interferÊncia eletromagnÉtica aplicada a...

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UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO CURSO DE ENGENHARIA ELÉTRICA INTERFERÊNCIA ELETROMAGNÉTICA APLICADA A ELETRÔNICA EMBARCADA DE VEÍCULOS Área de Engenharia Elétrica por Elder Eduardo de Ávila Geraldo Peres Caixeta, Doutor Orientador Campinas (SP), Dezembro de 2010

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UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO

CURSO DE ENGENHARIA ELÉTRICA

INTERFERÊNCIA ELETROMAGNÉTICA APLICADA A ELETRÔNICA EMBARCADA DE VEÍCULOS

Área de Engenharia Elétrica

por

Elder Eduardo de Ávila

Geraldo Peres Caixeta, Doutor Orientador

Campinas (SP), Dezembro de 2010

i

UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO

CURSO DE ENGENHARIA ELÉTRICA

INTERFERÊNCIA ELETROMAGNÉTICA APLICADA A ELETRÔNICA EMBARCADA DE VEÍCULOS

Área de Engenharia Elétrica

por

Elder Eduardo de Ávila

Relatório apresentado à Banca Examinadora do

Trabalho de Conclusão do Curso de Engenharia

Elétrica para análise e aprovação.

Orientador: Geraldo Peres Caixeta, Doutor

Campinas (SP), Dezembro de 2010

ii

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha esposa Renata e aos

meus pais, que sempre me apoiaram durante a

minha vida e ainda mais durante o período de

graduação.

iii

AGRADECIMENTOS

A Deus, autor da vida, por sempre me amar e me

capacitar a tornar-me tudo aquilo que sou. A minha

esposa, meus pais e meus irmãos que me apoiaram e

entenderam a minha ausência durante o período de

graduação. Ao professor D.r Geraldo Peres Caixeta

pelo incentivo e orientação deste trabalho.

Por último, agradeço aos professores do curso de

graduação em engenharia elétrica da Universidade São

Francisco e aos meus colegas de graduação pelos anos

de convivência e amizade.

iv

SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS ....................................................................................................... vi

LISTA DE FIGURAS .................................................................................................................... vii

LISTA DE TABELAS ................................................................................................................... viii

RESUMO ......................................................................................................................................... ix

ABSTRACT ...................................................................................................................................... x

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 1

1.1. EMC no contexto automotivo ..................................................................................................... 1

1.2. Objetivo geral .............................................................................................................................. 2

1.3. Objetivo específico ...................................................................................................................... 2

1.4. Metodologia ................................................................................................................................. 3

1.5. Estrutura do trabalho ................................................................................................................... 3

2. MOTIVAÇÃO PARA O ESTUDO DE EMC............................................................................. 4

2.1. História da EMC........................................................................................................................... 4

2.2. Definição de EMC........................................................................................................................ 6

2.3. Casos Práticos de EMI.................................................................................................................. 8

2.4. EMC na Indústria automotiva ..................................................................................................... 9

3. CONCEITOS IMPORTANTES NO ESTUDO DE EMC....................................................... 12

3.1. As equações de Maxwell............................................................................................................ 12

3.2. Regiões ao redor da fonte........................................................................................................... 14

3.2.1. Campo distante ....................................................................................................................... 15

3.2.2. Zona de transição .................................................................................................................... 15

3.2.3. Campo próximo....................................................................................................................... 15

3.3. Modelo de estudo para minimização de EMI ............................................................................ 15

3.4. Definição de componente e sistema .......................................................................................... 19

3.5. Relevância para EMC ................................................................................................................ 20

4. SISTEMA ELETRÔNICO AUTOMOTIVO .................. ........................................................ 22

4.1. As emissões radiadas por veículos: conceito ............................................................................. 22

4.2. O ruído Broadband .................................................................................................................... 23

4.2.1. O ruído do motor .................................................................................................................... 23

4.2.2. O ruído da ignição .................................................................................................................. 24

4.3. O ruído Narrowband ................................................................................................................. 26

v

4.3.1. Os microprocessadores e o ruído narrowband ....................................................................... 26

5. DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS ELETRÔNICOS AUTOMOTI VOS COM FOCO

EM EMC ......................................................................................................................................... 28

5.1. Minimização de EMI através da introdução de componentes ................................................... 28

5.2. Seleção de componentes ............................................................................................................ 29

5.3. Famílias lógicas e a relação dV/dt ............................................................................................. 31

5.4. Famílias lógicas e a relação dI/dt .............................................................................................. 32

5.5. Limiar de Imunidade ................................................................................................................. 33

5.6. Boas Práticas na Indústria Automotiva ..................................................................................... 34

5.7. Sistemas de Ignição .................................................................................................................. 35

5.7.1. Velas de Ignição ..................................................................................................................... 35

5.7.2. Cabeamento de Ignição .......................................................................................................... 38

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 40

6.1.Conclusão ................................................................................................................................... 40

6.2. Trabalhos futuros ....................................................................................................................... 41

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIAS ............................................................................................ 42

GLOSSÁRIO .................................................................................................................................. 43

vi

LISTA DE ABREVIATURAS

AC Alternating current

BB Broadband

CC Continuous current

CI Circuito Integrado

CISPR Comité International Spécial des Perturbations Radioeléctriques

DUT Device under test

EMC Electromagnetic Compatibility

EMI Electromagnetic Interference

FCC Federal Communications Commission

IEC International Electrotechnical Commission

NB Narrowband

PCB Printed circuit board

PCI Placa de circuito impresso

PWM Pulse width modulation

VLSI Very large scale of integration

vii

LISTA DE FIGURAS

Fig. 3.1 – Modelo de Compatibilidade Eletromagnética ................................................................... 7

Fig. 3.2 – Conceito de Imunidade e Susceptibilidade ....................................................................... 7

Fig. 3.3 – O sinal de onda quadrada e o seu espectro de frequência ................................................ 10

Fig. 4.1 – Fluxo Elétrico de uma carga ............................................................................................ 13

Fig. 4.2 – O fluxo magnético fora de um espaço fechado ................................................................ 13

Fig. 4.3 – Terceira equação de Maxwell .......................................................................................... 14

Fig. 4.4 – Quarta equação de Maxwell ............................................................................................. 15

Fig. 4.5 – Módulos envolvidos em compatibilidade eletromagnética .............................................. 16

Fig. 4.6 – Grupos de transferência de energia eletromagnética: ...................................................... 18

Fig. 4.7 – Definição de componente e sistema ................................................................................. 20

Fig. 5.1 – Ruído do tipo Narrowband e Broadband ........................................................................ 23

Fig. 5.2 – Sistema de Ignição ........................................................................................................... 24

Fig. 5.3 – Espectro de frequência de um ruído de ignição ............................................................... 25

Fig. 5.4 – Espectro de frequência genérico ...................................................................................... 27

Fig. 6.1 – Indutância mútua entre sistemas ...................................................................................... 30

Fig. 6.2 – Capacitância mútua entre sistemas .................................................................................. 31

Fig. 6.3 – Estágios de potência das famílias TTL e CMOS ............................................................. 32

Fig. 6.4 – Montagem de capacitor de desacoplamentos ................................................................... 33

Fig. 6.5 – Comparativo de potência e consumo específico de combustível com diversos valores de

resistor de supressão ......................................................................................................................... 35

Fig. 6.6 – Comparativo de tempo de partida em um motor com diversos valores de resistor de

supressão ........................................................................................................................................... 36

Fig. 6.7 – Resistor de supressão integrado a vela de ignição ........................................................... 37

Fig. 6.8 – Resistor de supressão integrado ao cabo de vela ............................................................. 38

Fig. 6.9 – Cabo blindado .................................................................................................................. 39

viii

LISTA DE TABELAS

Tab. 1.1 – Venda de veículos acumulada até setembro de 2010.........................................................1

Tab. 6.1 – Características das famílias lógicas ................................................................................ 31

Tab. 6.2 – Boas Práticas na Indústria Automotiva .......................................................................... 34

ix

RESUMO

DE AVILA, Elder Eduardo. Interferência Eletromagnética Aplicada a Eletrônica Embarcada

de Veículos. Campinas: Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade São Francisco, Campinas,

2010.

O aumento da utilização de sistemas eletrônicos cada vez mais complexos em veículos

gerou vários problemas ligados a compatibilidade eletromagnética que, conseqüentemente,

despertou na indústria automotiva a necessidade de um desenvolvimento de produtos e sistemas que

esteja alinhado a esta nova demanda. O assunto de compatibilidade eletromagnética vem ganhando

destaque à medida que casos de interferência eletromagnética tornam-se cada vez mais comuns.

Este trabalho aborda o histórico de problemas de compatibilidade eletromagnética na área

automotiva, a teoria na qual o assunto se fundamenta e aspectos práticos que devem ser

considerados durante a fase do desenvolvimento de produtos e sistemas para que se atinja um nível

de compatibilidade eletromagnética desejável com o menor custo.

