justiça e história em derrida e benjamin

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Artigo: Justiça e história em Derrida e Benjamin Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1º sem. 2013. ISSN: 2177-6342 347 JUSTIÇA E HISTÓRIA EM DERRIDA E BENJAMIN 1 JUSTICE AND HISTORY IN DERRIDA AND BENJAMIN Marcelo de Mello Rangel RESUMO Nosso texto se divide em quatro momentos. No primeiro deles, explicitaremos uma compreensão possível de justiça a partir de Derrida. No segundo momento, mostraremos a relação fundamental entre essa compreensão e a tarefa da desconstrução. Nosso objetivo, aqui, é o de explicitar que a desconstrução, ao fim, é um ato de “injustiça” necessário. Na terceira parte, buscaremos evidenciar a crítica do filósofo franco-magrebino a Walter Benjamin, em especial sua percepção de que Benjamin compreenderia o caráter de “injustiça” necessário a todo e qualquer pensamento e ação humanos, no entanto, insistiria na necessidade da instauração divina de uma história plenamente “justa” (ideal à totalidade). Na quarta parte, trataremos da hipótese de que Benjamin, em seus últimos textos, especialmente em suas “Teses sobre o conceito de história”, assume o caráter necessário da “injustiça” no interior da história, e não recorre mais à necessidade de um novo começo, de tempos plenamente “justos”, o que nos permitiria aproximar, assim, sua filosofia da história à tarefa derridiana da desconstrução. PALAVRAS-CHAVE: Filosofia da história; desconstrução e justiça ABSTRACT Our paper is divided into four stages. In the first, we will explain one possible understanding about justice from Derrida. In the second step, we show the fundamental relationship between this understanding and the task of deconstruction. Our purpose here is to explain that deconstruction, to finish, is an act of "injustice" necessary. In the third part, we will seek to highlight the critical of franco-maghrebian philosopher to the Walter Benjamin‟ s thought, particularly his perception that Benjamin would understand the character of "injustice" necessary to any and all human thought and action, however, insist on the necessity of establishing the divine a story full of "fair". In the fourth part, we address the hypothesis that Benjamin, in his last writings, especially in his "Über den Begriff der Geschichte", takes the necessary character of "injustice" within the history, and does not resort to the more need for a new 1 Este artigo é fruto de uma reelaboração do trabalho apresentado no GT Desconstrução e Alteridade, por ocasião da Anpof de 2012, realizada em Curitiba. Agradeço a Rafael Haddock Lobo pela orientação cuidadosa e amizade. Agradeço, também, a Dirce Eleonora Nigro Solis pela audição e estímulo. Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), beneficiário de auxílio financeiro da CAPES Brasil. E-mail: [email protected]

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  • Artigo: Justia e histria em Derrida e Benjamin

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 347

    JUSTIA E HISTRIA EM DERRIDA E BENJAMIN1 JUSTICE AND HISTORY IN DERRIDA AND BENJAMIN

    Marcelo de Mello Rangel

    RESUMO

    Nosso texto se divide em quatro momentos. No primeiro deles, explicitaremos

    uma compreenso possvel de justia a partir de Derrida. No segundo momento,

    mostraremos a relao fundamental entre essa compreenso e a tarefa da

    desconstruo. Nosso objetivo, aqui, o de explicitar que a desconstruo, ao

    fim, um ato de injustia necessrio. Na terceira parte, buscaremos evidenciar a crtica do filsofo franco-magrebino a Walter Benjamin, em

    especial sua percepo de que Benjamin compreenderia o carter de injustia necessrio a todo e qualquer pensamento e ao humanos, no entanto, insistiria

    na necessidade da instaurao divina de uma histria plenamente justa (ideal totalidade). Na quarta parte, trataremos da hiptese de que Benjamin, em seus

    ltimos textos, especialmente em suas Teses sobre o conceito de histria, assume o carter necessrio da injustia no interior da histria, e no recorre mais necessidade de um novo comeo, de tempos plenamente justos, o que nos permitiria aproximar, assim, sua filosofia da histria tarefa derridiana da

    desconstruo.

