lavagem de capitais - 2012

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1 LAVAGEM DE CAPITAIS: Lei 9.613/98 1. 1. Histórico da Lei 9.613/98: A comunidade internacional chegou à conclusão de que o combate a determinados tipos de criminalidade, como o tráfico de drogas e o crime organizado, somente pode ser feito de forma eficaz se houver medidas estatais que persigam o lucro decorrente desses crimes. Desse modo, a criminalização da lavagem de dinheiro está diretamente relacionada com o combate ao tráfico de drogas, ao crime organizado, aos crimes contra a ordem tributária, aos crimes contra o sistema financeiro, aos crimes contra a administração pública e a outros delitos que geram para seus autores lucros financeiros. O objetivo, portanto, é o privar as pessoas dedicadas a certos crimes do produto de suas atividades criminosas e, assim, eliminar o principal incentivo a essa atividade. Nesse contexto, o Brasil assinou um tratado internacional no qual se comprometeu a reprimir a lavagem de capitais. Trata-se da chamada Convenção de Viena: Convenção contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substância psicotrópicas (Convenção de Viena) Assinada em Viena, em 20 de dezembro de 1988. Promulgada pelo Brasil por meio do Decreto 154/1991.

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LAVAGEM DE CAPITAIS: Lei 9.613/98

1. 1. Histórico da Lei 9.613/98:

A comunidade internacional chegou à conclusão de que o combate a

determinados tipos de criminalidade, como o tráfico de drogas e o crime

organizado, somente pode ser feito de forma eficaz se houver medidas

estatais que persigam o lucro decorrente desses crimes.

Desse modo, a criminalização da lavagem de dinheiro está diretamente

relacionada com o combate ao tráfico de drogas, ao crime organizado, aos

crimes contra a ordem tributária, aos crimes contra o sistema financeiro,

aos crimes contra a administração pública e a outros delitos que geram

para seus autores lucros financeiros.

O objetivo, portanto, é o privar as pessoas dedicadas a certos crimes do

produto de suas atividades criminosas e, assim, eliminar o principal

incentivo a essa atividade.

Nesse contexto, o Brasil assinou um tratado internacional no qual se

comprometeu a reprimir a lavagem de capitais. Trata-se da chamada

Convenção de Viena:

Convenção contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substância

psicotrópicas (Convenção de Viena)

Assinada em Viena, em 20 de dezembro de 1988.

Promulgada pelo Brasil por meio do Decreto 154/1991.

Estabeleceu que os países signatários deveriam adotar medidas para

tipificar como crime a lavagem ou ocultação de bens oriundos do tráfico

de drogas.

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1.2. A expressão “Lavagem de capitais”:

O termo “lavagem de dinheiro” surge nos EUA, sendo lá chamada de “money

laundering”.

A origem do termo remonta a cidade de Chicago, na década de 20, quando

vários líderes do crime organizado abriram lavanderias de fachada nas

quais superfaturavam os lucros a fim de justificar seus ganhos ilícitos e

seu padrão de vida. Os criminosos, portanto, lavavam pouca roupa, mas

muito dinheiro.

Outras terminologias adotadas no mundo:

Em alguns países da Europa o crime de “lavagem de dinheiro” é conhecido

como “branqueamento de capitais”, o que não é uma terminologia adequada

considerando que poderia gerar discussões sobre eventual concepção

racional preconceituosa.

1.3. Conceito de Lavagem de capitais:

Por meio da lavagem de capitais, bens, direitos e valores obtidos com a

prática de crimes são integrados ao sistema econômico-financeiro, com a

aparência de terem sido obtidos de maneira lícita.

Ou seja, determinados crimes geram vultuosas quantias para os criminosos,

e eles precisam de alguma forma mascarar a origem desses valores. Ai é

que surge a lavagem de capitais. Ex.: locadora de filmes ou cinema que

sejam usados para lavagem de capitais (é muito difícil verificar qual a

quantia de dinheiro que um estabelecimento desses movimentou por mês).

Pergunta: para se falar em lavagem de capitais, é preciso que tenha sido

movimentado uma quantia vultuosa, ou um simples cheque já pode configurar

o crime? O depósito de um único cheque pode configurar o crime?

São poucos os casos desse tipo que chegam aos Tribunais Superiores, mas o

STF já entendeu que não é necessária a complexidade das operações, nem

tampouco um vulto assustador das quantias envolvidas. Um simples depósito

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de cheque já é suficiente para caracterizar o delito de lavagem de

capitais.

Lavagem de dinheiro é:

- a conduta segundo a qual a pessoa;

- oculta ou dissimula;

- a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou

propriedade;

- de bens, direitos ou valores;

- provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal;

- com o intuito de parecer que se trata de dinheiro de origem lícita.

Em palavras mais simples, lavar é transformar o dinheiro “sujo” (porque

oriundo de um crime) em dinheiro aparentemente lícito.

1.4. Gerações de leis de lavagem de capitais:

A lavagem de capitais surgiu, como vimos, na Convenção das Nações Unidas.

Quando a lavagem de capitais surgiu, ela estava ligada ao tráfico de

drogas. Com o passar dos anos, percebeu-se que era interessante expandir

a lavagem de capitais para outros delitos. Foi assim que surgiram as

gerações de leis de lavagem de capitais.

a) A 1ª geração de leis trazia a idéia de que o único crime antecedente

do qual resultaram bens, direitos e valores era o tráfico de drogas.

b) Nas leis de 2ª geração houve uma ampliação do rol de crimes

antecedentes, porém, permanece um rol taxativo. Nessas leis o tráfico já

não é o único crime antecedente. Existem outros delitos, mas em numerus

clausus.

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c) As legislações de 3ª geração, por sua vez, consideram que qualquer

crime grave pode figurar como delito antecedente do crime de lavagem de

capitais.

A Lei nº 12.683/2012 alterou a Lei n.º 9.613/98 para tornar mais

eficiente a persecução penal dos crimes de lavagem de dinheiro. Agora, o

artigo primeiro da Lei nº 9.613/98 como crime antecedente qualquer

infração penal, abarcando, agora, crimes e contravenções.

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,

disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores

provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.

Antes: a lei brasileira listava um rol de crimes antecedentes para a

lavagem de dinheiro fazendo com que o Brasil, segundo a doutrina

majoritária, estivesse enquadrado nas legislações de segunda geração.

Agora: qualquer infração penal pode ser antecedente da lavagem de

dinheiro. A legislação brasileira passa a ser a terceira geração.

“A eliminação do rol apresenta vantagens e desvantagens. Por um lado

facilita a criminalização e a persecução penal de lavadores

profissionais, ou seja, de pessoas que se dedicam profissionalmente à

lavagem de dinheiro. Por outro lado, a eliminação do rol gera certo risco

de vulgarização do crime de lavagem, o que pode ter duas consequências

negativas. A primeira, um apenamento por crime de lavagem superior à

sanção prevista para o crime antecedente, o que é, de certa forma,

incoerente. A segunda, impedir que os recursos disponíveis à prevenção e

a persecução penal sejam focados na criminalidade mais grave.

Podemos citar um exemplo esclarecedor sobre o assunto: Se um grupo estáel

de quatro pessoas, formado para a prática de crimes, realizasse, por

exemplo vários estelionatos e, com isso, arrecadasse uma grande quantia

em dinheiro que seria dissimulado por meio de lucro ficto de empresas de

fachada, tal conduta não seria punida como lavagem de capitais.

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Com a alteração trazida pela Lei nº 12.683/12, para os casos posteriores

à sua vigência, não é necessário mais discutir se existe ou não definição

legal de organização criminosa no Brasil considerando que, como visto, o

dinheiro “sujo” obtido com qualquer crime, se for ocultado ou

dissimulado, configurará delito de lavagem de capitais.

Perde, assim, relevância a longa e acirrada discussão se era válida ou

não a definição de organização criminosa estabelecida pelo Decreto

5.015/04, que promulgou a Convenção das Nações Unidas contra os Crimes

Organizado Transnacional – Convenção de Palermo.

Esse debate terá ainda importância nos casos anteriores à Lei nº

12.683/12 que, neste ponto, não é retroativa por ser lei penal mais

gravosa.

1.5. Fases da lavagem de capitais:

Aqui vamos trabalhar com essas fases da lavagem de capitais de acordo com

o chamado GAFI – Grupo de Ação Financeira sobre lavagem de dinheiro.

Trata-se de um grupo que foi criado pelos países mais ricos e que tem

exatamente essa idéia de punir a lavagem de capitais.

Fases:

1ª) Colocação: expressão em inglês “placement” – consiste na introdução

do dinheiro ilícito no sistema financeiro, dificultando a identificação

da procedência dos valores. É uma fase em que o dinheiro é introduzido.

Essa primeira fase, talvez seja a melhor fase para a descoberta do

delito, pois nela o dinheiro ainda está muito próximo de sua origem. Aqui

são utilizadas algumas técnicas, como por ex. a técnica do “smurfing” que

consiste no fracionamento de grandes quantias em pequenos valores.

art. 10, LLC: “Da Identificação dos Clientes e Manutenção de Registros”.

Esta lei tenta combater aquele antigo brocado segundo o qual “dinheiro

não tem cheiro”, dinheiro não tem origem. A lei quer, então, impor uma

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nova metodologia de trabalho ao sistema financeiro. Normalmente pega-se o

dinheiro e não se questiona de onde ele veio. Mas existe sim a obrigação

de se identificar quem são os clientes da instituição financeira.

Uma segunda técnica que é utilizada seria a utilização de

estabelecimentos comerciais que trabalhem com dinheiro em espécie. Como

ex. temos os cinemas, as locadoras de vídeos, as lavanderias, os

doleiros.

2ª) Dissimulação: expressão em inglês “layering” (no sentido de colocar

camadas) – nessa fase é realizada uma série de negócios ou movimentações

financeiras, a fim de impedir o rastreamento e encobrir a origem ilícita

dos valores. Ai é que entra o Sistema bancário. Num primeiro momento,

temos uma determinada quantia, ex.: R$ 500.000,00, que precisam ser

colocados no sistema financeiro. Ele é, então, colocado numa conta. Nessa

dissimulação se começa a fazer uma série de movimentações financeiras,

transferindo o dinheiro de uma conta para outra, para dificultar o

conhecimento da sua origem.

3ª) Integração: expressão em inglês – “integration” – nessa fase, já com

a aparência lícita, os bens são formalmente incorporados ao sistema

econômico, geralmente por meio de investimentos no mercado mobiliário ou

imobiliário. Depois das diversas transferências bancárias, o dinheiro

volta, muitas vezes até mesmo para refinanciar os crimes antecedentes.

Um único depósito de cheque, como vimos, já seria lavagem. O depósito de

cheque está na 1ª fase. Assim, para que o delito de lavagem de capitais

esteja configurado, não é preciso que estejam preenchidas as 3 fases. Não

é necessária a ocorrência dessas 3 fases para que o delito de lavagem

esteja consumado (RHC 80.816).

1.6. Bem jurídico tutelado:

Sobre o bem jurídico tutelado há 4 correntes na doutrina:

I- Uma primeira corrente diz que o bem jurídico tutelado é o mesmo bem

jurídico tutelado pelo crime antecedente. Essa corrente até seria

interessante quando estivéssemos diante das leis de 1ª geração (só o

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tráfico seria o crime antecedente). Agora, porém, já não é mais possível

sustentar essa corrente, diante da diversidade de bens jurídicos

tutelados pelos crimes antecedentes.

