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1041 JOÃO GOULART: RESGATE HISTÓRICO POR MEIO DA IMPRENSA PAULA CAUDURO BIANCO PUCRS [email protected] Resumo: Este artigo analisa o modo como os jornais Correio do Povo e Diário de Notícias retrataram João Goulart, por meio de suas matérias, na condição de Ministro do Trabalho entre 1953 a 1954. Detectou-se a existência de recorridos temas comuns em ambos os jornais, estabelecendo-se, desse modo, 3 categorias de análise: “Trabalhadores”, “Salário Mínimo” e “Jango”. Visa-se, portanto, contribuir com a historiografia sobre João Goulart, em sua função ministerial, sob um enfoque regional, posto que as obras que dispensam atenção sobre o referido são constituídas, predominantemente, por definições sintéticas, as quais, em muitos casos, abreviam os acontecimentos políticos de seu mandato, indicando brevemente a existência de uma relação de Jango com a imprensa. Palavras-chave: João Goulart; Ministro do Trabalho; Imprensa. João Goulart, Ministro do Trabalho: resgate por meio da imprensa A imprensa nacional, localizada na região sudeste do Brasil, não só acompanhou e reproduziu os acontecimentos políticos ligados à atuação de João Goulart, enquanto Ministro do Trabalho, bem como foi personagem ativa desse contexto durante a carreira política de Jango no ministério. À prova disso, têm-se, nas obras que retratam esse período da História do nosso país e, sobretudo nas obras de caráter biográfico sobre João Goulart, os relatos, ainda que esses possam ser classificados como “curtos” e “sintéticos”, apontando rapidamente a passagem de Jango no referido posto ministerial e, ainda, destacando alguns veículos da imprensa, como “O Radical”, “A Última Hora” e a “Tribuna da Imprensa”, sendo exemplos de jornais que se posicionavam a favor ou contra o ministro Jango. (SKIDMORE, 2010); (FERREIRA; DELGADO, 2011); (TOLEDO, 2004); (FERREIRA, 2011); (VILLA, 2004). Dos grandes veículos de informação do eixo Rio-São Paulo aos periódicos do Rio Grande do Sul, entretanto, é nítida a disparidade de influência, como se verá a seguir, que tais jornais imprimiram àquele momento político. De todo modo, Correio do Povo e Diário de Notícias, os jornais de maior circulação no estado gaúcho e principais fóruns públicos de debate (GALVANI, 1995); (RÜDIGUER, 2003); (DE GRANDI, 2005), além de reproduzir e retratar o exercício de João Goulart no Ministério do Trabalho com um grande volume de matérias, também foram, ainda que timidamente, veículos de informação com determinado posicionamento para com o ministro Jango.

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João Goulart: resGate histórico por meio da imprensa

Paula Cauduro BianCo

[email protected]

Resumo: Este artigo analisa o modo como os jornais Correio do Povo e Diário de Notícias retrataram João Goulart, por meio de suas matérias, na condição de Ministro do Trabalho entre 1953 a 1954. Detectou-se a existência de recorridos temas comuns em ambos os jornais, estabelecendo-se, desse modo, 3 categorias de análise: “Trabalhadores”, “Salário Mínimo” e “Jango”. Visa-se, portanto, contribuir com a historiografia sobre João Goulart, em sua função ministerial, sob um enfoque regional, posto que as obras que dispensam atenção sobre o referido são constituídas, predominantemente, por definições sintéticas, as quais, em muitos casos, abreviam os acontecimentos políticos de seu mandato, indicando brevemente a existência de uma relação de Jango com a imprensa.

Palavras-chave: João Goulart; Ministro do Trabalho; Imprensa.

João Goulart, Ministro do Trabalho: resgate por meio da imprensa

A imprensa nacional, localizada na região sudeste do Brasil, não só acompanhou e reproduziu os acontecimentos políticos ligados à atuação de João Goulart, enquanto Ministro do Trabalho, bem como foi personagem ativa desse contexto durante a carreira política de Jango no ministério. À prova disso, têm-se, nas obras que retratam esse período da História do nosso país e, sobretudo nas obras de caráter biográfico sobre João Goulart, os relatos, ainda que esses possam ser classificados como “curtos” e “sintéticos”, apontando rapidamente a passagem de Jango no referido posto ministerial e, ainda, destacando alguns veículos da imprensa, como “O Radical”, “A Última Hora” e a “Tribuna da Imprensa”, sendo exemplos de jornais que se posicionavam a favor ou contra o ministro Jango. (SKIDMORE, 2010); (FERREIRA; DELGADO, 2011); (TOLEDO, 2004); (FERREIRA, 2011); (VILLA, 2004).

Dos grandes veículos de informação do eixo Rio-São Paulo aos periódicos do Rio Grande do Sul, entretanto, é nítida a disparidade de influência, como se verá a seguir, que tais jornais imprimiram àquele momento político. De todo modo, Correio do Povo e Diário de Notícias, os jornais de maior circulação no estado gaúcho e principais fóruns públicos de debate (GALVANI, 1995); (RÜDIGUER, 2003); (DE GRANDI, 2005), além de reproduzir e retratar o exercício de João Goulart no Ministério do Trabalho com um grande volume de matérias, também foram, ainda que timidamente, veículos de informação com determinado posicionamento para com o ministro Jango.

