linguagem, compressão e algumas implicações para a matemática

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LINGUAGEM, COMPRESSÃO E ALGUMAS IMPLICAÇÕES PARA A MATEMÁTICA ESCOLAR Janete Bolite Frant Universidade Bandeirante, UNIBAN, Brasil [email protected] RESUMO Nesta apresentação utilizarei as noções teóricas de mapeamento conceitual 1 , em particular as de montagem conceitual, compressão e metonímia como propõem Giles Fauconnier, Mark Turner, Mark Johnson, George Lakoff e Rafael Nunez, entre outros linguistas cognitivos, para discutir as implicações da compressão e metonímia para a sala de aula de matemática. Para tal apresento e analiso dois casos, o primeiro um problema/provocação sobre a reta real com alunos da pós graduação stricto senso e o segundo “a apresentação intuitiva de função” encontrada no livro didático do Ensino Médio - Matemática Volume Único dos autores Gelson Iezzi, Osvaldo Dolce, Davi Degenszajn e Roberto Perigo. Palavras-chaves: compressão, teoria da cognição corporificada, sala de aula de matemática ABSTRACT I will present the theoretical notions of conceptual mapping, specifically conceptual blending, compression and metonymy as propose by Giles Fauconnier, Mark Turner, Mark Johnson, George Lakoff e Rafael Nunez, among others cognitive linguistics, in order to discuss possible impacts on mathematics classrooms. I will analyze two cases, one a problem regarding the real number line 1 Não confundir com mapa conceitual

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Page 1: linguagem, compressão e algumas implicações para a matemática

LINGUAGEM, COMPRESSÃO E ALGUMAS

IMPLICAÇÕES PARA A MATEMÁTICA ESCOLAR

Janete Bolite Frant

Universidade Bandeirante, UNIBAN, Brasil [email protected]

RESUMO

Nesta apresentação utilizarei as noções teóricas de mapeamento conceitual1,

em particular as de montagem conceitual, compressão e metonímia como

propõem Giles Fauconnier, Mark Turner, Mark Johnson, George Lakoff e

Rafael Nunez, entre outros linguistas cognitivos, para discutir as

implicações da compressão e metonímia para a sala de aula de matemática.

Para tal apresento e analiso dois casos, o primeiro um problema/provocação

sobre a reta real com alunos da pós graduação stricto senso e o segundo “a

apresentação intuitiva de função” encontrada no livro didático do Ensino

Médio - Matemática Volume Único dos autores Gelson Iezzi, Osvaldo

Dolce, Davi Degenszajn e Roberto Perigo.

Palavras-chaves: compressão, teoria da cognição corporificada, sala de aula de matemática

ABSTRACT

I will present the theoretical notions of conceptual mapping, specifically

conceptual blending, compression and metonymy as propose by Giles

Fauconnier, Mark Turner, Mark Johnson, George Lakoff e Rafael Nunez,

among others cognitive linguistics, in order to discuss possible impacts on

mathematics classrooms.

I will analyze two cases, one a problem regarding the real number line

1 Não confundir com mapa conceitual

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solved by graduate students. The second one an analysis of a high school

text book on the intuitive notion of real functions.

Keywords: Compression, Embodiment theory, Mathematic Classroom

1 Introdução

O papel dos processos cognitivos e lingüísticos na compreensão da matemática

escolar, quer seja quando ensinamos quer seja para compreender melhor a

aprendizagem do aluno, vem ganhando espaço nas pesquisas nacionais e internacionais.

Este grupo no SIPEM se reúne desde 2002 apresentando uma gama de trabalhos que

olham para as situações da sala de aula utilizando paradigmas da lingüística, da

cognição ou ainda uma articulação de ambos. No PME2, entre outros, um grupo sobre

Embodiment, Language and Gesture também se reúne e apresenta pesquisas desde

2001.

Para esta apresentação utilizarei as noções teóricas de montagem conceitual ou

integração conceitual e compressão como propõe Fauconnier, Turner, Lakoff, Nunez,

entre outros linguistas cognitivos para discutir suas implicações para a sala de aula de

matemática.

No dia a dia quando observamos amigos conversando encontramos vários

exemplos de compressão, que será definida a seguir, agora darei apenas um exemplo.

Podemos ouvir – aquele cirurgião era um açougueiro - e para quem está na conversa é

claro que o cirurgião não tinha outra profissão, a de açougueiro.