PALAVRAS-CHAVE: Compatibilidade Eletromagnética, Interferência Eletromagnética,

Eletromagnetismo, Indústria Automotiva.

x

ABSTRACT

DE AVILA, Elder Eduardo. Interferência Eletromagnética Aplicada a Eletrônica Embarcada

de Veículos. Campinas: Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade São Francisco, Campinas,

2010.

The expansion of complex electronic systems usage for vehicles has brought a great number

of electromagnetic compatibility problems and thus, raised for the automotive industry the necessity

of a system and product development which must be aligned to this new demand. The

electromagnetic compatibility issue has been getting attention as soon as the electromagnetic

interference cases become common.

This work deals with the history of electromagnetic compatibility problems in the

automotive industry, the theory in which the subject is based on and practical aspects that should

be considered during system and products development phase in order to achieve a desirable level

of electromagnetic compatibility with the lowest cost.

KEYWORDS: Electromagnetic Compatibility, Electromagnetic Interference, Electromagnetism,

Automotive Industry.

1

1 INTRODUÇÃO

1.1 EMC no contexto automotivo

Sistemas de entretenimento interativos, comodidade, conforto, segurança e

emissões de poluentes cada vez menores, são os principais parâmetros que impulsionam

a indústria automotiva na atualidade. Estes mesmos parâmetros foram responsáveis por

uma revolução no mercado automotivo nos últimos anos, tornando a engenharia elétrica

uma área imprescindível no desenvolvimento de automóveis. Tudo isto trouxe um

grande aumento no número de veículos vendidos, dando a indústria automotiva ainda

mais destaque. Abaixo, apresenta-se um balanço dos quinze modelos de veículos mais

vendidos no Brasil até setembro de 2010.

Total: 1326540

Fonte: <http:// http://quatrorodas.abril.com.br/QR2/autoservico/top50/2010.shtml>

Tab. 1.1 – Venda de veículos acumulada até setembro de 2010.

2

A complexidade dos sistemas de eletrônica embarcada em veículos e a

interoperabilidade entre estes sistemas trouxeram alguns desafios consideráveis a

engenharia elétrica a fim de garantir a continuidade desta evolução. Dentre estes

desafios, destaca-se a compatibilidade eletromagnética.

Sistemas passaram a interferir no funcionamento de outros sistemas de maneira não

proposital através do seu próprio funcionamento. Além disso, com a difusão da

utilização de telefones celulares e da transmissão de dados por rádio frequência,

sistemas passaram a ter o seu funcionamento prejudicado pela interferência externa

indesejada. Estudos aprofundados passaram a existir voltados à área de compatibilidade

eletromagnética.

Mesmo com o desenvolvimento do estudo de compatibilidade eletromagnética,

muitos problemas nesta área ainda ocorrem devido à falta de implementação de

contramedidas efetivas ainda na fase de desenvolvimento. Medidas acabam sendo

consideradas de maneira corretiva, aumentando custo e efetividade na contenção de

problemas.

1.2 Objetivo Geral

Este trabalho tem por objetivo geral a conceituação de EMC e algumas

metodologias que vem sendo empregadas na indústria automotiva visando EMC.

1.3 Objetivos Específicos

Os objetivos específicos deste trabalho são:

Conceituar EMC e EMI, dando uma visão geral dos fenômenos

eletromagnéticos que se relacionam ao assunto;

Demonstrar a importância da mitigação ou minimização da interferência

eletromagnética na indústria automotiva através de exemplos práticos;

Fornecer um histórico sobre a normatização na área de EMC;

3

Apresentar algumas metodologias atualmente empregadas na indústria

automotiva visando EMC.

1.4 Metodologia

A metodologia deste trabalho está baseada nas seguintes etapas:

a. Levantamento bibliográfico sobre a conceituação de EMC;

b. Levantamento bibliográfico sobre EMC na indústria automotiva, tendências e

desafios;

c. Levantamento das normas referentes a EMC na indústria automotiva;

d. Levantamento bibliográfico de metodologias empregadas na indústria

automotiva visando EMC.

1.5. Estrutura do trabalho

No primeiro capítulo é feita a introdução do trabalho e apresentado o objetivo

geral, específico e a metodologia utilizada para a conclusão.

No segundo capítulo são apresentados dados históricos de assuntos relacionados

a EMC, casos práticos cuja causa dos problemas estão relacionados a EMC, bem como

a definição do tema.

No terceiro capítulo são apresentados alguns conceitos de eletromagnetismo

relevantes ao estudo de EMC, além do modelo fonte-meio de transmissão-receptor

utilizado para o estudo do tema.

No quarto capítulo são apresentados os principais tipos de ruído gerados por um

veículo automotor.

No quinto capítulo são apresentadas algumas metodologias para mitigação ou

minimização de EMI na indústria automotiva.

No sexto capítulo o trabalho é concluído e apresentado algumas possibilidades

de trabalhos futuros relacionados ao tema.

4

2 MOTIVAÇÃO PARA O ESTUDO DE EMC

2.1 História da EMC

É possível se dizer que problemas relacionados a interferências eletromagnéticas

e a introdução de métodos visando a sua mitigação surgiram com o primeiro

experimento de Marconi sobre centelhamento no final dos anos 1800. Em 1901 Marconi

realizou a primeira transmissão transatlântica utilizando fios de cobre. Os únicos

receptores de relevância naquela época eram os receptores a rádio. Estes eram poucos e

muito distantes, o que tornava os problemas de interferência relativamente fáceis de

serem resolvidos. No entanto, artigos técnicos sobre rádio-interferência começaram a

aparecer em vários jornais científicos por volta do ano de 1920. Os receptores de rádio e

antenas eram bastante simples e propensos a interferência, fosse ela externa,

proveniente do ambiente, ou interna, como oscilações internas que eram auto-induzidas.

Melhorias no design dos equipamentos resolveram muitos desses problemas. No

entanto, rádio-interferência proveniente de equipamentos elétricos, como motores

elétricos e ferrovias, logo se tornaram as maiores fontes de problemas por volta de 1930.

Durante a 2ª Guerra Mundial, o uso de equipamentos eletrônicos, principalmente

rádios, equipamentos para navegação e radares aumentaram significativamente.

Interferências entre rádios e equipamentos de navegação a bordo dos aviões começaram

a aumentar na mesma proporção. Estes eram facilmente corrigidos trocando-se a

frequência de transmissão por uma faixa menos carregada, ou fisicamente movendo os

cabos das fontes de ruído, para evitar que os cabos captassem os mesmos. Como a

densidade de componentes eletrônicos naquela época era consideravelmente menor do

que aquilo que se tem atualmente, era possível minimizar os problemas de EMI caso a

caso, através da utilização desses métodos. No entanto houve um aumento significativo

nos problemas de EMI com a invenção dos componentes eletrônicos de alta densidade,

como o surgimento do transistor bipolar em meados de 1950, do circuito integrado em

1960 e do microprocessador em 1970. O espectro de frequência também passou a ser

mais denso com o aumento da demanda de transmissão de voz e dados. Estes fatores

fizeram com que houvesse um planejamento considerável com relação à utilização do

5

espectro de frequência, o que continua até os dias de hoje (RYBACK ; STEFFKA,

2004).

Talvez o primeiro evento que tenha dado ênfase a EMC foi a introdução do

processamento digital de sinais e da computação. No início de 1960, computadores

digitais utilizavam válvulas como elementos de chaveamento. Estes eram bastante

lentos se comparados aos atuais e requeriam um alto consumo de potência. Durante os

anos de 1970 os circuitos integrados permitiram a construção de computadores que

consumiam uma quantidade bem menor de potência e requeriam um espaço físico bem

menor. No fim dos anos 70 houve uma tendência em se substituir o processamento de

sinais analógicos pelo processamento digital de sinais. Quase todas as funções

eletrônicas passaram a ser implementadas utilizando processamento digital, uma vez

que a velocidade de processamento dos circuitos integrados, além do seu tamanho,

favorecia esta tecnologia. Em conseqüência disso, a ocorrência de EMI passou a

aumentar.

