jornal lince maio 2015

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ÀBÓRISÁ MOJUBÁ (RESPEITO A QUEM CULTUA O ORIXÁ) PORQUE O RAP SE TORNOU O FOCO DO MOVIMENTO NEGRO | PÁGINAS 3 A 6 O NEOLIBERALISMO DA PEC QUE APOIA A TERCEIRIZAÇÃO | PÁGINAS 14 E 15 MULHER & CERVEJA: TAÍ A VERÃO QUE NÃO NOS DEIXA MENTIR | PÁGINAS 20 A 22 PEDRO MUNHOZ LINCE JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA Nº 64 | Maio de 2015 DANIEL OLIVER

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Publicação do curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva

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Page 1: Jornal lince maio 2015

Àbórisá mojubá(respeito a quem cultua o orixá)

porque o rap se

tornou o foco do

movimento negro

| páginas 3 a 6

o neoliberalismo

da pec que apoia

a terceirização

| páginas 14 e 15

mulher & cerveja:

taí a verão que não

nos deixa mentir

| páginas 20 a 22

Pedro Munhoz

LINCE Jornal

laboratório

do Curso de

Jornalismo

do Centro

universitário

newton paiva

Nº 64 | Maio de 2015

da

nie

l o

liv

er

Page 2: Jornal lince maio 2015

2 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Dezembro de 2014

Cor res pon dên Cia

NP4 - Rua Ca tumbi, 546

Bairro Cai çara - Belo Horizonte - MG

CEP 31230-600

Contato: (31) 3516.2734

[email protected]

Este é um jor nal-la bo ra tó rio da

dis ci plina la bo ra tó rio de jorna lismo ii.

o jor nal não se res pon sa bi liza pela

emis são de con cei tos emi ti dos em ar ti-

gos as si na dos e per mite a re pro du ção

to tal ou par cial das ma té rias, desde

que ci ta das a fonte e o au tor.

SugEStõES DE pautaS?participE Do jornal lincE.

uma publicação feita pelos alunos do curso de jornalismo do centro universitário newton.

E-Mail: [email protected]

ExpedienteOpiniãO

LINCEJornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton

A edição 64 do Lince chega com

boas reportagens investigativas. Uma

delas avalia a liberdade de religião em

BH, que é prevista por lei, mas sua

infração está, não só na boca do povo,

como no olhar e no ato de julgar. Isso

porque os seguidores de doutrinas

afrodescendentes reclamam (com

razão) que convivem com o precon-

ceito de adeptos de outras crenças. E

o Lince, como não poderia deixar de

ser, foi às ruas para acompanhar uma

manifestação contra o ódio religioso.

Ainda na questão do precon-

ceito, buscamos entender o incô-

modo que mulheres enfrentam por

beber, cada vez mais, socialmente. E

afinal, por que a maioria das publici-

dades de cervejarias são voltadas para

o público masculino?

Aqui, você também lê a reporta-

gem especial sobre a trajetória do rap

nacional, e sua grande influência a

favor do Movimento Negro. Um cen-

tro educacional do aglomerado da

Serra é movido pelo hip hop, e atua

na ocupação de jovens de periferia.

Vale a pena conferir ainda a entre-

vista com Zeca Perdigão, o mito

mineiro da moda. E fomos entender

um pouco mais sobre o esporte que

vem crescendo em BH e atraindo

novos praticantes: o Crossfit. No

papel, uma ótima forma de eliminar

calorias, mas, e na prática? Analise os

prós e contras.

Recomendo que reservem um

tempinho para ler todas as matérias e

possam curtir, assim como eu, mais

uma bela obra da Central de Produção

Jornalística da Newton Paiva. Bom

aprendizado!

presidente do Grupo spliCe

Antônio Roberto Beldi

reitor

João Paulo Beldi

ViCe-reitora

Juliana Salvador Ferreira de Mello

Coordenadora dos

Cursos de CoMuniCaÇÃo

Juliana Lopes Dias

Coordenador da

Central de

produÇÃo JornalistiCa - CpJ

Pro fes sor Eus tá quio Trin dade Netto

(DRT/MG 02146)

pro Jeto Grá fiCo e

direÇÃo de arte

Helô Costa

(Registro Profissional 127/MG)

Monitores

Fernando Oliveira e Roger Leon

reportaGens

Alu nos do Curso de Jornalismo

do Centro Universitário New ton Paiva

diaGraMaÇÃo

Kênia Cristina e Márcio Júnio

Estagiários do Curso de Jornalismo

ar

Qu

ivo

Pes

so

al

Fernando oliveira

5º Período

O prazEr Em sEr

rEpórtEr

Page 3: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 3

Fernando oliveira

5º Período

A manifestação artística de brincar

com as palavras surgiu na Jamaica, na

década de 1960, mas foi impulsionada

quando chegou aos guetos de Nova York,

no início dos anos de 1980, onde a repres-

são racista ainda indignava os moradores

dos bairros pobres. Eram jovens revolu-

cionários que se baseavam em ideias

liberais influenciadas pela busca por

Justiça, fortemente pregadas por ícones

afrodescendentes — de Martin Luther

King e Malcom X a Nelson Mandela. Foi

criada assim, uma forma de disseminar a

luta contra o sofrimento do negro ainda

enraizada no racismo, representada pelo

acrograma R-A-P: Rhythm and Poetry.

O estilo de vida motivado pela sinto-

nia contagiante entre ritmo e poesia foi

inicialmente fragmentado em quatro

elementos. O primeiro é o DJ, responsá-

vel pela produção do arranjo sonoro, as

batidas que transformam o ambiente. O

segundo é o MC, que é quem compõe a

revolta em forma de poesia. Outro com-

ponente é o ‘break’, quando, por meio da

dança, a manifestação corporal reflete o

envolvimento da periferia com o ritmo.

E por fim, o grafite, que dá vida às pare-

des cinzentas, e constitui a expressão do

Hip Hop em imagens.

Apesar de existirem comunidades

carentes em todas as partes do mundo,

um dos países que aderiram ao movi-

mento norte-americano com bastante

disciplina foi o Brasil. Uma nação aba-

lada pela desigualdade social e pela forte

interferência do Estado como empeci-

lho para o desenvolvimento da classe C.

O brasileiro, antes envolvido pelo ritmo

do funk, que dominava os bailes de peri-

feria dos anos de 1970, e pelas tradicio-

nais confraternizações proporcionadas

pelo samba, encontrou no rap uma

forma de proclamar sua indignação. O

Hip Hop foi abraçado como um movi-

mento que dá voz aos excluídos pela

sociedade, e ganhou força em todo o

país, principalmente em São Paulo.

Diversos grupos foram se desta-

cando no mercado musical, e as rádios,

percebendo a nova tendência, sempre

destinavam espaço em seus programas

para o Hip Hop. O fenômeno do rap

nacional tomou consistência ao longo da

década de 1990. No entanto, o esforço

dos rappers em gravar suas músicas —

mesmo sofrendo com a censura ou com a

inviabilização de recursos — a princípio,

não traria retorno financeiro adequado,

se comparado a outros estilos musicais.

O que empolgava era o sucesso na missão

de espalhar a informação. Ficar rico com

o rap era inimaginável.

rEvOLuçãO através

das paLavras“Se liga, Juca! Favela pede paz, lazer, cultura e inteligência. Não, muvuca” - Sabotage

cena urbana

daniel oliver

Page 4: Jornal lince maio 2015

4 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

O “Lá na Favelinha” é um coletivo de

BH que tem o rap como princípio ativo, e

oferece a jovens do Aglomerado da Serra

a oportunidade de descobrir seus talen-

tos artísticos. O programa conta com ofi-

cinas de leitura, poesia, dança de rua, e

agora possui aula de inglês, aos sábados.

Mano-betto é um dos coordenadores do

projeto e afirma que falta informação ao

povo da periferia, fato que faz o rap se

tornar o principal instrumento a favor do

Movimento Negro.

— Aqui na comunidade, as pessoas

não têm acesso à cultura. Os principais

meios de comunicação acabam fazendo

com que os próprios moradores de perife-

ria desconheçam a cultura negra — ana-

lisa Mano-betto.

Ele aprofunda na questão ao reiterar

que “uma mulher negra quer alisar o

cabelo porque ela tem vergonha de ter o

cabelo duro; o menino está com vergonha

de sair de casa porque acha feio ter beiço e

nariz grande”.

— Só que aí vem o rap e os ensina a se

aceitarem do jeito que são, a reconhecer

as origens e saber como usar o talento

para fazer a diferença.

Mano-betto descobriu seu talento para

compor no “Lá na Favelinha”, se tornou

MC, e já está gravando um clip para alavan-

car seu trabalho como músico. Hoje, parti-

cipa de saraus, dá palestras, é oficineiro e

sempre está presente nas rodas de conver-

sas do projeto. Segundo Mano-betto, as

crianças que entram no programa com a

intenção de se tornar MC, acabam sendo

incentivadas a desenvolver a leitura.

— Quem quer fazer rap tem que falar

bem, e para falar bem, você tem que prati-

car a leitura — ensina.

“Então”, continua Mano-betto, “isso

força os meninos a buscarem informação.

E o intuito do Hip Hop é justamente esse:

trazer as crianças para um diálogo”

Em certo momento, ficou perceptí-

vel que o rap age diretamente no resgate

dos jovens de periferia que, só enxergam

o mercado de substâncias ilícitas como a

única saída para o sucesso. Sem estudo,

sem apoio, sem trabalho e muitas vezes

sem a referência da figura paterna, mas

que precisam se manter. A estudante de

Serviço Social e militante do Movi-

mento Negro, Júnia Morais, acusa o

poder público por não se manifestar

como deveria. Ela relata que o ingresso

de jovens de periferia na criminalidade

é responsabilidade do governo. Desta

forma, cabe aos MC’s o papel funda-

mental de prevenir o futuro desses garo-

tos que crescem nas favelas.

— Os rappers vivenciam situações

parecidas e tentam, através da música,

alertar esses jovens que nem sempre o

caminho mais fácil para se conseguir o

que se quer seria a melhor opção.

