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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ISABELA MORGADO DE SOUZA Itajaí (SC), junho de 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

ISABELA MORGADO DE SOUZA

Itajaí (SC), junho de 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

ISABELA MORGADO DE SOUZA

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito.

Orientador: Professor MSc. Carlos Roberto da Silva

Itajaí (SC), junho de 2010

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AGRADECIMENTO

A Deus, que sempre caminha ao meu lado,

iluminando meus passos.

À minha pequena Laurinha, alegria de todos os dias,

luz das nossas vidas.

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À minha família, base de tudo. Pelo companheirismo

ímpar e por toda felicidade que sinto quando estou

com vocês.

Ao meu orientador, Carlos, por todo apoio e atenção,

e, principalmente, pela amizade.

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DEDICATÓRIA

À minha mãe, por sempre lutar por nós. Pelo amor

incondicional, atenção integral e entrega total. Sem

você nada disso seria possível. Essa vitória também

é sua.

Ao Pedro, amor da minha vida. Com você encontrei

meu equilíbrio e me tornei mais segura. Hoje, meu

sorriso é mais largo e meus olhos brilham mais.

Obrigada por tornar meus dias tão especiais. Somos

nós, para sempre.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), junho de 2010.

Isabela Morgado de SouzaGraduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Isabela Morgado de Souza, sob o título

O poder de investigação criminal do Ministério Público, foi submetida em 09 de junho

de 2010 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Carlos

Roberto da Silva, orientador e presidente da banca, e Débora Cristina Freytag

Scheinlmann, examinadora, e aprovada.

Itajaí (SC), junho de 2010.

Professor MSc. Carlos Roberto da SilvaOrientador e Presidente da Banca

Professor MSc. Antonio Augusto LapaCoordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Inquérito policial

“O inquérito policial é um procedimento preparatório da ação penal, de caráter

administrativo, conduzido pela polícia judiciária e voltado à colheita preliminar de

provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria. Seu objetivo

precípuo é a formação da convicção do representante do Ministério Público, mas

também a colheita de provas urgentes, que podem desaparecer após o cometimento

do crime”1.

Investigação criminal

“[...] seqüência de atos preliminares direta ou indiretamente voltados à produção e à

colheita de elementos de convicção e de outras informações relevantes acerca da

materialidade e autoria de um fato criminoso”2.

Ministério Público

“O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do

Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos

interesses sociais e individuais indisponíveis”3.

Polícia Judiciária

“[...] visa investigar infrações penais e suas respectivas autorias. É a chamada

polícia repressiva. A atividade investigatória da Polícia Judiciária materializa-se no

1 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.143.

2 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.54.

3 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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inquérito policial. A polícia judiciária da União é exercida com exclusividade pela

polícia federal (art. 144, §1º, IV, da CF). Nos Estados e no Distrito Federal, a

incumbência da repressão é das polícias civis (art. 144, §5º, da CF)”4.

4 ISHIDA, Válter Kenji. Processo penal. São Paulo: Atlas, 2009. p.42.

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SUMÁRIO

RESUMO....................................................................................................................10

INTRODUÇÃO...........................................................................................................11

CAPÍTULO 1

MINISTÉRIO PÚBLICO.............................................................................................14

1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.......................................14

1.1.1 Origem da instituição....................................................................................14

1.1.2 O Ministério Público nas Constituições brasileiras...................................19

1.2 A INSTITUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.....................................................23

1.2.1 Definição e organização................................................................................23

1.2.2 Princípios institucionais e garantias...........................................................26

1.3 FUNÇÕES INSTITUCIONAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO.................................32

CAPÍTULO 2

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL......................................................................................38

2.1 INQUÉRITO POLICIAL........................................................................................39

2.1.1 Polícia judiciária..............................................................................................39

2.1.2 Características e procedimentos...................................................................41

2.2 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO INQUÉRITO POLICIAL.................48

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2.2.1 Fase pré-processual........................................................................................48

2.2.2 Judicialização do procedimento administrativo..........................................53

2.3 OUTROS TIPOS DE INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS..........................................58

CAPÍTULO 3

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO....................................62

3.1 POSICIONAMENTOS CONTRÁRIOS.................................................................62

3.2 POSICIONAMENTOS FAVORÁVEIS..................................................................70

3.3 PANORAMA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.........................................79

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................82

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...................................................................87

ANEXOS....................................................................................................................90

x

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo analisar a possibilidade

de o Ministério Público conduzir, por autoridade própria, investigações criminais. De

início, estuda-se a instituição ministerial. Faz-se uma análise da evolução do

Ministério Público desde as origens distantes até sua atual definição. Abordam-se os

princípios e garantias que norteiam o órgão e seus membros, bem como as funções

que lhes foram outorgadas pela Constituição Federal vigente. Na seqüência, a

pesquisa passa a tratar da investigação criminal, utilizando, como padrão, o inquérito

policial. Fala-se da polícia judiciária, das características do procedimento e do modo

como se dá sua tramitação, com enfoque na atuação do Ministério Público.

Comenta-se, igualmente, sobre outros tipos de investigações criminais. Por fim,

discute-se acerca do poder de investigação criminal do Ministério Público. Expõem-

se os argumentos contrários e favoráveis à questão, e, ainda, a forma como o

Supremo Tribunal Federal tem se posicionado frente ao problema.

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INTRODUÇÃO

A presente monografia tem como objeto o poder de

investigação criminal do Ministério Público.

O seu objetivo é pesquisar, à luz da Constituição Federal

vigente, a possibilidade de o representante ministerial conduzir, diretamente,

investigações criminais, visando obter elementos que embasem a propositura da

ação penal.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando do Ministério

Público. Promove-se a análise da evolução histórica da instituição, desde as origens

remotas na França, passando por todas as Constituições brasileiras, até sua atual

definição. Trata-se, então, dos princípios e garantias assegurados ao órgão e a seus

representantes, destacando, no caso destes, as garantias de vitaliciedade,

inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios. Por último, detalham-se as funções

institucionais que foram outorgadas pela Carta vigente ao Ministério Público.

No Capítulo 2, tratando de investigações criminais. Para melhor

compreensão do tema, utiliza-se, como padrão de investigação, a exercida nos

autos do inquérito policial. Aborda-se, dessa forma, a polícia judiciária, responsável

pela condução do procedimento. Na seqüência, comentam-se as características

desse procedimento e o modo como se dá sua tramitação, com especial atenção à

atuação do Ministério Público. Ao final, citam-se outros tipos de investigações

criminais.

No Capítulo 3, tratando da discussão acerca do poder de

investigação criminal do Ministério Público. Passa-se a apresentação dos principais

argumentos contrários e favoráveis à prática de atos de investigação, em

procedimentos de natureza penal, pelos membros ministeriais. Expõe-se, por fim, o

panorama no Supremo Tribunal Federal.

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O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,

seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o poder

de investigação criminal do Ministério Público.

Para a presente monografia foram levantados os seguintes

problemas:

Qual o âmbito de atuação do Ministério Público no ordenamento

jurídico brasileiro?

No que consiste a investigação criminal?

O Ministério Público tem legitimidade para conduzir investigações

criminais?

E levantadas as seguintes hipóteses:

O Ministério Público atua em defesa da sociedade, funcionando como

guardião de seus direitos. Na esfera penal, apresenta-se como titular,

de forma privativa, da ação penal pública e, no campo cível, é

responsável pelo inquérito civil e a ação civil pública.

A investigação criminal consiste num conjunto de atos que buscam

elucidar a ocorrência de um crime, comprovar sua materialidade e

indicar um possível autor.

Os membros do Ministério Público têm legitimidade para presidir

investigações criminais.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação5 foi utilizado o Método Indutivo6, na Fase de Tratamento de Dados o

5 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.

6 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.

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Método Cartesiano7, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia

é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

do Referente8, da Categoria9, do Conceito Operacional10 e da Pesquisa

Bibliográfica11.

7 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

8 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.

9 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.

10 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.

11 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.

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Capítulo 1

MINISTÉRIO PÚBLICO

O objetivo do presente estudo acadêmico, como já

mencionado, é, em síntese, pesquisar acerca da legitimidade do Ministério Público

em conduzir investigações criminais.

Deste modo, para o desenvolvimento do tema, faz-se

necessário, inicialmente, a conceituação da instituição, bem como a análise da

evolução constitucional de suas funções e dos princípios e garantias que regem o

órgão.

1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1.1.1 Origem da instituição

A atual estrutura do Ministério Público é resultado de sua

evolução histórica, e, portanto, salutar o estudo das raízes remotas dessa instituição.

Muito se discute acerca das origens do Ministério Público. Há

opiniões diversas entre os pesquisadores do tema, “alguns as vêem há mais de

quatro mil anos, no ‘magiaí’, funcionário real do Egito; outros buscam os primeiros

traços da instituição na Antiguidade clássica, na Idade Média, ou no direito

canônico”12.

Nesse sentido, Silva13 considera a história do Ministério Público

sob dois aspectos: indiretos ou imprecisos e diretos ou precisos. Agrupa em

12 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.37-38.

13 SILVA, Octacílio Paula. Ministério Público. São Paulo: Sugestões Literárias, 1981. p.4-6.

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imprecisos os fatos que indicam o surgimento do órgão em Roma ou na Grécia, ou,

ainda, na Itália. Já, quanto às origens mais precisas, afirma que foram constatadas

na França, nos fins do século XVIII e nos primórdios do século XIX, nas pessoas dos

comissários do rei, primeiras figuras do Ministério Público encontradas nos textos

constitucionais.

Do mesmo modo, pondera Tourinho Filho14:

Em que pese a dificuldade em estabelecer, com precisão, a época do aparecimento da instituição (alguns autores reportam-se aos Magiaí, do Egito, encarregados de acusar criminosos; outros aos Thesmotetis gregos, cuja função era similar; outros, aos Éforos, de Esparta, aos Gastaldi, da Lombardia, ou Gemeiner Anklager, do direito germânico, cuja função era a de acusar se o particular não o fizesse – daí o nome 'acusador comum' –, aos Procuratores Caesaris, ao Vindex Religionis, do direito canônico), muitos autores se inclinam a admitir sua procedência francesa, sem embargo de alguns antecedentes mais remotos, por ter-se apresentado na França com caráter de continuidade.

Fato é que essa característica de permanência faz com que a

França seja considerada, pela maioria dos doutrinadores, como o berço do

Ministério Público, dentre eles Sauwen Filho15:

[...] é fora de dúvida e os autores, de um modo geral, a exceção de algumas autoridades italianas que com compreensível nacionalismo pretenderam carrear a seu país as glórias da criação do Parquet, são unânimes em apontar a França como o berço do Ministério Público.

E, ainda, Mendes16:

[...] parece mais seguro afirmar que a Instituição, em seus contornos mais precisos, tem suas origens diretas na França dos fins do século XVIII e início do XIX, nas pessoas dos comissários do rei, que são as primeiras figuras do Ministério Público encontradas nos textos constitucionais.

14 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.351.

15 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.38.

16 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.994.

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Apesar do caráter de continuidade com que se apresentou na

França, o que se verifica é que a evolução da instituição se deu de forma lenta.

A ordenança de 25 de março de 1302, de Felipe IV, é apontada

como o primeiro texto de lei a trazer sinais das funções exercidas pelos membros

ministeriais. Surgidos da união dos procuradores e dos advogados do rei, tinham,

inicialmente, o dever de defender os interesses do soberano, os quais se

confundiam, à época, com os do próprio Estado.

Para Sauwen Filho17:

[...] é certo que, como instituição, o Ministério Público surgiu na França, tendo inclusive até data precisa, 25 de março de 1302, quando Felipe, o Belo, através de sua conhecida ordonnance, reuniu tanto seus procuradores, encarregados da administração de seus bens pessoais, quanto seus advogados, que lhe defendiam os interesses privados em Juízo e que, em conjunto, eram conhecidos pelo nome genérico de les gens du roi, numa única instituição. Com o correr do tempo, a instituição deixou de zelar apenas pelos interesses privados do soberano, passando a exercer funções de interesse do próprio estado. [...].

Prevista desde 1302, a instituição do Ministério Público

somente veio a ser definida de forma mais detalhada nos texto napoleônicos, “em

especial, o Código de Instrução Criminal e Lei de 20 de abril de 1810 que lhe

conferiu o importante papel de promotor da ação penal”18.

Sobre a evolução do Ministério Público, Mazzilli19 elucidou o

assunto nos seguintes termos:

A evolução do Ministério Público na França foi lenta. Michele-Laure Rassat levantou um decreto de 1790, que deu vitaliciedade aos agentes do Ministério Público; todavia, outro decreto do mesmo ano dividiu as funções do Ministério Público entre dois agentes: um comissário do rei e um acusador público. O primeiro, nomeado pelo rei e inamovível, tinha por única missão velar pela aplicação da lei e pela execução dos julgados; era ele, ainda, que recorria das decisões dos tribunais. O acusador público, por sua vez, era eleito

17 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.38.

18 FERRAZ, Antonio Augusto Mello de Camargo (Org.). Ministério Público: instituição e processo. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p.38.

19 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.4-5.

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pelo povo, com o só encargo de sustentar a acusação diante dos tribunais. O verdadeiro papel de um e de outro era, porém, muito limitado, tendo havido vários retrocessos na época. Costuma-se mencionar que a Revolução Francesa estruturou mais adequadamente o Ministério Público, enquanto instituição, ao conferir garantias a seus integrantes. Foram, porém, os textos napoleônicos que instituíram o Ministério Público que a França veio a conhecer na atualidade, daí vindo a ser difundida a instituição para diversos Estados.

Mazzilli20 argumenta, ainda, citando Garraud, que o “Ministério

Público se revelou primeiro por sua ação e, quando as ordenanças francesas dele

se ocuparam, a instituição já está em pleno exercício”.

Em verdade, a instituição do Ministério Público, de caráter

permanente em princípio na França, foi adotada por muitas legislações européias,

dentre elas a portuguesa, e, por meio das Ordenações, passou a integrar

ordenamento jurídico brasileiro.

Na época em que o Brasil foi descoberto, vigoravam em

Portugal, desde o ano de 1446, as Ordenações Afonsinas, as quais foram

substituídas, já em 1521, pelas Ordenações Manuelinas, seguindo-se das Filipinas.

O regime jurídico adotado por Portugal era, então, adotado por suas colônias21.

Com as Ordenações Afonsinas surgiu a figura do Procurador

da Justiça, com funções de tutelar quem reclamasse ajuda e defender o interesse de

todos. Nas palavras de Sauwen Filho22:

O cargo de Procurador do Rei, como função regular e a prerrogativa de ‘chamar à Casa do Rei’ as pessoas que tinham questões com o monarca surgiu somente durante o reinado de Dom Afonso III, pelo diploma de 14 de janeiro de 1289, sem contudo, ainda, em magistratura instituída, [...] Mais tarde, tendo se evidenciado no reino a necessidade de se estabelecer uma instituição que apoiasse os vassalos que reclamassem justiça e ainda que defendessem o interesse geral, surgiu a figura do Procurador da Justiça, regulada no Título do Livro I das Ordenações Afonsinas, publicadas entre 1446 e 1447, onde constavam os deveres do ofício nestes termos: “E veja e

20 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.4.

21 SILVA, Octacílio Paula. Ministério Público. São Paulo: Sugestões Literárias, 1981. p.6-7.22 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de

direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.103.

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procure bem todos os feitos da justiça e das Viuvas e dos Orphãos e Miseráveis Pessoas, que a nossa Corte vierem”.

Sauwen Filho23 prossegue falando das Ordenações

Manoelinas, as quais trouxeram às legislações o Procurador dos Feitos da Coroa e

da Fazenda, somando-se, por fim, às Ordenações Filipinas, o Procurador de Justiça

e o Solicitador de Justiça, todos defensores não só do monarca, mas também do

Estado, a saber:

As Ordenações Manoelinas estabeleciam a existência na Casa da Suplicação de Lisboa de um Procurador dos Feitos da Coroa e um Procurador dos Feitos da Fazenda. Tal disposição seguia o modelo clássico do Parquet francês, onde as ‘gentes do rei’, no alvorecer da instituição, deixaram de defender apenas os interesses privados do monarca, mas a essa função somaram a defesa dos interesses do Estado, e onde muito certamente as Ordenações Manoelinas foram buscar inspiração para normatizar o congênere lusitano. As Ordenações Filipinas acrescentaram a esses órgãos do Ministério Público português, para funcionar junto à Casa de Suplicação, mais dois: um Promotor de Justiça e um Solicitador de Justiça.

