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JOGOS DE ANÁLISE FONOLÓGICA:
alguns percursos na interação de duplas de crianças
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VALÉRIA SUELY SIMÕES BARZA BEZERRA
JOGOS DE ANÁLISE FONOLÓGICA:
Alguns percursos na interação de duplas de crianças
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco como requisito para a obtenção do grau de Mestre em Educação.
Orientadora: Profª Drª Ana Carolina Perrusi Alves Brandão
RECIFE
2008
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Bezerra, Valéria Suely Simões Barza
Jogos de Análise Fonológica: Alguns percursos na interação de duplas de crianças / Valéria Suely Simões Barza Bezerra. – Recife : O Autor, 2008.
186 f. : il. ; quad., fig.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CE. Educação, 2008.
Inclui bibliografia e anexos.
1. Cognição 2. Jogos educativos. 3. Fonologia 4. Brandão, Ana Carolina Perrusi Alves I. Título.
37 CDU (2.ed.) UFPE 370.152 CDD (22.ed.) CE2008-0062
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Aos meus amores Lamarck e Marina
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Já me fiz a guerra...
Por não saber (me leva amor) Que esta terra encerra
Meu bem-querer...(amor) E jamais termina
Meu caminhar ...(me leva amor) Só o amor me ensina
Onde vou chegar... (por onde for quero ser seu par)
(Edmundo Souto, Danilo Caymmi e Paulinho
Tapajós)
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AGRADECIMENTOS
Acredito que ninguém é vitorioso sem Deus para nos conceder forças, e colocar ao nosso
lado pessoas para nos auxiliar em cada momento dessa difícil jornada, que envolve muitos
sacrifícios, mas, ao mesmo tempo, é também repleta de alegrias, crescimento, aprendizado e
novas amizades conquistadas.
Neste momento, agradeço a Deus, por ter me concedido essa oportunidade de concluir
mais um projeto importante na minha vida pessoal, profissional e acadêmica, podendo perceber
Sua presença nos momentos mais difíceis. A Ele, também agradeço o privilégio de ter nascido
numa família espetacular que torce, vibra, chora e ri junto. Em especial, agradeço a minha mãe
Socorro Barza, a meu irmão Valdênio e minha cunhada Karla, por todo o apoio e paciência
durante todos os momentos.
A Ana Carolina Perrusi Brandão (Carol) por tê-la, não apenas como orientadora, mas
por ter sido minha parceira nesse trabalho, demonstrando dedicação, zelo, e principalmente,
paciência e compreensão na superação das dificuldades e nos desafios que a formação enquanto
pesquisador exige. Obrigada, especialmente, pelas contribuições fundamentais para a realização
desse trabalho.
À Andréia Galvão (Deinha) pelo apoio e contribuições na elaboração do projeto para
inscrição no Mestrado.
À Socorro Aquino pela amizade e apoio incondicional durante esse momento
acadêmico e nos que estão por vir.
Aos professores: Artur Morais e Lucia Browne pelo interesse e disponibilidade em
contribuir conosco, através de comentários preciosos no momento da qualificação.
À turma 24 pelos momentos maravilhosos de convívio durante as disciplinas cursadas.
Especialmente a Jailze Santos, Magna Cruz e Renata Jatobá, amigas de todas as horas. E às
novas amizades conquistadas: Dalvaneide, Maria José França, Danielle, Simone, Juliana,
Vanira e Jaqueline.
Aos professores do núcleo de Didática que proporcionaram reflexões valorosas e
durante as aulas: Verônica Gitirana, Eliana Borges, Maria Lúcia, Carlos Eduardo e Andréa
Brito.
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À Profª Kátia Melo pelo carinho nos momentos especiais de estudo e discussões tão
valiosas.
Às professoras colaboradoras da pesquisa Ana Helena e Fabiana. Meu muito
obrigado, também, a Anailze, Zina, Gorete, e Gil, assim como, toda a equipe da escola que
contribuiu de forma impecável para a realização desta pesquisa.
Aos funcionários da Secretaria do Mestrado, pela atenção dispensada no atendimento,
durante todo esse tempo de convívio.
A todas as crianças que participaram desse estudo, especialmente, por tudo o que
ensinaram, nos lembrando que SEMPRE é tempo de aprender.
Às minhas amigas Lívia e Raquel pelas preces dedicadas e pela torcida em todos os
momentos.
A minha querida e amada filha Marina, que esteve presente o tempo todo ao meu lado,
me ouvindo, ajudando e pacientemente, cuidou de mim com a doçura de sempre. Ao meu esposo
Lamarck, que estando próximo ou à distância, torceu e torce pelo meu sucesso. Obrigada pela
compreensão e pelo seu carinho.
Enfim, agradeço a todos aqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a
realização de mais uma etapa de vida.
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RESUMO Estudos recentes recomendam o uso de jogos didáticos como recursos importantes em diversas áreas do conhecimento (NASCIMENTO, 2007; LEAL, ALBUQUERQUE E LEITE, 2005; FREITAS 2004). No campo da alfabetização, não há, porém, indicações detalhadas sobre os possíveis ganhos dos aprendizes, quando inseridos numa situação de jogo. Deste modo, este trabalho se propôs a analisar, sistematicamente, o percurso de seis duplas de crianças ao longo de três sessões com quatro jogos de análise fonológica, com vistas a identificar as mudanças qualitativas observadas no caminho dessas duplas, considerando os seus conhecimentos fonológicos e os níveis de conhecimento sobre a escrita. As duplas investigadas foram classificadas em homogêneas e heterogêneas, com base nos níveis conceituais de escrita propostos por Ferreiro e Teberosky (1985). Atividades de avaliação de conhecimentos fonológicos, bem como um ditado de palavras foram realizadas antes e após as sessões com os jogos (exame inicial e exame final). Os quatro jogos utilizados mobilizavam diferentes níveis de habilidade fonológica: segmentação oral de sílabas e comparação do tamanho de palavras, identificação de sílabas iniciais, rimas e fonemas no início de palavras. As sessões foram videogravadas sendo identificados os tipos de erro encontrados em cada um dos jogos, os avanços observados nas habilidades fonológicas das crianças, bem como as interações entre elas, e intervenções da pesquisadora. Buscou-se, portanto, obter uma visão aproximada do percurso de cada dupla ao longo das sessões com um mesmo jogo. Os dados revelam que os tipos de erros apresentados em cada jogo foram encontrados em todas as duplas, independentemente dos níveis de conhecimento fonológicos e de escrita demonstrados pelas crianças. Além disso, considerando as habilidades fonológicas mobilizadas em cada jogo não se pode falar em termos de “tudo ou nada”. Assim, num mesmo jogo, numa mesma sessão, a mesma criança acerta e erra jogadas, sucessivamente. Em relação às interações entre crianças, as sessões analisadas indicam que um mesmo jogo pôde despertar reações bem distintas entre as duplas. Porém, não foi observada qualquer especificidade entre os desempenhos das duplas homogêneas e heterogêneas. Ao final das sessões com os jogos, o exame de escrita e das habilidades fonológicas revelou um grande progresso de todas as crianças em relação aos resultados obtidos no exame inicial. Em síntese, a presente investigação contribuiu para ampliar o conhecimento acerca dos diferentes modos revelados pelas crianças de refletir sobre as unidades das palavras, tais como sílabas, fonemas e letras. A pesquisa reforça ainda a proposta do jogo didático como espaço de criação da ZDP, indicando que a aquisição da língua escrita não se constitui em uma atividade solitária. Ou seja, o adulto/ professor, as outras crianças e os instrumentos didáticos utilizados na sala de aula parecem ter um papel extremamente relevante para o desenvolvimento das várias habilidades envolvidas nesta conquista.
Palavras - chave: Jogos didáticos, Alfabetização, Análise Fonológica.
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ABSTRACT
Recent studies recommend the use of didactic games as an important tool in several areas of education (NASCIMENTO, 2007; LEAL, ALBUQUERQUE E LEITE, 2005; FREITAS 2004). In the field of literacy, however, there is no detailed assessment of the effectiveness of these games. Thus, this work aimed to systematically examine the progress of six pairs of children over three sessions during which they played four games involving phonological analysis. The objective was to identify the qualitative changes in the progress of these pairs, in particular their phonological skills and levels of knowledge about writing. The children were classified as homogeneous and heterogeneous pairs, based on their conceptual level of writing as defined by Ferreiro and Teberosky (1985). Each child was asked to do some tasks to assess his/her phonological knowledge and writing abilities before (initial test) and after the game sessions (final test). The four games demanded different levels of phonological skill: oral segmentation of syllables and comparison of the size of words, identification of rhymes, initial syllables, and phonemes at the beginning of words. The sessions were video-recorded, and the types of errors in each game were analysed, as well as the progress in the children´s phonological skills, their interactions during the games and interventions of the researcher. In this way, the progress of each pair over the sessions within one game could be mapped. The data showed that the same types of errors in each game were found in all pairs of children, regardless their levels of phonological knowledge and written skills. Moreover, progress within a game was not linear and consistent. A child might provide a correct answer and justification for their action, but would not necessarily maintain that good performance in subsequent moves. The analyses of the interactions between the children within the homogenous vs. the heterogenous pairs did not show differences in patterns of performance or interactions as a function of this pairing. At the end of the game sessions, the results in the final test of written and phonological skills showed substantial progress for all children in comparison to the results obtained in the initial test. In summary, this research has helped to expand the knowledge about the different ways revealed by children to reflect on the units of words such as syllables, letters and phonemes. The research also reinforces the use of games as a teaching space for extending the ZDP, indicating that the acquisition of written language is not a solitary activity. That is, the adult/teacher, the children and the teaching tools used in the classroom seem to have an extremely important role in the development of various skills involved in learning to read.
Keywords: Educational games, literacy, phonological awareness.
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 14 Capítulo 1: REFERENCIAL TEÓRICO 1.1 O processo de aprendizagem segundo Vygotsky..................................................... . 18 1.2 A Relação entre os sujeitos e a construção de conhecimentos.................................. 20 1.3 O Jogo e a Educação: Breve histórico ........................................................................ 23 1.4 Jogo: Definições e relações com a educação e o desenvolvimento infantil .............. 25 1.5 Os jogos didáticos na alfabetização ............................................................................ 28 1.6 O processo de apropriação de escrita alfabética........................................................ 29 1.6.1 Escrita: Código ou sistema de notação? ............................................................ 31 1.6.2 A evolução das concepções de escrita pelas crianças ....................................... 32 1.7 Relação entre a consciência fonológica e a alfabetização.......................................... 34 1.7.1Consciência Fonológica: Conceitos e estudos..................................................... 35 1.7.2 Explorando as relações entre consciência fonológica e alfabetização............. 36 Capítulo 2: OBJETIVOS DA PESQUISA 2.2 Objetivos Específicos.............................................................................................. 47 2.1 Objetivo Geral ........................................................................................................ 47 Capítulo 3: METODOLOGIA 3.1 Sujeitos......................................................................................................................... 49 3.1.1 Formação das duplas........................................................................................... 49 3.2 Etapas da Pesquisa ....................................................................................................... 50 3.2.1 Os exames das habilidades fonológicas e dos níveis conceituais de compreensão do sistema de escrita alfabética............................................................. 50 3.2.2 As sessões com Jogos de AnáliseFonológica ....................................................... 52 3.3 Descrição dos jogos ...................................................................................................... 55 3.3.1 Jogo 1: Batalha de Palavras................................................................................ 55 3.3.2 Jogo 2: Bingo de Sons Iniciais ............................................................................. 56 3.3.3 Jogo 3: Bingo de Rimas ........................................................................................ 58 3.3.4 Jogo 4: Construindo a Torre ............................................................................... 58 Capítulo 4 : ANÁLISE DOS RESULTADOS 4.1 Analisando o exame inicial: as tarefas de ditado e de avaliação das habilidades fonológicas ........................................................................................................................... 62 4.1.1 Os níveis de escrita ................................................................................................ 62 4.1.2 Exame inicial das habilidades fonológicas .......................................................... 63 4.2 Analisando as sessões com os jogos de análise fonológica......................................... 68 4.2.1 Dupla 1: Rayane/ Lucas Vinícius ......................................................................... 70 4.2.2 Dupla 2: Luciano /Vitória ..................................................................................... 86
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4.2.3 Dupla 3: CamIlla/ Gilvânia................................................................................... 98 4.2.4 Dupla 4: Deyvson /Valéria .................................................................................. 108 4.2.5 Dupla 5: Gustavo / Mayara ................................................................................ 113 4.2.6 Dupla 6: Arthur /Joyce ....................................................................................... 122 4.3 Analisando o exame final: Atividades de escrita e atividades de consciência fonológica ...................................................................................................... 131 4.3.1 Os níveis de escrita .............................................................................................. 131 4.3.2 Exame final das habilidades fonológicas ........................................................... 133 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................... 139 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 145 ANEXOS ANEXO I ........................................................................................................................... 151 ANEXO II.......................................................................................................................... 158 ANEXO III ........................................................................................................................ 165 ANEXO IV ........................................................................................................................ 178
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INTRODUÇÃO
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Diversos estudos (BRANDÃO & GUIMARÃES, 1997; REGO, 1988; TERZI, 2006)
apontam a necessidade de mudança nas práticas pedagógicas que envolvem a leitura-escrita,
numa tentativa de tornar o processo de ensino e aprendizagem mais significativo e prazeroso para
as crianças.
Os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RECNEI, 1998), assim
como o documento, recentemente, publicado pelo Ministério da Educação “Ensino Fundamental
de nove anos - Orientações para a inclusão das crianças de seis anos” (2006) apontam, também, a
necessidade de se repensar as práticas pedagógicas nas salas de Educação Infantil e de Ensino
Fundamental, a fim de proporcionar às crianças um pleno desenvolvimento de suas capacidades.
Tais documentos propõem, além da reorganização da dinâmica do espaço escolar e da revisão de
seus objetivos, um debate sobre questões importantes tais como: concepção de criança e de
alfabetização, currículo, avaliação, entre outros temas relevantes.
Mesmo com a evidente preocupação de profissionais, pesquisadores e dos órgãos
governamentais com a qualidade da educação oferecida nas nossas escolas, ainda observa-se a
permanência de práticas alfabetizadoras que concebem a leitura e a escrita como uma atividade
mecânica de memorização de um código de conversão de unidades sonoras em unidades gráficas
(e vice-versa), encarando, muitas vezes, o sucesso na alfabetização como resultante de
capacidades exclusivamente individuais.
Entendemos, porém, que a tarefa de aprender a ler e a escrever exige da criança um
considerável investimento cognitivo, uma vez que, o aprendiz deve ter um papel ativo na (re)
construção de um sistema de representação, o que implica a elaboração de relações entre letras e
sons e não, simplesmente, a aquisição passiva de relações já estabelecidas. Em outras palavras,
para compreender e ativamente se apropriar do Sistema de Escrita Alfabética (SEA), é importante
que a criança pense a língua como um objeto a ser descoberto, cujas complexidades serão
desvendadas na interação com o próprio objeto de conhecimento (palavras e textos), assim como
com parceiros mais experientes (adultos ou não).
Acreditamos que os jogos que estimulam a análise fonológica das palavras, foco desta
pesquisa, podem contribuir nessa direção, possibilitando, àqueles que jogam, reflexões e
conhecimentos importantes para o seu processo de alfabetização.
Sabemos que o uso do jogo, enquanto recurso pedagógico, nem sempre é compreendido
como tal por profissionais da educação. Assim, muitas vezes, ele é introduzido na sala de aula
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sem planejamento ou intencionalidade pedagógica, ficando o professor envolvido em outras
atividades enquanto as crianças jogam. Neste contexto, ele funciona apenas como um passa-
tempo para ocupar as crianças, enquanto esperam a chegada dos pais ao final do dia, ou mesmo
como prêmio para aquelas que acabaram mais cedo suas tarefas (NASCIMENTO, 2007).
O jogo didático fica assim entendido como um brinquedo fornecido à criança, sem se
considerar as potencialidades que pode oferecer para o desenvolvimento de objetivos didáticos.
Tal prática ignora, portanto, que diversos autores têm recomendado o uso de jogos como uma
importante ferramenta didática para o professor.
Na educação matemática, por exemplo, Kami (1995) indica o uso de jogos de bola de
gude, boliche, corrida e baralho como oportunidades excelentes para as crianças pequenas
contarem, compararem quantidades, realizarem cálculos, possibilitando aos aprendizes pensarem
sobre os números de forma prazerosa e significativa. Cória-Sabini e Lucena (2004), por sua vez,
realizaram estudos sobre a aprendizagem e o desenvolvimento das noções de maior/ menor;
perto/ longe; alto/ baixo, ordenação e formas geométricas por meio de movimentos e jogos
corporais.
Outros estudos que defendem a importância do jogo na resolução dos problemas
matemáticos, na Educação Infantil, enfatizam a necessidade da intervenção do professor
(NASCIMENTO, 2007). Alertam ainda que não basta, simplesmente, permitir que a criança
jogue, é preciso estar atento às suas jogadas, estimulando sua reflexão sobre as habilidades
envolvidas no jogo, buscando promover a ampliação de seus conhecimentos.
O uso de jogos também tem sido indicado como importante aliado para o
desenvolvimento da linguagem oral e da interação social (KISHIMOTO, 1994). Ide (2006), por
sua vez, recomenda a utilização de jogos como recursos para auxiliar crianças com dificuldade de
aprendizagem, pela possibilidade de exploração e manipulação que eles oferecem, tornando-se
relevantes para o desenvolvimento do pensamento e aquisição de conteúdos.
Na área de ensino da leitura e escrita, que nos interessa particularmente, o uso de jogos e
brincadeiras em sala de aula tem sido recomendado para a aprendizagem dos princípios que
regem o SEA, de uma forma mais significativa e lúdica (LEAL, ALBUQUERQUE E LEITE,
2005). Freitas (2004) também destaca a importância de atividades de análise fonológica, jogos e
brincadeiras nas quais as crianças possam identificar, comparar e manipular os sons das palavras
como um poderoso auxílio para aquisição da escrita. Em um estudo recente, Aquino (2007),
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reafirma a importância de um trabalho sistemático de consciência fonológica com crianças da
Educação Infantil, reforçando a necessidade de instrumentalizar os professores, para que possam
auxiliar as crianças na tarefa de aprender a língua escrita.
Porém, ainda que muitos autores enfatizem a importância do uso dos jogos na educação e,
especificamente, no processo de alfabetização, não há indicações detalhadas na literatura atual
sobre os possíveis avanços que o aprendiz, inserido numa situação de jogo, realiza em relação aos
conhecimentos mobilizados pelos jogos com os quais interage.
A presente pesquisa, portanto, procurou registrar e analisar, de modo aprofundado, o
percurso de duplas de crianças durante sessões com jogos de análise fonológica, bem como a
evolução das habilidades dessas crianças, reveladas ao longo dessas sessões. Em outras palavras,
procuramos avaliar, sistematicamente, sessões de jogos de análise fonológica envolvendo duplas
de crianças, buscando identificar os conhecimentos partilhados e desenvolvidos na relação entre
os participantes, registrando esses conhecimentos mobilizados em tais situações, e as possíveis
mudanças qualitativas observadas, no contexto de interação das crianças com jogos, com seu
parceiro de jogo e com o adulto presente na situação.
Acreditamos que existem diversas possibilidades de proporcionar às crianças, em
processo de alfabetização, a aprendizagem de conceitos específicos relativos à língua escrita, sem
perder a dimensão lúdica e prazerosa. Faz-se necessário, então, um trabalho sistemático por parte
do professor, com o intuito de unir conhecimento ao prazer de aprender, sendo o jogo uma
excelente oportunidade nessa direção.
Assim, esperamos que o presente estudo possa contribuir para a atuação do professor,
oferecendo-lhe conhecimentos sobre os caminhos percorridos pelas crianças em relação às
habilidades metafonológicas em situações de jogos, propiciando pistas para um melhor uso deste
recurso no seu trabalho junto às crianças.
A seguir, apresentamos o Referencial Teórico (Capítulo I), que aborda os tópicos julgados
relevantes para a temática da pesquisa, tais como: a concepção do processo de aprendizagem
segundo Vygotsky, que enfatiza uma perspectiva sócio-interacionista na construção do
conhecimento; um breve histórico sobre o jogo e seu uso na educação; os diferentes enfoques
dados à palavra jogo e sua importância para o desenvolvimento infantil; o jogo como recurso
didático para o ensino da leitura e escrita, e finalmente, as relações entre consciência fonológica e
o processo de aquisição do SEA, apresentando alguns estudos relativos a essa temática.
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No Capítulo II, explicitamos os objetivos gerais e específicos que norteiam a presente
pesquisa e no Capítulo III descrevemos, detalhadamente, a Metodologia utilizada para a coleta de
dados. Por fim, no Capítulo IV, apresentamos a análise das sessões de jogos com as crianças,
tecendo ainda, na conclusão do estudo, algumas Considerações Finais sobre a pesquisa realizada.
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CAPÍTULO I - REFERENCIAL TEÓRICO
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1.1 O processo de aprendizagem segundo Vygotsky
Vygotsky (1998) compreende o ser humano como um ser essencialmente social, que se
constitui enquanto sujeito na relação com o outro, utilizando-se da linguagem como instrumento
de mediação. Para ele, o conhecimento é construído com e a partir do outro, através da interação
entre sujeitos, que estão inseridos num contexto sociocultural, no qual o indivíduo aprende e se
desenvolve no convívio com outros mais experientes de sua espécie. Em outras palavras, o
indivíduo estabelece relações com os objetos de conhecimento por meio dos outros, o que implica
uma dinâmica interativa que envolve não apenas as relações entre sujeito-objeto, mas uma
interação entre sujeito-sujeito-objeto.
Em síntese, na visão vigotskiana, a interação social é o meio pelo qual o indivíduo adquire
seus conhecimentos e, segundo sua teoria, a aprendizagem ocorreria em dois níveis: o primeiro
nível puramente externo: nível social (“interpsicológico”) que se dá na relação entre pessoas; o
segundo nível corresponde àquilo vivenciado no meio exterior que, posteriormente, passa a fazer
parte dos processos internos dos indivíduos (nível “intrapsicológico”).
Para o autor, a aprendizagem, portanto, estimula e ativa, no sujeito, processos internos que
se desenvolvem na inter-relação com os outros e que, posteriormente, passam a ser absorvidos
pelo curso interior do desenvolvimento e se convertem em aquisições internas do indivíduo.
Assim, os sujeitos em interação nas atividades sociais, realizadas num plano externo, passam a
realizá-las num plano interno, interiorizando ações a partir da experiência com o outro. É deste
modo que, segundo ele, a aprendizagem alavanca o desenvolvimento dos sujeitos.
Preocupado em compreender a relação entre aprendizagem e desenvolvimento, Vygotsky
(1998), aponta ainda a importância de se compreender a relação entre desenvolvimento e
aprendizagem, atribuindo a esses processos, uma dependência recíproca, complexa e dinâmica,
enfatizando que:
Aprendizagem e desenvolvimento não entram em contato pela primeira vez na idade escolar, mas estão ligados entre si desde os primeiros dias de vida da criança (p.110).
Nessa perspectiva, o autor observa que, desde o nascimento, as crianças se desenvolvem a
partir das atividades funcionais e significativas com os indivíduos mais velhos, os quais fornecem
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informações e orientações básicas para a realização de determinadas tarefas. É através da
imitação dessas atividades, inicialmente guiada pelos adultos, que a criança começa a realizar
ações que antes não tinha capacidade de fazer sozinha.
Com base na observação dessa capacidade imitativa das crianças, Vygotsky (1998)
propõe pelo menos dois níveis de desenvolvimento presentes nos indivíduos: O primeiro nível,
denominado de “desenvolvimento real”, compreende as funções mentais da criança que se
estabelecem a partir dos ciclos de desenvolvimento já completados, indicando a capacidade
cognitiva que a criança possui em realizar uma tarefa por si mesma. O segundo nível de
desenvolvimento da criança seria, segundo ele, o “desenvolvimento potencial”, que indicaria a
capacidade que a criança adquire de realizar uma tarefa a partir do auxílio do adulto ou par mais
experiente (VYGOTSKY, 1998).
A partir desses dois níveis de desenvolvimento, Vygotsky (op.cit) cria um conceito de
excepcional relevância para a sua teoria, a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), definida
como a distância entre o nível de desenvolvimento real, determinado pela solução de problemas
de forma autônoma, por parte do aprendiz, e o nível de desenvolvimento potencial, o equivalente
à solução de problemas, sob a orientação de um adulto ou outro parceiro mais competente
(VYGOTSKY,1987). Ainda conforme a abordagem vigotskiana, o que o indivíduo pode fazer
hoje com o auxílio do outro, poderá fazê-lo amanhã por si mesmo.
Para este autor, portanto, a aprendizagem a partir da ZDP constitui um processo que não é
solitário, mas, sim, dinâmico e compartilhado, e que nos permite examinar não somente o
desenvolvimento dos processos já completados, mas, também, aqueles que ainda não foram
concluídos. Tal perspectiva de aprendizagem proposta por Vygostsky pode ser facilmente
remetida ao domínio da aprendizagem escolar, uma vez que este espaço é, em princípio, o lugar
próprio para a promoção de novos saberes.
Neste sentido, retomando o conceito de ZDP, Hedegaard (1996) enfatiza que a escola
pode e deve favorecer aprendizagens através da interação entre criança-adulto ou criança-criança,
buscando um ensino que leve em conta o desenvolvimento real da criança, bem como suas
capacidades de aprender a realizar novas atividades, favorecendo espaços para o estabelecimento
de ZDPs. É sobre essa possibilidade de trocas de conhecimentos entre adultos ou outros parceiros
mais experientes, que trataremos a seguir.
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1.2 A relação entre sujeitos e a construção de conhecimentos
A interação em sala de aula vem sendo objeto de interesse de vários estudiosos e
profissionais de ensino, com a finalidade de compreender seu funcionamento, no sentido de
promover a construção de novas aprendizagens.
Estudos como os de Wertsch & Hickimann (1987), Moll (1996) Tudge (1996), Acioly-
Règnier (1996), Miranda (1997), Leal e Luz (2000), Laplane (2000), entre outros, destacam a
importância do papel da interação em sala de aula favorecendo mudanças nas relações entre as
crianças e o objeto de conhecimento.
Nessa mesma direção, o estudo de Teberosky (1987), por exemplo, analisa a interação
grupal entre crianças pré-escolares na construção da escrita, enfocando as suas capacidades de
compartilhar e confrontar concepções sobre o sistema alfabético a partir da interação entre o
objeto (a escrita) e entre os sujeitos. O referido estudo apresenta a experiência com um grupo de
crianças com idade de cinco anos e mostra como a cooperação entre elas se reflete positivamente
nas construções conjuntas realizadas. De fato, como salienta a referida autora, “as situações de
interação grupal constituem uma situação privilegiada” cuja vantagem devemos saber aproveitar
(Ibidem, p. 125).
Davis e Espósito (1989), também ressaltam que uma aprendizagem voltada para a
dimensão interativa pode favorecer ao professor, meios de compreender melhor seu aluno, bem
como contribuir para a sua aprendizagem.
As autoras enfatizam, ainda, que a experiência de cooperação entre parceiros, seja
criança-criança ou adulto-criança, favorece não apenas o conhecimento do outro (experiência
humana, tendo a linguagem como mediadora), mas, também, a produção de conhecimentos com
os outros. Assim, a interação, para as referidas autoras, “adquire um caráter estruturante na
construção do conhecimento na medida em que fornece, além da dimensão afetiva, desafio e
apoio para atividade cognitiva” (p.52).
Alguns autores têm buscado identificar mais sistematicamente os efeitos das interações
entre pares no desenvolvimento das crianças, abordando conteúdos de diferentes áreas do
conhecimento. O estudo de Leal e Luz (2000), por exemplo, objetivou analisar os processos de
interação entre duplas de crianças de uma sala de 3ª série, na produção de textos. Inicialmente, as
crianças foram avaliadas individualmente, através da produção escrita de notícias, cartas e contos,
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sendo, agrupadas e classificadas de acordo com seu desempenho em duplas simétricas (Fraco-
fraco; Médio-médio; Forte-forte) e duplas assimétricas (Fraco-médio; Fraco-forte; Médio-forte).
Em seguida, as crianças realizavam, também em duplas, produções escritas dos mesmos gêneros
textuais citados acima.
A pesquisa revelou que os sujeitos em pares explicitavam e confrontavam suas idéias para
decidir sobre o quê e como escrever, reelaborando suas concepções, o que de modo geral,
resultou na produção de melhores textos na situação em dupla do que individualmente. As duplas
assimétricas (fraco/médio), por exemplo, produziram textos classificados como fortes nos três
gêneros investigados, o mesmo também ocorreu com as duplas simétricas (médio/médio). Porém, as
duplas do tipo fraco/ fraco só avançaram na produção de carta.
Assim, como alertam Leal e Luz (2000), a situação de interação não necessariamente resultou
numa evolução na qualidade dos textos para todas as duplas, ainda que isso tenha ocorrido para a
maioria dos casos investigados. Segundo as autoras, talvez para as duplas com um desempenho
individual mais fraco fosse necessário ampliar o número de situações de interação, já que a pesquisa
analisou apenas o efeito de uma única produção em dupla.
As autoras ainda salientaram a necessidade de se analisar detidamente as interações entre as
duplas em que um dos parceiros já apresentava um texto classificado como forte na situação
individual, pois, neste caso, a melhoria do texto produzido em dupla poderia apenas representar a
predominância do parceiro mais competente. Em síntese, o referido estudo vem valorizar as
situações de interação entre duplas como um recurso didático importante no processo de
construção de conhecimento de crianças no contexto escolar.
Estudos envolvendo a análise da interação entre pares também foram conduzidos por
Tudge (1996). O autor salienta que embora as pesquisas apontem os efeitos benéficos que a
interação com parceiros mais competentes possam provocar no desenvolvimento cognitivo das
crianças, é necessário considerar com cautela a natureza de tais interações.
Em dois estudos em que pares de crianças realizavam tarefas de antecipação do
funcionamento de uma balança composta por oito bastões eqüidistantes e blocos de madeira, o
autor buscou investigar as interações entre pares de crianças quando o parceiro mais avançado
não era, necessariamente, o mais confiante em seus pontos de vista.
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Neste contexto, seus resultados mostraram que, embora os parceiros mais fracos tenham
sempre demonstrado avanços em seus níveis de conhecimento, o impacto das interações para os
parceiros mais competentes nem sempre foi positivo. Assim, conforme o autor salienta, nos casos
em que competência e confiança não se mostram associadas num mesmo sujeito, muito
provavelmente “... as crianças regredirão em suas formas de raciocínio quando defrontadas com
parceiros menos competentes” (TUDGE, 1996, p. 163). Ainda segundo o autor, isto ocorre
justamente porque tais crianças não confiam em seus próprios pontos de vista, situação que pode
ser agravada quando não lhes é fornecido feedback pelo pesquisador quanto à resposta dada.
Os estudos de Tudge levantam, portanto, uma questão interessante que é a possibilidade
de que a colaboração entre pares não resulte, necessariamente, em benefícios para o
desenvolvimento cognitivo. Assim, fatores como o grau de confiança do parceiro em seus pontos
de vista, a idade dos membros da dupla, o grau de engajamento de ambos na situação proposta,
entre outros, revelam o quanto pode ser complexa a análise dos efeitos da interação entre pares.
Tal afirmação coloca para os professores uma questão a mais para refletir e considerar nos
momentos em que estimulam a interação entre seus alunos na sala de aula.
Porém, é inegável que a adoção do conceito de ZDP traz para a escola novas bases para a
construção de conhecimentos, cabendo ao docente o desafio de fornecer informações dentro da
ZDP dos seus alunos.
A presente pesquisa visa, exatamente, investigar situações de interação voltadas para a
construção de conhecimentos sobre a escrita. Partimos do princípio de que a utilização de jogos
de análise fonológica com crianças pode funcionar como um dos espaços de criação de ZDP nas
salas de aula, na medida em que proporciona oportunidades de construção de conhecimentos,
articulados com as interações, que permeiam o processo de internalização e de desenvolvimento.
Em outras palavras, com a ajuda de outros jogadores ou do adulto mediador, espera-se que
jogadores menos experientes possam, gradualmente, ir incorporando novas aprendizagens,
resultando na produção de novos conhecimentos.
Acredita-se, portanto, que a utilização do jogo durante o processo de apropriação do
sistema de escrita pode proporcionar às crianças momentos de interação e de ampliação de certos
conhecimentos fundamentais para a conquista do SEA pela criança, em um contexto de
aprendizagem prazeroso e reflexivo.
24
Nessa perspectiva, analisar-se-á a interação entre duplas de crianças com as mesmas
hipóteses de escrita e duplas com níveis de compreensão distintos sobre o SEA como, em geral,
encontramos nas salas das nossas escolas. Com isso, espera-se registrar e analisar os processos de
constituição e apropriação de conhecimentos sobre o SEA, especificamente, os de natureza
fonológica, propiciados e manifestados na situação de jogo. Pretende-se, ainda, observar as
possíveis trocas e formas de compartilhar conhecimentos entre as diferentes duplas de crianças,
em momentos distintos, jogando um mesmo jogo por um certo período de tempo.
Considerando que a utilização de jogos na educação não é prática recente, será
apresentado, no próximo item, um breve histórico sobre a utilização de tais instrumentos no
contexto educacional.
1.3 O jogo e a educação: breve histórico
Os estudos iniciais sobre jogos educativos datam dos tempos da Roma e da Grécia
antigas. Assim, desde Platão e Aristóteles se destaca a importância do “aprender brincando”,
propondo-se o jogo como recurso para o ensino das palavras e dos números.
Na Idade Média, porém, o jogo passa a ser considerado como algo “não-sério” e até
delituoso, associado à idéia de embriaguez e prostituição. Tal conotação moral atribuída ao jogo
articula-se com a concepção de lazer e de divertimento que, nesta época, estava relacionada à
malandragem e ao vício (com os jogos de azar), noções evidentemente bastante distantes dos
interesses de educadores.
Porém, preocupados em trazer uma atmosfera lúdica para educação, estudiosos como
Quintiliano, Erasmo, Rabelais e Basedow (apud, BROUGÈRE, 1998) começam a inserir a
temática dos jogos em seus escritos. Neste contexto, destaca-se Quintiliano, que alia o jogo ao
aprendizado das letras, recomendando a preparação de doces em formato de letrinhas, buscando
transformar a aprendizagem em divertimento.
Erasmo também propõe o jogo como um meio de facilitar a aprendizagem da leitura e
escrita. Na época, a tarefa de aprender a ler e escrever tinha uma conotação muito séria, sendo
considerada como um verdadeiro trabalho para o aprendiz. O jogo introduzido na educação das
crianças, então, vem diminuir o sentido penoso atribuído a esse trabalho (BROUGÈRE, 1998).
25
O Renascimento traz para a sociedade novos ideais sociais e políticos, e o jogo passa a ser
novamente incorporado à educação, associando-se à aprendizagem, servindo para divulgar
conteúdos de história, de geografia, entre outros (KISHIMOTO, 2003).
Simultaneamente, abrem-se novas perspectivas para a educação de crianças pequenas.
Estas passam a ser compreendidas como indivíduos diferentes do adulto, surgindo a necessidade
de se pensar numa educação voltada para os interesses próprios do mundo infantil. A percepção
da infância com valor positivo se estende com o Romantismo. Neste período, o jogo aparece
vinculado à recreação, à conduta típica e espontânea da criança.
Comungando desta perspectiva em que o jogo é tomado como uma conduta espontânea e
livre, Froëbel funda os “Jardins da Infância” na Alemanha, na primeira metade do século XIX. A
partir deste período, o jogo é, assim, inserido como componente curricular na educação de
crianças pequenas com o objetivo de favorecer o desenvolvimento cognitivo e emocional dos
pequenos aprendizes. Froëbel, enfatiza ainda, que o jogo deve servir de suporte para atividades
didáticas, sem, porém, perder de vista a sua dimensão lúdica e prazerosa (KISHIMOTO, 2003).
Os jogos de construção, propostos por Fröebel, e até hoje presentes no ambiente escolar
de crianças pequenas, são ainda considerados como importantes no desenvolvimento da
criatividade e habilidades sensoriais. Na manipulação livre dos tijolinhos, a criança constrói
cenários, casas, mobiliários que irão fazer parte das brincadeiras simbólicas. Essas construções
evoluem em complexidade, à medida que a criança se desenvolve. Sendo assim, esse tipo de jogo
favorece relações e representações importantes que farão parte do mundo real da criança.
(KISHIMOTO, 2003).
A partir da função atribuída ao jogo por Fröebel, como propulsor do desenvolvimento da
criança e, posteriormente, com a propagação da Psicologia, o jogo recebe estatuto científico. O
jogo passa, assim, a ser utilizado também como instrumento de diagnóstico da personalidade
infantil e como recurso para ajustar o ensino às necessidades infantis. Deste modo, psicólogos e
psicanalistas como Bruner, Freud, Melanie Klein, Winnicot consideram o jogo como um material
a interpretar (BROUGÈRE, 1998).
No século XX, as concepções sóciointeracionistas de ensino e aprendizagem contribuem
para estabelecer novos paradigmas para a utilização do jogo na educação e, mais especificamente,
em sala de aula. Na visão de autores como Piaget, o jogo é visto como recurso de integração da
vida mental da criança (KISHIMOTO, 1994). Segundo ele, é através da brincadeira, que a
26
criança passa a melhor assimilar /compreender a realidade externa, a partir de uma experiência
individual de assimilação e acomodação.
O referido autor chama ainda a atenção para a existência de três sistemas de jogos: os
“jogos de exercício” nos primeiros anos de vida da criança, que envolvem atividades motoras e a
repetição de seqüências de atividade motoras. Os “jogos simbólicos”, que surgem posteriormente,
com o aparecimento da capacidade de representação e da linguagem, fazendo com que, na
brincadeira de faz de conta, a criança interaja com símbolos, papéis sociais, imitando ações e
desenvolvendo a imaginação.
E, finalmente, os “jogos de regras”, que para, Piaget marcam a transição de uma atividade
individualizada para uma atividade social, já que, segundo ele, a regra tem a função de integrar o
indivíduo no meio social. Ainda, segundo o autor, com esse tipo de jogo, a criança passa a
compreender regras que antes faziam parte do seu mundo exterior e que, após tal experiência,
passam a ser assimiladas como algo que faz parte de seu mundo interno. (KISHIMOTO, 1994).
