limites ao controle jurisdicional do ato administrativo ... · controle exercido pelo poder...

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Limites ao controle jurisdicional do ato administrativo discricionário.

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Limites ao controle jurisdicional do ato administrativo discricionário.

PRISCILA CUNHA DO NASCIMENTO

Advogada da União. Mestranda em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Especialista em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Bacharela em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Limites ao controle jurisdicional do ato administrativo discricionário.

1ª Edição

São Paulo

PerSe Editora 2012

Título Limites ao controle jurisdicional dos atos administrativos

discricionários.

Copyright ® 2012 by Priscila Cunha do Nascimento

Todos os direitos reservados ao autor. Proibida a reprodução no todo ou em parte, sob qualquer forma, salvo em citações com a indicação

da fonte.

Printed in Brazil/Impresso no Brasil

ISBN XXX-XX-XXXX-XXX-X

Autoria, capa, revisão e diagramação Priscila Cunha do Nascimento

Ficha catalográfica: Nascimento, Priscila Cunha. Limites ao controle jurisdicional do ato administrativo

discricionário/Priscila Cunha do Nascimento – São Paulo: Perse, 2012.

112p., 14x 21 cm ISBN XXX-XX-XXXX-XXX-X 1. Ato Administrativo. 2. Controle jurisdicional. 3 Limites ao

Controle jurisdicional. I - Titulo.

CDD: 342 CDU: 342.9

Índice para catálogo sistemático: 1. Direito administrativo: Discricionariedade administrativa:

Controle jurisdicional. 342.9

Aos meus pais, Helenira e Afrânio, pelo amor incondicional e incentivo a meus sonhos.

Sumário

Nota da Autora 09 Introdução 11

Capítulo I Desvendando o ato administrativo discricionário 15 1.1. Considerações iniciais sobre ato administrativo 15 1.2. A dicotomia entre os atos administrativos discricionários e vinculados 19 1.3. Justificativa e delineamentos da discricionariedade 23 1.4. Discricionariedade e arbitrariedade 266 1.5. O mérito do ato administrativo discricionário 288

Capítulo II Controle jurisdicional dos atos discricionários 399 2.1. Controle dos aspectos vinculados do ato administrativo discricionário 411 2.1.1 Considerações iniciais 411 2.1.2. Argumentos utilizados para defesa da insindicabilidade dos aspectos não vinculados do ato administrativo e suas refutações 455 2.1.3. Ampliação do controle de legalidade dos atos discricionários 633 2.2. Corrente doutrinária favorável ao controle dos aspectos não vinculados do ato discricionário 688 2.2.1. Considerações preliminares 688 2.2.2. A sindicabilidade judicial da discricionariedade e a juridicidade 70

Capítulo III Limites ao controle jurisdicional dos atos administrativos discricionários 777 3.1. Princípio da impessoalidade 788 3.2. Princípio da publicidade 79 3.3. Princípio da moralidade 80 3.4. Princípio da eficiência 822 3.5. Princípios gerais da proporcionalidade e razoabilidade 844 3.6. Principio da igualdade 886 3.7. A finalidade e o desvio de poder 89 3.8. A motivação e a teoria dos motivos determinantes 933

Capítulo IV O posicionamento do Supremo Tribunal Federal 977 4.1. Discricionariedade e separação dos poderes 977 4.2. Controle de legalidade dos atos discricionários 104 4.3. Controle de juridicidade dos atos discricionários 1066 Conclusão 111 Referências bibliográficas 151

Nota da Autora O presente trabalho se constitui na atualização e revisão da monografia apresentada com requisito parcial para obtenção do titulo de Bacharela em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará. O despertar pelo Direito Administrativo não aconteceu à primeira vista. Foi durante o estágio na Seção Judiciária da Justiça Federal no Ceará que os questionamentos à atuação da Administração Pública adentraram o universo da autora. Àquela época, aos olhos de uma estudante de direito, desconhecedora da magnitude e complexidade do Poder Executivo, a Administração Pública parecia ignorar a existência de um Estado de Direito ao desrespeitar cotidianamente as regras e princípios mais basilares do ordenamento jurídico brasileiro. Queria o destino que, após a titulação de bacharela em Direito, a autora fosse atuar justamente exercendo as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo Federal. A compreensão da Administração Pública se aperfeiçoou. Se a essência do posicionamento firmado cerca de seis anos atrás permanece, era necessário atualizar a obra a partir desta nova vivência. E como os anos não passaram apenas para a autora, a jurisprudência também mereceu atualização. A importância da inter-relação entre Administração Pública e o Poder Judiciário permanece, razão pela qual a presente obra pretende revisitar os limites de atuação deste Poder sobre aquele contribuindo para a discussão acadêmica do tema, respeitando, dentro do possível, as primeiras palavras proferidas pela autora.