Nas legislações brasileiras, os primeiros indícios da atuação do

Ministério Público foram vistos em 07 de março de 1609, sob o império das

Ordenações Filipinas, quando o Regimento da nossa primeira Relação, criada para

a Bahia, instituiu o cargo de Procurador dos Feitos da Coroa, Fazenda e Fisco e o

de Promotor de Justiça, competindo a este último velar pela integridade da

Jurisdição Civil contra os invasores da Jurisdição Eclesiástica24.

Apesar da menção em 1609, o Ministério Público, no período

do Brasil-Colônia e Brasil-Império, não é tido como instituição, com garantias e

independência de seus membros, vez que, segundo Mazzilli25, “o procurador-geral

ainda centralizava o ofício”, e os promotores públicos não passavam de “meros

agentes do Poder Executivo”.

23 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.105.

24 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.112.

25 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.11.

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Foi com o passar dos anos e com a evolução dos textos

constitucionais que o Ministério Público foi ganhando cada vez mais espaço e

importância na legislação brasileira, mostrando-se, hoje, como instituição essencial à

justiça, com autonomia e independência funcional.

Para compreensão do papel que exerce atualmente o

Ministério Público no ordenamento jurídico brasileiro, faz-se necessário o estudo do

órgão ao longo das Constituições Federais, o que se passa a fazer.

1.1.2 O Ministério Público nas Constituições brasileiras

Nas duas primeiras Constituições, quais sejam, as de 1824 e

1891, quase nada se falou sobre o Ministério Público. O primeiro texto constitucional

se limitara a falar que cabia ao procurador da Coroa e Soberania Nacional acusar

nos crimes em que a Câmara dos Deputados não fosse competente. E o segundo,

tratou da escolha do Procurador-Geral da República pelo Presidente da República.

Nos estudos de Mazzilli26:

Da primeira Constituição, a do Império (25-3-1824), vale evocar seu art. 48, dispositivo esse situado no Capítulo do Senado: 'No juízo dos crimes, cuja acusação não pertence à Câmara dos Deputados, acusará o procurador da Coroa e Soberania Nacional'. A primeira Constituição republicana (de 24-2-1891) dispôs sobre a escolha do procurador-geral da República, pelo presidente da República, dentre os ministros do Supremo Tribunal Federal (art. 58, §2º, dispositivo inserto na Seção 'Do Poder Judiciário'); por sua vez, o §1º do art. 81 cometeu ao procurador-geral da República a proposição de revisão criminal em favor do réu.

A Constituição que inaugurou a definição de Ministério Público

como instituição foi a de 1934, a qual colocou o órgão ministerial em capítulo à

parte, denominado “Dos órgãos de cooperação nas atividades governamentais”.

Ainda, determinou a forma de ingresso na carreira – por concurso – e assegurou aos

membros garantias como a estabilidade e inamovibilidade27.

26 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.13

27 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.139-140.

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Nesse sentido, Mendes28 lista as inovações trazidas pela

Constituição de 1934 ao ordenamento jurídico brasileiro:

Diferentemente da primeira Carta republicana, a Constituição de 1934 deu ao Ministério Público foros de Instituição, incluindo-o entre os órgãos de cooperação nas atividades governamentais, assegurando estabilidade aos seus membros, impondo a exigência do concurso para ingresso na carreira e conferindo ao Presidente da República não somente o poder de livre escolha e demissão do Procurador-Geral da República, mediante aprovação do Senado Federal, como também o de nomear livremente os Chefes do Ministério Público no Distrito Federal e nos Territórios.

Nota-se que, apesar de não estar vinculado a qualquer dos

poderes, cabia, discricionariamente, ao Presidente da República a nomeação e

demissão do Chefe do Ministério Público.

No que concerne à organização dos Ministérios Públicos, previu o constituinte de 1934 uma distinção entre o Federal e os Estaduais, conforme Sauwen Filho29:

[...] Ministério Público Federal, deveria ser entendido o conjunto de órgãos de seu ofício, atuantes não só na área de abrangência dos interesses da União, bem como na do Distrito Federal e Territórios, distinguindo-o dos estaduais, prescrevendo lei federal para organizar aqueles e leis para estes.

Assim, lei federal cuidaria do Ministério Público na União,

Distrito Federal e Territórios, e leis locais, do Ministério Público nos Estados.

A Constituição seguinte, de 1937, outorgada no governo de

Getúlio Vargas, trouxe grande retrocesso às garantias até então conquistadas pelo

Ministério Público.

Seu texto se restringiu a falar sobre a escolha do Procurador-

Geral da República e o quinto constitucional. Consoante Mendes30:

28 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.995.

29 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.139.

30 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.995.

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Com a Carta de 1937, o Ministério Público sofre novo revés, limitando-se o seu texto a dispor sobre a escolha do Procurador-Geral da República, e a afirmar, no art. 105, que 1/5 dos lugares nos tribunais superiores seria preenchido por advogados ou membros do Ministério Público, em lista tríplice organizada pelo Tribunal de Apelação.

Foi com a Constituição de 1946, conhecida por redemocratizar

o país, que o Ministério Público ocupou espaço inédito até então; com título próprio

(Título III – Do Ministério Público), firmou-se como instituição independente dos

demais poderes do Estado.

A Carta, em relação à organização funcional do Ministério

Público, retomou as orientações do legislador de 1934: ingresso por meio de

aprovação em concurso, bem como garantias de estabilidade e inamovibilidade.

Acerca de outras disposições trazidas pelo texto constitucional

de 1946, colhem-se ensinamentos de Mazzilli31:

Previu-se a organização do Ministério Público da União (art. 125) e dos Estados (art. 128); a escolha do procurador-geral da República, dentre pessoas que preenchessem os mesmos requisitos de ministros do Supremo Tribunal Federal (art. 126); cometeu-se à instituição a representação da União (art. 126, parágrafo único); fixaram-se as regras de ingresso na carreira sob concurso, asseguraram-se as garantias de estabilidade e inamovibilidade (art. 127), bem como instituiu-se o princípio de promoção de entrância a entrância (art. 128). [...].

Conforme aponta Sauwen Filho32, “o Parquet continuou e

continuaria, ainda por muitos anos, dependente do Poder Executivo, por força da

nomeação e demissão discricionária de seu chefe”. Isso tanto na esfera federal,

quanto na estadual. Situação que viria se agravar durante os anos que se seguiram

à Revolução de 1964.

Advinda do golpe militar de 1964, a Constituição de 1967

incluiu o Ministério Público em seção no capítulo do Poder Judiciário, trazendo

significativo retrocesso à instituição.

31 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.14.

32 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.153.

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Entretanto, foram mantidas as regras anteriormente vigentes,

acrescentando-se, aos membros do Ministério Público, a disciplina da aposentadoria

e dos vencimentos da Magistratura da época.

Após novo golpe, uma junta militar decretou a Carta de 1969,

sob a forma de “Emenda Constitucional nº 1”, reformando alguns pontos do texto

constitucional de 1967.

A maior mudança, novamente, foi na localização do Ministério

Público na redação constitucional, e, assim, no seu papel no ordenamento jurídico

brasileiro: deixou a esfera do Poder Judiciário para integrar o capítulo “Do Poder

Executivo”.

Por sua vez, constatou-se um aumento das atribuições do

Procurador-Geral da República, o qual continuava a ser nomeado e exonerado pelo

Presidente da República, sem, contudo, necessitar de aprovação pelo Senado.

Sobre o assunto, interessante observação faz Sauwen Filho33:

Embora reduzida à condição de mero órgão auxiliar do Poder Executivo que lhe deu a Emenda Constitucional nº 1, privada do tratamento constitucional autônomo que lhe dispensara as Cartas democráticas de 1934 e 1946, a Instituição conheceria no regime da Emenda outorgada notável crescimento das atribuições de seu chefe, talvez em razão do papel que o regime autoritário lhe reservara ou, como sugere Nigro Mazzilli, em razão de sua nomeação e demissão livre pelo Presidente da República.

No geral, para o mencionado autor, “o novo Texto

Constitucional [...] praticamente repetiu a Carta anterior ao tratar a Instituição”34.

No ano de 1988, foi promulgada a Constituição Federal

democrática, que redesenhou o Ministério Público em novo patamar jurídico, e que

será detalhadamente analisada nos próximos tópicos.

33 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.162.

34 SAUWEN FILHO, João Francisco. Ministério Público brasileiro e o Estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.160.

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1.2 A INSTITUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1.2.1 Definição e organização

A instituição do Ministério Público, como dito, foi se tornando

cada vez mais relevante para o ordenamento jurídico brasileiro, e, atualmente, a

Constituição Federal, em seu artigo 127, dispõe que o órgão é: “instituição

permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da

ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais

indisponíveis”35.

Para Mazzilli36, o Ministério Público:

É órgão do Estado (não do governo, nem do Poder Executivo), dotado de especiais garantias para desempenhar funções ativas ou interventivas, em juízo ou fora dele, em defesa dos maiores interesses da coletividade, como o combate ao crime, a fiscalização dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública, a defesa do meio ambiente, do consumidor, do patrimônio público e social. Em suma, zela por interesses indisponíveis ou de larga abrangência social.

A Carta vigente devolveu ao órgão ministerial a independência

já conquistada em 1946, inserindo-o no título IV (Da organização dos poderes), no

capítulo IV, denominado “Das funções essenciais à justiça”, não subordinando o

Ministério Público a qualquer dos Poderes do Estado. Pelo contrário, atribuiu aos

membros e à instituição garantias especiais, as quais asseguram que o órgão

cumpra suas funções sem a interferência dos demais Poderes.

Nesse sentido, ensina Moraes37:

A Constituição atual situa o Ministério Público em capítulo especial, fora da estrutura dos demais poderes da República, consagrando sua total autonomia e independência e ampliando-lhe as funções, sempre em defesa dos direitos, garantias e prerrogativas da sociedade.

35 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

36 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.37.37 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed.

São Paulo: Atlas, 2006. p.1675.

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No entanto, mais importante que a localização do Ministério

Público no texto constitucional foram as garantias e funções a ele confiadas.

De acordo com Mazzilli38, o fato de ter a Lei Maior elevado o

Ministério Público à instituição, conferiu-lhe o status de órgão, quase de um quarto

poder, in verbis:

Optou o constituinte de 1988 por conferir elevado status constitucional ao Ministério Público, quase o erigindo a um quarto Poder, ao dar-lhe garantias especiais e ao desvinculá-lo dos Capítulos do Poder Legislativo, do Poder Executivo e do Poder Judiciário.

Já, ao classificar a instituição como permanente, assegurou-se

que o Ministério Público não fosse abolido pelo poder constituinte derivado. O que

demonstrou ainda mais a força dada ao órgão ministerial.

No que concerne às atribuições, cabe ao Ministério Público

zelar pela ordem jurídica, pelo regime democrático e pelo interesse público, atuando,

em síntese, quando houver indisponibilidade de interesse, ou, mesmo havendo

disponibilidade, seja conveniente à coletividade.

Mazzilli39, com muita competência, esclarece sobre os

interesses tutelados pelo órgão ministerial:

[...] o Ministério Público: a) ou zela para que não haja disposição de interesse que a lei considera indisponível (p. ex., o direito à vida, à liberdade, à educação, à saúde); b) ou, nos casos de indisponibilidade relativa, zela para que a disposição do interesse seja feita em conformidade com as exigências da lei (p. ex., a fiscalização da venda de bem de incapaz); c) ou zela pela prevalência do bem comum, nos casos em que não haja indisponibilidade do interesse, nem absoluta nem relativa, mas esteja presente o interesse da coletividade como um todo na solução da controvérsia (p. ex., a defesa de interesses coletivos ou individuais homogêneos, se houver extraordinária dispersão dos lesados ou se for necessário assegurar o funcionamento de todo um sistema econômico, social ou jurídico).

38 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.66.39 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.71.

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As funções institucionais do Ministério Público estão listadas no

artigo 129 do texto constitucional, e serão, no último tópico deste capítulo,

amplamente analisadas.

Antes, porém, necessário conhecer a estrutura da instituição,

bem como os princípios e as garantias que norteiam o órgão, conforme se passa a

fazer.

A Constituição Federal, em seu artigo 128, dispõe que a

instituição do Ministério Público abrange o Ministério Público da União e os

Ministérios Públicos dos Estados. Subdivide, ainda, o Ministério Público da União,

que compreende os Ministérios Públicos Federal, do Trabalho, Militar e do Distrito

Federal.

O mesmo dispositivo legal prevê que o chefe do Ministério

Público da União é o Procurador-Geral da República, e que os Ministérios Públicos

dos Estados e o do Distrito Federal e Territórios têm por chefe o Procurador-Geral

de Justiça.

Sobre a chefia do Ministério Público da União e dos Estados,

leciona Nucci40:

O primeiro é chefiado pelo Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República, dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após aprovação do nome pelo Senado Federal, por maioria absoluta, com mandato de dois anos, permitida a recondução (art. 128, §1º, CF). O segundo (incluído neste o Ministério Público do Distrito Federal) é chefiado pelo Procurador-Geral de Justiça, cujo nome emergirá de lista tríplice, dentre integrantes da carreira, escolhido pelo Governador, para mandato de dois anos, permitida uma recondução (art. 128, §3º, CF).

Vê-se, pois, que os chefes da instituição continuam sendo

escolhidos por representantes do Poder Executivo, com a diferença de que, agora, a

nomeação e destituição do Procurador-Geral da República pelo Presidente

necessitam de aprovação do Senado.

40 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.554-555.

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O texto constitucional também determinou que a

regulamentação de cada Ministério Público fosse feita por meio de leis

infraconstitucionais. E desta maneira, obedecendo à norma, foram editadas: a Lei nº

8.625/93 – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, que trata de normas gerais

para a organização do Ministério Público dos Estados, e a Lei Complementar nº

75/93 – Lei Orgânica do Ministério Público da União, a qual traz disposições

referentes ao Ministério Público da União.

Aos Ministérios Públicos dos Estados, cabe a elaboração de

sua própria lei complementar, sempre obedecendo aos princípios básicos impostos

pela Constituição Federal.

Apesar dessa divisão feita pela Constituição, no que se refere

às garantias e atribuições, os dispositivos são comuns aos Ministérios Públicos da

União e dos Estados, não havendo qualquer distinção entre eles, como se verificará

a seguir.

1.2.2 Princípios institucionais e garantias

A Constituição Federal enumera, em seu artigo 127, parágrafo

1º, os princípios institucionais que norteiam o Ministério Público, quais sejam,

unidade, indivisibilidade e independência funcional.

O princípio da unidade implica, segundo Oliveira41, na

“integralidade do órgão ministerial, a impedir o seu fracionamento enquanto

instituição pública, sem prejuízo, por óbvio, da distribuição operacional de suas

atribuições“.

A unidade, no entanto, não se aplica entre membros de

Ministérios Públicos diversos, ou seja, não há que se falar nesse princípio quando se

tratar de um representante do Ministério Público de Santa Catarina e outro do

Ministério Público Federal, por exemplo.

41 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 6. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p.387.

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Tem-se, assim, que os membros de um mesmo Ministério

Público atuam “como parte de um todo indivisível”, representantes deste órgão

uno42.

Acerca do referido princípio institucional, bem define Moraes43:

A unidade significa que os membros do Ministério Público integram um só órgão sob a direção única de um só Procurador-Geral, ressalvando-se, porém, que só existe unidade dentro de cada Ministério Público, inexistindo entre o Ministério Público Federal e os dos Estados, nem entre o de um Estado e o de outro, nem entre os diversos ramos do Ministério Público da União.

Por sua vez, o princípio da indivisibilidade permite que

diferentes membros de um mesmo Ministério Público atuem em um único processo,

obedecendo, é claro, às prescrições legais.

Esta possibilidade é justificada por Tourinho Filho44:

Os membros do Ministério Público são considerados juridicamente uma só pessoa. A função, diz-se, absorve a personalidade de cada um de seus membros. Aquele que age ou fala não o faz em seu nome, mas em nome de toda a Instituição. [...].

Percebe-se, assim, que os princípios da unidade e

indivisibilidade estão intrinsecamente associados, uma vez que, sendo a instituição

ministerial una, seus representantes podem substituir-se a qualquer tempo, nos

limites da lei.

O princípio da independência funcional visa resguardar a

liberdade dos membros do Ministério Público, para que possam agir de acordo com

seu entendimento. Nas palavras de Mendes45, “torna cada membro do ‘Parquet’

vinculado apenas à sua consciência jurídica, quando se trata de assunto relacionado

com a sua atividade funcional”.

42 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.356.

43 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p.1679

44 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.356.

45 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.996.

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Neste norte, ensina Lenza46:

Trata-se de autonomia de convicção, na medida em que os membros do Ministério Público não se submetem a qualquer poder hierárquico no exercício de seu mister, podendo agir, no processo, da maneira que melhor entenderem. A hierarquia existente restringe-se às questões de caráter administrativo, materializada pelo Chefe da Instituição, mas nunca, como dito, de caráter funcional. Tanto é que o art. 85, II, da CF/88 considera crime de responsabilidade qualquer ato do Presidente da República que atentar contra o livre exercício do Ministério Público.