Segundo Júnia, o rap pode mudar

essa realidade. “Pode ser o preenchi-

mento desta lacuna que está vazia, por-

que, quando em contato com o rap, os

jovens se identificam, se reconhecem e

se apropriam do seu espaço”.

— O rap nacional é, em suma, de

cunho político-interventivo.

O estigma de “música de preto“ ou

“isso é coisa pra bandido ouvir”, reforçou

a marginalização do estilo. Até porque,

agradar a elite nunca foi sua intenção.

Muito pelo contrário, o rap era executado

para despertar o discernimento das pes-

soas em relação à vulnerabilidade socioe-

conômica. Como resultado, a oposição

preconceituosa contribuiu para acen-

tuar ainda mais a divergência entre o

público do Hip Hop e o Estado. “Há um

preconceito racial grave acerca de tais

comentários disseminados pela mídia”,

observa Júnia, lembrando que “o rap faz

denúncias sérias a respeito do genocídio

da juventude negra, violência policial,

precarização da educação pública, saúde

pública, dentre outros”.

Jovens enxergam novos rumos

“Aqui na favela ninguém tem a oportunidade de virar um cantor sertanejo ou um cantor de pop, aqui é o rap que te dá a oportunidade de colocar a cara na mídia e falar a sua verdade — sem hipocrisia — falar aquilo que você vive.” — Mano-betto

Centro Educativo Lá na Favelinha atua no resgate

Page 5: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 5

no final da década de 1990, o ritmo e a

poesia dominavam as frequências radio-

fônicas nos barracos das regiões periféri-

cas. e representando a dificuldade do

negro pobre em sobreviver no Brasil,

rappers brasileiros se tornaram idolatra-

dos. diante da fama, alguns se enriquece-

ram, outros não. exemplo de quem não

teve a oportunidade de ser reconhecido

como deveria foi sabotage.

ele ficou eternizado no cenário

do rap nacional após ser assassinado

em janeiro de 2003 , no auge do

sucesso, vítima do envolvimento com

tráfico de drogas. denominado como

“Maestro do Canão”, levava como

lema de vida a sentença “rap é com-

promisso” e alertava em suas letras

sobre os perigos da relação minu-

ciosa que tinha com o tráfico.

“... os manos que foram ficou na

memória. por aqui, só fizeram guerra

a toda hora. acontecimentos vêm e

revelam: a vida do crime não é pra nin-

guém! nem enquanto houver desvan-

tagem. só ilude um personagem, é

uma viagem. a minha parte não vou

fazer pela metade...”

os racionais MC’s reconheciam o

rap como uma ferramenta de oposição

contra tudo que envolvia a interferên-

cia do estado. o principal grupo de

música negra do Brasil, no auge do

movimento, negava se render às gra-

vadoras ligadas à mídia e, em várias

oportunidades, recusou convites para

se apresentar em tV aberta. na letra

“racistas otários”, se percebe a

denúncia à negligência estatal contra

o pobre negro:

“...50 anos agora se completam da

lei antirracismo na Constituição. infa-

lível na teoria, inútil no dia a dia.

então, que se ferrem eles com sua

demagogia. no meu país, o precon-

ceito é eficaz. te cumprimentam na

frente e te dão um tiro por trás...”.

outro grupo que se destacou por se

radicalizar contra o sistema foi o fac-

ção Central. dentre vários pontos,

conseguia traduzir, de maneira ímpar,

o drama do povo periférico. Bem como

na música “Mulheres negras”, compo-

sição de eduardo com participação de

Yzalú, na qual afirma o quanto essas

mulheres são imperceptíveis nos espa-

ços midiáticos. ao se tratar de ter nas-

cido com a pele escura, lutar pelo femi-

nismo agrega algumas pelejas a mais

em prol da liberdade.

“...não fomos vencidas pela anula-

ção social. sobrevivemos à ausência na

novela, no comercial. o sistema pode

até me transformar em empregada,

mas não pode me fazer raciocinar como

criada. enquanto mulheres convencio-

nais lutam contra o machismo, as

n e g r a s d u e l a m p a r a v e n c e r o

machismo, o preconceito, o racismo.

lutam para reverter o processo de ani-

quilação que encarcera afrodescen-

dentes em cubículos na prisão...”

O impacto do rap no Brasil

o rapper Mano Brown na apresentação especial

de 25 anos dos racionais MC’s, em BH

Fernando oliveira

Page 6: Jornal lince maio 2015

Outras camadas da sociedade

foram aceitando o movimento, e nos

anos 2000, se tornou comum ver

jovens brancos, de classe média alta,

moradores de bairro nobre, dirigindo

carro rebaixado com o som no último

volume tocando “Negro Drama”, dos

Racionais MC’s. Neste momento, até

os disseminadores do rap no Brasil

reconheceram que o movimento podia

ser abraçado por todos que lutam por

igualdade. E o Hip Hop engajado,

mesmo sendo um movimento de

minorias, explodiu em rede nacional.

O produtor musical e professor

de História, Jairo Mendes Versiani,

41, ressalta que, como qualquer

estilo, o rap acompanhou a transição

de gerações, e hoje se encontra disse-

minado em diversas camadas sociais.

Inclusive nas que não é direcionado.

— A globalização fez com que sur-

gissem novas pessoas interessadas em

movimentos de rua. No entanto, isso

não significa, necessariamente, que o

rap teve uma ascensão, mas demostra

que ele passa por uma nova fase. Hoje o

rap se tornou um estilo musical como

qualquer outro. Possui várias espécies,

ainda adota a resistência como princi-

pal mecanismo, mas que abre espaço

para outras opiniões.

Além dos grupos que faziam letras

compactuáveis com a cultura original

do manifesto, surgiram os que repre-

sentam em suas letras a realidade de

outras classes sociais. O que gerou o

questionamento em relação a mudança

de foco do movimento, que estaria per-

dendo sua essência.

— Essa nova safra do rap não sofre

tanto quanto antiga, mas também tem

o direito de se manifestar. Alguns falam

de álcool, drogas e mulheres; temos o

rap da ostentação; outros falam de

amor e fazem o ‘rap romântico’. Foram

vertentes que, querendo ou não, se

integraram e formaram a cena atual do

hip hop no Brasil — teoriza Versiani.

Em Belo Horizonte é comum encon-

trar grupos que incentivam os movimen-

tos artísticos de rua. Batalha da Pista, a

Rapa do Papa, a Batalha do Santê e a

Batalha da Estação são exemplos de ocu-

pação na cidade. Os Duelos de MC’s sem-

pre revelam novos talentos e também

atuam como estímulo para que os jovens

deem sua contribuição para o rap. Um

deles é João Paiva, rapper mineiro que vai

representar o Brasil em uma competição

de poesia na França, em junho. Em 2014,

ele foi campeão do SLAM-BR (o nome é

uma referência aos torneios de esportes

como o tênis — Grand Slam), competição

em que poetas campeões dos SLAM’s de

BH, São Paulo e Rio de Janeiro interpre-

tam composições autorais. João conquis-

tou a vaga para o SLAM mundial, que é

realizado uma vez por ano, em Paris, e

recebe representantes de 24 países.

“Esse momento que a cultura de rua

de BH está vivendo está muito bonito”,

acredita João, observando que “não só por

este patamar que atingimos, num nível

mundial, mas também por que a partir

desses movimentos, a gente percebe que

cada vez mais pessoas têm tomado consci-

ência de que a cidade é nossa, é do povo”.

— E nossa função é tomá-la para nós.

Temos que abraçá-la, ocupá-la e, quando

falo ocupar, é ocupar a rua mesmo, o pas-

seio, as praças, os viadutos, tudo. É literal-

mente tudo nosso!

Tendo o rap como principal artifício

para atrair jovens para mobilizações de

arte, João Paiva destaca a importância des-

sas atividades de rua como forma de cons-

cientização. Ele afirma que as ocupações

artísticas mostram para as pessoas que elas

não precisam esperar que o governo faça

algo de bom por elas — “elas podem fazer

por si mesmas e garantir que tudo seja do

nosso jeito e não do deles”, completa.

Certo é que, se o Estado não dá o

devido incentivo à periferia, as pessoas de

lá tomam a iniciativa e enfrentam a reali-

dade do seu jeito. Mostram para o mundo

que ali onde cresceram também existe

gente capaz de executar belas obras. O rap

é apenas uma delas. Afinal, a flor de lótus

nasce no pântano.

Nova realidade do rap

Das ruas de BH

para o mundoarQuivo “lá na Favelinha”

6 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

Page 7: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 7

sE fICar, O CarrO pEga;sE COrrEr, pEga tambémSemáforos de BH causam problemas. A disputa entre motoristas e pedestres mais se parece com um verdadeiro ringue

YCaro rodarte e elias Costa

3º Período

Cada vez mais, o cidadão que vive nas

grandes cidades brasileiras se sente como

um “estranho no ninho”. As cidades, dia

após dia, se mostram como um espaço pla-

nejado apenas para os automóveis. E cada

vez menos para os humanos. Em alguns

casos, o simples ato de atravessar uma rua

se torna um problema tão grande, que

ganha contornos quase surreais. Exemplo

disso é o que acontece na Avenida Carlos

Luz, no bairro Caiçara, região Noroeste de

Belo Horizonte, na altura do número 800.

O local é ponto de travessia de estu-

dantes de dois grandes estabelecimen-

tos de ensino e há um sinal de trânsito

programado com tempo de aproximada-

mente... 13 segundos! Isso tem provo-

cado dores de cabeça nos pais de alunos

do Colégio Franciscano Sagrada Família

e nos estudantes do Centro Universitá-

rio Newton Paiva, que convivem diaria-

mente com o perigo.

QUeBra-Molas

“A empresa responsável pelo trân-

sito não pode fazer a alteração de um só

sinal devido ao sincronismo que existe

entre os demais sinais instalados ao

longo da via”, é o que explica o diretor do

Colégio Sagrada Família, Ilton de Oli-

veira, 48. Ele ainda conta que já foram

entregues três ofícios à BHTrans solici-

tando melhorias no local. Um deles é

justamente o pedido para aumentar a

duração do tempo do semáforo aberto.

