introduÇÃo À propagaÇÃo das ondas … · onda eletromagnética ... para outros tipos de antena...

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INTRODUÇÃO À PROPAGAÇÃO DAS ONDAS RADIOELÉTRICAS Mauro S. Assis Comitê Brasileiro da URSI ENCONTRO ANUAL EM COMUNICAÇÕES, REDES E CRIPTOGRAFIA ENCOM 2012 IECOM Campina Grande, PB Outubro 2012

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INTRODUÇÃO À PROPAGAÇÃO DAS

ONDAS RADIOELÉTRICAS

Mauro S. Assis

Comitê Brasileiro da URSI

ENCONTRO ANUAL EM COMUNICAÇÕES,

REDES E CRIPTOGRAFIA – ENCOM 2012

IECOM

Campina Grande, PB

Outubro 2012

Mauro S. Assis – Engenheiro Eletricista (Telecomunicações) e

Mestre em Ciências de Engenharia Elétrica pela PUC/RJ em 1964 e

1966, respectivamente. Recebeu o titulo de Notório Saber do

Departamento de Engenharia Elétrica do Instituto Militar de

Engenharia (IME) em 2000. Um dos fundadores do CETUC -

PUC/RJ (Centro de Estudos em Telecomunicações da Universidade

Católica do Rio de Janeiro), tendo sido seu Diretor no período de

1969 a 1979. Trabalhou na PROMON Engenharia de 1979 a 1981. Entre 1981 e 1990

exerceu diversas funções no Departamento de Recursos Humanos (DRH) da

EMBRATEL. A seguir, atuou durante 11 anos na área de novas tecnologias de

radiodifusão no Ministério das Comunicações (1990 a 1999) e na ANATEL (1999 e

2000). Professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) entre 1981 e 2011.

Relativamente às atividades de pesquisa, a concentração tem sido nas áreas de difração,

radiometeorologia e propagação ionosférica. A sua experiência de ensino inclui as

disciplinas de teoria eletromagnética, antenas, propagação, sistemas de comunicações

via satélite e sistemas de comunicações móveis e fixos em cursos de graduação, pós-

graduação e extensão. Atualmente é Presidente do Comitê Brasileiro da URSI (União

Internacional de Rádio Ciência) e Representante Nacional da Comissão F (Propagação

de Ondas e Sensoriamento Remoto).

PARTE I

MECANISMOS DE PROPAGACÃO

E O ESPECTRO DE FREQUÊNCIAS

PROPAGAÇÃO PONTO-A-PONTO

O problema da propagação das ondas eletromagnéticas consiste basicamente na

determinação da potência na entrada de um receptor situado em um determinado ponto,

partindo do conhecimento da posição e das características do transmissor que irradia a

energia e das propriedades dos meios onde se propaga esta energia. Os meios em

questão envolvem três regiões:

a) Terra – influencia a propagação da energia em função da geometria do terreno

(irregularidades do relevo), das construções (principalmente nas áreas urbanas e

suburbanas das cidades), da vegetação e das características elétricas do solo

(condutividade e permissividade);

b) Troposfera – camada da atmosfera situada imediatamente acima da superfície da

terra e que se estende até uma altura de aproximadamente 10 km. A troposfera é um

meio não homogêneo, que varia com a altitude e a posição geográfica e cujas

características são analisadas através do comportamento de seu índice de refração;

c) Ionosfera – parte superior da atmosfera terrestre, situada aproximadamente entre 60

e 1000 km de altura onde a matéria encontra-se ionizada, ou seja, os elétrons e os

íons encontram-se separados por ação, principalmente, da radiação solar As

variações da propagação na ionosfera estão também associadas ao índice de refração

que, no caso, é função da posição (densidade de elétrons livres) e da freqüência.

Por outro lado, no que diz respeito ao posicionamento do transmissor e do receptor,

pode-se classificar três tipos de propagação:

a) Propagação ponto-a-ponto - corresponde à propagação entre dois terminais fixos;

b) Propagação ponto-área - propagação entre um terminal fixo e terminais fixos ou

móveis distribuídos aleatoriamente em uma determinada área;

c) Propagação ponto-multiponto - propagação entre um terminal fixo de referência e

outros terminais fixos localizados em uma determinada área.

1. Onda Eletromagnética

O fenômeno da propagação das ondas eletromagnéticas corresponde ao processo físico

através do qual a energia irradiada por uma antena transmissora atinge a antena

receptora. Fundamentalmente, trata-se de uma conceituação com inúmeras aplicações

em diversas áreas, seja em pesquisa ou em problemas práticos de engenharia. Neste

contexto, destacam-se os sistemas de radiocomunicações, a geofísica, o sensoriamento

remoto, etc. O interesse primordial do presente texto se refere ao emprego nos sistemas

de radiocomunicações, daí o termo onda radioelétrica ser usado como sinônimo de onda

eletromagnética. A energia em propagação está associada a um campo eletromagnético

composto por componentes vetoriais dos campos elétrico ( E ) e magnético ( H ). A

visualização deste processo torna-se mais simples na condição de campo distante, isto é,

quando o receptor encontra-se muito afastado do transmissor e que corresponde a

situação ilustrada na Fig. 1. A partir desta figura os seguintes conceitos podem ser

definidos:

a) Ciclo - corresponde a uma variação completa da onda em propagação;

b) Freqüência ( f ) - número de ciclos por segundo;

c) Comprimento de onda ( ) - comprimento de um ciclo. A freqüência e o

comprimento de onda relacionam-se através de,

.f = v (velocidade da luz no meio considerado).

d) Polarização

Define-se a polarização de uma onda através da direção do vetor campo elétrico

relativamente a um plano de referência, em geral a superfície da terra. Três tipos de

polarização são usualmente utilizados pelos sistemas de telecomunicações:

Polarização vertical – O campo elétrico é perpendicular à superfície da terra;

Polarização horizontal – O campo elétrico é paralelo à superfície da terra;

Polarização circular – O campo elétrico é dado pela soma vetorial de duas componentes,

de mesma amplitude, polarizadas vertical e horizontalmente e defasadas de 90 no

tempo.

Na realidade, o caso mais geral corresponde à polarização elíptica ilustrada na Fig. 2. O

campo elétrico é dado pela soma vetorial de duas componentes, de amplitudes

diferentes, polarizadas horizontal e verticalmente e defasadas de 90 no tempo ou

quando a defasagem no tempo não é 90 independentemente do valor da amplitude de

cada uma.

Fig. 1 – Onda eletromagnética

Fig. 2 – Polarização elíptica

2. Fenômenos de propagação

De uma forma geral, três fenômenos básicos devem ser destacados quando se considera

o ambiente de propagação: reflexão, difração e espalhamento ou difusão.

Reflexão – quando a onda eletromagnética incide na superfície de separação de dois

meios, parte da energia é refletida e parte é transmitida, penetrando no segundo meio.

As parcelas correspondentes de energia são calculadas através dos coeficientes de

reflexão e transmissão (ou refração). Tais coeficientes dependem das propriedades

elétricas dos meios em questão (permissividade elétrica e condutividade), da

polarização da onda, da frequência e do ângulo de incidência sobre a superfície de

separação, a qual deve ter dimensões muito maiores do que o comprimento de onda.

Este fenômeno é usualmente analisado pela óptica geométrica, fazendo-se uso da teoria

de raios, sendo de fundamental importância nos enlaces em visibilidade. Nesta situação,

os raios refletidos no solo e nas paredes dos prédios fazem variar a intensidade do sinal

recebido relativamente ao raio que se propaga em espaço livre;

Difração – é o fenômeno responsável pela existência de energia na região de não

visibilidade de um obstáculo. A intensidade do campo difratado apresenta um valor

sempre inferior ao que seria obtido em espaço livre. Matematicamente, avaliar a

atenuação por difração é mais difícil do que os efeitos da reflexão e transmissão dos

sinais. Através da difração pelo relevo do terreno e por construções existentes nas áreas

urbanas e suburbanas das cidades pode-se cobrir áreas de sombra de um transmissor;

Espalhamento – acontece quando o meio onde se propaga a energia possui obstáculos

com dimensões da ordem ou inferior ao comprimento de onda. Relativamente aos

fenômenos da reflexão e da difração, a análise teórica do espalhamento é bem mais

complexa de ser estruturada, razão pela qual os modelos empregados na prática são, em

geral, empíricos, obtidos a partir de dados experimentais. O espalhamento pela

vegetação, por fios da rede elétrica, por sinais de trânsito, chuva, etc., são exemplos que

acontecem em áreas urbanas e suburbanas. Cumpre acrescentar que o meio responsável

pelo espalhamento sempre possui condutividade, portanto, dependendo da frequência,

observa-se adicionalmente certa absorção da onda em propagação.

3. Propagação em Espaço Livre

Define-se a propagação em espaço livre como aquela realizada no vácuo ou em uma

atmosfera ideal, na ausência de qualquer objeto que provoque absorção ou reflexão dos

sinais. Define-se a atenuação em espaço livre (Ao) em dB por,

r

t

op

pdBA log10)(

onde

pt - potência transmitida;

pr – potência recebida.

No caso de antenas isotrópicas (gt = gr = 1) tem-se, 2

4log10)(

ddBAo

GHzfkmddBAo log20log205,92)(

ou

MHzfkmddBAo log20log205,32)(

Para outros tipos de antena basta subtrair os ganhos de transmissão e recepção em dB

(GT,R = 10log gt,r) da atenuação calculada acima.

4. Termos Relacionados ao Relevo do Terreno

Considerando a influência da superfície da terra, aparentemente é impossível obter

condições de propagação em espaço livre. Entretanto, dependendo a posição relativa do

receptor em relação ao transmissor e do coeficiente de reflexão do solo, existem

situações onde o efeito do relevo pode ser ignorado e a intensidade de campo elétrico na

antena receptora pode ser aproximada por seu valor em espaço livre. Para melhor

fundamentar a questão é recomendável introduzir algumas definições preliminares.

4.1 Zonas de Fresnel

As zonas de Fresnel possuem uma importância fundamental no problema da propagação

das ondas radioelétricas. A fim de chegar a uma conceituação perfeita das zonas de

Fresnel, é preciso introduzir primeiramente os elipsóides de Fresnel, os quais são

definidos como os lugares geométricos dos pontos cuja soma das distâncias às antenas

transmissora e receptora é constante e excede a distância em visada livre de um número

inteiro de meios comprimentos de onda. As diversas zonas de Fresnel correspondem às

regiões limitadas por dois elipsóides de Fresnel consecutivos. A primeira zona de

Fresnel constitui o caso de maior interesse prático e se refere à intersecção do primeiro

elipsóide com o plano perpendicular à superfície da terra que contém as antenas

transmissora e receptora, da forma ilustrada na Fig. 3.

