josé luiz ferreira - amplificadoresmeteoro.com.br · dilhar minhas primeiras notas e ......

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68 www.backstage.com.br Entrevista Entrevista Nelson Cardoso O músico Zé Luiz, como é conhecido, criou com seus irmãos Paulo e Ocimar a fábrica de amplificadores Meteoro. Sua personalidade franca e despojada, por ser ímpar e inconfundível, destaca-se em nosso segmento. Nesta entrevista exclusiva para a Backstage, ele conta como conseguiu aliar a alma de músico à alma de empresário, narra um pouco da história da Meteoro e principalmente da sua trajetória como músico. José Luiz, no início da fábrica Meteoro na década de 80 José Luiz Ferreira José Luiz Ferreira Fotos: Arquivo Pessoal / Divulgação

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EntrevistaEntrevista

Nelson Cardoso

O músico Zé Luiz, como é conhecido, crioucom seus irmãos Paulo e Ocimar a fábrica deamplificadores Meteoro. Sua personalidadefranca e despojada, por ser ímpar einconfundível, destaca-se em nosso segmento.Nesta entrevista exclusiva para a Backstage,ele conta como conseguiu aliar a alma demúsico à alma de empresário, narra um poucoda história da Meteoro e principalmente da suatrajetória como músico.

José Luiz, no início da fábrica Meteoro na década de 80

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de Músico e EmpresárioComo e quando você começou a

ser músico?

J.L. Vim de uma família em que a

música sempre esteve presente, meu

pai era multiinstrumentista e influ-

enciado por este ambiente, já aos 5

anos de idade, comecei a cantar e de-

dilhar minhas primeiras notas e

acordes no cavaquinho dele, que

sempre me incentivou. Portanto, lá

pelos 9 anos, mesmo pequeno, já

podia me considerar um músico.

Como e quando você teve, pela

primeira vez, o reconhecimento do

seu talento musical?

J.L. Sou de uma cidade do interi-

or do Paraná, chamada Cornélio Pro-

cópio. Lá havia uma cena musical

muito forte, por incrível que pareça.

Meu pai tocava em um grande gru-

po musical e era dono de uma padaria,

onde todos nós, eu e meus irmãos

trabalhávamos e iniciamos nossas vi-

das profissionais, paralelas à música.

Existiam grandes músicos que

também tinham seus trabalhos para-

lelos e alguns que já estavam até

morando fora da cidade.

Este celeiro musical era uma reali-

dade, isto você imagina em uma ci-

dade do interior, na década de 60

Por estes motivos, a Prefeitura de lá

teve a iniciativa de fazer uma noite de

gala para prestigiar e homenagear estes

músicos, dos quais eu já fazia parte.

Foram convidá-los e localizaram

até os que estavam fora da cidade.

Você não tem idéia da emoção desta

noite, estávamos todos lá e sem re-

ceber um centavo, ninguém recebeu

cachê e não houve, para mim, um re-

conhecimento maior que esta home-

nagem que a nós foi prestada.

Este acontecimento foi tão mar-

cante que, mais tarde, já com a Me-

teoro, decidi criar um evento, no Dia

do Músico, onde durante quatro anos

homenageamos pessoas que se rela-

cionavam com o cenário musical

paulistano: roadies, técnicos, lojis-

tas, bandas, enfim...Tudo isto por -

que, para mim, o maior reconheci-

mento de um músico é justamente

quando, no seu meio, ele é homena-

geado e agraciado com uma premia-

ção, justa, pelo seu trabalho e pelo

desempenho do seu talento.

Qual foi o seu primeiro instru-

mento musical e como ele apareceu

na sua vida?

J.L. Como falei, meu pai era um

grande músico e em casa tínhamos

sempre vários instrumentos. Os

meus primeiros instrumentos foram

justamente o cavaquinho e o violão

dele, embora mais tarde, para minha

surpresa, vendo meu interesse pela

música, dom e responsabilidade, ele

procurou, lá na minha cidade (Corné-

lio Procópio/PR), um senhor com o

nome de Carmona, que hoje poderia

ser considerado um luthier, e man-

dou fazer uma guitarra para mim.

Rapaz...Você não tem noção do peso

que tinha aquela guitarra, o braço era

muito grosso e as cordas muito altas,

meus dedos eram pequenos e era um

sofrimento para tirar um som, enten-

de? Os acordes com a perfeição que eu

queria ficavam difíceis.

Mas é aquela coisa, músico é en-

graçado, era um sonho... O meu pri-

“Ninguém recebeucachê e nãohouve, para mim,um reconhecimentomaior que estahomenagem que anós foi prestada.”

Zé Luiz (ao centro) com os irmãos Ocimar e Paulo

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EntrevistaEntrevista

meiro instrumento. E nada importa-

va, o que realmente valia é que era

meu e você não faz idéia, eu dormia

com a minha guitarra e aquele

pedalzinho e gostava de acordar

olhando para eles, sabe aquela sensa-

ção indescritível e foi meu pai quem

me proporcionou tudo isto.