A autora.

Introdução

A Constituição Federal de 1988 apresenta-se como um

instrumento de plena realização da cidadania, à medida que prestigia

os direitos individuais e sociais básicos dos indivíduos e institui os

meios para garanti-los, requisitos estes indispensáveis à configuração

do denominado Estado Social Democrático de Direito. Igualmente,

submete o exercício do Poder Estatal, em qualquer das suas esferas

ou dimensões, aos preceitos normativos e a diversos controles

externo e interno, dentre os quais se destaca na presente obra o

controle exercido pelo Poder Judiciário.

O controle dos atos administrativos discricionários pelo Poder

Judiciário se insere neste cenário como um elemento indispensável à

concretização da democracia e do Estado de Direito, haja vista

permitir, em última análise, que seja verificada a legalidade e

jurisdicionalidade do ato praticado pela Administração Pública. Com

efeito, somente o Poder Judiciário tem jurisdição, ou seja, somente

ele é capaz de fazer coisa julgada, dizendo, em caráter definitivo e

imutável, o direito aplicável a determinado caso concreto.

O princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional1 permite

que o Judiciário exerça a sua jurisdição sobre os atos administrativos.

Contudo, há uma limitação: o principio da separação dos poderes2,

que determina que os três Poderes sejam independentes e

harmônicos entre si. Surge o principal questionamento: como garantir

a independência e harmonia entre os Poderes quando o Poder

1 Conforme inciso XXXV da Constituição Federal de 1988, verbis: “(...) a lei não excluirá

da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. 2 Este princípio se encontra expressamente previsto no art. 2º da Constituição, que

preceitua que “são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

Priscila Cunha do Nascimento

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Judiciário é provocado para julgar a regularidade de ato praticado

discricionariamente pelo Poder Executivo na qualidade de

representante eleito pelo povo, titular soberano do Poder?

O aparente confronto existente entre estes princípios é o ponto

nevrálgico da problemática do presente estudo que gira em torno do

controle jurisdicional do ato administrativo discricionário.

Embora seja assente o posicionamento de que é possível a

apreciação pelo Judiciário dos atos discricionários da Administração

Pública, não é unânime o entendimento quanto à extensão deste

controle.

A decomposição dos atos administrativos em seus elementos

permite que se visualize com maior facilidade o ponto de

discordância. Os atos discricionários apresentam elementos

vinculados: agente competente, forma e finalidade; e elementos não

vinculados: objeto e motivo3.

No que se refere aos aspectos vinculados a doutrina e a

jurisprudência são unânimes em permitir o pleno controle da

legalidade desses aspectos. E não poderia ser de outra forma. Ora,

se o administrador deve pautar a sua atuação no princípio da

legalidade, a não observância dos ditames legais macula o ato

permitindo a atuação do Judiciário. Assim, havendo compatibilidade

entre o ato in concreto e os preceitos legais se reputa válido o ato

administrativo discricionário. Caso contrário, o ato deve ser anulado.

Entretanto, no que pertine ao controle dos aspectos não

vinculados do ato administrativo discricionário há controvérsia. O

posicionamento mais conservador defende não ser possível o

controle jurisdicional dos aspectos não vinculados do ato

discricionário, em especial, o controle do denominado mérito

3 Alguns doutrinadores denominam de mérito administrativo a avaliação da

conveniência e da oportunidade relativas ao motivo e ao objeto, inspiradoras da prática do ato discricionário.

Limites ao controle jurisdicional dos atos administrativos discricionários

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administrativo, invocando o princípio da separação dos poderes como

fator impeditivo desta atuação. Entendem que, por ser a

discricionariedade administrativa uma prerrogativa concedida pela lei,

qualquer ato praticado no âmbito do poder discricionário seria

legítimo, pois a lei previamente disciplinou a prática do ato conferindo

essa liberdade de escolha ao administrador.