Quando ouvimos a palavra cirurgião pensamos no, profissional, médico que

opera. O mesmo ocorre com açougueiro, pensamos no profissional das carnes. Por

enquanto peço gentilmente ao leitor que repare que para o médico em questão emergiu

uma qualidade nova a de “mau médico-operador” que não pode ser encontrada em

nenhuma das qualidades-entradas isoladamente, i.e., ser cirurgião ou ser açougueiro.

Neste caso, como veremos em breve, temos uma montagem conceitual e uma

compressão.

2 Conference of the International Group of Psichology and Mathematics Education

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2 Fundamentação Téorica

Sfard (2008) propôs duas metáforas para conhecimento, a aquisicionista e a

participacionista. Essas metáforas nos ajudam a pensar nossa sala de aula, na primeira,

como o nome sugere o conhecimento é “algo” que pode ser transmitido, transferido e

consequentemente para avaliarmos se um aluno aprendeu podemos testá-lo com o que

foi transmitido. Esta visão vem ao encontro de outros trabalhos tais como Bolite Frant

(2001) que propõe a imagem de uma caixa para conhecimento. Nesta metáfora, que

parece exagerada, a idéia da caixa é constantemente utilizada em sala de aula. Frases

como “ele aprendeu superficialmente tal conceito; perdi/esqueci a fórmula tal; ele não

transfere para os problemas o que aprendeu” enfim essas enunciações, entre outras, nos

levam a pensar o conhecimento como uma caixa onde podemos saber “superficial ou

profundamente”, pensar na caixa tendo buracos por onde escapariam conhecimentos, no

caso de esquecer. Concordamos com a segunda proposta, a participacionista. Nesta, a

matemática é um discurso e aprender matemática é participar da evolução deste

discurso.

Com isso busco me filiar teoricamente com correntes lingüísticas e cognitivas que

destacam o papel da linguagem cotidiana na construção do conhecimento. Considero

como texto tudo que é dito por outro (sujeito), e como por linguagem incluo gestos,

entonações, escritos e desenhos, os “saberes” produzidos registrados em livros,

enunciados pelo professor em sala, ou ainda por algum colega também são considerados

texto. A partir do momento que o sujeito cognoscente se apropria do mesmo e produz

significado para este texto então digo que este sujeito constitui objetos e produz

conhecimento.

Cabe estar atento para um fato, apontado por Ducrot (1991), que muitas vezes

parece passar desapercebido ou “por trás dos panos”, se a linguagem se restringisse ao

uso correto de códigos seriamos obrigados a concordar que tudo seria explicito e não

haveria necessidade de interpretações. No entanto, existem normas sociais de conduta

que determinam o que pode ser dito, como e onde. Um exemplo do dito pelo não dito

seria-- um aluno chega bastante atrasado para a aula e a professora, com um relógio no

seu pulso, pergunta ao aluno que horas são. Claro que ela não queria saber a hora foi

apenas um modo de forçar o aluno a entender seu próprio atraso. Existem outros

exemplos onde o implícito ocorre de modo inconsciente, não por um trauma mas porque

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podemos não estar conscientes de como um processo ocorre ou ainda por já estar

incorporado em nossos hábitos. Quem é professor de crianças e acredita no diálogo/

discurso pode muitas vezes perguntar diretamente a uma aluna porque ela fez o que fez

para resolver um problema e ficar desapontado com a resposta não sei, fiz assim porque

fiz. Neste momento, a aluna apenas diz que não está consciente do processo.

Lakoff e Johnson (1999) afirmam que nosso sistema conceitual é algo que ocorre

na maior parte das vezes sem que tenhamos consciência de como e do que está

acontecendo. Na maior parte das coisas simples do cotidiano nós simplesmente agimos

mais ou menos automaticamente de acordo com algumas linhas e que a linguagem é um

meio de elucidar tais linhas, regras. E é através da linguagem que o pesquisador pode

levantar mapeamentos conceituais para melhor entender o que está “inconsciente” ou

“implícito.

Antes de continuar, cabe mais um esclarecimento, seres humanos não aprendem

uma palavra como acontece nos dicionários. O dicionários trazem uma definição,

muitas vezes recorrente, por exemplo pintor- aquele que pinta e Pintar – ato executado

pelo pintor. Seres humanos precisam interagir com o mundo e com outros seres

humanos para compreender o uso das palavras, não adianta saber que pesado é

antônimo de leve para entender o que é leve e o que é pesado. Deste modo, observando

a linguagem, os diálogos/discursos, podemos enquanto pesquisadores e/ou professores

levantar dados que podem oferecer uma pista de como um participante deste diálogo

está compreendendo determinado assunto.

