literatura indÍgena, memÓria e resistÊncia: a casa-universo na obra de gabriel gentil e luÍs...

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 Literatura indígena, memória e resistência: A Casa-universo na obra de Gabriel Gentil e Luís Lana Larissa Lacerda Menendez 133 LITERATURA INDÍGEN A MEMÓRIA E RESISTÊNCIA: A CASA-UNIVERSO NA OBRA DE GABRIEL GENTIL E LUÍS LANA Larissa Lacerda Menendez (UFMT) RESUMO: Neste artigo, buscamos analisar o simbolismo da casa nas culturas tukano e desana, a partir de narrativas míticas publicadas por autores indígenas dessas etnias. Como recurso metodológico, utilizamos a análise interpretativa a partir da perspectiva teórica da decolonialidade. A principal contribuição do estudo está na elucidação do simbolismo da maloca. Concluimos que esta é, portanto, ressignificada e resiste ao tempo, através da evocação das memórias. PALAVRAS-CHAVE: Literatura indígena, literatura Tukano e Desana, mitologia INDIGENOUS LITERATURE MEMORY AND RESISTANCE: THE UNIVERSE- HOUSE IN WORKS BY GABRIEL GENTIL AND LUÍS LANA  ABSTRACT:  This paper is intended to analyze the symbolism of the house in the Tukano and Desana cultures, based on the mythic narratives published by indigenous authors of these ethnicities. As a methodological resource, we use the interpretative analysis from the theoretical perspective of decoloniality. The main contribution of this study is to elucidate the symbolism of the maloca. We conclude that this symbol is re-signified and withstands time by evo king memories. KEYWORDS: Indigenous literature, Tukanoan and Desana literature, mythology

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Artigo publicado na revista Polifonia, UFMT

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  • Literatura indgena, memria e resistncia: A Casa-universo na obra de

    Gabriel Gentil e Lus Lana

    Larissa Lacerda Menendez

    133

    LITERATURA INDGENA, MEMRIA E RESISTNCIA: A CASA-UNIVERSO

    NA OBRA DE GABRIEL GENTIL E LUS LANA

    Larissa Lacerda Menendez (UFMT)

    RESUMO: Neste artigo, buscamos analisar o simbolismo da casa nas culturas tukano e

    desana, a partir de narrativas mticas publicadas por autores indgenas dessas etnias.

    Como recurso metodolgico, utilizamos a anlise interpretativa a partir da perspectiva

    terica da decolonialidade. A principal contribuio do estudo est na elucidao do

    simbolismo da maloca. Concluimos que esta , portanto, ressignificada e resiste ao

    tempo, atravs da evocao das memrias.

    PALAVRAS-CHAVE: Literatura indgena, literatura Tukano e Desana, mitologia

    INDIGENOUS LITERATURE, MEMORY AND RESISTANCE: THE UNIVERSE-

    HOUSE IN WORKS BY GABRIEL GENTIL AND LUS LANA

    ABSTRACT: This paper is intended to analyze the symbolism of the house in the

    Tukano and Desana cultures, based on the mythic narratives published by indigenous

    authors of these ethnicities. As a methodological resource, we use the interpretative

    analysis from the theoretical perspective of decoloniality. The main contribution of

    this study is to elucidate the symbolism of the maloca. We conclude that this symbol

    is re-signified and withstands time by evoking memories.

    KEYWORDS: Indigenous literature, Tukanoan and Desana literature, mythology

  • Polifonia, Cuiab, MT, v. 21, n. 30, p. 133-150, jul-dez., 2014

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    Introduo

    Neste artigo buscamos analisar a obra literria, oriunda da produo dos

    escritores indgenas Gabriel Gentil (etnia Tukano) e Lus Lana, (cujo nome

    indgena Toramu Kehiri, etnia Desana), enfocando a simbologia da casa,

    tambm denominada maloca, que uma construo tradicional dos povos

    Tukano e Desana, da regio do Alto Rio Negro, no Amazonas. A construo da

    casa, assim como sua estrutura arquitetnica, apresenta-se repleta de

    significados no universo mtico-ritual abordado nas obras desses autores.

    A publicao de obras de autoria indgena constitui-se de modo ainda

    tmido quando pensamos na imensa diversidade cultural dos povos do Brasil e

    do seu potencial. Atualmente, a populao indgena soma aproximadamente

    305 povos e 274 lnguas. As diversificadas etnias expressam, a partir da arte,

    como tambm das narrativas mticas, outras vises sobre a vida e sobre o

    mundo. Alm de proporcionar outras perspectivas, tais publicaes

    constituem-se como meios de afirmao cultural, poltica e, sobretudo,

    epistmica, visto que resistem aos moldes culturais pr-estabelecidos pela

    sociedade colonialista.