Fig. 3 – Definição do raio da 1ª zona de Fresnel

4.2 Perfil do terreno

Define-se como perfil do terreno entre dois pontos o traçado que fornece a altitude do

relevo em relação à curva fictícia situada ao nível do mar e que liga estes dois pontos. O

perfil do terreno deverá conter pontos afastados de, no máximo, 1 km. A ordenada de

cada ponto corresponde à altura do relevo acima do nível do mar e a abscissa

corresponde à distância entre a projeção vertical do ponto sobre a curva fictícia situada

ao nível do mar e a origem das coordenadas, a qual é arbitrada de forma conveniente. A

base curvilínea para o traçado do perfil é construída a partir da equação

y = x2 / 2ae

onde x representa a distância e y a correção associada à curvatura da terra.

4.3 Nível de referência

O nível de referência em relação ao qual se avalia o efeito das irregularidades do relevo

é dado por uma linha reta ajustada ao terreno pelo método dos mínimos quadrados,

como ilustrado na Fig. 4.

h x a x a( ) 0 1

onde

nn

n n n

nxx

nhxxy

a/)(

/)(

220

nxayan

i

n

i /)( 01

sendo n o número de pontos considerados. Os pontos devem estar espaçados de 1 km e

devem ser escolhidos de tal forma que seja excluído o terreno adjacente de cada antena

que não seja visível da outra.

d

ddR 21

Fig. 4 – Nível de referência

4.4 Coeficiente de reflexão do solo

Devido às irregularidades do terreno, o coeficiente de reflexão do solo (RS) é dado pelo

coeficiente de reflexão Fresnel (RF) para uma superfície lisa multiplicado por um

coeficiente de espalhamento. No que diz respeito ao coeficiente de reflexão de Fresnel

tem-se que,

Rsen

senFh

cos

cos

2

2 - polarização horizontal;

Rsen

senFv

( cos ) /

( cos ) /

2 2

2 2 - polarização vertical;

sendo

r j60

r - permissividade relativa da superfície;

- condutividade da superfície.

Considerando que na propagação em visibilidade as alturas das antenas são,

normalmente, muito menores que a distância entre o transmissor e o receptor, o ângulo

de incidência na superfície da terra é muito pequeno, ou seja, 0. Nesta situação,

verifica-se nas equações acima que o coeficiente de reflexão de Fresnel pode ser

aproximado por RF = -1. Por outro lado, o interesse na análise do coeficiente de reflexão

do solo se concentra na condição RS< 0,3. Conseqüentemente, apenas o módulo do

coeficiente de espalhamento Cs precisa ser levado em conta,

2/)(exp 2sC

onde

4

t sen

;

h h

d

1 2 - ângulo de incidência em relação ao nível de referência;

t - desvio padrão das irregularidades do terreno em relação ao nível de

referência, qual é dado por,

2/1

1

2)]()([1

n

ixy

ixh

n

i

t

4.5 Tipos de relevo

A caracterização do relevo é feita a partir de um parâmetro denominado rugosidade do

terreno ou parâmetro Δh. Este parâmetro é definido pela diferença, em metros, entre os

níveis excedidos entre 10 e 90% no segmento de perfil considerado. No caso de

radiodifusão, este parâmetro é determinado no segmento de perfil do terreno situado

entre 10 e 50 km da estação transmissora no radial de interesse (Fig. 5). Uma forma

prática de determinar o valor de h ao longo de uma radial consiste em:

a) No segmento de perfil considerado, selecionar um total de 41 pontos espaçados de 1

km;

b) Ordenar os pontos assim obtidos segundo a altura de cada um, desprezando os 4

pontos mais altos e os 4 pontos mais baixos;

c) A diferença de altura entre o ponto mais alto e o ponto mais baixo dos 33 pontos

restantes corresponde ao parâmetro h do radial em questão.

Na determinação do parâmetro h em uma área homogênea, o procedimento acima

pode ser estendido para um conjunto de 8 (radiais), igualmente espaçados e traçados a

partir da estação transmissora. Nesta situação, dos 328 (8 x 41) pontos resultantes,

despreza-se os 32 pontos mais altos e os 32 pontos mais baixos, sendo h dado pela

diferença entre o ponto mais alto e o ponto mais baixo dos 264 pontos restantes.

Fig. 5 – Parâmetro Δh

Em função do parâmetro Δh pode-se admitir a existência de dois tipos de relevo: suave

e acidentado. Cumpre assinalar que uma análise mais rigorosa desta questão deveria

incluir um relevo de transição entre o suave e o acidentado. Entretanto, em vista da

dificuldade de fazer tal definição, esta questão, no momento, não será considerada.

a) Relevo suave

O relevo é considerado suave quando h < R, sendo R o valor médio do raio da

primeira zona de Fresnel na região onde o efeito das irregularidades do terreno seja mais

pronunciado (vizinhanças do ponto de reflexão quando o receptor estiver na zona de

interferência ou nos pontos onde se localizam os obstáculos mais proeminentes quando

o receptor estiver na zona de difração).

b) Relevo acidentado

O relevo é considerado acidentado quando h R.

4.6 Raio de curvatura de um obstáculo ( r )

Definido matematicamente por,

rn

ri

n

1

onde r x yi i i 2 2 , sendo os pontos xi e yi mostrados na Fig.6. O máximo valor de yi

deve ser da ordem do raio da primeira zona de Fresnel onde se localiza o obstáculo.

Fig. 6 – Definição do raio de curvatura

4.7 Ângulo de espalhamento

Definido matematicamente por,

d

a

h h

d

d

a

h h

d

d

ae e e

1 1

1

1 2 2

2

2

2 2

' '

onde as distâncias e alturas estão definidas na Fig. 7.

Fig. 7 – Ângulo de espalhamento

5. Zona de interferência e zona de difração

A introdução dos conceitos de zona de interferência e zona de difração tem por base o

modelo da terra plana mostrado na Fig.8. Embora idealizado, uma vez que não

considera as irregularidades do relevo e a curvatura da terra, os resultados obtidos por

este modelo são aplicáveis a outras situações mais complexas. Por outro lado,

desprezando a onda de superfície, o módulo da intensidade de campo elétrico no ponto

de recepção é dado por,

.2

1j

Fo eREE

onde

Eo – intensidade de campo elétrico em espaço livre;

RF – coeficiente de reflexão de Fresnel para ondas planas;

d

hh

212

Fig. 8 – Modelo da terra plana

Define-se a zona de interferência pela região onde a superposição dos raios direto

(espaço livre) e refletido no solo provoca uma oscilação da intensidade de campo

elétrico em torno do seu valor em espaço livre. A zona de difração é caracterizada pelo

fato da intensidade do campo elétrico estar sempre abaixo do seu valor em espaço livre,

decrescendo monotonicamente a medida que o ponto de observação (receptor) se afasta

do transmissor (ver Fig. 9). O critério de separação entre as zonas de interferência e

difração pode ser enunciado da seguinte maneira: quando existe folga (H) de 0,6 da

primeira zona de Fresnel em todo o percurso entre o transmissor e o receptor, diz-se que

o receptor encontra-se na zona de interferência do transmissor. Caso contrário, ou seja,

quando existe alguma obstrução, o receptor situa-se na zona de difração do transmissor.

Embora idealizado, uma vez que não considera as irregularidades do relevo e a

curvatura da terra, os resultados obtidos por este modelo são aplicáveis a outras

situações mais complexas.

Fig.9 – Zona de interferência e zona de difração

d

Tx

Rx

R2 R1

h2

R

α α

h1

Nos casos de interesse prático, o ângulo de incidência (α) é muito próximo de zero.

Nesta situação, independentemente da polarização, o coeficiente de reflexão pode ser

aproximado por –1 e o módulo da intensidade de campo tem por expressão,

d

hhsenEE o

2122

A partir desta equação mostra-se que a atenuação do sinal relativamente a uma terra

plana perfeitamente lisa é dada por,

)(log10)(log10)(log40120 21 mhmhkmdAtp

6. NOÇÕES DE RADIOMETEOROLOGIA

A importância fundamental dos fenômenos atmosféricos na propagação ondas

radioelétricas deu origem a uma ciência denominada radiometeorologia. Esta ciência

estuda a interação entre os diversos fenômenos meteorológicos e a energia em

propagação, procurando explicar as variações da intensidade do sinal que são

observadas na estação de recepção (desvanecimento).

A fim de classificar as regiões do globo terrestre que apresentam variações similares do

índice de refração, a radiometeorologia introduziu o conceito de rádio-clima. A

definição de um rádio-clima é feita em função do índice de refração, observando sua

variação média com a altitude, dependência sazonal, amplitude da variação anual,

distribuição estatística do gradiente do índice nas vizinhanças do solo, etc. Esta análise

aproveita normalmente as medidas de superfície e de radiossonda (altitude) realizadas

por estações meteorológicas. Pode-se também utilizar o instrumento denominado

refratômetro que fornece diretamente o valor do índice de refração no ponto de medida.

As desvantagens destes métodos é o fato da medida ser pontual, obrigando a

extrapolação de resultados para permitir a cobertura de uma região. Uma alternativa

para suprir esta deficiência é o emprego de radares meteorológicos.

Com a utilização de freqüências acima de 10 GHz nos sistemas de comunicações abriu-

se um novo campo na radiometeorologia. Estas frequências sofrem o efeito de absorção

pelo oxigênio e vapor d’água presentes no ar atmosférico e são atenuadas por

hidrometeoros (chuvas, nuvens, nevoeiros, etc.). No que diz respeito à aplicação de tais

frequências no Brasil, é de particular importância investigar as consequências das

elevadas taxas de precipitação típicas de regiões tropicais e equatoriais.

6.1 A Troposfera

Sob o ponto de vista da propagação das ondas radioelétricas, a troposfera pode ser

considerada como uma combinação de ar seco e vapor d’água. Para frequências até 100

GHz, o índice de refração da troposfera ( n ) é praticamente independente da frequência

e pode ser representado matematicamente através de,

T

ep

TXn 4810

6,7710)1( 6

onde p é a pressão do ar atmosférico em hPa, e é a pressão parcial do vapor d’água em

hPa e T a temperatura em K.