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A respeito do material selecionado nos jornais Correio do Povo e Diário de Notícias, é necessário destacar a seleção exclusiva de matérias jornalísticas sobre o período de atuação ministerial de João Goulart e, diante disso, constatar a expressiva quantidade desses textos, sendo encontrados 131 no jornal Correio do Povo e 89 no jornal Diário de Notícias. Entretanto, pequenas exclusões de algumas notas, como àquelas caracterizadas como “a pedido”, ou mesmo seus editoriais, por serem pouco representativos em relação ao tema em estudo, representaram a dispensa de 16 textos no Correio e 25 no Diário.

Por meio da sistematização de leitura e de análise e pelo agrupamento das matérias, a partir da identificação de temas comuns citados nos textos, três grandes grupos para investigação a respeito do modo como João Goulart foi retratado como Ministro do Trabalho pelos jornais Correio do Povo e Diário de Notícias foram estabelecidos e intitulados como “Trabalhadores”, “Salário Mínimo” e “Jango”.

Os “Trabalhadores” e o “Salário Mínimo”Os textos que indicam a próxima relação de João Goulart, enquanto Ministro do

Trabalho, para com os trabalhadores, representam um total de 45 matérias publicadas no Correio do Povo e 23 no Diário de Notícias. Percebe-se, também, que essas matérias apresentam uma imagem positiva de Jango, geralmente bem acolhido pela classe trabalhadora e tido como um político interessado e envolvido diretamente nos acontecimentos relacionados a essa classe. Tanto nos títulos de algumas das matérias, tais como: “Os líderes do comércio carioca visitam o ministro do Trabalho”1; “Goulart fala ao operariado em Pernambuco”2; “Vargas e Goulart aclamados pelos trabalhadores, ontem no Rio” 3; “Jango com os comerciantes”4; “Recepcionado em Santos o ministro do Trabalho”5, quanto nos conteúdos destas há, novamente, o reforço dessa ideia de aproximação positiva. Pelo trecho da reportagem do jornal Diário de Notícias, demonstra-se isso:

O ministro do Trabalho, Sr. João Goulart, esteve, ontem, na sede da Associação Comercial, que é também a da Federação das Associações Comerciais do Brasil, numa visita de cortesia e aproximação, mantendo com todos demorada conferência sobre diversos problemas de interesse para o comércio e para o Governo. (...).6

Outro exemplo é a matéria publicada no jornal Correio do Povo:

O ministro João Goulart, a convite de todos os sindicatos dos trabalhadores

1 OS LÍDERES..., 1953, p. 16.2 GOULART..., 1953, p. 20.3 VARGAS..., 1954, p. 12.4 JANGO..., 1953, p. 10.5 RECEPCIONADO..., 1953, p. 5.6 JANGO..., 1953, p. 10.

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desta cidade e especialmente para participar da festa comemorativa do 33º aniversário do Sindicato dos Estivadores, chegou a Santos (...). Ao seu desembarque compareceram numerosas pessoas (...) bem assim representações de todos os sindicatos do município paulista e vários outros dirigentes operários e políticos paulistas, que vieram recepcionar o titular da pasta do Trabalho.7

Dada sua já referida proximidade com os movimentos operários, os jornais Correio do Povo e Diário de Notícias apresentaram, também, expressivo número de matérias a respeito do envolvimento do ministro no episódio conhecido como Greve dos Marítimos, de modo a promover a rápida solução desse conflito. A Greve dos Marítimos foi um acontecimento de grande repercussão nacional que acabou por influenciar na chegada de Jango ao Ministério. (VILLA, 2011, p. 22). Ainda a esse respeito, de acordo com os jornais Correio do Povo e Diário de Notícias, o ministro Jango empenhou-se em solucionar a greve sem maiores conflitos. Se percebe isso pelo trecho da reportagem do Diário de Notícias em 20 de junho de 1953, intitulada “João Goulart examina as reivindicações dos marítimos em greve”, onde se lê:

Na manhã de hoje, o Sr. João Goulart recebeu em conferência o diretor do Departamento Nacional do Trabalho (DNT), Hugo de Faria, examinando, ambos, as reivindicações apresentadas pelos marítimos em greve. Foi, nessa oportunidade, procurada, com empenho, uma solução para o caso. 8

De mesma forma, o Correio do Povo publicou também uma matéria a esse respeito, na qual mostra a preocupação de João Goulart em dar fim à greve, agindo, novamente, com cautela e visando dar resolução ao embate. Afirmou o jornal:

O Sr. João Goulart iniciou sua atividade na alta administração do país como ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, recebendo do seu antecessor, sr. Segadas Viana, uma das mais graves e complicadas questões já surgidas desde a criação daquela secretaria de Estado. (...) Há três dias consecutivos, entrando pela noite até a madrugada, o Sr. João Goulart, assessorado por antigos funcionários do Ministério do Trabalho, vem se esforçando para encontrar uma fórmula capaz de conciliar os interesses dos marítimos e a situação financeira deficitária das companhias de navegação do governo e mais as empresas particulares. (...).9

Sendo assim, novamente se reitera, diante das passagens citadas acima, que ambos os jornais - Correio do Povo e Diário de Notícias – reproduziram uma imagem positiva de João Goulart para com os trabalhadores, sendo o caso da Greve dos Marítimos um bom exemplo disso.

