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Ivo Castro Em Entrevista

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  • q u a r t a - f e i r a , 2 7 d e j a n e i r o d e 2 0 1 6

    Ivo Castro em entrevista S os no-escolarizados e osescritores podem mudar pontualmente uma lngua.

    Para Ivo Castro, coordenador da Edio Crtica da obra de Fernando Pessoa, dizer que Pessoatinha desdobramentos de personalidade um perfeito disparate de quem no compreende agenialidade do escritor. Uma genialidade que se pressente na densidade da escrita, mesmoquando feita em momentos de cansao, e que nos obriga a colocar de novos modos a questodo singular e do plural. Se tivesse de escolher um heternimo preferido, escolheria RicardoReis pela nitidez clssica do seu mtodo. Mas foi o semi-heternimo Bernardo Soares, pela

  • mo da sua professora de Portugus, que o introduziu no universo pessoano. Tinha 13 anos eera, na altura, o chefe de uma turma de galfarros do Liceu Pedro Nunes, em Lisboa. Quaseno d para acreditar, mas diz que tambm ele se tornou galfarro, s que mais tarde.Desses tempos at ser nomeado coordenador da Edio Crtica da obra de Fernando Pessoa,na dcada de 1980, muito se passou. Entre outras coisas, formou-se em Filologia Romnica edoutorou-se em Lingustica Portuguesa na Faculdade de Letras de Lisboa, onde ainda professor. Viveu trs anos em Paris a cidade das tertlias e dos mticos cafs literriosFlore e Les Deux Magots. Empenhou-se para que a Lingustica se autonomizasse daLiteratura, e viu o penteado dos rapazes mudar quando se comeou a ouvir os Beatles emPortugal. Depois, e com a naturalidade das coisas exatas, foi vendo a lngua evoluir, compalavras novas a surgir e outras a morrer lentamente. Como flausina a palavra quedescrevia as meninas da moda no tempo de Sylvie Vartan, Franoise Hardy ou BrigitteBardot. O normal, portanto, numa sociedade aberta, como sempre foi a nossa, e numa lnguaque, mesmo traioeira, falada nos cinco continentes.

    Para este professor, linguista e membro do conselho editorial da INCM, traioeiro epreocupante mesmo o desprezo que a classe dos professores de Literatura tem pelo textocriticamente editado; acreditar-se na falsificao histrica dos 800 anos da lnguaportuguesa; termos uma lusofonia que s serve os outros e no serve Portugal e umMinistrio da Educao que no percebe o mal que est a fazer lngua com a poltica decolocao de docentes. [esta entrevista foi gravada em meados de 2015, muito antes daseleies que alteraram o sistema governativo em Portugal.]Num registo ora crtico ora muito bem-humorado, a PRELO esteve conversa com um dosmaiores linguistas portugueses da atualidade, mas que no foi capaz de nomear a sua palavrapreferida na sua lngua materna. S porque nunca se debruou sobre o assunto. Mas sabebem aquela de que no gosta: pompa, porque a seguir vem sempre circunstncia.

    PRELO (P) Em 1988, foi escolhido para realizar a edio crtica da obra de Fernando Pessoapublicada pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda. 27 anos volvidos, que balano faz desteprojeto?

    IVO CASTRO (IV) Tantas perguntas numa s! H algumas imprecises. Eu fui escolhido comosegunda escolha. Quem foi escolhido inicialmente foi a Prof. Luciana Stegagno-Picchio, umaprofessora italiana, uma grande pessoana e uma grande conhecedora da cultura portuguesa, queaceitou e que foi imediatamente objeto de uma barreira de crtica na imprensa Portuguesa. Istoporque a Prof. Luciana era uma estrangeira, e este trabalho no podia ser feito porestrangeiros. Era esse o nvel de chauvinismo em que se andava, em 1980 e tal, nos meiosculturais portugueses. Ao mesmo tempo que era criticada por aceitar dirigir a edio crtica dePessoa, ela prpria tinha percebido que no poderia fazer o trabalho que imprudentementetinha aceite, sem viver em Portugal. Ela vinha c ms sim ms no; isso era uma coisa. Outracoisa era ir viver para a Biblioteca Nacional. Era isso que os editores tinham que fazer. Elapercebeu que, de facto, a realidade do terreno implicava um trabalho contnuo e muito longo.De certa maneira, at lhe calhou bem estar a ser empurrada para fora. E assim saiu, e no tevede dizer no. E ento apareo eu, como segunda escolha.

  • P E a quem se ficou a dever a sua escolha?

    IC Essa escolha coube Dr. Teresa Patrcio Gouveia, que era na altura Secretria de Estado daCultura. Foi ela que ps isto a funcionar. O que h de singular que este o nico caso queconheo de uma atividade de natureza filolgica, portanto literria e cientfica, que promovida e financiada pelo governo, e com nomeao publicada em Dirio da Repblica. Mais ou menos ao mesmo tempo at um pouquinho antes arrancou a edio critica de Eade Queirs que alis tambm publicada na Imprensa Nacional. O estatuto das duas ediesdistingue-se exatamente nisto: enquanto a edio de Fernando Pessoa uma edio de iniciativae nomeao governamental, a edio crtica de Ea de Queirs uma iniciativa do Prof. CarlosReis e de um grupo de pessoas que trabalhava com ele, que se candidatou a apoios e recebeu-os. Possivelmente, esses apoios foram mais ou menos do volume dos financiamentos que eu tive,mas a pedido dele e por iniciativa dele. Mas tanto o projeto do Prof. Carlos Reis como o meuprojeto foram possveis numa fase de polticas otimistas da cultura, como o eram e isto espantoso de pensar! nos primeiros anos do governo do Prof. Cavaco Silva. Eram tempos depolticas otimistas. claro que eram polticas de cultura pensadas pelo Antnio Alada Baptistae pela Teresa Patrcia Gouveia. E, portanto, no podiam ser ms polticas. E resistiram mesmo passagem da pasta da Cultura para as mos do Dr. Pedro Santana Lopes que, inteligentemente,manteve as coisas que tinham sido feitas antes, em vez de querer fazer novas. Quis fazer outras:fundir edifcios, fundir instituies coisas deste gnero. Mas, neste plano, deu carta-brancapara tudo poder continuar. Hoje em dia no seriam possveis essas polticas. Nem o Governoatual [na altura da entrevista], nem os governos de Scrates nem, se calhar, os prximosgovernos tero [pausa] meios, tero No tero a coragem poltica e a imaginao parapromover iniciativas de longo prazo como esta.

    P E que balano faz deste projeto?

