jornal de teatro edição nr.1

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Uma publicação da Aver Editora - Abril de 2009 - Ano I Nº 1 R$ 5,00 Perucaria: uma arte fundamental Bastidores: as notícias por detrás do palco Grupo Dimenti transita entre dança e teatro EAD terá livro para festejar seus 61 anos Pag. 4 Pag. 19 Pags. 4 e 5 Pag. 9 Sated-SP busca recursos para abrir um retiro de artistas Pag. 18 Zezé Motta, uma incansável: no teatro, na política e na vida Ida Gomes, a estrela que não deixa de brilhar O grupo Luna Lunera até hoje participa dos principais festivais de teatro no Brasil e até no exterior. PRÊMIO SHELL Pags. 12 a 14 Pag. 21 ENTREVISTA VIDA & OBRA Pags. 6 e 7 Itaú Cultural investe em pesquisa e mapeamento Pag. 16 Festivais: celeiro de oportunidades Rio e São Paulo consagram os seus vencedores Mesmo com dificuldades, companhias de teatro aproveitam visibilidade dos festivais para buscar o reconhecimento no concorrido palco teatral brasileiro Pags. 10 e 11 Sonia Sobral, gerente de Núcleo do Instituto Sérgio Brito: premiado no Rio Cia de Foto Marco Issa / Argosfoto Diego Pisante Arquivo Pessoal Arquivo de família

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Jornal de Teatro

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Page 1: Jornal de Teatro Edição Nr.1

Uma publicação da Aver Editora - Abril de 2009 - Ano I Nº 1 R$ 5,00

Perucaria: uma arte fundamental

Bastidores: as notícias por detrás do palco

Grupo Dimenti transita entredança e teatro

EAD terá livropara festejar seus 61 anos

Pag. 4

Pag. 19

Pags. 4 e 5

Pag. 9

Sated-SP busca recursos para abrir um retiro de artistas

Pag. 18

Zezé Motta, uma incansável: no teatro, na política e na vida

Ida Gomes, a estrela que não deixa de brilhar

O grupo Luna Lunera até hoje participa dos principais festivais de teatro no Brasil e até no exterior.

PRÊMIO SHELL

Pags. 12 a 14 Pag. 21

ENTREVISTA VIDA & OBRA

Pags. 6 e 7Itaú Cultural investe em pesquisa e mapeamento Pag. 16

Festivais: celeiro de oportunidades

Rio e São Paulo consagramos seus vencedores

Mesmo com difi culdades, companhias de teatro aproveitam visibilidade dos festivais para buscar o reconhecimento no concorrido palco teatral brasileiro Pags. 10 e 11

Sonia Sobral, gerente de Núcleo

do Inst i tuto

Sérgio Bri to: premiado no Rio

Cia de Foto

Marco Issa / Argosfoto

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Arquivo PessoalAr

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Page 2: Jornal de Teatro Edição Nr.1

2 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Page 3: Jornal de Teatro Edição Nr.1

3Abril de 2009Jornal de Teatro

Editorial

Índice

w w w . a v e r e d i t o r a . c o m . b r

Presidente: Cláudio Magnavita [email protected]

Vice-presidentes: Helcio Estrella

[email protected] Espinosa

[email protected]

Presidente: Cláudio MagnavitaDiretores: Jarbas Homem de Mello, Anderson Espinosa e Fernando NogueiraRedação: Rodrigo Figueiredo (editor-chefe), Rodrigoh Bueno (editor) e Fernando Pratti (chefe de reportagem) Rio de Janeiro - Daniel Pinton, Douglas de Barros e Felipe SilSão Paulo - Danilo Braga, Fábio de Paula, Ive Andrade e Pablo Ribera BarberyBrasília - Alexandre Gonzaga, Ana Paula Bessa, Dominique Belbenoit, Renata Hermeto e Sérgio Nery Porto Alegre - Adriana Machado e Felipe PrestesFlorianópolis - Adoniran Peres

Marketing: Bruno Rangel ([email protected]) Comercial: Diego Silva Costa([email protected])

Redação Rio de Janeiro: Rua General Padilha, 134 - São Cristóvão - Rio de Janeiro (RJ). CEP: 20920-390 - Fone/Fax: (21) 2509-1675

Redação Brasília: SCN QD 01 BL F America Office Tower - Sala: 1209 - Asa Norte - Brasília (DF) - CEP: 70711-905. Tel.: (61) 3327-1449

Redação Porto Alegre: Rua José de Alencar, 386 - sala 802/803 - Menino Deus - Porto Alegre (RS). CEP: 90880-480. Tel.: (51) 3231-3745 / 3231-3734

Redação Florianópolis: Av. Osmar Cunha, 251 - sala 503, Ed. Pérola Negra, Centro - Florianópolis (SC). CEP: 88015-200. Tel.: (48) 3224-2388

Email Redação: [email protected] Arte: Ana Canto, Bruno Pacheco, Gabriela de Freitas e Keila Casarin.

Correspondência e Assinaturas:

Troféu mais concorrido do teatro brasileiro consagra os melhores de 2008 no Rio e em São Paulo

ShellPRÊMIO............................................................6 e 7

Em conversa com o Jornal de Teatro, a atriz conta sua trajetória de vida e toda a sua luta em prol da arte no Brasil

Criado no final de 2008, o IBTT investe na pesquisa para formar novos profissionais

Zezé Motta

Instituto Brasileiro de Tecnologia Teatral

ENTREVISTA..............................................

TÉCNICA.................................................................

12 a 14

18

O espetáculo teatral escrito por Millôr Fernandes e que abalou a estrutura do regime militar na década de 60

Liberdade, liberdadeHISTÓRIA............................................................... 22

Companhia baiana transita livremente entre teatro e dança, em produções como “Chuá”

Grupo DimentiDANÇA...................................................................... 9

w w w . j o r n a l d e t e a t r o . c o m . b rPublicações da Aver Editora:

Jornal de Turismo - Aviação em Revista - JT Magazine - Jornal Informe do Empresário

Redação São Paulo: Rua da Consolação, 1992 - 10º andar - CEP: 01302-000 - São Paulo (SP)Fone/FAX: (11) 3257.0577

Administração: Elisângela Delabilia ([email protected])Circulação: Davi Machado Lopes([email protected])

Uma estreia que tem a pro ssionalização da carreira

como protagonistaO teatro brasileiro está tendo um reencontro com a sua história. No século

passado, várias gerações viveram desta atividade. Criaram os seus lhos, constru-íram seu patrimônio. Nos anos 30, 40 e 50 o setor se pro ssionalizou a extremos. As grandes companhias chegavam a realizar dez sessões por semana. A bilheteria era a fonte maior de receita.

O negócio teatro repetia nos trópicos as matrizes seculares que zeram fortunas na Europa e na América do Norte. A pro ssionalização teve o seu divisor de águas com a chegada do mecenato das verbas das leis de incentivo nos anos 90 e agora no novo século. Não se pode deixar de registrar o impac-to da dramaturgia eletrônica, especialmente as telenovelas, que criaram astros capazes de encher as salas.

Hoje, em um período de espetáculos que se realizam de sexta a domingo, em que teatros fecham e se transformam em igrejas, em que espetáculos são montados só para cumprir a temporada mínima para receber as verbas da lei de incentivo scal, sem preocupação com a bilheteria, e até em que o público ca assustado em sair tarde das sessões por causa da violência, encontramos alguns sinais que são animadores.

O primeiro deles é uma nova geração de talentos. São atores, diretores, autores, técnicos e produtores empenhados em uma pro ssionalização ímpar. A renovação de talentos tem sido acompanhada de uma elevada capacidade de abraçar a carreira como pro ssão de vida.

Um exemplo é o que ocorre no teatro musical. O Brasil é hoje referência inter-nacional. Até os espetáculos que vêm de fora do País e são montados aqui recebem elogios dos produtores pelo elevado grau de pro ssionalismo dos brasileiros.

O Jornal de Teatro surge para ajudar neste processo de capacitação pro- ssional. É um jornal para quem vive do teatro e para o teatro. Abordaremos aspectos da pro ssão raramente enfocados em outras mídias.

Não se trata de mais uma publicação de roteiro e para o público nal. Nem uma publicação para discussão acadêmica do setor. Trata-se de uma publicação especializada para pro ssionais, a exemplo de outras do portfólio da Aver Editora.

Trata-se de ocupar uma lacuna que existe a partir da pro ssionalização. As pautas e editorias visarão sempre colocar em foco o teatro como pro ssão, carreira, negócio e arte que precisa ser respeitada por suas raízes milenares.

Estaremos também democratizando a informação, hoje privilégio de quem vive no eixo Rio-São Paulo. Estaremos utilizando a estrutura jornalística da Aver Editora, com suas redações regionais em Brasília, Porto Alegre, Florianó-polis e em breve Salvador, Curitiba e Belo Horizonte, além é claro do Rio de Janeiro e de São Paulo, que funcionam como matrizes.

O nosso conteúdo estará disponível em site aberto, o www.jornaldeteatro.com.br, permitindo o acesso daqueles que, estando fora dos grandes centros, queiram fazer da atividade a sua pro ssão.

Nascemos também com a missão de promover a integração regional com os nossos países vizinhos. Realidades muito próximas a nós. Ao mesmo tempo tão perto e tão longe! O primeiro passo foi dado com a troca de conteúdo com a argentina Multis x El Foro – Revista de Teatro, editada em Buenos Aires, com quem estabelecemos um convênio de troca de conteúdo que já poderá ser visto a partir da próxima edição.

O Jornal de Teatro nasce com uma missão. Nasce com propósitos nobres e para ser um espaço da classe e para a classe.

A partir de agora, este jornal é seu. Pertence àqueles que querem a pro s-sionalização de um setor, que no século passado foi a razão de viver de várias gerações. O nosso setor, que sempre viveu de ciclos, tem agora uma retomada pela pro ssionalização e a nossa publicação fará a sua parte.

Cláudio MagnavitaPresidente da Aver Editora

Apesar das dificuldades, companhias de teatro apostam nesse tipo de evento

em busca de mais visibilidade

Pág.: 10 e 11

Reportagem

Impressão: F. Câmara Gráfica e Editora

Page 4: Jornal de Teatro Edição Nr.1

4 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Bastidores

Vitrine Cultural abre 2009 com quatro peças no Teatro ImprensaDepois de selecionados os

12 espetáculos entre as mais de 400 propostas recebidas pelos curadores Valmir Santos e Kil Abreu, o projeto de formação de público que envolve, ain-da, uma parcela signi cativa da produção mais experimental do teatro brasileiro, entra em nova fase. O Projeto Vitrine Cultural 2009 do Centro Cultural Grupo Sílvio Santos apresenta os es-petáculos que ocuparão a Sala Vitrine e a Sala Imprensa, de terça a domingo: Comunicação a uma Academia, Eldorado, Ca-chorro Morto e Bartleby.

A curadoria do projeto se-lecionou oito peças inéditas e quatro reestreias para a tempo-rada. Ao longo de 2009, serão subsidiadas nove produções tea-trais para o Espaço Vitrine e três

Espaço Vitrine 1º trimestreComunicação a uma academia – Roberto Alvim Cachorro morto – Leonardo Faria Moreira Bartleby – Cácia Goulart

2º trimestreQuase nada – Alain Brum Frozen – Rachel Ripani Music-Hall – Gabriela Flores

3º trimestreFesta de separação – Janaina Leite

Mulher animalEspelhos Partidos, espe-

táculo livremente inspirado na narrativa poética “O Uni-córnio” de Hilda Hilst, apre-senta a transmutação de uma mulher em um animal. Essa mulher vai se cansando de sua impossibilidade de com-preensão nesse mundo como ser humano e aos poucos vai se transformando em um uni-córnio para que possa alcançar a liberdade dos seus desejos. A dramaturgia é de Flávia Couto e a direção de Edú Reis. O es-petáculo permanece em cartaz no Centro Cultural Rio Verde em São Paulo.

Em breve: obrasO projeto desenvolvido

pela arquiteta Jacqueline Moura prevê a criação de um cenário propício para o desenvolvimen-to e a fomentação da cultura no Estado. A proposta é de que sejam reunidos no Centro de Belas Artes diversas atividades artísticas, como um museu, uma biblioteca, salas para balé, teatro, música, além de uma pi-nacoteca e da reforma do Tea-tro de Bolso Lima Filho. A obra deve ser entregue para a popu-lação alagoana no ano de 2010. O projeto ainda contempla uma reforma no Teatro de Bolso Lima Filho, que passa a ter uma capacidade para 161 pessoas, sendo nove cadeirantes.

Comédia “Os difamantes”ganha sala maior

para a Sala Imprensa. O projeto tem como propostas incentivar grupos com pesquisas teatrais inovadoras, formar plateias por meio de ingressos oferecidos a preços populares (R$ 10,00 e R$ 5,00) e realizar ação social ba-seada na troca de ingressos por doações - sempre no primeiro mês das temporadas. Trata-se de um projeto de incentivo cultural que une ação social e oferece aos grupos e às produções estrutura de espaço e subsídio nanceiro.

Os 12 espetáculos selecio-nados receberão apoio para apresentar suas produções, que carão três meses em cartaz, cada uma, a partir de 4 de março. O Vitrine Cultu-ral funcionará com peças no Espaço Vitrine (48 lugares), às terças e quartas, outras às

Ensaio sobre Carolina – Gal Qua-resma Henfil já! – Nena Inoue

Sala Imprensa1º trimestreEldorado – Eduardo Okamoto

2º trimestreAmanhã é natal – Cinthia Maria Zaccariotto Ferreira

3º trimestreO livro dos monstros guardados – Zé Henrique de Paula

quintas e sextas e ainda mais uma aos sábados e domingos; e também uma produção na Sala Imprensa (452 lugares),

às quartas e quintas-feiras. O Projeto Vitrine Cultural con-templa quatro espetáculos em cartaz simultaneamente.

Curso de iluminação cênica em Pernambuco

Turma completa no Curso de Formação de Técnicos em Iluminação Cênica, realizado pela 9 Produções Artísticas. O curso, com incentivo do Fundo Pernam-bucano de Incentivo à Cultura - Funcultura, é gratuito e conta com 25 vagas, sendo 20 para alunos regulares/integrais e 5 para ouvin-tes. As inscrições para a turma de março já estão encerradas, mas ou-tra turma deve iniciar na segunda metade do ano. Acompanhe pelo site www.9producoes.com.br.

O objetivo do curso é inserir pro ssionais no mercado da cena artística de Pernambuco. As 215 horas de aulas aliam teoria e prá-tica. Para Dado Sodi, coordenador do projeto, “é nesse campo onde mais falta um aprofundamento na área técnica local. Por isso, elabora-mos um curso que tem uma forte carga teórica e que propõe a dis-cussão sobre o tema e a atual situa-ção da classe em Pernambuco”.

A atriz Kelzy Ecard, recen-te vencedora do Prêmio APTR (Associação dos Produtores de Teatro do Rio de Janeiro) de Me-lhor Atriz Coadjuvante por seu trabalho em “Rasga Coração”, está em cartaz com o espetáculo solo musical “Meu Caro Ami-go”, inspirado na obra de Chico Buarque de Hollanda. O texto é de Felipe Barenco; a direção de Joana Lebreiro (diretora dos bem sucedidos musicais sobre Antonio Maria, Mario Lago e Ary Barroso); e a direção mu-sical de Marcelo Alonso Neves. A música ao vivo é executada pelo pianista João Bittencourt. A peça é apresentada no Centro Cultural dos Correios, no cen-tro do Rio.

A ideia deste musical surgiu da paixão dos criadores do espe-táculo pela obra de Chico e sua onipresença nas vidas dos bra-sileiros, ora como trilha sonora de nossas histórias pessoais, ora

A comédia “Os Difamantes”, estrelada por Maria Clara Guei-ros e Emilio Orciollo Netto e dirigida por Ernesto Piccolo, es-treou no início de novembro de 2008 no Teatro do Leblon – Sala Tônia Carrero, para uma tempo-rada inicial de dois meses. Com o sucesso de crítica e público, a peça prorrogou sua temporada e migra para uma sala maior, a sala Fernanda Montenegro, no mes-mo teatro. O texto é dos jorna-listas Martha Mendonça e Nelito Fernandes e o texto brinca com o atual e insistente fenômeno do culto às celebridades, e o desejo, cada vez mais comum, de se tor-nar uma elas.

“Meu Caro Amigo” em temporada cariocacomo retrato da história recente do país. “Meu Caro Amigo” não é um espetáculo biográ co sobre o compositor, mas uma cção que busca, através da história da fã Norma, estabelecer um diálo-go entre memória individual e memória nacional. Entendendo a música como poderoso veícu-lo de compartilhamento de me-mória, o objetivo é despertar no espectador a lembrança de sua própria história ao mergulhar na saga desta mulher embalada pe-las canções de Chico.

“O tema da memória me acompanha desde o meu espe-táculo de formatura na UFRJ, principalmente este diálogo entre a memória coletiva e in-dividual, a relação entre histó-rias de vida pessoais dentro da perspectiva histórica do Rio de Janeiro e do Brasil. Apesar de a peça ser inspirada no Chico Bu-arque, ela reconstrói a memória de um personagem de cção

que é uma pessoa comum, ‘gen-te como a gente’. A gente quer que o público se identi que com a Norma. A história da Norma é toda permeada com as nossas próprias memórias e histórias de pessoas da família e amigos”, diz Joana Lebreiro.