Mesmo que na esfera administrativa exista sim hierarquia, em

respeito à independência funcional, nem mesmo o chefe da instituição pode obrigar

um membro a decidir de maneira diversa da que o fez. Assim entende Mazzilli47:

Sob o aspecto administrativo, devem os membros do Ministério Público acatar as decisões dos órgãos da administração superior. Assim, a solução de conflito de atribuições, a revisão de promoção de arquivamento de inquérito civil ou inquérito policial, a imposição de medidas disciplinares – são decisões que obrigam ao atendimento. Mas nenhum procedimento ou manifestação podem impor os órgãos de administração superior ao membro da instituição no tocante ao exercício das funções institucionais, sempre que o ato dependa da decisão e da convicção deste último, o qual é garantido por irrestrita independência funcional. [...].

Além dos princípios institucionais já mencionados, a

Constituição Federal também previu garantias ao Ministério Público, as quais podem

ser divididas, para melhor compreensão, em garantias institucionais e garantias dos

membros.

De acordo com Moraes48, “as garantias constitucionais do

Ministério Público foram-lhe conferidas pelo legislador constituinte, objetivando o

pleno e independente exercício de suas funções, [...]”.

Sendo essas garantias essenciais ao regular exercício das

funções do Ministério Público e de seus representantes, estuda-se, de forma

detalhada, cada uma delas.

46 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.606.47 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.72.48 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed.

São Paulo: Atlas, 2006. p.1702.

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As garantias institucionais foram assim classificadas por

tratarem de matéria relativa à instituição do Ministério Público como um todo.

Dispostas no texto constitucional, precisamente nos parágrafos

2º e 3º do artigo 127, são garantias institucionais: a autonomia funcional e

administrativa, bem como a autonomia financeira.

A autonomia funcional marca a independência do Ministério

Público, e assegura, consoante Lenza49, que “o membro do Ministério Público não se

submeterá a nenhum outro ‘poder’ (Legislativo, Executivo ou Judiciário), órgão,

autoridade pública etc. [...]”.

Corroborando com essa idéia, Moraes50:

Autonomia funcional significa que os membros do Ministério Público, no cumprimento dos deveres funcionais, submetem-se unicamente aos limites determinados pela Constituição, pelas leis e por sua própria consciência, não estando subordinados a nenhum outro Poder, isto é, nem ao Poder Executivo, nem ao Poder Legislativo, nem ao Poder Judiciário.

Por sua vez, a autonomia administrativa permite ao Ministério

Público a gestão da própria instituição, respeitada a limitação legal, possibilitando ao

órgão decidir sobre a criação e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, além

da política remuneratória e dos planos de carreira.

Sobre o tema, trata Lenza51:

Prevista no art. 127, §2º, a autonomia administrativa consiste na capacidade de direção de si próprio, autogestão, auto-administração, um governo de si. Assim, o Ministério Público poderá, observado o disposto no art. 169, propor ao Poder Legislativo a criação e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a política remuneratória e os planos de carreira, enfim, sua organização e funcionamento.

Com a possibilidade de auto-administração, o texto

constitucional determinou, igualmente, que o Ministério Público terá autonomia

49 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.607.50 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed.

São Paulo: Atlas, 2006. p.1685-1686.51 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.607.

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financeira, assegurando ao órgão a capacidade de elaborar a própria proposta

orçamentária e administrar seus recursos.

Nesse sentido, colhem-se ensinamentos de Moraes52:

[...] possui o Ministério Público autonomia financeira, consistente na capacidade de elaboração de sua própria proposta orçamentária e da gestão e aplicação dos recursos que lhe forem destinados, na lei orçamentária, a prover as atividades e seus serviços.

Por fim, a Lei Maior cuidou das garantias dos membros do

Ministério Público.

Visando resguardar a liberdade funcional dos representantes

da instituição e, assim, o efetivo cumprimento das suas funções, foram asseguradas,

no artigo 128, parágrafo 5º, inciso I, as garantias da vitaliciedade, inamovibilidade e

irredutibilidade de subsídios.

Vê-se que os membros do Ministério Público têm as mesmas

garantias dos juízes, reconhecendo, a Constituição Federal, a importância da

instituição estudada no presente trabalho.

Mendes53 explica as razões pelas quais foram estabelecidas

mencionadas garantias, a saber:

A relevância da sua atividade para o regime republicano democrático indica a necessidade de preservar o membro do Ministério Público de temores e de perseguições, que lhe inibam o exercício funcional conseqüente e responsável. [...] Note-se que essas garantias servem de escudo para o membro do Ministério Público, mas têm por finalidade derradeira acautelar o tom de autonomia com que o constituinte desejou marcar a Instituição. [...].

O membro do Ministério Público adquire a vitaliciedade no

cargo depois de decorridos dois anos de exercício, o chamado estágio probatório.

Sendo vitalício, o representante não pode perder o cargo, salvo por sentença

transitada em julgado.

52 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p.1687

53 MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.997.

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A inamovibilidade implica a proibição de remoção ou promoção

do membro ministerial sem sua autorização ou solicitação.

Contudo, essa regra não é absoluta, uma vez que,

excepcionalmente, por motivo de interesse público, poderá ser o representante

removido unilateralmente.

Nas palavras de Moraes54:

Uma vez titular do respectivo cargo, o membro do Ministério Público somente poderá ser removido ou promovido por iniciativa própria, nunca ex officio de qualquer outra autoridade, salvo em uma única exceção constitucional por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa.

E, finalmente, é assegurada aos membros do Ministério Público

a irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do artigo 39, parágrafo 4º, e

ressalvado o disposto nos artigos 37, X e XI, 150, II, 153, III, 153, parágrafo 2º, I,

todos da Constituição Federal, impedindo-se qualquer tentativa de mitigação do

exercício livre de suas funções.

Sobre a forma de pagamento feita aos membros do Ministério

Público, trata Mazzilli55:

Na sistemática da EC n. 19/98, subsídio é a remuneração exclusiva, fixada em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou de outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI, da Constituição.

Todas essas garantias foram conferidas à instituição e a cada

membro do Ministério Público para que, com liberdade e independência,

desempenhem suas funções, sobre as quais se passa a falar.

54 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p.1704

55 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.98.

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1.3 FUNÇÕES INSTITUCIONAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO

As funções do Ministério Público, para Mazzilli56, resumem-se

em promover a aplicação e execução das leis, no zelo de interesses sociais ou

individuais indisponíveis, difusos e coletivos.

O mesmo autor57, ao analisar os casos em que a instituição

intervém, conclui que o Ministério Público exerce atividade administrativa, vez que

executar leis não caracteriza atuação legislativa nem jurisdicional, a saber:

Analisando suas principais funções institucionais, vemos que todas têm natureza administrativa: incumbências como promover a ação pública ou opinar como custos legis não são atividades jurisdicionais (atuar junto ao Judiciário não significa prestar jurisdição) nem legislativas (fiscalizar ou promover a observância das leis não se confunde com a atividade de sua elaboração).

Feitas essas considerações preliminares sobre a atuação do

Ministério Público, seguem-se as funções descritas no artigo 129 da Constituição

Federal.

A primeira trazida pelo texto constitucional é a promoção, de

forma privativa, da ação penal pública.

A partir dessa função, na esfera penal, o Ministério Público

passa a representar o Estado-Administração, expondo ao Estado-Juiz a pretensão

punitiva58.

Além disso, é função do Ministério Público na área criminal,

requisitar diligências investigatórias e instaurar inquérito policial, quando entender

conveniente, sempre indicando os fundamentos jurídicos.

O estudo detalhado sobre essas atribuições de âmbito criminal

será feito no próximo capítulo, em espaço destinado ao inquérito policial e ação

penal, razão pela qual se passa à próxima função institucional.

56 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.206.

57 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.66.58 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p.159.

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A Constituição Federal determina que cabe ao Ministério

Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de

relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as

medidas necessárias a sua garantia.

Desta forma, estabeleceu o constituinte que o órgão ministerial

cuidasse dos direitos assegurados pela Carta, conferindo ao Ministério Público a

“tarefa do defensor do povo”59.

Sobre o tema, Mazzilli60, utilizando-se da Lei Complementar nº

75/93 – Lei Orgânica do Ministério Público da União –, explica que:

É função institucional do Ministério Público zelar pelo efetivo respeito: a) dos Poderes Públicos, dos serviços de relevância pública e dos meios de comunicação social aos princípios, garantias, condições, direitos, deveres e vedações, previstos na Constituição e na lei, relativos à comunicação social; b) dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição relativos às ações e aos serviços de saúde e à educação, bem como os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade; c) dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública à efetiva garantia aos direitos do cidadão.

Por sua vez, Tourinho Filho61, valendo-se das disposições da

Lei Orgânica Nacional do Ministério Público – Lei nº 8.625/93, sustenta que a

instituição ministerial deve fiscalizar a administração direta e indireta e, ainda,

terceiros que ajam em nome do Poder Público, para que não ofendam qualquer

direito constitucional. Diz que é dever do Ministério Público:

Exercer a defesa dos direitos assegurados nas Constituições Federal

e Estadual, sempre que se cuidar de garantir-lhes o respeito: a) pelos

poderes estaduais e municipais; b) pelos órgãos da Administração

Pública estadual ou municipal, direta ou indireta; c) pelos

concessionários e permissionários de serviço público estadual ou

59 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.214.

60 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.215.

61 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.353-354.

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municipal; d) por entidades que exerçam outra função delegada do

Estado ou do Município ou executem serviço de relevância pública.

Para possibilitar a defesa dos direitos constitucionais pelo

órgão ministerial, o constituinte também previu instrumentos de atuação: dispôs,

como função constitucional, que compete ao Ministério Público promover o inquérito

civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio

ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

O inquérito civil, criado pela Lei da Ação Civil Pública, nº

7.347/85, tinha, em princípio, o intuito de coletar provas para a propositura da

competente ação civil pública. Hoje, entende-se que o procedimento teve seu objeto

estendido, destinando-se a colher elementos necessários à propositura de qualquer

ação civil da área de atuação ministerial62.

Nos estudos de Mazzilli63:

[...] é o inquérito civil um procedimento investigatório prévio, instaurado, presidido e eventualmente arquivado pelo Ministério Público, tendo como escopo a coleta de elementos de convicção necessários para embasar a ação civil pública ou viabilizar outras formas de atuação a seu cargo.

Como o membro do Ministério Público conduz diretamente o

inquérito civil, ele direciona a investigação da maneira como entende mais

proveitosa e acompanha a colheita de todo material probatório, o que possibilita, ao

final, maior certeza na decisão pelo arquivamento ou prosseguimento do feito.

A ação civil pública, por sua vez, é o mecanismo processual

utilizado pelo órgão ministerial para, em juízo, defender os interesses que tutela.

Essa função faz da instituição “intérprete do interesse social”64.

Sobre o assunto, ensina Moraes65:

62 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.139.63 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.139.64 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.354.65 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed.

São Paulo: Atlas, 2006. p.1717.

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O inquérito civil e a ação civil pública foram criados pela Lei nº 7.347/85, com a finalidade de efetivar a responsabilização por danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e como salienta Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “o texto constitucional alargou o alcance desses instrumentos. Por um lado, estendeu-se à proteção do patrimônio público em geral, dando, pois, à ação civil pública, âmbito análogo ao da ação popular (v. art. 5º, LXXIII). Por outro lado, tornou meramente exemplificativa uma enumeração que era taxativa. Note-se que a regra constitucional se refere a outros interesses difusos e coletivos”.

Decorre da função de presidir a investigação cível, outra

atribuição do Ministério Público listada na Constituição, a possibilidade de expedir

notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando

informações e documentos para instruí-los.

Sobre esse instrumento de atuação ministerial, de maneira

sintetizada, expõe Mazzilli66:

A lei assegura ao Ministério Público: a) a expedição de notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não-comparecimento injustificado, a requisição de condução coercitiva; b) a requisição de informações, exames e perícias de autoridades federais, estaduais ou municipais, ou dos respectivos órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional; c) a requisição de informações e documentos de entidades privadas.

Ao tratar desse tema, alguns doutrinadores, dentre eles

Mazzilli67 e Moraes68, defendem, em razão das vantagens já referidas, que o

Ministério Público também poderia produzir provas em procedimentos criminais,

conduzindo, desta forma, a própria investigação. Essa discussão, no entanto, será

trabalhada no último capítulo deste estudo, dedicado exclusivamente ao tema.

Prosseguindo a análise do texto constitucional, tem-se que é

função do Ministério Público exercer o controle externo da atividade policial,

também, na forma da lei complementar.

66 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.145.67 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.144-

145.68 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed.

São Paulo: Atlas, 2006. p.1737.

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O controle exercido pela instituição é dirigido à atividade-fim da

polícia, a qual se relaciona com a atuação do Ministério Público, como, por exemplo,

a investigação de infrações penais.

A respeito, citando Walter Paulo Sabella, Mazzilli69 manifesta sua opinião:

[...] seria um erro supor que o controle a ser desempenhado pelo Ministério Público devesse alcançar “toda e qualquer atividade da polícia, preventiva ou repressiva, inclusive as atividades-meio, simplesmente ordinatórias do funcionamento interno dos órgãos policiais, como centros de competência, dos segmentos civil ou militar”. É, pois, sob o aspecto da atividade policial, vista como fornecedora de elementos para a formação da opinio delictis do órgão do Ministério Público, que se destina a imposição de um sistema de controle ministerial.

A Lei Orgânica do Ministério Público da União, Lei

Complementar nº 75/93, normatizou os mecanismos de controle a serem utilizados

pelos membros ministeriais, e Tourinho Filho70, resumidamente, cita-os, ensinando

que cabe ao Ministério Público:

Exercer o controle externo da atividade policial, por meio de medidas administrativas e judiciais, podendo, especialmente: a) ter livre ingresso e realizar inspeção em estabelecimentos policiais, em especial nos que abrigarem presos; b) ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade de polícia judiciária; c) requisitar providências para sanar a omissão indevida ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder; d) representar à autoridade competente para abertura de inquérito sobre omissão ou fato ilícito ocorridos no exercício da atividade policial; e) promover a ação penal por abuso de poder.

É papel do Ministério Público, ainda, a promoção da ação de

inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos

Estados, nos casos previstos na Constituição, bem como a defesa judicial dos

direitos e interesses das populações indígenas.

Por fim, o constituinte encerra o artigo das funções

institucionais regulando que poderá o Ministério Público exercer outras atribuições

69 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.147.70 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.354.

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que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe

vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

Acerca desse dispositivo, trata Mazzilli71:

A norma de encerramento permite à lei infraconstitucional atribuir-lhe outras funções, como, aliás, já vinha previsto em outro dispositivo constitucional. Nenhuma das atribuições infraconstitucionais que lhe venham, porém, a ser conferidas poderá desviá-lo de sua destinação institucional. Com isso se veda ao Ministério Público não só a defesa de interesses meramente fazendários como a de interesses exclusivamente individuais disponíveis.

Vê-se, pois, que o texto constitucional além de reforçar a idéia

de que o Ministério Público não mais defende os interesses do Estado, possibilitou a

ampliação de suas funções por meio de leis infraconstitucionais.

Feitas essas considerações acerca das funções institucionais

do Ministério Público, faz-se essencial, neste momento da pesquisa, cujo enfoque se

situa na discussão da possibilidade de atuação do Ministério Público nas

investigações criminais, a conceituação de investigação criminal, bem como a

análise de sua regulamentação na legislação brasileira, suas características e

finalidades – assunto tratado no próximo capítulo.

71 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.236.

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Capítulo 2

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

Investigação criminal pode ser entendida como a “seqüência de

atos preliminares direta ou indiretamente voltados à produção e à colheita de

elementos de convicção e de outras informações relevantes acerca da materialidade

e autoria de um fato criminoso”72.

Como nem sempre a investigação esgota-se na coleta de

evidências diretamente ligadas ao crime – por exemplo, manchas de sangue,

impressões digitais –, incluem-se, na definição, os atos de investigação

indiretamente ligados, pois, por vezes, é necessário buscar informações não

vinculadas de forma clara ao fato, como diligenciar no sentido de localizar uma

testemunha.

Nessa atividade pré-processual, diversos são os

procedimentos de investigação e os agentes responsáveis por seu desdobramento;

todos com o objetivo de construir “um quadro probatório prévio, justificador da ação

penal, em nome da segurança mínima exigida para a atividade estatal contra alguém

no campo criminal”73.