Na visão de Vygotsky, por sua vez, o jogo deve ser analisado como um resultado de
processos sociais. O jogo ou a brincadeira com suas regras, símbolos e signos, contribuem para a
assimilação de papéis e internalização de regras sociais. Deste modo, a partir de uma situação
imaginária, possibilitada pelo jogo, onde os sujeitos interagem entre si, os indivíduos
“incorporam elementos do contexto cultural adquiridos por meio da interação e comunicação”
(apud KISHIMOTO, 1994, p.42).
Para Vygotsky “o jogo é o elemento que irá impulsionar o desenvolvimento dentro da
zona de desenvolvimento proximal” (apud KISHIMOTO, 1994, p.43), favorecendo a troca de
experiências entre sujeitos com potencialidades de resolução de tarefas em níveis distintos.
Considerando que o termo “jogo” tem dado margem a uma série de interpretações
distintas, buscaremos, no próximo item, discutir esse tópico, especificando o conceito de jogo
adotado nesta investigação.
1.4 Jogo: definições e relações com a educação e o desenvolvimento infantil
Os diversos sentidos atribuídos à palavra “jogo” são destacados por autores como:
Brougère, (1998), Kishimoto (2006) e Lombardi (2005). De fato, trata-se de uma palavra
27
polissêmica, podendo ser entendida, por exemplo, como uma brincadeira, um tipo de esporte, ou
mesmo como sinal de astúcia de um indivíduo. Além disso, como vimos no item anterior, a
literatura apresenta diversos tipos de jogos: há os chamados “jogos simbólicos”; os “jogos de
construção”; os “jogos corporais ou de exercício”; os “jogos esportivos”, que aliam movimentos
corporais, exercícios e ludicidade; os “jogos educativos”, que favorecem o aprendizado e
estimulam a solução de problemas.
Pesquisadores como Brougère e Henriot apontam que o jogo pode ser visto como: “um
sistema lingüístico inserido num contexto social, um sistema de regras e um objeto” (apud
KISHIMOTO, 2006, p.16). Enquanto “sistema lingüístico” o jogo é visto como dependente da
linguagem dos diferentes sujeitos num determinado contexto social, que, durante as situações de
jogo, estão em constante comunicação. Enquanto “fato social” ele assume o sentido equivalente
ao contexto cultural e histórico de cada época, envolvendo regras próprias, assumindo
significados distintos em cada cultura. Finalmente, como “objeto”, se apresenta sob diversas
formas e tipos de materializações. Por exemplo: um tabuleiro de xadrez pode ser fabricado a
partir do papelão, da madeira ou do plástico (Ibidem).
Outros pesquisadores, como Wittgenstein, Caillois e Henriot buscam definir
características comuns a grupos de jogos, ou seja, procuram identificar as ‘semelhanças de
família’ entre eles (apud, CAMARGO e CARNEIRO, 2006, p. 125). Isto é, segundo esses
autores, os jogos apresentam diversos aspectos semelhantes entre si, pertencendo a uma mesma
família de jogo. Por exemplo: os jogos de tabuleiro como dama e o jogo de xadrez, possuem
aspectos em comum, assim como os diversos tipos de jogos de cartas, ou jogos de bola.
Embora não haja concordância plena entre os autores em relação às características do que
seria um jogo, Huizinga (2001) destaca certos aspectos relacionados à influência dos elementos
culturais e sociais na sua definição. Dentre os aspectos citados pelo autor, estão os seguintes: “o
prazer demonstrado pelo jogador; o caráter ‘não-sério’ da ação; a liberdade presente no jogo e sua
separação dos fenômenos cotidianos; a existência de regras; o seu caráter fictício ou
representativo; a limitação do jogo no tempo e no espaço” (p.28).
Porém, Kishimoto (2006), adverte que:
Embora predomine, na maioria das situações, o prazer como elemento distintivo do jogo, há casos em que o desprazer é o elemento que o caracteriza, isso em decorrência do esforço realizado na tentativa de atingir os objetivos propostos pelo jogo (p. 23).
28
Com o objetivo de esclarecer dúvidas em relação ao conceito de jogo, a autora propõe,
ainda, diferenciar os termos “brinquedo”, “brincadeira” e “jogo”. Assim, segundo Kishimoto
(2006), “brinquedo” é o objeto que serve de suporte para a brincadeira e que pode ser usado de
diferentes maneiras pelas crianças. A “brincadeira”, por sua vez, envolveria condutas estruturadas
com regras compartilhadas por aqueles que brincam. E, finalmente, o “jogo” se refere, segundo
ela, às ações lúdicas que envolvem tanto os objetos (brinquedos) quanto às regras estruturadas
externamente, às quais os participantes se submetem.
A autora recomenda, ainda, a necessidade de se compreender o jogo em uma dimensão
total. Ou seja, é importante, ao vivenciar a situação concreta de jogo, perceber a atitude mental
dos sujeitos envolvidos na atividade, uma vez que, uma mesma situação, quando observada
externamente, pode ser entendida como jogo, ainda que o jogador não manifeste
comportamentos, nem atitudes equivalentes ao lúdico.
Também na tentativa de diferenciar a “brincadeira” do “jogo didático”, Borba (2006)
afirma que a brincadeira está caracterizada por uma atividade espontânea, livre, sem hora
marcada, e sem objetivo de buscar resultados prévios e determinados. O jogo didático, ao
contrário, pressupõe, para a autora, a mobilização de conhecimentos específicos sob o
direcionamento de um adulto1.
Apesar de estabelecer tais diferenças entre o jogo didático e a brincadeira, Borba ressalta
que não há empecilhos para que o jogo possa ser utilizado como recurso lúdico, possibilitando
reflexões sobre conceitos específicos nas diversas áreas do conhecimento.
Neste estudo, classificamos, portanto, os jogos de análise fonológica que serão utilizados
como jogos didáticos, adotando o termo citado por Borba (op.cit). Assim, entendemos que, neste
sentido, o jogo pode funcionar como uma estratégia educacional capaz de potencializar diversas
aprendizagens, inclusive as relativas às habilidades fonológicas, foco da presente investigação.
No entanto, assim como Borba (2006), enfatizamos a necessidade de que não se perca a
dimensão lúdica e prazerosa do jogo, minimizando-se a ênfase no acerto. Em outras palavras, o
jogo didático, na escola, deve estar livre de pressões, favorecendo um clima de investigação e
motivação para novas aprendizagens, sem o constrangimento ou medo de errar.
1 Nota-se que tal definição de jogo didático parece estar de acordo com o que Kishimoto (1998, p.23) define como jogo educativo “aquele que está atrelado ao ensino de conteúdos”.
29
Em síntese, usar o jogo na escola, como uma ação intencional para potencializar
aprendizagens de certos conteúdos específicos, significa compreender que a associação do lúdico,
com a construção do conhecimento maximiza a experiência motivacional do ensinar e aprender.
Com base nos pressupostos expostos acima, discutiremos, no item seguinte, as
possibilidades da utilização de jogos didáticos no processo de alfabetização.
1.5 Os jogos didáticos na alfabetização
A compreensão da natureza do SEA, assim como suas funções, implicam a apropriação de
uma complexidade de princípios que envolvem aspectos específicos desse sistema e que precisam
ser aprendidos pelas crianças ao longo de seu processo de alfabetização. Tais princípios, segundo
Leal (2004), são os seguintes:
A escrita é horizontal e acontece da esquerda para a direita; escreve-se utilizando símbolos convencionais (letras), havendo uma correspondência grafofônica, isto é, correspondência entre o som (fonema) e a escrita (grafema), onde as normas ortográficas regem a representação dos fonemas; o sistema alfabético de escrita tem relação com a pauta sonora e não com as propriedades dos objetos; na escrita alfabética, a correspondência entre a escrita e a pauta sonora é realizada predominantemente entre grafemas e fonemas e não entre grafemas e sílabas; as sílabas podem variar quanto às combinações entre consoantes, vogais e semivogais, mas a estrutura predominante é a consoante-vogal; as regras de correspondência grafofônica são ortográficas, dessa forma pode-se representar um mesmo fonema através de letras diferentes ou uma mesma letra pode representar fonemas diferentes, assim como um fonema pode ser representado por uma ou mais letras. (LEAL, 2004:79)
Como já dissemos, na área de ensino da leitura e escrita, o uso de jogos e brincadeiras em
sala de aula têm sido recomendados para a aprendizagem dos princípios descritos acima, de uma
forma mais significativa e lúdica.
Nesse sentido, Leal et al. (2005) sugerem a utilização de “jogos de alfabetização”,
apontando três tipos de jogos que o professor pode utilizar como recurso em sala de aula para
auxiliar o aprendiz em seu processo de apropriação do SEA.
Como veremos, os jogos de análise fonológica que serão utilizados na presente pesquisa se
inserem na primeira categoria de jogos apresentada abaixo. Vejamos:
30
1. Jogos que contemplam atividades de análise fonológica sem fazer correspondência com a escrita - Para compreender a lógica do nosso sistema de escrita a criança precisa perceber de modo consciente, que a relação se dá entre os sinais gráficos (letras) e a pauta sonora e não entre os sinais gráficos e os significados ou propriedades físicas dos objetos. 2. Jogos que levam os alunos a pensar sobre as correspondências grafo-fônicas - Para compreender a lógica do sistema de escrita os aprendizes precisam descobrir as unidades menores (sílabas e fonemas) e compreender como elas correspondem às unidades gráficas. 3. Jogos que ajudam a sistematizar as correspondências grafo-fônicas – Para que os alunos tenham uma leitura e escrita mais autônoma e mais ágil, os alunos precisam realizar muitas atividades de leitura e escrita. Faz-se necessário que as crianças leiam palavras ou textos e escrevam palavras ou textos a fim de que consolidem as correspondências grafo-fônicas (LEAL et al., 2005, p. 119-121).
Vale destacar que, embora concordemos que os jogos didáticos possam funcionar como
estratégias de ensino importantes, estes não constituem os únicos recursos, nem são suficientes
para o trabalho que o professor precisa realizar em direção à compreensão do SEA por parte das
crianças. Sobre isso, tomamos emprestadas as palavras de Kishimoto (2006), quando afirma que:
A utilização do jogo potencializa a exploração e a construção do conhecimento, por contar com a motivação interna, típica do lúdico, mas o trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos e a influência de parceiros, bem como a sistematização de conceitos em outras situações que não jogos (p.37).
Assim, não devemos esquecer que os jogos de análise fonológica representam apenas um
dos caminhos possíveis para promover a reflexão sobre os princípios do nosso sistema de escrita
e a conquista da base alfabética da escrita. Na próxima seção, iremos discutir em mais detalhes,
os passos de tal conquista pela criança.
1.6 O processo de apropriação do sistema de escrita alfabética
Apesar da realização de inúmeros estudos voltados à aquisição da leitura e escrita em
crianças nos anos iniciais de escolarização, o tema “alfabetização” ainda continua suscitando o
interesse de diversos pesquisadores e profissionais de ensino.
31
Como tem sido afirmado, os estudos de Ferreiro e Teberosky (1985), divulgados no Brasil
nos anos 80, contribuíram para a mudança de foco do “como se ensina” a ler e escrever para o
“como se aprende”. As pesquisas de Ferreiro e colaboradores foram fundamentais para o
reconhecimento de que a tarefa de aprender a ler e escrever não se restringe a atividades de
memorização sem sentido por parte da criança, mas requer da mesma um amplo processo de
elaboração sobre a natureza e funcionamento da língua escrita.
O adulto alfabetizado tem uma percepção sobre a língua escrita diferente da criança, pois
já percorreu todo um processo de construção e reconstrução sobre as propriedades do sistema de
escrita, que o aprendiz ainda terá que vivenciar (CORREA, 2001). Deste modo, é comum não se
levar em conta o trabalho de elaboração do aprendiz sobre a língua escrita e, conferir a esse
esforço a mesma facilidade que, em geral, se atribui à aprendizagem da língua oral. Como alerta
Ferreiro (2003), pensar desta forma é entender a oralidade e a escrita como objetos já postos,
reduzindo todo o trabalho cognitivo que a criança faz a uma questão mecânica de métodos e
técnicas de ensino.
Embora se observe que a aprendizagem da linguagem oral nas crianças pequenas ocorra
de modo natural, como conseqüência da estimulação do ambiente no qual as crianças vivem, a
aprendizagem da língua escrita requer um trabalho mais complexo que nos remete a um local
específico, com certas estratégias pedagógicas dirigidas para este fim. Ou seja, a escola constitui
um espaço oficial com a responsabilidade de promover o ensino/ aprendizagem da língua materna
e, para tanto, deve reunir condições eficazes que auxiliem os educandos nesta tarefa.
Enfatizamos, ainda, que, para a criança compreender a escrita, se faz necessário certo
nível de reflexão sobre a representação da escrita. Assim, embora, não exista uma relação direta
entre a fala e a escrita (FERREIRO, 2003), a reflexão sobre o sistema de escrita parece estar
relacionada às possibilidades de práticas que explorem o confronto entre segmentação da fala e a
representação escrita. Ao que parece, os problemas em relação ao ensino da língua estão pautados
na necessidade de um trabalho pedagógico com os aprendizes de modo a promover tais reflexões,
de forma contínua, entre o que está escrito e o que é falado. Neste sentido, vale salientar que
diferentes concepções sobre as relações entre oralidade e escrita têm resultado em distintas
compreensões sobre a natureza do sistema de escrita.
Neste contexto, a língua escrita pode ser compreendida como um código de transcrição
gráfica, ou como um sistema de representação (ou notação). Considerando que diferentes formas
32
de concepção sobre a escrita resultam em conseqüências pedagógicas também distintas, se faz
necessário aprofundar um pouco mais a discussão sobre o que a escrita representa. É o que nos
propomos a fazer no tópico a seguir.
1.6.1 Escrita: Código ou Sistema de Notação?
As palavras “codificar” e “código” são, freqüentemente, usadas como referência ao
processo de alfabetização. Porém, como adverte Morais (2005), retomando Ferreiro e Teberosky
(1985), estas palavras pressupõem uma idéia de alfabetização como uma atividade em que basta
apenas aprender a substituir símbolos (sonoros) da fala por outros símbolos (gráficos) na escrita.
À primeira vista, portanto, a tarefa de aprender um código poderia parecer simples para o
aprendiz e, da mesma forma para o professor, pois bastaria a ele explicitar os símbolos gráficos e
todo o trabalho de junção de letras, sílabas e formação de palavras ficaria a cargo do aluno. No
entanto, se isto fosse verdade, não existiriam tantos problemas em relação à alfabetização de
crianças.
De fato, como salienta Morais (2005), a escrita faz parte de uma construção histórica
coletiva e sua representação transcende o objeto gráfico representado, isto é, a escrita remete a
significados. Compreender, portanto, a escrita como um sistema de representação ou notação
envolve mais do que apreender os símbolos lingüísticos (letras, fonemas, sílabas, etc.). Ao
escrever, o indivíduo atribui sentido e significado a um significante escrito, possibilitando uma
interpretação coletiva. Este trabalho construído pela humanidade é a tarefa que o aprendiz da
escrita terá que (re)fazer ao (re)elaborar as convenções do sistema de escrita alfabética, para
aprender a escrever, ao invés de apenas memorizar sons ou letras (MORAIS, 2005).
Segundo Rego (2007), alfabetizar na perspectiva da escrita como sistema de notação
alfabética, não se traduz, portanto, como algo simples e repetitivo. Ao contrário, é tarefa que
exige do professor muito mais do que conhecimento dos processos cognitivos das crianças
envolvidas na aprendizagem do sistema de escrita.
Ainda segundo a autora, o ensino do SEA requer do profissional a organização de um
ensino sistemático e desafiador, para que possa auxiliar os aprendizes a refletirem,
conscientemente, sobre as palavras e seus componentes.
33
Rego (Ibdem) também destaca que o professor deve auxiliá-los na evolução de suas
hipóteses sobre a escrita alfabética, sem perder de vista as práticas de leitura e escrita que envolve
o mundo letrado, uma vez que o trabalho de domínio da linguagem escrita, de modo isolado das
práticas sociais de leitura e escrita, torna-se algo sem sentido para o aprendiz.
A esse respeito, Morais (2006) ainda salienta a necessidade de encontrar meios que
direcionem e transformem o ensino-aprendizagem da língua escrita numa tarefa mais
interessante, tendo a preocupação de respeitar os processos evolutivos de elaboração/ re-
elaboração que as crianças desenvolvem sobre o sistema de escrita. Tais processos serão,
brevemente, apresentados no tópico seguinte.
1.6.2 A evolução das concepções de escrita pelas crianças
Atualmente, ninguém questiona o fato da criança entrar em contato com o mundo da
escrita antes de ingressar na escola, ainda que a freqüência, a natureza e a qualidade deste contato
possam variar em diferentes contextos sociais. De modo geral, porém, pode-se afirmar que as
atividades de leitura e escrita as quais as crianças têm acesso no ambiente em que vivem,
favorecem o desenvolvimento de conceitos e atitudes importantes para a relação que irá
estabelecer com tais objetos culturais, posteriormente, no período escolar.
Para Ferreiro e Teberosky (1985), neste contato com a escrita, diferentes “hipóteses sobre
como ela se processa” vão sendo construídas por todas as crianças, de qualquer meio social.
Assim, segundo essas autoras, numa fase inicial, as crianças não fazem diferença entre desenhar e
escrever. Numa etapa posterior, a criança passa a representar a escrita através de traços, bolinhas
ou rabiscos, ou seja, diferenciando a escrita do desenho dos objetos representados. Ainda nesta
etapa, as crianças começam a perceber que existem formas gráficas convencionais (as letras) para
poder escrever, mesmo que não se verifiquem tentativas sistemáticas de estabelecer relações entre
os aspectos fonológicos da fala e a sua representação gráfica. Esta fase se inclui na hipótese pré-
silábica, também chamada como escrita “pré fonética” (FERREIRO & TEBEROSKY, 1985)
Num segundo momento, a criança passa a compreender que a escrita representa a fala. Ou
seja, ela descobre que as palavras escritas são representadas por seqüências sonoras. Assim, ao
escrever, ora pode atribuir letras diferentes para representar cada sílaba da palavra, estabelecendo
34
uma relação de natureza apenas quantitativa entre os sons das palavras e a sua notação, ora vai
além, estabelecendo uma relação de natureza qualitativa, atentando para a qualidade dos sons das
palavras e buscando grafá-los de modo convencional.
Neste período de fonetização da escrita e antes de atingir a hipótese alfabética, a criança
entra num período de transição muito próximo ao nível alfabético, que constitui o chamado
período silábico-alfabético. Nessa fase, a criança enfrenta o desafio de encontrar uma forma de
analisar a palavra que vá além da sílaba, superando a sua hipótese anterior.
Finalmente, ao atingir a hipótese alfabética de escrita, diz-se que a criança se apropriou do
princípio geral do nosso sistema de escrita, entendendo não apenas o que a escrita representa, mas
seu modo de funcionamento. Em outras palavras, compreende que a palavra é formada por
unidades sonoras ainda menores que as sílabas, os fonemas. A partir daí, a criança passa a
enfrentar novos desafios para o domínio da norma ortográfica.
As evidências de uma evolução na conceituação da escrita, reveladas pelas crianças, nos
estudos de Ferreiro e Teberosky, mostram, sem qualquer dúvida, a dimensão do trabalho
cognitivo que os aprendizes da escrita desenvolvem.
Algumas das interpretações equivocadas sobre o processo evolutivo da escrita, trouxeram
conseqüências graves para o ensino da leitura e escrita. Pensava-se que, sendo a criança um
sujeito ativo e pensante, avançaria em suas hipóteses apenas por estarem expostas ao mundo
letrado, sem a necessidade de haver um trabalho pedagógico sistemático nesta direção. Ou seja,
deixou-se de levar em conta o trabalho do professor-alfabetizador necessário para que o aprendiz
pudesse avançar em suas concepções em direção da conquista do SEA.
Como já foi dito, segundo Morais (2005), tal sistema é dotado de propriedades
específicas, as quais precisam ser entendidas e re-elaboradas pelas crianças, ao mesmo tempo em
que elas devem interagir com as diferentes formas de expressão da língua na comunidade em que
vivem. Esse trabalho não pode ser subestimado, nem transformado em atividades de
memorização e cópia de palavras ou frases. Sendo assim, concordamos com Galvão e Leal
(2005), quando destacam que é preciso repensar uma nova forma de ensino da língua escrita sem
que, necessariamente, apelemos para um retorno aos tradicionais métodos de alfabetização, já
adotados no Brasil.
Defendemos, assim como Morais e Leite (2005), um trabalho no qual o professor possa
reorganizar seu espaço pedagógico, propondo e revendo seqüências didáticas específicas para a
35
apropriação do SEA, proporcionando aos aprendizes uma reflexão consciente sobre os aspectos
fonológicos e ortográficos das palavras, a fim de que eles possam compreender o funcionamento
do sistema e memorizar suas convenções.
No próximo item, discutiremos, mais detidamente, a respeito da relação entre a aquisição
da escrita e a reflexão sobre os aspectos fonológicos das palavras, que, como vimos, se constitui
em um elemento chave na conquista da base alfabética da escrita.
1.7 As relações entre consciência fonológica e alfabetização
A literatura científica apresenta, atualmente, um grande número de pesquisas que discute
as relações entre o desenvolvimento das habilidades metalingüísticas e a aprendizagem da língua
escrita. Porém, antes de avançar nesta discussão, é importante esclarecer que a atividade
metalingüística envolve a possibilidade do sujeito pensar sobre a própria língua e, não
simplesmente, de usá-la para se comunicar e atingir os seus objetivos. Neste sentido, é importante
salientar que, ao colocar a língua como foco de sua atenção, o indivíduo poderá refletir sobre seus
diferentes aspectos, tais como: o morfológico, o sintático, o textual e o fonológico, que nos
interessa, particularmente, nesta pesquisa.
Como afirma Morais (2006), a consciência fonológica é, portanto, apenas uma das
habilidades metalingüísticas, aquela que resulta da reflexão do sujeito sobre sílabas, rimas,
fonemas, ou seja, sobre segmentos sonoros que estão no interior das palavras.
Pedagogos, psicólogos e fonoaudiólogos têm demonstrado interesse especial em torno da
relação entre consciência fonológica e alfabetização. Um bom número de trabalhos nacionais e
internacionais (por exemplo, GOUGH e LARSON, 1995; BRYANT e BRADLEY, 1997; REGO,
1994; MORAIS, 1997; BARRERA, 2003; GUIMARÃES, 2003), apontam para uma associação
entre esses dois pólos. Contudo, entre os pesquisadores na área não há um consenso quanto à
natureza de tal relação e, conforme veremos no item seguinte há divergências até mesmo quanto
à maneira como se estruturam as habilidades fonológicas (FREITAS, 2004).
36
1.7.1 O conceito de consciência fonológica
Autores como Gombert (2003) destacam que crianças entre dois ou três anos já
apresentam sensibilidade aos aspectos fonológicos da linguagem. Segundo o autor, as crianças
despertam para aspectos sonoros da fala quando, por exemplo, se autocorrigem ou corrigem o
outro diante de uma palavra pronunciada equivocadamente, ou mesmo quando produzem ou
reconhecem palavras que rimam.
Tais procedimentos lingüísticos espontâneos são chamados de “epilingüísticos”, pois se
assemelham aos comportamentos metalingüísticos, mas não são conscientemente controlados
pelos sujeitos (GOMBERT, 2003). Em outras palavras, trata-se de uma consciência implícita que
evidencia uma sensibilidade a similaridades fonológicas.
Posteriormente, com o avanço da idade e do contato sistemático com a leitura e escrita, as
crianças passam a ter um controle mais intencional sobre a língua e, portanto, mais consciente,
configurando-se como uma capacidade metalingüística.
Segundo Freitas (2004, p.179), a consciência fonológica é, assim, entendida “como a
capacidade do ser humano de refletir conscientemente sobre os sons da fala” ou como afirma
Cardoso-Martins (1995, p.7) a consciência fonológica é a “consciência dos sons que compõem a
fala”. Em resumo, podemos afirmar que, a consciência fonológica é parte dos conhecimentos
metalingüísticos e consiste na possibilidade de refletir e de operar, de forma consciente, sobre
todas as unidades constituintes da palavra.
Como mencionado anteriormente, a estrutura da consciência fonológica constitui-se em
um tópico controvertido. Inicialmente, tal consciência era vista como uma habilidade discreta, de
modo que o sujeito, simplesmente, teria ou não teria consciência fonológica. Porém,
pesquisadores como Gough, Larson e Yopp (1995) (apud CARDOSO-MARTINS, 1995, p.7),
passaram a considerar que a consciência fonológica seria mais adequadamente descrita em
termos de uma “constelação de habilidades” que se apresenta em uma “estrutura hierárquica”
estendendo-se desde a percepção de unidades fonológicas mais globais (tais como a sílaba), até
os níveis mais complexos, isto é, a consciência plena dos segmentos fonêmicos.
Conforme salientam Freitas (2004), Morais (2005) e Leite (2006), esta última posição é a
mais aceita atualmente. Ou seja, considera-se que: “a consciência fonológica apresenta-se em
37
níveis de complexidade variados: nível das sílabas, nível das unidades intra-silábicas e nível dos
fonemas” (GOSWAMI & BRYANT, 1990, apud FREITAS, 2004, p.180).
A consciência fonológica no nível das sílabas, como o próprio nome sugere, compreende
a capacidade de segmentar, contar as palavras em sílabas, comparar o tamanho de palavras, etc.
Esta é considerada por vários pesquisadores como uma forma mais simples e natural, de
segmentação sonora. Os estudos de Morais e Lima (1989), Capovilla e Capovilla (2000),
Menezes (1999) e Leite (2006) confirmam essa afirmação. Tais estudos têm demonstrado que as
crianças apresentam um melhor desempenho em tarefas que envolvem a manipulação silábica,
confirmando sua maior facilidade em lidar com atividades de análise fonológica neste nível.
Segundo Goswami e Bryant (1990), outro nível da consciência fonológica envolve a
capacidade do sujeito de analisar as palavras em onsets e rime. Ou seja, segundo esses autores,
as sílabas podem ser divididas nestas duas partes (uma unidade de abertura e outra unidade final),
como por exemplo, na palavra monossílaba em inglês: “str-ing”. Os autores mostram, portanto,
que é possível encontrar unidades fonológicas que apresentam mais de um fonema (no exemplo,
“str” e “ing”), mas são menores do que a sílaba. Mostram ainda que palavras que compartilham o
mesmo “rime”, rimam, tais como: string, wing e thing.
No caso da língua portuguesa, as rimas podem englobar uma ampla variedade de
semelhanças sonoras que vão desde as unidades silábicas, como é o caso de vela e mola; palavras
com semelhanças nas unidades intra-silábicas (por exemplo, balão e melão), inter-silábicas, que
são rimas, envolvendo mais de uma sílaba (traço e palhaço) e até, rimas ao nível do fonema final
da palavra, como é o caso de porta e calça. No caso de semelhanças entre sons iniciais das
palavras, vemos a ocorrência de aliterações no português, tanto no nível da sílaba (pipoca e
piano), quanto no nível do fonema, por exemplo, macaco e menino. É importante salientar que os
jogos propostos neste estudo englobam as diversas variações de rimas e aliterações descritas.
Segundo Bryant, as rimas e as aliterações (onset) parecem se apresentar de modo
espontâneo no desenvolvimento lingüístico das crianças desde cedo, fazendo parte de músicas,
brincadeiras e livros infantis, sendo considerada por Rueda (1995 apud Freitas, 2004) como um
nível de conhecimento fonológico elementar.
O nível dos fonemas ou também chamado de consciência fonêmica constitui a habilidade
de segmentar as palavras em fonemas, ou seja, perceber as menores unidades de som, e que ao
38
serem modificadas suas posições, originam uma nova palavra. Para tanto, é necessário
reconhecer que a palavra é, na realidade, uma seqüência de fonemas.
Conforme salientam Freitas (2004) e Guimarães (2003), a atividade de identificar e contar
os segmentos fonêmicos das palavras é uma tarefa que exige alto nível de consciência fonológica,
pois o caráter abstrato do fonema dificulta a percepção isolada dos sons.
É importante ressaltar, seguindo a advertência de Morais (2005), que os termos
consciência fonológica e consciência fonêmica, são algumas vezes, inadequadamente, entendidos
como sinônimos. Porém, como vimos acima, a consciência fonológica constitui algo mais
abrangente, que envolve a manipulação de sílabas, unidades maiores ou menores que a sílaba e
fonemas. A consciência fonêmica, ao contrário, está restrita à capacidade de manipular fonemas,
ou seja, envolve ações, tais como: segmentar, adicionar ou subtrair fonemas das palavras,
produzir palavras com determinado fonema, entre outras.
1.7.2 Explorando as relações entre consciência fonológica e alfabetização
Desde muito cedo, constatamos que “brincar com a língua” faz parte das atividades
culturais que realizamos fora da escola. Cantigas de roda, parlendas, jogo da forca, adedonha,
palavras cruzadas, entre outros, são jogos e brincadeiras populares que chamam atenção das
crianças para os sons das palavras, bem como colaboram para sua reflexão sobre como as
palavras são formadas. Vemos, ainda, que a escola tem incorporado esses jogos e brincadeiras
populares, reconhecendo seu potencial como um poderoso recurso auxiliar no processo de
alfabetização.
De fato, pesquisadores como Freitas (2004), recomendam, particularmente, a realização
de atividades que estimulem a consciência fonológica das crianças desde a Educação Infantil,
oportunizando a manipulação e reflexão sobre os sons das palavras como auxílio na aquisição da
língua escrita.
Leal (2004) também sugere que os jogos ou atividades de reflexão fonológica
(comparação do tamanho de palavras, identificação de semelhanças entre sons iniciais das
palavras, por exemplo) contribuem para que os aprendizes percebam a natureza da relação entre a
39
escrita e a pauta sonora (que no nosso sistema de escrita é alfabética e não silábica), assim como
estabeleçam as relações grafofônicas com mais eficiência.
No Brasil, o estudo de Carraher e Rego (1981, apud CARRAHER, 1988), pode ser
considerado como um dos primeiros que exploraram, de forma sistemática, as relações entre
consciência fonológica e alfabetização. Assim, o trabalho dessas autoras já apontava para a
relação entre a capacidade de refletir sobre os sons das palavras e o bom ou mau desempenho dos
alfabetizandos. Quando questionadas, por exemplo, sobre qual a palavra maior: BOI ou
FORMIGA, a criança, numa fase inicial da alfabetização, poderia responder, que Boi é a palavra
maior, porque é um animal grande, não atentando para a pauta sonora, mas, sim, para as
propriedades físicas do objeto que a palavra representava. Para as autoras, o fato das crianças
relacionarem o tamanho das palavras às propriedades físicas dos objetos (mostrando-se, assim,
presas ao realismo nominal), representava um obstáculo ao progresso da aprendizagem da escrita,
já que é impossível avançar na conquista do sistema de escrita alfabética sem compreender que
esta registra os sons das palavras.
Em um estudo seguinte, Rego e Dubeux (1994), mostraram que uma metodologia de
ensino que estimula a reflexão das crianças sobre os sons das palavras tem, de fato, um impacto
positivo no sucesso da alfabetização.
Mais recentemente, o estudo de Capovilla e Capovilla (2000) com crianças brasileiras de
baixo nível sócio-econômico, cursando a 1ª serie, também apontou uma influência favorável da
consciência fonológica sobre a aquisição da escrita. O objetivo desse estudo era treinar crianças,
utilizando atividades de identificação e produção de rima, aliteração, consciência silábica e
fonêmica, além das correspondências grafema-fonema. Os pesquisadores consideraram a
intervenção proposta como positiva, uma vez que as crianças apresentaram melhores
desempenhos nas provas de consciência fonológica, assim como esses ganhos se estenderam para
a leitura e escrita de palavras (e pseudopalavras) e conhecimentos de letras. Os autores concluem
que é possível melhorar os atrasos das crianças nas atividades de leitura e escrita utilizando o
treinamento em consciência fonológica.
Em outro estudo, com 54 crianças de pré-escolar e de 1ª série de escolas públicas e
particulares da cidade de São Paulo, Capovilla, Gutshow e Capovilla (2004) procuraram
identificar, quais as habilidades cognitivas estariam relacionadas, posteriormente, com o sucesso
da leitura e escrita.
40
Numa etapa inicial, o estudo consistiu em aplicar várias atividades cognitivas, avaliando
as capacidades de vocabulário, consciência fonológica, seqüenciamento, memória fonológica,
aritmética, memória visual, cópia de formas geométricas e qualidade de escrita. Após dez meses,
as crianças foram avaliadas, uma segunda vez, com vistas a identificar quais entre essas
habilidades melhor prediziam o sucesso em leitura e escrita. Os resultados revelaram que as
habilidades que apresentam maior correlação com a leitura e a escrita foram: aritmética, memória
fonológica, vocabulário, consciência fonológica e seqüenciamento. Sendo que, dentre as
atividades de consciência fonológica, as que mais estavam correlacionadas com o sucesso na
aquisição da leitura e escrita foram atividades de consciência dos fonemas, em comparação com
outras que envolveram a consciência suprafonêmica (de sílabas e rimas). Ainda foi observado
que as habilidades de processamento visual e motor não apresentavam uma correlação
significativa com o processo de leitura e escrita.
Com esse estudo, os autores procuraram demonstrar que a causa dos problemas de leitura
e escrita estaria relacionada aos déficits de processamento fonológico, uma vez que apenas as
atividades que envolviam habilidades fonológicas (memória fonológica, consciência de sílabas
rimas ou fonemas) se mostraram correlacionadas com a alfabetização.
Outros estudos também apontam a existência de uma relação causal entre o
desenvolvimento da consciência fonológica e o processo de apropriação do SEA. Ou seja, a
consciência fonológica teria um papel preditor do sucesso na alfabetização.
A pesquisa realizada por Bryant e Bradley (1983 apud BRYANT, 1987), por exemplo,
que acompanhou crianças inglesas de idades entre 4 e 5 anos, ao longo de oito anos, reforça essa
idéia. O estudo pretendeu, exatamente, avaliar o papel da consciência fonológica na
alfabetização, a partir de treinamento em atividades que estimulavam a reflexão sobre
semelhanças sonoras nas palavras (rima e aliteração). Para isto, foram formados quatro grupos de
trabalho com crianças. Inicialmente, o primeiro grupo recebeu um treinamento em tarefas de rima
e aliteração, sem nenhum contato com leitura e escrita. O segundo, recebeu a mesma atividade do
grupo 1, mas com a oportunidade de representar os sons através de letrinhas móveis. As tarefas
do terceiro grupo foram de agrupar figuras em categorias conceituais, como por exemplo, coisas
de cozinha ou animais. Por fim, o quarto e ultimo grupo não recebeu qualquer tipo de
treinamento.
41
Os resultados deste estudo indicam um melhor desempenho dos dois primeiros grupos, ao
serem comparados com os demais. Além disso, o grupo que obteve melhor resultado foi aquele
cujas tarefas foram acompanhadas pela representação dos sons, através das letras móveis,
apontando, assim, para a relevância de um trabalho em que se tornem explícitas as relações dos
sons com os signos escritos, neste caso, realizado com o apoio das letras móveis.
Ainda no que concerne à discussão sobre a natureza das relações existentes entre
habilidades fonológicas e o aprendizado da leitura e escrita, outras pesquisas questionam a idéia
de que ela seria um fator antecedente e necessário para o sucesso na alfabetização. Tais estudos
indicam uma associação entre as duas variáveis numa outra direção, ou seja, a consciência
fonológica seria uma conseqüência da aquisição da leitura e escrita e não um fator antecedente e
necessário para o sucesso na alfabetização. .
O estudo de Morais, Cary, Alegria e Bertelson (1979, apud CORREA, 2003), por
exemplo, defende essa posição. Neste estudo, adultos portugueses analfabetos foram comparados
em sua performance, em tarefas de análise fonológica, com adultos alfabetizados em programas
de escolarização. Os autores partiam do princípio de que, se a consciência fonológica é
conseqüência do processo de alfabetização, os adultos alfabetizados deveriam apresentar melhor
desempenho nas atividades propostas.
As atividades propostas aos participantes do referido estudo se constituíam de dois tipos:
uma compreendia adição e a outra subtração de fonemas em palavras conhecidas ou palavras
inventadas. Os resultados apontaram que os adultos não alfabetizados, de fato, cometiam mais
erros em ambas as tarefas, principalmente quando a tarefa envolvia palavras inventadas. Porém,
como é possível perceber, as atividades mobilizaram apenas um dos níveis de consciência
fonológica, ou seja, as atividades realizadas tinham como foco a consciência fonêmica e, talvez,
por este fato, os analfabetos não tenham tido bons desempenhos nas atividades propostas
(CORREA, 2003).
Em outro estudo, Morais, Bertelsen, Cary e Alegria (1986, apud CORREIA, 2003)
comparando, mais uma vez, um grupo de adultos alfabetizados com um grupo de adultos não
alfabetizados, realizaram várias tarefas de análise fonológica (subtração e identificação de
fonemas e sílabas, identificação de rimas e segmentação de palavras rimadas). Os adultos
analfabetos também obtiveram desempenhos piores do que os adultos alfabetizados, sendo os
mais baixos desempenhos observados nas atividades que solicitavam a manipulação e
42
identificação de fonemas, reforçando a hipótese, segundo os autores, de que a consciência
fonológica seria conseqüência da aquisição da leitura e da escrita.
Vale ressaltar que, mais uma vez, as atividades propostas no estudo de Morais et al.
(1986), enfatizam a consciência dos fonemas. Assim, ao que parece no nível dos fonemas se faz
necessário um real conhecimento dos sujeitos sobre o sistema de escrita nas suas unidades
menores e mais complexas. O mesmo, porém, não pode ser dito quando as tarefas solicitam a
manipulação de unidades maiores, como demonstram os estudos de Morais (2004, 2005), Freitas
(2004), Leite (2006) e Aquino (2007). Tais estudos mostram que sujeitos não alfabetizados
podem ter sucesso em diversas tarefas que solicitam inclusive, a identificação e produção de
palavras rimadas.
