lei pele comentada

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LEI Nº 9.615, DE 24 DE MARÇO DE 1998 Institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES INICIAIS Art. 1º O desporto brasileiro abrange práticas formais e não- formais e obedece às normas gerais desta lei, inspirado nos fundamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito. §1º A prática desportiva formal é regulada por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática desportiva de cada modalidade, aceitas pelas respectivas entidades nacionais de administração do desporto. §2º A prática desportiva não- formal é caracterizada pela liberdade lúdica de seus praticantes.

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Page 1: Lei Pele Comentada

LEI Nº 9.615, DE 24 DE MARÇO DE 1998

Institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO IDISPOSIÇÕES INICIAIS

Art. 1º O desporto brasileiro abrange práticas formais e não-formais e obedece às normas gerais desta lei, inspirado nos fundamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito. §1º A prática desportiva formal é regulada por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática desportiva de cada modalidade, aceitas pelas respectivas entidades nacionais de administração do desporto.

§2º A prática desportiva não-formal é caracterizada pela liberdade lúdica de seus praticantes.

Como se observa, o art. 1º e seus parágrafos da lei Pelé é o mesmo que já se continha na lei Zico. Apenas no §1º do art.1º da lei atual há uma pequena alteração redacional que em nada altera o sentido do conteúdo da lei anterior.

Este artigo visa a esclarecer que os esportes podem ser praticados sob o império de regras previamente estabelecidas, de tal sorte que os participantes devem respeito a elas sob pena de alguma sanção determinada nessas mesmas regras. Buscando-se o exemplo do futebol, por mais difundido entre nós, teríamos a observar que os participantes de competições, oficiais ou amistosas, teriam de ater-se às regras gerais da International Board e às normas específicas de cada competição, expostas estas

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previamente em seus respectivos regulamentos. Aí se tem a prática formal da modalidade esportiva.

Em contraposição, dentro da mesma modalidade esportiva, a famosa pelada, sem regras ou regulamentos, por sua liberdade lúdica, apenas para deleite de seus participantes, se caracteriza como prática desportiva não-formal. O que vale ou não é estabelecido na hora, de comum acordo. Assim, as práticas de desporto não-formais são aquelas para as quais não existem regras preestabelecidas, cabendo aos seus participantes estabeleceram-nas de comum acordo, no momento mesmo da sua prática. Juntam-se os participantes e combinam na hora como será a disputa: se há ou não juiz (caso negativo, os próprios participantes são obrigados a denunciar as infrações que cometem); qual o tempo de duração do jogo; o limite de idade mínima e máxima dos participantes; se em caso de empate a decisão se faz por disputa em penalidades máximas ou se através de prorrogação, caso em que tanto esta pode ser por tempo como por morte súbita, e assim por diante. Enfim, esportes não-formais são os que se praticam sem regras predeterminadas.

Este o sentido básico do art. 1º e seus parágrafos, despiciendo falar-se em fundamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito porque nenhuma lei antidemocrática pode ser constitucional numa democracia.

CAPÍTULO IIDOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

Art. 2º O desporto, como direito individual, tem como base os princípios:

I - da soberania, caracterizado pela supremacia nacional na organização da prática desportiva;

II - da autonomia, definido pela faculdade e liberdade de pessoas físicas e jurídicas organizarem-se para a prática desportiva;

III - da democratização, garantido em condições de acesso às atividades desportivas sem quaisquer distinções ou formas de discriminação;

IV - da liberdade, expresso pela livre prática do desporto, de acordo com a

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capacidade e interesse de cada um, associando-se ou não a entidade do setor;

V - do direito social, caracterizado pelo dever do Estado em fomentar as práticas desportivas formais e não-formais;

VI - da diferenciação, consubstanciado no tratamento específico dado ao desporto profissional e não-profissional;

VII - da identidade nacional, refletido na proteção e incentivo às manifestações desportivas de criação nacional;

VIII - da educação, voltado para o desenvolvimento integral do homem como ser autônomo e participante, e fomentado por meio da prioridade dos recursos públicos ao desporto educacional;

IX - da qualidade, assegurado pela valorização dos resultados desportivos, educativos e dos relacionados à cidadania e ao desenvolvimento físico e moral;

X - da descentralização, consubstanciado na organização e funcionamento harmônicos de sistemas desportivos diferenciados e autônomos para os níveis federal, estadual, distrital e municipal;

XI - da segurança, propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial;

XII - da eficiência, obtido por meio do estímulo à prática desportiva e administrativa.

No capítulo II da lei Pelé, repetiu-se o que já se continha na lei Zico, com pequeníssimas variantes redacionais, sendo quase uma cópia fiel da lei anterior.

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Dentre os princípios fundamentais do desporto, a soberania desejada pela lei não pode ser tão absoluta quanto aparenta o inciso I, porque a organização da prática desportiva, internamente, está bastante subordinada a normas internacionais de várias modalidades. A FIFA e o COI estabelecem normas que devem ser obedecidas por todas as legislações nacionais, sem o que corre o país o risco de desfiliação. Ora, dentro da prática desportiva formal, nenhum sentido teria a prática de um esporte que se limitasse às próprias fronteiras com impedimentos de participações internacionais. Portanto, essa soberania está adstrita aos princípios do interesse e da moralidade pública de cada povo. Se a legislação nacional proibir a prática de alguma modalidade desportiva considerada pela sociedade nociva à formação de seu povo, aí estará exercendo o princípio da soberania, mas aí também se estará auto-excluindo de competições internacionais de tal esporte. Não quero citar nenhum esporte como exemplo, para que se não diga que me insurjo contra qualquer deles. Mas a mim, ao menos, não me satisfazem os esportes que, rotineiramente, levam seus praticantes a sequelas irreversíveis, quando não mesmo à morte, seja de pessoas seja de animais.

O princípio da autonomia é ínsito a toda e qualquer atividade humana, não se podendo impor comportamentos àqueles que não pertençam a um quadro autônomo, dentro do qual todos são, individualmente, sujeito e objeto, com direitos e deveres, opondo-se, grupalmente, como unidade autônoma a outras unidades co-irmãs, todas sob a égide das mesmas regras e normas convencionadas para a disputa pretendida.

O princípio da democratização é preceito constitucional. Onde houver discriminação, sob que forma seja, violada estará a lei maior. As formas de discriminação, em nosso país, não se revelam de forma clara, mas dizem com a injustiça social e econômica onde os menos aquinhoados lutam duplamente por um lugar ao sol.

O princípio da liberdade está assentado no preceito constitucional segundo o qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (Const. Fed., art. 5º, II). Por isso que a lei trata o desporto como direito individual e não como dever social. A liberdade a que a lei se refere é a liberdade do indivíduo e não a liberdade da coletividade.

O princípio do direito social é um dos grandes avanços da modernidade esportiva. Cumpre ao Estado, diretamente ou através de incentivos, criar condições para que a prática desportiva, formal, não-formal ou educacional, consiga minimizar a diferenciação na formação do atleta e do cidadão. Muita vez, é através do esporte que estará a salvação de uma juventude e, cada jovem assim salvo, pode representar a salvação de uma família, prestante à sociedade e ao país. Qualquer que seja a modalidade desportiva, ela será sempre um caminho para o lado bom da sociedade na medida em que afasta o jovem do lado mau que toda sociedade apresenta. Aos mais carentes, sobretudo, impõe-se maior assistência social e desportiva, até para realmente garantir o princípio da democratização anteriormente consagrado.

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O princípio da diferenciação busca resguardar direitos e impor deveres àqueles que elejam uma modalidade desportiva como profissão, resultando daí consequências de ordem trabalhista e previdenciária, entre outras.

O princípio da identidade nacional tem por primado a busca de valores da criação nacional para a valorização de modalidade desportiva que possa atingir degraus de igualdade com outros países.

O princípio da educação é justamente aquele que há de garantir recursos públicos para a prática do desporto como meio de formação do homem. Tem a ver com o princípio do direito social, anteriormente mencionado, e por isso que, ao comentarmos o §3º do art. 6º não nos pareceu, como se verá adiante, que a fórmula apresentada para distribuição da receita ali considerada seja, socialmente, a melhor.

O princípio da qualidade visa ao aperfeiçoamento do praticante do desporto na sua integralidade dentro da velha maxima de mens sana in corpore sano.

O princípio da descentralização é um dos mais importantes se considerarmos as dimensões continentais do Brasil. É fácil falar-se --tomemos ainda o futebol como exemplo -- das excelências de organização das competições dos campeonatos italiano, espanhol, alemão, enfim, de pequenos países europeus e mesmo das competições internacionais entre países da Europa. O que, porém, não se pode esquecer é que nesses países, por suas pequenas dimensões, não há, na maioria deles, campeonatos regionais; são todos nacionais, porque países pequenos. São tão pequenos que conseguem ter uma única moeda para todos eles. É preciso que se não esqueça, também, que, dentro da Europa, se fazem viagens de um país a outro (França/Inglaterra, Espanha/Itália, Holanda/Alemanha) em tempo igual a uma viagem Rio/São Paulo. Um atleta do Rio Grande do Sul chega a outros países (Uruguai, Paraguai, Argentina, Chile) em menor tempo que o gasto para alguns outros estados (Pernambuco, Ceará, Amazonas) dentro do próprio Brasil. Mas quando temos viagens do campeonato brasileiro, com os atletas passando mais tempo nos aeroportos e aviões e hotéis que nos campos de jogo ou de treinamento, e menor tempo ainda com sua família, seus pais, suas mulheres, seus filhos, é bem de ver que a descentralização do desporto no Brasil é primordial para o seu próprio desenvolvimento, assegurando-se melhor capacitação aos atletas, durante as competições, e obedecendo ainda às suas peculiaridades regionais. O próprio biotipo do brasileiro do sul difere do do norte. É nesse cadinho de tantas variantes e tantas vertentes que havemos de encontrar, pela descentralização, a unidade do desporto nacional.

O princípio da segurança está apenas no papel. Apesar de reiterado como necessária à prática de qualquer esporte, a segurança dos atletas tem sido esquecida ou desdenhada em diversas modalidades desportivas. Os responsáveis pela garantia desse princípio deveriam dar-se conta do número de atletas lesionados, alguns acidentalmente outros nem tão acidentalmente assim, a fim de que a prática desportiva, em que pese

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seu lado competitivo, não ultrapasse os limites impostos por suas próprias regras. Aos infratores, a punição; aos omissos, a exclusão.

O princípio da eficiência tem a ver com a busca do resultado positivo. Não a qualquer preço, como alinhavado acima, mas pela competência na prática da modalidade desportiva. Isto compete ao atleta. Mas a eficiência também há que ser buscada na administração do desporto e isto diz com os dirigentes. No Brasil, a maioria dos dirigentes é formada por amadores. Alguns realmente bem intencionados e altruístas; outros, buscando a consecução de interesses pessoais. Em regra, a fama e o poder. E conseguem. Conseguem através da projeção que lhes dá uma entidade desportiva com certo grau de prestígio junto ao público. Por isso que a idéia do clube-empresa e, em consequência, do dirigente profissional, pode ser uma solução para a melhoria do desporto brasileiro. Discutiremos sua obrigatoriedade ao tratarmos do art. 27.

CAPÍTULO IIIDA NATUREZA E DAS FINALIDADES DO DESPORTO

Art. 3º O desporto pode ser reconhecido em qualquer das seguintes manifestações:

I - desporto educacional, praticado nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer;

II - desporto de participação, de modo voluntário, compreendendo as modalidades desportivas praticadas com a finalidade de contribuir para a integração dos praticantes na plenitude da vida social, na promoção da saúde e educação e na preservação do meio ambiente;

III - desporto de rendimento, praticado segundo normas gerais desta Lei e regras de prática desportiva, nacionais e internacionais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e comunidades do País e estas com as de outras nações.

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Parágrafo único. O desporto de rendimento pode ser organizado e praticado:

I - de modo profissional, caracterizado pela remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva;

II - de modo não-profissional, compreendendo o desporto:

a) semiprofissional, expresso em contrato próprio e específico de estágio, com atletas entre quatorze e dezoito anos de idade e pela existência de incentivos materiais que não caracterizem remuneração derivada de contrato de trabalho;

b) amador, identificado pela liberdade de prática e pela inexistência de qualquer forma de remuneração ou de incentivos materiais para atletas de qualquer idade.

O desporto educacional não deve ser praticado com o objetivo do rendimento (a vitória a qualquer custo) mas sim com o objetivo de preparar a criança e o jovem para a vida esportiva como forma de sociabilidade. Por isso que as "competições" com o objetivo educacional devem ser muito bem monitoradas por professores bem qualificados e antes de iniciadas devem os pais receber "aulas de educação desportiva" para que não exijam que seus filhos sejam o brilhareco do clube ou da escola ou da rua ou do condomínio porque, em não conseguindo êxito, a criança ou o jovem passa por um processo de frustração como filho na medida em que não conseguiu corresponder à expectativa do papai coruja ou da mamãe vaidosa, para os quais o seu filho é sempre o melhor. E nem sempre e nem em tudo ele poderá sê-lo. Terá que aprender a ganhar, sem humilhar o vencido, e a perder, sem menoscabar a vitória de seu opositor. Perder e ganhar é a vida. Por isso que o desporto educacional tem por finalidade o desenvolvimento e a formação do indivíduo como cidadão e não como atleta. Somente se a criança ou o jovem mostrar pendor para o esporte e desejo de a ele se dedicar integralmente deverá receber incentivo para tal. Incentivo, não exigência. Muito menos a castração de um sonho. Os pais não podem viver a vida de seus filhos e muito menos impedir que eles vivam sua própria vida.

O desporto de participação exige um pouco mais. Não como competição, mas como desenvolvimento do cidadão já formado pelo desporto educacional, quando já

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estará apto a, através do esporte, colaborar até mesmo na preservação do meio ambiente. Muito se deve aos andarilhos, aos alpinistas, aos navegadores, aos passarinhos de ultraleve e o que não dizer do número de vidas salvas de afogamento pelos surfistas? Heróis anônimos, mas de qualquer forma heróis. Esta a verdadeira realidade que passa pelo desporto educacional para a formação do desportista que participa como cidadão na prática do bem comum.

Já no desporto de rendimento, bem, aí o Barão de Coubertain foi pro espaço. Não se pode mais falar que o importante é competir porque vencer é o que importa. O âmago do inciso III está na finalidade de obter resultados, o que significa dizer resultados positivos. Portanto, não adianta ser vice-campeão ou campeão moral e a medalha de prata pouco significa. É preciso vencer. E para vencer o atleta às vezes tenta ultrapassar seus próprios limites, o que lhe pode ser fatal, pela incapacidade de ser superior a si mesmo ou pela impossibilidade orgânica de se tornar melhor por meios escusos.

Quando praticado o esporte de forma profissional, o atleta passa a ter uma remuneração pactuada num contrato de trabalho e se torna um empregado de uma entidade desportiva, com os direitos e deveres de qualquer outro empregado. Encerrado o período ajustado no contrato, o atleta profissional é livre para trabalhar para outra entidade, respeitadas as regras de transferência de cada modalidade desportiva, excetuando-se o atleta profissional de futebol, que ainda é um escravo que se vende ou se troca como se fora mercadoria do senhor seu dono.

O desporto de rendimento praticado de forma não-profissional só se distingue do profissional pela idade do atleta, que não pode ser inferior a quatorze nem superior a dezoito anos. Os incentivos materiais dados a um bom atleta semiprofissional podem ser superiores aos salários de atletas profissionais. Não é raro entidades de prática desportiva oferecerem moradias para o atleta e sua família, alimentação de primeira qualidade, assistência médica e odontológica, estudos e condições de emprego para seus parentes próximos.

Se a entidade é composta por atletas profissionais e/ou semi-profissionais, objetivando a lucros materiais para a entidade e remuneração, sob qualquer forma, para os atletas, ela é uma entidade de desporto de rendimento, já que visa principalmente aos resultados, isto é, a conquistas, para obtenção de melhores retornos materiais para a entidade e melhores remunerações para os atletas.

Se, ao contrário, a entidade não tem esse objetivo, mas busca tão-somente a integração social e comunitária dos participantes, sem qualquer fim lucrativo ou remuneração, onde todos são amadores (excetuam-se empregados, como secretária, telefonista, auxiliar de escritório, etc.), podendo deixar de cumprir compromissos ou abandonar a prática desportiva quando lhes aprouver, sem qualquer sanção, pode tratar-se de uma entidade que pratica o desporto de participação ou de rendimento. Se tiver por objetivo principal a conquista dos títulos, pratica esporte de rendimento; se o primeiro objetivo for apenas o lazer como integração social, onde a vitória é fator secundário, pratica esporte de participação.

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Oportuno observar que a prática do desporto de rendimento obriga a submissão à lei e às regras da respectiva prática desportiva, nacionais e internacionais, o que já não ocorre com o desporto de participação, embora possa observar algumas daquelas regras, como prática de desporto formal.

Se os atletas não recebem qualquer espécie de remuneração pecuniária e não assinam contrato de trabalho, nem recebem incentivos materiais e não assinam contrato de estágio, a entidade pratica um desporto formal de modo amador.

Quando amador, o atleta nada recebe da entidade desportiva. Isto é o que está na lei. Em verdade, não é bem assim. Algumas entidades desportivas oferecem a seus atletas, mesmo amadores, alguns incentivos materiais tais como ajuda de custo para locomoção, pois alguns não têm dinheiro para deslocar-se de casa para o clube; alimentação, pois um atleta mal alimentado não pode produzir o que dele se espera numa competição de resultados; material esportivo que, em alguns casos, são usados como roupa social.

Lido o capítulo III, vê-se que até agora nenhuma alteração ocorreu entre a lei nova e a antiga, entre a lei Pelé e a lei Zico.

CAPÍTULO IV

DO SISTEMA BRASILEIRO DO DESPORTO

Seção IDa composição e dos objetivos

Art. 4º O Sistema Brasileiro do Desporto compreende:

I - Gabinete do Ministro de Estado Extraordinário dos Esportes;

II - o Instituto Nacional de Desenvolvimento do Desporto - INDESP;

III - o Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro - CDDB;

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IV - o sistema nacional do desporto e os sistemas de desporto dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, organizados de forma autônoma e em regime de colaboração, integrados por vínculos de natureza técnica específicos de cada modalidade desportiva.

§1º O Sistema Brasileiro do Desporto tem por objetivo garantir a prática desportiva regular e melhorar-lhe o padrão de qualidade.

§2º A organização desportiva do País, fundada na liberdade de associação, integra o patrimônio cultural brasileiro e é considerada de elevado interesse social.

§3º Poderão ser incluídas no Sistema Brasileiro de Desporto as pessoas jurídicas que desenvolvam práticas não-formais, promovam a cultura e as ciências do desporto e formem e aprimorem especialistas.

Começam aí pequenas alterações. Coloca-se dentro do Sistema Brasileiro do Desporto o Gabinete do Ministro de Estado Extraordinário dos Esportes. É bem de ver que, quando se fala de Ministro Extraordinário, está-se a falar de Ministro que não é Ministro. Está Ministro, como diria Eduardo Portella. O Ministro que cuida dos esportes é o Ministro da Educação e dos Desportos. Deu-se ao Sr. ÉDSON ARANTES DO NASCIMENTO esse epíteto por sua importância no desporto nacional e internacional, mas o mesmo cargo, ocupado pelo Sr. ARTHUR ANTUNES COIMBRA, cuja importância não é menor, não passou de mera Secretaria de Desporto e seu titular não passou de Secretário. Tanto que a Lei nº 8.672, de 06/07/93, só recebeu, para sua promulgação, as assinaturas do Presidente da República e do Ministro da Educação. O mesmo também aconteceu com o desportista BERNARD RAZMAN.

Assim, como, embora exista, eventualmente, um Ministro de Estado Extraordinário dos Esportes, parece-me que tal Gabinete não deveria integrar o Sistema Brasileiro do Desporto, posto que, a qualquer momento, por simples ato do Poder Executivo, tal cargo pode deixar de existir (v.com.art.84,§1º). Por isso que na lei Zico esse órgão era a Secretaria de Desportos do Ministério da Educação e dos Desportos. O Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro -CDDB, contemplado na lei Pelé, não é outra coisa senão o Conselho Superior de Desportos, da lei Zico, o que veremos ao comentar o art.11 da lei atual.

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Até aí, portanto, pouca alteração se fez. Copiou-se literalmente, ou quase, a legislação anterior. A partir daí, enquanto a lei Zico começa a tratar, na Seção II deste Capítulo IV, do Conselho Superior de Desportos (substituído pelo Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro -CDDB), a nova lei começa a tratar do INDESP (Instituto Nacional do Desenvolvimento do Desporto).

Seção IIDo Instituto Nacional do Desenvolvimento do

Desporto - INDESP

Art. 5º O Instituto Nacional do Desenvolvimento do Desporto - INDESP é uma autarquia federal com a finalidade de promover, desenvolver a prática do desporto e exercer outras competências específicas que lhe são atribuídas nesta Lei.

§1º O INDESP disporá, em sua estrutura básica, de uma Diretoria integrada por um presidente e quatro diretores, todos nomeados pelo Presidente da República.

§2º As competências dos órgãos que integram a estrutura regimental do INDESP serão fixadas em decreto.

§3º Caberá ao INDESP, ouvido o Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro - CDDB, propor o Plano Nacional de Desporto, observado o disposto no art. 217 da Constituição Federal.

§4º O INDESP expedirá instruções e desenvolverá ações para o cumprimento do disposto no inciso IV do art. 217 da Constituição Federal e elaborará o projeto de fomento da prática desportiva para pessoas portadoras de deficiência.

Aí temos a ditadura no esporte. O INDESP é uma autarquia federal, composta de uma Diretoria integrada por um presidente e quatro diretores, todos

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nomeados pelo Presidente da República, cujas competências serão fixadas em decreto, logicamente, do Presidente da República. As variações políticas determinarão as variantes do desporto. E seja o que Deus quiser.

No art. 6º da lei Zico, os quinze membros do Conselho Superior de Desporto também eram nomeados pelo Presidente da República, mas não a seu bel-prazer e sim obedecendo ao grau de representatividade de cada um deles.

A lei atual não diz se os membros do INDESP terão suas funções remuneradas ou não. Em caso positvo, qual o valor de tal remuneração? Também não diz a lei qual a sede do INDESP, se na capital da República ou outro Estado . Seja como for, os recursos do INDESP, relacionados no art. 6º, são vultosos. Basta consultar a CEF para se ver o valor anual dos prêmios não reclamados por seus ganhadores.

Art. 6º Constituem recursos do INDESP:

I - receitas oriundas de concursos de prognósticos previstos em lei;

II - adicional de quatro e meio por cento incidente sobre cada bilhete, permitido o arredondamento do seu valor feito nos concursos de prognósticos a que se refere o Decreto-Lei nº. 594, de 27 de maio de 1969, e a Lei nº. 6.717, de 12 de novembro de 1979, destinado ao cumprimento do disposto no art. 7º;

III - doações, legados e patrocínos;

IV - prêmios de concursos de prognósticos da Loteria Esportiva Federal, não reclamados;

V - outras fontes.

§1º O valor do adicional previsto no inciso II deste artigo não será computado no montante da arrecadação das apostas para fins de cálculo de prêmios, rateios, tributos de qualquer natureza ou taxas de administração.

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§2º Do adicional de quatro e meio por cento de que trata o inciso II deste artigo, um terço será repassado às Secretarias de Esportes dos Estados e do Distrito Federal, ou, na inexistência destas, a órgãos que tenham atribuições semelhantes na área do desporto, proporcionalmente ao montante das apostas efetuadas em cada unidade da Federação para aplicação segundo o disposto no art. 7º.

§3º Do montante arrecadado nos termos do §2º, cinqüenta por cento caberão às Secretarias Estaduais e/ou aos órgãos que as substituam, e cinqüenta por cento serão divididos entre os Municípios de cada Estado, na proporção de sua população.

§4º Trimestralmente, a Caixa Econômica Federal-CEF apresentará balancete ao INDESP, com o resultado da receita proveniente do adicional mencionado neste artigo.

No §3º do art. 6º, porém, é que se vê a grande aberração da distribuição da receita do INDESP. Ao atribuir cinquenta por cento da mencionada arrecadação aos municípios de cada estado na proporção de sua população, a lei está a dizer na proporção direta, quando, a nosso ver, deveria ser tal distribuição numa proporção não inversa, mas equânime, exatamente para manter nos municípios de menor renda per capita um maior poder de desenvolvimento do desporto. É verdade que os municípios de menor população representam menos votos na eleição, mas, ou se cuida do esporte como política de desenvolvimento de uma juventude e, consequentemente, de um povo, de uma sociedade, de um país, ou se cuida do esporte como política do me-dá-o-que-eu-te-dei. Municípios como o Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Goiânia, Curitiba, Florianópolis, Vitória, etc., etc., etc. não precisam tanto desses recursos para desenvolver seus esportes. Quixeramobim precisa mais... Itaqui precisa mais... Piraí precisa mais.

Os recursos do INDESP previstos na lei Pelé são os mesmos já existentes na lei Zico, previstos no art. 43 para a criação do FUNDESP, que era o Fundo Nacional de Desenvolvimento Desportivo.

Art.7º Os recursos do INDESP terão a seguinte destinação:

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I - desporto educacional;

II - desporto de rendimento, nos casos de participação de entidades nacionais de administração do desporto em competições internacionais, bem como as competições brasileiras dos desportos de criação nacional;

III - desporto de criação nacional;

IV - capacitação de recursos humanos: a) cientistas desportivos;

b) professores de educação física; e c) técnicos de desporto;

V - apoio a projeto de pesquisa, documentação e informação;

VI - construção, ampliação e recuperação de instalações esportivas;

VII - apoio supletivo ao sistema de assistência ao atleta profissional com a finalidade de promover sua adaptação ao mercado de trabalho quando deixar a atividade;

VIII - apoio ao desporto para pessoas portadoras de deficiência.

A destinação dos recursos do INDESP, na lei Pelé, é a mesma do FUNDESP, da lei Zico, e o art. 7º da lei atual é praticamente a cópia do art. 44 da lei anterior.

Uma boa inserção na lei atual é a destinação de parte desses recursos para apoio a pessoas portadoras de deficiência, não prevista na lei Zico. É essa novidade da lei atual que vai justificar a criação do Comitê Paraolímpico Brasileiro, que não poderia existir sem recursos governamentais. Na lei anterior, uma parcela dos recursos se destinava ao apoio técnico e administrativo do Conselho Superior de Desportos, o que não foi incorporado pela lei Pelé.

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Art. 8º A arrecadação obtida em cada teste da Loteria Esportiva terá a seguinte destinação:

I - quarenta e cinco por cento para pagamento dos prêmios, incluindo o valor correspondente ao imposto sobre a renda;

II - vinte por cento para a Caixa Econômica Federal - CEF, destinados ao custeio total da administração dos recursos e prognósticos desportivos;

III - dez por cento para pagamento, em parcelas iguais, às entidades de práticas desportivas constantes do teste, pelo uso de suas denominações, marcas e símbolos;

IV - quinze por cento para o INDESP.

Parágrafo único. Os dez por cento restantes do total da arrecadação serão destinados à seguridade social.

Este art. 8º da lei Pelé é cópia literal do art. 45 da lei Zico, com duas pequenas alterações: no inciso II, onde se lê administração dos recursos se encontra, no inciso II do art 45 da lei anterior administração dos concursos e na lei atual se contemplam as denominações , marcas e símbolos das entidades desportivas enquanto na lei anterior só se fala em denominações ou símbolos.

O parágrafo único desse artigo tem a redação totalmente diferente do parágrafo único do art. 45 da lei Zico, mas apresenta o mesmo conteúdo e finalidade: destinar dez por cento para a seguridade social, ou seja, para o INSS que, certamente, repassa esse montante para seus aposentados e pensionistas...

Art. 9º Anualmente, a renda líquida total de um dos testes da Loteria Esportiva Federal será destinada ao Comitê Olímpico Brasileiro-COB, para treinamento e competições preparatórias das equipes olímpicas nacionais.

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§1º Nos anos de realização dos Jogos Olímpicos e dos Jogos Pan-Americanos, a renda líquida de um segundo teste da Loteria Esportiva Federal será destinada ao Comitê Olímpico Brasileiro-COB, para o atendimento da participação de delegações nacionais nesses eventos.

§2º Ao Comitê Paraolímpico Brasileiro serão concedidas as rendas líquidas de testes da Loteria Esportiva Federal nas mesmas condições estabelecidas neste artigo para o Comitê Olímpico Brasileiro-COB.

Este artigo é cópia fiel do art. 46 da lei Zico e o §1º do art.9º é cópia quase fiel do parágrafo único do art. 46 da lei anterior.

O estatuído no §2º do art. 9º da lei Pelé, não contemplado pela lei Zico, parece de grande importância social e desportiva, na medida em que sacramenta e viabiliza o Comitê Paraolímpico Brasileiro.

Art.10. Os recursos financeiros correspondentes às destinações previstas no inciso III do art. 8º e no art. 9º constituem receitas próprias dos beneficiários que lhes serão entregues diretamente pela Caixa Econômica Federal - CEF, até o décimo dia útil do mês subseqüente ao da ocorrência do fato gerador.

Este artigo, feitas as necessárias adaptações de numeração referencial, é cópia

do art. 48 da lei Zico.

