jequitinhonha e sao francisco

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O livro Resgate cultural dos vales dos rios Jequitinhonha e São Francisco reúne imagens e depoimentos dos moradores do Norte de Minas. O livro é uma iniciativa do SEBRAE com o Governo de Minas.

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Resgate Cultural dos

Vales dos Rios Jequitinhonha e São Francisco

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Realização

SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS

SEBRAE NacionalArmando de Queiroz Monteiro Neto – Presidente do Conselho DeliberativoPaulo Tarciso Okamotto – Diretor PresidenteLuiz Carlos Barboza – Diretor TécnicoCésar Rech – Diretor financeiroVinícius Nobre Lages – Gerente da Unidade de Atendimento Coletivo, comércio e serviçosDurcelice Cândida Mascêne / Patrícia Salamoni – Coordenadora do Programa SEBRAE de Artesanato

SEBRAE - MGConselho Deliberativo - Banco do Brasil, BDMG, Caixa Econômica Federal, CDL-BH, CETEC, CIEMG, FAEMG, FAPEMIG, Fecomércio, Federaminas, FIEMG, INDI, OCEMG, SEBRAE e Secretária do Estado de Desenvolvimento Econômico. Luiz Carlos Dias Oliveira – Presidente do Conselho DeliberativoEdson Gonçalves de Sales – Diretor superintendente Luis Márcio Haddad Pereira Santos – Diretor de Desenvolvimento e AdministraçãoMatheus Cotta de Carvalho – Diretor de Cormecialização e Articulação RegionalAgmar Abdon Campos – Coordenador do Núcleo de Apoio ao Desenvolvimento dos Vales do Jequitinhonha, Mucuri e do Norte de Minas.

GERÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO DO SEBRAE – MGMarise Xavier Brandão

EQUIPE DO PROGRAMA SEBRAE DE ARTESANATOSabrina Campos AlbuquerqueSimone Aparecida da SilvaMarina Lúcia de Oliveira

SECRETARIA DE ESTADO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DE MINAS GERAIS Wilson Nélio Brumer – Secretário EstadualCarlos Eduardo Orsini Nunes de Lima – Subsecretário de Indústria, Comércio e ServiçosMaria Amélia Dornelles Dangelo – Superintendente de ArtesanatoBeatriz Leal Santana – Diretora de Desenvolvimento do ArtesanatoThiago Tomaz de Souza – Diretor de Promoção do Artesanato

Execução

SECRETARIA DE ESTADO DE CULTURAEleonora Santa Rosa - Secretária de Estado de CulturaMarcelo Braga de Freitas - Secretário Adjunto de Estado de Cultura

FUNDAÇÃO DE ARTE DE OURO PRETO – FAOPAna Maria Pacheco - Presidente Marconi Drummond Lage - Diretor da Escola de Arte Rodrigo Melo Franco de AndradeRosilene Fagundes Ladeira - Diretora de Planejamento Gestão e FinançasWalter Brizola Jr. - Coordenador do ProjetoJoana Pinto - Secretaria Execultiva

Produção e PesquisaTatiana CavinatoMaria Elisa Costa e SilvaFernanda Chagas de Oliveira

FotografiaAndré Fossati do Amaral ( orelhas; paginas 02 a 07; 10 a 25; 29; 34 a 115; 158 e 160 )Francilins Castilho Leal ( capa; paginas 08 e 09; 26; 30; 116 a 157 )

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Textos e PesquisaCid WildhagenRicardo Gomes LimaAntônio de Paiva Moura

Documentação em VídeoFundação Cultura Genial Tourinho

Projeto GráficoDomani ComunicaçãoMarisa Simões Coelho - Gerenciamento de Projeto GráficoAloisio Neves - Edição de ImagensKlaus Bernhoeft - Editoração e Direção de Arte

CartografiaMarcos Brito

Pesquisa MusicalMaria Lúcia Florêncio

CeramistaAlex D´artes

MestresEustáquio Ferreira, Antônio de Fátima Ferreira e Silvio Sebastião FerreiraLúcia Pereira da Rocha e Alice RochaMaria Efigênia FigueiredoJoão Antônio Costa e Eva Alves MachadoBelizário Pereira CoelhoMaria da ConceiçãoMaria Efigênia CostaElzi Gonçalves PereiraMaria Angélica Fonseca dos ReisJosé Rodrigues de QueirozOlímpia, Flaviana e Zumira Cordeiro do RosárioOscarlinda Batista da SilvaIrênio de Souza Santana