Outro problema exposto foi o fato de a

escola receber alunos a partir de dois anos

de idade e também alunos do CEAME

(Centro de Estudos e Atividades para

Melhor Idade), esses com idade entre 80 e

90 anos. Os idosos são obrigados a fazer um

esforço além da capacidade para alcançar

o outro lado da movimentada avenida. Há

dificuldade até nos desembarques em

frente ao prédio da escola por não haver

sinalização, permitindo parada para

embarque e desembarque de pessoas.

Como se não bastasse, alguns moto-

ristas também não respeitam o sinal ama-

relo. Não são poucos os que aceleram

ainda mais para avançar antes que acenda

o sinal vermelho. Para o diretor do colégio,

a saída mais viável, no momento, seria

construir uma elevação (o popular que-

bra-molas) na faixa de pedestres, a fim de

obrigar os motoristas a reduzirem a acele-

ração dos carros. Até agora, nenhuma

providência foi sequer cogitada.

trânsito

daniel oliver

Page 8: Jornal lince maio 2015

8 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

SEM TRANQUILIDADE

A assessoria de comunicação da

BHTRANS informou que a empresa está

avaliando o local para possível implanta-

ção de Traffic Calming, método empre-

gado em alguns países da Europa, como a

Alemanha e Holanda. Nada mais é do que

uma política para a redução da velocidade

dos veículos em áreas edificadas, tendo

em vista a redução do impacto ambiental

produzido por esses automóveis. Prevê

também a criação de ciclovias.

Teoricamente, a inserção do projeto

tende a garantir a tranquilidade para a

população e os demais circulantes. Ape-

sar de nem ter data prevista para o início

das atividades no local, os alunos veem a

promessa como um avanço. Estudante do

curso de secretariado da Newton, Luíza

Vieira, 19, acredita que “diante dos pro-

blemas e reclamações existentes nesse

ponto, sem dúvida alguma a criação vai

oferecer bem-estar e conforto para todos”.

Mas Mauro César Rodrigues, 38, que tra-

balhou de garçom durante 15 anos em um

bar das proximidades, prefere dar uma de

São Tomé. “Tem 15 anos que eles estão

prometendo dar um jeito nisso e até

hoje... Nada”, duvida.

Sobre os acidentes no curso da ave-

nida, os boletins de ocorrência são feitos

no 34º Batalhão de Polícia Militar/1

RPM e direcionados para o Batalhão de

Polícia de Trânsito (BPtran) situado na

Avenida Amazonas no bairro Gameleira,

que faz o monitoramento na região.

Todos os dados com o balanço final de

envolv idos são repassados para o

Estado, com as informações de vítimas

fatais ou não fatais.

O problema não é de hoje e já houve

vários atropelamentos no local. A ave-

nida possui um canteiro central

pequeno, que é insuficiente para a quan-

tidade de pessoas que precisam fazer a

travessia. Amanda Cordeiro da Silva,

23, é recepcionista de uma concessioná-

ria de automóveis próxima ao semáforo

e conta como é difícil chegar do outro

lado sem ter que apressar os passos. “O

tempo é insuficiente, quando você está

no meio da avenida, o sinal do outro lado

da rua já fechou”, conta.

Pior ainda para os alunos de uma

escola infantil localizada no mesmo

quarteirão, que não podem atravessar

sozinhos e são obrigados a aguardar a

vez em cima da pequena calçada cen-

tral. “O canteiro fica cheio de crianças, é

um perigo; as professoras passam

aperto danado para atravessar todas as

crianças em segurança”, afirma

Amanda.

Desde que assumiu a direção da

escola, Ilton de Oliveira afirma não ter

ciência de acidentes envolvendo os alu-

nos. Isso, no entanto, não tranquiliza os

responsáveis pelas crianças. Alina

Mariani de Souza vem buscar a sobri-

nha e conta que os riscos são muitos,

“pois as crianças são imprevisíveis e

qualquer descuido pode se transformar

em uma tragédia”. A recomendação

feita pelos colaboradores do colégio é de

sempre manter a calma e não ter pressa

na hora de atravessar a rua, além de

dividir os estudantes em pequenos gru-

pos para que se tenha o mínimo de segu-

rança possível.

EM AVALIAÇÃO...

Page 9: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 9

Pedro MUnHoz

3º Período

No dia 15 de abril, uma quarta feira

ensolarada, homens, mulheres, idosos e

crianças se paramentaram de branco e

seguiram para a Praça da Liberdade, na

Zona Centro-Sul da capital mineira, para

lutar por um direito que, curiosamente,

já lhes é garantido pela Constituição: o de

exercer livremente sua religião.

A Praça, que já havia sediado, dias

antes, um protesto de natureza política,

parece, no entanto, não guardar a mesma

quantidade de liberdade para todos os

manifestantes que desejam fazer uso

dela. Enquanto na primeira manifesta-

ção, a de natureza política, notou-se a

presença de carros de som, a esta, bem

menor, foi negado pela prefeitura o

direito ao uso de som mecânico. “Acaba-

ram de dizer que não pode usar o som”,

explicou Makota Celinha, presidente do

Centro Nacional de Africanidade e Resis-

tência Afro-Brasileira (CENARAB),

enquanto, ainda sem seus paramentos,

esmerava-se em montar o evento, junto

com cerca de vinte pessoas, a apenas

meia hora do começo estipulado para a

realização.

Makota explicou que, para que o uso

de som fosse permitido, era necessário

que o evento fosse classificado como

manifestação e, ao que parece, aquele

movimento não se qualificava para a pre-

feitura como tal, mas como um “ato”.

A organizadora do protesto (ou ato),

ainda relatou que teve dificuldades para

licenciar o evento que teria lugar na

Praça. A prefeitura havia, segundo

Makota, declarado que “a Praça da Liber-

dade já estava reservada para o uso do

Exército Brasileiro”. Porém, vencida a

questão do exército que, por algum

motivo, desistiu de ocupar a praça, o local

foi, rapidamente, decorado com belas

flores, vasos, tambores e esteiras no chão.

A ideia, segundo a presidente do CENA-

RAB, era “ocupar a Praça com beleza,

para afastar a feiura do preconceito”.

QUeM Fala Mais alto?

O motivo do ato, que enfeitou a

Liberdade de flores e levou até um dos

cartões postais de Belo Horizonte o som

de cânticos e o rufar de tambores, é que,

no caso do Brasil, a voz do preconceito,

muitas vezes, fala mais alto do que a das

leis. Membros de religiões relativamente

pequenas e muito estigmatizadas, os

candomblecistas, umbandistas e segui-

dores das religiões de matriz africana

como um todo, embora tenham sua liber-

dade de culto garantida pelas leis, são

cotidianamente obrigados a conviver

com os olhares enviesados, com a pecha

de satanistas ou de feiticeiros e, até

mesmo, com ataques brutais aos seus

locais de culto por parte de seguidores de

outras crenças.

A reportagem d’O Lince acompa-

nhou o ato promovido em Belo Hori-

zonte, que tinha por objetivo contribuir

para a difusão da cultura do Candomblé e

entregar ao Ministério Público Federal

uma carta que pede a investigação dos

O CaNdOmbLéCONtra O ódIO

Em ato pacífico, praticantes do Candomblé lutam contra o preconceito e pedem por liberdade e respeito. Mas por que?

Religião

Page 10: Jornal lince maio 2015

10 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

“Gladiadores do Altar”, grupo ligado à

seita Igreja Universal do Reino de Deus,

que adota ritualística próxima do milita-

rismo e que, na visão dos membros das

religiões de matriz africana, pode consti-

tuir séria ameaça ao estado laico e à liber-

dade religiosa.

A Igreja Universal do Reino de Deus,

aliás, é vista por boa parte dos entrevista-

dos como uma das principais difusoras

do ódio contra as religiões de matriz afri-

cana no Brasil. Desde que o “bispo” Edir

Macedo, ainda em 1997, publicou o livro

Orixás, Caboclos e Guias, deuses ou

demônios?, em que considerava as enti-

dades cultuadas por Candomblé e

Umbanda como demoníacas, a religião

tem atacado em seus programas televisi-

vos e jornais impressos a religiosidade de

matriz africana incansavelmente, contri-

buindo para reforçar os estigmas negati-

vos que sempre acompanharam os Povos

de Santo no Brasil.

deleGaCia de CostUMes

De fato, segundo Márcio Tata

Kamus’ende, presidente do Afoxé Ban-

darerê e seguidor do Candomblé desde

a infância, a história do preconceito

contra a sua religião é antiga. “Até 1988,

quando mudou a Constituição, nossa

Casa era obrigada a levar livro de atas

na Delegacia de Costumes, do mesmo

jeito que prostíbulos e casas de jogo de

azar”, relembrou.

Toda a história do Brasil parece ser

marcada por uma perseguição sem tré-

guas à religiosidade dos Povos de Santo.

No período colonial, a lei punia com

castigos corporais as pessoas que se

recusassem a seguir a religião católica e

uma parte considerável dos acusados

de feitiçaria pela Inquisição Portu-

guesa no Brasil estava, na verdade,

realizando rituais de origem africana

ou indígena. Durante o Impér io,

quando a religião oficial do Brasil ainda

era o catolicismo, os africanos ou brasi-

leiros escravizados eram, por decreto,

obrigados a seguirem os dogmas da

Igreja Católica.

Quando, finalmente, o país deixou

de ter uma religião oficial, passando a se

considerar como laico, crimes como os

de charlatanismo e curandeirismo conti-

nuaram a ser usados pelas polícias para

discriminar as religiões de matriz afri-

cana. No entanto, a polícia faz vista

grossa para as promessas de exorcismos e

de banhos de descarregos praticados a

torto e a direito pelas neopentecostais.

Agora, depois de garantida pela lei a

liberdade de culto, os praticantes do Can-

domblé passaram a ter que enfrentar os

ataques cada vez mais virulentos de

membros de religiões neopentecostais,

projetos de lei que, na prática, vão limitar

a liberdade religiosa e os fantasmas da

incompreensão quanto às crenças e ritos

inerentes à sua religiosidade.

