língua portuguesa - quem é vladimir herzog

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Vladimir Herzog Vlado Herzog (Osijek , Croácia (à época ainda parte do Reino da Iugoslávia ), 27 de junho de 1937 São Paulo , 25 de outubro de 1975 ) foi um jornalista , professor e dramaturgo . Passou a assinar "Vladimir" por considerar seu nome muito exótico nos trópicos. Naturalizado brasileiro , Vladimir também tinha paixão pela fotografia , atividade que exercia por conta de seus projetos com o cinema . O nome de Vladimir tornou-se central no movimento pela restauração da democracia no Brasil após 1964. Militante do Partido Comunista Brasileiro , foi torturado até a sua morte em São Paulo , após ter se dirigido pessoalmente ao órgão para um interrogatório sobre suas atividades "ilegais" [3] [1] . Segundo o jornalista Sérgio Gomes , Vladimir Herzog é um "símbolo da luta pela democracia, pela liberdade, pela justiça”. Vladimir era casado com a publicitária Clarice Herzog, com quem teve dois filhos. Com a morte do marido, Clarice passou por maus momentos, com medo e opressão e teve que contar para os filhos pequenos o que havia ocorrido com o pai. Clarice, três anos depois (1978), conseguiu que a União fosse responsabilizada, de forma judicial, pela morte do esposo. Ainda sem se conformar, ela diz que "Vlado contribuiria muito mais para a sociedade se estivesse vivo". Cartaz de 2009, que estiliza a foto oficial do alegado suicídio de Herzog, é utilizado por manifestantes na porta do jornal Folha de S.Paulo, em protesto contra um editorial do jornal que teria chamado a ditadura militar de "dita branda". Biografia Primeiros anos Herzog nasceu na cidade de Osijek , em 1937, na Iugoslávia (atual Croácia ), filho do casal de origem judaica Zigmund e Zora Herzog. Com o intuito de escaparem do Estado Independente da Croácia (estado fantoche controlado

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Língua Portuguesa - Quem é Vladimir Herzog

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Page 1: Língua Portuguesa - Quem é Vladimir Herzog

Vladimir Herzog

Vlado Herzog (Osijek, Croácia (à época ainda parte do Reino da Iugoslávia), 27 de junho de 1937 — São Paulo, 25 de outubro de 1975) foi um jornalista, professor e dramaturgo. Passou a assinar "Vladimir" por considerar seu nome muito exótico nos trópicos. Naturalizado brasileiro, Vladimir também tinha paixão pela fotografia, atividade que exercia por conta de seus projetos com o cinema. 

O nome de Vladimir tornou-se central no movimento pela restauração da democracia no Brasil após 1964. Militante do Partido Comunista Brasileiro, foi torturado até a sua morte em São Paulo, após ter se dirigido pessoalmente ao órgão para um interrogatório sobre suas atividades "ilegais" [3][1]. Segundo o jornalista Sérgio Gomes, Vladimir Herzog é um "símbolo da luta pela democracia, pela liberdade, pela justiça”.

Vladimir era casado com a publicitária Clarice Herzog, com quem teve dois filhos. Com a morte do marido, Clarice passou por maus momentos, com medo e opressão e teve que contar para os filhos pequenos o que havia ocorrido com o pai. Clarice, três anos depois (1978), conseguiu que a União fosse responsabilizada, de forma judicial, pela morte do esposo. Ainda sem se conformar, ela diz que "Vlado contribuiria muito mais para a sociedade se estivesse vivo".

Cartaz de 2009, que estiliza a foto oficial do alegado suicídio de 

Herzog, é utilizado por manifestantes na porta do jornal Folha de

S.Paulo, em protesto contra um editorial do jornal que teria 

chamado a ditadura militar de "dita branda".

Biografia

Primeiros anos

Herzog nasceu na cidade de Osijek, em 1937, na Iugoslávia (atual Croácia), filho do casal de origem judaica Zigmund e Zora Herzog. Com o intuito de escaparem do Estado Independente da Croácia (estado fantoche controlado pela Alemanha Nazista e pela Itália Fascista), o casal decidiu migrar com o filho para o Brasil, na década de 1940.

Educação e carreira

Herzog se formou em Filosofia pela Universidade de São Paulo, em 1959. Depois de formado,

trabalhou em importantes órgãos de imprensa no Brasil, notavelmente em O Estado de S.

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Paulo. Nessa época, resolveu passar a assinar "Vladimir", ao invés de "Vlado", pois acreditava

que seu nome verdadeiro soava um tanto exótico no Brasil. Vladimir também trabalhou por três

anos na BBC de Londres.

Na década de 1970, assumiu a direção do departamento de telejornalismo da TV Cultura, de

São Paulo. Também foi professor de jornalismo na Escola de Comunicações e Artes da USP e,

nessa época, também atuou como dramaturgo, envolvido com intelectuais do teatro. Em sua

maturidade, Vladimir passou a atuar politicamente no movimento de resistência contra

a ditadura militar brasileira de 1964 a1985, como também no Partido Comunista Brasileiro.