PROJETOS SELECIONADOS

Alexandre Caetano / D

ivulgação

Divulgação

Divulgação

Peça de Hilda Hilst em São Paulo

Projeto Vitrine Cultural apresenta 12 peças escolhidas entre as 400 propostas recebidas. À esquerda, Bartleby e à direita Eldorado: preços populares

Chico Buarque inspira musical

Page 5: Jornal de Teatro Edição Nr.1

5Abril de 2009Jornal de Teatro

OPINIÃO

Bastidores

Estreou no dia 21 de março, no Teatro do Sesc Santana, o espetáculo “O Processo”, base-ado na tradução do original de Modesto Carone (Prêmio Jabu-ti) para o texto de Franz Kafka, com direção e adaptação de José Henrique e cenário de Hé-lio Eichbauer. Em cena, Tuca Andrada interpreta o protago-nista Josef K. e contracena com mais oito atores - Sílvia Monte, Roberto Lobo, Mariana Olivei-ra, Alexandre Mofati, Antonio Alves, Paula Valente, Rogério Freitas, Thaís Tedesco.

O Processo é a história de um cidadão comum, que ao acordar em seu trigésimo ani-versário está detido sem moti-vo aparente. Durante um ano, Josef K. procura obsessiva-mente compreender os moti-vos de sua detenção, mas suas buscas não encontram respos-tas diante de um “tribunal” to-talmente inacessível, irracional e absoluto.

Tuca Andrada conta que construir o personagem Josef K. foi um desa o e que, para o ator, ainda se trata de um per-sonagem em construção. “Jo-sef K. é um quebra-cabeças, um caminho com muitas ver-tentes, muito fácil de um ator se perder. Ele pode ser lido de inúmeras maneiras dependen-do do que a direção propõe, e o José Henrique me deixou livre para escolher o meu ca-minho. Josef K. é um homem

O TEATRO BRASILEIRO EXPLORA BEM OS RECURSOS DA INTERNET?

A internet vem se revelando como um instrumento muito forte para o teatro brasileiro, especialmente como veículo de divulgação de espe-táculos, pois além de um grande alcance de público, é, entre as mídias, o meio mais barato de propagação das produções. No entanto, para além da propaganda, a internet oferece recursos que, acredito, o teatro brasileiro tem sabido aproveitar para outros fins: especialmente grupos e companhias se utilizam do meio virtual para “debater” sobre suas propostas artísticas e políticas, fortalecendo, a partir de seu público, discussões importantes para o avanço de suas obras.

Existe aí uma democratização no sentido da possibilidade de ex-posição de ideias e pensamentos, que permite a “qualquer pessoa” (qualquer pessoa que tenha acesso ao meio e à obra) comentar sobre o trabalho de determinados grupos. E isso é bom!

No caso do Grupo Clariô de Teatro, que desenvolve um trabalho específico na periferia de São Paulo, a internet se faz necessária e quase que imprescindível. Ela está à serviço, além da promoção, da criação de uma grande rede de coletivos artísticos que atuam também nos arrabaldes. Blogs, comunidades, sites, e-mails etc, se interagem num grande fórum que possibilita aos coletivos uma troca efetiva para o fortalecimento do movimento artístico voltado às margens das gran-des metrópoles.

Esse caminho ainda é muito tímido, mas aponta lugares interes-santes de preservação, intercâmbio e discussão permanente sobre os rumos dos grupos e do teatro brasileiro.

Naruna CostaAtriz do Grupo Clariô de Teatro

e editora do blog: www.espacoclario.blogspot.com

O Rio de Janeiro recebe a mais nova montagem do clás-sico de Schiller: “Maria Stuart”, com Julia Lemmertz no papel-título e Clarice Niskier como a Rainha Elizabeth, sob a direção de Antonio Gilberto, idealiza-dor do projeto ao lado das duas atrizes. A tradução utilizada é a de Manuel Bandeira, e comple-tam o elenco Mário Borges, An-dré Correa, Henri Pagnoncelli, Clemente Viscaino, Amélia Bit-tencourt, Pedro Osório, Renato Linhares, Maurício Souza Lima, Silvio Kaviski, Thiago Hausen, Maurício Silveira, Guilherme Bernardy e Ednei Giovenazzi em participação especial. O es-petáculo acontece no Centro Cultural Banco do Brasil, no centro do Rio de Janeiro.

A peça fala do histórico con ito entre as rainhas, pri-mas e rivais Elizabeth, da In-glaterra, e Mary Stuart, da Es-cócia. A motivação do diretor Antonio Gilberto para trazer ao público brasileiro deste iní-cio de século XXI a tragédia de Schiller escrita em 1800 à sua atualidade: “Por falar de senti-mentos e con itos tão comuns a nós seres humanos, essa obra de Schiller é um clássico. Por

Tuca Andrada protagoniza “O Processo” em São Paulo

racional que se perde dentro dos labirintos daquele tribunal e vê sua racionalidade ser joga-da no lixo. Desde o início um homem condenado, um ani-mal pego numa arapuca e que luta inutilmente para sobrevi-

ver. Não aceita e não entende as regras daquele tribunal pois sempre cumpriu todas as re-gras a que foi submetido, mas agora está a dois passos do ca-dafalso e só lhe resta cumprir seu destino”, diz ele.

Nova montagem de Maria Stuart chega ao Rio

ser um clássico será sempre oportuna e interessante uma nova montagem de ‘Maria Stu-art’”, a rma o diretor.

A encenação de Antonio Gilberto concentra seu foco na relação humana dessas duas rainhas e dos persona-

gens que giram em torno das mesmas. A montagem não pretende julgar essa “luta” en-tre essas duas mulheres, mas sim apresentar os con itos que zeram parte da relação das duas e que culminaram com a morte de Mary Stuart.

Depois de apresentações no interior do Estado de São Paulo pelo “Circuito SESC de Artes 2008”; na “Virada Cul-tural” da Prefeitura da Cida-de de São Paulo; e no evento “Planeta Sustentável”, realiza-do no Parque Ibirapuera, re-estreia no Teatro Ruth Esco-bar, São Paulo, a peça infantil “Tampinha Tira os Óculos” da Cia. Teatral Bangues e Pingue-Pongues, fundada pelos atores Carlos Baldim, César Figueire-do e Camilo Brunelli.

O texto escrito por Car-los Baldim e Camilo Brunelli traz ao palco dois palha-ços responsáveis por contar a história de “Tampinha”,

“Tampinha Tira os Óculos” volta a SP

uma menina que se acha feia porque usa óculos. Com lin-guagem circense, músicas e humor, Chicabom e Tange-rina, interpretados por César Figueiredo e Fábio Oliveira, revezam-se nos diversos per-sonagens da história.

O espetáculo “Doido”, com Elias Andreato, estrou dia 23 de março durante o Festival de Curi-tiba. Segundo o próprio ator de- ne, “o espetáculo fala de amor, loucura e arte, mostrando ao es-pectador o que essa viagem apai-xonante pode despertar no artista e no cidadão comum”. Na peça, um homem narra e vive persona-gens da dramaturgia universal.

A montagem não utiliza um gestual teatral formal para que, através apenas da palavra, o público seja encantado e ar-rebatado pelo pensamento de grandes lósofos, pensadores, poetas e dramaturgos.

“Doido” estreia em Curitiba

Fotos: Divulgação

Para o ator Tuca Andrada, construir o personagem Josef K. foi um desa o

História de Maria Stuart traz temas contemporâneos aos palcos cariocas

Realidade contada com bom humor

Doido: amor, loucura, arte mundial

Page 6: Jornal de Teatro Edição Nr.1

6 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Por Adoniran Peres

A celebração dos melhores da temporada dos espetáculos teatrais de 2008 foi realizada no último dia 10 de março com a entrega do 21º Prêmio Shell de Teatro, no Oi Casa Grande, no Rio de Janeiro (RJ). O evento contou com momentos de ho-menagem, consagração e con-fraternização. Com a casa lo-tada, foi apresentado pela atriz Beth Goulart, premiada em 2001 pela melhor interpretação.

Um dos momentos mais marcantes cou por conta da homenagem especial a Ida Go-mes. A atriz que morreu no dia 22 de fevereiro de 2009, aos 85 anos, recebeu um lon-go aplauso da plateia por sua grande contribuição ao teatro brasileiro. Seu irmão, o ator Fe-lipe Wagner lembrou a alegria da atriz ao saber que receberia o Prêmio Shell. “Estou muito emocionado de estarmos divi-dindo o orgulho e a saudade que sentimos dela”. A atriz Dé-bora Olivieri homenageou a tia com versos do soneto “Visita à casa paterna”, de Luiz Guima-

rães Jr., com o qual Ida ganhou seu primeiro prêmio em 1937 e um contrato com a Rádio Na-cional: “Uma ilusão gemia em cada canto/Chorava em cada canto uma saudade”.

PREMIADOSConcorrendo como melhor

ator, ao lado de nomes como Marcelo Faria e Fernando Eiras, Sérgio Britto foi ovacionado de pé pela plateia ao receber o prê-mio pelo trabalho na peça “A úl-tima Gravação de Krapp e Ato Sem Palavras I”. Aos 85 anos, com 63 deles voltados para o trabalho com teatro, ele dedicou a premiação à Isabel Cavalcanti, diretora de sua peça.

Britto, quem em 2003 já foi também homenageado na 16ª edição, avalia que os prêmios de teatro ao longo do tempo estão diminuindo. “A Shell foi aquela que manteve, no decorrer dos anos, ligação contínua com o teatro brasileiro. Particularmen-te, quei muito feliz com a ho-menagem que recebi há alguns anos na premiação”, destaca.

O prêmio de melhor atriz, concorrendo ao lado de Dri-

ca Moraes, cou com Patrícia Selonk, pela interpretação em “Inveja dos Anjos”. O mesmo espetáculo também ganhou o troféu no quesito autor, pelo texto de Maurício Arruda e Paulo de Moraes. Ary Coslov foi escolhido o melhor diretor por “Traição”.

Nas categorias técnicas, des-taque para a peça “Não Sobre o Amor”, premiada por melhor iluminação, de Beto Bruel, e ce-nário, de Daniela Thomas. No quesito música, excepcional-mente, os jurados optaram por dividir o prêmio entre Delia Fisher e Jules Vandystadt, pelos arranjos, vocal e instrumental, de “Beatles num Céu de Dia-mantes” e Fábio Nin, por “É Samba na Veia, é Candeia”.

JÚRINesta edição, zeram parte

do júri do Rio de Janeiro Sér-gio Fonta, dramaturgo, diretor e ator; Tania Brandão, pesqui-sadora e professora de História do Teatro Brasileiro; Fabiana Valor, atriz e bailarina; além de Bernardo Jablonski, professor e roteirista; e Caique Botkay,

instrumentista e compositor de músicas para teatro. Os dois úl-timos despedem-se do júri este ano, sendo substituídos pelo iluminador Jorginho de Car-valho e por João Madeira, que foi participante ativo na histó-ria do Prêmio Shell de Teatro e atualmente está na direção do grupo AfroReggae.

As comissões julgadoras - uma para o Rio e outra para São Paulo – geralmente são compostas de cinco pessoas em cada cidade, convidadas pela Shell entre artistas, personalida-des ligadas ao teatro e ao mundo cultural brasileiro, críticos etc.

O PRÊMIOCriado em 1988, o Prêmio

Shell de Teatro é ponto de refe-rência nos palcos. A premiação é oferecida aos maiores desta-ques da temporada teatral, no Rio de Janeiro e em São Paulo, separadamente, em nove cate-gorias: autor, diretor, ator, atriz, cenogra a, iluminação, música, gurino e categoria especial.

O prêmio é destinado aos pro ssionais do teatro brasilei-ro que tenham estreado espe-

Prêmio

Prêmio Shell: dia de homenagens e reconhecimento ao teatro

LISTA DE VENCEDORES DO

21º PRÊMIO SHELL DE TEATRO DO

RIO DE JANEIRO

Iluminação:Beto Bruel, por “Não Sobre o Amor”

Cenário:Daniela Thomas, por “Não Sobre o Amor”

Figurino:Inês Salgado, por “O Jardim das Cerejeiras”

Música:Delia Fisher e Jules Vandys-tadt, pelos arranjos (vocal e instrumental) de “Beatles num Céu de Diamantes”Fábio Nin, por “É Samba na Veia, é Candeia”

Categoria especial:Charles Möeller e Claudio Botelho, pela expressiva contribuição ao gênero mu-sical no cenário carioca

Autor:Maurício Arruda Mendonça e Paulo de Moraes, por “In-veja dos Anjos”

Diretor:Ary Coslov, por “Traição”

Ator:Sérgio Britto, por “A última Gravação de Krapp e Ato Sem Palavras I”

Atriz:Patrícia Selonk, por “Inveja dos Anjos”

Homenagem:Ida Gomes, pela contribui-ção ao teatro brasileiro

táculos no Rio de Janeiro e em São Paulo entre 1º de janeiro e 31 de dezembro. As peças que estreiam entre 1º de janeiro e 30 de junho concorrem às in-dicações do primeiro semestre e as peças que estreiam entre 1º de julho e 31 de dezembro concorrem às indicações do se-gundo semestre.

Os vencedores recebem premiação individual de R$ 8 mil e um troféu do escultor Domenico Calabroni. A festa de entrega dos prêmios acon-tece alternadamente em cada uma das cidades.

O número mínimo de apre-sentações, não necessariamente consecutivas, para que o espetá-culo concorra aos prêmios em São Paulo são 24, e o Rio de Ja-neiro 25. No caso de espetáculos em dias alternativos, o número mínimo é de 12 apresentações.

Fotos: Marcos Issa / Agorsfoto

Patrícia Selonk e Sérgio Bri o ganham o prêmio por atuações Felipe Wagner e Débora Olivieri recebem homenagem à Ida Gomes

Ary Coslov: prêmio por direção Jandira, Sérgio Bri o e Eva Todor Daniela Thomas é premiada Inês Salgado leva por gurino

Page 7: Jornal de Teatro Edição Nr.1

7Abril de 2009Jornal de Teatro

Autor - Marçal Aquino e Marília Toledo, por “Amor de servidão” Cenário - Renato Bolelli Rebouças, por “Arrufos” Figurino - Silvana Marcondes, Fernando Sato e Júlio Dojcsar, por “O santo guerrei-ro e o herói desajustado” Iluminação - Felipe Cosse e Juliano Coelho, por “Aqueles dois” Música - Josimar Carneiro, pela direção musical de “Divina Elizeth”

Shell premia os melhores do teatro em São PauloA 21ª edição do Prêmio Shell de Teatro aconteceu no dia 17 de março no Estação São Paulo. Nenhum espetáculo levou mais de um troféu

A chuva que caiu na noite da pre-miação e bloqueou o trânsito da cidade foi o motivo do atraso de mais de uma hora no início do evento. Sob a apresen-tação de Beth Goulart, a estatueta dou-rada em forma de concha e o cheque no valor de oito mil reais foram entregues aos destaques do teatro de 2008, esco-lhidos pela comissão julgadora formada por Kil Abreu, Marici Salomão, Mário Bolognese, Noemi Marinho e Valmir Santos.

Grande parte dos presentes concor-dou com a escolha do júri nas princi-pais categorias. A novidade cou por conta do prêmio dividido em Melhor Ator. Domingos Montagner e Fernan-do Sampaio, da companhia La Mínima, concorriam juntos na categoria, ambos pelo espetáculo “A noite dos palhaços mudos” (uma adaptação da história em quadrinhos do cartunista Laerte), mas os jurados consideraram que “a inter-pretação dos atores se completava, sen-do assim, merecem juntos o troféu”.

A melhor atriz foi Isabel Teixeira, pelo espetáculo “Rainha(s) - duas atrizes em busca de um coração”. A revelação foi uma das mais aplaudidas da noite e no discurso de agradecimento, Isabel disse que teatro é resistência e citou a recente alteração da lei que descaracte-riza algumas produtoras e aumenta o valor dos impostos pagos pelos artistas.

O espetáculo com maior número de indicações foi “A Alma Boa de Setsuan” que levou o prêmio de Melhor Direção para Marco Antonio Braz. Prêmio que o diretor ofereceu aos atores Maurício Marques e Denise Fraga, que estrelam a história de Bertolt Brecht.

O Prêt-à-Porter, projeto do CPT (Centro de Pesquisa Teatral), sob coor-denação do encenador Antunes Filho, ganhou na Categoria Especial. O home-nageado da noite foi Jacó Guinsburg, pela contribuição ao pensamento crítico do teatro no Brasil.

Criado em 1988, o Prêmio Shell de Teatro é referência para os palcos bra-sileiros. Em cada edição são divulgadas duas listas de indicados A premiação é oferecida aos maiores destaques da temporada teatral, no Rio de Janeiro e em São Paulo, separadamente, em nove categorias: Autor, Diretor, Ator, Atriz, Cenogra a, Iluminação, Música, Figuri-no e Categoria Especial.

CONFIRA A LISTA COMPLETA DOS VENCEDORES DO 21º PRÊMIO SHELL DE TEATRO DE SÃO PAULO

Categoria especial - Centro de Pesquisa Teatral do Sesc, pelos 10 anos do projeto Prêt-à-Porter Diretor - Marco Antônio Braz, por “A alma boa de Setsuan” Ator - Domingos Montagner e Fernando Sampaio, por “A noite dos palhaços mudos” Atriz - Isabel Teixeira, por “Rainha[(s)] – duas atrizes em busca de um coração”Reconhecimento e tradição

Beth Goulart entrega prêmio a Renato Bolelli por Melhor Cenário

Bráz, melhor diretor: “A Alma Boa de Setsuan”

Isabel Teixeira, melhor atriz por “Rainha[(s)]”O Centro de Pesquisa Teatral do Sesc levou o prêmio pelos 10 anos do projeto Prêt-à-Porter

Melhor Iluminação Felipe Cosse e Juliano Coelho por “Aqueles Dois”

Marília Toledo por “Amor de Servidão” Jacó Guinsberg: pensamento crítico do teatro

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fotoPor Rodrigoh Bueno

Page 8: Jornal de Teatro Edição Nr.1

8 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Editais

Festivais

Por Dominique Belbenoit

Estão abertas as inscrições para os primeiros editais da Se-cretaria de Cultura da Bahia lan-çados em 2009 por intermédio da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb). São cinco editais nas áreas de Artes Visuais, Dança, Teatro e Música, que irão selecio-nar artistas para apresentações e exposições em espaços culturais da Funceb, na capital e no inte-rior. Com o sucesso da estreia dos projetos “Segundas Musicais” e “Quintas do Teatro”, criados em 2008, este ano os respectivos edi-tais ampliam signi cativamente o número de projetos selecionados.