Esse posicionamento vem sendo confrontado com argumentos

decorrentes da constitucionalização do Direito Administrativo,

mediante a inserção na Constituição Federal de 1988 de regras

básicas e princípios a serem observados pelo Poder Executivo,

característica da fase Pós-Positivista do Direito. Admite-se a

apreciação da discricionariedade em certo grau com fundamento na

jurisdicionalização dos princípios administrativos. A discricionariedade

é compreendida sob outro enfoque: balizada por princípios gerais do

Direito e princípios administrativos constitucionais. A conduta a ser

adotada pelo administrador somente será legitima se consentânea

com as regras e princípios do ordenamento jurídico brasileiro. Esta

nova concepção da discricionariedade permite que alguns aspectos

não vinculados dos atos administrativos discricionários sejam

controlados pelo Poder Judiciário utilizando-se os princípios

constitucionais (e.g. da razoabilidade, da proporcionalidade e da

moralidade) como supedâneos para o exercício deste controle, o que

se denomina de controle de juridicidade.

A escolha do tema surgiu da crença de que, se o um lado é

necessário conferir um espaço de livre atuação da Administração

Pública, por outro lado este espaço não pode ser preenchido a seu

bel-prazer. O Poder Judiciário assume papel fundamental na aferição

da compatibilidade das escolhas administrativas com o ordenamento

jurídico brasileiro, conferindo prevalência ao amplo acesso a justiça,

entendido como uma garantia universal de que o Judiciário encontra-

se capaz de assegurar a defesa de toda e qualquer lesão ou ameaça

a direito, seja quem for o interessado, prestando um provimento

jurisdicional equilibrado e a tempo de dar efetividade a estes direitos.

A questão é: até que ponto o Poder Judiciário poderá se

imiscuir nos aspectos não vinculados do ato administrativo

Priscila Cunha do Nascimento

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discricionário sem que haja ofensa ao principio da separação dos

poderes.

Diante desta problemática quanto ao controle do ato

administrativo discricionário, especialmente no que se refere aos

seus aspectos não vinculados, foi realizado um estudo das posições

doutrinárias e jurisprudenciais defendidas em nosso país acerca do

tema proposto, apresentando-se ao final o posicionamento da autora

a respeito do assunto.

A presente obra tem, portanto, o objetivo de aprofundar o

estudo acerca do controle jurisdicional dos atos administrativos

discricionários, com ênfase no mérito administrativo.

No primeiro capítulo trabalha-se a conceituação de ato

administrativo, traçando os limites do poder discricionário, a sua

justificativa, o seu transbordamento (arbitrariedade) e o ponto chave

da problemática do trabalho: o mérito do ato administrativo

discricionário.

Já no segundo, discorre-se acerca do controle dos atos

discricionários, apresentando-se duas correntes doutrinárias. A

primeira defende que o controle a ser exercido sobre esses atos

limita-se ao controle de legalidade, ao passo que a segunda corrente

admite o controle dos aspectos discricionários do ato por meio do

controle de juridicidade. A partir desta análise, serão definidas as

balizas de atuação do Poder Judiciário na apreciação dos aspectos

não vinculados do ato administrativo discricionário.

Em remate, será apresentado o posicionamento dos Tribunais

Superiores sobre a sindicabilidade dos aspectos não vinculados do

ato administrativo, fazendo-se a devida correlação das decisões com

os limites estabelecidos no capítulo que o antecede.

Capítulo 1

Desvendando o ato administrativo discricionário

1.1. Considerações iniciais sobre ato administrativo

O ponto de partida da presente obra é a adequada

compreensão do ato administrativo, razão pela qual imprescindível

que seja apresentado o posicionamento doutrinário sobre a matéria.

O ato administrativo, no entendimento do professor Celso

Antônio Bandeira de Mello, pode ser compreendido como uma:

Declaração do Estado (ou de quem lhe faça as vezes – como,

por exemplo, um concessionário de serviço público), no

exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante

providencias jurídicas complementares da lei a titulo de lhe dar

cumprimento, e sujeitas a controle de legitimidade por órgão

jurisdicional4 .

Semelhante enfoque é defendido por Diógenes Gasparini ao

afirmar que ato administrativo é:

Toda prescrição unilateral, juízo ou conhecimento, predisposta

à produção de efeitos jurídicos, expedida pelo Estado ou por

quem lhe faça as vezes, no exercício de suas prerrogativas e

como parte interessada numa relação, estabelecida na

conformidade ou na compatibilidade da lei, sob o fundamento

de cumprir finalidades assinaladas no sistema normativo,

sindicável pelo Judiciário5.

Consoante lição de Maria Sylvia Zanella di Pietro6

, ato

administrativo é “a declaração do estado ou de quem o represente,

que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob

4 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17.ed. São, Paulo: Malheiros, 2004, p. 352. 5 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 60. 6 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 189