Seção IIIDo Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro - CDDB

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Já dissemos que o Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro - CDDB da lei Pelé nada mais é que o Conselho Superior de Desportos da lei Zico. Senão, vejamos.

Art. 11. O Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro - CDDB é órgão colegiado de deliberação e assessoramento, diretamente subordinado ao Gabinete do Ministro de Estado Extraordinário dos Esportes, cabendo-lhe:

I - zelar pela aplicação dos princípios e preceitos desta lei;

II - oferecer subsídios técnicos à elaboração do Plano Nacional do Desporto;

III - emitir pareceres e recomendações sobre questões desportivas nacionais;

IV - propor prioridades para o plano de aplicação de recursos do INDESP;

V - exercer outras atribuições previstas na legislação em vigor, relativas a questões de natureza desportiva;

VI - aprovar os Códigos da Justiça Desportiva;

VII - expedir diretrizes para o controle de substâncias e métodos proibidos na prática desportiva.

Parágrafo único. O INDESP dará apoio técnico e administrativo ao Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro - CDDB.

Enquanto a lei Pelé considera o CDDB órgão colegiado de deliberação e assessoramento, a lei Zico considerava o Conselho Superior de Desportos um órgão colegiado de caráter consultivo e normativo, o que vem a ser a mesma coisa. Tanto

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assim o é que os sete incisos que estabelecem a competência do CDDB já estavam na lei Zico, que ainda continha mais dois: dirimir os conflitos de superposição de autonomias e outorgar o Certificado de Mérito Desportivo, ambos excluídos da lei atual.

Nesse particular, o que nos parece de profunda gravidade legislativa é estar expresso no caput do artigo 11 que o Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro - CDDB é órgão diretamente subordinado ao Gabinete do Ministro de Estado Extraordinário dos Esportes. Se se trata de um Ministro Extraordinário (e seu titular o é, em todos os sentidos), é bem de ver que, não integrando a composição ordinária do Ministério, a qualquer momento pode tal cargo deixar de existir, exatamente porque, sendo extraordinário, é momentâneo, passageiro, necessário apenas em alguma circunstância e dentro de algum tempo. Por desejo do Presidente da República ou do próprio Ministro tal função pode ser delegada à Secretaria de Desportos do Ministério da Educação e do Desporto, e o Ministério pode ser extinto até por mero interesse ou desinteresse político. Necessária se fará, então, alteração legislativa para enquadrar-se tão recente lei em nova realidade. E quanto mais se mexe em uma lei mais ela parece oportunista e perde credibilidade. E mais grave ainda é não dizer a lei como se compõe esse Conselho, colegiado que é (v. com. art. 4º e art. 84, §1º).

Mantivemos esses comentários da 1ª edição para provar que nossa tese era correta.

Art. 12. (VETADO)

Seção IVDo Sistema Nacional do Desporto

Art. 13. O Sistema Nacional do Desporto tem por finalidade promover e aprimorar as práticas desportivas de rendimento.

Parágrafo único. O Sistema Nacional do Desporto congrega as pessoas físicas e jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, encarregadas da coordenação, administração, normalização, apoio e prática de desporto, bem como as incumbidas da Justiça Desportiva e, especialmente:

I - o Comitê Olímpico Brasileiro-COB;

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II - o Comitê Paraolímpico Brasileiro;

III - as entidades nacionais de administração do desporto;

IV - as entidades regionais de administração do desporto;

V - as ligas regionais e nacionais;

VI - as entidades de prática desportiva filiadas ou não àquelas referidas nos incisos anteriores.

O que a lei Pelé chama de Sistema Nacional do Desporto a lei Zico chamava de Sistema Federal do Desporto. Com essa única mudança, o art. 13 e seu parágrafo único da lei Pelé são cópia do art. 7º e seu parágrafo único da lei Zico. Os incisos I, III e VI da lei atual também já se encontravam na lei anterior e foram repetidos. De novidade, portanto, temos principalmente o Comitê Paraolímpico Brasileiro e as ligas desportivas, em âmbito regional ou nacional. Sobre as ligas, que grande controvérsia causou, causa e causará, falaremos ao tratar do art. 20.

A Lei nº 9.615, de 23 de março de 1998, embora admita, em seu art. 13, parágrafo único, inciso VI que as entidades de prática desportiva pertençam ao Sistema Nacional do Desporto independentemente de serem filiadas ou não a uma entidade de administração do desporto, exige tal filiação para a aplicabilidade de outros preceitos legais instituídos na mencionada lei. Assim, por exemplo, uma entidade de prática desportiva não filiada a uma entidade de administração do desporto não poderá ter seus atos ou de seus atletas submetidos a um Tribunal de Justiça Desportiva, posto que esses tribunais integram a administração do desporto. Portanto, uma entidade de prática desportiva que não esteja filiada a uma entidade de administração do desporto jamais terá seus direitos e deveres, nem seus atletas, submetidos à apreciação do respectivo Tribunal de Justiça Desportiva, não lhes restando senão e sempre e só o caminho da justiça comum.

Ninguém é obrigado a nada fazer mas, em o fazendo, tem que fazer nos termos da lei. E a lei que institui normas gerais sobre desporto no Brasil é a Lei nº 9.615/98.

Art. 14. O Comitê Olímpico Brasileiro-COB e o Comitê Paraolímpico Brasileiro, e as entidades nacionais de administração do desporto que lhes são filiadas ou vinculadas,

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constituem subsistema específico do Sistema Nacional do Desporto, ao qual se aplicará a prioridade prevista no inciso II do art. 217 da Constituição Federal, desde que seus estatutos obedeçam integralmente à Constituição Federal e às leis vigentes no País.

Nessa seção que trata do Sistema Nacional do Desporto, a lei Pelé faz alguns avanços, principalmente no que tange às ligas regionais e nacionais, o que importou na criação de entidades regionais de administração do desporto, avançando também quando sistematiza o Comitê Paraolímpico Brasileiro. Neste art. 14, enquadra-se o que se deve entender quanto ao funcionamento dos dois Comitês Olímpico e Paraolímpico Brasileiros. Como subsistemas, terão autonomia para estabelecer suas regras específicas que não poderão, contudo, opor-se às regras gerais, subordinando-se, pois, a elas.

Art. 15. Ao Comitê Olímpico Brasileiro-COB, entidade jurídica de direito privado, compete representar o País nos eventos olímpicos, pan-americanos e outros de igual natureza, no Comitê Olímpico Internacional e nos movimentos olímpicos internacionais, e fomentar o movimento olímpico no território nacional, em conformidade com as disposições da Constituição Federal, bem como com as disposições estatutárias e regulamentares do Comitê Olímpico Internacional e da Carta Olímpica.

§1º Caberá ao Comitê Olímpico Brasileiro-COB representar o olimpismo brasileiro junto aos poderes públicos.

§2º É privativo do Comitê Olímpico Brasileiro-COB o uso da bandeira e dos símbolos, lemas e hinos de cada comitê, em território nacional.

§3º Ao Comitê Olímpico Brasileiro-COB são concedidos os direitos e benefícios

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conferidos em lei às entidades nacionais de administração do desporto.

§4º São vedados o registro e uso para qualquer fim de sinal que integre o símbolo olímpico ou que o contenha, bem como do hino e dos lemas olímpicos, exceto mediante prévia autorização do Comitê Olímpico Brasileiro-COB.

§5º Aplicam-se ao Comitê Paraolímpico Brasileiro, no que couber, as disposições previstas neste artigo.

Este artigo estabelece a competência do Comitê Olímpico Brasileiro talqualmente já o fizera o art. 8º da lei Zico, com pequena modificação redacional no caput, onde faz menção à Constituição Federal e à Carta Olímpica, não mencionadas na lei anterior.

Os §§1º e 2º do art. 15 da lei atual já estavam consagrados na lei anterior, acrescendo a privacidade quanto aos lemas e hinos, antes não contemplados.

Nos §§ 4º e 5º do art. 15, a lei nova assegura ao Comitê Olímpico Brasileiro direitos, benefícios e garantias outorgados a outras entidades de administração dos desportos e o §5º do art.15 estende esses direitos, benefícios e garantias ao Comitê Paraolímpico Brasileiro. Trata-se de um grande avanço para o desenvolvimento dos demais esportes, além do futebol, na medida em que os esportes olímpicos e paraolímpicos passam a ter possibilidades de melhor aprimoramento. Não é possível que num país com cento e sessenta milhões de habitantes, com características tão variadas, aptos, portanto, à prática de qualquer esporte, não sejamos potência esportiva em jogos olímpicos. Só através de grandes incentivos e de boa formação desportiva nos clubes, escolas e universidades poderá o Brasil reiterar sua presença no pódio das Olimpíadas.

Art. 16. As entidades de prática desportiva e as entidades nacionais de administração do desporto, bem como as ligas de que trata o art. 20, são pessoas jurídicas de direito privado, com organização e

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funcionamento autônomo, e terão as competências definidas em seus estatutos.

§1º As entidades nacionais de administração do desporto poderão filiar, nos termos de seus estatutos, entidades regionais de administração e entidades de prática desportiva.

§2º As ligas poderão, a seu critério, filiar-se ou vincular-se a entidades nacionais de administração do desporto, vedado a estas, sob qualquer pretexto, exigir tal filiação ou vinculação.

§3º É facultada a filiação direta de atletas nos termos previstos nos estatutos das respectivas entidades de administração do desporto.

O art. 16 da lei Pelé consagra o que se continha no art. 9º da lei Zico. Faz, porém, a lei atual questão de diferenciar, no caput, o que estava diferenciado no § 1º do art. 9º da lei anterior, como entidades de prática desportiva ou entidades de administração do desporto, além de acrescer as ligas independentes como entidades autônomas igualmente instituídas como pessoas jurídicas de direito privado.

Os §§1º e 3º do art. 16 da lei Pelé já estavam consagrados nos §§ 1º e 2º do art. 9º da lei Zico.

Tanto atletas quanto ligas ou entidades de prática desportiva podem filiar-se diretamente a uma respectiva entidade de administração do desporto, desde que os estatutos desta o permitam. Há esportes, principalmente coletivos, em que o atleta não pode filiar-se diretamente a uma entidade de administração do desporto por ser exigência estatutária que ele esteja antes filiado a uma entidade de prática desportiva.

O §2º do art. 16 da lei atual, porém, dá às ligas um poder autônomo extraordinário, posto que permite sua existência independentemente de qualquer vínculo a outra entidade de desporto. Falaremos mais sobre este ponto ao tratarmos do art. 20.

Art. 17. (VETADO)

Art. 18. Somente serão beneficiadas com isenções fiscais e repasses de recursos públicos federais da administração

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direta e indireta, nos termos do inciso II do art. 217 da Constituição Federal, as entidades do Sistema Nacional do Desporto que:

I - possuírem viabilidade e autonomia financeiras;

II - apresentarem manifestação favorável do Comitê Olímpico Brasileiro-COB ou do Comitê Paraolímpico Brasileiro, nos casos de suas filiadas e vinculadas;

III - atendam aos demais requisitos estabelecidos em lei;

IV - estiverem quites com suas obrigações fiscais e trabalhistas.

Parágrafo único. A verificação do cumprimento da exigência contida no inciso I é de responsabilidade do INDESP, e das contidas nos incisos III e IV, do Ministério Público.

O disposto no artigo 18 da lei Pelé guarda consonância com o conjunto de exigências dos arts. 16 e 17 da lei Zico. Pareceu-me prudente a extinção, pela lei atual, do Certificado de Mérito Desportivo, que poderia atender mais a vaidades pessoais e interesses eleitoreiros do que propriamente ao bom desempenho das entidades desportivas.

A forma e o fundo da matéria ora analisada me parecem mais claros e objetivos na lei atual, inclusive e principalmente porque esta determina competências para verificação de suas exigências. O parágrafo único do art. 18 da lei Pelé foi de extrema habilidade e inspiração na medida em que atribui ao INDESP a verificação do cumprimento do estabelecido no inciso I e ao Ministério Público a fiscalização do estabelecido nos incisos III e IV. Parece-me evidente que a atribuição do Ministério Público não é apenas a de verificação mas também de fiscalização, consoante os termos constitucionais. A fiscalização do estrito cumprimento das leis é atribuição constitucional do Ministério Público e, dentre as leis, ressaltam as fiscais e trabalhistas, sem dúvida pouco respeitadas. Merece encômios, pois, o Conselho Deliberativo do Clube de Regatas do Flamengo que, um dia antes da promulgação da lei Pelé, tendo que eleger seu Conselho Fiscal, fez recair a Presidência de tal Conselho sob a responsabilidade do Eminente Procurador de Justiça Dr. ROBERTO ABRANCHES, cuja integridade, honradez e dedicação sempre foram orgulho para o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Assim, o Clube de Regatas do Flamengo, vanguardista, não esperou a fiscalização do Ministério Público chegar: colocou um membro do Ministério Público para se autofiscalizar.

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No que tange à competência do Ministério Público, tenho para mim que as entidades de prática desportiva submetidas a uma única unidade federativa serão fiscalizadas pelo Ministério Público do respectivo Estado; as entidades nacionais de prática desportiva e de adminstração do desporto deverão ser fiscalizadas pelo Ministério Público Federal; já as entidades regionais de prática desportiva ou de administração do desporto que forem constituídas sob a forma regional, tal como as ligas, deverão, a meu ver, ter sua fiscalização exercida pelo Ministério Público estadual do local da sede de seu funcionamento e não de sua constituição. Assim também me parece que os Tribunais de Justiça Desportiva deverão ser escolhidos, ou criados, em função da sede em que vierem a funcionar as sedes das ligas regionais. A escolha de seus membros, quando criados, deverá obedecer aos mesmos critérios previstos nos arts. 49 e seguintes da presente lei.

Art. 19. (VETADO)

Art.20. As entidades de prática desportiva participantes de competições do Sistema Nacional do Desporto poderão organizar ligas regionais ou nacionais.

§1º (VETADO)

§2º As entidades de prática desportiva que organizarem ligas, na forma do caput deste artigo, comunicarão a criação destas às entidades nacionais de administração do desporto das respectivas modalidades.

§3º As ligas integrarão os sistemas das entidades nacionais de administração do desporto que incluírem suas competições nos respectivos calendários anuais de eventos oficiais.

§4º Na hipótese prevista no caput deste artigo, é facultado às entidades de prática desportiva participarem, também, de campeonatos nas entidades de administração do desporto a que estiverem filiadas.

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§5º É vedada qualquer intervenção das entidades de administração do desporto nas ligas que se mantiverem independentes.

Art. 21. As entidades de prática desportiva poderão filiar-se, em cada modalidade, à entidade de administração do desporto do Sistema Nacional do Desporto, bem como à correspondente entidade de administração do desporto de um dos sistemas regionais.

O disposto nos arts. 20 e 21 da lei Pelé guarda consonância com o estatuído no art. 12 e seu parágrafo único da lei Zico. Parece-me, porém, que na lei Pelé a matéria vem mais claramente explicitada, assegurando realmente os direitos e deveres das ligas tanto regionais quanto nacionais. Daí algumas vozes que hoje se levantam contra este tratamento dado na lei Pelé não se terem insurgido quando da promulgação da lei Zico. É que na legislação anterior não se consubstanciava, com nitidez, o limite e o alcance da lei. Por isso que até os dias da nova lei nenhuma liga foi criada com esses parâmetros de autonomia e independência. Talvez a Liga do Nordeste tenha dado certo. Após a lei Pelé, sem dúvida, muitas se darão à luz, tão logo as entidades de prática desportiva, principalmente os clubes de futebol, compreendam e alcancem a grandiosidade de torneios ou campeonatos organizados sob os auspícios de seus exclusivos interesses. Em país com as dimensões do Brasil, com os extraordinários jogadores de futebol que possui, com a marca internacional que representa o futebol brasileiro, não há como se organizarem competições deficitárias se se tiver a liberdade de organizá-las em função dos interesses exclusivos das entidades de prática desportiva. E é bem de ver que, nesse particular, os clubes de futebol foram os grandes beneficiados, na medida em que poderão agrupar-se em entidades autônomas onde todos os integrantes têm os mesmos interesses, as mesmas finalidades e as mesmas potencialidades. Mesmo assim o fazendo, ainda poderão estar filiados a entidades de administração dos desportos e participar de seus campeonatos, quando isto lhes convier. Será o império dos clubes grandes e dos dirigentes competentes. As divergências e até as desavenças terão que ser esquecidas e sepultadas em benefício de todos. Os clubes ditos pequenos, se quiserem sobreviver, terão que se adequar a essa nova filosofia do esporte e lutar pela possibilidade de acesso, independentemente de descenso. Campeonatos estaduais, regionais ou nacionais, num país da dimensão do Brasil, se bem organizados, hão de gerar extraordinários lucros para seus participantes, principalmente se se consideram as dezenas de grandes clubes e as centenas de bons atletas. Os comentários ora urdidos se dirigem principalmente à prática do futebol porque é desta modalidade esportiva que mais cuida o povo brasileiro --tanto que cada desportista tem a sua seleção própria-- e também porque a lei Pelé, como fizera a lei Zico, se direciona mais para esse esporte. Mas estas considerações valem para todos os esportes, embora eu também concorde

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com aqueles que gostariam de ver uma lei específica para o futebol e outra para as demais modalidades desportivas, exatamente por essa desproporção entre o interesse geral pelo futebol e o interesse particular dos simpatizantes de cada outra modalidade desportiva.

O §2º do art. 20 do Decreto 2.574/98 apenas repete o conteúdo do §2º do art. 16 da Lei nº 9.615/98. O que a nova legislação trouxe de progresso no campo desportivo, nesse particular, foi a possibilidade de se organizarem ligas absolutamente independentes, que não precisarão filiar-se obrigatoriamente a qualquer outra entidade. Ficará a critério da liga filiar-se ou não. Será uma questão de opção, consideradas as vantagens e desvantagens da filiação. E o passo realmente importante é a proibição de qualquer intervenção das entidades de administração do desporto nas ligas que se mantiverem independentes.

O Clube dos Treze, por exemplo, que pode transformar-se em clube dos dezesseis ou clube dos vinte, certamente faria uma fortíssima liga nacional e, bem planejada e organizada, respeitando calendários de competições nacionais compatibilizados com os internacionais, como já agora a FIFA quer compatibilizar o calendário europeu com o sul-americano, sem amistosos caça-níqueis, com o apoio da imprensa, principalmente com a transmissão ao vivo pela televisão, que não afasta por si só o público do estádio, seria uma fonte inesgotável de recursos financeiros, que sustentariam os clubes independentemente dos outros faturamentos por contratos específicos de patrocínio de cada entidade. Se se admitisse um número fixo de participantes obrigatórios, que jamais sofreriam descenso, por suas tradições, suas torcidas, suas rendas, enfim, sua marca, e se se admitisse um número, digamos, exemplificativamente, quatro ou seis outros participantes que estariam sujeitos à regra do acesso e descenso de dois ou três destes clubes para que outros, das ligas regionais ou campeonatos estaduais, pudessem ter acesso a esse grupo de elite, certamente sairiam fortalecidos os clubes já grandes e os ditos pequenos tudo fariam para engrandecer-se, engrandecendo, em consequência, toda a unidade do futebol em nível nacional.

Veja-se, ainda, que as ligas integrarão os sistemas das entidades nacionais de administração dos desportos e as ligas que se mantiverem independentes não poderão sofrer qualquer intervenção de nenhuma outra entidade de administração do desporto. Se se forma, portanto, uma liga de âmbito nacional para a realização de campeonatos entre equipes de vários estados da Federação, criando seu próprio Tribunal de Justiça Desportiva, nenhuma interferência externa sofreria este campeonato, ditando-se seu desenrolar pelos estatutos e regulamentos da respectiva competição.

E para culminar com a excelência da lei, o art. 21 da lei Pelé, que tem seu paralelo no parágrafo único do art. 12 da lei Zico, clubes, federações e ligas poderão filiar-se a entidades nacionais ou regionais de administração do desporto, em qualquer das modalidades desportivas e participar, independente de suas próprias competições, também das competições dessas entidades. Assim, por exemplo, em se criando uma liga nacional de futebol com um determinado número de clubes para disputa de uma

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determinada competição, tenha o nome que tiver, nada impede que esses mesmos clubes, ou alguns deles, participem de um denominado, digamos, Campeonato Brasileiro de Futebol, que, digamos, a Confederação Brasileira de Futebol possa querer instituir, ou manter o modelo que já existe.

Parece-me, pois, que a criação de ligas não vingou na lei Zico exatamente por falta de clareza na sua conceituação e, principalmente porque, de certa forma, não tornava as ligas suficientemente independentes ou fora da ingerência de outras entidades, pois a lei Zico dizia que as ligas tinham que observar as disposições estatutárias das entidades de administração do desporto a que pertencessem, ou seja, os clubes poderiam formar ligas mas não podiam contrariar suas federações. Por isso que a tímida vedação do art. 31 da lei Zico ficou descaracterizada pelo inciso V desse mesmo artigo. Assim é que, se um determinado número de clubes de estados diversos formassem uma liga nacional, poderiam ver-se desfiliados eles de suas federações, o que, em última análise, poderia ser um risco ou, pelo menos, uma aventura. Agora, não. A formação das ligas, ante a clareza da lei, independe de outras entidades. Em suma: a lei Pelé fortaleceu os clubes. Se se organizarem, dentro de dois anos, no máximo quatro, a contar da lei, os grandes clubes brasileiros estarão à altura, administrativa e financeira e economicamente de qualquer outro grande clube de futebol estrangeiro e, com a quantidade e qualidade dos jogadores brasileiros, será difícil sermos superados nessa modalidade esportiva. Não ser superado não quer dizer ser sempre campeão. Quer dizer apenas que o futebol brasileiro será sempre top, já que em outros países, por suas condições econômicas e sócio-culturais, tal esporte poderá ter grande desenvolvimento. Permito-me fingir ter bola de cristal para afirmar que os Estados Unidos serão uma grande potência esportiva no futebol. Cobrem-me daqui a dez anos. Raciocinar com prazo menor ante um esporte, ou uma indústria, com faturamento de mais de duzentos bilhões de dólares anuais, é não ter visão ampla ante a amplitude do negócio que se quer gerir. E os americanos têm. E falei em dólares por ser a moeda das transações internacionais.

Art. 22. Os processos eleitorais assegurarão:

I - colégio eleitoral constituído de todos os filiados no gozo de seus direitos, admitida a diferenciação de valor dos seus votos;

II - defesa prévia, em caso de impugnação, do direito de participar da eleição;

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III - eleição convocada mediante edital publicado em órgão da imprensa de grande circulação, por três vezes;

IV - sistema de recolhimento dos votos imune a fraude;

V - acompanhamento da apuração pelos candidatos e meios de comunicação.

Parágrafo único. Na hipótese da adoção de critério diferenciado de valoração dos votos, este não poderá exceder à proporção de um para seis entre o de menor e o de maior valor.

Parece-me que, por melhor técnica legislativa, a matéria aqui tratada deveria compor uma seção. Correspondendo aos arts. 13 e 14 da lei anterior, que também mesclava numa única seção assuntos diferenciados, a lei atual é mais objetiva e clara. Em primeiro lugar porque, ao definir a composição dos colégios eleitorais e admitir a diferenciação de votos, a lei Pelé estabelece de pronto que a valoração dos votos não poderá exceder à proporção de um para seis entre o de menor e o de maior valor, enquanto a lei Zico, em seu art. 32, mandava observar critérios técnicos e a classificação nas competições oficiais promovidas nos últimos cinco anos ou em período inferior, sem prejuízo de outros parâmetros estabelecidos em regulamento. Em segundo lugar porque, como se vê, era um critério com absoluta falta de critério. Falar em prazo de cinco anos ou período inferior é nada falar. Permitir outros parâmetros quaisquer é deixar tal regra ao devaneio ou ao desmando dos que tenham maior mando. Por isso, também nesse ponto, a lei Pelé é melhor, por dar mais segurança às entidades de prática desportiva.

A defesa prévia instituída no inciso II é a garantia de um direito diante de possível insurreição contra outro direito. Ninguém, e falo ninguém mesmo em se tratando de pessoas jurídicas, pode ter negado um alegado direito sem que se lhe dê a possibilidade de defesa para demonstrar possuir tal direito. Ao menos em um regime democrático.

No caso do inciso III, necessário será que os regulamentos das entidades desportivas estabeleçam como se deverá fazer publicar tal edital. Dir-se-á que o consenso, ou, digamos, o direito consuetudinário manda que se entendam por órgão da imprensa de grande circulação os jornais diários de maior público. Assim seja. Mas seria admissível entender-se que algumas revistas semanais também são órgãos de imprensa de grande circulação? E valerá o edital publicado em uma dessas revistas por três vezes, cada qual em uma semana de um mês diferente? Se assim se fizer a publicação do edital, poder-se-á falar em atitude pouco ética ou pouco leal mas nunca

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em ato ilegal. O Decreto nº 2.574, de 29/04/98, em seu art. 24, III, determina que as publicações sejam consecutivas, corrigindo esse defeito da lei.

Por outro lado, em se tratando de liga desportiva composta por integrantes de vários Estados, em quais Estados deverá ser feita a publicação do edital? A meu ver, em tantos quantos abriguem sedes das entidades desportivas participantes da liga.

O sistema de recolhimento de votos imune a fraude também é um grande desejo do Tribunal Superior Eleitoral. Com direito a processo criminal e sob pena de prisão... E chega a ser lamentável que se tenha que colocar um item desses em lei desportiva.

Até para melhor garantia do inciso IV, o inciso V assegura aos meios de comunicação o acompanhamento da apuração. Esse direito da imprensa, que eu considero principalmente um dever, tem que ser absoluto, porque garantido constitucionalmente. Por isso, tem a imprensa o direito de saber, com boa margem de antecedência, dia, hora e local da apuração. Se se omitir, perderá o direito de criticar possíveis fraudes. Mas se se fizer presente, certamente a fraude, se ocorrer, terá perna curta. Alguns criminosos têm mais medo da imprensa que da prisão. E quando uma câmera de TV ou um microfone conseguem flagrantes de atos ilícitos, seus autores saem de cena. Daí a importância da garantia legal específica para o processo eleitoral esportivo. Não poderá haver subterfúgio para evitar ou sequer dificultar a atividade livre dos profissionais da imprensa.

Art. 23. Os estatutos das entidades de administração do desporto, elaborados de conformidade com esta Lei, deverão obrigatoriamente regularmentar, no mínimo:

I - instituição do Tribunal de Justiça Desportiva, nos termos desta Lei;

II - inelegibilidade de seus dirigentes para desempenho de cargos e funções eletivas ou de livre nomeação de:

a) condenados por crime doloso em sentença definitiva;

b) inadimplentes na prestação de contas de recursos públicos em decisão administrativa definitiva;

c) inadimplentes na prestação de contas da própria entidade;

d) afastados de cargos eletivos ou de confiança de entidade desportiva ou em

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virtude de gestão patrimonial ou financeira irregular ou temerária da entidade;

e) inadimplentes das contribuições previdenciárias e trabalhistas;

f) falidos.

Qualquer pessoa, física ou jurídica, só tem existência no mundo jurídico, ou

seja, só é sujeito de direitos e deveres, após um ato formal que comprove a sua existência. Os seres humanos, pessoas naturais, só passam a ter existência jurídica após a averbação de seu nascimento no Registro Civil, que lhes expede uma certidão do ato, chamada Certidão de Nascimento, que os torna pessoas de direito. A prova, pois, para a comprovação da existência de uma pessoa natural, no mundo do direito, não é a exibição de seu corpo mas a exibição de sua Certidão de Nascimento. Assim também, ninguém prova que é casado exibindo uma aliança mas sim uma Certidão de Casamento.

As pessoas jurídicas, da mesma forma, só passam a ter existência no mundo jurídico após o cumprimento de uma formalidade exigida por lei. Uma sociedade comercial, por exemplo, se rege por seu contrato social, o qual só terá validade perante terceiros depois de registrado ou inscrito na junta comercial de sua sede. Assim também outras entidades se regem por estatutos, como é o caso das entidades de prática desportiva. Portanto, qualquer clube, liga, federação, confederação terá que regular-se por um estatuto que será registrado ou inscrito em outra entidade que o oficialize. A partir daí, da inscrição ou registro do estatuto, é que a entidade de prática desportiva passará a ter personalidade jurídica e será considerada pessoa jurídica de direito privado, sujeito de direitos e obrigada a deveres. E nenhum estatuto poderá contrariar a lei que regula a matéria a que se propõe a entidade. Por isso, a lei Pelé exige que os estatutos das entidades de administração do desporto regulamentem, no mínimo, o que está expresso nos itens I e II do art. 23.

Quando a lei fala em instituição do Tribunal de Justiça Desportiva não significa necessariamente a criação desse órgão. A nosso ver, o termo está empregado no sentido de estabelecer, nomear, o que significa dizer que a entidade tanto poderá criar um tribunal como atribuir a função de dirimir seus conflitos a outro tribunal já existente. Parece-me a melhor maneira de se interpretar a lei, para que não haja, no caso, principalmente das ligas, superposição de competências ou jurisdições.

Quanto à inelegibilidade estabelecida no inciso II, parece-me que a redação não foi muito feliz porque não existe eleição para cargo de livre nomeação. E só se pode falar em inelegibilidade quando existe eleição. A lei deveria falar em impedimento para o exercício desses cargos e funções de livre nomeação. Quanto às causas de inelegibilidade, elas são claras e dispensam maiores comentários. Apenas me perguntaria se a falência a que se refere a letra f é a falência de pessoa física ou se o falido a que se refere a lei é pessoa física não falida mas integrante de pessoa jurídica falida.