Devido ao aumento de ocorrências relacionadas a interferência de sinais digitais

com/sem fio, a Comissão de Comunicação Federal (FCC) dos Estados Unidos

estabeleceu limites máximos para as emissões eletromagnéticas. A intenção dessa

regulamentação era tentar limitar a “poluição eletromagnética” no ambiente para, desta

forma, prevenir ou ao menos reduzir o numero de ocorrências de EMI. Uma vez que

nenhum equipamento que não atendesse os limites estabelecidos por essa lei da FCC

poderiam ser vendidos nos Estados Unidos, o assunto de EMC passou a gerar um maior

interesse dos fabricantes de equipamentos eletrônicos. Isto não significa que os Estados

Unidos foram os únicos responsáveis pelo entrave por um ambiente livre de ondas

eletromagnéticas indesejáveis. Outros países na Europa também propuseram leis

semelhantes às aplicadas nos EUA para equipamentos eletrônicos. Em 1933 uma

reunião da IEC em Paris recomendou a formação do International Special Committee

on Radio Interference (CISPR) para lidar com os problemas emergentes de EMI. Este

comitê elaborou um documento detalhando equipamentos de medição para a

determinação de emissões EMI em potencial. Encontros subseqüentes da CISPR

renderam várias publicações técnicas que incluíam técnicas de medição e definia limites

aceitáveis. Alguns países da Europa adotaram os limites propostos pela CISPR. A

norma proposta pela FCC foi a primeira a regulamentar a emissão eletromagnética para

equipamentos eletrônicos e, por sua vez, seguiam as regulamentações propostas pela

CISPR.

6

A comunidade militar nos EUA também propôs limites de emissões

eletromagnéticas através da regulamentação MIL-STD-461 antes da regulamentação

feita pelo FCC com o intuito de garantir o sucesso de suas missões. Um aspecto

interessante da legislação militar foi a imposição do requisito de susceptibilidade. Sinais

de interferência eram propositadamente injetados no equipamento e o mesmo precisava

manter a sua operação normalmente. Mesmo que um produto eletrônico estivesse em

conformidade com os requisitos legais de emissões eletromagnéticas, o mesmo poderia

ainda causar interferência ou estar susceptível as emissões de outro equipamento que

estivesse próximo. Os limites de emissões estabelecidos se destinavam simplesmente a

manter um ambiente mais limpo em termos de ondas eletromagnéticas.

Todas estas regulamentações fizeram de EMC um aspecto crítico no

desenvolvimento de equipamentos eletrônicos. Se os equipamentos produzidos não

estivessem em conformidade com as legislações vigentes, os mesmos não poderiam ser

vendidos no país, o que o tornou um assunto de grande relevância.

2.2 Definição de EMC

EMC pode ser definida como a capacidade de um sistema eletrônico de

funcionar adequadamente em um ambiente eletromagnético e não interferir em outros

sistemas imersos neste mesmo ambiente (RYBACK; STEFFKA, 2004). Isto implica

que o sistema seja imune às emissões eletromagnéticas de outros sistemas e

simultaneamente seja capaz de não interferir no funcionamento de outros sistemas, bem

como no seu próprio funcionamento.

O modelo básico que é usado para a definição de EMC consiste no fato de que

dois dispositivos A e B sejam capazes de operar um na presença do outro, bem como na

presença do ambiente externo, o que é chamado também de interoperabilidade. Não é

desejável que A interfira em B e nem que B interfira em A, tão pouco é desejável que o

ambiente externo interfira no funcionamento de A ou B, conforme fig. 3.1.

7

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 3.1 - Modelo de Compatibilidade Eletromagnética

Outra definição importante com relação aos receptores de energia é o conceito

de imunidade e susceptibilidade. Na indústria automotiva o termo imunidade é mais

usado enquanto para outras áreas que estudam EMC o termo mais usado é

susceptibilidade. A fig. 3.2 ilustra a relação entre ambos.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 3.2 – Conceito de susceptibilidade e imunidade

8

Desta forma, um componente ou sistema que tem baixa susceptibilidade possui

baixa imunidade e vice-versa (RYBACK ; STEFFKA, 2004).

2.3 Casos Práticos de EMI

Existem inúmeros casos práticos de EMI, desde casos comuns sem

consequências graves até casos de proporções catastróficas.

Talvez um dos casos mais comuns seja o aparecimento de uma “listra” em

algumas televisões mais antigas, sempre que se liga um liquidificador, um aspirador de

pó, um misturador ou algum outro eletrodoméstico que contém um motor universal.

Estas “listras” são resultado dos pequenos arcos nas escovas do motor universal. Como

o comutador interrompe o seu contato com as escovas em uma alta frequência (não há

um contato ideal), a corrente nos enrolamentos do motor (um indutor) é interrompida na

mesma frequência, causando uma grande tensão ao longo dos contatos, uma vez que a

tensão no indutor é definida por:

(3.1)

onde,

V= Tensão (V)

L= Indutância (H)

i= corrente (A)

Esta tensão gerada é rica em conteúdo espectral de alta frequência, que é radiada

através do cabo de alimentação do equipamento, que, por sua vez, irradia todo o sinal

para a rede elétrica da residência. A rede elétrica da residência constitui-se em um

conjunto de fios que acabam se tornando uma eficiente antena. Esta eficiente antena

transmite este sinal para a antena da TV, causando interferência (RYBACK ;

STEFFKA, 2004).

Outro caso é de uma versão de automóvel com sistema de injeção eletrônica. A

concessionária recebeu uma reclamação de um cliente que dizia que quando o veículo

)(dt

diLV Volts−=

9

era dirigido em uma determinada rua da cidade o motor morria. Medições de ondas

eletromagnéticas no ambiente detectaram a presença de um sinal ilegal proveniente de

um transmissor de rádio FM. O sinal do transmissor FM era conduzido até o

microprocessador através de fios, o que fazia com o que o microprocessador entrasse

em colapso (RYBACK ; STEFFKA, 2004).

Outro acontecimento é que alguns caminhões possuíam sistema de freios do tipo

Anti-Block System (ABS) instalados. Alguns caminhoneiros costumavam instalar um

transmissor de rádio para a comunicação com outros caminhoneiros, que, dependendo

da instalação, causava o travamento involuntário dos freios. O problema foi detectado

como sendo o acoplamento eletromagnético entre o sistema de freios e o transmissor. A

colocação de uma blindagem no circuito do transmissor eliminou o problema

(RYBACK ; STEFFKA, 2004).

Em 1982, o Reino Unido perdeu um navio militar, o HMS Sheffield, destruído

por um míssil durante a batalha contra a Argentina nas ilhas Falkland. O sistema de

rádio para a comunicação com o Reino Unido não funcionava adequadamente quando o

detector de mísseis no navio estava funcionando. Por este motivo, resolveu-se desligar o

sistema detector de mísseis durante uma comunicação. Infelizmente, neste momento o

inimigo disparou o míssil, destruindo o HMS Sheffield (RYBACK ; STEFFKA, 2004).

Estes são alguns dos inúmeros casos acontecidos dentro no universo da

eletrônica. Os resultados de EMI claramente apontam para a necessidade de um estudo

apurado da EMC.

2.4 EMC na Indústria Automotiva

O conceito de EMC vem sendo levado em consideração na indústria automotiva

nos últimos anos uma vez que o número de componentes elétricos e eletrônicos contidos

em um veículo vem aumentando muito.

Desta forma, levar em consideração a EMC é extremamente necessário, visto

que vários países já possuem normas relacionadas à EMC e, desta forma, estas devem

ser contempladas nos projetos de novos veículos. Além disso, levar em consideração

EMC é necessário para que se tenha o correto funcionamento de alguns componentes,

10

sob risco da necessidade de um “recall” caso estes componentes tenham seu

funcionamento prejudicado pela EMI.

Embora atualmente ainda haja a utilização de vários componentes que eram

usados há alguns anos atrás (bobina de alta tensão, por exemplo), vários outros

componentes digitais vêm sendo amplamente utilizados. Algo conhecido da tecnologia

digital é que o seu chaveamento através de ondas quadradas contem muitas harmônicas,

com frequências de ordens muito maiores que a frequência fundamental nos momentos

de troca de estado (de zero para um e de um para zero) e frequência igual a zero no

momento em que o sinal está estável, conforme fig. 3.3.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig.3.3 – O sinal de onda quadrada e o seu espectro de frequência.

11

Conforme mostrado na fig. 3.3, há uma frequência contida no instante de subida

e descida do sinal que, por sua vez, é muito maior que a frequência fundamental e, uma

frequência igual a zero para os instantes onde o sinal é estável em nível lógico alto ou

baixo. Na indústria automotiva, esta é uma das maiores fontes de EMC.

No que diz respeito à indústria automotiva, o assunto de EMC continuará

ganhando importância no futuro, uma vez que o desenvolvimento da tecnologia digital

vem favorecendo a ocorrência de caso de EMI, tais como:

A velocidade do clock de sistemas digitais está se tornando cada vez maior. O

problema é que, à medida que isto ocorre, estruturas metálicas como caixas,

paredes e tampas passam a ter um poder de blindagem cada vez menor, podendo

atuar até mesmo como eficientes antenas;

Na área de comunicação sem fio, frequências elevadas (na ordem de GHz) são

cada vez mais utilizadas. Os aspectos de EMC relacionados a isto têm de ser

caracterizados.

