jornal_o_sul_24

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Nuno M iguel M oura Barreto 24 de M arço de 1987 – 5 de Julho de 2012 Um abraço amig o... ano: 2012 . nr 24 . mês: Julho . director: António Serzedelo . preço: 0,01 € http://jornalosul.hostzi.com 07 . 12 NR 24 Ilustração Dinis Carrilho Espíritos nobres num mundo que os não merece re- sultam na partida prematura de seres humanos que se equivalem às obras maiores. Era assim o “puto Nuno”, uma pessoa genial, que gostava de confrontar e pertur- bar todos aqueles que se cruzavam no seu caminho. Ninguém lhe ficava indiferente, principalmente quando se sentava com a guitarra e derramava o seu reportório de canta-autor. A sua música espelhava, como poucos, as contradições de uma sociedade massificada, este- reotipada, convencionalizada. Mergulhava profunda- mente na suburbanidade – na sua lama, no ames- quinhamento do quotidiano e na irremediável cupidez pequenina que nos afoga. Profeta da crise, falava-nos mais que da Troika e das finanças públicas; narrava sim, desapiedadamente, a crise de valores e da solidariedade, que fazem os Homens, lobos de Homens. Tinha a perfeita noção que um país dos afectos, de dádiva e de partilha, era impossível neste formigueiro dos números, que por mero acaso cor- respondem mesmo a pessoas, coisa essa banida do léxico e da consciên- cia geral. Sabia, como muito poucos, que só as tretas contam neste mundo, que quem não canta de galo, perde-se no jogo da glória. As letras, carrega- das de uma poesia mágica e negra, esculpiam a crueza dos seres huma- nos, revelando o medroso e agressivo macaco primitivo. O “puto Nuno” não foi um músico, nem um arquitecto, nem um artista plástico. Era antes um ser de pleno direito e con- sciência maior, que sabia que a vida nos foi dada de graça e que não faz sentido pagar para a viver. Sabia, como poucos, que Portugal não progride, antes pelo contrário, Portugal Setubaliza-se. Portanto, onde havia tanta gente, não há ninguém – é o cada um por si. As virtudes, como ser afectivo, ser leal, que lhe eram inatas, são tidas neste subúrbio periférico por paler- mices. Todos nós queríamos que colocasse pés na terra, mas ele sabia melhor, tinha os olhos postos nas estrelas. Pois só nos céus pode o ser humano encontrar-se com o que merece, com a sua dignificação. “O ser humano é uma substância alquímica destinada à ourificação” e nós sabemos que tu, “puto Nuno”, és a estrela mais nova da constelação celeste. Prima Folia – Cooperativa Cultural, CRL

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Jornal cultural e de debates

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Nuno M iguel M oura Barreto24 de M arço de 1987 – 5 de Julho de 2012

Um abraço amigo...

ano: 2012 . nr 24 . mês: Julho . director: António Serzedelo . preço: 0,01 €

http://jornalosul.hostzi.com

07.12 NR

24

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Espíritos nobres num mundo que os não merece re-sultam na partida prematura de seres humanos que se equivalem às obras maiores. Era assim o “puto Nuno”, uma pessoa genial, que gostava de confrontar e pertur-bar todos aqueles que se cruzavam no seu caminho.Ninguém lhe ficava indiferente, principalmente quando se sentava com a guitarra e derramava o seu reportório de canta-autor. A sua música espelhava, como poucos, as contradições de uma sociedade massificada, este-reotipada, convencionalizada. Mergulhava profunda-mente na suburbanidade – na sua lama, no ames-quinhamento do quotidiano e na irremediável cupidez pequenina que nos afoga.Profeta da crise, falava-nos mais que da Troika e das finanças públicas; narrava sim, desapiedadamente, a crise de valores e da solidariedade, que fazem os Homens, lobos de Homens.Tinha a perfeita noção que um país dos afectos, de dádiva e de partilha, era impossível neste formigueiro dos números, que por mero acaso cor-respondem mesmo a pessoas, coisa essa banida do léxico e da consciên-cia geral. Sabia, como muito poucos, que só as tretas contam neste mundo, que quem não canta de galo, perde-se no jogo da glória. As letras, carrega-das de uma poesia mágica e negra, esculpiam a crueza dos seres huma-nos, revelando o medroso e agressivo macaco primitivo.O “puto Nuno” não foi um músico, nem um arquitecto, nem um artista plástico. Era antes um ser de pleno direito e con-sciência maior, que sabia que a vida nos foi dada de graça e que não faz sentido pagar para a viver. Sabia, como poucos, que Portugal não progride, antes pelo contrário, Portugal Setubaliza-se. Portanto, onde havia tanta gente,

não há ninguém – é o cada um por si.As virtudes, como ser afectivo, ser leal, que lhe eram inatas, são tidas neste subúrbio periférico por paler-mices. Todos nós queríamos que colocasse pés na terra, mas ele sabia melhor, tinha os olhos postos nas estrelas. Pois só nos céus pode o ser humano encontrar-se com o que

merece, com a sua dignificação. “O ser humano é uma substância

alquímica destinada à ourificação” e nós sabemos que tu, “puto Nuno”,

és a estrela mais nova da constelação celeste.

Prima Folia – Cooperativa Cultural, CRL

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Av. Luísa Todi 239 Setúbal265 536 252 • 961 823 444

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Devido às dificuldades finan-ceiras apresentadas recentemen-te pela Câmara Municipal de Pal-mela, a Comissão de Organização do PINO DO VERÃO lamenta informar que esse espectáculo estival não se realizará em 2012.