É legal porque hoje, aqui na Mete-

oro, sabendo desta importância e das

dificuldades que o músico tem para

ter seus instrumentos, temos um de-

partamento que cuida de manter dis-

ponível para músicos e bandas, os

nossos amplificadores para emprés-

timo. Bandas e músicos iniciantes

podem ter no seu palco os amplifica-

dores que grandes músicos e grandes

bandas do cenário nacional utilizam

em seus palcos e esta sensação é fan-

tástica, é maravilhosa, para quem

ainda não tem a condição de tê-los

em definitivo.

Fale-me da casa da Rita e de suas

andanças musicais neste local?

J.L. Êêêê, rapaz... Esta história

tem muita importância na minha for-

mação como músico, mas principal-

mente como homem.

Bom... Como falei, comecei muito

pequeno e aos 9 anos integrava o gru-

po musical Black Birds junto com

Luquinhas, Sílvio Cunha, Carlos

Ferreira - o Carlinhos, meu irmão - e

Acir Carvalho, já aos 12 anos inte-

grava profissionalmente este grupo

de baile da minha cidade e, naquela

época, o que a gente queria era tocar

e se contratavam, a gente ia.

A casa da Rita, por ser uma casa

para encontros amorosos, ficava um

pouco afastada do centro e, nos anos

60, as estradas não eram todas asfal-

tadas, era tudo um barro só. Nós tí-

nhamos as dificuldades comuns para

toda banda. Tínhamos problemas

para nos deslocar até lá, mas as me-

ninas eram tão legais, era tão bom

tocar ali, que fazíamos o seguinte:

tocávamos em um restaurante da ci-

dade, para juntar a grana para pagar

o táxi do fim de semana.

Lembro-me de momentos muito

divertidos e como eu era pequeno ain-

da, as meninas tinham um carinho

muito grande comigo. Nós brincáva-

mos muito, mas tinha sempre o lado

profissional e, além disto, era com-

plicado, imagine só eu naquela idade

estar tocando ali, numa casa como

aquela, então, de vez em quando, che-

gava a polícia no local. Elas me prote-

giam, me escondiam, isto porque elas

sabiam o quanto era importante eu

tocar. Era a maior correria, mas no fi-

nal, dava tudo certo, enfim... Puláva-

mos a janela, uma loucura...

Como a cidade era muito pequena

e, pelo comércio e musicalidade do

meu pai, ele era bastante conhecido e

influente, acabou conseguindo uma

autorização para tocar profissional-

mente, no local, como músico inte-

grante do grupo.

Mais do que isso, a importância

deste local foi realmente marcante

na minha vida, lembro-me de ter co-

nhecido uma senhora com a qual

conversava muito, ela me dava con-

selhos e me mostrava muita coisa

sobre a vida. Chamava-se D. Ivone e

foi uma das pessoas mais marcantes

da minha vida, e por estas e outras

foi muito bom ir tocar naquele local.

Quantos anos você tinha e como

começou a sua vida de músico pro-

fissional?

J.L. Como disse, aos 12 anos de ida-

de, da maneira mais divertida, na

casa da Rita, nas Rádios Cornélio

Procópio e Cruzeiro do Sul, no pro-

grama da Jovem Guarda, ao vivo,

além dos restaurantes, clubes, for-

maturas, na minha cidade e por todo

estado do Paraná.

A profissão torna o músico um

pouco andarilho, me fale desta época.

J.L. É verdade, esta é uma das

vantagens da nossa profissão. Viajá-

vamos muito e foi como músico que

pude conhecer o meu país. Esta

oportunidade não tem preço, imagi-

“Meu pai era bastanteconhecido e influente,acabou conseguindouma autorizaçãopara tocarprofissionalmente,no local, comomúsico”

Aos 9 anos, José Luiz integrava o grupo Black Birds

Os Diplomatas, grupo musical da cidade de Cornélio Procópio, do qual Zé Luiz participou

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ne só estar ao lado de grandes músi-

cos, fazendo o que gostávamos, le-

vando diversão e ainda conhecendo

os lugares que nos livros estudáva-

mos. É uma escola, uma verdadeira

lição, inigualável, é viver a história

como ela realmente é.

Lembro-me de ter tocado em cida-

des, como no Mato Grosso do Sul,

que inauguramos a luz elétrica, isto

porque durante um bom tempo, to-

cávamos com a energia movida a

óleo diesel e era muito engraçado,

porque o show e o repertório depen-

diam de quando o óleo estava che-

gando ao fim.

Como nosso grupo era uma banda

de baile, tocávamos de tudo. Então,

as viagens eram cada vez mais cons-

tantes, não existia asfalto, como dis-

se, na maioria dos locais que íamos,

eram caminhos complicados, geral-

mente de barro, tínhamos uma perua

e era nela que viajávamos.

