introduÇÃo ao estudo da neuroanatomia -...

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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA NEUROANATOMIA I - Generalidades Quanto mais se estuda o sistema nervoso cada vez menos se pode dissociar o estudo anatômico da abordagem multidisciplinar neste contexto. Para acolher essa interdisciplinaridade, criou-se há alguns anos o dispensável nome de Neurociência. Após uma longa evolução, as neurociências afirmam-se, hoje em dia, como o estudo do sistema nervoso, das suas composições moleculares e bioquímicas, e as diferentes manifestações deste sistema e do tecido através das nossas atividades intelectuais, tais como a linguagem, o reconhecimento das formas, a resolução de problemas e a planificação das ações. Até o século XVIII - função glandular, proposta de Galeno. No final do século XIX seu estudo tornou-se mais preciso devido às técnicas histológicas, Camilo Golgi (MO) descreveu a célula nervosa com corpo, dendritos e axônio. Ramon e Cajal marcaram células individualizadas, demonstrando que o SN não é uma massa contínua de células, mas uma intrincada rede de células, o qual conecta-se ao outro somente em partes especializadas de interação chamada sinapse (doutrina do neurônio). Esta proposta foi sustentada pela embriologia (Harrison), achando que a ponta do axônio dá origem ao cone de crescimento, o qual chefia o avanço do axônio ao seu alvo. No final do século XVIII (Galvani) - surge a neurofisiologia, descobrindo que a atividade da célula nervosa fornece uma maneira de conduzir o sinal que transporta informações de uma célula a outra. A farmacologia surge no final do século XIX, demonstrando que drogas interagem com receptores específicos sobre a célula, base da transmissão sináptica química. A quinta disciplina para o entendimento do cérebro, a psicologia, foi inicialmente formulada por filósofos da Grécia, seguidos por René Descartes, David Hume e John Locke. Após a metade do século XIX teve início a observação individual do comportamento através de Charles Darwin, proporcionando a análise do comportamento científico: a psicologia experimental (estudo do comportamento em laboratório) e a etiologia ( estudo do comportamento na natureza). II - Conceitos:

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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA NEUROANATOMIA

I - Generalidades

Quanto mais se estuda o sistema nervoso cada vez menos se

pode dissociar o estudo anatômico da abordagem multidisciplinar

neste contexto. Para acolher essa interdisciplinaridade, criou-se há

alguns anos o dispensável nome de Neurociência.

Após uma longa evolução, as neurociências afirmam-se, hoje em dia, como o

estudo do sistema nervoso, das suas composições moleculares e bioquímicas, e as

diferentes manifestações deste sistema e do tecido através das nossas atividades

intelectuais, tais como a linguagem, o reconhecimento das formas, a resolução de

problemas e a planificação das ações.

Até o século XVIII - função glandular, proposta de Galeno.

No final do século XIX seu estudo tornou-se mais preciso devido às técnicas

histológicas, Camilo Golgi (MO) descreveu a célula nervosa com corpo, dendritos e

axônio. Ramon e Cajal marcaram células individualizadas, demonstrando que o SN não é

uma massa contínua de células, mas uma intrincada rede de células, o qual conecta-se

ao outro somente em partes especializadas de interação chamada sinapse (doutrina do

neurônio). Esta proposta foi sustentada pela embriologia (Harrison), achando que a ponta

do axônio dá origem ao cone de crescimento, o qual chefia o avanço do axônio ao seu

alvo.

No final do século XVIII (Galvani) - surge a neurofisiologia, descobrindo que a

atividade da célula nervosa fornece uma maneira de conduzir o sinal que transporta

informações de uma célula a outra.

A farmacologia surge no final do século XIX, demonstrando que drogas interagem

com receptores específicos sobre a célula, base da transmissão sináptica química.

A quinta disciplina para o entendimento do cérebro, a psicologia, foi inicialmente

formulada por filósofos da Grécia, seguidos por René Descartes, David Hume e John

Locke. Após a metade do século XIX teve início a observação individual do

comportamento através de Charles Darwin, proporcionando a análise do comportamento

científico: a psicologia experimental (estudo do comportamento em laboratório) e a

etiologia ( estudo do comportamento na natureza).