II- Uma segunda corrente diz que o bem jurídico tutelado seria a

Administração da Justiça, porque o cometimento da lavagem torna difícil a

recuperação do produto do crime. Esta é a posição do prof. Rodolfo Tigre

Maia, dentre outros.

III- Uma terceira corrente entende que o bem jurídico tutelado é a ordem

econômico-financeira. Essa é a posição que, sem dúvida alguma, prevalece.

IV- A última corrente, por sua vez, entende que a lavagem de capitais

ofende dois bens jurídicos: o sistema econômico-financeiro e o bem

jurídico tutelado pelo crime antecedente. Essa é a posição do prof.

Alberto Silva Franco. Não é, porém, a posição que prevalece.

Tutelada que é a ordem econômico-financeira, vale uma observação

importante: a doutrina entende que é cabível a aplicação do Princípio da

Insignificância que, porém, está condicionado à presença de 4

pressupostos:

a) mínima ofensividade da conduta;

b) ausência de periculosidade social da ação;

c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e

d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Com relação à União, pacificou-se o entendimento de que a quantia limite

é R$ 20.000,00.

1.7. Crime antecedente:

A lavagem de dinheiro é classificada como um crime acessório ou

parasitário, considerando que se trata de delito que pressupõe a

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ocorrência de uma infração penal anterior. A doutrina chamava essa

infração penal anterior de “crime antecedente”.

A lei alterada afirma que a lavagem de dinheiro depende de uma infração

penal antecedente. Infração penal é um gênero que engloba duas espécies:

crime e contravenção. Logo, a lavagem depende agora de uma “infração

penal antecedente”

Ante: somente havia lavagem de dinheiro se a ocultação ou dissimulação de

bens, direitos ou valores proveniente de um crime antecedente.

Agora: haverá lavagem de dinheiro se a ocultação ou dissimulação for de

bens, direitos ou valores provenientes de um crime ou de uma contravenção

penal. Desse modo, a lavagem de dinheiro continua a ser um crime

derivado, mas agora depende de uma infração penal antecedente, que pode

ser um crime ou uma contravenção penal.

Importância no caso do “jogo do bicho”:

O chamado “jogo do bicho” não é previsto como crime no Brasil, sendo

considerado apenas contravenção penal tipificada no art. 51 do Decreto-

Lei nº 3.688/41. Logo, os chamados “bicheiros” ganhavam muito dinheiro e,

com essa quantia compravam imóveis e carros em nome das esposas, parentes

amigos, que funcionavam como “laranjas” ou então abriam empresas de

fachada apenas para “esquentar” as quantias recebidas com a contravenção

penal. Tal conduta de ocultação ou dissimulação do dinheiro “sujo” passa

agora a ser punida com lavagem, nos termos do novo art. 1º da Lei nº

9.603/98.

Outro exemplo seria o seguinte: para que se possa falar em lavagem, é

preciso visualizar que o dinheiro é resultado de um dos crimes

antecedentes. Ex.: tráfico de drogas.

Temos, basicamente, dois crimes: o tráfico de drogas e a lavagem de

capitais. Pergunta: os dois processos (o de lavagem e o de tráfico)

precisam tramitar juntos? Não. Não é necessária a tramitação conjunta dos

processos. Mas, se ela for possível, tanto melhor.

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Pode acontecer, por ex., que o agente seja absolvido pelo crime

antecedente (tráfico de drogas). Deve ele então ser absolvido pelo crime

de lavagem de capitais? Inicialmente devemos analisar qual foi o

fundamento da absolvição.

Assim: o processo e julgamento do crime de lavagem de capitais não

precisa tramitar obrigatoriamente em um simultaneus processus com o crime

antecedente. Se isso for possível, deverá ocorrer, mas, daí não se pode

concluir que a reunião dos processos seja obrigatória.

- A condenação pelo crime antecedente não é pressuposto para a condenação

pelo crime de lavagem (STJ, HC 36.837).

- A comprovação da ocorrência do crime antecedente figura como uma

questão prejudicial homogênea (do mesmo ramo do direito) do mérito da

ação penal relativa ao crime de lavagem.

Na hora de julgar alguém por lavagem, o juiz precisa, de maneira

incidental, afirmar que o dinheiro que foi lavado seria proveniente do

crime antecedente.

- Para a caracterização do delito de lavagem de capitais, o fato anterior

previsto como crime antecedente deve ser típico e ilícito, não se

exigindo a culpabilidade (Princípio da Acessoriedade Limitada).

- Caso haja a absolvição do autor do crime antecedente, com fundamento na

inexistência do fato, não constituir o fato infração penal ou existir

circunstância que exclua o crime, não será possível a punição do delito

de lavagem de capitais. É preciso, pois, saber o que gerou a absolvição

do crime antecedente.

Art. 386, CPP:

Art. 386.  O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte

dispositiva, desde que reconheça:

I - estar provada a inexistência do fato;

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II - não haver prova da existência do fato;

III - não constituir o fato infração penal;

IV –  estar provado que o réu não concorreu para a infração

penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração

penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de

pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal),

ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada

pela Lei nº 11.690, de 2008)

VII – não existir prova suficiente para a condenação.

Por outro lado, se o autor do crime antecedente for absolvido com base em

uma causa excludente da culpabilidade, subsiste a possibilidade de

punição pelo crime de lavagem de capitais.

- Presente uma causa extintiva da punibilidade, em relação ao crime

antecedente, nada impede a condenação pelo crime de lavagem de capitais.

Exceções: há duas causas extintivas da punibilidade que impedem que o

agente seja condenado pela lavagem de capitais: a abolitio criminis e a

anistia.

Pergunta: e se o crime antecedente ficar na modalidade tentada, e

possível a condenação pelo crime de lavagem de capitais?

No que toca ao crime antecedente tentado, nada impede a condenação do

agente pelo crime de lavagem, mas desde que tenham sido produzidos bens

aptos a serem lavados (o que, porém, dificilmente ocorre na prática).

Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:

(...)

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II - independem do processo e julgamento das infrações penais

antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz

competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade

de processo e julgamento;

Para que seja recebida a denúncia pelo crime de lavagem, deve haver, no

mínimo, indícios da prática da infração penal antecedente.

Registre-se que não exige condenação prévia da infração penal antecedente

para que seja iniciada a ação penal pelo delito de lavagem de dinheiro.

Por essa razão, o julgamento da infração antecedente e do crime de

lavagem não precisa ser feito, necessariamente, pelo mesmo juízo.

Exemplo: Jaime, traficante internacional de drogas, envia o lucro

decorrente do comércio ilícito de drogas, por meio de doleiros, para um

paraíso fiscal.

Quantos crimes praticou:

- Tráfico transnacional de drogas (art. 33 c/c art. 40, I da Lei nº

11.343/06)

- Evasão de divisas (art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86);

- Lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.603/98).

Para que seja oferecida a denúncia por lavagem de dinheiro não é

necessário que haja condenação prévia por tráfico ou evasão de divisas

(infrações penais antecedentes), bastando que existam indícios de sua

prática.

Outra pergunta: é necessário que esses três crimes sejam julgados pelo

mesmo juízo? O julgamento das três infrações precisará ser em conjunto?

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Não. O julgamento da lavagem de dinheiro não precisa ser,

necessariamente, feito pelo mesmo juízo que irá julgar a infração penal

antecedente.

A intenção original da Lei nº 9.603/98 era consagrar uma autonomia

absoluta entre o processo e o julgamento do crime de lavagem de dinheiro

e o da infração penal antecedente.

Ocorre que a jurisprudência afirmou que essa autonomia é relativa, ou

seja, é o juiz quem irá analisar se é conveniente ou não a reunião dos

processos, de acordo com as circunstâncias do caso concreto.

A lei nº 12.683/12 ao alterar o inciso II do art. 2º da Lei de lavagem,

deixou claro o que a jurisprudência e a doutrina majoritária já

sustentavam: o julgamento do crime de lavagem de dinheiro e da infração

penal antecedente podem ser reunidos ou separados, conforme se revelar

mais conveniente no caso concreto, cabendo ao juiz competente para os

crimes de lavagem decidir sobre a unidade ou separação dos processos.

Antes: a lei de lavagem afirmava que havia autonomia entre o julgamento

da lavagem e do crime antecedente, não esclarecendo se esta autonomia era

absoluta ou relativa nem o juízo responsável por decidir a unificação ou

separação dos processos.

AGORA: a alteração deixou claro que a autonomia entre o julgamento da

lavagem e da infração penal antecedente é relativa, de modo que a lavagem

e a infração antecedente podem ser julgadas em conjunto ou separadamente,

conforme se revelar mais conveniente no caso concreto, cabendo ao juiz

competente para o crime de lavagem decidir sobre a unidade ou separação

dos processos.

1.7. Sujeitos do crime:

- Sujeito passivo: é o Estado.

- Sujeito ativo: qualquer pessoa; o crime é comum.

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1.7.1. Pergunta: O autor do crime antecedente também responde por

lavagem?

Quanto a isso temos duas correntes:

1ª) não é possível que o autor do crime antecedente responda pelo delito

de lavagem de capitais, da mesma forma que acontece com os crimes de

receptação e favorecimento real. Na verdade, quando praticamos um crime,

a ocultação dos valores seria considerada mero exaurimento da conduta

anterior. Quando se pratica um crime é óbvio que esse dinheiro não ficará

simplesmente guardado e parado. Um outro argumento também interessante é

o de que a punição pelo delito de lavagem de capitais seria a violação do

Princípio que veda a auto-incriminação. Se se punisse o agente pela

lavagem de capitais, é como se ele fosse obrigado a revelar os valores

obtidos com o crime antecedente. Não é a corrente que prevalece.

2ª) nada impede que o autor do crime antecedente também responda pelo

crime de lavagem de capitais. O argumento de que a ocultação seria

exaurimento não é possível. Alguns doutrinadores afirmam que o princípio

da consunção deve analisar bens jurídicos. Não há como falar que a

lavagem seria mero exaurimento, se ela se refere a bem jurídico autônomo.

A partir do momento em que o dinheiro é investido e aplicado no mercado,

há uma conduta autônoma que vai lesar bem jurídico distinto. É a posição

que prevalece. Neste caso, aplica-se a regra do art. 69, CP: responde o

agente pelo delito antecedente e pela lavagem de capitais.

Pergunta: para responder por lavagem de capitais é preciso que o agente

tenha praticado o crime antecedente?

Não. A participação no crime antecedente não é condição sine qua non para

que o agente responda por lavagem de capitais, desde que tenha

conhecimento quanto à origem criminosa dos valores.

STJ, RMS 16.813

A tendência hoje é cada vez mais que ocorra essa terceirização da

lavagem: o próprio traficante não realiza o processo de lavagem, existem

Page 14: Lavagem de Capitais - 2012

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pessoas que são contratadas especialmente para isso (inclusive

advogados).

1.8. Tipo objetivo:

1.8.1. Conceituação dos dois verbos utilizados:

- Ocultar: significa esconder a coisa, dissimulando a posse. Ocorre

quando alguém pratica algum tipo de conduta objetivando dificultar ou

impedir que alguém encontre uma coisa.

- Dissimular: significa disfarçar; ou seja, o agente visa garantir a

ocultação. Dissimulação significa ocultação com fraude.

Atenção: a partir do momento em que a lei usa o verbo ocultar, temos aqui

um ex. de crime permanente, aquele cuja consumação se prolonga no tempo.