Nesta época, aprendi muito e a me

disciplinar também. Afinal, não tí-

nhamos roadies, técnicos, estas coi-

sas, éramos nós mesmos que carregá-

vamos nosso equipamento, instru-

mentos, montávamos o palco, passá-

vamos o som e tudo isto imediata-

mente após chegarmos aos locais que

faríamos nossas apresentações.

Por isto, na maioria das vezes, es-

távamos cansados pela viagem difí-

cil e suas intempéries - uma vez a

nossa perua até capotou - e assim

sendo, como havia muita poeira e

barro nos caminhos, você imagina

como ficávamos sujos.

Mas não havia tempo para descan-

so e tam pouco banho, quando ter-

minávamos de montar tudo, passar o

som, era a hora de correr, lavar o

rosto, as mãos, os pés e colocar uma

roupa limpa, a gravatinha, enfim... A

roupa de show e aí meu amigo era

paulada, ninguém segurava a gente e

Para chegar aos locais onde faziam os shows,Os Diplomatas enfrentavam estradas precárias

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EntrevistaEntrevistanós tocávamos muito e o melhor...

Felizes, muito felizes.

O engraçado é que sempre que

chegávamos nos locais dos shows,

estávamos realmente sujos e o pes-

soal que contratava acabava não

acreditando no som que fazíamos.

Aí sim, era difícil, um tempo mui-

to difícil, mas em compensação mui-

to gratificante e muito maravilhoso

de viver, viajar e fazer música, literal-

mente colocávamos o pé na estrada.

Como começou a surgir, na sua

cabeça, a Meteoro?

J.L. Depois disto tudo, passei

ainda por muitas coisas em Corné-

lio Procópio, toquei na Black Birds,

Os Rivais, Diplomatas, onde tínha-

mos como vocalista um primo nos-

so, o Márcio Aníbal... Ele tinha a

voz do céu, cantava muito, cantava

muito mesmo.

Ainda na minha cidade, toquei na

The Bad Boys Band e aí, como músi-

co, senti necessidade, obviamente,

de sair de lá à procura de novos hori-

zontes. Fui para Londrina (PR), to-

quei na New Sound, e para Presiden-

te Prudente (SP) atrás do sonho que

tinha de tocar numa banda cha-

mada Os Sombras. Este grupo,

eu dizia para mim mesmo sem-

pre e para minha mãe, um dia

vou tocar com eles e você nem

sabe... Cheguei até a pedir a

uma estrela para que aconte-

cesse e aconteceu. Passei um

tempo em Campinas (SP) e

foi só depois que vim para São

Paulo tocar com um grupo cha-

mado Super Grupo. Nas horas va-

gas, comecei a dar aulas em um con-

servatório, em Guarulhos, do maes-

tro Colacciopo, e isto durou muitos

anos, paralelo ao trabalho com o

grupo, porque já estava com família,

mulher e filhos.

Eu tinha muitos alunos, mas o

grupo começou a tocar e a viajar

muito, por isso constantemente ti-

nha que faltar e aquilo me incomoda-

va, então decidi e achei melhor sair

do conservatório.

Mesmo assim, o maestro e sua es-

posa, duas pessoas muito bacanas,

ainda me seguraram por mais um

ano, até que se tornou impossível

conciliar os dois trabalhos.

Só que meus alunos já estavam

bastante adiantados e acostumados

com minha técnica e alguns deles sa-

bendo onde morava, foram pedir-me

que continuassem as aulas na minha

casa, decidi dar as aulas, mas sabe

como é, o boato se espalhou e até

vinham alunos de São Paulo.

Nos dias que não tinha ensaio ou

show, nas horas que sobravam e nas

semanas que ficava em casa, tinha

alunos o dia inteiro e só parava para

me alimentar.

Foi aí que minha família começou

a ficar louca com aquele som insis-

tente, repetitivo, os mesmos acor-

des sempre, o que é comum para

quem está aprendendo a tocar e

como era tudo muito improvisado,

lá em casa, o que separava a aula da

sala era apenas uma cortina que ha-

víamos colocado para manter a pri-

vacidade deles.

Por estes motivos, começaram a

questionar se não havia um jeito de

diminuir aquele som insistente o

tempo todo, foi ai que decidi procu-

rar meu irmão Paulo e falar sobre

uma idéia que me veio à cabeça.

Paulinho, também músico, bateris-

ta, tinha trabalho fixo em uma grande

empresa, em eletrônica, na Phillips

do Brasil. Pedi que ele desenvolvesse

um ampli minúsculo e coloquei-o em

um fone de ouvido.

Era assim: o músico plugava na gui-

tarra ou no baixo e só ele ouvia o som.

