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JOSÉ HENRIQUE VALÉRIO
PROCESSING DESIGN: REFLEXÕES SOBRE DESIGN GERATIVO
São Paulo2013
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação, Arte e História da Cultura.
Orientação: Prof. Dr. Wilton Azevedo.
JOSÉ HENRIQUE VALÉRIO
PROCESSING DESIGN: REFLEXÕESSOBRE DESIGN GERATIVO
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Wilton Azevedo - OrientadorUniversidade Presbiteriana Mackenzie
Prof. Dr. Paulo Roberto Monteiro de AraújoUniversidade Presbiteriana Mackenzie
Profa. Dra. Gisela Belluzzo de Campos Universidade Anhembi Morumbi
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação, Arte e História da Cultura.
Orientação: Prof. Dr. Wilton Azevedo.
Dedico esta dissertaçãoao meu amado filho:
LUCAS VIDAL VALERIO
Agradecimentos
A Deus;
À Obra do Eterno na Face da Terra;
Ao meu filho Lucas. Minha jóia preciosa e meu anjo que tanto amo;
À minha mulher, Lucimara, pelo apoio em todos os momentos e por seu jeito tão
especial que me faz apaixonante todos os dias;
À minha Mãe. Presente, solícita e guardiã;
Ao meu pai (in memoriam): saiba que cumpri mais esta estapa, e esteja onde estiver,
gostaria que sentisse orgulho deste seu filho caçula;
Aos meus queridos irmãos, minha referência;
Ao meu orientador, Prof. Dr. Wilton Azevedo, que me mostrou os caminhos da pesquisa
e por acreditar em meu potencial;
A Paulo Costa, por sua generosidade colaborando com minha pesquisa;
Aos meus queridos colegas de turma, que me fizeram acreditar que pode existir
amizade entre alunos de um curso de mestrado;
E, por fim... Argus (in memoriam), você caninamente foi “o cara”!
RESUMO
A linguagem de Programação Processing pode ser considerada uma linguagem
pluralista. É usada em trabalhos que vão do design até com sua associação ao uso
da placa lógica Arduíno, com a qual é possível até mesmo controlar sistemas com
aplicações na área de impressão 3D, robótica, engenharia de transportes, entre outros.
Dentre toda essa vastidão de aplicações, esta pesquisa concentra-se na linguagem
de programação Processing enquanto design.
Procura-se entender, a partir de um levantamento histórico e conceitual, bem
como pela análise das obras de alguns artistas contemporâneos, do Brasil e do
exterior, a existência da imprevisibilidade desta modalidade de design, com o objetivo
de estudar o processing design e suas aplicações.
A estrutura autogerativa é confrontada com a tradição cultural do design
propagado hoje, tanto nas escolas quanto por designers. Para tanto, este projeto parte
de uma reflexão prático-teórica: apresenta uma série de exemplos de processing
design desenvolvidos por profissionais a partir dos questionamentos e das elucidações
levantados ao longo do processo de investigação, contribuindo com o entendimento
e sugerindo novos caminhos para a pesquisa sobre processing design e novas
tecnologias.
Palavras chave: Processing, processing design, generative design, design
processo, design gerativo.
ABSTRACT
The Processing language programming can be considered a pluralistic language.
It is used in works ranging from design to their association with the use of the logic
board Arduino, with which it is possible to control systems with applications in the
field of 3D printing, robotics, transportation engineering, and others. All of them this
vastness applications, this research focuses on Processing language programming
while design.
It seeks to understand, from a historical and conceptual as well as the analysis
of the works of some contemporary artists from Brazil and abroad, the existence of the
unpredictability of this type of design, purposing to study the processing design and
their applications.
The generative structure will be faced with the cultural design tradition propagated
today in schools and by designers. Therefore, this project It starts with the practical-
theoretical reflection: presents a series of examples of processing design developed
by professionals based on questions and clarifications raised throughout the research
process, contributing to the understanding and suggesting new avenues for research
on processing design and new technologies.
Keywords: Processing, processing design, generative design, design processo,
design gerativo.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Linguagens de programação mais utilizadas. .............................................59
LISTA DE FIGURAS
Fig. 1 - Ben Laposky. .................................................................................................21Figs. 2, 3 e 4 Imagens geradas pelo tubo osciloscópico. ..........................................21Fig. 5 John Whitney trabalhando com seu computador análogo mecânico. ............22Fig. 6 Lente zoom da câmera de Whitney focando na mesa rotativa primária de seu computador análogo mecânico ............................................................23Fig. 7 Whitney colocando seu gabarito de desenho geométrico dentro da mesa giratória do computador. .........................................................23Fig. 8 Modelos geométricos desenhados com o espirógrafo. ...................................23Fig. 9 Algumas pausas harmônicas diversas selecionadas de um material de computação gráfica usadas no filme “Arabesque” de 1975. ........23Fig. 10 Desenho elaborado por Aaron, ainda com formas básicas. .........................24Fig. 11 “Coming into a Lighter Place” . .......................................................................24Fig. 12 Jean-Pierre Balpe. Autoportrait en abîme (2009). ........................................25Fig. 13 Tela do programa de geração de romances Roman e estrutura das combinações entre os romances e a geração do romance virtual. .............27Fig. 14 As interações sendo correlacionadas gerando um texto. .............................27Fig. 15 Gerador de romance. .....................................................................................27Fig. 16 Balpe. “Me Tapolis”. .......................................................................................28Fig. 17 As variações do logotipo MTV a partir do primeiro logotipo concebido. ........31Fig. 18 e 19 As variações do logotipo da cidade de Melbourne (Austrália). ..............32Fig. 20 Catálogo Memphis de 1977. ..........................................................................34Fig. 21 Capa do catálogo Memphis. Christoph Radl. ................................................34Fig. 22 Logotipos do Estúdio Memphis. .....................................................................34Fig. 23 Exemplar da Revista The Face ......................................................................36Fig. 24 Projeto editorial The Graphic Language of Neville Brody ..............................38Fig. 25 Algumas fontes de letra criadas por Neville Brody ........................................38Figs. 26, 27, 28 e 29 Exemplares 1, 2, 3 e 4 da revista Fuse ...................................39Fig. 30 Anúncio de revista. Cliente: Nike. 1988 .........................................................40Fig. 31 Variações estilísticas da palavra Style até sua total abstração. ....................40Figs. 32 e 33 Capas de 1987 pré-computador criadas por Carson ...........................43Figs. 34, 35 e 36 Algumas capas da revista Beach Culture até sua última edição (1991). ..............................................................44Figs. 37, 38, 39 e 40 Edições da revista RayGun .....................................................47Fig. 41 Primeira experiência com legendas como um elemento de design. ............48Fig. 42 Mixed Messages, 1993. ................................................................................49Fig. 43 Tin Man, 1993. ..............................................................................................49Fig. 44 Too Much Joy, 1992. .....................................................................................50Fig. 45 Backbeat, 1994. .............................................................................................50Fig. 46 Screaming Trees, 1993. .................................................................................50Fig. 47 Detalhe de uma página de revista em que Carson usa a fonte Dingbats em artigo completo sobre Bryan Ferry. ........................................................51Fig. 48 Projeto editorial David Carson recent Werk e projeto editorial Ray Gun. ......51Fig. 49 Chuck Close em seu ateliê. ...........................................................................52
Fig. 50 O estilo realista das grandes pinturas dos retratos de Chuck Close antes de seu acidente. ..............................................................53Figs. 51 e 52 Big Self- Portrait (273x212cm) ............................................................54Figs. 53 e 54 John, 1997 (silkscreen - 163.8 x 138.4 cm). .......................................55Fig. 55. O processo clássico de design segundo Cédric Kiefer ................................63Fig. 56 O processo gerativo de design segundo Cédric Kiefer .................................63Figs. 57 e 58 Comparação entre as formas e quantidades de saída (outputs) entre o design clássico e o design gerativo, segundo Cédric Kiefer. ...64Figs. 59 e 60 Web site da linguagem de programação Processing e site open Processing. ....................................................67Figs. 61 e 62 Tela de abertura e janela principal do Processing. .............................69Figs. 63, 64 e 65 Telas de abertura do site de Paulo Costa. ....................................76Fig. 66 O projeto multimídia Preto no Branco. ...........................................................78Figs. 67, 68 e 69 Performers Rogério Borovik e Samira BR no projeto multimídia “Preto no Branco”. ......................................79Figs. 70, 71 e 72 Resultado das imagens em blend mode desenvolvidas por Paulo Costa para a performance “Preto no Branco”. ..............80Figs. 73, 74 e 75 Resultado das imagens em blend mode desenvolvidas por Paulo Costa para a performance “Preto no Branco”. ..............81Fig. 76 PerlinDraw, Trabalho realizado por Paulo Costa. ..........................................82Figs. 77, 78 e 79 PerlinDraw, Variações das imagens e detalhe do trabalho programacional realizado por Paulo Costa. ..................................83Fig. 80 Interface da obra Atame: a angústia do precário ...........................................87Figs. 81, 82, 83 e 84 Imagens da obra Atame: a angústia do precário .....................88Fig. 85 Imagem da obra Atame: a angústia do precário ............................................89Fig. 86 Dançarina Laura Keil em sua performance para a elaboração da obra Unnamed soundsculpture. .....................................................................92Fig. 87 Unnamed soundsculpture. Posição dos sensores de movimento Kinect em relação à dançarina Laura Keil. ....................................................92Figs. 88 e 89 Unnamed soundsculpture.Importação das partículas e para o tratamento gráfico no software 3D Max. ..................................93Fig. 90 Unnamed soundsculpture. Variações das superfícies aplicadas à dançarina ....................................................................................94Figs. 91, 92 e 93 Unnamed soundsculpture. Detalhes do efeito “areia” gerado pela multiplicação de pontos. ...........................................95Figs. 94 e 95 Busca por palavra-chave no site da livraria Cultura. ...........................98Figs. 96, 97, 98 Busca por palavra-chave no site da livraria Saraiva. .......................99Figs. 99 Busca por palavra-chave no departamento livros, site Submarino. ..........100Fig. 100 Busca por palavra-chave no departamento livros, site Submarino. ..........100
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................ 12
PRIMEIRO CAPÍTULO - CIBERCULTURA, TECNOLOGIA E SOFTWARES ..................................................................... 141.1 A INTENCIONALIDADE DO DESIGN ...................................................... 181.2 PIONEIROS DA IMAGEM COMO PROCESSO ....................................... 201.2.1 Ben Laposky (1914-2000) ...................................................................... 201.2.2 John Whitney Sr. (1918-1995) ................................................................ 211.2.3 Harold Cohen (1928) .............................................................................. 241.2.4 Jean-Pierre Balpe (1942) ....................................................................... 251.3 A REVOLUÇÃO DO PÓS-MODERNO ...................................................... 291.3.1 Neville Brody .......................................................................................... 351.4 OS ARTISTAS DA REVOLUÇÃO DIGITAL ............................................... 421.4.1 David Carson .......................................................................................... 421.4.2 Chuck Close ........................................................................................... 521.5 UMA NOVA LINGUAGEM ......................................................................... 56
SEGUNDO CAPÍTULO- LINGUAGEM DE PROGRAMAÇÃO ...................... 572.1 O CONCEITO PROCESSING DESIGN .................................................... 602.2 A LINGUAGEM DE PROGRAMAÇÃO PROCESSING ............................. 662.2.1 Características do Processing ................................................................ 682.2.2 Funções randômicas ............................................................................. 71
TERCEIRO CAPÍTULO3. ANÁLISE DE TRABALHOS ......................................................................... 743.1 PAULO COSTA .......................................................................................... 753.1.1 Dados ..................................................................................................... 753.1.2 Análise dos trabalhos ............................................................................. 783.2 WILTON AZEVEDO ................................................................................... 843.2.1 Dados ..................................................................................................... 843.2.2 Análise do trabalho ................................................................................. 843.3. CEDRIC KIEFER ...................................................................................... 903.3.1 Dados ..................................................................................................... 903.3.2 Análise do trabalho ................................................................................. 90
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 97
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 101
12
INTRODUÇÃO
Nos estudos acadêmicos, o ensino sobre as relações do design concentra-se na
questão da forma atrelada à função. Basicamente, a forma, neste caso, é representada
pelo resultado de todo um processo de integração de ciências e tecnologias, gerando
uma solução para algum problema específico dentro de uma sociedade. Também
de uma maneira geral aprende-se na disciplina história da arte e do design que a
tecnologia, com suas inovações, sempre acompanha a humanidade. Os exemplos
são muitos: tipos móveis de liga metálica inventados por Gutemberg revolucionando
o modo de fazer livros na Europa, a Revolução Industrial com suas máquinas a vapor
revolucionando todo um processo até então artesanal e tantos outros.
Nesse movimento constante, chegamos à era da cibertecnologia, com a revolução
advinda dos computadores. O impacto teve um efeito imediato na humanidade
em todos os campos do conhecimento, entre eles o design, cuja manifestação se
caracteriza como um processo, que é a própria linguagem, sobre cujo resultado
não há um controle, o que torna importante uma melhor compreensão dessa nova
condição. Podemos analisar, por exemplo, o campo do web design, que, através da
incorporação da linguagem de programação na criação de um algoritmo, leva ao
programador, por sua estrutura, um resultado completamente controlado, ou, através
de uma inserção de determinada sintaxe, muda a forma como a estrutura da página
web vai ser apresentada. “[...] Isto porque é um fazer pré-programado previsto por sua
escritura e é este crédito que a emancipa como novidade, não havendo nem ruído nem
estranhamento, pois tudo que está contido em uma programação é preconcebido, é
processo” (AZEVEDO, 2007, p.7).
Assim, pretende-se, com esta pesquisa, estudar o chamado design gerativo,
através do estudo do uso de linguagem de programação com recorte para a linguagem
Processing e suas aplicações no design, procurando estabelecer a importância do
processing design no atual contexto social de cibercultura e, dessa forma, contribuir
para futuras pesquisas sobre o tema. Também chamado de processing design,
esse tema não pode ser classificado nem como programação, nem como arte, no
seu sentido convencional. São ambas e nenhumas dessas coisas. A programação
é uma interface entre o homem e a máquina. É uma disciplina lógica e limpa, com
objetivos claramente definidos. A arte é um assunto emocional, como uma definição
13
altamente subjetiva e desafiadora. O design processo pode ser considerado, então,
como o local de encontro entre esses dois fatores, fazendo com que processos lógicos
sejam subvertidos para a criação de resultados ilógicos, imprevisíveis e expressivos
(PEARSON, 2011, p. XVIII). Por isso, até por uma questão interdisciplinar, nessa
dissertação não são estabelecidos os limites entre arte e design.
O método proposto para este projeto se caracteriza por um mapeamento inicial
com pesquisa qualitativa e estudo de caso, que, segundo Duarte (2011, p. 234), é “[...]
um método que contribui para a compreensão dos fenômenos sociais complexos,
sejam individuais, organizacionais, sociais ou políticos. É o estudo das peculiaridades,
das diferenças daquilo que o torna único e por essa mesma razão o distingue ou
o aproxima dos demais fenômenos”, e com pesquisa qualitativa na modalidade
observação direta extensiva, com a técnica de análise de conteúdo (LAKATOS, 1992,
p. 105), realizada através da seguinte estrutura:
No primeiro capítulo pretende-se contextualizar os pioneiros do design gerativo
através de análise da Cibercultura e da Tecnologia e seu impacto na sociedade.
Entendendo-se que houve muitos profissionais do design moderno que
valorizaram, sobretudo, o processo em suas obras e, em consequência, a mutabilidade
do resultado, tornou-se necessário fazer uma seleção para trabalhar com um número
restrito. Assim, foi analisada uma amostra dos trabalhos de sete artistas, cujas
características são consideradas precursoras do design gerativo: Ben Laposky, John
Whitney Sr., Harold Cohen, Jean-Pierre Balpe, Neville Brody, David Carson e Chuck
Close.
A partir dessas definições, foi possível, no segundo capítulo, fazer um recorte
para o objeto de estudo, que é a linguagem Processing, e estabelecer o conceito de
programação aplicada no design, entendendo a importância no processo na criação
das obras.
Construídos o primeiro e o segundo capítulos, no terceiro foram feitas análises
das obras de dois artistas nacionais – Paulo Costa e Wilton Azevedo – e um estrangeiro
– Cedric Kiefer (designer alemão) –, que trabalham com esse conceito na atualidade.
14
PRIMEIRO CAPÍTULO
CIBERCULTURA, TECNOLOGIA E SOFTWARES
O design, segundo Azevedo (1988, p. 11), [...], surge no mundo quando o homem
começa a fazer suas primeiras ferramentas [...] e passa por diversas mudanças
ao longo da história, desde concepções estilísticas advindas da contestação ou
inspirações de correntes artísticas anteriores, até a adição de novas tecnologias na
elaboração criativa.
