introdução ao existencialismo
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Seminário Arquidiocesano de São José
Introdução ao Existencialismo
Rio de Janeiro
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Sumário
Introdução .............................................................................................................................................. 3 1. O que é o existencialismo? ....................................................................................................................... 3 1.1. Existencialismo e existencialistas .................................................................................................................... 3 1.2. Filosofia da Existência ........................................................................................................................................... 3
2. Fontes do Existencialismos ..................................................................................................................... 5 2.1. O Vitalismo ................................................................................................................................................................. 6 2.2. A Fenomenologia ..................................................................................................................................................... 6
3. Filósofos da Existência .............................................................................................................................. 7 Sören Aabye Kierkegaard (1813 – 1855) .................................................................................... 8 1. Vida e Obras .................................................................................................................................................. 8 2. As condições da Existência ................................................................................................................... 10 3. Filosofia Existencial ................................................................................................................................ 14
Gabriel Marcel (1889 – 1973) ........................................................................................................ 15 1. Vida e Obras ............................................................................................................................................... 15 2. Fontes e Influências ................................................................................................................................ 16 3. Filosofia da Existência ............................................................................................................................ 16 3.1. A existência Encarnada ...................................................................................................................................... 17 3.2. A Existência do mundo e dos outros ............................................................................................................ 18
Karl Jaspers (1883 – 1969) ............................................................................................................. 19 1. Vida e Obras ............................................................................................................................................... 19 2. Por que um Filosofia da Existência? .................................................................................................. 20 3. O Filosofar desde a Existência Possível ............................................................................................ 21 4. Esclarecimento da Existência .............................................................................................................. 22
Linha Cronológica: ............................................................................................................................. 24
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Introdução
1. O que é o existencialismo?
1.1. Existencialismo e existencialistas
“O termo existencialismo designa o conjunto de tendências filosóficas que, embora divergentes entre si, têm em comum a análise da existência humana. É difícil, contudo, estabelecer o exato sentido que os diversos filósofos existencialistas atribuem a essa palavra. Entretanto, podemos dizer que o conceito de existência é tomado como algo que se refere à condição específica do homem como ser no mundo. Existir, então, implica estar em relação com outros seres humanos, com as coisas e com a Natureza. Relações múltiplas, concretas, dinâmicas; relações possíveis de acontecer ou não.” (Gilberto Cotrim)
Um das maiores dificuldades no estudo de existencialismo é justamente o fato de que é extremamente difícil definir o que ele realmente seja. Segundo Aloys Wenzl “não existe o Existencialismo como doutrina comum; existe só como situação filosófica temporal” (tirado da obra de Mário Curtis Giordani). Justifica-‐se então chamar o Existencialismo de conjunto de tendências filosóficas. De fato os existencialistas tem em comum somente o fato de partirem da mesma orígem, a Existência. Também existe problemas na terminologia utilizada comumente. De fato, com exceção talvez de Sartre, os filósofos ditos existencialistas não aceitavam bem serem chamados dessa forma. Isso se dá talvez pelo fato de que a maioria deles não permanece nas indagações sobre Existência, mas tende a tratar de outros problemas uma vez partindo dessa origem comum. Sobre isso Jean Wahl comenta o que disse Helmuth Kuhn:
“os filósofos da Existência não se atêm à Filosofia da Existência. Essas Filosofias da Existência tendem a terminar em qualquer coisa de diferente delas mesmas, quer seja a Ontologia de Heidegger, o Humanismo de Sartre, a teoria da Transcendência de Jaspers. Cada um deles, diz-‐nos Kuhn, sai, de um modo ou de outro, da Filosofia da Existência propriamente dita” (tirado da obra de Mário Curtis Giordani).
1.2. Filosofia da Existência Apesar de muito se utilizar o termo existencialismo, os grandes Filósofos da Existência e
seus comentadores sempre preferiram o termo Filosofia da Existência. Dessa forma, a partir de agora chamaremos o Existencialismo de Filosofia da Existência e existencialistas de Filósofos da Existência. Apesar de partirem do mesmo ponto, para cada Filósofo da Existência há uma Filosofia da Existência, de modo que a única semelhança necessária é o fato de partirem da condição existencial humana. Aquilo que é a existência humana, entretanto, é algo muito bem determinado para cada um deles, do modo que do que é possível deduzir algumas características gerais da Existência:
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a) Irracionalidade Tendemos a entender a Filosofia da Existência como um filosofia irracional e voluntarista,
fruto dos devaneios mentais dos filósofos do século XX. Tal concepção, entretanto, não é válida uma vez há de fato racionalidade entre os pensadores existenciais e nem tudo está reduzido à vontade.
A irracionalidade é aqui requerida pelo fato de que a Filosofia da Existência apareceu como uma reação a uma tendência racionalista da modernidade. Este irracionalismo não quer dizer que o Filósofo da Existência não use ou considere aquilo que diz a razão, mas que ele não aceita que ela seja capaz de abarcar tudo. É uma reação ao idealismo de Hegel.
b) Concretude/Historicidade Ainda contra as concepções idealistas, os Filósofos da Existência afirmam a concretude do
sujeito. Ante o “Eu Ideal” surge o “Eu Existencial”. Aqui pode-‐se perceber a preocupação da Filosofia da Existência com a vida concreta do homem. Não se pretende falar de um homem abstrato e ideal, mas vivo, carnal, real. Um homem que existe de fato, fora da mente. O homem é ser no mundo, um ser empírico que se apresenta tal como é. Vão ser tratadas dimensões mais carnais do ser humano que durante o período moderno foram deixadas de lado.
Sendo que o homem é um ser concreto, ser no mundo, o sujeito existencial também é um ser histórico, isto é, está modo muito bem determinado empiricamente pelo contexto do qual saiu. Cada um de veio de uma realidade bem específica. Ainda que alguns contextos serem comuns a vários sujeitos, existe uma historicidade que é própria de cada indivíduo. Só eu sou realmente eu, de modo que sou um ser individualíssimo, com um história e experiências próprias. Em certo sentido sou insubstituível. Nunca houve ou haverá alguém exatamente como eu no mundo. Daqui também pode-‐se entender um dimensão atualista, de modo que o homem nunca é um ser totalmente acabado e pronto, mas deve sempre estar desenvolvendo-‐se.
c) Liberdade Apesar do sujeito já nascer num contexto histórico determinado ao qual ele mesmo não
escolheu, por exemplo, sua família, sua nação, sua cultura etc, o homem é verdadeiramente livre. Liberdade aqui não significa fazer tudo o que se quer e quando quer, nem se reduz ao livre arbítrio que permite ao sujeito eleger as suas ações. A liberdade existencial deve ser pensada como a capacidade do homem de ser a origem autêntica de seu pensar e de seu agir. Ele não só escolhe o que quer fazer, mas tem certeza de que é ele mesmo quem escolhe. Quando pensa e age autenticamente, o homem intuitivamente se enxerga como aquele que, de fato, quer pensar e quer agir daquela forma.
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d) Comunicabilidade O pensamento existencial presa muito pela relação dos sujeitos. Todo o “Eu existencial”
toma consciência de sua existência mediante o diálogo com o outro. Esse outro, normalmente chamado de “Tu” ,e é muito importante na Filosofia da Existência. É sempre a partir da comunicação existencial que os sujeito crescem no conhecimento de si mesmo. Pode acontecer do Eu tratar o Tu como um Ele, isto é, como um outro que, apesar de ser diferente dos objetos, surge como alguém distante com o qual não tenho nenhuma relação existencial.
e) Fracasso O fracasso surge nos diversos autores existenciais de diversas maneiras. Lembremo-‐nos das
grandes máximas exaustivamente repedidas de Heidegger e Sartre. Este diz que o homem é um Ser para o Nada, aquele que é um Ser para a Morte. Apesar de tais visões mais pessimistas, há autores que entendem o fracasso como o lugar onde o homem encontra seus limites e, dessa forma, onde é levado à reflexão do que está mais além destes mesmo limítes, isto é, levado a refletir sobre a Transcendência.
f) Uma Filosofia do homem Por último temos que entender que somente homem tem realmente existência. A força que
a palavra existência possui no pensamento existencial é tal que fica impossível atribuí-‐la ao seres inanimados ou aos animais irracionais. O que justifica isso é talvez a noção do sujeito como ser consciente de si e do outro. Apesar do que possa parecer, em nenhum momento podemos entender que aquilo que nos rodeia não exista de fato, mas que existência em seu sentido forte é atribuída somente ao homem.