A partir daí, todos os alunos, que não

eram poucos, começaram a solicitar e

todos queriam comprar. E foi aí que,

me lembro muito bem, eram umas

oito horas da noite, fui à casa do Paulo

e disse para ele: "Paulinho, vamos

montar uma indústria!". Minha cu-

nhada, Irene, ao ouvir aquilo quase

morreu de rir, afinal o Paulinho esta-

va estabilizado, tinha um bom em-

prego e tudo aquilo só parecia um

sonho. Mas fui incisivo e acabei con-

vencendo o Paulinho em montarmos

algo pequeno, funcionando na casa

dele, na garagem e o mais engraçado

é que o primeiro fone foi montado

em cima da máquina de costura da

minha cunhada.

Ele me disse que não poderia dei-

xar o emprego e que eu deveria to-

mar conta de tudo, durante o dia, à

noite, ao largar do serviço, ele iria

para produção. Eu fazia as placas e as

desenhava a mão uma por uma, colo-

cava no preclorêto de ferro... Uma

loucura... Você tinha de ver... E a coi-Depois dos Bad Boys, Zé Luiz se mudou para Londrina

Primeiro produto lançado pela Meteoro, em 1984, oMeteoro Study Phone

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sa foi crescendo saímos da casa do

Paulo para uma salinha de 5m por 5m

onde fazíamos tudo, decidimos dar

um nome ao equipamento que se

chamou Meteoro Study Phone, cada

vez mais pedidos chegavam. Lem-

bro-me do nosso primeiro pedido, de

fones, foi para as Casas Tommasi,

por intermédio do sr. José Roberto,

guardo até hoje a cópia do pedido.

Mas continuávamos com o grupo e

foi quando apareci com isto em um

ensaio, os músicos enlouqueceram e

falaram: "Ô, Zé, você que mexe com

eletrônica, essas coisas, por que não

faz uns amplis pra gente tocar? Este

incentivo era o que faltava para par-

tirmos para algo ainda maior, alu-

guei uma casinha em Guarulhos e

tudo isto provocou uma conversa

ainda mais longa com o Paulo.

Na época, tinha acabado de chegar

ao Brasil os cubos Roland, que fazi-

am o maior sucesso e nos motivaram

a fazer um cubo no estilo, embora o

nosso tenha surgido da idéia de um

outro ampli, um Yamaha, que era

grande. Então nós reduzimos e fize-

mos o nosso no estilo cubo, daí sur-

giu o RX 100, o primeiro ampli Me-

teoro, lembro que era muito legal o

som dele.

Decidimos investir em propagan-

da. Eu já sentia o quanto era impor-

tante anunciar, para você ver, eu de-

sistir de fazer Faculdade de Engenha-

ria Cartográfica, e entrei em Desenho

Técnico e Publicitário o que sempre

me deu esta noção de publicidade

para minhas campanhas que até hoje,

sempre acompanho e aí mesmo com

uma salinha de 5 por 5m, já tínha-

mos um anúncio de meia página na

revista Som 3.

Qual foi o primeiro produto que

você fez?

J.L. Foi justamente o Meteoro

Study Phone.

Fale-me um pouco das dificulda-

des no início da Meteoro.

J.L. Como nós tocávamos, grana

não era problema, tudo que a gente

ganhava com as vendas investíamos

em peças e fazíamos mais aparelhos.

Uma de nossas dificuldades foi com

relação aos componentes. Por ser-

mos uma empresa muito pequena e

fabricantes de pequeno porte, não tí-

nhamos e não éramos ainda interes-

santes para os grandes fabricantes,

assim sendo, tínhamos que comprar

em lojinhas de eletrônica.

“Ô, Zé, vocêque mexecom eletrônica,essas coisas,por que nãofaz uns amplispra gente tocar?”

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sa foi crescendo saímos da casa do

Paulo para uma salinha de 5m por 5m

onde fazíamos tudo, decidimos dar

um nome ao equipamento que se

chamou Meteoro Study Phone, cada

vez mais pedidos chegavam. Lem-

bro-me do nosso primeiro pedido, de

fones, foi para as Casas Tommasi,

por intermédio do sr. José Roberto,

guardo até hoje a cópia do pedido.

Mas continuávamos com o grupo e

foi quando apareci com isto em um

ensaio, os músicos enlouqueceram e

falaram: "Ô, Zé, você que mexe com

eletrônica, essas coisas, por que não

faz uns amplis pra gente tocar? Este

incentivo era o que faltava para par-

tirmos para algo ainda maior, alu-

guei uma casinha em Guarulhos e

tudo isto provocou uma conversa

ainda mais longa com o Paulo.

Na época, tinha acabado de chegar

ao Brasil os cubos Roland, que fazi-

am o maior sucesso e nos motivaram

a fazer um cubo no estilo, embora o

nosso tenha surgido da idéia de um

outro ampli, um Yamaha, que era

grande. Então nós reduzimos e fize-

mos o nosso no estilo cubo, daí sur-

giu o RX 100, o primeiro ampli Me-

teoro, lembro que era muito legal o

som dele.

