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Lembranças, hoje, de outrora. Hoje, meu lado cristão aflorou Talvez, o medo da escuridão e o temor a Deus o despertou. Rezei, depois de muitas décadas, um Pai nosso e uma Ave Maria (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, semanalmente, a comunhão. Ah, mas me vingava na confissão! Dizia ao padre que não tinha pecado (como uma criança pode ter pecado?) Mas o padre se vingava, também, de mim! Tive que rezar até Deus enjoar da minha voz Mas rezava e pensava em Tereza. Detalhe! Tereza passeava, por minha reza, nua. Hoje, senti em mim o céu e o inferno! Bêbado de vinho e farto de pão, eu quase que pedi um perdão. Credo, depois de muitas décadas, a cruz resolveu me condenar! (vi tantas cruzes e Cristos “cruzes”) Sim, eu fui crucificado, também, quando obrigaram-me a crer “credo”! Ah, mas me vingava no banheiro! Pensava na professora de catecismo (como era “boa” a professora de fé!) Mas o pecado pesava minha consciência! Tive que rezar até Deus se fartar de mim!

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Page 1: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

Lembranças, hoje, de outrora.

Hoje, meu lado cristão aflorou

Talvez, o medo da escuridão

e o temor a Deus o despertou.

Rezei, depois de muitas décadas,

um Pai nosso e uma Ave Maria

(ambas decoradas no catecismo)

Sim, eu fui obrigado a estudar,

semanalmente, a comunhão.

Ah, mas me vingava na confissão!

Dizia ao padre que não tinha pecado

(como uma criança pode ter pecado?)

Mas o padre se vingava, também, de mim!

Tive que rezar até Deus enjoar da minha voz

Mas rezava e pensava em Tereza. Detalhe!

Tereza passeava, por minha reza, nua.

Hoje, senti em mim o céu e o inferno!

Bêbado de vinho e farto de pão,

eu quase que pedi um perdão.

Credo, depois de muitas décadas,

a cruz resolveu me condenar!

(vi tantas cruzes e Cristos – “cruzes”)

Sim, eu fui crucificado, também,

quando obrigaram-me a crer – “credo”!

Ah, mas me vingava no banheiro!

Pensava na professora de catecismo

(como era “boa” a professora de fé!)

Mas o pecado pesava minha consciência!

Tive que rezar até Deus se fartar de mim!

Page 2: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

Mas rezava e pecava em seguida – Herege!

Excomunguei-me e me fiz meu senhor

Hoje é hoje e já é não mais ontem,

tampouco, espero ser feliz amanhã

Graças a mim, voltei ao normal!

Putz, depois de muitas décadas,

a trindade quis me ressuscitar.

(morri para o depois, para viver o hoje)

Sim, sou, tal e qual, Lázaro! Só que voltei

da vida eterna para viver a vida de agora.

Ah, sempre me vingo da eternidade!

Vivo a vida e o momento até a exaustão!

(sou o efêmero mais eterno do mundo!)

Não estou pecando, nem difamando nada,

simplesmente, vivo me absolvendo sempre

Quem quiser que me atire pedras, mas digo:

- Cuidado, não quero me tornar um mártir! Lembranças, hoje, de outrora.

Hoje, meu lado cristão aflorou

Talvez, o medo da escuridão

e o temor a Deus o despertou.

Rezei, depois de muitas décadas,

um Pai nosso e uma Ave Maria

(ambas decoradas no catecismo)

Sim, eu fui obrigado a estudar,

semanalmente, a comunhão.

Ah, mas me vingava na confissão!

Dizia ao padre que não tinha pecado

(como uma criança pode ter pecado?)

Mas o padre se vingava, também, de mim!

Tive que rezar até Deus enjoar da minha voz

Mas rezava e pensava em Tereza. Detalhe!

Page 3: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

Tereza passeava, por minha reza, nua.

Hoje, senti em mim o céu e o inferno!

Bêbado de vinho e farto de pão,

eu quase que pedi um perdão.

Credo, depois de muitas décadas,

a cruz resolveu me condenar!

(vi tantas cruzes e Cristos – “cruzes”)

Sim, eu fui crucificado, também,

quando obrigaram-me a crer – “credo”!

Ah, mas me vingava no banheiro!

Pensava na professora de catecismo

(como era “boa” a professora de fé!)

Mas o pecado pesava minha consciência!

Tive que rezar até Deus se fartar de mim!

Mas rezava e pecava em seguida – Herege!

Excomunguei-me e me fiz meu senhor

Hoje é hoje e já é não mais ontem,

tampouco, espero ser feliz amanhã

Graças a mim, voltei ao normal!