Ao longo dos anos, o even-to cíclico PINO DO VERÃO tem sempre contado com o grande envolvimento da comunidade, através da participação de mú-sicos e coralistas das várias socie-dades filarmónicas, da presença de dezenas de actores, cantores e figurantes, e da cooperação de outras instituições regionais: um conjunto alargado de pessoas e instituições a quem profunda-mente agradecemos.

Apesar da colaboração de todos e das soluções técnicas e logísticas que se têm procurado, a realização do PINO DO VERÃO encontra-se ainda condicionada a um investimento financeiro direc-to, sendo que, segundo o acordo pré-estabelecido, esse valor se-ria comportado conjuntamente pela Câmara Municipal de Pal-mela, pelo Teatro O Bando e pelo FIAR – Centro de Artes de Rua. Na impossibilidade do investimen-to financeiro referente à Câmara

Municipal de Palmela, a realização do PINO DO VERÃO encontra-se inviabilizada no presente ano. En-tretanto, os parceiros continuam a procurar novas soluções de fi-nanciamento para o futuro.

Esperamos poder voltar a encontrar-nos com todos vós no Miradouro do Castelo de Palmela em anos vindouros.

Em representação da Comis-são de Organização do PINO DO VERÃO:

Augusto Santos, pela Sociedade Filarmóni-ca União AgrícolaDolores de Matos, pelo FIAR – Centro de Artes de RuaMiguel Jesus, pelo

Teatro O BandoJoão Lança, pela Sociedade Fi-larmónica Palmelense Loureiros

Joaquim Silva, pela Academia Musical União Trabalho de Sa-rilhos GrandesTiago Costa, pela Sociedade Fi-larmónica Humanitária

Os parceiros co-organizado-res do PINO DO VERÃO:Teatro O BandoCâmara Municipal de PalmelaFIAR – Centro de Artes de Rua

O [email protected]

A “Festa do Teatro” é já um mo-mento cultural de relevo na ci-dade de Setúbal, proporcionando ao público autóctone e aos visi-tantes momentos de verdadei-ro divertimento, de enriquecimento e de crescimento intelec-tual, em que o teatro assumirá o papel de dinamizador de redes de difusão, permitin-do a interligação de experiências e a mo-vimentação de espectáculos de carácter profissional. Privilegiando o nacional e não descurando a participação es-trangeira. Desde a música, ao te-atro, curtas metragens, debates, aos espectáculos de sala e de rua, formas artísticas emergentes e de natureza transdisciplinar, a Festa serve de interlocutor entre artis-tas e a comunidade, potenciando hábitos de fruição cultural e apos-tando na formação de públicos e no desenvolvimento da sua capa-

cidade crítica. Um dos objectivos da XIV Festa do Teatro é proporcionar uma pro-gramação eclética e diversificada, potenciando novos públicos.

Nestes tempos, em que o poder das tec-nologias saturam as nossas sociedades com distorções ide-ológicas que repri-mem e exploram, há que enfrentar e ocu-par essas mentiras e

o vazio espiritual que estão no centro do neoliberalismo. «As artes podem renovar os po-deres perceptivos e empáticos das inteligências dos nossos sentidos, possibilitando a (re)sensibilização e auto compreensão necessárias ao cultivo da nova solidariedade reflexiva e da comunidade da qual precisamos para arriscar o novo …» Dan Baron

Teatro Estúdio [email protected]

Cancelamento do PINO DO VERÃO 2012

A Festa Faz-se!

“ (..) encontra-se ainda condicionada a um investimento financeiro directo

“ (..) a Festa serve de interlocutor entre artistas e a comunidade

Festival Internacional de Teatro de Setúbal “XIV FESTA DO TEATRO”

25 de Agosto a 01 de Setembro

AGOSTOdia. 25•19hSalão Nobre> Sessão de AberturaRecital de Poesia e MúsicaManuel Cintra e Bruno Broa •22hEscola Secundária Sebastião da Gama> Cavalo Manco não TrotaACTA / Algarve24hPasso do Olival> (Re)cantos à Festa Momentos de animação e partilha

dia. 26•22hEspaço Fontenova (Rua Dr. Sousa Gomes, 11)> O Cerco de Leninegrado Teatro Estúdio Fontenova

•2722h Passo do Olival> Conversas de Teatro “O Teatro da Governança e a Governança do Teatro”

dia. 28•22hEspaço Fontenova> Um Precipício no Mar – Artistas Unidos•23hEspaço Fontenova> Mostra de Curtas-metragens– Experimentáculo

dia. 29

•22hEscola Secundária Sebastião da Gama> Julieta – Um espectáculo de Mario Gonzalez – Produção de ACT/TEATRO DOS ALOÉS/TELL TO JOY

dia. 30•22hParque do Bonfim> Os Três Capitães – FC Produções Teatrais / Teatro Casa da Comédia•22hPasso do Olival - Fados

dia. 31•22h30Auditório José Afonso> Spanish Blood – Azar Teatro/Valladolid•24hArtKafe Bar> VINHO RASGADO projecto GoG Setembrodia. 01•22hEscola Secundária Sebastião da Gama> 1325 – Peripécia Teatro / Vila Real •24hPasso do Olival> (Re)cantos à Festa Momentos de animação e partilha

Actividade Paralela:Instalação de Vídeo> Mostra fotográfica alusiva ao Festival de 2011 Com fotos de Pedro Soares

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O recente acordão do Tribu-nal Constitucional relativamente aos cortes nos subsídios de Na-tal e de férias dos funcionários públicos e pensionistas do Esta-do, foi um tiro no porta aviões de Passos Coelho.