Decidimos investir em propagan-

da. Eu já sentia o quanto era impor-

tante anunciar, para você ver, eu de-

sistir de fazer Faculdade de Engenha-

ria Cartográfica, e entrei em Desenho

Técnico e Publicitário o que sempre

me deu esta noção de publicidade

para minhas campanhas que até hoje,

sempre acompanho e aí mesmo com

uma salinha de 5 por 5m, já tínha-

mos um anúncio de meia página na

revista Som 3.

Qual foi o primeiro produto que

você fez?

J.L. Foi justamente o Meteoro

Study Phone.

Fale-me um pouco das dificulda-

des no início da Meteoro.

J.L. Como nós tocávamos, grana

não era problema, tudo que a gente

ganhava com as vendas investíamos

em peças e fazíamos mais aparelhos.

Uma de nossas dificuldades foi com

relação aos componentes. Por ser-

mos uma empresa muito pequena e

fabricantes de pequeno porte, não tí-

nhamos e não éramos ainda interes-

santes para os grandes fabricantes,

assim sendo, tínhamos que comprar

em lojinhas de eletrônica.

“Ô, Zé, vocêque mexecom eletrônica,essas coisas,por que nãofaz uns amplispra gente tocar?”

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EntrevistaEntrevistaAlém do custo ficar altíssimo, não

podíamos ter uma condição diferenci-

ada e não havia jeito de adquirir estes

componentes com uma margem de

erro pequena na fabricação. Isto nos

dava muita dor de cabeça e complica-

va a parte eletrônica dos nossos apa-

relhos, além dos desperdícios com as

peças que não se adequavam, por

exemplo, na parte eletroacústica.

Além disso, outros problemas foram

surgindo, eu não concordava de for-

ma alguma ir até uma loja e comprar

50 falantes para guitarra. Isto não

existe. Cada amplificador, cada gabi-

nete é um conjunto e o falante tem

que ser desenvolvido para aquele

produto específico.

Mas tivemos, em nosso caminho

grandes parceiros e amigos que acre-

ditaram e acreditam no nosso traba-

lho e muitos deles continuam co-

nosco e nos ajudaram a vencer estas

dificuldades.

Por exemplo, nesta história dos

falantes, me lembro que por inter-

médio do sr. Barion, da Bravox, co-

meçamos a desenvolver os falantes,

mas ainda comprávamos muito

pouco e não ficava viável, para em-

presa, fazer esta parceria conosco,

na época, para você ver as dificulda-

des de fabricação.

Aí resolvemos montar uma fábrica

de falantes, aconselhados por amigos.

Compramos uma fábrica já existente

e em duas semanas, ela começou a ro-

dar, com antigos funcionários... Meu

amigo... Foi outro problemão, cons-

tatamos que não era nada daquilo e

que não era tão fácil assim.

Depois... O que eu gostava mes-

mo era de pegar meus cubos, colo-

car no carro e sair para vender. Nun-

ca vou esquecer uma grande venda,

talvez o primeiro grande pedido que

recebemos, foi para o Torau (loja),

ele fez o pedido e na minha total in-

genuidade e inexperiência, antes

mesmo de entregar todos os apare-

lhos, precisando do dinheiro, fui lá

receber, ele vendo que não havia

maldade e sim total desconheci-

mento do processo, mandou fazer

um cheque para me pagar.

Com o crescimento da empresa,

começamos a fazer bons parceiros,

não posso esquecer as dificuldades

para colocar um aparelho nacional,

de fabricação caseira no mercado.

Mas no nosso caminho encontra-

mos tanta gente legal, foram muito

amigos e percebiam que, estávamos

realmente a fim de fazer algo de músi-

cos para músicos e que durante todos

estes anos, foram nossos parceiros e

nos ajudam até hoje nos dando o feed

back, extremamente necessário para

qualquer empresa, do que o nosso

consumidor final deseja e principal-

mente o que acha dos equipamentos.

Estas dificuldades nos fizeram ver

o quanto os lojistas, são importantes

e como é bom tê-los ao nosso lado.

A coisa começou a ficar ainda

mais louca... Eu ia para o banco,

“Compramos umafábrica já existentee em duassemanas elacomeçou a rodar, comantigosfuncionários”

Paulo Roberto produzindo o RX100

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EntrevistaEntrevistacomprava peças... montava os apare-

lhos... contratava gente... cuidava de

tudo, sempre com a ajuda do meu ir-

mão Paulo e ainda saía para vender.

Começamos a sentir outras gran-

des dificuldades, não entendíamos

nada da parte administrativa, contra-

tação, estas coisas e acontecimentos

como o do Torau começavam a nos dei-

xar constrangidos. Era necessário que

nos organizássemos com relação a

prazo de pagamento, cobrança, ge-

renciar as vendas, cadastrar nossos

clientes e nos planejarmos melhor.