  • IC Uma das poucas condies que coloquei Dr.Teresa Gouveia, ao aceitar a nomeao foi: Dareiresultados experimentais muito rapidamente; dareiresultados definitivos muito lentamente, semcalendrio, mas com certeza entrando no sculo quevem. E ela disse: Est a exagerar. E eu respondi:No estou! E estamos a ver que no estava aexagerar, e que s agora que estamos a ver o fim doprograma que rapidamente elabormos. Na altura, fizemos uma opo estratgica que foi aseguinte: vamos publicar a poesia de Pessoa, no nosvamos ocupar da prosa. Identificmos, ento, um planoeditorial. O plano de ttulos que aparece no anterrostode cada uma das nossas edies foi um grande erro,porque estabeleceu uma sequncia, uma numerao devolumes, e um recorte apriorstico dos volumes, antesde conhecermos a realidade completa. E a realidade constituda pelos papis que esto Biblioteca Nacional,os papis e livros que agora esto na Casa FernandoPessoa, mas ainda se achavam encaixotados, e outrospapis que ns no sabamos que existiam, com osproblemas que eles nos trazem. Provavelmente, teriasido mais inteligente ir publicando medida que osvolumes estivessem prontos, sem um plano pr-

    estabelecido. que, assim, estamos h vinte e tal anos a dever o tomo I do volume I. O que nodeixa de ser uma maneira m de executar um plano. Fomos otimistas demais ao assumir compromissos. No me refiro aceitao com a Dr. TeresaGouveia, mas ao plano que elaborei inicialmente. Hoje, no teria feito isso. O que teriacontinuado a fazer, isso sim, a opo pela poesia, no ligando prosa. E h razes de fundopara isto. Pessoa era nos anos 80 muito mais conhecido como poeta, evidentemente, do quecomo prosador. Havia as edies do Livro do Desassossego, havia escritos filosficos, e coisasassim do gnero. No havia um conhecimento muito claro da prosa dele. O conhecimento quens tnhamos da sua prosa era constitudo por fragmentos dispersos, que no comeavam nemacabavam, e que se podiam organizar em obras de vrios contornos, como depois aconteceu.Foram materiais desses, alis, que foram usados pelos mais recentes editores do Livro doDesassossego para inchar, e inchar, e inchar o volume com pedaos de prosa interessantes,pertinentes ou no.

    P O prprio Livro do Desassossego, como o conhecemos, foi editado apenas nos anos 80,correto?

    IC Houve fragmentos publicados em 1960 pela Maria Aliete Galhoz na obra potica da Aguilar,e depois a 1. edio foi da tica, dirigida por Jacinto Prado Coelho, que teve comocolaboradoras a Maria Aliete Galhoz e a Teresa Sobral Cunha. Foi publicada em 1982.

  • P Porque no se interessaram inicialmente pela prosa de Pessoa?

    IC Ns no nos interessmos inicialmente pela prosa porque achmos que era um continentebastante difuso, cujos principais problemas editoriais eram ler, decifrar os papis e, depois,saber onde eles se encaixavam. Ao passo que a poesia era um territrio muito rico dedocumentao controversa, que era preciso sistematizar, e com muitas propostas de soluotambm controversas. Era um terreno que, do ponto de vista do mtodo, e at do ponto de vistada teoria, era fascinante de admirar. A que estavam as reais dificuldades da edio de Pessoa.E continuo exatamente a pensar o mesmo. Foi por isso que ns decidimos atacar a poesia. S porvontade do Conselho Editorial da Imprensa Nacional que, na dcada seguinte, comecei apensar em publicar a prosa. Por um lado, os livros de poesia que se podia ter realizado emalguns anos estavam realizados, e os livros difceis de poesia que demoraram muito mais anos afazer estavam exatamente a demorar esses muitos mais anos a fazer. Um deles foi o Caeiro, quens publicamos em maro de 2015.

    P Fale-nos um pouco desta obra?

    IC O manuscrito principal da obra de Caeiro ummanuscrito dO guardador de rebanhos, cujo carterespecial foi percebido, ainda em vida de Pessoa, por umparente e colaborador dele chamado Eduardo Freitas daCosta, que na altura da morte do Pessoa se achou emposio de ficar na posse desse manuscrito. Trata-se,portanto, de um manuscrito que nunca esteve no Esplio,nunca esteve na arca, nem em vida do Pessoa. umcaderno de aspeto bronzeado nas ltimas folhas,porque esteve exposto luz, virado para baixo, pousadoem cima de mesas e de cmodas. Nunca foi arca.Eduardo Freitas da Costa guardou o manuscrito e depois,no sei muito bem como, foi transitando de mos emmos, muito provavelmente como um bem transacionvelde luxo j havia conscincia disso at que foi parars mos da famlia Sousa Machado, de Lisboa. E foi porintermdio de pessoas dessa famlia que tiveconhecimento dele e o pude estudar com vagar. Tiveassim a sorte de conseguir uma pequena descoberta.Quando peguei nele pela primeira vez, pensei: aqui esta prova de que verdade o que Fernando Pessoa disse aAdolfo Casais Monteiro na famosa carta da gnese dos

    heternimos, sobre o caderno de 30 e tal poemas que tinha escrito. Demorei uns dias, talvezsemanas, talvez meses, a perceber que isso no batia certo.

    P Porqu?

  • IC No batia certo porque no se encontrava, emdimenso, um corte que correspondesse queles safo,no sentido de tendo concludo a viagem ou tendochegado a porto seguro, ou ainda estando em terra).Ora, o caderno est coberto de uma escrita inicialmuito cuidadosa e caligrfica, que primeira vistapoderia parecer limpa e safa se isso no entrasse emcontradio com os seus hbitos de criar os textos comuma escrita rpida, inspirada e pouco legvel; estaescrita tpica de passagem a limpo, e no de criaoinicial de textos, especialmente nas circunstnciasdescritas na carta de Casais Monteiro. Depois disto, opoeta parece ter deixado de gostar do que tinha feito.E fez emendas sobre emendas, sobre emendas Hpginas em que encontramos um verso modificado novee dez vezes, utilizando materiais de escritadiversificadssimos. Ou seja, o manuscrito, depois deter sido construdo cautelosamente em vrias sesses,talvez uma dzia de sesses de escrita, foi quasetotalmente posto em causa e passou anos e anos a serrepensado e reescrito. Nada disto bate certo com aideia de o Guardador ter sido criado por meio de umato de escrita inspirada, muito rpida e muito definitiva. A evidncia fsica exatamente provado contrrio: este manuscrito, na sua nitidez caligrfica, deriva de rascunhos anteriores, osrascunhos da Biblioteca Nacional que ento eu ainda no conhecia; as camadas de emendasposteriormente sobrepostas desmentem que os poemas tivessem nascido prontos.

    30 e tal poemas. Alm disso, havia mudanas fsicas (na tinta, na caneta, na letra) queapareciam a intervalos muito mais curtos e irregulares, sugerindo que o manuscrito fora escritoem diversos momentos separados. No havia um ponto em que se dissesse: Ora c est,naquele primeiro dia ele escreveu at aqui, e o resto foi feito a seguir. Por outro lado, Pessoadisse que os poemas do Guardador tinham nascido perfeitos e acabados; a sua expresso limpos e safos (

    P Fernando Pessoa chegou ao pormenor de atribuir caligrafias distintas aos vriosheternimos?

    IC No. Fernando Pessoa tinha vrias caligrafias, dependendo da caneta ou lpis que estava ausar. Uns permitiam uma escrita mais mida; outros no. A caligrafia dependia tambm dadisposio com que estava. H manuscritos que esto datados no com o dia mas com a hora; eh manuscritos que esto datados das 3 ou 4 horas da manh. Talvez por isso, so dos maisdifceis de ler...