Em seguida, passa-se a observar como os dois jornais gaúchos reproduziram a

7 RECEPCIONADO..., 1953, p. 5.8 JOÃO..., 1953, p. 14.9 FAVORÁVEL..., 1953, p. 18.

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imagem de João Goulart a partir de outro aspecto relevante em seu exercício ministerial: a questão do salário mínimo. A esse respeito, é importante destacar que o Correio publicou 24 reportagens sobre o tema e o Diário Notícias apenas 5. Se, por um lado, a disparidade numérica é significativa, por outro lado, a partir da leitura das mesmas, pode-se dizer que as informações contidas em ambos estão correspondidas.

O Correio do Povo publicou a primeira reportagem a respeito do salário mínimo. Entretanto, o fez citando integralmente as informações prestadas pelo jornal O Globo, o qual atribuiu a iniciativa a uma ação do governo federal e mencionou apenas a participação do Ministério do Trabalho como uma das partes integrantes para a realização dessa ação. Infere-se isso segundo o texto abaixo publicado em 16 de julho de 1953:

O vespertino ‘O Globo’ publica hoje, com grande destaque, na primeira página, a seguinte nota: ‘O governo está em face de uma verdadeira onda de dissídios, movimentos visando melhoria de salários e ameaças de greves. A situação vai se tornando complexa e confusa. Reconhecem as autoridades que esses trabalhadores, face à carestia, têm direito a aumento. Entendem que, afinal, eles não são culpados pelos erros e fatores que contribuem para o encarecimento da vida. Mas conceder simplesmente uma majoração de salários não constitui solução, porque a uma melhora sucede sempre novo encarecimento da vida, dentro do círculo vicioso que aflige e tende a estrangular a nação. Por isso mesmo o chefe do governo cogita determinar aos ministros que interferem mais diretamente aos setores econômico-sociais, como da Fazenda, Agricultura e Trabalho, que estudem com urgência as medidas para enfrentar e resolver a situação, com providências de base que constituam soluções fundamentais, indo mesmo, se necessário, ao congelamento de preços e salários’.10

No Diário de Notícias, por sua vez, não mencionou a respeito da iniciativa do governo em promover estudos para tentar solucionar a referida crise. O periódico só se manifestaria em 6 de agosto daquele ano, ao informar na matéria “Estudos técnicos para levantamento do salário mínimo”, que o andamento dos estudos já eram coordenados pelo então ministro João Goulart e que esse procurava dar celeridade aos mesmos.11

O Correio do Povo apresentou maiores informações sobre o tema salarial, ao retratar em suas matérias o modo como essa questão foi trabalhada e desenvolvida pelo governo a partir da atuação da chamada “Comissão do Salário Mínimo”. A respeito da origem e finalidade da Comissão, o periódico publicou a respeito da mesma, a seguinte explicação:

(...) a Comissão de Salário Mínimo, instituída pelo Governo Federal, a fim de reestruturar as tabelas de salários mínimos, que estão em vigor desde 1948, e que não acompanharam a marcha ascensional dos preços das utilidades, o que vem dificultando sobremaneira a classe média, ou seja, a classe assalariada, principalmente a dos menores, suas condições de vida obrigam ao exercício de qualquer profissão. Ao que conseguimos apurar, os trabalhos já vão bastante adiantados, estando os responsáveis atentos às estatísticas dos preços dos

10 CONGELAMENTO..., 1953, p. 16.11 ESTUDOS..., 1953, p. 12.

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gêneros alimentícios, de molde a que seja possível uma taxação sem defeitos e que venha, por isso mesmo, atender os objetivos visados.12

Jorge Ferreira (2011) é um autor que faz uma rápida menção a sua existência no referido período de estudos para o aumento salarial.

De todo modo, em seguida, o Correio do Povo complementou, por meio de outras matérias, ainda a respeito da referida Comissão, informando que essa se subdividia de forma regional e que seus representantes, intitulados presidentes, eram convocados, vez ou outra, pelo Ministro João Goulart, para se reunirem no Ministério do Trabalho a fim de debaterem determinados temas, como, por exemplo, em uma especifica ocasião na qual debateram o encarecimento da vida no Brasil, bem como estipularam melhorias na condição dos salários mínimos, mediante a conjuntura econômica brasileira daquele período.13 Ainda nessa oportunidade, o Correio apresentou, segundo o que havia sido publicado no periódico A Noite, a entrevista que esse jornal fizera com o presidente geral da Comissão de Salário Mínimo, Sr. Nerceu Cruz César.14 Nela, o referido presidente declarava a respeito dos estudos sobre o salário mínimo:

(...) os estudos realizados pelo Serviço de Estatística do Trabalho sobre o assunto [salário mínimo], são minuciosos abordando os nossos problemas econômico-sociais, em todos os seus ângulos, pondo, desse modo, ao alcance do órgão sob sua presidência os elementos de que necessita para o encaminhamento imediato de suas atribuições.15

Porém, a riqueza e a importância de informações contidas nessa reportagem não se esgotaram nas referidas linhas citadas. Ainda sob as palavras do presidente da Comissão, Sr. Nerceu, o jornal Correio do Povo informou, ainda, o modo como os reajustes do salário mínimo deveriam ser feitos no Brasil e, nesse momento, refere-se à participação do Ministro do Trabalho João Goulart:

A Comissão de Salário Mínimo (...) tem por finalidade rever, para reajustar, de três em três anos, os salários que vigorarão no triênio seguinte. A última lei que estabelecia o salário mínimo (...) foi assinada em 1951. Nesse caso, uma nova revisão só seria feita em 1954. Todavia, a própria Consolidação das Leis do Trabalho assegura a revisão do salário vigente antes de decorrido o período de três anos, desde que profundas alterações econômicas e financeiras se tenham verificado. Daí a razão, porque ao cabo de dois anos de fixação do

12 SALÁRIO..., 1953, p. 7.13 SALÁRIO..., 1953, p. 12.14 Encontrou-se uma dificuldade em localizar o nome correto do presidente da Comissão de Salário Míni-mo. Em muitas reportagens, sobretudo no jornal Correio do Povo, há discordância no modo em chamá-lo, por exemplo, na reportagem do desse jornal em 9 de janeiro de 1954, é chamado de Dirceu Cruz César, ou então, já em 13 de fevereiro desse mesmo ano, é chamado de Nirceu César Cruz. Porém, nesse trabalho, tendo em vista a maior recorrência do nome Nerceu Cruz César, optou-se por essa denominação.15 SALÁRIO..., 1953, p. 12.

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último salário, a Comissão de Salário Mínimo (...) dos Estados, promoveram a revisão das bases atuais em termos que condigam com as necessidades dos trabalhadores (...) E as comissões estaduais de salário mínimo, na sua maioria acéfalas e desorganizadas, foram recompostas pelo ministro João Goulart, iniciando-se, assim uma fase decisiva de seus trabalhos. 16

A seguir, o Correio finalizou a matéria - ainda com as palavras do presidente Nerceu, reproduzindo, ainda, a publicação contida no periódico A Noite, - reiterando a participação do ministro João Goulart durante todo o referido processo e o empenho das comissões em promover de forma rápida os resultados de seus trabalhos:

Esse estudo, ao qual acompanhou, pessoalmente o ministro João Goulart, custou o penoso trabalho de equipe de técnicos. Só um desses técnicos executou cerca de 15 mil operações e cálculos. Por si se pode ter idéia do que foi a luta para levantar o panorama financeiro e econômico do país. Os componentes das comissões de salários mínimos, seguindo as instruções do titular da pasta do Trabalho, estão no firme propósito de promover um rápido entendimento entre as classes que representam, tanto de empregadores como de empregados, a fim de possibilitar uma solução imediata para a questão de revisão dos níveis atuais dos salários mínimos em todo o território nacional.17

Percebe-se, contudo, que logo após a publicação - pelo Correio do Povo - das reportagens a respeito dos trabalhos em andamento da comissão, ainda nesse jornal, surgiram reportagens que apresentavam as ressalvas dos empregadores para a possível nova proposta salarial e, até mesmo, as classes que se manifestavam contrárias ao modo como os estudos previam o aumento do salário mínimo. Detectou-se, todavia, que o jornal apresentava os reclames das classes patronais em relação ao que era discutido pela Comissão em nível regional (classes empregadoras de São Paulo reclamavam da Comissão de seu estado, por exemplo) e, ainda, reclames direcionados, também, ao ministro Jango. Por exemplo, na edição de 24 de dezembro, sob título “Restrições da classe patronal ao novo salário mínimo”, um texto no qual o Correio do Povo limitou-se a apresentar os argumentos da “oposição” à proposta salarial surgida no Distrito Federal, sendo essa proposta passível de dúvida quanto à sua legalidade. Dentre as justificativas utilizadas, o Correio informou apenas que “Os empregadores estão levantando uma preliminar quanto à revisão do salário mínimo: a da legalidade dessa revisão extraordinária, de vez que o atual salário mínimo foi adotado para vigorar até dezembro de 1954. Essa preliminar foi um dos temas da reunião de ontem no Ministério do Trabalho.” 18

Ainda a respeito desse enfoque – das matérias que apresentam o lado contrário ao aumento do salário mínimo ou as que contestam esse aumento – observa-se que o Diário

16 Idem.17 Idem.18 RESTRIÇÕES..., 1953, p. 24.

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de Notícias, pouco se manifestou a esse respeito. Há somente um texto em 29 de janeiro de 1954 cujo título “O problema do salário mínimo” refere-se à Federação do Comércio Varejista do Estado do Rio Grande do Sul, sendo esse texto caracterizado como “a pedido” da referida instituição manifestando-se em relação ao tema, não sendo incluída, portanto, como objeto de análise desse estudo, como já referido.