Para os artistas visuais, o “Por-tas Abertas para as Artes Visuais” irá selecionar 24 propostas de exposições, individuais ou cole-tivas, para ocuparem galerias em Salvador e centros culturais dos municípios de Alagoinhas, Feira de Santana, Jequié, Juazeiro, Porto Seguro, Valença e Vitória da Con-quista. Serão escolhidas duas pro-postas por espaço, com duração de trinta dias cada uma, a serem realizadas entre julho de 2009 a ju-nho de 2010 com verba de apoio no valor líquido de R$ 1,5 mil.

Bahia abre inscrições para cinco editais de CulturaJá o edital “Salões Regionais de

Artes Visuais da Bahia” abre ins-crição para trabalhos de temática livre em diversas modalidades, en-tre elas arte e tecnologia, cerâmica, colagem, escultura, fotogra a, gra- te, instalação e pintura. Os Salões 2009 terão três edições com expo-sições abertas à visitação pública nos centros de cultura de Valença, Juazeiro e Porto Seguro. Ao todo serão premiados nove artistas, três em cada salão, sendo dois prêmios de R$ 6 mil e um prêmio estímulo de R$ 3 mil, exclusivo para artistas do território de identidade onde o Salão será realizado, somando R$ 45 mil em premiação.

Com seleção prevista de 17 propostas (sete a mais em relação ao ano passado) de shows de can-tores, instrumentistas e grupos, o “Segundas Musicais” retorna em 2009 com premiação no valor de R$ 5 mil para cada apresentação, sendo o valor total do investimento de R$ 85 mil. No edital “Quarta que Dança”, serão eleitas 19 propostas entre espetáculos, intervenções ur-banas, dança de rua e trabalhos em processo de criação de companhias ou artistas independentes. Todos concorrem a prêmios que variam de R$ 3 mil a R$ 5 mil.

Os selecionados de música e dança farão uma apresentação única, a preços populares, na Sala do Coro do Teatro Castro Alves. Os grupos e artistas teatrais, pro ssionais e amadores, por sua vez, podem par-ticipar da seleção para o “Quintas do Teatro”, que este ano seleciona 20 espetáculos, o dobro em relação à edição de estreia, totalizando R$ R$ 100 mil em premiação. Também a preços populares, o projeto prevê a realização de apresentações no Cine-Teatro Solar Boa Vista e no Espaço Xisto Bahia.

Os interessados podem inscrever seus projetos gratuitamente até os dias 7 ou 8 de abril de 2009 (de acor-do com o prazo estipulado em cada um dos editais), na sede da Funceb, pelo correio ou ainda pela internet, no formulário de inscrição online. Os editais completos, formulários e o manual de elaboração de projetos culturais encontram-se disponíveis no site www.funceb.ba.gov.br.

PROJETO NO ACREA Prefeitura de Rio Branco, no

Acre, por meio da Fundação Gari-baldi Brasil, lançou o edital 2009 da Lei de Incentivo à Cultura no dia 3 de março. Projetos das áreas de arte, patrimônio cultural e esporte po-

dem ser apresentados até o dia 3 de abril, na Fundação de Cultura Gari-baldi Brasil (FGB). Serão disponibi-lizados R$ 780 mil para a realização de projetos, sendo R$15 mil para pessoa física, R$ 20 mil para pessoa jurídica e R$ 25 mil para entidades representativas de classe. Os proje-tos devem ser entregues até o dia 3 de abril, no período das 8h às 12 ho-

ras ou das 14h às 17 horas, na sede da Fundação Municipal de Cultura Garibaldi Brasil. O formulário pode ser acessado no site da prefeitura de Rio Branco www.pmrb.ac.gov.br. Para apresentar projetos é ne-cessário ser inscrito no Cadastro Cultural do Município de Rio Branco, mecanismo do Sistema Municipal de Cultura.

Por Felipe Sil

No universo de atores e atrizes amadoras em todo o País, os festivais de teatro são ótimas chances de apresenta-rem seus trabalhos para plateias diversas de suas cidades natais e, principalmente, mostrar seus talentos para pro ssionais ex-perientes que abarrotam even-tos do tipo. Os amantes da arte, por sua vez, já podem se preparar para curtir, pelo me-nos, duas festas da interpreta-ção que irão ocorrer no Brasil nos próximos meses.

De 27 de março a 5 de abril, a cidade de Pirassununga, em São Paulo, dá início ao IX Fes-tival Nacional de Teatro Cacilda Becker 2009. O evento, que faz homenagem no nome à atriz que nasceu no município, tem como objetivo incentivar cada vez mais as produções das artes cênicas, entre amadores e pro- ssionais, além de promover intercâmbio de ideias, o pensa-mento crítico e o debate; esti-mular a formação de grupos e novas propostas de encenação; e oferecer arte à comunidade.

É realizado nas dependên-cias do Teatro Municipal Cacil-

Eventos prometem animar amantes da arte teatral

da Becker pela Prefeitura Mu-nicipal de Pirassununga, sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Cultura e Turis-mo. A coordenação geral é de Israel Foguel. Atualmente, o festival é nacional, com a parti-cipação grupos de outros esta-dos, a exemplo do ano passado. Isso leva à procura de variados

grupos de diversas cidades pe-las orientações de como se ins-crever no evento, um dos mais esperados da cidade.

Em julho, é a vez do famoso Filo (Festival Internacional de Londrina), um dos mais impor-tantes do País. Lugar de encon-tro de diferentes escolas teatrais e de variadas linguagens, a festa,

que ocorre entre os dias 5 e 20, caracteriza-se por seu forte ape-lo pluralista. Apesar de pessoas e culturas tão diferentes, porém, todas parecem unidas pelo amor de estar no palco. É no evento que se reúnem alguns nomes não apenas do teatro nacional, mas também do internacional, apresentando espetáculos e dis-

cutindo questões que tocam a cultura e, também, a sociedade, já que esta não pode estar com-pletamente dissociada de qual-quer tipo de arte. As inscrições para o Filo ainda estão bertas.

Existente já há 40 anos e organizado pela Amen (Asso-ciação dos Amigos da Educa-ção e Cultura Norte do Paraná) e pela UEL (Universidade Es-tadual de Londrina), o festival é respeitado por, durante todo o período, ter valorizado prin-cípios como a democratização da cultura, a valorização do ar-tista e a construção da cidada-nia. Por tais motivos, e por ter conseguido se manter ativo du-rante quase meio século, é con-siderada uma festa visionária.

Para se ter uma ideia da sua importância, a amplitude do Filo, a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), com base na atuação do festival na cons-trução de uma cidadania através da cultura, reconheceu o evento. No ano 2000, a festa ganhou a inclusão da chancela, sob a for-ma de apoio institucional. O fes-tival também é considerado um patrimônio cultural de Londrina e do estado do Paraná.

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A Funceb abriu cinco editais para artes visuais, dança, teatro e música

A cidade paranaense organiza em julho o Festival Internacional de Londrina, um dos mais importantes do País

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9Abril de 2009Jornal de Teatro

Dança

Imagem drag sinhá moça da pós-modernidade, enveredar por uma lombra catártica ou perver-são fragmentada, não-linear e entupida de lacunas. Entendeu? Não se preocupe, pois poucas pessoas seriam capazes de deci-frar o verdadeiro signi cado das palavras ou a forma como elas são empregadas para de nir a arte desenvolvida pelo Dimen-ti, da Bahia. Talvez venha daí a sensação de polêmica causada pelo grupo e a impossibilidade de classi cação imediata de sua produção.

“Existe uma ansiedade mui-to grande em localizar os nossos trabalhos como teatro ou dança e ainda como adulto ou infanto-juvenil”, comenta Jorge Alencar, diretor-artístico do Dimenti. Ou-tro argumento é o fato da forma-ção dos integrantes ser bastante híbrida. “Isso causa desconfor-tos numa percepção mais fun-damentalista”, diz. “Não acredi-tamos em delidade, origem ou essência de uma obra, somente em possíveis e amplíssimas rela-ções criativas”.

Desde a sua criação, em 1998, o Dimenti vem utilizando diver-sas linguagens cênicas e audiovi-suais. A escolha pela mescla re-monta ao surgimento do grupo, feito de pro ssionais de diferen-tes áreas (teatro, dança, música, letras, comunicação, psicologia) em nível de graduação e de pós-graduação. “Estabelecemos inter-faces com outras mídias, a exem-plo de traduções cênicas de obras literárias. Atualizamos discussões que instiguem questões contem-porâneas”, revela Alencar.

EVOLUÇÃO Com o passar dos anos, o

Dimenti rmou a sua atuação tanto como grupo de pesquisa artística quanto como produto-ra cultural, realizando circuitos de repertório, o cinas, deba-tes, intercâmbios, publicações e audiovisuais (CDs, DVDs, videoclipes, documentários e curta-metragem). Hoje, reside num espaço em Salvador cha-mado Palco 4 – Atelier de Arte e Cultura e conta com oito in-tegrantes permanentes e ou-tros vários colaboradores que atuam nos espetáculos ou em

algum processo de criação em diferentes funções.

Como as atividades artísti-cas e da produtora estão conec-tadas, todo o apoio recebido (das verbas obtidas em editais públicos à circulação dos espe-táculos) vão para uma espécie de “fundo nanceiro” que pro-cura garantir ao grupo a autos-sustentabilidade. Atualmente, o grupo mantém todos os espe-táculos do repertório em ativi-dade, entre eles “O Alienista”, “Chá de Cogumelo”, “A Nove-la do Murro”, “Tombé”, “Pool Ball”, “Chuá”, “O Poste”, “A

Polêmicas e outras mídias no palco

Quem é: Companhia DimentiOnde está situada: em Salvador, no espaço chamado Palco 4 – Atelier de Arte e CulturaIntegrantes: Oito permanentes e outros colaboradores Espetáculos que fizeram história: “O Alienista” (1998), “Chá de Cogumelo” (1999), “A Novela do Murro” (2001), “Tombé” (2002) e “Batata!” (2008)Participação em festivais: II Fenateg (Paraíba), Enartci (Minas Gerais), Festival do Teatro Brasileiro VII Edição – Cena Baiana em Pernambuco (Pernambuco), Festival Nordestino de Teatro de Guaramiranga (Ceará), Mostra Sesc de Artes (Bahia), Festival Internacional de Artes Cênicas (Bahia), Panorama de Dança (Rio de Janeiro), Sensações Contrárias: Rio Cena Contemporânea (Rio de Janeiro), Play Rec - Festival Internacional de Videodan-ça do Recife (Pernambuco), Mostra "Brazil Knows What Videoart Is" – Centro Cultural Le Cube (França) e Fivu (Festival Internacional de Videodança de Montevideo), além de ter sido premiado como “Melhor Vídeo Experimental do Festival de Gramado Cine-Vídeo”, em 2007, e prêmio Porta Curtas no XI Festival Nacional de Vídeo – imagem em cinco minutos (Bahia)

Trabalhos realizados por Jorge AlencarComo performer, o ator, atual diretor artístico do Dimenti, colaborou em trabalhos como “Casa de Nina”, “Prisão do Ventre” e “O Mistério do Chiclete Grudado”. Foi in-dicado ao The Rolex Mentor And Protégé Arts Initiative (Suíça). Como dançarino, atuou em peças do repertório clássico como “O Lago dos Cisnes” (2001) ao lado de Ana Botafogo e Cecíllia Kerche e em trabalhos de Dança Contemporânea como “Pele” (2002) de Ivani Santana e “O Carvalho” (2008) de Fátima Suarez. Como diretor, es-trelou duas obras no Ateliê de Coreógrafos Brasileiros. Em 2005, compôs o espetáculo “A Lupa” e foi convidado para elaborar uma nova obra no Ateliê de Coreógrafos Brasileiros Ano V em sua edição comemorativa, criando “A Mulher-Gorila” (2006).

Impossibilidade de classificação imediata de sua produção faz do Dimenti, na Bahia, um grupo que transita livremente entre o teatro e a dança

ATOS & CENAS ACERVO

Mulher e o Bambu”, “Batata!” e “Sensações Contrárias”.

Segundo o próprio diretor, dois deles podem ser destacados pelas diferentes, às vezes, con-troversas recepções que tiveram, tais como “Chuá”, uma releitura de “O Lago dos Cisnes” para crianças e “Batata!” – uma li-vre tradução de autores baianos contemporâneos do universo de Nelson Rodrigues. “Todos os nossos trabalhos já foram se-lecionados para projetos e festi-vais por todo o País e o “Sensa-ções Contrárias” foi exibido no Brasil, na França e no Uruguai”,

acrescenta o diretor.Em abril de 2009, o Dimenti

vai apresentar três diferentes tra-balhos em Berlim, na Alemanha, e realizará a terceira edição de um encontro chamado “Intera-ção e Conectividade”, que reúne artistas de diferentes partes do País com mostras, o cinas e de-bates. “Queremos cada vez mais nos estruturar para garantir uma maior autonomia do grupo e de seus integrantes em relação às suas demandas e projetos para assegurar nossa liberdade cria-tiva, controversa, mas, para nós, sempre produtiva”, naliza.

Divulgação

Grupo Dimenti encena o espetáculo “Chuá”, uma releitura de “O Lago dos Cisnes”, um dos destaques segundo o diretor Jorge Alencar

Por Adriana Machado

Page 10: Jornal de Teatro Edição Nr.1

10 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Vale a pena participar de festivais?Por Rodrigoh Bueno

Um grupo de jovens ato-

res pernambucanos cruza o país de ônibus para apresentar seu trabalho e, sem verba para voltar para casa, se vê em uma difícil questão: como retornar para sua cidade sem dinheiro, e como seguir com o sonho de divulgar o trabalho mesmo com tantas di culdades? O que pare-ce um texto de algum espetácu-lo é parte da história da Cênicas Companhia de Repertório, e um momento considerado mágico para os membros da trupe.

O episódio aconteceu no Festival de Teatro de Curitiba em 2002 e para Antônio Rodri-gues, diretor do grupo, signi- cou “uma das histórias ines-quecíveis da carreira”.

“Fomos com dois espetácu-los, “Um Gesto Por Outro” de Jean Tardieu e “Transe” de Ro-nald Radde. A empreitada foi bastante arriscada, fomos com a cara e a coragem numa pro-dução coletiva, sem verbas su- cientes pra a viagem. Tivemos uma boa recepção do público e dos poucos jornalistas que as-sistiram aos espetáculos, porém passamos por momentos muito difíceis e de superação, mas essas di culdades nos fortaleceram ainda mais e a viagem ajudou no nosso amadurecimento enquan-

Pela experiência de algumas companhias de teatro, a resposta é ‘sim’, mesmo com as dificuldades financeiras e de incentivo enfrentadas

to pessoas e artistas”, conta.O Cênicas já era um grupo

apaixonado por festivais antes desta experiência em Curitiba e o episódio não abalou a pai-xão de cada um dos integrantes pelas viagens. O motivo que leva esses atores a se lançarem, mesmo quando as condições são adversas, é a possibilidade de mostrar o trabalho para o maior número de pessoas pos-sível. “O mercado de trabalho é difícil e competitivo, mas temos que buscar soluções para que a peça seja vista por um número maior de pessoas, pois como teatro é efêmero, nenhum re-gistro de vídeo ou fotogra a re ete o que acontece de fato entre artista e espectador. É um momento único e que por mais que seja tecnicamente impecável, acredito que uma apresentação nunca será igual a outra”, revela Rodrigues.

A di culdade que um grupo formado fora do grande eixo te-atral brasileiro encontra também pode ser resolvida com essas via-gens. A visibilidade é um fato e uma maneira de trocar experiên-cias com outros grupos e críticos. “Há no Brasil festivais muito im-portantes e, com certeza, Curiti-ba é um deles, pois os olhos do país se voltam para o que está acontecendo por lá. Os festivais em sua maioria aglutinam as pessoas que são formadoras de opinião e isso pode levar a uma projeção nacional. No caso de Curitiba diversos grupos come-çaram a sua projeção depois de participarem da mostra para-lela, o Fringe. Dentre eles o Espanca (MG), Grupo XIX

de Teatro (SP), Luna Lu-nera (MG) e Coletivo

Angu de Teatro (PE)”.

PERSEVERANÇAO Cênicas surgiu em 2001,

como fruto da iniciativa de atores de Garanhuns, interior de Pernambuco, que viviam em Recife. Para marcar a es-treia, escolheram (ou melhor, foram escolhidos para) partici-par de seu primeiro Festival, o FIG – Festival de Inverno de Garanhuns. ”Umas das coisas mais ricas que os festivais pro-porcionam aos grupos e com-panhias, são as possíveis trocas estéticas e de referências que possam vir a partir do contato desse coletivo de artistas. As-sistir espetáculos de estéticas e regiões diferentes, conversar mesmo que informalmente com esses artistas e buscar fa-zer avaliação sistematizada das informações pode ser muito valioso na pesquisa dos gru-pos”, acredita Rodrigues.

