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Page 1: Ligeiramente - Editorial Gustavo Gili · de guerra na Espanha. A vida de Robert Capa parecia guiada por um movimento irrefreável, que o fez fotografar cinco guerras: a Guerra Civil

Ligeiramente fora de foco

“A vida é perigosa e aquele que age deve ir até o fi m de sua ação, sem se queixar.”

Blaise Cendrars, Eloge de la vie dangereuse

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Endre Friedmann, que mais tarde fi cou conhecido como Robert Capa, nasceu em 1913 na cidade de Budapeste. Embora quisesse ser escritor, tornou-se fotógrafo. Obrigado a fugir da Hungria aos 16 anos de idade devido a suas atividades contra o regime do almirante Horthy, instalou-se em Berlim, onde conseguiu um emprego de entregador e, depois, de aprendiz de fotógrafo na agência Dephot. Sua primeira reportagem foi realizada em 1932, na cidade de Copenhague, com Leon Trótski. Em 1933, diante da ascensão do nazismo, mudou-se para Paris, onde conheceu Henri Cartier-Bresson, André Kertész, David Seymour e Gerda Pohorylle, que se tornou sua companheira (e com quem criou o pseudônimo Robert Capa). Em 1936, fez sua primeira cobertura de guerra na Espanha. A vida de Robert Capa parecia guiada por um movimento irrefreável, que o fez fotografar cinco guerras: a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), a resistência chinesa à invasão japonesa (1938), a Segunda Guerra Mundial na Europa (1941-1945), a primeira Guerra Árabe-Israelense (1948) e a Guerra da Indochina (1954).

Ele criou a agência Magnum com os amigos Henri Cartier-Bresson, Chim e George Rodger, ganhou a nacionalidade norte-americana, trabalhou com John Steinbeck, Theodore H. White, Irwin Shaw, Ernest Hemingway. Foi amante de Ingrid Bergman, passou inúmeras tardes nas corridas, as noites em clubes com mulheres deslumbrantes e as madrugadas jogando pôquer com amigos como John Huston e Gene Kelly.

Robert Capa foi intenso até o fi m: em 25 de maio de 1954, enquanto cobria a Guerra da Indochina, pisou numa mina terrestre e morreu na hora.

Robert Capa (1913-1954) foi um homem que viveu vertiginosamente, vorazmente próximo da realidade, dos homens e do mundo. Por meio do ato fotográfi co, no coração dos acontecimentos e além de qualquer voyeurismo, registrou a guerra com rara emoção e coragem. É sem dúvida por isso que suas fotos conti-nuam tão intensas e estimulantes, que seu trabalho de fotojornalista lhe traz fama internacional.

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Ver é um todo. Entrevistas e conversas 1951-1998Henri Cartier-Bresson13.5 × 20.7 cm, 124 páginasISBN: 9788584520015

Fotografi aJohn Ingledew21.5 × 25.6 cm, 272 páginasISBN: 9788584520435

Mestres da fotografi a.Técnicas criativas de 100 grandes fotógrafosPaul Lowe20 × 24 cm, 288 páginasISBN: 9788584520800

A ilusão especular.Uma teoria da fotografi aArlindo Machado13 × 20 cm, 184 páginasISBN: 9788584520329

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Editorial Gustavo Gili, SLVia Laietana 47, 2º, 08003 Barcelona, Espanha. Tel. (+34) 93 322 81 61

Editora G. Gili, LtdaAv. José Maria de Faria, 470, Sala 103, Lapa de Baixo, CEP: 05038-190, São Paulo-SP, Brasil. Tel. (+55) (11) 3611-2443w

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Texto e fotografias de Robert Capa

Introdução de Richard WhelanPrefácio de Cornell Capa

Tradução de José Rubens Siqueira

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Título original: Slightly Out of Focus, publicado originalmente por Henry Holt and Company, Inc., Nova York, 1947. Esta ediçao tem por base a edição da Delpire Editeur, 2003

Tradução: José Rubens Siqueira Tradução das notas biográficas e preparação de texto: Maria Luisa de Abreu Lima Paz Revisão de texto: Adriana Cerello

Design da capa: Toni Cabré/Editorial Gustavo Gili, SL

Qualquer forma de reprodução, distribuição, comunicação pública ou transformação desta obra só pode ser realizada com a autorização expressa de seus titulares, salvo exceção prevista pela lei. Caso seja necessário reprodu-zir algum trecho desta obra, seja por meio de fotocópia, digitalização ou transcrição, entrar em contato com a Editora.

A Editora não se pronuncia, expressa ou implicitamente, a respeito da acuidade das informações contidas neste livro e não assume qualquer responsabilidade legal em caso de erros ou omissões.

© da tradução: José Rubens Siqueira © Delpire Editeur, 2003para a edição em português:© Editorial Gustavo Gili, SL, 2018

Impresso na EspanhaISBN: 978-85-8452-118-0Depósito legal: B. 194-2018

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Capa, Robert, 1913-1954 Ligeiramente fora de foco / texto e fotografias de Robert Capa ; introdução de Richard Whelan ; prefácio de Conrell Capa ; tradução José Rubens Siqueira. -- São Paulo : Gustavo Gili, 2018.

Título original: Slightly out of focus. ISBN 978-85-8452-118-0

1. Capa, Robert, 1913-1954 2. Fotógrafos de guerra - Estados Unidos - Biografia 3. Guerra Mundial, 1939-1945 - Fotografias 4. Guerra Mundial, 1939-1945 - Narrativas pessoais I. Whelan, Richard. II. Capa, Cornell. III. Título.

17-11587 CDD-940.548173

Índices para catálogo sistemático: 1. Estados Unidos : Fotógrafos de guerra : Narrativas pessoais : Guerra Mundial, 1939-1945 940.548173

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ROBERT CAPApor Richard Whelan

Robert Capa fotografou cinco guerras: a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), a resistência chinesa à invasão japonesa (que ele cobriu em 1938), o palco europeu da Segunda Guerra Mundial (1941-1945), a primeira guerra árabe-israelense (1948) e a guerra da Indochina francesa (1954). Ninguém fotografou a guerra com tamanha bravura e mais intensa compaixão.