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Na lei anterior, essa matéria era tratada no art. 14, porém com um número menor de causas de inelegibilidade. Tinha, contudo, a lei Zico um parágrafo único que determinava que a ocorrência de qualquer daquelas hipóteses ao longo do mandato importaria na perda automática do cargo ou função. Pena que esse parágrafo único não tenha sido consagrado na lei atual.

Art. 24. As prestações de contas anuais de todas as entidades de administração integrantes do Sistema Nacional do Desporto serão obrigatoriamente submetidas, com parecer dos Conselhos Fiscais, às respectivas assembléias-gerais, para a aprovação final.

Parágrafo único. Todos os integrantes das assembléias-gerais terão acesso irrestrito aos documentos, informações e comprovantes de despesas de contas de que trata este artigo.

O órgão máximo de pessoas jurídicas regidas por estatutos é a Assembléia Geral ou o Conselho Deliberativo. Em regra, tais entidades se compõem também de um Conselho Fiscal, posto que não existe atividade que não comporte custos, e um Conselho Consultivo, que respalda, a priori, as decisões do órgão Diretor, embora, muitas vezes, tais decisões tenham que ser referendadas pela Assembléia Geral ou pelo Conselho Deliberativo. O acesso aos documentos é garantia de que todos os membros da Assembléia Geral ou do Conselho Deliberativo poderão votar de acordo com seu conhecimento próprio e não por informações de outrem.

Seção VDos Sistemas dos Estados, Distrito Federal e

Municípios

Art. 25. Os Estados e o Distrito Federal constituirão seus próprios sistemas, respeitadas as normas estabelecidas nesta Lei e a observância do processo eleitoral.

Parágrafo único. Aos Municípios é facultado constituir sistemas próprios,

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observadas as disposições desta Lei e as contidas na legislação do respectivo Estado.

O art. 25 e seu parágrafo único da lei Pelé é cópia do art. 15 e seu parágrafo único da lei Zico. Apenas, no caput, a lei atual exigiu observância do processo eleitoral, o que parece despiciendo, já que se existe regulamentação de um determinado processo legal ela tem que ser respeitada.

A autonomia dada aos Estados é pressuposto da representatividade da República Federativa, obedecendo-se, sempre, aos preceitos emanados da legislação federal. A faculdade outorgada aos municípios leva em conta principalmente as grandes capitais, onde, municipalmente, se podem constituir várias entidades de prática desportiva, o que, na grande maioria dos municípios brasileiros, seria impossível.

CAPÍTULO VDA PRÁTICA DESPORTIVA

PROFISSIONAL

Art. 26. Atletas e entidades de prática desportiva são livres para organizar a atividade profissional, qualquer que seja sua modalidade, respeitados os termos desta Lei.

O art. 26 da lei Pelé, que praticamente repete o art. 18 da lei Zico, coloca frente a frente empregado e empregador, através de contratos específicos e padronizados, respeitados os termos da lei. Na prática, porém, tal liberdade não ocorre simplesmente porque, presos que se encontram às entidades desportivas, os atletas se vêem obrigados a aceitar os contratos da maneira que lhes são impostos. Não se fala aqui do atleta excepcional, daquele que pode fazer exigências bastantes em face de seu valor mercadológico, que representa, também, grande receita para a entidade e, portanto, esse atleta sui generis, o di moral, é também uma marca que se destaca dentro da marca que é a entidade desportiva. A lei sempre se dirige ao homem médio da sociedade, não aos santos nem aos glorificados. E até que atinja a glória e se torne um di moral, o atleta profissional de futebol está sim submetido, porque escravizado, aos interesses das entidades, que os detêm presos pelo grilhão chamado PASSE. E num regime de escravidão não se pode falar em liberdade de contratação.

Quando se tem conhecimento de que atletas são vendidos ou trocados sem o saberem, quando se tem conhecimento de que o passe de atletas é dado como garantia

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ou mesmo pagamento de dívida, quando se sabe que um atleta profissional de futebol passou a ser propriedade de uma lavadeira como pagamento de dívida trabalhista da entidade desportiva para com essa profissional, não se pode falar, realisticamente, que os atletas são livres para negociar seu contrato. E se se recusam a aceitar as imposições das entidades desportivas a que estão submetidos, ficam sem poder trabalhar simplesmente porque não se podem transferir para outra entidade. Ou seja: o atleta profissional de futebol não tem liberdade de escolher para quem quer trabalhar. Logo, não tem liberdade para contratar. Estou a falar do que de comum acontece.

Não é menos verdade, porém, que os grandes clubes, em geral com bons dirigentes, sabem como negociar com o atleta, até porque este é a mercadoria que eles possuem para, valorizando-a, vendê-la com lucro. E os Sindicatos dos Atletas Profissionais pouco atuam até mesmo porque também os atletas pouca importância dão a seus sindicatos. Mas é de se ver que se poucos atletas tentarem uma rebeldia, dificilmente encontrarão eco entre os companheiros. E punidos serão. Daí sua fragilidade para negociar. Um metalúrgico não pára uma fábrica, mas uma greve geral representa grandes prejuízos para o mau empresário. Voltarei ao tema quando tratar do art. 28, §2º c/c o art. 93.

Art. 27 As atividades relacionadas a competições de atletas profissionais são privativas de:

I - sociedades civis de fins econômicos;

II - sociedades comerciais admitidas na legislação em vigor;

III - entidades de prática desportiva que constituírem sociedade comercial para administração das atividades de que trata este artigo.

Parágrafo único. As entidades de que tratam os incisos I, II e III que infringirem qualquer dispositivo desta Lei terão suas atividades suspensas, enquanto perdurar a violação.

O art. 27 da lei Pelé obriga a que sejam submetidas à forma empresarial as entidades de prática desportiva profissional. A lei Zico, em seu art. 11, admitia,

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facultativamente, tal possibilidade, sem lhe dar cunho obrigatório. Transformar-se-ia em empresa a entidade de prática desportiva que assim o desejasse, nas três modalidades previstas na lei anterior, quais sejam: transformação da entidade desportiva em sociedade comercial com finalidade desportiva; constituição de uma sociedade comercial com finalidade desportiva, tendo a entidade de prática desportiva anteriormente existente o controle da maioria de seu capital com direito a voto; e, finalmente, teria a entidade de prática desportiva a faculdade de contratar uma sociedade comercial tão-somente para gerir suas atividades desportivas, o que, evidentemente, se faria com finalidade de lucro. Mas, na lei Zico, tudo isto era facultativo; na Lei Pelé é obrigatório e, consoante o art. 94 desta lei atual, as entidades desportivas praticantes ou participantes de competições de atletas profissionais terão o prazo de dois anos, a contar da publicação da lei, para se transformarem em empresas, nos termos do art. 27.

Bem se sabem os motivos que levaram o Congresso Nacional a aprovar esta

obrigatoriedade. Ela seria desnecessária se a escrituração contábil dos clubes fosse confiável e se a ela tivessem acesso representantes da Receita Federal e do Ministério Público. Como a intervenção do Ministério Público nas entidades de administração e prática de desportos foi rechaçada, a fiscalização da Receita Federal nas empresas será efetiva. E a escrituração contábil terá que ser confiável, principalmente no que tange às transações internacionais. A imprensa esportiva especializada, que tudo escarafuncha, não sabe de nada nessa matéria. E as cifras publicadas de uma mesma transação ou de um mesmo contrato profissional são as mais contraditórias nas reportagens esportivas. Certamente não é por culpa dos jornalistas especializados. Eles reportam as informações que recebem. E são tantas...

Melhor seria, a meu ver, que se ficasse com a faculdade da lei Zico e não com a obrigatoriedade da lei Pelé. Cada qual saberia o que melhor lhe aprouveria e, em verdade, os Conselhos Deliberativos das entidades desportivas são compostos por associados, Beneméritos, Eméritos, Proprietários, Patrimoniais, enfim, por pessoas que também têm interesse no bom desenvolvimento de sua entidade, seja por dignidade, por bom senso ou por amor ao clube. Afinal, é também parte do seu patrimônio. E aos Conselhos Deliberativos ou às Assembléias Gerais de cada entidade deveria ser facultada a opção: ser ou não ser uma empresa e quando fazê-lo.

Se se vai tentar mudar a lei nesse período de dois anos, com uma nova legislatura, é preciso que o Congresso Nacional atente para a importância da perenidade das leis, posto que sua transitoriedade é sempre motivo de incertezas e inseguranças. Só o tempo pode dizer se uma lei é boa ou é ruim. Se o que vale hoje já não tem valor daqui a um ou dois anos, difícil será uma boa organização na prática desportiva em nosso país. E aí não adianta muito sonhar com o pódio.

Tenho evitado citar nomes de pessoas ou entidades, para que não haja particularização do que é geral. Fi-lo apenas uma vez em homenagem a um grande clube e a um grande desportista. Mas neste capítulo da obrigatoriedade de se transformarem em empresas as entidades de prática desportiva profissionais, permito-

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me trazer à baila o projeto empresarial do cidadão ARTHUR ANTUNES COIMBRA, o próprio responsável pela lei Zico, apelativo com que se consagrou mundialmente, para demonstrar que a simples faculdade de se criarem empresas desportivas com fins lucrativos dá a quem o quiser a possibilidade de desenvolvimento e aperfeiçoamento de um rentável negócio, como qualquer outro. Criado o Rio de Janeiro Futebol Clube, cujo nome mudou, pela existência de precedente, para CFZ DO RIO, foi estabelecido o projeto de o clube disputar a primeira divisão do futebol profissional do Estado do Rio de Janeiro dentro do prazo de cinco anos. Já está na segunda divisão e certamente o objetivo será alcançado em prazo menor que o inicialmente idealizado. Com os pés no chão, como sempre disse, desenvolvendo seu projeto na medida do possível, sem salários milionários mas também não aviltantes e com pagamento sempre em dia, gradativamente vai conseguindo patrocínios e promoções e mídia e o sucesso está garantido. Sempre disse a mim mesmo que o sucesso depende de três fatores: trabalho, talento e sorte. E Zico sempre teve os três. Portanto, não se tornou um empresário de sucesso porque a lei assim lhe impusesse. Fez o que sabe o de que gosta. Não sei se já há outros exemplos no Brasil, mas poucos alcançarão a meta tão rapidamente quanto ele. Simplesmente porque partiu na frente.

Art. 28. A atividade do atleta profissional, de todas as modalidades desportivas, é caracterizada por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral.

§1º Aplicam-se ao atleta profissional as normas gerais da legislação trabalhista e da seguridade social, ressalvadas as peculiaridades expressas nesta Lei ou integrantes do respectivo contrato de trabalho.

§2º O vínculo desportivo do atleta com a entidade contratante tem natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais, com o término da vigência do contrato de trabalho.

Art. 29. A entidade de prática desportiva formadora de atleta terá o direito de assinar com este o primeiro contrato de

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profisional, cujo prazo não poderá ser superior a dois anos.

Parágrafo único. (VETADO)

Este artigo é uma adaptação do art. 22 da lei Zico, com uma redação mais clara. Enquanto a lei anterior falava em contrato de trabalho com pessoa jurídica devidamente registrado na entidade federal de administração do desporto, a lei atual fala em entidade de prática desportiva que, já sabido, é pessoa jurídica de direito privado. O artigo 28 da lei atual não explicita em que entidade o contrato de trabalho deverá ser registrado, mas é certo dizer-se que terá de sê-lo em entidade nacional de administração do desporto, além de outra entidade a que esteja filiada a entidade de prática desportiva.

O §1º do art. 28 da lei Pelé é cópia literal do §2º do art. 22 da lei Zico. Se o atleta profissional é considerado empregado da entidade de prática desportiva, nada mais correto do que se lhe garantirem as regras da legislação trabalhista e previdenciária.

O §2º do art. 28 da lei Pelé é a resposta ao anseio de libertação dos atletas profissionais. Consoante o art. 26 da lei Zico, caberia ao Conselho Superior de Desportos fixar o valor, os critérios e condições para o pagamento da importância denominada passe. O art. 64 da mesma lei mandava que se observassem as resoluções 10/86 e 19/88 do Conselho Nacional de Desportos até que o art. 26 fosse regulamentado.

O §2º do art. 28 da lei Pelé acaba com tudo isso e o art. 119 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98 revoga todas as Resoluções do extinto Conselho Nacional de Desportos. Simplesmente se acaba com o aprisionamento de um atleta profissional a uma entidade de prática desportiva, extinguindo o monstruoso vínculo que se denomina passe. O passe nada mais é que o grilhão que atrelava o atleta a uma entidade de prática desportiva, digamos, a um clube, tornando-o escravo desse clube e não um empregado, simplesmente porque, mesmo após o encerramento do período do contrato de trabalho, o atleta continuava aprisionado ao clube, não se podendo transferir para outro, ou seja, sem ter a liberdade de escolher outro empregador para o qual trabalhar. O atleta se tornava, com o instituto do passe, um trabalhador que não tinha o direito de mudar de emprego, que não podia discutir bilateralmente seu contrato de trabalho, que se via obrigado a aceitar as condições impostas por seu empregador, sob pena de não poder exercer sua profissão. Já disse e repito que não estou falando dos atletas extra-série. Estou falando de atletas normais, regulares, medianos, para os quais a lei deve ser feita. Não estou falando dos gênios do esporte. Não estou falando dos di moral. Estes conseguem o que querem, até porque, por serem reconhecidamente gênios, quando este reconhecimento vem eles já não dependem da prática desportiva profissional para sua sobrevivência. Assim, a lei Pelé vem agasalhar antigo sonho dos atletas profissionais

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medianos. É certo que alguns atletas, absolutamente incompetentes para o exercício profissional, prefeririam manter-se escravos, desejosos do paternalismo que os clubes lhes poderiam dar porque sabedores de que outros clubes não se interessariam por seu trabalho. Este §2º do art. 28 da lei Pelé é a carta de alforria de que necessitava o atleta profissional de futebol. Por isso que, encerrado o contrato de trabalho, encerra-se também o vínculo desportivo do atleta com a entidade empregadora, posto que este vínculo é apenas acessório ao vínculo empregatício.

Considerando que o §2º do art. 28 só entrará em vigor a partir de 24 de março de 2001, os clubes nenhum prejuízo terão com a liberdade que será dada aos atletas profissionais de futebol. Mesmo os dirigentes e empresários são acordes nesse particular.

O desejo de alguns clubes formadores de atletas de garantias quanto a um período que se considere razoável para que os mesmos tenham preferência para estabelecer contratos de trabalho com os atletas por eles formados, a mim me parece respeitável. É bem de ver que esses clubes investem tempo, dinheiro e grande espaço físico na formação de atletas para o desporto de competição. Muitos não chegam a se profissionalizar, não dão retorno de vitórias importantes, não representam lucro para a entidade e, tendo representado custo, significa dizer, representam prejuízo. E uma empresa, como obriga a atual lei que sejam as entidades de prática desportiva, não pode raciocinar com prejuízo. Esse prejuízo tem que ser compensado com os êxitos que lhes são assegurados pelos vitoriosos na carreira desportiva. Considerando que, para participar de competições profissionais, o atleta, ao completar dezoito anos, tem que ser profissionalizado, é bem de ver que não será exagero que os clubes formadores de atletas tenham o direito de receber, por essa formação, uma contrapartida, em forma de trabalho remunerado, desse atleta assim formado, por um período razoável. O que se há de entender por período razoável? A meu ver, não menos de dois e não mais de quatro anos. Com o concurso desse profissional por dois anos, a entidade desportiva formadora do atleta já terá recebido o retorno profissional daquela mão de obra por ela desenvolvida. Portanto, dois anos é um tempo suficiente para que aquele atleta dê o retorno que a entidade dele espera. A partir daí, o passe livre desse atleta já não representa prejuízo para a entidade que o formou. Se, porém, for entendido que esse atleta deve, com seu trabalho, contribuir para que a entidade que o formou tenha com seu exercício profissional maior vantagem para compensar o que gastou com atletas que não tiveram sucesso, penso que mais dois anos de prioridade para um novo contrato de trabalho não seria nenhum prejuízo para o atleta, embora possa representar um grande lucro para a entidade de prática desportiva que o formou. É uma compensação que a lei dará a esses clubes para que eles continuem a investir em categorias de base. A mim, parece justo: o primeiro contrato de trabalho profissional do atleta terá que ser com a entidade que o formou, não podendo esse primeiro contrato ultrapassar vinte e quatro meses, como determina o art. 29; esta mesma entidade terá preferência para a primeira renovação do contrato de trabalho profissional, sendo que o prazo dessa renovação não poderá ser superior ao período que reste para completar quarenta e oito meses entre o início do primeiro contrato e o fim da primeira renovação. Essa preferência terá que ser sempre em igualdade de condições com outras ofertas de trabalho feitas ao atleta por outras entidades de prática desportiva. Findo esse período da renovação, o atleta estará

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livre para contratar com qualquer entidade de prática desportiva e, se estiver feliz em seu emprego, certamente dará preferência ao mesmo empregador.

Art. 30. O contrato de trabalho do atleta profissional terá prazo determinado, com vigência nunca inferior a três meses.

O art. 30 da lei Pelé repete o disposto no art. 23 da lei Zico, apenas não mais limitando o prazo máximo de duração do contrato, que na lei anterior não podia ultrapassar a trinta e seis meses. Parece-me que a lei Pelé seguiu a tendência mundial de se eternizarem os contratos de atletas profissionais. Isto é uma garantia para ambas as partes. Para o atleta por saber-se empregado por aquele período; para a entidade, por saber que aquele seu atleta, durante aquele período, não se há de transferir para outro clube. É evidente que, por se tratar de um contrato bilateral, cláusulas de rescisão terão que ser acordadas, até mesmo por exigência da lei. Ainda que assim o seja, outro acordo posterior pode alterar a forma de romper o contrato.

O prazo mínimo de três meses é uma questão de moralidade a fim de impedir empréstimos ou contratos relâmpagos para curtas competições.

Art. 31. A entidade de prática desportiva empregadora que estiver com pagamento de salário de atleta profissional em atraso, no todo ou em parte, por período igual ou superior a três meses, terá o contrato de trabalho daquele atleta rescindido, ficando o atleta livre para se transferir para qualquer outra agremiação de mesma modalidade, nacional ou internacional, e exigir a multa rescisória e os haveres devidos.

§1º São entendidos como salário, para efeitos do previsto no caput, o abono de férias, o décimo terceiro salário, as gratificações, os prêmios e demais verbas inclusas no contrato de trabalho.

§2º A mora contumaz será considerada também pelo não recolhimento do FGTS e das contribuições previdenciárias.

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§3º Sempre que a rescisão se operar pela aplicação do disposto no caput, a multa rescisória a favor da parte inocente será conhecida pela aplicação do disposto nos arts. 479 e 480 da CLT.

O art. 31 da lei Pelé, ainda mais aprimorado pelos arts. 33 e 35 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98, é um extraordinário aperfeiçoamento do acanhado e inoperante §1º do art. 22 da lei Zico. Enquanto esta apenas previa que a entidade empregadora que estivesse em atraso no pagamento de salários dos atletas profissionais não poderia participar de qualquer competição, oficial ou amistosa, a lei Pelé foi muito mais profunda. Mesmo após promulgada a lei Zico, muitas entidades de prática desportiva continuaram com a prática pouco desportiva de exigir que seus atletas trabalhassem sem receber salário. Talvez a maioria delas. E jamais tomei conhecimento de que a sanção imposta na lei Zico tenha sido aplicada. E mais: quando a lei Zico fala em atraso de pagamento dos atletas profissionais, um bom advogado, fazendo a interpretação literal do texto, poderia sustentar que a punição só poderia ser imposta se a entidade estivesse a dever salários a todos os atletas. Portanto, bastaria que a entidade complementasse o pagamento dos salários de apenas um profissional para eximir-se da punição. A lei Pelé foi mais profunda e mais perfeita exatamente porque individualizou a punição ao impor como sanção a rescisão do contrato de trabalho daquele atleta, que adquire a liberdade para transferir-se para outra entidade desportiva, tendo ainda direito a multa rescisória e haveres devidos. E esta sanção final é de suma importância porque, em querendo uma entidade desportiva desfazer-se de seu atleta profissional, poderia muito simplesmente deixar de pagar-lhe os salários devidos para que este buscasse outro empregador. Ora, o descumprimento de um contrato unilateralmente é o rompimento do contratado, sujeito, pois, o inadimplente às perdas e aos danos pertinentes, que, no caso sob análise, equivalem à multa rescisória, obrigatória em qualquer contrato de atleta profissional, mais os haveres devidos. Ou seja: o empregador não poderá lesar o empregado.

Nos §§1º e 2º do art. 31, a lei estabelece o que se deve entender por salário para efeito de aplicação do disposto no caput, incluindo o não recolhimento do fundo de garantia e das contribuições previdenciárias na mora do empregador.

Já o §3º do art. 31 conflita, a meu ver, com o disposto no caput do art. 28. Ora, se este artigo determina a obrigatoriedade de cláusula penal para a rescisão unilateral do contrato de trabalho, é nessa sanção que se indenizará pelo rompimento, desnecessário o recurso à CLT, o que imporia, em falta de acordo, a competência da Justiça do Trabalho para dirimir o conflito, com sério prejuízo para o atleta. O art. 479 da CLT determina uma indenização, apenas pela metade, do total a que o empregado teria direito até o termo do contrato. Ora, se a cláusula penal obrigatória nos contratos dos atletas profissionais for de maior valor, estará ele sujeito a manipulações em seu desfavor.

Veja-se, finalmente, que a mora do empregador que pode dar consequência às sanções previstas na lei se refere ao atraso do pagamento de salário, no todo ou em

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parte, não podendo o empregador alegar cumprimento de sua obrigação por haver pago o salário mensal se não tiver pago também o abono de férias, o décimo-terceiro salário, as gratificações, os prêmios e demais verbas inclusas no contrato. Para que haja o inadimplemento do empregador é necessário que essas obrigações decorram de força de lei ou de cláusula do contrato. Se uma entidade de prática desportiva promete um determinado prêmio pela conquista de um determinado título e não o paga, o atleta profissional só terá a proteção da lei se esse prêmio for instituído no próprio contrato ou como cláusula aditiva ao contrato de trabalho.

Art. 32. É lícito ao atleta profissional recusar competir por entidade de prática desportiva quando seus salários, no todo ou em parte, estiverem atrasados em dois ou mais meses.

Este artigo só terá aplicabilidade se um número significativo de atletas com salários em atraso, de uma mesma entidade desportiva, se recusar a atuar pela equipe. Dificilmente um ou dois atletas, apenas, o farão; serão facilmente substituídos e relegados à categoria dos esquecidos ou dos dispensáveis. O problema é que, se estiverem presos à entidade, não poderão trabalhar em outra. Esse artigo só se aplica aos atletas di moral. Por isso, creio que seja letra morta.

Art.33. Independentemente de qualquer outro procedimento, entidade nacional de administração do desporto fornecerá condição de jogo ao atleta para outra entidade de prática, nacional ou internacional, mediante a prova da notificação do pedido de rescisão unilateral firmado pelo atleta ou por documento do empregador no mesmo sentido.

Este artigo, sim, dá ao atleta profissional a garantia de pagamento em dia, ou quase, de seus salários. Poderá a entidade desportiva atrasar o pagamento de salários em até dois meses e vinte e nove dias. Mas, se completar o terceiro mês com atraso no cumprimento de sua obrigação de pagar os salários de seus empregados, incidirá na sanção do art. 31. Assim, acaba-se com a absurda prática de se manterem atletas profissionais trabalhando meses ou anos a fio, sem receber salários, apenas porque não se podem transferir para outra entidade desportiva, sem nenhuma sanção sofrer o empregador inadimplente. Agora, graças a esse art. 33 c/c o art. 31, haverá mais

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respeito aos direitos do atleta profissional, ao menos no que tange ao período de atraso do pagamento de seus salários.

Art. 34. O contrato de trabalho do atleta profissional obedecerá a modelo padrão, constante da regulamentação desta Lei.

É natural, por suas peculiaridades, que o contrato de trabalho de um atleta profissional tenha padronização diversa dos contratos de trabalho comuns. Entre outras exigências, temos que a cláusula penal é obrigatória, que o período mínimo de contrato seja de três meses, etc.

Art. 35. A entidade de prática desportiva comunicará em impresso padrão à entidade nacional de administração da modalidade a condição de profissional, semi-profissional ou amador do atleta.

Qualquer entidade desportiva poderá ter em seus quadros atletas amadores, semiprofissionais ou profissionais. Assim, fazendo parte dos quadros de determinada entidade, o atleta a ela estará vinculado. Essa vinculação tem que ser conhecida e reconhecida pela respectiva entidade nacional de administração da modalidade desportiva praticada pelo atleta. Para tanto, é indispensável que a entidade de prática desportiva a que esteja filiado o atleta comunique, em impresso padrão, tal condição à entidade nacional de administração da respectiva modalidade desportiva para que o vínculo seja nacional e internacionalmente conhecido. Só após essa formalidade o atleta estará integrado como tal ao mundo desportivo. Sem isso, ele inexiste como atleta, em termos nacionais ou internacionais.

Art. 36. A atividade do atleta semiprofissional é caracterizada pela existência de incentivos materiais que não caracterizem remuneração derivada de contrato de trabalho, pactuado em contrato formal de estágio firmado com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as

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hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral.

§1º Estão compreendidos na categoria dos semiprofissionais os atletas com idade entre quatorze e dezoito anos completos.

§2º Só poderão participar de competição entre profissionais os atletas semiprofissionais com idade superior a dezesseis anos.

§3º Ao completar dezoito anos de idade, o atleta semiprofissional deverá ser obrigatoriamente profissionalizado, sob pena de, não o fazendo, voltar à condição de amador, ficando impedido de participar em competições entre profissionais.

§4º A entidade de prática detentora do primeiro contrato de trabalho do atleta por ela profissionalizado terá direito de preferência para a primeira renovação deste contrato, sendo facultada a cessão deste direito a terceiros, de forma remunerada ou não.

§5º Do disposto neste artigo estão excluídos os desportos individuais e coletivos olímpicos, exceto o futebol de campo.

Este artigo trata da categoria dos atletas semiprofissionais, que se distinguem dos atletas profissionais por não terem uma remuneração derivada de contrato de trabalho mas sim por receberem incentivos materiais, não proibindo a lei que esses incentivos sejam uma contraprestação pecuniária, determinando o Decreto nº 2.574, de 29/04/98, em seu art. 45, §7º, inc. IV, que os incentivos sejam devidamente quantificados e valorizados, para que, a partir daí, se possam calcular os valores de seguro e de indenizações. Esses incentivos materiais aos atletas semiprofissionais podem atingir valores superiores aos salários de atletas profissionais da mesma entidade de prática desportiva. A prestação de serviços pelo atleta semiprofissional e a contraprestação dos incentivos materiais pela entidade de prática desportiva serão pactuados entre o atleta, assistido por seu representante legal, e a entidade de prática desportiva, através de contrato formal de estágio, que não tem consequências trabalhistas. Também esse contrato deverá conter obrigatoriamente cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral do contrato, por qualquer das partes.

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A meu ver, deveria a lei fazer observar prazos mínimo e máximo para esse contrato de estágio, principalmente em face da cláusula penal e da idade do atleta. Não é demais lembrar que um jovem de quatorze, quinze anos pode estar, naquele momento de vida, extraordinariamente aficcionado por determinada prática desportiva e se dispor a assinar um contrato de estágio até os dezoito anos. Mas não é menos verdade que, pela própria volubilidade da adolescência, este mesmo jovem pode vir a se apaixonar tão extraordinariamente por algo ou alguém que aquela prática desportiva já não lhe desperte qualquer interesse. Muitos jovens abandonam o esporte por esse motivo. A cláusula penal, em um contrato muito longo, parece-me angustiante para o jovem atleta ainda em formação, pois, pelo §1º do art. 36, só podem ser semiprofissionais os atletas com idade entre quatorze e dezoito anos completos. Já o §1º do art. 45 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98, diz que estão compreendidos na categoria dos semiprofissionais os atletas com idade entre quatorze e dezoito anos incompletos. E, consoante o §3º do art. 45 do Decreto, que é repetição quase toda literal do §3º do art. 36 da Lei, ao completar dezoito anos esse atleta semiprofissional terá que ser obrigatoriamente profissionalizado para que possa participar de competições entre profissionais, o que é defeso aos amadores e aos semiprofissionais com menos de dezesseis anos. E se, aos dezoito anos, o atleta não se profissionalizar, volta à condição de amador. Só que a Lei fala em atleta profissional, portanto, de qualquer esporte, enquanto o Decreto fala em atleta profissional de futebol, tornando restrito o que na Lei é amplo.

Quando, no §2º do art. 36, a lei só permite que o atleta semiprofissional participe de competições entre profissionais a partir dos dezesseis anos de idade, é bem de ver que andou bem o legislador ao proteger a figura física de atletas em ínicio de formação profissional.