Combinado a esta evolução de tecnologia, a medição de EMC também tende a

se tornar algo que continuará ganhando relevância no futuro, principalmente pelas

seguintes razões:

O ruído de fundo em analisadores de espectro e receptores tende a aumentar,

fazendo com que a medição de EMC de baixo nível seja dificultada;

Em alta frequência, as emissões radiadas dos produtos são mais estreitas e

direcionais, o que as torna mais difícil de serem detectadas;

As antenas que devem ser usadas para a medição da emissão eletromagnética de

um produto tendem ter um feixe de recepção mais estreito, o que dificulta a

detecção das emissões eletromagnéticas do objeto de ensaio.

Devido à evolução contínua e as premissas identificadas acima, o assunto de

EMC tende a ser algo que gerará grandes discussões ao longo dos anos.

12

3 CONCEITOS IMPORTANTES NO ESTUDO DE EMC

3.1 As equações de Maxwell

Para um bom entendimento do conceito de EMC, é necessário primeiramente

entender-se os conceitos físicos que estão por trás deste tema. Existem quatro relações

matemáticas que são importantes no estudo de EMC, que são conhecidas como

equações de Maxwell. Apesar de aparentemente confusas e de difícil utilização, as

equações de Maxwell basicamente estabelecem a relação matemática entre campo

elétrico, campo magnético e ondas.

A primeira equação de Maxwell é baseada nos estudos de Gauss e diz que existe

um campo elétrico ao redor de uma determinada carga. Isto significa que se existe uma

carga em um espaço livre, existirá um campo elétrico potencial ao redor desta carga,

que será proporcional a carga total que está gerando este campo. Este conceito está

ilustrado na equação 4.1 e fig. 4.1

qE.dA =∂ (4.1)

onde,

E= Campo Elétrico (V/m);

A= Área (m2);

q= carga elétrica (C);

0ε = Constante de permissividade elétrica no vácuo.

13

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 4.1 – Fluxo elétrico de uma carga

A segunda equação também se baseia nos estudos de Gauss e fala sobre a

existência de dipolos. Isto implica no fato de que se existe um polo norte,

necessariamente existirá um polo sul que, juntos, formarão um dipolo magnético. Para

qualquer superfície fechada, o fluxo magnético para dentro direcionado ao polo sul será

igual ao fluxo para fora do polo norte. Esta lei também implica no fato de que não existe

monopolos magnéticos. A equação 4.2 e fig. 4.2 ilustram a segunda equação de

Maxwell.

0B.dA=∂ (4.2)

onde,

B= Campo magnético (T);

A= área (m2).

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 4.2 – O fluxo magnético fora de um espaço fechado

14

A terceira equação de Maxwell é baseada nos estudos de Faraday e diz que a

variação do fluxo magnético gera um campo elétrico. Este fenômeno é a base da

construção de geradores elétricos e transformadores. A equação 4.3 e a fig. 4.3 ilustram

a terceira equação de Maxwell.

dt

B.dA)d(E.ds

∂−=∂ (4.3)

onde,

E= Campo Elétrico (V/m);

B= Campo Magnético (T);

A= área (m2).

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 4.3 – Terceira equação de Maxwell

A quarta equação de Maxwell, também baseada nos estudos de Faraday, diz que

a densidade de fluxo magnético é proporcional a taxa de variação do campo elétrico. A

equação 4.4 e a fig. 4.4 demonstram este conceito.

( )

∂+=∂ E.dAεdt

dImB.dS 00 (4.4)

onde,

B= Campo magnético (T);

m0= constante de permissividade magnética;

E= Campo elétrico (V/m);

A= área (m2).

15

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 4.4 – Quarta equação de Maxwell

A chave para o entendimento de EMC é encontrar, entender e aplicar estas

quatro equações para todos os casos de EMC. Isto permitirá a identificação da causa

raiz do problema e tornará possível compreendê-lo e resolvê-lo.

3.2 Regiões ao redor da fonte

Há dois conceitos ainda importantes que estão relacionados à descrição das

regiões de um campo em torno de uma antena que irradia potência. São estes o campo

próximo e o campo distante. É importante ter o conhecimento destes tipos de campo no

estudo de EMC pois existem formas de medição diferentes dependendo do campo ao

qual determinado sistema ou componente está inserido.

3.2.1 Campo distante

Seja o comprimento de onda λ de uma fonte. A região que se estende por mais

de dois comprimentos de onda da fonte é chamada de campo distante. O campo distante

é definido como sendo a região a partir de λ/2π ou 2D2/λ, o que for maior.

16

3.2.2 Zona de transição

A região entre o campo distante e o campo próximo é chamada de zona de

transição. Esta região contempla algumas características do campo próximo e do campo

distante.

3.2.2 Campo próximo

A região localizada a menos de um comprimento de onda da fonte é chamada de

campo próximo.

3.3 Modelo de estudo para minimização de EMI

Um conceito chave no estudo de EMC é a relação entre fonte-meio de

transmissão-receptor, que são os três elementos básicos compreendidos no estudo de

EMC, conforme fig. 4.5. Os receptores podem ser de dois tipos, intencionais e não

intencionais. Como exemplo de um receptor intencional, tem-se o receptor de um rádio

ou de uma televisão e, como exemplo de um receptor não intencional, tem-se a fonte de

um microcomputador. Este é o modelo básico que é usado para a determinação dos

problemas de EMC e, desta forma, para que se estruture um sistema robusto que seja

operacional nestas condições.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 4.5 - Módulos envolvidos em compatibilidade eletromagnética

17

Com base no conhecimento destes conceitos, é possível garantir EMC das

seguintes formas:

Diminuindo ou suprimindo a energia da fonte (desta forma pode-se diminuir a

quantidade de energia irradiada);

Modificar a trajetória de condução (meio de transmissão), por exemplo,

conduzindo-a por um fio ou radiando-a através do ambiente;

Modificar as características do receptor, transformando-o em um receptor

imune.

Com relação aos problemas de EMC, deve-se ter em mente esses três parâmetros

citados. O primeiro deles fala sobre a supressão ou diminuição da energia diretamente

na fonte. Por exemplo, observa-se que as mudanças de nível lógico alto para baixo e

vice-versa em circuitos digitais são os principais contribuintes para o espectro de alta-

frequência desses sinais (mudanças de estado rápidas, ou curtas), conforme já discutido

anteriormente. Em geral, quanto maior a frequência do sinal que passará pela trajetória

de condução, mais eficiente será o caminho de condução. Sendo assim, deve-se tornar

mais lenta as mudanças do estado alto para baixo e vice-versa. No entanto, para que isto

seja eficaz é necessário que o tempo de subida e descida do sinal seja levado a um nível

onde o circuito eletrônico funcione adequadamente. Por exemplo, não é justificável que

as transições de alto para baixo e vice-versa precisem ser levados a 100 ps quando os

circuitos funcionariam bem a partir de 1 ns. Em casos onde esta redução é possível sem

comprometer o funcionamento do circuito, é possível reduzir-se o conteúdo de alta

frequência espectral da emissão, o que tornará o caminho de condução mais ineficiente

e, portanto, reduzirá o nível do sinal no receptor.

Há também maneiras mais radicais para se tornar o caminho de condução

ineficiente, como, por exemplo, colocar o emissor enclausurado em uma proteção de

metal (shield). Esta alternativa, porém, é mais cara que reduzir o tempo de subida e

descida do sinal digital, nos casos onde isto é possível, além do que o desempenho desta

proteção está bem aquém daquilo que é considerado ideal. Reduzir a susceptibilidade às

emissões do receptor é também algo difícil de ser implementado, além de manter com

essa redução o correto funcionamento do circuito. Minimizar o custo adicional de um

sistema a fim de torná-lo compatível eletromagneticamente é algo de bastante

relevância. Um equipamento pode ser desenvolvido colocando-se todos os componentes

em uma blindagem, utilizando baterias de alta potência como fontes, entre outros,

18

porém, a aparência do produto, utilidade e custo serão inaceitáveis do ponto de vista do

consumidor. Pode-se ainda impedir a transferência de energia eletromagnética (no que

diz respeito à prevenção da interferência) em quatro subgrupos: emissões radiadas,

susceptibilidade radiada, emissões conduzidas, susceptibilidade conduzida, conforme a

fig. 4.6.

Fonte: PAUL, 2004.

Fig. 4.6 - Grupos de Interferência Eletromagnética

Um típico sistema eletrônico consiste em um ou mais subsistemas que se

comunicam entre si por meio de cabos. Estes cabos podem ser responsáveis por

conduzir sinais que serão utilizados por circuitos digitais (5 V, por exemplo) ou mesmo

para alimentação dos sistemas, seja ela AC ou CC. Todos estes cabos têm um potencial

para emitir ou receber energia eletromagnética e, em geral, são bem eficientes neste

processo. De maneira geral, quanto maior o cabo, maior é a sua capacidade de emitir ou

receber energia eletromagnética.