Endre Friedmann nasceu em Budapeste em 22 de outubro de 1913, numa família judia de classe média que tinha uma confecção de roupas elegantes. Seu irmão, Kornel, que viria a ser fotógrafo com o nome de Cornell Capa, nasceu em 1918.

Em maio de 1931, quando Endre tinha dezessete anos, foi preso por suas atividades estudantis de esquerda contra o regime protofas-cista do almirante Miklós Horthy e passou uma noite na cadeia. No dia seguinte, graças à influência da esposa do chefe de polícia, uma boa cliente da família, o pai de Endre conseguiu que fosse solto com a condição de deixar o país depois dos exames escolares, que estavam próximos. Em julho, ele partiu para Berlim, onde, no outono, matri-culou-se na Escola Superior de Ciências Políticas para estudar jorna-lismo, não fotojornalismo. A depressão econômica mundial logo impossibilitou que seus pais continuassem pagando sua educação. Forçado a deixar a escola, ele naturalmente procurou conterrâneos húngaros em Berlim, em busca de emprego. Acabou trabalhando como office boy da importante agência de fotojornalismo Dephot e foi logo promovido a assistente de laboratório, depois a aprendiz de fotografia.

Em novembro de 1932, a agência mandou-o a Copenhague para fotografar o exilado Leon Trótski, que ia dar uma palestra para estu-dantes dinamarqueses. O artigo publicado fez grande sucesso, mas antes que o fotógrafo pudesse capitalizar em cima dele, teve de fugir da Alemanha, em março de 1933, logo depois que Hitler assumiu poderes ditatoriais. Endre conseguiu permissão oficial para voltar a sua Budapeste natal e dali seguiu para Paris naquele outono. Nos w

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cafés de Montparnasse ele logo conheceu e fez amizade com outros fotógrafos como André Kertész, David Seymour (“Chim”) e Henri Cartier-Bresson.

No outono de 1934, André (como se chamava então) conheceu Gerda Pohorylle, uma refugiada judia alemã; logo se apaixonaram e passaram a viver juntos. Ela datilografava as legendas para suas fotos e arrumou um emprego na agência para a qual ele trabalhava; em troca, ele a ensinou a usar a câmera.

Na primavera de 1936, diante de uma assustadora escassez de vendas, André e Gerda resolveram inventar um glamoroso e bem-su-cedido fotógrafo americano chamado Robert Capa. Quando Gerda fez a ronda das agências editoriais, disse que as fotografias de André eram de Capa e que ela estava fazendo um tremendo favor aos edito-res dando-lhes a oportunidade de comprar o trabalho desse gênio esquivo. Impressionados, os editores compraram as fotografias e pu-blicaram.

O nome “Capa” parece ter sido inspirado em Frank Capra, o diretor de Hollywood cuja obra-prima, Aconteceu naquela noite, com Claudet-te Colbert e Clark Gable, acabara de receber o Oscar de melhor filme de 1934, conquistando também Oscars para o diretor e os dois atores. “Robert” também vinha do cinema, do ator Robert Taylor, que em 1936 era o amante de Greta Garbo em A dama das camélias. Na mes-ma época, Gerda mudou seu sobrenome para Taro, emprestado do jovem artista japonês Taro Okamoto, então vivendo em Paris.

Pouco depois, o misterioso Capa era realmente famoso. Quando a tramoia foi descoberta, André entendeu que teria de assumir o nome de Robert Capa e fazer jus à reputação desse sensacional fotó-grafo imaginário.

Em agosto de 1936, aos 22 anos, Capa começou sua abrangente e apaixonada cobertura da Guerra Civil Espanhola. Foi em sua pri-w

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meira viagem que fez a famosa fotografia de um miliciano republica-no espanhol começando a cair ao receber um tiro fatal. A foto foi publicada em todo o mundo com grande repercussão.

Gerda Taro, que muitas vezes trabalhou com Capa na Espanha, mas que também estava se tornando uma fotojornalista independen-te, permaneceu em Madri em 1937, quando Capa voltou a Paris para cuidar de alguns negócios. Surpreendida numa retirada confusa quando estava cobrindo o combate em Brunete, a oeste de Madri, Taro foi esmagada por um tanque de guerra republicano. Capa, que pretendia se casar com ela, nunca se recuperou inteiramente desse golpe.

Relutante em voltar para uma guerra que havia matado a mu-lher que amava, Capa passou seis meses na China, em 1938, com o cineasta holandês Joris Ivens, documentando a resistência à invasão japonesa que começara no ano anterior. Como o Japão era aliado da Alemanha, a guerra na China era tida, no geral, como o front oriental da luta internacional contra o fascismo, da qual a Espanha era o front ocidental.

Nesse outono, Capa voltou à Espanha para cobrir a retirada das Brigadas Internacionais, e continuou lá, fotografando as batalhas de Mora de Ebro e do rio Segre, ambas no front de Aragão. Em dezembro, a prestigiosa revista britânica Picture Post publicou oito páginas de fotos de guerra de Capa (então com 25 anos) e qualificou-o como “o maior fotógrafo de guerra do mundo”.

Logo depois do final da Segunda Guerra Mundial, Capa e seus ami-gos Henri Cartier-Bresson, Chim, George Rodger e William Vandi-vert fundaram a Magnum, uma agência fotográfica cooperativada. Durante o resto da vida, Capa dedicaria grande parte de seu tempo à orientação das operações da Magnum em Paris e Nova York. Seu maior entusiasmo era pelos fotógrafos jovens que convidava a fazer w

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parte da agência. Considerava-os sua própria família e se empenha-va muito em conseguir trabalho para eles, estimulando, aconselhan-do, emprestando dinheiro e levando-os a jantares e festas. Embora tivesse se naturalizado americano em 1946, Capa viveu em Paris durante o final dos anos 1940 e começo dos 1950. Lá vivia a vida glamorosa de tardes nas pistas de corrida, noites em boates com lindas mulheres e partidas de pôquer a noite inteira com amigos como John Huston e Gene Kelly.