Correa (2003), analisando criticamente os estudos de Morais et al. (1979, 1986), citados
acima, aponta ainda que o tipo de atividade realizada com os sujeitos analfabetos tinha um caráter
bastante escolar, o que de certa forma pode ter prejudicado o desempenho desses sujeitos, já que
o estudo não menciona qualquer proposta de treino para este tipo de tarefa com os participantes.
Pode-se supor, portanto, que após uma familiaridade com atividades escolares, os sujeitos
analfabetos poderiam apresentar desempenhos diferentes dos encontrados nos estudos, refutando
a idéia da consciência fonológica como conseqüência do processo de alfabetização.
Segundo Morais (2005), as divergências encontradas entre as conclusões dos autores a
respeito das conexões entre habilidades fonológicas e o processo de alfabetização resultam, na
verdade, de diferenças nas opções metodológicas, bem como, na própria concepção de
aprendizagem da leitura e escrita. Assim, certas variações nos resultados dos estudos podem ser
atribuídas, por exemplo, a diferenças no grau de complexidade das tarefas de análise fonológica,
utilizadas nas diferentes pesquisas, ou a diferenças na estrutura lingüística das palavras utilizadas
nestas tarefas, ou até mesmo a diferenças conceituais em relação ao tratamento dado à
consciência fonológica: como uma habilidade que a criança tem ou não tem, ou como um
conjunto de habilidades mais ou menos complexas. Além disso, diferenças entre as características
da língua (sua estrutura fonológica e ortografia) em que a pesquisa foi realizada também podem
ser fontes de divergências entre os resultados dos estudos.
43
Atualmente, há uma tendência a assumir uma perspectiva interativa, admitindo-se uma
influência recíproca entre a consciência fonológica e a aquisição da escrita, ou seja, nenhuma
seria considerada a causa da outra.
Nesta perspectiva, compreende-se que tanto a consciência fonológica auxiliaria o processo
de apropriação do SEA, como o próprio contato com a escrita contribuiria para o
desenvolvimento de níveis de consciência fonológica mais complexos, especialmente,os relativos
à análise fonêmica. Esta tem sido a posição assumida por diversos pesquisadores na área, como:
Barrera (2003), Guimarães (2003), Morais (2004), Leite (2006) e Aquino (2007).
Os estudos de Correa (1997) e Correa, Meirelles & Maclean (1999 apud CORREA,
2001), também confirmam tal visão interativa. As autoras tinham o objetivo de identificar quais
seriam as competências relacionadas à consciência fonológica que as crianças deveriam
apresentar antes de iniciarem o processo de alfabetização e que outras competências seriam
desenvolvidas ou aprimoradas durante a aquisição de leitura e escrita. Para tanto, foram
realizadas entrevistas com crianças em três momentos distintos: antes do início da alfabetização,
após três meses de iniciado o processo e ao final do ano letivo. As crianças foram submetidas a
tarefas diferentes, envolvendo tanto sílabas, por exemplo, identificar semelhanças e diferenças de
som inicial (sílabas); quanto fonemas: segmentar e subtrair sons (fonemas).
Os resultados revelaram que antes do início da alfabetização as crianças já apresentavam
certas competências fonológicas, destacando-se, a capacidade para identificar semelhanças entre
sílabas iniciais das palavras. Já na segunda fase do estudo, isto é, após os três meses do processo
de alfabetização, verificou-se que as crianças apresentaram desempenhos melhores nas tarefas de
análise fonêmica (segmentação e subtração de sons), embora continuassem obtendo êxito e
lidando melhor com tarefas no nível da sílaba. Finalmente, ao final do ano, foi possível observar
que as crianças aprimoraram suas capacidades fonológicas nos diferentes níveis propostos, sílaba
e fonema.
Assim, os estudos acima destacam a contribuição mútua entre o processo de alfabetização
e o desenvolvimento da consciência fonológica, principalmente daquelas capacidades
relacionadas à análise dos fonemas, que progridem à medida que as crianças avançam no nível de
escolaridade.
44
No entanto, os estudos de Correa (1997) e Correa et al. (1999), mostram ainda que o
desempenho das crianças, ao final da etapa de alfabetização, em tarefas envolvendo o nível das
sílabas continuou superior quando comparado ao desempenho das mesmas ao nível fonêmico. Ou
seja, de acordo com as autoras, segmentar e subtrair fonemas permaneceram como tarefas difíceis
apesar da evolução em suas capacidades fonológicas ao nível dos fonemas. Resultado semelhante
foi observado por Morais (2004).
O estudo recente de Leite (2006), também aponta uma influência recíproca, ao discutir as
relações entre o desempenho em tarefas em análise fonológica e a psicogênese da escrita. O
estudo explora, ainda, as relações entre esses elementos e o conhecimento do nome das letras.
A referida pesquisa foi realizada com 12 sujeitos, sendo seis crianças pertencentes a uma
escola pública e seis crianças de uma escola particular, situadas na região metropolitana do
Recife. Tais crianças foram avaliadas individualmente, em momentos distintos, ao longo de um
ano (a cada 45 dias), a partir de 1 atividades de habilidade fonológica.
As tarefas envolviam os diferentes níveis da consciência fonológica: separação e
contagem oral de sílabas, comparação entre o tamanho das palavras; produção e identificação de
palavras que começam com a mesma sílaba; identificação e produção de palavras que rimam;
identificação e produção de palavras que começam com o mesmo fonema, além de separação dos
fonemas e contagem dos fonemas das palavras. As crianças também foram avaliadas quanto ao
nível de evolução da escrita, a partir de um ditado de palavras e frases, leitura e reconhecimento
do nome próprio e atividade de reconhecimento dos nomes das letras, perfazendo um total de 15
atividades.
Os resultados revelaram que, de um modo geral, as crianças evoluíram tanto ao nível
fonológico, como nos conhecimentos sobre a escrita, independentemente do nível sócio-
econômico de origem.
Em relação aos resultados das atividades de habilidades fonológicas, o estudo destaca que
as atividades de separação oral de sílabas e contagem oral de sílabas eram mais simples para os
sujeitos investigados, enquanto as atividades mais difíceis envolviam a consciência do fonema,
bem como a consciência da sílaba (por exemplo, identificação de palavras com a mesma sílaba
inicial e identificação de palavras rimadas). A atividade de produção de palavras, com o mesmo
fonema inicial, foi muito difícil para todos os sujeitos, inclusive para aqueles no nível alfabético
45
de escrita, sendo a atividade de identificação de palavras com os mesmos fonemas, realizada com
sucesso apenas por esses sujeitos.
Quanto à atividade de segmentação e contagem oral de fonemas, o estudo revelou, por sua
vez, que as crianças, em diferentes níveis de compreensão da escrita, tiveram desempenhos
melhores nesta tarefa, do que na tarefa de produção de palavras com mesmo fonema. Vale notar,
porém, que os acertos obtidos corresponderam à segmentação e contagem do número de fonemas
em palavras monossílabas constituídas por duas vogais (EU, AI, por exemplo) Além disso, os
sujeitos com níveis mais avançados de escrita ao serem solicitados a segmentar os fonemas das
palavras citavam os nomes das letras constituintes das palavras e não os fonemas (por exemplo,
para LUA, dizia L-U-A). Talvez por isso, os desempenhos mais baixos nesta última tarefa
tenham ocorrido com as crianças pré-silábicas e silábicas.
Finalmente, o estudo mostrou que nem sempre o conhecimento dos nomes das letras ajuda
a criança a escrever, embora a habilidade de conhecer os nomes das letras tenha sido mais
observada nas crianças com hipóteses de escrita mais avançadas.
Em síntese, o estudo evidencia uma tendência geral no sentido de que as crianças
avançam nas duas competências enfocadas: a escrita e a fonológica. A pesquisa também revela
que todas as crianças, independente do nível conceitual em que estavam, apresentaram
dificuldades nas atividades envolvendo o nível dos fonemas. A autora ressalta, ainda, que as
habilidades que envolvem consciência fonêmica e o nome das letras não constituem requisito
para o aprendiz dominar as convenções do sistema de escrita, pois tais habilidades compõem
apenas uma parte dos conhecimentos relativos ao SEA.
Assim como Morais (2004), Leite (2006) conclui que é fundamental considerar a reflexão
fonológica como uma condição importante e necessária para ajudar os aprendizes na
compreensão da natureza e funcionamento do SEA. Porém, adverte que a consciência fonológica
não constitui uma condição suficiente para o domínio desse sistema, uma vez que é possível
encontrar crianças numa hipótese alfabética com desempenho idêntico em certas habilidades
fonológicas ao de crianças em uma hipótese silábica. Deste modo, como afirma Morais (2006:
62) “não existe uma relação direta e unidirecional entre o nível de consciência fonológica e o
domínio da escrita alfabética.” Em síntese, “algumas habilidades (fonológicas) são mais
claramente ligadas ao aprendizado inicial do sistema alfabético, outras parecem só se desenvolver
46
após o domínio do mesmo e, finalmente, algumas parecem não existir num nível consciente,
mesmo para quem já está alfabetizado.” (Morais, 2006: 61)
Diante do exposto nesta seção, é importante frisar que, na presente investigação, tal como
apontado por outros autores (MORAIS, 2004, 2005; MORAIS E LIMA 1989; LEITE 2006;
FREITAS, 2004; CORREA, 2001), entende-se que a consciência fonológica agrega habilidades
que se desenvolvem em níveis diferentes, fazendo parte do conjunto de habilidades
metalingüísticas, não se tratando, portanto, de algo que o indivíduo tem ou não tem. Também se
compreende que as habilidades fonológicas e o processo de aquisição da escrita se influenciam e
se reforçam mutuamente, contribuindo, em conjunto, para o processo de alfabetização. Nesta
pesquisa será possível explorar tais relações, na medida em que serão utilizados jogos que
mobilizam diferentes níveis de habilidades fonológicas com duplas de crianças em níveis
distintos de compreensão do SEA.
No próximo capítulo, apresentaremos, em mais detalhes, os objetivos gerais e específicos
que direcionaram o presente estudo.
47
CAPÍTULO II - OBJETIVOS
48
2.1 OBJETIVO GERAL
Investigar, de modo sistemático, o desempenho e as interações entre duplas de crianças
em processo inicial de aquisição do SEA, ao longo de uma seqüência de sessões de jogos de
análise fonológica. As duplas serão constituídas de crianças com o mesmo nível conceitual sobre
a escrita (duplas homogêneas) e níveis de conhecimentos distintos sobre a escrita (duplas
heterogêneas).
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
A. Identificar os conhecimentos fonológicos mobilizados, compartilhados e
confrontados entre as crianças, durante as sessões com os jogos;
B. Traçar um perfil do desempenho de cada dupla ao longo das três sessões
em que irá interagir com um mesmo jogo, registrando e analisando as
mudanças qualitativas observadas em relação às habilidades fonológicas
que venham a se manifestar no seu percurso com cada um dos jogos;
C. Analisar e comparar os desempenhos das crianças nas duplas
homogêneas e heterogêneas, a fim de observar alguma especificidade de
interações durante as sessões de jogos, bem como nos seus desempenhos
nas tarefas de habilidades fonológicas e de escrita, ao final das sessões.
D. Comparar o desempenho das crianças nas tarefas de habilidades
fonológicas e níveis de conceituação da escrita, antes e depois das
sessões de jogos.
49
CAPÍTULO III - METODOLOGIA
50
3.1 Sujeitos:
Tomaram parte nesta pesquisa 12 crianças, alunos de uma Escola Pública Municipal
localizada na cidade do Recife, cursando o Grupo V (Educação Infantil) e o 1° ano do primeiro
ciclo do Ensino Fundamental. As crianças, com idades entre cinco e sete anos, foram organizadas
em seis duplas que participaram das sessões com os jogos de análise fonológica.
3.1.1 Formação das duplas:
As duplas foram formadas tomando-se como base o exame dos níveis de evolução
psicogenética da escrita, propostos por Ferreiro e Teberosky (1985). Tais níveis foram avaliados
por meio de um ditado mudo com figuras de animais (ver ANEXO I). As palavras
correspondentes às figuras pertenciam, portanto, a um mesmo campo semântico e variavam na
quantidade de sílabas.
Os ditados foram aplicados, individualmente, num espaço fora da sala de aula, a 47
crianças, sendo 15 delas do Grupo V e 32 crianças de duas turmas do 1º ano do primeiro ciclo.
As crianças foram solicitadas a escrever os nomes dos animais correspondentes às figuras
e, na medida em que elas escreviam as palavras, a pesquisadora solicitava, imediatamente, que
fizessem a leitura, marcando a forma como cada palavra era lida na própria tarefa.
Com base no levantamento dos níveis de conhecimento das crianças sobre o SEA, as
duplas foram, então, organizadas em homogêneas e heterogêneas. As duplas consideradas
homogêneas foram aquelas que apresentaram níveis de conceituação da escrita semelhantes,
obedecendo ao seguinte esquema: uma dupla de crianças na hipótese pré-silábica; uma dupla de
crianças de nível conceitual silábico (eixo qualitativo); uma dupla de nível silábico-alfabético.
As duplas chamadas heterogêneas, isto é, aquelas cujas crianças apresentavam níveis
distintos de conceituação da escrita, foram constituídas por: uma dupla pré-silábica/ silábica (eixo
quantitativo); uma dupla silábica (eixo qualitativo) /silábico-alfabética e outra dupla silábico-
alfabética/ alfabética.
51
A opção por trabalhar com duplas homogêneas e heterogêneas teve como finalidade
ampliar a possibilidade de observação da interação entre crianças durante as sessões de jogos.
Assim, pretendíamos identificar se haveria alguma especificidade nas interações registradas nos
dois tipos de duplas, já que em princípio, nas duplas heterogêneas, o espaço de criação da ZDP
(conforme discutido no item 1.1 do Referencial Teórico), seria mais favorecido.
3.2 As etapas da pesquisa 3.2.1 Os exames das habilidades fonológicas e dos níveis conceituais de compreensão do
sistema de escrita alfabética
Após a etapa de formação das seis duplas que tomaram parte do estudo, passamos para a
primeira fase da pesquisa propriamente dita: a aplicação de um exame das habilidades
fonológicas no grupo de 12 crianças.
Este exame objetivou conhecer o ponto de partida das habilidades dos sujeitos em
refletirem sobre os segmentos sonoros das palavras, possibilitando a comparação de tais
desempenhos antes e após as sessões com os jogos de análise fonológica.
Nestes exames foram utilizadas as atividades metafonológicas propostas na pesquisa de
Leite (2006) que, por sua vez, seguiram os critérios de elaboração utilizados pelo CONFIAS.2 É
importante ressaltar que as atividades de habilidades fonológicas aplicadas às crianças ficaram
restritas àquelas mobilizadas pelos jogos propostos na presente investigação (ver ANEXOII).
Foram elas:
1- Atividade de segmentação de palavras em sílabas;
2-Atividades de contagem de sílabas;
3- Atividade de comparação de tamanho de palavras;
4- Atividade de identificação da sílaba inicial;
2Consciência Fonológica: Instrumento de Avaliação Seqüencial, São Paulo, Casa do Psicólogo, 2003.
52
5- Atividade de identificação de palavras rimadas;
6-Atividade de identificação do fonema inicial.
A partir deste exame também foi possível confrontar o nível das habilidades fonológicas
apresentadas pelas crianças com as suas respectivas hipóteses de escrita, observando se sujeitos
com níveis de escrita mais avançados apresentariam, necessariamente, níveis de consciência
fonológica também superiores, uma relação apontada em alguns estudos (GUIMARÃES, 2003).
O exame inicial de avaliação das habilidades metafonológicas foi realizado
individualmente e em duas sessões. Tal procedimento buscou favorecer o estabelecimento de um
vínculo positivo entre a pesquisadora e as crianças que, posteriormente, seriam convidadas a
participar das sessões de jogos. As sessões foram gravadas em áudio e em cada uma delas foram
aplicadas três atividades, perfazendo um total de seis atividades de reflexão fonológica.
Durante as sessões, a pesquisadora lia o comando de cada tarefa, apresentando
inicialmente dois exemplos às crianças em que ela própria explicava a atividade e dava a resposta
dos itens. Em seguida, solicitava que as crianças respondessem, oralmente, seis itens restantes.
As respostas foram anotadas pela pesquisadora na própria tarefa e durante as atividades não
houve qualquer intervenção de sua parte em relação às respostas das crianças.
Em seguida à realização do exame de avaliação das habilidades metafonológicas,
iniciamos as sessões com os jogos. As sessões foram realizadas com as seis duplas de crianças,
sendo os procedimentos adotados nestas sessões descritos no próximo item.
Na etapa final da pesquisa, todas as duplas realizaram um segundo exame das habilidades
metafonológicas (exame final) e mais um ditado mudo para avaliação dos níveis conceituais de
escrita apresentados pelos sujeitos após as sessões de jogos.
Na segunda tarefa de avaliação dos níveis de escrita (ver ANEXO III), apenas foi
aumentado o número de palavras do ditado mudo (de cinco palavras no primeiro exame, para dez
palavras no segundo), a fim de se obter uma maior possibilidade de avaliação das hipóteses de
escrita das crianças. O procedimento adotado nesta tarefa foi o mesmo da tarefa do ditado inicial,
já descrito anteriormente.
53
As atividades do exame final de habilidades metafonológicas foram as mesmas do exame
inicial, adotando-se também os mesmos procedimentos descritos acima. No entanto, a aplicação
do segundo exame foi realizada numa única sessão, uma vez que os vínculos entre as crianças e a
pesquisadora já estavam estabelecidos, além do fato das crianças já estarem familiarizadas com
as tarefas, sendo possível realizá-las mais rapidamente.
3.2.2 As sessões com jogos de análise fonológica
Como foi dito anteriormente, esta pesquisa se propôs analisar o percurso de duplas de
crianças em situações de jogos de análise fonológica, observando as interações das diferentes
duplas em momentos distintos com os mesmos jogos. Para tanto, recorremos à abordagem da
análise microgenética, proposta por Vygotsky (1998), porque possibilita ao pesquisador um
exame detalhado das situações interativas entre os sujeitos, ao mesmo tempo em que permite um
relato minucioso dos acontecimentos, tendo como foco o processo cognitivo em formação. Ou
seja, através de tal análise é possível acompanhar com detalhe as ações dos sujeitos em situação
de interação (GÓES, 2000).
Segundo Meira (1994), a videografia consiste no registro em vídeo das atividades
humanas e, apresenta-se como um instrumento usado em pesquisas que envolvem sujeitos em
plena atividade.
A videografia e a análise microgenética são para Carvalho & Cols (1996), recursos que se
combinam e que permitem um registro mais detalhado de situações de interação, viabilizando
uma avaliação mais cuidadosa do fenômeno, já que se torna possível observá-lo quantas vezes se
fizerem necessárias, oferecendo, com isso maior segurança ao pesquisador.
As sessões com os jogos de análise fonológica foram organizadas em três “blocos” e, em
cada bloco, as seis duplas jogavam quatro jogos diferentes, sendo dois jogos por sessão,
conforme o esquema apresentado no Quadro 1, abaixo.
Em seguida, dava-se um intervalo de uma semana para iniciar o segundo bloco de sessões
com os mesmos jogos e, por fim, após mais um intervalo, as crianças participaram do terceiro
bloco de sessões com os jogos. Assim, um mesmo jogo foi proposto para cada dupla ao longo de
54
cinco semanas, tornando possível registrar seis duplas de crianças jogando quatro jogos de
análise fonológica numa seqüência de três sessões com cada jogo.
Quadro 1- Organização das sessões de jogos
Vale salientar que cada sessão de jogo foi áudio e vídeo gravada e devidamente transcrita,
para uma posterior análise das situações de interação e desempenho das crianças com os jogos.
As sessões de jogos transcorreram tranqüilamente, paralelamente às aulas das crianças,
nos horários da manhã e tarde, de acordo com o turno das aulas das duplas participantes do
DUPLAS
BLOCOS DE SESSÕES DE
JOGOS
JOGOS
D1 D2 D3 D4 D5 D6
J1
J2
J3
1º BLOCO
(duas sessões com dois jogos por sessão)
J4
Intervalo
J1
J2
J3
2º BLOCO (duas sessões
com dois jogos por sessão)
J4
Intervalo
J1
J2
J3
3º BLOCO
(duas sessões com dois jogos por sessão)
J4
55
estudo. Tais sessões foram realizadas em uma sala bastante arejada, que funcionava como a
biblioteca da escola, sendo possível contar com mesas de apoio para os jogos.
Algumas ausências, por motivos diversos, aumentaram a freqüência da pesquisadora à
escola. Porém, foi possível contar com a colaboração de todo o pessoal da escola, principalmente,
das professoras. Os ruídos característicos do ambiente escolar não se constituíram em um entrave
para a realização da coleta de dados, sendo possível transcrever as sessões de jogos sem
problemas.
Na primeira sessão com as duplas, a pesquisadora leu as regras do jogo antes de iniciá-lo.
Da segunda sessão em diante com um mesmo jogo, a pesquisadora procurou retomar com as
crianças as regras já conhecidas e, através de uma conversa informal, a mesma ia perguntando
sobre funcionamento do jogo, para que as crianças fossem explicando o jogo a seu modo. Em
casos de engano, a pesquisadora retomava a explicação das regras.
De um modo geral, a intervenção da pesquisadora, durante as sessões de jogos
caracterizou-se como uma instrução direta ou tutorada semelhante ao procedimento adotado no
estudo de intervenção de Ferreira e Spinillo (2003) sobre a habilidade de produção de histórias
por crianças. Neste estudo, o adulto assumia um papel ativo na interação com a criança,
realizando intervenções explícitas sobre como era organizado um texto do gênero história e, quais
os aspectos estruturais desse texto, explicando e corrigindo as crianças sempre quando se fazia
necessário.
Em nossa pesquisa, a atuação da pesquisadora ocorreu de modo semelhante em cada
sessão com os jogos, pois a mesma explicava e retomava as regras de cada jogo, estimulava a
reflexão das crianças, questionava suas respostas e corrigia os erros cometidos pelas crianças,
buscando conservar uma atmosfera lúdica, característica da situação de jogo.
Assim, a pesquisadora não jogou com as crianças, nem jogou por elas, porém, esteve
presente, na situação, refletindo sobre as jogadas, convidando um jogador a auxiliar o outro e
intervindo, sempre que julgou necessário. Também é importante enfatizar que, com vistas a
manter um clima prazeroso, as crianças, em momento algum, foram obrigadas a participar das
sessões com os jogos.
Vale ainda informar que os jogos elaborados e utilizados nesta pesquisa foram testados
em um estudo piloto. O estudo envolveu seis duplas de crianças freqüentando uma escola
56
pública da rede municipal do Recife. Inicialmente, foram confeccionados três jogos de análise
fonológica e, a partir do estudo em questão, pudemos rever alguns aspectos relevantes, por
exemplo: mudanças de palavras e figuras utilizadas nos jogos, formas de atuação da
pesquisadora, etc.
O referido estudo possibilitou ainda observar se os jogos utilizados favoreciam a
interação entre as crianças, funcionando também como um momento de teste dos equipamentos
de áudio e vídeo, contribuindo para uma maior familiaridade da pesquisadora com tais
instrumentos.
A seguir, os jogos de analise fonológica que foram utilizados nesta pesquisa serão,
brevemente, descritos (ver ANEXO IV para um maior detalhamento).
3.3 Descrição dos jogos
Os jogos de análise fonológica utilizados nesta pesquisa3, tomaram como referência os
jogos que mobilizam conhecimentos sobre o SEA, conforme exposto por Leal et al. (2005).
Porém, dentre os diversos princípios que regem o nosso sistema de escrita e que podem inspirar
atividades que estimulam a reflexão sobre tais princípios, elegemos aqueles de natureza
fonológica, isto é, que mobilizam conhecimentos sobre os segmentos sonoros das palavras.
3.3.1 Jogo 1 - BATALHA DE PALAVRAS
Este jogo é composto por quarenta cartões de cartolina, com figuras correspondentes a
palavras de uma, duas, três e quatro sílabas (ver ANEXO IV) e mobiliza as habilidades
metafonológicas de segmentação e contagem das sílabas, bem como de comparação do tamanho
das palavras.
3 Os jogos 1, 2 e 3 estão propostos no livro e kit de Jogos para Alfabetização (2008), organizados por: BRANDÃO, A. C. P.; FERREIRA, A. B.; ALBUQUERQUE, E. B.; LEAL, T. F., produzido pelo CEEL (Centro de Estudos em Educação e Linguagem), do Centro de Educação, da Universidade Federal de Pernambuco.
57
O jogo segue a regra original do jogo de batalha com baralho. Ou seja, aquele jogador
que colocar a carta maior, no caso o cartão com a palavra com o maior número de “pedacinhos”
ou sílabas, fica com o “montinho” descartado, ganhando o participante que conseguir reunir o
maior número de cartões, ao final do jogo.
No jogo de Batalha de palavras, as intervenções da pesquisadora se deram no transcorrer
da sessão. Assim, diante de uma resposta incorreta, a pesquisadora parava a jogada e refletia
conjuntamente com os jogadores sobre como a palavra havia sido segmentada ou em relação à
contagem de sílabas realizada pelos participantes. Uma vez resolvido o problema, as crianças
identificavam o ganhador do montinho descartado e o jogo prosseguia normalmente. Vejamos um
exemplo que ilustra o que foi dito acima:
As crianças Rayane e Lucas Vinícius colocam duas cartas com as seguintes figuras: PE / MÃO.
R - Pé-é! LV – Mão-ó! (Mostrando dois dedinhos). P - Prestem atenção: é Pé-é (mostrando dois dedos) ou Pé (Mostrando um dedo)! R – Pé (concordando e levantando apenas um dedinho). P - Agora é mão-ó ou mão? (dirigindo-se para Lucas Vinícius). LV - É Mão! (Mostrando um dedinho). LV - Empatou! (As crianças colocam outras cartinhas na mesa e o jogo prossegue). (D1S1J1)4
3.3.2 Jogo 2 - BINGO DE SONS INICIAIS
O jogo é composto por dez cartelas, com seis figuras de objetos em cada cartela e um
saquinho contendo cartões com palavras escritas, cujas sílabas iniciais são correspondentes às
primeiras sílabas das palavras das figuras apresentadas nas cartelas (ver ANEXO IV). As
habilidades metafonológicas mobilizadas pelo jogo são as seguintes: reconhecimento da sílaba
inicial de palavras e identificação e comparação de palavras com a mesma sílaba.
O jogo funciona semelhante ao jogo original de bingo. A pesquisadora lia uma palavra em
voz alta, retirada, ao acaso, do saquinho, cabendo aos jogadores marcar em suas respectivas
4“D1S1J1” significa: Dupla 1, na Sessão 1 com o Jogo 1: Batalha de palavras. Em todos os fragmentos
transcritos serão usados: “P” para pesquisadora e as inicias dos nomes das crianças.
58
cartelas figuras cujos nomes correspondessem à mesma sílaba inicial da palavra lida pelo adulto.
O jogador que completasse primeiramente a sua cartela era o ganhador.
Vale ressaltar que, antes de iniciar o jogo, a pesquisadora informava às crianças os nomes
das figuras contidas nas cartelas, com o intuito de evitar enganos em relação aos nomes das
mesmas e, conseqüentemente, possíveis dificuldades de encontrar os pares entre as palavras
ditadas e tais figuras.
Pensando em favorecer as discussões e mobilizar uma maior troca de conhecimentos entre
as crianças das duplas, propusemos, na primeira sessão, que os dois jogadores ficassem com
cartelas iguais (ou seja, com as mesmas figuras). Porém, contrariamente ao esperado, percebeu-se
que esse procedimento mobilizava menos trocas entre as crianças. Deste modo, a partir da
segunda sessão com o jogo de bingo, passamos a sugerir que as crianças escolhessem cartelas
diferentes.
É preciso lembrar ainda que tivemos o cuidado de que as cartelas escolhidas pelas
crianças em cada sessão não fossem repetidas numa sessão posterior, bem como foi necessário ter
máxima atenção para com o registro das marcações das figuras nas cartelas.
Neste jogo, diferentemente do jogo de Batalha das palavras, as intervenções da
pesquisadora em relação às figuras que deixavam de ser marcadas na cartela ocorreram sempre
ao final de cada partida e não durante o jogo. Julgamos que interromper o jogo constantemente
para fazer esse tipo de reflexão poderia quebrar o seu ritmo e desinteressar as crianças. Tal
procedimento, na verdade, se assemelha ao adotado no jogo de bingo original, quando, ao
concluir o jogo, os participantes conferem os números ditados com os marcados em suas cartelas.
Vejamos um exemplo de como a intervenção indicada acima ocorreu:
Ao final da partida, a dupla deixou de marcar a figura VACA na cartela. A pesquisadora então pergunta: P - Qual a palavra que eu disse que combina com vaca? (A criança olha para cartela, observa a figura que faltou marcar) D – Vagalume! (Diz lembrando a palavra que foi lida durante o jogo) (D4S1J2)
59
3.3.3 Jogo 3 - BINGO DE RIMAS
Este jogo é semelhante ao anterior, tanto em relação ao material, quanto ao procedimento.
A única diferença é que as figuras das cartelas e os cartões com as palavras escritas no saquinho
combinam em relação aos segmentos sonoros finais (ver ANEXO IV). As habilidades
metafonológicas mobilizadas pelo jogo são, portanto, as de identificação e comparação de
palavras que rimam, isto é, terminam com o mesmo som final.
As palavras que compõem o Bingo de rimas variaram quanto ao tamanho (monossílabas,
dissílabas, trissílabas e polissílabas) e quanto à formação das rimas. Isto é, como já foi dito
anteriormente, as rimas que compõem este jogo foram pensadas tomando como base as diversas
possibilidades de produção de rimas entre palavras, ou seja, englobando a última sílaba ou a
vogal final das palavras, bem como os segmentos maiores que a sílaba (inter-silábicos).
As intervenções da pesquisadora quanto às jogadas incorretas durante este jogo seguiram
o mesmo procedimento descrito no jogo 2, ou seja, ocorriam ao final da partida.
3.3.4 JOGO 4 - CONSTRUINDO A TORRE
Este jogo é composto por 30 “cartas-pergunta” e tijolinhos de madeira nas cores azul e
vermelho, para construção da “Torre” (ver ANEXO IV). Em cada carta era apresentada uma
pergunta seguida de quatro figuras. Por exemplo: Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Tomada – Macaco - Tigre – Casa).
A habilidade metafonológica mobilizada neste jogo é, portanto, a identificação de
palavras com o mesmo fonema inicial.
Para cada um dos três blocos de sessão com esse jogo foram separadas dez cartas-
pergunta. Assim, na primeira sessão foram utilizadas dez cartas e nas demais sessões as dez
cartas eram renovadas, evitando-se que as crianças memorizassem as respostas corretas já dadas
anteriormente.
Inicialmente, a pesquisadora lia a carta retirada por um dos participantes, enfatizando que
as crianças deveriam ficar atentas para um sonzinho bem pequeno no começo da palavra e não
60
para o som da primeira sílaba ou pedacinho da palavra, nomeando as quatro figuras da carta-
pergunta, a fim de não gerar quaisquer dúvidas em relação aos seus nomes.
Para cada acerto, o jogador recebia tijolinhos para construir sua torre. Na primeira
resposta certa, o jogador da vez recebia um tijolinho, na segunda vez, e a cada resposta correta,
ele recebia dois tijolinhos, três, e assim por diante. O jogo terminava ao final da formulação das
dez perguntas e o ganhador era aquele que tinha conseguido construir a torre mais alta, ou seja,
aquele que conseguiu responder corretamente o maior número de perguntas.
Durante o jogo, o participante que não conseguisse fornecer a resposta correta, deveria
passar a vez para o outro. Este último tinha, então, a chance de receber mais um tijolinho para sua
torre, se acertasse a resposta. Caso nenhum dos jogadores conseguisse responder às perguntas
das cartas ou os dois respondessem de forma incorreta, a pesquisadora intervinha, dando a
resposta certa e, sendo assim, nenhum dos participantes recebia tijolinhos. Portanto, em momento
algum as crianças ficaram sem conhecer as respostas corretas.
Vejamos, abaixo, um fragmento que exemplifica a forma de atuação da pesquisadora em
caso de respostas erradas das crianças neste jogo:
As crianças estão diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Bota-Suco-Sopa-Peixe) (Rayane já havia tentado responder a esta mesma carta-pergunta sem sucesso, passando a vez para Lucas Vinícius) LV - Sopa começa com Peixe (Responde formando um par de palavras) P - Começam igual?! Sopa e Peixe começam iguais? (dirigindo-se para Rayane e chamando-a para refletir sobre a resposta do parceiro) R - Não! P - Sopa começa com que som? R - O “SO”! P - E Peixe? R - Com PE... O P(pê)! P - E tá igual? (Lucas presta atenção ao diálogo entre Rayane e a pesquisadora). R -Não! LV - Não! Bota e Suco! (Fazendo um gesto negativo com a cabeça, formando um novo par de palavras) P - Veja se começa igual... LV - BO... BO-TA... (levanta dois dedinhos de uma mão) e SU-CO (levanta dois dedinhos da outra mão e olha para as duas mãos) R - Começa não! P - Mais uma chance... Vai, outra vez! LV - É só essa vez, é? P - É, aí... Eu passo pra outra carta! LV - Sopa com Bota! P - Então vá! (esperando que ele reflita sobre as palavras ditas)
61
LV - SO-PA...(levantando dois dedinhos de uma mão) BO-TA (marcando dois dedos na outra mão e dirige um olhar para sua parceira) P – Sopa.../s/ Bota /b/ (enfatizando os sons dos fonemas iniciais). Começa igual, o sonzinho bem pequenininho? (Lucas Vinícius afirma com a cabeça, mas Rayane diz): R - Não! P - Olha, já que ninguém acertou o par, eu vou dizer: aqui é Suco e Sopa que começa com o sonzinho bem pequeno S [s]! (D1S1J4)
No próximo capítulo, será apresentada a análise das observações das sessões de jogos de
análise fonológica com as duplas de crianças, procurando responder as questões levantadas nesta
pesquisa.
62
CAPÍTULO IV – ANÁLISE DOS RESULTADOS
63
A análise dos dados envolveu três etapas. Primeiramente, tomamos para análise os dados
obtidos com os exames iniciais realizados antes das sessões de jogos, isto é, o desempenho de
cada criança no ditado de palavras utilizado para avaliar os níveis de escrita, bem como nas
tarefas para avaliar suas habilidades fonológicas. Nesta fase, observamos, ainda, as relações
existentes entre os diferentes níveis de conhecimento sobre a escrita das crianças e suas
habilidades fonológicas.
Numa segunda etapa, analisamos os desempenhos das duplas nas sessões dos jogos de
análise fonológica. E, finalmente, após as sessões de jogos, analisamos, mais uma vez, o
desempenho das crianças no exame de habilidades fonológicas, bem como no ditado de palavras,
confrontando esses dados com os resultados obtidos nos exames iniciais.
4.1 Analisando o exame inicial: as tarefas de ditado e de avaliação das habilidades
fonológicas
4.1.1 Os níveis de escrita
Como foi dito, todas as crianças realizaram, individualmente, um ditado de palavras. O
ditado foi avaliado com base nos níveis de evolução psicogenética da escrita, propostos por
Ferreiro e Teberosky (1985). A formação das duplas e sua classificação quanto aos níveis de
conhecimento sobre a escrita estão dispostas no Quadro 1, abaixo.
64
Quadro 1 - Classificação dos sujeitos quanto aos níveis de escrita no exame inicial
Após a atividade do ditado mudo, as crianças realizaram o exame inicial das habilidades
fonológicas, que será analisado a seguir.
4.1.2 Exame inicial das habilidades fonológicas
Conforme exposto na seção anterior, este exame teve a finalidade de conhecer o ponto de
partida das habilidades fonológicas dos participantes, antes das sessões com os jogos.
As crianças foram solicitadas a responder seis atividades de avaliação das habilidades
fonológicas. Em cada atividade eram fornecidos dois exemplos pela pesquisadora e, em seguida,
foram apresentados seis itens que as crianças deveriam responder oralmente. Deste modo, cada
DUPLAS NOMES DAS CRIANÇAS
NÍVEIS DE ESCRITA
Rayane Pré-silábico D1
Lucas Pré-silábico
Luciano Silábico-qualitativo
D2
Vitória Silábico-qualitativo
Camilla
Silábico-alfabético
HOMOGÊNEAS D3
Gilvania
Silábico-alfabético
Deyvson Pré-silábico D4
Valéria
Silábico-quantitativo
Gustavo
Silábico-qualitativo
D5
Mayara Silábico-alfabético
Arthur Silábico-alfabético
HETEROGÊNEAS
D6
Joyce Alfabético
65
atividade tinha um máximo de seis pontos de acerto. O Quadro 2, abaixo, informa os acertos das
crianças, em cada atividade realizada.
Quadro 2 - Total de acertos por atividade do exame inicial das habilidades fonológicas
O total de pontos obtidos por cada criança, no exame inicial de avaliação das habilidades
fonológicas, mostra certa variação no desempenho das mesmas, ainda que quase a totalidade
delas tenha apresentado uma performance geral superior a 50% nas tarefas propostas. Observa-se
que a menor pontuação (16 pontos) foi obtida por uma criança pré-silábica da dupla 1, e a maior
(34 pontos), foi obtida pelo único sujeito alfabético, um dos membros da dupla 6.
Enfocando as habilidades envolvidas em cada uma das seis atividades, é possível observar
que, de modo geral, os melhores desempenhos das crianças estão concentrados nas atividades 1, 2
e 3, já que quase todas elas acertam entre quatro a seis itens de cada tarefa. Assim, ao que parece,
as habilidades de segmentação de palavras em sílabas, contagem das sílabas das palavras e
comparação dos tamanhos de palavras não constituem problema para as crianças. Apenas
Duplas/
Crianças
Níveis de
escrita
Ativ 1
Segmentação da palavra em sílabas
Ativ 2
Contagem de sílabas
Ativ 3
Comparação de tamanho de
palavras
Ativ 4
Identf. Silaba inicial
Ativ 5
Identif. Rimas
Ativ 6
Identif. Fonema inicial
Total de acertos
Rayane P-S 5 5 5 1 0 0 16
D1 Lucas P-S 5 6 5 1 0 0 17
Luciano S-QL 5 5 4 6 4 0 24 D2
Vitória S-QL 6 6 6 2 4 2 26
Camilla S-ALF 4 5 5 3 3 1 21
D3 Gilvania S-ALF 6 5 5 5 3 2 26
Deyvson P-S 6 6 4 6 2 1 25
D4 Valeria S-QT 4 5 6 2 0 1 18
Gustavo S-QL 6 6 5 6 5 2 30
D5 Mayara S-ALF 5 3 5 2 1 1 22
Arthur S-ALF 5 6 6 5 4 1 27
D6 Joyce ALF 6 6 6 6 6 4 34
66
Mayara, criança da dupla 5, teve um desempenho mediano na atividade de contagem das sílabas,
destoando do alto desempenho apresentado pelas demais crianças nas três atividades
mencionadas.
