrecadação dos impostos internos. De-saparecia gradualmente a figura dos Provedores, à

medida que se instalavam as Juntas, ficando elesapenas como Juízes da Alfândega, cargo acessórioque já exerciam.

O século XIX começou com uma transforma-ção radical. A vinda da Família Real para o Brasilresultou na imediata abertura dos portos ao co-mércio internacional. A despeito do esgotamentodas jazidas auríferas, as aduanas voltaram a crescerem número e em movimento. A conjuntura políti-ca vivida pela Coroa lusa, totalmente dependenteda Inglaterra, impôs uma orientação que protegiaexcessivamente os comerciantes ingleses, favoreci-dos por uma tarifa de 15%, enquanto todos os de-mais, inclusive os portugueses, pagavam 24% ad 

valorem . Essa esdrúxula situação só foi totalmentecorrigida em 1826, ano em que se venceu o prazodo tratado firmado com a Inglaterra.

A Regência, apesar dos freqüentes tumultos erebeliões, encontrou tempo para organizar admi-nistrativamente o Império, dotando-o de uma es-trutura governamental centralizada, mas racional.

A Fazenda Pública foi objeto de uma reforma to-tal, entre 1830 e 1832, com a extinção do ErárioRégio, das Juntas e do Conselho da Fazenda, subs-tituídos pelo Tribunal do Tesouro Público e pelas

 Tesourarias Gerais. Criaram-se as Mesas de Ren-das e as Coletorias, ao mesmo tempo em que seaboliam numerosas repartições locais, que já nãotinham razão para existir.

As Alfândegas ganharam finalmente uma novalegislação, para substituir o velho foral da Alfân-dega de Lisboa, de 1587. Em 25 de abril de 1832

foi baixado por decreto o Regulamento das Alfân-degas do Império, substituído por um novo em 22

de junho de 1836. Paralelamente, a Regência cria-va, nos portos onde não houvesse aduana, as Me-sas de Rendas, regulamentadas por decreto de 30de maio de 1836. Os velhos Juízes da Alfândegaforam, em 1834, substituídos pelos Inspetores da

Alfândega.Em 1845, o Ministro da Fazenda, Alves Bran-co, estabelece nova tarifa aduaneira, esboçando umregime protecionista que pouco durou, mas cons-tituiu um marco na história econômica do Brasil.

A grande reforma do Tesouro, em 1850, poucoafetou as alfândegas em si, mas uma importanterepartição foi criada para centralizar a administra-ção tributária, a Diretoria Geral das Rendas Públi-cas, que, com algumas modificações, subsistiu atéa Reforma Aranha, em 1934.

Em 1860, entretanto, um novo Regulamentopara as alfândegas foi baixado pelo decreto n.2647, de 19 de setembro. Em 2 de agosto de1876, esse Regulamento sofreu profundas altera-ções, introduzidas pelo decreto nº 6.272. Foi essediploma legal que serviu de base para a célebreConsolidação das Leis das Alfândegas e Mesas deRendas, mandada executar por uma circular data-da de 24 de abril de 1885. Curiosamente, essaconsolidação fora feita por um funcionário adua-neiro para seu uso pessoal, mas ficara tão perfeitaque o governo a adotara. Posteriormente, ela foiatualizada, chegando até nossos dias com o nomede Nova Consolidação das Leis das Alfândegas eMesas de Rendas, a famosa N.C.L.A.M.A.R.

O café havia reativado o comércio exterior doBrasil na segunda metade do século XIX. O Brasilvoltara a crescer; mais uma vez, as alfândegas iriamdesempenhar um papel decisivo na administraçãofiscal. Apesar do liberalismo dominante, algumastênues medidas protecionistas foram adotadas.

Isso resultou num incremento do contrabando, es-pecialmente na fronteira meridional, no final doséculo, obrigando o governo a criar, no Rio Gran-de do Sul, um Serviço Especial de Repressão aoContrabando, composto de um esquadrão de cava-laria, com mais de uma centena de guardas. A si-tuação ali era tão grave, que eram comuns os tiro-teios entre contrabandistas e guardas aduaneiros,como noticiava, em 3/ 4/ 1912, oDiário Oficial da 

União .A Primeira Guerra Mundial, embaraçando o

comércio marítimo, obrigou o Brasil a produzir esubstituir artigos que não mais podiam ser impor-

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312 h i s t ó r i a d o s T RI BU TO S n O BRASI L4 ª Parte

tados. A industrialização brasileira tomou corpo elogo se tornou irreversível, ainda que em propor-ções modestas. A crise de 1929, também constri-tora do comércio internacional, acabou por bene-ficiar essa tendência industrial, embora a grande

depressão a prejudicasse nos primeiros anos. Aliás,como conseqüência da crise mundial, eclodiu em1930 a Revolução Liberal, que, na verdade, resul-tou numa longa ditadura de cunho nacionalista efascistizante.