2. Fontes do Existencialismos De maneira muito especial, apesar de todas as outras influência que possam ter ocorrido
sobre o pensamento existencial do século XX, temos, positivamente, a Fenomenologia e o Vitalismo como suas principais fontes. De fato, tanto o vitalismo quanto a fenomenologia, foram teorias que juntas operaram a grande superação do pensamento idealista, e que permitiram o desenvolvimento da Filosofia da Existência. Tal pensamento, entretanto, é de fundamental importância para entender sobre o que quer falar a Filosofia da Existência, afinal foi contra ele que ela surgiu. Também existe certa influência do pensamento metafísico na medida em que ele vai influenciar tais filósofos na busca pelo Ser. As poucas linhas que se seguem não pretendem englobar tudo que tais correntes filosóficas foram, pois para isso seria necessário outro curso somente para falar destes temas, porem é de grande importância ter uma ideia do que elas são para melhor entender como se desenvolveu o pensamento existencial.
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2.1. O Vitalismo Vitalismo, ou a Filosofia da Vida, é, tal como a Filosofia da Existência, um forma de pensar
que muito se afasta das concepções idealistas do mundo. Apesar das diferenças entre os filósofos vitalistas, também podemos, tal como o fizemos com a Filosofia da Existência, afirmar algumas características gerais.
Primeiramente falamos de um atualismo. Aqui presa-‐se de maneira muito especial a ideia de movimento, de vir a ser. Depois temos uma visão organicista do mundo que sempre aparece em contraposição com o mecanicismo que afirma o mundo como uma máquina. Falam ainda de um irracionalismo que exclui conceito a priori ou apenas ideais. Em quarto lugar também pretendem fugir do subjetivismo exagerado, de modo que afirmam uma realidade objetiva que transcende o sujeito. Aqui temos a grande diferença entre a Filosofia da Vida e a Filosofia da Existência, pois apesar de ambas serem atualista, a primeira supõe certa objetividade do sujeito como manifestação de um corrente vital, já o atualismo existencial quer enfatizar a subjetividade do homem. Por últimos estes filósofos falam de um pluralismo em oposição ao monismo idealista.
Pode-‐se ainda distinguir algumas escolas vitalistas. A mais importante é o bergsonismo, que tem por máximo representante Henri Bergson; há ainda o pragmatismo norte americano e inglês cujos representantes são William James e John Dewey; o historicismo de Wilhelm Dilthey; a filosofia da vida alemã com diversos pensadores menores como Keyserling e Klages.
Há ainda quem considere Nietzsche uma espécie de vitalista.
2.2. A Fenomenologia Fenomenologia é a segunda escola que, junto ao vitalismo, completa a separação entre o
século XX e XIX. Apesar de outros filósofos pretenderem fazer um filosofia do objeto, quem institui da Filosofia do Fenômeno foi Edmund Husserl.
Podemos falar de duas características importante do movimento fenomenológico. Primeiramente há o método descritivo dos fenômenos, isto é, a discrição daquilo que se apreende imediatamente pelos sentidos. Diferentemente do idealismo do século XIX, a fenomenologia não pretende partir de uma teoria do conhecimento, mas já dá a possibilidade do mesmo como algo óbvio. Por outro lado, após a análise profunda dos fenômenos, a fenomenologia de Bergson se volta ao conteúdo essencial dos mesmo através também de uma visão imediata, de um intuição essencial. Também aqui ocorre o rompimento com o idealismo que não acha possível qualquer conhecimento da essência das coisas.
Entre os grandes fenomenólogos, podemos citar, além de Husserl, Max Scheller e Edith Stein.
A fenomenologia foi fundamental à Filosofia da Existência uma vez que os grandes pensadores existenciais utilizaram do método fenomenológico de Husserl em suas pesquisas, porem é um erro enquadrar este filósofo entre os Filósofos da Existência.
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3. Filósofos da Existência Muitas vezes acontece o erro de estender a lista dos Filósofos da Existência mais do que se
deveria. De fato a filosofia da Existência se preocupa dos problemas da condição humana, porem não se reduz a isso, afinal é um problema que foi discutido em todas as épocas. Dai surge o erro de querer englobar filósofos como Sócrates, santo Agostinho e Pascal entre os Filósofos da Existência. Há ainda quem queira chamar de Filósofos da Existência pensadores e escritores como Unamuno ou Dostoievski, porem estes também não são Filósofos da Existência ainda que seus escritos em muito influenciem o pensamento existencial. Por último também é um erro incluir aqueles que falaram da Existência num sentido clássico no grupo dos Filósofos da Existência.
Filósofos da Existência, propriamente falando, são aquele que se preocuparam com o problema da Existência numa direção filosófica estrita segundo os critérios comuns antes abordados.
Temos então como os grandes nomes da Filosofia da Existência os filósofos Gabriel Marcel, Karl Jaspers, Martin Heidegger, Jean-‐Paul Sartre e, certamente, Kierkegaard como precursor destes todos. Em torno deles ainda existem alguns filósofos menores como os franceses Simone de Beauvoir e Merleau-‐Ponty, que eram ligados a Sartre, e os Russos Lev Chéstov e Nikolai Berdieav.
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Sören Aabye Kierkegaard (1813 – 1855)
1. Vida e Obras Nasceu em 5 de maio de 1813, em
Copenhague. Seus pais eram da Jutlandia ocidental. Como dose anos o pai de Kierkegaard, Michael Pedersen Kierkegaard, foi para Copenhague para ser aprendiz na casa de seu tio. Michael pode crescer financeiramente de modo a ser um dos principais comerciantes da região. Tendo sua primeira esposa morrido em 1796 sem lhe deixar filhos, casou com uma de suas criadas Ana Sörensdater Lund. Sua nova esposa lhe deu sete filhos sendo o último o próprio Sören Kierkegaard. Devido ao fato de seus pais já serem relativamente velhos ao nascimento de Kierkegaard, ele mesmo se intitula o “Filho da Velhice”. A isso ele também atribui sua débil condição física e seu caráter melancólico.
Raramente encontramos escritos de Kierkegaard falando se sua mãe, porem a figura de seu pai é recorrente. Reconhece inclusive que
herdou três disposições de seu pai, a criatividade, a dialética e a melancolia religiosa. Também foi seu pai o responsável por sua dura educação religiosa dentro do luteranismo dinamarquês. Foi fortemente iniciado na teologia luterana pietista de onde vem sua consciência de pecado, da depravação ingênita do homem, da distância entre Deus e as criaturas, e da redenção apenas pela fé no Cristo.
Kierkegaard se formou aos 17 anos como o melhor aluno de sua classe e, como era o desejo de seu pai, começou a faculdade de teologia na universidade de Copenhague. Durante os 10 anos que deveria passar estudando teologia, percebe-‐se que Kierkegaard não focou-‐se nessa matéria, mas de maneira especial na literatura e na filosofia. Esteve exposto à filosofia grega antiga e ao hegelianismo que em sua época dominava as universidades. Ele, entretanto, desde sua época de estudos universitários já parece recusar esse pensamento idealista de Hegel mostrando seu talento independente e reflexivo. Nessa época também desenvolveu-‐se sua vida social completamente diferente do tempo que passou na casa de seu pai. Foi o tempo em que Kierkegaard se entregou ao prazeres da bebida e da comida, das festas e reuniões. É o chamado período estético de jovem Kierkegaard. Rapidamente aquele garoto inteligente e sarcástico passou a distinguir-‐se em meio aos demais.
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O pai de Kierkegaard via com muito pesar o caminho para o qual seu filho marchava, de modo que preferiu romper a comunicação com seu filho deixando apenas para ele um mesada para seu próprio sustento. Além disso Kierkegaard também dava aulas de latim para poder arcar com todos os seus gastos. Segundo seu irmão mais velho foi esse o tempo em que Kierkegaard rompeu com suas praticas religiosas, ainda que seus Diários mantivesses constantes súplicas a Deus.