    P Como que caracteriza a escrita de Alberto Caeiro, que, segundo o seu criador, morreu

  • h precisamente 100 anos?

    IC Pegando na sua pergunta, uma escrita que temprolongamento no tmulo. Porque, tendo ele morridooficialmente em 1915, o seu penltimo poema est datado de1922, e o epitfio de quando morreu est datado de 1923. uma escrita para l do tmulo. No lhe posso responder pergunta de como ele eterniza aescrita de Alberto Caeiro, mas digo porqu. Vejo o trabalho doeditor crtico que aquilo que eu sou como sendo apessoa que rene, etiqueta e dispe os dados para seremanalisados pelos crticos literrios, pelas pessoas que podemintroduzir caracterizaes vrias (de gosto, estticas e devalorizao) que eu no poderia fazer. Alis, hcaracterizaes da escrita de Pessoa feitas de forma genial pormuitos crticos. Nem me apetece entrar em discordncia comalguns deles, nem acho que tenha algo a acrescentar ao queeles j disseram. Eles que tero alguma coisa a acrescentarao que j disseram, com base naquilo que a edio crticafornece. O que me sinto vontade para dizer apenas isto: a

    escrita dos poemas de Caeiro caracterizada de modo geral por ser uma escrita fluente ecorrida, seguida por inmeras alteraes pontuais, mas principalmente caracterizada por certossaltos, se quiser saltos paradigmticos, bastante frequentes, que ocorrem quando um poema,uma vez escrito, mantido intacto at que os seus ltimos versos se veem repetidamentebombardeados com alteraes profundas da estrutura, que afetam o significado total do poema.Mudanas terminais deste gnero acontecem com muita frequncia em Caeiro e so umacaracterstica no da escrita, mas da sua reescrita. E isto leva a uma pergunta a que no seiresponder.

    P Que : quando foram inicialmente escritos aqueles poemas e quando foram reescritos?

    IC A dispomos de um calendrio de cronologia relativa, com o qual conseguimos trabalharquase sempre. O que no sabemos isto: quando foi inicialmente escrito o poema, e como foiele escrito inicialmente como sendo de Caeiro ou como sendo de Pessoa? Ou seja, a escritados poemas de Caeiro precede a sua autoria, a sua atribuio ao heternimo, ou foi o contrrioque aconteceu? Em muitos manuscritos iniciais os rascunhos em papis soltos de muitasnaturezas diferentes, de escrita, essa sim, improvisada, com coisas que caracterizam umaescrita no planeada no encontramos atribuies claras de autoria, como se ainda nosoubessem quem os escrevia.Alis, qualquer pessoa pode comprovar isto. Os manuscritos de Caeiro esto integralmentedisponveis on line no site da Biblioteca Nacional. Os rascunhos so de naturezas dspares, econtm coisas muito engraadas. Por exemplo, o poema IX e o poema VIII, que o maior detodos, ocupam uma infinidade de papis pequenos. O que significa que quando Pessoa ou, sese quiser, Caeiro comeou a escrever aqueles poemas no sabia que ia escrever todos aquelesversos. Tanto que usou um papel pequeno e, depois, o poema foi crescendo como que por

  • vontade prpria. Teve, ento, de passar para um segundo papel, julgando que chegava, e depoispara um terceiro, e para um quarto, e por a fora Isto, sim, escrita improvisada. Quando vemos uma coisa destas, pensamos: antes disto no h nada; o poema nasceu aqui,nasceu nestas pginas. Hoje, somos testemunhas de como o escritor foi, de certa maneira, eleprprio testemunha do nascimento do heternimo. Mas que escritor era essa testemunha? Oescritor Pessoa, ortnimo, ou Caeiro? As marcas que hoje reconhecemos, essas marcas s maistarde foram atribudas a poemas que antes no eram de Alberto Caeiro, mas, por defeito, doortnimo.

    P E a quem coube essa deciso?

    IC Coube a Fernando Pessoa. Foi o prprio que decidiu, mas mais tarde, medida que foicrescendo uma parte do Guardador. E s a que conseguimos encontrar um vislumbre desemelhana com o que ele diz na carta a Casais Monteiro. H um ncleo de 20 a 30 poemas que parece ter nascido desta forma, que devem ter sidopassados a limpo muitas vezes, muito perto do perodo inicial de criao a Primavera de 1914.Mas quando comeam essas passagens a limpo, ainda no tinham sido escritos os poemas dametade final do ciclo. Faltavam uns 20 poemas, que j so escritos como sendo de Caeiro. Epara entrarem num barco que, de certa maneira, j navegava. So feitos para completar o ciclo.

    P A Edio Crtica de Fernando Pessoa foi o seu primeiro trabalho para a editora pblica?

    IC No. Se bem me lembro, o primeirotrabalho que fiz para a Imprensa Nacional foi umparecer sobre um projeto de edio. Na altura,o Dr. Vasco Graa Moura pediu-me que visse seesse projeto tinha pernas para andar. Tratava-seda lrica de Cames editada pelo professorbrasileiro, Leodegrio de Azevedo Filho, jfalecido. So seis ou sete volumes. O Dr. GraaMoura achava que era muito livro. Limitei-me aexamin-los, a dar um parecer favorvel, e aedio foi feita. Depois, tive uma encomenda,que est realizada, ainda com o Dr. Vasco GraaMoura, no tempo em que no Conselho Editorialestava Maria de Lourdes Belchior props que aImprensa Nacional publicasse uma nova edioda Fnix Renascida, uma coletnea de poesia barroca que teve duas edies no sculo XVIII edepois nunca mais foi publicada. Nos princpios dos anos 90, no tempo do Dr. Diogo Pires Aurlio,fui convidado a abrir uma coleo de lingustica e filologia, designada Filologia Portuguesa, ecompreendeu uma dezena de ttulos.

    P Como que chegou a/descobriu Fernando Pessoa?

  • IC Aos treze anos de idade, eu era aluno no Liceu Pedro Nunes e tinha como professora deportugus a Dr. Maria Aliete Galhoz. Ela era e sempre foi uma pessoa muito tmida, e tinhamedo da turma de galfarros que ns ramos. Eu era o chefe da turma. Tornei-me galfarromais tarde. Nessa altura eu e ela conversvamos bastante. E certo dia convidou-me para ir a suacasa para ver os livros que l tinha, e dentro de uma pasta que tinha em cima de uma mesinhada marquise morava na Avenida de Madrid, na altura mostrou-me uns papis batidos mquina e perguntou-me: Sabes o que isto ? Claro que eu no sabia. Isto so manuscritos doFernando Pessoa. E eu fiquei mais ou menos na mesma.

    P E que manuscritos eram esses?

