ler/escrever ritmos -...

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revista cia abem numero 6 setembro de 2001 Ler/escrever ritmos: a analise psicolingiiistica de uma experiencia com crianfas1 Ana Cristina F. Matte Resumo: A partir dos dados de uma turma de iniciayao musical formada par crianyas de 4 a 7 anos, 0 artigo indica 0 processo de aprendizagem da leitura/escrita de ritmos analisado em relayao ao processo de aquisiyao da escrita verbal. A analise psicolingOfstica dos processos individuais baseou-se em produyoes documentadas em dois diferentes momentos do ana letivo e teve como parametros 0 desenho dos simbolos, a relayao nota/silaba e a apreensao das nOyoes de densidade e de grupos rftmicos, indicando uma seqOencia de possfveis hip6teses formuladas pelas crianyas durante 0 processo de aquisiyao da escritura rftmica. o aprendizado da escrita musical, tanto rftmica quanta mel6dica, e um processo de aquisi9ao da escrita fortemente marcado pelo processo simultaneo de aquisi9ao da escrita formal. Este ultimo pode estar iniciando-se, em andamento ou ate mesmo estar conclufdo, dependendo da idade e da hist6ria do indivfduo envolvido, pois 0 ensino de musica no Brasil nao e, sistemati- camente, iniciado na infancia. Assim, a psicolin- gOfstica pode fornecer um arsenal te6rico extremamente util no estudo da aquisi9ao da linguagem escrita musical 2 o presente trabalho foi baseado em dados de uma unica turma no perfodo de um ano, 1994. Trata-se de uma turma de inicia9ao musical no conservat6rio Carlos Gomes, em Campinas - SP, com crian9as de 4 a 7 anos, da qual participei na qualidade de professora. No que concerne arftmica, alguns pontos sao importantes na descri9ao do trabalho: -0 ritmo era aprendido corporalmente, com marcha e dan9as. Usavamos can90es infantis para observar 0 ritmo geral, incluindo mudan9as de compasso, de andamento e de subdivisao (procedimento semelhante ao sugerido por Rego, 1990, para a linguagem verbal, com a abundante utiliza9ao de literatura infantil em sala de aula); - a composi9ao foi usada como forma de expressao (discutfamos 0 tipo de musica que estava sendo composta: alegre, triste etc.); 1 Pesquisa parcialmente financiada pela Fundayao de Amparo a Pesquisa de Sao Paulo (FAPESP). 2 A abordagem psicolingOfstica do aprendizado da escrita musical e encontrada tambem em Sinclair (1990), e, no campo da musical, no n Q 1 da revista Plural, da Escola de Musica Villa-Lobos (Rio de Janeiro), e em Souza (1999). 7

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revista cia

abemnumero 6

setembro de 2001

Ler/escrever ritmos:a analise psicolingiiistica de uma

experiencia com crianfas1Ana Cristina F. Matte

Resumo: A partir dos dados de uma turma de iniciayao musical formada par crianyasde 4 a 7 anos, 0 artigo indica 0 processo de aprendizagem da leitura/escrita de ritmosanalisado em relayao ao processo de aquisiyao da escrita verbal. A analisepsicolingOfstica dos processos individuais baseou-se em produyoes documentadas emdois diferentes momentos do ana letivo e teve como parametros 0 desenho dos simbolos,a relayao nota/silaba e a apreensao das nOyoes de densidade e de grupos rftmicos,indicando uma seqOencia de possfveis hip6teses formuladas pelas crianyas durante 0

processo de aquisiyao da escritura rftmica.

o aprendizado da escrita musical, tantorftmica quanta mel6dica, e um processo deaquisi9ao da esc rita fortemente marcado peloprocesso simultaneo de aquisi9ao da escrita formal.Este ultimo pode estar iniciando-se, em andamentoou ate mesmo estar conclufdo, dependendo daidade e da hist6ria do indivfduo envolvido, pois 0

ensino de musica no Brasil nao e, sistemati­camente, iniciado na infancia. Assim, a psicolin­gOfstica pode fornecer um arsenal te6ricoextremamente util no estudo da aquisi9ao dalinguagem escrita musical2 •

o presente trabalho foi baseado em dadosde uma unica turma no perfodo de um ano, 1994.Trata-se de uma turma de inicia9ao musical no

conservat6rio Carlos Gomes, em Campinas - SP,com crian9as de 4 a 7 anos, da qual participei naqualidade de professora. No que concerne arftmica,alguns pontos sao importantes na descri9ao dotrabalho:

- 0 ritmo era aprendido corporalmente, commarcha e dan9as. Usavamos can90es infantis paraobservar 0 ritmo geral, incluindo mudan9as decompasso, de andamento e de subdivisao(procedimento semelhante ao sugerido por Rego,1990, para a linguagem verbal, com a abundanteutiliza9ao de literatura infantil em sala de aula);

- a composi9ao foi usada como forma deexpressao (discutfamos 0 tipo de musica que estavasendo composta: alegre, triste etc.);

1 Pesquisa parcialmente financiada pela Fundayao de Amparo aPesquisa de Sao Paulo (FAPESP).

2 A abordagem psicolingOfstica do aprendizado da escrita musical eencontrada tambem em Sinclair (1990), e, no campo da inicia~ao

musical, no nQ 1 da revista Plural, da Escola de Musica Villa-Lobos (Rio de Janeiro), e em Souza (1999).