Foi aí que nosso irmão caçula, o

Ocimar (saxofonista) , entrou na em-

presa, como funcionário, para cuidar

de toda esta parte e você não acredi-

ta, em pouquíssimo tempo ele arru-

mou a casa. Sua garra, força de von-

tade e determinação eram tantas que

chamei o Paulinho e disse: " Irmão

vamos colocá-lo como nosso sócio!"

Além disso, o Ocimar, não podia

ficar sozinho e foi aí que meu cunha-

do João (Diretor de Fábrica da Mete-

oro) veio para ajudar a organizar os

departamentos.

Arrumada a casa começamos a di-

luir outras dificuldades, a venda para

o Brasil, um país demograficamente

extenso. Sentíamos a necessidade de

ter representantes em alguns esta-

dos, era complicado e caro para nós,

ainda, termos uma boa estrutura, foi

aí que veio para nós, outras gratas

surpresas e mais pessoas fantásticas

que nos ajudaram e ajudam (muitos

dos que começaram conosco ainda

estão na casa). Eles quebraram bar-

reiras que não foram poucas e

paradigmas. Recordo-me de quantas

vezes depois de rodar uma cidade in-

teira, levando meus amplis no braço

e mostrando loja em loja, tivemos

que dividir uma única refeição em

um quarto de hotel, bem simples,

como com meu parceiro "Preto"

(Hércules, Representante Interior de

São Paulo/Rio) e nunca ouvi destes

parceiros uma reclamação ou desâni-

mo, pelo contrário, sempre confi-

antes, cheios de elogios e com

uma vontade danada de

ver nossos produtos na

vitrine, bem colocados,

vendendo bem e sendo as-

sim credibilizados por

eles, que já estavam no

mercado representando

outras marcas.

Começamos a pensar que

precisávamos associar nos-

sa marca a formadores de

opinião, grandes músicos,

afinal sentíamos ainda difi-

culdades em consolidá-la.

Mais surpresas, mais par-

ceiros e acima de tudo gran-

des amigos, também neste meio,

encontramos no caminho.

Nossa filosofia foi e é até hoje, a

de fazer equipamentos com os quais

os músicos toquem e consigam tirar

deles o melhor som para suas carac-

terísticas musicais e que amplifi-

quem da forma exata o que conse-

guem, através dos seus talentos, ti-

rar do instrumento que tocam.

Com esta filosofia cheguei junto

de grandes músicos, os quais respei-

to e os convidei para ir até a fábrica,

tocar nos nossos amplis, dar opini-

ões e com alguns desenvolvi amplifi-

cadores que estão aí no mercado e

hoje compõem os back lines de gran-

des bandas, do nosso riquíssimo ce-

nário nacional e que nos prestigiam

usando nossos aparelhos.

Tenho como amigos, parceiros e

grandes responsáveis por estes tra-

balhos, músicos como o Mello

Júnior (guitarrista) hoje nosso Espe-

cialista de Produtos, Celso Pixinga

(baixista), conosco há 12 anos,

Hélcio Aguirra (guitarrista), que me

ajudou muitíssimo quando comecei

a desenvolver nossa linha de valvu-

lados, Andreas Kisser (guitarrista),

menino tão bom que o coração de

músico dele chega a nos emocionar

sempre que estamos juntos, Mozart

Melo, grande professor e muitos que

gostaria de citar, e a todos que fazem

esta grande família que é hoje a Me-

teoro Amplifier.

Você sempre apoiou os músicos

no início da carreira. Fale um pouco

dos Mamonas Assassinas.

J.L. É como falei, sou músico, né?

Sei a dificuldade de saber que tenho

talento, meu som é bom e não ter

equipamento para mostrar meu tra-

balho, para que possam me reconhe-

cer! Já pensou nisto?

Vixe, Maria, isto é muito ruim e

vai dando um desânimo. Então os

meninos eram assim, eles não ti-

nham equipamento e eram uma gran-

de banda, aqui de Guarulhos (SP),

eles usavam o nome de Utopia e fazi-

am um rock, na época, muito pareci-

do com o Barão Vermelho, tocavam

muito bem, mas no mercado musical

já existiam muitas bandas no estilo

deles. Estes meninos eram como

nós, quando tínhamos o nosso gru-

“Nossa filosofiafoi, e é até hoje, ade fazerequipamentos comos quais osmúsicos toquem econsigam tirar deleso melhor som”

Primeiro amplificador daMeteoro, lançado em 1985

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EntrevistaEntrevistapo, nunca tiveram ajuda de ninguém

e faziam tudo sozinhos. Não tinham

roadies, técnicos, tocavam com ins-

trumentos emprestados e pegavam

equipamento aqui na fábrica, para fa-

zer seus shows, eles praticamente

pagavam para tocar... Quer dizer...

Eles pagavam para tocar, mesmo.