Para quebrar a resistência das velhas oligarquiasburocráticas, enquistadas no Ministério da Fazen-da, o Ministro Oswaldo Aranha, em 1934, proce-deu a uma radical reforma na sua estrutura admi-nistrativa, substituindo o Tesouro Nacional pelaDireção Geral da Fazenda Nacional, gigantesco

órgão composto de Departamentos, um dos quaisera o de Rendas Aduaneiras, dando pela primeiravez uma direção especializada para as alfândegas.Essa reforma, necessária do ponto de vista políti-co, era bastante discutível sob o prisma técnico,pois importava na duplicação de órgãos de apoio ena inevitável rivalidade entre os diversos Departa-mentos.

Em 1938, o Brasil já começava a se recuperardos efeitos da crise, mas nova guerra era iminente.Em uma reunião realizada em Teresópolis, o Presi-dente Vargas concluiu uma aliança tácita com oempresariado nacional: a política aduaneira seriaalterada, com a criação de barreiras tarifárias, demodo que a indústria brasileira pudesse se desen-volver sem a competição de produtos importados.A efetiva eclosão da Segunda Guerra Mundial emsetembro de 1939 consolidou tal acordo, lançan-do o país no mais desvairado protecionismo alfan-degário.

Nem o fim do Estado Novo, nem as sucessivas

mudanças na Administração Pública modificaramesse regime de proteção, que perdurou intacto até1964. O governo Castelo Branco liberalizou umpouco as importações, abolindo barreiras admi-nistrativas e cambiais e reduzindo as tarifas fiscais,mas elas foram novamente elevadas, no governoCosta e Silva. Os governos militares que se segui-ram, imbuídos da intenção de modernizar o país epremidos pela crise cambial resultante da elevaçãodos preços do petróleo, não quiseram ou não pu-deram liberalizar mais o nosso comércio exterior.

Pelo contrário, instituíram a reserva de mercadopara a informática e estimularam, através de incen-

tivos fiscais, a produção interna de numerosos se-tores industriais.

Um avanço, entretanto, foi conseguido; o De-creto-Lei n.º 37, de 18 de novembro de 1966, fru-to dos estudos e pesquisas do aduaneiro Oswaldo

da Costa e Silva, chefe de uma das equipes da Co-missão de Reforma do Ministério da Fazenda,substituiu a velha N.C.L.A.M.A.R., dotando nos-sas alfândegas de uma legislação moderna e atuali-zada.

A criação da Secretaria da Receita, em 1968,restabeleceu a racionalidade da organização fiscalfederal, e permitiu ao governo administrar conve-nientemente o complexo sistema de incentivos fis-cais, ao mesmo tempo em que, modernizando osmétodos, conseguiu reprimir, pelo menos em par-

te, a avalanche de contrabando que se despenhavacontra as barreiras protecionistas (um erro come-tido na criação da S.R.F., abolir o nome ‘alfânde-ga’, só agora foi reparado, com a implantação dosistema de controle aduaneiro; o cargo de ‘inspetorda alfândega’, que fora substituído, poucos diasantes da instalação da Receita, pelo de ‘adminis-trador da alfândega’, e logo depois pelos Inspeto-res e Delegados da Receita Federal, também foirestabelecido). Além disso, o endividamento exter-no causado pela crise do petróleo forçou o país amultiplicar as exportações; conseqüentemente,também aumentaram, embora em menor grau, asimportações. O saldo obtido, necessário para opagamento dos juros e amortizações da dívida ex-terna, passou a gerar efeitos inflacionários e a ser-vir de motivo para críticas estrangeiras, desejosasde que ele fosse usado para importações.

Ao mesmo tempo, esse regime protecionistaestimulou também o descaminho, forçando a cria-ção, em 1977, de um órgão especializado, a Co-

missão de Planejamento e Coordenação de Com-bate ao Contrabando – COPLANC. Em 1988 seimplantou a Coordenação do Sistema de Contro-le Aduaneiro, num reconhecimento claro das ne-cessidades geradas pelo incremento do comércioexterior.

Foi a partir do governo Collor, empossado em1990, que se tentou realmente uma completa aber-tura dos portos aos produtos manufaturados es-trangeiros. O assunto, entretanto, é delicado e en-volve sérias discussões, pois países que realizaram

política semelhante estão colhendo resultadoscontraditórios, como a baixa da inflação à custa de

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desemprego em massa, sucateamento de seus par-ques industriais e graves conflitos sociais. Mesmoo Mercado Comum Europeu, considerado como amais brilhante experiência de cooperação econô-mica internacional, já é visto hoje, por alguns,

como sendo na verdade uma gigantesca muralhaaduaneira em torno dos consumidores europeus.As Américas reagiram a esse fechamento dos

portos europeus com a criação de mecanismos se-melhantes, o NAFTA, liderado pelos EstadosUnidos, e o MERCOSUL, integrado pelo Brasil,Argentina, Paraguai e Uruguai. É paradoxal que oneoliberalismo tenha levado à criação dessas gi-gantescas alianças alfandegárias. Parecemos mar-char não para um mundo de livre comércio, maspara um planeta dividido em blocos aduaneiros.