Os serviços de meteorologia fornecem normalmente os valores de p e T. Porém, no que

se refere à pressão parcial do vapor d’água, uma vez que a medida do conteúdo de água

na atmosfera é feita através da umidade relativa ( ur ), a determinação de e utiliza a

seguinte aproximação:

onde rs é a taxa de mistura saturada que pode ser calculada através de ,

Na troposfera o índice de refração difere muito pouco da unidade, cerca de 0,0003,

motivo pelo qual é mais cômodo empregar o parâmetro refratividade ( N ), definido por,

610)1( xnN

Em certos casos, como na propagação em dutos troposféricos, é conveniente trabalhar

com o índice de refração modificado ( nm ),

a

hnnm 1

e o correspondente módulo de refração ( M ),

610)1( xnM m

6.2 Refração Atmosférica

As variações do índice de refração da troposfera provocada por fatores climatológicos,

tais como, vento, aquecimento do ar, umidade, etc., levam este meio a comportar-se

como um meio estratificado, isto é, estruturado em camadas, ou como um meio

turbulento, onde há formação de turbilhões que se misturam aleatoriamente. A

atmosfera estratificada constitui o modelo usualmente empregado na análise do

desvanecimento (lento e multipercurso). O meio turbulento é o modelo usado para

explicar o espalhamento na troposfera, inclusive a cintilação observada nas ligações em

visibilidade. Esta seção analisa o fenômeno da refração em um meio estratificado,

responsável pela trajetória curvilínea da energia em propagação. Nas situações em que

seja conveniente tratar a superfície da terra como plana a troposfera será considerada

como um meio plano estratificado, onde n é função somente da altura. No caso mais

geral em que a terra é suposta esférica, trata-se a troposfera como um meio esférico

estratificado, sendo n função apenas da coordenada radial.

41022,6 x

rpue sr

)(

2360)(log2,12)/(log

KThPapkggrs

6.2.1 Trajetória dos raios nos meios estratificados

Nas ligações em visibilidade o emprego da óptica geométrica constitui uma ferramenta

que permite simplificar de modo substancial a complexidade do problema da

propagação de energia. Desta forma. O conceito de raio será aqui utilizado na

determinação da trajetória de uma onda radioelétrica que se propaga em um meio

estratificado. Considerando que um meio estratificado contínuo pode ser visto como o

limite de um meio estratificado em camadas com espessura tendendo a zero, tem-se pela

lei de Snell para a geometria plana da Fig.10a.

2211 sennsenn

ou, em função do ângulo com a horizontal

2211 coscos nn

Tomando o limite 0ch e passando à Fig.10b.

Cn cos

onde 00 cosnC é uma constante, sendo n0 e 0 os valores de n e no ponto de

partida do raio.

Fig. 10 – Meio estratificado plano

Equação da trajetória,

h

h Cn

dhCxx

022

0

O raio da trajetória em um ponto qualquer pode também ser determinado pelo modelo

da estratificação em camada. Assim, para a Fig.11,

)( dhdnsen

n

)5.3(cos Cn

Fig. 11 – Raio de curvatura

No caso de um meio estratificado esférico pode-se utilizar o mesmo raciocínio. De

acordo com a geometria da Fig. 12,

22

'

11 sennsenn

Porém, aplicando a lei dos senos no triângulo OAB, tem-se a relação

1

2

'

1

1

sen

r

sen

r

que, introduzida na expressão precedente, leva a

222111 senrnsenrn

Passando a um meio contínuo, é imediato que

Cnrsen

ou

Cnr cos

sendo C uma constante dada por 000000 cos rnsenrnC .

Fig. 12 – Meio estratificado esférico

De acordo com o conceito de índice de refração modificado, pode-se escrever,

Cnm cos

que é idêntica à equação correspondente ao meio plano estratificado apenas com a

substituição de n por nm.

A determinação da trajetória segue o mesmo procedimento usado no caso do meio

plano. Desta forma,

C

Cn

rd

drtg m

2122

ou, em função das coordenadas r e h,

C

Cn

dsah

dhtg m

2122 ][

)1(

Normalmente h /a << 1, daí,

22 Cn

Cdhds

m

que possui a mesma forma da equação obtida para o meio plano estratificado, com s

substituindo x. Assim, pode-se resolver o problema da terra esférica utilizando a

geometria da terra plana, desde que seja utilizado o índice modificado mn no lugar de n.

6.2.2 Raio equivalente da terra

Outro procedimento empregado usualmente na análise da refração atmosférica

relaciona-se ao conceito de raio equivalente da terra )( ea . Para cada valor

dhdn constante pode-se definir um raio equivalente pelo uso do qual as trajetórias se

tornam linhas retas. Este resultado é possível desde que a curvatura relativa de ae seja

igual a diferença em curvatura entre o raio e a superfície da terra. A Fig.13 ilustra esta

definição, cuja representação matemática é dada por,

eaa

111

ou ainda,

kaae

onde

dh

dna

k

1

1

O conceito de raio equivalente da terra pode ser definido também a partir do índice de

refração modificado. Neste caso, desenvolvendo-se em série de Taylor a expressão de n

no entorno do ponto h = 0 (r = a) e tomando os dois primeiros termos, tem-se

)()()( ' ahnanhn

onde

0

' )( hdh

dnan

Fig. 13 – Raio equivalente da terra

Substituindo a equação acima na expressão do índice de refração modificado,

a

hahnan

a

hnnm 1)()(1 '

ou

)(

)(

)(

)(1)(

'2'

an

an

a

h

an

an

a

hannm

Como ah , o último termo da expressão acima pode ser ignorado.

Daí,

)(

)(1)(

'

an

an

a

hannm

Fazendo

eaan

an

a

1

)(

)(1 '

chega-se a,

e

ma

hann 1)(

A semelhança entre a expressão acima e a definição do índice de refração modificado

mostra que em uma representação onde o raio da terra seja feito igual a ea , o índice de

refração é constante e igual ao valor na superfície da terra. Nesta situação, como

anteriormente, as trajetórias são linhas retas.

6.2.3 Atmosfera Padrão

Medidas realizadas em clima temperado mostram que o valor mediano do gradiente da

refratividade corresponde a,

dN/dh = -39 km-1

= - 0,039 m-1

,

Consequentemente,

k = 4/3 e ae = 8500 km.

No caso do módulo de refração, tem-se para a atmosfera padrão,

dM/dh = 118 km-1

= 0,118 m-1

Outras condições da troposfera são classificadas em função da atmosfera padrão. Desta

forma, pode-se classificar:

a) Atmosfera sub-padrão

dM/dh > 0,118 m-1

ou dN/dh > - 0,039 m-1

ou k < 4/3

b) Atmosfera super-padrão

0,118 m -1

> dM/dh > 0 ou - 0,157 m-1

dN/dh < - 0,039 m-1

ou 4/3 < k

c) Inversão do gradiente

dM /dh < 0 ou dN/dh < - 0,157m-1

ou k < 0

Estas condições, bem como combinações variadas delas, ocorrem em uma faixa

limitada de altura. Supõe-se que para grandes alturas o perfil do índice aproxima-se do

padrão.

6.2.4 Propagação nos dutos troposféricos

Quando se usa o índice modificado nm e, portanto, o módulo de refração M, as

trajetórias na atmosfera homogênea têm ligeira curvatura para cima relativamente a uma

terra plana de referência. O mesmo acontece para qualquer situação onde dM/dh seja

positivo, a curvatura reduzindo a medida que dM/dh diminui. Quando dM/dh se anula,

as trajetórias são linhas retas. No caso das inversões de M (dM/dh negativo) a curvatura

é negativa para os raios próximos da horizontal, ficando parte da energia presa onde se

dá a inversão. Devido a esta canalização parcial da energia, diz-se que as camadas onde

há inversão formam dutos. De acordo com a posição da inversão em relação ao nível do

solo, tem-se dutos de superfície e dutos elevados. Os dutos afetam os sistemas de

comunicações de duas formas distintas. Nas ligações em visibilidade podem provocar

um desacoplamento em as antenas transmissora e receptora ocasionando uma

substancial atenuação do sinal em propagação. Por outro lado, devido à baixa atenuação

que se observa na propagação no interior de um duto, o alcance radioelétrico é bem

maior do que na atmosfera padrão, propiciando o aparecimento de sinais intensos a

longa distância, constituindo-se, consequentemente, em um importante mecanismo para

a transmissão de sinais interferentes.

Para que seja visualizada a propagação no interior de dutos, a Fig. 14 exemplifica um

tipo simples de duto de superfície, com três possibilidades para um sinal em

propagação. A curva ( 1 ) mostra a trajetória típica para um raio no interior do duto. A

curva ( 2 ) ilustra um raio com ângulo de partida c satisfazendo a condição limite de

retorno. Na curva ( 3 ) observa-se um raio que não se propaga no interior do duto, pois

seu ângulo de partida é superior a c. Na análise da trajetória no interior de um duto,

utiliza-se normalmente o índice de refração modificado e, portanto, uma geometria

plana. Supondo que no ponto de partida do raio o índice de refração modificado e o

ângulo em relação à horizontal sejam, respectivamente, 0mn e 0 , em um ponto

qualquer da trajetória, tem-se

0coscos0

mm nn

Como o ângulo é, em geral, muito pequeno, é valida a aproximação,

21cos

2

Portanto,

e, finalmente,

6

0

2

0 10)(2 xMM

Fig. 14 – Duto de superfície

O cálculo de pode ser feito a partir dos valores de M – M0 tirados diretamente do

perfil de M, permitindo traçar a trajetória para cada valor de 0 (ângulo de partida). Este

método é particularmente útil porque possibilita o traçado dos raios sem o conhecimento

da equação que exprime M em função de h. A Figura 15 ilustra a aplicação do resultado

anterior na obtenção da trajetória em um duto troposférico.

Fig. 15 – Trajetória em um duto troposférico

6

0

2

0

2 10)()(2

10

xMMnn mm

6.3 Precipitação Pluviométrica

A energia em propagação através da chuva sofre efeitos de espalhamento e absorção

causados pelas gotas que a constituem. O espalhamento está associado às modificações

na geometria da onda de modo a satisfazer as condições de contorno sobre cada gota e a

absorção corresponde à dissipação térmica função da condutividade da água. O ponto de

partida na análise desta questão é dado pelo problema clássico da difração de uma onda

plana por uma esfera de condutividade finita. Desprezando a interação entre as gotas

(espalhamento múltiplo), o resultado assim obtido é estendido ao conjunto de N gotas.

Considerando a seguir o efeito da forma não esférica das gotas, chega-se a uma razoável

representação do modelo físico real. Embora não se pretenda neste trabalho desenvolver

a formulação matemática correspondente, a seguir, são conceituados os parâmetros

físicos associados ao fenômeno.

a) Índice de refração complexo da água ( )na - responsável pelo efeito de atenuação,

função da temperatura da água e da frequência de operação, e dado matematicamente

por,

02 fjn aaa

onde a é a permissividade elétrica da água, 0 é a permissividade elétrica do vácuo,

a é a condutividade da água e f a frequência de operação;

b) Taxa de precipitação - altura que atingiria a água coletada por unidade de tempo caso

não houvesse evaporação nem absorção pelo solo. A taxa de precipitação é expressa

usualmente em mm/h e calculada em função da dimensão (diâmetro) e da velocidade

terminal das gotas. A precisão da medida da distribuição estatística da taxa de

precipitação é de fundamental importância no estabelecimento de modelos para a

previsão da atenuação por chuva.

c) Distribuição do diâmetro ( )D das gotas - o diâmetro das gotas varia normalmente

entre 0,01 e 6,0 mm. Gotas com diâmetros inferiores a 0,01mm evaporam-se

rapidamente e acima de 6,0 mm a tensão superficial não é suficiente para mantê-las,

havendo fracionamento. A distribuição das gotas em função do diâmetro foi

determinada experimentalmente por Laws e Parsons para diversas taxas de precipitação.