II - Conceitos:

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2.1 - Sistema Nervoso: É um conjunto de órgãos responsáveis pela coordenação e

integração dos demais sistemas orgânicos, relacionando o organismo com as variações

do meio externo e controlando o funcionamento visceral.

2.2 - Neuroanatomia: É à parte da Anatomia que estuda o sistema nervoso. VIII -

Alguns conceitos importantes em neuroanatomia:

III - Alguns conceitos importantes em neuroanatomia:

1. Célula Nervosa (neurônio): são células altamente excitáveis, comunicam-se

entre si ou com células efetuadoras usando basicamente uma linguagem elétrica. Nos

vertebrados após a diferenciação os neurônios não se dividem, ou seja, após o

nascimento não são mais produzidos novos neurônios.

1.1 - Constituição:

1.1.1 - Corpo celular ou soma - tem tamanho

muito variado, geralmente triangular ou piramidal; parte da célula

que contém o núcleo-centro metabólico do neurônio. É rico em

organelas citoplasmáticas.

1.1.2 - Prolongamentos:

a) Dendritos - geralmente são curtos e ramificam-

se em prolongamentos cada vez mais fino. São especializados em

receber o estímulo.

b) Axônio (fibra nervosa) - tem diâmetro de 0,2 a 20 µm e estende-se até 1 metro; é especializado em gerar e conduzir o estímulo, é a unidade condutora, mantém a capacidade de um transiente elétrico que quando modificado determina o potencial de ação.

c) Bainha de mielina: é uma bainha de tecido gorduroso que envolve as fibras nervosas agindo como meio isolante

2 - Tipos de células:

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2.1 - Quanto à função:

2.1.1 - Neurônio sensitivo: levam informações ao sistema nervoso central.

2.1.2 - Neurônio motor: levam a resposta elaborada ao orgão efetuador da

resposta.

2.1.3 - Neurônio de associação: analisa as informações, armazena sob a

forma de memória, elabora padrões de resposta ou geram respostas espontâneas.

Quanto maior o número de neurônio de associação participando melhor o padrão da

resposta.

2.2 - Quanto à morfologia:

2.2.1 - Pseudo-unipolar - tem o corpo celular localizado no gânglio

(neurônios sensitivos)2.2.2 - Bi-polar - possui dois prolongamentos que deixam o corpo celular

(dendrito e axônio) São encontrados na retina e no gânglio espiral do ouvido interno

(neurônios sensitivos).

2..2.3 - Multi-polar - Possui vários dendritos e apenas um axônio

(neurônios motores).

3 - Sinapses:1.3.1 - Elétricas

1.3.2 - Químicas

4 - Cadeia neuronal: é a disposição dos neurônios no circuito ou vias nervosas.

5 - Neuróglia: tem como funções sustentação, revestimento ou isolamento,

modulação da atividade neural e defesa (fagocitose). Conserva a capacidade de realizar

mitose (crescimento)

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5.1 - No sistema nervoso central: Oligodendrócitos (produzem a

bainha de mielina)

5.2 - No sistema nervoso periférico: Células de Schwann (produzem a

bainha de mielina)

6 - Substância branca e cinzenta:6.1 - Substância branca: formada pelo predomínio de fibras nervosas

envolvidas por bainha de mielina.

6.2 - Substância cinzenta: formada pelo predomínio de corpos celulares dos

neurônios.

IV - Considerações sobre algumas propriedades fundamentais das células:

3.1 - Irritabilidade

3.2 - Conductibilidade

3.3 Contratilidade

V - Filogênese do sistema nervoso:

1 - Seres unicelulares (protozoários) - possuem apenas reações rudimentares,

não se especializaram.

2 - Fibras neuromusculares primitivas (espongiários)3 - Neurônios primitivos (celenterados) - células especializadas em irritabilidade

ou excitabilidade e condutibilidade

3.1 - Receptores

4 - Centralização do sistema nervoso (anelídeos):4.1 - Neurônios sensitivos

4.2 - Neurônios motores

4.3 - Neurônios de associação

4.4 - Arcos reflexos:

4.4.1 - Intra-segmentares

4.4.2 - Inter-segmentares

5 - Evolução dos três neurônios fundamentais:5.1 - Neurônios sensitivos - superficiais. Diferenciam-se em células capazes

de receber os estímulos do meio ambiente.

5.2 - Neurônios motores - nos metazoários passam a ser mais profundos.