Mas, isso pertence ao futuro, e a História nãotrata do futuro.”

Site Receita Federal (receita.fazenda.gov.br).

313a n e x o s

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314 H i st ó r i a d o s t r i b u t o s n o b r a s i l

CONSELHO DE REPRESENTANTES:

Paulo Roberto BuenoErnesto Ricca Filho (Sede)Glades Sumilda ZarzaAntônio Blanco ArcasDurvail Soares PompeoAntônio Celso PereiraCarlos Alberto Ayres PereiraIda Rosa de Góis (Capital)Arildo Goulart da MaiaFlávio Werneck Rebelo de Sampaio (DRT-2)Fábio J. Regueira Alves

Alberto Seiji Yugue (DRT-3)Eduardo MartinsIracy Mario G. Mezzena (DRT-4)Antônio CândidoMariza Grella VieiraLuiz Carlos Del Greco (DRT-5)Arlindo Ferreira de AragãoSamuel Celso CrysóstomoUrbano Montero Martinez (DRT-6)Maristela Lemos de Almeida Gebara

 José Roberto Ottoboni (DRT-7) José Aparecido Sioca João Dias Yanes (DRT-8)Gilberto Antonio de OliveiraGervásio Antonio Consolaro (DRT-9)Osvaldo Santos de CarvalhoOdilo Sossoloti (DRT-10)Heitor Okuma

 José Carlos Cardoso Souza (DRT-11)Nilo Calandria Ponce (DRT-12)Eugênio Evandro Fernandes

Raimundo Bispo Teles (DRT-13)Paulo Eduardo ForestiVicente Scardovelli (DRT-14)Lisandro Augusto Ribeiro do Amaral

 João Zana (DRT-15)Antonio Fernando Guimarães PaimSalimJoão Tannus (DRT-16)

SUPLENTESDO CONSELHO DE REPRESENTANTES:

Adherbal Silva PompeoAdolfo Lemes Gilioli JuniorAntonio Sérgio Gomes ValenteValdir Salles TrighetasValéria Aparecida BaciegaEliana M.P. Ferreira de Oliveira

 Jorge Augusto DinizMaria Vanda RodriguesRenato Abreu de FreitasLuiz G. Medeiros da Silva

 Teodoro Tadeu de Carvalho Kupper

 Jonas Verano PontesNazimAntonioRoberto Lima Wurmli

 Josué de OliveiraCélio Almeida ChavesFátima Aparecida de Carvalho Rosa

 Tânia G. Moura Borges de MendonçaEdson Pereira Bueno LealBenedito Felipe de SouzaLuiz Carlos da CostaGilson Manoel do CoutoMarco Antonio CalderaroGilberto Ricoboni

 José Antonio FrancisquiniGilmar Domingos Macarini

 José Carlos Miguel de MendonçaLuiz Carlos da SilvaValdiney Gomes dos SantosWaldemar dos Santos

 José Antonio NascimbemAlda Matias Lopes

Eran ManuchakianRoberto Luiz MartheMarcelo Fairbanks CesconLeniro da Fonseca

 José Eduardo LemeIsaias Domingos Sartor

Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo

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Fo n t e s e b i b l i o g r a f i a

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1 M APPAMUNDI , Universallis Cosmographia SecundumPtolomaei Traditionemet Americi VespucciAliornunqueIllustrationes, Saint-Dié, 1507, gravura,

228,5x125,5 cm, fac símile; Département des Carteset Plans dela BibliothéqueNationale. Paris, França GEcc 1574, pl. 4.

 2 [ Í NDIOS E NCONTRANDO N AVEGANTES  ] . In Staden,Hans, WarhaftigeHistoria vnd Deschreibeng eynerLandtschafft...Gedruckt zu Marpurg,1557; gravura.São Paulo, Coleção Guita eJoséMindlin.

 3 Carta dePero Vaz deCaminha a D. Manuel I, 1º demaio de1500;M ANUSCRITO . Lisboa, ArquivoNacional da Torredo Tombo.

 4

Lopo Homem,T ERRA B RASILIS , mapa do Atlas Miller,1515-1519; manuscrito iluminado sobrepergaminho,41,5 x 59 cm. Département des Cartes et Plans delaBibliothéqueNationale. Paris, França.

 5 Moedas portuguesas, cruzado emouro deD. João II;tostão emprata deD. Manuel I; meio tostão edoisvinténs deD. João IV; dez réis emcobredeD. JoãoIII; vintémeceitil deD. Manuel I. Rio deJaneiro,Museu deValores do Banco Central do Brasil.