O inconveniente desta distribuição é a apresentação sob a forma de tabela, havendo

necessidade de interpolação para obter a distribuição quando a taxa de precipitação

desejada encontra-se entre os valores disponíveis. Procurando simplificar este resultado,

Marshall e Palmer propuseram a adoção de uma distribuição exponencial-negativa dada

por,

)exp()( 0 DNDN

onde N(D) é o número de gotas por unidade de volume e por intervalo de diâmetro;

13

0 8000 mmmN e 121,0101,4 mmx .

Esta distribuição é aplicável em climas temperados. Entretanto, em climas tropicais e

equatoriais, particularmente em frequências acima de 20 MHz, como mostrado na

Fig.16, a distribuição log-normal se mostra mais adequada..

Fig. 16 – Comparação entre as distribuições de Marshall-Palmer e log-normal

d) Efeito da distorção das gotas - as gotas de chuva não são perfeitamente esféricas,

apresentando a forma aproximada de um esferóide oblato achatado em sua parte

inferior. Nesta situação, o vetor campo elétrico orientado ao longo da menor dimensão

da gota (polarização vertical) é menos atenuado do que quando orientado ao longo da

maior dimensão (polarização horizontal). O problema relativo à aplicação das condições

de contorno torna-se bastante complicado e, tendo em vista o escopo do presente

trabalho, será omitido o desenvolvimento matemático correspondente. O leitor

interessado poderá consultar os trabalhos de Oguchi e Morrison e Cross;

e) Atenuação específica - considerando a não-uniformidade da distribuição espacial da

chuva, a análise matemática é dirigida para o cálculo da atenuação por unidade de

comprimento (atenuação específica - ). Esta atenuação depende do índice de refração

da água, da velocidade terminal das gotas e da distribuição do diâmetro das gotas. Em

que pese o rigor da formulação matemática correspondente, a dificuldade na

determinação dos parâmetros citados, associada à manipulação algébrica necessária,

torna extremamente complexo o cálculo da atenuação. Por este motivo foi desenvolvida

uma solução empírica ajustada ao modelo teórico em questão. Esta solução constitui

uma aproximação bastante razoável, sendo definida através da seguinte lei de potência,

)]/([)/( hmmRkkmdB

sendo k e parâmetros que dependem da frequência, da polarização (gota com forma

de um esferóide oblato), da distribuição dos diâmetros das gotas e da temperatura. No

caso de taxas de precipitação elevadas, onde reside o interesse deste trabalho, o efeito da

temperatura pode ser ignorado. A Tabela I apresenta, em função da frequência e

supondo as gotas distribuídas segundo Marshall e Palmer, os valores de k e para

polarização horizontal ( , )kh h e polarização vertical ( , )kv v em trajetos horizontais

(ângulo de elevação nulo). Em uma situação qualquer, estes parâmetros são calculados

através das equações,

22coscos)( 2 vhvh kkkkk

e

kkkkk vvhhvvhh 22coscos)( 2

onde é o ângulo de elevação e o ângulo de inclinação em relação à horizontal

( 450 para polarização circular).

6.3.1 Chuva estratiforme e chuva convectiva

No que se refere ao estudo da atenuação por chuva é usual classificar dois tipos de

precipitação: a chuva estratiforme e a chuva convectiva. A chuva estratiforme cobre

regiões relativamente extensas (vários quilômetros) com baixa taxa de precipitação. O

limite superior para este tipo de chuva situa-se em torno de 20 a 30 mm/h. A chuva

convectiva é localizada, apresenta uma taxa elevada de precipitação (da ordem de 30 a

50 mm/h) e, dependendo das condições climáticas, ocorre em menos do que 0,1% do

tempo em um ano médio. Não é simples estabelecer rigorosamente os limites da faixa

de transição entre os dois tipos de chuva. Na realidade, medidas com radares

meteorológicos indicam a existência de uma região de transição entre as chuvas

estratiforme e convectiva. Deve-se observar nesta figura que a conversão da

refletividade do radar Z(mm6/m

3) para a taxa de precipitação R(mm/h) tem por base a

relação clássica Z = aRb. Um exemplo da transição é mostrado na Fig.17 para medidas

com um radar meteorológico localizado em Manaus (AM). Este texto não pretende

entrar em maiores detalhes da questão. Por este motivo, será considerada apenas a

classificação simplificada definida inicialmente supondo que a separação entre chuva

estratiforme e chuva convectiva ocorre em 20 mm/h.

Fig. 17 – Tipos de chuva

TABELA I

Valores de k e α

Frequency

(GHz) kH H kV V

1 0.0000259 0.9691 0.0000308 0.8592

2 0.0000847 1.0664 0.0000998 0.9490

3 0.0001390 1.2322 0.0001942 1.0688

4 0.0001071 1.6009 0.0002461 1.2476

5 0.0002162 1.6969 0.0002428 1.5317

6 0.0007056 1.5900 0.0004878 1.5728

7 0.001915 1.4810 0.001425 1.4745

8 0.004115 1.3905 0.003450 1.3797

9 0.007535 1.3155 0.006691 1.2895

10 0.01217 1.2571 0.01129 1.2156

11 0.01772 1.2140 0.01731 1.1617

12 0.02386 1.1825 0.02455 1.1216

13 0.03041 1.1586 0.03266 1.0901

14 0.03738 1.1396 0.04126 1.0646

15 0.04481 1.1233 0.05008 1.0440

16 0.05282 1.1086 0.05899 1.0273

17 0.06146 1.0949 0.06797 1.0137

18 0.07078 1.0818 0.07708 1.0025

19 0.08084 1.0691 0.08642 0.9930

20 0.09164 1.0568 0.09611 0.9847

21 0.1032 1.0447 0.1063 0.9771

22 0.1155 1.0329 0.1170 0.9700

23 0.1286 1.0214 0.1284 0.9630

24 0.1425 1.0101 0.1404 0.9561

25 0.1571 0.9991 0.1533 0.9491

26 0.1724 0.9884 0.1669 0.9421

27 0.1884 0.9780 0.1813 0.9349

28 0.2051 0.9679 0.1964 0.9277

29 0.2224 0.9580 0.2124 0.9203

30 0.2403 0.9485 0.2291 0.9129

31 0.2588 0.9392 0.2465 0.9055

32 0.2778 0.9302 0.2646 0.8981

33 0.2972 0.9214 0.2833 0.8907

34 0.3171 0.9129 0.3026 0.8834

35 0.3374 0.9047 0.3224 0.8761

36 0.3580 0.8967 0.3427 0.8690

37 0.3789 0.8890 0.3633 0.8621

38 0.4001 0.8816 0.3844 0.8552

39 0.4215 0.8743 0.4058 0.8486

40 0.4431 0.8673 0.4274 0.8421

A chuva nos trópicos tem uma origem predominantemente convectiva. As nuvens

associadas a este tipo de chuva, em geral, se apresentam formando grupos de células.

Na pior hipótese, a estrutura da chuva convectiva consiste de uma espessa camada de

nuvens do tipo nimbo-estratos na qual se superpõe torres do tipo cumulo-nimbos. A

separação entre as torres é da ordem de 20 a 25 km. A estrutura assim descrita mostrada

na Fig. 18.

Fig.18 – Estrutura da chuva nos trópicos

6.3.2 – Distribuição estatística da taxa de precipitação

O conhecimento desta distribuição em um ponto do percurso da propagação da energia

ou em suas vizinhanças é de primordial importância na previsão da atenuação por

chuva. Sempre que possível, dados locais da intensidade da taxa de precipitação devem

ser utilizados na estimativa da distribuição estatística. Entretanto, se esta informação

não estiver disponível, uma alternativa é lançar mão de modelos matemáticos obtidos a

partir de dados experimentais da área em estudo.

Inúmeros modelos têm sido propostos na literatura técnica internacional. Este texto

adota o modelo recomendado pelo UIT-R. Este modelo, proposto originalmente por

Salonen e Batista, possui uma cobertura global e depende de dados meteorológicos

usualmente disponíveis na área em estudo. Os dados necessários ao cálculo deste

modelo são:

a) Acumulado anual de chuva convectiva ( Mc ) em mm;

b) Acumulado anual de chuva estratiforme (Ms) em mm;

c) Percentagem de chuva em 6 horas (PR6) em %.

Deve ser ressaltado que foram testados vários limites para separar a chuva convectiva

da chuva do tipo estratiforme, sendo o valor de 6 mm em 6h o que mais se ajustou para

Chuva convectiva

os dados analisados. Assim dispondo dos dados meteorológicos e de acordo com este

modelo, a probabilidade de uma determinada taxa de chuva, Rp (mm/h), excedida em

p% de um ano médio, onde p ≤ P0, é dada por:

).1(

).1(exp.)R P(R

0

0000p

Rc

RbaRP

onde a = 1,09; 0.21797 P

MMb SC ; c = 26,02 b;

),(/),((0790.060

6e1),(),(LonLatPLonLatM

rrsLonLatPLonLatP

Mc = βMT

Ms = (1-β) MT

MT - total acumulado anual de chuva total de chuva em mm.

mm/h2

4),(

2

A

ACBBLonLatRp

A = a b

B = a + c ln( p / P0(Lat,Lon))

C = ln( p / P0(Lat,Lon))

O procedimento passo-a-passo para implementação deste modelo está descrito na Rec.

UIT-R P.837-6, incluindo a informação de como obter as variáveis Pr6, Mt e β. Cumpre

assinalar que, embora esta Recomendação esteja sendo continuamente aprimorada

visando maior precisão, ainda podem ser observados erros significativos na comparação

entre resultados do modelo e dados experimentais.

7. MECANISMOS DE PROPAGAÇAO

Entende-se por mecanismo de propagação o modo através do qual a energia irradiada

pela antena transmissora atinge a antena receptora. Embora na prática dois ou mais

mecanismos possam ocorrer simultaneamente, a vantagem de uma divisão se reflete

principalmente no desenvolvimento em separado, permitindo inúmeras simplificações.

( i ) Visibilidade

Uma idéia imediata da propagação em visibilidade corresponde a um percurso

direto da energia entre o transmissor e o receptor (onda direta). Entretanto, neste

mecanismo é necessário também levar em conta a possibilidade de reflexões na terra e

em camadas da troposfera (ondas refletidas). A Fig. 19 ilustra este mecanismo que, sob

o ponto de vista matemático, é o mais simples, uma vez que a atenuação de propagação

é calculada através da óptica geométrica.