Mal foi conhecido , vieram logo os comentadores habitu-ais afirmar na lógica habitual de que” o trabalho é quem deve pagar a crise”, que agora a medida tinha se de tornar extensiva tam-bém ao privado,para cumprir a exigência “igualitária”do TC, enquanto outros afir-mavam que não ha-via mais espaço para novos impostos.Que era muito perigoso taxar os privados,pois muitos receavam até vir a ser atingidos com essas medidas.

Então Passos Coelho desa-fiou a oposição a apresentar ideias para se saber onde ir bus-car o dinheiro faltoso.

O Bloco de Esquerda avan-çou com uma cortante : taxar os donos das grandes fortunas.Ai,ai!

Foi ,aliás ,o que Obama pro-meteu, recentemente, fazer nos EUA, se ganhar as eleições pre-sidenciais .

Por outro lado, o PCP na sua lógica de considerar o memo-rando da Troika um “ pacto de agressão ao país” pediu a sua reformulação com extensão dos prazos de pagamento, e baixa de juros , questão com que, Pas-sos Coelho não concorda em absoluto.

Quanto ao PS espera para ver.... ....

E n t r e t a n t o , inesperadamente , surgiu uma decla-ração “ terrível”.

O Presidente do T.C. ,Rui Mou-ra Ramos,um dos juízes que tinha votado contra o acordão , afirmou publicamente, que estava a haver uma manipulação res-tritiva do teor do

acordão, pois o que se queria propôr com ele era que “ se taxasse o capital, e não só já o trabalho”.

Ou seja, finalmente, pôr o capital a pagar também a crise.”

“Os ricos que paguem a crise!”,diria.

O conselheiro explicou ,ex-pressamente, numa entrevista á radio ,que se podia ir àqueles que auferem grandes rendimen-tos do capital , os que vivem

das rendas, dos negócios( imo-biliários/bolsistas), e até sugeriu cortes nas subvenções do Estado aos partidos, suprema heresia ,para um Estado que é Partido-crático.

Faltou -lhe falar da taxação das grandes transacções finan-ceiras internacionais , a muito falada Taxa Tobin.E dos dinhei-ros que vão parar aos paraísos fiscais, que hoje , sabe-se , se

colectados, rendiam 1,5 % ao PIB.Face a esta nova lógica , que

rompe com a neo liberal, Passos Coelho não encontrou outro ar-gumento para rebater a proposta do juíz conselheiro do TC , do que dizer que”entendemos es-tas declarações como de alguém que está de saída,e não como de quem durante todo o tempo não confundiu a presidência do TC , com um espaço de discussão politica”.

Engana- se Passos Coelho. Este é que é o bom caminho,que François Holande também de-fende, moderadamente. Não é o de continuar a tirar os ren-dimentos dos trabalhadores,a desregulação,como se fossem eles os fautores da crise ,come-çada com a derrocada dos ban-cos nos EUA (Leman ´s Brothers), que depois se transmitiu rapi-damente, aos bancos europeus e à Europa,face à insensatez e inoperância dos dirigentes e políticos europeus e nacionais que nada previram , e insisti-ram com o discurso de que a Europa estava imune ao virús americano.

Percebe-se agora quanto erraram!.

António SerzedeloDirector do jornal o Sul

[email protected]

“Mário Soares, um político assume-se” (Círculo de Leitores e Temas e Debates, 2012) é um longo relato onde uma das figu-ras marcantes da nossa vida po-lítica no século XX fala sobre o seu itinerário político, como este se fez acompanhar de ruturas, dúvidas e hesitações ao longo de uma prática que já soma sete décadas. Soares impôs-se como oposicionista, advogado de luta-dores pela liberdade, fundador do PS, um dos ministros de proa no processo da descolonização, líder da contestação em tempo de PREC, primeiro-ministro, presidente da República, deputado europeu e ci-dadão atuante no nosso tempo tão conturbado. É isto que se plasma nas 500 páginas de um ensaio que se pretende avivar o que há nele de político e ideológico e numa linguagem acessível, que é o seu timbre de comunicação.

De há muito sabemos o seu orgulho em ser político e em con-tinuar deslumbrado pela política e diz mesmo que quando lhe colo-cam adjetivos com sentido pejo-

rativo, como político profissional, ele responde que tem muita honra nisso, ele continua estrénuo adepto dessa política que “implica ideias, ideais, fortes convicções, vontade de servir, desinteresse pessoal, pa-triotismo, e coerência nas ideias e opiniões”.

Rememora o seu passado republicano e antifascista, a im-portância da guerra civil de Espanha e da II Guerra Mundial, época em que foi mi-litante comunista, de que modo atravessou o deserto e progressi-vamente foi aderindo aos ideais do socialismo democrá-tico e convictamente se fez anti-colonialista. Exila-se em França, no início dos anos 70. Abrem-se aqui as portas a uma grande con-vivência com figuras proeminen-tes da Internacional Socialista. E conta como, estando em Bona soube do 25 de Abril, na véspera à noite o ministro das Finanças de Willy Brandt dissera-lhe “O Go-

verno alemão tem informações da nossa embaixada em Lisboa, dos nossos serviços secretos, no âmbito da NATO, e informações fidedignas da CIA e dos ingleses. Todos os nossos informadores nos

asseguram que a dita-dura portuguesa está de pedra e cal e para durar. Por isso, vocês, exilados, não devem ter ilusões a esse pro-pósito. É perigoso que as tenham”. A História encarregou-se de o desmentir.