MonitoresAline Silva MagalhãesMaria JoanaIzaltina da ConceiçãoPedro Paulo Vieira de MacedoSelma QuaresmaAntônio José RaposoGilmara Rodrigues do RosárioNeide de Oliveira CardosoNísia de Oliveira CardosoMaria do Carmo Hipólito Ferreira

Parcerias

SEDVAN – Secretaria Extraordinária de Desenvolvimento dos Vales Jequitinhonha, Mucuri e Norte de Minas.IDENE – Instituto de Desenvolvimento do Norte/Nordeste de Minas GeraisAAFAOP – Associação Amigos da Faop.

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© 2005, Copyright by Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas EmpresasTodos os direitos reservados.

É proibida a duplicação ou reprodução deste volume ou de sua parte, por quaisquer meios, sem autorização expressa do SEBRAE.

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Sumário

Apresentação...............................................................................................................22

Mapa de Localização....................................................................................................32

Contextualização do Vale do Rio Jequitinhonha..........................................................34

Renda de Bilro e Crivo.................................................................................................44

Alambiques..................................................................................................................52

Tambores da Irmandade do Rosário e Congado da Misericórdia..................................60

Panelas de Moça Santa.................................................................................................68

Folia de Reis.................................................................................................................76

Corda de Caroá............................................................................................................84

Boi de Janeiro...............................................................................................................92

Panelas de Barro.........................................................................................................100

Bordado Rechiliê........................................................................................................108

Contextualização do Vale do Rio São Francisco......................................................116

Barcos........................................................................................................................126

Renda de Bilro...........................................................................................................134

Terno das Pastoras......................................................................................................142

Funilaria.....................................................................................................................150

Agradecimentos.........................................................................................................159

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Mapa de Localização

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Fotos: André Fossati / Textos: Cid Wildhagen

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Vale do Rio Jequitinhonha

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A tradição do fazer do Jequitinhonha

Vale do Jequitinhonha foi, até as duas primeiras décadas do século XVIII, pertencente à Bahia,

recebendo fortes influências daquela Capitania, com reflexos até o presente momento. Em face das

condições históricas e naturais a região é bastante heterogênea, com diferenças sociais entre o Alto,

o Médio e o Baixo Jequitinhonha. O Alto Jequitinhonha atraiu a atenção dos grandes centros desde

a época colonial até a República Velha, enquanto o Médio e o Baixo Jequitinhonha permaneceram

isolados, sem estradas, comunicando-se internamente através de um primitivo transporte fluvial,

alternado pelo cavalo de sela, pela tropa de burros e carro de bois.

O

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Os brancos, remanescentes ibéricos migraram do

Sul da Bahia e da Região Central de Minas. Legaram

a tradição do trabalho com o couro como atesta a

presença dos seleiros de Araçuaí. Na indústria caseira

da região é notável a qualidade da rapadura; do

requeijão moreno; dos doces de fruta com rapa-

dura e dos licores, a exemplo dos feitos por Dona

Mundinha, de Itamarandiba. A tecelagem caseira

também é de boa qualidade. Prima pelos ornatos em

cores vivas das colchas, tapetes e cortinas. Grande

parte dos habitantes de Chapada do Norte se ocupa

do tecido arraiolo.

Prof. Antônio Moura

Podemos dizer, sem perigo de errar, que o Vale do

Jequitinhonha, em toda a sua extensão, é a região

mineira onde a capacidade de trabalhos manuais

é mais expressiva. Mirando a capelinha de São

Gonçalo de Minas Novas, podemos imaginar quantos

marceneiros, pedreiros e oleiros lá estavam no meio

do século XVIII, oferecendo trabalho que caracte-

rizaria toda a região: simplicidade e originalidade.

A miscigenação entre o negro, o índio e o branco

não é visível somente na cor da pele do habitante da

região, mas em tudo de artificial produzido: artesa-

nato, arte popular, música, literatura e dramaturgia.