Foi a morte de seu pai que devolveu Kierkegaard para a vida religiosa. Como homenagem a seu pai, com quem reconciliou-‐se poucos meses antes de sua morte, Kierkegaard retoma sua carreira religiosa.
Em 1837 há outro acontecimento que muito determinou a vida e os escritos de Kierkegaard. Ele conhece Regina Olsen, filha do conselheiro de estado Terkel Olsen. Consegui separá-‐la de seu primeiro pretendente, Augusto Scheller, e ganhou de maneira muito especial se afeto. Apesar disso não se considerava digno dela devido, entre outras coisas, a diferença tão grande de idade entre os dois. Em 1841 rompe definitivamente com Regina apesar dos protestos da jovem. Durante toda sua vida nutriu profundo amor por ela, tanto que muito tempo continuou se comunicando com Regina através de seus escritos estéticos, de modo que eram como que mensagens cifradas que só Regina conseguia ler. No entanto, Regina perdeu as esperanças de ter Kierkegaard de volta e voltou com seu primeiro pretendente com o qual constituiu sua família. Depois disso cortou toda e qualquer relação com o filósofo ainda que fosse de simples amizade. Kierkegaard percebe que o sacrifício dessa paixão que nutria pela jovem o ensinou a libertar-‐se de sua impetuosa atividade estética.
Também em 1841 passou um semestre em Berlim onde tomou aulas de Schelling que a princípio o interessaram, mas passaram a lhe causar repulsa devido ao idealismo de seu discurso. Quando voltou para Copenhague dedicou-‐se inteiramente a sua carreira de escritos solitário sem preocupar-‐se com trabalho uma vez que havia herdado a grande fortuna de seu pai. Durante o período de 1845 e 1846 teve grandes batalhas ideológicas com P.L. Moeller e M. Goldschimidt, respectivamente redator e diretor do semanário “O Corsário”. Estes multiplicavam as caricaturas e ironias sobre Kierkegaard em seu jornal, de modo que o filósofo passou a ser uma figura muito conhecida em sua cidade não por seu pensamento, mas por sua peculiaridade.
Também foi Kierkegaard um grande crítico da religião oficial dinamarquesa, situação que levou a grandes problemas com Mynster, o bispo da época e logo mais à ruptura com a igreja dinamarquesa. De maneira explicita e aberta, Kierkegaard fazia fortes críticas ao cristianismo organizado como cristandade contrapondo-‐o ao cristianismo puro e autêntico. A gota d`água foi a polêmica com Martensen, um teólogo que, na morte de Mynster, foi fazer um elogio fúnebre que muito desagradou Kierkegaard.
Em 2 de novembro de 1855 Kierkegaard é levado muito mal ao hospital e morre 9 dias depois, num domingo. Suas últimas confidência foram ao pastor E. Bosen, que fora seu grade e
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fiel amigo desde a infância. A grande surpresa foi seu funeral que todos pensavam que seria um fracasso devido ao tipo de vida que levava. Apesar da visão que os mais velhos tinham de Kierkegaard, os jovens simpatizavam de maneira peculiar com o rebelde da Igreja Luterana, de modo que seu funeral foi um triunfo inesperado e espontâneo segundo o testemunho de um amigo.
Kierkegaard muito escreveu durante sua vida, porem suas principais obras foram publicadas com pseudônimos. Entre as principais obras temos: “Temor e Tremor”, sob o pseudônimo de Johannes de Silentio; “O Conceito da Angústia”, com a assinatura de Begrebet Angest; “Migalhas Filosóficas” e “Postcriptum”, como João Climacus; “O tratado Sobre o Desespero”, sob o nome de Anticlimacus. Grande parte das obras de Kierkegaard estão copiladas na obra “Ou Ou”, publicada tendo como autor ele mesmo.
Além de suas grandes obras há os escritos dispersos organizados em escritos A, B e C. De maneira especial enfatiza-‐se nos escritos A que constituem seu famoso “Diário”. Estes são escritos que acompanham e continuam os grandes temas de todas as suas grandes obras.
2. As condições da Existência A Filosofia da Existência de Kierkegaard não pode de maneira alguma ser pensada como
uma teoria sobre a existência ou um sistema sobre a mesma. Antes de mais nada, o filósofo fala de sua própria vida e vivencias, daquilo que ele mesmo experimenta enquanto existente. Dessa forma, para precisar a natureza de sua filosofia, devemos delinear não o que é a Existência de modo geral ou universal, pois o autor sequer aceitaria algo assim, mas as condições necessárias para falar de um autêntico existir.
a) Existência e Subjetividade: “Existir é escolher” Desta grande máxima do autor podemos entender a relação entre a Existência e a
Subjetividade. Esta frase significa que existir é não só fazer escolhas, mas se escolher, de modo que o sujeito não escolhe mais que a si mesmo. Nesse ponto entendemos o sentido existencial dessa escolha.
Tudo que o sujeito escolhe o faz em referencia a si, assim, não existe escolhe que não seja subjetiva, pois é o sujeito mesmo o referencial de cada escolhas. Ainda que o sujeito escolha a partir de critérios muito bem objetivos, aquilo que ele escolhe sempre diz respeito a ele mesmo, quer dizer, realiza ele como existente. Escolher é exercer a própria subjetividade, toda escolha externa é fruto de uma escolha interna.
Devemos ter atenção quanto a essa questão de escolhas. Como isso pode-‐se acabar afirmando que o homem perde seu caráter de essência fixa tornando-‐se possibilidades que se realizam mediante escolhas. Daqui se pode identificar a grande máxima do Filosofia Existencial que diz que a Existência precede a Essência. Não sei se podemos afirmar que, para Kierkegaard, não há nada de objetivo no sujeito, de modo que ele simplesmente é o que ele escolhe ser. Afinal, pensar a liberdade existencial não pode ser um esquecer-‐se da mesmidade do sujeito. O
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indivíduo é histórico, nasceu numa cultura específica na qual ele não escolheu. Há, claramente, um limite para as escolhas que o indivíduo pode fazer de si, por exemplo o fato de que o sujeito não é capaz, por quaisquer escolhas que faça, de mudar o seu passado, isto é, ele não pode escolher aquilo que ele viveu, ou as experiências que teve. Outro exemplo é que é impossível ao homem escolher não escolher, pois assim já está escolhendo.
Kierkegaard vai dar um banho de água fria nos adeptos do relativismo quando diz que a escolha existencial não pode ser uma escolha simplesmente arbitrária. Ele diz que escolher deve ser sempre escolher aquilo que é infinito e eterno. Para o filósofo a existência autêntica é aquela que escolhe a Deus.
Deus é a máxima subjetividade, pois qualquer objetividade o limitaria. Não podemos pensar, todavia, que assim estão totalmente excluídas aquelas características do Ser Divino dadas com tanta genialidade pela escolástica. Kierkegaard, apesar de muito falar de Deus como o máximo subjetivo, afirma que o a subjetividade do Eterno é também o máximo objetivo dele mesmo. Assim, tal como em Deus a subjetividade é seu máximo objetivo, nos homens a objetividade é o modo como se apresenta seu interesse subjetivo.
A subjetividade em Kierkegaard nada tem a ver com a subjetividade gnosiológica hegeliana. Também não nega o realismo do conhecimento científico, mas é a atitude existencial do homem ante seu interesse de salvação pessoal. O homem que vive na dispersão e finitude das objetividades do mundo, deve voltar-‐se para sua própria subjetividade que o conduz ao eterno, a Deus. Deve ser objetivo com os outros e subjetivo consigo mesmo, e ainda, relacionar-‐se objetivamente com sua subjetividade. A verdadeira subjetividade se dá quando o homem se coloca em relação pessoal com o divino.
b) Verdade, Engajamento e Risco Kierkegaard afirma que a verdade é a subjetiva. Isso, entretanto, deve ser muito bem
entendido antes de injustas acusações contra o autor. Podemos ler a expressão “a verdade é subjetividade” no filósofo como uma sentença que
não é tão oposta ao princípio tomista de que a verdade é adequação do intelecto à realidade. Kierkegaard mesmo admite que existe um imperativo do conhecimento assim como há o imperativo moral, de modo que o autor aceita que haja um regra objetiva do pensamento, porem a subjetividade da verdade deve ser entendida em seu sentido existencial e não ideal.