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nOmero 6setembro de 2001

revista daabem

flgUra1

Nome: I Marcha das FigurasTurma:_

~. d J n J d t~'Cd Cd c::3 Cd c::3Cd~c::3

d= 2 J= 1Agora escr... a sua marcha das figuras'

~ = 1 ~: Cd :~n =1 c::3 Cd c::3

o bingo funcionava como um ditado informal,alem de um exercfcio de leitura, pois a fungao de"cantar" passava por todos 4

. Essa situagao deditado informal era corriqueira; por outro lado, a(mica vez em que fizemos um ditado formal deritmos foi na prova de 6 de dezembro.

Os arranjos eram feitos sobre cangoesinfantis gravadas em disco e sobre composigoesdas criangas. Fazfamos exercfcios de composigaosobre 0 papel onde os compassos estavampreviamente delimitados e os pulsos marcados parareferencia, como no exemplo da figura 1:

criagao e escrita de arranjos e composigoesrftmicas.

vai = um pulso = uma semfnima

Iigeirinho = quatro sons regulares em umpulso =quatro semicolcheias

hum = silencio que dura um pulso = umapausa de semfnima

corre = dois sons regulares em um pulso =duas colcheias

Esse trabalho, complementado porbrincadeiras, como 0 bingo rftmico e a escritarftmica dos nomes, forneceu subsfdios para a

o presente texto focaliza dois momentosespecfficos do processo de aprendizagem darftmica: uma brincadeira de escrita rftmica dosnomes das criangas, realizada em maio, e umaprova/ditado, realizada em dezembro.

Depois de discutir a metodologia utilizada eapresentar as criangas que produziram os textosmusicais analisados, a analise da escrita rftmicados nomes e da prova/ditado vai investigar aship6teses das criangas frente aos problemas daescrita, alem de indicar uma hierarquia dessesproblemas.

Estudo dos grupos rftmicos

Com a brincadeira de marcha, ondeaprendfamos 0 que era pulso (uma regularidadetemporal), fomos brincando de subdividir emultiplicar palavras no tempo. Cada sflaba deveriacorresponder a uma nota e entao aprendemos umc6dig03 relacionando a palavra falada ritmicamenteao grupo rftmico:

vou = dois pulsos = uma mfnima

- a gravagao permitia a audigao crftica deexercfcios e composigOes.

o processo, portanto, consistia em ouvir,assimilar, reproduzir, criar e apreciar criticamente,sendo a leitura/escrita introduzida em diferentesmomentos do processo a cada aula, um processoque pode ser definido do gesto aescrita (Vigostky,1991), onde 0 contato professor/crianga nao e umavia de mao (mica: segundo Vigotsky (ct. Oliveira,1993), mesmo a imitagao e reconstrugao doobservado nos outros.

Essas composigoes eram trocadas, lidaspelos outros, Iidas por mim, com 0 piano, com avoz, com 0 violao, com instrumentos de percussao.Num estagio inicial as semicolcheias nao eramusadas, como no exemplo acima, mas logopassaram a fazer parte da marcha, com 0 treino dobingo rftmico.

Os trabalhos de composigao permitiramprivilegiar a carga cultural que a crianga traz paraa sala de aula e a criatividade no manuseio doselementos da escrita e da percepgao musical. Essapostura, adotada neste trabalho com criangas, temestreita Iigagao com aquela discutida por Kato,(1998), para a linguagem verbal: segundo a autora,os melhores resultados dependem de umaconcepgao que inclua um isomorfismo parcial entrefala e escrita, permitindo 0 usa da experienciaprevia do aluno.

---------------------3 Essa rela9ao entre palavras e grupos rftmicos a bastante similar aapresentada por Marsico (1987), que tambam apresenta 0 bingorftmico.

4 Os jogadores do bingo rftmico recebem cartelas com varias frases rftmicas. 0 "Ieitor" sorteia um quadrado de cartolina contendo umafrase, a qual ele Ie em voz alta. 0 jogador cuja cartela apresenta a frase Iida, marca-a com um feijao, ata preencher toda a cartela. Doisbingos foram usados nessa turma: com e sem semicolcheias. Aos poucos, no bingo, 0 c6digo "vai, corre,ligeirinho" foi sendo substitufdoper vocaliza90es ritmicas sem palavras e instrumentos musicais diversos.

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As crianyas da Turma Maravilha

As crian<;:as escolheram 0 nome TurmaMaravilha. A turma era composta desde crian<;:asem fase pictografica ou ideografica da aquisi<;:aoda linguagem verbal ate crian<;:as em fase dealfabetiza<;:ao formals, situa<;:ao bastante comumpois as escolas precisam agrupar um numeromfnimo de crian<;:as para viabilizar economicamentea turma. Mesmo assim, a escola permitiu que, numprimeiro momento, as crian<;:as menores fossemseparadas na Turma dos Gatinhos, cuja breveexistencia permitiu-nos avaliar com mais especi­ficidade seu comportamento.