Levam a resposta elaborada ao órgão efetuador da resposta (músculo ou glândula). 5.3 -

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5.3 - Neurônios de associação - profundos. Analisa as informações,

armazena sob a forma de memória, elabora padrões de resposta ou geram respostas

espontâneas. Quanto maior o número de neurônios de associação participando em uma

via nervosa, mais elaborada será a resposta. (anelídeos)

VI - Divisão do sistema nervoso:

1. Critério Morfológico:1.1 - Sistema Nervoso Central: a parte do sistema nervoso situado dentro da

caixa craniana e no canal vertebral. Analisando as informações, armazena sob a forma de

memória, elabora padrões de resposta ou geram respostas espontâneas.

1.1.1 - Encéfalo

1.1.2 - Medula espinhal

1.2 - Sistema Nervoso Periférico: É a parte do sistema nervoso situada fora

da caixa craniana e do canal vertebral, interligando o SNC a todas as regiões do corpo.

2. Critério Funcional:2.1 - Sistema Nervoso Somático (SNS) - aquele que relaciona o indivíduo

com o meio externo (meio ambiente). Sistema de vida de relação.

2.2 - Sistema Nervoso Visceral (SNV)- se relaciona com a inervação e

controle das estruturas viscerais (meio interno). Sistema de vida vegetativa.

3. Critério por Segmentação:3.1 - Sistema Nervoso Segmentar - é aquele sistema que se relaciona com

os nervos espinhais e nervos cranianos (M.E e T.E).

3.2 - Sistema Nervoso Supra-segmentar - aquele que não se relaciona aos

nervos. Cérebro e cerebelo. Obs - O I e II nervos não são nervos típicos.

VII - Sistema nervoso central:É aquele que se localiza dentro do

esqueleto axial.

1. Encéfalo: dentro do crânio neural.

1.1 - Cérebro ( Hemisférios Cerebrais D e

E )

1.1.1 - Telencéfalo

1.1.2 - Diencéfalo

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1.2 -Tronco cerebral (encefálico):

1.2.1 - Mesencéfalo

1.2.2 - Ponte

1.2.3 - Bulbo (Medula Oblonga)

1.3 - Cerebelo ( Hemisférios

Cerebelares D e E )

2. Medula espinhal: dentro do canal

vertebral.

VIII - Sistema nervoso periférico:

1. Terminações Nervosas: estruturas

situadas na extremidade livre das fibras nervosas

com capacidade de transformar energia em

impulso elétrico (receptor) e vice-versa) (efetor)

1.1 - Sensitivas (receptores) - podem

ser classificados em gerais e especiais/somáticas

ou viscerais. Localizam-se na superfície (pele,

neuroepitélio) ou no interior (músculos, tendões

ou vísceras)

1.2 - Motoras (efetores) - somáticas ou viscerais

2. Nervos: são cordões esbranquiçados constituídos por um conjunto de fibras

nervosas envolvidas por bainha de mielina.

2.1 - Espinhais

2.2 - Cranianos

2.3 - Classificação quanto à função das fibras nervosas:

a - Nervos sensitivos

b - Nervos motores

c - Nervos mistos

3. Gânglios: São aglomerados de corpos de neurônios fora do SNC.

3.1 - Sensitivos

3.2 - Motores (viscerais)

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IX - Distribuição da substâncias branca e cinzenta no SNC:

1 - Substância Cinzenta:

1.1 - Distribuição na medula espinhal

1.2 - Distribuição no tronco cerebral

1.3 - Distribuição no cérebro e cerebelo:

1.3.1 - Córtex

1.3.2 - Núcleos

2 - Substância Branca:

2.1 - Distribuição na medula espinhal:

2.1.1 - Funículos

2.1.2 - Fascículos

2.1.3 - Tratos

2.2 - Distribuição no tronco cerebral:

2.2.1 - Fascículos

2.2.2 - Tratos

2.2.3 - Lemniscos

2.3 - Distribuição no cérebro e cerebelo:

2.3.1- Centros brancos

medulares

X - Organização morfo-funcional do sistema nervoso:

1. Concepção Clássica:

1.1 - Vias aferentes: trazem informações ao sistema nervoso central

1.1.1 - Receptor

1.1.2 - Gânglio sensitivo

1.2 - Vias de Associação: analisa as informações, armazena sob a forma

de memória, elabora padrões de resposta ou geram respostas espontâneas. Quanto mais

neurônios de associação mais refinada será a resposta.