    O movimento indgena, apoiado por organizaes e composto por

    lideranas, artistas, intelectuais de diferentes etnias, conquistou direitos nas

    esferas das polticas pblicas. Dentre eles, pode-se destacar o direito educao

    indgena, que garantiu aos povos indgenas brasileiros o acesso ao ensino

    bilngue e intercultural, aps a promulgao da Constituio Federal, em 1988.

    Paralelamente aos subsdios assegurados por lei para implementao de

    polticas de afirmao identitria, assistimos disputa pela terra, acirrada por

    conflitos entre interesses desenvolvimentistas e modos de vida tradicionais,

    evidenciando a desigualdade, violncia e racismo a que essas populaes esto

    submetidas.

    Embora o Brasil seja juridicamente reconhecido como um pas

    pluritnico e multicultural, tambm se observa que os estabelecimentos de

    ensino privilegiam a viso eurocntrica em todas as reas de conhecimento. A

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    Gabriel Gentil e Lus Lana

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    fim de valorizar a diversidade cultural brasileira, a lei 11645/08 estabelece a

    obrigatoriedade de ensinar, em instituies educacionais de todos os nveis, a

    histria e cultura afro-brasileira, africana e indgena, principalmente nas reas

    de literatura e artes.

    Ainda h poucos projetos e iniciativas que contribuam efetivamente para

    a implementao dessa lei. necessrio assegurar o acesso informao de

    qualidade para aqueles que necessitam desenvolver trabalhos e desejam

    sensibilizar a sociedade em relao s culturas indgenas. A literatura indgena,

    nesse contexto, constitui-se como material importante para a tessitura de

    saberes que contemplem diversas perspectivas de mundo, alm da colonial.

    No cenrio literrio, h a promoo de encontros de escritores indgenas

    e diversas publicaes que ajudam a divulgar as culturas das distintas etnias

    brasileiras. Podemos citar como breves exemplos a criao do Ncleo de

    Escritores e Artistas Indgenas (NEArIn), vinculado ao Instituto Indgena

    Brasileiro para Propriedade Intelectual (INBRAPI), criado por ocasio do I

    Encontro Nacional de Escritores Indgenas, ocorrido no ano de 2003, no Rio de

    Janeiro.

    Iniciativas como essa proporcionaram a divulgao do trabalho de vrios

    escritores indgenas, como Ailton Krenak, Daniel Munduruku, Olivio Jekup,

    Lus Gomes Lana, Gabriel Gentil.

    A coleo Narradores indgenas do Rio Negro, cuja primeira publicao

    ocorreu em 1995, com o livro Antes o mundo no existia, de Toramu Kehiri e

    Umusi Parokumu, feita em parceria com a Federao das Organizaes

    Indgenas do Rio Negro, desdobrou-se em mais oito publicaes de autoria dos

    povos do noroeste amaznico, e um exemplo de produes da atualidade. Essa

    coleo constituda por narrativas dos mitos cosmognicos, sob a perspectiva

    das etnias Tukano, Desana, Oy, Baniwa, entre outros. Nela se inserem as obras

    dos autores indgenas que analisaremos no presente artigo.

    Em La idea de Amrica Latina (2005), Mignolo aponta paradigmas

    eurocntricos que norteiam as instituies, as polticas e os saberes e afirma que

    a modernidade, os pensadores europeus e seus conceitos foram transplantados

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    para os pases colonizados e impostos como verdades universais. Desse modo,

    revelam-se as relaes desiguais que constituem a sociedade. Assim, essa

    produo literria revela uma viso de mundo diferente daquela trazida pelos

    europeus.

    O continente americano existe como consequncia da expanso

    colonial europeia e os relatos dessa expanso so do ponto de

    vista europeu, da perspectiva da modernidade. (MIGNOLO,

    2005, p. 9)

    A assimetria de poder nas relaes sociais revela a viso eurocntrica

    sobre a alteridade e nos leva reflexo de como a colonizao atinge as

    subjetividades:

    A colonizao do ser consiste nada menos que em gerar a idia

    de que certos povos no formam parte da histria, de que no

    so seres. Assim, enterrados abaixo da histria europia desde

    o descobrimento, esto as histrias, as experincias e os relatos

    conceituais silenciados dos que foram excludos da categoria de

    seres humanos, de atores histricos e entes racionais.