No final dos anos 1940, Capa colaborou com vários projetos de amigos literatos. No verão de 1947, passou um mês viajando pela União Soviética com John Steinbeck; o livro que produziram, Um diário russo, trazia lado a lado o texto de Steinbeck e as fotos de Capa. No ano seguinte, a revista Holiday enviou Capa e o jornalista Theo-dore H. White à Hungria e à Polônia. E em 1949, ele e o romancista Irwin Shaw produziram o livro Report on Israel.

Em abril de 1954, Capa passou três semanas no Japão como convida-do da editora Mainichi Shimbun para lançar uma nova revista de fotografia. Em Tóquio, Osaka, Kyoto e outras cidades, concentrou-se em fotografar crianças. Ainda no Japão, aceitou uma proposta da Life para passar um mês na Indochina substituindo um fotógrafo que havia voltado para os Estados Unidos. Em 25 de maio, acompanhava um comboio francês numa missão de evacuação de dois fortes inde-fensáveis no delta do rio Vermelho. Quando o comboio parou, Capa foi até um campo próximo da estrada para fotografar um grupo de soldados franceses. Ali pisou numa mina terrestre e foi morto.

Num portfólio em memória da obra de Capa publicado na revista Popular Photography, John Steinbeck escreveu: “Capa sabia o que pro-curar e o que fazer quando encontrava. Sabia, por exemplo, que não é possível fotografar a guerra, porque é em grande parte uma emo-w

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ção. Mas ele realmente fotografou essa emoção, registrando seu en-torno. Era capaz de mostrar o horror de todo um povo no rosto de uma criança. Sua câmera captava e perpetuava a emoção.

“A obra de Capa é, ela própria, o retrato de um grande coração e de uma arrebatadora compaixão. Ninguém tomará o seu lugar. Nin-guém toma o lugar de qualquer grande artista, mas temos a sorte de ter em suas fotografias a qualidade do homem.

“Trabalhei e viajei muito com Capa. Ele podia ter amigos mais próximos, mas nenhum que o amasse mais do que eu. Tinha prazer em parecer displicente, descuidado com seu trabalho. Não era assim. Suas fotografias não são acidentais. A emoção que existe nelas não vinha do acaso. Ele podia fotografar movimento, alegria, comoção. Podia fotografar o pensamento. Ele captava um mundo e era o mun-do de Capa.”

E numa cerimônia funeral para Capa, Edward Steichen levan-tou-se e disse: “Ele entendia a vida. Vivia a vida intensamente. Ele dava generosamente aquilo que tinha para dar à vida... vivia com valentia, com vigor, com uma rara integridade.”

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PREFÁCIOCornell Capa

Meu irmão, Robert Capa, assumiu o encargo de registrar o inferno que o homem criou para si próprio, a guerra. Sua compaixão era por todos os que sofriam na guerra e suas fotografias transformaram em momentos eternos não apenas acontecimentos cruciais como tam-bém provações pessoais.

As exigências das décadas que ele viveu foram trágicas, mas o que lhe dava forças eram seu senso de humor e uma atitude autode-preciativa quanto à sua coragem. Eram esses os ingredientes essen-ciais desse homem, de sua vida e de seu trabalho. Em Ligeiramente fora de foco ele escreveu sobre suas experiências no Dia D: “O corres-pondente de guerra tem sua aposta – sua vida – nas próprias mãos e pode apostar neste ou naquele cavalo, ou pode guardá-la de volta no bolso no último minuto. Eu sou um jogador. Resolvi partir com a Companhia E na primeira leva.”

Ao tomar essa decisão, estava seguindo o conselho que sempre dava a seus colegas fotógrafos: “Se suas fotos não estão boas o suficiente, é porque você ainda não está perto o suficiente.” Mas por trás do humor, da ironia e da coragem havia uma grande sensibilidade, que o levou a observar com típica discrição: “Nem sempre é fácil ficar de lado sem poder fazer nada além de registrar o sofrimento à sua volta.”

A vida de Robert Capa é um testamento de dificuldades supera-das, um desafio enfrentado, um jogo ganho, a não ser pelo fim, quando ele pisou numa mina terrestre na Indochina e seu papel como testemunha se encerrou. Nascido sem meios para viajar, com uma língua que não tinha utilidade além das fronteiras de seu pe-queno país, a Hungria, ele conseguiu vivenciar o mundo através de um meio de comunicação universal, a fotografia. Assim conseguiu falar a todos nós, em seu tempo e hoje.

Durante sua breve passagem pela terra, ele viveu e amou muito. Nasceu sem dinheiro e morreu do mesmo jeito. O que deixou para trás é a história de sua viagem única e um registro visual que afirma w

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sua própria fé na capacidade humana de suportar e, de vez em quan-do, triunfar.

C. C. Nova York, abril de 1999

“Bob Capa: era um bom amigo e um grande fotógrafo, muito corajo-so. É lamentável para todos que as estatísticas o tenham atingido. Especialmente para Capa. Ele era tão cheio de vida que custa acredi-tar que está morto.”

Ernest Hemingway Madri, 24 de maio de 1954

Cornell Capa, irmão mais novo de Robert, fez uma notável carreira como fotojornalista para a revista Life e para a Magnum Photos. Em 1974, fundou o International Center of Photography na cidade de Nova York. Foi diretor da entidade até se aposentar em 1994, permanecendo como diretor funda-dor emérito até sua morte em 2008.

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InTROduçãORichard Whelan

O precoce adolescente de Budapeste que acabaria conhecido mun-dialmente como Robert Capa não aspirava ser fotógrafo. Queria ser escritor: repórter e romancista. Foi por acaso, não por escolha, que desviou, ou foi empurrado pelas circunstâncias, para a fotografia.

Mesmo quando a força sem precedentes de suas fotografias de guerra – na Espanha, na China e por todo o palco europeu da Segun-da Guerra Mundial – já o tinha estabelecido no ponto mais alto do fotojornalismo, Capa nunca abandonou o sonho de ser escritor pri-meiro e fotógrafo depois. Foi, portanto, com grande satisfação que ele viu em 1947 – na sobrecapa de Ligeiramente fora de foco, embora não na página de rosto – a primeira aparição de seus créditos favori-tos: “De Robert Capa, com fotografias do autor.” Esses créditos apare-ceriam depois em seus divertidos artigos para a revista Holiday sobre esqui nos Alpes, sobre festas e jogos em resorts cintilantes como Deauville e Biarritz, e sobre suas viagens e aventuras em países que iam da Noruega à Hungria.