Por outro lado, em seguida, além das manifestações de oposição, o Correio do Povo dentre suas publicações reproduziu matérias sobre as manifestações do operariado pela iniciativa da referida proposta salarial. A exemplo disso, têm-se as reivindicações dos operários ao Presidente da República Getúlio Vargas e ao bom acolhimento por parte do presidente para com os trabalhadores, os recebendo ao lado do ministro Jango, em 14 de janeiro de 1954:

O presidente da República recebeu, hoje, no Palácio do Catete, em companhia do ministro do Trabalho, sr. João Goulart, numerosa comissão de lideres sindicais que foram manifestar pessoalmente ao chefe do governo o ponto de vista dos trabalhadores sobre a fixação dos novos níveis de salário mínimo, tratando ainda de outros assuntos de interesse das classes obreiras, (...) Os trabalhadores pleitearam a aprovação do novo salário mínimo na base de dois mil e quatrocentos cruzeiros para o Distrito Federal, de acordo com a decisão da comissão especial que estudou a matéria. Usou da palavra, na ocasião, o Sr. Luiz França, em nome dos trabalhadores presentes. Agradecendo a visita, o presidente Getulio Vargas declarou que aguarda o resultado dos estudos procedidos pelas comissões do salário mínimo para decidir sobre a importante questão. E concluiu dizendo que os trabalhadores podem contar mais uma vez com o seu apoio para a solução das justas reivindicações do operariado brasileiro. 19

De outro modo, o Diário de Notícias voltaria a publicar matérias sobre o salário mínimo apenas em fevereiro de 1954, ao passo que o Correio também levantara a questão da fixação dos novos níveis de salário mínimo. Há um forte contraste na reunião de informações entre um e outro periódico. Pelo Diário: “Divulga-se que dentro de uma semana o ministro do Trabalho enviará ao Sr. Getúlio Vargas a minuta do decreto que fixará os novos níveis do salário mínimo para todo o país. Uma vez entregue a minuta do decreto, espera-se que a medida seja baixada ainda este mês.”20

A informação que previa a fixação dos novos níveis de salário mínimo foi publicada pelos dois jornais no dia 11 de fevereiro de 1954, informando, segundo a imprensa da Capital da República, que o ministro João Goulart enviaria dentro de uma semana no máximo às mãos no presidente Getulio Vargas, a minuta do decreto que fixaria os novos níveis dos salários mínimos em todo o país. 21 E, no Diário de Notícias, sob o breve relato

19 O OPERARIADO..., 1954, p. 18.20 FIXAÇÃO..., 1954, p. 12.21 A FIXAÇÃO..., 1954, p. 16.

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de mesmo tom: “Divulga-se que dentro de uma semana o ministro do Trabalho enviará ao Sr. Getúlio Vargas a minuta do decreto que fixará os novos níveis do salário mínimo para todo o país. Uma vez entregue a minuta do decreto, espera-se que a medida seja baixada ainda este mês.” ·.

Em seguida, as últimas reportagens do Diário de Notícias a respeito do salário mínimo no período em que João Goulart foi Ministro do Trabalho ocorreram em 19 de fevereiro, quando o periódico informou que o ministro João Goulart havia entregue a Getúlio Vargas as conclusões dos estudos sobre o salário mínimo. E que o presidente, Vargas, segundo reportagem de 23 de fevereiro, estaria inclinado à fixação do salário mínimo, porém no patamar de 1.700 cruzeiros. 22

Já o Correio do Povo teve sua última matéria sobre a questão salarial em 24 de fevereiro de 1954. Mas ao publicar esse último texto, informou apenas a respeito do posicionamento de um empresário, de mesmo modo como já havia feito anteriormente com o presidente da Federação das Indústrias, Sr. Zulfe Freitas Malmann, ao reiterar a idéia de que as classes patronais não estavam contra, em princípio, ao aumento do salário mínimo, entretanto, nas bases em que se estava sendo pensando, as consequências previstas por esses empresários eram desastrosas. 23

Nesse sentido, percebe-se que os jornais Correio do Povo e Diário de Notícias ao comunicarem a respeito das ações do ministro Jango - envolvidas a respeito do salário mínimo, desde o momento de seu surgimento, até mesmo o momento da entrega do estudo sobre o possível aumento salarial ao presidente Vargas, observa-se que ambos os periódicos não pretendem constituir-se sob forma de um caráter opinativo sobre o tema. Percebe-se, também, que esses periódicos evitaram manifestar quaisquer considerações ao tema salarial. De todo modo, por fim, não apenas a questão do salário mínimo constituiu-se como enfoque para ambos os jornais em relação ao ministro João Goulart e suas ações durante seu exercício ministerial. A própria figura do ministro, seu modo de agir para com os trabalhadores, por exemplo, é entendida como importante aspecto de análise.

Jango: o homem e o Ministro Com base em 46 matérias selecionadas no Correio do Povo e 36 no Diário de

Notícias, é possível perceber que os referidos jornais também retrataram o ministro João Goulart a partir das suas características pessoais, dos seus princípios profissionais, bem como seu posicionamento político-administrativo à frente da pasta trabalhista.

Dentre as primeiras referências em destaque, têm-se a reprodução do discurso de posse de Jango, ainda em junho de 1953, na qual os jornais apresentam o modo

22 VARGAS..., 1954, p. 16.23 O COMÉRCIO..., 1954, p. 14.

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como João Goulart pretendia manter seu modo de ser e de agir, além de apresentar seus ideais e orientações políticas, indicando, ainda, de que maneira pretendia atuar durante sua administração no Ministério do Trabalho. Tais falas, deve-se aqui observar, seriam reiteradamente repetidas por Jango e reproduzidas em muitas ocasiões por ambos os jornais, como, por exemplo, em discursos por ele proferidos em inaugurações de sedes trabalhistas, ou ao se defender de acusações de diversos setores sociais e políticos em relação à sua atuação ministerial.