As mudanças tecnológicas têm como consequência uma nova concepção de
expressão da prática e do discurso do artista em suas manifestações emocionais,
culturais e até mesmo profissionais. Podemos observar, por exemplo, o que aconteceu
nas pinturas, nas fotografias e nos filmes: a cada novidade tecnológica, um amplo
leque de possibilidades deu a essas expressões formas e manifestações artísticas
diferentes. Entre outros motivos, podemos destacar a permissão de novas formas
de comunicação e expressão que a tecnologia traz como possibilidades, ou, como
explica Azevedo (idem), “a diferença na atualidade é a ferramenta como o próprio ato
de gerar informação”.
O pós-modernismo nos trouxe, a partir da década de 1970, através de seu
amadurecimento tecnológico e científico, transformações que ocorreram em várias
áreas da humanidade, e em particular o que Lemos (2003, p.11) denomina de
cibercultura. A cibercultura é uma forma sociocultural que emerge da relação simbiótica
entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias de base microeletrônica, que
surgiram com a convergência das telecomunicações com a informática na década
de 1970. Ela está tão presente em nossas vidas que nem percebemos que existe,
quando vamos ao banco, pagamos nossas contas, fazemos nossos telefonemas,
acessamos nossas redes sociais ou e-mails, vemos as notícias nas telas planas no
metrô e nos ônibus (a chamada midia digital out of home) e em tantos outros exemplos
que povoam nosso cotidiano.
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Quem já tem pelo menos 40 anos de idade consegue testemunhar o avanço
tecnológico e científico que vem acontecendo e, principalmente, como as novas
gerações vêm preparadas desde seu nascimento para essa nova realidade. Muitos
de nós já vimos bebês manusearem um mouse e um teclado sem nunca terem tido
quaisquer formas de preparo ou aprendizado para tais equipamentos. De fato, estamos
vivenciando intensamente essa nova era de cibercultura, cuja palavra deriva do termo
cyberspace, inventado pelo escritor cyberpunk de ficção científica William Gibson, em
seu livro Neuromancer, de 1984.
Para Gibson (apud Lemos, 2010, p.127), o ciberespaço é um espaço não físico
ou territorial, que se compõe de um conjunto de redes de computadores através das
quais todas as informações (sob as suas mais diversas formas) circulam.
Esse espaço potencializador é considerado por Lemos (p.136) como uma das
mais diversas manifestações sociais em todo o mundo – o ciberespaço é um ambiente
mediático, como uma incubadora de ferramentas de comunicação, logo, como
uma estrutura rizomática, descentralizada, conectando pontos ordinários, criando
territorialização e desterritorialização sucessivas.
O ciberespaço não tem um controle centralizado, multiplicando-se de
forma anárquica e extensa, desordenadamente, a partir de conexões múltiplas e
diferenciadas. Cabrera (2006) analisa esses significados considerando o imaginário1
da sociedade moderna em relação com a tecnologia, a temporalidade e a conformação
do imaginário neotecnológico e comunicacional contemporâneo, convicto de que as
novas tecnologias da comunicação e da informação, em seu atual e específico modo
de existência, são significações instituídas do imaginário social.
Como reflexo, vemos designers ao longo dessas últimas três décadas
experimentando as novas possibilidades tecnológicas, ao mesmo tempo em que esta
tecnologia evolui. Suas obras ganham novos contornos e mensagens, já que, como
um meio extremamente midiático, principalmente com o advento da internet, este
ciberespaço propicia uma arte aberta, rizomática e interativa.
O ciberespaço tem sido visto pelos pensadores atuais de várias formas. Pelas
palavras de Wertheim (2001, p. 225), justifica-se pelo apelo quase religioso (senão
totalmente religioso) com que as pessoas devotam sua atenção a ele. Mas, assim
como os homens de ciência da Idade Média em relação ao conhecimento científico
1 Cabrera (2006 p. 17) refere-se a imaginário como um substantivo significando a capacidade criativa de fazer aparecer representações e ao conjunto de representações, afetos e desejos que dela resultam, sendo uma condição necessária da realidade.
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precário da época – no período medieval, monges, por exemplo, passaram a dizer o
que era certo e o que era errado em termos científicos, estabelecendo parâmetros com
os textos bíblicos e dogmas que deveriam ser usados na interpretação e validação do
que se podia aceitar –, estamos apenas iniciando o conhecimento sobre esse novo
espaço.
É preciso afirmar que o processing design2, por sua característica gerativa e,
principalmente, processual, que une vários códigos de linguagem em relação ao
tradicional uso de softwares separadamente, ainda está para ser compreendido.
Há uma geração de designers, que podemos chamar de analógicos, que ainda vê
o período pós-moderno como apenas um movimento baderneiro, e, sobretudo, uma
nova geração ciberespacial, consumista, do instantâneo, dos cliques do mouse, dos
bits e bytes, da vasta informação, acostumada com soluções igualmente imediatas,
lógicas, “mastigadas”, que “não tem tempo a perder”.
A chamada sociedade da informação, porém, sente paradoxalmente uma
vontade de contestar e viver intensamente, como o que ocorreu com as gerações
pós-modernistas. Essa é a dicotomia que Lemos (2003) aponta entre o tempo real de
poder inibir a reflexão e o clique generalizado que permite a potência de uma ação
imediata, o conhecimento simultâneo e complexo.
Outro aspecto importante se refere, segundo Cabrera (2006, p. 53), ao fato de
que, na modernidade, a consciência política das nascentes ciências sociais encontrou
um objeto privilegiado nas significações sociais como obra dos seres humanos. Mais
ainda: como obra daqueles seres humanos que detêm o poder em uma sociedade. E,
assim, conceberam-se os significados de uma sociedade como uma obra deformada,
a favor do poder e de seus governantes. “As significações sociais também mantêm e
justificam uma ordem social [...], mostram, contrastam e ocultam uma realidade social”
(CABRERA, 2006, p. 53).
Vemos, então, que o design dentro deste contexto passa por diversas fases e
transformações. Nessa atual cultura mediática, a interface funciona como o mecanismo
do software pelo qual a sociedade dialoga com seu mecanismo, percebendo o mundo
por meio de um sistema sensório. O designer, então, realiza o planejamento de uma
interface privilegiando os sentidos visuais e auditivos, utilizando diversos softwares
2 Processing design é um termo usado nesta dissertação. O equivalente na língua portuguesa pode ser design processo, conforme tradução realizada pelo Prof. Dr. Wilton Azevedo em orientação realizada em 24/09/2012. Foi checado se a palavra inglesa processing, em relação à linguagem de programação, não possui nenhum direito autoral ou licença. Conforme verificado no site http://www.processing.org (acesso em 26/09/2012), chegou-se à conclusão de que não há tal licença ou direito autoral por se tratar de uma linguagem de programação open source.
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como ferramenta. De acordo com Lopes (2004), as características que estimulam a
utilização do software como ferramenta são:
a) Boa navegabilidade: permite ao usuário uma navegação com bom grau de
facilidade, andar pelos programas buscando por informação de maneira rápida
e intuitiva;
b) Distribuição adequada do conteúdo: tem forte relação com uma boa
navegabilidade, pois o conteúdo apresentado é diretamente influenciado pela
forma como o usuário pode navegar;
c) Linguagem fácil: a linguagem precisa ser compreendida pelo usuário,
considerando a forma textual pela qual a informação é transmitida. Sua
compreensão é essencial para interação com o software, considerando três
fatores: habilidade de compreensão, expressão verbal e aprendizagem;
d) Motivação: o significado da palavra motivação foi extraído do latim, movere
motum, que significa aquilo que faz mover, ou seja, provocar movimento, atividade
no indivíduo (CAMPOS, 1987, p.187), ou seja, a motivação é caracterizada pela
produção de estímulo para que se possa desenvolver determinada ação. Sendo
assim, é por meio da motivação que o usuário continuará a utilizar o software de
maneira contínua;
e) Liberdade de ação: diz respeito à liberdade sentida pelo usuário na utilização
do software e à possibilidade de ir ao encontro de seu objetivo. A possibilidade
de escolher o próprio caminho faz com que o aprendizado seja de acordo com
o ritmo de cada usuário. Nem sempre o software satisfaz as necessidades de
expressão por sua própria limitação estrutural. É aí que entram as linguagens de
programação.
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1.1 A INTENCIONALIDADE DO DESIGN
O design tem uma história conservadora. Até o advento da tecnologia com a
introdução do computador Macintosh, nos anos 1990, o Estilo Suíço Internacional
foi uma corrente importante, com adeptos no mundo inteiro. A expressão pessoal
e soluções excêntricas eram rejeitadas, ao mesmo tempo em que se abraçava
uma abordagem mais universal e científica para a solução de problemas de design.
(MEGGS; PURVIS, 2009, p. 463).
Esse design não sofreu uma mudança significativa, mesmo com o advento
da tecnologia, principalmente com a democratização dos softwares: designers de
formação que estão no mercado resistem ao novo, talvez receosos de experimentarem
novas possibilidades de criação, não explorando o software como ferramenta ou novas
linguagens.
Rudy VanderLans, em uma conversa com Rob Giampietro sobre culpa e perda em
Design Gráfico, afirma que os designers voltaram a se tornar mais conservadores. Em
tempos de incerteza econômica, quando o futuro parece sombrio, há uma tendência
para olhar para trás, para escolher soluções seguras. Dentro de design gráfico, temos
visto uma ascensão em temas retrô, nostalgia, e o retorno do que parece ser o Estilo
Suíço Internacional (VANDERLANS, Rudy in HELLER, Steven et al., 2006, p. 17)
Atualmente, os meios de comunicação, segundo Cabrera (2006), “constituem um
espaço-chave no qual se configuram as representações da sociedade atual: operantes
e efetivos, trazem um conjunto complexo de mensagens realizadas por pressões da
própria comunicação, de anunciantes e de promotores”.
Percebe-se um momento de surgimento de novas formas de pensar, no momento
presente, em relação aos dogmas estabelecidos. Observamos, por exemplo, que, com
a web, o design não está mais preso a conceitos que corroboravam com a ideia que
algumas entidades têm dele.
O conceito de processing design não surge à toa em um mundo globalizado.
Um site pode ser modificado a qualquer hora. Essa dinâmica elimina a questão de
finalização, de um site pronto, fixo. Quando o design entra nos meios digitais, não
há a contemplação do eterno, muito menos uma estetização do admirável3 . Quando
o designer começa a propor um aspecto formal diferenciado, mudam-se, então, os
3 Conforme orientação realizada no dia 26/03/2012 com o Prof.Dr. Wilton Azevedo.
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comportamentos e as relações interpessoais: no momento em que um software
pode se reorganizar e se ressignificar, a ideia do design estar ligado a um projeto
preconcebido deixa de ter significado.
Hoje só é possível realizar design na web justamente pelo fato de este não ser um
meio fixo, por estar sempre em transformação, diferentemente do conceito de forma
e função, de utilitário, do que menos é o mais4 . Atualmente, por exemplo, podemos
criar, através de uma estrutura de programação, imagens que apareçam projetadas
ao mesmo tempo em que há a geração de um conjunto de som e texto ou sons que
possam gerar imagens e textos. Antigamente não havia condições tecnológicas para
isso. “Não há paralelos no passado que nos permitam aprender o uso dos códigos
tecnológicos [...], mas devemos aprendê-lo, senão seremos condenados a prolongar
uma existência sem sentido em um mundo que se tornou codificado pela imaginação
tecnológica [...]. (FLUSSER, 2007, p. 137).
Assim, o conceito do design, através de uma linguagem 0 e 1, torna intercódigos
os códigos que são apartados, ou seja, várias linguagens (áudio, vídeo etc) vão se
integrando. Dessa maneira, é muito complicado tentar classificar o design como sendo
de produto, visual, web ou gráfico, pois ele está além de quaisquer rotulagens. O
design é projeto e não simplesmente a operacionalização de máquinas ou softwares,
mesmo que, na realidade de hoje, o design seja software (Azevedo, 2012)5 .
4 “Less is more” é uma frase do poema Andrea del Sarto, de 1855, de Robert Browning, usada pelo arquiteto Ludwig Mies van der Rohe para um design minimalista. Disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/Less_is_more. Acesso em 04/02/2013).5 Conforme orientação realizada no dia 26/03/2012 com o Prof.Dr. Wilton Azevedo.
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1.2 PIONEIROS DA IMAGEM COMO PROCESSO
Vários foram os artistas que pensaram a imagem como processo. Entre eles,
estão: Ben Laposky, John Whitney Sr., Harold Cohen e Jean-Pierre Balpe, sobre quem
serão apresentados alguns dados e a análise de algumas de suas obras.
1.2.1 Ben Laposky (1914-2000)
Matemático e artista de Iowa (EUA), Ben Laposky foi um pioneiro na arte
computacional. Suas criações de imagens abstratas, de 1950, constituem um legado
importante para todos os artistas que lidam com arte computacional. Seus oscillons
(ou abstrações eletrônicas), como eram chamados por ele, foram reconhecidos como
sendo o primeiro desenvolvimento importante, neste domínio, como criações de arte,
e o primeiro a ser amplamente exposto e publicado tanto nos Estados Unidos como
no exterior (mais de 216 exposições desde 1952).
Suas obras consistiam na fotografia de imagens obtidas através de um tubo
osciloscópico de raios catódicos, que geram ondas que produzem curvas analógicas.
O resultado são imagens plasticamente interessantes que podem ser consideradas
como o despertar do que podemos hoje chamar de arte computacional, já que, mesmo
analógica, a tecnologia do osciloscópio foi usada como suporte estético, rompendo
com a ideia de leitura linear da obra artística.
21
1.2.2 John Whitney Sr. (1918-1995)
Um dos pioneiros da animação por computação e importante referência histórica
em motion graphics, considerado um dos pais da computação gráfica, John Whitney
começou a estudar, na década de 1940, junto com seu irmão James, as imagens
em movimento, utilizando eventualmente a integração de som. Teve uma carreira
muito bem-sucedida no cinema e na televisão, e entre seus trabalhos destacam-se: a
abertura do filme Vertigo, de Alfred Hitchcock, em parceria com o designer Saul Bass;
o filme Catalog, de 1961, e Arabesque, de 1975. Fundou a empresa Motion Graphics
para a produção de comerciais, sendo pioneiro também em lançar a animação por
computador.
Podemos supor que virá o tempo quando o que estou prestes a descrever terá
um próprio nome, mas por agora eu chamo de “periódicos computacionais”. É
um termo proposicional e experimental que pode ajudar a designar um novo
campo unificado para uma arte heterodimensional; um campo cuja especial
dimensão é o tempo. (WHITNEY, 1975).
Nessa citação podemos observar o aspecto visionário quanto ao processing
design e a integração dos processos como linguagem em determinado meio. Ele
Fig. 1. Ben LaposkyFonte: Disponível em: http://www.tumblr.com/tagged/ben-laposky. Acesso em 05/09/2012.
Fig. 2, 3 e 4. Da esq. para a dir.: Imagens geradas pelo tubo osciloscópico Oscillon 45, Electronic Abstracion 4 e Oscillon 3 (1952-1953).Fonte: Disponível em: http://www.atariarchives.org/artist/sec6.php. Acesso em 05/09/2012.
22
ainda segue falando sobre a arte temporal, tal como na teoria de Cabrera, quando
se refere à temporalidade de caráter provisório e à conformação do imaginário
neotecnológico e comunicacional contemporâneo. Uma arte que é material, como a
música em si, ou seja, espaço-temporal. Uma arte cujo tempo chegou por causa da
tecnologia do computador e que não poderia existir antes dele. Mesmo que essa arte
seja encontrada nos cadernos de Leonardo e tenha ficado no imaginário coletivo,
como sua máquina voadora, sua época era de impossibilidade tecnológica, pois ainda
não havia o desenvolvimento da computação gráfica. (Cf. WHITNEY, 1975.)6. Em
Arabesque (1975), assim como em suas primeiras obras, foram usados mecanismos
de orientação e controle da artilharia antiaérea na II Guerra Mundial (o modelo M-5),
surgindo, dessa forma, o primeiro computador análogo-mecânico. Esta máquina
consiste em três mesas giratórias (primária, secundária e terciária), um sistema de
câmeras e outras superfícies para a pré-programação de sequências de imagem e
movimento em ambiente de vários eixos, que desenhavam com a luz diretamente
sobre a película através de gabaritos de desenhos geométricos como um espirógrafo
(fig.8). (YOUNGBLOOD, 1970, p. 207/209). Arabesque é considerado seu primeiro
filme de computação digital.
6 Disponível em: http://www.atariarchives.org/artist/sec23.php. Acesso em 05/09/2012.
Da esquerda para a direta.
Fig. 5. John Whitney trabalhando com seu computador análogo mecânico.
Fig. 6. Lente zoom de sua câmera focando na mesa rotativa primária de seu computador análogo mecânico.
Fonte: YOUNGBLOOD, Gene. Expanded Cinema. U.S.A. Library of Congress.1970.