ESTADO LAICO?Em abril de 2014, após o Ministério Público

Federal entrar com uma ação pedindo a reti-

rada de vídeos da internet, a maior parte deles

ligados à Igreja Universal do Reino de Deus,

em que se desferiam ataques contra a religio-

sidade de matriz africana, o Juiz Eugênio

Rosa, da 17ª Vara Federal do Rio de Janeiro,

proferiu uma sentença, no mínimo, polêmica.

Rosa, para negar que os vídeos atentassem

contra a liberdade religiosa, dando ganho de

causa à IURD, simplesmente declarou que os

cultos afro-brasileiros não podem ser conside-

rados religiões.

O juiz, para sustentar sua afirmativa, ale-

gou que faltariam aos “cultos”, os traços

necessários para uma religião que, segundo o

juiz, seriam “um texto-base (corão, bíblia,

etc.), ausência de estrutura hierárquica e

ausência de um Deus a ser venerado”. A sen-

tença, da qual se retratou o juiz no mês

seguinte, ilustra com bastante pertinência a

preocupação de muitos dos praticantes do

Candomblé entrevistados. Parece haver, no

Brasil, para a maioria deles, um secularismo

pela metade que protege o cristianismo, em

suas diferentes vertentes, mais do que religi-

ões como o Candomblé e a Umbanda.

Fotos daniel oliver

Page 11: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 11

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12 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

O advogado e sacerdote do culto Omo-

lokô, Fernando de Paula Cortese Filho,

entrevistado em seu escritório, externa

essa preocupação: “Se você quiser fazer

um culto, hoje, na Praça Sete, você vai

sofrer perseguição, enquanto os evangéli-

cos chegam lá com a Bíblia, levam o micro-

fone e fazem o culto deles livremente. Essa

é liberdade plena, mas não é plena para a

gente”, afirmou Cortese, como vários

outros entrevistados. O também advogado

Paulo Afonso Moreira reforça a diferença

de tratamento que o estado confere às reli-

giões de matriz africana e às derivadas do

cristianismo: “O Estado quer que exerça-

mos nosso culto, mas não quer que toque-

mos nosso candomblé, não querem que

sacrifiquemos nossos animais... que liber-

dade de culto é essa?”.

A controversa questão do sacrifício de

animais, praticado no Candomblé, que

tem sido alvo de reiteradas tentativas de

proibição tanto por parte de parlamenta-

res ligadas às igrejas neopentecostais

quanto da parte de defensores da causa

animal, também interfere, segundo os

entrevistados, na liberdade religiosa.

Márcio Tata Kamus’ende observa

que, por vezes, as pessoas ficam reclusas

por quinze ou vinte dias no terreiro e que

os animais sacrificados são, todos eles

utilizados para a alimentação. “Se eu

mato um cabrito e alguns frangos pra

essas pessoas poderem comer, sou eu que

sou ruim? A JBS, dona da Friboi, mata

milhares de bois por dia e não é problema.

O peru de natal morre por causa de uma

festa religiosa e não é problema. E o meu

bode, o frango que eu mato para dar de

comer ao pessoal é problema?”, desabafa.

Essa diferença de tratamento atribu-

ído às diferentes religiões, segundo afir-

maram, unanimemente, os entrevista-

dos pode ser atribuída, além de à igno-

rância sobre os preceitos do Candomblé,

também ao racismo. Paulo Moreira

observa que não é apenas o Candomblé

que é alvo de preconceito no Brasil, mas a

música negra, a capoeira, os trajes, os

tambores. “Tudo que se relaciona à ques-

tão do negro no Brasil é uma verdadeira

luta. Matamos não um, mas cinco leões

por dia. É claro que esse preconceito tem

relação com o racismo.”

QUE LIBERDADE É ESSA?

Fernando Cortese, no mesmo sentido, afirma que

nossa sociedade ainda tem imensa dificuldade para

respeitar qualquer manifestação, seja religiosa, cultu-

ral ou acadêmica, que venha do negro: “vivemos em um

país de maioria negra, com grande influência africana

e quase nada se discute a esse respeito nas escolas e nas

faculdades”, observa.

A caracterização do Brasil como estado laico que, signi-

fica, em suma, não adotar religião oficial para que se possa

defender a liberdade de exercício e igualdade de condições

entre todas elas, parece esbarrar, ainda hoje, nas desigual-

dades históricas que forjaram a história do país.

Uma boa solução para o preconceito religioso parece

ser a lapidar observação de Donné Sandra de Vodun Djó:

“Tudo que passa pelo sagrado e que respeite o ser humano

é bom, e a melhor religião do mundo é aquela em que a

pessoa se sente bem nela. Ninguém tem o direito de agre-

dir a religião de ninguém, e quando eu vejo evangélico

agredir outro religioso, eu vejo o Cristo dele sendo crucifi-

cado novamente”. Parece simples, não?

DESIGUALDADES HISTÓRICAS

Page 13: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 13

RELIGIÃO ECOLÓGICA

O Candomblé deriva dos cultos ani-

mistas africanos e se transformou em uma

religião unificada devido ao fato de os

africanos escravizados de diferentes ori-

gens que aqui aportaram terem, constan-

temente, convivido e trocado experiências

entre si. Segundo Flávio de Oxalá, estu-

dioso e adepto do Candomblé, original-

mente, cada cidade ou nação africana

cultuava um orixá diferente. Apenas no

Brasil, com a mistura entre pessoas oriun-

das de diferentes culturas nas senzalas,

reuniu-se, no mesmo panteão, o culto a

diferentes orixás, voduns ou nkisis, pala-

vras diferentes que designam as entidades

responsáveis por forças da natureza, todas

elas cultuadas pela religião.

Flávio faz, ainda, questão de diferenciar

o Candomblé da macumba. A palavra

macumba, segundo o estudioso, pode signifi-

car tanto uma árvore africana, como um

instrumento musical feito da madeira dessa

árvore, não sendo termo apropriado para

designar religião alguma. O termo, no

entanto, tem sido utilizado, de forma pejora-

tiva, para desqualificar tanto o Candomblé

quanto a Umbanda.

“Candomblé é a preservação da vida

em toda a sua plenitude, tanto dos vege-

tais das águas... tudo, tudo, tudo é

sagrado.”, afirma Doné Sandra de

Vodun Djó, uma senhora negra, de cerca

de 70 anos de idade, que desmente,

ainda, a concepção de que o Candomblé

seja, essencialmente, uma religião poli-

teísta: “Deus para nós é um só, mas cul-

tuamos a essência da natureza”. Flávio

de Oxalá, que estava ao lado de Sandra,

completa: “Cada orixá representa um

elemento da natureza. Cultuamos a

água doce, a água salgada, o fogo, o tro-

vão, o ferro, toda a natureza, que é o que

nos mantém vivos. Mas o Deus, o cria-

dor, é um só”.

Ainda segundo Doné Sandra, o sin-

cretismo religioso, manifestado pelo fato

de diversos orixás serem representados,

no Brasil, pelas imagens de santos católi-

cos, não se deve apenas à perseguição

sofrida pelos escravos e pela tentativa de

camuflar sua religiosidade: “Eles joga-

vam os búzios e descobriram que, em

vida, Santo Antônio era regido por Ogum,

que Santa Bárbara era regida por Iansã.

Eles viram que Nossa Senhora era filha

de Oxum e pode-se dizer, também, que o

anjo da guarda de Maria era Oxum. E

assim se fez o sincretismo”.

ENTENDA O CANDOMBLÉ

Extraordinariamente rico, o panteão

do Candomblé contempla mais de 600

orixás. A proximidade da religião com os

fenômenos naturais faz dela, segundo o

advogado e axogun Paulo Afonso Moreira,

70, “uma religião ecológica”. De acordo

com Paulo, inclusive, todo o preconceito

que existe contra a sua religião advém,

justamente, da ignorância a seu respeito.

“Se as pessoas conhecerem o Candomblé

do jeito que ele é, sem distorcer, o precon-

ceito acaba”, sentencia.

O Xikaringoma (cantor ritual do

Candomblé) Márcio Kamus’ende parece

concordar que a principal maneira de

combater o preconceito é por meio da

educação. “No final do ano, todo mundo

de cara cheia, dá três pulinhos na onda lá.

Não sabe porque, mas dá. Joga lá uma

rosinha, sem saber porque, mas joga... é

moda, é bonito, mas tem pouca informa-

ção. Isso tinha que ir para as escolas, para

as universidades, de forma qualificada.”

Márcio alega que só recentemente o Bra-

sil passou a ter, por meio das cotas raciais,

estudiosos negros que conhecessem,

mais de perto, a cultura afro-brasileira,

havendo, ainda, poucos professores capa-

zes de ensinar aos jovens algo sobre o

Candomblé.

De acordo, porém, com Dona

Ivone, 76, católica, que passava pela

praça ao sair do cinema com uma

amiga e se fascinou pelo evento, o ato

que estava em curso, seria, já, uma

abertura para que o preconceito con-

tra o Candomblé começasse a ser

debelado. Segundo ela, aquela era

uma boa oportunidade para as pes-

soas conhecerem a religião e “abrirem

um pouco a cabeça”. Durante a entre-

vista, no entanto, uma jovem que

passava por perto do coreto, olhou

para o evento com cara fechada e fez o

sinal da cruz.

Page 14: Jornal lince maio 2015

14 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

economia

tErCEIrIzar Ou NãO:

EIs a quEstãO? Projeto segue rumo ao Senado para nova discussão, gerando mais conflitos entre a classe trabalhista e empregadores

eUriCo de soUza

3º Período

Uma queda de braço como há muito

não se via. A discussão que envolve o Pro-

jeto de Lei 4330, que praticamente libera

os processos de terceirização no Brasil,

repudiado pelas esquerdas e pela classe

trabalhadora, redesenha, mais uma vez a

nova face da direita, num debate cheio de

marchas e contramarchas. De um lado, os

sindicalistas, que temem o fim dos direitos

trabalhistas, achatamentos de trabalho e

demissões em massa. Do outro, empresas

com discurso de que a terceirização traria

mais competitividade e novas vagas no

mercado. E em meio a isso tudo, muita

gente perdida, sem saber o que representa

o Projeto de Lei.