Somente seis crian<;:as participaram da turmaMaravilha no perfodo de fevereiro a dezembro.Alem dessas, foram inclufdos na analise ostrabalhos das crian<;:as que completaram 0 primeirosemestre. as comentarios a seguir baseiam-se emanota<;:oes feitas por mim com intuito avaliativo nodecorrer do curso. Preferi adotar um c6digoidentificador (primeira letra do nome + idade) nodecorrer do texto pois os nomes nao retem em siesse dado importante que e a idade.

L4: Lucas - 4 anos - participou da aula daturma dos Gatinhos e chorou quando soube quevoltaria para a turma Maravilha. Inicialmente muitodistrafdo durante as aulas, em abril ja estava maisintegrado a turma e passou a compreender melhoro conteudo. Essa integra<;:ao atingiu tal grau quepossibilitava-Ihe buscar ajuda com os colegas maisvelhos quando 0 ritmo da turma era aceleradodemais para ele. Saiu da turma no final do primeirosemestre, portanto nao fez a prova de dezembro.

AP4: Ana Paula - 4 anos - tambem participouda turma dos Gatinhos. Participava de todas asatividades, um tanto quanta timidamente. Fezgrandes progressos, considerando-se sua condi<;:aode gatinha. Concluiu 0 curso em dezembro.

J5: Jaqueline - 5 anos - fez parte da turmados Gatinhos. Participava com desenvoltura, masnem sempre conseguiu acompanhar 0 ritmo daturma Maravilha quando a outra turma foi extinta.Mesmo assim, foi possfvel observar nela aincorpora<;:ao dos elementos musicais estudadosdurante 0 ana todo.

numero 6setembro de 2001

F5: Flavia - 5 anos - em fun<;:ao da suaintimidade com as letras e do seu grau deorganiza<;:ao, ficou na turma Maravilha, apesar daidade. Muito animada, participava de todas asatividades acompanhando bem a turma. No finaldo primeiro semestre dava mostras de que, comuma turma mais adiantada, desenvolver-se-ia muitomais, mas nao havia outra turma na escola quecomportasse sua idade. Concluiu 0 curso emdezembro.

R6: Raquel - 6 anos - quieta e arredia,passou por uma fase de rebeldia no meio doprimeiro semestre e depois equilibrou-se, menosintrovertida do que no infcio do curso. Acompa­nhava bem as aulas pois participava de todas asatividades com interesse. Tambem acompanhou aturma 0 ana todo.

C6: Carol - 6 anos - com uma bronquite quea atormentava constantemente, fez parte dosGatinhos, onde pOde mostrar seu espfrito delideran<;:a. Durante 0 mes de abril, concomi­tantemente amelhora de sua bronquite, deixou defazer parte do que eu chamava de os gatinhos daturma Maravilha. Sua dificuldade inicial com aescrita/leitura musical foi sendo aos poucossuperada e pude descreve-Ia, em junho, como"deslumbrante". Saiu da turma no final do primeirosemestre para seguir um curso de violao.

F6: Felipe - 6 anos - irmao do Lucas, Felipeapresentava excelente desempenho, conseguindorapidamente apreender 0 conteudo e mostravagrande criatividade. Como 0 irmao, interrompeu 0

curso no final do primeiro semestre.

P6: Paula - 6 anos - Passou por uma fasede rebeldia que cessou com a introdu<;:ao de umtrabalho extra-classe de flauta doce, realizadoconjuntamente com seu pai e orientado por mim.Participou da turma durante todo 0 ano.

R7: Renata - 7 anos - a unica crian<;:a que jafrequentava 0 ensino formal (primeira serie).Inicialmente era muito tfmida, relutando emparticipar, mas nao deixava de realizar todas asatividades propostas'. Iniciou 0 curso com tressemanas de atraso. Ap6s um mes de aulas ja estavamais segura, assimilando bem os conteudos emantendo-se num bom ritmo ate 0 final do curso,em dezembro.

5 Segundo Kato (1988), a lase primeira lase da aquisiyao da leitura escrita seria a lase do pictograma ou desenho, onde ha uma relayaoiconica entre 0 desenho e 0 que quer representar; a segunda corresponderia ao ideograma, representayao simb61ica mas ainda comuma concepyao iconica de quantidade. Contini (1988), sugere uma divisao dessas duas lases, baseado em Ferreiro: a) gralismo primitivo(rabiscos), b) gralismo primitivo com linearidade Ua com contraIe de direyao e quantidade), c) escrita pictogralica (desenho da escrita),d) escrita ideogralica ou unigralica (uma Jetra ou sfmbolo por paJavra).

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numero 6setembro de 2001

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Nos pr6ximos t6picos analiso dois tipos deproduyao de grupos rftmicos: a escrita dos nomesrealizada em maio e cinco questoes da prova dedezembro (as outras questoes tratavam de percep­yao meI6dica).