Fig.19 – Propagação em visibilidade

( ii ) Difração

Quando o percurso entre o transmissor e o receptor é obstruído ou a folga é

pequena como mostra a Fig. 20, a energia sofre um efeito de difração. Na região de

difração a formulação matemática é bastante complexa, sendo necessário o uso de

aproximações que permitam o emprego prático dos resultados provenientes dos modelos

teóricos. Um caso particular deste mecanismo de propagação corresponde ao campo

irradiado por um monopolo vertical sobre o solo. Este campo é polarizado verticalmente

e propaga-se como se guiado pela superfície de separação entre a terra e a troposfera.

Por esta característica recebe o nome de onda de superfície.

Fig. 20 – Propagação por difração

( iii ) Difusão Troposférica

A turbulência existente na troposfera, causada por variações rápidas do índice de

refração, é responsável pelo mecanismo da difusão ou espalhamento. A Fig. 21ilustra de

forma pictórica os turbilhões e camadas responsáveis pelo fenômeno da difusão.

Embora sempre presente, como corresponde a sinais geralmente fracos, o efeito deste

mecanismo somente é observado quando o receptor encontra-se muito além do

horizonte do transmissor. A Fig. 22 mostra o comportamento da intensidade de campo

em função da distância, onde são evidenciadas as regiões de visibilidade (interferência),

difração e difusão. Não existe um critério de separação simples entre as regiões de

difração e difusão, uma vez que esta separação depende de diversos fatores, tais como,

ângulo de espalhamento, relevo, condições meteorológicas (clima), etc. Como ordem de

grandeza pode-se dizer a separação acontece para distâncias entre 100 e 150 km.

Fig. 21– Propagação por difusão troposférica

Fig. 22 – Regiões de interferência, difração e difusão

( iv ) Dutos Troposféricos

Os dutos troposféricos originam-se da condição especial de estratificação da

troposfera, discutida anteriomente. A propagação nos dutos é similar à que se observa

em um guia de ondas convencional, com baixa atenuação, sendo possível obter sinais

intensos a longa distância. Como a formação de dutos é um fenômeno ocasional, este

mecanismo não pode ser empregado eficazmente nos sistemas de comunicações,

entretanto, o conhecimento de suas características é fundamental no estudo de

interferências. No caso dos enlaces em visibilidade, os dutos podem ser responsáveis

pelo desacoplamento entre o transmissor e o receptor, provocando redução substancial

na intensidade do sinal.

( v ) Espalhamento por Chuva

Ao atravessar uma região onde existe precipitação, o feixe de energia de uma

antena transmissora é parcialmente espalhada, propiciando propagação do sinal a longa

distância, em direções totalmente distintas da original. A idéia básica deste mecanismo é

mostrada na Fig. 23, para o caso específico e de grande interesse prático de interferência

entre uma estação terrena e uma estação terrestre.

Fig. 23 – Espalhamento por chuva

( vi) Guia de Ondas Terra-Ionosfera

A ionosfera é estruturada em camadas como mostra a Fig. 24. Considerando que o sol é

a principal fonte de ionização, observa-se na figura que as camadas variam do dia para a

noite. Quando o comprimento de onda é muito grande, praticamente não há penetração

de energia na ionosfera. Nesta situação, a propagação se processa no guia de ondas

formado pela superfície da terra e o limite inferior da ionosfera (camada D).

Fig. 24 – Estratificação da ionosfera

(vii) Propagação Ionosférica

Dependendo da freqüência e das condições da ionosfera, a energia em propagação pode

sofrer um processo contínuo de refração, possibilitando o retorno à terra (ver Fig. 25).

Trata-se de um mecanismo que possibilita a transmissão de sinais a longa distância,

sendo, no entanto, afetado pela variabilidade deste meio.

Fig. 25 – Propagação ionosférica

8. O Espectro de Frequências e os Mecanismos de Propagação

A preponderância de um mecanismo em relação a outro está intimamente relacionada à

freqüência da onda radioelétrica em propagação, podendo-se inferir que mecanismos de

propagação devem ser prioritariamente considerados na análise de um determinado

sistema de comunicações. No que segue, esta idéia será desenvolvida tomando por base

a divisão oficial do espectro de frequência conforme classificação da União

Internacional de Telecomunicações.

( i ) VLF – Frequências muito baixas (Very low frequency) – 3 a 30 kHz

(100km 10km)

Não há penetração na ionosfera, havendo reflexão na camada mais baixa desta região.

Para longa distância, o mecanismo principal é o guia de ondas terra-ionosfera. Como

são utilizados monopolos verticais na transmissão, para curtas distâncias, a propagação

se dá por onda de superfície. As aplicações nesta faixa se resumem a sistemas de faixa

muito estreita, tais como, móvel marítimo (telegrafia), radionavegação (Omega), sinais

horários, sensoriamento remoto, etc.

( ii ) LF – Frequências baixas (Low frequency) – 30 a 300 kHz

(10km 1km)

Os mecanismos de propagação são os mesmos da faixa de VLF. As aplicações também

têm pontos em comum com a faixa anterior. Por exemplo, móvel marítimo e

radionavegação marítima (Decca e Loran). Adicionalmente, vale citar a radiodifusão de

ondas longas (Região 1 da UIT) e radionavegação aeronáutica (rádio farol).

(iii) MF – Frequências médias (Medium frequency) – 300 a 3000 kHz

(1000m 100m)

O uso de monopolos verticais (em geral da ordem de /4) para a radiodifusão de ondas

médias, serviço de maior relevância desta faixa, faz com que o mecanismo principal

seja a onda de superfície. Durante à noite há possibilidade de propagação ionosférica a

longa distância, que mecanismo potencial de interferência entre estações de

radiodifusão.

( iv ) HF – Frequências altas (High frequency) – 3 a 30 MHz

(100m 10m )

A propagação ionosférica constitui o principal mecanismo. As aplicações aproveitam

este mecanismo para serviços de longa distância, como serviço fixo ponto-a-ponto,

móvel marítimo e móvel; aeronáutico, radiodifusão de ondas curtas, etc. Para curtas

distâncias a onda de superfície pode ser utilizada. Uma importante aplicação neste caso

é a propagação em floresta, quando um ou ambos os terminais estão imersos na

vegetação.

( v ) VHF – Frequências muito altas (Very high frequency) – 30 a 300 MHz

(10m 1m )

Nesta faixa três mecanismos podem igualmente ser utilizados: visibilidade, difração e

difusão troposférica. Entretanto, sob o ponto de vista prático, destaca-se o mecanismo

da difração. Isto porque, a visibilidade não é, em geral, economicamente viável por

necessitar de antenas muito elevadas, encarecendo o custo das torres. Por outro lado, a

difusão requer transmissores de alta potência, afetando não apenas o custo, mas também

agindo como uma potencial fonte de interferência. No que diz respeito ao serviços, esta

faixa tem uma ampla gama de aplicações. Com serviço móveis e fixos diversos,

radiodifusão de TV (canais de VHF) e FM, radionavegação aeronáutica, etc.

( vi ) UHF – Frequências ultra altas (Ultra high frequency) – 300 a 3000 MHz

(1m 0,1m)

Entre 300 e 1000 MHz esta faixa tem características bastante similares à faixa de VHF

comentada anteriormente. A partir de 1000 MHz, o mecanismo de visibilidade começa

a se tornar adequado por utilizar antenas menos elevadas e pelo fato da difração

introduzir maiores níveis de atenuação. Entretanto, com o congestionamento do

espectro em frequências abaixo de 1000 MHz, este quadro está sendo modificado, pois

freqüências no entorno de 2GHz estão sendo empregadas na expansão do serviço

telefônico móvel. Como na faixa de VHF, os serviços são bastante diversificados, ou

seja, serviços fixos e móveis, incluindo a telefonia celular (faixas de 800/900MHz e

1,8/1,9GHz), radiodifusão de televisão (canis de UHF), satélite móvel, telemetria e

rastreio (satélite), sistemas radar, radionavegação aeronáutica, etc.

( vii ) SHF – Frequências super altas (Super high frequency) – 3 a 30 GHz

(10cm 1cm)

Predominam as ligações em visibilidade dos sistemas de comunicações ponto-a-ponto e

ponto-multiponto de média e alta capacidades. Os satélites geoestacionários (e

futuramente não-geoestacionários) são também usuários desta faixa. Sistemas radar e

sensoriamento remoto da terra por satélite são outros serviços que utilizam a faixa de

SHF. A partir de 10 GHz atenuação por chuva passa a constituir uma importante

limitação no desempenho dos sistemas que operam nestas freqüências, onde também se

faz sentir o efeito da absorção por gases da atmosfera (oxigênio e vapor d’água).

(viii) EHF – Frequências extremamente altas (Extremely high frequency) – 30 a 300 GHz

(10mm 1mm)

Nesta faixa os efeitos da atmosfera (chuva, neve, nuvens e absorção por gases) são

bastante acentuados, reduzindo substancialmente a distância de cobertura nos sistemas

terrestres e dificultando a realização de projeto de comunicações por satélite com alta

confiabilidade. Embora a UIT tenha atribuição de serviços nesta faixa até 275 GHz, a

operação comercial está limitada atualmente a 50 GHz.

Cumpre informar que na terminologia utilizada em comunicações por satélite, outra

classificação, não oficializada pela UIT e originária dos sistemas radar, é também

encontrada na literatura técnica. Esta classificação é apresentada na Tabela 2.2 com um

resumo das aplicações em cada banda.

TABELA II

DESIGNAÇÃO DAS BANDAS DE FREQUÊNCIA PARA SATÉLITE

Designação Faixa Aplicações

Banda L

1 – 2 GHz

Sistemas Móveis, Radiodifusão

Sonora, Radiolocalização

Banda S

2 – 4 GHz

Sistemas Móveis, Radionavegação

Banda C

4 – 8 GHz

Sistemas Fixos

Banda X

8 – 12 GHz

Aplicações Militares

Banda Ku

12 – 18 GHz

Sistemas Fixos, Radiodifusão de

Televisão

Banda K

18 – 27 GHz

Sistemas Fixos

Banda Ka

27 – 40 GHz

Sistemas Fixos, Radiodifusão de

Televisão, Entre Satélites

A administração do espectro de frequências é uma atividade de fundamental

importância na coordenação dos sistemas de radiocomunicações. Por exemplo, no

compartilhamento de frequências entre diferentes sistemas (terrestres e/ou espaciais), o

uso otimizado do espectro é a base da solução que permite contornar os problemas de

interferência que podem resultar deste procedimento.