Terceirização é quando o trabalha-

dor deixa de ter contato direto com o

empregador/tomador de serviços e

passa a servir a prestadora de serviços

que vai ter contato direto com a empresa

responsável, tendo essas três partes. O

principal objetivo do PL 4330 é regula-

mentar esse processo. Na Legislação

atual, não há nenhuma lei direta sobre a

terceirização, sendo administrada pelo

Tribunal Superior do Trabalho, com a

súmula 331, de 2003, que diz que a ter-

ceirização só é possível para as ativida-

des que não correspondem à atividade-

-fim, ou seja, o produto final da empresa.

A principal polêmica da nova pro-

posta envolve exatamente a atividade-

-fim, pois pede que, mesmo nos setores

de objetivo final de uma empresa, seja

possível a terceirização. Na votação pela

Câmara dos Deputados, o destaque fica

por conta da aprovação da emenda que

impede a terceirização nos órgãos públi-

cos. De acordo com a advogada especia-

lista em direito trabalhistas, Amanda

Azeredo, é preciso esperar, para ver

quais mudanças vão realmente aconte-

cer na prática.

— O projeto ainda vai passar pelo

Senado e pode ser que haja emendas,

sem falar que ainda tem que passar pela

Presidente Dilma Rousseff, que poderá

vetar ou aprová-lo.

A existência de uma lei específica

para a terceirização é um ponto defen-

dido pelos simpatizantes do projeto. A

regra, para os simpatizantes, traria mais

estabilidade e segurança jurídica para

trabalhadores e empregadores. No

entanto, a possível aprovação da tercei-

rização traria o risco de redução na

remuneração dos trabalhadores, uma

vez que um estudo realizado pela Cen-

tral única dos Trabalhadores (CUT), em

parceira com o Departamento Intersin-

dical de Estatística e Estudos Socioeco-

nômicos (DIEESE), em 2014, apontou

que o trabalhador terceirizado receberia

cerca de 25% a menos pelo mesmo ser-

viço prestado.

Se a direita tem seus trunfos, os críti-

cos do PL 4330 já pontuam alguns de

seus pontos negativos. A terceirização vai

degradar as relações de trabalho, uma

vez que não existirão problemas de falta

por adoecimento do trabalhador, atrasos

e dificuldades para o cumprimento do

contrato de trabalho. Sem falar no esfa-

celamento da organização sindical e

achatamento salarial. O PL 4330 estabe-

lece que somente quando a terceirização

for entre empresas da mesma categoria

econômica é que seria assegurada a

mesma representação sindical. Isso rara-

mente acontece, uma vez que a empresa

contratada para prestação de serviços é

de outro setor econômico, prejudicando

assim a organização da categoria. Com

isso, os Acordos Coletivos e Convenções

Coletivas estão ameaçadas.

Pontuando ainda, o estímulo à pejo-

tização, o projeto de lei legaliza e amplia

a figura dos PJs, que são empresas de

uma pessoa só. A modalidade de relação

será estimulada porque o ônus ficará

apenas para o trabalhador, que não terá

direito a adoecer, tirar férias, faltar ao

trabalho, ter FGTS. E o INSS terá que

ser incluído no custo de sua empresa,

caso ele queira pagar.

De acordo com o professor Ramon

Peres, mestre em administração de empre-

sas e especialista em planejamento estraté-

gico e gestão de pessoas, “o argumento de

que o PL 4330 irá salvar a economia é balela,

falácia de empresários que visam o aumento

Page 15: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 15

de seus lucros”. Peres divide a ideia que os

lucros gerados pela precarização do traba-

lho não serão investidos em prol da socie-

dade, mas sim em função de aumentar as

riquezas de quem os conseguiu. “A visão do

empresário é de maximizar lucros e acho

que ele não está errado, não, mas é preciso

lembrar que o que as empresas têm de mais

importante são as pessoas, seus funcioná-

rios, que não têm sido valorizados e tratados

com carinho pelas organizações”. Isso se

comprava pelo aumento do número de tra-

balhadores que estão com problemas psico-

lógicos (depressão e estresse) gerados no

trabalho, afirmou o professor.

Na opinião do estudante de ciências

sociais, Tales Augusto, a terceirização

acarreta em grande proporção, a precari-

zação do trabalho e das condições do tra-

balhador. Para ele, a terceirização é

herança do neoliberalismo econômico,

que nos anos 1980, precisava de leis traba-

lhistas flexíveis para controlar a força de

trabalho. Assim, sindicatos enfraquecidos

e a mão de obra fragmentada faziam com

que as reivindicações dos trabalhadores

fossem dificultadas, se tornando muito

complicada a união pela luta por melhores

direitos. “A terceirização só beneficia o

empregador”, finaliza o estudante.

A estudante de jornalismo, Kelly

Cristina Santos, também não concorda

com a aprovação desta lei, pois acredita

que o PL 4330 livra as empresas de mui-

tas responsabilidades que ela deve ter

para com o trabalhador.

— Prejudica muito, e traz como prin-

cipal consequência a instabilidade no

emprego. Com uma lei mais flexível, pode

ser que haja maiores índices de acidente.

O professor Ramon Peres lista algu-

mas das principais consequências. “Pri-

meiro, aumentará a precarização do

trabalho, dos salários e dos direitos dos

trabalhadores; os terceirizados ganham

em média 24% menos e têm jornadas

pelo menos três horas semanais a mais.

Sem falar que não recebem participação

nos lucros e valores ínfimos referentes a

tíquetes refeição e raramente recebem

auxílio-alimentação”.

Aumento dos acidentes, adoecimen-

tos e mortes no trabalho são outro item

forte na pauta dos detratores do PLK

4330, segundo o advogado trabalhista

Maxuel Nascimento da Silva, “pois as as

empresas, na perspectiva de reduzir cus-

tos, vão gastar muito menos em treina-

mentos, formação e equipamentos de

segurança no trabalho, além de aplica-

rem maior intensidade no trabalho, com

jornadas mais longas e extenuantes”.

Segundo Nascimento, as estatísticas

mostram que em cada dez acidentes com

vítimas fatais de trabalho no Brasil, oito

são trabalhadores terceirizados.

Maior rotatividade de pessoal,

queda na arrecadação do Estado com

impostos e encargos sociais, comprome-

tendo aposentadorias, pensões e licen-

ças saúde seriam outros pontos negati-

vos. A advogada Helenice Vieira não

acredita na queda na qualidade dos

produtos ou prestação dos serviços,

mesmo quando questionada sobre o fato

de o trabalhador terceirizado não ter

identificação com a cultura da organiza-

ção, pois não faz parte dela e está ali

somente para desempenhar uma fun-

ção sem perspectivas de promoção.

“Tudo depende de uma boa conversa

entre patrões e empregados”, acredita.

O Projeto, já aprovado na Câmara dos

Deputados, agora segue para o Senado.

Page 16: Jornal lince maio 2015

16 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

“a mOda é OfIO CONdutOr dE tudO”

A roupa mais democrática que existe é o jeans!

Não ter preconceito, isso é feio ou aquilo é bonito. Tudo vale da personalidade

pessoal. Não precisa ter rótulo.

É importante você aprender a

conhecer as pessoas através

da imagem e não julgá-las.

entrevista

Fernando Bezerra e BrUnna alves

3º Período/ 5º Período

Paris, Milão e Nova York são capitais que se tornaram

referências no mundo da moda. Ditam tendências que

influenciam os estilistas brasileiros, mais precisamente em

São Paulo e Rio de Janeiro, onde são realizados os principais

desfiles do país — São Paulo Fashion Week e Rio Fashion

Week. No entanto, o cenário da moda em Minas Gerais

também tem ganhado força. E pode-se atribuir parte dessa

ascensão a Zeca Perdigão, um dos percussores da moda

mineira.

Desde os doze anos de idade, Zeca já brincava de desenhar

roupas para as mulheres que admirava. Seus pais eram donos

da loja de tecidos mais bem conceituada da cidade, a “Casa

Rolla”, que tinha várias outras lojas da marca espalhadas pela

cidade. Com o passar do tempo, foi tomando gosto pela moda,

e, o que começou como brincadeira, se tornou um trabalho

sério e reconhecido. Hoje é um dos produtores de moda mais

importantes do Brasil; participou de todas as sete marcas do

Grupo Mineiro de Moda e produziu mais de duzentos desfiles.

Zeca Perdigão falou à reportagem d’O Lince:

Fotos: Fernando bezerra

Page 17: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 17

linCe - De que forma a personalidade

influencia no estilo pessoal de se vestir?

zeCa - Olha, eu acho que o fundamental

é ter personalidade pra você se destacar. A

moda é um instrumento. Não tem essa histó-

ria de a pessoa estar bem vestida, mal vestida,

ser jeca, ser cafona. Cada um tem sua tribo,

escolhe a melhor maneira de se vestir. Não

tem como dar conselho sobre moda; a moda

é um conjunto de fatores. Envolve o cinema,

a cultura, o teatro, a literatura, a curiosidade

das pessoas. É não ter preconceito, isso é feio

ou aquilo é bonito. Tudo vale da personali-

dade pessoal. Não precisa ter rótulo.

linCe – O importante é se sentir bem...

zeCa – Claro. A pessoa deve se vestir de

maneira que ela se sinta bem. Agora, a moda

é um instrumento pra você conseguir várias

coisas na sua vida, pois nosso primeiro con-

tato, uns com os outros, é visual. Se ela é da

minha tribo ou se eu vou fazer de tudo pra

entrar na tribo dela. É importante você

aprender a conhecer as pessoas através da

imagem e não julgá-las. É aprender com

aquilo. Eu acho o ser humano divertido e a

moda divertida. A personalidade e a moda

são duas coisas que devem andar juntas, não

importa como sejam.

linCe - É possível aliar o conforto ao bom

gosto?

zeCa- Eu acho que sim, porque você

deve estar vestido adequadamente ao

ambiente em que você se encontra. A forma

que você vai arrumar o cabelo, você tem que

estar bem maquiada... Não que eu me

importe com isso. Mas não se deve julgar as

pessoas. “Ah, você é baranga, você não está

bem vestida” ... Não é por ai. Você tem que se

adequar ao momento em que se encontra.