24
1.2.3 Harold Cohen (1928)
Este célebre pintor inglês dos anos 1960, que estudou na Slade School of
Fine Arts, em Londres, migrou da pintura para a arte computacional com trabalhos
bem interessantes. É ele o criador de Aaron, em 1973, o software de desenho mais
sofisticado já escrito, que funciona de forma autônoma e elabora desenhos exclusivos.
Embora todo o trabalho que Aaron produz possa ser estilisticamente similar, o
intervalo de assunto, composição e cor não o é, o que de uma certa maneira o faz
criar sua própria poética, já que este software toma suas decisões na composição.
Então, mesmo que este software siga os comandos programacionais de uma forma
objetiva e exata, existe uma certa subjetividade no resultado, uma vez que advém
da subjetividade do artista e muitas vezes surpreende seu criador. Para Cohen, seu
envolvimento com a obra que produz é muito maior quando programa do que quando
pinta.
Fig. 11. “Coming into a Lighter Place” - Uma imagem que demonstra a evolução de Aaron.Fonte: Disponível em: www.dada.compart-bremen.de. Acesso em 31/01/2013.
Fig. 10. Desenho elaborado por Aaron, ainda com formas básicas.Fonte: Disponível em: www.radicalart.info. Acesso em 31/01/2013.
QR CODE 2 - Assista ao vídeo por algum aplicativo QR Code de seu celular ou acesse o site: http://www.youtube.com/watch?v=MwHQx9BrHQc
25
1.2.4 Jean-Pierre Balpe (1942)
Partindo da referência da Escritura Digital Expandida (EDE) proposta por Azevedo
(2009, p. 113) – , onde não há mais código predominante, mas a ambiência som-texto-
imagem, sem distinção entre som, imagem e texto, também Balpe7 foi incluído neste
trabalho como pioneiro da imagem como processo e mestre da literatura gerativa.
A literatura gerativa é definida por seu criador como a produção de textos literários
que se mudam continuamente por meio de um dicionário específico, um conjunto de
regras e sinais que, convertidos para os modelos matemáticos em forma de programa
numérico, vem revelar os conceitos conservadores sobre: 1. a imagem, como os
tratados canônicos de pintura; 2. as notações musicais; 3. as cifras logográficas da
escrita no barro, como a escrita cuneiforme.
Carlos Ceia8 nos dá uma definição do que é uma literatura gerada por computador:
Literatura Gerada por Computador (LGC), Infoliteratura ou Ciberliteratura
são termos que designam um procedimento criativo novo, nascido com a
tecnologia informática, em que o computador é utilizado, de forma criativa,
como manipulador de signos verbais e não apenas como simples armazenador
e transmissor de informação, que é o seu uso corrente. Tal uso criativo do
computador é extensível de forma geral à Arte Assistida por Computador
e à Ciberarte (composição musical, criação de imagens sintéticas, cinema
animado por computador, etc.) (CEIA apud BARBOSA, 2003, p. 4-5).
7 Diretor e fundador do departamento de Hipermídia da Universidade de Paris 8, Balpe vem se dedicando, desde os anos 1980, à investigação da literatura gerada a partir de programas de computador (BEIGUELMAN, 2003).8 Disponível em: http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&task=viewlink&link_id= 925&Itemid=2. Acesso em 11/10/2012.
Fig. 12. Jean-Pierre Balpe. Autoportrait en abîme (2009).Fonte: Disponível em: http://www.flickr.com/photos/58298703@N00/3574827509. Acesso em 01/10/2012.
26
Esse texto gerativo possui algumas características peculiares, como aponta
Balpe apud Silva (2006):
• disfração do texto no espaço numérico;
• ausência de origem e de fim;
• primazia do processo sobre o resultado;
• manutenção da abertura de novos textos;
• não esgotamento da leitura;
• o interesse centrado na renovação indefinida do processo;
• passagem da eternidade ao presente infinito.
É uma forma muito específica da literatura digital que muda completamente a
concepção da maioria dos conceitos da literatura clássica.
Os textos produzidos por um computador, e não escritos por um autor, requerem
de fato uma maneira muito especial de engrammation9 e, em consequência, também
apontam para um modo específico de leitura, particularmente sobre todos os aspectos
do tempo literário, visto que eles já não possuem nem início nem fim: “Le ‘produire’
n’est plus dans le ‘reproduire’, mais dans le ‘re-produire’”. (JEAN-PIERRE BALPE,
1997)
Sua trajetória10 começa com a pesquisa sobre a geração automática de textos
em 1975. Várias tentativas de geração de narração automática foram feitas nos anos
1980 nos Estados Unidos, mas nenhuma se mostrou satisfatória. Os primeiros poemas
gerados automaticamente em papel foram publicados na revista Continental Hotel.
Abaixo encontra-se um exemplo gerado pelo que pode ser o mais antigo gerador
automático, um gerador de poemas de amor:
Comme je t’aime je t’aime comme
Comme en enfer je t’aime je t’aime toujours plongé
Sous le vent insatiable le caneton perdu le caneton
Dans les airs comme comme comme malhabile comme
(BALPE Jean-Pierre, poème 8, Hôtel Continental, n° x, 1981)
9 Termo criado por Balpe significando a adaptação de vontades de expressão para as limitações técnicas do meio utilizado para a sua mediatização através de uma maneira específica de leitura. Por exemplo, um livro precisa de uma escrita fixa, e a mediatização por meio de uma tela necessita de outras modalidades de apresentação.10 Disponível em: http://www.olats.org/livresetudes/basiques/litteraturenumerique/11_basiquesLN.php. Acesso em 06/10/2012. (Tradução nossa).
27
Balpe (1997) exemplifica como a geração de textos é feita tendo como base
um gerador de romances chamado Romans. Consiste em um conjunto de quatro
geradores de diferentes romances e cada um destes produz uma obra autônoma
dentro das restrições de exibição. Esses romances são: Un roman inachevé, La mort
en tête, Prières de meurtres e An unfinished debate11.
Além disso, cada um desses livros é susceptível de criar locais ou pessoas que
podem “enviar” a quaisquer um dos outros.
Através da figura 13, podemos ver que, por exemplo, Un roman inachevé pode
ser enviado para Prières de meurtres, que participam da ação.
11 Tradução nossa
Fig. 13. À esq: tela do programa de geração de romances Roman. À dir.: estrutura das combinações entre os romances e a geração do romance virtual. Fonte: Disponível em: http://www.olats.org/livresetudes/basiques/litteraturenumerique/11_basiquesLN.php. Acesso em 06/10/2012.
Fig. 14. As interações sendo correlacionadas gerando um texto.Fonte: Disponível em: http://www.olats.org/livresetudes/basiques/litteraturenumerique/11_basiquesLN.php. Acesso em 06/10/2012.
Fig. 15. No gerador de romance, abrange um conjunto de estruturas hierárquicas de dicionários, cada um dos quais estão relacionados com todos os outros em que poderíamos chamar de uma gramática semântica.Fonte: Disponível em: http://www.olats.org/livresetudes/basiques/litteraturenumerique/11_basiquesLN.php. Acesso em 06/10/2012.
28
Um gerador é um controlador de um sistema substancialmente fechado sobre si
mesmo, em que um grande número de variáveis são correlacionadas. Cada alteração
de uma delas provoca alterações sobre uma grande parte de todas as outras. Assim,
uma vez que o gerador começa a produzir um texto, como um resultado da interação
de correlações, o resultado é imprevisível. Como com este gerador de textos não é
possível prever a linha da escrita, então a obra de ficção está sempre se expandindo.
Fig. 16. “Me Tapolis” - instalação gerativa e interativa encomendada pelo MARCO (Museu de Arte Contemporânea), AFAA e Aliança Francesa (Monterey, México), com Jacopo Baboni-Schilingi (compositor) e Miguel Chevalier (designer). Fevereiro a abril de 2002.Fonte: Disponível em: http://www.facebook.com/photo.php?fbid=10151164359037485&set=pb.636007484.-2207520000.1365876429&type=3&src=http%3A%2F%2Fsphotos-f.ak.fbcdn.net%2Fhphotos-ak-ash4%2F3703_10151164359037485_1810407556_n.jpg&size=960%2C720. Acesso em 13/04/2013.
29
1.3 A REVOLUÇÃO DO PÓS-MODERNO
Estamos acostumados a encarar o design basicamente e muito resumidamente
como solução de problemas, herdando sempre os ensinamentos que até hoje são
transmitidos nos cursos de design12 nas universidades. As ideias de que a forma segue
a função, de Louis Sullivan, como adequação ao propósito e unidade na diversidade
da escola Bauhaus, eram basicamente imperativos éticos e morais. Muitas vezes os
imperativos morais derrubavam a realidade prática, como pode atestar qualquer um
que tenha sentado em uma cadeira de Wright ou tenha lido à luz de uma Kugellicht da
Bauhaus (BIERUT et al., 2009, p. 303).
Quando uma nova abordagem aparece, a ruptura com esses conceitos é logo
rotulada como uma tentativa de quantificar ou qualificar a que ou por que essa
abordagem existe.
O designer atual desempenha suas funções com recursos que não existiam
há 20 anos. O advento da era digital fez uma revolução na sociedade na mesma
proporção da invenção da lâmpada. O reflexo no design foi imediato.
A história mostra que tecnologias como a tinta a óleo, câmeras e filme
mudaram a prática artística e o discurso [...]. O software detém uma posição
única entre os meios artísticos por causa de sua habilidade de produzir
formas dinâmicas, gestos de processo, comportamento definido e sistemas
de simulação naturais e integra outros meios de comunicação, incluindo som,
imagem e texto (REAS; CASEY, 2007).
Nessa transformação incessante da sociedade, a intenção de se ter um design
mais amplo e liberto vem de muito tempo, como embrião do que chamamos de
processing design. Um movimento denominado pós-modernista13 surge quando
designers rompem com dogmas impostos por correntes tradicionalistas do design
através do interesse pela complexidade da forma. Esse movimento, hoje mais
amadurecido, se alastra na moda, no cinema, na música e no cotidiano programado
pela tecnociência (ciência + tecnologia invadindo o cotidiano, que vai desde alimentos
processados até microcomputadores), sem que ninguém saiba se é decadência ou
12 Ou desenho industrial, como cursos ainda existentes com essa nomenclatura.13 Segundo Santos (1986, p. 8), o pós-modernismo é o nome aplicado às mudanças ocorridas nas ciências, nas artes e nas sociedades avançadas desde 1950, quando, por convenção, se encerra o Modernismo (1900-1950). Ele nasce com a arquitetura e a computação nos anos 1950. Toma corpo com a Pop Art nos anos 1960. Cresce ao entrar pela filosofia, durante os anos 1970, como crítica da cultura ocidental.
30
renascimento cultural (SANTOS,1986, p. 8). O sentimento e a intuição se opuseram
ao racionalismo comunicacional através de várias manifestações expressivas, nas
quais claramente se desprezavam conceitos como grid, hierarquia e legibilidade.
David Carson, ex-surfista profissional e professor do ensino fundamental que se voltou
para o design editorial nos anos 1980, tornou-se bastante polêmico durante o início
dos anos 1990. Inspirou jovens designers, enquanto irritava outros que acreditavam
que ele estava cruzando a linha da ordem para o caos. Sua tipografia era criticada e
denunciada.
Para Carson, não se deve se confundir legibilidade com comunicação, pois
muitas mensagens compostas de maneira tradicional são teoricamente legíveis, mas
oferecem pouco atrativo visual aos leitores, enquanto projetos mais expressionistas
podem atraí-los e envolvê-los (MEGGS, 2009, p.635).
Todos os pós-modernistas, precursores do design gerativo, vêm de uma época
em que a tecnologia ainda não tinha se tornado tão popular e democrática. O uso
dos layouts e estudos com a tecnologia analógica ainda eram a melhor forma de
propor um resultado. Enquanto as revistas dos anos 1970 eram lidas e desfrutadas
calmamente, os magazines dos anos 1980 desviavam a atenção e os sentidos do
leitor com agressivos layouts (HEITLINGER, 2006).
Kreutz, apud Vieira (2002, p.145), cita as Principais Estratégias de Construção da
Identidade Visual Corporativa e apresenta as regras (se é que podemos dizer regras
para este tipo de movimento) do design pós-moderno propostas por Bontempi:
1 - pensar no objeto de acordo com sua imagem, não como sua função;
2 - proporcionar a leitura de funções ambíguas;
3 - buscar um resultado informal na forma geral do objeto;
4 - não rejeitar redesenho;
5 - tender a uma imagem contraditória: pesada e leve;
6 - trabalhar o projeto de acordo com uma situação não-convencional;
7 - colocar partes dissimilares juntas (métodos de design NASA);
8 - introduzir um elemento não esperado (dar um sentido de suspense);
9 - fazer os objetos calmos, poéticos, introvertidos e um pouco ridículos;
10 - lembrar das palavras “velho” e “novo”;
11 - pensar que os objetos são diferentes um dos outros (séries diferenciadas);
12 - dar aos produtos características mistas - artesanais e tecnológicas;
31
13 - introduzir um elemento ornamental total nas partes (bi e tridimensional);
14 - combinar parte brilhante com parte opaca;
15 - evitar bordas finas.
A marca da MTV14 , criada por Frank Olinsky, Pat Gorman e Patti Rogof
(Manhattan Design) em 1981, é um exemplo da ruptura com os dogmas estabelecidos.
Com sua forma praticamente indefinida, assumindo diversas “roupagens”, é talvez um
dos mais emblemáticos logotipos do mundo do entretenimento. O logotipo da MTV
foi um precursor do que existe hoje como identidade animada, a respeito do qual, em
1996, o jornal The New York Times observou: “a passagem das informações da página
impressa para outras mídias mudou a natureza da identidade gráfica. O logotipo da
MTV, que surge de uma metamorfose inesperada, é provavelmente a culminância da
identidade animada” (MEGGS, 2009, p. 21).
14 Music Television, emissora de TV musical fundada nos Estados Unidos em 1981.
Fig. 17. As variações do logotipo MTV a partir do primeiro logotipo concebido.Fonte: Disponível em: http://logobr.org/branding/novo-logo-mtv/ (acesso em 06/02/2013)
32
A metamorfose em logotipo foi também praticada atualmente para a cidade de
Melbourne (Austrália) onde vemos claramente a referência gerativa do projeto.
Fig. 18 e 19. As variações do logotipo da cidade de Melbourne (Austrália).Fonte: Disponivel em: http://blog.stringanomaly.com/2010/09/city-of-melbourne-logo-redesign. Acesso em 20/11/2013.
33
Não é novidade o uso da metamorfose nas criações de marcas. O grupo italiano
Memphis, através de alguns designers, incluindo o artista gráfico Christoph Radl, que
comandava o setor de design gráfico, já havia realizado essa transformação.
Considerado vertente do pós-moderno, o grupo italiano Memphis, cuja estética
influenciou todo o visual dos anos 1980, surgiu em 1981, liderado pelo já consagrado
designer de produtos e arquiteto Ettore Sottsass (1917-2007), juntamente com
Marco Zanini, Matteo Thun e Aldo Civic. Seu estilo, de caráter pluralista, eclético e
hedonístico, tinha como característica a atitude experimental, fascinação pelo tátil,
padrões decorativos coloridos e a paixão pela geometria em suas luminárias, sofás
e gabinetes. A mistura dos produtos da cultura pop com os artefatos e ornamentos
do mundo clássico era o foco de interesse desse grupo. A função era secundária
à imagem icônica das formas. Para Sottsass, o conforto não estava em discussão,
muito menos a utilidade ou inutilidade. O cheiro e a tatilidade eram princípios pouco
comuns, mas utilizados. “É bom ressaltar que Ettore Sottsass surge no mercado de
design após ter criado uma das primeiras máquinas de escrever portáteis de plástico
para a Olivetti, em 1960, fato que pode provar o seu conhecimento prático sobre a
funcionalidade tradicional” (AZEVEDO, 1988).
Radl era o criador dos catálogos dos produtos. Fascinado por texturas,
padronagens, formas geométricas exageradas e cores berrantes, Radl lançou o
conceito de que a forma não era mais a função e sim a razão de ser dos seus projetos.
Nesses catálogos, Radl não trabalha as capas com fotografias, e sim com desenhos,
fazendo um dialogismo com o estilo “Memphiano” no meio impresso, “propondo um
banho de água fria em tudo aquilo que já se viu, e isso, às vezes, sendo obtido através
do humor” (AZEVEDO, 1988). Esse estilo acaba por influenciar também a área da
mídia impressa, criando uma nova dimensão de espaço impresso e criando catálogos
também para a Officina Alessi e a Enorme Corporation, entre outras.
QR CODE 3 - Assista ao vídeo por algum aplicativo QR Code de seu celular ou acesse o site: http://www.youtube.com/watch?v=MV0DTNLslLY&feature=BFa&list=PL3F67DA64781DD156
34
Fig. 20 . Catálogo Memphis de 1977.Fonte: Disponível em: http://www.flickr.com/photos/memphis-milano/page7/. Acesso em 31/01/2013.