Em nenhum momento Kierkegaard nega o conteúdo objetivo da verdade e muito menos afirma que a verdade é produzida pelo sujeito, porem afirma que a verdade objetiva de nada vale para o homem se não houver um adesão pessoal (e dessa forma subjetiva e existencial) a essa verdade. Assim, o sujeito não deve apenas conhecer especulativamente a verdade, isso não parece bastar, mas deve estar na verdade. A verdade não precisa apenas ser possuída intelectualmente, mas faz parte dela mesma ser quem possui o sujeito. Há em Kierkegaard uma identificação da verdade com a vida, isto é, a verdade deve ser vivida. O sujeito ante sua
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verdade existencial deve se comprometer como ela, esse comprometimento é o que Kierkegaard chama de engajamento.
Com a noção de paixão, que para Kierkegaard é o máximo da subjetividade e, por isso, a mais perfeita expressão da existência, a verdade surge como um drama. Esse drama ocorre quando o indivíduo, percebe o estado de tensão em que se encontra mediante os riscos que existem quando realizado o engajamento pessoal com a verdade.
Verdade, engajamento e risco estão necessariamente ligados e devem ser entendidos existencialmente. A existência autêntica, que é aquela que não se contenta só com verdades especulativas, é sempre a situação existencial onde o indivíduo experimenta esta tensão entre risco e engajamento. Uma noção depende da outra, do contrário cada um delas perde seu sentido existencial.
Assim, temos que não existe verdade subjetiva sem um engajamento com esta verdade e sem riscos decorrentes desse engajamento. Assumir uma verdade é assumir as consequências dessa verdade, é viver de modo conforme a essa verdade.
Para Kierkegaard a fé é a verdade por excelência. Isso porque Kierkegaard entende que é onde mais age a paixão e, dessa forma, exige o mais auto ponto de subjetividade. Aqui é necessário cuidado, pois dessa visão Kierkegaard vai afirmar o paradoxo da fé, de modo que a fé aparece absolutamente oposta a razão. Para o filósofo, é em virtude do absurdo que o homem tem fé. Esse paradoxo vai ser muito bem explicitado em sua obra “Temor e Tremor”, onde o filósofo fala da situação quase trágica de Abraão ante o pedido de Deus para que mate seu filho Isaac. Nessa passagem se encontra o dilema entre o homem ético e o homem religioso.
Temos que ter em mente que de nenhum modo a doutrina cristã admite um total separação entre fé e razão. Ainda que realmente distintos um do outro, nunca são contraditórios entre si. Kierkegaard realmente apresenta um dificuldade que deve ser levada em conta e vista com cautela por aqueles que pretendem se aprofundar em seus escritos.
Para dirigir nossa reflexão podemos pensar o cerne do problema kierkegaardiano entre fé e razão como um paradoxo entre a razão ética e a razão religiosa, pois foi Deus quem inscreveu a lei natural no coração do homem, porem também foi ele quem pediu que Abraão transgredisse tal lei para prova-‐lo na fé. Apesar da dificuldade trazida pelo pensamento de Kierkegaard, de modo nenhum podemos pensar o dom da fé como algo que anula a lei natural que Deus inscreveu no coração do homem, pois, desse modo, afirmaríamos um Deus contraditório. De maneira contraria, podemos pensar na relação entre lei natural e lei divina como um relação de submissão daquela a esta, de modo que quando a segunda contradiz a primeira faz parte da essência da primeira aceitar a segunda. Tal pensamento, no entanto, só faz sentido a partir de uma visão de mundo metafísica, de modo que a dificuldade que Kierkegaard apresentou continua vista desde o ponto de vista existencial.
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Neste curso não pretendemos solucionar de forma absoluta o problema criador por Kierkegaard, muito menos afirmar que todo o pensamento do autor está errado por causa disso. Muito foram os que ao longo dos séculos XIX e XX trataram desse tema. Para nós, basta termos a consciência dessa visão kierkegaardiana para lermos e falarmos com cautela e consciência sobre a filosofia do autor.
c) Desespero e Angústia O homem sendo subjetivo, isto é, sendo aquele que exerce a escolha, é também aquele que
se engaja com aquilo que escolhe. Ora, todo o engajamento traz risco e devido a esses riscos o sujeito experimenta a angústia e o desespero. Assim, pode-‐se dizer que é impossível ao homem fugir do desespero e da angústia um vez que é aquele a quem os riscos de suas escolhas se apresentam. Assim, existir é necessariamente estar sob a angústia e o desespero.
Estas duas condições, apesar de serem muito parecidas, não são a mesma coisa. A angústia relaciona-‐se com o pecado e Kierkegaard sempre o faz em vista do pecado
original de Adão. Primeiramente, a angústia surge como algo anterior ao pecado, pois acontece no âmbito na inocência original, isto é, do estado do homem antes do pecado. Entre a inocência original e o pecado há a angústia como salto de um para outro.
Kierkegaard fala da inocência original como ignorância do ser do homem, isto é, ignorância sobre o bem e o mal e, acima de tudo, sobre a liberdade em escolher o mal. Podendo escolher o mal, a liberdade é também possibilidade de culpa. Para o autor não foi a proibição do pecado que angustiou o homem, mas a própria liberdade de poder escolher o pecado.
Quando o homem escolhe o mal e peca, então ele se sente culpado. Essa culpa é a angústia enquanto que procede do pecado. Além disso também é angústia procedente do pecado o conhecimento do bem e do mal que ocorre mediante a perda da inocência original. A partir disso o homem pode angustiar-‐se em relação ao mal feito ou ao bem não feito. Quando angustia-‐se em relação ao mal surge o deseja de acabar com a realidade do mal no mundo, isso, todavia, é impossível para ele. Na angústia ante o bem, que Kierkegaard chama de angústia demoníaca, o sujeito vira as costas ao bem e perde sua liberdade. Ele passa agora a viver em resistência ao eterno e permanece sempre na exterioridade do temporal e finito.
Quanto ao que o autor chama de desespero, podemos dizer que se trata de algo similar à angústia quanto a necessidade de pensar o desespero em sua dimensão existencial. Porem o desespero tende a dar-‐se em uma dimensão mais teológica.
O desespero, em sua dimensão existencial, não é simplesmente desesperar-‐se de algo, mas desesperar-‐se de si mesmo. O homem é a síntese entre o finito e o infinito, o temporal e o eterno, da liberdade e da necessidade. O desespero existencial é aquilo que desestabiliza essa síntese. É um enfermidade do espírito humano, do eu do homem. Se a angústia é a vertigem da alma ante a possibilidade do pecado, o desespero é a vertigem de si mesmo, o querer desfazer-‐se de si. Isso se dá com a rebeldia do homem em relação ao que de eterno existe nele.
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A situação existencial mais importante do homem é a de estar diante de Deus. Ao abandonar isso o homem experimental um desespero que está fora de toda a ordem emocional, um desespero profundamente enraizado em seu espírito.
O desespero acontece em relação ao finito, ao infinito, à possibilidade, à necessidade, à consciência, à inconsciência, ao terreno, ao eterno e finalmente o que o autor chama de desespero obstinado. Esses diversos modos de desesperam assinalam a crescimento da consciência do homem em sua dimensão espiritual. O homem vai se reconhecendo como uma existência diante de Deus, como um eu teológico. Sendo um eu teológico, uma existência diante de Deus, o homem se descobre pecador. As faltas humanas só são pecados por serem cometidas diante de Deus. Dessa forma, tal como a angústia o desespero se relaciona ao pecado, de modo que se diz que o desespero manifesta e supõe o mesmo.
O desespero, entretanto, prepara o sujeito para o arrependimento e o perdão. Estes são os caminhos da fé. Ela é o oposto da desordem introduzida pelo desespero pecaminoso, de modo que pode reestabelecer a existência humana em sua relação com Deus.