O §4º do art. 36 se torna mais importante e problemático que o próprio caput. Veja-se que há clubes que investem altas somas durante muito tempo na formação de atletas com a finalidade de contar com sua participação em esportes de rendimento. Esses atletas ficam vinculados a essas entidades de prática desportiva desde quando começam a participar de competições oficiais. Tomando-se ainda como exemplo o futebol, há competições oficiais no futebol de salão que se iniciam com "atletas" de seis anos (categoria fraldinha) ou até mesmo cinco anos (categoria chupetinha). Desde essa época o clube está fazendo investimentos com o fim, não se tenha dúvida, de vir a revelar, no futuro, bons jogadores de futebol de salão e, mais ainda, que eles se tornem bons jogadores de futebol de campo. Quando esses atletas são "transplantados" do futebol de salão para o futebol de campo é porque revelam um potencial que os experts sabem que, em bom número, darão retorno ao clube. São aqueles momentos em que o clube dispõe de uma boa safra e de um bom olheiro. E o investimento passa a ser maior porque maiores cuidados receberão esses atletas. Assim, já aos quatorze anos, esses atletas assinarão aquele contrato como semiprofissionais, vinculando-se ao clube que lhes deu e continua dando a formação desportiva. A lei não fala da possibilidade de transferência do atleta nesse período para outra entidade de prática desportiva, mas, de comum acordo entre atleta e entidades, essa transferência não está proibida, sendo regulada por modalidade desportiva. Ao completar dezoito anos, o atleta

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semiprofissional será obrigatoriamente profissionalizado, sendo certo que a entidade de prática desportiva que o formou terá o direito de assinar com ele o primeiro contrato de natureza profissional, cujo prazo não poderá ser superior a dois anos (art. 29), além de ter direito de preferência para a primeira renovação deste contrato. A lei não estabelece limite de prazo para essa renovação, que poderá redundar em um contrato de um ano ou de dez anos. Quando a lei fala em direito de preferência, está-se a dizer que, em igualdade de condições, o atleta terá que assinar a renovação do contrato com a entidade que o profissionalizou. Mas, se outra entidade de prática desportiva oferece ao atleta melhores condições ou até mesmo condições diversas das apresentadas por aquela primeira a que estava vinculado, pode o atleta optar por essa outra entidade de prática desportiva, levando em conta os seus interesses. Quando se fala em direito de preferência está-se a falar em preferência em igualdade de condições. Assim, por exemplo, se a entidade que profissionalizou o atleta lhe oferece, para renovação, um contrato de dois anos de trabalho em que seu salário será x, pode este optar por assinar novo contrato de trabalho com outra entidade que lhe ofereça, no mesmo período de dois anos, o salário de 2x. Assim também, se a entidade de prática desportiva que o profissionalizou propuser ao atleta uma renovação de contrato de trabalho profissional por um período longo, digamos, dez anos, pode este atleta preferir assinar um contrato com outra entidade de prática desportiva por um período menor. Sendo diversa a proposta apresentada pela entidade de prática desportiva que o profissionalizou e a apresentada por outra entidade de prática desportiva, cabe ao atleta fazer a opção porque a preferência instituída por lei é apenas preferência, não obrigatoriedade. Só será obrigatória a preferência quando idênticas as propostas. É o efeito vinculante do primeiro contrato profissional.

Mas a mim assalta uma dúvida. Como já visto acima, a entidade de prática desportiva que formou o atleta terá o direito de assinar com este o primeiro contrato de profissional (art. 29). Como também já visto acima, a lei não proíbe (e o que a lei não proíbe ela permite) que uma entidade de prática desportiva forme um atleta desde criancinha e, já semiprofissional, digamos, com dezessete anos, o transfira para outra entidade de prática desportiva que profissionalizará o atleta, quando este completar dezoito anos. A quem caberá o direito de preferência para a primeira renovação? Não tenho mais dúvida. Esse direito caberá à entidade de prática desportiva que profissionalizou o atleta (§4º do art. 36) e não à entidade de prática desportiva que o formou, pois esta abriu mão do profissional, assim como a entidade de prática desportiva que profissionalizou o atleta pode abrir mão do direito de preferência à primeira renovação, gratuita ou remuneradamente.

Seja como for, as entidades de prática desportiva continuarão a formar atletas ainda que não tenham mais, como no caso do futebol, o direito de escravizar esses mesmos atletas. Em linguagem clara e objetiva, porque esse é o tema: a extinção do passe que escraviza os atletas profissionais de futebol aos clubes não fará com que essas entidades de prática desportiva percam o interesse na formação de novos atletas de futebol. Em primeiro lugar, porque devem dar uma satisfação ao seu quadro associativo através das práticas desportivas; em segundo lugar, porque apraz aos dirigentes ver suas entidades de prática desportiva buscarem títulos; em terceiro lugar, porque as entidades

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de prática desportiva que não participarem dos esportes de competição não serão entidades de prática desportiva; em quarto lugar, porque é através dessas competições e de seus resultados que os patrocínios advirão; em quinto lugar, porque se isso fosse verdade para o futebol também o seria para os demais esportes, como basquete, vôlei, natação, remo, ginástica olímpica, etc., etc.; em sexto lugar, porque a autorização para instalar salas de jogo de bingo obriga a aplicação do resultado financeiro no fomento do desporto; em sétimo lugar porque... em oitavo lugar porque... Enfim, mil razões há para que as entidades de prática desportiva continuem a investir na formação de seus atletas seja em que esporte for.

Ao excluir da abrangência do art. 36 os desportos individuais e coletivos olímpicos, exceto o futebol de campo, o seu §5º demonstra à saciedade que a lei se direciona basicamente para a prática desportiva do futebol de campo.

Art. 37. O contrato de estágio do atleta semiprofissional obedecerá a modelo padrão, constante da regulamentação desta Lei.

Referentemente ao atleta semiprofissional, este artigo é reiteração do art. 34, que trata do contrato de trabalho do atleta profissional.

Art. 38. Qualquer cessão ou transferência de atleta profissional, na vigência do contrato de trabalho, depende de formal e expressa anuência deste, e será isenta de qualquer taxa que venha a ser cobrada pela entidade de administração.

Este artigo repete a essência do artigo 19 da lei Zico. Acrescenta a lei atual que a anuência do atleta será necessária na vigência do contrato de trabalho porque após o prazo contratual o atleta será livre para se transferir para outra entidade de prática desportiva, nos termos da lei em vigor. Essa observação não constava na lei anterior porque tal liberdade inexistia. Impõe ainda a lei Pelé que não poderá ser cobrada qualquer taxa pela entidade de administração quando ocorrer esse tipo de transferência. É moralizadora tal isenção.

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Art. 39. A transferência do atleta profissional de uma entidade de prática desportiva para outra do mesmo gênero poderá ser temporária (contrato de empréstimo) e o novo contrato celebrado deverá ser por período igual ou menor que o anterior, ficando o atleta sujeito à cláusula de retorno à entidade de prática desportiva cedente, vigorando no retorno o antigo contrato, quando for o caso.

O teor deste art. 39, que cuida especificamente do contrato de empréstimo, é novidade que não existia na lei Zico. Foi importante que assim ficasse explicitado, pois o atleta, ao retornar a seu clube de origem, terá restabelecido o seu antigo contrato de trabalho, sem qualquer prejuízo para nenhuma das partes. Ao admitir ser transferido para outra entidade de prática desportiva, o atleta deverá, por questão de bom censo, exigir condições melhores do que aquelas de que já desfruta no clube cedente que o detém sob contrato. Seria tolice trocar seis por meia dúzia, a não ser que lhe importe mais a estrutura do clube cessionário, ou o local onde exercerá sua atividade, enfim, a menos que lhe pareça mais vantajoso, por outro motivo que não o lado apenas pecuniário, admitir a transferência. Pode um atleta, por exemplo, admitir transferir-se de um clube de interior para outro de grande centro esportivo, mesmo sem melhoria salarial. O §3º do art. 38 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98, determina que o salário mensal não poderá ser inferior ao do contrato cedido.

Parece-me redundância dizer que o período do contrato de empréstimo tenha que ser igual ou menor que o anterior. Se a entidade cedente só tem vínculo contratual com o atleta profissional por um determinado período, não pode ceder esse vínculo por um período maior. Logo, só poderá ser por período igual ou menor. Mesmo que seja o contrato de empréstimo estabelecido pelo período total do contrato do atleta com a entidade de prática desportiva cedente, ao final desse empréstimo o atleta terá que se reapresentar ao clube de origem, tenha ou não passe livre, posto que, mesmo tendo liberdade para contratar com outra entidade de prática desportiva, ainda terá que formalizar a desvinculação com o clube anterior, para só então poder-se vincular a outro.

Art. 40. Na cessão ou transferência de atleta profissional para entidade de prática desportiva estrangeira observar-se-ão as instruções expedidas pela entidade nacional de título. Parágrafo único. As condições para transferência do atleta profissional para o exterior deverão integrar obrigatoriamente os

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contratos de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva brasileira que o contratou.

O art. 40 da lei Pelé repete a essência do contido no art. 20 da lei Zico, apenas com outra redação. É importante que a lei preveja normas para que atletas brasileiros se transfiram para exercer sua profissão no exterior. Não se pode impedir que um profissional trabalhe em qualquer parte do mundo, mas, respeitados os estatutos e regulamentos das entidades internacionais, é necessário que o desporto brasileiro possa contar, quando preciso, com seus nacionais, principalmente para preparação e disputa de competições internacionais.

O que há de novo, na lei atual, é que no contrato de trabalho entre o atleta profissional e a entidade de prática desportiva será obrigatório constarem as condições em que o atleta se transfere para o exterior.

Art. 41. A participação de atletas profissionais em seleções será estabelecida na forma como acordarem a entidade de administração convocante e a entidade de prática desportiva cedente.

§1º A entidade convocadora indenizará a cedente dos encargos previstos no contrato de trabalho, pelo período em que durar a convocação do atleta, sem prejuízo de eventuais ajustes celebrados entre este e a entidade convocadora.

§2º O período de convocação estender-se-á até a reintegração do atleta à entidade que o cedeu, apto a exercer sua atividade.

O art. 41 e seus parágrafos da lei Pelé são cópia literal do art. 21 e seus parágrafos da lei Zico, tendo-se acrescentado apenas o termo convocante no caput do artigo.

É claro que as duas entidades, a convocadora e a cedente, devam estabelecer, de comum acordo, a forma como se dará a convocação de um atleta, profissional da segunda, para atender, com seu concurso, a compromissos da primeira.

Também o profissional terá que ser ouvido para dizer se aceita os termos da convocação, uma vez que a lei obriga a entidade convocadora a assumir tão-somente os mesmos encargos da entidade cedente. Pode o atleta convocado exigir da entidade convocadora um plus que não esteja previsto em seu contrato de trabalho, como, por

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exemplo, um especial seguro de vida e acidentes pessoais para participação em regiões afetadas por conflitos ou intempéries da natureza. Exagero? Os terremotos em alguns países são uma constante; os conflitos armados, em outros, também. Se jogos são programados para essas regiões para atender a interesses do patrocinador, que este assuma as exigências do atleta. Qualquer outra benesse que a entidade convocadora ofertar ao atleta a este se destina. A obrigação de cumprir os encargos previstos no contrato de trabalho continua sendo da entidade cedente, que será indenizada pela entidade convocadora. Qualquer compensação, a favor do atleta, que for ofertada pela entidade convocadora, a ele terá que ser repassada. Assim, por exemplo, se um atleta profissional recebe um salário de 2x por seu contrato com a entidade cedente que vem a receber da entidade convocadora 4x, esses 2x a maior pretencem ao atleta e não à entidade cedente. Se os não repassa ao atleta, a entidade cedente infringe norma trabalhista e o responsável pela apropriação indébita infringe norma criminal.

Em desejando qualquer compensação pela cessão do atleta profissional, a entidade de prática desportiva cedente terá que fazê-lo em nome próprio e a título específico e não em nome do atleta a título de salário ou premiação.

A entidade convocadora está obrigada a tantos encargos quantos os assumidos seja com o atleta profissional seja com a entidade de prática desportiva cedente até a reintegração do atleta a suas atividades normais, apto para o desempenho integral de sua profissão. Assim, se um atleta se lesiona durante o período de convocação, todos os seus direitos e os da entidade cedente terão que ser garantidos pela entidade convocadora enquanto perdurar a lesão.

Art. 42. Às entidades de prática desportiva pertence o direito de negociar, autorizar e proibir a fixação, a transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo ou eventos desportivos de que participem.

§1º Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço total da autorização, como mínimo, será distribuído, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo ou evento.

§2º O disposto neste artigo não se aplica a flagrantes de espetáculo ou evento desportivo para fins, exclusivamente, jornalísticos ou educativos, cuja duração, no conjunto, não exceda de três por cento do total do tempo previsto para o espetáculo.

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§3º O espectador pagante, por qualquer meio, de espetáculo ou evento desportivo equipara-se, para todos os efeitos legais, ao consumidor, nos termos do art. 2º da Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990.

Com pequena alteração, o caput do art. 42 da lei Pelé é cópia do caput do art. 24 da lei Zico.

Sendo um espetáculo, é justo que o evento esportivo seja comercializado para os meios de divulgação que os transmitem ou retrasmitem regiamente remunerados por seus patrocinadores. Quanto mais importante e de maior apelo popular for o espetáculo maior será a verba que os anunciantes investirão para patrocinar as transmissões. Logo, não menos justo será que, de acordo com a importância do evento, a entidade de prática desportiva tenha o direito de autorizar ou não a exploração comercial do espetáculo de que participe mediante o pagamento de importância equivalente à exibição. Em outros termos e linguagem clara: cabe à entidade de prática desportiva vender ou não seu espetáculo. Se o vende, tem toda liberdade para contratar. Cabe aos patrocinadores aceitar ou não os valores desejados pelas entidades de prática desportiva e não imporem eles valores que minimizem o espetáculo.

O §1º do art. 42 da lei Pelé é cópia do §1º do art. 24 da lei Zico, apresentando, porém, dois acréscimos de grande valia. É que a lei anterior estabelecia a salvaguarda de convenção em contrário quanto ao percentual, que também era de vinte por cento, mas a lei atual estabelece que esse é o mínimo a ser distribuído aos atletas profissionais. Portanto, só vale convenção em contrário quanto à participação dos atletas no preço da autorização se for para mais de vinte por cento; para menos, a lei proíbe.

Lamentavelmente, a lei não obriga a presença de representante dos atletas na assinatura desses contratos de transmissão, embora sejam também parte interessada.

Outro acréscimo importante é o que restringe a distribuição desse percentual apenas aos atletas profissionais, o que não ocorria anteriormente. Assim, se de um mesmo evento desportivo participarem atletas amadores, semiprofissionais e profissionais, o rateio a que se refere este parágrafo é feito somente entre os atletas profissionais, não tendo os atletas amadores e semiprofissionais qualquer participação na distribuição sobre o percentual do preço ajustado.

Assalta-me, então, uma dúvida: tenhamos que uma entidade de prática desportiva venda a emissoras de rádio e televisão, e estas revendam a seus patrocinadores, a transmissão de espetáculos de futebol da categoria júnior, da qual poderão participar atletas amadores, semiprofissionais e profissionais. Só estes últimos terão direito ao rateio do percentual que cabe aos atletas? E se apenas um dentre os onze jogadores da equipe for profissional, caberá exclusivamente a este o correspondente aos vinte por cento destinados por lei à partição entre os atletas profissionais?

Ao rigor da lei, as duas perguntas exigem resposta afirmativa. Se é justo ou não é justo passa a ser tema para outro debate. Mas se a lei determina que o

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mencionado percentual há que ser dividido entre os atletas profissionais, exclui a lei desse rateio os atletas amadores e os semiprofissionais. E não importa o número de atletas beneficiários do rateio. Se forem mil os profissionais, a divisão será por mil; se forem cem, a divisão será por cem; se forem dez, a divisão será por dez; se forem dois, a divisão será por dois; e se for um só, o felizardo ficará com o bolo todo. Legem habemus. Já disse que não estou discutindo se é justo ou se não é justo. Estou apenas mostrando o que está na lei. E, nessa passagem, não há falar-se em interpretação. A lei é clara e, quando ela é clara, dispensa interpretação. Exige apenas aplicação.

Assim, se num evento como o acima sugerido, uma entidade de prática desportiva se apresenta com dez profissionais e outra com apenas dois; se cada entidade de prática desportiva vai receber R$ 100.000,00 para participar daquele evento, terá cada qual que ratear vinte por cento, no mínimo, ou seja, R$ 20.000,00 entre seus atletas profissionais. Assim, cada atleta profissional da primeira entidade de prática desportiva receberá R$ 2.000,00 enquanto que os atletas profissionais da segunda entidade de prática desportiva receberão R$ 10.000,00 cada um.

O §2º do art. 42 da lei Pelé é praticamente o §2º do art. 24 da lei Zico. A diferença está em que, enquanto a lei anterior previa a possibilidade de exibição de flagrantes do espetáculo desportivo, com fins exclusivamente jornalísticos ou educativos, pelo período máximo de três minutos, fosse qual fosse a duração do espetáculo, a lei atual limita essa exibição a três por cento do total do tempo previsto para o espetáculo, o qual é calculado por regra de prática internacional de cada modalidade desportiva.

Se se levar em conta uma partida de futebol, cujo espetáculo tem uma previsão de duração de cento e cinco minutos, as empresas jornalísticas passaram a ter mais vantagem, pois ganharam mais tempo de transmissão sem o pagamento de direitos de arena. Se se considera que o tempo é de noventa minutos, houve desvantagem. Em disputas de vôlei, basquete ou tênis, por exemplo, a vantagem das emissoras com a nova lei é inegável. Mas aí eu me pergunto: as corridas de cavalos são um evento esportivo? Um grande prêmio, digamos, Grande Prêmio Brasil, é um evento desportivo isolado das outras corridas do mesmo programa? Se as duas perguntas tiverem respostas positivas, só mediante pagamento poderão tais competições ser transmitidas, com o devido rateio entre os atletas profissionais. E, já que não sou jogador nem entendo de turfe, gostaria de saber: o atleta é o jóquei ou o cavalo? Se na gíria turfística o cavalo de corrida é chamado de “atleta”, a quem serão pagos os vinte por cento? Perdoem-me os aficcionados a ignorância, mas, no interior do restaurante de um hipódromo, Manuel Bandeira escreveu que estão "lá fora os cavalinhos correndo, cá dentro os cavalões comendo."

O conteúdo do §3º do art. 42 da lei Pelé não fora contemplado na lei Zico, sendo, pois, uma boa inovação. O art. 2º da Lei de Defesa do Consumidor determina que se considera consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produtos ou serviço como destinatário final. Se esse parágrafo do art. 42 da lei Pelé for

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levado ao pé da letra, as emissoras de televisão que adotam o sistema pay per view correm grande risco. Vendem serviços que não podem oferecer porque o dia, hora e local dos espetáculos de futebol que venderam são alterados ou simplesmente cancelados.

Art. 43. É vedada a participação em competições desportivas profissionais de atletas amadores de qualquer idade e de semiprofissionais com idade superior a vinte anos.

Art. 44. É vedada a prática do profissionalismo, em qualquer modalidade, quando se tratar de:

I - desporto educacional, seja nos estabelecimentos escolares de 1º. e 2º. graus ou superiores;

II - desporto militar;

III - menores até a idade de dezesseis anos completos.

O tema tratado nos arts. 43 e 44 da lei Pelé foi abordado de forma mais sucinta nos arts. 27 e 28 da lei Zico, parecendo-me que a lei atual se fez mais clara. A lei atual proíbe que atletas amadores, de qualquer idade, participem de competições desportivas profissionais, exigindo, portanto, que o atleta, para participar de competições desportivas profissionais tenha que ser um profissional ou semiprofissional, desde que este não tenha idade superior a vinte anos.

O caput do art. 44 e seus incisos I e II da lei Pelé são cópia fiel do art. 28, I e II da lei Zico. Diferem ligeiramente no inciso III, que comentarei a seguir, mas não posso compreender porque ambas as leis fizeram questão de fazer constar a proibição de prática profissional de desporto educacional em estabelecimentos de 1º e 2º graus e superiores. Que outro nível educacional comporta o nosso sistema oficial de ensino? No pré-escolar é permitida a prática do profissionalismo? Em desporto educacional de pós-graduação (existe?) é permitida a prática de desporto profissional? Ora, se a prática é de desporto educacional, ela não pode ser desenvolvida de maneira profissional,

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consoante os termos do inc. I do art. 3º. da lei atual e que é repetição da lei anterior. Parece-me, pois, que ambas as leis se tornaram redundantemente tolas, nesse particular.

No inciso III, a lei Pelé proíbe a prática do profissionalismo desportivo até a idade de dezesseis anos completos, enquanto a lei Zico proibia tal prática até a categoria juvenil.

A meu ver, andou melhor a lei atual, ao definir idade mínima para a prática do desporto profissional, e não categoria, porque, de uma modalidade desportiva para outra, podem variar as faixas etárias de cada categoria. Mas, ao delimitar a idade, a lei atual pode criar um impasse para determinados atletas de extraordinário talento em algumas modalidades desportivas. Grandes atletas de ginástica olímpica estão já velhos aos dezoito anos e o auge de sua carreira desportiva é alcançado aos quatorze/quinze anos. Não podem eles ganhar dinheiro com o seu talento? E no tênis, em que grandes campeões se apresentam com idade cada vez menor? Seus nomes ou apelidos podem representar uma marca comercial?

Por isso, volto a dizer, filio-me aos que propugnam por uma lei específica para o futebol e outra lei para as demais modalidades desportivas, olímpicas ou não, cada qual com um capítulo específico, complementarmente à parte geral. E o caro leitor compreenderá minha posição se tiver paciência e coragem para chegar aos comentários ao art. 87.

Art. 45. As entidades de prática desportiva serão obrigadas a contratar seguro de acidentes pessoais e do trabalho para os atletas profissionais e semiprofissionais a elas vinculados, com o objetivo de cobrir os riscos a que estão sujeitos.

Parágrafo único. Para os atletas profissionais, o prêmio mínimo de que trata este artigo deverá corresponder à importância total anual da remuneração ajustada e, para os atletas semiprofissionais, ao total das verbas de incentivos materiais.

O art. 45 e seu parágrafo único da lei Pelé são um aperfeiçoamento do art. 29 da lei Zico, na medida em que explicitam a contratação pura e simples de seguro de acidentes para os atletas de alto rendimento, profissionais e semiprofissionais, com qualquer empresa seguradora, enquanto a lei anterior determinava a constituição de um sistema obrigatório de seguro.

A lei atual já determina o valor do prêmio mínimo do seguro, que corresponderá, minimamente, à importância anual da remuneração ajustada no contrato

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do atleta profissional e, para o atleta semiprofissional, ao valor total das verbas de incentivos materiais.

Quando a lei diz que estes valores de seguro são o mínimo a que a entidade de prática desportiva está obrigada, não impede que este valor seja maior. E assim há que ser na medida em que os contratos de trabalho de atletas profissionais podem ter duração de muitos anos. A meu ver, portanto, o valor do prêmio de seguro deveria ser igual ao valor total do contrato de trabalho, pois só assim o atleta profissional ou semiprofissional estaria garantido quanto à percepção do valor total ajustado a título de remuneração, seja curto ou longo o período do contrato. E quando se tratar de um contrato de duração por período inferior a um ano, não há falar-se em remuneração anual, a qual pode ser trimestral, semestral ou qualquer outra variação acima de três meses. Deve, pois, o atleta profissional, ao ajustar seu contrato de trabalho com a entidade de prática desportiva, exigir a contratação de seguro cujo prêmio não seja inferior ao total da remuneração que perceberia ao longo de todo o contrato. Se se tratar de um contrato de três meses, um ano ou cinco anos, o valor do prêmio do seguro deveria corresponder ao total desse período remuneratório, uma vez que, se o atleta sofrer um acidente pessoal ou de trabalho, poderá ficar incapacitado para exercer sua profissão por aquele período contratado. O prêmio do seguro servirá ao menos para garantir-lhe a sobrevida por aquele período em que ele deveria estar empregado.

Art. 46. A presença de atleta de nacionalidade estrangeira com visto temporário de trabalho previsto no inciso V do art. 13 da Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, como integrante da equipe de competição da entidade de prática desportiva, caracteriza para os termos desta Lei a prática desportiva profissional, tornando obrigatório o enquadramento previsto no caput do art. 27.

§1º É vedada a participação de atleta de nacionalidade estrangeira como integrante de equipe de competição de entidade de prática desportiva nacional nos campeonatos oficiais, quando o visto de trabalho temporário expedido pelo Ministério do Trabalho recair no inciso III do art. 13 da Lei 6.815, de 19 de agosto de 1980.

§2º A entidade de administração do desporto será obrigada a exigir da entidade de prática desportiva o comprovante do visto de trabalho do atleta de nacionalidade estrangeira

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fornecido pelo Ministério do Trabalho, sob pena de cancelamento da inscrição desportiva.

Como o inciso V do art. 13 da Lei nº 6.815, de 19/08/80, determina que, sob o regime de contrato, o estrangeiro poderá obter visto temporário de permanência no Brasil, ele vem como profissional já contratado. Se vier apenas como desportista, sem contrato de trabalho, estará o seu visto temporário enquadrado no inciso III do referido artigo, situação em que não poderá participar de campeonatos oficiais.

CAPÍTULO VIDA ORDEM DESPORTIVA

Art. 47. No âmbito de suas atribuições, os Comitês Olímpico e Paraolímpico Brasileiros e as entidades nacionais de administração do desporto têm competência para decidir, de ofício ou quando lhes forem submetidas pelos seus filiados, as questões relativas ao cumprimento das normas e regras de prática desportiva.

O art. 47 da lei Pelé busca reproduzir o disposto no art. 30 da lei Zico, fazendo-o de forma mais prolixa e, a meu ver, de modo menos feliz.

É evidente que a lei, tanto a atual quanto a anterior, teria que determinar tal competência às entidades de prática desportiva. Não seria necessário, portanto, que a lei nova fizesse menção específica aos dois Comitês, Olímpico e Paraolímpico, porque já estariam essas entidades abrangidas no conceito de entidade de administração do desporto. Nesse passo, foi prolixa a lei nova. E foi infeliz ao determinar que tal competência só existe para as entidades nacionais de administração do desporto. E quando for o caso de uma entidade de prática desportiva ter que submeter questões quaisquer a uma entidade estadual ou regional de administração do desporto? E essas entidades, estaduais ou regionais, podem decidir de ofício quanto ao cumprimento de normas e regras que a lei aborda? Se uma entidade de caráter não nacional decidir quanto a uma regra de prática desportiva, pode uma entidade de prática desportiva estadual, regional, municipal ou distrital desautorizar tal decisão por não ter sido emanada de uma entidade nacional de administração do desporto? Penso que não, embora a lei, por infeliz, permita entender que sim.

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Art. 48. Com o objetivo de manter a ordem desportiva, o respeito aos atos emanados de seus poderes internos, poderão ser aplicadas, pelas entidades de administração do desporto e de prática desportiva, as seguintes sanções:

I - advertência;

II - censura escrita;

III - multa;

IV - suspensão;

V - desfiliação ou desvinculação.

§1º A aplicação das sanções previstas neste artigo não prescinde do processo administrativo no qual sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa.

§2º As penalidades de que tratam os incisos IV e V deste artigo somente poderão ser aplicadas após decisão definitiva da Justiça Desportiva.

O art. 48 e seus dois parágrafos são cópia capenga e caolha dos três parágrafos do art. 31 da lei Zico, sem o caput.

Disse eu que a cópia é capenga porque, no caput do art. 48, cujos termos são cópia fiel do §1º. do art. 31 da lei Zico, amputaram-se, após a expressão poderes internos, outras obrigações da lei anterior, expressas nos termos ...e fazer cumprir atos legalmente expedidos pelos órgãos ou representantes do Poder Público... que constavam da lei Zico.

Disse eu ainda que a cópia é caolha porque agora, ao tratar das penalidades, permite que estas sejam aplicadas pelas entidades de administração do desporto, não se referindo mais a entidade nacional, o que tira a sintonia entre os arts. 47 e 48, enxergando-se uma amplitude no segundo que inexiste no primeiro.

As sanções consagradas na lei Pelé são absolutamente as mesmas que já constavam da lei Zico.

O §1º deste art. 48 da lei Pelé reproduz, com mais perfeição, o que se consagrara no §2º do art. 31 da lei Zico. Nesta, o processo administrativo, assegurados

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o contraditório e a ampla defesa, fazia referência expressa às sanções previstas nos incisos I, II e III do §1º do art. 31, como se fosse possível excluir as mesmas garantias quando se tratasse das sanções dos incisos IV e V do mesmo parágrafo, o que, evidentemente, não era o espírito da lei. Nessa passagem, portanto, a lei Pelé está perfeita, contrariamente à lei Zico, que apresentava aquela imperfeição.

O §2º do art. 48 da lei Pelé é cópia do §3º do art. 31 da lei Zico, com a necessária adaptação.

Tem a lei, nesse particular, o objetivo de garantir a qualquer indiciado, seja atleta seja entidade de prática desportiva, a possibilidade de só cumprir essas penas, que são irreversíveis, portanto, sem possibilidade de reparação, após a decisão definitiva da Justiça Desportiva.

Parece-me que a lei andou bem, sendo a atual cópia da anterior, por não me parecer justo que se cumpra uma pena consequente de uma condenação antes de se esgotarem todos os meios e modos, principalmente os recursos judiciais, de que se possa valer o indiciado para provar não merecer tal apenação. Portanto, quando a pena imposta por uma entidade de administração do desporto ou por uma entidade de prática desportiva for de suspensão (inciso IV) ou desfiliação ou desvinculação (inciso V), essa pena só poderá ser aplicada após o trânsito em julgado da sentença definitiva proferida pela Justiça Desportiva.

