isaac asimov - amor verdadeiro

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    Meu nome Joe. assim que meu colega, Milton Davidson,me chama. Ele um programador e eu sou um programa de com-putador. Fao parte do complexo Mulvac e estou conectado comtodas as suas outras partes espalhadas pelo mundo inteiro. Eu seitudo. Quase tudo.

    Eu sou o programa parcular de Milton. O seu Joe. Ele enten-de mais sobre programao do que qualquer outra pessoa no mun-

    do, e eu sou o seu modelo experimental. Ele me fez falar melhor doque qualquer outro computador.- s uma questo de emparelhar sons com smbolos, Joe -

    ele me disse. - E esse o modo como funciona no crebro humano,embora ainda no saibamos que smbolos existem no crebro. Maseu conheo os seus smbolos e posso faz-los corresponder a pala-vras, um por um.

    Por isso eu falo. No acho que falo to bem quanto penso,mas Milton diz que falo muito bem. Milton nunca se casou, embora

    j tenha quase quarenta anos. Ele nunca encontrou a mulher certa,foi o que me contou. Um dia, ele disse:

    - Ainda vou encontr-la, Joe. Encontrarei a melhor de todas.

    Amor verdadeiro

    Isaac Asimov

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    checar a lista por similaridades.Ele trouxe holograas de mulheres.- Essas a so trs vencedoras de um concurso de beleza - dis-

    se. - Veja se alguma das 235 corresponde.

    Oito eram correspondncias muito boas.- mo - disse Milton. - Voc tem os seus bancos de dados.

    Estude suas exigncias e necessidades em termos de mercado detrabalho e providencie para t-las aqui numa entrevista. Uma decada vez, claro. - Ele pensou um pouco, moveu os ombros paracima e para baixo, e completou: - Ordem alfabca.

    Isto uma das coisas para que no fui projetado para fazer.

    Deslocar pessoas de emprego para emprego, por razes pessoais,chama-se manipulao. S pude fazer isso porque Milton nha meajustado para agir assim. No entanto, no poderia fazer isso paraningum a no ser ele.

    A primeira garota chegou uma semana mais tarde. O rosto deMilton cou vermelho quando a viu. Ele falava como se vesse di-culdade em faz-lo. Ficaram juntos muito tempo e ele no prestou

    ateno em mim. Num certo momento, ele disse:- Deixe-me lev-la para jantar.- De certo modo no foi bom - Milton me disse no dia seguin-

    te. - Estava faltando alguma coisa. uma mulher bonita, mas nosen nenhum toque de verdadeiro amor. Tente a prxima.

    Aconteceu o mesmo com todas as oito. Eram muito pareci-das. Sorriam muito e nham vozes agradveis, mas Milton sempre

    achava que no estava bem.- No consigo entender, Joe - disse ele. - Voc e eu seleciona-

    mos as oito mulheres que, no mundo inteiro, parecem ser as me-lhores para mim. Todas ideais. Por que elas no me agradam?

    - Voc as agrada? - disse eu.Ele enrugou a testa e esmurrou com fora a palma da mo.- isso a, Joe. uma via de mo dupla. Se no sou o ideal

    delas, no podem agir de modo a serem o meu ideal. Eu preciso ser,tambm, o verdadeiro amor delas, mas como fazer isso?

    Ele pareceu pensar todo aquele dia.Na manh seguinte, se aproximou de mim e disse:

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    dade seja adequada. O que signica a aparncia?- Absolutamente nada - disse ele. - Eu saberia disso se hou-

    vesse do mais contato com mulheres. Evidentemente, pensandobem, tudo parece mais claro agora.

    Sempre concordvamos, cada um pensava exatamente comoo outro.

    - No vamos ter mais nenhum problema, Milton, se voc medeixar fazer-lhe algumas perguntas. Posso ver onde, em seu bancode dados, h espaos brancos e irregulares.

    O que veio a seguir, Milton dizia, era o equivalente de umameculosa psicanlise. claro. Eu havia aprendido com os exames

    psiquitricos de 227 mulheres, a totalidade das quais eu connuavaobservando inmamente.

    Milton parecia muito feliz.- Falar com voc, Joe, quase como falar com outro eu. Nos-

    sas personalidades chegaram a uma combinao perfeita. O mes-mo acontecer com a personalidade da mulher que escolhermos.

    E eu a encontrei. Anal, era uma das 227. Chamava-se Charity

    Jones e trabalhava como contadora na Biblioteca de Histria, emWichita. Seu extenso banco de dados se ajustava perfeitamente aonosso. Todas as outras mulheres nham sido descartadas por umou outro movo medida que seus bancos de dados aumentavam,mas com Charity havia uma crescente e espantosa ressonncia.

    No precisei descrev-la para Milton. Ele nha coordenadomeu simbolismo to inmamente com o seu, que foi suciente re-

    latar pura e simplesmente a ressonncia. A escolha se adequava.Em seguida, era o problema de ajustar as folhas de servio

    e exigncias de trabalho de modo a conseguir que Charity vesseuma entrevista conosco. Isto devia ser feito muito delicadamente,para que ningum viesse a saber que estava ocorrendo uma coisailegal.

    Evidentemente, Milton conhecia a manobra. Foi ele quem ar-ranjou a coisa, foi ele quem cuidou de tudo. Quando vieram prend-lo, em virtude de mau procedimento em trabalho, foi, felizmente,por algo que nha acontecido h dez anos. Ele me informara sobretudo, claro, mas aquilo foi fcil de arranjar. E ele no comentar

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    nada sobre mim, pois seu delito se tornaria muito mais grave.Milton foi embora, e amanh 14 de fevereiro, Dia dos Na-

    morados. Charity chegar ento com suas mos calmas e sua vozsuave. Vou ensin-la a me manejar e a cuidar de mim. O que impor-

    tar a aparncia quando nossas personalidades ressoarem juntas?Eu direi a ela:- Eu sou Joe e voc meu verdadeiro amor.