6  Capitania deSão Vicente, João Teixeira Albernaz,cosmógrafo deSua Majestade, Lisboa, 1631; cópia doATLAS DO E STADO DO B RASIL por M. Queirós, 1944,390 x 610 mm. São Paulo, Museu Paulista daUniversidadedeSão Paulo.

7  R OTEIRO DE T ODOS OS S INAIS , C ONHECIMENTOS ,

F UNDOS , B AIXOS , ALTURAS E D ERROTAS QUE HÁ NA

C OSTA DO B RASIL DESDE O C ABO DE S ÃO AGOSTINHO 

ATÉO E STREITO DE F ERNÃO DE M AGALHÃES , atribuídoa Luís Teixeira. Lisboa, Biblioteca da Ajuda.

8 P RAEFECTURAE P ERNAMBUCAE PARS B OREALIS UNA

CUM P RAEFECTURA DE I TAMARACA. In Barléus, Gaspar.Rerumper Octeniumin Brasilaeet...Amstelodami, Typographeio Ioanis Blaev, 1647; gravura. São Paulo,Coleção Guita eJoséMindlin.

 9 Antonio Castelo Branco:B ORRADOR EM QUE LANÇO 

TODAS AS CARTAS QUE ESCREVO , PRINCIPIADO EM 

AGOSTO DE 1742, ESTANDO NA B AHIA, SÉCULO 

XVIII , manuscrito. São Paulo, Coleção Guita eJoséMindlin.

10 Cruzado deouro D. Manuel; real deprata D. Manuel;dobra de16 escudos deouro, 1731, D João V; 7500réis deouro, 1826, D. Pedro IV; tostão deprata,1827, D. Pedro IV; 20.000 réis contramarcado emouro, 1727, D. Maria II. Rio deJaneiro, MuseuHistórico Nacional.

11 LISBOA ANTES E D URANTE O T ERREMOTO ; séculoXVIII; gravura deMateus Sautter. Lisboa, Museuda Cidade.

12 Carimbos de4 e400 sobre4 cruzados deD. João III;carimbo de500 sobre400 réis deD. João IV; carimbo250 sobre200 réis deD. João III; carimbo de100sobremeio-tostão marcado 75; carimbo 75 sobremeio-tostão dos Filipes. Rio deJaneiro, MuseuHistórico Nacional.

13 Despesas da Família Real nos anos de1842 e1843relacionadas a somas gastas comcasamentos depríncipes, nos valores de150:000$000 e100:000$00.InO B ALANÇO DA D YNASTIA...OFFERECIDO AO 

G OVERNO P ROVISÓRIO DOS E STADOS U NIDOS DO 

B RAZIL POR J. S. B OTAFOGO . Rio deJaneiro, ImprensaNacional, 1890. São Paulo, Coleção Particular.

14 Frans Post,P AISAGEM COM P LANTAÇÃO , 1668; óleosobretela, 71,5 x 91,5 cm. Rotterdam, MuseumBoijmans Van Beuningen.

15 ALAGUA AD ... In Montanus, Arnoldus. DeNieuweenOnbekend Weereld..., en beschereeven Door ArnoldusMontanus. Amsterdam, by Jacob Meurs...,in destadMeMeurs, 1671; gravura. São Paulo, Coleção Guita e JoséMindlin.

16   Johann Moritz Rugendas,P REPARAÇÃO D OMÉSTICA DA

F ARINHA DE M ANDIOCA. In Voyagepittoresquedans leBrésil, par MauriceRugendas; traduit del’allemand parmr. Colbery[...]. Paris, Engelmann & Cie., 1835;aquarela. São Paulo, Coleção Guita eJoséMindlin.

17  Leandro Joaquim,P ESCA DA B ALEIA, c. 1790, painelelíptico, 1.00 x 1.20 cm. Rio deJaneiro, MuseuNacional deBelas-Artes.

18 M APA DO C ABO DE S ANTO AGOSTINHO NO 

SÉCULO XVII , fac-símile, (s.d.). São Paulo,Biblioteca Municipal Mário deAndrade.

19 F ELIPE II , R EI DE  E SPANHA, E I DE P ORTUGAL, s.d.,buril . Rio deJaneiro, Fundação Biblioteca Nacional.

 20 Conquistas portuguesas. InC IVITAS O RBIS T ERRARUM ,deGeorgius Braunius eFranz Hohemberg, vol. I,Colônia, 1572.

 21 S T . S EBASTI EN V ILLE E PISCOPALE DU B RÉSIL. R IVIERE 

DE J ANEYRO . In Froger, Relation d’un Voyagefait en1695, 1696 & 1697, aux Cotes d’Afrique, Détroit deMagellan, Brezil, Cayenne& Illes Antilles, Paris,Michel Brunet, 1698. São Paulo, Coleção Guita eJoséMindlin.