    IC Era o Desassossego. Ela estava a tentar encontrar aordem dos papis do Desassossego, a preparar ocaminho para uma edio, que tinha sido encomendadapela tica ao Jorge de Sena, que estava emigrado.Estava numa situao mais ou menos idntica daProfessora Luciana Stegagno-Picchio de quem falmosh pouco. Ele disse: Os papis esto a e eu estou aquinos Estados Unidos da Amrica, portanto, preciso dealgum a que me prepare os papis para depois eueditar. Ou seja: que edite, para depois eu assinar. Eindicou o nome da Maria Aliete Galhoz. Portanto, aMaria Aliete Galhoz estava a preparar uma edio paraser assumida pelo Jorge de Sena. No sei por que razo

    isto depois no avanou, e o trabalho que ela fez levou o Dr. Jacinto do Prado Coelho, entosim, a promover a primeira edio do Livro do Desassossego, em que a Maria Aliete Galhoz foi aprincipal colaboradora. Resumindo, foi aos treze anos que descobri Fernando Pessoa, mas longede pensar que mais tarde iria trabalhar sobre ele.

    P Conhecem-se, pelo menos, duas tradues diferentes para francs do Livro doDesassossego: Livre de l'Intranquillit (Franoise Laye, 1991) e Livre de l'Inquitude (InsOseki-Depr, 1987). Pelo menos em relao ao ttulo, para si, qual a traduo mais bemconseguida e porqu? Intranquilidade ou inquietude?

    IC Intranquilidade. Porque tanto em portugus como em francs a palavra inquietude traduzum estado de preocupao por algo que est para acontecer. Ns no temos inquietude com opassado, que j est feito. A intranquilidade corresponde mais a uma posio. Tem a ver comuma posio de no estar bem. No estar bem, onde. No estar bem, como. No estar bem,com.

    P Aproveitando-me, agora, da traduo da obra pessoana para italiano Una solamoltitudine pergunto-lhe: Fernando Pessoa vivia entre a multido, muito s, ou as duascoisas ao mesmo tempo?

    IC Que vivia muito s, sem dvida nenhuma. Entendo essa traduo como uma multido

  • solitria. Ou seja, estar sozinho no meio da multido. Fernando Pessoa um autor que nosobriga a colocar, de modos novos, a questo do singular e do plural. Mas, repare, na nossacultura judaico-crist ns estamos preparados para isso. a ideia da Trindade. uma pessoa ouso trs? No caso de Pessoa, ele fabricou um polptico sua imagem.

    P O que mais admira na obra de Fernando Pessoa?

    IC A densidade que se pressente na escrita feita nos momentos de cansao, quando no hnenhum desejo de impressionar, surpreender, ocultar a realidade. H papis que se percebe queforam escritos em momentos desses, em momentos um pouco distrados. A qualidade da voz a bastante grave. E, muitas vezes, so seces de texto que, uma vez escritas, nunca mais foramreescritas.

    P Tem algum heternimopreferido?

    IC [Ricardo] Reis.

    P E porqu?

    IC Gosto da nitidez clssica domtodo de Reis.

    P Qual o maior disparate que jouviu dizer ou leu sobre FernandoPessoa e a sua obra?

    IC difcil escolher, dada a diversidade. Se no se importa, eu respondo-lhe no mencionandonenhum dos muitos, mas mencionando um tipo de disparate. Um disparate coletivo, que estembebido em grupos ou em camadas de pessoas, o de que se pode ter opinies sobre a obra dePessoa e, antes disso, se pode compreender a obra de Pessoa, sem ter o cuidado de usarverses que fossem criticamente trabalhadas. Este disparate coletivo sistematicamentepraticado com a maior das frivolidades por uma categoria profissional que d pelo nome deprofessores de literatura. O desprezo que a classe dos professores de literatura tem pelo textoeditado criticamente tem como consequncia que tudo o que disserem provisrio e serdescartado em devido tempo.

    P Cito agora Bernardo Soares: No tenho sentimento nenhum poltico ou social. Tenho,porm, num sentido, um alto sentimento patritico. Minha ptria a lngua portuguesa.Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que no me incomodassempessoalmente. Esta frase tem sido mote da expresso da lusofonia. Acha que a frase empregue, hoje emdia, de acordo com o que Fernando Pessoa queria dizer com ela?

    IC Os aproveitamentos polticos da frase no so da responsabilidade de Pessoa. Na obra dele,

  • faz sentido de vrios modos. De facto, ptria aqui a casa do ser, um dos aspetos em que,no tendo tido tempo para ler muita da filosofia alem do tempo dele onde encontramospreocupaes de Heidegger e Wittgenstein ele, de certa maneira, corporiza-a.Pessa refere-se lngua como o lugar onde se est e onde se vive e chama a isso ptria.Sente-se muito isso nos tais momentos de distrao. E esta afirmao muito pessoana tambmpor outro motivo: um paradoxo que se autodestri. Pessoa deve ter escrito mais em ingls doque em portugus. Pessoa pensava em ingls. Nos textos que escreve em portugus, asanotaes que faz na reviso so muitas vezes em ingls. Ele falava consigo prprio em ingls.Quando ele diz que a ptria dele a lngua portuguesa sim, o que ele diz e, sim, oque ele, em certas ocasies, por vezes sente. Mas, por favor! Ns acreditamos tanto nisso comoacreditamos que tinha desdobramentos de personalidade. No tinha! No h causas naturaispara explicar o desdobramento dos heternimos. No uma doena dele, mas sim um artefactocultural. E isto que ele acaba de dizer uma frase muito bonita, que por um lado faz todo osentido, e por outro uma completa mentira.

    P Em julho deste ano, a escritora Hlia Correia recebeu o Prmio Cames e dedicou-o Grcia. No seu discurso afirmou: () Na ditadura da economia a palavra esmagada pelonmero. E acrescentou: Amo mais a lngua portuguesa do que a ptria. Qual osignificado desta afirmao, quando Portugal acaba por passar por uma fase em que asdecises polticas so fortemente condicionadas por agentes externos? Pequena provocao:corremos o perigo de que nos digam que o portugus no uma lngua rentvel?

    IC H vrios problemas dessa natureza. interessante Hlia Correia dissociar a lnguaportuguesa da ptria ou de Portugal. Essa dissociao, de certo modo, j est feita a partir domomento em que ns reconhecemos que a lngua portuguesa pertence aos cinco continentes.Pertence a vrias ptrias. Ptrias feitas e a serem feitas. H vrias ptrias que se podemreclamar desta lngua. O que, evidentemente, cria inquietudes interessantes para o futuro:como que a coisa vai evoluir? Isto, quando se verifica que os vrios Estados que formalizamessas vrias Naes esto cada vez mais desatentos uns aos outros. No meio dessa desateno, oEstado portugus, atravs das suas autoridades, praticamente no acerta uma. De h vrios anosat agora, os governos e isto no uma crtica a este governo, uma crtica aos ltimosgovernos que Portugal tem tido foram obrigados a abdicar de uma poltica econmica efinanceira nacional, mas tambm foram obrigados a abdicar de uma poltica externa depromoo e defesa da cultura, e no tm quase instrumentos nenhuns para defender o que nsjulgamos serem os smbolos nacionais. H um momento em que temos de pensar o que devemossalvar das guas: o conceito de ptria ou a lngua? Sendo que um e o outro no esto destinadosa confundirem-se e a seguirem de mos dadas durante muito mais tempo.

    P Os portugueses baniram do seu lxico a palavra esperana?

    IC Espero que no.

  • P Um tradutor traduz uma lngua, via escrita; umintrprete f-lo oralmente. Um professor ensina a lngua; um escritor usa a lngua para criara sua obra. O que faz um linguista?