A autobiografia aparece adoçada com notas de caráter pes-

soal, o PREC aparece recheado de histórias mirabolantes. E assim se chega, depois do 25 de Novembro, ao que Soares denomina a norma-lização democrática, este período é esmiuçado e, como noutras épocas, Soares reporta-se a documentação já publicada. Concluída a etapa do primeiro-ministro, segue-se a pre-sidência da República onde, sem margem para dúvidas, criou uma

nova dimensão da função presi-dencial: as Presidências Abertas e a magistratura de influência; a sua popularidade tornou-se indiscutí-vel. Refere o seu relacionamento com Cavaco Silva, que praticamen-te ignora no seu livro.

Terminadas as suas funções de presidente da República, vemo-lo em missões de prestígio como a Comissão Mundial Independente para os Oceanos. Foi professor em Coimbra e deputado no Parlamen-to Europeu. Continuou a escrever, sem pausas. Em 2004, regressou a Lisboa, em qualquer intensão de fazer política. É nisto que aceita ser de novo candidato presidencial, orgulhou-se do serviço prestado quando as circunstâncias lhe eram desfavoráveis.

Mostra-se crítico demolidor de tudo quanto George Bush trouxe nos seus dois mandatos. Perto dos 87 anos escreve: “Sempre estive voltado para o futuro com esperan-ça e otimismo. Agora o futuro, por mais que o queira ver com cores suaves, o sentido do real obriga-me a ver os desafios que ai vêm e não

auguram nada de bom”. Continua a escrever, a perguntar-se. O seu livro é um testemunho porventura diri-gido às mais jovens gerações. Exal-ta a amizade e repete à exaustão que foi sempre idealista, solidário e defensor das chamadas grandes causas. Tirando as suas inimizades figadais (Cunhal e Eanes) atravessa a política com rara tolerância, ani-mal político que não esquece, de vez em quando farpa para verter sangue, como, por exemplo, fala de um seu íntimo colaborador, Rui Mateus, que recorda como empregado de restaurante que ficou ressentido por não ter sido ministro dos Negócios Estrangeiros. Os gigantes da política também têm fraquezas, talvez seja o que ele nos queira transmitir com estes ajustes de contas.

E aqui temos um inventário a acrescentar os anos de prática política que por aí vêm. Com toda esta bonomia e alegria de viver, Soares é fixe.

Beja SantosDocente Universitário

Presidente do Tribunal Constitucional sugere mudança de paradigma

Mário Soares, uma autobiografia

“ Oconselheiro explicou, expressamente, numa entrevista á radio ,que se podia ir àqueles que auferem grandes rendimentos do capital

“ Todos os nossos informadores nos asseguram que a ditadura portuguesa está de pedra e cal e para durar.

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Propriedade e editor: Prima Folia • Cooperativa Cultural, CRL / Morada: Rua Fran Paxeco nº 178, 2900 Setúbal

/ Telefone: 963 683 791 • 969 791 335 / NIF: 508254418 / Director: António Serzedelo / Subdirector: José Luís Neto • Leonardo da Silva / Consul-tores Especiais: Fernando Dacosta •

Raul Tavares / Conselho Editorial: Catarina Marcelino • Carlos Tavares da Silva • Daniela Silva • Hugo Silva • José Manuel Palma • Maria Madalena Fialho • Paulo Cardoso / Director Artístico:

Dinis Carrilho / Consultor Artístico: Leonardo Silva / Morada da Redacção: Rua Fran Pacheco nº 176 1ª 2900-374 Setúbal / Email: [email protected] / Registo ERC: 125830 / Deposito Legal:

305788/10 /Periocidade: Mensal / Tira-gem: 45.000 exemplares / Impressão: Empresa Gráfica Funchalense, SA - Rua Capela Nossa Senhora Conceição, 50 - Moralena 2715-029 - Pêro Pinheiro

O que te vou dizer aqui era o que te diria a seguir ao teu con-certo se tivesse havido ocasião para tal. Mas ainda bem que não houve, pois foi sinal de que ti-veste de te repartir pelas muitas pessoas que estiveram presen-tes na Academia Problemática e Obscura, dentro e fora da porta.

Em primeiro lugar deixa-me dizer-te que fiquei deveras sur-preendido com a garra com que te lanças a cada tema. O modo como te transfiguras é fantástico, e isso envolve e ajuda a prender o público. Quando falas, revelas sorrisos inibidos, alguma insegu-rança e as palavras não te saem de forma fluida, mas quando começas cada tema, agarra-lo decidido e seguro. Isso é muito importante quando se está em palco.

Quando falares antes de cada tema, acho que seria importante referires o seu nome e aquilo que o motivou. Fizeste isso uma ou duas vezes e resultou muito bem. Como a maior parte das pessoas nunca te ouviu cantar, não co-nhece os temas, como acontece quando se tem um disco ou se ouve várias vezes na rádio, essa informação é importante, pois quando se ouve uma canção pela primeira vez não se apanha parte da mensagem, e as suas subtile-zas escapam muitas vezes.