A atividade 4, identificação de sílabas semelhantes no início de palavras, parece trazer
problemas para algumas crianças, como é o caso, das crianças da dupla 1, Rayane e Lucas,
Vitória da dupla 2, Valéria da dupla 4 e, novamente, Mayara da dupla 5. Estes dados confirmam
outros resultados publicados pela literatura na área (ver BARRERA, 2003; LEITE, 2006)
afirmando que a atividade de identificar palavras com a mesma sílaba inicial parece ser uma
tarefa mais difícil do que segmentar e contar sílabas de palavras.
Desempenhos menos satisfatórios, porém, foram registrados na atividade 6 de
identificação de fonemas iniciais, seguida da atividade 5 de identificação de rimas, nessa ordem.
De fato, observando o Quadro 2, acima, nota-se que a identificação de fonemas iniciais se
mostrou uma atividade difícil para todas as crianças avaliadas5.
A atividade de identificação de rimas nas palavras, por sua vez, foi difícil para algumas
crianças, tais como: dupla 1, dupla 4 e Mayara, da dupla 5, apresentando ainda discrepâncias nos
desempenhos das habilidades entre crianças de uma mesma dupla. Nesta mesma atividade,
destaca-se o bom desempenho mais uma vez apresentado por Joyce, que acerta todos os seis itens
da atividade, bem como de Gustavo, da dupla 5, que consegue acertar cinco itens, além das
crianças da dupla 2 (Luciano e Vitória) que acertam quatro dos seis itens na atividade 5.
Confrontando os desempenhos das crianças nas atividades de habilidades fonológicas com
seus respectivos níveis de conhecimento sobre a escrita, observa-se que crianças com
semelhantes níveis de conhecimentos sobre a escrita (ou seja, as duplas homogêneas) tendem a
apresentar pequenas variações em seus níveis de habilidades fonológicas. Assim, considerando a
variação no total de pontos obtidos no exame entre as crianças de uma mesma dupla, nota-se que
as duplas 1, 2 e 3 apresentam um desempenho mais próximo em relação às suas habilidades
fonológicas.
Nas duplas heterogêneas, entretanto, nota-se mais discrepâncias nos desempenhos entre os
membros das duplas, como é o caso, por exemplo, da dupla 5, em que Gustavo apresentou 30
acertos no total, e Mayara obteve apenas 22. Observando o desempenho dessa dupla nas
diferentes habilidades fonológicas avaliadas, vemos que a variação apontada no resultado final se
5 Note-se, que Joyce da dupla 6 acerta 4 itens entre os 6 propostos na referida atividade.
67
deve a diferenças acentuadas do desempenho nas atividades 4, 5 e 6. Na verdade, a dupla 5 foi
aquela que apresentou mais variações de performance nas atividades realizadas, constituindo-se
em uma dupla heterogênea não apenas em relação aos conhecimentos sobre a escrita, mas
também, em relação às habilidades de reflexão fonológica.
Outros casos de maior variação de desempenho entre crianças foram encontrados em
outras duplas heterogêneas, tais como a dupla 4 na atividade 4 e a dupla 6 na atividade 6.
Ainda analisando os desempenhos das crianças com diferentes níveis de compreensão
sobre a escrita e seus desempenhos em cada atividade de habilidade fonológica, constatamos que
as três primeiras atividades (de segmentar e contar sílabas e comparar o tamanho de palavras)
puderam ser consideradas fáceis, independentemente, do nível de conhecimento sobre a escrita
das crianças. Por exemplo, a dupla 1, ambas no nível pré-silábico de escrita, obtêm bons
desempenhos nas referidas atividades. O mesmo se pode observar com as crianças da dupla 2
(nível de escrita silábico de qualidade), com a criança pré-silábica da dupla 4, com Gustavo (nível
silábico-qualitativo) da dupla 5 e com o sujeito alfabético da dupla 6: todos atingiram,
igualmente, boas pontuações nas referidas tarefas. De modo semelhante, Luciano (silábico-
qualitativo), da dupla 2, obteve a pontuação máxima na atividade de identificação de sílabas
iniciais, assim como Joyce, a criança da dupla 6 que já escreve alfabeticamente.
Por outro lado, as atividades de identificação de rimas e do fonema inicial (atividades 5 e
6) representaram uma tarefa difícil tanto para aquelas crianças com conhecimentos menos
elevados sobre a escrita, quanto para aquelas com conhecimentos mais avançados6. Observa-se,
por exemplo, o caso de Mayara (silábico-alfabética) que acerta apenas um dos seis itens da
atividade 5 e Valéria (silábico-quantitativo) que não consegue acertar nenhum item da referida
atividade. Já na atividade 6, podemos destacar o desempenho de Arthur, silábico-alfabético, que
acerta apenas um dos seis itens da tarefa, o mesmo que Deyvson, uma criança no nível pré-
silábico de escrita.
Alguns estudos (MALUF E BARRERA, 1997; FREITAS, 2004; LEITE, 2006) revelam
que apenas crianças com conhecimentos mais avançados sobre a escrita conseguem obter êxito na
atividade de identificação de fonemas nas palavras. Os autores justificam que isto ocorre pelo
fato de que crianças no nível alfabético de escrita são, em geral, capazes de realizar atividades de
formação e escrita de palavras, podendo visualizar mentalmente a palavra escrita, diferentemente
6 Uma exceção é o caso de Joyce (sujeito alfabético da dupla 6) que acertou quatro entre os seis itens da tarefa.
68
daqueles com conhecimentos iniciais sobre a escrita. Assim, a criança que, supostamente,
identifica palavras com fonemas iniciais semelhantes pode apenas estar identificando letras
iniciais semelhantes entre as palavras, ao invés de identificar fonemas. Em relação a isto os
estudos de Morais, (2005), Cavalcanti, Costa & Morais (2004) e Leite (2006) destacam que, de
modo geral, as crianças apresentam dificuldades em explicitar verbalmente os fonemas das
palavras.
Vale frisar, ainda, que os dados do Quadro 2 mostram que crianças com conhecimentos
menos avançados sobre a escrita, podem demonstrar melhores desempenhos em certas
habilidades fonológicas em relação a crianças com conhecimentos mais avançados sobre a
escrita. Este parece ser o caso de Deyvson (pré-silábico) e Gustavo (silábico-qualitativo), ao
serem comparados com a criança da dupla 3, Camilla, que está no nível silábico-alfabético de
escrita. Em relação ao total de acertos no exame inicial dessas crianças vemos que Deyvson teve
melhor pontuação (25 pontos) do que Camilla (21 pontos), ficando Gustavo com um total de
acertos (30 pontos) superior aos dois participantes anteriores.
Assim, os dados apresentados acima, parecem confirmar o fato de que na relação entre as
habilidades fonológicas e os níveis de conhecimentos sobre a escrita há uma enorme variação de
desempenhos que vão desde os níveis mais simples aos níveis mais complexos de reflexão
metafonológica, independentemente dos conhecimentos das crianças sobre a escrita com já foi
destacado nos estudos de Morais (2004, 2005), Freitas, (2004) e Leite (2006).
Por fim, é importante salientar que, com base nos resultados do exame inicial, é possível
gerar certas expectativas em relação aos jogos propostos para as duplas. Por exemplo, podemos
supor que o jogo 1, Batalha de palavras, deve ser muito fácil para todas elas, já que as
habilidades requeridas por este jogo de segmentação e contagem de sílabas e comparação de
tamanho de palavras não trouxeram dificuldades para as crianças. Nos jogos de Bingo de sons
iniciais e Bingo de rimas, porém, as duplas certamente irão apresentar dificuldades que precisarão
ser analisadas, já que apresentaram desempenhos bastante diversos em relação às habilidades
fonológicas requeridas nestes jogos. O jogo 4, Construindo a torre, que solicita a identificação de
pares de palavras com fonemas iniciais iguais, deve, por sua vez, representar um grande desafio
para todas as duplas, tendo em vista os desempenhos registrados na atividade 6, do exame inicial.
69
A seguir descreveremos a análise das sessões com os quatro jogos propostos neste estudo,
buscando observar o desempenho das seis duplas durante as sessões, bem como os percursos das
mesmas em três momentos diferentes.
4.2 As sessões com os jogos de análise fonológica
Conforme exposto no capitulo III, as sessões com os jogos propostos neste estudo foram
realizadas com seis duplas de crianças, num espaço fora da sala de aula.
As sessões de jogos foram organizadas em três blocos: no primeiro bloco as duplas
jogavam dois jogos e, em seguida, mais dois jogos, o mesmo ocorrendo no segundo e terceiro
blocos. É importante lembrar que, ao final de cada bloco de sessões com os jogos,sempre era
dado um intervalo de uma semana para iniciar um novo bloco. Além disso, todas as sessões de
jogos obedeceram a seguinte seqüência: jogo 1 (Batalha de palavras), jogo 2 (Bingo de sons
iniciais), jogo 3 (Bingo de rimas) e jogo 4 (Construindo a Torre).
Em síntese, o estudo teve como objetivo geral observar a interação entre duplas de
crianças jogando quatro diferentes jogos de análise fonológica, ao longo de três sessões para cada
jogo, o que resultou num período de três meses de coleta de dados.
Considerando que a análise das jogadas corretas não favorecia momentos de intervenção e
reflexão entre as crianças e o adulto presente, optamos por analisar as jogadas cujas respostas não
correspondiam ao que era proposto ou esperado em cada jogo. Ou seja, buscamos identificar os
tipos de erro encontrados durante as sessões de jogos e, a partir deles, observar as interações entre
as crianças, bem como as intervenções do pesquisador.
Vale ressaltar que, conforme indicado por Piaget (1973), consideramos o erro como uma
forma de expressão da compreensão do sujeito em um determinado ponto de seu
desenvolvimento e, sendo assim, compreendemos que ele pode, de fato, revelar muito sobre as
formas de compreensão da criança e, neste sentido, ser um elemento fundamental para melhor
orientar a atuação do professor no encaminhamento de jogos semelhantes aos tratados na presente
pesquisa.
Além dos tipos de erros observados, procuramos identificar o número de vezes em que
tais erros apareciam ao longo das sessões com os jogos. Esta análise permitiu uma visão
70
aproximada do percurso de cada dupla em relação aos erros mais e menos freqüentemente
encontrados em cada sessão. Porém, é preciso registrar que, numa mesma jogada, erros diferentes
pareciam emergir e, por vezes, tivemos dificuldade em especificar o tipo de erro cometido. Ou
seja, havia situações em que era difícil afirmar com segurança o que teria mobilizado as crianças
a responder de uma determinada forma, já que nem sempre uma possível justificativa para a
jogada era explicitada por ela ou podia ser facilmente inferida na situação.
O fragmento abaixo, extraído do jogo de Bingo de sons iniciais ilustra o quadro descrito
acima. Vejamos:
A pesquisadora retira do saco e lê a palavra: CABELO (Não havia na cartela uma figura correspondente) R - CA!... Copo (mostra a figura do copo na cartela) com cabelo! Começa com Ca! L - É Macaco! (mostra a figura na cartela, pronunciando a sílaba CA de modo enfático) P - Macaco começa com quê? R - E é o quê? Cabelo, né? (Relembrando a palavra lida) A pesquisadora confirma com um gesto de cabeça. R - CA e MA... Combina! CA e MA combina! (Diz vibrando) P – Tá, mas combina o quê? Eu quero saber... R - Macaco com... P – Ca e Ma... O quê é que tem igual aí? R - Combina! R - Combina P - Combina o quê? R - O Macaco com Cabelo! P - Qual o som que eles combinam? R - Ca e Macaco... Combina!! (Ela dirige um olhar ao parceiro, como se estivesse pedindo para ele concordar com ela) P - Tá igual, Lucas? L - Tá! (As crianças decidem marcar a figura do Macaco na cartela) (D1S2J2)
Nota-se que, ao formar o par Cabelo-Copo é possível, supor que Rayane esteja
identificando o fonema /k/ presente nas duas palavras. Em seguida, vemos Lucas comparando as
palavras Cabelo–Macaco, parecendo identificar a sílaba CA presente nas duas palavras,
desconsiderando a posição que elas ocupam nas palavras, não seguindo, portanto, a regra do jogo.
Mais adiante, partindo do par de palavras formado pelo seu parceiro, Rayane isola apenas as
sílabas iniciais das palavras Macaco e Cabelo, MA e CA e, neste momento, pode estar apenas
valorizando o som da vogal A, presente nas duas sílabas.
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Nota-se, dessa forma, que numa mesma jogada aparecem diferentes tipos de erros, que
buscamos interpretar e quantificar na medida do possível, na tentativa de fazer um levantamento
dos erros mais freqüentes em todas as duplas e ao longo das três sessões com os jogos.
Apresentaremos, no tópico a seguir, o percurso de cada dupla de crianças ao longo das
três sessões com cada um dos quatro jogos propostos, buscando traçar um perfil das suas
interações com um mesmo jogo, ao longo das sessões analisadas. Nesta análise, nos propomos,
ainda, a avaliar os conhecimentos das crianças relativos às habilidades fonológicas mobilizadas
em cada jogo, bem como a troca de informações entre elas e com o adulto presente na situação.
Vale ressaltar que, assim como Vygotsky (1998), estamos tratando neste estudo o jogo
como um espaço de criação da ZDP. Deste modo, estaremos analisando as interações e os
possíveis ganhos das crianças durante as sessões de jogos, levando em consideração o
desenvolvimento potencial das mesmas (o quanto a criança é capaz de aprender com auxílio de
um adulto ou de um parceiro mais experiente), comparando com o seu desenvolvimento real (o
quanto a criança é capaz de fazer sozinha), acreditando que um ensino voltado para o
estabelecimento de ZDPs, ou seja, um ensino que estimule e valorize as interações criança-
adulto-criança, proporciona as bases para novas aprendizagens.
4.2.1 DUPLA 1: RAYANE/ LUCAS
A dupla 1 era formada por duas crianças com cinco anos de idade, cursando o Grupo V da
Educação Infantil, ambas no nível pré-silábico de escrita, sendo, portanto, uma dupla homogênea.
De um modo geral, o comportamento da dupla se caracterizou por uma timidez inicial na
primeira sessão. Porém, nas sessões seguintes, as crianças se mostraram mais soltas e bastante
entusiasmadas, como mostra o seguinte fragmento no início da 2ª sessão da dupla com o jogo 1:
P - A gente vai jogar aquele joguinho ó... De Batalha! (Mostrando o jogo) R - Ah, eu sei qual é! L - Ah, esse é bom! (D1S2J1)
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JOGO 1 - BATALHA DE PALAVRAS
Retomando os resultados apresentados pelas crianças no exame inicial de habilidades
fonológicas (ver Quadro 2), é possível perceber que ambas apresentaram excelentes desempenhos
nas habilidades de segmentação, contagem e comparação do tamanho das palavras, o que
corresponde às atividades 1, 2 e 3, do exame inicial, respectivamente. Assim, esperava-se que,
durante o jogo de Batalha de Palavras, as crianças não apresentassem dificuldades.
De fato, foi isso que ocorreu, ainda que na 1ª e 2ª sessões tenha sido freqüente o erro de
segmentação incorreta de palavras, especialmente com palavras monossílabas. Isto acarretou
intervenções da pesquisadora, que possivelmente resultaram em um melhor desempenho da dupla
na última sessão, em que se observou uma queda significativa de erros em relação à primeira (de
10 para 5 erros). Vejamos um exemplo de intervenção registrado na 1ª sessão:
O par de palavras a ser comparado era: FLOR/ ESCADA R - Flor-ô! (segmenta e mostra os dois dedinhos na mão) L - Es-ca-da! (segmenta e mostra três dedinhos) P - É Flor-ô ou Flor? (mostrando dois dedos numa mão e um dedo em outra mão). R - Flor! (mostrando apenas um dedinho) L - Eu ganhei tudinho! (diz vibrando) (D1S1J1)
Chama-nos a atenção o fato de Lucas, na 2ª sessão, passar a adotar uma postura
semelhante à intervenção do adulto, que ao comparar os pares de palavras do jogo, sempre
mostrava nos dedos a quantidade de sílabas de cada palavra. Vejamos:
O par de palavras a ser comparado era: FORMIGA/ ESCADA L- For-mi-ga! Mostrando três dedos. R - Esca-da (Segmenta a palavra mostrando apenas dois dedos). P - É assim que separa? Que conta os pedacinhos de escada? (pergunta dirigida a Lucas) R - Es-ca-da! (Mostrando três dedos) L - Empatou! (diz concluído) R - Ah é... Empatou. (pouco satisfeita) L - For-mi-ga... Es-ca-da (mostrando três dedos numa mão e três dedos na outra). (D1S2J1)
Esse comportamento de Lucas parece ilustrar a importância do papel do adulto na
interação adulto-criança, proposto por Vygotsky (1998). Observa-se que a criança aprende, por
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meio da imitação de um comportamento do adulto o que, posteriormente, se mostra capaz de
fazer sozinha.
Como já foi dito, a freqüência do erro de segmentação incorreta das palavras diminuiu na
3ª sessão. Foi observado, nesta sessão, que as crianças se corrigiam mais rapidamente e a
intervenção do adulto, muitas vezes, não mais ocorria através de palavras: as trocas de olhares
entre a pesquisadora e as crianças funcionavam como uma forma de comunicação, como se pode
ver a seguir:
O par de palavras a ser comparado era: BOI/ REI R - Bo-i! (Rayane dirige um olhar para a pesquisadora como que pedindo uma aprovação. A pesquisadora reprova com uma expressão no rosto). R - Boi! (Mostrando apenas um dedinho). L - Rei! (Levantando apenas um dedo. E logo em seguida empurra todas as cartas para a parceira, sem perceber que deu empate) R - Empatou! (D1S3J1)
Nota-se que a troca de olhares entre a criança e a pesquisadora funciona como uma confirmação
da resposta para ela, ou um feedback (como propõe, TUDGE, 1996), tornando-a mais segura em relação à
expressão de conhecimentos de que ainda está se apropriando.
Ao longo das três sessões com o jogo 1, observa-se que a segmentação correta da palavra
com erro apenas na representação da quantidade de sílabas é algo pouco freqüente na 1ª sessão,
não reaparecendo nas sessões seguintes. Na verdade, este pode ser apenas um “falso erro”, já que,
como veremos no extrato a seguir, é possível que Lucas quisesse apenas levar o montinho de
cartas, ganhando a jogada.
O par de palavras a ser comparado era: SABONETE/ COMPUTADOR R - Sa-bo-ne-te! (mostrando quatro dedinhos) L - Com-pu-ta-dor! (Lucas segmenta a palavra corretamente, mas mostra cinco dedinhos na mão. Rayane conta em silêncio os pedacinhos da palavra computador. Em seguida diz). R - Empatou de novo! P - Vamos ver: Sa-bo-ne-te e Com-pu-ta-dor! (Comparando e mostrando quatro dedos em cada mão) R e L: Empatou! ( D1S1J1)
Ainda no jogo 1 foram observados outros momentos de aparente “falso erro”, conforme comentado acima. Tais tentativas de “trapacear” ou levar vantagem no jogo foram observados com certa freqüência, apenas na 3ª sessão, tendo sempre Rayane como protagonista. Vejamos alguns exemplos:
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O par de palavras a ser comparado era: VENTILADOR/ JACARÉ Antes de contar as silabas da palavra, Lucas fica animado, quando vê a figura: L - Jacaré... Meu...! É Jacaré! (Admirando a figura) R - Ven-ti-la-dor! (Mostrando quatro dedos). L - Já-ca-ré! (Lucas conta novamente e mostra três dedos na mão, Rayane interfere corrigindo o parceiro) R - Jacaré! (Mostrando apenas um dedo) P - Não, senhora! R - Já-ca-ré! (Mostrando os três dedos). R - Ven-ti-la-dor! (Mostrando quatro dedos)
O par de palavras a ser comparado é: FACA/ CARRO R- Fa-ca! (Mostrando dois dedos) Fa-cão! (Rindo e continuando com os dois dedos levantados). L - Car-ro! (mostrando dois dedos) R e L - Empatou! (D1S3J1)
É possível perceber, no primeiro exemplo, a nítida tentativa de Rayane em querer levar
vantagem, ao tentar diminuir a quantidade de sílabas da palavra colocada pelo parceiro. No
segundo exemplo, por sua vez, ela nomeia a figura de “facão” e não de “faca”, parecendo indicar
um desejo de aumentar o tamanho da palavra. Assim, embora ela saiba perfeitamente segmentar e
contar sílabas de palavras, entendendo que o tamanho da palavra independe de sua representação
física, tenta levar vantagem no jogo, lançando mão de um recurso que ela própria parece saber
que não funciona (note que ela sorri e mostra dois dedinhos, ao dizer a palavra “facão”).
Outro erro também pouco freqüente foi o de segmentação correta da palavra, com erro na
comparação entre os pares de palavras. Esse erro aparece com baixa freqüência tanto na 1ª
quanto na 2ª sessão. Vejamos um exemplo:
O par de palavras a ser comparado era: FADA/ MAR R - Fada madrinha7 P - Não, fada! R - Fa-da! (Mostrando dois dedos numa mão) L - Mar! (Mostrando um dedinho) R - Empatou! (conclui) P – Eita!! Empatou? L - Não! (E empurra as cartas na direção da parceira) R - É meu ou é dele? (parecendo não entender) P – Vocês agora contam novamente pra ver quem vai levar o montinho de cartas! R - Fa-da! (Mostrando dois dedos)
7 Note que, mais uma vez, Rayane parece tentar levar vantagem em relação a seu par, quando, diante da cartela com o desenho de uma Fada, pergunta: Fada madrinha? Neste caso, porém, ela busca aumentar, de fato, o tamanho da palavra.
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L - Mar! (Mostrando um dedo) L - Tu ganhou! (Empurrando as cartas para a parceira) (D1S2J1)
Finalmente, vale destacar que esta dupla não apresentou desânimo em relação aos ganhos
e perdas presentes no jogo, muito pelo contrário. Uma atmosfera lúdica e prazerosa se fez
presente entre as crianças, durante todas as sessões, como é possível observar no fragmento
abaixo:
O par de palavras a ser comparado era: GIRAFA/ PÁ R - Gi-ra-fa (mostrando três dedos) L - Pá! (Mostra apenas um dedo e não parece muito satisfeito pelo fato de sua carta ter apenas uma sílaba. Mesmo assim, entrega a sua parceira o montinho da mesa. Rayane ri, mas ele não se mostra derrotado). L - Pôxa, meu... Vou ganhar pouquinho! (reclamando da quantidade de cartas que tem, mas em seguida diz) Eu vou começar a jogar agora! (esfregando uma mão na outra, como um novo desafio). (D1S1J1)
Ao mesmo tempo, nota-se uma nítida diferença do comportamento de Lucas entre a 1ª e a
2ª sessões. Embora Rayane tenha uma postura muito mais ativa ao longo das três sessões:
compara as palavras, se corrige, empurra as cartas para si ou para o parceiro, Lucas apresenta-se
mais participativo e seguro a partir da 2º sessão, tomando a frente na comparação e conclusão de
muitas jogadas.
JOGO 2 - BINGO DE SONS INICIAIS
No exame inicial de habilidades fonológicas, as crianças Rayane e Lucas obtiveram
desempenhos inferiores na atividade 4. Deste modo, contrariamente ao jogo 1, a expectativa era
de que a dupla encontrasse dificuldades durante o Jogo 2. E isto realmente ocorreu.
A sessão com o jogo foi iniciada a partir da leitura das regras e escolha das cartelas com
as quais as crianças iriam jogar. No entanto, a pesquisadora percebeu que apenas a leitura das
regras não bastava, já que as crianças não pareciam compreendê-las. Assim, a pesquisadora
explicou o jogo na prática, ou seja, tomou uma cartela do jogo e a partir dela, puxou uma palavra
do saquinho e foi explicando o funcionamento do jogo, até que eles pudessem compreender. A
partida foi iniciada com a pesquisadora nomeando cada figura da cartela, a fim de evitar
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problemas de associação entre as palavras a serem ditadas e as palavras correspondentes às
figuras das cartelas.
Apesar desse cuidado inicial, as crianças ainda mostravam incompreensão do que o jogo
solicitava nas duas primeiras sessões. O exemplo a seguir indica como elas, inicialmente, se
apropriaram da instrução dada pela pesquisadora.
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: PIANO (na cartela havia o desenho de uma pipa) R - Pi... Lápis com a Pipa! La... P! (pareando duas figuras da própria cartela, sem considerar a palavra chamada) P - Não é Lápis e Pipa... É uma palavra que combine com Piano! É uma palavra que começa igual a piano. R - Pia com Pé! (faz novo arranjo entre palavras da cartela) L - É Pião mesmo! (sugere uma palavra que inicia com a mesma sílaba, mas que não está presente na cartela) R – É, mas não tem Pião aqui! P - Não é Pião... É uma palavra que começa com o mesmo som! Qual é, Lucas? L - Pipa e Bola! (ele também faz arranjos entre as figuras da cartela) R - La... Pi... Bo... (isolando os sons iniciais das palavras lápis, piano e bola que estão na cartela). P - Vejam, vocês estão esquecidos do jogo. Eu chamo uma palavrinha, vocês pensam nessa palavra e procura, na cartela, outra palavra que comece com o mesmo som da palavra que eu chamei. Qual foi a palavra que eu chamei? R - Pi... Piano! P - Então, tem que ver se na cartela de vocês tem uma palavra (figura) que comece com esse som! R - Ah... Pipa começa com isso (apontando para a figura do Macaco) Macaco! (Faz outro arranjo com figuras da cartela) P - Tem alguma coisa que comece igual a Piano? R - Lápis! P - Lápis e Piano... Começam iguais? R - Lápis começa com L(ele) e Piano começa com P(pê). P - Pi, sim! Piano começa com Pi! (Lucas se volta para a pesquisadora e aponta para a figura PÉ) P - Você acha que Pé começa igual a Pi, Lucas? R - Pé... Não! PÉ começa com E (é) A Pipa começa com P(pê)! P – Pipa tá igual a palavra piano? R - Não! Lucas muito atento a tudo, apenas balança a cabeça afirmativamente, concordando com a pesquisadora. P - E Pipa começa igual a piano? (a pesquisadora insiste no par proposto antes) R - Tá! L - Tá! P - Então, marca... Se começa igual... (as crianças trocam olhares e riem) (D1S2J2)
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Como é possível perceber, a partir do fragmento acima, embora as crianças consigam
isolar o som inicial das palavras, elas não parecem compreender bem o que o jogo propõe, ao
formarem arranjos entre as palavras da própria cartela (por exemplo, Pipa - Macaco, Pipa-Bola,
etc) ou quando citam palavras cujas figuras não estão presentes na cartela (no caso da palavra
Pião, proposta por Lucas).
Por outro lado, tal fragmento mostra que a solicitação feita no jogo, de identificar o
“pedaço inicial” das palavras, faz com que as crianças também ativem seus conhecimentos sobre
as letras das palavras e seus nomes. Assim, circulando entre diferentes possibilidades de
associação entre palavras, as crianças parecem simplesmente ter aceitado a resposta final dada
pela pesquisadora, ainda sem compreenderem muito bem o porquê.
Diante das questões levantadas acima, não foi surpresa constatar que o comportamento
mais observado durante a 1ª sessão, tenha sido o de não responder. Ou seja, as crianças apenas
refletiam sobre palavras, mas, ao final acabavam sem marcar as figuras da cartela, por não
identificar palavras que iniciavam com a mesma sílaba da palavra chamada.
Como a proposta do adulto presente na sessão era de intervir, levando as crianças a
refletirem sobre suas respostas, mas sem corrigir possíveis erros observados durante o jogo, a
etapa final do jogo, onde estava previsto para que isto acontecesse tornou-se bastante cansativa.
Assim, em muitos casos, a identificação das palavras não marcadas nas cartelas ou
marcadas de forma errada ficou apenas por conta da própria pesquisadora, pois as crianças já se
encontravam cansadas, sem vontade alguma de continuar as reflexões já feitas durante o jogo.
Apesar das dificuldades apontadas acima, as crianças tendem a responder e acertar mais
na identificação de palavras com a mesma sílaba inicial a partir da 2ª sessão. Porém, é preciso
considerar que a marcação das palavras na cartela nem sempre foi feita de modo correto pelas
crianças. Ou seja, a 2ª sessão foi marcada por episódios nos quais as próprias crianças decidiam
as figuras a serem marcadas na cartela, de certa forma, ignorando as intervenções da
pesquisadora, parecendo querer colocar as fichinhas na cartela a qualquer custo.
A pesquisadora, por sua vez, passa a permitir tal comportamento em alguns casos para
não frustrar demais as crianças que, diante das dificuldades de preencherem suas cartelas na 1ª
sessão, demonstraram sinais de enfado, direcionando a cabeça para o teto da sala, reclinando o
corpo nas cadeiras, levando as mãos à cabeça, soprando e respirando forte, ficando visivelmente
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desapontadas ao final do jogo na 1ª sessão, quando notaram que as palavras chamadas acabaram
e a cartela não estava totalmente marcada.
Outro erro presente no jogo 2 foi o de supervalorizar o som da vogal dentro da sílaba
inicial, ou seja, as crianças pareciam não identificar a sílaba inicial de modo completo, se
concentrando apenas no som da vogal. Esse erro apareceu pouco na 1ª sessão e aumentou de
intensidade na 2ª sessão, diminuindo na sessão final. Vejamos os exemplos:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: MADEIRA (na cartela há a figura de um Macaco) R - Ma! (isolando e identificando a sílaba inicial da palavra lida) R - Lápis com Pé... Lápis com Macaco! (formando pares de palavras com figuras da cartela). P - Lápis começa igual à Madeira, Lucas? R - Madeira... Ma e Lá, combina!! (Rayane isola as duas sílabas das palavras, provavelmente, valorizando a vogal comum nas duas palavras) P - Combina não! P - E você? Você acha que está igual Madeira e Lápis? (se dirige a Lucas) L - Madeira com Lápis! (repete os pares formados) P - Lápis... Madeira. Começam iguais? (pergunta novamente) L - Não! R - Combina! P - Não, não combina. Tem que ser o pedacinho todo.
Outro comportamento registrado no jogo 2 foi o de não considerar a posição que a sílaba
ocupa nas palavras. Neste caso, as crianças parecem identificar semelhanças entre as sílabas de
palavras, sem se importar com a posição que estas ocupam nas palavras em questão. O erro surge
a partir da 2ª sessão com freqüência baixa, e diminui ainda mais na 3ª sessão. Vejamos um
exemplo:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: BUCHA (há a figura Bule em uma das cartelas) R - Bu e Cha! (olha para a sua cartela e aponta para figura Chave. Pega uma fichinha para marcar a figura chave dirigindo o olhar para a pesquisadora, que balança a cabeça negativamente). P - Ele tem? (dirige a pergunta para que ela observe também a cartela do parceiro) R - Isso é o quê? (aponta para a palavra lida) P - Bucha! R - Bu! (isola a sílaba inicial e marca com a fichinha a figura Bule na cartela de Lucas). R- Eu já ajudei dois! Ele não me ajuda nenhuma! Só eu que ajudei ele! (D1S3J2)
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Com se vê acima, Rayane isola a sílaba inicial da palavra Bucha, parecendo associar a
sílaba final da palavra, com a silaba inicial (cha) da palavra Chave. Deste modo, identifica as
semelhanças sonoras entre as palavras, mas, inicialmente, se engana nas posições em que as
sílabas se encontram. Porém, com a intervenção da pesquisadora, ela rapidamente encontra a
figura esperada na cartela do parceiro.
Assim como foi registrado no exemplo acima, observou-se na 3ª sessão alguma forma de
auxílio entre os jogadores. No fragmento abaixo, Rayane, mais uma vez, fornece a resposta ao
parceiro, ao observar a sua cartela. Vejamos:
A pesquisadora retira do saquinho a palavra: BOLICHE (em apenas uma das cartelas tem a figura Bota) (Rayane observa a sua cartela e indica com um gesto de balançar a cabeça que não há figura na sua cartela) P - Olha a cartela dele pra ver se tem! (sugerindo que Rayane ajude o colega a encontrar) R – Tem. BOTA! (Ela pega a fichinha e marca a figura na cartela dele. Lucas parece bastante disperso neste momento) P - Nem visse, hein! Ela te ajudou! (risos) (D1S3J2)
Finalmente, como foi dito, na 2ª sessão, as crianças passam a marcar mais figuras na
cartela, identificando mais palavras com a mesma sílaba inicial. Isto é, elas conseguem acertar no
jogo, o que lhes dá um novo ânimo.
Na verdade, comparando o percurso das crianças da dupla 1 nas três sessões com o jogo 2,
observamos que elas avançam, especialmente, na 3ª sessão, quando Rayane preenche realmente
toda a cartela, de modo adequado, e Lucas fica faltando apenas uma figura para completar a sua.
Assim, parece inegável que o jogo 2 oferece às crianças uma excelente oportunidade de refletir
sobre os conceitos de , sílaba e sua posição na palavra.
Vale enfatizar, ainda, que apesar do jogo ter sido difícil para as crianças pré-silábicas, elas
não desistem de jogar e mesmo na 1ª sessão já revelam algum avanço na compreensão do jogo,
como mostra o fragmento abaixo:
A pesquisadora retira do saco e lê a palavra: VAGALUME (na cartela havia a figura de uma vassoura) R - Vassoura combina com Escova! (ainda sem compreender o jogo e pareando duas figuras da própria cartela, possivelmente combinando a sílaba Va de Escova com Va de Vassoura)
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P - Mas é o som da palavra/ vocês vão procurar na cartela palavras que tenham o mesmo som da palavra Vagalume! Vagalume começa com que pedaço? R e L - VA! (os dois ao mesmo tempo) P - Tem aí alguma palavrinha que começa igual? R - Tem! (apontando para a figura da cartela. Lucas repete o mesmo gesto de apontar a figura) R - Vassoura! P – Isso!! Vassoura começa igual a Vagalume! Então marca na cartela. (D1S1J2) Mais adiante a pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: BACIA (não havia figura correspondente a palavra na cartela) Eles fazem coro e dizem: NÃO! R- Eu ia dizer “Bassoura”! (sorrindo) (Lucas em silêncio, parece não entender a piada da colega) (D1S1J2)
JOGO 3- BINGO DE RIMAS
Os resultados apresentados pela dupla 1, nos exames iniciais de habilidades fonológicas
(ver Quadro 2) também revelam um baixo desempenho das crianças na atividade de identificação
de palavras rimadas, não conseguindo acertar nenhum dos seis itens da atividade 5 do exame
inicial. Assim, esperava-se que o Bingo de Rimas trouxesse para as crianças muitas dificuldades.
De fato, o jogo 3 foi ainda mais difícil para as crianças da dupla 1 do que o jogo 2. O
comportamento de não responder foi freqüente ao longo das três sessões, refletindo certa
indisposição das crianças diante do jogo e/ou a própria incompreensão do que o jogo solicitava.
As longas intervenções da pesquisadora deixavam as crianças um tanto desanimadas, por
não conseguirem acertar no jogo, ainda que em momento algum tenham manifestado o desejo de
parar de jogar.
Nota-se que, nas tentativas frustradas de combinar palavras com sons finais iguais, as
crianças acabavam sem marcar figuras na cartela, o que certamente, trazia muita frustração para
elas. Vejamos:
A pesquisadora retira do saco e lê a palavra: LINHA (na cartela a figura
correspondente era Galinha)
P - Linha rima com que daí? R - Aqui! (apontando na cartela para a figura do Bode) P - Bode? Bode e Linha?(repete enfatizando os sons finais)
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L - Bode e Linha, Não! L - Pião com Linha (comparando a palavra lida com outras figuras da cartela) P - Vamos ver... Linha... Pião rimou? (enfatizando mais uma vez os sons finais das palavras) R - Rima! (as crianças continuam fazendo associações incorretas com as figuras da cartela) (...) P - E Galinha com Linha? (sugerindo o par esperado) R - Não! L - Palhaço com Linha! P - Dá Rayane? Palhaço rima com Linha? R - Não! (risos...) (as crianças não identificam o par de palavras rimadas e a pesquisadora retira uma nova palavra do saquinho). (D1S1J3)
Porém, semelhante ao que foi observado no jogo 2, apesar das dificuldades apresentadas,
há momentos em que as crianças identificam pares de palavras rimadas de modo correto, como
mostra o exemplo abaixo:
A pesquisadora retira do saco e lê a palavra: CAMINHÃO (na cartela a figura correspondente era Pião) P - Caminhão rima com que aí? R - Com Palhaço ou com Pião? L - É não..... P - Caminhão! (repetindo a palavra do saquinho) L - Começa com Pião (bate palmas vibrando porque identificou a palavra rimada) P - Caminhão termina igual a Pião! (confirmando a resposta balançando a cabeça) L - Eu acertei!!! (diz vibrando) (D1S1J3)
Observa-se que Lucas, neste fragmento, identifica corretamente a palavra na cartela
indicando que ele conseguiu isolar e comparar os sons finais das palavras, ainda que afirme que
caminhão “começa” com pião, revelando uma dificuldade que apareceu com freqüência em
expressar adequadamente o que é “começo” e “fim” das palavras.
Vale a pena destacar, também, que, diferentemente do que esperávamos com este jogo, as
crianças muitas vezes conseguiam perceber associações corretas entre os sons vocálicos finais
das palavras em nível fonêmico, ou seja, emparelhando as palavras com base nos sons da vogal
final, ao invés de segmentos supra-segmentais finais, conforme era esperado quando as palavras
do jogo foram selecionadas. Este tipo de emparelhamento aparece nas três sessões com o jogo 3.