    IC Ensina a lngua tambm, mas a outro nvel. O professor de lngua ensina a usar a lngua. Olinguista, antes de a ensinar, tenta sab-la, tenta perceber como funciona a lngua.

    P Mais uma pequena provocao. Atribui-se a Erasmo de Roterdo a afirmao: Os grandesescritores nunca foram feitos para suportar a lei dos gramticos, mas sim para impor a sua.Concorda?

    IC Sim, sim! S h duas categorias de pessoas que tm autorizao para mudar a lngua derepente. Ou seja, autorizao para introduzir pontualmente na lngua alteraes ao que osgramticos ensinam. Esses dois tipos de pessoas so: os no-escolarizados, que mudam a lnguapor baixo, porque d jeito; e os escritores, que mudam a lngua por cima.

    P A via popular e via erudita

    IC Exatamente! isso mesmo.

    P Qual a principal distino entre linguistas, gramticos e fillogos?

    IC profisso de gramtico est associada a descrio de uma lngua em particular ou de umgrupo de lnguas afins descrio do seu contedo e do seu funcionamento acompanhado deregras para o ensino e para a prtica. Normalmente, para a gramtica a grande distino faz-seentre gramtica descritiva e gramtica normativa. A gramtica normativa indica o que obrigatrio, o que recomendado, e o que errado. A gramtica descritiva mais liberal.Aceita que a lngua tem erros ao lado de coisas certas. Porque que aparecem uns ao lado dosoutros, o que interessa saber. A natureza humana variada. O gramtico descritivo o maislinguista dos dois. O linguista trata dos mecanismos da lngua, dos processos de evoluo do pensamento, dahistria e da linguagem. o estudioso da lngua. Ou seja, o gramtico o mdico que est acurar doenas, e o linguista o mdico que estuda a etiologia da doena e as diversasteraputicas que podem vir a ser aplicadas.

    P O que faz o fillogo?

  • IC No quadro de pensamento do romantismo com dois sculos um fillogo isto tudo e tambm um professor de literatura, um historiador, um etnlogo, tudo! Todos os ramos doconhecimento que eram materializados nos monumentos os textos escritos eram monumentos eram armazenados e preparados (para serem lidos e estudados) por fillogos.

    P E hoje em dia?

    IC Hoje em dia, fillogo algo muito mais restrito: um crtico textual que prepara ediespara as pessoas lerem.

    P Decerto j lhe aconteceu ouvir esta frase: A lngua portuguesa muito traioeira.Acha que a lngua portuguesa especialmente traioeira?

    IC Em alguns aspetos, um bocadinho mais traioeira do que outras. Se bem que todas aslnguas sejam traioeiras para quem no as conhece. No h maior traio, por exemplo, do queuma pessoa ser levada a usar uma palavra de calo de uma lngua que no a sua, em que nonasceu. Faa o que fizer, sai mal. No dito pessoa certa, no dito nem com o tom nem noregisto correto, no era aquela palavra de calo mas uma outra. H coisas que nascem connoscoe que na nossa lngua materna no so nada traioeiras e que para os outros so traioeiras.Todas as lnguas so traioeiras. A lngua portuguesa, em cima disso, tem outras dificuldades. Por exemplo, o sistema de formasde tratamento remete, no para uma sociedade hierarquizada em castas, mas para umasociedade organizada em redutos bastante pequenos de intimidade, respeito,confidencialidade E os prprios portugueses, cada vez mais, lidam menos bem com estas zonasdiscretas do convvio. Isto vai traduzir-se no tratamento: os portugueses no sabem utilizar aforma adequada em cada momento, usando tendencialmente formas estereotipadas e que tmpor efeito, normalmente, deixar todas as pessoas ofendidas.

  • P H sempre palavras novas a aparecer no dicionrio. Em 2010, por exemplo surgiram noDicionrio de Lngua Portuguesa da Academia de Cincias de Lisboa palavras como: guetizar,basmati, pluriemprego, googlar, homebanking, sobre-endividamento entre outras. Damesma maneira que surgem palavras novas no dicionrio, tambm h outras quedesaparecem?

    IC A resposta sim. H palavras que caem em desuso e no so mortes sbitas. H palavrasque caem em desuso a pouco e pouco, que continuam a ser usadas na escrita mas que naoralidade ningum mais usa. H outras que passam de moda. Eu tenho um amigo que nasceu eviveu em Portugal at aos vinte anos e saiu de c em 1950 e tal. Ele fala muito bem portugus,mas continua a usar expresses que mais ningum usa. Usa, por exemplo, flausina. Sabe o que uma flausina? Faz uma ideia do que eram as meninas da moda no tempo da Sylvie Vartan, ouda Franoise Hardy, ou da Brigitte Bardot? Eram as flausinas! Mas isto para dizer que na boca domeu amigo a palavra no morreu. Mas quando ele morrer a palavra desaparece.

    P E h vrias assim. Umas duram pouco tempo, como otelismo

    IC Otelismo servia para designar os apoiantes do Otelo Saraiva de Carvalho, e duroupouqussimo tempo. Essas mortes justificam a necessidade de criao de novas palavras.

    P Acha que h demasiados estrangeirismos na lngua portuguesa ou que os usamos emexcesso? Por exemplo: site para stio; budget para oramento

    IC No. Nada disso. H pessoas que so um bocadinho ridculas. So ridculas quando sepercebe que esto a usar estrangeirismos para fazer gnero e no porque a forma mais rpida

  • de chegar l. Agora, para que que haveremos de estar procura de uma forma castia, porvezes provinciana, se temos um termo internacional facilmente reconhecido? Numa sociedadeaberta como aquela em que vivemos impossvel no haver estrangeirismos.

    P Outrar-se (Fernando Pessoa) ou escreviver (David Mouro-Ferreira) so palavrasque podero vir a constar do dicionrio de lngua portuguesa? Porqu?

    IC Se isso acontecesse, perderiam uma parte do encanto e da carga potica que tm. Masbasta que um nmero de pessoas se lembre de as usar para elas entrarem na lngua. Ou seja, ainovao lingustica proposta pelo escritor depende sempre do momento em que outros pegamnela.

    P Para Artur Anselmo, presidente do Instituto de Lexicologia do Academia de Cincias, onmero de vocbulos utilizados pelos portugueses tem vindo a diminuir de formapreocupante. Concorda?