Sinais de interferência podem também ser transmitidos entre os subsistemas

diretamente através das suas ligações de condução (entre os cabos). Se os subsistemas

estiverem protegidos por blindagens metálicas, correntes podem ser induzidas por sinais

19

internos ou externos. Estas correntes podem ser radiadas para o meio externo ou mesmo

para o próprio sistema que está sob esta blindagem. Este problema vem se tornando algo

cada vez mais comum, principalmente em equipamentos de baixo custo que utilizam

blindagens não condutoras, usualmente plásticas. Os circuitos eletrônicos que são

envolvidos por estas blindagens plásticas estão, em sua maioria, completamente

expostos as emissões eletromagnéticas, e, como tal, podem irradiar diretamente estas

emissões ou serem susceptíveis a ela, conforme mostrado na fig. 4.6.

Emissões eletromagnéticas podem ocorrer da alimentação AC de um

equipamento, de uma blindagem metálica que contém um subsistema, dos cabos que

conectam os subsistemas ou de um componente eletrônico envolvido por uma

blindagem não metálica. É importante que se tenha claro que a corrente pode ser

irradiada. Este é o fundamento essencial que faz com que as emissões radiadas, sejam

elas intencionais ou não intencionais, sejam produzidas. Uma corrente variando no

tempo é uma aceleração de carga. Desta forma, o processo fundamental que produz

emissões radiadas é a aceleração de cargas.

Como já citado anteriormente, emissões e imunidade à energia eletromagnética

ocorrem não somente pela propagação de ondas eletromagnéticas pelo ar, mas também

pela condução direta através de condutores metálicos, conforme ilustrado na fig. 4.6.

Usualmente este caminho de ligação físico é mais eficiente que o caminho de ligação

feito através do ar. Desenvolvedores de sistemas eletrônicos têm ciência disso e,

intencionalmente, colocam barreiras como filtros pelo caminho de ligação físico para

poder impedir a transmissão indesejada de energia. É importante observarmos que o

problema de interferência pode se estender além das barreiras mostradas na fig. 4.6. Por

exemplo, correntes que são conduzidas fora do cabo (irradiadas) serão inseridas na rede

de distribuição de energia da instalação. Esta rede de distribuição de energia é um

extenso emaranhado de fios que estão diretamente conectados de certa forma que

radiem estes sinais com certa eficiência. Neste caso, a emissão conduzida produzirá

emissão radiada. Conseqüentemente, a restrição das emissões conduzidas pelos cabos

que conectam os subsistemas de um determinado produto tem também a intenção de

evitar a propagação de emissões radiadas para o sistema de alimentação geral.

O primeiro passo no desenvolvimento de sistemas eletrônicos será o foco em

atender as normas legais impostas pelas agências governamentais.

20

3.4 Definição de Componente e Sistema

O estudo de EMC é necessário somente quando há o envolvimento de sistemas.

Não existe problema de EMC associadas intrinsecamente a uma chave, vela de ignição

ou mesmo a um microprocessador. Estes são componentes e as questões de EMC

surgem quando estes componentes estão funcionando e interagindo com o meio externo.

Desta forma, é importante termos claro o conceito do que é um componente e do que é

um sistema.

Um componente pode ser definido como algo que possui uma dimensão física e

massa, como um transistor ou um motor (SHIMITT. 2002). É possível tocar estes

componentes e até mesmo descrevê-los. É importante também entendermos que

conjunto é um agrupamento de materiais para a confecção de um determinado

componente. Por exemplo, um transistor é feito de material semicondutor, plásticos e

fios. Desta forma, os conjuntos de componentes são elementos de um sistema, conforme

ilustra a fig. 4.7.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 4.7 – Definição de Componente e Sistema

21

Desta forma, podemos definir um sistema como a interação de componentes

entre si e com o meio externo.

3.5 Relevância para EMC

A razão pela qual esta conceituação é importante é que se percebe que as

maiores questões de EMC estão relacionadas às características de sistemas ao invés de

deficiências inerentes de componentes. Isto se torna especialmente real na área

automotiva, mais que em outras áreas industriais, devido ao tamanho dos componentes

e a função dos sistemas automotivos.

Umas das questões chave de EMC é o entendimento de que o processo de

introdução de fios e condutores aos componentes elétricos pode gerar características

diferentes daquelas inerentes ao próprio componente. Isto é resultado da energia que

pode ser transferida como resultado desta fiação. Muitos profissionais que trabalham

com EMC perdem a noção deste fato e, muitas vezes, tentam elevar o desempenho dos

componentes, porém, em nível de sistema, isto não é nada simples.

22

4 SISTEMA ELETRÔNICO AUTOMOTIVO

4.1 A geração de Emissões Radiadas por veículos: Conceito

Sistemas automotivos podem ser fontes de emissões radiadas que podem

interferir tanto em equipamentos e subsistemas internos como podem ser fonte para a

interferência em outros veículos e sistemas que estejam próximos a ele, como rádios e

televisores. Componentes eletrônicos ativos geram emissões radiadas durante sua

operação normal causada pelos estados de chaveamento, portas lógicas, sinais de

controle do tipo PWM (pulse-width-modulated), entre outros. Mesmo aqueles

componentes que não são de estado sólido, como solenóides, buzinas, relés, velas de

ignição e outros componentes indutivos, geram emissões radiadas. Muitos desses

componentes têm sido usados desde os primórdios da indústria automotiva e ainda

requerem atenção especial quanto a garantia de medidas que são tomadas para evitar

que problemas sejam prevenidos.

A indústria automotiva classifica as emissões provenientes de sistemas elétricos

e eletrônicos em duas partes. Elas são classificadas em BB(Broadband) e

NB(Narrowband). Há vários métodos que podem ser usados para classificar as

emissões em BB e NB. A classificação das emissões, também chamada de ruído, é feita

de maneira simples, nos sistemas elétricos e eletrônicos automotivos. Se o ruído é

criado por um “arco” ou “faísca”, este é classificado como sendo do tipo BB. Isto

implica que todos os ruídos gerados por outros componentes sejam classificados como

sendo do tipo NB. Apesar de ser um método simples de classificação, este é bastante

prático e tem sido bastante eficaz ao longo dos anos de desenvolvimento de EMC

(RYBACK ; STEFFKA, 2004).

O ruído do tipo BB é aquele que ocupa um espectro de frequência mais amplo

que aquele utilizado pelo receptor. Isto significa que não é possível a sintonização de

uma frequência para o receptor que esteja livre de ruído. No entanto, quando tratamos

de ruído do tipo NB é possível que o receptor seja sintonizado a uma frequência onde

não haja ruídos presentes.

23

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 5.1 - Ruído do tipo Narrowband e Broadband

Como exemplo, supõe-se que uma janela de frequência deslizante defina o que

será ouvido pelo receptor. Pela fig. 5.1, pode-se perceber que o movimento desta janela

pelo ruído do tipo BB, sempre haverá uma quantidade de ruído considerável ao longo

do espectro, já que este ruído muda em função do tempo. Porém, se esta janela é

movimentada sobre o espectro com ruído do tipo NB, haverá uma faixa do espectro

onde o receptor estaria livre dos ruídos.

4.2 O ruído Broadband

4.2.1 O ruído do Motor

É simples observarmos os efeitos de um ruído do tipo BB causado por um motor

elétrico no dia a dia. Exemplos comuns são liquidificadores ou aspiradores de pó de uso

comum. Não é necessário que os mesmos sejam muito potentes para a geração de ruído.

Vários equipamentos a bateria são capazes de emitir energia suficiente para gerar um

ruído do tipo BB. Há muitas aplicações de motores em ambientes diferentes, e

obviamente, na indústria automotiva isto não é diferente. Motores são utilizados para

ajuste elétrico dos retrovisores, regulagem de altura de banco, limpadores de pára-

brisas, abertura dos vidros, entre outros. Outro ponto importante com relação ao ruído

gerado pelos motores é que adicionalmente a energia radiada do próprio motor, há ainda

24

a emissão conduzida da bateria até o motor através do chicote elétrico. Este é um ponto

de grande relevância na área automotiva, uma vez que o chicote elétrico constitui-se em

um caminho de baixa resistência elétrica para a passagem da corrente de ruído, que, por

sua vez, sempre buscará o caminho de menor impedância. Quando um motor é

conectado a uma alimentação através de um chicote elétrico, além de ser uma fonte e

um retorno para a fonte de alimentação, o chicote pode também atuar como um caminho

de baixa impedância para a passagem de ruído e, dependendo do tamanho do chicote e

de suas características, pode atuar também como uma ótima antena.

4.2.2 O ruído da Ignição

A fig. 5.2 mostra um sistema básico de ignição utilizado na indústria automotiva.