Mas tinham um grande potencial, o

Dinho, era exatamente aquela pessoa

do palco, brincalhão, extrovertido, in-

teligente, e vinha muito aqui, às vezes

ficava uma tarde inteira, sentado na

recepção, com aquele jeitão, para tro-

car umas idéias comigo, sempre pedia

desculpas por estar ali, imagina. Um

dia, ele chegou na fábrica, muito desi-

ludido com as coisas que estavam

acontecendo, de ter de tocar cover, de

não gostarem quando eles tocavam as

músicas deles e de estar na realidade

pagando para tocar nos lugares, por

que os gastos para ir tocar e mostrar

suas músicas ficavam altos.

Aí, meu fio... chamei o Dinho na

minha sala e falei: "Dinho, você pres-

ta atenção, você é um artista, sua

banda é legal, mas você tem que ter

um pouco mais de paciência!"

Não sei por que resolvi contar

uma história que havia acontecido

comigo, comecei assim...

"Nada nesta vida de músico é fácil.

Quando cheguei em São Paulo fiz fa-

zer um trabalho com uma grande

banda, antes disto, eu só tocava rock

in roll e tinha me desligado um pou-

co das leituras musicais e este grupo

era muito grande, já renomado, toca-

vam com muitos arranjos e só toca-

vam pedreiras do tipo: Glen Miller,

Frank Sinatra e outros grandes no-

mes. Era tudo com partitura não

dava para ser intuitivo e fazia muito

tempo que não lia aí... foi trave... só

trave, na certa. Após o primeiro fim

de semana, fizeram uma reunião em

uma grande mesa e o sr. Erlon José

me disse: "Sinto muito, mas você é

muito ruim para tocar conosco!"

Aquilo me deu um desespero, preci-

sava do emprego, estava com a minha

família e o pior, eu sabia e conhecia

muito bem meu potencial como músi-

co, olhei para o cara e pedi, por favor,

para que ele me desse uma chance para

mostrar que eu conseguiria estar ali no

meio daqueles grandes músicos que

faziam parte do grupo. Por isso, eu

agradeço ao Maestro Karan e a todos

aqueles músicos que me deram uma

nova oportunidade. Mas o melhor

você não sabe, Dinho e não vai acredi-

tar, um ano e meio depois eu era o Di-

retor Musical do grupo e 15 anos de-

pois fui o dono deste grupo, que per-

tencia à empresa Rearte Traipú, a qual

tenho muito carinho!"

Não sei por que lhe contei esta his-

tória, só sei que olhei para o Dinho e

ele estava com os olhos cheios d´água

e me pediu para trazer a banda dele

aqui na Meteoro, para que eu contasse

esta história para eles e aí... É lógico,

né?... Concordei, mesmo sem enten-

der muito bem e assim ele o fez. Vie-

ram todos os integrantes da banda

aqui e contei a história novamente.

Passou um tempo e me chega o

Dinho com aquele jeitão dele, com

uma fita cassete na mão e umas mú-

sicas bem alegres e divertidas numa

gravação muito ruim, feita em casa,

com muito vazamento e me disse:

"Zé... vê aí o que você acha?"

Disse que era muito legal porque o

país em que vivemos é muito alegre,

mas que seria melhor fazer uma demo

em um estúdio. Foi quando montamos

um equipamento em um barzinho cha-

mado Lua Nua, de um grande amigo, o

Valdir aqui em Guarulhos mesmo e

eles levantaram uma grana para fazer a

demo. Encaminhamos para um pessoal

do mercado fonográfico que gostou,

mas eles queriam ver ao vivo.

Aí, rapaz... Montamos o equipa-

mento novamente, no mesmo bar,

desloquei meu técnico de som preo-

cupado com a voz do Dinho, por que

nas músicas deles o grande barato do

som eram as letras e fui para lá. Sen-

tado, na mesa, com o pessoal, após

as primeiras músicas já estava com a

certeza do contrato firmado, foi mui-

to legal, legal mesmo.

Mas gostaria de deixar claro aqui

uma coisa, ninguém, mais ninguém

mesmo ajudou estes garotos, eles fi-

zeram tudo sozinhos com a força da

família e sabe por que tô dizendo

isto, por que depois que as coisas

acontecem e estouram aparecem

sempre os pais da criança. Tiveram

muita sorte mesmo assim, um ami-

go o Rick Bonadio e sua equipe fize-

ram um trabalho com eles e o pesso-

al da 89 FM, na época, deu a maior

força quando deixaram eles tocarem

no show em prol da campanha contra

a aids. Veja só, só tinham feras, mas

a maioria rock pesado, metal e colo-

caram os moleques lá no meio com o

trecho da música... "Me passaram a

mão na bunda e eu não comi nin-

guém...", inserido na chamada do

evento, aquilo foi um estouro, você

nem imagina!

Por fim, nessa época, nosso estan-

de na Expomusic tinha shows, ao

vivo, e o sonho do Dinho sempre foi

tocar lá no meu estande, imagine só?