Caso depósitos tenham sido efetuados antes da vigência da lei, responderá

o agente normalmente pelo delito, caso essa ocultação se prolongue no

tempo (04/03/98 – data da vigência da lei).

Súm. 711, STF:

“A lei penal mais grave (neste caso, a lavagem de capital) aplica-se ao

crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à

cessação da continuidade ou da permanência”.

Temos neste tipo objetivo dois verbos. Assemelha-se ao crime de tráfico

(só que no tipo objetivo de tráfico temos vários verbos, e não apenas

dois).

Esse tipo de crime em que temos vários verbos denomina-se crime de ação

múltipla ou de conteúdo variado. A relevância desta informação está no

Princípio da alternatividade: nos crimes de ação múltipla ou de conteúdo

variado, responderá por crime único o agente que praticar mais de uma

conduta dentro do mesmo contexto fático.

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A lavagem de capitais é exemplo, de acordo com a doutrina, de um crime

diferido ou remetido (ou acessório), pois depende da prática do crime

antecedente (e remete a este crime antecedente).

→ Natureza do crime de lavagem de capitais: é crime material ou crime

formal?

art. 1º e §1º, da LLC:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,

disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores

provenientes, direta ou indiretamente, de crime: (...)

§ 1º Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização

de bens, direitos ou valores provenientes de qualquer dos crimes

antecedentes referidos neste artigo:

I - os converte em ativos lícitos;

II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia,

guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;

III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos

verdadeiros.

O tipo penal fala em “ocultar ou dissimular...”, tanto no caput como no

§1º. Ocorre que o tipo penal do caput é diverso do crime do §1º. As

redações são muito diversas.

Assim, podemos afirmar que no §1º, como a redação traz o termo “para

ocultar ou dissimular”, a intenção (a finalidade) do agente é ocultar ou

dissimular, sem que haja necessidade de que isso ocorra. Há, assim, um

crime formal. Já no caso do caput, a redação diz apenas “ocultar ou

dissimular”, mas não fala em finalidade, mas apenas no verbo, o que quer

dizer que nesse caso é necessária a produção do resultado. Assim, trata-

se de crime material. Esse seria o melhor entendimento.

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Não obstante, a doutrina majoritária entende que ambas as figuras (caput

e §1º) trazem um crime formal.

1.8.2. Pergunta: o crime de lavagem é um crime congruente ou

incongruente?

- Tipo congruente ou congruente simétrico é o tipo em que há uma perfeita

adequação entre os elementos objetivos e subjetivos do tipo penal. No

tipo congruente é como se disséssemos que o tipo objetivo é absolutamente

ao tipo subjetivo. Ex. clássico de tipo congruente: homicídio – a conduta

incriminada pelo art. 121 é matar alguém, e o tipo subjetivo é querer

matar alguém (o chamado animus necandi).

- Tipo incongruente ou congruente assimétrico, por sua vez, é o tipo em

que não há uma perfeita adequação, sendo que o tipo subjetivo é acrescido

de um dolo específico (ou especial fim de agir).

Quando nos deparamos com um tipo incongruente, já não conseguimos fazer o

encaixe. Nele temos um tipo objetivo, mas o tipo subjetivo será acrescido

do chamado dolo específico (ex.: “para o fim de”, “com o fim de”).

Ex. de tipo incongruente: crime de extorsão mediante seqüestro (art. 159,

CP), em que há um especial fim de agir – diferentemente do crime de

seqüestro (art. 158, CP), que é ex. de tipo congruente.

Atenção para esse tema (tipo congruente ou incongruente) na Lei de

Drogas! Muito provável que caia em concursos: o tráfico é ex. de tipo

congruente (não exige nenhuma finalidade específica), enquanto o crime do

art. 28 é ex. de tipo incongruente (exige a finalidade específica “para

uso próprio”).

Atenção: o art. 1º, caput, da LLC é um ex. de crime de tipo congruente,

enquanto que o §1º é ex. de um tipo incongruente.

1.9. Tipo subjetivo:

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No Brasil, o crime de lavagem de capitais somente é punido a título de

dolo. Em alguns países da Europa o crime é punido a título de culpa.

Pergunta: o crime é punido apenas a título de dolo direto ou também é

punido a título de dolo eventual? Alguns doutrinadores dizem que o delito

de lavagem de capitais somente seria punido a título de dolo direto. Mas

sabemos que quando o legislador quer afastar o dolo eventual ele o faz de

maneira expressa. Vejamos alguns exemplos:

Ex.: art. 339, CP – denunciação caluniosa (traz a expressão “de que o

sabe inocente”) – o legislador restringe o tipo à figura do dolo direto;

Outro ex.: art. 180, CP – receptação (traz a expressão “coisa que sabe

ser produto de crime”) – o legislador diz que para ser punido é preciso

saber que aquilo era produto de crime (se o agente apenas assumir o

risco, o fato é atípico).

Voltando para a LLC: somente no §2º é que o legislador restringiu o tipo

ao dolo direto. Todas as condutas do art. 1º são puníveis tanto a título

direto, quanto a título de dolo eventual – salvo no caso do §2º, em que

as condutas somente são puníveis a título de dolo direto:

§ 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:

I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou

valores que sabe serem provenientes de qualquer dos crimes antecedentes

referidos neste artigo;

II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de

que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes

previstos nesta Lei.

Para que o agente responda por lavagem de capitais, não basta que ele

tenha conhecimento de que está ocultando valores, direitos, bens. É

preciso que ele saiba que os valores são provenientes de crime. Ou seja,

é indispensável que o agente tenha conhecimento de que os bens, direitos

ou valores ocultados são provenientes dos crimes antecedentes previstos

no art. 1º.

Page 18: Lavagem de Capitais - 2012

18

Problema: se cada vez mais a lavagem passa por um processo de

terceirização e profissionalização, o que a empresa de lavagem vai querer

saber sobre a origem dos valores? Nada.

Surge ai a chamada “Teoria da Cegueira Deliberada”: tem origem nos EUA e

é também conhecida como “Teoria ou Instruções da Avestruz” (em inglês

fala-se em “Wilfull Blindness” ou “Ostrich instructions”). Ela surgiu

inicialmente no crime de tráfico de drogas, mas passou a ser trazida

também para o crime de lavagem de capitais. Esta teoria traz a idéia de

que a pessoa deliberadamente evita a consciência da origem do dinheiro.

Assim, nos casos de lavagem é cada vez mais comum que o lavador

profissional evite conhecer a origem do dinheiro.

Atenção: quando o agente deliberadamente evita a consciência quanto à

origem ilícita dos bens, assume o risco de produzir o resultado,

respondendo pelo delito de lavagem de capitais a título de dolo eventual.

Ex.: caso do Banco Central de Fortaleza – dois empresários venderam 11

veículos para os autores da subtração, e foi pago tudo em dinheiro. E

eles não procuraram saber a origem dos valores. R$ 164.755.150,00 foram

subtraídos nesse golpe. O crime antecedente aqui foi praticado por uma

organização criminosa.

1.10. Objeto material:

Aqui basta que saibamos que o objeto material não se confunde com o bem

jurídico.

O objeto material do crime de lavagem de capitais são os bens, direitos

ou valores provenientes direta ou indiretamente dos crimes antecedentes

definidos no art. 1º, da LLC.

A doutrina distingue o produto direto de crime (ou producta sceleris) do

produto indireto: o produto direto do crime é o resultado imediato do

delito (ex.: na corrupção passiva, é a vantagem indevida que se recebe);

o produto indireto ou proveito da infração (também conhecido como fructus

Page 19: Lavagem de Capitais - 2012

19

sceleris) é o resultado mediato do crime, ou seja, é o proveito obtido

pelo criminoso como resultado da utilização do produto direto do delito

(ex.: a compra de um veículo com o dinheiro obtido com o tráfico). Tanto

o produto direto como o produto indireto dos crimes antecedentes é objeto

da lavagem.

1.11. Crimes antecedentes:

A legislação brasileira adota um rol taxativo (numerus clausus).

art. 1º, LLC:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,

disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores

provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;

II – de terrorismo e seu financiamento;

III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado

à sua produção;

IV - de extorsão mediante seqüestro;

V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou

para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição

ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;

VI - contra o sistema financeiro nacional;

VII - praticado por organização criminosa.

VIII – praticado por particular contra a administração pública

estrangeira (arts. 337-B, 337-C e 337-D do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de

dezembro de 1940 – Código Penal).

Pena: reclusão de três a dez anos e multa.

Lendo esse rol, vemos que dele não consta:

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20

- contravenções penais (e deveria ter constado pelo menos o jogo do

bicho);

- crimes contra a ordem tributária;

- crimes ambientais.

Análise dos crimes antecedentes:

1.11.1 Tráfico ilícito de drogas:

Pergunta: qual é o crime de tráfico de drogas, e onde ele está previsto?

O art. 33 da Lei de drogas não traz, assim como o CP (ex.: art. 121 –

homicídio), o nome do crime.

Na lei antiga (Lei 6368/76), a jurisprudência sempre considerou como

crime de tráfico o art. 12 e o art. 13 da lei. O art. 14, que à época

trazia a associação para o tráfico, de acordo com a jurisprudência

majoritária, não era equiparado a crime hediondo.

Na lei nova, o art. 33 traz, sem dúvida alguma, a figura do crime de

tráfico de drogas, mas o art. não traz o nome do crime.

Problema: o §2º traz a figura de quem induz, instiga ou auxilia alguém ao

uso indevido de drogas. Essa conduta caracteriza tráfico? Dela não

resulta nenhum bem, direito ou valor a ser lavado.

O art. 44 da Lei de drogas dá uma dica do que seja o crime de tráfico. A

partir do momento em que ele restringe a liberdade provisória, a anistia,

a graça, o indulto e a fiança para alguns crimes, ele indica que tais

crimes sejam crimes de tráfico de drogas. Ocorre que o crime do art. 35

(associação) deve ser excluído desse rol – e da mera associação não

resulta dinheiro, então não é possível que haja lavagem de capitais dela

proveniente.

Assim, o ideal é dizer que os crimes de tráfico são os previstos nos

seguintes dispositivos:

Page 21: Lavagem de Capitais - 2012

21

- art. 33, caput e §1º;

- arts. 34, 36 e 37.

O art. 36 da lei de drogas é o crime de financiamento para o tráfico.

Esse financiamento pode, então, ser equiparado ao crime de tráfico para

fins de lavagem de capitais.

1.11.2. Terrorismo e seu financiamento:

Pergunta: existe o crime de terrorismo no ordenamento jurídico? A maioria

da doutrina entende que não, que este delito não está definido no

ordenamento jurídico. Alguns doutrinadores, todavia, dentre eles Antonio

Scaranze Fernandes, sustentam que o delito estaria previsto no art. 20 da

Lei 7.170/83 (lei de Segurança Nacional), que traz os chamados crimes

políticos.

Problema: quando esse dispositivo fala em “atos de terrorismo”, esta

expressão funciona como um elemento normativo, que é um elemento

constante do tipo penal, cuja compreensão demanda um juízo de valor.

Ex.: mulher honesta (quando ainda existia no CP).

Atos de terrorismo é, pois, um outro exemplo de elemento normativo. Ou

seja, não é possível saber se é ou não terrorismo, porque não se sabe

quais são os atos de terrorismo.

