jesuitas

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Terra adentro As missões jesuíticas se alastraram pelo Nordeste por dois séculos e não se limitaram ao litoral Maria Emilia Monteiro Porto 1/6/2012 Chapada do Apodi no Rio Grande, Salvador e vilas litorâneas do sul da Bahia ou do Ceará são algumas das paisagens do Nordeste brasileiro que guardam a memória da ação dos jesuítas entre 1549 e 1759. Eles se espalharam pelo território brasileiro desde 1550, por meio de missões volantes centralizadas nos colégios da Bahia e do Rio de Janeiro. As que tiveram êxito permitiram a Manuel da Nóbrega (1517-1570) organizar, de sua base na Bahia, o sistema de missões que abrangia de Pernambuco a São Vicente. Desde 1556 foram fundadas Casas nas capitanias de Espírito Santo, São Vicente, Porto Seguro, Bahia, Olinda (1558), Rio de Janeiro (1568) e Pernambuco (1572). Esses lugares ofereciam o ensino elementar complementar da catequese entre os indígenas; eram os núcleos iniciais da expansão missionária, que originariam residências, missões, colégios, igrejas e seminários. Mas ainda havia uma vasta região a conquistar: os cerca de 2.400 quilômetros que se estendiam de Pernambuco até o Maranhão pela costa, e os confins que se estendiam para o interior. Acompanhando a expansão das forças coloniais, que no final do século XVI ganhou novo vigor, os jesuítas foram constituindo novas frentes e integrando-as ao projeto de fazer cidades e cidadãos católicos. Eles chegaram ao Rio São Francisco em 1575, alcançando SergipeeAlagoas. Após a conquista da Paraíba em 1585, que tem no Sumário das Armadas uma mostra do que foi o início dessa nova trajetória, os jesuítas desenvolveram missões que foram interrompidas por intolerância dos moradores, mas voltaram no final do século XVII, fundando em 1683 o Colégio da Paraíba, atual Faculdade de Direito. Inicialmente acompanhando a tendência litorânea da conquista, as missões do Rio Grande (1599), Ceará – além das do Piauí e do Maranhão, então integrados à Amazônia colonial portuguesa – tiveram em comum uma dinâmica de interiorização a partir da metade do século XVII. A ocupação holandesa (1630-1654) e a Guerra dos Bárbaros (1683-1713), uma das mais importantes guerras indígenas da História brasileira, põem em cena um sertão de índios sem terras, conflitos étnicos (entre potiguaras e tapuias) e a lógica brutal da prática escravista dos moradores e sertanistas. As missões chegam ao Ceará entre 1607 e 1608, e o centro foi a Missão de Ibiapaba, em 1671, na serra de mesmo nome. A ação dos jesuítas deixou sua marca nos prédios ainda bem conservados doColégio da Bahia, em Salvador, e nas belas ruínas das periferias da

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Page 1: JESUITAS

Terra adentroAs missões jesuíticas se alastraram pelo Nordeste por dois séculos e não se limitaram ao litoral

Maria Emilia Monteiro Porto

1/6/2012

Chapada do Apodi no Rio Grande, Salvador e vilas litorâneas do sul da Bahia ou do Ceará são algumas das paisagens do Nordeste brasileiro que guardam a memória da ação dos jesuítas entre 1549 e 1759. Eles se espalharam pelo território brasileiro desde 1550, por meio de missões volantes centralizadas nos colégios da Bahia e do Rio de Janeiro. As que tiveram êxito permitiram a Manuel da Nóbrega (1517-1570) organizar, de sua base na Bahia, o sistema de missões que abrangia de Pernambuco a São Vicente.

Desde 1556 foram fundadas Casas nas capitanias de Espírito Santo, São Vicente, Porto Seguro, Bahia, Olinda (1558), Rio de Janeiro (1568) e Pernambuco (1572). Esses lugares ofereciam o ensino elementar complementar da catequese entre os indígenas; eram os núcleos iniciais da expansão missionária, que originariam residências, missões, colégios, igrejas e seminários. Mas ainda havia uma vasta região a conquistar: os cerca de 2.400 quilômetros que se estendiam de Pernambuco até o Maranhão pela costa, e os confins que se estendiam para o interior. Acompanhando a expansão das forças coloniais, que no final do século XVI ganhou novo vigor, os jesuítas foram constituindo novas frentes e integrando-as ao projeto de fazer cidades e cidadãos católicos.  

Eles chegaram ao Rio São Francisco em 1575, alcançando SergipeeAlagoas. Após a conquista da Paraíba em 1585, que tem no Sumário das Armadas uma mostra do que foi o início dessa nova trajetória, os jesuítas desenvolveram missões que foram interrompidas por intolerância dos moradores, mas voltaram no final do século XVII, fundando em 1683 o Colégio da Paraíba, atual Faculdade de Direito. Inicialmente acompanhando a tendência litorânea da conquista, as missões do Rio Grande (1599), Ceará – além das do Piauí e do Maranhão, então integrados à Amazônia colonial portuguesa – tiveram em comum uma dinâmica de interiorização a partir da metade do século XVII. A ocupação holandesa (1630-1654) e a Guerra dos Bárbaros (1683-1713), uma das mais importantes guerras indígenas da História brasileira, põem em cena um sertão de índios sem terras, conflitos étnicos (entre potiguaras e tapuias) e a lógica brutal da prática escravista dos moradores e sertanistas. As missões chegam ao Ceará entre 1607 e 1608, e o centro foi a Missão de Ibiapaba, em 1671, na serra de mesmo nome.A ação dos jesuítas deixou sua marca nos prédios ainda bem conservados doColégio da Bahia, em Salvador, e nas belas ruínas das periferias da Colônia, como as da Missão de São Miguel em Estremoz, no Rio Grande do Norte.Há muito para ser visto sobre esse Nordeste que se integra à América portuguesa do fim do século XVI ao século XVII.

 

Page 2: JESUITAS

Maria Emilia Monteiro Portoé professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e autora da tese “Jesuítas na Capitania do Rio Grande – séc. XVI-XVII”. (Universidade de Salamanca, 2001).

 

Saiba Mais - BibliografiaANÔNIMO. “Sumário das armadas que se fizeram e guerras que se deram na conquista do Rio Paraíba, 1587”. In Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, nº 36. Rio de Janeiro: IHGB, 1873.ASSUNÇÃO, Paulo de. Negócios jesuíticos: o cotidiano da administração dos bens divinos. São Paulo: Edusp, 2004.FRANCO José Eduardo; TAVARES Célia Cristina. Jesuítas e Inquisição. Cumplicidade e confrontações. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2007.LACOUTURE, Jean. Os Jesuítas, vol. 1: Os conquistadores. Porto Alegre: L&PM, 1994.OLIVEIRA, Carla Mary S. O Barroco na Paraíba: arte, religião e conquista. João Pessoa: Editora Universitária-UFPB/ Iesp - Instituto de Educação Superior da Paraíba, 2003.POMPA, Cristina. Religião como tradução: missionários, tupi e “tapuia” no Brasil colonial. Bauru, SP: Edusc, 2003.

 

Saiba Mais - Filme“Sermões, a História de Antônio Vieira”, de Júlio Bressane (Brasil), 1989.