    (MIGNOLO, 2005, p. 30)

    As obras literrias indgenas, nesse contexto, assumem importncia

    poltica, pois revelam outros saberes, cujas bases epistemolgicas no se

    originam na modernidade e colonizao europeia. Para compreender essas

    narrativas preciso situ-las em seus contextos culturais, constitudos por

    referncias espao-temporais especficas e olhar criticamente para a nossa

    prpria representao cartogrfica:

    [...] A diviso do mundo em continentes conforme a cosmologia

    crist correspondia a uma inveno crist isolada que mais

    tarde foi aceita pelo mundo inteiro. (MIGNOLO, 2005, p. 51)

    Nesse artigo, tentaremos elucidar o simbolismo da casa nas culturas

    tukano e desana, a partir de textos publicados por indgenas dessas etnias. As

    narrativas produzidas por esses autores revelam concepes de mundo

    especficas dos povos da regio do Alto Rio Negro, que foram reprimidas e

    proibidas durante o processo civilizatrio justamente por no fazerem parte da

    cosmologia crist.

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    Gabriel Gentil e Lus Lana

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    1. A destruio das casas sagradas

    Os artistas Gabriel Gentil, da etnia Tukano, e Lus Lana (cujo nome

    indgena Toramu Kehiri), do povo Desana, nasceram na regio denominada

    rea Cultural do Rio Negro (RIBEIRO, 1995, p. 17), localizada no Amazonas,

    que abriga diversos afluentes como Rio Tiqui, Papuri e, alm disso, faz

    fronteira com a Colmbia.

    Essa rea cultural caracteriza-se por um conjunto de etnias como

    Tukano, Desana, Maku, Baniwa, entre outras, que atribuem a criao do

    universo deusa Yep (Av do Universo) e aos deuses troves, cujas realizaes

    e ensinamentos formam uma complexa cosmogonia (LANA; LANA, 1995). Os

    Tukano, Desana e demais povos da rea Cultural do Rio Negro praticam rituais

    de iniciao masculina, sendo as flautas sagradas um smbolo tradicional

    emblemtico. Casam-se entre si, constituindo um complexo cultural em que as

    etnias so interdependentes.

    Antes da colonizao, os povos da rea Cultural do Rio Negro viviam em

    moradias coletivas, as casas sagradas, chamadas tambm de malocas, que

    constituem um elemento simblico central na mitologia e concepo de mundo

    dessas populaes.

    As atuais comunidades Tukano e Desana, assim como outras da regio,

    so as sobreviventes do processo que se consolidou em 1763, quando o capito

    Jos da Silva Delgado foi destacado para fundar vrios povoados no Alto Rio

    Negro. Datam desta poca os primeiros mapas e as primeiras listas dos povos

    que habitavam a regio (BUCHILLET, 1992). Nesse perodo, iniciou-se a captura

    regular de indgenas usados como mo de obra escrava para a construo das

    vilas coloniais. A depopulao pela varola e a escravido dos anos seguintes

    originaram revolta entre as comunidades. Seguiram-se as exploraes do ciclo

    da borracha e as atividades missionrias.

    Em 1927, o etnlogo Curt Nimuendaju (1950, p. 173) concluiu que as

    relaes entre ndios e civilizados, os brancos, da regio, estavam

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    irremediavelmente estragadas. Destacou a transformao brutal dos modos de

    vida tradicionais, causada pela relao de explorao e discriminao entre

    indgenas e no-indgenas, assim como a desestruturao dos modos coletivos

    de organizao social.

    O seguinte relato ilustra a dimenso da violncia cometida contra os

    indgenas pelos colombianos e brasileiros:

    A passagem desta gente pelas malocas, mesmo na margem

    brasileira, toma s vezes o carter de um verdadeiro assalto de

    bandidos quando eles, armados at os dentes e debaixo de tiros,

    invadem as moradas para sacar ndios. Estes, atemorizados, no oferecem a menor resistncia. Como j ficou dito. O abuso

    presenta-se ento desaforadamente: no respeitam nem

    propriedade nem pessoa. As fmeas desde a menina impbere

    at a mulher casada lhes pertencem, e com a arma em punho

    sufocam qualquer protesto, do pai ou do marido. Roubam o que

    lhes parece aproveitvel e embarcam nas suas canoas debaixo

    de pancadas aqueles homens que lhes devem trabalho. s vezes

    carregam meninas e mulheres tambm enfastiados delas,

    abandonam-as depois em qualquer ponto da margem

    (NIMUENDAJU, 1927, p. 176).

    Nimuendaju (1950, p.180) destaca a presena da misso salesiana como

    importante fator de proteo aos indgenas da regio contra os saques,

    assassinatos e explorao: Foroso reconhecer que numa zona onde o ndio

    s recebe ultrajes de todos a Misso Salesiana representa enorme vantagem para

    este.

    Porm, Nimuendaju aponta a averso dos missionrios em relao

    cultura da regio:

    Prejudicado o ndio pelo missionrio especialmente devido

    comprovada incapacidade deste de compreender e fazer justia

    a uma cultura qualquer que no seja a presente cultura crist.