Escrita Rftmica dos Names

b) menos de uma nota por sflaba: AP4

Somente a AP4 escreveu um ritmo commenos notas que sflabas do nome (figura 3). Aacentuayao esta correta. Efacil perceber que AP4suprimiu a sflaba final do seu nome, atona, Sendoassim, sua hip6tese sobre a escrita do ritmo eaceitavel e pode ser considerada correta.

figura 4

figura 3

c) uma nota por sflaba, acento deslocado:R6 e C6

C6 explorou seu longo nome com variadasfiguras, mas 0 resultado modifica a acentuayaonatural (A-na Ca-ro-li-na, figura 4). R6 tambemdeslocou 0 acento. Ambas as meninas mostram teruma boa hip6tese sobre a relayao entre as sflabase as notas, mas ainda estao construindo a ideia dogrupo rftmico, na qual ainda nao cabe a acentuayao.

d) uma nota por sflaba, acento coerente: J5,F5, P6 e R7

J5 pediu ajuda para escrever 0 nome quefalava: dizia todas as sflabas com a mesma durayaoe eu escrevi 0 que ela estava dizendo, um grupode quatro semfnimas (Ja-que-Ii-ne).

figura 2

A escrita rftmica dos nomes surgiu de umabrincadeira bastante difundida cujo objetivo eapresentar e integrar pessoas num grupo (Hnhamosalguns alunos novos na classe): numa roda, empe, baHamos palmas marcando um pulso regular ecada um fa lava seu nome no ritmo das palmas.Vcirias subdivisoes surgiram naturalmente.Aproveitando a situayao, num segundo momentoescrevi no quadro um ritmo para cada nome e canteipara eles, pedindo que me repetissem. Depoisdisso, sugeri que cada um inventasse um ritmo parao seu nome e escrevesse num pedayo de papel.Finalmente, cada um leu para a turma 0 ritmo doseu nome, essa leitura foi "corrigida" por mim, quemostrei 0 que realmente estava escrito, tendo siderepetida por algumas das crianyas.6

o que caracterizaria uma escrita coerentecom a "regra" dos grupos rftmicos seria a escritade uma nota por sflaba do nome e a acentuayaocoerente (em cada grupo rftmico, nesse estagio,sempre a primeira nota e acentuada)? Consideran­do esses fatores, agrupei as produyoes da seguintemaneira:

a) c6pia do quadro: L4 e F6

L4 copiou seu nome (ritmo) do quadro,espelhando a frase rftmica assim como as letrasdo nome que colocou sobre as notas (figura 2). F6tambem copiou do quadro 0 ritmo do nome comoeu 0 havia escrito, mas sem espelhar.

6 Nao houve tempo hAbii para uma segunda escritura, posterior a essa leitura da professora; essa segunda escrita, cuja finalidade seriapermitir as crianr;:as aceitar 0 que efetivamente escreveram ou procurar auto-corrigir-se com vistas a escrever 0 que pretendiam, ficacomo sugestao.

7 Todas as crianr;:as, sem excessao, desprezaram 0 usc de barras de compasso, por isso eu tambem desconsiderei-as na anAlise.

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F5 e P6 escreveram seus nomes com 0 gruporftmico que coincidia com 0 numero de sflabas deseu nome.

R7 escreveu seu nome com tres semfnimas,permitindo uma leitura correta da acentuagao.

Parece-me que, nesse momento, a maioriadas criangas nao estava segura ou mesmopreocupada com a acentuagao dos grupos rftmicose algumas ainda tinham duvidas sobre a relagaonotalsflaba.

Ditado Rftmico

Ja na prova de dezembro, cujas quest5esde 6 a 10 dizem respeito a rftmica, podemosvis!umbrar mais claramente diferentes estagios doprocesso. As criangas trabalharam 0 ana todo comos grupos rftmicos e tinham grande familiaridadecom sua escrita e leitura, mas nunca haviam sidesolicitadas a fazer um ditado formal. As notas foramtocadas no piano, sempre notas repetidas. Damesma maneira como eram "cantadas" as seqOen­cias no bingo rftmico, a regencia do compassoassinalava 0 infcio e 0 fim das seqOencias.

As quest5es podem ser agrupadas emseqOencias sem silencio e seqOencias com silencio.

Nas sequencias sem silencio estousugerindo a observagao dos seguintes fatores: anogao de aumento/diminuigao da densidade, 0

numero de grupos , 0 numero de notas e a razaoda densidade, que nada mais e do que a escritacorreta dos grupos rftmicos cuja base fundamentalea subdivisao e mUltiplicagao dos tempos. Basean­do-se nos "erros", reveladores das hip6teses quea crianga esta realizando (ct. Figueira, 1996), foipossfvel agrupar as produg5es da seguinte forma:

a) escrita sem nogao de densidade: mesmoapresentando 0 numero de grupos correto, estetrabalho nao tem coerencia com a aceleragaoldesaceleragao do ritmo ditado.