Essa mesma discussão já existiu antes, no ECA:

art. 233, da Lei 8.069/90 (ECA): submeter criança ou adolescente sob sua

autoridade, guarda ou vigilância, a tortura. Tortura aqui é um elemento

normativo. O que seria essa tortura a que se refere esse art. 233? Uma

coisa pode ser tortura para alguém e não ser para outrem.

A legalidade do art. 233, ECA foi questionada perante o STF, que concluiu

por sua constitucionalidade, sob o argumento de que o conceito de tortura

poderia ser apreendido a partir das convenções internacionais das quais o

Brasil fosse signatário.

Page 22: Lavagem de Capitais - 2012

22

Esse art., porém, foi revogado pela Lei de Tortura.

O que importa aqui é que esse mesmo argumento do STF pode vir a ser

utilizado pelo STF no caso do crime de terrorismo.

Obs.: dissemos que para a maioria da doutrina o terrorismo não estaria

previsto no ordenamento pátrio. Mas e se o crime for praticado fora do

país e os valores sejam aplicados aqui no Brasil? O crime de lavagem de

capitais pode ser punido aqui no Brasil? Não.

Caso o delito de terrorismo seja praticado em outro país, entende a

doutrina que não será possível a punição pelo delito de lavagem de

capitais praticado em território nacional, sob pena de violação ao

Princípio da dupla incriminação.

1.11.3. Contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à

sua produção:

O legislador não deveria ter utilizado a expressão “contrabando”, seria

melhor que ele tivesse dito apenas tráfico de armas, munições ou material

destinado à sua produção.

O tráfico ou comércio de armas está previsto nos arts. 17 e 18 da Lei

10.826/03 (Estatuto do Desarmamento) e, além disso, a doutrina também

aponta o tráfico de armas no crime do art. 12 da Lei 7.170/86 (Lei de

segurança nacional).

1.11.4. Extorsão mediante seqüestro:

Este crime está previsto no art. 159, CP.

Atenção: o crime de extorsão mediante seqüestro previsto no CPM não é

crime antecedente de lavagem de capitais. O rol não comporta o crime

militar, só se refere ao crime comum.

1.11.5. Crime contra a Administração Pública:

Page 23: Lavagem de Capitais - 2012

23

O legislador aqui colocou quase que um capítulo inteiro do CP.

A parte final do dispositivo legal é redundante, pois concussão é crime

contra a AP.

Pergunta: o delito de prevaricação pode figurar como crime antecedente do

delito de lavagem de capitais? Prevaricar é retardar ou deixar de

praticar ato de ofício, ou praticá-lo contra expressa previsão legal,

para satisfazer interesse pessoal. Assim, a prevaricação não pode ser

crime antecedente, pois não tem dinheiro, bem ou valor envolvido (se

houver o recebimento de algum valor, não será mais prevaricação, e sim

corrupção passiva).

Assim, aqui entram os crimes contra a AP, mas desde que resulte proveito

econômico a ser lavado.

Os crimes contra a AP estão previstos entre os arts. 312 e 359-H, do CP;

na Lei de Licitações; e, ainda, na Lei dos crimes de Responsabilidade de

Prefeitos e Vereadores (DL 201/67).

Pergunta: e o ato de improbidade administrativa, pode figurar como

antecedente do delito de lavagem de capitais? Não. Ato de improbidade

administrativa não é crime e, se não é crime, não pode figurar como

antecedente da lavagem de capitais. Salvo, obviamente, se o ato de

improbidade também constituir crime.

1.11.6. Crimes contra o sistema financeiro nacional:

Esses crimes estão previstos na Lei 7.492/86 e também na Lei 6.385/76.

1.11.7. Crime praticado por organização criminosa:

Pergunta: Existe conceito legal de organização criminosa no nosso

ordenamento jurídico?

Page 24: Lavagem de Capitais - 2012

24

Esse problema vai surgir por conta da Lei 9.034/95, que é conhecida como

Lei das Organizações Criminosas. Essa lei disciplina meios de prova e

procedimentos investigatórios relativos a crimes praticados por quadrilha

ou bando, organizações ou associações criminosas.

Quadrilha ou bando são expressões sinônimas. É um crime autônomo,

previsto no art. 288, CP. Quadrilha é a associação estável e permanente

de mais de 3 pessoas com o fim de praticar uma série indeterminada de

crimes. Consuma-se o delito de quadrilha independentemente da prática dos

delitos para os quais os agentes se associaram.

Associações criminosas não se confundem com quadrilha. Elas estão

previstas no art. 35 da Lei de Drogas, por ex. Esse dispositivo exige

duas ou mais pessoas. Existem outras associações, como, por ex. a

associação prevista na lei do genocídio (art. 2º, da Lei 2.889/56).

Também existe delito de associação nos arts. 16 e 24 da Lei 7.170/83 (Lei

de segurança nacional).

Por fim, o conceito de organizações criminosas: este será visto na

próxima aula.

O grande problema sobre Organizações é saber se existe um conceito de

organizações criminosas no ordenamento jurídico brasileiro.

I- Para uma primeira corrente, não existe conceito legal de organizações

criminosas no Brasil. Essa primeira corrente ganha um reforço de uma

análise do próprio CN, onde tramitam pelo menos 3 projetos de lei que

visam definir o que seriam organizações criminosas. Se estão tramitando

no CN projetos de lei para definir o que seja organização criminosa, isso

significaria que não existe ainda o conceito no Brasil. De acordo com o

projeto de lei 7.223, organização criminosa é caracterizada pela presença

de pelo menos 3 das seguintes características:

- hierarquia estrutural;

- planejamento empresarial;

- uso de meios tecnológicos avançados;

Page 25: Lavagem de Capitais - 2012

25

- recrutamento de pessoas;

- divisão funcional das atividades;

- conexão estrutural ou funcional com o poder público ou com um agente do

poder público;

- oferta de prestações sociais;

- divisão territorial das atividades ilícitas;

- auto-poder de intimidação;

- alta capacitação para a prática de fraude;

- conexão local, regional, nacional ou internacional com outra

organização criminosa.

II- Uma segunda corrente, que também vem ganhando corpo, por sua vez,

afirma que, enquanto a lei brasileira não fornecer um conceito legal de

organizações criminosas, é possível a utilização do conceito dado pela

Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional,

realizada em Palermo (e por isso é conhecida como a Convenção de

Palermo, em 15/12/2000. De acordo com essa Convenção de Palermo,

organização criminosa é o grupo estruturado de 3 ou mais pessoas

existente há algum tempo e atuando concertadamente com o fim de cometer

infrações graves, com a intenção de obter benefício econômico ou moral.

Esta convenção foi ratificada pelo Decreto legislativo nº 231 e pelo

Decreto 5.015/04.

O Capez concorda com essa segunda corrente.

Em verdade, ninguém nega a importância dos Tratados Internacionais de

direitos humanos. O STF, inclusive, dá a eles um status normativo supra-

legal. Mas, daí a entender que um tratado internacional pudesse definir

crimes e estabelecer penas, é outra coisa. Para o prof. LFG, inclusive,

essa definição de crime por um tratado internacional violaria o Princípio

da Legalidade, exatamente em uma de suas garantias (ou facetas), qual

Page 26: Lavagem de Capitais - 2012

26

seja, a denominada lex popoli: crimes e penas só podem ser estabelecidos

com a participação dos representantes do povo na elaboração e aprovação

do texto final.

Por mais que a convenção internacional passe pela ratificação do CN, o CN

não pode alterar o tratado ao votá-lo, por isso a doutrina faz esta

crítica.

1.11.8. Crime praticado por particular contra a administração pública

estrangeira:

É o último crime do rol.

Aqui vale a pena ficar atento a duas observações:

- Esses crimes foram inseridos no CP pela Lei 10.467/02.

art. 337-B, 337-C e 337-D, CP.

- LLC, art. 1º, VIII, foi incluído pela mesma Lei 10.467/02.

A causa de aumento de pena do art. 1º, §4º: a lei aqui diz que a pena

será aumentada de 1/3 a 2/3 nos casos previsto nos incisos I a VI, se o

crime for cometido de forma habitual ou por intermédio de organização

criminosa. A lei é de 1998 e o inciso VIII foi incluído por lei posterior

(2002) e esqueceram de atualizar o §4º para incluí-lo. Atenção então: se

o crime antecedente for o do inciso VIII, mesmo que seja cometido de

forma habitual, não incide a causa de aumento de pena; ela não incide se

o crime for o do inciso VIII.

1.12. Tentativa:

É possível a tentativa no crime de lavagem de capitais? Sem dúvida que

sim. Afinal de contas, trata-se de crime plurisubsistente.

Porém, atenção: qual será a regra e qual será o benefício do agente no

caso da tentativa?

art. 1º, §3º, LLC:

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27

§3º. A tentativa é punida nos termos do parágrafo único do art. 14 do

Código Penal.

Esse dispositivo era absolutamente desnecessário e redundante, em virtude

daquilo que preceitua o art. 12, CP, segundo o qual as regras gerais do

CP aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não

dispuser de modo diverso.

1.13. Habitualidade:

Essa habitualidade será importante por conta do art. 1º, §4º, LLC, que

fala em crime cometido de forma habitual (caso em que será aumentada a

pena).

O crime de lavagem, portanto, não é um crime habitual, já que vai incidir

uma causa de aumento se ele for habitual.

Diante do art. 1º, §4º, conclui-se, portanto, que a habitualidade não é

uma elementar do crime de lavagem.

Atenção para não confundir crime habitual com a chamada habitualidade

criminosa. São conceitos distintos:

- No crime habitual, a prática de um ato isolado não gera tipicidade, ou

seja, exige-se do agente uma prática reiterada da conduta a fim de restar

caracterizado o delito. Ex.: art. 282, CP (exercício ilegal da medicina,

arte dentária ou farmacêutica). Aqui não basta uma única conduta, é

preciso que a conduta seja praticada de forma reiterada.

- Habitualidade criminosa é sinônimo de reiteração delituosa, ou de

criminoso habitual. Na habitualidade criminosa há pluralidade de crimes,

sendo a habitualidade uma característica do agente, e não da infração

penal. Na habitualidade criminosa, tem-se uma seqüência de atos típicos

que demonstram um estilo de vida do autor. A pessoa faz do crime o seu

estilo de vida, pois pratica muitos crimes.

Page 28: Lavagem de Capitais - 2012

28

Obs. ainda sobre o §4º: não é necessária uma homogeneidade de

circunstância de tempo, lugar e modus operandi para a incidência da causa

de aumento de pena do art. 1º, §4º (Atenção para não confundir com o

crime continuado, que exige essa homogeneidade)!

STJ, HC 19902.

1.14. Delação premiada:

A delação premiada, também conhecida como “Chamada de co-réu”, consiste

na possibilidade de o participante e/ou associado de infração penal ter

sua pena reduzida, substituída por restritiva de direitos, ou até mesmo

extinta, mediante a denúncia de seus comparsas às autoridades,

possibilitando o desmantelamento do bando ou quadrilha, a descoberta de

toda a trama delituosa, a localização do produto do crime, ou a

facilitação da libertação do seqüestrado, no caso do crime de extorsão

mediante seqüestro cometido em concurso de agentes.

Delação premiada, então, nada mais é do que o reconhecimento por parte do

Estado de que precisa da colaboração do agente.

Delação vem do verbo delatar, que significa apontar comparsas.

LFG entende que colaboração premiada seria o gênero do qual seria espécie

a delação premiada. Ex.: dizer a localização da vítima seria colaboração

e não delação (pois ai não se estaria apontando o comparsa).