3. Filosofia Existencial Para Kierkegaard a filosofia existencial é na verdade um método existencial, de modo que o
pensar filosófico não é um fim em si mesmo, mas deve sempre estar voltado para a vida do sujeito. Por isso que fica muito complicado tratar o que é a existência em Kierkegaard, e mais ainda afirmar qual seja a filosofia ou o método existencial por excelência. Para o autor cada método de encarar a existência é único em cada sujeito. Por isso que falamos aqui não da existência em si, mas das condições ais quais a mesma está encerrada.
Kierkegaard não afirma um modo de existir absoluto, porem vai absolutizar as condições sob as quais todos esses modos estão.
Não há dúvida de que existem muito problema em Kierkegaard para a filosofia cristã, de modo que não se pode falar dele como um filósofo cristão no sentido estrito do termo. Entretanto seu pensamento é de fundamental importância para os demais filósofos da existência. Foi Kierkegaard quem primeiro abriu as portas para a investigação existencial do homem. Num tempo em que reinava a filosofia idealista e abstrata, Kierkegaard propôs uma filosofia que se centrasse na concretude do sujeito. Talvez devido ao clima idealista de sua época ou ao fato de ter morrido jovem, no século XIX o autor teve pouca força e notoriedade. Somente no século seguinte seu nome ressurgiu como um dos mais importantes filósofos da história da humanidade que influenciaria grande parte do pensamento do século XX.
Apesar das dificuldades que seu pensamento tem desde o ponto de vista cristão, é de fundamental importância o estudo serio de seus escritos. Tal importância, entretanto, não diminui o cuidado que o estudante de filosofia cristão deve ter para não cair em situações arriscadas como a separação absoluta entre fé e razão ou a visão do pecado como algo puramente psicológico e subjetivo.
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Gabriel Marcel (1889 – 1973)
1. Vida e Obras Gabriel Marcel nasceu em Paris. Seu pai era embaixador, diretor de Belas Artes e da Biblioteca Nacional. Como viajava constantemente possuía um vasto conhecimento cultural bem como contato com escritores e artistas. Imbuído de ideias agnósticas não batizou Marcel. Já sua mãe morreu quando ainda era bem pequeno e Marcel foi educado por seu avô e sua tia, esta era judia, mas converteu-‐se ao protestantismo. Sua educação foi marcada por um rígido moralismo. Dedicou-‐se aos estudos de filosofia em Sorbonne. Foi discípulo de Bergson no Colégio da França. Além do interesse pela filosofia, possuía igual interesse pelo teatro e pela música. Será tão bom crítico e dramaturgo quanto filósofo.
Em 1908 se forma em filosofia com uma tese sobre os a metafísica de Coleridge e sua relação com a filosofia de Scheling. Aos 20 anos já é professor de filosofia, porem seu principal interesse não foi o magistério, mas a produção filosófica e literária. De maneira especial pode-‐se frisar o estudo dos neoidealistas Bredley e Royce aos quais vai abandonar em prol da filosofia da existência. Em 1919 se casa com Jacqueline Boegner. Após a primeira guerra, Marcel passa a participar ativamente da cultura francesa e tem contato com católicos como Gilson, Maritain, Mauriac e Paul Claudel. Por exemplo de conversão desses seu amigos, Marcel torna-‐se católico e, em 23 de março de 1929, pede o batismo. Aqui já pensa a fé como sendo essencialmente uma fidelidade. Um pouco antes abandona o idealismo e abraça o pensamento existencial para responder sobre a questão de Deus. Sua crença em Deus determinou profundamente sua filosofia. Quanto às obras de Marcel pode-‐se falar de duas fases distintas. A primeira é aquela onde o autor vai delineando sua filosofia da existência. Depois vemos Marcel debruçar-‐se sobre os males do mundo olhando para as crises sociais e para a civilização cada vez menos humanizada e mais ateia. Nesse momento suas meditações irão se afastar um pouco da temática existência e assumirá um tom mais moralizante. Marcel pretende restituir a filosofia como legítima sabedoria. Do ano de 1935 até 1973, ou seja, durante cerca de 40 anos, Marcel recebia todas as 6ª feiras em sua casa um série de estudantes de filosofia e de grandes mestres para escutá-‐lo e estar com ele. Dessa forma, mesmo não sendo por vocação um mestre universitário, Marcel tinha muito contato com jovens filósofos e isso fez seu pensamento ser conhecido em toda a França. Hoje é um dos mais famosos pensadores da Europa.
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Morreu no dia 8 de outubro de 1973.
2. Fontes e Influências Gabriel Marcel foi um filósofo que pode-‐se dizer que peregrinou por várias correntes filosóficas. É de fato complicado determinar suas influências e suas fontes, porem pode-‐se dizer que alguns autores tiveram maior importância em seu itinerário filosófico. Num primeiro momento temos Marcel formado no idealismo pós kantiano. Sua tese de graduação foi sobre o pensamento de Scheling na metafísica de Coleridge. Depois Marcel passa a ser um grande admirador de Bergson. Por último temos uma fase neoidealista sobre a influência de Bradley, mas acima de tudo Royce e sua metafísica. O método de Marcel foi o mesmo método compartilhado por praticamente todos os existencialistas, isto é, a fenomenologia de Husserl. De maneira especial pode-‐se frisar o junção da filosofia vitalista de Bergson com a fenomenologia de Husserl como pensamentos que muito marcaram o autor. Deles entendemos a repulsa pelas categorias lógico matemáticas do pensamento objetivo, e o recurso a interioridade e às fontes imediatas da vida emocional como forma de iluminar os problemas filosóficos. Apesar de todas essas influências, foi a sua crença em Deus que o conduziu para o pensamento filosófico pelo qual ele seria reconhecido em toda a Europa. Preocupado com o problema da existência de Deus, e afirmando que é Deus o fundamento das individualidades finitas, Marcel percebe que só pode falar sobre a questão da existência de Deus se antes precisar o que é a existência.
3. Filosofia da Existência Ainda que de maneira dispersa, Marcel já dirige seu pensamento em volta dos problemas existenciais desde seu Journal Métaphysique. Antes mesmo antes de Jaspers começar a falar na Alemanha dos temas existenciais, Marcel já tinha colocado tal discussão na literatura francesa de seu tempo. Dentre seus principais focos de indagação destacam-‐se: -‐A Existência concreta e singular: pensada em oposição ao pensamento idealista, isto é, objetivante e abstrato. -‐A experiência imediata da consciência: não é fruto de um conhecimento objetivo ao modo idealista, mas de um conhecimento imediato e original quase que intuitivo do sujeito quanto sua Existência. Sem perceber, Marcel vai se aproximando daquela filosofia concreta de Kierkegaard, ainda que não tivesse lido suas obras nessa época. O pensar existencial aparece como uma oposição ao racionalismo metafísica racionalistas. Percebe que a filosofia sumamente
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especulativa, isto é, voltada apenas para as ideias, exclui a verdade da Existência humana. Contra isso Marcel afirma a realidade da Existência particular e a unidade entre Existência e existente. Esse dado é completamente intuitivo, a Existência não precisa ser demostrada, mas reconhecida. Tanto Existência quanto existente são dados imediatos, não precisam de mediação. Para combater o objetivismo idealista, Marcel afirma a Existência como uma presença absoluta que é anterior a própria distinção de sujeito e objeto. Abandona a máxima cartesiana do “penso logo existo”, agora diz-‐se somente “eu existo”.
A primeira consciência que o sujeito tem da própria existência é a sua consciência corporal. O indivíduo se percebe, se sente, como um corpo. Percebendo ser um corpo o indivíduo se percebe como um existente. Assim ele se vê como um existência encarnada, isto é, uma existência ligada a um corpo. Em suma o homem tem consciência de si mesmo em seu corpo
3.1. A existência Encarnada A Existência como Existência encarnada é o ponto central da filosofia existencial de Marcel.
O conhecimento que diz respeito à Existência é sempre imediato e original. Ora, nada é mais imediato e original que a consciência de ser um corpo, porem deve-‐se entender a maneira que a Existência tem de se relacionar com o próprio corpo. Marcel vai contrapor seu pensamento contra dois que seriam seus extremos, o instrumentalismo e o materialismo Para o instrumentalista o corpo é apenas um instrumento do qual a Existência faz uso. Isso seria reduzir o corpo à condição de um objeto estranho ao próprio indivíduo. Pensando desse modo o sujeito não pode mais falar de seu próprio corpo, mas de um corpo entre os outros do qual não teria nenhuma intimidade. Por outro lado deve-‐se tomar cuidado para não cair numa visão de mundo puramente materialista onde se reduz o sujeito a ser apenas o corpo. Sendo a Existência algo imaterial, ela passa a não ser nada na realidade.