    A intolerncia inerente ao seu ofcio obriga a ver em cada ndio

    um objeto de converso religiosa, incompatibiliza-os com o

    cargo de protetor da individualidade indgena. A publicao do

    Monsenhor Pedro Massa: Misso Salesiana no Amazonas, a mais eclatante prova do pouco conhecimento que estes

    religiosos possuem da cultura indgena [...] o ndio no seu

    estado de cultura primitiva causa-lhes medo e nojo [...] No

    entanto, a maloca uma das mais importantes caractersticas

    instituies da cultura indgena. Alega-se que as malocas,

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    devido sua construo sem janelas, sejam prejudiciais

    sade, e pela convivncia ntima de diversas famlias debaixo

    do mesmo teto, prejudicial moral [...] o principal motivo,

    porm, de averso do missionrio contra a habitao coletiva

    outro. que ele v nela, e com toda a razo, o smbolo, o

    verdadeiro baluarte daquela organizao e tradio primitivas,

    daquela cultura pag, que tanto contraria seus planos de

    converso e domnio espiritual e social... (NIMUENDAJU, 1950,

    p. 181).

    Em 1914, os salesianos iniciaram sua atuao no Rio Negro e

    desenvolveram aes meticulosas para a destruio da cultura local.

    Primeiramente, convenceram as comunidades a abandonarem suas moradias

    coletivas. Elas eram grandes casas comunais onde moravam famlias extensas

    e, tambm, eram realizados seus rituais, fatos que revelam uma estrutura

    importante e fundamental na vida dessas populaes. Alegando falta de higiene

    e promiscuidade, os salesianos ridicularizaram os costumes tradicionais,

    proibiram a prtica de rituais e separaram as crianas de seus pais, para serem

    educadas em internatos.

    Um dos pontos programticos da Prelazia do Rio Negro era:

    [...] Transformar gradativamente as malocas, primeiro em uma

    srie de choupanas e depois, em casinhas de madeira. A grande

    maloca perigosa demais, tanto do lado moral quanto do

    sanitrio. Comece-se retirando dela os mais jovens para instru-

    los no internato gratuito: o primeiro passo para influir sobre

    os pais (BKSTA, 1988, p.13)

    A maloca era considerada casa do diabo, antro de orgias, onde se

    passava vcios de pais para filhos (BKSTA, 1988, p. 13), lugar insalubre por

    no permitir a sada de gs carbnico. Atualmente, no se encontram mais

    malocas comunais na regio.

    Segundo depoimento de Joaquina Lana, coletado em pesquisa de campo,

    O pai de meu pai ia inaugurar a maloca e convidou os parentes.

    Estava preparando a zarabatana, os enfeites. No dia em que

    estavam fazendo isso os padres chegaram. O primeiro foi o

    padre Joo, chegou ralhando em Tukano: Vocs esto fazendo caxiri, isso pecado, no presta, coisa do demnio. Na mesma hora ele disse: no vamos fazer mais isso e j estava tudo pronto. (MENENDEZ, 2007, p.80)

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    Lus Lana, coautor de Antes o Mundo no Existia, afirmou:

    Meu av foi o nico a no sair da maloca e construir casa de

    barro. As outras famlias fechavam as portas quando ele

    passava, ele era o diabo. Ele dizia: Meu neto, voc deve

    permanecer junto de seu pai e cuidar de nossa terra... Um dia

    ele soube que havia a ressurreio [...] meu neto eles esto

    certos, isso que diziam nossos antepassados. Chamava os

    padres de Bais do papel1. Antes disso queimou a mala2 onde estavam todos os objetos rituais dizendo que os tempos haviam

    mudado e que no haveria isso nas prximas geraes, a

    mitologia previa a destruio das malocas. (MENENDEZ, 2007,

    p.81)

    A memria individual, ao recordar e reconhecer lembranas, apoia-se

    num fundamento comum ao grupo. A reconstruo das lembranas opera a

    partir de dados e noes comuns. Ento, essa memria fundamenta-se na

    memria coletiva, para precisar as lembranas ou mesmo preencher algumas

    lacunas (HALBWACHS, 1990).

    Um depoimento tem sentido apenas em relao a um grupo do qual faz

    parte, supondo um acontecimento real outrora vivido em comum. Nos

    depoimentos acima, Lus e Joaquina Lana recordam-se de seus avs para

    descrever o encontro dos salesianos com os Desana. No presenciaram a vida

    nas malocas comunais at a idade adulta, as memrias de sua infncia so

    diferentes daquelas vividas pela gerao anterior. Suas memrias passaram-se

    no internato salesiano, na escola onde os primeiros padres no falavam a sua

    lngua. Alm disso, foram catequisados. A vida no internato, a sala de aula e a

    incomunicabilidade dos professores que no sabiam a lngua indgena, a

    separao entre meninos e meninas so recorrentes na histria dos povos

    indgenas do Rio Negro e seus afluentes.