Putz, depois de muitas décadas,

a trindade quis me ressuscitar.

(morri para o depois, para viver o hoje)

Sim, sou, tal e qual, Lázaro! Só que voltei

da vida eterna para viver a vida de agora.

Ah, sempre me vingo da eternidade!

Vivo a vida e o momento até a exaustão!

(sou o efêmero mais eterno do mundo!)

Não estou pecando, nem difamando nada,

simplesmente, vivo me absolvendo sempre

Quem quiser que me atire pedras, mas digo:

- Cuidado, não quero me tornar um mártir!

Page 4: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

Eu, o problema

Eu sempre procuro problemas

Por que Deus meu, por quê?

Por que tenho que complicar,

que dificultar; por quê?

Parece que gosto de me ver sofrer; parece.

Há uma ponte, prefiro nadar

Há atalhos, escolho a distância

Há o depois, prefiro o logo

Certamente, sou confuso em mim!

Eu nunca gostei de banho-maria

Procuro me escalpelar, sempre

Dou graças por um pesadelo,

um tormento; por quê?

Parece que gosto de me ver sofrer; parece

Há o sonho, quero acordar

Há placas, prefiro me perder

Há o sempre, quero o instante

Certamente, sou confuso em mim!

Page 5: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

Motivos

Tenho todos os motivos para sorrir

Todos

Mas, eu faço questão das lágrimas

Se a vida faz festa para me receber

Eu festejo a ressaca do dia seguinte

Sinto que sofro com minhas alegrias

É como matar a fome sem ter apetite

Tenho todos os motivos para cantar

Todos

Mas, eu faço questão do silêncio

Se o mundo me oferece o carnaval

Eu danço sozinho a valsa fúnebre

Calo o susto e a surpresa da espera

E me recolho aos rincões lúgubres

Tenho todos os motivos para viver

Todos

Mas, eu faço questão da despedida

Se o amor me convida para a vida

Como o tira-gosto, viro a mesa

peço a saideira, pago a despesa

E volto trôpego para minha tristeza

Eu tenho todos os motivos, todos!

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Registro de nascimento

A velhice está em uma data de nascimento,

cujo dia foi registrado para contar o tempo

Por isso,

desautorizei o mundo de marcar meus passos

e apaguei, da identidade, o carimbo da idade.

Agora?

Agora, eu nasço todos os dias com o amanhecer

e só comemoro o aniversário dos novos sonhos.

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Ao drº Sílvio

Estou, deveras, ansioso

(medo, talvez)

As minhas mãos suam

Os olhos estão arregalados

A palavra fraqueja na boca

e a boca está ressecada

As pernas já não respondem

(tremem de pavor)

Meu Deus! Deus meu!

Ah, quisera o amor fosse

o causador desses sintomas

Não, não é o amor!

É a espera na antessala

do Drº Silvio - odontólogo

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Buchicho

Eu quis inventar uma árvore

e nela trepar; derrubaram-me

Quis alcançar o infinito;

apontaram que era ali

Quis passear pelos sonhos;

todos me sacolejaram

Procurei fazer da vida

quimeras e, agora, onde ando,

sou apontado e ouço burburinhos:

- Coitado, ele é poeta!

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Hoje, percebi que nunca chorei,

nem lembro de ter vertido lágrimas

Ah, quando uma lágrima vinha

eu escrevia, rapidamente, uma poesia

Meu Deus,

acho que sou um poeta!

Eu choro sempre versos.

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Constipação

Acabei de chegar do hospital

Eu estava todo constipado

Colocaram-me numa maca.

O médico veio, imediatamente,

E ao me analisar, logo, percebeu:

Esse rapaz é um Poeta

e seu problema é verso preso.

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Poetia

Poeta e poesia são os mesmos

Não se pode desvencilhar ambos

Um nasce para parir o outro,

que também gera o que nasce.

Poeta e poesia são uns, não dois.

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otiecnoc

Por que me procura?

Nem eu sei onde estou.

Ando por tantos caminhos

que me perdi e nunca, nunca,

nunca mais me encontrei.

Não me encontre em respostas,

eu não respondo por mim.

O que faço ou não faço

é apenas um parco traço,

nesse percurso sem fim.

Não estou quando me chama

Nem vou! Vinde a mim!

Mas não demore, tenho vida

e não tempo para perder tempo.

Preciso andar até ganhar asas.

Não me espere no horário marcado!

O meu tempo não é o seu.

O ponto de encontro é um ponto

no meio de um vasto mundo,

no qual, maior que ele sou eu.

Conseguiu, enfim, me diagnosticar?

Se, passe, agora, para mim a receita.