Prisão e morte

Em 24 de outubro de 1975 — época em que Herzog já era diretor de jornalismo da TV Cultura

— agentes do II Exército convocou Vladimir para prestar depoimento sobre as ligações que ele

mantinha com o Partido Comunista Brasileiro (que fora colocado na ilegalidade pela ditadura

militar). No dia seguinte, Herzog compareceu ao pedido. O depoimento de Herzog foi realizado

numa sessão de tortura. Ele estava preso com mais dois jornalistas, George Benigno Duque

Estrada e Rodolfo Konder, que confirmaram o espancamento.

No dia 25 de Outubro, Vladimir foi oficialmente "encontrado enforcado com o cinto de sua

própria roupa". Embora a causa oficial do óbito, divulgada pelos órgãos de repressão da época,

seja suicídio por enforcamento, há consenso na sociedade brasileira de que ela resultou de

intenso processo de tortura, com suspeição sobre servidores do DOI-CODI, que teriam posto o

corpo na posição encontrada, pois as fotos exibidas mostram Vlado enforcado. Porém, nas

fotos divulgadas há várias inverossimilhanças. Uma delas é o fato de que ele se enforcou com

um cinto, coisa que os prisioneiros do DOI-CODI não possuíam. Além disso, suas pernas estão

dobradas e no seu pescoço há duas marcas de enforcamento, o que mostra que sua morte foi

feita por estrangulamento.

Na época, era comum que o governo militar ditatorial divulgasse que as vítimas de suas

torturas e assassinatos haviam perecido por "suicídio", fuga ou atropelamento, o que gerou

comentários irônicos de que Herzog e outras vítimas haviam sido "suicidados pela ditadura".

Em sentença histórica, responsabilizando a União pela morte, em outubro de 1978, o juiz

federal Márcio Moraes pediu a apuração da autoria e das condições da morte. Entretanto nada

foi realizado (Luiza Villaméa. "Memória e Silêncio". 28.Set.05. Isto É).

Os últimos momentos de Vlado

Matéria de Celso Miranda no Guia do Estudante da Editora Abril, descreve os últimos

momentos do jornalista, professor e militante do Partido Comunista (Celso Miranda.   Vladimir

Herzog: Mataram o Vlado   de 01/10/2005 00h00)  . A matéria integral merece ser lida pois traz

um detalhado exame dos acontecimentos, vinte anos depois (trechos).

Vladimir acordou mais cedo que de costume no sábado, 25 de outubro de 1975.

Fez a barba, tomou banho e se despediu da mulher Clarice, ainda na cama, com

um beijo. (...) Depois que entrou no DOI, Vlado trocou de roupa e vestiu o

macacão dos presos. Ainda pela manhã, foi acareado com dois presos. Com as

cabeças cobertas por capuzes de feltro preto, eles não podiam se ver. Mas um deles, Leandro (Leandro Konder), reconheceu o amigo: “Empurrei a borda do pano e vi o preso que chegava. Eu o reconheci pelos sapatos: eram os mocassins pretos que Vlado usava.” 

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Nessa hora, Vlado negou que pertencesse ao PCB e Konder e o outro preso foram retirados para um corredor, de onde ouviram os gritos de Vlado e a ordem para que fosse trazida a máquina de choques elétricos. “Os gritos duraram até o fim da manhã. Os choques eram tão violentos que faziam Vlado urrar de dor”, diz Konder. Um rádio foi ligado em alto volume para abafar os sons. Meia hora depois, por volta das 11h, Vlado foi para a sala de interrogatórios. “Mais ou menos uma hora depois, me levaram a outra sala onde pude retirar o capuz e ver o Vlado. O interrogador, um homem de uns 35 anos, magro, musculoso, com uma tatuagem de âncora no braço, mandou que eu dissesse a ele que não adiantava resistir”, lembra Konder. Vlado estava com o capuz enfiado na cabeça, trêmulo, abatido, nervoso. Sua voz estava por um fio. “Fui obrigado a ajudá-lo a redigir uma confissão que dizia que ele tinha sido aliciado por mim para entrar no PCB e listava outras pessoas que integrariam o partido.” Konder foi levado e os gritos recomeçaram. Essa foi a última vez que Vlado foi visto e ouvido. “No meio da tarde, fez-se silêncio na carceragem”, diz George Duque Estrada que também estava preso no DOI, em relato no livro Dossiê Herzog – Prisão, Tortura e Morte, de Fernando Pacheco Jordão.