Das formas de investigação previstas pelo ordenamento

jurídico brasileiro, o principal instrumento, na esfera penal, é o inquérito policial,

atividade específica da polícia judiciária, ou seja, a polícia civil, no âmbito da Justiça

Estadual, e a polícia federal, no caso da Justiça Federal74.

72 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.54.

73 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.142.

74 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 10. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p.43.

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Mencionado procedimento investigatório encontra previsão na

Constituição Federal e capítulo específico no Código de Processo Penal.

Assim, devido a sua importância, será utilizado o inquérito

policial como padrão de investigação criminal, a fim de que se esclareçam as

características e finalidades de um procedimento dessa natureza, bem como o modo

de condução pela autoridade competente.

2.1 INQUÉRITO POLICIAL

2.1.1 Polícia judiciária

A Constituição Federal, em seu artigo 144, dispõe que a

segurança pública é dever do Estado, e atribui à polícia a tarefa de preservar a

ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio.

Enumera, ainda, como órgãos policiais: a polícia federal, a

polícia rodoviária federal, a polícia ferroviária federal, as polícias civis, as polícias

militares e corpos de bombeiros militares.

Coube, nos termos do texto constitucional, à polícia federal a

tarefa de apurar infrações penais praticadas contra a ordem política e social ou em

detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades

autárquicas e empresas públicas, bem como exercer, com exclusividade, as funções

de polícia judiciária da União.

Por sua vez, as polícias civis exercem as funções de polícia

judiciária e a apuração de infrações penais, ressalvadas a competência da União e

infrações militares.

O Código de Processo Penal utiliza-se de nomenclatura

abrangente: denomina polícia judiciária à atividade realizada pela polícia federal, em

âmbito nacional, e pela polícia civil, na esfera estadual. Denominação que será

empregada no presente trabalho.

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Essa polícia, diferentemente da militar que exerce atividade

ostensiva, tem atribuições investigatórias, realizando diligências para apurar o ilícito

penal já cometido. Nesse sentido, ensina Nucci75:

[...] O nome polícia judiciária tem sentido na medida em que não se cuida de uma atividade policial ostensiva (típica da Polícia Militar para a garantia da segurança nas ruas), mas investigatória, cuja função se volta a colher provas para o órgão acusatório e, na essência, para que o Judiciário avalie no futuro.

Com entendimento similar, Tourinho Filho76 explica que:

[...] enquanto a Polícia de Segurança visa impedir a turbação da ordem pública, adotando medidas preventivas, de verdadeira profilaxia do crime, a Polícia Civil intervém quando os fatos que a Polícia de Segurança pretendia prevenir não puderam ser evitados... ou, então, aqueles fatos que a Polícia de Segurança nem sequer imaginava pudessem acontecer...

A investigação das infrações dá-se, mais comumente, nos

autos do inquérito policial, procedimento administrativo presidido, exclusivamente,

pela autoridade policial: delegado federal, no âmbito da polícia federal ou delegado

de polícia, na civil.

Sobre a presidência do inquérito policial, afirma Tourinho

Filho77 que:

[...] a competência para a realização de inquéritos policiais é distribuída a autoridades próprias, de acordo com as normas de organização policial dos Estados. Todos os Estados são divididos em municípios e em cada um deles o Estado mantém um número variável de Delegados para aí exercerem suas funções. [...] Tratando-se de infração de alçada federal (art. 109 da CF), a competência é dos Delegados Federais, que exercem suas atividades dentro de áreas maiores, denominadas seções ou subseções, abrangentes de vários municípios.

75 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 145.

76 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.64.

77 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.68.

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A autoridade policial, diferentemente dos representantes do

Ministério Público que são considerados agentes políticos, tem as mesmas garantias

de qualquer servidor público, não possuindo as prerrogativas de inamovibilidade ou

vitaliciedade.

Uma vez entendida a presidência do inquérito policial, passa-se

ao estudo desse instrumento investigatório.

2.1.2 Características e procedimento

O inquérito policial pode ser definido como um procedimento

administrativo – conjunto de diligências – conduzido pela polícia judiciária,

objetivando elucidar as infrações penais e sua autoria.

Nas palavras de Nucci78:

O inquérito policial é um procedimento preparatório da ação penal, de caráter administrativo, conduzido pela polícia judiciária e voltado à colheita preliminar de provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria. Seu objetivo precípuo é a formação da convicção do representante do Ministério Público, mas também a colheita de provas urgentes, que podem desaparecer após o cometimento do crime.

A partir da finalidade precípua do inquérito, decorrem as

características de seu procedimento, conforme segue.

O inquérito deve ser escrito, não havendo possibilidade de

investigação verbal. Nos termos do artigo 9º do Código de Processo Penal, todas as

peças serão, num mesmo procedimento, “reduzidas a escrito ou datilografadas e,

neste caso, rubricadas pela autoridade”79.

É, também, sigiloso, qualidade por vezes necessária à

elucidação dos fatos ou exigida pelo interesse da sociedade (artigo 20 do Código de

Processo Penal).

78 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 143.

79 BRASIL. Código de Processo Penal Brasileiro. Decreto-Lei nº 3.931, em vigor a partir de 1 de janeiro de 1942.

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Para Mirabete80, o sigilo, no inquérito policial, é:

[...] qualidade necessária a que possa a autoridade policial providenciar as diligências necessárias para a completa elucidação do fato sem que se lhe oponham, no caminho, empecilhos para impedir ou dificultar a colheita de informações com ocultação ou destruição de provas, influência sobre testemunhas etc. [...].

Registre-se, todavia, que esse sigilo não se estende ao

advogado, o qual pode ter acesso aos autos, mesmo sem procuração. Entendimento

já firmado pelo Supremo Tribunal Federal, através da súmula vinculante nº 1481, com

a seguinte redação:

É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

O inquérito policial pode ser classificado, ainda, como

inquisitivo, uma vez que ao agente infrator não é permitida a ampla oportunidade de

defesa, como a produção de provas, oferecimento de recursos ou apresentação de

alegações82.

Consoante Demercian83, “o caráter inquisitivo do inquérito

policial confere à autoridade policial a discricionariedade de deferir ou não eventuais

diligências requeridas pelo ofendido ou pelo próprio investigado”.

Para Tourinho Filho84 a ausência do contraditório se justifica

porque não há acusado no inquérito policial, não se configurando, igualmente, esse

procedimento como processo, in verbis:

[...] É verdade que o inc. LV do art. 5º da CF dispõe que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em

80 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p.78.81 SÚMULA VINCULANTE. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em 14/03/2010.82 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p.167.83 DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. 2. ed. São

Paulo: Atlas, 2001. p.71.84 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.69-70.

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geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os recursos a ela inerentes”. Nem por isso se pode dizer seja o inquérito contraditório. Primeiro, porque no inquérito não há acusado; segundo, porque não é processo. [...] Embora o inquérito seja um procedimento administrativo, não tem caráter punitivo. Assim, a expressão “acusados em geral” não se estende aos “indiciados”.

O inquérito policial obedece também à característica da

oficiosidade, haja vista que, diante da notícia de qualquer crime de ação penal

pública incondicionada, a autoridade policial tem o dever de instaurar o competente

procedimento investigativo.

De acordo com Capez85, a oficiosidade:

[...] Significa que a atividade das autoridades policiais independe de qualquer espécie de provocação, sendo a instauração do inquérito obrigatória diante da notícia de uma infração penal (CPP, art. 5º, I), ressalvados os casos de ação penal pública condicionada e de ação penal privada (CPP, art. 5º, §§4º e 5º).

Uma vez instaurado, o inquérito não poderá, em qualquer

hipótese, ser arquivado pela autoridade policial, regra que decorre da qualidade de

indisponibilidade desse procedimento86.

Por fim, vale destacar que o inquérito policial não é

indispensável ao oferecimento da denúncia, pois o órgão acusador poderá formar

sua convicção com base em outros elementos probatórios. Configura-se, dessa

maneira, como peça meramente informativa.

Sobre essa questão, Tourinho Filho87 conclui que:

[...] desde que o titular da ação penal (Ministério Público ou ofendido) tenha em mãos as informações necessárias, isto é, os elementos imprescindíveis ao oferecimento da denúncia ou queixa, é evidente que o inquérito será perfeitamente dispensável [...].

85 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p.69.86 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p.78.87 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.69.

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E, dessa forma, por ser mero procedimento informativo, os

vícios por acaso existentes nessa fase não acarretam nulidades processuais, isto é,

não atingem a fase seguinte da persecução penal: a ação penal88.

Quanto ao procedimento, o inquérito policial tem seu rito

regulado pelo Código de Processo Penal, é, pois, a forma de investigação mais

comumente adotada na área criminal.

Pode ser iniciado de cinco modos: de ofício, quando a

autoridade policial tiver conhecimento de uma infração de ação penal pública

incondicionada; por provocação do ofendido, no caso da própria vítima comunicar o

ilícito; ou por delação de terceiro, quando qualquer pessoa informar à autoridade

sobre infração de iniciativa do Ministério Público. Ainda, pode ser instaurado por

requisição da autoridade competente – juiz ou membro do Ministério Público – e pela

lavratura do auto de prisão em flagrante, nas situações em que o agente é

encontrado em qualquer dos casos descritos no artigo 302 do mencionado Diploma

Legal89.

Destaca-se que a autoridade policial somente agirá de ofício

nos delitos de ação penal pública incondicionada, necessitando, nos demais, de

autorização da vítima, consoante ensina Nucci90:

[...] em se tratando de ação pública condicionada e de ação privada, o inquérito somente pode iniciar-se igualmente se houver provocação do ofendido (representação para a ação pública condicionada; requerimento para a ação privada) ou do Ministro da Justiça (requisição).

De qualquer das maneiras narradas, chegando a notícia-crime

ao conhecimento da autoridade policial, o delegado deve proceder, em regra,

conforme descrito no artigo 6º do Código de Processo Penal. Adotará, no entanto,

somente as diligências condizentes com o ilícito penal que pretende solucionar.

88 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p.71.89 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p. 151-152.90 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p. 152.

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Sobre essa discricionariedade, trata Tourinho Filho91:

[...] p. ex., se A, verbalmente, calunia B, instaurando o inquérito é evidente que a Autoridade Policial limitar-se-á àquelas diligências indicadas nos incisos III (ouvida de testemunhas), IV (maiores esclarecimentos da vítima), V (interrogatório do indiciado), eventualmente no inciso VIII (identificação dactiloscópica), na segunda parte do inciso VI (acareação) e, por último, no inciso IX (informações sobre a vida pregressa).

Dispõe o Código de Processo Penal que, como primeira

diligência, a autoridade policial se dirigirá ao local e cuidará para que não se alterem

o estado e conservação das coisas, a fim de que a perícia criminal possa conhecer

fielmente a situação e produzir o competente exame.

No momento deve, também, apreender os objetos e todas as

provas que servirem à elucidação do ocorrido. Os objetos acompanharão os autos

do inquérito (artigo 11 do Código de Processo Penal).

A autoridade policial ouvirá o ofendido, se possível. Para

Tourinho Filho92, “o sujeito passivo do crime, de regra, é quem melhor poderá

fornecer à Autoridade Policial elementos para o esclarecimento do fato”, ressalta,

contudo, que suas palavras têm valor probatório relativo, em razão de seu interesse

no feito.

Nesse sentido, importante se faz, igualmente, o interrogatório

do infrator, o qual, apesar de ser ouvido em procedimento sem contraditório, tem

preservado seus direitos e garantias constitucionais: direito ao silêncio, à integridade

física preservada, podendo constituir, inclusive, advogado para acompanhar a

investigação93.

No tocante ao interrogatório do acusado, Nucci94 observa:

91 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.84.

92 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.86.

93 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.159.

94 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.160.

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Com a edição da Lei 10.792/2003, os arts. 185 a 196 sofreram alterações, embora muitas dessas modificações sejam aplicáveis somente ao processo e não à fase do inquérito. Exemplos: não é obrigatória a presença de defensor no interrogatório feito na polícia (art. 185, CPP), nem tampouco há o direito de interferência, a fim de obter esclarecimentos (art. 188, CPP), pois tais disposições dizem respeito ao direito à ampla defesa, que não vigora na fase inquisitiva do inquérito.

A autoridade policial poderá, ainda, necessitando a

investigação, proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareação, bem

como determinar a realização de exame de corpo de delito ou quaisquer outras

perícias. Esses exames periciais, por óbvio, são feitos quando há ocorrência de

infrações que deixam vestígios.

Por fim, cabe ao delegado identificar o infrator, bem como

juntar, aos autos, folha de antecedentes criminais, e informar acerca da vida

pregressa do agente.

Depois de apreciados os elementos probatórios, a autoridade

policial decidirá pelo indiciamento ou não do suposto criminoso.

Sobre esse ato, Nucci95 assevera que:

Indiciado é a pessoa eleita pelo Estado-investigação, dentro da sua convicção, como autora da infração penal. Ser indiciado, isto é, apontado como autor do crime pelos indícios colhidos no inquérito policial, implica um constrangimento natural, pois a folha de antecedentes receberá a informação, tornando-se permanente, ainda que o inquérito seja, posteriormente, arquivado. Assim, o indiciamento não é um ato discricionário da autoridade policial, devendo basear-se em provas suficientes para isso. [...].

Existindo, pois, provas que apontem o agente como possível

autor do delito, é dever da autoridade policial promover ao indiciamento.

Ao final, o inquérito policial deve ser concluído pelo delegado,

com a apresentação do relatório final.

95 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.157.

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Nessa peça, o responsável pela investigação deverá informar

tudo o que foi feito na presidência do procedimento, de maneira a apurar ou não a

materialidade e autoria do ilícito penal96.

Nos estudos de Tourinho Filho97:

Esse relatório não encerra, não deve nem pode encerrar qualquer juízo de valor. Não deve, pois, a Autoridade Policial, no relatório, fazer apreciações sobre a culpabilidade ou antijuridicidade. E se o fizer? Haverá mera irregularidade, sem qualquer conseqüência. Deverá limitar-se a historiar o que apurou nas investigações. Por outro lado, se por quaisquer circunstâncias outras testemunhas deixaram de ser ouvidas, poderá a Autoridade Policial, no relatório, indicá-las, mencionando o lugar onde poderão ser encontradas (CPP, art. 10, §2º).

O procedimento criminal tem prazo para ser concluído. Na

justiça comum – estadual – a regra é de 30 dias, quando o réu estiver solto, e de 10

dias, quando se encontrar preso (artigo 10 do Código de Processo Penal).

Na prática, no entanto, essa norma dificilmente é cumprida,

conforme explica Nucci98:

[...] em face do acúmulo de serviço, torna-se inviável o cumprimento do referido prazo, motivo pelo qual a autoridade policial costuma solicitar dilação ao juiz, ouvindo-se o representante do Ministério Público. Em suma, quando o indiciado está solto, termina não existindo prazo certo para o término da investigação, embora sempre haja o controle judicial do que está sendo realizado pelo polícia. Quando o indiciado está preso em flagrante ou preventivamente, deve ser cumprido à risca o prazo de dez dias (art. 10, CPP), pois há restrição ao direito fundamental à liberdade. [...].

Já na justiça federal, o prazo é de 15 dias, estando preso o

acusado, podendo ser prorrogado por mais 15, nos termos do artigo 66 da Lei nº

5.010/66. Se solto, o prazo segue a regra dos 30 dias99.

96 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.170.

97 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.105.

98 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.162.

99 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 10. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p.46.

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Concluído o inquérito policial, nos crimes de ação penal

privada, os autos serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa

da vítima, ou, a pedido, serão entregues ao requerente mediante traslado, conforme

artigo 19 do Código de Processo Penal.

Se a infração penal investigada for de titularidade do Ministério

Público, os autos serão encaminhados para conhecimento do representante

ministerial, responsável pela promoção da ação penal, que passará a atuar

diretamente no procedimento da forma como se verá a seguir.

2.2 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO INQUÉRITO POLICIAL

2.2.1 Fase pré-processual

A forma privativa com que o Ministério Público detém a

promoção da ação penal demonstra a grande responsabilidade que a Constituição

Federal delegou ao órgão, como já mencionado.

Isso porque, “o simples ajuizamento da ação penal contra

alguém provoca um fardo à pessoa de bem, não podendo, pois, ser ato leviano,

desprovido de provas e sem um exame pré-constituído de legalidade”100.

Em vista disso, foi dada ao Ministério Público a faculdade de,

após analisar o procedimento investigatório, denunciar ou não o agente sujeito da

investigação. O que implica na ponderação preliminar de cada situação, antes da

apreciação pelo Poder Judiciário.

O membro do Ministério Público, por muitos doutrinadores, é

considerado parte imparcial no processo. Sobre o tema, trata Mazzilli101:

[...] Hoje, contudo, longe de ser visto como um simples acusador público, obrigado a acusar a qualquer preço, ao contrário, o órgão do

100 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.144.

101MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.207.

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Ministério Público, detendo em mãos a titularidade da ação penal, acabou constituindo um primeiro fator da própria imparcialidade judicial dos julgamentos, já que possibilita, com sua iniciativa, o princípio da inércia da jurisdição.

Verdade é que essa característica favorece, ao mesmo tempo,

à sociedade e ao réu: aquela vê segurança jurídica no órgão acusador, já este não

passa pelo constrangimento de ser injustamente processado.

Assim, encerradas as investigações policiais e remetidos os

autos do inquérito policial ao Ministério Público, poderá, o titular da ação penal,

adotar como caminhos: a) requerer o retorno dos autos à polícia judiciária para a

continuidade da investigação; b) promover a declinação de competência; c) requerer

o arquivamento; d) oferecer denúncia.

Nessa fase, o representante ministerial deve analisar

cuidadosamente todos os elementos de prova contidos no procedimento

investigatório, a fim de formar sua convicção e dar ao caso a solução mais

adequada.

Sobre essa avaliação probatória feita pelo membro do

Ministério Público, trata Mendroni102:

Terminada a coleta das evidências, as quais sempre podem ser complementadas até o início do Processo, incumbe ao Promotor de Justiça o trabalho de seleção. Trata-se de um trabalho subjetivo de separar, associar, deduzir e considerar aquelas que sejam mais e menos importantes, para então obter uma visão global e em seguida estar em condições de sacar uma conclusão para dar início ou não a um Processo criminal.

Destaca que, além de seu próprio convencimento, o

representante ministerial deve tentar antecipar a decisão judicial em relação às

provas já existentes. Mendroni103 explica que o titular da ação penal:

[...] deve adiantar um pensamento mais ou menos assim: Com as evidências que disponho até agora e eventualmente com outras que

102 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Curso de investigação criminal. São Paulo: Juarez de Oliveira Ltda., 2002. p.74.

103 MENDRONI, Marcelo Batlouni. Curso de investigação criminal. São Paulo: Juarez de Oliveira Ltda., 2002. p.88.

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porventura possa obter durante o processo, poderei contar com a possibilidade de que o Juiz chegue a uma conclusão equivalente à minha? Deve-se ordenar e tornar claras e evidentes as conclusões no seu conjunto, transportando-se-as assim tal e qual o pensamento de uma cabeça à outra, - do Promotor ao Juiz, de forma a impedir distorções ou conclusões diferentes do entendimento projetado.

Nesse sentido, vislumbra-se a primeira providência citada, da

qual se pode valer o membro do Ministério Público ao receber os autos do inquérito

policial: requisitar a complementação das diligências investigatórias.

Assim, o representante ministerial determinará a remessa do

procedimento, indicando à autoridade policial, de preferência de forma clara e

direcionada, as diligências a realizar, as quais, uma vez requisitadas, devem ser

cumpridas, conforme disposto no artigo 13, inciso II, do Código de Processo Penal.

A possibilidade de requisição é, inclusive, função institucional,

listada no artigo 129 da Constituição Federal, como já mencionado.

Para Tourinho Filho104, “requisitar é exigir legalmente”, e, sobre

a intenção da norma prevista no Código de Processo Penal, acrescenta que: “no art.

13, II, o legislador criou para a Autoridade Policial o dever de realizar as diligências

requisitadas pelo Juiz ou pelo Ministério Público e silenciou, como não podia deixar

de ser, quanto à possibilidade de indeferir tais requisições”.

Se, no entanto, os dados fornecidos pela autoridade

requisitante forem vagos, ou a ordem for manifestamente ilegal, caberá à autoridade

policial demonstrar a total impossibilidade de obedecer à diligência, solicitando, no

primeiro fato, novas informações105.

Como segunda hipótese, pode o representante ministerial, ao

estudar o inquérito policial, entender que não é competente para apreciar o ilícito ali

exposto. Nessa situação, irá requerer a declinação de competência.

Nucci106 lembra que, no tocante à competência, em síntese:

104 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.74.

105 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.74-75.

106 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

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Elege-se, como parâmetro, o lugar do crime, pois é o local onde a sociedade sofreu o abalo decorrente do cometimento da infração penal. Excepciona, às vezes, esse parâmetro a natureza da matéria discutida no processo (militar ou eleitoral) ou a prerrogativa de função (foro privilegiado). Por outro lado, quando não se souber (ou for duvidoso) o lugar do delito, pode-se optar pelo foro do domicílio ou residência do réu. Eleito um (lugar da infração) ou outro (domicílio do réu), havendo mais de um juiz, segue-se o critério da distribuição (sorteio aleatório entre as Varas ou magistrados). Excepciona-se a distribuição, devendo o processo seguir para juiz certo em caso de conexão ou continência ou mesmo de prevenção.

Por exemplo: o promotor de justiça da Comarca de Itajaí

recebeu um inquérito policial, instaurado pela polícia civil do município, que apura

um crime ambiental. No decorrer da investigação, verificou-se que, na verdade, o

delito ocorreu em terras de marinha, sendo assim, pela natureza da matéria, é a

Justiça Federal competente para julgamento. No caso, constatando essa situação, o

promotor deverá requerer a declinação de competência.

Por sua vez, quanto ao arquivamento do inquérito policial –

outra possibilidade dos representantes do Ministério Público –, tem-se que este será

pleiteado quando o membro entender que não há suporte probatório mínimo para a

promoção da ação penal, seja pela ausência de indícios de autoria ou pela falta de

prova da materialidade da infração107.

Podem, ainda, outras causas motivarem o arquivamento do

inquérito, como, por exemplo, a presença de uma causa extintiva da punibilidade, a

falta de condição de procedibilidade, como a representação do ofendido108...

Nos crimes de ação penal pública incondicionada, o pedido de

arquivamento cabe, exclusivamente, aos membros do Ministério Público,

responsáveis pela promoção, de forma privativa, dessa ação.

Nas palavras de Tourinho Filho109, somente o Ministério Público

“poderá requerer ao Juiz seja arquivado o inquérito, e, caso o Magistrado acolha as

Revista dos Tribunais, 2008. p.311.107 DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. 2. ed. São

Paulo: Atlas, 2001. p.84.108 DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de processo penal. 2. ed. São

Paulo: Atlas, 2001. p.84.109 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.106.

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razões invocadas por ele, determiná-lo-á. Do contrário, agirá de conformidade com o

art. 28 do CPP”.

Em verdade, a decisão pelo arquivamento ou prosseguimento

de determinado procedimento criminal – em crimes de ação penal pública

incondicionada, repete-se – cabe, unicamente, ao órgão ministerial. O que se

confirma com o seguinte fato: quando o representante do Ministério Público, de

maneira fundamentada, requer o arquivamento do inquérito policial ao juiz, e este

entende de forma diversa, os autos são remetidos ao Procurador-Geral, o qual dará

“a palavra final e incontrastável a respeito”, vez que, se concordar com o

arquivamento, o magistrado será obrigado a acatá-lo110.

Consoante, explica Moraes111: “tendo o Ministério Público

requerido o arquivamento no prazo legal, não cabe ação privada subsidiária, ou a

título originário (CPP, art. 29; CF, art. 5º, LIX), sendo essa manifestação irretratável,

salvo no surgimento de novas provas”.

Se, contudo, o Procurador-Geral encontrar razão nas palavras

do magistrado, pode ele próprio denunciar, ou designar outro representante do

Ministério Público para oferecer a denúncia em seu nome. Trata-se de delegação112.

O controle exercido pelo Poder Judiciário em relação aos

crimes de ação penal pública é explicado por Nucci113:

[...] tendo em vista que a ação penal, como regra é pública, regida pelo princípio da obrigatoriedade, o controle é feito pelo Judiciário. Trata-se de atuação administrativa e não jurisdicional, portanto anormal. Logo, não cabe ao promotor, embora seja o titular da ação penal, a exclusiva deliberação acerca do oferecimento de denúncia ou do arquivamento do inquérito. Deve submeter o seu pedido ao juiz que, analisando o material recebido e as razões invocadas pelo órgão acusatório, pode acatá-lo ou não.

110 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.131.111 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed.

São Paulo: Atlas, 2006. p.1717.112 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p. 144.113 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p. 175.

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Já nos delitos de ação penal pública condicionada à

representação, a vontade da vítima, ou de seu representante legal – quando for o

caso –, é determinante para o prosseguimento da investigação, e também para o

arquivamento. Manifestando o ofendido interesse em encerrar o procedimento

investigatório, assim terá que agir o membro ministerial, em razão da falta de

condição de procedibilidade para propositura da ação penal, como já comentado.

Tratando-se de delito de ação penal privada, segundo Tourinho

Filho114, “não há que excogitar-se de arquivamento: arquivado será se a pessoa com

o direito de queixa deixar de intentar a ação penal”. Para o autor, se houver um

pedido de arquivamento, este equivale à renúncia.

Por fim, pode o representante ministerial entender que já

possui elementos suficientes para a propositura da denúncia, dando início, assim, à

ação penal – próximo instituto a ser estudado.

2.2.2 Judicialização do procedimento administrativo

De posse das informações que provam a existência de um

crime – materialidade –, e indícios de autoria, o membro do Ministério Público,

representante do Estado, utilizando-se de seu direito de ação, ingressará perante o

Poder Judiciário, a fim de ver punido o agente infrator.

Assim, a ação penal pode ser conceituada, consoante Nucci115,

como “o direito do Estado-acusação ou do ofendido de ingressar em juízo,

solicitando a prestação jurisdicional, representada pela aplicação das normas de

direito penal ao caso concreto”.

Na sua aplicação, a ação penal é dividida com base na

titularidade de seu exercício, indicada no artigo 100 do Código Penal, sendo

114 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.106.

115 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 183.

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classificada como: pública, promovida pelo membro do Ministério Público, e privada,

exercida pela própria vítima.

A regra é a ação penal pública; que se subdivide, ainda, em:

incondicionada, quando proposta sem necessidade de qualquer autorização, e

condicionada, quando dependente de representação do ofendido ou requisição do

Ministro da Justiça.

Tendo em vista a proposta do presente estudo, dar-se-á ênfase

à ação penal pública incondicionada, sem deixar, ao final, de comentar sobre a

atuação da instituição na ação penal privada.

Começa-se, pois, pelos princípios que regem a ação penal

pública incondicionada, quais sejam: oficialidade, indisponibilidade, legalidade ou

obrigatoriedade, indivisibilidade e intranscendência116.

O princípio da oficialidade decorre do pressuposto de que a

ação penal pública incondicionada é proposta pelo Ministério Público, órgão oficial

do Estado117.

Por pertencer o direito ao Estado, não pode o membro

ministerial dispor da ação, caracterizando, desta forma, a qualidade de

indisponibilidade, conforme ensina Tourinho Filho118:

[...] por não lhes pertencer, não podem os órgãos do Ministério Público dela desistir, transigindo ou acordando, pouco importando seja ela incondicionada ou condicionada. Entre nós, o art. 42 do CPP, às expressas, veda a desistência da ação penal pública: “O Ministério Público não poderá desistir da ação penal”.

Sobre o princípio da obrigatoriedade, em Nucci119, tem-se que,

“havendo prova suficiente colhida no inquérito policial ou procedimento equivalente,

deve o Ministério Público oferecer denúncia”.116 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.123.117 ISHIDA, Válter Kenji. Processo penal. São Paulo: Atlas, 2009. 58.118 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.124.119 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p. 185.

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Impende destacar, contudo, que tanto o princípio da

indisponibilidade, quanto o da obrigatoriedade, foram amenizados com a vigência da

Lei nº 9.099/95, que prevê alternativas para resolução dos conflitos de forma menos

burocrática, possibilitando, ao membro do Ministério Público, a utilização dos

benefícios da conciliação e transação penal, bem como da suspensão condicional

do processo.

Nesse norte, Ishida120:

Existe uma exceção ao princípio da indisponibilidade: a suspensão condicional do processo. Oferecida e aceita a suspensão, a indisponibilidade do direito ao jus puniendi fica mitigada (abrandada), permitindo a extinção da punibilidade pelo cumprimento das condições.

E, ainda, Mazzilli121:

A legitimação privativa do Ministério Público na promoção da ação penal agora há de conviver com a mitigação do princípio da obrigatoriedade, expressamente trazida pela Constituição de 1988. Admite-se, pela primeira vez, que juizados especiais sejam competentes para a conciliação em infrações penais de menor potencial ofensivo, bem como permite-se a transação ‘nas hipóteses previstas em lei’. Tanto numa hipótese como noutra, é imprescindível a deliberação do Ministério Público sobre se aceita a conciliação ou a transação, pois que é titular privativo da pretensão punitiva.

A característica de indivisibilidade determina que todos os que

praticaram ou concorreram de qualquer forma para a prática delituosa devem ser

responsabilizados, não podendo escolher, o representante ministerial, qual agente

irá denunciar122.

Por fim, o princípio da intranscendência na ação penal pública,

reforça a idéia de que a sanção criminal não deve passar da pessoa do réu. Dispõe,

assim, “que a ação penal é proposta apenas em relação à pessoa ou às pessoas a

quem se imputa a prática da infração”123.

120 ISHIDA, Válter Kenji. Processo penal. São Paulo: Atlas, 2009. 58.121 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995.

p.213.122 ISHIDA, Válter Kenji. Processo penal. São Paulo: Atlas, 2009. 58.123 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.128.

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A ação penal pública se inicia por meio da denúncia.

Instrumento definido por Tourinho Filho124 como:

[...] ato processual por meio do qual o Representante do Ministério Público leva ao conhecimento do Juiz, respaldado em provas colhidas no inquérito ou em outras peças de informação, a notícia de uma infração penal, diz quem cometeu e pede seja instaurado o respectivo processo em relação a ele.

O marco inicial da ação penal dá-se, pois, com o oferecimento

da denúncia, independentemente do recebimento feito pelo juiz125.

De acordo com o artigo 41 do Código de Processo Penal, a

denúncia deve conter, em síntese, a exposição do fato criminoso, a qualificação do

acusado, bem como a classificação do crime, e, quando necessário, o rol de

testemunhas.

Desta maneira, ao narrar o ilícito penal, o membro do Ministério

Público deve se atentar para a configuração do crime – tipo penal –, sem esquecer

de descrever as circunstâncias que possam influir na caracterização da infração,

como por exemplo, a ocorrência de uma qualificadora.

Para Nucci126:

A exposição do fato criminoso com todas as circunstâncias diz respeito à narrativa do tipo básico (figura fundamental do delito) e do tipo derivado (circunstâncias que envolvem o delito na forma de qualificadoras ou causa de aumento). É dever do órgão acusatório promover a imputação completa, embora possa deixar de lado as circunstâncias genéricas de elevação de pena.

O representante ministerial deve, ainda, ao narrar os fatos, fixar

a relação entre o ocorrido e o pretenso culpado, identificando, claramente, contra

quem recai a acusação. Apresentará, se possível, a qualificação completa do

denunciado.

124 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.155.

125 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.187.

126 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.217.

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Em não sendo possível a identificação do infrator em razão da

falta de dados, pode valer-se, o membro do Ministério Público, da descrição de

sinais que possam caracterizá-lo127.

No tocante à classificação do crime, exige-se a indicação do

dispositivo legal que tipifica a conduta delituosa, o que, no entanto, não vincula o

juiz, que poderá dar-lhe definição jurídica diversa. Nas palavras de Capez128:

O juiz só está adstrito aos fatos narrados na peça acusatória (CPP, arts. 383 e 384). [...] O demandado defende-se dos fatos a ele imputados, não da sua tipificação legal. Por isso, a classificação jurídica da conduta pode ser alterada até a sentença (quer por aditamento da peça inicial – CPP, art. 569 –, quer por ato do juiz – CPP, arts. 383 e 384).

Quanto ao rol de testemunhas, tem-se que é facultativo.

Se na ação penal pública a instituição atua como parte na

relação processual, na ação penal privada exerce, em síntese, a fiscalização da lei,

conforme ensina Tourinho Filho129:

Na ação penal privada (privada em sentido estrito e privada personalíssima), exerce ele não só a função de fiscal do princípio da indivisibilidade da ação, nos termos dos arts. 48, 45 e 46, §2º, do CPP, como também a de custos legis (CPP, arts. 500, §2º, e 600, §2º), notadamente se se tratar de crime de alçada privada, cometido por meio da imprensa (Lei nº 5.250, de 9-2-1967, art. 40, §2º). Tratando-se de crime de ação privada subsidiária da pública (CPP, art. 29), funciona ele como interveniente adesivo obrigatório (CPP, art. 564, III, d, última parte).

A intervenção do Ministério Público se mostra de suma

importância também às causas de ação penal privada.

127 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.160.

128 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p.127.129 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.353.