Na cerâmica percebemos uma nítida influência do

indígena, especialmente o botocudo que habitou a

região. O alemão Wind-Neuvied, em 1817, observou

a habilidade desses índios ao usar um instrumento

de caça chamado bodoque. A bala a ser arremessada

com arco e cordas era confeccionada de barro, em

forma esférica, na dimensão de uma bola de gude,

queimada em forno cerâmico. Do uso do bodoque

vem o nome botocudo. O forno cerâmico cavado na

rocha de hoje é uma experiência indígena. Também

a estética indígena foi transferida ao artista popular

do Jequitinhonha, pois os pigmentos obtidos com o

taguá - vermelho-terra - e com a tabatinga - branco

- predominam na maioria das peças da região.

Os negros migrados da Bahia contribuíram com as

técnicas de trabalhos em ferro e madeira. Os africanos

de origem Bantu revelaram-se excelentes fundidores

de ferramentas. Em Itamarandiba encontramos fer-

reiros que confeccionam ferro para marcar gado,

facas, facões e outros objetos. A Banda de Taquara,

do povoado de Bem Posta, no município de Minas

Novas é composta de elementos negros. Curiosamente,

todas as indumentárias e instrumentos musicais são

confeccionados pelos componentes da banda.

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Capelinha

Renda de Bilro e Crivo

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Lúcia Pereira da Rocha e Alice Rocha

Mestras

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Agulha, linha e amor

costura e o bordado eram considerados, desde os tempos coloniais, como uma tarefa consagrada às

mulheres, porque necessitava paciência e perseverança, valores impostos a elas na reclusão da casa.

O trabalho feminino se estabelecia pelo regime social do patriarcalismo, que limitava a mulher a uma

determinada experiência de vida. No entanto, na região mineradora, onde a vida e a sociabilidade

eram mais fluidas e a mobilidade social maior, observou-se outros tipos de famílias que não as da

"casa-grande". Nesta sociedade houve a ascensão de muitas mulheres a variados papéis, muito além

daquelas enclausuradas pelos esposos, havendo, sobretudo, relativa liberdade das mulheres nas camadas

populares da sociedade. As bordadeiras e rendeiras do Vale do Jequitinhonha, sucessoras deste modo

de vida, mostram com simplicidade que o seu fazer aflora um modo de ser, além da habilidade com

A

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as mãos, mas um pensar que abrange conhecimentos,

princípios e celebrações conquistados ao longo do

tempo.

Em Capelinha, cidade situada no Alto Jequitinhonha,

rodeada de eucaliptos e cafezais a perderem de vista,

residem duas senhoras. Ambas sempre viveram de

suas habilidades com panos, agulhas, cores e a lida

com as pessoas. Dona Lúcia, 86 anos, conduz a ofi-

cina de forma sociável, conversando animadamente

com suas alunas. Versátil, os seus movimentos são

leves e rápidos, tanto que consegue fazer várias

coisas ao mesmo tempo, para desespero das alunas

que não conseguem acompanhar a rapidez de suas

mãos. A técnica que ensina é a renda tecida com bil-

ros, tendo como base um papelão picado, também

chamado "pique", afixado numa almofada cilíndrica

por meio de alfinetes. A forma da renda a distingue

das demais elaboradas com agulha.

Dona Lúcia fala com admiração de sua irmã. "Alice

era professora na roça. Tem muitos em Capelinha

que ela ensinou a ler e a escrever. Parecemos muito

uma com a outra. Temos a mesma santa de devoção

e muita fé para alcançar as coisas. Diferente da

mocidade de hoje. Eles querem tudo pronto, têm

uma pressa que eu não entendo. Atualmente na

cidade só tem seis pessoas bordando. Aqui no Vale

todo muito faz coisas muito bonitas. Já me pergunta-

ram por que, mas não sei. É um dom de Deus, né?".

Dona Alice tem no trabalho de bordar uma fonte

de alegria cotidiana. Olhar sonhador, voz calma,

expressa a imagem de uma pessoa humilde, emotiva

e bondosa. Conta com delicadeza que em sua

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Chapada do Norte - Comunidade de Moça Santa

Panelas de Moça Santa

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Maria Efigênia Figueiredo

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galinha amarrada com um fio de algodão de forma

a proporcionar um traço mais uniforme, embora

algumas peças sejam pintadas com os dedos.