. AP4, questao 7, coloca 0 numero corretode grupos, mas enquanto no ditado a densidadediminui e permanece, a densidade escrita por elaaumenta e diminui8 :

figura 5

III~J J 1I=t J~d

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b) escrita com nogao de densidade mas semnogao de grupos: a aceleragao/desaceleragao dosgrupos escritos corresponde ado ditado, mas hainsuficiencia ou excesso de grupos:

figura 6

J5, qLJe8tao 7: II~J J 1I=t l'J J

P6, que8tao 8: II d lfflll =t J n.~

R6, que8tao 6: II J n J lI=td~n e

- J5 na questao 7 desacelerou corretamente,mas perdeu 0 grupo final (de uma semfnima);

- P6, na questao 8, considera que a longaduragao da nota inicial precisa de preenchimento,e introduz notas inexistentes, mas com 0 sentidode aceleragao preservado;

- R6, na questao 6, acrescenta ao numerocorreto de grupos uma pausa no final, com nogaoaproximada da variagao de velocidade.

c) escrita com nogao de velocidade e numerode grupos: apesar de nao levar em consideragao 0

numero de notas e a razao entre elas, esta escritarepresenta corretamente 0 numero e a variagao dedensidade dos grupos ditados:

figura 7

AP4, que8tao 8: lid ~1I~n~

J5, que8tao 8: II d ~1I=t J nAP4, que8tao 6: II J n J II =t d ~d

J5, que8tao 6: II J n J lI=tenJ

- AP4, questao 8, respeitou 0 numero degrupos ditado e 0 sentido de aceleragao correto,mas 5 notas viraram 6 e a grande diferenga dedensidade entre elas foi atenuada em sua escrita;

- J5, questao 8, colocou os dois gruposditados e a aceleragao correta, mas 5 notas viraram3, atenuando a grande diferenga de densidadeentre elas tal como fizera AP4;

- AP4, questao 6, escreveu os tres gruposditados e 0 movimento de acelerar/desacelerarcorreto, mas 4 notas viraram 6 e a pequenadiferenga de densidade entre elas foi exageradaem sua escrit'a;

8 Na c6pia dos exercicios sempre apresentarei a seqOencia ditada seguida, ap6s a seta, pela escrita da crianqa.

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- J5, quesUio 6, colocou as tres gruposditados e a movimento de acelerar/desacelerarcorreto, mas 4 notas viraram 3, pais um silenciosubstituiu a inicial; sendo assim, a movimento emesmo a razao da densidade estao praticamentecorretos em sua escrita.

d) esc rita com nOyao apropriada dedensidade, de numero de grupos e de numero denotas: tres produyoes apresentam numero degrupos e notas correto, com a adequada nOyao dedensidade mas razao exagerada au atenuada:

figure 8

R7, questao 6: II J J"") J II =td J"")d

R6, questao 8: lid Jfflll =t d ~ Jffl

F5, questao 8: lid Jfflll =t J Jffl

- R7, questao 6, colocou as tres gruposditados com suas 4 notas e a movimento deacelerar/desacelerar correto, mas a razao dadensidade foi exagerada;

- R6, questao 8, colocou as dais gruposditados com suas 5 notas e a acelerayao correta,mas a razao da densidade esta exagerada em suaescrita, onde uma pausa soma asemfnima a longotempo que R6 percebeu maior que a maior notapar ela conhecida;

- Ja F5, na questao 8, colocou as dais gruposditados com suas 5 notas e a acelerayao correta,mas a razao da densidade esta atenuada em suaescrita.

e) escrita com nOyao de quantidade degrupos e notas, mas com nOyao parcial dedensidade e razao parcialmente correta: estes daiscasos podem ser, talvez, somente uma questao deponto de vista. R6 e R7 escreveram da mesmaforma a questao 7, parecendo querer, com 0

aumento da durayao, marcar a acentuayao naturalda sequencia rftmica. A rigor, tal procedimentoprovoca uma acelerayao final na sequencia queoriginaAs outras produyoes estao corretas. Imentee marcada por uma desacelerayao:

figure 9

III Jffl J J II =t Jffl J J I

As outras produyoes estao corretas.

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Quanta as questoes 9 e 10, ditados desequencias com silencio, este apresentou-se comoum complicador a mais. Optei por agrupa-Ias damesma maneira que as anteriores, procurandoanalisar a papel do silencio no levantamento daship6teses:

a) escrita sem noc;:ao de densidade: nas duasvezes em que J5 escreveu sequencia com silencio,este nao aparece em sua escrita e a nOyao corretada variayao de densidade, que aparecera em todasas tres praduyoes anteriores suas, desaparece totalau parcialmente:

figure 10

J5, questao 9: II J"") ~ Jfflll =t Jffl d J"")

J5, questao 10: II ~ Jffl J II =t m J J"") d

- J5, na questao 9, coloca a numero corretode grupos, mas 0 movimento de acelerayaotransforma-se em desacelerayao e a pausa esubstitufda por uma nota longa (mfnima);