Isso é que é correto.

linCe - E de forma econômica, dá pra

andar na moda?

zeCa: Sim, pois a roupa mais democrá-

tica que existe é o jeans. A Forever por exem-

plo, vende jeans a R$ 39 e tem jeans a R$ 700.

Então, quer dizer, é uma roupa democrática.

Uma chuck branca e uma calça jeans, se ela

for correta, limpinha, bacana, ótimo! Um

chinelo de dedo, uma sandália havaiana...

Eu não consigo imaginar uma pessoa perto

da praia que não esteja de sandália havaiana.

Claro, eu não vou usar pra sair, mas todo

mundo usa. Há, sim, um jeito de andar na

moda de maneira muito econômica. Você

usar uma bermuda, uma calça jeans, chega

ser até um chame.

linCe - Muitos de nossos estudantes

aliaram a moda com o humor pra se vestir.

Você concorda com isso?

zeCa- Adoro! Eu acho que tem que ser

engraçado. Eu adoro gente divertida. Tem

pessoas que eu vejo com uma camiseta ou

uma regata com mensagens bacanas. Eu sou

um palhaço, eu sou uma personagem tam-

bém! Procuro uma personagem todo dia; eu

me canso com minha figura. Eu gosto disso,

de brincar com a moda, de criar uma perso-

nagem, de ser engraçado, leve. Adoro isso,

adoro uma pessoa divertida!

linCe – Você teria algum conselho para

as pessoas que ainda não definiram o estilo

próprio?

zeCa - Eu acho que é assim, gosto todo

mundo tem. Bom gosto é o que poucos têm.

Gosto é indiscutível. Bom gosto, não. Então,

assim, se informando, acabar com os precon-

ceitos. Você pode ser muito bem vestido, com

chinelo de dedo da maneira que você quiser.

Mas tire alguma coisa, seja divertido e bola

pra frente! Porque não tem como sugerir pra

uma pessoa, faça isso ou faça aquilo. E não

precisa comprar roupa cara. É até ridículo

pra uma pessoa estar grifada de cima a baixo,

isso é falta de personalidade. O legal é a mis-

tura de etiqueta cara com uma camisa

barata. São essas misturas que eu acho

bacana, essas tribos misturadas, é isso que é

bacana. Mas gosto de especialmente assim,

de pessoas que se encontram e que são

daquela turma: se são punks são punk’s; se

são hipsters são hipsters, se são universitá-

rios... Eu gosto quando elas se encontram

sem brigarem entre si, que se unam e que

formem a moda. Mas é importantíssimo que

você tenha cultura de moda. Eu tenho uma

estante que só tem revista de moda, de editor

desde os anos oitenta. Hoje tem a internet,

você tem mil acessos, é importante você ver.

Cinema, acompanhar os desfiles, é bom você

estar ligado com isso.

linCe - Normalmente os homens têm

mais resistência.

zeCa – Muito mais resistência. “Ai, eu

não quero ver isso!”. Mas eu acho que isso

deixa um homem mais bacana. Eles ficam

mais sensíveis. Isso faz bem para as pessoas,

e junto com isso cinema, literatura, arte. A

moda envolve tudo isso, é um condutor, é o

fio condutor disso tudo! E isso faz com que as

pessoas se tornem diferentes, mais criativas e

que se deem melhor.

Page 18: Jornal lince maio 2015

18 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

NzambI Ia ImOxI(O dEus é úNICO)

EnSAiO FOTOGRÁFiCO

Fotos daniel oliver

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Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 19

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20 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

comportamento

ONdE CErvEja é COIsa dE muLhEr?Por enquanto, ainda é na publicidade (não é, Verão?), mas elas já estão chegando lá também como consumidoras. Mesmo que ainda enfrentem o preconceito para conquistar esse espaço

daniel silva e BárBara Bernardes

3º Período/ 1° Período

Por muitos anos o envolvimento da

mulher com a cerveja se dava somente na

publicidade. A comercialização da maioria

das bebidas alcóolicas tinha (e, em parte,

ainda tem) como pilar a exposição da

mulher. Uma exposição que acontecia de

maneira tendenciosa e machista — mulher

não entende de cerveja e só serve pra ajudar

a vender. Hoje, tudo faz crer que essa ideolo-

gia começa a se tornar coisa do passado.

Apesar de ainda pequeno, o crescimento no

consumo, por parte das mulheres, já é rele-

vante em relação aos anos anteriores. Esse

novo modelo de atuação promoveu mudan-

ças consideráveis no mercado.

MUlHer, CrianÇa e CaCHorro

Mas, a imagem da mulher ajuda real-

mente a vender cerveja? Segundo o

publicitário e professor Lamounier

Lucas, 41, esse modelo de exposição da

mulher não tem uma resposta exata. Ele

acredita que a exposição feminina já

acontece desde o início da publicidade,

quando as propagandas eram voltadas

para o público masculino.

— Os apelos eróticos eram cada vez

maiores, o que ocasionou o surgimento

das pinups, que eram mulheres desenha-

das ou fotografadas de forma bem sen-

sual, explorando o erotismo para as

campanhas publicitárias.

Vale lembrar que, de acordo com

uma pesquisa, as publicidades obtêm

mais sucesso quando utilizam esses três

modelos em sequência: mulher, criança

e cachorro. No entanto, um novo cami-

nho encontrado pela publicidade é a

utilização do humor.

— Assim como o brasileiro aprecia o

erotismo, ele também gosta de dar risadas.

Uma observação interessante des-

tacada pelo professor é em relação à

publicidade feita pela cervejaria Bavá-

ria, que se contrapõe às demais. A cena

protagonizada por um senhor apre-

ciando a cerveja é interrompida por um

jovem que o questionava sobre a falta de

mulheres no comercial. O velhinho

retruca, afirmando que a qualidade do

produto não dependia do apelo sexual.

Ou seja, não era necessário mostrar

mulheres nuas para vender cerveja.

ClUBe das destiladas

Na contramão das cervejas, os des-

tilados não adotam o mesmo modelo de

publicidade. Mas, para Lamounier, há

uma explicação real, já que este tipo de

estratégia de marketing só faz sentido no

Brasil, devido ao clima tropical do país.

— Aqui, a cerveja é considerada

uma bebida refrescante. É sempre asso-

ciada ao calor, praia e mulher de biquíni.

De fato, o clima parece que interfere e

não só aqui. Em países latinos, de clima tro-

pical e cultura machista, como o México,

por exemplo, cerveja e, principalmente, a

tequila são associadas, em sua publicidade,

a calientes imagens femininas.

Outra explicação está no período do

dia em que os destilados são consumidos,

uma vez que, uma pessoa normalmente

consome esse tipo de drink em locais com

temperaturas mais amenas e agradáveis.

Mas isso não a isenta de usufruir da

sensualidade feminina. Quem não se

lembra da propaganda do vermute Cam-

pari? A mulher que, em uma festa, não

conseguia ser notada, derrama proposi-

talmente uma bebida de cor averme-

lhada em seu vestido branco, se tor-

nando mais provocante e diferente das

demais. O desfecho do comercial se dá

com a moça seduzindo um rapaz.

Outras bebidas, como os uísques,

por exemplo, flertam mais com a tradi-

ção, com o luxo e com ambientes mais

clássicos, mas sempre profundamente

masculinos, reforçando, pelo menos em

parte, o mito de que mulher não gosta de

uísque. “Não conheço nenhuma mulher

que gosta”, observa o empresário Cláu-

dio Prado Jr., 28, que já fez parte de um

“Clube do Uísque”, formado só por

homens. Cláudio, que estudou e fez

intercâmbio nos Estados Unidos, lem-

bra que, lá, uma das bebidas mais famo-

sas, o bourbon Jack Daniels, sempre

teve sua publicidade associada ao blues

e a elementos da cultura do sul dos Esta-

dos Unidos.

Page 21: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 21

em 2000, o Conar (Con-selho nacional de autorre-gulamentação publicitá-ria), por meio do artigo 44 anexo “p” - Cer ve jas e Vinhos — regulamentou para as empresas publicitá-rias a não indução ao con-sumo exagerado ou irres-ponsável; apelo à sensuali-dade em áudio ou vídeo que sugira o consumo.

Mas ainda não é o que se vê nas publicidades que cir-culam nos meios de comuni-cação. taí a Verão que não nos deixa mentir! Vem, Verão!!!

A LEI

Page 22: Jornal lince maio 2015

22 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

O consumo de bebidas por parte

das mulheres era bem menor se com-

parado aos tempos de hoje. A justifica-

tiva talvez esteja no crescimento de

espaços gourmets e cervejarias artesa-

nais no Brasil. “O espaço para as

mulheres foi se ampliando, tanto que

hoje é possível encontrar cartas de cer-

vejas iguais às de vinhos”, afirma

Lamounier. A explicação estaria no

“paladar aguçado das mulheres, que

consegue distinguir de maneira suave

os sabores de uma boa bebida”.

A advogada e funcionária pública

Paula Noce, 35, é produtora e degusta-

dora de cervejas artesanais. Ela acredita

que, “infelizmente”, o espaço cervejeiro é

dividido em duas partes.

— Um lado é da produção em larga

escala, ou seja, das cervejas de maior con-

sumo no Brasil, onde o machismo ainda é

grande. O outro lado é o das produções de

cervejas artesanais, onde a mulher já tem

seu espaço consolidado, tanto na organiza-

ção de eventos, quanto na produção. Algu-

mas já atuam até como mestre cervejeiras.