Internacionalmente, a coordenação das redes de telecomunicações dos setores

governamentais e privados de seus países membros é exercida pela UIT. Esta

organização é estruturada com uma Secretaria Geral e 3 (três) setores específicos: Setor

de Radiocomunicações (UIT-R), Setor de Padronização das Telecomunicações (UIT-T)

e Setor de Desenvolvimento das Telecomunicações (UIT-D). No contexto da

administração de frequências, o setor responsável é o UIT-R, cujo objetivo é assegurar o

uso racional, equitativo, eficiente e econômico do espectro e das órbitas dos satélites de

comunicações. Para fins de coordenação do uso do espectro, o globo é dividido em 3

(três) regiões, como mostra a figura 26: Região 1 – Europa e África, incluindo a parte

asiática da Rússia e a Mongólia; Região 2 – Américas; Região 3 – Ásia (exceto a parte

pertencente à Região 1) e países do Pacífico. A atribuição de frequências, por Região,

consta do Artigo S5 do Regulamento de Radiocomunicações (RR) da UIT, o qual serve

de referência para a elaboração da documentação dos países membros.

Concluindo as considerações sobre o espectro de frequências, vale acrescentar

características associadas às dimensões das antenas utilizadas em cada faixa.

a) Dimensão << λ – Faixas de VLF e LF

Tipos de antena: Dipolos e monopolos curtos;

b) Dimensão ~ λ – Faixas de MF, HF, VHF e UHF (até ~ 1-2 GHz)

Tipos de antena: Monopolo de λ/4 (MF); Dipolo de λ/2, conjunto de dipolos,

monopolo de λ/4 (HF); Conjuntos de dipolos, antenas Yagi, refletor de canto, log-

periódica, helicoidal, etc. (VHF e UHF);

c) Dimensão >> λ – Faixas de UHF (acima de 1-2 GHz), SHF e EHF

Tipos de antena: Refletores parabólicos, antenas impressas, etc.

Fig. 26 – Regiões 1, 2 e 3 da UIT

PARTE II

PROPAGACÃO PONTO-ÁREA COM

APLICAÇÕES AOS SISTEMAS

MÓVEIS CELULARES

PROPAGAÇÃO PONTO-ÁREA

A propagação nos sistemas móveis é do tipo ponto-área, entre um terminal fixo,

denominado estação rádio base (ERB), e terminais móveis distribuídos aleatoriamente

na área em estudo (célula). A cobertura de uma ERB estende-se desde algumas dezenas

de metros em ambientes interiores (picocélulas) até dez a vinte quilômetros nas células

localizadas em zonas rurais. Por outro lado, considerando a aleatoriedade do terminal

móvel, esta cobertura é usualmente estimada por um procedimento estatístico. Neste

contexto, cumpre informar que os sistemas celulares atuais são dimensionados para

cobrir entre 90 e 95% das células.

Os modelos utilizados no cálculo da propagação ponto-área podem ser determinísticos,

empíricos ou semiempíricos. Relativamente aos modelos determinísticos destaca-se a

técnica de traçado de raios como ferramenta para a estimativa precisa da atenuação

entre os pontos de transmissão e recepção. Entretanto, esta precisão depende da

disponibilidade de informações detalhadas sobre a urbanização da área em estudo.

Adicionalmente, tendo em vista os cálculos necessários para obter, em termos

estatísticos, a cobertura da célula, deve-se dispor de um software específico.

Obviamente, este software dever ser ajustado em função da morfologia de cada caso.

No caso dos modelos empíricos ou semiempíricos, a necessidade de informação sobre a

urbanização é menos crítica. É claro que existem modelos deste tipo onde é

imprescindível certo detalhamento dos dados locais. Entretanto, lançando-se mão da

experiência acumulada sobre o assunto e utilizando como referência os fenômenos de

propagação comentados anteriormente é possível estruturar modelos a partir de um

conjunto mínimo de parâmetros.

DESVANECIMENTO DOS SINAIS

Entende-se por desvanecimento a variabilidade do sinal que se observa no ponto de

recepção. O desvanecimento nos sistemas móveis pode ser estudado sob dois aspectos:

grande escala (janela da ordem de centenas de comprimento de onda do sinal) e pequena

escala (janela da ordem de dezenas de comprimento de onda do sinal). A Fig. 1

apresenta um exemplo de variação do sinal a medida que o terminal móvel se desloca.

Fig. 1 – Exemplo da variabilidade do sinal

As variações de grande escala estão associadas a: a) variação do valor mediano do sinal

em função da distância entre os terminais; b) variação do valor mediano que se observa

quando a distância transmissor-receptor se mantém fixa e o terminal móvel percorre

uma circunferência de centro na estação rádio base (sombreamento). O desvanecimento

em grande escala é ocasionado principalmente por obstáculos, tais como elevações do

terreno, construções, vegetação, etc. que se encontram no trajeto entre o transmissor e o

receptor. Em geral, este desvanecimento é caracterizado por uma distribuição de

probabilidade log-normal de média nula e desvio padrão típico de 4 à 12 dB.

As variações de pequena escala são causadas pela multiplicidade de percursos da

energia, causados por reflexão, difração e espalhamento, no trajeto entre o transmissor e

o receptor (desvanecimento multipercurso) e pela velocidade do terminal móvel (efeito

Doppler). O multipercurso está associado à dispersão do sinal no domínio do tempo,

enquanto o efeito Doppler provoca uma dispersão no domínio da frequência,

acarretando variabilidade temporal do canal de propagação. A Fig. 2 detalha os diversos

tipos de desvanecimento que podem ser classificados.

Fig. 2 – Tipos de desvanecimento

Desvanecimento em grande escala

O passo inicial na análise do desvanecimento em grande escala e estimar o valor

mediano da atenuação do sinal entre os terminais. Neste particular, conforme

comentado anteriormente, a altura da antena da ERB representa um parâmetro

importante no dimensionamento de um sistema celular. Quando a antena situa-se acima

da altura média dos prédios, dependendo da diretividade da antena utilizada, a cobertura

pode ser omnidirecional ou setorial. Esta situação modifica-se totalmente se a antena da

ERB estiver localizada abaixo do nível médio dos prédios, quando a cobertura se

restringe à rua principal (longitudinal) e, em menor profundidade, às ruas transversais,

através do efeito da difração nas esquinas. Obviamente, dependendo do tipo de célula a

ser coberta, ou mais precisamente, da altura da antena da ERB, procedimentos distintos

para o cálculo da atenuação devem ser adotados. Os sistemas móveis de 1ª e 2ª gerações

foram implementados nas faixas de 800 e 900 MHz com as antenas das ERBs

localizadas acima do nível médio dos prédios. Com o aumento de tráfego, houve uma

DESVANECIMENTO SELETIVO

DESVANECIMENTO PLANO

DESVANECIMENTO RÁPIDO

DESVANECIMENTO LENTO

VARIABILIDADE EM PEQUENA ESCALA

VARIABILIDADE DO SINAL

VARIABILIDADE EM GRANDE ESCALA

VARIAÇÃO DO NÍVEL MEDIANO DO

SINAL COM A DISTÂNCIA

DESVANECIMENTO EM GRANDE ESCALA

(POR SOMBREAMENTO)

VARIAÇÃO TEMPORAL DO CANAL

DISPERSÃO DO SINAL

redução progressiva do raio de cobertura até a introdução do conceito de microcélula,

levando a uma situação onde é mais adequado posicionar a ERB abaixo do nível médio

dos prédios. Posteriormente, com a utilização da faixa de 1800MHz, esta condição

tomou vulto, havendo uma reformulação significativa na metodologia de cálculo da

atenuação de propagação.

Antena da ERB acima da altura média dos prédios

Nesta situação é usual empregar procedimentos empíricos ou semiempíricos no cálculo

da atenuação mediana, onde os dados experimentais disponíveis são responsáveis por

uma parcela significativa da precisão do modelo adotado. O modelo conhecido por

Okumura-Hata é relativamente simples e apresenta resultados suficientemente precisos

para o planejamento de sistemas celulares. Este modelo empírico foi desenvolvido por

Hata ajustando fórmulas matemáticas aos resultados gráficos de Okumura. De acordo

com Hata, para a faixa de frequências entre 150 e 1500 MHz, a atenuação básica

mediana para uma área urbana ( buA ) é dada por,

dhhahfdBA bmbbu loglog55,69,44log83,13log16,2655,69

onde

f – frequência em MHz;

hm – altura da antena da estação móvel em metros;

hb – altura da antena da ERB em metros (limitada à faixa entre 30 e 200 m);

d – distância entre a ERB e a estação móvel em km (limitada à faixa entre 1 e 20 km).

A função mha depende da altura da estação móvel. No caso usual de mhm 5,1 , esta

função é igual a zero. Para outros valores de hm a função mha é dada por,

Cidades de pequeno ou médio porte

8,0log56,17,0log1,1 fhfha mm

Cidades de grande porte

1,154,1log29,82 mm hha , se MHzf 300

97,475,11log2,32 mm hha , se MHzf 300

No que diz respeito a áreas suburbanas e rurais, tem-se para atenuação básica mediana

de propagação,

Área suburbana ( bsA ),

4,528

log2

2

fdBAdBA bubs

Área rural ( brA )

94,40log33,18log78,42

ffdBAdBA bubr

Cumpre acrescentar que, para fins de planejamento, na determinação do raio de

cobertura de uma célula é conveniente separar a parcela que depende da distância dos

demais parâmetros. Lembrando que a atenuação sobre a terra plana varia com d4,

associa-se a este caso a uma dependência do tipo dγ. Assim, pode-se escrever para,

)()()( 21 dBAdBAdBAbu

onde

)()log(82,13)log(16,2655,69)(1 mb hahfdBA

ddBA log10)(2

10/)]log(55,69,44[ bh

Na faixa de 1,5 a 2,0 GHz utiliza-se uma extensão da formulação de Okumura-Hata

onde a atenuação básica mediana de propagação é dada por,

Mbmbbu CdhhahfdBA loglog55,69,44log82,13log9,333,46

sendo CM uma correção de 3 dB aplicável em áreas urbanas densas. Em outras áreas esta

constante deve ser tomada igual a zero. Neste caso, a expressão para A1 passa a,

Mmb ChahfdBA )](log[82,13)log(9,333,46)(1

Mantendo-se as definições de A2 e no que se refere a cidades pequenas e médias,

assim como as expressões para áreas suburbanas e rurais.

Antena da ERB abaixo da altura média dos prédios

Esta situação é de particular interesse para áreas urbanas onde existe elevada

concentração de prédios formando corredores (canyons) ao longo das ruas, como mostra

a Fig.3. O cálculo da atenuação neste caso pode ser feito com precisão tendo por base a

técnica de traçado de raios. Entretanto, conforme comentado anteriormente, a precisão

depende do detalhe da urbanização disponível na área em estudo. Para fins de

planejamento podem ser utilizados modelos mais simples, cujos resultados são

ajustados posteriormente. Este trabalho emprega um modelo que, dependendo da

distância entre a ERB e o terminal móvel, tem por referência a propagação em espaço

livre ou sobre uma terra plana. Adicionalmente, o modelo leva em conta, através de um

fator de bloqueio (), os seguintes fatores:

a) Difração lateral nas paredes dos prédios ao longo das ruas (Fig.4);

b) Atenuação causada pela vegetação urbana (Fig.5);

c) Espalhamento do sinal por pedestres, fios da rede elétrica, sinais de trânsito, etc.