Não contraries o facto de can-tares essencialmente de olhos fechados. É assim que te sentes melhor, e é sinal de que estás a sentir e a entregar-te por in-teiro ao tema.

As letras são qua-se todas agressivas, corrosivas mesmo. A sociedade está carre-gada de injustiças e de filha-da-putices. Fazes muito bem mostrá-las até ao tutano, como uma radiografia. A manei-ra como te entregas torna mais forte a mensagem. Conti-nua a explorar esse tipo de temas e de situações em que a sociedade, infelizmente, é rica, pois há muito para explorar nesses aspetos.

Acho aflitivo haver gajos como o João Pedro Pais, por exemplo, que tem uma grande facilidade em criar melodias e composições agradáveis, mas que em todas as canções fala do mesmo: a gaja que partiu, oh meu amor para aqui, oh meu

amor para acolá, à tua espera, será que virás… Não há pachorra para ouvir tantas canções que não dizem nada, ou dizem sempre

a mesma coisa, o que acaba por ser igual.

Falei dele porque foi o exemplo que primeiro me ocorreu, pois o nosso mercado musical está cheio de tontices dessas, gajos que até são músicos criativos e bons in-térpretes mas que, talvez para darem prioridade ao lado comercial, vendem a alma ao diabo e só fazem lamechices.

N u n o , t u t e n s todo um filão de te-

mas infinitos para desbravar, que são aqueles que a sociedade nos oferece quando andamos pelas ruas, quando ouvimos os outros contarem coisas ou quando as notícias chegam até nós.

À nossa volta há um amonto-ado de lixo humano onde poucos artistas querem pôr as mãos, tal-vez para as não sujarem. Assim o lixo vai continuar a amontoar-se. Tu pegas nele de forma corajosa,

como fez o José Afonso noutros tempos, que afinal não têm tanta diferença destes.

Uma das vertentes que estou a começar a explorar na minha pintura consiste precisamente em observar esse lixo humano e transpor os seus gritos interiores para a tela.

Percebo que sintas algumas dúvidas e que pre-cises dum feedback positivo da parte do público, porque es-tás agora a começar a mostrar-te. Mas, a pouco e pouco, põe isso para segundo plano. Tu tens muita garra naquilo que fa-zes, acreditas e sabes que tens qualidades que vais melhorar muito em breve, por isso deixa de te preo-cupar com a opinião do público.

A opinião deste ou daquele que te são familiares ou te co-nhecem bem é mais importante. De hoje para amanhã poderás deparar com algum público que não aceite tão bem as tuas coisas. Não interessa, passa ao lado. Não podes compor

para um público específico, mas um público que tenha a tua sensibilidade a ti se afei-çoará. Ninguém é unânime. E isso não é problema nenhum. O Bob Dylan fartou-se de levar das boas quando era novo (da tua idade) mas nunca desviou o seu rumo quando as reações do público foram adversas.

C o n f e s s o q u e onde mais me sur-preendeste foi nos temas instrumentais. Não estava à espera de tanta segurança com a guitarra, para mais sendo tu au-todidata. Os temas têm ritmo, força e são agradáveis de seguir. E intercalam muito bem com os outros em que usas a voz. Foram bons,

mesmo muito bons. E com algum improviso à mistura a coisa saiu impecável.

Acho também que doseias muito bem os ritmos, a evolução e o tempo de duração de cada tema. Não são longos nem curtos. Cada um dura o tempo que deve durar e termina no momento em

que deve terminar.Relativamente à breve con-

versa que tivemos a seguir ao teu concerto, quero repetir-te que gostaria de contar contigo na inauguração da minha exposição na Igreja de Jesus, que deve ser no início da segunda ou da ter-ceira semana de Março. Não sei ainda ao certo, quando souber te direi. Vai chamar-se “Sete Cristos na Igreja de Jesus”.

Sabes, tenho o dobro da tua idade, mas em matéria de exposi-ções estou ainda muito no prin-cípio. Só agora começo a expor com alguma regularidade e não estou habituado a fazê-lo em “es-paços nobres”. Também tenho sido um pouco atado, confesso.

Mas, das duas uma, quando inauguro uma exposição, ou não faço nada ou quero que aconteça algo mais do que apenas abrir as portas. Limitar-me às conver-sas da treta e à distribuição de sorrisos para este e para aquele não é comigo. Quando era aluno das Belas-Artes participei numa exposição coletiva com mais quatro colegas e contratámos uma orquestra de câmara para a inauguração. Pagámos dos nossos bolsos (os músicos fo-ram compreensivos e cobraram um valor acessível, diga-se). Foi um momento muito agradável.

Sugiro que interpretes apenas três ou quatro temas. Gostava que houvesse vocais e instrumentais. Tens algumas letras que remetem para alguma espiritualidade, que não é religiosa, como também não é religiosa a espiritualidade que coloco nos meus quadros, mesmo os desta temática.

Provavelmente não será ne-cessária qualquer aparelhagem sonora, pois a igreja tem uma boa acústica, como lhe compete. Isso dará mais encanto à tua interpre-tação, tornando-a mais intimista e mais próxima.

Diz o que te parece. Podere-mos ir lá, experimentar e com-binar as coisas. Já tenho au-torização para a realização da exposição por parte do provedor da Santa Casa da Misericórdia de Setúbal, que gere o espaço. Aliás, foi um assessor dele quem a propôs, depois de ter visto os quadros.