Ainda a respeito sobre sua posse no Ministério, Jango disse que seu compromisso de trabalho à frente do Ministério estava direcionado ao povo “no mais amplo sentido da expressão e especialmente com o proletariado”, dentre os quais dizia ter “orgulho de contar com inúmeras e sinceras amizades”. Além disso, em reforço ao seu argumento, disse, ainda, que pertencia “a um partido político cujo programa se assenta na defesa dos interesses dos trabalhadores, através do sistema de perfeito entendimento com as classes patronais, tendo como finalidade principal o bem-estar de todos e o progresso da nação”.24

Sobre essas mesmas questões, relativas às relações entre Jango e os trabalhadores, o Diário de Notícias também abordou com destaque alguns importantes aspectos do discurso de posse de João Goulart, destacou na fala de Jango sua proposta de atuação no Ministério do Trabalho, bem como de seu prognóstico sobre a realidade nacional:

(...) meus objetivos são claros e definidos, resumindo-se na conquista de uma ordem social mais justa, sem a mínima quebra das nossas tradições democráticas. Não trago para o Ministério um programa de inquietações – como pretendem algum setores políticos – e nem prometo solucionar milagrosamente os inúmeros problemas dos trabalhadores. Todos sabem, de resto, que esses problemas são consequência da realidade econômica que, no Brasil de hoje, se apresenta particularmente difícil às classes proletárias. Daí porque uma das minhas principais preocupações será fazer com que este Ministério, numa ação conjunta com os demais órgãos da administração pública, empenhe todos os seus recursos técnicos e humanos no esforço comum de superar as causas desse desajustamento – que pode ser apontado como fonte de profundos desequilíbrios, notadamente nos orçamentos domésticos dos trabalhadores. 25

Ainda em favor dos trabalhadores, Jango destacaria a importância dos sindicatos, dizendo estar ciente que a eficácia das ações de seu cargo estariam fadadas ao insucesso caso não houvesse “arregimentação imediata do proletariado através de células vivas e palpitantes do seu organismo – que são os sindicatos. Somente eles, com efeito, podem oferecer aos trabalhadores os meios legais, efetivos para a defesa de seus interesses

24 FAZ O TITULAR..., 1953, p.14.25 Idem.

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econômicos ou profissionais.”26

Em seguida, em outra oportunidade, Jango reitera seu posicionamento em prol dos sindicatos, prevendo a intensificação da sindicalização da massa trabalhadora do país, declara João Goulart:

(...) posso afirmar com satisfação que já se nota um interesse muito maior dos nossos trabalhadores principalmente aqui no Rio e em São Paulo, onde os trabalhadores com o seu ingresso nos sindicatos, estão procurando prestigiar os órgãos de classe. E eu, de minha parte, emprestarei todo o apoio e prestigio aos sindicatos, órgãos da defesa dos direitos e das justas reivindicações dos trabalhadores.27

Já em outra oportunidade apresentada pelo Correio do Povo, Jango sintetizou a idéias na qual entendia ser “dever do Ministério do Trabalho, portanto, estimular e prestigiar a organização sindical.” 28

Dentre os discursos de João Goulart proferidos em diferentes ocasiões, tem-se na ocasião da posse do novo dirigente da Delegacia Regional do Trabalho do Estado de São Paulo, o pronunciamento do ministro Jango em relação ao seu modo de pensar e de agir em relação e em beneficio aos trabalhadores, pois ciente estava dos difíceis fardos que a relação com esse grupo representava:

Mas acontece que, se não tenho vocação para cortejar os poderosos, muito menos para trair aqueles que em mim depositam suas esperanças. (...) Sou daqueles que, desafiando contestações acreditam sinceramente que o trabalhador brasileiro, para solucionar seus problemas, não necessita recorrer à violência ou à ilegalidade, bastando apenas exercitar as prerrogativas que lhe conferem os próprios recursos do regime democrático vigente no país. Não me afastarei uma polegada sequer na orientação que venho seguindo no exercício da investidura com que me honrou o preclaro Sr. Presidente da República. 29

Por fim, o ministro Goulart disse que o “pesado tributo” que cairia sobre seus braços seria simplesmente por “zelar pelo cumprimento das leis e ficar ao lado dos desafortunados.” 30

Em relação a essas idéias e posicionamentos para com o ministro Jango, encontramos no Correio do Povo e Diário de Notícias uma série de manifestações de membros da sociedade civil, ou de grupos políticos e militares. Nas matérias do Correio

26 RESPOSTA..., 1953, p. 2.27 AFIRMA..., 1953, p. 18.28 Idem.29 EXPOSTA..., 1953, p. 19.30 EXPOSTA..., 1953, p. 19.

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e do Diário, observa-se que houve a forte oposição por parte de membros e de entidades da sociedade civil e militar durante todo o período de exercício do Ministro João Goulart foram reproduzidas. Há, entretanto, um aspecto interessante a ser destacado sobre o teor dessas matérias, pois, em sua grande maioria, o que é apresentado não são os argumentos em si da oposição ao ministro, nem suas falas, mas, sim, os discursos de João Goulart defendendo-se de diferentes acusações em relação a sua postura frente à pasta trabalhista. Nesse sentido, Jango foi muitas vezes taxado de agitador popular, peronista, comunista, a favor da República Sindicalista no Brasil, sendo esses alguns dos rótulos atribuídos a João Goulart por parte dos oposicionistas. Tais acusações ao novo ministro surgiram já nos primeiros dias de sua posse no Ministério do Trabalho, na qual o Correio do Povo reproduziu graves acusações publicadas no jornal carioca Correio da Manhã ao recém empossado ministro, como se pode perceber pela citação abaixo:

O Correio do Manhã de hoje publica com grande destaque, na primeira página, um editorial, subordinado ao título “Preparando o golpe”, em que faz sérias acusações ao Sr. João Goulart, recentemente nomeado para o Ministério do Trabalho. (...) Depois de uma série de considerações, afirmando que o objetivo da nomeação do Sr. João Goulart é a formação de uma ‘frente sindical’, com que ‘seria completamente dominada a vida nacional e as próprias forças armadas, que são o único obstáculo para esse intento’ (...). Finalmente, concluiu o editorial: “o grupo Jango, ou simplesmente os jangos, já estão articulados com os trabalhadores do Nordeste através do diretório da região, com sede em Recife, mantendo ampla atividade em São Paulo e em Porto Alegre. (...).31

O Correio apresentou a defesa de Jango, o qual teria dito que tais argumentos eram boatos eu que não o surpreenderiam, pois, “(...) são extremamente ridículos e não encontram mais qualquer eco na opinião pública”. 32

É possível destacar, também, mais um momento significativo no qual a oposição se manifestou contra Jango publicamente. Foi a matéria do Diário de Notícias apresentando a oposição de outro político contra o ministro do Trabalho, conforme o trecho abaixo:

Na opinião do senador Hamilton Nogueira, o atual ministro do Trabalho está promovendo a liquidação da ordem política e social no país. O senador aponta ainda o Sr. João Goulart como demagogo a serviço de interesses antidemocráticos. O representante da UDN carioca, em entrevista concedida ao Diário da Noite, salientou, ainda, a coincidência de pontos entre a propaganda do Sr. João Goulart e a política peronista, declarando que o que o Sr. João Goulart está fazendo é exatamente por ordem e indicação do Sr.

31 ACUSADO..., 1953, p. 12.32 Idem.

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Getúlio Vargas e é tão mais grave quando coincide com a propaganda que a Argentina peronista está intensificando no Brasil. (...).33

Entretanto, não há entre as demais reportagens do Diário a possível resposta de João Goulart para essas últimas acusações.

De outro modo, como já se referiu anteriormente, há outras matérias nos jornais Correio do Povo e Diário de Notícias nas quais se encontram as falas de João Goulart defendendo-se dos seus opositores, mesmo quando esses não tinham seus nomes divulgados. Novamente, as defesas que Jango necessitava efetuar continuavam a ser a respeito dos “rótulos” que recebia, agitador, comunista, peronista. Nesse sentido, como se percebe no trecho a seguir, publicada pelo Correio, Jango falou a respeito de uma dessas acusações que vinha sofrendo por parte de alguns jornalistas do Rio. Naquela ocasião, ao ser acusado por esses profissionais cariocas (sem citar seus nomes) de pretender implantar o peronismo no Brasil, disse o titular do Trabalho:

Essas acusações que me fazem são destituídas de qualquer fundamento. (...) Ora represento um perigo para o regime, ora sou peronista, para alguns já estou sendo comunista ou então falsário e anarquista. Essa campanha, entretanto (...) não me fará recuar um centímetro sequer no caminho que me tracei à frente deste Ministério, e é com o apoio de milhares de trabalhadores, que, por todos os meios, já me manifestaram sua integral solidariedade. 34

Em outro episódio, como consta na reportagem do Diário de Notícias, em agosto daquele ano, Jango questionava: “Afinal, perguntaria, de quê me culpam? De ficar até altas horas atendendo aqueles que batem às portas do Ministério do Trabalho buscando uma solução para os seus problemas? Ora, se é crime o cumprimento do dever, aceito, até com orgulho, a pecha de criminoso.”35

Por um lado, como se apresentou anteriormente, a oposição sofrida pelo líder da pasta trabalhista esteve presente ao longo de todo seu exercício ministerial e foi reproduzida, em parte, pelos jornais Correio do Povo e Diário de Notícias. Ao mesmo tempo, também se observou que os referidos jornais apresentavam, também, o modo como Jango procurava defender-se de tais acusações. Por outro lado, é possível apontar, ainda, e com maior destaque, que Correio e Diário, demonstraram certa simpatia em suas matérias ao falar do ministro Jango. Infere-se isso, sobretudo nas reportagens que retrataram as visitas de João Goulart a Porto Alegre.