Segundo Lakoff e Johnson (1984) um mapeamento conceitual é um mecanismo

que permite organizar e reorganizar o pensamento.

Um tipo de mapeamento que vamos tratar aqui é a montagem conceitual como

proposta por Fauconnier e Turner (2002), que é um mapeamento envolvendo mais de

dois espaços mentais3. Espaços mentais, segundo os autores, são espaços construídos a

medida que pensamos e falamos, com propósitos de ação e compreensão local. O que

vem ao encontro do que Johnson (1987) propôs para esquema-imagem e ao que

Barsalou chama de representações modais como vemos abaixo no seu exemplo sobre

cadeira. Quando uma experiência ocorre (p.e. sentar gostosamente reclinado numa cadeira), o cérebro captura estas situações através de diferentes modalidades e as integra guardando uma representação multimodal em nossa memória (p. e., como a cadeira é fisicamente e sua sensação, a ação de sentar,

3 A metáfora conceitual é um mapeamento intra-dominio, envolvendo apenas dois espaços.

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introspecções de seu conforto e relaxamento). Mais tarde, quando é necessário um conhecimento para representar uma categoria (cadeira) as representações multimodais capturadas durante as experiências são reativadas para simular como o cérebro representou esta percepção, ação e introspecção associadas a este conhecimento. (BARSALOU, 2008, p.1).

Adotamos a posição de Fauconnier e Turner (2002) para montagem conceitual “

A montagem desenvolve estrutura emergente que não se encontra em nenhum dos

espaços de entrada.” E que corrobora com a perspectiva de Serguei Eisenstein, teórico e

cineasta, “Novas ideias emergem da colisão da montagem (síntese) e onde as ideias

emergentes novas não são inatas em nenhuma imagem isolada da sequencia editada.

Um novo conceito surge”. O exemplo do cirurgião açougueiro é uma montagem

conceitual. Os espaços envolvidos de entrada são as experiências e inferências sobre

cirurgião, experiências e inferências sobre açougueiro e o espaço da montagem seria o

cirurgião-açougueiro.

Falta colocar, ainda que brevemente, de que modo usaremos Compressão4 e

Metonimia, outros dois importantes mapeamentos conceituais.

Cabe notar que o próprio processo de montagem resultando em estruturas

emergentes no espaço montagem contem e envolve um processo nomeado de

compressão. A compressão não é o mesmo que codificação. Ainda hoje encontramos

em livros didáticos de matemática algo do tipo: Traduza para a linguagem matemática

“o dobro de um numero mais três é igual a 11” onde esperava-se dos alunos que

escrevessem 2x+3=11. A compressão é um processo que encurta distancia entre espaços

mentais. A emergência do cirurgião-açougueiro é um exemplo de compressão, pois os

dois espaços mentais cirurgião e açougueiro são comprimidos via a montagem. Ou seja,

de um modo conseguimos justapor esses dois espaços dando origem a um terceiro. E

este processo é bastante usado no nosso dia-a-dia, embora nem sempre estejamos

conscientes deste fato.

E por fim a metonímia, que ocorre quando uma entidade é usada para se referir a

outra. Sua principal função é referencial mas também promove a

compreensão/entendimento. Sabemos que neste caso uma parte referencia o todo, mas

existem muitas partes e dependendo da escolha que fazemos determina que aspecto do

todo estamos focando. Quando dizemos – para esta pesquisa vamos precisar de boas

cabeças- nos referimos a pessoas inteligentes e não apenas ao fato de que cabeça (parte)

se refere a pessoa (todo).

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Passemos portanto aos dois casos prometidos na introdução.

3 Análise e Discussão

3.1 A reta real é uma reta ou um ponto?

Apresento aqui uma provocação que faço nas aulas de Didática do Cálculo da pós

graduação, onde os alunos eram professores de matemática do Ensino Médio e

Universitário, protocolando suas respostas desde 2002.

A reta real é uma reta ou um ponto?

Esta pergunta, aparentemente boba para matemáticos, tem sido motivo de insônia

para muitos alunos e professores de matemática. Digo, quem fez bacharelado, mestrado

em matemática teve mais oportunidade de ir construindo espaços mentais para esta

resposta do que aqueles que cursaram licenciatura. Denuncio mais uma vez que na

tarefa de facilitar a aprendizagem muitas vezes dificultamos este processo. (ver Bolite

Frant, Acevedo e Font (2005)).