"É a parte que mais gosto. Antes tem que prestá

atenção, muita. Sabê onde vai, senão perde tudo

que fez. Tudo ajuda pra virar panela: água, barro,

sol, até o vento que sopra. Mas quando pinta fica

tudo bonito. A gente esquece as coisa, tudo, da

vida...".

Finalmente, utilizando os recursos naturais encon-

trados na região, as paneleiras fazem a queima das

peças num antigo sistema: a queima de barranco,

sistema copiado das olarias.

Para tal, o barranco serve de caldeira do forno que é

alimentado por lenha, localizada na base do mesmo,

enquanto a boca no topo do barranco recebe as

peças, assentadas numa chapa cheia de orifícios,

o que permite as chamas tocarem as peças. Este

processo dura aproximadamente nove horas, numa

temperatura aproximadamente de setecentos graus.

"Nos dia frio o quente do forno é bom de ficá perto.

De noite é bonito, o fogo brilha vermelho. A gente

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Belizário Pereira Coelho

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Nunca perdi a fé no que é feliz

eu Belizário é o marcador da Folia de Reis de Berilo, pequena cidade do Jequitinhonha, que tem

sua origem no começo do século XVIII, quando bandeirantes batearam ouro no vale do rio Araçuaí.

"Mas eu nasci mesmo foi em Comercinho, bem na divisa com Salinas que são a terra do fumo e da

cachaça. Pode-se dizer que lá se juntou os dois vício bravo. Meu pai era agricultor, plantava milho,

feijão, mandioca. Era um homem calmo que nem água de poço. Já minha mãe era prestimosa,

garrada com meu pai feito carrapato em couro de boi. Ajudava ele na lavoura, fazia panela, parteira

com chuva ou sol. Tinha gosto de canta e dança e não tinha homem que surrava ela num pandeiro.

Acho que peguei gosto de cantá Reis desde criança. Criei como meus pais, católico. Eu não dou

S

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Seu Belizário partilha de valores democráticos.

Tem um estado de consciência capaz de revelar o

entendimento da realidade social, compreendendo

o sentido que as ações podem motivar e inspirar as

pessoas.

"Custei a votar por causa da ditadura, nem no velho

Tancredo pude votar. Em 89 votei no Ulisses que era

homem guerreiro, e também porque sou fiel ao meu

partido. Votei no Zé Serra, achava que Lula ia ganhá

na política porque ele tava muito reforçado. Votei no

Zé Serra porque ele foi bom Ministro da Saúde. Eu

bem sei o que estou falando. Nas eleição municipal

sempre votei, mas não procuro prefeito não. Tem

gente que tem uma dorzinha de barriga, corre pra

procurar o prefeito e pedir remédio. Oriento o povo

pra entender a importância de votar direito. Nós,

trabalhadô rural somo muito fraco de organização.

Eu criei aqui a festa do abacaxi pra ver se reunia o

pessoal, festejar um pouco porque a lida na roça é

dura, pra quem como nós, que só tem prá contar o

coração. Mas a festa andou pouco..." .

A Folia de Reis de Berilo é um ato de solidariedade,

de cooperação entre os trabalhadores, e também

um vínculo com os sentimentos e as emoções,

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Fotos: Francilins / Textos: Ricardo Lima

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Vale do Rio São Francisco

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São Francisco

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José Rodrigues de Queiroz

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rede, tarrafa e anzol. Mas também a pesca acabou

por revelar seus problemas. O maior deles, o pro-

gressivo desaparecimento do pescado no rio São

Francisco fazendo com que dias de trabalho se con-

vertessem em poucos quilos de peixe, insuficientes

para o sustento. As razões, atribui ao assoreamento e

principalmente à ausência de chuvas que impedem

as enchentes que outrora faziam o rio transbordar,

ligando-o às lagoas, criatórios naturais de alevinos.

E o homem é também inquieto e, como fazer na

piracema, de novembro a fevereiro, quando o peixe

desova e a pesca está proibida? Como ocupar o

longo dia, tornado ainda mais comprido no hábito

do acordar cedo? Mais uma vez a resposta veio do rio.