Ao longo dos anos e do desenvolvimento dos sistemas de injeção/ignição eletrônica,

este sistema varia de veículo para veículo, porém o seu conceito continua inalterado.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 5.2 - Sistema de Ignição

No sistema de ignição, a bobina de ignição é o componente responsável por

armazenar energia e liberá-la em determinado momento para as velas de modo que

ocorra a ignição. O tempo para liberar esta energia é fornecido por um sensor indutivo

que verifica a posição do motor e informa qual deve ser o momento da ignição. Como a

25

bobina de ignição trata-se de um componente indutivo, a mesma segue a expressão

mostrada na equação (3.1).

No caso das bobinas de ignição, a indutância típica está na faixa de mH, a

variação de corrente está entre 5 A e 10 A, em uma variação de tempo na faixa de ms.

Esta combinação resulta em algumas dezenas de kV fornecidos a vela de ignição através

do distribuidor, ou simplesmente dos cabos de vela, que são conduzidos até o pequeno

gap da vela, causando uma faísca e iniciando o processo de combustão. Esta é a fonte de

ruído. Estas são as particularidades que todo o sistema de ignição tem em comum, não

importa a maneira como foram construídas. Todos possuem uma bobina, velas de

ignição e um método para controle da corrente no primário. A fig. 5.3 ilustra o espectro

de frequência do ruído proveniente de um sistema de ignição.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 5.3 – Espectro de frequência de um ruído de ignição

26

Pela fig. 5.3. podemos observar um espectro muito similar aquele do ruído do

tipo BB. Na primeira parte da fig. 5.3 tem-se o ruído em função do tempo. A segunda

parte mostra o ruído acumulado depois de certo tempo. Este resultado é possível

utilizando-se o analisador de espectro no modo de peak hold (detecção de pico)

mantendo uma determinada janela de frequência na tela e memorizando os picos ao

longo do tempo. O resultado é uma medição associada de picos ao longo do tempo.

4.3 O ruído Narrowband

Conforme já discutido anteriormente, o ruído classificado como sendo do tipo

NB é aquele cuja largura de banda é diferente da largura de banda do receptor. Isto

significa que existem apenas algumas frequências emitidas que podem interferir em um

receptor a rádio. A característica principal de um ruído do tipo NB é que a sua

frequência e amplitude tendem a ser estáveis ao longo do tempo.

4.3.1 Os microprocessadores e o ruído Narrowband

A fig. 5.4 é um exemplo de como as emissões vindas de um típico

microprocessador podem ocorrer como resultado das harmônicas provenientes de uma

frequência fundamental de operação do microprocessador. Olhando com cuidado para

este fenômeno, é possível observar que existe um padrão que se repete. Este padrão

ocorre em múltiplos da frequência do clock do microprocessador. O que é importante

com relação a este padrão é que as emissões permanecem constantes em relação a

frequência e relativamente constantes em relação a amplitude ao longo do tempo, com

exceção do ruído BB, onde frequência e amplitude variam ao longo do tempo.

27

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 5.4 – Espectro de frequências genérico

Uma das maiores fontes de ruído NB na indústria automotiva atual são os

microprocessadores. Para poder operar sinais digitais através de um microprocessador, é

necessário que se tenham sinais digitais de amplitude suficiente. Em segundo lugar, os

microprocessadores vêm sendo cada vez mais utilizados em diferentes módulos de um

veículo. Por último, engenheiros de desenvolvimento de hardware preferem trabalhar

com rápidas subidas e descidas de sinal para minimizar a banda de incerteza de sinal e

para evitar a dissipação de calor dos equipamentos. A fig.5.4 mostra o espectro de

frequência típico do funcionamento de um microprocessador, com sua frequência

fundamental (Fo) e suas harmônicas. A teoria diz que em uma onda quadrada só

aparecerão harmônicas ímpares, no entanto, este conceito só é válido para um duty cycle

de 50%, que raramente ocorre na natureza.

Além dos microprocessadores, existem outros componentes que geram ruído

NB, como transistores de potências, controladores de velocidade do tipo PWM,

transistores chaveamento, entre outros.

Espectro de Harmônicas

0102030405060708090

1 2 3 4 5 6 7 8

Frequência (xFo)

Am

plitu

de (d

B)

Fo 2Fo 3Fo 4Fo 5Fo 6Fo 7Fo 8Fo

28

5 DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS ELETRÔNICOS

AUTOMOTIVOS COM FOCO EM EMC

5.1 Minimização de EMI através da introdução de componentes

Uma vez que já foram abordados os conceitos relacionados a EMC e EMI na

indústria automotiva e o tipo de ruído que são gerados por seus componentes, pode-se

pensar em como desenvolver sistemas visando a minimização da interferência

eletromagnética.

Uma vez que a densidade de componentes eletrônicos presentes nos veículos

aumentou bastante, muitas vezes são necessárias a utilização de técnicas de simulação

para a identificação de problemas de EMI, como a FDTD- Finite difference time-

domain, FEM- finite-element method, entre outras, que tem sido aplicadas aos

problemas de EMI/EMC (ARCHAMBEAULT; BRENCH; CONNOR, 2009).

Existem algumas abordagens relacionadas ao desenvolvimento de circuitos que

tendem a aumentar as características de imunidade de sistemas eletrônicos automotivos

e seus componentes. Muitas dessas abordagens têm um impacto pequeno no

funcionamento e desempenho de seus componentes e sistemas, no entanto, visando o

menor custo possível e a maior eficiência, é necessário que estas abordagens sejam

realizadas durante a fase de desenvolvimento. Uma vantagem destas abordagens é que

algumas delas podem ser implementadas em estágios avançados do processo do

desenvolvimento de produto, se casos de EMI forem descobertos. Estas abordagens são

resumidas a seguir.

Adicionar indutâncias em série a barramentos I/O sensíveis.

Razão: Adicionar indutâncias pode produzir uma boa atenuação da energia de

RF para prevenir a ocorrência de problemas de imunidade. Além disso, se uma

quantidade mínima de indutâncias for adicionada, não é esperado que se tenha

um impacto sobre a funcionalidade dos componentes.

Adicionar capacitâncias paralelas para desviar sinais de RF de linhas sensíveis

Razão: Adicionar capacitâncias paralelas irá estabelecer um caminho de menor

impedância para energia, o que evitará que a mesma cause um distúrbio em

29

circuitos eletrônicos sensíveis. Muitas vezes isto é viável de ser incorporado,

uma vez que eles estão em paralelo com as linhas.

Isolar os circuitos uns dos outros ou utilizar um buffer.

Razão: Isto ajudará a eliminar qualquer looping de corrente que possa existir

devido à passagem de RF de um circuito para outro.

Utilizar como critério de desenvolvimento o menor ganho e largura de bandas

possíveis para processar os dados de maneira eficiente.

Razão: No caso de ter-se alto ganho e alta frequência, a propensão a ruídos de

entrarem no sistema e causarem falhas de funcionamento é maior. É importante

ter-se em mente o conceito de que esta abordagem só é viável durante a fase de

desenvolvimento de produtos.

Adicionar shields localizados aos circuitos

Razão: Evitar através dos shields que a energia entre ao circuito, embora esta

abordagem seja bem cara e nem sempre totalmente efetiva.

5.2 Seleção de Componentes

Uma das premissas básicas de todo e qualquer projeto elétrico é a seleção de

componentes. Selecionar componentes visando EMC é tão importante quanto selecionar

componentes visando a performance de um sistema. Exceto para circuitos de vídeo de

banda-larga e circuitos que se utilizam de osciladores, circuitos analógicos são

geralmente mais imunes que circuitos digitais. Como circuitos digitais são ruidosos,

cabe aqui enfatizar um pouco a seleção de componentes para a supressão de EMI.

Ao longo dos anos, é notável que o tamanho físico dos componentes eletrônicos

vêm diminuindo bastante. Os capacitores, indutores e CIs possuíam terminais

relativamente longos. Nos dias de hoje, capacitores e resistores são geralmente muito

pequenos até mesmo para manipulação manual e soldagem na PCI. Circuitos que

antigamente ocupavam um espaço considerável na PCI, agora estão agrupados em

dispositivos VLSI e muitas vezes funcionam mais rápido. Esta diminuição de tamanho

nos componentes trouxe um enorme benefício ao controle de EMI e à manutenção da

integridade dos sinais na PCI de circuitos que operam em altas frequências.

30

A questão mais relevante na seleção dos componentes digitais com

características de baixo ruído é a taxa de variação de energia. A tensão induzida por um

ruído de um circuito fonte em outro circuito é dada por:

dt

diMV −= (Volts) (6.1)

onde M é a indutância mútua entre os dois circuitos. Ou também, podemos ter:

dt

dvCV = (Volts) (6.2)

onde C é a capacitância entre os dois circuitos.