Em outros casos esta tro-ca pode nem ser presencial, ou melhor, primeiro se dar em uma esfera virtual para depois acontecer pessoal-mente. Este é caso de Antô-nio e Cláudio Dias, da com-panhia mineira Luna Lunera. Acompanhando o trabalho do grupo, que na época via-java o país com o espetáculo “Aqueles Dois”, de Caio Fer-nando Abreu, Antônio bus-cou o contato de Cláudio em comunidades virtuais e assim começou uma parceria Reci-fe–Belo Horizonte.

Parceria que surgiu a partir do interesse pelo autor e que se concretizou quando o Luna Lunera viajou para Recife, no nal de 2008. “Estávamos em cartaz com o espetáculo em São Paulo, no Sesc Paulista, e a apresentação de Recife precisava de um apoio por lá. Toni se pronti cou e ajudou

com detalhes de

produção, mesmo sem co-nhecer pessoalmente o gru-po” conta Cláudio, outro ator que tem uma história íntima com os festivais de teatro.

“Minha formação de ator está bastante relacionada com os festivais, pois acompanhei de perto os espetáculos e as discussões que aconteciam na cidade, como o FIT – Festival Internacional de Te-atro Palco e Rua, e o ECUM - Encontro Mundial de Artes Cênicas. Lá tive contato com referências mundiais e com pensadores de teatro que es-timularam o meu trabalho e a minha pesquisa” conta.

Naturalmente se deu a pas-sagem de espectador para parte do FIT, já com a companhia. Em 2001 o Luna Lunera foi selecionado para apresentar “Perdoa-me por me traíres”, de Nelson Rodrigues com dire-ção de Kalluh Araújo. O grupo voltou ao palco do festival com outros dois espetáculos, “Não desperdice sua única vida, ou..” e “Aqueles Dois” – premiado no 13º Prêmio Sesc-Sated MG nas categorias Melhor Espetáculo e Melhor Direção (Cláudio Dias, Marcelo Souza e Silva, Odilon Esteves, Rômulo Braga e Zé Walter Albinati); no 5º Prêmio Usiminas-Sinparc nas categorias Melhor Espetáculo, Melhor Di-reção e Melhor Ator (Rômulo Braga); e foi indicado ao Prêmio Shell São Paulo 2008 nas catego-rias de Melhor Direção, cenário

e Melhor Iluminação (Felipe Cosse e Juliano Coelho) - levan-do para casa o troféu de melhor iluminação de espetáculo em São Paulo no ano de 2008.

“Na primeira vez que parti-cipamos do FIT tivemos con-tato com a comissão que es-colhia os espetáculos e com a curadoria de outros festivais, o que ajudou a fechar novas tem-poradas em outras cidades e, a partir daí, vieram convites para novos festivais. Foi uma ótima vitrine. Aproveitamos a reper-cussão”, garante Cláudio.

Desde então, não pararam de surgir convites. O Luna Lunera já representou o Brasil no XII Temporales Internacionales de Teatro de Puerto Montt, Valdí-via e Santiago, no Chile; e esteve presente no Riocenacontempo-rânea/RJ, Porto Alegre EnCe-na/RS, Mostra da Cena Teatral Mineira, Festival de Teatro de Curitiba/PR, Festival Internacio-nal de Teatro de São José do Rio Preto/SP, Festival Internacional de Artes Cênicas da Bahia; além dos já citados FIT e ECUM.

NÚCLEO DE FESTIVAISAlguns destes eventos estão

relacionados. É o caso do Fes-tival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto, Porto Alegre EnCena, Festival Inter-nacional de Teatro Palco e Rua de Belo Horizonte, Riocenacon-temporânea; e mais os Festival Internacional de Londrina/PR e Cena Contempoânea – Festival Internacional de Teatro de Brasí-lia/DF, pertencentes ao Núcleo dos Festivais Internacionais de Artes Cênicas do Brasil.

O grupo de festivais foi criado em 2003 com a pro-posta de fortalecer e estimu-lar as artes cênicas no Brasil, além de ser uma importante ferramenta para difundir os

espetáculos brasileiros no ex-terior. Segundo a divulgação

do núcleo, “os festivais partici-pantes do Núcleo têm algumas especi cidades: além de serem internacionais e voltados às ar-tes cênicas, todos têm caráter público (são realizados pelo poder público ou entidades sem ns lucrativos), praticam preços populares, realizam uma programação de ativi-dades formativas e apresen-tam um painel da produção mundial das artes cênicas. O Núcleo dos Festivais ob-jetiva contribuir com a po-lítica de acesso à criação e à produção artística nacional, além de incentivar a circu-lação de espetáculos pelas cidades brasileiras.”

Reportagem

Antônio e Cláudio Dias atuam em “Aqueles dois”, de Caio Fernando Abreu

Diego Pisante / Divulgação

Page 11: Jornal de Teatro Edição Nr.1

11Abril de 2009Jornal de Teatro

retamente na assimilação e na relação do público com a obra”.

Segundo ele, um dos espetáculos do grupo, “Beckett”, foi convi-dado a uma turnê por Irlanda, Escócia e Es-panha. “Receando que a ideia de um grupo brasileiro encenando um autor irlandês – com bonecos, ainda mais – fosse criar algum tipo de rejeição, surpreendemo-nos com um êxito muito grande – público eufóri-co, briga na porta por ingressos, espectadores nos pedindo convites. Ao chegar a Glasgow, na Escócia, a poucos quilômetros dali, o es-petáculo simplesmente não funcionou: depara-mo-nos com um público seco, que reagia de forma completamente diferente aos diferentes momentos do espetáculo”.

A lista de festivais e mostras em que o grupo esteve presente é grande, algumas cidades são Nova Friburgo/RJ, Campinas/SP, Santos/SP, Canela/RS, Ribeirão Preto/SP, Rio de Janeiro/RJ, São Paulo/SP, Curitiba/PR, Porto Alegre/RS, Ouro Preto/MG, São João Del Rei/MG, São José do Rio Preto/SP, Mariana/MG, São Carlos/SP, Olinda/PE, Belo Horizonte/MG, Bonito/MS, Ja-raguá do Sul/SC, São Bernardo do Campo/SP, Santo André/SP, Garanhuns/PE, For-taleza/CE, Nova Igua-çu/RJ, Brasília/DF, Campos de Goytaca-zes/RJ, Rio do Sul/SC, Corumbá/MS, Suzano/SP e Juazeiro do Norte/CE. Além de espetáculos no Chile, Espanha, Co-lômbia, Irlanda, Escócia e Argentina.

A pernambucana Cênicas pode não ter se apresentado (ainda) na Europa, mas tem motivos de sobra para comemorar. No ano de 2003 o grupo voltou ao Festival de Curi-tiba com o patrocínio da cidade de Garanhuns. No retorno para Recife, novas referências, novos convi-tes para participação em festivais e prêmios como Melhor Espetáculo, Me-lhor Ator (Jorge de Pau-la), Melhor Iluminação e Melhor Sonoplastia como espetáculo “As Criadas”, de Jean Genet, no Janeiro de Grandes Espetáculos. Uma prova de que, mes-mo com as adversidades enfrentadas no início, va-leu a pena perseverar.

Reportagem

A estreia do Festival de Te-atro de Curitiba aconteceu em 1992 e desde então coleciona números grandiosos. Foram cerca de 1,3 milhões de pesso-as nas mais diferentes platéias, 1890 espetáculos que ocupa-ram ruas, praças, banheiros, bares e, en m, teatros.

O número de 2009 é 18, a idade que marca a maioridade do evento que mesmo entre contradições ainda é um dos mais respeitados pela crítica e pelas companhias de todo o Brasil. Para comemorar, a produção apresenta uma lista de mais de 300 espetáculos à disposição do público – fora as cada vez mais variadas ativi-dades de cultura, talvez um re- exo da mudança de nome que aconteceu em 2008, de Festival de Teatro de Curitiba para Fes-tival de Curitiba.

O Risorama, espaço para humor à stand-up comedy, já um dos eventos paralelos mais aguardados do ano na cidade, rmou-se o cialmente junto a programação o cial. O Mish Mash ainda é novidade e reúne artes circenses como a dança, mágica e malabarismo. A no-vidade de 2009 é o Gastrono-mix, um projeto que promete unir gastronomia à música. Chefs convidados preparam seus pratos embalados por música especialmente escolhi-da para a ocasião. Enquanto preparam os pratos explicam por que tal música combina com tal prato.

“O Festival cresce em todos os aspectos. Eventos, espetácu-los da Mostra, espetáculos do Fringe, além da quantidade de gente que podemos receber. Entendemos que ele se rma como uma grande vitrine das Artes Cênicas do Brasil. É uma

Festival de Curitiba alcança maioridadeEvento é considerado um dos mais respeitados do País

festa na cidade! As pessoas saem de casa e vão para os ba-res, ruas, cinemas, restaurantes e se sentem diferentes. Muda a intensidade do local, melho-ra a estima e tem impacto di-reto na economia, no turismo etc.”,disse Leandro Knopfholz, diretor artístico do Festival de Curitiba e um dos idealizadores do evento.

Os espetáculos mais co-mentados continuam na cha-mada Mostra Contemporânea, que na 18ª. edição traz 25 espe-táculos, sendo um deles o chi-leno “Sin Sangre”. A curadoria para esta mostra é de Tânia Brandão, Celso Curi e Lúcia Camargo.

A grande quantidade de espetáculos ainda se reúne no Fringe, espaço para as peças se lançarem nacionalmente e bus-carem a atenção de curadores de outras mostras e festivais.

HISTÓRIAA criação do Festival de

Curitiba é uma história contada anualmente com muito orgu-lho por seus idealizadores. Em uma mesa de bar, um grupo de jovens amigos tinha acabado de ver uma peça no Teatro Guaí-ra, o maior da cidade na época, quando lamentaram o pequeno número de peças de teatro em cartaz na cidade. Surgiu então a idéia de , ao invés de apenas lamentar, organizar um festival na cidade.

Em dezembro de 1991 acontecia a festa de lançamen-to do Festival, que iria estrear no dia 19 de março do ano se-guinte. Logo na primeira edi-ção, o Festival levou ao Paraná grandes nomes do teatro bra-sileiro, como Antunes Filho, José Celso Martinez Correia e Gabriel Vilella.

POR QUE PARTICIPAR?“Pela troca de informação,

novas referências, intercâmbio de idéias, visibilidade e, claro, retorno nanceiro” diz Cláudio Dias.

Segundo ele, o espetáculo “Aqueles Dois”, por exemplo, ainda sofre adaptações a partir das opiniões colhidas ao nal da peça em cada cidade. Quanto à referência de outras companhias, Dias cita a construção utilizada em algumas cenas da peça – fruto de uma o cina que o grupo fez com a Cia dos Atores, do Rio de Janeiro. “No FIT de 2002, am-bos apresentávamos espetáculos de Nelson Rodrigues e a apro-ximação foi quase inevitável. Um dos atores participava da produção do Riocenacontem-porânea e estivemos juntos por lá também. Depois veio o FIT em Belo Horizonte e passamos a manter um contato freqüente desde então”, conta.

Além das verbas destinadas por alguns festivais para que as produções apresentem os espetá-culos, as críticas e matérias publi-cadas na imprensa podem ajudar as companhias na captação de re-cursos para novas montagens.

Para Luiz André Cherubini, do Grupo Sobrevento, participar é importante “porque os Festivais são a melhor e mais segura ma-neira de circular com um espetá-culo. E porque navegar é preciso. Inclusive mais do que viver”.

ESPAÇO PARA TODOSO Sobrevento é um grupo

de teatro que se dedica desde 1986 à pesquisa da linguagem teatral, principalmente na arte dos bonecos e da animação. Além de ter participado de fes-tivais em muitos países, o gru-po realizou, dirigiu e foi cura-dor de festivais em quase todos os estados do Brasil. “Ao nal de cada Festival que realizou, o grupo disse que seria o último e se arrependeu logo depois”, garante, mostrando logo que se trata de outra companhia que vive com as malas prontas.

O que move o grupo para os eventos é novamente o in-tercâmbio, “a possibilidade de viver outras experiências, co-nhecer coisas novas acerca de nossa arte e nosso ofício”.

Luiz destaca as diferenças que o grupo percebeu entre as apre-sentações xas, quando o espetá-culo está em cartaz, e as de fes-tivais: “A diferença de públicos e de estrutura cênica marca profun-damente o desenrolar da apresen-tação e o estabelecimento da co-municação teatral. Determinados espetáculos sofrem mais do que outros com isto: montagens mais delicadas ou com características mais interativas, para dar apenas dois exemplos. Espetáculos mais fechados e mais técnicos tendem a di cultar a percepção, pelos ar-tistas, do sucesso do jogo teatral no momento em que se dá. Po-rém, independentemente disto, diferenças culturais interferem di-

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Festa do teatro atrai bom público e traz novidades para a 18ª edição

DivulgaçãoFotos: Divulgação

Page 12: Jornal de Teatro Edição Nr.1

12 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Zezé Motta atriz

“Quem desiste, não pode

ser feliz”Jornal de Teatro - Como

foi difícil te encontrar. A -nal, o que você está fazendo em Brasília?

Zezé Motta - Minha vida é muito louca, muito corri-da. Vou gravar um comercial amanhã (dia 17 de março), uma campanha incentivando as pessoas a pagarem o IPTU e que vai ao ar a partir de ju-nho. Mas na semana passada estive aqui para participar da abertura de uma conferência sobre igualdade racial. Inclu-sive, antes de nossa conversa, recebi outra ligação para tratar de assuntos referentes ao meu trabalho na luta pela defesa dos direitos autorais, vou car mais um tempo aqui para tra-tar mais desse assunto. Eu não paro nunca.

JT - Você está em cartaz com alguma peça no mo-mento?

ZM - Em abril vou estre-ar “7 – O Musical”, do Cláu-dio Botelho e Charles Möeller, com músicas de Ed Motta. Vamos estrear no teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo, com duração de três meses. Faço papel de má em “7”. É a pri-meira vez que faço uma vilã e estou me divertindo muito. O nome dela é Carmem, uma cartomante muito má que, para proteger uma cliente, persegue outra pessoa. Estou adorando.

JT - E fora dos palcos?ZM - Daqui a dois meses

vou começar a gravar “Caras e

Por Douglas de Barros

Do seleto grupo de artistas brasilei-

ros que se tornaram referência no ce-nário artístico na-cional, Maria José Motta de Oliveira, se destaca como

uma das poucas ar-tistas negras que atua-

vam em papéis de destaque na dramaturgia nacional desde que se

tornou Xica da Silva, no lme de mesmo nome do diretor Cacá Diegues.

Mas antes mesmo do sucesso nas telonas ou na te-levisão, Zezé já havia marcado presença no teatro bra-sileiro na fervilhante década de 1960. A atriz estreou no espetáculo “Roda Viva”, de Chico Buarque de Holanda,

logo após se formar em teatro no tradicional Tablado, de Maria Clara Machado. Além disso, já gravou oito

álbuns musicais e está prestes a lançar mais um. Mesmo tendo que se dividir em muitas para

dar conta de suas atividades pro ssionais, Zezé também se notabiliza por sua luta pelos di-

reitos dos artistas negros e sua militância frente aos direitos da classe artística no Brasil.

Entre gravações, conferências, reuni-ões e vida familiar, a atriz ocupa ainda, a convite do governador Sérgio Cabral, um cargo na recém-criada Superinten-dência da Igualdade Racial do Governo do Estado do Rio de Janeiro, em que cuida dos interesses de negros, índios, ciganos e todo tipo de ser humano que se sente discriminado.

Apesar da agenda corrida, a atriz, cantora e até mesmo diretora Zezé Motta conversou com o Jornal de Teatro por telefone em um hotel de Brasília, num dos poucos momentos que a atriz tem de descanso entre um trabalho e outro.

Bocas” pela Rede Globo, nove-la de Walcyr Carrasco e direção do Jorge Fernando. Vou entrar na segunda fase da novela, a partir do capítulo 60. Teve um boato sobre minha participa-ção em “Paraíso”, mas foi só especulação. Ontem (dia 15) comecei a gravar o novo lme da Xuxa, chamado “O Fantás-tico Mistério de Feiurinha”. As lmagens começam em julho ou agosto, mas nós lmamos porque tínhamos que aprovei-tar o navio italiano que estava atracado no Rio de Janeiro. No lme, eu faço o papel da Geru-sa, que conta a história da Feiu-rinha. Essa história na verdade é um livro do Pedro Bandeira que faz muito sucesso nas es-colas e é muito interessante. O enredo é um encontro de várias princesas de contos infantis e as mostra já casadas com seus príncipes cheias de lhos e tal, um barato. Parece que foi um achado da própria Sasha.

JT - Sua estreia no pal-co foi em “Roda Viva”, um clássico do teatro nacional. Como foi esse início?

ZM - Vim muito pequena para o Rio (Zezé nasceu em Campos, no norte- uminen-se), sinto-me carioca. Eu es-tudava em um colégio na Cru-zada São Sebastião, no bairro do Leblon, embora não tivesse direito porque não era mora-dora de lá, mas na época eu dei um jeitinho. Fiz o ginásio e ganhei uma bolsa para fazer o Tablado porque eu era muito

Entrevista

Page 13: Jornal de Teatro Edição Nr.1

13Abril de 2009Jornal de Teatro

Sempre recebo cartas de jovens me

pedindo opinião.