    IC Assim dito, parece-me simples de mais. Quando foi feito quer para o francs quer para oportugus o levantamento do chamado Francs Fundamental ou Portugus Fundamental,verificou-se que, em portugus, cerca de 1700 palavras entre verbos, substantivos e algunsadjetivos eram as palavras mais frequentes da lngua portuguesa. No francs mais ou menosa mesma coisa. Dito de outra forma: uma pessoa consegue fazer a sua vida e comunicar comoutros usando como base cerca de 1500 palavras muito frequentes, e um ou dois vocabulriosespecializados, de coisas do seu dia-a-dia e do dia-a-dia da comunidade onde est, ou do seutrabalho. Sendo assim, todos os portugueses tm cerca de 1500 palavras do seu vocabulriocomum, e depois tm alguns pequenos dicionrios prprios. Ns aqui falamos de manuscritos, deimpresses, de edies; outros falaro de serralharia, automveis, por a As pessoas vivem commuito poucas palavras. As pessoas analfabetas vivem sem palavras conhecidas da comunicaosocial, da literatura, da cultura, etc Em compensao tm conhecimentos muito ricos depalavras terra-a-terra, da vida quotidiana. Se forem agricultores sabem o nome das plantastodas, dos seus feitios, etc., palavras que ns no conhecemos. Os analfabetos tm outro tipo decultura. Mas de facto consegue-se viver com um nmero relativamente parco de palavras. Afirmaes pessimistas desse gnero talvez sejam feitas a pensar numa outra coisa: os jovens,na medida em que lhes permitido continuarem alrgicos leitura, tm fontes de aquisiolexical e de enriquecimento lingustico diminudos. So jovens no-reeducados, mal-educados.So jovens a quem o sistema de ensino no faz o que devia fazer. A, sim, verifica-se umempobrecimento lexical que ateno! no significa diminuio comunicativa. Com 20palavras, e se o seu grupo de interlocutores estiver de acordo consigo e fizer o mesmo, conseguefazer a comunicao de que precisa apenas com essas. So palavras que tm um espetrosemntico muito lato.

  • P Lembra-se da ltima palavra que descobriu ou que o tenha surpreendido? Qual foi?

    IC H uma palavra que ando desde ontem a tentar saber o que significa. a palavra alo, umtermo medieval. conhecido alo como uma raa de ces, mas neste contexto que me preocupano pode ser isso. Tem de ser alguma coisa da armadura do cavaleiro. Agora, que coisa? Aindano consegui descobrir. H pouco perguntava-me por palavras que desaparecem, estadesapareceu. Mas ficou escrita. Como no texto onde ela est alis so muitos pode serrepescada a qualquer momento, por essa via a palavra pode reaparecer, e reaparece como ummistrio. uma palavra que tem de ser reaprendida. Uma vez reaprendida ficamos a conhec-lae no pensamos mais no assunto. Provavelmente, isso que vai acontecer. Mas um caso vivo,concreto, em tempo real, de uma palavra desaparecida da lngua e que est a bater porta paraque lhe deem ateno. O que tambm um sinal de esperana.

    P Uma outra palavra que desapareceu e voltou a reaparecer a palavra arruada

    IC Pois! E isso muito engraado. por causa das manifestaes de rua, que voltaram.

    P Qual a sua palavra preferida em portugus? Porqu?

    IC Olha, olha No sei!

    P Nunca pensou sobre isso?

    IC No, nunca pensei. Eu agora podia arranjar aqui umas quantas palavras para ser agradvel,mas no. H muitas palavras de que gosto.

    P E h alguma que deteste?

    IC Ah! Isso mais fcil. A expresso pompa e circunstncia, no gosto dela.

    P E porqu?

    IC No gosto devido ao uso que lhe dado. Fico furioso com palavras previsveis, que jsabemos que vo ser usadas uma a seguir outra. Repare, quando ouvimos pompa j sabemosque vem a circunstncia. banal. Ou quando falamos de adeso a greves, muitas vezes vemqualificao a meio gs. A greve est a meio gs. So preguias mentais de profissionais dacomunicao social, que no percebem que as palavras so entidades soltas, que podem ser

  • recombinadas, e acham que ao usarem uma tm de usar a outra, quando isso no verdade.

    P o uso da redundncia, como na expresso a mim prprio

    IC Pois, a redundante, . Comigo e consigo tambm so redundantes. Quer saber porqu? Aformao de comigo co + mi + go. Este go final o mesmo cum latino da slaba inicial. Quandoo latim queria dizer comigo dizia me cum. Me cum evoluiu para migo em portugus, galego eespanhol. A certa altura as pessoas achavam que faltava ali qualquer coisa porque migo notransmitia j a ideia do com. E ento passaram a dizer com migo, e depois comigo. Ou seja,puseram l segunda vez o que j l estava. uma redundncia. Agora, pode passar sem ela? Nopode!

    P O que d unidade a uma lngua?

    IC O que d unidade a uma lngua uma estrutura gramatical que adquirida por todos osmembros de uma sociedade, aps a nascena. E tambm um dicionrio; um dicionrio em quealgumas palavras so conhecidas de todos, outras so conhecidas por especializados, e outrasso conhecidas apenas por camadas muito cultas. No um dicionrio nico, um dicionriocompartimentado. O conhecimento comum, por uma sociedade, dessas regras gramaticais edesse dicionrio costuma ser suficiente para dar unidade a uma lngua.

    P No dia em que os Beatles ou o Elvis comearam a fazer-se ouvir em Portugal, oportugus mudou? Isto , qual o contributo das artes e, neste caso, da msica para umalngua?

    IC Bom, claro que o portugus no mudou. O que mudou foi a maneira de os rapazes sepentearem! O contributo da literatura, da cultura, das artes, em geral, para a renovao de umalngua provm precisamente do poder que os artistas tm de propor novas formas de gosto,entre as quais esto as palavras. Isto , de propor comunidade novas formas, com acapacidade de convencer a sociedade a rapidamente gostar e adotar essas palavras. Um artistatem a capacidade de vender instantaneamente um produto lingustico que a escola demorariauma gerao a vender.

    P Qual a diferena entre uma lngua e um dialeto?

    IC Costuma dizer-se que uma lngua um dialeto equipado com um exrcito. Ou seja, umdialeto que detm um exrcito tem poder poltico e, portanto, pode invadir a rea de outrosdialetos. Historicamente, foi sempre assim que aconteceu. Modernamente, diria que uma lngua um dialeto que tem uma televiso. A televiso mais eficaz do que um exrcito. Aquilo queest a acontecer no mundo globalizado que os dialetos, como variedades menores dentro deuma lngua, esto cada vez mais a perder caractersticas, esto a ser descaracterizados, e atendncia para desaparecerem. Em Portugal, h 50 anos, dizia-se que havia dialetos no Nortee no Sul do pas que se distinguiam, e no Norte havia mais dialetos que se distinguiam uns dosoutros. Havia tambm uma questo que interessava s pessoas de Coimbra que era saber senas Beiras havia dialetos diferentes dos do Norte e do Sul. Havia quem dissesse que sim as

  • pessoas de Coimbra e quem dissesse que no quem no era de Coimbra. Havia um panoramaque foi cartografado, que o mapa de dialetos de Lindley Cintra. Um mapa muito semelhanteaos das regies portuguesas de Orlando Ribeiro. So produtos da mesma poca e que davamcontam da situao nessa altura. Hoje em dia no h isso. No h a mesma diviso entre Norte eSul. H, sim, diviso entre litoral e interior. E o litoral constitudo por uma espcie demegacidade onde vive quase toda a populao portuguesa, que vem desde Viana do Castelo atao Algarve com uma interrupo entre Sines e Lagos. Nesta megacidade predomina umsuperdialeto que o portugus standard que j no s o portugus de Lisboa. o portugusda comunicao social, o portugus das escolas. Isto porque os professores das escolas no sonaturais dos stios onde trabalham e esto constantemente a ser movimentados pelo Ministrioda Educao, que no percebe o mal que est a fazer lngua com a poltica de colocao deprofessores que tem; alm de fazer mal aos prprios professores. um mal profundo, que temconsequncias visveis a sculos de distncia e que se deve a polticas ignorantes, descuidadas edesrespeitosas, que em determinados momentos os governos tomam. Como no promoverem afixao em determinado local de professores desse local. Sem isto a reproduo dos dialetosest ameaada, com resultados que esto vista.