    PALAVRAS-CHAVE: Filosofia da histria; desconstruo e justia

    ABSTRACT

    Our paper is divided into four stages. In the first, we will explain one possible

    understanding about justice from Derrida. In the second step, we show the

    fundamental relationship between this understanding and the task of

    deconstruction. Our purpose here is to explain that deconstruction, to finish, is

    an act of "injustice" necessary. In the third part, we will seek to highlight the

    critical of franco-maghrebian philosopher to the Walter Benjamin s thought, particularly his perception that Benjamin would understand the character of

    "injustice" necessary to any and all human thought and action, however, insist

    on the necessity of establishing the divine a story full of "fair". In the fourth

    part, we address the hypothesis that Benjamin, in his last writings, especially in

    his "ber den Begriff der Geschichte", takes the necessary character of

    "injustice" within the history, and does not resort to the more need for a new

    1 Este artigo fruto de uma reelaborao do trabalho apresentado no GT Desconstruo e Alteridade, por

    ocasio da Anpof de 2012, realizada em Curitiba. Agradeo a Rafael Haddock Lobo pela orientao

    cuidadosa e amizade. Agradeo, tambm, a Dirce Eleonora Nigro Solis pela audio e estmulo.

    Professor Doutor do Programa de Ps-Graduao em Histria da Universidade Federal de Ouro Preto

    (UFOP), beneficirio de auxlio financeiro da CAPES Brasil. E-mail: [email protected]

  • Marcelo de Mello Rangel

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 348

    beginning of time fully "fair", which would allow us to approximate so his

    philosophy of history to the task of Derridas deconstruction.

    KEYWORDS: Philosophy of History, deconstruction and justice

    Parte I

    Nosso primeiro objetivo o de explicitar a compreenso derridiana de justia, a de

    que justia significa apenas aquilo que dotado de justeza. Dizendo ainda em outras

    palavras, justia significa mais propriamente a produo de juzos adequados e

    provenientes de determinado mbito especfico, dotado de um aspecto mais ou menos

    estvel, ou ainda, organizado a partir de determinadas regras, orientaes. Assim, ser justo

    uma qualidade daquilo que diz respeito e fora decidido no interior de uma determinada

    relao mais ou menos estvel, sendo apenas essa adequao, essa justeza, que confere

    justia a algo.

    De acordo com Derrida, no h contradio alguma na compreenso de que um

    determinado juzo justo seja tambm e a um s tempo injusto (parcial, ideal a parte(s) da

    totalidade), e isto porque se o prprio mbito mais ou menos estvel a condio de

    possibilidade para que um juzo ou enunciado especfico seja dotado de justia, de justeza,

    ele mesmo, o mbito, injusto em sua origem. O que temos aqui, ento, a indicao de

    que todo e qualquer juzo especfico, inclusive aqueles dotados do carter de justia

    (justeza), sempre e mais originariamente injusto. Se, por um lado, uma relao

    especfica condio suficiente para determinar a justia de algo, ela mesma se constitui

    o que significa dizer: vem a ser e sedimenta-se, e torna-se estvel -, a partir de uma

    superposio de decises arbitrrias e violentas, orientadas e provocadas por relatas mais

    originrios, anteriores prpria estabilidade da relao, digamos assim. Segundo Derrida:

    ... Heidegger se aplicar a mostrar que, por exemplo em Herclito, Dke, a justia,

    o direito, o julgamento, a pena ou o castigo, a vingana etc., originariamente

    Eris (o conflito, Streit, a discrdia ou o plemos, ou a Kampf), isto , tambm

    adika, a injustia). (Derrida, 2010, p.10)

  • Artigo: Justia e histria em Derrida e Benjamin

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 349

    Derrida lembra aqui de Heidegger, e o que est em questo a compreenso de que

    a origem de tudo o que , de tudo o que alcana determinado aspecto mais ou menos

    estvel, a injustia, o que significa - o conflito e a superposio de decises

    arbitrrias e violentas. O que se d na origem, no momento anterior determinao de

    uma forma mais ou menos estvel, uma luta aberta entre um conjunto especfico de

    sentidos, de foras para recorrermos a um termo caro a Nietzsche, luta que d lugar

    preponderncia de um sentido especfico em relao aos demais e, por conseguinte,

    organizao hierarquizada de um determinado conjunto de sentidos, constituindo, ento, a

    relao ou o aspecto mais ou menos determinado a que nos referimos. Derrida anota, ainda,