1.14.1. Pergunta: quando surgiu a delação premiada e onde ela está

prevista?

Art. 25, §2º, da Lei 7.492/86 (Lei dos crimes contra o sistema financeiro

nacional);

art. 8º, P.U., da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos);

art. 159, §4º, CP (extorsão mediante seqüestro);

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29

art. 16, P.U., da Lei 8.137/90 (Lei que dispõe sobre os crimes contra a

ordem tributária);

art. 6º, da Lei 9.034/95 (Lei das Organizações Criminosas).

Detalhe importante: em todos esses dispositivos legais supra citados a

delação premiada traz como benefício uma diminuição da pena de 1/3 a 2/3.

Outras hipóteses de delação premiada:

Art. 1º, §5º, da Lei 9.613/98 (LLC):

§ 5º A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser cumprida

em regime aberto, podendo o juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la por

pena restritiva de direitos, se o autor, co-autor ou partícipe colaborar

espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que

conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à

localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.

1.14.2. A delação premiada na Lei de lavagem de Capitais pode trazer para

o acusado 3 benefícios, que vão variar de acordo com o grau de

colaboração:

1) diminuição da pena de 1/3 a 2/3 e fixação de regime inicial aberto;

2) substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de

direitos;

3) perdão judicial como causa extintiva da punibilidade.

Além da lei de lavagem, também vai haver delação premiada nos seguintes

dispositivos legais:

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30

arts. 35-B e 35-C, da Lei 8.884/94 (Lei que dispõe sobre crimes contra a

ordem econômica) – ela possibilita o chamado “Acordo de Leniência”,

também conhecido como acordo de brandura ou acordo de doçura. Ele pode

ser inclusive uma causa impeditiva do oferecimento da denúncia e, se

cumprido, extinguirá a punibilidade do agente, conforme se depreende da

redação de tais arts.:

Art. 35-B. A União, por intermédio da SDE, poderá celebrar acordo de

leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a

redução de uma dois terços da penalidade aplicável, nos termos deste

artigo, com pessoas físicas e jurídicas que forem autoas de infração à

ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e

o processo administrativo e que dessa colaboração resulte:

I- a identificação dos demais co-autores da infração; e

II- a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração

noticiada ou sob investigação.(...)

Art. 35-C. Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei 8.137,

de 27 de novembro de 1990, a celebração de acordo de leniência, nos

termos desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e

impede o oferecimento de denúncia.

Parágrafo Único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se

automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste

artigo.

Arts. 13 e 14, da Lei 9.807/99 (Lei de proteção às testemunhas).

Para muitos doutrinadores, esta lei ficaria valendo como uma regra geral

de delação premiada, sobretudo para as leis anteriores:

Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder

o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado

que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a

Page 31: Lavagem de Capitais - 2012

31

investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha

resultado:

I- a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;

II- a localização da vítima com a sua integridade física preservada;

III- a recuperação total ou parcial do produto do crime.

Parágrafo Único. A concessão do perdão judicial levará em conta a

personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e

repercussão social do fato criminoso.

Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a

investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais

co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na

recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação,

terá pena reduzida de um a dois terços.

Art. 41, da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas):

Art. 41.  O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a

investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais

co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do

produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a

dois terços.

Momento para a concessão da delação premiada: para a doutrina, a delação

premiada pode ser acordada com o criminoso desde a fase investigatória

até o momento da sentença.

Porém, para alguns doutrinadores, a delação premiada poderia ser feita

mesmo após o trânsito em julgado da sentença condenatória, desde que a

delação fosse objetivamente eficaz. Nesse caso o benefício deverá ser

concedido através de uma revisão criminal, com fundamento no art. 621,

III, CPP:

Art. 621.  A revisão dos processos findos será admitida:

Page 32: Lavagem de Capitais - 2012

32

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei

penal ou à evidência dos autos;

II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou

documentos comprovadamente falsos;

III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência

do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição

especial da pena.

Proposta da delação: tanto a autoridade policial quanto o MP devem

alertar indiciados e acusados sobre a possível pena a que estarão

sujeitos em caso de condenação e sobre os benefícios que poderão obter em

virtude de uma efetiva colaboração. Caso haja consenso, poderá ser

lavrado um acordo sigiloso entre acusação e defesa a ser homologado pelo

juiz. Esse acordo não deve constar dos autos, nem se tornar público, nem

mesmo para os advogados dos demais acusados delatados.

HC 90.688 e AP 470

A publicidade do depoimento do delator somente irá ocorrer quando ele for

ouvido formalmente no processo, mas desde que essa oitiva seja

necessária.

Esse acordo de delação premiada tem fundamento nos dispositivos legais

acima citados e também no art. 129, inciso I, da Constituição Federal:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

Valor probatório de uma delação premiada: para a jurisprudência, a

delação premiada por si só não pode fundamentar uma condenação, devendo

estar corroborada por outros elementos probatórios. RE 213937

Benefício pessoal: a delação é um benefício pessoal, ou seja, não é

possível que seja aplicada aos demais co-autores ou partícipes do fato

Page 33: Lavagem de Capitais - 2012

33

delituoso (só poderá ser aplicado ao delator). Não é aplicável a quem não

colaborou.

1.15. Procedimento:

Art. 2º e ss, da LLC (Lei 9.613/98) trata das disposições processuais do

crime de lavagem de capitais.

O art. 2º, I, fala que o procedimento do crime de lavagem vai ser o

procedimento comum dos crimes punidos com reclusão, da competência do

juiz singular:

Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:

I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes

punidos com reclusão, da competência do juiz singular;

A lei aqui nesse dispositivo, então, faz menção a um procedimento: o

procedimento comum dos crimes punidos com reclusão.

Ocorre que esse procedimento, que outrora era definido pelo código de

acordo com a espécie de pena (reclusão ou detenção) sofreu uma alteração

por força da Lei 11.719/08, que alterou os procedimentos. Agora o

procedimento já não é mais determinado por conta da espécie de pena, mas

sim por conta do máximo de pena privativa de liberdade cominada.

Agora nós temos então o chamado procedimento comum ordinário e ele será

aplicável em relação aos delitos cuja pena máxima cominada seja igual ou

superior a 4 anos.

O procedimento sumário, por sua vez, será aplicável aos crimes cuja pena

máxima cominada for inferior a 4 e superior a 2 anos.

Por fim, o procedimento dos Juizados, que seria o procedimento comum

sumaríssimo, será aplicável a todas as contravenções e crimes cuja pena

máxima seja igual ou inferior a 2 anos, cumulada ou não com multa e

submetidos os crimes ou não a procedimento especial.

Page 34: Lavagem de Capitais - 2012

34

A pena do delito previsto no art. 1º da LLC é de 3 a 10 anos. Assim, se a

pena máxima cominada é superior a 4 anos, podemos concluir que o

procedimento aplicável será mesmo o procedimento comum ordinário (mas não

porque a pena é de reclusão, e sim porque o seu máximo é superior a 4

anos).

Pergunta: E se houver conexão probatória, com a conseqüente reunião dos

processos de lavagem e de tráfico de drogas, qual seria o procedimento?

A reunião desses dois processos não é obrigatória. Se puder acontecer,

tanto melhor, mas não há obrigatoriedade disso. Ocorre que, imaginando

que os processos sejam reunidos, haverá um problema: a lei de drogas tem

um procedimento especial e a LLC tem um procedimento comum. Assim, diante

da duplicidade de procedimentos, qual deles seria aplicável?

É preciso que nos lembremos do que dizia a antiga lei de drogas (Lei

6368/76), que tinha um dispositivo específico sobre o assunto: o art. 28,

que dizia que nos casos de conexão e continência entre os crimes

definidos naquela lei, e outras infrações penais, o procedimento será o

previsto para a infração mais grave, ressalvados os da competência do

júri e das jurisdições especiais.

Se hoje esta regra estivesse em vigor, nesse exemplo de conexão valeria

sempre o procedimento da Lei de Drogas, que traz hoje uma pena de 5 a 15

anos de reclusão. Ocorre que este art. 28 da Lei 6368/76, e a própria lei

foram revogados pela Lei 11.343/06.

Pergunta: a nova lei de drogas trouxe dispositivo semelhante ao antigo

art. 28? Não. A nova lei não trouxe nenhum dispositivo que trate dos

crimes conexos.

Mas então, agora, qual será o procedimento a ser usado nesses casos de

crimes conexos? Em verdade, desde antes, quando ainda estava em vigor o

antigo art. 28, ele já era bastante criticado pela doutrina (ex.: Vicente

Greco Filho) que dizia que não se pode estabelecer o procedimento em

razão da gravidade do delito.

Page 35: Lavagem de Capitais - 2012

35

É preciso sempre, diante de crimes conexos, buscar o procedimento que

seja mais amplo. E procedimento mais amplo não significa,

necessariamente, procedimento mais demorado. O procedimento mais amplo é

aquele que mais assegure às partes o exercício de suas faculdades

processuais.

Pergunta: diante dessa regra trazida pela doutrina, e diante dos dois

procedimentos em conflito (procedimento comum ordinário da LLC e

procedimento especial da Lei de Drogas), qual deles será o procedimento

mais amplo?

Sem dúvida alguma, para a doutrina, será o procedimento comum ordinário,

porque possibilita um maior nº de testemunhas, além de possibilitar que o

juiz conceda memoriais, que a sentença saia em 10 dias, possibilita

diligências, etc. Na verdade, a única vantagem que a Lei de Drogas tem é

a previsão da chamada “defesa preliminar”, mas, tirando isso, em tudo o

procedimento comum ordinário é mais amplo.

1.15.1. Autonomia do processo:

Essa autonomia do processo que aqui vamos trabalhar, vem citada no art.

2º, II, LLC:

Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:

I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes

punidos com reclusão, da competência do juiz singular;

II - independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes

referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país;

Page 36: Lavagem de Capitais - 2012

36

Esse dispositivo consagra a autonomia, a independência do processo de

lavagem de capitais, que não precisa tramitar em conjunto com o processo

pelo crime antecedente. O processo pelo crime de lavagem de capitais não

precisa tramitar, obrigatoriamente, com o processo em relação ao crime

antecedente, o que no entanto, não significa dizer que a reunião dos

processos seja proibida.

Tudo vai depender do caso concreto.

STJ, HC 48300 e HC 59663 (este último diz expressamente que não vige nem

a regra da obrigatória reunião e nem a da obrigatória separação).

Mesmo que o crime antecedente seja praticado em outro país, se a lavagem

for cometida no território nacional, o agente responderá aqui pelo crime

de lavagem.

Pergunta: e se ocorrer o contrário, a lavagem sendo praticada fora do

país?

Mesmo que o delito de lavagem de capitais fosse praticado em outro país,

também estaria sujeito à lei brasileira (extraterritorialidade

condicionada da Lei Penal brasileira – art. 7º, II, “a”. CP), na medida

em que tal crime está previsto em tratado ou convenção internacional.

Atenção, no caso do art. 7º, II, “a”, CP será necessário o implemento das

condições do art. 7º, §2º, CP:

Extraterritorialidade

Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no

estrangeiro:

I - os crimes:

a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;

b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de

Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de

economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;

c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;

d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;

Page 37: Lavagem de Capitais - 2012

37

II - os crimes:

a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;

b) praticados por brasileiro;

c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de

propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam

julgados.