“Na verdade,
é posta uma
antítese na qual
Radl, por meio de
sobreposição de
retículas criando
moirés, torna útil
seus impressos
divulgando
trabalhos artísticos
que questionam
a utilidade (ou
inutilidade)
dos objetos”
(AZEVEDO, 1998).
Fig. 22 . Logotipos da Memphis. De cima para baixo: Christoph Radl, 1982. Valentina Grego, 1983. Christoph Radl, 1983. Christoph Radl, 1983. Fonte: MEGGS, 1998.
Fig. 21. Capa do catálogo Memphis. Christoph Radl.Fonte: Disponível em: http://www.flickr.com/photos/memphis-milano/page7/. Acesso em 31/01/2013.
35
1.3.1 Neville Brody
Este designer britânico vitalizou o design gráfico, criou formas emblemáticas que
causaram um impacto nas artes gráficas, é um dos mais influentes designers gráficos
do nosso tempo. Foi o protagonista maior da orientação do revivalismo da tipografia
construtivista dos anos 192015 .
O período acadêmico de Neville Brody16 foi marcado pela atitude hostil de seus
professores, que consideravam seu trabalho pouco comercial, e, segundo entrevista
dada por ele a Adrian Shaughnessy17, a universidade não o preparou para a vida
profissional. Segundo as próprias palavras de Brody: “o único conselho que recebi foi
para vestir uma gravata nas entrevistas”. Também declarou que nunca aprendeu as
regras corretas da tipografia, o que o deixava livre para inventar métodos de trabalho e
configurações espaciais, fazendo com se tornasse uma autoridade por suas criações
tipográficas inovadoras.
[...] Brody se perguntava se “dentro da comunicação de massa, o humano
teria se perdido inteiramente”. Diante da decisão entre seguir belas-artes
ou o design gráfico, pensou: “por que não se pode adotar uma abordagem
pictórica dentro do meio impresso? Eu queria tornar as pessoas mais e não
menos conscientes, e no trabalho que eu havia começado a fazer seguia a
ideia do design para revelar, não para ocultar.” (MILLMAN, 2007).
Até finais da década de 1970, os jovens punks cantavam, com os Sex Pistols,
“não existe futuro”, e, no começo dos anos 1980, as teorias sociais questionavam
as representações e as categorias da modernidade, para falar de pós-modernidade.
Com ela se misturavam todos os pós (pós-industrialismo, pós-estruturalismo, pós-
marxismo, etc.) com todos os finais e as mortes: de Deus, do homem, das ideologias,
etc. (Francescutti apud Cabrera, 2006, p. 130).
Na Inglaterra, os grupos Sex Pistols e The Clash eram considerados os principais
representantes desse movimento que pregava o desrespeito às normas, no qual
Brody inicialmente se inspirou: ele primordialmente se fazia na batida de rock rápido
15 Inspirado por um movimento soviético precedente (a vanguarda russa) o construtivismo russo tinha como objetivo unir a arte ao trabalho [..] os construtivistas acreditavam que o design gráfico deveria privilegiar a legibilidade, baseando-se numa geometria e numa escrita simplificada de caracteres cirílicos, que seria mais acessível a um grupo de trabalhadores em sua maioria analfabetos. RAIMES ( 2007, p. 44).16 Neville Brody, nasceu em 23 de abril de 1957 em Londres. Estudou no Hornsey College of Arts em 1975 e no London College of Printing entre 1976 e 1979 onde realizou seu Bachelor of Arts cujo teor era um estudo comparativo entre o Dadaísmo e a Pop Art.17 Livro How to be a graphic designer without losing your soul, de Adrian Shaughnessy, 2005 (tradução nossa).
36
e vigoroso, mas seus protestos se estendiam às ruas com um jeito anarquista que
buscava libertar-se de qualquer opressão e autoridade, assim como dos estigmas
sociais (MOTHELET, s/d, p.67)18 .
Brody, no início, projetava ilustrações e capas para discos de rock de gravadoras
independentes, deixando marcado esse período pela originalidade. Começou sua
carreira criando os grafismos para grupos de música do estilo punk e indie-labels.
Análise das revistas The Face e Fuse
Brody lida com a tipografia de uma forma mais pessoal e menos comercial na
revista Arena (1987-1990), da qual foi diretor de arte. De um modo sintético, usa a
tipografia não decorativa por um tempo antes de voltar ao seu estilo expressivo visual,
principalmente com o advento da computação. Foi também nesse período que fundou
o seu The Studio, em Londres.
Como diretor de arte da revista inglesa The Face (1981-1986), deu sua contribuição
artística revolucionando completamente a maneira pela qual os designers e leitores
poderiam se aproximar mais do meio impresso. Brody ganhou fama mundial no design
editorial, sendo um dos designers mais admirados das últimas duas décadas, além da
grande legião de plagiadores de seu estilo.
18 Cf. Diseño Gráfico Contemporáneo, s/d. Compilador: Lic. Mónica González Mothelet, designer mexicana e professora da Universidade La Salle do México.Trata-se de um curso para estudantes sobre design gráfico contemporâneo, sem outras referências.
QR CODE 4 - Assista ao vídeo por algum aplicativo QR Code de seu celular ou acesse o site: http://www.youtube.com/watch?feature=endscreen&v=r1PZdOdojDM&NR=1
Fig. 23. Exemplar da Revista The FaceFonte: Disponível em: http://www.tipografos.net/designers/brody.html /. Acesso em 31/01/2013.
37
Em princípio podemos confundi-lo como um designer retrô, que busca nas
formas de Rodtchenko e outros artistas do construtivismo russo as formas geométricas,
porém suas atitudes experimentais e seus questionamentos aos cânones da estrutura
nos mostram, através da reinvenção da forma e da estrutura, a existência de uma
mudança de significado de elementos constitutivos. Talvez por isso seja imitado por
outros tantos designers.
Ele promoveu o rompimento com a tradição do design editorial e com seus
princípios de funcionalidade, utilizando layouts surpreendentes e novos typefaces,
além de reafirmar e fazer evoluir as tradições tipográficas e compositivas. As manchetes
se tornavam imagens, cada uma cuidadosamente confeccionada para expressar
conteúdo (MEGGS, 2009, p. 623):
[..] em uma revista, as palavras são fatores de reconhecimento, portanto, os
espaços entre letras se convertem em parte de um sistema modular. Sua
estrutura é um sistema de signos. Os elementos que ditam esse sistema são
signos, símbolos e palavras... Um artigo existe em muitos níveis, não consiste
só em palavras. E qualquer design mostra o modo como lemos o conteúdo. O
tipo que é usado, seu tamanho, a maneira de espaçá-lo, a posição escolhida,
tudo isso afeta a maneira como se lê um fragmento. (BRODY, apud JUÁREZ,
2003, p. 36)19 .
Seus trabalhos demonstram coragem e ousadia para rejeitar fontes consagradas,
como Futura, Helvética e Times, além de trazer o questionamento com as grandes
áreas em branco que podem ser deixadas pelo designer e seus contrastes com certos
exageros. Brody (apud JUÁREZ, 2003, p. 35) afirma: “Eu queria comunicar-me com
tanta gente quanto fosse possível, mas fazendo-o também de uma maneira artística,
mais popular, mais pessoal e menos manipuladora.”20
19 Tradução nossa20 Tradução nossa
38
Já a Revista Fuse era como uma mistura de revista e pôster A2. Fuse é qualificada
por alguns como “do futuro”. Com a grande criatividade de Brody aplicada em suas
páginas, esta revista funcionava como um fórum para a tipografia experimental. Ao
adquirir a revista, o consumidor recebia também disquetes com fontes de letra, sendo
Fig. 25 . Algumas fontes de letra criadas por Neville BrodyFonte: WOZENKROFT, Jon. 1994
QR CODE 5 - Assista ao vídeo por algum aplicativo QR Code de seu celular ou acesse o site: http://www.youtube.com/watch?v=k5HLXPyDUd0
Fig. 24. Projeto editorial The Graphic Language of Neville Brody, Estados Unidos, 1990Fonte: Disponível em: http://www.ha065.wordpress.com/gamswen/postmodern-graphic-design/. Acesso em 31/01/2013.
39
uma delas “oculta”. A grande intenção de Brody nessa revista era que, através de uma
livre participação dos autores das fontes, seus usuários pudessem reinterpretá-las ou
– por que não dizer –, modificá-las a ponto de facilitar seus trabalhos. Era dessa forma
que Neville Brody promovia a interatividade e as experimentações do design aplicado
à tipografia.
Talvez Brody encarasse as experimentações como uma forma de demonstrar
honestidade perante o que ele considera a indústria comercial do design. Segundo
ele, gostar da ideia de tentar ter algo criativo funcionando dentro de uma indústria
comercial é melhor do que fingir que se está em uma indústria cultural, quando na
verdade se está em uma indústria elitista:
Eu sinto que tenho algo muito forte para dizer em minhas mensagens. Eu
quero muito que ninguém fique à margem para esperar ser ouvido. Minha
tentativa consiste em usar conscientemente meu status de celebridade como
uma ferramenta de comunicação (BRODY, apud SHAUGHNESSY, 2005) 21.
21 Tradução nossa.
Fig. 26, 27, 28 e 29. Da esq. para dir.: Fuse 1 - Invenção, questionamento das tradições ocultas da tipografia, práticas protecionistas e a busca impossível do tipo de letra “clássica”. Isso se refletiu pela ênfase na revitalização e digitalização das fontes de letra em metal quente, criadas para uma idade diferente, com condições diferentes, em vez de projetar um tipo para o ambiente presente. Fuse 2 - Foi uma investigação sobre as origens mágicas da linguagem, com foco em Runas e da ideia do “secreto”, a informação intuitiva, a sua presença na sinapse entre sentimento e embora propondo que assumir a total responsabilidade para os elementos que usamos para criar novos modelos linguísticos. No extremo oposto da história da escrita, o tema para o Fuse 3 foi desinformação, uma brincadeira em projeto hi-tech, e sua função na fixação do grid de climas controlados como aeroportos e shopping centers. Os designers para as três edições foram, respectivamente, inglês, holandês e alemão. O tema para o Fuse 4 foi exuberância, exaltando as virtudes do tipo ornamental e dando a luz a “Dirty Face” - Barry Deck’s Caustic Biomorph (WONZENKROFT, 1994, tradução nossa).Fonte: WOZENKROFT, Jon. 1994
40
Fig. 30. Anúncio de revista. Cliente: Nike. 1988Fonte: WOZENKROFT, Jon. 1994
Fig. 31 . Variações estilísticas da palavra Style até sua total abstração.Fonte: WOZENKROFT, Jon. 1994
41
Brody acredita que o trabalho do designer é de grande responsabilidade na
sociedade, que ele precisa levar as ideias invisíveis e torná-las tangíveis, escapar da
mediocridade nascida de uma atual cultura genérica, padronizada no mundo todo.
Para ele, o direito de pensar está sendo tirado das pessoas. Seu trabalho consiste
em impedir que neste mercado exista um monólogo e promova-se um diálogo, que,
através de suas obras de caráter abstrato e ambíguo, o espectador olhe e tome sua
própria decisão quanto ao sentido pleno da peça. Sua mensagem principal é de que
ter integridade pessoal diferencia o bom do ruim.
Neville Brody parte da premissa de que o fato de sermos atingidos de modos
subliminares faz com que o designer tenha o poder de escolher a mensagem e poder
apresentá-la de forma diferenciada, definindo também o modo como o consumidor
ou usuário pode reagir, com respostas emocionais diferentes. O que o processo pode
fornecer é justamente atingir esse consumidor de uma forma menos massificada do
que o design tradicional preconiza.
42
1. 4 OS ARTISTAS DA REVOLUÇÃO DIGITAL
1.4.1 David Carson
David Carson22 vem remodelando e inovando o design gráfico. Sempre alvo de
críticas, segue mantendo um design inusitado e, para alguns, polêmico. É também
considerado o pai do grunge. Já ganhou 170 prêmios, sendo alguns deles: melhor
design de conjunto, capa do ano, prêmio de melhor uso da fotografia em design gráfico,
designer do ano em 1998, designer do ano 1999, mestre da tipografia e o prêmio ao
designer gráfico mais famoso do planeta em abril de 2004.
Carson não segue as convenções de design. Os tipos de letra usados por
ele muitas vezes desafiam os critérios fundamentais de legibilidade. Seus layouts
inusitados exigem que os leitores decifrem suas mensagens, o que inspira muitos
jovens designers e irrita a tantos outros que propagam seu estilo como caótico. O
que não significa que a falta de uma grande teoria, ou de regras, torne seu trabalho
intelectualmente inconsistente:
Eu acredito na emoção do design e na mensagem enviada antes que alguém
leia, antes do resto da informação, que é a resposta emocional ao produto,
à história, à pintura - o que quer que seja. Esta área do design é a que me
interessa mais, e acho que esta, para mim, é uma clara e muito simplificada
versão do que estou falando. (CARSON, 2003) 23
Sua visão deixa evidente que não se deve confundir legibilidade com comunicação,
pois muitas mensagens compostas de maneira tradicional são teoricamente legíveis,
mas oferecem pouco atrativo visual aos leitores, enquanto projetos mais expressionistas
podem atraí-los e envolvê-los. Para muitos, Carson renovou o panorama do design
gráfico, estagnado desde os anos da Bauhaus e protegidos por pessoas que talvez
se neguem a aceitar a chegada das novas tecnologias, como, por exemplo, a internet.
Em seus trabalhos marcantes na curta passagem pelas revistas Transworld
Skateboarding, Surfer e Beach Culture, e pela antológica revista Ray Gun (1992-22 Sociólogo, surfista e que se colocou a fazer design gráfico e a fazer história. Este texano nascido em 1956, graduou-se na San Diego State University em Sociologia. Chegou a ser professor na Real Life Private School, Grants Pass, Oregon para jovens com idades entre 13 e 18 anos. Seu contato com design se deu primeiro em 1980 na Universidade do Arizona, onde ficou duas semanas participando de workshop em design gráfico. Em 1983 realizou em Rapperswil, Suíça, um workshop de design gráfico com duração de três semanas, onde, entre os professores, incluía-se Hans-Rudolf Lutz.23 Trecho de uma palestra dada por Carson no TED. Disponível em: http://www.ted.com/talks/view /lang/ pt-br//id/436. Acesso em 17/02/2013. Tradução nossa.
43
2000), Carson ousou fazer um design que fosse difícil para seus leitores e escritores,
mas nunca quis confrontar o design tradicional. Ele mesmo, em uma entrevista no
documentário Helvetica (2007)24 , comenta:
Quando as pessoas começaram a ficar irritadas, eu realmente não entendia
por quê. Eu dizia: qual é o problema? Do que você está falando? E apenas
muitos anos depois alguém me explicou [...] que basicamente havia um grupo
que levou bastante tempo tentando organizar as coisas até conseguir fazer
funcionar uma espécie de sistema, e então me viram chegando e atirando
tudo pela janela. O que posso ter feito, mas não como a primeira intenção.
Este não era o plano.
Nesse mesmo documentário, Massimo Vignelli, considerado um dos maiores
designers nos anos 1960, quando viu os trabalhos expressivos, subjetivos, irregulares,
entendeu que era, segundo suas palavras, uma “irracional nova forma de projetar”, já
que em outro trecho do documentário comenta:
Nos anos 1970, a jovem geração estava perseguindo um tipo psicodélico e
todo o lixo que pudesse encontrar. E também nos anos 1980, com suas mentes
completamente confusas por aquela... doença chamada pós-modernismo,
as pessoas passaram a caminhar como galinhas sem cabeça [...] eles não
sabiam o que queriam, apenas sabiam contra o que estavam batalhando.
24 “Helvetica, o filme” é um longa-metragem independente de Gary Hustwit sobre design de tipografia, gráfica e cultura visual global. O documentário mostra, através de uma série de entrevistas, como a proliferação de um tipo de letra (que celebrou o seu 50 º aniversário em 2007) afeta nosso cotidiano. Fonte: Helm, Joanna. “Cinema e Arquitetura: Documentário “Helvetica, o filme”” 24 Feb 2012. ArchDaily. Disponível em: http://www.archdaily.com.br/34270. Acesso em: 31/01/2013.
Fig. 32 e 33 . Da esq. para a dir.: Capas de 1987 pré-computador. Carson especificou diferentes tratamentos tipográficos do typesetter usados em paste-up. Na imagem ao lado, usa diversos tipos de fontes em toda a capa. Uma antecipação da liberdade que o advento do desktop computing iria prover. (CARSON, 1995, tradução nossa) Fonte: CARSON (1995)
44
Revista Beach Culture (1989-1991)
Trazido, em princípio, para um projeto free lance como diretor de arte em uma
revista mais parecida com um catálogo de vestuário, de nome Surfer Magazine, Carson
e o editor Neil Feineman mudaram o nome, o conteúdo e a frequência da revista
para uma nova publicação que passou a se chamar Beach Culture. Em seus dois
anos de duração, antes de ser fechada, Carson embarcou na ideia da exploração de
comunicação. Destinada a um público voltado ao surf, Beach Culture estava, segundo
Heller (2004, p. 141):
cheia de indulgências em design e trapaças tecnológicas, mas também
incluía a fotografia marcante e ilustração por artistas talentosos, como Geof
Kern, Arisman Marshall, Milton Glaser, Matt Mahurin, e Henrik Drescher.