    e isto a partir de Heidegger, que a lngua alem permite a lembrana de que tudo o que

    justo, adequado, tambm e mais originariamente injusto, ou seja, arbitrrio e violento, e

    isto atravs da palavra alem Gewalt e suas duas conotaes possveis, a saber: 1. violncia

    ou poder no autorizado, arbitrrio e 2. poder autorizado (justo, adequado) da a

    possibilidade de se dizer Staatsgewalt, que significa autoridade ou poder de Estado, ou

    ainda, geistliche Gewalt, o poder espiritual da Igreja2. Heidegger evidenciaria, segundo

    Derrida, a sabedoria da linguagem e mostraria que ela capaz de resguardar o que tende a

    ser obscurecido e a cair, necessariamente, no esquecimento, repetimos - a compreenso de

    que tudo o que justo ou arbitrrio , em sua origem, injusto, ou ainda, advm, vem a

    ser, a partir da orientao de um elemento especfico aps profunda discrdia e imposio,

    o que o autor de Fora de Lei chama de interpretao dominante. A partir de ento,

    uma relao especfica, um aspecto prprio, organizado. Ou ainda, como podemos ler:

    J que a origem da autoridade, a fundao ou o fundamento, a instaurao da lei

    no podem, por definio, apoiar-se finalmente seno sobre elas mesmas, elas

    mesmas so uma violncia sem fundamento. O que no quer dizer que sejam

    injustas em si, no sentido de ilegais ou ilegtimas. Elas no so nem legais nem ilegais em seu momento fundador. Elas excedem a oposio do fundado ao

    no-fundado, como de todo fundacionismo ou todo anti-fundacionismo. Mesmo

    que o xito de performativos fundadores de um direito (por exemplo, e mais do

    que um exemplo, de um Estado como garante de direito) suponha condies e

    2 (...) Gewalt significa tambm, para os alemes, poder legtimo, autoridade, fora pblica. Gesetzgebende

    Gewalt o poder legislativo, geistliche Gewalt o poder espiritual da Igreja, Staatsgewalt a autoridade ou o

    poder do Estado. Gewalt , portanto, ao mesmo tempo a violncia e o poder legtimo, a autoridade justificada.

    Como distinguir entre a fora de lei de um poder legtimo e a violncia pretensamente originria que precisou

    instaurar essa autoridade, e que no podia ela mesma autorizar-se por nenhuma legitimidade anterior, de tal

    forma que ela no , naquele momento inicial, nem legal nem ilegal, outros diriam apressadamente nem justa

    nem injusta?. (Derrida, 2010, p.9-10)

  • Marcelo de Mello Rangel

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 350

    convenes prvias (por exemplo no espao nacional ou internacional), o mesmo

    limite mstico ressurgir na origem suposta das ditas condies, regras ou convenes e de sua interpretao dominante. (Derrida, 2010, p.26)

    Chegamos, assim, ao fim de nosso primeiro ponto, no qual explicitamos: 1. a

    determinao especfica da noo de justia junto a (para) Derrida, a saber, justeza,

    adequao de algo a uma relao ou aspecto, e 2. o carter injusto ou arbitrrio e

    especialmente violento, de tudo o que justo e, nesse sentido, a semelhana fundamental,

    em ltima instncia, entre o que justo e o que arbitrrio ou parcial e violento (em

    origem).

    Parte II

    Nosso segundo objetivo o de compreender, a partir de agora, a relao entre as

    noes de justia e de desconstruo segundo Derrida, ou ainda, o que se pode depreender

    da noo derridiana de justia que fundamental no que tange tarefa da desconstruo.

    Pretendemos, aqui, evidenciar uma determinao fundamental desconstruo com o

    objetivo especfico de compor uma medida adequada aproximao radical que

    pretendemos estabelecer, nos dois ltimos momentos de nosso texto, entre Derrida e

    Benjamin, entre a desconstruo derridiana e a filosofia da histria benjaminiana.

    Pois bem, a desconstruo caracterizada pela justia (justeza), e isto porque ela

    responsvel em relao a algumas determinaes decididas no interior de um mbito mais

    ou menos estvel, de uma tradio especfica, no entanto, se ela justa, ela tambm e

    mais propriamente injusta, ou seja, ela sempre a intensificao de um sentido

    organizador e arbitrrio transcendental, de uma interpretao dominante, que

    tende ao obscurecimento.