- J5, na questao 10, a qual inicia com umapausa, exagera no numero de grupos e s6parcialmente consegue escrever a desacelerayaoditada; alem disso, escreve incorretamente a grupode semicolcheias, omitindo uma delas.

b) escrita com nOyao de densidade mas semnOyao de grupos: aqui 0 silencio faz acrescentarau omitir grupos:

figure 11

P6, questao 9: II J"") ~ Jfflll =t J J J"") Jffl

R6, questao 10: II ~ Jffl J II =t ~ Jffl

F5, questao 9: II J"") ~ Jfflll =t Jffl

- P6, na questao 9, escreve mais gruposrftmicos do que as ditados e amite a pausa, apesarde conseguir apreender a nOyao de acelerayao quemodaliza a sequencia;

- R6, na questao 10, amite a grupo final, mascoloca a pausa inicial e escreve corretamente 0

tempo relativo do primeiro grupo ap6s a pausa;

- F5, na questao 9, escreve menos gruposrftmicos do que as ditados e amite a pausa, apesarde conseguir apreender a grupo final.

c) escrita com nOyao de densidade e numerade grupos: Ambas as produyoes de AP4 omitem apausa e colocam a numero correto de grupossonoros (silencio nao seria "sonora"):

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abem

1igura 12

AP4, quesHlo 9: II ~ ~ ffTJlI ~ ~ ~

,ll,P4, questao 10: II ~ ffTJ J II ~ ffTJ ~

- AP4, questao 9: a n09ao de variayao dadensidade e atenuada em funyao da pausa entreos grupos;

- AP4, questao 10: como a pausa esta noinfcio, nao atrapalha a nOyao de diminuiyao dadensidade.

d) escrita com nOyao de densidade, numerode grupos e numero de notas: a presenya dosilencio nao atrapalhou a produyao de R6 naquestao 9 no que concerne ao numero de notas esentido geral de acelerayao, mas ela, exagerandona variayao de densidade sentida, precisou aumen­tar 0 numero de grupos para dar conta do numerode notas. Cabe notar que esta foi uma das poucascrianyas que escreveu a pausa na questao 9.

tigln 13

III~ ffTJJ II ~ ffTJ J Ie) escrita com nOyao de densidade, razao,

quantidade de grupos e notas corretas mas omissaodo silencio:

- F5 e R7, questao 10:

1iqura 14

- R7, questao 9:

1igura 15

f) Somente uma produyao colocoucorretamente 0 silencio mas errou tanto a qualidadeda variayao de densidade quanta a quantidade denotas e grupos; P6, questao 10:

tigura 16

No pr6ximo t6pico comentarei brevemente 0trajeto observavel dessas seis crianyas no queconcerne aos grupos rftmicos.

numero 6setembro de 2001

Grupos Rftmicos: processos

A. Ana Paula (AP4)

AP4 escreveu em maio seu nome com menosnotas que sflabas, 0 que nao significa que naotenha compreendido a escrita rftmica do nome. Namesma folha em que escreveu 0 ritmo do nomeescreveu Ana Pa-ula (figura 3), para dividir 0 nomequando a folha acabou. Possivelmente, em termosde aprendizagem da escrita verbal, ela ainda naoalcanyara 0 estagio da silabayao e 0 que fez como ritmo do nome foi escrever somente os segmentossonoramente importantes: ela omitiu a sflaba atonafinal, que e sonoramente menos importante.

Em dezembro, AP4 apresenta dois tipos deprodu9ao nas quest6es sem pausa:

- quest6es 6 e 8: escrita com nOyao dedensidade e numero de grupos;

- questao 7: escrita sem n09ao de densidade(mas acerta 0 numero de grupos).

Parece que, para AP4, 0 numero de grupose mais importante nesse momenta do que adensidade, que ainda esta sendo testada. Por issonas duas seqOencias com pausas, AP4 omitiu 0silencio, inexistencia de som, e escreveu 0 numerocorreto de grupos sonoras. Quando 0 silencioestava no infcio, ela percebeu corretamente avariayao de densidade, mas quando ele estava nomeio, provocou uma ruptura na sequencia que afez perder a relayao entre os grupos.

B. Jaqueline (J5)

J5 nao quis escrever em maio seu nome:ditou-o para mim, ritmado, e satisfez-se com 0resultado: quatro semfnimas.

Em dezembra, em todas as produy6es parasequencias sem pausa, ela escreveu corretamentea variayao de densidade e, somente em uma dasvezes, diminuiu 0 numero de grupos rftmicos(perdeu, na questao 7, a semfnima final).

Quando procurou escrever as seqOenciascom pausas, sua eficiEmcia diminuiu: na questao 9ela acertou 0 numera de grupos mas inverteu avariayao de densidade e na questao 10 elaexagerou 0 numero de grupos, escreveu,incorretamente, um deles (com uma semicolcheiaa menos) e, s6 parcialmente, representou adesacelera9ao ditada.