PALADAR AGUÇADO

Paula é frequentadora assídua de even-

tos de degustação de cerveja. E foi em um

desses encontros que ela, juntamente com

mais quinze amigas, resolveu desenvolver

uma confraria feminina. Criada em 2012, a

Cheers (em inglês, saúde) é exclusiva-

mente feminina. Os encontros são realiza-

dos de forma aleatória: Uma vez a cada mês,

cada participante é responsável por organi-

zar as reuniões, que acontecem em casas ou

bares especializados. Os encontros são

encarados com bastante comprometi-

mento, uma vez que a confreira escolhida

do dia tem a responsabilidade de comparti-

lhar seus conhecimentos na área.

“Aqui há pessoas de diversas áreas,

dentista, advogada, entre outras. Nosso

principal objetivo é ampliar o conheci-

mento nesse espaço”, afirma a advo-

gada, explicando que tudo isso é levado

muito a sério.

— Nos encontros é permitido

somente o experimento de três a cinco

cervejas, e 200 ml para cada pessoa; isso

para não comprometer os sabores e

nuances de cada experimento.

A advogada reitera que o objetivo

“não é beber quantidade, mas sim, qua-

lidade.” A confraria já conta com uma

página no Facebook, Instagram (com

fotos dos eventos) e um blog com dicas

de cervejas e harmonizações. A utiliza-

ção do meio midiático tem o intuito de

divulgar os trabalhos realizados e

aumentar o número de mulheres inte-

ressadas no assunto.

CONFRARIA FEMININA

Paula também se aventura na arte de

produzir cervejas artesanais. Junta-

mente com seu noivo, ela iniciou uma

produção caseira de trinta litros por mês,

apenas por hobbie, produzindo somente

para amigos e familiares. A média de

preço da cerveja comercializada por ela

fica entre R$ 7 a R$ 12.

— Hoje produzimos setenta litros.

Pode parecer muito, mas a ideia é

ampliar a produção cada vez mais.

Com o passar do tempo, se torna

mais nítida a importância da mulher

como apreciadora ou profissional da

cerveja. O requinte, o charme e a delica-

deza fazem parte do toque feminino

para uma melhor apreciação deste pro-

duto tão desejado. Mas ainda não há

unanimidade. A estudante de jorna-

lismo Roberta Oliveira, 18, por exemplo,

até admite que gosta de cerveja, mas faz

uma ressalva entusiasmada: “minha

bebida favorita é a tequila”. A tequila,

aliás, vem conquistando terreno cada

vez maior na área feminina. Já se tornou

comum as mulheres iniciarem uma noi-

tada “com uma tequila básica”.

REQUINTE E CHARME

Page 23: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 23

sOuL E bLuEs Em baNCa dE rEvIsta

cultura

O saudosismo invade as editorias

roGer leon

5º Período

O blues surgiu nos Estados Unidos

ainda na virada do século passado. O soul,

que vem da fusão do ritmo com o blues (o

rhythm’n’blues), em meados da década de

1960. São dois dos gêneros musicais mais

expressivos. Do blues saíram o jazz e o rock.

O soul inspirou quase todos os segmentos da

música negra, dos anos de 1960 para cá.

As músicas começaram a surgir em

épocas políticas muito intensas, em que

as ruas americanas eram tomadas por

movimentos de liberalismo social, movi-

mentos contra o racismo, e contra a

Guerra do Vietnan, a favor do uso de

drogas, entre outros.

A também chamada “música de alma

negra”, apesar de ter surgido dos anos

1960 têm suas primeiras impressões no

começo do século XX em pequenas comu-

nidades negras que viviam no Sul dos

Estados Unidos. O termo soul music pode

ser usado como uma referência à música

negra em geral, independente do estilo,

mas é também um gênero específico da

música. Atualmente, o cenário do blues é

muito diferente do século passado. Para o

músico Pedro Rosa, a cor da pele já não

influencia mais no gênero.

— Se um de nós visse na rua uma pes-

soa como Ana Popovic passando ninguém

jamais falaria que ela é uma cantora e gui-

tarrista de blues. Alta, branca, loira, e um

gênio contemporâneo da música. Esse

negócio de música negra e música branca

não existe mais. É quase a mesma coisa que

falar que funk é música de pobre e música

clássica é música de rico. Toda generaliza-

ção é burra.

Para ele, o soul e o blues mesmo tendo

perdido vários de seus grandes nomes

continuam muito presentes na formação

dos gêneros musicais de hoje. “Se pegar-

mos as grandes músicas que tocam no

rádio hoje, principalmente dos ídolos do

pop, vemos uma grande influência princi-

palmente na sonoridade. Até mesmo no

Brasil. A Legião Urbana e o Barão verme-

lho também vieram do Blues”.

A editora Folha desde o dia 15 de

março começa a levar semanalmente às

bancas a coleção ‘Folha Soul e Blues’. A

coletânea traz biografias e histórias de

canções de grandes intérpretes. O livro da

semana vem acompanhado de um CD

com as músicas que mais marcaram a

carreira do artista biografado. Em cada

volume vemos ilustrações (muitas vezes

raras) e sugestões de filmes, livros e discos

relacionados a cada intérprete.

A coleção se divide em duas partes. A

primeira com 15 volumes é dedicada aos

grandes nomes do soul — de Stevie Won-

der e James Brown a Smokey Robinson. A

segunda, com os grandes nomes do Blues

mescla nomes mais contemporâneos

com lendas como Robert Johnson e B.B.

King. Carlos Calado, o autor e editor dos

dois primeiros livros-CD’s afirmou em

entrevista à Folha que “o blues e o soul

serviram de veículos para que os negros

norte-americanos pudessem se expres-

sar de maneira artística e em diferentes

épocas”.

Em seu blog, uma postagem caracte-

riza seu interesse pelo tema e seus princí-

pios para a realização do trabalho.

— Esse é um projeto que, de alguma

maneira, eu já planejava realizar há bas-

tante tempo. Comecei a ouvir soul music e

blues no início da adolescência, ainda na

década de 1960, e até hoje aprecio muito

esses gêneros musicais. Aliás, aproveito

para deixar aqui uma espécie de dedicató-

ria afetiva a um amigo daquela época: José

Renato Reis, que despertou minha atenção

para as mensagens e inovações sonoras da

soul music.

José Luiz, 46, é dono de uma banca de

revistas no bairro Caiçara, na região noro-

este de Belo Horizonte, e para ele o público

que compra a coleção é grande, porém,

menos diverso do que deveria.

— O que me parece é que quem vem

à banca e para com o objetivo de ver a

coleção são pessoas mais velhas. Saudo-

sistas. Em sua maioria, pessoas que já

conhecem o gênero que ouviam em dis-

cos de vinil. Os mais jovens não se inte-

ressam muito pelo universo musical

antigo já que a internet facilitou muito

cada um achar o que gosta e organizar

de seu próprio jeito.

Page 24: Jornal lince maio 2015

roGer leon

5º Período

Na tarde da segunda feira, 13 de abril,

morreu o escritor e jornalista uruguaio

Eduardo Hughes Galeano, aos 74 anos.

Galeano é autor de mais de 40 livros de

temas extremamente diversos, passando

de política e jornalismo até a ficção. Nas-

cido em Montevidéu no ano de 1940, veio

de família extremamente católica e cres-

ceu com o sonho de ser jogador de futebol

profissional, devido a seu amor pelo

esporte, sonho que era retratado com fre-

quência em suas obras, principalmente

em um de seus maiores sucessos: “O fute-

bol de sol a sombra” (1995). Ainda na

adolescência, trabalhou de carteiro, pin-

tor de letreiros, caixa de banco, até que,

aos 14 anos, vendeu sua primeira charge

para o jornal El Sol.

Vítima do regime militar de seu país,

Galeano foi preso em 1973 e exilado na

Espanha, onde permaneceu por quase uma

década. Nessa fase, disse uma de suas cita-

ções mais famosas: “as pessoas estavam na

cadeia para que os presos pudessem ser

livres”. Porém, dois anos antes de sua prisão,

escreveu a sua mais célebre obra, “ As veias

abertas da América Latina”, um texto clás-

sico para os seguidores de filosofias anticapi-

talistas, e antiamericanas.

O livro faz uma análise do cenário

econômico desde o período da coloniza-

ção europeia até a idade contemporâ-

nea. O argumento principal é contra as

raízes da exploração que influenciaram

a forma de vida da geração atual. Devido

o grande impacto da obra e do conheci-

mento exarcebado da história, o livro foi

banido em vários países, entre eles

Argentina, Chile, Uruguai e — claro! —

Brasil. A proibição contudo, durou

pouco tempo.

A grande polêmica acerca do livro

veio há pouco mais de um ano, quando

em Brasília, na 2ª Bienal do Livro, Gale-

ano afirmou que jamais leria de novo

sua grande obra.

— Eu não seria capaz de ler de novo.

Cairia desmaiado. Para mim, essa prosa

da esquerda tradicional é chatíssima.

Meu físico não aguentaria. Seria inter-

nado no pronto-socorro. Em todo o

mundo, experiências de partidos políticos

de esquerda no poder às vezes deram

certo, às vezes não, mas muitas vezes

foram demolidas como castigo por esta-

rem certas, o que deu margem a golpes de

Estado, ditaduras militares e períodos

prolongados de terror, com sacrifícios e

crimes horrorosos cometidos em nome da

paz social e do progresso”, disse o escritor.

Mesmo assim Galeano disse não se

arrepender de ter escrito o livro. Mas afir-

mou ter superado a fase”. O ex-presidente

venezuelano Hugo Chávez presenteou o

atual presidente americano com uma cópia

do livro, afirmando que se tratava de “uma

obra prima”. As vendagens dispararam

depois do episódio, na Amazon. O livro, que

estava em 54.295º na lista dos mais vendi-

dos, subiu em 48 horas para a segunda

posição. Galeano quando procurado, afir-

mou que nem Chávez nem Obama enten-

deriam o teor da história. Em julho de 2008,

Galeano foi agraciado com o primeiro título

de Cidadão Ilustre do Mercosul.