    Seno vejamos, de acordo com Derrida:

    Esse questionamento sobre os fundamentos (a desconstruo) no nem

    fundamentalista nem antifundamentalista (eu diria que injusto). Acontece mesmo, ocasionalmente, de ele (a desconstruo) colocar em questo ou exceder

    a possibilidade ou a necessidade ltima do prprio questionamento, da forma

  • Artigo: Justia e histria em Derrida e Benjamin

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 351

    questionadora do pensamento, interrogando sem confiana nem preconceito a

    prpria histria da questo e de sua autoridade filosfica. Pois existe uma

    autoridade portanto uma fora legitima da forma questionadora, a respeito da qual podemos nos perguntar de onde ela tira uma fora to grande em nossa

    tradio. (Derrida, 2010, p.13)

    O texto comea afirmando que a desconstruo no fundamentalista, e isto

    significa dizer que ela no pretende, em ltima instncia, evidenciar um ponto de

    determinao prprio ao real em sua totalidade, no entanto, o que significa dizer que ela

    no , tambm, antifundamentalista? Se ela no fundamentalista, a primeira impresso

    que temos a de que ela antifundamentalista, de que ela pretende mostra que o real no

    tem fundamento, ou mesmo, regularidade alguma. Derrida anota que essa compreenso

    um equvoco cometido por alguns desconstrucionistas, e mais, um equvoco responsvel

    por uma crtica precisa feita aos desconstrucionismos, a que acusa a desconstruo de ser

    uma tentativa de inscrever o carter de no-fundamento como o fundamento mesmo do real

    em sua totalidade ou seja, o carter mais fundamental do real seria, a partir dessa

    percepo criticada por Derrida, o de no ter fundamento algum.

    O que temos, assim, uma espcie de confuso entre a desconstruo e um

    questionamento reflexivo ctico imparcial (e antifundamentalista), e isto porque se a

    desconstruo um questionamento, ela algo mais, algo que no se satisfaz com o prprio

    questionamento e, por fim, com a evidenciao de que toda e qualquer delimitao do real

    dotada de no fundamento radical (ou do que j podemos chamar, aqui, de injustia). A

    desconstruo precisa e , ao fim, mais do que um exerccio reflexivo questionador que

    aponta o carter de injustia prprio a todo pensamento e ao, tambm, a assuno ou a

    aceitao da injustia de seu prprio movimento.

    Derrida lembra que a desconstruo, por vezes, coloca uma questo fundamental a

    da legitimidade mesma do questionamento. Questionar aparece como parte da

    desconstruo, mas como uma atitude limitada. O que significa dizer que existe uma

    autoridade, uma justeza, no que tange ao questionamento, mas a sua autoridade tambm

    deve ser tematizada. E, no sem motivo, a passagem que estamos discutindo termina com a

    questo de onde ela (a atitude questionadora) tira uma fora to grande em nossa

    tradio?.

  • Marcelo de Mello Rangel

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 352

    A fora da atitude questionadora advm quer da tradio fundamentalista quer da

    tradio antifundamentalista s quais nos referimos linhas acima e, em relao s quais,

    Derrida pretende se afastar, ou seja, os pensamentos orientados pela determinao

    fundamento, questionam e questionam-se at a exausto, e isto porque procuram aclarar o

    fundamento de algum ente em especial ou do ente em sua totalidade. J os pensamentos

    orientados pela determinao antifundamento, como o de Heidegger, segundo Derrida,

    tambm questionam e questionam-se incessantemente, e isto porque pretendem, sempre

    uma vez mais, evidenciar o carter de indeterminao radical do real. Ao fim, ambos no

    assumem o seu carter de injustia, no assumem que tambm so a intensificao

    necessria de uma deciso arbitraria e violenta originria que se sedimentou e deu lugar a

    um aspecto especfico.