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1.2.1 - No sistema nervosos central

1.3 - Vias eferentes: levam a resposta elaborada ao órgão efetuador da

resposta (músculo ou glândula)

1.3.1 - Efetor (efetuador)

2. Concepção Moderna ( LÚRIA)

2.1 - Bloco Energético (de regulação do tônus cortical, da vigília):

2.1.1 - Formação Reticular

2.1.2 - Sistema Ativador Reticular Ascendente (SARA)

2.1.3 - Área de controle do comportamento emocional

2.2 - Bloco Sensitivo (de recebimento, elaboração e conservação de

informações):

2.2.1 - áreas primárias (análise)

2.2.2 - áreas secundárias (síntese)

2.2.3 - áreas terciárias (integradora)

2.3 - Bloco Motor (de planejamento, de elaboração, execução e

acompanhamento):

2.3.1 - áreas primárias (aprendizagem motora)

2.3.2 - áreas secundárias (automatiza movimentos)

2.3.3 - áreas terciárias (elabora padrão motor)

X - O Cérebro de Lúria

O neurologista soviético A. R. Lúria encara o

cérebro como um sistema dinâmico desdobrado

em três blocos funcionais. Lúria tem-se

posicionado contra um enfoque localizacionista

estreito, postulando a abordagem do estudo do

cérebro dentro de um princípio holístico, baseado

na idéia de que os processos psicológicos em

larga escala operam em sistemas funcionais. Isto

significa que em qualquer lesão que determine

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uma deficiência numa capacidade cerebral específica atuaria determinando repercussões

também no sistema.

Os três blocos principais do cérebro luriano estão intimamente integrados e cada um

desempenha papel especial na atividade psíquica. O primeiro bloco funcional está

relacionado com a manutenção do tono do córtex, estado indispensável para o correto

processamento do recebimento e elaboração da informação, assim como dos processos

de formação de perguntas e controle de execução. O segundo bloco é responsável pelo

reconhecimento, elaboração e conservação da informação a partir dos aparelhos do

próprio corpo do indivíduo. E, finalmente, o terceiro bloco elabora os programas de

comportamento, responde pela sua realização e participa do controle de sua execução.

É fundamental para o funcionamento do primeiro bloco a intervenção do sistema

ativador reticular ascendente (SARA), localizado nas projeções superiores do tronco

encefálico, que assegura o tono geral do cérebro ou do estado de vigília e atenção do

córtex. O sistema reticular mantém o indivíduo em vigília, e até em estado de alerta, tanto

para o recebimento das informações como para a formação de programas. A essa

vertente incorpora-se o sistema límbico, cujo papel é fundamental na regulação dos

processos vegetativos, na vida ativa e na conservação dos vestígios da memória. O

comprometimento do sistema límbico (em animais e no homem) modifica

substancialmente o tono do córtex e determina profundo comprometimento da memória.

Se o sistema reticular ativador ascendente (primeiro bloco) é fundamental para a

ativação do córtex cerebral e manutenção da vigília, igualmente importante é a existência

de um controle cortical da atividade reticular. Este circuito córtico-retículo-cortical

(reverberante) seria responsável não só por uma “vigília de escolha” mas, até mesmo,

pelo estado de atenção do organismo. Segundo Lúria: “O funcionamento deste bloco não

está relacionado especialmente com os outros órgãos dos sentidos e tem um caráter

“modal* não específico”, assegurando o tono geral do córtex. * (referente à modalidade sensorial:

dor, tato, pressão, visão, audição)

Já o segundo bloco está ligado ao trabalho de análise e síntese dos sinais

provenientes do meio externo, através do recebimento, processamento e conservação da

informação que chega ao organismo humano. Este bloco é composto por áreas situadas

nas sessões posteriores do córtex cerebral (área parietal, temporal e occipital) em íntima

relação com os órgãos dos sentidos e sua atuação tem caráter “modal específico”. Esta

unidade funcional atua mediante um sistema de dispositivos centrais que registram as

informações visuais, auditivas e táteis, processam-na ou “codificam-na” e conservam na