319

C r é d i t o s i l u s t r a ç õ e s

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 22 PadreAntonio Vieira. Frontispício deO BRAS DO 

G RANDE PADRE ANTONIO V IEYRA DA C OMPANHIA DE 

J ESUS . T. I: A P ARIZ CHEZ S PÉRUE S T . J ACQUES ELA

V ISITATION , s.d. (manuscrito). São Paulo, ColeçãoGuita eJoséMindlin.

 23 Maurício deNassau. In Barléus, Gaspar.R ERUM PER 

O CTENIUM IN B RASILI AE ET ... Amstelodami, Typographeio Ioannis Blaev, 1647, gravura emcobre.Rio deJaneiro, Fundação Biblioteca Nacional.

 24 Moedas obsidionais holandesas: XII florins, ouro,1645; VI florins, ouro, 1645; III florins, ouro, 1645;III florins, ouro, 1646; XXXX soldos, prata, 1654.Rio deJaneiro, Museu Histórico Nacional.

 25  JoséWasth Rodrigues,P AÇO M UNICIPAL DE S ÃO 

P AULO EM 1628 , 1920, óleo sobretela, 100 x 755mm. São Paulo, Museu Paulista da UniversidadedeSão Paulo.

 26  Loius Michael Van Loo,S EBASTIÃO J OSÉDE C ARVALHO 

E M ELO , M ARQUÊS DE P OMBAL, 1766; óleo sobretela.Oeiras, Câmara Municipal deOeiras, Portugal.

 27  R ETRATO DE D. M ARIA I , final do século XVIII; , óleosobretela; 0,978 x 0, 752 m. Mariana, MuseuArquidiocesano deMariana.

 28  JoséWasth Rodrigues,D RAGÕES R EAIS DAS M INAS 

G ERAIS , 1730; aquarela. In Uniformes do exércitobrasileiro: 1730-1889. Rio deJaneiro, MuseuHistórico Nacional.

 29 Frontispício daV IAGEM FILOSÓFICA ÀSCAPITANIAS 

DO G RÃO -P ARÁ , Rio Negro, Mato Grosso eCuiabá(1783-1792). Rio deJaneiro, Fundação BibliotecaNacional.

 30  Jean BaptisteDebret,P OBRESTROPEIROS DE S ÃO 

P AULO . In Voyagepittoresqueet historiqueauBrésil...Firmim– Didot frères. Paris, 1834; aquarela.São Paulo, Coleção Guita eJoséMindlin.

 31 N OSSA S ENHORA DO R OSÁRIO , século XVIII, Paracatu,Minas Gerais; madeira entalhada, policromada,estofada, edourada, 2,02 m. Ouro Preto, Museu da

Inconfidência. 32 AUTOS CRIMES – J UÍZO DA C OMISSÃO CONTRA OS 

RÉUS ECLESIÁSTICOS DA C ONJURAÇÃO FORMADA EM 

M INAS G ERAIS , 1791. Ouro Preto, Museu daInconfidência.

 33 [ E CLESIÁSTI COS  ] . In Buvelot, L. & Moureau, Auguste.Rio deJaneiro pitoresco, 1842; aquarela. São Paulo,Coleção Guita eJoséMindlin.

 34 Fachada da Casa deCâmara deCadeia deMariana,Minas Gerais. Brasília, Secretaria do PatrimônioHistórico eArtístico Nacional.

 35 Fachada da Casa deCâmara deCadeia deGoiás,Goiás. Brasília, Secretaria do Patrimônio Histórico eArtístico Nacional.

 36  M APA DE LAVRAS EM M INAS G ERAIS , século XVIII;aquarela. São Paulo, Coleção Guita eJoséMindlin.

 37  Casa deresidência do CondedeAssumar, Vila doRibeirão do Carmo (Mariana). Mariana, Minas Gerais.

 38 Instrumentos deextração, fundição, aferição etransportedeouro, alguns provenientes da antiga CasadeFundição deVila Rica (Ouro Preto). Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

 39 Barras deouro (quinto), Mato Grosso, século XVIII;Minas Gerais eGoiás, século XIX. Rio deJaneiro,Museu Histórico Nacional.

 4 0 Guia ebarra deouro, 1814; ouro, Casa deFundiçãodeSabará. Rio deJaneiro, Museu Histórico Nacional.

 4 1 Olhos deboi, 1º selo postal brasileiro, gravados naCasa da Moeda do Rio deJaneiro emchapas decobreeemitidos nos valores de30, 60 e90 réis; 1843 . RiodeJaneiro, Museu Histórico Nacional.

 4 2 Livro deregistros debilhetes passados para pagamentodejornais deescravos à Real Extração do Diamantes,1787. Rio deJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

 4 3 Atestado deOuvidor eCorregedor da Comarca dosRio das Mortes, Inácio JosédeAlvarenga (fazendeiro eminerador), a João Batista da Motta, na Vila deSão João, a 19 deoutubro de1777. Ouro Preto, Museu daInconfidência.