A indutância mútua, M, depende da área da corrente de loop entre o circuito

fonte e o circuito vítima do ruído, direção, distância de separação e a altura dos circuitos

em relação a referência terra. As correntes de loop do circuito fonte e do circuito vítima

podem ser comparadas as correntes do enrolamento primário e secundário de um

transformador. A capacitância C depende da distância entre os condutores associada à

área dos condutores e a impedância Z é a impedância entre terra e o circuito vítima. O

circuito vítima e o circuito fonte atuam como um capacitor de placas paralelas,

conforme ilustrado pela fig. 6.1 e 6.2.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.1 – Indutância Mútua entre dois sistemas

31

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.2 – Capacitância Mútua entre dois sistemas

5.3 Famílias lógicas e a relação dV/dt

A tabela 6.1 a mostra diversas famílias lógicas e seus respectivos tempos de

subida, bem como suas taxas de variação de tensão. Quanto mais rápido o tempo de

subida e a tensão de trabalho, maior é a relação dV/dt. Usar o menor tempo de subida

que ainda permita o funcionamento desejável do circuito diminui a quantidade de ruído

gerado. Outra razão para se usar componentes com o menor tempo de subida possível é

limitar as harmônicas de alta frequência do sinal digital. Devido ao caminho das trilhas

de uma PCI agirem como uma antena e irradiar ruídos de alta frequência, limitar as

harmônicas desnecessárias de alta frequência previne essa irradiação desnecessária.

Família Lógica Tempo de subida (ns) Tensão de trabalho (V) dV/dt (V/ns)CMOS 5 V 100 5 0,50CMOS 12 V 25 12 0,48CMOS 15 V 50 15 0,30

HCMOS 10 5 0,50TTL 10 3 0,30

ECL 10K 2 0,8 0,40ECL 100K 0,75 0,8 1,10

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Tab. 6.1 – Características das Famílias Lógicas

32

5.4 Famílias lógicas e a relação dI/dt

Como resultado do empilhamento dos estágios de saída dos circuitos lógicos

dentro do CI, quando o nível lógico é alterado, os transistores se desligam geralmente

mais rápido do que se ligam e, conseqüentemente, drenam uma grande corrente

transitória de Vcc durante esta transição. Isto induz correntes transitórias no Vcc e no

GND.

O estágio de saída da família TTL possui um resistor limitador de corrente. A

família CMOS não possui esse resistor e, por esse motivo, drenam uma corrente no

transitório (chegando a valores maiores que 5 A/s) se comparado a família TTL.

Uma maneira de minimizar este fenômeno é a utilização de capacitores de

desacoplamento. O capacitor de desacoplamento, que irá suprir a necessidade de

corrente durante a fase de transição lógica, é um capacitor conectado entre Vcc e GND,

conforme ilustrado fig. 6.3 e 6.4. É importante, porém, que se considere manter o

terminal do capacitor de desacoplamento com o menor tamanho possível a fim de evitar

o aparecimento de indutâncias parasitas, além de montar o capacitor o mais próximo

possível aos terminais do CI, diminuindo assim a área de retorno de uma possível

corrente parasita.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.3 – Estágios de saída família TTL e CMOS

33

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.4 – Montagem de capacitor de desacoplamento

5.5 Limiar de Imunidade

A utilização de um transmissor manual é uma boa maneira de se determinar as

características de imunidade dos equipamentos eletrônicos e, através da utilização deste

transmissor, é possível calcular-se a intensidade aproximada do campo ao qual este

transmissor está imerso. Com este dado, é possível a determinação dos valores

absolutos de imunidade dos equipamentos e também as melhorias necessárias que

devem ser feitas, ou mesmo o resultado destas melhorias, no caso de uma verificação.

Para se calcular o valor aproximado do campo ao qual um transmissor está

submerso, pode-se utilizar a seguinte fórmula.

DP5,5.E = (6.3)

onde,

E= Campo Elétrico (V/m);

P= Potência (W);

D= distância do transmissor (m).

34

É importante estar claro que, nessas condições, o equipamento sob teste está

imerso a um ambiente de campo próximo (near-field). Através da medição do campo

elétrico no qual o DUT está submerso, é necessário determinar-se qual a intensidade do

mesmo que causa uma falha no DUT, em termos da distância do transmissor. Desta

forma, melhorias podem ser feitas ou mesmo verificação posterior destas melhorias.

5.6 Boas Práticas na Indústria Automotiva

Com relação aos chicotes elétricos na indústria automotiva e a interação entre as

diversas instalações elétricas em um veículo, criou-se uma lista de “melhores práticas” a

fim de auxiliar os engenheiros no desenvolvimento dos sistemas automotivos. Como se

trata de uma lista de “melhores práticas” faz-se necessário o entendimento de que nem

todas as práticas são aplicáveis a todos os equipamentos a todo o tempo. É necessário

entender-se a lógica que existe por trás de cada “boa prática” para avaliar se esta prática

é necessária para determinada aplicação. A lista de “melhores práticas” a seguir não

inclui todos os casos de problemas com fiação na indústria automotiva e tem apenas a

idéia de trazer uma possível solução para os casos que vivenciem o mesmo problema.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Tab. 6.2 – Boas Práticas na Indústria Automotiva

Boa Prática Razão

Organizar os fios de modo a estarem longe dos sistemas de ignição, chicotes de sistemas

secundários e velas de ignição

Podem ocorrer ruídos devido ao campo elétrico presente

Não misturar fios da antena, auto falantes e potência do rádio com fios do chicote elétrico

de outros sitemas

Podem ocorrer ruídos devido ao campo magnético presente

35

5.7 Sistemas de Ignição

5.7.1 Velas de Ignição

Embora a inserção de um resistor em série com a vela de ignição fosse um bom

método para a supressão de oscilações indesejadas, houve uma apreensão considerável

por parte dos engenheiros de desenvolvimento quanto à possibilidade deste método

prejudicar a eficiência do sistema de ignição devido a diminuição da energia de pico no

momento da faísca que é dada pela vela de ignição. Exaustivos testes foram realizados e

mostraram que a utilização de resistores de até 150 kΩ, muitas vezes superiores aos

utilizados como resistores de supressão, praticamente não representavam nenhuma

influência com relação ao torque, potência e consumo específico de combustível

(RYBACK; STEFFKA, 2004). A fig. 6.5 mostra a relação entre consumo específico de

combustível e potência do motor para três diferentes velas de ignição: Uma sem resistor

de supressão, outra com resistor de supressão de 10 kΩ e outra com resistor de

supressão de 20 kΩ.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.5 – Comparativo de potência e consumo específico com diversos valores de resistor de supressão

36

Outro ponto de estudo com relação à utilização dos chamados resistores de

supressão é que a utilização dos mesmos poderia intensificar os problemas de partida a

frio. Resultados de testes altamente controlados realizados pelo laboratório americano

da U.S Signal Corps Engineering demonstraram que para temperaturas inferiores a -30

F, o equivalente a aproximadamente -34,5 ºC, resistores de supressão não trazem

nenhum impedimento a partida do motor e, surpreendentemente, em alguns casos até

permitem a partida quase imediata no motor que, nas mesmas características de partida

levariam muito mais tempo sem o resistor de supressão (RYBACK; STEFFKA, 2004).

Aparentemente, o componente indutivo presente no momento da descarga elétrica na

ignição está mais propensa a afetar a ignição em partidas com temperaturas

extremamente baixas que a componente capacitiva. A componente indutiva aparecendo

no momento da faísca no formato de uma corrente contínua que flui através de um

resistor de supressão, com sua energia total liberada em um menor tempo mostra-se

mais efetiva no processo de ignição de gasolina fria se comparado ao mesmo valor de

energia mais distribuído ao longo do tempo. Os resultados destes testes de laboratório

são mostrados na fig. 6.6 e 6.7.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.6 – Comparativo de tempo de partida em um motor com diversos valores de resistor de supressão

Outro benefício inesperado com a utilização de resistores de supressão é que a

falha da vela de ignição por onde se dá a faísca, também conhecida como gap, é muito

menor ao longo do tempo se comparada como velas de ignição sem resistor de

Tempo de partida a frio

0

30

60

90

120

150

180

210

240

2 4 6 8 10

Temperatura (F)

Tem

po d

e pa

rtida

(seg

)

Sem resistor de supressão

Com resistor de 10 kOhm

- 10 - 20 - 30 - 35 - 40

37

supressão. Um estudo feito com diferentes motores de combustão operando em

diferentes faixas de rotação e plena carga mostrou que o aumento do gap nas velas com

resistores de supressão chega a ser 50% menor que em velas sem resistores de

supressão.