    Em decorrncia da teologia da libertao, do Conselho Vaticano II, na

    dcada de 1970, a Igreja Catlica Apostlica Romana adotou a viso

    transcultural em relao aos povos indgenas, o que significou, na prtica, um

    1 Bais eram os antigos chefes de dana das cerimnias Desana (MENENDEZ,2007)

    2 No mito de origem da noite narrado por Feliciano Lana (2002), o Dono da Noite possua uma

    mala onde haviam muitos enfeites para fazer a festa e escurecer o dia.

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    Gabriel Gentil e Lus Lana

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    modo de catequizao que tentava compreender as estruturas culturais,

    conviver com elas para poder transform-las.

    Foi nesse contexto que o salesiano Bksta estimulou Lus Lana e outros

    indgenas a registrarem a mitologia desana, inclusive pagando pelo servio.

    Disso resultou um livro que foi publicado em italiano pela editora Sellerio

    Editore Palermo, intitulado Il Ventre DellUniverso, no ano de 1986.

    2. Gabriel Gentil e Lus Gomes Lana

    Apesar de todas as transformaes decorrentes dos processos de

    colonizao, a memria das casas sagradas e seu significado simblico e ritual

    resistiram entre as geraes. Os livros escritos por Lus Lana e Gabriel Gentil

    no apenas evidenciam tal fato, mas revelam a tradio dos povos da rea

    Cultural do Rio Negro.

    O trabalho de Lus Lana elaborado em coautoria com seu falecido pai,

    Firmiano Lana marcado por narrativas mticas e ilustraes publicadas em

    italiano no livro Il Ventre DellUniverso, organizada por Bksta, conforme

    citado anteriormente.

    Dos manuscritos originais, desdobrou-se tambm outra verso, em

    portugus, intitulada Antes o Mundo no existia (1995) e, em espanhol,

    intitulada Antes el mundo no existia (2000). Essas publicaes foram

    organizadas por Berta Ribeiro.

    A temtica de Lus Lana so os mitos da criao do mundo, da origem da

    noite, em verso narrativa e pictrica, de acordo com o cl Desana kehiripor

    (MENENDEZ, 2007).

    A verso original dos manuscritos elaborados por Lus Lana foi

    considerada longa demais. As publicaes existentes so verses reduzidas da

    original. O caderno manuscrito se encontra na Itlia e uma cpia datilografada

    est com o autor.

    Esses fatos no se deram de forma harmoniosa. O artista enfrentou o

    desprezo da comunidade, inclusive, o seu filho quase foi expulso da escola. Se

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    ele acreditava naquilo que escrevera, por que mandara o filho ao colgio dos

    padres?

    Nas dcadas de 1970 e 1980, ainda era muito difcil encontrarmos

    publicaes ou mesmo algum tipo de estmulo valorizao das culturas

    indgenas. Assim, a repercusso desse trabalho foi grande, abrindo caminho

    para que outras pessoas da regio tambm fizessem o registro da cosmogonia e

    valorizassem sua tradio.

    Nas dcadas seguintes, formaram-se associaes indgenas na regio,

    com infraestrutura para projetos que continuam estimulando a produo de

    livros com narrativas mticas.

    Gabriel Gentil, falecido em 2006, paj da etnia Tukano, recebeu da

    Fundao Oswaldo Cruz o ttulo de pesquisador emrito no campo do

    conhecimento tradicional. O autor ainda trabalhou no Centro de Pesquisa

    Lenidas e Maria Deane, em Manaus (GENTIL, 2007, p. 213).

    Em sua publicao Mito tukano, quatro tempos de antiguidades (2000),

    Gentil escreve o mito de criao do universo, a partir da tradio oral de seu

    povo. A publicao contm duzentas e dezesseis pginas e traz o registro de

    rezas e rituais na lngua tukano, constituindo-se esse registro em lngua

    portuguesa e indgena como um importante ponto de afirmao tnica, em um

    contexto de colonizao que durante anos reprimiu a aprendizagem e a fala

    dessa lngua. Nos internatos salesianos, por exemplo, as crianas eram retiradas

    das aldeias e da convivncia dos pais para terem aulas em portugus.

    Aps a morte de Gabriel Gentil, o artigo de sua autoria denominado

    Bahsariwii - A Casa de Danas foi publicado em 2007. Nesse texto, o autor

    descreve costumes e tradies do povo Tukano e sua relao com a mitologia.

    H que se destacar que as publicaes das mitologias dos povos do Alto

    Rio Negro, escritas por eles mesmos, rompem com um longo perodo de

    represso e silenciamento de seus rituais, de suas lnguas, impostas pelos

    processos de colonizao. Michael Pollak (1989, p. 6), afirma que o longo

    silncio sobre o passado, longe de conduzir ao esquecimento, a resistncia de

    uma sociedade impotente diante do excesso de discursos oficiais.