Como a maioria dos exemplares da edição original de Ligeiramente fora de foco não tem mais as sobrecapas, a maioria dos leitores que mergulha no texto de Capa não conhece esta frase que aparecia na primeira orelha. “Como é evidentemente muito difícil escrever a verdade”, ele dizia, “no interesse dela eu me permiti às vezes ir um pouco além e um pouco aquém. Todos os eventos e pessoas neste li-vro são acidentais e têm alguma coisa a ver com a verdade.”

Essa declaração era necessária pela simples razão de que Capa escrevera seu livro não para ser tomado como um documento histó-rico mas sim para servir, com poucas alterações, de base para um roteiro de cinema interessante. A maioria das histórias do livro era perfeitamente verdadeira, mas Capa mudou o nome de alguns perso-nagens principais, acelerou a sequência de alguns acontecimentos e mudou pequenos detalhes. Por exemplo, na segunda frase do primei-ro capítulo, Capa declara que seu apartamento-estúdio ficava no “último andar de um prediozinho de três andares na Ninth Street”. w

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Na verdade, ficava no último andar de um prédio de tijolos marrons de cinco andares na West Ninth Street, 60. Podemos concluir que Capa achava que um prédio de três andares combinava melhor que um de cinco com a ideia que Hollywood fazia de uma construção pitoresca de Greenwich Village.

Capa era um contador de histórias nato e poucas coisas lhe eram mais prazerosas do que alegrar um amigo ou um estranho com a narrativa hilariante de alguma de suas aventuras picarescas. Quando a verdade literal era importante, ele contava a verdade literal. Mas quando só mesmo um chato pedante insistiria nela, Capa não via nenhuma razão para se proibir alguns enfeites para tornar uma boa história ainda melhor – o que quer dizer mais divertida, geralmente à custa de si mesmo.

Recentemente, sua reputação foi absolvida da alegação mais séria ja-mais feita contra sua honestidade numa questão muito importante. Um jornalista britânico idoso, cuja memória não era mais confiável, acusou Capa de ter feito sua famosa fotografia de um miliciano repu-blicano espanhol atingido por um disparo durante um treinamento e não durante uma batalha. Mas Capa estava bem longe de onde o jornalista dizia estar e um historiador espanhol confirmou que o homem na foto – que tanto ele como a família do próprio identifica-vam como Federico Borrell García – recebera um tiro fatal na hora e no local da foto de Capa: perto da aldeia de Cerro Muriano, poucos quilômetros ao norte de Córdoba, em 5 de setembro de 1936.

A viagem que Capa narra no capítulo inicial de Ligeiramente fora de foco não foi sua primeira experiência num comboio transatlântico até a Grã-Bretanha. Ele já havia feito travessia semelhante na prima-vera de 1941 para encontrar sua amiga Diana Forbes-Robertson (que conhecera na Espanha) para colaborarem num livro intitulado The w

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Battle of Waterloo Road sobre a maneira como os moradores cockney de um bairro do East End londrino estavam sobrevivendo à blitz. Dinah, como todos os seus amigos a chamavam, era filha do grande ator sir Johnston Forbes-Robertson e esposa do então famoso jorna-lista Vincent (“Jimmy”) Shean, cujo livro de memórias Personal His-tory havia sido um best-seller. A irmã de Dinah era lady Maxine Forbes-Robertson, cujo apelido, Blossom, virou “Flower” em Ligeira-mente fora de foco. O segundo casamento de Blossom, em 1932, foi com F.G. (Frederick George) Miles, então dono de uma escola de pi-lotos de avião. Aviadora entusiasta e experiente, Blossom logo come-çou a trabalhar com seu marido no projeto de um avião que viria a ser conhecido como o Hawk. Foi um sucesso imediato, porque era mais rápido, mais confortável e menos caro do que seu principal ri-val, o Haviland Moth. Durante a guerra, os contratos cresceram e nos primeiros anos da década de 1940 a Miles Aircraft empregava em sua grande fábrica em Reading seis mil trabalhadores.

Dinah e Jimmy levaram Capa para passar muitos fins de sema-na com os Miles durante o verão de 1941 e ficaram todos muito amigos. Como Capa havia retomado a amizade com Blossom e Miles depois da volta a Londres em 1942, foi bastante natural que os pro-curasse em meados de fevereiro de 1943, ao voltar a Londres depois de uma viagem de trabalho. Entre os hóspedes daquele fim de sema-na encontrava-se John Justin, um ator bonito, esguio, meio inglês, meio argentino, que fizera o papel de Ahmad, o líder deposto no maravilhoso filme de Alexander Korda, O ladrão de Bagdá, em 1940; depois disso ele desistira temporariamente da carreira cinematográ-fica para se tornar piloto da RAF. Ao lado de Justin estava sua glamo-rosa esposa de 25 anos, Elaine, uma beleza estonteante com a silhueta absolutamente sedutora, a atitude muito feminina e sexy, e a bela cabeleira ruiva que levou Capa a lhe dar o apelido de “Pinky”. O casamento com Justin já estava nas últimas, mas não consegui-w

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ram se divorciar. Conforme Pinky lembraria depois sobre ela e Capa, “bastou um olhar de um para o outro e sabíamos que alguma coisa havia começado”. Em Ligeiramente fora de foco a história desse ro-mance é entrelaçada com o relato da cobertura de guerra que Capa estava fazendo.

Pinky acabou se casando, de fato, com Chuck Romine, cuja privaci-dade Capa protegeu sob o nome de Chris Scott. Com Pinky perdida e a guerra na Europa terminada, passaram-se algumas semanas em que o fotógrafo deve ter sentido (como lamenta na primeira e na úl-tima frase de seu livro) que “não havia mais absolutamente nenhu-ma razão para levantar de manhã”. Mas ele logo arrumou uma razão muito boa para levantar: um romance com Ingrid Bergman, que es-tava na Europa para entreter as tropas americanas.