Digo para terem

perseverança e não desistir dos sonhos pois quem desiste não

pode ser feliz

dedicada, passava meus ns de semana estudando e não per-dia nenhum passeio ao teatro, ópera ou qualquer outro pro-grama cultural que a escola fa-zia. Gostava de teatro, mas não tinha pretensão, só depois des-cobri que queria isso. Quando terminei, a gente apresentou uma peça, o Flávio Santiago veio falar comigo, perguntou se eu queria seguir carreia e me falou do teste para o “Roda Viva”. Na semana seguinte z o teste e passei. Foi muito ba-cana. Em um mês já estava en-saiando. Depois de fazer muito teatro começaram a surgir as oportunidades. Primeiro para o cinema e em seguida televisão, quando a Marília Pêra me apre-sentou para o Bráulio Pereira, que me chamou para fazer a Zezé de Beto Rockfeller.

JT - E a música? Você gravou vários discos, inter-pretou canções de grandes compositores e costuma di-zer que é ‘cantriz’, não é ver-dade? Que espaço a música tem na sua vida?

ZM - Já gravei oito álbuns e as pessoas sempre me per-guntam se eu pre ro cantar ou representar. Eu respondo que me sinto em estado de graça dos dois jeitos. Quando tenho a oportunidade de juntar as duas coisas é perfeito. Canto muitas músicas nesse musical “7”. Levo minha experiência de atriz para a música, já que para cantar também é preciso interpretar.

JT - Então ainda preten-de lançar outros discos?

ZM - Estou sem gravar há uns seis anos, mas nesse ano de 2009 eu também vou gravar um CD e um DVD. Viu só quanta coisa? Tenho esse projeto que estava na la da gravadora Bis-coito Fino e quando vi que não ia rolar, resolvi mostrar para a Robby Digital e eles gostaram da ideia. Vão lançar no segun-do semestre desse ano. O CD vai se chamar “O Samba Man-dou Me Chamar” e vai ter mui-ta coisa inédita. Tinha até pen-sado em fazer releituras, mas como recebi tanto material bom e muita gente boa, acabei me empolgando.

JT - E os compositores? Já conhecidos ou pretende gravar canções de novos ar-tistas?

ZM - Tem Luiz Ayrão, Pau-lo César Pinheiro, Feital (Paulo César), Altay Veloso, Marqui-nho PQP, Serginho Procópio, entre outros. Um pessoal de primeira, além de composito-res mais novos.

JT - Você também dirige espetáculos, não é verdade?

ZM - Como diretora já ti-nha experiência com cantores como Jamelão, Leci Brandão e Ana Carolina ainda em Juiz de Fora. Inclusive, dei muita força para ela vir para o Rio. Recentemente, participei da supervisão de uma peça que estreou no porão da (Casa de Cultura) Laura Alvim, “Todo Amor Que Houver Nessa Vida” com Rogério Garcia e Felippo Leandro. Na verda-de, eu dei alguns palpites.

JT - Você é conhecida por

Entrevista

Fotos: divulgação

Zezé foi elogiada por sua atuação como Carmem no musical “7”. Sucesso de público e crítica no Rio de Janeiro, peça chega a São Paulo em abril

Page 14: Jornal de Teatro Edição Nr.1

Abril de 2009 Jornal de Teatro14uma postura combativa e en-gajada em projetos sociais e na luta por diversas causas.Como surgiu esse lado?

ZM - Foi uma coisa es-pontânea. Recentemente, fui convidada para fazer parte da Superintendência da Igualda-de Racial do Estado do Rio de Janeiro, um trabalho muito amplo e que cuida dos ciga-nos, índios, quilombolas e da saúde da população negra. Quando fui convidada pelo governador Sérgio Cabral, achei até que era um exagero. Achava que saúde devia ser para todos, o que é verdade. Mas depois me explicaram que existem algumas doenças que são exclusivamente de negros como a Anemia Falci-forme, uma doença que causa problemas nos glóbulos ver-melhos e pode levar a óbito. Estamos conversando com o ministro (da Saúde) Tem-porão para realizarmos uma campanha explicativa. Hoje em dia, com o teste do pezi-nho, já se acusa, mas há pes-soas adultas que podem ter e nem sabem.

JT – Neste tempo, você percebeu alguma melhora? Sua luta tem valido a pena?

ZM - Acho que sim. Se -carmos só reclamando e não arregaçar as mangas não va-mos avançar. Tive a ilumina-ção de participar da criação do Cidan (Centro de Informação e Documentação do Artista Negro) e isso ajudou muito. Quando a gente cobrava essa quase invisibilidade na mí-dia e nas artes, cada um dava uma desculpa. Diziam que os negros eram inseguros, que conheciam poucos artistas de qualidade. Daí surgiu o Cidan, que tem a nalidade de divul-gar. Já temos 21 anos e esta-mos muito felizes por termos feito a coisa certa. Hoje não se faz cinema, teatro ou televisão sem que sejamos consultados. Hoje esse contato se tornou mais fácil porque podemos dizer quem somos e onde es-tamos.

JT - O que você está achando da atuação da Jan-dira Feghalli à frente da Se-cretaria de Cultura do Rio?

ZM - Ainda é muito cedo. A nomeação dela assustou um pouco, mas acho que devagar as coisas vão se ajeitar. A Jan-dira tem se mostrado disposta a conversar com a classe artís-tica. Vamos torcer para que ela faça um bom trabalho.

JT - E sua vida hoje? É mesmo todo esse corre-corre ou você tem tido mais tempo para você e sua família?

ZM - É muito corrida, mas tenho tempo para mim sim. O segredo é contar com

• Roda-viva, de Chico Buarque, direção de José Celso Martinez Corrêa – 1967

• Fígaro, Fígaro

• Arena conta Zumbi

• A vida escrachada de Joana Martine e Baby Stompanato – 1969

• Orfeu negro – 1972

• Godspell - 1974

• Abre Alas, de Maria Adelaide Amaral – 1999

• Atualmente estrela Sete, O musical, de Cláudio Botelho e Charles Möeller

uma boa equipe e ter discipli-na. Acordo muito cedo, por isso o meu dia rende muito. Aos sábados faço pilates e, como moro na Lagoa (Ro-drigo de Freitas), caminho na orla sempre que posso. Já minha família me visita mais do que eu a ela. Passei o Carnaval com a minha mãe e aos domingos faço uma reu-nião com minhas seis lhas de coração. A gente conversa, come pipoca e assiste a vários lmes.

JT - Essa onda de papa-razzo tem te atrapalhado? Como conviver com isso?

ZM - Não tem me atrapa-lhado. Não estou em um mo-mento diferente, não sou mais novidade e não desperto a atenção deles.

PRINCIPAIS TRABALHOS

DE ZEZÉ MOTTA NO TEATRO

JT - E a nova geração? Você tem acompanhado os novos talentos? Quem você destaca?

ZM - Tem muita gente jo-vem pintando e é difícil pre-ver. Tento fugir do óbvio mas tenho acompanhando o ama-durecimento da Taís (Araú-jo), Claudinha Abreu, que já está virando veterana, Wagner Moura e o Lázaro (Ramos).

JT - E aqueles famosos conselhos para quem quer ingressar na carreira, você também tem para oferecer?

ZM - Sempre recebo cartas de jovens me pedindo opinião. O que digo é para ter perse-verança e termino as cartas dizendo que não desistam do sonho, pois quem desiste não pode ser feliz.

Entrevista

Zezé Mo a admite que sua vida é corrida, mas garante arrumar tempo para os seus lhos e família. Acordar cedo é uma tática para fazer o dia render

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15Abril de 2009Jornal de Teatro

Política Cultural

O principal medo dos pro-dutores culturais de perderem patrocínios já pode ser perdido. O MinC (Ministério da Cultura) lançou uma nova legislação de es-tímulo à cultura que estará dispo-nível para consulta pública no site do ministério (www.cultura.gov.br).

A legislação foi liberada esta semana pelo setor jurídico da Casa Civil, e promete acalmar os ânimos de quem achava que seria extinto o mecanismo de renúncia fiscal. A nova legisla-ção é uma alteração da Lei Rou-anet – lançada em 1991 e prevê incentivo a empresas e indiví-duos que desejam financiar pro-jetos culturais – que estabelece mais quatro faixas de renúncia fiscal. Atualmente existem ape-nas duas, de 30% e 100%, com a alteração serão acrescidas as de 60%, 70%, 80% e 90%.

Segundo o MinC, essa mu-dança visa evitar que empresas continuem deduzindo do Im-posto de Renda 100% do valor destinado a projetos culturais. O ministro da Cultura, Juca Ferreira, disse que a abertura da consulta pública do texto da lei permitirá que entidades do setor, produtores culturais, empresas e artistas façam su-gestões ao projeto durante um período de 45 dias. O ministro ainda irá viajar pelo Brasil para debater essas modificações.

Quem irá decidir quais as mi-croempresas e agência culturais que poderão ter direito às dis-tintas faixas de renúncia será a Cnic (Comissão Nacional de In-centivo a Cultura). O conselho, formado por representações do

MinC lança lei que reduz tributo de produtores culturais

governo e da sociedade, adotará critérios para o uso dos impos-tos. Ele será de nido, anualmen-te, por meio de portaria, onde serão relacionados cada critério com cada faixa de renúncia.

Projeto cultural que não te-nha integrado em seu espaço um projeto de acessibilidade terá dificuldade de ser aprovado. Foi o que disse o ministro Juca Ferreira, em entrevista ao jornal “Folha de São Paulo”. “Toda vez que tiver dinheiro público, tem que ter benefício público, ou não se justifica”, informou o ministro ao jornal.

OUTRAS MODIFICAÇÕES

Uma das maiores novidades da recente legislação é a cria-ção de cinco novos fundos de financiamento direto à cultura. São eles o fundo de audiovisual, de memória e patrimônio, de ci-dadania e diversidade, de arte e de equalização. Todos eles com o objetivo de ampliar o leque de áreas culturais para incentivo.

Outro fato de extrema im-portância é a manutenção do Fundo Nacional de Cultura que contará com recurso do Tesou-ro Nacional e também do Fi-cart, um fundo de capitalização. Com a renúncia fiscal, esses ou-tros mecanismos de incentivo ficaram debilitados.

Segundo o ministério, a Lei Rouanet precisava de meca-nismos que pudessem acabar com a concentração regional do financiamento e o baixo apoio à atividades culturais em áreas isoladas que, por exem-plo, contenham baixos Índices de Desenvolvimento Humano

(IDH). A respeito disso o de-putado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) encaminhou um re-querimento pedindo acesso ao texto da nova lei para que, no âmbito da Comissão de Educa-ção e Cultura (CEC) da Câmara dos Deputados, seja criada uma relatoria para debater o projeto. O deputado também defende a ideia de realizar-se um audiên-cia pública a respeito das modi-ficações, para que a população e a sociedade artística, cultural, possa compartilhar das mudan-ças e assim cooperar para que a atuação dela seja eficiente.

RELEMBRANDOEm dezembro do ano pas-

sado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei Complementar 128 que exclui as produtoras culturais do Sim-ples Nacional. Segundo Lula, tal atitude foi uma “medida emer-gencial para conter os efeitos da crise econômica”, e como solu-ção aumentou a carga tributária das produtoras culturais, que devem pagar entre 16% e 22% sobre o valor dos projetos. Com o Simples Nacional, ou Super-simples, a carga tributária era entre 4,5% e 16%, um aumento considerável.

Como era de se esperar, hou-ve uma forte manifestação dos produtores que chegaram a cha-mar a lei de “pacote bigorna”, e fez com que o presidente da Funarte (Fundação Nacional de Artes), Sérgio Mamberti tomas-se um susto. “O impacto na nos-sa área não foi previsto e, para nós, foi mesmo uma surpresa”, disse o presidente à época.

Em represália à atitude do

Governo, os agentes culturais en-viaram à Funarte um abaixo-assi-nado, este ano, com mais de 200 nomes, questionando a medida e chamando a atenção para um di-álogo urgente. Outro abaixo-assi-nado endereçado ao Congresso e realizado pelo Instituto Pensarte, ainda está circulando na internet (http://www.petitionline.com/

ip9s1234/petition.html) com quase 4 mil assinaturas.

A Funarte começou a agir nos bastidores do MinC na busca de uma solução que re-vertesse os efeitos negativos da lei complementar. A instituição também participou de algumas reuniões que cooperaram para a modificação na Lei Rouanet.

Por Ana Paula Bessa

Para Juca Ferreira, projetos não serão aprovados sem ações de acessibilidade

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Page 16: Jornal de Teatro Edição Nr.1

16 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Criado há 22 anos, o Institu-to Itaú Cultural busca encorajar ações ligadas à cultura brasileira. Com sede construída em São Pau-lo nos anos 90, mas ativo em pro-gramas distribuídos em todo País, os investimentos em pesquisa e mapeamento se destacam dentro da instituição que guarda espaço para diversas áreas como música, arte, cinema, dança e teatro. Os dois últimos fazem parte de um núcleo especí co chamado “Cêni-cas”, criado oito anos atrás.

Diferentemente do que mui-tos possam pensar, o espaço de-dicado às artes teatrais dentro da sede não pretende estrear peças para mantê-las em cartaz durante longos períodos de tempo. A ge-rente do núcleo “Cênicas”, Sônia Sobral, explica que a verba dos programas do instituto tem cará-ter nacional e por isso lançar peças não é a prioridade. “O que temos na sede da avenida Paulista é um teatro com capacidade para 250 pessoas, que dividimos com todas as outras áreas da instituição. Nos-sa missão é, na realidade, organi-zar e difundir informações sobre o teatro brasileiro, articulando re-lações nacionalmente”.

As peças apresentadas não -cam em cartaz por muito tempo, geralmente funcionam como uma forma de divulgação e incentivo para outros programas. “Não so-mos um teatro de pauta. Tudo que é apresentado precisa estar ligado a um projeto maior e isso nos faz diferente de qualquer outro espa-ço da cidade”, completa Sônia.

São dois grandes programas que guiam o seguimento teatral do “Cênicas” na maioria de suas ações: a Enciclopédia Itaú Cultural de Te-atro e o Próximo Ato – Encontro Internacional de Teatro. Ambos abrangem a visão nacional do ins-tituto e são trabalhos constantes para o núcleo de teatro e dança.

VERBETES ON-LINEUma das ações mais importan-

tes do Instituto Itaú Cultural é a Enciclopédia. São cinco delas que reúnem verbetes de diversas for-mas de expressão artística, como artes visuais, literatura e teatro. Todas são obras on-line, disponí-veis gratuitamente no site da ins-tituição (www.itaucultural.com.br) e são constantemente atualizadas sobre artistas, conceitos e obras.

Além do acesso às enciclopé-dias, o site da instituição guarda o maior acervo de artes visuais do Brasil, com quase 30 mil imagens na Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais e 3,3 mil verbetes entre todas as enciclopédias.

A Enciclopédia Itaú Cultural de Teatro é uma das mais antigas

do instituto, lançada em 2004, com os conselheiros Johana Albuquer-que, João Roberto Farias e Fatima Saadi. No início, apenas São Paulo e Rio de Janeiro estavam incluídos nos resultados. Hoje, as referên-cias da enciclopédia se expandi-ram geogra camente e incluem obras, artistas, diretores, grupos, espetáculos, cenógrafos, autores e conceitos de Minas Gerais, Per-nambuco e Rio Grande do Sul em seus quase 800 verbetes, imagens e maquetes. “É um trabalho contí-nuo, diário, com as atualizações no nosso acervo digital. Fazemos um lançamento dos novos verbetes por ano. Os dois últimos tiveram peças que caram em cartaz du-rante duas semanas, com grande sucesso”, explica Sônia Sobral.

As últimas peças apresentadas na sede da instituição em São Pau-lo aconteceram justamente para lançar os novos verbetes da enci-clopédia. Em 2008, a companhia Os Satyros encenaram “Vestido de Noiva”, do nordestino Nelson Rodrigues, com Norma Bengell.

Em fevereiro desse ano, para promover a presença dos minei-ros, pernambucanos e gaúchos na enciclopédia, peças que faziam referência a Nelson Rodrigues e Gilberto Freire e ao autor gaúcho Qorpo Santo foram apresentados pelos grupos Os Fofos Encenam e Giramundo, respectivamente.

O processo de criação da peça “Memória da Cana”, baseado em textos de Rodrigues e Freire, e “As Relações Naturais”, texto de Qorpo Santo, montado em um es-petáculo de bonecos dos mineiros do Giramundo, foram sucesso de público e deram visibilidade aos novos verbetes da enciclopédia, apesar de terem permanecido ape-nas duas semanas “em cartaz”.

FOCO NACIONALBuscando descentralizar a pro-

dução cultural no Brasil, o Institu-to Itaú Cultural criou há 12 anos o programa Rumos. É uma iniciati-va que pretende nanciar, desen-volver e identi car os trabalhos artísticos de diversas áreas como cinema, educação, jornalismo cul-tural, literatura, música e dança.

Já são mais de 700 projetos apoiados e mais de 18 mil traba-lhos inscritos. Todo o conteúdo produzido e nanciado pelo Ru-mos é distribuído gratuitamente para emissoras de televisão e ou-tras instituições.

Apesar do cenário teatral não ter ainda um programa particular no Rumos, Sônia Sobral a rma que “o programa ‘Próximo Ato – Encontro Internacional de Teatro’ caminha para se tornar um Rumos em breve, já que começa a ser um encontro de caráter nacional, em todas as regiões do País”.