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memória os vestígios da experiência adquirida. As áreas deste bloco podem ser

consideradas extremidades centrais (corticais) dos sistemas perceptivos (analisadores),

sendo que as extremidades corticais do analisador visual estão situadas na região

occipital, as auditivas na região temporal e as áreas táteis na região parietal. As áreas

primárias ou de projeção do córtex cabe a função de fracionar (analisar) a informação

recebida, enquanto às áreas secundárias cabe a função de unificar (sintetizar) ou

preceder a uma elaboração complexa da informação que chega ao indivíduo. Nesse

sentido, as estimulações das áreas primárias do córtex visual (campo 17*) determinam no

indivíduo sensações visuais sem forma definida, por assim dizer elementares, sob forma

de “luzes coloridas”, “bolas luminosas”, etc.

Entretanto, a estimulação das áreas visuais secundárias (campo 18 e 19*) determina a

sensação de objetos com formas definidas ou de seres animados (televisor, margarida,

cachorro, rosto conhecido, etc. ). O mesmo ocorre por ocasião da estimulação da área

auditiva primária, que provoca a audição de ruídos, zumbidos ou de sons isolados,

diversamente da excitação das áreas secundárias, que tem como corolário a audição de

melodias, palavras ou frases.

Na opinião de Lúria, as áreas primárias e secundárias não esgotam os aparelhos

corticais deste bloco. Sobre elas edificam-se as áreas terciárias do córtex, que asseguram

as formas mais complexas de funcionamento deste bloco. Estas áreas terciárias

aparecem nas etapas mais tardias do desenvolvimento filogenético e parecem ser

formações especialmente humanas, as áreas terciárias localizam-se na encruzilhada

parieto-têmporo-occipital e compreende os campos 39, 40 e 37 das áreas parietais

inferiores do córtex. O comprometimento dessas áreas determina uma dificuldade para

realizar uma codificação complexa da informação recebida, particularmente de unificar em

esquemas espaciais simultâneos as estimulações sucessivas que chegam ao cérebro.

Em virtude disso, os indivíduos com lesão dessas áreas têm dificuldades de se orientar no

espaço, de estruturar figuras geométricas, de localizar países no mapa geográfico, além

de confundir os lados direito e esquerdo. Enfim, ocorrem nestes indivíduos sérios

distúrbios do esquema corporal, além de dificuldades também com operações

matemáticas.

A atividade consciente do indivíduo começa com o recebimento e processamento de

informações e termina com a formação do respectivo programa de ação mediante a

execução de atos exteriores (motores) ou interiores (mentais). O terceiro bloco do cérebro

responde pela programação, a regulação e o controle do desempenho do indivíduo. O

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funcionamento deste bloco depende das áreas anteriores do cérebro, particularmente dos

lobos frontais.

As áreas anteriores do córtex, de modo análogo às posteriores, guardam uma estrutura

hierárquica, com a diferença de que as áreas primárias do córtex motor não são as

primeiras a serem acionadas, mas sim as últimas. A área primária ou de projeção deste

bloco é a região motora do córtex (área 4 de Brodmann). Esta região é responsável pela

exteriorização do ato motor. No dizer de Lúria: “Essa região prepara o lançamento dos

impulsos motores e cria a “melodia cinética” que põe em funcionamento as “teclas” da

área motora do córtex. A região pré-motora (área 6 de Brodmann). tem uma participação

importante na criação de habilidades motoras, de tal sorte que um elo motor seja

adequado e harmoniosamente substituído por outro. A desintegração funcional dessa área

não determina paralisia, como ocorre nas lesões da área motora (área 4 ), mas

desorganiza o ato motor de tal sorte que o mesmo perde a sua “seqüência e harmonia”.

Sobre a área pré-motora estruturam-se as áreas terciárias do córtex cerebral, também

denominadas de região pré-frontal (áreas 9, 10, 11 e 46 de Brodmann), de formação

completamente diferente. Esta região pré-frontal está apenas esboçada em certos

vertebrados, tem representação modesta nos símios e apresenta desenvolvimento

exuberante no homem. Representando aproximadamente um terço dos hemisférios

cerebrais, o córtex pré-frontal pode ser considerado formação específica humana. As

áreas da região pré-frontal estão conectadas a todas as áreas do cérebro e à formação

reticular.