Antes de voltar para casa, ela e Capa planejaram se encontrar em Hollywood, como de fato se encontraram, em dezembro de 1945. Ele não era nenhum estranho na cidade, pois durante a guerra tinha fi-cado amigo dos diretores John Huston, George Stevens, William Wyler, Irving Reis, Anatole Litvak e Billy Wilder. Litvak logo recla-mou, brincando: “Depois de duas semanas aqui, Capa já é convidado para festas que eu levei dez anos para frequentar.”

Em janeiro de 1946, William Goetz, chefe da International Pic-tures, contratou Capa como autor e aprendiz de diretor-produtor pelo generoso, mas nada extravagante salário de quatrocentos dólares por semana. Ele tinha de escrever suas memórias de guerra como base para um roteiro (começara a escrever contos autobiográficos em Sun Valley, Idaho, em 1941, momento em que Ernest Hemingway o aju-dou a dar um polimento aos primeiros) e passaria horas nos sets, na sala de montagem e na projeção de filmes clássicos. Mas descobriu que não conseguia se concentrar na escrita e ficou absolutamente entediado com as outras responsabilidades.w

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O mais frustrante de tudo é que só podia se encontrar poucas vezes com Ingrid Bergman, não só por causa de seu marido ciumen-to (o Dr. Petter Lindstrom, de quem ela queria muito se divorciar), mas também pelos ubíquos colunistas que a observavam de perto. Só quando Hitchcock começou a filmar Interlúdio, com Ingrid Bergman e Cary Grant, foi que Capa conseguiu alguma desculpa para ficar perto dela.

Quando Bergman levantou a questão de casamento, Capa disse que, como não via nenhum futuro para si mesmo em Hollywood, teria de voltar ao fotojornalismo e não podia se prender; caso se ca-sassem, ele não teria liberdade para aceitar os trabalhos perigosos que eram sua especialidade. E Bergman não poderia acompanhá-lo em suas viagens. Ela contou tudo isso a Hitchcock, que era uma espécie de padre confessor e acabaria incorporando o dilema dos dois em seu filme Janela indiscreta, em que James Stewart faz o papel de um foto-jornalista se esquivando (sem dúvida, mais asperamente do que Capa o faria) do casamento com a comentarista de alta moda representada por Grace Kelly.

Em meados de junho de 1946, numa visita a Nova York, Capa assi-nou contrato com o editor Henry Holt para escrever suas memórias, que ele começava a elaborar, embora a data de entrega de 15 de agos-to daquele ano não fosse nada realista. Capa, então, voltou a Holly-wood para ver se ele e Bergman podiam salvar seu romance sem se casar. Como não trabalhava mais para a International Pictures, Capa devia se dedicar a escrever. Em vez disso, passava os dias fotografan-do no set do novo filme de Bergman, O arco do triunfo, e as noites festejando no estúdio com Bergman e um animado grupo de amigos.

Mais tarde, nesse verão, enquanto assistia aos ensaios de seu amigo Charles Korvin para um papel num filme chamado Tempta-tion, Capa disse que era capaz de fazer o papel do servo egípcio Ham-w

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za melhor que o egípcio que tinham contratado para isso. O personagem, com o rosto bastante escondido pelo capuz do albor-noz, passava a maior parte de sua breve aparição na tela se curvando em reverência e saindo de costas do cenário, e falava umas poucas palavras numa algaravia. Irving Pichel, o diretor, concluiu que o so-taque de Capa funcionava e mandou embora o egípcio de verdade.

Assim terminou a carreira de Capa em Hollywood – e o seu caso com Ingrid Bergman. Logo em seguida, ele estava a caminho da Turquia para dirigir um documentário para a Marcha do Tempo. A experiência não foi agradável, pelo menos em parte, porque ele tinha de traba-lhar duro toda noite para terminar seu livro. O manuscrito atrasara quase quatro meses, e o editor estava furioso. Em Ancara, através do Serviço de Informações dos Estados Unidos, Capa contratou uma estudante que falava inglês, Rosette Avigdor, para datilografar en-quanto ele ditava, processo que explica em parte o tom direto de oralidade do livro. Ele mandou o último capítulo para Holt pouco antes do Natal de 1946. Trabalhando juntos, Capa e Avigdor ficaram tão amigos que, quando ela disse que ia partir para Nova York em janeiro para estudar na Universidade Columbia, ele sugeriu que fosse morar com sua mãe. As duas mulheres gostaram da ideia, e Avigdor se tornou a “irmã turca” de Capa.

Quando Ligeiramente fora de foco foi publicado, na primavera de 1947, as críticas foram quase todas excelentes. O crítico do New Republic escreveu: “Violando as tradições de todos os correspondentes de guerra, Capa conta o que aconteceu com ele – dentro de uma moldu-ra de uma terna e arrebatada história de amor... alegre, rápido, diver-tido.” O New York Herald Tribune Book Review elogiou a “fluente narrativa de vida privada e profissional, nada semelhante a nenhuma outra história de guerra e ao mesmo tempo complementar a todos os w

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outros livros já escritos”. O maior elogio, claro, era reservado às foto-grafias de Capa. O Philadelphia Inquirer declarou: “O que Tolstói faz com palavras por Sebastopol, Hemingway por Caporetto, Crane pela Guerra Civil, Capa consegue com sua câmera.”

O tributo mais eloquente, porém, veio de um jovem vencedor do Prêmio Pulitzer chamado John Hersey, com quem Capa iniciara uma cálida amizade na Sicília, em 1943. Num artigo sobre Capa in-titulado “O homem que inventou a si mesmo”, publicado na revista 47, que teve vida muito breve, Hersey escreveu: “Apesar de todas as suas invenções e posturas, em algum lugar de seu centro, Capa tem uma realidade. É o seu talento, composto de humanidade, coragem, bom gosto, uma elegância romântica, uma atitude dura quanto à mera técnica, um instinto para o que é adequado e uma habilidade para relaxar. Bem no cerne, ele tem até modéstia. Tem a intuição de um jogador... Tem humor. Tem uma ideia clara do que faz uma gran-de foto. ‘É um recorte do evento inteiro’, diz ele, ‘que mostra mais da verdade real da questão para alguém que não estava lá do que mos-traria a cena toda.’