A questão é sempre apresentada, com pequenas variações, da seguinte forma:

Sabemos que a reta real não possui “buracos”, assim dados dois pontos A e B

sobre a reta se eles não se tocam, podemos sempre colocar um ponto entre eles

(pensando na divisão do segmento AB em n partes) de tal modo que vamos

aproximando A de B até que A e B se toquem. Mas se A e B se tocam isto significa que

a distância entre A e B é zero e portanto A coincide com B. Logo, a reta real é um ponto

e não uma reta! Usamos a reta porque fica mais fácil de escrever muitos números, já que

se fosse num único ponto teríamos que escrever os números um em cima dos outros.

Para você, a reta real é uma reta ou um ponto? Justifique, defenda seu ponto de

vista

As respostas variam quase que na proporção de 20% para reta e 70%, embora

assustados, para ponto.

4 Para maior detalhes sobre Montagem e Compressão ver Fauconnier e Turner 2002 The Way We Think

A

A B

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No dia-a-dia seria bastante possível pegar dois objetos colocados distantes entre si

numa linha reta e colocá-los lado-a-lado e com isso tornar a distancia entre eles zero

com os mesmos se tocando, estes esquemas-imagem, espaços mentais ou seja lá o nome

que se dê vão compondo nosso sistema conceitual. Não existe um momento de diálogo

na escola onde alunos e professores argumentem sobre a diferença entre dois objetos

mundanos se tocarem e dois objetos matemáticos, números ou uma reta e uma curva, se

tocarem.

Na matemática escolar, o ensino dos conjuntos numéricos e sua representação

como pontos na reta é um exemplo bastante forte de compressão. Quando um professor,

ou texto no livro, afirma que “a reta real não tem buracos” está querendo dizer que o

conjunto dos números reais é denso e completo. Novamente densidade e completude

não compõe o currículo escolar, praticamente em nível algum, com exceção para quem

segue na matemática e cursa Teoria dos Números, que em geral não pertence ao

currículo da licenciatura.

Assim, para o aluno que não teve oportunidade de realizar esta compressão “a reta

não tem buracos” pode fazer outras inferências como vimos acima. Observe, leitor, que

o pesquisador pode levantar o processo de compressão realizado por um sujeito, no

entanto o sujeito é o único que pode exercer tal ação. E quando digo que o aluno não

teve a oportunidade de agir é porque os conjuntos numéricos participam da matemática

escolar de modo fragmentado, hoje existem várias teses e artigos, nacionais e

internacionais, envolvendo a construção do conjunto dos números reais que apontam

este fato. (Ver por exemplo Ripoll (2008); Giraldo e Martinez (2010))

Sobretudo, Lakoff e Nunez (2000) observaram que a metáfora conceitual

Números são Pontos numa Reta leva à montagem de Dedekind e que é somente pelo

nosso senso geométrico que completamos os racionais até chegarmos nos reais. Nunez

(2005) investiga o movimento, fictivo, na matemática e mostra que em algum ponto

nossa conceitualização de número é imbricada com nossa percepção cinestésica do

espaço físico.

Este é um caso de compressão com sérias implicações, entre elas a dificuldade

encontrada pelos alunos que cursam a disciplina de Cálculo na universidade.

3.2 Funções no Livro Didático

Gostaria de deixar claro que este foi apenas um livro escolhido por ser hoje

bastante utilizado no Ensino Médio em alguns estados brasileiros. A critica pode ser

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estendida a outros similares. Aqui, alem de compressão temos mais especificamente o

caso da metonímia.

Dado que podemos e devemos dialogar com os livros e que o livro didático, em

geral, é seguido pelo professor “ao pé da letra” apresento o inicio do Cap 3 do livro

Matemática Volume Único dos autores Gelson Iezzi, Osvaldo Dolce, Davi Degenszajn

e Roberto Perigo.

O titulo é Introdução: a noção intuitiva de função. No estudo cientifico de qualquer fenômeno, sempre procuramos identificar grandezas mensuráveis ligadas a ele e, em seguida, estabelecer as relações existentes entre essas grandezas. P.30

E segue apresentando o exemplo 1 denominado Tempo e Espaço, onde temos

uma foto de um ciclista solitário ao lado do texto que copio a seguir: Uma pista de ciclismo tem marcações a cada 500m. Enquanto um ciclista treina para uma prova, o técnico anota seu desempenho. O resultado pode ser observado na tabela abaixo.