Por isso que muitas vezes foram e continuam sendo incompreendidas decisões de nossos Tribunais de Justiça Desportiva conferindo liminares para garantia desse direito a alguns atletas que, devendo ser suspensos da participação em uma determinada etapa da competição, dela puderam participar, embora, pelo regulamento específico da própria competição, devessem estar excluídos, digamos, de uma determinada partida de futebol. É que o Tribunal tem que raciocinar com a irreparabilidade do dano causado ao atleta e mesmo à entidade de prática desportiva se uma decisão condenatória de primeira instância ou uma imposição regulamentar determinasse a suspensão, ainda que temporária, de um atleta por uma indigitada falta cometida, e se se viesse a comprovar que tal falta não fora cometida ou, mesmo que cometida, não devera o atleta sofrer aquele tipo de punição. Se o atleta ou a entidade de prática desportiva tem ainda o direito de recorrer e, através do recurso, comprovar que não deve ser apenado com aquela sanção ou que deve mesmo ser absolvido, como se haveria de reparar aquele dano já causado? Em face dessa impossibilidade de reparação do dano é que a pena de suspensão só se há de aplicar após definitiva decisão da Justiça Desportiva. A irreparabilidade do dano é garantia constitucional para concessão do direito de se aguardar a decisão definitiva o que, em regra, se consegue através de decisões liminares.

Apesar da incongruência entre os arts. 47 e 48 acima apontada, parece-me que esse Capítulo Da Ordem Desportiva foi melhor tratado na lei Pelé que na lei Zico, já que nesta se misturaram assuntos díspares.

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CAPÍTULO VIIDA JUSTIÇA DESPORTIVA

Art. 49. A Justiça Desportiva a que se referem os §§1º e 2º do art. 217 da Constituição Federal e o art. 33 da Lei nº 8.028, de 12 de abril de 1990, regula-se pelas disposições deste Capítulo.

Este art. 49 da lei Pelé é cópia ipsis litteris do art. 33 da lei Zico. O que a lei pretende é que, no âmbito desportivo, seja prestigiada a Justiça Desportiva. Como a Constituição garante o recurso ao Poder Judiciário a qualquer pessoa física ou jurídica que sofra ou se ache na iminência de sofrer um dano a seu direito (CF, art. 5º, inc. XXXV), qualquer atleta ou entidade de prática desportiva recorreria de pronto ao Poder Judiciário comum para garantir direitos desportivos que, às vezes, até não teria, e a Justiça Desportiva teria que se submeter à decisão da Justiça comum. Por isso, quando a matéria concernir à disciplina ou às competições desportivas, somente se poderá recorrer ao Poder Judiciário após se esgotarem todas as instâncias da Justiça Desportiva.

Se, porém, um atleta, dirigente ou árbitro é ofendido moralmente ou agredido fisicamente, fora de disputa normal do desporto, a reparação há que ser buscada de imediato na Justiça comum, porque a Justiça Desportiva se atém à disciplina e regras das competições.

Art. 50. A organização, o funcionamento e as atribuições da Justiça Desportiva, limitadas ao processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições desportivas, serão definidas em Códigos Desportivos.

§1º As transgressões relativas à disciplina e às competições desportivas sujeitam o infrator a:

I - advertência;

II - eliminação;

III - exclusão de campeonato ou torneio;

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IV - indenização;

V - interdição de praça de desportos;

VI - multa;

VII - perda do mando do campo;

VIII - perda de pontos;

IX - perda de renda;

X - suspensão por partida;

XI - suspensão por prazo.

§2º As penas disciplinares não serão aplicadas aos menores de quatorze anos.

§3º As penas pecuniárias não serão aplicadas a atletas não-profissionais.

O art. 50 da lei Pelé é também cópia fiel do art. 34 da lei Zico, acrescido apenas do termo desportivos ao final do caput.

O funcionamento de qualquer sistema de distribuição de justiça obedece a determinadas regras e normas que, em seu conjunto, se denominam códigos. Assim, obedecidas as regras gerais para a prática de qualquer modalidade desportiva, cada esporte terá suas próprias normas e cada Tribunal de Justiça Desportiva suas próprias regras. Assim é que existem Tribunais de Justiça Desportiva específicos para o futebol, o vôlei, o basquete, etc.

O §1º do art. 50 da lei Pelé é mera repetição do §2º do art. 34 da lei Zico, inclusive na própria ordem das apenações. Essas penas se podem aplicar ora à entidade de prática desportiva ora ao atleta ora a ambos, idênticas ou não, por um mesmo fato. As penas descritas nos incisos V, VII, VIII e IX se dirigem exclusivamente às entidades de prática desportiva.

O contido no §2º do art. 50 da lei Pelé não constava da Lei Zico, embora preexistente. Os atletas menores de quatorze anos, pelo próprio respeito que a prática desportiva deve à sua inocência, não eram e não são submetidos a julgamento por Tribunais de Justiça Desportiva. Quando muito, o regulamento da competição pode prever uma punição automática, independentemente de julgamento, tal como a suspensão por partida em caso de falta disciplinar grave.

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O §3º do art. 50 da lei Pelé é repetição pura e simples do §3º do art. 34 da lei Zico. A lógica da norma é evidente. Se da prática desportiva o atleta não percebe remuneração, não se lhe pode impor uma pena pecuniária por qualquer falta disciplinar que pratique. A meu ver, porém, nesse passo, a lei deveria também fazer menção aos atletas semiprofissionais, seja para puni-los seja para isentá-los de pena pecuniária. Isto porque deve o atleta semiprofissional ficar isento de tal pena se os incentivos que receba não se prestarem ao cumprimento de uma pena pecuniária; mas, como já dissemos, nada impede que um atleta semiprofissional tenha incentivos que superem em muito o que percebem alguns profissionais. Entendo, pelo texto da lei, que os atletas semiprofissionais também não são passíveis de pena pecuniária, posto que são atletas não-profissionais. Isso, nos termos precisos da lei.

Art. 51. O disposto nesta Lei sobre Justiça Desportiva não se aplica aos Comitês Olímpico e Paraolímpico Brasileiros.

O art. 51 da lei Pelé reitera o §4º do art. 34 da lei Zico, acrescentando o Comitê Paraolímpico, não contemplado na lei anterior.

Com objetivos específicos diferentes das demais entidades de prática desportiva e de administração do desporto, os Comitês Olímpico e Paraolímpico hão de submeter-se a regras próprias e não a regras gerais da Justiça Desportiva, inclusive porque subordinados às regras do Comitê Olímpico Internacional e não às entidades internacionais das diversas modalidades desportivas. A própria razão de ser da Olimpíada obriga a essa diferenciação quanto à aplicação de regras na prática de seus esportes.

Art. 52. Aos Tribunais de Justiça Desportiva, unidades autônomas e independentes das entidades de administração do desporto de cada sistema, compete processar e julgar, em última instância, as questões de descumprimento de normas relativas à disciplina e às competições desportivas, sempre assegurados a ampla defesa e o contraditório.

§1º Sem prejuízo do disposto neste artigo, as decisões finais dos Tribunais de Justiça Desportiva são impugnáveis nos termos gerais do direito, respeitados os pressupostos processuais estabelecidos nos §§1º e 2º do art. 217 da Constituição Federal.

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§2º O recurso ao Poder Judiciário não prejudicará os efeitos desportivos validamente produzidos em conseqüência da decisão proferida pelos Tribunais de Justiça Desportiva.

O art. 52 e seus dois parágrafos da lei Pelé são pura e simples repetição do art. 35 e seus dois parágrafos da lei Zico.

Confesso que não entendi nem uma nem outra lei.

Se o artigo de lei diz, no caput, que aos Tribunais de Justiça Desportiva compete processar e julgar, em última instância, as questões que menciona, em verdade se trataria de instância única, porque última, de cujas decisões, portanto, não caberia recurso. Se se trata de última instância, é porque não existe outra que lhe seja superior. Logo, não se pode opor recurso contra uma decisão de última instância.

E para que eu fique mais confuso, o §1º do art. 52 diz que as decisões finais dos Tribunais de Justiça Desportiva são impugnáveis... Se são impugnáveis, não são decisões finais, terminativas, e, se se pode impugnar uma decisão de um Tribunal de Justiça Desportiva, é porque aquela decisão não foi proferida em última instância. Impugnar uma decisão de um Tribunal significa apresentar recurso contra tal decisão. E um Tribunal só profere uma decisão final de última instância quando não caiba mais recurso, quando tal decisão não pode mais ser impugnada, e isto só acontece quando a decisão transita em julgado.

Os Tribunais de Justiça Desportiva são unidades autônomas e independentes das entidades de administração do desporto de cada sistema. Nesse ponto, a lei quer dizer que cada modalidade desportiva de cada unidade de prática e administração do desporto, federação ou liga, por exemplo, comporá um sistema a que corresponderá a existência de um Tribunal de Justiça Desportiva. Nenhuma ingerência nesse Tribunal, porque autônomo e independente, poderá ter a entidade de administração do respectivo esporte.

A referência que a lei faz aos §§1º e 2º do art. 217 da Constituição Federal é apenas para dizer que para se recorrer ao Poder Judiciário será necessário esgotarem-se todas as vias da Justiça Desportiva (§1º) e que a Justiça Desportiva terá o prazo de sessenta dias para proferir decisão final, contado o prazo da data da instauração do processo (§2º).

O §2º do art. 52 é de suma importância para garantia da prática desportiva. No âmbito meramente desportivo, as decisões dos Tribunais de Justiça Desportiva têm que prevalecer sobre qualquer outro entendimento que possa ter a Justiça comum.

Exemplificando, poderíamos dizer que, se um atleta é excluído de uma competição ou suspenso por determinado período ou eliminado definitivamente de uma competição desportiva sob acusação de haver praticado um ato ilícito, não pode o atleta nem a entidade de prática desportiva a que o mesmo pertence

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postular perante o Poder Judiciário comum a reparação do erro para se anularem as competições de que ele devera ter participado, porque inocente da acusação. Ainda que a Justiça comum reconheça sua inocência, os efeitos desportivos não poderão ser invalidados. Poderão, contudo, tanto o atleta quanto a entidade de prática desportiva a que esteja filiado, separada ou conjuntamente, postular a reparação pelos danos morais e materiais que tenham sofrido.

Admitamos, para bem esclarecer, que, numa rentável competição de futebol, haja uma partida que não desperte o interesse da mídia; admitamos que o juiz expulse um determinado atleta e o indicie na súmula afirmando mentirosamente ter sido por ele agredido; admitamos que a equipe desse atleta perca a partida por causa, exclusiva ou principalmente, dessa despropositada expulsão; admitamos que o atleta não disponha de outra prova que não o testemunho de seus companheiros de equipe; admitamos que o Tribunal de Justiça Desportiva considere essas testemunhas suspeitas e faça prevalecer a súmula condenando o atleta com a eliminação da competição; admitamos que sua equipe deixe de conquistar o título de campeão em consequência dessa derrota, porque os pontos positivos daquela partida lhe faltaram; admitamos que o prejuízo da entidade de prática desportiva é enorme e o prêmio a que o atleta faria jus é significativo. Admitamos agora que apareça, após a competição encerrada, um cinegrafista amador com o filme daquela partida, em que as imagens provem que o atleta não cometera aquela falta.

Poderão o atleta e a entidade de prática desportiva ir à Justiça comum em busca da reparação, moral e material, e, ganhando a causa, receber indenização. Mas a decisão do Tribunal de Justiça Desportiva vai prevalecer para o fim de manter os resultados, porque os efeitos de sua decisão foram validamente produzidos.

E quando uma entidade de prática desportiva perde uma competição por erro clamoroso, de fato ou de direito, praticado pelo Juiz?

O videotape da TV e os cinegrafistas amadores têm prestado grandes serviços à Justiça, à Política, ao Esporte... E muitos desses serviços são verdadeiros casos de Polícia.

Art. 53. Os Tribunais de Justiça Desportiva terão como primeira instância a Comissão Disciplinar, integrada por três membros de sua livre nomeação, para a aplicação imediata das sanções decorrentes de infrações cometidas durante as disputas e constantes das súmulas ou documentos similares dos árbitros, ou, ainda, decorrentes de infringência ao regulamento da respectiva competição.

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§1º (VETADO)

§2º A Comissão Disciplinar aplicará sanções em procedimento sumário, assegurados a ampla defesa e o contraditório.

§3º Das decisões da Comissão Disciplinar caberá recurso aos Tribunais de Justiça Desportiva.

§4º O recurso ao qual se refere o parágrafo anterior será recebido e processado com efeito suspensivo quando a penalidade exceder de duas partidas consecutivas ou quinze dias.

O que consta no art. 53 e seus parágrafos da lei Pelé é o que já constava do art. 36 e seus parágrafos da lei Zico, com pequenas alterações que de pronto analiso.

O caput do art. 53 da lei atual institui como primeira instância dos Tribunais de Justiça Desportiva (será que agora eu vou entender o art. 52?) uma Comissão Disciplinar para aplicação imediata (isto é importante para o estudo comparativo da legislação) das sanções que devam ser aplicadas com base apenas nas súmulas ou documentos similares dos árbitros.

Os membros dessa Comissão Disciplinar, em número de três, são nomeados pelos Tribunais de Justiça Desportiva. Na lei Zico, essa Comissão Disciplinar, também de três membros, era nomeada pela entidade de administração do desporto responsável pelos compeonatos ou competições que promovesse (art.36).

Um estudo comparativo das duas leis leva a concluir que, nesse passo, andou melhor a lei Pelé. A nomeação dos membros dessa Comissão Disciplinar feita pelo próprio Tribunal e não pela entidade de administração do desporto dá aos membros dessa Comissão uma independência maior porque não estarão seus membros sofrendo ingerência política dos organizadores das competições e serão nomeados para compô-las três integrantes do elenco de auditores, como determina o art. 61 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98. Considerando que essa Comissão Disciplinar é a primeira instância dos Tribunais de Justiça Desportiva, é possível aceitar que esse Tribunal seja considerado última instância, ainda que permaneça a incongruência da recorribilidade de suas decisões. Assim, essa Comissão Disciplinar aplicará de imediato as sanções que deva aplicar em decorrência das súmulas dos árbitros ou dos regulamentos das competições.

Os §§2º, 3º e 4º do art. 53 da lei Pelé, que teve vetado o §1º, correspondem aos §§ 1º, 2º e 3º do art. 36 da Lei Zico.

É preciso comparar, em conjunto, os §§2º e 3º do art. 53 da lei atual com os §§1º e 2º do art. 36 da lei anterior.

A lei Zico mandava a Comissão Disciplinar aplicar as sanções em procedimento sumário, sem fazer menção às garantias da ampla defesa e do

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contraditório, como fez questão de assegurar a lei Pelé. Já quando trata do recurso contra a decisão da Comissão Disciplinar, a lei Pelé já não repete expressamente essas garantias, como o fazia a lei Zico. Em resumo: enquanto a lei Pelé garante a ampla defesa e o contraditório por ocasião do julgamento da Comissão Disciplinar sem reiterar tais garantias na fase recursal, a lei Zico não dava tais garantias na fase de julgamento pela Comissão, só o fazendo na fase recursal.

Parece-me, pois, que, nessa passagem, a lei Zico estava mais consentânea com o objetivo da primeira instância, exercida pela Comissão Disciplinar, que é o imediatismo. A garantia da ampla defesa e do contraditório, nessa fase, impede que a Comissão Disciplinar possa fazer aplicação imediata das sanções que entenda dever impor. A garantia da ampla defesa importa na intimação do indiciado para tomar conhecimento da imputação; importa ainda na admissibilidade de uma defesa preliminar, chamada de defesa prévia e, ao fim da produção das provas, incluindo-se oitiva de testemunhas, que podem ser arroladas em outros estados ou outros países, pela garantia do contraditório, cabe ainda a defesa final, escrita ou oral, chamada de alegações finais. Como se vê, se a Comissão Disciplinar tem por objetivo a aplicação imediata das sanções, não há falar-se em ampla defesa nem contraditório. Ou se faz uma coisa ou outra. Se se pretende alcançar agilidade nessas decisões de primeira instância, o princípio do direito à ampla defesa, assegurado o contraditório em procedimento regular, tem que ser desprezado. Se se pretendem esses direitos garantidos, tem-se que desprezar a agilidade das decisões. Os dois objetivos, simultaneamente, não se podem alcançar. Quando se fala da morosidade da Justiça comum é exatamente porque o Poder Judiciário tem que respeitar o princípio constitucional do direito à ampla defesa, principalmente nos processos criminais, onde estão em jogo, de um lado, a liberdade do indiciado e, de outro, a vida, a honra , a fortuna ou a família da vítima.

E para impedir que uma sanção imposta injustamente cause danos muito graves ao atleta ou à entidade de prática desportiva, o §4º do art. 53 da lei Pelé, que repete o §3º do art. 36 da lei Zico, garante ao indiciado o efeito suspensivo da decisão cuja sanção exceda duas partidas consecutivas ou quinze dias. Se o indiciado vier a ser absolvido, a injustiça não ultrapassará a suspensão por duas partidas, e será pequena. Tão pequena que há competições em que determinados atletas até se esforçam por receber tal punição; quando, porém, houver uma suspensão por até quatorze dias, aí a injustiça, se houver, poderá ser grande, pois o atleta poderá ficar sem condição de jogo por quatro, cinco partidas; numa competição curta, essa punição é grave. Caberá aos julgadores da Comissão Disciplinar adotar critérios para não serem injustos. E partindo do pressuposto de que aquele que julga busca distribuir justiça, não temo que o imediatismo das decisões das Comissões Disciplinares tragam grandes injustiças. Ao menos, assim espero.

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Art. 54. O membro do Tribunal de Justiça Desportiva exerce função considerada de relevante interesse público e, sendo servidor público, terá abonadas suas faltas, computando-se como de efetivo exercício a participação nas respectivas sessões.

Esse art. 54 da lei Pelé é reiteração pura e simples do que prescrevia o art. 37 da lei Zico, sendo uma cópia literal da lei anterior.

Em que pese a relevância do cargo pela magnitude da Instituição, não me parece razoável que, tão-somente por ser considerado de relevante interesse público, deva o auditor, quando funcionário público, ter suas faltas ao serviço abonadas, como se efetivo exercício de suas funções estivesse cumprindo, porque esteja participando de sessões no Tribunal de Justiça Desportiva. Há Tribunais de Justiça Desportiva que se compõem com insignes nomes da Magistratura e do Ministério Público. Será justo que esses Juízes ou Desembargadores, Promotores ou Procuradores de Justiça deixem de exercer suas funções apenas porque estão atuando nas sessões dos Tribunais desportivos? Sei por ciência própria que não o fazem. Mas não sei se será justo para com o contribuinte que um outro tipo de funcionário, pago pelo erário através dos impostos, impostos a todos nós, possa deixar de desempenhar sua função apenas por ser membro de um Tribunal de Justiça Desportiva. A honraria de pertencer a um Tribunal de Justiça Desportiva por si só já justificaria a extinção do privilégio. E veja-se que só é auditor quem o desejar, não sendo um encargo compulsório, como acontece com o jurado quando convocado a representar a sociedade perante o Tribunal do Júri. Aí se justifica a isenção porque irrecusável, em princípio, a convocação.

Art. 55. Os Tribunais de Justiça Desportiva serão compostos por, no mínimo, sete membros, ou onze membros, no máximo, sendo:

I - um indicado pela entidade de administração do desporto;

II - um indicado pelas entidades de prática desportiva que participem de competições oficiais da divisão principal;

III - três advogados com notório saber jurídico desportivo, indicados pela Ordem dos Advogados do Brasil.;

IV - um representante dos árbitros, por estes indicado;

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V- um representante dos atletas, por estes indicado.

§1º Para efeito de acréscimo de composição, deverá ser assegurada a paridade apresentada nos incisos I, II, IV e V, respeitado o disposto no caput deste artigo.

§2º O mandato dos membros dos Tribunais de Justiça terá a duração máxima de quatro anos, permitida apenas uma recondução.

§3º É vedado aos dirigentes desportivos das entidades de administração e das entidades de prática o exercício de cargo ou função na Justiça Desportiva, exceção feita aos membros dos conselhos deliberativos das entidades de prática desportiva.

§4º Os membros dos Tribunais de Justiça desportiva serão obrigatoriamente bacharéis em Direito ou pessoas de notório saber jurídico, e de conduta ilibada.

O art. 55, seus incisos e parágrafos da lei Pelé repetem integralmente o art. 38, suas alíneas e parágrafos da lei Zico, acrescentando apenas o contido no §4º, com a exigência do bacharelado ou do notório saber jurídico, que não constava na lei anterior. Na lei Zico, o §3º do art. 38 foi vetado, por isso que, embora apresente o §4º, só contém três itens em seus parágrafos.

A composição dos Tribunais de Justiça Desportiva, como de qualquer outro Tribunal, é instituída em lei. Suas atribuições são definidas em lei e por seus Regimentos Internos, assim como sua procedibilidade. Quando a lei institui um mínimo, no caso, sete membros, é por entender necessária uma determinada representatividade, como se extrai dos incisos I, II, IV e V, onde aquelas quatro classes foram contempladas cada qual com apenas um representante. Quando o inciso III exige que, dos sete membros que compõem o Tribunal, três sejam advogados com notório saber jurídico desportivo, tem em mira o auxílio técnico que esses três especialistas possam dar aos demais quatro auditores que não deveriam ser, necessariamente, sabedores do Direito. E qualquer Tribunal de Justiça se funda na ciência jurídica. Parece-me, pois, que a composição é boa. Ali está um auditor indicado pela entidade de administração do desporto que julgará os casos que lhe sejam submetidos com a certeza

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de que a competição visa a determinado fim; ali está um auditor indicado pelas entidades de prática desportiva que saberá distribuir justiça tendo em vista o aprimoramento do desporto através das entidades que o indicaram para o cargo; ali está um representante dos árbitros, que saberá julgar as questões tendo em vista o ângulo de abordagem da punição a que esteja submetido o indiciado em cada julgamento; ali está um auditor que representa os atletas, sendo por estes indicado, embora eu creia que em cada mil atletas nem cinco tenham conhecimento de que possuem esse representante no Tribunal, crendo eu ainda que nem dois atletas em cada cinco mil tenham sido chamados para indicar o seu representante no Tribunal. E vou mais: se se fizer uma pesquisa entre os atletas, mesmo os profissionais, duvido que em cada mil mais de um saiba que possui tal representante. E este um que possa sabê-lo, talvez saiba que o tem mais não saiba quem o é.

Além desses quatro, dois indicados e dois representantes, ainda se assentam no Tribunal de Justiça Desportiva mais três advogados, cuja condição já expusemos acima.

Ao contrapor o §1º ao caput do art. 55, in fine, parece-me que a lei está mal redigida, porque estabelece um mínimo de sete membros e um máximo de onze. Ora, entre o mínimo e o máximo há uma variante de mais três possibilidades numéricas, o que, no entanto, a lei veda. Não há falar-se em mínimo e máximo. Tem-se que falar que o Tribunal de Justiça Desportiva é composto por sete ou onze membros, sendo sempre três advogados e um ou dois indicados pelas entidades relacionadas nos incisos I e II e mais um ou dois representantes das categorias mencionadas nos incisos IV e V . O art. 57 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98, aclarou o sentido do caput através de seus parágrafos, esclarecendo a dupla possibilidade. Isto porque, ao indicar nos incisos I, II, IV e V a nomeação de apenas um daqueles membros, na composição de um Tribunal com sete membros, e exigir no §1º a garantia da paridade no caso de aumento do número de seus componentes, obriga a lei que cada uma daquelas entidades e cada uma daquelas categorias passe a ter dois membros no Tribunal, o que obriga a existência de um Tribunal com onze membros. Portanto, ou sete ou onze membros. Nem menos nem mais nem meio.

Visto que assim se dá a composição do Tribunal de Justiça Desportiva, é bem de ver que o número de advogados não se altera. Serão três advogados para quatro membros que o não são, necessariamente, ou serão também três advogados para oito membros que o não são, necessariamente. Esta diferenciação na composição dos Tribunais de Justiça Desportiva pode levar à diferenciação na forma de julgar, na filosofia do Direito e no sentido das decisões dos Tribunais de Justiça Desportiva. Quando o Tribunal tem três advogados para quatro outros membros que o não são, há maior possibilidade de as questões serem decididas sob uma ótica mais jurídica que factual, bastando que os juristas convençam apenas um dos que o não sejam a decidir dessa ou daquela forma porque assim estará melhor aplicando o Direito. Já quando o Tribunal tem três advogados dentre onze membros, a tendência à juridicidade das decisões é mais remota porque, dos onze membros, oito são leigos (ou, pelo menos, não precisam ser advogados). A diferenciação que se poderá verificar e de que acima falamos ocorre porque, ao correr dos julgamentos repetidos, os Tribunais começam a

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tomar decisões que se repetem quando se repetem as questões sob seu julgamento. A reiteração dessas decisões idênticas para casos iguais é que se chama jurisprudência. E quando um Tribunal firma sua jurisprudência, é melhor que toda a Corte a ela se submeta, como, em geral, as Cortes inferiores se agasalham na jurisprudência das Cortes Superiores.

O §2º do art. 55 estabelece o prazo de quatro anos como período máximo do mandato dos membros do Tribunal, podendo haver apenas uma recondução, por igual período, podendo, portanto, qualquer daqueles membros permanecer como auditor do Tribunal de Justiça Desportiva por um período de até oito anos. Daí talvez possa o leitor, que até aqui me honrou com sua companhia, dar-me razão quanto à crítica ao privilégio instituído no art. 54 para o servidor público que seja membro de um Tribunal de Justiça Desportiva. E veja-se que o auditor de um Tribunal de Justiça Desportiva hoje pode vir a ser auditor em outro Tribunal amanhã, começando um novo mandato com direito a nova recondução.

O período em que o auditor prestará seus relevantes serviços ao Tribunal de Justiça Desportiva é estabelecido pelo Regimento Interno de cada Tribunal, não podendo, ex vi legis, tal período ser superior a quatro anos.

O §3º do art. 55 impede que dirigentes desportivos tenham cargo ou função perante a justiça desportiva. A moralidade do artigo é evidente. Um dirigente, como tal, há que pugnar pelos interesses de sua entidade. Jamais estará isento para julgar até porque, se vier a decidir contrariamente aos interesses de sua entidade, não será considerado um bom dirigente por seus companheiros de clube. Uma coisa é uma coisa...

Tal proibição já não atinge os conselheiros das entidades. Nem há razão para atingi-los. São eles, em geral, sócios da entidade, conselheiros dela, mas às vezes até em oposição aos interesses de uma determinada diretoria. E os Auditores de um Tribunal de Justiça Desportiva dificilmente se deixarão levar por sua paixão clubística. Quando se diz que tal ou qual Auditor é torcedor da entidade tal ou qual não se quer nem se pode deduzir daí que seus votos já sejam previamente conhecidos e as decisões tomadas por antecipação. Sob seu terno e sobre seu peito pode haver a camisa de um clube, que ele tem que amar, mas acima de sua paixão há uma honra, que ele tem que honrar. O cargo de Auditor só é exercido por quem ama o esporte e o amor ao esporte leva sempre a uma identificação de amor com um clube. É um cargo para apaixonados que, apesar da paixão, não esquecem a razão.

O §4º do art. 55 da lei Pelé que, como já disse, não existia na lei Zico, exige que os membros dos Tribunais de Justiça Desportiva, além de terem conduta ilibada, sejam obrigatoriamente bacharéis em Direito ou pessoas de notório saber jurídico.

Confesso que agora eu sucumbi e não entendo mais nada.

Desde quando se alijaram os rábulas dos Tribunais graças à disseminação das Faculdades de Direito no Brasil, só se reconhece algum saber jurídico, que não precisa

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sequer ser notório, a quem seja bacharel em Direito. Assim como aconteceu com os jornalistas e radialistas, que garantiram o exercício profissional pelos anos a fio dedicados à causa da imprensa, independentemente de terem ou não curso superior. Sua competência e dignidade para o desempenho de tão necessária missão já lhes tinham sido reconhecidas por seus ouvintes e leitores. Não precisaram eles fazer uma faculdade de jornalismo ou de comunicação, a qual só foi criada graças à conhecida frase do Chacrinha. Mas hoje o profissional de imprensa, como tal, tem que passar por uma faculdade para comprovar um mínimo de saber jornalístico. Os colaboradores são outra coisa e têm tratamento legal diverso. Assim também, é pelo diploma de bacharel em Ciências Jurídicas que se reconhece um mínimo de saber jurídico ao profissional do Direito. As cadeias estão cheias de profundos conhecedores do Direito Penal. Nem por isso podem esses presidiários ser considerados pessoas de notório saber jurídico. E mais: enquanto o inciso III exige que os três advogados indicados pela O.A.B. tenham notório saber jurídico desportivo, uma especialidade, esse malfadado §4º pede apenas que os leigos, não bacharéis, tenham notório saber jurídico, na generalidade.