Considerada um tanto caótica e cheia de excessos tipográficos que muitas
vezes eram ilegíveis, Beach Culture serviu a um público que, por sua
característica, podiam navegar por suas imagens e por seus textos.
Revista Raygun (1992-2000)
A revista de rock alternativa dos anos 1990 RayGun era bastante experimental,
e tinha, para muitos, uma linguagem visual perturbadora. Cada número era uma
experiência totalmente diferente da do anterior, o que, segundo Carson, algumas
vezes dava certo outras não.
Fig. 34, 35 e 36. Da esq. para a dir.: Algumas capas da revista Beach Culture até sua última edição (1991). Fonte: Disponíveis em: http://illustrationadventures.com/tag/sunday-times-magazine/ , http://www.coverjunkie.com/magazines/380 e http://www.flickr.com/photos/22309082@N07/2153586592/. Acesso em 10/02/2013. .
45
E em vez de uma paleta limitada e consistente de tipos, caras novas tendem
a ser introduzidas com todas as edições da Ray Gun. Não como questão de
novidade, mas como uma questão de encontrar uma nova expressão para
novos conteúdos. Ao invés de “por que mudar?”, a pergunta é “por que não?
(CARSON, 1995, s/n.)25 .
Gamonal (2004), através da revista eletrônica mexicana Razón y Palabra, assim
define os recursos gráficos e retóricos utilizados por Carson em ambas as revistas:
a) Uso não convencional da tipografia - Carson não crê que a tipografia
simplesmente deva estar a serviço do design para facilitar a leitura. Para ele as
palavras são também imagens que, com sua forma, podem transmitir além de seu
valor textual. Seus designs não têm uma visão estática da tipográfica tradicional. A
colocação em cena da tipografia nos projetos de Carson se converte em uma página
cheia de tipos dinâmicos que parecem voar, que se superpõem, que passeiam entre
as fotos e que invadem zonas que a tipografia tradicional considera restritas:
• Mistura e superposição de tipografia diferente, de tamanhos e de cores:
mudanças de tipos de letras e tamanhos, uso em uma mesma palavra de negritos
e cursivas ou de maiúsculas e minúsculas;
• Desmedida no tamanho dos tipos: ou exagerados ou ínfimos (quase ilegíveis);
• Entreletras (kerning) excessivas ou negativas, ou seja, muita separação entre
as linhas ou pouca separação entre elas;
• Flutuação de letras nas linhas: as letras não seguem uma mesma linha de base;
• Texto em cor sobre fundo também colorido que dificulta a leitura e obriga o leitor
a forçar a vista;
• Caixas de texto poligonais de diferentes formas: normalmente as revistas têm
um tamanho de coluna preestabelecido. Carson joga com os tamanhos e as
formas das colunas de texto;
• Blocos de texto girados ou invertidos que obrigam a girar a revista para lê-los;
• Títulos se sobrepondo sobre o corpo do texto;
• Mudança do cabeçalho da revista em cada número: este recurso ele utilizou na
revista RayGun;
• Invasão do texto na medianiz: o texto ocupa uma das zonas que o design tem
restringida, que é o espaço que une e separa uma página par de uma ímpar.
25 Tradução nossa. O livro não possui numeração de páginas e tem uma diagramação que desafia as leis da legibilidade... porém foi fundamental para entender um pouco de seu pensamento e de sua proposta.
46
• Omissão de títulos em algumas reportagens;
• Uso de sinais de pontuação como colchetes, ponto, sinais de maior ou menor
como recurso expressivo e não ortográfico;
• Dá aos números um uso estético e não textual. Por exemplo, por sua similaridade
de formas, utiliza o número “5”para substituir a letra “S”, ou o número “3” invertido
para substituir a letra “E”;
• Textos com erros corrigidos a mão;
• Não numera as páginas da revista.
Ele costumava espaçar as letras dos títulos de seus artigos de maneira
irregular ou os dispunha em sequências antes expressivas que normativas.
Também exigia que o leitor decifrasse sua mensagem fatiando partes das
letras. Os tipos de textos de Carson muitas vezes desafiavam os critérios
fundamentais de legibilidade (MEGGS, 2009, p. 634).
b) Ruptura do grid - A composição no design de Carson não conta com uma
estrutura a priori. O grid é uma estrutura invisível que sustenta as bases do design em
uma página. Seu uso no design de revistas tem sido muito importante para dar coerência
e permitir a identificação das seções. Carson opina que esta estrutura fixa, que dá
coerência e unidade a todas as páginas da revista, ao final provoca aborrecimento.
Por isso ele concebe a revista como um objeto vivo que evoluciona e muda ao longo
das páginas e também no número seguinte. Isso ele seguiu muito bem na revista Ray
Gun: cada número era totalmente diferente do anterior e era complicado identificá-la.
c) Fotografia - Carson é um fotógrafo compulsivo. Leva sempre consigo uma
câmera automática de 35 mm.
Carson considera que tanto a imagem quanto a palavra têm valor textual e valor
visual. Palavra e imagem não são dois sistemas diferenciados de comunicação.
d) Erro - Carson aproveita tudo. Talvez o erro seja seu melhor elemento criativo:
• Utiliza muitas vezes as correções do texto feitas a mão para incluí-las no design;
• Usa manchas produzidas por acidentes. Por exemplo, um café que caiu sobre
um papel, ou uma foto, incluindo manchas de sangue produzidas ao fazer uma
montagem ou uma colagem;
47
e) Audiovisual - Os meios audiovisuais têm invadido também as páginas impressas,
mudando o modo como se combinam tipografia e imagens. A controvérsia sobre o
novo design gráfico é um dos sintomas do amplo salto geracional entre os designers
experimentados e os designers novos. Os primeiros adquiriram seus conhecimentos
comunicativos com os meios impressos e depois com a televisão e os videogames, e
por isso têm maior facilidade para a interpretação das imagens audiovisuais.
Carson tem captado essa mudança nos hábitos de leitura pela influência dos
meios audiovisuais e consegue transpassar para o papel (um espaço estático) os
recursos desses meios. Seus designs parecem videoclips: as páginas da revista são
cada um dos fotogramas que os compõem:
Fig. 37, 38, 39 e 40. De cima para baixo, da esq. para a dir.: Edição 17 - 1994. Três imagens combinadas no Photoshop e colagem.Edição 19-1994. Imagem de banda está pequena, abaixo do código de barras, o que prejudica a ênfase normal em fotografia de capa. O logo Ray Gun característico foi desenhado por Ed Fella, retirado de um cartaz que ele projetou para o anúncio de uma palestra de Carson. Edição 21 - 1994. Rejeitando as cores agradáveis, uma foto em preto e branco feita em uma câmera Polaroid foi usada, com trocadilho visual no “hot potato”. Edição 25 - 1995. A primeira vez na história da revista que história na parte interna pulou para continuar na capa.Fonte: CARSON (1995)
48
• Repetição de sequências em fotos contíguas;
• Efeitos de esfumaçamento na tipografia, que lhe conferem um caráter veloz e
dinâmico;
• Páginas sem margens para a sensação de continuidade, como os fotogramas
de um filme;
• Uso de imagens tiradas dos meios audiovisuais: Carson fotografa as telas da
televisão e do monitor. Essas imagens têm uma textura de linhas horizontais
multicoloridas que se apreciam em sua reprodução.
Nos trabalhos de Carson muitas coisas funcionavam; outras, nem tanto. Mas o
importante era sua intenção de produzir uma linguagem absolutamente subjetiva e
interpretativa, absolutamente compatível com os dias de hoje, pois, através de sua
imprevisibilidade, realizava no papel o que hoje podemos realizar com o advento de
novas tecnologias, por exemplo, com a internet.
Ultimamente Carson também se dedica ao cinema e à televisão, chegando
a dirigir anúncios de TV. Produziu o curta-metragem The End of Print, além de ter
projetado a campanha mundial da marca Microsoft. Publicou dois livros : The End of
Print e 2nd Sight, essências do seu trabalho e estilo de compor.
Fig. 41. Ohio, 1987. Primeira experiência com legendas como um elemento de design. Fonte: CARSON (1995)
49
1.4.2 Chuck Close
Fig. 42. Mixed Messages, 1993. As impressões seccionadas do tipo foram utilizadas para explorar os espaços entre caracteres, em resposta ao título. A Introdução é repetida duas vezes, refletindo em dobro os créditos da escrita. (CARSON, 1995, tradução nossa)Fonte: CARSON (1995)
Fig. 43. Tin Man, 1993. Letra de Imprensa com caracteres quebrados usados como manchete. Fonte: CARSON (1995)
50
Fig. 45. Backbeat, 1994. Deliberadamente recortada para fora do velho cartão do Beatle John Lennon. Mudanças mais importantes em todo o artigo. Fonte: CARSON (1995)
Fig. 44. Too Much Joy, 1992. Primeiro parágrafo do artigo completamente obliterado por overlapping e tipos repetidos. Fonte: CARSON (1995)
Fig. 46. Screaming Trees, 1993. Provavelmente um pouco difícil de ler, a menos que você esteja interessado no assunto. A atitude deste projeto envolve uma risada silenciosa, com um ótimo comprimento de linha. Fonte: CARSON (1995)
52
O que podemos chamar de importância do processo, Close26 utiliza em suas
pinturas desde 1968, em retratos de rostos de grande tamanho, recorrendo a fotos
como base. O mais impressionante é que, ao chegarmos perto dos quadros, podemos
observar marcas de diversas formas, como círculos, quadrados ou até mesmo
suas próprias impressões digitais. Interessante ressaltar o fato de que ele sofre de
prosopagnosia27 e suas pinturas contribuíram em sua capacidade de poder identificar
melhor as pessoas a seu redor, o que talvez o tenha influenciado a retratar mais sua
família e amigos.
De fato, não é meramente a habilidade técnica que torna Close interessante
como artista, mas a inevitável lacuna entre a simulação e a realidade – mesmo
se essa “realidade” é ela mesma um simulacro. [...] sua intenção é a de
reproduzir o original tão fielmente quanto possa. Mas, contudo, ao fazer essa
afirmação ele é forçado a admitir que haverá uma área de diferença, mesmo
que desprezível, entre o que ele intencionava fazer e o que ele realmente
faz. Essa pequena discrepância é suficiente para animar suas pinturas, para
dar vida a elas como trabalhos de arte. (LUCIE-SMITH apud MELLO, 2008,
p. 22).
26 Charles Thomas Close, ou simplesmente Chuck Close (1940 - Washington/EUA), é um fotógrafo e pintor norte-americano. Graduou-se em 1962 na Universidade de Washington, em Seattle, e em 1964 dedicou-se a um mestrado em Arte Figurativa pela Faculdade de Arte e Arquitetura em Yale. Utiliza como técnica de pintura a foto-realismo, o que o enquadra no movimento artístico chamado de hiper-realismo.27 Doença que faz com que a pessoa tenha dificuldade em reconhecer rostos.
QR CODE 7 - Assista ao vídeo por algum aplicativo QR Code de seu celular ou acesse o site: http://www.youtube.com/watch?v=bhWkv4HuPQs&feature=related
Fig. 49. Chuck Close em seu ateliê.Fonte: Disponível em: http://www.brooklynrail.org/2008/06/art/chuck-close-with-phong-bui. Acesso em 28/09/2012.
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53
Um acontecimento transforma drasticamente sua vida, apelidado por ele de “The
event” (o evento). Em 1988, aos 48 anos e no auge de sua carreira,
[...] estava em uma cerimônia de celebração a artistas locais de Nova York
quando sentiu uma estranha dor no peito. Ele permaneceu no local e chegou
a apresentar o prêmio e a fazer um discurso, indo logo em seguida até o
hospital mais próximo, onde sofreu uma pressão mais forte que o deixou
tetraplégico. O caso foi registrado como um colapso da artéria vertebral
(FERREIRA et al., 2011, p. 10).
Após o acidente, desenvolveu um estilo inteiramente novo para manter a criação
de seus retratos. Passa então a pintar com o pincel na boca. Durante meses se
submete a uma reabilitação, vindo a adquirir, tempos depois, a mobilidade dos braços
e das pernas, passando a pintar com um pincel amarrado à mão. Seus retratos agora
são antes delineados por seus assistentes e depois pintados por ele. Sua deficiência
não o impediu de pintar com um realismo extraordinário, sendo que algumas telas se
encontram no Art Institute of Chicago, na Tate Gallery (Londres) e no Musée National
d’Art Moderne (França), entre outros.
QR CODE 10 - Assista ao vídeo por algum aplicativo QR Code de seu celular ou acesse o site: http://www.youtube.com/watch?v=Cg-zsxsalS8
Fig. 50. O estilo realista das grandes pinturas dos retratos de Chuck Close antes de seu acidente.Fonte: Disponível em: http://painting.about.com/od/famouspainters/ig/famous-paintings/Chuck-Close-Frank.htm. Acesso em 28/09/2012.
54
Embora pensemos que sua obra seja suficientemente gloriosa pelo alto grau
de detalhe que consegue pintar, não é propriamente na obra acabada que está a
verdadeira arte de Close, mas no seu processo sistemático e metodológico de criação.
Em seus trabalhos John (1997) e Big Self- Portrait (2004), a questão do processo de
criação requer um compromisso metodológico muito controlado, complexo e obstinado.
A técnica de pintura de Chuck Close consiste em subdividir uma foto-base em
células, dividindo a superfície de sua grande tela em um grid com o mesmo número
de células que a foto, e trabalhar cada célula de uma forma independente. Essa
técnica veio da aplicação da arte da tapeçaria moderna com um método assistido por
computador de tecelagem industrial [...] enfocando o processo sequencial da pintura
e com base no tempo de transferência de uma imagem fotográfica para a tela [...]
(RAVIN, ODELL, 2008)28.
28 Tradução nossa
Fig. 51 e 52. Big Self- Portrait (273x212cm)Fonte: Disponíveis em: http://drawthelineagainstprejudice.wordpress.com/page-1/self-portrait-by-chuck-close-2002-2003. Acesso em 16/09/2012.
55
Fig. 53 e 54. De cima para baixo: John, 1997 (silkscreen - 163.8 x 138.4 cm). Acima: elaboração da pintura. Abaixo: trabalho concluído.Fonte: Disponíveis em: http://mariyamileva.com/blog/2012/12/. Acesso em 19/02/2013.
56
1.5 UMA NOVA LINGUAGEM
Tanto Carson quanto Close, e tantos outros artistas29, abriram perspectivas
para o uso de uma nova linguagem – a do processing design –, passando a ganhar
novos adeptos no mundo todo, como Paulo Costa, Wilton Azevedo e Dimitre Lima, no
Brasil; Cédric Kiefer, na Alemanha, e Matt Pearson, nos Estados Unidos. É desta nova
linguagem que trataremos no próximo capítulo.
29 Poderiam ser citados vários outros artistas, como Armin Hoffman e Manfredo Massironi, porém julgamos ser irrelevantes citá-los devido ao escopo deste trabalho
57
SEGUNDO CAPÍTULO
LINGUAGEM DE PROGRAMAÇÃO
As linguagens de programação têm sido usadas por designers como forma de
expandir seus caminhos no processo de criação de um projeto através do processing
design. Para que seja possível compreender qual o conceito do design processo, assim
como entender a relevância do sistema de programação processing para o design
gerativo, é necessário que haja um entendimento básico do que seja programação.
A linguagem de programação pode ser dividida em dois grandes grupos: o de
baixo nível (dependente do hardware) e o de alto nível (permissiva à abstração do
hardware).
A linguagem de programação é o conjunto finito de palavras, comandos e
instruções escritos com o objetivo de orientar a realização de uma tarefa pelo
computador. [...] é a ferramenta de comunicação entre o programador que
visa resolver um problema e o computador que irá ajudá-lo a resolver este
problema. (SIEBRA, 2010, p.16).
De acordo com Lavelle (apud VASCONCELOS, 2003, p.10), a escolha da
linguagem se deve às seguintes características:
• Portabilidade: a possibilidade de utilização de diferentes hardwares por
determinadas linguagens;
• Desenvolvimento modular: a facilidade de utilização de funções, procedimentos
e objetivos;
• Compatibilidade entre versões distintas: as novas versões serem compatíveis
com a versão anterior;
• Legibilidade: fácil leitura do programa por diversos públicos;
• Eficiência do código gerado: a performance do programa deve ser alta, de
forma a responder à expectativa de seu usuário.
58
Uma programação pode ser dividida em três fases básicas: entrada,
processamento e saída (input, process e output). De acordo com a definição de
Siebra (2010, p.8), entrada são os dados de entrada do algoritmo30, os valores que
ele vai usar no processamento para chegar à solução do problema. O processamento
compreende os procedimentos utilizados para o resultado final e a saída são os dados
já processados, o resultado final do processamento. Um algoritmo sempre produz um
ou mais resultados (saídas), podendo não exigir dados de entrada [...], sendo que um
algoritmo é “uma solução” e não “a solução” de um problema.