A verdade é que nem eu sei bem

onde começo e onde termino

Mas sei, bem, onde quero chegar.

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Sou eu

Sou o meu próprio algoz

Um feitor

Que me pune e castiga

Sou o meu próprio senhor

Um patrão

Que paga com o soldo da vida

Sou eu

Um verbo e um predicado

Ninguém que é alguém

Um ser e a sua essência

O hoje, o amanhã, o ontem.

Sou o meu próprio Deus

Divino

Que me julga e absolve

Sou o meu próprio diabo

Inferno

Que a prato cheio se serve

Sou eu

Uma palavra e um silêncio

O outro e também o “eu”

Aquele que está e sempre

Um Deus, sem deus; ao léu.

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Sou assim

Não me procure em dicionários

Nem tente formular teorias

Eu sou o que sou, como sou

Enfim, do jeito que eu sou

À revelia

Não valho o prato que como

E daí?

Mas eu como a prato feito

O que o mundo regurgita

Sim

Sou assim

Não me busque em esquinas

Meu caminho é sem precisão

Eu vou e vou, como vou

De qualquer jeito eu vou

Sem direção

Não conheço o rumo certo

E daí?

Vagueio por infernos e céus

Condeno-me e me absolvo

Sim

Sou assim

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O Poeta

O POETA SENTE, MENTE, SENTE , MENTE...

SENTE MAIS QUE MENTE, MAIS QUE SENTE,

MAS MENTE, SENTE, MENTE, SENTE...

Page 16: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

E tome antialérgico

Minha rinite é minha tuberculose

De vez em quando, ela me ataca.

Coriza, nervoso e muito lenço

Atchin, atchin, atchin ...

E tome antialérgico

Estou bem, estou mal!

Pelo de animal,

mudança climática,

poeira, sereno

e a rinite não sossega

E tome antialérgico

Não tenho a tuberculose inerente aos poetas

Mas, restou-me conviver com essa rinite

Não morrerei dela, mas, certamente, com ela

E, assim, vou vivendo a vida constipado

O bom, se há bom nisso

É que posso ter os pulmões obstruídos,

mas meu coração é forte! Cof, cof, cof...

Page 17: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

Eu

Poeta de versos mancos

E versejar chulo

Tímido por natureza

Exibido por profissão

Trabalha pouco

Ganha pouco

Dorme pouco

Mas ganha da vida

Onicófágico

Alérgico

Dentuço

Porém convencido

Cronista do cotidiano

Compositor social

Escritor insistente

Boêmio inveterado

Graduado

Agnóstico

Pernóstico

Mas bom de papo

Bom leitor

Ótimo bebedor

Um mão de figa

Mas com um coração dado

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Eu era

Quem me conheceu de outrora, esqueça!

Eu mudei, andei por caminhos e tropecei

Levantei,

Mas ao me erguer aprendi a deixar o pé

Para que outro tropece e caia também

Eu era lindo, absolutamente lindo

Mas deformei essa minha beleza

Maquiei-me com todo egoísmo

E com sorrisos comprados

Eu vesti a inocência

E escancarei pré-requisitos

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

Quem me conheceu de ontem, perceba!

Eu calei, fechei meu coração e me guardei

Banalizei

Fingi emoções para seduzir os amores

E assim ofertar hipócritas emoções

Eu era poeta, verdadeiramente poeta

Mas rabisquei todos os meus versos

Rasurei com minha ganância

E com palavras decoradas

Eu enxuguei minhas lágrimas

E debulhei-me em sarcasmos

Page 19: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

Quem me conheceu do passado, apague!

Eu sequei, matei minha vida e ressuscitei

Ignorei

Encolhi o braço para não socorrer

E deixei no chão quem eu poderia erguer

Eu era gente, indiscutivelmente humano

Mas apunhalei as minhas sensações

Enterrei-a com os meus vieses

E com gestos ensaiados

Eu adormeci todo o onírico

E acordei os meus instintos

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

Quem me conheceu de antes, entenda!

Eu pequei, jurei em vão e me neguei

Crucifiquei

Injuriei o meu melhor e mais bonito

Para dar vazão ao esdrúxulo

Eu era tudo, um Apolo de sentimentos

Mas apedrejei todo o meu eu

Troquei-me por um vazio

Page 20: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

E por coisas tangíveis

Eu derrubei meus devaneios

E ergui o homem de hoje

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

Page 21: Lembranças, hoje, de outrora. - rl.art.br (ambas decoradas no catecismo) Sim, eu fui obrigado a estudar, ... senti em mim o céu e o inferno! ... voltei ao normal!

POESIAS

SOU

Mário Paternostro

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