Instante (min) Distância (m)

0 0

1 500

2 1000

3 1500

4 2000

5 2500

.

.

.

.

.

.

A cada instante (x) corresponde uma única distancia (y). Dizemos, por isso, que a distancia é função do instante. A fórmula que relaciona y com x é: y=500 . x

Os demais exemplos serão mostrados na apresentação, por enquanto vamos

analisar este.

Se este é um texto introdutório deveria dialogar muito mais com o leitor. De

grandezas mensuráveis e relações existentes entre essas grandezas encontramos Tempo

e Espaço que rapidamente, sem qualquer aviso, se transmutam em Instante e Distancia

para mais uma vez se transmutarem em y e x. E é esperado que o aluno que está sendo

introduzido neste tópico perceba e entenda que a relação entre as grandezas é a fórmula

que relaciona y com x.

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A metonímia em questão reside no fato de os autores optarem escrever y= 500 . x

ao invés de y(x)= 500.x

Novamente, a metonímia foi realizada pelos autores e/ou professor, o aluno não

teve oportunidade de ação.

No dia-a-dia fazemos essas “abreviações”, compressões e metonímias com

bastante freqüência desde que saibamos do que se trata. Por exemplo—fecha a mesa

7—significa fazer a conta do total consumido pelas pessoas sentadas na mesa 7.

A história nos mostra que nos papiros (de Ahmed, de Rhind) cada problema era

escrito com sua solução ainda não existia a tal solução geral. Será que para um aluno

começando a estudar sobre funções a abordagem acima é útil? Bom, na turma que

investiguei de primeiro ano do Ensino Médio de 27 alunos 3 entenderam na aula, os

demais buscaram monitoria (na própria escola) ou aula particular.

O que chama a atenção é que buscando outros livros vemos que este fato é bem

comum, logo de inicio aparece y em função de x mas sempre y=ax +b no entanto,

quando no lugar de y é usado f temos f(x) sempre.

Como o aluno pode entender o tal conceito intuitivo de função? Fica mais simples

decorar procedimentos que lhe rendem uma nota boa, ainda que não entenda o que está

fazendo.

4 Concluindo

Apresentamos aqui dois casos que ilustram a importância da teoria na explicitação

de dificuldades que surgem da falta de diálogo. Compressão e metonímia precisam fazer

parte dos acordos entre os participantes deste diálogo, do contrário o sentido pode se

perder.

No primeiro caso, os alunos/professores nem sempre apresentaram o mesmo

sentido para tocar e não ter buracos e para ser denso e completo.

No segundo caso o mesmo ocorre com a metonímia usada para funções.

Esta pesquisa sugere um olhar mais cuidadoso para os autores de livros didáticos,

para os professores e também para as políticas que envolvem elaboração de currículo.

Olhar esse que seja fundamentado nas pesquisas fundamentadas nos processos

cognitivos e lingüísticos e não apenas na lógica matemática dos conteúdos ou na

pretensão de facilitar a matemática para os estudantes pois corremos o risco de uma

decoreba que ajuda a obtenção de uma boa nota em detrimento da criação e da

compreensão.

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Agradecimentos

Agradeço a todos os alunos que fizeram parte das aulas de Didática do Cálculo

nestes 10 anos. Agradeço também a Sofia Alvim pela oportunidade de revisitar o Ensino

Médio. E agradeço ao meu grupo de embodiment e orientandos pelas discussões.

Referências

BOLITE FRANT, J., ACEVEDO, J., FONT, V. Cognição corporificada e linguagem

na sala de aula de matemática: analisando metáforas na dinâmica do processo de ensino

de gráficos de funções. Boletim GEPEM, 46, 41-54. 2005

GIRALDO, V., MARTINEZ, A, Uma Análise Da Introdução Do Conceito De Número

Real Em Livros Didáticos Brasileiros V HTEM 2010.

RIPOLL, Cydara C. A construção dos números reais nos ensinos fundamental e

médio. Disponível em: http://www.biemsbm.ufba.br/M54.pdf Acesso em

21/04/08.

SFARD, Anna. Thinking as Communicating, Cambridge University Press. Ebook

ISBN 978-0-511-37958-1. 2008.