Vejamos um exemplo:
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A pesquisadora retira do saco e lê a palavra: PRAIA (a figura correspondente na cartela seria Saia) R – Chu-va! A! Pra-ia! A... Igual! (Rayane compara a palavra lida Praia com Chuva, figura também presente na cartela. Nota-se que ela faz a segmentação da palavra, como se estivesse lendo a palavra escrita sobre a mesa, indicando com o dedo cada segmento que vai falando). P - Termina igual, Lucas? R - Chu- va... Pra-ia! Termina! (Segmenta as palavras enfatizando, mais uma vez, os sons finais, destacando o som da vogal na sílaba) P - Vai marcar? L - Vou! R - E se a gente errar? L - Será? P - E aí? Marca ou não marca? (Eles resolvem marcar a figura chuva na cartela e trocam olhares e risos) (D1S2J3)
Os tipos de erro identificados no jogo 2 ocorreram também no jogo 3. Assim, são
registrados erros de não considerar a posição que a sílaba ocupa na palavra, por exemplo: a
palavra lida era: Sacode (não havia figura correspondente na cartela). A criança diz: Calça. Ou
seja, ela, provavelmente, identifica as semelhanças sonoras entre SA e ÇA, sem considerar a
posição das sílabas nas palavras. Este erro aparece muitas vezes na 1ª sessão, embora tenda a
diminuir nas duas sessões seguintes.
Outro comportamento interessante, já comentado anteriormente em relação ao jogo 2, é
trazer para o jogo os conhecimentos relativos a letras e escrita de palavras conhecidas. Esses
conhecimentos, porém, nem sempre resultam em uma reposta correta, como vemos no exemplo
abaixo:
A pesquisadora retira do saco e lê a palavra: TRAÇO (traçu) (na cartela a figura correspondente seria palhaço) R - Pa-lha-ço (ó)... Tra-ço (u)... Não! O Traço termina com U e Palhaço termina com O! (marcando as sílabas nos dedinhos, segurando o dedo equivalente a sílaba final) P - Traço... Palhaço...! (sem dar ênfase ao som U no final das palavras) P - O que tu acha? Rima? L - Não! R - Não. (D1S1J3)
Nota-se que a intervenção realizada, na verdade, não aproveita a situação para informar
que a palavra “traço” também se escreve com a letra O, mostrando o cartão com a palavra
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“traço”, escrita e dizendo que embora falemos com o som do U no final, a palavra é escrita com
O, assim como “palhaço”.
Em relação aos comportamentos de auxílio entre os participantes no jogo 3, Rayane
continua bastante ativa durante as sessões, muitas vezes ajudando Lucas a marcar sua cartela,
quando, por exemplo, identifica, na cartela do parceiro, a palavra Repolho, marcando também na
sua cartela a figura Olho, ambas identificadas a partir da palavra lida Molho.
Comparando o desempenho geral das crianças, ao longo das três sessões, com o Bingo de
rimas, percebemos que, durante a 1ª sessão, elas identificaram e marcaram poucas figuras nas
cartelas, encerrando a partida com o término das palavras do saquinho. Na 2ª sessão, as crianças
preenchem toda a cartela, ora formando rimas com base nos segmentos supra-segmentais, ora
emparelhando as palavras com base no fonema final das palavras. Vale ressaltar, ainda, que em
outros momentos, as crianças não identificavam as figuras correspondentes nas cartelas, deixando
também, de responder no jogo. Na 3ª sessão, as crianças identificam e marcam na cartela algumas
palavras rimadas, do mesmo modo que na sessão anterior, mas são pegas de surpresa, quando
chegam ao final das palavras do saquinho, sem completar as suas cartelas. O aumento do número
de equívocos observados nesta sessão pode ser explicado, talvez, pelo maior número de palavras
incluídas no jogo, já que nesta sessão cada criança tinha cartelas com figuras diferentes, o que
não ocorreu na 1ª sessão, quando jogaram com cartelas com figuras idênticas.
Finalmente, é interessante notar que, a partir da 2ª sessão com o jogo 3 e, diferentemente
do que aconteceu no Bingo de sons iniciais, as crianças mostram algum interesse para conferir as
palavras chamadas com as marcadas nas suas cartelas. Assim, elas chegam a identificar alguns
pares de palavras rimadas, ainda que, na maioria dos casos, as respostas corretas sejam indicadas
pela pesquisadora, como vemos neste diálogo:
P - Dente combina com quê? (A pesquisadora retoma algumas palavras lidas durante o jogo) L - Corrente! (revisando a palavra marcada corretamente na cartela) P - Vocês marcaram ovelha com boneca, não foi? Então vamos ver se é ovelha ou é sapeca que combina com boneca? R - SA... Sapeca P - Qual o que combina mais: sapeca com boneca, ou ovelha com boneca? R - Sapeca! L - Sapeca com Boneca! P - Pois é... Mas vocês marcaram com ovelha! R - Eu sabia! L - Eu também sabia!
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P - Lençol foi com anzol, tá certo! P - o que combina mais: mola com pancada ou mola com rola? L - Mola com Rola! R - Errei de novo!
JOGO 4 - CONSTRUINDO A TORRE
Retomando os resultados revelados no exame inicial, vemos que as crianças Rayane e
Lucas também não conseguiram acertar nenhum dos itens da atividade 6: identificar palavras com
o mesmo fonema inicial (ver Quadro 2).
No entanto, durante o jogo, em alguns momentos, eles identificam corretamente os pares
de palavras, ainda que não fique claro até que ponto isso represente uma reflexão consciente.
Vejamos um exemplo:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam
com o mesmo sonzinho? (Figuras: Sofá - Pipa-Sapo - Maçã)
R - Eu já sei... Mas não vou dizer! L - É... Sofá e Sapo! (A pesquisadora confirma que a resposta é correta, Lucas dança na cadeira, vibrando) (Risos). P - Como foi que tu descobrisses? (Risos) L - Descobrindo! P - Como?
L - Porque Sofá era igual a Sapo! (D1S3J4)
Nota-se, ainda, que, erros que aparecem em jogos anteriores prosseguem neste jogo, como
é o caso da identificação de sílabas semelhantes nas palavras, sem levar em conta sua posição
(por exemplo, associando Sacode com Calça). Tal erro aparece na 1ª sessão com uma freqüência
maior, havendo uma pequena queda nessa freqüência nas sessões seguintes. Vale notar, ainda,
que, durante o jogo, a pesquisadora nem sempre solicitou uma justificativa para as respostas
dadas pelas crianças, já que isto poderia desvirtuar a situação de jogo.
Vejamos, porém, dois fragmentos, extraídos da 3ª sessão, em que a pesquisadora solicita
justificativa para uma determinada jogada e o que as crianças dizem:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Telha - Livro – Casa – Luva)
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R - Eu já sei! L - Casa e Luva! (formando um par de palavras e, provavelmente, identificando os sons finais das palavras) P - Casa /k/ e Luva /l/? Não está igual! (enfatizando os fonemas iniciais) R - Já sei qual é! R - CA... Isso é o quê? (isolando a sílaba inicial da palavra Casa e perguntando sobre a figura Telha) P - Telha! R - Ca... Te... Lu... Li! Ca-sa... Li! Não! (citando as sílabas iniciais das palavras Casa, Telha, Luva e Livro. Nota-se que, após as tentativas de identificar os pares de palavras com o mesmo fonema, Rayane parece desistir e passa a vez para o parceiro responder novamente) P - Ele já foi, agora é você! (A pesquisadora insiste para que ela responda) R - Luva com Livro! P - Luva e Livro! Por que você acha que tá igual? R - Porque é igual! P - O que está igual? R - A letra! P - Qual letra? Como assim? R - Lu e Li! Tá igual! (a pesquisadora confirma balançando a cabeça) R - Eu ganhei! (Risos)
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Colar – Régua - Ralo – Faca) L - É Faca e Ralo (possivelmente, valorizando o som da vogal nas sílabas iniciais) P - Faca com ralo... Começam com o mesmo sonzinho bem pequeno? R - Não! L - Começa, sim! R - A faca começa com... abcdef (marcando a seqüência das letras nos dedinhos e procurando o nome da letra F)... F (efe)... Começa com F(efe)... E o Ra... Começa com... Ra! L - Então é Faca com Régua! P - Começam igual, /f/ e /R/8? (Lucas apenas afirma com a cabeça demonstrando pouco interesse, enquanto que Rayane reflete atenciosamente sobre cada par de palavras). R - FA... e RÉ... Não... (fazendo um gesto negativo com o dedinho) (D1S1J4)
Como se vê, as crianças trazem para o jogo conhecimentos sobre nome das letras, sons de
sílabas ou sons das vogais. Nota-se, ainda, que, para Rayane o pedido de pensar no “sonzinho
bem pequeno” no início das palavras significa pensar no nome das letras, o que confirma os
estudos como os de Maluf e Barrera (1997), Leite (2006) e Morais (2006), que têm apontado a
dificuldade dos sujeitos em isolar os fonemas iniciais das palavras.
8 As representações das transcrições fonéticas são aquelas recomendadas pelo Alfabeto Fonético Internacional (CUNHA; CINTRA, 2001)
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Em síntese, apesar das crianças fazerem algumas associações esperadas entre as palavras
com mesmo fonema inicial, nota-se, em alguns momentos, que elas ficam cansadas, já que a
habilidade requerida pelo jogo é algo bastante difícil para elas, como é evidente no extrato
abaixo:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho?(Figuras: Balão-Boca-Mola-Rato) R - Bo-ca... Mo-la! (Falando a palavra de forma segmentada). BO... MO... (isolando as sílabas iniciais e, possivelmente, observando a semelhanças sonoras das vogais presentes nas sílabas) R - Tá certo! P - Boca e Mola... Lucas, tem o sonzinho do começo igual? (Dirige a pergunta a Lucas, porque ele parece um pouco disperso, brincando com os tijolinhos recebidos. Ele nega com um gesto de cabeça). P - É você quem vai responder agora. L – É... Balão com Mola! (fazendo novo arranjo) P – Olha, tu achas que é balão com mola. Têm o mesmo sonzinho bem pequeno do começo? (perguntando a Rayane) R - É... ! (confirmando e sorrindo) P - Olha, Balão /b/... Mola /m/! (enfatizando os fonemas iniciais das palavras) R - É não! É... Boca e Mola! (Retornando à primeira combinação que fez) P - Boca e Mola. Você acha que tem o mesmo sonzinho bem pequeno do começo? R - É! (Lucas balança a cabeça confirmando e rindo) P - Mas não é! Sabe qual é o certo aqui? L - Já sei qual é! É Balão com Rato! (interrompendo a pesquisadora) P - Balão não começa com o mesmo sonzinho de rato! Veja, /b/ /R/! Não ta igual. Presta atenção! (chamando a atenção de Lucas que brinca com as pecinhas em cima da mesa) L - Rato com Boca! (Lucas forma outro par) P - Olha Rato, Boca! Ra /R/... Bo /b/... Não tá igual. Aqui é: Balão /b/ e Boca /b/! (D1S2J4)
No caso do jogo 4, no que refere a Lucas, este não parece funcionar como espaço de
criação da ZDP, tal como proposto na teoria de Vygostsky (1998). Ao que parece, a atividade
solicitada para ele, mesmo com o auxílio do adulto, está muito distante das suas capacidades.
Porém, mesmo se apresentando, de modo geral, disperso durante o jogo, Lucas parece “se dar
bem”, ao aceitar muitas vezes as sugestões da pesquisadora, recebendo uma maior quantidade de
tijolinhos para a construção da torre. Rayane, por sua vez, se empenha bastante nas reflexões e
comparações entre as palavras e não se frustra com o fato de sua torre não crescer como a de
Lucas.
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Por fim, vale frisar que, de modo geral, mantém-se uma atmosfera lúdica durante o jogo
4, bem mais até do que nos jogos 2 e 3. Nota-se ainda uma ansiedade dos jogadores para ganhar
mais tijolinhos, já observada no jogo 3, quando queriam ver suas cartelas preenchidas.
4.2.2 DUPLA 2: LUCIANO /VITORIA
A dupla 2, assim como a dupla 1, também foi formada por duas crianças com cinco anos
de idade, cursando o Grupo V da Educação Infantil, ambas no nível de escrita silábico-
qualitativo, sendo, portanto, mais uma dupla homogênea.
De um modo geral, a dupla teve como característica o bom humor e a facilidade de
comunicação entre os parceiros. Mostravam-se sempre simpáticos brincando, conversando, rindo
e vibrando durante as sessões com os jogos, portanto, pareciam se divertir durante as sessões.
JOGO 1- BATALHA DE PALAVRAS
Diante do bom desempenho apresentado pela dupla nas habilidades fonológicas de
segmentação, contagem e comparação de palavras propostas no exame inicial, esperava-se que as
crianças da dupla 2, assim como as da dupla 1, não apresentassem dificuldades durante o jogo 1.
De fato, como previsto, foi isto o que ocorreu.
Desde o início as crianças demonstraram compreensão e total segurança diante da
instrução do jogo 1, como mostra o seguinte diálogo no inicio da 2ª sessão:
L - Ôxe... Não precisa explicar nada não, a gente já sabe! P - Ah, vocês já sabem! Então, explica aí como é que se joga! L - É... É pra achar os sons!... Os sons que têm mais! V - É! P - Então, ganha quem tiver colocado o quê? V - O que tem mais som!... Se tiver pouco som... Aí... a outra tiver muita, aí a outra ganha! P - Ganha quem tiver com muitos sons! E quando tiver empatado o que é que faz? L - Bota outra!... Naquela vez eu empatei com ela... L - Eu botei outra que tinha quatro sons, e ela botou uma que tinha três sons! V - Aí, tu ganhou!
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Diferentemente da dupla 1, a dupla 2 não apresentou erros relativos à representação da
contagem de sílabas das palavras, nem erros na comparação das palavras. Porém, está presente o
erro de segmentação incorreta das palavras monossílabas9. Este erro se caracterizou pelo
acréscimo de uma sílaba à palavra quando a criança faz a segmentação oral. Tal erro apareceu nas
sessões com o jogo 1, ainda que com uma freqüência menor do que a observada com a dupla 1.
A maior freqüência deste erro ocorre na 1ª sessão, diminuindo nas sessões seguintes.
Considerando a facilidade desta dupla com o jogo 1, as intervenções da pesquisadora não
ocorreram com a mesma freqüência que a dupla anterior. Apenas na 1ª sessão, elas foram mais
presentes, devido à maior incidência do erro de segmentação incorreta das palavras, indicado
acima. Assim, ao longo das três sessões com este jogo, a pesquisadora observou mais e interferiu
pouco nas interações entre os participantes, já que eles segmentavam, contavam e comparavam os
pares de palavras com mais autonomia e propriedade do que a dupla 1.
Na verdade, as poucas intervenções da pesquisadora funcionaram apenas como um ajuste
inicial e, também, de alerta para as segmentações equivocadas. Nota-se que as crianças
apresentavam domínio do jogo, já na 1ª sessão, com Vitória assumindo uma postura semelhante à
da pesquisadora, ao comparar as duas palavras, utilizando os dedos das duas mãos, do mesmo
modo que fez Lucas da dupla 1. Vejamos:
O par de palavras a ser comparado era: BARATA / COMPUTADOR V - Ba-ra-ta! (segmentando a palavra e mostrando três dedinhos). L - Com-pu-ta-dor! (segmentando a palavra e mostrando quatro dedinhos). L - Ganheeeei! (vibra) V - Ba-ra-ta... Com-pu-ta-dor... É quatro! (fazendo a comparação e mostrando numa mão três dedos e na outra, quatro dedos). (D2S1J1)
Uma característica observada desde a 1ª sessão com a dupla 2, e pouco observada com a
dupla 1, é uma espécie de “explicação da jogada”, comumente feita por Vitória, como mostra o
fragmento acima. Tal comportamento espontâneo é interessante porque pode ajudar um parceiro
com menos habilidade na compreensão do funcionamento do jogo, o que, porém, não parecia ser
uma necessidade de Luciano.
Também com a dupla 2 aparece o comportamento de “falso erro”, já comentado
anteriormente. Dessa vez, assim como fez Rayane da dupla 1, Luciano tenta aumentar o tamanho 9 Também ocorreram alguns casos de segmentação incorreta com palavras com mais de uma sílaba, como por exemplo, a palavra “leão”.
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da figura Fada representada na cartela, nomeando-a de Fada madrinha. Na 2ª sessão, ele tenta
levar nova vantagem e, diante da figura Salada (um prato com alface e rodelas de tomates, bem
visível), tenta aumentar a palavra dizendo Salada de fruta.
Vale a pena ressaltar que tais episódios favoreceram, na situação de jogo, momentos de
descontração entre os envolvidos na situação, mobilizando risos e comentários divertidos. Assim,
neste jogo se instala da 1ª à última sessão um clima de descontração. As crianças da dupla 2
vibram diante dos acertos e, os risos e comentários espontâneos aparecem a cada montinho de
cartas ganho, como mostra o extrato abaixo:
As palavras a serem comparadas eram TARTARUGA / PÁ L - Tar-ta-ru-ga! (mostrando quatro dedos) V - Pá (mostrando apenas um dedinho) L - Valeeeeu, cara! Valeu tartaruga! (D2S2J1)
JOGO 2- BINGO DE SONS INICIAIS
Retomando os desempenhos apresentados pela dupla 2 no exame inicial de habilidades
fonológicas (ver Quadro 2), nota-se que Luciano obteve um desempenho excelente, em
comparação a sua parceira, que acertou apenas dois itens da tarefa de identificação de palavras
com o mesmo som inicial. Deste modo, esperava-se que ele assumisse um papel mais ativo
durante as sessões com este jogo.
Porém, ao contrário do que se esperava, durante as sessões nota-se que Vitória não só
identifica apropriadamente mais palavras na cartela do que Luciano, como, também, traz
exemplos corretos de outras palavras que não estão presentes nas cartelas e que combinam com a
palavra chamada pela pesquisadora. Tal comportamento, aliado à iniciativa de isolar e verbalizar
o som inicial das palavras chamadas, bem como sua preocupação em explicar as respostas dadas
(ver o primeiro exemplo, abaixo), muitas vezes parece ajudar seu parceiro neste jogo, como
mostra o segundo exemplo abaixo:
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A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: RALO (na cartela há a figura do Rato) V -Rato! Porque começa com ra, com r (erre)! (Ela marca a cartela quase que imediatamente, enquanto seu parceiro observa com atenção). (D2S1J2) A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: MÉDICO (a palavra correspondente na cartela é Melancia) L - Não tem! V - O médico se foi...(diz brincando) P - Não tem a figura do médico, mas vocês têm que procurar outra palavrinha que tenha o mesmo som! V - ME... Meleca, mas não tem aqui! (citando outra palavra que não está na cartela) L - ME... Melancia! (apontando para a figura em sua cartela) V - ME... Meleca, mas não tem aqui! (repetindo o que havia dito) L - ME... Melancia! (repete) V -Tu já adivinhou de novo! (diz admirada) (D2S1J2)
Como se vê, no segundo exemplo, ao citar uma outra palavra (MELECA) não presente na
cartela, Vitória parece auxiliar o seu parceiro a identificar a figura Melancia na cartela.
Por outro lado, o fato de trazer novas palavras para o jogo parece, às vezes, desviar a
atenção das crianças das figuras presentes na própria cartela, chegando, em alguns casos, a
atrapalhar. Vejamos um exemplo:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: CABELO (na cartela há a figura Cachimbo) L - CA... Casa! (identifica a sílaba inicial, identifica também outra palavra e, logo em seguida, olha para sua parceira) V - Mas não tem aqui...! (procurando na cartela a figura Casa) P - Não tem a palavra Casa, mas será que tem outra palavrinha que comece com o mesmo pedacinho? Só é Casa que começa com CA, é? L - Não! V - Cabra também! (identificando mais uma palavra que não está na cartela) P - Mas não tem aí! V - Cabelo... Tem na gente! (comentando em tom de brincadeira) P - Tem alguma palavrinha aí? L e V - Não! (as duas crianças respondem ao mesmo tempo e, a pesquisadora lê uma nova palavra) (D2S1J2)
Neste exemplo, é possível pensar, ainda, que, se a pesquisadora tivesse adotado uma
postura mais direta dizendo: “É, gente, tem uma porção de palavras que começam com CA. Mas,
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na cartela de vocês tem alguma? Procurem agora na cartela!”, seria provável que as crianças
encontrassem e marcassem a figura cachimbo. No entanto, considerando-se que se tratava de uma
situação de jogo (ainda que didático), em muitos casos, a pesquisadora optou por deixar as
crianças mais livres e retomar as figuras não marcadas ao final do jogo.
Um erro que esteve presente apenas nas 1ª e 2ª sessões foi o erro de não considerar a
posição que a sílaba ocupa nas palavras, desaparecendo totalmente na ultima sessão,
diferentemente do que foi observado com a dupla 1, cuja freqüência deste erro foi maior.
Outro erro observado nas sessões com a dupla 1 e, que também esteve presente com a
dupla 2, é o erro de supervalorizar o som da vogal na sílaba. O curioso é que, com a dupla 2, esse
erro aparece apenas na 3ª sessão e, tendo como protagonista Luciano. Talvez isto ocorra pelo fato
de Vitória identificar mais palavras com o som inicial nas sessões anteriores, deixando Luciano
ansioso em marcar as figuras na sua cartela a qualquer custo. Vejamos um exemplo:
A pesquisadora retira do saco e lê a palavra: ESCOLA (não há figura correspondente nas cartelas) L - Escola! Co, Pé... Pé! (ele compara Escola-Copo, isolando a sílaba CO, em seguida compara Escola e Pé. Pára e aponta para a figura Pé da cartela) P – Escola (iscola)? (repete a palavra do saco enfatizando a silaba inicial) L - É Éscola!! (Ele corrige a pronuncia da pesquisadora) Éscola, o É! E o PÉ é P, É! V – Mas, menino, Escola começa com E. Tais ficando doido é? (diz admirada com a associação do parceiro, chamando a atenção do parceiro para o fato dele achar que as palavras Escola e Pé começam iguais). (Após o comentário de Vitória, Luciano desiste de marcar sua cartela). P – Olha, Pé tem É, mas não começa com ES (és)! (Passa-se para a leitura de uma nova palavra) (D2S3J2)
Este comportamento de parear palavras com sons iniciais iguais, valorizando a vogal
presente na sílaba inicial, também foi evidenciado no estudo de Leite (2006), entre crianças com
conhecimento de escrita no nível silábico-qualitativo, quando solicitadas a produzir palavras com
a mesma sílaba inicial de uma palavra dada. Por exemplo, indicar a palavra “alho” como
semelhante à palavra “cachorro”.
Apesar dos erros apontados acima, como se pode ver até aqui pelos extratos das sessões
com o jogo 2, as crianças desta dupla, diferentemente do observado com a dupla 1,
compreenderam bem as instruções do jogo. Apenas na 1ª sessão foi necessária, algumas vezes, a
intervenção da pesquisadora para explicar o que o jogo solicitava. Ainda assim, pode-se afirmar
92
que as crianças corresponderam ao que era esperado pelo jogo, ou seja, isolaram as sílabas
iniciais dos nomes das figuras das cartelas e compararam com outras palavras.
Um dado interessante é que, durante o jogo 2, já na 1ª sessão, as crianças dessa dupla
adotaram uma brincadeira de fazer comentários engraçados em relação às palavras chamadas.
Por exemplo, a palavra lida foi “Amarelo”. Uma delas diz, então: “Amarelo? Tem aqui!!
(apontando para a cor da cartela). A palavra lida foi “Galega”, uma delas diz: Tem não, não tem
nenhum galego aqui! Ou como no caso de um exemplo dado anteriormente: “O médico se foi!”,
para dizer que não havia figuras na cartela com o som inicial da palavra chamada.
Tal comportamento parece estar relacionado a um dos elementos apontados por Huizinga
(2001) e Kishimotto (2006) como constitutivo do jogo que é o seu aspecto não sério. Esse aspecto
de não seriedade se relaciona com o envolvimento dos participantes no jogo, manifestado por
meio de risos ou de piadas/ graçinhas presentes nas situações com os jogos nesta dupla.
Em síntese, o jogo 2 foi um jogo importante para as crianças da dupla 2, uma vez que elas
passaram a identificar mais os pares de palavras com os mesmos sons iniciais, ao longo das
sessões, sendo possível perceber desempenhos bem diferentes entre a dupla 1 e a dupla 2 num
mesmo jogo.
JOGO 3- BINGO DE RIMAS
Os resultados apresentados no exame inicial da dupla 2 indicam que os desempenhos na
atividade de identificar palavras rimadas foram medianos (ver atividade 5, no Quadro 2). Deste
modo, seria provável que as crianças apresentassem algumas dificuldades no Bingo de rimas,
pois o jogo solicita a habilidade de isolar os segmentos finais, identificá-los, para em seguida
compará-los a outras palavras semelhantes.
De fato, as crianças da dupla 2 apresentaram certas dificuldades no jogo 3, identificadas
na 1ª sessão, através do comportamento de citar os nomes das figuras das cartelas, isolando as
sílabas iniciais das palavras e não os sons finais, conforme a solicitação feita no jogo. Ou seja, as
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crianças desta dupla, semelhante ao acontecido com a dupla 1, apresentaram dificuldade em
identificar os segmentos sonoros finais das palavras10.
Diante disso, assim como foi observado com a dupla 1, os comportamentos de cansaço
aparecem, porém ficam restritos à 1ª sessão, já que da 2ª sessão em diante, a dupla 2 consegue
fazer avanços e identificar algumas palavras rimadas, ainda que sem demonstrar muita segurança.
Na última sessão, as crianças identificaram algumas rimas, mas como optaram por jogar com
cartelas diferentes, a quantidade de palavras a serem comparadas aumentou. Assim, tornou-se
mais difícil identificar e marcar todas as figuras nas cartelas, o que por sua vez, resultou em certa
frustração, já que as palavras do saquinho acabaram sem que todas as figuras das cartelas fossem
marcadas.
Apesar da dificuldade apontada acima, a dupla não perdeu seu bom humor característico,
dando continuidade, no jogo 3, às brincadeiras, risos e vibrações observadas igualmente nas
sessões com os demais jogos.
O fato das crianças não identificarem figuras na cartela e não responderem durante o jogo
3, também aparece com a dupla 2. Mas, diferentemente do que ocorreu com a dupla 1, este
problema não aumenta ao longo das sessões. Com esta dupla, esse comportamento aparece cinco
vezes na 1ª sessão, não aparece na 2ª sessão e, na 3ª sessão reaparece com freqüência um pouco
menor que na sessão inicial.
Porém, o erro de não considerar a posição que as sílabas ocupam nas palavras esteve
presente em todas as três sessões. Apareceu na 1ª sessão e na 2ª sessão com uma alta freqüência,
diminuindo na 3ª sessão. Vejamos um exemplo:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: CABARÉ (não há na cartela figura correspondente) V - Castelo... Os dois começam com CA! (identificando as sílabas iniciais entre a figura Castelo, presente na cartela, e Cabaré, a palavra lida, valorizando a sílaba inicial e não a rima) L - Cabaré! (repete a palavra) P - Mas não é o som do começo, é o som do final! V - É do fim! L - Cabaré começa com... Maré! (citando uma palavra que não estava na cartela) P - É! Cabaré rima com maré, mas tem aí (na cartela)? L - Não! (D2S2J3)
10 Tal dificuldade também foi revelada no estudo de Leite (2006), com crianças pré-silábicas.
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Como se vê neste exemplo, Vitória traz para o jogo 3 a estratégia de isolar a sílaba inicial
utilizada no jogo anterior, ainda que esta não seja mais adequada para esse jogo. Luciano, por sua
vez, assume um comportamento característico de Vitória no jogo 2, que era o de citar novas
palavras que não estavam na cartela, para combinar com as palavras chamadas. No exemplo
acima, é Luciano que faz isso apropriadamente, ainda que não consiga expressar verbalmente de
modo adequado que se trata do final da palavra e não como a palavra “começa”.
Neste caso, a dupla toma como modelo os comportamentos dos próprios parceiros de
jogo, diferentemente do ocorrido com a dupla 1, em que a influência maior parece ser do adulto
presente na situação. Isto põe em evidencia, novamente a importância da escola em promover
situações de aprendizagens compartilhadas, tal como foi proposto por Vygotsky (1998) e Leal e
Luz (2000), a fim de que o conhecimento seja, de fato, construído e partilhado pelos próprios
envolvidos no processo de aprendizagem.
Observa-se ainda, na mesma sessão do último exemplo dado acima, ou seja, a 2ª sessão,
que Vitória já começa a dar sinais de compreender o que o jogo 3 solicita, buscando isolar o som
final da palavra chamada, tentando fazer combinações com os sons finais das palavras
representadas nas figuras da cartela, ainda sem apresentar total segurança. Vejamos um outro
fragmento da 2ª sessão, em que isso se torna evidente
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: AMOR (há na cartela a figura do computador) V - Amor! (repete a palavra lida) L - Amor! ... ... ... V - Tem não! (diz sem prestar atenção) Não precisa nem contar ó... Quer ver? (Vitória fica impaciente e não deixa o parceiro refletir) Tomada, Computador e Luva! (Cita baixinho os nomes das figuras na cartela) L - Computador, Tomada... Não tem! (ele concorda) P - Nada? Nenhum parecido? (A pesquisadora pergunta diretamente a Vitória, percebendo que ela quer dizer algo) L - Nenhum! V- Eu acho que tem! P - O quê? L - Tomada! (Luciano responde interrompendo) P - Tomada? Tomada e amor terminam iguais? (Ele balança a cabeça positivamente) V – Vê, Computador... Tem dor... E amor... Que também é quase DOR...! (Referindo-se ao som final da palavra). (A pesquisadora confirma a resposta de Vitória com um gesto de cabeça)
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V – Acertei! (risos) V - Já ganhei de tu! (RISOS, Luciano também sorri) (D2S2J3)
É interessante notar que em nenhuma das três sessões com o jogo 3, a dupla 2 identificou
a rima das palavras com base no som da vogal da sílaba final, algo que aparece em outras duplas
investigadas neste estudo. Vale registrar, ainda, que, observando-se o desempenho das crianças
da dupla 2 ao longo das sessões, é possível dizer que este foi acima do esperado, considerando as
habilidades apresentadas no exame inicial. Além disso, se compararmos esta dupla com a dupla
1, no mesmo jogo, nota-se que a 2 apresentou um melhor desempenho. Podemos supor que a
diferença a favor das crianças da dupla 2 se deva aos níveis mais avançados de conhecimentos
que têm sobre a escrita (ambas no nível silábico-qualitativo).
JOGO 4- CONSTRUINDO A TORRE
De acordo com os resultados apresentados pelas crianças da dupla 2 no exame inicial (ver
Quadro 2), é possível perceber que ambas enfrentaram grandes dificuldades com a atividade de
identificação de fonemas iniciais. Com base nesse resultado, pode-se dizer que Vitória
surpreendeu durante o jogo 4.
De fato, no contexto do jogo, e já na 1ª sessão é possível perceber que Vitória parece ser
capaz de isolar e comparar os sons iniciais de algumas palavras, ainda que não consiga de modo
adequado explicitar verbalmente essa ação. Para Luciano, porém, a sílaba inicial é a unidade de
referência para sua reflexão, como veremos no fragmento abaixo:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Vaca-Mola-Circo-Mala) L - MO...MA (isolando as sílabas iniciais dos nomes das figuras mola-mala)...MA...VA (e Mala – Vaca) É Mala e Vaca. L - É... Eu Acertei! (comemora com risos afirmando que acerta, sem ouvir a pesquisadora) P - Vaca e Mala não são parecidas! ... É /v/ e /m/ (enfatizando os fonemas iniciais das palavras) V - Não porque vê... (Vitória tenta responder, mas seu parceiro não permite. Puxa a carta de sua mão impedindo que ela forme novos pares e a pesquisadora continua sua intervenção). P - Não é o sonzinho do A... É o sonzinho bem pequeno do começo. O bem pequenininho do começo!
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V – Vê, eu tenho um aí ó... Eu acertei... Isso é quase com isso (apontando para as figuras Mola e Mala) L - Não é! (sem concordar com o par formado pela parceira) P - E por que são parecidos? (se dirigindo a Vitória) V - Mola e Mala... Os dois começam com MA V - Então eu ganhei! (risos, ela pega uma pecinha para sua torre e seu parceiro não parece convencido) (D2S1J4)
É interessante observar que, como no exemplo acima e ao longo das sessões com o jogo 4,
as crianças apresentaram compreensões distintas diante de um mesmo problema a resolver, ou
seja, identificar palavras que começam com o mesmo sonzinho.
Assim, mesmo com a intervenção da pesquisadora que tenta explicar porque as palavras
Mala e Vaca não formariam um par correto, para Luciano, continua difícil identificar algo menor
do que a sílaba, além da vogal. Para Vitória, a intervenção do adulto parece ter contribuído para
que ela identificasse o par de palavras esperado no jogo. Porém, diante de sua explicação, não é
possível saber ao certo o que motivou sua resposta: se a identificação do fonema inicial /m/, ou se
seu conhecimento sobre o nome da letra M, presente nas duas palavras.
Durante as três sessões essas diferenças se mantêm. Vitória passa a identificar mais os
pares de palavras das cartas-pergunta justificando suas respostas, tomando como base ora os
nomes das letras, ora as sílabas das palavras, sem nunca isolar, explicitamente, os fonemas
iniciais. Já Luciano, parece ficar contrariado com o fato de não acertar no jogo, continuando a
isolar a sílabas inicias das figuras e fazendo pareamentos de palavras como Pato e Laço, como se
vê no fragmento abaixo:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (figuras: Linha-Pato - Laço-Navio) (...) L - Pato com Laço! P - Pato com Laço! (repete o par de palavras enfatizando os fonemas iniciais, e faz um gesto negativo com a cabeça, passando a vez para a outra jogadora) V - Eu sei uma aqui! V – Linha e Laço!... Ganhei mais um! (risos, a pesquisadora confirma a resposta com um gesto afirmativo de cabeça) Ai meu Deus... Eu vou construir a torre! (risos) (D2S2J4)
Outros erros observados nos jogos anteriores continuam presentes no jogo 4. Assim, o
erro de não identificar o fonema inicial, propondo pareamentos que parecem supervalorizar o
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som da vogal na primeira sílaba, aparece uma vez na 1ª sessão, em seguida, aumenta para quatro
vezes na 2ª sessão e diminui para dois erros na última sessão. O erro por não considerar a posição
que a sílaba ocupa nas palavras também está presente. Neste caso, a criança não isola,
necessariamente, as sílabas iniciais das palavras, ela emparelha palavras com base na semelhança
entre as sílabas em qualquer posição. Este problema também foi mais freqüente na 2ª sessão.
Vejamos um exemplo ocorrido na sessão anterior:
Diante da carta pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Cavalo – Xícara – Abacaxi – Avião) V - Esse é igual a esse! (apontando para as figuras Xícara e Abacaxi) Xícara e Abacaxi! P - Abacaxi tem Xi igual no fim, mas é pra procurar o pequenininho do começo! L - Xi! P - É o do começo! L - Errou, errou!!! Pode passar pra mim! P - Não, espere aí. Deixe-a tentar mais uma vez, você também foi duas vezes! P - Abacaxi termina com XI... E xícara começa com XI... Mas é o pedacinho do começo... Os dois têm que ser iguais no inicio! L - Cavalo... CA... XI... A e A! Abacaxi e Avião! Peguei mais um!!!! (risos...) (D2S1J4)
Semelhante ao jogo anterior, o pareamento de palavras sem considerar a posição que a
sílaba ocupa é freqüente no jogo 4 nas três sessões, talvez uma estratégia de sobrevivência para
lidar com um jogo mais difícil. Porém, quando o fonema inicial corresponde à sílaba inicial da
palavra, torna-se mais fácil para Luciano, como se vê no exemplo acima.
Nota-se, ainda, que o fato de Vitória conhecer o nome das letras torna mais fácil para ela
emparelhar as palavras e justificar suas respostas. De modo diferente, Luciano tem a sílaba inicial
das palavras como a unidade de referência de sua análise, o que dificulta a percepção do fonema
e, talvez por esse mesmo motivo, não compreenda nem aceite a resposta da parceira em alguns
casos, como mostra o diálogo abaixo. Vejamos:
Diante da carta pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Vassoura-Girafa-Cadeira-Violão). L - Vassoura! (cita o nome da figura da carta) P - Vassoura com quê? (lembrando a solicitação do jogo para formar pares de palavras) L - Cadeira... Não é... Girafa, não é... Violão também... Nenhum! (citando os nomes das figuras disponíveis)
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P - Nenhum? Tem sim! L - É... (aponta para a figura da cadeira) P - Vassoura e Cadeira? Você acha que começam com o mesmo sonzinho? (dirigindo a pergunta a ambos) V - Eu não acho, não! P - Então, vamos passar pra Vitória responder! L - Errei! (conclui Luciano) V - Esse com esse... (apontando para as figuras Vassoura e Violão) L - VA!... NÃO! (diz um pouco contrariado) P - Violão.../v/ Tem o mesmo sonzinho? L - Tem não! (insiste) V - Tem sim... .Porque todos dois começam com v(vê). L - VA!... Varal! Só varal! (identificando e comparando palavras Vassoura e varal, que têm a mesma silaba inicial, sem concordar com a resposta da parceira). P - Diz a ele o que você disse porque ele não escutou! V – Oh... Violão e Vassoura. Começa os dois com v(vê)! (identificando o nome da letra) L - V(vê)- OLÃO e Va -ssoura!... Tinha que ter Vaca! (ele insiste pensando na sílaba VA) P - Sim, mas todos dois começam com /v/! (confirmando a resposta de Vitória, mas enfatizando o fonema). V - Então eu ganhei! (risos) (D2S1J4)
Mesmo sem conseguir parear corretamente em todas as jogadas, é possível perceber que
Vitória, durante o jogo, começa a compreender o que o jogo solicita. Na verdade, ao longo das
três sessões, as crianças passam a responder mais no jogo, sem deixar de formar pares entre as
figuras propostas na carta-pergunta. Porém, ao compararmos o desempenho entre os membros da
dupla, é possível observar poucos avanços de Luciano. Nota-se que, mesmo na 3ª sessão, ele
ainda tem a sílaba como a menor unidade da palavra, conseguindo raramente identificar pares de
palavras com o mesmo fonema inicial. Já Vitória parece compreender, cada vez mais, o que o
jogo mobiliza, passando a identificar os pares de palavras com maior freqüência.