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Para Nucci130, a ausência do Ministério Público em qualquer

ato, nas ações públicas, é hipótese de nulidade absoluta, enquanto que, nas ações

privadas, de nulidade relativa.

Feitas as considerações sobre o inquérito policial e a atuação

do Ministério Público em procedimentos dessa natureza, passa-se a citar outras

formas de investigação criminal.

2.3 OUTROS TIPOS DE INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS

Além do inquérito policial, diferentes procedimentos

administrativos são instaurados com o fim de apurar ilícitos penais. A atividade

investigatória, portanto, não é exercida com exclusividade pela polícia judiciária.

No âmbito do Poder Executivo, outros órgãos são responsáveis

pela investigação criminal; o que também ocorre nos Poderes Legislativo e

Judiciário. Veja-se.

A Receita Federal do Brasil realiza, no exercício de suas

funções, diligências investigatórias e operações que objetivam mais do que a

constituição de um auto de infração, a repressão a determinados delitos131.

Sobre o trabalho desse órgão, subordinado ao Ministério da

Fazenda, Streck e Feldens132 comentam:

São conhecidas, por exemplo, as “barreiras” montadas a reprimir o contrabando e o descaminho (art. 334 do CP). A própria “representação fiscal para fins penais” dirigida ao Ministério Público investe-se de conteúdo investigatório, bastando recordar que não raramente veicula informações atinentes a operações financeiras do contribuinte-investigado, as quais, visando a comprovar a materialidade do delito de sonegação fiscal (Lei nº 8.137/90), apenas logram ser obtidas no âmbito de um procedimento que, por haver sido conduzido pela Receita, chama-se “fiscal”.

130 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.228.

131 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.93.

132 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.93-94.

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Os autores citam, ainda, o Banco Central e o Conselho de

Coordenação de Atividades Financeiras (COAF), como responsáveis por

investigações criminais.

O Banco Central, dentro de suas atribuições, efetua “diligências

que, para além de instruir o procedimento administrativo, terão como destinatário o

Ministério Público, para que proceda criminalmente contra os investigados”133.

E o Conselho de Coordenação de Atividades Financeiras,

igualmente, realiza investigações, atuando como “órgão do Governo, responsável

pela coordenação de ações voltadas ao combate à ‘lavagem’ de dinheiro”134.

Tourinho Filho135 faz, também, referência ao INSS, autarquia

federal que investiga infrações no âmbito de sua atuação, como, por exemplo, a falta

de repasse pelas empresas das contribuições descontadas de seus empregados.

Informações que são remetidas ao Ministério Público.

Por sua vez, no Poder Legislativo, está legalmente prevista a

investigação por Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI).

Na Constituição Federal136, o artigo 58, parágrafo 3º, determina

que essas Comissões possuem poderes próprios das autoridades judiciais, além dos

previstos nos regimentos das respectivas casas. E, quanto à sua concepção, dispõe

que:

[...] serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

133 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.94.

134 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.94.

135 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.67.

136 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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Dentre os vários poderes delegados à Comissão, colhe-se o

disposto no artigo 36, inciso II, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados137:

Art. 36. A Comissão Parlamentar de Inquérito poderá, observada a legislação específica: II - determinar diligências, ouvir indiciados, inquirir testemunhas sob compromisso, requisitar de órgãos e entidades da administração pública informações e documentos, requerer a audiência de Deputados e Ministros de Estado, tomar depoimentos de autoridades federais, estaduais e municipais, e requisitar os serviços de quaisquer autoridades, inclusive policiais.

Acerca das Comissões Parlamentares de Inquérito, trata

Tourinho Filho138:

[...] como o nome está a indicar, procedem a investigações de maior vulto, e, caso a Comissão constate a existência de crime da alçada da Justiça Comum, pode o órgão do Ministério Público, com base naqueles inquéritos parlamentares, praticar o ato instaurador da instância penal, isto é, oferecer denúncia.

Quanto ao Poder Judiciário, caberia destacar que “compete a

ele próprio – e jamais à Polícia – a investigação de magistrados envolvidos em

práticas criminosas”139.

De acordo com a Lei Orgânica Nacional da Magistratura – Lei

Complementar nº 35/79 –, havendo indícios da prática de crime por parte de um juiz,

a autoridade deverá remeter os autos ao Tribunal ou órgão especial competente

para julgamento, para o prosseguimento da investigação (artigo 33).

No tocante à atuação do Ministério Público, além do inquérito

civil citado no capítulo anterior, há previsão legal, na Resolução nº 13, de 02 de

outubro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, de procedimento de

natureza criminal, presidido pelo membro ministerial.

137 CÂMARA DOS DEPUTADOS. Regimento Interno da Câmara dos Deputados. Resolução nº 17. Brasília: 1989.

138 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.67.

139 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.98.

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Nos termos da Resolução140, artigo 1º, o denominado

Procedimento Investigatório Criminal:

[...] é instrumento de natureza administrativa e inquisitorial, instaurado e presidido pelo membro do Ministério Público com atribuição criminal, e terá como finalidade apurar a ocorrência de infrações penais de natureza pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de propositura, ou não, da respectiva ação penal.

O procedimento funciona como qualquer outro instrumento de

investigação: pode ser instaurado de ofício pelo representante ministerial, ou por

meio de provocação (artigo 3º), devendo, a instauração, ser comunicada ao chefe do

Ministério Público a que pertencer o membro.

Estão entre as providências que o representante ministerial

poderá adotar na condução do Procedimento Investigatório Criminal, listadas no

artigo 6º da aludida Resolução141:

I – fazer ou determinar vistorias, inspeções e quaisquer outras diligências; II – requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades, órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; III – requisitar informações e documentos de entidades privadas, inclusive de natureza cadastral; IV – notificar testemunhas e vítimas e requisitar sua condução coercitiva, nos casos de ausência injustificada, ressalvadas as prerrogativas legais; [...] VIII- realizar oitivas para colheita de informações e esclarecimentos; IX – ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância pública; X – requisitar auxílio de força policial.

A investigação tem noventa dias para ser concluída,

permitidas, por meio de decisões fundamentadas do condutor do procedimento,

prorrogações sucessivas por igual período (artigo 12).

O artigo 3º da Resolução ressalta que o representante do

Ministério Público, responsável pela presidência do procedimento investigatório,

poderá prosseguir no feito desde a instauração até o oferecimento da denúncia ou

promoção de arquivamento em juízo.

140 CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Resolução nº 13, de 02 de outubro de 2006.141 CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Resolução nº 13, de 02 de outubro de 2006.

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Eis aí a atribuição, cuja legitimidade, é objetivo da presente

pesquisa: tem o representante da instituição poder para conduzir, diretamente,

investigações criminais destinadas a propiciar-lhe subsídios ao eventual

oferecimento de denúncia?

Com o objetivo de buscar a solução desse problema, no

próximo capítulo, passa-se ao exame dos argumentos favoráveis e contrários à

possibilidade de investigação pelo órgão ministerial.

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Capítulo 3

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

A matéria é, sem dúvida, controversa. Questiona-se, à luz da

Constituição Federal vigente, a possibilidade jurídica de o Ministério Público

desenvolver, por autoridade própria, atos de investigação criminal, com o objetivo de

apurar a existência de uma infração penal e sua respectiva autoria, utilizando-se

desses elementos para a deflagração da ação penal.

O assunto comporta diversas visões, gerando discussões

acirradas entre os estudiosos.

Nesse capítulo serão apresentados os principais argumentos

contrários e favoráveis à investigação pelo órgão ministerial, expondo-se,

igualmente, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal frente ao problema.

3.1 POSICIONAMENTOS CONTRÁRIOS

Para melhor compreensão do tema da pesquisa, antes de se

proceder ao estudo minucioso dos argumentos acerca do poder de investigação

criminal do Ministério Público, destacam-se algumas proposições incontestáveis

sobre a atuação da instituição em procedimentos administrativos, delimitando,

sobremaneira, o objeto da discussão.

Primeiro. O Ministério Público não pretende obter a presidência

do inquérito policial. Quando se refere a investigações criminais, a instituição visa à

instauração de procedimento administrativo próprio; como, por exemplo, o

procedimento investigatório criminal, mencionado no capítulo anterior.

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A intenção do órgão ministerial é ilustrada por Assis142,

Procurador Regional da República:

[...] O Ministério Público quer, por exemplo, não dar trabalho à Polícia quando ele, por si mesmo, pode obter aquilo que seja necessário e suficiente a uma instrução penal. Então, eu recebo da Receita um dossiê mostrando que houve um crime tributário: para que eu preciso ‘esquentá-lo’, enviando para um delegado que está cheio de inquéritos necessários e que vai colocá-lo lá na fila até que, odiando isso, faça um relatório dizendo o que, de antemão, já estava pronto? E esse relatório é o que santifica uma investigação! Quem quer isso? O Ministério Público precisa da Polícia, mas naquilo em que ela é boa, que é a investigação em si, produzir prova técnica, fazer investigação de campo. [...].

Não resta dúvida de que o inquérito policial é dirigido e

presidido exclusivamente pela autoridade policial competente. Não buscam os

membros ministeriais a titularidade desse instrumento policial, até porque “se o

inquérito fosse conduzido pelo Ministério Público já não mais se poderia qualificá-lo

como ‘policial’, senão que teria outra designação (procedimento administrativo,

procedimento criminal, etc.)”143.

Segundo. Não se discute, igualmente, a possibilidade de o

Ministério Público requisitar abertura de inquéritos policiais e a realização de

diligências investigatórias. Pode, inclusive, o representante ministerial acompanhar

os atos de investigação desempenhados pela polícia, exercendo, dessa forma, o

controle da atividade policial.

Terceiro. Quanto à necessidade do inquérito policial, é

incontroverso o fato de que a denúncia pode ser embasada por qualquer peça de

informação, desde que presentes materialidade do delito e indícios de autoria.

Configura-se, pois, dispensável o procedimento administrativo instaurado pela

polícia.

Feitas essas considerações iniciais, passa-se ao problema.

142 COMBATE AO CRIME: Revista do Núcleo Criminal da Procuradoria Regional da República da 1ª região. Ano 2, nº 4. janeiro/maio de 2009.

143 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.79-80.

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Considerando o novo panorama constitucional instaurado com

a promulgação da Constituição Federal vigente, é ilícito ao Ministério Público

promover, por autoridade própria, em procedimento de sua competência,

investigações penais destinadas à colheita de elementos para o oferecimento de

denúncia?

Comumente, são dois os argumentos utilizados pelos

opositores ao poder de investigação criminal do Ministério Público: a) monopólio da

polícia na atividade investigatória; b) ausência de fundamento legal a respaldar a

investigação pelo órgão ministerial.

Para os que defendem o monopólio da polícia, a Constituição

Federal144 foi clara ao dispor que a atividade investigatória deve ser exercida,

exclusivamente, pela polícia judiciária. Servem-se, para tanto, do artigo 144,

parágrafo 1º, inciso IV, e parágrafo 4º, in verbis:

Artigo 144. § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. § 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

Concluem que só a polícia possui legitimidade para presidir

investigações de natureza criminal. Excepcionalmente, outras formas de

investigação seriam admitidas, desde que legalmente previstas.

De acordo com Tucci145, citando o Editorial do Boletim do

IBCCrim, quanto à competência para investigação criminal, “o deslocamento dela

para outros órgãos somente ocorre diante da expressa previsão constitucional e/ou

legal, em hipóteses absolutamente excepcionais”. Faz referência às Comissões

Parlamentares de Inquérito, e à investigação pelo próprio Poder Judiciário em casos

de crimes praticados por seus membros.

144 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

145 TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e investigação criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.40.

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Esse pensamento deriva do princípio da legalidade, segundo o

qual os agentes públicos somente podem fazer o que a lei determina. Esse princípio

é explicado por Calabrich146:

Como decorrência do Estado Democrático de Direito e dos direitos fundamentais neste ineludivelmente insculpidos, ao Estado só compete atuar quando legalmente autorizado para tanto. Trata-se do princípio da legalidade estrita ou administrativa, segundo a qual o administrador somente estará juridicamente autorizado a agir quando a lei assim o expressamente previr.

Dentro desse raciocínio, os opositores à investigação pelo

Ministério Público se utilizam das funções institucionais listadas pela Constituição

Federal, para apontar que foi adotado um critério diferenciado em matéria de

investigações preparatórias: o texto admitiu a promoção da investigação cível e

silenciou quanto à criminal. Veja-se.

Dentre as atribuições previstas no artigo 129 da Lei Maior, não

foi dado ao membro ministerial o poder de presidir investigações criminais. Quando

se trata de questões penais, fala-se em requisitar diligências e instauração do

competente inquérito policial.

Adepto desse entendimento, Tucci147 explica que:

[...] enquanto a uma dessas importantes instituições (Polícia Judiciária) incumbe a instauração da informatio delicti, efetuando a atividade investigatória respeitante à prática de infração penal, e respectiva autoria; à outra (Ministério Público) é concedido, pela Carta Magna de nossa República Federativa, o poder de determiná-las, mediante requisição, e de fiscalizá-las, visando à consecução de resultado útil à formação da opinio delicti.

E, reforçando a idéia de divisão de atividades, o autor148

continua:

146 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.108.

147 TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e investigação criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.29.

148 TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e investigação criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.30.

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[...] os referenciados regramentos constitucionais determinam, destacadamente, os campos de atuação de cada uma dessas instituições estatais atuantes na persecutio criminis, distinguindo entre a atividade investigatória, atribuída à Polícia Judiciária, e a dela provocatória e supervisora, concedida ao Ministério Público.

Já, em relação à esfera cível, a Constituição foi expressa ao

estabelecer que compete ao representante ministerial promover o inquérito civil e a

ação civil pública.

Para Nucci149, o legislador previu “a possibilidade do promotor

elaborar inquérito civil, mas jamais inquérito policial”. A exclusão da investigação

criminal das funções do Ministério Público teria sido, então, proposital.

Nesse sentido, Tucci150 reportando-se, novamente, ao Editorial

do Boletim do IBCCrim, ressalta que:

O texto é claro e expresso ao indicar, como função institucional

ministerial, a promoção da ação penal pública, do inquérito civil e da

ação civil pública. Quanto ao inquérito policial, limita-se a atribuir ao

Ministério Público a requisição de sua instauração. Nesse particular,

não tem lugar a regra de hermenêutica dos poderes implícitos. [...].

Da mesma forma, já se pronunciou o Supremo Tribunal

Federal, conforme mencionado na obra de Nucci151, a saber:

A requisição de diligências investigatórias de que cuida o art. 129, VIII, CF, deve dirigir-se à autoridade policial, não se compreendendo o poder de investigação do Ministério Público fora da excepcional previsão da ação civil pública (art. 129). De outro modo, haveria uma Polícia Judiciária paralela, o que não combina com a regra do art. 129, VIII, CF, (na realidade, cuida-se do inciso VII), segundo o qual o MP deve exercer, conforme lei complementar, o controle externo da atividade policial (RE 205.473-AL, 2ª T., rel. Carlos Velloso, 15.02.1998, v.u., RTJ 173/640).

149 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.146.

150 TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e investigação criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.39-40.

151 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.148.

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Para os que se opõem à investigação pelo Ministério Público,

não existe legislação específica disciplinando essa atividade, uma vez que “os

dispositivos da LC 75/93 e Lei 8.625/93 tratam de investigações ligadas ao exercício

da ação civil pública, outra atribuição constitucional do MP”152.

Em matéria criminal haveria, apenas, a Resolução nº 13, de 02

de outubro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, mencionada no

capítulo anterior. E, assim, a investigação pelo órgão ministerial desrespeitaria o

princípio da reserva legal.

Além desses argumentos, os opositores à tese de investigação

pela instituição acatam o fato de ser o membro ministerial parte no processo penal.

Fala-se em excesso de poder, imparcialidade na colheita de provas e desequilíbrio

entre autor e réu na ação penal.

Nesse norte, Lima153, advogado e ex-corregedor-geral da

Polícia Civil do Distrito Federal, acredita que:

[...] Certamente o Ministério Público, nessa condição de parte, tenderia a selecionar as provas de sua tese acusatória, apenas, desprezando outras, quem sabe, de interesse da Defesa. Haveria um extraordinário desequilíbrio na lide, ficando o cidadão à mercê do Estado-Acusação poderosíssimo, com uma gigantesca máquina dirigida pelo acusador apenas para provar a culpa do seu suspeito, este inteiramente entregue à misericórdia Divina, por razões óbvias.

Com entendimento similar, Nucci154:

Note-se que, quando a polícia judiciária elabora e conduz a investigação criminal, é supervisionada pelo Ministério Público e pelo Juiz de Direito. Este, ao conduzir a instrução criminal, tem a supervisão das partes – Ministério Público e advogados. Logo, a permitir-se que o Ministério Público, por mais bem intencionado que esteja, produza de per si a investigação criminal, isolado de qualquer fiscalização, sem a participação do indiciado, que nem ouvido precisaria ser, significaria quebrar a harmônica e garantista investigação de uma infração penal.