Segundo Amado (2007, p. 26), um programa pode ser analisado segundo duas
perspectivas:
– Sintaxe: o código está de acordo com as regras gramaticais da linguagem de
programação utilizada?
– Lógica: o código executa aquilo que se pretende? Um programa pode estar
sintaticamente correto (regra geral, o compilador detecta estes erros), mas estar
logicamente errado.
De acordo com informação da revista Info Exame31, a linguagem Java está no
topo do ranking das linguagens de programação mais populares. Essa linguagem
é considerada simples porque permite o desenvolvimento de programações em
diferentes sistemas operacionais e arquiteturas de hardware, sem que o programador
tenha que se preocupar com detalhes de infraestrutura. Dessa forma, o programador
consegue desempenhar seu trabalho de uma maneira mais produtiva e eficiente
(MENDES, 2009, p. 17).
30 Entende-se por algoritimo, segundo Gary Masters (apud Travisani, 2008, p. 39), como a estruturação de um pensamento ordenado e disposto de um meio “não-humano” qualquer de executar. É transferir a capacidade de raciocínio para algo que possa operá-lo. Em outras palavras, é uma sequência de instruções que especifica os passos para a resolução de um problema ou realização de uma tarefa.31 Matéria publicada em 17 de fevereiro de 2012 . Disponível em: http://info.abril.com.br/noticias/ti/veja-as-20-linguagens-de-programacao-mais-populares-17022012-26.shl. Acesso em 19/02/2013.
59
Tabela 2. Linguagens de programação mais utilizadas.Fonte: Disponível em: http://info.abril.com.br/noticias/ti/veja-as-20-linguagens-de-programacao-mais-populares-17022012-26.shl. Acesso em 19/02/2013.
Não por acaso, a linguagem Processing é baseada na plataforma Java,
conquistando a cada dia mais adeptos, pois utiliza o que é chamada de linguagem
de alto nível, ou seja, linguagem que utiliza caracteres, palavras e expressões de um
idioma, ou seja, uma linguagem cujos símbolos básicos e cujas palavras estão no
nosso cotidiano.
60
2.1 O CONCEITO PROCESSING DESIGN
A popularização da tecnologia, principalmente com os computadores domésticos,
propiciou o acesso à informação em massa, promovendo uma mudança na sociedade.
“[...] as chamadas ‘novas tecnologias’ podem ser pensadas como o rosto de um novo
otimismo que revitaliza a ‘esperança’ no progresso e a confiança no crescimento
da sociedade contemporânea” (CABRERA, 2006, p.134). As informações ficam
potencializadas no espaço cibernético, bastando apenas alguns cliques para que de
latente se torne usual. Em 2012, o número de usuários do espaço cibernético no Brasil
é de aproximadamente 84 milhões de pessoas que se conectam na internet, das quais
80% se conectam em redes sociais32 .
Para Meira (2012), dentro de alguns anos, não entender como a cibercultura
funciona e não ser capaz de usar suas interfaces para reprogramá-las (para atender
suas necessidades ou delas extrair dados) será um problema tão fatal, para qualquer
um, como o que está ocorrendo no País atualmente, onde 80% dos alunos do 9º
ano (antiga 8ª série) não entendem o sistema de porcentagens. Mesmo assim, essa
mesma sociedade brasileira, que já nasce em um mundo completamente diferente da
vivida por gerações passadas, tem a facilidade de acesso à informação neste espaço
que, em princípio, não possui controle nem dono (aqui não se levam em consideração
países regidos por ditaduras ou regimes fechados). Elas pertencem a uma geração
denominada “Geração C”.
É chamada de “C” porque reúne alguns “cês” como característica principal. Está
naturalmente computadorizada no sentido de estar pessoalmente informatizada. Trata-
se de pessoas que estão sempre conectadas com seus computadores, sempre se
comunicando, sendo orientadas a comunidades, centradas em conteúdos e sempre
clicando em coisas. Para se ter uma ideia do significado dessa nova geração, as
pessoas que nasceram a partir de 1990 e que terão 30 anos em 2020 vão ser, nesta
época, 40% da população dos Estados Unidos, da Europa e do BRIC (Brasil, Rússia,
Índia e China). A previsão para 2020 é que seis bilhões de pessoas tenham celulares,
80% da população do planeta, e que 4,7 bilhões acessem a internet primordialmente
através de smarth phones e não em redes fixas como lap tops, desktops, tanto
32 Participação de Silvio Meira no programa da Rádio CBN, “Bits da Noite”, com o tema: “Programar é preciso” (19/06/2012). Disponível em: http://cbn.globoradio.globo.com/colunas/bits-da-noite/ 2012/06/19/PROGRAMAR-E-PRECISO.htm. Acesso em 20/09/2012.
61
de suas casas como de seus trabalhos. O impacto disso pode ser observado nos
exemplos testemunhados recentemente, quando, mesmo com um nível de conexão
básico, internautas promoveram a derrubada dos governos da Tunísia e do Egito, bem
como deram início à revolução na Líbia. O Egito tentou enfrentar o movimento social
desligando a internet, mas teve que a religar, pois a medida afetou o sistema bancário,
o comércio e o turismo. Hoje não ter internet é como viver sem energia elétrica33 . Em
outras palavras, “[...] pancomunicação, tecnoinformação e orientação ao futuro” são
“três elementos essenciais do imaginário contemporâneo que configuram a ‘sociedade
da informação’ tal como é definida hoje”. (CABRERA, 2006, p.143).
Neste espaço tão essencial e até vital, palavras como padronização ou
uniformização soam estranhas em relação ao mundo analógico em que vivíamos, até
porque “as novas condições do saber em uma sociedade informatizada e tecnocrata
levam à crise dos megarrelatos e deixam os seres humanos “reféns” diante dos jogos
de linguagem e da paralogia” (LYOTARD apud CABRERA , 2006, p. 131).
De onde vem esta necessidade de pensar o resultado? De uma lógica de fins,
do que chamamos teleologia, ou seja, o que tem telos, fim, objetivo. Estamos
diante de uma lógica que necessita de ordenamento. A ordem é sinônima do
sistema das coisas. (TIBURI, 2010, p. 62).
Como parte desse contexto, o design não propicia a resposta que tradicionalmente
era ensinada na academia, pois tudo passa a ser processo, simulação e instabilidade.
Dificilmente serão produtos acabados. O que temos como percepção em nosso mundo
não é planificado pelo artista, nem por visões políticas: o poder e a velocidade da
tecnologia é que ditam os padrões do presente (WOZENKROFT, 1994).
Vimos como os artistas e designers, mesmo antes do advento da computação,
já praticavam o que chamamos de processing design. A história nos mostra que as
pesquisas com materiais desde lápis e tintas, passando por objetos como câmeras e
filmes, até o advento da computação gráfica, mudaram a prática profissional. As novas
tecnologias podem melhorar ou modificar a expressão do design, permitindo diferentes
formas de comunicação e expressão e, é claro, da criatividade. “É justamente este
poder articulador que nós, seres humanos, temos para poder experimentar signos
nem sempre convencionais em nosso cotidiano, principalmente quando a tecnologia
33 Participação de Silvio Meira no programa da Rádio CBN, “Bits da Noite” com o tema: “A geração C” (22/02/2011). Disponível em: http://cbn.globoradio.globo.com/colunas/bits-da-noite/2011/02/22/A-GERACAO-C.htm. Acesso em 20/09/2012.
62
nos coloca em uso verdadeiras máquinas semióticas [...]” (AZEVEDO, 2009).
O trabalho computacional é basicamente um trabalho matemático. Uma arte
também pode ser matemática, o que nos pode deixar com dúvidas quanto à liberdade
artística em detrimento das “prisões” numéricas. Lembremos antes de mais nada
que, no Renascimento italiano, artistas como Piero della Francesca, Albrecht Durer e
Leonardo da Vinci não só experimentaram princípios da geometria em seus trabalhos
como muitos deles até publicaram tratados sobre matemática. Isso significa que a arte
pode ter sim como pano de fundo um princípio matemático, um princípio computacional.
Mas o que pode representar o termo processing design? De acordo com o recorte
proposto nesta dissertação, podemos definir que, por processing design, entende-se
quaisquer peças geradas, compostas ou construídas com a utilização de algoritmos
computacionais com processos aleatórios e autônomos. Temos de analisar que o que
está acontecendo é que o desenho programacional possui uma peculiaridade em
relação ao desenho gráfico. Em vez de trabalhar visando o resultado, os profissionais
que lidam com essa linguagem trabalham no processo e não na sua configuração
final.
Na impressão escrita, as ferramentas que você gera são retóricas, pois elas
demonstram e convencem. Na escrita por computador, as ferramentas que
você gera são processos. Elas simulam e decidem sem necessariamente ter
o resultado (REAS, 2007).
Cédric Kiefer34 mostra, através de um fluxograma simplificado, a diferença entre
o que ele denomina de processo clássico de design e o processo gerativo (processing
design):
34 Designer que realiza trabalhos com a linguagem Processing, sócio da empresa de design alemã Onformative. Palestra no Campus Party em Berlim no ano de 2012. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=7vITr__QOc4. Acesso em 23/02/2013.
65
Com a evolução da internet, que está na versão 3.0, o que um programador
executa poderá ter resultados imprevisíveis de acordo com a reação do internauta ao
acessar suas páginas. Ao planejar um algoritmo para determinadas tarefas, o próprio
programador está ciente de que sua obra, a partir daquele momento, pode estar
terminada, já que todo o conceito está latente no que programou – o que dependerá
é se sua construção (ou intenção) inicial pode ser modificada com inserções em
sua programação, seja na mudança do algoritmo seja apenas na sintaxe. Se o que
programa na verdade é uma simulação, nada mais natural então de que tudo o que
possa fazer nunca seja um objeto finalizado, seja sempre sim embrião do que talvez
no modo analógico seja finalizado, como aponta Azevedo (2009), em que tudo é fruto
dessa escritura programada, uma escritura que se expande.
66
2.2 A LINGUAGEM DE PROGRAMAÇÃO PROCESSING
Segundo Cardoso (apud AMADO, 2007, p. 17), existem inúmeras linguagens de
programação, algumas específicas de determinados ambientes:
HTML:
Linguagem de Script (não é verdadeiramente programação)
Interpretada em tempo real (render)
Universal, Multiplataforma
- PHP:
Linguagem de Script (não é verdadeiramente programação)
Interpretada (executada pelo servidor)
Universal, Multiplataforma
- ACTIONSCRIPT:
Linguagem de Script (não é verdadeiramente programação)
Multiplataforma, mas dependente da aplicação/plataforma Flash/FlashPlayer.
Compilada+Interpretada (Player)
- PROCESSING:
Baseada na linguagem de programação Java
Simplificada
Multiplataforma, mas dependente da aplicação/plataforma Java
Compilada+Interpretada (executada pelo motor de Java)
- JAVA:
Multiplataforma (independente)
Compilada+Interpretada (executada pelo motor de Java)
- C/C++:
Linguagem universal que tem que ser adaptada às plataformas tecnológicas
Compilada (executada pelo SO ou pelo processador)
O foco da análise de programação nesta dissertação é a linguagem Processing,
que cresceu a partir do Media Lab do MIT (Massachussets Institute of Technology),
cuja finalidade de criação foi a de encontrar uma melhor maneira de escrever uma
ferramenta de código aberto e acessível que pudesse auxiliar profissionais em seus
67
processos criativos além do compartilhamento gratuito. Seus idealizadores partem da
premissa de que, tornando esses softwares open source, oferecem uma alternativa
disponível para a melhora de habilidade artística de quem utilizá-lo. Democratizando
o software neste sistema open source, aproveitando a web, sua disponibilização e
as trocas de informações e publicações de seus códigos programacionais entre os
milhares de estudantes, educadores e praticantes em todos os cinco continentes que
estão envolvidos através de várias comunidades de discussão, fazem o software
crescer de uma maneira inesperada, evoluindo sem um orçamento, diferentemente do
que ocorre com as grandes corporações do ramo. Esses fatores, então, possibilitam
que o software seja distribuído sem custo, o que permite o acesso a pessoas que não
podem arcar com o alto preço de um software comercial.
Fig. 59 e 60. Acima: web site da linguagem de programação Processing. Abaixo : site open Processing onde são trocadas experiências e tutoriais.Fontes: Disponíveis em: www.processing.org (acesso em 26/02/2013) e www.openprocessing.org/classroom/1640. Acesso em 05/02/2013.
68
Seus criadores são Casey Reas e Ben Fry que foram alunos de John Maeda35
no Media Laboratory do MIT. Casey Reas é um renomado artista e designer, sendo
um dos integrantes da Processing development team juntamente com Ben Fry, que
faz parte desta geração de jovens artistas que exploram processos computacionais e
estruturas fundamentais como modalidades criativas.
Segundo Amado (2007, p. 27), existem alguns motivos convincentes para se
usar o Processing:
1. É uma linguagem open source, ou seja, sem custos para sua aquisição;
2. Seu aprendizado é descomplicado, existindo diversos websites dedicados à
programação, alguns especialmente dedicados ao Processing;
3 . É baseado na plataforma Java, que faz com que seja simplificado, porque se
adapta ao processo de ensino;
4. É uma boa transição para outras linguagens e permite criar rapidamente
aplicações independentes ou applets para a web;
5. É compatível e extensível.
2.2.1 Características do Processing
Quando se excuta a linguagem Processing, na verdade se executa a linguagem
de programa Java. Talvez pelo fato dessa plataforma conseguir fazer com que se
escreva um código muito mais simples do que se precisaria escrever se se estivesse
trabalhando em Java puro, ela passa a se tornar mais receptível a leigos e a não
programadores.
Uma característica muito interessante nessa linguagem é o fato de se poder
realizar praticamente qualquer coisa utilizando seus comandos, principalmente no
contexto artístico. O Processing torna mais fácil escrever software para desenho e
animação e reagir ao ambiente, e programas são facilmente estendidos para integrar
com outros tipos de mídia, incluindo áudio, vídeo e eletrônicos. Versões modificadas
do Processing existem em telefones móveis e programas de microcontroladores
(REAS, FRY, 2007 p. 633).
35 John Maeda - designer e professor de Artes Midiáticas e Ciências no Massachussets Institute of Technology (MIT), é um dos mais conhecidos designers e pioneiros das artes digitais no mundo, influenciando a geração de “code artists”.
69
Sua interface é composta basicamente por um simples editor de texto para
códigos escritos, uma área de mensagem, um console de texto, guias para gestão de
arquivos, uma barra de ferramentas com botões para ações comuns e uma série de
menus. Quando programas são executados, eles abrem em uma nova janela chamada
janela de exibição (display window).
Segundo Reas e Fry (2007), o Processing pode ser utilizado em diversos
segmentos:
• Entrada e resposta - podem-se executar linhas de programação, onde uma
entrada (estímulo) resulta em alguma reação do hardware.
• Tipografia animada - a tipografia poderá ter movimentos cinéticos com o auxílio
do Processing, sendo utilizado, por exemplo, em cinema e televisão.
• Processing de imagem - técnicas de manipulação e modificação de imagens
no intuito de, por exemplo, corrigir um defeito, melhorar seu apelo estético ou
facilitar sua comunicação, acessando diretamente os pixels36 .
• Movimento e matrizes - movimentos do tipo “motion” não lineares, sinusoides,
curvos, que podem gerar “imprevisibilidade”.
• Formas cinéticas - desenhos do estilo cinético. Artistas exploram essa
programação para posicionar seus desenhos em um novo patamar, pois
conseguem integrar o tempo, a resposta e o comportamento com seus desenhos.
• Interface - códigos usados para deixar os elementos de uma interface gráfica
combinando com o mouse, tornando sua utilização intuitiva.
36 Menor unidade de uma imagem Bitmap
Fig. 61 e 62. Da esq. para a dir.: Tela de abertura e janela principal do Processing .Fonte: Software Processing
70
• Estrutura e Interface: integração de elementos de software, incluindo variáveis
de controle, estruturas, matrizes e objetos em conjunto com elementos visuais,
movimento e resposta.
• 3D: ambientes interativos e simulados em 3D, como, por exemplo, em jogos,
medicina, arquitetura, arte, engenharia e design industrial.
• Visão: algoritmos de visão computacional que podem criar em tempo real
relatórios sobre as identidades das pessoas, localização, movimentos gestuais,
expressões faciais, características dos passos, indicações do olhar e outros
atributos cada vez mais incorporados dentro da arte educacional midiática e
dentro da criação de jogos, obras de arte e muitas outras aplicações.