§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira,

ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro.

§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do

concurso das seguintes condições:

a) entrar o agente no território nacional;

b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;

c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira

autoriza a extradição;

d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido

a pena;

e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo,

não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.

1.15.2. Competência criminal:

Quem vai processar e julgar o delito de lavagem de capitais? Justiça

estadual ou Justiça federal?

Devemos ficar atentos ao que nos diz o art. 109, VI, CR:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados

por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;

Page 38: Lavagem de Capitais - 2012

38

Conclusão: crimes contra o sistema financeiro e a ordem econômico-

financeira somente serão de competência da Justiça Federal quando a lei

assim o determinar.

A competência, portanto, para julgar o crime de lavagem de capitais deve

ser retirada da própria LLC (Lei 9.613/98).

art. 2º, III – diz os casos expressos em que os crimes serão da

competência da Justiça Federal. Isso significa que nos demais casos a

competência será da Justiça estadual:

III - são da competência da Justiça Federal:

a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-

financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou

de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;

b) quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal.

Atenção para as hipóteses!

Diante do art. 2º, III, conclui-se: em regra, compete à Justiça estadual

o processo e julgamento do crime de lavagem de capitais. A competência

será da Justiça Federal somente nas seguintes hipóteses:

a) quando o crime for praticado contra o sistema financeiro ou em

detrimento e bens, serviços ou interesses da União, suas empresas

públicas ou autarquias (federais);

b) quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal.

Page 39: Lavagem de Capitais - 2012

39

Atenção: é bem verdade que na prática, na grande maioria dos casos a

competência será mesmo da Justiça Federal, mas não podemos dizer que esta

é a regra.

STJ, CC 96678 e HC 11462.

1.15.3 Criação de Varas Especializadas para o julgamento de crimes de

lavagem de capitais:

Esse tema é bem interessante para cair em uma segunda fase de concurso,

pois é uma das mais intensas discussões em relação ao crime de lavagem de

capitais.

Obs.: 90% da jurisprudência sobre esse crime de lavagem de capitais está

relacionada à essa criação de varas especializadas para julgamento desses

crimes. Muitos advogados afirmam que essa criação de varas violaria o

princípio do juiz natural.

Evolução histórica do tema:

Em 2001, foi feita uma pesquisa com juízes federais, e muitos deles

afirmaram que nunca haviam conduzido em processo ninguém pelo crime de

lavagem de capitais. Concluiu-se que não havia um preparo suficiente dos

julgadores para o processo e julgamento desses crimes.

Em 2003, surge a Resolução 314/03 do Conselho da Justiça Federal, que

determinava que os Tribunais Regionais federais deveriam especializar

varas no combate à lavagem de capitais, e inclusive, dizia que isso

deveria ser feito no prazo de 60 dias (tamanha a preocupação que

existia).

A partir daí então, os TRF´s começaram a especializar varas, por meio de

Resoluções e Provimentos:

Esse assunto provocou tanta polêmica porque alguns desses provimentos

determinaram que os processos em andamento nas demais varas fossem

remetidos (redistribuídos) às Varas Especializadas, salvo se já estivem

com a instrução encerrada.

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40

Surgiram então dois questionamentos:

- O Tribunal pode especializar Vara? Há previsão legal para essa

especialização em Varas?

- Essa alteração da competência aos processos penais que já estavam em

andamento não viola o princípio do juiz natural?

Analisemos cada um desses questionamentos:

Existe sim previsão legal para a especialização de Varas federais: art.

12, da Lei 5.010/66 (Lei que organiza a Justiça Federal – é velha, mas

continua em vigor):

Art. 12. Nas Seções Judiciárias em q houver mais de uma Vara, poderá o

Conselho da Justiça Federal fixar-lhes sede em cidade diversa da Capital,

especializar Varas e atribuir competência por natureza de feitos a

determinados juízes.

Além disso, a própria CR assegura ao Poder Judiciário autonomia

administrativa e financeira, podendo proceder à sua auto-organização

administrativa.

Porém, tem um detalhe importante que não pode passar despercebido: quem é

que poderá especializar as varas?

Com a CR/88 o Conselho da justiça federal já não tem mais esta

legitimidade, pois na verdade, ele hoje é um mero órgão de regulamentação

interna, que não tem mais esta atribuição. Assim, apesar de o art. 12

dizer que o Conselho da justiça federal pode especializar varas, diante

da CR/88, tal atribuição passou a ser dos próprios TRF´s.

Page 41: Lavagem de Capitais - 2012

41

Art. 105, P.U., II, CR, que diz quais são as atribuições do Conselho da

justiça federal (e dentre elas não inclui a especialização de varas).

Quanto à segunda questão: quanto à redistribuição dos processos que

estavam em andamento nas demais varas às varas especializadas, entendeu o

STJ não ser possível a aplicação da regra da perpetuação da jurisdição

prevista no art. 87, CPC, na medida em que teria ocorrido uma alteração

da competência em razão da matéria (e de acordo com a ampla

jurisprudência, o CPC pode ser aplicado sim ao processo penal,

subsidiariamente).

Art. 87. Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta.

São irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito

ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou

alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia.

Essa regra do art. 87, CPC diz que se o processo começou perante um juiz,

terminará perante este mesmo juiz (é a idéia de perpetuação da

jurisdição), salvo quando houver a extinção do órgão judiciário ou quando

houver a alteração da competência em razão da matéria ou da hierarquia

(nesse ultimo caso – hierarquia – o ex. é o de alguém que está

respondendo por um processo é eleito senador da República).

O STJ entendeu que a partir do momento em que a 2ª e a 6ª Varas de SP se

tornaram Varas Especializadas, é como se tivesse havido uma alteração de

competência em razão da matéria, e, portanto, os processos deveriam ir

para uma ou para outra vara.

Isso é o que aconteceu em SP, com o Provimento 238. Mas existiram

tribunais que não atuaram da mesma maneira que em SP, pois eles criaram

as Varas Especializadas e estas só passaram a valer para os novos

processos que fossem surgindo. Pergunta: isso não teria violado o

entendimento do STJ? Não, porque o art. 87, CPC é aplicável

subsidiariamente, então se o próprio provimento do Tribunal já deu uma

solução, é isso que deve ser aplicado (então não há problema algum em que

Page 42: Lavagem de Capitais - 2012

42

alguns tribunais tenham mantido os antigos processos em suas Varas

originais, de acordo com regramento próprio).

STJ, CC 57838 e Resp. 628673.

Posição do STF: já se aguardava uma posição do STF sobre isso há algum

tempo. Ele então decidiu, no HC 86660, que a Resolução nº 314 do Conselho

da Justiça Federal seria inconstitucional, pois o Conselho teria

extrapolado suas atribuições ao definir competência de órgãos

jurisdicionais, o que, no entanto, não contaminou as resoluções e

provimentos dos TRF´s.

Para o STF, portanto, o tema organização judiciária não está restrito ao

campo de incidência exclusiva da lei, uma vez que depende da integração

de critérios estabelecidos na Constituição, nas leis e nos Regimentos

Internos dos tribunais.

☺ também STF, HC 85060.

Mas o STF entendeu que essa especialização de varas é perfeitamente

legal, pois, se entendesse de forma contrária, teria que anular os

processos, o que não aconteceu.

1.15.4. Requisitos da denúncia:

Art. 2º, §1º, LLC (Lei 9.613/98):

§1º. A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência do

crime antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que

desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime.

Justa causa duplicada: deve o MP trazer um lastro probatório não só em

relação à lavagem, como também em relação ao crime antecedente.

Indícios, aqui no §1º, é sinônimo de uma prova semi-plena (e não de prova

indireta, como em geral entendemos – ex.: o gato e o rato entram num

compartimento e só sai o gato, temos o indício ou a prova indireta de que

o gato comeu o rato), ou seja, aquela com uma capacidade persuasiva

Page 43: Lavagem de Capitais - 2012

43

atenuada. Ou seja, o que basta na hora de se oferecer a denúncia, é que

tenhamos alguns elementos comprovando a origem da lavagem (crime

antecedente).

1.15.5 Suspensão do processo:

Essa suspensão do processo é a suspensão do processo prevista no art.

366, CPP. Ela visa, basicamente, preservar o direito à ampla defesa.

Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir

advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional,

podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas

urgentes e, se for o caso, decretar a prisão preventiva, nos termos do

disposto no art. 312.

Este art. será então aplicado ao cidadão citado por edital quando, em

decorrência dessa citação, o acusado não tenha comparecido e nem tenha

constituído defensor. A conseqüência desses 3 requisitos é a suspensão do

processo e da prescrição.

Isso ocorre em razão da preservação da ampla defesa: a presença do

acusado no processo penal é muito importante, seja para ele mesmo se

defender (auto-defesa), seja para ele ministrar ao seu advogado os

elementos que possam auxiliá-lo em sua defesa.

Pergunta: por quanto tempo a prescrição fica suspensa?

Para o STF (já há alguns julgados caminhando para essa posição), a

prescrição fica suspensa por prazo indeterminado.

Além de suspender o processo e a prescrição, esse mesmo art. 366, CPP

ainda prevê a possibilidade de produção de provas consideradas urgentes

e, se for o caso, da decretação da prisão preventiva (desde que

preenchidos os seus pressupostos).

→ Aplicação do art. 366, CPP na LLC:

Page 44: Lavagem de Capitais - 2012

44

art. 2º, §2º, LLC: de acordo com esse dispositivo, na lei de lavagem de

capitais não se aplica o art. 366, CPP.

§2º. No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o disposto

no art. 366 do Código de Processo Penal.

Obs.: para as provas de concurso o que se deve afirmar é que não se

aplica o art. 366, CPP. Porém, cuidado porque apesar do teor deste

dispositivo, há uma segunda corrente que entende que existe uma antinomia

entre o art. 2º, §2º da LLC e o art. 4º, §3º da mesma lei. Ou seja,

existiria um conflito aparente de normas existentes na mesma lei. O art.

4º, §3º diz que é cabível a aplicação do art. 366, CPP. Assim, na dúvida

entre qual dispositivo deve ter prevalência, a doutrina usa o princípio

do favor rei (deve prevalecer, diante da dúvida, a interpretação mais

favorável ao acusado); além disso a doutrina também conjuga aqui o

princípio da ampla defesa, para afirmar que deve prevalecer o disposto no

art. 4º, §3º:

Art. 4º. O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou

representação da autoridade policial, ouvido o Ministério pÚblico em

vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no

curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens,

direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos

crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do

Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de processo Penal.

Esse art. fala de medidas patrimoniais assecuratórias que são muito

importantes. Hoje no Brasil existe uma política de que o processo só

surte efeito se houver a prisão (em razão do que é veiculado na mídia, as

pessoas acham que o processo só surte efeito se a pessoa estiver presa).

Ocorre que no crime de lavagem interessa muito mais do que a prisão da

pessoa, a identificação, apreensão e seqüestro dos bens objeto da

lavagem, porque ali nesse tipo de organização criminosa, as “peças” são

muito facilmente substituíveis (assim que se prende alguém, esse alguém é

substituído por outro).

§§1º, 2º e 3º, do art. 4º:

Page 45: Lavagem de Capitais - 2012

45

§1º. As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas se

a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da

data em que ficar concluída a diligência.

Atenção, esse prazo de 120 dias também já vem sendo relativizado.

§2º. O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores

apreendidos ou seqüestrados quando comprovada a licitude de sua origem.