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    Gabriel Gentil e Lus Lana

    Larissa Lacerda Menendez

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    Outra forma de resistncia ocorre atravs do espao (HALBWACHS,

    1990). O grupo humano adapta seus hbitos e movimentos ao lugar, ao espao

    em que vive. Seus pensamentos so regulados pelas sucessivas imagens

    exteriores. Na sociedade tukano e desana, a memria coletiva tem seu ponto de

    apoio criado sobre as imagens espaciais:

    Sobre a dcima terceira maloca (Diapirowii, maloca das cobras)

    est a cidade de Manaus. Na cidade de So Gabriel da Cachoeira

    esto localizadas trs malocas: Dimokakuwii (maloca do

    smen), Diwairowii (maloca do Cacuri) e Dianahsikapaguwii

    (maloca do grande camaro). A humanidade desembarcou na

    cachoeira do Ipanor, no rio Uaups (KEHIRI E PAROKUMU,

    1995).

    Entre os povos do Alto Rio Negro, o espao geogrfico e a cosmogonia so

    indissociveis. Na concepo desses povos, os rios e cachoeiras foram

    navegados pelos heris culturais e a humanidade foi criada dentro das guas

    dos diversos rios da regio.

    Nas palavras de Gentil (2007, p. 249):

    Da Cordilheira dos Andes os Tukano vieram, foram trazidos

    pelos brancos espanhis, chegaram no rio Solimes e rio Negro,

    rio Amazonas, litoral do Brasil, sendo levados pelos brancos, e

    chegaram Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, quando o Rio era

    a capital do Brasil. Depois os Tukano foram trazidos pelos

    brancos brasileiros, saram via fluvial com a Canoa Grande. Mas

    os Mitos secretos dos Pajs, Chefes das Tribos Tukano e outras

    tribos, ensinaram que era uma cobra grande que estava trazendo

    os primeiros humanos na Terra. Agora verifiquem a sequncia

    das histrias dos mitos Tukano. Qual a atual Quarta moradia

    primitiva dos Tukano que chegaram com corpos humanos que

    fica em Ipanor Cachoeira, rio Uaups? Chegando em Ipanor

    Cachoeira, os Pajs, Chefes da Tribo fizeram cerimnia nos

    lugares anteriores onde passaram. Fazendo cerimnias rituais

    de origem os Tukano disseram: aqui que ns nascemos, nosso mundo aqui.

    A compreenso do espao geogrfico, para esses povos, ocorre a partir da

    identificao desses lugares sagrados, onde se originou a humanidade. As

    narrativas de Lus Lana e Gabriel Gentil referem-se a estes espaos sagrados e

    os significados que so compartilhados pelos povos da regio, revelando outra

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    concepo espao-temporal, completamente diferente daquela imposta pela

    viso colonial.

    H uma potncia grande na produo e fruio da literatura indgena: a

    afirmao de identidades diante de uma sociedade eurocntrica e a

    sensibilizao e transformao de leitores no-indgenas que podem, a partir da

    leitura dessas narrativas, reelaborar sua compreenso a respeito da alteridade.

    3. A Casa-universo

    Anteriormente abordamos o tema da destruio das casas sagradas

    (malocas) no contexto da colonizao e sob a perspectiva de produes

    acadmicas elaboradas por autores no-indgenas.

    Nesse tpico do artigo, analisaremos os textos produzidos

    exclusivamente pelos autores indgenas do Alto Rio Negro, ressaltando a sua

    perspectiva sobre a origem do universo e o significado da maloca.

    Os autores Gabriel Gentil e Lus Lana narram a cosmogonia em que a

    deusa do universo, chamada Yep e os deuses troves originam tudo o que

    existe. Eles transcreveram e traduziram um volume denso de narrativas orais

    para as pginas de seus livros, registrando a origem dos rituais, os cantos e

    cerimnias sagradas que fazem parte de seu legado cultural.

    Na tradio tukano e desana, a Av do Universo formou a terra e os seus

    pontos cardeais, moradia dos troves, que ajudaram a criar as florestas, os rios

    e a humanidade.

    Segundo Gentil (2000, p. 21):

    Na escurido existia uma voz que soava

    Esta voz a presena de Mirio (flauta sagrada)

    Que Yeba Bulo...

    As msicas andavam danando

    Fazendo carinho

    Primeiro ela tinha o corpo em forma de vento

    Invisvel.

    Ela possua a Vida da Alma

    Em forma de vento,

    Estava sentada.

    Dentro dessa voz, dentro do vento

  • Literatura indgena, memria e resistncia: A Casa-universo na obra de

    Gabriel Gentil e Lus Lana

    Larissa Lacerda Menendez

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    Vivia por si mesma uma Mulher

    Chamada Yepa

    Ela era chamada yepa-Bahuari-Mahso

    Gente (fem.) terra Gente que apareceu por si mesma.