“Acima de tudo – e é isso que aparece em suas fotos – Capa, que gastou tanta energia em invenções para sua própria pessoa, tem uma profunda e humana compaixão pelos homens e mulheres presos na realidade.”

R. W.Brooklyn, N.Y., 1999

Richard Whelan, historiador de cultura, é autor de Robert Capa: A Biography. Ao lado de Cornell Capa, ele editou diversos livros das fotografias de Robert Capa. Seus outros livros vão desde uma história política da guerra da Coreia (Drawing the Line) até uma biografia de Alfred Stieglitz.

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Robert Capa em um café de Paris, 1952. Fotografia © Ruth Orkinw

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1Nova York, 1942

Não havia mais absolutamente nenhuma razão para levantar de manhã. Meu estúdio ficava no último andar de um prediozinho de três andares na Ninth Street, com uma claraboia no teto, uma cama grande no canto e um telefone no chão. Nenhum outro móvel – nem um relógio. A luz me acordava. Eu não sabia as horas e não estava especialmente interessado. Meu dinheiro se limitava a uma moeda de cinco centavos. Eu não ia me mexer enquanto o telefone não tocasse e alguém sugerisse algo como um almoço, um trabalho, ou pelo menos um empréstimo. O telefone se recusava a tocar, mas minha barriga gritava. Entendi que qualquer tentativa de dormir seria inútil.

Rolei na cama e vi que a senhoria tinha enfiado três cartas por baixo da porta. Durante as últimas semanas, minha única correspon-dência era da companhia telefônica ou da companhia elétrica, então o mistério da terceira carta me tirou da cama.

Claro, uma das cartas era da Consolidated Edison. A segunda era do Departamento de Justiça, informando que eu, Robert Capa, ex--húngaro, atualmente nada definido, passava a ser classificado como estrangeiro potencialmente inimigo e como tal devia entregar mi-nhas câmeras, binóculos e armas de fogo e que teria de solicitar uma permissão especial para qualquer viagem que me levasse a mais de quinze quilômetros de Nova York. A terceira carta era do editor da revista Collier’s. Ela dizia que, depois de ponderar durante dois meses sobre meu portfólio, a Collier’s chegara à súbita conclusão de que eu era um grande fotógrafo de guerra, e que teriam muita satisfação de me contratar para um trabalho especial; que havia sido feita uma reserva para mim num navio que partia para a Inglaterra dentro de 48 horas e que anexo estava um cheque de 1.500 dólares de adianta-mento.

Ali estava um problema interessante. Se eu tivesse uma máquina de escrever e caráter suficiente, teria escrito uma resposta à Collier’s, contando que era um estrangeiro inimigo, que não podia ir nem a Nova Jersey, quanto mais para a Inglaterra, e que o único lugar para w

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onde podia levar minhas câmeras era o Departamento de Proprie- dade de Estrangeiros Inimigos, na Prefeitura.

Eu não tinha máquina de escrever. Tinha uma moeda no bolso. Re-solvi jogar a moeda para o alto. Se desse cara, eu tentaria me safar até com assassinato e iria para a Inglaterra; se saísse coroa, eu devolvia o cheque e explicava a situação para a Collier’s.

Joguei a moeda e deu: coroa!Entendi então que não havia futuro numa moeda, que eu ia

aceitar e sacar o cheque e que daria algum jeito de ir para a Inglaterra.O metrô aceitou a moeda. O banco aceitou o cheque. Tomei o

café da manhã no Janssen’s, ao lado do banco – um grande café da manhã que custou $ 2,50. Isso resolvia tudo. Agora, eu não podia de jeito nenhum devolver à Collier’s $1.497,50 e a Collier’s estava defini-tivamente com um problema nas mãos.

Reli a carta e confirmei que meu navio partia dentro de 48 ho-ras. Então, reli a carta do Departamento de Justiça e tentei resolver por onde começar. Tudo o que eu precisava era de uma dispensa da minha convocação, uma permissão de saída e reentrada dos Depar-tamentos de Estado e de Justiça, um visto britânico e algum tipo de passaporte para pôr esse visto. Não podia me dar ao luxo de receber um “não” logo de cara, de forma que precisava de um ouvido com-preensivo. Estava numa enrascada. Bem, os Estados Unidos estavam apenas começando a se dar conta do que queria dizer enrascada, mas os britânicos estavam em guerra havia dois anos e deviam estar acostumados com enrascadas. Resolvi recorrer aos britânicos pri-meiro.

Do Janssen’s até o terminal aéreo era uma caminhada de cinco mi-nutos. Descobri que havia um avião para Washington em menos de uma hora. Comprei uma passagem e a Collier’s perdeu um pouco mais de dinheiro.

Duas horas e meia depois, um táxi me deixou na embaixada britânica em Washington, onde pedi para falar com o adido de im-prensa. Fui levado à presença de um cavalheiro de paletó de tweed, cara vermelha e expressão entediada. Disse meu nome e não sabia por onde começar minha história, então simplesmente mostrei a ele as duas cartas, a da Collier’s, depois a do Departamento de Justiça. w

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Ele leu a primeira sem demonstrar nenhuma reação, mas quando baixou a segunda havia um traço de sorriso em seus lábios. Um pouco mais animado, pesquei no bolso e entreguei a ele a carta ain-da fechada da Consolidated Edison, que eu sabia muito bem ser uma notificação de que minha energia ia ser cortada. Ele me fez sinal para sentar.

Quando finalmente falou, foi surpreendentemente humano. Até a guerra começar, tinha sido professor de geologia. O início das hos-tilidades o encontrara no México, onde estudava tranquilamente a composição do solo no alto de vulcões extintos. Não se importava muito com política, mas estavam em guerra e foi convocado como adido de imprensa. Desde então, tivera de recusar todo tipo de pro-postas para salvar os britânicos. Ele me garantiu que o meu caso su-perava todos os outros. Eu era um campeão! Fiquei tomado de compaixão por ele, e por mim mesmo. Sugeri almoçarmos.