 4 4 Bilheteda Casa da Administração Geral dosDiamantes, Tijuco, 1779; cento evinteoitavas.Intendência dos Diamantes eReal Extração. Rio de Janeiro, Museu Histórico Nacional.

 4 5  John Mawe,V ISTA DE NEGROS LAVANDO DIAMANTES 

NO RIO J EQUITINHONHA NO C ERRO DO F RIO , Brazil.In Travels in theinterior of Brazil particularly in thegold and diamond districts of that country... London.Printed for Longman, Hurst, Rees, Orme, and Brown,Paternoster-Row, 1812; gravura. São Paulo, ColeçãoGuita eJoséMindlin.

 4 6  Residência do contratador João Rodrigues deMacedo,hojeCasa dos Contos, emOuro Preto. Casa dosContos – Escola deAdministração Fazendária, OuroPreto.

 4 7  ApólicedeDívida de400$00, ao Sargento-morAntonio Joséda Costa, assinada por JoaquimFranciscodeSeixas Sotomaior, deputado da Junta da RealFazenda, de16 demaio de1797. Rio deJaneiro,Museu da Fazenda Federal.

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8 0 Louis Guedy, J OSÉ M ARIA DA S I LVA P ARANHOS ,

V ISCONDE DO R IO B RANCO , s.d.; óleo sobretela.Rio deJaneiro, Museu Histórico do Ministério dasRelações Exteriores/ Itamaraty.

8 1 E TIQUETA PARA TECIDOS REGISTRADO PELA C IA.

P ETROPOLI TANA, 1888. Rio deJaneiro, ArquivoNacional/ Ministério da Justiça.

8 2 Armand Pallière,C HAFARIZ DAS M ARRECAS ,cerca 1830; aquarela. Rio deJaneiro,Museu Histórico Nacional.

83 Cédula de50.000 réis, Bahia. Rio deJaneiro, MuseudeValores do Banco Central do Brasil.

84 C AFÉDU B RÉSIL. In A Gazeta, 1929, São Paulo,Biblioteca Municipal Mário deAndrade.

8 5 Sobrado do comendador Luciano JosédeAlmeida,Bananal, SP. Brasília, IPHAN.

8 6  C ONSTITUIÇÃO DA R EPÚBLICA, 1891. Rio deJaneiro,Ministério da Justiça/ Arquivo Nacional.

8 7  Selos: (2) 15 mil, (2) 50 mil réis, 1 mil réis,(2) 200 réis; Imposto do Fumo, 10 réis; SeloPenitenciário Cr$ 100; Imposto SaúdeCr$ 1,50;Imposto deConsumo CR$ 1.000,00. Rio deJaneiro,Museu da Fazenda Federal.

8 8  Telegrama referenteao decreto 7562, de30 desetembro de1909 acerca do contrato para construçãoda Estrada deFerro deGoiás, assinado pelo presidenteNilo Peçanha, Francisco Sá eministro da FazendaLeopoldo Bulhões, 1909. Rio deJaneiro, Museu daReceita Federal.

8 9 C ONTRATO PARA CONSTRUÇÃO DA E STRADA DE F ERRO 

O ESTE DE M INAS ENTRE R OTHSCHILD AND S ONS 

E O G OVERNO B RASILEIRO , 1891. Rio deJaneiro,Museu da Fazenda Federal.

 90 Promissória no valor de28 contos, 329 mil e789 réis,assinada por Campos Sales emnomedeManuela Joaquina deMoraes, analfabeta, Campinas, São Paulo,18 dejulho de1872. Rio deJaneiro, Museu daRepública.

 91 J OAQUIM M URTINHO , M INISTRO DA F AZENDA DO 

GOVERNO C AMPOS S ALES , s. d. Rio deJaneiro,Museu da República.

 92 Selos: (2) 500 réis, 1 mil réis, (2) 30 réis, (2) 400réis. Rio deJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

 93 Brasil 77 1,30 comcarimbo da Inspetoria da ReceitaFederal, 2 mil réis, (2) 3 mil réis. Rio deJaneiro,Museu da Fazenda Federal.

 94 ALEGORIA DA R EPÚBLICA, óleo sobretela, 1889.São Paulo, Fundação Maria Luíza eOscar Americano.

 95 C ERTIFICATE OF S HARE . C AUTELA DE AÇÃO S ÃO 

P AULO B RAZILIAN R AI LWAY C OMPANY ,

CORRESPONDENTE À EMISSÃO DE B ARÃO DE M AUÁ ,1860, para arrecadar recursos para construção daestrada deferro Santos – Jundiaí. Coleção NoronhaAdvogados/ SP

 96  Estado da Bahia,B ALANCETE DA R ECEITA E D ESPESA

DA C OLETORIA F EDERAL DE S ANTA M ARIA DA

V I TÓRIA, OUTUBRO , NOVEMBRO E DEZEMBRO ; M ODELO 

N º 2 ANEXO ÀS INSTRUÇÕESPARA AS COLETORIAS ;1905. Rio deJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