"A gente morando na beira do rio, tem sempre uma

gente necessitando de embarcação e, naquele tempo,

aqui tinha três barqueiros que eram Seu Balbino, Seu

Paulo e Zé de Clemente e uns outros mais. Eu fui

atrás deles para me ajudar a fazer um barco. Eles

estavam sempre ocupados e nunca podiam, então

eu resolvi aprender por mim mesmo".

E assim ele o fez, para desespero da segunda mulher.

A televisão que tinha em casa vendeu e com o

dinheiro comprou cedro e tamboril, madeiras que

utiliza até hoje. Na beira do rio encontrou um barco

cujas dimensões rabiscou no papel. Um velho facão,

um martelo e um serrotinho emprestado foram fer-

ramentas suficientes para fazer seu primeiro barco.

Meio desajeitado, é verdade que admite, porém

logo vendido para Antônio Doido.

De lá para cá, Zé Pincel não mais parou de construir

barcos "no estilo sergipano", barcos de seis a oito

metros de comprimento, de fundo curvo e não reto

como era o modelo antigo mais comum no local.

No decorrer desses últimos dez anos, tempo de

dedicação ao ofício, fez cerca de duas centenas e

meia de barcos, grande parte encomendas que procura

atender numa ampla área que cobre principalmente

a bacia do médio São Francisco mineiro. Seus barcos

navegam hoje por águas do município e também por

São Romão, Januária, Itacarambi, Manga e Montes

Claros, em rios, represas e lagos.

Dispondo de uma maior diversidade de instrumen-

tos de trabalho do que no início do ofício, o artesão

utiliza atualmente motoserra, serrote, plaina, enxó,

martelo e sargento com os quais executa a cada dia

barcos mais aperfeiçoados, Zé Pincel acelerou o

ritmo da produção e é capaz de finalizar um barco

em quatro ou cinco dias, numa atividade que hoje

lhe toma quase o ano inteiro e não apenas o período

da piracema. A pescaria, no entanto, permanece

como sua segunda atividade pois, como afirma,

não é um "pescador de seguro", categoria com que

na região são denominados aqueles que, portando

carteira de pescador profissional, só se identificam

com a profissão no período da proibição quando

"pescam" no banco o auxílio financeiro garantido

pelo governo.

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São Francisco - Distrito de Bom Jardim da Prata

Renda de Bilro

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Olímpia, Flaviana e Zumira Cordeiro do Rosário

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Manusear tantas peças a um só tempo a tornava uma

mestra, competente, capaz. Da quantidade de bilros

dependia a largura da renda a ser executada. Quanto

maior o número empregado, mais larga a peça a ser

feita e mais complexo o desenho realizado. E dessa

maneira se desenvolvia a arte que ela levaria por

toda a vida, até a morte.

Poucas eram as interrupções neste ciclo. Prescrito mesmo

só o período de gravidez devido à crença de que trançar

fios e dar-lhes nós poderia estender-se ao cordão umbili-

cal e às tripas da criança, causando sua morte.

Assim se passava o tempo. No costume de cozer

em vida a mortalha e guardá-la para última roupa,

"pro dia que Deus chamasse", no uso das anáguas

e camisas que se sobrepunham por debaixo do ves-

tido para impedir as transparências, nos lençóis, nas

fronhas, nas toalhas de mesa, nos panos de igreja.

Tudo invariavelmente branco e enriquecido com

bicos e entremeios de renda.

Mas o tempo também passou. E com ele foram-se

várias tradições e surgiram novas maneiras de viver.

Chegaram a escola, a luz elétrica, o rádio e a tele-

Page 49: Jequitinhonha e Sao Francisco

visão. Novos hábitos, novos modos de preencher

o dia a dia, novas modas. A indústria trouxe outras

rendas, feitas aos metros por segundo, mais fáceis

de conseguir, mais baratas de comprar. Ampliou-se

o mercado de trabalho para a mulher com atividades

consideradas mais compensadoras. Às jovens já não

mais interessava trocar bilros. E a renda desapareceu

da localidade.

Há pelo menos 30 anos não se ouvia em Bom

Jardim da Prata o cantar dos bilros ao se chocarem

uns contra os outros, trocados por mãos femininas.