§3º. Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento

pessoal do acusado, podendo o juiz determinar a prática de atos

necessários à conservação de bens, direitos ou valores, nos casos do art.

366, do Código de Processo Penal.

Contradição da lei: um dispositivo diz que não se aplica o art. 366, CPP

e outro diz que se aplica.

Os casos do art. 366, CPP são aqueles em que o acusado é citado por

edital e não comparece e nem constitui advogado. Esse dispositivo (§3º)

diz que eu posso apreender os objetos do indivíduo citado por edital, e

ai ficarei com esses bens, praticando atos necessários à sua conservação

até o dia em que ele comparecer pessoalmente. Comparecendo pessoalmente e

comprovando a licitude dos bens ai sim será possível devolver tais bens.

1.15.6. Liberdade provisória:

Liberdade provisória é uma medida de contra-cautela que substitui a

prisão em flagrante, desde que o indivíduo preencha determinados

requisitos, podendo ou não ficar sujeito ao cumprimento de certas

condições.

É a resposta que o acusado pode conseguir quando preso em flagrante.

Se a prisão for ilegal, o caminho é o relaxamento da prisão, mas se a

prisão for legal, o caminho é a liberdade provisória.

Page 46: Lavagem de Capitais - 2012

46

Liberdade provisória é só para prisão em flagrante! Não vale para quem

foi preso preventiva ou temporariamente. Prisão preventiva ou temporária

é caso de revogação ou cassação, jamais de liberdade provisória!

Pergunta: cabe liberdade provisória na LLC?

Art. 3º, Lei 9.613/98:

Art. 3º. Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e

liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá

fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.

De acordo com esse art., não seria cabível liberdade provisória com ou

sem fiança no crime de lavagem de capitais.

Pergunta: poderia o legislador vedar o cabimento da liberdade provisória?

O legislador pode, assim de maneira abstrata, dizer que a liberdade

provisória não é cabível em um ou outro crime?

Pela leitura da Constituição, art. 5º, LXVI, que diz “quando a lei

admitir a liberdade provisória” fica parecendo que ao legislador cabe

dizer se cabe ou se não cabe, e se o legislador disse que não cabe, é

porque não cabe e pronto.

pelo STF na ADI 3.112;

- art. 44, da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas).

Posição doutrinária (LFG, Eugênio Pacelli): parte da doutrina entende que

não é dado ao legislador vedar de maneira absoluta a concessão da

liberdade provisória. A uma, porque tal vedação violaria o princípio da

presunção de inocência, criando-se hipótese de prisão obrigatória àquele

que foi preso em flagrante. A duas, porque a prisão de qualquer indivíduo

antes do trânsito em julgado de sentença condenatória depende de decisão

fundamentada da autoridade judiciária competente.

Outro ponto importante a ser tratado aqui diz respeito à alteração da Lei

8.072/90 pela Lei 11.464/07: a lei dos crimes hediondos, em seu art. 2º,

II, dizia que crimes hediondos e equiparados são insuscetíveis de

Page 47: Lavagem de Capitais - 2012

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liberdade provisória com fiança (e isso é óbvio, pois a própria CR já diz

isso) e também de liberdade provisória sem fiança. Em 2007 entra em vigor

a Lei 11.464 que consolida um entendimento que já era firme na

jurisprudência, apagando a vedação da liberdade provisória sem fiança. Só

vale, então, a vedação da Constituição. Assim, crimes hediondos admitem,

pelo menos em tese, a liberdade provisória sem fiança (aquela do art.

310, P.U. do CPP – quando o juiz verificar a inocorrência de qualquer

hipótese que autorize a prisão preventiva).

Ou seja, agora temos pelo menos a possibilidade de o juiz analisar,

diante do caso concreto, se há ou não motivo para a pessoa ter a prisão

preventiva decretada. Se o juiz verificar que se solta a pessoa seria

presa preventivamente, o juiz indeferirá a LP sem fiança e

automaticamente estará convertendo a prisão em flagrante em preventiva;

se o juiz entender que se a pessoa solta estivesse não teria motivo para

ser presa, então o juiz concederá a ela a LP sem fiança.

Para a doutrina, se é cabível LP sem fiança para crimes hediondos, que é

o mais grave dos delitos, o mesmo raciocínio deve ser aplicado às demais

leis que vedam a LP.

A jurisprudência, porém, não caminha nesse sentido. Para o STF, à exceção

de algumas decisões do Min. Celso de Mello, não seria cabível LP ao crime

de tráfico de drogas sob o seguinte argumento: se a Constituição disse

que tais crimes são inafiançáveis, implicitamente teria vedado a

concessão da LP.

Nesse sentido: STF, HC 93302 e STJ, HC 85682.

1.15.7 Recurso em liberdade:

A LLC, em seu art. 3º, parte final, diz textualmente que o juiz decidirá

se o réu poderá apelar em liberdade.

art. 3º. Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e

liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá

fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.

Page 48: Lavagem de Capitais - 2012

48

O que temos aqui nesse dispositivo é o que a doutrina chama de

recolhimento à prisão para apelar.

Esse recolhimento à prisão para apelar também estava previsto no art.

594, CPP e durante muitos anos este art. esteve em vigor. Tanto é verdade

que tínhamos a súmula do STJ de nº 09 que dizia “A exigência da prisão

provisória para apelar não ofende a garantia da presunção de inocência”.

Eis que surge o HC 88420, do STF, um julgado histórico, no qual entendeu

o STF que pelo fato de a Convenção Americana de Direitos Humanos

assegurar o direito ao duplo grau de jurisdição, não poderia o legislador

ordinário condicionar o conhecimento da apelação ao recolhimento à

prisão.

Surgiu então uma nova súmula do STJ – Súm. 347:

O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão.

Atenção para a nova redação dos arts. 413, §3º; 387, P.U.; e 492, I, “e”

do CPP:

Art. 413. § 3o  O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção,

revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade

anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a

necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas

previstas no Título IX do Livro I deste Código. (Incluído pela Lei nº

11.689, de 2008)

Art. 387. Parágrafo único.  O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a

manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra

medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser

interposta. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Art. 492.  Em seguida, o presidente proferirá sentença que: (Redação dada

pela Lei nº 11.689, de 2008)

I – no caso de condenação: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

Page 49: Lavagem de Capitais - 2012

49

e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se

encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva; (Incluído pela

Lei nº 11.689, de 2008)

Agora a própria lei, alterada que foi pela Lei 11.719/08, diz que

independentemente do juiz ter decretado a prisão e de o acusado ter sido

recolhido, o seu recurso será conhecido.

Pergunta: será que o art. 3º, LLC permanece válido? É claro que não.

Diante das alterações do entendimento jurisprudencial e das Leis 11.689 e

11.719, conclui-se que não é mais possível condicionar o conhecimento da

apelação ao recolhimento do acusado à prisão.

STF, HC 83868.

1.15.8 Recuperação de ativos e Medidas Cautelares:

Há uma idéia generalizada de que o processo penal somente é eficaz se a

pessoa estiver presa. Associamos sempre o resultado do processo eficaz

com a prisão.

Em se tratando de organizações criminosas, é óbvio que a prisão deve ser

mais rigorosa. Mas, em se tratando de lavagem de capitais, muito mais

importante do que prender a pessoa é a recuperação dos objetos. Até

porque os sujeitos que praticam este crime são regularmente substituídos,

o processo é terceirizado. A pena privativa de prisão não cumprirá o

efeito prático de acabar com o crime.

Um dos principais objetivos da criminalização da lavagem de capitais é o

ataque ao braço financeiro das organizações criminosas, pelos seguintes

motivos:

- o confisco de bens e valores promove a asfixia da organização

criminosa;

- insuficiência e ineficiência das penas privativas de liberdade;

Page 50: Lavagem de Capitais - 2012

50

- capacidade de controle das organizações criminosas do interior dos

presídios;

- rápida substituição dos administradores das organizações criminosas.

Art. 4º, LLC:

Art. 4º O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou

representação da autoridade policial, ouvido o Ministério Público em

vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no

curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens,

direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos

crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do

Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.

§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas se

a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da

data em que ficar concluída a diligência.

§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores

apreendidos ou seqüestrados quando comprovada a licitude de sua origem.

§ 3º Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento

pessoal do acusado, podendo o juiz determinar a prática de atos

necessários à conservação de bens, direitos ou valores, nos casos do art.

366 do Código de Processo Penal.

§ 4º A ordem de prisão de pessoas ou da apreensão ou seqüestro de bens,

direitos ou valores, poderá ser suspensa pelo juiz, ouvido o Ministério

Público, quando a sua execução imediata possa comprometer as

investigações.

→ Medidas Cautelares importantes:

a) Apreensão: trata-se de medida cautelar decretada com o objetivo de

apreender coisas, objetos e documentos de interesse para a instauração do

processo. Se realizada no interior de um domicílio, precisará de

Page 51: Lavagem de Capitais - 2012

51

autorização da autoridade judiciária. Se em via pública não, desde que a

autoridade que faz a apreensão tenha algum indício de que o sujeito

esteja portando arma ou qualquer objeto criminoso. ☺art. 240, CPP:

Art. 240.  A busca será domiciliar ou pessoal.

§ 1o Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a

autorizarem, para:

a) prender criminosos;

b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos

falsificados ou contrafeitos;

d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de

crime ou destinados a fim delituoso;

e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;

f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu

poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa

ser útil à elucidação do fato;

g) apreender pessoas vítimas de crimes;

h) colher qualquer elemento de convicção.

§ 2o  Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que

alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a

f e letra h do parágrafo anterior.

- Busca e apreensão em escritórios de advocacia: o escritório de

advocacia, assim como o consultório de um médico ou um estabelecimento

comercial (do balcão para dentro, e não as partes abertas ao público), é

considerado pela Constituição como domicílio. Assim, mesmo as Autoridades

Fazendárias dependem de autorização judicial para ingressar no domicílio.

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52

Caso específico do escritório de advocacia: o mandado de busca e

apreensão deve ser específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença

de representante da OAB, sendo vedada a utilização de documentos e

objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, salvo se tais

clientes também estiverem sendo investigados como partícipes ou co-

autores pela prática do mesmo crime que deu origem ao mandado de busca e

apreensão (☺art. 7º, do EOAB). É preciso cientificar a OAB que o mandado

será cumprido, e ela então designa um representante de OAB para

acompanhar a diligência. Mas, se a OAB se negar a indicar o

representante, a busca e apreensão não ficará condicionada a isso, o

mandado será cumprido normalmente.

O mandado de busca e apreensão deve ser cumprido durante o dia. Há

doutrinadores que entendem que dia é o período compreendido entre o

nascer e o pôr do sol, já outros doutrinadores entendem que é o período

compreendido entre as 6 e a 18 horas.

Obs.: o mandado deve ter seu início durante o dia, porém, iniciado

durante o período diurno, nada impede que se prolongue durante a noite.

b) Seqüestro de bens e valores: segundo Vicente Greco Filho, é uma medida

assecuratória, fundada no interesse público, e antecipativa do perdimento

de bens como efeito da condenação, no caso de bens que sejam produto do

crime ou adquiridos pelo agente com a prática do fato delituoso.

☺art. 91, II, “b”, CP.

Pode haver seqüestro de bens imóveis e também de bens móveis, se não for

cabível a busca e apreensão.