No meio de toda a ascensão rápida,

estourando nas paradas de sucesso

de todas as rádios do Brasil, eles fo-

ram até a feira e tocaram no meu

estande, aquilo foi uma loucura ain-

“Chamei o Dinho naminha sala e falei:Dinho você prestaatenção, você é umartista, sua banda élegal, mas você temque ter um poucomais de paciência!”

“Um ano e meiodepois eu era oDiretor Musical dogrupo e 15 anosdepois fui o donodeste grupo, quepertencia à empresaRearte Traipú”

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80 www.backstage.com.br

EntrevistaEntrevista

da maior, quase derrubaram a cabine

e acabou que foram feitas mais de

uma apresentação.

Eu acredito que o sucesso da Mete-

oro se deva à soma da alma do músico

com a alma do empresário. Como

você trabalha estas duas almas?

J.L. Na verdade elas são uma coisa

só e o músico para mim é como um

médico com um paciente para ser

operado, quando se sobe no palco e

se conta... 3... 4... É assim... Paula-

da, muito som e uma emoção indes-

critível. Eu me orgulho muito de ser

músico. Hoje quando viajo a negóci-

os, no Brasil ou fora do meu país e

vou preencher, minha ficha, nos ho-

téis, no item profissão, com muito

orgulho mesmo, preencho: "músico"

e sabe por quê? Escute bem o que eu

lhe digo: "Não existe aparelho que

meça precisamente o som e qualida-

de de um equipamento como a sensi-

bilidade de um grande músico".

Portanto, as duas almas estão ali-

adas e somam-se ao gosto sonoro

criando uma identidade e é isto que

faz a Meteoro ter o som dela, muito

próprio, dela, muito dela, entende?

Sei que você tem uma imensa ad-

miração pelo sr. Cristalino. Quem é e

o que representa para você?

J.L. Rapaz, agora você me pegou

de jeito. Bom... Um grande homem,

um vencedor, amigo, um músico fan-

tástico, a tradução mais verdadeira

do dom divino que Deus nos dá.

Um filho de índios, mineiro de Teó-

filo Otoni, que teve em sua compa-

nheira a força para aprender o que ela

lhe ensinou, que olhava um instru-

mento perguntava o que era, como

se tocava e saía tirando notas do

mesmo e fazendo música. Eu ficava

impressionado em ver a facilidade

com que ele tocava quase todos os

instrumentos. Com perfeição, ele to-

cava todos, muito bem.

Tocava em regionais, tinha mui-

to carinho pelos seus músicos,

para você ter uma idéia um dos

maiores saxofonistas da época, o

Bucck Pitman, trabalhou na or-

questra dele.

Cristalino Ferreira era meu pai!

Aquele que desde muito cedo me en-

sinou a respeitar a música e a profis-

são. Aquele que me incentivou sem-

pre a tocar. Um homem que respeita-

va acima de tudo sua mulher e seus

filhos e mais... Você poderia mexer

com quem fosse, mas não mexesse

com sua família... Meu fio, o homem

virava bicho, Vixe Maria, você nem

acredita no que ele seria capaz de fazer.

Para você ver, me lembro do

quanto a música era importante

para ele, porque nunca ouvi minha

mãe falar um "aí" que fosse sobre

isto, pelo contrário, saíamos para

tocar e era como aquela imagem que

todo garoto tem quando vai para es-

cola. Da mãe que leva até o portão,

para pegar a perua escolar, sabe

como é? Com a gente era a mesma

coisa, aliás, era ela quem fazia nos-

sas roupas de shows e ela, que é

muito linda, uma princesa até hoje,

sempre ia nos levar até a perua

quando esta chegava.

Então... O sr. Cristalino era esse

homem que era respeitado em casa e

na cidade que morava, mas principal-

mente como músico, isto porque você

imagine só ser músico naquela época,

em 60 e em uma cidade do interior,

mas ele era muito firme, cresci vendo-

o tocar e tocando com ele uma das coi-

sas mais importantes que ele me falou

foi: "Meu filho, nesta nossa profissão,

você vai se deparar com muitas coisas

boas e ruins. Nunca caia em nenhum

vício, você tem a música no sangue

que veio de mim, para você tocar você

não precisa disto"!

Que mais posso dizer? Só sei que

aos 14 anos de idade perdi este ami-

go, companheiro. Um homem de fi-

bra, músico, que me ensinou tam-

bém e principalmente a ser honesto e

verdadeiro nas minhas atitudes e fa-

zer disto a minha vida, alguém que

mostrou e fez entender o verdadeiro

valor da família. Por isso, um dos

nossos amplificadores mais comple-

tos leva seu nome uma homenagem

nossa àquele que nos deixou estas li-

ções que nós temos na alma e prin-

cipalmente no sangue.

“Hoje, quando viajoa negócios e voupreencher minhaficha nos hotéis, noitem profissão, commuito orgulhomesmo, preencho:"músico”

Zé Luiz, em 1987, o começo da Meteoro em feiras