A solução de Marcel é que não se pode pensar a relação corpo e Existência com uma concepção dualista onde um parece ser completamente oposto ao outro. Em vez do dualismo, Marcel propõe uma dualidade, isto é, a real distinção de existência e corpo, mas não sua separação em opostos. Entre existência e corpo existe uma unidade entitativa.
Falar de unidade entitativa não significa falar de duas substâncias que por acaso se juntaram, mas do corpo e da Existência como um só substância. Existência e corpo não se unem para formar o indivíduo, mas o corpo já é um prolongar-‐se da Existência, de modo que o indivíduo é os dois. Na análise existencial de Marcel, a Existência encarnada será o núcleo de uma dialética existencial e da relação da própria Existência com os outros e com o mundo.
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3.2. A Existência do mundo e dos outros O conhecimento sobre a Existência do mundo e dos outros também não se obtêm pela via da objetividade idealista, mas na experiência imediata e original, isto é, naquela experiência do próprio corpo. O sujeito olha pra realidade com os olhos daquilo que ele é, como os olhos de uma Existência encarnada. Uma inteligência pura ao modo idealista jamais consideraria algo como Existência. O mundo e os outros, enquanto Existência, só podem ser captados mediante aquele sentimento não objetivo que se dá no conhecimento imediato da experiência corporal. O corpo passa a ser a condição misteriosa da objetividade em geral. O sujeito percebe, a partir de seu corpo, que ele mesmo é ser no mundo, isto é, que ele está presente em um meio físico. O reconhecimento dessa presença assume um caráter de conhecimento imediato. O homem, quando toma consciência de si, já o faz como um ser no mundo, este passa então a ser anterior a qualquer objetivação racional. Além da consciência de ser um ser no mundo, o sujeito também percebe, através da experiência existencial da encarnação, a presença dos outros. O primeiro modo dessa experiência é a oposição radical entre aquilo que é um objeto e aquilo que é um outro. O primeiro é despersonalizado, não possui subjetividade. Já o segundo aparece um complemento para a própria personalidade do sujeito, uma prolongação de suas situações subjetivas, aquele com quem o sujeito mantem relações, aquilo que se pode chamar de um “Tu”. Para o “Tu” se apresentar como uma Existência para o sujeito, não basta a sua presença física ante o sujeito, pois existe aquele modo de estar presente sem verdadeiramente estar. A verdadeira experiência com o “Tu” é descrita por Marcel na teoria dos seres anônimos que estão no mesmo trem, isto é, na mesma jornada. Apesar de estarem no mesmo espaço físico, não existe senão um relação de exterioridades, até que algo diferente acontece. Um sujeito descobre um interlocutor com quem tem experiências comuns. Aquele que era um “Ele”, indiferente ao próprio sujeito, torna-‐se um “Tu” com que o “Eu” tem uma relação de comunicação. O “Tu” e o “Eu” são agora um “Nós”, uma unidade. O outro faz o sujeito descobrir a si mesmo. O sujeito se abre ao outro a partir do diálogo e do reconhecimento fraterno do outro como companheiro de destino. Para o filósofo não há como pensar o outro sem ser como ou Existência. Em suma, a Existência encarnada possui duas experiências diferentes. A experiência de ser um ser no mundo e a experiência de se comunicar com outros seres no mundo. A primeira vai permitir reconhecer a existência do mundo, a segunda a existência dos outros.
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Karl Jaspers (1883 – 1969)
1. Vida e Obras Karl Jaspers nasceu Oldenburg, Alemanha, de um
família de confissão protestante. Seus pais, entretanto, encaravam a religião como uma simples instituição social. Desde jovem recebeu um educação rigorosa a respeito da verdade, do dever, do trabalho e da lealdade. Quando à dimensão religiosa, Jaspers cresceu limitando-‐se a cumprir algumas formalidade exigidas. Apesar das aulas de religião que tinha na escola, Jaspers nunca às levou muito a serio, sempre ridicularizou as “histórias do pastor”. Quando ficou mais velho disse a seu pai que, por respeito a verdade, abandonaria a religião. Seu pai, no entanto, diz que ele tinha que honrar o dever comunitário com as instituições sociais, a religião era uma delas.
A primeira etapa de sua vida juvenil transcorreu normalmente, apesar dos problemas que tinha com a
administração da escola devido a seus espirito de independência. Além disso tinha um saúde muito frágil que acabou fazendo com que ele vivesse sempre numa grande solidão. Assim, Jaspers cresceu em meio a seus livros e a própria natureza, porem com pouco contato com outras pessoas. Desde jovem foi desenvolvendo o gosto pelo pensar filosófico. De maneira especial cresceu junto ao mar que, para ele, é presença do infinito, símbolo da transcendência e da liberdade. Seu primeiro contato com a filosofo foi através de Spinoza, de quem ele tirou a consciência do universo como totalidade.
Ao 18 anos, Jaspers descobre que possui uma doença pulmonar incurável e insuficiência cardíaca. Teria que, para sobreviver por muito tempo, assumir uma vida muito estrita. Dessa maneira o autor conhece o pessimismo e momentos de muito desespero. Tal situação de enfermidade, entretanto, vai lhe ser estimulo para o filosofar. Ela mesma será interpretada de maneira existencial.
Em 1901, inicia os estudos de jurisprudência na Universidade de Heildelberg e Munich, pretendia ser advogado. Como a ciência jurídica não lhe satisfaz, Jaspers resolve tentar ser médico e, após três períodos muda seu curso para medicina. Em 1907 conhece a irmã de um de seus colegas, Gertrud Mayer. Ela pertencia a uma piedosa família judia e Jaspers logo se apaixona por ela. Uma vez formado, ele casa-‐se com ela e recupera o otimismo que até então havia perdido. Será com ela que, aquele garoto que cresceu só vai entender a comunicação existencial. Gertrud também era muito apaixonada pelo saber e ajudou mundo seu marido em
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suas obras. Também é a Gertrud Jaspers que nosso autor deve o fato de ter se aproximado mais da bíblia. A fé judia de Gertrud transformou-‐se em Jaspers em uma filosofia bíblica.
Em 1910 Jaspers conhece o método fenomenológico de Russerl e os escritos e Max Webber. Depois de 3 anos escreve sua grande obra “Psicopatologia Geral” e depois de mais 1 ano entra em contato com as obras de Kierkegaard. Em 1916 sob à cátedra de psicologia de sua Universidade e depois de 3 anos escreve “Psicologia das Concepções de Mundo”.
Como o início da 1ª Guerra começa a definir o que seria algo muito recorrente em sua filosofia, isto é, as situações-‐limites. Em 1921 subiu à cátedra de filosofia. Esta é a primavera de suas reflexões sobre a realidade. Mergulhou nas filosofias de Platão, Plotino, Nicolau de Cusa, Descartes, Spinoza, Kant, Scheling, Hegel e, de maneira muito especial, Kierkegaard e Nietzsche. Jaspers, entretanto, ignora o aristotelismo e a escolástica. Até 1937 pública várias de suas famosas obras, entre elas, “Situação Espiritual de Nosso Tempo”, “Filosofia”, Filosofia da Existência”, “Razão e Existência”, entre outro. A partir daquele ano, entretanto, o governo nazista informa que ele vai ter que abandonar sua cátedra na faculdade por ser casado com uma judia. Mais tarde é proibido de fazer publicações, porem recusa divorciar-‐se de sua esposa e então os dois saem da Alemanha. Só em 1945, após o fim da guerra, o governo americano lhe restitui sua cátedra. Fica então em Heidelberg até 1948 quando vai para Basilea onde fica ensinado até 1961. Após isso, aposentado, Jaspers vive um vida tranquila com sua esposa até 26 de fevereiro de 1969.