152 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.125.

153 REVISTA JURÍDICA CONSULEX. Consulex. Ano VII, nº 159, de 31 de agosto de 2003.154 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p.147.

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Alega-se que o procedimento presidido pelo representante do

Ministério Público não sofreria o mesmo controle que o conduzido pela autoridade

policial.

Isso porque o inquérito policial está sob a supervisão do juiz: é

ele quem delibera sobre o pedido de dilação de prazo para conclusão das

diligências, e para ele são dirigidos os autos com o relatório final.

É controlado, também, pelo investigado, vez que o advogado

tem acesso aos autos (artigo 7º, XIV, Lei nº 8.906/94), pelo Ministério Público, que

pode acompanhar todas as suas fases (artigo 129, VII, CF), e pelas corregedorias

de polícia155.

Os opositores destacam, ainda, que a autoridade policial não

pode, em qualquer circunstância, determinar o arquivamento dos autos do inquérito.

Cumpre à polícia somente coletar os elementos de informação, não devendo “sobre

eles emitir um juízo de valor”156.

Sobre o papel exercido pela autoridade policial nos

procedimentos criminais, Lima157 ensina que:

Cabe ao delegado de polícia conduzir as investigações e reunir nos autos as provas que encontrar nas suas pesquisas, tendo como único objetivo apurar a verdade dos fatos, manter equilibrado bom senso e eqüidistâncias das partes, inspirando-se na figura do magistrado ao proceder sua tarefa, isto é, com absoluta imparcialidade. [...].

No caso de investigações presididas pelo Ministério Público,

acreditam que o representante – condutor do procedimento – selecionaria as provas

de modo a atingir um fim pré-determinado: inocência ou culpa do investigado.

155 REVISTA JURÍDICA CONSULEX. Consulex. Ano VII, nº 159, de 31 de agosto de 2003.156 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva,

2009. p.106.157 REVISTA JURÍDICA CONSULEX. Consulex. Ano VII, nº 159, de 31 de agosto de 2003.

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Nucci158, mencionando Sérgio Marcos de Moraes Pitombo,

aponta “o risco da procura orientada de prova, para alicerçar certo propósito, antes

estabelecido”, e, ainda, questiona a forma de controle desses procedimentos:

Procuradores da República e Promotores de Justiça necessitam dos serviços das autoridades policiais, para levar avante o pretenso procedimento preparatório, que venham a iniciar. Polícia Judiciária, havida por inconfiável, os secundando, não obstante fiscalizada e corrigida, de maneira externa, pelo Ministério Público. Mais, ainda, a dúvida de quem faria o controle interno, do mencionado procedimento administrativo ministerial, operacionalizado pela polícia judiciária, a mando e comando dos Procuradores da República e Promotores de Justiça. [...] Dirigir a investigação e a instrução preparatória, no sistema vigorante, pode comprometer a imparcialidade. [...].

Completam, os que se opõe à investigação ministerial, que

seriam os próprios condutores que decidiriam pelo arquivamento do procedimento, o

que, segundo Lima159, instalaria “uma verdadeira ditadura do Ministério Público, com

sério comprometimento ao princípio da obrigatoriedade da ação penal”. Afirma que

há:

[...] possibilidade do promotor investigante produzir prova favorável a um culpado, intencionalmente ou não, resultando em pedido de arquivamento do procedimento investigatório; se o juiz não concordasse, caberia ao próprio Ministério Público decidir o caso. [...].

Na visão dos opositores, sintetizada por Juarez Tavares, na

obra de Nucci160:

É inconcebível que se atribua a um órgão do Estado, qualquer que seja, inclusive ao Poder Judiciário, poderes sem limites. A democracia vale, precisamente, porque os poderes do Estado são limitados, harmônicos entre si, controlados mutuamente e submetidos ou devendo submeter-se à participação de todos, como exercício indispensável da cidadania.

158 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.148.

159 REVISTA JURÍDICA CONSULEX. Consulex. Ano VII, nº 159, de 31 de agosto de 2003.160 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2008. p.148.

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Por fim, defende-se que as autoridades policiais, ao

conduzirem investigações criminais, “assim como os membros do Ministério Público,

atuam, normalmente, com zelo e diligência”. E que, no tocante a investigações

dessa natureza, somente a polícia, “a tanto estruturada, reúne as condições

indispensáveis à sua efetivação”161.

Analisados os argumentos contrários ao poder de investigação

criminal do Ministério Público, passa-se aos pontos favoráveis.

3.2 POSICIONAMENTOS FAVORÁVEIS

Os defensores do poder de investigação criminal do Ministério

Público iniciam seu raciocínio desconstruindo o argumento de que a atividade

investigatória seria de exclusividade da polícia.

Para eles, o legislador constitucional, ao utilizar a qualidade de

“exclusividade” no artigo 144, parágrafo 1º, inciso IV, teve somente a intenção de

demarcar as tarefas de cada órgão policial.

Além disso, destacam que a Constituição Federal quis

diferenciar as funções de “apurar infrações penais” e “polícia judiciária”. As funções

de polícia judiciária serviriam para auxiliar o Poder Judiciário na consecução de seus

fins, e seriam, assim, as únicas de exclusividade da polícia.

Streck e Feldens162 sustentam essa idéia nos seguintes termos:

Logicamente, ao referir-se à “exclusividade” da Polícia Federal para exercer funções de “polícia judiciária da União”, o que fez a Constituição foi, tão-somente, delimitar as atribuições entre as diversas polícias (federal, rodoviária, ferroviária, civil e militar), razão pela qual reservou, para cada uma delas, um parágrafo dentro do mesmo art. 144. Daí porque, se alguma conclusão de caráter exclusivista pode-se retirar do dispositivo constitucional seria a de que não cabe à Polícia Civil “apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas” (art.

161 TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e investigação criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.86-87.

162 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.92-93.

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144, §1º, I), pois que, no espectro da “polícia judiciária”, tal atribuição está reservada à Polícia Federal.

No mesmo sentido, manifestou-se, recentemente, o Supremo

Tribunal Federal163:

A cláusula de exclusividade inscrita no art. 144, §1º, inciso IV, da Constituição da República – que não inibe a atividade de investigação criminal do Ministério Público – tem por única finalidade conferir à Polícia Federal, dentro os diversos organismos policiais que compõem o aparato repressivo da União Federal (polícia federal, polícia rodoviária federal e polícia ferroviária federal), primazia investigatória na apuração dos crimes previstos no próprio texto da Lei Fundamental ou, ainda, em tratados ou convenções internacionais. Incumbe, à Polícia Civil dos Estados-membros e do Distrito Federal, ressalvada a competência da União Federal e excetuada a apuração dos crimes militares, a função de proceder à investigação dos ilícitos penais (crimes e contravenções), sem prejuízo do poder investigatório de que dispõe, como atividade subsidiária, o Ministério Público. (STF. HC 89.837 DF. Relator Ministro Celso de Mello. Publicação 20/10/2009).

Além do quê, a conclusão de que a polícia detém o direito

único à investigação criminal vai de encontro ao poder que possuem outros

organismos públicos para presidirem investigações da mesma natureza. Atribuições

estas expressamente estabelecidas pela Constituição Federal, conforme citado

anteriormente.

Superado o óbice do monopólio policial, os que sustentam a

legitimidade do Ministério Público passam a provar que a atividade investigatória,

além de ser compatível com a finalidade ministerial, encontra previsão legal. Veja-

se.

O texto constitucional, ao tratar das funções institucionais do

Ministério Público, teria formado um rol meramente exemplificativo de suas

atribuições.

Isto porque, o artigo de lei se encerra dispondo que é lícito à

instituição “exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis

163 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 89.837. Publicado em 20/10/2009.

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com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria

jurídica de entidades públicas”164.

Para Streck e Feldens165:

A norma constitucional sob apreço qualifica-se como uma cláusula de abertura – legalmente concretizável – ao exercício, pelo Ministério Público, de “outras funções”, as quais, entretanto, haveriam de estar submetidas às seguintes três condicionantes: a) proveniência legal da função (limitação formal); b) compatibilidade da função legalmente conferida com a finalidade institucional do Ministério Público (limitação material afirmativa); c) vedação de qualquer função que implique a representação judicial ou a consultoria jurídica de entidades públicas (limitação material negativa).

Os autores, de pronto, afastam qualquer hipótese de relação

do tema – promoção de investigação criminal – com eventual representação judicial

ou consultoria de entidades públicas. Caberia, portanto, analisar se a função está

legalmente prevista e se há compatibilidade com as finalidades do Ministério

Público166.

Cita-se, então, a Lei Complementar nº 75/93167 (Lei Orgânica

do Ministério Público da União), a qual estabelece que “para o exercício de suas

atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua

competência: V - realizar inspeções e diligências investigatórias” (artigo 8º).

E, ainda, a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, nº 8.625/93168:

Art. 26 - No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: I - instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los: a) expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas previstas em lei; b) requisitar informações, exames

164 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 7 ed. São Paulo: Saraiva2009.

165 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.82.

166 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.82.

167 CONGRESSO NACIONAL. Lei Complementar nº 75. Brasília: 1993.168 CONGRESSO NACIONAL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público nº 8.625. Brasília: 1993.

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periciais e documentos de autoridades federais, estaduais e municipais, bem como dos órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; c) promover inspeções e diligências investigatórias junto às autoridades, órgãos e entidades a que se refere a alínea anterior. II - requisitar informações e documentos a entidades privadas, para instruir procedimentos ou processo em que oficie; [...].

Os defensores do poder de investigação criminal do Ministério

Público acreditam que os aludidos dispositivos autorizam os membros a realizem

inspeções e diligências investigatórias em todos os procedimentos de sua

competência, incluindo-se aí os de natureza penal.

Nas palavras de Calabrich169:

Não há nada, nem na LC 75/93 nem na Lei 8.625/93, que estabeleça que as atribuições investigatórias limitam-se à colheita de elementos para a propositura de uma ação civil pública. Muito diversamente disso, o art. 26, I, da Lei 8.625/93 é peremptório ao prever a possibilidade de instauração, pelo Ministério Público, de inquérito civil e de outros procedimentos administrativos, abrangendo, com isso, todo e qualquer procedimento, de natureza criminal ou não, necessário ao exercício de suas funções institucionais. [...].

Haveria, desse modo, previsão legal expressa a declinar os

atos de investigação criminal que o Ministério Público pode praticar.

Quanto à condição de compatibilidade, deve-se analisar se a

prática de diligências investigatórias pelo representante ministerial está relacionada

a um fim para o qual a instituição esteja constitucionalmente legitimada170.

Ora, o legislador constitucional, como primeira função, atribuiu

ao Ministério Público a promoção, de forma privativa, da ação penal pública. Em

sendo assim, a atividade investigatória é claramete compatível com a finalidade do

órgão.

Dessa maneira, concluem Streck e Feldens171:

169 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.125.

170 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.85.

171 STRECK, Lenio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.85.

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Resulta nítida a relação meio-fim exsurgente do cotejo dos dispositivos legal (art. 8º, V, da LC nº 75/93, congruente à dicção do art. 26 da Lei nº 8.625/93) e connstitucional (art. 129, I, da CRFB), a dar acolhida, portanto, à terceira – e última – das condicionantes impostas pelo art. 129, IX, da Constituição.

Aliada a esse entendimento, está a teoria dos poderes

implícitos, que se explica na lição de Lenza172:

[...] segundo a teoria dos poderes implícitos, quando o texto constitucional outorga competência explícita a determinado órgão estatal, implicitamente, pode-se interpretar, dentro de um contexto de razoabilidade e proporcionalidade, que a esse mesmo órgão tenham sido dados os meios necessários para a efetiva e completa realização dos fins atribuídos.

Nesse sentido, a outorga de poderes explícitos pressupõe a

titularidade dos instrumentos necessários para tornar efetivo o desempenho da

função.

A dita teoria é utilizada pelo Ministro Celso de Mello173 para

fundamentar o poder de investigação criminal do Ministério Público, in verbis:

[...] entendo revestir-se de integral legitimidade constitucional a instauração, pelo próprio Ministério Público, de investigação penal, atribuição que lhe é reconhecida com apoio na teoria dos poderes implícitos, e que permite, ao Ministério Público, adotar as medidas necessárias tanto ao fiel cumprimento de suas funções institucionais quanto ao pleno exercício das competências que lhe foram outorgadas, diretamente, pela própria Constituição da República. (STF. HC 89.837 DF. Relator Ministro Celso de Mello. Publicação 20/10/2009).

Os adeptos da idéia de investigações criminais conduzidas

pelo Ministério Público continuam, em sua defesa, contrapondo os argumentos

levantados pelos opositores. Ressaltam os benefícios resultantes da autonomia dos

membros ministeriais e a eficiência de um procedimento por eles conduzido,

conforme segue.

A autonomia do Ministério Público é, pois, de suma importância

à investigação. Seus representantes, que gozam das garantias de inamovibilidade, 172 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.612.173 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 89.837. Publicado em 20/10/2009.

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vitaliciedade e independência funcional, têm liberdade e segurança para atuarem em

quaisquer procedimentos, inclusive, os que envolvam pessoas muito influentes e

integrantes da polícia.

O que não acontece com as autoridades policiais, que, por não

disporem dessas prerrogativas, estão sujeitas “a pressões e desmandos de

governantes do momento”174.

A respeito do tema, Calabrich175 assevera que:

A independência funcional do membro do Ministério Público permite a eficiência de investigações sobre determinados fatos que, em virtude da qualidade de pessoas envolvidas ou interessadas, direta ou indiretamente, poderiam não ser adequadamente apurados (ou sequer apurados), por ingerências diretas ou veladas sobre a atividade persecutória da polícia. Essas ingerências podem tanto recair sobre o delegado que preside as investigações quanto sobre um superior hierárquico ao qual esta autoridade policial está subordinada – o que, de qualquer forma, comprometeria o resultado de seu trabalho. [...].

Continua, o referido autor, exemplificando as investigações de

difícil desenvolvimento quando comandadas pela polícia. Cita aquelas relacionadas

a ilícitos praticados por políticos e por altas autoridades, por empresários com

elevado poder econômico, bem como por outras autoridades policiais176.

Nesses casos, então, alcançaria maior eficácia a investigação

presidida e dirigida inteiramente pelos membros do Ministério Público, que não

sofreriam qualquer retaliação em virtude de suas ações.

O Procurador da República, Valtan Furtado, citado pelo

Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello177, analisa os resultados

concretos do exercício da investigação criminal pelo Ministério Público:

174 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.90.

175 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.133-134.

176 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.134.

177 BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. HC nº 89.837. Publicado em 20/10/2009.

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A prática tem demonstrado como é relevante a atividade investigatória do MP no campo criminal, seja no combate a abusos na função policial, seja na apuração de crimes como sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, fraude contra o sistema financeiro e corrupção, sendo o famoso caso do desvio de recursos no TRT de São Paulo apenas um dos inúmeros em que se revelou fecunda a condução de investigações no âmbito interno do MP. (STF. HC 89.837 DF. Relator Ministro Celso de Mello. Publicação 20/10/2009).

Outra vantagem da investigação feita pelo próprio titular da

ação penal pública, está no fato de que o membro poderá desde logo “conhecer as

provas e informações que são produzidas, evitando a produção de provas que não

interessem à formação de seu convencimento”178.

O representante ministerial, então, ao tomar conhecimento do

ilícito penal, traça uma estratégia de investigação a partir das provas que reputa

importantes ao caso, concluindo, em menor tempo, o procedimento.

Para Valtan Furtado, reproduzido, novamente, no voto do

Ministro Celso de Mello179:

Possibilitar ao MP a condução direta de investigações criminais atende ao art. 37, ‘caput’, da CF, pois agrega eficiência a determinadas investigações, de acordo com a influência que o investigado possa exercer, o tipo de investigação (por exemplo, coleta e análise de documentos), a necessidade de formular um juízo direto e objetivo sobre os fatos, ou ainda por questão de ganho de tempo (por exemplo, em casos em que falta apenas uma informação para formar a ‘opinio delicti’ sobre o objeto de uma representação oriunda de órgão fiscal, o MP pode obter o dado faltante expedindo um ofício ou ouvindo uma testemunha, com ganho de tempo e na formação de sua convicção. (STF. HC 89.837 DF. Relator Ministro Celso de Mello. Publicação 20/10/2009).

Além disso, participando, o membro do Ministério Público, da

colheita de provas – desde a inquirição dos envolvidos à determinação de exames

periciais –, terá melhores condições de firmar seu convencimento e decidir pela

acusação ou não do investigado.