Na prática, é desejável que os motores que utilizarão resistores de supressão visando

minimizar os problemas de interferência eletromagnética venham equipados com velas

que tenham resistores integrados. Algumas vantagens que podem ser citadas ao se

empregar os resistores dessa maneira são:

Resistores de supressão integrados são mais efetivos por não possuírem nenhum

cabo que esteja exposto a alta tensão, o que não acontece no caso da utilização

de supressores externos e que podem irradiar uma quantidade considerável de

interferência;

A questão do estoque e abastecimento dos fornecedores se torna mais simples,

uma vez que não são necessárias peças separadas;

A não utilização dos supressores por falta de conhecimento ou negligência é

resolvida quando estes estão integrados.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.7 – Resistor de supressão integrado a vela de ignição

Como já citado anteriormente, as velas de ignição com resistores integrados

devem ser preferencialmente usadas, no entanto, existem aplicações onde a montagem

da vela ao cabeçote restringe o tamanho da vela e, desta forma, torna-se necessária a

38

utilização de um resistor de supressão externo. Neste caso, a utilização de resistores no

conector do cabo de vela pode diminuir significativamente o problema com a irradiação

eletromagnética, conforme a fig. 6.7. De forma geral, quanto mais próxima o resistor de

supressão estiver da fonte de radiação (gap), mais eficiente será a supressão de ruído.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.8 – Resistor de supressão integrado ao cabo de vela

5.7.2 Cabeamento de Ignição

Chicotes elétricos ligados a parte de ignição não são fontes de interferências por

si só, porém, podem servir como fontes de irradiação de interferência de outras fontes.

Existem situações transitórias de tensão bruscas que se deve ao chaveamento da bobina

de ignição para a produção da faísca presentes na conexão entre cabos. Mesmo que

estas estejam bem blindadas, ainda assim podem irradiar interferência. Desta forma,

deve-se dar tanta atenção a interferência emanada tanto das conexões elétricas quanto

das fontes dos quais provêem esta interferência.

O chicote elétrico da parte de ignição pode ser dividido em duas partes: O

cabeamento de alta tensão e o cabeamento de baixa tensão. O cabeamento de alta tensão

resume-se na conexão entre as velas de ignição e a bobina de ignição. O cabeamento de

39

baixa tensão inclui a alimentação da bateria e a conexão à bobina de ignição. O

cabeamento de alta tensão é mais crítico devido à presença da própria alta tensão e dos

transitórios de tensão nas conexões elétricas. Estes transientes de tensão podem ser

reduzidos através da instalação de resistores de supressão ao longo do chicote elétrico,

no entanto, ainda assim faz-se necessário certo nível de blindagem para evitar a

irradiação da interferência. Blindagens para o cabeamento de alta tensão podem variar

em sua forma de construção desde formas básicas com baixa eficiência, como, por

exemplo, o fato de entrelaçar os cabos com uma capa que serve como blindagem, desde

o enlace dos fios com duas ou três camadas blindadas através de um conduto totalmente

blindado, o que eleva a eficiência a qualquer nível, desde que se aumente a espessura da

parede do conduto. O grau de blindagem vai depender da quantidade de energia

irradiada pelo conjunto que necessita ser suprimida.

Existem condutos blindados flexíveis que oferecem um grau de blindagem alta e

são efetivos na blindagem do chicote de ignição. São formados por fios enrolados em

forma de espiral que são colocados de modo a cobrir totalmente o cabo. Para aumentar o

nível de blindagem, podem ser acrescentadas ainda outras camadas destes fios,

conforme ilustrado pela fig. 6.9. A utilização destes condutos blindados flexíveis possui

algumas desvantagens e sua utilização deve ser reduzida a menor quantidade possível.

As principais desvantagens são:

Custo alto;

Sua construção requer quantidades consideráveis de cobre, latão e/ou bronze.

Fonte – RYBACK; STEFFKA, 2004.

Fig. 6.9 – Cabo blindado

40

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

6.1 Conclusão

Por toda a conceituação deste trabalho é notável que sistemas interativos, além

do aumento da eletrônica embarcada em veículos faz parte da realidade atual e o seu

aumento é um assunto indiscutível. A metodologia utilizada pela indústria automotiva

visando EMC tende a se desenvolver ainda mais, uma vez que com o aumento dos

sistemas eletrônicos incorporados aos veículos, novos desafios relacionados à EMC

virão e a indústria deverá estar preparada para superar tais desafios.

Conclui-se, além disso, que muitas vezes a mitigação da interferência

eletromagnética é um assunto de relativa baixa complexidade se tratado durante a fase

do desenvolvimento dos sistemas. Relacionado a esta relativa baixa complexidade está

o menor custo para que se atinja EMC nesta fase. Caso o assunto EMC seja tratado com

negligência pelos engenheiros de desenvolvimento de sistemas, as conseqüências

podem ser catastróficas, além de elevado custo e complexidade para que o sistema se

torne imune e/ou menos susceptível.

Na área automotiva, uma vez que o custo da utilização de combustíveis fósseis

vem aumentando, tanto financeiros quanto ambientais, a utilização de veículos híbridos

e elétricos vem ganhando espaço no mercado. Este tipo de veículo traz consigo um

grande desafio, uma vez que geram campos magnéticos e elétricos de alta intensidade e

baixa frequência. Estes campos eletromagnéticos de alta intensidade e baixa frequência

não devem causar interferências em muitos outros sistemas de eletrônica embarcada,

PCIs ou componentes de comunicação que estejam integrados aos veículos ou que

estejam sendo utilizados pelos passageiros. A maioria das ferramentas de análise de

EMC e suas técnicas focam tanto frequências baixas quanto altas. Muitos estudos já

vêm estão sendo realizados, porém, serão necessários muitos outros para que estes

problemas sejam resolvidos (ARCHAMBEAULT; BRENCH; CONNOR, 2009).

Por fim, conclui-se que o Brasil está demasiadamente atrasado com relação a

normatização de EMC. As normas que são utilizadas nacionalmente são normas

americanas e/ou européias, faltando um padrão nacional que possa normatizar valores

máximos, além de definir padrões para sua medição. Considerando o Brasil um país

41

emergente na produção de veículos, é necessário que haja um comitê para a criação de

uma norma brasileira (NBR), visando esta regulamentação.

6.2 Trabalhos Futuros

Visto que no Brasil não há uma norma que regulamente EMC, uma proposta de

trabalho é a realização de um comparativo entre as normas internacionais existentes,

destacando pontos fortes e fracos de cada uma delas, visando o início de um trabalho

para a proposta de uma norma nacional.

Outra proposta de trabalho é o estudo de algumas ferramentas de simulação que

visam o estudo de EMC/EMI, uma vez que ferramentas de simulação vem ganhando

cada vez mais espaço no desenvolvimento de sistemas.

42

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

RYBACK, T.; STEFFKA, M. Automotive Electromagnetic Compatibility (EMC).

Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2004.

SHIMITT , R. Electromagnetics explained: a handbook for wireless/RF, EMC, and

high-speed electronics. Massachusetts: Newnes Elsevier Science, 2002.

ARCHAMBEAULT, B.; BRENCH, C.; CONNOR, S. Review of Printed-Circuit-

Board Level EMI/EMC Issues and Tools. Invited Paper- IEEE, 2010.

PAUL, C. Introduction to Electromagnetic Compatibility. 2 ed. New Jersey: John

Wiley & Sons, Inc., 2004.

CHENG, D. Field and Wave Electromagnetics. USA: Addison-Wesley Publishing

company, 1983.

O’HARA, M.; COLEBROOK, J. Automotive EMC test harness: standard lengths

and their effect on radiated emissions. Istanbul. IEEE Symposium on

Electromagnetic Compatibility, 2003.

ROTHWELL, E.; CLOUDE, M.. Electromagnetics. USA: CRC Press LLC, 2001.

ADLER, U. Interference Suppression- Technical Instruction. Stuttgart: Robert

Bosch Ltda, 1979.

Revista Quatro Rodas- Auto Serviço- Mais vendidos. Disponível em <http://

http://quatrorodas.abril.com.br/QR2/autoservico/top50/2010.shtml>. Acesso em 25 out.

2010.

43

GLOSSÁRIO

Campo Distante A região que se estende por mais de dois

comprimentos de onda. O campo distante é

definido como sendo a região a partir de λ/2π ou

2D2/λ, o que for maior.

Campo Próximo A região localizada a menos de um comprimento

de onda da fonte é chamada de campo próximo.

Emissões Conduzidas Transmissão de interferência por um sistema

através de um meio físico

Emissões Radiadas Transmissão de interferência por um sistema

através do espaço livre.

Imunidade Conduzida Propriedade de um sistema a ser imune a

interferência causada através do meio físico.

Imunidade Radiada Propriedade de um sistema a ser imune a

interferência proveniente do espaço livre.

Zona de transição A região entre o campo distante e o campo

próximo. Esta região contempla algumas

características do campo próximo e do campo

distante.