Missa Ecumênica

Depois do ato institucional numero cinco, de 13 de dezembro de 1968, a missa ecumênica em protesto a morte de Vladimir Herzog foi o primeiro grande movimento da sociedade civil contra as práticas da ditadura militar. Reuniu milhares de pessoas dentro e fora da Catedral na Praça da Sé. O assassinato colocara uma grande questão religiosa. Os judeus não enterram suicidados dentro de seu cemitério, mas fora dele. Assim o enterro de Herzog, dentro do cemitério Israelista, e a respectiva missa se tornaram atos contra o regime militar. O então secretário de Segurança Estadual Erasmo Dias bloqueou a cidade inteira com barreiras policiais, impedindo o acesso à Catedral e o trânsito na cidade, mesmo assim as pessoas desceram de seus ônibus e automóveis e se dirigiram a pé até a catedral, no centro da cidade. A propria Praça da Sé, situada em frente a catedral, se encontrava totalmente tomada por policiais, seus cavalos e cachorros, que iam até praticamente a calçada da rua que separa as escadarias da Sé. Apesar da repressão a missa ocorreu silenciosamente até o seu final com cerca de oito mil pessoas em seu interior, e milhares na escadaria que gritando slogans pela volta da democracia. Ao final carros sem placa atiraram bombas de gás lacrimogênio contra os participantes que tentavam sair da Catedral em passeata. Dispersando o movimento (Celso Lungareti, "Vladimir Herzog é assassinado: o Brasil repudia o DOI-Codi".)

Registra ainda Celso Miranda      em      Vladimir Herzog: Mataram o Vlado      de 01/10/2005 00h00    .

Nas ruas de São Paulo, o clima era outro. Ainda na segunda-feira, cerca de 30 mil

estudantes da USP, PUC e Fundação Getúlio Vargas entraram em greve. A

garotada queria marchar pela cidade, mas aguardava a reunião com os

jornalistas. Juntos, aprovaram a realização de um ato religioso pela memória de

Vlado na sexta, dia 31. O cardeal Arns tomou a iniciativa: ofereceu a catedral da

Sé e disse que estaria lá. (...) No dia seguinte, o povo estava na rua e (com a

missa) fazia a primeira manifestação contra a ditadura após o AI-5. Um pouco antes da hora do culto, dois secretários do governador Paulo Egydio Martins ainda procuraram o arcebispo de São Paulo e lhe pediram para cancelar o evento. “Fui informado que existiriam mais de 500 policiais na praça com ordem de atirar ao primeiro grito. Se houvesse protestos, eles metralhariam a população”, lembra dom Paulo. A estratégia dos manifestantes era chegar à praça em pequenos grupos, evitando aglomerações. Cerca de 

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8 mil pessoas se espalharam pelas escadarias da Sé. As que conseguiram entrar viram o cardeal, o rabino Henry Sobel e mais 20 sacerdotes, entre eles dom Helder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife. “Ninguém toca impunemente no homem, que nasceu do coração de Deus para ser fonte de amor”, disse dom Paulo. “Nas minhas dores, ó Senhor, fica ao meu lado”, respondeu a audiência. Vladimir Herzog: Mataram o Vlado de 01/10/2005

Pós-morte

Gerando uma onda de protestos de toda a imprensa mundial, mobilizando e iniciando um processo internacional em prol dos direitos humanos na América Latina, em especial no Brasil, a morte de Herzog impulsionou fortemente o movimento pelo fim da ditadura militar brasileira. Após a morte de Herzog, grupos intelectuais, agindo em jornais e etc., e grupos de atores, no teatro, como também o povo, nas ruas, se empenharam na resistência contra a ditadura do Brasil. Diante da agonia de saber se Herzog havia se suicidado ou se havia sido morto pelo Estado, criaram-se comportamentos e atitudes sociais de revolução. Em 1976, por exemplo, Gianfrancesco Guarnieri escreveu Ponto de Partida, espetáculo teatral que tinha o objetivo de mostrar a dor e a indignação da sociedade brasileira diante do ocorrido.

 Segundo o próprio Guarnieri:

[...] Poderosos e dominados estão perplexos e hesitantes, impotentes e angustiados. Contendo justos

gestos de ódio e revolta, taticamente recuando diante de forças transitoriamente invencíveis. Um dia os

tempos serão outros. Diante de um homem morto, todos precisam se definir. Ninguém pode permanecer

indiferente. A morte de um amigo é a de todos nós. Sobre tudo quando é o Velho que assassina o Novo..

Legado

Em 2009, mais de 30 anos após a morte de Vladimir, surge o Instituto Vladimir Herzog. O Instituto destina-se a três objetivos: organizar todo o material jornalístico sobre a história de Vladimir, como meio de auxílio a estudantes, pesquisadores e outros interessados em sua vida e obra; promover debates sobre o papel do jornalista e também discutir sobre as novas mídias, e, por fim, ser responsável pelo Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, que premia pessoas envolvidas no jornalismo e na promoção dos direitos humanos.