Fomos ao Carlton e tivemos de tomar muitos dry martinis antes de conseguir uma mesa. Meu companheiro se animou consideravel-mente e comecei a sentir que, além da Collier’s, o adido e o Império Britânico teriam de me aguentar também. Quando finalmente con-seguimos uma mesa, peguei o menu e pedi uma dúzia de ostras Blue Points para cada um, como entrada. Ora, cinco anos antes, na Fran-ça, eu havia investido pesadamente em minha educação etílica e me lembrava que, em toda história de mistério inglesa onde lorde Peter Wimsey tinha alguma coisa a dizer, ostras eram acompanhadas por aquele maravilhoso borgonha branco chamado Montrachet. O Mon-trachet 1921 estava no fim da lista e era bem caro. Foi uma escolha feliz. Meu companheiro me disse que, quinze anos antes, quando fora passar a lua de mel na França, impressionara sua noiva com aquele mesmo vinho, de forma que ao terminar a garrafa estávamos falando de nosso amor pela França – e pelo Montrachet. Durante a segunda garrafa, concordamos que sentíamos com igual força que era preciso arrancar os alemães de la belle França e depois do café, durante o conhaque Carlos I, contei a ele sobre os meus três anos com o Exército Republicano na Guerra Civil Espanhola e como eu tinha boas razões para odiar os fascistas.

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De volta à embaixada, ele pegou o telefone e pediu para falar com o Departamento de Estado. Chamou alguém lá de cima, a quem se dirigiu pelo primeiro nome, disse que ali em seu escritório estava o “o bom e velho Capa”, que era vital que chegasse à Inglaterra e que eu passaria lá dentro de quinze minutos para pegar minhas permis-sões de saída e reentrada. Ele desligou, deu-me um pedaço de papel com um nome escrito e quinze minutos depois eu estava no Depar-tamento de Estado. Fui recebido por um cavalheiro vestido com apuro, que preencheu meu nome e ocupação num formulário, assi-nou e me disse que estaria tudo pronto às nove da manhã no escri-tório de imigração de Staten Island, no porto de Nova York. Então me acompanhou até a porta, relaxou por um momento, deu-me um tapa nas costas, uma piscada e me desejou “Boa sorte!”.

Quando voltei à embaixada, meu amigo adido estava um tanto solene e preocupado, até eu contar que o primeiro passo tinha dado certo. Dessa vez, ele ligou para o cônsul-geral em Nova York. Disse que “o velho Capa” estava de partida para a Inglaterra, com abso-lutamente tudo em ordem, mas não tinha passaporte. Dez minutos e vários telefonemas depois, o adido naval da embaixada, o profes-sor e eu estávamos todos num barzinho, bebendo ao sucesso de minha viagem. Estava na hora de eu pegar o avião, mas antes de partir, o adido naval me garantiu que ia mandar mensagens codifi-cadas para todos os portos do Reino Unido dizendo que eu ia che-gar em um certo navio, com câmeras e filmes, e que devia ser ajudado de todas as maneiras e levado em segurança até o almiran-tado em Londres.

No avião de volta para Nova York, concluí que os britânicos eram um grande povo, que tinham um maravilhoso senso de humor e que, em se tratando de coisas impossíveis, era muito bom estar do lado deles.

Na manhã seguinte, o cônsul-geral em Nova York observou que meu caso era muito excepcional, mas que a guerra também era muito excepcional. Ele me deu um pedaço de papel de aparência muito comum, pediu que anotasse meu nome, que explicasse por-que não tinha nenhum passaporte e declarasse as razões de minha viagem.w

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Escrevi que meu nome era Robert Capa e havia nascido em Bu-dapeste; que o almirante Von Horthy e o governo húngaro nunca gostaram de mim e que eu nunca gostara deles também; que o con-sulado húngaro, desde a anexação da Hungria por Hitler, se recusava a dizer se eu era húngaro, ou se não era; que enquanto Hitler domi-nasse a Hungria eu me recusava terminantemente a dizer que era húngaro; que havia nascido sob a intensa proteção de avós judeus de ambos os lados; e que odiava os nazistas e sentia que minhas fotos podiam ser úteis como propaganda contra eles.

Fiquei um pouco preocupado com a ortografia quando devolvi o papel, mas ele selou e carimbou, pôs uma fita azul em volta e assim nascia um passaporte.

Na manhã em que eu devia embarcar, ainda faltavam quatro ou cin-co permissões. Minha mãe, que agora vivia em Nova York, acompa-nhou-me e, enquanto eu tentava conseguir esses últimos papéis selados, ela esperava no táxi. Cada vez que eu voltava, ela me olhava em silêncio e tentava ler a resposta em meu rosto. Era uma mãe mui-to dividida naquela manhã, esperando, para meu próprio bem, que eu conseguisse as várias permissões para ir embora; no fundo de seu coração materno, rezando para que alguma coisa desse errado e eu não pudesse partir para a guerra outra vez.

Eu tinha, enfim, todos os papéis, mas estávamos uma hora e meia atrasados para o horário de partida do navio e a última esperança de minha mãe era que ele já tivesse ido embora.

Mas, quando chegamos ao píer, o velho e sujo navio mercante ainda estava lá. Um guarda irlandês enorme impediu a passagem. Mostrei os papéis.

– Está atrasado – ele disse. – É melhor ir depressa.Minha mãe só podia ir até ali. Ela deixou de ser a representante

da “valente maternidade dos tempos de guerra” e se transformou num grande e amoroso coração judeu. Toda a reserva de lágrimas há muito contidas verteu pelos cantos de seus grandes e belos olhos castanhos. O guarda irlandês de um metro e noventa e cinco passou o braço em torno dos ombros de minha mãe de um metro e cinquenta e disse: w

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– Dona, a senhora vai tomar um drinque comigo.Dei um último beijo em minha mãe e subi correndo a prancha.Minha última imagem dos Estados Unidos foram as costas do

guarda irlandês e de minha mãe se encaminhando para o bar, sob os arranha-céus subitamente sorridentes.

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Subi depressa pela prancha. Não era o único atrasado. Colado aos calcanhares de dois marujos cambaleantes, deixei os Estados Unidos.

O capitão, que estava parado no alto da prancha, virou-se para o imediato e disse:

– Bom, estes dois são os últimos, vamos embora. – Então me viu. – E quem é você?