No caso da questao 9, e possfvel deduzir,hipoteticamente, que ela colocou uma nota longa

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no lugar do silencio e espelhou a escrita da frase.Sera que 0 espelhamento pode ocorrer na escritamusical mesmo que na verbal ja tenha sidosuperado? Epossive!.

o silencio, para J5, ainda e uma inc6gnita ea obriga a questionar coisas que ja haviaassimilado, como a escrita de cada grupo, 0 numerode grupos e a variayao de densidade.

C. Flavia (F5)

F5 e uma pequena notavel, com um rendi­mento comparavel aos alunos mais "velhos". Ela,em maio, escreveu para 0 seu nome um ritmoadequado inclusive do ponto de vista daacentuayao.

Na prova de dezembro, F5 acertou as duasprimeiras sequencias sem pausas e parcialmentea terceira, onde atenuou a razao da densidade entreos dois grupos. A presenya do silencio tambem paraela foi um complicador: ela escreveu somente 0

grupo que conseguiu apreender na questao 9(escrita com n09ao de densidade e sem nOyao denumero de grupos) mas na questao 10, ressal­vando-se a omissao do silencio inicial, escrevecorretamente 0 ritmo ditado. 0 silencio da questao9, no meio da sequencia, provocou uma ruptura nasua percep9ao e F5 perdeu a n09ao do conjunto.

D. Paula (P6)

P6 escreveu em maio seu nome com umgrupo rftmico adequado do ponto de vistaquantitativo e da acentuayao. Em dezembro acertouas duas primeiras sequencias sem pausa, mas naterceira a presen9a de uma nota longa (minima,dois tempos) fez com que buscasse 0 preenchi­mento do tempo com grupos inexistentes. Esseprocedimento e similar aquele utilizado por ela nasquest6es com pausas: na questao 9, ela escreveduas notas iniciais, duas centrais preenchendo 0silencio e quatro finais. A quantidade de notas iniciale final esta correta e a variayao de densidade entreelas tambem, embora exagerada. Porem, aoescrever a sequencia da questao 10, iniciada poruma pausa, P6 prefere escrever a pausa e, mesmoassim, preencher 0 silencio com notas, acabandopor inverter a varia9ao de densidade.

Aparentemente P6 tem uma n09ao forte doconjunto, mas reluta em manter pulsos "vazios", 0

que ocorre no caso das pausas e no caso de notaslongas, cujo ataque num pulso produz um sommantido no(s) pulso(s) seguinte(s).

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E. Raquel (R6)

R6, ao escrever 0 ritmo do seu nome, colocouum grupo ritmico adequado do ponto de vista donumero de silabas (duas colcheias), masinadequado do ponto de vista da acentua9ao(escreveu Raquel).

Em todos os exercicios, com e sem pausas,da prova de dezembro, R6 demonstrou ter dominioda varia9ao de densidade e do numero de grupos,mas nao acertou completamente nenhuma dasquest6es, em fun9ao de um exagero na razao dedensidade entre os grupos. Em somente umaquestao ela omitiu um grupo final (uma seminima,questao 10). Escreveu as pausas corretamente,exceto quando quis desnecessariamente alongaruma minima. Portanto, a pausa nao foi para ela umelemento complicador.

F. Renata (R7)

R7 escreveu seu nome corretamente emmaio, tanto em numero de notas quanta em acento.Em dezembro, mostrou dominio da varia9ao dedensidade, as vezes exagerada, do numero degrupos e notas, sempre corretos exceto na omissaodas pausas. 0 silencio omitido nao foi um elementocomplicador, pois R7 conseguiu escreverperfeitamente os grupos ritmicos sonoras daquelesexercicios. No entanto, uma auto-correyao visivelpelo apagamento incompleto, na questao 10,demonstra que ela teve duvidas em nao escrevero silencio inicial e escreveu tres colcheias no inicioque depois apagou, ou seja, R7 sabia que haviaalgo onde eu pus uma pausa, mas suas hip6tesessobre a esc rita ainda nao se adequavam aopercebido.

Nenhum desses alunos acertou integral­mente nenhuma das duas quest6es com pausas.

Comentarios Gerais

Uma primeira considerayao possivel a partirdessa analise refere-se ao conceito de prova. Se euconsiderar apenas acertos e meios acertos (para naoser tao radical), sendo esses ultimos relativos a escritacorreta de algum grupo de cada sequencia ditada, terianas 5 quest6es com nota de 1 a 10: AP4 =2, J5 =1, F5= 5, R6 = 3, P6 = 7 e R7 = 6. Essas notas baixasdesestimulariam as alunas e nao trariam nenhuma infor­mayao relevante sobre 0 estagio de desenvolvimentode cada uma. Ao passe que a mesma prova, lidaconforme 0 processo de aquisiyao da escrita musical,possibilita ao professor perceber os tipos de hip6tesesque estao sendo individualmente realizadas pelas

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crianyas, tal como procurei fazer no t6pico anterior, efocalizar essas lacunas no dia a dia da sala de aula9

Isso s6 e possfvel mediante uma postura frente ainiciayao musical em que predomine 0 conceito demusica como linguagem, ao inves de tecnica, 0 mesmodevendo ser dito sobre a escrita musicapo.