LONGE DO MAINSTREAMO “Próximo Ato – Encontro

Internacional de Teatro” chega a sua sétima edição neste ano. As reuniões de três dias que incluem palestras, seminários e fóruns de discussão já foram registradas no Sul, Sudeste e Nordeste do País. São espaços para trocar experiên-cias entre os pro ssionais da área, articulando o teatro de grupo no Brasil. “Já discutimos muito aqui o que seriam esses teatros de gru-po brasileiros convidados a parti-cipar do programa. O que busca-mos é articular relações com os grupos engajados, investigativos, teatros de pesquisa mesmo. Não são encontros direcionados para

o mainstream ou companhias grandes”, explica a gerente do núcleo “Cênicas”.

Até o nal do ano, o “Próxi-mo Ato” terá reunido grupos tea-trais em todas as regiões do Brasil, com a ajuda de coordenadores em cada uma delas que pesquisam e mapeiam os possíveis participan-tes para depois fazer o convite e organizar o encontro, os conse-lheiros são Antônio Araújo, José Fernando Azevedo e Maria Ten-dlau. “Uma equipe grande traba-lha conosco para que nenhuma região que sem representação”, garante Sobral. “Durante os en-contros, como são muitas pessoas no mesmo espaço, usamos técni-

cas de comunicação para grupos grandes (open space)”.

Os encontros de troca de ex-periências acontecem ainda em 2009 em três capitais brasileiras. Brasília, representante da região Centro-Oeste, e Belém, represen-tando os Estados do Norte, rece-bem pela primeira vez a reunião de palestras e seminários em agos-to e setembro, respectivamente. Em novembro, a capital paulista hospeda o encontro de todos os grupos convidados do País para um grande encontro nacional. “É uma oportunidade para trocar ex-periências entre grupos grandes que trabalham com o teatro”, -naliza Sônia Sobral.

Marketing Cultural

Instituto Itaú Cultural investe em pesquisa e mapeamento

Por Ive Andrade

Foco da instituição é incentivar a cultura e a arte brasileira ajudando a desenvolver trabalhos de diversas áreas como música, dança e teatro

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“ Rumos Artes Visuais - Trilhas do Desejo”: 72 trabalhos expostos até o dia 10 de maio no Itaú Cultural

Logo na entrada o visitante se informa sobre as atrações. Peças teatrais são atrações constantes

Page 17: Jornal de Teatro Edição Nr.1

17Abril de 2009Jornal de Teatro

Técnica

Por Bruno Pacheco

As perucas, apliques e acessórios para os cabelos es-tão presentes em quase toda produção teatral. Seja ela de grande ou pequeno porte, com orçamento limitado ou não, é praticamente indispen-sável a utilização desses obje-tos de indumentária no pro-cesso de caracterização dos personagens e na ambientação do espetáculo. No teatro líri-co, por exemplo, existe um se-tor especialmente para cuidar deste importante item: a peru-caria. E o pro ssional respon-sável por esta área, conhecido como peruqueiro, precisa es-tar atento às novidades para se adequar aos orçamentos sem prejudicar a qualidade da apre-sentação. Por conta disso, ele estuda o roteiro, faz pesquisas e, em parceria com o guri-nista, confecciona as perucas de acordo com o que está sen-do produzido. Um trabalho técnico e dispendioso, mas es-sencial a qualquer ópera, balé e musical de sucesso.

O uso moderno de perucas começou na França de Luiz XIII, mas a origem do artefato se deu em civilizações mais an-tigas. No século IV a.C, mulhe-res gregas já usavam apliques de cabelos arti ciais. E no teatro? “Se consideramos as cerimônias religiosas como formas embrio-nárias da atividade teatral, en-contramos a peruca na cabeça de reis e sacerdotes egípcios na execução de ritos sagrados e, na Grécia, em procissões ao Deus Dioniso (não confundir com os históricos Dionísios)”, explica Maria Sutter, professora e coor-denadora da área de letras clás-sicas da PUC - Rio.

No Brasil, as perucas che-garam à sociedade com a corte portuguesa e no teatro com as primeiras companhias europeias, que se apresenta-vam no País como a Comedy Francese. Na década de 1970, a peruca viveu o seu momento de maior popularidade. Era a moda do momento e a maio-ria das mulheres queria ter a sua. Nos anos 1980, caiu em declínio e, atualmente, passa por uma fase de revitalização. Seja de bras vegetais, crinas de cavalos, os de lã, cabelos naturais ou os sintéticos, elas sempre ressurgem como um recurso válido tanto na vida particular como no palco.

A argentina Divina Lujan Soares é peruqueira do Teatro Municipal do Rio de Janeiro há 31 anos. Diz que perdeu as contas de quantas perucas

NO CURRÍCULO “LA TRAVIATA” COM ZEFIRELLI

Dos 100 anos que o Teatro Municipal do Rio de Janeiro completa agora em 2009, a peruqueira argentina Divina Lujan Soares participou ativamente deles nos últimos 30. Sem perder o sotaque portenho, nestas três décadas à frente do setor de perucaria no teatro carioca, Divina acumula muitas histórias. Nesta conversa com o Jornal de Teatro, ela fala da importância do teatro e das perucas em sua vida e da experiência única de ter trabalhado com o italiano Franco Zefirelli no Brasil.

Quando o teatro entrou na sua vida? E as perucas? Eles entraram praticamente juntos. Eu trabalhava como cabeleireira na

Argentina e sempre gostei muito de cabelos. Estudava e pesquisava sobre eles. Eu queria mais e decidi me preparar para entrar no Instituto do Teatro Colón, que é um teatro lírico muito conhecido. Fui aprovada e estudei histó-ria da arte e várias áreas dos bastidores como caracterização, iluminação, indumentária e, é claro, perucaria. Foi quando eu aprendi a diferenciar os tipos de peruca, as formas de costurar, pentear, arrumar. Também dei aulas e trabalhei em publicidade.

Como chegou ao Teatro Municipal do Rio de Janeiro?Eu tive a sorte de ficar trabalhando no Teatro Colón depois de formada.

Foram dois anos adquirindo experiência e contatos. Em 78, surgiu o convite do Hugo de Ana, que na época era o diretor artístico do Teatro Municipal, para que eu e mais outros profissionais argentinos viéssemos para o Brasil fazer parte da chamada Central Técnica de Produção. O Municipal estava sendo reaberto depois de três anos em reformas de modernização. Vieram ótimos profissionais para cada setor do teatro e o objetivo era formar uma escola de teatro aqui. De acordo com o contrato, ficaríamos por seis meses apenas. Sou a única daquele grupo que está até hoje.

Qual era a realidade do Municipal quando vocês chegaram?Não havia muita coisa. Até a nossa chegada existia muito pouco conhe-

cimento nessas áreas. Começou conosco. O teatro ficou fechado pois es-tava degradado. Eram feitos apenas shows e bailes de carnaval. Iniciamos muitos profissionais aqui.

Quantas perucas chega a fazer numa produção?Varia muito. Já fiz mais de 500.

Já presenciou atores confundirem e trocarem de peruca em plena apre-sentação?

Acontece muito deles colocarem de trás para frente. É muito difícil ter um solista que goste de usar peruca. Eles reclamam, dizem que esquentam demais. Eles preferem deixar o cabelo de acordo com o personagem. O bailarino até gosta de usar, mas por dançar muito ele perde a peruca. Já vi uma peruca voar em pleno balé e o ator era careca. Não teve jeito, a platéia disparou a rir.

Com tantas produções e trabalhos no currículo, quais você classifica como inesquecíveis?

Trabalhar com Franco Zefirelli foi um momento único. Por tudo que ele representa e me ensinou. Ele é uma pessoa ótima e simpática, porém muito severa. Conhece muito sobre cabelos. E ele nos ajudava pessoalmente e deu muitas dicas. Passamos 20 dias dentro do teatro montando o espetá-culo “Traviata” e convivendo com ele.

Perucas: saiba onde elas sempre são modaDesconhecido por muitos, o setor de perucaria mostra-se um componente fundamental às produções teatrais, principalmente às líricas

já produziu, mas não a paixão por confeccioná-las e a ne-cessidade de estar envolvida no processo de evolução da indumentária. “Já z peru-cas até com botões”, garante. Formada pelo Instituto do famoso Teatro Cólon de Bue-nos Aires, fundado em 1908 e o primeiro do gênero na Amé-rica do Sul, Divina “fez a cabe-ça” de célebres personagens das mais importantes óperas e ba-lés apresentados no Municipal nas últimas três décadas como “Turando”, “Aida” e “La Tra-viata” (dirigido pelo cineasta e cenógrafo italiano Franco Ze -relli). Ainda estão no currículo de Divina alguns trabalhos em produções importantes do ci-nema nacional como “Carlota Joaquina”, de Carla Camuratti, e da televisão, na minissérie “Os Maias”, da Rede Globo. Tam-bém integra a equipe da carna-valesca Rosa Magalhães, sendo responsável por inovações na maneira de produzir perucas para o carnaval carioca.

Segundo Divina, quando ela chegou ao Brasil, a peruca-ria não existia no Teatro Mu-nicipal. “Eu montei o setor e ensinei durante esses anos vários assistentes. Muitos tra-balham hoje em televisão, no carnaval e no teatro”, diz. Nes-te tempo também, houve uma evolução desta técnica no Bra-sil. “Quando cheguei ao Mu-nicipal já havia trazido muita coisa, mas tinha a di culdade para se achar boa matéria-pri-ma. Hoje conseguimos cabe-los de qualidade aqui no País. A troca de experiências com

produções de fora também contribuiu para aprendermos mais sobre o universo das pe-rucas”, acredita.

Divina explica que há uma grande diferença entre uma pe-ruca para teatro e as chamadas perucas sociais, usadas fora dos palcos. “São completamente diferentes. As perucas sociais são feitas com elástico para se adequarem a qualquer pessoa e a peruca teatral é confecciona-da sob medida, exclusivamente para determinado ator, consi-derando as suas características de acordo com a maquiagem e o gurino. Tudo tem que estar combinando”, ressalta.

Com orçamentos muitas vezes apertados e em tempos de responsabilidade ambiental e econômica, é natural que o reaproveitamento dos ma-teriais seja necessário. “Atu-almente temos cerca de 30 dias para deixar tudo pronto. Tudo depende do material disponível, da matéria-prima que será usada, do orçamento. Gosto de inovar, usar mate-riais diferentes. Já z perucas com botões, borracha...”, diz. Segundo Divina, todas as pe-rucas se reaproveitam. “Elas duram bastante, dependendo de como são guardadas e os cuidados que se tem na utili-zação. O suor, por exemplo, queima o brilho natural do ca-belo. Eu preservo muito bem as perucas do Municipal. Lavo, embalo e guardo para outras produções. Mas é importante comprar cabelo de qualidade para as perucas. Isso ajuda muito”, naliza.

Bruno Pacheco

Claudia M

eyer

Divina: 30 anos dedicados às perucas do Teatro Municipal do Rio

Perucas de época: é preciso pesquisa e estudo para confeccioná-las

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18 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Técnica

Sindicatos

Por Felipe Prestes

Facilitar o acesso ao conhe-cimento especí co da área que envolve iluminação, sonoplastia, cenogra a e gurino. Esse é o objetivo do IBTT (Instituto Bra-sileiro de Tecnologia Teatral), conhecido como tal a partir do nal de 2008. Fundador da ins-tituição, Milton Bonfante conta que tudo começou há cerca de cinco anos, quando iluminadores criaram um grupo para debater e trocar ideias sobre a pro ssão. “Ao grupo foram se somando outros pro ssionais, como ce-nógrafos e gurinistas, até que chegamos ao Instituto”.

Visando o aprimoramento, o IBTT criou um acervo de livros e teses sobre a área, que já serviu de suporte para pesquisadores de algumas localidades do País. En-tretanto, o acervo ainda não pode ser digitalizado devido a questões burocráticas que dizem respeito à autorização dos autores ou edito-

IBTT visa aprimorar conhecimento especí coCriado no final de 2008, o Instituto Brasileiro de Tecnologia Teatral propõe o debate, a pesquisa e a formação em detalhes técnicos

ras. “Já estamos trabalhando para digitalizar, mas há entraves e ain-da deve demorar um pouco para ocorrer”, explica Bonfante.

Além dessa atividade, o gru-po conta com 800 pessoas ca-dastradas para discutir a área via internet. A busca por conheci-mento não cará restrita a essas iniciativas. O instituto pretende agrupar a tecnologia teatral como um todo em um curso e levar a proposta inclusive até o Ministé-

rio da Educação. “Hoje, o que há são cursos técnicos de cada uma dessas áreas separadamente. Os cursos superiores de artes cênicas oferecem poucas opções também nesse tipo de conhecimento”, re-lata Bonfante, que atualmente dá aulas no Senac-SP.

Para levar por todo o Brasil o aprimoramento é necessário vencer entraves que dizem res-peito às diferenças regionais. Bonfante conta que o IBTT

busca mapear essas peculiarida-des a m de buscar um diálogo possível entre a classe em todo o País. “Em São Paulo, você pode oferecer um curso para utiliza-ção de equipamentos de última geração. Em Tocantins, você vai se deparar com outros desa os”, exempli ca.

No dia 6 de abril, às 19h, irá ocorrer o primeiro evento públi-co do instituto. No Teatro do Ator (praça Roosvelt, 172), na

Milton Bonfante começou a trabalhar com iluminação na dé-cada de 60 com um dos pionei-ros no País, Giancarlo Bortolotti. Há 25 anos, com o mercado brasileiro já mais amadurecido, abriu empresa própria, tendo trabalhado em eventos como a Bienal de Dança de Santos e em espetáculos como “A Bela e a Fera” e “Fantasma da Ópera”. É docente há mais de 15 anos, tem dois títulos publicados e es-creve regularmente para sites, blogs e periódicos que tratam de sua especialidade.

capital paulista, será oferecido um seminário sobre iluminação e trilha sonora para espetáculos, com a participação de Beto Bruel e Guto Gevaerd. Os dois foram responsáveis, respectivamente, pela iluminação e trilha sonora dos espetáculos “Av. Dropsie” e “Não Sobre o Amor”, ambos da Sutil Companhia de Teatro, diri-gida por Felipe Hirsch.

Por Fábio Luís de Paula

Toda categoria trabalhadora precisa de uma representação forte para lutar por seus direitos e criar um espaço de encontro comum entre os pro ssionais da mesma área. É por isso que existem os sindicatos. Eles são entidades sem ns lucrativos que defendem os seus associados. No mundo do teatro não é dife-rente. Há inúmeros preconceitos pela classe artística, que às vezes ainda é julgada como “à toa”, e é contra isso que o Sated-SP (Sin-dicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de São Paulo) trabalha.

Lígia de Paula Souza, presi-dente do Sated-SP desde 1986, explica que é uma organização de representação de todos os pro ssionais com base territorial no Estado de São Paulo somen-te. “O sindicato não serve apenas para direitos trabalhistas, como o piso salarial, mas também para cuidar da saúde, da mente e para ser um farol de atenção à evo-lução e progresso social. Nosso olhar está sempre em busca de novos mecanismos e melhorias à

Sated-SP apoia categoria artística e busca melhoriasEntidade tem sua história marcada por lutas e visa benefícios aos profissionais, como a criação de um retiro e promoção com a Copa de 2014

nossa categoria”. O Sated foi criado em 18 de

dezembro de 1934, numa época onde havia uma grande movi-mentação por conta do cenário político do Brasil. E o surgimen-to do sindicato foi uma proposta de atores, como Procópio Fer-reira e outros, para que a pro- ssão fosse o cializada. “Claro que houveram mudanças que acompanharam o tempo e a polí-tica ao longo desses anos. Temos a Lei 6.533, que regulamenta a atuação, e sempre buscamos atu-alizar e reformular nosso estatu-to. A última vez que o zemos foi em 2004”, destacou Lígia.

CAMPANHAS E PROJETOSA presidente comentou que

o Sated possui em seu currícu-lo uma série de projetos. Um deles foi a Campanha para a Prevenção da Aids, que come-çou em 1987 e perdura até hoje. Eles também lutaram contra o problema de trá co de pessoas, onde falsos recrutadores de ar-tistas levavam pro ssionais para serem literalmente escravos fora do País. “Foram inúmeras bata-lhas que me orgulho de ter par-

ticipado e promovido. Esta luta nunca acaba”.

Hoje dois pontos importan-tes encabeçam a lista de priori-dades: ajudar associados com a questão da moradia e tocar o projeto da “Casa do Sated”, que vai ser uma espécie de retiro para abrigar aposentados sem condições de trabalho e susten-to. Lígia pontuou que está tudo delimitado para esse plano. Será um condomínio em Mairiporã, com serviços médicos e ativi-dades que pretendem manter a mente e o corpo saudáveis, tudo custeado pela entidade.

“É nossa obrigação cuidar desses pro ssionais que contri-buíram com nossa categoria e com o Sated. Eles cam idosos e as oportunidades de emprego cam mais raras. É uma área de instabilidade e temos de saber contornar isso com destreza”.

COPA DE 2014O Sated-SP fica na região

central da cidade, na avenida São João, 1086, no quarto an-dar, de fácil acesso por metrô e ônibus. Possui uma programa-ção com cursos grátis e sessões

com palestras e apresentações. Pra se associar, basta ir até lá se inscrever, munido de documen-tação básica, registro profissio-nal (DRT) e três fotos sorrindo. É obrigatório ser do Estado de São Paulo e tem que contribuir com a taxa de um salário míni-mo por ano.

“Estamos agora nos preocu-pando com a Copa, porque no período dos jogos muitos turis-tas estarão no Estado e os espe-táculos serão, com certeza, uma opção para eles. Hoje os teatros estão lotados graças ao turismo e a Copa vai ser uma vitrine im-portantíssima!”, concluiu.