– Sou um caso bastante especial, sir. Sou um estrangeiro inimigo em viagem.

– Bem, já levamos uma carga bem estranha. Vamos para a mi-nha cabine ver como você está registrado na lista.

Ele encontrou a devida descrição de minha pessoa e examinou meus papéis sem comentar.

– Antes da guerra – contou – levávamos bananas e turistas das Índias Ocidentais para a Inglaterra. Agora, em vez de bananas, estou levando o sustento e no convés de passeio levamos aviões de bom-bardeio desmontados em vez de turistas. Bem, meu barco não é mais tão limpo como era, Sr. Capa, mas minhas cabines para turistas estão vazias e acho que vai achar as acomodações confortáveis.

Encontrei minha cabine e me instalei. Os motores estavam ronro-nando. Depois de dois anos nos Estados Unidos, eu voltava à Europa. Minha mente voltou no tempo. Dois anos antes, voando da França, eu tinha chegado a esse mesmo porto e naquele momento o que me preocupava era se me deixariam entrar. Naquele momento, também, meus documentos tinham sido pura invenção. Fui descrito como um perito em agricultura a caminho do Chile para melhorar o padrão agrícola daquele país e consegui um visto de trânsito que permitia que ficasse nos Estados Unidos por trinta dias. Não tinha sido fácil aportar naquela época... havia sido bem difícil convencê-los a me deixar ficar... e fora preciso o milagre de um professor inglês para me permitir sair!

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Tirei minhas câmeras, que desde 8 de dezembro de 1941 não tinha permissão nem de tocar, me servi de um drinque e era de novo jornalista.

Ao amanhecer, ancoramos no porto de Halifax. Ali o capitão desem-barcou para receber instruções. Mais tarde, depois que ele voltou, fi-quei sabendo que íamos fazer a travessia como parte de um comboio, que nosso navio seria o líder e que um capitão aposentado da Mari-nha, que era agora o comodoro do comboio, comandaria de nossa ponte.

Tive uma visão de uma sensacional página central quádrupla na Collier’s, chamada “O comodoro do comboio”, com fotografias dra-máticas daquele velho e cambaleante lobo do mar parado na ponte e navios afundando à proa e à popa.

Depois do jantar, o comodoro mandou me chamar. Quase não havia luz na ponte, mas, quando consegui enxergar seu rosto, fiquei decepcionado. Em vez do velho e cambaleante lobo do mar que eu tinha imaginado, encontrei um cavalheiro elegante nos seus cin-quenta anos, e a única semelhança que consegui encontrar com o personagem de minha imaginação era um par de enormes e muito arrepiadas sobrancelhas. Eu me apresentei e ele respondeu que era irlandês. Continuou imediatamente dizendo que estava muito inte-ressado no mundo do cinema e achava algumas atrizes de Holly-wood muito excitantes. Teria de ficar na ponte durante a viagem inteira, mas por que eu não subia até lá todas as noites para contar algumas boas histórias sobre Hollywood? Em troca, ele teria muito prazer em me contar tudo sobre comboios.

A combinação era bem injusta. Porque o comodoro conhecia seus comboios, enquanto eu nunca tinha estado em Hollywood. Mas não tive coragem de dizer que ele pronunciava errado meu nome, que eu não era o famoso diretor de cinema, que meu nome era Bob Capa e não Frank Capra. Durante o resto da viagem tive de fazer o papel de Sherazade. Só esperava que não fosse durar mil e uma noites!

Pernoitamos no porto. De manhã, o comodoro me perguntou se eu gostaria de ir com ele visitar os capitães dos outros navios do com-boio. A maior parte de nossos barcos navegava sob bandeiras estran-geiras e o comodoro passou um mau bocado tentando se fazer entender. Os capitães sueco e norueguês nos ofereceram aquavit e w

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falavam inglês bastante bem. O holandês tinha um gim muito bom e nenhum problema. O capitão francês tinha excelente conhaque e eu fiquei como intérprete. O grego tinha uma bebida assassina cha-mada ouzo e falava grego muito depressa. No total, visitamos 23 navios e, no cômputo geral, bebemos em 23 nacionalidades. No ca-minho de volta para o nosso barco, o comodoro reclamou de todos aqueles estrangeiros malucos e me fez sentir definitivamente anglo--saxão.

À tarde, formamos nosso comboio sem dificuldade. Seguimos em quatro fileiras de seis navios, com cerca de mil metros de distân-cia entre um e outro. Nossa escolta era um tanto escassa: um único destróier e cinco corvetas pequenas.

Em nossa primeira noite na ponte, o comodoro foi quem mais falou. Durante a Primeira Guerra Mundial tinha sido capitão de um destróier e em 1918 liderava uma frota inteira. Os nomes de Zee-brugge e Gallipoli flutuaram no ar. Quando terminou suas histórias, ele me perguntou como estava Lillian Gish. Garanti que miss Gish estava muito bem e, quando fui embora, nosso encontro parecia o começo de bela amizade.

Os quatro primeiros dias no mar passaram sem excitações. Eu ficava o dia inteiro tirando fotos de tudo e todos, do topo do mastro à sala de máquinas, e à noite ia para a ponte, contar ao comodoro tudo que me lembrava das revistas de fãs que tinha lido na sala de espera do dentista. Insinuei vagamente que eu era um homem muito discreto, mas mesmo assim fiz com que ele sentisse que tinha sido parte ativa em alguns daqueles escândalos de Hollywood. Em troca, ele me contou sobre um momento, num de seus comboios para Mur-mansk, em que suas botas congelaram no convés e ele não pôde sair do lugar durante três dias. O comodoro não bebia quando estava em alto-mar, mas eu tinha meu frasco de bolso e combatia o frio en-quanto ele falava. Depois da meia-noite, debruçado no parapeito da ponte de comando, às vezes eu me sentia num bar da Terceira Aveni-da com as luzes apagadas.

Até esse momento, minha “Batalha do Atlântico Norte” foi ab-solutamente agradável; na verdade, agradável demais. A tripulação, porém, não via com bons olhos meu desejo de ação e não se incomo-dava nem um pouco com a possibilidade de que a história do Collier’s fosse sem graça.w

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