Vale ressaltar que, embora a atmosfera lúdica e o bom humor das crianças tenham
permanecido neste jogo, Luciano parece um pouco contrariado, já que sua parceira acerta mais do
que ele e, conseqüentemente, faz sua Torre crescer. De fato, a competitividade é um dos aspectos
inerentes ao jogo e nota-se que algumas vezes Luciano grita: “acertei!”, mesmo sem a
confirmação da sua resposta pela pesquisadora.
Tal competitividade também fica evidente quando Vitória não auxilia Luciano de modo
espontâneo, já que isto colocaria em risco a sua vantagem no jogo. Vejamos um exemplo em que
isto ocorre:
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Diante da Carta-Pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho?(Figuras: Tatu-Casa –Copo-Sapo) L-Casa... CA... TA... (isolando mais uma vez os sons iniciais de palavras casa-tatu) P - /k/ e /t/? Tá igual? L - Não é não! L - CO...SA (identificando silabas iniciais de Copo - Sapo) V - Ele não sabe, não! (fazendo pressão para que o parceiro não responda e a pesquisadora passe a vez para ela) P - Espere aí um pouquinho... Ele sabe sim! L - Co...Ca...Sa. (cita novamente as sílabas iniciais de Copo-Casa-Sapo) P - Tu queres ajudar ele?(percebendo a ansiedade de Vitória em responder) V - Ah...Só pra ele ganhar um...Porque ele não tá ganhando... V - Casa é quase igual a esse (apontando para a figura do copo) Copo! P - Por quê?Como você descobriu? V - Vê: Casa... Copo... Começa com CA e CO! P - Tá certo, é o mesmo sonzinho bem pequenininho! V - Tá vendo tu? Só pra te ajudar! (D2S2J4)
4.2.3 DUPLA 3: CAMILLA/ GILVÂNIA
A dupla 3, formada por crianças com idades entre seis e sete anos, ambas com
conhecimentos sobre a escrita no nível silábico-alfabético, cursando o primeiro ano do primeiro
ciclo do Ensino Fundamental, constituiu mais uma dupla homogênea deste estudo.
Diferentemente das crianças das duplas 1 e 2, as crianças da dupla 3 eram muito tímidas,
caladas, demonstrando pouco entusiasmo diante dos jogos.
O diálogo a seguir, ocorrido no início da 3ª sessão com o jogo 1, ilustra o esforço da
pesquisadora, para que as crianças se envolvessem com o jogo proposto. Vejamos:
A pesquisadora apresenta as cartas do jogo e pergunta: P - Como é que joga esse joguinho? G - É pra adivinhar as coisas... (em tom de voz baixo) P - Adivinhar? Que coisas? G - O som! P - Isso! E faz como, hein, Camila? C - É pra adivinhar o desenho! P - Adivinhar, não! Contar quantos pedacinhos tem a palavra. E quem ganha? Uma olha para a outra, mas ninguém responde. A pesquisadora continua: P - A figurinha que... G - Tiver mais pedacinho! P - Isso! Aquele que tiver colocado a palavra maior!
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C - Aí, bota uma aqui... Outra aqui! (apontando para os lados em que as cartinhas ficam na mesa) P - E se for empate? Faz o quê? G - Bota outra.
JOGO 1 - BATALHA DE PALAVRAS
Os desempenhos apresentados pelas crianças da dupla 3 no exame inicial (ver Quadro 2),
indicaram bons resultados nas atividades 1, 2 e 3. Assim, bem como as duas duplas anteriores, as
crianças Camilla e Gilvânia não apresentaram dificuldades em relação ao jogo 1. Elas
compreenderam rapidamente as regras do jogo, e ao longo das sessões, foi registrado apenas um
único tipo de erro, o de segmentar incorretamente a palavras. Tal erro apresentou-se com baixa
freqüência em todas as sessões, e na grande maioria das vezes, ele se manifestou em palavras
monossílabas, ocorrendo também alguns erros na segmentação da palavra leão.
Considerando que tanto Camilla quanto Gilvânia se encontravam numa hipótese de escrita
mais avançada que as duplas anteriores, é interessante notar que este erro ainda persiste, ou seja,
é difícil para as crianças aceitar que uma palavra possa ter apenas um pedacinho.
Como já foi mencionado, o que chama atenção nessa dupla na 1ª sessão com o jogo 1 é o
seu comportamento passivo diante do jogo. Ou seja, elas segmentam as palavras e contam as
sílabas, mas não concluem a jogada. Esperam que a pesquisadora conduza o jogo e não tomam a
iniciativa de arrematar o montinho de cartas, como mostra o exemplo abaixo:
O par de palavras a ser comparado era: MAR/ CADEADO C - MAR (mostrando apenas um dedo) G - CA-DE-A-DO (mostrando quatro dedos. Elas olham para as cartas sem perguntar nem fazer nada, até que a pesquisadora pergunta). P - E agora? G - Quem ganhou foi eu! (diz bem baixinho) (D3S1J1)
A partir da 2ª sessão, as crianças se mostram um pouco mais ativas, comparando as
palavras e arrematando o montinho de cartas com mais autonomia, sem a interferência da
pesquisadora. Na 3ª sessão, as crianças parecem mais à vontade, porém, diferentemente das
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duplas anteriores, conversam muito pouco entre si, não dão risadas ou brincam durante as sessões
com o jogo 1.
Em síntese, transparece um comportamento desinteressado diante do jogo 1, bem distinto
do que vimos acontecer nas duplas 1 e 2, talvez porque este jogo não demande qualquer esforço
ou desafio para as crianças desta dupla.
JOGO 2- BINGO DE SONS INICIAIS
Retomando os resultados apresentados no exame inicial de habilidades fonológicas (ver
Quadro 2), nota-se que Gilvânia apresentou mais facilidade na atividade 4 do que sua parceira,
Camilla, que teve um desempenho regular. Porém, de um modo geral, podemos dizer que as duas
crianças não demonstraram dificuldades durante as três sessões com o jogo 2, ainda que Gilvânia
tenha se mostrado mais ativa durante as sessões. Assim, ela consegue preencher as suas cartelas
nas duas últimas sessões, além de auxiliar sua parceira em algumas jogadas.
Diferentemente do que foi observado com a dupla 1, a dupla 3 conseguiu entender bem as
instruções básicas do jogo, como se vê no diálogo seguinte, antes de iniciarem a 3ª sessão com o
jogo 2:
P - Esse é o jogo dos sons iniciais! C - Eu sei como é esse! P - Como é? G - Esse é o que combina! P - Combina como? G - Rimando! (confunde com o jogo 3) C - Esses nomes (apontando para as palavras do saquinho) pra ver se combina com os outros (das cartelas). P – Isso! Mas, lembrem-se que, nesse joguinho, o som que combina é o som do começo.
Apenas na 1ª sessão foi observada, com maior freqüência, a não marcação das figuras nas
cartelas, sem que houvesse, por parte das crianças, identificação das semelhanças sonoras entre a
palavra chamada e as respectivas figuras presentes nas cartelas. Da 2ª sessão em diante este erro
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desapareceu, indicando melhor desempenho das crianças na identificação de palavras com os
mesmos sons iniciais e ainda, uma familiaridade com o próprio jogo.
Como foi dito, Gilvânia está mais atenta ao jogo, especialmente na 1ª e 2ª sessões, pois
marca figuras tanto em sua cartela, como também indica figuras na cartela de sua parceira.
Vejamos alguns exemplos em que isto ocorreu:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: COFRE (há nas cartelas as figuras Coração e Cobra)G - Coração! (marca a figura na sua cartela) C - Chuveiro, Picolé, Baleia, Cobra e Jacaré (citando os nomes das figuras de sua cartela)11. G - Marca a Cobra! (indicando a figura a ser marcada na cartela de Camilla) (D3S2J2) A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: IOIÔ (havia a figura da Igreja em uma das cartelas) (Neste momento, cada uma lê as cartelas em voz mais baixa) P - Ioiô.... (repete a palavra chamada) C - Nada! (sem prestar muita atenção) G - Tem.... Igreja! (aponta a figura que está na cartela de sua parceira). P - Ioiô... Igreja... Tá igual? (Camila faz um gesto afirmativo com a cabeça). Ela ajudou! (D3S2J2)
Na 3ª sessão, Camilla se apresenta mais atenta, comparando e identificando mais palavras
com sons iniciais iguais. Porém, praticamente, observa-se que não há diálogo entre as crianças.
Há momentos em que Gilvânia identifica a palavra, marcando silenciosamente a figura na cartela.
Vejamos:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: TECLADO (na cartela tem a figura do Telefone) C - Cola, Balão, Jarro, Galinha, Mala, Pá. (citando os nomes das figuras da cartela) Gilvania olha para a pesquisadora e pega uma fichinha. Ela aguarda a sua parceira terminar de citar os nomes da cartela e marca na sua cartela a figura telefone sem dizer nada. P - Como tu descobrisses? G - Porque tá igual! P - E o que tá igual?
11 Durante as sessões com os jogos de Bingo (jogos 1 e 2), Camilla costuma citar em voz alta todos os nomes das figuras da sua cartela. Nota-se que esse procedimento contribui para que Gilvânia apresente sinais de cansaço e impaciência, durante as sessões com estes jogos.
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G - O começo! (Camilla apenas ouve o diálogo e também não faz qualquer comentário) (D3S3J2)
O erro de supervalorizar o som da vogal na sílaba esteve presente apenas na 1ª sessão em
baixa freqüência. Vejamos um exemplo onde este erro parece ocorrer.
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: PIANO (não há na cartela figura correspondente) C - Pia! (diz uma palavra que não está na cartela, sem olhar as figuras de sua cartela) P - Tem que procurar uma figura que comece com o mesmo pedaço. Tem aí? (apontando para a cartela) C - Não! Ilha, Lata, Casa Vassoura, Escova... Não tem! (cita os nomes das figuras de sua cartela enquanto Gilvânia observa) G - Tem! Ilha! P - Ilha começa igual a Piano? (perguntando a Camilla) G - Não! C - Não, meu Deus... Sabe ler não, é?!! P – Por que você achou que piano era parecido com ilha? G - Começam com a mesma letra. P – E Piano e Ilha começam com a mesma letra? (Novamente a pesquisadora intervém repetindo as palavras e, dirigindo a pergunta para a dupla, enfatizando as sílabas iniciais das palavras) C - Não! Porque Piano começa com R-E que eu vi! (Camilla se refere à palavra escrita, retirada do saco) E a pesquisadora nota e questiona novamente: P - Piano (começa) com R-E? (Apresentando a Camilla a palavra escrita) C - EITA!...É P-I! (Gilvânia não faz qualquer comentário) (D3S1J2)
Vale notar que o extrato acima ilustra um dos raros momentos em que uma das crianças
faz um comentário, ainda que pouco amistoso, em relação ao seu parceiro de jogo. Nota-se,
ainda, um comportamento, já observado nas duplas anteriores: a introdução de uma outra palavra
que não está presente nas cartelas (como a palavra Pia citada por Camilla). Isto parece reforçar a
idéia do jogo didático como um recurso que possibilita à criança reflexões mais espontâneas
sobre a língua.
O jogo 2, assim como o jogo 1, transcorre sem entusiasmo entre os jogadores. Também
diferentemente do percurso das duplas 1 e 2, após a familiarização da dupla 3 com o jogo,
registra-se uma freqüência mínima de erros que são sempre retificados pelas crianças, com a
intervenção da pesquisadora. Tal evidência parece corroborar com os resultados dos estudos de
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Morais (2005) e Leite (2006), onde crianças com conhecimentos mais avançados de escrita
tendem a isolar com mais facilidade as sílabas iniciais das palavras do que outras, com
conhecimentos menos avançados.
JOGO 3- BINGO DE RIMAS
Analisando os resultados apresentados pelas crianças da dupla 3 no exame inicial, é
possível perceber que tanto Camilla, quanto Gilvânia apresentaram desempenhos medianos na
atividade 5, acertando metade dos itens da referida atividade.
De fato, este jogo trouxe dificuldades para esta dupla, já que, freqüentemente, nas três
sessões com o jogo 3, as crianças não identificavam nas cartelas palavras que rimavam com as
palavras chamadas, ainda que, algumas vezes, Gilvânia identificasse adequadamente semelhanças
entre estas palavras e segmentos sonoros finais de novas palavras que, ela propunha, mas que não
faziam parte do jogo.
Apesar disso, pode-se afirmar que, ao longo das sessões, as crianças parecem ir
compreendendo o que é necessário fazer no jogo, ainda que nem sempre consigam isolar e
explicitar verbalmente os segmentos finais das palavras que associam. Tal dificuldade também
foi revelada no estudo de Leite (2006), porém, apenas entre as crianças com conhecimentos
iniciais sobre a escrita (pré-silábicos). O fragmento abaixo mostra que isto também pode ocorrer
com crianças no nível silábico-alfabético, como é o caso desta dupla. Vejamos:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: ROLA P -Vamos ver agora alguma coisa que rime com Rola! C - Menino, Martelo, Saia, Raiz, Sol e Vela! (citando os nomes das figuras na cartela) G - Martelo, Saia, Raiz, Sol e Vela (imitando a parceira) G - Tem.... Vela! (possivelmente associando as sílabas finais de Rola e Vela) P - Rola e Vela combinam? (Camilla presta atenção) G - Combina! C - Combina é?! (Camilla pergunta surpresa) P - Diz a ela por quê!(dirigindo-se a Gilvânia) G - Vela! P - Sim, mas o que é que elas combinam? Diz a ela! G - Me esqueci! P - Rola combina o quê com vela?
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G - O fim! P - E qual é o fim? C - Vai!!!(Camilla apressando a parceira) (Gilvânia dá com os ombros) P - Vela... Rola! É o quê? G - Rima igual! (D3S1J3)
Em outros casos, ainda que isolem e identifiquem a semelhança sonora entre a palavra
chamada e a palavra presente em sua cartela, as crianças erram por não considerar a posição que
a sílaba ocupa na palavra. Tal dificuldade está presente com baixa freqüência na 1ª sessão,
aumentando um pouco na 2ª e 3ª sessões. Vejamos um exemplo:
A pesquisadora retira do saco e lê apalavra: BOLACHA C - Abelha, Jacaré, Caracol, Dinheiro (citando os nomes das figuras) G - Cadeira, Pente e Cola (citando os nomes das figuras) P - A palavra que eu disse foi Bolacha! G - Tem! (apenas apontando para a figura Cola na própria cartela) P - Qual é? G - Cola! P - Bolacha e Cola? (enfatizando o som final das palavras) G - É que bolacha também tem LA! P - Tem... Mas o LA é no meio de Bo-la-cha! E o de Co-la é no fim! Realmente, todos dois têm o LA, mas é pra combinar fim com fim, tá? (Ela aceita a explicação, mas não se mostra muito satisfeita. Passamos para a chamada de outra palavra do saquinho) (D3S2J3)
Diante do exemplo acima, é possível afirmar que identificar as semelhanças sonoras entre
as palavras e, ao mesmo tempo, comparar as posições das mesmas nas palavras constitui uma
atividade difícil até para as crianças com nível mais avançado sobre a escrita, principalmente se
não dispõem da palavra por escrito, como recurso para auxiliar.
O procedimento adotado por Camilla, no jogo 2, de citar os nomes das figuras de sua
cartela a cada jogada, se repetiu no jogo 3, causando em sua parceira momentos de cansaço e
desânimo. Estes sinais puderam ser observados através dos comportamentos de Gilvânia, de olhar
para o teto, ao redor da sala, chegando a abaixar a cabeça sobre a mesa, aguardando a sua
parceira terminar a “leitura” da sua cartela.
A quase ausência de comunicação entre as crianças e a falta de entusiasmo das mesmas,
estiveram presentes durante todas as sessões do jogo. Assim, como seria de se esperar, a etapa
final de reflexão das palavras não marcadas nas cartelas ficou por conta apenas da pesquisadora.
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Vale ressaltar, ainda, que tal comportamento da dupla 3, reduziu também as possibilidades de
intervenções da pesquisadora durante o jogo.
Por fim, analisando o desempenho da dupla 3 ao longo das sessões com o Bingo de rimas
percebe-se que este foi um jogo difícil para elas. A esse respeito, Aquino (2007) sugere que
propostas de trabalho mais sistemático envolvendo pequenos textos que explorem a rima podem
facilitar às crianças o isolamento, detecção e produção de rimas, com mais naturalidade.
JOGO 4- CONSTRUINDO A TORRE
Os resultados apresentados no exame inicial de habilidades fonológicas (Quadro 2),
indicam que as crianças da dupla 3 tiveram um baixo desempenho na atividade 6, que solicitava a
identificação de palavras com o mesmo fonema inicial. Com base nisso, o jogo 4 era previsto
como um desafio para essas crianças.
Erros observados com as duplas 1 e 2 neste jogo também foram encontrados com a dupla
3. Assim foi o caso do erro de supervalorizar o som da vogal na sílaba inicial ao invés do fonema
inicial. A maior freqüência desse erro foi na 1ª sessão, diminuindo sua freqüência na 2ª e 3ª
sessões. O erro de não considerar a posição que a sílaba (ou o fonema) ocupa na palavra, está
presente em todas as sessões com o jogo 4. Na 1ª e 2ª sessões esse erro aparece com baixa
freqüência , enquanto que na 2ª sessão, ele aumenta um pouco.
Vale destacar, porém, que embora haja uma dificuldade evidente de perceber o fonema
inicial das palavras, as crianças passam a discutir mais sobre as respostas dadas, demonstrando
maior envolvimento com este jogo do que em relação aos jogos anteriores. Vejamos:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (figuras: Carro-Copo-Laço-Roda) G - Esse com esse (apontando para as figuras Roda e Copo, possivelmente, valorizando o som da vogal O nas duas palavras) P - Você acha que parece Roda e Copo? Tu achas, Camilla? C - Não! Acho não, porque Roda começa com R-O e Copo com C-O! P - Não é Roda e Copo! Qual seria, então, o mesmo pedacinho do começo! (passando a vez para Camilla responder) C - O do começo é o primeiro?
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P - É! (tempo de Camilla) C - Nada! (indicando que não é possível formar um par com as figuras) P - Nada? Tem? Diz aí! (passando novamente a vez para Gilvânia responder) G - Carro e Copo! P - Carro e Copo, começam com o mesmo sonzinho! Certinho! C - Começa?! (em tom de dúvida sem aceitar o par formado por sua parceira) P - Sim! É o sonzinho bem pequeno! Carro /k/, Copo /k/! (enfatizando os fonemas iniciais): C - Copo começa com C-O! (negando com o balançar a cabeça) P - E Carro? C - C-A! P - E o sonzinho primeiro não é o mesmo? Veja /k/ e /k/! C - Não! (insiste) P - Não é o pedaço inteiro, mas o sonzinho bem pequeno do começo é o mesmo! (D3S1J4)
Por outro lado, também foram registrados muitos casos de uma recusa total, por parte de
Camilla, em responder a carta-pergunta, talvez sinalizando sua dificuldade em lidar com a
possibilidade de perder no jogo12. Assim, nota-se que, especialmente na 2ª sessão, ela preferiu
não arriscar qualquer resposta, mantendo-se em silêncio em várias jogadas. Esse comportamento,
inclusive, já parecia dar indícios na 1ª sessão, já que Camilla levava um longo tempo para dar
uma resposta, levando sua parceira a reclamar: “Ela demora muito!”
Na última sessão, porém, registram-se alguns momentos em que Camilla se mostra mais
segura para arriscar uma resposta, como se vê nos dois exemplos seguintes:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Gato – Pena - Guitarra-Uva) G - Isso parece com um violão! (Comentando sobre a figura Guitarra) P - Mas não é violão, é guitarra! G-............ Como começa isso? (questionando sobre a figura Guitarra) P - É guitarra /g/! G - Esses dois não combinam não, né? (apontando as figuras Pena e Guitarra) P - Você tem que dizer os nomes das figuras! G - Pena e Guitarra! P - Você acha que começam iguais? Pena e guitarra? G - Não! (E volta a observar a carta. Camila está um pouco inquieta. Ela parece saber a resposta) G - Isso é o que mesmo? (novamente perguntando sobre a figura Guitarra) P- Guitarra!
12 Segundo Vygotsky, Freud e Kishimoto (apud Kishimoto, 2004), o elemento do desprazer também se faz presente nas situações de jogo, quando as crianças, diante do esforço que fazem para corresponder às expectativas do jogo ou da brincadeira, podem experimentar situações bastante dolorosas. Neste sentido, o jogo se constitui também em um instrumento que dá oportunidade para a criança de se deparar e, ao mesmo tempo, tentar superar essas dificuldades.
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G - Guitarra é com Guê, I? (parecendo querer saber como a palavra Guitarra é escrita) P - Mas a gente está procurando o som, né? C - Eu sei! (afirma com segurança) Gato e Guitarra! P - Como tu descobrisse? C - Pelo primeiro som! (D3S3J4)
Conforme evidenciado em outras pesquisas Morais (2005) Cavalcanti; Costa e Morais,
(2004) Leite, (2006) (apud, LEITE, 2006) é extremamente difícil para as crianças verbalizar
fonemas. Assim, mesmo quando identificam pares de palavras de modo correto, a referência
parece ser a palavra escrita. Vejamos um exemplo:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Balão-Casa -Livro-Cobra) C - Cobra e Livro? (Camilla se adianta e forma um par sem estar na sua vez) P - Espere aí, deixe que ela que responda primeiro! G - É Casa e Cobra. (identificando o par com o mesmo fonema) P - Como tu descobrisses? G - Porque Cobra começa com C e casa começa com C! (D3S3J4)
Finalizando, é importante frisar, mais uma vez, que, apesar das dificuldades inerentes à
habilidade fonológica mobilizada pelo jogo 4, as crianças da dupla 3 se envolvem mais com este
jogo, ainda que o clima de risos e brincadeiras, comumente presente nas situações de jogos, não
se manifeste com esta dupla.
Segundo Borba (2006), infelizmente, a ausência do lúdico e do prazer parece estar
associada ao avanço nos níveis escolares (séries ou ciclos). Ou seja, gradualmente priorizam-se
atividades e comportamentos que remetem a modelos pedagógicos tradicionais, retirando-se, do
espaço escolar ou das crianças, toda a alegria e motivação que lhes são inerentes, com propostas
que não estimulam o prazer e a curiosidade em aprender. Neste sentido, é possível hipotetizar que
o comportamento desta dupla, diante dos jogos, reflita o contexto de pouco entusiasmo que
observamos em muitas salas de aula. No entanto, o maior envolvimento demonstrado pelas
crianças com o jogo 4 reforça a possibilidade de que o jogo didático ou atividades lúdicas
funcionem como recursos importantes para modificar a forma das crianças se relacionarem com
os conhecimentos.
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4.2.4 DUPLA 4: DEYVSON/ VALÉRIA
A dupla 4, assim como a dupla 3, era formada por crianças cursando o primeiro ano do
primeiro ciclo do Ensino Fundamental, com idades entre seis e sete anos, porém com níveis de
conhecimento sobre a escrita diferenciados: pré-silábico e silábico-quantitativo.
De um modo geral, o comportamento das crianças desta dupla se caracterizou de forma
semelhante às crianças da dupla 3, isto é, mostravam-se quietas e sem realizar muitas trocas
verbais, ainda que, ao longo das sessões, tenham se revelado mais participativas do que a dupla
anterior.
JOGO 1-BATALHA DE PALAVRAS
Retomando os resultados apresentados pelas crianças no exame inicial de habilidades
fonológicas (ver Quadro 2) é possível perceber que, apesar das diferenças entre os níveis de
concepção de escrita, ambas apresentaram bons desempenhos nas atividades de segmentação,
contagem e comparação de palavras.
Observas-se que Deyvson (a criança na hipótese pré-silábica), assume uma postura mais
ativa durante o jogo, iniciando a segmentação dos pares de palavras, comparando e finalizando as
jogadas. É o que ilustra o exemplo abaixo:
O par de palavras a ser segmentado era: PORCO/ ELEFANTE D- Por-co... E-le-fan-te! (Mostrando dois dedos numa mão e quatro dedinhos na outra mão). P - Vamos deixar a colega contar também! (interferindo para que Valéria possa participar) V - E-le-fan-te! (Mostrando quatro dedinhos) D - Por-co! Ganhou ela! P - Por que você ganhou? (dirigindo-se para Valéria) V - Tem o mesmo som! P - Tem mesmo? Por-co...E-le-fan-te! Tem o mesmo som? (Deyvson faz o gesto negativo com a cabeça, sem concordar com a explicação da parceira) D - Tem mais som! P - Exatamente! Tem mais som! (D4S3J2)
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Valéria, porém, não se mostra ausente do jogo. Muitas vezes é possível observar que ela
também segmenta adequadamente e compara as palavras, silenciosamente. Deste modo, as
crianças da dupla 4 apresentaram poucos erros no jogo 1. Assim, tal como observado nas duplas
anteriores, o erro de segmentação incorreta da palavra foi o mais freqüente, ao longo das três
sessões. Na maior parte das vezes as palavras segmentadas incorretamente eram monossílabas,
embora as crianças também segmentassem, equivocadamente, palavras com mais de uma sílaba,
como a palavra leão.
Outro erro presente em algumas sessões com o jogo 1 é o de segmentação correta da
palavra, com erro na representação da quantidade de sílabas. Este erro aparece apenas uma vez na
2ª e 3ª sessões. Vejamos:
O par de palavras a ser comparado era: JACARÉ/ COMPUTADOR D - Com-pu-ta-dor ... Já-ca-ré! (segmenta as palavras das duas cartelas). V - Já-ca-ré... Quatro! (Mostrando quatro dedos) P - Já-ca-ré... Com-pu-ta-dor! (mostrando três dedos para jacaré e quatro para computador) D - Quem ganhou foi eu! (D4S2J1)
Talvez, o comportamento descrito acima possa ser incluído na categoria de “falso erro”,
pois, oralmente, Valéria segmenta corretamente a palavra, aumentando a quantidade de sílabas
que mostra nos dedos, quem sabe numa tentativa de arrematar o montinho de cartas. Na mesma
sessão, ela parece tentar levar vantagem no jogo, quando segmenta a palavra Picolé da seguinte
forma: “Pi-co-lé-é”, mostrando na mão quatro dedinhos.
Conforme o esperado, a Batalha de palavras foi, portanto, um jogo fácil para as crianças,
assim como para as duplas anteriores. Porém, embora elas não tenham dado qualquer sinal de
cansaço ou tenham expressado vontade de parar de jogar, não se instala entre as crianças um
clima de brincadeira, semelhante ao observado nas duplas 1 e 2.
JOGO 2- BINGO DE SONS INICIAIS
Os resultados do exame inicial (Quadro 2) mostram que as crianças da dupla 4
apresentaram desempenhos bem diferentes na atividade de identificar palavras com sons iniciais
iguais. Deyvson teve ótimo resultado na atividade 4, enquanto Valéria obteve um desempenho
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bastante inferior. Deste modo, a expectativa era de que Valéria encontrasse maiores dificuldades,
durante o jogo 2 do que seu parceiro. De modo surpreendente isto não ocorreu. Observamos que
as crianças compreenderam facilmente as instruções do jogo 2 e desde a 1ª sessão. Tanto
Deyvson, quanto Valéria isolam as sílabas iniciais das palavras chamadas, confrontando com as
palavras da cartela. Vejamos um exemplo:
Palavra lida: CHURRASCO (a figura correspondente na cartela é Chupeta) P - Tem alguma coisa aí, Valéria? D - CHU! (Deyvson isola a silaba inicial e observa a cartela da colega). V - Chupeta! (identificando a palavra correspondente) (D4S2J2)
Os erros de não considerar a posição que as sílabas ocupam nas palavras e de
supervalorizar o som da vogal, na sílaba inicial, aparecem apenas na última sessão, uma vez e três
vezes, respectivamente.
A baixa interação verbal entre as crianças também foi evidente ao longo das sessões,
muito embora este tenha sido um jogo fácil para a dupla, que identifica as palavras das cartelas,
correspondentes às palavras chamadas, praticamente sem erros.
JOGO 3- BINGO DE RIMAS
A partir dos resultados apresentados no exame inicial de habilidades fonológicas (ver
Quadro 2), nota-se que as crianças da dupla 4 apresentaram muita dificuldade de identificar
palavras rimadas, especialmente Valéria, que não consegue acertar nenhum item da atividade 5.
De fato, ao longo das sessões com o jogo 3, observa-se que, em vários momentos, as
crianças não marcam nas cartelas as figuras correspondentes às palavras chamadas. Assim, em
nenhuma das sessões elas conseguem preencher toda a cartela, ainda que, aparentemente,
compreendam o que o jogo solicita, como mostra o diálogo abaixo:
P - Estão lembrados desse joguinho? (As crianças balançam as cabeças afirmativamente). P - Então como é que joga? Esse é pra descobrir o quê? D - É pra ver... o som!
112
P - Que som? Do começo ou do fim? D – Do fim! P - Muito bem! (D4S3J3)
Talvez a ausência de comunicação e entrosamento entre os jogadores durante as sessões
possa ter contribuído para o baixo desempenho da dupla, observado durante este jogo. Nota-se
que Valéria, ao longo das sessões com o jogo, resiste, quando convidada a auxiliar seu parceiro.
Ou seja, ignora os pedidos da pesquisadora para olhar as figuras da cartela de Deyvson, dizendo,
rapidamente, que não há figuras para serem marcadas. Em outros momentos do jogo, percebe-se,
pela sua fisionomia, que ela identifica palavras que estão na cartela dele, mas não o ajuda. Isto
pode ser confirmado a partir conversa entre a dupla e a pesquisadora ao final da 3ª sessão, em que
Valéria deixa claro que sabia as rimas de algumas palavras que Deyvson não havia marcado em
sua cartela, durante o jogo. Vejamos o que diz Valéria:
P - Eu chamei uma coisa que rimava com cobra! V - Eu já ia dizer, mas eu não disse porque ele sabe! P-Então, Sobra rima com quê? V - Cobra! P - E Rola, rima com quê? Diz a ele! V – Bola
Com mostra o fragmento acima, ao final das sessões, no momento em que a pesquisadora
retoma algumas palavras chamadas e não marcadas na cartela ou propõe uma reflexão sobre as
figuras marcadas incorretamente, nota-se que as duas crianças conseguem identificar muitas
figuras que não haviam sido identificadas durante o jogo. Isto talvez se deva ao fato de que as
reflexões, após a partida, eram mais direcionadas pela pesquisadora. Ou seja, a pesquisadora
indicava a cartela onde elas deveriam procurar a figura correspondente à palavra chamada, já que
esta dupla optou por jogar com cartelas diferentes desde a 2ª sessão.
Vejamos um fragmento ao final da 2ª sessão, que ilustra o que foi dito acima.
P - A palavra Molho que eu disse, rimava com quê daqui? (pedindo que Deyvson observe a cartela de Valéria) D - ... Olho! P - Ovelha rimava com quê daqui? (indicando a cartela de Deyvson) Valéria aponta para a figura da Abelha! P - Caminhão rimava com quê daqui?
113
D - Pão! (identificando a figura na sua cartela) P - Lençol rimava com quê? (indicando a cartela a ser observada) D - Caracol! (D4S2J3)
JOGO 4- CONSTRUINDO TORRE
Os resultados do exame inicial das crianças da dupla 4 revelam que sua performance na
atividade de identificação de palavras com o mesmo fonema foi extremamente baixa. Assim, é
provável que a dupla encontre muita dificuldade neste jogo.
Como esperado, as crianças apresentaram alta freqüência de erros, durante as sessões com
o jogo 4, propondo pareamentos de palavras como “Balão e Livro”, “Cobra e Balão” , sem
conseguir propor os pares esperados, seguindo a instrução de identificar palavras com o mesmo
“sonzinho” , no começo da palavra que, no caso desta carta-pergunta, seria Casa e Cobra.
O erro de supervalorizar o som da vogal na sílaba, desconsiderando o fonema inicial, está
presente nas três sessões com o jogo 4. Na 1ª sessão ele aparece três vezes, aumentando sua
freqüência para quatro vezes na 2ª e 3ª sessões. Vejamos:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Balão -Mola –Rato – Boca) V - Balão com Rato! (Valéria enfatiza o som das vogais das sílabas iniciais) P - Deyvson, você acha que tá igual? (Ele nega com o gesto da cabeça) P - Só o A, né, mas antes da gente falar o A em Balão, tem um sonzinho bem pequenininho que não está igual ao de Rato! (diz enfatizando os fonemas iniciais das palavras Balão e Rato) D - Ela falou Balão com Rato, foi? P - Foi! D - É Balão com Boca! (A pesquisadora confirma a resposta) (D4S2J4)
Como mostra o fragmento acima, Deyvson começa a acertar os pares de palavras a partir
da 2ª sessão, ainda que nem sempre explicite, com segurança, o que motivou suas respostas,
como também se vê no trecho abaixo.
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Gato – Pena -Uva - Guitarra)
114
É a vez de Valéria responder, mas ela leva um tempo grande para dar a resposta. D - Isso é Guitarra, é?(A pesquisadora confirma com a cabeça) V - Pena com Gato! (possivelmente, valorizando o som da vogal A nas silabas) P - Pena e Gato o sonzinho do começo, tá igual?(enfatizando os fonemas iniciais das palavras) (Deyvson balança a cabeça, negativamente) D - Gato com Guitarra! P - Como tu descobristes? D - Tem o mesmo sonzinho do final! P - É do começo, rapaz! (risos) (D4S3J4)
Vale notar que, neste jogo, muitas das justificativas registradas com as duplas 1 e 2,
estavam diretamente ligadas aos nomes das letras. Deyvson, entretanto, não justifica
espontaneamente suas respostas e, ao ser questionado, não apresenta justificativas nesta direção.
Apesar de alguns acertos, identificar os fonemas iniciais é algo difícil para as crianças da
dupla 4, como foi também para as duplas 1 e 2 e Camilla da dupla 3. Tais resultados reafirmam
os estudos de Morais (2006), que indicam que crianças em processo de alfabetização encontram
mais dificuldades em isolar os fonemas iniciais das palavras do que isolar as sílabas iniciais.
4.2.5 DUPLA 5: GUSTAVO/ MAYARA
A dupla 5, assim como as duplas 3 e 4, era formada por crianças com idades entre seis e
sete anos, com conhecimentos sobre a escrita nos níveis silábico-qualitativo e silábico-alfabético,
ambas cursando o primeiro ano do primeiro ciclo do Ensino Fundamental.
Diferentemente do que foi observado com as duplas 3 e 4, as crianças da dupla 5 se
comunicavam com facilidade, bem como demonstraram bom humor e descontração durante as
sessões com os jogos.
JOGO 1- BATALHA DE PALAVRAS
De acordo com os resultados do exame inicial de habilidades fonológicas (Quadro 2), as
crianças Gustavo e Mayara apresentaram bons desempenhos nas atividades de segmentação,
115
contagem e comparação das palavras. Assim, a partir dos desempenhos das crianças nas referidas
atividades, não era esperado que a dupla 5 apresentasse dificuldades durante o jogo 1.
O jogo Batalha de palavras foi, de fato, facilmente compreendido pelas crianças, ainda
que mais uma vez constate-se o erro de segmentação incorreta das palavras monossílabas,
apresentado também pelas duplas anteriores. Na 1ª sessão este erro ocorreu cinco vezes, na 2ª
sessão, sua freqüência cai para quatro vezes, diminuindo para três vezes, na última sessão. Tal
erro tem sido recorrente entre as duplas investigadas neste estudo, o que indica a dificuldade das
crianças perceberem, num primeiro momento, que uma palavra pode ser representada apenas por
uma sílaba.
Uma característica notável nesta dupla é o entrosamento entre as crianças e a atenção em
relação às jogadas do parceiro. Assim, eles se apresentavam sempre atentos aos erros revelados
durante o jogo e um parceiro corrigia o outro sem constrangimento, sendo raros os momentos em
que a pesquisadora precisou intervir.
No extrato a seguir, observa-se Mayara, por exemplo, identificando a segmentação
equivocada do parceiro de maneira natural e descontraída, assumindo, já na 2ª sessão, um
comportamento semelhante ao do adulto nas intervenções feitas na 1a sessão. Vejamos:
O par de palavras a ser segmentado era: SOL / BOLA G - Sol-u! (mostrando dois dedos) M - Não é assim... (Mayara intervém rindo) P - É como? M - Sol (mostrando um dedinho) P - E Bola? M - Bo-la! (mostrando dois dedos e pegando as cartas) (D5S2J1)
Outro comportamento, presente ao longo das três sessões com o jogo 1, é o erro de
segmentação correta da palavra mas com representação errada da quantidade de sílabas. O erro
aparece na 1ª sessão quatro vezes e, na ultima sessão, aparece apenas uma vez. Vejamos alguns
exemplos:
O par de palavras a ser comparado era: REI/ ELEFANTE G - Re-i!(mostrando dois dedos) M – E- le- fan –te (mostrando cinco dedos) G - É quatro! (corrigindo a parceira) P - Conta aí direito, Mayara! G - E-le-fan-te! (É Gustavo quem conta e mostra quatro dedos)
116
P - E Rei... É quanto? G - Dois! (errando novamente) P - Hum, Hum! (negando com um gesto de cabeça). É Rei! (refaz e mostra apenas um dedo) (D5S2J1)
Como foi observado com a dupla 1 e a dupla 2, o “falso erro” também esteve presente
com a dupla 5. Nota-se que Gustavo na tentativa de arrematar o montinho de cartas, tenta
aumentar o tamanho da palavra. Vejamos:
O par de palavras a ser segmentado era: PORTA / PORCO G - Porquinho! (risos) P – É Porco! (corrigindo) G - Por-co! (mostrando dois dedos). M - Por-ta! (Mostrando também dois dedos) Empate! (D5S3J1)
Em resumo, pode-se afirmar que, neste jogo, as duas crianças assumiram, de forma
equilibrada, posturas ativas, segmentando, contando e comparando palavras com entusiasmo.
JOGO 2- BINGO DE SONS INICIAIS
Retomando os resultados apresentados no exame inicial de habilidades fonológicas, é
possível perceber uma diferença marcante nos desempenhos de Gustavo e Mayara. Assim,
considerando que Gustavo apresentou um desempenho muito superior ao de sua parceira na
atividade de identificar palavras com sílaba inicial iguais, seria esperado que ele assumisse uma
postura mais ativa durante o jogo.