Lígia de Paula e Mário Vaz, presidente e diretor do Sadet respectivamente

O Instituto Brasileiro de Tecnologia Teatral existe há cinco anos e foi idealizado por iluminadores

Sxc

Divulgação

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19Abril de 2009Jornal de Teatro

Cursos e Ofi cinas

Mais do que ensinar

Por Danilo Braga

Em uma São Paulo que se movia pelo ânimo do moder-nismo de 1922, o teatro ain-da era considerado uma “arte menor”. O que os paulistas não esperavam era que a sua terra da garoa se transforma-ria em um pólo teatral de pro-porções internacionais. Era maio de 1948, em uma sala alugada no Externato Elvira Brandão, na alameda Jaú. Lá, no segundo dia do mês, nascia a escola que em alguns anos formaria a primeira frente de atores brasileiros prontos para trazer para a terra do pau bra-sil o novo teatro, que não seria mais uma arte diminuta e vista com maus olhos.

A EAD (Escola de Arte Dramática) surgiu com a ne-cessidade e a demanda da bur-guesia paulista, que sentia falta do teatro no Brasil. Na Euro-pa, principalmente em Paris, a arte dramática estava em ascensão, recebendo destaque mundial. A elite burguesa de São Paulo, ainda respirando a Semana de 22 e a Revolução de 30, tinha essa demanda e tinha também alguém para alimentar esse desejo: dr. Al-fredo Mesquita, formado pela Faculdade de Direito do Lar-go São Francisco e fã de Eça de Queiroz.

Mesquita já tinha envolvi-mento pro ssional com a dra-maturgia. De 1933 até 1937 foi crítico teatral de “O Estado de S. Paulo”, escreveu e encenou peças, livros e contos, além de ter sido o fundador do GTE (Grupo de Teatro Experimen-tal), que mais tarde origina o TBC (Teatro Brasileiro de Comédia). O grã- no queria elevar o nível da dramaturgia brasileira, como nos conta a professora e pesquisadora da EAD, Nanci Fernandes.

A EAD, escola que revolucionou teatro brasileiro, faz 61 anos este mês e ganhará, em agosto, livro contando a sua história

Nanci, que foi formada pela EAD, contextualiza o nascimento da escola na esfera burguesa do nal dos anos 40, detentora da riqueza de valo-res culturais no País. Segundo a pesquisadora, o teatro sofreu um processo de estagnação até o nal da década de 30, não participando, inclusive, da Semana de Arte Moderna. Um de seus principais auto-res, Oswald de Andrade, só escreveria teatro em 1936. A tal “arte menor” não decolava nem mesmo no Rio de Janeiro dos anos 40, que era o Cen-tro de Produção Cultural no Brasil. No m de 43, a ence-nação de “Vestido de Noiva”, de Nélson Rodrigues, foi alvo de críticas severas, que levou o cenário do teatro brasileiro ao desânimo. Mas não Al-fredo Mesquita, que em 1942 passou a incorporar a gura do diretor, até então inédito no Brasil, na produção dra-mática do Grupo de Teatro Experimental.

Alfredo Mesquita sabia que o modelo parisiense de se en-sinar teatro não funcionaria no Brasil, mas muitas coisas foram aproveitadas do ensinar europeu. Ele acreditava que para mudar o teatro brasileiro era preciso mudar o ator. Esse não poderia exercer a função se não tivesse a cultura e a dis-ciplina necessária para tal. É então que, na sala emprestada pelo Externato Elvira Bran-dão, Alfredo Mesquita plantou a semente do novo teatro em São Paulo. Outras personagens começam a surgir na história da EAD, que se confunde com a história da dramaturgia bra-sileira como um todo.

Ainda em 1948, Franco Zampari fez uma aposta no teatro que é parte essencial da escola. Associado a um grupo da elite paulistana e usando

um casarão velho na rua Ma-jor Diogo, bairro da Bela Vis-ta, Zampari criou o TBC (Te-atro Brasileiro de Comédia). Equipado com 18 camarins, duas salas de ensaio, oficinas de montagem de cenário, al-moxarifado, sala de leitura e equipamentos modernos de áudio e iluminação, o TBC era voltado especialmente para o teatro amador. dessa maneira, o segundo andar do prédio passava a ser a nova casa da EAD.

É na EAD que alguns tex-tos estrangeiros, principalmen-te europeus, foram encenados aqui no País. O alemão Bertolt Brecht, o francês Alfred Jarry, o norte-americano Sam Sheppard e o espanhol Ramón Maria del Valle-Inclán tiveram suas obras representadas no Brasil pelo palco e equipe da EAD.

Em meados de 1950, o es-paço que o TBC oferecia já era demasiado pequeno para as necessidades da escola, que foi obrigada a mudar-se para a sua primeira sede própriaFoi Alfredo que por muito tempo custeou a existência da Escola de Arte Dramática. As aulas eram direcionadas não à burguesia, mas à classe média e baixa. Ministradas à noite, elas tinham o propósito ex-clusivo de que personagens, futuros atores da classe traba-lhadora, pudessem investir em futuro como ator e, incons-cientemente, investir na dra-maturgia brasileira. Apesar de não ser gratuita, o valor que os alunos pagavam era muito pe-queno. Tivemos acesso a um recibo, datado de 18 de junho de 1948, que vinha descrita a quantia de Cr$ 130.

Nanci contou que muitas vezes os alunos chegavam com muita fome, pois não tinham tempo (e muitas vezes dinhei-ro) para jantar antes de chegar

à aula, às 19h. Logo, Mesquita fez um acordo com grandes empresas alimentícias que pas-saram a fornecer suprimentos para que fosse organizado um “sopão” para os alunos, sem custo algum.

Em 1960, a escola brilhava. Agregava o uso da cenogra a, também inédita no País, e em 61 incluiu em seu currículo os cursos de crítica e dramatur-gia. A escola tinha o desejo e a capacidade para abraçar toda a revolução teatral que o País estava passando. Isso, porém, não se realizaria tão cedo.

O golpe militar de 1964 chegou e afetou a escola, que começou a ter problemas nan-ceiros. Em 1966, Alfredo Mes-quita não consegue mais manter a EAD e então a vende à USP (Universidade de São Paulo).

Até então, a pro ssão de ator não era considerada váli-da, o que fazia com que a EAD fosse um curso de ensino médio, incluindo as matérias obrigatórias para tal. No -nal, a carga horária disponível para as matérias especi cas de dramaturgia não era su ciente para a formação de um ator, o que de certa forma prejudicou o curso até 1982, quando foi regulamentado.

ATUALIDADEAinda hoje, a Escola de

Arte Dramática não tem mui-to espaço na USP. Dividindo espaço com o curso de gradu-ação em Artes Cênicas, o cur-

so tem 700 horas/aula, mais do que o necessário para um curso técnico segundo especi- cações do MEC. A professo-ra Nanci acredita que, por não ser considerado um curso de graduação e não fazer parte da Fuvest (órgão que aplica o vestibular para ingresso na universidade), o processo sele-tivo próprio da EAD bene cia o curso. “São alunos que en-traram pelo talento”.

O processo seletivo é dado em quatro partes. Em sua primeira fase, o aluno é sub-metido a um exame prático, onde deve escolher uma cena e apresentá-la a uma banca de professores. Na segunda, o aluno deve fazer um exame teórico sobre os textos que devem ser lidos previamente e elaborarem uma redação. No terceiro, o aluno deve apresen-tar uma cena dentro de uma lista de peças determinada. Na quarta fase, o candidato reali-za um estágio de quatro dias onde são testadas a voz, corpo e interpretação. De cerca de 500 inscrições anuais, são se-lecionados 20 alunos para in-gressar na escola. O candidato deve ser maior de idade.

Em agosto de 2009, Silvana Garcia publicará um livro pela Edusp, ainda sem título, sobre a trajetória da EAD. A obra será composta por ensaios e imagens que nos farão voltar no tempo na história da escola que construiu o teatro no Bra-sil como tal o conhecemos.

Aula de Comédia ministrada por Cacilda Becker na EAD

A Escola de Arte Dramática , em São Paulo, ainda busca seu espaço na USP. Processo de seleção é rígido, em quatro partes e o número de candidatos por vaga pode chegar a 25

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Danilo Braga

Page 20: Jornal de Teatro Edição Nr.1

20 Abril de 2009 Jornal de Teatro

Oportunidades

Classifi cadosCHAMA DA ARTE ESPAÇO CULTURAL

ALUGO AMPLAS SALAS PARA ENSAIO DE DANÇA E TEATROÓTIMA LOCALIZAÇÃO E ESTACIONAMENTO FÁCIL

SEGURANÇA E INFRAESTRUTURAFONES: (11) 3862-0231 7652-2578 (COM JUÇARA)

RUA SALES GUERRA, 199 (ALTURA DO 1.450 DA RUA AURÉLIA - VILA ROMANA)

FORMAÇÃO DE PÚBLICO - ENSAIO ABERTO DO ESPETÁCULO “SÓ” E PROCESSO DE CRIAÇÃO - 120 vagas Coordenação: Rachel Brumana13/4 - segunda-feiraApresentação: 17h30 às 18h30 - 80 vagasElenco: João MiguelFaixa etária: adultosPúblico alvo: interessados em geralProcesso de Criação - 18h30 às 21h30 - 40 vagasMediação: Alvise Camozzi Público alvo: interessados com conhecimento intermediário na áreaFaixa etária: adultosSeleção: carta de interesseInscrições:1 a 12/4

OFICINA DE CLOWN “NÚMEROS TRADICIONAIS EUROPEUS” - 25 vagas Coordenação: Caco Mattos16/4 a 25/6 - terças e quintas-feiras - 18h30 às 21h30Público alvo: interessados com conhecimento interme-diário na áreaFaixa etária: adultosSeleção: carta de interesseInscrições:1 a 13/4

OFICINA DE DRAMATURGIA “INICIAÇÃO AO TEATRO DO ABSURDO” - 25 vagas Coordenação: Nicolás Monasterio16/4 a 30/7 - quintas-feiras - 18h30 às 21h30 Público alvo: interessados com conhecimento interme-diário na áreaFaixa etária: adultosSeleção: carta de interesse e currículoInscrições:1 a 12/4

OFICINA DE DRAMATURGIA E ATUAÇÃO - 30 vagas Coordenação: Raquel Anastásia e Valderez Cardoso Gomes16/4 a 25/6 - terças e quintas-feiras - 18h30 às 21h30Público alvo: interessados com conhecimento interme-diário na áreaFaixa etária: adultosSeleção: entrevista dia 14/4 - 18h30 às 21h30Inscrições: 1 a 13/4

OFICINA “LABORATÓRIO INTERNACIONAL DE INTERPRETAÇÃO E DRAMATURGIA” - 15 vagas Coordenação: Alvise Camozzi e Letizia Russo22 a 30/4 - quarta-feira a sexta-feira - 15h às 21h e sábado - 13h às 18h (primeira semana) e segunda a quinta-feira - 15h às 21h (segunda semana)Público alvo: interessados com conhecimento intermediárioFaixa etária: adultosSeleção: carta de interesse e currículo e posterior en-trevista com pré-selecionados (em data a ser definida)Inscrições: 1 a 17/4

OFICINA “O AIKIDÔ E O CORPO DO ATOR” - 30 vagas Coordenação: Renata Mazzei22/4 a 24/6 - segundas e quartas-feiras - 14h às 17hPúblico-alvo: interessados com conhecimento interme-diário na área / Faixa etária: adultosSeleção: carta de interesse e currículoInscrições:1 a 14/4

OFICINA DE MAQUIAGEM E CARACTERIZAÇÃO TEATRAL - 25 vagas Coordenação: Atílio Beline Vaz25/4 a 25/7 - sábados - 14h às 18hPúblico-alvo: iniciantes na área Faixa etária: adolescentes e adultosSeleção: carta de interesseInscrições:1 a 17/4

OFICINA DE JOGOS, CANÇÕES E TEXTOS DE TEATRO - 30 vagas Coordenação: Cibele Troyano27/4 a 27/7 - segundas-feiras - 14h às 18h Público alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: adolescentesSeleção: aula-teste dia 13/4 - 14h às 18hInscrições:1 a 12/4

OFICINA DE DIREÇÃO TEATRAL - 25 vagasCoordenação: Marcelo Marcus Fonseca27/4 a 30/6 - segundas e terças-feiras - 18h30 às 21h30 Público alvo: interessados com conhecimento interme-diário na área / Faixa etária: adultosSeleção: currículo e carta de interesseInscrições:1 a 22/4

OFICINA DE PREPARAÇÃO VOCAL PARA ATORES - 25 vagasCoordenação: Paula Carrara7/5 a 18/6 - segundas e quintas-feiras - 10h às 13hPúblico-alvo: interessados com conhecimento interme-diário e avançado na área / Faixa etária: adultosSeleção: currículo, carta de interesse e entrevista dia 4/5 - 10h às 13hInscrições:1 a 30/4

FORMAÇÃO DE PÚBLICO - APRESENTAÇÃO DO ESPETÁCULO “BEM LONGE DA TRAÇALÂNDIA” E AULA-ABERTA DE JOGOS TEATRAIS - 100 vagas Coordenação: Aline Valencio Lemes (Cia. Pirilampo de Teatro)8/5 - sexta-feira - 15h às 19h Apresentação do Espetáculo: 15h às 16h - 60 vagasPúblico alvo: interessados em geralAula-aberta: 16h às 19h - 40 vagasPúblico alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: criançasSeleção: primeiros inscritosInscrições:1/4 a 7/5

FOTOGRAFIAFOTÓGRAFA ESPECIALIZADA EM BOOK DE ATORES E FOTOGRAFIA DE ESPETÁCULOS / ESTÚDIO PRÓPRIO

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ESTUDIO DE GRAVAÇÃOCHARLES DALLA - COMPOSITOR, DIRETOR MUSICAL, SERVIÇOS DE

ESTÚDIO-TRILHA SONORA E TRILHA SONORA ORI-GINAL PARA TEATRO/TEATRO MUSICAL

-ARRANJOS E ORQUESTRAÇÕES-DIREÇÃO VOCAL E

DIREÇÃO DE CANTORES-ESTÚDIO DE GRAVAÇÃO E FINALIZAÇÃO

COM PRO-TOOLS 7.3CONTATOS- 99607312/

[email protected]

OFICINA DE INTERPRETAÇÃO TEATRAL “BACANTES: UMA ORGIA DO PODER” – 20 vagasCoordenação: Rui Madeira13 a 28/4 – segunda a sexta-feira – 16h30 às 21h30Público alvo: interessados com conhecimento interme-diárioFaixa etária: adultosSeleção: carta de interesse e currículoInscrições: 1/4 a 10/4 OFICINA DE INTERPRETAÇÃO “A POESIA E A CENA” – 30 vagasCoordenação: Cia. Do Tijolo27/4 a 17/6 – segundas e quartas-feiras – 18h30 às 21h30Público alvo: interessados com conhecimento interme-diário na áreaFaixa etária: a partir de 16 anosSeleção: currículo e carta de interesseInscrições: 1/4 a 22/4

FORMAÇÃO DE PÚBLICO – APRESENTAÇÃO DO ESPETÁCULO “CONCERTO DE ISPINHO E FULÔ” E AULA ABERTA – 60 vagas Coordenação: Cia. Do TijoloApresentação23 a 26/4 – quinta a sábado – 17h30 às 18h30 e do-mingo – 17h às 18hPúblico alvo: interessados em geralSeleção: primeiros inscritosAula aberta 23 a 26/4 – quinta a sábado – 18h45 às 21h45 e do-mingo – 18h15 às 21h15Público alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: adultos Seleção: primeiros inscritosInscrições: 1/4 a 22/4

OFICINA DE TEATRO BASEADA NAS OBRAS DE MURILO RUBIÃO – 30 vagas Coordenação: Expedito Araújo29/4 a 16/7 – quartas e quintas-feiras – 18h30 às 21h30Público alvo: interessados com conhecimento interme-diárioFaixa etária: adolescentes e adultosSeleção: carta de interesse e currículoInscrições: 1/4 a 24/4

OFICINA DE TEATRO “MAZZAROPIS” – 30 vagas Coordenação: Arnaldo D’Ávila e Jedsom Kárta11/5 a 27/7 – segundas e terças-feiras – 18h30 às 21h30Público alvo: interessados com conhecimento interme-diário na áreaFaixa etária: adultosSeleção: aula teste – 5/5 - 18h30 às 21h30Inscrições: 1/4 a 27/4

FORMAÇÃO DE PÚBLICO – APRESENTAÇÃO DO ESPETÁCULO “ESTÃO VOLTANDO AS FLORES” E AULA ABERTA – 40 vagasCoordenação: Cia. Pompa CômicaApresentação30/4 – quinta-feira – 17h30 às 18h30Público alvo: interessados em geralSeleção: primeiros inscritosAula aberta30/4 – quinta-feira – 18h45 às 21h45Público alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: adolescentes e adultosSeleção: primeiros inscritosInscrições: 1/4 a 29/4

OFICINA DE TEATRO DE RUA –30 vagas Coordenação: Grupo Buraco D’Oráculo6/5 a 26/6 – quartas e sextas-feiras – 19h às 21hPúblico alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: adolescentes e adultos Seleção: carta de interesseInscrições: 1/4 a 30/4

OFICINA DE INICIAÇÃO TEATRAL – 30 vagas Coordenação: Gloriete Luz5/5 a 28/7 – terças-feiras – 14h às 17hPúblico alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: adolescentes e adultosSeleção: primeiros inscritosInscrições: 1/4 a 4/5Local: Unidade Básica de Saúde Doutor Manoel SaldivaRua Sampson, 61 – Brás

OFICINA DE TEATRO PARA INICIANTES – 30 vagasCoordenação: Fabiana Vasconcelos Barbosa5/5 a 28/7 – terças – 18h30 às 21h30Público alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: adolescentes e adultosSeleção: primeiros inscritosInscrições: 1/4 a 4/5

OFICINA DE INICIAÇÃO TEATRAL – 30 vagas Coordenação: Dione Leal Pettine9/5 a 25/7 – sábados – 14h às 17hPúblico alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: adolescentesSeleção: primeiros inscritosInscrições: 1/4 a 8/5

OFICINA DE TEATRO – 30 vagas Coordenação: Denise Maria Guilherme9/5 a 25/7 – sábados – 14h às 17hPúblico alvo: iniciantes na áreaFaixa etária: crianças Seleção: primeiros inscritosInscrições: 1/4 a 8/5

O cina Cultural Oswald de Andrade Oficina Cultural Amácio MazzaropiEndereço: Rua Três Rios, 363 - Bom Retiro - São Paulo - SP

Telefone: 11 3221 5558 | 3222 2662Avenida Rangel Pestana, 2401 - Brás - São Paulo/SP

Tel: (11) 2692-5166 - 2796-2635

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21Abril de 2009Jornal de Teatro

Vida e Obra

Por Daniel Pinton

Pela arte viveu, com a arte se despediu. Assim pode-se re-sumir a vida de uma das atrizes mais atuantes do cenário artístico brasileiro. Ida Szafran, atriz que se tornou conhecida como Ida Gomes, deixou a vida e os palcos no último dia 22 fevereiro, aos 85 anos, mas certamente deixou um legado de talento e amor, fruto de 65 anos dedicados à interpreta-ção, para todos aqueles que veem nas artes cênicas um caminho para se viver.