    Derrida se preocupa com ambos os gestos, em especial com a aproximao ou com

    a atribuio do carter de antifundamentalismo tarefa desconstrucionista. A desconstruo

    deve orientar-se pela compreenso de que em origem toda e qualquer determinao

    arbitraria, mstica, no entanto e, por conseguinte, que toda a atividade, mesmo a

    desconstruo, ela mesma a continuao necessria de uma deciso arbitrria e violenta,

    que ela mesma um agente, um caminho, que provoca a superposio e a sedimentao de

    determinados significados e sentidos originrios, podemos dizer. Dizendo ainda em outras

    palavras, a prpria tarefa de desconstruir obedece a um sentido transcendental que , em

    ltima instncia, no-tematizvel.

    Enfim, trata-se de reconhecer que: 1. o aspecto ou o horizonte histrico tende ao

    obscurecimento de sua origem arbitrria, tornando-se transcendental, e 2. o prprio homem

    tende a uma espcie de lassido (gelassenheit), para usar um termo caro a Heidegger. Ou

    seja, o homem, mesmo aquele que se mantm atento constituio em ltima instncia

    injusta de todo e qualquer aspecto e juzo, mesmo o exerccio da desconstruo,

    determinado pela finitude de sua potncia reflexiva e tende repetio performtica, no

    tematizada, de algum sentido possvel ao horizonte que o seu, que j esteja em curso.

    Em ltima instncia, 3. a repetio performtica (sedimentao necessria de

    determinados significados e sentidos originrios/transcendentais) o prprio ponto de

    partida do pensamento e da ao humanos, inclusive da tarefa da desconstruo, que por

  • Artigo: Justia e histria em Derrida e Benjamin

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 353

    isso , mais propriamente, injusta (parcial), ou ainda, em ltima instncia, agente e

    mtodo (caminho) de iterabilidade3.

    Parte III

    Nosso terceiro momento se preocupa em explicitar parte da crtica de Derrida a

    Walter Benjamin, que, no limite, compreenderia o filsofo alemo como um

    antifundamentalista, ou melhor, como um pensador que se reconheceria habilitado a

    mostrar o carter injusto de todo e qualquer princpio de determinao (discriminado pela

    tradio metafsica, para usarmos termos do prprio Benjamin), ou ainda o ato injusto de

    todo e qualquer fundamentalismo, e mais, que compreenderia que o seu prprio exerccio

    crtico seria, ao fim, neutro, imparcial, prprio demonstrao de uma soluo perfeita para

    essa histria da filosofia ocidental e metafsica, que seria a histria da injustia, a saber: a

    necessidade da interveno divina e da constituio de tempos nos quais os pensamentos e

    aes humanos seriam responsveis pela concretizao do que seria universalmente e mais

    propriamente justo (ideal totalidade). Derrida analisa um texto de Benjamin de 1921,

    intitulado Zur Kritik der Gewalt, e anota que o autor das famosas Teses sobre o conceito

    de Histria: 1. evidencia o carter finito de todo e qualquer pensamento e ao humanos

    no interior da histria e, a um s tempo, 2. tematiza a possibilidade mesma de uma

    transformao radical da histria.

    O que temos at aqui, segundo Derrida, que Benjamin, por um lado, se

    aproximaria da compreenso de que os homens em geral intensificam, necessariamente, a

    histria, um aspecto ou horizonte especfico da histria, apontando, assim, para a

    3 Sobre o problema da iterabilidade: Consequentemente, no h fundao pura ou instaurao pura do direito, portanto pura violncia fundadora, assim como no h violncia puramente conservadora. A

    instaurao j iterabilidade, apelo repetio auto-conservadora. A conservao, por sua vez, ainda re-

    fundadora para poder conservar o que pretende fundar. No h, portanto, oposio rigorosa entre a

    instaurao e a conservao, somente aquilo que chamarei (e que Benjamin no nomeia) de contaminao

    diferencial entre as duas, com todos os paradoxos que isso pode induzir. No h distino rigorosa entre uma

    greve geral e uma greve parcial (uma vez mais, numa sociedade industrial, faltariam tambm critrios

    tcnicos para tal distino), nem, no sentido de Sorel, entre uma greve geral poltica e uma greve geral

    proletria. A desconstruo tambm o pensamento dessa contaminao diferencial e o pensamento tomado na necessidade dessa contaminao (Derrida, 2010, p.90).