2. Por que um Filosofia da Existência? As vezes é difícil entender como que um médico e cientista como Jaspers acabou se
tornando um dos maiores pensadores existenciais do século XX. De fato, fica mais fácil entender seu pensamento se levarmos em conta com que o autor está dialogando ao escrever.
Primeiramente observa-‐se forte influência do pensamento kantiano na filosofia de Jaspers. De fato, nosso filósofo olha para Kant com grande respeito e admiração. Muito diferente da maioria dos pensadores existenciais que simplesmente pretendiam superar o idealismo iniciado em Kant, Jaspers pretende um diálogo com este. Sem desejar abandonar o que foi dito antes, Jaspers quer encontrar o Ser Absoluto e o ser em si das coisas, ainda que na filosofia kantiana e idealista isso seria algo impossível.
Além disso muito incomoda nosso autor a visão cientificista de sua época. Ele chega a afirmar que fizeram da ciência um superstição, ou ainda, um pseudociência. Jaspers não admite a pretensão dos cientistas de afirmarem coisas sobre o homem que escapam do objeto e método científico. Em sua obra Filosofia da Existência, Jaspers afirma que, com o idealismo a filosofia deixou de dar as respostas fundamentais à vida humana e a ciência acabou por pretender dizer ao homem quem ele é, de onde ele veio e para onde ele vai.
Dialogando com tais formas do pensar, Jaspers vai tentar colocar a ciência em seu lugar e devolver à filosofia seu estatuto de um pensamento universal. De fato do conhecimento do ser
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empírico, ao qual as ciências empíricas tem acesso, não pode ser dado como conhecimento de todo o Ser, pois de tal forma se acabaria reduzindo o Ser a algo que ele não é.
Para isso Jaspers vai tentar dar um resposta existencial ao problema do conhecimento de ser em si e do Ser absoluto para recuperar a filosofia como a disciplina que dá conta daquelas perguntas universais sobre o homem mesmo, isto é, de onde ele vem, para onde ele vai e qual o sentido de sua vida.
3. O Filosofar desde a Existência Possível Para chegar o ser em si e ao Ser absoluto, Jaspers entende que deve ultrapassar a teoria
kantiana da consciência. Tal teoria diz que tudo o que o sujeito conhece é aquilo que se apresenta como um objeto à sua consciência de sujeito. Isso é o que o autor chama de dicotomia sujeito-‐objeto. Isso significa que sempre que há conhecimento há um objeto que se apresenta a um sujeito. Nessa dicotomia fica impossível falar do ser em si da coisas e muito menos do Ser Absoluto.
Jaspers entende o ser em si como o ser das coisas independente de ser um objeto para um sujeito. O problema é que sempre que se tentasse conhecer esse ser em si imediatamente ele seria convertido num objeto e, dessa forma, não mais se estaria conhecendo o ser em si, mas o ser objeto.
O autor em nenhum momento nega a necessidade dessa dicotomia para o conhecimento, porem procura dar um outro modo de alcançar esse ser em si que não seja conhecer. Para isso nosso filósofo vai buscar um dimensão do sujeito que possa dar conta dessa tarefa.
Para Jaspers o sujeito é antes de mais nada um acontecimento único e irrepetível, um ser específico ao qual nenhum outro se assemelha É um existente empírico, um ser que vive empiricamente no mundo e que, por isso, é também objeto de conhecimento de outros sujeito e de si mesmo. Apesar dessa irrepetitividade do indivíduo, ele também possui um dimensão que é igual de todo e qualquer sujeito. Pode parecer contraditório, mas não é. O homem é irrepetível enquanto existente empírico, porem é igual a todos os outros enquanto que uma consciência geral para a qual os objeto são. Isso explica, por exemplo, o fato de não haver confusão entre os homens no conhecimento das coisas empíricas. Todo o homem que percebe uma cadeira a percebe, empiricamente, como qualquer outro homem, de modo que todas as consciência individuais tem algo em geral que permite o conhecimento das coisas.
Existente empírico e consciência geral são as dimensões do sujeito que estão dentro da dicotomia sujeito-‐objeto, de modo que, apesar de ambas terem sua importância no filosofar, não são suficientes para alcançar o ser em si das coisas.
Jaspers então afirma uma terceira dimensão do sujeito. Este é uma incondicionalidade. De fato, quando o indivíduo pensa e age, ele se percebe como origem autêntica desse pensar e agir. Não é outro senão eu quem pensa o que pensa e quem faz o que faço. Por ser essa origem, o sujeito entende que ele é mais do que uma simples consciência empírica para a qual
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tudo se apresenta. Ele não tem experiência empírica dessa origem que ele mesmo é. Aqui, o homem se descobre como uma Existência incondicionada.
O problema é que a Existência não pode ser objeto de nada, pois não há experiência empírica dela. O sujeito, entretanto, tem plena certeza de ser uma Existência na medida que é essa origem incondicionada de seu pensar e agir. Assim, para não afirmar a Existência como algo que é ou não é, pois isso já seria dar-‐lhe um estatuto empírico, Jaspers fala da Existência do homem como algo que se exerce plenamente ou se exclui totalmente. Dessa forma o homem não é uma Existência, mas uma Existência possível de exercer-‐se ou não.
Essa terceira dimensão do homem, a de uma Existência Possível, é donde o autor vai partir o que para ele é o verdadeiro filosofar. Sendo ela inobjetiva, pode dar conta do que também não se faz objeto, isto é, do ser em si.
A Existência Possível vai romper a dicotomia sujeito-‐objeto sem anular a mesma. O ser em si que para o Existente Empírico é um fantasia e para a Consciência em Geral é um limite, aparece como algo acessível à Existência Possível.
Esse filosofar a partir da Existência possível vai surgir em três vias, de modo que cada uma delas vai cuidar daquilo que o autor chama de Abrangente, isto é, algo que sem ser sujeito nem objeto abrange os dois. Tal noção é muito parecida com aquilo que o filósofo pensa que deve ser o ser em si. Dentre estas vias, a mais importante e que vai dar o nome de Filósofo da Existência à Karl Jaspers será o Esclarecimento da Existência, que no fundo é a sua propriamente a sua Filosofia da Existência.
4. Esclarecimento da Existência Esta é a Filosofia da Existência propriamente dita no pensamento de Jaspers. O filósofo não
pretende uma análise da Existência, mas um esclarecimento da mesma. Sendo ela um abrangente, nunca pode surgir como um objeto, de modo que não pode ser racionalmente conhecida. Dai o uso do termo Esclarecimento para falar dela. Porem, somente falara da Existência já nos trás um novo problema.
Quando falamos de Existência continuamos a falar de algo bem objetivo, afinal não se pode falar de algo sem que se faça desse algo um objeto. Dessa forma, Jaspers vai eapresentar a noção de símbolos. Através dos símbolos o sujeito pode falar daquilo que é inobjetivo de maneira objetiva. Quando falamos “Existência” ou “ser em si”, não estamos falando dessas coisas mesmas, mas estamos usando palavras que simbolizem essas realidades. Deve-‐se ainda tomar muito cuidado para não acabarmos falando de um mundo das Existência como um mundo paralelo ao mundo empírico. De fato há somente um mundo, porem as realidades existenciais que permeiam esse mundo são simbolizadas em palavras e conceitos que, sem esgotar o que elas são, servem para falar delas da maneira como nossa linguagem empírica permite.
Jaspers afirma que quanto mais refinada for nossa linguagem empírica, melhor podemos falar daquelas coisas que ultrapassam essa realidade. Há aqui uma grande harmonia entre o
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conhecimento das coisas objetivas e a aclaração das inobjetivas. Se temos um Consciência em Geral para a qual se apresentam as coisas empíricas, também há a chamada Consciência Absoluta para a qual os símbolos revelam sua dimensão existencial. Em nenhum momento o autor pretende negar a validade do conhecimento racional, mas deseja falar de um conhecimento transracional que é capaz de atingir as coisas em si não pela razão, mas pela Existência. Todo Esclarecimento existencial é um voltar-‐se a si mesmo, no sentido de origem autêntica do pensar e do agir. Disso o sujeito pode partir não só para o em si das coisas, mas para a Ser Absoluto.