Conhecida do grande públi-co pela interpretação marcan-te da vereadora Dorotéia, uma das três irmãs Cajazeiras em “O Bem-Amado”, de Dias Gomes, Ida nasceu em Krasnik, na Polô-nia, e foi criada até os 13 anos na França. Depois de passar pela In-glaterra, veio para o Brasil onde começou sua carreira como atriz de rádio passando por diversas emissoras como as rádios Nacio-nal, Tupi e Educadora.

Sua estreia na televisão foi em 1951 atuando em telepeças de “O Grande Teatro Tupi”, na TV Tupi, onde também fez “Co-ração Delator”. Na TV Globo, onde ganhou fama, participou de um total de 44 produções a partir de 1967, entre elas “Véu de Noi-va”, “Selva de Pedra”, “Estúpido Cupido”, “O Astro”, “Corpo a Corpo”, “Top Model”, “A Padro-eira”, “Da Cor do Pecado”, “JK” e “Duas Caras”, sua última nove-la, em 2007.

No cinema, Ida Gomes come-çou sua carreira em “Bonitinha, mas Ordinária”, em 1963, e ainda participou de mais nove lmes como “Amante Latino”, de 1979, “Copacabana”, de 2001, e “O Amigo Invisível”, seu último pro-jeto, em 2006. Sua atividade na te-lona, porém, não cou restrita. Ida também foi dubladora de atrizes

Ida Gomes, uma estrela que sempre vai brilharAtriz, falecida no último dia 22 de fevereiro, deixa um legado de 65 anos dedicados à interpretação no teatro, na TV e no cinema

consagradas como Joan Crawford, Bette Davis e Gladys Cooper.

TALENTO NOS PALCOSA estreia de Ida Gomes nos

palcos foi como integrante do Teatro do Estudante, com Pas-choal Carlos Magno. A atriz ainda se destacou nas peças “O Violinista no Telhado”; “No Na-tal a Gente vem te buscar”, pela qual ganhou o Prêmio Apetesp de melhor atriz coadjuvante; “O Avarento”; “Tio Vânia”; “Super Mãe”; “Lili”; “O Anjo Negro”; “Proibido Amar”, onde recebeu uma indicação como melhor atriz do Prêmio Sharp e “7 – O Musi-cal”, com a qual Ida se despediu dos palcos e do público mostran-do uma determinação e pro s-sionalismo raros no meio artísti-co. Mesmo bastante debilitada, a atriz participou de apresentações e ensaios até não ter mais forças. “A gente vai sentir uma grande falta dela. Ela era uma excelente atriz, participativa em todos os momentos. Até na coxia, a Ida era uma pessoa divertidíssima. Por todos esses motivos vamos sentir muita falta dela. Ela era de uma força inacreditável. A gente tinha a impressão de que ela que tinha mais energia do que todos nós, queria ensaiar à toda hora”, relatou a atriz Alessandra Maes-trini, colega no musical.

Ida nunca se casou nem teve lhos. Como ela mesma dizia, não era feita para casar, nem café sabia fazer, mas nunca deixou de despertar grandes emoções por toda a sua vida. Apesar de judia, Ida era constantemente escalada para interpretar freiras, madres, mulheres rígidas com os “bons costumes” e se divertia com o fato: tinha uma independência intelectual completamente opos-ta às personagens que usualmen-te emprestava alma. Os mesmos “bons costumes” que defendia

sob holofotes diziam que atriz não era mulher “direita” na época em que começou sua carreira.

HOMENAGEMEm sua família, deixa dois

atores: o irmão Felipe Wagner e a sobrinha Débora Olivieri. “Começamos a trocar nossas a nidades e experiências depois que me mudei para o Rio de Ja-neiro, em 1999, e, nesses 10 anos, convivemos como mãe e lha. Íamos produzir nosso primeiro espetáculo encomendado: “Idas e Vindas”. Ela era uma mulher extraordinária, inteligente, inte-lectual e moderna. Lia um livro ou dois por semana, sempre em inglês, falava mais de oito línguas, assistia a todas às peças teatrais e lmes”, contou Débora.

Ida Gomes receberia no últi-mo dia 10 uma grande homena-gem durante o 21º Prêmio Shell de Teatro. A atriz se mostrava bas-tante entusiasmada com a honra-ria e ansiosa pelo evento. “Pena ela não ter estado para agradecer a homenagem ao conjunto de trabalhos no Prêmio Shell. Ela só pensava na roupa e nos discurso que faria.”, falou a sobrinha. Feli-pe Wagner recebeu o prêmio em nome da irmã e aproveitou para contar aos presentes como surgiu a paixão de Ida pela dramaturgia. “Ida, quando jovem, ouviu na Rádio Nacional uma propaganda do programa “À procura de Ta-lentos” e resolveu se candidatar. Estávamos há nove meses no Brasil, ela ainda não falava bem português. Mas foi, declamou um poema e foi contratada como ra-dioatriz”, lembrou Wagner, refe-rindo-se ao poema “Visita à casa paterna”, de Luís Guimarães Jr., que, em seguida, foi lido por Dé-bora Olivieri. “Minha tia saiu de cena na hora certa. Seu coração parou, mas sua estrela vai brilhar para sempre”.

Acima, Ida Gomes em “O Avarento”, em parceria com Jorge Dória, e aos lados em outros momentos da carreira

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22 Abril de 2009 Jornal de Teatro

História

Em um abril de outros tem-pos, mais precisamente e não por acaso no dia 21, estreava no Rio de Janeiro o musical “Liberdade, liberdade”, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel.

O ano era 1965 e a tensão causada pelo golpe militar do ano anterior assombrava a classe artística, que sentia o re exo da repressão.

Para demonstrar a insatisfa-ção, dois grupos que já explora-vam o gênero chamado “teatro de protesto”, o paulista Teatro de Arena e o carioca Opinião, aca-baram produzindo o espetáculo considerado a obra pioneira do teatro de resistência no Brasil. O texto de “Liberdade, liberdade” é atual em qualquer época, pois reúne a visão de pensadores de diferentes períodos e contextos, sobre o tal “direito inalienável”.

O elenco que estreou a peça era composto por quatro atores, o já renomado na época Paulo Autran, Oduvaldo Vianna Filho, Nara Leão – que vinha do elogia-do espetáculo “Opinião”, e Tere-za Rachel, todos revezando os 56 papéis existentes na peça. A dire-ção musical era de Oscar Castro Neves e contava com o violão de Roberto Nascimento, Ico Castro Neves no contrabaixo, Francisco Araújo na bateria e Carlos Gui-marães na auta.

Desde o momento em que o texto chegou à censura causou polêmica, pois apesar de conter um forte discurso político de oposição ao regime militar, pos-suía citações de Platão, Sócrates, Abraham Lincoln, Martin Luther King, Shakespeare e até mesmo Jesus Cristo. Esse foi apenas o ponto de partida para a série de polêmicas que o grupo enfrenta-ria até o nal da temporada. Aliás, enfrentados com muito humor.

No ensaio nal, o ranger das cadeiras da plateia incomodou os produtores e Millôr Fernandes encontrou uma forma de resolver a questão, inserindo no texto o trecho a seguir.

“ E aqui, antes de continuar este espetáculo, é necessário que façamos uma advertência a todos e a cada um. Neste momento, achamos fundamental que cada

Liberdade, liberdade:um marco na dramaturgia brasileira

um tome uma posição de ni-da. Sem que cada um tome uma posição de nida, não é possível continuarmos. É fundamental que cada um tome uma posição, seja para a esquerda, seja para a direita. Admitimos mesmo que alguns tomem uma posição neu-tra, quem de braços cruzados. Mas é preciso que cada um, uma vez tomada sua posição, que nela. Pois companheiros, as ca-deiras do teatro rangem muito e ninguém ouve nada”.

A ESTREIAQuando os extremistas de di-

reita souberam que o espetáculo estrearia no dia que representa a morte de um dos principais heróis nacionais, Tiradentes, trataram de preparar suas mani-festações – a principal delas foi a pichação na fachada do teatro.

Aliás, durante todo o tempo em que o espetáculo esteve em car-taz, as manifestações também es-tiveram presentes, não sendo raro que manifestantes freqüentassem o teatro armados, e que a peça fosse interrompida com gritos de protesto. A situação quase chegou a um limite quando cer-ca de 50 pessoas pertencentes a um grupo radical de direita ten-tou depredar o teatro, conforme publicado no jornal Tribuna da Imprensa. Ao mesmo tempo em que aumentavam os protestos, aumentava a simpatia do público e crítica pelo espetáculo.

A CRÍTICAYan Michalski, do Jornal do

Brasil, dedicou quase metade de sua crítica abordando a interpre-tação de Paulo Autran e diz que “a versatilidade demonstrada por

Paulo Autran é impressionan-te: em duas horas de espetáculo ele esboça umas dez ou quinze composições diferentes, sempre adequadas e inteligentes, sempre livres de quaisquer recursos de gosto fácil”. Tereza Raquel tam-bém foi bastante elogiada, mas a jornalista considerou que “o char-me e a musicalidade de Nara não deixam de estar presentes, mas a sua voz frágil e as marcações es-téticas que lhe foram reservadas fazem com que a sua participação resulte bastante apagada” – infor-mação contrariada pelos demais críticos da época.

Sem dúvida a crítica que cau-sou maior polêmica foi a do jor-nal New York Times, em 25 de abril de 1965. “Os espetáculos teatrais que elevam a voz com protestos políticos contra o re-gime semimilitar do Brasil estão

produzindo, no país, bom entre-tenimento e uma nova visão dra-mática (...) Paulo Autran, o astro principal entre os quatro intér-pretes que representam no palco vazio, pronuncia, sob a luz de um único spotlight, a última palavra da peça: Resisto! A audiência de trezentas pessoas, que tinham pago o equivalente a um dólar e vinte e cinco centavos por pessoa para sentar amontoada, levantou-se e aplaudiu vibrantemente. (...) Contudo, o que parecia conquis-tar a audiência era o fato da irada mensagem da peça vir temperada com humor, música e um otimis-mo ansioso com respeito ao futu-ro do Brasil..”

Terminada a temporada ca-rioca, apenas Paulo Autran seguiu no elenco principal, sendo aplau-dido principalmente em teatros improvisados e universidades.

No roteiro da turnê estavam cidades que di cilmente recebiam a visita de grandes produções, o que causava ansiedade e descon- ança na população.

A cidade gaúcha de Pelotas, por exemplo, viu um jornalista ser proibido de publicar matérias de teatro após elogiar a peça. Em seguida, o mesmo jornal apresen-tou um editorial sob o título de “Palhaçada, palhaçada”.

A repressão também não deu trégua durante a turnê. O suces-so em todo o Brasil chegou aos ouvidos do alto escalão gover-namental e, no dia 2 de junho de 1965, o presidente Castello Branco enviou uma nota a seu sucessor, Costa e Silva, a rman-do que as ameaças de “Liberdade, liberdade” eram de aterrorizar a liberdade de opinião.

A partir daí, carros de polícia passaram a intimidar o público que comparecia ao teatro e as ame-aças de bomba se tornaram ainda maiores. Em 1966, a liberdade foi o cialmente (e nacionalmente) proibida pela Censura Federal.

Já no m da apresentação, o trecho: “como detalhe pessoal e nal, os autores e todos os parti-cipantes do espetáculo declaram que raras vezes trabalharam com tanta alegria. Se com as vozes que levantaram do silêncio da Histó-ria conseguiram gravar o som da Liberdade num só dos corações presentes, estão pagos e gratos”.

Reprodução

A peça, com o já consagrado ator Paulo Autran no elenco, estreou em 21 de abril de 1965 no Rio de Janeiro

Por Rodrigoh Bueno

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23Abril de 2009Jornal de Teatro

Espetáculo “Gota D’Água” fará turnê em Portugal

Internacional

Por Pablo Ribera

O musical brasileiro “Gota D’Água”, criado pelo cantor e compositor Chico Buarque em parceria com o dramaturgo Paulo Pontes, fará uma turnê em Portugal durante o mês de maio, com espetáculos previstos para seis cidades do país euro-peu, sendo que o primeiro deles acontecerá em Guimarães.

O “Gota D´Água” tem es-treia prevista para o dia 1º de maio, no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães. Em segui-da, o grupo segue para a capi-tal portuguesa, Lisboa, onde se apresentará no Centro Cultural de Belém, de 6 a 9 de maio.

O musical parte depois para o Cine-Teatro de Estarreja, no dia 15 de maio, depois para o CAE (Centro de Artes e Es-petáculos) da Figueira da Foz, no dia 16; depois apresentará o espetáculo no Coliseu do Por-to, em 20 de maio; e encerrará

a turnê no Teatro das Figuras, em Faro, no dia 23.

“Gota D’Água” é um espetá-culo com direção-geral de João Fonseca, direção musical de Ro-berto Burguel, e com atuações da atriz Izabella Bicalho, que vive Joana, e dos atores Cláudio Lins e Armando Babaioff, que fazem os papéis de Creonte e Jasão, respectivamente. Babaio-ff entra nesta turnê no lugar de André Arteche.

“Nossas perspectivas são as melhores. Estamos todos mui-to animados com esta turnê por Portugal. Esperamos que seja um grande sucesso”, disse Izabella Bicalho. “Meus amigos portugueses que viram o espe-táculo no Brasil disseram que temos tudo pra dar certo lá”.

HISTÓRIA O musical foi criado em

1975, quando Chico Buarque e Paulo Pontes adaptaram a tra-gédia “Medeia”, de Eurípedes,

FICHA TÉCNICA

Texto: Chico Buarque e Paulo PontesMúsica: Chico BuarqueDireção Geral: João FonsecaDireção Musical: Roberto Bür-guelCenário: Nello MarreseFigurino: Natália LanaCoreografia: Édio Nunes

ELENCO

Joana: Izabella BicalhoJasão: Armando BabaioffCreonte: Cláudio LinsCorina: Cláudia VenturaEgeu: Luca de CastroAlma: Maíra KestenbergZaíra: Sheila MattosXulé: Ronnie MarrudaCacetão: Lorenzo Martin

à realidade brasileira, dominada pela censura federal e repressão ideológica. A montagem origi-nal contou com coreogra a de Luciano Luciani, cenogra a e gurino de Walter Bacci e di-reção musical de Dori Caym-mi, sendo que a direção geral foi de Gianni Ratto. Os atores principais, que viviam os per-sonagens Joana e Jasão, foram interpretados por Bibi Ferreira e Oswaldo Loureiro.

Com uma grande carga po-ética, o espetáculo emocionou a crítica e o público, tornando-se um grande sucesso do teatro brasileiro, sendo assistido por milhares de pessoas.

Após 30 anos, o musical apresentou, em nova turnê, uma abordagem contemporâ-nea, com novos arranjos musi-cais, e assim, recebeu diversos prêmios no País, tendo estrea-do no Rio de Janeiro em 2007.

Nesta nova versão, a per-sonagem Joana é uma mulher

batalhadora que vive nos su-búrbios de uma grande cidade brasileira, a Vila do Meio-Dia, e que é abandonada pelo mari-do Jasão, que a troca por uma mulher muito mais jovem e rica, lha de Creonte.

Enquanto a mulher ca destroçada pela dor da trai-ção, Jasão, o ex-marido, vive dias de felicidade ao lado de Alma, desfrutando do suces-so do samba “Gota D’Água”, que não pára de passar nas rá-dios da cidade. A peça “O que Será (À Flor da Pele)”, “Par-tido Alto”, “Comadre Joana”, “Vila do Meio Dia”, “Paó”, “Virgem Matriaracarum” e o principal, “Gota D’Água”, são alguns dos temas interpreta-dos ao vivo neste musical.

O espetáculo “Gota D’Água” já tem nova turnê con rmada em Brasília (DF), em junho des-te ano. Segundo Izabella, “pro-vavelmente haverá novas turnês pelo Brasil”.

Releitura do musical criado nos anos 70 por Chico Buarque e Paulo Pontes apresenta abordagem contemporânea e novos arranjos para a estreia em Guimarães, Portugal, dia 1º de maio

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24 Abril de 2009 Jornal de Teatro