jorge bucay - pobres ovelhas

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Pobres Ovelhas

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  • POBRES OVELHAS

    FIQUEI A PENSAR no tema das relaes entre pais e filhos.

    O gordo tinha razo! Cada gerao v as coisas do seu prprio e nico ponto de vista. Ns e eles, como noutros tempos eles e os seus pais, discutimos por no sermos capazes de nos pormos de acordo sobre uma mesma realidade.

    Falei com os meus pais.

    Ah sim?

    Contei-lhes a histria da galinha.

    E?

    Ao princpio reagiram exactamente como eu achei que iam reagir. A minha me disse que no percebia a ligao, e o meu pai, que no concordava. Mas, depois, ficmos calados durante um longo instante e, no fim, j no estvamos assim tanto em desacordo.

    Conseguiram, finalmente, entrar em acordo sobre os desacordos.

    Sim, foi isso mesmo. Ficar de acordo, quando todos concordamos, fcil. Difcil chegar a um consenso quando discordamos. Mas isso foi o que aconteceu.

    Que bom!

    Apesar de tudo, no fim, o meu pai esclareceu que acha que tem prioridade de opinio por ser mais velho, por ter mais experincia e por haver perigos na vida que ainda no estamos em condies de enfrentar sem a ajuda dos pais e por a adiante.

    E tu achas que sim?

    No. Acho que consigo enfrentar quase tudo sem a ajuda deles.

    Quase tudo, mas no tudo?

    Algumas coisas, no.

    Ento, o teu pai tem razo. Existem perigos para os quais ainda precisas da ajuda dos teus pais.

    Sim...

    Esse raciocnio deixa-te em desvantagem, hem?

    Sim, mas verdade.

  • verdade! Agora falta saber se a verdade total e absoluta.

    Como?

    Escuta...

    Era uma vez uma famlia de pastores. Tinham todas as ovelhas juntas num s curral. Alimentavam-nas, cuidavam delas e levavam-nas a pastar.

    De vez em quando, as ovelhas tentavam fugir.

    Aparecia, ento, o mais velho dos pastores e dizia-lhes:

    Vocs, ovelhas inconscientes e arrogantes, no sabem que, l fora, o vale est cheio de perigos. S aqui podem ter gua, alimento e, acima de tudo, proteco contra os lobos.

    Regra geral, isto bastava para refrear os desejos de liberdade das ovelhas.

    Um dia, nasceu uma ovelha diferente. Digamos que era uma ovelha negra. Tinha esprito rebelde e incitava as suas companheiras a fugir para a liberdade da pradaria.

    As visitas do velho pastor para convencer as ovelhas dos perigos exteriores tornaram-se cada vez mais frequentes. No entanto, as ovelhas estavam irrequietas e, sempre que saam do curral, tornava-se mais difcil reuni-las novamente.

    At que, uma noite, a ovelha negra as convenceu a fugir de vez.

    Os pastores s deram por isso na manh seguinte, quando viram o curral vazio.

    Todos juntos, foram chorar junto do chefe de famlia.

    Foram-se! Desapareceram todas!

    Coitadinhas...

    E a fome?

    E a sede?

    E o lobo?

    Que vai ser delas sem ns?

    O velhote tossiu, puxou uma fumaa do seu cachimbo e disse:

    verdade, que vai ser delas sem ns? E pior ainda...

    ... Quer vai ser de ns sem elas?

    Extrado de Deixa-me que te conte de Jorge Bucay