E disse eu que é um malfadado parágrafo porque vai impedir a legitimidade da representação instituída fundamentalmente no inciso V e circunstancialmente no inciso IV. Um representante tem que conhecer profundamente as necessidades, ansiedades, ambições, desejos, paixões, enfim, a alma de seu representado. Portanto, o melhor representante dos árbitros será um árbitro ou ex-árbitro, o melhor representante de um atleta será um atleta ou ex-atleta. Não vislumbro, ao menos no meio futebolístico, tal possibilidade para os atletas profissionais que, de tão exigidos, dificilmente conseguem concluir um curso superior. Talvez por isso mesmo eles até prefiram ignorar que têm direito a um representante perante os Tribunais de Justiça Desportiva. Falta-lhe legitimidade. Não é um representante legítimo da classe.

CAPÍTULO VIIIDOS RECURSOS PARA O DESPORTO

Art. 56. Os recursos necessários ao fomento das práticas desportivas formais e não-formais a que se refere o art. 217 da Constituição Federal serão assegurados em programas de trabalho específicos constantes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além dos provenientes de:

I - fundos desportivos;

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II - receitas oriundas de concursos de prognósticos; III - doações, patrocínios e legados;

IV - prêmios de concursos de prognósticos da Loteria Esportiva Federal não reclamados nos prazos regulamentares;

V- incentivos fiscais previstos em lei;

VI - outras fontes;

O art. 56 da lei Pelé tem o mesmo sentido do art. 39 da lei Zico, com algumas pequenas variantes, para referir-se ao fomento das práticas desportivas formais e não-formais, como está redigido no art. 217 da Constituição Federal, enquanto a lei anterior falava em execução da Política Nacional do Desporto. Mera alteração redacional mas com os mesmos objetivo e conceito, posto que em ambas as leis os recursos são provenientes dos poderes públicos que menciona e dos oriundos da discriminação dos incisos I a VI, que são absolutamente os mesmos nas duas leis.

Como bem se vê, são várias fontes de recursos com vultosas somas, cuja arrecadação, fiscalização e aplicação exigem transparência absoluta. Como se constituem os fundos desportivos, previstos no inciso I, e quem os administra? Como se fiscalizam centavo a centavo as receitas oriundas de concursos de prognósticos agasalhadas no inciso II? Como se recolhem os prêmios a que se refere o inciso IV? Como se podem fiscalizar as outras fontes a que se refere o inciso VI?

E o INDESP?A intervenção do Ministério Público seria um bom grau de moralidade. Mas

essa Instituição, que tem o dever constitucional de zelar pela aplicação da lei, foi praticamente excluída desta lei. Tarefa ingente para a Receita Federal e os Tribunais de Contas.

Art. 57. Constituirão recursos para a assistência social e educacional aos atletas profissionais, ex-atletas e aos em formação, recolhidos diretamente para a Federação das Associações de Atletas Profissionais - FAAP:

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I - um por cento do contrato do atleta profissional pertencente ao Sistema Brasileiro do Desporto, devido e recolhido pela entidade contratante;

II - um por cento do valor da multa contratual, nos casos de transferências nacionais e internacionais, a ser pago pela entidade cedente;

III - um por cento da arrecadação proveniente das competições organizadas pelas entidades nacionais de administração do desporto profissional; IV - penalidades disciplinares pecuniárias aplicadas aos atletas profissionais pelas entidades de prática desportiva, pelas de administração do desporto ou pelos Tribunais de Justiça Desportiva.

O art. 57 da lei Pelé trata da matéria que se inscrevia nos arts. 39 a 48 da lei Zico (Capítulo IX), que cuidava integralmente da arrecadação, fiscalização e aplicação Dos Recursos para o Desporto, através da criação do FUNDESP, que era o Fundo Nacional de Desenvolvimento Desportivo, tratando de maneira clara o assunto. Na lei Pelé, com a colocação do INDESP lá no art. 5º, com recursos específicos arrecadados e distribuídos na forma dos arts. 6º e 7º, e outros artigos (56 e 57) para tratar da mesma matéria, qual seja, recursos para o desporto, criou-se uma colcha de retalhos de cetim onde os recursos podem deslizar do pé à cabeceira da cama. Quando se pensar que o dinheiro foi para o art. 7º talvez ele tenha sido destinado ao art. 56 e vice-versa.

A arrecadação e destinação de dinheiro público costuma causar preocupação e especulação. O INDESP já foi objeto de investigação contábil.

Art. 58. (VETADO)

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CAPÍTULO IXDO BINGO

Art. 59. Os jogos de bingo são permitidos em todo o território nacional nos termos desta Lei.

Já admitido pelo art. 57 da lei Zico, o BINGO ficou bem aclarado na lei Pelé, que desenvolveu o seu conceito, estabeleceu direitos e deveres, legalizando, em seu próprio texto, a atividade dessa modalidade de jogo.

Esse é o cassino que pode; o outro não pode. O que obriga a existência de shows, que traz diversões independentes do jogo, que dá empregos para artistas, que traria do exterior milhões de dólares, que impediria a saída do país de milhões de dólares, esse não pode. O jogo é proibido no Brasil em nome da moralidade pública...

Então, voltemos ao cassino que pode.

Em geral em casas bonitas, decoradas e confortáveis, exercem as cartelas o mesmo fascínio que as roletas. Joga-se pelo prazer de jogar, perde-se pela esperança de ganhar, dorme-se para no outro dia retornar. O jogador de Bingo sabe bem da sua importância social. Afinal de contas, sete por cento do que ele perde vai para os cofres de uma entidade desportiva, que assim poderá engrandecer o esporte nacional...

Art. 60. As entidades de administração e de prática desportiva poderão credenciar-se junto à União para explorar o jogo de bingo permanente ou eventual, com a finalidade de angariar recursos para o fomento do desporto.

§1º Considera-se bingo permanente aquele realizado em salas próprias, com utilização de processo de extração isento de contato humano, que assegure integral lisura dos resultados, inclusive com o apoio de sistema de circuito fechado de televisão e difusão de som, oferecendo prêmios exclusivamente em dinheiro.

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§2º (VETADO)

§3º As máquinas utilizadas nos sorteios, antes de iniciar quaisquer operações, deverão ser submetidas à fiscalização do poder público, que autorizará ou não seu funcionamento, bem como as verificará semestralmente, quando em operação.

O art. 60 da lei Pelé tem respaldo no art. 57 da lei Zico. Na lei anterior se exigia que a entidade de prática desportiva fosse filiada a uma entidade de administração do desporto em pelo menos três modalidades esportivas além de participar de competições oficiais organizadas pela mesma, o que a lei atual não exige, mas o inc. VIII do art. 79 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98, determina atuação regular e continuada na prática de pelo menos uma modalidade desportiva; pela lei atual as entidades de prática desportiva se credenciam para exploração do bingo junto à União, determinando o Decreto citado que se requeira ao INDESP ou à Secretaria da Fazenda Estadual respectiva tanto o credenciamento (arts. 75 e 78) quanto a autorização (art. 85); a lei anterior já exigia o credenciamento perante a Secretaria da Fazenda da respectiva Unidade da Federação. Parece-me que a lei Zico era melhor no ponto em que exigia a efetiva prática desportiva em pelo menos três modalidades, uma vez que assim realmente se poderia falar em desenvolvimento do desporto e não de um esporte; parece-me que a lei Pelé é melhor quando exige o credenciamento perante a União, porque assim se terá alguma uniformidade na concessão, na fiscalização e na execução dos fins a que a lei se destina.

Desnecessário comentar o §1º do art. 60. Quem já foi a um cassino de bingo sabe o que este parágrafo está dizendo. Quem ainda não foi, então vá; perca um pouco de dinheiro mas aprenda um pouco de Direito. E em de lá saindo poderá dizer: perdi dinheiro, mas agora eu sei o que significa o §1º do art. 60 da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998.

Ver-se-á, porém, que ao conceituar o que é bingo permanente deixando de conceituar o que é bingo eventual, poderá parecer que as duas modalidades são opostas o que, no todo, não é verdade. No bingo eventual não se exige sala própria para esse fim, podendo a jogatina realizar-se em qualquer dependência da entidade; na casa do Diretor ou do Presidente ou do associado, já é caso de polícia. No bingo eventual já não é proibido o contato humano consoante a lei Pelé. Mas, observe-se bem, é contato humano com o processo extrativo, não é contato humano com outro humano. O contato humano com a máquina vai ser proibido pelo §5º do art. 75 do Decreto já citado. A garantia de lisura, vale dizer, de honestidade, devia ser pressuposto de toda e qualquer atividade humana. Quando se apresenta necessário colocar em lei tal garantia, não sei quem garante a garantia... E, finalmente, se no bingo permanente os prêmios sempre serão em dinheiro, no bingo eventual o prêmio pode ser qualquer, menos dinheiro.

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Quando digo qualquer, estou a dizer qualquer prêmio que não afete os bons costumes, e assim estará salva a moralidade pública.

Ah, ia esquecendo. Quando as casas de bingo permanente oferecem automóveis ao ganhador, isto é só um brinde, porque, como prêmio, a lei não permite...

Se eu ia esquecendo de comentar o acima exposto, acabei por esquecer mesmo de comentar o §3º do art. 60.

Art. 61. Os bingos funcionarão sob responsabilidade exclusiva das entidades desportivas, mesmo que a administração da sala seja entregue a empresa comercial idônea.

Se é para fazer, que se faça bem feito. O art. 61 da lei Pelé, agora combinado com o art. 60, é um dos mais importantes e perfeitos da lei, dando às entidades de prática desportiva a responsabilidade de terem a capacidade de se autofinanciar através do Bingo. É sabido o quanto se pode arrecadar com uma sala de jogo desse tipo. São milhões de dólares anuais em qualquer lugar do mundo. Ora, qualquer entidade de prática desportiva há que ter espaço físico para instalar em sua própria sede uma sala desse tipo. Maior ou menor, dependerá de suas possibilidades, de sua localização, de seu quadro associativo, enfim, de uma gama de fatores envolventes que os empresários do setor e os administradores das entidades haverão de saber concluir para viabilizar sua instalação. Se a entidade de prática desportiva apenas empresta seu nome para que uma empresa, idônea que seja, explore essa fonte de renda, não receberá senão aqueles minguados sete por cento a que alude a lei, ou pouco mais, se o dono da sala de bingo for muito bonzinho. Só que já agora o Decreto nº 2.574, de 29/04/98, que regulamentou a lei, não permite sequer o empresário bonzinho, posto que, ao distribuir, percentualmente, a receita do bingo, estabeleceu que as entidades desportivas ou ligas só receberão sete por cento. E mais: essa atividade, porque legal e social, é uma das melhores fórmulas que a lei permite para aumento de um quadro associativo. Quando os autores do projeto da lei Zico e os Congressistas que o aprovaram legalizaram a exploração do jogo do bingo, fizeram-no porque viram nesse caminho a possível salvação das entidades de prática desportiva. A lei Pelé aperfeiçoou ainda mais o conteúdo da lei anterior e definiu com precisão essa atividade lucrativa. Ora, quando uma entidade de prática desportiva abre mão de ela mesma explorar através de sua própria administração e em seus próprios domínios o filão que representa o jogo do bingo, está em verdade emprestando sua marca para que outrem obtenha os resultados financeiros. O retorno é tão pequeno que não vale a pena a concessão. Valeria o investimento na criação da própria sala, porque, aí sim, o retorno compensa a responsabilidade da entidade e o prestígio da marca.

Não sei quantos dirigentes de entidade de prática desportiva estão debruçados sobre o tema de maneira suficientemente profissional. Mas, sem dúvida, é uma grande

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porta aberta para a salvação de muitos clubes no Brasil. Muitos banqueiros do sistema financeiro prefeririam ser banqueiros de um cassino em Las Vegas. O banco quebra; a banca não quebra jamais.

A lei é nova mas a prática é antiga. Junte-se à antiga prática a nova lei e se terá a redenção financeira de muito clube em dificuldade.

Art. 62. São requisitos para concessão da autorização de exploração dos bingos para a entidade desportiva:

I - filiação a entidade de administração do esporte ou, conforme o caso, a entidade nacional de administração, por um período mínimo de três anos, completados até a data do pedido de autorização;

II - (VETADO)

III - (VETADO)

IV - prévia apresentação e aprovação de projeto detalhado de aplicação de recursos na melhoria do desporto olímpico, com prioridade para a formação do atleta;

V - apresentação de certidões dos distribuidores cíveis, trabalhistas, criminais e dos cartórios de protesto;

VI - comprovação de regularização de contribuições junto à Receita Federal e à Seguridade Social;

VII - apresentação de parecer favorável da Prefeitura do Município onde se instalará a sala de bingo, versando sobre os aspectos urbanísticos e o alcance social do empreendimento;

VIII - apresentação de planta da sala de bingo, demonstrando ter capacidade mínima para duzentas pessoas e local isolado de recepção, sem acesso direto para a sala;

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IX - prova de que a sede da entidade desportiva é situada no mesmo Município em que funcionará a sala de bingo.

§1º Excepcionalmente, o mérito esportivo pode ser comprovado em relatório quantitativo e qualitativo das atividades desenvolvidas pela entidade requerente nos três anos anteriores ao pedido de autorização.

§2º Para a autorização do bingo eventual são requisitos os constantes nos incisos I a VI do caput, além da prova de prévia aquisição dos prêmios oferecidos.

Os incisos I a IX do art. 62 listam as exigências para que a entidade de prática desportiva obtenha autorização para a exploração do jogo do bingo.

Necessariamente, uma entidade de prática desportiva tem que estar filiada a uma entidade de administração do desporto. Para a concessão, contudo, terá que comprovar essa filiação por um período de pelo menos três anos antes do pedido de autorização.

Parte do que a entidade de prática desportiva venha a arrecadar terá que ser destinada à melhoria do desporto olímpico, dando-se prioridade à formação de atletas, daí uma das razões porque já disse e direi sempre que nenhuma entidade de prática desportiva que ao longo de sua história tenha formado atletas deixará de fazê-lo. A mudança da lei não muda a tradição histórica de um clube.

A exigência de certidões elencadas no inciso V me traz algumas dúvidas. Como a lei não fala que tais certidões tenham que ser necessariamente negativas, eu me pergunto se mesmo tendo contra si ajuizadas cem ações cíveis, duzentas trabalhistas, quinhentos títulos protestados pode a entidade de prática desportiva, mesmo assim, obter a autorização para exploração do Bingo. Se pode, desnecessárias as certidões; se não pode, bastaria a lei exigir tais certidões negativas; se depende da análise de alguém ou de algum órgão, qual o critério para conceder ou negar?

E ainda me pergunto: as certidões que se exigem são somente relativas às entidades de prática desportiva ou se referem também a seus dirigentes? Na segunda hipótese, parece-me um exagero, porque qualquer dirigente poderá estar sofrendo um processo cível por ação de despejo em simples caso de retomada de imóvel locado ou mesmo uma reclamação trabalhista movida por qualquer ex-empregado seu, sem que tais ação e reclamação possam representar falta de idoneidade para qualquer cargo ou função. O mais idôneo dos cidadãos não está livre desse tipo de processo. Em se tratando da primeira hipótese, não vejo razão para a exigência da certidão do

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distribuidor criminal. Uma entidade de prática desportiva não pode figurar como ré em processo criminal. Logo...

A comprovação de regularização de contribuições junto à Receita Federal e à Seguridade Social já é um empecilho mais sério. Muitas administrações de entidade de prática desportiva deixam de honrar tais compromissos, diferindo-os para seus sucessores que assim também o fazem e, numa bola de neve, acaba a entidade de prática desportiva com vultosos débitos fiscais, previdenciários e trabalhistas de difícil implemento. Veja-se, porém, que a lei não exige quitação total e imediata. Exige a regularização, isto é, o comprovante de que, se há débitos, estes se encontram ajustados para pagamento futuro.

O parecer favorável da Prefeitura Municipal é uma exigência do seu poder de polícia, não podendo a união impor a um município uma atividade que lhe não convenha, dentro dos dois aspectos do urbanismo e do alcance social mencionados no inciso VII.

A exigência do tamanho da sala é aleatório e o número duzentos foi apanhado no ar. Poderia ser cem como trezentos. E o já mencionado Decreto exige que sejam duzentos lugares para participantes sentados.

Pequenos municípios jamais poderão ter salas de jogo de bingo, pois jamais terão presença de mais de cinquenta pessoas.

A sala de jogo de bingo terá que situar-se no município da sede da entidade de prática desportiva. Por um lado, é salutar a exigência na medida em que prioriza a vitalidade do município que abriga a entidade de prática desportiva; por outro lado, porém, perde a visão da possibilidade de franquias ou mesmo da existência de filiais da empresa concessionária. Há entidades de prática desportiva no Brasil que, embora tenham sua sede em um determinado município, são clubes de expressão estadual e até nacional com fanáticos torcedores espalhados por todo o país. Talvez esses simpatizantes preferissem que uma parte da renda do bingo de sua cidade revertesse para a formação de atletas do clube de seu coração. Não se pode ignorar que a sobrevivência de um clube esportivo está diretamente ligada à existência de seus aficcionados, isto é, de sua torcida. Se se desprezam os torcedores, que valor tem a marca? A massa e a marca são simbiose que, como tal, não se podem separar.

O mérito esportivo pode servir como suplemento para a autorização do jogo do bingo e, quando este for realizado de forma eventual, cumprem-se apenas as exigências elencadas nos incisos I, IV, V e VI e a exigência do parágrafo único do art. 85 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98.

Art. 63. Se a administração da sala de bingo for entregue a empresa comercial,

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entidade desportiva juntará, ao pedido de autorização, além dos requisitos do artigo anterior, os seguintes documentos:

I - certidão da Junta Comercial, demonstrando o regular registro da empresa e sua capacidade para o comércio;

II - certidões dos distribuidores cíveis, trabalhistas e de cartórios de protesto em nome da empresa;

III - certidões dos distribuidores cíveis, criminais, trabalhistas e de cartórios de protestos em nome da pessoa ou pessoas físicas titulares da empresa;

IV - certidões de quitação de tributos federais e da seguridade social;

V - demonstrativo de contratação de firma para auditoria permanente da empresa administradora;

VI - cópia do instrumento do contrato entre a entidade desportiva e a empresa administrativa, cujo prazo máximo será de dois anos, renovável por igual período, sempre exigida a forma escrita.

O art. 63 é de cunho meramente empresarial, listando o que a entidade de prática desportiva terá que comprovar, além das exigências do art. 62, caso prefira repassar a terceiros o seu direito de exploração do jogo do bingo. É matéria de ordem administrativa, com seus aspectos comercial e tributário, enfim, matéria do Direito Societário, nada tendo a ver com o Direito Desportivo, propriamente dito.

Art. 64. O Poder Público negará a autorização se não provados quaisquer dos requisitos dos artigos anteriores ou houver indícios de inidoneidade da entidade desportiva, da empresa comercial ou de seus dirigentes, podendo ainda cassar a autorização se verificar terem deixado de ser preenchidos os mesmos requisitos.

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Considerando que a exploração do jogo depende de autorização do Poder Público, nos termos da lei, exerce a União o seu poder de polícia na verificação do cumprimento das exigências legais para a concessão. E vai mais além: a fim de evitar que entidades esportivas, empresas comerciais e dirigentes idôneos sejam usados como laranjas para se obter a concessão e depois sejam substituídos por inescrupulosos exploradores do jogo do bingo, reserva-se a União o poder, eu diria o dever, de cassar a autorização se verificar terem deixado se ser preenchidos aqueles requisitos.

Art. 65. A autorização concedida somente será válida para local determinado e endereço certo, sendo proibida a venda de cartelas fora da sala de bingo.

Parágrafo único. As cartelas de bingo eventual poderão ser vendidas em todo o território nacional.

O caput do art. 65 se refere ao bingo permanente, nos termos do §1º do art. 60 e dos incisos VII e IX do art. 62. Já o bingo eventual, consoante o par. único, poderá ter suas cartelas vendidas em todo o território nacional. Por isso que sustentamos acima que as entidades de prática desportiva que, embora locais, tenham repercussão nacional, poderão encontrar na exploração direta e não concedida do jogo do bingo a sua salvação financeira. Uma entidade de prática desportiva desse porte, com marca nacional e competência publicitária, poderá realizar um ou dois bingos eventuais por ano e, certamente, em cada qual, venderá milhões de cartelas. Com cartelas de valores diferentes para prêmios variados, terá a garantia de não precisar desfazer-se de seu patrimônio, móvel nem imóvel. Muito menos ter que vender seus escravos... Basta, portanto, competência empresarial para que não se lamente a concessão do passe livre aos atletas profissionais de futebol e muito menos a falta de recursos para formação de atletas nas categorias de base.

Art. 66. (VETADO)

Art. 67. (VETADO)

Art. 68. A premiação do bingo permanente será apenas em dinheiro, cujo

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montante não poderá exceder o valor arrecadado por partida.

Parágrafo único. (VETADO)

O art. 68 é claro e dispensa comentários. Contrario sensu, o bingo eventual poderá ter qualquer premiação, exclusivamente em bens e serviços, conforme determina o §5º do art. 75 do Dec. 2.574/98. Dinheiro não pode, nem premiação que contrarie os bons costumes e a moralidade pública.

Art. 69. (VETADO)

Art. 70. A entidade desportiva receberá percentual mínimo de sete por cento da receita bruta da sala de bingo ou do bingo eventual.

Parágrafo único. As entidades desportivas prestarão contas semestralmente ao poder público da aplicação dos recursos havidos dos bingos.

Ao permitir que a entidade de prática desportiva sub-rogue o seu direito de explorar o jogo do bingo, a lei o faz admitindo a incompetência ou o desinteresse na exploração direta. Nesse caso, a empresa comercial concessionária derivada terá que reverter à entidade de prática desportiva sete por cento de sua receita bruta. E a lei certamente faz incidir o percentual sobre a receita bruta para evitar que a entidade de prática desportiva tenha que exercer fiscalização contábil para apuração da receita líquida, pois quem renuncia à exploração de tão rentável mercadoria que é o jogo de bingo demonstra desinteresse ou incompetência. Enfim, falta de visão empresarial. E como as entidades de prática desportiva serão obrigadas a transformar-se em empresas, nos termos da presente lei, fica difícil compreender que uma empresa entregue a outra a exploração de tão bom segmento do seu negócio, obtendo de retorno um percentual irrisório de apenas sete por cento.

Veja-se ainda que, pelo par. único, as entidades de prática desportiva ficam obrigadas a prestar contas ao poder público da receita auferida através do bingo e da aplicação desses recursos, os quais só podem ser destinados ao fomento do esporte. Como já dissemos e repetimos: recursos não faltarão para a formação de atletas pelas entidades de prática desportiva. Pode faltar competência.

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Art. 71. (VETADO)

§1º (VETADO)

§2º (VETADO)

§3º (VETADO)

§4º É proibido o ingresso de menores de dezoito anos nas salas de bingo.

O §4º do art. 71, cujo caput foi vetado, é claro e dispensa comentários. Menores de dezoito anos não podem entrar em sala de bingo assim como não podem tomar bebidas alcoólicas em público...

Como o caput do artigo 71 foi vetado, juntamente com três outros parágrafos, parece-me que teria sido melhor que esse §4º se transformasse em um artigo independente. Não se pode separar, sem mutilar, uma parte do corpo de sua cabeça. Ora, o sinal gráfico representativo de parágrafo é a configuração de duas letras S que significam Signum Sectionis, e não se pode seccionar o inteiro que não existe. O Decreto que regulamentou a Lei corrigiu esse defeito de técnica legislativa e copiou literalmente esse equivocado §4º, transformando-o em seu art. 101.

Art. 72. As salas de bingo destinar-se-ão exclusivamente a esse tipo de jogo.

Parágrafo único. A única atividade admissível concomitantemente ao bingo na sala é o serviço de bar ou restaurante.

Parecem-me claros tanto o caput do art. 72 quanto seu par. único. Observa-se, contudo, que algumas ou muitas entidades de prática desportiva, por si ou por delegação, além do jogo do bingo também exploram nos mesmos locais o jogo de azar através de máquinas eletrônicas. Quando a lei fala em sala de bingo está falando de todo o aparato arquitetônico em que se instalam tais salas. Não admite a lei divisão de espaço físico para, sob amparo legal, falar-se em exploração do jogo do bingo e no mesmo local, no mesmo prédio, em sala contígua ou separada da sala de bingo, instalarem-se máquinas eletrônicas para exploração de outro tipo de jogo. E a lei é clara nesse sentido e enfatiza ainda mais tal proibição nos termos do artigo seguinte e do art. 103 do Decreto nº 2.574, de 29/04/98. Parece-me, pois, que alguma coisa está errada.

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Art. 73. É proibida a instalação de qualquer tipo de máquinas de jogo de azar ou de diversões eletrônicas nas salas de bingo.

Retomem-se os comentários ao art. 72 e seu par. único e se verá que, com o advento da presente lei, as entidades de prática desportiva que exploram o jogo do bingo, diretamente ou através de empresa outra, terão que se adaptar e excluir de suas salas de bingo as máquinas eletrônicas, popularmente conhecidas como caça-níqueis.

Art 74. Nenhuma outra modalidade de jogo ou similar, que não seja o bingo permanente ou o eventual, poderá ser autorizada com base nesta Lei.

Parágrafo único. Excluem-se das exigências desta Lei os bingos realizados com fins apenas beneficentes em favor de entidades filantrópicas federais, estaduais ou municipais, nos termos da legislação específica, desde que devidamente autorizados pela União.

Como já dito anteriormente, a lei Pelé aperfeiçoou grandemente a lei Zico no capítulo relativo ao jogo do bingo. E a lei ora em exame é específica para o desporto, tornando-se evidente que, com base nesta lei, nenhuma outra modalidade de jogo poderá ser autorizada. Só se pode autorizar o jogo do bingo e mesmo assim com as exigências impostas pela lei. Fora disso, é desvirtuar o objetivo da lei que é o fomento do desporto.

Os bingos admitidos pelo par. único já tinham previsão legal.

Art. 75. Manter, facilitar ou realizar jogo de bingo sem a autorização prevista nesta Lei.

Pena - prisão simples de seis meses a dois anos, e multa.

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Aqui começa o tratamento das possibilidades ilegais que se caracterizam como crime. São definidos os tipos que se enquadram na perseguição penal. Parece-me que esta parte da lei (arts. 75 a 81) deveria compor um capítulo próprio. A prática de qualquer desses crimes há que ser julgada nos parâmetros da presente lei, porque especial, embora alguns dos crimes aqui previstos já estejam configurados no Código Penal.

Permito-me, de antemão, dizer que sou contrário, como estudioso do Direito Criminal, à banalização da pena de prisão. Penso que esta forma de condenação deveria ser reservada exclusivamente para aqueles criminosos que devessem ser segregados do convívio social por absoluta impossibilidade de sua coexistência com os seus semelhantes, dos quais ele, o criminoso, se apartou por opção de vida. Faço este comentário preliminar para justificar os comentários subsequentes.

Preliminarmente, cumpre observar que todos os crimes elencados na lei se subsumem às duas penas, cumulativamente: prisão e multa. Parece-me que seria de melhor política criminal que se apresentassem as sanções alternativamente, prisão ou multa, deixando o legislador ao critério do Juiz aplicar uma ou outra no caso de condenação. E digo que seria de melhor política criminal porque pode o Juiz, diante de um determinado fato típico, antijurídico e culpável, entender que deva proferir sentença condenatória. Mas pode esse mesmo Juiz, diante de um acusado que se apresente, por seu passado, como um homem de bem, prestante à sociedade, entender que não é justo segregar este homem através de uma pena de prisão. Ocorre que o Juiz não faz a lei; ele a cumpre. E, nos casos previstos na presente lei, o Juiz, se condenar, terá que proferir sentença condenando o réu nas duas penas: prisão e multa. Em hipóteses que tais, por considerar que a pena de prisão é injusta, embora considerasse justa a pena de multa, o Juiz optará pela absolvição, já que não lhe é permitido proferir uma sentença condenatória cuja execução ele mesmo considere injusta, por excessiva. Esta crítica, portanto, se aplica a todas as penas inseridas nestes artigos.

Compreendo quando a sociedade anseia por que acusados de alguma prática ilícita, com repercussão na mídia, sejam levados à cadeia. Esta é uma reação natural das pessoas de bem que não admitem que esses crimes fiquem impunes. Porém, muitas vezes mais importante que o aprisionamento do autor do ato ilícito é a reparação dos danos causados às suas vítimas. Ante a possibilidade de se verem aprisionados e ainda serem condenados ao ressarcimento, estes acusados se utilizam de todos os recursos legais para o retardamento do processo contando com que o decurso do tempo atenue sua pena ou mesmo possa extingui-la. Se se propugnasse pela imediata indenização, até como atenuante da apenação criminal, talvez o objetivo social fosse melhormente atingido. E muitas vezes a sociedade deseja a condenação de quem não pode ser penalmente condenado simplesmente porque o Direito Criminal não admite a responsabilidade objetiva, como veremos ao comentar o teor do art. 80.

Estabelecidas estas premissas como preliminar, veja-se que o art. 75 define como crime a manutenção, facilitação ou realização do jogo de bingo sem a autorização prevista na lei. Isto porque, nesse caso, a realização de qualquer jogo será considerada ilegal se não se ativer aos casos de autorização previstos em lei, já que no Brasil o jogo é ilegal... E nos casos de que trata a presente lei, tal prática é crime e não apenas

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contravenção. Daí o grau da pena, sobre a qual já falamos e contra a qual nos insurgimos.

Art. 76. (VETADO)

Art. 77. Oferecer, em bingo permanente ou eventual, prêmio diverso do permitido nesta Lei.