Caberia, portanto, uma investigayao ampla doprocesso de aquisiyao da Iinguagem musical escrita noescopo da psicolingOfstica que permitisse a construyaode uma hierarquia, ou campos interrelacionados, comas hip6teses da crianya sobre a escrita (estagios dedesenvolvimento). Dessa forma 0 professor teria umareferencia para analisar 0 material produzido pelascrianyas.

A presente analise, e esta e a segundaconsiderayao a fazer, realiza uma investida nessesentido, possibilitando observar alguns aspectospertinentes. Em primeiro lugar, 0 contato com variosgrupos e elementos rftmicos nao significa que a crianyava focaliza-Ios todos de uma vez. Quais seriam esseselementos? Sugeri a) acelerayao/desacelerayao; b)numero de grupos rftmicos; c) numero de notas; d) razaoda densidade, ou melhor, razao de subdivisao/multiplicayao na relayao nota/pulso. a processo sugeridopela analise dos trabalhos desses alunos seria:

1. duas possibilidades: ou 0 aluno fixa 0 numerode grupos rftmicos ou atem-se aquestao da acelerayao/desacelerayao;

2. 0 aluno, ao perceber que sua hip6tese anterior

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nao da conta desses dois aspectos do ritmo,reformulando-a a fim de superar 0 problema, 0 quedefniniria esse segundo estagio;

3. 0 aluno percebe outro aspecto quantitativo doritmo, 0 numero de notas (ataques) e sua terceirahip6tese deveraabrangertambem esse aspecto a partirda reformulayao das hip6teses anteriores;

4. provavelmente e a acentuayao que leva 0

aluno a questionar a hip6tese anterior e 0 coloca noquarto estagio, aparentemente uma regressao: ele fixao numero de grupos e notas mas perde, parcialmente,a noyao de variayao de densidade; essa instabilidade 0

leva aquestao da razao de subdivisao/multiplicayao narelayao nota/pulso;

5. quando reformular suas hip6tesesconseguindo adequa-Ias a relayao nota/pulso, estara,finalmente, escrevendo ritmos corretamente.

A percepyao do silencio coloca um novoproblema para a crianya frente aescrita musical. Ela vairepensar todas as suas hip6teses, cometendo erros queem seqOencias sem silencio nao mais comete" , ateconseguir entender que, em musica, 0 silencio e taoimportante quanta a nota.

Cabe ressaltar que esses estagios nao devemser vistos como uma sequencia rfgida: assim como nadae 6bio na escrita, seja ela musical ou verbal, ou mesmonada e6bvio na linguagem, 0 processo de sua aquisi9aoe um vai evem constante, nunca uma rua de mao unica.

9Conforme Castro (1996), epreciso levarem considera~o no processo de aquisi~o da Iinguagem uma independencia parcial, que produz ft090eSinfantis para palavras adultas, au seja, recria a linguagem enquanto a adquire. Os errcs, com a entrada da teoria de Piaget, passaram a ser vistascomo reflexos au indfcios de um processo onde a crianya, ao adquirir a representayao escrita da linguagem, reconstr6i sua relayao com ela. Acrianc;:a passa a ser vista como um sujeito ativo e a linguagem oomo um dos objetos cujo conhecimento e fruto da construyao desse sujeito. Nadiscussao desse assunto, Abaurre etalii (1995) explicaque, paroutro lado, a sujeito piagetiano eum sujeito ideal eque, portanto, apesquisa baseadaem dados do mundo (crianc;:as reais) nao pode ignoraros dados que, se nao confirmam nem contradizem ateoria, se nao respondem as perguntaspropostas par ela. tem, par sua vez, a potencial de evidenciar e ate elucidar outras pertinencias no campo da aquisiyao da Iinguagem escrita.

10 No campa da linguagem verbal, Smolka (1988), conclui que as crianc;:as aprendem a escreverescrevendo, isto e, usando aescrita ea leitura comseus devidos fins, porisso eimportante escrever parque quer ea que quer escrever, sem esquecer que essa escrita sempre direciona-se a a1guem.No mesmo sentido, Cagliari (1998) enfatiza que a leitura de um texlo nao pode perder de vista a texlo como veiculo de um conteUdo global: embusca desse conteudo, alga comunicado de a1guem para alguem, a processo de leitura inclui decifra.yao, reflexao, opiniao.

11 0 processamento de hip6teses pela crianc;:a e discutido em Smolka (1988). A autora sugere um agrupamento de hip6teses motivado pelomaterial escrito, mas ressalta que ele deve servista como uma construc;:ao par parte do sujeitcx:rianc;:a baseada em movimentos de uma linguagemem constituic;:ao e, simultaneamente, constituidora, num processo de intemalizayao do social marcado pela relayao de interlOCUlfao, ambos presentesna dimensao discursiva das produc;:oes infantis. Ela baseia-se em Vigotsky (1991), que discute que a hist6ria do desenvolvimento da Iinguagem nascrianc;:as e marcada par evoluc;:oes einvoluc;:oes, plena de descontinuidades, tal como na hist6ria do Homem.

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