CULTURA

a mENtE abErta dE EduardO gaLEaNO

soBrevivente

Chuck Palahniuk

leYa

Extremamente ácido, o livro do gênio por trás do “Clube Da Luta” é de 1996, mas há pouco chegou ao Brasil. Em uma narrativa completamente fora da ordem cronológica dos acontecimentos, a personagem Bradson resolve se matar e sequestra um avião, contando toda a sua trágica história de vida para ser salva na caixa preta. O final, claro, é surpreendente.

CRÍTiCAS

A história e a tardia mudança de posiçao de um dos ícones da literatura

nada será CoMo antes

Júlio Maria MasterBooks

Uma profunda aula sobre a vida da cantora Elis Regina, desde a adolescência, quando cantava “Fascinação” com as amigas, nas escadarias de um colégio, até seu fim trágico e prematuro. Sem poupar detalhes que poderiam ‘arranhar’ a imagem da artista, o livro pode ser chamado de uma biografia definitiva de Elis. Lançado no dia em que faria 70 anos.

24 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

Page 25: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 25

Ambição, falta de ética e foco.

Essas três características se resumem

em uma só pessoa: Lou Bloom (Jake

Gyllenhaal), personagem protagonista

do filme “O Abutre” (Night Crawler -

2014), que faz um denso mergulho no

que se pode chamar de o submundo do

jornalismo policial. A ação se passa em

Los Angeles, onde Bloom é um ladrão

que vive de bicos secundários, até que

um dia sua vida muda, ao ‘descobrir’ a

profissão de vídeo freelance. Estes são

também conhecidos como repórteres

da noite, profissionais sem nenhum

escrúpulo, que vendem vídeos sensa-

cionalistas, sempre envolvendo escân-

dalos e tragédias sangrentas, a peque-

nas redes de TV.

Bloom apanha da concorrência,

mas aprende rapidamente e começa a

fazer vídeos, até convencer a diretora de

jornalismo da rede de TV KWLA, Nina

Ramines (Rene Russo) a comprar um

deles. Ao pressentir as possibilidades do

ramo, Lou Bloom um pobre estagiário

Rick (Riz Ahmed) que acaba se tor-

nando seu GPS humano dentro de seu

pequeno carro. Ágil como sempre, não

hesita invadir e até mesmo interferir em

algumas cenas de crime, em busca de

melhores ângulos para filmar. O passo

seguinte é eliminar a concorrência, o

que significa atropelar livremente a

ética, única forma de sobreviver em um

mundo aparentemente sem leis.

Direção segura do ex-roteirista Dan

Gilroy, que encontra em Gyllenhaal o

parceiro perfeito para encarnar o ambi-

cioso Lou Bloom — ele chegou a ema-

grecer 10 kg para dar à personagem o ar

decadente e faminto de quem sobrevive

como um abutre (boa também a versão

nacional do título). Jake Gyllenhaal, que

é também um dos produtores do filme,

decorou todo o roteiro como se fosse

uma peça de teatro. As atuações mar-

cantes, dele e de Rene Russo, garantem

o clima de um suspense angustiante,

que é deixado bem claro no rosto dos

personagens. Não foram poucos os críti-

cos norte-americanos que reclamaram

dele não ter recebido uma indicação

para o ‘Oscar’.

Nota: 4,8.

“O abutre”, um mergulho no submundo do jornalismo

Page 26: Jornal lince maio 2015

26 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015

Carlos Benevides e átila Moreno

4º Período/ 3º Período

Recomendação de médicos e da Orga-

nização Mundial da Saúde, todos já sabem

que a prática regular de exercícios físicos

traz melhorias ao corpo. Atividades como a

esteira ou a bicicleta não são unânimes,

profissionais da área da educação física

vêm propondo novos tipos de modalidades

para manter o corpo ativo de maneira dinâ-

mica e em grupo, como é o caso do crossfit.

Explosão, força e condicionamento são

as prioridades da modalidade que está em

alta no Brasil e no mundo. Os exercícios deste

programa priorizam bastante o uso do peso e

equilíbrio do corpo. Pular corda, levantar

pesos, dar cambalhotas e saltos são alguns

dos desafios que a aula propõe ao aluno. O

crossfit, no entanto, também não é unanimi-

dade. Profissionais da saúde estão discutindo

os malefícios que a prática pode levar. Lesões

musculares e rompimento de ligamentos

estão na pauta de médicos que estão dissua-

dindo quem pensa em fazer a prática.

Para todos

“É um esporte que trabalha o condi-

cionamento de forma geral”, define

Natália Pinheiro, professora da academia

Crossfit BH, a primeira do gênero em

Minas Gerais. Segundo ela, a atividade

prepara a pessoa para qualquer tipo de

situação do cotidiano. Dessa maneira, os

praticantes conseguem correr para pegar

um ônibus, carregar sacolas de super-

mercado e até subir escadas com mais

facilidade e vigor.

Para não ocorrer lesões e contusões,

existe uma curva de aprendizado nos

treinamentos para todas as pessoas, de

todos os tipos de porte físico, como pon-

dera Pinheiro.

— A aula é a mesma para todos, mas,

quando temos um aluno novato, pegamos

apenas a base do crossfit. São os agacha-

mentos, exercícios para levar o peso do

ombro acima da cabeça e ele sempre será

acompanhado pelos professores. Isso serve

não apenas para novatos, mas para pessoas

mais velhas ou que estão lesionadas.

a ONda dO

CrOssfItFebre no Brasil, o Crossfit tem levantado dúvidas quanto ao risco de lesionados. Em contrapartida, é uma excelente opção para entrar em forma e levar uma vida mais saudável

esporte

Quanto às lesões, maior preocupação

que gira em torno do crossfit, Natália dá o

recado: “É preciso humildade. Ninguém

pode chegar aqui e carregar toneladas de

peso. Primeiro a técnica e depois usar um

pouco de peso. Algumas pessoas não

entendem isso”. É fundamental que cada

um conheça seu próprio corpo e seus limi-

tes. Ou o risco de lesão será inevitável.

Após qualquer exercício físico de alta

intensidade, é normal sentir queimação ou

dores musculares. Existe, entretanto, uma

tênue linha entre o cansaço e a lesão. Natá-

lia Pinheiro explica que são sensações bem

diferentes: “A contusão é focada em

alguma parte no corpo. A pessoa, por exem-

plo, sente dor no ombro esquerdo, e não no

direito. No caso da dor muscular, o aluno

sente a fadiga no ombro inteiro. A lesão é

sempre em um ponto específico”.

— É preciso conhecer o objetivo de

cada aluno. Alguns fazem crossfit apenas

para melhorar a saúde e levar uma vida

melhor. Outros, para conhecer e ultrapas-

sar seus limites. Eu mesma sinto dor mus-

cular há quatro anos e digo a todos que isso

é absolutamente normal.

QUAL É SEU LIMITE?

Page 27: Jornal lince maio 2015

Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 27

“Como o crossfit é uma atividade

de alta intensidade, o que eles colocam

é muito peso e repetições com carga

alta”, pontua a fisioterapeuta Miriam

Bastos. Segundo ela, antes de começar

qualquer exercício físico, é necessário

que a pessoa faça uma avaliação para

saber se está apta a praticar ou não. Pelo

fato de o crossfit não ter uma estabiliza-

ção na coluna e nas articulações, o risco

de lesão cresce, segundo ela.

De acordo com Bastos, algumas lesões

sequer provocam dor. Elas atacam de

repente? Não é bem assim. “Tem gente que

tem predisposição a lesão. Se o sujeito tra-

balha oito horas sentado, numa posição

curvada, a contusão pode acontecer de

forma mais natural. Se essa pessoa, após o

trabalho, vai fazer, na sua atividade diária,

um exercício de coluna, ela vai se machu-

car”. Fica a reflexão do motivo da lesão:

peso utilizado ou a péssima postura

durante oito horas?

Para a fisioterapeuta, a dor muscular,

que vem em forma de queimação, dura

geralmente 48 horas. É preciso ficar atento

se a dor persiste ou se ocorre nas articula-

ções. E, caso algum determinado exercício

ou movimento sempre cause um incô-

modo, é um indicativo que há uma lesão ali.

Benefícios do crossfit? Muitos, é o

que diz Miriam Bastos.

— Qualquer atividade traz uma

melhora de vida. Neste esporte em especí-

fico, temos tanto condicionamento físico

quanto aeróbico, força e postura, depen-

dendo do exercício que o professor passar.

Como a obesidade é uma doença

epidêmica do século XXI, quem está

acima do peso pratica o crossfit a fim de

perder gordura. Com treinos de alta

intensidade que priorizam o condicio-

namento, é certo que a pessoa perderá

alguns quilinhos e começará a ter um

corpo mais definido.

Há histórias de pessoas que perderam

praticamente metade do peso do corpo,

baixando os níveis de triglicérides e coles-

terol, algumas das palavras mais temidas

para quem não está em dia com a balança.

“Devemos fazer o que gostamos. As

lesões acontecem em qualquer atividade

física. Se a pessoa gosta do exercício, não

vejo motivos para não praticá-la”, consi-

dera Miriam.

O crossfit é, sem dúvida, um esporte

que está se tornando cada dia mais popular

em nível mundial. A pratica leva à perfei-

ção, uma modalidade que usa questão

competitiva e desafiadora, fazendo com

que o atleta busque sempre melhorar seus

aspectos físicos e também psicológicos.

“Nenhum esporte me prendeu tanto

quanto este”, é o que diz Lívia Gia, 27, que

pratica crossfit há dois. Segundo ela, que

já fez várias atividades físicas, a dinamici-

dade e a alta intensidade se tornaram

uma paixão pelos exercícios que estão

fazendo sucesso no Brasil.

— Em menos de seis meses de cross-

fit, perdi 10kg e praticamente 10% de

gordura. Isso, além do bem-estar da

saúde. Parece que é mentira, mas as pes-

soas realmente viciam. Estou viciada

neste esporte!

“VICIADA NESSE ESPORTE”

CARGA PESADA

Fotos daniel oliver

da

nie

l o

liv

er

Page 28: Jornal lince maio 2015