Pena - prisão simples de seis meses a um ano, e multa de até cem vezes o valor do prêmio oferecido.

É evidente que se a lei determina uma forma de premiação, não se pode oferecer prêmio diverso do previsto em lei. Ao comentarmos o art. 68, fizemos ver que a premiação do bingo permanente só pode ser em dinheiro mas, a contrario seusu, fizemos ver também que, não havendo a lei determinado forma específica de premiação para o bingo eventual, qualquer prêmio poderia ser ofertado ao ganhador, desde que respeitados os limites dos bons costumes e da moralidade pública. Quando, agora, o art. 77 diz que é crime oferecer prêmio diverso do permitido por esta lei, em bingo permanente ou eventual, eu me pergunto: qual a forma de premiação prevista na lei para o bingo eventual? E eu respondo: não há. Como então poderá a entidade de prática desportiva oferecer prêmio diverso se, para o bingo eventual, a lei não prevê a modalidade de premiação? Diante dessa ambiguidade, pelo confronto dos arts. 77 e 68, pode, nesse ponto, alguém ir para a cadeia?

Este trabalho, como já dito, não foi escrito de uma só penada. Após estas considerações críticas, foi editado o Decreto n° 2.574, de 29/04/98, que regulamentou a chamada lei Pelé, nos arts. 75, §5º e 85, inciso IV e seu parágrafo único, determinando a forma de premiação do bingo eventual, que só pode ser em bens e serviços.

Fiz questão de manter os comentários à lei elaborados antes da promulgação do

Decreto para mostrar como é importante a perenidade das leis e o quanto é difícil, ao jurista, falar sobre leis em uma sociedade de tanta insegurança legislativa, onde até já se disse que a Constituição Federal não passa de um periódico.

Art. 78. (VETADO)

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Art. 79. Fraudar, adulterar ou controlar de qualquer modo o resultado do jogo de bingo:

Pena - reclusão de um a três anos, e multa.

Aqui se tem o âmago do cometimento criminoso no jogo do bingo, como em qualquer outro jogo: a fraude, a adulteração ou o controle do resultado. A intencionalidade aqui é evidente e o elemento subjetivo do agente é manifesto. Porque mais grave o crime, mais severa a pena. Haverá, contudo, situações em que, mesmo neste tipo legal, será difícil comprovar a autoria e, para melhor aclarar esta dificuldade, remeto o amigo leitor aos comentários do art. 80, onde a individualização do agente é ainda mais delicada.

Art 80. Permitir o ingresso de menor de dezoito anos em sala de bingo:

Pena - detenção de seis meses a dois anos, e multa.

Aqui se terá o grau de dificuldade para se determinar quem é o agente. O responsável imediato pelo ingresso dos apostadores à sala de bingo é o porteiro, isto é, o responsável pelo acesso à sala de jogo. O responsável mediato é a entidade de prática desportiva ou a empresa que administra a sala de bingo. Como as pessoas jurídicas não podem cometer crimes, os responsáveis são os dirigentes da entidade de prática desportiva e os sócios da empresa. Como se poderá afirmar com absoluta certeza, pois só a certeza absoluta pode levar o Juiz a proferir uma condenação criminal, qual ou quais sejam os responsáveis pelo ingresso de menor na sala de bingo? Pode ser o porteiro que consciente e voluntariamente o permitiu ou, involuntariamente, porque se deixou enganar no tumulto de muitos frequentadores ingressando ao mesmo tempo. Podem ser os dirigentes da entidade de prática desportiva ou os sócios da empresa que, na ânsia de maior frequência e melhores lucros, deram ordem nesse sentido ao responsável pela portaria. Se todos negam sua responsabilidade, difícil será a prova no sentido condenatório. Como condenar o dirigente ou o empresário se o porteiro, por exemplo, se deixou subornar mas do suborno não se tem prova? Qual a

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responsabilidade, num caso desses, do empresário ou dirigente? Por outro lado, se os próprios dirigentes ou empresários emitem ordem nesse sentido, como poderá o porteiro recusar-se a cumpri-la? Será demitido e outro o fará. Como se vê, a singularidade dos tipos criminais previstos na lei poderia levar o Juiz a uma sentença que condenasse à pena de multa mas não a uma pena de prisão.

Art 81. Manter nas salas de bingo máquinas de jogo de azar ou diversões eletrônicas:

Pena - detenção de seis meses a dois anos, e multa.

O art. 81 é claro e sobre esse tema já falamos um pouco antes. Só que a lei já está em vigor e esse artigo independe de qualquer regulamentação ou do decurso de qualquer prazo. Os responsáveis por algumas salas de bingo precisam apressar-se e retirar tais maquininhas de suas salas ou então...

CAPÍTULO XDISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 82. Os dirigentes, unidades ou órgãos de entidades de administração do desporto, inscritas ou não no registro de comércio, não exercem função delegada pelo Poder Público, nem são consideradas autoridades públicas para os efeitos desta Lei.

O art. 82 da lei Pelé é uma adaptação do art. 49 da lei Zico. É evidente que as pessoas físicas ou jurídicas mencionadas não podem ser consideradas autoridades públicas nem mesmo suas funções são delegadas.

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Art. 83. As entidades desportivas internacionais com sede permanente ou temporária no País receberão dos poderes públicos o mesmo tratamento dispensado às entidades nacionais de administração do desporto.

O art. 83 da lei Pelé é cópia fiel do art. 51 da lei Zico. É natural que entidades desportivas internacionais que se instalem, permanente

ou temporariamente no Brasil, recebam o mesmo tratamento dispensado às entidades nacionais de administração do desporto. Em princípio, a regra é no sentido da colaboração e se não se deve dar mais não se justifica que se dê menos.

Em verdade, o Direito Internacional consagra este tratamento com base no princípio da reciprocidade.

Creio, pois, que a lei deveria ter acrescentado a exigência de as entidades brasileiras receberem o mesmo tratamento quando no exterior.

Art. 84. Será considerado como de efetivo exercício, para todos os efeitos legais, o período em que o atleta servidor público civil ou militar, da Administração Pública direta, indireta, autárquica ou fundacional, estiver convocado para integrar representação nacional em competição desportiva no País ou no exterior.

§1º O período de convocação será definido pela entidade nacional da administração da respectiva modalidade desportiva, cabendo a esta ou aos Comitês Olímpico e Paraolímpico Brasileiros fazer a devida comunicação e solicitar ao Ministério Extraordinário dos Esportes a competente liberação do afastamento do atleta ou dirigente.

§2º O disposto neste artigo aplica-se, também, aos profissionais especializados e dirigentes, quando indispensáveis à composição da delegação.

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O caput do art. 84 e seu §2º da lei Pelé são cópia fiel do caput e do §2º do art. 52 da lei Zico, enquanto o §1º daquela é adaptação do §1º desta.

É absolutamente necessário o previsto neste artigo de lei. O servidor público estará a serviço da sociedade, isto é, do contribuinte, seja enquanto presta seu trabalho regular seja quando representa o desporto nacional em competições internacionais. Como servidor público, sua substituição não será difícil. Como atleta, poucos conseguem representar a elite em qualquer modalidade desportiva. Se se concede tal privilégio aos Auditores dos Tribunais de Justiça Desportiva, com muito mais razão se há de concedê-lo aos atletas nestas circunstâncias.

Se a lei andou bem no enunciado do caput, não posso dizer o mesmo quanto ao §1º. Este trabalho não foi escrito de um só jato e, entre o tempo em que fizemos os comentários ao art. 4º da presente lei e o momento atual, em que estamos a comentar o §1º do art. 84 da lei Pelé, ocorreu o que prevíamos àquela época: o Ministério Extraordinário dos Esportes foi extinto. Ou foi extinto porque era extra...ordinário ou foi extinto porque seu titular era tão extraordinário que não se lhe poderia dar um sucessor. Esta segunda hipótese me parece aberrante e grosseira para com seus antecessores na Secretaria de Desportos do Ministério da Educação e dos Desportos.

Enfim, como eu dizia naquela oportunidade, o perigo da presente lei, naquele passo, está exatamente nas possibilidades de manipulação política que ela permite.

E agora? A quem se vai fazer a devida comunicação e a quem se vai solicitar a competente liberação do afastamento do atleta ou dirigente, segundo a exigência desse parágrafo, se o Ministério já não existe?

Aí, o Decreto nº 2.574, em seu art. 108, §1º, determinou:

Art. 108 - §1º O período de convocação será definido pela entidade

nacional da administração da respectiva modalidade desportiva, cabendo a esta ou aos Comitês Olímpico e Paraolímpico Brasileiros fazer a devida comunicação e solicitar ao titular do Ministério a que estiver vinculado o INDESP a competente liberação do afastamento do atleta ou dirigente.

E até agora não se sabe a que Ministério o INDESP está subordinado... Ao Ministério da Educação e dos Desportos, desde já, ou ao Ministério Extraordinário dos Desportos quando o Pelé voltar?

Ou, talvez, até quem sabe ao Ministério da Indústria, Comércio e Turismo...

E se o Presidente da República realmente já admitiu a recriação do Ministério Extraordinário dos Esportes após a recreação profissional de seu antigo titular, parece-me que até por boa oportunidade política o Ministério deveria de pronto ser recriado, ainda que com a nomeação temporária ou interina de um Ministro.

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Felizmente para o desporto nacional, já agora em segundo mandato, o Presidente da República descobriu que no Brasil existem outros desportistas tão extraordinários quanto o antigo Ministro e recriou o Ministério dos Esportes, encontrando na figura de RAFAEL GRECA o homem certo para o lugar certo. A excelência do Ministro GRECA se vê de pronto na nomeação do não menos extraordinário desportista MANOEL TUBINO para a presidência do INDESP. Felizmente para o desporto o apelo para a recriação do Ministério dos Esportes foi atendido.

Veja o caro leitor que estamos mantendo comentários da primeira edição para demonstrar que propugnamos pelo melhor para o desporto brasileiro.

O §2º do art. 84 da lei Pelé dispensa comentários. Estende aos profissionais especializados e dirigentes o mesmo tratamento que no caput é dado aos atletas.

Art. 85. Os sistemas de ensino da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como as instituições de ensino superior, definirão normas específicas para verificação do rendimento e o controle de freqüência dos estudantes que integrarem representação desportiva nacional, de forma a harmonizar a atividade desportiva com os interesses relacionados ao aproveitamento e à promoção escolar.

O art. 85 da lei Pelé é cópia fiel do art. 53 da lei Zico.Como o artigo depende de regulamentação pela União e pelos Estados, Distrito

Federal e Municípios, cada qual definindo como se fará a harmonia mencionada entre a prática desportiva e o aproveitamento escolar, cada qual poderá organizar-se de maneira diversa, de modo que as definições é que deverão merecer comentários já que o artigo de lei é claro. Penso que, no que pertine à matéria, os sistemas de ensino deveriam, e a própria lei já o poderia ter feito, abonar as faltas às aulas dos atletas que menciona, do mesmo modo como faz com os funcionários públicos. Às vezes, o aproveitamento do estudante independe de sua frequência à sala de aula. Um atleta brasileiro com curso completo de inglês e diploma de uma universidade inglesa ou americana precisa de frequência absoluta às aulas de inglês em curso universitário de Letras?

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Art. 86. É instituído o Dia do Desporto, a ser comemorado no dia 23 de junho, Dia Mundial do Desporto Olímpico.

Pela lei Pelé, o dia 23 de junho é o dia do desporto, por ser o dia mundial do desporto olímpico; pela lei Zico (art. 54), o dia 19 de fevereiro era o dia do desporto, sem que a lei dissesse porquê.

Art. 87. A denominação e os símbolos de entidade de administração do desporto ou prática desportiva, bem como o nome ou apelido desportivo do atleta profissional, são de propriedade exclusiva dos mesmos, contando com a proteção legal, válida para todo o território nacional, por tempo indeterminado, sem necessidade de registro ou averbação no órgão competente.

Parágrafo único. A garantia legal outorgada às entidades e aos atletas referidos neste artigo permite-lhes o uso comercial de sua denominação, símbolos, nomes e apelidos.

O art. 87 e seu par. único da lei Pelé são cópia quase fiel do art. 55 e seu par. único da lei Zico. E eu disse quase fiel porque a lei Pelé dá essa garantia também ao nome ou apelido desportivo do atleta profissional, o que a lei Zico não contemplava.

Bem analisando a matéria, vislumbra-se de pronto a importância da proteção legal a essas entidades para sua denominação e seus símbolos, porque estes são a representação da marca. Independe de registro ou averbação. Quando a lei diz no órgão competente, me parece uma teratologia legislativa porque, se a garantia é dada pela própria lei, não existe órgão com competência para assegurar tal garantia.

Quanto a essas entidades, o que pode ocorrer como situação problemática é o surgimento de uma entidade com nome igual ao de entidade já existente. O fato se resolve com a pura e simples mudança do nome da segunda entidade. Mas se aquela preexistente não denuncia o fato e a subsequente adquire expressão de grandeza tal que torne seu nome uma marca de razoável prestígio, parece a mim que a denunciação após esse fato consumado pode representar um enriquecimento indevido. Daí porque me parece necessário que haja uma eficiente fiscalização pelas entidades de administração do desporto a fim de evitar a superposição de nomes ou símbolos entre entidades desportivas.

Quando a lei Pelé dá essa mesma garantia aos atletas profissionais quanto a seus nomes e apelidos esportivos, o que a lei Zico não sancionava, parece-me que há

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uma primeira injustiça com os atletas amadores. Um atleta amador de ginástica olímpica, por exemplo, de carreira curtíssima, pode ter uma tal consagração que seu nome possa representar uma extraordinária força de marketing, como ocorreria, por exemplo, se um atleta brasileiro de ginástica olímpica conquistasse a medalha de ouro em uma olimpíada. Admitindo que esse atleta, mesmo tendo o apoio de algum patrocinador, fosse um atleta amador, porque não lhe dar a mesma garantia legal para exploração de seu nome como marca comercial?

Por outro lado, parece-me que também quanto aos nomes e apelidos de atletas profissionais podem surgir problemas ou injustiças. Com o apelativo PELÉ, que é uma marca, ou com o apelativo ZICO, que também é uma marca, não há problema. Ambas as marcas estão protegidas por força desta lei. E cito apenas os dois apelativos porque seus apelidos se insculpiram indeléveis no cenário desportivo nacional e internacional e também porque sempre citados ao longo deste trabalho. Outros há, porém.

Mas quando o nome ou apelido desportivo é comum a vários atletas de uma mesma geração ou de gerações distintas, a quem pertencerá a exploração do nome, isto é, da marca? Insisto em não querer citar nomes, mas no futebol de hoje, por exemplo, há vários atletas profissionais com o mesmo nome, alguns até tendo que acrescer, como apelativo, o nome de sua cidade ou estado de origem ou ainda um apelido qualquer que o diferencie de seus homônimos.

Essa garantia da marca será dada ao que primeiro a utilizou ou ao que lhe deu maior prestígio? Na primeira hipótese, a partir de quando se considerará aquele nome como marca daquele atleta? No segundo caso, qual o grau de aferição para conferir a marca a este ou àquele?

Silencio, porque não sei responder.

Aliás, porque não se dar tal garantia também a técnicos cujos nomes são uma marca? E porque não a roupeiros famosos como BABÃO e XIMBICA?

Art. 88. Os árbitros e auxiliares de arbitragem poderão constituir entidades nacionais e estaduais, por modalidade desportiva ou grupo de modalidades, objetivando o recrutamento, a formação e a prestação de serviços às entidades de administração do desporto.

Parágrafo único. Independentemente da constituição de sociedade ou entidades, os árbitros e seus auxiliares não terão qualquer vínculo empregatício com as entidades desportivas diretivas onde atuarem, e sua remuneração como autônomos exonera tais entidades de quaisquer outras responsabilidades trabalhistas, securitárias e previdenciárias.

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O caput do art. 88 da lei Pelé é cópia fiel do caput do art. 58 da lei Zico, enquanto o par. único da primeira é cópia quase fiel, com pequena alteração, do par. único do citado artigo da lei Zico.

Penso que a idéia é boa. Seriam assim formadas empresas prestadoras de serviço que alcançariam maior ou menor prestígio em função de suas atuações tão próximas do modelo de exatidão quanto possível. Querer que os árbitros não errem é querer que sejam superiores à própria natureza humana. Muitos erros cometidos por árbitros na era da eletrônica também são cometidos por comentaristas esportivos às vezes até em posição mais privilegiada. A dúvida só é desfeita depois de várias repetições do mesmo lance. E o árbitro tem às vezes que decidir de pronto sem ter quem ou o quê o auxilie. Mesmo quanto a determinados lances, onde entra a faixa da interpretação subjetiva, comentaristas acharão que a decisão do árbitro foi a melhor enquanto outros dirão que não, embora o lance seja absolutamente o mesmo. Portanto, errar está na natureza humana. O juiz de tênis, por exemplo, se tiver dúvida, poderá desfazê-la numa quadra de saibro, o que já não acontecerá em outro tipo de quadra. Na antiguidade se admitia que o lince pudesse ver através das paredes. Talvez fosse o caso de contratá-los para decidir um lance em que um atleta se interponha à visão do árbitro.

Portanto, essas associações de árbitros acabariam por definir-se como de boa ou má qualidade em função das atuações de seus componentes, conforme a quantidade de erros e acertos, principalmente nos lances cruciais, que definam o resultado de uma partida ou mesmo de uma competição inteira. O bom nome da associação estará indissoluvelmente ligado a essas atuações. A partir daí, quanto maior a credibilidade de uma associação de árbitros, quanto maior o seu prestígio tanto maior será a contrapartida da remuneração a ser fixada para atuação de seus membros. Recuso-me a crer na existência de árbitros desonestos; se existem, não me contem. A própria função que exerce o árbitro, até há pouco chamado mesmo de juiz, não lhe permite a contrafação do canalha ou do pusilânime.

O disposto no par. único é consequência da própria autonomia das associações de árbitros e auxiliares de arbitragem assim constituídas.

Art. 89. Em campeonatos ou torneios regulares com mais de uma divisão, as entidades de administração do desporto determinarão em seus regulamentos o princípio do acesso e do descenso, observado sempre o critério técnico.

O art. 89 da lei Pelé é cópia fiel do art. 59 da lei Zico.

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Essa é a prática mais salutar. No caso das ligas, porém, penso que outros critérios, além do técnico, podem ser adotados, como já expusemos nos comentários aos arts. 20 e 21.

Art. 90. É vedado aos administradores e membros de conselho fiscal de entidade de prática desportiva o exercício de cargo ou função em entidade de administração do desporto.

O art. 90 da lei Pelé é cópia fiel do art. 60 da lei Zico.Tem a lei o objetivo da moralidade desportiva. Haveria sempre de pairar

alguma dúvida, menor que fosse, sobre a lisura de atos praticados por membro de entidade de administração do desporto se, simultaneamente, fosse ele membro também da administração ou do conselho fiscal da entidade de prática desportiva.

CAPÍTULO XIDISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Art. 91. Até a edição dos Códigos da Justiça dos Desportos Profissionais e Não-Profissionais continuam em vigor os atuais Códigos, com as alterações constantes desta Lei.

O art. 91 da lei Pelé é adaptação do art. 66 da lei Zico.Como a lei não dá prazo para a edição dos Códigos da Justiça dos Desportos,

os vigorantes permanecem, com as alterações de pronto impostas pela presente lei.O art. 91 da Lei nº 9.615/98 mantém vigentes os atuais Códigos da Justiça

Desportiva, até que novos códigos sejam elaborados para cada modalidade desportiva. Evidentemente, a lei atual se sobrepõe aos códigos existentes, pela hierarquia das leis, e, naquilo em que um código possa conflitar com a legislação desportiva atual, prevalece a Lei e não o Código. O CBDF- Código Brasileiro Disciplinar de Futebol já está sendo revisto por uma comissão para sua atualização e adaptação aos termos da Lei nº 9.615/98

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Art. 92. Os atuais atletas profissionais de futebol de qualquer idade, que, na data de entrada em vigor desta Lei, estiverem com passe livre, permanecerão nesta situação, e a rescisão de seus contratos de trabalho dar-se-á nos termos dos arts. 479 e 480 da C.L.T.

Esse artigo não tem similar na lei Zico, que não tratou da liberdade de passe do atleta profissional de futebol. Aqui a lei não diz nada. Ou melhor, ela diz que o que era continua sendo.

Art. 93. O disposto no §2º do art. 28 somente entrará em vigor após três anos a partir da vigência desta Lei.

A lei estabelece aqui o prazo fatal, ou seja, o dia 24 de março de 2001, para que seja finalmente abolida a escravatura no Brasil. Chegou tarde, mas finalmente chegou. Este é o anseio de tantos quantos sabem respeitar a dignidade do ser humano, porque gado a gente marca, tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente, disse o poeta Geraldo Vendrées.

Em emocionante e emocionado discurso, na sessão do dia 15 de maio de 1957, perante a Câmara dos Deputados, que votaria a Resolução 115/57 para que a Casa concedesse licença para procedimento criminal contra o Deputado CARLOS LACERDA, defendeu-se ele pessoalmente certo de que a decisão lhe seria desfavorável, posto que o pedido se assentava em imputar-lhe crime de opinião na sua função de jornalista, e a decisão seria política, interessando ao Governo, ao qual fazia oposição ferrenha, como incansável líder da minoria.

LACERDA fez então apelo aos Srs. Deputados para que dessem andamento aos projetos por ele apresentados, enumerando-os, dentre os quais eu destaco, neste trecho do discurso:

Projeto n° 2.267, deste ano - regula as relações de emprego entre atletas profissionais de futebol e os clubes para extinguir essa condição de escravo em que tais profissionais ainda se encontram no Brasil, objeto de negócios feitos à custa da sua curta e imprevista vida profissional.

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Isto foi dito por ninguém menos que CARLOS LACERDA, já em 1957.E o artigo (ainda então sem número) do projeto, dizia:

Art. Fica abolido o "passe".§ Entende-se por "passe" a importância devida por um empregador a outro, pela cessão do atleta, haja ounão expiração do contrato.

Passados mais de quarenta anos, quase meio século, e ainda há quem deseje que a escravidão continue.

Art. 94. As entidades desportivas praticantes ou participantes de competições de atletas profissionais terão o prazo de dois anos para se adaptar ao disposto no art. 27.

O art. 27 é o que obriga as entidades de prática desportiva a se transformarem em empresas ou delegarem a exploração comercial de seu esporte a uma empresa. Para o cumprimento de tal obrigação, a lei concede um prazo de dois anos. Portanto, corram. Quem sair primeiro ganha a corrida.

Art. 95. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Esta lei entrou em vigor no dia 25 de março de 1998.

Art. 96. São revogados, a partir da vigência do disposto no §2º do art. 28 desta Lei, os incisos II e V e os §§1º e 3º do art. 3º, os arts. 4º, 6º, 11 e 13, o §2º do art.15, o parágrafo único do art. 16 e os arts. 23 e 26 da Lei nº 6.354, de 2 de setembro de 1976; são revogadas, a partir da data de publicação desta Lei, as Leis

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nºs 8.672, de 6 de julho de 1993, e 8.946, de 5 de dezembro de 1994.

Quando uma lei abrangente de uma determinada matéria entra em vigor, manda a técnica legislativa que outras leis que tratem do mesmo assunto sejam revogadas, no todo ou em parte. De preferência explicitamente porque senão a revogação será implícita, o que pode gerar dúvidas quanto à aplicação da lei no tempo. No caso presente, em que buscamos apenas um estudo de legislação comparada entre a lei anterior, chamada de LEI ZICO, e a lei atual, LEI PELÉ, vê-se que esta revoga aquela, na sua integralidade. Assim, deixa de existir a lei Zico e passa a existir apenas a lei Pelé e, até que esta seja revogada por outra, o desporto nacional será regulado pela lei Pelé. Não me parece justo. Não me parece justo que a lei atual leve apenas o apelativo PELÉ quando acabamos de demonstrar que aproximadamente 80% (oitenta por cento) da lei atual é cópia fiel, ou próxima ou adaptação da lei anterior.

Uma lei científica, Lei de BOYLE-MARIOTTE, ficou conhecida com o nome dos dois pesquisadores. Portanto, se se quiser dar um nome mais justo à atual lei dos desportos no Brasil, que seja ela a simbiose dos nomes dos dois extraordinários desportistas, que honraram suas carreiras e sua Pátria, e que se lhe dê, como fiz em meu arquivo de computador, o apelativo de LEI PELÉ-ZICO.

Brasília, 24 de março de 1998; 177º. da Independência e 110º. da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Iris Rezende Pedro Malan Paulo Renato Souza Paulo Paiva Reinhold Stephanes Edson Arantes do Nascimento

(ÍNTEGRA DA LEI ZICO)

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LEI Nº. 8.672, DE 6 DE JULHO DE 1993

Institui normas gerais sobre desportos e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICAFaço saber que o Congresso Nacional decreta e eu

sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO IDAS DISPOSIÇÕES INICIAIS

Art. 1º O desporto brasileiro abrange práticas formais e não-formais e obedece às normas gerais desta Lei, inspirado nos fundamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito.

§1º A prática desportiva formal é regulada por normas e regras nacionais e pelas regras internacionais aceitas em cada modalidade.

§2º A prática desportiva não-formal é caracterizada pela liberdade lúdica de seus praticantes.

CAPÍTULO IIDOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

Art. 2º O desporto, como direito individual, tem como base os seguintes princípios:

I - soberania, caracterizado pela supremacia nacional na

organização da prática desportiva;

II - autonomia, definido pela faculdade de pessoas físicas e jurídicas organizarem-se para a prática desportiva como sujeitos nas decisões que as afetam;

III - democratização, garantido em condições de acesso às atividades desportivas sem distinções e quaisquer formas de discriminação;

IV - liberdade, expresso pela livre prática do desporto, de acordo com a capacidade e interesse de cada um, associando-se ou não a entidades do setor;

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V - direito social, caracterizado pelo dever do Estado de fomentar as práticas desportivas formais e não-formais;

VI - diferenciação, consubstanciado no tratamento específico dado ao desporto profissional e não-profissional;

VII - identidade nacional, refletido na proteção e incentivo às manifestações desportivas de criação nacional;

VIII - educação, voltado para o desenvolvimento integral do homem como ser autônomo e participante e fomentado através da prioridade dos recursos públicos ao desporto educacional;

IX - qualidade, assegurado pela valorização dos resultados desportivos, educativos e dos relacionados à cidadania e ao desenvolvimento físico e moral;

X - descentralização, consubstanciado na organização e funcionamento harmônicos de sistemas desportivos diferenciados e autônomos para os níveis federal, estadual e municipal;

XI - segurança, propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial;

XII - eficiência, obtido através do estímulo à competência desportiva e administrativa.

CAPÍTULO IIIDA CONCEITUAÇÃO E DAS FINALIDADES DO DESPORTO

Art. 3º O desporto como atividade predominantemente física e intelectual pode ser reconhecido em qualquer das seguintes manifestações:

I - desporto educacional, através dos sistemas de ensino e formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o desenvolvimento integral e a formação para a cidadania e o lazer;

II - desporto de participação, de modo voluntário, compreendendo as modalidades desportivas praticadas com a finalidade de contribuir para a integração dos praticantes na plenitude da vida social, na promoção da saúde e da educação e na preservação do meio ambiente;

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III - o desporto de rendimento, praticado segundo normas e regras nacionais e internacionais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e comunidades do País e estas com outras nações.

Parágrafo único. O desporto de rendimento pode ser organizado e praticado:

I - de modo profissional, caracterizado por remuneração pactuada por contrato de trabalho ou demais formas contratuais pertinentes;

II - de modo não-profissional, compreendendo o desporto:

a) semiprofissional, expresso pela existência de incentivos materiais que não caracterizem remuneração derivada de contrato de trabalho;

b) amador, identificado pela inexistência de qualquer forma de remuneração ou de incentivos materiais.

CAPÍTULO IVDO SISTEMA BRASILEIRO DO DESPORTO

SEÇÃO IDA COMPOSIÇÃO E OBJETIVOS

Art. 4º O Sistema Brasileiro do Desporto compreende:

I - o Conselho Superior de Desporto;

II - a Secretaria de Desporto do Ministério da Educação e do Desporto;

III - o Sistema Federal, os Sistemas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, organizados de forma autônoma e em regime de colaboração, integrados por vínculos de natureza técnica específicos de cada modalidade desportiva.

§1º O Sistema Brasileiro do Desporto tem por objetivo garantir a prática desportiva regular e melhorar-lhe o padrão de qualidade.

§2º Poderão ser incluídas no Sistema Brasileiro do Desporto as pessoas jurídicas que desenvolvam práticas não-formais, promovam a cultura e as ciências do desporto e formem ou aprimorem especialistas.

§3º Ao Ministério da Educação e do Desporto, por sua Secretaria de Desporto, cumpre elaborar o Plano Nacional do Desporto, observadas as diretrizes

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da Política Nacional do Desporto, e exercer o papel do Estado na forma do art. 217 da Constituição Federal.