Sabes os meus contactos. Fico à espera.

Abraço(fev. 2010)

A. GalrinhoProfessor

Olá Nuno,

“ As letras são quase todas agressivas, corrosivas mesmo. A sociedade está carregada de injustiças e de filha-da-putices. Fazes muito bem mostrá-las até ao tutano, como uma radiografia.

“ Tu tens muita garra naquilo que fazes, acreditas e sabes que tens qualidades que vais melhorar muito em breve, por isso deixa de te preocupar com a opinião do público.

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Talvez tu falasses vento e eu escutasse água

Trocámos palavras, trocámos risadas e gargalhadas .Trocámos lágrimas, músicas e segredos. Trocámos desalentos e desencantos. E zangas...quando tu me dizias :Não quero saber do lirismo que não é libertação.Não imaginava o mundo que escondias sob as tuas roupas. Talvez tu falasses vento e eu escutasse água.....E por este caminho delineaste o teu percurso, sempre contra a corrente...Fizeste coisas excepcionais, cantaste injustiças, abandonos e solidão. Transformaste, a tua tristeza em arte, em poesia, em música. Teceste a vida , numa manta de retalhos, bordada de versos como quem chora, enleada a dar voz aos que não tinham voz, a cantar as lamúrias dos tristes, a sentir a dor dos que se sentem sós. Talvez Nuno, tu falasses vento....vontade de voar...e eu escutasse água vontade de te aconchegar...E assim te foste aconchegando, cada vez más próximo do abismo e dos silêncios, carregando em ti o peso do desalento e da impotência, de quem viveu em excesso de velocidade, e soçobrou á lentidão da transformação do mundo.Há momentos raros e abissais em que, ao contrário do provérbio, um homem se torna escravo dos seus silêncios, quando poderia ter sido senhor das suas palavras. Sem retorno possível.

Até sempreDa tia Cristina

Até já, Nuno Nas linhas onde me deito,Nos braços do meu tormento,O pouco da vida, no meu jeito,Vivendo no pouco que tento. Nesta amargura desmedida,Nestes passos atormenadosDeixo os meus pedaços de vida,Adormecidos nos meus fados. Deixa-me a vida perdida de amargura,Deixa-me o sonho mais perdido,Já não quero viver na noite escura,Quero deixar a vida que tenho vivido. Leva-me amor na tua mão,Quero o teu beijo, minha sorte,Só para parar o meu coração,Leva-me na mão com beijo de morte. Freud MamedeFadista

Para ti querido. Até.... Hoje somos menos.

Eras sorriso e eras lágrima.Eras alma, ser sem freio.Querias tudo sem querer nada. Talvez um cigarro pelo meio.

Fugiste pela fresta de uma janela pesadaVidros fumados, fechadura trancada. Dobradiça velha, enferrujada, que não abria nem nada.E ali vivias numa casa sem porta, poeirenta, meio torta. Eras sorriso. Eras lágri...ma. Eras alma. Ser sem freio.Mas eras também ausência.E nessa maré que não vaza, nesse mar de ti, faz da janela uma jangada. Segue navegando, aqui e ali, mas descansa de vez em quando.Hoje somos menos. Muito menos.Hoje somos um. Madalena Moreira de SáPrima

Agradecimentos:

À Mozart, onde durante algum tempo frequentou aulas de guitarra.•Bacalhoeiro, em Lisboa, onde deu o seu 1ª concerto. •Prima Folia, sendo a 1ª entidade que o convidou a tocar em Setúbal, tendo-se repetido posteriormente, uma das vezes com Francisco Fanhais e João da Ilha (uma referência do NUNO).•Escola Secundária Sebastião da Gama.•Livraria Culsete, onde se afundava nas historias e banhos culturais do SR Medeiros. •Papelaria/Tabacaria Portela, centro comercial S. Julião. •Teatro Estúdio Fontenova, com par-ticipações e apontamentos musicais •António Galrinho, sempre mestre desde a Escola Sebastião da Gama até sempre.... •Golf Design.•Maria Laurinda e Abílio. •J.P.Leitão. •Aos meus amigos, familiares e vizi-nhos. •Aos amigos do NUNO. • ACM do Montalvão•Atelier Paula Faria

Margarida MouraMãe

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Meu caro Espinosa, bem sei que nasceste e viveste há séculos atrás, numa outra ge-ografia monótona feita de lei-teiras e moinhos com túlipas figurativas. Tudo isso fedia, no entanto, apesar das diferenças, não consigo deixar de pensar que, mesmo que não leias esta missiva, ela não tem menos per-tinência em ser escrita. Quando em ti penso, na realidade é um outro que tenho no meu espí-rito. É que vi “A rapariga com o brinco de pérola”, com soberba fotografia, mas cheiros nausea-bundos que transpunham a tela.

Evoco-te para te dizer que, mesmo que não o tenhas es-crito, a mim me disseste que “as coisas boas, são sempre difíceis”. E esta Europa fede, mesmo que seja a única coisa que mereça a pena manter. É triste, mas quando escreves-te o “tratado da Política”, estes Merkels, Hollandes e Montis não passavam ainda de provetas…não contavas com isto. As vacas açorianas são a maior virtude desta Europa actual.

Cara Cristina, além disso, tive cuidado, onde quer que se me desse ocasião, de remover os prejuízos que poderiam es-

torvar a aceitação das minhas demonstrações, mas como ain-da restam bastantes que, também, ou, me-lhor, principalmente poderiam e podem impedir os Homens de abranger o enca-deamento das coisas tal como o expliquei, fui levado a pensar na conveniência de aqui os citar perante o tribunal da razão.