Porém, durante as sessões com o jogo 2, Mayara surpreende, mostrando-se plenamente
capaz de isolar as sílabas iniciais das palavras chamadas e compará-las com os nomes das figuras
na cartela.
Na verdade, são raros os erros evidenciados durante as três sessões com o jogo 2. O fato
das crianças identificarem pares de palavras, considerando apenas o som da vogal na sílaba
inicial, aparece apenas uma vez na 1ª sessão e mais uma vez na última sessão. São registrados,
ainda, alguns poucos casos (apenas duas vezes) de palavras chamadas que ficaram sem resposta e
somente na 1ª sessão.
117
Novamente chama a atenção, a facilidade de diálogo e entrosamento entre as crianças
durante o jogo, comportamento este, bastante diferente do que foi observado com as duplas 3 e 4.
O exemplo a seguir ilustra como os olhares e gestos entre os parceiros influenciaram as
decisões a serem tomadas durante o jogo. Vejamos:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: PALITO (apenas na cartela de Gustavo poderia ser feita a correspondência com a figura Pá) G - PA! (isolando a silaba inicial da palavra lida) M - Copo, Pé, Pipa, Lápis, Macaco, Bola! (citando os nomes das figuras de sua cartela) M - É Palito, é? (perguntando sobre a palavra chamada) G-Palito... (Gustavo repete a palavra chamada e aponta para a figura da PÁ na sua cartela, e sem marcar, dirige o olhar para Mayara). P-.Não começam iguais, Pá e Palito? (faz a pergunta porque percebe os olhares) M - Não! É Pé (citando uma figura de sua cartela) P - Pá não começa igual a Palito, não? (pergunta novamente, dirigindo a pergunta para Gustavo. Ele balança a cabeça, num gesto positivo) M - Balão... Palito! (apontando para a palavra Balão. Talvez esteja supervalorizando o som da vogal na sílaba e, não a sílaba inicial completa) P - Pá começa igual a Palito, Gustavo? (enfatizando as sílabas iniciais) G - Pa de Pato e Pa de Palito! (Confirma e marca na cartela a figura Pá) (D5S3J2)
Nota-se um nítido intercâmbio entre os jogadores, mostrando a necessidade de Gustavo de
ter aprovação de sua parceira para a jogada que queria empreender.
Em síntese, o jogo 2, assim como o jogo 1, foi bastante divertido para as crianças e
embora não tenham sido difíceis, trouxeram desafios interessantes para a dupla.
JOGO 3 - BINGO DE RIMAS
De acordo com os resultados do exame inicial das habilidades fonológicas é possível
observar desempenhos bastante discrepantes entre as crianças da dupla 5 na atividade de
identificação de palavras rimadas.
Como se observa no Quadro 2, Gustavo mais uma vez apresenta bem mais facilidade do
que Mayara na identificação de rimas, sendo, portanto, esperado um comportamento mais ativo
de sua parte durante o jogo 3. De fato, Gustavo parece apresentar melhor desempenho na
118
identificação das rimas do que sua parceira, já na primeira sessão com o jogo 3. Mayara, por sua
vez, apresenta-se um pouco insegura nos pareamentos, assumindo, inicialmente, uma posição de
passividade nas primeiras sessões, superando as dificuldades a partir da segunda sessão.
Como foi observado nas duplas anteriores, foi registrado na dupla 5 o comportamento de
não marcar as figuras nas cartelas, por não identificá-las durante o jogo. Isto ocorreu três vezes,
na 1ª sessão e quatro vezes na última. Observou-se ainda, no jogo 3, a tendência de identificar a
rima apenas a partir da vogal na sílaba final e não com base nos segmentos maiores da palavra.
Este tipo de resposta aparece na 2ª sessão com alta freqüência (cinco vezes) e diminui de
freqüência na última sessão, para três vezes. Vejamos um exemplo em que, após a intervenção
da pesquisadora Mayara repensa sua resposta:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: PRAÇA G - Não! (diz rapidamente) P - E na dela tem? G - Não! (olha rápido para a cartela da parceira) P - Tem Mayara? M - Tem Boneca! P- Praça e Boneca? M – Praça e Boneca terminam com A! P - Sim, mas Chuva também termina com A e calça também termina com A! Mas tem que ter alguma coisa pra rimar! P - Encontraram alguma coisa? Praça não rima com nada daí? M - Aqui ó, achei!!! Praça... Calça! P - Calça! (D5S2J3)
Um outro comportamento que persistiu ao longo das três sessões resultou de uma certa
confusão das crianças em relação à posição dos sons nas palavras, , observado também nas duplas
anteriores. Neste erro, as crianças chegam a identificar semelhanças sonoras entre as palavras
(sílabas), sem, porém, considerar a posição que elas ocupam nas palavras, se no início ou no fim.
Vejamos um exemplo:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: ALICATE M - Boneca, Chuva, Barba! (Mayara cita os nomes das figuras da sua cartela) P - Bigode! (corrige o nome da figura nomeada de “barba” por Mayara) M - Alicate... Chuva! (formando um par) P - Tá igual? Alicate e Chuva?
119
M - A senhora não disse que chuva começa com A? (ela se refere a uma intervenção, onde a pesquisadora esclarece que muitas palavras na cartela terminam com A) P - Eu disse que Chuva termina com A, mas Alicate não termina com A! Começa com A! M - NÃO! (concluindo que na sua cartela não há figura correspondente à palavra chamada) (D5S2J3)
Como se vê no exemplo acima, do ponto de vista das crianças, parece ser preciso certo
tempo para identificar, com segurança o que é início e o que é final de uma palavra, e
conseqüentemente, quando um som está no início ou no fim da palavra.
Além da dificuldade descrita acima, o exemplo a seguir ilustra, novamente, como as
crianças apresentam uma tendência de parear as palavras com base nas vogais finais e não em
segmentos maiores da palavra. Vejamos mais um exemplo:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: PRAIA M - Mola, Boneca, Calça, Repolho! ... É Mola!(apontando para a figura Mola, indicando ser a palavra correspondente a palavra chamada) G - Não! P - Você acha que Mola rima com Praia? (pergunta diretamente a Gustavo, a partir do par formado por Mayara) G – Praia e Mola! Não! P – Por que você acha que está igual? O que eles têm de iguais?(se dirige a Mayara) M - A voz! P - A voz de quem? Praia e Mola... Tá igual? M - É... Praia... Mola! (enfatizando os sons finais das vogais) P - Os dois terminam iguais? Com quê? M - Com A! (Após a resposta dada, a criança marca na cartela a figura Mola) (D5S2J3)
É possível compreender que quando Mayara diz a voz, ela pode estar tentando dizer o
som, e como a sonoridade da vogal é mais marcante, ela insiste e marca na cartela a figura Mola.
Analisando, portanto, os desempenhos das crianças no jogo 3, é possível notar que,
apesar de algumas dificuldades iniciais já superadas, ao final do jogo 3, as duas crianças
conseguem identificar palavras rimadas. Vejamos alguns exemplos:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: MOLHO M - Anzol... (citando o nome de uma das figuras da cartela) Não! G - Repolho! (identificando a palavra correspondente)
120
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: DENTE M - Dente e Bigode! É igual?(questionando sobre o par formado) G - Não! P - Tá igual?(dirigindo a pergunta a Mayara) M - Não! P - E tu? Será que ela tem alguma coisa aí que rime com Dente? (Pergunta dirigida a Gustavo) M - Vê aí, vai, por favor! (Pedindo a Gustavo que observe sua cartela. Gustavo aponta e tenta marcar a figura Corrente na cartela da parceira) M- Ei, peraí, eu marco! (D5S2J3) A Pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: TRAÇO M- Laço! (marcando a figura na cartela) (A pesquisadora confirma com o gesto de balançar a cabeça) (D5S3J3)
Vale destacar que as crianças da dupla 5 mostram-se bastante concentradas no jogo,
refletindo com interesse sobre os sons das palavras e estabelecendo comparações. Tal
concentração não impede que se divirtam, criando brincadeiras a partir das palavras do próprio
jogo, dando sinais claros de prazer e alegria, durante todas as sessões. Vejamos alguns exemplos
dessa expressão:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: FINO M - Bigode... Fino. Bigode fino! (Mayara repete as duas palavras dando a entender que fino é uma característica do bigode. Ambos riem e balançam a cabeça negativamente, indicando que não há figura na cartela) (D5S2J3) A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: SOBRA G - Jacaré! P - Jacaré com Sobra? G - Tô doido, tô doido! (balançando a cabeça) (D5S3J3) A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: DENTE G - Jacaré! Jacaré tem dente! (risos) P - Tem ou não tem uma palavra que rime com dente? M – Menina, Carroça, Laço, Banheiro! Não (riem , citando os nomes das figuras da cartela) (D5S3J3)
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JOGO 4 - CONSTRUINDO A TORRE
Com base nos resultados apresentados no exame inicial, é possível perceber que as
crianças da dupla 5 apresentaram um baixo desempenho na atividade de identificar palavras com
o mesmo fonema inicial. Deste modo, é esperado que ambas enfrentem problemas durante o jogo
4.
De fato, nota-se, especialmente, na 1ª sessão, que as crianças parecem formar pares de
palavras de modo aleatório, como mostra o extrato abaixo:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com os mesmos sonzinhos? (Figuras: Girafa-Peteca-Sacola – Geladeira)
G - Mayara vai ganhar! (Diz Gustavo tentando prever o resultado do jogo) M - Peteca e Sacola! P –Peteca... /p/ Sacola... /s/.Começam iguais, Gustavo? (A pesquisadora questiona enfatizando o som inicial do fonema. Gustavo apenas nega, com um balançar de cabeça) P - Vê aí qual é! Dá uma olhadinha aí! (dirigindo-se a Gustavo) M - Se ele errar é eu, né? (diz preocupada com a seqüência do jogo) P - Não, você já respondeu... e passou pra ele! G - ... ... Peteca e Girafa! (forma um novo par, talvez identificando os sons finais das palavras) P - Peteca... Girafa... Começam iguais? Por quê? Peteca e Girafa... (Os dois jogadores negam com um balançar de cabeça, mas ninguém responde) P - Aqui seria Girafa e Geladeira... Que têm o mesmo sonzinho bem pequeno /dЗ/ M - Era o que eu tava pensando... P - É... Mas você não disse... Você tem que dizer bem forte: Eu sei! (D5S1J4)
Na verdade, o jogo 4 parece ser um jogo difícil para todas as duplas analisadas até aqui.
Porém, assim como as demais duplas, as crianças da dupla 5 conseguem identificar pares de
palavras corretamente em algumas jogadas e, apesar de não apresentarem, ainda, justificativas
para suas respostas, estas não parecem ser meramente fruto do acaso. Vejamos alguns exemplos
ocorridos na 2a sessão:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho?(Figuras: Linha – Pato - Laço – Navio) G - Linha e Laço! P - Por quê? G - Porque tá igual! (risos)
122
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho?(Figuras: Rede – Nó - Roda – Sol) M - Rede com Roda! P - Muito bem! E como tu descobriste? M - Descobrindo! (risos) (D5S2J4)
Possivelmente, as intervenções feitas pela pesquisadora na primeira sessão podem ter
colaborado para o melhor desempenho observado a partir da segunda sessão. Vejamos mais um
exemplo de uma dessas intervenções, em que a pesquisadora explicita os fonemas iniciais das
palavras:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes começando com o mesmo sonzinho? (Figuras: Colar -Ralo – Régua – Faca) M - Colar, Ralo, Régua e Faca. É Faca e Colar! P - Faca e Colar... Tem o sonzinho igual?(enfatizando os fonemas iniciais das palavras) G - Não! P - Mais uma chance... Diz outra! (olhando para Mayara) M - Ralo e Régua! (formando o par esperado) P - Ralo e Régua, Gustavo, começam com o mesmo sonzinho? G - Não! P - Começa sim! Veja, é Ralo e Régua! (enfatizando os sons do fonema /R/ nas duas palavras) (D5S1J4)
Vimos ainda que as crianças da dupla 5 não mencionaram os nomes das letras nas suas
explicações, diferentemente das duplas anteriores, que produziam justificativas baseadas nos
nomes das letras das palavras pareadas.
Também é possível observar, especialmente na 1ª sessão, que as várias tentativas das
crianças para identificar os fonemas nas palavras parecem cansá-los. Assim, Mayara, por
exemplo, reclama diretamente de seu parceiro, com expressões do tipo: “Vai logo, Gustavo,
ô...”; “Que demora, Gustavo!”; “E aí, Gustavo, encontrou?”. Em outros momentos, observam-
se comportamentos de inquietação nas crianças, olham para o teto, brincam com as pecinhas do
jogo que estão sobre a mesa, embora não desistam de jogar. Nas sessões seguintes, as respostas
das crianças acontecem de forma mais rápida, o que dá mais dinamismo ao jogo.
123
Conforme já comentado outras vezes, observa-se, neste jogo, que alguns pareamentos
feitos pelas crianças ocorrem tendo como referência a semelhança entre as vogais da sílaba inicial
como mostra o fragmento abaixo:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Violão - Girafa-Vassoura-Cadeira) (...) G - Violão e Girafa... VI e GI! (Gustavo antes balbucia as sílabas das palavras correspondentes às figuras da cartela). P – É, realmente, eles têm o som do I igual, mas, é um sonzinho pequeno. O do começo! Tem outro sonzinho bem pequenininho que é o do começo: é Vassoura e Violão! Porque todos dois começam com /v/. (D5S1J4)
Apesar dos problemas apontados acima, observamos alguns progressos das crianças ao
longo do jogo, acertando em algumas jogadas, os pares de palavras com o mesmo fonema inicial,
ainda que não verbalizassem os fonemas, nem justificando suas respostas. Assim, é possível dizer
que ambas se esforçaram na superação das dificuldades iniciais, diminuindo a freqüência dos
erros, ao longo das três sessões.
4.2.6 DUPLA 6 : ARTHUR / JOYCE
A dupla 6, assim como as duplas 4 e 5, era formada por crianças com idades entre seis e
sete anos, com níveis distintos de conceituação da escrita: nível silábico-alfabético e alfabético,
ambas cursando o primeiro ano do primeiro ciclo do Ensino Fundamental.
Semelhante ao que foi observado com as duplas 3 e 4, o comportamento das crianças se
caracterizou por timidez e dificuldade de comunicação entre elas, apresentando-se muito quietas
e silenciosas durante todas as sessões.
124
JOGO 1- BATALHA DE PALAVRAS
Os resultados apresentados no exame inicial das habilidades fonológicas revelaram que as
crianças Arthur e Joyce tiveram ótimos desempenhos nas atividades de segmentação, contagem e
comparação de palavras (ver Quadro 2). Assim, era esperado que o jogo 1 fosse um jogo
extremamente fácil para a dupla 6.
O jogo 1, de fato, não trouxe qualquer dificuldade para as crianças, sendo registrado um
único tipo de erro: o de segmentação incorreta de palavras monossílabas13, que apareceu apenas
duas vezes na 1ª sessão e mais duas vezes, na 2ª. Vale dizer, ainda, que, é Arthur quem comete
esse tipo de erro, já que sua parceira, desde o início, apresenta-se bastante segura no momento da
segmentação e contagem dos pedacinhos das palavras.
É possível notar, no exemplo abaixo, que tanto Joyce como Arthur segmentam e contam
as palavras silenciosamente, porém sem apresentar a facilidade de comunicação observada nas
duplas 1, 2 e 5.
O par de palavras a ser comparado era: BORBOLETA/ SOL A – (Ambos mexem os lábios em silêncio, supostamente segmentando as palavras e Arthur diz:)... Ela ganhou! (Joyce recolhe as cartas da mesa em silêncio) (D6S1J1)
Apesar da falta de comunicação entre os jogadores, as crianças parecem assumir posturas
um pouco mais ativas a partir da 2ª sessão revelando segurança e facilidade em relação às
habilidades mobilizadas pelo jogo 1. Deste modo, os dois passam a comparar as palavras e definir
as jogadas, sem a necessidade da pesquisadora estar constantemente “puxando” o jogo, como
ocorreu na 1ª sessão. Vejamos alguns exemplos que ilustram o que foi dito acima:
O par de palavras a ser comparado era: VENTILADOR/ FLOR J- Ven-ti-la-dor.... Flor (Joyce segmenta e conta as duas palavras, mostrando numa mão quatro dedos e na outra apenas um) A - Eu ganhei! (finaliza) O par de palavras a ser comparado era: PIRULITO/ PICOLÉ
13 Note que este foi um erro que apareceu em todas as duplas, com crianças de diferentes níveis de conceituação sobre a escrita. Assim, ao que parece, é difícil para as crianças conceber que uma palavra pode ter apenas uma sílaba.
125
J – Pi-ru-li-to (mostrando quatro dedos) PI-CO-LÉ (mostrando três dedos). EU! (diz tomando as cartas para si). (D6S2J1)
JOGO 2- BINGO DE SONS INICIAIS
Considerando que a dupla 6 apresenta um excelente desempenho no exame inicial das
habilidades fonológicas na atividade 4 (ver Quadro 2), é provável que o jogo 2 também seja
muito fácil para essas crianças.
Realmente, foram raros os erros cometidos por elas durante o jogo 2. Observamos que o
comportamento de não responder foi o único presente durante as três sessões com o jogo. Ele
apareceu apenas uma vez na 1ª sessão, aumentando para quatro vezes, na última sessão,
possivelmente porque, nesta ocasião, as crianças optaram por jogar com cartelas diferentes,
aumentando, assim, a quantidade de palavras para serem marcadas.
Vale ressaltar, ainda, que ao final da última partida, quando a pesquisadora retoma
algumas palavras que não foram identificadas, as crianças da dupla 6 conseguem rever com
facilidade as figuras não marcadas na cartela durante o jogo, como mostra o fragmento abaixo:
P – Na cartela dela ela marcou Estrela. Não teve nenhuma palavra que comece com o mesmo som na tua cartela, Artur? A - Escova! (identificando a figura correspondente na sua cartela) P - E na tua cartela não tinha nada que começava igual a Teclado? (citando outra palavra chamada) A - Televisão! P - E tu não tinhas nada que começasse igual a Amarelo?(dirigindo a pergunta a Joyce) (Joyce apenas balança a cabeça afirmativamente, apontando para a figura Abacate na sua cartela). P - E outra palavra que começa igual a Médico?(direcionando a pergunta a Joyce) J - Melão!
JOGO 3- BINGO DE RIMAS
Ainda que Arthur não tenha revelado grandes dificuldades na atividade 5 do exame
inicial, acertando quatro itens, é possível supor que Joyce, o único sujeito alfabético do estudo e
126
que também acerta todos os itens da atividade, assuma uma postura mais ativa no jogo, em
relação ao seu parceiro,
Na verdade, ao longo das três sessões, a superioridade de Joyce no jogo é visível, ainda
que seja difícil afirmar que ela assuma um comportamento “ativo” durante as sessões, já que
reflete silenciosamente sobre as palavras chamadas, falando muito pouco, limitando-se à
comunicação por meio de gestos e olhares, o que não facilitava também as intervenções da
pesquisadora. Assim, embora, ao longo das sessões com o jogo 3, Joyce apresente-se mais segura
em suas respostas, seu comportamento extremamente silencioso faz com que não compartilhe
seus conhecimentos com o parceiro, não estimulando para que ele avance em suas reflexões sobre
os sons finais das palavras.
O fragmento a seguir ilustra um dos poucos momentos em que Joyce explicita
verbalmente o que estava pensando, mostrando que, de fato, consegue adequadamente isolar os
segmentos finais das palavras e compará-los. Vejamos:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: DENTE J - Chocolate! (Joyce vai logo pegando uma fichinha para marcar a figura Chocolate na cartela. Observa-se que Arthur não está muito convencido da correspondência entre as palavras) P - Você acha que Dente rima com Chocolate? (dirigindo a pergunta a Arthur) (Ele apenas balança negativamente a cabeça) P - Joyce você disse que Dente rima com Chocolate? Explica pra ele porque você acha que rimam. J - É que no final de Chocolate tem T-E e no final de Dente também tem T-E!
(Arthur parece, agora, convencido. Balança a cabeça em sinal positivo e marca também a figura Chocolate na sua cartela) (D6S1J3)
Nota-se que Joyce rima as palavras (Dente e Chocolate), isolando a sílaba final Te, e não
o segmento maior ENTE, conforme era esperado, quando as figuras das palavras Pente e
Corrente foram propostas e apresentadas em outras cartelas do jogo. Isto quer dizer que,
inicialmente, acreditava-se que no caso da cartela desta partida, nenhuma figura seria marcada, já
que se supunha que os segmentos supra-segmentais finais das palavras seriam mais facilmente
identificados no jogo. Observa-se, porém, que para Joyce (uma criança com nível alfabético),
assim como para crianças de outras duplas, nem sempre esse foi o caso. Ou seja, neste jogo, é
127
possível notar que, por diversas vezes, as crianças combinavam palavras isolando apenas as suas
sílabas finais ou até mesmo as vogais das últimas sílabas das palavras.
Ainda, assim como comentado em relação ao jogo 2, o comportamento de não responder
aumenta na 3ª sessão, possivelmente pelo mesmo motivo apontado no jogo 2. Isto é, as crianças
optam por jogarem com cartelas diferentes nesta sessão, o que, conseqüentemente, aumenta a
quantidade de palavras para serem comparadas e as possibilidades das crianças deixarem de
marcar algumas delas.
Registra-se, ainda, do mesmo modo que as duplas anteriores, que as crianças da dupla 6
mostram-se surpresas quando a pesquisadora informa que as palavras do saquinho acabaram e
eles não completaram as suas cartelas. Porém, neste caso, identificam, com facilidade, as palavras
não marcadas na etapa de reflexão, após o término do jogo.
Por fim, vale ressaltar as tentativas da pesquisadora de estimular a expressão das crianças
e a troca de conhecimentos relativos ao SEA entre os parceiros, conforme podemos ver nos
fragmentos abaixo:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: SOBRA A - Não! (diz sem observar com atenção a sua cartela) P - É no fim viu, gente? Não tem nada aí que rime com Sobra? A - Bola! (provavelmente, Arthur faz o pareamento entre Sobra e Bola considerando apenas o som A da vogal final presente nas duas palavras). P - Bola e Sobra? (Enfatizando as sílabas finais das palavras). P - Tem, Joyce? (Nota-se que ela nega apenas com um gesto de cabeça inicialmente, mas espera um pouco e, logo em seguida, sem dizer nada, marca na sua cartela a figura da Zebra) P – Fale o nome da figura! (Neste momento, Arthur presta atenção e não fala nada) J – Zebra! (marcando a figura presente na sua cartela) P - Zebra, ela marcou. E tu, achasses alguma?(enfatizando a sílaba final da palavra) A - É qual palavra? (referindo-se a palavra chamada) P - Sobra! (repete a palavra retirada do saquinho) P - Tem na dele?(chamando Joyce a auxiliá-lo) A - Tem não! (diz sem parecer prestar atenção) P - Tem na dele? (dirigindo a pergunta a Joyce mais uma vez) J - Tem, Cobra! (marcando na cartela do parceiro sem fazer qualquer comentário extra) P - Sobra, não rima com Cobra, não? (a pesquisadora repete as palavras e Arthur apenas confirma com um balançar de cabeça, fazendo um ar de riso) (D6S2J3)
128
Vejamos um outro exemplo:
A pesquisadora retira do saquinho e lê a palavra: MOLHO (Joyce observa a sua cartela e faz o gesto negativo de balançar a cabeça, indicando que não encontrou uma figura correspondente) A - Mola! (observa a sua cartela, emparelhando Molho – Mola, talvez identificando a sílaba MO nas duas palavras, ainda que os sons das sílabas nestas palavras não sejam idênticos ou, possivelmente, identifica o fonema inicial) P - Mola e Molho? P - Por quê? (ele faz um gesto de levantar os ombros e permanece em silêncio. Joyce também permanece em silêncio) (D6S2J3)
Como podemos ver acima, as crianças da dupla 6 não trocam, nem explicitam seus
conhecimentos, parecendo não compartilhar do mesmo jogo. Estão em dupla, mas jogam de
forma isolada, sem que sejam observados gestos, olhares, ou palavras que demonstrem estarem
numa situação de interação.
JOGO 4- CONSTRUINDO A TORRE
O resultado do exame inicial mostrou que as crianças da dupla 6 apresentaram
desempenhos diferentes na atividade de identificação do fonema inicial. Enquanto Joyce mostrou
um desempenho regular, seu parceiro acertou apenas um item nesta atividade (ver Quadro 2).
Assim, o jogo 4 deve trazer desafios para as duas crianças da dupla.
Na verdade, foram observadas algumas dificuldades ao longo das três sessões neste jogo,
apresentadas, quase exclusivamente, por Arthur. Porém, a partir da 3ª sessão, o próprio Arthur
apresenta um nítido progresso em sua habilidade de identificar palavras com o mesmo fonema
inicial. No caso de Joyce, foram observados pouquíssimos erros de pareamento entre as palavras.
Como se viu ao longo das sessões com o jogo 4, bem como nos jogos anteriores, não se
instala um clima lúdico durante os encontros com risos, conversas e brincadeiras, tão comuns nas
duplas 1, 2, e 5. Apesar disso, a dupla 6 não deu sinais de cansaço ou desconforto durante as
sessões, como foi o caso da dupla 3. Nota-se apenas que Arthur, em alguns momentos, revela sua
frustração diante da dificuldade de identificar os fonemas iniciais nas palavras, através de gestos
como passar a mão sobre o cabelo, com uma fisionomia preocupada ou contrariada. Tal
129
sentimento, possivelmente, se agrava pelo fato de sua parceira acertar bem mais que ele durante o
jogo. Vejamos alguns exemplos em que isto foi observado:
(É a vez de Arthur puxar a carta-pergunta. Neste momento, Joyce se aproxima mais do colega, para poder observar melhor as figuras). Carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com os mesmos sonzinhos? (Figuras: Bota-Suco-Sopa-Peixe) (Nota-se que Arthur leva um tempo para dar a resposta e em seguida responde apenas apontando para as figuras Bota e Peixe, presentes na carta-pergunta) P – Bota e Peixe. Você acha que começa igual? (enfatizando os fonemas iniciais das palavras) (Ele responde afirmativamente com a cabeça) P - E você, Joyce, acha que Bota -Peixe começam iguais? (ela nega com um gesto de balançar a cabeça) P – Então, qual é a resposta?(dirigindo-se para Joyce) J - Suco-Sopa! (a pesquisadora apenas balança a cabeça, positivamente) (Arthur faz um trejeito com o rosto e um balançar de cabeça, parecendo desapontado por não ter acertado) (D6S1J4)
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com os mesmos sonzinhos? (Figuras: Bola - Pia - Mala - Moto) A -.... ... ... Esse e esse! (Apontando para as figuras Moto - Bola da carta-pergunta) P - Diga o nome! A - Moto e Bola! (enfatizando o som das vogais nas palavras) P - Moto e Bola? Estão começando igual?! (ele encolhe os ombros) P - É essa a resposta? (Pergunta diretamente a Joyce) (Ela nega com o gesto de balançar a cabeça) J- É Moto e Mala! P - Por quê? J - Porque tem a mesma letrinha... Esse e esse! (apontando novamente para as figuras Moto e Mala) P - Olha só Arthur... Moto /m/ Mala /m/! (enfatizado os fonemas iniciais das palavras. Arthur, em silêncio, parece aceitar a explicação) (D6S3J4)
Apesar da dificuldade enfrentada por Arthur no jogo, é importante destacar que ele
consegue algumas vezes encontrar o par de palavras esperado, após a intervenção da
pesquisadora, como mostra o fragmento abaixo, extraído já na 1a sessão:
130
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho?(Figuras: Cama-Vaca-Bota-Vela) A - Esses dois! (apontando para as figuras Vela e Bota. Possivelmente, Arthur identificou as semelhanças sonoras das vogais finais das palavras, pois enfatiza os sons das vogais) P - Vela e Bota têm o mesmo sonzinho bem pequeno da palavra? (A pesquisadora repete o par de palavras enfatizando os fonemas iniciais /v/ /b/) A – Tem! (insiste) P - Vela e Bota têm qual som igual? A - Os dois tão iguais apontando para as duas figuras. P - Veja: Vela /v/ e Bota /b/ têm o sonzinho do começo iguais?(Arthur apenas balança negativamente a cabeça) A –Vela/Vaca (indica o par esperado, apenas apontando as figuras). (Joyce presta atenção em silêncio, e confirma com a cabeça) (D6S1J4)
Assim como se verificou com outras duplas, encontramos alguns erros já apontados
anteriormente no jogo 4. Nos exemplos abaixo podemos observar o erro de supervalorização do
som da vogal na sílaba inicial, desconsiderando o fonema inicial da palavra. Neste caso, as
crianças, seguindo a instrução da pesquisadora de encontrar o “sonzinho” bem pequeno que
começa a palavra, respondem tomando como base o som da vogal na sílaba inicial e não o
primeiro fonema da palavra.
As crianças estão diante da seguinte carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Cavalo-Abacaxi-Avião-Xícara) (É a vez de Arthur): A – Cavalo e Abacaxi! P - O que tem igual? Cavalo e Abacaxi começam iguais? A - Aqui é o A e aqui também! (Apontando para a figura do Cavalo e em seguida a do Abacaxi) P -Veja, Cavalo começa com A? CA-valo? (repete a palavra enfatizando a sílaba inicial. Ele balança negativamente a cabeça) A - Avião – Abacaxi (propondo o par esperado) (D6S1J4)
Outro comportamento presente nas três sessões com o jogo 4, ainda que com baixa
freqüência (duas vezes na 1a sessão, diminuindo nas sessões seguintes), é resultado de certa
confusão sobre a posição dos sons nas palavras. Ou seja, as crianças identificam sílabas
semelhantes entre as palavras, mas sem se importar com a solicitação do jogo, deixando de
131
atentar para o fonema do começo das palavras. Por exemplo, na 2ª sessão Joyce propõe o par
Copo e Sapo, possivelmente considerando a sílaba final (PO).
No caso específico desta dupla, apesar da pequena comunicação entre os parceiros, e da
ausência do componente lúdico no jogo, foi possível observar progressos nas crianças no jogo 4.
Nota-se, ao longo das sessões, um melhor envolvimento com o jogo, especialmente na última
sessão, quando começam a falar um pouco mais, justificando algumas de suas respostas. Além
disso, a partir da 2a sessão, Joyce parece se posicionar mais diante das respostas de seu parceiro,
assumindo uma postura mais ativa no jogo, conforme seria esperado diante do resultado do
exame inicial.
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Balão-Boca-Mola-Rato) A - ... ... ... Esse e esse! (Apontando para as figuras Mola e Boca) P - Mola e Boca? É isso, Joyce? J - Não! P - Diz aí! J - Balão e Boca! (D6S2J4)
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho (Figuras: Laço-Rato - Rei -Pipa) J - Rato- Rei! P - Como tu descobrisse? J - Porque tem o primeiro sonzinho igual. É de Rato e Rei! ! (D6S3J4)
Como já foi dito no início da análise do jogo 4, é possível observar um grande progresso
de Arthur na 3ª sessão, embora Joyce se mostre mais consciente de suas respostas, apresentando
justificativas para os pares de palavras formados. Porém, vale notar que Arthur também passa a
justificar suas respostas na 3ª sessão, ainda que numa freqüência menor do que a sua parceira.
Vejamos:
Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho? (Figuras: Balão - Casa-Livro-Cobra) A - Esses dois! (Arthur aponta para as figuras Balão e Casa) P - Esses dois qual? Qual é o nome? A - Balão e Casa!
132
P - Balão e casa! !(enfatizando os fonemas iniciais das palavras). Os dois têm o sonzinho do A, mas não começam iguais! J - Casa e Cobra! P – Isso! Como tu descobriste? J-Porque tem o C(cê) e C(cê)! (identificando letras iniciais das palavras) Diante da carta-pergunta: Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o mesmo sonzinho?(Figuras: Gato – Pena - Guitarra- Uva) (Arthur leva um tempo para dar a resposta e responde apenas apontando as figuras na carta-pergunta) P- Tem que dizer o nome! (aponta as figuras Gato e Guitarra) A- Gato e Guitarra! P- E como você descobriu? A- Aqui tem G e aqui também! (D6S3J4)
É interessante notar que seguindo os resultados dos trabalhos de Leite, (2006) e Morais
(2005), as crianças de níveis silábico-alfabéticos ou alfabéticos, quando atendem adequadamente
a solicitação de parear palavras com fonemas iniciais idênticos, baseiam sua resposta na
identificação das letras no começo das palavras, sem explicitar verbalmente os fonemas
correspondentes a essas letras. Vale salientar, ainda, que tal tipo de justificativa foi também
encontrada em uma criança em nível conceitual de escrita silábico-qualitativo (ver Vitória da
dupla 2, no jogo 4).
A seguir, será descrito e analisado o exame final de avaliação das habilidades fonológicas,
bem como as atividades de escrita, sendo os resultados deste exame confrontados com o exame
inicial, realizado antes das sessões com os jogos.
4.3 Analisando o exame final: Atividades de escrita e atividades de consciência fonológica
4.3.1 Os níveis de escrita
Conforme o que estava previsto, ao final das sessões com os jogos de análise fonológica,
respeitando-se o intervalo de uma semana, todas as crianças realizaram novas atividades de
escrita de palavras (ditado mudo), e atividades para avaliação de suas habilidades fonológicas.
A tarefa do ditado mudo foi semelhante à atividade do exame inicial, apenas com o
acréscimo de quatro figuras dentro do mesmo campo semântico, ou seja, as crianças foram
133
solicitadas a escrever o nome de dez figuras no exame final ao invés de seis figuras como no
exame inicial.
As atividades de análise fonológica realizadas ao final das sessões com os jogos, também
foram semelhantes às atividades do exame inicial. Porém, foram aplicadas numa única sessão
com cada criança, pois estas já apresentavam condições de realizar as atividades com maior
rapidez.
Como já foi dito anteriormente, o presente estudo não se caracterizou como um estudo
típico de treinamento em consciência fonológica. No entanto, consideramos importante avaliar as
crianças após as sessões de jogos, tendo em vista que o esperado após as sessões com os jogos
seria encontrar uma evolução nas habilidades fonológicas das crianças e, possivelmente, um
avanço em relação aos seus conhecimentos sobre a escrita.
O Quadro 3, abaixo, apresenta o perfil das crianças em relação ao desenvolvimento da
escrita nos exames inicial e final.
Quadro 3 - Classificação dos sujeitos quanto aos níveis de escrita nos exames inicial e final14
14 Nota - Devido ao avanço das crianças nos níveis de conhecimento sobre a escrita, a classificação das duplas no momento do exame inicial, em homogêneas e heterogêneas, não se manteve no exame final.
DUPLAS CRIANÇAS
NÍVEIS DE ESCRITA Exame inicial
NÍVEIS DE ESCRITA Exame final
Rayane Pré-silábico Silábico-alfabético D1
Lucas Pré-silábico Silábico-qualitativo
Luciano Silábico-qualitativo Silábico-alfabético D2
Vitória Silábico-qualitativo Silábico - alfabético
Camilla
Silábico-alfabético Alfabético D3
Gilvania
Silábico-alfabético Alfabético
Deyvson Pré-silábico Alfabético
D4
Valéria
Silábico-quantitativo Silábico-alfabético
Gustavo
Silábico-qualitativo Silábico-alfabético D5
Mayara Silábico-alfabético Alfabético
Arthur Silábico-alfabético Alfabético
D6
Joyce Alfabético Alfabético
134
Os resultados expostos no Quadro 3, acima, confirmam o progresso esperado: todas as
crianças avançaram em suas hipóteses de escrita. Destaca-se, por exemplo, o fato de no exame
final não haver mais criança alguma no nível pré-silábico de escrita, considerando que no início
do estudo havia três crianças pré-silábicas, o equivalente a 25% da amostra. Além disso,
enquanto no exame inicial havia apenas um sujeito alfabético, no exame final encontramos seis
crianças no nível alfabético de escrita, ou seja, 50% dos participantes do estudo. Nota-se ainda o
caso de crianças como Rayane e Deyvson (crianças das duplas 1 e 4, respectivamente), ambos
pré-silábicos antes das sessões de jogos, passando para os níveis silábico-alfabético e alfabético
ao final das sessões.
Assim, os níveis de escrita apresentados no Quadro 3, acima, parecem revelar a
importância das reflexões fonológicas para o processo de apropriação da escrita, como já
apontado em estudos de treinamento (BRADLEY e BRYANT, 1983; CAPOVILLA e
CAPOVILLA, 2004 e CARDOSO-MARTINS, 1995).
4.3.2 Exame final das habilidades fonológicas
De modo semelhante, esperava-se que ao final das sessões de jogos, o exame das
habilidades fonológicas revelasse um progresso em relação ao desempenho demonstrado no
exame inicial.
O procedimento utilizado para a aplicação do exame final, bem como os critérios de pontuação
adotados nas atividades foram os mesmos utilizados no exame inicial. Deste modo, a quantidade
máxima de acertos, em cada atividade, foi de seis pontos. O Quadro 4 abaixo apresenta o número
de acertos das crianças em cada atividade realizada, antes e após as sessões de jogos.
135
Quadro 4: Resultados dos exames inicial e final das habilidades fonológicas e dos níveis de escrita
O total de pontos obtidos nas atividades realizadas no exame final revela, de modo geral,
um grande progresso no desempenho das crianças em relação às habilidades fonológicas.