• Rede: tendo como exemplo a grande rede da internet, artistas incorporaram esta
tecnologia em seu trabalho. Há duas tendências gerais: fazer arte onde a internet
é usada como uma ferramenta para a difusão rápida e fácil da obra e fazer arte
onde a internet é o meio efetivo do trabalho. Essas duas tendências, no entanto,
não são mutuamente exclusivas. Alguns dos trabalhos mais interessantes on-
line tecem as duas técnicas em conjunto e podem ultrapassar os de uma ou
outra técnica.
• Música: pode-se usar uma variedade de técnicas e ferramentas que estão
disponíveis para trabalhar computacionalmente o som, devido à integração
estreita da tecnologia digital com criações sonoras, principalmente durante a
última metade do século.
• Mobile: o Mobile Processing fornece uma maneira de escrever aplicativos
de software personalizados para telefones celulares que podem utilizar suas
características incorporadas ao hardware, bem como se conectar à internet
e se comunicar com servidores que fornecem poder computacional e dados
adicionais.
• Eletrônica: em conjunto com uma placa lógica de patente Arduino, podem-
se realizar diversas atividades em objetos, como impressoras, elevadores,
brinquedos, máquinas de lavar. Em obras artísticas – tal qual Marcel Duchamps
utilizou motores elétricos em sua época –, podem realizar obras de arte interativas,
sendo controladas por componentes eletrônicos e microcontroladores por
software.
71
2.2.2 Funções randômicas
Para melhor entendimento de como o design gerativo se processa em uma
linguagem de programação, buscou-se trazer as explicações sobre quais sintaxes da
linguagem Processing37 estariam mais associadas com este conceito, através do livro
de Ben Fry e Casey Reas.
Os autores comparam a forma gerativa de uma criação artística ao caos, em que
os computadores são máquinas que fazem cálculos consistentes e precisos e devem,
portanto, simular números aleatórios para o tipo aproximado de operações casuais
utilizados na arte não digital. Existe um evidente contraste entre a estrutura rígida e o
caos completo, e algumas das experiências mais satisfatórias estéticas são criadas
pela infusão de um no outro (p. 154).
De acordo com Valadares (2011, p. 82), os programas em Processing recebem
a denominação de sketch. Um sketch possui uma estrutura básica, que pode ser
modificada, mas que é utilizada na maioria dos projetos de artes visuais.
void setup( ) {
}
void draw ( ) {
}
A instrução setup( ) tem a função de efetuar configurações iniciais, que serão
efetuadas sempre que o programa for executado. A instrução draw( ) executa
continuamente o código escrito abaixo dela, condição necessária para a programação
de animações e eventos interativos.
Entendemos, então, que o design gerativo, quando programado na linguagem
Processing, possui, entre alguns fatores (se somados a outras linguagens de
programação), sintaxes principais inseridas dentro dessa estrutura básica, que são:
Função aleatória (random)
Sintaxes
37 Cf.: REAS, Casey. Processing: a programming handbook for visual designers and artists / Casey Reas & Ben Fry ; foreword by John Maeda. USA: MIT Press books. 2007.
72
random( ), randomSeed( ), noise( ), noiseSeed( )
Essa função é usada para criar valores imprevisíveis dentro da faixa de
especificação por seus parâmetros.
random(high)
random(low, high)
Os valores atribuídos na sintaxe random( ) não são previsíveis. Cada vez que
o programa é executado, o resultado é diferente. Os números desta função podem
ser usados para controlar praticamente qualquer aspecto de um programa. Se
colocarmos a sintaxe random( ) com dois parâmetros, existirá um maior controle
sobre os resultados da função.
Usando-a em uma estrutura, podem ser gerados números aleatórios de uma
maneira relativamente fácil. Às vezes, podem ser incluídos números imprevisíveis nos
programas. A função randomSeed( ) é a sintaxe para a produção de tais números.
Sintaxe
randomSeed(value)
Alterando o valor do parâmetro determinado para randomSeed( ), pode ser
gerado um conjunto diferente de números e, desse modo, por exemplo, alterar-se
uma imagem produzida pelo programa.
A função noise( ) (ruído) é uma sintaxe mais controlável para criar valores
inesperados. Ela usa a técnica Perlin Noise, desenvolvida por Ken Perlin, trabalhando
por interpolação entre valores randômicos para criar transições suaves entre os
números retornados da função random( ). A função noise ( ) tem entre um e três
parâmetros:
Sintaxe
noise(x)
noise(x, y)
noise(x, y, z)
73
A versão da função com um parâmetro é utilizada para criar uma única sequência
de números aleatórios. A versão com dois parâmetros pode ser usada para criar uma
textura bidimensional. A versão com três parâmetros pode ser utilizada para criar uma
forma ou textura tridimensional, ou ainda uma textura animada bidimensional.
Segundo Siebra (2010, p. 7), as instruções do algoritmo devem estar em uma
sequência lógica, ou seja, deve existir uma ordem de execução dos passos da sequência
sem ambiguidades. Além disso, um algoritmo sempre produz um ou mais resultados
(saídas ou outputs), podendo não exigir dados de entrada. Através da compreensão
da operacionalidade de uma programação pode-se, então, compreender onde reside
o design processo.
Vários são os artistas que têm utilizado esta nova linguagem em seus trabalhos:
Jer Thorp, Yannick Mathey, Constanza Casas, Mark C Mitchell, Pieter Steyaert, Mark
McKeague, Leonardo Solaas, Dimitre Lima, Binho Dias etc. Selecionamos dois deles
no Brasil - Paulo Costa e Wilton Azevedo – e um profissional estrangeiro – Cédric
Kiefer (Alemanha), por lidarem com este conceito na atualidade em seus trabalhos de
repercussão internacional.
74
TERCEIRO CAPÍTULO
ANÁLISE DE TRABALHOS
Neste capítulo são analisados trabalhos de artistas selecionados que
desenvolvem trabalhos com design processo. Tendo em vista a enorme quantidade
de profissionais que lidam com essa categoria, o critério de seleção baseou-se em
profissionais cujos trabalhos tivessem sido reconhecidos e/ou mencionados. Outro
critério foi no sentido de se entender que seus trabalhos são gerados e exibidos a
partir da execução de um algoritmo, escrito em alguma linguagem de programação
(tendo preferencialmente a inclusão da linguagem Processing), e executados através
de um sistema computacional, podendo ou não ter a participação direta de algum
expectador, mas que tenha inequivocamente o caráter gerativo (ou seja, que não
possua a percepção do que seja início ou fim e sim o processo como linguagem).
Foram escolhidos dois profissionais brasileiros – Paulo Costa e Wilton Azevedo
– e um profissional estrangeiro – Cédric Kiefer (Alemanha). Apesar da diversidade de
estilo de trabalho, os projetos desses artistas apresentam semelhança e conexão, em
especial em relação ao conceito do design processo e intercodicidade.
75
3.1 PAULO COSTA
3.1.1 Dados
Artista desde 1992, com instalações, participações em mostras e prêmios
conquistados, Costa38 comenta que seus primeiros trabalhos já apresentavam
imagens em movimento, integradas com o espaço físico. Utilizava projetores de filme
(super-8 ou 16 mm) que funcionavam em looping. Eram trabalhos que estavam ligados
à multimídia, ao cinema expandido e à cibernética. De uma forma oportuna e pelas
facilidades de viabilização dos trabalhos, ele optou posteriormente pela programação
como forma de controlar as exibições. Para Costa, nesse período não fazia sentido
traçar questionamentos sobre a natureza do código e suas especificidades (como ele
questionava com relação ao cinema).
Devido a seu contato com a performance através do grupo Neotao, Costa foi
levado a uma pesquisa sobre a integração de outros dispositivos, como os sensores.
Nesse caso, a necessidade sobre um certo tipo de controle e edição o levou ao
planejamento sobre acoplamentos entre corpo-software-dispositivo-imagem. Essa
transição resultou em seu afastamento dos suportes tradicionais e da pesquisa sobre
o desenho e a fotografia. A prática do desenho sempre foi mais natural em termos
de produção e atualmente o motiva a compreender as reais possibilidades do código
enquanto formalização de um tipo de pensamento, visualidade ou estrutura. Hoje
em dia, Costa utiliza as seguintes linguagens de programação: Processing, devido à
facilidade de uso, à disponibilidade de tutoriais, bibliotecas de códigos e grande base
de usuários e criadores com os quais se podem trocar informações; OpenFrameworks
(baseados na linguagem C++) e Opencl, pela otimização de alguns de seus trabalhos.
Para Costa, a programação contribui efetivamente para o processo projetual,
visto que é um meio de se expandir o próprio pensamento criativo. Para ele, certos
projetos de design (gráfico, industrial, digital, arquitetônico), principalmente aqueles
que se confrontam com altos níveis de complexidade, que tomam um grande número 38 Paulo Costa é formado em Análise de Sistemas (PUCC - Puc Campinas), Artes Plásticas (UNICAMP - Universidade de Campinas) e mestre em Multimeios (ECA/USP - Escola de Comunicação e Artes - Universidade de São Paulo). Atualmente é professor nos cursos de Artes e Novas Mídias, Design Digital e Games da Escola de Artes, Arquitetura, Design e Moda (UAM -Universidade Anhembi Morumbi). No campo artístico, participou do grupo NeoTao, formado por colegas da UNICAMP, artistas provindos das artes visuais e cênicas. Produz trabalhos que integram festivais, como FILE (Festival Internacional de Linguagem Eletrônica) e GLI.TC/H. Entrevista realizada em fevereiro de 2013.
76
Fig. 63, 64 e 65. Telas de abertura de seu site http://www.navax.net.br onde se observa a randomicidade de imagens a cada atualização de páginas.Fonte: Disponível em: www.navax.net.br (acesso em 07/10/2012)
77
de variáveis ou possibilidades de resultados, devem levar à programação como
um facilitador, ou como um meio orgânico em que ideias e conceitos possam ser
parametrizados com o intuito de se produzir protótipos, visualizações, simulações e
experimentações.
Ele entende que o processo em design não descarta o conceito de produto final,
isto é, sob uma perspectiva evolutiva, prevalece aquele resultado que mais se adapta.
Nesse sentido, Costa acredita que o processo tem a ver com delineamento e registro
de erros e acertos, efetivando a congruência entre referências múltiplas e escopos
do projeto (ambiente). Descrever esses registros e rastros como possíveis soluções
subscreve o teor da complexidade projetual. A aplicação crescente das tecnologias
(em particular a programação) no design gerativo indica justamente uma dissolução da
centralização autoral e reconhecimento do processo (geração) como “matéria-prima”.
Segundo Costa, muitos artistas discutem o uso de códigos ou algoritmos prontos
de forma vazia ou arbitrária, os quais, segundo ele, devem ser utilizados para nossas
próprias necessidades, seja na arte seja no design. De outra forma, não é interessante
a mera utilização. Ele comenta que têm proliferado artistas que produzem imagens ou
gráficos utilizando sempre o mesmo algoritmo, que muitos deles confundem design
com a geração pura de ilustrações complexas. Ele prossegue dizendo que o design
está conectado sim a um processo, que se conecta também a um projeto e que serve a
um problema. Se o processo é gerativo ou não, vai depender muito desses fatores....e
não de uma mera ilustração desvalorizada.
78
3.1.2 Análise dos Trabalhos
Performance “Preto no Branco”
Instalação criada por Rogério Borovik, videoartista, curador e professor de
Mídia Eletrônica em São Paulo, e Samira BR, performer e professora de Arte da
Performance no Departamento de Linguagens do Corpo no curso “Comunicação e
Artes do Corpo” na PUC/São Paulo, “combina performance, som e processamento de
imagens em tempo real para construir uma projeção totalmente interativa. Explorando
opostos complementares como a luz e a sombra, positivo e negativo, preto e branco,
convidando o público a participar da obram projetando sua imagem instantaneamente
sobre a cidade”. Disponível em: http://www.espacoliquido.com.br/pretonobranco.
Acesso em: 07/10/2012.
Costa desenvolveu um software que faz um blend (mistura) entre imagens
capturadas em tempo real e vídeos armazenados. Essa mistura ocorre pela divisão
da tela em duas porções de imagens que podem ser invertidas, funcionando como
espécies de máscaras para outra camada de imagens. A seleção das imagens e
efeitos pode ser acionada por teclado mapeado.
Anteriormente esse projeto era realizado no Keyworx, um software de programação
visual destinado à videoperformance. Mas como o software foi descontinuado, ficou
difícil para ele a utilização em plataformas mais recentes. Então resolveu propor aos
performers a elaboração de um software customizado que tivesse as mesmas funções
do patch desenhado dentro do ambiente do Keyworx.
Fig. 66. O projeto multimídia Preto no Branco, criado e desenvolvido pelo casal de artistas Rogério Borovik e Samira Br em 2008, é um work in progress que engloba criação de vídeos e imagens gráficas, graffiti e stencil, apresentações ao vivo em eventos de caráter experimental e interativo, onde Paulo Costa realizou a programação de software artístico. Disponível em: http://vimeo.com/23655510. Acesso em 07/03/2013.Fonte: Disponível em: http://finodabossa.blogspot.com.br/2011/04/perfomance-preto-no-branco.html. Acesso em: 07/03/2013.
79
Fig. 67, 68 e 69. Performers Rogério Borovik e Samira BR no projeto multimídia “Preto no Branco” Fonte: Disponíveis em: http://projetointegracao.wordpress.com/2011/04/23/performances/roge%CC%81rioborovik-samira-br-foto-germania-heibe-25/. Acesso em: 04/03/2013.
80
Fig. 70, 71 e 72. Resultado das imagens em blend mode desenvolvidas por Paulo Costa para a performance “Preto no Branco”.Fonte: Disponíveis em: http://www.navax.net.br/advanced/index.html#vmbw.html. Acesso em: 04/03/2013.
81
Fig. 73, 74 e 75. Resultado das imagens em blend mode desenvolvidas por Paulo Costa para a performance “Preto no Branco”.Fonte: Disponíveis em: http://www.navax.net.br/advanced/index.html#vmbw.html. Acesso em: 04/03/2013.
82
PerlinDraw
Trabalho realizado com experimentação de códigos que utilizam funções
aleatórias que podem trazer resultados “inesperados” do ponto de vista estético. Foi
usada uma aplicação que utiliza o algoritmo criado por Ken Perlin39 para gerar fluxos
de partículas a partir da trama de pixels que compõem uma determinada imagem
bitmap. Segundo Costa, o interessante dessa abordagem é a impossibilidade de pré-
visualização de um resultado, o que o obrigou a programar uma interface de controle
de parâmetros para o gerenciamento do resultado gráfico final.
Os parâmetros definidos por ele no algoritmo inserem flexibilidade ao código,
tanto em termos de manutenção quanto no resultado final. O seu “infinito” vai
depender de quem insere os parâmetros. Neste trabalho foi usada a randomicidade,
mas Costa teve a necessidade do que ele define como “modular as condições dessa
modularidade”.
39 Perlin Noise - que já vem pronto no próprio Processing com a funcão noise. Ken Perlin elaborou esse algoritmo a partir de um problema. Ele trabalhou na primeira versão do filme Tron e lá percebeu a “limpeza” e a racionalidade dos gráficos computacionais da época. Isso o levou a produzir um algoritmo que gerasse valores randômicos, não totalmente aleatórios, mas que pudessem seguir uma espécie de equação baseada nas harmonias sonoras. Tudo isso para colocar um “ruído” na imagem, ou torná-la mais realista (assim como na natureza). Hoje, o Perlin Noise é utilizado largamente em muitos softwares de computação gráfica para modelar nuvens, montanhas, fogo, etc., tendo ganhado um Oscar pelas contribuições prestadas à indústria do cinema. (COSTA, 2013)
Fig. 76. PerlinDraw, Trabalho realizado por Paulo Costa.Fonte: Disponível em: http://www.navax.net.br/advanced/index.html#perlindraw.html. Acesso em 04/03/2013.
83
Fig. 77, 78 e 79. PerlinDraw, Variações das imagens e detalhe do trabalho programacional realizado por Paulo Costa.Fonte: Disponíveis em: http://www.navax.net.br/advanced/index.html#perlindraw.html. Acesso em 04/03/2013.
84
3.2 WILTON AZEVEDO
3.2.1 Dados
Além de atuar na docência universitária, Wilton Azevedo40 é artista plástico,
designer gráfico, poeta e músico. Dentre tantas atividades, a análise de seus trabalhos
se concentra naquilo que diz respeito à produção poética dos meios digitais. Realizando
desde 1997 experiências em seu estúdio com softwares de autoria, Azevedo descobre
o potencial visível que havia nestes experimentos para realizar um novo formato do
fazer poético.
A parceria Philadelpho Meneses se deu dois anos depois onde mostra Azevedo
(2009, p.5) : “[...] Philadelpho veio ao meu estúdio e mostrei-lhe então o que eu
estava fazendo com imagens, sons e textos em um software de autoria. [...] Naquele
momento, nascia o Interpoesia. No pequeno estúdio em Pinheiros (SP – Brasil)”.
Surgiu então um produto que, segundo Azevedo (idem), é “um marco na produção
poética hipermidiática no Brasil”, chamado de Poesia Hipermídia Interativa.