Meu caro Espinosa, é por essas e por outras que a Fi-losofia vai ser erradicada do ensino oficial. Es-creves, escreves, e ninguém te perce-be. Tive a consultar as listas do eBay e da Amazon e tu, de um ponto de vista comercial, não va-les nada. Tanta pá-gina nos teus livros e aproveitamos uma só c i tação. Estou profundamente de-siludida, pois nunca, nem nesta altura, em que estamos tolhidos pelo medo, pensas em escre-ver para alguém para além de ti mesmo.

Cara Cristina, esta doutrina, além de que torna a alma tran-

quila sob todos os as-pectos, tem ainda a vantagem de nos en-sinar em que consis-te a nossa suprema felicidade ou beati-tude, isto é, apenas o conhecimento, pelo qual somos induzi-dos a realizar apenas

os actos inspirados pelo amor e pela piedade.

Espinosa, das duas, uma. Ou estás a dizer que somos burros, ou que tu és esperto.

Apesar da tua forma intragável de escrita, fazes-me reconhecer que, efectivamente, ou, também por isso, mais ainda talvez, a culpa é nossa e não devemos evocar as nossas múmias em vão. Descansa em paz, nós, teremos a nossa guerra.

C a r a C r i s t i n a , essa alegria não pode ser sólida e sem um conflito interior.

Cristina Pinheiro Gonçalves

Estudante

Temos que gostar de Batman. De respeitá-lo. De compreendê-lo. E, claro, de temê-lo. Ele é o eterno vigilante. Ele é o “cape crusader”. Ele é o “Cavaleiro das Trevas”.

Criado em 1939 por Bob Kane e Bill Finger, Batman é, sem gran-des discussões, uma das persona-gens mais ricas e complexas que alguma vez emergiu dos quadra-dos dos “comics” e das novelas gráficas. Não é por acaso que Neil Gaiman, Alan Moore ou Frank Miller não tiveram grandes dú-vidas perante a oportunidade de assinar aquilo que, naturalmente, se acabariam por tornar algumas das suas mais icónicas histórias. Tal como não é por acaso que, em 2008, tivesse saído a obra “Bat-man and Philosophy: The Dark Knight of the Soul”, uma compi-lação de ensaios filosóficos que procura desvendar um pouco da complexidade moral que rodeia esta mesma personagem.

É sabido: ao contrário de mui-tos dos mais reconhecidos super-heróis, Batman não tem qualquer tipo de poderes sobre-humanos; ele não foi abençoado ou con-

denado a ser aquilo que é: ele, simplesmente, decidiu sê-lo in-dependentemente disso. No fundo, ele é apenas um ser humano como nós, nas suas fraquezas e nas suas virtudes, sem, no entanto, na ver-dade alguma vez o ser. Batman é Bruce Wayne, um multimi-lionário que, ainda em criança, assiste ao violento e gratui-to assassinato de seus pais; um evento que o marcaria profunda-mente, e que o leva-ria a jurar vingança a todos os crimino-sos e dedicar-se à protecção da sua cidade natal de Gotham City, tendo, para o efeito, num acto de puro sacrifício pessoal e da mais absoluta abnegação, treinado o seu corpo e a sua mente a um ponto extremo.

Batman não voa; não é mais rápido que uma bala; nem é verdadeiramente invulnerável a balas. Ele é frágil; ele é hu-mano; e depende em grande medida da sua capacidade de ser mais inteligente e hábil que o seu oponente para o conse-guir vencer. Moralmente, isto coloca-o num plano distinto da dos restantes super-heróis:

coloca-o no plano da moralidade humana, uma moralidade neces-sariamente povoada por espaços cinzentos. Batman não é estra-nho à violência. No entanto, e apesar disso, ele é alguém que se

recusa determinan-temente a matar os seus inimigos – um facto notório perante o Joker, o seu mais louco, imprevisível e homicida arqui-inimigo. Mas pensa nisso. E pensa muito.

C o m p a r a t i v a -mente a este, o Su-per-Homem é um

ser humano moralmente muito mais perfeito, na medida em que não vive envolvido nesse tipo de dúvidas (e não deixa de ser irónico que o suposto representante má-ximo da moralidade humana seja ele mesmo um alienígena). Para o Super-Homem, matar está fora de questão porque simplesmente isso não se lhe apresenta como uma questão. Para Batman, no entanto, esta não é uma situação tão linear, já que, para este, ma-tar, é, acima de tudo, um ponto de não retorno que arrasta conse-quências inaceitáveis para a sua própria pessoa. Como o próprio chega a afirmar algures, matar

seria simplesmente “demasia-do fácil”; e esta seria uma linha que, depois de cruzada, o tornaria fundamentalmente indistinguível de todos aqueles que ele jurara combater.

O universo de Batman é negro, soturno, vagamente decadente e particularmente gótico. Um am-biente que Tim Burton acabaria por capturar na perfeição nos dois filmes em que adaptaria a perso-nagem ao grande ecrã: “Batman” (1989) e “Batman Re-turns” (1992), com um sempre excedível e muito subvaloriza-do Michael Keaton no papel principal. Esteticamente falan-do, estas foram, sem dúvida, as melhores adaptações até à data.