    P E a questo do mirands?

    IC O mirands um dialeto ou, mais exatamente, um conjunto de dialetos. Mas um conjuntode dialetos de uma lngua que no o portugus. da lngua asturo-leonesa, que se encontra dolado de l da fronteira de Trs-os-Montes. H razes histricas para explicar isso. um dialetoem territrio portugus de uma lngua transfronteiria. Em Portugal tem o estatuto de lnguaoficial minoritria, pois uma lngua com instrumentos de ensino, com gramtica, comdicionrio, literatura e muito interesse na sua sobrevivncia. Em Portugal no h mais nenhumasituao como esta.

    P E o que dizer do barranquenho?

    IC O barranquenho no lngua, mas sim um minidialeto constitudo por elementos do dialetoandaluz, do outro lado da fronteira, e do dialeto alentejano, do lado de c. Depois temos o casode Minde no est na pergunta, mas eu digo-lhe. Os de Minde querem ter um estatuto igualaos de Miranda, mas no tm direito a isso. Em Minde h uma variedade lingustica que no dialeto. o chamado minderico, que tem grupos de presso e lobbies bastante ativos. Ominderico no um dialeto, mas aquilo a que se chama uma gria, uma norma fechada, privativade grupo socioprofissional que utiliza materiais dos dialetos locais e que utilizada pelaspessoas em situaes de confidencialidade. uma gria, no um dialeto. Em relao a lnguas no territrio portugus, possivelmente deveramos comear a pensar numlevantamento slido, em certas cinturas das grandes cidades, da existncia de crioulos africanoscomo lnguas de comunidade. H indicadores muito interessantes que nos mostram que hjovens de origem europeia que aprendem a falar crioulo porque a lngua dominante no grupode amigos onde esto inseridos. Isso v-se na msica. O Rap, por exemplo. Esse elemento dereprodutividade um elemento essencial para que se possa falar de uma lngua. Talvez ao ladodo mirands devssemos comear a habituar-nos a que h outras lnguas estrangeiras pois oque so em territrio portugus e em comunidades definidas. Agora, preciso defini-las

  • melhor.

    P O erro ortogrfico de hoje pode ser a norma de amanh?

    IC Sim. O erro lingustico de hoje pode ser a normade amanh. Se for aceite pela comunidade, transforma-se em norma e entra no sistema da lngua. O erroortogrfico, para deixar de o ser, depende dealteraes da conveno (mudanas de cima parabaixo), ao passo que a aceita o da comunidade umamudana de baixo para cima.

    P Ainda em relao norma, no caso da atribuiodo nome prprio o peso da norma faz-se sentir.Esteve ligado ao Instituto dos Registos e do Notariado(IRN). A lista de nomes foi atualizada e agora possvel registar uma menina com o nome de Ingridou Acil, por exemplo. Mas no um menino a quemqueiram chamar Tom ou Elvis. Qual o critrio? Queteste preciso passar para ter o estatuto de nomelegal na lngua portuguesa?

    IC A legislao portuguesa era bastante restritiva. A partir do ano 2000 foi-seprogressivamente tornando um pouco mais permissiva, mais atualizada com os tempos. Por umlado, a Lei da Liberdade Religiosa tornou extensivo a nomes estrangeiros, de religies queexistem em Portugal, o mesmo estatuto e direito que at ento eram dados aos nomes catlicos.Por outro lado, o fenmeno da emigrao levou a que fossem reconhecidos direitos a filhos deemigrantes nascidos no estrangeiro e a filhos de estrangeiros nascidos em Portugal que lhespermitissem terem nome estrangeiro, ou dos pais ou do pas onde nasceram. Finalmente, oAcordo Ortogrfico de 1990 reintroduziu o K, o W, e o Y o que significa que os nomes voltarama poder incluir essas letras, que at ento estavam banidas. Neste quadro, o mecanismo umpouco mais aberto, mas sempre preciso que o pai que v registar o filho esteja em condiesde convencer o funcionrio do Registo Civil de que aquele nome um nome possvel. Porque noh uma lista dos nomes permitidos. H uma lista dos nomes no permitidos e outra lista dosnomes que foram postos em dvida, mas que acabaram por ser permitidos. Mas a lista dos nomespossveis infinitamente maior, sendo constituda por todos os nomes em relao aos quaisningum tem dvidas que so nomes portugueses. Na lista dos permitidos no est Mariaporque no preciso. Se o funcionrio considerar, com a sua experincia lingustica, que o nomeque est a ser proposto portugus, no se pensa mais no assunto e est resolvido. Dependemosda experincia, mas tambm do arbtrio do funcionrio. Se o funcionrio achar que LyonceViiktrya um nome poderosssimo, o nome passa. E este passou. Se o funcionrio tiver dvidas,ento h um processo hierrquico de controlo dialogado, que pode levar a que o nome sejapermitido. Ento, esse nome que esteve em causa, e que foi apreciado por um linguista, entrapara a lista dos permitidos. Se no, fica na lista dos no-permitidos.

  • P Podemos exprimir tudo por palavras?

    IC Claro que no! H pouco falvamos da arte. A arte uma forma de nos exprimirmos sempalavras.

    P Os emojis so novas formas de linguagem? A Internet veio mudar a nossa relao com aspalavras, propondo-nos novas formas de comunicao?

    IC No so uma forma de linguagem. So elementos grficos significativos, como qualquerdesenho o .

    P , h largos anos, professor de crtica textual da Faculdade de Letras da Universidade deLisboa. Para si a crtica textual uma arte ou uma cincia?

    IC Dizer uma cincia pode parecer pretensioso, mas no uma arte. Fazer crtica textual precisamente uma recusa de editar livros como se fossem arte, com critrios estticos, de gostoe de opinio. uma cincia na medida em que tem um objeto definido, tem um mtodo que sequestiona constantemente, e mecanismos de autocrtica e de reviso.

    P Em 2014, comemoraram-se os 800 anos da Lngua Portuguesa

    IC No verdade! No se comemoraram nada os 800 Anos da Lngua Portuguesa. E ascomemoraes em que a INCM participou, de uma forma generosa mas deficiente, so umsimples processo de propaganda que no tem nenhuma fundamentao cientfica. E quandoforam praticados os poucos atos dessas comemoraes, todos estavam cientes de que estavam aparticipar de uma fico histrica.

    P Celebrar o aniversrio da nossa lngua numa data precisa, por um lado, envolve algumgrau de arbitrariedade e de escolha. Por outro lado, evidente que uma lngua no nasceunum dia s Porqu o 27 de junho de 1214 para o nascimento do portugus?