SEÇÃO IIDO CONSELHO SUPERIOR DE DESPORTOS

Art. 5º O Conselho Superior de Desportos é órgão colegiado de caráter consultivo e normativo, representativo da comunidade desportiva brasileira, cabendo-lhe:

I - fazer cumprir e preservar os princípios e preceitos desta Lei:

II - oferecer subsídios técnicos à elaboração do Plano Nacional do Desporto;

III - dirimir os conflitos de superposição de autonomias;

IV - emitir pareceres e recomendações sobre questões desportivas nacionais;

V - estabelecer normas, sob a forma de resoluções, que garantam os direitos e impeçam a utilização de meios ilícitos nas práticas desportivas;

VI - aprovar os Códigos de Justiça Desportiva e suas alterações;

VII - propor prioridades para o plano de aplicação de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Desportivo - FUNDESP, elaborado pelo Ministério da Educação e do Desporto, por meio de sua Secretaria de Desportos;

VIII - outorgar o Certificado de Mérito Desportivo;

IX- exercer outras atribuições constantes da legislação desportiva.

Art. 6º O Conselho Superior de Desporto será composto de quinze membros nomeados pelo Presidente da República, discriminadamente:

I - o Secretário de Desporto do Ministério da Educação e do Desporto, membro nato que o preside;

II - dois, de reconhecido saber desportivo, indicados pelo Ministério da Educação e do Desporto;

III - um representante do Comitê Olímpico Brasileiro;

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IV - um representante das entidades de administração federal do desporto profissional;

V - um representante das entidades de administração federal do desporto não-profissional;

VI - um representante das entidades de prática do desporto profissional;

VII - um representante das entidades de prática do desporto não-profissional;

VIII - um representante dos atletas profissionais;

IX - um representante dos atletas não-profissionais;

X - um representante dos árbitros;

XI - um representante dos treinadores desportivos;

XII - um representante das instituições que formam recursos humanos para o desporto;

XIII - um representante das empresas que apóiam o desporto;

XIV - um representante da imprensa desportiva.

§1º A escolha dos membros do Conselho dar-se-á por eleição ou indicação dos segmentos e setores interessados, na forma da regulamentação desta Lei.

§2º Quando segmentos e setores desportivos tornarem-se relevantes e influentes, o Conselho, por deliberação de dois terços de seus membros, poderá ampliar a composição do colegiado até o máximo de vinte e nove conselheiros.

§3º O mandato dos conselheiros será de três anos, permitida uma recondução.

§4º Os conselheiros terão direito a passagem e diária para comparecimento às reuniões do Conselho.

SEÇÃO IIIDO SISTEMA FEDERAL DO DESPORTO

Art. 7º O Sistema Federal do Desporto tem por finalidade promover e aprimorar as práticas desportivas de rendimento.

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Parágrafo único. O Sistema Federal do Desporto congrega as pessoas físicas e jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, encarregadas da coordenação, da administração, da normatização, do apoio e da prática do desporto, bem como as incumbidas da Justiça Desportiva e, especialmente:

I - o Comitê Olímpico Brasileiro;

II - as entidades federais de administração do desporto;

III - as entidades de prática do desporto filiadas àquelas referidas no inciso anterior.

Art. 8º Ao Comitê Olímpíco Brasileiro, entidade jurídica de direito privado, compete representar o País nos eventos olímpicos, pan-americanos e outros de igual natureza, no Comitê Olímpico Internacional e fomentar o movimento olímpico no território nacional, em conformidade com as disposições estatutárias e regulamentares do Comitê Olímpico Internacional.

§1º Caberá ao Comitê Olímpico Brasileiro representar o olimpismo brasileiro junto aos poderes públicos.

§2º É privativo do Comitê Olímpico Brasileiro o uso da bandeira e dos símbolos olímpicos.

Art. 9º As entidades federais de administração do desporto são pessoas jurídicas de direito privado, com organização e funcionamento autônomos, e terão as competências definidas em seus estatutos.

§1º As entidades federais de administração do desporto filiarão, nos termos dos seus estatutos, tanto entidades estaduais de administração quanto entidades de prática desportiva.

§ 2º É facultada a filiação direta de atletas nos termos previstos no estatuto da respectiva entidade.

Art. 10. As entidades de prática do desporto são pessoas jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, constituídas na forma da lei, mediante o exercício do direito de livre associação.

Parágrafo único. As entidades de prática desportiva poderão filiar-se, por modalidade, a entidades de administração do desporto de mais de um sistema.

Art. 11. É facultado às entidades de prática e às entidades federais de administração de modalidade profissional, manter a gestão de suas atividades sob a

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responsabilidade de sociedade com fins lucrativos, desde que adotada uma das seguintes formas:

I - transformar-se em sociedade comercial com finalidade desportiva;

II - constituir sociedade comercial com finalidade desportiva, controlando a maioria de seu capital com direito a voto;

III - contratar sociedade comercial para gerir suas atividades desportivas.

Parágrafo único. As entidades a que se refere este artigo não poderão utilizar seus bens patrimoniais, desportivos ou sociais para integralizar sua parcela de capital ou oferecê-los como garantia, salvo com a concordância da maioria absoluta na assembléia geral dos associados e na conformidade dos respectivos estatutos.

Art. 12. As entidades de prática desportiva poderão organizar ligas regionais ou nacionais e competições, seriadas ou não, observadas as disposições estatutárias das entidades de administração do desporto a que pertençam.

Parágrafo único. Na hipótese do caput deste artigo é facultado às entidades de prática desportiva participar, também, de campeonatos nas entidades de administração do desporto a que estejam filiadas.

Art. 13. A duração dos mandatos deve ajustar-se, sempre que possível, ao ciclo olímpico ou à periodicidade das competições mundiais da respectiva modalidade desportiva.

Art. 14. São causas de inelegibilidade para o desempenho de cargos e funções, eletivas ou de livre nomeação, de entidades federais de administração do desporto, sem prejuízo de outras estatutariamente previstas:

I - ter sido condenado por crime doloso em sentença definitiva;

II - ser considerado inadimplente na prestação de contas de recursos financeiros recebidos de órgãos públicos, em decisão administrativa definitiva.

Parágrafo único. A ocorrência de qualquer das situações previstas neste artigo, ao longo do mandato, importa na perda automática do cargo ou função de direção.

SEÇÃO IVDO SISTEMA DOS ESTADOS, DISTRITO FEDERAL E MUNICÍPIOS

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Art. 15. Os Estados e o Distrito Federal constituirão seus próprios sistemas, respeitadas as normas estabelecidas nesta Lei.

Parágrafo único. Aos Municípios é facultado constituir sistemas próprios, observadas as disposições desta Lei e as contidas na legislação do respectivo Estado.

CAPÍTULO VDO CERTIFICADO DE MÉRITO DESPORTIVO

Art. 16. É criado o Certificado de Mérito Desportivo a ser outorgado pelo Conselho Superior de Desportos.

Parágrafo único. As entidades contempladas farão jus a:

I - prioridade no recebimento de recursos de natureza pública;

II - benefícios previstos na legislação em vigor referente à utilidade pública;

III - benefícios fiscais na forma da lei.

Art. 17. Para obtenção do Certificado de Mérito Desportivo são requisitos entre outros:

I - ter estatuto de acordo com a legislação em vigor;

II - demonstrar relevantes serviços ao desporto nacional;

III - (VETADO)

IV - apresentar manifestação do Comitê Olímpico Brasileiro, no caso de suas filiadas;

V - possuir viabilidade e autonomia financeiras;

VI - manter a independência técnica e o apoio administrativo aos órgãos judicantes.

CAPÍTULO VI

DA PRÁTICA DESPORTIVA PROFISSIONAL

Art. 18. Atletas, entidades de prática desportiva e entidades de administração do desporto são livres para organizar a atividade profissional de sua modalidade, respeitados os termos desta Lei.

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Art. 19. Qualquer cessão ou transferência de atleta profissional depende de expressa anuência deste.

Art. 20. A cessão ou transferência de atleta profissional para entidade desportiva estrangeira observará as instruções expedidas pela entidade federal de administração do desporto da modalidade.

Parágrafo único. Além da taxa prevista na alínea b do inciso II do art. 43 desta Lei, nenhuma outra poderá ser exigida, a qualquer título, na transferência do atleta.

Art. 21. A participação de atletas profissionais em seleções será estabelecida na forma como acordarem a entidade de administração e a entidade de prática desportiva cedente.

§1º A entidade convocadora indenizará a cedente dos encargos previstos no contrato de trabalho, pelo período em que durar a convocação do atleta, sem prejuízo de eventuais ajustes celebrados entre estes e a entidade convocadora.

§2º O período de convocação estender-se-á até a reintegração do atleta à entidade que o cedeu, apto a exercer sua atividade.

Art. 22. A atividade do atleta profissional é caracterizada por remuneração pactuada em contrato com pessoa jurídica, devidamente registrado na entidade federal de administração do desporto, e deverá conter cláusula penal para as hipóteses de descumprimento ou rompimento unilateral.

§1º A entidade de prática desportiva empregadora que estiver com pagamento de salários dos atletas profissionais em atraso, por período superior a três meses, não poderá participar de qualquer competição, oficial ou amistosa.

§2º Aplicam-se ao atleta profissional as normas gerais da legislação trabalhista e da seguridade social, ressalvadas as peculiaridades expressas nesta Lei ou integrantes do contrato de trabalho respectivo.

Art. 23. O contrato de trabalho do atleta profissional terá prazo determinado, com vigência não inferior a três meses e não superior a trinta e seis meses.

Parágrafo único. De modo excepcional, o prazo do primeiro contrato poderá ser de até quarenta e oito meses, no caso de atleta em formação, não-profissional, vinculado à entidade de prática, na qual venha exercendo a mesma atividade, pelo menos durante vinte e quatro meses.

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Art. 24. Às entidades de prática desportiva pertence o direito de autorizar a fixação, transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo desportivo de que participem.

§1º Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço da autorização serão distribuídos, em partes iguais, aos atletas participantes do espetáculo.

§2º O disposto neste artigo não se aplica a flagrantes do espetáculo desportivo para fins exclusivamente jornalísticos ou educativos, cuja duração, no conjunto, não exceda de três minutos.

Art. 25. Na comercialização de imagens decorrentes de contrato com a entidade de administração de desporto, as entidades de prática desportiva participarão com vinte e cinco por cento do resultado da contratação, de modo proporcional à quantidade de atletas que cada uma cedeu, ressalvados os direitos assegurados no artigo anterior.

Art. 26. Caberá ao Conselho Superior de Desportos fixar o valor, os critérios e condições para o pagamento da importância denominada passe.

Art. 27. É vedada a participação de atletas não-profissionais, com idade superior a vinte anos, em competições desportivas de profissionais.

Art. 28. É vedada a prática do profissionalismo em qualquer modalidade desportiva, quando se tratar de:

I - desporto educacional, seja nos estabelecimentos escolares de 1º e 2º graus ou superiores;

II - desporto militar;

III - menores até a categoria de juvenil.

Art. 29. Será constituído um sistema de seguro obrigatório específico para os praticantes desportivos profissionais, com o objetivo de cobrir os riscos a que estão sujeitos, protegendo especialmente os praticantes de alto rendimento.

CAPÍTULO VIIDA ORDEM DESPORTIVA

Art. 30. No âmbito de suas atribuições, cada entidade de administração do desporto tem competência para decidir, de ofício ou quando lhe forem

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submetidas pela parte interessada, as questões relativas ao cumprimento das normas e regras desportivas.

Art. 31. É vedado às entidades federais de administração do desporto intervir na organização e funcionamento de suas filiadas.

§1º Com o objetivo de manter a ordem desportiva, o respeito aos atos emanados de seus poderes internos e fazer cumprir os atos legalmente expedidos pelos órgãos ou representantes do poder público, poderão ser aplicadas, pelas entidades de administração do desporto e de prática desportiva, as seguintes sanções:

I - advertência;

II - censura escrita;

III - multa;

IV - suspensão;

V - desfiliação ou desvinculação.

§2º A aplicação das sanções previstas nos incisos I, II e III do parágrafo anterior não prescinde do processo administrativo no qual sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa.

§3º As penalidades de que tratam os incisos IV e V do §1º deste artigo só serão aplicadas após a decisão definitiva da Justiça Desportiva.

Art. 32. Quando se adotar o voto plural, a quantificação ou ponderação de votos observará, sempre, critérios técnicos e a classificação nas competições oficiais promovidas nos últimos cinco anos ou em período inferior, sem prejuízo de outros parâmetros estabelecidos em regulamento.

CAPÍTULO VIII

DA JUSTIÇA DESPORTIVA

Art. 33. A Justiça Desportiva a que se referem os §§1º e 2º do art. 217 da Constituição Federal e o art. 33 da Lei nº 8.028, de 12 de abril de 1990, regula-se pelas disposições deste capítulo.

Art. 34. A organização, o funcionamento e as atribuições da Justiça Desportiva, limitadas ao processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições desportivas, serão definidas em Códigos.

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§1º Os Códigos de Justiça dos desportos profissional e não-profissional serão propostos pelas entidades federais de administração do desporto para aprovação pelo Conselho Superior de Desportos.

§2º As transgressões relativas à disciplina e às competições desportivas sujeitam o infrator a:

I - advertência;

II - eliminação;

III - exclusão de campeonato ou torneio;

IV - indenização;

V - interdição de praça de desporto;

VI - multa;

VII - perda de mando do campo;

VIII - perda de pontos;

IX - perda de renda;

X - suspensão por partida;

XI - suspensão por prazo.

§3º As penas pecuniárias não serão aplicadas a atletas não-profissionais.

§4º O disposto nesta Lei sobre Justiça Desportiva não se aplica ao Comitê Olímpico Brasileiro.

Art. 35. Aos Tribunais de Justiça Desportiva, unidades autônomas e independentes das entidades de administração do desporto de cada sistema, compete processar e julgar, em última instância, as questões de descumprimento de normas relativas à disciplina e às competições desportivas, sempre assegurada a ampla defesa e o contraditório.

§1º Sem prejuízo do disposto neste artigo, as decisões finais dos Tribunais de Justiça Desportiva são impugnáveis, nos termos gerais do direito, respeitados os pressupostos processuais estabelecidos nos §§1º e 2º do art. 217 da Constituição Federal.

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§2º O recurso ao poder Judiciário não prejudica os efeitos desportivos validamente produzidos em conseqüência da decisão proferida pelos Tribunais de Justiça Desportiva.

Art. 36. As entidades de administração do desporto, nos campeonatos e competições por elas promovidos, terão como primeira instância a Comissão Disciplinar integrada por três membros de sua livre nomeação, para aplicação imediata das sanções decorrentes de infrações cometidas durante as disputas e constantes das súmulas ou documentos similares dos árbitros, ou ainda, decorrentes de infringência ao regulamento da respectiva competição.

§1º A Comissão Disciplinar aplicará sanções em procedimento sumário.

§2º Das decisões da Comissão Disciplinar caberá recurso aos Tribunais Desportivos, assegurados o contraditório e a ampla defesa.

§3º O recurso a que se refere o parágrafo anterior será recebido com efeito suspensivo quando a penalidade exceder de duas partidas consecutivas ou quinze dias.

Art. 37. O membro do Tribunal de Justiça Desportiva exerce função considerada de relevante interesse público e, sendo servidor público, terá abonadas suas faltas, computando-se como de efetivo exercício a participação nas respectivas sessões.

Art. 38. Os Tribunais de Justiça Desportiva serão compostos por, no mínimo, sete membros e, no máximo, onze membros, sendo:

a) um indicado pelas entidades de Administração do Desporto;

b) um indicado pelas entidades de Práticas Desportivas que participem de competições oficiais da divisão principal;

c) três advogados com notório saber jurídico desportivo, indicados pela Ordem dos Advogados do Brasil;

d) um representante dos árbitros, por estes indicado;

e) um representante dos atletas, por estes indicado.

§1º Para efeito de acréscimo na composição, deverá ser assegurada a paridade apresentada nas alíneas a, b, d e e, respeitado o constante no caput deste artigo.

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§2º O mandato dos membros dos Tribunais de Justiça Desportiva será de, no máximo, quatro anos, permitida apenas uma recondução.

§3º (VETADO)

§4º É vedado a dirigentes desportivos das Entidades de Administração e das Entidades de Prática, o exercício de cargo ou função na Justiça Desportiva, exceção feita aos membros de Conselho Deliberativo das Entidades de Prática Desportiva.

CAPÍTULO IX

DOS RECURSOS PARA O DESPORTO

Art. 39. Os recursos necessários à execução da política Nacional do Desporto serão assegurados em programas de trabalho específicos constantes dos Orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além dos provenientes de:

I - fundos desportivos;

II - receitas oriundas de concursos de prognósticos;

III - doações, patrocínios e legados;

IV - prêmios de concursos de prognósticos da Loteria Esportiva Federal não reclamados nos prazos regulamentares;

V - incentivos fiscais previstos em lei;

VI - outras fontes.

Art. 40. Ao Comitê Olímpico Brasileiro é concedida autorização para importar, livre de tributos federais, equipamentos, materiais e componentes destinados, exclusivamente, ao treinamento de atletas, às competições desportivas do seu programa de trabalho e aos programas das entidades federais de administração do desporto que lhe sejam filiadas ou vinculadas.

§1º O Ministério da Fazenda poderá, mediante proposta do Ministério da Educação e do Desporto, através de sua Secretaria de Desporto, estender o benefício previsto neste artigo às entidades de prática desportiva e aos atletas integrantes do Sistema Federal do Desporto, para execução de atividades relacionadas com a melhoria do desempenho das representações desportivas nacionais.

§2º É vedada a comercialização dos equipamentos, materiais e componentes importados com benefício previsto neste artigo.

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§3º Os equipamentos, materiais e componentes importados poderão ser definitivamente transferidos para as entidades e os atletas referidos no §1º, caso em que, para os fins deste artigo, ficarão equiparados ao importador.

§4º A infringência do disposto neste artigo inabilita

definitivamente o infrator aos benefícios nele previstos, sem prejuízo das sanções e do recolhimento dos tributos dispensados, atualizados monetariamente e acrescidos das cominações previstas na legislação pertinente.

Art. 41. (VETADO).

Art. 42. Por unificação do Fundo de Assistência ao Atleta Profissional de que trata a Lei nº 6.269, de 24 de novembro de 1975, com o fundo de promoção ao Esporte Amador de que trata a Lei nº 7.752, de 14 de abril de 1989, fica criado o Fundo Nacional de Desenvolvimento Desportivo - FUNDESP, como unidade orçamentária destinada a dar apoio financeiro a programas e projetos de caráter desportivo que se enquadrem nas diretrizes e prioridades constantes da Política Nacional do Desporto.

§1º O FUNDESP, de natureza autárquica, será subordinado ao Ministério da Educação e do Desporto, através de sua Secretaria de Desporto, observado o disposto no inciso VII do art. 5º desta Lei.

§2º O FUNDESP terá duas contas específicas: uma destinada a fomentar o desporto não-profissional, e, outra, à assistência ao atleta profissional e ao em formação.

Art. 43. Constituem recursos do FUNDESP:

I - para fomento ao desporto não-profissional:

a) receitas oriundas de concursos de prognósticos previstos em lei;

b) adicional de quatro e meio por cento incidente sobre cada bilhete, permitido o arredondamento do seu valor feito nos concursos de prognósticos a que refere o Decreto-lei nº 594, de 27 de maio de 1969 e a Lei nº 6.717, de 12 de novembro de 1979, destinada ao cumprimento do disposto neste inciso;

c) doações, legados e patrocínios;

d) prêmios de concursos de prognósticos da Loteria Esportiva Federal não reclamados;

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e) (VETADO)

f) outras fontes;

II - para assistência ao atleta profissional e ao em formação:

a) um por cento do valor do contrato do atleta profissional pertencente ao Sistema Federal do Desporto, devido e recolhido pela entidade contratante;

b) um por cento do valor da indenização fixada pela entidade cedente, no caso de cessão de atleta a entidade estrangeira;

c) um por cento da arrecadação proveniente das competições organizadas pelas entidades federais de administração do desporto profissional;

d) penalidades disciplinares pecuniárias aplicadas aos atletas profissionais pelas entidades de prática desportiva, pelas de administração do desporto ou pelos Tribunais de Justiça Desportiva;

e) receitas oriundas de concursos de prognósticos previstos em lei;

f) dotações, auxílios e subvenções da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

g) doações, legados e outras receitas eventuais.

Art. 44. Os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Desportivo terão a seguinte destinação:

I - para o desporto não-profissional:

a) desporto educacional;

b) desporto de rendimento, nos casos de Jogos Olímpicos, Campeonatos Mundiais, Jogos Pan-americanos e Jogos Sul-Americanos;

c) desporto de criação nacional;

d) capacitação de recursos humanos: cientistas desportivos, professores de educação física e técnicos em desporto;

e) apoio a projetos de pesquisa, documentação e informação;

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f) construção, ampliação e recuperação de instalações desportivas;

II - para o desporto profissional, através de sistema de assistência ao atleta profissional e ao em formação, com a finalidade de promover sua adaptação ao mercado de trabalho, quando deixar a atividade;

III - para apoio técnico e administrativo do Conselho Superior de Desportos.

Art. 45. A arrecadação obtida em cada teste da Loteria Esportiva Federal terá a seguinte destinação:

I - quarenta e cinco por cento para pagamento dos prêmios, incluindo o valor correspondente ao imposto sobre a renda;

II - vinte por cento para a Caixa Econômica Federal, destinados

ao custeio total da administração dos concursos de prognósticos desportivos;

III - dez por cento para pagamento, em parcelas iguais, às entidades de prática desportiva, constantes do teste, pelo uso de suas denominações ou símbolos;

IV - quinze por cento para o FUNDESP.

Parágrafo único. O total da arrecadação, deduzidos os valores previstos nos incisos I, II, III e IV será destinada à seguridade social.

Art. 46. Anualmente, a renda líquida total de um dos testes da Loteria Esportiva Federal será destinada ao Comitê Olímpico Brasileiro para o treinamento e as competições preparatórias das equipes olímpicas nacionais.

Parágrafo único. Nos anos de realização dos Jogos Olímpicos e dos Jogos Pan-americanos, a renda líquida total de um segundo teste será destinada ao Comitê Olímpico Brasileiro, para o atendimento da participação de delegações nacionais nesses eventos.

Art. 47. (VETADO).

Art. 48. Os recursos financeiros correspondentes às destinações previstas no inciso III do art. 45 e nos arts. 46 e 47 desta Lei constituem receitas próprias dos benefíciários que lhes serão entregues diretamente pela Caixa Econômica Federal até o décimo dia útil do mês subseqüente ao da ocorrência do fato gerador.

CAPÍTULO XDAS DISPOSIÇÕES GERAIS

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Art. 49. Os dirigentes, unidades ou órgãos de entidades de administração do desporto inscritos no Registro Público competente, não exercem função delegada pelo Poder Público nem são considerados autoridades públicas para os efeitos da lei.

Art. 50. A Secretaria de Desportos do Ministério da Educação e do Desporto expedirá instruções e desenvolverá ações para o cumprimento do disposto no inciso IV do art. 217 da Constituição Federal e elaborará projetos de prática desportiva para pessoas portadoras de deficiência.

Art. 51. As entidades desportivas internacionais, com sede permanente ou temporária no país, receberão dos poderes públicos o mesmo tratamento dispensado às entidades federais de administração do desporto.

Art. 52. Será considerado como de efetivo exercício, para todos os efeitos legais, o período em que o atleta, servidor público civil ou militar, da Administração Pública direta, indireta, autárquica ou fundacional, estiver convocado para integrar representação nacional em competição desportiva no país ou no exterior.

§1º O período de convocação será definido pela entidade federal de administração da respectiva modalidade desportiva, cabendo a esta ou ao Comitê Olímpico Brasileiro fazer a devida comunicação.

§2º O disposto neste artigo aplica-se, também, aos profissionais especializados e dirigentes, quando indispensáveis à composição da delegação.

Art. 53. Os sistemas de ensino da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como as instituições de ensino superior, definirão normas específicas para a verificação do rendimento e o controle de freqüência dos estudantes que integrarem representação desportiva nacional, de forma a harmonizar a atividade desportiva com os interesses relacionados ao aproveitamento e à promoção escolar.

Art. 54. Fica instituído o Dia do Desporto, a ser comemorado no dia 19 de fevereiro.

Art. 55. A denominação e os símbolos de entidades de administração do desporto ou de prática desportiva são de propriedade exclusiva dessas entidades, contando com proteção legal válida para todo o território nacional, por tempo indeterminado, sem necessidade de registro ou averbação no órgão competente.

Parágrafo único. A garantia legal outorgada às entidades neste artigo permite-lhes o uso comercial de sua denominação e de seus símbolos.

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Art. 56. São vedados o registro e o uso, para fins comerciais, como marca ou emblema de qualquer sinal que consista no símbolo olímpico ou que o contenha, exceto mediante prévia autorização do Comitê Olímpico Brasileiro.

Art. 57. As entidades de direção e de prática filiadas a entidades de administração em, no mínimo, três modalidades olímpicas, e que comprovem, na forma da regulamentação desta Lei, atividade e a participação em competições oficiais organizadas pela mesma, credenciar-se-ão na Secretaria da Fazenda da respectiva Unidade da Federação para promover reuniões destinadas a angariar recursos para o fomento do desporto, mediante sorteios de modalidade denominada "Bingo", ou similar.

§1º O órgão competente de cada Estado e do Distrito Federal normatizará e fiscalizará a realização dos eventos de que trata este artigo.

§2º Quando se tratar de entidade de direção, a comprovação de que trata o caput deste artigo limitar-se-á à filiação na entidade nacional ou internacional.

Art. 58. Os árbitros e auxiliares de arbitragem poderão constituir associações nacionais e estaduais, por modalidade desportiva ou grupo de modalidades, objetivando o recrutamento, a formação e a prestação de serviços às entidades de administração do desporto.

Parágrafo único. Independentemente da constituição das associações referidas no caput deste artigo, os árbitros e auxiliares de arbitragem não têm qualquer vínculo empregatício com as entidades desportivas diretivas onde atuam, e a sua remuneração como autônomos exonera tais entidades de quaisquer outras responsabilidades trabalhistas e previdenciárias.

Art. 59. Em campeonatos ou torneios regulares com mais de uma divisão, as entidades de administração do desporto determinarão em seus regulamentos o princípio do acesso e descenso, observado sempre o critério técnico.

Art. 60. É vedado aos administradores e membros de Conselho Fiscal das entidades de prática desportiva o exercício de cargo ou função nas entidades de administração do desporto.

Art. 61. Nas Forças Armadas os desportos serão praticados sob a direção do Estado-Maior das Forças Armadas e do órgão especializado de cada Ministério Militar.

Art. 62. O valor do adicional previsto na alínea b do inciso I do art. 43 desta Lei não será computado no montante da arrecadação das apostas para fins de cálculo de prêmios, rateios, tributos de qualquer natureza ou taxas de administração.

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Parágrafo único. Trimestralmente a Caixa Econômica Federal apresentará à Secretaria de Desporto do Ministério da Educação e do Desporto balancete com o resultado da receita proveniente do adicional mencionado no caput deste artigo.

Art. 63. Do adicional de quatro e meio por cento de que trata a alínea b do inciso I do art. 43 desta Lei, a parcela de um ponto e meio percentual será repassada à Secretaria de Esporte dos Estados e do Distrito Federal ou órgãos que tenham atribuições semelhantes na área do desporto proporcionalmente ao montante das apostas efetuadas em cada Unidade da Federação para aplicação segundo o disposto no inciso I do art. 44.

CAPÍTULO XIDAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Art. 64. Até a regulamentação do valor do passe, prevista no art. 26 desta Lei, prevalecem as Resoluções nºs 10, de 10 de abril de 1986, e 19, de 6 de dezembro de 1988, do Conselho Nacional de Desportos.

Art. 65. Fica extinto o Conselho Nacional de Desportos.

Art. 66. Até a aprovação dos Códigos de Justiça dos Desportos Profissional e não-Profissional, continuam em vigor os atuais Códigos.

Art. 67. As atuais entidades federais de administração do desporto, no prazo de cento e oitenta dias a contar da publicação desta Lei, realizarão assembléia geral para adaptar seus estatutos às normas desta Lei.

§1º Em qualquer hipótese, respeitar-se-ão os mandatos em curso dos dirigentes legalmente constituídos.

§2º A inobservância do prazo fixado no caput deste artigo sujeita a entidade infratora ao cancelamento do Certificado do Mérito Desportivo que lhe houver sido outorgado e importará na sua exclusão automática do Sistema Federal do Desporto até que se concretize e seja averbada no registro público a referida adaptação estatutária.

Art. 68. No prazo de sessenta dias contados da vigência desta Lei, a Caixa Econômica Federal promoverá a implantação dos registros de processamento eletrônico, necessários à cobrança do adicional a que se refere a alínea b do inciso I do art. 43.

Art. 69. O Poder Executivo proporá a estrutura para o funcionamento do FUNDESP e do Conselho Superior de Desporto, num prazo de sessenta dias a contar da publicação desta Lei.

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Art. 70. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 71. Revogam-se as Leis nºs 6.251, de 8 de outubro de 1975, 6.269, de 24 de novembro de 1975, o Decreto-lei nº 1.617, de 3 de março de 1978, o Decreto-lei nº 1.924, de 20 de janeiro de 1982, o art. 5º da Lei nº 7.787, de 30 de junho de 1989, a Lei nº 7.921, de 12 de dezembro de 1989, o art. 14 e art. 44 da Lei nº 8.028, de 12 de abril de 1990 e demais disposições em contrário.

Brasília, 6 de julho de 1993, 172º da Independência e 105º da República.

ITAMAR FRANCO Murílio de Avellar Hingel