  • Marcelo de Mello Rangel

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 354

    iterabilidade e, portanto, para a injustia (parcialidade), de todo e qualquer pensamento

    e aes. Para Benjamin, a histria tambm tenderia constituio de interpretaes

    dominantes, obscurecendo o seu carter injusto originrio, e isto sempre novamente,

    constituindo, assim, horizontes transcendentais. No entanto, e distante de Derrida,

    Benjamin no se contentaria com essa compreenso, sublinhando a de que todo

    pensamento e ao humanos seriam determinados pela injustia e, no limite, inclusive o

    dele prprio. De certo modo, e de maneira desconcertante, Benjamin se aproximaria de

    Heidegger, e mais, de uma espcie de esprito alemo prprio ao sculo XIX e s primeiras

    dcadas do sculo XX, determinado pela tentativa de explicitao da possibilidade e da

    necessidade da reconstituio radical da histria/do real, a despeito de sua condio

    transcendental.

    justo essa preocupao do jovem Benjamin, muito prxima s preocupaes do

    autor de Ser e Tempo, que aturde a Derrida. O que o filsofo franco-magrebino prope, e

    isto num congresso dedicado lembrana do Nazismo e do que se convencionou chamar de

    soluo final, que pensadores to diferentes como Benjamin, Heidegger e Carl Schmitt

    intensificaram, cada um ao seu modo, um sentido ou esperana fundamental ao prprio

    Nazismo, a saber, a da assuno de uma histria novssima, de um novo comeo, que seria,

    no caso de Benjamin, caracterizado pela superao da ingenuidade jurdica e

    representacional. Enfim, os pensamentos de Benjamin, Heidegger, Schmitt e, no limite, o

    prprio Nazismo, seriam originariamente semelhantes. Ou ainda como podemos ler:

    (...) interessei-me muito por aquilo que chamei, ento, de psiqu judaico-alem, isto , a lgica de certos fenmenos de especularidade perturbadora, ela mesma

    refletida em certas figuras de pensadores e escritores judeus alemes deste sculo,

    Cohen, Buber, Rosenzweig, Scholem, Adorno, Arendt e justamente Benjamin. Uma reflexo sria sobre o nazismo e sobre a soluo final no pode privar-se de uma anlise corajosa, interminvel e polidrica da histria e da estrutura dessa

    psiqu judaico-alem. Entre outras coisas de que no posso falar aqui, estudamos algumas analogias, dentre as mais equvocas e por vezes mais

    inquietantes, ente os discursos de certos grandes pensadores no-judeus e certos grandes pensadores judeus alems: certo patriotismo, frequentemente um nacionalismo, por vezes mesmo um militarismo alemo (durante e depois da

    primeira guerra) no eram a nica analogia, longe disso, por exemplo, em Cohen

    ou Rosenzweig e naquele judeu convertido que foi Husserl. nesse contexto que

    certas afinidades, limitadas mas determinveis, entre esse texto de Benjamin e

    certos textos de Carl Schmitt, ou de Heidegger, parecem-me merecedoras de uma

    interrogao sria. No apenas em razo da hostilidade democracia tout court,

    no apenas em razo da hostilidade Aufklrung, de certa interpretao do

  • Artigo: Justia e histria em Derrida e Benjamin

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 355

    plemos, da guerra, da violncia e da linguagem, mas tambm em razo de uma

    temtica da destruio, muito em voga naquela poca. (Derrida, 2010, p.66-7)

    No entanto, a crtica de Derrida cuidadosa e generosa, ele tambm anota que

    Benjamin sempre lembra o carter de autonomia desse movimento de reconfigurao ou de

    revoluo histrica, o que significa dizer, que no caberia a nenhum pensamento e ao

    humanos especficos, como o dele mesmo, mais propriamente, intervir ou mesmo

    resguardar essa revoluo e, ainda mais, no caberia nem mesmo o seu reconhecimento

    (evidenciao), e isto porque ele irromperia e se resguardaria imediatamente. Em linhas

    gerais, o que est em questo aqui que Benjamin explicitaria, incessantemente, o carter

    finito do pensamento e da ao humanos no que tange transformao radical da histria,

    no entanto, impaciente e inconformado, em especial em razo de seu mpeto revolucionrio

    de origem marxista, lembra Derrida, se importaria logo em evidenciar a possibilidade e a

    necessidade da transformao radical da histria a partir da interveno divina. Benjamin se

    preocupara em constatar a impossibilidade do homem de transformar a histria e, nesse

    sentido, sentia-se passivo por demais. Ento, apostava suas fichas numa interveno divina.