(Fig.5).

Por outro lado, devido ao efeito das viaturas em deslocamento, supõe-se uma elevação

do nível de referência do plano de reflexão.

Fig. 3 – Canyon urbano

Fig.4 – Condições de difração em um canyon urbano

Fig. 5- Ilustração dos fatores que causam absorção e espalhamento em vias

urbanas

A partir do modelo da terra plana e com base em dados experimentais foi feita a análise

do exemplo mostrado na Fig.6. Neste exemplo, tem-se 3 (três) itens a serem

considerados:

a) A propagação entre a ERB e a esquina das ruas principal e transversal;

b) A difração na quina do prédio que separa as duas ruas;

c) A propagação no trecho entre a esquina e o terminal móvel.

No item (a), dependendo da folga do trajeto, é utilizado o modelo do espaço livre ou da

terra plana. No caso da terra plana, supõe-se a reflexão no teto das viaturas. Os efeitos

de difração lateral e espalhamento são levados em conta através de um fator de bloqueio

definido a partir de dados experimentais;

No item (b), a difração na esquina é avaliada pela Teoria Geométrica da Difração, sendo

da ordem de 10 a 30 dB. É razoável tomar 20 dB como valor de referência;

No item (c), há necessidade de introduzir a conceituação de propagação em percurso

misto para considerar a transição da rua principal para a rua transversal. Relativamente

aos efeitos de reflexão e bloqueio, procede-se de modo similar ao item (a).

Fig. 6 – Exemplo ilustrativo

A Fig. 7 mostra a comparação entre a estimativa de cálculo com base nas considerações

acima e dados teóricos e experimentais nas frequências de 2 e 6 GHz. No trecho na rua

principal, o modelo aqui descrito é mais pessimista, provavelmente pelo emprego do

fator de bloqueio. A atenuação por difração na esquina é coerente com o valor de

referência de 20 dB. Quanto à propagação na rua transversal há uma concordância

satisfatória entre as medidas e a teoria. De um modo geral, pode-se dizer que o modelo

de cálculo proposto é adequado. Com a finalidade de reduzir a margem de erro, é

recomendável a realização de ajustes a partir da comparação com uma quantidade maior

de dados experimentais.

Fig. 7 – Análise comparativa entre resultados teóricos e experimentais

Percentagem de cobertura da área (PCA)

Em um sistema celular a cobertura adequada das células depende do correto

dimensionamento dos equipamentos a serem empregados no enlace entre a ERB e o

terminal móvel. Considerando o posicionamento aleatório do terminal móvel no interior

da célula, conforme comentado anteriormente, a cobertura é avaliada através de um

procedimento estatístico. Neste contexto, supondo que o problema possa ser tratado

através de uma distribuição normal, a percentagem de cobertura de uma célula é dada

por,

b

aberfeaerfPCA b

ab1

1)(12

1 2

12

onde

x

t dtexerf0

22)(

- função de erro;

2

log10;

2

eb

Ma

M – margem de desvanecimento;

σ – desvio padrão da distribuição normal;

γ – expoente da variação com a distância (dγ).

Resultados experimentais mostram que é razoável adotar γ = 3,5 na aplicação da

expressão acima. Tomando-se este valor como referência, chega-se à Tabela I, onde a

margem de desvanecimento é dada em função da percentagem de cobertura desejada e

do desvio padrão da distribuição normal.

TABELA I

PERCENTAGEM DE COBERTURA DA ÁREA

Desvanecimento em pequena escala

A variabilidade em pequena escala refere-se a mudanças bruscas na amplitude e na fase

do sinal quando a distância entre o transmissor é levemente alterada. Para deslocamento

da ordem ou menores que um comprimento de onda, estas variações podem chegar a

cerca de 30 a 40 dB em relação ao valor médio do sinal. Conforme comentado

anteriormente, este desvanecimento é causado pela existência de múltiplas trajetórias da

energia entre o transmissor e o receptor e pelo efeito Doppler. Vale acrescentar que,

embora analisados separadamente, se houver movimentação do terminal móvel, estes

fenômenos afetam simultaneamente o sinal recebido.

Dispersão do sinal

Havendo multipercurso, o sinal captado pelo receptor não se restringirá apenas à uma

cópia do sinal transmitido, mas ao somatório de várias réplicas deste sinal, cada uma

com sua amplitude, fase, retardo temporal e ângulo de chegada. No domínio do tempo

os parâmetros do multipercurso são retirados do perfil de retardos (delay power

profile) – P(τ) que corresponde a representação da potência do sinal recebido como

função do retardo temporal em relação a um tempo fixo de referência. A Fig. 8 ilustra

um perfil de retardos típico onde se pode destacar,

Fig. 8 – Perfil de retardos

Cobertura

(%)

Desvio padrão (dB)

6,0 6,5 7,0 7,5 8,0 8,5 9,0 9,5 10,0 10,5 11,0 11,5

90 3,3 3,9 4,4 4,9 5,5 6,0 6,6 7,1 7,7 8,2 8,8 9,4

95 5,9 6,6 7,3 8,0 8,7 9,4 10,2 10,9 11,6 12,4 13,1 13,9

98 9,3 10,2 11,2 12,1 13,1 14,0 15,0 16,0 16,9 17,9 18,9 19,9

τA – Retardo do primeiro sinal que chega ao receptor;

τe – Retardo médio;

τRMS – Valor RMS do retardo (desvio padrão);

τA – Valor máximo do retardo relativo a um nível de limiar do sinal.

A análise da propagação multipercurso, no domínio do tempo, depende da relação entre

a duração do símbolo transmitido (TS) e o desvio padrão de retardos (delay-spread -

RMS), que é a raiz quadrada do segundo momento central do perfil de potência de

retardos. Em outras palavras, se RMS for muito menor que TS , todas as componentes do

multipercurso chegam dentro do mesmo período de símbolo, não ocorrendo a

interferência entre pulsos adjacentes (IES – Interferência Entre Símbolos ou ISI –

InterSymbol Interference). Em contrapartida, se RMS é da ordem ou maior que TS,

haverá ocorrência de IES.

Associado ao RMS está o conceito de faixa de coerência (BC), com a qual se pode

verificar o grau de correlação entre duas frequências dentro de uma determinada faixa de

frequências. O valor de BC é proporcional ao inverso de RMS. Assim, dependendo do

tamanho da faixa de transmissão (B), desvanecimentos distintos (descorrelatados) podem

ou não acontecer para frequências diferentes dentro de B. Dependendo do grau de

correlação considerado, BC é dada por,

ρ = 0,5; RMS

CB5

1

ρ = 0,9; RMS

CB50

1

onde ρ é o fator de correlação.

Em função da dimensão relativa entre B e BC, dois tipos de desvanecimentos podem ser

definidos:

a) Desvanecimento plano – no caso de B ser muito menor que BC ou TS muito maior

que RMS. O sinal sujeito a este desvanecimento é denominado de faixa estreita;

b) Desvanecimento seletivo – no caso de B ser da ordem ou maior que BC ou TS da

ordem ou menor que RMS. O sinal sujeito a este tipo de desvanecimento é

denominado de faixa larga.

Variabilidade temporal do canal

A variabilidade temporal do canal é consequência do movimento relativo entre o

receptor e o transmissor, da modificação das propriedades físicas do canal ao longo do

tempo e do movimento apresentado pelo ambiente (vegetação, veículos, etc.). Na

maioria dos casos, a principal responsável pela variação temporal do canal é a

mobilidade do receptor, porém existem situações onde os outros dois fatores são

dominantes. Este trabalho analisará apenas a variabilidade do canal relacionada com a

mobilidade do receptor, porém o efeito dos dois outros fatores será análogo. A análise

deste problema está baseada em dois conceitos: tempo de coerência (TC) e o desvio

Doppler máximo (fD).

O desvio Doppler é observado como um deslocamento da frequência em consequência

da variação do canal com o tempo. Este deslocamento é proporcional à velocidade (v)

do receptor móvel e seu valor máximo vale v , onde é o comprimento de onda do

sinal. O tempo de coerência (TC) é proporcional ao inverso da faixa Doppler e

corresponde a uma medida estatística da duração temporal na qual o canal é invariante.

Embora não haja uma única definição de TC, uma definição geralmente aceita é tomar

TC como a média geométrica entre TC dado pelo inverso de fD (1CT ) e o valor

correspondente a um fator de correlação temporal igual a 0,5 (2CT ), isto é,

D

C

D

Cf

Tf

T16

9;

121

DDD

CCCfff

TTT423,0

16

9121

21

Para o caso do domínio da frequência, a análise da dispersão do sinal, depende da

relação entre a dimensão da faixa de transmissão (B) e fD. Dois tipos diferentes de

desvanecimento podem ocorrer:

a) Desvanecimento lento: no caso de B ser muito maior que fD ou TS muito menor que

TC;

b) Desvanecimento rápido: no caso de B ser da ordem ou menor que fD ou TS da

ordem ou maior que TC. Nesta condição o canal é dito seletivo no tempo, sendo dual

em relação ao canal seletivo em frequência discutido na Seção anterior. Sob o ponto

de vista prático, este desvanecimento somente ocorre para baixas taxas de

transmissão (da ordem de 15 kbps ou menos).

Verificou-se que para valores da BER (Bit Error Rate – Taxa de erro de bit) entre 10-3

e

10-4

o sinal irá sofrer desvanecimento lento para B > 100 a 200fD. Através de simulação

[4] foi verificado que para B > 150fD garante-se, na maioria dos casos, uma BER < 10-3

.

No domínio do tempo a relação corresponde à TS < TC / 27.

Na analise da variação temporal do canal, no domínio do tempo, dois outros parâmetros

são importantes, a taxa de cruzamento de nível (NR) e duração média de

desvanecimento (<R>), que correspondem à medida da correlação temporal dos pulsos

durante o desvanecimento. Estes parâmetros são definidos por,

)exp()2( 22/1 DR fN

e

2/1

2

)2(

1)exp()(

Df

onde ρ = A/Arms é a relação entre o nível de limiar e o valor rms da amplitude do

envelope de desvanecimento. A título de exemplo numérico, o valor rms da amplitude

do sinal é cruzado em uma taxa de 0,915fD.

Nos sistemas reais o retardo no tempo e o desvio Doppler causam simultaneamente

problemas desvanecimento. Consequentemente, pode-se ter as seguintes combinações

de desvanecimento:

Desvanecimento plano e lento – neste caso os efeitos da IES e do desvio Doppler

podem ser ignorados;

Desvanecimento seletivo e lento – o efeito Doppler pode ser ignorado, mas a IES deve

ser levada em conta;

Desvanecimento plano e rápido – o sinal é tratado como faixa estreita, porém o efeito

Doppler deve ser considerado;

Desvanecimento seletivo e rápido – tendo em vista os valores típicos da faixa de

transmissão e da velocidade do terminal móvel este desvanecimento tem grande

probabilidade de não ocorrer em um sistema celular.