Em 29 de outubro de 1953, o Correio do Povo anunciava a vinda do ministro João

33 HAMILTON..., 1953, p. 2. 34 AFIRMA..., 1953, p. 18.35 EXPOSTA..., 1953.

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Goulart à capital gaúcha para o próximo dia 12 de dezembro, sem, no entanto, promover maiores aclamações. Todavia, percebe-se que, chegado o dia da visita do líder da pasta trabalhista a Porto Alegre, foi com entusiasmo que Correio do Povo e Diário de Notícias divulgaram o fato. No primeiro jornal, inclusive, sob o título “Os trabalhadores gaúchos receberão, hoje, entre grandes manifestações de apreço, o seu Ministro do Trabalho”, o jornal publicou uma rápida biografia de João Goulart e, concluiu, que, desde “(...) junho do corrente ano, foi nomeado Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, onde se vem empenhado decididamente pela aplicação dos princípios de justiça social.” 36

Já o Diário de Notícias, a chegada do ministro enfocou outros aspectos:

Chega, hoje, a Porto Alegre, mais discutido dos homens da República destes últimos tempos: Jango Goulart, ministro do Trabalho, Indústria e Comércio do governo do Sr. Getúlio Vargas. Gaúcho da fronteira, jovem (o mais jovem do Ministério), o Sr. João Belchior Marques Goulart recebeu, até a ascensão de Aranha, os ataques (cerrados) do grosso da imprensa carioca. Ataque aos quais a principio não deu trela, mas que por fim levaram-no a irritar-se. E a revidar: “Reacionário é o que eles são; não compreendem porque o ministro do Trabalho deva defender os trabalhadores.” Acharam-no a ele, Jango, ameaça constante ao regime. Sem poder contar com uma boa milícia, armada, o responsável pela pasta do Trabalho, Indústria e Comércio achou de bom alvitre não contestar a acusação. Goulart vai levando. Baniu-se da onde que lhe imputou boa parte da imprensa do Rio (...) e saiu para o interior desses brasis, a encetar mesas redondas com as classes trabalhadoras. E, às vezes, com as patronais. No seio das primeiras tem conseguido (...) simpatias amplas. As últimas, as dos patrões, não querem-no mal de todo. Goulart vai levando (...). 37

A repercussão da visita de João Goulart a Porto Alegre não cessou imediatamente. No dia seguinte, o Correio noticiou que, na véspera daquele dia, o ministro Jango havia chegado à cidade. (RECEBIDO..., 1953, p. 4). Mas no dia 17, ainda daquele mês, tanto o Correio do Povo quanto o Diário de Notícias publicaram extensas matérias sobre a repercussão da visita do ministro. No Correio, intitulada “O Rio Grande recebeu de coração aberto o jovem e eminente Ministro João Goulart” e no Diário, intitulada “Profunda a repercussão da vibrante recepção de Porto Alegre a Goulart”, ambas as reportagens continham partes do mesmo texto, o qual, em alguns trechos informava:

Poucas vezes, na crônica de nossa cidade, um homem público foi recebido como o Sr. João Goulart (...) se puseram à prova foram os sentimentos fraternais dos trabalhadores gaúchos, de gratidão e lealdade, para com o

36 OS TRABALHADORES..., 1953, p. 12.37 CHEGA HOJE..., 1953, p. 12; 4.

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moço que, recém-saído dos pagos a fim de ocupar um dos mais altos postos na administração federal, fez dos interesses da classe trabalhadora a sua preocupação permanente, procurando melhorar as suas condições de vida, através de medidas governamentais e de uma ação sempre harmonizada e conciliatória entre empregadores e empregados. 38

Encerrado os dias nos quais Jango esteve em solo gaúcho, somente no período próximo a sua demissão, os jornais voltariam a comentar sobre a vinda do ministro ao Estado. Porém, o teor de entusiasmo verificado durante os dias daquela visita de dezembro de 1953 não se repetiram.

Por fim, observa-se que dentre as matérias selecionadas no Correio do Povo e no Diário de Notícias as quais indicavam a respeito tanto das características pessoais de João Goulart, da sua orientação política, quanto da oposição e dos apoios que recebeu por parte da sociedade, foram retratados com destaque pelos referidos periódicos. Observou-se, também, que em especial as matérias que se referiam à presença do ministro em solo gaúcho, essas receberam significativo destaque por parte dos jornais, percebendo-se, ainda, certa simpatia, em maior ou menor proporção pelos dois periódicos.

Referências Bibliográficas

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38 O RIO GRANDE..., 1953, p. 12; PROFUNDA..., 1953, p. 9.

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VILLA, Marco Antonio. Jango: um perfil. São Paulo: Globo, 2004.

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CHEGA HOJE. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 12, 12 dez. 1953.

CONGELAMENTO. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 16, 16 jul. 1953.

ESTUDOS. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 12, 6 ago. 1953.

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FAZ O TITULAR. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 14, 19 jun. 1953.

FIXAÇÃO. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 12, 11 fev., 1954.

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HAMILTON Nogueira contra Goulart. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 2, 28 out. 1953.

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JOÃO GOULART. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 14, 20 jun. 1953.

O COMÉRCIO. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 14, 24 fev, 1954.

O MINISTRO. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 44, 6 set. 1953.

O RIO GRANDE. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 12, 17 dez, 1953.

O OPERARIADO. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 18, 14 jan, 1954.

OS LÍDERES. CORREIO DO POVO,Porto Alegre, p. 16, 26 set. 1953.

OS TRABALHADORES. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 12, 12 dez. 1953.

PROFUNDA. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 9, 17 dez. 1953.

RECEPCIONADO. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 5, 3 mar. 1953.

RECEBIDO. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 4, 13 dez. 1953.

RESPOSTA. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 2, 20 jun. 1953.

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RESTRIÇÕES. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 24, 24 dez. 1953.

SALÁRIO Mínimo. CORREIO DO POVO, Porto Alegre, p. 7, 05 mai, 1953.

VARGAS. DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Porto Alegre, p. 16, 23 fev, 1954.