De maneira muito especial podemos ainda falar das Situações Limites dentro do tema do Esclarecimento da Existência, pois é nessas situações que o sujeito percebe seus limites e se abre à Transcendência. Em Jaspers, Existência, por mais importante que seja, é insuficiente à si mesmo, de modo que nos limites que lhes são próprios encontra o Fracasso que pode ou fazê-‐la fechar-‐se nas coisas empíricas e seguras, ou a ajudar a dar o salto rumo a Transcendência que a completa. Isso entretanto já não é mais sua Filosofia da Existência, mas sua Metafísica.
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Linha Cronológica:
1813 – Nasce Sören Aabye Kierkegaard 1821 – Nasce Fiódor Dostoiévski 1830 – Kierkegaard começa a estudar teologia na Universidade de Copenhague 1833 – Nasce Wilhelm Dilthey 1837 – Kierkegaard conhece Regina Olsen 1838 – Morre o pai de Kierkegaard – Kierkegaard escreve a crítica à Andersen 1840 – Kierkegaard torna-‐se noivo de Regina Olsen 1841 – Kierkegaard separa-‐se de Regina Olsen – Kierkegaard assiste as lições de Schelling – Kierkegaard conclui seu doutorado sobre a tese “Sobre o Conceito da Ironia” 1843 – Regina Olsen volta com seu primeiro pretendente, Frederico Schelegel – Kierkegaard publica Aut-‐Aut – Kierkegaard publica Temor e Tremor com o pseudônimo Johannes de Silentio. – Kierkegaard publica A repetição com o pseudônimo Constantino Constantius 1844 – Kierkegaard publica Begrebt Angest com o pseudônimo Vigilius Haufniensis – Kierkegaard publica Philosophiske Smuler com o pseudônimo de Johannes Climacus – Nasce Friedrich Nietzsche 1845 – Kierkegaard começa sua polêmica com “Corsário” – Kierkegaard publica Stadier paa Livest Vei com o pseudônimo Hilarius Bogbinder 1847 – Kierkegaard publica Dialética da comunicação Ético-‐Religiosa 1848 – Kierkegaard publica Sygdommen til Doeden com o pseudônimo Johannes Anticlimacus 1855 – Morre Soren Kierkegaard 1859 – Nasce Edmund Husserl – Nasce Henri Bergson – Nasce John Dewey 1864 – Nasce Max Weber – Nasce Miguel de Unamuno – Dostoievski publica Notas do Subterrâneo 1866 – Nasce Leon Chéstov 1874 – Nasce Nicolai Berdiaev – Nasce Max Scheler 1878 – Nasce Martin Buber 1883 – Nasce Karl Jaspers – Nasce Franz Kafka – Nasce José Ortega Y Gasset 1886 – Nasce Paul Tillich – Nasce Karl Barth 1896 – Bergson publica Matéria e Memória 1897 – Max Weber se torna professor de Economia Nacional em Heidelberg. 1888 – Nasce Jean Wahl 1889 – Nasce Gabriel Marcel
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– Nasce Martin Heidegger 1891 – Nasce Edith Stein 1900 – Chéstov publica A ideia de Bem em Tolstoi e Nietzsche – Morre Nietzsche 1901 – Jaspers começa a estudar medicina após abandonar a faculdade direito – Husserl publica Investigações Lógicas 1903 – Chéstov publica Filosofia da Tragédia 1905 – Nasce Jean-‐Paul Sartre – Nasce Emmanuel Mounier 1906 – Nasce Hannah Arendt 1907 – Bergson publica A Evolução Criadora – Wahl conhece Bergson e torna-‐se seu discípulo 1908 – Marcel forma-‐se na faculdade – Jaspers começa sua preparação para o doutorado em medicina. – Nasce Simone de Beauvoir – Nasce Maurice Merleau-‐Ponty 1910 – Jaspers casa-‐se com Gerturd Mayer; conhece as obras de Husserl; começa a estudar os escritos Webber 1911 – Berdiaev publica Filosofia da Liberdade – Morre Dilthey 1913 – Jaspers publica Algemeine Psycophatologie – Husserl publica Ideias Relativas a uma Fenomenologia Pura – Unamuno publica Sobre o Sentido Trágico da Vida – Nasce Paul Ricoeur – Edith Stein ingressa na Universidade de Gotinga onde conhecerá Husserl – Nasce Albert Camus 1914 – Jaspers Descobre as obras de Kierkegaard – Ortega Y Gasset publica Eu Sou Eu e Minhas Circunstâncias 1919 – Marcel case-‐se com Jacqueline Boegner – Jaspers publica Psycologie der Weltanschauungen 1920 – Morre Max Weber 1921 – Jaspers assume a cátedra de filosofia em Springer 1922 – Buber publica Eu e Tu 1924 – Morre Kafka 1925 – Marcel publica Existence et objectivité 1927 – Marcel publica Journal Métaphysique – Heidegger publica Ser e Tempo 1829 – Morre Scheler 1929 – Marcel Converte-‐se ao catolicismo e é batizado – Simone de Beauvoir ingressa na Universidade de Sorbonne onde conhece Sartre e Merlau-‐Ponty 1930 – Unamuno publica São Manuel Bueno, Martir 1931 – Chéstov publica Sobre o Destino do Homem – Nasce Colin Wilson
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1932 – Jaspers publica Philosophie: Weltorientierung; Existenzerkellung; Methaphysik! – Bergson publica Duas Fontes da Moral e da Religião 1933 – Sartre descobre a fenomenologia de Husserl e a filosofia de Heidegger – Começa o Terceiro Reich 1935 – Marcel publica Être et Avoir 1936 – Chéstov publica Kierkegaard e a Filosofia Existencial – Berdiaev publica Cinco Meditações Sobre a Existência – Morre Unamuno 1937 – Jaspers publica Existenzphilosophie. O governo nazista tira sua cátedra por sua esposa ser judia. Karl e Gertrud Jaspers sem da Alemanha. 1938 – Sartre publica A Náusea – Morre Husserl – Morre Chéstov – Berdiaev publica Espírito e Realidade 1940 – Marcel publica Du Refus à l`invocation – Maurice Merleau-‐Ponty publica Humanismo e o Terror – Morre Bergson 1942 – Morre Edith Stein – Sartre e Camus se conhecem 1943 – Sartre publica O Ser e o Nada 1944 – Marcel publica Homo Viator 1945 – Termina a Segunda Guerra Mundial – Fim do Terceiro Reich – Jaspers é restituído em sua cátedra na Alemanha pela administração americana. Fica encarregado de reestruturar a faculdade. 1946 – Berdiaev publica Ensaio de Metafísica Escatológica 1948 – Jaspers publica Der Philosophie Glaube – Morre Berdiaev 1950 – Morre Mounier 1951 – Marcel publica Le mystère de l’étre! 1952 – Marcel publica Les hommes contre l`hunian – Sartre e Camus se desentende devido a publicaçnao da obra de Camus O Homem Revoltado – Morre Dewey 1955 – Marcel publica L’homme problématique – Morre José Ortega Y Gasset 1956 – Colin Wilson publica The Outsider e propõe o Neoexistencialismo 1958 – Simone de Beauvoir publica Memorias de uma Moça Bem Comportada. 1960 – Morre Albert Camus 1961 – Morre Maurice Merleau-‐Ponty 1962 – Jaspers publica Der Philosopische Glaube Angesichts der Affenbarung 1965 – Morre Martin Buber – Morre Tillich 1967 – Morre Jean Wahl
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1968 – Morre Karl Barth 1969 – Morre Karl Jaspers 1973 – Morre Gabriel Marcel 1975 – Morre Hannah Arendt 1976 – Morre Martin Heidegger 1980 – Morre Jean-‐Paul Sartre 1986 – Morre Simone de Beauvoir 2005 – Morre Paul Ricoeur 2013 – Morre Colin Wilson
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