    Ela apareceu no meio dos sons musicais

    No meio de nuvem brilhosa

    Ela Gente (fem.) Msica Sagrada.

    tinha um corpo invisvel,

    de Pedra quartzo, em forma de osso de bacia

    O texto transcrito acima faz referncia ao primeiro momento de criao

    do universo, em que o ser sobrenatural, invisvel, feminino yepa-Bahuari-

    Mahso, surge em forma de Msica Sagrada. De acordo com a cosmogonia, junto

    do universo surgiram os troves, em cada um dos pontos cardeais. Esses troves

    ensinaram cerimnias, cantos, danas, sabedorias. Um dos pontos culminantes

    dessa tradio est no ritual de iniciao masculina, em que os homens detm

    o conhecimento das flautas sagradas, cuja viso proibida para as mulheres.

    Em verso diferente da de Gentil (2000), Lana (1986) tambm inicia a

    narrativa cosmognica fazendo referncia Av do Universo:

    No princpio o mundo no existia. As trevas cobriam todas as

    coisas. Vieram seis coisas misteriosas. A partir dos objetos a

    Mulher divina passou a existir. As trevas cobriam todas as

    coisas. Enquanto ela estava pensando, comeou a se levantar

    algo, como se fosse um balo[...] envolveu a escurido, de

    maneira que esta toda ficou dentro dele. O balo era o mundo.

    Gentil e Lana evocam smbolos importantes da cultura e tradio dos

    povos Tukano e Desana: o corpo da Deusa, as flautas sagradas, a criao do

    universo. Essa simbologia materializada nas grandes casas comunais em que

    viviam os povos da regio antes da colonizao.

    As malocas eram os lugares em que os rituais eram praticados, em que

    mundo espiritual e material se encontrava.

    Desde o comeo do Mundo, foi a criadora Deusa da Terra Yep,

    que construiu a primeira Maloca, local na Casa da Terra,

    Yepwii. Este lugar o mais antigo da Terra. Assim, no comeo

    do mundo este lugar era a Casa do Cu, Emesewii, era a moradia

  • Polifonia, Cuiab, MT, v. 21, n. 30, p. 133-150, jul-dez., 2014

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    da criadora[...] Bashsariwii: a Casa de Danas, Centro de

    Cultura. Onde os velhos Pajs, com os Chefes, com suas trs

    esposas cada um, que comandam a Maloca. Fazem as canes

    e melodias rituais, curam as doenas materiais e espirituais.

    um lugar onde fazem vrias artes, vrios tipos de rituais. E

    trocam sabedorias, fazem ritos secretos... (GENTIL, 2007).

    Nessa grande moradia indgena, realizavam-se rituais, guardavam-se

    objetos sagrados, como o banco onde se sentava a av do universo. Cada uma

    das vigas sustentadoras do teto representava um ancestral da poca da criao

    do mundo. O universo criado pela Av do Mundo tem a forma de uma grande

    maloca onde nas extremidades moram os troves.

    Assim a maloca est construda em cima do corpo da Criadora,

    porque a terra representa a Mulher, a nossa me. o Deus

    Pedra Quartzo Branco, o sol, outros Deuses que a engravidam.

    Assim as rvores so os cabelos da criadora, o lugar da maloca

    construdo entre as coxas dela, os morros altos so os seios

    dela. Todos os tipos de seres vivos, animais e ns humanos

    somos os micrbios, os piolhos dela... a porta da maloca

    representa a boca do Criador Deus Pedra... a viga central da

    maloca representa a coluna vertebral... os esteios centrais

    principais so Deuses e Deusas que moram na Casa do Cu

    Emesewii...os caibros so costelas, os cips amarrados so as

    veias...Tambor Trocano corao alma do criador...Lana ritual

    transformador, fazedor, multiplicador de gente,

    pnis...Todos esses materiais de construo juntos tornam-se

    deus criador do mundo... (GENTIL, 2007, p.230).

    A maloca, lugar sagrado, constituiu-se como o centro de ligao entre os

    homens e deuses, espao religioso. A narrativa mitolgica, cujo sentido

    compartilhado pela cultura da qual faz parte, registrada por Lus Lana e

    Gabriel Gentil, estabelecendo interlocuo com leitores no indgenas. Num

    contexto de discriminao e racismo em relao a esses povos, a interlocuo

    com leitores no indgenas caracteriza-se como um importante vetor de difuso

    cultural.

    A clareza da narrativa de Gentil explicita o significado da maloca. A

    Terra concebida como o corpo/casa da deusa. Cada rvore, morro, materializa

    o corpo da Av do Universo. Ao mesmo tempo em que a casa universo,

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    Gabriel Gentil e Lus Lana

    Larissa Lacerda Menendez

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    tambm personificada, pois materializa-se em corpo, dotado de vida, boca,

    corao, veias.