Podemos notar que quase todas elas obtiveram no exame final um total de acertos superior ou
muito próximo a 30 pontos, o que pode ser considerado um bom índice de desempenho nas
Níveis de escrita
Ativ 1
Segmentação da palavra em
sílabas
Ativ 2
Contagem de sílabas
Ativ 3
Comparação de tamanho de palavras
Ativ 4
Identf. Silaba inicial
Ativ 5
Identif. Rimas
Ativ 6
Identif. Fonema inicial
Total de acertos
Duplas/ Crianças
EI EF EI EF EI EF EI EF EI EF EI EF EI EF EI EF
Rayane P-S S-ALF
5 6 5 6 5 6 1 6 0 5 0 4 16 33
D1
Lucas P-S S-QL
5 6 6 5 5 6 1 4 0 6 0 1 17 28
Luciano S-
QL
S-ALF
5 6 5 6 4 6 6 6 4 4 0 4 24 32 D2
Vitória S-
QL
S-ALF
6 5 6 6 6 6 2 5 4 6 2 5 26 33
Camilla S-
ALF
ALF
4 5 5 5 5 6 3 6 3 5 1 2 21 29
D3
Gilvania S-
ALF
ALF 6 5 5 6 5 6 5 5 3 5 2 6 26 33
Deyvson P-S ALF
6 6 6 4 4 6 6 6 2 3 1 2 25 27
D4 Valeria S-
QT
S-ALF
4 5 5 6 6 6 2 6 0 2 1 2 18 27
Gustavo S-
QL
S-ALF
6 5 6 6 5 6 6 6 5 5 2 3 30 31
D5
Mayara S-
ALF
ALF
5 5 3 3 5 5 2 3 1 3 1 1 22 23
Arthur
S-
ALF
ALF
5 5 6 5 6 6 5 6 4 6 1 4 27 32
D6
Joyce ALF ALF 6 6 6 6 6 6 6 6 6 6 4 6 34 36
136
tarefas. Nota-se, ainda, que Joyce consegue acertar todos os itens nas seis atividades de
habilidades fonológicas avaliadas.
Em muitos casos o progresso nas habilidades fonológicas é nítido como, por exemplo,
ocorreu na dupla 1. Apenas em poucos casos tal progresso é muito reduzido, como pode ser
constatado nos casos de Deyvson, Gustavo e Mayara.
Uma análise mais detalhada da evolução das crianças nas diferentes habilidades
fonológicas avaliadas reforça o dado, observado no exame inicial, de que os melhores
desempenhos estão nas três primeiras atividades propostas no exame, com muitas crianças
acertando todos os itens nas atividades de segmentação, contagem e comparação de palavras.
Alguns dados qualitativos merecem ser comentados com respeito à evolução apontada
acima. Em relação à atividade 3, por exemplo, que solicitava a comparação do tamanho de
palavras, um dos itens propunha a comparação das palavras MICROFONE e BORBOLETA com
a mesma quantidade de sílabas. Durante o exame inicial, algumas crianças apenas contavam as
sílabas de uma das palavras, dando em seguida a resposta sem, necessariamente, comparar com a
outra palavra. Já no exame final, essas crianças contavam e segmentavam as duas palavras
comparando, de fato, a quantidade de sílabas das duas palavras, e afirmando muitas vezes: deu
empate, empatou! Respostas semelhantes às registradas durante as sessões com o jogo 1: Batalha
de palavras.
Diferentemente do que foi constatado no exame inicial, a atividade 4 de identificação da
sílaba inicial das palavras trouxe bem menos problemas para as crianças após as sessões de jogos.
Assim, percebe-se, no exame final, um avanço considerável em relação ao desempenho inicial
das crianças. Excetuando os casos de Lucas e Mayara, a grande maioria das crianças obteve
100% de acertos ou quase isso, nos itens desta atividade, ou seja, um quadro bem distinto do que
se observou no exame inicial.
O mesmo pode ser dito em relação à atividade de identificação de rimas (atividade 5). De
fato, após as sessões de jogos, a grande maioria das crianças mostrou um índice de acerto na
atividade igual ou superior a quatro itens. Percebe-se ainda um avanço considerável para algumas
crianças: Rayane e Lucas, por exemplo, passam de nenhum acerto na tarefa para 100% e 83,33 %
de acertos, respectivamente.
Vale ressaltar ainda que, embora se registrem avanços consideráveis na atividade 6, como,
por exemplo, os progressos de Rayane (dupla 1), Luciano (dupla 2), Gilvânia (dupla 3) e Arthur
137
(dupla 6), a atividade de identificação dos fonemas iniciais continuou bastante difícil para pelo
menos metade das crianças, já que estas apresentaram um índice de acertos inferior ou igual a 3.
Assim, vemos que os piores desempenhos das crianças ficaram, mais uma vez, centrados nas
habilidades a nível do fonema.
Ainda analisando a atividade 6 (identificação de palavras com o mesmo fonema inicial),
destacamos que, apesar das crianças conseguirem avanços nos conhecimentos sobre a escrita
seus desempenhos na referida atividade foi pequeno. É o caso de Deyvson, que sai do nível pré-
silábico, para o nível alfabético de escrita, mas que acerta apenas dois dos seis itens na atividade.
O mesmo podemos dizer de Valéria, que avança do silábico-quantitativo para o nível silábico-
alfabético, acertando, igualmente, apenas dois itens, além de Mayara que avança do nível
silábico-alfabético para o nível alfabético de escrita, mas acerta apenas um item na atividade 6.
Tais dados reforçam o que tem sido evidenciado em outras pesquisas (FREITAS 2004, LEITE
2006; MORAIS 2005), quando apontam a consciência fonêmica como o nível mais complexo da
consciência fonológica, até mesmo para aqueles com conhecimentos mais avançados sobre a
escrita.
Analisando as discrepâncias de desempenhos entre as crianças de uma mesma dupla em
todas as atividades de análise fonológica propostas no exame final, podemos dizer que as
variações entre os participantes de uma mesma dupla tenderam a diminuir após as sessões de
jogos. Poucos casos fogem deste padrão, como, por exemplo, as duplas 1, 3 e 5, que apresentam
uma grande variação de desempenho na atividade 6.
Observando os níveis de conhecimentos sobre a escrita, apresentados pelos participantes
e os seus desempenhos nas atividades de habilidades fonológicas, é possível notar que à medida
que as crianças avançam nos conhecimentos de escrita, avançam também nas habilidades
fonológicas. Isto indica uma influência recíproca entre as habilidades de reflexão fonológica e a
aquisição da escrita, conforme nos apontam os estudos de Morais (2005), Leite (2006) e Barrera
(2003).
Comparando também os resultados das duplas homogêneas e heterogêneas após as
sessões com os jogos de análise fonológica, não foi possível destacar qualquer especificidade em
relação aos desempenhos dos dois tipos de dupla. Assim, não se pode afirmar, por exemplo, que
as duplas heterogêneas avançaram mais do que as homogêneas, sinalizando assim uma influência
mais positiva das interações assimétricas, em relação às interações ditas simétricas. Ao contrário,
138
ao que parece, todas as crianças avançaram independentemente de pertencerem a duplas
homogêneas ou heterogêneas. Vemos, por exemplo, o grande progresso da dupla 1, formada por
duas crianças pré-silábicas, que ao final das sessões de jogos, passaram para os níveis silábico-
alfabéticos e silábico qualitativo no exame final. Por outro lado, a evolução de Dayvson, também
pré-silábico e participante de uma dupla heterogênea, que conclui as sessões de jogos escrevendo
alfabeticamente, supostamente sinalizaria um impacto mais positivo das duplas heterogêneas. Tal
afirmação, porém, não se confirma quando constatamos que as crianças silábicas qualitativas da
dupla 2 (homogênea) e da dupla 5 (heterogênea) progridem igualmente para o nível silábico-
alfabético.
Assim, conforme afirmamos acima, os dados do estudo não permitem tirar conclusões
sobre possíveis vantagens das duplas heterogêneas em relação às duplas homogêneas, no que
concerne ao favorecimento da ZDP. Porém, os dados da pesquisa revelam, claramente, que as
trocas entre os parceiros e/ou o adulto presente nas situações de jogos tiveram uma influência
muito positiva, independentemente dos níveis de conhecimentos sobre a escrita dos parceiros nas
duplas, sendo estes níveis semelhantes ou não.
No próximo e último capítulo faremos algumas considerações finais relativas à pesquisa
encaminhada.
139
CONSIDERAÇÕES FINAIS
140
Em linhas gerais, este estudo se propôs a analisar, sistematicamente, o percurso de duplas
de crianças ao longo de três sessões com quatro jogos que mobilizam diferentes habilidades
fonológicas. Buscamos, assim, identificar as mudanças qualitativas observadas no caminho
dessas duplas, considerando os conhecimentos fonológicos, bem como os níveis de conhecimento
sobre a escrita de cada criança.
Neste capítulo, nos propomos a pontuar certos aspectos que nos chamaram a atenção na
análise dos dados coletados e discutidos no capítulo anterior.
Um primeiro ponto a ser destacado diz respeito a algumas boas surpresas registradas no
desempenho de crianças durante os jogos, considerando sua performance no exame individual
das habilidades fonológicas, realizado antes das sessões de jogos. Isto pode ser notado, por
exemplo, com Valéria (dupla 4) e Vitória (dupla 2) no jogo de Bingo dos sons iniciais. O mesmo
pode ser dito em relação à Mayara (dupla 5) que apresentou, igualmente, um baixo resultado no
exame inicial e teve ótimo desempenho durante o jogo 2. Portanto, ao que parece, a situação
criada pelo jogo favoreceu o crescimento de algumas crianças, que se mostram desde a 1ª sessão
com mais habilidade do que seria esperado, em função do que havia sido demonstrado por elas no
exame inicial.
Outro ponto diz respeito à constatação da relevância de se oferecer às crianças diferentes
jogos, mobilizando diferentes habilidades fonológicas. Conforme já foi dito, a literatura na área
afirma que a consciência fonológica, na realidade, apresenta-se como um conjunto de
habilidades. Essas habilidades se revelam em níveis de complexidade diferentes, exigindo ainda
dos aprendizes conhecimentos lingüísticos também distintos. Assim, os jogos aqui propostos
mobilizavam desde a comparação do tamanho de palavras, até a consciência dos fonemas,
considerando, portanto, os diferentes níveis de complexidade de habilidades fonológicas. Neste
contexto, foi observado que habilidades mobilizadas por um determinado jogo eram importantes
para o jogo seguinte, ou seja, uma habilidade ou estratégia adotada num jogo parecia ser
incorporada e utilizada posteriormente. Por exemplo, a habilidade de identificar e isolar
oralmente a sílaba inicial das palavras, mobilizada pelo jogo 2, por Luciano e Vitória (dupla 2)
foi apresentada também no jogo 3, apesar do jogo solicitar a identificação de segmentos finais
das palavras. A estratégia de Rayane (dupla 1) de segmentar as palavras nos dedinhos
apresentada no jogo 2, para facilitar a identificação da posição das sílabas das palavras, também
141
foi utilizada no jogo 3. Daí decorre a relevância de se oferecer às crianças jogos, mobilizando
diferentes habilidades fonológicas, oportunizando a exploração de diferentes estratégias.
Nesta mesma direção, comportamentos e erros presentes num jogo também foram
observados em outros jogos. Certos tipos de erro, inclusive, nos chamaram a atenção por sua
presença em todas as duplas. A tentativa de segmentação de palavras monossílabas no jogo 1
(Batalha de palavras), por exemplo, esteve presente em todas as duplas. Um dado, igualmente,
interessante foi a dificuldade das crianças de saber o que é sílaba/ pedacinho inicial e sílaba/
pedacinho final, revelada, particularmente, nos jogos 2 e 3. Ou seja, muitas vezes, elas pareavam
palavras com sons semelhantes, porém, sem atentar para a posição dessas sílabas nas palavras.
No Bingo de rimas, por exemplo, as crianças pareavam palavras como Cabaré e Castelo
explicitando que as duas começam com CA! ou Calça e Sacola, já que Todas duas têm SA! Neste
sentido, nos parece importante a criação de jogos que mobilizem a atenção das crianças para as
posições das sílabas nas palavras, de modo que elas percebam o que é sílaba inicial e final.
Um outro aspecto importante é que, observando as habilidades fonológicas demonstradas
pelas crianças em cada jogo não se pode falar em termos de “tudo ou nada”. Ou seja, num mesmo
jogo, numa mesma sessão, a mesma criança acerta e erra jogadas, sucessivamente. Até mesmo
nos jogos mais difíceis para elas, vimos que jogadas corretas também aparecem. Assim, o jogo
parece possibilitar que as crianças oscilem entre o sucesso e o fracasso, sendo esta dinâmica algo
típico em todos os jogos e ao longo de todas as sessões, independentemente dos níveis de
conhecimento fonológicos e de escrita demonstrados por cada criança.
Assim, vale destacar o fato de não ter sido observada qualquer especificidade entre os
desempenhos das duplas homogêneas e heterogêneas, assim classificadas em relação aos níveis
de conhecimentos sobre a escrita. Tal procedimento metodológico esteve fundamentado na
hipótese de que crianças mais experientes auxiliariam outras menos experientes, gerando-se uma
maior possibilidade de compartilhamento e troca de conhecimentos entre os parceiros, durante as
sessões com os jogos. Porém, não se observou nas duplas heterogêneas uma dinâmica
característica nesta direção. As duplas 4 e 6, por exemplo, ambas heterogêneas, assim como a
dupla 3 (homogênea) pouco compartilhavam ou explicitavam seus conhecimentos. Como foi
destacado, as crianças dessas duplas se comunicavam muito pouco e, com base nas sessões
observadas, é possível dizer que em alguns momentos pareciam até estar jogando sozinhas.
142
Cabe, portanto, perguntar por que isto ocorreu com as duplas 3, 4 e 6. Será que essas
crianças eram, simplesmente, mais tímidas e sensíveis à situação artificial provocada durante as
sessões de jogos? Será que o fato de serem crianças de salas diferentes da escola provocou ou
agravou esse comportamento mais retraído? Ou será que, para essas duplas, um jogo didático já
tem tanta “cara de tarefa”, que não desperta qualquer interesse ou entusiasmo especial? Esta é
uma questão que merece ser investigada em outros estudos.
Por outro lado, foram notáveis as manifestações de interesse, alegria e entrosamento
apresentados pelas duplas 1, 2 e 5 durante os jogos. No jogo de Batalha de palavras, por exemplo,
as crianças da dupla 2 (Luciano e Vitória), agiram com entusiasmo, segmentando e comparando
palavras em cada jogada. Porém, ao jogarem o mesmo jogo, a dupla 3 (Gilvânia e Camilla)
tiveram que ser freqüentemente estimuladas pela pesquisadora para comparar as palavras e
resgatar o montinho de cartas. No jogo 4, comparando novamente a dupla 3 e a dupla 4,
enquanto Camilla (dupla 3) resiste em se arriscar nas suas respostas, com medo de errar,
Deyvson e Valéria respondem livremente as perguntas do jogo, sem temores, ainda que, as
respostas dadas não sejam as esperadas. Portanto, mesmo a partir de uma pequena amostra, como
foi o caso deste estudo, conclui-se que um mesmo jogo pode despertar comportamentos e reações
bem distintas entre as crianças. Tal caráter de incerteza presente no jogo foi ressaltado por
Huizinga (2007), ao indicar a dificuldade de se prever as atitudes e ações dos jogadores durante
as situações dos jogos, já que estes dependem de fatores internos ou mesmo externos ao
indivíduo.
Nota-se, ainda, nas duplas 1, 2 e 5, iniciativas espontâneas de justificar ou comentar suas
próprias jogadas ou a dos parceiros, ou até mesmo iniciativas de responder pelo outro. Tais
comportamentos contribuíram para gerar um clima de construção de conhecimento entre os
jogadores, favorecendo a compreensão do parceiro em diversos momentos. Neste sentido, vemos
que o jogo pode, de fato, funcionar como espaço de criação da ZDP, seja pelas diversas formas
de interação entre os parceiros, seja na relação com o adulto presente.
Assim, vimos que algumas das intervenções realizadas pela pesquisadora, presente nas
situações de jogos, também auxiliaram as crianças, provocando avanços no desenrolar de uma
mesma sessão. Ou seja, a partir de um erro, seguido de uma intervenção, foi possível notar
crianças fazendo correções de jogadas durante um mesmo jogo. O adulto presente, portanto, teve
um papel importante para o desenvolvimento das crianças.
143
Por fim, enfatizamos que a metodologia utilizada neste estudo não nos permite associar
causalmente a participação das crianças nas sessões de jogos e o avanço evidenciado no exame
final de habilidades fonológicas, bem como no ditado de palavras. Porém, o progresso das
crianças foi notório e parece confirmar a influência recíproca entre consciência fonológica e a
alfabetização, pois, à medida que as crianças melhoram os desempenhos ao nível fonológico,
progridem também em relação aos seus conhecimentos sobre a escrita.
Nesta direção, vale ainda registrar alguns depoimentos das professoras das crianças que
participaram das sessões de jogos. Tais depoimentos, tomados ao final da pesquisa, indicam a
leitura feita pelas docentes do desenvolvimento de seus alunos que, como veremos, também
sinalizam mudanças positivas neste grupo.
No depoimento abaixo, a professora enfatiza, por exemplo, a possível contribuição dos
jogos nos aspectos emocionais das crianças: Camilla (dupla 3) e Lucas (dupla 1). Vejamos:
Camilla era uma menina tímida, retraída, que tinha muitas dificuldades de aprendizagem. Por quê? Porque, como ela sabia que os outros estavam mais adiantados que ela, ela se retraía, se recolhia... Ficava calada e não queria participar de jeito nenhum. Ela não desenvolvia e isso a estava prejudicando! Então, depois que ela viu que tinha um momento em que podia participar, demonstrar que sabia... Ela mudou! Tá lendo! Ela está alfabética! Hoje ela sabe compreender o que tá fazendo e faz sozinha. Coisa que ela não fazia antes! Lucas Vinícius também se destacou brilhantemente! De todos os que participaram da pesquisa eu acho que ele se destacou mais! Ele era uma criança tímida, não falava, ficava num cantinho sozinho! Eu acho que ele também sentiu isso... Depois, ele ficou mais participativo, mais alegre! Isso foi muito bom! (Professora 1)15
Assim, na visão desta professora, o jogo parece contribuir para a criança se sentir mais
segura diante de suas próprias dificuldades. E, de fato, isto pôde ser observado com Camilla,
especialmente, ao longo das sessões com o jogo 4.
Uma outra professora destaca o entusiasmo e o interesse das crianças que, após as sessões
da pesquisa, passam a solicitar que ela traga jogos para sala. Ou seja, embora algumas crianças
não tenham, aparentemente, demonstrado muito entusiasmo durante as sessões de jogos da
pesquisa, de acordo com esta professora, as crianças passam a solicitar jogos na sala de aula.
Vejamos o que diz a professora:
15 Optamos por preservar a identidade das professoras em seus depoimentos.
144
Dentro da sala de aula são muitas coisas que você tem que dar conta.... E nem sempre você faz o que você acha que deve ser feito. Quando você começou a fazer a pesquisa e começou a jogar, naturalmente, os meninos vinham de lá com esse interesse em jogar, né? Aí eu era obrigada a introduzir o jogo, porque eles ficavam me cobrando: Quando é que vai ter jogo aqui? ...Eles ficavam cobrando de mim, porque só alguns iam pra lá jogar e outros não. Foi, assim, que eu tive que trazer alguns jogos para poder satisfazer a todos. E aí eu joguei com eles, e pude observar, que eles começam compreender o porquê das coisas (Professora 2).
Neste depoimento da professora vemos ainda que ela expressa a dificuldade de se adotar
uma prática de ensino da língua numa perspectiva dinâmica, que compreenda a relação entre o
aprendiz com o objeto de conhecimento, sem a ênfase na repetição ou memorização de
conteúdos.
De acordo com as professoras, o jogo parece ter funcionado também como um propulsor
de atividade metalingüística, pois, à medida que as crianças evoluíam nos jogos, passavam a
refletir, de forma mais consciente sobre as palavras, justificando e explicando mais suas
respostas, defrontando-se com conhecimentos já adquiridos e os novos conhecimentos
mobilizados durante o jogo. Isto pode ser observado na fala da professora, a seguir:
Há momentos em que a criança faz a atividade e, quando você questiona como ele descobriu aquilo, ele diz: não sei, descobrindo... Ou você ainda pergunta: Por quê? E eles respondem... Porque... (risos). Essa resposta mostra que eles não sabem o porquê. Quando eles passaram a jogar eles respondem: é porque termina igual! Porque começa igual, ou porque têm a mesma letra! Aí, assim, você percebe que eles sabem! (Professora 2)
Concluindo, vale destacar que a presente investigação contribuiu para ampliar o nosso
conhecimento acerca dos diferentes modos, revelados pelas crianças, de refletir sobre as unidades
das palavras, tais como sílabas, fonemas e letras. A pesquisa também mostra a possibilidade de
avanços nos níveis de compreensão sobre a escrita, sem que, necessariamente, se proponha um
“treinamento em consciência fonológica”, mas sim, por meio de jogos de análise fonológica.
Assim, o estudo reforça que a aquisição da língua escrita não se constitui em uma atividade
solitária. Ou seja, o professor, as outras crianças e os instrumentos didáticos utilizados na sala de
aula parecem ter um papel extremamente relevante para o desenvolvimento das várias
habilidades envolvidas nesta conquista.
145
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151
ANEXO I
152
Atividade Escrita – Exame Inicial Dupla 1 – Lucas e Rayane
153
Atividade Escrita – Exame Inicial Dupla 2 – Luciano e Vitória
154
Atividade Escrita – Exame Inicial Dupla3– Camilla e Gilvãnia
155
Atividade Escrita – Exame Inicial Dupla 4 – Deyvson e Valéria
156
Atividade Escrita – Exame Inicial Dupla 5 – Gustavo e Mayara
157
Atividade Escrita – Exame Inicial Dupla 6 – Arthur e Joyce
158
ANEXO II
159
ATIVIDADES PARA AVALIAÇÃO DE HABILIDADES METAFONOLÓGICAS
Identificação do sujeito Nome________________________ Idade_________________________
ATIVIDADE 01 SEPARAÇÃO ORAL DE SÍLABAS
1- Material: Cartões com figuras para contagem das sílabas das palavras. 2- Procedimento: Agora nós vamos fazer uma atividade de separar os pedacinhos das palavras. Exemplos (pesquisador). Eu vou mostrar uma figura e dizer o nome dela bem devagar como se estivesse separando em pedacinhos a palavra MESA. Depois eu vou marcar nos dedos quantos pedacinhos tem essa palavra. Por exemplo, a palavra ME-SA (mostrando nos dedos as partes das palavras). Veja, eu vou mostrar outra figura que o nome é CARACOL. Separar nos dedos as partes da palavra... (repetindo a instrução anterior). Agora é a sua vez de tentar! Eu vou te mostrar uma figura você vai dizer a palavra como se ela estivesse partida em pedaços (você pode usar os dedos para separar). Vamos lá? Atividade 1) SOFÁ 2) BORBOLETA
3) TATU 4) PÁSSARO 5) VENTILADOR 6) BOLA
160
Identificação do sujeito Nome________________________ Idade_________________________
ATIVIDADE 02 CONTAGEM DE SÍLABAS NAS PALAVRAS
1-Material: Cartões com figuras para contagem das sílabas das palavras. 2-Procedimento: Agora nós vamos fazer uma atividade de contar os pedacinhos das palavras representando novamente com os dedos cada pedacinho da palavra. Exemplos (pesquisador) Eu vou mostrar uma figura e dizer o nome dela bem devagar como se estivesse separando em pedacinhos a palavra. Por exemplo, a palavra VACA tem dois pedaços: Veja: VA-CA (mostrar nos dedos a quantidade de sílabas da palavra). Eu vou dizer agora a palavra JABUTI. Note que JÁ-BU-TI, tem...(repetir a mesma explicação). Agora é a sua vez de tentar! Eu vou te mostrar a figura, você vai separar o nome dela e contar usando os seus dedinhos. Vamos lá? Atividade
1) XAMPU
2) MURIÇOCA
3) CAFÉ
4) FÍGADO
5) ESPANADOR
6) VENTO
161
Identificação do sujeito Nome________________________ Idade_________________________
ATIVIDADE 03 COMPARAÇÃO DO TAMANHO DE PALAVRAS 1- Material: Cartões com pares de gravuras que contêm palavras grandes e palavras pequenas 2- Procedimento: Agora a tarefa é pensar quantos pedacinhos têm as palavras das figuras e descobrir qual a palavra maior, ou seja, a que tem mais pedaços!
Exemplos (pesquisador)- Aqui tem duas palavras GATO e PERCEVEJO (mostrando o cartão). Veja a palavra PERCEVEJO (dizer a palavra partida em pedaços, marcando com os dedos) é maior que a palavra GATO porque tem quatro pedacinhos (mostrar com os dedos a quantidade), enquanto que a palavra GATO (segmentar a palavra e mostrar nos dedos) só tem dois pedacinhos. Um outro exemplo: BOLO-BRIGADEIRO. A palavra BRIGADEIRO é maior que a palavra BOLO... (repetir a explicação e a justificativa) Agora é a sua vez! Eu vou mostrar o cartão, vou falar o nome das duas figuras. Você repete o nome delas e me diz qual das duas é a maior palavra.
Atividade
1) ALFINETE ( ) COLHER ( ) IGUAIS ( )
2) URSO ( ) PAPAGAIO ( ) IGUAIS ( )
3) CAMA ( ) TELEFONE ( ) IGUAIS ( )
4) CARAMBOLA ( ) LARANJA ( ) IGUAIS ( )
5) GILETE ( ) LÁPIS ( ) IGUAIS ( )
6) MICROFONE ( ) BORBOLETA ( ) IGUAIS ( )
162
Identificação do sujeito
Nome________________________
Idade_________________________
ATIVIDADE 04 IDENTIFICAÇÃO DE PALAVRAS QUE COMEÇAM COM A MESMA SÍLABA 1- Material: Quatro cartões com gravuras (dentre as quais duas compartilham a mesma sílaba inicial). 2- Procedimento: Hoje nós vamos descobrir quais as palavras são parecidas, ou seja, quais as que começam com o mesmo pedacinho! Exemplos Eu vou dizer as seguintes palavras BOTA – TIJOLO - LIVRO – LIQUIDIFICADOR (mostrando os cartões). As palavras LIVRO e LIQUIDIFICADOR são parecidas porque elas começam com o mesmo pedaço LI. Observe outro exemplo: AVIÃO-ABELHA-RELÓGIO-PATO. Note que AVIÃO e ABELHA começam iguais (repetir a explicação) Agora é a sua vez de tentar! (mostrar os cartões a dar a mesma instrução) Atividade 1) BOLACHA – ESCOVA –BONECA -PALETÓ
2) SAPATO-SACOLA-TAPETE-MACACO
3) LUPA-JARRO-LUVA-BOCA
4) ABRIDOR-ALICATE-CHAVEIRO-VESTIDO
5) MANTEIGA-ESPADA-TIGELA-MANGUEIRA
6) CASA-ILHA-SACO-CARRO
163
Identificação do sujeito Nome________________________
Idade_________________________ ATIVIDADE 05 IDENTIFICAÇÃO DE PALAVRAS QUE RIMAM 1- Material: Cartões com quatro figuras dentre as quais duas figuras que compartilham os segmentos intra-silábicos semelhantes; 2- Procedimento: A tarefa agora é identificar os sons das palavras que TERMINAM de forma parecida. Vamos descobrir quais as figuras que têm as palavras que terminam com o mesmo som, ou seja, as palavras que rimam. Exemplos (Mostrando os cartões das figuras) eu vou dizer os nomes das figuras, veja: CASACO –TOMADA - ESPELHO-ENXADA. As palavras ENXADA e TOMADA são parecidas. Elas terminam com o mesmo pedaço. ENXADA termina com o som ADA e a palavra TOMADA também termina com o som ADA. Observe outro exemplo: CHUPETA-DOMINÓ-CANETA-CIGARRO. VEJA CHUPETA e CANETA, ambas terminam... (repetir a mesma explicação) Agora é a sua vez. Eu vou apresentar os cartões com as figuras e falar os nomes e você vai descobrir as palavras que rimam e (as palavras que rimam) falar qual o pedacinho parecido! Atividade 1) BARATA-PIPOCA-GRAVATA-PALHAÇO
2) CARETA-MORANGO-GAVETA-VASSOURA
3) INJEÇÃO - CACHORRO – TOMATE – CORAÇÃO
4) OVELHA-APITO-ORELHA-IGREJA
5) MARTELO-JABUTI-CASTELO-GOIABA.
6) JANELA-CINZEIRO-COLETE-PANELA
164
Identificação do sujeito Nome_______________ Idade_________________
ATIVIDADE 06 IDENTIFICAÇÃO DE PALAVRAS QUE COMEÇAM COM O MESMO FONEMA 1- Material: Cartões com quatro figuras onde duas delas têm o nome que compartilham o menor som inicial, o mesmo fonema; 2- Procedimento: Vamos continuar com as nossas atividades de descobrir palavras com o mesmo som? Só que agora nós vamos prestar atenção no menor sonzinho que começa a palavra. Exemplos - Veja aqui tem quatro figuras: MESA – PIPA – FOGÃO - FITA. Veja, FOGÃO e FITA possuem o mesmo som. Note que não é o mesmo pedacinho, mas o som bem pequeno é o mesmo. FOGÃO começa com o som /f/ e FITA também começa com o som /f/.Veja um outro exemplo: VOVÓ-VACA-FLOR e LATA. Observe que VOVÓ e VACA começam com um mesmo sonzinho (repetir a explicação anterior) Agora é a sua vez! Eu vou mostrar os cartões e você vai descobrir quais as palavras que têm o mesmo sonzinho só do começo! Atividade
1) COLAR-ROSA-RALO-BULE
2) XÍCARA-TELHADO-TECLADO-CENOURA
3) MALA-BANCO-MOTO-DADO
4) RODA-PIA-RATO-BOLA
5) GELO-COLA-SAPO-SELO
6) MENINO-CANECA-MALETA-GUITARRA
165
ANEXO III
166
Atividade Escrita – Exame Final Lucas
167
Atividade Escrita – Exame Final Rayane
168
Atividade Escrita – Exame Final Luciano
169
Atividade Escrita – Exame Final Vitória
170
Atividade Escrita – Exame Final Camilla
171
Atividade Escrita – Exame Final Gilvânia
172
Atividade Escrita – Exame Final Deyvson
173
Atividade Escrita – Exame Final Valéria
174
Atividade Escrita – Exame Final Gustavo
175
Atividade Escrita – Exame Final Mayara
176
Atividade Escrita – Exame Final Arthur
177
Atividade Escrita – Exame Final Joyce
178
ANEXO IV
179
Descrição das figuras (palavras) que compõem o Jogo 1
Batalha de Palavras
São quarenta cartões com figuras cujas palavras são formadas por uma, duas três e quatro sílabas.
Quantidade de sílabas nas Palavras
Figuras dos cartões
Monossílabas: MÃO, PÃO, TREM, PÁ, FLOR, PÉ, SOL, REI,
MAR, BOI.
Dissílabas: FADA, JARRO, VELA, BOLA, PIPA, LEÃO,
PORTA, CARRO, CAMA, FACA.
Trissílabas ESCADA, SALADA, PICOLÉ, GIRAFA, TESOURA, BARATA, SAPATO, PANELA, FORMIGA, JACARÉ.
Polissílabas BORBOLETA, BICICLETA, CADEADO,
PIRULITO, TARTARUGA, ELEFANTE, TELEFONE,
SABONETE, VENTILADOR, COMPUTADOR.
180
Figuras apresentadas nas cartelas e palavras ditadas do jogo 2 Bingo de Sons
Iniciais
Figuras das cartelas
Palavras
ditadas
Sílaba Transcrição
fonética
CADEIRA/ CASA/ CACHIMBO/ CACHORRO
CABELO
CA [ka]
TELEFONE/ TELEVISÃO TECLADO TE [tε] AVIÃO/ ABACATE/ ABACAXI AMARELO A [a] FADA/ FACA FAZENDA FA [fa]
PIRULITO / PICOLÉ/ PIPA/ PEDRA PIANO PI [pi]
GALO/ GATO/ GALINHA GALEGA GA [ga] MAÇÃ/ MACACO MADEIRA MA [ma] VASSOURA/ VACA VAGALUME VA [va] PETECA/ PÉ/ PEDRA PEDAÇO PE [pε] BOLA/ BOTA BOLICHE BO [bo]
BULE/ BURRO BUCHA BU [bu]
CHAVE/ CHAPEU CHÁ CHA [ſa]
RÉGUA/ RELÓGIO REMÉDIO RE [Ra]
PATO/PALHAÇO/PÁ PALITO PA [pa] ESCOVA/ ESTRELA/ ESCADA ESCOLA ES [iſ]
RATO / RÁDIO RALO RA [Ra]
BARATA/ BALEIA/ BALÃO BACIA BA [ba]
LATA/ LÁPIS LARANJA LA [la]
CORAÇÃO/ COLA/ COBRA/ COPO COFRE CO [ko]
CHUPETA/ CHUVEIRO CHURRASCO CHU [ſu]
SAPATO/ SABONETE SALADA SA [sa] MELANCIA/ MELÃO MEDICO ME [mε]
ILHA/ IGREJA IOIÔ I [i]
JARRO/ JACARÉ JAQUETA JA [Зa]
181
Cartelas utilizadas nas sessões com o Jogo 2
São dez cartelas contendo seis figuras cujos nomes possuem a sílaba inicial semelhante às palavras ditadas.
CADEIRA TELEFONE AVIÃO
FADA RÉGUA PATO
PIRULITO VACA CHAVE
BARATA CACHORRO FACA
MELANCIA BURRO RATO
BOTA PALHAÇO CACHIMBO
CHUVEIRO PICOLÉ BALEIA
IGREJA COBRA JACARÉ
COPO PÉ PIPA
LÁPIS MACACO BOLA
CORAÇÃO ESTRELA CHUPETA
BULE MELÃO ABACATE
GATO ILHA LATA
CASA VASSOURA ESCOVA
GALO RÁDIO TELEVISÃO
SAPATO ESCADA PEDRA
COLA BALÃO JARRO
GALINHA MALA PÁ
MAÇÃ PETECA RELÓGIO
SABONETE CHAPÉU ABACAXI
182
Figuras apresentadas nas cartelas e palavras ditadas no Jogo 3
Bingo de Rimas Figuras das Cartelas Palavras
ditadas Segmento sonoro final (rima)
Transcrição fonética
OLHO/ REPOLHO MOLHO OLHO [oλo]
TELHA/ ABELHA OVELHA ELHA [eλa]
FLECHA/ BORRACHA BOLACHA CHA [ſa]
ARRAIA/ SAIA PRAIA AIA [aja]
BUZINA/ MENINA FINA INA [jna]
CALÇA/ CARROÇA PRAÇA ÇA [sa]
LAÇO/ PALHAÇO TRAÇO AÇO [aso]
TOMADA/ ESPADA/ PANCADA ADA [ada]
PICOLÉ/ JACARÉ CABARÉ É [ε]
TRATOR/COMPUTADOR AMOR OR [or]
PIÃO//PÃO/MACARRÃO/MAMÃO CAMINHÃO ÃO [αw]
ZEBRA/ COBRA SOBRA BRA [bra]
MOLA/COLA BOLA ROLA OLA [ola]
MAMADEIRA/CADEIRA/ LADEIRA DEIRA [dejra]
BANHEIRO/ DINHEIRO PINHEIRO NHEIRO [ŋejro]
ANZOL/CARACOL/SOL LENÇOL OL [ol]
MARTELO/ CASTELO FARELO ELO [εlo]
VELA/ SELA BELA ELA [εla]
TOMATE/CHOCOLATE ALICATE ATE [at’i]
TAPETE/ CAPACETE ALFINETE ETE [et’i]
BONECA/ PETECA SAPECA ECA [εka]
BIGODE/BODE SACODE ODE [odj]
GALINHA/ RAINHA LINHA INHA [iŋa]
MENINO/ SINO FINO INO [ino]
CHUVA/ LUVA UVA UVA [ſu]
NARIZ/RAIZ CICATRIZ IZ [is]
CORRENTE/PENTE DENTE ENTE [ĕt’i]
PORTA/FLAUTA PASTA TA [ta]
183
Cartelas utilizadas nas sessões com o Jogo 3 Dez cartelas contendo seis figuras cujas palavras rimam com as palavras ditadas.
MOLA BONECA CALÇA
ANZOL CORRENTE CHUVA
GALINHA PALHAÇO MAMADEIRA
BODE NARIZ PIÃO
MENINO MARTELO SAIA
RAIZ SOL VELA
ABELHA CHOCOLATE JACARÉ
CARACOL ESPADA DINHEIRO
CASTELO TOMADA BIGODE
REPOLHO COMPUTADOR LUVA
MENINA BOLACHA CARROÇA
LAÇO BANHEIRO TOMATE
MAMÃO FLAUTA SINO
TELHA PICOLÉ BUZINA
OLHO TRATOR FLECHA
PORTA RAINHA PÃO
CADEIRA PENTE ZEBRA
TAPETE CAPACETE COLA
BOLA ARRAIA COBRA
MACARRÃO SELA PETECA
184
Cartas - Perguntas que compõem o Jogo 4- Construindo a Torre
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
SOFÁ MAÇÃ SAPO PIPA
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
BOCA SAPO
BALÃO RATO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
TATU SAPO CASA COPO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
LAÇO PATO LINHA NAVIO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
CAVALO ABACAXI XÍCARA
CORAÇÃO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
SALADA PIPOCA PANELA
CARACOL
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
REDE NÓ
RODA SOL
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
VACA CIRCO MOLA MALA
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
CASA
TOMADA TIGRE
MACACO
185
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
GUITARRA GATO PENA UVA
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
MALA PIA
BOLA MOTO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
CEBOLA CIGARRO JACARÉ
BESOURO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
FOCA RATO MESA FADA
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
CARRO COPO RODA LAÇO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
VELA CAMA VACA BOTA
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
FITA GALO MAÇÃ FOGÃO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
TELHA LIVRO LUVA CASA
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
COLAR RÉGUA RALO FACA
186
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
ILHA SAIA
IGREJA RATO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
SUCO SOPA BOTA PEIXE
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
CASA
TOMADA TIGRE
MACACO
Quais das figuras
abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
CHAVE MALA
CHUVA DEDO
Quais das figuras abaixo
têm os nomes que começam com o mesmo
sonzinho?
COBRA BALÃO LIVRO CASA
Quais das figuras abaixo
têm os nomes que começam com o mesmo
sonzinho?
REI RATO LAÇO PIPA
187
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
LUVA SOFÁ URSO LÁPIS
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
CENOURA
CIRCO BANANA
TELEFONE
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
TATU FITA FADA BOLO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que começam com o
mesmo sonzinho?
SALA SOPA MAÇÃ PIPA
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
DADO PINTO VACA DEDO
Quais das figuras abaixo têm os nomes que
começam com o mesmo sonzinho?
GIRAFA SACOLA
GELADEIRA PETECA