    IC Trata-se da data do primeiro testamento do rei Afonso II, terceiro rei de Portugal. A suaescolha para documento fundador no muito feliz, pois no um documento nico (h deleduas cpias, mas houve mais), no o testamento definitivo do rei (dois outros o substituram),no o documento mais antigo em portugus que se conhece e, acima de tudo, uma lngua nonasce quando a comeam a escrever, mas muito antes.

    P Mas existem textos anteriores: uma Notcia de Fiadores, datada de 1175; um Auto dePartilhas dos irmos Sanches, de 1192; a Notcia de Torto, em data incerta (1211? 1214?1216?), contempornea do Testamento de D. Afonso II.

    IC Exatamente. precisamente por haver cincia disponvel, publicada e recente a esterespeito que se torna inadmissvel que algumas instituies com responsabilidades culturaismuito grandes e a a INCM exercitou alguma prudncia, mas o mesmo no se poder dizer doInstituto Cames ou da Biblioteca Nacional se tenham deixado enredar nesta manobra de

  • publicidade e promoo de uma data que no existe. As grandes instituies de cultura do nossopas no podem dar-se ao luxo de patrocinar atos de ignorncia quando h cincia disponvel.

    P O Centro Virtual Cames, na seco de Histria da Lngua que foi por si dirigida,disponibiliza a biografia de Lindley Cintra, uma das figuras principais da Lingusticaportuguesa. Passo ento a citar parte dessa biografia: () Cintra no foi um homemparadoxal, nem muito apreciador de ironias ou surpresas conceptuais. () no gostava deCames e, se pudesse ser lngua, preferia ser o castelhano. E agora pergunto-lhe, acha queo castelhano e o portugus, duas lnguas irms na ascendncia, conseguem conviverpacificamente?

    IC Eu acho que o portugus e o espanhol convivem muito bem. Nas regies de fronteiraconvivem de maneira diferente da das capitais. Mas tambm a convivem muito bem. possvelque na conquista de cargos de ensino nos Estados Unidos da Amrica ou no Oriente acha algumacompetio entre elas, mas francamente a competio que pode haver entre o ensino doportugus e do espanhol bem menor do que a competio entre o ensino do portugus dePortugal e do portugus do Brasil essa que uma competio feroz!

    P E o portunhol na ponta da lngua?

    IC A questo do portunhol!... Ns quando vemos um estrangeiro pomos logo a boquinha emfeitio para falar estrangeiro. Ns, portugueses, adoramos falar lnguas estrangeiras, e achamosque temos jeito para falar lnguas estrangeiras. At tenho impresso de que ns temos maisjeito para falar lnguas estrangeiros do que outras naes. Mais do que os espanhis, porexemplo. Algumas naes so completamente alrgicas s lnguas estrangeiras. H aquelafamosa piada da senhora inglesa que dizia que no gostava de vir para a Europa porque naEuropa tinham a mania de falar estrangeiro. Os franceses tambm eram assim, mas ultimamentefazem tudo e mais alguma coisa para falar ingls. Tinham uma ideia de superioridade da sualngua, mas que parecem ter abandonado. Os espanhis so tambm bastante imperiais nesseaspeto. Mas povos como os do norte da Europa sabem que tm de falar outra lngua alm da sua,e sabem que essa lngua agora o ingls, e por isso so quase bilingues. Ou seja, os povos quetm uma noo da sua marginalidade sabem que frequentemente os assuntos que tm de tratarso com estrangeiros. Muitas naes esto como ns a fazer os possveis para falar a lngua dosoutros. Bem ou mal. Esses fenmenos so normais em naes que acham que no esto nocentro do mundo.

    P Otimista ou pessimista em relao lngua portuguesa no mundo?

    IC Pessimista. No acredito nas estruturas polticas da Comunidade dos Pases de LnguaPortuguesa. No h unidade lingustica a mdio e a longo prazo que possa justificar o termolusofonia. E no colhem as desculpas que costumam ser dadas para usar o conceito em si, que o de uma comunidade de simpatias, de conhecimento mtuo, e que muito boa para osnegcios. O que se tem verificado que esses negcios so para desproveito dos portugueses.Portugal tem sido diplomaticamente humilhado pelos amigos da Guin Equatorial, por TimorLeste, que nos deve alguns favores, tem sido vendido a grandes interesses brasileiros e

  • angolanos. Tudo isso a cavalo de uma lusofonia que s serve para os outros e no para Portugal.Como isto uma questo que est nas mos de governos, preciso que haja uma opinio pblicasuficientemente robusta para mostrar que as coisas no esto tranquilas.

    P Quais os desafios da lingustica para o sculo XXI?

    IC Desafios que esto a ser bem enfrentados. O reconhecimento de que cada vez mais fcilconhecer os processos cognitivos que esto por trs da aquisio da linguagem, doarmazenamento da memria e do processamento humano e automtico da linguagem. Tudo istodevido ao desenvolvimento das neurocincias, que est a ser feito com abertura aos aspetoscomunicativos que a lingustica fornece. Isso est evidentemente a levar a lingustica para muitolonge da histria literria; no da histria lingustica, porque a histria de uma coletividadelingustica em certos aspetos prefigura a histria da aquisio da linguagem do indivduo.Portanto, at h ganhos nestes desenvolvimentos. Mas o afastamento entre a lingustica e aliteratura ntido. Os estudos literrios clssicos no tm muitos caminhos por onde ir. Veja oaparecimento de subcincias que os especializam e substituem: a teoria da literatura, osestudos comparatistas, os estudos culturais, a traduo literria So tudo desenvolvimentosque de certo modo replicam aquilo que ns, linguistas, fizemos nos anos 70 quando nosautonomizmos em relao literatura.

    P Enquanto acadmico, crtico, investigador eprofessor, que mensagem deixaria para quem querestudar lingustica?

    IC A lingustica, hoje, um estudo cientfico que temos cofres cheios de saberes adquiridos e estabilizados etem desafios muito interessantes pela frente, masperdeu um certo triunfalismo que teve nos primeirostempos de revoluo chomskyana, e que levaram, nosanos 70 e 80, a uma indevida invaso do ensinosecundrio por prticas lingusticas ou conceitoslingusticos que so bons para universitrios, mas nopara ensinar lngua. Ainda o estamos a pagar um pouco,na atual reao que j ps novamente no centro doensino da lngua portuguesa o fenmeno literrio. Nemessa invaso nem esta restaurao me parece quesejam donas da razo.

    P Pergunto-lhe a si, Ivo Castro, se pudesse ser lngua, que lngua gostaria de ser?

    IC Ahhh! Seria o francs!

    P E porqu?

    IC Olhe, calhou. Fui educado numa idade em que a primeira lngua estrangeira que se

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    Prelo (s) quarta-feira, janeiro 27, 2016

    aprendia era o francs, e tive a possibilidade de viver muito tempo em Frana. O francs que sei um francs j antigo, como as flausinas do meu amigo. De facto, depois do portugus, alngua que me imediatamente disponvel e uma lngua que infelizmente tenho poucaoportunidade de falar.

    P Agora e para terminar: e Leite Vasconcelos?

    IC Ah! Leite Vasconcelos o maior linguista que Portugal jamais teve e que continuar a ter!Adoro dizer isto aos meus colegas! [risos]

    TPR

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