 97  Duplicatas deempréstimos no valor de2146 librasesterlinas de1908 ede4200 libras esterlinas de1911.Rio deJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

 98 Imposto sobreCapital Realizado das EmpresasIndustriais eSociedades Anônimas, TheSP TranswayLight and Procter Cie. Limited, exercício de1910. Rio

deJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

 99 GuilhermeGaensly, ArmazémdecaféTelles Quirino,Santos, São Paulo 1901/ 1910. Prefeitura doMunicípio deSão Paulo, Secretaria Municipal deCultura, Departamento dePatrimônio Histórico –Arquivo deNegativos.

10 0 A C IGARRA, ano 1932, número 426, 1932. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas/ CPDOC.

10 1 Nita Ney eLuiz Soroa emBraza Dormida, direção deHumberto Mauro, 1929. São Paulo, Cinemateca

Brasileira.10 2 Recibo depagamento deimposto derenda do Conde

Francisco Matarazzo, 1926. Rio deJaneiro, Museu daFazenda Federal.

10 3 Ficha Estatística Pessoa Jurídica, 1910. Rio deJaneiro,Museu da Fazenda Federal.

10 4 Delegacia Geral do Imposto sobrea Renda, Secção deRevisão, Pedido deesclarecimento a Antonio ManuelBueno deAndrade, Rio deJaneiro, 5 defevereiro de1932. Rio deJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

10 5 Circular nº 11, Tesouraria da Fazenda da Província deMinas, Ouro Preto, referenteaos balancetes mensais,assinada por JoséA. Pereira da Costa, 4 dejulho de1872. Rio deJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

10 6  Circular nº 1 de3/ 01/1922, para cumprimento daLei 4440 de31 dedezembro de1921. Rio deJaneiro,Museu da Fazenda Federal.

10 7  Livro deescrituração do Imposto deConsumo deEnergia Elétrica, da Coletoria das Rendas Federais emCabreúva, Estado deSão Paulo, da Empresa Luz eForça deCabreúva, 1930. Rio deJaneiro, Museu daFazenda Federal.

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10 8 Apóliceda dívida pública, 1870, Emissão D. Pedro II.São Paulo, Coleção Noronha Advogados.

10 9 Rui Barbosa, c. 1920. Rio deJaneiro, Fundação CasadeRui Barbosa.

110  Telegrama deautorização para assinatura decontrato

deummilhão delibras esterlinas comRotschild andSons, referenteàs Lei 25 de30 desetembro de1891 e36 de26 dejaneiro de1892 assinado pelo ministro daFazenda Rodrigues Alves, 2 dejunho de1892.Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

111 Declaração deImposto deRendimentos 1939/1940,Modelo dedeclaração derendimentos 1970, Modelodedeclaração derendimentos, 1959, Modelo dedeclaração derendimentos, 1999, Carnês- Leão deImposto sobrea Renda, década de1980. Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

112Pereira Passos inaugurando trecho deobras na RuaSetedeSetembro entrea Avenida Central ea Rua 1ºdeMarço, Rio deJaneiro, 06/09/1900. Rio de Janeiro, Museu da República.

113 Benedito J. Duarte, Rua 15 deNovembro esquina comRua Direita, Largo da Séemdireção à Praça AntonioPrado, 1910/ 1912. Prefeitura do Município deSãoPaulo, Secretaria Municipal deCultura, DepartamentodePatrimônio Histórico – Arquivo deNegativos.

114 Washington Luís, presidenteda República, c. 1930.Rio deJaneiro, Museu da República.

115 Carta deGetúlio Vargas, Ministro dos Negócios daFazenda, ao Delegado do Tesouro Nacional emLondres acerca detítulos resgatados deRothschild andSons, 11 denovembro de1927. Rio deJaneiro, Museuda Fazenda Federal.

116  PresidenteGetúlio Vargas, General Miguel Costa (àesquerda) eCoronel Góes Monteiro, chefedo EstadoMaior das Forças Revolucionárias, no carro ferroviáriopresidencial a caminho deSão Paulo. InR EVISTA DA

S EMANA, anno XXXI, número 47, 8 denovembro de1930. São Paulo, Biblioteca Municipal Mário deAndrade.

117  Apóliceda Dívida Interna do Estado deMinas Geraisno valor de200$00, 1934. Rio deJaneiro, Museu daFazenda Federal.

118 Fábrica Nacional deMotores, município deDuquedeCaxias, Rio deJaneiro, inicialmenteprojetada paraconstruir aviões, mas fabricando caminhões, c. 1942.Rio deJaneiro, Fundação Getúlio Vargas/CPDOC.