    Mas, a um s tempo, essa compreenso parecia-lhe talvez otimista demais, talvez otimista

    demais para a sua melancolia, sentimento (Stimmung) que o provocava, ento, a dar um

    pao atrs e a lembrar que, ao fim, essa revoluo era imprevisvel e irreconhecvel, e que

    restaria ao homem mover-se no interior da histria assumindo sua condio finita,

    responsvel por pensamentos e aes, em ltima instncia, necessariamente injustos

    (parciais, prprios lgica da iterabilidade). Bem, para Derrida, Benjamin se movia

    incessantemente e desconcertantemente entre essas duas compreenses, e assim dava um

    pao para fora daquela atmosfera alem que destacamos mais acima. Entre dentro e fora, no

    entanto, ainda era movido pela esperana da revoluo da histria, compreenso que

    imporia, sublinho o condicional imporia, dificuldade ao nosso exerccio de aproximao

    radical da filosofia da histria de Benjamin desconstruo derridiana.

  • Marcelo de Mello Rangel

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 356

    Parte IV

    Enfim, nosso quarto e mais ligeiro ponto. Se, atravs da interpretao de Derrida,

    temos acesso a um Benjamin estranho e perturbador, que evidenciava, a um s tempo,

    a origem injusta de todo e qualquer pensamento e aes humanos, e, ainda, a necessidade

    e possibilidade de transformao radical da histria, o que, no limite, obscureceria esse

    carter injusto do seu prprio pensamento, parece-nos que uma outra interpretao

    tambm possvel, em especial a partir das Teses sobre o conceito de Histria. No

    podemos tratar, como gostaramos, desse texto, no entanto, ainda resta-nos tempo para uma

    breve aproximao. Em sua segunda tese, Benjamin escreve:

    O passado leva consigo um ndice secreto pelo qual ele remetido redeno.

    No nos afaga, pois, levemente um sopro de ar que envolveu os que nos

    precederam? No ressoa nas vozes a que damos ouvido um eco das que esto,

    agora, caladas? E as mulheres que cortejamos no tm irms que jamais

    conheceram? Se assim , um encontro secreto est marcado entre as geraes

    passadas e a nossa. Ento fomos esperados sobre a terra. Ento nos foi dada,

    assim, como a cada gerao que nos procedeu, uma fraca fora messinica,

    qual o passado tem pretenso.... (Benjamin, 2005, p.48; grifo nosso)

    Benjamin fala de redeno e de fora messinica, o que significa, em seu texto,

    mais propriamente, rearticulao e assuno da harmonia do real em sua totalidade. No

    entanto, uma breve referncia torna-se fundamental para a anlise desse pargrafo e para as

    demais teses, a de que se trata de uma fraca fora messinica, e grifo, aqui, a palavra

    fraca. Ela nos permite perceber que qualquer rearticulao e assuno da harmonia do real

    em sua totalidade limitada, no cabendo pensar numa revoluo da histria, mas sim,

    numa atuao crtica melanclica, ou seja, finita, sem grandes pretenses, no interior da

    histria. Assim, no se trata mais de um pensamento que explicitaria a necessidade da

    interveno divina, mais propriamente, como acontece em Zur Kritik der Gewalt, e apontou

    Derrida. E mais, essa fraca fora messinica claramente atribuda aos homens, ou ainda

    como afirma Lwy:

    A hiptese hertica, do ponto de vista do judasmo ortodoxo, de uma fora messinica (messianische Kraft) atribuda aos seres humanos est presente tambm entre outros pensadores judeus da Europa central, como Martin Buber.

  • Artigo: Justia e histria em Derrida e Benjamin

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 357

    Mas, enquanto para ele se trata de uma fora auxiliar, que nos permite cooperar

    com Deus na obra de redeno, para Benjamin essa dualidade parece suprimida no sentido de aufgehoben. Deus est ausente, e a tarefa messinica inteiramente

    atribuda s geraes humanas. O nico messias possvel coletivo: a prpria

    humanidade, mais precisamente, como veremos depois, a humanidade oprimida.