Art. 125 e art. 132, CPP:

Art. 125.  Caberá o seqüestro dos bens imóveis, adquiridos pelo indiciado

com os proventos da infração, ainda que já tenham sido transferidos a

terceiro.

Art. 126.  Para a decretação do seqüestro, bastará a existência de

indícios veementes da proveniência ilícita dos bens.

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Art. 127.  O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou do

ofendido, ou mediante representação da autoridade policial, poderá

ordenar o seqüestro, em qualquer fase do processo ou ainda antes de

oferecida a denúncia ou queixa.

Art. 128.  Realizado o seqüestro, o juiz ordenará a sua inscrição no

Registro de Imóveis.

Art. 129.  O seqüestro autuar-se-á em apartado e admitirá embargos de

terceiro.

Art. 130.  O seqüestro poderá ainda ser embargado:

I - pelo acusado, sob o fundamento de não terem os bens sido adquiridos

com os proventos da infração;

II - pelo terceiro, a quem houverem os bens sido transferidos a título

oneroso, sob o fundamento de tê-los adquirido de boa-fé.

Parágrafo único.  Não poderá ser pronunciada decisão nesses embargos

antes de passar em julgado a sentença condenatória.

Art. 131.  O seqüestro será levantado:

I - se a ação penal não for intentada no prazo de sessenta dias, contado

da data em que ficar concluída a diligência;

II - se o terceiro, a quem tiverem sido transferidos os bens, prestar

caução que assegure a aplicação do disposto no art. 74, II, b, segunda

parte, do Código Penal;

III - se for julgada extinta a punibilidade ou absolvido o réu, por

sentença transitada em julgado.

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54

Art. 132.  Proceder-se-á ao seqüestro dos bens móveis se, verificadas as

condições previstas no art. 126, não for cabível a medida regulada no

Capítulo Xl do Título Vll deste Livro.

Uma vez feito o seqüestro, qual é o prazo para o início da ação penal?

Decretada o seqüestro, a ação penal deverá ser iniciada dentro do prazo

de 120 dias.

Art. 4º, §1º, LLC:

§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas (=

afastadas) se a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte

dias, contados da data em que ficar concluída a diligência.

Atenção: No CPP esse prazo não é de 120 dias (como na Lei de Lavagem), e

sim de 60 dias. Mas esse prazo de 60 dias também não tem caráter

absoluto, admitindo a jurisprudência sua prorrogação em virtude do

Princípio da Proporcionalidade.

- Restituição de coisas apreendidas: ☺art. 4º, §2º, LLC:

§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores

apreendidos ou seqüestrados quando comprovada a licitude de sua origem.

Esse dispositivo não estaria invertendo o ônus da prova?

O ônus da prova no processo penal é da acusação. Mas, se o indivíduo

pretender a restituição dos objetos apreendidos ou seqüestrados durante o

curso do processo, não só deverá comparecer pessoalmente, como também

comprovar a licitude de sua origem. Já se ao final do processo o MP não

comprovar a ilicitude da origem dos bens, o acusado deverá ser absolvido,

com a conseqüente restituição dos bens.

c) Arresto: é uma medida assecuratória fundada no interesse privado que

tem por finalidade assegurar a reparação civil do dano causado pelo

delito, em favor do ofendido ou de seus sucessores. O arresto recai sobre

Page 55: Lavagem de Capitais - 2012

55

qualquer bem que integre o patrimônio do acusado, desde que suficiente

para garantir a futura recomposição patrimonial.

Arts. 136 e 144, CPP:

Art. 136.  O arresto do imóvel poderá ser decretado de início, revogando-

se, porém, se no prazo de 15 (quinze) dias não for promovido o processo

de inscrição da hipoteca legal. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de

2006).

Art. 137.  Se o responsável não possuir bens imóveis ou os possuir de

valor insuficiente, poderão ser arrestados bens móveis suscetíveis de

penhora, nos termos em que é facultada a hipoteca legal dos imóveis.

(Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).

§ 1o Se esses bens forem coisas fungíveis e facilmente deterioráveis,

proceder-se-á na forma do § 5o do art. 120.

§ 2o Das rendas dos bens móveis poderão ser fornecidos recursos arbitrados

pelo juiz, para a manutenção do indiciado e de sua família.

Art. 138.  O processo de especialização da hipoteca e do arresto correrão

em auto apartado. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).

Art. 139.  O depósito e a administração dos bens arrestados ficarão

sujeitos ao regime do processo civil. (Redação dada pela Lei nº 11.435,

de 2006).

Art. 140.  As garantias do ressarcimento do dano alcançarão também as

despesas processuais e as penas pecuniárias, tendo preferência sobre

estas a reparação do dano ao ofendido.

Art. 141.  O arresto será levantado ou cancelada a hipoteca, se, por

sentença irrecorrível, o réu for absolvido ou julgada extinta a

punibilidade. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).

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Art. 142.  Caberá ao Ministério Público promover as medidas estabelecidas

nos arts. 134 e 137, se houver interesse da Fazenda Pública, ou se o

ofendido for pobre e o requerer.

Art. 143.  Passando em julgado a sentença condenatória, serão os autos de

hipoteca ou arresto remetidos ao juiz do cível (art. 63). (Redação dada

pela Lei nº 11.435, de 2006).

Art. 144.  Os interessados ou, nos casos do art. 142, o Ministério

Público poderão requerer no juízo cível, contra o responsável civil, as

medidas previstas nos arts. 134, 136 e 137.

Pergunta: É cabível o arresto na Lei de Lavagem de Capitais?

Vimos que a apreensão e o seqüestro são possíveis.

O caput do art. 4º, da LLC diz expressamente:

Art. 4º O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou

representação da autoridade policial, ouvido o Ministério Público em

vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no

curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens,

direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos

crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do

Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.

A apreensão não está prevista nos arts. 125 a 144, CPP. Será então que a

lei quis falar em arresto e não em apreensão?

Temos duas interpretações possíveis:

1ª) ao fazer menção no art. 4º, quis o legislador se referir ao arresto,

na medida em que faz menção aos arts 125 a 144, CPP – portanto, é cabível

sim o arresto na LLC, porque ao se referir à apreensão ele quis falar do

arresto. É o entendimento do promotor de justiça William Terra;

2ª) como o art. 4º dispõe que somente podem ser indisponibilizados bens,

direitos ou valores suspeitos de guardar vinculação com a lavagem de

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capitais, seria inviável que essas medidas fossem adotadas em relação a

patrimônio diverso, razão pela qual somente seria cabível o seqüestro e

não o arresto. É o entendimento de Eugênio Pacelli (no inquérito 2.248).

- Alienação antecipada: tem expressa previsão legal na Lei de Drogas.

Consiste na venda antecipada de bens considerados instrumentos da

infração penal, ou daqueles que constituam proveito auferido pelo agente

coma prática do delito, desde que haja risco de perda do valor econômico

pelo decurso do tempo.

Art. 61, Lei 11.343/06:

Art. 61.  Não havendo prejuízo para a produção da prova dos fatos e

comprovado o interesse público ou social, ressalvado o disposto no art.

62 desta Lei, mediante autorização do juízo competente, ouvido o

Ministério Público e cientificada a Senad, os bens apreendidos poderão

ser utilizados pelos órgãos ou pelas entidades que atuam na prevenção do

uso indevido, na atenção e reinserção social de usuários e dependentes de

drogas e na repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de

drogas, exclusivamente no interesse dessas atividades.

Parágrafo único.  Recaindo a autorização sobre veículos, embarcações ou

aeronaves, o juiz ordenará à autoridade de trânsito ou ao equivalente

órgão de registro e controle a expedição de certificado provisório de

registro e licenciamento, em favor da instituição à qual tenha deferido o

uso, ficando esta livre do pagamento de multas, encargos e tributos

anteriores, até o trânsito em julgado da decisão que decretar o seu

perdimento em favor da União.

É mais um motivo para se decretar medidas cautelares. Não é o mais

correto (não deveria ser uma justificativa para decretá-las), mas em

razão do descaso e da deficiência das Polícias, isso ocorre efetivamente.

Ex.: imaginemos um helicóptero apreendido de um traficante (as

Corporações todas ficam de olho no helicóptero, e a manutenção dele

parado nas dependências do Estado é enorme). Daí então a importância

dessa utilização.

Art. 62, §§ 4º, 5º e 9º, da Lei de Drogas:

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Art. 62.  Os veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de

transporte, os maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de

qualquer natureza, utilizados para a prática dos crimes definidos nesta

Lei, após a sua regular apreensão, ficarão sob custódia da autoridade de

polícia judiciária, excetuadas as armas, que serão recolhidas na forma de

legislação específica.

§ 4o  Após a instauração da competente ação penal, o Ministério Público,

mediante petição autônoma, requererá ao juízo competente que, em caráter

cautelar, proceda à alienação dos bens apreendidos, excetuados aqueles

que a União, por intermédio da Senad, indicar para serem colocados sob

uso e custódia da autoridade de polícia judiciária, de órgãos de

inteligência ou militares, envolvidos nas ações de prevenção ao uso

indevido de drogas e operações de repressão à produção não autorizada e

ao tráfico ilícito de drogas, exclusivamente no interesse dessas

atividades.

§ 5o  Excluídos os bens que se houver indicado para os fins previstos no

§ 4o deste artigo, o requerimento de alienação deverá conter a relação de

todos os demais bens apreendidos, com a descrição e a especificação de

cada um deles, e informações sobre quem os tem sob custódia e o local

onde se encontram.

§ 9o  Realizado o leilão, permanecerá depositada em conta judicial a

quantia apurada, até o final da ação penal respectiva, quando será

transferida ao Funad, juntamente com os valores de que trata o § 3o deste

artigo.

Na Lei de drogas, portanto, é perfeitamente possível a alienação

antecipada, pois há previsão legal (art. 62, §4º e ss).

Mas e na Lei de Lavagem de Capitais, é possível?

Há doutrinadores que admitem, como por ex. o prof. José Paulo Baltazar

Jr.

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Mas a LLC não tem dispositivo legal acerca da alienação antecipada. O que

a LLC na verdade prevê, em seus arts. 5º e 6º não é a alienação

antecipada, mas sim a nomeação de um administrador dos bens apreendidos

ou seqüestrados.

Art. 5º Quando as circunstâncias o aconselharem, o juiz, ouvido o

Ministério Público, nomeará pessoa qualificada para a administração dos

bens, direitos ou valores apreendidos ou seqüestrados, mediante termo de

compromisso.

Art. 6º O administrador dos bens:

I - fará jus a uma remuneração, fixada pelo juiz, que será satisfeita com

o produto dos bens objeto da administração;

II - prestará, por determinação judicial, informações periódicas da

situação dos bens sob sua administração, bem como explicações e

detalhamentos sobre investimentos e reinvestimentos realizados.

Parágrafo único. Os atos relativos à administração dos bens apreendidos

ou seqüestrados serão levados ao conhecimento do Ministério Público, que

requererá o que entender cabível.

A LLC prevê que o juiz nomeará um administrador que poderia, a título de

ex., alugar o imóvel seqüestrado, tanto para que o objeto não fosse

deteriorado, bem como para que ele fosse por si só mantido.

Obs.: tramita no CN projeto de lei que visa regulamentar a alienação

antecipada na LLC, e, assim, poderíamos concluir que essa regulamentação

ainda não existe.

Atenção: se o crime antecedente for o crime de tráfico, já caberá a

alienação antecipada, mas não com base na LLC e sim com base na Lei

11.343/06.