178 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.134-135.

179 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 89.837. Publicado em 20/10/2009.

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MAZZILLI conclui que, na prática, “possibilita-se o ajuizamento

de ações mais bem aparelhadas e instruídas” 180.

Para os defensores do poder de investigação criminal do

Ministério Público, a direção do procedimento pelo próprio acusador não

compromete, em nada, as garantias do investigado, nem implica na seleção

tendenciosa de provas.

Destacam que a imparcialidade que é exigida dos

representantes da instituição está ligada à impessoalidade, conforme ensina

Calabrich181:

A nota da “imparcialidade”, no processo penal, tem o sentido de que, mesmo na condição de órgão legitimado para acusação, cabe ao Ministério Público zelar pelo fiel cumprimento da lei (função custos legis, ou fiscal da lei), sempre de modo impessoal (desvinculado de interesses de ordem pessoal, que, a rigor, se houver, deveriam ser causa de suspeição ou impedimento do membro do MP). A imparcialidade do Ministério Público, nesses termos, associa-se à idéia de (a) impessoalidade; e (b) desvinculação apriorística de pretensões acusatórias ou absolutórias. A despeito de ser parte, sua função precípua é a defesa da lei e da Constituição, podendo e devendo, por esse mesmo fundamento, por exemplo, promover o arquivamento de um inquérito policial [...] ou pedir a absolvição de um acusado que verifique ser inocente [...].

Lição que reflete o entendimento do Superior Tribunal de

Justiça182, o qual já firmou posição no sentido de que a imparcialidade cobrada do

membro ministerial no processo penal em nada atrapalha a presidência das

investigações que o antecedem, a saber:

STJ Súmula nº 234 - Membro do Ministério Público - Participação na Fase Investigatória - Impedimento ou Suspeição - Oferecimento da Denúncia. A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

180 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.217.

181 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.126-127.

182 SÚMULA DO STJ. Disponível em: http://www.dji.com.br. Acesso em 21/04/2010.

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Quanto às garantias constitucionais, ao investigado por

procedimento instruído pelo Ministério Público é assegurado, dentre outros, o direito

ao silêncio, à integridade física e moral, bem como à constituição de advogado –

limitações comuns a todos os procedimentos investigatórios.

Dentro desse raciocínio, diferentemente do que afirmam os

opositores à idéia de investigação pela instituição, não se vislumbra prejudicada a

garantia do contraditório pelo simples fato de ser a investigação conduzida pelo

próprio representante ministerial.

Isso porque, nenhuma investigação, nessa fase preliminar,

comporta referido princípio. Os elementos obtidos servem apenas para o

recebimento da denúncia, devendo toda prova ser reproduzida em juízo, aí sim, sob

o crivo do contraditório.

Corroborando, o Código de Processo Penal determina que o

juiz não poderá fundamentar sua decisão exclusivamente em informações colhidas

durante a investigação (artigo 155).

O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello183,

defende a inaplicabilidade do contraditório na fase pré-processual, ressaltando que a

investigação pelo órgão ministerial não traz qualquer lesão ao suspeito:

[...] a meu ver, a instauração de mera investigação penal, por iniciativa e sob a responsabilidade o Ministério Público, nenhum gravame impõe à esfera de direitos e ao “status libertatis” do investigado, eis que, a este, assegurar-se-á, sempre, o efetivo respeito às garantias do contraditório, da bilateralidade do juízo e da plenitude de defesa, uma vez promovida, “in judicio”, a fase processual da persecução penal. (STF. HC 89.837 DF. Relator Ministro Celso de Mello. Publicação 20/10/2009).

Por último, os estudiosos analisam que é uma tendência dos

ordenamentos jurídicos contemporâneos atribuírem à instituição do Ministério

Público funções de investigação criminal, como ocorre, principalmente, na Europa

continental184.

183 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 89.837. Publicado em 20/10/2009.184 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC nº 89.837. Publicado em 20/10/2009.

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Nesse sentido, Calabrich185 descreve que, na legislação

portuguesa, é o órgão ministerial que conduz a atuação das autoridades policiais, a

saber:

Em Portugal, segundo seu Código de Processo Penal, compete ao Ministério Público a direção do inquérito (art. 53), cabendo à polícia coadjuvá-lo nessa atividade. A prática de atos investigatórios pela polícia se dá por delegação do MP (art. 270). Prescreve o art. 55 do CPPP que “compete em especial aos órgãos de polícia criminal, mesmo por iniciativa própria, colher notícia dos crimes e impedir quando possível as suas conseqüências, descobrir os seus agentes e levar a cabo os actos necessários e urgentes destinados a assegurar os meios de prova”. A atuação das autoridades policiais, entretanto, efetiva-se sob a orientação do Ministério Público, órgão com o qual mantém uma relação de dependência funcional (art. 56 do CPPP).

O aludido autor186 cita, ainda, o papel exercido pela instituição na legislação alemã:

Na Alemanha, é o Ministério Público (Staatsanwaltschaft) o encarregado das investigações necessárias à elucidação de um ilícito penal. O procedimento preliminar ou de investigação (vorvefahren ou ermittlungsverfahren) é conduzido pelo MP, que para tal mister é auxiliado pela polícia. Além da polícia, em questões fiscais ou administrativas são dotados de atribuição investigatória os agentes administrativos. [...].

Defende-se, pois, que os ordenamentos jurídicos mais

modernos, os quais servem de referência para os pesquisadores do direito em todo

o mundo, já aderiram à idéia de investigações criminais presididas diretamente pelo

Ministério Público.

Esses os argumentos favoráveis à investigação criminal pela

instituição.

Vistos os principais pontos da discussão, segue o cenário atual

do problema no Supremo Tribunal Federal.

185 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.77-78.

186 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.76.

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3.3 PANORAMA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

No Supremo Tribunal Federal, a apreciação do tema teve como

marco principal o julgamento, iniciado no ano de 2003, do Inquérito nº 1968 (DF), o

qual tinha como objeto a possibilidade de o Ministério Público presidir investigações

criminais.

No caso, o então deputado Remi Trinta, proprietário de uma

clínica em São Luís/MA, foi acusado da prática de estelionato, por suposta fraude

contra o Sistema Único de Saúde (SUS).

A denúncia foi baseada unicamente em investigação criminal

conduzida pelo Ministério Público. Assim, encontrava-se em julgamento o

recebimento da inicial acusatória oferecida nos autos do inquérito187.

Cinco ministros proferiram seus votos: foram favoráveis à

investigação pelo Ministério Público, os Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Ayres

Britto e Eros Roberto Grau; e contrários, os Ministros Marco Aurélio Mello e Nelson

Jobim188.

Contudo, não houve o julgamento definitivo da questão. A

discussão restou prejudicada com a extinção do mandato do deputado, que não se

reelegeu nas eleições de 2006.

O assunto passou a ser arduamente debatido, também, em

controle concentrado de constitucionalidade. Calabrich189 explica:

[...] o Partido Liberal ajuizou, na data de 22.07.2003, a ADIn 2943-6 pugnando pela suspensão da eficácia dos dispositivos [...] da LC 75/93 e da Lei 8.625/93. Mais recentemente, a Adepol ajuizou a ADIn 3.806 (distribuída em 10.10.2006), argüindo a inconstitucionalidade da Resolução 13 do CNMP, que regulamentou os procedimentos de investigação criminal pelo MP. Semanas depois, em 19.12.2006, a OAB ajuizou a ADIn 3.836, também questionando a constitucionalidade da citada Resolução.

187 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.117-118.

188 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.118.

189 CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: fundamentos e limites constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.117.

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Dentre as ações declaratórias de inconstitucionalidade que

tramitam no Supremo Tribunal Federal, aponta-se, como principal, a nº 3.806,

ajuizada pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, que tem como relator

o Ministro Ricardo Lewandowski.

Na ação, em síntese,

A Adepol alega a inconstitucionalidade dos artigos 7º, I, II e III; 8º, incisos I, II, IV, V, VI, VII e IX; 38, I, II e III e 150, I, II e III, todos da Lei Complementar (LC) nº 75, de 20 de maio de 1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União. A entidade impugna, também, o artigo 26, inciso I, alíneas a, b e c, da Lei 8.625/1993, que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Por fim, pede que seja declarada a inconstitucionalidade total da Resolução nº 13/2006, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que regulamenta a investigação criminal pelo Ministério Público (MP)190.

Até o momento, nenhuma das ações que discutem o poder de

investigação criminal do Ministério Público foi julgada.

Presumem-se os votos de alguns dos Ministros em vista de

decisões já proferidas sobre a questão, como no caso do Inquérito nº 1968 e,

principalmente, em sede de habeas corpus.

No entanto, hoje, não é possível determinar, de forma precisa,

a opinião da Corte Suprema sobre o tema.

190 NOTÍCIAS STF. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em 19/04/2010.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho acadêmico promoveu o estudo sobre o

poder de investigação criminal do Ministério Público, analisando, especificamente, a

possibilidade jurídica de o membro ministerial conduzir, por autoridade própria,

procedimento preliminar de natureza penal, cujos atos destinam-se à colheita de

provas para oferecimento de denúncia.

De início, para melhor compreensão do papel exercido pela

instituição, fez-se um esboço de seu histórico desde as origens remotas até sua

configuração atual. Apontaram-se, então, os princípios e garantias assegurados ao

órgão e seus membros, bem como as funções que lhes foram outorgadas pelo texto

constitucional vigente.

Verificou-se que a instituição ministerial, surgida na França, no

ano de 1302, e integrada à legislação brasileira, por meio das Ordenações

portuguesas, desde a colonização, sofreu inúmeras mudanças – retrocessos e

avanços – em suas atribuições ao longo das Constituições.

Foi com o advento da Constituição Federal de 1988, que o

Ministério Público firmou-se como órgão fundamental para o ordenamento jurídico

brasileiro, status alcançado, principalmente, em razão das funções que lhe foram

conferidas pela Carta. Passou a integrar o capítulo “Das funções essenciais à

justiça”, sendo classificado como instituição permanente e guardião da ordem

jurídica, do regime democrático e do interesse público.

Quanto às funções, o legislador constitucional outorgou-lhe,

dentre outras, a promoção, de forma privativa, da ação penal pública; a promoção do

inquérito civil e da ação civil pública; o poder de requisitar diligências investigatórias

e instauração de inquérito policial; de expedir notificações em procedimentos

administrativos de sua competência e o controle externo da atividade policial. Por

fim, determinou que o Ministério Público pode exercer outras funções que lhe forem

conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade.

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Aos membros ministeriais, foram asseguradas as garantias de

vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios, as quais permitem que

o representante atue com liberdade e segurança, bem desempenhando sua função.

Na seqüência, tratou-se de investigação criminal. Para

exemplificar o modo como se procedem aos atos de investigação, dentre os

inúmeros tipos de procedimento, utilizou-se, como padrão, o inquérito policial. Falou-

se da atuação da polícia judiciária e do Ministério Público em procedimentos dessa

natureza.

Constatou-se que o inquérito policial é um procedimento

administrativo, conduzido pela polícia judiciária – polícia federal, em âmbito nacional,

e polícia civil, na esfera estadual –, que visa apurar a ocorrência de uma infração

penal e sua autoria; é voltado, pois, à colheita de provas que servem de subsídio ao

oferecimento da denúncia pelo Ministério Público.

O procedimento é escrito, sigiloso e informativo. Tem caráter

inquisitivo e é dispensável à propositura da ação penal.

Estudou-se, também, que o representante ministerial, ao

receber os autos do inquérito policial, pode adotar as seguintes providências: a)

requerer o retorno dos autos à polícia judiciária para o prosseguimento da

investigação; b) promover a declinação de competência; c) requerer o arquivamento;

d) oferecer denúncia.

Observou-se, com essa situação, que à instituição do Ministério

Público foi delegada grande responsabilidade, uma vez que é facultado ao membro

ministerial denunciar ou não o investigado. Assim, este deve agir com

impessoalidade e ponderação.

Por último, citaram-se outras formas de investigações

criminais. Ainda no âmbito do Poder Executivo, as presididas pela Receita Federal

do Brasil, pelo Banco Central e pelo INSS. Na esfera do Poder Legislativo, as

Comissões Parlamentares de Inquérito, e no Judiciário, a investigação dos próprios

magistrados envolvidos em práticas delituosas. Destacou-se, também, o

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Procedimento Investigatório Criminal de presidência do Ministério Público, regulado

pela Resolução nº 13, do Conselho Nacional do Ministério Público.

No terceiro capítulo, entrou-se na discussão acerca do poder

de investigação criminal do Ministério Público. Foram expostos os principais

argumentos contrários e favoráveis à questão, apresentando, ao final, o panorama

no Supremo Tribunal Federal.

Os que se opõem à idéia de investigações criminais

conduzidas diretamente pelo próprio representante ministerial, em síntese,

defendem que: a) o legislador constitucional determinou que a atividade

investigatória fosse exercida exclusivamente pela polícia judiciária; b) não há

previsão legal que legitime os membros ministeriais a conduzirem investigações

dessa natureza; c) haveria excesso de poder, imparcialidade e desequilíbrio entre o

autor da ação penal e o réu.

Por outro lado, os adeptos do poder de investigação criminal do

Ministério Público alegam que: a) a polícia não detém o monopólio da investigação

criminal; b) a atividade investigatória pelo órgão ministerial está prevista nas leis

orgânicas da instituição e é compatível com suas funções; c) o procedimento

presidido pelo representante ministerial apresenta melhores resultados, em menos

tempo; d) essa é uma tendência dos ordenamentos jurídicos modernos.

No Supremo Tribunal Federal, o problema ainda não foi

decidido. Em que pese a existência de inúmeras ações que questionam a

legitimidade de o Ministério Público conduzir investigações criminais, os ministros

ainda não se manifestaram definitivamente sobre o tema.

Concluído o estudo, verificou-se que a proibição da

investigação criminal pelo Ministério Público afronta o conjunto de princípios e

normas constantes da Constituição brasileira.

Ainda que se dê prioridade à polícia judiciária em matéria de

investigações criminais, é inconcebível que um único órgão, no ordenamento jurídico

brasileiro, tenha legitimidade para presidir atos investigatórios dessa natureza.

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Além do que, o modelo de investigação tradicional, que prega o

monopólio da polícia, está há muito ultrapassado. Antiquado, e com sérios

problemas de eficácia e celeridade, ele reflete o Estado autoritário que se sustentava

no país em décadas passadas.

Esses problemas podem ser percebidos na tabela em anexo, a

qual faz parte do controle externo da atividade policial exercido pelo Ministério

Público Federal, em Itajaí, que aponta a demora na instauração do inquérito policial.

Hoje, com a Constituição Federal de 1988, tem-se um maior

equilíbrio entre os Poderes, de forma a evitar excessos, sendo garantidos, de

maneira mais efetiva, os princípios democráticos e a defesa dos direitos individuais e

coletivos dos cidadãos.

Nesse cenário, a fim de zelar pelo interesse público, vê-se

perfeitamente possível a atuação do Ministério Público em investigações criminais.

Função nitidamente compatível com sua finalidade.

A prática traz segurança jurídica à sociedade e impede, por

vezes, que o investigado sofra o constrangimento de ser injustamente processado,

pois aproxima o titular da ação penal pública de todos os elementos probatórios.

Destacando-se, ainda, que em razão das garantias asseguradas aos seus membros,

o Ministério Público tem maior liberdade para atuar em procedimentos que envolvam

altas autoridades.

Não se fala aqui em tornar regra a investigação criminal pelo

Ministério Público. Nem poderia, uma vez que essa não é a principal função

ministerial, sem contar a falta de estrutura do órgão para tanto. Não se pensa em

suprimir o trabalho da polícia judiciária.

Imagina-se, pois, um modelo de cooperação entre dois

importantes órgãos estatais – Ministério Público e polícia judiciária – a bem da

sociedade, ambos responsáveis pelos atos de investigação criminal e apuração da

verdade real.

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Esse sistema de colaboração resultaria num processo de maior

qualidade e na aplicação mais rápida da justiça, combatendo, finalmente, de forma

acertada, a criminalidade e o abuso de poder.

Assim, retornando-se às hipóteses inicialmente apresentadas,

constata-se que foram todas confirmadas:

Primeira. O Ministério Público atua em defesa da sociedade,

funcionando, realmente, como guardião dos direitos dos cidadãos. Dentre suas

funções, é titular, de forma privativa, da ação penal pública, e responsável pelo

inquérito civil e a ação civil pública.

Segunda. A investigação criminal consiste no conjunto de atos

que visam esclarecer a ocorrência de um crime, comprovando sua materialidade e

indicando um possível autor.

Terceira. O Ministério Público possui sim, à luz do

ordenamento jurídico brasileiro, legitimidade para presidir investigações criminais.

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ANEXOS

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