    No se trata de esperar o Messias, ou de calcular o dia de sua chegada como o fazem os cabalistas e outros msticos judeus que praticam a gematria mas de agir coletivamente. A redeno uma auto-redeno, cujo equivalente profano

    pode ser encontrado em Marx: os homens fazem a sua prpria histria, a

    emancipao dos trabalhadores ser obra dos prprios trabalhadores (Lwy,

    2005, p.52).4

    Em linhas gerais, a interveno divina desaparece e a histria passa a ser uma

    espcie de horizonte imanente constitudo por mltiplos sentidos (mltiplos sopros de ar,

    como escrevera Benjamin), que vo medindo fora e estabilizando-se, a cada momento,

    como aspecto transcendental que tende a obscurecer o seu carter relacional. No interior de

    cada aspecto, as geraes passadas, o que significa dizer, os mltiplos sentidos

    obscurecidos da histria, continuam reivindicando a condio de protagonista. O homem

    passa a ser, a um s tempo, algum que intensifica as necessidades de uma interpretao

    dominante, de um horizonte especfico, e, tambm, uma espcie de confidente de sentidos

    obscurecidos, que so as irms desconhecidas ou, em outro momento do texto, as

    mulheres que poderiam ter-se dado a ns. Para Benjamin, a histria passa a ser um

    conjunto de possibilidades, uma multiplicidade de sentidos que vo se constituindo como

    protagonistas, aqui e ali, em razo de sua tenso eterna, e os homens aparecem como

    agentes necessrios, que atravs de pensamentos e aes intensificam, a um s tempo,

    sentidos prprios ao seu horizonte especfico (presente) e, tambm, a horizontes passados,

    as vozes esquecidas que sopram de longe e to perto. O que reparamos que o homem

    4 Ainda sobre o problema da determinao fraca da fora messinica apontada por Benjamin, Giorgio

    Agamben e o prprio Michel Lwy anotam uma possibilidade que vai ao encontro da que destacamos no

    texto, no entanto, no sublinham com tanta fora o carter de fragilidade de toda e qualquer ao messinica

    como significando, mais propriamente, o limite, necessrio, de toda e qualquer pensamento e ao humanos

    no que tange a uma rearticulao justa (ideal totalidade) da histria, permanecendo, ainda, em seus textos,

    outra possibilidade de compreenso desta determinao fraca, a saber: a de que ela tende rearticulao justa

    da histria, mas que nasce de uma fragilidade radical, de um sofrimento profundo, digamos assim. Ou ainda,

    se trataria de uma fora messinica compreendida, ainda, como a possibilidade de rearticulao justa da

    histria, que no propriamente comum, que encontra pouca possibilidade para se realizar, mas que apesar

    disto seria possvel, pois como podemos ler: Por que essa fora messinica fraca (schwach)? Como sugeriu Giorgio Agamben, poderamos ver nisso uma referncia a uma passagem do Evangelho cristo segundo so

    Paulo, 2 Cor. 12, 9-10: para o Messias, a fora se realiza na fraqueza na traduo de Lutero: mein Kraft ist in den schwachen mchtig. Mas a expresso provavelmente tem tambm um significado poltico atual: a

    concluso melanclica que Benjamin tira dos fracassos passados e presentes do combate emancipador. A

    redeno no inteiramente garantida, ela apenas uma possibilidade muito pequena que preciso saber

    agarrar. (Lwy, 2005, p.52)

  • Marcelo de Mello Rangel

    Sapere Aude Belo Horizonte, v.4 - n.7, p.347-359 1 sem. 2013. ISSN: 2177-6342 358

    passa a participar de uma espcie de jogo transcendental e tambm transcendente, o que

    significa dizer, que aparece como um agente responsvel pela iterabilidade, ou repetio,

    do horizonte transcendental que o seu, e, tambm, pela liberao e constituio de

    determinaes algo inditas (e obscurecidas) ao horizonte que o seu: semelhante ao que

    acontece no interior da desconstruo derridiana, ou ainda, o que o filsofo franco-

    magrebino quer significar atravs das noes de iterabilidade e de contaminao

    diferencial. Sempre injusto!

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  • Artigo: Justia e histria em Derrida e Benjamin

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