    Analogamente, as malocas so tambm corpos dos deuses, dotados de

    vida. Segundo Gentil (2007, p. 230), os pajs fazem sete cerimnias para

    transformar a Maloca em Corpo dos Criadores. Na primeira cerimnia, a Terra

    transformada no corpo de Yep. Na segunda cerimnia, os esteios so

    transformados nos antepassados, moradores da Casa do Cu. Na terceira

    cerimnia, a Maloca se transforma em corpo do Criador ou Criadora. Nas

    cerimnias seguintes os pajs se comunicam com os deuses e o poder para curar

    e proteger as pessoas provm desses rituais.

    Todos esses materiais de construo juntos tornam-se deus

    criador do mundo. Em cada poca, nos tempos climticos, a

    estrutura das malocas, espiritualmente, elas mudam de

    posies. s vezes ele viaja para outros Mundos em busca de

    comidas e para visitar os parentes dele. Quando ele viaja, s

    deixa o esprito, roupa dele. Quando ele fica em p ou anda,

    a que est a evoluo dos tempos. Nossos crebros recebem

    informaes vindas de fora, conhecimento e fenmenos. A

    Terra costuma tremer. Junto com o Criador costumam chegar

    outros Deuses, de outros Mundos, invisivelmente. Muitas vezes

    eles trazem alegrias, riquezas, sabedorias, ou as doenas. Essas

    coisas ns humanos no percebemos nem olhamos, porque

    somos muito pequenos... e ns humanos construmos o Mundo

    em que vivemos durante as nossas vidas. importante saber: a

    maloca como uma pessoa viva. muito difcil explicar, fazer

    as pessoas entenderem, acreditarem nessa parte. (GENTIL,

    2007, p. 235).

    Gentil explicita que a maloca como uma pessoa viva e destaca a

    dificuldade dos seus interlocutores no indgenas de compreenderem esse fato.

    A partir dessa perspectiva, o texto possibilita a compreenso de que a condio

    humana depende de tudo o que existe no universo.

    Consideraes finais

    A publicao de narrativas como as de Gabriel Gentil, Lus Lana, entre

    tantas outras existentes no Brasil, revelam concepes da realidade que no

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    podem ser compreendidas pelos paradigmas impostos pela viso da

    modernidade e colonialidade.

    A diversidade cultural passa primeiramente pelo reconhecimento de

    tradies que foram duramente reprimidas pelas foras colonizadoras que at a

    atualidade relegam aos povos indgenas e seus saberes um lugar

    hierarquicamente inferior.

    Segundo Mignolo, a matriz colonial de poder fundamenta-se no

    ocidentalismo:

    Nome da regio do mundo e de lugar epistmico daqueles que

    classificavam o planeta e que ainda hoje seguem fazendo-o [...]

    o ocidentalismo no era s um campo de descrio mas tambm um lcus de enunciao por excelncia (status que

    conserva ainda hoje) ou seja, um lugar epistmico desde o qual

    se classificava e categorizava o mundo. (2005, p. 66)

    Para alm do contexto poltico, que as narrativas de escritores indgenas

    abarcam, defrontamo-nos com desafios de compreenso diante de smbolos e

    significados que no podem ser explicados por concepes eurocntricas.

    Desse modo, podemos conceber as narrativas indgenas como expresses

    de resistncia colonialidade do saber e do ser, pois elas nos convidam a

    compartilhar outras vises sobre o mundo e nos permitem perceber a

    complexidade das subjetividades humanas, constitudas em contextos culturais

    marcados pela violncia da colonizao. Constatamos que as perspectivas

    oriundas das populaes indgenas, apesar das tentativas de releg-las

    inferioridade, invisibilidade e destruio, so recriadas, recontextualizadas

    para que seu legado sobreviva entre as diferentes geraes.

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    Recebido em 29/02/2014.

    Aceito em 10/10/2014.

    Larissa Lacerda Menendez

    Professora colaboradora e ps-doutoranda no Programa de Ps graduao de

    Estudos de Cultura Contempornea (ECCO)/UFMT. Mestre e Doutora em

    Cincias Sociais pela PUC-SP. Graduada em Educao Artstica (FAAP). Tem

    experincia na rea de Educao, com nfase em Antropologia e Arte. Autora

    do livro Iconografias do Invisvel: a arte de Feliciano e Lus Lana

    (Ed.Annablume/FAPESP, 2009). Desenvolveu pesquisa com povos indgenas

    Guarani, no Estado de So Paulo, e Desana e Paumari, na regio do Alto Rio

    Negro e Purus, no Amazonas.

    E-mail: [email protected]