D e p o i s , c l a r o , tudo mudou. Joel S c h u m a c h e r ( d e quem, aliás, aprecio uma mão cheia de filmes) tomou o leme da franquia e ofereceu-nos as calamidades que foram “Bat-man Forever” (1995) e “Batman & Robin” (1997). Michael Keaton, inteligentemente, não quis nada com o assunto. Um assunto que, diga-se de passagem, ganharia uma temática claramente (e

abstrusamente) homoerótica (os fatos, meu Deus, os fatos…), e sem qualquer pingo ou sombra de substância.

E que dizer? Que felizmente Cristopher Nolan não entrou nes-sa espiral insana e vazia. Nolan relançou a saga no cinema com “Batman Begins” (2005) e “The Dark Knight” (2008). E são estas sem dúvida as adaptações mais profundas e exploratórias dos aspectos e dilemas morais que

atravessam a perso-nagem. O seu Batman é sombrio, emocio-nalmente investido e intelectualmente consciente das con-sequências das suas acções. É um que se fundamenta na ques-tão dos limites morais de um ser humano como nós quando se vê confrontado com

o pior de humano que existe em nós.

“The Dark Knight Rises”, o ca-pítulo final desta saga tem estreia marcada para 2 de Agosto. É já daqui a uns dias. Pessoalmente, estou expectante. E você, não?

Tiago Apolinário [email protected]

Carta a Espinosa:

A Obsessão e o seu DiaBatman:

"O Cavaleiro das Trevas"

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“ (...) Batman não voa; não é mais rápido que uma bala; nem é verdadeiramente invulnerável a balas.

“ (...) mesmo que não leias esta missiva, ela não tem menos pertinência em ser escrita.

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“ (...) O universo de Batman é negro, soturno, vagamente decadente e particularmente gótico.

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“Dois caminhos divergiam num bosque e Eu … Eu escolhi o menos percorrido, e isso fez Toda a dife-rença…” Robert Frost

Embora muitos defendam que a competição faz parte do homem, outros discordam com os níveis pa-tológicos que já atingi-mos. De fato, um dos fatores que mais con-tribui para os elevados números de transtor-nos de ansiedade e hostilidade atuais, é o stress crescente e contínuo induzido pela competição agressiva que se implantou em todas as esferas, desde a nível organizacional, académico, material e até da própria imagem individual. Hoje tudo é Competir, em tudo temos de ser os melhores e os vencedores, sendo vitoriosos não apenas uma vez mas sempre, porque ficar em segundo lugar é ser inferior, é perder, é ter vergonha.

Estaremos nós a escolher sis-tematicamente “o caminho mais percorrido”: de uma sociedade ca-pitalista darwiniana que gera mais perdedores que vencedores, mais

desistentes que sobreviventes, mais frustrados que motivados? de uma sociedade que formata e pressio-na as crianças desde tenra idade para cumprir com as flutuantes exigências ditadas pelos mercados de trabalho? de uma sociedade que caminha assustadoramente para os

modelos nipónicos em que as taxas de suicídio culminam quando os estudantes chumbam nos exames de admis-são à universidade para a qual foram moldados desde crianças? de uma sociedade em que o su-cesso pessoal é priori-tário não interessando se para isso temos de

ser hostis para com os nossos pares?Seria (ainda) possível optar

pelo “outro caminho menos per-corrido”: contribuirmos para que as crianças atinjam a excelência na sua competência específica e ina-ta que foi guiada e potenciada por um sistema de educação adaptado às suas necessidades individuais? contribuirmos para criar crianças equilibradas com uma autoestima estável capaz de apoiar as suas de-cisões futuras? contribuirmos para

o crescimento de seres humanos com valores sólidos e éticos que permitam fundar uma sociedade inovadora e justa? contribuirmos para estimular relações interpesso-ais saudáveis e criativas baseadas na colaboração? será possível que os educadores e os professores tra-balhem em conjunto para reduzir a hostilidade gerada pela competição agressiva vivida a nível escolar? será possível explicarmos às crianças que existe a competição - como se explicam outros fatos da vida - para assim estarem preparados, mas que esta pode ser destrutiva e não é es-sencial à sobrevivência?

Não é por acaso que certos es-tudos de psicologia social e edu-cacional (David Johnson, Teresa Amabile) concluíram que quanto mais complexo é um tema, mais fácil será a sua aprendizagem caso o modelo adotado entre alunos seja o da colaboração em detrimento da competição. Tudo indica que quando a concentração se des-via para vencer em vez de criar, a performance baixa. Assim, inúme-ros investigadores opinam que o nosso verdadeiro Progresso, tanto social como económico, depende de uma mudança de paradigma,

Competição versus ColaboraçãoPUBLICIDADE

de Competição para Colaboração, em que cada criança tenha as suas oportunidades conforme as suas competências inatas.

As seguintes citações sintetizam de forma simples algumas das ques-tões abordadas:

“As crianças desenvolvem-se apesar da competição e não por causa dela.” A. Kohn

“A competição é para a auto-estima o que o açúcar é para os dentes.” A. Kohn

“A competição deforma a personalidade em vez de formá-

la.” S. Pinela

Sofia [email protected]

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Como o apoio do jornal Cultural e de Debates

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dia. 20Marcão • MPB

Agosto

dias. 2•16•23Johnny and the Reptiles

dia. 25Groveland

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“ (..) Estaremos nós a escolher sistematicamente “o caminho mais percorrido”: de uma sociedade capitalista darwiniana

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