Este interrelacionamento conspícuo com as demais áreas do cérebro e, em especial,

com a formação reticular permite aos lobos frontais a manutenção do tono do córtex

cerebral. O papel ativador dos lobos frontais pode ser demonstrado mediante um estímulo

de tensão intelectual (a elaboração de um cálculo complexo, por exemplo) que induz ao

aparecimento nas áreas frontais de ondas lentas especiais, que se propagam a outras

áreas do córtex e que foram denominadas ondas da expectativa por Grey Walter.

Esse papel ativador dos lobos frontais decai no indivíduo com patologias dessas áreas.

Efetivamente, uma afecção frontal bilateral costuma determinar apatia e perda da

iniciativa, ficando o indivíduo incapaz de conservar as intenções, de manter os programas

complexos de ação, de inibir os impulsos não-correspondentes aos programas e de

regular a atividade sujeita a esses programas. Isso tudo consubstancia a importância do

terceiro bloco na criação de intenções e na formulação de programas de ação que

concretize essas intenções.

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OS TRÊS BLOCOS PRINCIPAIS DO CÉREBRO

Como já indicamos, o cérebro humano, que assegura o recebimento e a elaboração das

informações e a criação de programas de suas próprias ações bem como o controle da

execução destes, trabalha sempre como um todo único. Contudo o cérebro é um aparelho

complexo e altamente diferenciado, composto de várias partes: a perturbação do

funcionamento normal de cada parte se reflete fatalmente no seu trabalho.

Em resumo:

- O primeiro bloco mantém o necessário tônus do córtex cerebral, indispensável

para o bom andamento dos processos de recebimento e elaboração da informação, bem

como os processos de formação de programas e controle da execução destes;

- O segundo bloco assegura o próprio processo de recebimento, elaboração e

conservação da informação que chega ao homem do mundo exterior (dos aparelhos do

seu próprio corpo);

- O terceiro bloco elabora programas de comportamento, assegura e regula sua

realização e participa da atividade do controle do seu cumprimento.

Todos os três blocos se instalam em órgão isolados de cérebro e só o trabalho bem

organizado leva a uma acertada organização da atividade consciente do homem.

SensaçãoSensação PercepçãoPercepção IntegraçãoIntegração DecisãoDecisão ProgramaçãoProgramação ExecuçãoExecução

CORTEX CORTEX -- GNOSIAGNOSIA CORTEX CORTEX -- PRAXIAPRAXIA

SISTEMA NERVOSO CENTRALSISTEMA NERVOSO CENTRAL

ÁREASÁREAS ÁREASÁREAS ÁREASÁREAS ÁREASÁREAS1ª1ª 2ª2ª 3ª3ª 3ª3ª 2ª2ª 1ª1ª

SISTEMASISTEMALÍMBICOLÍMBICO

FORMAÇÃOFORMAÇÃORETICULARRETICULAR

ESTÍMULOESTÍMULO((visual, auditivo,visual, auditivo,gustativo, etc.)gustativo, etc.)

RESPOSTARESPOSTA((Expressão corporal: Expressão corporal:

fala, escrita, postura, etc.)fala, escrita, postura, etc.)

Bloco Bloco EnergéticoEnergéticoPRIMEIRA PRIMEIRA UNIDADEUNIDADETônus cortical, Tônus cortical, vigília,vigília,estados mentais.estados mentais.

Bloco SensitivoBloco SensitivoSEGUNDA SEGUNDA UNIDADEUNIDADERecebimento, Recebimento, análise eanálise econservação de conservação de informaçõesinformações

Bloco MotorBloco MotorTERCEIRA UNIDADETERCEIRA UNIDADEProgramação, regulação Programação, regulação eeverificação da atividadeverificação da atividade

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EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO:

1. Conceitue Sistema nervoso e neuroanatomia.

2. Comente sobre a evolução dos três neurônios fundamentais.

3. Cite os três principais tipos de neurônios.

4. O que se entende por cadeia neuronal ?

5. Divida o Sistema nervoso pelos critérios morfológico e funcional.

6. Como se organiza funcionalmente o sistema nervoso ?

7. Como se divide o Sistema nervoso central ?

8. Conceitue substância branca e cinzenta e como se distribuem no SNC ?

9. Que partes constituem o cérebro?

10.Que partes constituem o SNP?

11.Que fenômeno se dá nas áreas secundárias da segunda unidade de LURIA?

12. Segundo a concepção clássica, o que fazem as vias de associação?