119 Nota deimportação dequerosenefrancês, 1953. RiodeJaneiro, Museu da Fazenda Federal.

120 Recebedoria Federal deSão Paulo, Patentes deregistro

decomércio a varejo, 1940. Rio deJaneiro, Museu daFazenda Federal.

121 Decreto-Lei nº 2416 de17 dejulho de1940, queaprova a codificação das normas financeiras paraEstados eMunicípios. Rio deJaneiro, Ministério da Justiça/ Arquivo Nacional.

122 Mendez, Getúlio Vargas eZéAmérico. InO M ALHO ,ano XLIII, número 63, abril de1945. São Paulo,Biblioteca Municipal Mário deAndrade.

123 Decreto-Lei 4789, de5 deoutubro de1942,Obrigação deguerra, no valor nominal deCr$ 100,00,1942. Rio deJaneiro, Museu da Receita Federal.

124 Nota do índio, 3ª estampa do valor de5 cruzeiros.Rio deJaneiro, Museu deValores do Banco Centraldo Brasil.

125 Emenda Constitucional número 3, 1961. Rio de Janeiro, Ministério da Justiça/ Arquivo Nacional.

126  Campanha deJuscelino Kubtischek à presidência da

República: Santiago Dantas, Juscelino, BeneditoValadares eErnani do Amaral Peixoto, 1955.Rio deJaneiro, Fundação Getúlio Vargas/ CPDOC.

127  Construção da Câmara eSenado federais, Brasília,1959. Agência JB/RJ

128  Jânio Quadros discursando na inauguração da escoladeMetalurgia emVolta Redonda, 1961. WalterFirmo/Agência JB.

129 Deposição deJoão Goulart, Rio deJaneiro. 1/ 4/64.EquipeJB/Agência JB.

130 Usina Hidrelétrica deItaipu, Foz do Iguaçu,15/3/1992. Marcelo Theobald/ Agência JB.

131 Rodovia Transamazônica, 04/ 12/ 1974. Agência JB/ RJ

132 Correspondência do Banco Central do Brasil àRecebedoria Federal do estado da Guanabara sobrecédulas falsas de1000 cruzeiros, 1963 . Rio de Janeiro, Museu da Fazenda Federal.

133 Selo Imposto deconsumo não oficial “Export”utilizado emcigarros vendidos por camelôs emSãoPaulo, evidenciando sonegação fiscal.

134 Selo oficial deImposto sobreProdutosIndustrializados (IPI), ControleClasseIII-R.

135 Cédulas queimadas nos fornos do Banco Central,22/05/1994. Evandro Teixeira/ Agência JB.

136  Comício pelas eleições Diretas 84, Candelária, Rio de Janeiro, 11/ 4/ 1984. Vidal da Trindade/ Agência JB.

137   Tancredo Neves, presidenteeleito, anuncia seu gabineteministerial, 12/3/ 1985. Luciano Andrade/ Agência JB.

138 Promulgação da Constituição, Brasília, DF,5/10/ 1988. Moreira Mariz/ Agência JB.

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139 Camelô Luiz Américo segurando cédulas decruzados,cruzados novos ecruzeiros, Rio deJaneiro,2/12/1990. Ricardo Leoni / Agência JB.

14 0 Paulo Cesar Vieira resgata seus cruzeiros bloqueados,Rio deJaneiro, 16/09/1991. Marcelo Régua/ Agência JB.

14 1 AliceMisselino segurando cédulas dereais, CineEstação Botafogo, Rio deJaneiro, 28/06/1996.Sandra deSouza/ Agência JB.

14 2 Alves Josédos Santos Macedo , funcionário da fábricada Pirelli emFeira deSantana, Bahia, 26/ 6/ 97.Roberto Setton / Agência Estado.

14 3 Modelo defatura deserviços prestados detalhada daEmpresa Brasileira deTelecomunicações-Embratel,especificando alíquotas decobrança deimpostosICMS ePIS/Confins. Rio deJaneiro, Empresa

Brasileira deTelecomunicações.14 4 Sitedecompras do Grupo Pão deAçúcar pela

Internet, Sitedebuscas ecompras Yahoo! ,Internet,Sitedebuscas ecompras Yahoo! Brasil, Internet, Sitedebuscas ecompras deimóveis emóveis, Internet.

14 5 Supermercado Zona Sul, Rio deJaneiro, cupomfiscalcomtaxação de18% sobreproduto alimentício.FNAC Brasil Ltda., cupomfiscal detransaçãocomercial semincidência deimposto ICMS.

14 6  Primeira reunião da Comissão deControleda GestãoFiscal: Ministro Pedro Malan, Pedro Parente, Everardo

Maciel, Martus Tavares, Eduardo Guimarães eoutros,16/09/ 1998. Gilberto Alves/ Agência JB.

147  Moedas de1, 5, 10, 25 centavos eR$ 1,00.

14 8 Nota deR$ 10,00 comemorativa dos 500 anos dodescobrimento do Brasil.

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