Sua produção nesta área é muito extensa. Iremos analisar uma bem significativa
que é a Sequência do Atame: A Angústia do Precário – 2007 – (UnderLab)
3.2.2 Análise do trabalho
Sequência do Atame: A Angústia do Precário – 2007 – (UnderLab)
Através dessa obra, o autor conseguiu ultrapassar os limites físicos do papel,
tal como as possibilidades do código verbal e sua sintaxe através da tecnologia
hipermidiática. Essa prosa digital é definida por Azevedo (2009, p.30) como aquela
“cuja característica está na importância do fazer poético no suporte digital, detectando o
que possibilitou a transição entre: a escrita e sua oralidade, e a imagem potencializada
40 Wilton Azevedo é artista plástico, designer gráfico, poeta e músico. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP e pós-doutor pela Université Paris VIII Laboratoire de Paragraphe 2009 - sob tutoria do Prof. Dr. Phillipe Bootz. Professor Doutor pesquisador do Programa de Pós-graduação strito sensu em Educação, Arte e História da Cultura e colaborador do Programa de Pós graduação em Letras, da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Faz parte do grupo Transitoire Observable e do conselho do E-Poetry, festival de poesia digital (2001-2009), Open Port Chicago Theater Image and sound Performance 2007. Participou da 9ª Bienal Internnacional de Poesie em 2007, Encontro Internacional de Poesia Experimental; Amanda Berenguer; 2008, é do conselho científico da Université Paris VIII Laboratoire de Paragraphe.
85
em sua mutação, e o som como movimento espacializado, tudo contido em um sistema
de escritura digital expandida”.
Atame: A Angústia do Precário concentra em uma única obra vários códigos
comunicacionais, tendo como fio condutor o poema de que destacamos alguns trechos:
Nada me resta!
Nada.
É estranho saber que o único botão que tenho para apertar,
pode contar a história de uma paixão.
Mesmo que com o tempo, esta mesma história vire ficção...
Não tem importância!
Não tem importância alguma!
Nada terá resposta enquanto copiarmos a nós mesmos.
Atarmos a esta memória em pedaços é o que me restou,
Sozinha, neste apartamento de imagens sem eco.
A cama desarrumada,
Os sinais do vício marcados no estofado
A tua voz na secretária eletrônica dizendo que não estamos
O tempo precisou passar para eu acreditar que nunca estava
Dei razão à secretaria eletrônica
Leave your message after the beap!!!
De acordo com a definição encontrada no FILE41 , Atame - A angústia do precário
pretende colocar no ambiente da hipermídia o trânsito intertextual e polifônico de
vozes que compõem uma prosa. É composto de uma internarrativa sonora, imagética
e textual em que a intervenção mudará sempre as situações de seu enunciado – sua
lexia – e os dados informacionais. Azevedo (2009, p.33) nos dá uma clara definição do
que chama de exercício de composição, em que faz surgir uma única formação sígnica
para se expandir, faz com que as diferentes linguagens desapareçam formando uma
41 Festival Internacional de Linguagem Eletrônica. Disponível em: http://www.filefestival.org/site_2007/ pop_trabalho.asp?id_trabalho=1401&acao=visualizar&cd_idioma=1. Acesso em: 06/03/2013
86
espécie de pulsar e quasar da linguagem humana, porque não há aqui uma tecnologia
que media ou inter media, e sim uma tecnologia que insere e intervém, alterando os
signos como processo em sistema de escritura, os dados – datum – como parte de um
sistema, e a articulação dos algoritmos – mathematic models – como poesia.
A programação passa a ser parte integrante desta escritura digital expandida,
em que os três códigos predominantes se integram quando pensamos em um método
para realizá-lo, e se expandem quando começamos a programá-los. O resultado é um
produto que não conta histórias, não nos traz para a sensação do signo admirável,
não há imagens inteiras, ou seja, há um núcleo de signos se expandindo criando
um corpo virtual que existe potencialmente como poética, mas nunca estará pronto,
definido, acabado ou reconhecido (idem, p.34) [...].
A obra possui, por sua própria constituição tecnológica, o caráter gerativo, pois
está baseada em características interpoéticas de escritura expandida.
Com base na tese de Azevedo42 , a análise mostrou que:
- É uma obra na extensão swf (foi feito no programa Adobe flash e Adobe Director
com inserções programacionais);
- Sua interface não é fixa, a todo momento acontecem mudanças imagéticas ao
longo desta obra;
- O poema é praticamente desprovido de palavras escritas;
- Extrapola os limites bidimensionais do papel, não existindo mais código
predominante, a ambiência é som-texto-imagem; não se consegue diferenciar a
predominância de nenhum código;
- Utiliza algoritmo com sintaxes sem ligações com a linguística: atrelada a
software, a escritura é promovida por um programa que tem de ser preconcebido
como escritura para existir, promovendo uma expansão intercódigos;
- Não há necessidade de uma interpretação do receptor, já que, conforme
definição de Dias-Pino (apud AZEVEDO, 2009, p.31), o poema resolve-se por
si mesmo [...] não existe a preocupação de finalidade no sentido do desafio
conclusivo, e sim em ser uma linha que se expande em busca do experimento –
existe apenas a contemplação estética do projeto;
- Linguagem interativa, conforme os estudos das formas de recepção discutidas
42 Cf. AZEVEDO, Wilton. Interpoesia - O Início da escritura expandida.
87
por Norbert Wiener (apud AZEVEDO, 2009, p.62): podemos não só optar, como
também intervir, mudar as relações indiciais que o mundo dos signos nos oferece,
inventando novos destinos para o desenleio das linguagens. Não existe uma arte
para a eternidade, para o infalível, quebrando a cadeia da ambição do eterno.
Através da inserção de um algoritmo, esta obra nunca terá um formato definitivo,
pois há um posicionamento espaço/temporal que volta a ser realizado a cada vez que
tal software é acionado. A obra de Azevedo se associa ao design gerativo por sua
característica de escritura expandida, pois ali se percebe que, através de algoritmo
inserido na estrutura do software (Director), a obra não possui início nem fim, e que
cada um que tem acesso a esta obra pode realizar seu próprio poema, dependendo
de onde se clique, já que existe a liberdade de interação (mudança de sequência,
interrupções, etc.), ocorrendo, segundo Valadares (2011, p. 72), um deslocamento
mais intenso do papel do sujeito/espectador, ao solicitar dele uma atitude participativa,
em lugar da mera contemplação, e com essa atitude o usuário passa a ser um coautor
da obra, sem que ela perca sua originalidade estética.
Fig. 80. Interface da obra Atame: A Angústia do PrecárioFonte: Fornecido pelo autor
89
Fig. 85. Imagem da obra Atame: A Angústia do PrecárioFonte: Fornecido pelo autor
90
3.3. CEDRIC KIEFER
3.3.1 Dados
Este jovem designer alemão, é formado em design pela HfG Karlsruhe e FH
Potsdam. Kiefer leciona design gerativo e Processing na HAWK Hildesheim, FH
Wiesbaden, FH Mainz. É também autor da Revista Weave. Possui em parceria com a
designer Julia Laub o estúdio Onformative em Berlim, onde, entre tantos clientes, se
destacam as empresas Adobe, Allianz, Audi, BASF, Nike entre outras.
.
3.3.2 Análise do Trabalho
O movimento corporal, criando referência para muitas interpretações visuais; a
possibilidade de expansão do movimento quando inserido em um espaço não mais
físico; o corpo que, a partir deste espaço tecnológico, pode assumir todas e nenhuma
forma; constante e inconstante, definido e indefinido, reagindo ao sabor de vibrações
sonoras. Esta espécie de escultura digital animada foi criada por um dos fundadores
do estúdio alemão Onformative, especializado em design gerativo e soluções para
vários tipos de mídia, Cedric Kiefer, juntamente com Daniel Franke.
O projeto denominado Unnamed soundsculpture foi produzido pelos estúdios
Onformative.com e Chopchop.cc em 2012, definido por Kiefer como uma animação
expandida. A ideia básica deste projeto é a criação de uma escultura sonora em
movimento a partir dos dados de movimento gravados de uma pessoa real.
Foram colocados três sensores de movimento Kinect (console game XBOX
360) de forma triangular, registrando os movimentos da dançarina de Berlim, Laura
Keil, interpretando uma peça musical Kreukeltape por Machinefabriek. Através dos
registros das imagens, passou-se à forma digital: convertendo-se as três imagens
captadas em uma única, tridimensional, pela linguagem Processing.
Essas imagens foram processadas em uma única nuvem com mais de 22 mil
pontos em 3D, permitindo um tratamento gráfico praticamente sem limitações de
perspectiva, sincronizadas e exportadas como um grande conjunto de dados através
do sistema de criação de partículas Krakatoa43 , onde foram multiplicadas para serem
carregadas no software 3d Studio Max. Neste software foram criados e renderizados
43 Plug In do Software 3D Studio Max
91
os diversos tipos de superfícies aplicadas às formas corporais da dançarina, entre
eles, areia, água, tinta, etc. Um algoritmo sincronizava os movimentos da dançarina,
juntamente com as formas renderizadas aleatórias e o áudio. A multidimensionalidade
da escultura sonora já estava contida em cada movimento da dançarina.
Esta arte não mais fica presa a um tipo de superfície tangível, uma tela de pintura,
por exemplo. Ela vai além da própria materialidade do objeto, que neste espaço ganha
novas formas, movimentos e sons.
O que antes, na pintura, estava relacionado ao percurso do olhar (tempo
pictórico), registrado pela materialidade pictórica, agora está relacionado a um
tempo que se atualiza via algoritmo. Ele imita os fenômenos naturais em um
processo numérico e devolve imagens em movimento que simulam conceitos
sobre o cóisico. Por meio destas características da imagem de síntese, em
que todo este universo sígnico convive de forma híbrida, os sentidos humanos
passam a criar um novo critério interdisciplinar de percepção e cognição
(AZEVEDO, 2009, p. 48).
O corpo deixa de ter sua característica formal imutável, passando, através da
tecnologia, a ter uma obsolência no que se refere à dependência de uma interpretação
absolutamente racional.
92
Fig. 86. Dançarina Laura Keil em sua performance para a elaboração da obra Unnamed soundsculpture.Fonte: Disponível em: http://www.arch2o.com/untitled-soundsculpture-daniel-franke-cedric-kiefer/. Acesso em 10/03/2013.
Fig. 87. Unnamed soundsculpture. Posição dos sensores de movimento Kinect em relação a dançarina Laura Keil.Fonte: Disponível em: http://www.arch2o.com/untitled-soundsculpture-daniel-franke-cedric-kiefer/. Acesso em 10/03/2013.
93
Fig. 88 e 89. Unnamed soundsculpture.Importação das particulas e para o tratamento gráfico no software 3D Max.Fonte: Disponível em: http://www.arch2o.com/untitled-soundsculpture-daniel-franke-cedric-kiefer/. Acesso em 10/03/2013.
94
Fig. 90. Unnamed soundsculpture. Variações das superfícies aplicadas à dançarina.Fonte: Montagem baseada em vídeo. Disponível em: http://www.arch2o.com/untitled-soundsculpture-daniel-franke-cedric-kiefer/. Acesso em 10/03/2013.
95
Fig. 91, 92 e 93. Unnamed soundsculpture. Detalhes do efeito “areia” gerado pela multiplicação de pontos.Fonte: Disponível em: http://www.arch2o.com/untitled-soundsculpture-daniel-franke-cedric-kiefer/. Acesso em 10/03/2013.
96
Em síntese, tanto as obras de Paulo Costa e Wilton Azevedo, aqui no Brasil,
quanto a de Cédric Kiefer, na Alemanha, conseguem integrar o que Azevedo (2009,
p. 13) define como sistemas matriciais (verbal, visual e sonoro). Antes isolados, esses
sistemas passam, a partir da era do software, a explorar as novas formas do se fazer
perceber como linguagem, características que também podem ser encontradas nas
obras de vários outros artistas que trabalham neste gênero, comprovando que o
processing design segue o que Cabrera (2006, p.186) relaciona entre o processo com
o presente e o resultado com o futuro: “o futuro é o lugar realizado, e o presente é o
espaço em que deve realizar-se. A chegada do que há que esperar faz real no aqui e
agora”.
97
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procurou-se, nesta pesquisa, iniciar-se a reflexão sobre o processing design e
sobre as questões referentes à importância do processo na elaboração de uma obra, tal
como sua mutabilidade. Demonstrou-se que muitos artistas já tinham essa vontade de
realizar uma obra que pudesse ultrapassar os limites da representação bidimensional,
conseguindo resultados satisfatórios no meio analógico em que viviam. Por isso ficou
muito evidente a diferença do design clássico sobre o design processo, já que este
consiste basicamente no resultado da evolução tecnológica que, com sua aplitude de
possibilidades nos vários campos da ciência, naturalmente teve seu reflexo no design.
As imagens que até então eram fixas agora se tornam potenciais, não terminam
em sua própria condição, passando a ser como um próprio reflexo da condição
humana em sua evolução e mudança. Mesmo com a grande revolução dos softwares
gráficos que inegavelmente revolucionaram a forma como os designers criam suas
obras (antes limitadas pela tecnologia disponível), facilitando e ampliando as soluções,
elas ainda continuavam limitadas pela própria estrutura programacional, fechadas a
qualquer tipo de criação intercodicional.
Uma segunda revolução pode estar acontecendo agora com a democratização
da linguagem programacional: o design atrelado à linguagem de programação e, no
caso, como foco deste trabalho, a linguagem Processing. Ela possibilitou aos designers
experimentar a liberdade de criação com softwares de sua própria autoria, propiciando
uma linguagem intercódigo, ou seja, uma mesma obra pode ter áudio, vídeo e gráfico.
O mais fácil exemplo dessa quebra de linguagens é o próprio espaço cibernético.
Dentro da web pode-se compreender com mais facilidade a quebra estética da
contemplação do estático. No mundo da internet nada é estático, tudo está em
constante modificação.
O design processo não surge para substituir o design atualmente propagado, mas
sim como outra maneira de enxergar o design e para demonstrar que não há como
ignorá-lo. Ainda é uma forma de manifestação pouco explorada e pouco difundida,
talvez pelo fato de nossa sociedade não conhecê-la em sua essência. Cabrera (2006)
nos mostra que a aceitação dessa nova condição está sujeita ao que ele chama de
98
imaginário social, tão forte e influente. Os meios ainda constituem um espaço muito
influente na configuração dos significados imaginários que tais quais são operantes e
efetivos na sociedade contemporânea. Os meios são o espaço de produção simbólica
em que se constrói a realidade social em que vivemos. (CABRERA , 2006, p.85).
Este trabalho é um passo inicial em pesquisa sobre o tema, por isso ressaltamos
a importância da continuidade por futuros pesquisadores, já que a tecnologia sempre
está em constante evolução e, com ela, novas manifestações artísticas, dinâmicas
e coletivas, que irão necessitar de um aprofundamento maior e de um mapeamento
mais abrangente. Foi constatado, por exemplo, no levantamento bibliográfico sobre a
linguagem de programação Processing, que não existe nada traduzido para o nosso
idioma, assim como até o fechamento dessa dissertação há escassez de livros sobre
o tema nas tradicionais livrarias paulistanas (virtuais e físicas). Abaixo, está a pesquisa
por títulos com as palavras-chave “processing” e “processing design” nas tradicionais
livrarias virtuais brasileiras.
Fig. 94 e 95. Busca por palavra chave no site da livraria Cultura.Fonte: Disponíveis em: www.livrariacultura.com.br. Acesso em 04/02/2013.
99
Fig. 96 e 97. Busca por palavra chave no site da livraria Saraiva.Fonte: Disponíveis em: www.livrariasaraiva.com.br. Acesso em 04/02/2013.
Fig. 98 e 99. Busca por palavra-chave no departamento livros, site Submarino.Fonte: Disponível em: www.busca.submarino.com.br. Acesso em 04/02/2013.
100
Outro fator importante é o crescente número de adeptos do uso da linguagem
Processing, tal como os diversos trabalhos e as trocas de informação pela internet.
Mas mais importante é a diversidade da formação desses autores, oriundos de vários
estudos das ciências humanas, além de muitas universidades em todo o mundo já
adotarem como disciplina o estudo da linguagem Processing como ferramenta de
design.
Assim como portas foram se abrindo e as percepções e as concepções do
autor sobre o significado amplo do design foram sendo a todo momento reavaliadas
no processo de elaboração desta dissertação – da apresentação do tema ao
desenvolvimento –, espera-se que os profissionais da área, ou mesmo os interessados
em linguagem programacional atrelada ao design, reflitam sobre elas para não caírem
na armadilha de terem concepções equivocadas sobre a realidade tecnológica atual
e sobre suas consequências no design, principalmente no design processo, com
enormes perspectivas de popularização.
Fig. 100. Busca por palavra chave no departamento livros, site Submarino.Fonte: Disponível em: www.busca.submarino.com.br. Acesso em 04/02/2013.
101
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