A memória coletiva acerca da arte da renda parecia

estar irremediavelmente morta. Até que se realizou

neste ano de 2005 a oficina de resgate do ofício.

Os bilros voltaram a cantar.

E sua música reavivou as lembranças das sábias

rendeiras que, qual sacerdotisas de tempos idos,

traziam guardado na memória um mundo julgado

perdido. E seus olhos voltaram a brilhar ao ver a

renda que, por suas mãos, ressurgia do passado

nas almofadas e nas jovens aprendizes que eram a

certeza de sua continuidade.

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Pedras de Maria da Cruz

Terno das Pastoras

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Oscarlinda Batista da Silva

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de conduzir o grupo. E assim, o Reis se manteve durante muitos anos, até que, doente, Seu Miguel se afastou

e Oscarlinda assumiu sua organização.

"Vamos plantar flor O povo já dizia

Eu não sei plantar Que o terno não saía

Saiu as pastorinhas O terno está na rua

Pela rua a passear Com prazer e alegria"

Há cinco anos a Mestra mudou-se para a sede do município, levando consigo o sonho de reviver no local

as Pastoras, vê-las entoando os cânticos religiosos e, em cortejo pelas ruas, o som das animadas marchinhas

carnavalescas.

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"Um beijinho contra um beijinho

A moreninha vai ficar sozinha

Depois de um beijo vem a acertação

A moreninha cai no alçapão

Não vai, não vai

Toma cuidado, olha o azar

Não vai, não vai

Que a polícia manda te pegar

Na quarta-feira, tudo acabado

A moreninha vai ficar de lado

A moreninha puxa o seu cordão

Fulô bigóia cai no alçapão"

"Pra mim é uma missão. Eu só vou parar de cumprir

ela quando Deus me chamar."

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Agradecimentos

Minas Novas

Prefeitura Municipal de Minas Novas; Rádio Bom Sucesso; Revista De Fato; Associação dos Artesãos de Minas Novas

Capelinha

Prefeitura Municipal de Capelinha através da SECMATUR – Secretaria de Meio Ambiente, Cultura e Turismo; ACIAC

– Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Capelinha.

Chapada do Norte

Prefeitura Municipal de Chapada do Norte; ARCA - Associação dos Artesãos de Santa Cruz de Chapada do Norte; ACHANTI

– Associação Chapadense de Assistência à Necessidade do Trabalhador e Infância; Rádio Comunitária Boa Vista.

Berilo

Prefeitura Municipal de Berilo; ARAI – Associação Rural de Assintência à Infância; ACIAC – Associação Comercial,

Industrial e Agropecuária de Capelinha.

Araçuaí

Prefeitura Municipal de Aaçuai; Creche do Fundo Cristão da Baixa Quente.

Itaobim

Prefeitura Municipal de Itaobim – Secretaria Municipal de Cultura; EMATER

Jequitinhonha

Prefeitura Municipal de Jequitinhonha; Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jequitinhonha.

São Francisco

Prefeitura Municipal de São Francisco; Secretaria Municipal de Ação Social; Secretaria Municipal de Turismo, Cultura e

Comércio; Jornal O Barranqueiro; Escola Estadual Barreira dos Índios.

Pedras de Maria da Cruz

Prefeitura Municipal de Pedras de Maria da Cruz; Escola Municipal Albino Soares; Padre Manoel Pereira dos Santos.

Januária

Prefeitura Municipal de Januária; Prefeitura Municpal de Turismo, Cultura e Esporte; Sesc Januária; Casa da Memória

de Januária.’

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SEBRAE MG

Avenida Barão Homem de Mello, 329 - Nova Suíça

30460-090 - Belo Horizonte - MG

Tel (31) 3371 8989

www.sebremg.com.br

SECRETARIA DE ESTADO DE CULTURA DE MINAS GERAIS

Palacete Dantas - Praça da Liberdade, 317

30140-110 - Belo Horizonte - MG

Tel: (31)-3269-1000 - Fax: (31)-3269-1009

www.cultura.mg.gov.br

FUNDAÇÃO DE ARTE DE OURO PRETO

Rua Getúlio Vargas, 185 - Bairro do Rosário

35400-000 - Ouro Preto - MG

Tel (31) 3552 2083 - Fax (31) 3551 2014

www.faop.mg.gov.br

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