TÉCNICAS DE MELHORIA

No que diz respeito à propagação dos sinais, a degradação da qualidade em um sistema

celular está associada a 3 (três) fatores: a redução do valor da relação portadora/ruído

(RPR) na entrada do receptor, o espalhamento no domínio do tempo (distorção de

frequência) e o espalhamento no domínio da frequência (distorção temporal). As

técnicas de melhoria têm por objetivo minimizar o efeito destes fatores de modo a

manter o desempenho do sistema dentro de um padrão adequado.

Redução da RPR

Este efeito é causado pelo desvanecimento plano. Para minimizar este efeito as

principais técnicas são: a) o aumento da potência de transmissão e/ou aumento do ganho

de antena, b) a modificação do tipo de modulação, c) o emprego de códigos corretores

de erro e d) a recepção em diversidade. No caso dos sistemas celulares, à técnica citada

em (a) não possibilita um ajuste dinâmico em função da variabilidade do sinal na

entrada do receptor. Os parâmetros potência e ganho de antena são especificados no

projeto em função da cobertura da célula. Uma vez atingida a margem definida na

Tabela I, tais parâmetros não garantem uma melhoria do desempenho. O mesmo se

aplica ao tipo de modulação, definido em função da taxa de transmissão e da largura de

faixa necessária. Desta forma, serão consideradas a seguir as técnicas definidas nos itens

(c) e (d).

Códigos corretores de erro

A base desta técnica é a introdução controlada nos dados transmitidos de bits

redundantes que possam ser utilizados na detecção e correção dos erros causados pelo

canal de transmissão. A detecção de erros pode ser feita através de um procedimento

simples conhecido por paridade. Para isto divide-se a mensagem original em blocos de

bits onde, dependendo da soma módulo-2 de cada bloco, acrescenta-se um bit de

paridade que poderá, em função do critério utilizado ser 1 ou 0. Por exemplo, no bloco

1011101, cuja soma é 1, acrescentou-se o bit 1 (igual à soma). A soma do novo bloco

assim formado (10111011) será 0. A verificação de ter havido ou não erro é feita pela

soma dos bits deste bloco no receptor. Caso tenha sido recebido o bloco abaixo,

10011011 soma 0, quando deveria ser 1

erro

é imediato concluir que houve um erro. Este procedimento indica ter havido erro, porém

não faz correção. È claro que, se houver dois erros no mesmo bloco não haverá

indicação de erro. No entanto, esta possibilidade é remota devido à utilização da técnica

de entrelaçamento de bits descrita adiante. Nos sistemas celulares emprega-se o código

CRC (Cyclic Redundancy Check) para verificar a existência de erros em uma mensagem

através de redundância. Este código é usualmente empregado para verificar a qualidade

da transmissão pela quantidade de erros observados, seja pela taxa de erro de bits (BER

– Bit Error Rate) ou pela taxa de erros por quadro (FER – Frame Error Rate).

Para detectar e corrigir erros no próprio receptor emprega-se os codificadores do tipo

FEC (Forward Error Correction). Para esta finalidade, são classificados dois tipos de

códigos: código de bloco e código convolucional. Encontra-se ainda na literatura a

denominação de código concatenado que, na realidade consiste de uma combinação de

um código de bloco com um convolucional.

Na codificação de bloco a mensagem é dividida em blocos de k bits. A cada bloco

acrescentam-se r bits de redundância. O ponto fundamental desta técnica é estabelecer

um algoritmo para geração dos bits redundantes de forma que, no receptor, possa ser

feita a detecção de erros e a correção desejada. Nos códigos convolucionais os bits de

informação não são grupados em bloco. A sequência destes bits geram uma outra

sequência de bits que depende da composição dos registradores usados na codificação.

Um código deste tipo é caracterizado por 3 (três) inteiros n, k e K. A relação k/n tem o

mesmo significado dos códigos de bloco (bit de informação por bit codificado). O

inteiro K é um parâmetro conhecido por comprimento limite e representa o número de

bits de entrada do qual depende a saída codificada. Na decodificação os erros são

detectados porque correspondem a sequências de transição que não foram transmitidas.

Quando é encontrado um erro, o decodificador verifica todas as possíveis sequências

que poderiam ter sido transmitidas e seleciona a mais provável. Um dos melhores

algoritmos para decodificação de códigos convolucionais foi desenvolvido por Viterbi.

Por este motivo, os sistemas atuais fazem referência ao decodificador Viterbi.

Os sistemas atuais permitem um ajuste dinâmico dos bits redundantes, aumentando o

número quando as condições do canal estão desfavoráveis e reduzindo quando o inverso

acontece. Embora reduza a taxa de transmissão quando o desvanecimento plano é mais

intenso, este procedimento assegura uma qualidade de sinal aproximadamente

constante. O estudo em detalhe das técnicas codificação não está dentro do escopo deste

texto. O leitor interessado poderá obter detalhes na literatura técnica especializada.

Recepção em diversidade

Este técnica corresponde à recepção de dois ou mais sinais descorrelatados que contêm

a mesma informação. As técnicas usuais de diversidade são: a) diversidade de espaço;

b) diversidade de frequência; c) diversidade de polarização. A seguir, são apresentados

alguns comentários sobre estas técnicas.

a) Diversidade de espaço

As antenas de recepção devem estar separadas por uma distância tal que garanta a

descorrelação dos sinais. Uma separação de alguns comprimentos de onda é suficiente.

Trata-se de uma técnica simples, econômica e de fácil implementação. Usualmente a

recepção em diversidade de espaço é feita com apenas duas antenas.

Relativamente ao processamento dos sinais, pode-se ter diversidade por comutação e

por combinação. No primeiro caso o receptor escolhe o melhor sinal a cada instante e no

segundo os dois sinais são aproveitados e combinados convenientemente. Um exemplo

da diversidade por comutação é mostrado na Fig.9. Nesta figura, a melhoria obtida está

associada ao nível de intensidade do sinal correspondente à linha cheia que define o

envelope dos sinais isoladamente.

Intensidade do sinal

Distância

Fig. 9 – Diversidade dupla de espaço com comutação dos sinais

b) Diversidade de frequência

Neste caso, o mesmo sinal é transmitido simultaneamente em duas ou mais portadoras.

O espaçamento entre as portadoras deve ser maior do que a faixa de coerência para

garantir a descorrelação entre os sinais. Esta técnica não faz uso econômico do espectro

de frequências, não sendo utilizada pelos sistemas celulares.

c) Diversidade de polarização

O receptor utiliza duas antenas polarizadas ortogonalmente. As antenas podem estar

separadas ou montadas em uma mesma estrutura. Apesar da vantagem adicional

proporcionada pela separação espacial, a primeira configuração requer uma área maior

para sua instalação. Nesta técnica, a descorrelação dos sinais é mais efetiva quando há

um número elevado de reflexões aleatórias ao longo dos trajetos de multipercurso,

situação típica das áreas urbanas.

Entrelaçamento de bits

Uma forma de diversidade no tempo utilizada em comunicações digitais é o

entrelaçamento de bits. Trata-se de uma técnica eficiente no combate a erros que

acontecem em rajada (error burst) em um canal com desvanecimento e que pode ser

vista como uma forma de diversidade de tempo. O princípio básico é distribuir

convenientemente os bits dos blocos codificados da mensagem original de modo que

bits contíguos fiquem separados. Com este procedimento, os erros de rajada da

mensagem original são transformados em erros individuais de bit na sequência da

mensagem gerada. Tais erros são de mais fácil correção através do FEC. A

implementação é simples, requer o uso de um dispositivo com memória e uma

estruturação em matriz onde, por exemplo, os bits são arquivados em linha e lidos em

coluna para serem transmitidos. Na recepção faz-se a operação inversa. A desvantagem

desta técnica é o aumento do retardo na transmissão da informação, tendo em vista o

tempo adicional requerido para o entrelaçamento e desentrelaçamento dos bits.

Entretanto, fixando adequadamente a duração dos blocos que serão entrelaçados, o

possível efeito desfavorável torna-se imperceptível. O princípio desta ideia é ilustrado a

seguir, para o caso de blocos com 7 bits.

SAÍDA

ENTRADA A1 A2 A3 A4 A5 A6 A7

B1 B2 B3 B4 B5 B6 B7

C1 C2 C3 C4 C5 C6 C7

D1 D2 D3 D4 D5 D6 D7

E1 E2 E3 E4 E5 E6 E7

F1 F2 F3 F4 F5 F6 F7

G1 G2 G3 G4 G5 G6 G7

Tem-se então como entrada,

A1A2A3A4A5A6A7B1B2B3B4B5B6B7C1CC2C3C4C5C6C7D1D2D3D4D5D

6D7E1E2E3E4E5E6E7F1F2F3F4F5F6F7G1G2G3G4G5G6G7

e, na saída (bits transmitidos),

A1B1C1D1E1F1G1A2B2C2D2E2F2G2A3B3C3D3E3F3G3A4B4C4D4E4F4G

4A5B5C5D5E5F5G5A6B6C6D6E6F6G6A7B7C7D7E7F7G7

Portanto, um erro em rajada afetando, por exemplo, até um máximo de 7 bits conforme

sublinhado acima, introduz erro de apenas um bit por bloco.

Equalização

Através desta técnica, a compensação pela distorção em frequência causada pelo

desvanecimento multipercurso é feita pelo reagrupamento da energia dispersada no

tempo do símbolo original. Em outras palavras, a equalização introduz uma filtragem tal

que, em combinação com a distorção do canal, leve a uma resposta plana em frequência

e linear em fase. Para os canais invariantes no tempo, a definição de suas características

é mais simples, permitindo o uso de equalizadores fixos. Entretanto, o canal rádio móvel

é variante no tempo, sendo necessário que o equalizador se adapte ao canal a cada

instante. A este tipo de equalizador é dado o nome de equalizadores adaptativos, os

quais têm a propriedade de capturar e seguir as variações do canal.

A grande vantagem do equalizador é que, além de combater a interferência entre

símbolos resultante do espalhamento temporal do sinal, atua também de modo

satisfatório na interferência co-canal. Tem como desvantagem a redução da relação

sinal-ruído devido à eliminação da energia dispersada fora do tempo de cada símbolo. A

equalização mais comum é a linear, a qual, no entanto, não se mostra adequada para o

canal rádio móvel. Os equalizadores não-lineares mais utilizados são: DFE (Decision

Feeback Equalizer) e MLSE (Maximum likelihood Sequence Estimation). Maiores

detalhes sobre esta técnica podem ser encontrados na literatura especializada.